formaÇÃo inicial e continuada de professores

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Formação inicial e continuada de professores IX CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2007 UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO 1 FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA DE PROFESSORES C OMUNICAÇÃO C IENTÍFICA

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Formação inicial e continuada de professores

IX CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES - 2007UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - PRO-REITORIA DE GRADUAÇÃO

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FORMAÇÃOINICIAL E CONTINUADA

DE PROFESSORES

COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA

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INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas do século XX, educadores, legisladores, estudiosos,instituições e governos emitiram ou manifestaram opiniões sobre a formação de professores..

Na fase de denúncia, a LDB 4024/61 questionou o modelo de currículo (3 + 1) quevinha sendo adotado nos cursos de Licenciatura, passando a exigir um currículo mínimo, compostopor um núcleo de matérias com vistas a uma adequada formação cultural e profissional comênfase na formação do educador.

No bojo dessa prerrogativa de mudança, diferentes orientações1 (Parecer 292/62,Parecer 672/69, Resolução 9/69) foram dadas, tendo nas “matérias pedagógicas” um eixo cur-ricular responsável pela formação do professor, pois “o que ensinar” (conhecimentos adquiridosna área específica) preexiste ao “como ensinar” [o método (Didática)], bem como prescinde deum conhecimento prévio sobre o aluno (Psicologia do Desenvolvimento e da Educação), ainstituição Escola (Estrutura e Funcionamento do Ensino) em seus objetivos, organização, políticapública e de uma Prática de Ensino (sob a forma de estágio supervisionado - nas escolas dacomunidade, nos moldes dos “internatos” dos cursos de Medicina) para atender a exigência detreinamento profissional. (CHAGAS, 1980)

Embora tenha havido estes esforços novas denúncias, criticando o “vernizpedagógico” que foi dado aos cursos de formação: expressão essa que se refere, nos anos 1980e 1990, à dita necessidade de se ter uma base comum nacional de formação de educadores,articulada com as disciplinas de conteúdo específico e as integradoras, na formação do professordas áreas específicas. Reivindicava-se a definição de um corpo fundamental de conhecimentos;a formação pedagógica sólida e não fragmentada; o desenvolvimento do conteúdo específico naótica do ensino; a valorização da relação “prática-teoria-prática” - articulação entre a teoria e aprática desde o começo do curso – a revisão do modelo curricular adotado; o acompanhamentoe a supervisão permanente nos estágios curriculares; a prática pedagógica; a interdisciplinaridade;a delimitação dos saberes da docência; a autonomia pedagógica, a constituição de uma identidadeprofissional do docente

A partir destas denúncias, em diferentes momentos, buscaram-se perspectivas desuperação que foram construídas a partir do debate no seio da categoria: em reuniões científicas,associações profissionais, instituto/fundações e periódicos, entre outros. Numa síntese sobre o

A ESCOLHA DO MAGISTÉRIO COMO PROFISSÃO

NETO, Samuel de Souza (UNESP/RC); CARDOZO, Aline Sckatelberg (UNESP/RC); SILVA,Delmar Benelli da (UNESP/RC); RIBEIRO, Brenda do Prado (UNESP/RC); SILVA, Juliana de

Souza (UNESP/RC); BRUM, Esther Vieira (UNESP/RC); CEREGATTO, Luciana (UNESP/RC);CESANA, Juliana (UNICAM/PPGEF); BENITES, Larissa Cerignoni (UNESP/RC);

MOTTA, Adriana Ijano (EMEIEF Maria Apparecida de Luca Moore)

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assunto, FIORENTINE e colaboradores (2000) observaram que, nos últimos anos, as pesquisassobre a formação de professores apresentaram os seguintes pressupostos:

- a partir de 1960 – uma maior valorização do conhecimento específico a serensinado;

- a partir de 1970 – maior ênfase nos aspectos didáticos e pedagógicos enas tecnologias de ensino;

- a partir de 1980 – maior destaque para as dimensões sócio-política eideológica;

- a partir de 1990 – início do enfoque sobre a prática docente e os saberespedagógicos.

Considerando este quadro esse estudo deu continuidade ao projeto “O corpo”, tendocomo um de seus objetivos apresentar um diagnóstico sobre os professores, considerando aescolha da docência como profissão, bem como o exercício da profissionalidade docente

A DOCÊNCIA COMO PROFISSÃO: A IDENTIDADE PROFISSIONAL EM QUESTÃO

Esta realidade pode ser constatada, em parte, na Resolução CNE/CP 1/2002 e naResolução CNE/CP 2/2002 ao se propor uma concepção de formação de professores, para aeducação básica, em que a ênfase na prática pedagógica perpassa todo o currículo na elaboraçãodo Projeto Pedagógico e propõe-se um corpo de conhecimentos para a formação docente. Porém,o trabalho docente, em sua prática, pode ocorrer em ambientes formais e não formais, escolarese não escolares; e a docência (e os saberes provenientes dessa prática) se constitui na base daidentidade da profissão docente.

Neste contexto, CONTRERAS (2002, p. 73) utiliza-se do termo profissionalidadepara designar “o modo de resgatar o que de positivo tem a idéia de profissional no contexto dasfunções inerentes ao trabalho docente”, abarcando três dimensões:

- obrigação moral – tendo como componentes a preocupação com o bemestar dos alunos e com a ética, perpassando as relações de afetividade e motividade;

- compromisso com a comunidade – estabelecendo, inicialmente, com osprofessores e, a seguir, com a sociedade como um todo intervenção nos problemas sociais epolíticos, e compreendendo a escola como um local de preparação para a vida futura, comoagente regulador da sociedade (liberdade, igualdade, justiça);

- competência profissional – transcende o domínio de habilidades e técnicase emerge a partir da interação entre a obrigação moral e o compromisso com a comunidade.

Esse dimensionamento exige que se enfrente o desafio da mudança em três níveis:o das mentalidades, das práticas e dos compromissos.

“Por mentalidade quero significar a maneira de pensar, julgar e agir.(...) O desafio das práticas significa tornar as vivências e experiênciasobjetos de análise e reflexão. Em geral, não há preocupação com ocontexto em que são construídas e consolidadas as nossas práticas,

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em outras palavras, não reconstruímos a trajetória histórica da nossaprática.Finalmente, o desafio do compromisso significa transitar do discursopara a ação, articular o real possível e o ideal, destruir as fantasiasque cercam o mundo dos planejamentos e programas, gestar e gerirpropostas capazes de dialogar com as práticas e as realidades,resgatar o sentido do planejar para a ação”. (MACHADO, 1996, p.103-104)

Dessa leitura vem o questionamento de que na construção dessa profissionalidadeprecisamos saber: Qual é a nossa concepção de professor? O que esperamos de nossos alunos?Como vamos colocar isto na prática? Como, nós nos inserimos neste contexto?

Porém, visando aprofundar este contexto se propõe quatro formas de ações (ORTIZ,2003, p. 6):

Descrever: O que faço? O objetivo desta ação é descrever eventos concretos deensino em que se revê suas ações distanciados do contexto, o que permite maior organização epossibilidade de enxergar seu plano de aula, como se desenrolou sua aula naquele dia. Essasdescrições não precisam ser complexas ou técnicas, mas devem considerar e dar voz à açãodos praticantes.

Informar: O que significa isto? Qual o significado das minhas ações? Implica abusca dos princípios que embasam, conscientemente ou não, as ações realizadas. Ao informar,o professor pode perceber e verbalizar as teorias que ele próprio foi percebendo e internalizandono decorrer de sua história como aluno e como professor, as quais permeiam a sua ação e/ou oseu texto.

Confrontar: Como me tornei assim? Como cheguei a agir dessa forma? Este émomento de confrontar idéias e razões, de interrogar as teorias que embasam as ações, dequestionar o senso comum com o objetivo de entender por que se ensina do modo como seensina.

Reconstruir: Como posso fazer diferente? Aprender é reconstruir, remodelar,transformar, integrar o novo ao conhecido. Pela reconstrução dos seus conceitos e visões, oprofessor pode alterar a sua prática, compreendendo que o ensino não é uma realidade imutável,definida pelos outros, mas contestável na sua essência. De forma que possa decidir o que émelhor para a sua prática (teorização). Portanto aproxima-se a teoria da prática, o pensamento daação, o professor do pesquisador, visando a sua emancipação, a sua autonomia.

No processo de formação, a autonomia, responsabilidade e a capacitação sãocaracterísticas tradicionalmente associadas a valores profissionais que deveriam ser indiscutíveisna profissão docente (CONTRERAS, 2002).

No âmbito desse processo, então, se pergunta: há necessidade de um “novo”profissional e redimensionamento dos elementos constitutivos dessa profissão ou bastariaressignificar os conhecimentos e saberes docentes já existentes? Na construção da identidadede uma profissão já não se encontrariam os aspectos objetivos e subjetivos que a delimitam

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como corpo de conhecimento, ética e altruísmo?‘A profissionalidade docente se refere às qualidades da prática profissional dos

professores em função do que requer o trabalho educativo (CONTRERAS, 2002). Dessa forma, aprofissionalidade não consiste apenas ensinar, mas engloba todos os valores e pretenções que odocente deseja alcançar na profissão.

Gimeno Sacristán apud Papi (2005) afirma que para que haja um entendimentosobre a profissionalidade docente, é necessário que se entenda o conceito de prática educativa, aqual deve ser entendida de forma ampla e não apenas delimitada pela prática didática dosprofessores. A educação envolve outras esferas, sejam elas de determinações políticas,econômicas ou culturais e isso faz com que os professores não tenham domínio total sobre aprática, uma vez que tais setores interferem na vida escolar.

Portanto, assim como a constituição da profissionalidade docente não é umfenômeno simples, a constituição da identidade dos professores também apresenta certasparticularidades e configura-se como um fenômeno complexo.

De acordo com estudos de Pimenta (2002), a identidade não pode ser consideradaum dado imutável, nem externo que possa ser adquirido, mas é um processo de construção dosujeito historicamente situado. A profissão de professor, como as demais, emerge num dadomomento e contexto histórico como resposta às necessidades que foram postas pelas sociedades,adquirindo estatuto próprio e legalidade.

Neste contexto algumas profissões deixaram de existir, enquanto que outrassurgiram nos tempos atuais e outras, ainda, adquiririam tal poder legal que se cristalizariam aponto de permanecerem como práticas altamente formalizadas e significados burocráticos. Outrasnão chegariam a desaparecer, mas se transformariam no decorrer das novas demandas dasociedade, como é o caso da profissão de professor.

No caso da educação escolar, Pimenta (2002) constatou que no mundocontemporâneo o crescimento quantitativo dos sistemas de ensino não tem correspondido há umresultado formativo (qualitativo) adequado às exigências da população envolvida, nem às exigênciasdas demandas sociais, passando a exigir uma nova identidade profissional do professor.

De modo que uma identidade profissional se constrói a partir da significação socialda profissão, da revisão constante dos significados sociais da profissão e da revisão das tradições.Ela se constrói também através do significado que cada professor, enquanto ator ou autor, confereà atividade docente no seu cotidiano a partir de seus valores, de seu modo de situar-se no mundo,de sua história de vida, de suas representações, de seus saberes, de suas angústias e anseios,do sentido que tem em sua vida o ser professor (PIMENTA, 2002). Portanto, a identidade doprofessor é construída ao longo de sua trajetória como profissional do magistério. No entanto, é noprocesso de sua formação que são consolidadas as opções e intenções da profissão. Assim, aidentidade vai sendo construída com as experiências e história pessoal, no coletivo e na sociedade(PIMENTA e LIMA, 2004).

Porém, visando aprofundar o que foi arrolado escolheu-se como trabalho de campo

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uma escola municipal da cidade de Limeira, visando levantar junto ao corpo de professores acompreensão que eles têm do magistério, visando resegnificar a própria profissão.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Como caminho para este percurso escolheu-se a pesquisa de análise qualitativa,do tipo descritiva, visando num segundo momento passar para a pesquisa ação, que supõe ocontato direto e prolongado do pesquisador com o ambiente e a situação que está sendoinvestigada, sendo o ambiente natural a principal fonte dos dados e o pesquisador o principalinstrumento.

A técnicas utilizadas nesta investigação foram o questionário, a observação e afonte documental. Porém, para o momento estaremos apresentando, apenas, os dados doquestionário. O questionário composto por 12 questões foi encaminhado para 35 professoras,tendo a devolutiva de 31 (88,57%). Das 12 questões trabalhadas estaremos apresentados osresultados das questões (seis) vinculadas ao magistério.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os dados relativos a questão da docência foram coletados tendo como fonte deinformação o questionário, a observação de aulas e a entrevista. Porém, nesse momentoestaremos apresentando os dados relativos, apenas, ao questionário.

Na primeira questão “O que levou você a optar pelo Magistério?”, o que se encontrouforam indícios de que a escolha desta profissão ocorreu em função da (o): afetividade, socializaçãoprimária, questões de gênero e desejo de transformação social foram os aspectos que maismotivaram as participantes na escolha da profissão (Figura 2). Estas respostas reportam para ofato de que as professoras gostam de crianças, tiveram influência familiar, pelo fato de seremmulheres e, ainda, por ter uma vontade muito grande de modificar a sociedade. O item afetividadefoi o que se destacou dentre as respostas das professoras, compreendendo 23% do total dasrespostas obtidas.

Que s tão 1

23%

19%

16%

16%

10%

10%6%

afetiv idade

soc ialização primária

ques tao de gênero

transformação soc ial

genérico

socialização secundária

opção espiritual

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Figura 1: Respostas referentes a primeira questão do questionário aplicado.A décima segunda questão visou complementar a primeira ao colocar: “Se não

fosse a docência, em qual campo de atuação você gostaria de estar trabalhando? Por quê?”Categorias encontradas (Figura 6):

Figura 6: Respostas referentes à décima segunda questão do questionário aplicado.- Área de humanas I. Nesta primeira categoria as respostas que se destacaram

foram: magistério/docência, pois “nunca pensei em trabalhar em outro campo”.- Área de humanas II. Outros campos da área de humanas, priorizando o trabalho

com pessoas. Foram destacadas as seguintes atividades: direito, comércio, serviço social epsicologia.

- Área de humanas III. Dentre esta categoria as respostas que emergiram são:trabalhar em outros campos como escritora, decoradora e designer, arquitetura, administração,gastronomia e artes.

- Área da saúde. Gosta de trabalhar com pessoas e destacaram as áreas queenvolvem a medicina.

- Área de exatas. De forma geral também gosta de trabalhar com pessoas e gostariade ser bancária.

- Voluntário. Um participante afirmou que gostaria de trabalhar no voluntariado.Com relação a esta pergunta houve um predomínio da área das Humanidades

77% do total das respostas.Nas análises de conteúdo apresentadas em relação às diferentes questões do

questionário vinculadas a docência, magistério observou-se que oito participantes (25,8%) eramaqueles que queriam fazer o magistério e não tinham, ou admitiam, outra opção, mas os demaisparticipantes apresentaram outros interesses, podendo caracterizar aquilo que Levenfus (1997b)denominou de uma escolha sem conhecimento da profissão e de si mesmo ou que recebeuinfluência da família sem levar em consideração os interesses da pessoa. Para aqueles que nãotinham dúvida dessa escolha, o grande balizador foi a dimensão afetiva ou afetivo-social sugerindocomo colocou Contreras (2002), na obrigação moral da profissionalidade docente, a preocupação,o respeito e o interesse pelos escolares o que implicaria numa afetividade e moralidade.

Ques tão 1 2

27%

27%23%

17%

3% 3%área de humanas I

área de humanas II

área de humanas III

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v oluntar iado

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A segunda questão deste bloco “Como você definiria o magistério?” caracteriza-sepor identificar dimensões da profissionalidade docente.

Figura 2: Respostas referentes à segunda questão do questionário aplicado.

Dentre as respostas obtidas, as que mais se destacaram foram a dimensão afetivo-social, a dimensão pessoal-profissional e a dimensão social. Foi possível verificar que a dimensãoafetivo-social se destacou alcançando 54% das respostas das professoras (Figura 2).

Esta dimensão se caracterizou por considerar o magistério como algo prazeroso egratificante, pois se vê a progressão dos alunos, no entanto é uma profissão pouco valorizada.Um total de 3 pessoas não respondeu a esta questão.

Considerando a questão 3a “Dentro da profissão o que você mais gosta de fazer?”observaram-se as seguintes categorias:

- dimensão afetivo-social que compreende conviver e ter contato com as crianças.- dimensão cognitiva moral que tem a ver com a progressão dos alunos e formação

do cidadão.- dimensão cognitiva está ligada à vontade de aprender coisas novas.- dimensão experiencial relaciona-se à prática pedagógica e à viabilização de

projetos.- não respondeuVerificou-se que o maior número de respostas se concentrou na categoria - dimensão

afetivo-social que teve como resultado 54% das respostas das docentes.

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Figura 3a: Respostas referentes à terceira questão do questionário aplicado.

A questão 3b diz “Dentro da profissão o que você menos gosta de fazer?”. Entreas respostas analisadas encontraram-se as seguintes categorias:

- Gestão escolar. Nesta categoria foram encontradas respostas que se referem àparte burocrática (preenchimento de papéis e reuniões); às frustrações que o sistema educacionalpropõe e à dupla jornada de trabalho.

- Dimensão cognitiva. A resposta encontrada nesta categoria foi: alunos que nãoprogridem.

- Dimensão moral. A resposta encontrada nesta categoria foi: presença deprofessores irresponsáveis.

- Não Respondeu- Dimensão motora. A resposta encontrada nesta categoria foi: dar aula de Educação

Física.- Genérico. A resposta encontrada nesta categoria foi: não vê algo que não goste.A categoria referente a parte democrática da gestão escolar de destacou como

sendo o ponto negativo da profissão atingindo 67% das respostas das professoras conformeobservado na Figura 3b.

Figura 3b: Respostas referentes a terceira questão do questionário aplicado.

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A questão número 4 pergunta: “Quais disciplinas ou conteúdos tidos comoimportante, no processo de formação, para o exercício da docência?” As categorias de respostasencontradas para esta questão foram:

Figura 4: Respostas referentes à quarta questão do questionário aplicado.

- Disciplinas Humanas. As respostas desta categoria foram: didática, psicologia efilosofia. Um total de 14 professoras respondeu esta categoria que abarcou 46% das respostas(Figura 4).

- Genérico. As respostas desta categoria foram: disciplinas teóricas que exigiamsomente a memorização.

- Não respondeu.- Prática Pedagógica.- Ética. A resposta desta categoria foi: respeito pelo cliente.- Disciplinas do núcleo comum. As respostas desta categoria foram: matemática,

história e geografia.As disciplinas relacionadas às Humanidades e ao conteúdo teórico foram as que

mais se destacaram dentre as respostas obtidas.A quinta questão se caracteriza por “Qual o conhecimento ou saber que você

considera mais importante para a prática pedagógica?”Respondendo ao que tinha sido fundamental, em termos de conhecimento, para a

docência e prática profissional, os participantes assinalaram como disciplinas importantes adidática, psicologia, sociologia acrescentando num outro momento a filosofia, temáticas queenvolviam a cidadania e a ética e a experiência ou saber da experiência. Tais conhecimentosassinalados fazem parte daquilo que se denominou chamar de saberes da docência.

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Figura 5: Respostas referentes a quinta questão do questionário aplicado.

Na análise dos dados referentes a esta pergunta utilizou-se da proposta de Tardif(2002) visto que ela abrangia de forma ampla todas as respostas averiguadas, como:

- Saberes da Formação Profissional. O conteúdo destes saberes foram definidosde acordo com as respostas de 11 professoras (36%): cidadania e ética, valores que ajudam osalunos a progredir na sociedade; didática; psicologia; sociologia e filosofia.

- Saberes da Experiência. Um total de 10 professoras (32%) fez parte desta categoriae responderam: a troca de experiência; conhecimento das crianças e reflexão da prática pedagógica.

- Saberes Curriculares. As respostas desta categoria foram feitas por 6 professorase consistia em dominar o conteúdo e estar atualizado.

- Genérico. Três professoras responderam que o conhecimento mais importantepara a prática pedagógica são os conhecimentos teóricos e práticos.

- Não Respondeu. Apenas uma professora não respondeu esta questão.O bloco de conhecimentos assinalado não é estanque, mas apresentam uma

correlação com os saberes da formação profissional e saber experiencial nos estudo de Tardif(2002) por envolver, no primeiro caso, os conhecimentos provenientes da ciências da educação,ideologia educacional bem como o saber pedagógico. No entanto, quando se fala no saberexperiencial, o único que é desenvolvido fora da universidade por envolver um conhecimento tácito,este abarca a socialização primária e a socialização secundária. Porém há outros autores comoPimenta (2002) que vão apresentar outro recorte do que foi colocado, localizando os diferentescomponentes que foram assinalados nos saberes pedagógicos, conhecimento e saberes daexperiência.

CONCLUSÃO

Com relação ao que se propôs apresentar foi observado que a dimensão reflexivado docente se realizou através das compreensões apresentadas no que diz respeito à docência.

A docência, entendida como a base da identidade do professor, foi analisada na

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perspectiva de que as atitudes das docentes abarcavam os três aspectos principais (a obrigaçãomoral, o compromisso com a comunidade e a competência profissional) do exercício daprofissionalidade, tendo como componentes: afetividade, moralidade, urbanidade, cooperação ediálogo.

Foi identificado que a autonomia docente passa pelo processo de reflexão ecompreensão de aspectos atitudinais, ou seja vinculados aos saberes da formação profissional(que envolve uma dimensão pessoal e uma dimensão profissional) traduzidos na forma de se“colocar-se no lugar do aluno”.

Dessa forma, concluiu-se que o trabalho realizado na escola, envolvendo o exercícioda profissionalidade docente, propiciou boas reflexões no âmbito pessoal e profissional,favorecendo, dessa forma, o relacionamento interpessoal e uma prática pedagógica mais dialógicae fundamentada na reflexão na e sobre a ação

REFERÊNCIAS

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______ Conselho Federal de Educação. Parecer nº 292, de 14 de novembro de 1962.

______ Conselho Federal de Educação. Parecer nº 672, de 04 de setembro de 1969.

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NOTAS

1 -Trata-se de orientações doConselho Federal de Educação.

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as últimas décadas, as pesquisas sobre os saberes desenvolvidos pelos docentesem sua prática têm se intensificado, no sentido de torná-los públicos, desmistificando e contribuindopara que os mesmos conquistem o respeito e a consideração que sempre mereceram. O estudo1

aqui apresentado inscreve-se neste âmbito de investigação tendo como foco as descrições,explicações e interpretações dos professores sobre a sua prática pedagógica com o objetivo deevidenciar os fatores que contribuiriam para a constituição de sua identidade e dos seus saberes.

O artigo de Tardif, Lessard e Lahaye (1991) sobre os saberes docentes, despertouo interesse da comunidade educacional no Brasil como um novo campo de estudo há pouco maisde dez anos. O tema se insere em um contexto maior e ocupa o lugar central nos debatesinternacionais e em pesquisas (Shulman, 1986a, 1986b e 1987; Zeichner (1994); Gauthier, Tardife Mellouk, 1993; Gauthier et al, 1998; Perrenoud, 1996; Tardif, 2000a, 2000b, para citar alguns),estando na base das reformas na formação de professores implantadas em muitos países naAmérica do Norte e Europa há cerca de duas décadas.

Algumas das questões que mobilizam tais estudos buscam responder o que sabemos professores, quais os saberes que estão na base de sua profissão, se envolvem tambématitudes e posturas, onde são adquiridos. Outros estudos (NÓVOA, 1992a, 1992b, 1998) buscamconhecer sua vida, trajetória pessoal e de formação, suas crenças, valores, e perspectivas,constituídas a partir das experiências vividas.

O saber profissional, de acordo com Tardif (2000a) é aprendido na prática, pelaexperiência, em contato com a realidade do trabalho e com os demais atores sociais, no interiorde um grande processo que é a socialização profissional.

Na formação inicial, o reconhecimento da importância dos conhecimentos práticosdo professor, como destaca o autor, significa o primeiro passo para possibilitar ao futuro profissionalo discernimento para enfrentar o ineditismo do cotidiano, denominado por Schön (1983) como“estruturação ou construção do quadro de problemas”, em oposição ao modelo da racionalidadetécnica, na qual imagina-se que a transposição de proposições teóricas e conhecimentos científicosda formação se efetue de forma direta e linear na resolução de futuros problemas da práticaprofissional.

Conhecer quais são os saberes necessários, indispensáveis ao professor éimportante, portanto, não só para dar visibilidade e condições de resgatar um profissionalismo em

A EXPERIÊNCIA DO TRABALHO NACONSTRUÇÃO DOS SABERES DOCENTES:IMPLICAÇÕES PARA A FORMAÇÃO INICIAL

LIMA, Sônia Filiú Albuquerque (UEMS); GRIGOLI, Josefa A. G. (UCDB)

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crise (TARDIF, 2000a), como é fundamental para orientar os currículos de formação universitária.Que saberes são esses?

OS SABERES DA DOCÊNCIA

Gauthier (1998) situa os saberes dos professores no âmbito de uma problemáticateórica geral. O que acontece quando o professor ensina? O que ele faz para instruir e educar ascrianças? O que é preciso saber para ensinar? Se existe um repertório próprio ao ensino, querepertório é esse? Como é construído? Um dos mitos em relação aos saberes docentes é queser professor é um ofício sem saberes, ou seja, basta conhecer o conteúdo, ou basta ter talento,ou basta ter bom senso, ou basta seguir a intuição, ou basta ter experiência, ou basta ter cultura.Por outro lado há também o mito de que os saberes docentes não têm ofício. Embora as faculdadesde educação tenham produzido saberes formalizados a partir de pesquisas, esses saberes nãose dirigiam ao professor real, cuja atuação se dá numa verdadeira sala de aula. A idéia era de queao professor (como um técnico) cabia apenas aplicar as descobertas da ciência. Na verdade, osprofessores criticam com razão a não pertinência desses saberes “científicos” ao seu contextode trabalho. Esse fracasso do projeto da ciência da educação, segundo o referido autor, tambémcontribuiu para a desprofissionalização da atividade docente. É como se o saber cientifico sobreo ensino tivesse amputado de seu objeto real um professor real, numa sala de aula real, diante deum grupo de alunos reais.

Segundo Tardif, Lessard e Lahaye (1991) os saberes docentes originam-se de quatrofontes: saberes da formação profissional; saberes disciplinares; saberes curriculares e saberesda experiência e argumentam sobre a necessidade dos programas de formação darem maiorrelevância aos saberes da experiência, pois os mesmos constituem-se fonte de referência para aprática docente. Os estudos apontam que os outros saberes parecem ser validados no exercíciodo cotidiano e permitem aos professores um distanciamento de outros conhecimentos adquiridosfora de sua prática. Colocam ainda em evidência que nos saberes da experiência os demaissaberes são amalgamados.

Tardif (2000a) apresenta uma caracterização dos saberes docentes a partir deestudos sobre o tema. Segundo eles esses saberes são:

a) temporais: ou seja, são adquiridos através do tempo. Uma boa parte do que osprofessores desenvolvem em suas práticas provém de suas histórias de vida e de sua história deformação escolar. Eles trazem uma imensa bagagem de conhecimentos anteriores à sua formaçãoacadêmica, de crenças e certezas sobre o que seja uma prática pedagógica. Essas certezaspermanecem imunes às teorias dos cursos de formação e ao principiarem sua experiênciaprofissional, tais crenças serão reativadas para solucionar os problemas do cotidiano. As primeirasexperiências profissionais também são decisivas para desenvolver o sentimento de competência,a estruturação de uma rotina. Muito cedo essa experiência transforma-se em truques do oficio,modelos de gestão de classe e de ensino. Os saberes são temporais também porque se

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desenvolvem ao longo da carreira, concorrendo para a construção da identidade docente, em umprocesso de socialização e adaptação às demandas institucionais.

b) plurais e heterogêneos: provém de diversas fontes como já foi apresentado. Sãoecléticos quanto às concepções teóricas que fundamentam as ações do professor, ainda quecontraditórias. Sua utilização é pragmática; como as várias ferramentas de um artesão paradesenvolver a sua arte, estão a serviço da ação e é nela que adquirem significado e utilidade. Asteorias, as habilidades se integram em função dos vários objetivos que buscam atingirsimultaneamente. Dessa forma, os professores em seu cotidiano: “procuram controlar o grupo,motivá-lo [...] ao mesmo tempo prestam atenção individual a certos alunos da turma, procuramorganizar atividades de aprendizagem, acompanhar a evolução da aprendizagem, [...] etc.” (TARDIF,2000a, p. 15).

c) personalizados: sendo a atividade docente essencialmente de interação humana,a personalidade do professor é absorvida no processo e, em certo sentido, é o ponto principaldessa interação. Dificilmente os conhecimentos serão objetivos. Não há tecnologias eficazespara controlar as situações de interação humana. O professor sabe que deverá contar com suascapacidades pessoais, consigo mesmo, para controlar o seu ambiente de trabalho (Ibid).

d) situados: são elaborados em função de uma situação especifica de trabalho quese apresenta diante de seres humanos que devem interagir seus significados, negociando-oscoletivamente. É a “contextualidade”, ou seja, os saberes estão ancorados em contextos, situaçõesconcretas que demandam habilidades, conhecimentos específicos. São produzidos nas diferentesinterações e relacionados a situações de trabalho.

A categoria trabalho parece ser central na análise dos autores, pois é através domundo do trabalho que os outros conhecimentos serão validados, ou não. Os saberes daexperiência ocupam, portanto, um lugar fundamental em relação aos demais saberes. Concluindoas contribuições dos autores, um aspecto que fica bem enfatizado é que ensinar é mobilizar umavariedade de conhecimentos compostos, reinventando-os no trabalho, adaptando-os etransformando-os. A experiência do trabalho não é apenas o lugar onde os conhecimentos sãoaplicados, mas é em si mesma um conhecimento do trabalho a respeito dos outros conhecimentos,não apenas faz parte de um corpo de saberes, mas, estabelece o lugar onde esses saberes sãoamalgamados e re-elaborados.

A caracterização dos saberes apresentados pelos autores, a partir das pesquisaslança luz para o entendimento da epistemologia do métier docente. Nesta direção o estudo aquiapresentado busca colaborar na compreensão de como o professor aprende o seu fazer, do queé de fato decisivo na formação do seu pensamento que se manifesta em sua prática, a fim de quesua formação universitária possa ser mais efetiva.

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OUVINDO OS PROFESSORES

O estudo apresentado a seguir iniciou-se há cerca de três anos em uma escola darede municipal de Campo Grande - MS, escolhida intencionalmente pelas referências positivas aseu respeito, tendo alcançado os melhores resultados em 2003 nas avaliações do SAEB. O universoinvestigado compreendeu o grupo de professores e equipe técnico-administrativa. Relatamosaqui uma análise das entrevistas realizadas com os professores. Buscamos identificar os fatoresatribuídos pelos professores como decisivos na elaboração de sua prática educativa.

Os entrevistados são 8 professores que atuam da Educação Infantil à 4ª série doEnsino Fundamental, têm em média 42 anos, com uma experiência média na educação de 18anos aproximadamente e todos com mais de 3 anos de permanência na escola.

A entrevista foi organizada em 6 blocos compreendendo a vida escolar, a formaçãoinicial, a experiência inicial, a formação continuada, a escola como local de formação e a prática etrajetória profissional. Apresento aqui os resultados e discussão relativos ao último bloco. Asquestões sobre a prática e a trajetória profissional objetivam conhecer, nas falas dos professores,como organizavam suas aulas, como avaliavam, sobre as mudanças ao longo de sua carreira,como aprenderam a prática desenvolvida, o que fariam se fossem recomeçar, o que pensam dosalunos e fatores que influenciaram a sua prática. Essas questões giravam em torno de umaquestão central: como os professores aprenderam sua prática?

A fala do professor, seus argumentos foram tomados como indicativos dos fatoresque influenciaram a elaboração de fazer docente. É preciso levar em conta que essa fala não ésuper consciente, não é super racional, uma vez que as percepções podem ser falhas, os reaismotivos podem estar no subconsciente e a memória é seletiva. Se a fala não é super conscientee super racional, é, contudo a forma mais próxima para a compreensão da realidade do professor.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Em geral, os professores demonstram gostar do que fazem, referem-se a umaseqüência didática planejada na sua prática, procurando contextualizar os conteúdos, utilizandomateriais didáticos concretos, com métodos ativos em um clima descontraído e dialógico.

Nas respostas dadas às questões apresentadas, foram destacadas todas asmenções dos professores que referiam a fatores determinantes para o desenvolvimento da suaprática pedagógica. Esses fatores estão relacionados no quadro abaixo:

Quadro 1: Fatores, apontados pelos professores, que influenciaram na elaboraçãode sua prática.

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Agrupamos estes fatores em cinco categorias para análise de acordo com afreqüência com que são mencionados e podem ser observadas na tabela a seguir:

Tabela 1: Categorias de fatores, mencionados pelos professores, por freqüência eproporção, que influenciam a sua prática docente.

(*) O total registrado refere-se ao número de posições expressas pelosrespondentes e não ao número de sujeitos.

Dentre as menções, observa-se que a grande maioria, 85%, refere-se à experiênciacomo fonte do aprendizado da prática, se considerarmos que a experiência socializada é tambémuma forma de reconhecer o valor da experiência, ainda que vivida por um colega. Há apenas umamenção sobre a formação inicial:

De vez em quando, a professora Selene (a professora da faculdade)falava assim...: Tudo que você for fazer se você não planejar você seenrola porque se você planeja uma coisa, você estuda e sabe aquiloque você vai fazer (J.).

Mesmo nesta única menção referente à formação inicial, ela se apresenta válidaporque a experiência ratifica sua legitimidade:

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O que acontece? O aluno sempre tá testando o professor. Ele sabequando você sabe o assunto ou quando você quer enrolar a aula, equando ele percebe isso você não segura a sala, não tem como segurar[...]. E a Selene falava isso: Do momento que você planejou sua aula,você conhece sua turma, a primeira coisa, você tem que conhecer asua sala, o ambiente onde você vai trabalhar [...] (J.).

A fala da professora deixa transparecer a relação entre os planejamentos orientadospela professora da faculdade e a segurança que disso resulta na sala de aula. Observa-se nasfalas dos professores, quando tratam especificamente da formação inicial, que essa influênciaem sua prática não é muito significativa. “O que ocorreu de positivo, só foi o grau de esclarecimento.Você aprimora... assim interiormente” (W.). Embora se atribua a essa formação certa importância,ela parece não ser significativa para o professor em sua prática: “Eu me especializei, eu amadurecimais dentro dos conteúdos específicos [...]. Só que pra vida prática... a gente só aprendetrabalhando” (M.). E até muitas vezes essa formação não parece ser reconhecida, por eles, muitoalém de uma mera titulação: “Ah, você tem curso superior? Não?! Ah, vai fazer! Eu até brinco: vaifazer, se você for preso tem uma sala especial! [....] mas eu acho que o nível superior sempre teacrescenta algo, por mais vago que seja esse curso” (M.).

Em geral não se nega a contribuição da formação inicial, mesmo que seja paraoutras aprendizagens válidas. No entanto, a relação entre essa formação e a prática é praticamenteinexpressiva na fala dos professores. Não se duvida também que o esclarecimento mencionado,o aprimoramento “interno” tenha possibilitado posteriormente ao profissional fazer leiturasdiferenciadas da situação prática, que não seriam feitas sem aquele aprimoramento. No entanto,essa influência para o professor parece vaga ou insuficiente.

Segundo Tardif (2000a, p. 19), nas disciplinas da formação, “aprender é conhecer, mas

em uma prática, aprender é fazer, e aprender fazendo”. São lógicas distintas, cuja distinção tem

um agravante quando as disciplinas são apresentadas de forma fragmentada, isoladas umas

das outras. No modelo da racionalidade técnica não se leva em consideração as convicções,

conhecimentos e crenças que os alunos já trazem antes da formação acadêmica,

desconsiderando-se, portanto, os filtros cognitivos, sociais e afetivos mediante os quais os futuros

professores irão processar as novas informações.

Nesse sentido, quanto à experiência escolar, vários entrevistadosreportam-se a professores que marcaram sua formação escolar: “A(aula) que eu mais gostava era Educação Física. [...] a forma delaexplicar. Era uma forma diferente de todos os professores” (W., prof.de Ed. Física).

As experiências desagradáveis da formação escolar foram também destacadas. Muitasvezes essas experiências parecem influenciar no sentido de motivar o professor a não reproduzirpráticas daquele que o marcou negativamente.

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As experiências desagradáveis da formação escolar foram também destacadas.Muitas vezes essas experiências parecem influenciar no sentido de motivar o professor a nãoreproduzir práticas daquele que o marcou negativamente.

Eu só lembro que no ginásio eu detestava muito Português e Matemática e hoje porironia do destino eu sou professor de Matemática. [...] acho que muitas vezes é pelos própriosprofessores (...) era a forma de explicar que não fazia com que prendesse a atenção. [...] Naquelaépoca o sistema era muito rígido. [...] se a gente não acertava, castigo na certa. [...] Ficar em péatrás da porta, risos..., de costas para parede, algumas vezes. [...] qualquer coisa assim, a genteera punido (G., prof. de Matemática).

Enquanto alguns eventos marcaram especialmente, muitos outros podem ter seperdido no esquecimento:

Engraçado... eu não me lembro. A única coisa que eu me lembro foiuma professora da minha segunda série que me tratou muito mal. [...]Porque ela me agarrou assim na carteira, ai eu falei que não saía; ela:sai! Eu: não saio! E ela me puxou, eu e carteira junto. Eu nunca maisesqueci desta professora. É a única coisa que me lembro...(C.).

Sobre essa formação escolar, Tardif (2000a) chama a atenção para o fato de queos professores são profissionais que estiveram imersos em seu local de trabalho, salas de aula,por cerca de 16 anos antes de começar a trabalhar e, essa vivência solidifica uma bagagem deconhecimentos anteriores que resistem à mudança nos cursos de formação. Nas situaçõesinusitadas, que exigem uma improvisação do profissional, muitas vezes ele acaba reproduzindopadrões de prática de seus professores da infância, do repertório da experiência escolar, nemsempre consciente. Mesmo que os professores não tenham mencionado suas experiênciasescolares como fatores que influenciaram sua prática, quando perguntados diretamente sobreisso, percebe-se nas suas lembranças que, de forma indireta essas experiências foram tambémfatores determinantes. Essas experiências também estão no âmbito da prática. Caso fossemconsideradas na tabela apresentada provavelmente aumentariam a porcentagem de fatoresrelativos à experiência prática.

As menções referentes à formação continuada são também bem inexpressivasem relação à importância dada aos professores aos saberes da experiência. A maioria mencionoua experiência inicial como momento de aprendizado da prática. Um aprendizado sofrido: “Foi umsusto!” Situações difíceis: “Eu entrei na escola e um garotinho de oito anos falou assim: Você quevai ficar no lugar da outra professora? [...] Aí ele disse: pois aqui quem manda sou eu. Eu jámandei ela embora e se você não andar do meu jeito você também tá fora” (J.). Outra professorareconhece as pedras no caminho: “Naquele ano eu tive bastante dificuldade” (M.).

Essas constatações parecem confirmar as conclusões de Tardif, Gauthier e outros

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sobre a importância dos saberes da experiência. Isso tem diretas implicações para a formaçãoinicial.

99 IMPLICAÇÕES PARA A FORMAÇÃO INICIAL

A lei 9.394/96 (BRASIL), ao tratar sobre a formação inicial do profissional docente,estabelece no Art. 65 que devem ser destinadas à prática de ensino no mínimo 300 horas. Com ahomologação da Resolução CNE/CP 02/2002 (BRASIL), as horas de formação prática passarampara 800, sendo 400 destinadas ao estágio supervisionado, e 400 destinadas à prática comocomponente curricular, vivenciadas ao longo do curso, o que denota estar havendo umentendimento, pelo menos na lei, de que a formação prática seja um elemento essencial na formaçãode professores. Contudo, uma mudança na lei, não muda uma cultura.

Após quase cinco anos dessa resolução, a realidade dos programas de licenciaturasparece estar longe de evidenciar a importância e o lugar da prática nos currículos. A propósitodessa questão e com base em estudos de Gauthier, C. Tardif M. e Mellouk, M. (1993), Borges(2004) ressalta que “percebeu-se que essa estratégia, isolada, é frágil diante da cultura universitáriaalicerçada em bases disciplinares”.

Em nossa experiência no ensino superior, ao tentarmos desenvolver projetosinterdisciplinares de prática a partir dos primeiros anos da formação de professores, algumasresistências dessa cultura universitária foram, em um primeiro momento, expressas em pronun-ciamentos de professores universitários de uma licenciatura, tais como: “os acadêmicos dasséries iniciais não estão maduros para a prática”, ou, “as práticas não serão significativas semuma boa fundamentação teórica” e ainda, “a carga horária determinada nas Diretrizes Curricularespara os anos iniciais de formação de professores é excessiva”.

Essa forma de resistência parece evidenciar valores e concepções de formaçãosegundo o modelo da racionalidade técnica. Em decorrência de alguns discursos, até persuasivos,favoráveis a este modelo e provindo dos professores universitários, muitos acadêmicos,possivelmente sem muita reflexão, têm se colocado a favor da instrumentalização teóricaprecedendo a prática.

Pode-se dizer que tal epistemologia da formação universitária é um forte elementona atual cultura de formação docente. Em que sentido, essa lógica de formação tem contribuídopara a construção dos saberes da prática do futuro professor? Pelo visto, pouco tem contribuídoe até pode ter representado em um obstáculo.

Os estudos, entre os quais este se insere, têm colaborado para evidenciar anecessidade de se repensar a formação universitária no sentido de possibilitar condições paraque os futuros professores construam um repertório de conhecimentos baseados nos saberesprofissionais da forma como os professores os mobilizam em seus contextos. Para isso, énecessário que a universidade esteja mais presente na escola e os profissionais da escola estejammais presentes na universidade e mesmo que os professores das escolas sejam co-autores naformação dos acadêmicos, enquanto atuam, dessa forma, em sua própria formação continuada.

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Além dessa parceria que precisa ser estreitada ou construída, faz-se necessárioconceber a formação teórica universitária, que tem seu lugar, como circundante de um eixo cen-tral: a prática. Como fazer isso? Quando se compreende a importância e quando se quer, asformas são criadas. Enquanto isso não acontece, vamos fingindo que formamos para a prática enossos futuros professores fingindo que estão sendo formados.

REFERÊNCIAS

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BRASIL. Resolução CNE/CP 2, de 19 de fevereiro de 2002. Institui a duração e a carga horáriados cursos de licenciatura, de graduação plena, de formação de professores da Educação Básicaem nível superior.

BORGES, M. C. F. O professor da Educação Básica e seus saberes profissionais. Araraquara:JM Editora, 2004.

GAUTHIER, C. et al. Por uma teoria da Pedagogia. Pesquisas contemporâneas sobre o saberdocente. Ijuí: Ed. UNIJUÍ, 1998.

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______. Os professores e suas histórias de vida. In: NÓVOA, A. Vida de professores. Porto: Porto,1992b.

______. História da profissão docente: desafios para a pesquisa. Palestra proferida na PUC –Rioem 25 de agosto de 1998.

PERRENOUD, P. Práticas pedagógicas, profissão docente e formação. Lisboa: D. Quixote, 1996.

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SHULMAN, L. Those who understand: growth in teaching. Educational Researcher: Washington, V15, n. 2, February, 1986a.

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______. Knowledge and teaching: Foundations of the New Reform. Harvard educational Review.V 57, n. 1. Feb., 1987.

TARDIF, M. Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitários: elementospara uma epistemologia da prática profissional dos professores e suas conseqüências em relaçãoà formação para o magistério. Revista Brasileira de Educação. n. 13, Jan/Fev/ Mar/ Abr., 2000a.______. A ambigüidade do saber docente nas reformas relativas à formação universitária para o

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magistério. São João Del rei: Fundação de Ensino Superior de São João Del Rei (FUNREI) revistaVertentes, n. 15 Jan/Jun, 2000b.

TARDIF, M. LESSARD, C. e LAHAYE, L. Os professores face ao saber: um esboço de umaproblemática do saber docente. Teoria e educação: Porto Alegre, n. 4, 1991.

ZEICHNER, K. Formação reflexiva do professores: idéias e práticas. Lisboa: Educa, 1993.

NOTAS

1 Trata-se de um recorte de pesquisa em andamento, desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa “Prática Pedagógica e Formação deProfessores”, vinculado ao Programa de Pós-graduação – Mestrado em Educação, da Universidade Católica Dom Bosco, CampoGrande, MS, sobre o tema “A gestão pedagógica do ensino e aprendizagem na sala de aula: continuidades e rupturas”. O projetoconta com financiamento parcial da FUNDECT-MS.

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Este texto faz parte da pesquisa desenvolvida no Programa de Pós-Graduação emEducação da Universidade Federal de Mato Grosso, intitulada Aprendizagem da docência dasprofessoras que atuam no 1º e 2º ciclos do ensino fundamental. Tal pesquisa objetivou investigara contribuição da formação contínua para a aprendizagem da docência. Participaram da pesquisaseis professoras que atuam no 1º ciclo do ensino fundamental em uma escola da rede públicaestadual, localizada no município de Várzea Grande/MT. Trata-se de uma pesquisa qualitativa emque lançamos mão de narrativa escrita e oral como instrumento para coleta de dados.

Neste texto, abordaremos a formação de professores, focalizando a formaçãocontínua, tendo como aporte teórico um conjunto de conceitos que permeiam a discussão naperspectiva da profissionalidade docente.

No primeiro tópico, apresentaremos alguns enfoques sobre a formação deprofessores, mais diretamente, a formação contínua. Em seguida, traremos alguns dados dapesquisa ora apresentada.

ALGUMAS CONTRIBUIÇÕES SOBRE FORMAÇÃO (CONTÍNUA) DEPROFESSORES

Vivemos atualmente, em uma sociedade considerada, por muitos teóricos, comopós-moderna, marcada pela inovação tecnológica e social; dessa maneira, o interesse sobre aformação de professores, nos últimos anos, ganhou destaque no campo da investigação entre osdiversos estudiosos educacionais internacionais e nacionais.

Existem diversas tendências históricas sobre a formação de professores. Algumasabordagens tomam, como referência, uma concepção mais crítica, mais reflexiva, que concebe oprofessor como profissional do ensino, ao passo que outras são mais tradicionais, com umavisão mais clássica, pautada na racionalidade técnica, ora positivista, ora empirista, que concebeo professor como um técnico, não considera o saber deste, só o saber científico.

O trabalho na escola ou em um sistema escolar, a partir de uma abordagem maiscrítica, mais reflexiva, requer novas e velhas concepções pedagógicas e uma nova culturaprofissional, forjada nos valores da colaboração e do processo social, considerado comotransformação educativa e social, em que o professor é um profissional do ensino e, como tal,pensa, executa, avalia etc., seu próprio trabalho pedagógico.

A FORMAÇÃO CONTÍNUA DAS PROFESSORAS DO 1ºCICLO DE UMA ESCOLA DA REDE PÚBLICA

ESTADUAL DO MUNICÍPIO DE VÁRZEA GRANDE/MT

DAMASCENO, Kelly Katia; MONTEIRO, Filomena Maria de A. (UFMT)

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Além disso, o saber do professor passa a fazer parte do corpo técnico, sendoconsiderado e aceito dentro da organização escolar e educativa.

A possibilidade de inovação nas instituições educativas não pode ser propostaseriamente sem um novo conceito de profissionalidade do professor, que deve romper com inérciase práticas do passado, assumidas, passivamente, como elementos intrínsecos à profissão. Essenovo conceito refere-se aos modos como a constante acomodação profissional vai permitindonovas maneiras de os sujeitos professores se entenderem como profissionais capazes dedesempenhar suas funções.

Neste sentido, para dialogarmos com as percepções e os sentimentos dosprofessores, assumimos o conceito de profissionalidade do professor ou profissionalidade docente,definido por Gimeno Sacristán (1995, p.65) como sendo “[...] a afirmação do que é específico naação docente, isto é, o conjunto de comportamentos, conhecimentos, destrezas, atitudes e valoresque constituem a especificidade de ser professor”. O autor fala-nos então de um conjunto deaspectos relacionados diretamente ao modo como os professores desempenham e organizamseu trabalho pedagógico, o que, logicamente, pressupõe os múltiplos conhecimentos capazes dedar sustentação às ações que eles desenvolvem; porém, a definição de profissionalidade não élinear, envolve diferentes concepções e abordagens de ordem sociológica, antropológica, histórica,ideológica, enfim, diversos olhares.

A partir desse conceito de profissionalidade, o professor e as condições de trabalhoem que exerce a profissão são o núcleo fundamental da inovação nas instituições educativas,tendo como objetivo primeiro da educação o de ajudar as pessoas a serem mais livres, menosdependentes das influências econômicas, políticas e sociais dominantes.

Assim, a profissionalidade do professor está diretamente ligada ao exercício desua prática profissional, a qual está condicionada por uma rede de relações de poder. Se a práticaé um processo constante de estudo, de reflexão, de discussão, de experimentação conjunta edialética com o grupo de professores, aproximar-se-á da tendência emancipadora, crítica,assumindo um determinado grau de poder, que repercute no domínio de si mesmo.

Desse modo, uma questão importante dentro da profissionalidade do professor énão se perder de vista que concepção de escola, ensino e currículo, tem-se em cada épocahistórica, pois, a partir disso, determinar-se-á que tipo de abordagem terá a formação deprofessores.

Para tanto, faz-se necessário pensar uma formação docente a incerteza, a fim delidar com a complexidade posta atualmente. Tudo isso envolve uma nova concepção de formaçãoinicial e contínua, de todos que intervêm no processo educativo.

No atual contexto social, econômico e político em que nos encontramos, há umagrande exigência de adequação do sistema educacional ao modelo econômico e tecnológico.Com isso, o conhecimento e a educação passam a ter uma grande importância, assim como aformação de professores se torna um campo de grande desafio.

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Nesse contexto, mudanças educacionais são necessárias e terão mais chancesde êxito com o apoio dos professores. Nóvoa (1992) defende que a mudança educacional dependedos professores e da sua formação, para que ocorra transformação das práticas pedagógicas nasala de aula.

O autor diz, ainda, que o desafio da formação de professores,

[...] consiste em conceber a escola como um ambiente educativo,onde trabalhar e formar não sejam actividades distintas. A formaçãodeve ser encarada como um processo permanente, integrado no dia-a-dia dos professores e das escolas, e não como uma função queintervém à margem dos projectos profissionais e organizacionais(McBride, 1989 apud Nóvoa, 1992, p.29),

Para Imbernón (2004), situar a profissão numa sociedade em mudança, com umalto nível tecnológico e um vertiginoso avanço do conhecimento, implica não apenas a preparaçãodisciplinar, curricular, mediadora, ética, institucional, coletiva, mas também uma importantebagagem sócio-cultural. Além de outros elementos que, até o momento, não pertenciam à profissão,como os intercâmbios internacionais, as relações com a comunidade, as relações com aassistência social etc. Assim, será necessário formar o professor na mudança e para a mudança.

Entretanto, muita proposta de formação encaminhada atualmente, não condiz coma perspectiva de formação na e para a mudança, percebe-se uma concepção de ensino comointervenção e investigação baseada no paradigma processo-produto, em que o professor éconcebido como técnico.

Assim, a formação de professores, pensada como acúmulo de conhecimentosteóricos para serem aplicados, posteriormente, na prática, pode ser condizente com uma propostade formação na lógica da racionalidade técnica, em que esses conhecimentos fazem parte de umconjunto de fatos, princípios, regras e procedimentos que se aplicam aos problemas instrumentais,em que a lógica da prática é considerada como “[...] um processo de preparação técnica, quepermite compreender o funcionamento das regras e das técnicas no mundo real da sala de aulae desenvolver as competências profissionais exigidas pela sua aplicação eficaz”. (Idem, p.108)

Desse modo, a lógica da racionalidade técnica, segundo Schön (1987, apud Pérez-Gómez, op.cit., p.109) pode distinguir-se por dois tipos de situações práticas e dois deconhecimento apropriado para atuar eficazmente. O primeiro tipo é constituído pelas situaçõesfamiliares, em que o profissional pode resolver os problemas mediante a aplicação rotineira dosprincípios, regras, procedimentos e técnicas do conhecimento profissional. O segundo é constituídopor situações que não lhes são familiar, nas quais o problema não está claramente definido e ascaracterísticas da situação não se ajustam perfeitamente às teorias e técnicas disponíveis. Nestecaso, a prática é a ocasião apropriada para aplicar procedimentos de pesquisa aprendidos nateoria e orientados pelas regras e fases do método científico: generalização, elaboração da hipótese,derivação lógica de proposições e definição operativa de variáveis, recolha de dados, verificaçãode hipótese, inferência.

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Dessa forma, o investimento na formação docente é imprescindível, mas não équalquer formação; tem que ser uma formação pautada em uma concepção de superação àlógica racionalidade técnica, ou seja, um pensamento e proposta de formação para que osprofessores possam refletir e agir sobre e na sua organização do trabalho pedagógico.

Mizukami et al. (2002, p.42) afirmam que as políticas no campo da formação deprofessores deveriam ter alguns princípios, tais como: - Docentes como sujeitos e não comobeneficiários. – Formação mais que treinamento. Em vez de receitas, o desafio está em pensaruma formação integral, não limitada à mera transferência de conteúdos, métodos e técnicas, massim, orientada, fundamentalmente, àquilo que se pede que os docentes alcancem com seusalunos: aprender a pensar, a refletir criticamente, a identificar e resolver problemas, a investigar, aaprender, a ensinar. Este seria, portanto, o significado dos termos educação e formação, concebidosdiferentemente de capacitação e treinamento.

Nesta perspectiva, a concepção de formação de professores adotada neste texto éde contínuo, ou seja, o desenvolvimento de uma vida toda, a partir da história pessoal e profissional,em que é constituída de aspecto cultural, social e econômico. Segundo Moita (1992, p.115),“Ninguém se forma no vazio. Formar-se supõe troca, experiência, interações sociais,aprendizagens, um sem fim de relações. [...] Um percurso de vida e assim um percurso deformação”; com isso, não podemos desconsiderar o percurso pessoal e profissional dosprofessores, muito pelo contrário, este percurso faz parte de seu desenvolvimento profissional.

Para Marcelo (1999, p.26), o conceito de formação de professores,

[...] é a área de conhecimentos, investigação e de propostas teóricase práticas que, no âmbito de Didáctica e da Organização Escolar,estuda os processos através dos quais os professores - em formaçãoou em exercício - se implicam individualmente ou em equipe, emexperiências de aprendizagem através das quais adquirem ou melhoramos seus conhecimentos, competências e disposições, e que lhespermite intervir profissionalmente no desenvolvimento do seu ensino,no currículo e da escola, com o objectivo de melhorar a qualidade daeducação que os alunos recebem.

O mesmo autor ainda traz um conjunto de princípios considerados importantes emrelação à formação de professores: 1) Concebe a formação de professores como um contínuo.2) A necessidade de integrar a formação de professores em processos de mudança, inovação edesenvolvimento curricular. 3) A intrínseca relação dos processos de formação de professorescom o desenvolvimento organizacional da escola. 4) A necessidade de articulação e integraçãoentre a formação de professores em relação aos conteúdos propriamente acadêmicos edisciplinares, e a formação pedagógica dos professores. 5) A necessidade de integração teoria-prática na formação de professores. 6) A procura do isomorfismo entre a formação recebida peloprofessor e o tipo de educação que posteriormente lhe será pedido que desenvolva. 7) A procurada individualidade como elemento integrante de qualquer programa de formação de professores.8) O questionamento de crenças e práticas institucionalizadas.

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Além desses princípios para a formação de professores, Marcelo busca em Deweytrês atitudes básicas importantes para se ter um ensino reflexivo; são elas

- Mentalidade aberta, ou seja, a ausência de preconceitos, deparcialidades e de qualquer hábito que limite a mente e a impeça deconsiderar novos problemas e de assumir novas idéias, e ainda, integrarum desejo activo de escutar mais do que um lado, de acolher osfactos independemente da sua fonte, de prestar atenção sem melindresa todas as alternativas, de reconhecer a possibilidade do erro mesmorelativamente àquilo em que mais acreditamos;- Responsabilidade, uma responsabilidade intelectual. Serintelectualmente responsável quer dizer considerar as consequênciasde um passo projectado, significa ter vontade de adoptar essasconsequências quando decorram de qualquer posição previamenteassumida. A responsabilidade intelectual assegura a integridade, istoé, a coerência e a harmonia daquilo que se defende.- Entusiasmo, descrito como a predisposição para afrontar a actividadecom curiosidade, energia, capacidade de renovação e de luta contra arotina. (Marcelo, 1992, p.62)

Essas atitudes, segundo Marcelo, se constituem em objetivos a serem alcançadospelos programas de formação de professores, mediante estratégias e atividades que possibilitema aquisição de um pensamento e de uma prática reflexiva.

Dessa maneira, a formação de professores, entendida como um conjunto de açõese atitudes que possibilitam o desenvolvimento pessoal e profissional dos professores, faz partede um sistema escolar em que se encontra uma concepção de escola, currículo e ensinodeterminado por e para uma sociedade.

No desenvolvimento pessoal e profissional docente, a discussão acerca formaçãocontínua, faz-se necessário, pois há alguns anos, não é privilegio só dos profissionais da educação,mas das diferentes áreas, devido à característica do mundo social (do trabalho) regido por altastecnologias e preconizado pela edificação da sociedade do conhecimento e de um novo tipo dehomem: o homo studiosus.

De fato, a profissão docente é uma das profissões que mais tem recebido solicitaçõespara manter-se atualizada, qualificada, em face da realidade social. Para isso, o investimento nacontinuidade dos estudos dos professores, na perspectiva do desenvolvimento profissional, temsido inquestionável e inevitável.

Com o investimento em formação contínua, espera-se que a prática pedagógicaseja transformada urgentemente, face a diversas críticas quanto à qualidade do ensino oferecidopela escola e à ineficiência em resolver determinados problemas pedagógicos (comuns ou não)no processo educativo.

No entanto, é temeroso esperar resultados, em curto prazo, desses investimentos.Para Nóvoa (1992), a formação quase nunca conduz, diretamente, à ação inovadora, e é precisoter consciência deste fato, se não quisermos cair em mistificações que nos dificultam umaapropriação interveniente das realidades educacionais.

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Neste sentido, a formação contínua é entendida como um processo educativopermanente de (des)construção de conceitos e práticas para corresponder às exigências dotrabalho e da profissão docente, inserindo-se, não como substituição, negação ou mesmocomplementação da formação inicial, mas como um espaço de desenvolvimento ao longo da vidaprofissional do professor, comportando objetivos, conteúdos, formas organizativas diferentesdaquela, e que tem seu campo de atuação em outro contexto, porquanto

[...] a formação continuada trata da continuidade da formaçãoprofissional, proporcionando novas reflexões sobre a ação profissionale novos meios para desenvolver o trabalho pedagógico. Assim,considera-se a formação continuada como um processo de construçãopermanente do conhecimento e desenvolvimento profissional, a partirda formação inicial e vista como uma proposta mais ampla, dehominização, na qual o Homem Integral, produzindo-se a si mesmo,também se produz em interação com o coletivo” (ANFOPE, 1994,apud Nunes, 2000, p. 9).

Candau (1996, p.143) aponta para uma nova concepção de formação contínua,embora com diferentes perspectivas, porém, de forma geral, com princípios de consenso entreos profissionais da educação. Tais princípios prescrevem que

- O locus da formação a ser privilegiado é a própria escola; isto é, épreciso deslocar o locus da formação continuada de professores dauniversidade para a própria escola de primeiro e segundo graus.(Atualmente Educação Básica).- Todo processo de formação tem de ter como referência fundamentalo saber docente, o reconhecimento e a valorização do saber docente.- Para um adequado desenvolvimento da formação continuada, énecessário ter presentes as diferentes etapas do desenvolvimentoprofissional do magistério; não se pode tratar do mesmo modo o pro-fessor em fase inicial do exercício profissional, aquele que já conquistouuma ampla experiência pedagógica e aquele que já se encaminhapara a aposentadoria; os problemas, necessidades e desafios sãodiferentes e os processos de formação continuada não podem ignoraressa realidade promovendo situações homogêneas e padronizadas,sem levar em consideração as diferentes etapas do desenvolvimentoprofissional.

Nesse sentido, Mizukami et al. (2002a, p.28) consideram que

A formação continuada busca novos caminhos de desenvolvimento,deixando de ser reciclagem, como preconizava o modelo clássico,para tratar de problemas educacionais por meio de um trabalho dereflexividade crítica sobre as práticas pedagógicas e de uma permanente(re) construção da identidade do docente.

Da mesma forma, Fusari (1998) contribui com o referencial, quando afirma que aformação contínua vai além de uma concepção de complementação; logo, a formação permanentedo professor é uma necessidade inerente à própria natureza dinâmica e contraditória do fazerpedagógico, ao partir do pressuposto de que é o professor que detém um conhecimento em

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primeira mão dos verdadeiros problemas da escola, e a escola (lugar de trabalho/profissionalidade)é o locus privilegiado e pólo desencadeador de formação contínua de professores.

Na perspectiva da escola como locus da formação contínua, Marcelo (1992, p.54)coaduna com o enfoque ao dizer que “uma formação contínua centrada na actividade cotidiana dasala de aula, próxima dos problemas reais dos professores, tendo como referência central otrabalho das equipes docentes, assumindo, portanto uma dimensão participativa, flexível e activa/investigadora”.

Assim, o modelo de formação contínua que privilegia somente a oferta de cursosde curta duração, oferecida pelas instituições de ensino superior ou por outras agências formadoras,tem sido criticado, por não contribuir com a efetiva alteração das práticas pedagógicas.

Segundo Mizukami et al.(2002b, p.192), considerar a escola como local de formação,em oposição à formação ocorrida somente em espaços das universidades ou em situaçõesdesvinculadas das vidas e culturas das escolas, parece ser compatível com a natureza dosprocessos de construção dos saberes docentes.

Sob tal ótica, a escola passa a ser entendida como local de teoria e da prática,ambiente de produção do saber docente, e a formação docente, como processo relacionado aoconceito de aprendizagem permanente, envolvendo os saberes e as competências docentescomo resultados de aprendizagens realizadas ao longo da vida, dentro e fora da escola,considerando outros espaços de conhecimento.

Fusari (2004, p.18) concorda com a forte tendência atual de valorizar a escolacomo o locus da formação contínua. Entretanto, diz que algumas condições existentes na escoladevem ser mantidas e outras ampliadas, tais como:

[...] a estrutura da carreira, a forma de contrato, a jornada de trabalho,a estrutura e a gestão escolar podem facilitar ou dificultar a implantaçãoe/ou implementação de projetos de formação contínua. [...] osprofessores da educação básica deveriam ser contratados (e,remunerados) para uma jornada de trabalho na qual teriam de atuar nadocência (aulas), em atividades pedagógico-administrativas, e ematividades de formação contínua em serviço na própria escola (nocoletivo) e fora dele. Além de grupos de formação, a escola poderiainstituir modalidades de formação. Algumas são muito conhecidas,como ciclos de palestras e grupos de estudo. (gripo do autor)

Além disso, o mesmo autor aponta, ainda, a necessidade da participação doseducadores em encontros e congressos regionais, estaduais e nacionais, nos quais conhecempessoas diferentes, autores, obras, trocam experiências, ampliam contatos, trocam materiaisetc., propiciando não só o enriquecimento profissional, mas também novas oportunidades para oenriquecimento pessoal e cultural dos educadores.

Diante do exposto sobre a formação de professores, traremos a seguir a análisede alguns apontamentos a partir das narrativas das pesquisadas.

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ALGUNS DADOS DA PESQUISA

Ao serem indagadas sobre a contribuição da formação contínua para a (re)construção da aprendizagem da docência, todas as professoras investigadas mencionaram quea formação contínua/cursos de capacitação contribuíram com a prática pedagógica.

Com a formação continuada é uma forma de você está adquirindonovos conhecimentos, e também os transmitindo. Os cursoscontribuíram, porque através deles adquiri novos conhecimentos.(Luz)(NE11)

A formação continuada é sempre bem vinda para teoria e prática emelhoria da qualidade do ensino. Os cursos são para você discutiridéias, interagir informações, e melhorar a prática em sala de aula.(Aruak) (NE1)

Com a evolução da tecnologia necessitamos estar a cada dia nosinovando, e é somente nos cursos de capacitação que aprendemosnovas teorias que irão contribuir na melhoria de nossa práticapedagógica. (Helena) (NE1)

Os cursos de capacitação nos levam a fazer uma reflexão de nossaprática pedagógica e assim procurarmos mudar a nova maneira detrabalhar em sala de aula com os nossos alunos. (Laura) (NE1)

Alguns cursos que já participei me ajudaram muito, mas não são todos,aqueles que você vai lá, e é só blá, blá, blá, não adianta. É bomquando você participa de um curso que depois lá na sala de aula dápra por em prática. (Emanuele) (NE1)

A formação continuada é importante porque a gente tem que estarsempre inovando para ter uma boa formação. Os cursos que participoajudam muito, não saberia trabalhar se não fizesse os cursos. Aprendia prática e a cada curso você aprende mais. (Vitória) (NE1)

As professoras pesquisadas enfatizam, como formação contínua, os vários cursosde capacitação de que elas vêm participando ao longo da carreira profissional; buscam, nessescursos, a melhoria da prática docente. Entretanto, ressaltamos, conforme mencionamos no itemanterior, que não é qualquer curso de capacitação que contribui efetivamente para a mudança emelhoria da prática docente. Mizukami et al. (2002a) apontam que cursos de curta duração,quando muito, fornecem informações que, algumas vezes, alteram apenas o discurso dosprofessores e pouco contribuem para uma mudança efetiva. Nessa perspectiva, segundo Nunes(2000), a formação contínua deveria proporcionar novas reflexões sobre a ação profissional enovos meios para desenvolver o trabalho pedagógico.

Ainda sobre a formação contínua, os relatos que se seguem revelam que o ProgramaGestar2 contribuiu, em diferentes aspectos, para as pesquisadas,

O Gestar foi um dos primeiros que comecei e fui até o fim. O Gestareu gostei. Nós trabalhamos em grupo, e eu era insegura demais, tinhamedo até de falar. E com ele eu aprendi a me expressar, se fosse pra

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eu ir lá na frente eu não ia, não gostava, e através do Gestar com ascolegas eu comecei [...] (Helena)(NO2)3

O que eu aprendi mais foi com o Gestar, cada livro que a gente estudava,a gente tinha uma tarefa e poderia trabalhar na sala de aula. Eu trabalhomuito com o material do Gestar. O Gestar deu continuidade ao PROFA,com a escola ciclada teve um inicio, com o conhecimento do Gestarcompletou o trabalho iniciado no PROFA. (Vitória) (NO2)

O Gestar foi um curso que fiz e gostei muito. Teve didática, metodologia,que considero importante para ajudar melhorar nossa prática. O Gestarfoi maravilhoso, me ajudou muito. E da experiência de ter sido formadora.Ali mesmo também era interessante porque as sugestões partiam detodos, cada um trazia, falava de sua experiência, era uma troca, ondeaprendíamos também. A melhor formação que tive foi a do Gestar.(Aruak) (NO2)

Eu aprendi muito no Gestar. O que eu mais aprendi é a forma detrabalhar. As mudanças de como trabalhar. São as mudanças queconstantemente estão ai, e a formação continuada trás tudo isso, ojeito de trabalhar a maneira de trabalhar. Estou querendo dizer dametodologia, porque, não adianta nada você fazer um curso, e quandovolta para sala de aula, você esta estabilizada [...] Até mesmo o meupapel enquanto formadora me ajudou muito a melhorar a abrir minhacabeça. (Luz) (NO2)

Eu aprendi muito com o Gestar. Porque ali você fazia oficina. Tinha aparte teórica, mas também tinha a parte prática. (Laura) (grifo nosso)(NO2)

Sobre o Programa Gestar, o espaço da escola foi utilizado para os encontrosquinzenais. O curso foi dividido em quatro (04) módulos, e cada módulo com dois (02) livrosdenominados de TP (teoria e prática), intercalando momento de discussão e atividades dematemática e língua portuguesa, totalizando uma carga horária de 200 horas. As formadoras doGestar foram duas professoras que participaram da capacitação oferecida pelos técnicos daSecretaria de Educação, mesmo sem terem a formação específica (licenciatura em Letras e emMatemática) exigida pelo Programa.

Os relatos das professoras sobre o Gestar revelaram diferentes aspectos que fo-ram, particularmente, significativos para cada uma delas. No caso da professora Helena, adimensão pessoal teve um enfoque maior, quando diz que o curso ajudou-a a se expressar melhordiante dos outros colegas. As outras professoras enfatizaram a metodologia do Gestar comosendo significativa para a prática docente. Para as professoras Aruak e Luz, a participação noGestar foi importante também pelo fato de terem sido elas as formadoras do grupo. Assim, essefato acaba contribuindo com a construção/reconstrução de suas aprendizagens da docência.Outro fato que talvez contribui com a formação dessas professoras esteja relacionado com olocus da formação. Ou seja, neste caso o espaço da escola.

A professora Laura, em sua narrativa, amplia o relato quando traz um aspectoimportante sobre a formação contínua, ou seja, que os próprios professores são responsáveis, decerta forma, por sua formação. Para alguns autores (Mizukami et al., 2002, Marcelo, 1999) esse

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aspecto é essencial nas propostas de formação de professores. A narrativa dessa professoratraz o que Merriam e Caffarella (in Marcelo, 1999, p.53) afirmam que é “aprendizagem autônoma”;esta aprendizagem se refere ao

modo como a maior parte dos adultos adquire novas idéias,competências e atitudes... devido ao fato de serem aqueles queaprendem, que têm a principal responsabilidade de planificação,desenvolvimento e avaliação das suas próprias experiências deaprendizagem.

Este autor ainda cita Knowles, que diz que “a aprendizagem autônoma não é umprocesso isolado, muito freqüentemente exige colaboração e apoio entre os que aprendem,professores, recursos, pessoas e companheiros” (idem, p.53). Desse modo, a aprendizagemautônoma está imbricada pela dimensão pessoal e pela troca de experiência com outros.

A análise dos dados nos revelaram que as pesquisadas constroem/reconstroemsuas aprendizagens da docência, a partir de experiências vivenciadas na formação docente,principalmente na formação contínua, em que o locus foi a própria escola. Nesta perspectiva deformação contínua, o Programa Gestar foi o mais citado nas narrativas das professoras.

No entanto o desafio da formação continua permanece, ou seja, não só de buscade estratégias que possam enriquecer a metodologia do professor, como também contribuiçõesteóricas que possam elucidar as situações vividas na prática docente.

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NOTAS

1 1ª narrativa escrita.2 GESTAR – Programa de Gestão de Aprendizagem Escolar. Foi pelo MEC para melhorar o desempenho dos alunos nas disciplinasde Matemática e Língua Portuguesa. A formação continuada de professores utiliza recursos de educação a distância com momentospresenciais e atende professores de 1ª a 4ª série de escolas públicas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.3 Narrativa oral.

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O objetivo deste trabalho consiste na apresentação de algumas reflexões acercada formação do professor, alicerçadas nas contribuições da pedagogia histórico-crítica, expressãoteórica do marxismo no campo da educação.

As idéias aqui trabalhadas contrapõem-se às veiculadas pelas pedagogiascontemporâneas, especialmente a formação reflexiva (ALARCÃO, 1996; CANDAU, 1996; GIESTA,2005; GIOVANNI, 2003; MIZUKAMI, 2002; NÓVOA, 1997; PÉREZ GOMEZ, 1997; PERRENOUD,2002; ZEICHNER, 1993; e outros), cuja fundamentação teórica encontra-se na chamadaepistemologia da prática (SCHÖN, 1997), que tem lugar nas pesquisas e nas políticas propostaspara a formação inicial e continuada de professores em nosso país (BRASIL, 1998, 2006).

Em linhas gerais, a formação reflexiva compreende a prática profissional comolocus original de formação e de produção de saberes e de competências, o que justificaria aênfase na valorização dos conhecimentos experienciais em processos formativos.

[...] mais que conteúdos, disciplinas e pesquisa universitária, doravantesão os saberes da ação, os docentes experientes e eficazes, e aspráticas profissionais que constituem o quadro de referência da novaformação de professores (BORGES e TARDIF, 2001, p. 16)

O fenômeno da valorização da prática na formação docente vem sendo associadopor pesquisadores, tais como Pereira (2000), Imbernón (2001), Mizukami (2002), e outros, aoevento da complexidade das relações sociais, políticas, econômicas e culturais que caracterizariama sociedade do século XXI, cuja marca essencial seria a competitividade e a produção e divulgaçãode novos conhecimentos de forma acelerada e vertiginosa. Nesse contexto, “a concepção deconhecimento científico nocional e imutável como substrato para a educação” (MIZUKAMI, 2002,p. 11) teria sido superada por uma perspectiva mais complexa de base interacionista, queresponsabilizaria os próprios sujeitos pela construção de conhecimentos em situações de interaçãocom um ambiente plural.

Essa visão obriga superar a concepção de saber escolar como conjuntode conhecimentos eruditos, valorizados pela humanidade (ou seja,um saber de classe), para aderir a uma perspectiva mais complexa, ada formação do cidadão nas diversas instâncias em que a cidadaniase materializa: democrática, social, solidária, igualitária, interculturale ambiental. Essa perspectiva amplia e re-significa a concepção dosaber escolar [...], colocando-o em diálogo com a realidade objetivaem que as práticas sociais se produzem. (MIZUKAMI, 2002, p. 12)

A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA PERSPECTIVADA PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA

MAZZEU, Lidiane Teixeira Brasil (UNESP/Araraquara)

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Desse modo, os “conhecimentos eruditos”, “valorizados pela humanidade” – edesqualificados sob a justificativa de se tratarem de “um saber de classe” –, não seriam capazesde responder aos desafios colocados pela nova configuração da educação “de caráter maisrelacional, mais dialógico, mais cultural-contextual e comunitário” (IMBERNÓN, 2001, p. 07). Taisdesafios exigiriam um modelo de formação docente cuja concepção superasse o modelo da“racionalidade técnica”, compreendida como o domínio dos conteúdos e de suas técnicas detransmissão. Trata-se, então, “de considerar a chamada racionalidade prática como mais capazde fazer frente à situação assim caracterizada” (MIZUKAMI, 2002, p. 12).

Nosso questionamento a essa epistemologia refere-se à primazia da prática e àsecundarização dos conteúdos teórico-científicos nos processos de formação docente que, emgrande medida e à revelia de sua intenção, têm reforçado a dicotomia entre teoria e prática nodesenvolvimento do trabalho educativo (MAZZEU, 2007).

Consideramos que a superação da dicotomia entre teoria e prática não está naaproximação dos processos formativos ao cotidiano escolar, mas na necessidade de abstraçãodessa realidade para a efetiva compreensão da totalidade dos fenômenos que interferem no trabalhoeducativo em busca da concretização de sua essencialidade. Nesse sentido, defendemos a reflexãofilosófica e o conhecimento científico como essenciais à formação do educador.

Procederemos, a seguir, à apresentação da compreensão da educação escolar napedagogia histórico-crítica para discutir o papel do educador e de sua formação no desenvolvimentodo trabalho educativo.

O PAPEL DA EDUCAÇÃO ESCOLAR NA FORMAÇÃO DOS INDIVÍDUOS

A pedagogia histórico-crítica compreende o ato educativo como um processo dehumanização dos indivíduos devendo ser, portanto, ato consciente e intencional de produção ereprodução da humanidade histórica e coletivamente construída pelos homens, em cada indivíduosingular. Isso porque, diferentemente dos demais animais, o homem necessita produzircontinuamente sua própria existência por meio de sua atividade essencial: o trabalho (SAVIANI,2003).

De acordo com Duarte (1993), o trabalho é a atividade por meio da qual o homemse apropria da natureza e a transforma criando os meios necessários para a satisfação de suasnecessidades básicas de existência. Na medida em se apropria e transforma a natureza de modointencional, o homem nela se objetiva criando uma realidade humana, o que Saviani (2003)categoriza como o “mundo da cultura”.

É, portanto, por meio da própria atividade de produção e reprodução de suaexistência que o homem humaniza a si mesmo numa relação dinâmica entre apropriação eobjetivação que se efetiva na produção de instrumentos e objetos, usos e costumes, significações,relações sociais, conhecimentos, linguagem etc. Tais objetivações, ao se tornarem constituintesda realidade humana, do “corpo inorgânico”1 do homem, passam a ser, também, objeto de

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apropriação pelo próprio homem (DUARTE, 1993).

Cada indivíduo, para se objetivar enquanto ser humano, enquanto sergenérico, precisa se inserir na história. Isso não pode ser compreendidocomo um ato de justaposição externa, mas como uma necessidadedo próprio processo de formação do ser do indivíduo, ou seja, o indivíduo,para se constituir enquanto um ser singular, precisa se apropriar dosresultados da história e fazer desses resultados “órgãos de suaindividualidade”. (DUARTE, 1993, p. 40)

Podemos afirmar a partir dessas considerações que o processo de formação doindivíduo é em essência um processo educativo. O fato de o gênero humano ser externo aohomem impõe a necessidade da apropriação da cultura humana para que o indivíduo possa objetivarsua própria existência.

Assim sendo, Saviani (2003) afirma, ao definir a especificidade da educação esco-lar, que os elementos da cultura humana não a interessam em si mesmos, mas enquanto há anecessidade de que os homens os assimilem como condição para a produção e reprodução dopróprio homem, do gênero humano. Trata-se aqui de analisar o processo educativo como parteda dialética entre continuidade e ruptura na transmissão das “forças essenciais humanas” àsnovas gerações de seres humanos.

Tendo em vista que a humanidade se desenvolve por meio de um processo histórico,ao mesmo tempo em que a nova geração é determinada e dependente das gerações anteriores,já que herda os meios de existência dessas gerações – “um modo de produção, com osrespectivos meios de produção e relações de produção” –, a nova geração é também responsávelpela transformação desses meios, operadas justamente sobre as bases das produções herdadas,o que impõe a transmissão e a assimilação desses elementos como condição para a criação donovo. Nesse contexto, cabe à educação “possibilitar que as novas gerações incorporem oselementos herdados de modo que se tornem agentes ativos no processo de desenvolvimento etransformação das relações sociais” (SAVIANI, 2003, p. 143).

Desse modo, as duas questões centrais da pedagogia, compreendida como oprocesso por meio do qual o homem se tornam “plenamente humano”, referem-se ao problemada seleção dos conteúdos a serem ensinados e ao problema das formas, dos métodos e dosprocessos que tornem possíveis a transmissão e a assimilação desses conteúdos, dessessaberes, visando a formação e o desenvolvimento do educando no contexto da prática socialglobal.

No que se refere ao primeiro aspecto, isto é, à identificação dos elementos culturaisa serem assimilados pelos indivíduos humanos, Saviani (2003) postula a necessária compreensãodo conceito de clássico como categoria indispensável para a seleção dos conteúdos do trabalhoeducativo. No sentido expresso pelo autor, clássico é “aquilo que se firmou como fundamental,como essencial” (SAVIANI, 2003, p. 13) na cultura humana, resistindo aos embates do tempo. Énesse sentido que o autor afirma, quanto à especificidade da educação escolar, que “clássico na

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escola é a transmissão-assimilação do conhecimento” (SAVIANI, 2003, p. 18).O segundo aspecto refere-se à descoberta e à organização dos meios, isto é,

“conteúdos, espaço, tempo e procedimentos” (SAVIANI, 2003, p. 14) por meio dos quais, cadaindivíduo singular poderá se apropriar progressivamente dos elementos clássicos e essenciaispara a constituição de seu processo de humanização. Nesse sentido, o saber sistematizado nãobasta para a existência da escola, sendo igualmente necessária a criação das condições detransmissão-assimilação desse saber. Trata-se da transformação do saber elaborado em saberescolar, dosado e seqüenciado com a finalidade de viabilizar sua transmissão e assimilação,permitindo que o educando adquira gradativamente e o mais possível, tanto o domínio do saberelaborado, quanto o modo como se produz esse saber.

É necessário observar que nessa concepção de educação a primazia não é dadaao conhecimento espontâneo, assistemático, fragmentário, desarticulado. A pedagogia histórico-crítica considera a educação escolar como a forma mais desenvolvida de formação alcançadapelo processo histórico de desenvolvimento do gênero humano, que se encontra ligada, desde asua origem (como expressão da modernidade), à necessidade de generalização do conhecimentosistematizado, científico.

Não se trata, portanto, de negar o caráter essencial da educação escolar napromoção do saber científico, menos ainda, sua finalidade de preparar os indivíduos para osenfrentamentos postos pela prática social, mediante os avanços técnicos e científicos alcançadospelo desenvolvimento histórico do gênero humano. Trata-se de defender um posicionamento afavor da efetiva socialização desses saberes, retirando-os da esfera da lógica privada, do âmbitoexclusivo dos detentores dos meios de produção, para promover de forma efetiva e igualitáriatodos os indivíduos humanos.

Sendo assim, o trabalho educativo, considerado como atividade mediadora nocontexto da prática social, deve ser compreendido e realizado de forma intencional, regido pelafinalidade de garantir a universalização das máximas possibilidades geradas pelo processo históricode desenvolvimento do gênero humano a todos os indivíduos, indistintamente, o que implica aconcretização da socialização do saber elaborado e da instrumentalização do acesso a essesaber de modo a contribuir de forma afirmativa para a prática social dos educandos.

O TRABALHO EDUCATIVO E A FORMAÇÃO DO EDUCADOR

Tendo em vista o papel da educação escolar e do trabalho educativo na pedagogiahistórico-crítica é imperativo compreender o papel da formação do educador para que esteestabeleça uma relação consciente com o significado de sua atividade, isto é, com o compromissohistórico que a tarefa de preparar as novas gerações demanda tanto no que se refere à formaçãodo educando como indivíduo singular, quanto no que refere à produção e reprodução da própriasociedade.

De acordo com a pedagogia histórico-crítica, a formação docente deve estar

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fundamentada em bases teóricas sólidas apoiadas na reflexão filosófica e no conhecimentocientífico como condição para a efetiva compreensão do homem como síntese de múltiplasdeterminações, assim como das vinculações do trabalho pedagógico no contexto da prática so-cial (SAVIANI, 1995).

Conforme Saviani (1996), a reflexão filosófica possibilita ao educador a superaçãode uma compreensão sobre a prática pedagógica concebida de forma fragmentária, incoerente,desarticulada e simplista, porque guiada pelo senso comum, por uma compreensão unitária,coerente, articulada, intencional e cultivada, porque guiada pela consciência filosófica. Trata-se deuma reflexão crítica sobre os problemas que se apresentam na realidade educacional,fundamentada em um método de análise que atenda às exigências sintetizadas pelo autor nascategorias: radicalidade, rigor e globalidade. Sendo a pedagogia histórico-crítica expressão teóricado marxismo no campo da educação, essas categorias devem ser compreendidas a partir doreferencial teórico-metodológico que as fundamenta.

Conforme o materialismo histórico-dialético, não há como compreender osfenômenos humanos e sociais em sua totalidade ignorando o contexto histórico no qual sedesenvolvem em suas múltiplas determinações. Desse modo, os problemas que se apresentampara a prática educativa devem ser investigados, analisados e compreendidos à luz da perspectivahistórica e crítica, para a qual o conhecimento da realidade não se dá pela experiência imediata,mas por meio de abstrações que permitam o estudo de sua gênese, assim como dos fatores queinfluenciaram e determinaram seu desenvolvimento. O método dialético analisa, portanto, ascontradições existentes entre a essência e a aparência, investigando as relações entre as partesde forma a compreender o fenômeno em sua totalidade (KOSIK, 1976).

Esse mesmo percurso deve ser seguido pela reflexão filosófica preconizada paraa formação do professor. A categoria de radicalidade diz respeito ao necessário aprofundamentopara se chegar às raízes, aos fundamentos do problema que se apresenta como objeto de reflexãoao educador. Uma visão superficial, pautada em impressões imediatas, imprecisas e fragmentárias,não basta para analisar criticamente as situações e circunstâncias que se apresentam ao trabalhoeducativo. É necessário que se vá ao fundamento, às bases que dão sustentação ao problema eque determinam sua manifestação como fenômeno na realidade.

Essa categoria pauta-se na concepção de crítica radical preconizada por Marx emA Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, na qual o autor afirma que “ser radical é agarrar ascoisas pela raiz” (MARX, 2005, p. 151). Nesse sentido, a essência de um fenômeno só pode sercompreendida por meio do estudo de sua gênese, analisando como se deu seu desenvolvimentoe identificando quais fatores condicionaram sua manifestação.

Duarte (2001) destaca, como um exemplo desse tipo de pensamento, a análisecrítica desenvolvida por Vigotski acerca dos fundamentos filosóficos da obra de Piaget. Conformeo autor, Vigotski assume a atitude metodológica de não diluir sua análise nos aspectos particularesdos experimentos realizados e dos dados apresentados por Piaget. Vigotski procura analisarcriticamente os fundamentos, o núcleo central da teoria piagetiana, evidenciando as posições

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teóricas e filosóficas do autor, ou a ausência delas. Essa atitude, que permitiu a Vigotski abalar aspróprias estruturas da teoria por ele analisada, deve ser tomada, segundo Duarte (2001), comoexemplo do tipo de pensamento necessário aos educadores marxistas nos dias atuais,especialmente frente ao ecletismo tão em voga nas teorias pedagógicas do “aprender a aprender”2.

A categoria de rigorosidade responde à exigência de procedimentos sistemáticose metódicos para o desenvolvimento da análise, com a finalidade de questionar conclusões desenso comum e generalizações apressadas ensejadas por concepções abstratas de formaçãohumana.

De acordo com Lukács (1974) a rigorosidade é uma exigência do marxismoortodoxo. A ortodoxia diz respeito, exclusivamente, ao método dialético que deve ser adotado,desenvolvido e aprofundado no mesmo sentido e com a mesma rigorosidade de seus fundadores,evitando-se tanto o dogmatismo quanto o ecletismo que caracterizam todas as tentativas realizadaspara “superá-lo” ou “melhorá-lo”. Nesse sentido, podemos destacar o esforço dos pesquisadoresda pedagogia histórico-crítica em colocar suas pesquisas a serviço da construção de umapedagogia marxista, seguindo rigorosamente os fundamentos teórico-metodológicos da dialéticamarxista nas análises sobre os fenômenos educacionais.

A categoria de globalidade responde à necessidade de um exame do problema emseus múltiplos aspectos e determinações, ou seja, uma visão de conjunto na qual o problemadeve ser analisado em relação aos demais aspectos do contexto no qual se encontra inserido.

Conforme Kosik (1976), a realidade ou a essência do fenômeno não se apresentade modo imediato ao homem, mas apenas de modo mediato, isto é, por meio da investigação eda elucidação das relações existentes entre a essência e o fenômeno, entre o todo e as partes.Em outras palavras, a apropriação da realidade pelo pensamento só é possível pela mediação dateoria. Assim sendo, o autor afirma que o fenômeno possui uma estrutura própria que pode serrevelada e descrita a partir da análise de seus fundamentos e de suas determinações, possibilitandoa compreensão do mesmo em sua totalidade.

Considerando que a compreensão da realidade não se dá de modo imediato, aanálise dos problemas educacionais deve, portanto, seguir o princípio da investigação dialética,buscando compreender a realidade de cada fenômeno como um momento do todo, como síntesede múltiplas determinações e em sua globalidade.

Conforme Saviani (1996), essas categorias não são auto-suficientes nem devemser compreendidas como justaposições cuja somatória permitiria o surgimento da reflexãofilosófica.

A profundidade [radicalidade] é essencial à atitude filosófica do mesmomodo que a visão de conjunto [globalidade]. Ambas se relacionamdialeticamente por virtude da íntima conexão que mantém com o mesmomovimento metodológico, cujo rigor [criticidade] garante ao mesmotempo a radicalidade, a universalidade e a unidade da reflexão filosófica.(SAVIANI, 1996, p. 17-18)

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Trata-se, portanto, de uma reflexão pautada no método dialético que possibilita aoeducador o desenvolvimento da capacidade de refletir com profundidade e rigorosidade sobre osproblemas educacionais. Tal atividade tem como finalidade favorecer a compreensão dessesproblemas em sua totalidade, bem como a análise dos condicionantes do trabalho educativo parao encaminhamento de possibilidades efetivas para a formação do educando, considerando aconcepção histórico-social de formação humana (SAVIANI, 1996).

Nesse sentido, o conhecimento científico (o saber clássico) se apresenta comoinstrumento valioso para o desenvolvimento do trabalho educativo, tanto no que se refere àcompreensão da realidade na qual se efetiva a prática pedagógica, tendo em vista as finalidadese os objetivos da educação escolar, quanto no que se refere ao próprio conteúdo do conhecimentocientífico, como instrumento direto de formação humana.

Sendo assim, a atividade educativa comprometida com os objetivos e finalidadesda educação escolar, tal como concebida pela pedagogia histórico-crítica, não prescinde de umaformação do educador com bases sólidas, fundamentada em conhecimentos científicos. Taisconhecimentos orientam as análises e proposições acerca do desenvolvimento do trabalhoeducativo, o qual implica a transmissão-assimilação desses conhecimentos de forma sistemática,direta e intencional, tendo em vista a formação do homem como ser genérico, conhecedor darealidade concreta que determina sua existência na sociedade de classes, bem como daspossibilidades de transformação consciente dessa realidade.

No entanto, a classe dominante vem se apropriando desse conhecimento ecolocando-o a serviço de seus próprios interesses, promovendo o esvaziamento da educaçãoescolar pública destinada à classe dominada. Como conseqüência, temos que a formação doeducador também vem sendo esvaziada por concepções que se fundamentam na epistemologiada prática que, ao estabelecer a primazia da prática, propõe o cerceamento da formação doeducador ao âmbito da cotidianidade, o que a nosso ver, configura-se como um retrocesso para aformação intelectual3.

O próprio fenômeno da formação continuada pode ser visto como o resultado deum processo histórico de empobrecimento cultural do professor justificado pelo esvaziamento daeducação escolar e pelas necessidades de formação de indivíduos adaptados à lógica do capital,que alcançou dimensões consideráveis nas políticas educacionais implementadas nos últimosanos no Brasil.

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NOTAS

1 As características do gênero humano não são dadas ao homem, isto é, não são transmitidas pela herança genética, masresultantes das atividades produzidas pelos homens durante seu processo de desenvolvimento. São, portanto, característicashistóricas e sociais. As categorias de “corpo inorgânico” em Duarte (1993) e de “segunda natureza” em Saviani (2003) correspondema essas características externas ao corpo biofísico do homem e que precisam ser produzidas e reproduzidas como garantia desobrevivência tanto do indivíduo, como do próprio gênero humano.2 Sobre a crítica às pedagogias do “aprender a aprender”, vide Duarte (2001; 2003).3 A propósito do esvaziamento do trabalho do professor vide Facci (2004).

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INTRODUÇÃO

A constatação da existência de crianças que apresentam dificuldade naaprendizagem aponta a necessidade do conhecimento de situações escolares onde aaprendizagem não se realiza, quais as conseqüências da vivência de fracasso escolar e a melhormaneira de o professor intervir para reverter o quadro desolador no qual se encontram essascrianças. Faz-se também necessário um maior domínio teórico da especificidade do processo deescolarização e das vivências do contexto escolar.

REFERENCIAL TEÓRICO

Dificuldade de Aprendizagem

O fato de existirem crianças que não conseguem alcançar sucesso na aprendizagemescolar sempre incomodou os estudiosos das diversas áreas do saber. Muitos deles, segundoCampos (1997), analisando os problemas de aprendizagem, chegaram a variados termos edefinições.

Para a autora, os termos mais utilizados na escola são dificuldade ou problema deaprendizagem. A dificuldade de aprendizagem refere-se a alguma desordem na aprendizagemgeral da criança e provém de fatores reversíveis e normalmente não tem causas orgânicas. Nãoé um termo que pode ser considerado sinônimo de déficit intelectual ou mesmo deficiência men-tal.

García (1998), em seus estudos, considera algumas áreas do conhecimento, aoreferir-se às dificuldades na aprendizagem: as dificuldades de aprendizagem da linguagem (DAL),as dificuldades de aprendizagem da leitura e escrita (DALE) e as dificuldades de aprendizagemda matemática (DAM).

Dentre as dificuldades de aprendizagem, Pelegrini e Golfeto (1998) especificam osTranstornos Específicos do Desenvolvimento das Habilidades Escolares – TEDHE, nos quais háuma perturbação na normalidade de habilidades da criança desde muito cedo, prejudicando a suacompetência acadêmica. Manifestados já nos primeiros anos de escolaridade, um de seus

A FORMAÇÃO DOCENTE COMO FATOR DEREVERSÃO DO INSUCESSO ESCOLAR DOS ALUNOS

DO ENSINO FUNDAMENTAL

CRUZ, Sônia Aparecida Belletti (Mestre em Educação Escolar, Professora PEBII, Vice-Diretorade Escola Pública Estadual); STEFANINI, Maria Cristina Bergonzoni (FCLAR/UNESP)

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diagnósticos importantes é diferenciar os transtornos sem causas neurológicas, daqueles quesão delas provenientes, como a paralisia cerebral.

Estão relacionados a dificuldades da criança em articular os fatores biológicos,psicológicos e sociais e, segundo os autores, estão presentes mais nos meninos do que nasmeninas.

Para estes autores, os TEDHE muitas vezes estão associados a síndromes, comoo Transtorno de Déficit de Atenção, Transtorno de Conduta ou Transtornos Específicos dodesenvolvimento da fala e da linguagem.

Já na perspectiva do fracasso escolar estar relacionado ao aluno, às suas condiçõesinternas de aprendizagem, Weiss (1997) enfoca o histórico pessoal e familiar da criança. Essaperspectiva é, normalmente, considerada pela escola como a causa da maioria dos casos debaixo desempenho escolar, pois muitas crianças vêm de lares desestruturados, com pais quenão acompanham os estudos dos filhos e os próprios alunos não têm interesse em aprender.

Pesquisas de Jacob; Loureiro (1986) e Machado; Marturano; Loureiro; Linhares eBessa (1984) indicam que, em relação ao desenvolvimento escolar, essas crianças demonstramdificuldade na interação social ao confrontar-se com novas situações em seu cotidiano, além deserem menos curiosas e criativas. Os estudos mostram que essas crianças parecem demonstrarpouca capacidade adaptativa tanto em casa, como na escola, isto é, apresentam dificuldade emadaptar-se aos dados da realidade que as cerca, comprometendo as possibilidades de seudesenvolvimento cognitivo e emocional.

Formação de Professores e aprendizagem dos alunos

Quando observamos uma sala de aula e constatamos a presença de crianças queapresentam baixo desempenho em relação à leitura, à escrita e à interpretação e resolução deproblemas matemáticos, fica fácil comprovar a importância do papel do professor para reverteresse quadro de insucesso escolar.

A respeito da ação docente, muito se questiona a relação entre competência eamor que o professor estabelece no seu fazer cotidiano. Kramer e André (1984), citando Mello,mencionam que “as professoras que não sabem o que fazer, amam”. As autoras mostram que aforte relação afetiva estabelecida pelo professor com os alunos e as suas manifestações deidentificação com as crianças no auxílio do cumprimento das tarefas e no estabelecimento denormas disciplinares contribuem, muitas vezes, para o sucesso escolar dos alunos.

Campos (1997) salienta que os cursos de formação de professores devemapresentar qualidade e valorizar o papel desse profissional no contexto de sala de aula. Ele deveformar-se para ser um docente reflexivo sobre os problemas de cada situação cotidiana, semdeixar de apoiar-se em estudos e pesquisas de fundamentos científicos.

Para Marcelo (1998), quando o professor intervém na aprendizagem do aluno, alémde processar o conhecimento-na-ação (aquele conhecimento dinâmico e espontâneo sobre como

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fazer as coisas), ele processa a reflexão-na-ação, que é o seu pensar sobre o que está fazendoenquanto faz. É a sua atuação consciente que inclui improvisação, combinação e recombinaçãode elementos de uma certa situação.

Buscando compreender a maneira como ocorre a prática pedagógica, a autonomiae a identidade profissional do professor e como ele resolve problemas e conflitos encontrados nocontexto escolar, Chakur (2002) apresenta os níveis de profissionalidade docente: no Nível I, oprofessores demonstra profissionalidade fragmentada, com desvio de identidade e práticapedagógica com rotinas cristalizadas, levando à resistência de mudanças; suas atitudes sãorepressivas e descomprometidas com a aprendizagem dos alunos; aceita desvios de função. NoNível II, os professores encontram-se com semi-identidade, prática mais flexível, presa ainda àspráticas tradicionais; seus esquemas começam a descristalizar. Nível III, os professores mantém-se com autonomia responsável e identidade profissional; mais flexíveis, adequam a matéria aonível do aluno e são criteriosos na utilização do material didática; utilizam soluções políticas,cooperativas e inovadoras, baseadas na reflexão.

Para Marin (1996) é preciso que os cursos de formação de professores adotemum paradigma com fundamentos histórico e social, para que busquem levantar histórico de vida,processo de socialização, expectativas, crenças, valores, enfim, as representações iniciais dosalunos (futuros professores), que deverão ser articuladas com os conteúdos do próprio curso,incorporando neles “uma concepção mais ecológica que permita a articulação das vivências dosalunos com um projeto político pedagógico de curso em que os desejos que temos em relação àformação de professores se concretizem” (p. 163).

Considerando que a eficiência da intervenção do professor junto aos seus alunosestá estreitamente relacionada à qualidade de sua formação, nosso trabalho tem como objetivosaber o que dizem os professores sobre seu trabalho em sala de aula e sua relação com osalunos com dificuldades de aprendizagem, bem como, compreender a influência da formação doprofessor sobre suas ações no ambiente escolar.

METODOLOGIA

Nosso trabalho é um estudo descritivo, de caráter qualitativo, embasado nos moldesapresentados por Selltiz e col. (1965), Lüdke e André (1986), Triviños (1992) e Minayo (1998).Consta da descrição e interpretação dos resultados obtidos por meio de entrevista semi-estuturada,com questões abertas, realizada com oito professores do Ensino Fundamental numa escola públicaestadual, situada no centro da cidade de Araraquara - SP.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os depoimentos dos professores foram organizados em categorias para quefizéssemos a análise qualitativa.

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a) Como é a relação do professor com seus alunos

Nesta categoria, os professores consideram bom o relacionamento deles com ascrianças com dificuldade na aprendizagem.

As afirmações dos professores a respeito de sua relação com os alunos:

“Eu preciso ter muito jeito com ela. Ela é muito carente. Ela gosta queeu a toque, passe a mão no cabelo, dê um beijnho, elogie. Ela gostamuito de mim. Ele também. Eu não sou uma profa. autoritária. Eu soumuito maleável com eles. Ele me entregou um bilhete: “Para minhaquerida profa” A gente se relaciona bem, não tenho problema comeles.” (prof. C-2ª s.)

“A I. é outra que nunca me respondeu. Mas, eu tenho que ficar brava:‘Você vai fazer!’Aí, ela fica emburrada e o P. faz aquele bico. Eu falo: Que bico! Ele vaicair! (risos) Aí, ele quer rir. Mas eu não sei ficar brava por muito tempo,eu não consig! (risos). Daqui a pouco eu estou brincando.“Ela tem uma carência, tem que ficar sempre grudada. Se saio comeles, ela tem que estar sempre abraçada.”Outro dia, eu fiquei de mal dela a semana toda, até ela fazer tudobonitinho.”(prof. D-2ª s.)

“ ... acho que eles esperam muito da gente e eu sinto que eles buscammuita coisa, além do carinho, além do afeto. Eles buscam tambémexplicações, eles querem esclarecer as coisas. Eles chegam pra gentepra tirar dúvidas.” (prof. F-3ª s.)

“Eu comprei caderno de dez matérias e figurinhas pra ele. Tudo eucolava no caderno. No final da aula, ele vinha mostrar o caderno.É ele passou a ter capricho. Até canetas coloridas eu comprei pra verse ele se interessava ...”“Sempre me beijando, falando que eu era bonita! Adorava fazercartãozinho e mandar. Ela, não. Ficava no cantinho dela, me davabeijo na hora de ir embora. Mas, conversar, vir aqui, não. A gentepercebia que ele é uma pessoa carente e queria que eu desse umapalavra de carinho.” (prof. H-4ª s.)

Ao responderem que não têm queixa das crianças, um sujeito mostrou entusiasmoe satisfação ao responder que seu aluno com dificuldade de aprendizagem adora fazer cartãozinhopara ele. Outro disse ficar de mal quando o aluno não executa suas atividades. São abordagensdiferentes, que mostram acertadamente um esforço na relação professor/aluno que garanta bomresultado.

Da parte das crianças, o que pudemos reter na fala dos sujeitos é que elas estãosempre buscando a aprovação e o apoio do professor. Mesmo quando o professor lhes pareceexigente e punitivo, apesar de demonstrarem irritação, as crianças logo querem conversar comeles e agradá-los. Por isso, acreditamos ser um engano do professor considerar “carente” oaluno que deseja a sua atenção e quer estar próximo dele.

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Estas observações correspondem às afirmações de Tapia (2000), de que para aaprendizagem se efetivar, um dos pontos fundamentais na sala de aula é a relação que seestabelece entre o professor e o aluno.

Em relação a essa afirmação do autor, ressaltamos que o bom resultado do alunoem sua aprendizagem depende do tipo e a qualidade da relação da criança com o professor. Nodecorrer da sua rotina escolar, as mensagens que o professor passa para a criança, antes, du-rante e depois das atividades é fator decisivo para a sua motivação e para a sua aprendizagem.

Para Carvalho (1996), a maneira como professor e aluno se vêem, as manifestaçõesde simpatia ou antipatia entre eles influenciarão positiva ou negativamente na produção escolar.

Defendendo o mesmo ponto de vista, Morales (2000) ressalta que no contextoescolar, além do ato intencional de educar, o professor também ensina, sem querer, com o seujeito de ser e com a maneira de se relacionar com os alunos. O autor salienta que na relação doprofessor com seus alunos, tudo é comunicação e reforça a idéia de que, até mesmo o modo deolhar seus alunos diz algo para eles.

Segundo Morales (2000), aos olhos dos alunos, o professor ideal e desejado éaquele que se mostra competente para ensinar e controlar a classe. Sem, no entanto, deixar decriar um clima agradável e de relacionar-se, em termos de saber elogiar, ser compreensivo,paciente, atencioso e disponível para ajudar e tratar a todos de forma igualitária. Os alunos sentem-se seguros, pois esse professor mostra-se sensível às suas necessidades.

Acreditamos, então, que o professor aceito e querido pelos alunos terá bom êxitoem suas realizações.

b) - seu trabalho no cotidiano escolar

Nesta categoria, constatamos a manifestação de preocupação dos professoresem relação ao seu fazer docente.

Apresentamos as afirmações de alguns professores:

“... dou aula uma semana na sala e já conheço os que vão terdificuldade, mas vão e os que ou eu fazendo de tudo ou eu não fazendoquase nada, vão! E tem os que você tem que carregar no colo praconseguir ir. Então, a gente acaba aprendendo com as crianças, atrabalhar com eles. Eu gosto do que eu faço, eu sempre gostei! É fácillidar com a criança que vai bem. Você mostra o caminho, ela vai. Mas,é tão bom lidar com as que têm esses problemas e chega no final doano, você consegue alguma coisa com elas.”(prof. D-2ª s.)

“Procuro analisar minhas dificuldades. Então, vejo da minha parte umcerto bloqueio. Não sei se isso faz parte daquela época em que agente era discriminada quando não sabia alguma coisa. Então, eu ficosensibilizada com a criança e, às vezes, fico sem saber o que fazer.Estou pensando em mudar algumas estratégias, a metodologia detrabalho, preparar algumas coisas específicas para eles. E para issoeu vou precisar da ajuda da coordenadora da escola.

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Eu tenho algumas dúvidas. E na hora do SARESP, como será? E osmeus alunos do ano passado, aqueles que tinham dificuldade, têmdificuldade ainda esse ano. E eu fico me perguntando como serádepois que eles saírem daqui, como será depois da 4a série. Porqueeu valorizo tudo o que a criança faz. E depois? Mas eu prefiro agirassim e deitar e dormir tranqüila. Do que ficar com remorso, pensandoque eu poderia ter feito mais” (prof. F-3ª s.)

“Avalio a situação de cada aluno, pra ver até que ponto ele vai chegar.Não generalizo, porque um é diferente do outro: ‘Olha, você fazendoisso pra mim, está bom!” Agora, tem aluno que vai dar conta de muitomais. Então, o papel do professor é trabalhar de acordo com o que oaluno pode render. No caso dessa menina que não dá conta de tudo,o meu papel é fazer com que ela domine a leitura. Se eu conseguirisso, eu consegui parte do meu objetivo.” (prof. G-4ª s.)

Na análise destes relatos, constatamos que todos os sujeitos consideram-sededicados e bons professores, embora digam buscar ajuda da coordenadora pedagógica da escolapara resolver certos problemas de seus alunos e, em alguns casos, não saber o que fazer comos alunos.

Outro, mostrando humildade, salienta que vai aprendendo a trabalhar as dificuldadesdos alunos com eles mesmos.

Porém, nenhum deles mostrou buscar suporte teórico na literatura especializada,demonstrando satisfazer-se com consultas a seus pares, permanecendo suas açõesfundamentadas apenas no senso comum.

Cavaco (1991), em seus estudos sobre o percurso profissional, também mostra atendência dos professores em consultar os colegas, quando se defrontam com problemasrelacionados aos alunos, afirmando que, muitas vezes, eles recorrem às redes informais de apoiopara discutir problemas, trocar idéias, expor dúvidas e partilhar sucessos e fracassos. Porém,nem sempre, obtêm respostas de qualidade, pois elas podem constituir-se em esquemas deações repetitivas e rotineiras e em receitas pobres e sem significado que, em nada contribuempara melhorar suas ações.

De forma geral, os professores demonstram tranqüilidade e segurança ao relatarsuas intervenções, manifestando o sentimento de que fazem o melhor para os alunos.

Neste caso, as causas do não aprendizado dos alunos recairiam sobre eles mesmose suas famílias? Algumas falas dos professores apontam uma resposta positiva para esta pergunta.Refletindo sobre elas, não podemos discordar dos professores sobre a forte interferência da idéiaque os pais têm sobre a escola e do valor que dão ao conhecimento e o aprendizado dos filhossobre o empenho escolar dos mesmos.

Quanto à dificuldade na aprendizagem ser atribuída a problemas da criança, vemosna literatura por nós apresentada, que já é possível detectar o potencial da criança para aprender.Porém, acreditamos que, mais importante do que indicar o nível intelectual é proporcionar ajuda àcriança para que ela se desenvolva. Vista como uma técnica que permite avaliar o desempenho

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da criança, ao mesmo tempo em que é aplicado um suporte instrucional para ela aprender, aavaliação assistida é apresentada por Linhares (1998) como uma técnica que indica no aluno suaeficiência de aprendizagem e transferência desta aprendizagem e, portanto, contribui para aefetivação da aprendizagem.

Apesar dos sujeitos terem dito que, em certos momentos, não sabem o que fazerpara o aluno interessar-se em realizar suas atividades, consideramos positivo o fato de muitosrelatarem com detalhes o sucesso dos alunos, emocionando-se com as conquistas deles e dizendomanifestar a eles sua alegria. Parecem não sentir obrigação de ensinar ou preocupação em passaruma imagem de bom professor; demonstram dedicação e carinho por esses alunos e, realmente,parecem desejar que eles aprendam.

Esta constatação corresponde aos resultados obtidos por Bueno e Garcia (1996)em seus estudos sobre o êxito das crianças na escola. Segundo as autoras, a conduta de inter-esse pelos alunos e o cuidado dedicado a eles (denominado “desvelo”), asseguram a confiançaque têm em si próprios e no professor, garantindo êxito na aprendizagem.

Segundo os professores, essa atitude afetiva sempre é retribuída pela criança comgestos singelos, como por exemplo, um cartão que ela faz para o professor. Em contrapartida, oprofessor sente-se tocado demasiadamente por esse gesto, o que o faz gostar ainda mais dessacriança e, conseqüentemente, se desdobrar a ajudá-la.

Outro aspecto que nos chamou a atenção foi o fato do professor garantir que écapaz de saber os resultados do aluno até o final do ano, só pelas observações que faz nasprimeiras semanas de aulas. Afirma identificar quais alunos alcançarão sucesso e quais se sairãomal no desempenho escolar. O que normalmente acontece em conseqüência desta expectativa éque o professor investe mais naqueles que ele espera bom desempenho, os considerados “fortes”,deixando os “fracos” à própria sorte, o que lhes traz sucessivos fracassos.

Analisando essa prática, chamada de profecia auto-realizadora, Carvalho (1996)afirma que a influência do professor na aprendizagem do aluno é decisiva, já que a diferenciaçãooferecida aos alunos faz realçar as suas características individuais.

A esse respeito, Morales (2000) observou que os alunos menos motivados, menosinteressados pelas atividades, recebem dos professores comentários negativos, mensagens queos desmotivam ainda mais. E aqueles que são mais ativos, mais motivados, recebem mais reforçopositivo do professor.

Ao responder-nos de forma emocionada e, em algumas vezes, com lágrimas nosolhos, o professor descreveu sua angústia em não ter certeza se suas ações são adequadas e deprovável eficiência para sanar as dificuldades dos alunos.

Consideramos que esse “sofrimento” manifestado pelo professor poderia seramenizado ou mesmo evitado, se sua formação lhe assegurasse segurança e competência.

De fato, só uma formação sólida e consistente, baseada em conhecimentos teórico,prático, científico e técnico torna o professor apto a compreender o aluno em seus aspectos físicoe psicológico, tendo condições de intervir eficientemente para reverter os resultados negativos.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A criança que apresenta dificuldade de aprendizagem demonstra dificuldade emseu relacionamento com o professor, com os colegas e com o próprio processo ensino-aprendizagem, já que se sente incapaz de confrontar-se com novas situações e não tem perspectivade sucesso.

Apesar de sabermos que ela é capaz de superar tais dificuldades, através deatendimento e acompanhamento cuidadoso, não podemos desconsiderar que os freqüentesfracassos interferem negativamente na sua auto-estima e auto-competência. É necessário que oprofessor dispense a ela cuidados especiais para que volte a acreditar na sua capacidade deaprender e sinta-se feliz.

Será que estas questões estão presentes entre os professores, ou pelo menos, seaproximam do que eles pensam?

As respostas dos sujeitos mostrando como percebem seu trabalho nos leva àreflexão sobre a formação dos professores e a estreita relação dela com a aprendizagem dosalunos. Logicamente, um professor que, em sua formação obteve subsídios para saber avaliarsua atuação e a refletir sobre ela, aprendeu a tornar-se consciente de sua parcela deresponsabilidade nos resultados das crianças e a empenhar-se em buscar os bons resultados.

A respeito da opinião dos autores e das respostas dos sujeitos, perguntamo-nos seo professor está e sente-se preparado para lidar com as crianças consideradas diferentes.Podemos, até, perguntar se ele sente-se preparado para atuar com as chamadas crianças“normais”. Nosso questionamento corresponde à preocupação de estudiosos da questão daformação docente, quando sugerem permanente atualização e aprimoramento dos conhecimentosdos professores.

Consideramos que, se o professor estiver munido dos conhecimentos que adquireem sua formação inicial e continuada e da sabedoria que acumula no seu fazer, saberá interviracertadamente e obterá resultados gratificantes no processo ensino-aprendizagem.

Mas, qual é o professor que se encontra, realmente, em condições favoráveis deobservar seus alunos, avaliar suas capacidades, reconhecer suas dificuldades e intervireficazmente, buscando e encontrando metodologias adequadas às particularidades de cada um?Qual é o professor que questionará suas ações e refletirá sobre elas, de maneira crítica? Sabemosque, se formos responder essas questões, teremos que considerar que, somente o professor“bem” formado profissional e pessoalmente atuará positivamente no enfrentamento das dificuldadesde aprendizagem dos alunos. E que, o conhecimento que utiliza na sala de aula, em sua atuação,ele adquiriu não só em sua formação docente, mas é fruto, também, da cultura de escola que eletem, da idéia de escola que ele traz de suas vivências como aluno e de como o professor deveproceder. Portanto, a forma de intervenção do professor será mais ou menos eficiente, dependendode como ele aprendeu a ensinar e como ele pensa que deve ensinar.

