globalização da economia mundial e os mercados de trabalho
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GLOBALIZAÇÃO DA ECONOMIA MUNDIAL E OS
MERCADOS DE TRABALHO
Victor Hugo Klagsbrunn 1
1. A Globalização da Economia Mundial e a Integração dos Mercados de Trabalho
Em primeiro lugar cabe perguntar-se o que há de novo no que se entende por globalização da
economia mundial. Desde o início do século temos uma mobilidade e uma integração crescentes
dos capitais a nível mundial, com grandes empresas investindo e construindo instalações
produtivas em várias partes do mundo, inicialmente concentradas nos setores dos serviços
públicos, utilizando muitas vezes o mercado internacional de capitais. Daí disseminou-se o
conceito de imperialismo e o conjunto de teorias e concepções críticas quanto às perspectivas de
concentração/cartelização do capital e monopolização dos mercados. Na verdade, a chamada
fase imperialista sucedeu e aperfeiçou a etapa anterior fundamentada exclusivamente na
mobilidade de produtos, de um lado os produtos primários dos países coloniais para os centrais
e, de outro, de produtos industrializados dos últimos para os primeiros. Esta mobilidade não
deixou de constituir a base material das trocas internacionais na etapa imperialista, ela apenas
foi subordinada ao movimento de capitais altamente concentrados, no geral estruturados na
forma de sociedades anônimas, que foram investidos em setores altamente rentáveis e com
rendimentos mais ou menos assegurados por políticas públicas na periferia do capitalismo
mundial: em primeira linha nos serviços públicos, mas também em grandes plantations voltadas
para a exportação.
Desde tempos coloniais o movimento de mercadorias, comandado pelas metrópoles, sempre foi
acompanhado por e determinou movimentos migratórios, canalizando excedentes populacionais
existentes em regiões pauperizadas ou não dos países centrais ou periféricos. Durante a fase
imperialista essas migrações continuaram sendo a contrapartida de movimentos de capitais
controlados pelos centros do capitalismo mundial. De um lado parte das camadas que deveria
1 Professor Titular do Departamento de Economia da Universidade Federal Fluminense, Niterói, RJ.
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gerir os processos de produção nos países periféricos vinha dos países de origem dos capitais
investidos. Por outro lado, todo esse processo de intensificação de trocas internacionais, com ou
sem investimento diretamente na produção e nos serviços básicos, tinha seu sustentáculo e sua
razão de ser na fantástica onda de concentração e de centralização de capital ocorrida desde a II
Revolução Industrial. Os impérios coloniais eram uma de suas consequências.
Já antes das duas guerras mundiais e de modo mais marcante no pós-guerra o investimento de
capitais também em países menos desenvolvidos se dirigiu, de início apenas marginalmente,
para a produção industrial. O objetivo inicial era via de regra o de suprir o mercado local com
produtos que encontravam pouca concorrência e traziam altos lucros. O fim da reconstrução das
economias européias nos anos 50 permitiu canalizar maior quantidade de capital para o
investimento em atividades produtivas, agora não necessariamente em atividades primárias, em
países do terceiro mundo. As prioridades eram então as de suprir os maiores mercados locais
que, no geral, apresentavam também condições mais adequadas de produção e de infrastrutura,
incluindo a existência de mercados de trabalho asssalariado suficientemente estabelecidos.
A etapa atual vem sendo caracterizada pela globalização crescente, embora este termo seja
utilizado e entendido de modos muito variados e até contraditórios. O seu uso corrente
subentende atividades de empresas em geral de maior envergadura, que são coordenadas e
planejadas globalmente, quer dizer, levando em conta os investimentos realizados em diferentes
países.
Em décadas anteriores essas empresas foram denominadas multi ou transnacionais. Em ambas
designações diminuía ou mesmo desaparecia a importância da caracterização de seus centros de
operação. Na sua prática, porém, essa caracterização mostrava-se crucial, por exemplo em
momentos em que seus investimentos feitos em outros países eram postos em questão, quando
aquelas firmas mostravam toda sua interseção com os governos de seus países de origem,
forçando-os a atuar politica e militarmente para garantir seus investimentos no estrangeiro.
A globalização das atividades das firmas internacionais é um reflexo e expressão do
transbordamento da concorrência entre empresas para fora dos limites nacionais e mesmo das
regiões mais industrializadas. Por outro lado, a disseminação de atividades econômicas de
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grandes empresas nunca deixará de estar condicionada pelos diferentes espaços físicos,
culturais, políticos, institucionais e econômicos existentes nos vários países em que atuam. A
importância desses espaços multifacéticos não desaparece, apenas se modifica, condicionados
em primeiro lugar pelas transformações tecnológicas na produção, no transporte, nas
comunicações e na penetração de interesses internacionalizados na própria condução das
políticas econômicas e sociais locais, informada pela disseminação de idéias sociais, econômicas
e políticas no meio das camadas sociais que elaboram e propõem os caminhos que acabam
predominando nos vários países.
