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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA, ENSINO E NARRATIVAS MESTRADO PROFISSIONAL I SEMINÁRIO PROGRAMA DE PÓS- GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA, ENSINO E NARRATIVAS Local de Realização: Auditório do Curso de História – Centro Histórico Dias 19 e 20 de maio de 2015 CADERNO DE RESUMOS EXPANDIDOS ISBN: 978-85-8227-137-7

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA, ENSINO E NARRATIVAS

MESTRADO PROFISSIONAL

I SEMINÁRIO PROGRAMA DE PÓS-

GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA, ENSINO E

NARRATIVAS

Local de Realização:

Auditório do Curso de História – Centro Histórico

Dias 19 e 20 de maio de 2015

CADERNO DE RESUMOS EXPANDIDOS

ISBN: 978-85-8227-137-7

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ISBN: 978-85-8227-137-7

A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EM CAXIAS: PASSADOS POSSÍVEIS DE SE

PRESERVAR

Joana Batista de Souza

Educação Patrimonial é um instrumento de “alfabetização cultural” que possibilita ao

indivíduo fazer a leitura do mundo que o rodeia, levando-o à compreensão do universo

sociocultural e da trajetória histórico-temporal em que está inserido. Este processo leva

ao reforço da auto-estima dos indivíduos e comunidades e à valorização da cultura

brasileira, compreendida como múltipla e plural”(Horta, 1999,p.9). O objetivo aqui é

discutir sobre parte da pesquisa de Mestrado, na qual busco refletir sobre a metodologia

da Educação Patrimonial no contexto escolar das escolas públicas de Caxias-MA

gerando um diálogo entre os indivíduos e o patrimônio cultural. Cabe assim questionar.

Qual a relação da metodologia da Educação patrimonial com preservação do patrimônio

local? De início nos reportamos ao chamado Patrimônio Histórico, que segundo

Françoise Choay é uma parte do patrimônio cultural. A expressão designa um bem

destinado ao usufruto de uma comunidade que se ampliou a dimensões planetárias,

constituído pela acumulação contínua de uma diversidade de objetos que se agregam

por seu passado comum: obras e obrasprimas das belas artes e das artes aplicadas,

trabalhos e produtos de todos os saberes e savoir-faire dos seres humanos (CHOAY,

2001).É, então, uma estratégia por meio das quais grupos sociais e indivíduos narram

sua memória e sua identidade, buscando para elas um lugar público de reconhecimento,

na medida mesmo em que as transformam em “patrimônio”. Transformar objetos e

estruturas arquitetônicas em patrimônio cultural significa atribuir-lhes uma função de

“representação”, que funda a memória e a identidade. Nesta perspectiva a Educação

Patrimonial pode ser aplicada como objeto de estudo a cerca que tem sido indicado para

o ensino por possibilitar a compreensão do aluno, identificando o passado nos vários

espaços de convivência, ”a escola, casa, comunidade, trabalho, lazer - , e igualmente por

situar os problemas significativos do presente (BITTENCOURT, 2009, p.168). Para

Horta (1999), a metodologia da Educação Patrimonial pode ser desenvolvida no

ambiente formal de ensino (escolas) ou informal (comunidade, associações de bairro,

museus, parques ambientais) e também se adequar a qualquer tipologia de patrimônio,

ou seja, “qualquer evidência material ou manifestação da cultura, fotografias,

documentos, sítios arqueológicos, prédios históricos, reservas ambientais, monumentos,

paisagens naturais, praças, festas e comemorações, rituais, parques ecológicos, por

exemplo, são considerados patrimônios culturais Nos dias atuais, é cada vez maior a

preocupação com a preservação do patrimônio histórico e cultural de uma sociedade, de

um lugar. As dimensões e as características que definem o nosso tempo e espaço geram

discussões constantes sobre o que, como e para quem preservar. Por tal, este trabalho se

propõe levantar os possíveis desafios à efetivação da Educação Patrimonial no espaço

escolar a partir da percepção de que a preservar o patrimônio cultural se apresentam

como essencial para os sujeitos históricos, na medida em que possibilita o reencontro

com as raízes das suas comunidades e a reafirmação das suas identidades. Nesse sentido

o trabalho se torna relevante ao problematizar questões como: qual a relação da

Educação patrimonial com preservação do patrimônio local? E como aproximar o aluno

de sua própria história ou da história de sua cidade? Como articular a prática da

Educação Patrimonial com o ensino de História? Ao pensarmos a História como uma

disciplina dinâmica, o ensino de História também é dinâmico à medida que traz para

sala de aula, temáticas atuais para a produção de novos saberes, resultando no estímulo

à interação, a socialização do aluno e principalmente que o mesmo se perceba como um

ser social e valorize seu ambiente e suas experiências. O ensino de História pode fazer

escolhas pedagógicas capazes de possibilitar ao aluno refletir sobre seus valores e suas

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práticas cotidianas e relacioná-los com problemáticas históricas inerentes ao seu grupo

de convívio, à sua localidade, à sua região e à sociedade nacional e mundial. (PCN,

p.34, 1998). É dentro dessa perspectiva que podemos traçar uma relação do que é vivido

e experienciar essas vivências dos alunos à medida que os mesmos possam expandir seu

conhecimento da relevância histórica que Caxias tem no cenário maranhense atribuída

em grande parte relacionado ao patrimônio arquitetônico herdado da influência

portuguesa. Caxias no Maranhão nasceu das Aldeias Altas, por volta de 1716, às

margens do rio Itapecuru nas terras mais planas e mais altas. Seu processo de

urbanização inicia-se com a chegada dos jesuítas que formaram as primeiras missões

catequéticas. Elevada à categoria de Vila (1811), é denominada Caxias das Aldeias

Altas, passando à categoria de cidade, com a denominação de Caxias (1836), em

consequência do aumento populacional, resultante do desenvolvimento econômico no

século XIX, onde era a principal exportadora de algodão para a Europa. O patrimônio

edificado de Caxias é um testemunho do processo de urbanização da cidade e

concentração de riquezas proporcionadas pelo ciclo de exportação do algodão e

instalação de manufaturas e dos trilhos de ferro por onde passaram, artigos de luxo,

cargas de alimentos e de ideais, sobretudo após o fato de alguns conjuntos

arquitetônicos do período colonial brasileiro terem sido considerados patrimônios

culturais da humanidade pela UNESCO. Esses “lugares”, considerados lugar de

memórias em Caxias fazem referências a uma cidade provinciana com aspectos

modernos e uma riqueza material e opulência resultante das influências vindas da

Europa Ao longo do processo de modernização das cidades, percebemos uma intensa

desvalorização do patrimônio edificado local e também o desconhecimento com relação

ao patrimônio cultural. De acordo com as políticas de preservação criadas pelo Instituto

do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional –INPHAN, geralmente atuam com o

objetivo de reforçar uma identidade coletiva, visando à educação e a formação de

cidadãos. Esse é o discurso que costuma justificar a constituição desses patrimônios e o

desenvolvimento de tais políticas públicas de preservação (FONSECA, 2005); mas, na

prática é preciso criar mecanismos que viabilizem e estreitem de fato a relação entre

patrimônio e sociedade. Fazse necessário então, definir a Educação patrimonial, na qual

se constitui uma prática educativa social que visa à organização de estudos e atividades

pedagógicas interdisciplinar, com o objetivo de, interagir com diversas áreas do

conhecimento visando à análise dos bens culturais que implica explicações múltiplas

sobre o sentido do passado, e da memória, associados à política e a educação ambiental,

ao direito e ao desenvolvimento tecnológico, industrial e social. (PELEGRINI, 2009, p.

36). Diante da necessidade de salvaguardar o patrimônio cultural material da cidade de

Caxias, se torna necessário despertar no aluno para que eles conheçam as

peculiaridades, singularidades e particularidades do local. Como aproximar o aluno de

sua própria história ou da história de sua cidade? Para Jaime Pinski e Carla Pinki para

despertar no aluno o sentimento de pertencimento ao mundo em que vive é

imprescindível que, cada estudante precisa se perceber, de fato como sujeito histórico, e

isso só se consegue quando ele se dá conta dos esforços que nossos antepassados

fizeram para chegarmos ao estágio civilizatório no qual nos encontramos. (PINSKI,

2010, p.21) Par os autores esse trabalho deve começar na sala de aula, por ser

teoricamente um espaço de aprendizagem, de sociabilidades e vivência dos indivíduos

dentro e fora do ambiente escolar. Por isso, a (re)elaboração do passado e a consequente

reconstrução da memória, como fatores importantes para a composição do presente,

exigem o resgate de elementos que darão formas ao espaço vivido e vivenciado, cujos

elementos se apresentam como objetos de identificação de uma sociedade, de uma

cultura. Dessa forma, as contribuições de Rüsen (2001),Schmidt, Barca, Martins (2011),

Cerri (2011), nos mostra que o sentido de preservar um lugar, está ligado à sua

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formação histórica adquirida pelo que eles chamam de Consciência Histórica. Assim

para eles, entende-se a consciência histórica como uma atitude de orientação de cada

pessoa no seu tempo, sustentada refletidamente pelo conhecimento da História. Os

desafios de educar para o patrimônio comungam com as discussões sobre como e para

que preservar. Nesse sentido este trabalho continua com o debate de ampliação dos usos

da Educação Patrimonial e disponibilizar subsídios para que se ampliem as práticas

educativas a partir do processo educacional que se articulam as possibilidades de

desenvolver a sensibilidade e a consciência dos indivíduos para a importância da

preservação desses bens culturais em sala de aula e posteriormente. Palavras - Chave:

História. Ensino. Educação Patrimonial.

REFERÊNCIAS:

ALMEIDA. Eliane de Sousa. Patrimônio cultural e memórias: percorrendo os dias e

sentindo a cidade de Caxias. In: MELO, Salânia; PESSOA, Jordânia. (org.) Percorrendo

Becos e Travessas: feitios e olhares das histórias de Caxias. Teresina: Edufpi, 2010.

BARCA, Isabel. Marcos de Consciência Histórica de jovens portugueses. Currículo sem

Fronteiras, v.7, n.1, pp.115-126, Jan/Jun 2007.

BITENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e métodos.

São Paulo, Cortez Editora, 2008.

___________. O saber histórico na sala de aula. 12. ed. – 1ª reimpressão.- São Paulo:

Contexto.2013 CERRI, Luis Fernando. Ensino de história e consciência história. - Rio

de Janeiro: Edita FGV, 2011 CHOAY, F. A alegoria do patrimônio. Trad. Luciano

Vieira Machado. São Paulo: Unesp.

FUNARI, P. P. A.; PELEGRINI, S. C. A. Patrimônio histórico e cultural. Rio de

Janeiro: Zahar, 2006. HALL, Stuart. A Identidade Cultural na pós-modernidade. 7. Ed.

Rio de Janeiro: DP&A, 2002.

HORTA, Maria de Lourdes Parreira. Guia Básico de Educação Patrimonial. Brasília:

IPHAN/ Museu Imperial, 1999.

SCHIMDT, Maria Auxiliadora, BARCA, Isabel, MARTINS, Estevão de Rezende

(Org.). Jörn Rüsen e Ensino de História.- Curitiba: Ed. UFPR, 2011.

REFLEXÕES SOBRE GÊNERO NO MOVIMENTO REGGAE EM SÃO LUÍS:

UM OLHAR NA IDENTIDADE E ATUAÇÃO DA MULHER.

Thalisse Ramos de Sousa

Esta produção tenciona refletir sobre a atuação da mulher no movimento reggae de São

Luís através de suas múltiplas identidades considerando as variáveis de raça, classe e

gênero. Atualmente, é marcante a presença das mulheres nos salões de reggae de São

Luís, porém, mesmo sendo presença constante, e reconhecido alguns progressos, a

situação de coadjuvantes perdura até os tempos atuais, pois no reggae, os homens ainda

são os verdadeiros protagonistas. São eles os donos de radiolas, os dj´s, os proprietários

dos bares, os apresentadores de programas de reggae no rádio, enfim as pessoas que

lideram o reggae em São Luís. Com esta análise pretendemos contribuir para o resgate

da atuação feminina no reggae e participar do esforço de dar a Elas o estatuto que lhes

foi negado. Elas participaram desde o começo, porém os relatos sobre o reggae narram

apenas os feitos dos homens. E as mulheres, como ficam? Meu esforço soma-se a outros

esforços que têm por finalidade tirar do silêncio a voz da mulher. Anseio em obter

respostas para questionamentos como: Quem são as personagens destas histórias? Onde

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elas estão hoje? Como significam sua atuação no espaço do reggae? Como a macro

história está contida nas micros histórias? Qual o lugar social que lhe é reservado?

Quais os discursos que as constroem? Como o discurso feminino é articulado com

outros discursos que configuram redes de saberes? Tratar deste objeto de estudo pode

ser visto como um exemplo de inclusão dos sujeitos invisíveis e de reconhecimento de

que as vozes das mulheres e das minorias (maiorias) silenciosas (silenciadas) estão

ocupando espaços que precisam ser desvelados. As discussões teóricas, em torno das

relações de gênero, decorrentes da construção social e histórica dos sexos, tiveram seu

espaço no movimento feminista como uma nova forma de entender a relação de

dominação a que as mulheres eram submetidas. Os estudos de Joan Wallace Scott

(1995), em fins da década de 60 do século XX, trouxeram à tona preocupações que

enfatizavam a importância da relação homem-mulher no espaço social. A maneira como

a mulher se comporta na sociedade e desempenha seus papéis, nada tem de natural ou

biológico, mas, são construções que se dão a partir das relações sociais. Simone de

Beauvoir (1949), em sua famosa frase – “Ninguém nasce mulher, mas se torna mulher”

– inaugurou os fundamentos do conceito de gênero. Lutando contra o essencialismo

biológico, onde a anatomia era o destino, ela mostrou que ser homem ou ser mulher

consiste numa aprendizagem. Saffioti (2000) nos orienta que a categoria gênero também

é relacional e só pode ser captada na trama das relações sociais e no processo histórico.

