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Guardiões do planeta Jaeder Wiler Parte I

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Guardiõesdo

planeta

Jaeder Wiler

Parte I

O mundo globalizado quebra a cada dia valores humanos que deram origem autopias que visam uma sociedade paradisíaca. Ideologias de sistemas políticos efundamentos seculares de uma ordem superior viraram inúmeras bandeiras quesangram dia a dia disputando o que lhes resta de crença.

Depois de meio século de debate descobri que não tenho mais forças para participardesta dialética do que deve ou não deve fazer parte da ordem social. Decidi entãolançar-me no mundo da ficção, onde tudo pode, onde a alma voa e anda sobreoceanos.

Sonhos e ficção, legado da imaginação humano capaz de criar uma cadeira derodas que substitui as pernas de um homem arrancadas por armas de guerra –paradoxalmente, também capaz de criar bombas para novamente arranca-laconcedendo-lhe o prêmio da dependência. Tudo isso fruto de um sistema de naturezapredadora da raça humana que ainda desconhece os limites da ganância e daambição.

Guardiões do planeta: confesso ter surgido na minha vida, como uma tentativa domeu ser de fugir deste campo de batalha feroz e hipócrita: que não perdoa ninguém.

Com o diz um amigo querido: “Ciência não tem bondade”, eu acrescento “Nossosistema não tem bondade e tão pouco flexibilidade”.

Jaeder WJaeder WJaeder WJaeder WJaeder Wilerilerilerileriler.....

Prefácio.

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Havia relógio espalhados em todas as direções, certamente. Havia seis bilhões de indivíduose não sei mais quantos bilhões de micro vidas andando pra lá e pra cá em todo o planeta. Calore chuva se alternavam em regiões segundo os movimentos dos astros e dos ventos. Havia umaguerra, onde valia tudo para encontrar a felicidade. O que seria a felicidade? Havia conceitos edefinições com milhares de variações. Cada indivíduo tinha a sua própria maneira de discursarsobre o tema. Subiam em tribunas improvisadas e, em seus próprios dialetos esbravejavam e altoe bom som: Siga-me, eu sou o caminho e o segredo da felicidade. E, feudos impenetráveis eramdefendidos e formados...

No momento em que tudo isso acontecia, vi-me sufocado por informações desconexas,cujas fontes eu não conhecia e não tinha o direito de argumentar a favor e nem contra. Espadase canhões apontados para a minha cabeça determinavam ser meu dever escolher: uma daquelasbandeiras; segundos eles, indiscutíveis verdades.

A pressão era muito forte. Eu estava quase explodindo. Bum! Explodi. Eu e tudo que estavaao meu redor.

Fui desintegrado: desapareci do tempo-espaço, bem como daquilo que estruturava minhaidentidade. Vivi o efeito do ditado bíblico “Do pó vieste para o pó retornarás”. Transformei-me emum grão de areia.

Implodi-me ou me explodiram: fiquei sem pensamento, sem vida. Experimentei o nada, oabsolutamente vazio.

Acordei! Meio inconscientemente, emergido num campo escondido dentro de uma selvaverde, úmida e misteriosa. Era uma clareira enorme; parecida com um capo de futebol após oúltimo espetáculo. Vazio e absolutamente silencioso.

Instante atrás procurava um canto neutro para meditar e reagrupar os neurônios. Elesestavam me deixando louco. E ali esta eu: num lugar de atmosfera mágica e assustadora. Ondese respira ar tão puro que o coração dispara. De uma maneira ou de outra, ocorria a realizaçãodo meu desejo. Desejo de ficar só. Momento para deixar o meu interior contar a minha estória:precisava me conhecer. Era o momento da minha verdade. Era tudo ou nada.

O sentimento e a sensação era algo difícil de descrever. Possivelmente estava numa dimensãointermediária entre a razão e a ilusão. A dúvida se instalará! Estou vivo ou morto?

Pisei em algo macio, parecia um tapete feito em puro algodão, mas não era. Era um terrenode areia fina, bem próxima ao tipo de areia que encontramos nas ampulhetas. Olhei para o sul,norte, leste e oeste e não conseguia ver a linha do horizonte.

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Diabos, algo acontecia. Uma luz bem forte vinda de todas as direções do infinito traspassavameu corpo da cabeça aos pés e seguia terra adentro. Era muita luminosidade. Nem tive tempode ficar com expressão de assombro ou medo, meu humor sincronizou-se com o maravilhoso,com a alegria. Comecei a enxergar minúsculas partículas brilhantes dentro dos fachos de luzes.Quis pegá-las e prende-las com as mãos. Elas escapuliam e sorriam. Riam muito. Riam de mim.Entrei no clima. Gargalhei e entrei na brincadeira. Foi amor á primeira vista. Pareciam ter gostadode mim. Meu instante de total embriaguez. Vieram centenas. Depois milhares. Depois não seimais quantas. Estava prestes ao êxtase da brincadeira quanto alguém começou a bater palmasem um tom que me era familiar. Aquele som de espectador solitário que aprecia a distância oshow do picadeiro. Parei. Virei o pescoço por cima dos ombros para a esquerda. Não vi ninguém.Torci o pescoço para a direita. Ninguém atrás. Ninguém do lado. De onde viriam aquelas palmascalorosas. De repente uma gargalhada: talvez um eco da minha, pensei. Esfreguei os olhos.Umedecidos refletiram luzes. Olhei para cima. Surpresa! Um velhinho de barbas brancas deolhos brilhantes, como as partículas que tentavam pegar, só que de tamanho maior. Ele olhavapra mim e parecia se divertir muito. Flutuava e veio descendo em minha direção, suavemente,coisa de filme de ficção. Á medida que descia aumentava de tamanho. Quando estava bemperto alcançara mais ou menos um metro e vinte de altura. Magro. Fitou-me profundamente.Sorri meio sem jeito. Estendeu-me a mão e disse:

Quer aprender como pegá-las? Eu estava paralisado: acenei que sim, gesticulando a cabeça.Ele deu um pulo no ar. Um movimento circular numa velocidade que mal deu para piscar osolhos e muito menos registrar e entender como era possível aquela acrobacia. Parou na minhafrente. Fitou-me no fundo dos olhos e colocou sua mão direita por cima da minha. Fiqueimaravilhado! Lá estava a minúscula criatura. Na realidade só via o brilho e os movimentos dealgo. Fica difícil definir o resto do corpo acho que só poderia ser medida em micros, ou numamedida menor ainda, se é que existe.

Coloquei os dedos em direção desejando tocá-la. Não toquei: tinha medo de esmagá-la.

Algo de maravilhoso começou a acontecer. Ela começou a aumentar seu tamanho: umafantástica criaturinha brilhante parecida com uma mexa de algodão daquelas pequeninas queencontramos flutuando no ar. Sim a magia estava na palma da minha mão. Não sei como, mas,ela aumentou de tamanho para se apresentar, um gesto totalmente consciente. Era tudo o queeu queria. Seguramente leu meus pensamentos. Adivinhou meus desejos. Agradecicarinhosamente. A toquei com o máximo de delicadeza possível. Na verdade minhas mãostranspiravam de tanta emoção. Soprei suavemente como fazia na infância com aquela planta,cujas flores são parecidas e leves como algodão. Só que agora a intenção não era para que elaflutuasse ao vento, mas uma brisa suave para secar minhas mãos assustadas.

Ela gostou do carinho; do calor do contato e retribuiu com um sorriso.

