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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MÚSICA Prova de História da Música e Percepção (180 min.) – Julho de 2015 GABARITO 1a Parte – MESTRADO E DOUTORADO - Relacionar os termos às definições correspondentes (1 ponto) – 10 min. DEFINIÇÃO TERMO C Instrumento musical de sopro, antecessor do oboé A) moteto E Gênero musical associado ao Brasil originado como dança, podendo se apresentar por vezes como música vocal ou instrumental. B) baixo contínuo G Termo que designa um conjunto de formas musicais emparentadas, cuja versão escolástica envolve o uso de 2 ou mais temas trabalhados numa estrutura tripartida C) charamela F Tipo de composição instrumental surgida a final do séc. XVII, que combinava o estilo concertato, baixo firme e soprano ornamentado, baseada no sistema tonal maior-menor e construção com andamentos separados e autônomos D) diálogo falado H Movimento musical brasileiro ideologicamente fundamentado nos escritos de Mário de Andrade E) lundu B Técnica de escrita da harmonia implícita característica do Barroco e cuja realização dependia da perícia do intérprete. F) concerto A Gênero vocal originado a partir das cláusulas de substituição medievais, em cujo repertório histórico encontram-se nomes tão distantes quanto Guillaume de Machaut e José Maurício Nunes Garcia, dentre outros. G) sonata D Uma das características que distingue o singspiel e a ballad opera da ópera séria H) nacionalismo K Conjunto de recursos musicais desenvolvidos desde o séc. XVI a partir das figuras da retórica para exprimir ou representar estados de ânimo I) concertato I Estilo ou prática musical cujo desenvolvimento se alicerçou na segunda prática proposta por Monteverdi K) afetos 2a Parte – MESTRADO E DOUTORADO - Audição: Você ouvirá trechos musicais numerados de 1 a 14. Identifique qual o trecho que melhor se adequa às categorias abaixo (gênero, período histórico, técnica composicional ou compositor) com o número do trecho. (valor: 2 pontos) – 30 min. 11 - Te Deum (Luis Alvares Pinto – tibi omnes) 14 - Ópera (Chico Buarque - Opera do Malandro) 07 - Fuga (C. Guarnieri - Prologo e Fuga) 04 - Rococó (M. Dias de Oliveira-Magnificat) 05 - Sinfonia (Nepomuceno – Sinf. 1º movimento) 08 – Cantata (Anônimo – Herói, Egrégio, Douto...) 12 - Eletroacústica (R. Coelho de Souza) 09 - Quarteto de cordas (Mignone) 03 - Nacionalismo brasileiro (Nazareth – Reboliço) 13 - Lundu (Xisto Bahia – Isto é bom) 02 - Microtonalismo (Smetak - Tendenciosa) 10 - Villa-Lobos (Bachiana n. 4) 06 - Romantismo (Luciano Gallet - Batuque) 01 - Abertura (J. M. Nunes Garcia – em Re) Processo de Seleção para o PPGMUS-UFBA (Musicologia) 2015 1

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MÚSICA

Prova de História da Música e Percepção (180 min.) – Julho de 2015

GABARITO 1a Parte – MESTRADO E DOUTORADO - Relacionar os termos às definições correspondentes

(1 ponto) – 10 min.

DEFINIÇÃO TERMO

C Instrumento musical de sopro, antecessor do oboé A) moteto

E Gênero musical associado ao Brasil originado como dança, podendo se apresentar por vezes como música vocal ou instrumental.

B) baixo contínuo

G Termo que designa um conjunto de formas musicais emparentadas, cuja versão escolástica envolve o uso de 2 ou mais temas trabalhados numa estrutura tripartida

C) charamela

F Tipo de composição instrumental surgida a final do séc. XVII, que combinava o estilo concertato, baixo firme e soprano ornamentado, baseada no sistema tonal maior-menor e construção com andamentos separados e autônomos

D) diálogo falado

H Movimento musical brasileiro ideologicamente fundamentado nos escritos de Mário de Andrade

E) lundu

B Técnica de escrita da harmonia implícita característica do Barroco e cuja realização dependia da perícia do intérprete.

F) concerto

A Gênero vocal originado a partir das cláusulas de substituição medievais, em cujo repertório histórico encontram-se nomes tão distantes quanto Guillaume de Machaut e José Maurício Nunes Garcia, dentre outros.