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O MOVA-Regional é um programa pautado na relação de parceria existente entreas esferas do governo e da sociedade civil organizada e visa ao atendimento comunitário dejovens e adultos analfabetos e/ou com baixa escolarização. Sua origem está ligada ao MOVA-SP,criado em 1989, durante o período em que Paulo Freire esteve à frente da Secretaria Municipal deEducação do município de São Paulo, na gestão da prefeita Luiza Erundina (1989-1992). As primeirasturmas do MOVA na região do ABCD foram organizadas no município de Diadema, em 1995,expandindo-se aos poucos para as demais cidades. Há um discurso muito presente na região,em especial entre os munícipes e educadores ligados ao movimento, que apregoa os grandesresultados alcançados pelo Programa, tais como: a melhoria da qualidade de vida de seuseducadores e educandos, por intermédio da alfabetização; a participação mais consciente e ativade seus membros no plano sócio-cultural dos municípios; o despertar da consciência política daspessoas de baixa escolaridade; a melhoria do poder de articulação entre sociedade civil e governo,entre outros aspectos divulgados como positivos. Entretanto, uma análise sobre o movimento,iniciada durante a dissertação de mestrado e aprofundada na tese de doutorado da autora, indicouque por trás da aparente eficácia e eficiência das ações desenvolvidas no Programa, muitosproblemas e limitações impedem, ou pelo menos relativizam as freqüentes manifestações deapoio e atribuições de méritos irrestritos ao MOVA. São inegáveis as contribuições do movimentopopular à educação de jovens e adultos. Entretanto, a reflexão aqui apresentada é a de que aformação inicial e continuada dos educadores do Movimento de Alfabetização no ABCD, MOVA-Regional, aproxima-se, quer na sua estrutura organizacional, quer nas estratégias de suaimplantação e desenvolvimento, mais da proposta neoliberal de educação do que das propostasdos movimentos populares de alfabetização dos anos 60 influenciados pelo ideário freireano.

Entrevistas, depoimentos, documentos, dados censitários e de atendimento foramutilizados na análise, tendo como referenciais a teoria crítica, com especial ênfase nos estudos epesquisas desenvolvidas na perspectiva educacional freireana. Embora a região compreendasete municípios, o universo de pesquisa analisou os dados de apenas três municípios (Diadema,Santo André e Mauá) com vários anos de experiência no trabalho com a educação de jovens eadultos.

Uma das clássicas frases de Paulo Freire: ninguém educa ninguém, mas todos seeducam em comunhão, proferida em vários momentos de sua obra (FREIRE, 1974; 1985; 1996)aparece como um dos pressupostos de muitas ações destinadas à educação de jovens e adultose também do MOVA-Regional. Os dados coletados durante a pesquisa empírica mostram que talprincípio vem sofrendo ao longo dos anos um processo de banalização, que em última instância

A FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA DOSEDUCADORES DO MOVA-REGIONAL

PRADO, Edna; GREGO, Sonia M. Duarte (FCLAr/UNESP)

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tem contribuindo para a descaracterização do próprio professor enquanto profissional qualificadopara o exercício do magistério.

Num passado não muito distante a escola, enquanto instituição social, era a princi-pal fonte de transmissão dos conhecimentos acumulados na história da humanidade. Com opassar dos anos, novas formas de educação foram consideradas. Hoje são comuns asexpressões: educação formal, correspondente à escolar; educação não-formal, correspondendoàquela que ocorre, ou pelo menos deveria ocorrer, nos movimentos populares e nas organizaçõesnão-governamentais e, finalmente, a educação informal que, mais antiga que as duas primeiras,acontece na família, na igreja, na comunidade. Segundo Gohn (1999) é a intencionalidade do atopedagógico que distingue as duas primeiras da educação informal.

A educação não-formal é apresentada nos dados coletados como uma das marcasdo trabalho pedagógico desenvolvido no MOVA-Regional. Um dos pressupostos básicos daeducação não-formal é o de que a aprendizagem se dá por meio da prática social. É a experiênciadas pessoas em trabalhos coletivos que gera um aprendizado. A produção de conhecimentosocorre não pela absorção de conteúdos previamente sistematizados, objetivando ser apreendidos,mas o conhecimento é gerado por meio da vivência de certas situações-problema (GOHN, 1999).

É consenso que os movimentos não fazem educação formal, dedicam-se àeducação não-formal. Entretanto, as falas dos sujeitos da pesquisa, por apresentarem a ausênciade rigor metodológico e marcas de espontaneísmo em muitas ações, permitem uma aproximaçãoda prática pedagógica desenvolvida pelo MOVA-Regional à educação informal e, sendo assim,confirmam ser desnecessários tantos investimentos por parte dos parceiros envolvidos que,gradativamente, vêm deixando o movimento, conforme falas dos próprios coordenadores do MOVA.

Nessas falas também é possível identificar a diferença entre o MOVA-Regional euma sala de educação de jovens e adultos institucionalizada no que tange à profissionalização, noMOVA, há o predomínio da “criatividade”, da “espontaneidade”. O espontaneísmo mostra-se umacaracterística marcante do movimento, de tal maneira que a não relação da prática com umateoria, por mínima que seja, tem gerado o imobilismo.

A discussão sobre os limites e alcances da educação formal e não-formal perpassa,indiscutivelmente, o processo de formação docente. Vários são os autores que teceramconsiderações sobre a importância da formação dos educadores dos movimentos populares.Beisiegel (1992) ao referir-se aos círculos de cultura dos anos 1950 e 1960 mostra a importânciada figura do educador no processo de conscientização dos educandos. Para ele, por mais quenos círculos de cultura a experiência e a fala do educando fossem centrais, o papel do educadorera fundamental. Segundo suas próprias palavras,

Certamente havia uma condução da “conscientização”. E estacondução era possibilitada por alguns procedimentos bem evidentes:pela seleção dos temas a serem debatidos nos “círculos de cultura”;pelo encaminhamento dos debates para o exame desses temas pré-selecionados; e pela explicitação, sob uma teoria, dos significadossubjacentes às experiências de vida dos moradores. (BEISIEGEL,1992. p. 179, grifo nosso)

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Gadotti (1997) também destaca, ao referir-se aos círculos de cultura, a importânciado educador no processo de alfabetização, destacando inúmeras ações que este deve ter:

[...] o coordenador do círculo de cultura deve ser um agente promotorde discussão e um observador atento às dificuldades de expressão dogrupo. Deve-se procurar fazer com que todos participem, estimulando-os com perguntas e tentando prolongar o debate em torno da palavrageradora, que deverá estar escrita de modo destacado e ser visívelpara todos os alfabetizandos. Com essa finalidade, serão utilizadosvários recursos didáticos, desde o quadro-negro até projetores de slidese videocassetes. (GADOTTI, 1997. p. 38)

Os dados analisados mostram uma preocupação constante com a “formação”dos educadores em todo o MOVA-Regional. Em todos os municípios ocorre uma formação inicial,seguida de uma formação permanente, realizada através de reuniões periódicas. Quanto àformação inicial, as cargas horárias são diferentes. Diadema é o município que apresentava, noinício do movimento regional, a menor carga horária, 15 horas, enquanto Santo André apresentavaa maior carga, 50 horas iniciais.

A formação inicial é entendida como o primeiro contato do educador recémselecionado com o histórico e a metodologia de trabalho na educação de jovens e adultos. Entreos principais aspectos trabalhados na formação inicial estão: a própria estrutura e funcionamentodo MOVA; o conhecimento e a análise da conjuntura política, econômica e social brasileira; oresgate histórico da trajetória da educação popular e da EJA; as concepções de educação,alfabetização e letramento, os conhecimentos matemáticos indispensáveis ao adulto e a articulaçãoteoria e prática ao longo do trabalho educativo. (MOVA-REGIONAL, 1997)

Na tentativa de sanar as principais dificuldades apresentadas pelos novoseducadores, cada cidade organiza seus períodos de formação de acordo com as suasespecificidades. Entretanto, não há grandes diferenças e nem tampouco rigor teórico e metodológicosobre os aspectos a serem trabalhados. Embora os membros do MOVA-Regional não gostem dapalavra cartilha, por ela possuir, segundo eles, um significado muito restrito, a superficialidademostra-se como característica marcante dos cadernos de formação dos educadores.

A formação continuada é vista como o aprofundamento constante das questõesapresentadas aos educadores durante o primeiro contato com o universo da educação de jovense adultos, apresentando, entre outros objetivos, a preocupação em proporcionar momentos dereflexão para que esses educadores possam aprofundar seus conhecimentos sobre as relaçõesexistentes entre economia, política e a alfabetização de adultos.

Através da formação continuada dos educadores todo o material recolhido nassalas do MOVA ao longo da semana, como por exemplo, as experiências vividas, as informaçõestrazidas dos centros comunitários, os temas geradores escolhidos no processo coletivo dediscussão, as histórias dos bairros, de vida, são discutidas e sistematizadas com a intervençãoda equipe técnico-pedagógica para serem trabalhadas nas semanas seguintes. De acordo com adocumentação consultada, o material trazido pelos educadores para as reuniões de formação

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continuada é a base para a sistematização do conteúdo a ser trabalhado com os educandos,contribuindo também, segundo a coordenação do movimento, para a melhoria da própriasistemática dos encontros de formação, uma vez que parte da realidade de educadores eeducandos.

O acompanhamento pedagógico dos educadores ocorre através de reuniõessemanais, geralmente em horários alternados para garantir uma maior participação.

Quanto à formação dos próprios coordenadores, Diadema era o único município aapresentar reuniões quinzenais; em Santo André, elas eram mensais e, em Mauá, bimestrais.Não há informações no material consultado sobre esse item nos demais municípios. No início doMOVA-Regional os municípios possuíam um fórum municipal. Mas hoje, os dados coletados nasentrevistas mostram que a situação não permanece a mesma. Em função das novasadministrações municipais, apenas Santo André e Diadema mantém fóruns periódicos. Nessesfóruns são discutidas as questões do cotidiano, das reais necessidades dos educadores e doseducandos.

A formação docente no MOVA também ocorre por meio de vários encontros regionaise nacionais. As falas dos entrevistados mostram que tais encontros têm sido produtivos para ofortalecimento do movimento, em especial no que diz respeito aos momentos destinados às trocasde experiências docentes. Entretanto, os dados coletados apresentam a questão político-partidáriamuito forte no discurso do movimento e nenhuma referência a aspectos teórico-filosóficos ou deordem técnica que, em princípio, devem corresponder a pontos culminantes dos encontros deeducação. Tais encontros parecem caracterizar-se por uma acentuada superficialidade. Antesdos encontros nacionais, as coordenações regionais promovem encontros menores, destinadosa garantir uma maior participação dos educadores, educandos e delegados regionais na discussãosobre o tema do encontro nacional. Durante esses encontros, que geralmente têm a duração deuma semana, as aulas são suspensas, fato que pode colaborar para a não-continuidade dosalunos, isto porque, uma característica da educação de jovens e adultos é a grande evasão deseus alunos. Inúmeros fatores são apresentados pelos alunos como motivadores do abandonodos estudos, tais como: emprego, cansaço e as constantes suspensões de aula para passeios,festas e, como visto acima, encontros de professores.

As falas dos entrevistados reforçam a importância atribuída pelos coordenadoresdo MOVA-Regional aos encontros nacionais para a troca de experiências e fortalecimento daspráticas desenvolvidas e, mais uma vez, o envolvimento dos educadores com o MOVA de suacidade. O estudo mostrou declarações carregadas de um sentimento ufanista, característica queficou bem marcada durante a realização das entrevistas com os coordenadores e professores doMOVA dos municípios pesquisados, os quais se preocupavam em afirmar que o movimento localapresentava aspectos positivos. Entretanto, em suas falas, esses entrevistados não demonstravamexplicitamente quais eram esses aspectos positivos, em especial, no que diz respeito à partepedagógica de um movimento de educação popular. Apenas em um depoimento aparece areferência à organização de uma cooperativa a partir do conteúdo discutido em sala. Em outros,

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são apontados como positivos: o chamamento dos alunos feito pelos educadores (ida àcomunidade), o poder do MOVA para eleger o prefeito de um dos municípios e o envolvimento doseducadores. De maneira geral, as várias referências feitas às trocas de experiências nessesencontros, apontada como aspecto positivo, assemelham-se mais à reprodução do senso comum,a práticas marcadas pelo pragmatismo, sem possuírem fundamentação teórico-pedagógica. Oaspecto político mais uma vez se sobressai ao pedagógico. De acordo com Dossiê Educação,apresentado pela Revista Estudos Avançados. V.15 nº 42. São Paulo, maio-ago/2001, “nem semprese procura e se consegue distinguir entre o que são exercícios de um jargão na moda daquilo quetem respaldo em investigações teóricas e empíricas.” (p.7). A questão do fortalecimento do grupotambém ganha destaque nas falas. Mas, esse fortalecimento encontra-se mais ao nível individual,é o indivíduo que, numa perspectiva psicológica, se fortalece no grupo. De maneira geral, aseducadoras assemelham-se muito a seus educandos, também apresentam uma baixa auto-estima, também são carentes e precisam de reconhecimento.

É inegável a importância do movimento e desse desejo de fortalecê-lo, mas nãosão visíveis as características que garantam por muito mais tempo sua existência; assim, essesencontros tornam-se frágeis, no que tange ao aspecto pedagógico. Por mais que as comunidades,as igrejas, os movimentos tenham semelhanças com a escola, ela guarda em si uma singularidadeque vai muito além da educação não-formal e informal.

A reflexão de Pinto (1997) sobre o papel do educador popular relaciona-sediretamente às questões acima e destaca, assim como Saviani (1997), as posições diferentesocupadas por educadores e educandos, afirmando que o educador deve possuir uma consciênciamais avançada.

O educador deve ser o portador da consciência mais avançada de seumeio (conjuntamente com o filósofo, o sociólogo). Necessita possuirantes de tudo a noção crítica de seu papel, isto é, refletir sobre osignificado de sua missão profissional, sobre as circunstâncias que adeterminam e a influenciam, e sobre as finalidades de sua ação. (p.48, grifo nosso)

O trecho acima se mostra pertinente para elucidar uma das várias interpretaçõesequivocadas do princípio freireano: ninguém educa ninguém, mas todos se educam em comunhão.Educadores e educandos são iguais no que diz respeito aos seus direitos e deveres enquantomembros de uma sociedade, também são iguais enquanto portadores de cultura, compreendidacomo o conjunto de suas crenças e valores, neste sentido, ambos se educam. Entretanto, colocá-los em posição de igualdade enquanto domínio do saber sistematizado pela humanidade constitui-se mais uma forma de alienação, isto porque, como uma pessoa pode ensinar a outra aquilo quenão sabe? É preciso assumir, sem temer as críticas, que não é qualquer pessoa que pode serprofessor. Como uma pessoa é capaz de alfabetizar a outra, à luz de uma Teoria Crítica,desconhecendo-se como massa de manobra de ideologia dominante.

Em outro trecho de seu livro Sete lições sobre educação de adultos, Pinto (1997)

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reafirma a posição diferente entre educador e educando: “a ação do educador tem de consistir emencaminhar o educando adulto a criar por si mesmo sua consciência crítica, passando de cadagrau ao seguinte, até equiparar-se à consciência do professor e eventualmente superá-la”. (p. 85,grifo nosso).

A expressão em destaque vem ao encontro da idéia defendida por Saviani (1997).“Até equiparar-se” significa dizer que ambos (professor e aluno) se encontram em posiçõesdistintas. Segundo ele, há, inegavelmente, uma relação assimétrica entre professores e alunos, oque não significa ser ela responsável por um processo de submissão e passividade dos educandosdiante da arrogância e autoritarismo docente, prática veementemente combatida por Paulo Freire.Mas é inegável que o professor deva ter, em princípio, mais domínio que seus alunos, sobre aquiloque pretende ensinar. Em essência, como afirma Amaral (2003 p. 18) “professor é aquele queensina alguma coisa a alguém”.

A fala do próprio Paulo Freire corrobora as afirmações acima:

O professor só ensina verdadeiramente, na medida em que conhece oconteúdo que ensina, quer dizer, na medida em que se aproxima dele,em que o aprende. Neste caso, ao ensinar, o professor re-conhece oobjeto conhecido. Em outras palavras, re-faz sua cognoscitividade nacognoscitividade dos educandos. (FREIRE, 1985 apud BARRETO,1998. p. 70, grifo nosso)

A tarefa de alfabetizar um adulto não é simples, ele encontra-se na fase maiscomplexa e plena da natureza humana, muitos já possuem família, trabalham e não podem sertratados como crianças e nem tampouco vítimas de práticas espontaneistas.

Refletindo uma maior preocupação em respeitar as especificidades da educaçãode jovens e adultos, a década de 90 destaca-se pela ampliação dos estudos e pesquisas destinadosa essa modalidade de ensino, entretanto, segundo Borges (2002):

[...] permanecem até hoje as idéias dos anos 70 e 80 em diversosestilos de re-edição. Persiste a idéia de que “qualquer pessoa quesaiba ler e escrever pode se converter em alfabetizador e que qualquereducador possa ser educador de adultos”. [...] O papel que o profes-sor de jovens e adultos precisa desempenhar para, a partir do quesabe, desenhar esta nova escola, depende do seu envolvimento comtoda a complexidade que abarca a compreensão dos processos deconstrução do conhecimento e a análise da trajetória da EducaçãoPopular. (apud GADOTTI; ROMÃO, 2002. p. 98, grifo nosso)

Ao educador, independentemente do tipo de educação, formal ou não-formal, énecessário o conhecimento de uma teoria que dê sustentabilidade ao processo de ensino. Somenteum educador preparado é capaz de efetivamente garantir uma educação de boa qualidade. Mas odespreparo e a não-formação específica constituem-se, na grande maioria dos casos, as marcasdo educador que trabalha na educação de jovens e adultos.

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Os professores que trabalham na EJA, em sua quase totalidade, nãoestão preparados para o campo específico de sua atuação. Em geral,são professores leigos ou pertencentes ao próprio corpo docente doensino regular. Note-se que, na formação de professores, em nívelmédio e superior, não se tem observado preocupação com o campoespecífico da educação de jovens e adultos. Deve-se também consideraras precárias condições de profissionalização e de remuneração dosdocentes. São elementos fundamentais: tanto a profissionalizaçãoquanto a formação adequada dos professores de jovens e adultos.Não se obterá ensino de qualidade sem um corpo docentequalitativamente preparado para o exercício de suas funções e, muitomenos, com precária situação no que respeita à remuneração econdições de trabalho. (Comissão Nacional de Educação de Jovens eAdultos, 1994 apud GADOTTI; ROMÃO, 2002. p. 122)

São comuns os questionamentos sobre a formação e atuação de pessoas nãohabilitadas na área da alfabetização, não só por parte dos especialistas em educação, mas depessoas da população em geral, que vêem na formação docente um dos grandes entraves domovimento, tanto que o próprio coordenador reconhece ser frequentemente indagado sobre acapacidade de ensino dos educadores do MOVA-Regional.

Hoje, os alfabetizandos não são mais os adultos cerceados do passado, nascidosna zona rural, migrantes nos grandes centros, sem experiências com a educação formal, nemtampouco os alfabetizadores são intelectuais, jovens ligados ao movimento estudantil ou militantespolíticos, imbuídos de toda uma ideologia libertária para a construção de uma nova sociedademais justa. Agora, grande parte dos alfabetizandos é de adolescentes e jovens nascidos nasperiferias das grandes cidades, excluídos do sistema regular de ensino, quer pela necessidade detrabalho para o sustento da família, quer por não se adaptarem a ele ou ainda por serem portadoresde necessidades físicas e educacionais especiais. E os educadores, em sua grande maioriamulheres, com escolarização em nível médio, sem muito engajamento político-social.

Quanto ao perfil dos educadores, as fala dos sujeitos da pesquisa mostram que,em geral, não difere muito do perfil apresentado pelos educandos. A grande identificação do educadorcom o educando é também apontada por um dos educadores como um facilitador da ação dechamar os indivíduos da população local para iniciarem seus estudos, ou para voltarem a estudar.O fato de o educador ir até a casa do aluno é apresentado de forma positiva como uma tarefainerente ao seu papel dentro da educação não-formal e contrário ao papel do professor dosprogramas institucionalizados.

Como visto, a formação dos educadores do MOVA-Regional aproxima-se mais depráticas experimentalistas, pautadas no senso comum, não em teorias e metodologiascomprovadamente estudadas, até porque, com um número tão reduzido de horas, como abarcaras especificidades de uma modalidade de ensino tão complexa? A esse respeito, é pertinente aafirmação apresentada pela Comissão Nacional de Educação de Jovens e Adultos (1994):

[...] a maioria das iniciativas no campo da EJA não tem configuradoum atendimento qualitativo satisfatório. A falta de uma política claratem provocado a implantação destes serviços de maneira precária e

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pedagogicamente inconsistente. As práticas pedagógicas não seconformam ao específico da educação de jovens e adultos,reproduzindo, muitas vezes o ensino regular de maneira inadequada efacilitadora. (Comissão Nacional de Educação de Jovens e Adultos,1994 apud GADOTTI; ROMÃO, 2002, p. 123)

A partir da distorção de outro princípio freireano: educar é um ato político, tambémpresente em vários de seus textos (FREIRE, 1974; 1985; 1996) o discurso da importância dapolitização do ato pedagógico ganhou centralidade na formação de educadores populares e aessência do “o que ensinar” e “como ensinar” parece ter sido relegada a um segundo plano. Se nopassado era ingênuo considerar a formação do educador exclusivamente em seu caráter técnico,hoje, não menos ingênuo parece ser tratar da formação docente prioritariamente sob seu aspectopolítico. Segundo Romão (2002),

Alguns educadores desavisados entenderam que se tratava detransformar a cátedra numa tribuna ou num palanque e, levando aatitude ao extremo, abandonaram os conteúdos e os objetivos daescola básica, para transformarem todo seu “plano de curso” numdiscurso sobre a ideologia e a luta de classes, tornando temas tãoimportantes verdadeiros biombos da incompetência.” (apud GADOTTI;ROMÃO, 2002, p. 68, grifo nosso)

A falta de conhecimentos técnicos e pedagógicos como indicam os dados dapresente pesquisa, parece ser uma marca do MOVA-Regional, contrariando os pressupostos dopróprio Paulo Freire:

A segurança com que a autoridade docente se move implica umaoutra, a que se funda na sua competência profissional. Nenhumaautoridade docente se exerce ausente desta competência. O profes-sor que não leve a sério sua formação, que não estude, que não seesforce para estar à altura de sua tarefa, não tem força moral paracoordenar as atividades de sua classe. O que quero dizer é que aincompetência profissional desqualifica a autoridade do professor.(FREIRE, 1996. p. 103, grifos nossos)

Ainda de acordo com Freire (1985), a politicidade da educação pressupõe adiminuição da distância entre o discurso de uma opção teórico-metodológica e sua prática efetiva.

É uma contradição proclamar uma opção progressista e ter uma prática autoritáriaou espontaneista. A opção progressista demanda uma prática democrática, em que a autoridadejamais se alonga em autoritarismo, mas que, por sua vez, jamais se amofina no clima irresponsávelda licenciosidade. (FREIRE, 1985. p. 68, grifos nossos.)

A compreensão equivocada de teorias e métodos que leva muitos professores àapropriação de discursos indevidos também é apontada por Amaral (2003) como um grande entravepara uma educação de boa qualidade:

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A pedagogia de projetos e a proposta de interdisciplinaridade levaramos professores à falsa concepção de que trabalhar conteúdos é ummal: não se pode ser conteudista (e a palavra vem carregada denegatividade). O mito da oposição entre “transmissão de conhecimento”e “construção de conhecimento” tomou conta do imaginário dosprofessores, levando-os ao medo de ensinar (Amaral, 2000). Iludidospela falácia de que ninguém ensina nada a ninguém, o professor nãoquer (ou não sabe?) mais ensinar. Não se pode negligenciar oconhecimento disciplinar: não se desenvolvem habilidades intelectuaisno vazio! (AMARAL, 2003. p. 18)

É o próprio Paulo Freire, autor da frase ninguém ensina nada a ninguém, que reforçaa importância do conteúdo:

Se o professor progressista, ao contrário do reacionário, deve esforçar-se por ‘desopacisar’ a realidade e ‘desmiopisar’ os alunos, ele nãopode, jamais, deixar de lado o ensino do conteúdo em favor apenas dapolitização dos alunos. Do ponto de vista do professor progressista,nem a compreensão mágica do conteúdo segundo a qual, em simesmo, ele é libertador, nem tampouco o descaso por ele como se aclaridade política trabalhasse sozinha. A claridade política é necessária,indispensável mesmo, mas não é suficiente. (FREIRE, 1985. p. 69)

O aspecto político partidário também se faz presente na escolha dos coordenadorese das equipes técnicas locais. Os educadores não precisam ser necessariamente professoresformados. Basta terem, no mínimo, o ensino médio. É de sua responsabilidade arregimentar osalunos e conseguir um local para a implantação do núcleo. O educador recebe uma bolsa-auxíliopaga com recursos de um convênio firmado entre Prefeitura e sociedade civil e mais vale-transporte(não são todos os programas que oferecem este subsídio) para a reunião pedagógica. Mais doque a própria formação docente, o principal critério de seleção dos educadores, de acordo comos documentos analisados, é o compromisso político-social e o engajamento nas atividades dacomunidade em que estão inseridos. Os educadores do MOVA-Regional devem participar deatividades sociais, devem fazer parte de núcleos de associações e/ou núcleos de mobilizaçãopopular. Preferencialmente, devem ser lideranças populares. Ele deve ter um perfil de militantesocial, independente de posição partidária, mas uma pessoa que realmente esteja comprometidacom o crescimento das pessoas, enfim, com o processo. A indicação do educador, feita pelaentidade a qual ele está ligado, não é condição única para que a pessoa já se torne um educadordo MOVA. Os indicados devem passar primeiro por todo o processo de formação inicial, e seconsiderados aptos pela equipe técnico-pedagógica voltam para as comunidades para o início dotrabalho.

Mas, sendo os próprios coordenadores e equipes locais os responsáveis pelaseleção das pessoas indicadas pela comunidade, não é possível garantir que afinidades político-partidárias também não sejam critérios adotados para a escolha dos educadores. Embora osgestores do movimento afirmem que os membros da coordenação e equipe técnica são, compoucas exceções, professores habilitados dos programas municipais selecionados pela experiência

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e por um trabalho significativo na educação de jovens e adultos, a observação e o contato de anoscom a estrutura de gestão dos dois programas permitem afirmar que, em muitos casos, o critériopreponderante na escolha da equipe de capacitação dos educadores é a afinidade e a militânciapolítico-partidária dos envolvidos. Tanto é que as equipes são, freqüentemente, desfeitas em funçãodesses interesses.

Os dados coletados fornecem indicativos de que o MOVA-Regional não temalcançado plenamente seus objetivos, limitando-se, muitas vezes, à politização de seus educandosno plano discursivo. Pelo relato dos educandos, apenas com o discurso politizado dos educadoreseles não têm conseguido dominar o mecanismo básico de decodificação do código lingüístico enem tampouco progredir nos estudos e, como conseqüência mais ampla, inserir-se enquantocidadãos na sociedade atual. Desta forma, surge uma importante indagação: o MOVA-Regional,assim como os movimentos do passado pode ser considerado popular? A afirmação de Pinto(1997) parece apontar para uma resposta negativa, pois, segundo ele, para ser popular, “a educaçãotem que ser uma possibilidade igual para todos, em qualidade e quantidade. Por isso, a alfabetizaçãoé apenas o início de um processo educacional que de direito deve sempre visar aos graus maisaltos do saber.” (p. 49). Pode ser popular um movimento que priva seus educandos de um sabermais sistematizado, através de educadores mais bem preparados e de uma verdadeirapossibilidade de inserção social e continuidade nos estudos? A reflexão aqui apresentada não écontrária à educação não-formal, até porque, ela tem sido nos últimos anos a principal via deacesso da população adulta à alfabetização. A questão que se coloca é saber até que pontoefetivamente ela tem se caracterizado como educação não-formal ou tem se aproximado depráticas espontaneistas mais identificadas com a educação informal.

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INTRODUÇÃO

Os currículos de formação de professores guiaram-se durante muito tempo porum interesse técnico em que se privilegiava um conhecimento fortemente marcado pelo paradigmapositivista, no qual o professor devia resolver os problemas da prática por meio da aplicação deteorias e de técnicas científicas. A componente prática dos cursos era relegada para segundoplano e colocada normalmente no fim do curso.

Não era dada atenção especial a formação de professores para a prática de ensinoconcreta e real nas escolas. Apesar de vários autores terem chamado a atenção para a importânciada componente prática da formação inicial dos professores e para a incorporação dos saberesdocentes na formação de professores, a componente prática nunca teve um significado relevantenessa formação. Isso deriva do facto de alguns autores defenderem que a Prática Pedagógica eos saberes dos docentes não são a componente mais importante na formação de professores ede ela apenas contribuir para formar professores conservadores que se limitam a imitar modelosfornecidos por outros professores mais experientes.

Para além disso, existem autores que argumentam que a função da Universidadenão é profissionalizar, mas somente fornecer aos estudantes instrumentos teóricos e conceptuaisque serão mais tarde aplicados nos seus locais de trabalho. Vários autores defendem que as trêsfunções de uma Universidade são o ensino, a pesquisa e a extensão não cabendo nela o exercícioda prática e a profissionalização dos graduados. Até ao momento, a maior parte das Universidadespermaneceram arraigadas a um modelo clássico assente num paradigma racionalista cartesiano.

1. SABERES DOCENTES E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Os principais problemas relacionados com a fragilidade da formação prática doscursos de formação de professores não se relacionam apenas com fragmentação a que estásujeito o conhecimento, mas situam-se, fundamentalmente, na dicotomia que existe na formaçãode professores entre a teoria e a prática.

De acordo com Tardif (2004:270), os cursos de formação de professores sãonormalmente programados de acordo com um modelo “aplicacionista”, no qual os estudantestêm, numa primeira fase, as disciplinas e só depois é que têm um estágio para “aplicarem” osconhecimentos adquiridos nas disciplinas teóricas. No modelo aplicacionista há separação entre

A INCORPORAÇÃO DOS SABERES DOCENTESNA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

DIAS, Hildizina Norberto (UP/Maputo); ANDRÉ, Marli (PUC/SP)

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a pesquisa, a formação e a prática. Os pesquisadores produzem conhecimento que é transmitidonos cursos de formação de professores e, por sua vez, os formadores transmitem-nos aosestudantes para que estes no futuro apliquem tais conhecimentos na prática. Para o mesmoautor, o modelo aplicacionista tem dois problemas principais: é idealizado segundo uma lógicadisciplinar em que não há relação entre as disciplinas e em que “aprender” é conhecer e não é“fazer”; o outro problema é que o modelo aplicacionista considera que os alunos são espíritosvirgens e não se tem em consideração as suas crenças e representações anteriores.

Com a evolução constante da Ciência e da Técnica, a sociedade e o mercado detrabalho exigem que as Instituições de Formação de Professores (IFP) tenham também a tarefade proporcionar ao estudante uma formação profissionalizante. Um dos maiores desafiosenfrentados, na actualidade, pelas IFP2 s é fornecer uma formação profissionalizante que permitaa articulação imprescindível entre o “saber” e o “saber fazer”. A relação entre “saber fazer” e“saber fazer bem” implica necessariamente o aparecimento de uma epistemologia da práticaque, como diz Alarcão (l996:11), baseando-se em Schon (l983), “tenha como ponto de referênciaas competências que se encontram subjacentes a prática dos bons profissionais “.

O mais importante neste momento é procurar uma forma de conceber a formaçãode professores que seja holística e sistémica e que permita ao estudante (futuro professor)apreender a totalidade e a complexidade dos fenómenos educacionais relacionados com o ensinode uma certa disciplina e que tal compreensão conduza o estudante ao desenvolvimento decompetências que são usadas pelos “bons” professores.

Conforme Tardif (2004:240), o estudo dos saberes docentes produz mudançasnas concepções e nas práticas na formação de professores. A primeira mudança é oreconhecimento que os professores são “sujeitos de conhecimento” e que “deveriam ter o direitode dizer algo a respeito da sua própria formação profissional”. Em segundo lugar, é que a formaçãode professores deveria basear-se nos saberes que são, quotidianamente, usados pelos professoresno exercício profissional. Segundo o mesmo autor, muitas teorias foram concebidas e não têmrelação e/ou aplicação para as situações educacionais concretas. Em terceiro lugar, Tardif (op cit)considera que os cursos de formação de professores funcionam em torno de lógicas disciplinaresem que as várias disciplinas aparecem separadas e fragmentadas, constituindo “unidadesautónomas fechadas sobre si mesmas”.

De forma concreta, Tardif (2004: 274-276) considera que a formação de professoresdeve introduzir quatro mudanças fundamentais:

1) os pesquisadores universitários devem começar a trabalhar nas escolas ea realizar pesquisas em colaboração com os professores de forma a construírem um repertóriode saberes;

2) é necessário criar dispositivos de formação, de acção e de pesquisa quesejam úteis para os professores;

3) é preciso quebrar a lógica disciplinar nos cursos de formação de professoresde forma a que seja possível impedir a fragmentação dos saberes e a criação de equipes de

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formação pluricategoriais;4) os professores universitários devem começar a realizar pesquisas e

reflexões críticas sobre as suas próprias práticas.Borges (2004:33-109) refere-se ao facto de que a relação entre os saberes docentes

e a formação de professores ganha força devido à orientação profissonalizante que passa a dominara formação de professores na década de 90. Tal orientação profissionalizante critica os modelosde formação de professores prevalecentes, destacando os factos de haver distanciamento entrea formação de professores e a realidade educacional; os professores queixam-se amiúde de queo que aprenderam na sua formação inicial serviu pouco para resolver os problemas que enfrentamno quotidiano das escolas onde trabalham. Tal declaração serve, de acordo com a mesma autorapara reforçar o mito de que os professores “aprendem a ensinar com a prática, pela experiênciado ofício” (p 33).

Consideramos que a componente de formação de professores onde há maiorpossibilidade de integração e uso dos saberes docentes é a pedagógica. Tal componente integrahabitualmente as disciplinas da Pedagogia, Didáctica, Psicologia e as actividades de Estágio ePrática Pedagógica. Vejamos a influência que os estudos sobre os saberes docentes podem terpara a ressignificação da área da Didáctica.

2. INCORPORAÇÃO DOS SABERES DOCENTES NA DIDÁCTICA

A Didáctica pode ser definida como sendo uma área da Pedagogia que tem comoobjecto de estudo o processo de ensino/aprendizagem. Durante muito tempo, o objecto de estudoda Didáctica circunscrevia-se ao ensino1 e ela era definida como sendo “a ciência e a arte doensino” (Haydt-2002:13). A Didáctica era assim definida pois havia muita primazia no trabalho doprofessor. Foi a partir da importância, que a aprendizagem do aluno ganhou, que a Didácticapassou a preocupar-se com o processo dinâmico e interactivo de ensinar e aprender que aconteceentre o professor e o aluno (Haydt-2002).

Enquanto alguns autores como, por exemplo, Nérici (1991) afirmam que a Didácticatem como seu objecto de estudo certos elementos didácticos (aluno, objectivos, professor,conteúdo, técnicas de ensino e o meio geográfico, económico, cultural e social); outros, comoCandau (1988) apontam três dimensões de estudo, respectivamente, a técnica, humana e sócio-política.

A Didáctica tem uma importância fundamental na formação do professor pois é adisciplina que vai mostrar ao futuro professor, como é que ele deve transformar os objectivoseducacionais, definidos pelas instâncias superiores da Educação, em conteúdos. Vai tambémfornecer os métodos e as estratégias que deverão ser usados para que o aluno aprenda osconteúdos dos programas. A Didáctica também dá indicações sobre os materiais didácticos maisadequados para o ensino e aprendizagem das matérias e sistematiza as formas mais correctasde avaliar a aprendizagem do aluno.

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As inovações nas práticas pedagógicas, na formação de professores e nainvestigação provocaram na década de 90 um movimento de “ressignificação” da Didáctica. Deacordo com Pimenta (1997: 20/21), a ressignificação da Didáctica decorreu (i) “do maciçoinvestimento na qualificação dos docentes, tanto na formação inicial quanto na formação emserviço (...); (ii) dos novos desafios do ensino em contextos inter/multiculturais; (iii) “da investigaçãosobre o ensino enquanto prática social viva; nos contextos sociais e institucionais nos quais ocorrem”;(iv) do desenvolvimento de pesquisas qualitativas em educação.

Para Oliveira (2000:153), a Didáctica hoje tende a evoluir de uma Tecnologia doEnsino com base na Teoria Psicológica, para a Didáctica como Teoria Pedagógica. Para autoraantes citada, a Didáctica busca, hoje em dia, “um fazer científico-tecnológico sobre o fenômenodo ensino, com base na visão dialéctico-materialista desse fenômeno, enquanto uma prática so-cial pedagógica”

O elemento mais importante da ressignificação da Didáctica, com implicaçõesdirectas para a formação dos professores, conforme Pimenta (2000:21), tem a ver com a construçãoda teoria didáctica partindo da prática e considerando os contextos sócio-teóricos/históricos emque tal prática ocorre. Para a mesma autora, a importância da prática pedagógica para ressignificara Didáctica advém dos resultados das pesquisas qualitativas (cf. Pimenta -2000:22) e da pesquisasobre “o professor reflexivo” desenvolvida na abordagem feita por Schön (1983), Zeichner (1988)e Elliot (1993), apud Pimenta (1997:23).

Segundo Pimenta (2000), o movimento de “ressignificação” da Didáctica, tendo aprática como elemento principal para tal movimento, implicou também uma ressignificaçãoepistemológica da Pedagogia e de outras ciências da educação que se relacionam com a Didáctica.Para a mesma autora, o grande desafio da Didáctica é constituir o seu objecto de estudo a partirdo ensino “tomado como prática social.

O estudo dos saberes docentes é importante para a Didáctica Curricular, na medidaem que qualquer reforma curricular sobre a formação de professores terá de ter em conta osconhecimentos, competências, habilidades e destrezas que o professor deve possuir para exercera sua profissão. Existe consenso que na sua prática quotidiana, os professores produzem certossaberes que derivam da sua experiência de vida e de trabalho em relação com os seus colegasde profissão.

O movimento de ressignificação da Didáctica coloca a figura do professor comoelemento fundamental. Tal facto significa considerar o professor como um intelectual reflexivo,que reflecte na acção e sobre a acção que ele realiza (paradigma de Schön - 1983). Ao colocar afigura do professor como o elemento fundamental emerge, necessariamente, a reflexão sobre ossaberes e as experiências docentes.

Apesar de sabermos que a Didáctica avançou em vários aspectos, sabemos queainda existem muitos outros aspectos que deveriam estar contemplados no programa de DidácticaGeral e das Didácticas Específicas. Das reflexões que viemos efectuando ao nível da área daDidáctica identificamos cinco grandes lacunas na mesma área:

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1) Construção do saber didáctico a partir da prática de ensino quotidiana dosprofessores nas escolas primárias e secundárias;

2) Adopção de uma perspectiva orientada para o ensino na diversidade;3) Articulação mais adequada entre a componente teórico-reflexiva e a

componente técnico-prática, de carácter instrumental;4) Direccionar a Didáctica no sentido de se articular melhor com as outras

áreas de conhecimento, adoptando, para além das perspectivas multidimensional e multidisciplinarque lhe são características, uma perspectiva inter e transdisciplinar;

5) Incorporação de novos temas como inteligências múltiplas, uso de novastecnologias de comunicação e informação.

Apesar das modificações introduzidas, e com base na nossa experiência comoprofessoras de Didáctica e das leituras que efectuamos, podemos afirmar que a Didáctica éleccionada numa perspectiva demasiado teórica. Apesar de usarmos, como uma das fontes deconhecimento, as experiências dos estudantes, tais experiências assumem um carácter ilustrativo.Ainda não somos capazes de teorizar os conhecimentos do senso comum e de incorporá-los nosconteúdos leccionados.

Temos muitas dificuldades de constituir o objecto de estudo da Didáctica partindoda prática de ensino real na sala de aulas. Não estamos sequer a realizar estudos etnográficos daprática escolar que permitam colher novos subsídios que venham enriquecer e inovar a teoriadidáctica, de forma a elevar tanto a qualidade de formação de professores, bem como a própriaprática de ensino nas escolas.

Sentimos que parece existir dissonância entre as teorias e os preceitos queconstituem o conhecimento didáctico leccionado na Universidade e nas Instituições de Formaçãode Professores e os saberes docentes que são, quotidianamente, construídos pelos professoresnas Escolas.

Tal dissonância pode estar a ser causada, tal como diz Francisco (2006: 39), pelofacto de a Pedagogia se ter centrado em referenciais da ciência clássica fundada num modelopositivista que estuda “os fenómenos através de relações de causalidade, priorizando análisesmeramente quantitativas e com isso desfigurando a complexidade da prática educativa”.

A Didáctica ainda não está a ser capaz de usar os saberes docentes construídosna prática de ensino dos professores nas escolas. Colocamos como princípio fundamental daDidáctica a ligação entre a teoria e a prática, mas tal afirmação ainda se situa no plano discursivodas intencionalidades. Ainda não fomos capazes sequer de identificar as inadequações entre asteorias ensinadas na Universidade e as práticas de ensino nas escolas. Muitas vezes,questionamos a pertinência de certas teorias didácticas ou de certas práticas de ensino, masainda não as confrontamos para podermos confirmar as possíveis inadequações.

As dificuldades que enfrentamos de usar os saberes da prática de ensino são de

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natureza epistemológica e metodológica. Como constituir uma epistemologia da prática? Comoorganizar os conhecimentos didácticos, a serem leccionados nos cursos de formação deprofessores, a partir de teorizações dos saberes didácticos dos professores? Que metodologiasdevem ser usadas para investigar os saberes da prática de ensino, apreendendo os significadosreais que lhes são inerentes e compreendendo os contextos em que eles são criados? Comousar os saberes da prática sem sermos “praticistas”, articulando a teoria com a prática de ensinode forma a que as duas “andem de mãos dadas”, diminuindo a distância entre o que recomendamosque seja feito e o que realmente está a ser feito?

A Didáctica que leccionamos continua a adoptar uma perspectiva universal,homogénea e monocultural, prescrevendo métodos, técnicas e estratégias para situaçõeshomogéneas e ideais. Toda a dimensão técnica é leccionada supondo a existência de uma escolaideal com turmas pequenas, com condições materiais ideais. Falamos do aluno da Escola Primáriae Secundária de forma abstracta.

Muitas vezes limitamo-nos a leccionar abordagens, modelos, teorias, métodos,oriundos de situações monoculturais, diferentes da nossa realidade, sem explicar muito bem aoestudante como deve fazer a aplicação prática dessas teorias. Com isto não queremos, de formaalguma, dizer que pretendemos deixar de lado o conhecimento universal já sistematizado na áreada Didáctica, mas pretendemos trazer a nossa modesta contribuição para melhorar a qualidadede ensino e aprendizagem em situações de diversidade cultural e linguística.

Por exemplo, a situação educacional moçambicana no ensino público é complexa.Existem escolas primárias públicas em que as turmas chegam a ter 80 alunos; em muitas escolasas crianças ainda se sentam no chão, debaixo das árvores, não possuem livros, nem materialdidáctico suficiente. Os perfis linguísticos2 dos alunos são diversos e heterogéneos e os programase os manuais escolares não têm em consideração tais perfis diversificados. É urgente quetenhamos em conta a dimensão cultural do ensino de uma língua. Num país multilinguístico emulticultural como é o nosso não faz sentido que a Didáctica se mantenha numa perspectivahomogénea e monocultural e que “fechemos os olhos” à heterogeneidade e diversidade linguístico-cultural.

Para estudarmos as formas de incorporação dos saberes docentes nos cursos deformação de professores, efectuamos um estudo de caso numa Escola Primária em Maputo,Moçambique. A pesquisa referida (Dias – 2007) visava reflectir sobre a incorporação dos saberesdocentes na formação de professores em contextos de diversidade cultural. Nesta escolaobservamos as salas de aula de 5 professores. Usamos como técnicas de recolha de dados aobservação participante, a entrevista, conversas e análise documental.

Os resultados do estudo de caso mostraram que os professores desenvolvemcertos saberes para melhor se adaptarem às suas condições de trabalho. Vimos que para alémdos saberes da formação profissional, dos saberes disciplinares e dos saberes curriculares, osprofessores desenvolvem uma série de saberes práticos, derivados da sua experiência que sesituam ao nível do “saber fazer” e “saber ser”.

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Notamos que os saberes da experiência derivam de uma reflexão sobre a práticade ensino, na qual o professor reflecte sobre a adequabilidade dos conteúdos, dos métodos eestratégias e dos meios usados. É a partir dessa reflexão que o professor vai planificarprocedimentos didácticos e vai avaliar os efeitos das experiências que vai fazendo quotidianamente.

Verificamos que as condições de trabalho precárias, as contradições enfrentadas,as zonas de desorganização deixadas pela planificação central, impulsionam e mobilizam asemoções, os desejos e a vontade do professor de modificar a realidade precária em que eletrabalha, respondendo assim às necessidades que tem.

Os saberes docentes são fruto da reflexão crítica que os professores fazem darealidade educacional. Numa situação de diversidade, o professor deve prestar atenção particularaos saberes relacionais, comunicacionais e ao “saber ser e estar”. Concluímos que para leccionarna diversidade cultural, o professor deve saber:

1) trabalhar na incerteza e na complexidade;2) ser afectivo, mobilizando carinho, atenção, cuidado, diminuindo a tensão e

promovendo o relaxamento;3) respeitar e considerar as diferenças entre os alunos, acompanhando o

processo de formação de identidades culturais híbridas;4) seleccionar formas de comunicação e interacção durante as aulas que sejam

eficazes para o ensino e a aprendizagem.

O estudo de caso permitiu identificar os saberes docentes em situações dediversidade cultural e de forma a incorporar tais saberes na formação de professores devemos,em primeiro lugar, sistematizá-los e, em segundo lugar, incluí-los nas disciplinas que tratam dasquestões acima referidas.

Podemos tomar como exemplo a prática do silêncio na sala de aula. Com o estudoefectuado verificamos que existe um processo de ensino para que as crianças fiquem em silêncio.O professor treina a disciplina corporal por meio de recomendações diárias sobre a postura docorpo; ensina as crianças a controlar os movimentos do corpo, ensina a disciplinar a fala, a relaxar,a diminuir a tensão emocional. A educação para o silêncio é feita de forma gradual e sistemática.Consideramos que este conhecimento sobre a prática do silêncio pode ser perfeitamente integradona formação de professores, tanto nas disciplinas da componente psicopedagógica, como nasdisciplinas específicas.

Ao nível da Didáctica e da Pedagogia, o silêncio pode ser tratado no tema sobre arelação pedagógica. São várias as áreas específicas que podem estudar o silêncio na sala deaulas. A integração de tal conteúdo será muito importante porque estaremos a ir ao encontro daprática docente nas escolas moçambicanas.

Não queremos dizer que devemos transportar directamente o que os professoresestão a fazer para as várias disciplinas, mas devíamos fazer uma verdadeira articulação entre a

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prática e a teoria, i.e., já sabemos como decorrem as aulas, então iríamos explorar no âmbitoteórico o que há, por exemplo, sobre o silêncio, a afectividade, o respeito, a formação de identidades,o processo de aculturação, etc.. Seria mais útil ensinar de forma mais profunda o que realmenteo aluno precisa para poder dar aulas em ambientes diversificados.

Haveria ganhos tanto ao nível teórico, como também ao nível prático. Ao nível teórico,aprofundaríamos assuntos que neste momento não estão a merecer a devida atenção como, porexemplo, a interacção silenciosa, a comunicação na aula por formas não-verbais, a afectividade,o desenvolvimento da criatividade, o tema da complexidade, da incerteza, a formação ao longo davida, etc.. Nas várias disciplinas podíamos focalizar melhor os assuntos que são mais importantespara a prática. Do lado prático também teríamos ganhos porque o aprofundamento teórico trariaresultados positivos para a prática de ensino. Por exemplo, em relação à educação para o silêncio,existem conhecimentos sistematizados sobre técnicas de relaxamento, mas observamos que osprofessores apenas mandam dormir, cantar e brincar. Seria importante levar para a escola outrastécnicas já estudadas ao nível teórico, como o controle da respiração, exercícios sistematizadospara aliviar as tensões, para aumentar a atenção, a concentração, etc..

O estudo dos saberes docentes é muito importante porque podemos identificarformas de trabalho no quotidiano escolar e transformá-las em conhecimentos que possam serincorporados nos cursos de formação de professores.

A conclusão a que chegamos com a pesquisa é que os saberes da experiênciadocente podem ser sistematizados e incorporados nos cursos de formação de professores.Partindo dos saberes docentes pode-se efectuar uma melhor articulação entre a teoria e a prática,porque saberemos como é que os professores estão a trabalhar e o que é necessário tomar,prioritariamente, como objecto de estudo ao nível teórico. Estaremos assim a contribuir paraformar professores melhor preparados para a prática, pois a observação da prática não serávazia e não se discutirá apenas o que vemos no quotidiano, mas teremos de fazer um movimentonecessário de verificar o que existe ao nível teórico de forma a compreender e enriquecer a práticaobservada com os conhecimentos que já foram e estão a ser construídos teoricamente.

A incorporação dos saberes docentes nos cursos de formação de professores,deve ser acompanhado de mudanças na Didáctica em acção nestas instituições. Muitas vezesmudamos os currículos, retiramos e acrescentamos disciplinas, mas mudamos muito pouco asnossas práticas de formação. Falamos e escrevemos sobre mudanças educacionais para asescolas primárias e secundárias, mas esquecemo-nos de olhar para nós próprios. Continuamosa ter a mesma prática repetitiva que tínhamos há anos. Mudamos muito pouco. E a consequênciadisso é que os nossos estudantes irão, provavelmente, reproduzir os modelos que estão a receberna IFP.

Continuaremos a falar sobre novos enfoques didácticos, sobre a criação de umaDidáctica Interdisciplinar, uma Didáctica Fundamental, Multicultural, etc. mas nada disto terá efeitosse as modificações não forem por nós operadas. Podemos introduzir conteúdos novos na Didácticasobre o respeito ao outro, a consideração das diferenças e sobre estratégias teóricas para

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diversificar o ensino, mas se continuarmos a não introduzir tais mudanças nos cursos de formaçãode professores e se não formos para a escola, nada terá efeito. Continuaremos a fazer pesquisa,dissertações e teses para obtermos títulos e prestígio académico, mas o nosso discurso continuaráa ser um discurso de lamentação que introduz mudanças pequenas e às vezes irrelevantes, poisas nossas palavras caem no vazio. A nossa prática não está a corresponder às reflexões e àsteorias que propomos.

Consideramos que é urgente que as Instituições de Formação Professoresmodifiquem a sua prática quotidiana, que ensinem conhecimentos disciplinares e curriculares deforma rigorosa e com qualidade e que desenvolvam, em simultâneo, atitudes e valores referentesao respeito ao outro, ao cuidado, ao afecto na própria instituição para que os futuros professoresvivenciem tudo isso durante a sua formação. O futuro professor deve vivenciar e experimentaraprender numa situação em cuja prática quotidiana estejam presentes os elementos mínimosnecessários para um ensino que valorize e articule convenientemente os conhecimentos, asdestrezas e as atitudes a serem desenvolvidas nas dimensões cognitiva, afectiva e psicomotora.

O estudo dos saberes docentes enriquece a teoria e melhora a formação deprofessores, pois possibilita uma melhor articulação entre a teoria e a prática. Ao estudarmos ossaberes docentes temos também uma melhor percepção sobre o que define a profissionalidadedocente, i.e., sobre os conhecimentos, comportamentos, destrezas, atitudes e valores que definema especificidade de ser professor3. Consideramos que os currículos de formação de professoresdeveriam ser construídos com base na profissionalidade docente.

A construção dos currículos com base na profissionalidade docente significa queos cursos de formação de professores devem ter disciplinas que forneçam conhecimentosespecíficos sobre a área de ensino, bem como é necessário que os cursos de formação deprofessores incluam também o desenvolvimento de comportamentos, destrezas, atitudes e valores.Os conhecimentos específicos, ligados à área da disciplina a ser no futuro leccionada (Português,Matemática, etc.), bem como a área psicopedagógica (Psicologia, Pedagogia, etc.) e geral (língua,Informática, etc.), devem ser ensinados de forma interdisciplinar de modo a reconstruir a unidadede estudo e do ensino de uma área do conhecimento que foi fragmentada pelas várias disciplinas.É importante que saibamos também desenvolver, no futuro professor, a reflexão, a imaginação, acriatividade, o espírito ético, o sentido estético e lúdico, a iniciativa, a auto-disciplina, a organizaçãoe a dedicação para que o estudante no futuro possa, por si, procurar informações, ser autónomoe criativo. As qualidades antes mencionadas são muito importantes, pois são essenciais para aformação ao longo da vida.

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NOTAS

1 De acordo com Libâneo (1994:23) o ensino “corresponde a acções, meios e condições para realização da instrução”; por sua veza instrução, para o mesmo autor, refere-se “à formação intelectual, formação e desenvolvimento das capacidades cognoscitivasmediante o domínio de certo nível de conhecimentos sistematizados”.2 Há alunos monolingues, filhos de pais monolingues e outros de pais bilingues; há crianças que chegam à escola falando apenas alíngua bantu; há bilingues em vários graus de conhecimento da língua portuguesa.3 Definição de profissionalidade apresentada por Gimeno Sacristán (1995:65).

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O tema formação de professores tem sido foco de inúmeras pesquisas e trabalhospublicados nas áreas da Educação e da Psicologia. Dos vários elementos que compõem aformação do educador, um se refere à obrigatoriedade da disciplina Psicologia da Educação nocurrículo dos cursos de magistério, licenciatura ou Pedagogia. Os estudos sobre o tema,geralmente, tratam da Psicologia como instrumento para aperfeiçoar as relações ensino-aprendizagem. Neste sentido, há poucas pesquisas sobre a maneira como esta ciência se configurana formação docente1.

Em função disso, na pesquisa aqui descrita2, tivemos como finalidade investigar olugar que o professor atribui à Psicologia em sua formação e em seu trabalho pedagógico,compreendendo a apropriação e a avaliação feitas por ele da Psicologia que lhe foi ensinada e asexpectativas que possuía para esta área do conhecimento, entrevistando sete professores deuma escola pública municipal da cidade de São Paulo. A leitura do conteúdo destes depoimentospermitiu constituir quatro categorias de análise: a) a relação que estabelecem com a Psicologia,por meio de definições desta ciência, da presença dela no trabalho docente, de demandas para aPsicologia e para os psicólogos e do contato que os depoentes tiveram com os profissionaisdessa área; b) como a Psicologia está presente nos cursos de formação; c) a maneira como osdepoentes estabelecem a relação entre teoria e prática no processo formativo, priorizando asegunda como instrumento da primeira e, por fim, d) a situação da escola pública atual, que seconfigura como o cenário no qual se desenvolvem as relações entre a Psicologia e a Pedagogia.

No que se refere à relação estabelecida com a Psicologia, os depoentesapresentaram definições que ora se aproximam do objeto de estudo da Psicologia, ora a definempor meio de sua função ou aplicabilidade. Em geral, a conceituação é do senso comum e trata deuma Psicologia de auto-ajuda.

No trabalho pedagógico, a Psicologia é evocada para embasar as ações do profes-sor, principalmente nos casos do que entendem como dificuldades de aprendizagem. Ela traz osuposto controle da relação professor-aluno, do processo ensino-aprendizagem e da disciplina,com a possibilidade imaginária de realizar um trabalho individualizado. A Psicologia explica osproblemas da escola, por meio de uma linha de pensamento diagnóstica e fornece ao docenteconhecimento para o domínio das situações que se põem em seu cotidiano de trabalho, dando-lhe “jogo de cintura”. O mais relevante, para o professor, é a dimensão psicológica da relação como aluno.

Quando fazem demandas à Psicologia e aos psicólogos, pedem socorro, em virtudeda vivência de desamparo, solidão e sobrecarga, que só pode ser compreendida se remetida à

A PSICOLOGIA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES:A DESCONSTRUÇÃO DO MODELO TECNICISTA

LARA, Aline Frollini Lunardelli (Universidade de Mogi das Cruzes)

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realidade escolar atual. A Psicologia é tomada como instrumento de explicação do que acontecena escola, em geral, e no trabalho pedagógico, em particular.

A novidade no que diz respeito às demandas foi a presença da Psicologia na escolapara trabalhar o sofrimento do professor, já que o desejo de ser um preceptor – alguém queatenderia individualmente cada aluno, como um professor particular – traz necessariamentefrustrações. Assim, além de solicitar, em alguns momentos, o encaminhamento dos alunos quenão aprendem, querem, na maioria das vezes, a Psicologia para aliviar angústias e, por isso,desejam o psicólogo na escola e não na formação. A experiência com eles, todavia, tem sidofrustrante, porque consideram que a Psicologia está distante da realidade escolar vivenciada.

A formação em Psicologia foi relatada como um amontoado de autores e teoriasque se repetem de forma superficial e imprecisa. Pouco se lembram do que estudaram não sóem Psicologia, mas nos cursos em geral.

A principal queixa sobre a formação diz respeito à falta de vínculo entre os conteúdosaprendidos e a prática pedagógica, ou seja, à falta de aplicabilidade. Consideram que a boaformação é a que está voltada para a prática escolar; em conseqüência, formação ruim é formação“muito teórica”. Não percebem, todavia, que não aprenderam teorias.

A relação entre teoria e prática, nesse sentido, permeou toda a fala dos entrevistadosquando avaliaram sua própria formação. Desejam a prática, sinônimo de ter efeito, ser útil, teraplicabilidade, ajudar a resolver problemas, ter função, ser concreto, aprender fazendo, ter contatocom o psicólogo na escola e não na formação. A vontade de aprender com estudos de caso e, porisso, aproximar-se da prática, reforça a visão preceptorial, do atendimento individualizado de cadaaluno.

A denúncia sobre as condições escolares apresentou a descaracterização dainstituição escolar e do professor. Os docentes trataram principalmente da dificuldade de exercersua profissão. O exemplo mais citado de dificuldade foi a inclusão de alunos com necessidadeseducacionais especiais.

No cenário apresentado pelos professores entrevistados foi possível verificar que aformação, em geral, e a formação em Psicologia, em particular, têm como fundamento o princípioda racionalidade instrumental, ou seja, do ensino da Psicologia como técnica para melhorar ouaperfeiçoar a escola. Por isso, destacam tão veementemente a necessidade de aprender a prática,desvinculando-a da teoria. Contudo, a formação não tem tratado nem da teoria nem da prática,muito menos da relação entre elas. Ensina-se técnica com o objetivo último de promover a soluçãode problemas imediatos, distanciando-se de qualquer possibilidade de reflexão sobre o queacontece na escola atual que tem promovido sua descaracterização como instituição educativa eainda sobre a formação dos educadores como parte desta descaracterização.

Neste sentido, verifica-se que a Psicologia na formação de professores faz partedo que denominamos modelo de racionalidade instrumental presente nos processos formativos,promovendo a reprodução de uma Psicologia psicometrista, preconceituosa, classificatória, emdetrimento da reflexão, das experiências intelectuais.

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O PREDOMÍNIO DA RACIONALIDADE INSTRUMENTAL NA FORMAÇÃO

Essa pesquisa revela a falta de possibilidades de reflexão e da construção daautonomia do pensar nos processos formativos. Não há mais formação intelectual e cultural aquem pretende ser um formador. Os cursos ensinam modelos pedagógicos fundamentados empropostas psicológicas como receitas para se conseguir um ensino eficaz, desconectados docontexto educacional, além de preconceitos já superados pela própria ciência que inviabilizam oensino das classes populares.

Em nossa investigação verificamos que os depoentes tiveram contato com autorese textos da Psicologia e da Educação de maneira imprecisa e superficial, geralmente com aapresentação de fragmentos de propostas pedagógicas vinculadas a esses autores. Além disso,aprenderam, aí sim de maneira eficiente, a pensar de forma instrumental, pragmática, buscandometodologias, maneiras de agir, receituários e também aprenderam uma Psicologia que fundamentaa visão preceptorial de ensino.

A crítica à realidade escolar é, geralmente, fundamentada em um modelo instru-mental de pensamento: a escola vai mal, e muito mal, porque não se encontrou um modo adequadode ensinar; os professores não tiveram contato com formas eficazes de conhecimento sobredesenvolvimento e aprendizagem.

Mas no que consiste a lógica da racionalidade instrumental? De que forma elapermeia os processos de formação?

No processo histórico da modernidade, de acordo com Leopoldo e Silva (1997), arazão esclarecedora foi condição de emancipação do homem em relação às forças da naturezae aos dogmas alheios ao domínio da pura razão, como os mitos. Esta finalidade racional estápresente desde Bacon e Descartes: “Conhecer emancipa porque o conhecimento traz consigo odomínio da realidade” (Id. Ibid., p. 11).

A conseqüência necessária para se atingir o domínio da realidade seria possuir odomínio técnico da natureza. A vinculação, no projeto de Bacon e Descartes, entre teoria e técnica,portanto, seria o único meio de aprimoramento da vida. A razão, por meio de um mesmo métodoobjetivo – o físico-matemático – deveria conhecer todos os objetos, mesmo sendo tão distintos,como a Física e a Moral, para atender ao estatuto de cientificidade. Assim, “[...] o progresso doconhecimento ocorre de maneira solidária a uma restrição do exercício da racionalidade teórica”(Id. Ibid., p. 15).

O que antes seria condição de domínio da natureza para o aprimoramento da vida,passa a ser condição de domínio do próprio homem, uma vez que, para conhecê-lo, tornou-senecessário submeter o objeto de estudo das ciências humanas – o próprio sujeito – ao paradigmade objetividade que teve seu auge com o positivismo.

A razão instrumental, dessa forma, ganhou uma dimensão totalitária e a práticapassou a ser entendida como derivação da teoria, mera aplicação técnica do conhecimento teórico-instrumental. A maior conseqüência, segundo o autor, do paradigma físico-matemático foi a

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dissolução da realidade em objeto do conhecimento. A razão instrumental abandonou o sujeito e,no caso específico da Psicologia, transformou o sujeito em objeto manipulável, trouxe arepresentação da pessoa como coisa. Há, portanto, a identificação entre racionalidade e reificação.Para a Psicologia, a reificação do sujeito tornou-se a única possibilidade de conhecê-lo.

Na razão instrumental, então, conhecer é saber fazer; é para controlar que seconhece. O progresso do conhecimento é o progresso do domínio, fazendo com que aintencionalidade pragmática da consciência intelectual seja conhecer para dominar.

O autor argumenta que a Teoria Crítica da Escola de Frankfurt traz a possibilidadede se considerar as contradições presentes no modelo tradicional da razão instrumental,identificando o caráter histórico da própria razão e, por isso, suas contradições, questionando ahomogeneidade e uniformidade do objeto.

A racionalidade técnica identifica, então, meios com fins. A confiança na razão e noseu progresso ilimitado enfraquece, segundo o autor, a visão crítica da racionalidade. A razãotorna-se absoluta, exprimindo-se por meio da instrumentalização. O progresso, identificado àrazão, traz o regresso e a subordinação do homem às próprias condições de dominação por elecriadas: “[...] esta representação reificada que o sujeito tem de si mesmo é que opera a regressãode uma pretensa emancipação a uma total submissão e controle, numa realidade histórico-socialtotalmente administrada pelos parâmetros funcionais da razão instrumental” (Id. Ibid., p. 21, grifodo autor).

Crochik (1990, p. 154) partilha dessa mesma tese:

Assim, o processo de desenvolvimento social se legitima em si mesmo,é um fim em si próprio representado pela administração racional, umaadministração tão racional, que a leva à irracionalidade, por esquecerque ela é meio para a felicidade humana. Mas, por levar o seu controleda natureza a um controle extremo sobre o homem, impede aindividualização deste. O sistema da razão formal, de servo setransforma em senhor, o animal racional apartado de sua especificidade,se aliena de si mesmo ao não se diferenciar neste formalismo.

A realidade administrada pela razão instrumental invade diversos âmbitos da vidahumana e neles se incluiu a formação, compreendida como a formação do indivíduo na sociedade,em seus aspectos sociais, políticos, culturais e éticos. A preparação de professores faz partedesse contexto amplo, no qual, desde o século XIX, tem predominado o “saber fazer”. A técnicanecessária para que o homem conhecesse e dominasse o mundo e, por meio disso, seemancipasse, tornou-se o aprisionamento do homem, pois abandonou sua relação com a teoriae passou a ser mera aplicação instrumental dela.

Para Adorno e Horkheimer, segundo Leopoldo e Silva (1997), a liberdade nasociedade é inseparável do pensamento esclarecedor, mas as instituições da sociedade e asformas históricas concretas contêm as condições de regressão ao mesmo tempo em que contêmas de esclarecimento: “[...] a emancipação se converte em submissão, na medida em que o

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progresso da razão instrumental coincide com a regressão do humano à categoria de coisa” (Id.Ibid., p. 23).

Neste sentido, ao analisar a formação de professores, como parte da regressãodo esclarecimento, compreende-se o predomínio da razão instrumental que vem para habilitar osdocentes a executar modelos pedagógicos com o objetivo de atingir a eficácia do ensino. Opensamento, a reflexão, a própria razão são apartados das finalidades educacionais. A formaçãodestina-se a saber fazer – agir de maneira adequada, buscar métodos eficazes – ao invés defazer saber – refletir, elaborar, produzir, construir conhecimentos e o próprio pensamento.

Crochik (1990) enfatiza que o tecnicismo leva a uma posição anti-teórica e à buscade soluções imediatas, não refletidas. Esta ideologia da racionalidade tecnológica fortalece opensamento e o comportamento padronizados, cujo critério é a eficácia sobre o meio. Além disso,coloca-se no lugar de questões políticas e, nesta perspectiva, “[...] não se trata de modificar asociedade, mas de aperfeiçoá-la, e, como a técnica traz, da Filosofia Positivista, a imagem daneutralidade, as contradições sociais são suspensas e a técnica adentra no cotidiano através deum processo de racionalização crescente” (Id. Ibid., p. 153).

O mesmo ocorre no processo de formação: não se trata de questionar, refletir,transformar a formação, mas de aperfeiçoá-la. Para isso, organizam-se cursos de aperfeiçoamentoe reciclagem que têm como finalidade a introdução de novas metodologias no trabalho docente.Perde-se a possibilidade da formação de uma consciência política; em seu lugar tem-se “[...] aconsciência tecnológica, uma consciência que reduz a si mesmo e aos outros, a objetos técnicos.Não precisamos dizer que é o grau mais avançado da reificação” (CROCHIK, 1990, p. 153).

A técnica não é neutra, mas também não está inerentemente vinculada à dominação.As relações históricas, entretanto, mostram que quanto mais há progresso, com o desenvolvimentotécnico, mais se aperfeiçoa a dominação. O avanço técnico, neste sentido, que poderia libertar ohomem de diversas formas de trabalho massificadoras, o tem aprisionado.

O RETORNO À TEORIA COMO RESGATE DA REFLEXÃO

O resgate da autonomia pode ser possível pelo retorno à teoria; para tanto, segundoAdorno (1995), a teoria precisa desprender-se do pragmatismo, o que significa que o critério devalidade de um conhecimento não pode ser sua utilidade prática. A formação, como auto-reflexãocrítica que conduz à autonomia, deve passar pela análise da relação entre teoria e prática.

Para o autor, a característica de nossa época é a aversão à teoria – seu atrofiamento– que gera a conseqüente fragilidade da práxis: os homens passam a desejar transformar omundo sem interpretá-lo. O verdadeiro conceito de práxis se perde na formação do indivíduo coma destruição da teoria pelo primado da razão prática: “[...] Práxis sem teoria, abaixo do nível maisavançado do conhecimento, tem que fracassar e, segundo seu conceito, a práxis deveria realizá-lo. Falsa práxis não é práxis” (Id. Ibid., p. 211).

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Falta auto-reflexão na práxis quando ela se transforma em fetiche, isto é, o espíritoda práxis passa a ser a própria falta de espírito. Propagar esta antítese entre teoria e prática,segundo o autor, serve para denunciar/renunciar à teoria:

[...] O espírito burguês reúne a autonomia e a aversão pragmatistapela teoria tão antinomicamente quanto a sociedade que o sustenta.O mundo, que a razão subjetiva tendencialmente só se limita ainda areconstruir, na verdade deve ser continuamente transformado conformesua tendência à expansão econômica e, contudo, semprepermanecendo o que é. O que mexe com isso é amputado do pensar:sobretudo, a teoria que quer algo mais que reconstrução. Dever-se-iaformar uma consciência de teoria e práxis que não separasse ambasde modo que a teoria fosse impotente e a práxis arbitrária, nemdestruísse a teoria mediante o primado da razão prática [...] Pensar éum agir, teoria é uma forma de práxis [...] (ADORNO, 1995, p. 204).

Adorno (1995) afirma que, quando a práxis serve apenas para responder “o quefazer”, ela transforma-se em ideologia. O autor analisa que a supervalorização da prática ocorrequando se perdeu a capacidade de se fazer experiências3:

[...] O que, desde então, vale como o problema da práxis, e hojenovamente se agrava na questão da relação entre teoria e práxis, co-incide com a perda de experiência causada pela racionalidade dosempre-igual. Onde a experiência é bloqueada ou simplesmente jánão existe, a práxis é danificada e, por isso, ansiada, desfigurada,desesperadamente supervalorizada (Id. Ibid., p. 203-204).

O ativismo, dessa forma, conduz à regressão. No processo formativo deprofessores, teoria e prática são vistas de maneira dissociada: não se percebe que a ação práticasó ocorre por meio da teoria, ou ainda, como aponta o autor, que o pensamento sempre quealcança algo importante, produz um impulso prático, mesmo que não seja visível de forma imediata.Ao contrário, a mediaticidade deve ser a característica do pensamento: este só ocorre quandonão se aceita passivamente o desde sempre dado.

Explicitar contradições ao invés de omiti-las deveria, neste sentido, constituir-secomo finalidade de qualquer processo formativo, além, é claro, de resgatar a liberdade que opensamento, a auto-reflexão – enfim, a teoria – podem produzir.

Todavia, há na formação a crise da prática, explicitada pela angústia do não sabero que se deve fazer. Então, abandona-se a teoria e a práxis transforma-se em mero tecnicismo,busca por metodologias que se encaixem nos problemas pedagógicos enfrentados. Perdem-seos fins e até mesmo os meios. No entanto, encontrar os meios mais adequados para a soluçãoimediata de dificuldades continua sendo o objetivo principal. Adorno fala do fascínio exercido pelapráxis: “[...] Esta é uma dialética desesperada: do fascínio que a práxis impõe aos homens não épossível escapar senão através da práxis, ela porém, ao mesmo tempo – apática, estreita, carentede espírito – contribui enquanto tal para reforçar esse fascínio” (Id. Ibid., p. 207).

A teoria pode gerar a liberdade desde que não seja orientada pelo fascínio exercido

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pela prática, ou seja, desde que não tenha como finalidade resultados encomendados. A superaçãoda dicotomia entre teoria e práxis e a conseqüente aversão à teoria só pode, para o autor, ocorrerpelo resgate da própria teoria:

[...] Os que não param de gritar: Demasiado abstrato!, empenham-senum concretismo, numa imediatez, que estão abaixo do nível dosmeios teóricos disponíveis. Isso favorece a práxis aparente. Os maisfinórios dizem [...] que a teoria é repressiva; e qual atividade no interiordo ‘status quo’ não o seria a seu modo? O agir imediato, no entanto[...] está incomparavelmente mais próximo da repressão do que opensamento, o qual ajuda a respirar. O ponto arquimédico: como épossível uma práxis não-repressiva, como navegar entre as alternativasespontaneidade e organização; isso só pode ser descoberto, se é queé possível, através da teoria e não por outra via (ADORNO, 1995, p.223, grifo do autor).

A própria prática, apartada da teoria, é compreendida como técnica e, nesse sentido,a Psicologia, por meio de suas teorias de desenvolvimento e de aprendizagem pode, supostamente,oferecer técnicas, métodos de ensino e de controle dos processos de aprendizagem paraaperfeiçoar as relações pedagógicas:

Os homens inclinam-se a considerar a técnica como sendo algo emsi mesma, um fim em si mesmo, uma força própria, esquecendo queela é a extensão do braço dos homens. Os meios – e a técnica é umconceito de meios dirigidos à autoconservação da espécie humana –são fetichizados, porque os fins – uma vida humana digna – encontram-se encobertos e desconectados da consciência das pessoas(ADORNO, 2003, p. 132-133).

Adorno (2003) enfatiza, ainda, a necessidade de fortalecer nas Universidades enos cursos de preparação para o magistério uma Sociologia vinculada à pesquisa histórica denossa própria época. Destaca, também a importância da presença da Filosofia na formação deprofessores. Ao discutir as decisões a respeito da educação, ressalta que modelos autoritários,impostos a partir do exterior contradizem a idéia de homem autônomo, emancipado, e, nestesentido, as mudanças curriculares ou os modismos pedagógicos implementados nas escolas,sem qualquer consulta aos docentes, constituem-se como momentos repressivos que produzema pseudoformação.

A pseudoformação não é uma formação pela metade; é a negação da formaçãocultural e em seu lugar é colocada a falsificação da formação, que exclui da consciência dosindivíduos os resquícios de espanto e resistência. Para Adorno (1996), a pseudoformação é aforma dominante da consciência atual. É produzida, dentre outros fatores, pela separação socialentre o trabalho do corpo e o trabalho do espírito. Nas relações mais avançadas do capitalismo,as diferenças econômicas impedem os indivíduos de pensar no sentido e na finalidade da formaçãocultural. As relações sociais, assim, evitam que a cultura cumpra a promessa de liberdade.

Segundo o autor, a formação deveria se referir ao indivíduo livre e à sua consciência,

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pressupondo uma sociedade autônoma, uma humanidade sem status e sem exploração. Nestesentido, nas sociedades capitalistas, a formação cultural é convertida em pseudoformaçãosocializada. Todavia, Adorno (1996) afirma que a auto-reflexão crítica sobre a pseudocultura é aúnica possibilidade de manter viva a cultura em nossos dias, uma vez que, por se desenvolver emuma sociedade contraditória, a cultura tem duplo caráter: de formação e de pseudoformação.Esta fortalece a ideologia e promove uma formação regressiva.

A pseudoformação – o pseudo-saber – invade e destrói a possibilidade de realizarexperiências formativas como um processo progressivo, emancipador e contínuo. Em seu lugarpromove vivências: aceleradas, fragmentadas, nas quais a imediaticidade deforma a capacidadede pensar, entender e sentir.

A pseudoformação não é um passo para a formação: ao contrário, é seu principalinimigo. Na condição de não-saber, o indivíduo busca saber; mas no pseudo-saber, a pessoajulga-se sabedora. A pseudoformação, assim, é o pseudo-entendido, o pseudo-experimentado,que possui status de entendido e experimentado.

Também com a finalidade de discutir a preparação para o magistério e criticar otecnicismo presente nos modelos formativos atuais e, assim, resgatar os processos de formação,Patto (2004) reflete sobre o lugar das humanidades neste processo.

A autora afirma que as dificuldades da escola pública não podem ser compreendidascomo de cada professor individualmente, maneira como são interpretados os obstáculos daeducação e que está na base da constituição dos cursos de reciclagem e aperfeiçoamento, alémdos de licenciatura e Pedagogia. A escola pública é uma instituição e, portanto, tem caráter social.Por isso, o que deve ser visado não é ao professor individualmente, mas sim à escola.

O que não se percebe, segundo a autora, é que o chamado “despreparo” do pro-fessor só se agrava com propostas milagrosas dos cursos de aperfeiçoamento porque continuamsendo apoiados em teorias psicológicas de desenvolvimento e de aprendizagem que entendem arelação professor-aluno abstraída do contexto educacional.

Por isso, resgata o lugar das humanidades no processo formativo, defendendo apresença da Filosofia e da História na formação de professores, para desenvolver tanto a atitudefilosófica diante da realidade escolar, quanto para compreender a gênese histórica dos fenômenoseducativos.

No que se refere à Psicologia na formação dos professores, a autora aponta queela é ilusória como instrumento para entender as relações entre desenvolvimento e a aprendizagema fim de que o professor possa ter o domínio absoluto desses processos. O que a Psicologiapode trazer é a “leitura” ou a “escuta” do que surge nos grupos de formação e o trabalho com aangústia presente nas relações educativas. Conclui que a:

Formação é mais do que domínio de conhecimentos em determinadocampo disciplinar e aprendizagem de técnicas de ensino ou depesquisa. Sem negar a relevância deles, insisto que formação ésobretudo exercício permanente de presença ativa no mundo, pensadada perspectiva do compromisso ético. Penso que uma nova concepção

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de formação docente deve começar com uma nova concepção deeducador: seja alfabetizador no ensino fundamental, professor dematemática no ensino médio ou docente de história da educação noensino superior, ele deve ser formado como trabalhador intelectual,pois só assim pode fazer a sua parte na realização histórica dahumanização da vida (PATTO, 2004, p. 77, grifo da autora).

Como resgatar processos formativos orientados para a busca das experiênciasintelectuais, para o retorno à teoria como práxis? Como formar professores para a autonomia,para a auto-reflexão, enfim, para o desenvolvimento do espírito, do pensamento, contra a barbárie,para que possam ser formadores?

Como a Psicologia pode se inserir na formação de professores, promovendo aconsciência crítica, ao invés de oferecer receitas para aperfeiçoar o ensino?

A Psicologia certamente não pode salvar a escola. Mas criticá-la como forma deaperfeiçoamento das relações pedagógicas ou ainda como explicação naturalizante para osproblemas de escolarização pode desvelar os danos que ela tem causado para a instituição es-colar e para a formação de professores. A Psicologia como parte de um processo de formaçãopode ser a própria desconstrução dessa Psicologia tecnicista, instrumental, utilitarista.

Nesta desconstrução é tarefa fundamental historicizar o conhecimento produzidopela Psicologia em sua relação com a Educação, quando se quer uma Psicologia participante deum processo formativo.

O projeto filosófico da formação diz respeito àquele apontado por Maia (2002) deconsiderar radicalmente a condição social e recuperar historicamente o processo dialético doesclarecimento, que se dá por meio da teoria:

De uma práxis que se opunha à ideologia, a crítica atualmente serefugia na teoria, procurando fugir a meros termos operacionais ouestatísticas que vigiam o funcionamento ótimo da máquinaadministrativa, mas neste refúgio, ao contrário de furtar-se à práxis, acrítica não deixa de ser também prática e política (Id. Ibid., p. 64-65).

Neste sentido, não é qualquer Psicologia que pode garantir processos de formação,mas sim aquela que questione as crenças sobre ensino e aprendizagem eficazes e, por isso,garanta uma outra inserção dos professores no ensino de seus alunos. Esta Psicologia teria achance de pôr os professores a pensar seu próprio pensamento. De acordo com Adorno (1996),a única possibilidade de sobrevivência da formação é o exercício da auto-reflexão crítica sobre apseudoformação. No caso da Psicologia, é fundamental refletir criticamente sobre sua presençanos processos de pseudoformação de educadores como possibilidade de resgatar o sentido daformação.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ADORNO, Theodor W. Notas marginais sobre teoria e práxis. In: _____. Palavras e sinais: modeloscríticos 2. Tradução Maria Helena Ruschel. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995. p. 202-231.

_____. Teoria da semicultura. Educação e Sociedade, ano XVII, n. 56, p. 388-411, dez. 1996.

______. Educação e emancipação. 3. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003.

CROCHIK, José Leon. A personalidade narcisista segundo a Escola de Frankfurt e a ideologia daracionalidade tecnológica. Psicologia USP, São Paulo, v. 1, n. 2, p. 141-154, 1990.

LEOPOLDO E SILVA, Franklin. Conhecimento e razão instrumental. Psicologia USP, São Paulo,v. 8, n.1, p. 11-31, 1997.

MAIA, Ari Fernando. Televisão e barbárie: um estudo sobre a indústria cultural brasileira. 226f. Tese(Doutorado em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano) – Instituto de Psicologia,Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002.

PATTO, Maria Helena Souza. Formação de professores: o lugar das humanidades. In: BARBOSA,R. L. L. (Org.). Trajetórias e perspectivas da formação de educadores. São Paulo: UNESP, 2004.p. 61-78.

NOTAS

1 Em consulta ao acervo do sistema SIBI/DEDALUS da Universidade de São Paulo e, mais especificamente, ao Instituto de Psicologia(IP) e à Faculdade de Educação (FE) do campus da capital, foram encontrados diversos trabalhos que tratam da formação deprofessores. Na FE há mais de dois mil livros, artigos, dissertações e teses sobre o tema. Já no IP é possível encontrar cerca decento e vinte trabalhos referentes ao assunto. Quando a consulta é efetuada tendo como palavras-chave formação de professorese Psicologia o número de registros na FE se reduz para noventa e cinco. No IP, foram encontrados 92 registros. Como pôde serobservado por meio dos títulos dos materiais encontrados, a maioria diz respeito ao ensino de técnicas ou métodos que possamaperfeiçoar as relações de ensino e aprendizagem. A Psicologia aparece representada em algumas teorias para instrumentar oprofessor em seu trabalho pedagógico. A partir da década de 90 é possível verificar a presença de trabalhos que visam ao estudoda formação do professor e de seu compromisso político. Todavia, há poucos trabalhos que se referem à análise crítica dos cursosde aperfeiçoamento docente ou à presença da Psicologia na formação de educadores.2 Dissertação de Mestrado intitulada “Formação docente e racionalidade instrumental: reflexões sobre a Psicologia a partir dodepoimento de professores”, sob a orientação da Profa. Titular Maria Helena Souza Patto, Instituto de Psicologia, USP, SP, defendidaem junho/2006.3 “[...] aquilo que caracteriza propriamente a consciência é o pensar em relação à realidade, ao conteúdo – a relação entre as formase estruturas de pensamento do sujeito e aquilo que este não é. Este sentido mais profundo de consciência ou faculdade de pensarnão é apenas o desenvolvimento lógico formal, mas ele corresponde literalmente à capacidade de fazer experiências. Eu diria quepensar é o mesmo que fazer experiências intelectuais. Nesta medida, e nos termos que procuramos expor, a educação para aexperiência é idêntica à educação para a emancipação” (Adorno, 1996, p. 151).

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INTRODUÇÃO

Neste artigo, são apresentadas análises preliminares de dados obtidos em pesquisadesenvolvida em nível de graduação, no período 2006-2007, que objetiva responder à seguintequestão: quais concepções sobre a profissão docente são aprendidas por alunos dos cursos deLicenciatura durante sua formação inicial para a docência?

Na formação inicial de professores buscou-se resposta para a indagação feita. Aformação inicial de professores resulta da interação de uma complexidade de fatores que permeiame caracterizam o curso de licenciatura. Nesta etapa da formação do professor, reduzir suaaprendizagem à aquisição de conhecimentos da área específica a qual pertence o conteúdo queele irá ensinar pode não ser uma boa idéia, se se pensar que a complexa realidade que esperapelo professor na escola e na sala de aula exigirá dele bem mais do que isso. Aprender a ensinaré um processo, nas palavras de Mizukami (2002, p. 22). Um processo permanente (MIZUKAMI etal., 2002), do qual faz parte a formação inicial. Precedendo ao ingresso do futuro professor naescola, os anos de licenciatura são destinados à aquisição de conhecimentos e habilidades paraa profissão. Na condição de instituição formadora do professor por excelência, a universidadeassume o compromisso de introduzir o futuro professor no complexo universo da educação e doensino, facultando-lhe os saberes necessários à docência: saberes sobre a escola, sobre o aluno,sobre o processo de ensino-aprendizagem, sobre as novas propostas educacionais etc.

Na formação inicial, surge a necessidade de colocar o futuro professor em contatocom as possibilidades e dificuldades relativas à sua profissão e à educação, de modo maisabrangente. Ao final da licenciatura, espera-se que o professor tenha alguma clareza a respeito deaspectos relacionados à sua profissão; espera-se que consiga fazer suas opções teórico-metodológicas, ainda que estas, em sua prática profissional futura, não se confirmem; espera-seque tenha segurança, ainda que minimamente, para desenvolver sua prática educativa. Isso seriaesperar muito de uma formação inicial? Por que não investir devidamente nesta formação tornando-a suficientemente capaz de subsidiar com sucesso os momentos iniciais do professor na escola,momentos esses que, muitas vezes, definem todo um percurso profissional? A licenciatura,enquanto ponto de partida oficial de uma formação profissional que habilita para a prática1, pode

APRENDIZAGENS SOBRE A DOCÊNCIA NAFORMAÇÃO INICIAL: UMA INVESTIGAÇÃO

ANALÍTICO-DESCRITIVA DAS CONCEPÇÕES DEFUTUROS PROFESSORES SOBRE A SUA PROFISSÃO

LOPES, Rosemara Perpétua (UNESP/IBILCE/Pedagogia);NONO, Maévi Anabel (UNESP/IBILCE/Educação)

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ser a chave para a satisfatória realização de um processo formativo permanente.Epistemologicamente, licenciar é conferir o direito a alguém de exercer algo (uma profissão).Seria a licenciatura apenas uma autorização, uma outorga, ou implicaria ela em algo mais, como,por exemplo, compromisso? Que contribuição ao processo contínuo de formação do professorpode (ou cabe à) a formação básica oferecer?

As universidades formam professores. A licenciatura habilita o professor para assalas de aula. As grades curriculares dos cursos de licenciatura evidenciam a formação inicialoferecida, apontam na direção de como os futuros professores irão conceber e se relacionar comsua profissão. É a formação universitária moldando a visão de mundo do estudante, influindo nasua vida profissional. Os conhecimentos aprendidos pelo estudante na universidade orientam opensar e o agir do professor na escola. Os conhecimentos adquiridos por esse profissional antesde iniciada a sua carreira - não somente os adquiridos nos anos de licenciatura, mas também osadquiridos nos anos de escolaridade - figuram como aprendizagens de uma formação que nuncase acaba.

Quem é o profissional que atende pelo nome de professor? Quem é essa figuracentral dos discursos e estudos educacionais? Nas palavras de André (2001, p. 92-3),

[...] professor não é, certamente, apenas aquele que ensina emdeterminada área específica, professor é também aquele que atua nainstituição social, política e cultural, que é a escola, participando(consciente ou inconscientemente, de maneira competente ou não)das lutas políticas que se travam nela e por ela, e das experiênciassociais e culturais que se desenvolvem no contexto escolar – lutas eexperiências que ensinam tanto quanto (ou mais do que?) as áreasespecíficas em que ensinam. [...] Muitas são as dimensões doprofissional professor [...]; sua formação deve, pois, abranger todasessas dimensões. Formar o professor não é apenas qualificá-lo emuma área específica, capacitá-lo teórica e metodologicamente paraensinar determinado conteúdo, mas é também formá-lo para enfrentare construir a ação educativa escolar em sua totalidade.

Embora longa, a citação acima se faz oportuna. Nela, André afirma que muitas sãoas dimensões do profissional professor e que todas essas dimensões deverão ser contempladasem sua formação. De outro modo, para quê se forma o professor?

O professor é um profissional, não um missionário. Historicamente foi ummissionário, na época dos jesuítas. Mas este tempo é passado (não é mesmo?).Independentemente do conteúdo específico que ensina – Língua Portuguesa, Matemática, Biologia,História, Geografia, Artes, e outros -, o professor é um profissional que atua no campo da educação.Nas palavras de André (idem, p. 100),

[...] só estará habilitado para uma ação pedagógica pertinente ecompetente no ensino da Matemática, das Ciências, da Física, daBiologia, da Química, da Geografia, da História etc., um professorcuja formação tenha sido influenciada – marcada, determinada – pelaspesquisas na área específica ou nas áreas específicas na qual ou nasquais e para a qual ou para as quais se forma professor.

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Muitos autores estudam e escrevem sobre a profissão docente, sobre o professore seus saberes (TARDIF, 2001; MIZUKAMI, 2004). Na literatura educacional, os diferentesparadigmas de formação do professor são objeto de análise (PÉREZ GÓMEZ, 1992). O perfil deum curso de licenciatura varia de acordo com o tipo de formação a ele veiculada. Na perspectivade Pérez Gómez (1992, p. 110), a prática deveria assumir um papel central em todo o currículodos cursos de formação docente, visto que, na vida profissional, na escola, o professor se defrontacom variadas situações para as quais não encontra respostas pré-elaboradas.

Não se pode negar que as situações incertas e conflituosas da sala de aula, enquantoreflexo de uma sociedade igualmente incerta e conflituosa, requerem atenção e superaçãoconstantes. À educação cabe responder às mudanças sociais e tecnológicas ocorridas ao longodo tempo. No campo de atuação do professor, o desafio da sala de aula (e, de modo maisabrangente, de um ensino de qualidade) permanece. Segundo Mizukami et al.,

[...] aprender a ser professor, nesse contexto, não é, portanto, tarefaque se conclua após estudos de um aparato de conteúdo e técnica detransmissão deles. É uma aprendizagem que deve se dar por meio desituações práticas que sejam efetivamente problemáticas, o que exigeo desenvolvimento de uma prática reflexiva competente. Exige aindaque, além de conhecimentos, sejam trabalhadas atitudes, as quaissão consideradas tão importantes quanto os conhecimentos. (2002,p. 12)

No cenário educacional dos dias atuais, figura, ainda, a questão apresentada porMizukami (2004), no artigo Aprendizagem da docência: algumas contribuições de L. S. Shulman.A questão é “como os professores aprendem a ensinar”. De acordo com o artigo, os professoresprecisam ter diferentes tipos de conhecimentos, a exemplo do específico, do pedagógico doconteúdo e do curricular. Os professores devem ter conhecimento das formas de transformar oconteúdo considerando os propósitos do ensino, assim como conhecimento das formas decomunicar tal compreensão, de modo a propiciar o desenvolvimento do conteúdo comunicado namente do aluno. Os professores devem encontrar formas de comunicar conhecimentos para osoutros. De acordo com um depoimento citado em Wilson, Shulman, Richert (1987, apud MIZUKAMI,2004), quando se aprende a ser professor, deve-se aprender em termos de como se irá ensinaralgo, de como isso irá afetar os estudantes e de como eles serão capazes de entender o conteúdoproposto2.

Ao se falar em “o professor deve isto ou aquilo”, é sempre bom esclarecer que,muitas vezes, não é a boa vontade do professor que o leva à ação, mas sim fatores como formação,condições de trabalho e recursos favoráveis. Muitas vezes, o professor (já em exercício) sequerse dá conta de que é possível agir de outro modo. A desvalorização da profissão docente contribuipara mantê-lo neste “estado de dormência”. Pode acontecer ainda que o professor vá para aescola munido de boas intenções, em busca da concretização de suas idéias e ideais. Ele querfazer o melhor, e trabalha com afinco para isso, acreditando no que faz. No entanto, sozinho as

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chances de sucesso nessa empreitada reduzem-se, podendo tornar-se nulas. Isto porque o pro-fessor não é uma ilha na escola, assim como também a escola não o é na sociedade.

Segundo defende Libâneo (2001, p. 192), “[...] a profissão de professor combinasistematicamente elementos teóricos com situações práticas reais”. A este respeito, Libâneo faza seguinte consideração:

Atualmente, em boa parte dos cursos de licenciatura, a aproximaçãodo futuro professor à realidade escolar acontece após ter passadopela formação “teórica” [inicial] tanto na disciplina específica comonas disciplinas pedagógicas. O caminho deve ser outro. Desde oingresso dos alunos no curso, é preciso integrar os conteúdos dasdisciplinas em situações da prática que coloquem problemas aosfuturos professores e lhes possibilitem experimentar soluções. [...] osalunos [futuros professores] [diz ele] precisam conhecer o mais cedopossível os sujeitos e as situações com que irão trabalhar.

O que Libâneo propõe é uma articulação entre teoria (acadêmica, por excelência)e prática (escolar). Como ele mesmo diz “[...] trata-se de uma formação centrada nas demandasda prática” (LIBÂNEO, 2001, p. 193). A relação entre organização (cultura) escolar e formaçãodocente estabelecida pelo autor traduz-se na premissa de que a organização escolar é fonte emeio de aprendizagem profissional. O ponto de vista de Libâneo evidencia o fato de que o profes-sor não está isolado no ambiente escolar, ele determina esse ambiente, sendo por ele determinado.Numa época em que estudiosos consideram a racionalidade prática como o tipo de formaçãonecessária aos futuros professores (PÉREZ GÓMEZ, 1992; ZEICHNER, 1993; SCHÖN, 1992),Libâneo apresenta a escola e sua organização como local de formação docente.

A docência envolve uma multiplicidade de fatores, conforme se observa. Falar sobredocência é falar sobre sujeitos e processos. Sujeitos são idiossincráticos, culturais, sociais,históricos; processos são contínuos. A diversidade permeia o processo formativo do professor, dauniversidade à escola. O universo escolar espera pelo professor, seus saberes, suas práticas. Eo professor, que expectativas tem sobre o universo escolar, o que sabe sobre o seu campo deatuação, sobre sua função - na escola e na sociedade -, sobre a função da escola, do ensino e daeducação?

Isso tudo tem muito peso na prática educativa. As concepções dos professoresnorteiam seu trabalho na escola (MARCELO GARCIA, 1997, p. 65). Professores em início decarreira vivem o drama da “adaptação”, por quê? Por que não tornar o ingresso do professor naescola mais sublime e menos traumático, conferindo-lhe previamente saberes sobre a realidadedesse lugar e de seus ocupantes?

ASPECTOS GERAIS DA PESQUISA

Questões como as acima expressas motivaram a investigação sobre processosde aprendizagem da docência vividos por estudantes do quarto ano em cursos de licenciatura,formação básica aqui focalizada. Tal investigação resultará no Trabalho de Conclusão de Curso

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de Graduação do Curso de Licenciatura em Pedagogia.Pressupondo ser a licenciatura um período caracterizado pela aquisição de saberes

sobre a docência e período no qual é formada a visão do futuro professor sobre a sua profissão –visão, esta, que orientará a sua prática educativa na carreira inicialmente –, elaborou-se, comoinstrumento de coleta de dados, um questionário contendo oito perguntas abertas, referentes àsseguintes temáticas: prática educativa na concepção do futuro professor, relação entre teoria(conhecimento) e prática (do professor), gestão escolar na concepção do futuro professor,aprendizagens ou saberes do futuro professor na formação básica, a importância das experiênciasde ensino na formação do professor.

O questionário foi respondido por vinte estudantes de dois cursos de licenciatura:Curso de Licenciatura em Letras e Curso de Matemática Licenciatura, de uma universidade públicado interior paulista. Dos vinte estudantes, dez pertencem a cada um dos cursos mencionados;dos dez, cinco estudantes freqüentam o curso no período diurno e cinco no noturno. A coleta dedados foi realizada em sala de aula, no período de novembro de 2006 a março de 2007. Pararealizá-la, contou-se com a colaboração de professores dos cursos envolvidos.

Feita a coleta, procedeu-se à descrição e análise dos dados, tendo sidoestabelecidos os seguintes eixos de análise: 1) Professor: da teoria à prática da sala de aula, noqual se buscou evidenciar as concepções dos estudantes sobre a prática educativa do professorem sala de aula, sobre o papel do professor na escola e na sociedade, sobre as teorias educacionaisque orientam a prática educativa do professor; 2) A relevância das concepções do professor naprática educativa, no qual se buscou evidenciar as concepções dos estudantes questionadossobre o ensino e a educação, pressupondo, por sua abrangência, essas concepções são indicativasdos processos de aprendizagem vividos pelos futuros professores e também de suas concepçõessobre a profissão para a qual se formam; 3) O papel do professor na gestão escolar, no qual sebuscou evidenciar a concepção dos estudantes sobre gestão escolar e, mais especificamente,sobre o papel do professor na escola, evidenciado se, para os estudantes questionados, a açãodo professor está restrita ou não à sala de aula; 4) Saberes e formação docente, no qual foi dadoenfoque aos saberes aprendidos ou não pelo estudante na licenciatura, pressupondo seremesses saberes reflexo da formação do estudante; 5) Formação e trabalho docente, eixo no qual foidado enfoque à interface existente concepções e práticas, ambas tributárias da formaçãoprofissional do estudante; 6) Experiência docente: formação que transcendo os estreitos limitesda sala de aula da universidade, eixo no qual se buscou evidenciar a experiência de ensino dosestudantes questionados, discutindo a importância dessas experiências na formação do profes-sor.

Atualmente, a investigação se encontra na etapa final de análise. O trabalho realizadoaté o momento tem revelado certa insegurança dos futuros professores quanto à profissão para aqual se formam e aparente fragilidade de suas concepções sobre a docência. Os estudantesmostram-se preocupados e receosos quanto ao que os espera depois da formatura na escola deensino fundamental e médio, seu campo de trabalho.

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Em resposta ao questionário, os estudantes escreveram, entre outras abordagens,sobre o que aprenderam no curso que os forma, sobre o que não aprenderam e sobre o quegostariam de ter aprendido, mas não aprenderam. Nesse intuito, expressaram desejos efrustrações; escreveram sobre suas perspectivas e angústias. A criticidade marca o discurso dossujeitos envolvidos na pesquisa, levando o leitor à reflexão sobre a importância da formação básicano percurso profissional do professor, afinal, os momentos iniciais do professor na escola podemser cruciais à sua carreira, conforme afirma o estudante ALN43. Desiludido, melhor dizendo,frustrado em suas expectativas, o professor iniciante corre sério risco de abandonar ou tornar-seindiferente à profissão escolhida.

[...] Já tive experiência como estagiária, professora substituta emonitora. Foram péssimos quando relativos ao ensino de escolapública. Na escola particular, encontrei dificuldades também, mas estaspodiam ser sanadas com o conhecimento de prática de ensino quetivemos na graduação. Atualmente leciono apenas particularmenteporque nesses casos há interesse de aprendizagem por parte do alunoe com isso posso aplicar o que aprendi na graduação. Fora isso, éimpossível dar aula. O que fazemos é uma tentativa frustrada e umdesgaste emocional intenso para educar (no sentido de “dar berço”)os [aos] alunos, uma vez que os pais delegaram tal responsabilidadepara a escola. No caso da escola pública, pior, pois além disso, somosconstantemente ameaçados. Viramos na verdade, uma descarga dasfrustrações dos alunos que não conseguem aprender e não vêemsentido nisto e portanto destrata [destratam] o professor a todomomento. Eu me desiludi totalmente e profundamente com a profissãodo professor. (ALN4)

A análise, cujo objetivo é evidenciar o que pensa o estudante que cursa o quartoano de licenciatura sobre a sua profissão – a docência – vem revelando a precariedade de umaformação que não prioriza o preparo do estudante para o ingresso na escola como professor,conforme evidencia o enunciado pelo estudante AMN4.

Talvez discussões como esta sejam os conteúdos mais importantespara o professor. No curso de matemática aprendi a ficar bom emcálculo e não deixar nenhum aluno me pegar com perguntinhas chulas,mas o que direi para um aluno com problemas familiares, iniciando ouso de drogas ou que não respeita professor e colegas? Faça o exercíciox e y? Quem sabe assim eles resolvam seus verdadeiros problemas etambém goste da matemática... Parece irônico. (AMN4)

Nas respostas, alguns estudantes demonstram mais do que insegurança;demonstram desespero e, algumas vezes, revolta, como no caso de AMN4. Ao discorrer sobre arealidade que espera por eles na escola, evidenciam seus temores e sua visão negativa do campode atuação do professor. Alguns se declaram frustrados e ou decepcionados com o que viramnas escolas como estagiários, a exemplo de ALN4.

Chama a atenção o modo como o estudante de licenciatura define sua profissãofutura. No caso do estudante AMN4, uma visão pouco otimista da profissão marca seu discurso,como ilustra o trecho a seguir.

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A profissão PROFESSOR é a mais atuante na educação depoisdaquela recebida em casa pelos pais. Mas hoje vemos situaçõescontraditórias a isso: pais que acham que professores sãoresponsáveis pela educação dos filhos; professores que simplesmentetransmitem idéias e não aprendizado; “prostitutas e prostitutos” dosaber: fácil de se ganhar dinheiro lidando com pessoas carentes ecedentes de aprendizado. (AMN4)

Ao escrever sobre a experiência de ensino que teve, o estudante ALN5 evidenciaaspectos da formação básica vivida.

O estágio de observação na rede pública é obrigatório no último ano.É interessante quando você consegue aprender alguma dica sobredar aula com o professor. Mas me parece desnecessário quando tudoo que o professor da série “tal” faz é gritar e gritar; b) já lecionei línguaportuguesa, mas somente para adultos e foi uma ótima experiênciaporque você se sente a vontade para falar de igual a igual, pode cobrarcoisas deles que não são possíveis de serem feitas a uma criança. Jálecionei outras coisas que não língua portuguesa a crianças de váriasidades. Também é legal, mas a gente tem que ter mais calma epaciência, além de saber dosar. (ALN5)

Em suma, a investigação tem revelado que o preparo e as perspectivas dosestudantes envolvidos na pesquisa são negativos em relação à sua profissão, cujo campo deatuação é a escola. Embora receosos, inseguros e descontentes, esses estudantes em breve(em 2008) estarão na escola, atuando e sobrevivendo ao desafio de ensinar em condições adversas,contando apenas com as aprendizagens de uma formação inicial centrada numa realidade quenão é a da escola de ensino fundamental e médio para a qual o professor se dirigirá. Nessesentido, parece previsível o futuro que os aguarda nos primeiros anos da docência.

CONSIDERAÇÕES ACERCA DA PESQUISA REALIZADA

Considerando o que a investigação tem revelado até o momento, o problema quese coloca é o da não percepção da realidade vivida. Na escola, se o professor não conseguir iralém do senso comum em relação à realidade que o cerca - especialmente o professor em iníciode carreira -, refletindo e agindo com segurança sobre essa realidade, suas chances de superardesafios e adversidades, assim como de sobreviver a mudanças educacionais constantes reduzem-se, podendo comprometer sua carreira e, até mesmo, sua saúde (mental). Realidades aparentesremetem ao mito da caverna, de Platão: é preciso enxergar além das sombras (realidade aparentevivida no interior da caverna), sem, contudo, deixar que os olhos acostumados à escuridãodeslumbrem ao contemplar a claridade antes desconhecida.

A formação de professores é um dos primeiros fatores a ser considerado quandose trata de qualidade da educação e do ensino (NÓVOA, 1997). Nesse sentido, convém lembrar oque afirma Marcelo Garcia (1997, p. 51), ao citar Kemmis (1987, p. 74): “[...] a educação só podereformar-se transformando as práticas que a constituem”. Práticas e políticas que, conforme

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enunciado pelo estudante ALN1, configuram o campo de atuação do professor, campo no qual aeducação e o ensino acontecem.

Ao meu ver, não é só o ensino que não está bem, e sim toda a educaçãobrasileira, partindo do material didático defasado, da indisciplina, daprogressão continuada (que faz com que muitos alunos, que não sabemnem escrever cheguem ao Ensino Médio), das políticas educacionaisadotadas (com uma visão utópica do ensino), e da má administraçãoescolar encontrada em várias escolas. Cabe, porém, inserir ao caóticosistema educacional brasileiro as péssimas condições de ensino aque muitos alunos são submetidos. Isto se dá devido a má remuneraçãodos educadores, as precárias condições de trabalho, etc., o que leva[faz] com que muitos se sintam desmotivados a exercer com primaziaseus trabalhos. (ALN1)

A escola, enquanto campo de atuação do professor, não pode figurar como umaestranha e ameaçadora realidade àquele que freqüenta o último ano de uma formação básicapara a docência. De outro modo, da universidade à escola, o choque entre o estudado e o vividose fará inevitável. Tomando-se a formação permanente como parâmetro, o contexto educacionalapresentado pelo estudante ALN1 leva à reflexão sobre quais conhecimentos são necessários aoprofessor para atuar na instituição escolar, nos dias atuais. Uma investigação para além dosconhecimentos devidos à formação básica.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANDRÉ, M. (Org.). O papel da pesquisa na formação e na prática dos professores. Campinas:Papirus, 2001.

LIBÂNEO, J.C. Organização e gestão da escola: teoria e prática. Goiânia: Alternativa, 2001.

MARCELO, C. Pesquisa sobre a formação de professores: o conhecimento sobre aprender eensinar. Revista Brasileira de Educação, n. 09, Set/Out/Nov/Dez 1998.

MARCELO GARCIA, C. A formação de professores: novas perspectivas baseadas na investigaçãosobre o pensamento do professor. In: NÓVOA, A. (Coord.). Os professores e a sua formação. 3ª

ed. Lisboa, Portugal: Dom Quixote, 1997. (Coleção Temas de Educação, v. 1).

MIZUKAMI, M. G. N. Aprendizagem da docência: algumas contribuições de L. S. Shulman. Revistado Centro de Educação. Universidade Federal de Santa Maria, vol. 29, n. 02, 2004. Disponível emhttp://www.ufsm.br/ce/revista/revce/2004/02/a3.htm. Acessado em: 13/jun/2007.

MIZUKAMI, M. G. N. et al. Escola e aprendizagem da docência: processos de investigação eformação. S. Carlos: Ed. UFSCar, 2002.

NÓVOA, A. (Coord.). Os professores e a sua formação. 3ª ed. Lisboa: Dom Quixote, 1997.

PÉREZ GÓMEZ, A. O pensamento prático do professor: a formação do professor como profissionalreflexivo. In: NÓVOA, A. (Org.). Os professores e a sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992, pp.95-114.

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SCHÖN, D. A. Formar professores como profissionais reflexivos. In: NÓVOA, A. (Org.). Osprofessores e sua formação. Lisboa, Dom Quixote, 1992.

TARDIF, M.. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002.

ZEICHNER, K. M. A formação reflexiva de professores: idéias e práticas. Lisboa, EDUCA, 1993.

NOTAS

1 Segundo Marcelo (1998, p. 56), “os professores em formação possuem crenças e imagens anteriores [à formação básica] que osacompanham ao longo de sua formação”.2 Sobre os diferentes tipos de conhecimentos dos professores previstos por Shulman, ver Marcelo Garcia (1997).3 No decorrer do texto, serão utilizadas as seguintes siglas: ALN4, AMN4, ALN5 e ALN1, significando, cada qual, respectivamente:Aluno de Letras do período Noturno, número quatro; Aluno de Matemática do período Noturno, número quatro; Aluno de Letras doperíodo Noturno, número cinco, e Aluno de Letras do período Noturno, número um.

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho objetiva, fundamentalmente, problematizar a formação deprofessores como campo de conhecimento, tendo em vista as dificuldades presentes em suaconstituição.

Foi organizado a partir do levantamento da produção de setenta e três grupos depesquisa participantes do I Simpósio dos Grupos de Pesquisa sobre Formação de Professoresno Brasil, promovido pelo GT Formação de Professores da ANPEd, coordenado pelas autorasdeste trabalho e realizado em julho de 2006, na PUC/SP.

O Simpósio constou das seguintes etapas:1ª. Conferência de abertura, proferida pela Profª Drª Maria do Céu Neves Roldão

(Universidade do Minho – Portugal), intitulada - “A formação de professores como objeto de pesquisa- contributos para a construção do campo de estudo a partir de pesquisas portuguesas”, na qualforam lançadas as bases teóricas para a discussão dos trabalhos apresentados pelos grupos depesquisa participantes do evento;

2ª. Distribuição dos grupos de pesquisa em Grupos de Trabalho (GTs), de modoque cada GT pudesse contar com propostas oriundas de diferentes instituições e regiõesgeográficas do país. Cada grupo de pesquisa participante apresentou o relato de seus trabalhos,a partir do seguinte roteiro de análise: objetivo principal; campo temático (tema e subtemas);população-alvo; quadro teórico; natureza da investigação; contribuições para o campo da formaçãode professores; desafios teórico-metodológicos;

3ª. Socialização dos resultados dos grupos de trabalho, por item do roteiro, emgrande grupo;

4ª. Análise desses resultados, empreendida pelas seguintes pesquisadorasconvidadas e seguida de debates: Maria da Graça Mizukami (Universidade Mackenzie), MengaLüdke (PUC-Rio) e Maria do Céu Roldão (Universidade do Minho – Portugal), esta última cotejandoos resultados obtidos nos grupos de trabalho com o referencial teórico apresentado por ela naconferência de abertura do evento.

CONTEXTUALIZANDO O CAMPO DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

A formação de professores, como objeto de pesquisa, vem sendo analisada pormeio de levantamentos realizados a título de “estados da arte” ou “estados do conhecimento”, ouainda “revisões de investigação”.

ARTICULANDO CONHECIMENTOS E CONFIGURANDOO CAMPO DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

LIMA, Emília Freitas de (UFSCar); PASSOS, Laurizete Ferragut (PUC/SP)

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As análises empreendidas pelo GT Formação de Professores (GARRIDO;BRZEZINSKI, 2001; LIMA et al., 2003) revelam, nas discussões acerca do campo de pesquisasobre a formação de professores, que, nos anos 90 e nos três primeiros anos da presente década,têm predominado os estudos sobre Formação Inicial; Formação Continuada e DesenvolvimentoProfissional Docente; Saberes Docentes e Aprendizagem Profissional. Quanto ao primeiro tema,destacam-se os estudos que analisam disciplinas constantes do currículo das licenciaturas. Comrelação ao segundo, destacam-se estudos sobre os processos individuais da aprendizagem dadocência e da produção e mobilização de saberes. Finalmente, ao terceiro tema correspondemtrabalhos que focalizam aspectos relativos ao ensino em sala de aula, tanto dos cursos formadoresquanto dos professores em formação.

Os temas menos abordados têm sido: dimensão política da formação e da profissãodocente; processos de construção da aprendizagem do início da docência; base de conhecimentoprofissional; ensino fundamental de 5ª a 8ª séries; ensino médio; políticas públicas de formação;ensino superior (nesse caso, encontram-se trabalhos sobre a formação na universidade, massão raros os estudos sobre a formação dos professores da universidade).

Têm sido silenciados temas como: profissionalização (valorização da carreira,condições de trabalho, apoios à formação, movimentos docentes organizados, relações com asinstâncias administrativas e pedagógicas etc.); relações entre formação e gênero; lugar / papel daFormação Inicial no continuum da Formação de Professores; formação de professores e temastransversais dos PCN; formação de professores para atuar fora da escola (movimentos sociais,hospitais, presídios, crianças em situação de risco etc.); ensino profissionalizante; Educação deJovens e Adultos; Educação Especial; Educação Rural, entre outros.

Por outro lado, alguns temas aparecem como emergentes: professor formador;formação de professores a distância; formação de professores e informática; interdisciplinaridade;trabalhos na linha dos Estudos Culturais (relações entre cultura e escola, cidadania etc.- maisvoltados para currículo-em-ação do que para Formação de Professores).

Uma análise mais global permite identificar centralização em torno de alguns temasversus lacunas ou “desprestígio” em relação a temas importantes para a área. Permite, ainda,constatar que algumas dessas produções se alinhariam, por exemplo, com discussões sobre aprática pedagógica, outras com discussões sobre currículo. Portanto, as primeiras se identificariammais proximamente com o GT de Didática e as últimas, com o de Currículo, na atual configuraçãoorganizativa da ANPEd.

Talvez isso se deva ao que Roldão (2006, p.1) diagnostica como dificuldade própriada área de Educação e de outras áreas do campo das Ciências Sociais, tendo em vista “acomplexidade dos objectos de estudo, inseridos na trama social e histórica tanto quanto por elainfluenciados”, tornando “difícil a clarificação de territórios de pesquisa e campos bem definidosdo conhecimento”.

A partir daí, procurou problematizar o “campo de estudo FORMAÇÃO DEPROFESSORES”, definindo-o em termos de

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[...] conceitos estruturantes que tendencialmente deverão delimitar ecentrar a investigação a produzir, tomando em devida conta asnecessárias interfaces com o que designámos por campos adjacentes,mas que não podem ser subsumidos num campo difuso, porquedemasiado amplo, que perde dessa forma parte do seu potencialinterpretativo e teorizante (ROLDÃO, 2006, p.3)¹.