Recordei-me de uma cena da minha infância, quando por alguns instantes segurei umaandorinha em minhas mãos. Nossos corações quase explodiram. Ela pensando que nunca maisia voar e, eu sabendo que ao solta-la: nunca mais viveria aquele momento de completo êxtase.

E a história estava prestes a se repetir. Ela ficará maior, mais visível. E era indescritivelmentelinda.

Com a mão aberta e num sopro continuo vi a criaturinha de minhas mãos alçar vôo naquelabrisa despedida.

Confesso que chorei ao vê-la partir...

O velho sorriu. Sentou-se como uma criança naquele chão iluminado. Perguntei-lhe seunome. Ele disse brincando. Se você conseguir me pegar, conto pra você. Se não! E numsegundo estava de pé. Topei. Corri em sua direção. Que nada. O danado não estava mais lá.Havia evaporado no ar.

Foi quando senti um toque em minhas costas. Sim, ele era muito rápido. Dei um pulo,

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tentando pega-lo, nem que fosse pelas pernas. Novamente a surpresa. Estatelei-me no chão eele novamente havia sumido: sem dúvida ele era muito rápido. Perguntei-lhe?

Quantos anos o senhor têm? Acho que bilhões. Milhões. Talvez menos que dez anos,respondeu!

Entrei no clima da ironia e brinquei. Concordo com o último número!

Caímos numa gargalhada de uma só nota.

Percebe-se logo que o senhor é uma criança.

Ele disse: por essa sua afirmação dá para deduzir que seria um grande diplomata ou cônsul.

Novamente caímos em risos e muitas gargalhadas.

Sim, o velho acabara de me conquistar. Claro que ambos, tínhamos gostado um do outro.Pedi-lhe para sentar-mos e conversar. Esta bem, com uma condição.

Conversaremos, mas sem nenhuma palavra.

Indaguei! Isto é possível. Ainda não aprendi arte da telepatia, se é que ela existe.

Entre a terra e o céu a mistérios que a mente humana ainda vai descobrir, afirmou!

Então concordo, respondi.

Fez de novo um gesto muito rápido com as mãos e as criaturinhas voltaram. Milhares, talvezmilhões delas. Fomos envolvidos por nevoa de luzes dos pés até a cabeça. Não demoroumilésimos de segundos e tudo voltou ao normal.

Se é que podemos chamar o que se passava de normal. As criaturinhas desapareceram.Evaporaram na luz.

Ele apertou minha mão.

Foi o toque mais intenso que já conheci. Uma mistura de calor, compaixão, fraternidade emais outros sentimentos que nem sei explicar. A verdade é que uma lágrima desceu pelo meurosto, peito, barriga, coxas e perdeu-se por entre os meus dedos dos pés e a areia onde pisava.

Depois disso não abrimos mais a boca. De uma maneira que não entendo parece que eleme transferiu o poder da telepatia. Eu entendia tudo. E não dizia uma palavra. Era um mistério.Mas a partir daquele momento nossas mentes se comunicavam numa mesma sincronia efreqüência em perfeita harmonia.

Sentamo-nos. Olho no olho. Disse-lhe; quer dizer, transmiti meus pensamentos. Era umasensação de lucidez que nunca havia experimentado. De uma forma ou de outra sabia estartransmitindo o que eu poderia estar falando, mas para meu espanto se quer lembrava que tinhaboca.

Contei que estava triste com o que tinha visto e vivido até o momento. Argumentei o tempotodo, sem mover centímetros dos músculos faciais, que apesar de ver e ter conquistado osbenéficos da nossa era: a comodidade oferecida pela santa tecnologia e ter convivido comsabias pessoas que diziam conhecer o caminho da felicidade, não conseguia interação comminha família e com os grupos sociais. Disse também que trabalhava desde meus oito anos deidade e, enfim... Chorei as pitangas, como se diz. Fiz dele um padre, um amigo, um terapeuta.

Nossa conversa parecia estar acontecendo num templo vedado. Havia um silêncio absoluto.Ele olhava-me com carinho, parecia ser o olhar da própria harmonia. Ouvia com a atenção deuma pessoa que desconhecia relógios. Não aparentava nenhuma pressa.

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Não me interrompia. Deixava-me a vontade. Era como entrar no meu quarto. Ligar o som,gritar e falar sozinho qualquer coisa, sabendo que na porta estava um cartaz vermelho com osdizeres: Não perturbe gênio bravo! E que todos iam respeitar o aviso.

Foi a maior sensação de liberdade que senti na minha vida. Ele não me reprimiu e nem medeu conselhos. Só ouviu: como meus pais nunca fizeram...

Silenciei-me. Ficamos assim por algum tempo, na verdade perdi a noção do tempo. Podeter sido um quantum de tempo qualquer – curto ou longo. Difícil descrever...

Uma linda borboleta amarela apareceu do nada. Fazia acrobacias em nossa frente como sefirmando como a rainha dos ares.

Meu novo amigo notou-a também, mas ninguém fez comentários. Apenas um pequenodeleite para os olhos.

Um show de acrobacias que desviou minha atenção por alguns minutos.

E, como se num passe de mágica comecei a ouvir meu interior e era como se recebesseuma mensagem.

Não havia som físico, mas era como se houvesse som! Outro grande mistério. Sim eu asouvia; palavras claras com sentido definido. Uma linguagem simples. Poucos verbos, mas,objetivos, sem metáforas, sem figuras de linguagem. E foi dizendo, quer dizer; irradiando.

Meu amigo; posso afirmar para você que não existe um caminho único e verdadeiro para afelicidade, por isso o frenesi das pessoas que o rodeiam. Como você, muitos querem aplacar oburaco negro entre a alma e o corpo. Para alguns uma dualidade, para outros uma unidade,única e inseparável. Portanto aceite e siga seu ciclo, ele terá como o de todos, inicio, começo,fim e talvez recomece de uma outra forma, ainda desconhecida pelo nosso dicionário social.

E a dúvida final não é um problema. Ao contrário é a esperança de muitos. É a possibilidadede continuar. Um sonho que nos mantém firmes em nossos objetivos. Tornando nosso presenteum desafio.

Quem sabe; como muitos acreditam, a morte inexiste.

E que ela é apenas uma passagem: lembre-se que a lenda de Fênix é a esperança em vida.

E porque não imaginarmos que essa lenda, pode nos trazer de volta de outras dimensões,também através de lágrimas composta não pela simples gotas de uma lágrima. Mas por algumaoutra matéria mais pura, que ainda desconhecemos?

Tudo se transforma; as cinzas também; delas, já sabemos; podem surgir diamantes!

E a soma deste elemento novo com outros, deixam o indivíduo cada vez mais próximo dafelicidade.

Vou revelar-lhe meu nome, apesar de você não ter conseguido vencer-me no pega-pega,como combinamos:

Meu nome é Bobo.

Indaguei! O Bobo da corte? Bobo universal, afirmou.

Habito todos os homens e mulheres do planeta. Sou ouvido por alguns. Por outros não.Alguns não entendem o que digo e por isso ficam doentes.

Há quem confunda o conceito de bobo com ignorância. São os que ouvem e não entendeme que olham mas não enxergam.

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Eu, também me renovo, mas quando disse minha idade, disse-lhe apenas o que você queriaouvir. Nem mesmo eu sei minha idade. E pra que importa esta delimitação de tempo. O tempopara a felicidade pode ser apenas segundos ou bilhares de segundos. O que importa para umsurfista? O comprimento da onda ou o êxtase que ela pode lhe proporcionar. O tempo vem emondas; umas menos e outras mais longas. É só isso.