As formas como homens e mulheres se vêem vai depender das circunstâncias, das

representações coletivas e da ideologia dominante. Assim, os papéis normativos, os

comportamentos atribuídos a homens e mulheres e a relação entre os sexos não são

discursos neutros, mas representações construídas repletas de significado e de relações

de poder. Assim, é importante ressaltarmos que em nossa sociedade, a qual tem

produzido historicamente papéis sexuais de forma hierárquica e dicotomizada,

reproduzidos na família, na escola, na igreja, nas empresas e em outras instituições, não

é algo natural, mas fruto das relações sociais. Portanto, exploração e machismo não são

manifestações inatas, mas construídas no contexto das relações sociais, permeadas pelas

relações de classe, gênero e etnia. As relações de gênero implicam desigualdade e

dominação: inscrevem-se em relações de poder em que “o princípio masculino é tomado

como medida de todas as coisas” (Bourdieu, 1999, p.03). Portanto, integram um

complexo sistema de dominação masculina, fortemente institucionalizado e

internalizado, e estruturam todos os aspectos da vida social, justamente por está presente

em todos os processos sociais, gênero, pode ser utilizado para debater questões como

raça, classe, identidade, etnicidade e outros, expressando-se na cultura, ideologia,

violência, sexualidade, reprodução, divisão do trabalho, organização do estado e nas

práticas sociais e de lazer, como é o caso do reggae em São Luís. As questões de gênero

são pouco discutidas no movimento reggae, o que impede questionamento de certos

valores e práticas, que acabam por levar a um comportamento discriminatório e

reprodutivo das diferenças, entre eles o “ocultamento” da mulher na sociedade que

reflete-se na historiografia atual, mas esta tem atravessado um processo de renovação

teórico-metodológico nas últimas décadas. Tem-se deixado de fazer historiografia

apenas descrevendo acontecimentos de caráter político ou simplesmente provendo uma

narrativa destacando os aspectos econômicos da vida social. As relações sociais

emergem para primeiro plano, ganham importância na contemporaneidade. Como

resultado desse processo, a pesquisa historiográfica tem valorizado o uso de aportes

teóricos e fontes históricas “que busquem valorizar outros personagens através da

análise do processo social e da expansão de concepção de documento histórico” (Burke,

1992). Essa ampliação na concepção de fonte histórica, que agora não se limita apenas a

documentos e considera também memória, testemunhos orais, fotos, filmagens, entre

outros, beneficia a historiografia no entendimento de estruturas menores da sociedade e

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imputa significância às singularidades, o que impacta em estudos de particularidades

sociais. Seguindo esta perspectiva, temos como recursos metodológicos para esta

pesquisa observação participante através de vivências nas festas de reggae, análises de

fontes escritas mediante consultas em documentos oficiais (leis e políticas) e não

oficiais ( jornais e revistas de época, fotos, vídeos, programas de rádio), além de

entrevistas com participantes (homens e mulheres) do movimento reggae, membros da

cadeia produtiva e representantes de entidades de classe ou sociedade civil organizada,

utilizando a técnica de História Oral, pois “mesmo os que trabalham com períodos

anteriores têm alguma coisa a aprender com o movimento da história oral e precisam

estar conscientes dos testemunhos e tradições embutidos em muitos registros

históricos”. (BURKE, 2000, p.72). O trabalho irá inicialmente contextualizar o

surgimento do reggae sob influência da revolução cultural ocorrida nos ano 60 e 70,

como uma nova linguagem capaz de enfatizar a necessidade de paz e transformação

social. Os cantores de reggae tornaram-se porta vozes das mazelas do terceiro mundo,

propondo inclusão de sujeitos até então marginais como o negro, o pobre e as mulheres,

que neste momento, assim como vários movimentos sociais começam a estabelecer as

bases do movimento feminista. Em seguida será feita uma abordagem sobre a

consolidação e expansão do reggae em São Luís, principalmente nos anos 80 e 90,

explanando sobre sua forma peculiar de estruturação e apropriação em terras

ludovicense relacionando o impacto da construção dessa identidade regueira e a forma

de participação das mulheres no movimento. Por fim, será analisada a identidade da

mulher regueira considerando os múltiplos aspectos que permeiam seu cotidiano

(maternidade, sexualidade, trabalho, religião etc) a fim perceber como elas representam

sua atuação no movimento reggae e como são representadas. Há uma necessidade

urgente de tirar do “anonimato” quem são essas mulheres que participam do movimento

há quase 40 ano, registrar suas memórias, feitos, protagonismos, revelar suas ambições

e necessidades e assim pagar uma dívida histórica dando o reconhecimento e a

visibilidade devida, fornecendo subsídios para a criação de políticas e ações que

possam transformar a realidade social na qual elas se encontram e começar a escrita de

uma nova história, dessa vez mais justa e igualitária.

BIBLIOGRAFIA REFERENCIADA

BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. 6. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1999.

BURKE, Peter (Org.). A escrita da história: novas perspectivas. Tradução Magda

Lopes. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1992.

CANCLINI, Nestor. Culturas híbridas. São Paulo: EDUSP, 2003.

POLLAK, M. Memória e identidade social. Estudos Históricos, v. 5, n. 10, 1992.

SAFFIOTI, Heleieth I. B. “Rearticulando Gênero e Classe Social”, In: BRUSCHINI,

Cristina e Costa, Albertina de O. Uma Questão de Gênero. Rio de Janeiro, Editora Rosa

dos Tempos, Fundação Carlos Chagas, 2000.

SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil para a análise histórica. Recife: SOS Corpo,

1995.

Silva, Carlos Benedito Rodrigues da. Da Terra das primaveras à ilha do amor: reggae,

lazer e indentidade cultural. São Luís: EDUFMA, 1995.

Silva, Carlos Benedito. Ritmos da Identidade: Mestiçagem e sincretismo na cultura do

Maranhão. Doutorado: Ciências Sociais. SP. Orientadora: Dr° Terezinha Bernardo.

PUC, 2000

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JOSÉ CUPERTINO E A UMBANDA EM SÃO LUÍS: ABORDAGENS E

PERSPECTIVAS SOBRE A INSERÇÃO DO CULTO NA CAPITAL

MARANHENSE NA DÉCADA DE 1960.

Márcia Andrea Teixeira da Silva

A presente pesquisa visa analisar o processo de inserção das manifestações

umbandistas nos terreiros de São Luís na década de 1960, por intermédio do vereador

José Cupertino, com o objetivo de compreender a dinâmica sociocultural e o processo

histórico dos terreiros de Umbanda em São Luís. No objeto em análise aborda-se a

História Cultural devido ao fato desta corrente teórica possuir uma ampla abordagem de

temas e estudos sobre manifestações populares, como por exemplo: comportamentos,

costumes, dentre outros aspectos das distintas estratificações socioculturais. Vale

ressaltar que os estudos sobre as representações vêm obtendo um espaço considerável

na produção historiográfica, especialmente, por estabelecer enquanto objeto de pesquisa

um amplo leque de possibilidades, viabilizando dessa forma, o diálogo entre as

disciplinas e distintos campos de investigação. Faz-se necessário destacar que há um

forte debate entre a relação memória popular e história oral. Montenegro (2001, p.16)

explica que os problemas de caráter epistemológico que remetem a questão do

empirismo e a prática histórica ortodoxa; a forma do material da história oral; o

testemunho individual; a narrativa ou autobiografia, não são autossuficientes, o que

importa na história oral, segundo o autor, não são os fatos acerca do passado, mas toda a

trajetória em que a memória popular é construída e reconstruída. A perspectiva histórica

estabelece direta relação com a memória, para Halbachs (1990, p.80) deve-se

compreender a história como uma construção que, ao resgatar o passado (campo

também da memória), aponta para formas de explicação do presente e projeta o futuro.

O operar, próprio do fazer histórico na sociedade, localizaria em cada indivíduo um

procedimento interior semelhante (passado, presente e futuro) através da memória. Em

que pese às questões acerca dos conceitos de identidade, elementos fundamentais na

presente pesquisa, Stuart Hall (2005) analisa a crise na pós-modernidade tomando como

núcleo as modificações estruturais que desconstroem e fragmentam vários segmentos

inerentes às identidades de classe, religião, nacionalidade, etnia, gênero e raça. O autor

discute que esses segmentos traçavam uma localização sólida do indivíduo social, no

entanto, as paisagens culturais estáveis que demarcavam esses territórios passaram por

um processo de desintegração desses sujeitos, o que Hall denomina de deslocamento e

descentração do sujeito. O estudo de Hall (2005) corrobora para o objeto em análise,

pois em meio à discussão da inserção da umbanda, por intermédio do vereador e

radialista José Cupertino, tendo em vista que durante parte de sua trajetória na

religiosidade afro-brasileira ele era conhecido como curandeiro, logo, atenta-se para o

olhar de vanguarda do vereador, que perpassa por um processo de descentramento do

sujeito curandeiro, coibido pelos órgãos da segurança, quanto à dinâmica de festividade

em seu terreiro. E assim permite um deslocamento de sua identidade enquanto

curandeiro e passa a ser umbandista exatamente no contexto em que a prática religiosa é

reconhecida enquanto religião no cenário nacional. Temos, portanto, um panorama das

práticas de apropriação e representação (CHARTIER, 1988) no campo da religiosidade

afro-brasileira, especificamente no Maranhão. Diante do exposto o presente estudo visa

desenvolver processualmente uma estrita relação com os conceitos de memória e

identidade na perspectiva histórica das representações umbandistas em São Luís, e visa,

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dessa forma, valorizar o patrimônio sócio cultural maranhense/brasileiro. No que tange

à questão da relação deste estudo com os aspectos metodológicos do ensino de História,

atenta-se para necessidade de trabalhar as referências historiográficas em consonância

com os parâmetros curriculares nacionais, sob o ponto de vista da conscientização dos

alunos em relação às identidades culturais de cada grupo, de cada povo, de cada

indivíduo, uma vez que a Umbanda, e outras manifestações religiosas afrodescendentes,

ainda são reconhecidas pela maioria do corpo discente a partir de um olhar etnocêntrico.

No tocante a metodologia, a pesquisa visa estudar a Umbanda em São Luís na década de

1960 através de jornais, do Diário Oficial do período, referências bibliográficas, além

do resgate da memória a partir de entrevistas com umbandistas e seus familiares, e de

pessoas ligadas a José Cupertino, importante divulgador desta manifestação religiosa e

possível introdutor do culto no período anteriormente citado. Intenciona-se também

observar a trajetória política do vereador, através de documentação da Câmara, com o

intuito de perceber os projetos por ele implementados e a relação com a umbanda, além

de perceber as alianças políticas que viabilizaram o funcionamento dos terreiros do

culto em São Luís na década de 1960. Assim, é possível verificar que a presente

pesquisa tem sua relevância para a produção historiográfica maranhense, contribuindo

não apenas para os estudos sobre cultura popular, mas também para as questões do

ensino, por desenvolver uma abordagem que visa resgatar a memória de grupos

inseridos nas religiões afro-brasileira e cujos valores precisam ser passados para outras

gerações.

Palavras-chave: Umbanda. José Cupertino. São Luís

REFERÊNCIAS

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Rio de Janeiro. Vozes: 2004.

CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações. Lisboa:

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HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Vértice, 1990.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 10 ed. Rio de Janeiro: DP

& A, 2005.

MONTENEGRO, Antônio Torres. História Oral e Memória: a cultura popular

revisitada. 3ª edição. São Paulo: Contexto, 2001.

POLLACK, Michael. Memória e Identidade Social. Revista Estudos Históricos, Rio

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brasileira. São Paulo: Ática, 1994.

BRECHAS DO CATIVEIRO: PRÁTICAS EDUCATIVAS DE MULHERES

ESCRAVAS NO MARANHÃO OITOCENTISTA.

Elaine Regina Mendes Lisbôa

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Tratar acerca do papel da mulher ao longo do processo histórico, tem sido uma

preocupação recente dos pesquisadores das ciências humanas e sociais, tendo-se em

vista a sua posição considerada secundária em um contexto de dominação masculina no

qual os papéis sociais eram legitimados a partir do ser homem ou ser mulher, cor da

pele e do nível da instrução. No entanto, novos caminhos começam a proporcionar

desconstruções de mitos, através de olhares diferenciados à fontes, assim como os

vários entrecruzamentos possíveis entre elas, discutindo-se narrativas históricas que

dirigem-se ao passado e proporcionam elementos que problematizam representações

desses "acontecimentos" no tempo presente. Instigadas a partir das discussões da

História Social e da História Cultural, a referida abordagem, passou a ser objeto de

estudo de historiadores que buscam trazer para as cenas históricas abordagens e sujeitos

"presos", até então, aos bastidores das tramas sociais. Como afirma Pollak (p.4, 1989)

acerca da existência de uma "predileção atual dos pesquisadores pelos conflitos e

disputas em detrimento dos fatores de continuidade e de estabilidade deve ser

relacionada com as verdadeiras batalhas da memória". Novos estudos passaram a se

preocupar com "novos sujeitos do novo passado" (SARLO, 2007, p.16), um exemplo

são as mulheres e escravos. É nessa perspectiva que busca-se refletir acerca das

relações de gênero e escravidão no que se refere às praticas educativas do Maranhão

Oitocentista. Então, abordar essas temáticas, configura-se enquanto um desafio para a

historiografia, uma vez que analisa-se documentos da época que estão imbricados de

intenções que legitimam as vivências de uma sociedade escravocrata, elitista e

patriarcal, legitimando assim, a "ausência" de fontes escritas que façam referência as

mulheres escravas, enquanto sujeito. A partir dessa problemática, as pesquisadoras e os

pesquisadores da área procuraram perceber as lutas, as vivências e as resistências dessas

mulheres, todavia, de acordo com o entendimento de Maria Odila Leite da Silva Dias o

que dificultava o estudo da história das mulheres era a ausência de fontes ou a

invisibilidade destas. E a proposta era a de buscar as minúcias, de ler nas entrelinhas, de

garimpar o metal precioso das fontes em meio a abundante cascalho. (DIAS, 1992).