Para ela, são conceitos estruturantes do campo de estudo Formação de Professoresaqueles referentes aos processos de aprendizagem e desenvolvimento da construção doconhecimento e do desempenho profissional dos docentes, especificados em três elementosdefinidores da profissão docente: a função docente e sua natureza, o desempenho docente, e anatureza e componentes do conhecimento profissional.

Já entre os campos adjacentes, são por ela identificados os do currículo e dadidática, e os campos das culturas docentes e cultura organizacional de escola; e, num segundonível de proximidade, e resultantes em larga medida do cruzamento das culturas profissional eorganizacional, os domínios de estudo ligados ao pensamento e concepções dos professores,identidade profissional e percursos profissionais.

Haveria, também, para a autora, campos próximos, nos quais estariam os trabalhosrelacionados à formação em outros contextos (formação de outros profissionais, formação deadultos e outras).

No texto-base (op.cit.), esse esquema conceitual é apresentado com riqueza dedetalhes e de argumentações e constituiu ferramenta fundamental para as discussões ocorridasno referido Simpósio.

A partir, então, da revisão dos estudos na área de Formação de Professores e dacontribuição da pesquisadora convidada – cujas idéias rapidamente delineamos – foi possívelmapear, de maneira clara, as questões e problemas centrais do campo, que constituíram o pontode partida para o debate realizado durante o Simpósio.

ANALISANDO QUESTÕES E PROBLEMAS CENTRAIS DO CAMPO DAFORMAÇÃO DE PROFESSORES

Após a realização dos trabalhos em grupos e de sua socialização no grande grupo,o debate dos resultados daí advindos – empreendido pelas Professoras Maria da Graça Mizukami,Menga Lüdke e Maria do Céu Roldão – enfatizou aspectos, que, a nosso ver, possibilitaram avançosimportantes em direção à busca de configuração do campo da pesquisa em formação deprofessores. Alguns deles são indicados a seguir.

Uma das principais questões destacadas foi aquela referente à presença de certaindefinição entre as concepções de professor pesquisador e pesquisador acadêmico e entrepesquisa e intervenção. Na raiz dessa questão está a concepção de pesquisa, que se encontraem plena evolução. Se, de um lado, temos de aceitar certa abertura, de outro não podemosperder os limites da função precípua da pesquisa, o que implica a necessidade de configurar

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muito claramente o problema, a fim de procurar entendê-lo, esclarecê-lo. Neste caso, é essencialdistinguir-se entre o problema, tal como é detectado na prática pedagógica e a problematizaçãodele enquanto gerador de pesquisa. Por mais que se pareça com um jogo de palavras, localizar-se-ia aí a sutileza que distinguiria um relato de experiência sobre uma dada situação e uma pesquisa.

Diretamente vinculada a esse tema está a questão do campo teórico-conceptual,envolvendo a natureza do conhecimento dos “acadêmicos” e dos “práticos”. Esses dois tipos deconhecimento não são de natureza diferente: o que ocorre é que o dos professores, sendo prático,só se constitui em conhecimento se for alimentado pelo conhecimento sistematizado. A resoluçãodesta incomunicabilidade tem de ser superada por uma redefinição dessa relação.

Foi também constatada, no conjunto da produção dos grupos de pesquisa, umaconfusão entre metodologia, método e técnica, assim como fragilidade das elaborações teóricas,indispensáveis à construção do conhecimento.

Destacou-se, ainda, a presença de muitas questões “suspensas” a respeito da“pesquisa colaborativa” e “pesquisa em cooperação”, como, por exemplo, as que dizem respeitoa iniciativa, mérito e autoria. Chamou a atenção para o fato de que a base de tais pesquisas temde ser a escola.

O conjunto da produção apresentada permitiu detectar-se uma escassa presençade estudos envolvendo observação, o que confirma resultados de levantamentos feitos tambémno exterior. Tal indicador é preocupante, já que tais estudos são extremamente importantes paraque se estabeleça o confronto entre a lógica do professor e a do pesquisador.

Os resultados apontaram a ausência de pesquisas sobre avaliação da formação,o que constituiria importante indicação para futuros estudos.

Apontaram, ainda, uma exacerbação do uso da “pesquisa qualitativa”, que aindaaparece nos trabalhos como em oposição à “quantitativa”.

Além disso, foi percebida a presença de indefinição do significado de “pesquisaqualitativa” e de “pesquisa etnográfica”.

Foi feita a defesa da importância de estudos meta-analíticos, que identifiquemregularidades e lacunas na produção da área.

Com relação ao quadro teórico que fundamenta os trabalhos dos grupos de estudosparticipantes do Simpósio, foram destacados os seguintes aspectos:

a) De modo geral, os grupos se apóiam em literatura semelhante sobre Formaçãode Professores;

b) Como os grupos não explicitaram o entendimento de alguns termos básicos(reflexão, por exemplo), tal referencial pode ter conotações diferentes. Foi indicado como muitoimportante haver a “tradução” de nossas fontes teóricas, pois isso repercute nas opçõesmetodológicas;

c) O quadro teórico presente no trabalho dos grupos é amplo, tendo como referênciavárias áreas do conhecimento importantes, tais como a Psicologia, a Sociologia, a Psicanálise, aAntropologia. Se, de um lado, tal amplitude pode ser positiva, de outro é importante que a pergunta

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de pesquisa tenha natureza educacional e não psicológica, antropológica ou social, embora aEducação se sirva dessas áreas. Essa é uma preocupação de natureza epistemológica, queindica o cuidado na salvaguarda dos campos, mas com diálogo entre eles, pois o conhecimentoeducacional não é a “aplicação” dos conhecimentos gerados em outras áreas.

Foi, ainda, discutida uma questão de fundo no tocante à pesquisa sobre Formaçãode Professores: estaria ela contribuindo para enfrentar os problemas da escola básica? Nessesentido foi destacado como preocupante, por exemplo, o fato de só ter havido, entre os setenta etrês grupos presentes ao evento, um discutindo alfabetização e um pesquisando ensino técnico.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho constitui um embrião de estudo meta-analítico, com vista àdifícil tarefa de configurar o campo da Formação de Professores. Cada uma das questões aquilevantadas possibilita desdobramentos e exige aprofundamentos que fogem ao escopo desteartigo.

Não obstante suas proporções, possibilita a indicação de pontos importantes aserem considerados na produção da área. Permite, ainda, o estabelecimento de diálogo entre ospesquisadores, cuja dificuldade foi um dos aspectos destacados no referido evento, razão pelaqual foi louvada a iniciativa de sua realização e indicada a necessidade de sua continuidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANDRÉ, M. (org.) Formação de professores (1990-1998). Brasília: MEC/INEP/COMPED, 2002.

______. A formação de professores nas pesquisas dos anos 1990. In: MACIEL, L.S.B.; SHIGUNOV

NETO, A. Formação de professores: passado, presente e futuro. São Paulo: Cortez, 2004.

GARRIDO, E.; BRZEZINSKI I., Análise dos trabalhos do GT Formação de Professores: o querevelam as pesquisas do período de 1992 a 1998. Revista Brasileira de Educação, n. 18, set./out./nov./dez., 2001, p. 82-100.

LIMA E. F. de; TERRAZZAN E. A.; BRZEZINSKI I.; GARRIDO E.; NÚÑEZ I. B.; PASSOS L. F.;RAMALHO B. L.; RIBAS M.H.. Análise dos trabalhos apresentados no GT8 no período de 1999 a2003. Trabalho apresentado na 26ª Reunião Anual da ANPEd, na categoria de “TrabalhoEncomendado”. Poços de Caldas / MG, 2003.

ROLDÃO, M.C. A formação de professores como objecto de pesquisa - contributos para aconstrução do campo de estudo a partir de pesquisas portuguesas. Lisboa/Pt, 2006 (mimeo.)

NOTAS

¹ O texto-base da Conferência: ROLDÃO, M.C. A formação de professores como objecto de pesquisa - contributos para a construçãodo campo de estudo a partir de pesquisas portuguesas. Lisboa/Pt, 2006 (mimeo.) foi publicado no n.1 da Revista Eletrônica doPrograma de Pós-Graduação em Educação da UFSCar (disponível em http://www.reveduc.ufscar.br:8080/)

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A ações de formação continuada no Brasil são recentes. Datam de meados dadécada de 60 e início da década de 70 as primeiras sistematizações dos órgãos públicos voltadosao aperfeiçoamento do pessoal docente (PALMA FILHO e ALVES, 2003), inclusive pelo Ministérioda Educação (MEC) na modalidade de cursos.

Em meados da década de 70 e 80 iniciou-se o trabalho de treinamento e formaçãopermanente junto aos professores no então ensino de primeiro grau no Brasil. Os cursosfuncionavam sob a forma representativa, ou seja, alguns poucos professores participavam dasformações e depois “repassava” essa mesma formação aos demais docentes das escolas emque atuavam.

Essa técnica de formação teve grande influência no modo de desempenhar açõesde formação contínua para professores no país, pois acreditava-se, com base nos resultadospositivos que esse tipo de formação apresentava à parcela de professores participantes destes“treinamentos”, na viabilidade e eficácia dos cursos para os profissionais do ensino.

Concomitante ao desenvolvimento dessa prática de formação, a expansão da escolapública inaugura um novo período para a educação nacional, já que eram grandes as demandasque insidiam nesse setor emergente. Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, odiscurso de democratização reforçou os desafios postos à escola pública e à atuação dosprofessores, já que vislumbrava o acesso de todos à escola. Dessa mudança decorreram inúmerasdificuldades de manutenção do sistema educacional, acarretando modificações significativas nasorientações e políticas educacionais que se seguiram.

Um dos problemas encontrados com a abertura da escola à população e com osanseios de uma paridade democrática refletiu no exercício do magistério e na profissão docente.Data dessa época o recrutamento de professores sem qualificação para o exercício da profissão,especialmente das séries iniciais do ensino básico, e também a necessidade de realizar açõesde capacitação dos docentes, cuja responsabilidade se estendia para além da educação de umapequena elite. Entretanto, a envergadura do discurso político não teve uma extensão prática emtermos da atuação pedagógica, ou no modo de processar o ensino. Os professores atuavam nadiversidade sob a lógica da homogeneidade.

No início da década de 90 o país passa por um intensificado processo de diminuiçãodas ações do Estado, a qual teve reflexões também na área educacional _ processo observadoespecialmente a partir do governo de Fernando Collor de Melo, que acentuou políticas neoliberais,orientadas por acordos internacionais.

AS POLÍTICAS DE FORMAÇÃO CONTINUADA DEPROFESSORES: ENTRE DISCURSOS E AÇÕES

GALINDO, Camila Jose; INFORSATO, Edson do Carmo (UNESP/Araraquara)

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Meio à intensidade de mudanças, a formação continuada dos professores conquistouespaço de destaque nas ações governamentais e nas práticas à margem desta; conquistou avançosefetivados na forma de Lei, no desenvolvimento de pesquisas sobre a temática (da formaçãocontinuada de professores) e de ações de formação múltiplas, resultando ainda no aparecimentode um corpo teórico circunscrito e tematizado. Por outro lado, apesar desses avanços,especialmente referente ao campo legal, pouco se avançou nas práticas outrora aplicadas, já queo sistema privilegiado na viabilização das ações de formação continuada ainda decorria de pacotessob a forma de cursos, sendo portanto pouca, senão bastante limitada (FUSARI, 1997;FALSARELLA, 2002), a repercussão dessas formações sobre a atuação profissional dosprofessores.

AS POLÍTICAS

A formação continuada dos docentes é marcada pela presença de um discursopromissor nos documentos legais da década de 90 e início do ano 2000 (BRASIL, 1996a; 1999;2005) e justificada perante a necessidade de “inovação” do campo educacional _ tardio em relaçãoao contexto mundial.

A publicação dos documentos: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional –LDB 9394/96 (BRASIL, 1996a), Referenciais de Formação de Professores – RFP (BRASIL, 1999)e Diretrizes Gerais da Rede Nacional de Formação Continuada de Professores – RNFC (BRASIL,2005) refletem a primazia que a formação continuada dos professores da educação básica temocupado nas políticas do setor educacional no país.

Algumas publicações (EDUCAÇÃO, 2004a; EDUCAÇÃO, 2004b; OECD, 2005) têmdemonstrado que a formação continuada dos profissionais do ensino se faz hoje um foco dasorientações internacionais em todo o mundo, sendo sobre ela centralizada a idéia de sucessoeducacional com a efetivação de reformas pontuais. A obtenção de resultados positivos de algunspaíses que investiram na formação continuada de professores tem colaborado para a consecuçãode investimentos na qualificação dos docentes em larga escala nos âmbitos do poder executivomunicipal, estadual e federal.

Para além da influência que as diretrizes de organismos internacionais exercemsobre as políticas nacionais é perceptível que no seio dessas diretrizes, há sempre a idéia de quea qualificação dos profissionais é um indicador de qualidade na educação, tornando-a campo deinvestimento necessário, de viabilidade temporal e relativamente curta e que somada às facilidadesde obtenção de investimentos para o custeio das mesmas, inside em melhorias no setor que hátempos se faz emergente.

Reconhecido o avanço das ações nesta área, não podemos deixar de pontuar que,apesar dos ganhos que se obtiveram em termos legais, as políticas nacionais no Brasil têm sidooscilantes em direcionamentos práticos da formação em serviço e da formação continuada dosprofissionais da educação. Essa oscilação nos leva a perceber a existência de propósitos distintos,

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percebidos tanto em termos conceituais e discursivos quanto os práticos, o que demonstra osinteresses na captação de recursos para fins diversos, que não apenas aqueles voltados a formaçãocontinuada.

A LEGISLAÇÃO E AS PRÁTICAS

Dois documentos iniciaram a legalização da formação continuada dos professoresno país: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96 (BRASIL, 1996a) e aLei Federal 9424/96 (BRASIL, 1996b) que regulamentou o FUNDEF (Fundo de Manutenção eDesenvolvimento do Ensino Fundamental e da Valorização do Magistério). Posterior a essaspublicações surge também os Referenciais para Formação de Professores (BRASIL, 1999) e asDiretrizes Gerais para Rede de Formação Continuada (BRASIL, 2005).

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96 (BRASIL, 1996a)estabelece o direito à formação continuada a todos os profissionais do ensino da educação básicaem seu título VI, e aponta fundamentos e responsabilidades para com a formação continuada nopaís por meio dos seguintes artigos:

Artigo 61 (dos profissionais da educação) – A formação de profissionaisda educação, de modo a atender aos objetivos dos diferentes níveis emodalidades de ensino [...] terá como fundamento:Parágrafo I – a associação entre teorias e práticas, inclusive mediantea capacitação em serviço.

Artigo 63 (dos profissionais da educação) – Os institutos superioresde educação manterão:Parágrafo III – programas de educação continuada para os profissionaisda educação nos diversos níveis.

Artigo 67 (dos profissionais da educação) – Os sistemas de ensinopromoverão a valorização dos profissionais da educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira domagistério público:Parágrafo II – aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive comlicenciamento periódico remunerado para esse fim. (grifo nosso).

No artigo 70 do título VII, destinado aos recursos financeiros, essa mesma Leiexplicita as responsabilidades financeiras da formação continuada:

Artigo 70 (dos recursos financeiros) – considerar-se-ão como demanutenção e desenvolvimento do ensino as despesas realizadas comvistas à consecução dos objetivos básicos das instituições educacionaisde todos os níveis, compreendendo as que se destinam a:Parágrafo I – remuneração e aperfeiçoamento do pessoal docente edemais profissionais da educação. (grifo nosso).

O ‘direito’ estabelecido em Lei, entretanto, não parece ter se concretizado narealidade da maioria dos profissionais do ensino, mesmo tendo se passado mais de dez anos deexistência dessa mesma Lei, modificada substancialmente como veremos adiante na discussão

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acerca de outros documentos que versam sobre a formação continuada (BRASIL, 1999; 2005).Formulamos, no que se refere aos destaques da LDB 9394/96 (BRASIL, 1996a)

para a formação continuada, algumas observações sobre as especificidades dessa formação,bem como sobre as possibilidades de sua concretização nos parâmetros da Lei, destacando osseguintes pontos:

- A Lei traz uma generalidade no que se refere à concretização da formaçãocontinuada nos estabelecimentos de ensino no país, bem como do próprio conceito de formaçãocontinuada, pois:

- No conectivo ‘inclusive’ (no artigo 61) transparece a idéia de que a formaçãocontinuada pode ser substituída pela formação inicial do professor, retirando-se assim, da formaçãocontinuada, o papel que lhe cabe;

- No artigo 63 a generalidade do termo ‘educação continuada’ não deixaexplícito se se trata da formação continuada propriamente dita ou da formação em serviço, umavez que ambas fazem parte do que se denomina educação continuada;

- O termo ‘aperfeiçoamento profissional continuado’ parece estabelecer certadistinção do que se entende por formação continuada, uma vez que o primeiro é deresponsabilidade de órgãos públicos mantenedores da educação (ou sistemas de ensino), e deresponsabilidade dos institutos de educação os ‘programas de educação continuada’. Haveriaalguma atribuição de valor nessas responsabilizações ou um mal entendimento de termos?

- A confusão terminológica da Lei, não permite inferências precisas quanto àatribuição institucional para a formação continuada dos professores, não havendo ainda mençãosobre os sujeitos que devem envolver-se nessas ações de formação, nem mesmo se as mesmaspodem ou não ser terceirizadas.

O aparato legal para a formação continuada construído pelo Ministério da Educaçãonão possibilitou, em decorrência da ausência de direcionamentos e especificações legais, aconcretização de ações promissoras. Essas imprecisões no texto da Lei (BRASIL, 1996a) reforçama não validade da mesma perante as práticas no setor, visto que é possível encontrar um percursoautônomo que antecede e ultrapassa a publicação da Lei.

Em termos cronológicos, podemos ver ainda, a ação política na área com a criaçãoda Ementa Constitucional 14 (BRASIL, 1996b) que estabeleceu um fundo para o financiamento daEducação, referente ao Ensino Fundamental e à Valorização do Magistério. Essa Lei, compostade 15% dos recursos referente ao Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS),Fundo de Participação dos Estados (FPE), Fundo de Participação dos Municípios (FPM), Impostosobre Produto Industrializado (IPI), passa a regulamentar os gastos orçamentários com o setorpara Estados e municípios brasileiros. Em seu artigo 2º (BRASIL, 1996b) explicita que a aplicaçãodo fundo deve ser realizada na “manutenção e desenvolvimento do Ensino Fundamental público,e na valorização de seu magistério”, e de acordo com o artigo 7º, na remuneração e na capacitaçãode professores, inclusive leigos.

Com a criação do FUNDEF, algumas iniciativas em ações de formação continuada

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puderam ser realizadas oficialmente no âmbito dos municípios pelas Secretarias ou Departamentosde Educação, o que possibilitou a realização de ações de formação em serviço em larga escala apartir da segunda metade da década de 90.

A formação continuada de educadores no país ganhou mais legitimidade com apublicação dos Referenciais para Formação de Professores (RFP) (BRASIL, 1999), documentoelaborado pelo MEC e publicado em fins da década de 90. Apesar de ser uma referência legalimportante, ele deixa em aberto um aspecto central da formação continuada dos professores –erro anteriormente cometido pela LDB 9394/96 (BRASIL, 1996a) _ referente às ações e ao perfildos sujeitos formadores; embora seja reconhecido o papel central que os formadores têm naconcretização da formação continuada.

Precisamente, o RFP (BRASIL, 1999, p.70) define que o papel da formaçãocontinuada no Brasil é o de “[...] propiciar atualizações, aprofundamento das temáticas educacionais[...] apoiar-se na reflexão sobre a prática [...] e promover processos constantes de auto-avaliação[...] para construção contínua de competências profissionais”. Tais atribuições evidenciam aestratégica posição do formador e o desafio a ser superado pelos sistemas de ensino em seusdiferentes níveis da gestão educacional. Essa mesma responsabilidade, por sua vez, revela asdebilidades históricas com as ações de formação continuada, como por exemplo, a ausência deprocessos de formação para os formadores. A inexistência desses processos limita as ações noconfinamento das formações que historicamente se estabelecem sobre “[...] eventos pontuais –cursos, oficinas, seminários e palestras - que, de modo geral, não respondem às necessidadespedagógicas mais imediatas dos professores e nem sempre se constituem um programa articuladoe planejado [...]” (BRASIL, 1999, p. 41).

Nos sistemas estaduais de educação a responsabilidade para com a formaçãocontinuada é das Secretarias de Educação, hoje subdivididas em decorrência de processos dedescentralização do setor educacional, nos âmbitos estaduais e municipais. Como nessasinstâncias há uma ausência de quadros de formadores, verifica-se uma prática de terceirizaçãode ações de formação continuada não raro sob um alto custo de serviços, resultados nem sempreeficazes e com falta de controle das ações, o que culmina, num distanciamento das ações deformação para com a realidade dos professores.

Essa precariedade contribui sobremaneira também para que os modelos de gestãoeducacional apresentem grandes insuficiências em suas atribuições, e debilidades que inviabilizamações efetivas e construtivas para essa área de atuação.

Há duas principais críticas que o próprio documento (BRASIL, 1999, p. 46) reconheceno que se refere à administração, organização e metodologia da formação continuada quedemonstram dificuldades na gestão:

[...] falta de articulação entre várias instâncias de gestão do sistema,a descontinuidade dos projetos e programas de um governo para outro,a pressa com que as ações são planejadas e realizadas para atenderàs limitações do tempo político das administrações, a falta de incentivos

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salariais ou institucionais para que os professores participem deprogramas de formação e a inexistência de tempo previsto na jornadade trabalho e no calendário escolar para formação em serviço [...] nãose planeja de forma articulada ações extensivas e de profundidade,priorizando-se a alternativa de grandes eventos pontuais, cujo efeito ébastante relativo e discutível [...] não há como considerar suas reaisnecessidades e avanços em atividades desse tipo.

Deste modo, a formação continuada dos professores, sob o descompasso einterrupções das propostas, não se efetiva, mesmo nos âmbitos mais estruturados de gestãoeducacional, o que tem requerido na atualidade, uma tomada de decisão precisa acerca dosobjetivos da formação continuada para os anseios de uma sociedade em mudança, visto que elatem, historicamente, se mostrado necessária.

Há ainda nos RFP (BRASIL, 1999), preconizado também na LDB (BRASIL, 1996a)e em referenciais bibliográficos nacionais (GIOVANNI, 2001) a sugestão de realização da formaçãocontinuada no âmbito das instituições escolares. Entretanto, o problema da formação do formadorou responsável pela formação dos professores permanece, ficando a dúvida acerca do profissionalcapacitado para desenvolver tal tarefa na escola. Valendo considerar ainda que há restriçõestambém quanto à inserção de outros profissionais alheios à escola.

A escola como foco de formação do professores enseja a discussão acerca dosrecursos e métodos disponibilizados para as ações formativas na escola – que também nãoencontra espaço nos RFP (BRASIL, 1999). Tais aspectos constituem complicadores carentes deresolução.

Parece-nos que há uma necessidade emergente para um mapeamento sobre osentraves que dificultam a aplicabilidade da formação nos diversos níveis e instâncias onde elaocorre. Esse levantamento de dados mais precisos sobre as diferentes realidades de ações deformação continuada, abre um caminho profícuo na resolução de problemas e dificuldades dodesenvolvimento profissional do professor. Nesse sentido, de acordo com os RFP (BRASIL, 1999,p. 47), é possível encontrar alguns intervenientes do processo de formação contínua no país, queainda se encontram precários, como por exemplo:

[...] a inexistência de mecanismos de acompanhamento contínuo daprática pedagógica, de avaliação periódica dos resultados das açõesdesenvolvidas e de identificação de demandas de formação, colocadaspelas dificuldades que encontram os professores no exercícioprofissional, [que] prejudica a qualidade de formação, uma vez queestes são instrumentos de avaliação fundamentais para o planejamentoe redimensionamento dos programas. (grifo nosso).

Assim, tais observações nos levam a inferir que apesar da legalização – que constituium avanço positivo – a formação continuada de professores apresenta características bastantepontuais que evidenciam um campo ainda em processo de formação.

A avaliação e acompanhamento das práticas de formação continuada e, ainda, aidentificação de demandas de formação são precisamente pontos essenciais para um planejamento

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estratégico na área. A não contemplação prática, validada em documentação oficial reflete osduros caminhos a serem trilhados, bem como a ausência de uma cultura de informação,capacitação/formação coerente, interlocutora das legalizações e das necessidades do contextoeducacional.

Sabe-se, contudo, que o planejamento e a definição de estratégias requer capacidadede antecipar demandas e necessidades _ fator que nos dias atuais constitui um diferencial paraproposta e/ou desenvolvimento de ações políticas para quaisquer setor, especialmente a educação,cujos objetivos são atingidos a longo prazo.

Uma iniciativa importante, em face da carência de articulações e planejamento nosprocessos de formações realizados para os professores na educação básica no país, e da ausênciade diretrizes norteadoras mais precisas e diferenciadas, está a recente institucionalização daformação continuada de professores por meio da criação, pelo MEC, da Rede Nacional de FormaçãoContinuada (BRASIL, 2005). Essa rede se compõe pelo estabelecimento de uma parceria entreos órgãos: MEC, Sistemas de Ensino, e Centros de Pesquisa e Desenvolvimento da Educação ebaseia-se em quatro principais eixos: Redefinição e ampliação do financiamento da educaçãobásica, Inclusão social, Democratização da gestão, Valorização\ formação inicial e continuadados profissionais da educação, os quais visam atender os seguintes objetivos: 1) Institucionalizaro atendimento da demanda de formação continuada; 2) Desenvolver uma concepção de sistemade formação em que a autonomia se construa pela colaboração, e a flexibilidade encontre seuscontornos na articulação e na interação; 3) Contribuir com a qualificação da ação docente nosentido de garantir uma aprendizagem efetiva e uma escola de qualidade para todos; 4) Contribuircom o desenvolvimento da autonomia intelectual e profissional dos docentes; 5) Desencadearuma dinâmica de interação entre os saberes pedagógicos produzidos pelos Centros, nodesenvolvimento da formação docente, e pelos professores dos sistemas de ensino, em suaprática docente; 6) Subsidiar a reflexão permanente na e sobre a prática docente, com exercícioda crítica do sentido e da gênese da sociedade, da cultura, da educação e do conhecimento, e oaprofundamento da articulação entre os componentes curriculares e a realidade sócio-histórica;7) Institucionalizar e fortalecer o trabalho coletivo como meio de reflexão teórica e construção daprática pedagógica.

Esses objetivos possuem uma similaridade com as orientações e as críticascontidas nos RFP (BRASIL, 1999, p. 22-23). Entretanto, a viabilidade das ações parece serproblemática, já que as instâncias responsáveis não apresentam estrutura para efetivá-las –caracterizando a histórica descontinuidade das políticas públicas no país, especialmente em açõeseducacionais.

A política da RNFC se materializa no âmbito da esfera pública de ensino nas redesmunicipais e estaduais, habilitando os docentes atuantes nos níveis da educação básica (educaçãoinfantil, ensino fundamental e ensino médio) por meio de ensino a distância (EAD), certificando-osem nível médio (para os professores atuantes na educação infantil e nas séries iniciais do ensinofundamental) e também, em nível superior (para docentes das disciplinas específicas do currículo

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das séries finais do ensino fundamental e do ensino médio). Como se vê, a Rede materializa aformação em serviço no rol de ações de formação continuada.

A efetivação da RNFC traduz os resultados da prática de recrutamento deprofessores leigos de formação em exercício da função docente nos referidos níveis de ensinoem toda a extensão territorial brasileira. Um fator a ser considerado com essa política, se refere àinterpretação dada ao conceito de formação continuada, visto que ela é colocada no âmbito práticoem amplitude muito maior do que aquela postulada na LDB 9394/96 (BRASIL, 1996a) e tambémnos RFP (BRASIL, 1999). A RNFC considera a formação inicial como parte da política de formaçãocontinuada, sob ações de certificação em massa de profissionais (professores) não habilitados.(grifos nosso)

As novas políticas (BRASIL, 2005) têm focado a formação inicial como eixo dasações formativas, o que nos leva a inferir uma dualidade de concepções acerca da formação deprofessores, especialmente do conceito de formação continuada. Elas têm considerado ação deformação continuada qualquer atividade formativa direcionada aos professores. Entretanto, certificareducadores que não possuem formação, apesar de representar um avanço, se configura comouma ação pontual circunscrita no campo da formação em serviço; portanto, o uso do termo“formação continuada” se faz no mínimo impróprio.

É ainda pertinente destacar que, para um campo em construção, a incoerêncianão apenas teórica como também prática das ações oficiais terá repercussões tanto nas atividadeseducativas quanto na própria (re)constituição do campo da formação contínua dos professores.Esse postulado incide sobre as intenções formativas oficais (BRASIL, 2005), que preconizamformação em nível médio aos docentes da educação infantil e das séries iniciais do ensino fun-damental, pois há uma ambigüidade entre discurso e prática, que inviabiliza a realização efetivade ações qualitativas para o campo em questão. Onde está o avanço prático da política para aformação dos professores? Os propósitos da RNFC (BRASIL, 2005) trazem a idéia de que umacapacitação mínima é suficiente para os que trabalham nas séries iniciais da educação básica. Oconceito de formação continuada nesse contexto se traduz em medida paliativa de carátereconômico que entende que a formação de professores pode-se concretizar sob quaisquermodalidades, níveis e tempos.

Outra consideração sobre a RNFC (BRASIL, 2005) é que a institucionalização daformação continuada dos professores no Brasil envereda para a estratégia e/ou tendência defocalização das políticas públicas que transitam entre a gestão dos sistemas e a articulação dasações de formação continuada sob a perspectiva de buscar ou identificar pontos e áreasestratégicas de ação. Isso implica considerar novas orientações para a denominada “autonomia”dos municípios e o delineamento de resolução de suas demandas educacionais.

Apesar da imprecisão que as “Orientações Gerais” (BRASIL, 2005) encerra aodestacar a necessidade dos sistemas (re)pensar formas e/ou metodologias viáveis de identificaçãodas defasagens (que não apenas sob a avaliação do rendimento escolar dos alunos _ como setem, historicamente, tomado como base para as formações) _ parece iniciar-se um clima de

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tensão e surgimento de novas cobranças quanto às tarefas a serem “executadas” pelos professorese gestores municipais.

Apesar das evidências de um salto qualitativo da formação continuada expressasna institucionalização da mesma, há uma problemática anunciada nessa política que requermudanças estruturais de base nos âmbitos político-administrativos e em toda hierarquia da gestãoeducacional, que abrange desde a forma de elaboração, até a execução e avaliação dos processoseducacionais e formativos, institucionalizados ou não.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Congresso Nacional. Lei Federal 9394 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece Diretrizese Bases da Educação Nacional. Brasília, 1996a.

______. Congresso Nacional. Lei Federal 9424/96 de 24 de dezembro de 1996. Dispõe sobre oFundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério.Brasília, 1996b.

______. Ministério de Educação e Cultura. Secretaria de Educação Fundamental. Referenciaispara Formação de Professores. Brasília, 1999.

______. Ministério da Educação, Secretaria da educação Básica. Orientações Gerais para RedeNacional de Formação Continuada de Professores da Educação Básica. Brasília, 2005.

EDUCAÇÃO e conhecimento: a experiência dos que avançaram. Brasília: Unesco, Ministério daEducação, 2004b.

EDUCAÇÃO um tesouro a descobrir. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: MEC: UNESCO, 2004a.

FALSARELLA, A. M. Políticas de capacitação e mudanças no cotidiano escolar. In SAMPAIO, M. M.F. O cotidiano escolar face às políticas educacionais. Araraquara: JM Editora, 2002, p. 69-96.

FUSARI, J, C. Formação contínua de educadores: um estudo de representações de coordenadorespedagógicos da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. 1997. Tese (Doutorado).Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1997.

GIOVANNI, L.M. Aprendendo sobre a profissão docente com o exercício da liberdade para refletir.In: Almeida, J.S.de (Org.) Estudos sobre a Profissão Docente. Araraquara- SP: Laboratório Edito-rial da Universidade Estadual Paulista, São Paulo: Cultura Acadêmica, 2001, p. 45-73.

OECD. Teachers Matter: attracting, developing and retaining effective teachers. Overview. In: Edu-cation and training policy. OECD, 2005.

PALMA FILHO, J. C.; ALVES, M. L. Formação continuada: memórias. In: BARBOSA, R. L. L. (Org).Formação de educadores: desafios e perspectivas. São Paulo: Editora UNESP, 2003, p. 279-296.

SINISCALCO, M. T. Perfil estatístico da profissão docente. São Paulo: Moderna, 2003.

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Contemporaneamente, sabemos que o ser humano aprende capacidades, aptidõese habilidades que o humanizam a partir do seu nascimento. É o que declaram Vigotski e seuscolaboradores.1 Segundo estes estudiosos, desde o nascimento, o sujeito vai, mediante as relaçõessociais que estabelece, considerando suas condições de vida, educação e atividade, se tornandohomem. Vai se apropriando das qualidades humanas, que, ao contrário dos animais, não fazemparte da sua herança genética, mas são externas a ele e constituem a sua herança social. E, paraque cada pessoa se torne homem, são necessárias apropriações das qualidades tipicamentehumanas incrustadas nos objetos culturais, capazes de mover o seu desenvolvimento cultural.

De acordo com o Enfoque Histórico-Cultural, cujo precursor é Vigotski (1896-1934),as qualidades humanas são caracterizadas por capacidades, habilidades e aptidões culturalmenteconstituídas, dentre as quais a capacidade de recordar, a memória voluntária, a percepçãovoluntária, a atenção voluntária, as diferentes formas de linguagem e de pensamento, a imaginação,as emoções, os sentimentos; todas externas ao sujeito no momento do seu nascimento(VYGOTSKI, 1995). Por serem externas ao sujeito, somente em processos mediados de atividade,tais qualidades são internalizadas e passam a constituir as qualidades inerentes à humanizaçãode cada pessoa. Isto pressupõe níveis diferentes de humanização, considerando as condiçõesconcretas de vida, educação e atividade de cada sujeito.

Considerando esta tese, é essencial, então, pensarmos sobre atividades quepossam propiciar a aprendizagem dessas qualidades capazes de mover o desenvolvimento cul-tural do homem. Em especial, neste trabalho, buscamos discutir sobre contar e ler histórias comoatividades promotoras de um amplo desenvolvimento das crianças pequenas, considerando seuritmo e seu tempo – que são particulares, individuais e, neste momento, dando ênfase à “Caixaque conta Histórias” como recurso metodológico e motivador da aprendizagem da leitura na infância.Especialmente, focamos o trabalho desenvolvido em cursos de formação inicial de professores,alguns dos quais já atuam na educação das nossas crianças em diferentes municípios do Estadode São Paulo.

Conforme explicitamos, na seqüência, desenvolvemos este trabalho teórico-práticocom discentes dos cursos de Pedagogia da FUNDEC (Dracena, SP.) e da UNESP (Marília, SP.),bem como em atividade de pesquisa, cujos parceiros eram crianças de um grupo de 1º ano do

CAIXAS QUE CONTAM HISTÓRIAS: RECURSOSDIDÁTICO-PEDAGÓGICOS PARA SUBSIDIAR A

FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA DEPROFESSORES (AS) DA INFÂNCIA.

LIMA , Elieuza Aparecida de (FUNDEC-Dracena; UNESP-Marília)GIROTTO , Cyntia Graziella Simões (UNESP-Marília)

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ensino fundamental e sua respectiva professora.2 Esses trabalhos de formação docente inicialserão o foco desta exposição, assim como os resultados parciais da pesquisa. Desde 2004,iniciamos discussões teóricas e organizamos oficinas para confecção das referidas Caixas quecontam Histórias, nos cursos de formação docente. Nosso intuito era e é constituir elos entre ateoria defendida e refletida por nós, alunos(as) e professoras, e a prática de sala de aula, quer sejana educação de zero a seis anos, quer seja nos anos iniciais do ensino fundamental.

No ano de 2006, realizamos um trabalho de investigação colaborativo, em que aprofessora, parceira da pesquisa, juntamente com a equipe de pesquisadores (coordenadores ealunos da graduação de Pedagogia – bolsistas do Núcleo de Ensino da UNESP – Marília/SP.),organizou sua ação docente voltada para o aprendizado da leitura e da escrita em contextossignificativos. Para tanto, dentre as várias atividades propostas, para a ambientação e criação deum entorno propício a esse aprendizado, como hora do conto, biblioteca móvel, jornal de parede,jornal mural, texto livre, projetos de leitura e escrita, dentre outras, organizou-se a atividade coma “Caixa que conta Histórias”, estudando as obras de Roseane Murray , autora da literatura infantileleita para as proposições do ano letivo de 2006 naquela escola. Vale esclarecer que, também,por meio dessa investigação foi possível atuar na formação de professores, quer seja na formaçãoinicial – alunas da graduação, quer seja na continuada – professora parceira de trabalho.

PRESSUPOSTOS PARA A FORMAÇÃO TEÓRICA DO(A) PROFESSOR(A) DAEDUCAÇÃO INFANTIL.

- Por favor, pode me dizer que caminho devo tomar para sair daqui? -perguntou Alice.- Isso depende muito de onde você quer ir - respondeu o gato.- Isso pouco importa - disse Alice.- Então não importa que caminho você tome.(trecho de “Alice no País das Maravilhas” de Lewis Caroll)

Antes de centrarmos nossa discussão no trabalho com as “Caixas que contamhistórias”, nos cursos de formação docente, é imprescindível refletirmos sobre os fundamentosque embasam este fazer pedagógico, trazendo à tona as contribuições de Vigotski e seuscolaboradores.

Os primeiros anos de vida marcam um momento da infância em que a criançaestá aberta para descobrir o mundo de pessoas e objetos que a cerca. Este é um momentopropício para aprendizagens que subsidiam todo o desenvolvimento posterior do homem. Porisso, estudos recentes assinalam que, do nascimento aos dez anos, a criança vive os denominados“períodos sensíveis ao desenvolvimento”3 das formas iniciais e voluntárias de qualidadeshumanizadoras tais como: a memória voluntária, a atenção voluntária, diferentes formas depercepção, a imaginação, a função simbólica da consciência, as emoções, as formas de linguageme de pensamento, os sentimentos, as premissas inerentes à personalidade (MUKHINA, 1996).

Como tais capacidades psíquicas são externas ao sujeito ao nascer, para que elas

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sejam apropriadas e desenvolvidas em níveis cada vez mais sofisticados, são essenciais condiçõesadequadas de vida, de educação e de atividade. Isso significa que não é qualquer ação que provocaa aprendizagem destas capacidades, mas atividades nas quais elas sejam necessárias e façasentido para quem as apropria.

Para ampliar essa reflexão, Mukhina (1996, p. 43) explicita:

As diferentes condições em que transcorre o desenvolvimento psíquicoda criança interferem de maneiras distintas nesse desenvolvimento.As condições naturais – constituição do organismo, suas funções esua maturação – são imprescindíveis; sem elas não pode haverdesenvolvimento psíquico, mas não são elas que determinam asqualidades psíquicas da criança. Isso depende das condições de vidae da educação, sob influência das quais a criança assimila a experiênciasocial.A experiência social é a fonte do desenvolvimento psíquico da criança;é daí, com o adulto como mediador, que a criança recebe o materialcom que serão construídas as qualidades psíquicas e as propriedadesde sua personalidade.

Nesse sentido, é fundamental planejar e organizar atividades mediante as quais acriança possa aprender o uso dessas capacidades em experiências inicialmente realizadas emrelação com outras pessoas. Eis outra tese essencial para compreendermos o desenvolvimentoinfantil: a educação sistematizada pode provocar aprendizagens promotoras de desenvolvimentoquando considera ações colaborativas entre a criança e o professor e entre as crianças e seuspares. Para Vigotskii (1988), essas ações colaborativas, feitas em conjunto, constituem o iníciodo processo de apropriação dos conhecimentos, no nível interpessoal. Um segundo momentodesta apropriação, é a realização das ações feitas externamente no nível intrapessoal, ou seja, nonível mental.

Dessa forma, as relações possíveis de se estabelecerem na instituição educativapodem ser motivadoras de aprendizagens essenciais ao desenvolvimento cultural da inteligênciae personalidade humanas. Uma vez que todos os processos psíquicos são realizados inicialmentenas relações entre as pessoas, constituem-se como

[...] resultado da passagem para o interior das ações de orientaçãoexterna [...]. Graças ao processo de internalização, a assimilação deações dirigidas sob orientação do adulto aperfeiçoa as ações psíquicasinternas e impulsiona o progresso psíquico. (MUKHINA, 1996, p. 46).

Em especial na educação das crianças pequenas, entre zero e seis anos, o fazerpartilhado é fundamental no processo de apropriação de conhecimentos propulsores de um amplodesenvolvimento da inteligência e da personalidade infantis. Inicialmente, a criança realiza atividadescom a parceria do adulto e outras pessoas mais experientes para, então, ao internalizar as açõespráticas e mentais, poder fazê-las de modo independente.

Do ponto de vista da teoria aqui defendida, esse trabalho pedagógico intencional emediatizado é base essencial na criação de elos mediadores entre a criança e o conhecimento a

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ser apropriado. O(a) professor(a), portanto, é um sujeito essencial nesse processo quando organizao espaço, o tempo e os materiais na instituição de educação infantil, contemplando o tempo dacriança e o espaço como historicamente formado a partir das experiências ali vivenciadas. Comomediador e criador de mediações, o professor assume seu papel precípuo como enriquecedor daatividade infantil e, também, se torna sujeito ativo como protagonista de sua prática pedagógica.

Pelo exposto, a atividade do sujeito – quer seja a criança ou o(a) professor(a) – nãose caracteriza como qualquer fazer no âmbito educativo. A atividade, no enfoque histórico-cul-tural, é o fazer que mobiliza o uso de capacidades mentais reorganizando-as em níveis cada vezmais sofisticados, na vivência em que o sujeito pode conciliar o objetivo a que quer chegar aomotivo que o impulsiona a agir, atribuindo sentido às suas ações.

Para o fazer docente, essa tese tem uma implicação pedagógica fundamental: aosfazeres estéreis e esvaziados de sentido não são capazes de garantir aprendizados essenciaisao desenvolvimento amplo da criança e tampouco a envolve como sujeito ativo e capaz de fazer,de ser e de se relacionar como protagonista das suas aprendizagens.

Considerando esses princípios teóricos cujas implicações pedagógicas precisamser repensadas e efetivadas cotidianamente nas instituições de educação infantil, mas, sobretudo,urgem ser base teórica nos cursos de formação inicial e continuada de professores(as). Combase nisso, no item seguinte, discutimos sobre o contar e o ler histórias como uma possibilidadede atividade motora de aprendizagens e, conseqüentemente, de desenvolvimento amplo dacriança.

O CONTAR E O LER HISTÓRIAS: FAZERES ESSENCIAIS NA EDUCAÇÃOINFANTIL

Ao refletir sobre a leitura e as leituras na educação infantil, é possível pensar emuma diversidade de formas de leitura na infância: a leitura de mundo que a criança faz com todosos seus sentidos ao manusear objetos, ao perceber o movimento das plantas e dos animais, aover ilustrações de livros, ao olhar o que acontece ao seu redor... ao ouvir, ao tatear, ao degustar oque cai em suas mãos e, ainda, ao buscar desvendar os símbolos lingüísticos. Para nós – enosso fundamento no trabalho de formação de professores (as), essa leitura é um descobrir e seapaixonar pelo mundo como Madalena Freire assinala com propriedade no texto “A paixão deconhecer o mundo” (1995).

Essa paixão de conhecer o mundo caracteriza, por sua vez, inúmeras leituraspossíveis de serem planejadas e organizadas, intencional e conscientemente, na rotina diária daeducação infantil. Dentre elas, faremos uma reflexão particular sobre o ler e o contar históriascomo maneiras de inserir ativamente – a partir do fazer ativo e intencional do(a) professor(a) – acriança desde pequenininha no mundo letrado. Ainda que ela não leia o texto escrito, efetivamente,terá oportunidade de perceber atitudes de leitores efetivos, apropriando-se paulatinamente deestratégias de leitura.

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Primeiramente, é essencial apontar que a hora do conto ou a hora da história é ummomento fundamental na rotina de trabalho das crianças pequenas (LIMA, 2005). Salientandouma vez mais que ao compreendermos que os primeiros anos de vida são fundamentais aoprocesso de humanização e que, nesses anos, as crianças se desenvolvem de forma acelerada,aperfeiçoando a percepção, a atenção, a memória, o pensamento, a comunicação, os momentosde contar ou ler histórias são oportunidades significativas a um desenvolvimento amplo na infância.

Conforme aponta Coelho (1989), as histórias podem ser contadas ou lidas e cadauma dessas atividades pode ser desenvolvida a partir de um recurso: simples narrativa, com ouso do livro, com gravuras, com flanelógrafo, com desenhos, com interferências do narrador edos ouvintes, com dramatização, teatro de bonecos, dentre outros. Ao contar ou ler histórias, o(a)professor(a) utiliza-se de voz clara, cuja intensidade depende da própria história e do lugar onde ahistória é contada.

A duração da narrativa ou da leitura da história é, pois, flexível e depende doenvolvimento das crianças e, também, da idade delas. Para dar um exemplo quanto àsespecificidades de cada momento da infância, é possível explicitar que, as crianças bem pequenasainda não desenvolveram uma atenção voluntária e têm mais dificuldade de permanecerem umtempo muito longo ouvindo histórias, ainda mais se a professora não provoca e mobiliza a atençãoe a percepção das crianças, utilizando recursos diferenciados e tendo o contar e o ler históriascomo parte da rotina das crianças (LIMA, 2001).

Desta perspectiva, o êxito da narração depende, em grande medida, do envolvimentode todos os sujeitos na atividade de leitura. Parar constantemente a história para chamar a atençãodas crianças acaba por levar ao fracasso da atividade: é preciso envolver as crianças, chamar aatenção delas para o ambiente e para a história a ser contada ou lida; por isso, a importância dasconversas com a turma, localizando cada criança no tempo e no espaço dando-lhe a oportunidadede tornar-se sujeito ativo daquilo que experimenta cotidianamente na instituição educativa.

Ao observar e ouvir as crianças, escutando-as com todos os seus sentidos, o(a)professor(a) tem instrumentos fundamentais para a escolha das histórias e para a otimização daatividade com os pequenos. Conversar com as crianças antes e depois dos momentos das históriasfundamenta novas atividades com a história contada ou viabiliza a introdução de novas histórias aserem lidas ou contadas. Isso significa que quando alguma criança interrompe a história é precisose dirigir a ela seja com um olhar ou sorriso afetuoso indicando que depois de terminada a históriaela terá voz e vez de se manifestar (HEVESI, 2004).

Com isso, a partir das histórias podem surgir relatos escritos pelo(a) professor(a),desenhos das crianças, dramatização, modelagens, dobraduras e recortes, brincadeiras,construção de maquetes. Vale ressaltar, no entanto, que as histórias, poemas, cantigas devemser lidas e contadas pelo seu valor em si mesmas, porque tais textos podem aguçar a escuta dacriança. A criança, que é um dos maiores escutadores da realidade que a circunda, pode, pormeio destas atividades, escutar a vida nas suas cores, formas, sons, cores; escutar os outros,adultos e seus colegas. A criança como sujeito capaz de perceber que a escuta é ato de

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comunicação que reserva maravilhas, alegrias, surpresas, entusiasmos, paixões e fantasias.A hora do conto pode ser motivada pelo uso da “Caixa que conta histórias”, conforme

pudemos comprovar em nossa pesquisa. Essa maneira de contar histórias é uma alternativametodológica para que a criança seja efetivamente envolvida nessa atividade e, sobretudo, porbuscar mobilizar o uso de capacidades mentais essenciais ao seu desenvolvimento cultural: amemória, a atenção e a percepção voluntárias, a imaginação, a linguagem oral, o pensamento, asemoções, a função simbólica da consciência, a vontade, conforme já salientamos anteriormente.

Vale mencionar que a “Caixa que conta Histórias” caracteriza-se por materiaisreciclados: uma caixa de sapatos coberta por papel e grude, contendo histórias que as criançasgostam, objetos e imagens que retratem o texto escolhido ou mesmo fantoches e “dedoches”.Além disso, pode contemplar as histórias produzidas pelas crianças, cantigas preferidas e cantadascom o uso da caixa.4 Em suma, na “caixa” cabe a imaginação, a criação, a reciclagem, a artemanual, as palavras registradas nos livros (agora recontadas) dos adultos e das crianças e permitea mediação e a criação de mediações pedagógicas primordiais à educação potencializadora dahumanização na infância. Tudo isso, repensamos continuamente nos cursos iniciais e continuadosde formação docente

Conforme assinala Vigotskii (1988), um bom ensino – uma educação potenciadora– é aquele que, ao se adiantar ao desenvolvimento o faz avançar a níveis cada vez mais elevados.Neste sentido, o trabalho do(a) professor(a) pode ser motivador desse desenvolvimento, tendocomo um dos recursos pedagógicos as denominadas “Caixas que contam histórias”.

EM SÍNTESE

A leitura e as leituras possíveis na educação infantil vão além das palavras, mascontêm as palavras, os anseios e as necessidades de conhecimento das crianças. Nessas leituras,o(a) professor(a) é o sujeito mediador e criador de mediações entre a criança e a culturahistoricamente elaborada, introduzindo os pequenos e as pequenas no mundo da fantasia, dosbens culturais e da apropriação de conhecimentos necessários ao seu desenvolvimento pleno.

Não é possível, pois, restringir as linguagens na educação infantis, mas, ao contrário,faz-se fundamental refletir sobre elas e sobre sua importância no pleno e harmônico desenvolvimentoda inteligência e da personalidade de nossas crianças que estão apaixonando-se pelo mundo aoagir ativamente sobre ele, transformando-o e sendo transformadas por ele. Dessa forma, urgeque esses saberes sejam apropriados pelos(as) professores(as) no seu processo de formaçãoinicial ou continuada, quer seja por meio das atividades de ensino ou de pesquisa.

Como educadoras e formadoras de professores(as) dedicados à educação dascrianças e como sujeitos e agentes ativos do processo educativo sistematizado devemos, portanto,assumir nossa tarefa de mediadores e criadores de mediações conscientes do nosso fazer, umavez que, como profissionais da educação, temos que criar novos motivos de conhecimentos nosindivíduos desde o seu nascimento.

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Para concluir essa reflexão, ainda que não permanentemente, trazemos um trechodo livro “O pequeno Príncipe” para pensarmos que nossas crianças são mais que rosas a serem“regadas” e “cultivadas”: são sujeitos ativos no processo em que se humanizam e precisam denossa escuta atenta e visível em todos os momentos de sua infância.

E voltou, então, à raposa:- Adeus... – disse ele.- Adeus – disse a raposa. – Eis o meu segredo. É muito simples: sóse vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos.- O essencial é invisível aos olhos – repetiu o principezinho, para nãose esquecer.- Foi o tempo que perdeste com tua rosa que a fez tão importante.- Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa... – repetiu ele, para nãose esquecer.- Os homens esqueceram essa verdade – disse ainda a raposa. –Mas tu não a deves esquecer. Tu te tornas eternamente responsávelpor aquilo que cativas. Tu és responsável pela tua rosa...- Eu sou responsável pela minha rosa... – repetiu o principezinho, paranão se esquecer. (SAINT-EXUPÉRY, 2000, p. 72-74).

REFERÊNCIAS

CAROLL, Lewis. Alice no País das Maravilhas.

COELHO, B. Contar histórias: uma arte sem idade. São Paulo: Ática, 1989.

FREIRE, M. A paixão de conhecer o mundo: relato de uma professora. 12.ed. Rio de Janeiro: Paze Terra, 1995.

HEVESI, K. Relação através da linguagem entre a educadora e as crianças do grupo. In: FALK, J.(Org.). Educar os três primeiros anos: a experiência de lóczy. Tradução de Suely Amaral Mello.Araraquara: JM Editora, 2004. p. 47-56.

LEONTIEV, A. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1978. ______. UmaContribuição à Teoria do Desenvolvimento da Psique Infantil. In: VIGOTSKII, L.S. et al. Linguagem,Desenvolvimento e Aprendizagem. São Paulo: Ícone/EDUSP, 1988. p. 59-84.

LIMA, E. A. de. Re-conceitualizando o papel do educador: o ponto de vista da Escola de Vigotski.2001, Dissertação (Mestrado em Ensino na Educação Brasileira). Faculdade de Filosofia eCiências, UNESP, Marília, 2001.

______. Infância e teoria histórico-cultural: (des) encontros da teoria e da prática. 2005, Tese(Doutorado em Ensino na Educação Brasileira). Faculdade de Filosofia e Ciências, UNESP, Marília,2005.

MUKHINA, V. Psicologia da idade idade pre-escolar. Tradução de Claudia Berliner. São Paulo:Martins Fontes, 1996. (Psicologia e Pedagogia)

SAINT-EXUPÉRY, ANTOINE DE. O Pequeno Príncipe. 48.ed. 2.impr. Rio de Janeiro: Agir, 2000. p.72-74.

VIGOTSKII, L. S. Aprendizagem e desenvolvimento na idade escolar. In: VIGOTSKII, L. S.; LURIA,

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A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, Desenvolvimento e Aprendizagem. São Paulo, Ícone: Edusp,1988. p. 103-117.

VYGOTSKI, L.S. Problemas del desarollo de la psique. Obras Escogidas, Vol. III. Madrid: Visor,1995.

NOTAS1 Dadas as diferentes maneiras de grafar o nome do estudioso russo Lev Semenovich Vigotski [Vygotski; Vygotsky, Vigotsky,Vigotskii, dentre outras], no presente texto optamos por “VIGOTSKI”, salvo as referências bibliográficas que serão descritas assim como na versão original.2 Trata-se das atividades articuladas ao projeto de pesquisa “Ensinar e aprender a ler e a escrever em contextos significativos”, financiado pela FUNDUNESP (processo nº114/2006), desenvolvido em uma escola pública do município de Marília.3 De acordo com Mukhina (1996, p. 54), “cada idade se distingue por uma elevada receptividade seletiva para diferentes tipos deensinamento. Em certa idade, determinadas ações instrutivas exercem influência máxima sobre o andamento do desenvolvimentopsíquico. São os denominadosperíodos sensíveis de desenvolvimento. [Por exemplo,] sabe-se muito bem que o período sensível para ensinar a criança a falar situa-se [até por volta dos dois, três anos].”4 No caso de nossa pesquisa, as crianças produziram suas caixas, a partir de sete livros de Roseana Murray (Retratos, Risos de alegria, Receitas de olhar,Artes e ofícios, Silêncio dos descobrimentos, Tantos medos e outras coragens) a fim de recontarem a si mesmas, durante a “Hora do Conto”, bem como para as demais crianças da escola, durante a Feira anual,ocorrida ao final do ano letivo de 2006.

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Neste trabalho, são descritos e analisados dados parciais obtidos durante odesenvolvimento do projeto de pesquisa “Casos de ensino e processos de aprendizagemprofissional no curso de Pedagogia” (FAPESP 2006/02065-9). Objetiva-se, na pesquisa emandamento, com término previsto para 2008, investigar possibilidades e limitações dos casos deensino (MIZUKAMI, 2002; SHULMAN, 2002; NONO, 2001, 2005) como estratégias formativas einvestigativas a serem utilizadas em curso de Pedagogia. Objetiva-se, também, explicitar, pormeio do uso de casos de ensino, processos de aprendizagem da docência vividos por futurosprofessores, focalizando-se especialmente aspectos referentes à participação docente na gestãoe organização escolares.

O interesse pela investigação dos casos de ensino surge em um contexto em quediferentes estratégias formativas e investigativas dos processos de desenvolvimento profissionaldocente estão sendo estudadas, entre as quais os diários reflexivos, histórias de vida, auto-biografias, narrativas, experiências de ensino e aprendizagem (MARCELO GARCIA, 1999). Oestudo aqui apresentado objetiva evidenciar algumas das contribuições do uso dos casos no quese refere aos processos de desenvolvimento profissional docente de alunos de Pedagogia. Sempretender investigar de maneira exaustiva as potencialidades e limitações dos casos de ensino,espera-se encorajar a continuidade das pesquisas sobre essas ferramentas, ainda incipientes noBrasil.

Resultados já obtidos em pesquisas realizadas e questões a serem aindarespondidas, principalmente no Brasil, onde os casos foram pouco investigados, fundamentarama escolha dos casos de ensino como foco de investigação nesse projeto. Vale destacar estudodesenvolvido por Lundeberg (1999) que obteve resultados que mostram que casos de ensinocontribuem para que futuros professores explicitem e reconheçam seus conhecimentos sobreensino, permitindo-lhes, ainda, estabelecer relações entre aspectos teóricos e situações escolaresespecíficas e contextualizadas e examinar suas próprias crenças sobre as melhores formas deensinar.

REFERÊNCIAS TEÓRICAS

Por volta de 1980, Lee Shulman, então presidente da American Educational Re-search Association (AERA), afirma a necessidade de que programas de formação docenteconsiderem o conhecimento de situações escolares específicas como um dos conhecimentosrequeridos na prática docente que deveriam ser desenvolvidos na formação profissional. Numcontexto de insatisfação diante dos programas de formação docente, espera-se que os casos de

CASOS DE ENSINO NA FORMAÇÃO DO PEDAGOGO

NONO, Maévi Anabel (UNESP/IBILCE)

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ensino “[...] sejam mais engajados, mais exigentes, mais intelectualmente excitantes e estimulantes,mais adequados para estabelecer pontes entre aspectos teóricos e práticos, além de maisadequados para auxiliar professores iniciantes a ‘pensar como professores’” (SHULMAN, 1992, p.01).

Nesse contexto, diversos estudos passam a focalizar casos de ensino comoinstrumentos importantes para serem utilizados na formação dos professores e na investigaçãodos processos de desenvolvimento profissional docente. Tais estudos se fundamentam naspesquisas acerca da natureza do conhecimento docente, nas experiências preliminares – aindaque esporádicas e não totalmente estruturadas – com casos de ensino em cursos de formaçãode professores e em outros campos profissionais como Medicina, Direito e Administração e nabusca de métodos alternativos de ensino a serem utilizados nos programas de formação docente.

Na literatura sobre casos de ensino, é possível encontrar uma variedade dedefinições, formas e propósitos de utilização de casos na formação de professores. De acordocom Merseth (1999), a definição mais comumente utilizada refere-se ao caso de ensino como umdocumento descritivo de situações ou eventos escolares reais, elaborado especificamente paraser utilizado como ferramenta no ensino de professores. Trata-se de uma representação multidi-mensional do contexto, participantes e realidade da situação. Os casos são narrativas elaboradascom o objetivo de dar visibilidade ao conhecimento sobre o ensino envolvido na situação descrita(ALARCÃO, 2003). O que define um caso é a descrição de uma situação com alguma tensão quepossa ser aliviada; uma situação que possa ser estruturada e analisada a partir de diversasperspectivas e que contenha pensamentos e sentimentos do professor envolvido nos eventos(SHULMAN, 1992). De acordo com Alarcão (2003, p. 52),

Os casos são a expressão do pensamento sobre uma situaçãoconcreta que, pelo seu significado, atraiu a nossa atenção e merece anossa reflexão. São descrições, devidamente contextualizadas, querevelam conhecimento sobre algo que, normalmente, é complexo esujeito a interpretações. Os casos que os professores contam revelamo que eles ou os seus alunos fazem, sentem, pensam, conhecem.[...] os casos só são casos (e não meros incidentes) porquerepresentam conhecimento teórico e assumem um valor explicativoque vai para além da mera descrição. [...] Dado o caráter altamentecontextualizado e complexo da actividade profissional do professor, aanálise casuística de episódios reais apresenta-se-me como umaestratégia de grande valor formativo. Permite desocultar situaçõescomplexas e construir conhecimento ou tomar consciência do queafinal já se sabia.

De acordo com Lundeberg, Levin e Harrington (1999), os casos têm sido utilizadoscom objetivo de permitir aos estudantes, em programas de formação docente, explorar acomplexidade do ensino e pensar sobre como resolveriam dilemas da profissão. Recentemente,os casos vêm sendo utilizados com propósitos de investigar o pensamento dos professores efacilitar processos de reflexão em futuros professores.

As formas de utilização dos casos de ensino descritas na literatura variam. Pitton

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(1998) sugeriu que os casos poderiam ser utilizados de maneiras diversas, embora sempre coma presença de um instrutor que pudesse apresentá-los aos futuros professores/professoresprincipiantes, utilizando estratégias para facilitar reflexões em torno das situações descritas eestabelecimento de relações com situações similares. Sugeriu, ainda, que os estudantes poderiamser encorajados a ler individualmente e refletir sobre as situações a partir das questões colocadas.Pequenos grupos podem discutir os casos e, em seguida, apresentar suas considerações paraum grupo maior de colegas. Os casos podem também ser utilizados para facilitar as discussõesem classe. Os futuros professores podem escrever sobre as relações entre os casos apresentadose suas próprias experiências com situações de ensino. As análises dos casos, além de permitirque futuros professores exercitem suas capacidades de análise de situações práticas de ensino,parecem garantir acesso a ricas informações sobre seus processos de aprendizagem profissionale de construção do pensamento docente (HARRINGTON, 1999). Wassermann (1994) trata danecessidade de que as questões que acompanham os casos de ensino, orientando suas análises,estimulem o estabelecimento de relações entre conhecimentos teóricos e a situação práticadescrita.

A utilização de estratégias de estudo de casos de ensino parece oferecer vantagenspara o desenvolvimento e a explicitação do conhecimento profissional dos professores e futurosprofessores. Entre tais vantagens, podemos destacar: provocação de uma prática reflexiva;familiarização com a análise e a ação em situações complexas que ocorrem em sala de aula;implicação do professor/futuro professor em seu processo pessoal de aprendizagem profissional;explicitação e desenvolvimento de crenças e conhecimentos do professor que estão na base desua prática de sala de aula; análises de várias temáticas relacionadas a diversos aspectos doensino; revisão de concepções sobre aprendizagem, ensino, avaliação, gestão escolar;estabelecimento de relações entre aspectos teóricos ligados ao ensino e situações específicasdo dia-a-dia escolar.

Ao analisar uma situação de ensino, o professor/futuro professor recorre aos seusconhecimentos acadêmicos e às suas experiências prévias, podendo examinar sua validade frenteà complexidade das situações de sala de aula. O estudo de casos possibilita o estabelecimentode relações entre a teoria educacional e as particularidades das situações de ensino. Métodos decasos garantem aos futuros professores analisarem diferentes situações que poderão enfrentarno exercício da profissão. Ao apresentarem situações escolares singulares, os casos de ensinopossibilitam a análise de questões estritamente relacionadas ao contexto escolar e de sala deaula – que envolvam as implicações sociais, econômicas e políticas da atividade de ensinar – e,ainda, permitem que professores e futuros professores discutam e analisem tais situações, refletindosobre conhecimentos profissionais próprios da docência.

Mizukami (2000, p. 156) considera os casos de ensino como:

[...] importantes instrumentos de pesquisa – ao possibilitar não apenasapreender as teorias pessoais dos professores, o processo deconstrução de conhecimentos profissionais, o desenvolvimento do

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raciocínio pedagógico, como também compreender o pensamento doprofessor – e de ensino – ao possibilitar o desenvolvimento profissional,a construção da base de conhecimento sobre o ensino, odesenvolvimento do raciocínio pedagógico e a construção doconhecimento pedagógico de conteúdos, que constituiria aespecificidade da aprendizagem profissional.

Nesta investigação, os casos de ensino são focalizados como um dos inúmerosinstrumentos que podem ser utilizados em programas de pesquisa e formação de professores.Aparentemente, é a combinação de diversas estratégias formativas e investigativas que iráproporcionar e explicitar processos de aprendizagem profissional docente. Zeichner (1999) destacaque muitos estudos têm apresentado novas estratégias de ensino e pesquisa como supostamentecapazes de resolver todos os problemas da formação de professores. Nesta investigação,entretanto, concorda-se com Levin (1999, p. 157) quando afirma que os casos de ensino nãodevem ser considerados como uma panacéia, mas como um dentre os diversos instrumentosexistentes na área de ensino e pesquisa sobre Formação de Professores.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Nesta investigação, relativa à Formação Inicial de professores, pretende-se re-sponder à seguinte questão de pesquisa: quais as possibilidades formativas e investigativas douso de casos de ensino em curso superior de Pedagogia, especialmente no conjunto de disciplinasque focalizam aspectos da aprendizagem da docência referentes à participação docente na gestãoe organização escolares?

Conforme definem as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia(Parecer CNE/CP 1, 15/05/2006), “As atividades docentes também compreendem a participaçãona organização e gestão de sistemas e instituições de ensino”. A gestão educacional deveconfigurar-se, de acordo com tais diretrizes, como uma das dimensões do campo de atuação doprofissional formado no curso de Pedagogia. Neste sentido, investigar formas/estratégias depromoção de aprendizagens relativas à participação docente na gestão e organização escolaresmostra-se bastante relevante.

Ao apontar as possibilidades formativas e investigativas dos casos de ensino comofoco central deste estudo, objetiva-se também analisar processos de aprendizagem da docênciavividos por alunos do curso de Pedagogia. Espera-se, entretanto, ressaltar a importância, noâmbito dos estudos sobre Formação de Professores, da investigação de estratégias que permitam,ao mesmo tempo, a construção de conhecimentos sobre processos de aprendizagem profissionalda docência e a intervenção em tais processos. A relevância desta investigação no quadro atualdas pesquisas educacionais reside em suas contribuições ao investigar não apenas processosde aprendizagem da profissão docente, mas uma das estratégias que possa promovê-los eexplicitá-los. Vale ressaltar que este projeto representa uma continuidade de dois estudos járealizados na área de Formação de Professores, com resultados promissores no que se refere

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ao uso de casos de ensino como instrumentos de pesquisa e formação docente (NONO, 2001,2005).

A metodologia de casos utilizada envolve dois momentos distintos ecomplementares: 1) análise (individual e coletiva) de casos de ensino previamente selecionadospela pesquisadora e 2) elaboração de novos casos de ensino, pelos futuros professores, combase em experiências escolares vividas em situações de estágio na Educação Infantil e nos anosiniciais do Ensino Fundamental (esta etapa será realizada em um momento posterior às análisesde casos, durante o segundo semestre letivo de 2007). Trata-se de um estudo descritivo-analítico,de natureza qualitativa, que vem sendo desenvolvido tendo como sujeitos 42 (quarenta e dois)alunos de graduação em Pedagogia (curso noturno em universidade pública), com ingresso nocurso em 2006.

No que se refere às análises de casos de ensino, até o momento, foramapresentados aos estudantes, no ano letivo de 2006 e no primeiro semestre letivo de 2007, 5(cinco) casos selecionados com base nos objetivos da pesquisa, ou seja, casos de ensino quetrouxessem situações que garantissem a análise de aspectos referentes à participação docentena gestão e organização das instituições de Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Funda-mental. Os casos foram retirados de livros e revistas voltados à educação. Dos casos analisados,apenas um deles foi analisado individualmente pelos sujeitos. Os demais casos foram analisadosem pequenos grupos, definidos pelos próprios sujeitos, sob supervisão da pesquisadora.

As análises foram orientadas por roteiros entregues junto aos casos de ensino.Após a entrega para a pesquisadora, pelos sujeitos, das respostas, por escrito, aos roteiros dequestões, tais respostas foram discutidas por todo o grupo de sujeitos envolvidos na investigação,com mediação da pesquisadora. As respostas já entregues não foram alteradas pelos sujeitosapós as discussões coletivas, com o intuito de que os dados obtidos permanecessem os mesmos.Os alunos puderam, entretanto, ao final da discussão com todo o grupo, registrar novas análisesdo caso de ensino, caso considerassem necessário, em ficha separada. Essa possibilidade denovos registros teve como objetivo verificar o potencial das discussões coletivas dos casos deensino, orientadas por um mediador (no caso, a pesquisadora).

Os dados obtidos até o momento da investigação – análises individuais e coletivas(pequenos grupos) de casos de ensino, registradas por escrito, e análises individuais escritasapós a discussão coletiva (grande grupo, envolvendo os 42 sujeitos) mediada pela pesquisadora(feitas caso o sujeito considerasse necessário) – estão sendo analisados tendo como foco aspossibilidades e limitações dos casos de ensino como estratégia formativa e investigativa a serutilizada em curso superior de formação inicial de professores para a Educação Infantil e para osanos iniciais do Ensino Fundamental, especialmente nas disciplinas que focalizam aspectos daaprendizagem da docência referentes à participação docente na organização e gestão das escolas.

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DESCRIÇÃO E ANÁLISE PRELIMINAR DOS DADOS

São apresentados, neste trabalho, dados referentes às análises dos sujeitos emtorno do caso de ensino “Meu batismo de fogo” (WEISZ, 2002). O caso foi utilizado, nestainvestigação, como instrumento de caracterização dos sujeitos da pesquisa. Trata-se de um casono qual uma professora relembra momentos vividos quando ingressou no curso de formação e naprofissão docentes. Ela destaca as dúvidas sobre os motivos que a levaram a optar pelo CursoNormal e a permanecer nele até o final. Além disso, a docente relata muitas dificuldades enfrentadasao ingressar na profissão. Aponta lacunas em sua formação inicial e dilemas enfrentados diantede um grupo de crianças que pareciam encontrar na escola uma armadilha montada para quenão pudessem se sair bem. Trata-se de um caso de ensino que não trouxe um episódio de ensino,especificamente, mas descrições e reflexões de uma professora a respeito de episódios vividosno início de sua trajetória profissional.

A partir da análise desse caso de ensino, os alunos que acabavam de ingressar nocurso de Pedagogia puderam explicitar diversos conhecimentos sobre: a) os motivos que oslevaram a escolher o curso de Pedagogia; b) a área de atuação do pedagogo; c) sua trajetóriacomo alunos e as aprendizagens vividas durante o tempo que passaram nos bancos escolares;d) os conhecimentos necessários para o professor ensinar e atuar na escola e e) como experiênciascom ensino podem influenciar sua formação como pedagogos. O estudo desse caso permitiuuma primeira aproximação aos saberes trazidos pelos alunos ao seu curso de formação inicial.Enquanto instrumento de intervenção nos seus processos de aprendizagem da profissão, a análisedo caso estimulou o estabelecimento de processos reflexivos em torno de tais saberes e de seuprocesso de construção.

No que se refere à escolha pelo curso de Pedagogia, é possível constatar umconjunto variado de fatores que, segundo as respostas obtidas, interferiram na opção dos alunospelo curso. A vocação para a profissão e o desejo de trabalhar com crianças, de lecionar ou deatuar na gestão escolar aparecem como alguns dos motivos para a escolha da Pedagogia. Algunsalunos destacam que as condições financeiras em que viviam não permitiram que freqüentassemum curso pré-vestibular, o que determinou a escolha por um curso “menos concorrido”.

A Pedagogia nem sempre é a primeira opção de curso superior dos alunosingressantes. Em alguns casos, a escolha não foi exatamente pelo curso de Pedagogia, mas porcursar uma universidade pública e gratuita, no período noturno. Experiências escolares vividasdurante a trajetória como aluno também aparecem como motivadoras para escolha do curso.Alguns alunos apontam o interesse por trabalhos sociais e pela Psicologia como motivos para aopção pela Pedagogia, considerando serem áreas relacionadas entre si. O interesse por atuarcom pesquisa educacional também aparece como motivo da escolha pela Pedagogia. O desejode mudar a realidade educacional, “[...] de fazer a diferença, minimizando a desigualdade noensino” (A13, A39, A40, A36), de “[...] mudar a realidade atual do país, começando as melhorias jáno ensino fundamental” (A35, A1, A26, A25) também aparece nas análises dos alunos. É

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interessante notar que experiências vividas em contato com crianças também são apontadascomo motivos para a escolha da Pedagogia.

No que se refere aos conhecimentos dos alunos ingressantes no curso delicenciatura em Pedagogia a respeito do campo de atuação do pedagogo, é possível constatar,por meio dos dados obtidos, que alguns deles acreditam, ao ingressar no curso, ter conhecimentodesse campo de atuação, enquanto outros apontam a necessidade de saberem mais a respeitodas possibilidades de atuação deste profissional.

Alguns alunos destacam que “O pedagogo, atualmente, tem um campo muito amplode trabalho” (A42) e que “A Pedagogia é um curso muito abrangente diferente do que muitaspessoas pensam que a Pedagogia é simplesmente para dar aula. O campo de atuação doPedagogo é muito amplo [...]” (A7, A11, A12, A21). De modo equivocado, alguns alunos confundemo pedagogo com o psicopedagogo, escrevendo que o pedagogo pode “[...] dar palestras, clinicar,fazer cursos paralelos e ser psicopedagogo” (A13, A39, A40, A36). Ainda de forma equivocada,alguns alunos se referem ao curso de Pedagogia em seu formato anterior às Diretrizes CurricularesNacionais, destacando que a atuação deste profissional depende das “habilitações” cursadas.

Interessante notar que alguns alunos vinculam o pedagogo ao pesquisador emeducação. Alguns alunos destacam que o campo de atuação do pedagogo vai além do ambienteescolar, escrevendo que “[...] este profissional se faz necessário em empresas, trabalhando naárea de Recursos Humanos” (A35, A1, A26, A25) e citando que “[uma integrante do grupo] conheceuma pedagoga que atua em uma clínica ajudando na educação de crianças excepcionais” (A2,A6, A28, A33). De modo geral, pode-se dizer que os ingressantes vinculam a profissão pedagogoàs atividades de ensino e gestão nas escolas de Educação Básica, apontando, ainda, outraspossibilidades de atuação, por exemplo, na elaboração de material didático e na área de recursoshumanos.

Ao serem solicitados a escrever sobre sua trajetória como alunos, os ingressantesdo curso de Pedagogia destacam e analisam, principalmente, a organização das escolas em queestudaram e o preparo e atuação de seus professores. Entre os alunos, 11 deles declaram terrealizado seus estudos parte em escolas públicas e parte em particulares, 25 apenas em escolaspúblicas e 6 apenas em escolas particulares. A escola pública aparece associada, na maioria dasanálises, a professores mal preparados para ensinar e a instituições com estruturas inadequadaspara o ensino e a aprendizagem.

Ao se referir ao trabalho desenvolvido por seus professores, os ingressantes docurso de Pedagogia destacam a forma como eles se relacionavam com os conteúdos queensinavam e analisam a metodologia de ensino que utilizavam. A18 escreve que sua professoraera “[...] muito tradicional e rigorosa e o método de alfabetização foi aquela B+A=BA, apesar desua rigidez era uma boa professora, pois a classe toda saiu alfabetizada”. Para A7, A11, A21, “[...]os professores eram muito mal preparados, não tendo didática”.

Ainda no que se refere a sua trajetória escolar, os alunos do curso de Pedagogiaanalisam as aprendizagens que vivenciaram em seus tempos de escola. De modo geral, não

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destacam conteúdos aprendidos em uma ou outra área de conhecimento. As aprendizagensrelatadas se referem, muito mais, àquelas relacionadas à convivência com outras pessoas e àformação como cidadãos. A importância da escola está em “[...] ensinar ao aluno a importância deformar suas próprias opiniões, para não deixar ser manipulado” (A7, A11, A12, A21); “[...] naconstrução como pessoa, na aprendizagem, nos relacionamentos sociais em geral” (A13, A39,A40, A36); “[...] [garantir] a integração social, no amadurecimento pessoal [...]” (A20, A30, A31, A3);“[...] [ser] a base no nosso aprendizado do convívio social” (A2, A6, A28, A33). A aluna A42 sintetiza:“A escola tem extrema importância na nossa vida; como aluna, eu aprendi muita coisa: comoconduzir minha vida em sociedade, a importância do estudo, enfim, adquiri conhecimentos eaprendi, de certa forma, a ser cidadã”. As alunas A35, A1, A26, A25 afirmam: “A escola nos iniciouna vida social, junto a comunidade, nos ensinou noções de respeito, a partilhar, nos deuresponsabilidades e a necessidade de organização”.

A partir da análise do caso de ensino, os alunos do curso de Pedagogia puderamexplicitar os conhecimentos que acreditam ser necessários para o professor ensinar seus alunose, além disso, atuar na escola.

No que se refere aos conhecimentos necessários para o professor ensinar, há umdestaque para os conhecimentos acadêmicos adquiridos na graduação. Alguns alunos citam asdisciplinas que estão cursando na faculdade como importantes fontes de conhecimento para oprofessor. A42 afirma: “O professor precisa ter fundamentação em todas as disciplinas oferecidasna faculdade: filosofia, psicologia, história, etc. [...] é necessário conhecer algumas teorias epensadores”. A5, A34, A19 apontam a necessidade da formação em Pedagogia: “A professoradeveria ter a formação em Pedagogia para poder ter assim noções mais amplas do conhecimentona área de Educação como: filosofia, sociologia, cidadania, uma boa didática, etc.” Os alunos nãochegam a explicitar de quais formas tais conhecimentos poderiam auxiliar o professor em seutrabalho diário com os alunos e como o professor deveria lidar com tais conhecimentos. A22, A23,A32, A37 se referem aos “[...] conhecimentos adquiridos na graduação: psicologia da educação,filosofia da educação, história da educação, organização escolar e outros” como possíveis deserem “aplicados” nas situações escolares. Em outra análise, realizada por A15, A16, A27, épossível constatar uma forma de encarar os conhecimentos acadêmicos como separadosdaqueles que serão construídos durante a atuação: “Deve-se ter um conhecimento tanto sobre ateoria que se aprende nos bancos universitários, como também na prática junto aos alunos [...]”.

Ao cursar o primeiro ano da graduação em Pedagogia, ainda não parece clara aosalunos a relação entre as disciplinas cursadas na universidade e sua futura profissão. Além disso,aparentemente, caracterizam as aprendizagens vividas na universidade como teóricas, de certaforma desvinculadas da prática de sala de aula, sendo um conhecimento necessário ao professorsaber “[...] relacionar a teoria à prática” (A42). Os alunos destacam, em suas análises, outrosconhecimentos necessários para o professor ensinar, entre os quais, o conhecimento do conteúdoa ser ensinado, de métodos de ensino (inclusive metodologias “alternativas”), de materiais didáticos,de notícias relacionadas à educação, “[...] do que chamamos de didática” (A30) e, ainda, de “[...]

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saber avaliar o desempenho do aluno” (A30). O conhecimento dos alunos também é apontado emdiversas respostas dadas pelos estudantes de Pedagogia à questão referente aos conhecimentosnecessários para o professor ensinar.

Uma das alunas destaca que o importante, “[...] antes de qualquer conhecimentoseja científico ou humano, é ter amor vivo pela Educação, assim vai ser menos difícil quandosurgirem os desafios, os problemas do dia-a-dia da sala de aula, ou da profissão” (A24). O amorpela profissão também aparece como essencial na afirmação de A14, A18, A42, segundo asquais, “Além do embasamento teórico, também acreditamos ser necessário conhecer o contextohistórico-social no qual o aluno está inserido, numa reflexão constante da sua prática pedagógica,compromisso social e acima de tudo o amor pela profissão”.

No que se refere aos conhecimentos necessários para o professor atuar na escola– indo além da sala de aula e, portanto, participando diretamente da organização e gestão escolares– alguns alunos apontaram não haver muita diferença em relação aos conhecimentos necessáriospara ensinar. As alunas A23, A22, A32, A37, por exemplo, ofereceram a mesma resposta para asquestões referentes aos conhecimentos para ensinar e para atuar na escola. A aluna A31 escreve:“Parece-me que a resposta seria a mesma já que com estes conhecimentos adquiridos um passojá é dado. Resta a sabedoria para enfrentar problemas do dia-a-dia”. Outros alunos, aparentemente,não conseguiram citar conhecimentos diferentes daqueles necessários à atuação em sala deaula, como, por exemplo, a aluna A42, que afirma: “Além dos conhecimentos que já descrevi, oprofessor precisa ter domínio sobre a disciplina que irá lecionar” e as alunas A7, A11, A12, A21 queescrevem: “Para atuar em uma escola é preciso ter autonomia, saber sair de situações-problemas,ter domínio para saber se impor na sala de aula”.

Outros alunos citaram conhecimentos além daqueles citados anteriormente. Entretais conhecimentos, destacam-se aqueles referentes “[...] à estrutura do sistema escolar e toda aburocracia que o envolve. [...] A questão burocrática envolve também a elaboração do projetopolítico-pedagógico, a elaboração do plano de ensino, leis educacionais em geral” (A14, A18, A42,A24). A18 destaca que “Além dos citados na questão anterior, ele deve saber como a escola seorganiza, não só a sala de aula, mas também na área de gestão, as burocracias, os estatutos quemantém o seu funcionamento geral”. Também são citados conhecimentos referentes à capacidadede relacionamento com as pessoas, além de características pessoais relacionadas à paciência ecriatividade. A5, A34, A19 afirmam que “Ele tem que saber atuar não só apenas dentro da sala deaula, deve interagir com as outras pessoas e outras atividades. Deve ser sociável e criativo”.

No caso de ensino “Meu Batismo de Fogo”, a autora relata uma experiência comensino que vivenciou no início de sua carreira e que a afastou “[...] durante os doze anos seguintesda educação” (WEISZ, 2002, p. 12). Segundo ela, “[...] a experiência com esses meninos está naorigem de tudo o que fiz depois e do rumo que minha vida profissional tomou” (p. 12). Diantedesse relato e da análise realizada pela autora do caso em torno de sua experiência profissional,vivenciada enquanto ainda cursava o último ano do antigo Curso Normal, foi solicitado aos sujeitosda pesquisa que apontassem se já possuem algum tipo de experiência com ensino e, se sim,

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quais as contribuições dela para sua formação como pedagogo.Dos 42 sujeitos, 24 declararam não possuir nenhum tipo de experiência com ensino

e 18 apontaram já possuir algum tipo de experiência com ensino.Entre os alunos que declararam não possuir experiência, vale destacar que alguns

deles, de certa forma, consideram este fato como negativo em sua formação, já que procuram,em suas respostas, apontar formas de suprir essa “lacuna”, como pode-se observar na escritade A8, A4, A38, A17: “Concluímos que não temos nenhuma experiência na área, mas pretendemosadquirir o máximo de conhecimento possível para nos tornarmos ótimos profissionais” ou, ainda,nas respostas dadas por A20, que escreve que “Nunca tive experiência profissional. Porém, desdepequena, ajudo meus irmãos e primos menores a estudarem para as provas, a fazerem trabalhosescolares” e por A14 que destaca que “Infelizmente ainda não tenho nenhuma experiência nessaárea, porém tenho muita vontade, pois sei que a teoria não vive sem a prática e vice-versa”. Aexperiência profissional parece ser encarada como necessária para a formação profissional,mesmo inicial.

Em relação aos sujeitos que declararam já possuir algum tipo de experiência comensino, estando, no período da coleta destes dados, no primeiro ano do curso de Pedagogia,foram apontadas experiências diversas: estágios realizados no curso de magistério, estágiosremunerados em escolas particulares e/ou municipais, atuação como monitora em escolas deeducação infantil e/ou anos iniciais do ensino fundamental, atuação como professora de línguaportuguesa e língua estrangeira em escola particular, ‘professora’ de evangelização espírita, monitoraem curso de datilografia, atuação como auxiliar pedagógico em escola particular, atuação comoorientadora social em projeto do governo federal, trabalho voluntário em comunidade religiosa,trabalho como monitora em buffet de festas infantis, trabalho como professora de piano e, ainda,como cuidadora de crianças pequenas em residências de amigos.

Ao analisar suas experiências, alguns alunos destacam aprendizagens vividas queserão importantes em sua carreira profissional. Para A13, A39, A40, A36, “[...] a contribuição dissoem sua formação é como lidar com as crianças em sala de aula [...] tendo também conhecimentode jogos pedagógicos e contação de histórias”. Outros alunos também destacam a possibilidadede contato com crianças como grande contribuição das experiências anteriores com ensino parasua formação profissional. A33 afirma: “Conheci vários ‘tipos de crianças’, desde aquelas carentes,até as ricas mimadas”. Também se referindo às crianças, A2 escreve: “[...] pude conviver comdiferentes tipos de crianças, cada qual da sua maneira e posso até dizer que me apaixonei tambémpor aquelas consideradas mal-criadas. Estas últimas me espantaram, mas penso que se nemelas me fizeram desistir é porque estou na profissão certa”. São encontradas referências àscrianças em outros trechos das respostas dos alunos, como no trecho em que A29 destaca que“Trabalhei com crianças carentes e tive a oportunidade de aprender muito com cada uma delas”.A18 destaca dificuldades vividas nas primeiras experiências com ensino e aponta formas deenfrentamento adotadas.

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Como a professora Telma [do caso de ensino], no início sentidificuldades principalmente com relação às formas de ensinar e avaliar,quais conteúdos, o que devo trabalhar, qual a melhor seqüência dosconteúdos, o que devo trabalhar primeiro, o que trabalhar depois.Pesquisando e estudando alguns assuntos e com a ajuda daCoordenadora Pedagógica da escola já sanei muitas dúvidas e melhoreiminha prática, mas ainda me considero um pouco insegura.

Vale ainda destacar a análise de A24 que, diferentemente da professora Telma,personagem do caso de ensino, que encerra seu relato com a frase “Esse foi meu batismo defogo, e fez que eu me afastasse durante os doze anos seguintes da educação”, escreve: “Esta foiminha primeira e inesquecível experiência educacional, a partir desta me firmaria ou desistirialogo da Educação; creio que a primeira opção se cumpriu” (A24).

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INTRODUÇÃO

A voz abordada neste texto é a voz que permeia os processos humanos de interaçãopor linguagem oral, integrante das formas de falar que, por sua vez, permeiam o desenvolvimentointelectual e da personalidade (VIGOTSKI, 2000). As formas de utilizar a voz na comunicação porlinguagem oral se consolidam por processos similares aos que regem o desenvolvimento do serhumano: historicamente construído por experiências sociais e culturais. Compreende-se, nestecontexto, que a utilização da fala é uma ação presente no habitus humano de ser e de fazer(BOURDIEU, PASSERON, 1986). Embora a voz seja emitida na maioria das vezes sem que seprecise pensar para escolher os padrões mais aceitas por grupos sociais ou interlocutoresespecíficos. Este fato não impede que as formas de falar sejam retraduzidas, continuamente,pela exposição a novas experiências e conceitos que, se utilizados e aceitos por grupos sociaiscom bons resultados, incorporam-se gradualmente ao habitus pré-existente.

Isso é possível, pois a voz é um atributo humano passível de análise e de modificação(PITTAM, 1994), repleto de significado que produz uma diversidade de reações nos interlocutoresviabilizando, ou não, empatia com o falante. Pode-se interpretar que as diferentes experiênciascom essas variações e seus efeitos moldam as formas de falar para diferentes grupos e emdiferentes situações.

Tal qual se constrói o comportamento vocal para as relações sociais, constroem-se as formas profissionais de falar e as variações vocais segundo fatores histórico-sociais dasprofissões, segundo experiências dos pares profissionais, segundo os modos mais aceitos defalar pela sociedade. A comunicação oral dos professores está presente na sala de aula duranteas interações e a comunicação oral com os alunos no processo de ensinar e aprender, e nelaencontram-se a voz, a fala e as variações possíveis de seus componentes.

Por se tratar de um dos principais recursos do trabalho docente, e principalmentepor compor os processos de interação que ocorrem em sala de aula durante a comunicação oral(BEHLAU, DRAGONE, NAGANO, 2004), a voz do professor merece atenção especial durante aformação profissional. Esta atenção focada principalmente para que o professor passe a ter coma voz uma relação mais consciente (relação definida por Duarte, 1993 ao abordar as formas pelasquais o indivíduo torna o objeto foco de sua objetivação) ofereceria a possibilidade de retraduçõesde suas formas de falar.

DESPERTAR DA RELAÇÃO CONSCIENTECOM A VOZ NA FORMAÇÃO INICIAL DO

PROFESSOR: EFEITOS NA PRÁTICA DOCENTE *

DRAGONE** , Maria Lúcia Oliveira Suzigan ( UNESP)

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O despertar do professor para sua própria voz, conforme o título desta tese sugere,tem o significado de tornar os processos envolvidos na produção da voz e no comportamentovocal fatos merecedores de maior atenção. Uma relação consciente com a voz envolve estabelecercom a emissão da voz e com o comportamento vocal relações que favoreçam o conhecimentode sua produção, das suas formas de utilização, de como este processo ocorre e de dominarsuas possibilidades funcionais. É saber utilizar a voz como real recurso de trabalho, adaptando-aas situações diversas de sala de aula, transformando-a para valorizar as interações e àcomunicação oral com seus alunos, para valorizar o conteúdo falado; significa saber valorizar aprópria forma de falar maximizando pontos positivos, minimizando os negativos, e principalmentenão gerando esforço e conseqüente desgaste vocal no decorrer do exercício da profissão. Éanexar novas experiências vocais na construção da voz profissional, na apropriação pelo profes-sor de um de seus recursos de trabalho.

Para compreender a voz nas situações de uso profissional torna-se necessárioanalisá-la sob a ótica das funções que lhe são atribuídas e das formas aceitas como preferenciaispara alcançar ações de trabalho bem sucedidas. No caso da voz do professor é fato que ela éutilizada na maioria das ações docentes, com exigências de alta demanda e intensidade, emambientes nem sempre adequados acusticamente, e para muitos alunos. É muito comumencontrar professores considerando suas vozes importantes porque as utilizam em grande partede suas ações, porém não se percebe uma busca para avançar na compreensão, para melhorutilizá-la na função educativa, para fortalecer ou enfraquecer as interações e a comunicação oralem sala de aula nas quais se encontra a essência do trabalho docente. No campo educacionalvaloriza-se o conteúdo, mas, de forma alguma sem minimizar o valor implícito neste conteúdo,esquece-se que ele tem uma forma de ser expresso além do significado da palavra ou da estruturagramatical, forma na qual residem a voz e o comportamento vocal. Estes conceitos, incorporadosao exercício desta profissão, obscurecem esta forma de falar, que tem significado nela mesma,que altera ou acrescenta significado à palavra falada.

Nas últimas décadas houve uma relevante divulgação por parte dos profissionaisda saúde, especificamente por fonoaudiólogos, de conceitos básicos de cuidados vocais paraeducadores em exercício ou em formação. Estas iniciativas buscavam difundir que a voz é passívelde cuidados e que ser rouco não é fatídico, ou seja, rouquidão não pode ser algo esperado depoisde alguns anos profissionais. Aos poucos estes fatos vêm sendo assimilados por esta classeprofissional, lentamente. Na tentativa de compreender esta lentidão, a atenção dos estudiosossobre o assunto se voltou para a compreensão da voz do professor na sala de aula, quanto a suautilização na condução dos processos de ensinar e aprender, e regendo as interações com osalunos com toda gama de interferentes, procurando compreender seu valor real na sala de aula.

Desta forma, gradualmente, revelou-se na produção científica uma voz que estavaobscurecida na sala de aula, escondida nas entrelinhas dos estudos da educação e iluminadasomente sob o foco da saúde vocal, pelos fonoaudiólogos. Ela aparece como aquela presente nacomunicação oral do professor e nas suas relações envolvidas no processo de ensino e

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aprendizagem. Destacou-se a necessidade de se compreender muito mais do que somente comoo professor tem utilizado sua voz, pois, se a voz ocorre durante a ação do professor, há de secompreender melhor o trabalho docente, conhecer que ele é a engrenagem do processo de ensino-aprendizagem, e conhecer o professor como o gerenciador dessa engrenagem com toda suacapacidade, emoção e ação. A voz passou a ser compreendida como um dos micro-gestos doprofessor presente o tempo todo na sala de aula, pouco mencionada e explorada, masprovavelmente fator interferente nas relações entre professor e aluno (Dragone, 2000).

Ainda alheios a este quadro que ora se desvenda, a maioria dos professores segueutilizando recursos vocais de forma a dar conta de suas necessidades, com opções construídaspor suas histórias de vida pessoal e profissional, que nem sempre conduzem a um melhordesempenho com um mínimo esforço vocal. É fato que só se consegue escolher opções diferentesse o sujeito for exposto a várias delas, saber que elas existem, compreendê-las e praticá-las. Taloportunidade pode surgir de várias formas na formação do indivíduo, sendo uma delas durante aformação profissional formal inicial ou continuada. Assim, supõe-se que se os professores fossemexpostos à formação específica em voz e comportamento vocal poder-se-ia lhes dar a chance decompreender melhor a utilização da voz e as inúmeras opções para seu uso. Sob este cenárioestruturaram-se os pilares deste estudo na compreensão de que pesquisas relacionadas à vozdo professor, em se tratando de um objeto presente no núcleo do trabalho docente – a sala deaula, exigem olhares interdisciplinares (MARIN, 2005) para o fortalecimento das análises erelevância dos dados, segundo focos diversos e integrados, sem perder de vista o contexto noqual ela ocorre e nem o indivíduo professor que a origina.

OBJETIVO

Expor professores em formação no ensino superior a conceitos sobre voz ecomunicação oral para observar e analisar os resultados, desta exposição, durante os processosde interação com alunos em sala de aula.

MATERIAL E MÉTODO

Este projeto de pesquisa foi aprovado por Comitê de Ética com seres humanos, econsolidou-se cumprindo o rigor metodológico de obtenção de termos de consentimento livre eesclarecido de todos os participantes, além das autorizações institucionais dos locais nos quais apesquisa ocorreu.

Optou-se por uma pesquisa analítico-descritiva cujos dados foram coletados noano de 2005, a partir das respostas a um questionário inicial por 133 sujeitos graduandos doúltimo ano de cursos superiores de formação para o magistério de três Instituições de EnsinoSuperior do interior do estado de São Paulo, com a finalidade de compor o perfil dos participantes.Em seguida foi oferecido um Curso de Extensão em Voz e Comunicação Oral, com 32 horas de

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duração, gratuito, a todos respondentes do questionário inicial, com carga horária semelhante auma disciplina curricular dos cursos de graduação. Somente 17 somente dos sujeitos queresponderam ao questionário inicial participaram do curso por motivos diversos, fora do controledireto do pesquisador, tais como: dificuldade em realizar o curso em horários letivos, agendamentodo curso pelas instituições em épocas coincidentes com congressos nos quais os alunos tinhaminteresse em participar e divulgação sem foco direto nos alunos prováveis sujeitos da pesquisa.

O conteúdo do curso priorizou o despertar de uma relação mais consciente com avoz entre os participantes, como um elemento inicial de reflexão e de autopercepção do professorsobre suas formas de falar e os impactos prováveis nos alunos, sendo assim os demais conceitostrabalhados durante o curso passaram a compor um universo de opções passíveis de seremrealizadas pelos professores durante a aula (formas de falar diferenciadas, sem tensão, comfunções definidas, de impacto positivo e corretamente utilizadas nos diferentes momentos daaula). Foram realizados registros em áudio das vozes dos participantes (/a/ prolongado) antes edepois do curso, com a finalidade de avaliar as faixas de referência de normalidade vocal,constatando a possibilidade de aprimoramento.

Três (3) professoras participantes do curso, já atuantes no magistério em sériesiniciais da Educação Básica, alunas dos cursos de graduação, foram eleitas para serem observadase filmadas em sala de aula durante a realização de uma atividade didática completa, antes edepois do curso, num espaço de tempo médio de três meses e meio, no qual o Curso de Extensãoem Voz e Comunicação Oral configurou-se como a única variável na rotina destas professoras.Obteve-se 540 minutos de imagens em vídeo, que foram editadas e organizadas aleatoriamente,segundo três momentos da aula (GIOVANNI, 1996): motivação para aprender, ação de ensinar eaprender e expressão do conhecimento, configurando 20% das amostras em vídeo configurando-se como representativas da situação real.

Os dados obtidos passaram por três dimensões de análise quantitativa equalitativamente: (1) análise da pesquisadora, também observadora em sala de aula, que estendeuo olhar da câmera de vídeo para a movimentação na sala de aula e para as impressões das açõescomunicativas presenciadas, respeitando os três momentos da aula; (2) análise das amostrasem vídeo por seis fonoaudiólogas, avaliando a voz e o comportamento vocal e verbal, e (3) porseis educadoras avaliando a comunicação oral em sala de aula e os processos de interação comos alunos e com os objetivos de cada momento da aula. Os dados das análises (2) e (3) foramapontados em escala linear de 10 cm, sem demarcação de graduação, cujo limite à esquerdarepresentava a pior performance esperada e o da direita a melhor de cada atributo, e medidos emcentímetros posteriormente, quanto maior o valor melhor a performance. As médias obtidas paracada atributo em cada momento da aula foram obtidas e analisadas estaticamente fortalecendoos achados qualitativos.

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RESULTADOS:

A realidade estrutural dos cursos de ensino superior para formação de professoresé de estruturas curriculares densas sem espaços para atividades extracurriculares como oagendamento de um curso sobre voz e comunicação oral segundo formato planejado no métododesta tese, com formato de disciplina curricular, e desta forma foram necessárias adaptaçõessegundo as possibilidades estruturadas pelos coordenadores dos cursos e a diminuição da am-plitude da coleta de dados pela impossibilidade de realizar o curso em uma das instituições deensino.

O curso priorizou o despertar de uma relação mais consciente com a voz entre osparticipantes, como um elemento inicial de reflexão e de autopercepção do professor sobre suasformas de falar e os impactos prováveis nos alunos, sendo assim os demais conceitos trabalhadosdurante o curso passaram a compor um universo de opções passíveis de serem realizadas pelosprofessores durante a aula (formas de falar diferenciadas, sem tensão, com funções definidas, deimpacto positivo e corretamente utilizadas nos diferentes momentos da aula).

As condições metodológicas propostas permitiram que o curso pudesse serconsiderado a variável principal no período de estudo, pois foi o único fato diferenciado que ocorreuna formação dos professores participantes além da formação, da qual já participavam, de nívelsuperior. E, a análise dos dados obtidos permitiu afirmar que ao participarem de um curso destanatureza os professores atuantes nos momentos iniciais da Escola Básica reagiriam de forma amodificar seu comportamento vocal durante a comunicação oral em sala de aula, e que estareação poderia gerar respostas na interação com os aluno.

A definição das três professoras a serem observadas revelou-se significativa peladiversidade de sua formação (uma de ensino público, duas ensino privado), de atuação nos anosiniciais de Ensino Básico (ensino infantil, fundamental e alfabetização), da natureza das instituiçõesde atuação (privada, pública e projeto de extensão em parceria pública-privada). Todas iniciantese todas ainda em formação no ensino superior, professoras corajosas ao permitirem a exposiçãoe análise de suas aulas, retratos da realidade!

A aulas de três professoras foram analisadas sob dimensões diversas antes edepois do curso, com focos também diversos tecendo pareceres que combinados compuseramum retrato das modificações percebidas na voz e na comunicação oral das professoras duranteos processos de interação entre elas e seus alunos no interior da sala de aula.

Ficou evidente que houve benefícios para a aula relacionados à voz e comunicaçãooral das professoras e aos atributos comunicativos envolvidos na interação entre professor ealunos, permeando o processo de ensinar e aprender.

As observações em sala de aula e das imagens dos registros em vídeo pelapesquisadora permitiram a constatação de alguns aspectos modificados após o curso nas aulasde todas as professoras:

- melhor qualidade de vocal, ressonância da voz e articulação de fala.

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- maior quantidade de busca de contatos verbais e tentativas de mantê-los.Outros aspectos foram mais particulares e as modificações ocorreram

especificamente segundo as necessidades de cada uma das professoras. Como relacionado noQuadro 1 a seguir:

Quadro 1: Aspectos particulares antes e depois do curso pela observação dasaulas

Embora os benefícios constatados, quando quantificados, não tenham reveladodiferenças muito grandes em valores absolutos (ver Tabelas 1 e 2) entre as situações observadasantes e depois do curso, a maior parte deles foi estatisticamente significante revelando que aparticipação das professoras no curso foi positiva com relação às modificações observadas nautilização de voz e fala em sala de aula.

A análise qualitativa realizada pelas fonoaudiólogas foi devidamente quantificada eos dados obtidos tratados estatisticamente, estabelecendo com maior precisão quais dos aspectosobservados tiveram maior destaque por serem significantes, conforme exposto abaixo na Tabela 1.

Antes do curso Depois do curso

- pouco contato verbal - utilização de mais contatos verbais com voz audível e projetada no ambiente.

- opção de agudizar e tensionar a voz cada vez que precisava de intensidade

- voz mais projetada e fala intensa sem tensão ou mudança de tom

- voz rouca-moderada com tensão fonatória e psicodinâmica inadequada

- rouca discreta/moderada com emissões menos tensas e psicodinâmica adequada ao contexto

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Tabela 1: Valores médios dos atributos vocais e de fala e de fala obtidos pelas professorasantes e depois do curso de extensão segundo avaliação das fonoaudiólogas

Teste Wilcoxon: p-valor 0,05 * valores estatisticamente significantes # valores com tendência a significância

Neste caso cada atributo vocal e de fala, em cada momento observado da aula(Motivação para a Ação de ensinar e aprender, Ação de ensinar e aprender e Expressão doconhecimento) foi analisado estabelecendo-se resultados associados às questões particularesde cada situação do processo de ensinar e aprender. A estes resultados foi possível associaralgumas observações não formais das avaliadoras em questão que ilustraram a realidade da salade aula que permearam constantemente as modificações dos atributos vocais e de fala, que,embora melhorados, ocorreram em contexto com dificuldades outras importantes no processode ensinar e aprender. O Quadro 2 resume os resultados desta dimensão de análise, e traz asprincipais observação sobre a ação das professoras.

Quadro 2: Atributos vocais e de fala com diferenças significativas antes e depois docurso e observações das fonoaudiólogas sobre as dificuldades das professoras.

MOMENTOS DA AULA

ATRIBUTOS Motivação para a ação Ação para aprender

Expressão do

conhecimento

antes depois p-valor antes depois p-valor antes depois p-valor

Articulação 7,33 7,13 0,931 7,07 7,85 0,240 6,99 7,61 0,074#

Entonação 5,34 5,88 0,239 5,17 7,03 0,019* 5,24 6,76 0,023*

Loudness 5,40 7,12 0,007* 6,40 7,33 0,206 7,07 6,68 0,446

Pitch 5,94 6,29 0,758 5,46 7,57 0,002* 6,11 6,46 0,349

Ressonância 6,02 6,77 0,088# 6,34 7,26 0,144 6,43 6,88 0,316

Ritmo 6,54 6,56 0,586 6,48 8,20 0,015* 6,56 7,16 0,206

Velocidade de fala 6,73 7,03 0,828 6,52 7,58 0,009* 6,87 7,18 0,679

Qualidade da voz 6,24 6,47 0,422 5,55 7,92 <0,001* 5,87 6,54 0,267

Psicodinâmica 4,92 5,52 0,296 4,16 6,61 0,003* 4,71 6,14 0,055#

Atributos vocais e de fala com diferenças significativas para melhor antes e depois do curso

Observações das fonoaudiólogas sobre as dificuldades das professoras

Momento motivação para aprender - loudness Momento Ação de ensinar e aprender - entonação, pitch, ritmo e velocidade de fala - qualidade vocal - psicodinâmcia vocal Momento expressão do conhecimento - entonação

- organização e realização das atividades didáticas - controle da classe - conteúdo da comunicação - falta de percepção sobre a forma de falar, ou, de não falar, influenciando os processos de manutenção da atenção do aluno.

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Atributos vocais e de fala com diferenças significativas para melhor antes e depoisdo curso Observações das fonoaudiólogas sobre as dificuldades das professoras

Momento motivação para aprender - loudness - organização e realização dasatividades didáticas- controle da classe- conteúdo da comunicação- falta de percepção sobre aforma de falar, ou, de não falar, influenciando os processos de manutenção da atenção do aluno.

Momento Ação de ensinar e aprender- entonação, pitch, ritmo e velocidade de fala-qualidade vocal- psicodinâmcia vocal

Momento expressão do conhecimento - entonação

A análise qualitativa de educadoras também foi devidamente quantificada e, comoocorreu com os dados anteriores, foram tratados estatisticamente, conforme se pode observar aseguir na Tabela 2.

Tabela 2:Valores médios dos atributos comunicativos obtidos pelas professorasantes e depois do curso segundo avaliação de educadoras

A análise destes atributos comunicativos analisados em cada momento da aula(Motivação para a Ação de ensinar e aprender, Ação de ensinar e aprender e Expressão doconhecimento) evidenciou resultados associados às questões particulares de cada situação doprocesso de ensinar e aprender.

Por sua vez, as educadoras formalizaram suas observações sobre aspectosdidático-pedagógicos ainda imaturos nas professoras observadas oferecendo dadoscomplementares às situações de ensinar e aprender, novamente indissociáveis dos atributosanalisados e do processo de ensinar e aprender, conforme descrito no Quadro 3. Observar que aseta anexada ao quadro revela que a piora dos atributos comunicativos das professoras no momentoda ação de ensinar e aprender pode estar associada às dificuldades das professoras,compreendendo que a dificuldade em privilegiar a comunicação oral e oferecer-lhe aprimoramentotorna-se muito difícil frente a outras necessidades básicas e carentes de atenção das professoras

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não poderiam se distanciar do foco de atenção naquele momento.

Quadro 3: Atributos comunicativos com diferenças significativas antes e depois docurso e observações das educadoras sobre as dificuldades das professoras.

CONCLUSÃO:

Os dados obtidos segundo as três dimensões de análise da voz e da comunicaçãooral das professoras em sala de aula ilustram as relações estreitas entre os principais resultadose as observações complementares sobre a atuação didático-pedagógica das professoras, que,embora não tenha sido o foco principal deste estudo, expuseram as dificuldades de professorasiniciantes na fragilidade de suas aulas, conseqüentemente expuseram a fragilidade da formaçãoformal de professores.

De uma forma geral foi possível observar o uso mais adequado da voz pelasprofessoras, segundo ambientes e contextos da sala de aula, em relação a: intensidade e tom devoz; posturas corporais de comunicação direcionando a projeção da voz para o foco de interação– os alunos; utilização de psicodinâmica vocal e expressividade de fala mais variada procurandoadequá-las às necessidades das atividades propostas; entonação, ritmo e velocidade de fala;articulação de fala mais precisa; e ressonância menos tensa, favorecendo a projeção da voz,com evidente diminuição da tensão fonatória.

Estes benefícios para a voz e para a fala das professoras provavelmentecolaboraram para a melhora da interação comunicativa em sala de aula, conforme os resultadosobtidos nesta área de análise. Assim, houve melhora da atenção dos alunos, das atitudescomunicativas das professoras, do envolvimento do aluno nas situações de ensinar e aprender eda manutenção da interação verbal da professora com os alunos. Todos estes benefícios foramevidentes em dois momentos da aula: Motivação para aprender e Expressão do conhecimento; emenos evidentes na situação Ação de ensinar e aprender, provavelmente em decorrência de

Atributos comunicativos com diferenças significativas antes e depois do curso

Observações das educadoras sobre as dificuldades das professoras

Momento motivação para aprender - melhoraram os seguintes atributos: atenção do aluno, atitudes comunicativas das professoras, envolvimento do aluno e manutenção da interação verbal. Momento Ação de ensinar e aprender: - todos atributos pioraram Momento expressão do conhecimento: - melhoraram os seguintes atributos comunicativos: atenção dos alunos e atitudes comunicativas das professoras.

- conteúdo das aulas

- atividades pedagógicas

- orientações individualizadas esquecendo-se do coletivo

- indagações repetitivas

- assumir a direção do processo de

ensinar

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dificuldades presentes entre professoras iniciantes durante da situação de ensinar.Algumas considerações finais se fazem necessárias para abrirem a possibilidade

de reflexões sobre este recurso do trabalho docente – a voz do professor – que carece ainda demuitas outras pesquisas sobre sua utilização em sala de aula de forma integrada aos processosde ensinar e aprender:

- a voz humana permeia os processos humanos de desenvolvimento intelectual eda personalidade e é conduzida por processos historicamente construídos e mutáveis que regema sociedade;

- as formas humanas de ser e de fazer constroem-se por experiências sociais eculturais que incluem o aprendizado formal e incluem a forma de falar, de comunicar-se por meiode linguagem oral. Tais formas são reproduzidas sem que se tenha a necessidade de pensarpara fazer escolhas a cada momento e a cada contexto, mas são passíveis de modificaçõesquando expostas a novos processos educativos, formais ou não, que propiciem novas experiênciase ofereçam possibilidade de pequenas modificações que comporão a constante retradução daforma de ser e de fazer;

- a forma de falar produz um impacto no ouvinte, de acordo com julgamentosbaseados em suas experiências anteriores, favorecendo aproximação ou distanciamento dosinterlocutores; sendo que a voz e a forma de falar são decorrentes de processos passíveis deserem modificados para o estabelecimento das interações desejadas, caso se conheça comofazê-lo;

- o professor interage com seus alunos, em boa parte do tempo, com a linguagemoral permeando os processos de ensinar e aprender, portanto, sua voz é um de seus principaisrecursos de trabalho e, como toda voz profissional, carece de aprimoramento e cuidados;

- os resultados do presente estudo revelaram que as professoras observadas emsala de aula, antes e depois de participarem do curso sobre voz e comunicação oral, apresentaramtransformações perceptíveis na comunicação oral que utilizaram em sala de aula, após o curso,beneficiando as interações presentes nos processos de ensinar e aprender.

Portanto, é possível afirmar que a exposição de professores (e futuros professores)a conteúdos teórico-práticos abordando voz e comunicação oral, recursos básicos do trabalhodocente, traz benefícios para a atuação profissional desses professores – o que permite, finalmente,sugerir que este seja mais um dos saberes docentes a serem privilegiados durante o processo deformação inicial (e também continuada) de professores.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BEHLAU M; DRAGONE M. L. S; NAGANO L. A Voz que ensina: o professor e a comunicação oralem sala de aula. Rio de Janeiro: Revinter, 2004.

BOURDIEU, P; PASSERON J. C. A reprodução. Rio de Janeiro: Livraria Francisco AlvesEditora;1982.

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DRAGONE, Maria Lúcia Suzigan - Voz do Professor: interfaces e valor como instrumento detrabalho. 2000. 192 p. Dissertação (Mestrado em Educação Escolar) - Universidade EstadualPaulista “Júlio de Mesquita Filho”, Araraquara, 2000.

DUARTE, N. A individualidade para-si:contribuição a uma teoria histórico-social da formação doindivíduo. Campinas:editora autores Associados, 1993.

GIOVANNI, L. M. O trabalho do professor alfabetizador: organização do ensino e conseqüênciaspara a aprendizagem. In: MICOTTI MCO (Org). Alfabetização: estudos e pesquisas. Rio Claro:

UNESP, 1996. p. 79-88.

MARIN, A J. O Trabalho Docente: núcleo de perspectiva globalizadora de estudos sobre ensino.In:______(Cood). Didática e Trabalho Docente. Araraquara: Junqueira&Marin, 2005. p.30-56.

PITTAM, Jeffery. Voice in Social Interaction: an interdisciplinary approach. Language and languagebehaviors, v. 5. Thousand Oaks-CA: Sage Publication, 1994. 198 p.

VIGOTSKI, L S. A construção do Pensamento e da Linguagem. São Paulo: Martins Fontes; 2000.

NOTAS

* Tese (Doutorado em Educação Escolar) Araraquara – SP. Faculdade de Ciências e Letras da Universidade Estadual Paulista “Júliode Mesquita Filho” – UNESP, fev,2007. Versão Reduzida. Orientadora: Prof.a Dr.a Luciana Maria Giovanni.** Fonoaudióloga, Especialista em Voz, Docente Ensino Superior UNIARA – [email protected]

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1. INTRODUÇÃO

A complexidade dos processos, subjetivos e objetivos, envolvidos na construçãodas identidades singulares e culturais exige pensar como o sujeito da atualidade, sofre, experimenta,vivencia e sintetiza a diversidade de influências culturais no qual está imerso. Ao mesmo tempo,torna-se imprescindível resgatar os diversos espaços e linguagens, para que todos possamcontribuir para a transformação de indivíduos-objetos em cidadãos-sujeitos responsáveis por suaposição no mundo, perpassando as categorias da obrigação moral, compromisso com acomunidade e a competência profissional, lembradas por CONTRERAS (2002) como dimensõesda profissionalidade docente.