A transformação das condições técnicas tem se acelerado flagrantemente sob o efeito da
introdução de elementos microeletrônicos inicialmente na produção e mais recentemente na área
dos serviços, cortando postos de trabalho e limitando as possibilidades de aumento do
emprego. . Os meios de transporte tornam-se cada vez mais rápidos e baratos, em função da
extensão do transporte aéreo, o que tem contribuído enormemente para o crescimento do
comércio mundial, incluindo cada vez mais produtos que antes tinham que necessariamente ser
produzidos localmente, devido por exemplo a sua rápida perecividade. Veja-se o avanço da
floricultura de exportação na Colômbia, que fornece seus produtos nos mercados europeus. O
extraordinário avanço dos meios de transporte também tem sido um fator essencial para permitir
e facilitar a migração de indivíduos entre os vários países e continentes.
Mas talvez em nenhum outro setor o avanço tenha sido mais contundente do que nos meios de
comunicação. A dissseminação da telefonia internacional via satélite e mais recentemente a
integração mundial através da rede INTERNET tornaram as comunicações, decisões e
transferências sobretudo de valores praticamente instantâneas. Por isto, é antes de mais nada na
área das conexões e transferências financeiras que podemos falar de uma verdadeira
globalização. A transferência de valores e de aplicações financeiras, cuja existência é
meramente contábil e indepente de transposição no espaço físico, tornou-se tão rápida e fácil
seja dentro da mesma cidade ou com o outro lado do planeta. Em todos os demais setores e
campos de atividade seguem atuando, mais ou menos fortemente, as limitações espaciais e
territoriais para a transposição de bens e serviços. Em outras palavras, em todas as demais áreas
das relações internacionais podemos falar apenas de uma globalização mais ou menos relativa.
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Não se pode perder de vista o fato de que as condições de valorização do capital financeiro
continua atrelada, embora com grande autonomia, às condições materiais de produção e de
valorização, que dependem do consumo e das taxas de lucro no setor produtivo e de serviços,
fortemente condicionadas pelas circunstâncias e conjunturas locais. A possibilidade de combinar
investimentos financeiros em diversos setores e países e de modificar rapidamente essas
combinações permite ampliar ainda mais a autonomia relativa dos investimentos nas áreas
financeiras, o que além de aumentar a volatilidade de investimentos nos setores financeiros
aprofunda a dependência de ondas especulativas que agora se espraiam quase instantaneamente.
Em todas as etapas de desenvolvimento do mercado mundial, incluindo a atual, um outro nível
de globalização relativa existiu e segue existindo também há muito tempo e pouca atenção tem
despertado entre economistas, mesmo entre os mais críticos: o da internacionalização dos
mercados de trabalho. O fenômeno da migração de trabalhadores para países com rápida
industrialização não é novo. A expansão das minas de carvão e a industrialização a ela acoplada
na Região do Ruhr, na Alemanha, não teria sido possível sem as levas de migrantes poloneses; a
migração de habitantes das ex-colônias inglesas e franceses para as ex-metrópoles é outro
exemplo marcante. No pós-guerra citemos apenas alguns: os turcos na Alemanha na época do
“milagre econômico alemão” e os mexicanos nos Estados Unidos.
É bem verdade que, inicialmente, os migrantes entram pela porta dos fundos, para fazer os
trabalhos mais pesados, muitas vezes nos setores que apresentam rápido aumento de demanda
por trabalhadores, inclusive ramos emergentes da indústria. Logo, no entanto, a importância dos
migrantes deixa de ser marginal, para assumir papel determinante para ramos e setores-chave. É
o caso da agricultura californiana, mas também dos turcos nas indústrias siderúrgicas e mesmo
de automóveis alemãs. Nos serviços industriais e públicos em países como a França e a
Inglaterra a presença de migrantes é também marcante.
A discussão sobre globalização da economia mundial hoje centra no que se poderia designar um
novo nível de complementariedade entre empresas e dentro das empresas internacionais, no
âmbito regional e mundial, fruto de uma concorrência internacional extremamente acirrada, que
inclui também a disputa dos mercados emergentes pelos grandes grupos industriais que
produzem para escalas supra-nacional, regional e mundial. A expansão industrial do Japão,
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invadindo os países industrializados com seus produtos e dizimando ramos industriais inteiros,
criou sem dúvida toda uma nova configuração nas condições da concorrência entre os capitais.
O Brasil, assim como outros países em vias de industrialização, é atingido por estas novas
imposições da concorrência em vários níveis. Em primeiro lugar mencione-se a entrada de
produtos novos ou diferenciados, via importação, para o qual a ideologia do chamado neo-
liberalismo faz o trabalho de convencimento, que ele mesmo não consegue fazer nos países
centrais, em grande parte ainda marcados pelo protecionismo. Um outro caminho que volta a se
apresentar é a abertura de novas fábricas no país, por parte de capitais estrangeiros, antevendo
uma grande expansão dos mercados para certos produtos, cujo consumo ainda é baixo, como é o
caso dos automóveis no Brasil e na América Latina de modo geral.
