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Histórica - A Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 56, nov. 2012

H A REVISTA ONLINE DO ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

Editorial

Apesar de processos recentes, como os casos da Venezuela e do Paraguai, que vivenciaram disputas que culminaram em graves desestabilizações políticas em seu regime institucional, a América Latina tem conseguido avançar na consolidação da estabilização política após as dita-duras que assolaram o continente. Por conta desse cenário, as pesquisas realizadas nesse campo avançaram sensivelmente na última década, sendo possível analisar as múltiplas facetas do con-texto repressivo vivido pelos países do Cone Sul, ultrapassando, assim, uma primeira geração de estudos que, por várias questões e, principalmente, pela proximidade de um período tão traumá-tico, não se aproximava de questões mais polêmicas (como o colaboracionismo, as divergências dentro dos grupos de tendência política de esquerda na resistência, o tipo de repressão sofrida pela classe média e pelos pobres) ou tratava vários pontos através de uma perspectiva extrema-mente bidimensional. Esses estudos pioneiros foram importantes, sobretudo, na coleta de dados, e são, também, fontes históricas para entender como a sociedade e a academia vivenciaram o processo de abertura política desses países.

Nesta edição, trazemos artigos que estão alinhados com as temáticas desse campo de pesquisa. Iniciamos a edição com as reflexões de Lidiana Justo acerca da organização da Guarda Nacional na província da Paraíba, que possibilita uma visão ampla da montagem do aparelho re-pressivo brasileiro desde o século XIX. Extrapolando as fronteiras nacionais, mas tratando de um período fundamental para compreender as estruturas políticas do século XX, Francisco Fagundes nos apresenta a Ação Católica e sua resistência ao fascismo na Itália no final da Segunda Guerra Mundial. Um eco das consequências políticas desse conflito pode ser apreendido no artigo de Da-niela Ferreira, que apresenta os caminhos e descaminhos da revista Seiva, publicação do Partido Comunista da Bahia, em tempos de repressão do Estado Novo varguista.

Também no campo da mídia, Aloysio Castelo apresenta um panorama sobre o programa de rádio Rede da Democracia e suas vinculações com os veículos impressos, propiciando uma re-flexão sobre os últimos períodos do governo Goulart e com texto que culminou na sua deposição

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

pelo golpe de 1964. O último artigo dessa edição, de Jaime Figueiroa e Antonio Cesso, apresenta um balanço historiográfico do campo da História do Trabalho, especialmente nos modos como este tem se relacionado contemporaneamente com as questões do controle e da repressão na produção acadêmica. Já o Imagens de uma Época traz a crônica visual do jornal Ultima Hora sobre os menores infratores do Rio de Janeiro na década de 1950.

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

Sumário

A ORGANIZAÇÃO DA GUARDA NACIONAL NA PROVÍNCIA DA PARAÍBA (1831-1850):INSTITUIÇÃO DA ORDEM E DAS “MERCÊS” POLÍTICAS............................................................................... 5 Referências..........................................................................................................................................12 Fontes.................................................................................................................................................. 13

A AÇÃO CATÓLICA: A RESISTÊNCIA PIEMONTESA AO FASCISMO (1933-1944).................................14 Referências......................................................................................................................................... 20

CAMINHOS E DESCAMINHOS DA REVISTA SEIVA (1938-1943)..............................................................22 Surge a revista Seiva: um mensário de luta.................................................................................... 25 Referências......................................................................................................................................... 29 Periódicos........................................................................................................................................... 29

OS JORNAIS CARIOCAS DA REDE DA DEMOCRACIA NA QUEDA DO GOVERNO GOULART ................................................................................................................................................30 Referências......................................................................................................................................... 35

ASPECTOS DA HISTÓRIA DO TRABALHO: CONTROLE, REPRESSÃOE CONTRADIÇÕES.......................................................................................................................................................37 Introdução.......................................................................................................................................... 38 Contradições da introdução do trabalho no Brasil...................................................................... 39 Trabalho, indústria e profissionalização como formas de controle............................................ 41 Considerações Finais........................................................................................................................ 42 Referências......................................................................................................................................... 43

5COSTA, Lidiana Justo da. A organização da Guarda Nacional na província da Paraíba (1831-1850): instituição da ordem e das “mercês” políticas. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 05-13, maio 2013.

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Histórica - A Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 56, nov. 2012 Histórica - A Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 56, nov. 2012

H A REVISTA ONLINE DO ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

A ORGANIZAÇÃO DA GUARDA NACIONAL NA PROVÍNCIA DA PARAÍBA (1831-1850): INSTITUI-ÇÃO DA ORDEM E DAS “MERCÊS” POLÍTICAS

Lidiana Justo da Costa1

Resumo: O estudo sobre a Guarda Nacional na província da Parahyba do Norte (1831-1850) le-vou-nos a perceber práticas de uma Cultura Política nessa instituição, que foi criada no período regencial, pela Lei de 18 de agosto de 1831, para manter a “ordem” no Império brasileiro. Dessa maneira, percebemos as práticas dessa Cultura Política, por exemplo, nas reclamações, nos pare-ceres e elogios da elite dirigente sobre a organização social local da Guarda Nacional; na maneira como foram ocupados os cargos de comandos na milícia; nas demonstrações de apoio ou rejei-ção aos governantes por parte dos milicianos; e, sobretudo, nas “mercês” concedidas aos aliados políticos para que ocupassem um cargo de destaque na Guarda Nacional ou recebessem isenções no que concerne ao alistamento nessa instituição. Portanto, analisar o papel exercido pela Guarda Nacional na província da Paraíba é, também, dialogar com os valores e comportamentos partilha-dos pela elite dirigente na condução da desejada ordem.

Palavras-chave: Guarda Nacional. Milicianos. Ordem.

Abstract: The study of the National Guard in the province of Parahyba do Norte (1831-1850) led us to realize practices of a Political Culture in this institution – which was established by law in the regency period of August 18, 1831 to maintain “order” in the Brazilian Empire. Thus, we see that the practices of this Political Culture, for example, the complaints, opinions and praise the ruling elite about the social organization of the local National Guard, in the way were occupied posi-tions of command in the militia; statements of support or opposition to ruling by the militia, and above all, the “favors” granted to political allies so that they occupy a position of prominence in the National Guard, or receive exemptions regarding the enrollment at this institution. Therefore, analyzing the role played by the National Guard in the province of Paraiba is also dialogue with the values and behaviors shared by the ruling elite in driving the desired order.

Keywords: National Guard. Militiamen. Order.

1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal da Paraíba, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Serioja R. C. Mariano, coordenadora do Grupo de Pesquisa “Sociedade e Cultura no Nordeste Oitocentista”. E-mail: [email protected].

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

6COSTA, Lidiana Justo da. A organização da Guarda Nacional na província da Paraíba (1831-1850): instituição da ordem e das “mercês” políticas. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 05-13, maio 2013.

Uma das primeiras notícias a respeito da Guarda Nacional2 na província da Paraíba3 trata-se de uma correspondência do regente Diogo Antonio Feijó, de 14 de outubro de 1831, ao presiden-te da província, Francisco José Meira. Atentemo-nos para o que disse o regente:

Manda a Regência em nome do Imperador que V. Exa. dê pronta execução a Lei de 18 de agosto do corrente, e que proponha três cidadãos para cada posto, cuja nomeação pertence ao governo com declaração de suas idades, profissão, serviços e mais circunstancias que creditem a cada um dos propostos, ficando certo por brevidade se lhe remeterá o modelo dos uniformes dos mesmos Guardas.4

Essa correspondência – enviada dois meses depois de criada oficialmente a Guarda Nacio-nal no Brasil, pela Lei de 18 de agosto 1831 – nos mostra que a execução da ordem da criação da mi-lícia em alguns municípios da província ainda não havia sido executada pelo poder local. Observe que, além de pedir que se “acelere” a criação da Guarda Nacional na província, o regente Feijó destacou que deveriam ser eleitos três cidadãos para os postos de comando da futura milícia. E, embora não especifique a categoria dos postos, acreditamos que a preocupação do regente era de que os respectivos cidadãos, que viessem a exercer o cargo de comando da Guarda, fossem escolhidos pelo governo da província, tomando como critério “suas idades, profissão, serviços e mais circunstancias que creditem a cada um dos propostos”. Desta feita, conjecturamos que os escolhidos para os cargos de comando deveriam ser pertencentes de uma elite local, afinada, por sua vez, com o governo da província.

Com relação à criação da Guarda na província, a documentação nos indica que ela encon-trou alguns obstáculos que puderam ser percebidos nos diálogos estabelecidos entre a elite diri-gente através de ofícios, correspondências e relatórios trocados entre si. Nesse sentido, analisan-do um ofício da Câmara Municipal da cidade da Paraíba, fica evidente a morosidade em executar a lei. A citação é longa, mas merece ser descrita:

Nesta sessão foi [apresentada] a esta Camara Municipal o oficio de V.Exc. de 4 do corrente exigindo resposta de outro [datado] de 8 de agosto findo acerca d’organização das Guardas Nacionais; o Estado em que se acham os trabalhos desta Camara sobre a sua organização e as causas que tem feito [?] de ser esta a única capital de província que ainda não tem Guarda Nacional apesar dos esforços de V. Ex.ª para poder lançar mão dos meios a seu alcance a fim de ver organizadas as mesmas guardas. Esta Camara Exmo Sr. apesar de reconhecer a Justiça que assiste a V.Exª nesta parte, com tudo previne a V.Exº isenta deve estar dos reproches de V.Exª, e da publica censura pelas razões que possa mostrar. Em sessão de 9 de novembro de 1831 [?] presente a Camara [?] o oficio desse Exmo governo de 8 do mesmo mês a que acompanhou a Lei de 18 de [agosto] de 1831 passando aquela Camara

2 Cf. ALMEIDA (1998); ALMEIDA (1986); CASTRO (1977 [1979]); FARIA (1977); NUNES (2005); RIBEIRO (2005); SALDANHA (2006); URICOECHEA (1978).3 Utilizaremos a grafia “Paraíba” para nos referenciar à província.4 Correspondência do Regente Diogo Antonio Feijó enviada ao presidente da província da Paraíba Francisco José Meira, ordenando a execução da lei de criação da Guarda Nacional na respectiva província, de 14 de outubro de 1831. Arquivo Histórico Waldemar Bispo Duarte/PB. Cx: 010, Ano: 1830/1833. Grifos nossos.

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

7COSTA, Lidiana Justo da. A organização da Guarda Nacional na província da Paraíba (1831-1850): instituição da ordem e das “mercês” políticas. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 05-13, maio 2013.

a cumprir [?] [A] sessão resolveu, e mandou oficiar aos juízes de Paz do município para executarem na parte correspondente, mandando-lhes livros, relação de eleitores dos respectivos distritos, e até exemplares da lei; que não vindo em numero suficiente necessário foi manda-los ver de [Pernambuco]. Em 18 do mesmo mes ativou a mesma Camara aos juízes de paz afim de adiantarem o alistamento. Por oficio de 26 de janeiro do ano seguinte mandou responsabilizar ao Juiz de Paz suplente do [?] o mesmo fez em [?] de maio mandando responsabilizar ao de Santa Rita pela morosidade e apatia em que se achava [...] aquela mesma Camara as dificuldades que suscitaram no distrito de Santa Rita pela repugnacia que apresentava o juiz de paz.5

Pelo teor do documento, notamos que a Câmara Municipal da província da Paraíba tentava se justificar a respeito da morosidade da criação da Guarda Nacional na capital da província. E es-tava sendo cobrada por isso, afinal fora advertida de que essa era “a única capital de província que ainda não tem Guarda Nacional”. Consideramos certo exagero nessa afirmação, pois a Guarda Na-cional encontrou dificuldades para se formar em diversas províncias do Império; possivelmente essa advertência foi uma maneira de acelerar a execução da lei. Na província do Espírito Santo, por exemplo, Kamila Nunes de Deus Oliveira (2011) percebeu que a milícia vivia em “eterna organiza-ção”; Jeanne B. de Castro (1977 [1979]) também alertou para as dificuldades em se formar a milícia em todo território nacional, já que sua organização dependia dos poderes provinciais e também da cooperação da elite dirigente patrimonial, como bem atentou Fernando Uricoechea (1978).

O presidente da província, João José Moura Magalhães, na sua arguição na 2ª legislatura da Assembleia Provincial da Paraíba, em 1839, disse que o problema da desorganização da Guarda não era inerente apenas à província da Paraíba, pelo contrário: aquela situação atingia as demais províncias do Império brasileiro. Mesmo assim, não desanimou, dizendo que “grandes esforços, e trabalhos é precizo empregar, para fazer d’ela uma verdadeira ‘Milicia Nacional’”.6 Portanto, através dessa fala, vemos que a província da Paraíba não foi a única a sofrer com a desorganização ou atraso na organização da Guarda Nacional, pois, passados oito anos, esse problema persistia. Ou seja, oito anos depois de criada a milícia, ainda havia obstáculos, segundo ele, que dificultavam o progresso da instituição cívica na província.

Como percebemos através dos diálogos trocados pelos responsáveis pela criação da milícia, a morosidade em se criar a Guarda Nacional foi seguida de várias “justificativas” por parte dos responsáveis pelo cumprimento da lei de criação da Guarda e também de “pressões” por parte do governo central para que se acelerasse o cumprimento da respectiva lei. Além disso, houve con-flitos envolvendo a própria elite local que estava incumbida de formar a milícia, como vimos an-teriormente no caso exposto pela Câmara Municipal. Pelo que podemos perceber na documenta-ção dos anos de 1831 e 1832, os poderes locais tentaram “adaptar-se” à nova lei para, em seguida, fazerem o levantamento dos cidadãos ou procurarem entender a lei de criação da milícia, visando 5 Documento da Câmara Municipal da Paraíba expondo os motivos que retardaram a criação da Guarda Nacional na província. Não há, nele, nenhuma menção a data ou ano; todavia, acreditamos que ele é concernente ao ano de 1832. Arquivo Histórico Waldemar Bispo Duarte/PB. Cx: 010, Ano: 1830/1833. Grifos nossos.6 Fala do presidente da província da Paraíba, João José Moura Magalhães, no dia 16 de janeiro de 1839, na abertura da segunda sessão da 2ª legislatura da Assembleia Legislativa da província. Pernambuco, Tip. de M. F. de Faria, 1839. p. 12. Disponível em: <http://www.crl.edu/brazil/provincial/para%C3%ADba>. Acesso em: 24 ago. 2012.