Essa sociedade globalizada deveria possibilitar aos sujeitos trabalharem osconhecimentos científicos e tecnológicos, desenvolvendo habilidades para operá-los, revê-los econstruí-los com sabedoria. Entretanto, se isso não acontece por causa da desvalorização doexercício e formação para o magistério, carga horária elevada, condições de trabalho não dignas,proletarização, entre outros, compromete-se todo um processo emancipatório.

Neste contexto falar sobre a identidade docente torna-se fundamental por apontar ocorpo de conhecimento que dá sustentação ao fazer docente. Diz respeito aos saberes ecompetências que são construídos historicamente e configuram a docência no âmbito da dinâmicasocial (PIMENTA, 2002). Para TARDIF (2002) os saberes não se reduzem a mera transmissão deconhecimentos já construídos, mas como um saber plural. Da mesma forma o exercício daprofissionalidade também nos remetem a um novo olhar para o professor, enquanto um agentesocial.

Tendo como leitura esta perspectiva e ponderando, de forma não sistematizada,sobre a perda de referências do professor no meio escolar constatada por ocasião do estágioprofissional, na disciplina de Prática de Ensino, bem como a preocupação do curso de extensão“A Fraternidade como Prática Pedagógica” em que se observou o esforço de se resgatar aidentidade docente, via dimensão afetiva, com resultados significativos, decidiu-se investigar comoesta complexidade, dos processos objetivos e subjetivos, influencia a construção da identidadedo professor em sua dimensão (sócio-) afetiva.

No âmbito desse processo este estudo tem como objetivos (a) averiguar no itineráriopedagógico das políticas públicas (legislação) de formação de professores como a dimensão

DO DIREITO A TERNURA À “PEDAGOGIA DO AMOR”:UM ESTUDO SOBRE A IDENTIDADE DO PROFESSOR

EM SUA DIMENSÃO (SÓCIO-) AFETIVA”

Juliana de Souza Silva; Samuel de Souza Neto ; Larissa Cerignoni Benites(UNESP/Rio Claro)

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(sócio-) afetiva é expressa no âmbito do conhecimento, competências e habilidades e (b) elucidaros aspectos constitutivos da dimensão (sócio-) afetiva da identidade do professor em docentesque atuam em escolas de educação básica ou ensino profissionalizante.

2. A FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA DOS PROFESSORES: A IDENTIDADEDOCENTE EM QUESTÃO

Na formação do professor a hegemonia de uma cultura audiovisual e a reivindicaçãode uma cultura do tato e do olfato aparecem como emblemáticas no processo educativo, pois...

Ao excluir o tato e o olfato do processo pedagógico, nega-se apossibilidade de fomentar uma identidade e proximidade afetiva com oaluno, perpetuando-se uma distância corporal que reforça a posiçãode poder do mestre, que agora se torna verdade incontestável. Estemanejo do espaço nega sumariamente ao estudante a possibilidadede reconstruir a dinâmica afetiva dos conteúdos cognoscitivos que lhesão entregues, multilando-se assim o saber e perpetuando-se oautoritarismo”. (RESTREPO, 1998, p. 32 , grifo nosso)

O autor questiona o modelo fabril que à escola acabou absorvendo, se referindo aoconteúdo da prática educativa como o modo de organização e controle do trabalho do professor,ao colocar que a sua função foi reduzida ao cumprimento de prescrições, esquecendo-se que aescola é, antes de tudo, um centro de formação humana.

No bojo deste processo a questão afetiva acabou ganhando contornos explícitosdecorrentes da perda de limites em muitas das salas de aula, da perda de auto-estima e daidentidade de professor. Essa problemática ganhou força a ponto do então Secretário de Educaçãodo Estado de São Paulo, Prof. Dr. Gabriel Challita, publicar dois livros (“Pedagogia do Amor” e“Educação: a solução está no afeto”) com ênfase na temática do amor e na questão do afeto.

Esses textos, grosso modo, visam “elevar a moral” e “massagear o ego” dosprofessores, numa tentativa de valorização da subjetividade do educador, sem, contudo, entrar noâmago da questão. Corroborando com o que foi colocado também se pode citar Augusto Cury,que com seus textos, se tornou um dos campeões de venda de livros de auto-ajuda, tratando orado perfil de Jesus Cristo, ora da auto-estima pessoal e ora do perfil de professores, alunos e pais.Por exemplo:

“Infelizmente,quase ninguém mais valoriza os educadores.Entretanto, eles são os profissionais mais nobres da sociedade. (...)Os professores, embora desvalorizados, são os alicerces da sociedade.Eles precisam ter subsídios para resolver os conflitos em sala de aula,educar a emoção e fazer laboratórios do desenvolvimento dainteligência”. (CURY, 2002 p. 28 grifo nosso)

Na realidade o que este autor traz subjacente a estas questões diz respeito ao fatode que os docentes não estão conseguindo fazer uma leitura mais abrangente da questãoeducacional, ficando presos, possivelmente, a concepções de ensino decorrentes de um modelo

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de “professor monocultural” em que se valoriza a eficácia e a eficiência na prática pedagógica.Porém, a sociedade atual exige a formação de um “professor intermulticultural”, cuja ênfase passaa estar relacionada com questões de diversidade e pluralidade cultural. (CORTESÃO, 2002, p.59).

De acordo com SOUZA NETO (2000, p.7) no meio social, o processo de construçãoda identidade de uma pessoa caminha entre um resultado estável e provisório, individual e coletivo,subjetivo e objetivo, biográfico e estrutural de diversos percursos de socialização que constroem,em conjunto, os indivíduos e definem as instituições. Entretanto, não se pode desconsiderar quea construção de uma identidade social não é transmitida de uma geração a outra, mas é construídapor cada geração com base nas categorias e posições herdadas da geração precedente (o queincluí as limitações e conquistas).

Esta questão da identidade do professor também foi motivo de atenção especial,por parte das políticas públicas (legislação) no que tange à formação de professores da educaçãobásica, em cursos de licenciatura, graduação plena, ao se reconhecer que esta preparação possuium corpo de conhecimento próprio:

§ 3º A definição dos conhecimentos exigidos para a constituição decompetências deverá, além da formação específica relacionada àsdiferentes etapas da educação básica, propiciar a inserção no debatecontemporâneo mais amplo, envolvendo questões culturais, sociais,econômicas e o conhecimento sobre o desenvolvimento humano eprópria docência, contemplando:I – cultura geral e profissional;II – conhecimentos sobre criançasadolescentes, jovens e adultos, aí incluídas as especificidades dosalunos com necessidade educacionais especiais e as das comunidadeindígenas;III – conhecimento sobre dimensão cultural, social, políticae econômica da educação;IV – conteúdos das áreas de conhecimentoque serão objeto de ensino;V – conhecimento pedagógico;VI –conhecimento advindo da experiência”. (BRASIL, 2002, p 3-4; BRASIL,2001, p 43-44)

Embora haja estas orientações, que sem dúvida são um avanço em relação alegislação anterior (BRASIL, 1962; BRASIL, 1969), não se deixa de observar que a discussãomoral perpassa as relações de afetividade e motividade, mas não são colocadas em primeiroplano. Este foi, portanto, o caminho trilhado para a delimitação do problema de pesquisa quenorteou os pressupostos dessa investigação, e que foi formulado da seguinte maneira: Quais oselementos constitutivos da dimensão (sócio-) afetiva que mais contribuem para a construção daidentidade do professor no exercício da profissionalidade docente?

3. METODOLOGIA

Para a obtenção de respostas escolheu-se como procedimento metodológico àinvestigação de análise qualitativa privilegiando-se o construtivismo social que de acordo comGEWALNDSZNAJDER E MAZZOTTI (1998) utiliza a literatura em estágios posteriores para

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comparação com resultados obtidos, trabalha no “contexto da descoberta” e busca formularindutivamente suas teorias com base na análise dos dados.

O local escolhido para o trabalho de campo foi a Universidade Estadual Paulista-Campus de Rio Claro, tendo como universo de pesquisa um projeto de extensão, realizado peloDepartamento de Educação, com o nome de “Escola de Educadores”. Os participantes escolhidosforam em torno 20, tendo recebido resposta de 14 sujeitos no questionário que foi aplicado paramapeamento.

A coleta de dados foi realizada, inicialmente, com 14 dos 20 participantes desseprojeto que frequentaram os cursos de extensão (módulo I, móduloII e módulo III), realizado naUNESP-RC no ano de 2006 e 2007. Paralelo a este trabalho também se utilizou como técnica decoleta de dados a fonte documental: legislação e proposta e relatórios do projeto “Escola deEducadores”. Cabe ressaltar que o estudo prevê na sua segunda fase a entrevista. Na ocasião foipassado para estes participantes uma folha individual com o termo de consetimento livre eesclarecido.

4. RESULTADOS PARCIAIS E ANÁLISE

4.1 – Da Fonte Documental: Legislação e “Escola de Educadores”Cabe ressaltar que durante todo o século XX, no Brasil, se lutou por políticas

educacionais que viessem a solidificar a construção da identidade docente, mas as conquistasacabaram ficando restritas à questão das reformas do ensino e conquista de um rol de disciplinas,denominado também de “verniz pedagógico”. Por exemplo:

- 1890 - Renovação do Ensino Primário; motivo: falhas apontadas no preparo técnico-pedagógico dos professores, propondo-se como alternativa a orientação didática prática dos alunos-mestres em Escolas Modelo, anexas aos Cursos Normais;

- 1939 - Curso de Didática (Decreto-Lei nº 1190, de 4 de abril de 1939, que criou aFaculdade Nacional de Filosofia (FNFi) também estabeleceu as seções fundamentais de filosofia,de ciências, de letras, de pedagogia e uma especial de didática): era dado em um curso ordináriode um ano, depois de três anos de bacharelado, com as seguintes disciplinas: Didática Geral,Didática Especial, Psicologia Educacional, Administração Escolar, Fundamentos Biológicos daEducação e Fundamentos Sociológicos da Educação.

- 1946 - Renovação do Ensino Secundário; motivo: falhas apontadas no preparotécnico-pedagógico dos professores, propondo-se como alternativa, a orientação didática práticados alunos-mestres em Escolas Modelo, anexa aos Colégios de Aplicação.

- 1961 – LDB nº 4024: artigo 70, passa a exigir o currículo mínimo - um núcleonecessário de matérias para não comprometer uma adequada formação cultural e profissional. ALDB nº 4024/61 questionou o modelo de currículo adotado (Artigo 70), passando-se a exigir umcurrículo mínimo: um núcleo necessário de matérias para não comprometer uma adequadaformação cultural e profissional. Passa a ser exigido um percentual de 1/8 da carga horária do

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curso para a parte pedagógica, visando fortalecer a formação do professor.- 1962 - Parecer CFE 292 - estabeleceu os currículos mínimos dos cursos de

licenciatura, sublinhando que “o que ensinar” (conhecimentos adquiridos na área específica)preexiste ao “como ensinar” [o método (Didática)], bem como de um conhecimento prévio doaluno (Psicologia da Adolescência e da Aprendizagem), da instituição escola (Elementos deAdministração Escolar) em seus objetivos, estrutura, funcionamento e de uma Prática de Ensino(sob a forma de estágio supervisonado - nas escolas da comunidade, nos moldes dos “internatos”dos cursos de Medicina) para atender a exigência de treinamento profissional. Esta formaçãoteria como objetivo fazer do professor, um educador, capaz de tornar o seu ensino uma atividadeparticularizada e “um instrumento para a formação integral do aluno”. (Chagas, 1962: 96). Com aintrodução da Prática de Ensino, os Ginásios de Aplicação passaram a ter o papel de Centros deExperimentação e Demonstração.

- 1969 - Resolução CFE 9 - fixou os mínimos de conteúdo e duração à formaçãopedagógica. As matérias pedagógicas são fixadas: Psicologia da Educação [Adolescência eAprendizagem - “Adolescência e Aprendizagem, por exemplo, situam-se naturalmente antes daadministração escolar e da didática; e o estágio apresentará sem dúvida melhor rendimento seiniciado quando o ensino dessas últimas estiver pelo menos a meio-caminho” (CHAGAS, 1962:99)], Didática, Estrutura e Funcionamento do Ensino de 2º Grau e Prática de Ensino [sob a formade estágio supervisionado (de preferência em escolas da comunidade), pois para Valnir Chagas ainclusão da Prática de Ensino nos currículos de Licenciatura deveria trazer “o necessário realismoàquelas abordagens mais ou menos teóricas da atividade docente”]. Estas matérias deverão serdesenvolvidas no mínimo em 1/8 da carga horária do curso, enquanto que a da disciplina Práticade Ensino deveria corresponder a 5% da carga horária total do curso de Licenciatura.

Com relação às novas medidas, o Parecer CNE/CES 009/2001 e a ResoluçãoCNE/CES 001/2002 não apontam para a dimensão afetiva, ficando a critério de quem os lê interpretarnas entrelinhas dos normativos a questão como podemos ver a seguir:

“Art 5º O projeto pedagógico de cada curso, considerado o artigo an-terior levará em conta que:I –n a formação deverá garantir a constituição das competênciasobjetivadas na educação básica;II – o desenvolvimento das competências exige que a formaçãocontemple diferentes âmbitos do conhecimento profissional do profes-sor;III – a seleção dos conteúdos das áreas de ensino da educação básicadeve orientar-se por ir além daquilo que os professores irão ensinarnas diferentes etapas da escolaridade;IV – os conteúdos a serem ensinados na escolaridade básica devemser tratados de modo articulado com suas didáticas específicas;(...)Art 6º Na construção do projeto pedagógico dos cursos de formaçãodos docentes serão consideradas:I – as competências referentes ao comprometimento com os valoresinspirados na sociedade democrática§3º (...)

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VI – conhecimento advindo da experiências”.Art 13.Os docentes incumbir-se-ão de:1. participar da elaboração da proposta pedagógica doestabelecimento de ensino;2. elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a propostapedagógica do estabelecimento de ensino;3. zelar pela aprendizagem do aluno;estabelecer estratégias de recuperação para os alunos de menosrendimento.”.(BRASIL, 2001, p. 32, BRASIL, 2002, p.3)

Nos artigos dos pareceres citados acima podemos interpretar a dimensão afetivaquando nos é colocado o comprometimento com valores, ou ir além do conteúdo, quando nos éapontado o saber advindo da experiência, ou quando é colocado que o professor deve zelar pelaaprendizagem do aluno, questões que podem dar margem para essa leitura, mas que não deixam-na explícita, cabendo a quem lê interpretar dessa maneira. Sendo assim, fica claro que a dimensãoafetiva não ocupa um lugar de destaque nas Políticas Públicas de Formação para o Magistério,embora haja a valorização da cultura geral e profissional, dimensão social da identidade desseprofessor, a questão da dimensão afetiva, dessa identidade, continua sem uma especificaçãoclara.

Quanto ao Projeto “Escola de Educadores” observou-se que este teve comoproposta a preocupação com a formação inicial e continuada, bem como capacitação docente,tendo como ponto de partida o resgate da auto-estima docente e da identidade do professor. Paraeste percurso o projeto escolheu como estratégia metodológica o diálogo operativo, visando osrelacionamentos, com vistas à mudanças de natureza interna (a própria pessoa) e externa(ambiente de trabalho) em relação às práticas pedagógicas, bem como fomentar reuniõespedagógicas com as pessoas interessadas. Neste itinerário o projeto gerou cursos de extensão,tendo como perspectiva a práxis docente. Dessa forma os participantes desses cursos deextensão: Módulo I – “A fraternidade como prática pedagógica”; Módulo II – “Educação para a paz:possibilidades pedagógicas”; Módulo III – “Escola: construindo espaços de fraternidade” foramestudantes e professores. Porém, a fonte documental desse projeto não será objeto de análisenesse momento.

4.2 – DO QUESTIONÁRIO

O questionário aplicado foi composto de 10 questões, abarcando concepção deprofessor, profissão, saberes presentes na atividade docente, identidade do professor, a escolhaprofissional, as dimensões utilizadas em sala de aula, o tipo de leitura que privilegia e a contribuiçãoou não da literatura de “auto-ajuda” para a docência.

Neste sentido as respostas dos participantes foram agrupadas para uma melhorinterpretação.

PERGUNTA N°1 – Como você conceitua a palavra professor? Pudemos observarque nas respostas dadas pelos professores que três deles (1, 9 e 14) acreditam que professor é

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aquele que transmite um conhecimento. Para outros (7, 10, 12 e 13), o professor é um profissionalpouco valorizado em nossa sociedade, mas que é alguém que tem sonhos. Outro grupo (2, 3, 4,5, 6, 8 e 11) acreditam no papel do professor como mediador do conhecimento, transformador eformador de cidadãos.

PERGUNTA N°2 – Na sua opinião ser professor é profissão? Os participantes (1 e14) vêem o papel docente como uma postura. Outros (2, 3, 8,12), vêem o magistério como maisque uma profissão, algo que envolve dom e amor, enquanto que outros (4, 6, 9 e 10), não vêem omagistério como uma profissão, mas como um dom, aptidão e dever. No entanto algunsparticipantes (5, 7, 11 e 13) definem o magistério como uma profissão como qualquer outra.

PERGUNTA N°3 – O magistério (docência, ser professor) enquanto profissão possuium corpo de conhecimento próprio? Se possui, quais são esses conhecimentos ou saberes?Dois dos participantes (1 e 14) apontam à importância dos saberes e a necessidade de um corpode conhecimentos para o magistério. Dois (2 e 11) apontam a necessidade de um saber experiencialaliado ao saber teórico. Dois (3 e 5) só apontam como importante o saber da experiência, enquantoque (4, 6 e 7) privilegiam apenas o saber teórico, um (8) preferiu não responder a pergunta equatro (9, 10, 12 e 13) não definiram.

PERGUNTA N°4 – Dentro desse contexto de profissão, e saberes o que caracterizaa identidade do professor? Com exceção de um (11) que não respondeu a questão e de três (3, 4e 6) que responderam que o que caracteriza a identidade do professor é a sua formação, o restantenão nos forneceram respostas ligadas à identidade, mas sim as características de um perfil deprofissional.

PERGUNTA N°5 – Você gosta de ser professor? Porque escolheu essa profissão?De forma geral, os participantes responderam que gostam da profissão com exceção do (7) queapontou escolher o magistério por falta de opção, (12) que diz que apesar de gostar não se senterealizado e o participante (1) que preferiu não responder a questão.

PERGUNTA N°6 – Pensando na sala de aula quais dessas dimensões: cognitivo,social, afetivo, motor, moral você considera importante para seu trabalho? Os professores (1, 2,3, 5, 7, 8, 10, 11, 12, 14) consideram todas as dimensões importantes. No entanto (4 e 6) acreditamque social, afetivo e moral tratados nessa ordem dariam mais resultado e (13) acredita que afetivo,social e moral tratados nessa ordem dariam mais resultado.

PERGUNTA N°7 – No seu dia-a-dia qual o tipo de leitura você costuma fazer? Porfavor, aponte um ou outro autor ou nome de texto ou livro que você gostou de ter lido nos últimostempos. Constatamos que todos os participantes efetuam vários tipos de leituras compredominância da literatura de auto-ajuda.

PERGUNTA N°8 – Você é a favor ou não dos livros de auto-ajuda para professores?Justifique. Os participantes (2 e 9) se posicionaram contra, (4, 5 e 6) acreditam existir outrasformas mais interessantes de conhecimento; (3, 8, 10, 11, 12 e 14) são a favor da leitura, (7 e 13)disseram que depende do conteúdo e (1) não definiu.

PERGUNTA N° 9 – Na sua opinião qual seria a contribuição ou não da literatura de

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auto-ajuda para a formação continuada de professores? De forma geral quase todos acreditamnuma contribuição efetiva dessa literatura, com exceção de (2 e 4) que não gostam desse tipo deliteratura, (6) que não tem opinião formada e (7) que preferiu não responder a questão.

Pergunta n°10 – Como você trabalha a dimensão afetiva nas suas aulas? Ela éimportante? Se é qual a relação que você estabelece com o exercício de sua profissionalidadedocente? Essa última questão evidenciou a importância da questão afetiva nas aulas, sendo quetodos consideram esta dimensão importante, com exceção do participante (9) que não respondeua questão.

4.3 – ANÁLISE DOS RESULTADOS

No intuito de saber o que os participantes da pesquisa apontaram sobre o que é serprofessor criou-se a categoria “profissão professor”, pois percebeu-se que parte dos professoresacreditam que a profissão docente seja um “chamado divino”, um dom. De acordo com PAPI(2005), a profissão guarda relações com a Igreja e as pessoas que exerciam a docência passarama ser vistas como tendo uma vocação. Posteriormente, a docência passou a ser de tutela doEstado, mas, a profissão continuou a ser relacionada com as virtudes, por exemplo, da bondade.Parte pequena dos professores que responderam ao questionário consideram a docência comouma profissão, e isto de acordo com SARMENTO (1994), pode acontecer pelo fato da profissãopreencher alguns pré-requisitos como, posse de um saber altamente especializado, expressoatravés de um vocabulário esotérico e adquirido através de uma formação que exige longaescolaridade, rigoroso controle de admissão dos candidatos ao exercício da profissão pelosmembros já integrados, a existência de um código de conduta profissional onde se exprime ocaráter desinteressado da atividade exercida, a liberdade de exercício da profissão, o usufruto decondições de trabalho adequadas.

Como podemos constatar, no exercício da atividade docente faltam vários dessespré-requisitos. Os professores muitas vezes são formados em cursos de qualidade duvidosa.Geralmente os integrantes mais antigos da profissão sentem-se diminuídos perante a nova geraçãode profissionais. O vocabulário da profissão é simples, possibilitando que qualquer pessoa sinta-se apta a discutir educação, as condições de trabalho. Os salários, na maioria das vezes não sãodignos se comparados com outras profissões que também exigem curso superior. Portanto, osdocentes não têm “liberdade” na profissão, recebem ordens do Estado ou de “especialistas emeducação”, e se vêem obrigados a cumprir prescrições pré-estabelecidas.

Para termos um parâmetro sobre o que os professores pensam sobre ossaberes criamos a categoria “saberes” e, de acordo com suas respostas, pudemos observar quena maioria das respostas privilegiam tanto o saber da formação, que segundo TARDIF E LESSARD(2005) são aqueles adquiridos durante a formação para o exercício da profissão quanto o saberda experiência, que são situações que acontecem durante a carreira e fazem com que o profes-sor crie estratégias para agir diante de determinadas situações. Alguns outros participantes nãosouberam definir sua opinião sobre o assunto

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De forma geral, todos os participantes acreditam que todas as “dimensõesdo conhecimento” sejam importantes para que um trabalho efetivo seja realizado. Talvez por essefato a literatura de auto-ajuda seja vista pela maioria deles como importante, pois privilegia osaspectos sentimentais. Como nos aponta RESTREPO (1998) não podem ser excluídos do atopedagógico, pois quando se nega a possibilidade de uma proximidade afetiva com o aluno perpetua-se a distância corporal que pode reforçar as relações de poder e o modelo fabril que foi absorvidopela escola.

De acordo com as respostas dos participantes sobre a literatura de “auto-ajuda” foi apontada essa categoria por estar freqüentemente presente nos hábitos dos participantes.Apesar de os mesmos também realizarem outros tipos de leitura, essa literatura, na maioria dasvezes, os agrada e motiva. De acordo com RUDIGER (1996) o consumo dessa literatura setornou entre os professores muito freqüente, mas, representa um perigo na medida em que podemcolocar uma amálgama nas críticas que atribuem ao indivíduo todos os seus fracassos e vitórias,sendo assim, basta força de vontade para resolver todos os problemas, tanto sociais, comoemocionais, afetivos. O autor, ainda, coloca que o consumo desse tipo de literatura tornou-sehábito para os docentes. Esse tipo de leitura em partes representa um avanço para a categoria jáque consideram no ensino o aspecto afetivo, mas, ao mesmo tempo individualizam o sujeitofragmentando-o. Ainda se necessita do uso de outro instrumento como a entrevista para aprimorarestas idéias.

5. CONSIDERAÇÕES GERAIS

De fato a questão da “auto-ajuda” está presente no inventário construído com aresposta dos professores se constituiu em um objeto de pesquisa promissor, ainda que não setenha feito às entrevistas. No entanto, observou-se que ela apresenta uma fonte inexoravelmentevinculada a dimensão pessoal naquilo que TARDIF (2002) vincula aos saberes de formaçãoprofissional devendo ser explorado por nós nessa nova etapa, bem como a influência que aspedagogias não diretivas tiveram nesse processo.

Os aspectos constitutivos dessa dimensão da identidade do professorcontemplaram inicialmente, as categorias “profissão docente”, “saberes”, “dimensões”, “auto-ajuda”, revelando-se promissoras exigindo-se seu aprofundamento, pois, com certeza, auxiliarãona configuração de um quadro teórico mais nítido.

A leitura inicial de alguns normativos vinculados às políticas públicas de formaçãode professores nos foram promissoras no que se refere à dimensão afetiva, a não ser quando sefala que há necessidade de se formar o educador (Lei 4024/61), apontando para a perspectiva denecessidade de uma identidade social, mas, que não entram no mérito da dimensão afetiva, dopessoal, mas entende-se que ambas são interdependentes (o pessoal e o social/coletivo).

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REFERÊNCIAS

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______ Conselho Nacional de Educação. Parecer n. 009/2001. Brasília 08 de maio de 2001.

______ Conselho Federal de Educação. Resolução nº 9, de 6 de outubro de 1969.

______ Conselho Federal de Educação. Parecer nº 298, de 17 de novembro de 1962.

CONTRERAS, J. A Autonomia de professores. 1a ed. São Paulo: Cortez, 2002.

CORTESÃO, L. “Ser Professor: um ofício em risco de extinção?”. 1ª ed. São Paulo: Editora Cortez,2002.

CHALITA, G. Educação: a solução está no afeto. 8ª ed. São Paulo: Editora Gente, 2001.

CURY, A.. O mestre do Amor. 1a ed. São Paulo: Editora Academia de Inteligência, 2002.

GEWANDZNADJDER, F. E MAZZOTTI, A. J. O Método nas ciências naturais e sociais. Pesquisaquantitativa e qualitativa. 1a ed. São Paulo: Editora Pioneira, 1998.

PAPI. S. O. G. Professores: formação e profissionalização. 1ª ed. São Paulo: JM Editora, 2005.

PIMENTA, S. G. Saberes pedagógicos e atividade docente. 3a ed. São Paulo: Cortez, 2002.

RESTREPO. L. C. O Direito à Ternura. 2a ed. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 1998.

RUDIGER, F. R. Literatura de auto-ajuda e individualismo. 1° edição. Porto Alegre: Ed. Universidade/

UFRGS, 1996.

SARMENTO. M. J. “A vez e a voz dos professores: contribuindo para o estudo da culturaorganizacional da escola primária”. 1ª ed. Portugal: porto Editora, 1994.

SOUZA NETO. S. O professor, quem ele é?. In: ENCONTRO DE EDUCADORES DO MOVIMENTO

HUMANIDADE NOVA, I.Vargem Grande Paulista, São Paulo, 2000.(trabalho mimiografado).

TARDIF. M. Saberes Docentes e Formação Profissional. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Vozes,2002.

TARDIF. M E LESSARD. C. O Trabalho Docente: elementos para uma teoria da docência comoprofissão de interações humanas 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2005.

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INTRODUÇÃO

Historicamente, os problemas relativos à qualidade da educação brasileira encontramna capacitação docente importante prioridade na implementação de políticas públicas parasuperação das contradições que a realidade apresenta. Iniciativas as mais diversas têm sidoexperimentadas, mas uma série de justificativas, que vão desde o tamanho do território nacionalcom todas as suas diferenças sociais, políticas e econômicas até as peculiaridades locais, acabampor apenas atestar a complexidade do binômio quantidade x qualidade na educação e servir dereferência para explicar o seu fracasso.

A partir do movimento de reestruturação produtiva dos anos 90, novos apelos,diagnósticos e propostas são feitas em direção a mudanças na educação que possam garantir aformação de profissionais melhor qualificados para as novas exigências do mercado de trabalho,bem como, em última instância, a formação de cidadãos melhor ajustados ao modelo de sociedadede consumo de bens e serviços que se produz na lógica do capital. O mesmo movimento alcançaa formação e desenvolvimento de educadores.

Esse fenômeno dos anos 90 veio acompanhado pela explosão das novastecnologias, especialmente as de base microeletrônica, e da febre dos programas da chamadaeducação continuada. Certamente, tanto as novas tecnologias quanto a educação continuadatrazem elementos novos para o cenário educacional e podem proporcionar avanços significativospara a sociedade em geral e a educação, em particular. Entretanto, ao acompanhar depoimentose registros relativos ao diagnóstico do público-alvo e à avaliação final de um desses programasdirigido a docentes da escola pública (e, é muito comum observar situações semelhantes emqualquer outro), é possível notar algumas contradições que se reproduzem historicamente, semencontrar soluções orgânicas.

Este artigo tem por objetivo levantar elementos à reflexão sobre essas contradições,nomeando-as bem como as razões pedagógicas pelas quais tais programas não atingem osobjetivos a que se propõem, mantendo-se, então, a pseudoformação docente, que se estende atoda a sociedade, sob a lógica daquilo que deveria superá-la: a educação continuada, sob a influênciadas novas tecnologias.

Como referência para a análise do objeto proposto, serão tomados os conceitosapresentados por Adorno e Horkheimer, em Teoria da pseudocultura, e por Adorno, em Tabusacerca do magistério e A filosofia e os professores.

EDUCAÇÃO CONTINUADA EPSEUDOFORMAÇÃO DOCENTE

ROGGERO, Rosemary (Universidade Braz Cubas)

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No primeiro texto (publicado em 1971), os autores elaboram uma crítica à formaçãoexistente na sociedade burguesa, que se caracteriza por manter o sujeito aprisionado à produçãoda vida material. Nesse sentido, defendem que essa formação é falsa porque não permite aemancipação do sujeito pelo desenvolvimento da auto-consciência: “Os sintomas de colapso daformação cultural que se observam por todas as partes, até mesmo no estrato das pessoascultas, não se esgotam com as insuficiências do sistema educativo e dos métodos de educaçãocriticados há várias gerações; as reformas pedagógicas isoladas, por indispensáveis que sejamnão nos valem, e ao trazer à tona as reclamações espirituais dirigidas pelos que são educados,revelam uma inocente despreocupação frente ao poderio da realidade extrapedagógica sobreestes, as quais podem, inclusive, aprofundar a crise.” (Horkheimer & Adorno, 1996, p. 388)

A partir dessa constatação inicial, os autores apresentam o conceito de formação,como cultura apropriada subjetivamente e o conceito de pseudocultura ou pseudoformação, comocultura dissociada: “a formação que se separa das coisas humanas, que descansa em si mesmae se absolutiza, se torna pseudoformação.” (Horkheimer & Adorno, 1971, p.143).

No segundo texto, Tabus acerca do magistério, Adorno (1995a) constrói um ensaioque explora uma possibilidade de abordagem de um problema que cerca as relações educacionais:algumas dimensões da aversão social ao magistério, a partir do conceito de tabu, no sentido dasedimentação coletiva de representações que se conservam como preconceitos psicológicos esociais e retroagem sobre a realidade como forças reais.

Já em A filosofia e os professores, ao realizar uma análise do processo e dosresultados dos exames para contratação de professores para a universidade de Hessen, Adorno(1995b) identifica elementos fundamentais que informam o caráter fragmentário da formaçãodocente, que se reflete socialmente.

Apesar de terem sido produzidos em outro tempo e lugar (anos 60 na Alemanha),esses três textos apresentam conceitos que nos permitem uma análise crítica da educaçãocontinuada, na forma como vem se dando em nossa realidade.

O objeto de análise será apresentado por meio de uma categorização dos discursosregistrados por 930 educadores participantes da proposta em questão, em material de diagnósticodo público atendido e de avaliação final de uma ação de educação continuada na região do AltoTietê, na rede pública do Estado de São Paulo.

Tendo em vista os elementos encontrados, julga-se irrelevante descrever a propostae as condições em que a mesma se desenvolveu, visto que a categorização dos depoimentosprescinde dessa descrição por seu caráter generalista.

É importante frisar que não se trata de análise estatística dos dados, mas de umestudo qualitativo, de caráter exploratório, uma vez que tais registros permitem uma categorizaçãopreliminar (não-neutra) pela pesquisadora, envolvendo: as expectativas e necessidades dosdocentes em ações de educação continuada; as relações entre tempo, vivência e experiência noexercício do magistério; as relações entre conhecimento e informação estabelecidas pelosprofessores; a importância conferida aos recursos materiais e técnicos para a prática pedagógica;

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o discurso usado para justificar a própria condição e atuação docente; e a sua busca pessoal poraperfeiçoamento.

Expectativas e necessidades dos docentes em ações de educação continuadaObserva-se que a quase totalidade dos registros atesta que as expectativas e

necessidades dos grupos não são levadas em consideração para a elaboração das propostas,afirmando que estas estão, via de regra, distanciadas da realidade educacional para a qual queremcapacitá-los. A responsabilidade pelo suposto fracasso das ações de capacitação é posta sobreo estado (como entidade abstrata) que não desenvolve políticas educacionais adequadas econsistentes.

Ainda assim, os participantes sempre procuram atender os chamados paracapacitações, como demonstração de boa vontade e a crença de que as novas propostas possamtrazer alguma inovação e a superação dos problemas sempre apontados em ações anteriores.Entretanto, a curiosidade com que se mobilizam em direção a essas propostas converte-se emapatia, quando se deparam com a reprodução de velhos modelos sob nova roupagem.

Por outro lado, a avaliação relativa aos capacitadores mostra-se ambígua, tendendoa apoiar-se em critérios subjetivos como simpatia e bom relacionamento com os membros dosgrupos, enquanto são, de fato, desqualificados para a tarefa que assumiram: ainda que, não raro,o capacitador seja alguém que atua como docente na mesma rede, ou seja, vivencia concretamenterealidade semelhante à daqueles a quem se dirige a capacitação, a mudança de papel parececonvertê-lo, sem mediação, em alguém que desconhece essa realidade e, por isso, a idealiza deforma romântica ou ingênua.

Apesar de todos os problemas de que os participantes costumam queixar-se,reclamam um acompanhamento por parte das instituições e agências promotoras das ações deeducação continuada, embora esse acompanhamento não seja claramente definido ou descrito.

São comuns, também, reivindicações de pagamento de diárias para transporte erefeições, as quais poderiam auxiliar na criação de um comprometimento maior dos participantescom as ações de educação continuada.

Como Adorno (1995b) já observava no sistema educacional alemão, parece haveruma antipatia em relação à escola administrada, burocrática, que se manifesta na forma de atitudesambíguas: se por um lado, há uma representação positiva em relação ao papel social do profes-sor, por outro, o magistério transmite um clima de falta de seriedade, de infantilismo, que semanifesta na ambivalência e no ódio silencioso que persiste entre o professor universitário –como profissão de maior prestígio – numa ponta, e o professor da educação fundamental e média– com menor prestígio – na outra.

A figura do professor ainda carrega o estigma feudal do escravo e do monge,mantendo, por isso, a dificuldade de constituir status e uma respeitabilidade que ultrapasse aperspectiva missionária.

Quando se trata de atuação na escola pública, essas ambigüidades se apresentam

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com maior profundidade. Nesse caso, prevalecem algumas iniciativas corporativistas e pontuaisbem como atuações fragmentadas das representações de classe. Em todos os casos, nota-se afragilidade da categoria profissional, que se restringe a reivindicações de reposição da sua auto-estima.

Além disso, Horkheimer & Adorno (1971, p. 144-5) argumentam que: “quando ocampo de forças que chamamos formação se congela em categorias fixas, sejam as do espíritoou as da natureza, as do poder ou as da acomodação, cada uma delas, isolada, se coloca emcontradição com o que ela mesma nomeia, se presta a uma ideologia e fomenta uma formaçãoregressiva ou involução”.

A partir desse argumento, é possível pensar sobre o quanto a idéia de capacitar,presente nas ações de educação continuada, envolve outras que se contrapõem a esta: alguémassume o poder de capacitar, enquanto alguém se acomoda no papel passivo de receber acapacitação para capacitar outros. Esse processo tem se revelado a tal ponto frágil que, de fato,a formação propiciada por meio da educação continuada tende a denotar um caráter regressivo efalso.

RELAÇÕES ENTRE TEMPO, VIVÊNCIA E EXPERIÊNCIA NO EXERCÍCIO DOMAGISTÉRIO

Nota-se que muitos participantes relacionam o tempo de magistério a uma vivênciaprofunda da realidade educacional, que por si só já permite a experiência necessária para o trabalhopedagógico. Nesse caso, os mais velhos tendem a mostrar-se fechados à revisão ou reformulaçãoda sua prática profissional e à participação em qualquer proposta de educação continuada serveapenas para a confirmação daquilo que já trazem cristalizado na sua visão de mundo e daeducação.

Na outra ponta, os que têm pouco tempo de magistério, justificam sua pouca vivênciapelo pouco tempo, fazendo crer que só com o aumento desse tempo ganharão a experiência queoutros colegas já têm e que muitos já teriam cristalizado de forma negativa (afinal, esse se mostraum bom momento para mostrar o quanto se busca, a partir das semelhanças, diferenciar-se dosdemais). Também é comum se registrar algo como que um ressentimento quanto às atitudes doscolegas mais experientes, que pouco auxiliam os iniciantes. Há, também, os que parecem nuncasentir-se preparados para qualquer desafio que a realidade da sala de aula apresente, independentede seu tempo e vivência no magistério. Esses alegam que sua formação não foi adequada, quenão têm condições para lidar com situações de alunos e famílias, piores a cada ano.

Para Adorno (1995b, p. 103), “a opinião pública não leva a sério o poder dosprofessores, por ser um poder sobre sujeitos civis não totalmente plenos, as crianças. O poder doprofessor é execrado porque só parodia o poder verdadeiro, que é admirado.” Essa perspectivaparece válida na análise da relação entre tempo, vivência e experiência, porque ela justifica, aomesmo tempo, a atitude de martírio – ingênua e romântica – e a de não envolvimento mais profundo

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do docente com seu papel formador, já que ele não se vê reconhecido por isso.Entretanto, sob a máscara da falsa experiência (avaliava Benjamin, já em 1913),

esconde-se o pedagogo dogmático, incapaz de manter-se fiel na busca do conhecimento e nocultivo da juventude do espírito. Essa opção pela cristalização das vivências em dogmas seconverte em intolerância e tem se reproduzido por várias gerações.

Fugir a essa determinação significa romper com as tendências à cristalização daexperiência que se degenera na vivência do dogma pedagógico. Entretanto, uma tal escolhademandaria, ao mesmo tempo, o reconhecimento da autolimitação frente ao existente e a buscapermanente da autoconsciência em prol de uma outra relação entre indivíduo e sociedade.

Essa outra relação não é descrita pelo autor, porque isso afastaria a possibilidadede liberdade do sujeito e manteria a acomodação que se critica e quer ver superada. Não descrevê-la, se traz a desvantagem da falta de referência de que muitos indivíduos necessitam para fazeravançar uma idéia, traz, por outro lado, a vantagem da liberdade de experimentar.

RELAÇÕES ENTRE CONHECIMENTO E INFORMAÇÃO ESTABELECIDASPELOS PROFESSORES

Pode-se perceber o quanto esses são conceitos que não se distinguem, em grandeparte dos depoimentos analisados. Nesse terreno pantanoso, os livros, revistas e jornais parecemestar sendo relegados a um segundo plano, no que se refere ao acesso à informação e à basepara construção de conhecimentos, enquanto o acesso à Internet e o fato de possuir ou não umcomputador pessoal são referências para a inclusão/exclusão no universo do saber.

Nesse sentido, sentindo-se excluídos digitais, muitos professores solicitam umaadequação dos livros didáticos e outros recursos materiais, ainda que não se encontrem descriçõesclaras desses recursos e seus possíveis usos.

Ao reclamar a presença dos livros didáticos, por exemplo, os professoresdemonstram uma forma fragmentária de lidar com o conhecimento, convertendo todo saber eminformação com prazo de validade: após as provas e exames, o aluno pode esvaziar-se desseconteúdo que já cumpriu seu papel (meramente burocrático e de controle da disciplina formal).

A busca de conceitos que possam ser aplicados, testados, pensados, superados,não está em questão nessa escola, nessa visão de educação e de papel docente. Via de regra, oprofessor não vivencia isso em sua própria formação, então não pode compreender como fazê-lopara a formação de seus alunos. Assim, o suposto conhecimento passa a funcionar comoinstrumento de poder nas mãos do mais forte, que pode, com ele, castigar o mais fraco. O profes-sor se transforma “lenta, mas inexoravelmente, em vendedor de conhecimentos, despertando atécompaixão por não conseguir aproveitar melhor seus conhecimentos em benefício de sua situaçãomaterial” (Adorno, 1995b, p. 105) E mais: “A colcha de retalhos formada de declamação ideológicade fatos que foram apropriados, isto é, na maior parte das vezes decorados, revela que foi rompidoo nexo entre objeto e reflexão” (Adorno, 1995a, p. 63). Esse rompimento mantém a menoridade

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humana, eternizando a realidade da maioria dos homens aquém da individuação, numa impotênciasocial que se autonomiza de tal forma que apenas reproduz a dependência.

Essa realidade ainda permite explorar um outro aspecto da questão relativa aoconhecimento: a linguagem. Negligenciá-la não é resultado do acaso, mas possui valor estratégicoporque facilita a constituição de mecanismos de dominação. Assim, o professor não só não alcançaa própria emancipação como atua na manutenção da dominação social, já que a linguagem éveículo do pensamento. Sem linguagem, não há pensamento. Sem pensamento não háconhecimento. Sem conhecimento torna-se impossível reconhecer e ir em busca da superaçãode contradições sociais e da própria dominação.

Nesse sentido, a forma predominante de lidar com o que se entenda porconhecimento tende a apoiar-se naquilo que é disponibilizado pela indústria cultural, seja no campodos esportes, das novelas ou das histórias reais, que se apresentam como suportes à compreensãoda realidade, além da imaginação produtiva. Assim se dá “a exclusão socialmente ditada pelaformação” (Horkheimer & Adorno, 1971, p. 148) – uma exclusão que se caracteriza pelaimpossibilidade da auto-reflexão.

IMPORTÂNCIA CONFERIDA AOS RECURSOS MATERIAIS E TÉCNICOS PARA APRÁTICA PEDAGÓGICA

Observa-se a tendência a uma interpretação segundo a qual os computadoresparecem constituir o único instrumento capaz de tornar as aulas atraentes e motivadoras, alémde ser a ferramenta por excelência para providenciar o acesso à informação e à construção deconhecimentos.

Entretanto, para que essa ferramenta pudesse demonstrar o seu valor, seria precisoque cada aluno e cada professor tivesse o seu computador pessoal em sala de aula (como sesupõe ocorrer em todas as escolas particulares, vistas como modelo de qualidade a ser atingido).

A capacitação para o trabalho com jogos e outras técnicas pedagógicas ainda ébastante reclamada, ainda que já se mostre também desgastada, a menos que o capacitadortraga algo completamente desconhecido pelo grupo. A expectativa parece ser a da reproduçãoimediata, sem adaptações ou recriações pelos participantes, algo mágico que resolva facilmenteos problemas de disciplina, motivação, envolvimento e aprendizagem, já que os alunos “se cansamlogo”, “já conhecem a maioria dos jogos apresentados”, “já participaram dessa atividade comoutro professor”, entre outros aspectos apontados.

Para situações como essa, Adorno (1995b, p. 109) afirmou que aquilo que é relativoao conhecimento – a realidade – passa a ser cuidadosamente mantido a distância por meio dedispositivos organizatórios de uma realidade intramuros escolares, um estado de coisas quereflete o espírito objetivo, isto é, da não-necessidade de explicitar a relação sujeito/objeto,impermeabilizando-o no que se refere à crítica, quando não se apresenta a realidade como algorestrito àquilo que é expresso pela mídia, como já foi abordado no item anterior – e sem mediaçãocrítica.

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Assim, os professores tendem a adotar uma postura em que a ausência, adificuldade ou a não existência de recursos materiais em condições ideais (nunca descritas oudefinidas com clareza) impede o conhecimento e reproduz a alienação: “o progresso da infra-estrutura tem aumentado o retrocesso da consciência. Aquilo que está aparente na concretudedos bens materiais esconde, por meio da pseudodemocrática ideologia de vendedor esseretrocesso”. (Horkheimer & Adorno, 1971, p. 161).

O DISCURSO USADO PARA JUSTIFICAR A PRÓPRIA CONDIÇÃO E ATUAÇÃODOCENTE

A pobreza e a autocomiseração são as condições predominantemente assumidaspelos professores, no discurso. Consideram-se mal formados, mal instruídos, mal orientados,participando de um sistema educacional sem política que os ampare, à mercê de todos osproblemas sociais que estouram nas salas de aula de escolas mal equipadas. Entretanto, aindaencontram alguma força na “missão” que acompanha a profissão escolhida: formar pessoaspara a vida, ainda que raramente se sintam em condições adequadas para isso.

Quanto a isso, afirma Adorno (1995b, p. 110) que: “O processo civilizatório de queos professores são agentes orienta-se para um nivelamento. Ele pretende eliminar nos alunosaquela natureza disforme que retorna como natureza oprimida nas idiossincrasias, nos maneirismosde linguagem, nos sintomas de estarrecimento, nos constrangimentos e nas inabilidades dosmestres.” Os alunos passam a ser vistos como indisciplinados. Nesse caso, “triunfarão aquelesalunos que percebem no professor aquilo contra o que, de acordo com seu instinto, se dirige todoo sofrido processo educacional.”

É claro que o próprio Adorno realiza, com isso, uma crítica ao processo educacional,com a sua dupla hierarquia: a oficial, com seus critérios intelectuais de desempenho e notas; e asub-oficial, com um conjunto de habilidades relativas ao ser homem, não abraçadas pela hierarquiaoficial. Com essa dupla hierarquia, as ambigüidades encontram espaço nas relações educativase vão mantendo os princípios da dominação. Tanto que “para o desenvolvimento individual doshomens a escola constitui quase o protótipo da própria alienação social” (Adorno, 1995b, p. 112)

O problema aqui se apresenta no fato de que o discurso se reproduz sem que seofereçam possibilidades para a sua mudança e, obviamente, para a mudança da realidade que oproduz. A realidade do embate entre professores e alunos, em suas divergências e entraves nãoé considerada para além da constatação de que é algo difícil e penoso mesmo, com que cadaqual deve tentar lidar da melhor maneira possível, com bom senso. As alternativas, como se vê,são tão abstratas que os professores tendem a escapar delas sugerindo que essa realidade éresponsabilidade da família e esta também passa a ser tratada como entidade abstrata,caricaturizada em descrições como: “os problemas dos alunos se justificam pela pobreza dasfamílias, mães separadas e promíscuas, pais desempregados e bêbados”.

Desse modo, como a formação cultural tende a ser negada: “os elementos não-assimilados da formação cultural robustecem a coisificação da consciência” (Horkheimer & Adorno,1971, p. 163)

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A BUSCA PESSOAL POR APERFEIÇOAMENTO DOCENTE

Raros são os professores que indicam a busca de outras formas de aperfeiçoamentoprofissional que atendam as suas necessidade mais imediatas ou mais amplas. Há rarasindicações de leituras, à exceção de algo que esteja no topo das listas apresentadas em editaisde concursos.

Há muitos depoimentos que remetem à idéia de que haja um grupo crescente deprofessores que vem se tornando consumidor de cursos, muito mais pelo que representam nacarreira do magistério do que pelo que possam contribuir com a sua formação, efetivamente.

Para Adorno (1995a), a formação voltada para atender somente os imperativos daprofissionalização, é uma formação falsa. Quando esse autor aborda a formação, o faz no sentidode denunciar que, em nossa sociedade, o processo de especialização leva a uma formaçãodiferenciada, tendencialmente superior; porém, o caráter estritamente instrumental dessa formaçãoimpede a diferenciação como produção da consciência: “o pseudoculto se dedica à conservaçãode si sem si mesmo” (Horkheimer & Adorno, 1971, p. 167). A consciência acaba por expressar-sepelo caráter instrumental. A formação que leva a este estado de coisas só pode ser originária deum processo que separa a consciência (voltada para a auto-reflexão crítica) da preparação parao trabalho (que aprisiona o indivíduo na produção da vida material), por isso a sua falsidade.

Esse estado de coisas revela uma situação em que o professor mantém a suamenoridade social: “Na incapacidade do pensamento em se impor, já se encontra à espreita opotencial de enquadramento e subordinação a uma autoridade qualquer, do mesmo modo comohoje, concreta e voluntariamente, a gente se curva ao existente” (Adorno, 1995b, p. 71).

Curvar-se ao existente é uma forma de lidar com o medo, entregando-se a ele,como indivíduo que, ainda que impedido de sê-lo, estabelece para si mesmo objetivos de progresso,que se consubstanciam no engodo da autopreservação. Nesse processo, “sua postura é de defesaautomática...”(Adorno, 1995b, p. 71).

Quem se defenderia de algo que não seja ameaçador? A ameaça é tão real e omedo tão petrificante que: “uma das características da consciência coisificada é manter-se restritaa si mesma, junto a sua própria fraqueza, procurando justificar-se a qualquer custo” (Adorno,1995b, p. 71). Conseqüentemente, há professores que se negam à imposição do estudo, doaprofundamento, de identificar suas próprias lacunas de formação para buscar superá-las,contraditoriamente ao que seria desejável de quem optou por uma profissão intelectual. O própriosistema cuida de manter essa ambigüidade velada pelo manto dos procedimentos instrumentais,como as provas, exames, títulos, planos de carreira, educação continuada, entre outros meios deaprovação social para pertencer a um grupo e adquirir respeitabilidade. Nenhum dessesprocedimentos permite enfrentar o medo, e o medo precisa ser superado para que a consciênciapossa desenvolver-se e as buscas pessoais encontrem caminho na auto-reflexão.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A perspectiva com que a presente reflexão se apresenta não pretende “jogar acriança com a água do banho”. Entendemos que haja um universo de boas intenções nas propostasde educação continuada e um sem-número de argumentos para mantê-la. Como diriam ospróprios autores em que nos fundamentamos, na própria alienação esconde-se a fagulha libertadorada consciência. Nesse caso, uma crítica que se propõe contundente e nuclear pode contribuirpara revelar aquilo que está camuflado.

O processo capitalista de produção tem negado aos homens os pressupostos daverdadeira formação, apoderando-se, inclusive do tempo livre, e a pedagogia – ainda que possibilitea resistência – têm servido mais aos interesses do capital que à formação. Um exemplo disso,apresentado por Adorno, está presente na questão da educação popular. Como ele mesmo adverte,“a escolha dessa expressão demandou muito cuidado”, certamente na direção de que suaelaboração desse conta de exterminar o processo excludente do capitalismo. Ao contrário, aspráticas da educação popular só têm servido para manter muito claros os limites entre os quepodem e os que não podem ter uma formação – senão melhor ou emancipatória – ao menos commais acesso e compreensão dos bens culturais socialmente produzidos.

Entretanto, como foi abordado antes, a formação do senhor é imposta ao escravo,ainda que este não a alcance e, por isso, tenha negado o acesso ao que lhe é exigido. Por outrolado, até mesmo a formação do senhor torna-se falsa, na medida em que está impregnada dassofisticadas e sutis formas que se produzem na cultura totalitária e alienante. É o mercadointegrando e adaptando a educação aos mecanismos da dominação e, até mesmo confundindoou ampliando as formas de dominação que se exercem nas relações entre senhor e escravo: porvezes, o professor se posiciona como o senhor (do saber) e exige do aluno a humildade servil doescravo. Este depende daquele para ser iniciado nos caminhos da construção do conhecimentoe os rituais de iniciação são, também, muito próximos dos primitivos.

Possivelmente, grande parte dos próprios professores não se dêem conta dessacontradição, mas o fato é que a reproduzem no fazer típico de sua formação – também fragmentada– também uma pseudoformação. Do contrário, o que a teria feito degenerar-se?

A educação tem, então, servido ao propósito da formação de indivíduosheteronômicos, sem autonomia real. Faz-se instrumento do sistema para conservar a estagnaçãoda consciência. Portanto, a educação não é libertadora a priori, mas ainda assim é necessária,porque pode auxiliar como atenuante à violência.

Podemos ter como metáfora que a manutenção da pseudoformação se dá sob umvéu – algo leve e que apenas torna opaca a visão daquilo que esconde. Talvez, por isso – porapenas manter velada a realidade cheia de boas intenções, mas repleta de contradições – é quea pseudoformação se mantenha. Se as contradições estivessem protegidas por uma cortina dechumbo nosso esforço por descerrá-la seria maior.

Por outro lado, quando tomamos os depoimentos dos professores que participaram

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de um determinado programa de formação, é preciso deixar claro que não nos referimos somentea eles em nossa análise, mas por meio do que é possível detectar nesses depoimentos deixamosexposto o nervo inflamado das próprias propostas de educação continuada, as quais,sistematicamente, mantêm a pseudoformação, que impede a superação da dominação social domodo como se apresenta no nosso sistema educacional. As contradições que observamosremetem aos propositores de qualquer iniciativa de educação continuada para docentes.

Esta análise ainda nos permite formular a hipótese de que, dentre as razõespedagógicas pelas quais os programas de educação continuada não atingem os objetivos a quese propõem, está a ausência de diálogo efetivo que busque compreender as necessidades eexpectativas dos professores, ouvindo-os quanto às práticas adotadas, soluções encontradas edificuldades que se mantêm em sua ação formativa e em sua própria formação.

A partir disso, pode se tornar viável encontrar aquela fagulha libertadora a que nosreferimos antes, em direção à superação da pseudoformação docente, que ainda se estende atoda a sociedade, apesar de todas as promessas e possibilidades das políticas educacionais edas novas tecnologias. Os pressupostos para a elaboração de políticas e para o uso das novastecnologias ainda não foram alcançados.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ADORNO, Theodor. Tabus acerca do magistério. Educação e Emancipação. São Paulo: Paz eTerra, 1995a

ADORNO, Theodor. A filosofia e os professores. Educação e Emancipação. São Paulo: Paz eTerra, 1995b.

HORKHEIMER, M. e ADORNO, T.. Teoria de la Seudocultura. Sociológica. Madrid: Taurus, 1971.

BONINI. Luci de Melo & PRADOS, Rosália Maria Netto. Relatório Final do Programa Teia do Saber.Mogi das Cruzes, São Paulo: Universidade Braz Cubas. 2003.

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Dentre os desafios impostos às políticas públicas de formação continuada deprofessores das séries iniciais e à produção de conhecimentos na área da formação profissionalde professores, situa-se a conciliação entre, de um lado, as orientações epistemológicaspredominantes (NÓVOA, 1992) e, de outro, a necessária conexão entre a compreensão deprocessos comportamentais derivada da pesquisa básica e a inserção desses conhecimentosem contextos aplicados reconhecidamente relevantes (MACE, 1994), como, por exemplo, o ensinoe a aprendizagem, em sala de aula, de conteúdos curriculares das séries iniciais da EducaçãoBásica obrigatória.

As orientações quanto ao tratamento didático manifestadas nos PCNs/LínguaPortuguesa (BRASIL, 1997) estabelecem vínculos entre os objetivos e as atividades de avaliação.Preconiza-se que os objetivos de ensino balizam a avaliação (BRASIL, 1997; p. 95), sendo que osobjetivos permitem a elaboração de critérios para avaliar a aprendizagem das diferentesmodalidades de conteúdos curriculares. Assim, os objetivos, ao especificarem capacidadespertinentes para os conteúdos selecionados e para os respectivos ciclos envolvidos, representamaprendizagens imprescindíveis, sendo que os critérios de avaliação devem, portanto, ser analisadoscom base nos objetivos que orientaram as práticas de ensino oferecidas.

O texto dos PCNs/Língua Portuguesa salienta claramente a necessidade de o pro-fessor estar devidamente capacitado ou habilitado para executar conjuntos distintos de atividadesdiretamente relacionadas com a concretização das intenções educativas expressas no texto(BRASIL, 1997; cf. p. 48 e 97).

Destarte, a concretização das intenções educativas dos PCNs/Língua Portuguesaimpõe, aos professores, capacidades e habilidades para: i) delinearem práticas de ensino e deavaliação consistentes com os objetivos de ensino selecionados para um dado ciclo e determinadosconteúdos curriculares; bem como, ii) interpretarem as medidas comportamentais produzidaspela interação dos alunos com tais práticas, considerando os objetivos de ensino que justificarama proposição das mesmas.

Do ponto de vista da Análise do Comportamento, estima-se que as noções decapacidades e de habilidades mencionadas nos documentos oficiais, definem-se pela aquisiçãode comportamentos que, sensíveis aos efeitos que produzem no contexto institucional em queocorrem, caracterizam-se pelo planejamento de contingências comprometidas com a produçãode determinados objetivos de ensino.

ENSINO E APRENDIZAGEM DE LÍNGUAPORTUGUESA NAS SÉRIES INICIAIS: ASPECTOS

METODOLÓGICOS NA INVESTIGAÇÃO DENECESSIDADES FORMATIVAS

Ana Paula Araújo Fonseca ; Jair Lopes Júnior(Unesp/Bauru)

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Dentre os distintos comportamentos que definem um repertório eficaz de ensino,sob a ótica da Análise do Comportamento, ou da análise operante dos processos de ensino e deaprendizagem (KUBO e BOTOMÉ, 2001; SCHMIDT, 1999), cumpre destacar a descrição, peloprofessor, das contingências de ensino nas quais são registradas as medidas comportamentaisde desempenho dos alunos. Tal descrição deve garantir visibilidade às relações entre os objetivosesperados e as práticas de ensino e de avaliação consistentes com a obtenção desses objetivos,bem como entre as medidas de desempenho registradas e os objetivos selecionados.

Estudos realizados com professores das séries iniciais do ensino público estadualapontaram restrições de repertório dos mesmos em descrever as contingências de ensino comas quais trabalhavam (FONSECA, 2004; LOPES Jr. e COSTA, 2005; LOPES Jr. et al, 2004).Nestes estudos, diante de atividades planejadas de interação entre os pesquisadores e cadaprofessor individualmente, estes descreveram as contingências de ensino de conteúdoscurriculares da área de Ciências Naturais nomeando, com expressões genéricas (por exemplo,concentração, atenção, memória, raciocínio, dentre outras), as exigências impostas pelas atividadespropostas, tanto quanto as habilidades necessárias para o sucesso dos alunos.

Resultados análogos foram registrados em literatura pertinente. Pereira, Marinotti eLuna (2004, p. 24) constataram que as respostas fornecidas pelo professor ao descrever suaprática diferem das ações efetivamente observadas no seu contato com os alunos. Schmidt (1999)analisou o tipo de instruções oferecidas por uma professora do ensino especial aos seus alunose verificou que o comportamento instrucional da professora não esteve sob controle dos efeitosproduzidos em seus alunos, corroborando dados que evidenciam independência funcional entre ocomportamento de ensinar do professor e o comportamento manifesto do aluno em interaçãocom tais ações do professor (WEISSMANN, 1998).

Kubo e Botomé (2001) preconizam que ensinar é um processo comportamentalque define-se pelos efeitos que produz, a saber, pela aprendizagem do aluno e não pelas intençõesdo professor ou por suas reflexões ou relatos verbais sobre as suas práticas educativas em salade aula (cf. CARVALHO, 2002). O professor é responsável pelo planejamento e execução decontingências instrucionais sob às quais os alunos aprendem. Somado a isso, ele deve ser capazde definir, de modo explícito e claro, os objetivos do processo de ensino, em termos de alteraçõesa serem produzidas de modo planejado no comportamento do aluno (ZANOTTO, 2000).

Porém, a tarefa de planejar condições de ensino baseadas em necessidadesindividuais dos alunos não fica facilitada pelas condições objetivas de trabalho fornecidas aosprofessores. Muitas vezes, ao invés de o professor ficar sensível ao resultado de sua práticaeducativa no comportamento de seus alunos, eles estão respondendo à instâncias superiores, àoutros professores, aos seus planos de aula, ao comportamento disciplinar do aluno, à participaçãodos pais na escola, às crenças sobre as famílias dos alunos, às exigências burocráticas ou àsexpectativas e formação profissional (PEREIRA, MARINOTTI e LUNA, 2004).

Considerando-se, portanto, que os comportamentos de ensinar definem-se pelosefeitos produzidos nos desempenhos dos aprendizes, estima-se relevante a identificação de

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condições que poderiam ampliar as possibilidades do planejamento e da execução de práticaseducativas sustentarem relações de funcionalidade com as medidas de desempenho dos alunos.

Nesses termos, partindo do exposto, o presente trabalho objetivou avaliar se aexibição de trechos de vídeos de aulas ministradas por professores de quarta série referentes aoconteúdo de Língua Portuguesa, poderia se caracterizar como condição facilitadora para possibilitar,aos mesmos professores, a realização de vinculações entre seus objetivos, suas estratégias deensino e de avaliação.

MÉTODO

Participaram deste estudo, dois professores da rede pública estadual. Apósapreciação do projeto pela direção e coordenação da escola, os professores foram convidados aparticipar do estudo e assinaram o Termo de consentimento livre e esclarecido aprovado peloComitê de Ética em Pesquisa da instituição dos pesquisadores. Todas as sessões de coleta dedados foram realizadas na própria escola onde eles lecionam. Juntamente com os professores,participaram suas respectivas turmas. De acordo com o procedimento, cada professor indicoutrês alunos, com desempenho em Língua Portuguesa, caracterizado como aquém do esperadopara a série.

Tabela1. Características dos professores participantes______________________________________________________________Professor/Sexo Série Tempo de magistério Tempo na escola Formação______________________________________________________________P1/F 4ª 20 anos 06 meses PedagogiaP2/M 4ª 06 anos 06 meses Pedagogia______________________________________________________________As observações das aulas ocorreram durante o horário regular de algumas aulas

de Língua Portuguesa ministradas pelos professores. Já as entrevistas ocorreram durante o HTPCou, quando era viável, durante os horários de Educação Física e de Educação Artística, uma vezque essas disciplinas são de responsabilidade de professores especialistas.

O procedimento adotado consistiu em três etapas:Etapa 1: Neste momento, solicitou-se aos professores que indicassem até três

alunos que eles considerassem com desempenho aquém do esperado para o ciclo em LínguaPortuguesa. Em seguida, planejou-se, para cada professor, a observação de uma unidade didáticaprevista para as aulas de Língua Portuguesa desta série. Todas as observações e registros emvídeo foram devidamente agendados com antecedência junto aos professores. A escolha do temada unidade didática ficou a critério dos próprios professores. A carga horária referente às aulaspara esses conteúdos variou em função do planejamento de cada professor, conforme descriçãona seção Resultados.

Antes da realização da primeira filmagem, a pesquisadora realizou uma entrevista

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inicial com os professores, com o intuito de estabelecer vínculos positivos, conhecer a descriçãodo professor sobre sua turma e garantir participação do modo mais natural possível antes dacondição de filmagem. Além disso, obteve autorização dos pais ou responsáveis pelos respectivosalunos para a realização das filmagens e cumpriu um período de ambientação, a fim de conhecere ser conhecida pelos alunos da classe. Para isso, realizou duas observações com a filmadoradesligada, para que os alunos pudessem se familiarizar com a presença do aparelho durante aaula. A partir disso é que a primeira aula de Língua Portuguesa foi registrada em vídeo. Os registrospriorizaram a interação dos professores com os alunos indicados. Durante todo o tempo defilmagem, a pesquisadora permaneceu ao lado da filmadora observando a aula e sem interaçãocom os professores e com os alunos.

Etapa 2: Esta etapa consistiu em cada professor responder individualmente, comregistro em áudio, a um roteiro de entrevista que explorava tópicos como: a) as estratégias deensino utilizadas; b) os objetivos pretendidos com tais estratégias; c) os efeitos conseguidos comos alunos com o uso de tais estratégias; d) as medidas comportamentais dos alunos que indicavamesses efeitos; e) a possível influência que esses efeitos geraram em seu comportamento deensinar o conteúdo, referentes ao conjunto de aulas da unidade didática ministrada. Essa entrevistaocorreu após o registro das aulas da unidade didática e antes da exibição do vídeo correspondenteao professor.

Etapa 3: Esta última etapa consistiu na realização de uma reunião entre cada pro-fessor e a pesquisadora. Nesta ocasião, a pesquisadora exibiu trechos das filmagens referentesà unidade didática observada. Os trechos foram selecionados utilizando-se o seguinte critério, asaber, trechos que mostrassem ações descritas pelo professor durante a entrevista da etapa 2,permitindo que professor e pesquisadora pudessem analisar os mesmos fenômenos, possibilitandoa verificação de correspondência verbal e não verbal e a comparação futura entre as análisesefetuadas por ambos. Imediatamente após a apresentação dos trechos das filmagens, apesquisadora apresentou novamente o mesmo roteiro de entrevista da etapa anterior.

RESULTADOS

Na Etapa 1, cada professor indicou três alunos, os quais eles avaliavam apresentardesempenho aquém do esperado para a série. Os professores descreveram as dificuldades dosalunos com ênfase em propriedades das respostas, sem referência à aspectos do contexto diantedo qual as ocorrências das mesmas foram observadas. P1, por exemplo, disse que seus alunoseram “copistas” e P2 disse que a maior dificuldade dos alunos era com “sílabas complexas”. Natabela, constam informações sobre os temas ministrados pelos professores.

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Tabela 2. Tema ministrado pelos professores, com o respectivo número de aulas

____________________________________________________________

Professor Tema da unidade didática Nº de aulas

______________________________________________________________

P1 Linguagem Culta 04

P2 Vários tipos de texto 09

______________________________________________________________Na etapa 2, após as filmagens e diante do roteiro de entrevista antes de assistir ao

vídeo das aulas, os professores apresentaram resultados semelhantes no que diz respeito aosseguintes aspectos:

- Baixo valor informativo das descrições sobre as estratégias de ensino utilizadas.Por exemplo, ao citar a estratégia “realizar exposição oral”, P2 não esclarece em que condiçõesessa exposição foi realizada, quais as informações que seriam expostas, de que forma etc. Domesmo modo, P1 cita “Passar letra da música -Saudades da minha terra-”, informação que nãopermite conhecer o que, de fato, ele fez, pois não há especificações se os alunos tiveram quecopiar a letra da lousa, se foi lida pelo professor etc.

- Descrições de objetivos de ensino que ora faziam menção a ação dos alunos, oraà própria prática pedagógica do professor. Um exemplo de objetivo referente à prática pedagógicaé a descrição de P1 “Ensinar ortografia”, ou seja, é o professor quem vai ensinar ortografia, nãopodendo se caracterizar como objetivo. Outro exemplo, agora fazendo menção a ação dos alunosé a descrição de P2 “que eles soubessem interagir em grupo, realizar atividades em grupo”,caracterizado como objetivo a ser alcançado pelo professor, mas realizado pelos alunos.

-Independência entre efeitos conseguidos com os alunos, estratégias de ensinoutilizadas e objetivos pretendidos. Nesse aspecto, os professores descreveram efeitos conseguidoscom os alunos indicados que, não necessariamente, levavam em consideração os objetivos queeles pretendiam e as estratégias utilizadas para se chegar a tal. Exemplo disso é P1 relatar comoefeito da estratégia “Passar o texto do Chico Bento (modo caipira)” que os alunos “acharamengraçado”, sendo que seu objetivo para esta estratégia era “fazer com que eles conseguissemvisualizar os erros e passar o texto de forma culta”. Sendo assim, P1 demonstra distância descritivaentre a identificação dos efeitos nos comportamentos dos alunos daquilo que era esperado queeles fizessem.

- Objetivos muito amplos para se atingir em uma aula. Esse aspecto também serepetiu para os dois professores. Descrição de objetivo como o mencionado por P2 “que alunoscomeçassem a falar e a escrever certo a nossa língua” impossibilitam o professor de aferir oalcance do mesmo durante uma única aula. Sendo assim, dificulta-se, também, a visibilidade dasações dos alunos que dariam demonstrações de aproximação dos objetivos pretendidos, o que,por sua vez, impede o professor de avaliar a adequação de suas estratégias com base nos

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objetivos, uma vez que falta clareza sobre os comportamentos que os alunos deveriam apresentarjá nesta aula para demonstrar aprendizagem.

- Crença nas dificuldades dos alunos indicados impedirem o alcance de efeitossatisfatórios. Este aspecto se mostrou, de modo mais específico, nas descrições de P2, querelatou como efeitos das duas estratégias citadas nesta etapa, uma dificuldade relacionada acaracterísticas pessoais dos alunos indicados. P2 relatou “porque a exposição oral pra eles é atémais difícil” ou “Os outros têm muita dificuldade e eles (indicados), mais ainda”. Porém, o profes-sor não menciona quais ações dos alunos demonstram e/ou confirmam tais dificuldades adicionais.No caso de P1, esta crença apareceu na reincidente resposta “nenhum” sobre os efeitosconseguidos com os alunos indicados em quatro, das seis estratégias mencionadas, sem nenhumrelato a respeito das ações desses alunos.

Os resultados da etapa 3, marcada pela exibição dos vídeos das aulas ministradaspelos professores, será descrito na seqüência:

- Aumento das descrições a respeito dos aspectos da aula: Após a exibição dosvídeos, os dois professores tiveram seu relato ampliado. P1, por exemplo, passa de duas paraquatro estratégias de ensino citadas. P2, por sua vez, ao contrário da etapa anterior, relata efeitosconseguidos com os alunos indicados para as cinco estratégias citadas após a exibição do vídeo.Porém, no que diz respeito ao valor informativo das descrições, poucas diferenças foramidentificadas.

- Inconsistência do relato sobre estratégias e objetivos: Após assistir ao vídeo dasaulas, P1, mais especificamente, menciona como estratégias de ensino, o que antes do vídeohavia sido mencionado como objetivo. Ou seja, antes do vídeo, “mostrar que as palavras podemser escritas de modo diferentes” e “falar sobre o compositor Belmonte” eram objetivos e nãoestratégias. De modo similar para os dois professores, a manutenção do relato de objetivoscentrados na ação dos alunos e de objetivos centrados na ação pedagógica se manteve, mesmoapós a exibição do vídeo.

- Manutenção da independência entre objetivos, estratégias e efeitos: Este aspectose manteve para os dois professores. Após a exibição do vídeo, os dois continuaram respondendosobre os efeitos conseguidos com os alunos indicados sem, necessariamente, relacioná-los aosobjetivos pretendidos. Mais do que isso, ao mencionar os efeitos, muitas vezes, os professoresnão descreviam claramente as ações dos alunos, por exemplo, ao dizer “percebi que foramrazoavelmente bem na medida deles” ou “alguns observaram com mais propriedade, outros não”,P2 não informa que ações dos alunos foram apresentadas durante a aula.

- Reconhecimento do insucesso no uso de algumas estratégias e da ausência demedidas de avaliação: Esse resultado foi mais específico para P1 que, ao mencionar sobre osefeitos conseguidos com os alunos, diz “acho que o problema não foi nem não querer cantar, foinão conseguir localizar as palavras no texto, na letra da música” ou “Eu sei que eles ficaramsabendo do que eu falei, agora eu também não cobrei nada pra saber se teve efeito ou não”. Ao

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realizar tais descrições, P1 reconhece a ausência de medidas de avaliação e identifica possíveisdificuldades de realização da tarefa proposta por parte dos alunos indicados.

- Confirmação das características dos alunos como dificultador para a obtençãodos efeitos: Antes de assistir aos vídeos, os dois professores tiveram dificuldade em relacionarcaracterísticas dos desempenhos dos alunos com características das condições de ensinodisponibilizadas. Constatou-se a negação de possíveis efeitos para os alunos indicados, no casode P1, e a ênfase em uma dificuldade adicional dos alunos indicados, no caso de P2. Diante dosvídeos, essas propriedades dos relatos dos professores foram acentuadas. P1, por exemplo,afirmou sobre o aluno C: “C, nenhum efeito. Não sei, às vezes eu acho que ele não entende direitoo que eu falo, porque teve uma hora que eu pedi pra classe que riscassem, que sublinhassem aspalavras desconhecidas e ele sublinhou o texto inteiro”. P2, por sua vez, relatou que “No caso doG, eu vi uma indiferença muito grande. O J é sempre disperso, sem muito ânimo pra fazer ascoisas. A aluna A, um pouco de apatia em querer fazer”. Ou seja, nestas falas, os professoressugerem ter identificado no vídeo, confirmações do que eles já haviam descrito na etapa anterior,sem relacionar tais efeitos a possíveis estratégias oferecidas por eles. Especificamente para P2,um aspecto interessante foi a identificação dos efeitos em termos valorativos mais do quedescritivos, utilizando-se expressões como “bons”, “positivos” e “negativos”. Exemplos: “eu vejoque o efeito foi bom, eles tiveram oportunidade de entender, de sentar junto, de brigar, de falar, detentar se entender, então essa é uma experiência a mais pra eles” ou “Foram bons, porque namedida em que olharam, pensaram sobre isso, leram, viram, pensaram e analisaram”.

Tanto na Etapa 1, como na Etapa 2, nenhum dos professores mencionou sobre oscomportamentos prévios que seus alunos já apresentavam antes do início das aulas da unidadedidática.

DISCUSSÃO

Analisando-se os resultados obtidos, nota-se que a exibição do vídeo das aulaspode ajudar o professor a ampliar seu repertório descritivo a respeito das mesmas. Isso é possívelpela criação de uma condição facilitadora para que o professor fale a respeito da sua práticaprofissional.

Porém, apenas ser exposto ao vídeo, parece não se caracterizar como condiçãosuficiente para instrumentalizar o professor a estabelecer relações entre as estratégias de ensinoque ele proporciona, os objetivos que ele almeja alcançar com o uso de tais estratégias e asformas de avaliação para saber quais os efeitos conseguidos com os alunos após a execuçãodas estratégias propostas.

Outro aspecto que parece não ser suficiente apenas com a exibição do vídeo éfazer com que o professor demonstre compreender que as ações apresentadas pelos alunosdurante a aula estão intimamente relacionadas às ações planejadas e executadas por ele.

Desta forma, percebe-se que os professores se mostram sensíveis aos vídeos

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exibidos, ou seja, os vídeos exercem efeitos sobre eles, mas esses efeitos se caracterizam maispela imediaticidade dos fenômenos apresentados do que por um aumento na capacidade analíticado professor de compreender funcionalmente os aspectos presentes durante as aulas.

Os dados expostos indicam independência funcional entre as ações propostaspelo professor e o desempenho dos alunos, replicando dados anteriores da literatura, contudo,obtidos sob condições metodológicas distintas (FONSECA, 2004; LOPES Jr. e COSTA, 2005;Lopes Jr. et al, 2004; PEREIRA et al., 2004; SCHMIDT, 1999). Isso demonstra um distanciamentocom uma proposta de análise funcional descritiva que, por sua vez, está comprometida emidentificar variáveis associadas com a ocorrência ou não de determinados repertórios. Entenda-se como repertório os comportamentos que o professor relata querer ensinar ao descrever seusobjetivos de ensino.

Tornar tais variáveis visíveis tem um importante papel na proposição de estratégiasde intervenção, seja alterando-se eventos antecedentes, eliminando-se eventos conseqüentes oufornecendo-se conseqüências mais eficientes relacionadas à manifestação dos repertóriosselecionados (KUBO e BOTOMÉ, 2001; ZANOTTO, 2000; 2004). Sendo assim, se o professor semostra capaz de relacionar funcionalmente sua ação à ação dos alunos, ele pode alterar suasestratégias de ensino (evento antecedente), oferecer feedbacks mais direcionados a cada aluno,com base no desempenho apresentado (evento conseqüente) etc.

Sabe-se que a apresentação do vídeo, dificilmente, conseguiria obter como efeitosa aproximação dos professores de uma interpretação funcional. No entanto, mais do que acreditarnessa possibilidade, exibir os vídeos ajuda a evidenciar uma possível dificuldade dos professoresem interpretar fenômenos como os de alunos “copistas” ou “indisciplinados”. Tais fenômenos,muitas vezes, relacionam-se ao uso de estratégias de ensino inadequadas às características daturma.

Outro fator a ser considerado é a ausência de descrições dos professores sobremedidas prévias dos seus alunos. Partindo-se do pressuposto de que o papel do professor éfazer com que seus alunos passem a apresentar comportamentos que não estavam presentesantes da exposição às aulas, mostra-se necessário o desenvolvimento de recursos que viabilizem,de modo mais direto e informativo, a identificação e a avaliação de mudanças nos repertórios dosalunos em função da exposição às condições disponibilizadas pelos professores.

Os resultados deste estudo mostraram-se consistentes com as orientaçõesepistemológicas que preconizam a importância e a necessidade de vincular propostas de formaçãocontinuada com o contexto da atuação profissional do professor. Outrossim, tais resultadosigualmente salientaram a necessidade de pesquisas adicionais, visto que, como conhecimentoou saber docente relevante, a aquisição e o desenvolvimento de habilidades para tornar maisvisíveis as relações entre objetivos de ensino, estratégias de ensino e de avaliação, enquanto umanecessidade formativa, não se constituíram em efeito natural ou espontâneo da exposição aoregistro (em vídeo) de suas respectivas atuações profissionais.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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FONSECA, A.P.A. Práticas educativas e processos comportamentais no âmbito da alfabetizaçãocientífica: Análises metodológicas e experimentais. Relatório técnico submetido à Diretoria Científicada FAPESP (Bolsa IC – Processo 03/05669-4), 2004

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Analisar as variáveis que interferem nos resultados do trabalho pedagógico epossibilitar um “olhar diferenciado” para os futuros pedagogos têm sido um desafio, uma buscaconstante e a preocupação principal dos docentes responsáveis pelo acompanhamento dosestágios de Ensino Fundamental e Educação Infantil e Trabalho de Conclusão de Curso daUniversidade São Francisco. Entre outros, tem-se por objetivo com estas disciplinas que osalunos construam novos conhecimentos para atuarem de forma satisfatória em sala de aula.Durante o trabalho de supervisão dos estágios e orientação do trabalho de conclusão de curso,oportuniza-se aos alunos momentos de socialização a fim de que eles possam refletir sobre aorganização da prática pedagógica.

O objetivo do presente trabalho é apresentar o resultado de dois estudos sobre aanálise de materiais didáticos utilizados por docentes para ensinar a ler e escrever, desenvolvidospor alunas do curso de Pedagogia da Universidade São Francisco. O interesse pelo tema surgiua partir da realização do Estágio Supervisionado em Ensino Fundamental, composto por momentosde observação da prática docente, neste caso, especificamente do processo de alfabetização, daparticipação no desenvolvimento das atividades e da organização de seqüências didáticas nomomento da regência.

Para a compreensão de tais aspectos, apresentaremos primeiramente os objetivose a organização do estágio supervisionado e do trabalho de conclusão de curso e, por fim osresultados dos dois estudos sobre materiais didáticos.

O ESTÁGIO SUPERVISIONADO [1]

Parte-se da perspectiva de que o estágio é um momento intencionalmenteorganizado para que o aluno possa ter a oportunidade de apreender a realidade concreta, nosmomentos em que estiver convivendo com crianças e seus professores no contexto escolar.

Entende-se por estágio a prática e o período supervisionado, durante os quais oestudante se habilita para exercer sua profissão, vivenciando conhecimentos e desenvolvendohabilidades adquiridas durante o curso, assim como atitudes e posturas docentes. É nessarealidade que o futuro professor tem a oportunidade de avaliar a formação que está recebendo nocurso, e como fazer desse momento uma base de reflexão, de análise e crítica, através de uma

ESTUDOS DE MATERIAIS DIDÁTICOS PARAALFABETIZAR: UMA ARTICULAÇÃO ENTRE O

ESTÁGIO SUPERVISIONADO E O TRABALHO DECONCLUSÃO DE CURSO

TORTELLA, Jussara Cristina Barboza (USF)

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postura indagativa e problematizadora sobre o cotidiano escolar.Os docentes responsáveis pela disciplina Estágio Supervisionado organizaram um

manual de orientações com o objetivo de que os alunos possam ter consciência da importânciade tal disciplina e realizem o estágio para garantir uma análise crítica da realidade escolar e,principalmente, que encontrem lá elementos que o ajudem a serem profissionais competentes. Odocumento é composto pelos seguintes itens: Introdução; Objetivos; Responsabilidade do Estagiárioe do Supervisor; Distribuição da carga horária e atividades; Modalidades e roteiro de atividades:caracterização da unidade escolar, estágio de observação, participação e regência; Fichascumulativas; Critérios de Avaliação e Auto Avaliação; Estrutura de formatação e organização dapasta de estágio.

Constituem-se objetivos do estágio· Proporcionar aos estagiários um contato direto com o campo de atuação

do Pedagogo no Ensino Fundamental, a fim de que o mesmo possa desenvolver sua competênciatécnica-política-social, vislumbrando a transformação social;

· Oportunizar ao estagiário, condições de integração no contexto escolar paraque o mesmo possa identificar as características da prática pedagógica e sua integração com acomunidade interna e externa;

· Desenvolver, através da crítica, oportunidades para que os estagiáriosidentifiquem suas possibilidades e limitações e idealizem estilos mais produtivos de participaçõesno processo ensino-aprendizagem;

· Contribuir, através de tarefas de pesquisa, exposições e debates sobre aproblemática atual nas áreas de formação específica, estimulando o espírito crítico e auto-críticodos futuros professores;

- Propiciar aos alunos situações nas quais possam:- Caracterizar a Unidade Escolar;- Conhecer a proposta pedagógica e as características da comunidade em

que está inserida a escola e/ou instituição;- Conhecer o Plano de Gestão/Escolar;- Avaliar o plano de ensino e planejamento de trabalho dos professores;- Observar procedimentos didáticos e estratégias do professor;- Identificar o papel do professor no processo educativo e da função da escola

na comunidade;- Verificar que a ação educativa deve ser planejada de forma integral;- Elaborar seqüência didática de atividades que possam ser desenvolvidas e

aplicadas em uma classe ou série;- Propiciar o contato com educandos de diferentes séries do Ensino Funda-

mental e identificar variáveis que interfiram no processo ensino-aprendizagem;- Participar de atividades extra-classe e/ou extra curriculares caracterizando-

as, também, como variáveis intervenientes do processo de construção do conhecimento;

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- Vivenciar procedimentos de ensino;- Desempenhar, em situações planejadas e controladas, o papel de profes

sor;- Analisar o próprio desempenho nos estágios realizados.Optou-se pela utilização da seqüência didática e do trabalho com projetos na

modalidade do estágio de regência, como uma opção consciente e reflexiva sobre o que significaaprender e ensinar; como pressuposto da preocupação do professor em favorecer a construçãoda autonomia intelectual dos alunos, em observar os conhecimentos prévios, em aprender aarticular objetivos de ensino e objetivos de realização dos alunos, em possibilitar o entendimentoe a importância de se trabalhar com diferentes conteúdos: procedimentais, conceituais e atitudinais;em aprender a organizar atividades que se aproximem cada vez mais da versão social, e emaprender a avaliar os resultados obtidos, dentre tantos outros aspectos.

O desenvolvimento das atividades do estágio tem suscitado, em muitas dos alunosdo curso de Pedagogia, o interesse por direcionar os estudos de pesquisa a serem desenvolvidosna disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso.

O Trabalho De Conclusão De Curso [2]Ao longo de três semestres, os estudantes realizam as disciplinas Pesquisa e

Prática Pedagógica I, II e III, tendo a oportunidade de elaborar conhecimentos teóricos e práticos,para que ao final da disciplina sejam capazes de:

a) utilizar metodologia científica adequada à elaboração de trabalho monográficoou de pesquisa;

b) aprimorar os procedimentos de revisão bibliográfica;c) refletir criticamente sobre as fontes consultadas;d) analisar os dados colhidos em campo;d) organizar logicamente o Trabalho de Conclusão de Curso;f) redigir o TCC de acordo com as normas acadêmicas.Assim, como no estágio supervisionado, os docentes responsáveis pelas disciplinas

voltadas para o Trabalho de Conclusão de Curso organizaram um manual de orientações com osseguintes itens: Objetivos do TCC; Tipos de Pesquisa; Elementos básicos do projeto: delimitaçãodo assunto, a revisão da produção científica já acumulada sobre o tema, a formulação do problema,a(s) hipótese(s), metodologia - descrição dos procedimentos, cronograma de execução, referênciasbibliográficas; Partes de um relatório TCC – organização do conteúdo textual.

As disciplinas Pesquisa e Prática Pedagógica I e II são desenvolvidas por um únicoprofessor. Já na disciplina Pesquisa e Prática Pedagógica III há uma divisão, sendo que cadadocente fica responsável por um determinado número (geralmente sete ou oito) de orientandos,que se encontra semanalmente para orientações individuais. No decorrer do semestre sãorealizados também seminários nos quais os alunos apresentam e debatem as pesquisas queestão sendo desenvolvidas.

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ESTUDOS DE MATERIAIS DIDÁTICOS PARA ALFABETIZAR

A abrangência dos aspectos relacionados ao campo da alfabetização é ampla. Umresgate histórico da educação brasileira demonstra que, a partir da década de 1980, os métodosanalíticos e sintéticos passaram a ser questionados, e foi introduzida uma nova perspectiva: aconstrutivista. Os equívocos de interpretação da teoria e a tentativa de aplicação direta da mesmaem sala de aula, trouxeram, além da resistência, muita dúvida e distorções. Como resultado dainsegurança de alguns professores, muitos alunos saíram da escola sem aprender, e pais ficaramrevoltados.

Novas publicações sobre a alfabetização demonstram que os autores estãopreocupados em elucidar a teoria, minimizando os equívocos estabelecidos e, a partir dasdiscussões sobre como a criança aprende, ou seja, os processos de aprendizagem aliados aoprocesso de ensino, trazem exemplos práticos sobre quais atividades mais indicadas paraalfabetizar, considerando os pressupostos teóricos.

A atuação como docente em formação inicial e continuada de professores temdemonstrado que muitos educadores, embora saibam verbalizar e justificar sua opção pelaperspectiva construtiva, que dizem embasar sua prática, quando selecionam os materiais didáticospara ensinar a ler e escrever, aqui entendidos por atividades retiradas de livros didáticos ouelaboradas pelo próprio professor, e ainda jogos comprados ou confeccionados pelo professor,demonstram incoerência com os pressupostos preconizados por tal perspectiva. A análise dejogos e atividades pode constituir-se como um fator de extrema importância para elucidar algumasquestões que norteiam o processo de construção da leitura e escrita, e a prática do professor.

Como já dito, a realização do estágio supervisionado contribuiu para a escolha dotema para o desenvolvimento de dois trabalhos de conclusão de curso: o primeiro, “Análise deatividades no período de alfabetização a partir da perspectiva construtivista” desenvolvido porRizzato, Tortella (2006), e o segundo, Bagne, Tortella (2006), “Construção ou desconstrução:análise de jogos pedagógicos no período de alfabetização”[3]. As questões norteadoras dostrabalhos foram as seguintes: como é realizada a seleção do material pelo professor para poderauxiliar o aluno na aprendizagem? Os jogos existentes, tanto os fabricados e comercializados,quanto os produzidos pelos professores, atendem os princípios pedagógicos construtivos?

A partir da questão norteadora, objetivou-se estudar e analisar atividades e jogos deleitura e escrita utilizadas no processo inicial da alfabetização. As pesquisas utilizaram a análisede materiais didáticos, ou seja, de atividades e jogos utilizados pelos professores na fase dealfabetização, constituindo-se, portanto, em uma pesquisa de análise documental. Tinha-se porhipótese que as atividades formuladas ou organizadas pelos professores não atendiam aosprincípios estabelecidos pelo referencial construtivista.

Para subsidiar a análise de atividades e jogos. utilizou-se os princípios estabelecidospor Weisz (2003, p.66) que determinam uma boa situação de aprendizagem:

- os alunos precisam pôr em jogo. tudo o que sabem e pensam

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sobre o conteúdo que se quer ensinar;- os alunos têm problemas a resolver e decisões a tomar, em funçãodo que se propõem produzir;- a organização da tarefa pelo professor garante a máxima circulaçãode informação possível;- o conteúdo trabalhado mantém suas características de objetosócio-cultural real, sem se transformar em objeto escolar, vazio designificado social.

A partir dos princípios, organizaram-se instrumentos para a análise das atividadese jogos para alfabetizar (ANEXO 1).

Os materiais selecionados são provenientes de livros didáticos, folhasmimeografadas fornecidas por professores que atuam em redes municipais, jogos industrializadose jogos confeccionados por professores.

O estudo de Rizatto, Tortella (2006) apresenta a análise de 30 atividades sendo 14de escrita e 16 de leitura. Os gráficos a seguir demonstram a análise realizada.

ATIVIDADES DE ESCRITA

ATIVIDADES DE LEITURA

0

5

10

15

20

25

30

35

TotalAtiv. 1

TotalAtiv. 2

TotalAtiv. 3

TotalAtiv. 4

TotalAtiv. 5

TotalAtiv. 6

TotalAtiv. 7

A SA PN AN

0

5

10

15

20

25

30

35

40

TotalAtiv. 8

TotalAtiv. 9

TotalAtiv. 10

TotalAtiv. 11

TotalAtiv. 12

TotalAtiv. 13

TotalAtiv. 14

0

5

10

15

20

25

30

35

40

TotalAtiv.15

TotalAtiv.16

TotalAtiv.17

TotalAtiv.18

TotalAtiv.19

TotalAt. 20

A SA PN AN

0

5

10

15

20

25

30

35

40

Total At.21

Total At.22

Total At.23

TotalAtiv. 24

TotalAtiv. 25

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O estudo de Bagne, Tortella (2006) apresenta a análise de 15 jogos, sendo 6 deescrita e 9 de leitura. Os gráficos a seguir demonstram a análise realizada.

Jogos de leitura

0

5

1 0

1 5

2 0

2 5

3 0

3 5

4 0

T o t a lA t i v. 2 6

T o t a lA t iv. 2 7

T o t a lA t iv. 2 8

T o t a lA t iv. 2 9

T o t a lA t iv. 3 0

0

2

4

6

8

10

12

14

DIG

OM

OR

SE

ENC

AIXE

AC

AIXI

NH

A

ENC

AIXE

FIG

EPA

LAVR

AS

M F

IG E

PALA

VRA

M L

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AIN

ICIA

L

ENC

AIXE

OLA

PIS

APR

END

OAL

F

BRIN

C C

LETR

AS

LOTO

DAS

LETR

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ASAPNAN

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Jogos de escrita

A observação dos gráficos construídos a partir da análise dos materiais didáticos –atividades e jogos – comprovaram parcialmente a hipótese de que os mesmos não atenderiam osprincípios estabelecidos por Weisz(2003).

Dados interessantes podem ser inferidos a partir da análise dos dois estudos.O estudo de Rizatto, Tortella (2006) mostra que, das quatorze atividades de escrita, somente trêsatendem satisfatoriamente aos itens tendo uma maior pontuação. Para as atividades de leitura, oquadro apresenta-se diferente: das dezesseis, onze atividades estão com o maior número depontuação, ainda que algumas não atendam todos os itens.

Um ponto interessante a destacar é a qualidade observada das atividades. Comomuitos docentes produzem cópias dos materiais no mimeógrafo, a qualidade de muitas propostasencontradas era quase ilegível

O estudo de Bagne, Tortella (2006) apresenta uma configuração diferente daapresentada por Rizatto, Tortella (2006). Dos nove jogos de leitura apenas um apresenta umapontuação maior, e dos seis de escrita, apenas dois. Outros fatos foram também destacadospela pesquisadora, dentre eles, o de que alguns dos jogos construídos pelos professoresapresentam propostas mais significativas em relação à construção do conhecimento e suasproblematizações e ainda, percebe-se que os jogos comercializados apresentam propostas detrabalho nas quais o aluno necessita apenas realizar associações muito simples, sem suscitaruma ação reflexiva da criança. Muitos dos jogos subestimam a capacidade da criança, colocando,por exemplo, o auxílio de cores para que ela possa concluir o jogo; no entanto este auxílio, naverdade impede a criança de pensar sobre o objeto de conhecimento a que o jogo se propõe atrabalhar: a escrita e a leitura.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Primeiramente, é necessário salientar que os quadros organizados para a análise,estão ainda em estudo e portanto devem ser entendidos como algo ainda não definido, como uminstrumento de análise de atividades e jogos pedagógicos. Durante o processo da pesquisa foiconstatada a necessidade de construir-se um quadro para a análise de atividades e jogos deescrita e outro para os de leitura, isso porque há alguns itens que se referem especificamente acada uma dessas modalidades. Fica, portanto, difícil de analisar com exatidão os resultados,visto que em alguns momentos, o item não se aplica e por isso não pode contar pontos.

Ainda que os instrumentos necessitem de alguns ajustes, aspectos importantesdo processo de ensino da escrita e da leitura necessitam serem refletidos. Pelos resultados daspesquisas apresentadas, observa-se uma inadequação dos materiais selecionados para odesenvolvimento de atividades de aprendizagem por parte dos alunos.

O acompanhamento do trabalho pedagógico dos alunos, que já atuam como docentee a experiência como assessora de coordenação pedagógica de uma rede municipal, nos fazemrefletir sobre alguns aspectos: 1. É necessário que o professor tenha claro para si quais são osprocessos de construção da leitura e escrita; 2. O docente precisa dominar os diferentesprocedimentos didáticos necessários para ensinar a ler e escrever; 3. É preciso saber selecionarbons materiais didáticos para alfabetizar; 4. Não basta selecionar bons materiais se eles nãoapresentam uma seqüência lógica para o desenvolvimento das atividades.; 5. As atividades oujogos utilizados devem conter bons desafios para os alunos refletirem sobre o objeto de estudo:leitura e escrita.

Além dos aspectos relacionados à seleção de materiais pelo docente, a seleção demateriais também deve ser fruto de um estudo realizado conjuntamente pelo corpo docente eequipe de especialistas da unidade escolar: supervisor, diretor, vice-diretor e coordenadorpedagógico. Por fim, espera-se que os estudos ora apresentados contribuam para reflexõessobre a seleção e a utilização de materiais didáticos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAGNE, Juliana; TORTELLA, Jussara C. Barbosa. Trabalho de Conclusão de Curso: Construçãoou desconstrução: análise de jogos pedagógicos utilizados no período da alfabetização – Cursode Pedagogia da Unidade Acadêmica da Área de Ciências Humanas e Sociais da UniversidadeSão Francisco. Campus Itatiba.

RIZZATO, Cibele S; TORTELLA, Jussara C. Barbosa. Trabalho de Conclusão de Curso: Análisede atividades no período de alfabetização a partir da perspectiva construtivista – Curso de Pedagogiada Unidade Acadêmica da Área de Ciências Humanas e Sociais da Universidade São Francisco.Campus Itatiba.

WEISZ, Telma. O diálogo entre o ensino e a aprendizagem. 2. Ed. São Paulo: Ática, 2003

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NOTAS DO AUTOR

[1] Dados retirados do manual de orientações: Estágio Supervisionado no Ensino Fundamental do curso de Pedagogia da UniversidadeSão Francisco, cujo manual que foi organizado por docentes do referido curso.[2] Dados retirados do documento do manual de orientações do Trabalho de Conclusão de Curso e do Plano de Ensino do curso dePedagogia da Universidade São Francisco, cujo manual foi organizado por docentes do referido curso.[3] Os trabalhos foram orientados pela profa. Dra. Jussara Cristina Barboza Tortella

NOTAS:

Quadro para análise de atividades e jogos PARA CRIANÇAS QUE AINDA NÃOSÃO ALFABÉTICAS

http://www.youtube.com/watch?v=LEy2ycDoBRc&mode=related&search=

Classificação Sigla Valor

Atende Satisfatoriamente

A S 3

Atende Parcialmente A P 2

Não atende N A 1

Não se aplica N 0

Quadro 1

Questões: A S A P N A N Os alunos precisam pôr em jogo tudo o que sabem e pensam sobre a leitura e escrita?

Para fazer a atividade, a criança necessita resolver problema referente ao sistema de escrita?

Para resolver a atividade, o aluno necessita acionar seus conhecimentos prévios sobre o sistema de escrita?

As crianças utilizam como referência as letras iniciais e/ou finais das palavras?

Ao realizar a atividade, a criança precisa pensar com que letra irá escrever?

Para fazer a atividade, a criança precisa pensar com quantas letras se escreve aquela palavra?

Para resolver a atividade, a criança precisa reconhecer as letras?

Ao realizar a atividade, as crianças necessitam ou são capazes de antecipar o que está escrito?

Para fazer a atividade, a criança necessita problematizar aquilo que já conhece sobre leitura e escrita de modo a encontrar soluções possíveis para escrever ou ler?

A atividade propõe boas situações-problema que levam o aluno a pensar sobre o sistema de escrita?

Ao fazer a atividade, os alunos necessitam interpretar o que escreveram?

A organização da tarefa garante a máxima circulação de informação possível?

Para resolver a atividade, o aluno tem a necessidade de argumentar com o grupo expondo suas idéias e pontos de vista sobre o conteúdo proposto?

O conteúdo trabalhado mantém suas características de objeto sócio-cultural real, sem se transformar em objeto escolar vazio de significado social?

É possível estabelecer relações entre o conteúdo desenvolvido com a vida cotidiana do aluno?

Os conteúdos desenvolvidos são significativos e funcionais para o aluno?

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Este trabalho analisa o Programa Ensino Médio em Rede (EMR) em uma cidadedo interior do estado de São Paulo, verificando se e como este contribui com a formação continuadade professores. Metodologicamente, optamos pelo estudo de caso, pois buscamos compreenderuma realidade particular (EMR em uma determinada cidade), tratada como uma unidade dentrodo sistema maior (EMR no estado de SP).

Conduzir um estudo de caso para construir compreensão aprofundadaé hoje corrente, no âmbito das ciências humanas e sociais, e écompatível com diferentes correntes teóricas, com diferentes técnicasde investigação e com diferentes paradígmas epistemológicos.(OLIVEIRA-FORMOSINHO, 2002, p. 91)

Os instrumentos de pesquisa utilizados foram: entrevistas com os AssistentesTécnicos Pedagógicos (ATP), com os professores coordenadores e com os professores;observação de videoconferências, teleconferências, trabalhos na WEB – PROMETEUS e análisedo Regimento do EMR.

FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES

Os Referenciais para Formação de Professores definem formação continuada:

É necessidade intrínseca para os profissionais da educação e fazparte de um processo permanente de desenvolvimento profissionalque deve ser assegurado a todos. A formação continuada deve propiciaratualizações, aprofundamento das temáticas educacionais e apoiar-se numa reflexão sobre a prática educativa, promovendo um processoconstante de auto-avaliação que oriente a construção contínua decompetências profissionais. Porém, um processo de reflexão exigepredisposição a um questionamento crítico da intervenção educativa euma análise da prática na perspectiva de seus pressupostos. Issosupõe que a formação continuada estenda-se às capacidades eatitudes e problematize os valores e as concepções de cada profes-sor e da equipe (BRASIL/MEC/SEF, 1999, p. 70).

Perrenoud (1997, p. 35) afirma que a mudança da prática passa tanto por umatransformação do habitus como pela disponibilidade de ação. Neste aspecto, a educação continuadafoi crescendo como uma modalidade importante de formação docente, especialmente nos paísesem desenvolvimento, devido às defasagens verificadas ao término da formação inicial dosprofessores.

FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES:PERCEPÇÕES DOCENTES SOBRE O ENSINO MÉDIO

EM REDE

ROSALEN , Marilena Aparecida de Souza ; ROZINELI , Thiago (UNIMEP)

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Tentando superar a relação linear entre teoria e prática escolar, originado daracionalidade técnica, foram propostos inúmeros significados ao papel do professor. Dentre eles,destacamos a construção do professor como prático-reflexivo, segundo Schön (1983 e 1987),que exerce uma ação reflexiva.

A ação reflexiva é um processo que implica mais do que a busca desoluções lógicas e racionais para os problemas; envolve intuição,emoção; não é um conjunto de técnicas que possa ser empacotado eensinado aos professores. A busca do professor reflexivo é a busca doequilíbrio entre a reflexão e a rotina, entre o ato e o pensamento(GERALDI, 1998, p. 248).

A capacidade de desenvolver trabalhos com a complexidade da realidade escolar,unindo teoria com a prática define o sucesso do educador. Schön nomeia esta capacidade deconhecimento prático e a enuncia como um processo de reflexão-na-ação ou como um diálogoreflexivo com a situação problemática concreta (GÓMEZ, 1992, p. 102).

A reflexão é fundamental para o conhecimento prático e pressupõe aimersão do educador no mundo da sua prática profissional, incluindovalores, interesses sociais, situação política-econômica e conteúdos.Acreditamos que para criar e construir uma nova realidade é necessárioir além das regras, teorias e procedimentos conhecidos. Assim, oeducador reflexivo constrói o seu próprio conhecimento, que transcendeo conhecimento emergente da racionalidade técnica (ROSALEN, 2001,p. 70).

Na mesma direção, Almeida (2001) explicita o processo de formação do professor:

Para dar conta do tamanho do desafio é preciso entender que o pro-fessor está sempre em processo de formação, quer seja quando estáestudando, preparando suas atividades, refletindo sobre os desafiosda prática, se relacionando com os alunos ou colegas. Entender dessamaneira a formação do professor requer pensá-lo em suas dimensõescoletiva, profissional e organizacional, contribuindo para a suaemancipação profissional e para a autonomia na produção de seussaberes. Significa também reconhecer que o processo de aprender aensinar se prolonga durante toda a carreira docente (ALMEIDA, 2001,p. 5).

Tais aspectos apontam para um processo contínuo de atualização profissional quevai além do ensino formal – uma formação na qual se destaca o valor da prática como elementode análise e reflexão do professor (GARCIA, 1995). O conceito de formação docente deve estarrelacionado ao de aprendizagem permanente, que considera os saberes e as competênciasdocentes como resultados não só da formação profissional e do exercício da docência, mastambém de aprendizagens realizadas ao longo da vida, dentro e fora da escola (MIZUKAMI et al,2003, p. 31).

Existe uma necessidade forte de interconexão entre o currículo da formação iniciale a formação permanente de professores. Neste aspecto não se pode pensar que a formação

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inicial oferece produtos prontos e acabados, mas que é a primeira fase de um longo e diferenciadoprocesso de desenvolvimento profissional (GARCÍA, 1995).

A formação de professores deve acontecer como uma formação contínua centradana atividade cotidiana da sala de aula, próxima dos problemas reais dos professores, tendo comoreferência central o trabalho de equipes docentes, assumindo, portanto, uma dimensão participativa,investigadora e flexível. Neste sentido, Nóvoa (1995) enfatiza que a formação se dá pelaexperimentação, pela inovação, pelo ensaio de novas formas de trabalho pedagógico e por umareflexão crítica sobre a sua utilização. A formação passa por processos de investigação, diretamentearticulados com as práticas educativas.

Os professores tendem a basear suas ações e argumentações naprópria experiência pessoal e profissional. Por isso, há de sereconhecer que a prática docente é uma instância permanente deaprendizagem, por tratar-se de uma dimensão que implica aexperimentação pessoal diária do professor (LIMA & REALI, 2002, p.223).

Assim, a inovação não se caracteriza como aplicação de conhecimento produzidofora da escola e ausente à experiência do professor: ela nasce de sua reflexão sobre a prática eda finalidade em questioná-la e compreendê-la a partir do contexto em que habitualmente ocorre.Destaca-se, ainda, que a inovação da formação e da prática pedagógica não pode consistir apenasem propósito e intenção. Precisa transformar-se em movimento construtivo contínuo, criador denovos focos de investigação, estimulador de novas descobertas e propiciador de novas ações.Então, formação e prática pedagógicas devem estimular a criatividade no contexto em que emergeme se concretizam, possibilitando a geração de propostas inovadoras e contribuindo para o processode mudança (PORTO, 2000).

Neste sentido, falar de formação de professores é falar de um investimento educativodos projetos da escola, pois mudança educacional depende dos professores e da sua formação.Depende, também, da transformação das práticas pedagógicas na sala de aula (NÓVOA, 1995).

Para a formação de professores, segundo McBride (1989) apud Nóvoa (1995), odesafio está em conceber a escola como um ambiente educativo, onde trabalhar e formar nãosejam atividades diferentes. A formação deve ser encarada como um processo permanente,integrado no dia-a-dia dos professores e da escola e não como uma função que intervém à margemdos projetos profissionais e organizacionais.

Desta forma, a formação continuada é uma importante condição de mudança daspráticas pedagógicas, entendida como processo crescente de autonomia do professor e da unidadeescolar e como processo de ação-reflexão dos agentes educativos, em particular, dos professores,com o propósito de concretizar o objetivo educativo da escola (PORTO, 2000).

Contudo, nas diferentes ações de formação continuada, os comportamentos visíveisdos professores diante de novos conhecimentos e informações também constituem outro pontorecorrente e merecedor de atenção por parte dos formadores, pois, diante do reconhecimento de

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que não dominam um determinado conteúdo ou aspecto de seu trabalho, as reações dosprofessores podem variar desde o desejo e o esforço de aprendizagem até o total bloqueio eresistência ao novo (MONTEIRO; GIOVANNI, 2000).

Ripper (1996) aponta que:

A importância que se dá à formação dos professores e, principalmente,à formação em serviço, não é ocasional, pois parece claro na literaturaque o papel do professor é de fundamental importância no trabalhopedagógico. O objetivo é valorizar o educador, oferecendo-lhe constanteaperfeiçoamento técnico-pedagógico que estimule a vontade deconstrução coletiva dos ideais pedagógicos e sociais a seremalcançados em seu fazer pedagógico. Espera-se possibilitar, dessemodo, ao educador não só a formação continuada e cotidiana, mastambém a visualização de novas fronteiras a serem alcançadas nodesenvolvimento do aluno e segurança para conduzir esse processo(p. 79).

Para que as ações de ensino presentes nas situações de formação continuada epara que as aprendizagens delas resultantes se efetivem, é preciso que haja, tanto por parte dosformadores responsáveis pelo processo, quanto por parte dos profissionais participantes, apercepção e a consciência da intencionalidade de que se revestem tais situações. É precisocompromisso com os esforços e movimentos exigidos pelas situações de ensinar e aprender.Como afirma Mello (1998, p. 19) a formação básica é condição para um sujeito “tornar-se” profes-sor, “ser professor” implica estar em contínua formação.

Com o surgimento das novas tecnologias, à disposição dos educadores, novaspossibilidades de quebra de paradigmas surgem ao mesmo tempo em que o isolamento culturalem que se encontra grande parte dos “profissionais” da Educação pode ser eliminada. Relacionandonovas tecnologias e formação de professores, Valente (1997) afirma que:

A formação do professor deve prover condições para que ele construaconhecimento sobre as técnicas computacionais, entenda por que ecomo integrar o computador na sua prática pedagógica e seja capazde superar barreiras de ordem administrativa e pedagógica. Essa práticapossibilita a transição de um sistema fragmentado de ensino parauma abordagem integradora de conteúdo e voltada para a resoluçãode problemas específicos do interesse de cada aluno. Finalmente,deve-se criar condições para que o professor saiba recontextualizar oaprendizado e a experiência vivida durante a sua formação para a suarealidade de sala de aula compatibilizando as necessidades de seusalunos e os objetivos pedagógicos que se dispõe a atingir (p. 14).

Uma das possibilidades advindas da utilização das novas tecnologias é a Educaçãoa Distância (EaD), que tem sido apoiada pelo governo federal como uma alternativa dedemocratização de acesso ao ensino superior, inclusive de formação do professor. O EnsinoMédio em Rede é um exemplo de programa de formação continuada que utiliza as novas tecnologias.

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ENSINO MÉDIO EM REDE

Norteado pelos princípios contidos na Lei de Diretrizes e Bases da EducaçãoNacional (LDBEN) - Lei nº 9394/96, o Ministério da Educação (MEC) implementou mudanças noEnsino Médio, tornando a educação profissional complementar aos cursos de educação geral,fixando as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (DCNEM) e elaborando osParâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM). Este movimento detransformação da escola média e de seu currículo, através da redefinição do seu papel social, échamado de Reforma do Ensino Médio.

As definições induzem e legitimam uma mudança nas finalidades do Ensino Médioe, conseqüentemente, na forma de selecionar os conteúdos, organizar as situações deaprendizagem, reorganizar os procedimentos de avaliação, gerir os espaços e tempos de formaçãoe, como condição, repensar o trabalho e a formação do professor e dos agentes educacionaisresponsáveis pela escola média.

Neste contexto, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP)considerou necessário discutir e alterar sua organização, repensando a cultura de trabalho e aformação (em especial, continuada) dos agentes educacionais e professores envolvidos, numprocesso que possibilitasse o trabalho coletivo e desenvolvesse as competências e osconhecimentos necessários aos novos desafios do Ensino Médio no estado de São Paulo e criouo Ensino Médio em Rede (EMR).

O EMR contou com o financiamento do Programa de Melhoria e Expansão do EnsinoMédio (PROMED) por meio de convênio firmado entre a Secretaria de Educação do Estado (SEE),o Ministério da Educação (MEC) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), teve a gestãoda Fundação da Vanzolini e visava unir a formação em serviço com a formação pessoal deprofessores, professores-coordenadores, supervisores e assistentes técnicos pedagógicos (ATP),do ensino médio da rede pública estadual. O Programa realizou-se tendo como objetivo maisamplo a melhoria da qualidade do ensino médio, promovendo a implementação da reforma cur-ricular, destacando o processo de leitura e de escrita, a gestão escolar democrática, a adequaçãodos espaços pedagógicos das escolas e a formação continuada de professores.

O EMR contou com o uso dos ambientes de aprendizagem e os recursos virtuaisda REDE DO SABER - teleconferências, videoconferências e ferramentas web, além de materiaisde apoio especialmente desenvolvidos para o programa e foi desenvolvido em duas fases, aprimeira entre 2004 e 2005, que teve o seu conteúdo voltado para a contextualização da propostade formação dos membros envolvidos, e a segunda fase, desenvolvida em 2006, com ênfasepara o desenvolvimento curricular no Ensino Médio das áreas de Linguagens, Códigos e suasTecnologias; Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias; e Ciências Humanas e suasTecnologias. Na organização dos grupos, os supervisores e os ATPs eram mediadores dasdiscussões.

Durante o programa 2004 e 2005 foram abordados quatro temas: a formação do

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professor/coordenador/mediador no Programa Ensino Médio em Rede; professores e alunos: umencontro possível e necessário; o currículo da escola média; o projeto político-pedagógico daescola. Em 2006 os conteúdos buscaram uma contextualização histórica e perspectivas atuaisdo Ensino Médio, focalizando as mudanças exigidas pela sociedade para ampliar as finalidadesdesse nível de ensino em direção à formação cidadã, à preparação para o mundo do trabalho e aoprosseguimento dos estudos.

Os temas foram associados a dois conjuntos de atividades: as VIVÊNCIASFORMATIVAS, nas quais o participante ampliava seus conhecimentos sobre o currículo e analisavasua própria prática pedagógica, e as VIVÊNCIAS EDUCADORAS, em que foram propostasatividades a serem desenvolvidas nos locais de atuação específicos – unidade escolar ou diretoriade ensino – por meio de projetos de trabalho para cada um dos segmentos, totalizando 666 páginasimpressas; um CD-ROM com uma coletânea de artigos e pesquisas, assim como legislações,diretrizes e parâmetros curriculares relativos ao Ensino Médio; e vídeos (total de 3h42 de duração)produzidos para a discussão de questões relevantes do Programa. O trabalho realizado contavacom atividades coletivas - durante os horários de trabalho nas HTPCs (Horário de TrabalhoPedagógico Coletivo), na própria sala de aula, nas diretorias de ensino e nos ambientes da Rededo Saber e com atividades individuais, fora dos horários de trabalho.

A videoconferência acontecia em uma sala (de uma escola pública estadual,localizada no centro da cidade) preparada com equipamentos com dois aparelhos de televisão,um aparelho de videocassete, uma câmera de vídeo, um aparelho de projeção multimídia, microfonee um computador com impressora. Na sala existia sistema de som, iluminação e ventilaçãoadequada. A capacidade da sala era para 35/40 professores. A videoconferência era transmitida,ao vivo, da sede em São Paulo e todas as escolas que sediavam o EMR assistiam a mesmavideoconferência em suas cidades. Geralmente, participavam da discussão, conosco, as cidadesde Guaratinguetá, Jundiaí, Santos, Guarulhos e Limeira. Em média, no EMR pesquisado,participavam 30 pessoas, sendo sempre a maioria do sexo feminino. Independente da temáticatrabalhada, a dinâmica do trabalho era sempre a mesma, videoconferência, café, debate e atividade.Às vezes, o tempo era insuficiente para as discussões e às vezes, o coordenador dos debatesdeixava transparecer que não havia se preparado suficientemente, revelando que a liderança doEMR não era um grupo coeso e que as atividades programadas chegavam de diferentes formasaos professores nas reuniões por áreas. Isto parecia desmotivar alguns, mas outros continuavamenvolvidos na reflexão da temática.

