id: 59683649 12-06-2015 corte: 1 de 10 destaque portugal

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Tiragem: 14617 País: Portugal Period.: Diária Âmbito: Economia, Negócios e. Pág: 4 Cores: Cor Área: 26,00 x 31,17 cm² Corte: 1 de 10 ID: 59683649 12-06-2015 Portugal na CEE: da inevitabilidade às crises de crescimento António Freitas de Sousa [email protected] Entre o ano de 1962, em que o velho ditador Oliveira Salazar testou a possibilidade de aproximar Portugal da então CEE, até à assinatura do Trata- do de Adesão em Lisboa (faz hoje 30 anos) – passando pelo período de consultas com vis- ta à adesão iniciado em 1972 por Marcello Caetano, pela reabertura do processo em 1977 pela mão de Mário Soares e pelo primeiro sucesso do grupo rock GNR “Portugal na CEE” (1981) – o país confron- tou-se com a inevitabilidade da adesão àquela estrutura pró-federativa europeia. Quase 600 anos depois do início da aventura portuguesa fora da Europa (a tomada de Ceuta, no Norte de África, foi em 1415), o país regressava exangue ao lugar de onde ti- nha partido: o império do Oriente desaparecera há mui- to, o império do Brasil também e o império africano estava no fim, acossado pela reserva dos nossos próprios aliados oci- dentais (entre eles o Papa Pau- lo VI e o Presidente norte- -americano John F. Kennedy) em aceitar a eternização da presença portuguesa naquele continente. Restava a Europa – e até Sa- lazar, um ano depois de o MPLA ter aberto o primeiro conflito armado nas colónias, percebeu isso. Os grandes grupos econó- micos também: António Cham- palimaud e o poderoso grupo CUF (da família Mello) multi- plicavam parcerias com empre- sários europeus, cuja face mais visível era a presença dos sue- cos da Eriksberg e da Kockums e dos holandeses da El NDSM, e da Wilton-Fijernoord no capital da Lisnave, o primeiro grande Adesão O balanço entre os prós e os contras da entrada de Portugal na CEE é claramente positivo. Do lado dos prós está a modernidade, a consolidação da democracia e o desenvolvimento. 30 anos de adesão à União Europeia Destaque António Vitorino Ex-comissário, ex-ministro do PS Portugal seria “um país substancialmente diferente” se não tivesse entrado na CEE. O saldo é, para o ex-comissário, muito positivo e do lado negativo só há a salientar “as dificuldades de adopção do euro” e a PAC. António Saraiva Empresário, presidente da CIP Há na Europa um lado não cumprido, diz o empresário. Falta federalismo e união bancária. Nesse quadro, diz, “não se pode falar verdadeiramente de coesão” nem de sentido político. Mas “o desenvolvimento é claro”. PORTUGAL ENTRA NA CEE COM... empreendimento nacional vi- rado para a economia interna- cional. “Portugal não tinha alterna- tiva”, diz o politólogo Viriato Soromenho Marques, autor da obra ‘Portugal na Queda da Eu- ropa’ – uma espécie de resumo da presença do país na União Europeia. “Era, aliás, a alterna- tiva mais racional”, afirma, como também o disse o socia- lista e ex-ministro António Vi- torino em declarações ao Eco- nómico. A adesão formal foi assinada com pompa e circunstância a 1 de Janeiro de 1986 no Mosteiro dos Jerónimos, em Belém, por Mário Soares, que no mês se- guinte seria eleito Presidência da República. O primeiro im- pacto da adesão será a drena- gem para Portugal de fundos financeiros (ver pág. 16) que pretendiam estreitar o ‘gap’ de desenvolvimento entre o país e a média da CEE. “Foi a inser- ção num espaço económico incontornável”, como afirmou ao Económico o presidente da CIP, António Saraiva, com os fundos estruturais a servirem de esteio ao investimento ma- ciço em infraestruturas e no sector produtivo. Consolidação da democracia Mas, como recorda o social-de- mocrata e ex-ministro António Cadilhe, “a entrada do país na CEE foi também a garantia da vida democrática” num país que havia saído há pouco de uma ‘guerrilha’ – que esteve por diversas vezes muito próxi- ma da guerra civil – entre dois lados opostos: a democracia ocidental e o socialismo pró- -comunista. A consolidação da democra- cia é o pano de fundo necessário e suficiente para o “aperfeiçoa- mento institucional”, nas pala- vras de Soromenho Marques, e para “uma visão cosmopolita, mais moderna, uma cultura aberta ao mundo, que é um dos traços morais da adesão”, que António Vitorino salientou. A prova de fogo da adesão dar-se-ia a partir de 1 de Janei- ro de 1992, quando Portugal as- sumiu pela primeira vez a presi- dência da CEE – o debute de Es- panha, que entrara na comuni- dade ao mesmo tempo, dera-se entre Janeiro e Junho de 1989. O ministro dos Negócios Estran- geiros era, na altura (com Cava- co Silva como primeiro-minis- tro), João de Deus Pinheiro, que haveria de ser comissário euro- peu. Genericamente, a presi- dência correu bem do ponto de vista institucional – o que viria a repetir-se entre Janeiro e Ju- nho de 2000 e Julho e Dezembro de 2007, quando Portugal asse- gurou novamente a presidência rotativa da Europa. Com o euro no horizonte Um ano mais tarde, em Novem- bro, entraria em vigor o Tratado da União Europeia (Maastricht) – ‘remasterizado’ pelos Trata- dos de Amsterdão (1999), Nice (2001) e Lisboa (2007) – que foi uma espécie de refundação da ‘velha’ CEE, que implicaria o aprofundamento do federalis- mo, mas também o reforço das instituições europeias, com as consequentes perda de poder e de decisão nacionais e a buro- cratização de Bruxelas e Estras- burgo. Foi também o lança- mento da futura moeda única europeia, o Ecu (também alvo de uma referência musical “Tu queres Ecus” (1992) dos Peste & Sida e que em boa hora foi re- baptizado como euro). E foi aí que as coisas começaram a complicar-se. “A perda de instrumentos macroeconómicos, nomeada- mente as políticas monetária e cambial, não é necessariamente má – porque se pode fazer mau uso desses instrumentos”, afir- ma Miguel Cadilhe, mas foi um golpe rude numa economia que Miguel Cadilhe Ex-ministro do PSD “A abertura à modernização” e a “garantia de democracia” são, para o ex-ministro das Finanças de Cavaco Silva, os aspectos mais positivos da adesão à então CEE. A perda de instrumentos económicos estará do outro lado. Viriato Soromenho Marques Filósofo e politólogo O balanço da adesão “é 90% positivo” mas, para o politólogo, “ainda falta saber-se o que vai resultar da união económica e monetária”. E esse é um aspecto fundamental, num país que esteve anos em crise.

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Page 1: ID: 59683649 12-06-2015 Corte: 1 de 10 Destaque Portugal

Tiragem: 14617

País: Portugal

Period.: Diária

Âmbito: Economia, Negócios e.

Pág: 4

Cores: Cor

Área: 26,00 x 31,17 cm²

Corte: 1 de 10ID: 59683649 12-06-2015

Portugal na CEE:da inevitabilidadeàs crises de crescimentoAntónio Freitas de [email protected]

Entre o ano de 1962, em que ovelho ditador Oliveira Salazartestou a possibilidade deaproximar Portugal da entãoCEE, até à assinatura do Trata-do de Adesão em Lisboa (fazhoje 30 anos) – passando peloperíodo de consultas com vis-ta à adesão iniciado em 1972por Marcello Caetano, pelareabertura do processo em1977 pela mão de Mário Soarese pelo primeiro sucesso dogrupo rock GNR “Portugal naCEE” (1981) – o país confron-tou-se com a inevitabilidadeda adesão àquela estruturapró-federativa europeia.

