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1 Geografia da Infância: Vivências e Práticas Dentro e Fora da Instituição Escolar Fabíola Faria Sodré Silva 1 Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro [email protected] Luiz Guilherme de Souza Xavier 2 Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro [email protected] Introdução Ao se pensar no termo infância, automaticamente vem à mente a imagem de diferentes crianças, em diversas idades, atuantes em atividades de lazer e escolares, e quase nunca se passa a real importância da dimensão e compreensão que essa simples palavra carrega em si. A infância se constrói por meio de um vasto ambiente de negociação que provoca a produção de culturas de criança, de espaços destinados a ela pelo “mundo adulto” e suas instituições e territorialidades infantis. Desse modo o trabalho a ser desenvolvido visa contemplar essas crianças como protagonistas de suas identidades e cultura social dentro do espaço/território em que vivem na expectativa de auxiliar tanto o corpo pedagógico como docente à compreensão da significância que esse espaço tem sobre a formação do ser humano, desde seus primórdios, caracterizando a comunidade escolar composta de pequenos cidadãos que carrega em si notáveis individualidades. A pesquisa pretende refletir sobre os principais aspectos norteadores das práticas pedagógicas no processo de construção do conhecimento na área de Geografia da Infância e valorização da cultura local no geografar as infâncias, analisando também o que dizem os documentos (nacionais, municipais e PPP escolar) e as práticas pedagógicas no contexto da Geografia da Infância, tendo como recorte espacial de análise a Creche Municipal Tempo de Criança mediante visitas, experiências narrativas e entrevistas com docentes, considerando o contexto situado do bairro Volta Grande e Santo Agostinho e do município de Volta Redonda para se entender sobre a 1 Bolsista de Iniciação Científica e Graduanda em Licenciatura em Pedagogia da UNIRIO/CEDERJ/UAB. 2 Doutorando em Geografia pela UERJ e Professor Presencial do Curso de Licenciatura em Pedagogia daUNIRIO/CEDERJ/UAB.

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Geografia da Infância: Vivências e Práticas Dentro e Fora da Instituição Escolar

Fabíola Faria Sodré Silva1 Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

[email protected] Luiz Guilherme de Souza Xavier2

Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro [email protected]

Introdução

Ao se pensar no termo infância, automaticamente vem à mente a imagem de

diferentes crianças, em diversas idades, atuantes em atividades de lazer e escolares, e

quase nunca se passa a real importância da dimensão e compreensão que essa simples

palavra carrega em si. A infância se constrói por meio de um vasto ambiente de

negociação que provoca a produção de culturas de criança, de espaços destinados a ela

pelo “mundo adulto” e suas instituições e territorialidades infantis.

Desse modo o trabalho a ser desenvolvido visa contemplar essas crianças

como protagonistas de suas identidades e cultura social dentro do espaço/território em

que vivem na expectativa de auxiliar tanto o corpo pedagógico como docente à

compreensão da significância que esse espaço tem sobre a formação do ser humano,

desde seus primórdios, caracterizando a comunidade escolar composta de pequenos

cidadãos que carrega em si notáveis individualidades.

A pesquisa pretende refletir sobre os principais aspectos norteadores das

práticas pedagógicas no processo de construção do conhecimento na área de Geografia

da Infância e valorização da cultura local no geografar as infâncias, analisando também

o que dizem os documentos (nacionais, municipais e PPP escolar) e as práticas

pedagógicas no contexto da Geografia da Infância, tendo como recorte espacial de

análise a Creche Municipal Tempo de Criança mediante visitas, experiências narrativas

e entrevistas com docentes, considerando o contexto situado do bairro Volta Grande e

Santo Agostinho e do município de Volta Redonda para se entender sobre a

1 Bolsista de Iniciação Científica e Graduanda em Licenciatura em Pedagogia da UNIRIO/CEDERJ/UAB. 2 Doutorando em Geografia pela UERJ e Professor Presencial do Curso de Licenciatura em Pedagogia daUNIRIO/CEDERJ/UAB.