O EMR pesquisado envolveu um total de 776 pessoas, sendo: 01 supervisor deensino, 04 Assistentes Técnicos Pedagógicos, 55 Professores Coordenadores, 671 Professoresdo Ensino Médio e 45 escolas. Entrevistamos 40 (quarenta) pessoas, entre professores e agenteseducacionais, de diferentes áreas e escolhidas aleatoriamente: I - Linguagens, códigos e suasTecnologias – 10; II - Ciências da Natureza e Matemática e suas Tecnologias - 10; III - CiênciasHumanas e suas Tecnologias – 10; Coordenadores – 08 e Assistentes Técnicos Pedagógicos -02. Todos os entrevistados têm Licenciatura concluída e alguns ainda possuem curso de Pedagogia.

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Dos quarenta professores e agentes educacionais entrevistados 17 deles iniciaramo EMR no ano de 2004, 10 no ano de 2005 e 13 no ano de 2006. A média de tempo de serviço dosentrevistados é de 07 anos (máximo de 15 e mínimo de 05 anos).

Perguntados sobre a capacitação, 38 pessoas responderam que se capacitamcontinuamente. A leitura é a forma de capacitação mais adotada (citada por 43% dos entrevistados).Silva (1993) cita a auto-formação pelo estudo, através da leitura, como um tipo de educaçãocontinuada.

A segunda forma de capacitação mais citada foi o EMR (40% dos entrevistados),revelando que menos da metade dos participantes do EMR o reconhecem como um processo deformação continuada, conforme é explicitado no Regimento do Ensino Médio em Rede.

Outras formas citadas de formação continuada foram (alguns entrevistados citaramvárias): Diretoria Regional de Ensino (33%), Teia do Saber (25%), Pró-Gestão (15%), outro cursode graduação (13%), pós-graduação (10%), educação a distância (5%) e internet (3%). As trêsprimeiras formas citadas (e o EMR) demonstram que o Estado têm oferecido alternativas para aformação continuada de seus professores.

Dos quarenta entrevistados, 33 entendem que o EMR contribuiu para a formaçãocontinuada deles, dois acreditam que não e cinco responderam parcialmente. Segundo eles, acontribuição acontece a partir das reflexões da prática pedagógica, relacionando o tema com arotina (citado por 88% dos entrevistados), das trocas de experiências (citada por 65% dosentrevistados), por meio do estudo do material fornecido (20%) e na elaboração de projetosconjuntos, que articulam disciplinas e alteram a prática da sala de aula (20%).

Assim, a maioria dos entrevistados avalia que o EMR contribui para a sua formaçãocontinuada através das reflexões que são geradas no grupo, com trocas de experiências,relacionando a prática com a teoria e levando a uma nova prática, principalmente através dosprojetos coletivos. Isto vai ao encontro do entendimento de formação continuada apresentadoanteriormente, neste trabalho, segundo Geraldi (1998), Gómez (1992) e Rosalen (2001) - a formaçãonão se constrói somente por acúmulo de cursos, de conhecimentos ou de técnicas, mas sim,através de um trabalho de reflexão e crítica sobre as práticas e de (re)construção permanente daidentidade pessoal do professor (NÓVOA, 1995).

A maior parte dos entrevistados (38) disse que utiliza (com diferentes periodicidades)os conteúdos aprendidos do programa EMR e alguns (5) estão desenvolvendo projetos comoutros professores na escola de origem, alterando a prática pedagógica com os alunos. Emborao Regimento do EMR apresente previsão de que as discussões continuem nos HTPCs das escolase desemboquem nas salas de aulas, verificamos que isto acontece aquém do esperado, mas queé um embrião que pode levar à melhoria da qualidade do Ensino Médio.

Concluímos que o Estado de São Paulo tem oferecido alternativas para a formaçãocontinuada de seus professores e o EMR é um exemplo. A partir da pesquisa realizada, verificamosque o EMR propiciou a formação continuada dos professores, principalmente através das reflexõesdas temáticas relacionadas com as práticas pedagógicas, que possibilitaram a implantação de

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projetos coletivos, com articulação de diferentes disciplinas. Acreditamos que o que falta é umapolítica de formação continuada mais consistente, que alinhave as alternativas oferecidas, tornando-as mais efetivas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, Maria Isabel de. “Docentes para uma educação de qualidade: uma questão dedesenvolvimento profissional.” I Conferência Municipal de Educação. Piracicaba-Secretaria Mu-nicipal de Educação. Texto, 2001. (mimeo).

BRASIL. MEC. Secretaria de Educação Fundamental. Referenciais para a formação de professores.Brasília, DF: MEC/SEF, 1999.

GARCÍA, Carlos Marcelo. A formação de professores: centro de atenção e pedra-detoque. In:NÓVOA, A. (Coord.) Os professores e a sua formação. 2. ed. Lisboa: Publicações D. Quixote,1995. p. 51-76.

GERALDI, C. M. G., MESSIAS, M. G. M. e GUERRA, M. D. S. Cartografias do trabalho docente:professor(a)-pesquisador(a). Campinas-SP: Mercado das Letras, 1998.

GÓMEZ, Angel Pérez. O pensamento prático do professor: a formação do professor comoprofissional reflexivo. NÓVOA, António (org.). Os professores e a sua formação. Lisboa: DomQuixote, 1992.

LIMA, S. M. & REALI, A. M. M. R. O papel da formação básica na aprendizagem profissional dadocência (aprende-se a ensinar no curso de formação básica?). MIZUKAMI, M. G. N. & REALI, A.M. M. R. (org.) Formação de professores, práticas pedagógicas e escola. São Carlos-SP:EdUFSCar, 2002.

MELLO, R.R. Os saberes docentes e a formação cotidiana nas séries iniciais do Ensino Funda-mental: um estudo de casos múltiplos de tipo etnográfico. São Carlos, PPGR, UFSCar, tese dedoutorado, 1998.

MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti et al. Escola e aprendizagem da docência: processos deinvestigação e formação. São Carlos: EDUFSCar, 2003.

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CONTEXTUALIZANDO O ESTUDO

O estudo realizado, o qual foi norteado pela pergunta Como trabalhar com projetosem Geometria Analítica, usando software de geometria dinâmica, visando a favorecer a formaçãode futuros professores de Matemática?, pautou-se na implementação de uma intervençãopedagógica constituída de nove encontros de aproximadamente três horas cada um, em quealunos em Regime Especial de Recuperação (RER) na disciplina de Geometria Analítica seengajaram no desenvolvimento de projetos enfocando conteúdos dessa disciplina, usando soft-ware de geometria dinâmica (o software Geometricks3), o qual permite a construção de figurasgeométricas que podem ser movimentadas mantendo-se as propriedades das mesmas.

A referida estratégia pedagógica, que associou o trabalho com projetos e o uso detecnologias informáticas levando em conta os pressupostos teóricos do Construcionismo, seconstituiu numa forma de entrelaçar o uso das mídias informáticas às experiências educacionaisde futuros professores de Matemática, por meio de atividades que concederam aos mesmosautonomia para pesquisar, construir e reconstruir representações e elaborar projetos envolvendoconceitos da disciplina anteriormente mencionada.

A respectiva intervenção foi planejada levando em conta a necessidade deinvestigarmos a possibilidade de prover aos futuros professores o estudo do conhecimentomatemático e o desenvolvimento de saberes de uso pedagógico das tecnologias informáticas,entrelaçando o uso destes recursos às experiências formativas dos licenciandos.

O trabalho foi concretizado com seis alunos do primeiro ano da licenciatura emMatemática da Unesp de Rio Claro, SP, os quais foram selecionados de acordo com o interessedemonstrado pelo trabalho que seria desenvolvido e a disponibilidade de tempo para participar dainvestigação. Posterior a seleção, os licenciandos divididos em duplas, engajaram-se nodesenvolvimento de projetos em Geometria Analítica. Tais projetos constituíram-se na elaboraçãode atividades didáticas focando conteúdos diversos desta disciplina, privilegiando o uso do soft-ware Geometricks. A criação do ambiente de aprendizagem que permeou o desenvolvimento dosprojetos foi norteada pelos princípios do Construcionismo abordados por Papert (1994; 2003),Valente (1999; 2003a, 2003b) e Maltempi (2004; 2005).

Os projetos elaborados foram apresentados aos colegas envolvidos nas atividadesde coleta de dados da pesquisa em uma sessão destinada à socialização dos trabalhos das

FORMAÇÃO INICIAL DOCENTE EM MATEMÁTICA:DESAFIOS E POSSIBILIDADES DO TRABALHO COMPROJETOS E COM TECNOLOGIAS INFORMÁTICAS

RICHIT1*, Adriana ; MALTEMPI2*, Marcus Vinicius (Unesp/Rio Claro)

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duplas. Esse encontro contou com a presença de um colega da turma que não estava em RER edo professor de Geometria Analítica da respectiva instituição no corrente ano, o qual colaboroutecendo comentários sobre cada uma das atividades que estavam sendo expostas.

O DESENVOLVIMENTO DOS PROJETOS

A estratégia pedagógica adotada no trabalho com os projetos foi planejada emconsonância com o objetivo do estudo. Um dos aspectos que caracterizaram a intervençãorealizada com os sujeitos do estudo, o qual foi apontado pelos licenciandos como condição favorávelà sua aprendizagem e desenvolvimento, foi o caráter construcionista da mesma. A estratégiapedagógica praticada no trabalho com os projetos permitiu-lhes maior participação em seu processode formação, conforme preconizado pelo Construcionismo. Nesta, as duplas de estudantespuderam escolher os temas que seriam desenvolvidos nas atividades, realizar as construçõesusando procedimentos distintos, bem como estruturar os projetos à sua maneira.

O Construcionismo é uma teoria educacional que se baseia em atividades quepromovem a construção do conhecimento a partir da interação do indivíduo com o computador(MALTEMPI, 2004). Segundo esta visão, à medida que o sujeito interage com este recurso ele éinstigado a investigar, pesquisar e refletir sobre o objeto de sua criação. Papert (1994) acrescentaque neste processo o computador pode favorecer a aprendizagem por fomentar a iniciativa pessoaldo sujeito de buscar novas informações que o levem a uma re-organização cognitiva, construindo,destarte, o próprio conhecimento.

A transcrição4 a seguir relata a avaliação de um participante do estudo acerca daestratégia adotada na elaboração dos projetos, enfatizando a autonomia que lhes foi concedida, aqual é defendida na abordagem construcionista.

PE: Com relação à estratégia que a gente adotou na elaboração dosprojetos, você achou esta forma de trabalhar positiva?Licenciando P: Eu gostei, porque a gente se sentiu à vontade parafazer o que queria e abordar o assunto que a gente achava maisinteressante, sabe. Porque tinha o livro do Paulo Boulos inteiro e agente pôde escolher o assunto que a gente quis de verdade, entendeu?Isso é bom porque a gente se motiva mais a fazer o que a gente estáfazendo. Porque aí a gente tem mais vontade de fazer, entendeu? Sevocê fala pra gente fazer um trabalho sobre cônicas e a gente nãogosta de cônicas, por exemplo, eu não vou ter vontade de fazer,entendeu. Só que no caso, os que a gente escolheu foram os que agente queria fazer. Que a gente tinha vontade de desenvolver.

As argumentações a favor desta estratégia ressaltam algumas das dimensões dotrabalho com projetos propostas por Dewey (1959), dentre elas o interesse e o valor intrínseco, asquais são enfatizadas nas respostas obtidas em entrevistas realizadas com os sujeitos da pesquisa.Constatamos nas conversas mantidas com esses alunos que a segunda dimensão sugerida porDewey esteve fortemente presente nas atividades que constituíram os projetos das duplas, pois

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cada tema focado ou era o conteúdo preferido da dupla ou era o conteúdo que a dupla teve maisdificuldade na disciplina.

Ao questionarmos os futuros professores sobre a importância do interesse noprocesso de aprendizagem em Geometria Analítica, notamos que as respostas fornecidas tenderampara um ponto comum, conforme podemos observar nos depoimentos apresentados abaixo.

PE: Você acha que a investigação de temas relacionados à GeometriaAnalítica pode ser mais favorável à aprendizagem se esta partir dointeresse do aluno?Licenciando V: Sim, acho, porque você demonstrando mais interesserelacionado a uma investigação dos temas de Geometria Analítica,que partiu de você ter escolhido, abrange mais as suas expectativas eseu empenho quanto à matéria melhora.Licenciando E: Se for de meu interesse, estarei fazendo uma coisaque gosto e tudo que você faz quando gosta tem melhores resultados.

De maneira geral, avaliamos que a aprendizagem por projetos na formação inicialdocente, tendo como princípio a estratégia pedagógica descrita neste texto, pode contribuir para oamadurecimento pessoal dos licenciandos, aspecto este que se reflete na sua postura conscientefrente às situações e desafios que podem se apresentar nesse processo.

PE: Pensando na estratégia que adotamos para elaborar os projetos,na qual você teve liberdade para escolher o assunto que quis ou quevocê mais gostava. Isso não é ruim? Como fica o restante do conteúdo?Licenciando P: Ah! Vendo por esse lado é ruim, porque aí, muitasvezes, a gente deixa de trabalhar algum conteúdo, de fazer outrascoisas, mas mesmo assim eu acho legal porque a gente se desenvolve.Tem um monte de desafio no meio disso, porque não está tudo prontinhopara a gente. Se estiver tudo pronto, a gente não vai precisar correratrás das coisas e tal. [...] Porque na hora de fazer a atividade práticamesmo, é que a gente vai aprender.Igualmente, acreditamos que o trabalho pode ter contribuído paramelhorar a auto-estima dos alunos engajados na investigação, devidoà possibilidade de estarem produzindo algo que pode ser exploradopor outras pessoas, aspecto este que colaborou para que se sentissemcapazes e úteis, além de favorecer a inclusão social dos mesmos. Odepoimento que segue relata a avaliação de um participante sobreesta questão.PE: Como aluna, você acha que o trabalho que foi desenvolvido aquipode ter te ajudado em algo?Licenciando P: Pelo fato da gente ter ficado em RER, deu um baqueem todo mundo, sabe. Aí a gente foi convidado para fazer esse trabalhoaqui, então a gente viu que também era capaz de fazer as coisas,entendeu. A gente aprendeu algumas coisas e agora a gente podeaprofundar, tanto a Geometria Analítica quanto sobre o Geometricks.

Outro aspecto relevante observado durante a elaboração das atividades foi a atitudede colaboração entre os licenciandos. Não raro, integrantes de duplas distintas discutiam entre sios conceitos e propriedades abordadas nos projetos e sobre a forma como as atividades estavamsendo apresentadas e propunham sugestões que pudessem melhorá-las.

As características deste ambiente de caráter construcionista, segundo as

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considerações de Maltempi (2004,2005) e Valente (1999; 2003b), podem contribuirconsideravelmente com a formação inicial docente, pois permitem que os futuros professorestroquem experiências e ajudem-se mutuamente, como notado nas conversas e discussões entreeles.

Sob este enfoque, frisamos que a utilização das mídias informáticas nos cursos delicenciatura não pode se restringir a uma disciplina específica e isolada das demais, mas sim,deve estar incorporada às disciplinas que compõem estes currículos e às práticas pedagógicasdos professores formadores, como uma maneira de influenciar a ação docente dos futurosprofessores.

EXPERIENCIANDO ASPECTOS IMPORTANTES DO TRABALHO DOCENTE

Na intervenção descrita e analisada na referida pesquisa, os licenciandos puderamexpressar suas idéias por meio da realização de tarefas, nas quais eles tiveram autonomia parapesquisar sobre um determinado tema, refletir sobre suas concepções acerca deste tema econfrontá-las com as concepções de seus companheiros e com os conceitos apresentados nomaterial de apoio (livros didáticos, apostilas e endereços de páginas Web), princípios estes quecaracterizam o processo de aprendizagem. Além disso, contavam com a presença dapesquisadora, que intencionalmente mediava todo esse processo auxiliando e questionando osalunos.

Focando a questão da formação docente e avaliando a estratégia de trabalhoadotada no desenvolvimento dos projetos, alguns dos sujeitos engajados no presente estudoressaltaram a relevância de permitirmos que futuros professores tenham experiências de seimaginar e agir como professores logo no início da licenciatura, segundo relato abaixo.

Licenciando F: Eu acredito que se, talvez, todos os cursos tivessemuma atividade assim, eliminaria muitas possibilidades de frustração,porque às vezes a gente está estudando e [...]. Eu estou estudandoaqui e não sei como vai ser depois, como é ser professor futuramente,entendeu. Eu posso chegar lá e não gostar, porque por enquanto euestou aprendendo a Matemática ainda. Eu não me coloquei ainda naposição de professor, de ensinar alguma coisa, de preparar algumaatividade. Mas se eu tenho essa experiência logo no começo dalicenciatura, pelo menos eu já sei mais ou menos como vai ser nofuturo. Com isso, eu posso ir pensando sobre como ensinar aqueleconteúdo de Matemática que estou aprendendo na aula.

O depoimento deste estudante pontua aspectos concernentes ao processo deformação inicial de professores que são relevantes ao exercício da profissão docente, como apromoção de reflexões e experiências sobre ser professor e discussões sobre o tratamentopedagógico necessário ao conteúdo matemático, por exemplo, momentos estes que precisamser privilegiados nos cursos de licenciatura, mas que de certa forma têm sido negligenciados emmuitas instituições.

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Além disso, o depoimento supra reforça a relevância dessas vivências como ummeio de auxiliar o estudante recém chegado no curso de licenciatura, a refletir sobre o trabalhodocente, diminuindo, assim, frustrações posteriores.

O ENSINO DE MATEMÁTICA COM TECNOLOGIA INFORMÁTICA

No decurso das atividades que permearam o desenvolvimento dos projetos foramsurgindo, nas conversas entre as duplas e a pesquisadora e nas discussões do grupo, asconcepções destes alunos com relação ao ensino de Matemática. Pelo que se pôde constatar,estas concepções têm origem nas experiências educacionais que eles vivenciaram até o momento.Embora esperássemos que estes fossem críticos com algumas destas experiências e avaliassemque as mesmas poderiam ser diferentes com o uso de tecnologias, muitos deles revelaram umapego muito grande a abordagem expositiva-mecânica de sala de aula e aos processos dedemonstração algébrica realizados na lousa. A transcrição da conversa apresentada após esteparágrafo, a qual foi promovida entre a professora-pesquisadora e um participante, revela queeste aluno mostrou-se muito cauteloso com relação ao uso de mídias informáticas em sua poste-rior prática, deixando claro que qualquer docente da disciplina de Matemática, em primeiro lugar,precisa adquirir experiência e segurança com o conteúdo específico e que somente depois deveprocurar aprimorar a prática pedagógica, incorporando à mesma as tecnologias informáticas.

PE: Você como professor de Matemática, você tentaria utilizar oGeometricks ou um outro software para dar aula? Como você imaginaa sua prática de sala de aula?Licenciando V: Assim, de começo, eu acho que eu não saberia comousar, porque sabe, eu acho que eu me prendo muito a dar, a querermostrar a teoria mesmo, eu penso em saber, em desenvolver mais ateoria. Mas eu acho que com o tempo, assim de professor, eu achoque eu aprimoraria tudo.PE: Aí você utilizaria? Então você acha mais importante primeiro oprofessor [interrupção]Licenciando V: Não. Não primeiro. A experiência como professor, euacho que eu teria que adquirir primeiro para depois desenvolverexperiência utilizando software.PE: Você acha mais difícil trabalhar Matemática usando software?Licenciando V: É. Ou eu acho que teria dificuldade de usar um soft-ware na minha aula, por falta de experiência, assim, de ser professor.Então, no primeiro impacto, logo que eu for dar aula, eu não saberiacomo usar. Mas eu acho que não deve ser tão difícil para quem temexperiência de sala de aula e experiência com o conteúdo, porque seesse professor pegar o software, eu acho que ele consegue, é maisfácil até de demonstrar muitas coisas em Matemática.

De acordo as concepções reveladas pelos integrantes do coletivo formado no estudo,verificamos que estes alunos consideram a apresentação de um determinado conceito matemáticoe suas propriedades, seguida de exemplos e exercícios em sala de aula, uma prática obrigatóriaao professor de Matemática. Esta crença pode ser explicada com base nos resultados de estudos,

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como de Cury (2001), que mostram que as crenças, concepções e prática docente de professoresem geral é fortemente influenciada pelas experiências vivenciadas por eles na formação inicialdocente e, também, pelas suas vivências sociais, pessoais e escolares.

Salientamos, pelo depoimento anterior, que os referidos alunos sentem-se um poucodesconfortáveis com a possibilidade de assumirem a função docente. Este receio é perfeitamentecompreensível, e certamente é uma reação comum à maioria dos alunos de licenciatura quefazem parte do modelo de formação conhecido como 3+1, discutido por Moreira e David (2005),no qual os licenciandos são vistos unicamente como alunos durante os três primeiros anos dalicenciatura e somente no último ano eles começam a imaginarem-se como professores e agiremcomo tal.

Avaliando os aspectos ressaltados no depoimento apresentado e comentado nessaseção, defendemos que a formação inicial docente em Matemática precisa levar em conta avalorização do conhecimento específico, mas que este não seja o fim único desse processo deformação. É preciso promover a construção do conhecimento matemático de formacontextualizada, ou seja entrelaçada às experiências formativas do licenciando, usando recursosdiversos, como as tecnologias informáticas.

A AQUISIÇÃO DE SABERES DE USO PEDAGÓGICO DAS TECNOLOGIASINFORMÁTICAS DO PONTO DE VISTA DA INTERVENÇÃO REALIZADA

Tomando como ponto de partida a idéia aqui defendida que as mídias informáticasdevem fazer parte das experiências educacionais do licenciando desde o início da graduação, demodo que este desenvolva habilidades de uso pedagógico das mesmas, procuramos saber quaiseram as concepções dos sujeitos deste estudo acerca destes recursos e de que forma estesconcebem o uso das mídias informáticas no ensino e na aprendizagem de Matemática.

PE: A autonomia dada a vocês para elaborar atividades usandotecnologia informática ou um outro recurso contribui para a formaçãotecnológica de um professor?Licenciando F: Contribui, mas como foi o primeiro ano assim, vamosdizer, pra uma formação tecnológica, acho que foi interessante, foiimportante, mas não pode parar por aí, a gente tem que explorar outrascoisas, fazer outras atividades em outras disciplinas. [...], a gentetem que aprender ainda mais, para que a gente possa formalizarrealmente nossas idéias e aquilo que foi aprendido até agora. A genteaprendeu bastante sobre o software e sobre Geometria Analítica, e euacho que foi por causa dessa liberdade didática que a gente teve.

Partindo deste depoimento e levando em conta os trabalhos de Ponte et al. (2003),Mercado (1999) e Papert (2003), defendemos que é essencial colocar o futuro professor, durantea sua formação, em contato com vários recursos tecnológicos preparando-o para enfrentar osdesafios que venham a se apresentar no exercício da sua profissão e, principalmente, estimulando-o a desenvolver habilidades de uso pedagógico destes recursos, contribuindo, destarte, com a

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formação dos alunos desse futuro professor.Segundo depoimentos dos sujeitos da pesquisa e das conversas entre eles e a

professora-pesquisadora, constatamos que esta mudança metodológica na prática pedagógicanão é encarada com naturalidade pelos mesmos, como podemos observar na transcrição a seguir.

Licenciando E: Como professor, eu quero usar estes recursos, pelomenos em algumas aulas, porque, como o B falou, não só o software.Primeiro eu daria a teoria e depois aplicaria para o aluno poder vermelhor o que ele está estudando. Para ele ter uma idéia melhor.Visualizar, por exemplo, uma cônica. Tem aluno que não conseguevisualizar uma cônica do jeito que outras pessoas têm facilidade. Então,no computador ele ia visualizar melhor e isso pode ajudá-lo a aprenderaquele conceito ou definição.

Desta forma, podemos inferir que para estes alunos o papel das mídias informáticasna prática pedagógica em Matemática abrange os aspectos da visualização e da demonstraçãodefendidos por Lourenço (2002) e Borba e Villarreal (2005). Analogamente, ponderamos que estesrecursos desempenharam um papel motivador na intervenção implementada, uma vez quepossuem atualmente valor social em muitos grupos culturais, aspecto este que diz respeito àsdimensões do trabalho com projetos discutidas por Maltempi (2004).

No que tange ao papel da demonstração no ensino de Matemática, sabemos queesta é essencial na construção dos conhecimentos desta área, de acordo com Lourenço (2002)e Rolkouski (2002). Nesse sentido, como o Geometricks favoreceu a visualização de conceitos epropriedades que foram enfocados nas atividades produzidas pelos alunos, e esta por sua vezpropiciou a verificação destes conceitos e estimulou a investigação matemática, sustentamosque a intervenção realizada contribuiu na apropriação e no aprofundamento de saberesmatemáticos.

Com relação à formação pedagógica, esclarecemos que a intervenção desenvolvidafavoreceu a aquisição de saberes de uso pedagógico das tecnologias informáticas, considerandoos depoimentos dos sujeitos do estudo e a análise das atividades desenvolvidas pelos mesmos.Ademais, foram promovidas reflexões acerca das distintas formas de uso destas e da necessidadedo professor mediar o conteúdo apresentado nos livros didáticos às necessidades dos seus alunos.

Tomando por base os resultados do estudo desenvolvido, ressaltamos que aplicandoesta proposta de trabalho ao longo da licenciatura, focando outras disciplinas, é possível contribuircom o processo de formação inicial docente, pois os futuros professores podem aprofundar osconhecimentos dos recursos que estão sendo utilizados, bem como dos conteúdos matemáticos,em conseqüência das possibilidades de implementar novas e distintas investigações matemáticaspor meio destes recursos.

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ALGUMAS REFLEXÕES FRENTE AOS RESULTADOS OBTIDOS

Com base no trabalho desenvolvido, o qual foi norteado pelas idéias construcionistas,e nos dados coletados, analisamos que uma das características presentes ao longo da interaçãocom os alunos foi o notável envolvimento destes com a atividade proposta, fato este que lhespermitiu ampliar os conhecimentos em Geometria Analítica, disciplina que estavam em recuperação(RER). Sendo assim, avaliamos que o interesse imediato foi o elemento mobilizador no envolvimentodesses alunos com os projetos. Em conseqüência, eles foram instigados a aprofundar os conceitosjá aprendidos e pesquisar outros que pudessem ser associados aos anteriores, visando a ampliaros conhecimentos nesta disciplina.

Neste sentido, os alunos freqüentemente exploravam outros recursos que estavamdisponíveis no ambiente de aprendizagem promovido nesta investigação, além do Geometricks edo material de apoio. Eles recorriam às ferramentas de busca na Internet visando a ampliar ourevisar os conceitos, definições e propriedades apresentados no material de apoio. A preferênciapor este recurso foi justificada pelos mesmos, em função de que estas os conduziam diretamenteao assunto que desejavam, enquanto que a busca em sites ou livros demandava mais tempo,pois precisam “passear” pelo conteúdo dos mesmos até localizar o tópico procurado.

Da mesma forma, salientamos que estes sujeitos tiveram liberdade para manipu-lar os instrumentos de coleta de dados, como câmera fotográfica e gravadores de áudio. Comrelação às gravações em áudio, algumas duplas registravam as discussões sobre algumas dasatividades produzidas e em seguida ouviam a gravação, avaliando se haviam sido claros nascolocações e argumentações. Outras vezes, simulavam a apresentação de uma dada atividade,visando a treinar para a exposição coletiva que seria realizada após a conclusão dos projetos.Nesta situação, quando consideravam que as explicações não haviam sido objetivas ou adequadas,repetiam a simulação, gravando-a novamente.

Partindo das situações descritas nos parágrafos anteriores, avaliamos queestratégia pedagógica assumida na intervenção permitiu que os estudantes pudessem explorarassuntos diversos, usando o software Geometricks, e com isso, os conceitos e propriedadesusados nas construções passaram a ter sentido para os mesmos. Isto é, à medida que os sujeitostiveram autonomia para tratar um determinado conceito a seu modo, puderam estabelecer relaçõesdeste com outros, assim como, o recurso utilizado assumiu distintos papéis, como auxiliar navisualização, potencializador nas investigações matemáticas ou instrumento para realizarconstruções geométricas. Tal atitude pode ter sido privilegiada devido à ação da professora-pesquisadora em promover momentos de integração com os sujeitos deste estudo, bem comopelas conversas informais que manteve com os mesmos, tornando possível estreitar os laços deamizade e colaboração entre todos, de acordo com a avaliação de um integrante do grupo.

Licenciando F: é essencial você não criar uma barreira entre você e oaluno, porque veja, muitas coisas a gente deixa de aprender, de iratrás por causa de vergonha ou alguma coisa desse tipo que te im-

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pede de perguntar. Esse trabalho foi excelente por causa disso, porquequando a gente entrou, logo no começo estabeleceu uma amizade. Agente começou a se conhecer melhor, [...] e isso contribuiu para queclareassem muitas coisas pra mim que até então [pausa]. Realmente,sabe, muitas coisas que pra mim eram abstratas, com essa amizadeque criamos eu tive coragem de perguntar. Então essa atividadecolaborou. Acredito que essa é uma forma da gente mudar algumacoisa, talvez aí, num futuro próximo, quando formos professores, jácultivar essas coisas na sala de aula.

O aspecto ressaltado no depoimento desse aluno evidencia a importância doacolhimento no processo pedagógico em Matemática, visto que este aspecto favorece o diálogoentre aluno e professor, contribui com a troca de experiências entre ambos e permite oesclarecimento de dúvidas, favorecendo desse modo, o processo de apropriação do conhecimentonessa área do conhecimento.

Igualmente, a experiência favoreceu a auto-estima dos licenciandos, pois, apesarde retidos na disciplina de Geometria Analítica, estavam elaborando material didático para a mesma.Ou seja, o fato das atividades produzidas constituírem-se em material pedagógico destinado aalunos e professores, contribuiu para que os estudantes se sentissem valorizados no contextosocial em que estavam inseridos.

Sumarizando, depreendemos que a atividade pedagógica fundada nodesenvolvimento de projetos que privilegiam o uso de tecnologias informáticas, em consonânciacom os princípios do Construcionismo, constitui-se em significativa experiência educacional nalicenciatura, de modo que podem corroborar no processo de formação inicial docente emMatemática, pois favorece o aprofundamento do conteúdo matemático, dimensão esta queconsideramos relevante na formação inicial docente. Outrossim, esse tipo de experiência permiteo desenvolvimento de competências de uso pedagógico das mídias informáticas, assim comopermite ampliar o conhecimento do recurso que está sendo utilizado.

Porém, para potencializar tais contribuições é preciso estender esta prática aolongo da licenciatura, abrangendo várias disciplinas, diversificando o tipo de trabalho a serdesenvolvido pelos alunos, variando os recursos tecnológicos investigados e, principalmente,promovendo leituras e reflexões sobre as distintas formas de uso pedagógico destes recursos,conforme enfatizado em Richit e Maltempi (2005).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apoiando-nos nas considerações expostas ao longo do texto de que é possívelauxiliar o processo de ensino e aprendizagem promovendo um ambiente propício à participação einvestigação, de acordo com os pressupostos do Construcionismo, e adotando estratégias detrabalho com tecnologias informáticas, que conferem ao aluno autonomia para criar suas própriasatividades ou projetos, acreditamos que é possível contribuir para a promoção de mudanças nosprocessos de formação inicial docente em Matemática.

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Ainda, as conclusões do estudo aqui apresentado ressaltam que as atividades decaráter construcionista podem colaborar com o aprendizado do conteúdo matemático, favorecendoo desenvolvimento integral de futuros professores e preparando-os para utilizar as mídiasinformáticas no contexto das suas atividades sociais e profissionais, bem como aplicar oconhecimento adquirido em outras situações, que não as de sala de aula. Porém, sabe-se queestas mudanças são viabilizadas se o uso da tecnologia estiver entrelaçado às experiênciaseducacionais do licenciando ao longo de sua trajetória escolar e acadêmica, bem como ao longode sua carreira profissional.

É nesse sentido que avaliamos que o estudo aqui apresentado apontou caminhospara os cursos de formação inicial docente em Matemática, os quais precisam favorecer aformação específica, pedagógica e tecnológica. Tais dimensões podem ser privilegiadasentrelaçando as experiências formativas dos licenciandos ao uso de recursos tecnológicosadequados a esta área do conhecimento.

Por fim, é necessário ressaltar que os agentes escolares precisam se engajarnesse processo de transição, pois é por meio da mobilização destes que mudanças se tornampossíveis, e da sua ação que a finalidade da educação tem a possibilidade de se concretizar.Porém, além de investir em processos de formação e exigir o engajamento do corpo docente ediretivo escolar é crucial que os gestores do ensino invistam em políticas públicas favoráveis amelhoria do ensino em geral.

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NOTAS

1 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática. Bolsista CNPq. E-mail: [email protected] Professor do Departamento de Estatística, Matemática Aplicada e Computação e do Programa de Pós-Graduação em EducaçãoMatemática. E-mail: [email protected]* Membros do GPIMEM – Grupo de Pesquisa em Informática, outras Mídias e Educação Matemática.3 Software de geometria dinâmica, desenvolvido por Viggo Sadolin da The Royal of Educational Studies. Versão Demo disponível emhttp://www.igce.unesp.br/pgem/gpimem.html4 Visando a preservar a identidade dos sujeitos da pesquisa não serão usados os nomes dos mesmos e, para facilitar a distinçãodas falas ao longo do texto, serão usadas apenas as iniciais dos nomes. PE: pesquisadora.

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O presente trabalho investigou as possíveis contribuições de um programa deformação de professores em serviço, o GESTAR, quanto ao desenvolvimento de conteúdos nessesprofessores. O problema que se põe é: Em que medida um programa de formação de professoresem exercício nos anos iniciais do Ensino Fundamental, GESTAR, contribui: 1- para odesenvolvimento de conceitos, capacidades e atitudes mais sólidos e positivos em relação àgeometria; 2- para uma prática letiva adequada aos princípios e orientações do Programa? Entreas diferentes formas de conceituar os conteúdos elegemos aquela que considera o aprendizcapaz de alcançar os objetivos que não se limitam ao desenvolvimento apenas das capacidadescognitivas mas incluem as demais capacidades que são mobilizadas no ato de aprender. Assim,optamos pela tríade de conteúdos denominadas por Coll (1986, apud Zabala 1998, p. 30) deconceituais, procedimentais e atidudinais. As opções metodológicas enquadram-se em estudode caso múltiplo essencialmente qualitativo mas complementado quantitativamente. Olevantamento envolveu o uso de diferentes instrumentos em três momentos distintos: pré-teste;desenvolvimento da proposta; e pós-teste. Os participantes da pesquisa foram professores deduas escolas de Rondonópolis-MT. Os resultados apontam que após a capacitação as notasobtidas foram significativamente superiores se comparadas às anteriores à capacitação, nasduas escolas. Dessa forma é possível afirmar que a formação contribuiu para o desenvolvimentode conteúdos nos aspectos elencados e o professor mostrou-se mais seguro em sua práticapedagógica.

A EDUCAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES NA LITERATURA

Procede-se neste ponto a um levantamento de trabalhos e de autores que têm sedestacado nos estudos da temática da presente investigação, contribuindo para a compreensãoda mesma.

Lujan (1997), utilizando o modelo de desenvolvimento do pensamento geométricode van Hiele e apoiado na Psicologia Genética de Piaget, desenvolveu um trabalho de investigaçãode atividades geométricas em alunos da 1ª série do 1º grau, utilizando materiais confeccionadosespecialmente para essa pesquisa. Participaram da mesma 44 estudantes da rede oficial deensino do estado de São Paulo, e constituíram-se um grupo experimental e outro de controle. Osinstrumentos utilizados foram um pré-teste, intervenção e pós-teste. Para a intervenção opesquisador elaborou um conjunto variado de materiais pedagógicos e atividades. Os resultados

GESTAR: FORMAÇÃO DE PROFESSORES EMSERVIÇO E A ABORDAGEM DA GEOMETRIA.

KOCHHANN, Maria Elizabete Rambo ; PIROLA, Nelson Antônio(UNESP/Bauru)

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mostraram desempenho significativamente melhor no pós-teste nos alunos que compunham ogrupo experimental, os quais revelaram ter adquirido conceitos geométricos frente à proposta detrabalho pedagógico condizente ao seu nível cognitivo. Os componentes do grupo de controle nãoapresentaram evolução, alguns tendo até um desempenho inferior no pós-teste.

O pesquisador afirmou também que os sujeitos, dentro do grupo experimental, nãoforam atingidos na mesma proporção, justificando tal fato ser compreensível pela complexidadedo processo educativo o qual envolve diferentes variáveis, destacadamente o nível cognitivo dosalunos, suas experiências anteriores e condições socioeconômicas. Ressalta e de forma bastanteenfática as possibilidades que o uso do material concreto propiciou às crianças que compunhamo grupo experimental quando as mesmas se depararam com a manipulação, exploração,discussão de idéias, motivação, reflexão, enfim recursos que podem tornar possível aaprendizagem significativa e agradável.

O GESTAR também propõe variadas atividades fazendo uso de materiais demanipulação, os quais são ressaltados pelas contribuições que apresentam aos participantes.Aponta para o fato de muito professores desconhecerem as orientações para um trabalho noensino de geometria, considerando-o muito difícil. Um dos objetivos do programa que estamosinvestigando é também capacitar os docentes para o ensino dessa temática, e o mesmo é elucidadoem Lujan (1997) quando se refere à importância do professor para a seleção de material,organização de atividades e intervenção pedagógica. É possível que os sujeitos desta pesquisacareçam de experiências anteriores com a geometria, tendo seu desempenho no pré-testeinfluenciado pelo pouco contato com a temática em questão.

O autor ora em pauta ainda destaca o fato de a concepção construtivista de basepiagetiana, adotada no trabalho, ter sido de uma orientação segura e valiosa, pois sua finalidade éver o aluno como construtor de seu próprio conhecimento, “elaborando sua própria forma depensamento através de um longo processo de maturação” (p. 115). É possível que os cursistasdo GESTAR sintam-se sujeitos de seus próprios conhecimentos, pois a proposta do programatrabalha nessa concepção educativa.

Enfim, se durante o GESTAR os participantes foram experimentando o gosto detrabalhar com esse tema, assimilando procedimentos vivenciados, acreditamos que estarãoposteriormente mais aptos a efetivamente conduzir um trabalho com seus alunos. E, assim comoos sujeitos do referido grupo experimental, poderão sair desse programa muito mais preparados,pois tiveram a experiência e vivenciaram no estudo da geometria a possibilidade de uma formaçãoteórica e prática, a qual é base de todo o processo educativo. Segundo Lujan (1997, p. 121), “sebem estruturados, no que diz respeito aos conteúdos e maneiras de ensiná-los, e, pedagogicamentecuidados, podem contribuir para a formação do aluno-futuro-professor e elevação da qualidade deensino”.

A tese de Nacarato (2000) analisou o processo de educação continuada de cincoprofessoras de uma escola privada em Campinas-SP que atuam nas séries iniciais do EnsinoFundamental, e a questão principal da pesquisa foi sobre os saberes curriculares, reflexões e

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conflitos produzidos por docentes das séries iniciais do Ensino Fundamental que estavamenvolvidas no processo de aprender geometria e tentar ensiná-la. A abordagem metodológicautilizada consistiu na pesquisa-ação. O material empírico coletado foi analisado frente a três eixosprincipais: 1) currículo da geometria vivenciado pelas professoras; 2) currículo apresentado àsmesmas; 3) currículo em ação: produção de sentidos para uma possível geometria escolar e aincorporação da geometria no currículo das séries iniciais. Inicialmente o trabalho revelava umarelação bastante díspar, na qual a pesquisadora era vista como a produtora e sistematizadora desaberes e as cinco professoras como participantes. Nessa perspectiva foi observada muitaresistência por parte das educadoras.

Ao alterar essa lógica, tornando-a uma concepção de pesquisa-ação, as professorascomeçaram a trazer suas experiências de sala de aula, a partir das quais surgiam problematizaçõese questionamentos, tanto teóricos como práticos. De acordo com Nacarato (2000), o processo deeducação continuada deu-se entre dois pólos: os aspectos teóricos e epistemológicos e ospedagógicos e práticos. Tais aspectos recebem nesse trabalho a denominação de conteúdosconceituais e procedimentais, e é neles que se centram os olhares.

O envolvimento das professoras na produção dos saberes da ação docente revelou-se como processo individual e subjetivo, no qual a apropriação e reflexão dos saberes foi particu-lar a cada uma das envolvidas, levando em conta seu desenvolvimento profissional.

Os conflitos e reflexões produzidos apontaram para aspectos a serem consideradosna educação continuada, tais como as narrativas reflexivas de aulas, a valorização e a produçãocoletiva de um currículo escolar. Esse processo foi produto das influências do contexto de ação eda história de vida estudantil e profissional das professoras investigadas.

Do GESTAR espera-se também que cada cursista faça a assimilação segundoseus conhecimentos prévios, possivelmente diferentes de professor para professor, e que elaseja mediada pelo professor formador, pelo material instrucional e pelas práticas pedagógicas. Aprincípio não podemos esperar o mesmo empenho, mas que ele seja adequado aos conhecimentosconstruídos por cada um dos participantes no decorrer de seu percurso pessoal e profissional.

Passos (2000), focalizando a resolução de problemas, pesquisou a problemáticado ensino de geometria, especificando os aspectos psicopedagógicos e epistemológicos dasrepresentações e interpretações geométricas de alunos de 5 classes de 4ª série do Ensino Fun-damental e como o docente percebia e explorava essas representações. Foi evidenciada aimportância da visualização geométrica no processo ensino-aprendizagem dos estudantes. Aanálise centrou-se na representação dos sólidos geométricos no plano e no espaço peloseducandos e suas dificuldades no reconhecimento de representação plana de objetostridimensionais, além da análise das relações entre representação, visualização, familiaridadecom o desenho, as convenções e o vocabulário específico de geometria do qual têm domínio.

Os resultados da investigação confirmam dados de outras pesquisas, no sentidode que os alunos iniciam pelo reconhecimento das figuras geométricas a partir de aspectos maisglobais, partem da percepção-identificação de forma e características para posteriormente

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externarem sua compreensão de relações entre forma, elementos e depois a deduções simples.Contrariamente ao que é senso comum, a visão dos objetos e a manipulação dos

mesmos não é suficiente para o aluno aprender geometria, segundo a autora. Ela aponta, ainda,que ao tentarem ensinar geometria para os discentes, os sujeitos de sua pesquisa apresentammuita dificuldade tanto no aspecto teórico quanto metodológico, alertando que esse fato podecomprometer o processo de aprendizagem dos estudantes. Também explicita que com os cursosde formação não se tornou possível aos professores pesquisados disporem de um conhecimentoprofundo da geometria para poder ensiná-la a seus alunos.

Passos concluiu o trabalho reafirmando a necessidade de atualização por partedos docentes, visto tal fazer parte do trabalho de “quem se propõe a pensar teoricamente parabuscar soluções para uma prática educativa consciente” (p. 330).

Bairral (2002) realizou uma investigação que buscou identificar as formas pelasquais a formação a distância em geometria contribui para o desenvolvimento dos conteúdos deconhecimentos profissionais do professor de Matemática. Consideraram-se três aspectos noconteúdo: o geométrico, os estratégico-interpretativos e os afetivo-atitutinais. Essa caracterizaçãodeu-se prioritariamente pelo uso das ferramentas (fórum de discussões, chats, correio eletrônico,tarefas geométricas, entrevista, auto-avaliação contínua, etc.) para a análise semântica do discursodocente nos diferentes espaços de comunicação do entorno virtual formativo. A investigação acenoupara a importância do uso dos meios virtuais como estratégia que favorece o desenvolvimentoprofissional; mostrou que há possibilidade de uma aprendizagem teleinterativa ao partilharexperiências e reflexões críticas, entretanto é difícil acontecer a mudança epistemológica em umcurso de curta duração.

Também foi constatado que, no desenvolvimento de trabalho dessa natureza, odocente participa da dinâmica comunicativa e integra contextos diferentes ao seu desenvolvimentoprofissional.

A aderência que o trabalho em foco possui com esta tese está na possibilidade deque, participante de uma formação, o professor consiga agregar componentes geométricos aoseu desenvolvimento profissional e possa trabalhar a temática com atitudes mais positivas e comos conceitos e procedimentos mais elaborados.

Bertoluci e Tancredi (2005) apresentaram aspectos do desenvolvimento de umminicurso on-line para docentes sobre geometria que focalizava os polígonos, com o objetivo depossibilitar a apreciação, por parte dos cursistas, de conhecimentos teóricos e metodológicossobre polígonos1. Participaram do minicurso 24 professoras, as quais realizaram atividades comoclassificação de figuras planas; classificação de polígonos e identificação de seus elementos;perímetro de um polígono; polígonos regulares e congruência e semelhança entre polígonos. Osresultados do trabalho indicaram que as professoras sabiam pouco sobre o assunto, tanto emtermos conceituais como metodológicos, quando iniciaram o minicurso, mas com este ampliaramseus conhecimentos e puderam refletir sobre o tema e sua prática no ensino de geometria.

São aspectos como os investigados que observamos nos sujeitos desta pesquisa,ao longo do desenvolvimento do projeto GESTAR.

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SUJEITOS, INSTRUMENTOS E PROCEDIMENTOS

O quadro docente que participa do programa é composto de professoras que atuamnas fases iniciais do Ensino Fundamental, da coordenadora da escola e dos formadores deMatemática. Em nossa investigação, serão objetos de análise os dados das doze professorasque atuam, nas diferentes fases do 1º e 2º ciclos. Possuem curso superior sendo tal formaçãoem: 7 pedagogas, uma cursando pedagogia, 2 formadas em Letras, uma em Geografia e uma emBiologia. Estamos em fase final da pesquisa e analisaremos o desempenho dos participantes emrelação à algumas questões sobre o desenvolvimento profissional. Utilizaremos pseudônimospara preservar a identidade das respondentes.

A primeira fase da pesquisa é composta por quatro instrumentos. Um deles consisteem uma caracterização dos sujeitos elaborada a partir de algumas perguntas pessoais e outrassobre as experiências pessoais referentes à temática Geometria e às experiências com essetema. O segundo instrumento é um teste sobre os conhecimentos dos professores sobreGeometria. A esse teste foi atribuída nota, na escala de 0 a 10, e sobre ele reside nossa análise notexto ora exposto. O terceiro instrumento é uma escala de atitudes em relação à Geometria (EARG).No quarto instrumento buscamos saber o nível de envolvimento dos professores na parte deEducação a Distância (EaD), visto que a carga horária nessa modalidade é bastante grande. Asegunda fase consiste em observações de aulas das professoras quando estão desenvolvendoatividades geométricas com os alunos. Na terceira e última fase será feito novo questionário paraverificar se houve aprendizagens dos conteúdos conceituais trabalhados durante o programa ese foram percebidas alterações nas atitudes dos professores em relação à Geometria.

DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL

Sendo o desenvolvimento profissional um compromisso assumido ou a assumirpor parte de cada um dos docentes que participaram desta investigação, sabemos que urge atomada de consciência quanto à sua formação, visto o professor constantemente deparar comsituações que lhe são “novas”, em nível pessoal e/ou profissional e para as quais o seu fazerdocente requer uma resposta apropriada. Para poder o docente requerer de seu aluno acompreensão de conceitos, procedimentos e aquisição de conhecimentos, ele enquantoprofissional precisa utilizar, sem reservas, situações novas, lançar-se ao raciocínio indutivo,identificar padrões e formular conjecturas, resolver problemas, usar o raciocínio espacial, o dedutivo,desenvolver a sensibilidade, o sentido de beleza e de apreço pela Matemática, segundo Correia(2005, p. 23) “deixar que o belo - contido em raciocínios, em padrões, nos efeitos surpreendentesdas regularidades, nas formas… - se evidencie”.

Compreendemos que a constituição do ser professor é composta por diferentesmomentos. As professoras, no pré-teste geométrico introdutório das TPs, encontraram muitasdificuldade na resolução de algumas situações. Por outro lado, as situações descritas,principalmente as decorrentes das transposições didáticas observadas, revelam ter havido, por

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parte das educadoras, iniciativas que oportunizam aos alunos atividades na perspectiva daconstrução de conhecimento em geometria. Isso mostra que o programa mobilizou as docentes,na medida em que ofereceu subsídios para o trabalho de conteúdos geométricos. Entende-seque tal mobilização é necessária na busca pelo desenvolvimento profissional de cada professor.Um bom aproveitamento dos programas de formação ofertados pode ser considerado um excelentecaminho nessa procura; entretanto, ele deverá ser apenas um dos meios para que o docentedescubra as diferentes possibilidades que ele terá para continuamente ir construindo o seudesenvolvimento. O GESTAR poderá ser o princípio, mas enquanto proposta de curso tem datalimitada de início e finalização, enquanto esse desenvolvimento terá de ser uma proposta para avida. Enfim, as escolas podem se tornar espaço favorável para o trabalho e a aprendizagem dosprofessores. Para Tardif (2002, p. 280), isso requer “muito mais espaço e tempo para que osprofessores possam inovar e implantar novos métodos de ensino, para que se ponham de acordoe desenvolvam um profissionalismo colegiado, etc.”

Para ICA foi importante, segundo afirmou na entrevista, assumir os objetivos queforam determinados, sem estudar a TP eu seria incapaz de resolver os exercícios, quando vocêtem dúvidas, você lê, tenta sozinho depois tem a resposta no material. A professora realçou aimportância da pré-leitura e a aplicação das sugestões: se deu sempre, já está no nossoplanejamento, é isso que estou fazendo. Corrobou com tal pensar SOA, quando declarou naentrevista: sempre aconteceu, por termos um planejamento escolar, e mais se não tivéssemos oGESTAR esses conteúdos não seriam trabalhados pois não faziam parte da minha formação.MIR e AMO, também na entrevista, afirmaram com diferentes palavras a mesma opinião,destacando respectivamente que ajudou muito, muito em todos os sentidos, trabalhar com osalunos em grupo e, na seqüência,

deu pra crescer bastante, levamos muitas atividades à sala de aula.Participei dois anos em Cuiabá, só que lá é uma hora só e vê o queestá nas TPs e pronto, uma semana tem na outra não. Lá não háaquele compromisso, lá não tem oficina como tem aqui.

Mesmo tendo AMO reelembrado ter vivido o GESTAR nas duas modalidadesinvestigadas, apontado a primeira como de menor comprometimento, salientado o fato de terlevado as atividades à sala de aula, o desempenho da professora se manteve inalterado entre opré e o pós-teste de geometria, e na escala de atitudes verificou-se ter havido um decréscimo napontuação alcançada.

Para DOD, quando do uso da palavra na entrevista, fez uma defesa contundentedas contribuições do GESTAR, declarando que:

não foi só a leitura desse conteúdo, mas de forma imprescindível acontribuição de nossos professores. A professora de Matemáticaespecificamente pela clareza, a forma de trabalho que elegeu e ageometria, eu comecei a gostar a 4 anos atrás quando iniciei oGESTAR, levamos as atividades para a sala de aula, depois tivemosespaço para apresentar o que conseguimos fazer.

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Completou, ainda: na socialização das atividades, ficamos surpresas. Partimospra outros livros, sempre buscando outras coisas também.

O desenvolvimento profissional de qualquer educador poderá acontecer tambémcomo fruto de programas de formação como o que está em foco neste trabalho ou resultado docompromisso que o professor esteja tendo com o desempenho enquanto profissional, para o quenecessita atualizar-se, haja vista as necessidades do momento poderem estar requerendoconhecimentos não presentes em sua formação, por estar a viver em outro tempo. Tempo que,além de requerer domínio dos conhecimentos vistos na formação inicial, abarca outros, tambémrelevantes e necessários ao aprendiz na construção de sua cidadania. A pretensão da pesquisadoraé que, após esse contato compromissado com o GESTAR, as docentes possam se alçar ao nívelque Tardif (2002, p. 255) denomina “saber”, que engloba de acordo com o autor “os conhecimentos,as competências, as habilidades (ou aptidões) e as atitudes, isto é, aquilo que muitas vezes foichamado de saber, saber-fazer e saber-ser”.

JÁ ANE revelou ter ficado surpresa pelo fato do nosso propósito de acompanhar asaulas ao declarar na entrevista:

Primeiramente eu tive um impacto muito grande com você na primeiraprova. O fato de você quer participar de três aulas ministradas pelagente, provocou uma certa distância entre nós. Trabalhei no diamarcado, aquilo que eu iria trabalhar mas em outro dia. Tem que aceitar.Li sim toda a TP.

Na continuação da entrevista, a cursista lembrou que não tinha o material antes, eunão tinha. Eu acompanhava aqui no grupo. É o primeiro ano que faço esse estudo.

Fato bastante diferente é o que observamos com NEU, professora da alfabetizaçãoque propôs atividades das mais variadas com seus alunos dentro da temática em estudo. Paraisso fez uso de material diversificado, mostrando interesse naquilo que estava sendo estudado evontade de compartilhar esses conhecimentos com seus alunos. Frente a nossa indagação sobreas transposições didáticas observadas, ela declarou na entrevista:

É claro que com uma observação você tem mais empenho, mas é deminha prática preparar uma boa aula. Claro que sabendo que seriaobservada me ative em preparar melhor essa aula. Eu participei doGESTAR desde que começou. Eu acho que cresci bastante. Ter umprofessor da área para desenvolver as oficinas foi muito bom, ele tinhasegurança naquilo que estudávamos, isso antes não acontecia.

É salutar observar uma declaração como essa, não só para nós, na condição depesquisadora, mas para quem sabe que isso tem muitos reflexos no próprio grupo. Ter professoresassim representa um diferencial na qualidade do trabalho e da própria produção intelectual eindividual.

Encontramos, ainda, professoras como TEN, que afirmou na entrevista que mesmo

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Com todo o material na mão não tinha tanto interesse. Os alunosperderam muito pelo fato de eu não haver aplicado as atividades doGESTAR anteriormente. Eu via mas não tinha tanto interesse. Nãoaceitei anteriormente. Agora fiz a experiência e percebi que eleapresenta uma forma mais fácil de ensinar, mais gostosa. Com essasatividades os alunos aprenderam com mais rapidez ainda.

ELY, ao iniciar a entrevista, já fez uma retomada de sua posição anteriormenteexpressa quanto à Matemática e à geometria:

Eu não gostava de geometria. Minha área é totalmente oposta daMatemática. Eu não gostava da Matemática. Então antes da Bete viraqui eu propus aos meus alunos uma atividade sobre os polígonos.Mas aceitei preparar aulas que incluíssem as atividades sugeridaspelo material, pude ver que quando a gente aprende os alunos aprendemtambém. É gostoso isso.

Nas declarações de NEA, temos um panorama que difere muito do que foicomumente apresentado, visto a professora ter declarado, na entrevista, que

A grande maioria somos mulheres que temos filhos, marido e casa,não vive só pra escola. Se pagasse melhor até que daria para fazertudo o que ele quer. Eles esquecem que somos gente. Pro aluno podetudo, mas o lado humano do professor é esquecido.

A professora LEY, mesmo tendo assumido as aulas de substituição de outra docente,a que foi citada como uma exímia executora do GESTAR, confessou que esta lhe recomendou ouso de sugestões de atividades, mas acabou declarando: Tive problemas de saúde, isso meimpossibilitou de participar melhor. E mais, estou começando a fazer faculdade agora. Tenho tudopra aprender ainda.

Essas duas professoras nada revelam sobre seu desenvolvimento profissional;acabam alegando questões particulares considerando-as como importantes, fazendo, dasmesmas, situações frente às quais pouca mobilidade visualizaram para atingir saltos qualitativosno desempenho pessoal e profissional. Esses problemas são reais para todo ser humano, condiçãoprimeira de qualquer pessoa, mas no exercício da docência devem ser resolvidos para nãoatrapalhar o fazer docente e as questões que lhe dizem respeito.

Em FRA, é saliente uma visão mais positiva da profissão e uma mobilidade frenteà sua prática pedagógica; ela afirmou na entrevista:

desde que iniciei as aulas nessa escola em abril do corrente ano,destaco que já comprei material pedagógico para desenvolver o trabalhodepois descobri que na escola tinha uma grande quantidade de mate-rial muito do qual não era do conhecimento dos demais professorestambém.

Torna-se óbvio que a presença na prática docente de tal conteúdo, quando requeridodo professor, será resultado de ações de formação contínua, sem as quais esse profissional não

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se tornará apto a ministrar a temática. O que não é aceitável é ficar no lamento quanto a conteúdosa que durante a formação o docente não teve acesso. É, sim, necessário mover-se em busca dasuperação das lacunas evidenciadas. Tal prática é requerida também do aluno, quando se deparacom situações que lhe são desafiantes. Conforme nos lembra muito bem Lorenzato (2006, p. 5),“Geralmente se referindo ao ensino da geometria, é comum professores se dizerem com o direitode não ensiná-la por se sentirem inseguros; não conhecer o assunto a ser ensinado não geradireitos ao professor, e sim, o inevitável dever de aprender ainda mais”.

CONSIDERAÇÕES

Os problemas observados na implementação do GESTAR nas duas modalidades,expandida e condensada, vêm confirmar que uma das dificuldades mais freqüentes que ocorremnas reformas de ensino, como observa Tardif (2002, p. 285) não são de formulação de princípiosmas de implantação. O mesmo autor, apoiado em Fullan et alii (1998, p. 8 apud Tardif, 2002, p.285), afirma que, “no momento, não precisamos mais de novas inovações nem de novasmudanças, mas de reforçar nossa capacidade de assumi-las e de lidar com elas”.

Dentre as recomendações dos propositores do GESTAR, uma delas é a práticapedagógica, por se compreender que ela é um espaço privilegiado de crescimento, de aprendizagemautônoma, de mobilização de saberes e competências específicas. Observamos que no exercíciodessa prática o professor conseguia dar vida àquilo que ele havia experimentado enquanto cursistaparticipante de inovações pedagógicas e, ao propô-las aos alunos, estava ao mesmo tempo fixandoalguns conceitos e reelaborando suas aprendizagens, principalmente as procedimentais, comose vê em TARDIF (2002, p. 291).

Não apenas do professor em formação se exige um saber e um saber-fazer, masde qualquer trabalhador, pois para o autor em foco (2002, p. 236), “não existe um trabalho semtrabalhador que saiba fazê-lo, ou seja, que saiba pensar, produzir e reproduzir as condiçõesconcretas de seu próprio trabalho”. O professor, no GESTAR, ao ter sido convidado a aperfeiçoarseu saber-fazer, agregou conhecimentos capazes de oportunizar mais crescimento também aosalunos, pois estes estão diretamente em contato com esse fazer docente e, desse modo, tiverama oportunidade de aprimorar seus conhecimentos. Enfim, houve uma diferença na proporção dosconhecimentos dessa modalidade, mas todos saíram enriquecidos pela vivência que tiveram.

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NOTAS

1 O endereço de acesso é www.portaldosprofessores.ufscar.br

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho se propõe a fazer uma análise de como tanto a formaçãoinicial como a formação em serviço são momentos importantes na configuração de uma práticadocente consentânea com o que se espera hoje do professor e da escola.

Entretanto, cabe ressaltar que o ponto de partida da análise foi constituído por doismomentos e dois campos diferenciados no interior do currículo do ensino básico. Trata-se deduas análises, uma no campo da Educação Ambiental e outra no campo do ensino de História.Foram discutidos quais os alcances e o papel dos professores em dois programas que sepropuseram a instaurar práticas pedagógicas alternativas, congruentes com as atuais diretrizescurriculares nacionais e os princípios teóricos dos conteúdos de referência.

Acreditamos que as iniciativas tanto oficiais quanto as de projetos focados projetopor iniciativa da própria escola – um dos casos aqui em exame - dependem, para seu êxito daadesão dos professores, que para isso devem estar preparados e sensibilizados. Estes predicadossão funções da formação docente, que deve qualificar o profissional para que ele possa atenderas demandas da escola, dos alunos e da sociedade. Assim, o presente artigo quer desvendar asprincipais dificuldades e obstáculos da prática docente para dar suporte e promover mudanças noensino básico.

REFLEXOS DA AÇÃO DOCENTE SOBRE ALTERAÇÕES CURRICULARES

A participação de professores na pesquisa de sua própria prática tem sidoespecialmente valorizada nos últimos anos, ganhando o professor vez e voz, exercendo o papelde ator do cotidiano escolar e para além dele. (Carvalho, 2005: 97).Contudo deve-se estar alertade que a aproximação conseguida entre pesquisador e professores é sempre mediada por umasérie de questões a qual se deve estar atento antes de qualquer julgamento. Segundo Nóvoa(NÓVOA, 2002:55)

IMPLICAÇÕES DE ALGUMAS PRÁTICAS ETENTATIVAS DE INOVAÇÕES CURRICULARES NO

FAZER DOCENTE – O PAPEL DA FORMAÇÃOCONTINUADA E INICIAL NO DESENVOLVIMENTO DE

DUAS EXPERIÊNCIAS CURRICULARES EMDIFERENTES ÁREAS

SOUZA, Maria Inez Salgado de (PUC/Minas); SENA, Ana Odália Vieira (UNEB);NOVAES, Priscila Weitzel (PUC/Minas)

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As últimas décadas não foram fáceis para os professores, tendo-seacentuado progressivamente os fatores de mal-estar profissional. Maisdo que uma profissão desprestigiada (...) a profissão docente tornou-se difícil de viver do interior. A ausência de um projecto colectivo,mobilizador do conjunto da classe, dificultou a afirmação social dosprofessores, dando azo a uma atitude defensiva mais própria de“funcionários” do que de “profissionais autônomos”.

Além disso, prossegue o mesmo autor:

A organização das escolas parece desencorajar um conhecimentoprofissional partilhado dos professores, dificultando o investimento dasexperiências significativas nos percursos de formação e a suaformulação teórica. E, no entanto, este é o único processo que podeconduzir a uma transformação de perspectiva. (MEZIROW,1990, apudNÓVOA, 2002:58).

Assim, a presente análise coloca o foco sobre o trabalho do professor e na suaexperiência, ao mesmo tempo em que procura apreender como esses aspectos são ou nãodeterminantes de sua prática. Além disso, como mostra Cole e Walter (1989, apud NÓVOA,2002) uma das fontes mais importantes de stress é o sentimento de que não se dominam assituações e os contextos de intervenção profissional. É preciso um tempo para acomodar asinovações e as mudanças, para refazer as identidades.”

Nos dois casos em estudo foram propostas mudanças e inovações: uma de ordemoficial, com base nos Parâmetros Curriculares Nacionais e outra de âmbito local: num projeto decurso de EJA, que tenta inovar sua pedagogia de acordo com a clientela atendida. Como reagiramos professores às demandas a eles feitas pelos dois projetos? Que semelhanças e diferençaspodemos reconhecer nas formas de atuação dos profissionais de ensino de História e EducaçãoAmbiental, quando chamados a serem protagonistas de mudanças curriculares?

Com base na literatura pertinente o propósito aqui é verificar como se deram e sedão as ações docentes que são requeridas por processos de formação contínua em um projetode Educação Ambiental . Como indica a literatura na área, os professores devem ser protagonistasativos nas diversas fases da formação contínua, que para Nóvoa são constituídas pela concepção,acompanhamento, regulação e avaliação (Nóvoa, 2002:64) Esse autor acrescenta: “sem uminvestimento positivo das experiências inovadoras que já estão no terreno, desencadeiam-sefenômenos de resistência pessoal e institucional e provoca-se a passividade de muitos atoreseducativos”. (Nóvoa, 2002:65)

Ao lado dessa forma de qualificação docente, veremos o exercício da funçãopedagógica de professores-monitores de História. Nosso ponto de partida de análise aí é dadopor Fonseca quando diz que: “O historiador que exerce o trabalho pedagógico é um educador, umprofissional docente, cujo ofício consiste no domínio e na transmissão de um conjunto de saberesatravés de processos educativos desenvolvidos no interior do sistema escolar.” (FONSECA,1997:23)

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Falando sobre a função docente hoje J.M. Esteve ( apud FONSECA) observa que:“Houve um aumento das exigências em relação ao professor, sem que isso tenha

sido acompanhado por mudanças significativas na formação”. Assim, a discussão de propostasde avanços e mudanças no ensino de História, não pode deixar de considerar a formação inicialque fornece ao profissional da área um conjunto de saberes de conteúdo, aliados a um saberfazer pedagógico e lhe fornecem margem de autonomia na condução de projetos de ensino.

A EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO TEMA TRANSVERSAL: DEMANDAS AOSPROFESSORES

Ser professor significa ter de dar conta de um conjunto de saberes e práticas quese relacionam com uma dada área do conhecimento. Nos dias atuais as exigências feitas aoprofessor são de várias ordens; de conteúdos, de práticas didáticas, de procedimentos de interaçãocom os alunos. Para dar conta de tais demandas o professor tem diante de si a formação inicial,quase sempre mais teórica que prática e a formação em serviço ou continuada. Para Nóvoa oterritório da formação é habitado por sujeitos individuais e coletivos e, portanto há diferentesintervenientes nesse processo.

Discute-se então como o processo de formação continuada de um grupo deprofessores foi proposto e levado a termo por seus participantes. Qual foi a sua participaçãoconcreta no desenvolvimento do projeto/programa e que contribuição a formação deixou a essesprofessores. Foram eles capazes de executar o que deles se exigia? Que reinterpretação deramàs diretrizes do projeto? Que margem de autonomia tiveram?

Acredita-se, que responder a essas três questões já nos dá suficiente pano defundo do trabalho docente na inovação curricular proposta para Educação Ambiental.A pesquisaque tratou de ver como a Educação Ambiental é tratada no âmbito dos temas transversais , tevecomo seus informantes e interlocutores os professores de uma escola fundamental que haviamparticipado do programa Parâmetros em Ação.Esse Programa foi elaborado por especialistas doMEC que por sua vez treinaram instrutores de diversas regiões a aplicar o processo de treinamentoa professoras de todas as disciplinas, qualificando-as para o trabalho com os conteúdos daEducação Ambiental, enquanto um tema transversal do currículo.

Mas afinal, o que são os temas transversais? Os temas transversais apresentam-se como mais uma tentativa de articulação entre as disciplinas que compõem o currículo. Assim,como mostra Macedo ( MACEDO, 2002:55-56) os temas transversais não são disciplinas, elesdevem perpassar todas as disciplinas em razão de sua importância social, uma vez que asdisciplinas tradicionais não conseguem por si mesmas dar conta de alguns recortes da “realidadesocial”. Dando ênfase antes à lógica disciplinar, do que à relevância social dos conteúdostransversais, os critérios de seleção das áreas nos PCN e sua organização dos conteúdos sebaseia na lógica interna das disciplinas. Macedo nos diz que os temas transversais é que tem dese encaixar nos espaços das disciplinas curriculares e que esse encaixe, na maioria dos casos é

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deixado a cargo do professor. (MACEDO, 2002:56). Essa tarefa se complica pois os temastransversais apresentados como “fundamentais para a atuação crítica dos alunos”, ocupam naverdade um patamar inferior ao das disciplinas escolares tradicionais. A inserção dos temastransversais nos PCN não contribui para uma organização curricular mais democrática, comoseria de se esperar. O conhecimento assim organizado deixa confusos os professores conteudistaspor formação e requer deles um novo esforço, para incluir diferentes temáticas articuladas à suacarga horária específica.

No caso dos Parâmetros em Ação, procurou-se explorar quatro competênciasprofissionais dos professores: a leitura e a escrita; o trabalho compartilhado; a administração daprópria formação como aprendiz e formador e a reflexão sobre a prática pedagógica. (SENA,2007:46) Com uma organização processual em forma de grupos de discussão a metodologiautilizava-se de professores-formadores, profissionais da educação que se tornavam formadoresde professores e se encarregavam de todo o processo formativo desde a seleção dos materiaisaté a coordenação dos trabalhos em grupo. Além desses coordenadores locais, atuaram naformação, os profissionais que constituíram a Rede Nacional de formadores contratados peloMEC para atuar na formação e na assessoria dos coordenadores gerais e de grupo, osinterlocutores da Coordenação Nacional (MEC, 2002).

A proposta apoiou-se em um conjunto de materiais que os professores poderiamutilizar tanto em sua própria formação quanto em seu trabalho cotidiano de formação de cidadãos.Esses materiais incluíam textos, programas de vídeo, CDs de músicas, CD-ROM com informaçõessobre a legislação ambiental, cartaz com mapa das ecorregiões do Brasil e compilação de diversasinformações ambientais de utilidade para o professor. Assim a Coordenação geral de EducaçãoAmbiental (COEA) implementou entre 2001 e 2002 o “Parâmetros em Ação- Meio Ambiente naEscola” (PAMA) para professores de 5ª a 8ª série do Ensino Fundamental. O programa procurouvalorizar e trabalhar com as especificidades e concepções de Educação Ambiental existentesnas escolas que visavam melhorar as condições ambientais e sociais da comunidade por meiode atitudes e comportamentos que fossem construídos de forma participativa. (SENA, 2007).

Como aponta a literatura referente à formação continuada, é preciso levar em contaos saberes e dizeres dos professores quando se trata de prepará-los para atender às exigênciasdo mundo atual sob vários aspectos: sociais, econômicos, culturais e políticos. Nesse sentido,aponta Sena:

Reconhecer que os professores de profissão são sujeitos doconhecimento é reconhecer, ao mesmo tempo, que eles deveriam tero direito de dizer algo a respeito de sua própria formação profissional,pouco importa onde ela ocorra, seja na universidade, nos institutos ounoutros lugares. (SENA, 2007:51)

A construção da transversalidade no currículo exigiria pois, uma postura além dalógica disciplinar de um currículo segmentado. Tarefa das mais complexas quando se sabe que aformação inicial de todos os professores é organizada dentro das lógicas de cada disciplina.

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Essas disciplinas não possuem relação entre elas, constituem antes unidades autônomas fechadassobre si mesmas e de curta duração. Essas características curriculares afetam a forma como osprofessores sempre trabalharam, impedindo a abordagem do meio ambiente dentro da lógica dainterdisciplinaridade.

A partir dos dados levantados por SENA (2007) em que foram entrevistados 10professores e 60 alunos de uma escola fundamental de 5ªa 8ª série, onde foi aplicado o PAMA, osresultados da pesquisa indicaram uma falta de convergência dos objetivos do programa e daproposta da transversalidade com as ações docentes conduzidas pela maior parte dos professoresentrevistados.

As respostas dos professores, quando confrontadas com as dos alunosevidenciaram o pouco conhecimento deles sobre os temas da Educação Ambiental, apenas osprofessores de Ciências e Geografia continuaram a desenvolver conteúdos ambientais nas aulase nem sempre os professores tiveram a consciência da importância de um trabalho junto àcomunidade para o entendimento da problemática ambiental. As práticas pedagógicas de EducaçãoAmbiental relatadas foram de ordem genérica e com grande ênfase ainda em comemorações dedatas específicas ou projetos pontuais de intervenção no decorrer do ano letivo, além de palestrasagendadas pelo poder público. Os oito professores que afirmaram não estarem utilizando osconhecimentos do PAMA deram como justificativa “dificuldade de associar o tema Meio Ambientecom a disciplina com que trabalha” (SENA, 2007:84). Dentre outras explicações que iremos aduzirao final desta análise uma delas é apontada por Sena:

A possibilidade de os professores desenvolverem práticas significativasde Educação Ambiental depende, portanto, de políticas públicasdestinadas a melhorar não só a formação inicial e em serviço, mastodo esse conjunto de condições que interfere na qualidade do ensino.

Analisando o que sucedeu em uma escola, coma formação continuada tendo emvista um programa específico a ser desenvolvido em consonância com diretrizes curricularesoficiais, devemos nos conscientizar de que nem sempre o prescrito é cumprido e nem recebe oapoio daqueles que deveriam dar cumprimento a essas diretrizes. Como explica Nilda Alves, arespeito de um tipo de “burla” num estudo sobre os Diários de Classe:

Nesses processos se multiplicam as astúcias, criam-se múltiplasformas de usar o que é imposto. A possibilidade do que é variado vaiaparecer , assim, dentro de redes múltiplas, nas quais os praticantesdas escolas- discente, docentes, outros servidores, pais de alunos,vizinhos ,etc.- vivem e criam táticas para agir dentro do espaçoapropriado, “jogando” com o tempo. (ALVES, 2003:76).

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UM PROJETO ALTERNATIVO NO ENSINO DE HISTÓRIA: PROBLEMAS LIGADOSÀ FORMAÇÃO INICIAL

A segunda pesquisa objeto da presente análise focalizou o ensino de História dentrode um projeto voltado para a EJA. A pesquisa se deu em duas turmas de um curso noturnodestinado a adultos que se distanciaram da escola regular há muitos anos. O curso é equivalenteao segundo segmento do ensino fundamental regular (5[ a 8ª séries) e tem a duração de trêsanos. Não há uma preocupação em acompanhar as séries do ensino regular, mas sim de adequaros conteúdos ao perfil e ao ritmo das turmas, constituídas por adultos cujas idades vão de 22 a 74anos. Espera-se, que o professor de História possa descobrir e averiguar os interesses de cadaum dos seus alunos para poder desenvolver atividades que os façam adquirir o gosto pela aquisiçãodos conteúdos da disciplina. (Novaes, 2007:89).

Há assim uma necessidade de um processo de qualificação e acompanhamentodos professores-monitores ao longo de sua permanência no projeto para se adequarem aoprocesso de ensino e aprendizagem dos educandos da Educação de Jovens e Adultos. Na verdadeuma das preocupações expressas na literatura que trata do tema é a defasagem entre osprogramas de educação de adultos e os alunos que dela se servem. No caso aqui descrito essasintonia é buscada pela coordenação do projeto, através de reuniões periódicas com os professores-monitores. Além disso, procurou-se sanar esse descompasso tradicionalmente encontrado nassalas de aula de adultos entre os alunos e o currículo, com a Proposta Curricular para a Educaçãode Jovens e Adultos (MEC 2002).

A pesquisa em questão centrou-se na maior parte do tempo em sala de aula, poiso objetivo principal era analisar como as professoras-monitoras selecionavam os conteúdos efaziam a mediação didática entre o conhecimento acadêmico e o conhecimento escolar. Alémdisso, foi aplicado um questionário aos quatro monitores-professores que atuam no curso nasaulas de História. Em ambos os procedimentos metodológicos a pesquisa se voltou para obterinformações em primeira mão de professores iniciantes, que convivem ao mesmo tempo com oconhecimento acadêmico na universidade e com a prática docente no projeto de EJA. Esse fatotornou-se significativo por ajudar a desvelar aspectos referentes à formação recebida pelosmonitores-professores no curso de Licenciatura e a construção do perfil do professor de História.Segundo Novaes

As figuras centrais desta pesquisa foram os estudantes de licenciaturaem História, que ao mesmo tempo atuavam como professores emsala de aula. A escolha desses sujeitos se deu pelo fato de comoestudantes, poderem estar em contato direto com as novas perspectivasda historiografia do ensino de História e seu (lugar) no currículo. (NOVAES, 2007)

Além disso, segundo foi constatado pela pesquisa, o referido projeto tambémpretende absorver e colocar em prática novas propostas pedagógicas voltadas para o públicoque freqüenta a EJA.

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No acompanhamento do desempenho docente dos professores-monitores apesquisadora cotejou algumas informações referentes à qualificação dos docentes-alunos paraexecutar o programa de História. As referencias no tocante ao seu preparo pedagógico foramvagas e imprecisas. Igualmente inconsistente parece ser o conhecimento que possuem sobre asdiretrizes curriculares nacionais, seja os PCN, ou mesmo as referentes à EJA. Ficou claro que seutilizam, sobretudo dos livros didáticos já consagrados pelo uso em escolas regulares comorecurso para as aulas e até para a programação dos conteúdos. Não há critérios estabelecidospara a escolha do material didático a ser usado em sala, os monitores-professores, a partir dealgumas orientações gerais do programa, selecionam e produzem seu próprio material de ensino.Percebe-se aí uma improvisação das aulas e do conteúdo que parece atender ao que preconizao documento da Proposta Curricular para a Educação de Jovens e Adultos, mas que demonstra aimaturidade do jovem monitor-professor e sua insegurança quanto à seleção de conteúdos. Apropósito, Santomé pondera que a formação atual do professor “não considera objeto de suaincumbência a seleção explicita de conteúdos culturais.” (SANTOMÉ, 2002:161)

Apesar de todas essas dificuldades inerentes à formação inicial e não finalizada,os professores-monitores observados foram capazes de ter um bom desempenho didático nasaulas, utilizando-se de meios atuais como informática, TV e vídeos, além de mapas e imagens.Uma das monitoras-professoras embora não se proponha enfatizar aspectos historiográficos decunho mais complexos, procura em suas aulas “enfatizar tópicos do cotidiano com temas comotrabalho, agricultura, construção civil, relações das mulheres, crianças e idosos em umadeterminada civilização, conceitos de família da época e da sociedade estudada.”. (Novaes, 2007).Ao mesmo tempo, observa Novaes, algumas das aulas tornavam-se incompreensíveis para osalunos pela dificuldade de acompanharem o raciocínio histórico e a linguagem acadêmica de umadas professoras-monitoras. Nesse caso, afirma a pesquisadora “a transposição didática nãoocorreu, pois a monitora-professora não conseguiu transformar o conhecimento acadêmico emconhecimento escolar, acessível aos alunos.” (Novaes, 2007; 105) Ocorreu, que mesmo seutilizando de novas linguagens ou de textos consagrados no estudo do, conteúdo de História,notou-se uma falta de sintonia entre os alunos e essas linguagens, pois muitas estão muitoaquém do seu cotidiano. O professor não deve privar os alunos do contato com diferentes meiosde conhecimento e de linguagens, no entanto os mesmos devem ser introduzidos aos poucos, demaneira que os discentes possam absorver compreender e inserir tais meios e novas linguagensno seu cotidiano.

CONSIDERAÇÕES SOBRE A FORMAÇÃO CONTINUADA E INICIAL DEPROFESSORES E SEU IMPACTO NO CURRÍCULO.

A seguir, o texto se propõe discutir os fatores inerentes aos dois tipos ou modalidadesde formação que influenciaram os professores nos dois casos pesquisados: como vem se dandoa formação continuada na Educação Ambiental e a formação inicial nos conhecimentos disciplinares

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como a História. Recorre-se, portanto, à literatura que tem por foco a formação do profissionaldocente nos dois casos. É preciso observar que ambas as modalidades de formação vão estarligadas e que uma formação continuada para ter êxito, entre outros fatores depende de umaformação inicial consistente. Do mesmo modo, a formação inicial, dado as transformações dehoje no ensino e às constantes demandas ao professor na atualidade terá que ser complementadapor uma constante atualização dos docentes e de suas práticas.

Nos dois casos em exame se está diante de professores de diferentes disciplinascurriculares, que no caso da formação continuada são profissionais com bastante experiênciapelos anos de profissão que apresentam. Já os professores de História são ainda alunos degraduação e, portanto exercendo pela primeira vez a função docente. Não cabe aqui comparar osdois grupos, mas ver como se desincumbem das demandas a eles colocadas dois projetos. Naformação em serviço se requer desses professores que atuem com um currículo disciplinarmenteorganizado, que passem a trabalhar novos conceitos e conhecimentos, no caso A EducaçãoAmbiental, numa perspectiva interdisciplinar e integradora. O que de fato se viu, quando interrogadosfoi que dentre 10 docentes, apenas dois continuavam aplicando os conhecimentos adquiridos naformação fornecida pelo PAMA, um programa organizado a partir do MEC com auxílio e participaçãodo município.

Carvalho conclui a esse respeito em seu estudo sobre formação continuada:

Na medida em que os professores deixam de ser responsáveis pelaprodução de objetivos, conteúdos e métodos de seu trabalho(transferidos para equipes técnicas, pacotes de ensino, livros didáticose outros), ocorre um estranhamento entre os professores e suaprodução-trabalho. Nesse processo, os professores tendem a serconsumidores e/ou usuários de saberes e lógicas alienígenas paraeles. (CARVALHO, 2005:99)

Carvalho acrescenta que isso nem sempre ocorre de modo passivo, mas que elespodem subverter as lógicas impostas ou reaproveitá-las usando-as para outros fins. (CARVALHO,2005:100)

Com relação aos professores-monitores de História o fator que parece ser odeterminante de suas práticas é o da formação específica inicial. O formato que predomina é adicotomia entre preparação para o ensino/ preparação para a pesquisa. Segundo Fonseca(FONSECA, 1997:28)

o historiador que exerce seu ofício em sala de aula vive umasituação ambígua: ocupa uma posição estratégica e ao mesmo tempodesvalorizada; desenvolve uma prática cultivada e ao mesmo tempo,aparentemente desprovida de saberes; vive cotidianamente o dilemaentre a autonomia profissional e a ameaça da proletarização e dareprodutividade

Ainda mais problemática é a estrutura da formação inicial, que, pelo que se observoua partir das aulas ministradas no curso de EJA, tem uma feição incongruente com as necessidades

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pedagógicas desse tipo de alunos. As causas são múltiplas, mas a principal parece ser adefasagem entre a teoria e a prática. Flores (FLORES, 2006:53) relata em um estudo feito comalunos recém entrados na profissão docente, que de acordo com os participantes as teoriasaprendidas na universidade não são aplicáveis ao contexto da sala de aula. E de fato notou-se apartir da pesquisa com os monitores-professores a pouca integração entre a faculdade e a salade aula. Na maior parte das aulas, via-se que os que ocupavam da docência o faziam antesintuitivamente que respaldados em práticas reflexivas ou orientações fornecidas peloscoordenadores.

A literatura tem sublinhado a necessidade de se repensar a formação dosprofessores no sentido de responder aos desafios cada vez mais complexos que se colocam àsescolas e aos professores. Investigações recentes, como as que servem de fundo a esteartigo,indicam que há um abismo entre as escolas e as universidades ou cursos de formaçãopedagógica. A se perpetuar tal lógica, de pouco adiantarão os projetos de formação continuada,se a formação inicial não for integradora, pois os processos de preparação e qualificação docenteacabarão sendo marcado por descontinuidades e fragmentação.

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INTRODUÇÂO

Os índices têm demonstrado os consecutivos fracassos a que tem sido exposta aeducação brasileira, dentre elas destaca-se: a má-formação dos profissionais da educação; adesvalorização da profissão de professor e a conseqüente baixa remuneração de suas atividades;o pouco investimento em programas de educação continuada para os professores em exercício;o papel de legitimadora dos valores sociais vigentes desempenhados pela escola.

Considerada por Demo (1992) como o fator mais importante para a qualidade daeducação básica, a formação de professores encabeça a relação dos problemas a seremenfrentados por todo o sistema educacional. Ao se referir aos altos índices de evasão escolarverificado no Brasil, esse autor atribui o fato, em parte, aos baixos teores qualitativos do sistemaeducacional e, em especial, à má-formação do professorado nele atuante. Afirma ainda que ascrianças pobres e culturalmente indigentes aproveitam precariamente os frutos do sistemaeducativo, em função principalmente dessa má qualificação dos professores. Critica, por fim, aconcepção das instituições responsáveis pela formação de professores, em especial o arcaísmode seus currículos, baseados principalmente na reprodução do conhecimento, sem que sevalorizem a investigação e a produção do conhecimento por parte dos alunos. Nesta mesmadireção, Riba (1997), já havia constatado a precariedade da qualidade dos cursos de formação deprofessores, afirmando que tal deterioração, nas últimas décadas no Brasil, chegou a níveisalarmantes.

Ser professor não se caracteriza um processo simples e imediato, mas complexoe longo, de acordo com Lara et al. (1998), um professor não surge de repente, isto é, do dia paraa noite. Para tornar-se um verdadeiro professor, é preciso um processo de formação profissionalque lhe possibilite uma vasta liberdade de escolhas, atuação consciente e comprometimentosocial, fundamentado em valores que o levarão a desenvolver uma ação competente, crítica,transformadora e interativa.

Os professores dos alunos com deficiência experimentam dificuldades similaresàs enfrentadas, por seus colegas de profissão, independente da clientela com a qual trabalham.Tiveram uma formação calcada no reprodutivismo e na mera transmissão do conhecimento(Mantoan, s.d., Bereohff, 1994; Bueno, 1994; Masini, 1994); recebem insignificantes salários esão desvalorizados profissionalmente, muito embora sejam reconhecidos como abnegadosguardiões de “crianças-problemas” (Mazzotta, 1993; Fonseca, 1995; Carvalho, 1997); sofrem dafalta de oportunidades de qualificação profissional, devido principalmente à precariedade da política

INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO DECOMPETÊNCIA NA EDUCAÇÃO ESPECIAL

MACHADO, Francisca de Moura (UDE /Uruguai)

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de capacitação docente, tornando-se, muitas vezes, importantes veículos de difusão e demanutenção da ideologia da classe dominante, à qual, em geral, não pertencem.

A partir das relações estabelecidas ao longo de sua vida pessoal, de sua formaçãoprofissional e de sua prática pedagógica, o professor de alunos com deficiência constroem sentidosque retratam o seu modo de ser e de agir, suas concepções. Será que, em sua formação, osprofessores dos alunos com deficiência mental têm sido expostos aos diferentes sentidos sobrea deficiência? Apresentam lucidez nas suas próprias concepções?

Dentre as conclusões dos Grupos de Trabalhos sobre Formação de Professoresem Educação Especial do VII Ciclo de Estudos sobre Deficiência Mental, organizado pelo Programade Pós-Graduação em Educação Especial da Universidade Federal de São Carlos, identificou-seque os cursos de formação de professores especiais ignoram, via de regra, as concepções,repletas de estereótipos e preconceitos, sobre o fenômeno da deficiência trazida por seus alunos,sugerindo que tais cursos deveriam avaliar essas concepções, substituindo-as por outras maisrealistas e otimistas sobre a deficiência.

Pensar em uma escola eficiente significa, em um primeiro momento, pensar noprofessor eficiente, ou seja, naquele que é competente para ensinar. O que significa, então, sercompetente para ensinar? São várias as vertentes teóricas em relação à competência do profes-sor. Há autores que enfatizam a competência técnica, outros valorizam mais a competência política,ou pessoal, no entanto, acredita-se, que todas são fundamentais para a realização de um trabalhode qualidade nas escolas, ou seja, ao professor se faz necessário tanto à competência técnicaquanto à política e a pessoal.

Perrenoud (2000a) apesar de dar maior ênfase à competência técnica, não deixade valorizar a competência política. Ele apresenta 10 grandes dimensões de competências quedevem ser desenvolvidas no professor pelas instituições de formação inicial e contínua: organizare dirigir situações de aprendizagem; administrar e dirigir a progressão das aprendizagens; concebere fazer evoluir os dispositivos de diferenciação; envolver alunos em suas aprendizagens e em seutrabalho; trabalhar em equipe; participar da administração da escola; informar e envolver os pais;utilizar novas tecnologias; enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão; administrar suaprópria formação contínua. Afirma, ainda, que ser um bom professor não significa apenas acapacidade de transferir conhecimento, se faz necessário uma postura reflexiva, capacidade deobservar, de regular, de inovar, de aprender com outros.

Na visão de Demo (1993), um outro importante autor nesta vertente, lembra que oprofessor deve ser capaz de desenvolver na criança a capacidade de raciocínio, de posicionamento,tornando-o desafiador, provocador e instigador. Mas, para tanto, é importante o professor aprendera ler criticamente; obter redação própria e expressar-se com desenvoltura; dominar conhecimentose informações estratégicas do processo de transformação da realidade atual; pesquisar, iniciandocom pequenas pesquisas, passando para elaborações mais exigentes, que já expressamcapacidade de síntese, de compreensão global, de posicionamento crítico criativo; aprimorarhabilidade metodológica para manejar e produzir conhecimento.

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Dentro dessa mesma vertente, encontra-se também Freire (1998), ao bom profes-sor também se faz necessário as seguintes qualidades: humildade; amorosidade; a tolerância; acapacidade de decisão; segurança; tensão entre paciência e impaciência; parcimônia verbal. Arends(1995) complementa a afirmando que, aos futuros professores, nas próximas décadas, serãoexigidos conhecimentos de Pedagogia, que vão além de conhecimentos relativos aos conteúdosespecíficos, como também serão responsáveis por recursos e práticas educativas que sejameficazes. Acredita o autor que, ao professor do século XXI, será exigida a capacidade em váriosdomínios como, por exemplo: escolar, pedagógico, social e cultural, como também que sejamreflexíveis e capazes de resolver problemas.

O professor é a peça chave desse processo, devem estarem atentos para anecessidade crescente de pensar em uma educação permanente, em decorrência principalmenteda velocidade com que as mudanças vêm ocorrendo na atualidade. Os avanços tecnológicos e apopulação acelerada do conhecimento exigem, cada vez mais, uma permanente atualizaçãoprofissional. Verificou-se na literatura que o professor precisa de muitas competências. Acompetência do professor deve constituir-se em aspecto relevante da educação em geral e daorganização escolar neste novo século, torna-se cada vez mais evidente que o sucesso dosalunos e da escola depende de sua prática profissional.

Assim, em face ao referencial apresentado e das necessidades de se analisarmelhor a problemática aqui considerada, urge diante deste quadro situacional, melhorar a qualidadeda formação dos professores de alunos com deficiência mental e, conseqüentemente suas práticaspedagógicas. Foram estabelecidos os seguintes objetivos, para a presente investigação: identificarcaracterísticas (escolaridade, tempo de profissão, tempo de experiência no atendimento dosprogramas); verificar o desenvolvimento infantil dos alunos por programa; avaliar a competênciado professor pela auto-avaliação, por meio de uma escala de competência, desenvolvida para apesquisa; comparar os resultados da auto-avaliação de competência do professor com a avaliaçãode desenvolvimento e aprendizagem dos alunos e, algumas variáveis como grau de escolaridadee experiência profissional.

MATERIAL E MÉTODO

Por se tratar de uma pesquisa que analisa a questão da competência do docenteno trabalho com crianças especiais (deficiente mental e múltipla), foram explicitadas a necessidadedo sigilo e a liberdade da participação ou não no estudo.

Para o desenvolvimento desta pesquisa, foi realizada uma pesquisa de naturezaqualitativa no qual participaram 10 professores, que atuavam nos programas de estimulaçãoprecoce e educação infantil do ensino especial em um centro de educação especial estadualDom Bosco da cidade de Rio Branco – AC. No ano de 2003. Os participantes eram todos do sexofeminino, com idade de 22 a 35 anos, com tempo médio de 10 anos de experiência na docência,oito dos participantes tinha apenas o Ensino Médio (habilitação magistério) e duas com o curso

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superior (licenciatura em pedagogia).Para a coleta de dados foi respondido um questionário como um instrumento de

auto-avaliação de competência para o ensinar, elaborado pela autora, esse instrumento compostopor 56 itens – habilidades para a prática docente – com cinco julgamentos para cada item: nada,pouco, mais ou menos, muito e demais. Esse instrumento foi desenvolvido a partir de um estudobibliográfico, que objetivou identificar as competências e habilidades necessárias para ensinar deacordo como o ponto de vista de professores; leitura e reflexão de textos, livros, artigos, teses edissertações que tratam do assunto – competências e habilidades necessárias à prática docente.Foram identificadas algumas dimensões, dentre as quais se destacaram três característicasfundamentais para carreira docente e seus aspectos preponderantes: competência pessoal –que se refere aos itens de habilidades que avaliam aspectos da personalidade do professorrelacionados à prática docente tais como afetividade, motivação, disciplina e equilíbrio; competênciapolítica – refere-se aos itens de habilidades que avaliam o valor político atribuído à atividade docentetanto no âmbito individual como coletivo, tais como compreensão do valor político da educação,ação política no cotidiano escolar, avaliação do impacto da educação; competência técnica –refere-se aos itens de habilidades que avaliam os conhecimentos técnicos do professor relacionadoà prática docente, tais como técnica de ensino, administração do programa, domínio de atividades,planejamento e avaliação.

Realizou-se também, o levantamento da avaliação diagnóstico e histórico dosalunos, que foram atendidos pelas participantes no ano de 2002.

O método utilizado foi à comparação entre à auto-avaliação de competência para oensinar com a avaliação diagnóstico e histórico dos alunos, e análise da relação da variável graude escolaridade e experiência profissional.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O estudo evidenciou que, a dimensão relacionada característica pessoal, a auto-avaliação na competência atribuída pelas professoras, o grupo se auto-avaliou como profissionaisque, no momento, possuem muita competência para ensinar.

Esse autoconceito positivo das professoras pode ser entendido como significativo.Entretanto, deve considerar que para uma prática profissional eficiente se faz necessário muitomais do que apenas um autoconceito positivo, é preciso também, como aponta Perrenoud (2000b)uma postura reflexiva, capacidade de observar, de regular, de inovar, de aprender com os outros.Freire (1996) acrescenta afirmando que o verdadeiro professor, ou seja, o competente é aqueleque tem como meta que ensinar não significa apenas transferir conhecimento, mas também criaras possibilidades para sua própria construção.

A dimensão em que os participantes se atribuíram com a menos competência foi àrelacionada às características técnica e política.

Talvez isso se justifique pelo fato de os professores acreditarem que as habilidades

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relacionadas com a afetividade (vínculo com o aluno, diálogo, gostar do aluno...) e a motivação(gostar da profissão, considerar o trabalho importante...) sejam as mais importantes para suaprática profissional, ou, ainda, porque são as que reconhecem com mais facilidade. Vale destacarnesse momento a posição de autores como Codo & Gazzotti (1999) e Freire (1996) os quaisestabelecem que a prática educativa requer afetividade. Acrescentam que é necessário seestabelecer uma relação afetiva com o aluno, caso contrário a sua aprendizagem não serásignificativa, podendo ocorrer lacunas e insucessos.

É importante ressaltar que há várias vertentes teóricas em relação à competênciadocente. Entretanto, acredita-se que ao professor se faz necessário tanto às habilidadesrelacionadas com a competência pessoal (estabelecer vínculo, diálogo...) como a técnica (domíniode conteúdo, manejo de classe, planejamento, etc.) como a política (compreender que a educaçãoé um processo amplo que tem impactos nas relações sociais, desenvolver o trabalho pedagógicoa partir da compreensão da realidade vivida pelos alunos...).

Os resultados referentes ao desenvolvimento e aprendizagem dos alunos apontaramque apenas duas professoras conseguiram obter resultados positivos no trabalho com os alunos;três das participantes não conseguiram obter resultados significativos em relação ao seu trabalhopedagógico desenvolvido; os restantes das professoras obtiveram resultados razoavelmentesatisfatórios. No entanto, pressupõe-se, então, que apesar de ensinar, algumas professoras nãoconseguiram desenvolver a aprendizagem significativa em seus programas de atendimento. Issosugere que essas professoras que não desempenharam tão bem sua competência, apesar deter uma autopercepção positiva, precisam de um maior investimento em seu desenvolvimentoprofissional.

A auto-avaliação por grau de instrução constatou, que o grupo com menorescolaridade se atribuiu maior competência, o que indica que esse grupo sente-se mais competenteque o outro. Essa diferença para menor pode indicar que esses profissionais foram mais exigentesem relação à auto-avaliação, porque têm uma auto-avaliação crítica de sua atuação. Não deixa deser um resultado estranho, considerando que autores como Demo (1993), Garcia (1995), Nóvoa(1995), entre outros, enfatizam a necessidade de o professor ter uma boa formação inicial. Garcia(1995), afirma que tanto a formação inicial como contínua se constituem em aspectos fundamentaisno desenvolvimento profissional e na prática dos docentes.

A auto-avaliação, na categoria de experiência profissional não houve indícios quepossibilitasse detectar significância entre o grupo. Destaca-se que autores como Arends (1995),Guardieri (2000) e Porto (2000) enfatizam a importância da prática e da experiência profissional.Arends (1995) afirma que para um professor se torna competente ele precisa do desenvolvimentoprofissional, e isso só ocorre por meio da formação continua incluindo a experiência profissional.

A competência das professoras com a avaliação de desenvolvimento eaprendizagem dos alunos e, grau de escolaridade e experiência profissional, aponta uma ausênciade associação entre essas variáveis e a competência das professoras, apesar da avaliação deaprendizagem dos alunos não legitimar tais competências. Nesse sentido, torna-se incoerente,

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principalmente quando se traz para consideração a importância que é atribuída à formação iniciale continua, pois se acredita que se os professores realmente fossem detentores de um conjuntode técnicas e habilidades pertinentes à prática docente o que prevaleceria como resultados, alunoscom melhores índices no seu desenvolvimento e na sua aprendizagem.

CONSIDERAÇÕEAS FINAIS

Com base nos resultados, este estudo concluiu que as professoras que participaramda pesquisa assumem uma autopercepção positiva de sua competência, embora os resultadosnão legitimaram tais competências.

Constatou-se que, a associação entre a auto-avaliação de competência para ensinare a avaliação do desenvolvimento e aprendizagem dos alunos, grau de escolaridade e experiênciaprofissional apresentou uma estrutura de correlação extremamente complexa. Todavia, torna-seimportante ressaltar que essa discrepância entre os resultados obtidos por meio da escala deauto-avaliação para ensinar e os resultados de aproveitamento das crianças talvez se justifiquepelo fato das professoras ainda entenderem o fracasso do aluno como um problema, umadificuldade apenas do aluno ou da deficiência patológica que eles possuem.

Acredita-se, entretanto, que o desempenho das crianças especiais (deficiente mentale múltipla), na escola que fiz parte da pesquisa, poderá ser minimizado e até eliminado se ocorrerum melhor investimento no desenvolvimento profissional, ou seja, se ao professor for possibilitadoa alcançar maior competência pessoal, política e técnica. Espera-se então, que uma maiorpreocupação com a formação e preparação dos professores seja a tônica da educação nessenovo milênio, pois o professor, como apontam, Lara et al. (1998), não surge do dia para noite,mas, sim, a partir de um longo e rico processo de formação profissional que lhe possibilite umaatuação consciente e plena de comprometimento social.

A partir deste estudo, vislumbra-se a necessidade da construção de um novo espaçodiscursivo sobre a formação continuada dos professores de educação especial (deficiência men-tal e múltipla) e, por conseguinte, sobre a da deficiência de um modo geral. Nesta perspectiva éque, a nosso ver, se deve ressignificar a educação, papel da instituição escola e o da formação deprofessores.

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INTRODUÇÃO

A interpretação do professor como profissional intelectual critico ( GIROUX, 1997)permite a superação da justaposição e dicotomia entre o processo de formação inicial e continuadados professores, entendendo-se que [...] “os sujeitos aprendem mediante um processo aberto,especulativo e irreversível de reorganização contínua de seus sistemas de idéias”. (GÁRCIA EPORLÁN ,2000, p22)

No entanto, é preciso considerar que a interpretação do professor como profissionale dos saberes constituintes da profissão pode ser dar a partir de diferentes modelos: o do técnico,o reflexivo e o intelectual reflexivo. ( CONTRERAS, 2002).

NO entanto, a dimensão evolutiva e progressiva da formação do professor implicano reconhecimento de que a elaboração de seus saberes profissionais se dá ao longo do processode desenvolvimento profissional do professor, desde sua formação inicial e durante seu percursoprofissional. , identificando-se a formação inicial como um dos momentos desse processo deelaboração, relacionado às experiências vivenciadas ao longo da vida profissional do professor,enquanto a vida profissional é reconhecida como propiciadora do saber prático, adquirido peloconfronto de experiências, articulado à postura reflexiva e ao ciclo profissional do professor.

Assim, a formação inicial passa a ser compreendida como um importantemomento de formação, no qual o futuro professor deve ter possibilidade de atuar pedagogicamente,analisar o que faz, o que pensa, e o que sente, de modo a apropriar-se de instrumentos quepermitam a elaboração dos seus próprios e primeiros saberes e fazeres.

No entanto, dificuldades no desenvolvimento do pensamento e de atitude criticareflexiva, ainda no processo de formação inicial, têm sido indicadas em estudos diversos. Bejaranoe Carvalho ( 2003) referem-se ás dificuldades de operar mudanças ou evoluções nas crenças dealunos de cursos de formação inicial para professores e relatam a existência de uma visãopessimista sobre a possibilidade de programas de formação inicial consigam mudançassubstanciais nos sistemas de crenças de futuros professores.

Reconhece-se, assim, como Pacheco e Flores ( 1999, p.45) que:

Tornar-se professor constitui um processo complexo, dinâmico eevolutivo que compreende um conjunto variado de aprendizagens e deexperiências ao longo de diferentes etapas formativas. Não se trata deum acto mecânico de aplicação de destreza e habilidades pedagógicas,

CAMPOS, Luciana Maria Lunardi ; DINIZ, Renato Eugênio da Silva (UNESP/ Botucatu)

LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS EATUAÇÃO PROFISSIONAL : O QUE DIZEM OS EX-

ALUNOS, ATUAIS PROFESSORES

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mas envolve um processo de transformação e (re) construçãopermanente de estruturas complexas, resultante de um lequediversificado de variáveis. .

Huberman( 1995) identifica fases nessa evolução: fase de “ sobrevivência edescoberta”, fase de estabilização( momento de identificação profissional e segurança) fase dediversificação ( momento de questionamento, de experimentação, de buscas plurais); fase deserenidade e distância afetiva( conservadorismo) e de desinvestimento, recuo e interiorização,que constituem o ciclo profissional.

Nesse sentido, ser professor “envolve um processo de transformação e (re)construção permanente de estruturas complexas, afetivas e cognitivas” (PACHECO E FLORES,1999, p.45) e é nesse processo que ocorrem aprendizagens, novas aquisições e o saber daexperiência, dialeticamente, é superado por incorporação.

O reconhecimento da formação inicial e da vida profissional como momentos deum mesmo continuum do processo de elaboração de saberes profissionais do professor exige odesenvolvimento de investigações que busquem compreender como se dá a relação entre essesmomentos na elaboração dos saberes e como esses dois momentos interagem .

Neste contexto, desenvolvemos uma investigação que tem objetivo compreender oprocesso de elaboração de saberes profissionais junto a professores de Ciências e de Biologia,identificando relações entre o processo de formação inicial e experiências oriundas do percursoprofissional.

Inquietados por alguns questionamento, desenvolvemos como parte inicial dainvestigação um estudo cujo objetivo era identificar e compreender como os ex-alunos queatuam como professores analisaram o cursos de licenciatura , o que eles aprenderam com essecurso e com a atuação profissional .

Neste artigo, apresentamos dados sobre esse estudo .

METODOLOGIA

Este estudo insere-se em uma abordagem qualitativa de pesquisa, ao ter comopreocupação básica a identificação de conhecimentos de um grupo de ex-alunos e a busca depossíveis significados e inferências sobre os mesmos (conforme LUDKE E ANDRÉ, 1986; MINAYO,2000, 1998; TRIVIÑOS, 1995).

Como sugere Minayo (1998, p. 22), consideramos os ex-alunos , nossos sujeitosde estudo, como: “gente, em determinada condição social, pertencente a determinado grupo so-cial ou classe com suas crenças, valores e significados.

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ParticipantesEx-alunos do curso de Ciências Biológicas–modalidade licenciatura, formados no

período de 2001 a 2005, de uma universidade estadual do estado de São Paulo , que atuam comoprofessores.

Coleta, organização e análise dos dados. Os dados da investigação foram coletados inicialmente por meio de questionário e

serão, posteriormente, aprofundados e ampliados com entrevistas individuais. O questionário, que é uma forma de entrevista, consiste numa lista de questões

escritas a serem respondidas pelos pesquisados. Este instrumento é importante para a pesquisaqualitativa pelo fato de ser um meio pelo qual pode-se obter informações pessoais dos pesquisados,suas opiniões, seus interesses, seus julgamentos, subjetivos, suas autopercepções, suas atitudese suas adaptações pessoal e social. Ele também permite que o pesquisado sinta-se mais àvontade para expressar seus apontamentos, diferentemente da entrevista e de observações dopesquisador em sala de aula.

O questionário foi elaborado com 09 questões dissertativas, abordando aspectosrelacionados à identificação do ex-aluno, curso de licenciatura e atuação profissional. Ele os foiencaminhado aos alunos formados no período de 2001 a 2005, por correio e por e. mail, a partir deinformações obtidas junto à universidade e de contatos anteriores com os alunos .

Os dados obtidos foram organizados em quatro eixos :1- Ex- alunos professores2 – O curso de licenciatura e a formação3- Aprendizagens com o curso de licenciatura4- Aprendizagens com a atuação profissional

RESULTADOS

Do total de questionários enviados, recebemos 51 questionários, nos quaisverificamos que 28 ex-alunos não atuam ou atuaram como professores e 23 atuam.

1- EX- ALUNOS PROFESSORES

Consideramos como atuação, apenas as experiências profissionais em escolas.Assim, a atuação como professor do cursinho mantido pelo centro acadêmico ou de monitor dedisciplinas, antes de cursar as disciplinas pedagógicas, não foi computada.

Esses alunos atuam em diferentes níveis de ensino, como demonstrado na tabela01

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Tabela 01 – Nível de atuação

Podemos contatar que um maior número de ex-alunos atuou no ensino médio .Verificamos que os ex- alunos possuem um tempo breve de atuação, como indicado

na tabela a seguir :

Tabela 02 – Tempo de atuação

Verifica-se que com exceção de dois ex-alunos, os demais ( 20) não atuavamcomo professor na rede pública ou privada de ensino, antes de concluir a licenciatura em CiênciasBiológicas . Assim, constata-se que a maior parte dois ex-alunos encontra-se na fase inicial decarreira.

Segundo este autor, esta fase de “ sobrevivência e descoberta” , conformeHuberman (1995), o que envolve o choque da realidade e o entusiasmo inicial .

Ano Ed.

Infantil

En

Fundam

Ensino

médio

Curso

supletivo

Ensino

superior

Pre-

vest

2001 - 2 2 1 3 -

2002 1 2 3 - - -

2003 - 3 6 - 1 2

2004 - 4 3 - - -

2005 1 3 4 - - 1

Ano 1 a 5

meses

6 meses

/1ano

2anos 3 anos 4

anos

5ou +

anos

Não

especi-

ficou

Total

ex-

alunos

2001 - - 1 2 - - 1 4

2002 - 1 1 - - 1 - 3

2003 1 1 1 2 1 - 1 7

2004 1 1 1 1 - - - 4

2005 2 - 2 - 1 - 5

Total 4 3 6 5 1 2 2 2

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2 – O CURSO DE LICENCIATURA E A FORMAÇÃO

O curso de licenciatura foi analisado, de um modo geral, como positivo pela maiorparte dos alunos (15 citações), indicado pelas palavras “interessante, muito bom, bom, muitoproveitoso importante , imprescindível”. Um exemplo está apresentado na transcrição abaixo :

O curso de licenciatura contribuiu muito para minha formação, me fezrepensar valores. Vejo-o como imprescindível. Foi uma rica oportunidadede aprender e discutir assuntos da área de humanas, que modificoumeu pensar e meu agir, tornando-me mais consciente dos meus direitose deveres diante da sociedade.

Os aspectos mais indicados como positivos foram : a teoria , as discussões e ofornecimento de “ferramentas”.

Dois alunos avaliaram como positivo, ressaltando a comparação com outros cursosde licenciatura, dizendo haver mais comprometimento dos professores .

No entanto, mesmo indicando o curso como positivo, alguns alunos indicaramaspectos que podem ser compreendidos como, por exemplo o uso excessivo de texto pelasdisciplinas.

Outros apontaram apenas aspectos negativos do curso, como no relato transcritoabaixo :

“Com carga horária deficitária – poucas aulas –, e ao mesmo tempomuito maçante (muito carga teórica). Acredito que este novo currículo(diluição da Licenciatura) dê cabo a resolver esta questão. Senti falta,também, de atividades e levantamento de questões mais práticas –sair um pouco do “mundo dos livros pedagógicos””.

Os aspectos negativos do curso mais citados foram : a condução das disciplinas,a relação entre teoria e prática e a organização curricular, como indicado na transcrição abaixo :

“ De maneira geral bom, mas algumas falhas podem ser revistas ecorrigidas. Disciplinas devem entrar antes no currículo do curso, poishá grande diferença entre os textos de assuntos da área biológicas,que passamos anos vendo ( são mais objetivos e os de humanas (geram mais discussão, vários aspectos).”

È preciso ressaltar que os ex-alunos freqüentaram o curso no modelo 3+1, jáamplamente discutido e criticado pela literatura.

Em relação ao estágio, um ex-alunos comentou.

05n 22 p-Poderíamos ter feito estágio nas escolas particulares também,comparando os alunos, pois tenho tido a oportunidade de trabalhoscom esses 2 classes sociais e as diferenças em termos de inter-

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esse, conhecimento e “saber”o que quer na vida são bem relevantes.Muitos da minha turma desistiram de ser professor, pois se assustaramcom as crianças e o desanimo dos prof. do estado .

3- APRENDIZAGENS COM O CURSO DE LICENCIATURA

As respostas indicaram uma diversidade na aprendizagem dos alunos, que foramreunidas em aprendizagens sobre :

- Analisar, interpretar e compreender (10) : Necessidade de construção de raciocíniocrítico, Ver de outro modo diversos aspectos, Entender diferentes situações , Capacidade deobservar e analisar as situações, Aprender respostas diferentes, Ser criativa, Organização,Importância da reflexão do professor

-metodologia (8) : avaliação, avaliação de material didático , prepara aulas, daraulas e discutir sobre elas, Metodologia de ensino para Ciências Biológicas e Métodos alternativosde ensino, Aumento na facilidade de comunicação e expressão

- - área de humanas (6) : Contato com área de humanas, Aquisição deconhecimentos humanos e filosóficos, Pensar sistêmico ( trama / teia de conhecimentos) , Aspectoshistóricos e filosóficos da educação e ciência, Diferentes linhas /propostas pedagógicas baseadasnas idéias dos educadores pensadores (psicologia da educação), Questões históricas

- o aluno /o outro (4) : Valorizar formas de pensamento dos outros, Considerar oaluno , Não julgar os conhecimentos prévios dos alunos, Respeitar a história de vida dos alunos

- o aprender (3) : Conteúdos de teorias da aprendizagem- legislação educacional (4) : LDB- a profissão (2) : Consciência do que é educar e do papel do professor, Valorizar o

trabalho do professor -outros : realidade escolar (2) : Conhecer a estrutura das escolas, Realidade

escolar, preparo de relatórios

Alguns ex-alunos indicaram não elementos de aprendizagem, mas sim meios oufatores que possibilitaram a aprendizagem, entre eles o estágio (8), aulas (psicologia, didática),aulas de Práticas de Ensino(4) e a diversidade de textos e autores estudados . Dois ex-alunoscitaram as experiências extra –classe , como participação em congressos, no cursinho ..

Os alunos indicaram como aspectos do curso importantes para trabalho comoprofessor : ,

-Práticas : Práticas (5), Seminários e apresentações (5), Prática de ensino (3) e-Conteúdos teóricos : conteúdos específicos de Biologia ( 6)Conteúdo teórico ex-

tenso /aprofundado das disciplinas (2), Conteúdos relacionados com cotidiano, Conteúdoindependente de cada disciplina, Disciplinas relativas á licenciatura

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Formação inicial e continuada de professores

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-.Modelo : : Observação dos professores (modelo), Aprender com professores quesentem paixão pelo que fazem , Professores como modelo

IMPORTÂNCIA DA REFLEXÃO

- Interação : Respeitar diferenças Observar o aluno como ser pensante, Facilidadede comunicação e expressão, Respeitar os alunos, Valorizar pensamento dos outros, Respeitardificuldades

-Técnicas de didática e prática de ensino-Outras experiêncas (congresso, estágios).- necessidades do professor : Ser criativa, Somente o conhecimento não faz um

bom professor, Professor deve ter capacidade de transpassar as informações, Preparar umaboa aula

4- APRENDIZAGENS COM A ATUAÇÃO PROFISSIONAL

Em relação à aprendizagem com a atuação profissional, nas respostas verificamosque alguns alunos referiram-se a atuação como estagiários (alunos do curso de licenciatura) ,indicando Estágio prático, Conteúdo teórico aprofundado, Exemplos de professores no estágio,Teorias de aprendizagem, Didática, Prática de ensino. estas respostas não foram consideradas .