Vale ressaltar, ainda, que muitas dessas fontes foram e, são mal conservadas, ou

mesmo, destruídas com a intenção de apresentar uma história "universal", sendo assim

faz-se necessário analisar outras histórias dessas mulheres escravas que estão

escondidas "por baixo" de narrativas essencialmente masculinas. Através dessa análise,

percebe-se que o cotidiano dessas mulheres escravas estava permeado por negociações e

conflitos, evidenciando as brechas e adaptações entre a norma e o vivido, entre o que

era posto como regra para as escravas e como elas as vivenciavam, como afirma de

Certeau (1990), nessa brecha se insinuam as reformulações, os desvios, as apropriações

e as resistências, assim exemplifica-se essa ideia a partir das negociações entre os

discursos de exclusão ao espaço escolar, expressos nas Leis e Regulamentos da

Instrução Pública no Maranhão Império, e o vivido nas práticas de uma parcela de

cativas que frequentavam as escolas ou outros espaços de sociabilidade, em seu

cotidiano, permeados de processos de aprendizagem. Para tanto, é necessário analisar

diversas formas que envolveram essas mulheres em processos educativos, visto que se

aprende em espaços formais de educação, assim como em outros espaços. Através desse

entendimento, o referido trabalho problematiza as vivências das mulheres escravas no

Maranhão Oitocentista em dimensões diferenciadas e complementares de processos

educativos: a educação aprendida nas instituições públicas e particulares da Província

do Maranhão, assim como no espaço privado, nas ruas e em outros espaços de

sociabilidade. Nesse sentido, havia interesses mútuos em processos educativos de

escravos, uma vez que para Fonseca (2002) podem ser entendidos como estratégias

educacionais as atividades que buscavam introduzir nos escravos as habilidades

necessárias à sua atuação como trabalhador e a naturalização das relações entre

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dominador e dominado, tornando- os produtivos e submissos, para que não viessem a

representar uma ameaça à vida dos senhores. E segundo Cruz (2009, p.126) apesar da

escravidão, os negros também eram influenciados por processos educativos que

moldavam aspirações de civilidade, integração social e liberdade. As instituições

educativas, a Igreja, o Estado estavam em harmonia com os interesses do país e da

Província do Maranhão, pautados em um projeto civilizador moldavam a instrução com

o intuito de demarcar claramente a divisão econômica e sociocultural, além de

estabelecer os papéis sociais. Esse discurso refletia o comportamento a ser seguido pela

elite, pelos pobres e pelos escravos. De acordo com Abrantes (2014) a capital da

Província exigia um disciplinamento do espaço urbano e de seus habitantes,

especialmente os escravos e os livres pobres, conforme os padrões de civilidade

europeus. Em consonância com essa ideia, os processos educativos no caso das

mulheres escravas que trabalhavam no espaço privado estavam direcionados para

"prepará-las" ao convívio com a elite, tornando-as minimamente "disciplinadas". Por

isso, a disponibilidade institucional de aprendizagem estava direcionada ao

oferecimento dos trabalhos manuais, como evidencia-se por meio do anúncio do

Internato e Externato Maranhense de N. S.de Vitória: "(...) escravas de menor idade,

para aprenderem custura chã labyrinthos, bordados, rendas, engomar, e outros serviços e

brendas próprios de sua condição" (Publicador Maranhense, 07/01/1869). Outra

possibilidade de aprendizagem dava-se também através da idéia de impregnação

defendida por Magalhães ( 1996) transmitindo o conhecimento pelas vivências do

cotidiano, assim o dia-a-dia ensinava diversas atividades à essas mulheres. Dessa forma,

a referida pesquisa trata de grupos excluídos das narrativas historiográficas oficiais,

proporcionando assim uma grande motivação ao ser investigada, visto que evidencia-se

vários silêncios, lacunas, não ditos que instigam o profissional a buscar "respostas"

através do diálogo com várias fontes, estabelecendo assim o paradigma indiciário, o

qual segundo Carlo Ginzburg (2003, p. 143-179) considera uma possibilidade

metodológica de construção do conhecimento por meio da coleta dos indícios e

pormenores, muitas vezes considerados, em outras metodologias, aspectos

insignificantes para a compreensão de determinadas problemáticas. Portanto, a

metodologia de trabalho perpassa pela coleta e análise de fontes primárias (leis,

regulamentos, ofícios, relatórios, documentos escolares, periódicos), referências

bibliográficas do momento estudado, assim como referências contemporâneas sobre o

tema, com intuito de perceber, por meio do entrecruzamento das fontes, como esses

sujeitos escravizados vivenciaram práticas educativas em meio ao discurso de

"superioridade" da elite branca. E partir disso, perceber construções de novas

abordagens que deslocam a mulher escrava do patamar apenas de submissão e

exploração, percebendo-as enquanto sujeitos em processos de busca por sua autonomia.

Palavras-chave: Mulheres Escravas. Práticas Educativas. Maranhão Oitocentista.

REFERÊNCIAS:

ABRANTES, Elizabeth Sousa. A educação do “Bello Sexo” em São Luís na segunda

metade do século XIX. São Luís: Editora: UEMA, 2014.

CERTEAU, Michel de. A Invenção do cotidiano. Artes de fazer. Petrópolis, Vozes,

1990, [Tradução: Ephraim Ferreira Alves].

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CRUZ, Mariléia dos Santos. A Educação dos negros na sociedade escravista do

Maranhão Provincial. Revista Outros Tempos (UEMA), vol 06, número 8, 2009.

DIAS, Maria Odila Leite da Silva, Teoria e método dos estudos feministas: perspectiva

histórica e hermenêntica do cotidiano. In COSTA, Albertina de Oliveira &

BRUSCHINI, Cristina. Uma Questão de Gênero. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos.

São Paulo: Fundação Carlos Chagas, 1992.

FONSECA, Marcus Vinícius. Educação e Escravidão: um desafio para a análise

historiográfica. Revista Brasileira de História da Educação n° 4 jul./dez. 2002

GINZBURG, Carlo. Mitos, emblemas e sinais: morfologia e história. 2 ed. São Paulo:

Companhia das letras, 2003.

M AGALHÃES , Justino (1996). Um contributo para a história do processo de

escolarização da sociedade portuguesa na transição do Antigo Regime. Educação

Sociedades & Culturas, Porto Alegre, n. 5. Edições Afrontamento.

POLLACK, Michael. Memória,esquecimento e silêncio. Revista Estudos Históricos:

v.2, n.3, 1989.

SARLO, Beatriz. Tempo passado: cultura da memória e guinada subjetiva; tradução

Rosa Freire d’Aguiar. São Paulo: Companhia das Letras; Belo Horizonte: UFMG, 2007

Fontes Primárias

Periódico Maranhense: O Publicador Maranhense 1869

DOS ESPAÇOS DO QUARTEL AOS LABIRINTOS DO BORDEL: QUANDO A

ORDEM E A DESORDEM SE ENCONTRAM (SÃO LUÍS 1905-1915)

Ricardo de Jesus Pacheco Silva.

O tema apresentado faz parte de uma pesquisa desenvolvida no Programa de Pós-

Graduação em História, Ensino e Narrativa (PPGHEN) pela Universidade Estadual Do

Maranhão (UEMA), cujo projeto de pesquisa aprovado tem como título: “DO

QUARTEL AO BORDEL: das entranhas da ordem às vísceras do prazer” (São Luís

1905-1945). Essa temática aqui exposta faz referência à primeira metade do século XX,

entretanto, a proposta da pesquisa aqui apresentada será direcionada aos anos que

seguem de 1905 a 1915. O espaço de estudo está inserido no centro da capital do

Maranhão, São Luís, abrangendo, principalmente, o bairro do Desterro que hoje faz

parte do Centro Histórico da capital maranhense e que nesse período reunia outros

bairros além desse, como o Portinho e a Praia Grande. A pesquisa, entretanto, foca

principalmente, a área para onde foi remanejado o quartel da Polícia Militar do Estado

(PME), instalado nas dependências do Antigo Convento das Mercês a partir de 1905

(FARIA, 2007), e os espaços de negociação do amor venal, ou seja, ruas e quarteirões

onde estavam localizados bordéis, boates, casa de cômodos e cabarés. A análise,

entretanto, desses espaços, não está direcionada a um estudo da prostituição, como

também não se trata de um ensaio sobre a instituição militar. A pretensão desta pesquisa

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está direcionada à interpretação de uma realidade constituída por múltiplas relações

estabelecidas por militares e meretrizes pertencentes a uma sociedade historicamente

determinada, com seus valores, princípios morais e visão de mundo. A ideia é analisar

as múltiplas relações vivenciadas e compartilhadas por militares e meretrizes nesse

período do século XX, experiências essas, constituídas a partir da dinâmica que

contrapõe o símbolo da ordem, o militar da PME, e a prostituta, a imagem da desordem

(SILVA, 2008), numa rede de sociabilidade tecida por práticas e representações.

Relações que, de certa forma, são aqui analisadas a partir do momento em que o

Comando Geral da Polícia Militar do Estado e seu efetivo são transferidos para o Centro

de São Luís, no bairro do Desterro em 1905, acomodando-se no antigo Convento das

Mercês. A pretensão visa entender como essas relações foram possíveis, e de que forma

elas foram sendo construídas, além, é claro, dos reflexos produzidos na instituição

militar, no meretrício e na sociedade da época. Entendendo essa realidade e suas faces

sob o olhar e o caminhar minucioso do policial militar que emerge das vivências e

experiências compartilhadas com as negociadoras do amor venal, nos espaços de

transitoriedade do prazer. Além dessa questão central, pretende-se compreender de que

forma essas relações foram se consolidando, tendo em vista que esses espaços já

estavam submetidos a mecanismos de vigilância e controle, eram com grande

frequência monitorados por policiais da secretaria de segurança pública, os policiais

civis, delegados e os guardas de quarteirões, entre outros (CAMPOS, 2001). Vale

também frisar a reação da sociedade da época ao se deparar com o convívio de militares

da PME e meretrizes que habitavam o centro de São Luís, em locais próximos as

chamadas casas de famílias e o quartel geral da Polícia Militar do Estado. Em linhas

gerais, essas relações, entre militares e meretrizes, que tem início logo após a

implantação do quartel no bairro do Desterro e que se estenderá até a implantação da

ZBM na década de 40 do século XX é o foco central da pesquisa que estou

desenvolvendo pelo Programa de Pós-Graduação em História, Ensino e Narrativa na

UEMA e que culminará em uma dissertação a ser apresentada como etapa final para

obtenção do título de mestre. Entretanto, a proposta aqui apresentada vai se limitar a

analisar alguns aspectos dessas relações que entrelaçam militares e meretrizes

compartilhadas no período que vai de 1905 a 1915. Vale também frisar que a intenção é

acompanhar esse militar em suas relações construídas no cotidiano ao entrelaçar dever,

desejo e prazer nas múltiplas experiências compartilhadas e vivenciadas nos espaços de

cumprimento de suas obrigações e nos locais de sociabilidade do amor venal. E dessa

forma entender uma sociedade historicamente localizada, com suas práticas e

representações, regidas por valores, princípios, visão de mundo e concepção de

realidade. A pesquisa, de certa forma, tem haver com um trabalho inacabado, iniciado

durante a minha produção monográfica que priorizou as décadas de 1950 e 1960 do

século XX. E nesse período o quartel já estava funcionando a algumas décadas e a ZBM

já havia sido instituída legalmente. Nesse primeiro trabalho o ponto principal foi

também o militar visto a partir de suas relações compartilhadas com meretrizes nos

lugares de negociação do prazer. Agora, nessa nova pesquisa que culminará em um

trabalho dissertativo pelo PPGHEN da UEMA, faço um recuo temporal e amplio o

espaço de estudo para entender de que forma essa relações começaram a ser construídas

e quais mecanismos foram instituídos, a priori, na tentativa de neutralizar as práticas

vivenciadas por militares da PME e que eram consideradas uma violação ao decoro da

própria instituição a que pertenciam. A intenção é buscar a compreensão de uma

realidade multifacetada a partir da análise do cotidiano de sujeitos historicamente

localizados, e assim, compreender a sociedade de sua época. Dessa forma, a pesquisa

propõe o resgate dessas relações entre militares e meretrizes como ponto de partida para

compreensão de grupos sociais e indivíduos, aqui pensados como atores principais da

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dramaturgia do seu cotidiano. Será utilizado o gênero, como categoria instrumental para

análise dessa realidade histórica, pois nos possibilita repensar homem e mulher a partir

das relações construídas pelos mesmos, nunca pensados de forma isolada, mas como

produtos socioculturais. Nesse sentido, o militar aqui analisado é o epicentro dessas

relações de gênero e deve ser sublinhado a partir do seu aspecto relacional com a

meretriz. Numa palavra, a compreensão de qualquer um dos dois, homem ou mulher só

poderá existir se forem analisados a partir das relações compartilhadas por ambos,

nunca de forma separada (SHOIET, 1997) É preciso ainda destacar que operar com

relações de gênero focando o masculino é algo escasso na historiografia maranhense. O

que se tem priorizado, nas relações que envolvem o masculino e feminino, é em grande

parte centrado na mulher. Sendo assim, pretendemos, a partir dessas relações,

concentrar os holofotes em formas distintas de masculinidades (CONNELL, 2013)

produzidas por esse militar, sujeito este constituído a partir de suas múltiplas relações

com o outro, aqui em especial a meretriz. E assim, entender esse mosaico de relações e

utilizá-lo na compreensão de sua realidade, revendo princípios, valores,

comportamentos, visões de mundo, práticas de sociabilidades que possam descortinar

aspectos da sociedade de seu tempo. Vale lembrar que uma rica documentação de

registros militares compilados nos Boletins Regimentais está disponível no Quartel

Geral da PMMA (Polícia Militar do Maranhão), localizado no Bairro do Calhau. Essa

documentação registra, de forma detalhada, as alterações diárias dos militares e suas

punições que estão compiladas em um acervo que data de 1900 aos dias atuais. Além

dessa documentação que é a principal fonte de pesquisa, temos também acesso as fontes

jornalísticas, documentos jurídicos, políticos, registro e relatórios de médicos e

sanitaristas. Sendo assim, acredito na relevância dessa pesquisa, pois além de operar

com o gênero, enquanto categoria de análise histórica, e enfatizar os discursos e práticas

que constroem diferentes masculinidades, ela também é uma contribuição para

sociedade maranhense que pode através de trabalhos científicos, aqui em especial de

história, utilizá-lo na compreensão de sua realidade, e dessa forma, rever princípios,

valores, comportamentos, visões de mundo práticas de sociabilidades e representações

que ainda hoje ecoam em nossa sociedade e que podem ser rechaçadas, extirpadas,

ampliadas, revista, modificadas, fortalecidas ou mesmo excluída, dependendo da forma

que elas possam ou não contribuir para melhorias do nosso quadro social.

Palavras-Chaves: Relações de gênero. Policial militar. Meretriz.

REFERÊNCIAS:

CAMPOS, Marize Helena. Maripozas e pensões: um estudo da prostituição em São

Luís do Maranhão na primeira metade do século XX. Dissertação (Mestrado em

História) – USP, São Paulo, 2001, p. 21.

CONNEL, Robert W; MESSERSCHMID, James W. “Masculinidade Hegemônica:

repensando o conceito”. Estudos Feministas, 21 (1), jan. abr 2013. Pp1

FARIA, Regina Helena Martins de. Em nome da ordem: a constituição de aparatos

policiais no universo luso-brasileiro (século XVIII e XIX). Tese (Doutorado em

História) – Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal de

Pernambuco, Recife, 2007, p. 210-211.

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SILVA, Ricardo de Jesus Pacheco. Militares e meretrizes: a ordem e a desordem numa

linha tênue. Monografia (Graduação em História) - Universidade Federal do Maranhão,

São Luis, 2008, p. 14.

SHOIET, Rachel. Enfoques femininos e sua história: desafios e perspectivas. In:

MATOS, Maria Izilda S. de; SOLER, Maria Angélica (orgs.). Gênero em debate:

trajetória e perspectiva na historiografia contemporânea. São Paulo: EDUC, 1997, p. 63.

.241-282.

A VISÃO DE TÚNDALO COMO EXPRESSÃO DA MEMÓRIA CRISTÃ DO

ALÉM MEDIEVAL

Bianca Trindade Messias- Bolsista FAPEMA.