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Territorialidade da criança nesse contexto social, esperando alcançar a ampliação do

pensamento crítico mediante o confronto da prática com os referencias teóricos.

A Infância no contexto da Geografia

Existem variedades de interpretações sobre o termo infância, o entendimento

sobre os espaços infantis também merece um olhar muito especial. A própria LDB de

1996, em um de seus capítulos, reconhece a Educação Infantil como uma etapa de

significativa importância no desenvolvimento humano, incluindo-a na educação básica,

deliberando sobre a formação mínima para seus profissionais.

Delgado e Muller (2006, p.10) apresentam, em seus dossiês, experiências

teóricas e empíricas, contravindas do entendimento de infância pertinentes aos “espaços

institucionais” e à “idade cronológica”, compreendendo, de forma ampla, qualidades de

espaço e tempo das infâncias, percebendo que as crianças não experimentam e

acumulam vivências somente em ambientes escolares e sim, também, em qualquer

espaço que estão inseridas, até porque da mesma forma em que estão conectadas aos

espaços institucionais estão vinculadas e são sujeitas ativas dos não institucionais. É

necessário se pensar sobre a criança e o seu território descobrindo a importância desse

último para a sua formação conforme, dito por Delgado e Muller (2006).

Refletir sobre os diferentes espaços das infâncias permite descentrar nossos olhares das dimensões físicas e ambientais que instituímos como as mais adequadas para as crianças, esquecendo-nos muitas vezes que em outros espaços também acontecem encontros, desencontros, descobertas e trocas. Nesse sentido, entendemos que os espaços embora prontos, construídos e idealizados por nós adultos não garantem relações humanas baseadas em sentimentos de respeito pela diversidade, pelas pluralidades das infâncias ali contidas (DELGADO; MULLER, 2006. p.8).

Ao longo da história pesquisadores, tentam descrever o sentimento de infância

com a pretensão de descobrir a associação do espaço onde a criança está inserida com o

seu desenvolvimento. A possibilidade de uma construção de identidade cultural se dá

por meio da constituição de espaços destinados a um grupo social determinado, o que

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acaba aproximando à realidade a dimensão do termo território. Dentro desse

determinado grupo social, as pessoas inseridas viveriam de acordo com as significações

trazidas por meio delas, “territorializadas” a um local concreto a partir de regras a serem

seguidas. Da mesma forma ocorre com as crianças em seus diferentes contextos, o que

significa a constituição de identidades infantis locais por meio de limites e diferenças

entre os grupos sociais. Sendo assim as relações estabelecidas entre o indivíduo e o

lugar onde se está é mediada pelos demais sujeitos envolvidos, numa relação carregada

de sentidos.

Sendo assim, Lopes e Vasconcellos (2006) dizem que “a busca de compreender

quais os lugares ocupados nesse processo de interação da criança com os demais

sujeitos de seu entorno [...] é um dos esforços da geografia da infância” (p.122) e que “a

interface das diferentes infâncias, seus cotidianos e contextos espaciais” (p.123) justifica

o termo “Geografia da Infância”:

[...] a geografia da infância tem como questão básica a compreensão da infância em seus diferentes contextos, ou seja, como os arranjos sociais, culturais, produzem as infâncias em seus diferentes espaços e tempos e como as crianças ao se apropriarem dessas dimensões sociais, as reconfiguram, as reconstroem, e ao se criarem, criam suas diferentes geografias (LOPES; VASCONCELLOS, 2006, p. 122).

O mundo contemporâneo tem de maneira sutil moldado o que se conhece pelo

termo infância, destruindo aos poucos esse conceito, voltando-se para outros fins que

não priorizam a construção da identidade das crianças como sujeitos protagonistas. É

necessário repensar no conceito de infância levando em consideração as diversas

interpretações e significações da mesma para o alvo principal que são as crianças a fim

de não só continuar a trabalhar na expectativa de uma educação de qualidade como

também mudar a interpretação da territorialidade infantil.