As novas constelações da concorrência internacional levam também a mudanças na forma de
produzir, disseminando-se alguns dos princípios adotados por empresas japonesas em sua
expansão internacional. Como era de se esperar, as transformações colocam novas exigências
quanto à força de trabalho a ser empregada. No entanto, todas estas mudanças tecnológicas, de
organização do trabalho e da produção, bem como nas exigências quanto à qualificação da força
de trabalho, apresentam vários reversos, que nada têm de positivo: o desemprego agora
reconhecido como estrutural, a diferenciação dos mercados de trabalho com o aumento
concomitante do emprego de pouca qualificação na indústria e sobretudo nos serviços.
Lembremos que é o setor de serviços o único que vinha aumentando o emprego, especialmente
nos Estados Unidos, mas em ritmo claramente descendente.2
Longe de constituir exceção, a expansão de empregos menos exigentes e com remuneração mais
baixa se insere dentro da mesma lógica da diferenciação crescente dos mercados de trabalho dos
países industrializados. É por esta brecha que migrantes internacionais, entre eles os
trabalhadores brasileiros, têm logrado penetrar no mercado de trabalho dos países
industrializados.3
2 Veja-se um quadro alarmante do desemprego e da menor qualidade do emprego nos países industrializados, p.ex. em OCDE (1994).
3 Uma visão sobre as tendências atuais de internacionalização do mercado de trabalho pode ser encontrada em Van DIJK (1995) e SIMAI (1995). Uma boa seleção de teorias explicativas para as migrações internacionais e sobre a forma de inserção dos emigrantes brasileiros nos Estados Unidos encontra-se, por exempl, em SALES, T. (1995), p. 126 e segs. e 132-134.
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2. O mercado de trabalho nos países industrializados
De modo geral, os governos dos países industrializados já não podem mais ignorar o problema
do desemprego. Desde pelo menos a crise de 1974/75 suas economias têm apresentado
dinamismo menor, com crises mais pronunciadas e mais longas. A fase relativamente mais
longa de crescimento durante o governo Reagan constituiu uma exceção no período, durante a
qual o crescimento foi fortemente impulsionado por uma política de déficit spending
conservadora: ao mesmo tempo que cortava impostos e gastos sociais, o governo dos Estados
Unidos aumentou em muito as despesas militares. Mesmo com o ciclo relativamente mais longo
da era Reagan, podemos reconhecer, sobretudo, desde meados da década der 70, com crises
pronunciadas e periódicas - que sempre incluíram diminuição da produção e do emprego.
Independente de se considerar ou não o desemprego como um característica intrínseca do
sistema capitalista4, é fato que as transformações tecnológicas muito rápidas ocorridas nas
últimas décadas têm contribuído de forma decisiva para a expansão do que tem sido chamado de
desemprego estrutural. A busca de cortes nos custos, impulsionada pela concorrência mais
acirrada em função da expansão e integração dos mercados nacionais em mercados regionais e
mundiais sempre tem por consequência o corte de postos de trabalhos e a modificação constante
dos empregos que permanecem. Esta tendência pode ser e é no geral contraposta à tendência ao
crescimento da produção, do emprego e do consumo que ocorre em forma cíclica no sistema
capitalista. Fases de crescimento mais lento, como se observa no capitalismo mundial desde a
crise de 1974/5 e, por outro lado, a aceleração das transformações tecnológicas na produção, nos
serviços, nos transportes, nas comunicações, etc. tiveram por consequência um aumento rápido
do desemprego, do subemprego e uma diminuição dos rendimentos dos empregados. Esta
evolução está longe de ser linear e igual para todos os segmentos do mercado de trabalho, como
se enfatiza a seguir. Resulta um volume cada vez maior de desempregados com poucas chances
de serem novamente absorvidos no mercado de trabalho e com características de permanência,
aumentando o denominado desemprego estrutural.
4 Lembremos que para MARX a contituição do que ele designa por exército industrial de reserva constitui a lei geral da acumulação capitalista. Veja-se MARX,K. (1985), Livro I, Cap. 23.
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O reconhecimento, embora tardio, da sua existência permanente ou estrutural coloca na ordem
do dia questões relativas à conformação e transformação dos mercados de trabalho, nacionais e
internacionais, às novas exigências de qualificação dos setores de ponta e às exigências postas
para os sistemas educacional e de formação profissional.
Toda a ênfase da discussão sobre os mercados de trabalho nos países industrializados - e o
desemprego daí decorrente - parte das necessidades dos setores de ponta, que são os que ditam a
tendência geral.5 Esta ênfase justifica-se plenamente pela exigência de se verificar o que seria
novo no horizonte e se preparar para ele. A relação com o progresso científico-técnico é
evidente e imediata. Este tem sido responsável pela racionalização da produção, tendo o
desemprego como uma de suas consequências. Mas não esqueçamos que o “modelo industrial
japonês” não existiria sem os empregos mal pagos e não regulamentados nas empresas
fornecedoras e o desemprego seriam bem maior se a agricultura do país fosse exposta aos ventos
da concorrência internacional e boa parte das mulheres não se retirassem do mercado do
trabalho após o casamento.
