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REVISÕES & ENSAIOS IDADE ÓSSEA EM PEDIATRIA Instituto da Criança do Hospital das Clinicas da Faculdade do Medicina da Universidade de São Paulo. 1 Professor Titular de Pediatria Preventiva & Social FMUSP Aceito para publicação em 10 de abril de 1960 EDUARDO MARCONDES 1 Idade óssea (IO) é o índice do desenvolvimento do esque- leto, um aspecto da maturação do indivíduo. Na grande maioria das crianças, o crescimento físico, vale dizer, o aumento da estatura, está muito bem balanceado com diferentes aspectos da maturação, como o desenvolvimento ósseo, o sexual, o men- tal, o dentário, o neuromotor e outros, de modo a ser possível, do ponto de vista clínico, considerá-los, todos, como componen- tes de um mesmo processo. Conseqüentemente, infere-se que uma criança de estatura normal deve estar normalmente desen- volvida. Tal conduta é em parte justificada, pois os dois proces- sos (o crescimento e a maturação) iniciam-se e devem terminar juntos'. Maturidade é um produto final, um estado acabado e matu- ração pode ser entendida como o processo através do qual o ponto final é atingido. A maturidade morfológica é inevitável para todos os indivíduos, porém chega mais cedo na vida para uns e mais tarde para outros, fenômeno esse que tem implicações na estatura final do indivíduo: de fato, a diferentes velocidades de maturação esquelética (em busca da maturidade do esqueleto) correspondem diferentes velocidades de ganho de estatura e diferentes produtos finais, isto é, diferentes estaturas finais. Claro está que nem todos os sistemas fisiológicos da criança maturam a uma mesma velocidade. Ao final do primeiro ano o cérebro apresenta toda a população neuronal disponível para o resto da vida, mas os órgãos genitais estão neste mo- mento em fase de franca imaturidade, muito mais distante do estado adulto do que o cérebro. É provável que exista um meca- nismo de regulação central da maturação da criança como um todo, mas há, também, independência entre os diferentes setores e daí os distintos tempos de maturidade (cerebral, dentária, esquelética e outros ").

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REVISÕES & ENSAIOS

IDADE ÓSSEA EM PEDIATRIA

Instituto da Criança do Hospital dasClinicas da Faculdade do Medicina daUniversidade de São Paulo.1 Professor Titular de PediatriaPreventiva & Social — FMUSPAceito para publicação em 10 deabril de 1960

EDUARDO MARCONDES 1

Idade óssea (IO) é o índice do desenvolvimento do esque-leto, um aspecto da maturação do indivíduo. Na grande maioriadas crianças, o crescimento físico, vale dizer, o aumento daestatura, está muito bem balanceado com diferentes aspectosda maturação, como o desenvolvimento ósseo, o sexual, o men-tal, o dentário, o neuromotor e outros, de modo a ser possível,do ponto de vista clínico, considerá-los, todos, como componen-tes de um mesmo processo. Conseqüentemente, infere-se queuma criança de estatura normal deve estar normalmente desen-volvida. Tal conduta é em parte justificada, pois os dois proces-sos (o crescimento e a maturação) iniciam-se e devem terminarjuntos'.

Maturidade é um produto final, um estado acabado e matu-ração pode ser entendida como o processo através do qual oponto final é atingido. A maturidade morfológica é inevitável paratodos os indivíduos, porém chega mais cedo na vida para uns emais tarde para outros, fenômeno esse que tem implicações naestatura final do indivíduo: de fato, a diferentes velocidades dematuração esquelética (em busca da maturidade do esqueleto)correspondem diferentes velocidades de ganho de estatura ediferentes produtos finais, isto é, diferentes estaturas finais.

Claro está que nem todos os sistemas fisiológicos dacriança maturam a uma mesma velocidade. Ao final do primeiroano o cérebro já apresenta toda a população neuronal disponívelpara o resto da vida, mas os órgãos genitais estão neste mo-mento em fase de franca imaturidade, muito mais distante doestado adulto do que o cérebro. É provável que exista um meca-nismo de regulação central da maturação da criança como umtodo, mas há, também, independência entre os diferentes setorese daí os distintos tempos de maturidade (cerebral, dentária,esquelética e outros ").