Quase 600 anos depois doinício da aventura portuguesafora da Europa (a tomada deCeuta, no Norte de África, foiem 1415), o país regressavaexangue ao lugar de onde ti-nha partido: o império doOriente desaparecera há mui-to, o império do Brasil tambéme o império africano estava nofim, acossado pela reserva dosnossos próprios aliados oci-dentais (entre eles o Papa Pau-lo VI e o Presidente norte--americano John F. Kennedy)em aceitar a eternização dapresença portuguesa naquelecontinente.

Restava a Europa – e até Sa-lazar, um ano depois de o MPLAter aberto o primeiro conflitoarmado nas colónias, percebeuisso. Os grandes grupos econó-micos também: António Cham-palimaud e o poderoso grupoCUF (da família Mello) multi-plicavam parcerias com empre-sários europeus, cuja face maisvisível era a presença dos sue-cos da Eriksberg e da Kockumse dos holandeses da El NDSM, eda Wilton-Fijernoord no capitalda Lisnave, o primeiro grande

Adesão O balanço entre os prós e os contras da entrada de Portugal na CEE é claramente positivo.Do lado dos prós está a modernidade, a consolidação da democracia e o desenvolvimento.

30 anos de adesão à União EuropeiaDestaque

António VitorinoEx-comissário, ex-ministro do PS

Portugal seria “um paíssubstancialmente diferente” senão tivesse entrado na CEE. Osaldo é, para o ex-comissário,muito positivo e do lado negativosó há a salientar “as dificuldadesde adopção do euro” e a PAC.

António SaraivaEmpresário, presidente da CIP

Há na Europa um lado nãocumprido, diz o empresário. Faltafederalismo e união bancária.Nesse quadro, diz, “não se podefalar verdadeiramente de coesão”nem de sentido político. Mas “odesenvolvimento é claro”.

PORTUGAL ENTRA NA CEE COM...

empreendimento nacional vi-rado para a economia interna-cional.

“Portugal não tinha alterna-tiva”, diz o politólogo ViriatoSoromenho Marques, autor daobra ‘Portugal na Queda da Eu-ropa’ – uma espécie de resumoda presença do país na UniãoEuropeia. “Era, aliás, a alterna-tiva mais racional”, afirma,como também o disse o socia-lista e ex-ministro António Vi-torino em declarações ao Eco-nómico.

A adesão formal foi assinada

com pompa e circunstância a 1de Janeiro de 1986 no Mosteirodos Jerónimos, em Belém, porMário Soares, que no mês se-guinte seria eleito Presidênciada República. O primeiro im-pacto da adesão será a drena-gem para Portugal de fundosfinanceiros (ver pág. 16) quepretendiam estreitar o ‘gap’ dedesenvolvimento entre o paíse a média da CEE. “Foi a inser-ção num espaço económicoincontornável”, como afirmouao Económico o presidente daCIP, António Saraiva, com os

fundos estruturais a serviremde esteio ao investimento ma-ciço em infraestruturas e nosector produtivo.

Consolidação da democraciaMas, como recorda o social-de-mocrata e ex-ministro AntónioCadilhe, “a entrada do país naCEE foi também a garantia davida democrática” num paísque havia saído há pouco deuma ‘guerrilha’ – que estevepor diversas vezes muito próxi-ma da guerra civil – entre doislados opostos: a democraciaocidental e o socialismo pró--comunista.

A consolidação da democra-cia é o pano de fundo necessárioe suficiente para o “aperfeiçoa-mento institucional”, nas pala-vras de Soromenho Marques, epara “uma visão cosmopolita,mais moderna, uma culturaaberta ao mundo, que é um dostraços morais da adesão”, queAntónio Vitorino salientou.

A prova de fogo da adesãodar-se-ia a partir de 1 de Janei-ro de 1992, quando Portugal as-sumiu pela primeira vez a presi-dência da CEE – o debute de Es-panha, que entrara na comuni-dade ao mesmo tempo, dera-seentre Janeiro e Junho de 1989. Oministro dos Negócios Estran-geiros era, na altura (com Cava-co Silva como primeiro-minis-tro), João de Deus Pinheiro, quehaveria de ser comissário euro-peu. Genericamente, a presi-dência correu bem do ponto devista institucional – o que viriaa repetir-se entre Janeiro e Ju-nho de 2000 e Julho e Dezembrode 2007, quando Portugal asse-gurou novamente a presidênciarotativa da Europa.

Com o euro no horizonteUm ano mais tarde, em Novem-bro, entraria em vigor o Tratadoda União Europeia (Maastricht)

– ‘remasterizado’ pelos Trata-dos de Amsterdão (1999), Nice(2001) e Lisboa (2007) – que foiuma espécie de refundação da‘velha’ CEE, que implicaria oaprofundamento do federalis-mo, mas também o reforço dasinstituições europeias, com asconsequentes perda de poder ede decisão nacionais e a buro-cratização de Bruxelas e Estras-burgo. Foi também o lança-mento da futura moeda únicaeuropeia, o Ecu (também alvode uma referência musical “Tuqueres Ecus” (1992) dos Peste &Sida e que em boa hora foi re-baptizado como euro). E foi aíque as coisas começaram acomplicar-se.

“A perda de instrumentosmacroeconómicos, nomeada-mente as políticas monetária ecambial, não é necessariamentemá – porque se pode fazer mauuso desses instrumentos”, afir-ma Miguel Cadilhe, mas foi umgolpe rude numa economia que

Miguel CadilheEx-ministro do PSD

“A abertura à modernização” e a“garantia de democracia” são,para o ex-ministro das Finançasde Cavaco Silva, os aspectos maispositivos da adesão à então CEE.A perda de instrumentoseconómicos estará do outro lado.

Viriato Soromenho MarquesFilósofo e politólogo

O balanço da adesão “é 90%positivo” mas, para o politólogo,“ainda falta saber-se o que vairesultar da união económica emonetária”. E esse é um aspectofundamental, num país queesteve anos em crise.

Page 2: ID: 59683649 12-06-2015 Corte: 1 de 10 Destaque Portugal

Tiragem: 14617

País: Portugal

Period.: Diária

Âmbito: Economia, Negócios e.

Pág: 5

Cores: Cor

Área: 26,00 x 31,31 cm²

Corte: 2 de 10ID: 59683649 12-06-2015BANDEIRA DA UE● A bandeira da União Europeia,além de simbolizar a União dediferentes povos , representatambém a unidade e a identidade da

Europa. O círculo de estrelasdouradas representa a solidariedadee a harmonia entre os povos. Asestrelas são doze porquetradicionalmente este número

constitui um símbolo de perfeição,plenitude e unidade. Assim, abandeira manter-se-á sem mudança,independentemente dos futurosalargamentos da UE.

OS PRÓS E OS CONTRAS

● Desenvolvimento económico,social e do trabalho.● Abertura ao mundo global, àmodernidade e ao diferente.● Suporte institucional, entreoutros, conferido pela União.

✔A FAVOR

● Dificuldades de adesão àmoeda única.● Política Agrícola Comum, quedestruiu a agricultura.● Perda de capacidade dedecisão nacional.

✘CONTRA

UMA CRISE POLÍTICA

Mário Soares e Rui Macheteassinam o tratado de adesãoà CEE a 12 de Junho de 1985,no Mosteiro dos Jerónimos.Os ministros Jaime Gama eErnâni Lopes aguardam asua vez. Um dia depois,Mário Soares comunica ademissão do cargo de pri-meiro-ministro. A ascensãode Cavaco Silva no PSD,após a morte de Mota Pinto,mudou a relação entre opartido e o PS no BlocoCentral. Entre divergênciaspessoais e políticas, os doislíderes partiram a corda,mas combinaram fazê-lo sódepois da assinatura. A ten-são estendeu-se a quemdevia assinar o tratado. Ca-vaco exigiu que Macheteassinasse, sob ameaça defazer cair o Governo, lem-bra Joaquim Vieira, na bio-grafia de Mário Soares.Soares não queria - tinhamsido Ernâni Lopes, JaimeGama e António Marta a li-derar as negociações - masteve de ceder e substituirMarta por Machete (sóquatro podiam assinar, se-gundo as regras europeias).