Sou um guardião dos segredos da raça humana. Tenho a responsabilidade de preservar asemente. É nela que encontramos a seqüência de todas as formas de vida do planeta.

Conheço a arte do palhaço no circo infantil e conheço também; como se dá os buracosnegros da economia humana.

Todos, de uma maneira ou de outra seremos imortais.

Deixamos lembranças, saudades e maneiras de agir e pensar. É uma forma de ficar por aquidepois que o corpo se desintegra. E, mesmo desintegrando-se ele comporá a matéria de outrose quem sabe vai se recompor?

A sempre um pouco de nós acompanhando as passagens das gerações que se sucedem.

Você foi escolhido para um grande feito. Esta chegando á sua hora.

Como assim, perguntei?

Muitos investiram em você.

Acredite!

Esteve aparentemente sozinho para aprender com a experiência. Não pense que não vimosquanta fome e quanto frio você suportou. Humilhação e desafeto. Não interferimos para você iralém dos seus limites e você ultrapassou os limites esperados e, com sobra.

Agora é á hora de acrescentarmos um brilho no seu conhecimento.

O senhor me assusta!

Você vai influenciar pessoas a fundarem uma organização mundial de preservação ambientalde todo o planeta. Uma organização de respeito à vida e sem falcatruas.

Não estou entendendo nada. Calma: virão outros para te orientar...

A luz intensa foi diminuindo e o sol foi embora, veio à lua, as estrelas e neste instante ouvi umbarulho estranho. Algo em alta velocidade descia céu abaixo. Cores vermelhas, amarelas comtons de azul e verde. Aparentemente em chamas.

Os deuses do fogo lançavam um aviso. Um espetáculo que precisava ser compartilhado.Era um meteorito? Era alguma coisa... Nunca tinha visto algo assim. Era algo estupendo. Nãosei...

Olha! Apontei o dedo para o céu e procurei meu amigo, ia mostrar-lhe aquela mágica cena,para minha surpresa ele havia desaparecido.

Naquele momento cocei a cabeça, fiquei perturbado. Era mistério demais...

Confesso que fiquei vendido, aquela sensação sentida quando entramos de cueca na salae descobrimos que nossa mãe está com visita.

Uma tremenda sensação de espanto.

Meu corpo foi ficando pesado. Sentei-me na areia macia. Algumas lágrimas desciam pelo

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meu rosto. Uma brisa forte tomou conta do momento. Tentei achar algo para me apoiar naquelaareia fina. Imaginei-me ser areia movediça. Senti que lutava contra a lei da gravidade; minhaenergia foi se apagando, assim como uma lareira sem lenha. Na última chama adormeci.

Não tenho a menor idéia de quanto durou o adormecer. A lógica indica que foi muito tempoe não me recordo de nenhum pesadelo e muito menos de sonhos. Foi como um período deamnésia. Não se sabe quando começa e tão pouco quando e como termina. Apenas passou elá estava eu: vivo novamente.

Sentindo as delicias de uma brisa suave. Virei para um lado. Virei para o outro buscando umnorte. Nada! Estava em algum lugar em qualquer lugar deste universo. Tentei me localizar, semlevantar, ainda deitado no chão macio como colchão. Não havia nenhuma dor muscular. Nemmesmo aquela preguiça que costuma retardar o acordar. Estiquei o corpo como normalmente oscachorros e os gatos fazem. Bocejei. Então fiquei de pé. Passei a mão pelo rosto e respirei bemfundo.

Soltei a respiração no ritmo da brisa.

E então ele aparece. Na verdade estava do meu lado o tempo todo. Quieto. Olhando.Espreitando. Nos seus olhos um brilho de esperança e de convite à amizade. Perguntei-lhe onome? Ele respondeu. Futuro!

Futuro! Cai na gargalhada.

Ele ficou sério e perguntou? Esse circo todo é por causa do meu tamanho ou da minhasuposta idade?

Suposta! Ele me intimidou.

Achei estranha a resposta incisiva e um nome tão forte e significativo para aquela criança.Mas não questionei.

Diante de mim, estava um garoto, com seus treze anos aproximadamente. Pelos seus trajes.Sandálias tipo franciscanas ou romanas. As pernas nuas. Na cintura algum tipo de tecido que separecia com folhas e do umbigo pra cima nenhuma proteção ou ornamento.

Na cabeça, apenas os cabelos com um corte estranho; natural e reluzentes. Sim! Na minhafrente estava um futuro cacique. Pajé. Feiticeiro ou qualquer outra nomenclatura que se possadar a uma pessoa decidida, inteligente e de rara e complexa sapiência. Este fará coisasimportantes. Talvez por isso o nome, pensei...

Estendeu-me a mão esquerda. Aceitei o gesto. Provavelmente um canhoto! Começamos acaminhar em direção a floresta. Acredito que diante de uma criança tão segura e serena que meconduzia ao desconhecido, tive medo. Medo sim.

Medo visível, confirmado pela forma apertada que eu segurava sua mão que me guiava. Osuor como orvalho nas folhas descia pela minha testa.

Caramba! Coisas estranhas vinham acontecendo desde que pensei em procurar um cantopara colocar as idéias no lugar. Explosão! Pontos de luz ou fadinhas. O velho sábio. Telepatia.Uma espécie de morte ou de amnésia. Realmente tudo era o inesperado.

Agora uma criança com um vestuário esquisito, um pouco de índio, um pouco de futurismo.O que estava rolando? Será que eu estava sonhando. Belisquei-me algumas vezes, mas ocenário não se alterou. Resolvi continuar na estória sem questionar.

Caminhamos longamente por trilhas ora estreitas ora largas, decoradas por arvorescentenárias, flores e plantas e animais exóticos. Á medida que me tornava um observadordarwiniano meu coração acelerava. Em alguns momentos pensei: é agora, serei vitima de umataque cardíaco, d’aqueles fulminantes. Morte súbita como é conhecido popularmente.

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Onde a pessoa sem tempo de dizer amém passa desta para melhor, ou pior, na verdadeninguém sabe. Meu coração estava no máximo de suas pulsações.

Senti que havia sobrevivido ao desconhecido. Pare! Parei de andar e de pensar. Foi atéprovidencial. Caso contrário meus neurônios entrariam em curto. Certamente alguns já estavamsem a camada protetora. Assim como um fio elétrico de um circuito instalado por um maueletricista.

Era a voz de comando do meu guia. Ele olhou bem fixo para mim e apontou uma arvore quelembrava a lendária torre de Babel!

Após a fantástica viajem pelo mundo da fauna e da flora chegamos a uma arvore gigante.Acho que precisaria de um circulo formado por mil homens de braços bem compridos paraabraçá-la. Rodeamos a arvore e o meu amigo Futuro, levou-me por entre os arbustos formadoresde uma segunda vegetação circunvizinha, composta até por arbustos cheios de espinhos, quedesestimulavam á aproximação de estranhos.

Delicadamente recomendou-me cuidados nos movimentos e acenou para que me senta-senuma tábua. Era uma tábua que lembrava uma centopéia. Ela possuía centenas de minúsculasrodinhas. Algo parecido com um carrinho de rolimã só que com apoios laterais com a frenteencaixada numa fenda, cuja abertura era uma passagem. Uma passagem secreta escondida emuito bem encoberta por arbustos cerrados. Estreita. Para ele a altura ideal. Entrei com umpouco de sacrifício. Graças ao meu bom estado físico pude exercitar a arte do contorcionismo.Abaixando aqui. Ajoelhando ali. Consegui me acomodar na tábua. A vegetação intensaproporcionava uma atmosfera úmida e refrescante.