G) sonata

D Uma das características que distingue o singspiel e a ballad opera da ópera séria H) nacionalismo

K Conjunto de recursos musicais desenvolvidos desde o séc. XVI a partir das figuras da retórica para exprimir ou representar estados de ânimo

I) concertato

I Estilo ou prática musical cujo desenvolvimento se alicerçou na segunda prática proposta por Monteverdi

K) afetos

2a Parte – MESTRADO E DOUTORADO - Audição: Você ouvirá trechos musicais numerados de 1

a 14. Identifique qual o trecho que melhor se adequa às categorias abaixo (gênero, período histórico, técnica composicional ou compositor) com o número do trecho. (valor: 2 pontos) – 30 min.

11 - Te Deum (Luis Alvares Pinto – tibi omnes)

14 - Ópera (Chico Buarque - Opera do Malandro)

07 - Fuga (C. Guarnieri - Prologo e Fuga)

04 - Rococó (M. Dias de Oliveira-Magnificat)

05 - Sinfonia (Nepomuceno – Sinf. 1º movimento)

08 – Cantata (Anônimo – Herói, Egrégio, Douto...)

12 - Eletroacústica (R. Coelho de Souza)

09 - Quarteto de cordas (Mignone)

03 - Nacionalismo brasileiro (Nazareth – Reboliço)

13 - Lundu (Xisto Bahia – Isto é bom)

02 - Microtonalismo (Smetak - Tendenciosa)

10 - Villa-Lobos (Bachiana n. 4)

06 - Romantismo (Luciano Gallet - Batuque)

01 - Abertura (J. M. Nunes Garcia – em Re)

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3a Parte – MESTRADO E DOUTORADO - Análise de exemplos musicais impressos (30 min.) Discorra sucintamente (máximo de 6 linhas) sobre cada um dos exemplos musicais impressos (1 a 3), inserindo-os no provável contexto histórico, estético, estilístico, etc. (3 pontos).

EX. Nº1

1. Obra para cordas com baixo continuo. Textura polifônica tipo fuga a 3 vozes em Sol maior. A partir disso pode-se deduzir que a obra pertence ao período barroco e, considerando a instrumentação pode ser identificado como sonata a trio. O sujeito, do tipo anacrústico com final masculino, ocupa 3 compassos e meio. O sujeito é tonal e a mutação do contorno melódico acontece no último tempo do 2º compasso do tema (4ª descendente por 5ª descendente). A sequencia das entradas nesta exposição segue a ordem A-S-T ou vl2-vl1-vla.

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EX. Nº2

2. Obra que se inicia utilizando um conjunto de câmara integrado por violino solista, clarinete, clarineta baixo (escrita em sons reais) e harpa. Textura contrapontística e dodecafônica. A série (construída por quintas) parece ser usada em subconjuntos de 3 notas. Enquanto obra dodecafônica parece vinculada à estética representada por Schoenberg, Webern e Berg (2ª Escola de Viena, séc. XX). Por apresentar uma sonoridade menos próxima do dodecafonismo e/ou atonalismo (devido fundamentalmente à sucessão de quintas), parece-nos ser de Alban Berg. A indicação de solista no violino não parece condizer com uma obra de câmara, o que nos leva a pensar que possa ser escrita para um instrumental maior, por exemplo orquestra, e que apenas o começo tenha utilizado uma textura camerística (Concerto para violino).

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EX. Nº3

3. Obra para piano em lá menor, textura de melodia acompanhada. A melodia aparece na mão direita depois de 4 compassos de introdução homorrítmica. A melodia usa bordaduras duplas alternadas com movimentos melódicos descendentes enquanto o acompanhamento usa ritmos sincopados em semicolcheias e colcheias, assim como de colcheias pontuadas e semicolcheias, muito comuns à música urbana brasileira do tipo choro. Parece ser Tico-tico no fubá de Zequinha de Abreu composto a inicio do século XX (1917).

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4a Parte - MESTRADO E DOUTORADO – Ouvir o exemplo de áudio atentamente procurando perceber e descrever os seguintes quesitos (4 pontos) – 30 min.

a) Orquestração e outros aspectos instrumentais e/ou tímbricos relevantes b) Andamento, tipo de compasso e outros aspectos rítmicos e/ou métricos relevantes c) Textura e técnica composicional d) Estrutura, indicando a forma ou gênero correspondente.

