geografares_representações cartográficas no ensino de geografia

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 GEOGRAFARES, Vitória, n o  4, 2003  7 REPRESENTAÇÕES CARTOGRÁFICAS: TEORIAS E PRÁTICAS PARA O ENSINO DE GEOGRAFIA  Ângela Massumi Katuta Professora Assistente da Universidade Estadual de Londrina, PR, na disciplina Prática de Ensino em Geografia e Estágio Supervisionado. “No princípio era a Ação. A palavra não foi o princí- pio – a ação já existia antes dela; a palavra é o final do desenvolvimento, o coroamento da ação” (Vygotsky, 1991, p. 131). INTRODUÇÃO As representações cartográficas devem ser compre- endidas enquanto linguagens que são instrumentos humanos social, histórica e geograficamente construí- dos. Possuem a função de orientação das atividades humanas em diferentes sociedades, assim como qual- quer outro tipo de conhecimento. Dessa forma, tais representações devem ser apreendidas, lidas e com- preendidas de forma contextualizada, pois também expressam a cosmologia e a geografia de cada socie- dade. No presente texto, fiz alguns apontamentos sobre questões que devem ser consideradas quando se trata do uso das representações cartográficas voltadas para o ensino da geografia. Num primeiro momento, ela- borei algumas observações sobre as relações entre lin- guagem, pensamento e construção do conhecimento. Parti do pressuposto de que os docentes, independen- temente do nível de ensino e da especialidade com que trabalham, devem ter construído reflexões mínimas sobre tais processos, a fim de conduzir de forma autô- noma o processo de ensino e aprendizagem na sala de aula. Além disso, entendo que é nesse contexto que o uso das representações cartográficas deve ser realiza- do, principalmente quando se trata do ensino formal da geografia em todos os níveis. Posteriormente, refleti sobre alguns aspectos teóri- co-metodológicos que devem ser considerados quan- do da realização do trabalho com representações car- tográficas no contexto da sala de aula e, especifica- mente, no ensino da geografia. Por fim, abordei o pa- pel das referidas representações na construção de raci- ocínios geográficos, e seu lugar na formação dos pro- fessores. É importante salientar que o presente texto foi ela- borado apenas com o objetivo de apontar alguns ele- mentos a ser considerados, quando do debate, da re- flexão e do trabalho em torno da temática ora propos-

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  • GEOGRAFARES, Vitria, no 4, 2003 7

    REPRESENTAESCARTOGRFICAS:

    TEORIAS E PRTICAS PARAO ENSINO DE GEOGRAFIA

    ngela Massumi KatutaProfessora Assistente da Universidade Estadual de Londrina, PR,

    na disciplina Prtica de Ensino em Geografia e Estgio Supervisionado.

    No princpio era a Ao. A palavra no foi o princ-pio a ao j existia antes dela; a palavra o finaldo desenvolvimento, o coroamento da ao(Vygotsky, 1991, p. 131).

    INTRODUO

    As representaes cartogrficas devem ser compre-endidas enquanto linguagens que so instrumentoshumanos social, histrica e geograficamente constru-dos. Possuem a funo de orientao das atividadeshumanas em diferentes sociedades, assim como qual-quer outro tipo de conhecimento. Dessa forma, taisrepresentaes devem ser apreendidas, lidas e com-preendidas de forma contextualizada, pois tambmexpressam a cosmologia e a geografia de cada socie-dade.

    No presente texto, fiz alguns apontamentos sobrequestes que devem ser consideradas quando se tratado uso das representaes cartogrficas voltadas parao ensino da geografia. Num primeiro momento, ela-borei algumas observaes sobre as relaes entre lin-

    guagem, pensamento e construo do conhecimento.Parti do pressuposto de que os docentes, independen-temente do nvel de ensino e da especialidade com quetrabalham, devem ter construdo reflexes mnimassobre tais processos, a fim de conduzir de forma aut-noma o processo de ensino e aprendizagem na sala deaula. Alm disso, entendo que nesse contexto que ouso das representaes cartogrficas deve ser realiza-do, principalmente quando se trata do ensino formalda geografia em todos os nveis.

    Posteriormente, refleti sobre alguns aspectos teri-co-metodolgicos que devem ser considerados quan-do da realizao do trabalho com representaes car-togrficas no contexto da sala de aula e, especifica-mente, no ensino da geografia. Por fim, abordei o pa-pel das referidas representaes na construo de raci-ocnios geogrficos, e seu lugar na formao dos pro-fessores.

    importante salientar que o presente texto foi ela-borado apenas com o objetivo de apontar alguns ele-mentos a ser considerados, quando do debate, da re-flexo e do trabalho em torno da temtica ora propos-

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    ta. No tive a inteno de esgotar e nem de apontarcaminhos e solues para o uso das representaescartogrficas no ensino de geografia. Entendo que taisaes devem ser, necessariamente, fruto de debates esistematizaes coletivas, considerando-se especifici-dades, objetivos e o contexto de realizao de cadaprocesso de ensino e aprendizagem.

    LINGUAGEM, PENSAMENTOE CONHECIMENTO

    Assim como falham as palavras quandoquerem exprimir qualquer pensamento,

    Assim falham os pensamentos quando que-rem exprimir qualquer realidade.

    Mas, como a realidade pensada no a ditamas a pensada,

    Assim a mesma dita realidade existe, no oser pensada.

    Assim tudo o que existe, simplesmente existe.O resto uma espcie de sono que temos.Uma velhice que nos acompanha desde a

    infncia da doena(Pessoa, 1980, p. 116).

    Muito se tem escrito sobre linguagem, pensamentoe conhecimento. Esses temas, principalmente a lingua-gem, ainda hoje so debatidos por intelectuais de pro-fisso, poetas, como se pode observar na epgrafe, eat pintores lembrem-se de Edvard Munch (1863-1944) e seus quadros A voz (1893), O grito (1893).Falhas das palavras, das imagens, dos pensamentos,ou diferentes expresses e variaes sobre o mesmotema?

    Freqentemente, cada um dos termos citados abor-dado separadamente e, no raro, por uma especialida-de cientfica. Assim, ainda hoje, de acordo com o en-tendimento de muitos especialistas, a linguagem ob-jeto da lingstica, o pensamento da psicologia e o co-nhecimento da filosofia. De uma forma geral, cada ci-ncia e cientista se entendem como possuidores de umobjeto de estudo especfico. Tal posse, aparentementeparece garantir a identidade de cada um dos ramos dosaber, e, ainda mais, o direito do exerccio do pensar erealizar determinadas prticas social e juridicamentesancionadas aos especialistas em determinadas reasdo saber.