Quando associamos desemprego estrutural com progresso científico-técnico pensamos
inicialmente e sobretudo no setor industrial. A constante revolução na forma de produzir
constitui elemento intrínseco da concorrência entre capitais em qualquer setor e, muito
especialmente, na indústria. E uma de suas consequências sempre é a substituição de trabalho
vivo por trabalho morto. Em fase de crescimento mais lento, como constatamos desde pelo
menos meados dos anos 70, com exceção da fase do governo Reagan, é natural que o
desemprego decorrente de inovações tenha sido menos contrabalançado por um aumento da
escala de produção. Esta já é uma razão, por si só, para explicar o aumento do desemprego
desde então. Outra, está relacionada com as próprias características da onda de inovações ora em
curso no mundo da produção, incluindo as mudanças na organização do trabalho.
Nos Estados Unidos e em boa parte da Europa as últimas décadas assistem a uma maior
concentração de renda devido a dois movimentos: por um lado, os trabalhadores com mais
5 Isto é verdadeiro tanto na discussão sobre o assim chamado Modelo Japonês de Gestão Industrial quanto no que se refere a estudos mais globais como o da OCDE sobre o emprego (ver OCDE, 1994, L´Ètude de l`OCDE sur l´Émploi - Données et Explications, Parties I et II, Paris. Sobre as novas tendência da organização do trabalho, veja-se p.ex. KLAGSBRUNN (1994).
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qualificação, inseridos nos processos mais modernos de produção, e camadas médias com
especializações requeridas pelos novos avanços tecnológicos passam a ganhar mais e aumentam
sua participação no consumo. Por outro lado, uma proporção cada vez maior da população
economicamente ativa fica excluída destes avanços e passa a ocupar empregos pouco exigentes.
Nos Estados Unidos, por exemplo, o nível de renda dos 10 % mais pobres baixou sensivelmente
no mesmo período, talvez por se empregar mais no setor de serviços 6. Esta desigualdade,
própria do sistema, deixou de ser compensada pelo menos em parte, como vinha sendo tentado
no pós-guerra, devido ao desmonte progressivo de serviços públicos voltados para as camadas
menos afortunadas, resultado de políticas econômicas de cunho neoliberal. Com isto, as
camadas de poder aquisitivo crescente passaram a demandar mais serviços pessoais, diretamente
ou através de pequenas empresas como clínicas, restaurantes, lavanderias, táxis, engraxates, etc.
Estes são aparentemente os campos de trabalho que se expandem na área de serviços, nos quais
os migrantes, incluindo os brasileiros, vêm encontrando emprego, por exemplo nos Estados
Unidos.
A conjuntura econômica e, consequentemente, a situação no mercado de trabalho nos países
industrializados, se desenrolou de modo diferenciado nos últimos anos: nos Estados Unidos e na
Europa, por exemplo, o aumento da produção e do emprego em 1993 e 1994 foram
significativos. No caso japonês, a situação é certamente algo diferente. O Japão quase não
participou da última onda internacional de recuperação e auge econômico.
Muito tem sido enfatizado, com razão, que as novas formas de produção e de organização do
trabalho exigem trabalhadores com características diferentes. Vejamos a seguir como se coloca
a exigência do “novo” tipo de trabalhador em função dos últimos avanços tecnológicos,
especialmente na indústria.
3. Algumas observações sobre a relação entre o desenvolvimento tecnológico recente e
as tendências atuais quanto à qualificação dos trabalhadores.
Normalmente associa-se a evolução técnica na produção industrial com o investimento ne-
cessário - para se continuar competitivo - em equipamentos cada vez mais integrados e caros.
6 Ver OCDE, 1994, p.22 e seguintes.
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Pelo seu tamanho e custos crescentes associa-se o investimento em capital fixo com uma menor
flexibilidade de utilização. Esta era a tendência histórica, sempre contraditória com de-
senvolvimentos que tendiam a baratear os elementos do capital fixo.7 Na fase do pós-guerra,
caracterizada pela expansão da produção em massa, baseada nas economias de escala, a
tendência de rápido aumento absoluto e sobretudo relativo do valor do capital fixo só fez
aumentar. Equipamentos com dispositivos microeletrônicos rompem com esta suposição
intuitiva, que nunca se colocou, na verdade, como necessidade lógica ou histórica. O capital fixo
pode não aumentar tanto, mas o capital constante, que inclui também todo o capital circulante
sem salários, incluindo portanto o que se gasta com insumos, segue aumentando
tendencialmente. O trabalho vivo movimenta cada vez mais trabalho morto. Há a tendência de
se substituir trabalho e máquinas por sistemas de máquinas cada vez mais complexos, mas elas
em si não precisam ser em conjunto sempre mais dispendiosas. A microeletrônica permite
reprogramar os equipamentos e, até certo ponto, utilizá-los para processos produtivos diferentes 8, o que implica em barateamento relativo.