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É nesse contexto que se pretende rever neste artigo ascaracterísticas, a importância clínica e o manejo adequado da IOcomo índice da maturação do esqueleto. Em que pese a necessi-dade de equipamento radiológico, a IO é dado de fácil obtençãoe rápida interpretação, muito útil na apreciação do crescimentoe desenvolvimento da criança, desde que o pediatra esteja devi-damente informado sobre as peculiaridades de seu uso clínico,o que inclui certamente suas limitações.

INFORMAÇÕES BÁSICAS SOBRE A IDADE ÓSSEA16618.

O valor da IO como índice de desenvolvimento esqueléticoé reconhecido há decênios. A maturação do esqueleto está soba influência de fatores

— genético-constitucionais— hormonais (com ênfase no hormônio tireoidiano)— nutricionais— sócio-econômicos— climáticos e sazonais— bioquímico-farmacológicos

podendo mostrar atraso ou aceleração em função da presença deinúmeras doenças. Realiza-se através da progressiva minerali-zação dos núcleos dos ossos curtos e das epífises dos ossoslongos, presentes no tecido cartilaginoso preexistente. Paralela-mente, a cartilagem de conjugação determina o progressivocrescimento dos ossos longos rumo à dimensão e forma finais:a parada do crescimento ósseo coincide com a ossificação com-pleta da cartilagem de conjugação. Há no corpo humano 800centros de ossificação, metade dos quais se desenvolvem aindana vida intra-uterina. Três núcleos clássicos estão presentes aonascimento constituindo-se em índices de maturidade fetal:núcleo distai do fémur (núcleo de Beclard), dp calcáneo e doastrágalo. Em que pese todo o avanço científico na área médicañas últimas décadas, o processo íntimo da ossificação é poucoconhecido3.

Vários autores apontam a influência do sexo, comprovandoo fato de as meninas apresentarem maior velocidade de matu-ração esquelética do que os meninos durante quase todo operíodo de crescimento, sobretudo a partir de 10 a 12 anos deidade. A velocidade de ossificação é um traço hereditário. Estu-dos de gêmeos, irmãos comuns e primos, bem como estudosde duas gerações, valorizam a influência genética: afirma-se quea velocidade de maturação é herdada autossomfeamente ". Háuma relação básica geneticamente controlada entre maturaçãofísica, esquelética e dentária2 c 19

V eventualmente mascarada emodificada pelos fatores ambientais. Variabilidade em função daestação do ano já foi referida6. Fatores étnicos não podem seresquecidos4.

Vários métodos de leitura das radiografias são preconizados:método clássico inspecionai, de uma ou mais áreas do corpo,ou mensuração do tamanho dos núcleos e comparação compadrões de referência (atlas). O método de Oxford confere pon-tos a cada um dos núcleos considerados e a soma total dos

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pontos fornece a localização da criança numa determinadaescala: este método é muito mais preciso, mas os anteriores sãocertamente mais úteis pela simplicidade.

A escolha de zona a ser radiografada para a determinaçãoda IO é assunto controvertido na literatura. Vários autores men-cionam uma importante assimetria entre as duas mãos a pontode escreverem que as diferenças podem ser tão intensas que éde se duvidar do valor da radiografia de mãos e punhos comoíndice do desenvolvimento de qualquer outra parte do corpo.Afirma-se que o lado esquerdo apresenta velocidade de matu-ração maior do que o lado direito, e por isso muitos autores seutilizam somente da radiografia da mão esquerda. No entanto,nem todos encontram assimetria importante entre um lado eoutro, afirmando-se que as diferenças entre os dois lados sãotão pequenas que devem ser esquecidas na avaliação da IO pormeio de radiografias5. Embora haja referência na literatura aoutras áreas que não as das mãos e as dos punhos, estas éque são utilizadas pela quase totalidade dos pesquisadores.Não se deve esquecer que é uma zona de fácil acesso, nãoapresenta riscos, não traz incômodo para os pacientes e temdezenas de centros de ossificação, 80% dos quais aparecematé mais ou menos 6 anos de idade.