    A situao a que rpida e muito brevemente fiz alu-so prtica comum em nossos dias, no entanto taldiviso do trabalho intelectual1 muitas vezes cria pro-blemas de difcil soluo, ou, em outras palavras, im-possibilita a elaborao de respostas a questes e,muitas vezes, inviabiliza o prprio ato de construode perguntas, que pode supor a supresso da atual di-viso das cincias. Elias (1994, p. 7) afirma nesse sen-tido que, apesar de admitir-se que a estrutura internadas cincias mude, a diviso da Cincia, de acordo comas instituies atuais, aceita como imutvel. Assimse constituram historicamente grandes reas do saber Cincias Exatas, Biolgicas e Humanas no bojodas quais existem vrias outras especialidades.

    importante salientar que no estou defendendo aeliminao das especializaes, elas so importantes; eudiria que, considerando a atual forma de produo deconhecimentos e projeto societrio, se constituem emcondio para a elaborao de saberes mais congruentescom a realidade2 . No entanto, a especializao no podese impor em detrimento da elaborao de conhecimen-tos de um nvel mais elevado de sntese3.

    Uma grande parte dos debates sobre linguagem,pensamento e conhecimento tem sido permeada pelaproblemtica da especializao levada s suas ltimasconseqncias. A simples comparao do conceitomoderno de ser humano elaborado pelas cincias bio-lgicas e humanas, expresso da diviso cartesianacorpo e alma4, j basta para nos convencer da necessi-dade do exame crtico da atual diviso do trabalho in-telectual, principalmente no caso da temtica ora emquesto. Linguagem, pensamento e conhecimento fa-zem parte de um mesmo complexo de pensamento, nopossuem existncias separadas e independentes comoquer crer a maior parte dos discursos elaborados nobojo da tradio cientfica, centrados no entendimentodo indivduo em si e per si.

    Abordagens de linguagem, pensamento e conheci-mento centradas apenas no indivduo fazem parte deuma tradio de pensamento muito presente em estu-dos psicolgicos, exceo de pesquisas cujo referen-cial terico-metodolgico se baseia no materialismohistrico dialtico, como o caso dos trabalhos de LevSemenovich Vygotsky, Alexander Romanovich Luriae Alex N. Leontiev, principais representantes da psi-cologia sovitica, na perspectiva da referida matriz depensamento.

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    Como afirma Elias (1992, p. 12 e seg.), linguagem,pensamento e conhecimento so diferentes funes deum mesmo processo de conhecimento, e no devemser abordadas como processos substancialmente inde-pendentes e diferentes. Lnguas, pensamentos e conhe-cimentos devem ser entendidos como sendo sociais eindividuais ao mesmo tempo. importante salientarainda que toda reflexo sobre tal questo traz, no seubojo, implicaes profundas para os processos de en-sino e aprendizagem, formais e no-formais.

    Outro ponto a ser esclarecido, e que discutidodesde os epicuristas5 at os nossos dias, a questo daorigem da linguagem, como se fosse possvel elaborarteorias sobre o seu incio. Para Elias (1994, p. 8),

    Tal resposta no ser encontrada. O crescimento de umalngua, tal como o do conhecimento, um processo con-tnuo sem rupturas absolutas. O que podemos esperarvir a encontrar, por outras palavras, um fluxo inces-sante de linguagem e de conhecimento que transportameios estandardizados de comunicao e orientao. mantido em actividade por tcnicas de estandardizaoque podem ser ou no reconhecidas como tal. A capaci-dade de controlar os padres de conhecimento e da falanuma sociedade , geralmente, um aspecto concomitan-te da distribuio das oportunidades de poder numa so-ciedade.

    Depreende-se da citao que a linguagem enquan-to tal somente se realiza socialmente, dada a sua fun-o de comunicao e orientao das atividades hu-manas. O referido autor entende tambm que os pro-cessos de humanizao do ser humano so as matrizesdo crescimento do conhecimento. Em outras palavras,construo de conhecimento, uso da linguagem comomeio de comunicao e humanizao so processosamalgamados, caractersticos dos seres humanos mo-dernos (Homo Sapiens sapiens).

    As pesquisas realizadas por Olson (2003, p. 160 eseg.) permitem afirmar que hipteses explicativas so-bre a origem da linguagem tendem a se multiplicar deforma descontrolada, principalmente em funo daescassez da possibilidade de comprovao de fatos.Considerando tal problemtica, em 1866, a SociedadeLingstica de Paris proibiu as discusses sobre a ori-gem da linguagem em suas reunies. O mesmo autorenumera hipteses consideradas mais provveis, ape-

    sar de afirmar categoricamente que jamais teremoscerteza sobre o surgimento da linguagem:

    Talvez um pequeno grupo de humanos tenha dado umaespcie de salto conceitual, que logo se espalhou parapopulaes vizinhas. Pode ser, tambm, que vrios gru-pos estivessem usando protolinguagens relativamentesimples, que foram suplantadas por uma forma de comu-nicao mais sofisticada. A linguagem pode ter sido de-senvolvida de forma gradual, atravs de inovaessurgidas em diferentes grupos (Olson, 2003, p. 163).

    Verifica-se pelo exposto que, mesmo atualmente,no se pode fazer afirmaes acerca das origens dofenmeno abordado, no entanto as hipteses elencadasexplicitam a funo dual da linguagem: tem o poderde unir, desunir, integrar e desintegrar grupos huma-nos. Alm disso, ao mesmo tempo, possibilita e limitatanto o conhecimento quanto a comunicao. Sem alinguagem o conhecimento no se realiza, assim ela seconstitui em estrutura estruturante6 ou fundamento detodo e qualquer pensamento humano, o que no pu-der ser assim articulado dificilmente ser consideradopensamento (Tung-Sun, 2000, p. 175).

    O mesmo autor (p. 175) defende a tese de que alinguagem tem sido um fator favorvel e no um obs-tculo ao desenvolvimento do pensamento, pois o cria

    1. Estou me referindo aqui diviso interna dos sujeitos que atuamcomo intelectuais em determinada sociedade. Concordo comGramsci (1978, p. 7) que diz: Todos os homens so intelectuais,poder-se-ia dizer ento; mas nem todos os homens desempenhamna sociedade a funo de intelectuais.2. Termo usado por Elias (1994, p. 111 e seg.) contra tendnciasque entendem que o conhecimento existe para alm do espao etempo e outras que sugerem que ele existe no exterior dos sereshumanos. Num contexto cientfico, o par de antnimos verdade ementira menos utilizvel, pelo fato de o trabalho cientficoproceder de forma gradual: Tem o carcter de um processo nadireco de uma maior congruncia com a realidade e de um menorcontedo de fantasia dos smbolos a diversos nveis. Asproposies podem tornar-se mais adequadas ou menosadequadas como smbolos dos factos (Elias, 1994, p. 112).3. As diferenas entre os diversos saberes mtico, religioso, desenso comum, cientfico etc. referem-se aos nveis mais ou menoselevados de sntese; sobre esse assunto ver Elias (1994).4. Para os cristos medievais o mundo fsico era um reflexo doespiritual, concebido como realidade primria e verdadeira. Sobreesse assunto ver o livro de Wertheim (2001).5. Epicuro viveu aproximadamente entre 341 a 270 a.C.; juntamentecom Lucrcio, foi sucessor de Demcrito, que transmitiu a eles afilosofia do atomismo, que postulava a idia de [...] um universoconstitudo de minsculas partculas indivisveis que semovimentavam livremente em um infinito vazio neutro e, atravs desuas colises e combinaes, criavam todos os fenmenos(Tarnas, 2000, p. 288). Segundo o mesmo autor (p. 287) o sistemaepicurista foi criado para resolver as objees lgicas contra amutao e o movimento apresentadas por Parmnides.6. Termo usado por Bourdieu (2000).