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

8COSTA, Lidiana Justo da. A organização da Guarda Nacional na província da Paraíba (1831-1850): instituição da ordem e das “mercês” políticas. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 05-13, maio 2013.

organizar os comandos nas áreas de suas jurisdições. Dizemos isso após verificar na documen-tação que, só a partir de 1833, os ofícios e correspondências oficiais apresentaram notificações do tipo: “que já estavam concluídos os alistamentos, eleitos os oficiais, alguns pareceres sobre as instruções dos guardas nacionais, ou mesmo pedidos de armamentos ao governo provincial.”7

Feita essa consideração, é preciso notar que o alistamento para a Guarda Nacional coube aos juízes de paz de cada município; esses juízes, por sua vez, deveriam registrar tudo nos livros de matrículas.8 Na província da Paraíba, embora algumas listas de qualificações estejam destruídas pela ação do tempo e também sejam escassas, foi possível identificar o cidadão que foi inserido na reserva e aqueles que foram postos no serviço ativo.

Ao analisar a lista da Guarda Nacional do “Batalhão de Alagoa Grande”, no ano de 1833, so-bre a quantidade de cidadãos qualificados, encontramos um total de 227 cidadãos; destes, 182 foram designados para o serviço ordinário do Batalhão e apenas 45 foram inseridos na reserva. Dentre os colocados na reserva, havia 7 juízes de paz, 7 delegados, 1 professor, 2 capitães de ordenança, 2 alferes de milícia e 2 fiscais.9 Os demais cidadãos postos no serviço ativo nesse Ba-talhão não tiveram suas ocupações destacadas pelo qualificador. Por outro lado, encontramos pistas na nossa documentação sobre as ocupações dos guardas nacionais que costumavam ser inseridos no serviço ativo da Guarda Nacional na província, sendo as ocupações mais frequentes as de ferreiro, pescador, porteiro, oficial de sapateiro, pedreiro e agricultor.10 Sobre essa última ocupação, cabe mencionar que o presidente da província da Paraíba, José de Moura Magalhaens, em 1839, sentiu-se incomodado com o fato de se ter “cidadãos industriozos e aplicados ao serviço da lavoura”,11 sendo estes desviados de suas ocupações para realização do serviço de guarnição

7 Ver ofícios e correspondências dos juízes de paz aos presidentes da província da Paraíba. Arquivo Histórico Waldemar Bispo Duarte/PB, Cx: 010, Ano: 1830-1833.8 Eles deveriam reunir o Conselho de qualificação composto pelos seis eleitores “idôneos” mais votados do distrito e que tivessem assentado praça na Guarda Nacional. Caso nas localidades não houvesse esse número de eleitores, cabia ao juiz de paz a escolha de outros cidadãos.9 Alistamento dos Guardas Nacionais do serviço ordinário do Distrito do Batalhão de Alagoa Grande, do município da Vila do Brejo de Areia. Arquivo Histórico do Estado da Paraíba Waldemar Bispo Duarte, Cx: 010, Ano: 1830-1833. A lei de criação da Guarda Nacional de 1831, no seu artigo 12, dizia que o serviço na milícia era obrigatório para todo cidadão brasileiro com renda para ser eleitor ou votante, com idade de 21 até 60 anos. E embora fosse obrigatório, havia algumas isenções para militares do Exército ou da Marinha, clérigos que não quisessem se alistar voluntariamente, carcereiros, encarregados das guardas das prisões, oficiais da justiça e a polícia. Por outro lado, a lei de reforma da Guarda, em 1850, foi mais criteriosa quanto às isenções. Nela poderemos perceber que, dentre algumas mudanças empreendidas pelos legisladores, houve a alteração da idade para ingressar na milícia. Ficando estabelecido no seu artigo 9, parágrafos 1 e 2, que o cidadão votante poderia ingressar na milícia, desde que fosse maior de 18 anos e menor de 60 anos. Se os mesmos cidadãos fossem filhos-famílias, ou seja, sem renda, mas que, dividindo a renda de seus pais, lhe coubessem a quantia de 200 réis, o respectivo cidadão deveria compor as fileiras da milícia. No artigo 10 dessa lei, houve a ampliação para 8 parágrafos relativos àqueles cidadãos que estariam excetuados dos alistamentos. Portanto, ficaram excluídos os cidadãos com “moléstias” (que os tornavam inabilitados para o serviço), os senadores, ministros, conselheiros de Estado e presidentes de províncias, oficiais, praças do Exército, Armada e corpos policiais pagos e a Imperial Guarda de arqueiros, além dos clérigos e religiosos de todas as ordens, magistrados perpétuos, carcereiros e seus ajudantes, e indivíduos matriculados nas Capitanias dos Portos. Para mais informações, indicamos: Lei n. 602, de 19 de setembro de 1850, Art. 9 e 10.10 Essas informações foram encontradas em ofícios, correspondências e informes oficiais ao longo do período estudado por nós (1831-1850). Fonte: Arquivo Histórico Waldemar Bispo Duarte/PB, Cx: 010, Ano: 1830-1833.11 Fala do presidente da província da Paraíba do Norte, o Dr. João José de Moura Magalhaens, que abriu a segunda sessão da 2ª legislatura da Assembleia Legislativa da mesma província, em 16 de janeiro de 1839. Pernambuco, Tip. de M.F. de Faria, 1839. Disponível em: http://www.crl.edu/brazil/provincial/para%C3%ADba. Acesso em: 24 ago. 2012.

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

9COSTA, Lidiana Justo da. A organização da Guarda Nacional na província da Paraíba (1831-1850): instituição da ordem e das “mercês” políticas. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 05-13, maio 2013.

das Praças e Cidades – um serviço que, diga-se de passagem, deveria ser prestado pelo corpo de Primeira Linha da província. Pelo que nos mostra a documentação, essa conduta costumava se repetir com frequência, o que acabava resultando em diversas tentativas, por parte desses cida-dãos, de escaparem do alistamento ou do serviço cotidiano da milícia com pretextos diversos.

Ainda no que tange à ocupação dos guardas cidadãos, chamamos a atenção para uma es-pecificidade: na nossa documentação, a menção sobre a ocupação dos oficiais só aparece preci-samente e, como necessidade, a partir de 1837. Foi nesse ano que o governo da província, através de um decreto, alterou as regras concernentes às nomeações dos oficiais, exigindo, dentre outras coisas, que se colocassem ao lado dos nomes “observações” quanto a sua ocupação.12 Nesse perí-odo, portanto, encontramos as ocupações dos oficiais especificadas da seguinte maneira: nego-ciantes, empregados públicos, juiz de paz, agricultor e negociante, negociante e criador, admi-nistrador e sócio de engenho, proprietário de engenho, filho de proprietário, vereador, professor (de letras, latim e cirurgião) e doutor de medicina. Logo, percebemos que interessava ao governo selecionar aqueles personagens que desfrutassem de certo prestígio social.

A partir desse decreto (1837), o comandante do Batalhão deveria encaminhar ao presidente da província uma relação com os nomes dos guardas sugeridos por ele para o posto de oficial. Convém salientar que essas sugestões seriam, ou não, aprovadas pelo presidente da província. No entanto, percebemos que os comandantes costumavam indicar aqueles homens que estavam dentro de seu círculo de influência e, ao mesmo tempo, que fossem afinados com a política do governo provincial. Afinal, como bem atentou Richard Graham (1997, p. 135): “A sobrevivência do sistema político dependia da manutenção de sua legitimidade”. Daí a necessidade de se ter no comando da milícia pessoas que pertencessem a uma elite política ligada ao partido situacio-nista do momento. Corroborando com essa perspectiva de análise, Serioja R. C. Mariano (2006) destacou que as redes familiares na província da Paraíba se utilizaram dos partidos políticos – e, consequentemente, dos cargos públicos – como forma de se manterem no poder. Portanto, per-cebemos que o mesmo ocorreu no processo de nomeações para o cargo de oficial da Guarda Nacional; essas relações foram definidoras na escolha de quem deveria ocupar um cargo de co-mando dentro da milícia.

Convém salientar que a partir de 1840 o governo provincial intentou racionalizar ainda mais a instituição, de modo a deixá-la nas mãos do governo. Nesse período, demissões e admissões foram bem acentuadas.13 Atentamos também que os motivos políticos para desligar um oficial 12 O Decreto número 8, de 1837 previu que os cidadãos que concorreriam para o posto de oficial deveriam ter uma renda líquida anual de 400 mil réis por “bens de raiz, agricultura, comércio ou emprego”. Já no artigo 2º do referido Decreto, foi declarado que os oficiais subalternos também seriam nomeados pelo presidente, com a indicação dos comandantes, sejam os dos Batalhões ou outros corpos, e os do Estado maior, incluindo os promotores, secretários e ajudantes, sob propostas de seus respectivos chefes. Para mais esclarecimentos, ver Decreto nº 8 da Assembleia Legislativa da Parahyba, de 14 de março de 1837. Arquivo Histórico Waldemar Bispo Duarte/PB, Cx: 014 (A), Ano: 1837. 13 A década de 1840 foi o período conhecido como Regresso, momento em que ocorreram mudanças estruturais, como a Lei de Interpretação do Ato Adicional. Essa Lei, é preciso ressaltar, não foi uma ruptura brusca com o estágio anterior, haja vista que havia elementos do federalismo. Pela afirmação de Dolhnikoff (2005), entende-se que, embora o Ato Adicional tenha feito alterações institucionais, como cobrança de impostos, obras públicas, criação e manutenção de uma força policial e controle dos empregos provinciais, de alguma maneira, no que tange às relações entre governo

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

10COSTA, Lidiana Justo da. A organização da Guarda Nacional na província da Paraíba (1831-1850): instituição da ordem e das “mercês” políticas. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 05-13, maio 2013.

ou readmiti-lo foram comportamentos frequentes do poder provincial. Para ilustrar nossa argu-mentação, propomos a análise de um ofício do Tenente Coronel e Comandante do Batalhão de Pombal, Felis Rodrigues dos Santos, em 1845. Ele pediu a reintegração de um oficial ao presidente da província da Paraíba, Frederico Carneiro de Campos.

Vejamos a situação exposta pelo comandante:

Peço a V. Ex.ª [mercê] de mandar reintegrar o exercício do Capitão da 5ª Companhia, João Neiva da Silva, que foi demitido pelo excelentissimo Presidente o Sr., Pedro Chaves, sem o mais pequeno motivo, e nem crime algum, somente por espirito de partido integrando ao Capitão Gonçallo José da Costa homem este perseguidor dos inocentes que são afeitos ao sistema constitucional e a S.M.I.14

Pedidos ou “mercês”, como a que acabamos de expor, foram práticas políticas que remetem ao período colonial brasileiro (KRAUSE, 2010). Atente que o Tenente Coronel Felis Rodrigues dos Santos fez questão de mencionar na sua mercê que o então presidente da província reintegrasse João Neiva; que este fora demitido, como ele falou, “sem o mais pequeno motivo, e nem crime algum, somente por espirito de partido”. Isso nos leva a perceber que os motes políticos que en-volveram as facções políticas na província da Paraíba acabaram, por sua vez, influenciando no processo de indicação para o oficialato da Guarda Nacional. Como bem refletiu Richard Graham (1997), a nomeação ou demissão, proteção política e os favores fizeram parte das relações sociais desenvolvidas no século XIX. Para o autor, nessa teia de relacionamentos, “Uma das principais responsabilidades dos presidentes provinciais, portanto, consistia em influenciar nas nomeações para o corpo da Guarda Nacional” (p. 125). O mesmo se dava com as demissões: caso o oficial não fosse bem quisto pelo governo provincial, a demissão era o meio mais eficaz para afastá-lo de um cargo que denotava status político, com vistas a priorizar aqueles que fossem homens de “confian-ça” do governo (URICOECHEA, 1978).

O mesmo ocorreu com relação ao alistamento para a Guarda Nacional na província da Para-íba. “Coincidentemente” os serviços na milícia costumavam recair sobre os menos favorecidos so-cialmente. E com relação àqueles que pertenciam à elite, estes costumavam ser isentos do serviço ativo na Guarda. No entanto, o alistamento não ocorreu sem protestos por parte desses milicianos das camadas populares. Muitos criaram subterfúgios para não prestarem serviço na Guarda Na-cional e um dos recursos mais utilizados foi a desculpa de que estariam com “moléstias”. Eviden-temente que não estamos desacreditando de todas as justificativas, estamos apenas aventando a hipótese de que algumas dessas alegações eram falsas, tratando-se de um subterfúgio para es-capar do serviço. E o que nos fez chegar a essa averiguação foi a preocupação do governo central

central e provincial, as atribuições de ambos foram mantidas, sendo isso, na acepção da autora, se “não um federalismo pleno, ao menos um modelo de federação.” 14 Correspondência enviada por Felis Rodrigues dos Santos, em 14 de janeiro de 1845, ao presidente da província da Paraíba, Frederico Carneiro de Campos, pedindo para que o capitão João Neiva da Silva, que fora vítima de perseguição no governo anterior, fosse reintegrado ao Batalhão. Arquivo Histórico Waldemar Bispo Duarte/PB, Cx: 26, Ano: 1845. Grifos nossos.

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

11COSTA, Lidiana Justo da. A organização da Guarda Nacional na província da Paraíba (1831-1850): instituição da ordem e das “mercês” políticas. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 05-13, maio 2013.

em sempre alertar os responsáveis pelo alistamento e pela manutenção da ordem nas províncias a ficarem atentos para casos de alegações falsas de “moléstias”. Contundentemente, entendemos que essas estratégias para escaparem do alistamento ou do serviço na Guarda são sintomáti-cas de que o serviço obrigatório e gratuito na milícia cidadã acabava sendo um ônus para esses milicianos, que tinham que lutar pela sua sobrevivência diária. E não só isso, a rotina da milícia alterava o seu cotidiano: seja no trato da lavoura, nas feiras, no comércio, ou até mesmo em suas diversões, que muitas vezes desembocavam em embriaguez.