Audiovisual da União Europeia

ainda não tinha atingido o equi-líbrio e estava habituada a usá--los para disfarçar as suas inca-pacidades.

Uns anos antes, em 1989, oMuro de Berlim caía inespera-damente, com estrondo. A reu-nificação da Alemanha deixavaclaro que, em pouco tempo, aCEE nunca mais seria a mesma:a absorção de alguns países daantiga órbita da União Soviéticapela comunidade era o preço apagar pelo fim da Guerra Fria.No dia 1 de Maio de 2004 Repú-blica Checa, Hungria, Estónia,Letónia, Lituânia, Eslováquia,Eslovénia e Polónia (juntamen-te com Chipre e Malta) passa-vam a fazer parte da União Eu-ropeia. De um dia para o outro,Portugal deixava os últimos lu-gares da União em termos dediversos índices macroeconó-micos e aproximava-se da mé-dia do desenvolvimento da Eu-ropa a 25 (Bulgária e Roméniaentrariam em 2007 e a Croácia

em 2013). Mas isso eram só es-tatísticas. Que, noutros dois as-pectos, funcionariam a desfavordo país: os fundos comunitáriospara o desenvolvimento teriamnecessariamente de ser reparti-dos pelos novos membros; e arepresentatividade do país di-luir-se-ia numa guerra de ‘im-portâncias’ entre países do pri-meiro e do segundo pelotão.

Mas, por aqueles dias, tudoisso parecia não ter grandes im-plicações: em Março de 2000, oConselho Europeu definiu a Es-tratégia de Lisboa, que elegeu oemprego, as reformas econó-micas e a coesão social como asprioridades até 2010; em 1 deJaneiro de 2002 dá-se a entradaem circulação do euro – comPortugal a fazer parte da eliteque a ele teve acesso; e em Ju-nho de 2004 Durão Barroso, atéentão primeiro-ministro, é es-colhido como presidente da Co-missão Europeia (cargo queocuparia até ao ano passado).

Pelo meio, a União sofreuum enorme percalço – quetoda a estrutura de Bruxelastentou minimizar da forma quepôde: a Constituição Europeia(ou Tratado Constitucional),publicada em Julho de 2003 eassinada em Outubro de 2004,em Roma, e que deveria ser su-fragada pelos Estados-mem-bro, acabaria por ser um pro-jecto completamente falhado –em 29 de Maio de 2005 a Françavotou maioritariamente contraa sua adopção, abrindo umprecedente que acabou por de-terminar que o texto fosse,pura e simplesmente, atiradopara o cesto dos papéis.

A UE tentou reencontrar-seno Tratado de Lisboa, mas o fra-casso da Constituição deixouclaro que o euro-cepticismo ga-nhava espaço e que o federalis-mo era olhado por um númeronão despiciendo de europeuscom muitas, mas mesmo mui-tas reservas. Seja como for, em

Dezembro de 2007, os 27 Esta-dos-membro assinaram o Tra-tado de Lisboa, que tinha comobondosos objectivos aumentar ademocracia, a eficácia e a trans-parência das instituições euro-peias, tornando a União capazde enfrentar os desafios globaisdas alterações climáticas, da se-gurança e do desenvolvimentosustentável. O Tratado de Lis-boa foi ratificado por todos ospaíses antes de entrar em vigor,a 1 de Dezembro de 2009.

Subitamente, no Verão passadoNo Verão anterior, em Setem-bro, o banco norte-americanoLehman Brothers desapareceu.Era lá problema deles, dizia-se– mas nos meses seguintes issosofreu um trágico desmentido:a crise do ‘subprime’ chegou àspraias da Europa e varreu ocontinente como um tsunami.Irlanda, Grécia e Portugal – “astrês cobaias mais fracas do pro-jecto de união económica emonetária”, como dizia Soro-menho Marques – foram os pri-meiros países a sucumbir, coma Espanha, Itália e França aocuparem o vagão seguinte,que esteve prestes a começar aandar nos trilhos que levariamao descarrilamento. De entãopara cá (e até ao fecho destaedição), a União Europeia aindanão deixou de existir – mas acrise que se instalou no seu in-terior deu novo alento aos eu-rocépticos, desacreditou asinstituições (e os homens queas compõem) e deu mais forçaaos extremistas. Mas tambémdeu um novo espaço ao BancoCentral Europeu (BCE), funda-do em Junho de 1998 e um dospilares da recuperação. Entre-tanto, desde Março de 2014, háuma guerra nova às portas daUnião: é entre a Ucrânia e aRússia e ninguém sabe a certoaté onde chegarão as suas on-das de choque.

Apesar de tudo, António Vi-torino, Miguel Cadilhe, AntónioSaraiva e Soromenho Marquesconsideram todos que o saldo dapresença de Portugal na UniãoEuropeia é claramente positivo.O cosmopolitismo, as questõeslaborais e de igualdade de géne-ro, a liberdade de circulação, adignidade que os emigrantesportugueses ganharam, aspreocupações pelo ambiente e,de um modo mais genérico, amodernidade e o desenvolvi-mento patrocinados pela adesãoforam alguns dos aspectos sa-lientados – com a lista de Vito-rino a ser a maior de todas. ■

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Tiragem: 14617

País: Portugal

Period.: Diária

Âmbito: Economia, Negócios e.

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Área: 26,00 x 31,17 cm²

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Destaque 30 anos de adesão à União Europeia

Rui MacheteMinistro dos Negócios Estrangeiros

A adesão de Portugal às Comu-nidades Europeias significavauma grande aspiração para a es-magadora maioria dos que ti-nham nascido e chegado à razãona vigência do Estado Novo epossuíam dele uma visão críti-ca, devido ao seu carácter dita-torial e à incapacidade de reali-zar a modernização do país oude resolver o problema colo-nial. Representava a forma pal-pável e exequível de terminarcom o isolacionismo e o atrasosocial português.

O 25 de Abril de 1974 trouxeuma enorme esperança de mu-dança. Cedo, porém, se releva-ram as pretensões hegemónicasdos comunistas e de parte im-portante do Movimento dasForças Armadas que preten-diam impor um regime tendocomo modelos os sistemas tota-litários de partido único. Quer oPCP quer o MFA detiveram atéao 25 de Novembro de 1975 umaenorme influência que se teriaconcretizado transitoriamentenum regime comunista não fos-se a resistência que se lhes foioposta, sobretudo pela partedemocrática das Forças Arma-das, pelo Partido Socialista, peloPartido Social Democrata etambém pelo CDS.

A instauração de um regimepluralista com a consagraçãodas liberdades fundamentais ede eleições livres era contudofrágil, e esse sentimento refor-çou ainda mais o desejo de in-gressarmos na organização po-lítica da Europa Ocidental, re-presentada pelas ComunidadesEuropeias. Essa Europa consti-tuía a garantia mais realista e

sólida de liberdade política e dedemocracia.

Ao fim de longas e porfiadasnegociações, resultantes da ac-ção convergente dos partidosdemocráticos (PS, PSD e CDS),foi finalmente obtida a almejadaentrada, solenemente celebradana assinatura do tratado de ade-são de 12 de Junho de 1985.

Com ela, reforçou-se o Esta-do de Direito, a separação depoderes e a democracia, e os di-reitos, liberdades e garantiasganharam um novo vigor. Opluripartidarismo, por um lado,e o Estado Social, por outro, ad-quiriram igualmente um relevoprático muito maior do que atéaí consagrado pela Constituiçãode 1976. Passámos a fazer partedo Mundo Ocidental que entãoclaramente se contrapunha, nadivisão dicotómica do Globo, aomundo comunista.