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    e desenvolve. Essa tese no contrria idia da lin-guagem enquanto mecanismo limitador da comunica-o e do conhecimento; Tung-Sun se refere a apenasuma cultura, se a compararmos com outras verificare-mos que diferentes lnguas no partilham a mesma l-gica de entendimento do mundo.

    Na medida em que o objeto da Lgica est nas regras deraciocnio implcitas na linguagem, a expresso desse ra-ciocnio deve ser implicitamente influenciada pela estru-tura da linguagem, e as diferentes lnguas tero formasde Lgica mais ou menos diferentes. Da a diferena en-tre a Lgica chinesa e a Lgica aristotlica7 (Tung-Sun,2000, p. 177).

    O fato de a linguagem se constituir numa estruturaestruturante do pensamento no impossibilita a afir-mao de que ela tambm uma estrutura estruturada8,pois a mesma tecida, urdida, no contexto das maisdiferentes sociedades. Herdamos da sociedade no bojoda qual nascemos o conjunto de linguagens e entendi-mentos de mundo engendrados social, geogrfica ehistoricamente. Assim, os cdigos somente se funda-mentam como linguagem se o conjunto da sociedadeos utilizar, o que implica a existncia de pessoas inte-gradas, pois ... perde a sua funo e, alis, o seu car-ter como lngua, se for compreendida apenas por umfalante (Elias, 1994, p. 23).

    A abordagem de linguagem, pensamento e conhe-cimento como um processo nico de realizao dopensamento humano explicita o carter interdependentedessas funes. Os desdobramentos dessa perspectivana educao formal so considerveis. Ao se pensarna relao mutuamente dependente das trs funes, aaprendizagem das mais variadas linguagens (grfica,cartogrfica, escrita, matemtica, artstica nas suas maisdiferentes formas) se torna condio para a realizaode pensamentos e conhecimentos mais congruentescom a realidade9.

    Dessa forma, fica clara a funo e o lugar da lin-guagem no ensino e na aprendizagem formais: trans-formar-se em instrumento que auxilie no processo deconstruo de entendimento do mundo no qual vive oaluno. Nesse contexto, deixa de ter sentido a realiza-o de processos de alfabetizao mecnica, cuja pre-ocupao no ensinar a ler, ou a construir entendi-mentos acerca do mundo, mas decifrar cdigos. A lei-

    tura entendida no presente texto num sentido amplo,como processo de construo de significados a partirde produtos culturais e, portanto, narrativas as maisvariadas.

    Luria (1986, p. 21) afirma que os seres humanos sediferenciaram de outros animais quando mudaram ra-dicalmente todas as categorias fundamentais de seucomportamento, passando existncia histrico-social,ao trabalho e s formas de vida social vinculadas aeles. Segundo o mesmo autor, existem dois fatoresdecisivos que determinam a passagem da conduta ani-mal atividade consciente dos seres humanos: o tra-balho social, que uma atividade humana vital, e aapario da linguagem.

    As aes complexas dos seres humanos decorremdo trabalho e de sua diviso social, que provocaram oaparecimento de motivos sociais de comportamento. quando a conduta do ser j no est mais determina-da por objetivos instintivos diretos. Dessa forma, paraa realizao das atividades humanas, ocorre a elabora-o de motivaes complexas, em comparao comos outros animais. Da Vygotsky (1991, p. 131) afir-mar que no princpio era a ao, contrariando o livrosagrado dos cristos, o Gnesis (1,3-4), para quem acriao aconteceu por meio da palavra divina. Verifi-ca-se nesse sentido duas posies epistemolgicas so-bre a linguagem diametralmente distintas.

    Para Vygotsky (1991), a partir da ao dos sereshumanos que a linguagem se constituiu, tornando-seum dos instrumentos mais poderosos na orientao ena comunicao das idias humanas. A ao sobre oobjeto antecedeu a sua nomeao; nesse sentido, o es-tatuto ontolgico da linguagem no est pautado napalavra, mas na ao. Da ser a palavra o coroamentoda ao e no o contrrio.

    Na narrativa do Gnesis verifica-se que a palavraantecede a existncia da coisa, do objeto, que so cri-ados por um ato de nomeao divina. Vejam o poderda palavra nessa cosmologia: ela quem confere esta-tuto ontolgico para as coisas. O objeto somente passaa ter existncia pela palavra, porque Deus disse Faa-se a luz e assim, fez-se a luz. A idia de luz anterior coisa, que nessa perspectiva se constitui enquantoexpresso da primeira. Observa-se nessa passagem b-blica a crena, ainda muito presente em determinadastradies filosficas aprioristas, de que a idia de umindivduo sobre a coisa, no caso Deus, precede a ao.

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    E de que essa ltima constitui-se em ato individual,realizvel por todo ser humano, negando assim a apren-dizagem e o social, categorias centrais para o entendi-mento do processo de humanizao do ser humano.

    Ao criticar a tradio filosfica apriorista e indivi-dualista que parte do pressuposto de que a aquisiodo conhecimento pelo ser humano universalmente amesma10 , Elias assim se expressa:

    A imagem dos seres humanos, sobre a qual repousa todaa trama da epistemologia filosfica, sem fundamento.O ideal, esse do indivduo totalmente independente, deum eu sem voc e sem ns, o ideal de uma pocaanterior, apresentado como se fosse fato atemporal euniversal. Descartes sinalizou: Cogito ergo sum. O quese configura absurdo! Meramente, para dizer isso, tem-se que aprender uma linguagem comum; e por que diz-lo se no houver quem oua, aceite ou rejeite? O homemde palha apresentado por Descartes ganhou ultimamentealgumas folhas de figueira, como intersubjetividade ouvalidade para todos os seres humanos, que proporcio-nam alguma ilusria companhia ao sujeito isolado do co-nhecimento a posteriori. Pouco fazem, entretanto, parasalv-lo de sua solido bsica ou, as teoriastranscendentais do conhecimento, de intrnsecas tendn-cias solipsistas (Elias, 1998, p. 27).

    Os postulados elaborados pelas teorias transcenden-tais tiveram e ainda tm grande influncia nos meiosacadmicos. O referido autor, ao longo de suas obras,as combateu incessantemente por entend-las comoderrotistas, pois presumem que as pessoas no possu-em capacidade de adaptao a diversas situaes dadaa crena em categorias universais de pensamento dosseres humanos e, assim, de desenvolver outros mo-dos de pensamento, em funo dos novos objetos queas aes fazem emergir. Na perspectiva dessas teo-rias derrotistas, a aprendizagem deixa de ter centrali-dade na humanizao do ser humano, processo esseque no referido entendimento no sequer considera-do, pois os seres humanos j nascem humanos, no seconstroem como tais.