4ª parte

A) Orquestra sinfônica, vozes solistas e coro B) Alegro, compassos ternários (3/4) e binários (2/4, 4/4, 6/8) C) Textura homofônica, sistema tonal. D) Estrutura. Este é o quarto movimento da 9ª sinfonia de Beethoven. A sinfonia está

estruturada em quatro movimentos. Este movimento diferencia a sinfonia de todas as anteriores composta por Beethoven por incluir vozes solistas e coros utilizando o poema de Schiller conhecido como “Ode à Alegria”.

Numa análise mais completa, poder-se-ia dizer que este movimento apresenta a micro-estrutura de uma sinfonia dentro da sinfonia, apresentando uma espécie de “resumo” da obra toda.

Beethoven mudou o padrão costumeiro das sinfonias clássicas, ao colocar o scherzo antes do movimento lento. Esta foi a primeira vez que ele fez isso numa sinfonia, embora tivesse feito o mesmo em outros tipos de composições, como os quartetos op. 18 números 4 e 5, o trio para piano "Arquiduque" op. 97, e a sonata para piano op. 106 "Hammerklavier").

5a Parte – MESTRADO E DOUTORADO – A partir da audição da 4ª Parte: a) Contextualizar historicamente o exemplo ouvido na 4ª parte (incluindo elementos como o

possível local de produção da obra, a situação histórica geral – 4 pontos) b) Procurar estabelecer claramente o elo ou vínculo entre os quesitos descritos na audição (4ª

parte) e o contexto histórico aqui descrito, incluindo a sua relação com o momento histórico no Brasil (2 pontos) – 30 min.

5ª parte

A obra como elemento identificador do período na história da música: Sendo esta a 9ª sinfonia de Beethoven, o período em questão é o Romantismo na Alemanha. A produção musical de Beethoven representa a transição entre a música clássica, do século XVIII, e a romântica, do XIX. As fases na produção de Beethoven. Na sua primeira fase, Beethoven manteve o rigor, o equilíbrio e a disciplina formal da música clássica. Exatamente como seus mestres Mozart e Haydn, as grandes referências do classicismo. Beethoven, no entanto, antecipou a emoção presente na música romântica. Na segunda fase, de 1800 a 1814, após algumas experimentações notáveis, alcança seu ponto máximo de criação. Na terceira fase, surpreendeu o público e a crítica da época com uma música abstrata, composta em um estado de absoluta surdez. O uso de vozes e texto poético nesta sinfonia, propõe um caminho composicional e artístico que levaria tanto à música programática de Berlioz quanto aos poemas sinfônicos (já adiantado sutilmente na sua 6ª sinfonia – Pastoral) muito comuns no romantismo e no romantismo tardio. A música de Beethoven evoluiu consideravelmente ao longo dos anos. Suas primeiras composições, entre 1792 e 1800, apesar de já demonstrarem um marcante estilo pessoal, ainda estão muito próximas da música típica daquele século 18. Em sua segunda fase, entre 1800 e 1814, após algumas experimentações notáveis, alcança seu ponto máximo de criação.

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É, curiosamente, o período das primeiras manifestações de sua doença. Ali, Beethoven consuma, com extraordinária genialidade, todos os recursos e possibilidades do classicismo. A terceira e última fase de Beethoven, enfim, entre 1814 e as vésperas de sua morte, surpreenderá o público e a crítica da época. Muitos de seus contemporâneos não compreenderão e torcerão o nariz para aquela música abstrata, composta em um estado de já absoluta surdez. Desta fase, ficarão sobretudo os últimos quartetos e a portentosa Nona sinfonia. A herança que Beethoven deixou para a música posterior será avassaladora. Morto em 1827, sua arte e seu nome dominarão todo o século 19.