A morte sempre foi inquietante para o homem medieval, os medievos tinham a certeza

da imortalidade da alma, entretanto desconheciam o destino da mesma no pós-morte. A

população vivia num mundo arraigado de valores e regras cristãs, onde o cristianismo

ensinava as normas de conduta para um bom ordenamento social e informava o que

poderia acontecer no além-túmulo, visando a salvação de todos. Uma das formas de

educá-los era através da pregação, momento importante para a difusão dos

ensinamentos de Cristo e seus apóstolos. A Bíblia era a principal fonte de ensino, mas

além dela os clérigos utilizavam outras narrativas, como por exemplo, os relatos de

viagens imaginárias ao Além-túmulo. Estas retratavam as histórias de homens que

foram agraciados em conhecer o além, ou seja, os três reinos eternos que são o Inferno,

Purgatório e Paraíso, com o objetivo de retornar ao mundo dos vivos como testemunhas

de sua experiência. Assim, os eclesiásticos dialogavam com as memórias de Cristo,

como a ressureição, as provações e as parábolas, juntamente com as memórias dos

viajantes que foram ao Além medieval e recontavam as características dos lugares do

pós-morte, com o objetivo de torná-las vivas e presentes no cotidiano dos medievos. A

Visão de Túndalo é um exemplo de narrativa visionária ao Além, o manuscrito foi

escrito no século XII em latim ou gaélico pelo monge Marcus, de quem possuímos

poucas informações, e traduzido para vários idiomas entre os séculos XII e XVI, como o

alemão, francês, inglês entre outros. Duas versões portuguesas da visio foram traduzidas

entre o final do século XIV e início do século XV por monges cistercienses do mosteiro

de Alcaboça. A narrativa é conservada em dois códices diferentes uma no códice 244,

atualmente depositada na Biblioteca Nacional de Lisboa, traduzida por Fr. Zacharias de

Paypolle; e outro no códice 266, localizada no Arquivo Nacional da Torre do Tombo,

traduzido por Fr. Hilário da Lourinhã. A fonte narra a viagem do cavaleiro chamado

Túndalo, proveniente da nobreza, porém aos olhos da Igreja as suas ações eram

indisciplinadas, pois não seguia a conduta cristã, como ir às missas, se confessar, fazer a

caridade, entre outras práticas. Túndalo era um exemplo de cavaleiro pecador da

sociedade feudal, porém foi privilegiado ao conhecer as penas e sofrimentos do Inferno

e Purgatório e as glórias e maravilhas do Paraíso num dia em que se sente mal e fica em

estado de morte aparente, sendo levado ao Além-túmulo por um anjo. Após visitar os

espaços do pós-morte, a sua alma voltou ao corpo, revelando aos que estavam ao seu

redor as características dos lugares vistos e depois desse momento o cavaleiro

arrependeu-se de seus pecados e converteu-se ao cristianismo. A partir da Visão de

Túndalo temos o objetivo de analisá-la como um manual pedagógico de comportamento

e transmissora de memória dos valores cristãos presentes na sociedade medieval, sendo

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a memória cristianizada interpretada como um elo de ligação entre Deus e os homens,

fazendo com que os medievos conhecessem um passado idealizado a partir do

conhecimento das Sagradas Escrituras, que enfatizam os grandes feitos de Jesus na

terra, e que os medievos tivessem desprezo pelo mundo terreno, pela presença dos

vícios que os rodeavam e os levavam a pecar. Ao mesmo tempo, as viagens ao Além

apresentavam um futuro anunciado cuja expectativa era a salvação, conforme obteve o

cavaleiro Túndalo ao final de sua narrativa. A memória é objeto de estudo da história,

através dos relatos e dos testemunhos permite que os fatos do passado sejam

reconstruídos a partir do presente, retratando as experiências, os sentidos daqueles que

vivenciaram o passado, narrando as coisas como aconteceram, ou como eles

imaginavam, selecionando, escolhendo e omitindo alguns fatos. Jacques Le Goff

(2003), em sua obra História e Memória, observou a importância da memória para a

estruturação organizacional das sociedades ao apresentar o seu caráter histórico;

destacamos a fundamentação e significados assumidos na Idade Média. Nesse período a

memória foi cristianizada, interpretada como um vínculo de conexão entre Deus e o

homem ao retomar as memórias dos grandes feitos de Jesus e seus apóstolos, a fim de

mostrar para os medievos os princípios que eles deveriam seguir para terem uma boa

conduta. A difusão das memórias ocorria por meio da oralidade, principal caminho de

comunicação do mundo dos leigos com os dos clérigos, nessa perspectiva “[...] a

oralidade funcionava no aspecto pedagógico do relato. A oralidade implica teatralidade

e improvisação por parte daquele que lia. A voz era garantidora de autoridade, assim

como a presença de um suporte escrito sobre o qual o leitor poderia fazer intervenções e

modificações ao texto segundo o desejo de causar determinada impressão sobre a

plateia”. (ZIERER, 2013, p. 114). A voz era o canal essencial de ensino para os

medievos, assim como a escrita, essa era fundamental para a legitimação dos discursos

eclesiásticos, sendo as suas fontes o relato bíblico. Assim, o escrito e o oral

encontravam-se em equilíbrio, recitar os evangelhos conforme estava escrito na Bíblia

era um privilégio divino exercitado por meio das regras mnemotécnicas, ao passo que

esquecer de alguma passagem ou até mesmo palavra era designado como manifestação

do ser maligno. Um dos temas presentes nas pregações era o Além medieval, cujo

objetivo era informar os espaços do pós-morte para onde as almas serão conduzidas

após o Juízo Final. As memórias dos relatos de viagens imaginárias e os da Bíblia

estavam conectados durante a missa, que revivia a memória litúrgica da presença de

Cristo no momento da Eucaristia. Esta era invocada pela manipulação dos objetos

sagrados e através das palavras as pessoas lembravam da existência do Pai, representado

pelo corpo e sangue de Cristo. Para além da memória litúrgica, existe a memória

transcendente a fim de apresentar o mundo sobrenatural, segundo Patrick Geary, “a

memória é uma parte da alma à qual pertence a imaginação, e todas as coisas

imagináveis são, em essência, objetos da memória”. (GEARY, 2006, p. 178). Uma das

formas de conhecer e tornar visível o Além era através da imaginação, pois, conforme

Jérôme Baschet (2006), a pregação era um verdadeiro teatro em que os clérigos

articulavam a voz e as expressões corporais a fim de prenderem a atenção daqueles que

estavam ouvindo e incitá-los a produzirem imagens mentais. Sandra Pesavento explica

que “o imaginário faz parte de um campo de representação e discursos que pretendem

dar uma definição da realidade”. (PESAVENTO, 1995, p. 15). O estudo do imaginário

não se restringe apenas as imagens mentais, mas envolve as produções dos discursos

que expressam os hábitos, os valores simbólicos e ideológicos dos grupos sociais que os

constroem atribuindo significado para a realidade social em que vivem. A Visão de

Túndalo é uma narrativa de memória e imaginação do Além, uma de suas características

é a descrição dos três reinos eternos. Primeiramente a alma do cavaleiro Túndalo foi

conduzida para o Inferno, um lugar sombrio, habitado pelo príncipe das trevas, Lúcifer e

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os demônios, nesse espaço as almas sofrem com as punições de seus pecados praticados

na terra. O Purgatório é o local intermediário entre o Inferno e o Paraíso, as almas são

destinadas conforme os pecados veniais e após a purgação ascendem para o Paraíso. O

Paraíso se opõe ao Inferno e Purgatório pela sua claridade, calmaria e está dividido em

três muros: o muro de Prata, Ouro e Pedras preciosas. No muro de Prata encontravam-se

aqueles que não cometeram o adultério, no de Ouro estavam os monges, homens e

mulheres, e os construtores da Igreja e o de Pedras Preciosas as noves ordens de anjos,

os patriarcas, os profetas da Bíblia, os apóstolos de Jesus e as virgens. A partir da

análise da narrativa Visão de Túndalo observamos que essa expressa os valores da

cultura medieval, as memórias do cavaleiro foi apropriada e selecionada pelos clérigos

por um processo de “enquadramento” (POLLAK, 1992, p. 6) para que o homem

medieval adquirisse consciência de si, de suas ações que deveriam ser realizadas no

mundo terreno para a espera de futuro próximo que será continuado no Além. Portanto,

as memórias do cavaleiro Túndalo retratam as suas experiências no Além medieval,

informando os elementos que compõem cada espaço do pós-morte, atrelados com a

imaginação das coisas vistas e sentidas revelando os elementos visíveis e indivisíveis do

cristianismo para obtenção da salvação.

Palavras- chave: Memória. Além medieval. Salvação.

REFERÊNCIAS

FONTES:

Visão de Túndalo (códice 244). Ed. de F.H. Esteves Pereira. Revista Lusitana, 3,

1895, p. 97-120.

Visão de Túndalo (códice 266). Ed. de Patrícia Villaverde. Revista Lusitana, n.s., 4,

1982-1983, p. 38-52.

ESTUDOS:

BASCHET, Jèrôme. A Civilização Feudal. São Paulo. Globo, 2006.

GEARY, Patrick. Memória. In. LE GOFF, Jacques; SCHMITT, Jean-Claude (coord).

Dicionário Temático do Ocidente Medieval. V. II. Tra. De Hiário Franco Júnior. São

Paulo/ Bauru: Imprensa Oficial/ EDUSC, 2006, p. 167-181.

LE GOFF, Jacques. História e Memória. Campinas, SP. Editora da Unicamp, 2003.

PESAVENTO, Sandra. Em busca de uma outra história: imaginando o imaginário.

Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 15, n. 29, p. 9-27, 1995.

POLLACK, Michael. Memória e Identidade Social. In. Revista Estudos Históricos.

Rio de Janeiro, v.5, n.10, 1992, p. 200-212.

ZIERER, Adriana. Da ilha dos bem aventurados à busca do Santo Graal: uma outra

viagem pela Idade Média. São Luís: Ed. UEMA, 2013.

ÀS AULAS CIDADÃOS: AS PRIMEIRAS ORDENS SOBRE A INSTRUÇÃO

PÚBLICA PARA O SERTÃO MARANHENSE DO OITOCENTOS (1827-1834)

Wild Muller dos Santos Lima Orlanda

O texto ora proposto emerge de minha pesquisa de mestrado pela Universidade Estadual

do Maranhão em História, Ensino e Narrativas (PPGHEN-2014), em andamento e busca

analisar os aspectos históricos educacionais no sertão maranhense no âmbito das

Escolas das Primeiras Letras no período de 1827 a 1841. Sendo assim, analisar a

História da Educação no Maranhão Oitocentista, na perspectiva de entender como esta

história representa, oculta, permite ou (im)possibilita, a construção historiográfica,

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social, cultural e educacional no sertão maranhense constitui uma questão fundamental a

ser discutida. Certamente, que esta pesquisa possibilite descobrir novas informações

sobre este modelo de ensino implantado no século XIX no Brasil que veio como o

consolidador do novo ideal de progresso e civilidade.

Através de uma análise do fenômeno educacional do oitocentos no Maranhão seria

possível entender e confrontar diferentes concepções de homem, sociedade e educação,

já que entre as legislações e os sujeitos a que essas leis se destinam existe um amplo

leque de experiências e representações multiplamente vivenciadas e expressadas.

Evidentemente, a realização de estudos a respeito dessa modalidade de educação

precisa, de um lado, considerar as questões sociais e educacionais mais amplas que a

circundam e, de outro, interpretar criticamente sua especificidade, destacando seus

elementos sociais, históricos, pedagógicos, legislativos e culturais.

A pesquisa se fundamenta nos seguintes procedimentos: estudo bibliográfico (fontes

secundárias) e documental (fontes primárias). Para a revisão bibliográfica inicio com a

categoria sertão, para perceber como as sociedades formam os seus sistemas de

representações temos que analisar, no nosso caso os sentidos de sertão, os sistemas de

significação que nelas estão presentes, sendo signos ou não, observar a sua natureza

mutante que foge às tentativas de enquadramento e fixação.

Nesse sentido, devemos esgarçar os muitos fios que tecem às tramas das narrativas que

o instituem, tornando-se primordial o rompimento com perspectivas de análises

apoiadas em leituras que veem o espaço como algo naturalizado, imutável e perene. Os

discursos que trazem uma ideia naturalizada de espaço, são fortemente encontrados em

visões que desconsideram ou desconhecem o fato de que a própria natureza é provida de

historicidade, negando-se a conceber que os recortes espaciais seriam atravessados por

múltiplas temporalidades. (MUNIZ, 2008, p. 33-36).

Para tanto, considero as contribuições de Francisco de Paula Ribeiro (1848), Capistrano

de Abreu (1853 e 1927), Sérgio Buarque de Holanda (1945), Gilmar Arruda (2000),

Erivaldo Neves (2003) e Nísia Trindade Lima (2013) Outros pesquisadores, estes

maranhenses, que se valem da categoria sertão, merecem destaque Maria do Socorro

Cabral (1992), Sandra Regina Rodrigues dos Santos (2010), Irisnete Santos de Melo

(2010), Alan Kardec Gomes Pachêco Filho (2011), Carlota Carvalho (2011) e

Raimundo Lima dos Santos (2014).

Tomando como base Irisnete Melo (2010), pensar no sertão maranhense do século

XIX, não é tarefa fácil a ser empreendida, na verdade é fazer uma construção de

retalhos e vestígios encontrados aqui e ali e que vão construindo o conhecimento, dentre

essas pequenas peças que se encaixam nos deparamos com relatos de viajantes, livros de

memórias e pesquisas acadêmicas. O seu sertão, aqui apresentado também é visto como

um espaço polissêmico, um espaço de ambiguidades, composto de diferentes práticas

sociais, políticas e culturais.

No que tange à pesquisa documental (fontes primárias), o processo aquisitivo de

informações está sendo desenvolvido no Arquivo Público do Estado do Maranhão

(APEM), Biblioteca Pública Benedito Leite, no site http://www.crl.edu/pt-

br/brazil/provincial/maranh%C3%A3o, que abrange o Projeto de Imagens de

Publicações Oficiais Brasileiras que são publicações, emitidas anualmente durante o

Império, apresenta uma síntese das atividades em cada província..

Estão sendo utilizadas técnicas de manipulação, análise e interpretação de documentos

próprias da historiografia. Para tanto os métodos teóricos e empíricos serão essenciais

para o desenvolvimento da pesquisa. As fontes documentais pesquisadas serão Leis e

Regulamentos das Instituições Públicas no Império; Códigos da Instrução Pública no

Maranhão; Documentos como diários, ofícios, relatórios e falas encaminhados aos

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presidentes da província do Maranhão; Decreto Imperial de 26 de Março de 1824; Lei

Imperial de 15 de Outubro de 1827; as atas do Conselho Presidial do Maranhão (órgão

que auxiliava o presidente da província no trato de questões envolvendo as necessidades

provinciais) na execução da Lei de 15 de outubro 1827 na província, especialmente no

sertão maranhense.