Esses milicianos, é preciso ressaltar, também foram personagens protagonistas de vários conflitos internos na Guarda Nacional na província. A documentação nos mostra casos de pro-testos e insubordinação aos oficiais. Um dos atos de insubordinação foi relatado por Irineu Pinto (1908 [1977], p. 142):

11 de Março – As praças da Guarda Nacional em serviço na Capital entram em desordens no respectivo Quartel, às 9 horas da noute, no intuito de expelirem do seu recinto o comandante do destacamento. Comparecendo o Prefeito e alguns officiaes do mesmo batalhão conseguiram em poucos momentos restabelecer a ordem, sendo apenas presos quatro soldados que em seguida foram punidos.

Podemos inferir a partir do exposto que motins, desacatos e irreverências foram comporta-mentos que fizeram parte do cotidiano da Guarda Nacional na província da Paraíba. O caso mos-trado revela a “audácia” de milicianos querendo expulsar do Quartel o seu comandante, levando--nos a perceber que os guardas cidadãos não foram personagens passivos diante da autoridade oficial. Pelo contrário, foram personagens que em determinados momentos fizeram valer suas vontades, ainda que isso resultasse em penalidades, como o caso dos soldados que foram presos.

Vimos, portanto, que estudar a Guarda Nacional na província da Paraíba é dialogar cons-tantemente com os valores e comportamentos partilhados pela elite dirigente, no que tange à organização e direcionamento dessa instituição, elementos que são característicos de uma Cul-tura Política. Nesse sentido, podemos perceber que com o passar dos anos essa elite dirigente foi “desvirtuando” a ideia original da Guarda Nacional no que diz respeito à eletividade dos pos-tos da milícia – o decreto provincial número 8, de 1837, foi um exemplo disso. E quanto à lei de reforma da milícia em 1850, ela apenas tornou legal uma prática que vinha sendo executada pelos governos provinciais do Império brasileiro.15 Por fim, chamamos atenção para os compor-tamentos nada “patrióticos” de alguns milicianos ao criarem subterfúgios para escaparem do alis-tamento e do serviço da Guarda, já que um dos requisitos salutares da lei de criação da milícia era de que seus milicianos fossem cidadãos patrióticos. Esses guardas cidadãos (é preciso frisar)

15 As mudanças na Lei de criação da Guarda Nacional de 1831, através de decretos, não ocorreram apenas na província da Paraíba, mas nas demais províncias do Império brasileiro (CASTRO, 1977 [1979]).

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12COSTA, Lidiana Justo da. A organização da Guarda Nacional na província da Paraíba (1831-1850): instituição da ordem e das “mercês” políticas. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 05-13, maio 2013.

não foram passivos e alheios ao que acontecia, sendo uma prática comum entre eles protestos e insubordinações aos superiores.

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Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

A AÇÃO CATÓLICA: A RESISTÊNCIA PIEMONTESA AO FASCISMO (1933-1944)Francisco Fagundes de Paiva Neto1

Resumo: Analisamos neste artigo a participação da Ação Católica na região piemontesa italiana durante a resistência ao fascismo a partir da colaboração dos grupos políticos de caráter socia-lista e liberal, sobretudo entre 1944 e 1945. Nesse processo político, visualizamos a Ação Católica como um setor da Igreja Católica, que em âmbito local colaborou para o esgarçamento das bases políticas do regime fascista. A contribuição da micro-história, quanto ao uso das escalas, nos per-mitiu perscrutar as fontes disponíveis. Utilizamos fontes bibliográficas, dentre as quais o diário de D. Luigi Grassi (bispo da Diocese de Alba), que nos revelaram a relação do catolicismo com a resistência política ao fascismo.

Palavras-chave: Ação Católica. Antifascismo. Segunda Guerra Mundial.

Abstract: This article aims to analyze the engagement of Catholic Action in the Italian region of Piedmont during resistance against fascism through collaboration of socialist and liberal political groups, especially during 1944 and 1945. In this political process we see the Catholic Action as a sector of the Catholic Church, which collaborated locally for mining the fascist regime political bases. As far as method of scales we used the contribution of the micro historic approach which allowed us to scrutinize the available sources. We used auto-bibliographical sources as well, such as D. Luigi Grassi’s journal (the archbishop of Alba Diocese), which showed us the relation betwe-en Catholicism and political resistance against fascism.

Keywords: Catholic Action. Antifascism. Second World War.

1 Doutor em Ciências Sociais/UFCG. Professor do Departamento de História/UEPB. Este artigo é parte das reflexões apontadas na nossa tese de doutorado. E-mail: [email protected].

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A Segunda Guerra Mundial foi combatida em duas grandes frentes: as convencionais (exér-citos), responsáveis pela beligerância entre os Estados nacionais; e as irregulares (guerrilhas), res-ponsáveis pelo alastramento nos diversos países europeus, através dos movimentos da chamada Resistência2. A combinação dessas duas experiências de guerra, com as suas metodologias de combates regulares (entre exércitos), ganhou um novo componente com a participação das tro-pas irregulares a partir do momento em que civis foram às armas. O aparecimento dos grupos da Resistência assumiu contornos mais definidos quando a Alemanha invadiu a União das Repúbli-cas Socialistas Soviéticas (URSS). No mês de agosto de 1939, a Alemanha e a URSS assinaram um acordo de não agressão, tendo para Hitler o caráter de estratagema pela neutralização de uma aliança dos russos com a França e a Inglaterra. A partir de 1939, os nazistas invadiram a Polônia, e no primeiro semestre de 1940 marcharam sobre a Noruega, a Dinamarca, a Holanda e a Bélgica. O primeiro semestre de 1941 demonstrou o êxito dos países do Eixo (Alemanha, Itália e Japão), pois a Europa estava quase toda dominada e apenas a Inglaterra resistia aos ataques aéreos alemães e da marinha italiana no Mediterrâneo.

A quebra do tratado de não agressão, firmado entre Hitler e Stalin com a invasão alemã ao território soviético (1941), representou uma nova fase na guerra, pois ganhou um componente político e militar inesperado (HOBSBAWM, 1995, p. 165). Surgiu, em âmbito internacional, uma curiosa aliança entre o capitalismo dos Estados Unidos e o comunismo da URSS, que nos campos de guerra semeou coalizões de resistência, de um lado a outro, balizadas pelo aspecto de comba-ter as forças da Alemanha, da Itália e do Japão, principalmente.

Contudo, a invasão alemã na URSS fez despertar a resistência interna por grupamentos de civis, denominados genericamente de partisans (partidários), cujas filiações eram as mais diversas. Cotidianamente ocorriam ataques surpresas por grupamentos, roubos de material bélico, destrui-ções de equipamentos ou infiltrações para se obterem informações importantes para as tropas aliadas. Em meio ao conflito, a população civil também enfrentava a passagem de desertores (que lhe solicitava víveres) ou as violências sexuais cometidas pelas tropas, enquanto no Sul da Itália o caos era incrementado pelas ações de clãs mafiosos, munidos de armamentos roubados, como carros de combate e armas automáticas leves (LEWIS, 2003). Avaliando a atividade da Resistência italiana, Hobsbawm (1995, p. 165-166) considerou que:

Enquanto os italianos podiam deixar a memória de Mussolini para trás com a consciência limpa, os alemães, que tinham apoiado o seu governo até o fim, não podiam colocar distância entre eles próprios e a era nazista de 1939-45 [...]. O mesmo não se deve esquecer, fizeram os elementos profunda e intransigentemente anticomunistas na Igreja Católica e seus exércitos de religiosos convencionais, embora a política da Igreja fosse demasiado complexa para ser classificada [...] como “colaboracionista” em qualquer parte.

2 As Resistências foram constituídas por grupos civis e militares de várias tendências políticas, cujo esforço se orientou pelo combate ao nazifascismo. Tal experiência política esteve presente em diversos Estados europeus por meio dos “machis”, na França, e dos demais partisans (Itália, Iugoslávia, Bulgária e Grécia), que contaram com a participação de católicos, anarquistas, liberais e socialistas, embora fossem predominantemente comunistas. Ver: HOBSBAWM (1995, p. 144-177) e BOUTZOUVI (1994).

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Essas considerações aguçam a nossa percepção sobre a existência de brechas na sociedade italiana, que, mesmo sob as coações do regime fascista, pôde dar uma demonstração de resistên-cia política a partir de grupos de civis em armas. Com frequência ocorreram associações entre os Aliados e os partigiani, graças ao apoio de militares com o auxílio de homens ou equipamentos. A base fascista não conseguiu conter o gotejamento das organizações clandestinas constituídas por militantes das variadas tendências políticas.

No caso da área do Piemonte, visualizamos tensões entre a hierarquia da Igreja e os mem-bros do Estado fascista, tendo em conta que nessa região da Itália a oposição ao regime ganhou uma forte expressão devido à presença de um bispo abertamente antifascista, cuja oposição foi manifestada desde a época em que foi padre. No curso da Segunda Guerra Mundial, a postura predominante entre os bispos era a de tentar acomodar a situação de oposição ao nazifascismo como forma de manter a unidade entre o rebanho católico ou de não comprometer a reinserção da Igreja, no caso dos Estados italiano e francês (MICHEL, 1977, p. 81; COUTROT, 2003, p. 342).

Avaliando o contexto da relação Estado/Igreja na Itália, a partir das escalas, percebemos como a micro-história nos sugere uma diversidade de matizes (GRENDI, 1998; REVEL,1988). Dessa forma, a Ação Católica, entre 1929 e 1942, enfrentou alguns conflitos com o Estado, a exemplo da educação dos jovens (1929), embora tenha instado os seus membros pelo jornal “Civilização Católica” a apoiar os fascistas contra os liberais; ou no caso extremo, entre 1941 e 1942, em que os membros da AC foram convocados às forças armadas, mas o próprio Papa Pio XII contornou a disputa e, em 1939, demonstrou a aprovação eclesiástica a Mussolini (SMITH, 2000, p. 513-555).

A relação da Igreja no âmbito nacional manteve algumas tergiversações com o regime fas-cista, ao passo que no Piemonte o bispo de Alba, D. Maria Grassi, assumiu uma postura antagô-nica ao regime. A participação dos católicos na Resistência foi acentuada na Província de Cuneo, no Piemonte, desde o ano de 1933, através das orientações dadas pelo então monsenhor Luigi Maria Grassi à AC em contraste explícito com o fascismo. A tônica da AC era um projeto político com “o primado religioso, moral e civil entre os povos”, demarcando um espaço próprio entre os governos de inspiração liberal, nazifascista ou comunista. Depois, em 1937, D. Grassi criticou abertamente o fascismo, na Gazzetta d’Alba, afirmando “se tratar de uma minoria não querida pelo sufrágio universal e não confortável ao aspecto eclesiástico ou em outros termos: uma ditadura reacionária de massa”. (GRASSI, 1994, p. 23).

Um dos primeiros grupos sociais católicos a sofrer as pressões políticas pré-fascistas foram os campônios do Piemonte, devido ao surgimento do Partido dos Camponeses (após o fim da IGM), que assumiu contornos de sustentação do fascismo em gestação. Nessa fase, o movimen-to camponês foi contido enquanto era restaurado o monopólio do poder nas mãos dos grupos oligárquicos rurais (MOLA, 1994, p. 26). Para os membros da AC, os camponeses foram um grupo importante na oposição aos fascistas a partir de 1944, considerando as condições políticas de opressão e a forte presença do catolicismo nas áreas rurais.

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No campo político, os fascistas adquiriram um inimigo de grande envergadura: os seguido-res das orientações da AC no Piemonte. Entre os anos de 1936 e 1937, o levantamento do mon-senhor Grassi apontava para uma presença sólida da AC em 97 paróquias do Piemonte, contando com pelo menos 17% dos habitantes da Diocese com uma posição política antifascista. Porém, esse número tendeu a crescer nos anos posteriores.

A Igreja na Itália estava dividida diante do fascismo. A hierarquia clerical dava sinais de fissu-ras, sendo seguida pelos leigos. No caso de Alba, os religiosos faziam uma oposição por meio do trabalho nas paróquias. No bispado de D. Grassi em Alba3 ocorreu uma franca oposição ao regime fascista, que resultou em várias mortes, como a do padre Demetrio Castelli4, que foi fuzilado na área do Piemonte, e do padre Girotti, morto no campo de concentração de Auschwitz (Polônia). Além disso, outros religiosos passaram por cárceres ou foram ameaçados pelos militares. Assim, percebemos um franco conflito entre o regime e vários membros da Diocese de Alba, colaboran-do para o apoio dos católicos aos grupos armados.

A AC (no Piemonte) e os grupos partisans eram unânimes quanto à necessidade da derroca-da fascista. A força guerrilheira mais expressiva na área esteve sob o comando de Enrico Martini, “Mauri”, ex-oficial do Estado Maior do Exército Italiano até 1943, durante a experiência imperialista na África. A partir de então, refugiou-se no Piemonte e organizou forças de resistência em Cuneo (área montanhosa nos Alpes), Langhe e Monferrato (ambas consideradas como áreas de colinas) por meio das Formações Autônomas, cuja orientação ideológica era a distância dos diversos par-tidos, restringindo as atividades às missões militares contra os nazifascistas.

No mês de julho de 1944, a guerra civil tomou um corpo mais robusto no Piemonte. O então bispo de Alba, D. Grassi, politicamente monárquico, deparou-se com uma realidade de guerra marcada pela presença de três grupos: os aliados, o Reino do Sul e os partigiani; as tropas alemãs e os partidários de Mussolini; e, por fim, os seguidores do dissidente fascista Pietro Badoglio, que se associou aos Aliados. Em 1944, os conflitos se tornaram mais agudos devido à reação dos nazifas-cistas ao avanço das tropas aliadas, que desde o mês de junho haviam ocupado Roma, rumando para o Norte e Nordeste do país.

As estratégias de Mauri, somadas às qualidades militares das formações partigiani sob o seu comando, revelaram-se na criação de uma zona composta por 400 comunas livres dos nazifas-cistas (1944) entre Langhe e Monferrato, tendo como capital livre para uma junta de governo a cidade de Alba, sob a proximidade do comando Aliado e do bispo de Alba.