Beethoven como exemplo de transição no contexto histórico. Revolução Francesa, Antigo Regime, burguesia, concertos públicos, situação social dos compositores e artistas. Tendo Beethoven viveu em um momento histórico marcado pelo signo da transição, como a sua obra manifesta, fortemente marcado pelas revoluções (como a Revolução Francesa de 1789, por exemplo). Com a revolução, o Antigo Regime monárquico e absolutista, conduzido pela aristocracia, cedia lugar para uma nova classe dirigente, a burguesia. É justamente essa burguesia que passará a ser o principal público consumidor de arte e de música na Europa naquele instante. Antes, no classicisismo, o artista era praticamente um servo da nobreza, que lhe encomendava as obras, levava-o para tocar em seus luxuosos salões e, em seguida, mandava-o embora, junto com os demais criados da casa. Com os novos tempos pós-revolução francesa, começaram a aparecer também os primeiros espetáculos públicos. Músicos e compositores exibiam sua obras para um número cada vez maior de espectadores. Antes nivelado aos serviçais, o artista ganhava personalidade própria, o que ajudaria a reforçar o caráter de subjetividade e de individualidade artística, tão caro aos românticos.

Contexto do Romantismo histórico social. Generalidades

O Romantismo surgiu na Europa em uma época em que o ambiente intelectual era de grande rebeldia. Na política, caíam sistemas de governo despóticos e surgia o liberalismo político (não confundir com o liberalismo econômico do Século XX). No campo social imperava o inconformismo. No campo artístico, o repúdio às regras. A Revolução Francesa é o clímax desse século de oposição. O Romantismo foi um movimento artístico, político e filosófico surgido nas últimas décadas do século XVIII na Europa que perdurou por grande parte do século XIX. Caracterizou-se como uma visão de mundo contrária ao racionalismo e ao iluminismo e buscou um nacionalismo que viria a consolidar os estados nacionais na Europa. Inicialmente apenas uma atitude, um estado de espírito, o Romantismo toma mais tarde a forma de um movimento, e o espírito romântico passa a designar toda uma visão de mundo centrada no indivíduo. Os autores românticos voltaram-se cada vez mais para si mesmos, retratando o drama humano, amores trágicos, ideais utópicos e desejos de escapismo. Se o século XVIII foi marcado pela objetividade, pelo Iluminismo e pela razão, o início do século XIX seria marcado pelo lirismo, pela subjetividade, pela emoção e pelo eu. O termo romântico refere-se ao movimento estético ou, em um sentido mais lato, à tendência idealista ou poética de alguém que carece de sentido objetivo. O Romantismo é a arte do sonho e fantasia, as vezes de caráter bucólico que se espelha na relação do homem com a natureza. Valoriza as forças criativas do indivíduo e da imaginação popular. Opõe-se à arte equilibrada dos clássicos e baseia-se na inspiração fugaz dos momentos fortes da vida subjetiva: na fé, no sonho, na paixão, na intuição, na saudade, no sentimento da natureza e na força das lendas nacionais. O culto à natureza e à imaginação. Alguns autores neoclássicos já nutriam um sentimento mais tarde dito romântico antes de seu nascimento de fato, sendo assim chamados pré-

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românticos. Nesta classificação encaixam-se Francisco Goya e Bocage. O Romantismo surge inicialmente naquela que futuramente seria a Alemanha e na Inglaterra. Na Alemanha, o Romantismo, teria, inclusive, fundamental importância na unificação germânica com o movimento Sturm und Drang. O Romantismo viria a se manifestar de forma bastante variada nas diferentes artes e marcaria, sobretudo, a literatura e a música (embora ele só venha a se manifestar realmente aqui mais tarde do que em outras artes). À medida que a escola foi sendo explorada, foram surgindo críticos à sua demasiada idealização da realidade. No Brasil, o romantismo coincidiu com a Independência política do Brasil em 1822, com o Primeiro reinado, com a guerra do Paraguai e com a campanha abolicionista.

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Prova Dissertativa – Musicologia (180 min.) – Julho de 2015 Parte única – MESTRADO E DOUTORADO – Escrever um (1) ensaio dissertativo sobre a seguinte questão:

Ao escrever A History of Western Music, Grout e Palisca optaram por adotar uma divisão em seções que seguisse a divisão tradicional de períodos estilísticos, por vezes associando-os a critérios técnicos, por vezes ao nome de compositores ("o século XIX: Ópera e Drama Musical"; "A Era Renascentista: de Ockeghem a Josquin"). Por sua vez, Guilherme de Melo em 1908, na sua A Música no Brasil... optou por uma divisão associada às diversas influências étnicas e/ou culturais que, no tempo, teriam contribuído para a formação da “brasilidade” musical.

