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Esta capela, obra de 1565 do Cardeal francês Mathieu Cointrel (italianizado como Matteo Contarelli), é herdada por Virgilio Crescenzi que encomenda os frescos do tecto ao Cavaleiro d’Arpino, que fora mestre de Merisi. Foi pelo interesse do Cardeal Del Monte que Caravaggio recebe em 1599 a encomenda para pintar os três quadros da capela, com grande rigor histórico e unidade programática. Tudo tinha de estar pronto antes do Jubileu de 1600. À esquerda, pintou a famosíssima Vocação de São Mateus, à direita pintou o Martírio do santo evangelista e, ao centro, São Mateus e o Anjo.

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Esta capela, obra de 1565 do Cardeal francês Mathieu Cointrel (italianizado como Matteo Contarelli), é herdada por Virgilio Crescenzi que encomenda os frescos do tecto ao Cavaleiro d’Arpino, que fora mestre de Merisi. Foi pelo interesse do Cardeal Del Monte que Caravaggio recebe em 1599 a encomenda para pintar os três quadros da capela, com grande rigor histórico e unidade programática. Tudo tinha de estar pronto antes do Jubileu de 1600. À esquerda, pintou a famosíssima Vocação de São Mateus, à direita pintou o Martírio do santo evangelista e, ao centro, São Mateus e o Anjo.

Conjunto da Cappella Contarelli, em San Luigi dei Francesi,

com as telas de Caravaggio e o tecto afrescado pelo Cavaleiro d’Arpino.

A Academia de S. Lucas de Roma, presidida pelo respeitado

pintor-escritor FEDERICO ZUCCARO (1541-1609), acolhe

muito mal as novidades pictóricas de Caravaggio… Tendo ido

em 1601 à Cappela Contarelli ver as telas de Merisi, que

davam tanto que falar na cidade, Zuccaro disse: Che rumore

è questo ? …«Não percebo a razão de tanta surpresa. Isto

nada mais é do que a iluminação de Giorgione…»

«Quest’opera, per havere alcune pitture del naturale, e per

essere in compagnia d’altre fatte dal Cavalier Gioseppe

(d’Arpino), che con la sua virtù si aveva presso i professori

qualche invidia acquistata, fece gioco alla fama dal

Caravaggio, ed era da’ maligni sommamente lodata. Pur

venendovi a vederla Federico Zucchero, mentre io era

presente, disse – Que rumore è questo ? e guardando i tutto

diligentemente, soggiunse: Io no ci vedo altro che il pensiero

del Giorgione nella tavola del Santo, quando Christo il

chiamò al Appostolato; e sogghignando , e maravigliandosi di

tanto rumore, voltò le spalle, e andossene con Dio»…

Giovanni Baglione, Vite de' pittori, scultori ed architetti, Roma, 1642, p.137.

CAPPELLA CERASI

Santa Maria del

Popolo

1601

A Cappella Cerasi, na nave esquerda

da Basilica de Santa Maria del

Popolo, era propriedade da família do

Cardeal Pietro Foscari, mas passou

em fins do século XVI para a do

advogado Tiberio Cerasi, tesoureiro

de Clemente VIII.

Crucifixão de São Pedro -- Conversão de S. Paulo na estrada de Damasco,

de Miguel Ângelo Caravaggio, 1601, Capela Cerasi, Santa Maria del Popolo.

Conversão de S. Paulo na

estrada de Damasco.

Miguel Ângelo Caravaggio, 1600

Tábua, 230 x 175 cm

Capela Cerasi, Santa Maria del

Popolo, Roma

Miguel Ângelo

Buonarroti,

Cappella

Paolina,

Vaticano.

1541-1544

Conversão de S. Paulo na estrada de Damasco, Miguel Ângelo Caravaggio,

pormenor, 1600-1601, Capela Cerasi, Santa Maria del Popolo, Roma

Annibale Carracci (1560-1609),

Assunção da Virgem, altar da

Capela Cerasi, 1601.

Giovan Pietro Bellori (1613-1696),

autor de Le vite de’ Pittori, Scultori

ed Architetti moderni (1672), que

promoveu a defesa do Classicismo

e foi Commissario delle antichità di

Roma de Clemente X.

Caravaggio: instante, luz dramática, contrastes de

claro-escuro: Incredulidade de São Tomé, óleo sobre

tela, 1601-1602, 107x146 cm. Neues Palais, Potsdam

Beijo de Judas, c. 1602.

National Gallery, Irlanda.

Deposição de Cristo

tela, 1602-1604,

300x203 cm

(da Cappella Vittrice, em Santa

Maria in Vallicella)

Pinacoteca Vaticana, Roma

O poeta MARIO MILESI dedica ao seu amigo

Caravaggio várias rimas elogiosas: «Ammirate

l'altissimo pittore»... Comparando-o a uma

espécie de Miguel Ângelo revivido, dedica um

poema à tela Amor Vincit que o jovem Merisi

pinta para Vincenzo Giustiniani, e elogia o seu

narturalismo ao invés da maniera afectada de

artifício... Outro poeta, Giulio Cesare Gigli, no

poemeto La Pittura triomphante, chama-lhe «il

gran protopittore, meraviglia dell’arte, stupor

della natura, seben versaggio poi di rea

fortuna»... Os estudos de Giorgio Fulco (1980)

e Lorenzona Rachele, entre outros, analisam

esse largo contributo dos poetas para a fama

rapidamente adquirida pelo jovem Caravaggio

em Roma (e fora dela). Caravaggio, Amor Vincit Omnia

Giovanni Baglione (1566-1644), Amor sacro e Amor profano, 1602. Palazzo Barberini.