    Linguagem, pensamento e conhecimento, na refe-rida perspectiva terica, so ancorados em categoriasfixas de entendimento humano, independentes e eter-nas. Por isso, nesse contexto, possvel acreditar edefender a existncia de verdades humanas; pensamen-

    tos e conhecimentos absolutos, atemporais e abstra-tos. Contudo, como bem observa Elias (1994, p. 15),tal crena permitiu a Descartes elaborar a questo quese constituiu no bicho da ma da modernidade:Como uma pessoa pode estar segura de que a respostaque elaborou para uma questo correta ou, nos ter-mos da filosofia clssica, verdadeira? Essa dvidacartesiana nos persegue at hoje11, muitos elaboramdoutrinas que defendem que o conhecimento trata-sede uma eterna distoro ou uma dissimulao da reali-dade esse o debate central na obra de Baudrillard(1991) Simulacros e simulao.

    Elias (p. 111 e seg.) prope como resposta dvi-da cartesiana a substituio de conceitos estticos porprocessuais, pois parte do pressuposto de que o traba-lho cientfico procede de forma gradual:

    Tem o carter de um processo na direco de uma maiorcongruncia com a realidade e de um menor contedo defantasia dos smbolos a diversos nveis. As suas proposi-es podem tornar-se mais adequadas ou menos adequa-das como smbolos dos fatos (Elias, 1994, p. 112).

    Um conhecimento mais congruente com a realida-de permitiria a sobrevivncia de determinados gruposhumanos, em detrimento de outros, e tambm possibi-litou o desaparecimento dos seres humanos antigos(Homo Sapiens ou pr-sapiens), com a conseqentesupremacia dos anatomicamente modernos (HomoSapiens sapiens) inclusive sobre os demais seres vi-vos existentes no planeta. Chamo a ateno do leitornesse ponto do texto para a pertinncia da Teoria sim-blica, tambm preconizada por Elias, quando se trata

    7. Grifo nosso. A lgica aristotlica se baseia na gramtica grega.As discrepncias entre as formas gramaticais do latim, do francs,do ingls e do alemo no acarretam qualquer diferena entre aLgica aristotlica e as regras de raciocnio prprias dessas lnguas,porque elas pertencem mesma famlia lingstica indo-europia(Tung-Sun, 2000, p. 177).8. Termo usado por Bourdieu (2000).9. Ver nota 2.10. Esse entendimento ao longo de vrios sculos, principalmenteno XVIII o sculo da linguagem, segundo os lingistas , seexpressou na procura pela lngua perfeita, na crena em aspectosuniversais na linguagem, gerando inclusive teses sobre a existnciade uma gramtica geral (sobre a idia de linguagem universal, verPort Royal, Noam Chomsky) e de universais no processo derealizao do pensamento (principal expoente atualmente muitodivulgado no Brasil: Jean Piaget).11. Seno como entender o debate central presente no contexto datrilogia Matrix, filmes escritos e dirigidos pelos irmos Larry e AndyWachowski?

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    da elaborao de reflexes acerca de temticas sobre aproduo simblica.

    No contexto da Teoria simblica, os conhecimen-tos possuem carter lingstico de mensageminterpessoal sob a forma de padres sonoros mais oumenos estandardizados, constituindo-se assim em sm-bolos de fatos reais. Observe-se que essa teoria explicitaa necessidade do esclarecimento dos fundamentos darelao entre o smbolo e o que ele simboliza, por issopossui carter processual e enfatiza os movimentos dopensamento. Da a negao do conceito esttico daverdade, e a utilizao do termo maior ou menorcongruncia com a realidade. O parmetro para saberse o conhecimento mais ou menos congruente com arealidade a sobrevivncia dos grupos humanos. Oque implica tanto a capacidade deles de se livrar dosperigos que eles constituem para os outros e para si,quanto na habilidade de eliminar ou pelo menos deconter os perigos sua sobrevivncia colocados pelosoutros elementos da natureza12. Por isso os conheci-mentos

    [...] servem aos seres humanos, numa forma, como meiode comunicao e, em outras, como meio de orientaoe, sob a forma do pensamento, como experimentao si-lenciosa sobre um leque de solues possveis a fim dese descobrir, entre elas, a melhor e a mais simples (Elias,1994, p. 111).

    Verifica-se na concepo de conhecimento ora ex-plicitada a impossibilidade de distino dos termos lin-guagem, pensamento, memria e conhecimento comose fossem substncias diferentes. Esses sempre estive-ram e ainda esto a servio da sobrevivncia dos gru-pos humanos, que se mantm por meio do trabalho. claro que em cada momento histrico, nos diferenteslugares e sociedades, a relao entre o smbolo e o queele simboliza se modifica, da serem diferentes as lin-guagens, os contedos do pensamento, memria, co-nhecimento, enfim, a cosmologia dos diversos gruposhumanos.

    Para Luria (1986, p. 22):

    Como resultado da histria social, a linguagem trans-formou-se em instrumento decisivo do conhecimento hu-mano, graas ao qual o homem pode superar os limitesda experincia sensorial, individualizar as caractersti-

    cas dos fenmenos, formular determinadas generaliza-es ou categorias. Pode-se dizer que, sem o trabalho e alinguagem, no homem no se teria formado o pensamen-to abstrato categorial.

    Assim, linguagem e trabalho so elementos impor-tantes a ser considerados no processo de construode pensamento, memria e conhecimento humano.Como afirmei anteriormente: linguagem, pensamen-to, memria, conhecimento e trabalho social so pro-cessos que se realizam no ser humano de formainterdependente. O trabalho, ou a ao sobre a coisa,forja a constituio de formas de atividades psquicasespecificamente humanas. Da Vygotsky13 afirmar queno princpio era a Ao, ou seja, o trabalho. Ao con-trrio do que est escrito no livro do Gnesis, o verbono foi o princpio de tudo, a ao o antecedeu. A pa-lavra constitui-se ao mesmo tempo em condio e re-sultado da realizao do trabalho ao e da sobre-vivncia humana. Promove o coroamento da ao, forjaa sistematizao mnima necessria sobrevivncia degrupos humanos, em diferentes nveis, snteses e siste-mas, constituindo o pensamento, a memria e o co-nhecimento, alterando tambm as formas de realiza-o do trabalho.

    No construmos conhecimento e memria sem lin-guagem e pensamento, bem como no pensamos semlinguagem, memria ou conhecimento. Por sua vez, aconstruo da linguagem supe tambm a elaboraode pensamento, memria e conhecimento. As lingua-gens so a condio e expresso para e da realizaodo processo de pensamento humano, ou seja, consti-tuem-se em instrumentos do e para o pensar.

    Existem dois outros conceitos extremamente im-portantes e que devem ser considerados ao se refletirsobre aes especificamente humanas como a lingua-gem, a memria, o pensamento e o conhecimento: evo-luo e desenvolvimento. O estudo desses dois pro-cessos em separado, o primeiro pela biologia e o se-gundo pela psicologia, acabou obnubilando a princi-pal caracterstica que nos diferencia dos outros ani-mais: o entrelaamento de processos de evoluo bio-lgica e de desenvolvimento social.