O equipamento com elementos microeletrônicos apresenta outra vantagem essencial: no geral
ele se controla a si mesmo e permite fácil reprogramação. Deste modo, a tendência que vinha
sendo observada, de restringir progressivamente a atividade do trabalhador fabril a mero
controlador de máquinas, se modifica em muitos casos. Agora o trabalhador é chamado a
intervir sobretudo quando há problemas no processo e estes problemas são denunciados e
localizados pelo próprio equipamento. Sua qualificação tem que ser maior, para resolver pro-
blemas de menor gravidade, evitando assim que o capital investido fique parado por muito
tempo. A atividade de manutenção passa a ser parte integral do trabalho do operador de
máquina e a equipe especializada de manutenção e reparação só precisa ser chamada quando o
problema for de solução não imediata. Esta evolução começou a se consolidar em ramos ditos
de processo, como a indústria química, no qual a produção hoje em dia ocorre em circuitos
fechados, mas se consolida aos poucos, como princípio, nos demais ramos de produção.
7 A este respeito veja-se MARX,K. (1985), Livro Primeiro, Cap.XIII.8 Sobre as transformaçöes tecnológicas ocorridas nas últimas três décadas, especialmente no Japäo, no
contexto da evoluçäo econômica no período, veja-se por exemplo CORIAT (1990).
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Esta é a razão de encontrarmos em tantos setores da indústria moderna uma crescente exigência
quanto à qualificação dos trabalhadores 9. Mesmo que estes ganhem forçosamente mais, seu
custo como parte do custo total torna-se por um lado menor e, por outro, aumenta sua
importância estratégica para manter o capital crescente em funcionamento. Assim entende-se
também a importância redescoberta, creditada ao sistema japonês de gestão, de enfatizar a
capacidade e a autonomia relativa do trabalhador industrial no processo de produção e, até
mesmo, de integrá-lo na fase de projeto de novos investimentos.
Com equipamentos munidos de elementos microeletrônicos de controle e programação abre-se
mais espaço para o trabalho em grupos em mais setores das fábricas. As formas contemporâneas
de produção e especificamente o trabalho em grupo exigem trabalhadores com mais autonomia,
maior preparo e mais confiança em suas opiniões. São qualidades que nas formas de
organização anteriores não eram estimuladas, pelo contrário. Por outro lado, deixa-se em boa
parte a escolha do como trabalhar a critério do próprio grupo, desde que a meta exigida seja
alcançada. Como em qualquer esporte por equipe, ficam apenas os melhores.
4. O mercado de trabalho para migrantes dos países subdesenvolvidos: o caso dos
migrantes brasileiros nos países industrializados
Alguns aspectos relevantes da emigração brasileira para os países industrializados a diferenciam
de outros grupos nacionais e ela se apresenta bastante diferente nos vários países de destino .
Nos casos dos Estados Unidos e do Japão os brasileiros ocupam postos de trabalho pouco ou
quase não disputados por trabalhadores nativos.
Vejamos inicialmente mais de perto a emigração para os Estados Unidos. Por mais que as
poucas pesquisas e a observação enfatizem que a maioria dos migrantes é constituída de
indivíduos de nível de escolaridade bastante elevado e oriundos de famílias de classe média, sua
inserção no mercado de trabalho nos Estados Unidos ocorre, principalmente, em ocupações no
9 NEVES (1992) salienta o aumento da qualificaçäo dos trabalhadores em tarefas de manutençäo, negando a mesma necessidade para os demais trabalhadores operadores.
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âmbito dos serviços. Margolis10 localizou a maioria dos imigrantes brasileiros em Nova York
lavando pratos em restaurantes, engraxando sapatos (um quase-monopólio dos brasileiros),
fazendo faxina e dirigindo táxi ou como motoristas particulares. SALES (1995) descreve os
brasileiros vivendo na região de Boston ocupados principalmente lavando pratos em
restaurantes e bares11. Estes são ramos que passam ao largo das grandes transformações
tecnológicas em curso.
Nos Estados Unidos, o panorama do trabalho ilegal dos brasileiros se complica sobremodo
porque ele se mescla com o imenso turismo, por via aérea, tantas vezes mera forma encoberta de
transporte e comércio de bens para venda no Brasil. Segundo informações internas dos Estados
Unidos, citadas na Revista Veja, o turista brasileiro é o segundo que mais compra em sua
estadia no país, ficando só atrás dos japoneses. É claro que as compras tém sido muito
estimuladas pela sobrevalorização da moeda brasileira desde julho de 1994, mas o fenômeno é
bem anterior, como veremos. Deste modo, a própria viagem pode ser facilmente financiada,
total ou parcialmente, com a venda de alguns produtos eletrodomésticos. Além disto, como os
Estados Unidos exigem, para conceder o visto de entrada, uma passagem de ida e volta, o trecho
da volta é passado adiante, para algum migrante que queira passar “férias” no Brasil, por preço
abaixo do custo normal e, assim, todo este mixto de migração-turismo-comércio se torna ainda
mais atraente.
Esta intrincada rede impossibilita, além disto, todo e qualquer controle de quanto os migrantes
trazem ou mandam para suas famílias no Brasil. Sempre há algum conhecido, amigo, parente ou
vizinho disposto a trazer algum dinheiro. Os dólares que assim entram no país fogem de
qualquer controle por parte do Banco Central e alimentam o mercado paralelo de divisas no
Brasil.