Discuta sumariamente quais os prós e contras de cada uma das abordagens historiográficas acima referidas e proponha uma estrutura de tópicos à maneira de Sumário para uma possível História da Música (no Brasil ou Brasileira?), procurando resolver ao máximo os problemas identificados, inserindo uma breve enunciação do conteúdo de cada tópico e (se houver) sub-tópicos. Depois de feito isso, explique quais foram os critérios escolhidos (incluindo a fundamentação teórica dessa escolha) para estabelecer dita estrutura de tópicos.

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Prova de Teoria – Musicologia (180 min.) – Julho de 2015 1a Parte – MESTRADO E DOUTORADO – Discorra analiticamente (incluindo o maior número de detalhes) sobre os exemplos a seguir, e indique os seus possíveis contextos teórico-musicais históricos (2 pontos cada – total 10 pontos). Ex. 1 – Epitafio de Seikilos. Original:

Transcrição:

:

Música grega antiga. É famoso por ser o mais antigo exemplo encontrado de uma composição musical completa, incluindo notação musical e letra no mundo ocidental. Uma melodia da música grega foi encontrada gravada em uma lápide. Também há na gravação a informação de que foi feita por um certo Seikilos, para sua esposa, presumivelmente enterrada no local. Há controvérsias sobre a datação desta lápide, desde 200 a.C. até cerca de 100 d.C. Embora existam exemplos mais antigos de notação musical (por exemplo os hinos délficos), todos eles são apenas fragmentos. O elemento básico da música grega era o tetracorde, que consistia numa sequencia de quatro notas descendentes inclusas no intervalo de uma quarta justa, e os intervalos entre as quatro notas, sendo variáveis, definiam as modalidades diatônica, cromática ou enarmônica da peça musical. O tetracorde cromático era formado por um intervalo de terça menor e dois intervalos de semitom; o tetracorde enarmônico tinha um intervalo de terça maior e dois de quarto-de-tom. O tetracorde diatônico variava de acordo com a posição do semitom, formando os subtipos dórico (semitom na base, de origem grega), frígio (semitom no centro, de origem asiática), e lídio (semitom no alto). A justaposição de dois tetracordes, ao que consta concebida por Terpandro de Lesbos, formava uma harmonia - não no sentido atual de sons simultâneos. Os tetracordes podiam, assim, ser conjuntos ou disjuntos. Se em uma harmonia disjunta se acrescentavam um tetracorde conjunto no topo, um outro também conjunto abaixo, e sob este uma outra nota (proslambanòmenos), criava-se o sistema téleion, ou perfeito, abrangendo duas oitavas inteiras. Com a mudança de oitava dos tetracordes anexos para baixo ou para cima do tetracorde fundamental criavam-se os hipomodos (hipodórico, hipofrígio e hipolídio) ou os hipermodos (hiperdórico, hiperfrígio e hiperlídio). O grande teórico da música grega antiga foi Pitágoras, considerado o fundador de nosso conhecimento de harmonia musical - a relação física entre as diferentes freqüências sonoras (notas) e o efeito de suas combinações. Também foi ele o sistematizador da associação de cada modo com determinado estado de alma, imbuindo-os de uma ética especial. Por exemplo, o modo dórico era considerado capaz de induzir um estado (ethos) pacífico e positivo, ao passo que o modo frígio era considerado subjetivo e passional, uma sensibilidade hoje em grande parte perdida, mas que pode

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ser vagamente comparada ao efeito das modernas escalas maior, convencionalmente usada para produzir uma impressão animada e alegre, e menor, usada para descrever estados melancólicos ou introspectivos. Também a ele se deve a análise da música sob a ótica de uma matemática transcendental, relacionando-a à constituição íntima do universo, concebido como uma estrutura criada e sustentada através de relações numéricas perfeitas que produziam a chamada música das esferas, a qual, entretanto, só poderia ser inteligível através do pensamento superior. Daí a ligação da música com a filosofia e a conseqüente codificação de uma série de regras éticas para composição e execução musical, a fim de que a música humana ecoasse a ordem perfeita do cosmo. Ex. 2 –