Para mim, ter participado ac-tivamente neste processo, assi-nando o Tratado de Adesão dePortugal à CEE, constituiu o fac-to mais gratificante e significati-vo da minha carreira política.Nesse dia, não havia nuvens so-bre Lisboa nem sobre a Europa.

Afigurou-se que, a partir daí,era possível fortalecer e con-cretizar grandes princípios doEstado democrático de Direito eas grandes reformas económi-cas e sociais que permitiam ser-mos verdadeiramente uma so-ciedade do século XX – certa-mente com esforço e trabalho,mas sem receios quanto a in-certezas do futuro.

A queda do Muro de Berlimem 1989, seguida da implosãodo Império Soviético, assegura-va também a sólida convicçãode que a Paz estava estabeleci-da. Parecia que em definitivo…

Essas impressões não eramerradas; eram apenas no tempomais transitórias do que os maiscépticos poderiam julgar.

Quando hoje alguns se ques-tionam sobre se valeu a pena apertença à União Europeia faceà realidade do presente, maisincerta e por vezes ameaçadora,

a resposta que dou é claramenteafirmativa.

Se tivéssemos protelado aadesão até não se sabe quando ouse não a tivéssemos feito – comocertos pretendiam em 1985 –,Portugal estaria hoje certamentemais perto dos países em vias dedesenvolvimento do que dospaíses evoluídos e tecnologica-mente avançados (ainda que al-guma distância nos separe, emvários aspectos, destes).

Realizámos importantes pro-gressos e mesmo a adesão ao eu-ro, hoje tão criticada, constituiuum factor relevante de progresso.

Há que reconhecer que nãoaproveitámos como devíamosas ajudas da adesão e a nossagovernação foi, no geral, poucoeficiente. Neste aspecto, nãopodemos esquecer que a quali-ficação das pessoas acabou porser muito negligenciada, o queprejudicou a modernização e aprodutividade do país.

É verdade também que osegoísmos nacionais dos Esta-dos-membro fizeram muitasvezes olvidar os grandes princí-pios consagrados nos tratadosda construção europeia. Mas fo-

ram os nossos excessos de des-pesismo e consequentes déficesorçamentais os principais fac-tores da situação difícil queatravessámos em 2011 e queconseguimos agora ultrapassar.

Há também que observar quea Europa não foi nunca apenaseconomia. Foi orientada por umideal de valores humanistas quealgumas vezes estiveram obs-curecidos, mas que obstinada-mente acabaram sempre porrenascer.

Por outro lado, na realidadecontemporânea onde se cumu-lam, de novo, os riscos de con-flitos e onde as ameaças do ter-rorismo jihadista com propósi-tos globalizantes tentam afir-mar-se, a Europa continua arepresentar uma entidade polí-tica mais segura do que a frag-mentação nos seus Estados--membro.

Apesar de todas as debilida-des – e por vezes contradições –da cooperação atlântica, a UniãoEuropeia constitui, juntamentecom os Estados Unidos da Amé-rica, a garantia mais forte da se-gurança dos povos e da estabili-dade das democracias. ■

A Europa nuncafoi apenaseconómicaEstratégia Não aproveitámos como devíamos as ajudas daadesão e a nossa governação foi, no geral, pouco eficiente.

OPINIÃO

“A queda do Murode Berlim em 1989,seguida da implosãodo Império Soviético,assegurava tambéma sólida convicçãode que a Paz estavaestabelecida.”

Para mim, terparticipadoactivamente nesteprocesso, assinandoo Tratado de Adesãode Portugal à CEE,constituiu o factomais gratificante esignificativo da minhacarreira política.

Quando hoje algunsse questionam sobrese valeu a pena apertença à UE face àrealidade do presente,mais incerta e porvezes ameaçadora,a resposta que doué claramenteafirmativa.

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Page 4: ID: 59683649 12-06-2015 Corte: 1 de 10 Destaque Portugal

Tiragem: 14617

País: Portugal

Period.: Diária

Âmbito: Economia, Negócios e.

Pág: 8

Cores: Cor

Área: 26,00 x 31,90 cm²

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Destaque 30 anos de adesão à União Europeia

Luís Reis [email protected]

O clube europeu permitiu a Por-tugal um desenvolvimento eco-nómico e social que, de outra for-ma, não teria sido possível. Mastrouxe exigências às quais o paísnão conseguiu responder: maiorconcorrência externa, sobretudoapós o alargamento a Leste; e acriação da moeda única, que eli-minou a arma da política monetá-ria. Trinta anos depois, o país tar-da em alcançar a média europeia.

Quando chegou à então Co-munidade Económica Europeia(CEE), Portugal vinha de três anosde um programa de ajuda externado Fundo Monetário Internacio-nal (FMI), o segundo da sua curtavida democrática. Um períodomarcado por restrições salariais eum ajustamento económico quesó não foi mais doloroso porque opaís tinha a arma da desvaloriza-ção da moeda, para dar um im-pulso às exportações e à competi-tividade. À conta dessa estratégia,a inflação andava perto dos 20%.

O PIB per capita do país cor-respondia então a cerca de apenas55% da média do clube europeu, oque levou à transferências degrandes somas de dinheiro paraPortugal, para ajudar ao desen-volvimento. Era o início do mila-gre dos fundos comunitários.

Os fundos e a questão agrícolaA estabilidade política alcançadaapós a chegada à CEE, aliada auma conjuntura externa favorávele à transferência dos fundos co-munitários, permitiu a Portugalacelerar e começar a convergircom o clube europeu. Nos primei-ros anos após a adesão, entre 1986e 1991, a economia nacional cres-ceu a uma média na ordem dos5,7% ao ano. E o PIB per capitacresceu sempre a um ritmo muitosuperior ao da média da CEE.

Um resultado ajudado pelorecurso a uma política orçamen-tal expansionista: o Estado gasta-va para estimular a economia, detal forma que o défice nunca foiinferior a 3% do PIB e chegoumesmo a superar os 7%.

A chegada dos fundos estrutu-rais trouxe, porém, uma conse-quência para a qual o país não es-tava devidamente preparado. Aoabrigo das regras da Política Agrí-

O PIB cresceu a um ritmo con-sideravelmente mais baixo - em93, fruto da crise cambial, o paísesteve mesmo em recessão - e oPIB per capita passou a crescer aum ritmo mais em linha com mé-dia europeia, chegando a ficaraquém da média em alguns anos.O cenário agravou-se com a che-gada da moeda única: o país per-deu a arma da política monetária.E logo numa altura em que a con-corrência externa aumentou, fru-to do alargamento da UE aos paí-ses de Leste, em 2004.

A entrada de dez novos Esta-dos-membro, com salários maisbaixos e produtos mais baratos,provocou um choque de compe-titividade que já não podia serdisfarçado com desvalorizaçõesda moeda. O país não se tinhareformado para enfrentar as exi-gências da nova Europa e isso eracada vez mais notório.

A crise e o acentuardas assimetriasEntre 2001 e 2008, a economiacresceu de forma tímida e sem-pre muito apoiada na grandevantagem da moeda única: a fa-cilidade de acesso ao crédito. Acrise financeira de 2008 e a res-posta dos Estados, através dosgastos para estimular as respec-tivas economias, aumentandodéfices e dívidas públicas, preci-pitaram o país para o terceiroresgate externo da democracia.

O programa de ajustamento foidesenhado para implementar asreformas que o país não fez nosanos após a adesão à CEE, algo queexigiu o empobrecimento da eco-nomia, à medida que os Estadosmais ricos, com menores dificul-dades, fugiam cada vez mais.

“Não soubemos antecipar astransformações na Europa”, dizMendonça, que aponta o dedotambém à Europa. “Sofremos ochoque do euro e não consegui-mos adaptar-nos. Mas o euro nãoactuou simetricamente no ajusta-mento. Pelo contrário, acentuouas assimetrias”, conclui.