Um ex- aluno considerou difícil indicar separadamente aprendizagens relacionadasà formação e à atuação e comentou :

Sinceramente não consigo separar a resposta desta pergunta dasrespostas já dadas nas perguntas 6 e 7. Toda a bagagem adquiridadurante o curso, incluindo a licenciatura, transpareceram no meutrabalho como professor de aluguma forma. Penso que o conjunto deconhecimentos adquiridos, sejam eles acadêmicos ou oriundos dasrelações sociais durante o curso, e a consciência geral que sedesenvolve é que são e foram importantes para o trabalho como pro-fessor. Na intenção e atitude para se formar crianças e jovens o queprevaleceu foi o meu entendimento e dedicação, carregados dos valorese princípios desenvolvidos durante minha formação na graduação.

Os demais ex-alunos citaram aspectos:

- metodológicos : Como proceder para que alunos assimilem conteúdo, Organizarconteúdo da aula, Como preparar uma boa aula, Selecionar melhor recurso, Motivar os alunos,Capacidade de relacionar conteúdo com cotidiano

-Aprendizagem : Alunos prendem por analogia com cotidiano-Interação : Facilidade de comunicação e expressão, Saber lidar com os alunos,

observar o aluno como ser pensante Trabalho em equipe

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- reflexão : Refletir sobre minhas ações, Importância da reflexão-auto- avaliação : Saber que você pode ser modelo para os alunos- profissão geral do professor :Papel da escola na sociedade, Papel do professor,

Inserção da escola na sociedade

OUTROS : CAPACIDADE DE ORGANIZAÇÃO

Alguns alunos ainda apresentaram comentários gerais , dos quais muitos indicarama questão da dificuldade da relação entre teoria e prática . Um aluna disser “ser feliz comoprofessora” e apenas uma indicou a compreensão de que o processo de formação inicial éapenas o inicio da formação .

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O reconhecimento do professor como profissional exige, entre outrascaracterísticas, a identificação da existência de um corpo de conhecimentos específicos(CONTRERAS, 2002) freqüentemente identificado como “saberes ou conhecimentosprofissionais”.

Esse corpo de conhecimentos pode ser compreendido como um conjunto deconcepções epistemológicas, contextualizado por um sistema concreto de práticas escolares,que refletem as concepções, percepções, experiências pessoais, crenças, atitudes, expectativase dilemas do professor, expressos nas linhas de ação docente (PACHECO E FLORES, 1999p.22).

Consideramos que os dados obtidos neste estudo possibilitam a identificação dasdiferentes dimensões no conjunto de conhecimentos do professor, a partir de autores comoSchulman (apud Alarcão, 1998), Alarcão (1998) Saviani (1996), Tardif, Lessard e Lahaye (1991),Gauthier et al. (1998) e a identificação da articulação entre os saberes construídos na formaçãoinicial e na atuação profissional .

Assim, será possível refletir sobre como evolui o professor de Ciências Biológica,com a profissão, na relação com outros intervenientes diretos do ato educativo, na relação com osaber, na relação consigo mesmo e reconhecer que ele aprende com as práticas de trabalho, nainteração com os outros, no enfrentamento de situações, na resolução de problemas, na reflexãosobre dificuldades e êxitos, avaliando e reajustando formas de ver e atuar. (CAVACO, 1995).

Compreender como o professor se produz e produz um saber profissional“unitário, coerente, articulado, explícito, original, intencional, ativo e cultivado” (SAVIANI, 1996, p.10)é o nosso desafio .

BIBLIOGRAFIA

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Este texto apresenta resultados parciais da fase inicial da pesquisa decorrente doProjeto “Literatura na escola: espaços e contextos. A realidade brasileira e portuguesa”, ora emandamento e realizada no oeste paulista brasileiro.

HISTÓRICO DA PESQUISA

Com os resultados do PISA, foi possível detectar, em nossa sociedade, umacrescente preocupação com as relações estabelecidas entre os leitores e o material escrito, emespecial, o livro de literatura. Observamos, em Portugal e no Brasil, essas mesmas preocupações,sobretudo pelo fato de que, apesar de todo o investimento em programas de fomento à leitura,por parte dos governos dos dois países, as políticas públicas de Formação de Leitores não estãoatingindo seus objetivos de formar leitores qualitativamente melhores.

A fim de analisar e reavaliar criticamente essas políticas e propor uma reflexãosobre a relação do aluno com sua língua materna e seus desdobramentos (leitura e compreensãode textos, produção de textos e reflexão sobre os conhecimentos lingüísticos), o projeto de pesquisareferido, em desenvolvimento junto ao grupo do “Centro de Estudos de Leitura e Literatura Infantile Juvenil” – CELLIJ – da Universidade Estadual Paulista, UNESP – Brasil, em conjunto com ogrupo “Literatura Infantil e Educação para a Literacia” do LIBEC – Centro de Investigação emPromoção da Literacia e do Bem-Estar da Criança, da Universidade do Minho – Portugal, visa aum estudo comparativo que busque analisar e modificar os resultados apresentados pelos alunos,nas avaliações internacionais, de acordo com as colocações conseguidas pelos dois países –Portugal ficou em 25o. lugar e o Brasil em 37o. lugar no PISA de 2003.

A matriz metodológica configura-se em três momentos distintos:1) levantamento de dados quantitativos nos dois países, por meio de uma pesquisa

etnográfica, a fim de verificar quais livros de literatura infantil-juvenil existem nas escolas, comocirculam e como estão sendo utilizados nas relações entre os agentes escolares; além disso,deverão, ainda, ser identificadas outras leituras a que as crianças e seus familiares tenham acesso;

2) realização de coleta de dados de natureza qualitativa, por meio também de umapesquisa etnográfica, para que possam ser compreendidos os valores, diferenças e semelhançasmanifestadas pelas crianças na recepção de obras literárias brasileiras e portuguesas, buscando

MEDIAÇÃO, LEITURA E LITERATURA INFANTO-JUVENIL:O PERFIL DO COORDENADOR

PEDAGÓGICO DAS ESCOLAS DO OESTE PAULISTA

GIROTTO, Cyntia Graziella Guizelim Simões (UNESP/Marília);9LIMA, Elieuza Aparecida de (FUNDEC/Dracena - UNESP/Marília)

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identificar as nuances presentes na rejeição e na adesão causadas pelas obras propostas; e3) após os dois primeiros momentos, buscaremos uma visão qualitativa e

quantitativa do trabalho proposto e realizado no interior das salas de aulas brasileiras e portuguesase dos aspectos referentes à diversidade do acervo a que os leitores têm acesso. Assim, nesteterceiro e último momento, a matriz metodológica será diferenciada, adotando-se a pesquisa-ação, que visará a propor e implantar, nas escolas selecionadas, um programa de leitura baseadono trabalho com textos literários na sala de aula e nas bibliotecas escolares. Visará ainda a formaçãodos professores, tendo como contribuintes os professores-pesquisadores da UNESP – campi dePresidente Prudente, Assis e Marília, no Estado de São Paulo –, e docentes da Universidade doMinho e de Évora, em Portugal.

Os dados levantados nos dois países terão como a pretensão definir e redefinircontinuamente a pesquisa, por meio de instrumentos tais como questionários, entrevistas eregistros efetuados e comparados, referentes ao trabalho aplicado nas duas regiões englobadaspelas Universidades. Visamos, enfim, a um ensino de língua materna que respeite toda a gama deinferências, contextos e significações inseridas em seu interior; que auxilie os “pequenos” leitoresdos dois países a descobrirem suas identidades leitoras, no final deste processo, por meio daparticipação e formação efetiva dos seus professores e demais educadores.

O grupo de pesquisa brasileiro é formado por oito docentes de departamentos efaculdades diferentes da UNESP. Esse grupo analisa as diferentes situações de trabalho comliteratura e leitura presentes no cotidiano escolar, refletindo as relações estabelecidas entre oensino da língua e a apropriação desta por parte dos alunos. Volta-se, ainda, para a produçãoinfantil e juvenil literária publicada no Brasil, atualmente. Por meio destas análises, foi possívelestabelecer relações entre o lugar do livro na escola e, em decorrência, os modos de ler e deproduzir textos nas instituições escolares. Nesse sentido, os docentes se empenharam, nos últimosanos, em analisar os materiais de leitura oferecidos pelo MEC, como o Programa NacionalBiblioteca na Escola (PNBE) e os Kits Literatura em Minha Casa – livros infantis distribuídos àsescolas públicas brasileiras pelo governo federal. Após a análise, foram oferecidos cursos deformação continuada para docentes do Ensino Fundamental, com uma síntese de estudos eorientações sobre o ensino da leitura, produção de textos e uso do texto literário, na escola.

Em Portugal, o grupo de investigação tem em mãos, dentre outros, o projeto“Educação Literária e Literacia”, e vem examinando criticamente as formas como a escola gere arelação do aluno com a sua língua materna. Para tal, analisa o papel que os documentos eorientações curriculares oficiais concedem à língua e à literatura, no contexto do Ensino,identificando, nos parâmetros de formação de docentes para o Ensino Básico, as contribuiçõespara uma percepção da língua na sua pluralidade de funções e contextos. Além disso, reconhece,caracteriza e analisa as concepções dos docentes acerca da língua e da literatura. Tem, ainda,identificado e caracterizado os modos como os manuais escolares de Língua Portuguesa para oEnsino Básico asseguram a promoção de uma sensibilização ao conhecimento da língua, emtoda a sua riqueza semiótica, propondo recomendações que permitam garantir uma aprendizagem

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da língua, na sua pluralidade de funções e contextos.Compreendemos que a leitura do texto literário, associada a ações didáticas

diversificadas, pode proporcionar um ensino de leitura significativo, por sugerir o uso de diversostipos de textos literários e modos de estimular o ato de ler. Considerando que as avaliações sobreleitura têm-se utilizado de diversos tipos de textos: literários (novelas, crônicas, poesia, obra teatraletc.); jornalísticos (notícia, artigos de opinião, entrevistas etc.); instrucionais (receita, instrutivoetc.); epistolares (cartas em geral); publicitários (cartazes, avisos, propagandas, dentre outros);que a literatura está pouco presente no trabalho com leitura desenvolvido nas escolas; que o usoexclusivo e constante do livro didático limita a criança ao contato com esse tipo de material deleitura; que as instituições de ensino adotam manuais didáticos, em detrimento do texto literário, eque os docentes do Ensino Fundamental declaram-se inseguros e mal formados para o trabalhocom os textos literários diversos, esta pesquisa elege como objetivo principal estudar a contribuiçãoque podem oferecer as literaturas infantil e juvenil, para a efetiva formação do leitor em suasrelações com o aprendizado da língua portuguesa, abrangendo aspectos ligados à produção detextos e à reflexão sobre conhecimentos lingüísticos. Para tanto, delimita o campo de atuação aescolas de duas regiões de Portugal e da região Oeste do Estado de São Paulo, no Brasil.

Além desse objetivo geral, apresentamos como objetivos específicos da primeirafase da pesquisa:

1. Verificar, nas escolas estaduais e municipais de 1a a 6a séries dos municípiosde Presidente Prudente, Assis, Marília, Évora e Braga, a presença da literatura infantil e juvenil;

2. Averiguar quais livros de literatura infantil e juvenil existem nessas escolas,como são organizados, como circulam e como são utilizados por professores, alunos ebibliotecários;

3. Identificar outras leituras a que as crianças e seus familiares tenham acesso,para além do universo escolar;

4. Analisar como os professores promovem a aproximação entre o aluno e aliteratura, e que representações pais, alunos e educadores constroem a respeito do livro de literaturainfantil e juvenil; e

5. Comparar as duas realidades, brasileira e portuguesa, tentando verificar seo trabalho da fase II (intervenção com alunos e professores) amenizará as dificuldades de leiturae escrita.

O primeiro eixo teve como objetivo produzir dados quantitativos, predominantemente,permitindo o registro dos dados em gráficos, tabelas e outros instrumentos semelhantes. Paraisso, foram organizados formulários com questões próprias para a produção de informaçõesquantitativas que alimentaram o software estatístico Statistical Package for the Social Sciences(SPSS), coletando e analisando dados de forma similar. Assim, na primeira fase, buscamos acoleta de dados quantitativos relativos à presença da literatura nas escolas. Essa recolha foi

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realizada em escolas do 1º e 2º ciclos do Ensino Fundamental, no Brasil, devendo ser futuramenterealizada em Portugal. A pesquisa abarcou da 1ª à 6ª série, identificando, por exemplo, a presençaou ausência de bibliotecas escolares e quantificando e classificando os livros existentes. Após averificação da presença da literatura, nas escolas, a meta foi, mediante a aplicação de umquestionário junto aos professores e coordenadores das escolas selecionadas, observar como otrabalho com a literatura é realizado nas escolas e de que maneira a formação inicial dessesprofessores interfere na sua prática pedagógica. E, ainda, examinar como crianças de 3ª a 6ªsérie se relacionam com os livros, com as disciplinas que ensinam leitura e com o espaço dabiblioteca escolar. De posse desses resultados, a idéia foi analisar se tais práticas relativamenteà literatura podem ou não estar associadas aos maus resultados no PISA.

Em Presidente Prudente, o trabalho envolveu um total de 53 (cinqüenta etrês) escolas, sendo 21 (vinte e uma) instituições municipais e 24 (vinte e quatro) estaduais. EmAssis, o grupo de aplicadores visitou um total de 29 (vinte e nove): todas as escolas estaduaisreceberam os alunos, compondo 12 (doze) estabelecimentos; entre as municipais, apenas duasnão fizeram parte da avaliação. Numa delas, houve resistência da direção, dificultando asentrevistas; noutra, havia apenas uma turma de alunos na faixa escolar sob a abrangência dapesquisa, pois se tratava de estabelecimento iniciante em termos de Ensino Fundamental (3ªsérie em diante). Assim, para o conjunto da pesquisa, foram computados os dados relativos a 27(vinte e sete) escolas, no pólo de Assis. Em Marília, pesquisamos 18 escolas municipais e 19instituições estaduais, perfazendo um total de 37 escolas. Neste sentido, 117 (cento e dezessete)escolas receberam nossos alunos/pesquisadores, 901 professores responderam ao questionário,sendo 343 de Presidente Prudente, 94 de Assis e 464 de Marília. Os coordenadores pedagógicosdessas instituições de ensino também foram ouvidos: 53 coordenadores de Presidente Prudente,24 de Assis e 37 de Marília. Também conversamos com 109 sujeitos responsáveis pelas bibliotecasescolares e cerca de 5.800 alunos de 3ª a 6ª série de escolarização. Os dados coletados atravésdesses instrumentos são analisados ao longo do documento1.

Dado o grande volume de dados coletados e categorizados em três partes– professores e coordenadores pedagógicos; biblioteca e as concepções de seu responsável; e operfil de alunos de 3ª a 6ª séries das escolas pesquisadas, o texto ora apresentado focalizaresultados parciais da pesquisa, enfocando a figura do coordenador como agente promotor ounão da leitura e da literatura no espaço das escolas pesquisadas.

1. O PERFIL DO COORDENADOR PEDAGÓGICO DAS ESCOLAS DO OESTEPAULISTA

As questões articuladas em torno do tema “prática pedagógica” contempladas poresta pesquisa, consideraram a existência de práticas e modos de ensino da leitura via escola.Existem muitas problemáticas a serem enfrentadas para que o ensino da leitura (e o ensino daliteratura) na escola se efetive e sejam formados leitores críticos e autônomos, como tão

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amplamente difundido em diversos discursos. Para este texto, elegemos a subcategoria de análise“Atividades de literatura infantil e Juvenil”.

Antes de discutirmos as atividades de literatura infantil e juvenil, faz-se necessárioapontar que a instituição escolar tem, em sua essência, uma atitude didático-pedagógica, aoinserir quaisquer conteúdos dentro de uma perspectiva que atenda aos seus próprios anseios. Aleitura e a literatura, uma vez no âmbito escolar, também estão à mercê dessa perspectivapedagógica. Todavia, é relevante esclarecer que o enfoque pedagógico deve aplicar-se apenas aprocedimentos indicados para o desenvolvimento da leitura e da literatura na escola e não, comogeralmente acontece, de se buscar uma obra literária e pedagogizá-la, com o intuito de ensinar acriança certas estratégias e preceitos.

Para que a escola possa cumprir uma das suas funções fundamentais comoformadora de leitores, necessita de estruturas física e humana adequadas. Para que haja umprojeto com diretrizes claras acerca da aprendizagem e do desenvolvimento da leitura e da literaturana unidade escolar, é preciso prioritariamente: (1) que o corpo docente esteja minimamentefundamentado e seja freqüentemente realimentado com estudos sobre leitura e a literatura, daí opapel fundamental do coordenador pedagógico como o parceiro interlocutor do trabalho pedagógicocom a leitura e a literatura, criando a ambientação necessária e elos mediadores essenciais paraque os docentes possam, nessa parceria, formularem ações didáticas voltadas à formação dacompetência leitora e à necessidade e gosto pela leitura e literatura; e (2) que a escola possuauma biblioteca com um acervo mínimo, para que o projeto possa se desenvolver e para que acriança possa manuseá-lo e explorá-lo em suas máximas possibilidades, estimulando-se, assim,o contato da criança com obras literárias, sem a didatização ou a transformação do que foi lidoem fichas, perguntas ou outras atividades inibidoras da espontaneidade e do aspecto prazerosoque a literatura pode proporcionar2.

No entanto, não basta apenas contar com biblioteca e acervo adequados, se ocorpo docente da unidade escolar não se envolve adequadamente com o projeto de promoção daleitura. Se o professor não possuir conhecimento e fundamentação suficientes para o discernimentodo que seja leitura e sua aprendizagem, por meio da vivência e da utilização da diversidade dosgêneros do discurso em situações comunicativas reais e, ainda, do que seja a especificidade dogênero literário e como ele se incorpora na vida das crianças, dificilmente a leitura e a literaturaterá sucesso na escola e, por conseqüência, na vida das crianças.

Dada a importância da figura do coordenador, nesse processo, como alguém quepode não apenas “lutar” por espaços efetivos em que possam ocorrer mediações de leitura, coma criação e manutenção de áreas objetivamente destinadas à leitura da criança – leitor em formação– na escola, mas como aquele que também busca meios de contribuir para a formação continuadados mediadores3 da leitura, no caso os professores, a pesquisa procurou contemplar a buscapela compreensão da natureza da orientação do trabalho com o ensino da leitura na escola,realizada pelos coordenadores, como contribuidora na qualitativa ação desses mediadores,lembrando que ler é um direito que toda criança deve ter assegurado, uma vez que a leitura,

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principalmente a literária, contribui para o desenvolvimento e o crescimento intelectual, conformenos explicita Bamberger (1987, p.9): “o direito de ler significa igualmente o de desenvolver aspotencialidades intelectuais e espirituais, o de aprender e progredir”.

1.1 ATIVIDADES DE LITERATURA INFANTIL E JUVENIL

A chamada leitura literária, para ser realizada com prazer, exige um conjunto defatores que pode variar desde a forma de organização do espaço em que se lê e do acervo(impresso ou eletrônico) que está à disposição do leitor, à postura dos profissionais que fazem amediação por meio de produtos e atividades culturais. Essa categoria de análise tem a preocupaçãode verificar, aos olhos dos coordenadores, se as atividades de literatura infantil e juvenil têm ocorridono espaço escolar e como tem se efetivado tais orientações.

Muito embora a maioria dos coordenadores (86,8%) assuma orientar projetoscom a literatura infantil e juvenil, com freqüência semanal (50%), parece não haver distinção entrea orientação do trabalho com a leitura daquela voltada aos trabalhos destinados à literatura infantile juvenil, especificamente quanto à ambigüidade de assinalarem mais propriamente a finalidade,período de realização, do que sobre “como”, a forma como se estabelece a orientação.

No entanto, dentre tantas respostas, há aquelas com indicativos, ainda que poucoprecisos, sobre a natureza da orientação, em que listam, por exemplo, a relevância de o professorprivilegiar em suas ações: organização de espaços, momentos e técnicas de contar histórias(leitura compartilhada, cantinho da leitura, roda de leitura, hora do conto, hora da novela, leituralivre), estímulo à leitura e produção de textos, realizar aulas de leitura com atividades decorrentes(fichas, resumos, gramática, reescrita), leitura para despertar a curiosidade dos alunos, sugerirlivros interessantes, promover o gosto pela leitura, idas à biblioteca.

Sem dúvida, a literatura é um dos componentes fundamentais no processode desenvolvimento infantil, pois proporciona à criança o desenvolvimento de sua competêncialeitora, possibilidades para resolver seus conflitos internos, além de estimular sua imaginação,contribuindo para que o lúdico esteja presente em sua vida. Segundo Bortolin (2006), o que permeiatoda a trajetória do leitor ou de sua formação é o elemento lúdico, o prazer que a leitura como umtodo vai lhe proporcionar, ou seja, desde o contato tátil com o livro, com sua ilustração, até o textoescrito propriamente dito. Daí a importância de como efetivamente tem se dado esse trabalho, naescola.

Os exemplos, a seguir, apresentam aquelas respostas, pouco precisas, quetambém nos alertam para a necessidade de formação do próprio coordenador para a orientação,junto aos professores, do ensino da leitura e da literatura infantil e juvenil: “através de projetos”(sujeito 219, escola 120), “conscientizando o professor e orientando” (sujeito 33, escola 42),“Mensalmente avaliamos os projetos da escola” (sujeito 20, escola 3), “através de capacitações”(sujeito 17, escola 10), “com incentivo e apoio aos professores” (sujeito 44, escola 16),“apresentando material didático pedagógico” (sujeito 50, escola 8), “esse trabalho é organizado

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de acordo com o grupo de professores” (sujeito 213, escola 129), “estimulando e envolvendo atodos para que sejam verdadeiros comunicadores” (sujeito 130, escola 100), “apenas quandosurge no HTPC e discutimos e trocamos experiências” (sujeito 39, escola 36).

Ainda sobre a metodologia de trabalho, uma resposta chama a atenção: “Procurotrabalhar com o grupo de professores uma fundamentação teórica sobre a importância da culturaleitora, estimulada através da partilha de práticas bem sucedidas e sugestões práticas deatividades.” (sujeito 123, escola 59). Há aqui uma preocupação em, inicialmente, formarteoricamente os docentes, para depois colocá-los frente à prática.

Dada a pouca precisão no conjunto das respostas, não é de se estranhar, portanto,que os coordenadores não saibam precisar a fundamentação científica em que baseiam asprováveis orientações. Ao serem indagados “Em quais livros teóricos você se baseia para estasorientações? Nomear”, 25% das respostas ficou em branco, as demais se dividiram em: troca deexperiências, orientações e capacitações; PCN, Módulo Letra e Vida, Tecendo Leituras, LivrosPedagógicos. Ao tentar nomear, aparecem, na maior parte, não os nomes dos livros, mas osnomes de alguns autores da academia representantes de áreas de conhecimento e nem semprerelacionadas à leitura e/ou literatura infantil: Piaget, Vigotsky, Paulo Freire, Perrenoud, Lener, Rojo,Smith, Jolibert, Soares, Manguel, Martins, Ferreiro, Coelho, Solé. Revistas também foramnomeadas, como: Pátio, Revista do Professor e Nova Escola. E outros autores da mídia, comoRoberto Shiniashiky, Augusto Cury.

Tais respostas são preocupantes, na medida em que não ter respaldo teóricoespecífico sobre o ensino da leitura e da literatura traz implicações pedagógicas para a formaçãodo leitor e do gosto pela leitura. Nesse sentido, como uma das decorrências, podemos afirmarque ter referência sobre a obra a ser indicada aos professores ou selecionada para a biblioteca daescola requer do coordenador o conhecimento do caráter polissêmico da linguagem simbólica,enfim, do aspecto artístico de que se compõe a obra literária. Caso contrário, por exemplo, tantoo coordenador em sua orientação ao professor, quanto este, por sua vez, na mediação com oaluno, poderão não saber discernir entre a obra de cunho estético daquela de teor pedagógico,cuja função distorce a coerência interna da obra ou ainda não apresenta elementos que possibilitemao leitor contato com dilemas que podem ajudá-lo a resolver os seus próprios.

Quanto às questões “Na sua opinião, qual o perfil dos professores queaderem a estes projetos? e “Qual seria o perfil dos professores que resistem a este tipo de projeto?”,de modo geral, os coordenadores definem os professores que organizam, participam edesenvolvem projetos de leitura, com um perfil de leitores; dinâmicos, inovadores, e da área deHumanas; interessados em cultura e participantes de formação continuada.

As respostas dos coordenadores das três cidades pesquisadas indicaram umnúcleo referencial em torno do qual puderam ser registradas algumas manifestações. Esse núcleocentra-se na característica básica constituinte do perfil do professor que elabora ou participa deprojetos com leitura na escola: trata-se do que consideram como o professor leitor. A ocorrênciadessa categoria a torna nuclear, porque as respostas mais freqüentes apontam o professor, que

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demonstra ser leitor pelos seus atos, como o que mais entusiasticamente elabora ou participados projetos nessa área. Ao redor dessa característica nuclear, manifestam-se as demais que aela se vinculam e compõem um quadro mais bem configurado: são professores dinâmicos einovadores; possuem boa formação acadêmica e cultural em Ciências Humanas; elescompreendem a leitura como ferramenta inalienável para a formação humana; e por todas essascaracterísticas, participam de encontros de formação continuada, com o objetivo de inovar,dinamizar e experimentar atividades para construção de suas aulas.

Ao caracterizar como leitor o professor participante de projetos de leitura, oscoordenadores se utilizam de uma expressão que caiu no gosto da mídia, embora tenha sidoproduzida pelos meios acadêmicos, não só no Brasil, mas no mundo ocidental. Trata-se daexpressão “hábito de ler”, já citada anteriormente. Empregada com suas variações, hábito deleitura e criação do hábito de leitura, trouxe com ela a idéia de que todas as crianças e todosprofessores sabem ler, isto é, sabem ler todos os gêneros do discurso, mas, pela ausência de umprograma sistemático e eficiente, não criariam o hábito, nem o gosto, e não os criando, desdecriança, não se tornariam leitores. Essa premissa produz uma indagação: a leitura seria um hábitoou uma competência a ser desenvolvida pela escola, em situações convincentes de aprendizagem?Ou ainda: os escolares sabem ler e o que lhes falta seria apenas o hábito, ou apenas porque nãotem o hábito não são leitores? São questões provocadas pelas próprias respostas doscoordenadores.

Esse perfil parece não ser tão comum entre professores por várias razões, entreas quais se destaca o limitado poder aquisitivo e a própria restrição do tempo, absorvido pelastarefas inerentes as suas funções. A afirmação do coordenador 218, da escola 115, traz em simesma uma singularidade: “acredito que quem tem o hábito de ler transmite naturalmente anecessidade da leitura”. A singularidade se situa na representação de que faz do professor leitorcomo aquele que, por ter o hábito, não o transmite, mas cria a necessidade de ler. São duasatividades intelectuais distintas: uma seria o hábito, existente no adulto mediador; a outra seria anecessidade em processo de recepção pela criança, aluno de escolas. O singular parece situar-se na existência de uma ação que, ao ser transmitida, seria transformada pela ação do sujeitoreceptor em outra: a da necessidade. Sem ter consciência de sua afirmação, esse coordenadorproduz uma indagação: o professor pode incutir hábito ou criar necessidade?

E qual seria o perfil dos professores resistentes a esse tipo de projeto de leitura? Asrespostas a tal questão trouxeram várias características de professores, ora de natureza pessoal,ora relacionadas à sua formação. Os adjetivos empregados para as primeiras revelam professoresapáticos, acomodados, parados no tempo, ou, em outra perspectiva, auto-suficientes eindividualistas. Em relação à formação, apontam que são malformados, tradicionais, fechados,conteudistas, não-leitores.

Além dessas características, listam outras, tais como as de não gostar de ler, nãosentir prazer, nem gosto, nem ter o hábito de ler e a de utilizar somente o livro didático; são os deidade mais avançada; não têm compromisso com os alunos e com a educação; trabalham em

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várias escolas, e são, geralmente, da área das exatas. Algumas poucas respostas indicam nãohaver nenhuma resistência, todavia é preciso considerar que alguns coordenadores evitam qualqueranálise crítica, como é o caso do sujeito 11, da escola 12, ao afirmar: “não tenho esse professor.Todos aderiram ao Projeto Leitura, consenso do grupo e é o objetivo prioritário para o avanço doaluno no processo ensino aprendizagem”.

A visão do coordenador é a da leitura como instrumento para a própria escolarização,para a própria formação do homem. Em algumas respostas, o coordenador não consegue avaliaros professores, como o sujeito 12, da escola 34, que declara não conseguir “enxergar, sãomuralhas”. Outros, como o coordenador 122, da escola 72, fazem análises mais aprofundadas,ao dizer que “são professores, de uma certa forma, que não buscam inovações em seu ensino,não internalizam a real necessidade da leitura, estando presos a concepções antigas que nãofavorecem a este tipo de trabalho e que muitas vezes ficam centrados apenas nos livros didáticos”.

Essas observações sintetizam o universo das respostas, porque traçam o perfil doprofessor que não participa de ações que não as consideradas rotineiras por ele próprio.

Para finalizar este texto, devemos reiterar que, como Monteiro Lobato, acreditamosque é fundamental estreitar a convivência do leitor com o livro, pois ele é “[...] sobremesa: tem queser posto debaixo do nariz do freguês, para provocar-lhe a gulodice” (AZEVEDO et al., 1997,p.131). Em relação à criança, isto nos parece mais importante ainda, pois cabe aos mediadoresda leitura, dentre eles, os que aqui são sujeitos de nossa pesquisa: professores, bibliotecários ecoordenadores – indiretamente em suas orientações – provocar, desde a mais tenra idade, anecessidade4 e o gosto pela leitura. Almejamos que a criança brasileira possa encontrar espaçose mediadores que possam ajudá-la a ampliar a sua curiosidade e a “mitigar a sede” de leitura daliteratura; que a leitura e a literatura possam fazer parte da vida das crianças.

Entretanto, é necessário que as escolas e as bibliotecas busquem agregar pessoascomprometidas com a leitura e tenham como objetivo principal levar a criança, sem distinção oupreconceito, ao universo da leitura. E ainda que cada criança possa ver na leitura mais um brinquedodentre os tantos existentes, como o Menino Maluquinho, de Ziraldo, que, em seu cotidiano, tem aleitura e o fazer versos como atividades tão “naturais”, “corriqueiras” como jogar futebol ou construiruma pipa.

Por fim, lembramos que o engajamento em defesa da leitura tornou-se, também,uma tarefa emergencial, pois, na atualidade, carecemos de espaços dedicados à infância, nosquais possamos contribuir para a formação de leitores, respeitando o seu imaginário e ludicidade.Nesse sentido, acreditamos que seja fundamental um posicionamento mais decisivo por partedos mediadores de leitura, dos quais aqui falamos, de maneira geral e breve, mediante atitudes eações de resistência à “desmontagem da infância”, por intermédio do fazer pedagógico conscientee intencional.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AZEVEDO, C. L. de; CAMARGOS, M.; SACCHETTA, V. Monteiro Lobato: furacão na Botocúndia.São Paulo: SENAC, 1997.

BAMBERGER, R. Como incentivar o hábito da leitura. São Paulo: Ática/Unesco,(1975),1987.BORTOLIN, Sueli. A mediação de leitura nos espaços infanto-juvenis. In: BARROS, MariaHelena Toledo de.(et al) Leitura: mediação e mediador. SP Ed.FA, 2006.p.65-75.

DAVIDOV, V.V. The influence of L.S. Vygotsky on Education, Theory, Research and Practice. In:Educational Researcher, v.24, n°.3, abril 1988.

DUARTE, N. A individualidade para-si: Contribuição a uma teoria histórico social da formação doindivíduo. Campinas, SP: Editora Autores Associados,1993.

LEONTIEV, A. N. A demarche histórica no desenvolvimento do psiquismo. In: ¾¾¾. Odesenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1978.

TALÍZINA, N. Psicologia de la Enseñanza. Moscou: Progresso, 1988.

NOTAS

1 Serão realizados três seminários (um para cada cidade em que foi feita a pesquisa), nas escolas, a fim de apresentar osresultados da investigação a diretores e coordenadores.2 O livro constitui-se em uma, dentre outras tantas objetivações humanas — entendidas como criações ou transformaçõeshistórico-socialmente produzidas — que, ao ser apropriado pela criança, traz consigo elementos constitutivos de todo o processohistórico formador do autor, da obra enquanto tal e do próprio leitor. Lendo, a criança entra em contato com esse objeto que é frutode todo um contexto e que fará parte da formação de sua consciência como homem. “É na relação entre sua vida e a história socialhumana (cujos produtos materiais e mentais constituem o mundo no qual transcorrerá essa vida) que cada ser humano constitui suaindividualidade” (Duarte,1993) O livro é, nessa perspectiva, uma objetivação humana que medeia o diálogo da criança com o autor,constituindo seu discurso interior, seu pensamento.3 A palavra mediador deriva do latim “mediatore” e significa aquele que medeia ou intervém. Em se tratando da leitura, segundoBortolin (2006), podemos considerar que o mediador do ato de ler é o indivíduo que aproxima o leitor do texto. Em outras palavras,o mediador é o parceiro mais experiente dessa relação, que pode ser exercida por diferentes indivíduos, independentemente dosexo, da idade e da classe social, em diferentes espaços e em diferentes situações e com diferentes gêneros discursivos.4 A crítica é de que a escola, desde o início, tem feito do livro um meio, um objeto de motivação para aprendizagens consideradas deimportância superior. A leitura feita e indicada no sentido utilitário, deixa de ser uma atividade cujo objetivo coincide com o próprio atodo ler para se tornar uma ação cujo objetivo não está no texto, mas em outras atividades (tais como o aprendizado de conceitos,moralização, exemplificação de comportamentos). Vale ressaltar a discussão feita por Leontiev e outros estudiosos da teoriahistórico-cultural sobre a importância de a criança ter consciência dos motivos pelos quais age e de interessar-se pelos objetivosdas atividades que realiza. Assim, denominamos atividade o fazer do sujeito que envolve o conhecimento, no plano mental, acercado resultado a ser atingido, em resposta à satisfação de uma necessidade ou interesse desse indivíduo (DAVÍDOV, 1988;LEONTIEV, 1988; TALÍZINA, 1988). Esse conhecimento é essencial para o trabalho pedagógico quando entendemos que o sujeitoque aprende deve estar envolvido no processo educativo de forma ativa, quer seja quando, nos projetos de trabalho, particularmentena Hora do Conto, a criança participa das decisões do que e como fará alguma atividade, quer seja quando ela sabe o porquê e opara quê realizará determinadas ações.

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1.INTRODUÇÃO

As novas exigências econômicas, políticas e sociais, ocasionaram em mudançasnas estruturas educacionais. A partir disso, a nova escola pública, deveria incorporar um papelsocializador, isto é, assumir as novas características organizacionais e pedagógicas perante aatual clientela oriundas do processo de desenvolvimento econômico, cientifico e tecnológico, comoapontam Giorgi e Leite (2004).

Temos então, um professor inserido em uma nova realidade cujo sua função, asvezes indefinida, perde-se na dimensão das coisas novas, na utilização das coisas velhas e naperspectiva de um futuro educacional melhor a partir da prática docente.

Esta pesquisa é continuação do projeto de pesquisa desenvolvido por Viviane CristinaFernandes, “A formação inicial de professores e a realidade da sala de aula: o curso de pedagogiada FCT/UNESP de Presidente Prudente”, que teve como objetivo realizar um aprofundamentoteórico a respeito da formação de professores, tendo como priori a questão da articulação entre aformação inicial e a prática na sala de aula, e verificar porque não há articulação entre teoria eprática no processo de formação oferecido por este curso de Pedagogia.

A partir da realização do aprofundamento teórico sobre formação de professores, esobre a questão da articulação da teoria e da prática (estágio), a aluna também realizou umapesquisa empírica junto aos alunos e aos professores do curso de pedagogia, buscando averiguaros motivos que facilitam ou dificultam a existência da articulação entre formação inicial dosprofessores e realidade da sala de aula.

Compreendendo a importância de se entender o processo formativo do professor,não somente no aspecto de sua formação inicial, continuamos o aprofundamento teórico sobre aformação de professores na perspectiva de analisar os saberes necessários á docência e odesenvolvimento profissional do professor.

Para isto, esta atual pesquisa complementa o estudo sobre a formação do profes-sor, porém agora abrangendo a questão de sua formação continua em serviço e não somente suaformação inicial.

Partindo do pressuposto de que os cursos de formação de professores devemlhes assegurar condições necessárias para que os docentes superem os modelos de racionalidadetécnica, proporcionando assim, uma base reflexiva em sua formação, como afirma Contreras

O CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃODE PRESIDENTE PRUDENTE: ESPAÇOPARA FORMAÇÃO DE PROFESSORES?

TINTI, Marcela Corrêa; LEITE, Yoshie Ussami Ferrari (FCT/UNESP)

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(2002), Pimenta (2002), Libâneo (2002), Ghedin (2002) e Giroux (1997), consideramos importanteverificar como os professores percebem seu processo formativo e desenvolvimento profissionalatravés de seu pertencimento a um ambiente de poder político como o Conselho Municipal deEducação de Presidente Prudente (COMED).

Buscamos, portanto, investigar qual o reflexo do COMED na formação do profes-sor; como a sua participação nesse colegiado interfere na construção e reconstrução dos saberesda docência e no desenvolvimento profissional do professor.

Quando concretizamos uma ação, que faça menção tanto aos direitos quantosaos deveres estabelecidos por legislação regular para o cidadão, estamos atuando como serespolíticos em sua prática profissional e social. A partir disso, podemos considerar também que esteprofessor reflexivo em sua prática docente em sala de aula tem o estabelecimento de uma relaçãohumana e profissional diretamente ligada ao aluno, e isto nada mais é do que a realização de suaação política perante sua realidade de trabalho.

Esta ação política direta é o ato de pertencer a uma sociedade, contribuindo eexercendo funções especificas que a auxiliem em seu desenvolvimento de forma significativa, ouseja, qualquer cidadão exerce um “poder político”. Porém é através da participação em órgãosnormativos, como os Conselhos, que a população pode desempenhar seu poder políticoconjuntamente com o poder político administrativo, já que os conselhos são órgãos formados porintegrantes da sociedade que defendem interesses populares.

O Conselho pode ser um órgão “revolucionário”, ou simplesmente, um órgãopassivo, com baixa representatividade e manifestação. Porém independente de como se apresente,é importante destacar que os Conselhos são, acima de tudo, um ganho democrático de poderpopular e político.

Esta pesquisa trata não somente da formação do professor e funções, mas tambémdas relações que podem ser estabelecidas entre o Conselho e os docentes, isto é, como o fato deser conselheiro pode mudar ou não o saber do professor.

Esta possibilidade de pertencer a órgãos colegiados proporciona ao professordesenvolver sua prática política, que até então era desenvolvida com ações diretas inseridas nocontexto de sala de aula, ou seja, a participação efetiva dos professores a Conselhos Municipaisde Educação, possibilita o acesso a um novo contexto e a novas estruturas e práticas, provocandoo anseio por novos saberes?

Pretendemos através desta pesquisa compreender como a participação do docenteno Conselho Municipal de Educação do Município de Presidente Prudente, pode contribuir em suaformação e atuação profissional.

Temos portanto como objetivos:- Realizar aprofundamento teórico sobre a formação de professores, os

saberes da docência e o desenvolvimento profissional docente;- Realizar uma síntese teórica sobre histórico dos Conselhos Municipais de

Educação e sua organização atual;

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- Analisar o Conselho Municipal de Educação de Presidente Prudente, suaconstituição e funções.

- Identificar reflexos do COMED na formação do professor: como aparticipação dos docentes nesse colegiado interfere na construção e reconstrução dos saberesda docência e em seu desenvolvimento profissional.

Está pesquisa insere-se em uma abordagem qualitativa, já que se baseia nacompreensão de elementos sociais, culturais, crenças e concepções dos sujeitos investigados ena interpretação que os mesmos aplicam a um determinado fenômeno.

Dessa forma, para desenvolvimento desse projeto de pesquisa realizei em umprimeiro momento, leitura e fichamento de textos que tratam da formação de professores, ossaberes da docência e o seu desenvolvimento profissional.

Em seguida, foi realizado um aprofundamento teórico sobre os Conselhos, suahistoricidade e organização atual, buscando assim entender sua funcionalidade e papeldesempenhado na sociedade.

Realizei também leitura e fichamento da Lei que defere a criação do ConselhoMunicipal de Educação em Presidente Prudente e de seu Regimento Interno para melhorcompreensão deste órgão colegiado em especifico. Além disso, achei necessário realizar leiturae fichamento de textos de âmbito legal, que amparam o direito à educação, a formação do profes-sor e mais especificamente a criação dos Conselhos.

Para compreendermos a participação dos professores no COMED e seusrespectivos reflexos, utilizaremos de um levantamento empírico de dados, através da aplicaçãode entrevistas junto a dez membro do COMED, sendo dois de cada gestão.

A FORMAÇÃO DE PROFESSORES E AS NOVAS EXIGÊNCIAS SOCIAIS: ALGUNSAPONTAMENTOS.

O sentido e o papel do professor em nossa sociedade têm apresentadomodificações relativas, já que a escola atual apresenta novas clientelas e novas necessidades.Estas modificações são parâmetros fundamentais para se entender a função docente, compreenderseus objetivos, interesses e prática educacional.

Os diversos avanços nos diferentes setores que compõem a sociedade, como osetor de comunicação, tecnologia, comunidades virtuais, campo e perspectivas de trabalho,interferem diretamente na Instituição Escolar, trazendo novos desafios sobre a ação “ensinar”, oque podem ou não descaracterizar a conquista da corporação escola. Partindo dessas premissas,percebemos que o professor não é o único que precisa rever suas funções e práticas para enfrentaros novos desafios contemporâneos.

Um dos fatores que marcam a nova fase da Escola Pública é a expansão quantitativade vagas. Essa expansão possibilita o acesso das classes trabalhadoras a Instituições Púbicasde Ensino, tornando o direito à educação não mais um direito restrito, mas um direito de todo e

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qualquer cidadão independente de sua situação econômica, cultural e financeira. Portanto, podemosconsiderar esta expansão como um dos ganhos democráticos populacionais de grande valia, jáque amplia sua abrangência e possibilidade do poder “conhecer” a qualquer individuo que queirabuscar esse conhecimento.

Leite e Di Giorgi (2004) apontam que essa medida de ampliação de vagas é ser umganho educacional, mas que não veio acompanhada de ações que garantissem a melhoriaqualitativa do ensino, sendo que quase todas as Escolas ainda mantêm uma estruturaorganizacional tradicional, conservadora, pautada em princípios burocratizantes, que dificultam aadoção de novas práticas pedagógicas pelos professores. Os autores apontam ainda que, aEscola com a sua organização e a sua cultura burocratizadora e centralizadora, condiciona aprática dos professores, impossibilitando que se manifestem como sujeitos e profissionais.

Podemos compreender que a atual sociedade nos trouxe uma Escola, com novasnecessidades, ou seja, as mudanças da Instituição Escolar aconteceram a partir das necessidadesda sociedade. O suporte que embasava uma escola tradicional e que cuidava de uma pequenacamada da população continua presente até hoje, embora agora receba uma população bastantediferente, com necessidades diferentes e com uma realidade diferenciada.

Os conflitos entre a Escola, o docente e a sociedade, acontecem porque os agentessociais, Escola e docentes, não respondem às necessidades sociedade, transformando asmudanças e exigências da instituição escolar em um “órgão impulsionador” nas mudanças doprocesso formativo do professor e na estruturação da escola. Ou seja, assim como a escola, oprofessor está estruturado de maneira que não correspondem as necessidades sociais. Asmudanças ocorreram também para eles dificultando sua prática em sala de aula, já que estavamformados para outras situações, outras demandas. O docente não reconhece a população queatende, por esperar pelos estigmas que caracterizavam os alunos de antigamente, querendoreconhecer as características de uma classe fundamentada em outros conceitos, nesta novaclientela atendida, ocasionando assim, sua “eliminação” quando não reconhecida.

Entre outras características que incapacitam o professor para o sucesso noatendimento da população, Leite e Di Giorgi (2004) apontam a forma com que a falta de recursose condições estruturais do sistema educacional são atribuídas, geralmente, exclusivamente aosprofessores. O docente, portanto, fica responsabilizado pelo não “progresso” dos envolvidos naEscola.

A formação dos professores, a preparação formativa para o mercado de trabalho, éfator importante, e que nem sempre capacita realmente os docentes para a função docente.

O problema da formação de professores, quando se fala de reformaseducacionais tem o papel de mordomo, nas histórias de detetive semprese acaba encontrando esse culpado por suas dificuldades ouinsucesso. Quando ela não dá certo ou fica emperrada, atribui-se aosprofessores essa situação. Essa postura é internacional e no Brasilnão se foge a essa norma. (KRASILCHIK, 2001 p. 27 apud LEITE e DIGIORGI, 2004, p. 138).

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O primeiro elemento trata às relações entre os sistemas de formação e o mercadode trabalho, e o segundo elemento a formação e o desempenho profissional. Estes elementosainda encontrados nos projetos dos cursos de formação de professores conservam a percepçãode uma formação adequada para responder de modo relativamente estável as necessidades docampo de trabalho e da ocorrência da transferência praticamente automática de obtençõesrealizadas durante o processo de formação, para o mercado profissional.

Outro fator importante citado por Pimenta (2002, p.133) que contribui para a formaçãodocente é a mudança da “epistemologia da prática para epistemologia da práxis”, pois a práxistrata do movimento simultâneo de ação e reflexão, ou seja, “ a práxis é uma ação final que traz, noseu interior, a inseparabilidade entre teoria e prática”, sendo assim, a práxis não é uma ação pelaação, mas sim, um ação “orientada por uma dada teoria e tem consciência de tal orientação”.

Assim, uma formação qualitativa deve abarcar as exigências da população, umafundamentação teórica pautada na compreensão da sociedade, e uma prática voltada às questõesda população envolvida, possibilitando ao professor cursando melhor visualização e compreensãodos problemas sociais, portanto uma prática profissional mais adequada. Por isso, a identidadedo professor deve ser definida como ponto de partida, e a partir desse processo de construção dosujeito constituir, em sua dinamicidade, a profissão docente como prática social.

Os cursos de formação de professores têm se constituído de um currículo formalfundamentado em conteúdos e atividades de estágios distantes da realidade das escolas, aindasobre as perspectivas tradicionais, o que dificulta uma ação correta aos docentes em sua práticaem aula.

Pimenta (1999, p.16) cita que a perspectiva burocrática e cartorial que os cursosde formação de professores se fundamentam, não dão conta de captar as contradições presentesna prática social de educar, e pouco contribuem para a composição de uma nova identidade doprofissional docente.

Sobre o saber docente Fiorentini (2001, p.319) indica outra perspectiva, a de que“O saber do professor, portanto, não reside em saber aplicar o conhecimento teórico ou cientifico,mas sim, saber nega-lo, isto é, não aplicar pura e simplesmente este conhecimento mas transforma-lo em saber complexo e articulado ao contexto em que ele é trabalhado/produzido. Mas convémlembrar mais uma vez; só negamos algo se o conhecemos profundamente”.

A partir destes ideais, vemos a necessidade na formação do professor voltada àsua realidade, uma formação que abranja mais que apenas uma teorização, mas que inclua a“rotina” da prática de pesquisa, elemento essencial que colabora tanto para a formação daidentidade do professor, quanto para uma futura ação em sala de aula. Esta prática auxilia nareestruturação de novas concepções e incentiva a busca contínua por conhecimento.

A formação inicial dos professores é aspecto importante e de suma relevância paraa prática efetiva docente, entretanto, observamos no discorrer dos apontamentos que, a formaçãocontinua do professor em serviço é incontestável para a continuidade de uma prática qualitativa esignificativa. Isto é, o professor, agente direto de relação entre conhecimentos e alunos, pode ser

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importante para o processo formativo do individuo no que determina a disciplina, mas também noque diz respeito à ação social que o docente prática; tendo a realidade social bem compreendida,prática docente fundamentada, e eterna busca por conhecimento para manter-se ativamente bomno que faz o professor dificilmente desenvolverá um trabalho marcado pela frustração no alunado,evitando assim, uma frustração em sua própria identidade.

“A especificidade da formação pedagógica, tanto inicial como a contínua, não érefletir sobre o que se vai fazer, nem sobre o que se deve fazer, mas sobre o que se faz”.(HOUSSAYR, 1995, p.28 apud PIMENTA 1999, p.26).

OS CONSELHOS: UM BREVE HISTÓRICO.

Os Conselhos são uma possibilidade de intervenção popular no espaço público,sendo que um dos fatores que contribuiu para esse impulso foi a eleição de 1982 na qual forameleitos vários governadores que se opunham ao regime militar. A Constituição de 1988 tambémtem grande importância, já que possibilita a participação popular, sendo regido pelo principio dadescentralização, assim como a democratização. A tipologia dos Conselhos pode ser “definida”da seguinte forma: concepção, composição e fins

Partimos então para o histórico das formas de participação, com as manifestaçõesdos movimentos sociais da década de 70 e 80, que resultaram em dois tipos de Conselhos:Conselhos Populares e os Conselhos Comunitários. Estes conselhos fazem parte de um vertenteque Gohn (2001) caracteriza como “luta de trabalhadores”, ou seja, são conselhos estruturadosna defesa direta dos interesses populacionais, da luta dos setores oprimidos. Através destacaracterização, podemos então perceber as características políticas da natureza do Conselho.

A outra vertente traçada por Gohn (2001), é uma vertente vinculada às diretrizes doEstado, ou seja, uma vertente burocrática, ligada a estrutura estatal, caracterizando assim, osConselhos Institucionais. Estes Conselhos são vinculados à estrutura administrativa e objetivamintegrar os indivíduos na dinâmica da vida associativa local. Temos então, os ConselhosInstitucionais como legítimos por força da legislação, podendo também ser intitulados comoConselhos Legais ou Oficiais.

“A escolha dos conselhos na educação foi feita dada a importânciaque essa área passou a ter na atualidade, no discurso e nas políticasgovernamentais, conferindo-se as escolas atributos que ultrapassamsua dimensão de ensino/aprendizagem para se transformar em espaçosde socialização e de prestação de serviços públicos municipais, assimcomo a educação passou a ter no novo paradigma do mundo dotrabalho”. (GOHN, 2001 p.99)

A formação dos Conselhos na educação é amparada por lei, porém não definidasua função, sendo que a Constituição Federal de 1988 e a LDB não traçam um perfil claro dospapeis dos órgãos colegiados a educação. Sabemos que estes colegiados apresentam poder

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“limitado”, são sinônimos de representatividade, sendo que para efetivação de participação dagestão democrática é necessário ser indicado ou eleito para tal.

Os Conselhos Municipais são citados pela primeira vez em lei brasileira a partir daLei 5.692/71. A LDB não trata especificamente da criação de Conselhos Estaduais e Municipais,mas possibilita sua criação por permitir a criação de órgãos normativos.

A partir disso, a criação dos Conselhos Municipais de Educação são previstos porConstituições Estaduais e por Leis Complementares, e sua regulamentação fica sobresponsabilidade dos Municípios, órgão que deliberará a respeito de suas funções junto aoexecutivo, indicação de Conselheiros e institucionalidade junto a Câmara.

A partir de 1996, podemos verificar um aumento na criação dos ConselhosMunicipais de Educação. Isso ocorre por “disposição” legal (LDB nº.9.394/96, EmendaConstitucional nº14/96 e FUNDEF Lei nº.9.424/96), já que muitos municípios ao optarem porconstituir o Sistema Municipal de Educação tem que criar seus Conselhos Municipais de Educação.

Porém, vale ressaltar que os municípios não têm obrigação de criarem um ConselhoMunicipal de Educação, sua obrigatoriedade está relacionada a criação do Conselho deAcompanhamento e Controle Social do FUNDEF, o CACS, caso o município tenha alunosmatriculados no Ensino Fundamental, para que tenha direito a restituição do valo “per capita”através do números de aluno matriculados. Este órgão é um fiscalizador da utilização dos recursospúblicos tendo acesso a toda documentação de referencia aos recursos e repasse para a educaçãopor conta do FUNDEF.

O Conselho Municipal de Educação de Presidente Prudente (COMED) tem seuinicio em 14 de março de 1996, através de Lei Complementar nº.26/96, sancionada pelo PrefeitoMunicipal da época Agripino de Oliveira Lima Filho.

Está Lei de criação é amparada nos termos da Lei Estadual nº.9.143, de 9 demarço de 1995 que trata a respeito dos Conselhos Municipais e Regionais de Educação comoórgãos normativos dos sistemas Municipais de Ensino que terão sua criação e instalação a partirdo Poder Executivo Municipal, combinada ao parágrafo único do Artigo 209 da Lei Orgânica Mu-nicipal, que irão estabelecer como funções primordiais deste Conselho Municipal caráter normativo,deliberativo e consultivo referentes a questões de implementação de ações diretamenterelacionadas a área educacional.

Através do decreto nº.11.139/97 de 8 de abril de 1997, foram nomeados os primeirosmembros do COMED, que tomaram posse em 14 de maio do mesmo ano; e em 04 de junho de1997, data-se a eleição da primeira diretoria, que foi empossada em 16 de junho seguinte.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

A função docente vem passando por mudanças significativas, mudanças estasque impulsionam a um novo papel a desempenhar. Temos que a formação inicial dos professoresé aspecto fundamental para o desenvolvimento de sua função, já que, é a partir desta que se

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define sua postura perante a prática em sala, seus problemas e frustrações.Para tanto, a formação de professores não deve prender-se exclusivamente a

formação inicial. Para o desenvolvimento pleno da atividade docente é necessário, sob as novasperspectivas sociais que se encontra a sociedade, a continuidade de uma formação que amparea prática do professor em sala de aula, e que permita ao professor o teorizar a respeito da novarealidade social, visando uma melhor compreensão da realidade do aluno, e da realidade do seutrabalho ao longo do exercício do magistério.

As novas necessidades da sociedade geram novas expectativas para o papel doprofessor. O docente tem dificuldade de reconhecer a nova escola, e o seu papel perante ela.Essa falta de identidade docente gera a incapacidade do professor diante de sua atuação. Portantoé relevante que o professor tenha clara a sua função, e para isso, é necessário também que aformação inicial do professor proporcione ao menos uma base reflexiva, base esta fundamentalpara o desenvolvimento de sua prática, e indispensável para que aconteça uma formação con-tinua em serviço, que possa realmente estruturar sua ação, intelectualidade e prática docente demaneira mais significativa.

As percepções de mundo e a expectativa em torno do que seria chamado de“aprendizado” levam a sociedade a agregar características de “Juiz Inquisidor”, abandonando ocaráter educacional e abordando, direta ou indiretamente, uma postura de produção.

Alienados, ou simplesmente acomodados, sem perspectivas ou incentivos, osprofessores no geral, estão ligados diretamente à subordinação de algo, ou alguém, que nem aomenos conhecem, porque sabem pouco demais, produzem um pouco de nada e limitam-se apensar, um pensamento que se iguala a suas ações, fraco, sem horizonte, sem amanhã.

E a produção vai além de onde os olhos conseguem ver, pois trata pessoas comoobjetos relacionando-os como apenas peças que compõem o sistema econômico, ou seja, se oque alimenta a economia é gente subordinada, esse é o produto final que o aparelho Escola deveproduzir, afinal de contas, pessoas pensantes, embasadas, críticas e realmente estudadas seriamde difícil manipulação, e seu custo unitário maior. A produção de novas peças e a reposição dosestoques é o processo que rege a “economia escolar”, partindo de interesse, somente deinteresses, para interesses cada vez maiores.

A estrutura do sistema educacional é fundamentada, portanto, no sistemaeconômico, político e social em que nossa sociedade é construída. Somos capitalistaseconomicamente falando, somos capitalistas educacionalmente atuando, manipulamos osinteresses comuns para servir ao interesse de poucos.

Se o docente é o agente direto entre o desenvolvimento intelectual dos alunos e abase teórica fator necessário para o decorrer de sua prática, vemos que o professor deve exercerseu poder político em sala de aula, como cidadão que corresponde a suas funções e especificidadescom compromisso e responsabilidade.

É através de seu pertencimento a um órgão de gestão política, como os Conselhos,que o professor pode também exercer sua prática política, e consequentemente adquirir novos

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conhecimentos, que irão influenciar diretamente sua prática como docente.Daí a importância de não se deixar contaminar com o “veneno” do desânimo a

docência, pois a frustração e a falta de perspectivas eximem o professor de participações nossetores que regem a educação como a própria sociedade, e, portanto, excluindo a chance de secriar e aplicar a identidade precisa do professor.

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INTRODUÇÃO

Analisando a escola pública paulista há alguns anos, percebemos o quanto o pro-fessor se sente sozinho em sua profissão, pois não há: planejamento coletivo; espírito decomunidade escolar, apoio aos problemas encontrados, recepção calorosa aos que adentram àprofissão etc. Parrilla e Daniels (1998) afirmam que apesar de o conhecimento considerável quepossuem, os professores raramente compartilham-no com seus colegas.

Segundo Villani e Valadares (2002), várias políticas públicas têm privilegiado otrabalho coletivo entre os professores, pois acreditam que estes sejam capazes de transformarações individuais em ações coletivas e modificar o ambiente escolar.

Embora haja, no papel e no discurso, uma indicação governamental para que ostrabalhos desenvolvidos na escola sejam coletivos (e interdisciplinares), as condições de trabalhoimpostas impedem ou dificultam que isso aconteça. Em decorrência, o que observamos ao finalde uma jornada diária de trabalho são professores exaustos, que dificilmente comentam episódiosagradáveis que tenham ocorrido em suas salas de aula. Tais atitudes ajudam a aumentar asensação de fracasso que ronda a profissão docente. Poucos são os professores que efetivamentetêm disponibilidade temporal e mental para desenvolver um trabalho em grupo. (BOZZINI, 2005).

Apesar das condições desfavoráveis, acreditamos que sendo o grupo deprofessores coordenado por um membro – professor ou especialista - que facilite o exercício dareflexão sobre a ação, os resultados poderão ser bastante frutíferos no sentido de uma formaçãocontinuada mais adequada a esse profissional.

Parrilla e Daniels (1998), ao contarem suas experiências com os Grupos de Apoioentre Professores, afirmam que esses encontros

…proporcionam um fórum, onde os professores podem compartilharseus conhecimentos e destrezas sobre o ensino, e onde podemexpressar e receber apoio emocional e reforço de seus companheiros.(...) Oferecem, além disso, apoio ao ajudar os professores acompreender que não estão sozinhos e que outros têm dificuldadessimilares. Por último, os grupos de apoio também proporcionam umaoportunidade aos professores para liberarem-se das frustrações etensões derivadas do ensino (p.27).

O DIÁLOGO GERANDO POSSIBILIDADES DECONSTRUÇÃO DO TRABALHO COLETIVO NA

ESCOLA PÚBLICA E INFLUENCIANDO ODESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL E

INSTITUCIONAL

WEIGERT, Célia (DEME/UFSCar); OLIVEIRA, Márcia Rozenfeld Gomes de (CDCC/CBME/IFSC/USP- São Carlos); BOZZINI, Isabela Custódio Talora (FFCL de São José do Rio Pardo/

FEUC)

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A idéia de grupos de apoio ou de encontros reflexivos, nos quais os professores sereúnem para socializar idéias, discutir os problemas da escola, buscar alternativas para melhoriaconjunta do espaço escolar e para realizar uma reflexão sobre a ação, nos parece interessantepara o desenvolvimento desse profissional e da Instituição em que ele se encontra. Nessa direção,entendemos a escola como instituição aprendente, uma escola reflexiva que continuamente sepensa a si própria, na sua missão social e na sua organização (ALARCÃO, 2001).

Segundo Geraldi et al (2000), a formação profissional do professor deve

... atentar para a prática como referência para compreendê-la e (re)constituí-la, a relevância de descrever e compreender o cotidiano daescola pública típica; a necessária associação ensino/pesquisa naformação inicial; o respeito aos saberes dos professores e dasprofessoras produzidos em seu trabalho; a necessidade de construircaminhos coletivos na escola pública (p.241).

Entendemos que cada escola é única e que seu corpo docente constrói uma culturacotidiana, responsável por muitas das atitudes dos professores, inclusive em sala de aula. A equipeescolar pode auxiliar, dar apoio ao desenvolvimento de atividades inovadoras e criativas pelosprofessores, bem como pode barrá-las. Os estudos que salientam a importância e odesenvolvimento de grupos de trabalho na escola destacam o contexto como determinante naconstrução da cultura local e desenvolvimento das atividades dos componentes do grupo.

Várias pesquisas têm ressaltado a importância do trabalho em grupo na formaçãode professores por acreditarem que o diálogo entre diferentes concepções, apoiado por interventoresou coordenadores (internos ou externos) capazes de auxiliar o processo de reflexão, possibiliteum crescimento profissional do grupo em questão (VILLANI e FREITAS, 1998; PIERSON ET AL,2000; VALADARES e VILLANI, 2002; BOZZINI ET AL, 2003).

Tanto as relações existentes dentro de um grupo, como a atuação de cada profes-sor nesse espaço, acontecem por causa do grupo. Para Souto (1993), as situações de grupo queacontecem na escola

... são situações de ensino-aprendizagem, nas quais os sujeitos nãoaparecem de forma isolada, suas ações acontecem em função dasrelações que se estabelecem num momento determinado dentro deum processo temporal (p.51).

Diante disso, este trabalho visa discutir as possibilidades de trabalho coletivo entreprofessores nas escolas públicas paulistas, visando a Formação Continuada desses profissionaisem serviço numa perspectiva crítico-reflexiva. Para tanto, nos utilizaremos de três trabalhos depesquisa desenvolvidos individualmente pelas autoras (WEIGERT, 2003; BOZZINI, 2005; OLIVEIRA,2005).

Cabe ressaltar que a metodologia utilizada nos trabalhos foi de cunho qualitativo eos métodos de coleta de dados também foram semelhantes: observação de reuniões coletivasnas escolas, anotações em diário de campo, entrevistas semi-estruturadas e questionários abertos

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com os sujeitos.Em primeiro lugar nos propomos a apresentar os diferentes contextos em que

foram realizadas as pesquisas, bem como os resultados encontrados e posteriormente nospropomos a realizar uma análise conjunta dos resultados, buscando ressaltar os aspectos maisrelevantes e congruentes das pesquisas, utilizando os referenciais do professor reflexivo, da escolareflexiva e do trabalho coletivo.

O CONTEXTO DE CADA PESQUISA

PESQUISA 1: O TRABALHO INTERDISCIPLINAR A PARTIR DE UM PROJETOCOLETIVO

O “Programa de Ensino do Projeto Flora Fanerogâmica do Estado de São Paulo”,um projeto temático financiado pela FAPESP, foi proposto para contribuir com a melhoria do ensinoda rede pública, mais especificamente, em relação aos conhecimentos de Botânica, explorandouma metodologia interdisciplinar. O Projeto envolveu várias Instituições (Universidades, Escolas eFAPESP) com a finalidade de propiciar a elaboração de um projeto coletivo que integrasse aspráticas diárias em sala de aula de vários professores e, portanto, de várias disciplinas do ensinomédio.

Neste texto faremos um recorte, a partir da dissertação de mestrado de uma dasautoras (WEIGERT, 2003), focando o desenvolvimento do projeto em uma escola da cidade deSão Carlos, tendo como foco o processo de construção da metodologia interdisciplinar por estegrupo, particularmente. O grupo do projeto era formado por professores da rede estadual de ensino(das disciplinas de Biologia, História, Geografia e Artes), especialistas das universidades envolvidas,técnicos e estagiários. O convite para compor o grupo partiu da Instituição, diretamente para asprofessoras das escolas públicas.

O projeto foi desenvolvido durante os anos de 1998 e 2000 em uma escola deensino médio da rede publica estadual, E. E. Dr. Álvaro Guião, e por opção das professoras, emclasses de terceiros anos. O grupo reunia-se todas as semanas, no período da tarde, para refletira planejar as atividades e os desdobramentos destas. As reuniões foram gravadas, inicialmenteem áudio e, posteriormente, em vídeo.

A aceitação do convite feito pela instituição, através das coordenadoras, foi motivadapor diferentes demandas, mas todas tinham em comum o desejo de buscar melhorias para oensino. As professoras receberam bolsa-auxílio durante a vigência do projeto, tendo sido este umincentivo importante para o envolvimento nas atividades, mas certamente não foi decisivo. Outrofator importante para a aceitação do convite para participar desta construção foi o vínculo anteriorque todas as professoras mantinham com a professora de biologia, que desempenhou o papel delíder e interlocutora.

O convite feito inicialmente às professoras, e que as seduziu, depois de um tempopassou a despertar um outro sentimento: o medo. Inicialmente, as diferentes expectativas em

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relação aos objetivos a serem alcançados e a diferença de metodologias da Botânica, mais racionale pragmática, com a metodologia da Educação, mais reflexiva, dificultaram o estabelecimento deuma identificação entre as coordenadoras e entre elas e as professoras. As posições atribuídasàs integrantes do grupo Flora já estavam previamente definidas, mas depois das primeiras reuniõesefetivas, alguns papéis se modificaram em conseqüência da complexidade que seria trabalharcom um grupo tão heterogêneo em uma pesquisa em Educação.

Por conta disso, foi preciso construir uma linguagem comum às pessoas, para queelas percebessem que havia maneiras diferentes de construir representações e de aceitar asdiferentes formas de elaborações; cada uma das integrantes do grupo Flora havia criado umarepresentação sobre o que seria construir coletivamente um planejamento interdisciplinar. Osvínculos que se estabeleciam eram decorrentes de alianças e defesas, que por um motivo ououtro faziam com que as pessoas construíssem uma identificação entre elas, necessário para asobrevivência do grupo à medida que nos fornece os marcos identificatórios e o traço comumentre os indivíduos. E estas concepções precisavam dialogar para o grupo conseguir estabelecer-se.

As professoras estavam desconstruindo seus papéis de professorastransmissoras, e tentando construir sua identificação com o papel de professora reflexiva eorientadora de seus alunos. Da mesma forma, como se identificavam com a racionalidade dosespecialistas e sentiam muitas angústias ao romper com o ensino tradicional, buscavam naidentificação com a universidade uma saída para manter a sua esperança em inovar em sala deaula.

As preocupações com os aspectos objetivos permearam o inicio do projeto, pordois aspectos, principalmente. O primeiro é a predominância e a supervalorização dos especialistas.A segunda foi a não participação efetiva da Educação nas primeiras discussões tendo direcionadoo grupo para não atribuir importância aos aspectos subjetivos implicados no projeto.

Esse primeiro encontro das professoras, dispersas em suas especificidades, foisendo substituído por uma busca de possíveis identificações com o objeto de desejo, no caso, amelhoria do ensino de botânica. E foi em torno deste desejo que o grupo Flora buscou organizar-se. Para as coordenadoras (especialistas em Botânica), o desejo era responder à instituição depesquisa que fomentava o projeto, por isso elas buscaram uma professora já conhecida queresponderia à expectativa com um trabalho sério. Para as professoras, o desejo de resposta eramultifacetado: de um lado, a instituição universitária, representada pelas pesquisadoras e, agora,coordenadoras e do outro lado a Escola com toda sua tradição.

PESQUISA 2: UM PROJETO DE PARCERIA ENTRE UNIVERSIDADE E ESCOLAPÚBLICA COMO POSSIBILIDADE DE CONSTRUÇÃO DO TRABALHOCOLETIVO NA ESCOLA

Este trabalho contempla um recorte de uma tese de doutorado (OLIVEIRA, 2005)de uma das autoras e procura discutir a importância do desenvolvimento de projetos de parceria,

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no caso particular entre uma Universidade Pública e uma Escola Pública de São Carlos-SP, queincentivem a construção e sustentação de grupos de trabalho na escola, a formação continuadade professores e a interação positiva entre instituições de pesquisa e de ensino. A parceriaestabelecida pretendia entre outros aspectos o desenvolvimento profissional de professores deCiências. Essa aproximação trouxe a revisão de posições dos professores universitários tanto naárea de ensino, como na pesquisa. Quanto à formação continuada, o grupo desenvolveu umavisão crítico-reflexiva, caminhando na direção da autonomia do desenvolvimento profissional.

O projeto do qual emergiu a parceria, originou-se em discussões no Instituto deEstudos Avançados pertencente à USP, sobre formas de cooperação da Universidade Públicapara a melhoria das condições de ensino e aprendizagem da escola pública (ZUFFI et al, 2003).Dadas às características e potencialidades desse Campus de São Carlos a proposta foi direcionadapara o ensino médio da rede pública, tendo como caráter essencial os aspectos científicos etecnológicos. O projeto intitulado: “Desenvolvimento e Avaliação de uma Pedagogia UniversitáriaParticipativa no Ensino Médio: atividades com ênfase em matemática e ciências”, teve o suportefinanceiro da Fapesp, e foram oferecidas bolsas aos professores da Escola e recursos diversospara os pesquisadores. Feito o convite à Escola parceira, alguns professores das respectivasáreas, Física, Química, Biologia e Matemática passaram a participar ativamente. Existia um vínculoforte entre eles e um desejo de realizar um trabalho conjunto diferenciado de qualidade na EscolaPública com suporte da Universidade (OLIVEIRA, 2005).

A partir das dificuldades e conquistas apresentadas pelos professores envolvidosna parceria para a implementação do projeto e as mudanças propostas, pudemos refletir sobrealguns aspectos importantes desse processo. Na sua maioria os professores colocaram emsuas falas as dificuldades no trabalho e a “solidão” que enfrentam em seu dia-a-dia. O queconstatamos, entretanto, foram diferentes concepções e construções de parcerias nos sub-gruposcriados em cada disciplina específica. Percebemos, que existia um desejo legítimo de váriosprofessores pela busca do saber, para ter acesso a novos materiais didáticos, que ainda estavamem fase de teste, possibilidade de trocas e reflexão sobre o processo de ensino-aprendizagem eo próprio desenvolvimento pessoal e profissional, o que teria sido o mote para a entrada no projeto.

Quanto à constituição do grupo de trabalho percebemos que exista um “ideal comume compartilhado” pelo grupo da parceria (pesquisadores-professores) que carregava uma certautopia, no desejo de melhorar o ensino público, mas por parte dos professores da escola somava-se mais um elemento, a ilusão dos professores de pertencer a um grupo ligado à universidade. Naverdade entendemos que foi nesse momento que se gerou a idéia de pertencimento no grupo.

A liderança do grupo nessa fase era exercida pela Coordenadora do projeto naUSP, que mantinha o ideal comum, era respeitada pelo grupo e considerada uma pessoa acessívele séria. O trabalho desse grupo de professores e pesquisadores passou por diferentes etapas,alguns professores deixaram o projeto por diferentes motivos e sempre que algum elemento degrupo deixava o grupo, o grupo passava por uma fase de reorganização. A parceria foi sendoestabelecida na conquista de alguns ideais do projeto, no reconhecimento de um trabalho

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diferenciado e de qualidade pela comunidade escolar e o trabalho coletivo foi deixando uma marcano grupo de busca pela autonomia. A construção coletiva de projetos interdisciplinares, feiras deciências na Escola, construção de artigos e trabalhos para congressos, escritos conjuntamenteentre professores e pesquisadores e entre as diferentes áreas, bem como a reorganização deespaços coletivos na escola como laboratórios, sala de informática, biblioteca e salas para reuniãoe vídeo, foram conquistas do grupo na escola. O percurso do grupo foi marcado por momentos dereflexão sobre a prática educativa na escola, motivado pela solução de problemas cotidianos e avalorização do pedagógico e da necessidade de intercambiar conhecimentos e saberes para seatingir os resultados desejados. Nesse aspecto o papel do grupo como suporte para a ação reflexivateve um papel essencial. O trabalho em grupo e em subgrupos exigiu o desenvolvimento de saberese competências que foram sendo adquiridos ao longo do processo: o saber trabalhar coletivamente,tomar decisões conjuntas, resolver problemas coletivamente, ouvir os colegas e expor seusproblemas. Estes momentos auxiliam uma reflexão coletiva onde todos contribuem.

PESQUISA 3: O HTPC COMO ESPAÇO PARA PROMOÇÃO DO TRABALHOCOLETIVOEste trabalho é um recorte da tese de doutorado de uma das autoras (BOZZINI,

2005) e evidencia uma possibilidade de construção coletiva em uma escola estadual do interior deSão Paulo à partir do HTPC (Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo). Tentaremos apontar aquios aspectos facilitadores da construção coletiva numa escola pública.

Essa escola foi escolhida porque seus professores apontaram (em um questionário)o HTPC desse estabelecimento como prazeroso, bem como um espaço importante para trocasde conhecimento e experiência contribuindo para a aprendizagem profissional. Por esse motivo,nos fixamos em tentar compreender o que tornava tais encontros (HTPC) espaços significativospara os professores e especialistas que atuavam na escola.

Já em entrevistas com os professores e especialistas, identificamos o quepensavam sobre o HTPC, a função dele na escola e a atuação dos especialistas nesse espaço(Quadro 1).

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Quadro 1: O que os professores e especialistas pensam sobre o HTPC destaescola e sobre a atuação da coordenação/direção neste espaço.

P1, P2, P3, P4, P5, P6 – professoras (PEB II) da escola; Co – Coordenador; Di – Diretora; Su – Supervisor.

Sujeito O que pensam sobre o HTPC nesta escola

Atuação do coordenador/direção em relação ao HTPC

P1 - momento de troca de experiências, tentativa de resolver problemas da escola.

- coordenadores são pessoas capacitadas, que preparam a reunião. O HTPC depende do coordenador saber dirigir.

P2 - estudo ou tempo para atualização profissional.

- primeira vez que vê um HTPC bem conduzido.

- coordenador democrático, pensa na demanda dos professores.

P3 - momento de troca de experiências, tentativa de resolver problemas da escola.

- textos trabalhados parecem trazer conforto, esperança aos professores, numa perspectiva de levantar sua auto-estima.

- bom trabalho do coordenador ao selecionar textos.

- bom entrosamento com a equipe escolar, apesar da diversidade de pensamentos.

P4 - aqui se aprende bastante; em outros locais não funciona bem, ninguém participa, a direção atrapalha.

- leitura de textos para reflexão.

- o coordenador é bom e a anterior também era. Ele leva a sério.

- nosso relacionamento aqui é ótimo.

P5 - aqui é o melhor que já fiz. - um importante espaço de

aprimoramento; - momento de troca de experiências,

tentativa de resolver problemas da escola.

- a direção e coordenação, eles te escutam, eles se preocupam com o bem estar da escola, dos professores. Aqui todo mundo quer fazer a escola funcionar.

P6 - momento de troca de experiências, tentativa de resolver problemas da escola.

- planejamento de atividades.

- coordenador muito bom, escuta os professores.

Co - deve ser um momento de estudo; mas na maioria das escolas não é: é um momento de passar recado, de falar mal de aluno.

- recomendações da SEE são muito vagas.

- textos para reflexão, coisas do dia-a-dia, que podem ajudar: sobre o trato com o aluno, a postura do professor.

- a organização quem faz mesmo é o coordenador.

- pauta de acordo com a necessidade da semana.

- diretora acompanha, vem a todos, faz questão de participar.

Di - fortalece o trabalho de sala de aula. - um fortalecimento das idéias,

conhecimento da totalidade da escola, momento de encontro e de estudo.

- é um importante momento para a equipe escolar se debruçar sobre problemas e procurar soluções.

- aqui funciona porque há compromisso da coordenação na condução das reuniões.

Su - a diretora anterior mudou a cara do HTPC, ela trabalhava no sentido de fazer o crescimento do professor; e os atuais deram continuidade.

- como a escola é pequena, não muda muito o corpo docente, ficaram raízes e vínculos com esse espaço.

- aqui eu sinto compromisso, a diretora atual e a anterior também são pessoas super comprometidas com a escola.

- juntos, eles fazem um ótimo trabalho, um trabalho que satisfaz a gente também.

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DISCUSSÃO

Analisando os diferentes contextos de pesquisa, selecionamos os aspectos comunsque contribuíram para a efetivação do trabalho coletivo entre os professores nas escolas públicas.

Como destacado nos resultados das três pesquisas a condição necessária paraqualquer iniciativa coletiva é a presença do diálogo. A possibilidade do diálogo ser efetivo nasce dodesejo dos sujeitos de pertencerem ao grupo e no desejo de ver suas expectativas satisfeitas.Porém, essa condição não é suficiente para que o diálogo seja efetivo e construtivo, a atençãopara a fala do outro e o respeito às diferenças individuais precisam ser elaboradas pelo grupo.Essas condições são fundamentais para que se constitua um grupo produtivo dentro da escola(WEIGERT, 2003).

Inicialmente o desejo de pertencimento a um determinado grupo pode gerarinseguranças e incertezas, como sugere Valadares (2002) toda identificação inicial sugere quealguns elementos possam estar sendo negados (angústias, incertezas e rivalidades), para quetodos possam se sentir seguros e se concentrem na tarefa proposta.

No caso da pesquisa 2, sobre a parceria, as queixas relatadas pelos professoresda escola quanto à solidão profissional e a falta de suporte para seu desenvolvimento pessoal eprofissional foi uma motivação para a entrada nos projetos e a participação no grupo. Entendemosessas “queixas” como falta de suporte para suas questões teóricas e práticas do cotidiano,destacando a busca de parcerias e trocas, tendo a expectativa de que a participação no trabalhocoletivo poderia suprir essa carência. Segundo Torre e Cabrera (1998), projetos coletivos comprofessores de áreas e níveis diferentes são fundamentais para que o professor supere o isolamentoem que se encontra em sua prática cotidiana e propiciar novas formas de atuação, que rompamcom a cultura do individualismo para orientar a prática através de outros modelos que fomentema cooperação, a reflexão e a colaboração entre os profissionais.

No entanto, a introdução de uma inovação envolve algumas dificuldades. Entre asapontadas por Huberman (1973), duas delas estão diretamente envolvidas com o caráter coletivoinerente à metodologia interdisciplinar. É mais difícil constituir um grupo de trabalho eficiente comprofessores que falam ”línguas diferentes”. A metodologia interdisciplinar prevê a integração deáreas diferentes, que necessitam de um tempo maior de diálogo entre os membros do grupo,com disponibilidade para o diferente, para conhecer as contribuições que cada disciplina pode darna construção, ou na reconstrução, de um conhecimento contextualizado.

Um planejamento interdisciplinar apresenta como propósito inicial a integração dossaberes através do diálogo entre os especialistas. A partir daí, abrem-se possibilidades diferentesde interpretações de como promover este diálogo. Uma opção é integrar os saberes específicossem desconstruir as estruturas disciplinares que fornecerão os subsídios necessários paraestabelecer o diálogo entre os conhecimentos, promovendo uma retomada na comunicação en-tre os especialistas. Ao estabelecer elos entre os diferentes saberes, a interdisciplinaridade buscaretomar a função primeira da descompartimentalização dos conhecimentos: organizadora de

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conhecimentos para assegurar uma coerência global.Mas os problemas referentes a uma mudança desta natureza precisam ser

analisados para que os professores, principalmente em serviço, tenham possibilidades dedesenvolver um trabalho interdisciplinar nas escolas públicas. Em geral, as inovações sugeridasao sistema de ensino não são implantadas com facilidade entre os professores porque não há apreocupação em discuti-las com todo o corpo docente para que conheçam a proposta e discutamcomo implantá-la entre seus pares. O sentimento de pertencimento a um grupo começa naelaboração do projeto, com a consulta aos professores sobre quais as demandas, quais assugestões de caminhos a serem percorridos.

Considerando a experiência coletiva vivenciada com o projeto Flora, um dos fatoresfacilitadores do estabelecimento do diálogo entre as professoras da escola de ensino fundamen-tal e as especialistas da universidade foi a liderança da professora de biologia. Os vínculosestabelecidos anteriormente entre a professora e as coordenadoras e entre ela e as professorasda escola, foi decisivo para estabelecer uma interlocução entre os conceitos trazidos da teoria eos conhecimentos práticos de sala de aula construídos em anos de magistério.

Já no HTPC apresentado na pesquisa 3, pudemos perceber a importante liderançado coordenador e da direção da escola no comando das atividades. A escuta sensível docoordenador parece importante para o grupo, ele abre espaço para o desabafo de problemaspessoais e profissionais, todos os professores parecem ser ouvidos.

Autores como Moreno (1998) defendem alguns princípios, que ela denomina comomedidas facilitadoras de trocas entre participantes de um grupo. São exemplos: conseguir umclima de trabalho favorável, caracterizado pela confiança, a credibilidade e a cooperação; (...)buscarcontribuições de todos os participantes; não fazer comentários negativos acerca das contribuiçõesdos participantes; serem capazes de escutar os demais sem críticas, nem interrupções (escutaativa); (...)definir o problema e conseguir o compromisso para resolvê-lo (p. 190).

A equipe escolar parece contar com essas medidas facilitadoras e isso se refletena escola, o que leva os docentes a identificarem o HTPC como um importante momento paratroca de experiências, tentativa de resolver problemas da escola e espaço de aprendizagem.

Segundo Parrilla & Daniels (1998),

... a resolução colaborativa de problemas entre professores proporcionaàs escolas o acesso a um recurso próprio de valor inestimável. Defato, converte o professor no protagonista do desenvolvimento escolar(e não outros profissionais), e apóia sistematicamente a reflexãobaseada na ação e dirigida à mudança e melhoria escolar. (p. 16)

Os professores e o coordenador identificam a diretora como uma liderança ativano espaço escolar. Esse entrosamento entre os diferentes seguimentos da escola cria um climade cooperação entre os integrantes do grupo, que sentem um desejo ainda maior de participar dodesenvolvimento da escola.

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A partir disso, e em congruência com o observado no projeto de parceria com auniversidade, podemos reafirmar a importância do líder no grupo, seja exercida por um membroda própria escola ou mesmo de fora acreditamos que seu papel como elemento aglutinador,organizador para se superar as dificuldades de se estabelecer horários comuns para encontros eespaços para se discutir e avaliar o andamento do trabalho, é vital para a sobrevivência do trabalhocoletivo. O papel da liderança pode ser alternado entre os elementos do grupo, de acordo com asnecessidades do grupo e as etapas do trabalho coletivo, para que a sobrevivência do grupo possaser garantida.

Característica assumida pelo grupo Flora foi a rotatividade de líderes durante todo oprocesso de construção interdisciplinar, apesar do papel de interlocutora ter sido sempre daprofessora de biologia. Entre as coordenadoras, a liderança também era rotativa, com algumaresistência inicial, mas depois do estabelecimento do diálogo entre o grupo como um todo, essasarestas foram aparadas em prol de um objetivo comum: a elaboração de um planejamentointerdisciplinar e, portanto, com o diálogo estabelecido e assumido por todos os integrantes.

Um grande marco do sucesso do projeto como uma expressão coletiva foi aaceitação pela escola toda de uma metodologia inovadora. A promoção de uma atividade que setransformou em um grande evento na escola (1º. Guião em Ação) foi a forma de introduzir oprojeto na escola e manter o grupo unido em torno de seus objetivos, quando os obstáculos setornaram maiores que as esperanças na mudança. O questionamento dos pares, na escola,deixava as professoras participantes fragilizadas e receosas de aplicar as atividades planejadas;diante deste problema, o grupo se une em torno de um evento e sai fortalecido, pelo reconhecimentodos pares e da direção e coordenação da escola. Este reconhecimento facilita a negociação deespaços dentro da escola.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao analisarmos as três experiências relatadas, fica claro a pertinência do trabalhocoletivo dentro da escola como fator de envolvimento com o processo de ensino-aprendizagem.Apesar disso, o maior problema que se percebe na escola pública é a falta de continuidade emprojetos. Tanto em termos de políticas públicas, quanto da equipe escolar propriamente dita, jáque a rotatividade de professores nas instituições de ensino básico é extremamente grande.

Além disso, para a escola fica a sensação de banalidade do trabalho acadêmicoque nunca retorna para a escola seus resultados; fica também a sensação de desamparo esolidão ao reeditar uma metodologia usada no projeto, mas que agora sem o apoio das Instituiçõesse torna inviável. Ao pensar em um projeto coletivo é necessário que haja um comprometimentocom a divulgação dos resultados, com a continuidade de metodologias inovadoras bem sucedidas,e com a formação continuada dos professores em serviço. Existem muitos exemplos em quepercebemos que essas iniciativas são fundamentais para reintroduzir estes professores noambiente de pesquisa, nos institutos de ensino superior.

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Pensar na escola reflexiva, que aprende e se desenvolve nas interações é abrirespaço e tempo para um trabalho criativo com profissionais que refletem e se comprometem embuscar sua autonomia. Segundo Alarcão (2001), só a escola que se interroga sobre si própria setransformará em uma instituição autônoma e responsável, autonomizante e educadora, somenteessa escola mudará o seu rosto.

Nessa direção a construção de grupos de trabalho na escola, pode de fato contribuirpara o desenvolvimento de um novo saber escolar, na construção de habilidades e atitudes quepriorizam o coletivo sem, contudo oprimir as individualidades. Para isso, seus membros não podemapenas ser treinados para executar decisões tomadas por outro, não podem ser moldados para apassividade e o conformismo. Ao contrário, devem ser incentivados e mobilizados para aparticipação, a co-construção, o diálogo, a reflexão, a iniciativa, a experimentação (ALARCÃO,2001).

Esse trabalho desenvolvido não somente entre os profissionais da escola, mas,sobretudo na forma de parcerias com a Comunidade, transforma a nossa atual concepção deescola, aquela fechada em seus próprios muros e abre a escola para a possibilidade de novasiniciativas, projetos sociais, parceiras com Universidades ou com outras instituições interessadasem contribuir com uma nova escola.

REFERÊNCIAS

ALARCÃO, I (org.) (2001) Escola Reflexiva e a Nova Racionalidade. Porto Alegre: Artmed Ed.,2001.

BOZZINI, Isabela C.T.; SUDAN, Daniela C.; OLIVEIRA, Márcia R. G. de ; FREITAS, Denise deContribuições da Prática de Ensino de Ciências para a Formação Reflexiva dos(as) Futuros(as)Professores(as) Reveladas nas “Crônicas” da Disciplina. ENPEC, 2003.

BOZZINI, I C.T. A construção do espaço coletivo escolar: três estudos sobre o Horário de TrabalhoPedagógico Coletivo. Tese, PPGE - Universidade Federal de São Carlos, 2005.

GERALDI, Corinta M.G., MESSIAS, Maria da Glória M., GUERRA, Míriam D. S. Refletindo comZeichner: um encontro orientado por preocupações políticas, teóricas e epistemológicas. IN:GERALDI, C.M.G. ET AL Cartografias do trabalho docente: professor(a)-pesquisador(a). Campinas:ALB/Mercado das Letras, 2000. (p. 237-274).

HUBERMAN, A. M. Como se realizam mudanças em educação. São Paulo: Cutrix, 1973.

MORENO, Marita S. La comunicación y los grupos de apoyo entre profesores. IN: PARRILLA,Angeles e DANIELS, Harry Creación y desarrollo de grupos de apoyo entre profesores. Bilbao:Ediciones Mensajero, 1998. (p. 185-195).

OLIVEIRA , MARCIA R. G. de. Projeto de Parceria entre Universidade e Escola Pública Estadual deEnsino Médio: Limites e Possibilidades, 2005. Tese (Doutorado em Educação) Centro De CiênciasHumanas – UFSCar, SC, 2005.

PARRILLA, Angeles e DANIELS, Harry. Creación y desarrollo de grupos de apoyo entre profesores.Bilbao: Ediciones Mensajero, 1998.

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PIERSON, Alice Helena Campos; FREITAS, Denise, VILLANI, Alberto; FRANZONI, Marisa. Umaexperiência interdisciplinar na formação inicial de professores In: VII Conferência Interamericanasobre Educação em Física, 2000, Canela/RS. CD-Rom da VII Conferência Interamericana sobreEducação em Física. Porto Alegre: UFRGS - Instituto de Física, 2000.

VALADARES, Juarez M. As formas e a construção da subjetividade em um grupo de professores:análise de uma prática e seus discursos. Dissertação (mestrado), Instituto de Química e Faculdadede Educação, São Paulo, Universidade de São Paulo (USP), 2002.

VILLANI, Alberto & FREITAS, Denise de Análise de uma experiência didática na formação deprofessores de Ciências. Investigações em ensino de ciências, v.3, n2,1998. (p.127-142).

VILLANI, Alberto & VALADARES, Juarez M. A conspiração grupal na mudança de uma escola: umpapel esquecido nas análises curriculares. IN: ANPED 22ª.Reunião Anual, GT 12, CD-ron, Caxambu-MG, 2002.

WEIGERT, Celia. A interdisciplinaridade e o trabalho coletivo: variáveis envolvidas no processo deconstrução do planejamento interdisciplinar. 2003. Dissertação (Mestrado) – Universidade EstadualPaulista, Bauru, 2003.

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INTRODUÇÃO

O ensino de Ciências praticado pela maioria dos professores das séries iniciais doensino fundamental e educação infantil de escolas públicas brasileiras tem-se caracterizado poruma prática escolar na qual a educação científica deixa muito a desejar. Muitas vezes, porinsegurança ou por medo de não dominarem assuntos específicos das Ciências Naturais, osprofessores acabam lidando com informações e/ou conceitos presentes nos livros didáticos. Assim,passam a desenvolver um ensino de Ciências empobrecido e carente de atividades interessantes,que possam contribuir para a formação de um pensamento científico nas crianças.

Como professora convidada a ministrar Oficinas de Ciências para os alunos-professores do Programa de Educação Continuada (PEC-Formação Universitária/Municípios/USP),em janeiro e julho de 2004, desenvolvi uma proposta de formação cujo principal objetivo era rompercom a prática pedagógica de uso corrente dos professores: trabalhar apenas os conteúdos deCiências presentes nos livros didáticos. Além disso, havia a intenção de apresentar uma propostade ensino de Ciências baseada numa perspectiva de recuperação da natureza do conhecimentocientífico numa visão global, não fragmentada, não especializada do conhecimento, integrandovários aspectos tanto da cognição como da emoção. Uma perspectiva que não separa da criançasua ludicidade e sua curiosidade em estar e conhecer o mundo. A tentativa era de superar omodelo cartesiano da Ciência, centrando-se num trabalho com projetos, que privilegia a participaçãodas crianças, tanto na escolha de seus objetos de conhecimentos, como enquanto sujeitos naconstrução e ressignificação desses conhecimentos.

Apesar da faixa etária exigir uma formação inicial polivalente, os professores exercemuma prática escolar na qual a educação científica não se realiza. Até a promulgação da Lei deDiretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN 9394/96, o ensino médio era condição suficientepara a formação inicial de professores de educação infantil e para as quatro primeiras séries doensino fundamental, o qual não garantia uma formação sólida e competente nas diferentes áreasdo conhecimento e, principalmente, em Ciências. Assim, os professores, lidam com informações,

O ENSINO DE CIÊNCIAS NA EDUCAÇÃO DA INFÂNCIANUMA PERSPECTIVA CULTURAL E CIENTÍFICA:

ANÁLISE DE APRENDIZAGENS DE ALUNOS-PROFESSORES DO PROGRAMA DE EDUCAÇÃO

CONTINUADA- FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA/MUNICÍPIOS

PELIZON, Maria Helena ; MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti (Universidade Presbiteriana Mackenzie).

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noções e/ou conceitos presentes nos livros didáticos que fogem ao seu entendimento. Seus poucosconhecimentos são uma síntese de várias explicações e, portanto, não fazem sentido se vistasisoladamente (BIZZO, 98, p.10). Há ainda o medo e insegurança dos professores por nãodominarem os assuntos específicos e metodologia adequada, tornando-se assustados, bloqueandoum trabalho eficiente. Busquei na literatura infantil conteúdos interdisciplinares e uma linguagemque rompesse com a visão e a prática tecnicistas do ensino de Ciências que recuperasse aludicidade e a curiosidade do professor para esta área, incentivando a parceria e cumplicidade doadulto e da criança frente à novidade do mundo.

Precisamos de uma pedagogia da infância que privilegia a integração das diferentesáreas do conhecimento, das diferentes linguagens expressivas, comunicativas e cognitivas dascrianças, capaz de produzir uma didática coerente, tanto com o novo paradigma das ciências,como com as atuais concepções de criança e ensino, em condições de formar uma criançacompetente para lidar com os problemas deste mundo cada vez mais complexo.

Esta pesquisa surgiu quando, numa das oficinas (foram um total de 11), umaprofessora/aluna fez o seguinte comentário “Já trabalhei este livro com as crianças e nunca percebique poderia trabalhar conteúdos de ciências”. Esta frase reflete bem a situação dos professoresque, formados por uma visão mecânica e linear da ciência e desprovidos de uma vivência culturalmais ampla, têm dificuldade em trabalhar interdisciplinarmente um texto literário. Assim, um livrode literatura infantil só é utilizado num contexto circunscrito da língua portuguesa para ensinargramática ou desenvolver o gosto pela leitura. O comentário dessa professora mostra a dificuldadedos educadores para perceberem a presença das ciências naturais em livros de literatura, nosfenômenos ao nosso redor, além dos costumeiros livros didáticos.

Senti então quão importante era o meu papel de formadora, o que me motivou aentrar num programa de pós - graduação e desenvolver um projeto de pesquisa que possibilitasseverificar:

- Quais as contribuições que a proposta de formação desenvolvida nas Oficinas deCiências nas semanas presenciais do Programa de Educação Continuada (PEC - FormaçãoUniversitária/Municípios/USP) trouxe para a prática pedagógica de professores de educação infantile das séries iniciais do ensino fundamental?

REFERÊNCIAS TEÓRICAS

Partimos de uma concepção sobre o ensino de Ciências que preconiza anecessidade de uma nova visão que o integre com a vida, a cultura e a produção de conhecimentoscientíficos. Assim, é de fundamental importância um ensino de Ciências que possibilite a formaçãode crianças mais sensíveis e respeitosas para com a natureza e de si próprias, assim como, umaaproximação a formas de trabalhar mais rigorosas e criativas, mais coerentes com o modo deprodução do conhecimento científico (FUMAGALLI, p.21). Estamos ainda distantes de um ensinoque permita essas aproximações e o fascínio pelo conhecimento mais elaborado (DIAS, 2003,

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p.233), que possibilite às crianças uma real alfabetização científica e cultural. Para SNYDERS(1988) somente a cultura elaborada torna o mundo compreensível aos homens. A cultura elaborada“é o ponto de vista que abre mais horizontes” (p.51) e é através da ciência que ocorre a possibilidadede nos tornarmos conscientes de nosso “ser” e “estar” no mundo. Essas visões reforçam aimportância de um ensino de Ciências que busque a unidade da cultura e o conhecimento científico,como aponta DIAS:

O sentido da unidade da cultura e o fascínio pelo conhecimento maiselaborado precisam ser recuperados em nossa sociedade decomunicação de massa cuja ênfase está no consumo e num saberdescartável e utilitário, que contaminou a própria escola (2003, p.233).

A conquista dessa unidade depende da ruptura de uma visão fragmentada decurrículo e de uma visão mais integradora de conhecimentos, levando as crianças a uma tomadade consciência do mundo de hoje e que as faça sentirem-se dignas de se apaixonarem por ele(SNYDERS, 1988, p.46). Buscamos fundamentar a organização da prática pedagógica por “projetosde trabalho” desenvolvido por HERNANDEZ (1998). Este autor apresenta uma concepção de“projetos de trabalho” como um caminho que possibilita aos alunos compreenderem o mundo emque vivem. Entende a aprendizagem como um processo de inferências e transferências entre osconhecimentos que os alunos já possuem e as novas situações-problemas ou questões propostaspelos professores (p.74). Um processo de significação e de conscientização que implica apreenderos mecanismos da própria ação, no sentido de criar novas estruturas mentais e novasacomodações.

Adotamos nas Oficinas ministradas uma metodologia para o ensino de Ciênciasproposta por DELIZOICOV e ANGOTTI (1990) que consiste de três momentos pedagógicos:problematização inicial, organização do conhecimento e aplicação do conhecimento. Estametodologia permite o reconhecimento e a aceitação dos conhecimentos prévios dos alunos, otrabalho com conteúdos constitutivos do cotidiano dos mesmos e uma postura questionadora doprofessor frente o saber e a vivência dos alunos e professores. Permite ainda uma participaçãoativa dos alunos e do professor, mediada pelo diálogo, e o desafio constante frente às situaçõesexperienciadas em sala de aula.

Para superar o “senso comum pedagógico” presente nas práticas cotidianas dosprofessores, GIL PEREZ e CARVALHO (2003, p. 26-27) destacam a importância dos professoresquestionarem a visão simplista do que é Ciência e o trabalho científico; a redução do aprendizadodas Ciências a algumas destrezas, esquecendo aspectos históricos e sociais, dentre outros.Baseados na idéia de aprendizagem como construção de conhecimentos e acreditando nanecessidade de transformar o pensamento espontâneo do professor, esses autores realizaramanálise de pesquisas sobre a didática das Ciências com o intuito de apurar o que se deve “saber”e “saber fazer” para uma docência de qualidade na disciplina e destacam: conhecer a matéria aser ensinada; conhecer e questionar o pensamento docente espontâneo; adquirir conhecimentos

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teóricos sobre a aprendizagem e, em especial, a de Ciências; formular crítica fundamentada naprática cotidiana; saber preparar as atividades capazes de gerar aprendizagem efetiva; saberdirigir as atividades dos alunos; saber avaliar e utilizar a pesquisa e a inovação.

Segundo MIZUKAMI (2003), o limite do modelo tradicional de ensino deve-se ao fatode ele não levar em conta a complexidade e os diferentes contextos em que ocorrem as práticaseducativas (p. 14). Desse fato emerge uma nova concepção de formação, num continuum, apoiadano paradigma da racionalidade prática que incorpora uma concepção construtivista deaprendizagem; neste caso, a formação docente

é vista segundo o modelo reflexivo e artístico, tendo por base aconcepção construtivista da realidade com a qual o professor sedefronta, entendendo que ele constrói seu conhecimento profissionalde forma idiossincrática e processual, incorporando e transcendendoo conhecimento advindo da racionalidade técnica (idem, p.15).

A reflexão é entendida como elemento capaz de integrar conhecimentosprovenientes da formação inicial, continuada, e das experiências vivenciadas pelos professores.ZEICHNER (1993), ao discutir o conceito de prática reflexiva, coloca que Dewey, no princípio doséculo passado, fez uma distinção entre o ato humano que é reflexivo e o que é rotina. Enquantoo ato de rotina é guiado pelo impulso, tradição e autoridade, o ato reflexivo é guiado pela intuição,emoção e paixão. Na rotina, a realidade é percebida como não apresentando problemas, e osprofessores acabam perdendo de vista as metas e os objetivos de seu trabalho. Já uma açãoreflexiva significa processo, implica uma maneira de encarar e responder aos problemas, umamaneira de ser professor (p.18).

Para MIZUKAMI (2003), a concepção de formação inicial varia segundo o modeloda racionalidade técnica ou da racionalidade prática. O modelo da racionalidade técnica privilegiaa formação inicial, enquanto momento da apropriação do conhecimento profissional. No modeloda racionalidade prática abre-se espaço para os saberes resultantes da prática e para o processode construção do profissional reflexivo.

ALMEIDA e BIAJONE (2005) citam diversas reformas realizadas em alguns paísesna formação inicial de professores. Depreende-se dessas reformas que as exigências básicaspara o exercício da prática docente envolvem tanto conhecimentos teóricos das ciências quantoconhecimentos resultantes das experiências e das práticas reflexivas. Isto vem mostrar que oscursos de formação inicial não garantem uma formação profissional competente aos profissionaisde ensino. Da mesma forma, a formação continuada tem-se caracterizado por cursos de reciclageme atualização profissional de curta duração (30-180 horas), que perpetua o modelo da racionalidadetécnica. As universidades, nesse caso, ao ofertarem tais cursos têm se constituído como produtorasde conhecimento cabendo aos profissionais do ensino fundamental e médio a aplicação,socialização e transposição didática da produção universitária (MIZUKAMI, 2003, p. 27). Cria-sedessa forma, uma dicotomia entre a teoria e a prática. Os professores tornam-se executores,sem ter participação na definição dos objetivos ou na determinação dos conteúdos de formação.

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Suas necessidades individuais não são levadas em consideração e nem são criadas oportunidadespara uma ação ativa (PARENTE, 2004, p.94).

Contrariamente têm surgido modelos de formação continuada centrados na escola(lugar de trabalho) e nas situações problemáticas colocadas pelos próprios professores. Originam-se assim pesquisas colaborativas, em que os professores aprendem a refletir e a agircooperativamente, tendo a universidade como parceira no desenvolvimento de projetos de pesquisasobre práticas escolares e sobre formação inicial e continuada (GARRIDO, 2000, p. 16). Dessaforma,

a formação continuada busca novos caminhos de desenvolvimento,deixando de ser reciclagem, para tratar de problemas educacionaispor meio de um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticaspedagógicas e de uma permanente (re)construção da identidadedocente (MIZUKAMI, 2003, p. 28).

Um desses modelos é o Programa de Educação Continuada (PEC) - FormaçãoUniversitária instituído por parcerias entre a Secretaria de Estado de Educação de São Paulo euniversidades paulistas - UNESP, USP e PUC.

PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA (PEC) – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional institui a década da educação e,no seu final somente serão admitidos professores habilitados em nível superior ou formados portreinamento em serviço (Artigo 87 § 4º), e indica como um dos eixos de atuação realizar programasde capacitação para todos os professores em exercício, utilizando também, para isso, os recursosde educação à distância (Artigo 87 § 3º inciso III). Nesse sentido, a Secretaria de Estado de Educaçãoem parceria com a Universidade Estadual Paulista a Universidade de São Paulo e a PontifíciaUniversidade Católica de São Paulo instituiu o Programa de Educação Continuada – FormaçãoUniversitária para Professores de 1ª a 4ª Séries do Ensino Fundamental (PEC- FormaçãoUniversitária). Numa primeira fase este programa envolveu professores da rede estadual e numasegunda fase foi ampliado para professores de educação infantil das redes municipais.

Esses Programas de Educação Continuada objetivavam oferecer aos docentesefetivos das redes públicas um programa superior de licenciatura plena. O funcionamento dessesProgramas consistia de cinco modalidades de atividades: videoconferências, teleconferências,trabalho monitorado, vivências educadoras, estudos independentes e trabalho de síntese do cursocom de atividades desenvolvidas ao longo de todo o Programa sob a supervisão de orientadoresacadêmicos.

Esses Programas de Formação Universitária tiveram que atender às determinaçõeslegais propostas pelas Diretrizes Curriculares Nacionais e como parte integrante destasdeterminações foi estabelecida a realização de 192 horas de Oficinas Culturais. Os alunos-professores do PEC- Formação Universitária/ Municípios sob a orientação da Faculdade de

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Educação da Universidade de São Paulo tiveram, em 2004, duas Semanas Presenciais, ocorridasno campus dessa Universidade: uma no período de 26 a 31 de janeiro e outra, de 12 a 16 de julho.Durante essas duas semanas ministramos a Oficina de Ciências intitulada “O Ensino de Ciênciasnuma abordagem interdisciplinar” para onze turmas de alunos-professores do PEC. Nossaproposta priorizava a coleta de dados e o subsídio aos alunos-professores na elaboração deprojetos de trabalho numa perspectiva interdisciplinar, que pudesse contribuir para aproximar osalunos das questões das Ciências. Buscamos conhecer e problematizar suas práticas com umaproposta de trabalho que enriquecesse os conhecimentos estabelecidos nas salas de aula. Partindode livros de literatura infantil, desenvolvemos atividades de construção de redes temáticasinterdisciplinares e discussões sobre as múltiplas possibilidades de trabalho que isto pode oferecer.Buscamos uma ruptura na seqüência de conteúdos de ciências, normalmente trabalhados naeducação infantil e séries iniciais do ensino fundamental, propiciando às crianças um ensinosignificativo e prazeroso. Refletimos sobre a importância de um ensino que respeitasse osconhecimentos que as crianças trazem para a escola; o professor como um mediador dasaprendizagens dos alunos e também constante aprendiz nesse processo; o fundamental diálogoentre professor e aluno e alunos entre si, facilitando novas aprendizagens, como também apossibilidade de organização do currículo por projetos de trabalho.

Essas oficinas foram fontes de dados da primeira etapa da pesquisa. Esta tambémse constituiu por dois estudos de casos (segunda etapa) descritos na metodologia apresentada aseguir.

METODOLOGIA DA PESQUISA

A questão motriz da pesquisa foi:-Quais as contribuições que a proposta de formação desenvolvida na Oficina de

Ciências nas semanas presenciais do PEC- Formação Universitária/ Municípios trouxe para aformação pedagógica em Ciências de professores de educação infantil e das séries iniciais doensino Fundamental?

Para a busca de dados, foi feita a opção de realizar um estudo descritivo analítico ede natureza qualitativa. Tal estudo envolveu a análise de dados obtidos durante a realização daspróprias Oficinas de Ciências (primeira etapa) e de uma pesquisa colaborativa que se desenvolveua partir de dois estudos de casos (segunda etapa).

Na primeira etapa utilizamos como fontes de dados os registros sobre asexpectativas dos alunos-professores em relação às Oficinas, suas dificuldades em ensinar Ciênciaspara as crianças e avaliação da Oficina.

Para cada uma dessas diretrizes construímos cinco categorias para análise. Emrelação às expectativas: aprender (ampliar) conhecimentos; superação das dificuldades (sanardúvidas); conhecer novas abordagens e técnicas para o ensino de Ciências; sugestões de atividadese bibliografia; que seja dinâmica e prazerosa. Em relação às dificuldades em ensinar Ciências:

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necessidade de maior conhecimento na área; como trabalhar Ciências com crianças; a falta detempo (por priorização da alfabetização) e como trabalhar de maneira integrada; falta de materialespecífico e espaço adequado; número elevado de alunos por sala. Em relação à avaliaçãoutilizamos os subitens, eu proponho, eu critico, eu felicito.

A análise dos dados desta primeira etapa revelou o conhecimento e a prática doseducadores no ensino de Ciências, além de possibilitar-nos testar uma metodologia de formaçãodo educador de Educação Infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental. Os resultados obtidosinstigaram a continuação da pesquisa para aprofundar o estudo e realizarmos uma segunda etapada pesquisa, com dois estudos de caso, focada no trabalho de campo em duas escolas, uma deEducação Infantil e outra de Ensino Fundamental, com duas professoras que freqüentaram asOficinas de Ciências durante as Semanas Presenciais numa pesquisa colaborativa, ocorrida emsalas de aula.

Optamos pelo estudo de dois casos porque são representativos de uma classe -professoras que freqüentaram as Oficinas de Ciências durante as semanas presenciais do PEC-Formação Universitária Municípios/USP em 2004 - e porque buscamos conhecer, em profundidadeesses casos particulares com suas singularidades e especificidades. Uma professora de 4ª sériedo Ciclo I do Ensino Fundamental de uma escola da Rede Estadual de Ensino de São Paulo euma professora de 3º estágio de uma Escola Municipal de Educação Infantil de São Paulo.

A atuação “in loco” da pesquisadora ensejou a possibilidade de realização depesquisa qualitativa colaborativa que permite o desenvolvimento de uma prática reflexiva dosprofessores, possibilitando um repensar das práticas cotidianas.

Uma pesquisa colaborativa é feita com a escola e não sobre a escola (GARRIDO,2000) e pressupõe diálogo, trocas, discussões entre pesquisadora e professoras, consenso etomada de decisão democrática (MIZUKAMI, 2003, p. 43). Concordamos com a posturaconstrutivista desta autora quando diz que

o conhecimento se constrói a partir de hipóteses que se estruturam ese desestruturam. O conhecimento docente também se constrói: coma quebra das certezas presentes na prática pedagógica cotidiana decada um de nós. Portanto, é preciso intervir para desestruturar ascertezas que suportam essas práticas [...] Nesse processo de parceriaentre as pessoas [...] cada um oferece o que sabe e, estando abertopara ouvir e analisar posições diferentes das suas, adquire outrasformas de ver o mundo, de se ver nele e de compreender seu papel noexercício profissional (idem, p. 43).

Dessa forma, a proposta em realizar uma pesquisa qualitativa colaborativa nospermitiu, além de uma atuação enquanto pesquisadora, assumir uma dimensão formadora. Nessemomento as fontes de dados foram obtidas por meio de observação participante no contextoescolar; análise de conteúdo de relatos de alunos e professoras; análise das produções e avaliaçõesdos alunos; e entrevistas.

Como metodologia de análise dos dados utilizamos a interpretação direta (STAKE,1999, p. 69) e a reflexão cooperativa (GARRIDO, 2000, p.40).

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STAKE diz que, para alcançar os significados dos casos, os pesquisadores utilizamduas estratégias: a interpretação direta dos exemplos individuais e a soma de exemplos, até quese possa dizer algo sobre eles como conjunto ou classe (p. 69). Para este autor não se trata deser um pesquisador mais qualitativo ou mais quantitativo. Em sua análise, o pesquisador buscadar sentido a determinadas observações do caso, por meio de um estudo mais atento e da reflexãomais profunda de que for capaz, gerando, portanto, uma análise muito subjetiva. Diz, ainda, queos livros sobre metodologia (como o dele) oferecem convicções, não receitas e que cadapesquisador deve encontrar as formas de análise que lhe serão úteis (p. 71). Nesse sentido,compartilhamos com GARRIDO (2000)

o pressuposto de que através da reflexão cooperativa os professoresse tornam capazes de problematizar, analisar e compreender suaspróprias práticas, de produzir significado e entendimento que permitemorientar o processo de transformação das ações escolares (p.40).

Através do processo de reflexão colaborativa e apoiada nos referenciais teóricosque sustentam esta pesquisa, partimos da hipótese da possibilidade de produzir conhecimentosque possam contribuir para formação de professores de educação infantil e das séries iniciais doensino fundamental em Ciências.

O objetivo geral da pesquisa foi:- Analisar as contribuições que a proposta de formação desenvolvida na Oficina “O

ensino de Ciências numa abordagem interdisciplinar” nas semanas presenciais do PEC-FormaçãoUniversitária Municípios trouxe para a formação e a prática pedagógica de professores de educaçãoinfantil e das séries iniciais do ensino fundamental.

Tivemos como objetivos específicos as seguintes questões:- Analisar quais atividades realizadas na Oficina “O ensino de Ciências numa

abordagem interdisciplinar” foram importantes para a prática pedagógica dos professores.- Identificar os aspectos positivos e negativos dos trabalhados nas semanas

presenciais.- Analisar quais aspectos da proposta de formação da Oficina “O ensino de Ciências

numa abordagem interdisciplinar” foram considerados, pelos professores, como facilitadores parasuas práticas pedagógicas atuais.

- Analisar, a partir de projetos desenvolvidos pelos professores com seus alunos,aspectos que eles consideram como decorrentes de aprendizagens oriundas da proposta daOficina “O ensino de Ciências numa abordagem interdisciplinar”.

RESULTADOS

Primeiramente, gostaria de ressaltar o caráter inovador e a importância do Programade Educação Continuada- Formação Universitária na graduação de um contingente muito grandede professores da Educação Infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental das redes municipais

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e estadual de ensino do Estado de São Paulo. Inovador em dois aspectos: por apresentar umaconcepção de formação de natureza híbrida, ou seja, por caracterizar-se tanto como formaçãoinicial em nível universitário, como formação continuada para profissionais efetivos da educação,em média, com quinze anos de atividades nessas redes de ensino (CARNEIRO, 2006); e porutilizar uma metodologia que integra ensino presencial e a distância, através de mídias interativasque possibilitam momentos de trabalho e estudo on e off-line dos participantes.

A importância deste Programa Especial de Formação emerge tanto nos depoimentosdos alunos-professores que participaram da Oficina de Ciências nas Semanas Presenciais (fontesde dados da primeira etapa desta pesquisa) como nos relatos orais e escritos das duas professorasescolhidas para trabalhos na segunda etapa. Esses relatos confirmam que a formação deprofessores deve ocorrer num continuum, evidenciando a não suficiência da formação inicial parao desempenho da docência. Os dados da primeira etapa revelam a necessidade de aprender eampliar mais os conhecimentos adquiridos e daí surge a importância que teve o PEC- FormaçãoUniversitária no sentido de atualizar e ressignificar os conhecimentos que os alunos-professoresjá detinham.