A Educação no Município de Volta Redonda

Volta Redonda, conhecida como Cidade do Aço (devido a Companhia

Siderúrgica Nacional-CSN) e localizada no sul do Estado do Rio de Janeiro, na região

do Médio Paraíba Fluminense, conta com cento e cinco unidades escolares que

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abrangem a Educação Infantil e o Ensino Fundamental, e para cada um desses o olhar

pedagógico é específico.

De acordo com a entrevista realizada com a supervisora educacional Andréia

Crespo Diniz, o número de crianças matriculadas em Creches e Pré-escolas cresceu

muito desde o ano de 2009 onde, nesse informado, 1.889 (mil, oitocentos e oitenta e

nove) crianças foram registradas; no ano de 2012, 3.584 (três mil, quinhentos e oitenta e

quatro) crianças foram matriculadas e essa média foi considerada 90% da demanda

cumprida na época. No ano de 2013, de acordo com a entrevista realizada com a

mesma, 6.573 (seis mil, quinhentos e setenta e três) crianças foram matriculadas, e essas

estavam distribuídas em 55 unidades escolares.

Outra questão específica no município de Volta Redonda é que as escolas, pré-

escolas e creches municipais estão quase todas preparadas, estruturalmente, e atendendo

cerca de 500 crianças com deficiências entre visuais, mentais, auditivas, físicas e

transtornos globais de desenvolvimento educacional, onde também recebem

atendimentos educacionais especializados em salas de recursos multifuncionais, ainda

de acordo com a supervisora educacional.

História da Creche: Lugares e Espaços em questão

A Creche Municipal Tempo de Criança, situada na Rua Jayme Martins, número

980, bairro Santo Agostinho, se encontra em uma comunidade bastante heterogênea, e

os alunos que frequentam essa instituição são de idade entre 06 meses à 3 anos.

Segundo o Plano Político Pedagógico da Instituição, ou seja, o “PPP” os pais da maioria

estão empregados e garantem minimamente as necessidades básicas; existem também

aqueles que se encontram desempregados como também desajustados, ou lares desfeitos

que conforme relata o “PPP” refletindo negativamente no trabalho escolar. De acordo

com esse mesmo documento, as crianças são de classes populares onde não são

prioritários o lazer e a cultura. Quanto ao estudo sabem que é importante, sendo assim

os professores acabam atuando como reforço para carências familiares.

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O “PPP” também assinala que a creche está inserida numa gestão democrática

que tem como Filosofia Norteadora construir um Homem que seja crítico, criativo,

questionador e participante, e que com isso construa uma sociedade mais justa e

democrática sendo participante e comprometido com valores de honestidade,

fraternidade e justiça social.

Na expectativa de cumprir com o dever de oferecer uma educação de qualidade a

creche também conta com a formação mesclada do corpo docente entre ensino superior

e ensino médio (Curso Normal), recendo sempre que possível uma formação

continuada, que são feitas em horários flexíveis, com o intuito de haver trocas de

experiências, esclarecimentos das dúvidas, acompanhamentos dos planejamentos e

projetos, e tudo mais que se faz necessário para um trabalho pedagógico de qualidade.

Por mais de 10 anos a Creche aguardara a reforma prometida pela Prefeitura que

tinha como projeto ampliar o espaço onde as crianças poderiam se socializar e criar

territorialidades de ser/aprender por meio da exploração do espaço/território,

aproveitando o morro que já existia e o grande espaço verde que poderia ser preservado

e aproveitado para a promoção da educação, porém a realidade foi inversa. O verde e

natural quase se perdeu e os espaços de crianças construídos pelo “mundo adulto”

apenas alimentam a imaginação infantil e não potencializa o aprender e o descobrir

através das brincadeiras e atividades dirigidas. Hoje um enorme e vilão azul – portão –

as separam do único contato com a natureza e os brinquedos, o que tem alimentado a

reclamação das professoras e auxiliares por não poderem deixar as crianças explorarem

o espaço por questão de segurança.