Neste momento a pesquisa encontra-se na análise O Conselho Presidial iniciou suas

atividades em meados de 1825, com o primeiro mandato dos conselheiros, que se

estendeu até 1834, por isso o recorte temporal deste texto. Suas atas foram registradas e

são preservadas atualmente pelo Arquivo Público do Estado do Maranhão.

Nesse sentido este trabalho se divide nos seguintes tópicos: discussão conceitual sobre a

categoria sertão; as fontes oficiais para a História da Educação na província (as atas do

Conselho); breve histórico do projeto Constitucional de 1823; a Constituição de 1824; a

Lei Geral da Educação de 1827 e os seus desdobramentos nas ações do Conselho.

A pesquisa encontra-se na fase de análise documental, na qual serão contemplados: as

atas do Conselho Presidial, o livro de Ordens do Conselho Presidial, livro de ordens do

Conselho Geral e Assembleia Provincial e documentos avulsos de professores do sertão

maranhense (como ofícios, relatórios, requerimentos, etc.).

O trabalho do historiador pressupõe o conhecimento da historiografia que o precede, em

função do diálogo com o já escrito que o fazer histórico exige. Dessa forma, este estudo

vai ao encontro da produção histórica realizada atualmente. O cotejar obras anteriores é

um dos efeitos de verdade da análise histórica, na medida em que o discurso do

historiador se fundamenta em outro, já conhecido. Daí a necessidade de reflexão

historiográfica que aborde de maneira crítica as produções passadas, percebendo

amarras e sentidos de uma criação intelectual, como: contexto, destinação,

alinhavamento teórico-crítico, entre outros elementos que revelam perspectivas e

posicionamentos das obras e dos autores (GALVES; BITENCOURT, 2014, p. 13).

Dando continuidade à revisão bibliográfica sobre a historiografia da educação brasileira

e maranhense, analisarei as contribuições dos autores que se empenharam em estudar o

período Oitocentista, e que de certa forma contribuíram para os estudos educacionais,

incluindo o sertão. Dando ênfase para os seguintes autores, no que se refere a

historiografia brasileira: José Ricardo Pires de Almeida (1889), Moacyr Primitivo

(1936, 1938), Dermeval Saviani (2007), Alessandra Schueler e José Gonçalves Gondra

(2008) e André Castanha (2013). Em se tratando da província do Maranhão é de

fundamental importância remeter à sua historiografia e se torna indispensável a reflexão

das obras de Jerônimo de Viveiros (1937), Maria do Socorro Coelho Cabral (1984),

Maria de Lourdes Lauande Lacroix (1983) Cesár Augusto Castro (2009), Mariléia dos

Santos Cruz (2012), Andréa Pestana de Almeida (2013) e Elizabeth de Souza Abrantes

(2014).

De posse dos resultados da pesquisa documental, nos baseando em estudos

historiográficos e nos apropriando de instrumentos que nos permitam compreender

como se efetivou o processo de criação dessas escolas, pretendo, por meio de uma

prática histórica, que segundo Certeau (2003), depende dos instrumentos que se utilizam

da sua operacionalização e do formato de intencionalidade da sua escrita, reconstruir o

processo de ensino das Escolas de Primeiras Letras no Maranhão, fazendo uma “análise

de discurso” contrapondo os documentos analisados e as seguintes obras: A esfinge do

Grajaú (1993) de Dunshee de Abranches; Os Sertões(2011) de Carlota Carvalho.

Esta análise se empenhará em identificar possíveis “contradições” ou como afirma

Barros (2011) trazer a nu as “representações” que subjazem sob as narrativas

examinadas, e para tal se valerá de técnicas semióticas, da identificação de temáticas, da

contraposição intertextual entre discursos produzidos por indivíduos que ocupem

diferentes posições da sociedade maranhense, voltadas para a educação, no período

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estudado, para posterior discussão dos resultados e elaboração da redação final de

dissertação.

Palavras chave: História; Educação; Sertão.

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ENTRE A HISTÓRIA E A LITERATURA: CONSIDERAÇÕES INICIAIS

ACERCA DA NARRATIVA DE EDUARDO GALEANO

Liana Márcia Gonçalves Mafra

O presente trabalho tece algumas considerações acerca da pesquisa em andamento no

Programa de Pós-Graduação em História, Ensino e Narrativas-PPGHEN/UEMA,

partindo da possibilidade da Literatura apresentar-se como material de inquirição para

os estudos da História, considerando que os dois campos, apesar de distintos, são

formas de desvelamento e apreensão da realidade, atribuindo-lhe sentido, oferecendo o

mundo como texto, pois, como musas, Clio e Caliope, criam aquilo que cantam. De

acordo com Sandra Pesavento (2008), com o advento da História Cultural, o campo de

análise histórica ampliou e vivenciou uma significativa modificação, com incorporação de

novas documentações, novos objetos de estudo e aplicações metodológicas. Assim,

expandiu-se a perspectiva da relação entre a História e a Literatura e ambas, como

narrativas, tendo a realidade como referente, participam da criação do mundo. Desse

modo, entende-se as narrativas literárias e históricas como discursos que indagam e

respondem a respeito dos homens no mundo. Tal reflexão tem como objeto as narrativas

do escritor uruguaio Eduardo Galeano, cuja escrita sempre foi direcionada a narrar a

história ignorada da América Latina sob a ótica dos explorados, excluídos e esquecidos.

À vista disso, a presente investigação é inteiramente desenvolvida com base em

pesquisa bibliográfica e propõe-se a analisar a representação da ditadura militar na

América Latina a partir das narrativas de Eduardo Galeano, no entrelaçamento entre

literatura, história e memória, especificamente, alicerçada no último livro da trilogia

Memoria del fuego – El Siglo del Viento (1986) –, cujos temas representados na obra

abordam os fatos sociais e políticos ocorridos na América durante as ditaduras militares,

problematizando como a literatura latino-americana representou textualmente e ficou

marcada pelo regime ditatorial e de todos os problemas que dele deriva, assim como

Eduardo Galeano interpreta, ficcionalmente, história e memória, no contexto dos anos

de repressão na América Latina, tecendo-as com os fios de sua experiência pessoal,

social e política. Convém ressaltar que as transformações políticas e sociais marcaram a

literatura latino-americana produzida por vários escritores, principalmente no século

XX. Esta literatura produzida com o compromisso social é reconhecida como literatura

engajada e seus autores, cujas escritas estavam associadas à política, como Eduardo

Galeano, utilizaram-na para denunciar as injustiças e para reivindicar a liberdade,

principalmente nos tempos de ditadura. Assim, a esta pesquisa problematiza também o

papel do escritor, como intelectual da América. Como exemplo para esta explanação,

temos que Galeano, em Montevidéu, atuou como chefe de redação do semanário

Marcha e diretor do jornal Época, que foram sucessivamente fechados pelo governo

militar. Em face da perseguição, Galeano teve que se exilar em 1973, em Buenos Aires,

onde participou e dirigiu a revista Crisis, mas teve que sair novamente para o exílio. Em

sua escritura convivem o jornalismo – vértebra de sua obra –, o ensaio e a narrativa

literária, sendo, sobretudo, um cronista do seu tempo, que retrata com acuidade a

sociedade contemporânea, penetrando em suas chagas e em suas máscaras cotidianas.

Em uma de suas narrativas, Galeano refere-se à revista Marcha, publicação, que durante

décadas, deu voz ao povo uruguaio e terminou sendo silenciada em 1974 pela ditadura.

Noticias

Desde Uruguay.

Han quemado las colecciones y los archivos de Marcha.

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Clausurarla les parecía poco.

Marcha había vivido treinta y cinco años. Cada semana demostraba, con sólo existir, que no venderse

era posible.

Carlos Quijano, que la dirigió siempre, está en México. Se salvó raspando.

Marcha ya no existía y Quijano insistía en quedarse, como velándola. Llegaba a la redacción a

la hora de siempre y se sentaba ante el escritorio y ahí permanecía hasta el anochecer,

fantasma fiel en el castillo vacío: abría las pocas cartas que todavía llegaban y atendía el

teléfono, que sonaba por error. (GALEANO, 2011, p. 202.

Sobre a revista, Enrique Serra Padrós (2013) esclarece que durante a ditadura uruguaia

houve perseguição a escritores e a jornalistas. A imprensa também sofreu fortes

restrições, assim como o semanário Marcha, que, juntamente com outros, sofreu

proibições e constantes fechamentos e vários integrantes da revista foram presos,

obrigados ao exílio. Segundo Padrós, em 1977, o vice-diretor, o jornalista da revista,

Julio Castro, foi sequestrado e desaparecido. Diante das narrativas de Padrós e de

Galeano, vê-se práticas ditatoriais comuns naquele período. Diante do exposto,

considera-se que conhecimento da história através de um autor e da literatura enriquece

o campo e o ensino da história, pois a literatura tornou-se um meio de denúncia das

atrocidades cometidas pelo regime, tentando evitar o silenciamento e o esquecimento,

haja vista a censura e o fechamento de vários meios de comunicação e dos canais de

participação política. Assim, a literatura tornou-se um campo de resistência e

testemunha histórica, trazendo consigo as marcas do tempo em que foi produzida.

Sobretudo porque a literatura não é produzida no vazio, mas a partir dos discursos

vivos, onde há interação e relação entre obra, escritor e ambiente. E as fronteiras entre

as narrativas literárias e históricas tornam-se cada dia mais tênues, considerando que a

história é, com frequência, porto de partida para a literatura e a história busca na

literatura outras formas de conhecimento do passado. E este tipo de escrita qualificado

com a expressão literatura de testemunho cresceu a partir da década de 70 e, de acordo

com Alfredo Bosi (2002), tal escolha do termo prendeu-se a necessidade de abranger

um grande número de escritos situados na intersecção de memórias e engajamento.

Logo, não somente historiografia e não somente ficção, testemunho, colocando o sujeito

no centro dos estudos e modificando a percepção de subjetividade e de hierarquia dos

fatos. Beatriz Sarlo (2007) afirma que apesar da literatura não explicar e tampouco

dissolver todos os problemas colocados, há nela um narrador que sempre pensa fora da

experiência, como se além de sofrer os homens pudessem se apoderar do pesadelo. Em

observação sobre a literatura na esfera das ditaduras do Cone Sul, destaca ainda que só

houve condenação dos ditadores por conta da recordação, através dos relatos das

testemunhas e vítimas dos governos militares. A memória foi peça fundamental do

ponto de vista jurídico e da reconstrução do passado, uma vez que muitos registros

sobre os atos ditatoriais haviam sido destruídos pelo regime. Segundo Valéria de Marco

(2004), essas produções literárias têm origem na violência do Estado e na redefinição da

identidade dos autores latino-americanos durante o exílio. São relatos de sobreviventes

como fontes de reflexão historiográfica, demonstrando a necessidade de examinar as

relações entre violência, representação e produções artísticas. Desse modo, no que

concerne a Eduardo Galeano, observa-se que sua produção no período da ditadura é

política e é histórica, considerando que apresenta outras possiblidades de conhecimento

do real vivido. E suas narrativas alinham-se à recomendação de Walter Benjamin (1994)

quando afirma que os historiadores devem “escovar a história a contrapelo”,

investigando minuciosamente o que é transmitido pela interpretação oficial, removendo

os destroços do passado, remexendo as ruínas para revelar o discurso sufocado dos

vencidos. Em suma, este diálogo entre as duas áreas, literatura e história, é relevante

porque propicia maior potencialidade de revelação das experiências, a partir da

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exploração de novas linguagens, novos ângulos e temáticas. Então, antecipa-se que a

escrita de Galeano está entranhada na História e de História. Logo, depreende-se a

importância de se conhecer a América Latina a partir de um escritor, a necessidade de

explorar mais a literatura latino-americana, a novidade que ainda é a concepção da

ditadura militar através da literatura, tendo em vista que a evocação da memória é

provocada por múltiplas modalidades.

Palavras-chave: História, Literatura, Eduardo Galeano.

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O MASSACRE DE ALTO ALEGRE NA MEMÓRIA COLETIVA DE BARRA

DO CORDA: DISPUTAS, SILENCIAMENTOS E MÚLTIPLAS

REPRESENTAÇÕES

Carlos Eduardo Penha Everton

No ocaso da Monarquia e raiar da República, ao fim do século XIX, o Brasil ainda era

um país no qual o “Sertão”, em diversas partes do território, continuava a se configurar

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como uma região que teimava em permanecer esquiva a um processo civilizatório que

já havia permeado significativo período, de mais de três centúrias, entre o início efetivo

do processo de colonização e o fim do Império. É nesta perspectiva, conforme AMADO

(1995) da inserção de partes desse Sertão no processo de civilização e nacionalização

integral do território brasileiro que se justifica propor estudar o “Massacre de Alto

Alegre” (episódio ocorrido a 13 de março de 1901, no qual missionários religiosos –

eclesiásticos e leigos, totalizando cerca de duzentas pessoas, segundo números oficiais

divulgados pela imprensa da época – foram assassinados por índios Tehetehara-

Guajajara em um aldeamento religioso, na época, no território pertencente à cidade de

Barra do Corda, hoje Jenipapo dos Vieiras, no estado do Maranhão). Muito embora a

discussão macro da presente produção não esteja voltada a questionar as razões que

conduziram ao aludido fato, relacioná-lo às discussões que giram em torno de Sertão –

tanto enquanto categoria quanto como espacialidade – e sua “conquista” é algo

considerado de grande pertinência, tendo em vista que a região que serviu como palco

para o que ora se estuda é parte do que outrora genericamente era denominado como

pertencente aos sertões maranhenses, mais precisamente na cidade de Barra do Corda,

onde, no ideário popular, conforme BRANDES (1994) a ideia de Sertão – ainda

hodiernamente – é muito presente, seja na literatura local, no linguajar do homem

comum, no cotidiano do município, em nomes de estabelecimentos comerciais e em

marcas como a própria canção símbolo da cidade, a Canção Cordina, que nomina a

cidade como “Princesa do Sertão”. Assim, estudar um conflito que ocorreu nesse

município e, mais do que isso, as memórias que se construíram ou que foram silenciadas

sobre ele e algumas das possibilidades de representação acerca do mesmo, enseja a

busca do entendimento, incipiente – que seja – do sertão e alguns elementos a ele

subjacentes. No sertão barra-cordense, parte de um sertão “diferente”, de acordo com

PACHECO FILHO (2011), sobressaem-se, dentre eles: uma vegetação exuberante, um

relevo altiplano, uma hidrografia com dois rios extremamente importantes e que se

encontram na zona central de onde se povoou a cidade, assim como os traços humanos,

quais sejam os índios, primeiros elementos humanos a fazerem morada naquelas

paragens e os não-índios, aos poucos, também, “incorporados” à paisagem local. As

problemáticas atinentes a esse processo de incorporação e consolidação da presença dos

não-índios, estudadas por ZANNONI (1999) com suas instituições e cultura, e a

plenitude de tensão e conflitos, frequentes, segundo MELO (2011) disso resultantes, são

o pano de fundo para a discussão que ora se traz à tona – que só é exequível a partir da

apropriação desse conhecimento, para o que lançamos mão de pressupostos teóricos que

discutem o sertão; dos que interpretam a cartografia e a espacialidade locais, como