Em relação às aprendizagens específicas proporcionadas pelo PEC, evidencia-sea formação de uma visão mais crítica sobre suas práticas pedagógicas. Pudemos verificar, nasegunda etapa da pesquisa, a aquisição de práticas reflexivas sobre-a-ação e a reflexão sobre areflexão-na-ação, quando verbalizavam suas angústias e suas necessidades para melhorencaminhamento nos projetos de trabalho desenvolvidos com os alunos. Outra questão bastantesignificativa é o fato de as professoras terem mudado “o olhar” para com os alunos, passando apercebê-los como sujeitos da aprendizagem e como detentores de conhecimentos e de concepçõesprévias sobre os fatos e fenômenos que os cercam. Além disso, passaram a dar-lhes voz e aouvi-los, isto é, passaram a respeitá-los e a desenvolver uma atitude mais democrática em salade aula.

A ausência de um trabalho coletivo foi o responsável pela falta de motivação e desegurança, fatores importantes para que as professoras atuassem com maior liberdade e solturano desenvolvimento de um trabalho por projetos; também representou desestímulo quando doretorno às suas escolas, após a conclusão do PEC.

As professoras acreditam na proposta, têm condições e competências, mas nocaso das duas professoras, essa ausência de parceiros desestimula-as a se aventurarem, sozinhas,numa atividade pedagógica diferenciada e na qual acreditam. Este é um fator muito forte queacaba por minar as potencialidades de trabalho dessas duas professoras. Aliado a esse fator,coloco a falta de uma política pública de acompanhamento e de formação diretamente nas escolas,pois o que verificamos é um descompasso entre as concepções de educação, ensino eaprendizagem preconizadas nos materiais do PEC e as concepções encontradas nas escolasanalisadas. É preciso resgatar a importância das unidades escolares como locais de aprendizageme torná-las comunidades aprendentes (HARGREAVES, 2004), no sentido de romper com afragmentação e cristalização do currículo, na busca de uma integração entre os profissionais da

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educação e entre os conteúdos das diferentes áreas do conhecimento, para que o Projeto PolíticoPedagógico reflita as reais necessidades e expectativas de toda comunidade escolar e se con-cretize.

Essa falta de unicidade repercute na dificuldade das duas unidades escolares emfacilitarem e promoverem um enriquecimento e uma alegria cultural, necessária para que a escolaseja um lugar de satisfação (SNYDERS, 1988, p.109).

Outra dificuldade para um trabalho mais competente é o número de alunos porclasse, em média, 36 freqüentes nas duas escolas.

Apesar de um tempo relativamente curto, pudemos constatar a construção deconhecimentos de valor significativo para o trabalho em Ciências junto alunos e professores,expressos nos relatos das duas professoras e nos trabalhos realizados pelos alunos.

A intervenção “in loco” fortaleceu uma vontade e uma possibilidade vislumbradapelas professoras, mas ainda com imagem de “ousadia” e fora do planejamento e do conteúdoescolar. O “fazer diferente” mobilizou o grupo e teve repercussão fora da escola, percebido pelacarta do avô de um aluno à professora. As ligações estabelecidas entre a escola, a vida e oconhecimento puderam ser sentidas mesmo que de um jeito fugaz, pelo tempo de vida de umprojeto. Este não significou apenas aumento de informações e conteúdos, mas possibilitou àscrianças registros pessoais, feitos por palavras ou desenhos. Um girassol não é só uma flor compétalas, mas vira arte, vira vínculo de afeto quando as crianças têm espaço para integrar-se coma cultura, a arte e a educação. Nesse sentido, as imagens registradas pelas crianças falam daalegria cultural que se busca nas escolas e que pôde ser atestada como possível, durante ostrabalhos com as professoras nas Oficinas de Ciências do PEC.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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GARRIDO, Elsa. Pesquisa Universidade-Escola e Desenvolvimento Profissional do Professor.Tese apresentada à Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, para obtenção doTítulo de Livre-Docência, 2000.

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INTRODUÇÃO

A necessidade de mudanças nos rumos da educação no Brasil tem colocado emevidência a formação de professores e, conseqüentemente, a formação inicial oferecida peloscursos de Licenciatura. Há visões diferentes do que significa “ser um bom professor” e até mesmodas funções da escola em uma sociedade em constante mudança e que atravessa uma fase deincertezas e busca de identidade.

A disciplina de Estágio Supervisionado de Matemática na Educação Básica,oferecida nos cursos de Licenciatura em Matemática da UFSCar no sétimo período, proporcionouaos alunos cerca de cento e vinte horas de estágios nas escolas durante o semestre, além dosencontros para debates e trocas de experiências na Universidade. O objetivo desta pesquisa écompreender o trabalho colaborativo realizados pelos futuros professores e alguns dos professoresdas escolas onde eles realizaram seus estágios. Algumas questões foram levantadas nos de-bates em sala de aula na Universidade: Como deve ser a relação Universidade-Escola para que oconhecimento gerado seja formador para ambas as partes? Como fazer para que o futuro profes-sor olhe a realidade escolar com olhar investigativo? Como promover e facilitar a colaboraçãoentre os futuros professores e os professores das escolas parceiras? Para tentar responder aestas indagações procuramos realizar um trabalho mediado pela teoria disponível sobre o tema,os diários de campo dos futuros professores e observações participantes dos formadores nassalas de aula. Para este trabalho contamos com a fundamentação teórica de Colchran-Smith eLytle (1999) sobre as relações entre conhecimento e prática e de Fiorentini (2004), Ponte e Boavida(2002) e Pimenta (2001, 2005) sobre práticas colaborativas.

Colchran-Smith e Lytle (1999) destacam três concepções de aprendizado deprofessores: o “conhecimento-para-a-prática” o “conhecimento-em-prática” e o “conhecimento-da-prática”. No conhecimento-para-a-prática parte do pressuposto de que os pesquisadores nonível universitário geram o conhecimento formal e as teorias para que os professores os usempara melhorar suas práticas profissionais. No conhecimento-em-prática pressupõe-se que osprofessores iniciantes aprendem com os professores competentes, uma vez que é valorizado oque é conhecido como conhecimento prático. A terceira concepção, o conhecimento-da-prática,procura romper com a dualidade entre o conhecimento formal e o conhecimento prático,considerando as salas de aula dos professores como locais para uma investigação intencional,

O ESTÁGIO NA FORMAÇÃO INICIAL DEPROFESSORES: UM TRABALHO COLABORATIVO

ENTRE UNIVERSIDADE E ESCOLA

Maria Aparecida Vilela Mendonça Pinto Coelho (UFSCar/UNICAMP)

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usando a sua própria prática e a teoria produzida por outros como material para questionamentoe interpretação.

Nesse sentido, os professores aprendem quando geram conhecimentolocal “de” prática trabalhando dentro do contexto de comunidades deinvestigação, teorizando e construindo seu trabalho de forma a conectá-lo às questões sociais, culturais e políticas mais gerais (Colchran-Smith e Lytle,1999, p. 2)

Nessa perspectiva, a geração de conhecimento e seu uso são consideradosproblemáticos e sempre abertos a discussão, portanto inseparável do sujeito que conhece. Abase desta concepção está em o professor considerar suas salas de aula como locais deinvestigação, conectando seu trabalho a questões políticas, intelectuais e sociais mais amplas eassumindo um ponto de vista crítico na teoria e na pesquisa de outros. A concepção deconhecimento da prática parte do pressuposto de que o conhecimento que os professores devemter para ensinar bem emana de uma investigação sistemática do ensino, construído coletivamentedentro de comunidades locais e conectados a agendas políticas e sociais mais amplas.

A idéia central neste trabalho é de que o conhecimento da prática aolongo de toda a vida profissional é gerado pela transformação da salade aula e das escolas em locais de pesquisa, através do trabalhocolaborativo em comunidades de investigação, para compreender aco-construção do currículo, o desenvolvimento do conhecimento lo-cal, e a tomada de uma perspectiva crítica com relação a teorias epesquisas de outros (p. 30).

Os autores apontam o trabalho colaborativo em comunidades de investigação comofundamentais para que seja gerado o “conhecimento da prática” através de um processo reflexivoque possa permitir a produção de significados em um longo período de tempo através decomentários, tensões, diferenças e oposições. Nesse sentido, a sala de aula e a escola sãotransformados em locais de pesquisa, baseados no contexto intelectual, social e cultural do ensino.

O TRABALHO COLABORATIVO

De acordo com Fiorentini(2005) nem todo trabalho coletivo é autenticamentecolaborativo. Na colaboração todos trabalham conjuntamente e se apóiam mutuamente, visandoatingir objetivos comuns negociados pelo coletivo do grupo.

Esse desejo de trabalhar e estudar em parceria com outrosprofissionais resulta de um sentimento de inacabamento e incompletudeenquanto profissional e da percepção de que sozinhos é difícil darconta desse empreendimento (p. 54).

Neste caso o autor se refere a pessoas dispostas a compartilhar espontaneamentealgo de interesse comum, não havendo hierarquia entre os membros. Ele destaca também que

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um grupo colaborativo não está livre de tensões decorrentes de relações internas de poder e poresse motivo necessita ser flexível e estar aberto para rever acordos e enfrentar juntos ascontradições do mundo da prática. Envolve, portanto, negociações cuidadosas e tomada conjuntade decisões. Para que possa se realizar um trabalho colaborativo nesta perspectiva, torna-senecessário que, mesmo nos grupos que podemos considerar heterogêneos, como no caso doque é formado por professores escolares, alunos de Licenciatura e professor da Universidade, éimportante que a crença que norteia os trabalhos seja a de que todos têm o que dar e o quereceber, de acordo com sua função e que todos lucram com as interações. Embora os objetivossejam comuns, todos atuam desempenhando papéis diversos. Pimenta (2005) destaca o papeldo pesquisador universitário, como o de ajudar o grupo a problematizar as questões vivenciadas,ou seja, situá-las em um contexto teórico mais amplo, possibilitando a ampliação da consciênciados envolvidos, com o objetivo de planejar as formas de transformação das ações e práticasinstitucionais que se fizerem necessárias. Nesse sentido, faz uma distinção entre prática e ação:

Esta [ação] pertence aos sujeitos, é própria dos seres humanos quese expressam nelas. Na ação, agimos de acordo com o que somos e,no que fazemos, é possível identificar o que somos. A prática pertenceao âmbito do social e expressa a cultura objetivada, o legadoacumulado, sendo própria das instituições. É certo, no entanto, quenossas ações expressam práticas sociais e que estas são constituídasa partir dos sujeitos historicamente considerados (p. 523).

A autora destaca ainda que a pesquisa colaborativa tem por objetivo criar nas escolasuma cultura de análise das práticas que são realizadas, a fim de possibilitar que os professores,auxiliados pelos docentes da universidade, transformem suas ações e as práticas institucionais.

Boavida e Ponte (2002) se referem a um aspecto que julgamos importante nosgrupos colaborativos:

Apesar das dificuldade acrescidas que poderão surgir nestas equipas,elas têm, no entanto, a vantagem de possibilitar olhares múltiplossobre uma mesma realidade, contribuindo, assim, para esboçarquadros interpretativos mais abrangentes para essa mesma realidade(p. 5).

Os autores citam também outro aspecto que caracteriza os grupos colaborativos,que é o reconhecimento de objetivos particulares específicos para cada um dos membros.Destacam que esses objetivos existem sempre, podendo ser explícitos ou implícitos, conscientesou inconscientes. Pimenta, Garrido e Moura (2001) chamam atenção para a cultura internaproduzida pelas organizações escolares e que lhes são próprias, que exprimem os valores e ascrenças que os membros da organização partilham. Nesse sentido, elas não são apenasdivulgadoras, mas também produtoras das práticas sociais, mobilizando vários tipos de saberes:de uma prática reflexiva, de uma teoria especializada e de uma militância pedagógica.

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A EXPERIÊNCIA DE ESTÁGIO DOS FUTUROS PROFESSORES

Os episódios para a análise foram coletados dos diários de campo dos alunos, queeram enviados semanalmente, comentados pela professora de estágio e devolvidos para os futurosprofessores, em alguns casos com sugestões da bibliografia para esclarecer dúvidas e instigarnovas reflexões. Com o objetivo de compreender o trabalho colaborativo realizado pela professorada Universidade, os futuros professores e os professores das escolas onde foram realizados osestágios, procuramos nos orientar pelas questões: Como deve ser a relação Universidade-Escolapara que o conhecimento gerado seja formador para ambas as partes? Como fazer para que ofuturo professor olhe a realidade escolar com olhar investigativo? Como promover e facilitar acolaboração entre os futuros professores e os professores das escolas parceiras? No episódioque se segue a aluna comenta o método usado pela professora e revela ter tido a oportunidade decolaborar com ela durante a aula (as falas dos futuros professores serão identificadas pelas siglasAJ, AA, AV, AS, da professora de estágio por PE e da professora da escola por uma letra maiúscula):

AA: Achei o método usado pela professora F para a abordagem desólidos geométricos muito bom, pois acredito que seja mais fácil paraa absorção de conceitos quando pode ser feita do concreto para oabstrato. Além disso, é muito bom quando podemos ajudar a professorae os alunos durante a aula. Acho que é esse o principal objetivo doestágio.PE: Gostaria de saber mais detalhes sobre a aula, como ela trabalhouos conceitos, se aproveitou para trabalhar Geometria Plana... E a teoria,o que diz a esse respeito? Dê uma pesquisada.

A futura professora revela ter em mente o principal objetivo do estágio, que é o detrabalhar colaborativamente com a professora da escola. Procuramos instigar a reflexão e o espíritoinvestigativo da estagiária propondo novas questões e apontando a necessidade do apoio dateoria, para que a experiência não se resuma a uma simples descrição de fatos baseados nosenso comum. Os futuros professores AV e AS, parceiros de estágio, revelam suas experiênciasem uma regência de aula:

AV: A aula que preparei fala sobre Geometria Plana. Esta aula foi umaproposta da professora L para os estagiários. Esta proposta consistede dois momentos: O primeiro momento consiste em uma aula duplasobre a teoria em cada sala e o segundo momento é dado por umaaula dupla de exercício/dúvidas em cada sala. O segundo momento énecessário porque os alunos devem entregar um trabalho que consisteem uma lista de exercícios sobre a matéria dada.AS: Passamos todo o tempo corrigindo as provas de noções degeometria plana, referente às aulas que demos. Surpreendeu-mebastante as notas: as médias das salas estavam extremamente baixas,mesmo depois da significativa participação que os alunos tiveram du-rante a explicação do conteúdo. A professora L propôs que fizéssemosalterações quanto ao valor de cada exercício, dando maior valor aosque fossem mais fáceis; esta é uma saída, de fato as notas subirãoum pouco, mas não muito. Estou com um pouco de receio em executartal alteração, temendo ser injusto com os alunos que conseguiram

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fazer os exercícios mais difíceis e não tiveram tempo de fazer os demais,além das demais alterações que deveram ser feitas nos outros tiposde provas, já que foram quatro provas distintas, porém semelhantes.Assim, decidi esperar até o próximo encontro na escola, para conversarmelhor com a L e ver se conseguimos encontrar uma saída maissatisfatória para todas as partes envolvidas: alunos e docentes.

Os futuros professores revelam as sugestões apresentadas pela professora daclasse para os estagiários e até mesmo uma “saída” para resolver o problema das notas baixas.AS destaca o receio de ser injusto com os alunos e propõe um encontro com a professora paradiscutirem uma saída mais satisfatória para todas as partes. A concepção subjacente deconhecimento, nesse caso, parece se aproximar da caracterização apresentada por Cochran-Smith e Lytle (1999) do “conhecimento da prática”, que é gerado dentro de comunidades deinvestigação, contrapondo-se ao “conhecimento em prática”, de estudar os peritos. Ao invés disso,segundo as autoras, novas relações colaborativas se estabelecem, substituindo a relação perito-novato (p. 35). Podemos perceber que a professora dá sugestões e também dá voz aos estagiáriospara que apresentem as suas. No episódio seguinte o aluno AV revela ter se apoderado, de formareflexiva, da experiência da professora L. A professora formadora procura instigar a reflexão apoiadana teoria:

AV: Pela observação realizada, vemos que a professora firma umcontrato didático com cada turma que ministra aulas e então viabilizasuas aulas através deste instrumento didático.PE: Você procurou saber mais detalhes sobre esse contrato? Vocêpode estudar um pouco da teoria de contrato didático para dialogarcom ela. AV: Ora, sem um contrato didático algumas aulas se tornamimpossíveis. Nas salas visitadas pudemos notar que todos os alunosapresentam uma boa postura e vontade de assistir aulas. Acreditoque isto é resultado do contrato didático firmado pela professora. Tenhobons exemplos para isso; 1ºD e 1ºF. São turmas de alunos maisexpansivos e que prestam atenção nas aulas se a professora chamara atenção deles algumas vezes. Mesmo assim a indisciplina nestesprimeiros anos é muito pequena.O fato mais importante deste primeiro contato é um aluno do 1º F.Este aluno nasceu no Paquistão e está no Brasil há pouco tempo, ouseja, não consegue se comunicar na nossa língua ou muitas vezes secomunica muito mal. Este aluno tem domínio da língua inglesa e aprofessora L pediu que eu auxiliasse este aluno porque falo inglês.

O aluno AV revela também o auxílio prestado à professora ao dar assistência aoaluno estrangeiro. Este episódio vem ilustrar a observação de Fiorentini (2005) sobre o desejo detrabalhar e estudar em parceria devido a um sentimento de inacabamento e incompletude e dapercepção de que sozinho é difícil dar conta do empreendimento. A aluna AA, em outro episódio,revela a abertura da professora a idéias novas e o incentivo que ela dá aos futuros professorespara colocarem os seus métodos e suas idéias nas aulas:

AA: O segundo fato ocorreu quando a professora estava explicandotécnicas de divisão através de três métodos: “Método Curto”, “Método

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Longo” e outro que se baseava na multiplicação do divisor por múltiplosde dez. F estava fazendo um exercício com esse outro método e suamaneira de resolvê-lo não estava de acordo com a técnica. AJ [parceirade estágio] lhe disse qual era a maneira correta de desenvolvê-lo e aprofessora pediu para que fizesse aquele cálculo na lousa, e ela assimo fez. Esse gesto se repetiu nas duas aulas seguintes. Gostei daatitude da professora, pois se mostrou aberta a novos conhecimentos.Acredito que esse tipo de relação entre professora e estagiáriasenriquece muito o estágio, contribuindo para a nossa formaçãoacadêmica.PE: é muito bom que vocês possam colaborar. Ela também tem muitoa colaborar com vocês. Faça perguntas e procure esclarecimentossobre as práticas dela em sala de aula.

A futura professora se sentiu valorizada ao presenciar a parceira ser incentivada aapresentar para a classe o seu método de resolução. A professora de estágio aproveitou aoportunidade para reforçar as bases do trabalho colaborativo e a necessidade de trocar experiênciase saberes. Nesse sentido, segundo Cochran-Smith e Litle (1999), A chave é que os estudantesprofessores são socializados no ensino por meio de uma comunidade de pesquisadores eaprendizes que vêem o questionamento como parte da tarefa de ensinar (p. 41). No episódioseguinte o futuro professor AV narra sua experiência de monitoria:

AV: Hoje começa minha atividade como monitor na escola. Estaatividade de monitoria foi proposta pela professora L com a intençãode que os alunos da escola tenham uma oportunidade extra-classe deaprendizagem. A professora L pediu-me hoje que eu ficasse com umaaluna do 3º colegial para ajudá-la com a matéria de inequações. Fiquecom a aluna o tempo todo, pois ela tinha diversas dúvidas sobre comodar a resposta de uma inequação, como por exemplo mostrar oconjunto solução de uma inequação. Esta aluna quer prestar vestibu-lar e por isso está fazendo um estudo intenso, ou seja, está fazendocursinho paralelo ao 3º colegial. Esta garota trouxe-me uma apostilade cursinho com vários exercícios. Ficamos 2 horas conversando sobreexercícios e com dar a resposta a uma questão de múltipla escolha.Portanto, esta foi uma atividade bem tranqüila, devido ao fato de ficareu e uma aluna em uma atividade pedagógica.

O futuro professor AV conta sua experiência em sala de aula, durante uma regênciaque realizou:

Todo este conteúdo foi pedido pela professora L. Digo que é muitoconteúdo para ser passado em duas aulas, pois minha experiênciamostrou que não consigo cumprir toda esta ementa em duas aulas.Esta aula é uma situação especial, porque você é estagiário. Mas elaserve como reflexão: Como seria se você tivesse mais autonomia?

O futuro professor percebe que a experiência de estágio, embora importante, temmuitas diferenças em relação a uma aula normal. Ele destaca a questão da autonomia e essa éuma diferença importante, mas existem outras. A situação de estágio, como indica Shon (2000)promove a liberdade para aprender através do fazer, em um ambiente de risco relativamentebaixo (p. 25). O autor argumenta que as escolas profissionais devem repensar tanto a epistemologia

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da prática, quanto os pressupostos pedagógicos sobre os quais seus currículos estão baseadose valorizar e ensino prático reflexivo como um elemento chave da educação profissional. A alunaAJ narra um episódio que ela julgou marcante para a sua experiência profissional:

AJ; O fato mais marcante de hoje foi a indisciplina da 5ª A. Já no inícioda aula, a professora me pediu para olhar a sala um instante, poisprecisava buscar um livro na biblioteca. Os alunos até que ficaramquietos por um tempo, mas depois começou a conversa e algunsdeles saíram de seus lugares. Foi trabalhoso fazê-los se acalmarem,mas consegui. A professora voltou e retomou a aula. Mas a conversatambém foi retomada pela turma. F ficou tão nervosa que até errou umexercício que estava corrigindo na lousa. Quando saímos da classe,ela desabafou dizendo que em alguns momentos fica muito desanimadadiante desse tipo situação, pois muitos alunos não têm o menorrespeito pelo professor. Alguns deles não respeitam nem sequer ospais, quem dirá então uma outra pessoa?

A futura professora teve a oportunidade de perceber aspectos que vão além da salade aula, situando-se em contextos sociais mais amplos. Uma reflexão mais aprofundada sobreessas questões na sala de aula na Universidade pode levar o futuro professor a conectar seusesforços a questões sociais e políticas mais amplas. No episódio seguinte o aluno AS faz umareflexão que mostra como em determinados momentos o estagiário se sente professor da turmae responsável por ela:

AS: Aula perfeita: Consegui fazer todos os exercícios que tinha separadopara a turma, finalizando seu cronograma de estudo sobre funçõesafim, como eu havia previsto. Reservei alguns minutos do fim da aulapara bater um papo com meus alunos, pois percebi que alguns delesnão estavam agindo normalmente. Disseram-me que estavam assimpor conta do cansaço de fim de tarde. Foi muito gostoso este papoque tive com eles; acabaram falando bastante sobre si mesmo, sobreseus problemas, suas ideologias, a forma como vêem as coisas etudo mais. Por fim, me cobraram a brincadeira ou curiosidadematemática que sempre levo, mas que, hoje, não tive tempo parapreparar.

AS: A professora L pediu que fizesse uma introdução referente a funçõesdo segundo grau. Para tal deu uma olhada no livro que estavam usandoe acabei não gostando muito da forma em que as coisas estavamdispostas ou como eram definidas. Assim, acabei somente por usar olivro para ver os tópicos que ali seriam tratados, fechando-o eimprovisando um esquema de estudo, mais resumido, tentando clarearum pouco mais as definições usadas pelo livro. Como os garotos tinhamacabado de fazer um estudo sobre gráficos de funções, optei porensinar, também, os gráficos de funções do segundo grau; o que acabousendo um ato falho meu, pois, disse-me mais tarde a professora, queeste seria somente feito no mês de agosto. Por fim, acabei algebrizandoo problema de forma que o estudo de funções deste tipo fosseequivalente ao estudo de áreas, cujo domínio era maior por parte dosalunos. Acho que fiquei um pouco triste com a aula que dei, já queacabei judiando um pouco daqueles jovens com uma hora e quarentade matemática densa. Mas, como já disse, foi a decisão que tomei,pois queria que tivessem uma boa e firme base teórica antes de partirem

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para o pragmático. O maior inimigo do professor é o tempo.PE: Acho que existem outro inimigos. Podemos falar sobre eles amanhãna Universidade.

A futura professora AJ se refere a uma conversa após a regência de uma outradupla que estava estagiando na mesma escola. Procuramos realizar as reflexões sobre asregências em conjunto para que todos pudessem aproveitar das reflexões:

AJ: E assim encerrou a aula. A AA, AD, PE e eu fomos ao pátio paraconversar sobre a regência delas, acho isso muito bom, pois servepara analisar e melhorar numa próxima vez.PE: O que você achou da reflexão após a experiência? Você, comoprofessora, poderia fazer isto após cada aula? E qual foi o papel dosinterlocutores na experiência?

CONCLUSÕES

O objetivo de compreender o trabalho colaborativo realizado pelos futurosprofessores e os professores das escolas onde se realizaram os estágios nos levou a reflexõessobre a escola como uma comunidade de investigação. Nesse sentido, procuramos instigar nossosalunos, futuros professores, a buscarem e oferecer colaboração, formando parcerias quepudessem levá-los a compreender melhor as práticas pedagógicas e a contribuir com idéiasnovas para melhorar essas práticas. As questões levantadas sobre as relações Universidade-Escola nos levaram a refletir sobre o grande potencial para a educação que emana de situaçõesnas quais prática e pesquisa caminham juntas, em grupos colaborativos e comunidades deinvestigação. É importante que o futuro professor olhe a realidade escolar com olhar investigativo,buscando compreender a realidade e tentando agir sobre ela e não apenas a descrevendo eaceitando suas limitações, da forma como alguns deles chegam a se referir nos diários de estágio.A colaboração entre os futuros professores e os professores das escolas parceiras deve serincentivada e pode ser facilitada pela ação mediadora do professor formador.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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SCHÖN, D. A. Educando o profissional reflexivo: um novo design para o ensino e a aprendizagem.Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.

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1 INTRODUÇÃO

Temos, atualmente, vivenciado o fenômeno preconceito de maneira polissêmica,por meio de variadas formas, tonalidades e conotações. Essa diversidade e variedade estão seapresentando de modo sutil ou agressivo, implícito ou explícito, visível ou invisível.

O preconceito, presente nas relações cotidianas em geral, adentra a todas asesferas da realidade social. Uma dessas esferas, dentre tantas outras, na qual o preconceito estápresente é na instituição escolar. Embora a escola seja uma instituição social que tem por funçãopossibilitar, por meio da educação formal, a promoção humana, ela expressa, contraditoriamente,mas não de modo mecânico ou passivo, as relações sociais existentes, inclusive, as relaçõespreconceituosas.

É dentro desse contexto que situamos nosso estudo e, também, expressamosnosso objetivo. Buscamos investigar se a forma de ocupação do espaço da sala de aula dealunos de um curso de formação de professores, em nível médio, interfere na relação pedagógicaentre professores e alunos.

Qual era, exatamente, nossa preocupação? Nossa preocupação estava centradanos alunos que, em seu processo formativo, ocupam o espaço localizado ao fundo da sala deaula e que são, comumente, estigmatizados como alunos do “fundão”.

Nossa investigação foi desenvolvida em dois momentos que estão inter-relacionados: estudo bibliográfico e estudo de campo.

Para o primeiro momento, realizamos um estudo bibliográfico, o qual foi constituídode análise das produções de autores brasileiros (CROCHIK, 1995; BORNIOTTO 2002), eestrangeiros (SNYDERS, 1988; SCHIFF, 1993). Esses autores discutem, especificamente, nossoobjeto de estudo •o preconceito. Suas análises apresentam e tratam do preconceito tanto de umaperspectiva genérica quanto se dedicam àqueles preconceitos manifestos no contexto da escola.Por outro lado, necessitamos, também, das produções voltadas à questão da educação escolar(SANFELICE, 1986; BRANDÃO, 1986), a fim de que pudéssemos realizar nossas reflexões acercado objeto de estudo no contexto escolar.

Para o segundo momento, o estudo de campo, escolhemos a técnica da observaçãoparticipante (também denominada de observação direta), cujos dados são obtidos “[...] por meiodo contato direto do pesquisador com o fenômeno observado [...]” (CHIZZOTTI, 2000, p. 90). Em

O PRECONCEITO QUE MARGEIA OS ALUNOS DO“FUNDÃO”: UMA QUESTÃO NA FORMAÇÃO DE

PROFESSORES?

VIEIRA, Renata de Almeida ; MACIEL, Lizete Shizue Bomura (UEM)

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nosso caso recolhemos dados, que denominamos de qualitativos, acerca da relação pedagógicaentre professores e alunos de uma 2ª série de um curso de formação de professores, em nívelmédio. A instituição escolar é pública e está localizada no município de Maringá, região noroestedo estado do Paraná.

Os dados que conseguimos obter por meio da observação participantepossibilitaram-nos uma intensa reflexão acerca dos alunos que se localizam ao fundo da sala deaula. Os estudos bibliográficos que realizamos ofereceram-nos subsídios para a explicação e acompreensão do nosso objeto.

Inter-relacionando os dados de campo com os estudos bibliográficos, buscamosentender os nexos que compunham o preconceito em relação aos alunos do “fundão” e refletirsobre eles, sem perder de vista os imperativos da prática social na atualidade.

2 O ESTUDO DE CAMPO: A TURMA OBSERVADA E O “FUNDÃO”

As questões que problematizamos neste trabalho tiveram origem no decurso dadisciplina de Metodologia e Prática do Ensino Médio – modalidade Normal, do 4º ano do curso dePedagogia da Universidade Estadual de Maringá, em 2005, mais precisamente nas situaçõesobservadas durante o cumprimento do Estágio Supervisionado, como parte da formação inicialde professores para esse nível de ensino. Em continuidade, neste momento, encontramo-nos nacondição de pós-graduanda, em nível de mestrado, e de orientadora, do Programa de Pós-Graduação em Educação, dentro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação, Preconceitoe Formação de Professores, vinculado ao CNPq, a partir da qual retomamos o texto analíticoproduzido naquela oportunidade para a disciplina, visando aprofundar as reflexões daquele processoformativo.

Ao retomarmos nossas observações, situamos nosso leitor que a 2ª série estavaacomodada em uma sala de aula de porte médio, comportando confortavelmente em torno de 25alunos, mas que abrigava 35 alunos. Em sua constituição material essa sala tinha um quadro degiz; um pequeno armário; ventiladores de teto; e um mural vazio e em condições precárias.

Alguns alunos se faziam presentes em sala antes mesmo do horário de início dasatividades escolares (7h30min.), indicado pelo sinal audível em todos os espaços da instituiçãoescolar.

Em sala de aula, observamos que os alunos conversavam, riam, mexiam em seustelefones celulares, desenhavam no quadro de giz, mas não disponibilizavam seus livros oucadernos sobre a carteira antes da chegada dos professores. Mesmo com a entrada do professorem sala de aula os alunos não se mobilizavam para o seu início, pois se mantinham indiferentes.Essa indiferença independia do horário da aula, cabendo, em todas as oportunidades, aosprofessores chamar-lhes a atenção para o início e o respectivo desenvolvimento das aulas.

Um outro aspecto que nos chamou a atenção foi a forma como os alunos seutilizavam de diferentes estratégias para diferentes professores. Dependendo do professor que

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adentrava a classe, cuja postura e forma de encaminhamento de aula os alunos já conheciam, osmesmos se mobilizavam com mais ou menos rapidez para seus lugares, com mais ou menoscuidado.

Destacamos que a forma como os alunos retiravam o material da bolsa, oscomentários que realizavam entre si em relação à aula em questão, o modo como dirigiam aatenção ao professor ou, então, o ato de ignorar a sua presença, enfim, a postura dos alunos emcada disciplina, bem como a forma como o professor iniciava e encaminhava sua aula, foi colocando,em evidência, elementos que, se refletidos, possibilitariam a nossa compreensão das relaçõespedagógicas, ali, construídas.

Ao examinarmos um pouco mais acerca dessas relações, foi possível detectarmosuma variação de respostas dadas, pela turma, aos diferentes professores. Exemplificamos essasvariações correntes nessa turma. Para um determinado professor os alunos respondiam àssituações de aula com atitudes de enfrentamentos indiretos como, por exemplo, conversasparalelas sobre assuntos outros que não aqueles tratados na ou pela disciplina, evasão da sala,longas conversas no celular, silêncio diante de alguma pergunta ou manifestação do professor. Jápara outro professor mudavam consideravelmente as atitudes, pois se integravam à aula,respondiam ao que lhes eram solicitados, opinavam, perguntavam, participavam, e mesmo quandorecebiam críticas ou eram corrigidos em alguma coisa, mantinham-se participativos e receptivosao professor.

Percebemos que tais oscilações estavam diretamente vinculadas às posturasassumidas pelos professores no exercício de sua prática pedagógica. Esse pareceu-nos ser umdado importante que observamos.

As posturas pessoais e didático-pedagógicas dos professores foram tambémbastante diferenciadas. Verificamos professores que entravam em sala de aula de forma sisuda,fechada; não explicitavam aos alunos as alterações de suas aulas como interrupção de umdeterminado conteúdo ou de uma determinada atividade, mudança do conteúdo em estudo;realizavam solicitações de trabalhos escolares sem muito sentido pedagógico, demonstrandofalta de objetivos claros; não dirigiam sua atenção ao coletivo da sala de aula, mantendo a atençãoapenas para um determinado grupo de alunos, alijando os demais alunos de sua atenção.

Frente a essas posturas os alunos correspondiam da seguinte forma: mostravam-se indiferentes, distantes do conteúdo, ainda que presentes fisicamente em sala de aula;estabeleciam conversas paralelas, ou qualquer outra atividade não relacionada ao conteúdo dadisciplina.

Havia, contudo, professores que estabeleciam uma outra postura, pautada norespeito mútuo, na qual o conhecimento e o comportamento do aluno, como futuro professor,eram questões de aula. A opção metodológica de ensino que orientava o encaminhamento da aulae o desenvolvimento do conteúdo, bem como os vínculos entre aquilo que estava sendo estudadoe sua aplicação, evidenciavam que o processo de formação desses alunos não era um processoqualquer, mas um processo de formação docente.

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Os alunos diante dessa postura mostravam-se mais comprometidos com o pro-fessor e com as suas respectivas formações. As desmobilizações, indiferenças e distanciamentosapresentavam-se menores entre professores e alunos.

Uma outra situação que observamos relacionou-se ao modo desigual de tratamentooferecido aos alunos. Constatamos, em muitas ocasiões, professores que demonstravam umacerta indisposição em relação aos alunos que estavam sentados ao fundo da sala. As aulas,invariavelmente, eram direcionadas aos alunos localizados nas primeiras carteiras, próximos aoespaço ocupado pelos professores.

As conversas em sala de aula eram muito comuns e ocorriam com diferentesalunos, independentemente de sua localização. No entanto, quando a conversa em sala seavolumava muito era comum o professor chamar a atenção dos alunos localizados no fundo.Percebíamos, inclusive, que os próprios colegas de turma demonstravam concordâncias diantedas acusações e depreciações feitas por alguns professores em relação aos alunos do fundo dasala, estigmatizados como “fundão”.

Os alunos localizados mais à frente da sala mantinham comportamentos apreciadospelos professores: dirigiam seus olhares ao professor; copiavam as atividades que lhes eramsolicitadas; eram pontuais na entrega dos trabalhos escolares. A maioria dos alunos do “fundão”,por sua vez, comportava-se de maneira aparentemente alienada.

Assistimos a uma dada situação em que os alunos foram questionados por umaprofessora, representante da turma no Conselho de Classe, acerca do motivo para o baixorendimento em determinadas disciplinas. Alguns, sentados nas primeiras carteiras, atribuíramesse resultado ao excesso de conversas, principalmente de “alguns grupinhos da sala”, deixandoimplícita a referência aos colegas do “fundão”, no momento em que direcionaram seus olharespara o fundo da sala de aula.

Esta representação acerca dos alunos do “fundão” não foi unânime entre osprofessores. Um exemplo disso foi a observação realizada por uma das professoras da turmadurante a apresentação de um seminário pelo grupo do “fundão”. Em seu comentário afirmou quehavia alguns alunos desse grupo que eram muito críticos, mas que ao serem impedidos, poralguns professores, de manifestarem suas opiniões, acabavam dando muito trabalho.

Ao presenciarmos essas e outras situações, nas quais ficaram evidentes relaçõespreconceituosas, em relação aos alunos que ocupavam os espaços localizados ao fundo da salade aula, as quais cristalizavam um tratamento naturalizado para esse tipo de relação, inquietamo-nos diante desse real escolar. Tal inquietação foi se corporificando à medida que buscávamosentender as origens e os condicionantes dos preconceitos manifestos em sala de aula e nãotínhamos, ainda, subsídios suficientes para explicá-los.

Ademais, o fato de se tratar de um curso de formação de professores, em nívelmédio, o estabelecimento desse tipo de relação (preconceituosa) tornou-se ainda mais séria aosnossos olhos, já que o processo pedagógico acaba por legitimar posturas e atitudes que o sensocomum produz, mas que deveriam ser percebidas, compreendidas e superadas pela prática

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escolar, particularmente em um curso de formação de professores. Foi, pois, nesse contexto queo fenômeno preconceito escolar tornou-se objeto deste estudo.

A seguir, apresentamos uma reflexão, em primeira aproximação, acerca dopreconceito relacionado aos alunos do “fundão”, sem perder de vista a interferência disso noprocesso pedagógico e a relação desse processo com a prática social.

Registramos, de antemão, que estabelecemos esse tipo de reflexão com o intuitode fomentar novas discussões acerca da complexidade, possibilidades e limitações do ser pro-fessor, tanto daquele professor que está em exercício, como aquele que se encontra em formação.Acreditamos que se se pretende e se quer, de fato, a formação de um professor que estejacomprometido com uma prática pedagógica transformadora, tem-se que compreender as relaçõesestabelecidas na escola.

3 O PRECONCEITO E ALGUMAS HIPÓTESES SOBRE O “FUNDÃO”

Para situar o fenômeno preconceito, na atualidade, lançamos mãos da contribuiçãode Crochik (1995), autor brasileiro que realizou estudos articulando preconceito, indivíduo e cultura.

Para o autor, o indivíduo, submerso em uma sociedade complexa a qual desconhece,vive em um constante estado de ansiedade e de incertezas. Para amenizar tal estado ospreconceitos entram em cena, já que eles escamoteiam as origens das desigualdades e dadominação que permeiam as relações sociais, naturalizando-se assim uma situação deincompreensão frente à opressão.

Por conta da dificuldade que tem para penetrar na constituição sócio-política dasociedade atual, o indivíduo utiliza-se de estereótipos (entendidos como atributos associados àparticularidade que assume a característica preponderante da vítima do preconceito) de modo asustar a sua insegurança. Mesmo sustando-a de forma imediata, o indivíduo não compreendeque

A mesma lógica administrativa pertinente à organização da produçãode bens materiais serve de modelo para a constituição do indivíduo,para a funcionalização da família, para o aperfeiçoamento da escolana transmissão de conhecimentos que são reduzidos por aqueleprocesso em informações (CROCHIK, 1995, p. 155).

Além disso, o preconceito serve de justificativa e base às ações de violência dirigidasao outro, que de algum modo desvia das convenções sociais estabelecidas. O preconceituoso,nesse sentido, não percebe a igualdade expressa na diferença, isto porque segundo Crochik(1995, p. 61):

A sensação de superioridade do preconceituoso em relação à suavítima é solicitada por uma cultura que não permite um lugar fixo aninguém, pois é a própria insegurança de todos os indivíduos, é aeterna luta de todos contra todos, que a sustenta, assim o poder

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sobre o mais fraco é a busca de um espaço em uma sociedade quegira em torno do poder, busca esta fadada ao fracasso.

Essas reflexões do autor nos fornecem elementos para levantar algumas hipótesessobre o preconceito em relação aos alunos do “fundão”.

A primeira é de que professores e alunos, imbuídos de um conteúdo social queprivilegia uma lógica administrativa, pertinente à organização da produção de bens materiais,(re)produzem em sala de aula, mas não de modo mecânico e passivo, os preconceitos eestereótipos vigentes na sociedade. Isso ocorre porque a escola, assim como outros segmentossociais, não privilegia a experiência (entendida como conhecer o outro, e a realidade que nosenvolve, de forma mais profunda) e nem a reflexão sobre as relações estabelecidas socialmente.Sem ambos (experiência e reflexão) não é oportunizado ao indivíduo (nesse caso, professores ealunos) compreender a realidade, daí ocorrer a reprodução de um olhar naturalizado, permeadode preconceito, em relação aos alunos que ocupam as carteiras ao fundo da sala, o estigmatizado“fundão”.

Além disso, consideramos que o preconceito gera expectativas em relação aocomportamento do outro; essas expectativas interferem na compreensão dos fatos e contribuempara que eles ocorram. É o que a psicologia denomina de “profecias auto-realizáveis”.

Além do preconceito dirigido aos alunos do “fundão”, encontramos outrascolocações negativas em relação ao termo fundo. Por exemplo, é flagrante o preconceito emrelação àqueles que moram no “fundo” da cidade, no fundo da vila; àqueles que viajam no “fundo”do ônibus, ou da lotação; àqueles que vivem de sua produção de “fundo” de quintal.

Essas e outras afirmações negativas em relação ao termo “fundo”, corriqueiramentepresentes no cotidiano contemporâneo, permitem pensar que as significações implícitas queperpassam o “fundo” da sala de aula e que rendem aos alunos que ali se acomodam o título de“fundão”, ultrapassam os limites da classe escolar e deitam raízes na dinâmica social, que estápautada, sobretudo, pelas desigualdades decorrentes da divisão de classes.

Cabe-nos questionar, por que sentar no fundo da sala, ou mesmo morar no fundoda vila, carrega um sentido negativo e pejorativo, e arrasta concepções preconceituosas? O quehá de implícito nessa situação tão explícita e até mesmo corriqueira?

Neste estudo, concordamos com Sanfelice (1986, p. 89) ao afirmar que “[...] aquiloque está a acontecer na Sala de Aula, bem como no fenômeno educativo como um todo, não estáisento das implicações decorrentes das relações mantidas com o todo social [...]”.

Ao considerar tal articulação, sala de aula e contexto social, assinalada pelo autor,frisamos que assim como a sociedade engendra uma espécie de classificação e seleção doshomens, os quais devem corresponder a um modelo padrão, também, em sala de aula, aclassificação e seleção se façam presentes, classificação vinculada, muitas vezes, à capacidadeintelectual do aluno. Daí o fato do aluno se sentar à frente da sala, próximo à mesa do professor,ter uma conotação afirmativa, positiva, e o sentar-se ao fundo, portanto longe do professor, terconotação negativa.

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Em outras palavras, é como se na escala de classificação (implicitamente presenteem sala de aula) o aluno da frente possuísse as virtudes requisitadas pela instituição escolar,ocupando então uma posição “superior” na referida escala, enquanto que aquele aluno situado aofundo, distante do professor, da vigilância quanto ao cumprimento das regras, enfim das virtudesdemandadas pela escola, ocupasse uma posição “inferior” na classificação escolar.

A respeito dessa classificação, Borniotto (2002, p. 35), em sua dissertação demestrado, destaca que, “O mundo do trabalho distribui, localiza, classifica, valoriza os homenstrabalhadores de acordo com as suas respectivas ‘qualidades’. De forma idêntica esse processotambém ocorre no mundo escolar, mesmo que não seja categorizado como produtivo”. A autoradestaca, também, que “O espaço de sala de aula recebe alunos de acordo com o rótulo que lhesfoi atribuído nas classificações realizadas pela escola ou pelo professor. Alguns lugares sãodeterminantes e definidos para a identificação do sentido de ser aluno na escola” (BORNIOTTO,2002, p. 35).

Entendemos, diante disso, que um tratamento classificatório e seletivo dos alunosalém de expressar preconceitos, tal como ocorre na prática social, acaba por envolver os alunosem uma espécie de divisão de classe no interior da sala de aula. Por que realizamos tal afirmação?Porque classificados, grosso modo, como bons e maus alunos, aqueles que têm “condições” e“aptidão” para aprender e os que não têm, nem todos os alunos são contemplados com a atençãodo professor, particularmente os que são tratados de modo pejorativo como, por exemplo, osalunos do “fundão”.

Ainda sobre a classificação dos alunos, pode ocorrer que “fundão” não esteja incluídono rol de atenção do professor, ficando à margem do processo de ensino e de aprendizagemescolar, podendo-lhes, inclusive, sobrevir uma espécie de exclusão intelectual, por conta doabandono pedagógico sofrido.

Mediante esta exclusão, a qual é submetida, de certo modo, os alunos do “fundão”,questionamos: o problema está realmente no aluno que ocupa o espaço ao fundo da sala? O fatodo aluno se acomodar ao fundo, converte-o automaticamente em estudante de segunda categoriae, portanto, merecedor de menos atenção do professor e respeito dos colegas, do que o outroestudante que se senta à frente, próximo do professor?

E, ainda: como fica tal situação em um curso de formação inicial de professores?A prática pedagógica desenvolvida pelos professores ratifica o preconceito ao “fundão” ao tratar aquestão de forma naturalizada? É possível romper com esse tipo de preconceito? É possívelsuperar um olhar naturalizado por parte de professores e alunos, sobretudo em um curso deformação docente?

Uma contribuição para se refletir a respeito das questões que levantamos é adiscussão desenvolvida por Sanfelice (1986, p. 93), na qual assinala que a sala de aula não selimita a um espaço de reprodução, podendo ser também um espaço de fermentação, haja vistaque ela “[...] não é um casulo hermético desvinculado do todo social e das suas contradições”.

Uma outra questão que consideramos importante e que devemos colocar em tela,

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refere-se ao tipo de aula que costumeiramente é ministrada aos alunos. Será que a aula édesenvolvida com significado para o aluno? Será que os alunos são sensibilizados e mobilizadospara adentrarem ao conteúdo escolar proposto? Será que algumas atitudes atribuídas ao “fundão”como, por exemplo, o alheamento à aula, as conversas paralelas, enfrentamento direto com oprofessor, o fazer bagunça, não indicam mecanismos de resistência à ordem, à obrigatoriedadede estar em sala e ter que assistir a aulas destituídas de significado e sentido?

Brandão (1986, p. 114), em seu texto-depoimento intitulado A turma de trás, relataque em sua época de estudante a missão dos alunos de trás era “Transgredir com sabedoria asregras de ‘comportamento’ estabelecidos pelos regimentos dos colégios para as salas de aulas[...]”. Embora assinale a transgressão como missão da turma de trás, ressalva que nas aulas dealguns (bons) professores havia atenção de todos. Para o autor:

Alguns professores eram tidos como ‘bons’, mesmo quando severos.Falo aqui, com respeito, da categoria de sujeitos da docência, cujacapacidade de comunicar o saber da matéria era inteligente e atrativao bastante para sobrepor, ao interesse da transgressão, o da atençãocoletiva (BRANDÃO, 1986, p. 118).

Schiff (1993), por seu turno, denuncia e critica, entre outras coisas, que há umaidéia muito forte interiorizada pela maioria dos homens de que cada um ocupa o lugar que merecee isso se deve às diferenças de capacidade intelectual. O autor demonstra que as explicaçõescientíficas justificadoras das diferenças entre os homens servem, na realidade, para a justificaçãoda estrutura social, justificação essa que passa pela desqualificação e segregação de muitos eseleção e qualificação de poucos.

Diante de todas as colocações, é possível depreender que as caracterizaçõesnegativas que margeiam os alunos do “fundão” guardam estreita relação com ardilosos artifíciosdecorrentes das desigualdades sociais, as quais estão expressas na hierarquização dos homens,hierarquização esta que promove os que estão acima, e deprecia, inferioriza os que não estão,mesmo não sendo possível todos estarem em um mesmo patamar, ou no caso da sala de aula,em um mesmo lugar, seja esse lugar localizado à frente ou ao fundo.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Frente às explicitações, hipóteses e questionamentos ora realizados, convémregistrarmos que uma prática pedagógica alienada e resignada não tem condições de fazer cumprira função social da escola, entendida aqui, na perspectiva de Snyders (1988), como ruptura entrecultura primeira e apropriação da cultura elaborada, em um movimento metodológico decontinuidade-ruptura.

Uma prática pedagógica acrítica certamente serve à reprodução de preconceitos,inclusive, daqueles referentes aos alunos do “fundão”. Além disso, o estabelecimento de relações

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preconceituosas em sala de aula alija, exclui o aluno do processo de aprendizagem escolar. Talsituação se agrava ainda mais quando se trata de um curso de formação de professores (futurosprofessores com formação inicial média), os quais poderão também reproduzir os preconceitosvividos, ou expressos, tanto em relação ao “fundão”, como em relação a outras circunstâncias desala de aula.

O preconceito que se produz dentro da instituição escolar, em um curso de formaçãode professores, em relação aos alunos que são pejorativamente denominados e estigmatizadosde “fundão”, é perverso, como todo preconceito. A sua constância e banalização e, em decorrênciadisso, a sua naturalização, certamente concorre, tacitamente, para deixar à margem do processopedagógico esses alunos. Ademais, ao não ser constatado e refletido pelos professores comoum preconceito, as dificuldades de mobilização e ação para o seu enfrentamento aumentam,uma vez que é difícil lutar contra algo que se desconhece. Urge, então, que o professor compreendaquem são seus alunos, qual a função da escola e qual o objetivo de sua prática pedagógica,prática esta que precisa estar alicerçada em uma formação consistente que lhe permita articulara teoria aprendida com a prática exercida.

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Em busca da qualidade educacional, muitas mudanças na formação docente têmse efetivado, não só no Brasil, como na América Latina e em outros países em desenvolvimento,já que boa parte da culpa pelo fracasso escolar recai sobre o professor, em virtude de sua formaçãoprecária. Assim, se faz necessário analisar com certo cuidado os processos de formação que seapresentam como saídas eficazes para resolver os problemas da formação docente e entendercomo os programas estão ajustados às determinações do Banco Mundial (BM) e Fundo MonetárioInternacional (FMI).

As políticas educacionais implantadas nas últimas décadas demonstramestar cada vez mais alinhadas aos ajustes econômicos assentados na auto-regulação do mercado.Dessa forma, fica “visível o tratamento dado à educação como indústria, não medindo ações eprocedimentos para a sua efetivação” (SILVA, 2002, p. 149). Tanto a Lei de Diretrizes e Bases daEducação Nacional (LDBEN), que esteve em tramitação de 1989 a 1996, assim como o PlanoNacional de Educação (PNE), que tramitou de 1997 a 2000, tornaram-se modelo para a educaçãopública.

A rigor, as políticas para educação pública que deveriam subordinar-se à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional tornaram-seobjeto de manipulação e de ajuste do campo educativo às prioridadesdo campo econômico. (SILVA, 2002, p. 150).

Com base nessa política educacional em consonância com a economia,as políticas externas de ajuste esperam formar trabalhadores polivalentes, exigidos pelas demandasdo mercado e também consumidores dos produtos industrializados. Na prática, isso ocorre atravésde medidas de controle como as avaliações externas, os Parâmetros Curriculares Nacionais, afalta de investimento e revisão do PIB, a falta de política de educação para jovens e a desqualificaçãode professores. Todas essas medidas são mecanismos de favorecimento do mercado e aberturada educação ao setor privado.

É essa a política assumida pelo governo federal, através do Ministério daEducação, pelas elites dirigentes e efetivada atualmente no Estado de São Paulo, mas que não éfeita de maneira crítica, ignorando as tentativas de repúdio por parte de outros setores da sociedade,como os fixados no III Congresso Nacional de Educação (SILVA, 2002).

Enquanto havia a abertura da educação para todos na década de 80, naformação docente ocorreu o contrário, pois, inversamente, a profissão passou a conviver com adesvalorização crescente:

O PROGRAMA PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA EA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DO ENSINO FUN-

DAMENTAL: UMA AVALIAÇÃO

SILVA, Joice Ribeiro Machado Da (Prefeitura Municipal De Marília)

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as licenciaturas curtas, os cursos de fim de semana, a despolitização,a contenção salarial, as disciplinas desconectadas entre si e com arealidade, o distanciamento entre a teoria e a prática, o livro didáticocomo único instrumento de trabalho, as condições de trabalhoinadequadas, a ausência de reflexão sobre a prática pedagógica, ainabilidade para lidar com crianças destituídas da socialização primária,as dificuldades de domínio de conteúdos, as metodologias inapropriadasàs expectativas dos alunos, os estágios duvidosos e o processo deavaliação seletiva e classificatória constituem deficiências detectadasna formação desse profissional. (SILVA, 2002, p. 164).

É nesse contexto que acontece a implementação das políticas públicaspara a educação básica de natureza “contencionista- reformista” (SILVA, 2002, p. 165), que oartigo 9°, § VI e arts. 61 a 67, da lei n° 9.3494/96 modificaram e introduziram alterações na formaçãodo professor.

O art. 62 determina:

a formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á emnível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, emuniversidade e institutos superiores de educação, admitida, comoformação mínima para o exercício do magistério na educação infantile nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, oferecida emnível médio, na modalidade Normal.

O fato de se abrir uma possibilidade de formação no nível médio apontaque a formação não foi assumida como política e demonstra ainda uma fragmentação e adesvalorização do profissional (MELO, 1999; SILVA, 2002).

Apesar de a questão da formação docente ser tratada em vários documentos— como a Conferência Mundial de Educação para Todos, na LDB, no Plano Decenal de Educação(PDE), no Fórum Permanente pela Valorização do Magistério e Qualidade da Educação — poucofoi feito para que realmente houvesse uma política voltada para a formação docente numaperspectiva social, a fim de entendê-la e defendê-la como um direito do professor (MELO, 1999).A própria LDB define todos os fundamentos, os níveis e o locus da formação em apenas seisartigos. Como ressalta Melo (1999), há um enxugamento do conceito de formação a ponto de seconfundir capacitação com formação. Havendo uma redução na concepção de formação docente,abre-se um espaço para se investir em uma formação curta.

Esse excesso de pragmatismo tem contribuído para que se confundao espaço e as finalidades de cada um desses elementos e, mais queisso, tem restringindo o direito a uma política de formação ampla,permanente e contemporânea, em troca de aligeiramento e modularesmomentos de aperfeiçoamento (MELO, 1999, p. 53).

Ao mesmo tempo em que hoje há muitas cobranças a respeito dasatribuições do professor, há também um empobrecimento cultural, reduzindo-se as metas e osobjetivos da formação docente, “evidenciando grande descompasso entre as políticas de formação

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e os objetivos proclamados de melhorar a qualidade de educação pública” (MELO, 1999, p. 50).Para melhorar a qualidade do ensino, o BM considera mais vantajoso manter os

salários dos professores baixos e garantir uma maior distribuição de livros didáticos, fazendo doprofessor um mero executor de atividades. Para exercer tais tarefas se justificaria um curso curtoe à distância, baseado em práticas cotidianas.

Essa forte tendência de formação docente precisa ser analisado de um modo maisaprofundado. Considerando que a formação do professor é fundamental para que se efetive umensino de qualidade, por que não criar políticas públicas que privilegiem uma formação inicialampla e sólida teoricamente e não apenas a formação aligeirada e/ou formação continuada?Talvez seja para assegurar a formação de professores com habilidades e competências, atendendoa uma visão capitalista. “Neste quadro, a formação de professores ganha relevância por suadimensão estratégica na formação das novas gerações” (FREITAS, 2003), que serão “educadas”para a competitividade desde a mais tenra idade.

A descentralização do ensino, que faz parte das reformas educacionais, tambémincentivou a ênfase numa formação aligeirada, mais curta, pois o custo é menor que a formaçãomais ampla e é considerada pelo BM como mais eficaz. A idéia é oferecer ao professor cursosrápidos, atrelados a planos de carreira, que possibilitem aumento de salário, na medida em queas avaliações externas comprovem sua “competência”. Além disso, passou-se a incluir cursosintensivos e material didático suplementar. Nesse sentido, a formação continuada entraria parareparar lacunas na formação inicial aligeirada, justificando a criação de cursos curtos que teriamcomo alicerce a experiência prática profissional. Como afirma Maués (2003, p. 104), “caberia àformação inicial apenas dar noções mais gerais, deixando todo o resto a cargo da formaçãocontínua”. Concomitantemente a esses ideais está a questão de cortes dos recursos para aeducação pública, previsto também pelo BM, que considera ser um desperdício investir numasólida formação inicial do educador, já que a formação com cursos curtos é menos custosa, poisa idéia que está subentendida é a de enxugar a máquina, gastando o mínimo possível, para atingiro máximo possível de resultados.

Torna-se claro que a principal tendência para a formação docente, a partir da décadade 90, é realizar uma mudança de paradigma da profissão, fazendo com que o professor se tornemais um insumo de mercado que será treinado para essa função ao invés de um intelectualtransformador, como vários autores o definem (GHEDIN, 2002, PIMENTA, 2002), tendo ainda osmecanismos legais como a LDB e o PNE, que irão validar tal tendência. Podemos perguntar:quem passará a cuidar da formação humana?

Repensar a formação docente se faz necessário e urgente, a fim de garantir aosprofessores conhecimentos teóricos, práticos e políticos, além de valorizá-los financeiramente,permitindo que sejam capazes de tomar decisões, sejam criativos e críticos. Para isso é necessáriauma formação completa, a inicial e a continuada. Dessa forma, podemos esperar um professorcom habilidades como “trabalhar coletivamente e em equipe, discutir políticas sociais, combater anaturalização da exclusão escolar, desarticular as premissas neoliberais no campo das idéias e

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práticas e não abrir mão dos princípios democráticos e de justiça social” (SILVA, 2002, p. 170).Considerando esse contexto, analisamos nesta pesquisa, o Programa Especial de

Formação de Professores de 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental (PEC – Formação Universitária)que se propôs a ser um programa de formação em nível superior, aplicado aos professores emexercício do Estado de São Paulo, a fim de obterem um diploma em licenciatura plena.

No caso do programa em questão, apesar de seu caráter de formação continuada,como o próprio nome denomina, tratou-se de um curso de formação inicial em nível superior, jáque seria oferecido um diploma para professores que já atuavam como profissionais. Entendemosque essa dubiedade do nome, não é casual, mas intencional, pois ao apresentar na sua propostaum nome que o definiria como formação continuada, possibilitou uma maior aceitação por partesdo envolvidos no curso.

Nosso objetivo não foi de analisar se houve ou não mudança na prática docenteapós a realização do programa, mas de analisar a proposta do programa e suas seis versões ecompreender se ele pode ser considerado como aligeirado ou não. Vale ressaltar que consideramosum curso aligeirado, aquele que é realizado de maneira rápida, com uma formação abreviada quenão assegura a boa qualidade do curso. Além desses objetivos, analisamos ainda quem estavaocupando o lugar do professor, quem eram os reais docentes do programa, ou seja, aquele queestava diretamente se relacionando com os alunos-professores que, nesse caso, foi o tutor.

Os dois relatórios de avaliação da Fundação Carlos Chagas (FCC), que analisamos,apontam que tal programa foi uma experiência muito boa para os alunos–professores, já quemuitos não realizavam nenhum tipo de estudo, nenhuma reflexão há muito tempo. Sem dúvida,para quem nada possui, o pouco que é oferecido já tem significado. No entanto, para quem aindanão tenha tido oportunidade de realizar estudos em nível superior, é necessário que lhe sejapermitida uma formação em profundidade, caso se queira um profissional que recupere o seuprestígio tanto social como intelectual, garantindo uma melhora efetiva na educação. Sendo assim,há a necessidade de uma proposta que realmente forme o professor, evitando que se aligeire eque se fragmente o conhecimento.

A política educacional definida pela Secretaria Estadual de Educação (SEE) tempossibilitado a efetivação de importantes mudanças no sistema educacional paulista, desde 1995.Seus três eixos norteadores são: a racionalização organizacional, a mudança nos padrões degestão e a melhoria da qualidade de ensino (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA, 2001; 2002).Apesar de ocorrerem várias mudanças e ajustes nas versões desse programa, a políticaeducacional defendida pela SEE permanece a mesma em todas elas, sendo definida na versãopreliminar de dezembro de 2000 e mantida na versão final de outubro de 2002.

Tal política educacional vai ao encontro das políticas neoliberais para a educação,sugeridas pelo Banco Mundial. Nesse sentido, todas as versões apontam para essa questão,fundamentando-se naqueles princípios (racionalização organizacional, a mudança nos padrõesde gestão e a melhoria da qualidade de ensino).

Um convênio foi então, estabelecido entre a SEE, a Universidade de São

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Paulo (USP), a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), a Universidade EstadualPaulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP) e a Universidade de Campinas (UNICAMP). No entanto,a UNICAMP se retirou do convênio, ainda em sua fase de planejamento, por não concordar com aconcepção desse tipo de formação, que poderia levar a um aligeiramento da formação e tambémpelas restrições impostas às universidades, entre elas a proibição de alteração das ementas dasdisciplinas a serem ministradas.

Com o intuito de cumprir a determinação do § 4° do art. 87 da LDBEN – “somenteserão admitidos professores habilitados em nível superior ou formados em serviço” – e a partir deuma interpretação equivocada desse mesmo artigo, o PEC – Formação Universitária foi aprovadoem uma reunião do Conselho de Reitores das Universidades Públicas Paulistas (CRUESP), nodia 11 de abril de 2001, pelos três Pró-Reitores das três universidades envolvidas em convêniocom a SEE. O fato de o art. 87 prever treinamento em serviço, não significa necessariamente quedeve ser ministrado em nível superior, mesmo porque “treinar” alguém não significa formar. Esteartigo prevê também a utilização de recursos da educação à distância para formar os professoresem exercício como se configurou este programa de formação, ao mesclar o ensino presencial eà distância.

Em relação ao § 4° do art. 87, há ainda outros equívocos de interpretação,especialmente quando determina que todo professor que não possuir curso superior deve cursá-lo até o fim da década da educação, portanto 2007. Brandão (2005) afirma que essa determinaçãonão poderia se aplicar aos professores já admitidos.

Para todos os efeitos, do ponto de vista legal, no caso de docentes deeducação infantil e das quatro séries do ensino fundamental, a formaçãomínima exigida é a ‘oferecida em nível médio, na modalidade Normal’,como dispõe o art. 62 (Título VI – Dos Profissionais Da Educação)dessa LDB. (p. 170, itálico e negrito no original).

Portanto, fica claro que este parágrafo do art. 87 não sustenta as intenções em queestá baseado o PEC, ao afirmar que precisa “formar” seus professores em exercício, até fim dadécada de educação. O PEC foi oferecido, ou melhor, tornou-se obrigatório para os professoresefetivos, excluindo os inúmeros professores não efetivos, mas que atuam na rede estadual.

A metodologia utilizada propôs um curso presencial que durou 18 meses, comforte apoio de mídias interativas, que se configura como educação à distância, já que atinge umcontingente relativamente grande espalhado geograficamente ao mesmo tempo. Assim não dápara caracterizá-lo como um curso apenas presencial. Segundo Monteiro (2005, p. 71), “a formaçãoque se realiza mediante as novas tecnologias da informação e comunicação, sem a necessidadeda presença física do estudante e/ou do professor, é o que define para a formação à distância”.

Sua a estrutura curricular era composta por módulos de aprendizagens, subdivididosem Temas e Unidades, a fim de trabalhar os conteúdos, promovendo a integração entre teoria eprática. Teve uma dinâmica de funcionamento, que previa 5 modalidades de atividades articuladas

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entre si: videoconferência, teleconferência, trabalho monitorado (sessão on line, sessão off line esessões de suporte), vivências educadoras e estudos independentes. No entanto, tanto os relatóriosda Fundação Carlos Chagas, quanto o relatório final do Comitê Gestor, responsável pelo andamentodo curso na UNESP, afirmaram que as atividades mais aceitas pelos alunos-professores eram asque tinham uma menor carga teórica.

Assim, as principais atividades que mais agradaram foram às teleconferênciasque eram ministradas por diversos convidados e não somente os mestres e doutores ligados àuniversidade, e as escritas de memórias. As atividades que continham uma carga teórica, comoas videoconferências e os trabalhos monitorados (TM), eram as que causaram mais reclamações,tanto pelo fato dos professores estarem presentes de forma virtual, como, a quantidade de assuntosteóricos que iam se acumulando no decorrer do curso, causando sempre a impressão de todosterem que fazer tudo muito rápido, muito aligeirado.

O curso é maravilhoso! A teoria é muito importante para nós, mas émuito corrido. A gente acaba perdendo a oportunidade de aprender.

A quantidade de conteúdos tem prejudicado a qualidade. Não consigo vivenciar ocurso de forma profunda... (FCC, 1° RELATÓRIO, 2002, p. 55).

Poderíamos dizer que se o PEC tinha a intenção de transmitir informações aosalunos–professores, isso foi veementemente efetivado. Isso não significa dizer que houve apreensãoefetiva do conhecimento, portanto, não ocorreu formação. Os alunos-professores “avaliaram osassuntos tratados no módulo estudado (nesse caso, o de alfabetização) e concluíram apontandopara o que é considerada a principal falha do curso: o pouco tempo para aprofundar idéias,conceitos e teorias” (FCC – 2° RELATÓRIO, 2002, p. 32, itálicos nossos).

Um outro ponto que destacamos no programa do PEC – Formação Universitáriarefere-se aos agentes educacionais, principalmente o papel do tutor. Apesar da inclusão de doutorese mestres na estrutura do programa, essa participação é restrita e ocorre quase sempre de formavirtual, como é o caso dos professores-assistentes, que não foram tão bem aceitos justamentedevido a essa forma de contato, evitando o estabelecimento de vínculos afetivos. Por outro lado,foi o tutor — que dava continuidade aos trabalhos em sala de aula e estava em contato diário edireto com os alunos-professores — quem estabeleceu um grande vínculo afetivo, podendo atéevitar casos de desistência do curso.

A formação desse tutor diferiu pouco em relação à dos alunos-professores, poisele deveria ter a graduação em qualquer curso (porém isso não ocorreu, já que no pólo de PresidentePrudente, por exemplo, vários tutores estavam cursando Pedagogia), o que já traz um prejuízo,pois não é qualquer graduação que pode atender às especificidades da Pedagogia (MORELATTI,FÜRKOTTER, LEITE, 2003). No entanto, é justamente esse tutor, com a menor formação nagrade de proposta do PEC, que esteve em contato diário com os alunos, aprofundando as

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discussões das vídeo e tele–conferências e sendo o responsável por “ensinar” tudo o que havianas apostilas, de todas as áreas do conhecimento. A grande questão é que nem sempre ele deu“conta” de aprofundar questões teóricas importantes e que precisavam de esclarecimento, deencaminhamento adequado, causando muitas vezes confusões e dúvidas que não eramsolucionadas.

Notamos que, dessa forma, o tutor atende muito bem às diretrizes do Banco Mundial,que coloca o professor como um insumo caro demais, exigindo que seu salário seja reduzido.Como não há a possibilidade da redução do salário de um doutor e mestre, contratar um tutor éuma boa solução para não ter que pagar salários mais altos. Portanto, notamos que a intençãodesse programa de formação estava mais centrada na certificação formal a baixo custo, ou seja,na precarização da certificação.

Por essa perspectiva, entendemos que o PEC atende em muitos sentidos aoprograma neoliberal, que está preocupado apenas com o mercado em que está se tornando oscursos de formação docente, na medida em que, prevê poucos recursos humanos e financeirose rapidez na formação.

Concluímos que as políticas neoliberais aplicadas à educação, especificamente noque se refere à formação de professores das séries iniciais do Ensino Fundamental, nos anos 90,principalmente impostas pelo Banco Mundial, propuseram uma concepção de formação docentealigeirada. Vivenciamos um amplo processo de precarização no processo de formação, nacertificação e no trabalho docente. São as novas estratégias que o capitalismo desenvolve, visandoà manutenção da ordem, reforçando a alienação do professor. Resta-nos o desafio de buscarefetivamente políticas de formação docente que signifiquem ruptura com as estratégias neoliberais,propiciando a construção da autonomia e apropriação do conhecimento por esses trabalhadores,elementos negados pelo capitalismo e seus defensores, novos súditos da velha ordem.

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O regime de progressão continuada é uma medida que apresenta uma indefiniçãoconceitual em decorrência das diferentes interpretações teóricas sobre as temáticas ciclos eprogressão escolar. A própria SEE-SP em diversos documentos oficiais e informativos (Jeffrey,2006) não esclarece o conceito de progressão continuada.

A falta de um consenso sobre a definição conceitual do regime de progressãocontinuada pode ser observada em trabalhos como de Freitas (2003) e Arroyo (1999).

Deste modo, se ciclos e progressão continuada para Freitas (2003) apresentamconcepções contraditórias, para Arroyo (1999, p. 155) existe uma variedade de experiências enomenclaturas, que nem sempre conseguem alterar a lógica seriada.

Apesar da crítica realizada por autores como Freitas (2003) e Arroyo (1999) sobreas propostas de ciclos e progressão escolar, pelo fato de difundirem concepções de educação epolítica públicas, por vezes, contraditórias e distintas, a definição de Barretto e Mitrulis (2001),para essas formas de organização escolar, indica uma conceituação mais abrangente capaz derepresentar a realidade educacional brasileira, ao entenderem que tais propostas são

[...] períodos de escolarização que ultrapassam as séries anuais,organizados em blocos cuja duração varia, podendo atingir até atotalidade de anos prevista para um determinado nível de ensino. Elesrepresentam uma tentativa de superar a excessiva fragmentação docurrículo que decorre do regime seriado durante período deescolarização. A ordenação do tempo escolar se faz em unidadesmaiores e mais flexíveis, de forma a favorecer o trabalho com clientelasde diferentes procedências e estilos de aprendizagem (BARRETTO eMITRULIS, 2001, p. 1).

O regime de progressão continuada, a partir da definição de ciclos destacada porBarretto e Mitrulis (2001), pode ser compreendido como um processo de avaliação contínuo eformativo, que não se restringe à obtenção de uma classificação, ao final de cada série, mas naaprendizagem e acompanhamento do desenvolvimento do aluno durante períodos de escolarizaçãodeterminados.

No caso da rede estadual paulista de ensino, embora tenham sido adotados doisciclos de aprendizagem – ciclo I (1ª a 4ª série) e ciclo II (5ª a 8ª série) – as séries anuais continuaramexistindo, o que certamente fez com que o regime de progressão continuada deixasse de contribuir,significativamente com a tentativa de superação da fragmentação do currículo. Tal constatação

O REGIME DE PROGRESSÃO CONTINUADA:IMPLICAÇÕES NA ATUAÇÃO E FORMAÇÃO

CONTINUADA DOCENTE

JEFFREY, Debora Cristina (UNESP/ São José do Rio Preto)

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apenas reforça a idéia de Barretto e Mitrulis (2001), que as experiências de ciclos e progressãoescolar, no Brasil, resultam de medidas intermediárias entre o regime seriado e a progressãocontínua.

Então, se o regime de progressão continuada, implantado na rede estadual deensino de São Paulo, desde o ano letivo de 1998, manteve a estrutura seriada e a fragmentaçãocurricular, é possível compreender que tais fatores mantêm inalteradas a organização do trabalhopedagógico da escola e as atividades educacionais realizadas no interior da sala de aula,contradizendo a proposta inicial da medida que, segundo a Secretaria de Estado da Educação deSão Paulo (SEE-SP,1998), era promover a reorganização do tempo e espaço escolares, além depossibilitar mudanças nas atividades educacionais e avaliativas realizadas na sala de aula.

A ATUAÇÃO E A FORMAÇÃO CONTINUADA DOCENTE DIANTE DO REGIME DEPROGRESSÃO CONTINUADA: ESTUDO DE CASO.

A fim de analisar a atuação e o processo de formação continuada de professoresde uma escola da rede pública estadual de São Paulo, optou-se pela realização de um estudo decaso.

O estudo de caso consistiu na coleta de dados na Escola Estadual Esperançalocalizada, na região norte do município de Campinas-SP, em um bairro da periferia que faz divisacom outras cidades pertencentes à Região Metropolitana de Campinas.

Juntamente com outras três escolas de ensino fundamental e médio, a unidadeescolar atendia uma população escolar que, nos últimos 15 anos, apresentou um crescimentosignificativo, em virtude das invasões no entorno do bairro. Este fato fez com que essas escolas,durante o processo de reorganização das unidades escolares da rede estadual de ensino, ocorridoem 1996, dividissem o atendimento do ensino fundamental, sendo que, das quatro, duas oferecemsomente vagas no ciclo I (1ª a 4ª série) e as outras duas, no ciclo II (5ª a 8ª série) e ensino Médio.

Os profissionais da educação entrevistados tinham, pelo menos, sete anos deatuação na escola estadual analisada e possuíam uma carga horária diversificada. Entre asprincipais peculiaridades apresentadas pelos docentes, destacam-se a formação na graduaçãoem Instituições do Ensino Superior privadas e a conclusão de curso de pós-graduação(especialização e mestrado) somente por um dos entrevistados.

Compreende-se que os depoimentos apresentados pelos docentes resultam deum processo dinâmico, no qual suas representações apontam, concomitantemente, aspectospresentes tanto nas orientações oficiais e informativas divulgadas às escolas, como suaspercepções pessoais e profissionais

Os professores da Escola Esperança entrevistados se identificavam comoprofissionais que necessitavam de auxílio constante para realizarem sua prática pedagógica,sobretudo após a introdução do regime de progressão continuada. Eles culpabilizavam a SEE-SP pela falta de apoio, subsídios e informações necessários ao trabalho com a proposta.

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Além disso, as condições existentes na Escola Esperança, como falta de materiaisde apoio às diferentes disciplinas do currículo e número excessivo de alunos por professores, osquais na maioria dos casos chegam a lecionar para mais de cem alunos, foram apontadas comofatores que desfavoreciam o envolvimento dos docentes com novas possibilidades de avaliação econdução do ensino e aprendizagem, como destacou o depoimento do Professor 3.

Eu acredito que falta subsídio, faltam coisas básicas pro meu dia-diade trabalho [...]. Eu acho que se houvesse material adequado pracada disciplina, eu acredito que o projeto poderia ser levado mais asério [...] – Professor 3 (Geografia), 39 anos.

Para os professores entrevistados, as dificuldades em conduzir a sua práticapedagógica mediante a introdução do regime de progressão continuada é reforçada pelainexistência de cursos preparatórios, como especialização, apontada pelo Professor 2, ou pelafalta de tempo para realizá-los, aspecto ressaltado pelo Professor 9, fatores estes que, durantesuas falas, apareciam como condições que contribuíram para reforçar as dúvidas existentes emrelação a proposta na rede.

Falta de informação e de grana pra poder investir no professor prapoder trabalhar com ele [...], dar curso de especialização pra pessoapoder trabalhar com alfabetização, por exemplo – Professor 2 (Ciências),49 anos.

Para a rede de ensino ainda existem dúvidas. Talvez, pelo fato de queainda não houve tempo para realmente preparar todos os profissionaisenvolvidos – Professor 9 (Química/Matemática), 53 anos.

Os depoimentos dos Professores 2 e 9 culpabilizam a SEE-SP pela falta depreparação dos docentes e investimento neles para trabalharem, efetivamente, no regime deprogressão continuada em sala de aula. Na opinião de ambos, o órgão central deveria assumir aresponsabilidade da oferta de cursos preparatórios, contribuindo para a constituição de práticas emetodologias condizentes com a proposta adotada.

No caso específico do Professor 4, a preocupação com a capacitação docentesuperou, até mesmo, a questão da redução de carga horária em disciplinas como história, geografiae ciências, redução esta que, em sua opinião, comprometia a qualidade de ensino, com aampliação da carga horária de disciplinas como matemática e português, estabelecida pelaResolução 4/98, que orientava as matrizes curriculares do ensino fundamental e médio, ao declararque:

A redução da carga horária de disciplinas como história, geografia eciências fez com que a qualidade, realmente, caísse bastante, mas oque falta, realmente, nesse projeto, é a capacitação dos professorescomo um todo – Professor 4 (História), 38 anos.

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A SEE-SP, desde 1998, a fim de contestar as afirmações do corpo docente comrelação à falta de preparação, tem justificado a existência e oferta de cursos de capacitação aosprofissionais da educação com a realização do Programa de Educação Continuada (PEC), entreos anos de 1997 e 1998, e a Teia do Saber, a partir de 2003.

Brito (2001), ao analisar o PEC, a partir da coleta de dados, de documentos oficiaisda SEE-SP e de materiais produzidos por uma Universidade privada responsável pela capacitaçãoem uma região pólo do Estado de São Paulo, evidencia que:

a) Nos cursos de formação promovidos pelo PEC, os professores tiveramcarga horária menor que os diretores e coordenadores;

b) A temática da avaliação, central no regime de progressão continuada, alémde pouco abordada, não foi retratada com a profundidade necessária;

c) O PEC enfatizou a formação da equipe de gestão escolar;

Devido à abrangência da rede, o PEC organizou o grupo de professores pordisciplinas, fazendo com que os trabalhos estivessem desarticulados do coletivo de cada escola.A partir do ano de 2003, a SEE-SP passou a desenvolver outro Projeto de educação continuada,denominado Teia do Saber, com o propósito de atualizar os docentes da rede nas diversas áreasdo conhecimento e oferecer subsídios teóricos e práticos para auxiliá-los nas situações do dia-a-dia escolar. O Projeto Teia do Saber é oferecido por universidades públicas e privadas e contacom suporte das Diretorias de Ensino. Porém, os Professores e o Coordenador entrevistados daEscola Esperança, até o ano letivo de 2004, não haviam participado destas capacitações.

Apesar de os projetos de capacitação como o PEC e a Teia do Saber, procurarem,no entendimento da SEE-SP, oferecer subsídios para o trabalho pedagógico realizado nas escolas,parece que não há uma preocupação com os saberes que poderão ser produzidos pelosprofissionais da educação e suas implicações nas atividades escolares.

Particularmente a respeito do regime de progressão continuada, Silva (2000), aoanalisar os saberes docentes constituídos nesta forma de organização escolar, considera que,sem o domínio dos fundamentos da proposta, serão desenvolvidas dentro do sistema “maneirasnovas de se trabalhar”, com a criação de novos saberes que podem ser contraditórios ou mesmoambivalentes em relação aos objetivos estabelecidos com a medida.

Com relação aos Professores da Escola Esperança entrevistados, a criação denovos saberes e maneiras de trabalhar, de acordo com seus depoimentos, estão relacionadoscom o perfil, interesses e características dos alunos atendidos.

O perfil, interesse e característica dos alunos, apontados pelos Professoresentrevistados, restringem-se ao tipo de comportamento que os grupos apresentam, sendo estesrotulados pelo fato de serem ou não desinteressados e indisciplinados.

Para o Professor 1, além do desinteresse e da indisciplina, aspectos queatrapalhavam a condição do seu trabalho pedagógico em sala de aula, a facilitação dos estudos

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para os estudantes com o regime de progressão continuada, que no seu entendimento, eliminoua reprovação, contribuía para que estes desvalorizassem a escola, as atividades e os professorescomo pessoas.

Fica ruim pro professor, atrapalha pra todo mundo porque o aluno àsvezes passa sem saber nada, ele fica no reforço, mas nem sempreele leva a sério mesmo, ele vai mais pra passear, às vezes, por que ospais exigem, [...] porque tudo que a gente tem fácil não valoriza. Emrelação à educação não é diferente o que vem fácil demais, não valorizanada, da escola às atividades. Os próprios professores se sentemdesvalorizados, não em termos diretos, mas como profissional mesmo,e, muitas vezes, até como pessoas mesmo [...] – Professor 1(Geografia), 33 anos.

A perda de autonomia docente para o estabelecimento de uma avaliação quepudesse estimular o aluno a estudar e, conseqüentemente, obter aprovação ao final do ano, é umfator que Arcas (2003) também constatou em seu estudo de caso, durante entrevista comprofessores da rede estadual que apontavam a mesma preocupação expressa pelo Professor 1,com relação à desmotivação dos alunos aos estudos e ao favorecimento da aprovação de muitos,sem a efetiva aprendizagem do que havia sido ensinado. Para o Professor 8, essa situação,poderia estar desenvolvendo um “vazio de conteúdo”, devido à falta de comprometimento dasfamílias e dos professores no estímulo à aprendizagem e ao empenho dos alunos.

O regime de progressão continuada se por um lado eliminou essemedo da reprovação, por outro lado, impactou muito na inobservânciapor causa da idade [...] do adolescente, por que se não houver umempenho maior da família e da escola, essa promoção sem exigênciamaior, em passar o aluno por aquela aprovação, né, tradicional, elapode nos levar a um vazio de conteúdo da parte do aluno se houver umdescuido dos pais e professores – Professor 8 (Ciências), 55 anos.

A preocupação do Professor 8 com o “vazio de conteúdo” resultante da falta deempenho de pais e Escola na motivação dos estudos dos alunos, indica que, em sua percepção,o aspecto motivacional deve continuar a ser algo externo ao ritmo de cada um. Silva (2000), aesse respeito, constata, em seu estudo de caso, que para os professores a diminuição dasexigências de aprendizagem dos conteúdos específicos no processo de escolarização, estariaformando alunos sem os pré-requisitos necessários ao domínio de conteúdo.

Para Barretto e Mitrulis (2001), a visão de muitos professores, pais e alguns alunos,de que teria havido uma redução das exigências de aprendizagem, a partir da proposta de ciclos,pode ser justificada pela vivência em uma escola seriada, onde a motivação dos estudos erainfluenciada pela nota, competição e pelo medo da reprovação, sendo inviável conceber umprocesso de ensino-aprendizagem vinculado aos interesses e às necessidades dos indivíduos, oque fundamenta a proposta de progressão continuada.

No entanto, apesar da vivência escolar em uma organização seriada, o regime de

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progressão continuada, para alguns professores entrevistados, é compreendido de maneiracontraditória, representando, ao mesmo tempo, uma medida inovadora e também responsávelpela desqualificação do ensino, aspecto expresso pelos docentes 9 e 5.

A proposta em si é maravilhosa, a questão é puramente quando setrata da prática – Professor 9 (Química/Matemática), 53 anos.

A falta de conhecimento profundo do regime de progressão continuadadesqualificou o ensino – Professor 5 (Matemática), 40 anos.

A visão dos Professores 9 e 5 a respeito do desafio de colocar em prática o regimede progressão continuada no cotidiano escolar, diante do risco de a medida desqualificar o ensino,indicou a insegurança destes docentes com relação ao estabelecimento de novas práticasavaliativas e de ensino.

Magalhães (1999), a esse respeito, ao retratar a prática avaliativa de uma professorado ciclo I da rede estadual de ensino, evidencia que a docente analisada apresentava vários conflitosentre o seu trabalho pedagógico e o regime de progressão continuada, principalmente com relaçãoà perda de controle do processo avaliativo e à definição da aprovação ou reprovação do aluno,mediante o seu êxito ou fracasso nas provas finais. Este fato, segundo Magalhães (1999), contribuiupara que a indisciplina aumentasse e o controle da turma por meio da coerção por nota, deixassede ser algo significativo para os alunos.

Freitas (2002), neste sentido, reconhece a gravidade do problema destacado porMagalhães (1999), por compreender que a mudança na concepção de avaliação tem feito comque os professores percam, de fato, o controle sobre o resultado de seu trabalho, produzindo,assim, “efeitos motivacionais desastrosos sobre ele” (p. 318). Isso porque a proposta de ciclos,incluindo aí a progressão continuada, além de não eliminar a avaliação (formal e informal), rede-fine seu papel e autoria, fazendo com que esta seja associada com ações complementares comoa recuperação paralela.

O Professor 3, em depoimento, demonstrou compreender a necessidade deredefinição da prática avaliativa na perspectiva do regime de progressão continuada, ao apontarque a prova, em sua opinião, deveria ser substituída pela produção diária do aluno, e a nota,atribuída de acordo com o seu desempenho ao longo do bimestre.

O que pede o regime de progressão continuada é que a avaliação doaluno seja uma avaliação contínua, diária, então, nesse sentido, euacho interessante porque, eu sei que tem muitos professores quetinham aquela idéia ainda tradicional de avaliação, só avalia o aluno nodia da prova, isso e aquilo, não é? E passava sem enxergar outrasqualidades no aluno, você entendeu? [...] Então, o aluno sabe que anota dele vai depender do empenho dele, né? Do desempenho nodecorrer do bimestre, você entendeu? Então, muitos custam a perceberisso. Daí, eu converso com ele e tudo mais, e explico que o dia-a-diadele é que vai pesar [...] – Professor 3 (Geografia), 39 anos.

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A vinculação da nota ao empenho na realização das tarefas diárias, presente nodepoimento do Professor 3, apontou que os critérios de avaliação baseiam-se no comportamentoe cumprimento das atividades em sala de aula pelos alunos. A esse respeito, Freitas (2003)compreende que a valorização desse tipo de critério caracteriza-se por um plano informal daavaliação, por se referir aos juízos de valores construídos nas interações do cotidiano escolar. Eleconsidera que:

A parte mais dramática e relevante da avaliação se localiza aí, nossubterrâneos onde os juízos de valor ocorrem. [...] Esse jogo derepresentações vai construindo imagens e auto-imagens que terminaminteragindo com as decisões metodológicas do professor. [...] Aquicomeça a ser jogado o destino dos alunos, para o sucesso ou fracasso.As estratégias de trabalho do professor em sala de aula ficampermeadas por tais juízos e determinam, consciente ouinconscientemente, o investimento que o professor fará neste ou naquelealuno. (FREITAS, 2003, p. 45).

O plano informal da avaliação baseado no juízo de valores também é analisado porBertagna (2003), em estudo de caso numa escola pública, ao evidenciar que os professores aoabandonarem a prática de provas ou realizarem sua aplicação somente para cumprir um ritual,após o estabelecimento do regime de progressão continuada, fundamentam a avaliação apenasnos julgamentos e juízos construídos no dia-a-dia escolar, transformando as avaliações informaisem notas, de modo a representar o rendimento do aluno.

A dificuldade de redefinição do papel da avaliação e de sua autoria pelos professores(Freitas, 2002), levando-os, em diversas situações do cotidiano escolar, à execução de uma práticaavaliativa estabelecida no plano informal, de acordo com o depoimento do Professor 3, também éreforçada pela necessidade de atender às pressões e aos anseios de algumas famílias, que nãocompreendem a nova organização escolar, desejando, portanto, a continuidade da lógica seriada,que propiciava uma maior exigência aos estudos de seus filhos.

[...] a nossa preocupação não é com os critérios de avaliação, a nossapreocupação maior é com a expectativa do aluno, o impacto que causaisso na família, porque nós temos muitos pais que não entenderammuito bem, antes de se informarem melhor reclamam, né, e não queremque seus filhos sejam promovidos, digamos assim, sem o fantasmada retenção – Professor 3 (Geografia), 39 anos.

A preocupação com a expectativa do aluno e a cobrança de várias famílias emrelação à avaliação e sua finalidade, apontadas pelo Professor 3, contradiz o olhar do Professor 8,com relação ao papel dos familiares no acompanhamento do desempenho e no estímulo de seusfilhos aos estudos.

Tá faltando uma maior estimulação da família pelo próprio sistemaescolar, pra que a família entenda o que está acontecendo, [...] nósnão temos uma cultura de família na escola. A nossa cultura é de

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família alheia ao processo pedagógico, nós temos um número aindapequeno de famílias participativas no trabalho escolar daqui, e issofaz com que a gente leve mais tempo pra se aproximar das famílias eabsorver melhor esse grande impacto que está causando que é aausência de uma exigência maior da parte do aluno [...]. Teria que poruma maior estimulação, nós teríamos que preparar novos critérios deestimulação para incentivar o aluno a buscar o conhecimento,naturalmente. E aqui um dos objetivos devem ser justamente esse,desenvolver as potencialidades do aluno nas tarefas” – Professor 8(Ciências), 55 anos.

O depoimento do Professor 8 apontou o reconhecimento deste de que o estímuloda família para apoiar o aluno nas tarefas escolares, exigindo maior empenho dos filhos, é umaspecto que se encontra falho, sendo, portanto, um dever do professor estabelecer novos critériosque favoreçam a dedicação dos alunos, particularmente na realização de tarefas. Ao valorizar arealização das tarefas, o Professor 8 limita a dimensão do trabalho pedagógico com os alunos,que precisam se preocupar com o cumprimento das atividades propostas e não com sua própriaaprendizagem.

Pavan (1998), ao analisar o sucesso escolar de alunos de uma escola públicalocalizada na periferia do município de Jundiaí–SP, já indicava a existência da crença de algunsprofessores de que a presença dos familiares no espaço escolar seria determinante para o êxitodo aluno, juntamente com a oferta de condições adequadas para o estudo domiciliar, a disciplinarígida dos pais e, principalmente, o bom comportamento dos filhos.

Para o Professor 1, no entanto, a estrutura familiar dos alunos da Escola Esperançaé algo crítico, que se reflete na falta de estímulo do aluno.

É crítico o papel da família na vida do aluno e cabe aos agentes quesomos nós superar esse fator crítico, né? Porque isso que nós temos,do aluno se sentir desestimulado por causa da não exigência maiorde empenho dele pela família é reflexo da estrutura da família. Todoaluno com melhor estrutura familiar, logicamente, que vão muito melhornesse novo sistema; os alunos cuja estrutura familiar já deixa a desejar,incluindo os casos graves de degradação da estrutura familiar, o riscoé maior, porque a escola, ela oferece o seu produto, que é o seuestabelecimento e uma relação pedagógica, professor, aluno. Porém,tá faltando ainda um componente que seria a família se aproximarmais da escola. Nesse aspecto vai levar muito mais tempo pra queesse impacto seja absorvido pelo o sistema – Professor 1 (Português),33 anos.

Na percepção do Professor 1, a família deveria ser analisada a partir do tipo deestrutura que possui, relacionando o aproveitamento dos estudos pelos alunos com o nível dedegradação familiar que vivenciam e desconsiderando, por outro lado, os diferentes tipos de arranjoque possuem, problemas de ordem social e econômica, relações de poder e gênero existentesem cada uma delas.

Carvalho (2004), ao destacar a relação entre família e escola, compreende que

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esta ligação pressupõe o desejo de construir, particularmente, na escola pública, uma continuidadecultural e a identidade de propósitos entre estes dois agentes. No entanto, ainda de acordo comCarvalho (2004, p. 44), a solicitação dos professores, da presença dos pais na escola públicapoderá ocorrer por duas razões: a) quando se sentem frustrados e impotentes diante dasdificuldades de aprendizagem e/ou de comportamento com as quais não conseguem lidar; b)quando são culpabilizados, implícita ou explicitamente, pelas autoridades escolares, mídia oupelos próprios pais e mães, pela deficiência do ensino e fracasso escolar.

Deste modo, com base na análise de Carvalho (2004), pode-se compreender queos Professores 8 e 1, ao destacarem a necessidade de participação da família na escola e noacompanhamento das tarefas escolares de seus filhos, apontam, indiretamente, suas inquietaçõesdiante de possíveis problemas com a indisciplina e pressão da própria SEE-SP, que em documentoscomo o Planejamento 2000 (SEE-SP, 2000), reforçam a responsabilidade docente no sucesso eaprendizagem do aluno, com o estabelecimento do regime de progressão continuada.

Segundo se depreendeu dos depoimentos, o regime de progressão continuadapara os professores da Escola Esperança entrevistados é uma medida que gera insegurança aosprofissionais da unidade escolar. Isso porque, mesmo após sete anos de sua implantação, elesrevelam dúvidas com relação à proposta e às possibilidades que a medida pode oferecer à práticapedagógica e avaliativa, devido à falta de capacitação e a ausência de materiais específicos, porparte da SEE-SP, que propiciem o desenvolvimento de diferentes metodologias.

Como o regime de progressão continuada, caracterizou-se como propostaidealizada e implementada sem a participação dos docentes na rede estadual de ensino, emvirtude da centralização da SEE-SP no processo de decisão e orientação da medida, entende-sea partir de Lima (2001, p. 58), que acabou ocorrendo uma separação nítida entre a concepção e aexecução, entre os superiores e os subordinados, favorecendo o predomínio de uma concepçãoburocrática de escola.

Lima (2001), alerta para o fato de que a legitimação de uma concepção burocráticade escola contribui para o estabelecimento do que denomina como infidelidade normativa dosatores escolares. O conceito, de acordo com o autor, deve ser definido como a invenção de novasregras construídas pelos atores escolares, que podem ser distintas ou antagônicas, com o intuitode suplantar a força jurídica-normativa das primeiras regras, através de resistências mais oumenos clandestinas ou do exercício da autonomia.

Na análise de Lima (2001, p. 64), a infidelidade normativa é um fenômeno quepermite caracterizar os atores educacionais e a ação organizacional da escola, sendo justificadoem algumas situações como de desconhecimento, falta de clareza, reprodução deficiente dosconteúdos, erro (não) intencional de interpretação dos normativos pelos sujeitos, já que:

Na verdade, a infidelidade seria mais correctamente compreendida seconsiderada enquanto fidelidade dos actores aos seus objectivos,interesses e estratégias (LIMA, 2001, p. 64, grifo do autor).

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Diante das colocações de LIMA (2001), o termo infidelidade normativa é considerado,como a fidelidade dos atores educacionais, no interior da escola aos seus objetivos, interesses eestratégias em contraponto ao normativismo da SEE-SP.

Com isto, enquanto a SEE-SP procura regulamentar e legitimar o regime deprogressão continuada sem indicar a base norteadora que o orienta, os entrevistados, de acordocom os seus depoimentos, aprenderam a conviver, após sete anos de implementação da medida,pelo que pôde ser observado, paralelamente entre duas formas de organização: a oficial,regulamentada pelas normas da SEE-SP, e a extra-oficial, constituída pelas representações dosdocentes, suas experiências, convicções e incertezas.

Os depoimentos permitem evidenciar que a organização extra-oficial tem oferecidosubsídios necessários para o trabalho pedagógico, o estabelecimento da relação professor-alunoe as práticas avaliativas, entre outros aspectos descritos pelos entrevistados.

Por isso, os docentes entrevistados talvez procurem se manter apegados àspráticas, concepções, aos fundamentos e ao trabalho pedagógico que já conhecem e com osquais se sentem seguros, sem que necessariamente tenham que se desfazer delas ou substitui-las por elementos desconhecidos.

Essa situação, certamente se agrava, pelo fato da formação continuada propostana Escola Esperança ser restrita às reuniões pedagógicas semanais, em que durante as duashoras de encontro debatem-se os problemas de ordem pedagógica ou administrativa, mas poroutro lado não favorecem o compartilhamento de informações, experiências e vivências quepossam auxiliar os profissionais da educação no desenvolvimento do conjunto de saberesnecessários ao trabalho docente.

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INTRODUÇÃO

A formação inicial é o momento em que o profissional da docência adquireconhecimentos pedagógicos, específicos e científicos do ensino. Segundo COSTA,1996, se estafase de formação não promover a alteração das concepções prévias incorretas sobre a escola, aEducação Física e o ensino que os estudantes transportam para o curso, estas idéias irão exerceruma influência permanente e decisiva nas suas crenças, perspectivas pedagógicas ecomportamentos quando forem professores de Educação Física.

Dessa forma, surgiu o nosso problema: Existe evolução no pensamento sobre afinalidade da atuação profissional docente e dos saberes necessários para o exercício da docênciaem Educação Física de alunos ingressantes e concluintes da graduação comparados comprofessores atuantes na escola?

Como nosso procedimento procurou-se alcançar o seguinte objetivo: Analisar opensamento de estudantes ingressantes e concluintes do curso de licenciatura em EducaçãoFísica e professores da área atuantes na educação básica sobre a finalidade e atuação profissionaldocente e os saberes necessários para o exercício da docência.

DOCÊNCIA

Afirmar que docência é simplesmente o ato de ensinar, pode apresentar em umprimeiro momento a finalidade da ação, porém é um conceito precipitado e simplista secomeçarmos a analisar o que realmente seja ensinar e a complexidade de ser professor. Alémdisso, para podermos entender o que seja docência, a resposta a essa questão implica em entenderoutras dimensões essenciais, como por exemplo, no que se diz respeito qual o papel da educação,da escola e do educador. No entanto, é primordial que antes de entendermos essas dimensõestenhamos claro o que significa a ação de ensinar.

Para PINO, (2007) a palavra “ensino” é utilizada tanto para designar a ação e aspráticas de ensinar como os diferentes níveis e modalidades do sistema educacional. O significadoetimológico do verbo “ensinar” vem do latim que é indicar, fazer sinal ou apontar numa direção,entretanto, o significado da palavra varia em razão das práticas sociais dos povos, revelando as

OS (DES)CAMINHOS DA FORMAÇÃO INICIALE AS INFLUÊNCIAS NAS AÇÕES PEDAGÓGICAS

DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA

COSTA , Amanda Luiza Aceituno da ; PALMA, Ângela Pereira Teixeira Victória;PALMA, José Augusto Victoria (UEL),

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diferentes concepções que decorrem dessas práticas. Já no caso do ensino e da palavra ensinar,o seu significado pode ter diversas variações, sentidos e significados de acordo com as diversasteorias e paradigmas educacionais que orientam as práticas pedagógicas, a docência.

Atualmente, nos deparamos em diversas situações de nosso cotidiano, seja naescola, no trabalho, na academia ou até mesmo em uma festa nas quais escutamos as pessoasingenuamente dizerem que estão ensinando algo, como a mãe que ensina a filha a fazer um bolo,o amigo lhe ensina a mexer no computador, ou mesmo em uma academia o instrutor ensina opraticante a executar o exercício. O termo ensinar é comumente utilizado em diversas situaçõese lugares que nem sempre se referem a uma escola de educação básica ou a um educador. Aespecificidade e a identidade do profissional da área acabam por se perder em meio a tantasações que são equivocadamente consideradas como ensino.

Muitos, ingenuamente, acreditam que o professor transmite informações que atéentão o aluno desconhecia e esse ato, por si só, já poderia ser caracterizado como ensino. Logo,se temos mais informações sobre um determinado assunto do que outra pessoa e ascompartilhamos, estaríamos desempenhando a mesma função do professor, ensinando; comonos casos citados anteriormente. Analisando por essa mesma perspectiva, se leio um livro edescubro informações que até então desconhecia, esse livro poderia ter me ensinado algo?

Entretanto, o que consideramos aqui como ensino, vai muito além da transmissãode informações ou repetições. Logo, as ações citadas acima não poderiam ser consideradasensino, por esse se tratar de uma ação complexa e que diz respeito à especificidade de umadeterminada profissão.

É certo que cada profissão tem sua especificidade, própria de sua área, que nãocabe a uma outra área executar aquela função. Uma função que a caracterize como única. Oprofessor tem como especificidade, própria de sua área, o ensino, cabendo à ele, pois para tanto,estudou durante anos, e construiu e melhorou todos conhecimentos pedagógicos, científicos,específicos, sociológicos, filosóficos e outros necessários para exercer a profissão de educador.

Porém, se o professor, a mãe e o livro transmitem informações, o que faz o profes-sor ser o único com conhecimentos capazes de ensinar? O que diferencia a ação profissional dadocência da ação dos demais? Por que só o professor possui a especificidade de ensinar seoutras pessoas também transmitem informações e são consideradas como se tivessem ensinandoalgo?

A grande diferença do professor para os demais está no significado, sentido eintenção de seu trabalho, enquanto que para os outros, a transmissão de informações tem fimnela mesma, para o professor a transmissão do saber não é o fim, mas sim o meio para que oestudante chegue a um estágio mais elevado de conhecimento, que compreenda, transforme erenove aqueles saberes. A transmissão dos conhecimentos feita pelo professor em sala de aula,se faz necessária, porém não é isso que caracteriza a ação de ensinar do professor. O que acaracteriza é como esse aluno irá processar tais conhecimentos e tentar fazer analogias,comparações e reelaborá-los e coordenando esses novos saberes com os que já possui. Nesseprocesso, o professor tem o papel de dar condições para que o aluno reflita e reelabore tais

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conhecimentos adaptando-os para a sua vida. Ou seja, ao receber uma informação o aluno atransforma em conhecimento, a partir das relações que o mesmo irá fazer entre o que já conheciae o assunto novo que esta sendo ensinado, e para que isso oconteça é necessário, que o profes-sor crie condições, estimule e questione por meio de conflitos cognitivos solucionáveis. Essesprocessos, que fazem parte da ação pedagógica, compete ao professor realizar, pois somenteele tem a intenção de ensinar. Para CHAVES (2007), se não houver por parte do professor, queapresenta o conteúdo, a intenção de que seu aluno aprenda aquele saber que esta expondo,então, não há ensino.

Portanto, podemos afirmar que ensinar é um processo muito mais complexo eamplo, vai além da simples transferência de informação, do saber fazer, da memorização e domodelo, que é comumente utilizado, historicamente, nas aulas de Educação Física, dando a falsaimpressão que esteja ensinando algo, sendo na realidade, uma grande confusão epistemológicaentre as palavras adestrar, treinar e memorizar com a palavra ensinar.

A mãe que ensina a filha a fazer um bolo teve a intenção de ensinar, entretanto,essa ação inicia e termina nela mesma. A intenção que o professor deve ter vai além de quererque seu aluno faça alguma ação que o mesmo tenha lhe mostrado ou instruído, vai além de tiraruma boa nota na prova ou se executou a ação que desejava com perfeição. O propósito do ensinopara o professor é eminentemente educacional.

Ensinar e aprender, ainda que independentes, integram um processo mais amplochamado educação. Cada indivíduo que participa desse processo deve compreender o porquê deestar ali e a cada dia, procurar o significado de sua atividade dentro desse processo. O professorque ensina e o aluno que aprende estão juntos, em uma constante troca de conhecimentos,transmissão de saberes essenciais, busca de uma significação para esses saberes perante ocotidiano da escola da sociedade e de sua própria vida; são práticas que ocorrem a cada momento,sem interrupções dentro do processo educativo. Essa troca de saberes não se trata dos conteúdosespecíficos da Educação Física, pois esses, o professor tem a obrigação de saber mais que oaluno. A troca de conhecimento se dá na medida que o professor se torna professor a cada aula eatravés da reação perante determinada maneira de agir, o professor a refaz, em busca da melhormaneira que se possa ocorrer a compreensão dos alunos. O professor aprende com os alunos aser professor, ou seja, a refazer e repensar suas estratégias pedagógicas, porém os conteúdos esaberes científicos continuam os mesmos.

Educação é uma palavra forte, que para Morin (2004), é a utilização dos meios, ouseja, o como se promove o ensino que permitem assegurar a formação e o desenvolvimento deum ser humano. Para este autor, a palavra ensino não é suficiente para comportar todo significadoe sentido da educação escolarizada, assim, o mesmo, utiliza do termo “ensino educativo” paradesignar todas as ações e comprometimentos necessários a docência.

Muito se fala e muitos “chavões” foram criados como slogans nos meios decomunicação tais como: educação e cidadania, educação emancipadora, construção do alunocrítico e reflexivo, entre outros, porém, para a educação realmente ser transformadora e

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emancipatória, necessita estar centrada na vida, precisa considerar as diferenças pessoais, acultura, o modo de vida das pessoas.

A educação que estamos considerando é a que faz o educando pensar, refletir,compreender o mundo que esta inserido, se entenda como um ser atuante e que suas açõesterão conseqüências; se entenda como um sujeito que faz a história, que depende dele, ser éticoe analisar o que seja melhor.

SABERES DOCENTES

Ser professor é uma tarefa que exige desafios. Desafios esses que são decorrentesda ação complexa que é o ensinar. Alguns desafios da docência incluem lidar com a diversidadecultural presente em uma sala de aula, com o inesperado a cada dia, muitas vezes com faixaetária diferente na mesma sala, com a responsabilidade atribuída às instituições de ensino naatualidade, entre tantos outros.

Essa complexidade na ação do professor é pela simples razão do mesmo trabalharcom seres humanos que têm necessidade, intencionalidade, vontade e estão, a todo momento,evoluindo por meio da compreensão dos conhecimentos.

Dessa forma, por mais que tentamos enumerar as diversas possibilidades deacontecimentos que poderiam ocorrer em uma aula, seria impossível prever, com segurança,tudo o que pode acontecer no cotidiano da escola. Não podemos antecipar o que o outro indivíduo,que convivemos na relação professor e aluno, imagina e pensa, por serem seres humanos quepossuem suas próprias individualidades. Por isso, ser professor é como define bem Perrenoud,(1996, p:11) “(...)decidir na incerteza e agir na urgência(...)”. Ser professor exige uma série deconhecimentos que vão além dos conhecimentos específicos, da técnica e do saber fazer.

Em meio a desafios e incertezas o professor deve desenvolver sua especificidadeque é a de ensinar, e ao fazer isso, assume diversas responsabilidades e tarefas, que são inerentesao processo de ensino em que se busca a aprendizagem efetiva do educando. Tarefas essas,que não conseguiriam ser explicadas e baseadas apenas em uma formação técnica ou em umguia técnico de “como se ensina”. E para que de fato o ensino ocorra, é preciso que o professorcompreenda o que faz, porque faz, quando faz, para que faz, quando, porque e para que avalia.Para que essas tarefas obtenham sucesso, são necessários, por parte dos professores, muitomais que o conhecimento construído durante o curso de graduação, é preciso que o professorcontinue estudando sempre. Esses estudos devem estar baseados em saberes, alguns autorespreferem chamar de competências como Perrenoud (1996) e Campos (2007). Esses saberes oucompetências docentes não se tratam de uma lista ou grade de conteúdos específicos que oprofessor deve adquirir durante sua formação inicial, mas sim, “(...)constroem-se, na formação,mais também ao sabor da navegação diária de um professor, de uma situação de trabalho àoutra” (LÊ BOTERF in PERRENOUD, 2000,p:15).

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Os saberes docentes são construídos, reelaborados e resignificados durante todaa carreira docente, pois, fazem parte do processo de auto-avaliação do seu trabalho no cotidianoda escola.

Nota-se, para a construção necessária dos saberes, que a ação docente perpassapor etapas espiraladas necessitando de uma constante análise coletiva e individual, ou seja, adiscussão, o diálogo sobre a ação, abstração, reflexão, individualidade e subjetividade de cadaprofissional para se chegar aos saberes docentes que estarão sempre dispostos a reavaliaçõese renovações, como um ciclo que se renova a cada retomada de pensamento.

Portanto, “Tornar-se professor constitui um processo complexo, dinâmico e evolutivoque compreende um conjunto variado de aprendizagens e de experiências ao longo de diferentesetapas formativas” (PACHECO e FLORES, 1999, p:45).

Esse conjunto variado de aprendizagens e de experiências que fazem parte detodo o processo formativo docente, deve-se estender da formação inicial até o término da carreiradocente, podendo ser denominado como conhecimentos científicos, pedagógicos, psicológicos,filosóficos, antropológicos e os conhecimentos que o professor constrói através da experiênciado seu cotidiano de sala de aula. Isso só é possível se houver um diálogo, realizado pelo próprioprofessor entre a sua ação e a base teórica que lhe dá sustentação para o seu agir.

Tardif, (2002), denomina esse conhecimento como saberes experienciais, que éfruto da experiência e da prática cotidiana do docente e do seu trabalho como professor na interaçãocom os alunos, na gestão da classe.

Perrenoud, (2000), afirma que a noção de competência ou saberes profissionaisdesignará aqui uma capacidade de mobilizar diversos recursos cognitivos para enfrentar um tipode situação, ou seja, nesse contexto os saberes profissionais são subjetivos e não determinados,dependendo do bom senso e da reflexão do professor para decidir a melhor forma de agir emdeterminada situação. É aqui que se faz necessária a real formação do professor apresentandoatitudes com características de autonomia que poderá refletir sobre a sua ação. Possibilitandodessa forma, um profissional crítico que constrói seu conhecimento e não apenas o que reproduz,ou que segue manuais como se fossem regras padronizadas como verdade absoluta.

Para Tardif, (2002), os conhecimentos especializados, nos quais alguns derivamdos saberes científicos, devem ser adquiridos através de uma longa formação de alto nível, namaioria das vezes, de natureza universitária que no caso seria a formação inicial. Essa formaçãoé sancionada por um diploma que possibilita o acesso a um título profissional, título esse queprotege um determinado território profissional contra a invasão dos não diplomados e dos outrosprofissionais. Tardif, (2002), acrescenta ainda que os profissionais devem se apoiar emconhecimentos especializados e formalizados, na maioria das vezes, por intermédio das disciplinascientíficas em seu sentido amplo, incluindo, evidentemente, as ciências naturais e aplicadas, mastambém as ciências sociais e humanas, assim como as ciências da educação.

Para que ocorra o ensino efetivamente, não é suficiente apenas os conhecimentoscientíficos, pois, um profissional pode conhecer muito sobre os conhecimentos de sua área

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específica, porém se ele não souber construir e proporcionar a aprendizagem desses conteúdoscom os alunos, de nada adianta seus conhecimentos científicos no que se refere a ação docente.

Os conhecimentos pedagógicos são aqueles em que o professor se fundamenta edireciona o seu ensino São conhecimentos que capacitam o professor a criar situações maispropícias a aprendizagem de acordo com determinada perspectiva ou modelo de educação que oprofissional escolhe seguir. Os saberes pedagógicos englobam conhecimentos como organizare dirigir situações de ensino-aprendizagem, avaliações, administrar situações problemas de acordocom o nível dos alunos.

METODOLOGIA

Este estudo foi realizado por meio de uma pesquisa de campo de cunho qualitativo.A coleta de dados se deu por meio de um questionário com 17 perguntas abertas,

e giraram em torno das temáticas: educação, Educação Física, currículo e formação profissional.Para dar conta de alcançar os objetivos desta pesquisa analisamos duas questões que foram:qual a função do professor de Educação Física? Quais os saberes necessários para sua açãodocente?

Este questionário foi aplicado em três grupos distintos: a) em 62 professores deEducação Física que atuam na educação básica, b) em 102 estudantes de Educação Física quecursavam o último ano de graduação baseado pela resolução CFE 03/871, nos anos de 2005 e2006, e c) 108 estudantes que cursavam o primeiro ano do curso de Educação Física regido pelaresolução CNE 01 e 02/02, nos anos de 2005, 2006 e 2007, na Universidade Estadual de Londrina.

O objetivo aqui não é comparar as respostas dos entrevistados, mas sim verificaro pensamento de cada grupo que respondeu ao questionário.

Para ilustrar melhor, dividimos a análise das respostas, dos entrevistados, tomandocomo base as duas perguntas escolhidas para esta pesquisa, funções do professor e saberes doprofessor.

ANÀLISE DOS DADOS

FUNÇÕES DO PROFESSORComo resposta de quais as funções que o professor de Educação Física deve

desempenhar em seu contexto de trabalho, dos 102 alunos concluintes do curso de EducaçãoFísica, apenas 46 responderam que a função do professor é de fato ensinar e ser educador.Enquanto que as respostas dos 108 estudantes iniciantes no curso, 36 indicaram, em suasrespostas, a ação de ensinar como a função do professor de Educação Física. Dos 62 professoresatuantes na educação básica, 32 deles indicaram a ação de ensinar como função do professor deEducação Física. Portanto, os dados nos mostram que menos da metade do total dos entrevistadosconsideram a ação de ensinar como especificidade e função do professor de Educação Física.

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O desenvolvimento de habilidades motoras nos alunos, por meio das aulas deEducação Física, foi citado como sendo função do professor, por 28 concluintes, 14 ingressantese 24 dos professores atuantes na educação básica. Outra função que apareceu nas respostas foia promoção da saúde, foi citada por 12 dos concluintes, 8 dos ingressantes e 29 dos professores.Nestas duas funções citadas, desenvolvimento de habilidades motoras e promoção da saúde,ambas não fazem parte da função principal de um profissional da docência, que é o de promovere criar condições propícias para a aprendizagem dos conteúdos próprios da Educação Física.Temos certo que, ao estudar os conteúdos da área, as crianças poderão entender melhor comoagir no cotidiano para melhorar a promoção da saúde, mas não pode ser considerada como umfim em si mesmo.