10 Ver MARGOLIS,M.(1995)11 SALES (1995), p. 134 se refere às ocupações principais dos brasileiros vivendo na região,
oriundos em grande medida da cidade mineira de Governador Valadares. MARGOLIS (1995), p. 31/32, julga ter indícios suficientes de que os migrantes radicados em Newark ,N.J. e em áreas do Estado de Massachusssetts, próximas a Boston, são em maior proporção operários que, em parte, também se empregam na construção civil, como motoristas de caminhão, como frentistas ou como empregados de restaurante.
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Em todos os casos de emigração, uma das poucas vantagens dos imigrantes, frente aos naturais
do país, é que, nos primeiros tempos, quando predomina a idéia de uma migração temporária, o
migrante está disposto a aceitar qualquer tipo de trabalho, muitas vezes fazendo coisas que não
aceitaria fazer em seu próprio país. O caso dos migrantes estrangeiros talvez corresponda à tão
decantada e nunca encontrada mobilidade completa do fator de produção trabalho. O que os
leva a este tipo de decisão é o diferencial de rendimentos: uma faxina em Nova Iorque pode
significar até 60 dólares por dia.
É o mesmo espírito de tudo sacrificar, por pouco tempo, que leva os migrantes a aceitarem
empregos que os naturais não aceitam e a viver sob condições muito precárias, dividindo espaço
com muitos companheiros em quartos apertados de pensões ou em apartamentos minúsculos. Os
naturais do país têm além disto acesso, embora cada vez mais restrito, a assistência social e a
outros programas sociais que lhes permitem não ser forçados a aceitar qualquer tipo de emprego
pouco qualificado e mal visto.
A situação no mercado de trabalho japonês é bastante diferente. Depois de décadas de rápido
crescimento industrial, o país vivia uma crescente escassez de mão-de-obra também para a
indústria no início dos anos 90. Neste setor os dekasseguis encontram trabalho nos famosos três
Ks que em japonês significam empregos penosos (kitsui), sujos (kitanei) e perigosos (kiken) 12.
Estes empregos podem ser tanto na área de serviços, quanto na indústria. O que os caracteriza,
de modo semelhante ao caso dos brasileiros nos Estados Unidos, é que em muitos casos são
empregos pouco cobiçados pelos nacionais e que não contam, no geral, entre os que vêm
sofrendo grandes transformações tecnológicas. Nem a qualificação anterior e nem os
conhecimentos do idioma japonês dos migrantes brasileiros os qualificariam para assumir postos
de trabalho mais exigentes.
Os dados expostos no ítem seguinte indicam que o auge da emigração para o Japão teria
ocorrido no período 89-92, quando ocorreu uma saída líquida significativa para aquele país.
12 As características básicas da emigração de brasileiros para o Japão, aqui sintetizadas, foram extraídas de entrevistas bastante esclarecedoras com Reimei YOSHIOKA, do Centro de Apoio aos Trabalhadores Brasileiros no Japão, que funciona em São Paulo, de YOSHIOKA, R. (199), da leitura do jornal Notícias do Japão, editado em S.Paulo e da leitura de material publicado em vários órgãos de imprensa brasileiros. Quanto a algumas diferenças entre a migração para o Japão e os Estados Unidos veja-se também SALES (1995), p. 131-135.
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Segundo as informações veiculadas em revistas, o tempo de permanência no Japão não passa, no
geral, de três anos. É o tempo suficiente para economizar alguma reserva e com ela comprar
casa ou automóvel e tentar estabelecer-se em uma atividade autônoma no Brasil, nos ramos que
exigem menor capital inicial, como o comércio e os serviços. Como se vê, como muitas vezes
acontece nas migrações por razões econômicas, seu caráter é eminentemente temporário, com
alta rotatividade. Não se sabe como a emigração evoluirá em função de uma diminuição da
demanda por trabalhadores no Japão. Se se confirmar o aumento do desemprego também no
Japão, aquele país poderá adotar medidas de controle de imigração de brasileiros. A provável
consequência poderá ser, por um lado, uma certa diminuição da emigração de brasileiros, mas
sobretudo a mudança de seu caráter temporário para algo mais permanente. Se alguma limitação
à imigração for introduzida, muitos tentarão esticar sua estadia, com medo de perder a
possibilidade de algum dia retornar para outra temporada. Algo semelhante ocorreu com a
limitação da imigração de mexicanos nos Estados Unidos e dos turcos na Alemanha.
O incentivo para os próprios emigrantes nisseis e sanseis para o Japão não deve ter diminuído,
em 1994 e 95, mesmo com a menor demanda por trabalhadores naquele país. Isto porque a
valorização do ien frente ao dólar - de 20 % só no primeiro semestre de 1995 - e por
conseguinte com relação ao real, compensa possíveis perdas de salários decorrentes da pior
situação no mercado de trabalho japonês.