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Fundos da Creche onde o portão é o único objeto de separa as crianças de um mundo de experiências com o natural e o conreto.

É preciso considerar a territorialidade das crianças como elemento fundamental

para a utilização e estruturação de espaços escolares, assim como as práticas

pedagógicas. Todo esse complexo processo parte também da necessidade de

compreensão da importância docente, em seus aspectos formativos e profissionais, que

tende a ser um dos elos fundamentais.

Estrutura e usos da Creche: territórios construídos por

adultos e territorialidades de crianças.

Conhecendo as Docentes3

3 No corpo da pesquisa, as professoras entrevistadas foram identificadas simbolicamente no intuito de preservar seu anonimato, denominadas P1, P2 e P3.

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Na expectativa de entender a visão que as profissionais da educação têm a

respeito de algumas questões da instituição e da Educação Infantil, foram realizadas

perguntas a três professoras, sendo cada uma responsável por um Maternal,

compreendidos em I, II e III.

Durante a entrevista é notável que o desejo e a realidade de trabalhar com a

Educação Infantil entre essas profissionais variam entre a afeição, o dom e facilidade de

comunicação, e o encanto, onde o ato de “descobrir” o mundo e o novo, junto das

crianças, torna o trabalho sempre prazeroso mesmo que às vezes cansativo.

Mas qual o perfil das famílias vindas à Creche, e até que ponto, no contexto em

sala de aula, essa relação de família-professora é determinante? As entrevistadas P2 e

P3 disseram que a clientela é composta por sua maioria de classe baixa, onde que por

necessidade de trabalho os pais deixam seus filhos na creche confiando no trabalho

realizado ali, mas é sempre necessário mostrar a eles – de acordo com as professoras –

que além do cuidar a creche é responsável por nortear o caminho das primeiras

aprendizagens da criança. Já para a terceira entrevistada “o perfil varia a cada ano”,

onde essa acredita que quanto menor for a faixa etária, mais a família acaba se

envolvendo.

Sabendo sobre o perfil das famílias surgiu a curiosidade de entender como

funciona a parceria escola/família na Creche na visão dessas, uma vez que nos dias

atuais estudos estão sendo realizados na expectativa de descobrir até que ponto o

envolvimento ou não da família influencia no processo de aprendizagem da criança,

sabendo que o psicológico e emocional são fatores importantíssimos nesse processo

conforme Wallon aborda em suas pesquisas e conceitos em sua teoria da afetividade.

Foi possível perceber a preocupação de todas em sempre envolver a família com os

acontecimentos, trabalhos e eventos realizados e promovidos pela Creche. Mostrar aos

pais o que seus filhos aprendem ou até mesmo simples diálogos nas reuniões de pais

estreitam o laço entre os envolvidos promovendo um trabalho mais eficaz, sendo assim,

a relação que todas descreveram é de reciprocidade, respeito e confiança.

Na visão delas essa relação gera a confiança e credibilidade entre as partes

envolvidas, não associando mais a Creche como um simples local onde as crianças são

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deixadas enquanto seus pais trabalham, pois notam que as primeiras aprendizagens

acontecem nesse tipo de instituição. As professoras narraram exemplos de algumas

crianças de quase dois anos, e outras nessa faixa etária, que foram para a creche ainda

engatinhando e que em poucas semanas aprenderam a andar, e outras que não falavam

nada e hoje já se socializam; e tudo isso não somente com estimulações das envolvidas

como principalmente por ajuda de outras crianças que acabam se tornando pequenos

professores. O que elas explicaram é que muitas das vezes a família, por vários motivos,

acaba não estimulando as crianças a falarem e a andarem no “tempo certo”, por

exemplo, e quando essas vêm à Creche, essa se encarrega de trabalhar nessas e outras

necessidades.