CARVALHO (2011), PACHECO FILHO (2011) ; daqueles que oferecem perspectivas

de conhecimento sobre os Tenetehara-Guajajara e compreensão do Massacre de Alto

Alegre (quase nenhuma a partir da visão da História, mas predominantemente da

Antropologia), como ; dos que trabalham com as categorias de História e Memória; dos

que nos embasam a tratar das representações da memória barra-cordense a partir de

visões estruturais que fogem às construídas até o presente momento, nos possibilitando

discutir relações entre outras categorias, no que tange ao conflito do Alto Alegre, como

mito, memória e suas representações. Também nos é conveniente salientar que a

materialização desta produção tem como SANTOS (1991), BRANDES (1994)

ZANNONI (1998 e 1999), GOMES (2002), MATTOS (2007), importante traço o

estudo que chamaríamos em um “quase” neologismo de etno-histórico (visto que este

ramo da pesquisa histórica apenas recentemente tem ganho maior ênfase), em função do

uso da metodologia da História com fontes orais , porém realizada sobretudo através das

incursões nos espaços das etnias Tenetehara_Guajajara e Kanela, diretamente

envolvidas nos traços de memória produzidos sobre o Massacre de Alto Alegre (o

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destaque a estas interferências se deve à realização de entrevistas com barra-cordenses

não-índios, assim como com o cineasta Murilo Santos, autor de uma produção-

documentário intitulada “O Massacre de Alto Alegre” e alguns atores). A realização dos

colóquios mencionados tem como finalidade a percepção de questões relevantes ligadas

à memória, categoria fundamental de discussão na pesquisa. Primeiramente, é relevante

que se mencione que a memória regional é profundamente marcada por nuances de

narrativas ligadas ao Massacre de Alto Alegre, em versões construídas tendo por base a

documentação escrita oficial; relatos da imprensa; diversas representações

memorialísticas das Igreja Católica (muitas das quais “martirizadoras” dos religiosos) e

da própria oralidade popular, reproduzida pelas gerações posteriores ao fato. Povoam

fortemente o referido imaginário figuras como a “Infeliz Perpetinha” (a jovem Perpétua

dos Reis Moreira, adolescente branca raptada e jamais resgatada, a quem eram

atribuídas inscrições cravadas nos caules das árvores da região, nas quais a mesma teria

feito auto-proclamações como “Infeliz Perpetinha”), assim como o índio que teria

assassinado, com requintes de crueldade, uma das freiras que seria sua

madrinha...dentre várias histórias que, com algumas variações possuem núcleos

semelhantes: índios cruéis, traiçoeiros contrastando com as lastimáveis histórias dos que

foram “covardemente” atacados, quando apenas – segundo esta memória – queriam

evangelizar e fazer o bem a essa população nativa. Na cidade de Barra do Corda,

especificamente, existem várias representações que tornam-se lugares de memória, mais

precisamente, da reprodução de uma memória extremamente desfavorável aos

indígenas. A realização anual de missas na matriz, rememorando o 13 de março de 1901

e em sufrágio da alma dos religiosos; a fachada dessa igreja, com as efígies dos

religiosos mortos, assim como as diversas representações em monumentos e imagens,

feitas pela Igreja Católica (algumas delas já não mais na cidade) servem como

atualizadoras desse fato, inclusive – percebemos – cristalizando isto nas mentes

cordinas, mesmo quando não há, individualmente, declaradamente, esse propósito.

Ainda assim, os não-índios continuam a reproduzir as ideias nocivas à construção da

imagem indígena, alimentadas pelas tensões que resultaram e foram resultantes daquele

conflito, ao qual se insiste em chamar de Massacre de Alto Alegre (que é uma nomeação

desfavorável, à qual não nos coadunamos – e por isso é reproduzida aqui sempre em

destaque, itálico – mas que nomeia o conflito à maneira da imprensa da época, que

também o nomeava como “Hecatombe de Alto Alegre”). Aos indígenas, sobretudo aos

Tenetehara-Guajajaras, artífices do processo que culminou com o fato em questão,

restou a potencialização do preconceito que sempre pesou, e muito, sobre os nativos.

Nas próprias palavras da população barra-cordense, a visão sobre eles aparece sempre

de maneira mais intolerante com essa etnia do que com o povo Kanela. Também sobrou

a eles o silenciamento (categoria importante a ser entendida dentro da própria ideia de

memória que aqui se discute) e que pode ser percebido de diversas maneiras, seja pelo

escamoteamento de sua memória das narrativas populares correntes; a ausência de uma

positivação da figura do índio nas relações de poder que resultaram nesse conflito ou ao

aniquilamento de possibilidades de reprodução das memórias desse povo,

consubstanciada em ações como a desconstrução física do cemitério no qual ficavam os

restos mortais de João Manoel Pereira dos Santos (vulgo João Caboré, líder da

sublevação, herói para os indígenas, mas considerado por autoridades eclesiásticas da

época, por exemplo, como famigerado, cruel, bárbaro e outros adjetivos desabonadores

de igual valia), que deu lugar a uma pequena praça que em nada referencia aquele ou

qualquer elemento indígena. Na tentativa de enriquecer a discussão sobre o Massacre de

Alto Alegre e, mais ambiciosamente, de oferecer um novo caminho – jamais um fim –

ao que se debate sobre essa temática é que propomos, a partir do diálogo com as

memórias conhecidas em nosso trabalho de campo e do contato que tivemos com novas

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ISBN: 978-85-8227-137-7

perspectivas do que se pode (ou se deva) entender por mito uma nova reflexão sobre os

embates da memória barra-cordense, da memória do Massacre de Alto Alegre, qual seja

a possibilidade de discussão destas enquanto construções erigidas a partir de estruturas

geralmente próprias de narrativas míticas, o que nos cria (e mais ainda nos criará)

espaço para o trânsito em três categorias: mito, memória e representações (estas últimas,

que podem ser resultado tanto da apropriação de memória, ressignificação e construção

de não indígenas e indígenas). Contudo, o refinamento disto exige um aprofundamento

maior, certamente com amplitude suficiente para justificar ser construído em produção

de dimensões superiores a esta.

Palavras chave: Teneteharas-Guajajaras – História – Memória

REFERÊNCIAS

AMADO, Janaína. Região, Sertão, Nação. In: Estudos Históricos. Rio de Janeiro, vol.

08, nº 15, 1995. p. 145-151.

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Teresina, Editora da UFPI, 2011.

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Murilo Santos / Zen Comunicações / TVE Brasil / TVE Maranhão / Fundação Padre

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de Coordenação e Desenvolvimento, Instituto de Pesquisas Econômicas e Sociais, São

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ISBN: 978-85-8227-137-7

O ARRAIAL DO PRÍNCIPE REGENTE ENTRE A HISTÓRIA E A MEMÓRIA

DOS “SERTÕES DOS PASTOS BONS”

Paulo Eduardo de Sousa Pereira

O processo de conquista da região conhecida como “sertões dos Pastos Bons”,

apesar de alguns consideráveis estudos, ainda carece de muita pesquisa no sentido de

uma problematização mais específica das diferentes dinâmicas que atuaram na

colonização do Sul do Maranhão. Neste sentido, justifica-se minha inquietação sobre o

processo de devassamento da região do Alto Itapecuru, nos “sertões dos Pastos Bons”,

no sentido de salientar a importância do Arraial do Príncipe Regente (1807-1818), como

núcleo militar e ponto de apoio estratégico para a efetivação da conquista oficial da

região no início do XIX.

A partir das leituras de Sebastião Gomes da Silva Berford (1810) e de Francisco

de Paula Ribeiro (1815), primeiros militares exploradores a palmilharem e registrarem

oficialmente a região dos “sertões dos Pastos Bons”, compreende-se o Arraial do

Príncipe Regente para além de um núcleo militar, como a manifestação mais concreta

dos interesses da coroa portuguesa em promover o enquadramento dos altos sertões

maranhenses à dinâmica do litoral. Neste sentido, o Arraial foi implantado numa área

indistinta, tida como “inculta” e “deserta”, que geograficamente se posicionava tanto

distante da zona agronômica exportadora quanto da zona pecuarista e de subsistência.

O Arraial do Príncipe Regente representa a região de contato entre as fronteiras

econômicas que moviam as frentes de povoamento e avançavam distintamente pelo

espaço geográfico maranhense naquele início do século XIX. Seu ponto nodal é

oferecer suporte militar e estratégico para o encontro da fronteira da agroexportação que

subia do norte e a fronteira da pecuária que se espalhava a partir do sul.

O militar major Francisco de Paula Ribeiro, que implantou, em 1807, o Arraial,

é incisivo em seu “Roteiro...” (2002, p.107) quanto à importância do contato do sertão

com o litoral, afirmando que a capitania possuía duas porções distintas pelo que até se

poderiam formar duas comarcas, mas para o bom prosperar, ambas “melhor entre si

deveriam dar-se as mãos e sustentar combinadas a sua florescência comercial e

agronômica”.

O discurso de Paula Ribeiro é bem característico do ideal de nacionalidade tão

em voga no século XIX. Isto se torna bem plausível com as leituras de Candice Vidal e

Souza (1998) e Lúcia Lippi de Oliveira (1998) autoras que trabalham a concepção de

sertão a partir de um “sertão fronteira” que se situa e influencia na formação da

nacionalidade brasileira, permitindo a compreensão de como o pensamento social

brasileiro refletiu sobre as históricas distinções entre o sertão e o litoral e como o ideal

integrador que moveu o processo de conquista dos sertões maranhenses se inscreve e se

identifica com o ideal de nacionalidade e de civilidade difundido no pensamento social

brasileiro.

Outro ponto crucial é a cristalização de uma memória histórica da região a partir

do discurso instituído com o Arraial. Neste caso específico, observa-se que o contexto

histórico da região até a chegada do agente colonizador é memorizado e sacralizado

pelos emissários oficiais como um tempo de barbárie e atraso. O discurso político

oficial é de dominação, e projeta a região a um processo de ruptura com sua história

imediatamente anterior, associada à idéia de retardamento e decadência, e a lança a uma

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história constituída pela visão daquele que tem o poder de oficializar. Afinal, a história

enquanto construção social é um mecanismo que serve a um sistema de dominação e

legitimação de memórias de determinados grupos sobre outros.

Palavras chave: sertões de Pastos Bons, colonização, memória, história.

Referências

AMADO, Janaína. O grande mentiroso: tradição, veracidade e imaginação em História

Oral. História, São Paulo, n. 14, p. 125-136, 1995.

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08, nº 15, 1995. p. 145-151.

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BLOCH, Marc Leopold Benjamin, 1886-1944. A Apologia da história, ou, O ofício de

historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed. 2001.

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CABRAL, Maria do Socorro Coelho. Caminhos do gado: conquista e ocupação do Sul

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Yara Aun Khoury. Revista de Estudos pós-graduados em História e do Departamento de

História da PUC – SP, 1993.

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brasileiro. In: História, Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, vol.

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RIBEIRO, Francisco de Paula. “Descrição do território de Pastos Bons, nos sertões do

maranhão, propriedades dos seus terrenos, suas produções, caráter dos seus habitantes

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SOUZA, Candice Vidal e. Fronteira no Pensamento Social Brasileiro: o sertão

nacionalizado. In: Sociedade e Cultura, vol. I , nº1, pp. 55-61, jan./jun. de 1998.

UMA ANÁLISE DAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DOS PROFESSORES DE

HISTÓRIA DO CENTRO DE ENSINO ESTADO DO CEARÁ EM BACABAL -

MA

Germeson Azevedo Soares

Esta pesquisa tem como objetivo geral analisar as práticas pedagógicas dos professores

de História do Ensino Médio do Centro de Ensino Estado do Ceará em Bacabal – MA,

já os específicos são: observar as práticas pedagógicas dos professores de História da

referida instituição escolar, identificar as metodologias e recursos utilizados no

cotidiano escolar e descrever as práticas pedagógicas dos docentes inseridos no estudo.

Trata-se de uma pesquisa de cunho científico com metodologia descritiva e enfoque

quanti-qualitativo com abordagem metodológica pautada na história oral temática, no

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qual participam como sujeitos da pesquisa, sete professores da rede estadual de ensino,

os quais lecionam a disciplina História no Ensino Médio. O presente estudo realizar-se-

á por meio do método indutivo, o que nos permite uma análise aprofundada do objeto

em estudo. Utilizar-se-ão as pesquisas qualitativas o que nos possibilitará observar o

fenômeno de perto já que esta possui um caráter exploratório, concedendo aos

colaboradores a possibilidade de expor livremente suas ideias sobre o assunto em foco.

Para o desenvolvimento da abordagem qualitativa da pesquisa se faz necessária a

técnica da observação participante porque supõe-se a reciprocidade entre o pesquisador

e pesquisado em busca de uma compreensão neste trabalho. Conforme Bogdan e Biklen

(1994): “Os investigadores qualitativos tentam interagir com os sujeitos de forma

natural, não intrusiva e não ameaçadora”. Outro aspecto a se ressaltar é em relação à

pesquisa quantitativa, objetivando apurar as opiniões dos entrevistados que será feito

através de um questionário aberto aplicado aos professores. Esclarece Fonseca (2002):

“A utilização conjunta da pesquisa qualitativa e quantitativa permite recolher mais

informações do que se poderia conseguir isoladamente”. Nesse sentido, o referido título

nasceu da observação dos professores do C. E. Estado do Ceará cuja prática pedagógica

ainda é embasada nos métodos e técnicas tradicionais de ensino. Mediante a análise das

metodologias dos docentes no processo de ensino-aprendizagem foi verificado que estas

contemplam um contexto sociopolítico, implícito na educação desta instituição. Assim,

essa experiência denota um distanciamento entre os discursos dos professores e a

realidade vivenciada em suas práticas marcadas por um contexto de desencontros entre

o tradicional e os novos paradigmas existentes no ensino da disciplina. Com isso, a

gênese desse conflito está na própria história da cidade que somente nos anos oitenta

recebe professores graduados vindos de outros estados como foi o caso da professora

Maria das Graças Ávila Brito. A partir, dos anos noventa com a criação do Programa de

Capacitação Docente (PROCAD) é que alguns professores de Bacabal e região puderam

se graduar nessa área. Todavia, até o presente momento, não há nenhum curso de

graduação específico para formar historiadores ou professores de história no município.

No que tange a relação de ensino e aprendizagem, as partes envolvidas no processo

precisam compreender a luz das novas teorias e metodologias que há sim espaços para

um novo ensino de história, voltado para todas as dimensões de vivência dos homens na

sociedade e que ele é essencialmente plural, ou seja, comporta uma variedade

significativa de experiências e essas quando são consideradas no processo educativo.