É difícil reconhecer uma correlação direta e imediata entre a conjuntura econômica e o nível de
emprego geral na economia, por um lado, e a capacidade de absorção de imigrantes brasileiros
nos Estados Unidos e mesmo no Japão, por outro. No primeiro caso a primeira dificuldade já
começa com a própria estimativa da quantidade e das formas de emprego dos emigrantes
brasileiros. Tanto a estadia quanto o trabalho são ilegais e/ou informais. A conjuntura da
demanda industrial se reflete de modo atenuado na demanda por trabalhadores formalmente
empregados no setor. Podemos inferir que a parte informalmente empregada em serviços
prestados às indústrias, como por exemplo os de limpeza, também é afetada mais diretamente
pela conjuntura geral. Mas já é difícil concluir se o reflexo se dá na mesma direção ou em
sentido contrário. Por exemplo, uma indústria pode decidir cortar custos, passando alguns
serviços a subcontratantes que empreguem força-de-trabalho ilegal e, assim, possam oferecer o
mesmo serviço mais barato. Já para os serviços pessoais, a relação do emprego informal dos
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brasileiros com a conjuntura geral de emprego é mais indireta e difícil de precisar. As camadas
sociais que necessitam de faxineiras, p.ex., só deixam de empregá-las se perderem o emprego.
Mas mesmo assim não imediatamente, pois precisam seguir procurando trabalho. No entanto,
não há nenhum indício de que os que mais contratam serviços pessoais têm estado entre os
primeiros a perder emprego quando a crise ocorre. Ao contrário, o longo processo de seleção
tecnológica, ao qual estiveram expostos nas últimas décadas, deixou-os muito preparados para
adaptar-se a mudanças nos ambientes e nos processos de trabalho.
No caso do Japão, embora os poucos dados disponíveis indiquem um arrefecimento da
migração, não há ainda indícios de que os trabalhadores brasileiros empregados na indústria
estejam entre os primeiros a serem despedidos. Não se pode esperar que as empresas despeçam
trabalhadores já adaptados e prontos a aceitar trabalho mais pesado, e certamente por menor
remuneração, em épocas de “vacas magras”, só porque são estrangeiros e nem falam bem o
idioma japonês. Na verdade, estes brasileiros estão no mínimo tão ameaçados quanto os
japoneses que trabalham em empresas subcontratantes menores, e que não estão incluídos entre
os “eleitos” empregados em grandes empresas, nas quais segundo a tradição, o emprego é
garantido por toda a vida profissional. Além disso, os imigrantes brasileiros estão em situação
melhor que outros grupos de imigrantes, como os chineses e coreanos, de longe os dois maiores
grupos de estrangeiros, para os quais não há legislação que lhes dê algum tipo de amparo ou
possibilidades de visto de permanência por tempo mais longo.
Embora quase não tenham sido pesquisados, também por ser fenômeno dos mais recentes, a
emigração brasileira para os países industrializados compõe-se em sua maior parte, segundo as
informações e observações disponíveis, de indivíduos oriundos de mercados de trabalho
urbanos e relativamente modernos e que apresentam, em boa medida, níveis de escolaridade
elevados. Estas características lhes permitem penetrar com certa facilidade, através do turismo
por via aérea ou pela ascendência de pais e avós, e encontrar nichos nos mercado. Mas não lhes
permitem fugir de empregos de pior qualidade e baixa remuneração, pelo menos nos primeiros
tempos.
A forte emigração de brasileiros para países industrializados, desde meados dos anos 80, tem
certamente componentes conjunturais, mas já hoje se apresenta com características de
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continuidade. O excesso de população em nossas cidades leva os brasileiros a procurar formas
de sobrevivência as mais variadas, inclusive a emigração. Por outro lado, esta acarreta efeitos
importantes quanto aos hábitos de consumo e a cultura em nossas cidades e ao “turismo”
internacional. Este se apresenta crescentemente combinado com o comércio informal e a
migração mais ou menos temporária. O excedente crescente de trabalhadores com níveis altos
de escolaridade, sem ocupação correspondente nas cidades grandes e médias, tem encontrado no
exterior uma válvula de escape, nem sempre condigna com sua formação pessoal e profissional.
Todo contingente migratório apresenta características específicas e historicamente diferenciadas.
No geral, podemos constatar alguns pontos que vão se tornando comuns. Se inicialmente os
migrantes oriundos do chamado Terceiro Mundo vinham em maior parte de áreas agrícolas, o
panorama vem se modificando mesmo no caso de migrações clássicas como a dos mexicanos
para os Estados Unidos e dos turcos para a Alemanha. Em todos os casos a disseminação de
conhecimentos e técnicas modernas também nos países do Terceiro Mundo coloca os indivíduos
citadinos em contato com novas capacidades de sobrevivência e de penetração nos países
industrializados. Resulta que atualmente não é mais possível imaginar as sociedades
industrializadas, em todos os setores e ramos de produção e de serviços, sem a presença dos
migrantes vindos de países pouco desenvolvidos.