    Resultado de um longo processo de adaptao, aevoluo biolgica possibilitou o desenvolvimentosocial. Apesar de alguns pesquisadores muitas vezesutilizarem esses termos como sinnimos, no caso da

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    temtica em questo preciso que os dois sejam deli-mitados claramente, tentando assim evitar cair em ar-madilhas apriorsticas.

    O apriorismo kantiano e sua dimenso transcen-dental do pensamento podem ser tomados como exem-plo de alienao da diferena entre evoluo e desen-volvimento. Kant (2002, p. 46) confirma a possibili-dade dos conhecimentos a priori, em funo da exis-tncia de uma cincia constituda de puros conceitossimples do intelecto:

    Toda a matemtica pura, no seu conjunto, cincia quecompreende simples conceitos a priori, sem faz-los apoi-arem-se em conceitos empricos. [...]. A filosofia trans-cendental o sistema de todos os nossos conhecimentospuros a priori. Habitualmente ela denominada ontologia.A ontologia trata, portanto, das coisas em geral e as abs-trai de toda particularidade. Ela rene todos os conceitospuros do intelecto e todos os princpios do prprio inte-lecto e da razo (Kant, 2002, p. 46-47).

    A defesa da existncia de conhecimentos puros apriori, de uma ontologia fundada na abstrao das par-ticularidades, e portanto na generalizao, explicita anegao das capacidades de adaptao humana e deelaborao de diferentes respostas e produtos simbli-cos multiplicidade de situaes. Subjacente a essaconcepo, h uma tendncia monossemizao dosconhecimentos, das lnguas, do pensamento e dascosmologias, enfim dos smbolos que elaboramos a fimde compreender o real. Nessa perspectiva, se eliminao movimento de constituio de relaes entre smbo-los e as idias que eles podem simbolizar, viabilizandoassim o processo de dicionarizao desses smbolos, etambm a defesa de uma nica verdade existente paraalm das relaes humanas.

    Voltemos distino ainda no realizada entre evo-luo e desenvolvimento e, portanto, s reflexes deElias (1994), com sua Teoria simblica sobre a ques-to. O nosso crebro o resultado evolutivo de suces-sivos processos de adaptao, constituindo-se assimna ferramenta humana mais poderosa e verstil. Porisso, podemos afirmar que a evoluo que torna pos-svel o desenvolvimento.

    Ambos os processos se baseiam na transmisso de meiosde sobrevivncia entre geraes e nas suas transforma-

    es, algumas das quais permitem melhorar as possibili-dades de sobrevivncia. Mas o que transmitido e o modocomo transmitido difere significativamente nos doiscasos. No caso da evoluo, o instrumento principal detransmisso e transformao uma estrutura orgnicadesignada gene. No caso do desenvolvimento, o instru-mento principal de transmisso e transformao so sm-bolos no sentido lato da palavra, incluindo no s o co-nhecimento, mas tambm, por exemplo, os padres decomportamento e de sentimento. Inicialmente, a trans-misso entre as pessoas atravs da lngua foi a sua prin-cipal forma (Elias, 1994, p. 24).

    Considerando o exposto, o termo evoluo expres-sa processos biolgicos de transmisso de genes, quese realizam num prazo muito longo, considerando-sea mdia de vida de cada ser humano. Desenvolvimen-to, nesse contexto, refere-se transmisso intergera-cional de smbolos sob diversas formas, implicam arealizao de processos de aprendizagem. A constitui-o biolgica dos seres humanos, expresso de pro-cessos adaptativos e evolutivos, lhes permite a aquisi-o da lngua. Nascemos dotados da disposio biol-gica para aprender lnguas, no nascemos de posse deuma lngua. Assim, atravs da aprendizagem, seja elaformal ou no-formal, adquirimos, alm das lnguasdas pessoas que nos cercam, que se constituir em nossoprincipal meio de comunicao, as formas de pensa-mento e de atuao sociais.

    Alm da linguagem, funes como pensamento,memria e conhecimento se constituem em exemplosde processos de entrelaamento da evoluo biolgicacom o desenvolvimento social. Somos dotados de ca-pacidades biolgicas para falar, nos comunicar, pen-sar, conhecer e lembrar, no entanto essas no se reali-zam sem a aprendizagem. Como j disse anteriormen-te, os contedos, as maneiras de aprendizagem variamhistrica, geogrfica e socialmente, da no fazer sen-tido, na perspectiva da teoria simblica, a defesa daexistncia de pensamentos puros a priori, de univer-sais lingsticos, de categorias a priori de pensamen-

    12. O que no significa construir uma relao predatria com osoutros elementos da natureza, mas aes sustentveis cuja lgicaestaria voltada para a melhoria da qualidade de vida dos sereshumanos, o que implicaria inclusive a eliminao dos conflitos entreos diferentes grupos sociais.13. Vide epgrafe.

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    to, da idia da existncia de uma verdade externa aosseres humanos, entre outros. Eis o divisor de guasque pode nos parametrizar para pensar e trabalhar comas representaes cartogrficas, voltadas para o ensi-no da geografia.

    REPRESENTAES CARTOGRFICAS:ALGUNS ASPECTOS TERICO-

    METODOLGICOS

    ... o modo que imaginamos o real espacial pode vir atornar-se na matriz das referncias com que imagina-

    mos todos os demais aspectos da realidade(Santos, 2000, p. 197).

    Ensino de geografia e imagens de espao, essasltimas expressas sob a forma de mapas, possuem ain-da hoje intensa identificao no contexto das repre-sentaes sociais. Poder-se-ia afirmar que so aml-gamas disseminadas desde a institucionalizao da re-ferida disciplina no sculo XIX. Quando as pessoasreferem-se a esse meio de comunicao, logo pensamno globo terrestre, num planisfrio, ou numa planta dacidade esses so os mapas cartogrficos.

    O uso de tal expresso pode parecer redundante,mas importante atentar para o surgimento de produ-tos culturais que, apesar de se intitularem como carto-grafias, mapeamentos, mapas, atlas, no apresentamsequer um nico mapa. Trata-se de estratgia para lu-dibriar o pblico? Tal fato expresso de confusoconceitual? So cartografias outras? Ou se constituemem escrituras, figuraes espaciais cuja natureza dainformao tem como referncia os lugares,contexturas espaciais14, empiricamente existentes ouno?

    Para responder s questes colocadas, retomemosa primeira parte da epgrafe transcrita no presentesubitem. Santos (2000, p. 197), assim como Lefebvre(1991, p. 34), afirma que o real espacial15 a matrizdas referncias com que imaginamos todos os aspec-tos da realidade. Dessa forma, o topos deve ser consi-derado o incio de tudo.