Kyrie eleison é uma oração da liturgia cristã. Existem expressões similares em alguns salmos, e nos Evangelhos, mas o testemunho mais antigo de seu uso litúrgico remonta ao século IV, entre a comunidade cristã de Jerusalém, e, no século V, na missa do rito romano, como prece litânica e resposta a determinadas invocações. No rito tridentino o Kyrie vinha recitado depois do ato penitencial; no rito ambrosiano é recitado até hoje, durante o ato penitencial, e repetido três vezes ao fim da Missa, antes da bênção final. O Kyrie faz parte também do ordinário da missa. Depois da reforma litúrgica, o Kyrie foi substituído, no rito romano, pela invocação "Senhor, tende piedade." No rito bizantino, em grego, a aclamação Kyrie eleison é cantada diversas vezes, pelos fiéis, em resposta às orações do celebrante. O canto gregoriano é um gênero de música vocal monofônica, monódica (só uma melodia), não acompanhada. As características foram herdadas dos salmos judaicos, assim como dos modos gregos, que no século VI foram selecionados e adaptados por Gregório Magno para serem utilizados nas celebrações religiosas da Igreja Católica. Somente este tipo de prática musical podia ser utilizada na liturgia ou outros ofícios católicos. Só nos finais da Idade Média é que a polifonia (harmonia obtida com mais de uma linha melódica em contraponto) começa a ser introduzida nos ofícios da cristandade de então, e a coexistir com a prática do canto gregoriano. O canto gregoriano foi estabelecido como a música litúrgica da Igreja Católica pelo Papa São Gregório I (c.540–604). São chamados de modos gregorianos as escalas ou modos utilizados por esta música de caráter monofônico. Os modos gregorianos foram usados durante a Idade Média e o Renascimento. Progressivamente, durante o Renascimento, tornaram-se nossas escalas maiores e

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menores. O número de modos varia de acordo com a época e o ponto de vista dos teóricos, mas no geral, oito modos gregorianos foram identificados. Os Modos Gregorianos tinham uma final, uma nota na qual a melodia terminava e na qual encontrava repouso. Sua função era similar à função da tônica em escalas maiores e menores. Além disso, tinham também uma dominante. A dominante era a nota sobre a qual havia muita insistência durante a melodia. Modos são divididos em duas categorias: os modos autênticos e os modos plagais. Cada modo plagal está associado com um modo autêntico. Ambos têm as mesmas notas e compartilham a mesma final. A diferença entre o modo autêntico e seu relativo plagal está na nota dominante e na extensão. Tratados de Canto Gregoriano associam os números ímpares I, III, V e VII aos modos autênticos. Seus modos plagais relativos estão associados aos números pares II, IV, VI e VIII. O relativo plagal do modo autêntico I é o II, ou seja, a relação é I-II, III-IV...etc.. Alguns teóricos usam nomes gregos tais como Dórico, Frígio, Lídio e Mixolídio para se referir aos modos autênticos I, III, V e VII respectivamente. Para os modos plagais, é adicionado o prefixo hipo ao nome da relativa autêntica: o modo II torna-se modo Hipodórico, IV o Hipofrígio..etc.. Ex. 3 – Cantigas de Santa Maria (123 – Esta é de louvor) Original: Transcrição:

As Cantigas de Santa Maria são um conjunto de composições em galego-português, que no século XIII era a língua fundamental da lírica culta em Castela. Existem dúvidas sobre a autoria direta do Rei Afonso X, o Sábio, mas ninguém duvida da sua participação direta como compositor em muitas delas. Do ponto de vista da história da música, é considerada como a coleção de música cortesã monódica mais importante do século XIII. As melodias estão tomadas da monódia gregoriana, da lírica popular e das canções dos trovadores, e adotam na sua maioria a forma de rondó, com um refrão musical que se repete depois das glosas. As Cantigas de Santa Maria podem se dividir em dois grupos:

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O primeiro, as "Cantigas de Nossa Senhora", nas quais o tema é formado por louvores à Virgem e é um verdadeiro compêndio de histórias, milagres, e relatos relacionados à Virgem, quer pela sua intervenção direta, quer pelos amores místicos que a sua figura gera nas almas piedosas. O segundo são as cantigas de loor (louvor), poemas mais sérios, profundos, quase místicos, nos quais, em lugar de cantar os milagres da Virgem, reflete sobre ela, como numa oração. Estas adotam a forma de hinos sagrados como os quais se interpretavam na liturgia, mas que serviram ao mesmo tempo de treinamento literário e musical nas cortes palacianas e festas profanas, e que daí eram transmitidas pelos jograis.