Começando com o início da vida indo até o final da mesma o ser humano passa

por estágios de conhecimentos e reconhecimentos de suas próprias preferências e

gostos, limites, e aquisição e usos de habilidades, por exemplo, notando a sua

individualidade em meio a tantos outros igualmente únicos. Esse processo de

autoconhecimento é muito das vezes influenciado pelo ambiente, cultura e pessoas com

as quais esse convive, e o fato da criança passar certo período do dia nas dependências

da creche faz com que o (a) educador (a) busque sempre diferentes alternativas de

trabalhos a fim de atender as necessidades de seus alunos ao mesmo tempo em que é o

(a) responsável pela formação inicial dos mesmos.

Nesse contexto, foi levantada a questão da Geografia dentro da Educação

Infantil, e o que cada uma considera relevante para a realização das aulas dessa

disciplina. Todas informaram que seus trabalhos estão embasados sob o campo Corpo e

Movimento, onde levam “a criança a conhecer, dominar e modificar o espaço em que

vive” por meio de jogos e brincadeiras. Nenhuma das três professoras afirmou possuir

dificuldades de trabalhar a questão da Geografia da Infância com seus alunos, de acordo

com as mesmas.

Ainda se tratando da Geografia da Infância, o interesse em aprofundar esse

assunto fez com que houvesse questionamento sobre quais espaços dentro da instituição

eram mais utilizados nas práticas, e para se trabalhar o Corpo e Movimento – conforme

relatado – quais recursos, estratégias e objetivos consideravam determinantes para a

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aprendizagem das crianças. Todas afirmaram que os espaços mais utilizados são a sala

de aula e o pátio de recreação onde podem explorar as noções espaciais por meio de

jogos, músicas e brincadeiras, no intuito de levá-los a compreender essa noção do

espaço, entretanto, uma das entrevistadas aprofundou a questão dizendo que seu

trabalho não se prende somente dentro dos muros escolares, já que se preocupa em usar

experiências vivenciadas entre as crianças e suas famílias, e amigos como uma

construção do conhecimento geográfico infantil.

Foi possível perceber que o trabalho realizado por elas envolve mais as

dependências da instituição, surgindo assim a necessidade de compreender como o

espaço físico é visto para o trabalho da Educação Infantil, principalmente, considerando

a relação entre a recente reforma da instituição escolar e o atendimento das necessidades

pessoais e pedagógicas das crianças e delas mesmas. Quando chegamos nessa questão a

visão de todas elas eram diferentes. Para P1 a reforma realizada – apesar de não “ser de

primeiro mundo”, conforme falado – permite realizar um bom trabalho já que para ela o

espaço físico é satisfatório. Para a P2 apesar de a reforma chegar em “boa hora” e ter

ampliado a creche “as salas ainda não são grandes o suficiente para contemplar todas as

áreas e cantos específicos”, além de faltar salas específicas para histórias, estimulação e

repouso, permitindo-nos perceber particularidades sobre a visão de cada uma sobre o

processo educacional. Já para a P3 o problema do trabalho com maior qualidade não

está relacionado às dependências da creche, pois mesmo com a reforma vinda em boa

hora “o trabalho funcionaria melhor – na visão dessa – se o número de crianças por

turmas fossem pequenos”, pois assim “facilitaria o ‘conhecer’ as crianças, estreitando o

relacionamento com as família”, e também com um número reduzido de crianças

diminuiria o barulho. Haja vista que o espaço destinado à aprendizagem deve ser

adequado aos objetivos educacionais, onde que para cada trabalho, de um determinado

campo, os recursos devem estar disponíveis principalmente quando tratamos da

educação infantil onde a questão da identidade e autonomia são mais exploradas, mas

não basta apenas ter bons espaços estruturalmente, pois para que aconteça a

aprendizagem é necessário providenciar meios de se chegar até ela.