No mês de setembro de 1945, os membros da Divisão Giustizia e Libertà (GL) avançaram cerca de 80 quilômetros em território nazifascista. A Criação do Corpo dos Voluntários da Liberda-3 Em março de 1933, Pio XI nomeou-o bispo de Alba. Assumiu a diocese em 11 de junho de 1933.4 O padre Demetrio foi fuzilado no Castelo de Polenzzo (25/08/1944), com mais dois homens, pelos nazistas, sob a acusação de colaborar para uma emboscada partisan contra os alemães. O próprio bispo de Alba, Dom Grassi, esteve profundamente envolvido com os jovens participantes da Resistência, demonstrando que não é fácil atribuir uma análise generalista sobre a hierarquia da Igreja, em relação à política, por conta das identidades dos membros do clero ou pelas demandas dos fiéis.

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de (CVL) não indicou em nenhum momento uma unanimidade entre os partigiani, pois cada um marchava conforme a sua bandeira (MOLA, 1994, p. 13-14). E assim, até a derrota plena dos fas-cistas, os combates foram intensos, com muitas mortes, aprisionamentos e troca de prisioneiros entre os beligerantes, algumas vezes intermediadas por D. Grassi.

O caráter mais acentuado do envolvimento da Diocese de Alba no confronto com o regime fascista ganhou evidência por meio da aproximação de D. Grassi com os militantes dos grupos da Resistência. A aproximação teve um aspecto politicamente esdrúxulo, porque D. Grassi era mo-narquista, enquanto a juventude partisan sofria influência especialmente de grupos socialistas e da AC, “que foi a matriz orgânica de tantas partes dos quadros e da base dos grupos partisãos.” (MOLA, 1994, p. 30). Em meio à guerra civil em Cuneo, ficou claro para os nazifascistas que havia uma forte ligação entre os guerrilheiros e o bispo de Alba, pois D. Grassi facilmente obtinha tro-cas e libertações de prisioneiros ao ponto de ser denunciado como o “bispo partigiano”. Embora o bispo agisse de acordo com os princípios cristãos, sua predileção política pelos guerrilheiros ficou registrada pela sua própria pena quando afirmou “que não poderia me desinteressar pelos partigiani, quando a minha diocese era partisan em pelo menos 90 entre 100”; e também quando constatou que entre os fascistas era raro ver um dos seus diocesanos enquanto tinha “quase todos os seus filhos mais jovens nos bosques, entre rochas a servir a pátria em uma vida selvagem, do trágico verdadeiramente cotidiano”. Por fim, ele se pergunta sobre os partigiani: “Como desinte-ressar-me (como pretendiam os fascistas), considerar-lhes delinquentes, ajudar quem os queria todos mortos?” (GRASSI, 1994, p. 77).

Diante das hostilidades aos nazifascistas na região do Piemonte, tornou-se problemática a condição do bispo de Alba, pois a prisão ou a morte poderia suscitar um processo ainda mais acentuado de comprometimento de setores católicos com a Resistência. Dessa forma, a estraté-gia dos nazifascistas foi a de fuzilar ou deportar alguns padres que cumpriam as orientações de D. Grassi, como forma de enfraquecer as bases da Resistência entre o baixo clero católico, que capilarizava as ordens do bispo, e de estabelecer a dissuasão entre os fiéis pelo recurso da vio-lência. Dessa forma, o bispo ficou em uma situação complexa, pois precisou realizar uma série de atividades que antes poderiam ser delegadas aos seus subordinados, a exemplo das negociações pela troca e soltura de prisioneiros ou o contato com os nazifascistas ou com os partisans para a resolução de questões variadas.

A participação dos partigiani demonstra uma variedade de tendências políticas laicas e re-ligiosas (católica) no enfrentamento aos grupos nazifascistas. Apesar dos vínculos entre o Estado italiano e o Vaticano, ocorreram posicionamentos contrários às relações com a política tutela-da pelos nazifascistas. Os debates e as práticas de dissidência dentro da Igreja tiveram um as-pecto próprio com relação à permanência dos vínculos de bispos e padres bem como de leigos com a instituição.

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Por sua vez, a experiência da luta dos católicos entre os partigiani demonstrou a sua im-portância na formação de uma área liberada da influência nazifascista. Porém, reafirmamos a percepção de que muitos componentes das forças nazifascistas eram também católicos, alguns convictos e outros submetidos aos rigores do serviço militar, não excluindo a prática de Resistên-cia pela deserção, por sabotagens materiais ou ainda pelo trânsito de informações privilegiadas, importantes para o conhecimento das estratégias e objetivos visados pelos inimigos.

Os membros da Resistência (anteriormente camponeses, operários, professores, religiosos, entre outros) traziam as demandas das vítimas do nazifascismo pelo exercício de pacificar, por meio da sua doação aos combates contra exércitos bem treinados (o italiano e o alemão), regiões até então sob o domínio fascista.

Outro aspecto referente à população de Alba e à sua cultura política voltou-se para a pre-sença de alguns trabalhadores socialistas que frequentavam missas. Essa questão desponta como um aspecto interessante sobre a religiosidade entre os militantes ou adeptos da esquerda asso-ciados ao catolicismo. Esse fator colaborou igualmente para o recrutamento da Resistência. Em alguns estudos realizados por Hobsbawm (2000, p. 60) foi possível constatar que a secularização e as posturas antirreligiosas ou de indiferença religiosa eram mais comuns entre os operários das metrópoles, enquanto nas pequenas cidades os trabalhadores cultivavam uma prática religiosa mais participativa entre fins do século XIX e primeiras décadas do século XX. Essa questão pode ser explicada pela permanência de aspectos comunitários associados às práticas religiosas.

No caso de Canale, as estruturas de autoridade e da comunidade não haviam sido rompidas, destruídas ou transformadas pelo capitalismo moderno, cuja tendência é substituir a sociedade pela comunidade e de fazer a religião perder o monopólio de formar e comunicar ideias entre a população5. Logo, percebe-se como em uma determinada região podemos constatar as varia-ções do fenômeno político a partir de algumas memórias transmitidas por meio de gerações, que formaram alicerces de uma cultura política6 socialista em conflito com o liberalismo da fase pré-fascista pelos direitos dos trabalhadores. Posteriormente, as questões em pauta se demar-caram por processos organizativos, envolvendo desde questões partidárias até sindicais e anti-fascistas. Assim, a vida em Alba se constituiu como nexo entre a experiência política de famílias camponesas e uma conjunção do catolicismo com a esquerda. Percebemos pelas narrativas que os assuntos referentes às relações entre socialismo, monarquia e catolicismo faziam parte de uma experiência específica de classe. Durante a formação da classe operária inglesa no século XIX, ocorreu a divisão dos operários em uma diversidade de denominações cristãs. O Metodismo, por exemplo, assemelhou-se bastante com a Igreja Católica na Itália, especificamente em relação às questões de ser praticado por patrões e trabalhadores, enquanto se enfrentavam politicamente (THOMPSON, 1987).

5 Segundo Hobsbawm (2000, p. 60), mesmo pessoas devotas, supersticiosas ou ortodoxas votavam na esquerda “ateia”. Cerca de 40% das pessoas na Sicília e Sardenha, nos polarizados anos 1950, não viam incompatibilidade entre o catolicismo e o comunismo.6 Cultura política refere-se às ações e representações relacionadas ao fazer político. Ver: MOTTA (2009).

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No caso italiano, a presença do papado garantiu a formação de práticas políticas relacio-nadas ao catolicismo por meio de um vasto leque: monarquistas e republicanos, sendo estes di-vididos em sociais-democratas, socialistas, liberais e democratas-cristãos. Podemos imaginar a dimensão dessas disputas grupais tendo em conta a ocorrência da própria guerra na Itália.

Apesar das relações políticas do Papa com o regime fascista, o Nordeste italiano destacou--se por um movimento de resistência ao regime. Esse fato implicou inclusive a participação ativa do bispo da Diocese de Alba, região do Piemonte, com os guerrilheiros antifascistas. As manobras políticas da burguesia do norte italiano não tardaram a limitar o poder político da monarquia e, posteriormente a sua abolição, na década de 1940, após a queda fascista (MOLA, 1994, p. 14).

Findo o conflito, a sociedade italiana precisou passar pelo desafio da reconstrução, enquan-to alguns efeitos da guerra se apresentavam irreversíveis. Inegavelmente o conflito colaborou para a debilidade física de D. Grassi, cuja oposição ao fascismo surgiu ainda antes da guerra e perdurou até o fim do conflito. Por fim, em 5 de abril de 1948, D. Grassi feneceu, sendo sepultado três dias

depois, fato que causou uma enorme comoção na Diocese de Alba.

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Histórica - A Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 57, fev. 2013

CAMINHOS E DESCAMINHOS DA REVISTA SEIVA (1938-1943) Daniela de Jesus Ferreira1

Resumo: A sobrevivência do Comitê Regional do Partido Comunista da Bahia, após a forte repres-são do Estado brasileiro em 1935, contribuiu para que alguns comunistas baianos enveredassem pelo caminho das letras através da articulação e produção de uma revista. Esta foi denominada Seiva, e tornou-se o primeiro periódico antifascista a circular no cenário do Estado Novo. Para driblar a censura que proibia e vistoriava toda e qualquer ação de oposição ao governo, a revista teve, a princípio, característica literária. Foram produzidas 18 edições ao longo da sua “primeira fase”, que perdurou de 1938 a 1943, quando foi proibida de circular pelo governo Getúlio Vargas.

Palavras-chave: Imprensa. Intelectuais. Censura.

Abstract: The survival of the Regional Committee of the Communist Party of Bahia after the strong repression of the Brazilian state in 1935 contributed to some communist of the state fol-lowed by the path of letters through the articulation and production of a magazine. The magazine was called Seiva, and became the first newspaper circulating in the anti-fascist Estado Novo sce-nario. To circumvent the censorship which prohibited and investigated any and all opposition to the government, the Journal had the characteristic literary principle. Produced 18 editions along its “first phase”, which lasted from 1938 to 1943, when was prohibited by government of Getulio Vargas.

Keywords: Press. Intellectuals. Censorship.

1 Mestre em História, na área de concentração História, Cultura e Poder, pela Universidade Estadual de Feira de Santana-BA (2012). Atualmente, atua na rede Estadual de Ensino do Estado da Bahia. E-mail: [email protected].

22FERREIRA, Daniela de Jesus. Caminhos e descaminhos da revista Seiva. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 22-29, maio 2013.

Histórica - A Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 56, nov. 2012 Histórica - A Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 56, nov. 2012

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Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

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23FERREIRA, Daniela de Jesus. Caminhos e descaminhos da revista Seiva. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 22-29, maio 2013.

A Revolução Russa de 1917, e seus efeitos ao longo dos anos, foi um dos fatores que moti-varam um maior interesse dos brasileiros pelo comunismo e por estudos associados à dinâmica da sociedade brasileira em grande efervescência. Na década de 1930, houve o apogeu tanto das lutas sociais quanto da produção de materiais teóricos e de propaganda pelos comunistas.

Nesse processo, os baianos estiveram envolvidos em ações individuais e coletivas, atuando tanto no âmbito regional quanto nacional. Por isso, é relevante conhecer os comunistas baianos por meio de suas produções, pelas reflexões que fizeram do seu tempo e que ficaram guardadas em materiais impressos, como as revistas. Assim, o estudo da revista, enquanto mecanismo de produção cultural, aglutinadora de intelectuais, facilitadora da circulação das ideias políticas, tor-na-se uma importante fonte para o conhecimento dos homens, de suas trajetórias e dos grupos sociais. Principalmente por acreditar que uma história preocupada com as ideias não pode perder de vista sua interlocução com a trajetória dos homens e das mulheres, as relações sociais devem ser levadas em consideração. Essa história deve ainda se preocupar com a intertextualidade, com as diversas leituras realizadas do texto relacionadas ao contexto do sujeito que a produziu. Em síntese, deve preocupar-se com a recepção do material exposto, divulgado e propagado.

A concepção formulada pelo italiano Antonio Gramsci torna-se relevante nos nossos es-tudos sobre os intelectuais, já que podemos entender os articulistas da Seiva como tais. Grams-ci concebe todos os homens como intelectuais, conquanto com características de classe. Isto é, não existe a possibilidade de qualquer atividade humana sem atividade intelectual. Para Gramsci, todo ser humano “desenvolve uma atividade intelectual qualquer, ou seja, é um filósofo, um artis-ta, um homem de gosto, participa de uma concepção de mundo, possui uma linha consciente de conduta moral.” (GRAMSCI, 1982, p. 7).

Essa forma de perceber o intelectual auxilia na análise dos integrantes do Partido Comunista do Brasil (PCB) e de suas ideias, já que o debate de ideias foi fundamental para o desenvolvimento do PCB, o qual desde sua formação teve dificuldades em afirmar-se ideologicamente, fosse por sua “herança anarquista”, fosse pelo seu “envolvimento com o marxismo”. O relacionamento com a teoria foi motivação para vários estudos e muitas polêmicas entre os integrantes do Partido e aqueles que se preocuparam em conhecê-lo, estudá-lo, reconhecer e compreender seus influxos teóricos que moldaram as formas de pensar e agir dos comunistas.

Essas ideias que os comunistas brasileiros produziram não estavam isoladas ou surgiram do nada; elas eram adequadas a uma época, à sua temporalidade. Dessa forma, os textos que chega-vam às suas mãos, até os que eles mesmos produziam, não estavam isentos de intenções e mo-tivações. A divulgação e a leitura fizeram com que os materiais produzidos por sujeitos como os alemães Karl Marx e F. Engels, os russos V. Lênin, e L. Trotsky pudessem atrair muitas mentes, com suas publicações e o conhecimento de suas ações, formando milhares de seguidores. Um dos ar-ticulistas da revista baiana Seiva, João Falcão, comentou como a leitura de V. Lênin foi importante para sua formação e proposição da revista ao informar que

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

24FERREIRA, Daniela de Jesus. Caminhos e descaminhos da revista Seiva. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 22-29, maio 2013.

Concorreu bastante para essa ideia a leitura sobre a vida e a ação de Lênin na Rússia. Sob a mais difícil clandestinidade e perseguição do regime czarista, ele jamais deixou de debater e levantar os problemas teóricos da revolução Russa, mesmo no exílio, valendo-se para isso, de revistas e jornais clandestinos. O exemplo do Classe Operária, jornal ilegal do PCB que circulava a 13 anos, enfrentando todos os percalços, estimulava o projeto fascinante. (FALCÃO, 2008, p. 7).