Vapt! Senti um pequeno empurrão antes de dizer; estou pronto e lá estava uma novaaventura se abrindo na minha estória. Algo de fantástico. Algo indescritivelmente de puraadrenalina. É tudo que se consegue pensar numa hora desta.

O carrinho deslizava numa velocidade espantosa sobre uma trilha lisa formada por uma pistatransparente. Parecia ser uma superfície de gelo ou de vidro. Sinceramente nem dava tempo deolhar o que estava ao redor. Na verdade não se olha nem para cima nem para baixo, fica-secentrado no aperto da respiração. Foi um passeio de montanha russa. Foi como um sustoquântico. A gente fica com medo e fecha os olhos por segundos e quando abre tudo esta no seulugar.

Chegamos!

Ouvi ou captei com o pensamento. Já não distinguia som de telepatia. Era tudo a mesmacoisa. Eu estava dentro de uma rede de comunicação como emissor e receptor, isto eu entendia!

Lá dentro, por entre um mosaico de raízes um fantástico mundo. Arquitetura medieval econtemporânea. Ruas, avenidas e praças que nunca havia pensado. O espaço ocupado emvárias dimensões. Faces de uma geometria que nunca havia visto. Mas, tudo funcionado emperfeito equilíbrio.

Primeiro apresentou-me seus avós. Senhor e senhora vestidos com uma túnica prateada,assim como todos os presentes. Variando apenas as cores. Percebi que ali havia um elo forte nacadeia de antepassados. Não sei quantas pessoas ali se encontravam; não apertei a mão denenhuma porque eram milhares. Apenas acenei com a cabeça, demonstrando minha satisfaçãoem estar ali.

Todos estavam felizes com a minha visita. Ninguém falava em comida e bebida. Aliás,ninguém falava literalmente. Desde o encontro com senhor Bobo. Conscientizei-me que a formade linguagem neste universo que me encontrava era outra. Parece que a telepatia era coisa quese aprendia desde criança naquele fantástico mundo. Eu estava espantado.

Pensei que acenderiam o cachimbo da paz, ou qualquer outro tipo de convenção queconhecia, me enganei:

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Digamos que a luz da alegria e da felicidade alimentava o ambiente e era o cartão de visitade todos.

O que gentilmente me cederam em abundância.

Senti-me um príncipe recebido com o mais nobre respeito.

Ficamos; homens e mulheres, conversando por muito tempo. Histórias, lendas de conquistase do crescimento espiritual da raça humana era o assunto predileto de todos. Há muito sentiafalta de uma boa conversa. Coisas consistentes. Trocar idéia sem interesse em competir.

Apenas conversar; adorei cada palavra que ouvi.

Por um bom tempo havia me desgarrado do meu novo companheiro. Gritei, quer dizeraumentei minhas ondas cerebrais focando intuitivamente minhas energias na freqüência doFuturo, silêncio foi á resposta.

Futuro, naquele momento, não estava ao meu alcance. Acredito que ele o fez de propósito.Queria, penso eu, que o conhecimento do seu passado acontecesse da maneira mais naturalpossível. E foi assim. Já me sentindo em casa, ouvi alguém me chamando. Fiz perguntas sobrea evolução da raça humana. Sobre as invenções existentes nos quatro cantos do mundo. Todoscom muita paciência tentavam satisfazer minhas dúvidas. O problema é que pareciam e eraminfinitamente mais avançados que eu. Confesso, ás vezes fazia gestos de quem entendia paraabreviar meu sofrimento ao constatar que minha pobre lógica não acompanhava as explicaçõesque me davam.

Parece que suas questões cotidianas, eram algo complexo demais para mim. Sabiam dissoe tentavam me poupar. Falavam de coisas complexas de maneira simples e sempreexemplificando.

Mas pude esclarecer muitas dúvidas. A principal é que tudo vem á seu tempo e que se deveter grande respeito pelo passado, por conseqüência, respeito pelos mais velhos.

Futuro tinha uma doce melodia quando se comunicava. Sim, havia melodia, não essa quese conhece ao som da guitarra ou de um vocalista. Mas uma melodia composta por matériasdesconhecidas. Próximo ao que se sente, quando ouvimos o solo de qualquer instrumentomusical, ou quando meditamos ao lado de uma pequena queda de água. Algo inerente a todasua composição como ser. Algo belo e pronto. Seus olhos. Sua face acompanhava o ritmodesta escala musical. Sim. Futuro era uma criança verdadeira. Brincalhona, mas responsável.

Adorei seus avós! Ele brincou. Eu também. Venha.

Saímos correndo para um outro lado, onde uma raiz enorme servia de escorregador paraoutras crianças que ali se divertiam.

Perguntei?

- Não existe privacidade por aqui?

Ele com cara de surpresa; o que você quer dizer!

Se toda comunicação aqui é na base da telepatia tudo que penso você sabe, e vice versa.

Claro que não respondeu.

Todos nossos impulsos dependem de nossa vontade e em nossa mente há um emissor queexpressa essa vontade. Portanto coisas que você quer guardar só para você não são emitidas.E também somos éticos. Ninguém invade a mente de ninguém. Se assim fizéssemos seria aditadura do coletivo, não existiriam indivíduos. Seriamos uma única célula, assim como moléculasde água num grande oceano.

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Puxa! Fiquei admirado. Como aquele garoto podia ter tanto conhecimento e ser tão bom naoratória.

Resolvi ficar quieto e aprender o máximo possível.

Lembrei-me do provérbio popular: “ Deus deu ao homem duas orelhas e uma boca “, claroque para escutar mais e falar menos...

Entramos num buraco, que parecia um esconderijo dentro do esconderijo.

Mas não era um buraco comum. Enorme. Algo como a cratera de um vulcão. Algo comouma estação central de metro Londrino de última geração. Gigantesca. Fiquei maravilhado.Futuro pegou na minha mão e me levou a uma cadeira que ficava no centro da grande caverna.Tirou de um canto coberto por outras plantas inexistentes no meu pequeno arquivo cerebral.

Vi milhares de equipamentos que não me eram de todo estranhos. Telas de plasma. Painéisdigitais. Muita luz e cores sobrepostas como nunca havia sequer imaginado.

Colocou-me um óculo especial. Era diferente. Não tinhas hastes e Moldava-se perfeitamenteno meu rosto. Parecia ser feito de uma resina viva.

Colocou na ponta do meu dedo uma espécie de micro chip que imediatamente moldou-secom perfeição ao formato dele. Era orgânico. Era espantoso, mas era algo que parecia terinteligência própria. Por um instante o espanto virou pavor.

Deduzi que aquilo era um sofisticado mouse.

Alguns raios de luzes coloridas se acenderam. Cruzavam o ar formando inúmeras figurasgeométricas.

Sentou-se a meu lado e disse:

Vamos viajar... Em segundos eu estava correndo dos dinossauros, que com suas enormesbocas queriam me devorar. Tigres dentes de Sabre. Elefantes bizarros. Peixes voadores. Hienasenormes que vinham em bando atrás de nós.

Futuro, ria, gargalhava. Eu estava suando. O coração acelerado. Sem ar. A beira do pânico.Então ele segurou a minha mão e tomou o controle da situação. Tudo mudou e lá estávamosnós. Na beira de uma lagoa. Mansa. Do nosso lado monges orientais andando calmamente porentre as plantações de arroz. Senhoras e senhores calmos e tranqüilos, tocando instrumentosmágicos que trazia calma e paz no espírito.