O país está mais desenvolvi-do e mais perto da UE - o PIB percapita valia, em 2013, 79% damédia comunitária. Mas temainda vários desafios pela fren-te, a começar pelo desemprego,que é hoje mais elevado do quehá trinta anos atrás. ■

Retrato Adesão à UE trouxe inúmeras vantagens, mas também desafiospara os quais o país não se preparou, como o euro e a concorrência externa.

Economia sofreu comeuro e abertura a Leste

cola Comum (PAC) - que sofreuduas grandes alterações que apa-nharam a economia nacional -Portugal viu-se obrigado a reduzira exploração e a produção, moti-vando críticas que ainda se ouvemhoje em dia, de que a Europa pa-gou para Portugal destruir a suaagricultura e pescas.

“Verificou-se uma redução daactividade agrícola, da populaçãoligada à agricultura, mas não par-tilho a ideia de que tudo foi mau”,diz António Mendonça, econo-mista e professor do ISEG. “Por-tugal seguiu as tendências gerais,ainda que com atraso: aumentouas actividades com maior valoracrescentado; aumentou a quali-dade de produções; e criou condi-ções para a atracção de um outrotipo de empresários”, frisa, no-tando que a PAC levou a que se eli-minassem produções e explora-ções de menor valor. E se é verda-de que, na altura da adesão, o sec-tor representava cerca de 20% doemprego em Portugal, no que dizrespeito ao PIB acabava por nãocontribuir com mais do que 9%.

A moeda única e o alargamentoO início dos anos 90 trouxe umatravagem da economia, que coin-cidiu com o trilhar do caminhopara a moeda única. A adesão aoMecanismo de Taxas de Câmbio(MTC), em 92, retirou autonomiaà política monetária: passou a ha-ver limites à flutuação do câmbiodo escudo face ao marco alemão.

O esforço de convergêncianominal, a que se somou umamaior atenção às contas públicase uma maior dificuldade peranteo aumento da concorrência ex-terna, levou a que a convergên-cia com a Europa diminuísse.

A entrada de dez novosEstados-membro, comsalários mais baixos eprodutos mais baratos,provocou um choquede competitividadeque já não podia serdisfarçado comdesvalorizações damoeda.

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O ‘mea culpa’ do PSDversus o “paíssubsidiário” do PSSeis eurodeputados em curtoe aceso debate na hora de fazero balanço das três décadasde Portugal na UE.

Gisa Martinho em [email protected]

O ambiente de pré-campanhaeleitoral contaminou o debateentre os seis eurodeputadosconvidados para, em Estrasbur-go, fazer o balanço dos 30 anosda assinatura da adesão de Por-tugal à CEE. As diferentes leitu-ras políticas do caminho percor-rido pelo país desde 12 de Junhode 1985 e, em particular, nos úl-timos cinco anos, rapidamentedegenerou numa troca de pala-vras azeda entre os eurodeputa-dos da coligação e do PS, peranteo independente Marinho e Pintoe a ala mais à esquerda - PCP eBloco alegaram agendas aperta-das para se retirarem mais cedo.

“A celebração não é total”,disse Carlos Zorrinho, eurode-putado do PS, depois de frisarque desde “2011 Portugal come-teu um erro de posicionamen-to”, ficou “sem voz activa naUE, tornou-se um país subsi-diário da Alemanha”. A inter-venção do socialista causou deimediato incómodo entre oseurodeputados da maioria, queatrasados, só ouviram as frasesfinais. Antes Zorrinho, que eraprofessor na Universidade deÉvora em 1985, tinha destacadoque Portugal era hoje, graças àentrada no clube europeu, uma“sociedade mais moderna” e“uma democracia consolidada,ainda que a necessitar deobras”. Ainda que haja muitopara aprender, por exemplo,como “subir na cadeia de valor,com mais criação de riqueza emenos através dos custos demão-de-obra”. O socialistaterminou, por isso, com umapelo à reflexão uma vez que opaís “nunca tinha divergido emtermos sociais e isso quebrou--se nos últimos quatro anos”.

Paulo Rangel, eurodeputadodo PSD, ainda destacou o “saltobrutal” dado por Portugal entre1985 e 2015, os ganhos em in-fraestruturas e qualificação, masnão resistiu a um ataque políticoaos socialistas. O social-demo-crata lembrou “a irresponsabili-

dade total do Governo socialis-ta”, que levou ao resgate da‘troika’, e a necessidade de um‘mea culpa’ do país: “Não sepode culpar a União Europeia.Os portugueses também falha-ram, havia obrigações que nãocumprimos”. Nuno Melo, doCDS, preferiu passar ao lado dacelebração dos 30 anos, paraapontar baterias ao programa degoverno socialista apresentado asemana passada. “Há sempreum custo social quando é precisopagar contas”, avisou o popular.

Não houve resposta socialista.Carlos Zorrinho, antigo secretá-rio de Estado do Executivo de Jo-sé Sócrates, também alegou pro-blemas de agenda para sair dasala do Parlamento Europeu, emEstrasburgo. A restante esquerdatambém deixou cedo o debate,mas ficaram notas negativas dastrês décadas de Portugal na UE.João Ferreira destacou, em pri-meiro lugar, o desaparecimentode explorações agrícolas, da frotapesqueira, da perda de peso daindústria num balanço que reco-nhece ser “complexo e difícil”. Oeurodeputado comunista salien-tou ainda os “efeitos profunda-mente assimétricos” do processoeuropeu e notou que os últimosanos desmentem o “cenário idí-lico e de harmonização do pro-gresso” que muitos esperavamnos anos 80. Marisa Matias, doBloco, assinala os dois momentos– Tratado de Maastricht e euro –em que a integração deixa de ser“positiva para ser negativa”. Abloquista critica também as másescolhas políticas. “Ninguém nosobrigou a gastar dinheiro em be-tão em vez de em massa cinzen-ta”, diz. E, para o futuro da UE,Marisa Matias tem “dúvidas quea comunidade resista com estaquebra de solidariedade”.

Na fase do debate interactivosobre os 30 anos da assinatura doTratado, em Belém, restavamapenas Paulo Rangel e Marinho ePinto – para quem é “especulati-vo” dizer que o país está melhordentro da UE. Nem o dia de Por-tugal, 10 de Junho, fez com queos parlamentares baixassem aguarda em período pré-eleitoralnum tema, Europa, que no pas-sado fazia esbater divergênciaspolíticas e até formar uma frentecomum do bloco central. ■

“Não se podeculpar a UniãoEuropeia. Osportuguesestambém falharam,havia obrigaçõesque nãocumprimos”, dizPaulo Rangel.

“Há sempre umcusto socialquando é precisopagar contas”,avisou Nuno Meloque preferiupassar ao lado dacelebração dos 30anos de adesão.

Para João Ferreiraos últimos anosdesmentem o“cenário idílico ede harmonizaçãodo progresso” quemuitos esperavame frisou os “efeitosprofundamenteassimétricos”.

Marisa Matiascriticou as másescolhas políticas:“Ninguém nosobrigou a gastardinheiro em betãoem vez de emmassa cinzenta”.

Para Marinho ePinto é“especulativo”dizer que o paísestá melhordentro da UniãoEuropeia.

Infografia: Mário Malhão | [email protected]

Desde “2011Portugal cometeuum erro deposicionamento”,ficou “sem vozactiva na UE,tornou-se um paíssubsidiário daAlemanha”, dizCarlos Zorrinho.

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Relatos O Económico convidou seispersonalidades a escrever uma pequenahistória sobre a sua experiência europeia queos marcou nestes trinta anos.

A adesãona primeirapessoa

Destaque 30 anos de adesão à União Europeia

Em 1977, quando acabei o cursode Economia, a hipótese da ade-são de Portugal à então Comuni-dade Económica Europeia (CEE)já estava na agenda, mas os as-suntos europeus ainda não cons-tavam do curriculum académico.