Verificou-se que os ossos do carpo são muito mais variáveisdo que os do metacarpo, das falanges e extremidades distaisdo rádio e do cubito. Alguns autores recomendam ignorar ocarpo desde que haja outros núcleos à disposição do médico,e outros preconizam o uso de "idade cubital", "idade ilíaca" e"idade sesamóide", mais adequadas como índice de desenvolvi-mento esquelético do que as idades ósseas médias, ou então,a utilização de duas idades ósseas: idade óssea de osso redondoe idade óssea de osso longo20.

Estudaram-se com profundidade os erros sistemáticos evariáveis na interpretação das radiografias "• M e 15. Verificou-senão haver erro importante em relação aos seguintes fatores:atlas utilizado, idade da criança, sexo, diferença entre IO e 1C,diferenças entre radiografias de diversas crianças e pressa naapreciação das chapas. Houve problema quanto à qualidade dasradiografias. O método de medir o tamanho dos núcleos é maissujeito a erros do que q método inspecionai, este muito maissimples. Verificou-se, também, que o erro na leitura de radio-grafias em duplicata por um mesmo observador é muito pequeno:o mesmo não ocorre na leitura de uma mesma radiografia pordois observadores, e daí a necessidade de os estudos seremfeitos sempre por um mesmo observador. Este comete erros,porém surpreendentemente constantes para cada um deles: umavez treinado, atinge seu próprio nível de interpretação e torna-sede grande confiança para estudos populacionais e evolutivos.O método é digno de confiança para comparar a IO de grupos,mas de valor duvidoso se baseado em uma única radiografia.

Em que pese uma importante variabilidade na época deaparecimento dos núcleos de ossificação (vide em seguida), aordem de aparecimento é bastante constante. Para as mãos epunhos (30 centros) a ordem de início da ossificação dos centrosé a seguinte19 (fig. 1):

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1. Grande osso2. Ganchoso3. Distal da epífise do radio4. Epífise da falange proximal do 3.° dedo5. idem do 2.° dedo

*6. ídem do 4.° dedo7. Epífise do metacarpo II8. Epífise da falange distal do 1.° dedo9. Epífise do metacarpo III

10. Epífise do metacarpo IV11. Epífise da falange proximal do 5.° dedo12. Epífise da falange média do 3.° dedo13. idem do 4.° dedo14. Epífise do metacarpo V15. Epífise da falange media do 2.° dedo16. Piramidal17. Epífise da falange distal do 3.° dedo18. idem do 4.° dedo19. Epífise do metacarpo I20. Epífise da falange proximal do 1.° dedo21. Epífise da falange distal do 5.° dedo22. idem do 2.° dedo23. Epífise da falange média do 5.° dedo

'24. Semilunar•25. Trapézio*26. Trapezoide•27. Escafóide28. Epífise do cubito29. Pisiforme30. Sesamóide do adutor do polegar

• Centros mala sujeitos a variações.

As idades mais freqüentes de aparecimento dos 8 núcleosdo punho e dos 2 núcleos distais dos ossos do braço são apresen*tados a seguir (tabela 1).

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O último núcleo a surgir é o correspondente ao sesamóidedo adutor do polegar: 12 anos e 8 meses no sexo masculino e10 anos e 1 mês no sexo feminino. Aceita-se que seu apareci-mento é o "início do fim" da ossif¡cação dos ossos do carpo,e portanto de mau prognóstico para as crianças de baixa estatura.

O fato da IO ser determinada por comparação com padrõespreestabelecidos, e de serem estes geralmente os apresentadospor Greulich & Pyle9, faz com que seja de validade duvidosas aaplicação dos resultados em crianças não americanas. Sendo,no momento, impossível a confecção de um Atlas a partir decasuística brasileira, a alternativa seria a determinação dosdesvio da IO de crianças normais brasileiras em relação ao Atlasde Greulich & Pyle e obtenção de fatores de correção. Foi o quese fez16e 17 a partir do estudo de 135 crianças brasileiras, eutrófi-cas, de 9 meses a 12 anos de idade, sendo 65 do sexo femininoe 70 de sexo masculino.