Por isso, ao tratar dessa problemática Chartier faz um alerta para que não caiamos no erro de separar as ideias das vivências:

Por isolar as ideias ou os sistemas de pensamento das condições que autorizavam sua produção, por separá-las radicalmente das formas da vida social, esta história desencarnada instituiu um universo de abstrações onde o pensamento parece não ter limites já que não tem dependências. (CHARTIER, 2002, p. 28).

A repercussão das ideias sempre foi fundamental para a sua manutenção e reprodução. Elas só passam a ser instigantes a partir do momento em que se espalham e se proliferam; sozi-nhas elas não se “reproduzem”. As palavras voam e pousam, pedem passagem, propagando ideias concretas e abstratas com difícil imparcialidade, mesmo que nem todos confirmem objetividade. Seria inocência acreditar que as ideias são neutras, e que não oferecem diversos mecanismos de apropriação dependendo da forma que são divulgadas. Elas estimulam atitudes e anseios, des-pertam mentes adormecidas.

A sobrevivência do Comitê Regional do Partido Comunista na Bahia após a forte repressão do Estado no governo Getúlio Vargas, em 1935, contribuiu para que alguns comunistas baianos enveredassem pelo caminho das letras através da articulação e produção de uma revista ainda pouco estudada, mas que foi de grande relevância para a afirmação dos comunistas baianos e como meio de divulgação de uma literatura considerada “subversiva”.

Nesse contexto estão inseridos os comunistas, que investiram na criação de uma revista em pleno período da ditadura do Estado Novo (1937), de repressão e censura às ideias e textos comu-nistas. Homens e mulheres refletiram sobre a necessidade de uma melhor atuação, posicionando--se em meio às truculências do período, tomando todas as precauções e despistando, obviamen-te, os censores. Essa preocupação era justificada, pois, desde 1923, o Departamento Estadual de Ordem Política e Social (DEOPS), criado pelo governo brasileiro, “impunha seu poder” aos agentes considerados subversivos: “ao penetrarmos neste universo, nos deparamos com os limites impos-tos pelos homens da República preocupados com a circulação de ideias ditas ‘revolucionárias’”. (CARNEIRO, 1997, p. 15). Dezenas de escritoras e escritores, operárias e operários e intelectuais foram perseguidos por suas ideias nesse período.

Na Bahia, a censura se manifestava em espetáculos públicos. Em 1937, uma fogueira que lembrava a Inquisição foi acesa durante o governo do interino Antônio Fernandes Dantas. Foram

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25FERREIRA, Daniela de Jesus. Caminhos e descaminhos da revista Seiva. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 22-29, maio 2013.

queimados vários livros dos escritores Jorge Amado e José Lins do Rêgo em Salvador, nas proxi-midades da Escola de Aprendizes Marinheiros:

[...] os livros apreendidos e julgados como simpatizantes do credo comunista, a saber: oitocentos e oito exemplares de Capitães de Areia, duzentos e vinte e três exemplares de Mar Morto, oitenta e nove exemplares de Cacau, noventa e três exemplares de Suor, duzentos e setenta exemplares de Jubiabá, duzentos e catorze exemplares de País do Carnaval, quinze exemplares de Doidinho, vinte e seis exemplares de Pureza, treze exemplares de Banguê, quatro exemplares de Moleque Ricardo, quatorze exemplares de Menino de Engenho, vinte e três exemplares de Educação para a Democracia, seis exemplares de Ídolos Tombados, Ideias, Homens e Fatos, vinte e cinco exemplares de Dr. Geraldo, quatro exemplares do Nacional Socialismo Germano, um exemplar de Miséria através da Policia. (JORNAL ESTADO DA BAHIA, 1937, p. 3).

Surge a revista Seiva: um mensário de luta

A criação da revista Seiva foi motivada por João Falcão, natural de Feira de Santana-BA e precursor da ideia, depois levada para os demais integrantes do grupo na Bahia. Dentre eles, os comunistas Rui Facó (cearense), os estudantes de Direito, Armênio Guedes (baiano) e Diógenes Arruda Câmara (pernambucano). O projeto foi aprovado e colocado em prática e houve todo um empenho e estratégia para sua realização. Os comunistas, durante as efervescências da década de 1930, não poderiam ficar omissos, pois essa seria uma boa oportunidade para intervirem de alguma forma e sem muitas suspeitas em meio à situação caótica do cenário brasileiro. Por isso, o efeito criado pela possibilidade e efetividade real da revista revigorou ânimos e motivou paixões. A discussão dentro do Comitê Regional baiano foi produtiva em torno do desenvolvimento e en-foque da revista; foi um projeto coletivo, nascido do seio de uma juventude ávida por mudanças sociais e que atuava em células comunistas existentes no Estado. A célula da Faculdade de Ciên-cias Jurídicas e Sociais da Bahia foi o centro irradiador do periódico.

O nome da revista foi sugerido por Armênio Guedes. A Seiva tornou-se a primeira revista antifascista a circular no cenário do Estado Novo em 1938. Para driblar a censura que proibia e vis-toriava toda e qualquer ação tida como contrária às posições do governo, o periódico teve, a prin-cípio, aspectos literários. Foi escrito por articulistas comunistas e não comunistas, o que favoreceu a sua circulação e condição para sua existência, e que prevaleceu até o fim. Segundo João Falcão,

A primeira edição da Seiva esgotou-se, tendo alcançado grande repercussão nos meios intelectuais e literários de Salvador e maior ainda nos círculos oficiais. O chefe da censura local, que aprovara toda a matéria a ele submetida previamente, depois de vê-la impressa em letra de forma levou um susto. A revista apresentava-se forte e livre demais para o gosto do regime. Mas, como os escritores baianos que nela figuravam eram bastante conhecidos, o Dr. Enéas Torreão Costa, censor

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

26FERREIRA, Daniela de Jesus. Caminhos e descaminhos da revista Seiva. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 22-29, maio 2013.

do DIP, nos aconselhou, recomendando que tivéssemos mais cuidado no próximo número, para não criar problemas para ele e, pior, para nós. (FALCÃO, 2000, p. 47).

Ao longo das 18 edições, seus articuladores utilizaram textos e reproduções de autores como Michael Golde, Upton Sinclair e Máximo Gorki, já que os russos eram apreciados principal-mente por conta da luta dos bolcheviques. Autores como Victor Hugo, Pablo Neruda, Castro Alves, Lima Barreto, Euclides da Cunha tiveram seu espaço garantido na revista. Comunistas baianos como Jacob Gorender, João Falcão e Jorge Amado apropriaram-se da imagem e dos poemas de Castro Alves para entender o Brasil e para ganhar fôlego nas lutas.

O mensário2 contou com a colaboração de escritores dos seguintes estados: Sergipe, Per-nambuco, Alagoas, São Paulo, Rio de Janeiro, Ceará, Paraná, Paraíba, Pará e Rio Grande do Norte, mas a predominância era de escritores baianos. Muitos dos textos de autores estrangeiros eram reproduções. Em suma, os artigos provinham de escritores, militantes comunistas e jornalistas que se interessavam em publicar ou eram convidados a redigir para a Seiva. Vários artigos foram escritos diretamente para o periódico, alguns textos não foram assinados, outros foram escritos e assinados por pseudônimos; além disso, contou com artigos escritos diretamente para Seiva, por latino-americanos, em uma espécie de intercâmbio cultural.

A revista reverberou, mesmo que não abertamente, o sentido de luta, a defesa do naciona-lismo e o combate ao imperialismo. Convocou os intelectuais para cumprirem o papel de liberta-dores da América. O primeiro número lançado em 1938 chamava a atenção para isso, com a “Men-sagem aos intelectuais da América”. A unidade americana e o coletivismo do seu povo libertariam o continente de todos os seus males. Um excerto do editorial:

Quando do outro lado do Atlântico o ódio e a discórdia cavam barreiras profundas entre os povos, Seiva surge com o propósito de unir a inteligência de toda a America em um largo abraço de amizade e compreensão. A mesma disposição de defender a dignidade do pensamento e a civilização contra a onda avassaladora do barbarismo solidariza todos os intelectuais honestos do universo, especialmente os da América, reduto invencível da paz, mas que se levantará como um só homem contra o que ouse desrespeitar o solo de qualquer das suas livres nações. Para essa tarefa de tornar cada vez mais real a cordialidade entre os povos e resguardar o pensamento humanos que conta eles se vão preparando, numa proporção assustadora, urge a união de todos os homens da America, para onde se volve a cobiça dos imperialistas expansionistas, união que deve ser começada pelos seus intelectuais, defensores natos da cultura e do progresso da humanidade. SEIVA tem, portanto, as suas colunas abertas a todos os escritores da América que simpatizem com essa orientação e queiram contribuir com a sua inteligência e a sua boa vontade para a aproximação de todas as nações americanas, pelo trabalho sincero e desinteressado de seus homens de pensamento. É animada desse espírito que SEIVA dirige sua mensagem de simpatia, de admiração e de fraternidade a todos os escritores da America, até onde possa chegar, mensagem que é um reflexo de

2 A revista deveria circular mensalmente, mas as intempéries políticas e financeiras dificultavam a divulgação mensal da Seiva.

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

27FERREIRA, Daniela de Jesus. Caminhos e descaminhos da revista Seiva. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 22-29, maio 2013.

simpatia, da admiração e da fraternidade com que olha e deseja sempre olhar os povos a que eles pertencem. (REVISTA SEIVA, 1938, p. 18).

Através da diversidade dos seus textos, a revista Seiva discutiu o negro na Bahia e no Brasil, o preconceito racial, o materialismo dialético, a situação operária, a situação feminina, a cultura e os conflitos internacionais de seu tempo. Na Seiva, várias revistas foram divulgadas, tanto estran-geiras quanto nacionais. Alguns desses periódicos eram influenciados por comunistas. Dentre as anunciadas na Seiva, estavam as revistas

Democráticas e antifascistas que circulavam no país como Problemas, dirigida por Arnaldo Pedroso d`Horta e Arnaldo Serroni, de São Paulo; Diretrizes, dirigida por Samuel Wainer e por sua mulher Bluma Wainer; e a Revista Acadêmica, por Murilo Miranda e Moacyr Werneck de Castro, Rodrigues de Miranda e Alfio Ponzi, de Pernambuco; Cultura, dirigida por Afonso Schmidt, de São Paulo; Esfera, por Maria Jacintha Silva de León Chalreo, Aureo Ottoni e Frederico R. Coutinho; Alagoas, por Afrânio Melo; e Dom Casmurro, Hebdomadário pelo que eram responsáveis Brício de Abreu, Marques Rabêlo, Joel Silveira e Danilo Basto, do Rio de Janeiro. (FALCÃO, 2008, p. 14).

Em meio às conturbações políticas e sociais, a juventude era um dos alvos da Seiva. Inves-tiram nela, conclamaram uma participação mais ativa. Publicavam sempre textos provocativos, instigando a juventude a intervir na realidade. Segundo as fontes, a juventude baiana era dinâ-mica, atuando nas escolas ou nas faculdades. “No período da luta antifascista foi um instrumento pujante. Considerada o futuro da nação. A juventude é, antes de tudo, uma força de paz. Esta é a conclusão que se pode retirar da observação cuidadosa de toda a sua luta no mundo [...]”. (REVIS-TA SEIVA, 1940, p. 11).

Em seus aspectos gerais, a revista significou um importante instrumento na estrutura do movimento comunista baiano. Promoveu e demonstrou certo grau de organização desse grupo ao realizar um empreendimento tão perigoso. Planejaram e colocaram em prática a revista Seiva, a qual ultrapassou as fronteiras do território nacional, sendo conhecida em outros países da Amé-rica Latina. Houve todo um investimento para que o periódico não só existisse, mas se consolidas-se, mesmo com as dificuldades e obstáculos políticos da repressão do governo Vargas.

Às vezes os números demoravam meses para sair, mas eram publicados. As prisões e a falta de dinheiro foram fatores que atrasavam a saída dos exemplares. A escolha dos textos, as matérias redacionais, os artigos literários, a tipografia, tudo isso demandava tempo e dinheiro que os comunistas nem sempre possuíam. Sem contar que deveriam ainda se preocupar com a censura. O conteúdo da revista não sofreu perceptíveis modificações por conta desse evento. A desigualdade social continuou “cantada” na Seiva, como no poema “Agonia do Artista”, de Manoel Caetano Filho:

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

28FERREIRA, Daniela de Jesus. Caminhos e descaminhos da revista Seiva. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 22-29, maio 2013.

Quis matar a fome de uma criança, mas milhares de crianças abriram para mim as suas bocas pequeninas/ Quis enxugar as lagrimas de uma mulher, mas milhares de mulheres estavam chorando/ Quis erguer um homem que tombara vencido e milhares de homens encontrei mergulhados no pântano da vida/ Quis aos opressores que deixassem de esmagar as multidões, gritei que estava crescendo, crescendo, cada vez mais, a força das massas represadas/ Cantei bem alto para todos os seres da terra, a desoladora tristeza das almas esmagadas e as maravilhosas belezas da humana redenção. Mas estava morto no peito o coração dos homens! (REVISTA SEIVA, 1941, p. 26).

Com todas as dificuldades, a revista resistiu e publicou 18 edições em sua primeira fase, de 1938 a 1943. As letras, o entretenimento, os debates suscitados foram selados apenas parcialmen-te. Em julho de 1943, ela foi censurada pelo Estado Novo. Teve como motivação principal para o empastelamento a entrevista realizada pelo comunista baiano Jacob Gorender com o general Ma-noel Rabelo, crítico das ações praticadas pelo governo Vargas em relação à atuação brasileira na Segunda Guerra Mundial. O general culpava Vargas de isenção e despreocupação com a Guerra, convocando os soldados para tarefas inúteis. O posicionamento da Seiva comungava com o pen-samento do general. O Brasil tinha que atuar na Segunda Guerra Mundial, e não apenas observar.

Após a circulação da Seiva contendo a entrevista do líder da “Sociedade Amigos da Amé-rica”, general Manoel Rabelo, esta parou de circular: “assim, Jacob Gorender, Wilson Falcão e eu fomos presos e levados para o quartel da Guarda Civil no dia 15 de julho, ao mesmo tempo em que éramos denunciados ao Tribunal de Segurança Nacional.” (FALCÃO, 2008, p. 10). A prisão dos integrantes da Seiva não repercutiu apenas na Bahia. No Rio de Janeiro acontecia o 6º Congresso Nacional dos Estudantes, e alguns se mobilizaram contra as prisões “[...] e, incorporados, represen-tantes de quase todos os Estados foram ao presidente da República, Sr. Getúlio Vargas, solicitar a libertação dos diretores da revista.” (CARONE, 1982, p. 228).