    Evidncias arqueolgicas indicam que a noo delugar antecede a existncia do Homo Sapiens sapiens,os seres humanos anatomicamente modernos, cuja pre-sena comprovada desde o Paleoltico Superior, en-tre 40 a 12 mil anos atrs. H indcios de que os

    neandertalenses16 possuam imagens de espao e ti-nham noo do real espacial ou do topos devido pre-sena de rudimentos de arte e vestgios de crena numavida pstuma: sepultamento dos mortos em fossas ar-tificiais e em cavernas, juntamente com comida e ar-mas; ritos funerrios, com oferendas; realizao desacrifcios humanos (70 mil anos atrs), desenvolvi-mento de culto aos animais. Tais aes jamais poderoser tomadas como aleatrias, foram realizadas de for-ma deliberada, certamente respaldadas por diferentescosmologias e sistemas de crenas. Estou me referin-do a vises de mundo, pois num perodo aproximadode 110 mil anos a idia da existncia de uma nicacosmologia para povos da mesma espcie, que vive-ram em tempos e lugares to diferentes, seria indefen-svel.

    Considerando o exposto, somente com a constru-o social da conscincia do meu lugar que o outrolugar, ou, no caso dos neandertalenses, o lugar dosmortos, poderia ser concebido. Assim, pode-se afir-mar que a noo do topos, nesse sentido, no se cons-titui em prerrogativa dos seres humanos modernos.Avanando nesse raciocnio possvel afirmar que arealizao dos ritos funerrios era viabilizada e, aomesmo tempo, tambm viabilizava a construo dadimenso simblica e, conseqentemente, da lingua-gem, do pensamento, da memria e do conhecimento,num nvel elementar de sistematizao. Por isso, taiscapacidades no foram suficientes para garantir a so-brevivncia desses grupos, que conviveram durantealgum tempo com os Homo Sapiens sapiens. O cre-bro desses ltimos, pelo fato de ter maior capacidadede linguagem, possibilitou a construo de cosmologiashumanas mais congruentes com a realidade, principalresponsvel pela sobrevivncia dessa espcie at hoje.E assim o ser humano

    Interrompeu o monoplio do processo de evoluo bio-lgica da vida. Antes que aparecesse a linguagem, virtu-almente todas as informaes importantes relevantes vida, que tinham que ser passadas para a gerao seguin-te, eram codificadas nos genes na estrutura espacialdas molculas de ADN (Szamosi, 1988, p. 50).

    Essa cosmologia diferenciada fez com que os sereshumanos anatomicamente modernos Homo Sapienssapiens produzissem figuraes espaciais em caver-

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    REPRESENTAES CARTOGRFICAS

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    nas, denominadas hoje arte rupestre, desde o PaleolticoSuperior (40 a 12 mil anos a.C.). Segundo Smith (1997,p. 57), datam desse perodo as primeiras representa-es paisagsticas com algumas feies planas.

    Muitas inscries parietais ou rupestres e imagenspaisagsticas representadas em diferentes objetos vasos, por exemplo, elaboradas anteriormente escri-ta17 esto sendo estudadas por historiadores da car-tografia, pelo fato de esses profissionais as considera-rem como mapas pr-histricos. Apesar de ter peque-na ou quase nenhuma semelhana com os mapas oci-dentais atuais, entendo que algumas figuraes espa-ciais pr-histricas, e mesmo as atualmente elabora-das por outros povos e grupos sociais, devem ser tam-bm denominadas mapas por se tratar de representa-es grficas que, ao representar o topos, o no-lugar,ou ambos, facilitam o entendimento espacial de coi-sas, conceitos, condies, processos ou eventos nomundo humano18.

    Eis um dos divisores de guas que fundamenta di-ferentes referenciais terico-metodolgicos e prticasna cartografia: as distintas concepes de mapas. Te-mos ento, a partir de uma concepo moderna e oci-dental de mapa19, uma cartografia conhecida comocientfica, herdeira direta da concepo newtonianae kantiana de espao, amplamente difundida no ensi-no formal da geografia e outras disciplinas escolares.

    Newton foi o grande sistematizador da concepomoderna de espao e da nova cosmologia fundada numfisicalismo sem precedentes, que negava a existncia,a realidade e a possibilidade de conhecimento e, por-tanto, o acesso verdade20 das coisas no passveis deser fisicizadas, ou seja, da res cogitans domnio dospensamentos, sentimentos e experincias espirituais.A concepo do topos moderno foi lenta e gradual-mente construda desde Coprnico, no sculo XV, pas-sando por Kepler, Galileu, Descartes, at atingir seumais alto nvel de sistematizao com Newton, no s-culo XVII. Para esse ltimo, o lugar uma parte doespao que um corpo toma.

    Por outro lado, temos tambm figuraes espaciaisque possuem caractersticas totalmente distintas dasdenominadas cientficas, mas que tambm devemosigualmente considerar como mapas por facilitar o en-tendimento espacial de coisas, conceitos, condies,processos ou eventos de diferentes grupos humanos.Vale salientar que os mapas cientficos que atual-

    mente conhecemos constituem-se em expresso social,geogrfica e histrica da sociedade europia, cujomodo capitalista de produzir, pensar, perceber, conhe-cer e representar se disseminou pelo globo.

    O domnio da res cogitans atualmente est sendoexpresso nas cartografias, sem mapas cientficos, oucartogrficos, como me referi no incio do subitem, quetratam de lugares, mesmo daqueles empiricamente noexistentes, como por exemplo os de fico cientfica,os de nossas fantasias de um modo geral, de algunsdesenhos animados, quadrinhos, msicas, pinturas, en-tre outros. tambm dessa cartografia, dos mapas no-cartesianos elaborados a partir dela, que o ensino dageografia deve se apropriar, a fim de romper com umaconcepo fisicalista de espao, que esse saber tem afir-mado e confirmado ao ancorar-se de formafundamentalista na dualidade cartesiana res cogitansX res extensa, cartografando, mapeando, conhecendo,geografizando e ensinando somente a essa ltima, do-mnio fisicamente extenso de matria e movimento.

    Por ser uma linguagem topolgica por excelncia,no a nica, cujo ideal de cientificidade raramente questionado, a cartografia cientfica e seus produtosforam e so utilizados tradicionalmente na elaboraode leituras geogrficas da realidade, principalmente noensino formal da geografia. Isso no significa dizerque essa, juntamente com a escrita, deve ser a nicaempregada no entendimento da lgica de ordenaoterritorial das sociedades. Existem vrias possibilida-des para o registro, enquanto escritura, e comunicaode informaes, saberes e conhecimentos de cunhoespacial. A pergunta Onde? foi, e poder ser res-pondida em cada sociedade e contexto de vrias for-mas, desde que os seres humanos consigam sobrevi-

    14. Termo usado por Santos (2000, p. 197).15. Numa concepo lefebvriana: o topos.16. H evidncias de que os neandertalenses, mais conhecidoscomo Homo Sapiens ou pr-sapiens, viveram no Paleoltico mdioentre 150 a 40 mil anos.17. Os primeiros registros escritos datam de aproximadamente 4 milanos a.C.18. Conceito usado por Harley e Woodward (1987, p. XVI).19. A concepo de mapa elaborada por Oliveira (1993, p. 322) um exemplo didtico: Representao grfica, geralmente numasuperfcie plana e em determinada escala, das caractersticasnaturais e artificiais, terrestres ou subterrneas, ou, ainda, de outroplaneta. Os acidentes so representados dentro da mais rigorosalocalizao possvel, relacionados, em geral, a um sistema dereferncia de coordenadas. Igualmente, uma representao grficade uma parte ou total da esfera celeste.20. Concebida como coisa existente de forma externa ao serhumano.

