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8/17/2019 Herberto Helder, Alquimista Das Imagens - Revista Cult

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Herberto Helder, alquimista das imagensUm ano após sua morte, poeta tem a obra completa reeditada no Brasil e livro póstumo lançado em Portugal

TAGS: Herberto Helder, Literatura, literatura portuguesa, Livros, Poesia

por Helder Ferreira

Há um ano – na madrugada do dia 22 para o dia 23 de março de 2015 – morria o poetaportuguês Herberto Helder; sua obra, no entanto, ainda pulsa com o recente lançamento de

Letra aberta, livro composto por poemas inéditos do “mago da palavra”, em Portugal, e com anotícia de que, enfim, sua obra completa – que soma 50 livros – será reeditada no Brasil pelo

braço carioca da editora lisboeta Tinta-da-china.

“Herberto é o maior poeta português desde Fernando Pessoa. Quando percebi que sua obranão estava disponível nas livrarias brasileiras, quis que fosse nosso selo a fazê-lo”, conta aeditora portuguesa Barbara Bulhosa, responsável pelo projeto que relata não ter encontradoobstáculos nas negociações com os herdeiros e com a editora Porto, responsável pela obra emPortugal.

O primeiro título a chegar às prateleiras será Os passos em volta, seleção de contos em prosapoética do autor (publicada originalmente em 1963) cuja edição brasileira (de 2005, pela

Azougue Editorial) encontra-se esgotada. O livro, que será lançado em maio deste ano comtiragem inicial de dois mil exemplares, trará um texto introdutório crítico assinado porespecialista brasileiro ainda não definido. O mesmo ocorrerá com os demais quatro volumesque dividem a obra completa do autor: Poemas completos, tomo de 700 páginas programadopara setembro; Photomaton & Vox , O bebedor nocturno e Poemas canhotos, que ficarão para2017.

Já o livro de 33 poemas inéditos recolhidos de cadernos do escritor por sua viúva, Olga

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Ferreira Lima, ainda não tem data para chegar ao Brasil. Barbara, no entanto, diz que o volume (lançado com tiragem única em Portugal, de acordo com a vontade de Herberto)“certamente” será editado no Brasil.

Há quem questione o lançamento póstumo. É o caso do editor e crítico literário brasileiro JorgeHenrique Bastos, responsável pela organização de O corpo o luxo a obra (Iluminuras, 2000),edição que primeiro apresentou o trabalho do poeta português ao público brasileiro e um dospoucos títulos ainda disponíveis no mercado nacional. “É muito perigoso seguir um processode ‘dissecação’ de um autor como o Herberto. Ele era muito cuidadoso com a sua obra,eliminava muito, reescrevia sem cessar, recusava o óbvio, a repetição. Por isso, tenho algumasdúvidas com esta edição em vias de ser publicada em Lisboa”, argumenta ele, que conheceu oautor quando morou em Portugal no início dos anos 1990. “Afirmo mesmo que, conhecendo

como conheci a viúva do Herberto Helder, houve alguma motivação lateral, ou alguma pressãoeditorial para que tal ocorresse. É uma pena, pois, na verdade, a editora deveria preocupar-seem começar a conceber uma edição mais consentânea com a personalidade deste poeta, oúnico a se ombrear com Pessoa”.

Paola Poma, professora de Literatura Portuguesa da Universidade de São Paulo, compreende oquestionamento: “Toda edição póstuma é uma ação de risco, e caberia apenas ao poeta dar oseu veredito final, daí talvez uma desconfiança contínua se imponha a estas edições”. Por outrolado, ela chama a atenção para a “extrema importância” da publicação de rascunhos,anotações, esboços e “até mesmo poemas pensados e/ou criados pelos autores” para o trabalhode pesquisadores, uma vez que essas descobertas auxiliariam na elaboração do pensamentocrítico. “Devido ao fato de Herberto Helder reescrever sistematicamente sua obra – poemacontínuo –, estes poemas retirados de anotações podem contribuir para reforçar ou negarobsessões, traços e imagens recorrentes da sua poética”, explica.

Segundo a professora, a reedição da obra completa do poeta deve facilitar o trabalho de seuspesquisadores, ainda que o acesso às edições portuguesas tenha sido facilitado pelo advento dainternet. “No passado, era bastante problemático comprar livros portugueses, poucas livrariaslidavam com a importação, e os preços eram praticamente inviáveis”, ela relembra. Pomatambém considera fundamental que os volumes nacionais sejam acompanhados por prefácios,posfácios ou estudos feitos por ensaístas brasileiros: “Este tipo de mediação intelectual torna aobra de Herberto Hélder mais acessível ao nosso leitor, mapeando novas relações e redefinindooutros campos possíveis de leitura”, opina.

Poma conta que, desde a publicação, em 1986, de A alquimia da linguagem, estudo pioneirode Maria Lúcia Dal Farra, tem surgido nas universidades brasileiras uma nova geração depesquisadores interessados no autor português. Na USP, além da área de LiteraturaPortuguesa, da qual ela faz parte, a poesia de HH tem ampla circulação nos departamentos deTeoria Literária e de Estudos Comparados de Literaturas em Língua Portuguesa; naUniversidade Federal Fluminense (RJ), ela conta, foram defendidos dois doutorados sobre opoeta, além de terem sido publicados diversos ensaios. “Não se pode esquecer também quetudo isto contribui, de modo vigoroso, para estimular alunos de graduação e de pós-graduaçãoa desenvolverem novas pesquisas sobre o autor. As revistas acadêmicas e outras dão provadisto”, ela ressalta.

O que, no entanto, é capaz de instigar leigos e especialistas a se debruçarem tão avidamentesobre os “poemas canhotos” de Herberto Helder?

Talvez, como destaca o crítico Jorge Henrique Bastos, seja o modo como o poeta conseguiuexorcizar Fernando Pessoa e adentrar um território totalmente novo. “Ele revolucionou apoesia de língua portuguesa com sua impressão digital, de certa maneira, extirpando ofantasma pessoano e levando a língua até um patamar que poucos percorreram”, ele explica.

Talvez, como aponta a professora Paola Poma, seja o emprego radical da imagem presente emsua obra. “Além de inesperada, Herberto Helder a redimensiona na estrutura do poema de talmodo que a mesma imagem (ou imagens similares) vai ganhando novos sentidos e tensões”,analisa. “Diante desta dilatação de imagens sempre em movimento, me parece ser impossívelficar indiferente a versos como: “As mães são as mais altas coisas/ que os filhos criam, porquese colocam/na combustão dos filhos, porque/ os filhos estão como invasores dentes-de-leão/no terreno das mães”.

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