Perguntou-me se estava gostando. Disse que sim. Ele de maneira brincalhona, largou aminha mão e gritou: o comando é seu. Navegue!

Dei um berro. Uma figura gigantesca que já assustou o mundo me encarava: King Kongfrente a frente era demais para meu pequeno espírito.

Ouvi uma multidão gritando em coro.

Morte aos cristãos, morte aos protestantes, muçulmanos, judeus e outras vozes infamadasrepetindo centenas de refrões. Era uma guerra de gritos. Nada se entendia.

Parecia que os tímpanos iam estourar: abaixo todas as religiões e outras doutrinas; morte ademocracia, morte ao comunismo. E as vozes não paravam e eram cada vez mais altas; fora aditadura, o capitalismo, morte a isso morte aquilo.

Prendam os piratas. Vamos saquear tudo. Acabem com os Imperadores, Reis e Rainhas.

Acho que estava dentro do inferno. Corria como um louco. Balas de fuzis, de canhão,

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espadas cheias de sangue. Lanças cravadas na carne. Parecia que eu era a carne. Nummomento estava na antiga Babilônia. No outro na antiga China. Na Inglaterra. Na Irlanda donorte. No Japão. No oriente médio. Na antiga Grécia. Morte aos romanos. Morte. Morte. Morte.Morri.

Apaguei completamente. Era como desligar a tomada de uma lâmpada. Penso que fui parao espaço e estava flutuando e nada me tocava. Sim. Estava morto.

Foi o que pensei...

Algo como a luz suave da alvorada, seguida de uma voz suave tocou-me foi á últimaimagem que registrei.

Quando acordei, lembrava-me das fases que o meu corpo passará:

Comecei a recordar cada etapa:

Primeiro a respiração foi aumentando. O calor intenso. O cérebro com medo. Depois opânico, a falta de ar e uma disritmia progressiva e, finalmente: apaguei.

Futuro, jovem e sábio; sabendo que eu precisava de tempo para assimilar este mistério entreo sonho, a realidade e fantasia, aguardou o tempo necessário para que meu corpo e espírito serefizessem.

Finalmente de olhos bem abertos olhei nos seus olhos; compassivos e a minha espera:

Meu amigo. Estou morto. Perguntei?

Sorriu como um adulto e disse: não.

Você esta mais vivo do que antes.

Quem é você afinal? Perguntei? Criança, criança. Não pode ser.

Repeti isso várias vezes.

Silenciosamente, pegou seus brinquedos de alta tecnologia e guardou-os no mesmo lugar.Abraçou-me bem, como quem quer dar colo. Seja do pai. Seja da mãe. Naquele instante sentique abraçava a mim mesmo. Queria sim. Dar todo meu afeto aquela criança. Mas, eu tambémacabava de descobrir que também precisava deste afeto. Acredito que naquele momentohouve o primeiro e mais puro principio de escambo - a troca de afetos sem moeda de troca.Apenas sentimento por sentimento. Uma sensação indescritível.

Refeitos dos efeitos de uma emoção tão intima. Futuro chamou-me num canto e sussurrou.Temos que ir embora. Mas, quero lhe revelar um segredo.

Meu nome não é Futuro, apresentei-me com esse nome, por que sabia ser, o que vocêqueria ouvir. Na verdade, sou filho do senhor Bobo, me chamo Harmonia. Troquei de nome commeu irmão mais velho. Em breve você vai conhecê-lo; ele está a caminho.

Senhor Bobo. Futuro que não é futuro, mas Harmonia. Murmurei...

O que disse?

Nada, pensei alto.

Esta vendo o disse a você anteriormente. O que vale para a comunicação oral. Vale para atelepatia. Pense antes de emitir o sinal.

Agora você ficou em dúvida se emitia ou não um pensamento. E, você mesmo cortou a

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emissão. Tudo é uma questão de treino. Agora você já está num nível acima e nunca maissentirá medo de pensar livremente. Não existe ainda policia do pensamento.

Viu como ainda existe mundo privado.

Quando voltamos para a floresta, no caminho principal, ainda conversamos um pouco.Minha cabeça estava cheia de coisas para pensar. Meu coração e espírito já calmos e serenos.

Pensando mais saboreando as maravilhas daquela trilha. Arvores e arbustos de todas ascores. Vermelho em tom de vermelhos. Amarelos outonos e outros amarelados era tudo sul real.Em alguns trechos a paisagem parecia vir de dentro de um monitor de plasma de última geração.Melhor parecia que se tinha mergulhado na tela. Parecia realismo puro.

Tudo era um sonho e precisa de um toque no real para saber que estava vivo. Passei acaminhar acariciando os arbustos. Vegetação verde. Flores de todas as cores: amarelas,vermelhas, brancas, rosas e outras difíceis de definir. Mas, todas de uma beleza indescritível.

Senti uma picada! Uma gota de sangue vermelho rubro saiu timidamente do meu dedo.Depois outra e depois várias. Meus olhos embaçaram. Fiquei um pouco tonto. Murmurei.: Futuropare. Um curto nos meus neurônios.

Queria falar e ao mesmo tempo usar a telepatia, algo como “ telepatizar”, não sei como sedeu um pedido de socorro, mas ele ouviu!

Ele me atende. Seu olhar é fixo. Sinto náuseas e um frio gelado na espinha. Um suor secoe frio percorre minha alma. Minha garganta é fechada por uma estranha sensação de desertosem uma gota de água. Sinto o espinho como uma adaga comprida, cuja ponta atingiu ocoração. Penso ou vejo meu dedo ficar do tamanho da pata de um elefante. Ele fica muitopesado. O sangue não para de sair. Vejo sangue sanguessugas alimentando-se do meu sangue.

Sinto um solavanco e parto para o mundo vegetativo.

Desmaiei ou morri. Naquele momento não havia diferença. Senti um sabor de despedia.Despedida da vida. Gritei pelo Futuro. Meu pedido de socorro encontrou um eco de silênciomortal. Um sabor de solidão.

Apaguei completamente. Assim como num eclipse total. Trevas. Só trevas. Nem mesmosonho ou delírios.

Ouvi latido de cães. Pássaros cantando seguido de barulhos de aviões a jato. Muitos.Centenas. Parecia a segunda guerra mundial. Abri os olhos. Não. Não estava sonhando.Assustado e com o olhar intermitente comecei a explorar o mundo com a pouca lógica que merestava. Meu corpo estava quente. Eu estava respirando. Havia um curativo no meu dedo ondeo inchaço atingirá o tamanho da pata de um elefante. Portanto estava vivo. A não ser que tudoque é visível e palpável é irreal, pensei.

Procurei pelo Futuro. Gritei. Gritei muito alto. Estava só. Seria tudo aquilo um estado dealucinação? Fiz a pergunta em voz alta.

Neste momento um avião fez um vôo baixo e dele saiu um pára-quedas que se abriu,segundos depois. À medida que se aproximava do solo, a pessoa acenava amistosamente.

Fui invadido por uma mistura de medo e mistério. Meu coração já havia se embebedado porvárias vezes de muita adrenalina e, tudo indicava mais uma grande dose. Acho que já tinhamorrido pelo menos três vezes. O que aconteceria a partir deste inusitado ator que entrava emcena sem o meu convite. Aliás, não convidará ninguém. Tudo que fiz foi procurar um canto paraficar em paz.

Para que minha alma pudesse refletir sobre seus objetivos e desejos. Mas não conseguiprivacidade.

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Diversos atores entraram no meu espaço e me levaram para aventuras de máxima adrenalina.