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    ver futuramente. As repostas possveis a tais questesdependem de cultura, momento histrico, local e pro-jeto societrio subjacentes a cada sociedade. Comoafirma Santos (1997, p. 31):

    Onde? Eis a pergunta central do discurso geogrfico queo responder trar, sem dvida, as marcas da maneira pelaqual a sociedade organiza-se e entende-se enquanto tal e,portanto, cujos desdobramentos dependero tanto daqueleque responde enquanto persona, quanto da dimensocosmolgica em que se insere a prpria construo doquestionamento.

    Assim, podemos responder questo utilizandocoordenadas de latitude e longitude, topnimos ou ou-tras referncias que nos facilitem o entendimento e acomunicao de idias acerca do topos. Diferentescosmologias e concepes de espao e tempo resul-tam em cartografias, mapas e geografias distintos.

    Esses ltimos so os instrumentos de orientao ede construo de conhecimentos propriamente huma-nos. As figuraes espaciais e os mapas que os sereshumanos modernos Homo Sapiens sapiens produ-ziram desde as suas origens so expresses de diferen-tes cosmologias. importante salientar que os concei-tos de espao e tempo so instrumentos de orientao econhecimento essenciais aos seres humanos. Da osvestgios da existncia de figuraes espaciais desde asorigens dos seres humanos anatomicamente modernos.

    Ao ordenar e produzir suas imagens de espao, fi-guraes espaciais, pinturas, cartografias, mapas, ge-ografias ou outros produtos simblicos, os seres hu-manos ordenavam e ainda ordenam a si mesmos e aomundo em que viviam e vivem. Assim, tentam com-preender a si e ao outro, entendido como alteridade,buscando dar um sentido sua vida e, portanto, aoslugares vividos, imaginados, fantasiados, fabulados eficcionados.

    AS REPRESENTAESCARTOGRFICAS,

    O RACIOCNIO ESPACIAL E AFORMAO DOCENTE

    O mapa e a realidade tm um modo de existnciadiferente mas no contrastado. (...). As pessoas devem

    distanciar-se da realidade fsica da cidade a fim de

    construir e utilizar um mapa; devem, por assim dizer,elevar-se mentalmente a um nvel de sntese acima dasua existncia imediata como um agrupamento de ma-

    tria (Elias, 1994, p. 4).

    Os conceitos de espao e tempo so os instrumen-tos primordiais de orientao e conhecimento cons-trudos no bojo de nossa tradio social (Elias, 1998,p. 79) ou das cosmologias humanas. Em outras pala-vras, a linguagem, o pensamento, a memria e o co-nhecimento se realizam por meio das categorias sim-blicas de espao e tempo. Diferentemente de outrosanimais, que parecem comunicar-se apenas por sinais,os seres humanos usam tanto esses ltimos quanto ossmbolos.

    [...] os sinais conduzem significados primitivos. Refe-rem-se, sempre, a algo fisicamente presente, perceptvel.[...]. Os smbolos tambm conduzem significados e tam-bm podem referir-se a algo perceptvel. [...]. Mas os sm-bolos podem tambm referir-se a outros smbolos(Szamosi, 1988, p. 54).

    Eis uma das diferenas primordiais da cosmologiahumana: usar tanto sinais quanto smbolos, cujos sig-nificados sociais, que devem ser aprendidos, so so-cial, histrica e geograficamente construdos, a fim deque o conhecimento e a comunicao se realizem. Parao mesmo autor (p. 59), o simbolismo humano se tor-nou uma grande fora evolutiva.

    Apesar de sermos biologicamente equipados comum aparato vocal, para produzir e compreender os sm-bolos sonoros de uma lngua, que nos permita o co-nhecimento e a comunicao, faz-se necessria a apren-dizagem que ativa nosso potencial biolgico para odesenvolvimento da linguagem. Em outras palavras, arealizao da aprendizagem para a ativao de nossospotenciais uma caracterstica especificamente huma-na. Assim, os processos educativos, sejam eles formaisou no-formais, so a condio para a humanizaodo ser humano.

    Os mapas tal qual os conhecemos, assim como ou-tras representaes, so a expresso de um certo pen-sar o espao estruturas estruturadas e permitem aomesmo tempo a realizao de certos raciocnios espa-ciais, entre o conjunto de raciocnios possveis, ou seja,so tambm estruturas estruturantes de determinados

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    REPRESENTAES CARTOGRFICAS

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    pensamentos de cunho topolgico. Por isso, se fazemnecessrias a elaborao e a adoo de conceitos demapa, cartografia e tambm de geografia que rompamcom as antigas polarizaes entre natureza e cultura,fsico e humano, individual e social.

    Nossas cartografias e anlises geogrficas dos di-ferentes grupos humanos no podem restringir-se ape-nas dimenso da res extensa domnio fisicamenteextenso de matria e movimento. Essa, mesmo hoje,tem sido priorizada nos discursos e textos cartogrfi-cos e geogrficos, e prepondera enquanto caractersti-ca central de grande parte dessas narrativas. no con-texto da produo e disseminao dos referidos dis-cursos que podemos verificar a insatisfao discente,pois muitos, obviamente, no conseguem entender aimportncia dos mapas, da cartografia e muito menosdo ensino da geografia para a construo de raciocni-os mais congruentes com a realidade.

    Refletir, construir e debater geografias e cartogra-fias que auxiliem o ser humano a entender a lgica daterritorialidade dos diferentes espaos e, portanto, en-tender a si mesmo e aos outros pessoas, lugares, en-fim, ao mundo deve ter centralidade no atual mo-mento. O abandono de [...] hbitos enraizados de pen-samento e, em particular, o hbito de ordenar o mun-do, segundo uma velha receita filosfica e do sensocomum, em categorias polarizadas e desarticuladascomo a natureza e a cultura... (Elias, 1994, p. 42),deve ser considerado meta fundamental. Em outraspalavras, o abandono do cartesianismo, cujas polari-zaes e cujos maniquesmos desarticuladores invia-bilizam a realizao de reflexes processuais maiscongruentes com a realidade, requer a construo e oexerccio constante de outros hbitos de pensamento,linguagem e conhecimento.