Tornei-me assistente na Fa-culdade de Economia do Porto erecebi então um convite paracolaborar com a Comissão deCoordenação da Região Norte.Aí, recebi como primeira enco-menda analisar o que acontece-ria à região Norte se algum diaPortugal aderisse à CEE. Foi umdesafio tão interessante quantoangustiante porque não tinhaqualquer base por onde partir.

Comecei por isso por fazer umprimeiro trabalho sobre o queera a CEE - que acabou por serpublicado - com base na escassaliteratura existente na altura,que me obrigou a fazer inúmerasviagens de comboio a Lisboapara fotocopiar as informaçõesdisponíveis no centro de docu-mentação europeu. Foi a minhaestreia nos assuntos europeus.

Esta foi uma história que memarcou sobre o quão distante aagenda europeia estava entãodo nosso quotidiano. Acabei porbeneficiar de uma bolsa que melevou para Inglaterra fazer ummestrado e um doutoramentoexactamente sobre esses temas,findos os quais regressei aos lu-gares de origem, já com outraleitura das circunstâncias.

Não perdi o rumo da enco-menda inicial e logo na tese demestrado fiz os cálculos sobre osganhos e perdas em termos dedesvios e de criação de comérciodecorrentes da adesão à CEE, queme deixaram muito preocupada.

Quando, em grande aflição,fui comunicar ao Dr. Mário Soa-res, na altura primeiro-ministro,que sem os fundos estruturais deapoio às regiões mais desfavore-cidas os resultados económicosda adesão seriam muito duvido-sos, ele respondeu com um gran-de sorriso e a maior das bono-mias: “Minha querida amiga, istonão é economia, isto é política”.

Esta é uma frase que me vemfrequentemente à memória, eque hoje considero mais actualdo que nunca.

Uma das minha primeiras fun-ções no MNE foi o pelouro daCEE. Coube-me assim ocupar--me do processo de adesão, queimplicava um exaustivo mas fas-cinante trabalho, que ia desde aredacção de documentos à pre-paração das viagens ministeriaisàs capitais dos então nove Esta-dos membros e ao acompanha-mento, em Lisboa, dos funcio-nários da Comissão encarrega-dos do processo de adesão.

Redigi em Fevereiro de 1977as cartas com o pedido de ade-são às três Comunidades. Ummero formulário que a Comis-são nos forneceu.

Nesse tempo, os pedidos de

adesão eram entregues em Bru-xelas pelo embaixador do paíscandidato ao representante doEstado-membro que detinha apresidência. Estava previsto queas ditas cartas, depois de assina-das pelo primeiro-ministro,fossem enviadas para Bruxelaspela mala diplomática regular.Só foram porém devolvidas na

véspera da data prevista para asua entrega. Não era já possívelenviá-las por mala. O director--geral recorreu aos grandesmeios: mandou-me ir a Bruxe-las levar as cartas.

Sucede que nesse tempo fu-mava e tinha um magnífico is-queiro Dupont, lacado a preto,que muito prezava. O avião da

TAP aterra em Bruxelas, come-ça o desembarque e quando es-tou quase a sair dou conta queme esqueci do precioso isquei-ro. Aguardei que os outros pas-sageiros saíssem, voltei busca--lo e, quando finalmente saio,dou pelo colega que estava àminha espera, mas sobretudodas cartas, à beira de um ataquede nervos, convencido que eunão tinha vindo.

No dia seguinte o nosso repre-sentante, o embaixador AntónioSiqueira Freire, um grande Se-nhor e um Grande Diplomata,convidou-me a assistir à cerimó-nia. Ufano por participar nummomento histórico, lá o acompa-nhei à representação do ReinoUnido junto das ComunidadesEuropeias, país que detinha apresidência, onde o nosso embai-xador entregou as três anódinascartas que mais mudaram Portu-gal no século XX. Quando chegá-mos um colega britânico disse--nos “caso se tenham esquecidodas cartas temos aqui um envelo-pe vazio para entregarem…” ■

“Isto não éeconomia, é política”ELISA FERREIRAEurodeputada do PS

Diplomata carteiroFERNANDO NEVESEmbaixador e ex-secretário de Estadodos Assuntos Europeus

Audiovisual da União Europeia

Foto de família de vários primeirosministros e chefes da diplomacia europeiano Palácio Real em Madrid no final dacerimónia de adesão de Espanha.

Um colega britânico disse-nos“caso se tenham esquecido dascartas temos aqui um envelope

vazio para entregarem”.

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Naquele início de 1987 Portugalera um recém-chegado à UniãoEuropeia, olhado de soslaio pormuitos funcionários e diploma-tas do microcosmos da “Europaeuropeia”. Muitos dos emigran-tes lusos que nos anos sessentavieram para estas bandas a saltoe com uma mala de cartão eramjá pequenos ou mesmo grandesempresários, empregados qua-lificados, gente séria e traba-lhadora que se afirmou e se in-tegrou na sociedade local, comovida estável, uma casa, uma si-tuação. Mas para muito bom di-plomata ou funcionário inter-nacional a imagem que tinhamde nós tinha parado em… 1960:um país pobre, atrasado, sujeitoaté há pouco a uma ditaduraterceiro-mundista, muito cató-lico e muito conservador. Difícilde nos verem de outra forma,mesmo aos eurofuncionárioscomo eles.

Daí as perguntas e as surpre-

sas: como era possível ver tan-tas mulheres nas delegaçõesportuguesas nas reuniões com oConselho o com a Comissão?Tantas portuguesas funcioná-rias, tantos portugueses comestudos universitários e pós--universitários, a falarem tãobem francês e inglês, ou mesmoalemão? O quê? Em Portugal asmulheres podiam ter contasbancárias sem autorização dosmaridos? Na Bélgica tal não erapermitido até 1990… O quê? Eos filhos tinham o nome de fa-mília da mãe e do pai? Na Bélgi-ca tal só foi permitido… em2014! O Código Civil Portuguêsreconhecia a igualdade entre ossexos? E mesmo no seio do ma-trimónio e da família? E a igual-dade de direitos dos filhos den-tro ou fora do casamento? E odivórcio e o aborto eram legais?

Levámos meses ou mais a ex-plicar que o nosso país tinhadado um enorme salto societal,político e económico e que aadesão à então CEE era a nossaesperança de consolidar esseprogresso, com a integraçãonum espaço democrático enuma economia social de mer-cado então vibrante e dinâmica.

Pouco a pouco fomo-nosafirmando e o nosso valor foisendo reconhecido. Somos tãobons como os outros, por vezesmelhores, trabalhamos tão bemcomo eles e até temos muitasvezes um espírito mais aberto emais inovador.

Vários de nós, com muitotrabalho e empenho, para nãodizer engenho e arte, fomos fa-

zendo o nosso caminho e hojehá na Comissão cerca de ses-senta portugueses em cargosde chefia.

A colega que me perguntouem Maio de 1987 se eu era por-tuguês, pois portugueses sóconhecia choferes de táxi emulheres-a-dias, era minhasubordinada dois anos depois.Comecei na Direcção Geral daCooperação e Desenvolvimen-to, onde passei sucessivamentepor funções de técnico, em se-guida assistente do director--geral e chefe de divisão. De-pois passei pela administraçãoe em 1999 tirei quatro anos delicença sem vencimento paravir tomar ar e apanhar som aPortugal. Em 2003 voltei aBruxelas, à DG Pescas; depoisao Alargamento, no gabinetedo comissário Olli Rehn, em

seguida director no Secretaria-do Geral da Comissão, respon-sável pelas relações com o Par-lamento Europeu, depois chefeadjunto de gabinete do presi-dente Durão Barroso, de novona administração como direc-tor-geral adjunto e agora, des-de 2013, de regresso à origem,à na Direcção Geral da Coope-ração e Desenvolvimento,como director-geral.