Os resultados permitiram as seguintes conclusões:1. Para lactentes: em ambos os sexos, os valores médios

obtidos apresentam uma diferença com os de Greulich &Pyle clinicamente desprezível, com um desvio-padrão damédia a 5,2 meses, vale dizer, 6 meses na prática;

2. Para pré-escolares: no sexo masculino, constata-se umatraso em relação aos valores de Greulich & Pyle daordem de 11 meses no início do período (24 meses deidade cronológica) e de 4 meses no final (83 meses)com um desvio-padrão da média igual a 10,9 meses, valedizer, 1 ano na prática; no sexo feminino, constata-se,surpreendentemente, que os valores médios superam osdados de Greulich & Pyle em 2 meses durante todo operíodo, com um desvio-padrão da média igual a 15,6meses.

3. Para escolares: no sexo masculino, foi observado umatraso em relação aos valores de Greulich & Pyle muitogrande no início do período (84 meses de idade crono-lógica), cerca de 19 meses, com valores decrescentescom o aumentar da idade cronológica, de tal sorte queno final do período (138 meses de idade cronológica) oatraso é de 9 meses, com um desvio-padrão da médiaigual a 12,1 meses; no sexo feminino a situação é quali-

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tativamente semelhante (diminuição do atraso com oaumentar da idade cronológica), porém quantitativamentediferente: o atraso no início é da ordem de 6 meses, nofinal do período não há atraso: desvio-padrão da médiaigual a 12,8 meses.

Através da utilização do Atlas de Greulich & Pyle, quaisseriam então os limites da normalidade de IO para nossas crian-ças? Em primeiro lugar, consideremos que o valor esperado ± 1vez o desvio-padrão corresponde à faixa da normalidade; o valoresperado — 1,96 vezes o desvio-padrão significa IO seguramenteatrasada; o valor esperado + 1,96 vezes o desvio-padrão signi-fica IO seguramente adiantada; entre os valores normais e osseguramente atrasados e adiantados há valores de IO cujo signi-ficado clínico é bioestatisticamente indefinido, cabendo ao pedia-tra julgá-los à luz de outros dados clínicos e laboratoriais. Emsegundo lugar, substituamos o desvio-padrão exato obtido emtrabalho anterior17 (um desvio para cada idade cronológica) porum valor médio arredondado válido para as duas faixas etárias(lactentes e pré-escolares) e cada sexo, bem como arredondemoso número 1,96 para 2,0. A esta altura, façamos um resumo dosprincipais dados quanto ao Atlas de Greulich & Pyle e a questãodos desvios:

— quanto às diferenças em relação ao Atlas de Greulich &Pyle:sem diferença: lactentes de ambos os sexos

pré-escolares e escolares de sexo femininomenos seis meses: pré-escolares de sexo masculinomenos doze meses: escolares de sexo masculino

— quanto ao desvio-padrão da média:seis meses: lactentes de ambos os sexosdoze meses: pré-escolares e escolares de ambos os

sexos

Assim decidido, apresenta-se na tabela 2 os valores da IOpara nossas crianças, de 2 a 12 anos de idade, resultado finalcom valores reconhecidamente arredondados de uma investiga-ção que procurou estabelecer padrões de normalidade paracrianças normais de São Paulo a partir de um atlas construídopara crianças normais norte-americanas. Trata-se, na realidade,um "versão prática" de grande utilidade no dia-a-dia do pediatra.

UTILIZAÇÃO CLÍNICA DA IDADE ÓSSEA

A IO é o tempo de crescimento. Sendo certo que o cresci-mento cessa (praticamente) com o fechamento da cartilagemde conjugação, e sendo esse fenômeno um dos dados da matu-ração do esqueleto que se aceita ser medida pela IO, claro estáque a IO é muito mais "idade de crescimento" do que a idadecronológica do indivíduo. Considere-se o crescimento físico(avaliado através da estatura e do peso) como C e a IO comoindicativo de maturação, M. Normalmente C e M são bem balan-ceados apresentando uma velocidade equivalente, isto é, a umaunidade de ganho de altura, por exemplo, corresponde uma uni-dade de ganho de maturação, no mesmo tempo decorrido. Todosos processos capazes de perturbar o crescimento e desenvolvi-mento da criança e que evoluem com atraso equivalente de