Sobreviverei a este novo personagem:

Tudo foi escurecendo; vi-me embaixo de um grande pára-quedas com um desconhecido.Dei-lhe um soco seguido de um grito de guerra. Desesperadamente procurava uma maneira desair da armadilha quando ele falou em voz alta; fique calmo rapaz. Errei nos cálculos e o ventome empurrou para cima de você. Sou amigo. Ajude-me a tirar este velho pára-quedas que possoexplicar.

Saiba você que este companheiro me acompanha a mais de cinco décadas.

Acho que me atrasei me desculpe disse ele!

Não me recordo de ter solicitado a presença de ninguém, disse em voz alta e carregada deraiva. Explique-se não estou entendendo...

Meu nome é Bom-senso, sou professor do se amigo Harmonia. Você quase morreu meuamigo. Você foi mordido por uma cobra. Uma cobra catalogada como inofensiva. Mas estacobra possui um veneno raríssimo, a maioria de suas vitimas adquire uma cegueirapermanentemente ou passa a depender de remédios diários para evitar grandes convulsões quelevam a parada cardíaca.

Mas pensei ter apenas espetado um espinho no dedo. É o que todos pensam. Sorte suaHarmonia ter cuidado de você e depois me enviou para continuar o seu preparo para o grandedia.

Que virada. Que grande dia?

Esqueceu o que conversou com o senhor Bobo?

Sabe o que acho. Acho que são vocês os malucos.

Acho que já atravesseis o patamar da ilusão e agora estou no mundo da alucinação.

Sai para um retiro e vocês são minhas fantasias. Nem o Senhor Bobo. Nem o Harmonia tãopouco os antepassados são reais. Todos são frutos da minha alucinação.

Aliás, Bom senso. Que nome esquisito. Entrar em cena pulando de um avião num pára-quedas velho como esse. Até que para uma fantasia você foi criativo, mas para o nome vocêpoderia ter usado um pouquinho mais a imaginação.

E para onde foi meu protetor. No momento, Harmonia esta estudando e sendo preparadapelo seu pai, o senhor Bobo e seus antepassados. É uma espécie de reunião de família parapreparar o futuro do Futuro, irmão de Harmonia.

Ah! Entendi mais ou menos...

E o senhor quem é! Quer dizer, seu nome é Bom-senso. Professor da Harmonia, meu amigoe irmão do Futuro que está a caminho. E ai...

Ai, que vou verificar se já se recuperou da mordida da cobra. Respire ao meu sinal. Solte oar.

É parece que todas as suas vias respiratórias foram restabelecidas. O aparelho respiratórioe a visão são os mais atingidos por este veneno. Felizmente você escapou sem efeitos colaterais.

Para com isso. Senhor Bom senso. Se o senhor é produto da minha fantasia; tudo isso éirreal.

Não existe cobra e muito menos machucado. Ele sorriu discretamente.

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Então vamos apertar mais um pouco o curativo, disse ele. Ai! Senti muita dor. E aquela dornão me parecia imaginação. Fiquei em silêncio.

Quer dizer; criei um vazio em minha mente. Freqüência de repouso. Precisava de um tempopara esfriar a bateria.

Bom agora que se acalmou posso lhe contar o objetivo da minha missão com você.

Devo levá-lo a um lugar para responder algumas das perguntas que você fez quando aHarmonia apresentou aos nossos antepassados e em seguida devo levá-lo a aldeia ondeviveram muita gente que você conheceu pessoalmente e outros apenas pelos nomes, inclusiveHarmonia e seu irmão Futuro.

Dizendo isso, Bom-senso colocou a mochila, com seu inseparável pára-quedas na costa ecomeço a andar.

Sem escolha, comecei a segui-lo. O caminho parecia conhecido. Pássaros conhecidos eanimais silvestres comuns na minha vida desfilavam pelo trajeto.

Novamente notei que a fome não se manifestava. Paramos a beira de uma lagoa. Um localtão lindo: digno dos melhores filmes do cinema.

Visto daquele ângulo, o lago era uma bela piscina esverdeada. Esmeralda liquida!

Parecia que um paisagista tinha plantado cada arvore que circundava o lago. Palmeiras.Coqueiros. Vegetação rasteira e até aquela flor vermelha, chamada bico de papagaio. Essadominava a paisagem.

Querendo mostrar sabedoria quis ensinar Bom senso, como beber água numa situação deacampamento.

Peguei uma grande folha dobrei ao meio no sentido longitudinal e novamente ao meio nosentido transversal. Formou-se uma concha com a qual retirei a água e mostrei para Bom sensoque apenas sorriu.

Nem bebi. Também não estava com sede.

Bom-senso entrou e sumiu por entre a água que jorrava por cima da mata. Senti certodesconforto. Pensei em desistir e sair correndo. Veio a questão; correr para onde?

Respirei fundo como se fosse dar um mergulho profundo do alto de um trampolim, mergulhei.Sai por entre raízes e vitórias régias no centro de uma caverna escondida pela mata. Para meuespanto estava seco. Nenhuma gota de água em minha roupa. Nem mesmo uma tímida molhada.Estava completamente seco, apesar de toda aquela água que jorrava e a umidade do ambiente.

Bom-senso estava sentado me esperando. Ele estava sentado em cima de uma pedraestranha. Na cor grafite e com a forma de uma cistina de igreja. Muito estranho pensei!

Você esta meio confuso. Não esta? Claro, respondi. Você acha que não deveria...

Acho que sim, disse ele. Mas paciência é uma virtude. Logo você entenderá tudo.

Preparado para essa grande viajem. Fiz um gesto positivo com a cabeça.

Pegou uma espécie de chave na mochila e apontou para a pedra. Uma porta automáticacomeçou se abriu. Dentro tudo que conhecia da mais alta tecnologia elevado á máxima potência.

Painéis de plasma e assentos ergométricos. Quase perdi o fôlego. Ofereceu-me um liquidopara beber. Para mim era água, mas ele falou um outro nome que não me lembro.

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Nem me atrevi a perguntar se aquilo era uma nave ou um avião, ou um complexo simulador.

Sentou-se numa cadeira que parecia a de um comandante. Sentei na cadeira ao lado eimitei seus gestos.

Sorriu para mim. Colocou as mãos no lado direito do painel. Senti um zunido no ouvido ecochilei por alguns segundos.

Desperto olhei por uma pequena janela. Janela não, Toda a nave era uma janela. O que erapedra tinha se transformado em água. Água num estado que já tinha imaginado. Sólido que nãoé sólido. Algo parecido com vidro, mas menos rígido. Novamente meu coração ameaçou meabandonar, uma taquicardia de proporções que jamais tinha sentido. Pensei que tinha chegadoà minha hora. Respirei em ri timo tão frenético como a respiração de uma mulher no parto. Foihorrível, mas do jeito que veio se foi...

Impensável. Inacreditável. Impossível. Meus olhos ficaram arregalados. Vi o surpreendente.O êxtase do belo e majestoso. Primeiro estar numa nave de água. Um dos meus sonhos quandoestudei um pouquinho de física. Havia imaginado que se dominassem as moléculas de água,construiria uma nave em formato de triângulo eqüilátero. Viajaria em todas as direções apenastransferido a força segundo os vértices de cada angulol e ainda, quando necessário, transformariaseus narizes pontudos em aríetes de titânio, ou algo mais forte. Teria a maior velocidade douniverso. Armas. E ali estava eu, dentro do meu sonho e ainda com todas as estrelas que vi e quenão vi em toda a minha vida. Planetas que só conhecia pelos sites de astronomia e geografia,inclusive a Terra. Estavam lá. Quase ao alcance das minhas mãos. Pareciam bexigas coloridas,só que paradas no ar.