Ex. 4 – Tocata e Fuga em Ré Menor, BWV 565 – J.S.Bach

Tocata e Fuga em Ré Menor, BWV 565 é uma peça de música de órgão escrita por Johann Sebastian Bach. Como se indica no título dado à peça, a Tocata e fuga está composta em ré menor. Não está em ré dórico como se depreende da armadura de clave, já que no barroco era una prática comum escrever as alterações nas notas sensíveis (si bemol na relativa maior) em vez da armadura de clave. Começa com um floreado a uma voz na parte alta do teclado, dobrado na oitava. Cai depois para a parte inferior, onde surge um acorde de sétima diminuta, construído nota a nota. Este converte-se num acorde de ré maior, tomado do modo da paralela maior. Não é difícil encontrar a fonte desse tratamento rapsódico evidente nos primeiros trabalhos para órgão de Bach: este era um grande admirador de Dieterich Buxtehude na sua juventude. Essas obras para órgão são caracterizados pela presença do stylus phantasticus, um estilo de interpretação derivado da improvisação incluindo elementos de excitação e bravura, com harmonias ousadas e mudanças bruscas de registo. Costumam iniciar-se com uma secção livre, seguida por uma secção imitativa (às vezes uma fuga completa como neste caso), depois outra secção livre, depois outra secção imitativa (normalmente baseada em material do motivo da primeira secção imitativa) e finalmente outra secção livre.

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Ex. 5 – Sinfonia n.º 5 em Dó menor Op. 67 de Ludwig van Beethoven

A Sinfonia n.º 5 em Dó menor Op. 67 de Ludwig van Beethoven é a primeira sinfonia do autor composta em tonalidade menor. Os quatro movimentos constituem a particularidade de uma homogeneidade orquestral, sendo que, ao mesmo tempo, um exemplo de alternância.

Sinfonia é uma palavra de origem italiana e tem conotações que vão além do seu significado mais divulgado e conhecido, consolidado a partir do classicismo e que se refere a uma peça para orquestra construída na forma-sonata.

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Composição musical escrita para orquestra, geralmente estruturada em quatro movimentos. No período clássico, era estruturada da mesma maneira que a sonata: o primeiro movimento rápido, com a exposição geralmente indo da tónica para a dominante, desenvolvimento no tom da dominante e recapitulação dos temas principais, também geralmente retornando à tonalidade principal, podendo algumas vezes ter uma introdução lenta; o segundo movimento sempre lento ou moderado, sem uma orientação determinada quanto à forma, e o terceiro movimento mais rápido que o primeiro, geralmente estruturado como um rondó. Algumas vezes, entre o movimento lento e o rondó, era introduzido um minueto.

Bibliografia sugerida Duckles, Vincent & J. Pasler. “Historical and Systematic Musicology”, In: S. Sadie and J. Tyrrell

(eds.), The New Grove Dictionary of Music and Musicians, London 2001. [Outras edições podem ser usadas]

Grout, Donald J. & Claude Palisca. A History of Western Music. 4a. ed. New York: Norton.

[Outras edições bem como a edição em português ou em espanhol podem ser usadas] Kiefer, Bruno. História da música brasileira:dos primórdios ao início do século XX. 4. ed. Porto

Alegre: Movimento. 1997. [Outras edições podem ser usadas]

Mariz, Vasco. História da Música no Brasil. 7ª ed. rev. e ampliada. Rio de Janeiro: Civilização

Brasileira, 2009. [Outras edições podem ser usadas]

Mello, Guilherme Theodoro Pereira de. A Música no Brasil desde os Tempos Coloniaes até o

Primeiro Decênio da República. Bahia [Salvador]: Typ. São Joaquim, 1908. Stanley, Glenn. “Historiography”, In: S. Sadie and J. Tyrrell (eds.), The New Grove Dictionary of

Music and Musicians, London 2001. [Outras edições podem ser usadas]

Stanley, Glenn et alii. “Musicology II”, In: S. Sadie and J. Tyrrell (eds.), The New Grove

Dictionary of Music and Musicians, London 2001. [Outras edições podem ser usadas, bem como a edição “online”]

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