No cenário baiano, a revista apareceu como contraponto às políticas e ideais conservadores reinantes. Proibiu-se a reprodução e circulação dos textos, mas os ideais permaneceram propaga-dos, agora por outros veículos que não excluíam o textual. Dessa forma conturbada terminou o primeiro ciclo da revista Seiva. O mensário reapareceu em novembro de 1950, com a participação de Luis Henrique Dias Tavares, Wladimir Guimarães e Clóvis Moura. Sobreviveu a cinco edições (1950/51/52) e teve como subtítulo “Mensário de cultura nacional e popular”, encerrando a segun-da fase da revista.

Inseridos em um processo histórico que demandava intervenção e conhecimento, os baia-nos que produziam a Seiva investiram em um aprofundamento da luta nas condições objetivas que possuíam, e não refutaram as influências que receberam e as dificuldades que encontraram. Transformaram as leituras de Castro Alves, Lima Barreto e Euclides da Cunha em literatura subver-siva e completa de incentivos e exemplos para a continuidade da luta. Através deles, enxergaram um Brasil dependente e explorado que poucos souberam cantá-lo e interpretá-lo como deveria, e

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29FERREIRA, Daniela de Jesus. Caminhos e descaminhos da revista Seiva. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 22-29, maio 2013.

como realmente existia. Os Sertões de Cunha, os poemas de Alves, os textos atraentes e fortes do funcionário público Lima Barreto, tido como louco pelas autoridades, foram leituras que propor-cionaram e contribuíram para a formação política e intelectual dos comunistas.

A Seiva e sua dinâmica foram responsáveis pelo amadurecimento e florescimento de um viver e ser comunista nas Terras de Todos os Santos, em um momento de fechamento político. Um mostrar-se, um fazer-se, um refazer-se constante, em que as aspirações e o sonho de um mundo justo eram as únicas coisas que não mudavam, só cresciam, e o envolvimento com o socialismo, que parecia distante, passou a ter mais crédito e, possivelmente, ser mais provável de ser realiza-do.

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Periódicos

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______. Salvador, n. 7, set. 1940.

______. Salvador, n. 9, jun. 1941.

JORNAL ESTADO DA BAHIA, 17/12/1937.

30CARVALHO, Aloysio Castelo de. Os jornais cariocas da Rede da Democracia na queda do governo Goulart. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 30-36, maio 2013.

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OS JORNAIS CARIOCAS DA REDE DA DEMOCRACIA NA QUEDA DO GOVERNO GOULART1

Aloysio Castelo de Carvalho2

Resumo: O artigo debate a Rede da Democracia, programa criado no Rio de Janeiro em outubro de 1963 pelas rádios Tupi, Globo e Jornal do Brasil, que iam ao ar quase todos os dias e repercu-tiam pelo país através de emissoras afiliadas. Os pronunciamentos eram publicados n’O Jornal, n’O Globo e no Jornal do Brasil. A Rede da Democracia deu voz aos políticos, militares, empresá-rios, jornalistas, professores, intelectuais, sindicalistas e estudantes, possibilitando a articulação no campo discursivo com a oposição, principalmente com a UDN, IPES e IBAD. Programa que criticava as concepções nacionalistas e reformistas, bem como as decisões do governo Goulart, a Rede da Democracia reagiu às forças que incentivavam a maior participação popular na vida política e estimulou mudanças na natureza do regime democrático.

Palavras-chave: Imprensa. Política. Autoritarismo.

1 Versão modificada do trabalho apresentado na Associação Brasileira de Ciência Política, em 2012.2 Professor do Departamento de Economia e da Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal Fluminense. Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo. Autor de A Rede da Democracia: O Globo, O Jornal e Jornal do Brasil na queda do governo Goulart (1961-64) (Niterói: EDUFF; NITPRESS, 2010).

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

Criada no Rio de Janeiro em outubro de 1963, a Rede da Democracia era um programa co-mandado pelas rádios cariocas Tupi, Globo e Jornal do Brasil. Ia ao ar quase todos os dias e reper-cutia pelo país através de outras centenas de emissoras afiliadas. Os pronunciamentos difundidos pelas emissoras eram posteriormente publicados nos jornais O Jornal, O Globo e Jornal do Brasil. A Rede da Democracia foi idealizada por João Calmon, deputado do Partido Social Democrático (PSD) e vice-presidente dos Diários Associados, a maior organização na área das comunicações de massa, reunindo jornais, revistas, rádios e emissoras de televisão.

A Rede da Democracia simboliza no campo da imprensa a busca de novas formas de atua-ção, em face dos desafios colocados pela crise política que envolveu o governo Goulart. Seu sur-gimento é uma forte evidência de que os representantes da imprensa liberal se colocaram como atores políticos no governo Goulart. Criada logo após o presidente solicitar ao Congresso o Estado de Sítio e denunciar que estava em andamento uma conspiração golpista, esse amplo sistema de comunicação nacional deu voz aos representantes políticos, militares, empresários, jornalistas, professores, intelectuais, sindicalistas e estudantes, possibilitando a articulação no campo dis-cursivo dessas emissoras e jornais do Rio de Janeiro com partidos e grupos de oposição ao go-verno, principalmente com a UDN, o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), que financiava as campanhas eleitorais dos candidatos anticomunistas. A rede era uma versão conservadora da Voz da Legalidade, criada por Brizola em 1961, cujas emissoras haviam mobilizado a opinião pública pela posse de Goulart na crise após a renúncia de Jânio Quadros e, em seguida, passaram a pregar a antecipação do plebiscito com a volta do presidencialismo. Programa radiofônico que criticava as concepções nacionalistas e re-formistas, bem como as decisões do governo Goulart, a Rede da Democracia reagiu às forças que incentivavam a maior participação popular na vida política e, sobretudo, amadureceu mudan-ças que deveriam ser efetivadas na natureza do regime democrático. Com base no diagnóstico de que estava em andamento a subversão das estruturas da sociedade brasileira, os represen-tantes da imprensa carioca construíram propósitos comuns com relação aos temas políticos que precederam o golpe de 1964.

A criação da Rede da Democracia significou, portanto, uma aproximação entre as linhas editoriais de O Jornal, O Globo e Jornal do Brasil, voltados para a articulação de uma comunicação oposicionista que conferia funções políticas à imprensa, num ambiente em que os militares es-tavam sendo chamados a intervir no Estado. Os discursos apresentados pelos seus proprietários e representantes no dia da inauguração, em 25 de outubro, deixam claro que o eixo central se deu em torno do combate ao comunismo, considerado uma ideologia totalitária que visava à desestruturação do regime representativo, com o fim dos mecanismos jurídicos que garantiam os direitos individuais, em especial os relacionados à liberdade e à propriedade. O termo comu-nismo apareceu associado à revolução, em contraposição à ideia reformista aceita pelos jornais, que percebiam no governo omissão no combate a essa ideologia, colocando-se, desse modo, em

31CARVALHO, Aloysio Castelo de. Os jornais cariocas da Rede da Democracia na queda do governo Goulart. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 30-36, maio 2013.

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

32CARVALHO, Aloysio Castelo de. Os jornais cariocas da Rede da Democracia na queda do governo Goulart. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 30-36, maio 2013.

confronto com a legalidade constitucional e com os tradicionais valores de liberdade da socie-dade brasileira. De fato, Nascimento Brito prognosticou que forças políticas tentariam obter “o consentimento popular para fazerem do Brasil a experiência infeliz que o nazismo, o fascismo e o comunismo impuseram a outros povos.”3 Nessa linha discursiva também se expressou Roberto Marinho, para quem os brasileiros estavam sendo “vítimas de uma deformação, intencional por parte de uma minoria de demagogos e de comunistas empenhados em envenenar as nossas re-lações com os países do mundo ocidental.”4 E João Calmon, representando Assis Chateaubriand dos Diários Associados, viu no rádio o instrumento político contra o comunismo para ganhar “a batalha da propaganda, que é o episódio mais importante da Guerra Fria.”5

Os representantes da imprensa do Rio de Janeiro haviam perdido a convicção no regime representativo, com seus diversos instrumentos constitucionais de limitação dos poderes, sobre-tudo após o plebiscito ter decidido pelo retorno ao presidencialismo em janeiro de 1963. A partir daí, uma coalizão de forças, envolvendo trabalhistas e comunistas, passou a apostar na mobiliza-ção sindical com greves, manifestações de rua e ações políticas extrainstitucionais a fim de pres-sionar o Congresso a aprovar as reformas de base, em particular a reforma agrária. Predominava a percepção de que a ativação política das massas estava articulada ao projeto intervencionista do governo e de que este estimulava o confronto com as tradicionais instituições representativas, colocando na ordem do dia a construção de um tipo de democracia plebiscitária inspirada em Rousseau, como forma de aferição da vontade das grandes maiorias. Diante desse quadro, surgi-ram impulsos para se repensarem os rumos do Estado, cujas estruturas administrativas estariam sendo apropriadas pelas forças partidárias de apoio ao governo, assim como se exercia controle sobre a máquina sindical com fins políticos considerados antidemocráticos. Apelos para inter-venção militar tornaram-se constantes e foram acompanhados de um questionamento sobre os canais de representação da sociedade, num movimento de valorização da própria imprensa. Por-tanto, nesse momento de crise política, encontram-se os elementos de uma nova forma de regi-me que então começava a nascer na consciência liberal.

Com a criação da Rede da Democracia, alguns dos representantes da imprensa no Rio de Janeiro assumiram mais abertamente a postura de atores políticos. As lideranças mais expressivas do campo jornalístico carioca criaram um amplo sistema de comunicação para articular no campo discursivo os diversos setores sociais e o conjunto dos representantes da imprensa em todo o país como oposição ao governo, ao mesmo tempo em que fecharam ideologicamente seus discursos, pedindo a intervenção do Exército para conter a influência comunista no país. A Rede da Demo-cracia não adquiriu um caráter de debate ou de confronto de opiniões para o esclarecimento da opinião pública. A missão de informar o público foi substituída pela propaganda política. Foi o próprio João Calmon, deputado pelo PSD e idealizador da Rede da Democracia, que justificou

3 OBJETIVOS da Rede da Democracia, desde ontem no ar: “Desmascarar a tentativa de eliminar a liberdade em nome da justiça social”. O Jornal, Rio de Janeiro, 26 out. 1963, p. 3.4 Ibid, p. 3.5 Ibid, p. 3.

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33CARVALHO, Aloysio Castelo de. Os jornais cariocas da Rede da Democracia na queda do governo Goulart. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 30-36, maio 2013.

o uso do rádio como instrumento de propaganda política anticomunista, num pronunciamento para a Rede da Democracia, gravado quando se encontrava na República Federal da Alemanha, como integrante da delegação da Comissão de Relações Exteriores da Câmara Federal6:

Não esqueçamos que Hitler ascendeu ao poder graças a utilização eficiente deste fabuloso instrumento que é o rádio. E chego à conclusão que devemos empenhar-nos cada vez mais na batalha da propaganda para combater os totalitários de direita ou de esquerda que manipulam tal arma com maior dinamismo e eficiência [...].

Estamos convencidos de que a criação da Rede da Democracia em outubro de 1963 sofreu influência das ideias da escritora francesa Suzanne Labin, desenvolvidas no livro Em cima da Hora, lançado no Brasil7 no mesmo ano e com repercussão na imprensa, sobretudo em O Jornal, do qual João Calmon era diretor. O Jornal noticiou a palestra de Suzanne Labin na Escola Superior de Guerra (ESG), sobre as estratégias de ação comunista, proferida em agosto de 1963. Posterior-mente, trechos de livros da autora foram lidos em vários programas da Rede da Democracia pelo deputado Raul Brunini, da UDN,8 popularizado através de suas atividades no rádio e reconheci-do como o primeiro profissional de comunicação a transmitir discursos parlamentares através do programa Parlamento em Ação, levado ao ar pela Rádio Globo do Rio de Janeiro entre 1950 e 1958.9 Uma das propostas de Suzanne Labin para combater a infiltração e propaganda comunista envolvia o que ela denominou de recuperação da imprensa. Consistia na “formação de uma rede de imprensa diária e periódica de tiragem suficiente ampla, expressamente dedicada à desinto-xicação dos espíritos”. A rede ou liga, tal como propunha Labin, “não deve limitar-se à imprensa”, mas deve “utilizar todos os outros meios de expressão desde logo as revistas, panfletos e livros”. Por fim, na luta contra o totalitarismo soviético, a liga ou rede deveria ser o catalisador de uma união suprapartidária e supranacional, de modo a “empolgar” todos os “adeptos da livre-iniciativa e os adeptos do socialismo, conservadores e inovadores, ateus e cristãos, amarelos, brancos e negros – porque todos homens livres”.10 Nessa linha de argumentação, seguem as palavras de Roberto Marinho sobre o caráter da Rede da Democracia, por ocasião de sua inauguração:

6 CALMON à Rede da Democracia: Desenvolvimento da RFA desmente falsos nacionalistas do Brasil. O Jornal, Rio de Janeiro, 3 dez. 1963, p. 3.7 A francesa Suzanne Labin (1913-2001), militante internacional do anticomunismo, escreveu dezenas de livros e folhetos, traduzidos em vários idiomas, que tiveram ampla distribuição como material da luta ideológica no tempo da Guerra Fria. No Brasil, além do Em cima da hora, foram também publicados títulos como A Rússia de Stalin, O Duelo Rússia x EUA, A Condição Humana na China e A Guerra Política. (Venício A. de Lima, Agência Carta Maior, 05/04/211, “Golpe de 1964: os jornais e a opinião pública”).8 REDE da Democracia: Em marcha no Brasil conspiração de origem e comando estrangeiros. O Jornal, Rio de Janeiro, 4 dez. 1963, p. 3; REDE da Democracia alertou contra “movimentos de recuo do martelo” o povo brasileiro. O Jornal, Rio de Janeiro, 4 jan. 1964, p. 3.9 CPDOC. Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro pós-1930. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2001. Disponível em: <http://cpdoc.fgv.br/acervo/dhbb>. Acesso em: maio 2013.10 LABIN, Suzanne. Em cima da hora. Rio de Janeiro: Rio de Janeiro, 1963. p. 135-136.