Queriam que eu as fotografasse. Aos poucos fui sentindo um pulsar, suave como ás batidasdo meu coração, agora calmo e em paz.

Sentia meu corpo leve: flutuando. Produto do êxtase. Uma melodia suave, com notasdivinas quebrava aquele imenso silêncio.

Perguntei! Bom-seno, eu mereço tudo isso.

Sim meu bom amigo. Você merece. E não sou eu apenas que esta afirmando seu merecidomérito, mas uma arvore enorme que esta ramificada nas raízes dos seus antepassados.

Relaxe. Vamos fazer desta viajem uma aula divertida. Aula. Exclamei! Sim, meu bom amigo.O meu plano de vôo é baseado em um único objetivo: atender seu desejo de conhecer algunsmistérios do universo.

Puxa! Não mereço tanto.

Olha a sua esquerda. Veja aquela nuvem de poeira gigantesca. Ali nascerá uma estrela ouplaneta.

Há poeira cósmica por todo universo. Como se fosse um grande tapete. Ela se acumula esobre grade pressão seus bilhares de átomos se aquecem: dizem que mais de dez milhões degraus. Inicia-se a combustão de gases e os átomos vão se combinando numa progressão queresulta em corpos gasosos e depois em sólidos. Os primeiros serão planetas e os últimosestrelas. Falo no plural, porque segundo os superiores; isto acontece em bilhares de ponto douniverso. Em centenas de galáxias e quem sabe, até em outras dimensões.

Nossa! Acho que vou estudar para ser astronauta ou astrônomo.

Calma! Espere para ver; há muito mais no universo.

O que é aquilo brilhante vindo em nossa direção. É muito pequeno para ser um astro.

Não se preocupe, é apenas lixo espacial. Algum pedaço de metal que se desprendeu dos

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inúmeros foguetes e sondas que os homens estão inventando para conhecer os mistérios douniverso.

No futuro; você ou seus filhos poderão montar uma empresa para tirar lixo do espaço.

Sua firma poderia ter o nome de LA – Lixo Atômico. E o slogan da campanha poderia ser:

Reciclamos com a velocidade dos eletros: INVISTA APENAS UM QUANTUM E SEU ESPAÇOTERÁ O BRILHO DAS ESTRELAS!

Quem sabe, um quantum não será o dinheiro do Futuro.

Caramba senhor Bom senso, como o senhor é inteligente!

Nada disso meu amigo. Somos todos inteligentes.

Na realidade acho que é uma boa hora para contar-lhe a verdade.

Não sou só professor do Futuro. Sou também tio. Formamos uma grande família e,descendemos de uma linhagem de seres que vieram para a terra para propagar o equilíbrio doplaneta, em Protum I, não conhecemos a morte: apenas vivemos...

Como assim? É complicado. Por enquanto posso adiantar que valorizamos demais osnossos antepassados. Para nós; somos frutos de uma arvore cujas raízes se interligam.

Plaftite! Um barulho muito esquisito pôs fim á conversa. O choque seguido de uma intesavibração fez a nave girar em torno dela mesma numa velocidade espantosa.

Com os olhos ligados no espaço tentando entender o que se passava. Digo espaço, porque,pelo menos de dentro para fora permitia uma visão de trezentos e sessenta graus. Não haviaponto de referência; norte, sul; em cima ou embaixo. Esquerda ou direita. Apenas girávamos. Asensação naquele intervalo de tempo era de queda livre. Mas queda para onde? Para qualquerlado que olhava não via limites, não via horizontes e sim o infinito.

Gritei pelo Bom senso! Nada. Ele estava desacordado.

Senti medo da morte. Respirei fundo buscando o autocontrole e o bom senso que nãovinham. Meio tonto, meio confuso procurei no painel um jeito de estabilizar a nave. Mas eununca tinha entrado nem numa cabine de um monomotor. Fiquei desesperado.

Pensa, dizia uma voz interior e imperativa. Pensei.Preciso cortar a força. Apertei um botão que indicava força ligada e desliga. Meu pobre

inglês me guiou. On e off eu sabia o que significava. Se o primeiro é ligado; apertei asegunda seta, porque na realidade era um painel que nunca tinha visto e com as instruçõesvisíveis, mas pareciam estar inseridas dentro da estrutura de plasma ou água. Sei lá. Eracomo ver um bloco de gelo colorido por dentro. Todas as luzes se apagaram. Mas a velocidadenão diminuiu.

A nave continuou na mesma velocidade e no mesmo rodopio. Não sei por quê: mas atontura passou. Acho que foi quando a luminosidade aumentou. Pelo menos foi o que senti. Aúnica coisa que sei é estávamos passando por entre um monte de estrelas. Havia estrelas portodos os lados. A cada uma delas, pensava que haveria uma colisão.

Foi neste momento que percebi um detalhe que me deixou um pouco tranqüilo.

Nossa nave não estava em queda livre e também não tinha aumentado á velocidade.Simplesmente havia mudado a direção com o impacto, além de mudar sua rotação..

Tudo que eu precisa fazer era parar o rodopio. Segundo o pouco que havia visto falar sobrefísica “nenhum corpo pode mudar seu estado de repouso sem que uma força terceira aja sobre

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ele”, portanto precisava descobrir uma força contraria que impedisse aquele movimento circulare uniforme.

Mas onde eu, um simples mortal e com um currículo escolar nada exemplar poderia resolveraquela situação.

Praticamente estava viajando numa nave cuja aceleração era parecida com a de umbumerangue. Exceto que não faria uma volta em si mesmo!

Foi ai que pensei: se escolheram á água para aplicar tanta tecnologia é porque a água tempropriedades de adaptação tão voláteis como os gases. Para começar na decolagem passamosa matéria de sólido para este estado incrível, que nem sem definir.

Portanto neste painel deve ter alguma coisa ligada à morfologia, a forma. Talvez...

Dei um grito de alegria com a luz que me iluminou. No painel ao alcance dos meus dedos osdizeres; formas geométricas para situações especiais: aperte os símbolos que desejar. Em baixodestes dizeres com a maior simplicidade que a comunicação merece: todas as formas geométricaspossíveis; quadrado, triângulos, hexágonos e os círculos. Nem pensei: não coloquei o dedo, masa mão inteira no símbolo da circunferência e quase que instantaneamente a nave iniciou umaseqüência de ações que não entendia: via se jatos de vapor saindo em suas laterais e o formatose modificou completamente. Tudo que sei é que a nave ficou circular e estável, inacreditável!

Respirei fundo e nem quis entender o que aconteceu. Apenas, em pensamento; agradeci aoArtur, meu antigo professor de física. Coisa de colégio. Que Deus o tenha.

Recobrei a calma. Liguei a chave que havia desligado. As luzes internas se acenderam.

O ambiente gelado ficou aquecido.

Sentei-me novamente e comecei a cantar. Isto era inacreditável. Não cantarolava nem nobanheiro, há anos.

De olho neste universo, fico mais perto do Criador. Frase que comecei a cantarolar,comemorando o bom momento que vivia após o grande susto.

Na verdade acho que estava rezando. Rezando a minha maneira para agradecer a Deus osimples fato de estar vivo. Fato que não tinha muita certeza.

Joguei um pouco do liquido que bebemos no rosto do Bom senso. Finalmente ele acordou!

Suas primeiras palavras: “Tirei um merecido descanso. Que soneca maravilhosa.”