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C e M, determinam a conservação do potencial de crescimento,visto que a desaceleração de M equivale a uma espera até que Cpossa superar os agravos. O caso contrário (atraso de C e velo-cidade conservada de M) significa "perda de tempo" para C,visto que está havendo uma diminuição do tempo útil de cresci-mento. Na medida em que ambas as idades, a cronológica e aóssea, são de mesmo valor, têm logicamente o mesmo valorclínico. Contudo, IO atrasada em relação à idade cronológicasignifica que — considerado aquele momento — a criança temmais anos para crescer do que permitiria supor sua idade crono-lógica. E vice-versa no caso de IO avançada. Por isso, IO atrasadamelhora o prognóstico quanto à estatura final em crianças comcrescimento deficiente e é de "mau agouro" para meninas queestão crescendo muito!

Resulta, pois, muito importante o estudo evolutivo da IOno seguimento de crianças com problemas de crescimento:nesse sentido, uma determinação anual é muito útil (por exem-plo, no mês do aniversário da criança). Tal estudo deverá serfeito através do auxograma.

Idade óssea noauxograma

O auxograma é um dos métodos gráficos de expressar osdiferentes aspectos do crescimento. O método proposto é modi-ficado de Escalona8 e consiste num sistema biotipológico abertoque se fundamenta no princípio das variações individuais emtorno de medidas médias estabelecidas para cada idade e cadasexo. Trata-se de um sistema de coordenadas em cuja abscissase encontram os meses ou anos de idade e na ordenada a idadecronológica (1C), idade altura (IA), idade peso (IP), idade óssea(IO), idade mental (IM) e idade genital (IG). A grande vantagemdo sistema proposto é a possibilidade de acompanhar simulta-neamente, em suas múltiplas correlações, vários dados docrescimento, todos avaliados através de um único parâmetro, o

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tempo. De fato, à medida em que utilizamos "¡dade-isto" e"idade-aquilo" estamos substituindo centímetros, quilos, númerode núcleos e aspecto clínico de desenvolvimento pubertário pormeses ou anos.

Vejamos alguns exemplos (fig. 2). Em l, trata-se de ummenino que aos 5 anos de idade (a) apresentava uma IA de3 anos, vale dizer, importante atraso do crescimento estatural,com peso proporcionado (IA = IP). Sua IO era de 2 anos e meio,IM equivalente à idade cronológica. IG irrelevante pela idadecronológica da criança. Revista a criança 18 meses após (b),constata-se: manutenção das posições relativas de 1C, IA e IO,isto é, velocidade iguais de crescimento (C) e maturação (M)bem como IO atrasada em relação à 1C. Comentário — Comofoi mantida a velocidade de crescimento estatural, C = M eIO < 1C, conclui-se pelo bom prognóstico. Em II, trata-se (a)de um menino de 7 anos de idade cronológica, com 4 anos deidade altura, isto é, grave prejuízo do crescimento estatural:contudo, sua IO está atrasada em relação à 1C. IG irrelevantepela idade da criança. Revistó dois anos após (b), constata-seaceleração da velocidade de crescimento, pois o déficit de esta-tura em relação à 1C é menor do que na consulta anterior:contudo, a IO "disparou", e, de atrasada que era em (a), passoua ser equivalente a (b) na segunda consulta. Comentário — Emque pese a aceleração do crescimento estatural, C < M e IO =1C: o prognóstico em (b) é pior do que em (a). Em III, trata-sede uma menina que em (a) estava preocupada com sua estatura.De fato, o caso é de preocupar mesmo, pois sua IO está bematrasada em relação à 1C (C > M) o que significa que há aindarazoável tempo de crescimento, confirmado aliás pela IG, tam-bém atrasada. Revista dois anos depois (b), constata-se que asituação está mais preocupante: a menina cresceu ainda maise sua IO não acompanhou esse crescimento estatural, isto é,

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confirma-se C > M. Comentário — Pois é, vai mal essa menina,pois o atraso da IO e da IG bem como a persistência de C > Msugerem que a estatura final pode ser muito elevada, ocasionan-do eventuais problemas psicossociais.

O caso da prediçãoda estatura finalatravés da idade

óssea

IO tem sido utilizada para, em combinação com outrosdados, prever a estatura final de meninos e meninas. Desconhe-ço estudo brasileiro a respeito.