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34CARVALHO, Aloysio Castelo de. Os jornais cariocas da Rede da Democracia na queda do governo Goulart. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 30-36, maio 2013.

A Rede da Democracia, que vai ao ar pela primeira vez, não terá colorido político-partidário e inspira-se nos mais puros sentimentos de patriotismo e na preocupação com os destinos nacionais em tão grave momento da vida brasileira. Dará guarida a todos aqueles que, comungando dos mesmos sentimentos e propósitos, queiram participar da cruzada cívica em defesa da lei e da ordem.11

Um dos temas mais divulgados pela Rede da Democracia, que revela registros de intensa atividade até meados de março de 1964, foi o da reforma agrária, compreendida em diversos pronunciamentos como um pretexto para se alterar a Constituição e o direito de propriedade, considerado a base do regime representativo. A oposição ao projeto de reforma agrária do go-verno, sobretudo nos meses que antecederam o golpe, apareceu vinculada à ameaça comunista, ideia que esteve presente na grande maioria das matérias publicadas e nos pronunciamentos12 veiculados pela Rede da Democracia.13 A luta anticomunista foi transformada numa questão de segurança nacional a partir do argumento de que uma guerra revolucionária se espalhava pelo país. Isso explica a prioridade dada no campo discursivo às alianças com os militares e o apelo para que as Forças Armadas interviessem no Estado. De fato, no âmbito das homenagens aos militares mortos na Intentona Comunista de 1935, o jornalista Roberto Marinho apelou, através da Rede da Democracia, no final de 1963, para que “as comemorações se transformassem numa demonstração de civismo, em que civis unidos aos militares ameaçados, agora também ou mais do que há 28 anos pela traição vermelha, afirmem a sua devoção à pátria em perigo”. O jornalista terminou o pronunciamento pedindo que o “povo brasileiro” “comparecesse às romarias e mani-festações” em favor da liberdade e da democracia.14 Além de Roberto Marinho, podemos avaliar a importância da Rede da Democracia por meio de outros personagens que se pronunciaram pela cadeia de rádios e tiveram seus discursos publicados nos jornais: Ruy Gomes de Almeida, Bilac Pinto, João Calmon, Mem de Sá, Armando Falcão, Virgílio Távora, Nascimento Brito, Daniel Krieger, Milton Campos, Fillinto Müller, Pedro Aleixo, Ildo Meneghetti, Raimundo Padilha, Júlio de Mesqui-ta, Austregésilo de Athayde, Aureliano Chaves, Eurico Gaspar Dutra, Amaury Kruel, Eduardo Go-mes, Cordeiro de Farias, Josué Montelo, João Mendes, Magalhães Pinto, Pery Constant Bevilacqua, Herbert Levy, Daniel Krieger, Sandra Cavalcanti, Raul Brunini, Aliomar Baleeiro e Plínio Salgado.

No âmbito da interpretação em que os representantes cariocas da imprensa liberal preten-diam ser reconhecidos como a principal expressão legítima da opinião pública, porque mais com-prometidos não só com a preservação das vigentes estruturas econômico-sociais capitalistas mas com a adoção de um modelo de desenvolvimento sem restrições à entrada dos investimentos 11 MARINHO, Roberto. Desmascarar a tentativa de eliminar a liberdade em nome da justiça social. O Jornal, Rio de Janeiro, 26 out. 1963.12 Recolhemos todas as matérias sobre os pronunciamentos veiculados pela Rede da Democracia e publicados pel’O Jornal entre os dias 22 de outubro de 1963 e 22 de março de 1964. Obtivemos 72 matérias, totalizando 204 pronunciamentos. 13 Jean-Marie Domenach cita em seu livro uma frase de Goebbels que é bastante elucidativa do que é propaganda política: “Fazer propaganda é falar de uma idéia por toda a parte, até nos bondes”. Domenach analisou a propaganda política do tipo leninista e hitlerista. DOMENACH, Jean-Marie. La propaganda política. Buenos Aires. Editorial Universitária de Buenos Aires, 1962.14 Roberto Marinho na Rede da Democracia: “Data da intentona não só lembra a traição, mas advertência e decisão”. O Jornal, Rio de Janeiro, 10 nov. 1963, p. 3.

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35CARVALHO, Aloysio Castelo de. Os jornais cariocas da Rede da Democracia na queda do governo Goulart. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 30-36, maio 2013.

do capital estrangeiro e favorável a um alinhamento internacional liderado pelos Estados Unidos, encontra-se a explicação para o surgimento da Rede da Democracia, cujos esforços se voltaram para articular ideologicamente os setores civis e militares oposicionistas ao governo. A Rede da Democracia colocou a imprensa no centro das mobilizações para a reorganização do poder po-lítico e pregou uma mentalidade de guerra para combater o comunismo, entendido como uma forma de despotismo típica da contemporaneidade que ameaçava o ideal de liberdade sob o qual se desenvolveu a moderna civilização ocidental. A Rede da Democracia é uma evidência de que os representantes da imprensa liberal assumiram formas de ação direta no cenário político. Vasto sistema de comunicação organizado por todo o país e comprometido com a propaganda política anticomunista, a rede sinalizou no campo discursivo a existência de uma coalizão conservadora disposta a lutar pela preservação da ordem social dominante e conter as investidas do Executivo contra os princípios que regem a propriedade privada. Portanto, os representantes da imprensa carioca não se restringiram às tradicionais funções de intermediação jornalística ao dar publici-dade às decisões parlamentares e aos atos do governo. Ao mesmo tempo em que questionaram a credibilidade das instituições representativas e exaltaram a si próprios como representantes da opinião pública, os jornais se organizaram politicamente através da Rede da Democracia e fo-mentaram a intervenção das Forças Armadas, quando ideais igualitários estimulavam as camadas populares a reivindicarem sua incorporação no processo decisório do país.

Ao resgatarem a tradição liberal, os jornais acabaram por reproduzir o papel ambíguo desse discurso na cultura política brasileira. Não só vocalizaram demandas por liberdade, mas também apelaram para a intervenção repressiva do Estado. Isso nos leva a aceitar que a imprensa de natu-reza privada, defensora da economia de mercado, soube articular no momento de crise das insti-tuições representativas os discursos liberal e autoritário. Os representantes da imprensa se apro-priaram desses discursos sociais e assim agiram para evocar dois tipos de legitimidade, de modo a responder aos desafios colocados pela crise política. Os jornais defenderam a preservação das instituições representativas liberais, mas evocaram a legitimidade da luta contra o comunismo e a necessidade de ordem interna como condição para a retomada do desenvolvimento econômico. Isso significa que os jornais compartilharam temas abordados pela Doutrina de Segurança Nacio-nal desenvolvida pela Escola Superior de Guerra, que preconizava um papel interventor para os militares na sociedade brasileira.

Referências

CPDOC. Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro pós-1930. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2001. Dis-ponível em: <http://cpdoc.fgv.br/acervo/dhbb>. Acesso em: maio 2013.

DOMENACH, Jean-Marie. La propaganda política. Buenos Aires: Editorial Universitária de Buenos Aires, 1962.

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36CARVALHO, Aloysio Castelo de. Os jornais cariocas da Rede da Democracia na queda do governo Goulart. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 30-36, maio 2013.

FERREIRA, Jorge. O governo Goulart e o golpe civil-militar de 1964. In: ______; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. O tempo da experiência democrática: da democratização de 1945 ao golpe civil--militar de 1964. O Brasil republicano, v. 3. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

LABIN, Suzanne. Em cima da hora. Rio de Janeiro: Rio de Janeiro, 1963.

MEDEIROS, Jarbas. Ideologia autoritária no Brasil (1930-1945). Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1978.

O JORNAL. Rio de Janeiro, 26 out. 1963; 10 nov. 1963; 3 dez. 1963; 4 dez. 1963; 4 jan. 1964

SANTOS, Wanderley Guilherme. Décadas de espanto e uma apologia democrática. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

37FIGUEIROA, Jaime P. Sepúlveda; CESSO, Antonio Ivan. Aspectos da História do Trabalho: controle, repressão e contradições. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 37-44, maio 2013.

Histórica - A Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 57, fev. 2013Histórica - A Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 56, nov. 2012 Histórica - A Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 56, nov. 2012

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ASPECTOS DA HISTÓRIA DO TRABALHO: CONTROLE, REPRESSÃO E CONTRADIÇÕESJaime P. Sepúlveda Figueiroa1

Antonio Ivan Cesso2

Resumo: O presente artigo pretende abordar as relações sociais do trabalho a partir de uma perspectiva histórica. Trata-se de realizar uma análise de como o trabalho tem sido foco de controle pelo capital, cujo jogo criado para tal fim permite reconhecer aspectos relacionados ao desenvolvimento do capitalismo. Para tanto, lança-se mão de uma revisão bibliográfica que torna possível reconhecer esse processo. O estu-do permitiu compreender como, historicamente, o trabalho foi e continua sendo responsável por imprimir valor às mercadorias, e, para este fim, foi objeto de controle social e foco de repressão de seus movimen-tos. Constitui característica do processo de manutenção do capital a contraditória condição da força de trabalho: o verdadeiro produtor de valor esteve sempre prestes a ficar à margem do sistema.

Palavras-chave: Trabalho. Lutas de Classes. Controle e Repressão.

Abstract: This article seeks to address the social relations of work from a historical perspective. It is carry-ing out an analysis of how the work has been the focus of control by capital, whose game created for this purpose, allows to recognize aspects related to the development of capitalism. Therefore, throws up the hand of a literature review that makes it possible to recognize this process. The study allowed us to under-stand how, historically, the work was still responsible for printing value to goods, and to this end, was the object of social control and repression focus your movements. It is characteristic of the process of capital maintenance, the contradictory condition of the workforce: the real producer of value has always been about getting the margin system.

Keywords: Work. Class Struggles. Control and Repression.

1 Professor efetivo da Rede Pública do Governo do Estado de São Paulo e professor Universitário. Mestre em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (bolsa pelo Governo do Estado de São Paulo), área de concentração em História, Sociedade e Educação no Brasil, com orientação do Sr. Dr. José Luis Sanfelice.2 Professor efetivo da Rede Pública do Governo do Estado de São Paulo e professor Universitário. Bacharel em Administração de Empresas. Doutorando em Educação pela Universidade Metodista de Piracicaba (bolsa pelo Governo do Estado de São Paulo), na linha de pesquisa em História e Filosofia da Educação, com orientação do Sr. Dr. José Maria de Paiva.

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Introdução

O objetivo deste artigo é o de fazer uma revisão das transformações do trabalho a partir de um quadro amplo de referências. Lança-se mão do estabelecimento de uma caracterização introdutória a respeito de uma sociedade marcada pelos conflitos de interesses, em que pese o mecanismo de exploração dos verdadeiros produtores de valor, e cujos instrumentos de controle do trabalho desenvolvidos ao longo do tempo convergem para um lugar comum, ou seja, a ma-nutenção da dinâmica do capitalismo.

Ao longo dessa discussão, serão pontuadas as características gerais do desenvolvimento do capitalismo bem como os aspectos relacionados ao processo histórico de construção do trabalho no Brasil, destacando as contradições contidas na inserção de formas de controle sobre ele.

Na análise de Marx e Engels (1998), o conflito entre as classes sociais constitui o motor do movimento da história, uma vez que os interesses antagônicos correspondem às posições de opressores e oprimidos.

Entre lutas e diversas formas de repressão, a humanidade vem se transformando desde o período feudal, onde se constituía, conforme Huberman (1986), de três classes – sacerdotes, guer-reiros e trabalhadores –, cabendo ao que trabalhava produzir para as outras duas classes. Sendo o clero e a nobreza as classes governantes (controlavam a terra e o poder por ela emanado), fica-va a cargo da Igreja a ajuda espiritual, e da nobreza a proteção militar, através de pagamento às classes trabalhadoras pelo cultivo da terra. Com a expansão do comércio, os mercadores passam a procurar lugares para se proteger durante suas viagens e encontram nos “burgos” tal segurança. As cidades também crescem e a Idade Média se depara com um novo grupo que surge da prática mercantil3, tendo agora a posse do dinheiro como uma nova fonte de riqueza. Surge, assim, a clas-se média. O homem começa a lutar pela liberdade de escolha, indo à luta quando preciso:

Na Inglaterra, em 1689, e na França, em 1789, a luta pela liberdade do mercado resultou numa vitória da classe média. O ano de 1789 bem pode ser considerado como o fim da Idade Média, pois foi nele que a Revolução Francesa deu o golpe mortal no feudalismo. Dentro da estrutura da sociedade feudal de sacerdotes, guerreiros e trabalhadores, surgira um grupo da classe média. Através dos anos, ela foi ganhando força. Havia empreendido uma luta longa e dura contra o feudalismo, marcada particularmente por três batalhas decisivas. A primeira foi a Reforma Protestante; a segunda foi a Gloriosa Revolução na Inglaterra, e a terceira, a Revolução Francesa. No fim do século XVIII era pelo menos bastante forte para destruir a velha ordem feudal. Em lugar do feudalismo, um sistema social diferente, baseado na livre troca de mercadorias com o objetivo primordial de obter lucro, foi introduzido pela burguesia. A esse sistema chamamos – capitalismo. (HUBERMAN, 1986, p. 140).

3 Cf. PAIVA, José Maria de. Sobre a Civilização Ocidental. Cadernos de História da Educação, Uberlândia, v. 11, n. 1, p. 307-324, jan./jun. 2012.

38FIGUEIROA, Jaime P. Sepúlveda; CESSO, Antonio Ivan. Aspectos da História do Trabalho: controle, repressão e contradições. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 37-44, maio 2013.

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

39FIGUEIROA, Jaime P. Sepúlveda; CESSO, Antonio Ivan. Aspectos da História do Trabalho: controle, repressão e contradições. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 37-44, maio 2013.