    Mudanas de hbitos de pensamento demandamtrabalhos e investimentos intensivos na esfera da edu-cao formal, por parte tanto de quem ensina quantode quem aprende. Segundo Foucambert (1994, p. 22 eseg.), para fazermos de uma criana um tradutor oudecodificador ocasional do escrito para o oral, so ne-cessrias menos de 500 horas de aula21. Para que seconstrua o hbito de ver e usar a escrita, ... da mesmamaneira que aquele que mergulha num romance, sa-boreia um poema ou descobre, em poucos minutos, asnotcias impressas nas 300 mil palavras de seu jornaldirio ... (Foucambert, 1994, p. 22-23), ou seja, para

    fazermos do aluno um leitor, so necessrias 10 milhoras de vida22.

    inegvel que existem diferenas de hbitos depensamento, linguagem, memria e conhecimento en-tre um leitor e um decodificador, tanto de textos escri-tos quanto de outros derivados das diversas linguagens.Um leitor de representaes cartogrficas, ao contr-rio de um decodificador, construiu hbitos que o pos-sibilitam entrar no mapa, sem atordoar-se com todo ojogo de transformaes simblicas entre o real e o re-presentado, elevando-se mentalmente a um nvel desntese acima da sua existncia imediata, como afirmaElias na epgrafe do presente subitem. Comporta-secomo Alice em Atravs do espelho, a herona criadapelo genial Lewis Carrol. A criana da fronte pura elmpida, como a denominava em poesia seu criador,ao entrar na Casa do Espelho, e presenciar as transfor-maes provocadas pelo processo de espelhamento,com as conseqentes mudanas de lugares, interlocu-tores com funes, discursos e lgicas diferentes, aca-ba nesse processo todo construindo e vivenciando h-bitos de pensamento outros.

    Entrar no mapa assim como no texto escrito, por-tanto ser leitor, implica saber lidar com o jogo sim-blico subjacente s sintaxes especficas das diver-sas linguagens. Muitos pesquisadores, como PierreBourdieu e, especificamente, Jean Foucambert, nocaso da leitura, advertem que a construo de algunssaberes e hbitos, principalmente aqueles relaciona-dos cultura erudita, esto ligados ao status das clas-ses privilegiadas.

    A relao com a leitura, com os leitores, sempreantecede o saber ler. Por isso, muitos autores afirmamque existem docentes que apenas alfabetizam e noensinam a ler, at pelo fato de eles no serem leitores,mas meros decodificadores. O contexto social no qualcada aluno vive, principalmente o familiar, propiciacondies para que esse se torne ou no leitor dos maisdiferentes produtos culturais. Da a importncia da es-cola, enquanto instituio que pode proporcionar ...condies sociais e comunitrias que surtiro efeitossemelhantes (Foucambert, 1994, p. 26) a um contex-to de leitores ou de pessoas leiturizadas, segundo omesmo autor.

    21. Grifo nosso.22. Grifo nosso.

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    Da a necessidade de se repensar coletivamente aeducao docente, na perspectiva de que essa estejacentrada na formao de leitores do mundo, o que so-mente pode se realizar atravs do acesso e da leiturados mais diferentes produtos culturais. No caso espe-cfico da formao dos professores que trabalham comos saberes geogrficos, importante atentar para o fatode que as representaes cartogrficas so importan-tes e, at mesmo, imprescindveis para o desvelamentodos lugares. No entanto, essas no devem ser as nicasfiguraes espaciais a ser usadas no processo educativo.Existem diversas representaes espaciais e linguagensque permitem outros tipos e nveis de snteses da rea-lidade, e que efetivamente podem contribuir para aconstruo de entendimentos menos duais dos luga-res, propiciando assim possibilidades de construo dehbitos de pensamento menos cartesianos. Para tanto,reflexes sobre questes ligadas linguagem, ao pen-samento, ao conhecimento, memria, ao trabalho, en-quanto aes humanas, devem ter lugar nos processoseducativos de formao inicial e continuada, no ape-nas dos professores mas tambm dos gegrafos comoum todo.

    A extraordinria capacidade humana para construirdiferentes modelos simblicos de mundo, a partir dasdiversas linguagens, no deve ser negada pela institui-o escolar. Considerando-se que essa ltima, em qual-quer nvel de ensino, tem como papel central a disse-minao de conhecimentos mais congruentes com arealidade, o acesso, a construo do hbito de leituradas diferentes linguagens, deve ser um dos objetivos aser insistentemente perseguido pela referida institui-o e, portanto, pelos educadores que nela trabalham. no contexto ora esboado que se deve pensar a edu-cao do professor de geografia. Encerro o presentetexto com um pequeno excerto de Foucambert (1994,p. 23), endereado aos educadores; tal mensagem podeser tranqilamente transposta para a leitura de dife-rentes figuraes espaciais, que devem fazer parte douniverso lingstico do referido profissional:

    A escola s pode alfabetizar, mas, apesar de tudo, elapode dirigir a maneira de ser leitor hoje mais do quenunca. Ela capaz de selecionar comportamentos queno ensina: as 10 mil horas necessrias para tornar-seleitor no so aulas que edificam um saber futuro; sotempo de vida dentro de um meio educativo (territrio

    educativo!) que j confere ao interessado um status deleitor. Meio que se dirige a ele como se lhe fosse impos-svel no ser um utilizador da escrita que o rodeia, e quepermeia todas as suas aes e as de quem lhe prximo.

    Para as crianas que no tm essas condies so-ciais e culturais, a escola deve transmitir outra tcnicade uso da escrita, aquela empregada quando no se leitor.

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    REPRESENTAES CARTOGRFICAS

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    SZAMOSI, Gza. Tempo & Espao: as dimenses gme-as. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1988.

    AbstractThe present text deals with questions to be concern when thesubject is cartographical representations in geography teaching.In this work were made some observations about therelationship between language, thought and construction ofknowledge. We presuppose that the teachers, in a general form,must be formulated some reflections about these questions,with the finality to conduct, in an autonomous manner, theprocess of teaching and learning in classroom. Also we reflectabout some theoretical and methodological aspects that shouldbe relevant when we work with cartographical representationsin classroom, and, specifically in the teaching of geography.Finally, we boarded the application of these mentionedrepresentations to the elaboration of geographical ratiocination,and its place within educational formation concerns to theteachers.

    KeywordsGeography teaching Cartographic representations Maps.

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    ResumoO presente texto traz apontamentos sobre questes a ser con-sideradas quando se trata do uso das representaescartogrficas no ensino da geografia. Foram feitas algumasobservaes sobre as relaes entre linguagem, pensamento econstruo do conhecimento. Partiu-se do pressuposto de queos docentes, de forma geral, devem ter construdo reflexesmnimas sobre tais questes, a fim de conduzir de forma aut-noma o processo de ensino e aprendizagem na sala de aula.Refletiu-se tambm sobre alguns aspectos terico-metodol-gicos que devem ser considerados quando da realizao dotrabalho com representaes cartogrficas no contexto da salade aula e, especificamente, no ensino da geografia. Por fim,abordou-se o papel das referidas representaes na constru-o de raciocnios geogrficos, e seu lugar na formao dosprofessores.

    Palavras-chaveEnsino de geografia Representaes cartogrficas Mapas.

    Texto apresentado na mesa redonda Representaes cartogrficas: teorias e prticas para o ensino deGeografia, no 7 Encontro Nacional de Prtica de Ensino de Geografia (Vitria, setembro de 2003).