Visto hoje de Bruxelas, Por-tugal é um país que se moder-nizou e que conseguiu ultra-passar uma profunda crise fi-nanceira, económica e social,onde apetece ir passar férias ouapenas o fim-de-semana, osoito voos diários de Bruxelaspara Lisboa estão muitas vezescheios. Os portugueses são re-conhecidos e respeitados, te-mos um capital há que preser-var e ampliar. Já não somos ospobres e atrasados, somos mes-mo, com os irlandeses, um casode sucesso. Sucesso esse queespero possa chegar o mais de-pressa possível ao bolso e à vidados meus compatriotas.

Aderi à União Europeia nomesmo ano de Portugal: corriao ano de graça de 1986 e nadaseria como dantes no Ocidente.

Recordo uma história singe-la de entre as muitas que pode-ria evocar: Novembro de 1988,Estrasburgo. Enquanto espera-

va a remoção das barreiras queimpediam a passagem pelos“passos perdidos” do Palácioda Europa, reflectia nas pala-vras que acabara de ouvir: “Omeu desejo enquanto pastorsupremo da Igreja Universal,vindo da Europa Central e co-nhecedor das aspirações dospovos eslavos, esse outro ‘pul-mão’ da nossa mesma pátriaeuropeia, é que a Europa possaum dia crescer para as dimen-sões que lhe foram dadas pelageografia e pela história”. Umautopia, pensava, condenada aesbarrar no Muro ainda erecto,coberto de grafitis do lado Oci-dental, imaculado a Leste. En-tão, instintivamente, ergui acabeça: uma figura vestida debranco dirigia-se-me. Olhosde um escuro azul devassaram--me a alma; estendeu a mão,quedei-me transido por ins-tantes, entreguei-lhe a minha.Ele sorriu, “che Dio lo benedi-ca”, e foi-se. De sorriso parvona cara, fiquei a imaginar essaEuropa grande e unida a respi-rar o futuro a dois pulmões.

Passaram-se 27 anos. Há seismeses, novo Papa visitou a capi-tal da Alsácia. Pediu aos deputa-dos que cuidem “da fragilidadedos povos e pessoas” (Francis-co). Apelou à liberdade indivi-dual, sem “limite além daqueleque a sociedade” impõe parasalvaguardar a liberdade dopróximo (João Paulo II). Exigiuuma Europa centrada na pessoahumana (Francisco). Lembrou osubstrato cristão da Europa(João Paulo II). “Esta Europa avójá não é fecunda nem vivaz”,afirmou Francisco. O continen-te está “envelhecido”, disse, eapelou ao reforço “da democra-cia dos povos da Europa”.

27 anos depois, perseguem--me os olhos de João Paulo II. AEuropa alargou-se (quase) aoslimites da (sua) geografia e his-tória. Mas nada está concluído:há muito a reconstruir nestaintegração imperfeita, refémde egoísmos nacionalistas epulsões tsunâmicas de lucrosem freio.

Mas talvez dentro de 27 anos,também a Europa unida, soli-dária, humana, fiel à tradiçãoclássica, romana e cristã, volte aser fecunda e vivaz. ■

Português?Só conheço choferesde táxi e mulheres--a-diasFERNANDO FRUTUOSO DE MELODirector-geral do Desenvolvimentoe Cooperação

“Che Dio lo benedica”PAULO SANDEInvestigador do Instituto de EstudosPolíticos da Universidade Católica e ex--director do Gabinete em Portugal doParlamento Europeu

Audiovisual da União Europeia

O primeiro-ministro Mário Soaresabraça o seu homólogo espanhol

Felipe González.

Destaque 30 anos de adesão à União Europeia

Há muitoa reconstruirnesta integraçãoimperfeita, refémde egoísmosnacionalistas epulsões tsunâmicasde lucro sem freio.

Em Maio de 1987, uma colegadisse-me que portugueses só

conhecia choferes de táxi emulheres-a-dias, conta

Frutuoso de Melo.

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Destaque 30 anos de adesão à União Europeia

Foi em 1995, durante os traba-lhos do “grupo de reflexão”para a revisão do Tratado deMaastricht. Os debates eramem francês ou inglês. Um dia,em Lisboa, sou informado queos alemães haviam exigido ouso da sua língua nos trabalhosfuturos. Era difícil recusar: era(e é) a mais falada primeira lín-gua dentro da UE. Aproveitan-do a “boleia”, a Espanha, quetinha a presidência do “grupode reflexão”, e a Itália, que eraa nova presidência semestralda UE, colocaram discreta-mente as respetivas línguasentre as que poderiam ser uti-lizadas na reunião seguinte do“grupo”. Falei telefonicamentecom os holandeses e os gregos,mas não consegui criar comeles nenhuma frente de resis-tência à “golpada”. Informeiassim Bruxelas que, se houves-se mais alguma língua na reu-nião para além do alemão, eufalaria em português (cabia--me nessa reunião representarPortugal, substituindo o titu-lar, o professor Gonçalves Pe-reira). Foi-me dito que, infe-lizmente, para essa reunião,não poderia haver interpreta-ção para português. Retorquique, nesse caso, eu falaria emportuguês, “traduzindo” de-pois para uma das línguas até aí

Parlam

entoE

uropeu

utilizadas. Demoraria apenas odobro do tempo… Chegado aBruxelas, os espanhóis procu-raram convencer-me das suasrazões. Recusei. Minutos de-pois, vieram ver-me os italia-nos, acolitados pelo secreta-riado-geral do Conselho. Man-tive a minha teimosia. A reu-nião começou tensa. O presi-dente espanhol abriu a reuniãoem francês. Inscrevi-me parafalar logo depois do italiano.Quando ele falou, falou em in-glês. Sorri. Na Europa, bater opé, quando se tem razão, é amelhor política.

Onze anos depois do 25 deAbril, Portugal assinou o Trata-do de Adesão às ComunidadesEuropeias. Para aí chegar foramoito anos de negociações duras.Foi com longas noites negociaisque se fez dia na nossa adesão.

A última noite negocial, noPalácio das Necessidades, foi decariz bilateral, luso-espanhol,para regular a transição das re-lações entre os dois países ibé-ricos após a adesão. Descobrir eenfrentar a Espanha como par-ceiro e como concorrente nomesmo espaço económico in-tegrado, foi um dos maiores,senão o maior impacto da nossaadesão. Imediatamente antes,em sucessivas longas noites em

Bruxelas, Portugal tinha fecha-do as negociações com os dezEstados membros. Foi no qua-dro do fecho das negociaçõesque Delors elaborou, com basenum pedido português, a subtile discreta declaração anexa aoTratado que garantiu, uns anosmais tarde, também numa lon-ga noite de um Conselho Euro-peu, a decisão sobre o PEDIP.

Depois da adesão, veio a ne-gociação permanente, isto é,colocar e defender o interessenacional no perímetro do inte-resse comum europeu. A inte-gração de Portugal deu-se namesma altura em que a cons-trução europeia acelerou o seuaprofundamento, com o mer-cado único, Schengen e a UniãoEconómica e Monetária. Deci-siva foi a liderança de Delors e oapoio de Mitterrand e Köll. A

instrumento para o crescimen-to económico intenso que Por-tugal conheceu nesse período.

Em 1992, ocorreu a primeirapresidência portuguesa daUnião Europeia, vivida com aadrenalina que uma “primeiravez” sempre desencadeia. Detantos momentos intensos re-cordo apenas um, a iniciativaconduzida pela presidênciaportuguesa de então para me-diar um acordo entre o ReinoUnido e a Espanha, de modo agarantir que Gibraltar pudesseintegrar plenamente o funcio-namento do mercado interno apartir de 1992. Depois de mui-tas auscultações e diálogos bi-laterais, organizámos uma reu-nião final para formular umcompromisso aceitável porambos os países. Foi assim que,numa tarde primaveril, osmeus colegas Carlos Westen-dorp e Tristan Garel Jones e eupróprio nos reunimos, a sós,em Seteais, com o objectivo dealcançar uma fórmula que fi-zesse convergir a Espanha e oReino Unido. Depois de muitashoras de debate frontal, massempre construtivo, já bem demadrugada (mais uma longanoite negocial!) chegámos a umcompromisso consideradoequilibrado e razoável. Contu-do, uns dias depois, uma daspartes viria a recusar o com-promisso que, por isso, nem viua luz do dia. Mas que foi umbelo esforço, foi, daqueles queintegram a parte invisível doiceberg de qualquer Presidên-cia Europeia. ■

A guerra das línguasFRANCISCO SEIXAS DA COSTAEmbaixador e antigo secretário de Estadodos Assuntos Europeus (1996-2001)

Questionada sobre osignificado real da ex-pressão “coesão eco-nómica e social”, Tha-tcher disparou: “It’stheir word for cash!”.