Contradições da introdução do trabalho no Brasil

No Brasil colonial, conforme Ianni (1987), manteve-se o convívio entre mercadoria e escravo, sendo que durante todo esse período o produto final das atividades dos trabalhadores escraviza-dos, tanto do negro como do índio, foi internacionalmente comercializado. Essa contradição foi superada somente em meados do século XIX, já que o trabalho escravo é uma atividade organi-zada segundo um padrão de racionalização do regime de produção mercantil, sendo que neste regime no Brasil o “escravo aparece na condição de meio de produção” (p. 46), sendo ele um meio de produção entre outros – como a terra, a tecnologia, a matéria-prima –, de acordo com a estru-tura empreendida. Ele “é comprado, alugado, emprestado, dado de presente ou vendido” (p. 46), e ao ser subordinado ao senhor, constituído como propriedade, “não tem personalidade, estado. É, pois privado de toda a capacidade civil.” (p. 46).

Com a transferência do poder real para o Brasil em 1808, a Academia Militar e a Academia da Marinha foram destinadas, para além das próprias atividades bélicas, a criar cursos que garan-tissem ao Estado e ao capital a formação de burocratas. Cursos superiores como desenho, história e música foram criados para desenvolverem “bens simbólicos” para consumo das classes domi-nantes. Trata-se, na verdade, de renovar a orientação ideológica que “legitimava as relações de dominação mantidas e dissimuladas pelo aparato jurídico.” (CUNHA, 1986, p. 68).

O latifúndio definia as relações sociais de produção, e o trabalhador não era detentor do produto de seu árduo trabalho. Mas o fato de haver uma inversão mínima de capital na prática agrícola indica que as formas capitalistas de produção estavam pouco desenvolvidas, nesse limiar que constitui a passagem do regime imperial para o regime republicano.

Enquanto na Europa as transformações pelas quais passava a sociedade anunciavam ao mundo as profundas modificações que ocorreriam em função da Revolução Industrial, o Brasil conservava formas rudimentares e primitivas de produção. (BASBAUM, 1986).

A sociedade brasileira vive a partir de meados do século XIX uma situação diferente do pe-ríodo colonial, sendo moldada por um novo sistema internacional econômico, em que o capital passa a ter novas aplicações lucrativas, tornando o escravo relativamente sem eficácia e consti-tuindo novos valores para a cultura capitalista, tais como:

[...] propriedade privada, como forma concreta de capital; lucro, como função dos fatores e da direção dos empreendimentos; salário, como remuneração da mão-de-obra efetivamente utilizada na produção; previsão dos negócios, complementaridade das atividades econômicas, integração produtiva e ótima dos fatores da produção; crise e flutuações específicas de cada setor ou ramo. (IANNI, 1987, p. 47).

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

40FIGUEIROA, Jaime P. Sepúlveda; CESSO, Antonio Ivan. Aspectos da História do Trabalho: controle, repressão e contradições. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 37-44, maio 2013.

Ainda para Ianni, a transformação do escravo em trabalhador livre vai em direção dos que entendem que o trabalhador livre é também um consumidor em potencial ou efetivo, tendo, diversos grupos, razões humanitárias que incentivaram o abolicionismo brasileiro, sem contar os movimentos de grupos sociais que realizaram movimentos de opinião pública sobre a reorgani-zação do ensino, proclamando as vantagens do regime republicano, a separação entre Igreja e Estado, tornando também a escravidão moralmente condenada, em que:

[...] as contradições entre mercadoria e o escravo, e entre a noção de igualdade dos homens perante Deus e a lei e a existência real do escravo dizem respeito a um componente essencial do sistema capitalista de produção. Trata-se do valor de troca. O valor de troca é um alvo fundamental da produção mercantil. É no processo de realização do produto do trabalho, enquanto valor de troca, que se dá a realização do lucro, que é alvo do fazendeiro ou do empresário. Por isso, ampliar a produção de mercadorias, com base no trabalhador livre, é ampliar a margem de lucro possível. [...] Torna-se óbvio que é preferível operar com o trabalhador livre, colono ou assalariado, cuja remuneração (ou margem de apropriação avaliada monetariamente) é função do produto da força do trabalho. (IANNI, 1987, p. 49-50).

A luta pelo fim da escravidão no país confundia-se com a luta por uma República idealizada, e o positivismo, embora já fragilizado no velho mundo, começava a conquistar fiéis no Brasil. Ao discutir a questão da escravidão no país, Bosi (2002), em seu livro Dialética da Colonização, sugere uma abordagem materialista dialética do processo ideológico recorrente à história do Brasil, e passa a considerar a análise das práticas sociais e culturais marcadas pelo tempo e pelo espaço.

O autor afirma que há uma relação entre as representações da sociedade e a sua realidade efetiva, e focaliza as práticas como sendo o “fermento” das ideias, pois estas racionalizam as “aspi-rações difusas nos seus produtores e veiculadores” (p. 194). Dessa forma, a ideologia é composta por motivações particulares, mas que são dadas como se fossem do interesse geral. Nos discursos, o interesse particular é expresso sob a forma de algum princípio. A questão fundamental trazida por Bosi consiste em inquirir sobre qual a melhor forma de entender a articulação que se confi-gurou entre a ideologia liberal, contrastada com a realidade da escravidão no Brasil do século XIX.

Para tanto, Bosi escolhe refletir a respeito dos modos de pensar dominantes da classe polí-tica brasileira, que tiveram vigência após a independência e avançaram até depois da metade do século XIX. Para ele, o binômio escravismo-liberalismo desenvolveu-se no país apenas na condi-ção de um “paradoxo verbal” (p. 195). A contradição central que se impõe é a de que o liberalismo, em seu conteúdo político, equivalia à ideologia burguesa do trabalho livre, e, sendo assim, não houve condições para a existência de um liberalismo escravocrata.

Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, nº 58, maio 2013

41FIGUEIROA, Jaime P. Sepúlveda; CESSO, Antonio Ivan. Aspectos da História do Trabalho: controle, repressão e contradições. Histórica, São Paulo, ano 9, n. 58, p. 37-44, maio 2013.

Trabalho, indústria e profissionalização como formas de controle

Com a ampliação do mercado, segundo Durkheim (1999), aparece a indústria, que tem como efeito a transformação das relações entre patrões e operários, tendendo a aumentar as necessidades da segunda classe devido às influências das grandes aglomerações, passando a má-quina a substituir o homem, começando também a criar um novo sistema de relação. O operário passa, então, a ficar o dia todo longe de sua família e não tem mais contato com quem o em-prega, fazendo com que essa nova estrutura tenha um novo desenho e seja transformada com rapidez, surgindo os interesses de conflitos que não se equilibram na mesma velocidade, fato que acaba fortalecendo a divisão do trabalho, que “foi acusada com frequência, de diminuir o individuo, reduzindo-o ao papel de máquina.” (p. 388). Porém, para Durkheim a divisão do traba-lho leva à solidariedade, pois cria entre os homens direitos e deveres que os unem por um modo durável de relacionamento.

No final do século XIX, uma nova forma de organização do trabalho, o taylorismo, surgiu da utilização de princípios científicos aplicados à produção fabril, deixando clara a separação dos processos de concepção e de planejamento da produção do setor produtivo de mercadorias pro-priamente dito. Henri Ford, na mesma época, cria a linha de montagem e a fragmentação do trabalho, iniciada com a Revolução Industrial. Negava mais uma vez ao trabalhador o direito à consciência do processo de concepção da produção, do qual ele faz parte apenas como força produtora. O trabalhador passa a viver, definitivamente, uma relação de estranhamento com o produto final de seu ofício, na medida em que realiza apenas uma parte da produção de um determinado bem.

Nesse contexto, a escola profissionalizante surgiu para dar suporte ao processo de repro-dução do capital e tornou-se uma matriz produtora da mercadoria força de trabalho. Assim, a educação profissionalizante atuou como disciplinadora da mão de obra, utilizando de uma meto-dologia que, pode-se dizer, tratou de adestrar as massas urbanas para o trabalho. Segundo Engui-ta (1993, p. 194), o que toda escola fordista tem como obsessão é eliminar o trabalho intelectual “para constituí-los em monopólios da direção, ou seja, do capital e seus comparsas”.

Hoje, a globalização da economia em curso coloca as forças produtoras diante do problema do desemprego. As empresas, na intenção de superar a rigidez do esquema fordista de produção, que compromete o processo de acumulação capitalista, sofisticam-se, avançando na eficiência e na agilidade da produção de suas mercadorias, pois se utilizam cada vez mais de modernas tec-nologias com grande capacidade de simplificar o trabalho.

Em sua fase atual, o capitalismo transpõe as fronteiras nacionais e pulveriza a possibi-lidade de colapso das economias nacionais. Milhões de desempregados aumentam os bol-sões de pobreza em todo o mundo. Kurz (1992) expressa bem esse quadro de angústia das populações excluídas:

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O jogo do mercado mundial, que absorveu e assimilou todas as outras formas, já não permite que os perdedores voltem depois para a casa em sossego, mas sim está destruindo sucessivamente para eles toda possibilidade de uma existência digna. Quando esses homens, povos, regiões e Estados perceberem que nunca mais terão alguma chance de vencer e que as futuras derrotas inevitáveis os privarão de qualquer possibilidade de viver, lançarão, mais cedo ou mais tarde, o tabuleiro no chão e dispensarão todas as regras da chamada civilização mundial. Essas regras democráticas da “razão mundial” burguesa e iluminista são em sua essência abstratas e insensíveis, pois seu verdadeiro fundamento é o automovimento do dinheiro, abstrato e privado de sensibilidade, movimento que faz nascer suas leis históricas destrutivas e as executa mecanicamente até o terrível fim. (KURZ, 1992, p. 186).

O novo modo de produção industrial, denominado “modo de produção flexível”, caracteri-za-se pela busca de novos mercados e novas fontes de energia, e também pela desestruturação dos sindicatos, na medida em que desarticula toda uma rede historicamente criada, quando os trabalhadores tomaram ciência da sua legítima força de trabalho, o que, hoje, parece algo em processo de rarefação.

Morin (1984) adverte sobre as modificações das condições de vida devido às novas tecnolo-gias, as quais influenciaram para o aumento do consumo, fazendo com que o ser humano se indi-vidualize mais ainda, dando condições para que surja uma cultura de massa que vai ao encontro dessa individualização que aflora em nossa sociedade:

Ela vai fornecer à vida privada as imagens e os modelos que dão forma a suas aspirações. Algumas dessas aspirações não podem se satisfazer nas grandes cidades civilizadas, burocratizadas; nesse caso a cultura resgata uma evasão por procuração em direção a um universo onde reinam a aventura, o movimento, a ação sem freio, a liberdade, não a liberdade no sentido político do termo, mas a liberdade no sentido individual, afetivo, íntimo, da realização das necessidades ou instintos inibidos ou proibidos.Mas sobre um outro plano, as imagens se aproximam do real, ideais tornam-se modelos, que incitam a uma certa práxis... Um gigantesco impulso do imaginário em direção ao real tende a propor mitos de auto-realização, heróis modelos, uma ideologia e receitas práticas para a vida privada. Se considerarmos que, de hoje em diante, o homem das sociedades ocidentais orienta cada vez mais suas preocupações para o bem-estar e o standing por um lado, o amor e a felicidade por outro lado, a cultura de massa fornece os mitos condutores das aspirações privadas da coletividade. (MORIN, 1984, p. 90).

Considerações Finais

A análise das novas tecnologias que respondem pela reestruturação produtiva tem de-monstrado seu efeito perverso, por um lado, eliminando postos de trabalho, e, por outro, fazendo emergir novas necessidades dentro do espaço de produção: exige-se do trabalhador uma maior

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capacidade de abstração e de reflexão sobre os processos produtivos. Nesse ponto, é preciso re-conhecer que não se pode acreditar que o trabalhador está por desaparecer, pois, como aponta Antunes (2002), “não é possível perspectivar, nem mesmo num universo distante, nenhuma pos-sibilidade de eliminação da classe-que-vive-do-trabalho.” (p. 62, grifos do autor).

Frigotto (1994), em texto intitulado “As mudanças tecnológicas e educação da classe traba-lhadora: politecnia, polivalência ou qualificação profissional?”, alerta que as transformações que suscitam uma demanda por maior e mais profunda qualificação profissional de um trabalhador não rompem com a lógica de exclusão social do capitalismo, pois:

Se na verdade não dá para negar que essas mudanças tecnológicas configuram uma nova qualidade, é preciso afirmar que elas não configuram um processo revolucionário, na medida que se dão sob a lógica das relações sociais marcadas pela exclusão. Por isso a forma de inserção no processo produtivo é bem diversa nos países subdesenvolvidos. Trata-se de uma relação subordinada, mas também é excludente no interior do capitalismo avançado. (FRIGOTTO, 1994, p. 48).

Dessa forma, pode-se dizer que o trabalho vem sendo historicamente responsável por im-primir valor às mercadorias; porém, não sem ser objeto de controle social e foco de repressão de seus movimentos. Além disso, também constitui característica desse processo uma contradição inerente: como numa corda bamba, o mesmo que produz valor é aquele que fica a mercê dos caprichos do capital, podendo, mais cedo ou mais tarde, ficar à margem do sistema.

Referências

ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho?: ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. São Paulo: Cortez, 2002.

BASBAUM, Leôncio. História Sincera da República. 5. ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1986.

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DURKHEIM, Émile. Da Divisão do Trabalho Social. Tradução de Eduardo Brandão. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

ENGUITA, Mariano F. Trabalho, Escola e Ideologia. Marx e a crítica da educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.

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FRIGOTTO, Gaudêncio. As mudanças tecnológicas e educação da classe trabalhadora: politecnia, polivalência ou qualificação profissional? In: MACHADO, Lúcia R. (Org.); et al. Trabalho e educação. Campinas: Papirus; Cedes. São Paulo: Ande; Anped, 1994. (Coletânea CBE)

HUBERMAN, Leo. História da Riqueza do Homem. 21. ed. Rio de Janeiro: LTC Editora, 1986.

IANNI, Octavio. Raças e Classes Sociais no Brasil. 3. ed. São Paulo: Brasiliense, 1987.

KURZ, Robert. O colapso da modernização. 5. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. O Manifesto Comunista. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998.

MORIN, Edgar. Cultura de Massas no Século XX: O Espírito do Tempo – 1 – Neurose. Tradução de Maura Ribeiro Sardinha. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1984.

PAIVA, José Maria de. Sobre a Civilização Ocidental. Cadernos de História da Educação, Uberlândia, v. 11, n. 1, p. 307-324, jan./jun. 2012.