Fiquei pasmo! Bom Senso acordará como se o que aconteceu era normalíssimo.

O senhor não se assustou com o que aconteceu? Claro que não, disse ele.

E por falar no pequeno incidente. Nossa conversa estava tão boa que esquecemos dele nãoé.

Esquecemos de que, indaguei: do lixo espacial completou.

Era só ter mudado a direção da nave que ele não nos atingiria.

Quero lhe dar os parabéns.

O senhor deve estar brincando. Parabéns por quê?

Porque você se saiu muito bem. Teve muito bom senso.

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Repito: o senhor deve estar de brincadeira.

Passei um susto danado. Fiquei morrendo de medo. Não sabia o que fazer. Não sei comonão fiz nas calças.

Mas você manteve a situação e o seu espírito sob controle?

Eu! Apenas agi segundo meus instintos.

No inicio não entendia nada. Depois que me acostumei com o rodopio. Na realidade percebique apenas tínhamos mudado de rota e a maneira de viajar no espaço. Digamos que numa navecom tanta tecnologia e um painel auto-explicativo tudo fica fácil, até ter bom senso numasituação inusitada.

Porque seu povo escolheu a matéria água para construir uma nave tão avançada.

É simples: primeiro pela simplicidade de sua composição e sua capacidade de transformaçãoe segundo: hidrogênio tem em abundância no universo. Quer combustível mais barato que esse.E ainda: atende as exigências de preservação ambiental de todo universo.

Ia falar que esta nave era algo que imaginei, mas desiste!

Murmurei. Vivendo e aprendendo. A vida proporciona caminhos indescritíveis e imprevisíveis.Em qualquer direção que se vá, nossa vida é regada pela rainha imaginação. Santa imaginação,leva-nos ao desconhecido, principalmente quando pensamos que a morte esta por perto.

Brilhante! Minha aula com você terminou.

Parece que qualquer que seja a situação, nem mesmo uma inusitada como essa, tira devocê a capacidade de controlar o medo. Analisar e só depois agir.

Bom senso; você me deixa encabulado!

Olhou-me com olhar de pai e disse; mais uma vez; parabéns.

Vamos mudar a rota novamente.

Para a aldeia do Futuro. Perguntei.

Sim! Só vi algumas luzes do painel alterando alguns números. Nova longitude. Nova latitude.

Lá vamos nós.

Não era arvores e animais na paisagem desta vez. Era um caminho de estrelas.

Aos poucos o planeta Plutom I foi aparecendo. Exatamente como as fotos tiradas peloHubble que acessei pela Internet. Um planeta de Prótons.

Cores de todas as cores: vermelho, amarelo, azul. Cores vivas e belas. Era fantástico demaispara ser real.

Atenção! Vamos fazer um vôo livre. O que você quer dizer com isso, perguntei.

Quero dizer que vamos desembarcar no ar.

O quê! Quer me assustar.

Não se preocupe. Não é perigoso.

Meu velho albatroz vai nos levar até sentirmos a grama molhada em nossos pés.

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Neste planeta tem grama molhada. Claro que tem disse ele. Estamos num canto do universoque tem as mesmas características que a mama Terra.

Então porque não pousamos com a nave?

Você já imaginou uma nave espacial chegando da Terra. Muitos daqui têm parentes vivendolá. E eles não sabem desta ponte de contato. Seria o caos. Haveria uma grande invasão: dePlutom I para a Terra e vice-versa.

Pararíamos o planeta. Seriamos presos. E até provarmos nossa origem; seriamos consideradosmentirosos e subversivos a ordem universal e apodreceriam na prisão.

Sem falar na possibilidade de sermos atacados por naves de defesa deste planeta, que nosabateriam em pleno ar.

Bom! E quem é Albatroz.

Você o conheceu quando nos apresentamos. Sobre suas asas você me socou, lembra.

Ah! Seu pára-quedas.

Sim. Meu velho pára-quedas. Não se fabricam mais destes.

Depois da segunda guerra mandei cerzir um furo. Um único furo de fuzil que ele levou nomeu lugar. Para o tamanho de sua circunferência, foi só um pequeno arranhão.

Veja como faremos: a nave descerá até uma altitude segura. Saltaremos pela escotilha debaixo. Não se preocupe; o albatroz foi fabricado para descer como uma pena. Mesmo tendo dezvezes mais a soma de nossos pesos. A nave esta programada para voltar sozinha para umesconderijo seguro e ao nosso alcance.

Esta conversa foi tão rápida. Nem me despedi do espaço e das estrelas.

Senti o chão sair dos meus pés e um frio na espinha.

Um vento forte abraçou meu corpo. Nunca senti a força de um vento assim.

Pensei estar de olhos abertos. Pensei estar vendo nuvens e a descida. Pensei milhões decoisa.

O vento aumentava. Não conseguia abrir os olhos.

Pensei na calma. No Bom senso. No futuro.

Algo tocou os meus pés. Abri os olhos era a copa de uma enorme arvore.

O vento aumentava. A arvore balançava.

Galhos se quebravam.

Ouvi a voz do Bom senso. Vou te soltar.

Adeus!

Neste instante um raio cortou a arvore no meio.

Cai por cima de uma folhagem. Sorte mim.

Toquei-me dos pés a cabeça. Nada quebrado. Nada arranhado.

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Abençoada terra. Gritei bem alto.

Fiquei feliz.

Ouvi um grito maior que o meu.

Nunca esqueça de mim.

Olhei para o alto e vi Bom senso preso no Albatroz voando para o infinito.

A tempestade se acalmou. Eu também.

Sentei numa clareira, longe das arvores e adormeci.

Sonhei com o Futuro. Com a caverna dentro da grande arvore, com toda aquela tecnologia.Seus parentes e antepassado. O meigo e inteligente Bobo. Todos estavam em festa.

Parecia que tinham descoberto a forma secreta de se viver bem junto com o semelhante.

Bom senso apareceu com um jarro daquele liquido idêntico á água, mas que chamavam porum outro nome.

Todos, sem surpresa, ouviram o que ouvi: você meu amigo é o motivo da nossa felicidade.Você é o fruto de todas as nossas vidas juntos. Por isso, por estranha que possa ter sido esta

sua aventura; foi á forma que encontramos, em consenso para presenteá-lo.

Estamos muito orgulhosos e queremos ouvir um discurso...

Bum. Ratata. Bum. Neste momento, estrondos, barulho de tiros de metralhadoras.

Bombas pesando toneladas caiam sobre o planeta, caiam sobre Bagdá. Explosões aqui eali.

Voltei ao mundo que conhecia. Voltei á cidade. A caminho do doce lar...

Olhei para o céu.

As estrelas tinham partido. Em seus lugares milhões de luzes silvando no ar, comemorandoa uma noite macabra.

Parecia uma festa com fogos de artifício. Aviões em vôos rasantes soltavam á morteanunciada.

Doce vida. Doce realidade. Batidas do coração social a milhares de anos.

Tiros de canhões por todos os lados. Milhares de pessoas correndo. Pessoas morrendo.

Redes de televisão, rádios e jornais numa guerra particular para aprisionar os fatos.

Corri do medo. Corri para alguma direção. Escondido num canto; respirei...

Meio confuso. Meio feliz. Se é que existe meio feliz?

Não tenho a menor idéia de como isso aconteceu.

Sai do universo da imaginação ao perceber que estava em minha casa.

Já debaixo do meu telhado não quis pensar. O estomago acusava certo desconforto. Era avelha fome. Mas em vez de atendê-la me sentei diante do computador.

continua na parte II