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Por outro lado o número excessivo de crianças é também um fator que deve ser

levado em consideração para a promoção de uma educação de qualidade uma vez que

para a eficácia do trabalho deve-se haver uma dedicação, e com o número excedido não

é possível atender os objetivos pré-determinados, desse modo a preocupação da terceira

entrevistada é justamente esse, ciente de que não basta apenas ter um espaço promotor

da educação, é necessário repensar sobre como atender todas as crianças levando em

conta suas necessidades e tempo de desenvolvimento.

E sobre as capacitações profissionais oferecidas pela SME (Secretaria Municipal

de Educação), o que dizem? As três entrevistadas assinalaram que essas capacitações

dão suporte para trabalhar a diversidade cultural, concordando que as capacitações são

importantes instrumentos capazes de enriquecer a prática diária, podendo ampliar o

olhar e a reflexão por meio de estudos e experiências.

As professoras dedicam-se a levar seus alunos a entenderem o seu papel na

sociedade e a desenvolver a superação de seus próprios limites, reconhecendo o seu

espaço no mundo onde estão inseridos por meio de brincadeiras e até mesmo de

investigações. O chão se torna o palco e elas são as protagonistas do roteiro chamado

vida.

Considerações Finais

A infância é o pontapé inicial para a formação do indivíduo. É por meio dela que

o caráter do ser humano é moldado tornando-o capaz de viver ou não em harmonia

dentro da sociedade. Quanto mais forem trabalhados valores nas primeiras idades mais

esses serões afirmados na pessoa na vida adulta, não esquecendo que o que também

contribui para a construção da identidade é a família e o espaço onde a criança está

inserida. Um lar estruturado possivelmente permitirá uma maior desenvoltura no lidar

com a vida, mas mesmo que haja problemas no convívio familiar a instituição consegue,

se desejar, encaminhá-la para uma vida familiar saudável.

Desse modo é possível entender que as significações e conceitos sobre o termo

infância e a interpretação da Geografia da Infância e territorialidades infantis são pontos

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chaves para o desenvolvimento dentro das instituições, cabendo aos profissionais da

educação um olhar maleável e crítico quanto o trabalho que realizam juntamente das

crianças, pois cada uma delas carrega em si histórias e experiências únicas providas da

construção inicial de suas identidades por meio de um vasto ambiente de negociação e

troca de tudo o que as cerca.

A entrevista, realizada em dias diferentes possibilitou perceber que a visão de

cada uma tem uma particularidade e forma diferente de pensar e agir apesar de

acreditarem num mesmo princípio que é promover uma educação de qualidade, sendo

assim na visão de cada uma é notório que por mais que pesquisas sejam realizadas sobre

o mesmo tema sempre algo é desconhecido e está pronto para ser explorado mais e mais

vezes, nos tornando verdadeiros agentes aptos a aprender e reaprender muitas e muitas

vezes.

O fato de existir espaços destinados às crianças para promoção de uma educação

de qualidade nos primeiros anos, como creches e pré escolas, por si só não farão com

que essas verdadeiramente desfrutem de suas conquistas até porque para que ocorra

verdadeiramente a aprendizagem o estímulo da instituição e de seus profissionais, bem

como sues planejamentos e metodologias, são indispensável.

A pesquisa possibilitou a percepção de que o trabalho realizado na educação

infantil não está mais voltado para o simples ato do cuidar das necessidades básicas da

criança como forma de compensar a ausência dos pais na formação da mesma por

motivos de trabalhos e outros, de fato esse primeiro cuidado não deixa de estar na

proposta da criação das creches, entretanto o papel da creche vai muito além dessa

questão, fazendo com que a criança possa se identificar no mundo em que vive criando

e recriando suas próprias histórias por meio de suas descobertas no mundo, se

conhecendo e afirmando a sua identidade social e cultural. O estar “aqui e agora” é a

chave para repensar o papel do educador e suas metodologias de trabalhar com seus

alunos a Geografia da Infância.

Bibliografia

BEDÊ, Valdir. “Volta Redonda na era Vargas 1941-1964 (História Social)”, p. 33

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