5. Tendências gerais e questões abertas para uma agenda de pesquisa.
Na discussão recente o aspecto da globalização dos mercados de trabalho tem sido pouco
focalizado. Trata-se de fenômeno mais antigo, que hoje perde interesse para outros como o da
globalização dos mercados financeiros. A evolução tecnológica recente impulsiona a
globalização destes últimos e a maior mobilidade dos trabalhadores também é muito facilitada
pela massificação dos meios de transporte internacionais especialmente do transporte aéreo.
A emigração de brasileiros é um fenômeno recente, intimamente relacionado com o menor
crescimento econômico dos anos 90 mas também aponta para alguns problemas estruturais dos
mercados de trabalho do Brasil. A tendência, compartilhada com os demais países capitalistas
avançados, de aumento do desemprego e do subemprego, se mostra no país especialmente nos
centros urbanos, nos quais qualificações até há pouco bastante escassas rapidamente se tornaram
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excedentes. Não só pela crescente qualificação técnica, especialmente de segmentos da classe
média, quanto também pela rápida racionalização do trabalho também nos ramos dos serviços e
da administração, em boa parte devido à disseminação da microeletrônica. Frente a este pano de
fundo, de transformações que poderiam ser chamadas estruturais, impactam as consequências de
um longo período de baixo crescimento da produção e sobretudo do emprego na década de 90,
que mal foi contrabalançado pela prosperidade econômica de julho de 94 a abril de 95.
A comparação da emigração de brasileiros para os Estados Unidos e o Japão permite iluminar
alguns aspectos interessantes dos movimentos migratórios para os países industrializados. Antes
de mais nada constatamos que os brasileiros que emigram são cada vez mais, e em sua maioria,
vindos dos centros urbanos modernos e fazem parte das camadas médias da população. Assim
sendo, sabem se inserir nos mercados de trabalho dos países desenvolvidos, mesmo que lá
consigam empregos com um grau de exigência muito inferior à sua qualificação profissional. O
que importa é a diferença de salários entre o Brasil e o Japão ou Estados Unidos. A emigração
para o Japão se dirigia no início, e atualmente de modo decrescente, ao setor industrial; para os
Estados Unidos, salvo a exceção dos migrantes de Governador Valadares para a construção
civil, os brasileiros se empregam em serviços, pessoais ou não.
A globalização crescente encontra na formação de blocos econômicos regionais sua forma mais
adequada para o atual nível de concorrência internacional. A formação de mercados comuns
permite ampliar a escala de produção e de distribuição de bens e serviços para fazer frente à
crescente concorrência externa e a integração dos mercados.
Por mais que a circulação de indivíduos seja sempre um dos últimos ítens a serem
regulamentados pelos blocos regionais, a migração interna aos blocos começa a se incrementar
quase que paralelamente ao maior comércio de bens e serviços. O conhecimento mútuo dos
respectivos mercados por parte das empresas dos países integrados e a maior divulgação das
condições imperantes nos demais países incentivam por si só uma maior circulação de
indivíduos em busca de regiões e setores onde possam melhor vender sua força de trabalho. Por
exemplo, não são apenas os professores brasileiros de português que migram para a Argentina,
mas também todos os profissionais que enxergam melhores condições de competir no mercado
de trabalho respectivo no outro país. O mesmo é verdadeiro para os profissionais argentinos.
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Deste ponto de vista, quando os blocos regionais caminham no sentido de regulamentar também
a circulação de indivíduos, o emprego de trabalhadores estrangeiros e até a conciliação de
sistemas diferentes de previdência social, não se faz mais do que acompanhar uma tendência
que já se observa nos vários segmentos dos mercados de trabalho respectivos.
Tendo em vista a profundidade e a rapidez dos desenvolvimentos observados nos mercados de
trabalho mais integrados, coloca-se sobretudo a questão de se saber os limites de tais tendências.
Certamente as próprias sociedades respectivas terão que tomar medidas no sentido de evitar que
o desemprego e as desigualdades crescentes desandem em revoltas populares. Propostas para
limitar a jornada de trabalho com o objetivo de distribuir melhor o trabalho por mais indivíduos
já hoje constituem legislação concreta na França e na Itália e foram introduzidas na Alemanha
por força de acordos coletivos de trabalho.
Da mesma forma, maior desigualdade social e mais desemprego demandam mais atendimento
social aos necessitados e não menos. As propostas de Estado mínimo começam por isto a serem
substituídas por novas propostas de programas sociais e sobretudo de geração de emprego e
renda. O papel das organizações não governamentais vem sendo também constantemente
revalorizado.
A forma do desenvolvimento tecnológico que resulta em desemprego e desigualdade crescentes
coloca como consequência um menor crescimento do consumo final, cuja principal componente
continua sendo a massa de salários pagos na economia. O formidável aumento da produtividade
do trabalho, acompanhado pelo menor emprego em termos relativos e absolutos, implica a
disponibilidade maior de bens e serviços que necessitam de demanda solvente para que a
atividade econômica possa trazer bons lucros. Esta, por sua vez, se vê limitada pelo crescimento
pífio do consumo final, mesmo com as novas formas de crédito pessoal e de previdência privada
que, por sua vez, também pressupõem níveis aceitáveis de rendimento.
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