Nesse sentido Certeau (1995) afirma que: “Os alunos não conseguem dar sentido ao que

estudam, desse modo apenas entendem a universidade como meio para adquirirem um

certificado”.

A renovação no ensino da disciplina história no decorrer da vida escolar é marcado

pelos vícios tradicionais da escola, como a resistência plurifacetada da coordenação

pedagógica, supervisão, direção, professores, alunos e comunidade escolar. Quando o

professor sugere no seu discurso propostas inovadoras para o ensino, acaba sendo alvo

de críticas, ensinar história segundo Karnal (2007): É uma atividade em permanente

transformações.

A discussão acerca das falhas do método tradicional de ensino começou a ser criticado

no Brasil no anos oitenta, quando surgiu como oposição propostas inovadoras, por

exemplo, a consolidação dos ideais da pedagogia Histórico-crítica e mais tarde o

processo de redemocratização do país, uma nova constituinte e nos anos noventa, a

difusão dos ideais da Educação para todos, novas Diretrizes Educacionais e os

Parâmetros Curriculares convergirem para a mudança de pensamento sobre as práticas

de ensino. Outro ponto a ser ressaltado é que nos anos noventa com a implantação da

Lei nº 9.394/96, na qual é trazida a exigência da formação de professores graduados

para ministrar as disciplinas de Educação Básica dentre elas História, observou-se uma

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corrida ascendente na busca por essa formação. A partir do contexto já apresentado

sobre a visão historiográfica e os problemas relacionados ao Ensino de História,

percebeu-se que é somente a partir da interconexão entre historiografia e linguagens que

se pode traçar um estudo crítico acerca do distanciamento entre as teorias do currículo

vigente (Ensino de História) e as práticas pedagógicas desenvolvidos pelos professores

da referida disciplina no C. E Estado do Ceará em Bacabal –MA. Diante desse dado,

faz-se necessário analisar as articulações do conhecimento historiográfico com os

aspectos metodológicos do cotidiano escolar sob a luz das teorias da Análise do

Discurso e das teorias e métodos do Ensino de História com foco na escola dos Annales.

Verificar-se-á, portanto, alguns fatores que esclarecem a dicotomia teoria-prática tão

fortemente presente no fazer pedagógico dos professores de História atualmente.

Podemos destacar a má formação dos professores nos cursos de História, com estágios

não suficientes para uma atuação competente, além de uma necessidade na formação

continuada voltada para os novos paradigmas do ensino atual de História. Observa-se,

também, que os alunos, habituados com os métodos tradicionais, como o da

“memorização dos questionários”, fazem resistência diante dos novos métodos de

ensino de História. Nas últimas décadas o que se observou com a Teoria da Escola dos

Annales é que a história é construída a partir das narrativas humanas, o que abrange a

perspectiva sobre as subjetividades dos indivíduos e a construção de um conhecimento

histórico diverso, por apresentar linguagens distintas e estruturas distantes dos fatos

isolados como era na Escola Positivista. Essa Escola tinha como característica

primordial uma visão objetiva da história, em que o historiador é um sujeito neutro, que

não deveria intervir diretamente em seu objetivo de pesquisa, mas sim, deveria trabalhar

com os fatos de uma maneira em que manteria separado o historiador e seu objeto.

Assim, os trabalhos deveriam ser embasados a partir dos documentos, os quais

deveriam ser analisados de uma forma crítica e metódica. Um ponto a se ressaltar é a

interdisciplinaridade, que também tem sido objeto de muita discursão entre professores

e pesquisadores. Embora não lhe é negada sua importância na construção do

conhecimento escolar mais amplo. A atual organização curricular proposta pelos temas

transversais não só permite essa aproximação como incentiva esse trabalho. A dúvida

está nas práticas escolares das escolas, pois para existir interdisciplinaridade tem que

haver vínculos epistemológicos entre si e um ponto comum ao mesmo objeto. Segundo

Circe Bittencourt, a interdisciplinaridade exige do docente um aprofundamento do seu

campo específico de conhecimento, da sua disciplina escolar, ao mesmo tempo

desencadeia um trabalho metodológico em conjunto. Nesse sentido, conteúdos

específicos são ensinados com um método comum a todas as disciplinas. Outro fator é a

escolha do livro didático desprovido de um conhecimento teórico do professor que faz

sua escolha baseado nas suas conveniências. Elenca-se, ainda, a ausência de um diálogo

entre o professor de história com os demais professores. Por fim, o próprio Sistema em

si com a contratação de professores de áreas afins que às vezes são obrigados a

ministrarem a disciplina História. Além disso, na década em questão foram elaborados

os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), os quais visam unificar o currículo

ministrado nas escolas nacionais, além de trazerem uma visão mais próxima da escola

dos Annales o que não era prática das escolas brasileiras até os anos oitenta. Depois

desse período, o que se assiste no ensino de História é um choque entre a Escola

Positivista e a Escola dos Annales, causando, assim, uma confusão entre o que e como

se ensina História na escola contemporânea. Um marco também fundamental para a

escolha desta temática está relacionado com a leitura do livro Ensino de História:

fundamentos e métodos de Circe Maria Fernandes Bittencourt (2009) que fez com que

tivéssemos outra concepção desse ensino e nos motivasse à realização do presente

estudo.

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ISBN: 978-85-8227-137-7

Palavras-chave: Práticas pedagógicas. Ensino. História.

REFERÊNCIAS

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CERTEAU, Michel de. A Operação Historiográfica. In: DE CERTEAU, M. A Cultura

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FONSECA, J. J. S. Metodologia da Pesquisa Científica. Fortaleza: UEC, 2002.

KARNAL, Leandro (org.) História na Sala de Aula: conceitos, práticas e propostas. 5.

ed. São Paulo: Contexto, 2007.

IDENTIDADES NÔMADES1: HISTÓRIA ORAL E MIGRAÇÃO NO

MARANHÃO CONTEMPORÂNEO

Áurea de Fátima Lopes Silva

Sabe-se que a migração é um fenômeno bastante conhecido, muito comum entre os

povos do mundo todo. Essas migrações acontecem por vários fatores: econômico,

sociais, religiosos, guerras, entre outros; ainda existem migrações relacionadas a

gêneros, migrações internacionais, porém a migração de que trata este trabalho está

relacionada com a saída de pessoas do interior para a capital, mais precisamente,

pessoas que saíram do município de Cururupu, no interior do Estado do Maranhão, e se

estabeleceram na capital, São Luís.

Segundo Feitosa (2006), pode-se definir migração como entrada e saída de pessoas de

seu lugar de origem para outro lugar. De acordo com Johnson (1997), migração é o

movimento físico de indivíduos dentro e entre sistemas sociais. É importante pelo efeito

que produz sobre áreas que perdem migrantes através de emigração e áreas que os

recebem por imigração. Já no campo da história, o historiador Alistair Thomson (2002)

define de maneira mais ampla o fenômeno da migração, afirmando que considera

migração tanto internacionais quanto intranacionais, como passagem física de um lugar

para o outro e essa experiência continua por toda vida do migrante e das gerações

subsequentes.

Muitos estudos apontam que a migração está diretamente relacionada à busca pela

melhoria de vida. Percebe-se também que os maiores deslocamentos ocorrem nas zonas

rurais dos estados, ou seja, as pessoas do interior dos estados migram para várias

regiões em busca de novas oportunidades nos grandes centros urbanos, alguns buscam

oportunidades em outros estados, outros buscam na capital, São Luís. Esses fenômenos

1 Trabalhamos aqui com o conceito de identidade segundo o ponto de vista das novas abordagens da

nova história cultural que entende que os sujeitos são: “conceptualizado como não tendo uma identidade

fixa, essencial ou permanente (HALL, 2006, p. 11 – 12).

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são causados, muitas vezes, pela precariedade dos serviços públicos, em determinados

municípios menores, e/ou pela falta de políticas públicas, tais como: saúde, educação,

emprego, etc.

Na Microrregião do Litoral Ocidental Maranhense, onde está localizada a cidade de

Cururupu, juntamente com os municípios de Alcântara, Apicum-Açú, Bacuri,

Bacurituba, Bequimão, Cajapió, Cedral, Central do Maranhão, Guimarães, Mirinzal,

Porto Rico do Maranhão e Serrano do Maranhão que, em sua soma, ocupam uma área

de 9.157,45080 km2

com uma população de 183.749 habitantes, sendo o município de

Cururupu detentor da maior parte da população da região, com um contingente estimado

em 33.745 habitantes, sendo urbana a maioria da população com 22.216, e a rural com

10.378 habitantes, de acordo com o Censo de 2010 (IBGE). Portanto, iremos investigar

esse fenômeno migratório do município de Cururupu para a capital São Luís, através de

um estudo de caso de uma associação cujos membros são todos migrantes desse

município e que se estabeleceram na capital, com o objetivo de compreender de que

maneira esse estabelecimento ocorreu e quais foram suas maiores dificuldades em

integrar-se a outro ambiente cultural que é o centro urbano.

A Associação Filhos e Amigos de Cururupu (AFAC) nasce a partir de uma ideia que

aqueles migrantes tiveram ao se encontrar em um evento comemorativo da Igreja

Católica, o qual celebrava o jubileu de ouro da missão dos padres canadenses em

Cururupu - Jubileu Brasil, Canadá, que foi celebrado em 2008. Os ex-alunos foram

convocados pelas freiras do Convento São José, que está localizado no bairro do

Filipinho, em São Luís, e que na época faziam parte da missão. Dessa forma, nasce a

AFAC, de início formada pelos ex-alunos do Colégio Dom Bosco2, escola fundada pela

Missão, depois ampliada para todos os filhos e amigos da cidade de Cururupu, com a

intenção de abraçar de forma mais ampla os filhos dessa cidade. O nascimento efetivo

da associação acontece em fevereiro de 2009, depois de vários encontros informais que

aconteciam para “matar” as saudades que esses ex-alunos sentiam da cidade e do tempo

de escola. Hoje, a AFAC é uma associação registrada, com personalidade jurídica, com

estatuto, sem fins lucrativos e sem ideologia político - partidária.

A metodologia que usaremos na investigação será a da História Oral, ou seja, os relatos

orais desses migrantes que compõem a associação. Acreditamos que os testemunhos

serão de fundamental importância para compreendermos o processo migratório e toda a

trajetória desses sujeitos nesse processo. Como afirma (THOMSON, 2002, p. 345), “O

testemunho pessoal oferece singulares vislumbres do interior do vivido nos processos de

migração”. Escolhemos ainda, dentre os membros, aqueles que participaram da ideia de

fundar tal associação, sobretudo, os membros que fazem ou fizeram parte das diretorias

anteriores, com o objetivo de descobrir o principal interesse da AFAC; se há, entre os

membros, uma rede de sociabilidade; se são unidos por uma mesma identidade, a de ser

cururupuense; se essa identidade é o que une os membros da AFAC. É comum aos

pesquisadores, que recorrem ao arsenal metodológico da História Oral, trabalharem com

fontes complementares, pois como assevera (THOMPSON, 1992, p. 31) “a história oral

possibilita novas versões da história”, por isso os relatos orais serão usados na pesquisa

juntamente com a análise de dados fornecidos pelos Órgãos do Governo, como o IBGE

(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e o IMESC (Instituto Maranhense de

Estudos Socioeconômico e Cartográficos) sobre a migração e a região onde se localiza a

cidade. Esses Órgãos vão nos dar valiosas informações no que tange aos índices, à

economia etc.

Através dos relatos orais já colhidos no início da investigação, percebemos que a

Associação Filhos e Amigos de Cururupu tem como objetivo principal trabalhar em prol

2 Essa Instituição não tem nenhuma relação com a Escola Dom Bosco de São Luís.

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da cidade, através de vários aspectos, sobretudo, no cultural: resgatar algumas

manifestações culturais esquecidas; apoiar, divulgar e realizar seminários nas escolas

fomentando, de alguma forma, a importância dessas manifestações culturais; outra

preocupação é a preservação dos casarões antigos, que ainda restam na cidade e que

estão completamente abandonados pelo poder público local. Esse é o objetivo central da

AFAC. Além do núcleo em São Luís, ela mantém um outro no município de Cururupu,

com a intenção de saber, através dos próprios moradores, quais são os problemas mais

urgentes que a Cidade possui e a associação, possa cooperar. Quem melhor pode indicar

esses problemas são as pessoas que convivem na cidade, por isso, a Associação faz

reuniões periódicas em Cururupu, além das reuniões na Capital. A intenção da aAFAC é

de levar a sede para o município de Cururupu e, aqui em São Luís se tornar um núcleo.

Portanto, a análise desenvolvida nesta pesquisa visa articular as relações entre migração,

memória, narrativa e identidade, isto é, através dos relatos objetivamos melhor

compreender a migração e a atuação desses atores na construção e/ou manutenção de

suas identidades e da identidade da AFAC. Nesse sentido, GUIMARÃES NETO (2006)

afirma que a prática do historiador é redefinida perante as possibilidades de novos

territórios e de novas abordagens e metodologias nas pesquisas historiográficas

contemporâneas.

Palavras - Chave: Migração. Identidade. Cururupu.

REFERÊNCIAS

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http://www.ibge.com.br, acesso em janeiro de 2014.

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O INDIZÍVEL NO MARANHÃO: O FUNCIONAMENTO DO SNI E DO DOPS

SEGUNDO SEUS AGENTES VISÍVEIS

Fábio Aquiles Martins de Alencar

A Ditadura Civil-Militar brasileira buscou sustentação no controle da palavra falada ou

escrita, no controle das atitudes, na construção de um discurso legitimador, na

confecção do silêncio atemorizado pelo uso da força ou pela possibilidade de seu uso.

Órgãos como o Serviço Nacional de Informações (SNI) e o Departamento de Ordem

Política e Social (DOPS) foram reconhecidamente instrumentos de controle e de

construção do indizível também sobre as terras maranhenses.

Este trabalho visa discutir a criação e o funcionamento desses órgãos no Maranhão,

evidenciando a relação entre eles e os seus papéis de sustentáculos do regime ditatorial

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brasileiro nas décadas de 1970 e 1980 a partir, principalmente, de entrevistas realizadas

com parte dos agentes do SNI e do DOPS durante essas duas décadas, escrevendo,

dessa forma, sobre o que agora pode ser dito por quem construiu e consolidou essas

instituições, com palavras ainda vivas como nos proclama a História Oral. Por mais que

as falas dos nossos entrevistados não nos façam tentar enxergar e reproduzir as cenas de

espionagem e violência das quais talvez tenham participado, procuraremos nas suas

falas a celebração da ditadura civil-militar e dos elementos que a mesma construiu ou

tentou construir.