Um dos trabalhos mais recentes (e de fácil aplicação) éde autoria de Roche, Wainer & Thissen21: trata-se do métodoRWT, que utiliza a idade óssea, o peso, a altura deitada (ou aestatura + 1,25cm) e a média aritmética da altura dos pais.Para cada idade das crianças em estudo, há fatores de correção,podendo ser positivos ou negativos: a soma algébrica de todosos valores fornece a predição média da estatura final: umafigura adicional permite estabelecer a faixa de predição, isto é,os limites inferior e superior da estatura final para um deter-minado caso, com 90% de probabilidade de acerto segundo osautores do método. Os fatores de correção são apresentados natabela 3, para meninos de 1 a 16 anos de idade e para meninasde 1 a 14 anos. A fig. 3 permite estabelecer os limites inferiore superior da estatura final.

Vejamos um exemplo (tab. 4). Predição da altura final deum menino de 6 anos e 3 meses de idade cronológica, comaltura (deitado) de 108,7cm, peso 17,4kg, estatura média dospais de 169,0cm e idade óssea de 5,4 anos. Os cálculos são osseguintes, a partir da tabela 3.

Os autores do método RWT lembram que ele foi desenvol-vido a partir de crianças norte-americanas sadias e de corbranca. Erros .poderão ocorrer em virtude de medição inacurada,das falhas intrínsecas da própria idade óssea e de i n terço r ré n-cias mórbidas no decorrer da vida da criança. Pergunto: seriaaplicável às nossas crianças o método RWT tal como publicado?

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Idade óssea emalgumas situações

clínicas

As dez causas mais freqüentes de atraso na IO são asseguintes:

1. Atraso de causa familiar2. Hipotireoidismo (atraso muito intenso)3. Hipopituitarismo (atraso moderado)4. Desnutrição prolongada5. Doenças crônicas de um modo geral6. Condrodistrofias (por exemplo, acondroplasia)7. Mucopolissacaridoses (por exemplo, Síndrome de

Hurler)8. Hipogonadismos e agenesia gonadal (por exemplo, Sín-

drome de Turner)9. Doença de Addison

10. Mongolismo

As dez causas mais freqüentes de avanço na IO são asseguintes:

1. Avanço de causa familiar2. Hipertireoidismo (não é achado constante)3. Síndrome adrenogenital4. Puberdade precoce5. Tumores do ovario6. Tumores das células intersticiais testiculares7. Tumores do 3.° ventrículo envolvendo o hipotálamo8. Tumores da pineal (somente no sexo masculino?)9. Obesidade simples associada à estatura elevada

10. Síndrome de McCune-AIbright

Ao recém-nascido, não se aplica a idade óssea avaliadaatravés da radiografia de punhos e mãos visto que o primeironúcleo carpal é visualizado somente a partir do terceiro mês.Urge, pois, utilizar outras áreas para a avaliação da maturaçãoesquelética no período neonatal. Sénécal et ai.23 publicaraminteressante estudo de 994 recém-nascidos (incluindo 245 hipo-tróficos): nesse trabalho, os autores determinaram a idade ósseaatravés do estudo de cinco núcleos (distai do fémur — núcleode Beclard —, proximal da tíbia, cubóide, astrágalo e calcáneo)em relação aos quais determinaram estádios de maturação doque resultou uma soma de pontos. Foi possível, assim, deter-minar os percentis 10, 50 e 90 para recém-nascidos normais

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e hipertróficos da 26.a à 43.a semana de vida intra-uterina. Verifi-caram, também, que a maturação esquelética resiste melhor àdesnutrição fetal do que o crescimento físico avaliado pelaaltura e peso.

Em relação à desnutrição (distrofia por carência calórico-proteica), estudo 1Ó de 530 crianças de ambos os sexos, incluindo135 crianças bem nutridas, 276 moderadamente desnutridas e119 gravemente desnutridas (lactentes, pré-escolares e escola-res), mostrou atraso da idade óssea proporcional ao atraso docrescimento físico (peso e estatura). A fig. 4 mostra os histo-gramas das idades ósseas de pré-escolares bem nutridos (grupo1), moderadamente desnutrido (grupo 2) e gravemente desnutri-dos (grupo 3). Quando a IO é referida à idade cronológica,nota-se desvio de seus valores para a esquerda, isto é, IQatrasada em relação à idade cronológica, mais intensamente nogrupo 3, em ambos os sexos. Porém, se a IO for referida aopeso, não mais se nota o referido desvio, significando, pois,que os atrasos da IO e do peso são equivalentes. Assim, érecomendável que a interpretação da IO de crianças desnutridasseja feita por comparação com a idade peso (ou idade altura) enão com a idade cronológica.

