hector saint pierre a revolucao copernicana nos estudos da defesa

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  • 7/25/2019 Hector Saint Pierre a Revolucao Copernicana Nos Estudos Da Defesa

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    A REVOLUOCOPERNICANA NOSESTUDOSDADEFESAHctor Luis Saint-Pierre

    Chamamos o destino das paralelas 1 ao peculiar funcionamento da Poltica deDefesa e da Diplomacia na Poltica Externa brasileira. Ambas, de costas, projetam o Brasil

    internacionalmente como guiadas pelas suas lgicas prprias como se as tivessem. Pelafalta de uma Poltica Externa nacional ou ignorando-a, elas parecem obedecer ao interessecorporativo das respectivas burocracias do Estado (Foras Armadas e Itamaraty) ousimplesmente aos desgnios dos que se encontram no seu comando. Afortunadamente,muitas vezes elas esto sintonizadas, mais por um ideal nacionalista de ambas corporaesdo que pela obedincia poltica de Estado. Este fenmeno, alm de mostrar a falta dessapoltica, e talvez como sua causa, revela o pouco interesse que o tema da Poltica Externa seja na sua variante diplomtica ou da defesa ainda desperta na sociedade em geral e nasua representao poltica em particular.

    Nos ltimos anos houve uma srie de reunies de especialistas em Defesa em vriospases da Amrica Latina nas quais, com algumas variaes, constatamos que essefenmeno se reproduz em quase todos eles. O tema dessas reunies tem sido o DebateDemocrtico para a Poltica de Defesa Nacional. Resumidamente, esses encontrosconstituem o processo de abertura nacional das caixas-pretas das questes de Defesa, nasquais se discute desde o tema da violao dos direitos humanos, nas recentes ditaduras, atmodelos de Defesa e projeo estratgica nacional. Todavia, em todos foi possvel notar oque denominamos posio epistemolgica Ptolemaica nos assuntos da Defesa. Estaposio, dominante nesses debates, absolutamente compreensvel e justificada na AmricaLatina. Ela consiste em pensar a Defesa Nacional centrada em consideraes domsticas,como se ela fosse uma questo interna aos Estados. Justifica-se: na histria de nossa regio,os militares tiveram uma participao decisiva na formao das novas naes e,conservando uma antidemocrtica autonomia dentro do Estado, intervieram sempre que

    assim o acharam oportuno no cenrio poltico e nos destinos nacionais, obscurecendo ahistria demasiado recente do continente com sangrentas ditaduras. Por isso, no deveestanhar essa preocupao Ptolemaica por parte dos acadmicos do tema. Desde a dcadados 70 at nossos dias, o tema do controle civil sobre os militares dominou o cenrioepistemolgico desta rea e certamente permanecer algum tempo como tema central. Porserem os militares o instrumento especfico da Defesa, quando se pensa a Poltica da reano difcil considerar tambm o tema do controle civil, que eminentemente referido poltica nacional.

    A histria deve ser escrita sem hesitaes e a justia deve ser feita, doa a quem doer.s vezes, a imputao jurdica cede s presses polticas por convenincias degovernabilidade, mas a imputao causal da histria no pode deter-se ante nada. Ditoisto e cientes do longo caminho a percorrer at consolidar a frgil democracia do nossocontinente com a normalizao do controle civil sobre os militares, propomos a rupturaLivre-docente do DECSPI, Campus de Franca. Lder do Grupo de Estudos da Defesa e Segurana Internacional(GEDES) diretor do Centro de Estudos Latino Americanos da Universidade Estadual Paulista (CELA/UNESP) ecoordenador da rea Paz, Defesa e Segurana Internacional do programa interinstitucional (UNESP/UNICAMP/PUC-SP) de ps-gaduao em Relaes Internacionais San Tiago Dantas.1.- No nosso artigo Poltica de Defesa e Relaes Internacionais no Brasil: o destino das paralelas publicadona sua verso completa nos anais do No XXVI Congresso Internacional da Latin American SudierAssociations, Puerto Rico, maro de 2006.

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    epistemolgica da perspectiva ptolemaica em questes de defesa para realizar umarevoluo copernicana na rea. Esta consiste em ver os temas da Defesa desde outraperspectiva, a saber, na sua natureza especfica que internacional, j que o sentido daDefesa no outro que o ambiente internacional no qual o pas se encontra. No h sentidoem se ter um instrumento como o da Defesa se no for por estarmos imersos num mundoanrquico e conflitivo como o internacional. Assim, a revoluo copernicana propostaaponta o bvio, passar de ver a Defesa como questo de poltica interna para analis-la nasua natureza especfica e no seu significado que internacional.

    Talvez por isso nessas reunies os acadmicos debatam com polticos, diplomatas emilitares, porque a Defesa no pode ser pensada apenas por um desses segmentos. Mas, oque fica claro nessas reunies a falta de formao acadmica especfica para estar alturada importncia nacional desses debates, a ausncia de especialistas em relaesinternacionais expertos em temas da Defesa e Segurana Internacional. Por isso, o quechama a ateno que nenhum dos cursos de Relaes Internacionais no Brasil contemplenem uma disciplina referida ao tema da Defesa. Dramtico constatar que a formaoacadmica dos nossos diplomatas tampouco a tem, assim como, por parte dos militares,

    notria a falta de estudos em RI na sua formao superior. Recentemente alguns cursos deRI incorporaram a disciplina Segurana internacional, mas nem a perspectiva da Defesa,que d sentido e peso emprico quela, nem o estudo das FAs, que so seu instrumento,mereceram alguma reflexo especial por parte desses cursos que pretendem formar osquadros para operar neste mundo cada vez mais incerto.

    A nossa Universidade, atenta a esse dficit, contempla no seu curso de RI docampus de Franca duas disciplinas que conseguimos implantar sobre estes assuntos e que otornam nico: Segurana Internacional e resoluo de conflitos e Auxilio humanitriointernacional. Consoante com sua viso de futuro, a UNESP, associada com a Unicamp e aPUC-SP, no j consagrado programa de ps-graduao de RI San Tiago Dantas, instituiuuma rea de concentrao em Paz, Defesa e Segurana Internacional, induzida pelo

    Ministrio da Defesa e o Ministrio da Educao atravs da CAPES, com o claro objetivode satisfazer uma demanda crescente e uma necessidade impostergvel de profissionaisnessas reas. Demanda essa no apenas acadmica, como atesta a presencia de oficiais dasFA entre nossos alunos e postulantes, nem s do Brasil, constatada na pretenso decandidatos de diferentes pases.