Em Setembro de 1603, tendo o pintor Giovanni Baglione apresentado queixa

judicial conta o arquitecto Onorio Longhi e os pintores Orazio Gentileschi,

Filippo Trisegni e Miguel Ângelo Caravaggio por difamação através de certas

poesias grosseiras e ofensivas, o pintor defende-se, nega a acusação e

emite um depoimento célebre, ao afirmar que:

Il Cavalier Cesare d’Arpino, Federico Zucchero, Cristoforo Roncalli, Annibale

Carracci y Antonio Tempesta son valenthuomini

Ou seja, mostra generosidade em elogiar os seus detractores, o que não

Impediu que fosse encarcerado e só obtém liberdade graças à intervenção

do embaixador francês.

Em 1604, acusado de ter arremessado um prato de alcachofras`e insultado

um moço «de la fonda del Moro», é preso; meses volvidos, de novo é preso

numa briga na calle dei Greci, sendo liverto por intercessão do Cardeal Del

Monte e de Olimpia Aldobrandini.

Caravaggio, São João Baptista

como uma criança, c. 1603

óleo sobre tela, 132x97 cm. Museu

Capitolini, Roma.

Caravaggio, CEIA DE EMAÚS, 1601.

National Gallery, Londres.

Caravaggio, CEIA DE EMAÚS, c. 1600. Col. particular.

Michelangelo Merisi da Caravaggio,

Sacrifício de Isaac, 1603

104 cm × 135 cm

Uffizi, Florença

Caravaggio, Coroação de Espinhos, c. 1605.

Viena, Gemaldegalerie..

São João Baptista, tela, c.

1605-1606, 172,5x104,5 cm

Nelson Gallery, Kansas City.

Caravaggio, Madonna di Loreto, c. 1603-

1605. Cappella Cavalletti igreja de Santo

Agostino, Roma.

Foi encomendada em 1603 pelos

herdeiros do Marquês Ermete Cavalletti

para a capela familiar em Santo Agostino,

perto de Piazza Navona. Representa a

cena num realismo humanístico de

grande sensibilidade, recorrendo a

modelos populares, dentro daquilo que o

historiador de arte Walter Friedlaender

definiu como o «realistic mysticism» do

pintor, reflectindo uma profunda devoção

tridentina, fiel às práticas devocionais dos

Exercícios Espirituais de Santo Inácio de

Loyola e aos textos dos Oratorianos e

Agostinhos.

Madona com a serpente

(Madona Palafrenieri), tela, 1606,

229x211 cm. Galleria Borghese, Roma.

Foi pintado para a Arciconfraternita di

Sant'Anna de Parafrenieri na Basílica

de São Pedro, exposta na igreja de

Sant’Anna dei Palafrenieri na Via di

Porta Angelica in Borgo, e adquirida

pelo poderoso Cardeal Scipione

Borghèse, que, com este, chegou a

possuír seis Caravaggios no seu

Palácio romano.

A Morte da Virgem, encomendada em 1601

pelo jurista do papa Laerzio Cherubini para

uma capela na igreja carmelita de Santa

Maria della Scala in Trastevere em Roma, a

tela de 1605 foi rejeitada pelos frades

(como referem os biógrafos, de Giulio

Mancini a Baglione e Bellori) pelo facto de

Caravaggio ter usado uma jovem prostituta

recém-afogada no Tibre como modelo da

Virgem Maria. O Duque de Mântua

Vincenzo Gonzaga adquiriu-a e expô-la em

1607 com grande sucesso.

Caravaggio, Morte da Virgem

óleo sobre tela, 1605-6, 369x245 cm

Museu do Louvre, Paris.

Apesar do sucesso e do reconhecimento, mesmo por parte dos detractores, o

pintor continuou a ser um temperamento conflitual, envolvendo-se em brigas. Um

depoimento de 1604 de Floris Claes van Dijk diz que «após acabar um trabalho

era certo que passava um mês ou dois com a espada a lado e a companhia de um

criado, de taberna em taberna, pronto a envolver-se em lutas, de modo que é

muito ingrato acompanhá-lo.

Em 1606, matou à espada um criado da cúria papal e, condenado, teve de fugir de

Roma, sem dinheiro e com a cabeça a prémio. Vai trabalhar em Nápoles, de

seguida em Malta, depois na Sicília, onde pinta obras de um lirismo transfigurado

como Ressurreição de Lázaro (Messina) e a Degolação do Baptista (La Valetta),

óptimas experiências lumínicas.. Em Malta, em 1608, terá envolvimento em outra

briga. Volta a Nápoles em 1609, onde volta a ser preso. Enfim perdoado pelo

Papa, apresta-se a voltar a Roma, mas morre de febre malária, em Porto Ercole,

às portas da Cidade Eterna, em Junho de 1610.

As setes obras de Misericórdia,

tela, terminada em Janeiro de 1607,

390x260 cm

Igreja de Pio Monte da Misericórdia,

Nápoles

Madona do Rosário, tela, 1606-1607,

364x249 cm Kunsthistorisches

Museum, Viena.

Executada nos turbulentos anos finais,

após a fuga de Roma e mais uma

condenação, abriga-se no castelo do

nobre Marzio Colonna, que o protege,

e para quem pinta em 1606 este

excelente e grande quadro.