Atraso da IO tem justificado o uso de terapia hormonal emalgumas situações controvertidas. Assim, Hermosa & Sobel10

recomendam o uso de T-3 em crianças de baixa estatura eIO atrasada, ainda que clínica e laboratorialmente eutireoidianas.

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Por outro lado, Rudman et al.22 afirmam que crianças de baixaestatura e resposta normal do hormônio do crescimento à insu-lina, respondem à ministração de 4 doses de hormônio de cresci-mento, tanto mais intensamente quanto maior o atraso da IO.

CASUÍSTICA

Caso / — Betânia — Pront. 1.690 (fig. 5) — Paciente de sexofeminino, nascida em 14/07/67, primeira consulta com 6a 3m.Levada ao Hospital por apresentar desenvolvimento insuficiente,anorexia e dor à micção. O exame físico revelou apenas palidezcutâneo-mucosa, além da baixa estatura.

Os diagnósticos à admissão foram desnutrição de 2.° grau,crescimento insuficiente, infecção urinaria (?), enterobiose eescabiose. A análise da curva de crescimento revela tratar-sede criança portadora de nanismo, porém com manutenção de boavelocidade de crescimento. As duas primeiras IO são 12 mesesatrasadas em relação à idade cronológica, o que melhora oprognóstico. No final do período, aceleração da velocidade docrescimento bem como da IO. Com 12 anos e 1 mês de idadecronológica: altura de 137cm, pubarca + +, telarca + e ausên-cia de menarca. Bom prognóstico, deverá atingir a altura finalmínima para sexo feminino que é de 150cm ou dela aproximar-se(predlção pelo método RWT = 150,33cm).

Caso 2 — Edmar — Pront. 1.267 — Paciente de sexo mascu-lino, nascido em 27/02/64, primeira consulta com 12a 1m.Levado ao hospital por insuficiente crescimento desde os primei-ros meses de vida. Vômitos desde o início da vida, cefaléiafrontotemporal há 7 anos. Alimento forçado, graves distúrbiosda dinâmica intrafamiliar: pai alcoólatra e mãe epiléptica sobcontrole. Exame físico sem dados positivos exceto a baixa esta-tura. Os diagnósticos à admissão foram criança pequena para aidade cronológica (limítrofe de nanismo), problema de escolari-dade e distúrbios emocionais. Não se dispõe de curva de cresci-mento. Três aferições de IO mostraram os seguintes resultados:

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Com 15a 8m a altura era de 155cm. Bom prognóstico em funçãode IO, deverá atingir a altura final mínima para o sexo masculinoque é de 160cm (predição pelo método de RWT = 161,31cm).

Caso 3 — Perci — Pront. 2.049 — Paciente de sexo mascu-lino, nascido em setembro de 1961, primeira consulta com 14anos, quando então sua altura era 146cm e seu peso 34.000g.Constatado baixo peso ao nascer (2.400g, 8 meses de gravidez)e má escolaridade. Na ocasião, sua IO correspondia a 13 anose um ano após, a 13 anos e 6 meses, vale dizer, baixa velocidadede maturação esquelética, pois em 12 meses de vida a IO pro-grediu apenas 6 meses. Ao mesmo tempo, o exame físico revelougenitalia em estágio II de Tanner, sem pêlos axilares, voz infan-til, isto é, puberdade moderadamente atrasada para a idadecronológica do paciente (15 anos e 3 meses) o que reforça obom prognóstico quanto à altura final. Revisto pela última vezcom 17 anos, altura igual a 161,0cm, normal aceitável para oadulto de sexo masculino, sobretudo porque — neste caso —pode-se prever ainda mais alguns centímetros pois é possívelque haja crescimento estatura! até 20 anos.

REFERÊNCIAS

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