Um belo esforçoVÍTOR MARTINSAntigo secretário de Estadodos Assuntos Europeus (1985 e 1995)

oposição recorrente da senhoraThatcher não chegou para blo-quear esses avanços.

Um dia, questionada porjornalistas, sobre o significadoreal da expressão “coesão eco-nómica e social”, MargarethThatcher disparou com algumasobrançaria: “It’s their wordfor cash!”. Mas não foi por essemenosprezo da Dama que umdia exigiu “My money back”que a coesão económica e socialdeixou de se erguer como pilarda integração europeia. Foi um

Grupo de 20 dos 24 eurodeputados portugueseseleitos nas primeiras eleições para o ParlamentoEuropeu realizadas em Portugal, em 1987.

Primeiros eurodeputadosportugueses e espanhóis à chegadaao aeroporto de Estrasburgo a 2 de

Janeiro de 1986. O primeiro a descera escada do avião é o eurodeputado

português Luís Paes Beiroco e osegundo Francisco Lucas Pires.

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Destaque 30 anos de adesão à União Europeia

Fundos Ao dinheiro que Portugal recebeu de Bruxelas somaram-se outros82 mil milhões, mas o país continua longe da convergência com a UE.

96 mil milhões depois...Portugal recebe mais25 mil milhões de euros

Mónica [email protected]

Entre 1989 e 2013, Portugal rece-beu mais de 96 mil milhões deeuros em fundos estruturais e decoesão. Resultado? Um país maismoderno, desenvolvido e maispróximo dos parceiros europeus.Mas não o suficiente. 28 anos de-pois, Portugal volta a ser benefi-ciário de um novo quadro comu-nitário de apoio e volta a recebermais 25 mil milhões de euros.

“Os fundos não cumpriram asua missão”, reconhece o secre-tário de Estado do Desenvolvi-mento Regional, Manuel CastroAlmeida. “Portugal vive há 28anos com quadros comunitáriose se nos primeiros dez anos seaproximou 12 pontos percen-tuais da economia europeia, nos18 anos seguintes houve uma di-vergência de um ponto percen-tual do rendimento per capitaeuropeu. Um resultado que po-deria ser ainda pior, caso a Euro-pa não tivesse feito um alarga-mento, a países mais pobres quebaixaram a média europeia”, su-blinha o responsável. “Não acei-to que me digam que está bem.Estou disposto a tudo para ten-tar, pelo menos, um caminhodiferente que nos garanta quedentro de sete anos nos aproxi-mamos da média europeia”,acrescenta Castro Almeida.

Fruto da persistência destadivergência, Portugal voltou areceber de Bruxelas um chequede 25 mi milhões de euros parainvestir entre 2014 e 2020 nodesenvolvimento do país.

E como “os dinheiros públi-cos são o fermento de outros di-nheiros”, nas palavras de LuísValente de Oliveira, ex-minis-tro do Planeamento, a estes 96mil milhões de euros comunitá-rios somaram-se mais 48 milmilhões de euros de contrapar-tida nacional por parte de enti-dades públicas e 34 mil milhõesde agentes privados, revela oestudo “25 anos de Portugal eu-ropeu”, coordenado pelo eco-nomista Augusto Mateus. “So-mando o financiamento daUnião Europeia, a contrapartida

pública nacional e a contrapar-tida privada nacional entre 1989e 2013, o montante global de in-vestimento programado paraPortugal ascende a 178 mil mi-lhões de euros a preços cons-tantes de 2011”, revela o docu-mento. “Este montante total deinvestimento programado parao país supera a riqueza anual-mente gerada pela economiaportuguesa”, acrescenta.

Com o acesso aos fundos co-munitários “Portugal sai do je-jum de infraestruturas”, explicaLuís Braga da Cruz. “Começou--se pelo mais óbvio e premente,o que se afigurou como bom cri-tério” para “reduzir o défice deacessibilidade e apostar na for-mação”, frisa o presidente daFundação Serralves e do CentroPortuguês de Fundações.

Até ao alargamento a Leste,aos parceiros iniciais da coesãoera destinada cerca de metadedas verbas da política regionaleuropeia, passando para cercade um quarto no pós-2007.Portugal foi dos grandes benefi-ciários dos fundos estruturaispor habitante. Com os fundoscomunitários Portugal cons-truiu estradas (só no QCA I fo-ram 1.133 km de autoestradas),hospitais, escolas, redes de sa-neamento, linha férrea, portos,etc. Mas com o novo quadro co-munitário – o Portugal 2020 –as regras começam a mudar e aprioridade além da competiti-vidade da economia passa tam-bém pela inovação social. “Nemsó de betão vive o desenvolvi-mento”, lembra Braga da Cruz.

Ao longo destes anos, os fun-dos apoiaram mais de 39 milprojectos de empresas, a largamaioria de PME. Sendo o QRENo período que, de longe, maisempresas apoiou (cerca de 14mil, de acordo com os dados deexecução de Maio deste ano).

“O objectivo é ter muito me-nos fundos dentro de sete anos”,admite o ministro do Desenvol-vimento Regional. Miguel Poia-res Maduro explica que isto “si-gnificaria que Portugal conver-giu com a média europeia. Era overdadeiro indicador”. ■

€ 11,17 milhõesA Casa da Música foi financiada em 11,17milhões de euros por Bruxelas, mas oapoio poderia ter ido até 14,89 milhões.

€ 179,44 milhõesA Expo 98 foi financiada num totalde 179 milhões de euros. Mas o custoelegível ascendia a 285 milhões.

€ 1,93 milhõesFoi quanto Bruxelas pagouefectivamente pelo CCB, masinicialmente Bruxelas admitiapagar até 3,11 milhões.

Bruno Barbosa

APOIOS RECEBIDOS

Até 2020 Bruxelas terádisponibilizado a Portugal 212 milmilhões de euros.

Quadro comunitário Valor

QCA I 13,3 mil milhões

QCA II 25,4 mil milhões

QCA III 30,5 mil milhões

QREN 26,8 mil milhões

Portugal 2020 25,2 mil milhões

Fonte: Comissão Europeia

“O objectivo é termuito menosfundos dentro desete anos, o quesignificaria quePortugal convergiucom a médiaeuropeia”, diz oministro MiguelPoiares Maduro.

“Os fundos nãocumpriram a suamissão”,reconhece osecretário deEstado ManuelCastro Almeida.

“Os dinheirospúblicos são ofermento deoutros dinheiros”,diz Luís Valente deOliveira.

Paulo Figueiredo

Paula Nunes

“Começou-se pelomais óbvio epremente, o que seafigurou como bomcritério” para“reduzir o déficede acessibilidade eapostar naformação”, diz LuísBraga da Cruz.

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Tiragem: 14617

País: Portugal

Period.: Diária

Âmbito: Economia, Negócios e.

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Os 30 anos de Portugal na União Europeia vistos por Rui Machete,António Vitorino, Elisa Ferreira, Fernando Neves, Fernando Frutuoso de Melo,Paulo Sande, Francisco Seixas da Costa e Vítor Martins. ➥ P4 A 16 E OPINIÃO

12 de Junho de 1985,Portugal na CEE