Vale ressaltar que tais órgãos tiveram suas gestações em momentos anteriores ao

ditatorial capitaneado pelos militares brasileiros, momentos em que o Estado brasileiro

já fazia uso do tripé formado pela vigilância, pelo cerceamento e pela repressão, embora

tenham tido nas décadas de 1960 e 1970 seu momento de maior força e duração, nos

fazendo necessitar do evidenciamento da Doutrina de Segurança Nacional como

principal arcabouço para a concretização de uma violência devidamente

institucionalizada.

A doutrinação anticomunista, tanto entre militares, quanto entre civis, expandiu-se a

partir do frustrado levante do Partido Comunista em 1935. As Escolas militares

tornaram-se verdadeiros centros de construção de discursos e práticas anticomunistas. É

durante a década de 1950 que a Doutrina de Segurança Nacional ganha parte de sua

sedimentação nas palestras proferidas por um coronel e futuro chefe do SNI, Golbery do

Couto e Silva.

O Serviço Nacional de Informações (SNI) foi criado em junho de 1964 através da lei

4.341, objetivando dirigir, em todo o Brasil atividades de informação e contra

informação, e, de forma especial as que fossem do interesse da Segurança Nacional,

ligado diretamente ao próprio presidente da República e ao Conselho de Segurança

Nacional (CSN), e incorporando funcionários e acervo do Serviço Federal de

Informações e Contrainformações (SFICI), que havia sido criado em 1956. Conforme

D’ARAÚJO, SOARES e CASTRO (1994) a inexistência de uma estrutura de

informações eficiente contribuiu decisivamente com a queda de João Goulart, de

acordo com os militares entrevistados para a confecção da obra “Anos de Chumbo: A

Memória Militar e a Repressão”

Além da agência central e das agências regionais, o SNI dispunha de DSIs (Divisões de

Segurança Interna) em cada ministério e as ASIs (Assessorias de Segurança Interna) em

outros órgãos públicos como universidades, além da existência de uma Escola Nacional

de Informações, criada entre os anos de 1971 e 1972, que formava civis e militares que

abastecessem os centros de informação espalhados pelo país.

O já mencionado general Golbery do Couto e Silva, maior nome ligado ao SNI é o do

seu primeiro chefe e principal idealizador, pois, segundo PIERANTI, CARDOSO e

SILVA, a política de segurança nacional evidenciada durante o regime militar tem

fortes ligações com o livro “Planejamento Estratégico”, lançado em 1958 pela

Biblioteca do Exército, quando esta reuniu as conferências dirigidas pelo próprio

Golbery dentro dos muros da Escola Superior de Guerra a partir de 1952.

Enquanto ao SNI cabia a informação e a contrainformação, um dos braços armados do

regime era o DOPS, Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), órgão utilizado,

principalmente durante as ditaduras do Estado Novo e a Civil-Militar nascida em 1964,

foi criado em 17 de abril de 1928 pela lei nº 2304, estabelecendo a repressão e o

controle de indivíduos e de grupos considerados subversivos por quem controlava o

governo, assegurando a chamada ordem. Sua atuação foi ampliada a partir da criação da

primeira Lei de Segurança Nacional, que respaldou as perseguições a comunistas e

integralistas, que constituíam os principais focos de oposição a Vargas durante seu

período constitucional.

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Recebeu a alcunha DOPS a partir de 1938, já durante a ditadura varguista do Estado

Novo, possuindo embriões nos estados, as Delegacias de Ordem Política e Social. Mas

foi durante o regime militar que esse órgão se fortaleceu de forma considerável,

contando com um número bem maior de agentes, se tornando parte integrante do amplo

sistema de segurança nacional em comunhão com as Forças Armadas.

SNI e DOPS foram importantes órgãos para a prática da vigilância, do cerceamento e da

repressão, bases sustentadoras de um estado que buscava a onipresença, interferindo nos

mais variados setores da sociedade brasileira, mas não foram as únicas. De acordo com

REZENDE (2013), o regime militar buscou variadas estratégias, como o crescimento

econômico e uma forte propaganda associada a ele, bem como utilizou-se do aparato

psicossocial.

A proclamação de valores ligados à família, à religião, à pátria, à ordem e à disciplina,

tão bem defendidos pelos discursos conservadores civis, também eram máximas

defendidas pelos militares dentro dos quartéis, que ao ouvirem os pedidos de salvação

pronunciados por bocas e faixas ostentadas por mães durante as quarenta e nove

marchas da Família com Deus pela Liberdade, tiveram que sair às ruas, retirar tudo

aquilo que contrariava o sagrado preconizado pelas famílias brasileiras, e governar a

pedidos, isto é, em nome da moral e dos bons costumes. Dessa forma, estava montada a

estratégia psicossocial do regime, devidamente coadunada com a vigilância, o

cerceamento e a repressão a todos aqueles que se distanciavam dos valores que a grande

maioria desejava, gerando assim, subterfúgios para o regime buscar legitimar uma

democracia singular, conveniente apenas à realidade brasileira. O Legítimo não poderia

ser apenas jurídico, pautado numa nova constituição e nos vários atos institucionais,

sendo necessário a continuidade de uma suposta democracia, formada pelo legislativo

com duas câmaras e dois partidos, como nas grandes democracias, mas presidida por

um defensor dos valores que haviam sendo corrompidos pelos líderes civis, que haviam

sido eleitos pelo voto direto.

Palavras-Chave: Ditadura Civil-Militar – SNI e DOPS - Legitimidade

REFERÊNCIAS

D’ARAÚJO, Maria Celina, SOARES, Gláucio Ary Dillon, CASTRO, Celso. Visões do

Golpe: a memória militar de 1964. Rio de Janeiro. Relume Dumará, 1994

FLORINDO, Marcos Tarcísio. O serviço reservado da Delegacia de Ordem Política e

Social de São Paulo na era Vargas. Franca,SP: Universidade Paulista, 2000:35 in

Oliveira.

FIGUEIREDO, Lucas. Ministério do Silêncio. A história do serviço secreto brasileiro

de Washington Luís a Lula (1927-2005). Rio de Janeiro: Record, 2005, pg. 19 in

OLIVEIRA.

OLIVEIRA, Nilo Dias. A vigilância da DOPS-SP às Forças Armadas (Brasil - década

de 1950) sistema repressivo num Estado de natureza autocrática. Dissertação de

mestrado Programa de Pós - graduação em História da PUC-SP, sob orientação da Prof.

Dra. Vera Lucia Vieira, 2008.

PIERANTI, Octavio Penna, CARDOSO, Fabio dos Santos e SILVA, Luiz Henrique

Rodrigues da. Reflexões acerca da política de segurança nacional: alternativas em face

das mudanças no Estado, in: RAP Rio de Janeiro 41(1):29-48, Jan./Fev. 2007.

REZENDE, Maria José de. A Ditadura Militar no Brasil: Repressão e Pretensão de

Legitimidade: 1964-1984. Londrina, Eduel, 2013.

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AS PRÁTICAS DOCENTES NO ENSINO DE HISTÓRIA NA ZONA

RURAL DO MUNICÍPIO DE GONÇALVES DIAS/MA: DILEMAS E

POSSIBILIDADES

Thiago de Jesus Araújo Cruz

A escola enquanto âmbito institucional formal surge tardiamente na zona rural

brasileira, apesar de o Brasil ser um país de origem predominantemente agrário, sendo a

educação em si um privilégio destinado a uma minoria que detinha o poder econômico e

que tinha como destino ocupar os postos mais importantes dentro da estrutura social de

diversas localidades pelo país afora.

Apesar de seu caráter agrário, a educação formal no meio rural não foi sequer

mencionada nos textos constitucionais até 1891, evidenciando o descaso dos dirigentes

e as matrizes culturais centradas no trabalho escravo, na concentração fundiária, no

controle do poder político pela oligarquia e nos modelos de cultura letrada europeia.

O objetivo de meu estudo é analisar a prática docente no ensino de história nas escolas

de ensino fundamental maior da zona rural do Maranhão, no munícipio de Gonçalves

Dias, ressaltando a importância de o educador lançar mão dos recursos e possibilidades

a seu alcance para dinamizar as aulas de história. Para esse empreendimento leva-se em

consideração não apenas aqueles saberes construídos em sala de aula, mas também

aqueles construídos na convivência social, na cultura, no lazer e nos movimentos

cotidianos. A sala de aula é um espaço específico de sistematização, análise e de síntese

das aprendizagens se constituindo assim, num local de encontro das diferenças, pois é

nelas que se produzem novas formas de ver, estar e se relacionar com o mundo.

A literatura na área educacional tem mostrado a importância destacada do professor no

processo de progressão e aprendizagem dos alunos. Apesar dessa constatação, a

condição de trabalho desses profissionais tem-se deteriorado cada vez mais. No caso

específico da área rural, além da baixa qualidade e salários inferiores aos da zona

urbana, eles enfrentam, entre outras, as questões de sobrecarga de trabalho, alta

rotatividade e dificuldade de acesso à escola, em função das condições das estradas e da

falta de ajuda de custo para locomoção.

Para realização deste trabalho estão sendo utilizados diferentes procedimentos

metodológicos, tais como: revisão bibliográfica da literatura especializada,

considerando também a literatura da área de História, observações de sala de aula,

aplicação de questionários para perceber como vem se dando a construção e

reconstrução do pensamento durante o processo ensino aprendizagem nas escolas

pesquisadas. Considerando esse processo, será analisada a problemática educacional,

desde a valorização e disponibilização de recursos que a escola oferta, à formação dos

professores, até as carências cognitivas dos discentes.

A justificativa para a escolha do tema do ensino da disciplina história nas escolas de

ensino fundamental maior na zona rural da cidade de Gonçalves Dias - MA, partiu não

só de minha experiência como professor de uma escola da zona rural deste município,

mas também da percepção do difícil contexto vivenciado por docentes e discentes no

relacionamento com o processo de ensino-aprendizagem, realidade está agravada pela

soma de vários fatores, dentro os quais podemos citar, por exemplo: a desvalorização da

cultura rural dessas regiões, o clientelismo político na convocação dos profissionais da

educação que ainda é muito forte como moeda de troca, a posição insatisfatória ocupada

pelas escolas dos povoados na lista de prioridades do poder público, as dificuldades

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enfrentadas pelos professores em geral, e especificamente os de história (principalmente

os que não possuem formação na área), na sua prática pedagógica, a realidade da

clientela dessas escolas que apresentam especificidades que devem ser levadas em

consideração, a pouca participação das famílias no dia a dia da escola, currículos

incompatíveis com a realidade rural, instalações precárias, e muitos outros que vem se

somar a esse quadro de negligencia, e que são apenas um caso, dentre vários que

assolam o estado do Maranhão e até mesmo do Brasil.

A relevância de estudos dessa natureza encontra-se no fato de haver uma escassez de

estudos similares na historiografia da educação maranhense, mas lembrando que essa é

uma falha que ocorre a nível nacional, pois diante de tantos problemas educacionais, as

questões relativas à zona rural acabam sendo encaradas como de menor importância.

Esse panorama reflete o elitismo acentuado do processo educacional e a má vontade por

parte de muitas autoridades que por motivos diversos acabam encarando a educação das

camadas populares como um arremedo de um processo que não tem a pretensão de

formar uma verdadeira consciência cidadã (LEITE, 1999).

Essa concepção discriminatória acabou ganhando força a partir da primeira metade do

século XX, período em que surge um discurso urbanizador que enfatizava a fusão entre

os dois espaços, urbano e rural, por acreditar que o desenvolvimento industrial, em

curso no Brasil, faria desaparecer dentre de algumas décadas a sociedade rural, ou seja,

“o campo é uma divisão sociocultural a ser superada, e não mantida” (ABRAÃO,

1989).

No processo de análise do material coletado e na observação foram percebidas as

dificuldades enfrentadas pelo professor de história ao desenvolver sua prática

pedagógica e nesse sentido estamos propondo a construção de um capítulo que possa

apontar medidas que auxiliem no fazer desses professores.

Ainda do ponto de vista metodológico foram elaboradas algumas etapas de fundamental

importância para o desenvolvimento da pesquisa, quais sejam:

Mapeamento das escolas municipais de ensino fundamental maior da zona rural de

Gonçalves Dias;

Seleção de duas amostragens para realização do estudo a que se propõe esse

trabalho;

Elaboração de questionários a serem aplicados com os personagens envolvidos no

processo educacional, focando na dupla professores/alunos.

Observações das escolas selecionadas e da realidade de sala de aula nas aulas de

história;

Análise dos estudos teóricos compatibilizados com a realidade de sala de aula,

objetivando a elaboração final de uma proposta para o ensino de história nas

escolas trabalhadas.

Espera-se com estes resultados preliminares construir uma proposta para melhorar a

prática escolar do ensino de História das escolas da zona rural de Gonçalves Dias – MA,

pois embora exista um discurso de que a maioria dos professores tenha em sua prática

docente utilizado a reflexão crítica, sobrevivem ainda muitas limitações no que se refere

a uma efetiva prática em sala que de fato propicie uma aprendizagem na história

conforme exigências de cunho legislativo.

O processo de ensino-aprendizagem só terá significado para o professor e o aluno na

medida em que proporcionar um aprendizado que favoreça relações, conexões,

comparações, generalizações, e os outros atributos entre os elementos estruturantes da

prática escolar.

Palavras- Chave: Educação. Ensino de História. Zona rural.

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ISBN: 978-85-8227-137-7

REFERÊNCIAS:

ABRAÃO, José Carlos. O Educador a caminho da roça: notas introdutórias para

uma conceituação de educação rural. Mato Grosso do Sul, 1989.

ARROYO, Miguel Gonzalez; CALDART, Roseli Saleti; MOLINA, Mônica Castagne

(orgs). Por uma educação do campo. Rio de Janeiro: Vozes, 2004.

BITENCOURT, Circe Maria Fernandes (org). O saber histórico em sala de aula. 9ª

Ed. São Paulo: Contexto, 2004.

BRASIL. Secretária de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais:

história e geografia. Brasília: MEC, SEF, 1997.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Nova LDB. Lei nº

9394/96.

BRASIL. Ministério da Educação – Diretrizes operacionais para a educação básica

nas escolas do campo. Brasília, DF, 2002.

FONSECA, Selva Guimarães; SILVA JÚNIOR, Astrogildo Fernandes. O ensino de

História no meio rural em produções acadêmicas nas IES mineiras (1996-2008).

http://www.lfti.com.br/EMEC/trabalhos/38/textocompletoastrogildo.pdf.

JANOTTI, Maria de Lourdes Monaco. História, Política e Ensino. In: BITENCOURT,

Circe Maria Fernandes (org). O saber histórico em sala de aula. 9ª Ed. São Paulo:

Contexto, 2004. p.42-53.

LEITE, Sérgio Celani. Escola rural: urbanização e políticas educacionais. São Paulo:

Cortez,1999.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. São Paulo: editora Paz e Terra, 1996.

SILVA, M. S. “Os saberes do professorado rural: construídos na vida, na lida e na

formação”. Dissertação de Mestrado-UFPE, Recife, 2000.