Com relação a estas funções do professor citadas nas respostas dos entrevistados,podemos inferir que os professores egressos dos cursos de Educação Física e os estudantesconcluintes responderam, por razão do tipo de perfil e objetivo do curso de licenciatura que cursarame ainda estavam cursando, baseado na resolução CFE 03/87, que é o curso que responde peloensino dos conhecimentos, com algumas disciplinas específicas para se trabalhar na escola e nagrande maioria das disciplinas para dar conta dos conhecimentos fora do contexto escolar, dandoao curso um caráter generalista. Esta formação tal como estava sendo proposta realmente,conforme as respostas analisadas, não estava conseguindo promover um conhecimento adequadopara exercer a docência. Já nas respostas dos estudantes ingressantes, podemos inferir que foia percepção que os mesmos tiveram quando cursaram a educação básica, ou seja, pelas atitudesque muitos dos seus professores de Educação Física tiveram ao passaram pela sua vida estudantil.

Encontramos ainda nas respostas, que o ensino do jogo, da dança e do esporte foiindicado por 10 estudantes concluintes, 42 iniciantes e 48 dos professores atuantes. É certo queo ensino dessas manifestações culturais fazem parte do conteúdo da disciplina de EducaçãoFísica, porém, não é a função principal e nem sua especificidade. Ao agir em sala de aula oprofessor irá ensinar os conteúdos jogo, esporte, dança, entre outros, promovendo nos alunosuma compreensão e vivencia dos mesmos.

Nesta função citada pelos entrevistados foi possível verificar uma incidência maiornas respostas dos estudantes iniciantes com relação aos concluintes. Pode-se inferir, por essasrespostas, que foi o que muitos deles tiveram como experiência na Educação Física enquantofreqüentavam a educação básica. Esse olhar trata-se de uma construção social ingênua e desenso comum, a respeito da função do professor de Educação Física.

Outra confusão, quanto a função do professor, encontrada nas respostas dosestudantes e dos professores foi o de não excluir os alunos em sala de aula, respondida por 6 dosalunos concluintes, 8 dos iniciantes e 5 dos professores atuantes na escola. Sabemos que a nãoexclusão dos alunos é importante e necessária dentro do contexto escolar, porém, é função detodo o corpo docente da escola e não apenas e nem exclusiva do professor de Educação Física.

Nota-se que os discursos dos ingressantes, concluintes e professores atuantesforam muito semelhantes e com uma diferença pouco significativa nas respostas analisadas,

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aparecendo uma pequena diferença quantitativa no que se refere ao desenvolvimento de habilidadesmotoras e ao ensino do jogo, da dança e do esporte.

SABERES DO PROFESSOR

A partir das análises das respostas dos estudantes iniciantes e concluintes e dosprofessores sobre os saberes necessários a ação docente, pôde-se perceber que as respostasdos três grupos de entrevistados continuam muito semelhantes, com diferenças poucosignificativas. Percebeu-se em algumas respostas que um determinado número de entrevistadosconfundiram o que seria função da docência e saberes do professor.

No que se diz respeito aos saberes necessários à prática docente, 35 dos alunosconcluintes e 38 dos alunos iniciantes, responderam que os saberes necessários aos professoresde Educação Física são os ligados à biologia e a fisiologia, ou seja, que dizem respeito aocrescimento e desenvolvimento humano. Como mostra as falas de alguns dos alunos concluintese iniciantes da pesquisa:

De fato, o professor de Educação Física deve conhecer também essesconhecimentos científicos nos quais, são necessários à ação docente. Porém, o que se podeperceber, através das respostas dos entrevistados, é que esses conhecimentos fisiológicos ebiológicos foram considerados apenas ligados ao aspecto físico do sujeito e como os únicosnecessários para as aulas de Educação Física, ligado ao desenvolvimento e aperfeiçoamentodos alunos para a melhora da performance em modalidades esportivas, para encontrar edesenvolver talentos, sendo que esses conhecimentos devem ser trabalhados com os alunospara um melhor entendimento de seu corpo e de como os mesmos influenciam em suas vidasfora da escola, além de serem conhecimentos que dão suporte para a construção de váriosconteúdos da Educação Física e não simplesmente serem trabalhados com o fim de desenvolverpotencialidades nos alunos.

Estes saberes citados pelos entrevistados logo houve uma ligação por parte deles,que os saberes pertinentes ao professor de Educação Física seriam os conhecimentos esportivos.O esporte foi indicado na pesquisa por 16 alunos concluintes, 18 alunos ingressantes e 20 dosprofessores atuantes. Mais uma vez um dos conhecimentos necessários aos professores deEducação Física foi indicado, porém de forma isolada como se fosse o único conhecimentonecessário ao professor, ou até mesmo como sinônimo da área para poder mediar as aulas deEducação Física. O esporte, como uma manifestação cultural de forte influência em nossasociedade, deve sim ser estudado e compreendido nas aulas, porém, como um dos conteúdos aserem ensinados, abordando suas origens, história, regras, a construção do por que de ser umamanifestação cultural e a importância de se estudar na escola em um determinado nível deescolarização. O equívoco nesta resposta foi considerar o esporte como único conteúdo ou omais importante pertencente a Educação Física escolar, e ainda sinalizado como rendimento,competição e o aperfeiçoamento de técnicas e habilidades técnicas.

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Há uma ligação entre os conhecimentos esportivos e fisiológicos muito presentesnas respostas dos entrevistados, pois, há uma idéia equivocada da sociedade na qual, o profes-sor de Educação Física, deve através de suas aulas preparar atletas que se destacarão no futuro.Pode-se observar esta questão também em discurso banalizado de políticos, meios decomunicação e de alguns professores de Educação Física. Acredita-se que o esporte pode tirarcrianças das drogas e formar melhores cidadãos, como se o esporte por si só fosse capaz detais possibilidades. O esporte pode sim ser um dos meios que venha a ajudar na formação dascrianças, porém ele sozinho não faz nada, é necessário a ação pedagógica do professor por meiode seus conhecimentos pedagógicos e científicos para que então, essas possibilidades sejamalcançadas.

Outra resposta que apareceu dos entrevistados foi a respeito dos conhecimentosrecreativos que o professor de Educação Física deveria possuir. Dos estudantes concluintes, 5responderam que os conhecimentos recreativos são necessários aos professores de EducaçãoFísica, 9 dos alunos iniciantes e 6 dos professores apresentaram esta resposta.

Esses conhecimentos recreativos não se sustentam, pois, a Educação Física, comodisciplina curricular obrigatória está sendo considerada por nós como área de conhecimento,contém conteúdos a serem ensinados pelo professor e compreendidos pelos alunos.

O ensino não ocorreria de fato se a ação do professor ficasse apenas em ministraratividades que tivessem a preocupação de recrear os alunos, como se as aulas fossem umacompensação para as outras disciplinas consideradas, pelos leigos, como intelectuais. Aoproporcionar o ensino de um determinado conteúdo, o professor deve se preocupar que a estratégiaescolhida, para o encaminhamento deste assunto, tenha um caráter lúdico, ou seja, o meioescolhido deve ser prazeroso para as crianças. O que diferencia a atividade do professor e a deum recreador são seus objetivos. Enquanto para o recreador sua atividade tem fim nela mesma,para o professor, a atividade, deve ser uma das muitas maneiras para que, seu aluno, alcance oobjetivo de compreender um determinado conteúdo.

O conhecimento do professor deve ser pratico e teórico, foi o que apareceu naresposta de 10 estudantes concluintes, 9 dos iniciantes e 7 dos professores atuantes na educaçãobásica. A teoria e a prática aqui foram mencionadas pelos entrevistados de forma isolada, comose primeiro fosse necessário um embasamento teórico para a prática ocorrer. Não havendocoordenação entre o saber teórico e o saber prático. Os conhecimentos éticos e morais apareceramna resposta de 6 dos concluintes, 5 dos iniciantes e 6 dos professores atuantes. É evidente queesses conhecimentos são importantes para a ação pedagógica de um professor de EducaçãoFísica, porém, são atitudes que são inerentes ao trabalho de todas as profissões e de todos oscidadãos, não sendo um item que se destacaria somente para o professor de Educação Física.

Por fim, os conhecimentos pedagógicos do professor apareceram nas respostasde 16 alunos concluintes, 14 estudantes ingressantes e 10 professores atuantes. Esse númeropode-se considerar pequeno por ser um dos conhecimentos principais que deveria ter aparecidonas respostas, pelo menos por parte dos alunos concluintes e dos professores que já atuam coma área.

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Os conhecimentos pedagógicos é um dos principais, claro que não é suficientepara exercer a função da docência, pois, nele esta inserido toda a ação cotidiana do professor, éo que possibilita a relação e interação aluno professor e professor aluno, o como, porque e paraque ensinar, quando, porque e para que avaliar, e ainda seus princípios éticos. São aqueles emque o professor aprende a responder como se dá o conhecimento do aluno. São conhecimentosque capacitam o professor a criar situações mais propícias a aprendizagem de acordo comdeterminada perspectiva ou modelo de educação que o profissional escolhe seguir.

Os saberes pedagógicos englobam conhecimentos como organizar e dirigirsituações de ensino-aprendizagem, avaliações, administrar situações problemas de acordo como nível de escolarização dos alunos; ensinar conteúdos que sejam pertinentes a série, entre outros

Ao lado dos conhecimentos pedagógicos, esperava-se que os alunos,principalmente os concluintes e professores atuantes, indicassem os conhecimentos científicoscomo necessários à ação educativa, pois, nele estão inerentes conhecimentos tais como:paradigmas educacionais, teorias de ensino e aprendizagem, teoria de currículo, sobre a funçãoda escola e da sua própria disciplina entre outros. Os saberes científicos são aqueles que dizemrespeito aos conteúdos específicos da área de atuação, são esses conhecimentos que sustentama ação docente. Porém, esta resposta, não foi citada por aluno algum, que participou da pesquisa,como sendo saberes do professor

Pode-se perceber como as respostas dos alunos iniciantes e concluintes no cursode Educação Física estão com variações pequenas e com diferenças pouco significativas.

CONCLUSÃO

Ao analisarmos os dados coletados, pôde-se perceber como houve dificuldadedos grupos de entrevistados em diferenciar as funções da docência dos saberes necessários aação pedagógica.

Os estudantes concluintes e iniciantes do curso de graduação em Educação Físicativeram respostas muito semelhantes, fato esse que gera uma certa preocupação, pois, issosignifica que aqueles alunos que estavam terminando o curso têm o mesmo entendimento, doque seja docência, daqueles que estão ingressando no curso e terão, ainda, todo o percurso deaprendizagem pela frente.

A formação inicial é o momento no qual se adquire conhecimentos e promovealterações nas concepções equivocadas que o estudante carrega com ele quando inicia nauniversidade. Logo, pode-se perceber que o processo de formação inicial orientado pela resoluçãoCFE 03/87 não esta atingindo seus objetivos no que diz respeito a docência. Esses concluintesdeveriam estar mais conscientes a respeito de suas funções perante a escola e de quaisconhecimentos necessitam para atuarem nela. A minoria dos estudantes concluintes entendemcomo função e especificidade do professor de Educação Física a ação de ensinar e atribuemcomo função do professor de Educação Física atividades que são pertencentes a todos os

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professores da escola como dominar o conteúdo, interagir com os alunos, entre outras.Essa falha na formação inicial de professores influencia diretamente nas ações

pedagógicas dos futuros professores de Educação Física, pois, sem uma formação adequada osfuturos profissionais chegam na escola para ministrar as aulas com o mesmo pensamento arespeito da Educação Física na escola do que os outros professores, pais e alunos, não havendoassim, condições desse profissional argumentar, se posicionar para um melhor trabalho.

Conclui-se que a formação inicial tal como estava baseada na resolução CFE 03/87 realmente não estava atingindo os objetivos necessários a ação docente. A mudança de currículodo curso realmente era necessária para um ensino da Educação Física na escola de melhorqualidade e que melhor atenda os objetivos da docência. O que se espera é que o curso baseadona Resolução CNE 01 02/02 consiga alcançar seus objetivos relacionados à docência para umamelhor legitimidade da Educação Física na escola.

Quanto aos professores que já estão atuando na educação básica, espera-se, queos mesmos, sintam a necessidade de procurarem formas de capacitação continuada, no qual, dêsuporte para um melhor aprofundamento e ressignificação das questões relacionadas ao ensino,ao objetivo e finalidade do contexto escolar.

REFERÊNCIAS

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PINO, A. Ensinar – aprender em situação escolar. FE – UNICAMP. <www.lite.fae.unicamp.br>Acesso em 29/03/07.

NOTAS

1 O currículo do curso generalista, baseado na resolução CFE 03/87, está em processo de desativação. Na UEL desde o vestibularde 2005 este curso não é mais oferecido, passando o curso a ser baseado nas resoluções CNE 01 e 02/02.

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As discussões e reflexões propostas neste texto estão presentes na tese dedoutorado de Cunha (2006), defendida no Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Continuada(GEPEC), da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas.

A educação continuada de professores, a formação centrada na escola e a açãodo coordenador pedagógico como mediador do trabalho docente coletivo são as principaistemáticas que orientaram a investigação, que dialogou com cinqüenta coordenadoras de escolasde Educação Infantil, públicas e privadas, em dois momentos e circunstâncias de investigação. Oprimeiro momento da pesquisa foi estruturado com base em um trabalho de formação promovidopor uma organização não-governamental e envolveu três grupos de coordenadoras que se reuniramquinzenalmente com a pesquisadora, durante um semestre, para discutir suas práticas comoformadoras de professores. O segundo momento da pesquisa foi pautado por um encontro comseis coordenadoras que haviam participado dos grupos anteriores, quando se buscou oaprofundamento das temáticas da pesquisa, notadamente a rotina do trabalho coletivo deprofessores, suas possibilidades e dificuldades como mediadoras.

O interesse inicial da pesquisa foi investigar se as coordenadoras pedagógicas sereconheciam (ou não) como formadoras de professores nas escolas, tomando como ponto departida as contribuições dos trabalhos organizados por Guimarães, Mate e Bruno (1998), Bruno,Almeida e Christov (2000) e Almeida e Placco (2001, 2003, 2006).

O diálogo com as coordenadoras permitiu reconhecer que as mesmas valorizavama formação que acontecia nos momentos de trabalho docente coletivo, reivindicando, entretanto,uma formação em colaboração (co-ordenação), ou seja, uma responsabilidade compartilhada ecomprometida (co-formação).

As coordenadoras defenderam uma formação pautada pela reciprocidade entrecoordenadores e professores e fundamentada na participação e intercâmbio que “não só leva oindivíduo a ter uma melhor compreensão de si próprio, uma vez que pode testar a validade desuas idéias através da compreensão que o outro tem de suas palavras, como também estimulasua capacidade de pensar” (ROMERO, 1998, p.46).

Esse texto socializa e problematiza algumas das questões propostas nainvestigação, a saber: Qual a prática das coordenadoras em relação às ações de formação nasescolas? Quais as possibilidades e dificuldades presentes no cotidiano das coordenadoras paraorganizar essa formação? Como vêem o seu trabalho?

PRÁTICAS DE CO-ORDENAÇÃO E CO-FORMAÇÃONAS ESCOLAS: ENCONTROS ENTRECOORDENADORES E PROFESSORES

CUNHA, Renata C. O. Barrichelo (UNESP/Rio Claro-GEPEC/UNICAMP);PRADO, Guilherme do Val Toledo (GEPEC/UNICAMP)

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A CO-ORDENAÇÃO E A CO-FORMAÇÃO NAS ESCOLAS

As práticas de formação apontadas pelas coordenadoras foram diversas:orientações individuais, orientações em grupos por idades, leitura de textos, discussão dedeterminados temas no coletivo. Essa formação no coletivo pareceu vinculada à leitura de textosque a coordenadora propunha para sensibilizar, esclarecer algum assunto, reforçar determinadosvalores ou discutir problemas específicos.

Cesca (2003) encontrou a mesma relação formação/leitura de textos entre ascoordenadoras entrevistadas na sua pesquisa: crê-se que a leitura e a discussão de textossubsidiariam a prática dos professores.

Essa proposta de formação através da leitura de textos e estudos de teorias sobretemas que sejam de interesse e necessidade do grupo de professores é defendida por Souza(2001) quando destaca a importância de definir “um tema a ser discutido/estudado, uma tarefa aser desenvolvida, pois só se constrói grupo pela realização de tarefas, com a busca de objetivoscomuns” (p.29).

Esse trabalho de formação e leitura de textos/discussão de temas no horário detrabalho pedagógico coletivo (HTPC) e nas reuniões ficava subordinado, entretanto, aos assuntosrelacionados à Secretaria (recados, orientações, informativos) – caso das escolas públicas – e aquestões de organização e planejamento. O trabalho coletivo como espaço de formação (BRUNO,1998) e as reuniões na escola como espaço de comunicação e saber (BRUNO e CHRISTOV,2000) ainda constituem uma realidade a ser construída. A pergunta posta por Torres (2001) -reuniões pedagógicas: espaço de encontro entre coordenadores e professores ou exigênciaburocrática? – continua atualizada.

As coordenadoras registraram que as professoras sentiam necessidade deconversar sobre os problemas de determinadas crianças e de suas famílias e de “passar”informações entre uma classe e outra. Reconheceram, ainda, que as professoras se ajudavamquando contavam e partilhavam suas experiências. Essas necessidades confirmaram a discussãoproposta por Almeida (2001) de que “boa parte dos saberes dos professores é construída narelação com o outro” (p.70) e que uma relação calorosa autêntica é condição para o exercício deuma postura relacional que valorize o olhar, o ouvir, o falar e o prezar. Correia (2005) reforça essamesma idéia quando defende a “troca de olhares entre subjectividades que se escutam mutuamentenuma relação de reciprocidade” (p.69).

As coordenadoras, bem como os autores citados, apontaram para um aspectoimportante da formação na escola, que é o componente de socialização. Nessa perspectiva,assumo o conceito de Gomes (2006) que, apoiada em Dubar (1997), define a socialização como

um processo interativo e multidirecional, de transmissão de valores, modos de sesituar no mundo, histórias de vida, normas e regras e que pressupõe uma transação entre osocializado e os socializadores, resultante de negociações permanentes. Produto das influências

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presentes ou passadas, é uma construção lenta e gradual de um código simbólico. Assim,socializar-se é um processo de identificação, de construção de identidades, que envolve osentimento de pertença e de relação, a maneira a que o sujeito passa a assumir, mesmo queparcialmente, o passado, o presente e o projeto do grupo no qual participa (p.289).

Considerar os encontros no HTPC ou reuniões como possibilidade de socializaçãoque implica reconhecimentos recíprocos e construção de identidades pode funcionar como“plataforma de lançamento” para uma formação que faça da leitura de textos, discussão de temase reflexões sobre as práticas dos professores uma oportunidade para fortalecer valores,compreender contextos e posições-de-sujeito (WOODWARD, 2000), negociar pontos de vista econstruir um sentimento de pertença que possibilite o desenvolvimento pessoal e profissional dosprofessores.

POSSIBILIDADES E DIFICULDADES NA ORGANIZAÇÃO DA FORMAÇÃO

As dificuldades foram relacionadas à formação das professoras, consideradainsuficiente na maioria das vezes; à falta de uma equipe técnica ou de interlocutores quedialogassem sobre o trabalho na escola; a divergências políticas; aos horários das reuniões eremuneração; ao cansaço e sobrecarga de trabalho das professoras e das coordenadoras.Importante também ressaltar os conflitos entre o projeto pedagógico da escola e as expectativasdos pais e a necessidade de se “adequar” ou “romper” com essas expectativas.

A pesquisa de Clementi (1997) identificou a falta de tempo, o stress e a ansiedade(desejo de fazer tudo o que é preciso ser feito) para justificar as dificuldades presentes na rotinadas coordenadoras. Em comum, as coordenadoras sentiam-se sobrecarregadas pelo excessode atividades, como planejar as reuniões, organizar encontros individuais e grupais, acompanharos alunos, conversar com os pais, dar retorno aos professores, atividades burocráticas, reuniõese solicitações da Secretaria, além dos inúmeros problemas emergenciais do cotidiano.

Considerar as condições de vida, de trabalho e de tempo livre do professor (e docoordenador) no planejamento das ações de formação contínua (LIMA, 2001) é um imperativo.Outra necessidade é assumir a formação dos professores como atividade de importância-rotina(GONÇALVES, 1995 apud PLACCO, 2003) e pensar estratégias que potencializem o trabalhocoletivo.

A optimização do potencial formativo dos contextos de trabalho passa, em termosde formação, pela criação de dispositivos e dinâmicas formativas que facilitem a transformaçãodas experiências vividas no quotidiano profissional, em aprendizagens a partir de um processoautoformativo, marcado pela reflexão e a pesquisa, a nível individual e colectivo. É esta articulaçãoentre novos modos de organizar o trabalho e novos modos de organizar a formação (centrada no

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contexto organizacional) que facilita e torna possível a produção simultânea de mudanças individuaise colectivas. Os indivíduos mudam, mudando o próprio contexto em que trabalham (CANÁRIO,1998, p.5).

Canário propõe cinco questões estratégicas que atendam às necessidadesanunciadas: pensar a escala da organização escolar numa perspectiva global; construir um projetode formação com base em modalidades de intervenção (lógica de projetos, de ação) que facilitema produção de mudanças individuais e coletivas; enfatizar a construção de problemas e o confrontode pontos de vista a partir das experiências dos professores – formalização da experiência –promovendo o diálogo entre as produções internas e interlocutores externos; inserir a escola emredes de formação que comunicam e disseminam inovações.

Os estudos de Meireles (2000) também nos ajudam a reconhecer algumasestratégias para o desenvolvimento da reflexão que oportunizem a transformação das experiênciasem aprendizagens. Defendendo a importância da escrita na formação, sugere a produção deportfólios e de narrativas (1), bem como de projetos de investigação-ação, análise de casos etarefas de descrição, interpretação, confronto e reconstrução de problemas.

Apesar da complexidade de se avaliar as reflexões dos professores, Meireles sugereatentar para alguns indícios relevantes, como a passagem do foco de preocupação do professorpara o aluno, reflexão na ação, leitura das experiências sob diversas perspectivas, consideraçãodos problemas sob diferentes óticas, disponibilidade para considerar múltiplas alternativas, nãoaceitação acrítica das situações e problematização da relação teoria-prática.

Essas são algumas possibilidades que podem converter as próprias dificuldadesdas coordenadoras em material para reflexão, reivindicação e produção de inovações.

AUTO-IMAGENS E METÁFORAS

As coordenadoras recorreram a diversas metáforas que indicaram como sereconheciam: “molas”, “bombril”, “bombeiras” e “satélites”, entre outras.

A metáfora da “mola”, instrumento para impulsionar e fazer saltar, carregava a queixade que os professores estavam sempre esperando estímulos e incentivos, tomando poucasiniciativas. Associar “bombril” e “mil e uma utilidades” à coordenação denunciava a fragmentaçãodas ações da coordenadora no cotidiano da escola. A identificação como “bombeiras” que corriampara “apagar incêndios” explicita a falta de intencionalidade na ação. Reconhecer-se como um“satélite”, única metáfora com conotação positiva, expressava um sentido de movimento, deacompanhamento e de presença que era valorizado pelas coordenadoras.

Dubar (2005) e sua discussão sobre a identidade social (2) e a articulação dasidentidades individuais e coletivas destaca que a maneira pela qual os atores se identificam unscom os outros leva em conta, além das trajetórias subjetivas, o contexto de ação que é também ocontexto de definição de si.

O reconhecimento dessas metáforas confirma sua teoria de que essas designações

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de si são construções sociais partilhadas entre aqueles que têm trajetórias subjetivas e definiçõesde atores similares no campo profissional. Para Dubar, as identidades são construções sociais ede linguagem e, portanto, relativas a um tipo de contexto social. Considerando que a identidadesocial é construída por ações individuais e coletivas, consideradas em processos históricos econtextos simbólicos, essa construção combina a dualidade entre “atos de atribuição” (identificaçãodada pelo outro a partir de categorias socialmente disponíveis) e “atos de pertencimento”, queexprimem a identidade para si, isto é, a identidade aceita ou recusada pelo indivíduo.

O fato é que é na atividade com os outros que “um indivíduo é identificado e levadoa endossar ou a recusar as identificações que recebe dos outros e das instituições” (DUBAR,2005, p.138). Ressalta, contudo, que quando há desacordo entre a identidade social atribuída e aidentidade social reconhecida pelo sujeito, o indivíduo faz uso de estratégias identitárias destinadasa reduzir a distância entre esses dois pólos. Essas estratégias podem assumir duas formas: oindivíduo tenta acomodar a identidade-para-si à identidade para os seus outros significativos(transações externas ou objetivas) ou tenta assimilar a identidade-para-o-outro à identidade-para-si na tentativa de harmonizar parte de suas identidades herdadas com o desejo de construir parasi novas identidades no futuro (transações internas ou subjetivas).

A relação entre as identidades herdadas, aceitas ou recusadas pelos indivíduos, eas identidades visadas, em continuidade às identidades precedentes ou em ruptura com elas,depende do modo de reconhecimento pelas instituições legítimas e por seus agentes que estãoem relação direta com os sujeitos envolvidos. A construção das identidades se realiza, pois, naarticulação entre os sistemas de ação, que propõem identidades virtuais, e as “trajetórias vividas”,no interior das quais se forjam as identidades “reais” às quais os indivíduos aderem (DUBAR,2005, p.140).

Dubar defende a idéia de que as identidades subjetivas (para si) são contingentescom as cenas sociais em que o indivíduo investe ao longo de sua vida e que o processo biográfico(identidade para si), juntamente com o processo relacional/comunicativo, utiliza um mecanismocomum: a tipificação. Esse mecanismo de tipificação implica adotar alguns modelos socialmentesignificativos para combinações que sirvam para se auto-identificar e para identificar os outros.

As metáforas que as coordenadoras empregaram para representar sua funçãopodem ser compreendidas, à luz da teoria de Dubar, como uma tipificação construída a partirdessa correlação entre “atos de atribuição” (expectativas dos professores quanto ao trabalho dascoordenadoras) e “atos de pertencimento” (a maneira como reconhecem o próprio papel). Ascoordenadoras são identificadas e identificam-se através dessas metáforas e, se é fato que asidentidades são construções sociais e de linguagem, relativas a um tipo de contexto social,construídas por ações individuais e coletivas, somente a criação de novos contextos de ação naescola pode oportunizar outras identidades.

Isso significa que a invenção de novas modalidades de socialização/formaçãopessoal e profissional no contexto do trabalho coletivo na escola será responsável tanto pelaemergência de uma nova cultura de formação no interior da escola como de produção de uma

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identidade visada pelas coordenadoras.

FINALMENTE

A formação de professores no HTPC, assumida pelas coordenadoras comooportunidade de co-ordenação e co-formação, pressupõe a interlocução sobre as práticas, oconfronto de posições, a interrogação do vivido, a elaboração de projetos conjuntos. É o coletivode trabalho, entendido como espaço de reflexão e intervenção, de socialização de experiências ede (re)construção de identidades e práticas, que pode vir a permitir que cada professor ecoordenador dê sentido à sua experiência e se reconheça produtor de conhecimentos e saberes.

Essa formação em contexto de trabalho, a despeito das dificuldades e limitaçõesapontadas, acena com a perspectiva de fortalecer o coletivo de professores, que é desafiado agerar sentidos e coerências para a atuação individual e do grupo. Professores e coordenadoressão considerados formandos e formadores, podendo negociar responsabilidades e compartilharnecessidades, interesses, contribuições teóricas. Nessa perspectiva, a formação é co-produzidanos projetos educativos, na reflexão-ação e na perspectiva que conjuga a promoção da auto-realização com a intervenção na realidade.

Defendemos que essa formação que acontece no interior da escola é potencializadaquando conta com a coordenadora pedagógica enquanto articuladora do trabalho docente coletivo.A coordenadora está sendo aqui considerada como um elemento importante para favorecer eorganizar as reflexões dos professores e estimular a socialização das práticas de modo a construirum sentimento de responsabilidade comum em relação aos problemas do cotidiano, bem comoatuar como uma interlocutora responsável pela comunicação entre as várias instâncias da escolae com os formadores externos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. T.(org.). Identidade e Diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

NOTAS

(1) Meireles (2000) classifica as narrativas em diários de bordo (informações factuais), diários íntimos (sentimentos e consideraçõesmais pessoais), registros cotidianos (que incluem fatos e sentimentos) e narrativas autobiográficas.(2) Identidade: “resultado a um só tempo estável e provisório, individual e coletivo, subjetivo e objetivo, biográfico e estrutural, dosdiversos processos de socialização que, conjuntamente, constróem os indivíduos e definem as instituições” (DUBAR, 2005, p.136).

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O presente texto compõe uma análise preliminar de processos formativos, indicadoscomo reflexivos e investigativos, realizados num curso superior de formação para professoresem exercício, na Universidade Estadual de Ponta Grossa/ Pr. Trata-se de uma pesquisa deDoutorado (em andamento), na área de Metodologia de Ensino, a qual originou-se de indagaçõessobre o impacto da formação realizada na prática docente dos professores envolvidos, tendo emvista a necessidade de compreender elementos que demonstrem como os professores mobilizamseus conhecimentos, como descrevem e analisam suas práticas, como materializam processosreflexivos, como buscam resolver as problemáticas inerentes à complexidade do ensino.

Aliado ao quadro político, legal e tecnológico em que tal curso situou-se, um eixo foiconsiderado crucial e tornou-se objeto de atenção: a proposta pedagógica. Nesse âmbito, a“reflexão” do professor no contexto histórico, organizacional, cultural e de si próprio, como pessoae profissional, foi considerada processo essencial no projeto do curso.

Em função disso, buscou-se articular estratégias formativas que possibilitassem areflexão e a investigação do professor na e sobre sua prática docente, num entrelaçamento entresaberes pessoais e da experiência, saberes pedagógicos e saberes específicos das áreas doconhecimento. A concretização de tal finalidade; a diversidade teórica e metodológica de abordagenssobre prática reflexiva, professor reflexivo, ensino reflexivo; o percurso de construção da proposta;a preocupação sobre o conteúdo e o campo da reflexão de professores desencadearamproblemáticas a serem enfrentadas. Ainda, as possíveis repercussões do curso nos processosde pensamento e no trabalho docente dos professores tornaram-se possibilidade de investigação.

Com base nos elementos anteriormente citados, busca-se investigar: “Quais ascontribuições do percurso formativo realizado no Curso Normal Superior com Mídias Interativas(CNSMI) para o processo de reflexão de professores em contexto de trabalho?” Tem-se comoobjetivos: analisar as contribuições do percurso formativo realizado no CNSMI para o processo dereflexão dos professores; analisar a relação entre os processos formativos realizados e a reflexãodos professores sobre sua prática docente; examinar e analisar os momentos e as situações dereflexão durante a trajetória de formação.

O CONTEXTO DA PESQUISA E SEU DELINEAMENTO METODOLÓGICO

Interessa à presente pesquisa buscar elementos que mostrem “como” o professormobiliza a reflexão e reconstrói seu saber sobre o trabalho docente e se isto pode ter relação com

PROCESSOS FORMATIVOS-REFLEXIVOS :CONTRIBUIÇÕES PARA A PRÁTICA DOCENTE DEPROFESSORES EM CONTEXTO DE TRABALHO

SANTOS, Sydione(UEPG/UFSCar)MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti (UFSCar/ Mackenzie)

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a formação que vivenciou. Isto é, deseja-se buscar dados que tragam respostas significativaspara o problema, que oportunizem compreender a contribuição dos processos formativos,fundamentados na epistemologia da prática e indicados como reflexivos.

Assim, a pesquisa é de natureza qualitativa, considerando alguns elementosapontados por Bogdan e Biklen (1994): todos os dados coletados são importantes epredominantemente descritivos; a preocupação maior é com o processo, com a complexidade datrajetória dos participantes; o significado que as pessoas dão às coisas e à sua vida são objeto deatenção do pesquisador; a análise dos dados segue um processo indutivo.

Nessa direção, a pesquisa desenvolve-se por meio de um estudo longitudinal, como objetivo de descrever a evolução dos processos reflexivos dos professores, levando-se emconta as estratégias formativas realizadas durante o curso e de como estas puderam oportunizarnovas significações sobre a prática docente.

Desse modo, estão sendo utilizados os materiais escritos, realizados duranteo curso de formação, totalizados num conjunto de oito produções, nas quais são expressos atrajetória de aprendizagem, a versão que o professor imprime ao seu trabalho, o estilo pessoal deenfrentamento das questões, as inúmeras relações travadas entre o curso e a vida pessoal-profissional. São estas: memorial introdutório (realizado no início do curso), relatórios de quatrovivências educadoras (diagnóstico, docência reflexiva, pesquisa-ação, inserção na comunidade),relatórios de estágio (duas etapas intercaladas às vivências), Síntese Elaborada de Curso (trabalhode conclusão), considerando-se que esta contém uma totalidade do processo formativo vivenciadono curso.

Nesse contexto, as narrativas dos estudantes-professores são tomadas como fontede coleta de dados. Tem-se como propósito penetrar no discurso dos professores paracompreendê-los e analisar como mobilizam os processos de aprendizagem no contexto de umcurso específico, à luz da categoria da “reflexão”. Entende-se que os documentos pessoais sãoum significativo instrumento pra se chegar ao pensamento do professor pelo fato de que se tratade um recurso que requer escrever e implica refletir. Explicita-se também o caráter longitudinal ehistórico de um corpo de documentos pessoais, os quais evidenciam o transcorrer da ação e aevolução do pensamento ao longo de um transcurso, conservando a sequência, a evolução e aatualidade dos dados. (Zabalza , 2004)

Com o objetivo de realizar um estudo em profundidade, optou-se pela metodologiade “Estudo de Caso”, pois este é um tipo de investigação descritiva que busca o conhecimento doparticular e singular e permite a compreensão de um percurso inserido numa totalidade. A finalidadedo trabalho constituiu-se em explicar a evolução das análises de alguns professores durante ocurso e o significado de cada trajetória. Dessa forma, selecionou-se um número pequeno decasos para estudar em profundidade, constituindo-se num “Estudo de Casos Múltiplos”, em queos sujeitos estão sendo considerados como unidades de análise, porém, inseridos numa totalidadeconstituída por todo um percurso formativo, em que um conjunto de dimensões pessoais,profissionais, contextuais estão em permanente relação. Espera-se produzir um tipo de

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conhecimento sobre o pensamento dos professores a partir de resultados que possam contribuirpara uma teoria sobre processos formativos.

A seleção dos casos a serem estudados iniciou-se pela exploração de 16 trabalhosde conclusão, que foram escolhidos aleatoriamente, no âmbito das turmas dos cinco municípiosparticipantes do 5º circuito do Curso. Ao mapear as Sínteses, foram examinadas e selecionadasaquelas que correspondiam aos critérios definidos: retomada da trajetória pessoal, acadêmica eprofissional; a prática como objeto de reflexão; descrição e análise de eventos da sala de aula;compreensão dos conteúdos abordados durante o curso; entrelaçamento da experiência com ossaberes pedagógicos, saberes específicos ( áreas do conhecimento) e visão de docência ampliada;discussão da influência do curso no processo de aprendizagem profissional.

Nesse contexto, foram selecionados quatro trabalhos para serem estudados, tendoem vista: o significado atribuído pelas professoras à sua aprendizagem e ao curso realizado; omovimento teórico-prático expresso na narrativa; a apresentação de texto descritivo das atividadesdo curso, dos temas abordados, das vivências realizadas, permeadas com diferentes formas dereflexão; o fato de afirmarem que o curso as deixou mais “reflexivas”. Atualmente, algumas possíveisanálises estão sendo realizadas.

Lendo percursos de formação: uma análise preliminarApresenta-se aqui uma primeira leitura dos dados coletados a partir do mapeamento

de dois percursos de formação, os quais evidenciam características do processo de aprendizagemprofissional de duas professoras, denominadas de P1 (professora de classe multiseriada, nazona rural, local em que sempre morou, 15 anos de carreira) e P2 (professora de uma escolaurbana/ de grande porte, 21 anos de carreira). É possível observar alguns elementos comuns nosdois percursos e outros idiossincráticos, o que demonstra a forma de cada professora apropriar-se do curso que realizou, considerando-se a relação com sua história pessoal-profissional, influentena mobilização dos seus processos de pensamento.

Dessa maneira, no espaço deste trabalho, serão abordadas algumas característicasevidenciadas no ciclo formativo proposto, como: a experiência como elemento inerente àaprendizagem profissional, as motivações pessoais influentes na trajetória de um curso, aobservação como processo intrínseco à investigação-reflexão, o papel e o lugar da teoria nasmaneiras de descrever e analisar as práticas, a pesquisa-ação como situação formativa-reflexiva.

As duas professoras são consideradas “experientes” e, nesse caso, torna-seimportante reconhecer suas características e necessidades ao se delinear um curso de formação.Dentre as características apontadas por Reali (2006, p. 9), ressalta-se o fato de que os professoresexperientes detêm um “estoque” de informações, o qual é usado para interpretar os eventos,construindo-se representações mais complexas sobre o ensino. Nesse sentido, uma característicaevidenciada nos percursos é o fato das professoras já possuírem uma base de conhecimentopautada pelas experiências passadas, o que fica claro nos seus memoriais.

Nessa perspectiva, P1 faz uma revisão do passado, ressaltando experiênciaspositivas e negativas, destacando suas dificuldades em trabalhar, num dado momento de sua

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carreira, com o Ciclo Básico de Alfabetização. Qualifica tal experiência como “traumática”, poisacha que não estava “preparada” para trabalhar com uma orientação diferenciada para aalfabetização. No entanto, esta falta de “preparo” parece ser ainda um problema para ela, poiscontinua afirmando não estar apta para trabalhar com alunos com diferentes dificuldades deaprendizagem, incluindo-se aquelas referentes à relação-comunicação com as famílias dos alunos.

As “dificuldades” são a tônica desta primeira narrativa, P2 também revisa seupassado, enfatizando dificuldades desde o início de sua carreira: dificuldades em trabalhar com“alunos carentes”, dificuldade de adaptação nas mudanças de escola, medo de não conseguirensinar. Afirma que foi adquirindo experiência com as colegas e com a própria “prática”. Esteaspecto é comum às duas professoras, as quais reafirmam que seus cursos de formaçãotrabalharam uma teoria ideal, distanciada da prática. Esperam assim, que o curso de graduaçãopossa auxiliar no aperfeiçoamento de suas experiências de ensino.

Esses dados demonstram o valor da “experiência” como ponto de partida e dechegada para as professoras. Sem dúvida a experiência é necessária fonte de aprendizagemprofissional e a literatura sobre formação de professores referenda a questão. Porém, nem sempretoda e qualquer experiência pode conduzir a uma ressignificação adequada da prática e promovero conhecimento do professor. Sem a necessária problematização - interpretação da experiênciae de uma análise pautada em diferentes fontes de conhecimento profissional, corre-se o risco derepetir práticas equivocadas, justificadas pela utilidade imediata da “ação”.

No ciclo formativo em pauta, buscou-se a qualificação e a transformação dasexperiências, as quais tornaram-se balizadoras da reflexão. Constata-se que as professorassentiram-se encorajadas a problematizar suas experiências, num processo crescente de rupturase avanços nas suas maneiras de pensar. Tal processo foi evolutivo durante o percurso de formação,no qual entrecruzaram-se também as experiências dos colegas, do tutor, dos docentes do curso,de outros profissionais e de diversas fontes de dados e conhecimentos.

Vale situar ainda os fatores pessoais que interferem na trajetória das duasprofessoras. P1 expressa o desejo de “melhorar sua prática”, menciona o conceito inicialmenteabordado no curso sobre “professor reflexivo” e mostra-se curiosa, à procura do novo, com espíritoaberto, querendo alterar velhas crenças e examinar conseqüências na ação, atitudes apontadaspor Dewey (1959) e inerentes a um processo reflexivo. P2, embora demonstre-se preocupadacom a aprendizagem de seus alunos, centra sua motivação na idéia de aperfeiçoar-se, recuperaro tempo em que ficou “parada” e deseja prosseguir estudos numa pós-graduação. São motivaçõesdiferentes, que fazem parte dos processos de desenvolvimento profissional, os quais são pautadostambém por fatores afetivos, interesses pessoais, visões sobre a profissão e sobre os cursos deformação, dentre outros. Importa compreender como tais questões influenciam a trajetória dasprofessoras no curso de formação e como este pode ajudá-las a modificar suas concepçõesiniciais.

Pode-se inferir também que, dentro dos processos formativos propostos,desenvolvem-se vários processos necessários e inerentes ao movimento de aprendizagem dos

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professores. Desse modo, a “observação” apresenta-se como um processo elementar naconstrução do conhecimento sobre a docência, ocorrendo em todas as fases do curso. Nota-seque uma primeira observação é a de si mesma e de sua própria história profissional, aliada a umaprovocação do curso sobre uma determinada visão de professor reflexivo e investigativo. Munidasdeste primeiro olhar, as professoras iniciam um diagnóstico da prática docente (1ª Vivência). Aobservação das experiências é patamar necessário para processos de investigação, daí serprovocada e orientada nesta primeira inserção.

Nesse contexto, P1 mantém a meta de melhoria da sua prática e referenda quedeseja “observar” uma outra escola e sala de aula para pensar sobre a sua forma de ensinar. Épossível verificar a observação fortemente aliada a processos de descrição daquilo que vê, ouve,sente. No entanto, não é mero relato de fatos, porque duas questões permitem que a professoradê um salto qualitativo no que se refere ao seu processo de pensamento: a orientação esistematização da observação proposta pelo curso, articulada ao referencial teórico desenvolvidonos módulos iniciais/temas, que servem como balizadores para este momento; a meta de melhorarsua própria prática e sua disposição para a mudança e para aprender.

Nesse sentido, ela descreve suas observações, permeia com depoimentos daprofessora, dos alunos, da coordenadora da escola observada, explicita sua percepção, ensaiauma reflexão mais sistematizada com base nos referenciais estudados, busca identificar osproblemas e levantar hipóteses, pensando na sua sala de aula, em que faria para resolver assituações problematizadas, como por exemplo, a indisciplina da classe multiseriada e os diferentesníveis de aprendizagem. Percebe-se que a teoria tem ressonância no seu modo de pensar aprática e, aliada a novas perguntas e hipóteses, elabora, nesse momento, um quadro teórico-prático para prosseguir em seu processo formativo.

Com a mesma orientação do curso, P2 observa sua própria escola e uma outrasala de aula, realiza entrevistas e questionários com professoras, alunos, coordenadoras, diretora,famílias. Demonstra responsabilidade em relação às orientações do curso e organiza um bommaterial de coleta de dados, fundamentando-se nos referenciais teóricos já trabalhados. No entanto,a prática observada é descrita e apresentada “sem grandes problemas”, sua trajetória depensamento mostra-se da seguinte forma: “vê-ouve-descreve”, não ocorrendo o exercício daproblematização. Mantém sua preocupação com a aprendizagem dos alunos, porém a formacomo observou não sugeriu metas claras a serem buscadas por ela quanto ao seu próprio modode ensinar.

É possível verificar as formas diferenciadas de observação de cada professora e o“papel da teoria” (entendida aqui como conhecimento objetivo, produzido cientificamente). No casode P1 a teoria é mediadora e tem papel propositivo, auxiliando na identificação de problemas e aconstruir um primeiro quadro conceitual que lhe permite iniciar um processo de ressignificação dasua prática. Para P2, os elementos teóricos norteiam um primeiro exercício de observação quelhe permitiu ter uma visão mais ampla de sua própria escola, porém, serviram muito mais comojustificativa para confirmar o bom “funcionamento” da escola.

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Sobre o diagnóstico de P2 é possível levantar algumas hipóteses: a existência deuma postura de consenso com o seu próprio ambiente de trabalho; a possibilidade ou não deinterlocução com o seu tutor-formador e seus colegas de curso sobre suas observações, bemcomo a qualidade das reflexões durante as análises posteriores à vivência. Cabe lembrar que aatitude dos professores frente à sua aprendizagem também norteia-se por valores, crenças,conhecimentos, normas e referências pautadas na organização escolar em que atuam, o que éinfluente na sua compreensão sobre a aprendizagem profissional e na maneira como considerame lêem novas informações.

No contexto das situações formativas propostas pelo curso, experiência, observaçãoe teorização vão sendo articuladas, pois ao se observar e problematizar a sua prática, provocam-se sugestões/idéias que se encontram na relação com um problema e conduzem o pensamentona busca de soluções. Desse modo, reflexão e investigação apresentam-se como processosnecessários na desestabilização de crenças e de práticas cristalizadas. Para tal transformaçãosabe-se que se faz necessário ocorrer uma reelaboração dos quadros conceituais, o que “constitui,nessa ótica, uma mediação entre teoria e prática, revelando, de um lado, novos significados dateoria e, de outro, novas estratégias para a prática” (Mizukami, 2000, p. 144 ).

No caso de P1, pode-se perceber, com nitidez, o movimento anteriormente descrito.Ao realizar as vivências e o estágio (docências reflexivas, pesquisa-ação, inserção-investigaçãona comunidade), a professora considera como pontos de partida, a cada vivência, problemasobservados e interpretados na atividade anterior. As problemáticas abordadas desde a 1ª vivênciaimpulsionam a análise sobre sua própria prática e conduzem a uma ação diferenciada daexperiência que já vivia e considerava, muitas vezes, mal sucedida ou rotinizada. Ilustrativo dissoé a sua dificuldade de compreender e realizar trabalho com projetos interdisciplinares, de trabalharcom os diferentes níveis de aprendizagem e efetivar trabalho em grupo, de entender o conceito deafetividade nas relações de ensino, dentre outros. Além disso, demonstra preocupação constantecom o significado do conteúdo escolar para os alunos e questiona sobre a forma dela colocar-secomo mediadora entre conhecimento científico e a realidade dos mesmos.

Assim, acrescenta novos elementos teóricos ao que já sabia, transformando seuquadro conceitual e orientando seu planejamento para o ensino. Na condução da prática proposta,mantém atitude de escuta e observação constante, o que promove avanços e a constatação denovas necessidades. Para tanto, é possível verificar que este processo ocorre tanto no decursode sua ação (reflexão na ação), como amplia-se e sistematiza-se quando distancia-se paradescrevê-la e analisá-la (reflexão sobre a ação), momento retrospectivo realizado nos diários, nadiscussão/socialização com tutor, colegas do curso, docentes, no trabalho on-line com professores-assistentes e na escrita da narrativa, realizada após cada vivência e estágio.

No caso de P2, a teoria também é provocadora, orientadora e esclarecedora quantoaos aspectos inerentes à prática de ensinar e aprender. No entanto, o que se pode observar é queP2 explicita como preocupação “a aprendizagem de novas maneiras de ensinar”, centrando seuraciocínio nas “dificuldades dos alunos em aprender”. Este é o objetivo que norteia o

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desenvolvimento de suas vivências e do estágio. A teoria parece servir para justificar aquilo queconstata em relação aos alunos e, nesse sentido, também parece ter um peso maior na conduçãode sua análise sobre seu trabalho, especialmente, nas primeiras vivências que realizou. Porém, apartir da primeira etapa do estágio (atividade realizada após a 2ª vivência) um aspecto se diferencia,é o fato dela estar mais atenta e perceptiva à sua prática de ensino e à reação dos alunos, o quelhe permite apontar novas necessidades.

Torna-se importante analisar que o movimento teórico-prático proposto permite,ainda que de maneira diferenciada nos dois casos, um posicionamento consciente das professorasem relação à prática e ao seu próprio desenvolvimento pessoal-profissional. Há indício que oreferido processo oportuniza a consciência de finalidades que se fazem inerentes ao processo deensino e da necessidade de prever, propor, observar, decidir, rever, avaliar, encaminhar suas açõese assumir responsabilidade sobre as mesmas, entendendo que sua prática é conseqüente.

Nessa dimensão, a 3ª vivência constitui-se num exercício de pesquisa-ação,demonstrando significativas evidências quanto à ampliação do quadro conceitual das professoras,além de revelar a possibilidade da produção de novos conhecimentos a partir de problemasemergentes da experiência.

A estratégia da pesquisa-ação configura-se como possibilidade real de reflexão,colocando o professor na condição de pesquisador da sua prática e de “prático-reflexivo”. A referidatipologia de pesquisa é legítima à medida que afirma a necessidade e o valor da pesquisa dospráticos como aqueles que estão “dentro” do processo de investigação. Zeichner e Noffke (2001)apontam para o fato de que, nesse âmbito, os professores possam ser mediadores e produtoresdo conhecimento e não apenas meros consumidores da pesquisa educacional; além disso, éimportante a consideração de que estes, por viverem as situações educacionais em suas escolase salas de aula, podem oferecer compreensões importantes para o processo de produção doconhecimento.

Importante dizer que tal proposta não se reduz à ingenuidade de pensar que todosos problemas são de única responsabilidade do professor, pois são determinados por condiçõeshistóricas e sociais intervenientes nos processos de ensino e na organização escolar. Porém,trata-se de pensar nas possibilidades de ação e, especialmente quando os problemas passam aser compreendidos, faz-se necessário a tomada de decisões nos âmbitos possíveis de atuação.

A pesquisa-ação, no conjunto das propostas formativas do curso, gera a 5ª produçãoreflexiva. Propõe-se a identificação de um problema, a contextualização e compreensão deste,com base nas observações anteriores e em diferentes fontes, para melhor caracterização eelucidação do mesmo. A intenção é trabalhar a partir da observação da própria experiência, masconstruir análises fundamentadas em teorias já produzidas que permitam o confronto teórico-prático, produzindo-se novas significações em torno da questão. Este trabalho de interpretação econfronto teórico-prático auxilia na elaboração de estratégias para a ação e impulsiona a tomadade decisão, visando as alterações na prática. Definem-se, a partir disso, as linhas de ação, ashipóteses de enfrentamento, visando solucionar ou minimizar as dificuldades. A efetivação da

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ação exige observação atenta para posterior análise e avaliação de sua experiência, o que podeainda gerar novos questionamentos e novas possibilidades de enfrentamento. O referido cicloconverge na direção da produção de conhecimento que se constitui nas “teorias práticas do pro-fessor”.

O percurso de P1 evidencia a potencialidade da pesquisa-ação como processoformativo-reflexivo. Suas observações nas vivências e estágio anteriores geram problematizações,o que é possível devido ao fato da professora intensificar, em cada momento do percurso, o“olhar” sobre suas experiências, reavaliando-as continuamente. Ainda, é possível perceber que ateoria trabalhada nos temas/módulos provoca o relacionamento das informações, a seleção dedados, a observação de dificuldades. Assim, elabora uma investigação em decorrência dasdificuldades de aprendizagem que alguns de seus alunos têm na produção de textos.

Verifica-se que P1 “coloca-se” na sua prática, assumindo que precisa rever suamaneira de ensinar e traça metas para solucionar o problema. Realiza um movimento teórico-prático na compreensão do problema e na planificação de estratégias por meio de: leitura dediversas fontes para elucidar o tema, confrontando com sua prática; coleta de dados, utilizandoquestionários, entrevistas e observações; palestras sobre o tema. Assim, vai construindo síntesesparciais e estabelecendo relações entre as fontes e sua prática. Realiza intervenção e observa,discute as estratégias propostas, relaciona com seu referencial teórico, faz uma síntese de suanova compreensão e apresenta novo questionamento sobre o problema.

O que se pode notar é que a professora desenvolve um processo de compreensãopelo qual as partes de diferentes informações vão sendo apreendidas nas relações com suasproblemáticas e seu contexto de ensino, por meio de reflexão constante na e sobre sua prática.Intensifica-se sua capacidade de observar, narrar, relacionar fontes e dados, intervir, tomar decisões,concluir, o que lhe auxilia a direcionar sua ação de modo mais conseqüente e seguro, tornando-semais consciente de novos problemas.

No caso de P2, é possível também verificar que a pesquisa-ação causa significativoimpacto em seus processos de pensamento. Observa dificuldades de aprendizagem nos seusalunos e procura examiná-los com mais cuidado. Para tanto, realiza estudos sobre problemas deaprendizagem e estabelece a meta de entender e ajudar um aluno específico. Faz levantamentode referencial e coleta dados com sujeitos envolvidos com o problema. Elabora síntese teórico-prática, cruzando suas observações e a literatura consultada, o que possibilita a construção deestratégias para trabalhar com o aluno. É interessante analisar que, nessa situação, a professoraparece estar mais “dentro” do seu processo de aprendizagem profissional e o curso provoca umposicionamento frente a uma dificuldade real, vivenciada na sua experiência, oportunizando-lhe oexercício da problematização, observação, análise de dados, tomada de decisões.

Desse modo, destaca-se o significado e o valor formativo da pesquisa-ação emcontexto de trabalho. Alarcão (2003) enfatiza que, subjacente a esta abordagem, encontra-se aidéia de que se houver reflexão e conceitualização da experiência profissional, efetiva-se o valorformativo, além de aceitar que a compreensão da realidade é produto dos sujeitos enquanto

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observadores participantes implicados e imbuídos do desejo de resolver os problemas queencontram na prática.

Em função do exposto, a análise preliminar possibilitou confirmar que odesenvolvimento profissional se constrói por meio de um conjunto de processos formativos queestabelece relações interdependentes entre contextos diversos e diferentes dimensões.Oportunizou também verificar que a aprendizagem profissional pressupõe um crescimento contínuode possibilidades de transformação na prática docente, durante toda uma carreira, ao longo davida. Incluem-se os processos reflexivos como necessário componente no contexto de evoluçãoe continuidade desta trajetória de aprendizagem.

Sendo assim, os percursos também demonstraram que a reflexão é categoriacomplexa e dinâmica, pois é um tipo de pensamento que exige a atitude de abertura, o desejo, aintenção de quem pensa, na direção de metas estabelecidas. Além disso, é processo, no qual opensamento está em contínua mudança, considerando-se as experiências e as problemáticasenfrentadas. Nesse sentido, a reflexão reporta-se a contextos, a situações que necessitam serresolvidas. Daí a importância de se partir das experiências profissionais e analisar a natureza dassituações propostas nos espaços e tempos de formação. Observou-se ainda a possibilidade deconcretização de uma “atitude investigativa”, entendida como cerne do processo de auto-aprendizagem, a qual pode estar sendo incorporada à continuidade do desenvolvimento profissionaldas professoras estudadas.

Diante disso, a análise inicial permitiu construir outras questões a seremaprofundadas na pesquisa, as quais podem gerar novas compreensões sobre os processos depensamento do professor.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BOGDAN, R. & BIKLEN, S. Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria daeducação e aos métodos. Portugal Porto, 1994.

DEWEY, J. Como pensamos. 3 ed. São Paulo: Ed. Nacional, 1959.

MIZUKAMI, M. da G. N. Casos de ensino e aprendizagem profissional da docência. In:ABRAMOWICZ, A. & MELLO, R. R. (Orgs.) Educação: pesquisas e práticas. Campinas: Papirus,2000.

REALI, A . M. de M. R. Reflexões sobre a validade dos vários tipos de formação para odesenvolvimento profissional. In: Anais do Congresso Internacional em Educação Escolar (CDRom).FCLAr/ UNESP, Araraquara, 2006.

ZEICKNER, K .M. & NOFFKE, S. E. Practitioner Research. In: Richardson, V. (Ed.) Handbook ofResearch on Teaching. Fourth Edition. Washington, D. C.: American Educational Research Asso-ciation, 2001, p. 298-330.

ZABALZA, A. Diários de aula: um instrumento de pesquisa e desenvolvimento profissional. Porto

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Alegre: ARTMED, 2004.

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INTRODUÇÃO

A História da Educação Brasileira tem evidenciado a descontinuidade nas propostasimplementadas pelos Governos nos níveis Federal, Estadual e Municipal. A Educação de Jovense Adultos – EJA – não difere desta realidade. Ela aparece, desde o Período Colonial, passando portodo Império, em diferentes discursos, projetos e leis, porém só alcança algum significado “prático”na República. Isto se dá não apenas pelo discurso liberal que sustenta os ideais republicanos,mas significativamente, pelas pressões, internas e externas, que o Brasil sofre em relação aoavanço industrial e à adequação da mão de obra à nova realidade econômica.

A implantação das propostas para EJA deu-se assim de forma muito variada,atendendo aos diferentes interesses de seus propositores. É clara a relação entre a EJA e osproblemas políticos e econômicos: a estrutura social do país ideologicamente determinada pelasclasses mais favorecidas marca sua concepção elitista, causando em muitas pessoas uma certainsatisfação.

Uma amostra dessa insatisfação e do questionamento que foi sendo gestado nasociedade brasileira, em fins das décadas de 40 e 50, com relação à ineficiência das campanhas,marchas e projetos mirabolantes para a erradicação do analfabetismo, somadas às pressõesinternacionais para a elevação do índice de alfabetização, é o aumento de iniciativas populares,procurando superar os índices provenientes deste descaso dos governos para com a EJA. Issomotivou diversos setores da sociedade civil, nas décadas de 50 e de 60, ligados à Igreja Católica,aos partidos de oposição, aos movimentos estudantis secundaristas e universitários, como exemploo Movimento de Cultura Popular –MCP, Movimento de Educação de Base – MEB, Cruzada ABCda Igreja Protestante, União Nacional dos Estudantes – UNE, além de outros movimentos; aretomarem as discussões em torno, não apenas da EJA, mas da defesa da escola pública comoum todo.

Com o golpe de 1964, dando início ao período da ditadura militar (64-84) retirou decena as iniciativas populares que pensavam a EJA como instrumento de conscientização etransformação da sociedade, ao mesmo tempo em que reforçou uma visão utilitarista da escola,implantando um conceito funcional de alfabetização, ou seja, aprender a ler e a escrever para serútil ao mercado capitalista de trabalho. Um representante clássico deste período, lançado em

QUEM SÃO OS DOCENTES QUE ATUAM NAEDUCAÇÃO PARA PESSOAS JOVENS E ADULTAS NOMUNICÍPIO DE VITÓRIA DA CONQUISTA-BA EM DOIS

ESPAÇOS DISTINTOS: ESTADUAL E MUNICIPAL?

SALES, Sheila Cristina Furtado(UESB - UFSCarI); BARRETO, Denise Aparecida Brito (UESB)

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1971, é o Movimento Brasileiro de Alfabetização – MOBRAL1, que propagandeou muito mais querealizou e gastou muito para reduzir, em apenas, aproximadamente, 8% do índice de analfabetismototal do país, nos 19 anos de existência do movimento.

Também no ano de 1971 deu-se a inclusão, pela primeira vez na história, de umcapítulo na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, a de nº 5.692, dedicado aoensino supletivo2, para aqueles que foram marginalizados da escola regular na idade própria.

Com o fim da ditadura militar, a política que se instaura a partir de meados dadécada de 80 do século passado, com discurso da redemocratização àqueles que foram excluídos,com a Fundação Educar e com as Comissões Nacionais do País, na EJA é da garantia de acessoà escola. Porém, este discurso ainda diverge e se distancia muito da realidade ocorrida nos Estadose Municípios.

A EJA, por ter sofrido ao longo desses anos, o descaso das políticas públicas, nãoapresenta clareza por parte das Secretarias de Educação Estaduais e Municipais no que se refereà aplicação dos recursos destinados a esta clientela, à especificidade deste atendimento e àsuperação das propostas imediatistas de “campanhas de erradicação do analfabetismo”. Asdiferentes experiências que ainda assim, ocorrem no país já têm alterado para o aumento donúmero de alunos que deixam a rede pública diurna, em busca pela opção pelo Ensino Noturno,uma vez que, os adolescentes e jovens ingressam cada vez mais prematuramente no mercadode trabalho, interrompendo o ciclo previsto de escolarização básica. Isso exige uma reflexão maisprofunda destas mudanças, além da urgência de uma revisão da educação do próprio sistema.

A realidade Nacional, hoje, tem deixado cada vez mais claro a necessidade de umapolítica permanente de EJA, que não se limite apenas na superação do chamado analfabetismo.Além de pessoas que lêem e escrevem, o mundo está cada vez mais a exigir pessoas quepensem os processos de mudanças pelos quais passamos, para que possam ser sujeitos críticosde sua aprendizagem e não apenas objetos. Mais do que pessoas especializadas, tecnicamentetreinadas para responder às exigências deste mundo globalizado, é necessária uma educaçãoque resgate nos indivíduos o direito de ser gente de sua história, ultrapassando os limites de umavisão de leitura como codificação e decodificação.

O Plano Decenal de Educação para todos propõe uma educação voltada para osexercícios ativos dos direitos da cidadania. O conceito de cidadania subjacente a este programanão se limita àquele conceito restrito ao seu aspecto jurídico, de cunho moralizante que, oriundode uma concepção burguesa, foi se configurando no decorrer histórico, num projeto de dominaçãoda maioria da população. O conceito de cidadania é aqui concebido como igualdade política,econômica, jurídica, social e cultural. A cidadania é compreendida como processo de construçãosocial forjado no interior da prática social e política dos movimentos populares. Implica assim, aconquista do direito ao atendimento de todas as necessidades básicas da pessoa humana esupõe o processo de construção da identidade pessoal e social de cada um.

Neste sentido ainda, este documento entende que há necessidade de sistematizaçãoda EJA, alerta para o fato de que “faz-se necessário estruturar e institucionalizar programas

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alternativos de educação continuada com o objetivo de reduzir o contingente atual de analfabetose elevar os níveis médios de escolaridade dos jovens e adultos subescolarizados.” (PLANODECENAL, 1993, p. 49)

Quanto à operacionalização destes programas, estes deverão ser compatíveis comuma política voltada para a descentralização e autonomia.

Ainda há uma ênfase no que diz respeito à necessidade de se promover e ajustarcada vez mais uma educação que vá ao encontro do aluno, aqui em especial jovens e adultos e éassim que: “a variedade de contexto da clientela requer grande mobilidade de meios de atendimentode constantes ajustamentos às disponibilidades de tempo e possibilidades do educandos”. (PLANODECENAL, 1993, p. 49)

A Lei 9394/96 que fixa as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, assegura aosjovens e adultos, em seu artigo 4º uma educação com características e modalidades adequadasàs suas necessidades e disponibilidades, além de garantir a oferta de Ensino Noturno Regular.

Como conseqüência da trajetória da educação no Brasil, especialmente no campoda educação de pessoas jovens e adultas, tivemos como objetivo geral deste trabalho registrar osprogramas de ensino fundamental implementados, após a aprovação da LDB 9394/96 e da lei doFUNDEF, ambos no ano de 1998, pelo poder público estadual (EJA I e II) e pelo municipal (REAJA)na cidade de Vitória da Conquista, destacando características dos programas assim como aspectosrelacionados aos docentes que neles atuam.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Utilizamos como abordagem metodológica a pesquisa qualitativa e nessa perspectivautilizamos como instrumento para a coleta de dados questionários distribuídos na rede públicamunicipal e estadual de ensino de Vitória da Conquista-BA, especialmente nas escolas localizadasna zona urbana.

Foram distribuídos duzentos e cinqüenta questionários sendo a metade em escolasde EJA da rede municipal e a outra parte em escolas de EJA da rede estadual. Desse totalconseguimos obter a resposta de 57 professores do município e 52 professores atuantes na rededo estadual, formando um total de 109 questionários respondidos.

Os questionários aplicados foram divididos em duas categorias principais: naprimeira foram abordadas questões tais como sexo, idade, formação inicial, tempo de atividadedocente, tempo de atividade docente na modalidade de EJA, série em que leciona, além derelacionar eventos de formação continuada freqüentados nos últimos cinco anos. A segunda partedo questionário é composta por trinta questões abertas abordando aspectos relacionadas diretaou indiretamente com o processo de aquisição pessoal da leitura e da escrita e também questõesabordando práticas docentes relacionadas com a aprendizagem da leitura e da escritadesenvolvidas junto aos alunos de EJA. Para efeito deste trabalho somente as questões relacionadascom a primeira etapa do questionário serão abordadas.

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O CAMPO DE PESQUISA: CARACTERIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE VITÓRIA DACONQUISTA

Vitória da Conquista, localizada a mais de 900m de altitude, é a segunda maiorcidade do interior baiano, com uma população estimada em 285.927 habitantes, segundo fontesdo IBGE (2006).

A localização geográfica de Vitória da Conquista é um dos fatores favoravelmenteconcorrentes para seu papel de destaque regional. A cidade está no centro de um importantecruzamento rodoviário, a BR-116, por onde ocorre um grande fluxo de produtos e pessoas, natroca entre duas importantes partes do país: o norte e o sul.

Com relação à educação,atualmente o município conta com 68 escolas públicasque atendem a Educação de Jovens e Adultos, sendo 29 na zona rural com apenas uma delas decunho estadual e 40 na zona urbana distribuídas entre estado e município, num número de 16 e 24respectivamente. A educação infantil, segundo dados do SEI. BA (2006) somam um total de 254unidades assim distribuídas conforme a dependência administrativa: 134 unidades municipaislocalizadas na zona rural, duas estaduais implantadas na zona urbana, 19 municipais e 99particulares.

Já as escolas que oferecem ensino fundamental somam-se 169 municipaisinstaladas na zona rural; 29 estaduais, 33 municipais e 79 particulares estando todas endereçadasna zona urbana.

Ainda segundo os dados coletados no site do SEI (2006), a oferta deestabelecimentos de Ensino Médio é bem mais restrito: apenas um estadual localizado na zonarural; 13 escolas estaduais, uma federal (Cefet) e dez estabelecimentos particulares localizadosna zona urbana. Com a diminuição significativa no número de estabelecimentos de ensino públicoe privado que oferecem o ensino médio fica evidente o estrangulamento do processo educativo nacidade de Vitória da Conquista condenando um contingente enorme de adolescentes, jovens eadultos a interromper sua jornada escolar.

ALGUNS RESULTADOS

Conforme fora mencionado anteriormente, de duzentos e cinqüenta questionáriosdistribuídos em escolas públicas do município de Vitória da Conquista que atendem a modalidadeEJA, conseguimos retorno de 109. Desse total 57 foram respondidos por professores de EJA domunicípio e 52 por professores de EJA atuantes na rede estadual.

Todos os professores da rede municipal atuam em classes do ensino fundamentalmenor, programa REAJA, sendo que 21 deles atuam na zona rural e 36 na zona urbana. Todos osprofessores da zona rural declararam atuar em turmas multisseriadas3, enquanto que osprofessores que trabalham na zona urbana ficaram distribuídos entre os Módulos I a IV. Essedada constata que as turmas localizadas na zona urbana possuem características que muito as

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distanciam da realidade das turmas instaladas na zona rural, onde ainda é mantida, anos apósanos, as classes multisseriadas que parecem fazer parte da realidade da zona rural no paísdécadas após décadas.

Antes de prosseguirmos, cabe informar que, na visão dos sujeitos da pesquisa, noSeguimento I, a equivalência com o ensino regular se dá conforme descrito a seguir: Módulo Iequivale a 1ª série do ensino fundamental regular; Módulo II equivale a 2ª série; Módulo III à 3ª; eMódulo IV à 4ª série.

Com base na equivalência anteriormente descrita, os professores do REAJA dazona urbana, quando interrogados sobre o Módulo em que atuam ficaram assim distribuídos:cinco atuam no Módulo I; quatro no Módulo II; quatro no módulo III; e sete no módulo IV. Onze delesdisseram atuar em classe multisseriada da seguinte forma: cinco professores atuando com osMódulos I e II e seis atuando com os módulos III e IV.

Apesar do município não disponibilizar sala de alfabetização, cinco dos professoresclassificaram seu Módulo de atuação como Alfa. Quando nos deparamos com essa informação,inicialmente imaginamos que essas pessoas haviam declarado desta forma por serem recentesna Rede e não terem conhecimento da Proposta do REAJA e que nela não consta o MóduloAlfabetização. Porém, para nosso espanto, quando fomos investigar tempo de docência na EJA,apenas dois destes sujeitos da pesquisas estava na Rede há menos de três meses, os demaisestá a dois anos atuando no REAJA e um deles tem 17 anos de docência no município, o outrotem 19 anos e o outro 23 anos. O nosso espanto se deu pelo descompasso entre tantos anos naRede Municipal e falta de conhecimento de que a Proposta do REAJA não tem o MóduloAlfabetização.

Outra constatação que nos chamou atenção é que, de maneira geral, a formaçãoinicial dos professores do REAJA estão condizentes com o previsto na Proposta pedagógica deorganização do ensino noturno das escolas municipais de Vitória da Conquista Seguimento I e IIda educação de jovens e adultos, divulgada pela SMED em 2005 quando ela diz que “O coletivo deprofessores do segmento I será composto, preferencialmente, por professores com Magistério,pedagogos, podendo também atuar os de outras licenciaturas.”(2005, p. 13).

Com a falência do Curso Normal Médio nas escolas do país, esse termo“preferencialmente” utilizado na Proposta nos preocupa, pois pudemos notar que dos 57 sujeitosque responderam ao questionário, apenas um é pedagogo, um cursa História na universidadelocal e um dos docentes possui curso superior incompleto. Todos os demais, ou seja, 54professores têm sua formação inicial restrita ao ensino médio, Curso de Magistério.

Dos 57 docentes 8 têm mais de 19 anos de atuação na Rede Municipal; 12 têm de15 a 19 anos e 6 têm de 10 a 14 anos; ou seja, mais de 50% dos docentes têm mais de dez anosde magistério, ficando apenas 26 profissionais com um tempo de profissão entre 3 meses e 9anos.

Em breve um grande contingente de docentes deverá, com base em possíveisaposentadorias, ser substituído e com a diminuição de oferta de professores com Magistério

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como essa “preferência” se manterá para atender as necessidades e demandas da Rede noensino fundamental menor de pessoas jovens e adultas? Mesmo não acreditando que o CursoSuperior, por si só, seja garantia de qualidade na educação e de mudanças significativas noprocesso educativo, como a SMED vem se movimentando para promover a formação de todoesse contingente de docentes do REAJA?

Mais um dado bastante interessante que conseguimos averiguar com base nosquestionários respondidos, é que apenas oito professores têm mais de cinco anos de docênciano REAJA, e desses apenas três estão no Programa desde sua implantação. Segundo relato dospróprios sujeitos, o período de maior efervescia do Programa foi de sua implantação até o ano2000, com grandes investimentos na formação e qualificação docente, em recursos de diversasordens, na locação de veículos para atividades extra-classe, produção e publicação de livros quetiveram como autores os próprios alunos do programa, distribuição farta de material paradiscussões sobre temáticas envolvidas com a EJA, grande acompanhamento de coordenadores,seminários específicos abordando questões relacionadas a EJA, planejamento, discussões eestudos em conjunto com coordenadores e professores de outras unidades, dentre outras ações.

Segundo os mesmos sujeitos, a partir de 2001 até os dias de hoje o Programa vemperdendo prestígio junto a SMED, além de terem sido quase extintos os investimentos naqualificação docente, na divulgação da produção dos alunos, também reclamam da falta de apoioàs atividades extra-classe, aos momentos de planejamento, ausência de livros e material de apoiochegando a dizer da redução na quantidade de papel destinado a esse Programa.

Se essas informações são procedentes, mais um dado nos preocupa em relaçãoa qualificação e formação dos docentes da Rede pública municipal que atual na educação depessoas jovens e adultas no município de Vitória da Conquista: dos 57 professores queresponderam ao questionário, 38 professores estavam atuando no REAJA há menos de doisanos em 2005. Como será que vem sendo feita a qualificação docente para atuar na educaçãodas pessoas jovens e adultas no município de Vitória da Conquista no milênio atual?

Uma característica muito marcante no conjunto de professores da Rede municipalque atuam no REAJA é que foram registrados apenas três professores do sexo masculino, existindouma predominância massiva de mulheres, dentro da nossa amostragem um número de 54. Essedado para nós se torna interessante no momento em que pudemos comparar com os questionáriosrespondidos pelos professores da Rede Estadual de ensino de EJA, que conforme recomendaçãoda atual legislação vigente, concentra suas atividades na oferta de vagas no ensino fundamentalmaior e no ensino médio. Como as exigências legais para atuação nessas etapas do ensinopedem qualificação específica de acordo com a área de atuação obtida em instituição de ensinosuperior, o número de profissionais do sexo masculino é mais expressivo. De um total de 52questionários respondidos por docentes da Rede Estadual, 15 foram respondidos por pessoas dosexo masculino sendo que desses três atuam na EJAI e possuem o Magistério como formaçãoinicial.

Dos 52 professores do Estado que responderam ao questionário, 9 atuam na EJAI4

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sendo que 7 têm como formação inicial o curso de Magistério e duas pessoas têm curso superior(uma Pedagoga e a outra formada em Letras). Na EJAII e na EJAIII temos, respectivamente 21 e8 docentes que responderam ao questionário. Atuando em mais de uma etapa nós obtivemosresposta de 13 docentes que são professores no ensino fundamental maior e no ensino médio.

Dos docentes que atuam na EJAII apenas dois estão cursando graduação, sendoum em Biologia e o outro em Matemática; e outros dois têm pós-graduação, nível especializaçãoconcluída. Assim como na EJAIII todos os demais docentes são graduados: 09 em Letras, 08 emGeografia, 10 em História, 01 em Música, 07 em Matemática, 02 em Biologia e 06 em Pedagogia.

Esses dados demonstram que, assim como ocorre no município em relação àexigência mínima para atuar no ensino fundamental menor, aqui no caso do estado essa exigênciamínima também é respeita, ou seja, Magistério para quem atua no ensino fundamental menor eGraduação para quem atua no ensino fundamental maior e no ensino médio.

Outra questão que nos chamou a atenção é que os docentes da Rede Estadualdeclaram maior tempo de docência tanto no Estado como em relação à EJA. Quanto a essaúltima questão acreditamos que isso se dê pelo fato do Estado ter implantado os programas daantiga Suplência (e atual EJA) desde o ano de 1993, antecipando o Programa REAJA em pelomenos cinco anos.

Dos 52 docentes 15 têm mais de 20 anos de atuação na Rede Estadual; 05 têm de15 a 19 anos e 18 têm de 10 a 14 anos; ou seja, mais de 70% dos docentes têm mais de dez anosde magistério, ficando apenas 14 profissionais, dentre os que responderam ao questionário, comum tempo de profissão entre 3 meses e 9 anos.

Sobre o tempo de docência no Programa de EJA pudemos obter as seguintesinformações: apenas 20 professores têm menos de cinco anos de docência na modalidade deEJA e assim como aconteceu com o Programa REAJA da SMED-VC, o período de maiorefervescência e de grandes investimentos na formação continuada dos docentes que atuam naEJAI, II e III foi ao longo da década de 90 do século passado. No caso do Estado o número deprofissionais que vão demandar por afastamento via aposentadoria ainda é mais expressivo doque no caso dos profissionais do município. Se não existirem movimentos de capacitação eformação continuada dos profissionais que atuam nessa modalidade de ensino ora em estudocomo ficará a EJA no Município de Vitória da Conquista?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observamos que, apesar dos professores serem submetidos a processos deformação diferentes, atuarem em espaços públicos distintos, ambos os grupos denunciaram odescaso com que a EJA vem sendo tratada no milênio atual, principalmente quando enfatizamque o momento áureo dos programas aos quais estão vinculados ocorreram na última década doséculo passado, sendo poucos os momentos de formação continuada na modalidade de educaçãode pessoas jovens e adultas.

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Acreditamos que a pouca periodicidade dos cursos e encontros de formação emserviço, dificulta a familiaridade dos professores com reflexões que pudessem enriquecer e subsidiarsuas práticas, já que, principalmente no caso dos professores ingressantes no Programa de EJAdo município e do estado há menos de cinco anos não demonstraram indícios de oportunidadepara participar de eventos específicos no campo da EJA. Ao contrário, os docentes de ambas asredes que atuam há mais de cinco anos no campo da EJA mencionaram participação em encontros,seminários, discussões de temáticas específicas dessa modalidade de ensino mas ressalta queessas eram mais comuns durante a segunda metade da década passada.

Atrelada à formação continuada, também percebemos um descontentamento euma preocupação de ambos os grupos quanto a falta de materiais e recursos necessários para odesenvolvimento das atividades em sala de aula, mas como esse não era nosso objetivo principalna investigação, não foi possível detectar e compreender de modo mais detalhado a extensãodesse descontentamento e nem sequer o quanto a prática docente é influenciada por conta dessaescassez de recursos.

Outra questão que nos preocupa é sobre a formação inicial dos docentes dos doisespaços públicos em estudo, especialmente para as séries iniciais do ensino fundamental, emais especificamente de EJA. Pudemos observar que a maioria esmagadora é formada pordocentes de nível médio: antigos “Cursos de Magistério”. Não estamos colocando em dúvida acondição e as qualidades dos trabalhos desenvolvidos por esses docentes, mas estamospreocupados com os movimentos feitos (ou não) pelas Secretarias de Educação para substituiçãodesses quadros, assim como para suas ampliações (já que a demanda por EJA a cada anoaumenta, conforme pode ser observado em diversos dados estatísticos). Se por um lado oscursos de Magistério estão em extinção, por outro as ofertas de vagas para formação de docentesde nível superior não vem acompanhando, principalmente nas cidades do interior (que às vezesnem Faculdades ou Universidades possuem), o número de vagas que deixaram de ser oferecidasnas antigas “Escolas Normais”. Sendo assim, como vai se dar o processo de substituição eaumento do quadro dos docentes do ensino fundamental menor de EJA?

Só para concluir, mais uma vez a questão do gênero no campo da educação, quepode estar classificada na categoria de “Serviços comunitários, sociais e pessoais”5, é no ensinofundamental maior e no ensino médio, que exigem uma maior qualificação profissional, ou seja,no mínimo a graduação mesmo que em alguma licenciatura, o número de pessoas do sexomasculino são mais representativos, enquanto que as no ensino fundamental menor, no qual aexigência mínima é o Curso Normal Médio, a maioria esmagadora de pessoas que atuam é demulheres.

Percebemos que tanto nos programas da esfera estadual como municipal nessanova década parece demarcar um retrocesso quanto à identidade da EJA na cidade de Vitória daConquista, com uma diminuição do impacto dos programas de qualificação docente e atendimentoàs necessidades de alunos no processo ensino-aprendizagem para essa modalidade.

Acreditamos ser imprescindível a valorização social e política da EJA em Vitória da

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Conquista com discussões e práticas de formação inicial e continuada de seus professores demodo que deixe de possuir um caráter subalterno ao ensino fundamental e médio regular.

REFERÊNCIAS

BAHIA, SEI . http://www.sei.ba.gov.br/sei/alimenta.wsp acesso em 29/06/2006.

IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – 2000) data da consulta 29/06/2006

PREFEITURA MUNICIPAL DE VITÓRIA DA CONQUISTA – Secretaria Municipal de Educação –(proposta em discussão com os professores) Proposta Pedagógica de organização do ensinonoturno das escolas municipais de Vitória da Conquista Segmento I e II da educação de jovens eadultos. Vitória da Conquista – BA.2005.

PREFEITURA MUNICIPAL DE VITÓRIA DA CONQUISTA/ SECRETARIA MUNICIPAL DEEDUCAÇÃO E CULTURA. Escrevendo a vida. Projeto Reaja. Produção de alunos. Vol. 1 Vitória daConquista, 1999. - Helena, A nossa Cidade. Página 32. Escrevendo a Vida / Secretaria Municipalde Educação – Vitória da Conquista (BA): SEMEC: FNDE, 1999. – (Produção de Alunos, 01) .

PREFEITURA MUNICIPAL DE VITÓRIA DA CONQUISTA. http://www.pmvc.ba.gov.br/interface/index_geografia.asp acesso em 29/06/2006.

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SALES, Sheila Cristina Furtado. Educação de jovens e adultos no Estado da Bahia – ProgramaEJAI e II. 2001. Dissertação. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo: Programa de EstudosPós-graduados em Educação: História, Educação, Sociedade.

CASTELLS, Manuel. A era da informação: economia, sociedade e cultura.O poder daidentidade.Volume 2. 3ª ed. Editora Paz e Terra. São Paulo, 2002.

NOTAS

1 O MOBRAL tinha a finalidade de alfabetizar pessoas com 15 anos ou mais de idade com pouca ou nenhuma escolaridade, setornando o executor de um serviço de alfabetização em grande escala, abrangendo todos os municípios brasileiros.2 O ensino supletivo tem características voltadas para uma clientela adulta e como objetivo básico recuperar o tempo perdido dos quenão tiveram acesso a aprendizagem da leitura e da escrita em idade anterior a adolescência. Classes nas quais os professores atendem alunos em diversos estágios de aprendizagem podendo ter alunos desde o processode alfabetização até o estágio equivalente à 4ª série do ensino fundamental.4 Etapa que no Programa de EJA da SEC-BA corresponde, como apontamos anteriormente, às séries iniciais do ensino fundamental.5 Para maiores esclarecimentos consultar Castells (2002, p. 1991-210, v. II)

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A divulgação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) - uma das mudançaspropostas nas últimas décadas - foi apresentada como oportunidade para todo o sistema escolarpensar sobre o processo educacional como um todo e planejá-lo, numa perspectiva interdisciplinar,tendo em vista a “educação para todos”. Contudo, isso demanda mudanças ao professor em suadocência, fazendo com que ele reflita sobre suas opções teóricas, avalie sua atividade profissional,buscando novas formas de pensar e realizar a sua ação, implicando na continuidade de suaformação, tendo a escola como espaço privilegiado para que essa formação aconteça (CANDAU,1997, MARIN, 1995 PORTO, 2000).

Tendo em vista propiciar uma discussão sobre tais parâmetros entre os professoresda rede pública de ensino foi criado pelo Ministério de Educação e Cultura (MEC), em 1999, oPrograma de Desenvolvimento Profissional Continuado “Parâmetros em Ação”, também conhecidocomo “PCNs em Ação”, tendo como finalidades:

Apresentar alternativas de estudos dos Referenciais Curriculares agrupo de professores e a especialistas em educação (...) Contribuirpara o debate e a reflexão sobre o papel da escola e do professor naperspectiva do desenvolvimento de uma prática de transformação daação pedagógica. Criar espaços de aprendizagem coletiva, incentivandoa prática de encontros para estudar e trocar experiências e trabalhocoletivo nas escolas. Identificar as idéias nucleares presentes nosReferenciais Curriculares e fazer as adaptações locais necessárias,atendendo às demandas identificadas no âmbito do estado/municípioou da própria escola. (BRASIL, 1999, p.09).

Entretanto, como será que os professores reagem diante do que é proposto nocurso? O presente estudo teve como finalidade responder a essa questão a partir de análise dasreações de professoras das séries iniciais do ensino fundamental durante ações de formaçãocontinuada das quais participavam, focalizando, nesta comunicação, algumas reações com relaçãoao aspecto interdisciplinar presente no curso Parâmetros em Ação.

Este estudo contou com sessões de observação em três turmas do curso“Parâmetros em Ação”, totalizando 34 professoras da rede municipal de ensino de uma cidade daregião centro-oeste do estado de São Paulo. A estratégia utilizada pelo Programa consistia na“formação de grupos de estudos” sob a coordenação de um formador que poderia ser um profes-sor da rede que recebia formação específica por uma equipe de assessoria do MEC para atuarcomo “facilitador” nessa atividade coletiva.

REAÇÕES DE PROFESSORAS SOBRE AINTERDISCIPLINARIDADE VEICULADA EM

CURSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA

SAMBUGARI, Márcia Regina do Nascimento (PUC/SP)

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Esse programa era desenvolvido desde 2000 na rede municipal na qual foi realizadaesta pesquisa. Os encontros com as professoras ocorriam no momento do Horário de TrabalhoPedagógico Coletivo (HTPC) e por isso as professoras eram remuneradas. Organizadas porséries em que atuavam, as professoras semanalmente iam até o Departamento de Educaçãoonde eram realizados os estudos, permanecendo reunidas durante duas horas com a formadoraresponsável pela turma na qual estavam inseridas. Elas utilizavam um caderno de registro noqual anotavam dúvidas, sínteses de discussões e comentários pessoais. Este estudo contoutambém com entrevista com oito professoras selecionadas a partir de suas reações, sendo trêscom manifestação de aceitação e cinco com atitudes de indisposição com relação ao curso. Osdados coletados foram analisados tomando como aporte teórico as categorias “capital cultural” e“habitus” em Pierre Bourdieu.

A noção de Capital Cultural elaborado por Bourdieu (2002, p. 74) refere-se aos códigos culturais, aos saberes ou bens culturais que o indivíduovai adquirindo e a relação que ele mantém com esses conhecimentos,podendo existir na forma “incorporada” a partir da aquisição einternalização de conhecimentos, crenças, da cultura; “objetivada” pormeio de aquisição de bens culturais e “institucionalizada” que se dápor meio da certificação escolar. Nesse estudo, cuja parcela é aquicomunicada, interessa entender, sobretudo, a forma incorporada,considerando o processo de aquisição de novos conhecimentosescolares a serem ensinados, focalizando o aspecto interdisciplinar.

Para Fazenda (1995), a interdisciplinaridade é uma atitude, um novo olhar, quepermite compreender e transformar o mundo, uma busca por restituir a unidade perdida do saber.Para a autora a interdisciplinaridade tem a idéia norteada por eixos básicos: a interação, a humildade,a totalidade, o respeito pelo outro e é também marcada pelo sentimento de intenção consciente,clara, objetiva e não apenas pela interação de todos os elementos do conhecimento.

Com relação a essa perspectiva interdisciplinar presente na proposta do cursoParâmetros em Ação, algumas professoras eram mais propensas a aceitar e outras mais inclinadasa atitudes de rejeição. Entretanto, uma análise mais detalhada do conjunto dos episódios permitiuapontar regularidades, porém não constância total, pois tanto umas, quanto outras oscilaram emsuas manifestações. Não havia, portanto, homogeneidade nas suas manifestações. Esse dadoparece ser um indicador da condição de sujeitos que as professoras possuíam. Em certascircunstâncias aceitavam os procedimentos de estudo e as noções veiculadas por estarem maisde acordo com seu habitus ou por identificarem condições de melhoria em suas atividades dedocência ou, ainda, pelo fato de ter relato de uma colega apontando o sucesso em circunstânciasimilar.

Em outras circunstâncias elas rejeitavam perspectivas de trabalho ou conceitospor se verem confrontadas em seu habitus ou pelas impossibilidades dadas pelas condiçõesadversas em que viviam e atuavam. Oriundas de famílias simples que tiveram poucasoportunidades de escolarização, essas professoras viveram sempre numa cidade cujo entorno

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cultural era bastante restrito e fizeram o Magistério como única “opção” devido à falta de acesso econdições financeiras. São oriundas de famílias acostumadas ao trabalho, e como mulheres,ajeitas às responsabilidades domésticas. Além disso, as análises apontaram que essas professorasviviam uma sobrecarga de atividades, demonstrando um certo desânimo e cansaço. Essasobrecarga oriunda do curso se acumulava às inúmeras tarefas que já desempenhavam na escolae em casa.

As condições de trabalho também foram recorrentes, apontando problemas taiscomo a máquina de reprografia que não funcionava, a falta total de papel ou a cota reduzidaquando havia. Essas situações apontaram que as professoras esbarravam em condições reaisporque elas sabiam que tinham que fazer as matrizes de atividades, alguma coisa que permitissea elas trabalhar dentro da sala de aula, mas acabavam procurando alternativas como tirar dinheirodo próprio bolso para realizar as atividades, pois a escola não oferecia condições materiais paraque elas desenvolvessem o que estavam aprendendo nos cursos.

A análise dessas informações indicou uma desvantagem cultural nessas professorasresultante do ambiente cultural dos próprios pais, dos avós e do próprio entorno cultural vivido porelas que não inclui práticas e conhecimentos culturais desde leituras, arte, cinema, música, teatro,literatura e que tem a ver com vantagens de referenciais que elas não viveram e que a cidadepequena também não proporcionou. Ao considerar essas condições de existência das professoras,talvez a manifestação de rejeição reflita, esteja permeada por essa realidade despojada vivida eincorporada. Mas será que a proposta do curso leva em conta essa realidade das professoras?De que forma poderia contribuir para que as professoras ultrapassem essas desvantagensculturais? Será que os cursos de formação continuada não precisariam estar atentos a essarealidade das professoras?

Essa realidade revelou também que tanto as condições de vida quanto as de trabalhoguardam relação com as condições precárias da realidade educacional brasileira, pois a ausênciade recursos financeiros é recorrente nos estudos e também na documentação das escolas e dasdiscussões sobre as políticas educacionais. Tais condições podem estar, de um lado, favorecendoa manutenção do habitus dessas professoras. Mas por outro lado, a análise demonstra ocomprometimento delas em realizar as atividades necessárias para efetivar seu trabalho; emboragastem é a forma de manter seu emprego, sua sobrevivência profissional e econômica.

Retomando uma das hipóteses iniciais da presente pesquisa, talvez a indisposiçãoocorra devido a percepções, modos de pensar que estão incorporados nas professoras e quemuitas vezes afetam suas ações, pois segundo Bourdieu (1996, p. 42):

Os sujeitos são, de fato, agentes que atuam e que sabem, dotados de um sensoprático (...), de um sistema adquirido de preferências, de princípios de visão e divisão (o quecomumente chamamos de gosto), de estruturas cognitivas duradouras (que são essencialmenteproduto da incorporação de estruturas objetivas) e de esquemas de ação que orientam a percepçãoda situação e a resposta adequada.

É esse “senso prático” que ajuda o indivíduo a lidar com as diferentes situações

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com as quais vai se deparando. Dessa maneira, é importante compreender as manifestaçõesdas professoras, levando em consideração suas condições de existência que refletem nalinguagem, nos valores e gostos próprios de sua origem social, assim como no senso que têmsobre os limites das situações e nos compromissos de ordem diversa.

As professoras com atitudes de rejeição manifestaram dificuldade em certosconteúdos, não conseguindo estabelecer conexões com as diferentes áreas curriculares, criando,assim, um certo desconforto que era expresso, em sua maioria, sob forma de brincadeiras asquais ficaram evidenciadas em vários momentos de interação, conforme destacado no episódioabaixo:

No momento da leitura de um texto que abordava a questão daresolução de problemas com números naturais que envolvem adição esubtração ocorreu a seguinte troca:Coord. do grupo: Agora vamos pensar em alguns problemas queenvolvem adição e subtração.Professora Azaléia: Maria tinha 13 balas, ganhou mais 2. Com quantasficou? [À medida em que falava, a coordenadora escrevia na lousa].Coord. do grupo: Que idéia tem aqui: é de combinar, comparar outransformar?Professora V: Transformar? [expressão de dúvida]Coord. do grupo: Não, é combinar porque ela tem 13 e ganha mais 2.Professora D: É isso que eu não entendo. [expressão angustiada]Coord. do grupo: Então pessoal. É preciso trabalhar todas essas idéias,senão a criança fica restrita em apenas uma idéia.Professora Ri: Nossa, como a gente vai passar pro aluno se a gentenão sabe? Primeiro temos que aprender, né.Professora K: Muitas vezes elas erram, mas porque a gente se esquecedisso.Coord. do grupo: Por isso que é importante nos preocuparmos maiscom o conceito do que com o procedimento. (Nota de Campo, nº 05,Turma PCNs/Manhã, 04/05/04)

As professoras com manifestações de aceitação apontaram uma mudançasignificativa na visão dos assuntos, relacionando com sua prática docente, destacando acontribuição do curso para o trabalho com os alunos em sala de aula, sendo recorrentes expressões tais como: “aqui eu aprendo a dar aula para primeira série” ou “olha, hoje, quantascoisas aprendi!” e observado no depoimento da professora Rosa:

(...) a gente está aprendendo muito e está pondo em prática o quevocê aprende, o que você vê, você coloca em prática na sala. Têmmuitos projetos, muitas atividades que você tem que desenvolver nasala. Então ali você faz na teoria, mas aplicando na prática e você vêque dá muito resultado. (Professora Rosa)

Essas professoras vieram de um contexto familiar bem simples, com poucaescolarização e, talvez, o papel essencial do curso tenha consistido em ajudá-las a superar essasdesvantagens familiares e escolares para ter o que oferecer aos seus alunos que também eramoriundos de famílias de uma cidade pequena. Talvez por isso as professoras apresentassembastante dificuldades criando um certo desconforto diante dessas situações.

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Além das dificuldades, algo que chamou a atenção se refere ao reconhecimento dealgumas lacunas em sua formação, tanto na área de Matemática, quanto na Língua Portuguesa,embora outros componentes curriculares apareceram. Ao trabalharem sobre a importância daleitura para os alunos, num certo ponto do curso, elas reconheceram que precisavamprimeiramente ter a atitude de leitoras.

Ao cruzar as informações acerca das práticas culturais dessas professoras comesse reconhecimento delas, observa-se aqui, mais uma vez, que elas não possuíam o hábito deleitura e a suspeita de que não tinham desde sua escolarização a partir das respostas vagasapresentadas pela maioria delas no questionário, respondendo que liam vários gêneros de leitura,não especificando o que liam e a reclamação geral observada nas turmas quando se deparavamcom textos longos apresentados nos cursos.

A discussão de Giovanni (2003) acerca das condições que precisam ser dadas aoprofessor para que a formação continuada em exercício propicie mudanças de comportamentodo professor, neste estudo entendido como habitus, nos ajuda a pensar que talvez essa situaçãoproblemática reconhecida pelas professoras sinalize a ausência de um projeto de leitura paratoda a escola. Para que haja mudança nas situações de leitura citadas pelas professoras, aautora contribui ao salientar a necessidade de se trabalhar a partir de um projeto que envolva todaa escola, tendo um caráter coletivo e sistemático. Porém, o trabalho proposto no curso acabasendo individualizado, a ser desenvolvido dentro da sala de aula de cada professor, fato que talvezdificulte alteração no habitus das professoras. O reconhecimento dessa necessidade de leitura,entretanto, pode ser considerado um indicador de alteração na direção de reconhecer mais umalacuna e disposição para aceitar o que se veiculava no curso

Essa realidade aponta a necessidade de se levar em conta as condições de vida ede formação dessas professoras, entre outros aspectos, para compreensão das manifestaçõesdentro desse espaço de formação, assim como as possibilidades de investigação que ficamabertas, principalmente as trajetórias profissionais, pois afinal, ter atitudes de aceitação e de rejeição,segundo a abordagem teórica deste estudo, são ambas aprendidas dentro das possibilidadespostas pelas situações vividas e do espaço limitado, porém real de subjetividade que cadaprofessora possui para a constituição e alteração dos habitus relativos a processos de formaçãoe ações docentes.

A análise das reações das professoras diante da proposta do curso Parâmetrosem Ação permitiu verificar também as realidades conflituosas vividas por elas diante da implantaçãodas reformas. Elas expressaram em muitas das situações, o conflito instaurado em suas vidasprofissionais em face das mudanças exigidas delas. Ficou constatada, também, a contribuiçãodo curso na aquisição de novos conhecimentos, pois constituía um espaço de aprendizagem deconhecimentos que, talvez as professoras já soubessem, seja porque já estudaram, seja porqueaprenderam com a experiência, mas no momento do curso aprenderam de formas diferentes,envolvendo as diferentes áreas curriculares:

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O professor tem que estar com constante aprendizagem, mesmo queele saiba o tema que vai ser proporcionado em algum curso, mas elevai estar revendo, alguma coisa nova você sempre está aprendendoporque sempre tem o novo, e se você já conhece você está revendo,você tem que estar em constante aprendizagem. (Professora Azaléia)

Na leitura do texto sobre “orientações metodológicas”, surgiu uma dúvida em comoexplicar porque vai o zero no quociente. Então as professoras começaram a conversar entre si:

Professora J: Eu sempre fico em dúvida em como explicar porque vai o zero noquociente quando não dá para dividir.

Professora M.M: Ah, eu não fico explicando não,eu só falo; “aí vai o zero” e elesnunca me perguntaram o porquê. [tom de brincadeira]

Professora Rosa: E se perguntarem eu respondo: “porque vai o zero, oras!” Foiassim que eu aprendi. [risos]

Coord. do grupo: [Foi até a lousa e explicou. Assim que terminou de explicar falou:]Por isso que é importante que a criança entenda o conceito e não só o procedimento.

Professora Rosa: Nossa quanta coisa estou aprendendo!! (Nota de Campo 03,Turma PCNs/Manhã, 27/04/04)

Com a perspectiva de Bourdieu, analisa-se que houve ampliação do capital cul-tural dessas professoras. Mesmo tendo reações de rejeição ou indisposição, as professorasreconheceram o papel dos cursos para ampliação de conhecimentos. Essas manifestações podemser analisadas enquanto possibilidades de ampliação de seu capital cultural e até mesmoreestruturação parcial de parte de seu habitus tanto em relação ao estudo quanto à alteração deações.

Para Bourdieu (2003, p. 53-54) habitus é “um sistema de disposições duráveis”, ouseja, um conjunto de tendências, de comportamentos que vão sendo adquiridos pelo indivíduo pormeio das experiências práticas e das “condições materiais de existência” que são os preceitos,os conceitos, as preocupações produzidas primeiramente nas relações familiares e,posteriormente, nas demais agências de socialização com as quais irá se deparar no decorrer desua vida, tais como a escola, clubes, igreja, vida profissional, etc. Essas disposições orientam asatitudes, as opções, enfim, as ações do indivíduo em seu agir cotidiano que pode ser ora consciente,ora inconsciente e que está em constante reformulação.

Essas disposições duradouras vão se formando, no decorrer da trajetória de vidade cada professor, a partir de suas práticas culturais, ou seja, do capital cultural e que vão formandoa identidade, a percepção desses professores, evidenciando práticas próprias da camada socialà qual pertencem. Alguns episódios relatados apontam pistas de alterações em facetas do habi-tus na medida em que manifestam mudanças na percepção das situações, nos modos de pensarsobre os conteúdos e atividades para ensiná-los bem como a disposição para tentar mudançasnos seus encaminhamentos em sala de aula. O depoimento abaixo apresenta essa possibilidade

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de mudança, de reestruturação de facetas do habitus no que tange ao ensino da Matemática:

Pra mim era um pouco complicado ensinar divisão, aí eu vi diversosmétodos de como ensinar divisão com os PCNs e mais o livro doDante de soluções de problemas com divisão. Juntei tudo, nossa,hoje consigo ensinar divisão tranqüilamente, sabe, sou super segurapra ensinar, então, estou achando ótimo. (Professora Margarida)

Porém, apesar da perspectiva interdisciplinar presente na proposta do curso, nodecorrer de sua realização ela não ocorria, limitando-se a leituras, a aplicação em sala de aula eretorno para ver se deu certo. Entretanto, as discussões sobre as riquezas da sala de aula de fatonão tinham espaço para aparecer no debate mais amplo e coletivo, nem mesmo para o relatosobre a existência ou não de tais inter-relações esperadas teoricamente. Nessas condições haviapouca possibilidade de alterações em facetas do habitus docente para romper a disciplinaridade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Programa de desenvolvimento profissionalcontinuado. (Primeiro e Segundo Ciclos do Ensino Fundamental – 1ª a 4ª séries). Brasília, MEC/SEF, 1999.

BOURDIEU, Pierre. Razões práticas: sobre a teoria da ação. Campinas: Papirus, 1996.

______. Os três estados do capital cultural. In: NOGUEIRA, Maria Alice ; CATANI, Afrânio (Org.)Escritos de Educação. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 71-79.

______. Esboço de uma teoria da prática. In: ORTIZ, Renato. A sociologia de Pierre Bourdieu. SãoPaulo: Olho d’água, 2003, p. 39-72.

CANDAU, Vera Maria F. Formação continuada de professores: tendências atuais. In: ____________(Org.). Magistério: construção cotidiana: Petrópolis: Vozes, 1997, p. 51-

_____. A Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa. Campinas/SP: Papirus, 1995.

GIOVANNI, Luciana Maria. O ambiente escolar e ações de formação continuada. In: TIBALLI,Elianda F. A.; CHAVES, Sandramara M. (Orgs) Concepções e práticas de formação de professores:diferentes olhares. Rio de Janeiro: DP&A, 2003, p. 207-224.68.

MARIN, Alda J. Educação continuada: introdução a uma análise de termos e concepções. CadernosCEDES, Campinas, n.36, p. 13-20, 1995.

PORTO, Yeda da Silva. Formação continuada: a prática pedagógica recorrente. In: MARIN, Alda J.(Org.). Educação continuada. Campinas: Papirus, 2000.

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INTRODUÇÃO

Em levantamento realizado na área de Educação durante a década de noventaacerca da pesquisa sobre a formação de professores no Brasil, André (2000) constatou que nostrabalhos sobre licenciaturas, a maior parte enfatiza o estudo das disciplinas pedagógicas eespecíficas e o currículo de cada curso. Enquanto a atuação do professor também é razoavelmenteestudada, a formação inicial recebe menor ênfase, o que demonstra pouca atenção ao aluno dalicenciatura. Além disso, faltam investigações sobre as articulações entre as disciplinas pedagógicase específicas. O que se observa dessa constatação é uma visão fragmentada dos cursos, pois otodo de cada um deles se perde em particularidades e redundâncias.

Outra revelação do estudo de André (2000) diz respeito à língua estrangeira, nossoobjeto de estudo. A distribuição das pesquisas sobre licenciaturas evidenciou, sem especificarautores e títulos, apenas cinco trabalhos dedicados ao estudo de línguas, o que demonstra tambémpouca atenção a esse tema.

Já no que diz respeito à formação docente continuada, André (2000) observa que amaioria dos estudos se concentra em propostas governamentais ou da Secretaria de Educação,em programas e cursos de diferentes instituições, em processos de formação em serviço e naprática pedagógica. Assim como na formação inicial, as pesquisas também se relacionam aaspectos específicos, como uma disciplina, um curso ou uma proposta de formação e as principaisquestões levantadas nesses trabalhos coincidem com aquelas da formação inicial: o currículo, aestrutura ou o funcionamento do curso. Mais uma vez, temos um quadro fragmentado e parcialtambém da formação docente.

Na área de Lingüística Aplicada ao ensino de línguas, a preocupação com a formaçãoinicial e continuada de professores também vem sendo uma constante em âmbito nacional, aponto de já ter se tornado objeto de estudo de diferentes pesquisas, como aponta Monteiro (2004).O número crescente de estudos sobre a formação de professores de Língua Inglesa, como os deAbrahão (1992, 2001 e 2004), Abreu-e-Lima e Margonari (2002), Almeida Filho (1999 e 2000),Barcelos (2004), Basso (2001), Celani (2000), Gimenez (2004), Leffa (2001), entre outros, tambémcomprova a inquietação dos pesquisadores em entender como os futuros professores estão sendopreparados e como atuam em serviço.

Desde 2002, Silva e Margonari, (2003/2004 e 2005) têm pesquisado a formação

RE/ESTRUTURAÇÕES NO PROCESSO DEFORMAÇÃO PROFISSIONAL DE PROFESSORES

INICIANTES DE LÍNGUA INGLESA

SILVA, Ademar da; MARGONARI, Denise Maria (UFSCar)

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inicial de professores de Língua Inglesa, o que, de certa forma, vem contribuindo para suprir algumasdas lacunas acima apontadas e possibilitou o presente estudo. Essa pesquisa, que está sendodesenvolvida nas disciplinas Prática de Ensino e Estágio Supervisionado de Língua Inglesa I e IIem uma universidade federal do estado de São Paulo apresenta, até o momento, os seguintesresultados:

(1) Os alunos-professores apóiam-se no referencial teórico estudado parafundamentar suas opiniões acerca da experiência vivida ou mesmo se posicionarem comdesenvoltura frente às questões relativas ao ensino de língua estrangeira, à sala de aula, ao ensinopúblico e privado. Discurso este que não só serve de apoio para lhes conferir maior segurança,como também é utilizado para discorrer sobre questões advindas da prática. Isso revela os aspectospositivos da integração entre teoria e prática propostas pelo curso.

(2) Ao longo da licenciatura, o aluno-professor desenvolve uma concepção delinguagem e uma concepção de ensinar e aprender línguas, passando a se conscientizar dasresponsabilidades de sua futura profissão e das várias competências que a envolvem e a questionarsua capacidade de, como educador, se posicionar frente a uma sala de aula, proporcionando econstruindo a formação daqueles que deverão atuar nos processos de transformação social. Taisinquietações e questionamentos tomam corpo durante as aulas de Prática de Ensino. Insegurançae tensão se manifestam quanto a sua atuação em sala de aula e essas sensações conflitantesaumentam durante e após o estágio de observação e regência, pressionando o filtro afetivo (cf.KRASHEN, 1982) desses alunos, o que os leva a questionar a sua escolha profissional.

(3) Dadas as características da licenciatura dupla, é possível identificar três perfisde aluno-professor: (a) o perfil 1 é aquele que, desde o início, se identifica com o curso e temcomo objetivo ser professor. Na maioria das vezes, desenvolve projetos de pesquisa na área deensino-aprendizagem de Língua Inglesa, ministra aulas em escolas de idiomas, para alunosparticulares e empresas. Esse aluno também tem momentos de insegurança, mas dada as suasexperiências, lida com as incertezas de uma maneira branda; (b) o perfil 2 é aquele que, apesarde se identificar com o curso, não se vê como professor de língua estrangeira, preferindo o ensinode língua materna. Isso implica mais tempo dedicado ao estudo das disciplinas relacionadas àLíngua Portuguesa, o que faz com que sua competência lingüístico-comunicativa em línguaestrangeira não seja tão desenvolvida, gerando assim mais insegurança para ele; (c) o perfil 3não se interessa pelo ensino de línguas em geral e não se vê como professor. Esse aluno atédesenvolve uma competência lingüístico-comunicativa na língua estrangeira, mas opta pelasdiversas possibilidades de trabalho que a graduação em Letras lhe propicia, tais como: pesquisa,revisão e tradução. Devido a essas características, cumpre todas as disciplinas pedagógicassem se envolver muito com as questões advindas da prática.

(4) Respostas aos problemas e às inquietações em (2) estão relacionadas aosperfis de cada aluno, ou seja, cada qual responde diferentemente aos questionamentos queemergem durante as atividades da disciplina Prática de Ensino. Os perfis, que em (3) atuamcomo uma força no processo de formação do futuro professor, são fatores que influenciam suas

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ações, decisões e re/elaborações do discurso sobre sua futura atuação profissional.(5) Esse aluno-professor está numa fase de exploração de possibilidades

profissionais, por isso estrutura e reestrutura as diversas opções que a vida lhe oferece e que sãocomuns à faixa etária em que se encontra (21 a 28 anos) (SIKES, 1985). O tempo, as experiênciasprofissionais e a maturidade talvez o ajudem na decisão final e na superação das dificuldades.

Assim, tendo em vista as lacunas apontadas no estudo de André (2000) e partindodos dados expostos, procuramos desenvolver um estudo longitudinal, que tem como objetivoacompanhar a trajetória profissional dos professores em início de carreira, egressos do curso deLicenciatura em Letras de uma instituição pública do interior do estado de São Paulo, desde o ano2000 até o ano de 2005. Analisando trechos de questionários e relatórios de estágio da disciplinaPrática de Ensino e Estágio Supervisionado em Língua Inglesa I e II desses egressos, procuramoscruzá-los com dados desses alunos já em serviço.

Para o desenvolvimento deste artigo, foram selecionados apenas os egressos doano de 2002 e foram analisados os vários momentos de re/estruturação profissional pelos quaispassaram. Pretendemos demonstrar que as inquietações, ansiedade e inseguranças advindasdesse processo, além de, muitas vezes, superadas, variam de acordo com o perfil do aluno-professor que, numa fase de exploração de possibilidades, re/arranja sua opção profissional frenteàs escolhas, possibilidades e obstáculos vivenciados.

Para tanto, além desta introdução, serão apresentados os procedimentosmetodológicos utilizados, a análise dos dados e alguns resultados obtidos e as consideraçõesfinais, em que tecemos conclusões sobre esse estudo e apontamos perspectivas futuras.

1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Os dados para esta pesquisa foram extraídos de três fontes: (a) questionários(aplicados no início e ao final da disciplina Prática de Ensino), (b) relatórios de estágio e (c) e-mails enviados a ex-alunos egressos de 2002, em que lhes era solicitado um texto narrativo sobrea sua trajetória de vida profissional, do momento em que tinham deixado a universidade até o anode 2005, explicitando as experiências e os sentimentos vividos em cada decisão tomada.

Como nossa intenção era saber o caminho percorrido pelos alunos após agraduação, o primeiro critério para a seleção do grupo escolhido foi a distância temporal entre aconclusão do curso de Letras e o ano de 2005.

O segundo critério foi quantitativo, ou seja, optamos pela turma de 2002 porque foia que mais respondeu às mensagens eletrônicas enviadas: de 16 licenciados, 13 responderamas nossas solicitações.

Entendendo discurso como atividade produtora de efeitos de sentido entreinterlocutores, portanto, atividade comunicativa e o processo de sua enunciação, que é reguladopor exterioridade sócio-histórica e ideológica, que determina as regularidades lingüísticas e seuuso (TRAVAGLIA, 1991, p. 25; cf também ORLANDI, 1983), na análise, que é de cunho qualitativo,

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o processo de escrita (dos questionários, relatórios e narrativas) nos permitiu observar momentosde reflexão e avaliação das experiências e histórias de vida de cada sujeito no momento daenunciação.

O processo de escrita de qualquer texto, seja ele questionário, relatório ou narrativa,é o momento em que o aluno-professor organiza o discurso e dá sentido às experiências vividas,ou seja, é a ocasião em que se retomam inquietações necessárias para instaurar a reflexão sobreteoria e prática, sobre a arte de ensinar, estimulando a maturidade e a definição do posicionamentoprofissional do futuro educador.

2 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

Acreditando que as escolhas lingüísticas constantes dos questionários, relatóriose narrativas revelam o processo de construção e organização das experiências vivenciadas,passamos à apresentação e analise dos dados. Dos 16 ex-alunos contatados, 13 retornaram asolicitação. Veja-se a tabela 1:

Tabela 1Desse grupo, 8 (61,5%) estão exercendo alguma atividade docente e 5 (38,5%)

estão atuando em outra área. Dos que estão no magistério, 5 (38,5%) lecionam Inglês e 3 (23%),Português. Veja-se a tabela 2 abaixo:

Tabela 2As porcentagens indicam que um número razoável de ex-alunos professores

egressos de 2002 está seguindo a opção profissional prevista pelo curso de licenciatura. A tabelaa seguir1 mostra que, excetuando três casos, essas opções relacionam-se ao perfil dos alunos.

Tabela 3

Lecionando Não lecionando

Total

8 (61,5%) 5 (38,5%) 13 (100%)

Lecionando Não Lecionando Total Inglês Português

5 (38,5%) 3 (23%)

5 (38,5%)

13 (100%)

In s t itu iç ã o L e c io n a In g lê s

P e r fil 1 L e c io n a P o r tu g u ê s

P e r f il 2

1 (S ) 1 E s c o la p ú b lic a

1 (M )

1 1 (A ) 2

E s c o la m u n ic ip a l

1 (A C ) 1

1 (D ) 1 1 E s c o la d e id io m a s 1 (G ) 2

U n iv e rs id a d e p ú b lic a

1 (K ) 1

F a c u ld a d e P a rt ic u la r

1 (J ) 2

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Note-se que na escola de idiomas há um ex-aluno perfil 2 lecionando Inglês e narede estadual pública há um aluno perfil 1 lecionando Português. Além disso, há uma ex-aluna,(D), cujo perfil é 1, mas que, por conta da necessidade, apropriou-se da facilidade propiciada peladupla licenciatura e atua também na área Língua Portuguesa. Apesar dessas migrações, a maioriados ex-alunos segue o perfil inicialmente escolhido.

Após o rastreamento e análise das migrações dos alunos já em serviço,apresentamos a análise do cruzamento dos relatórios com os depoimentos enviados pormensagem eletrônica, demonstrando o processo de reestruturações pelas quais todos os perfispassam.

2.1 ALUNO PERFIL 1

A ex-aluna K, que durante o estágio de regência demonstrava não ter tido grandesproblemas na prática, visto ser a Língua Inglesa a sua área de atuação, continuou lecionando emescolas de idiomas após a graduação. Nesse percurso, teve decepções, pois precisou se desligardessa escola para se dedicar ao processo seletivo da Pós-Graduação. Por dois anos consecutivos,não conseguiu passar na seleção para o Mestrado em Lingüística Aplicada e Educação de duasinstituições públicas do interior do Estado de São Paulo, o que a desanimou:

[...] tentei incansavelmente por dois anos consecutivos, cada vez queprestava, mais eu me decepcionava e me achava incapaz de passarnessa etapa do meu desenvolvimento profissional. Então, me desanimei[...] Acho que ter passado pelo processo seletivo como professorasubstituta [...] me fez acordar e voltar a sonhar com meu antigo idealde seguir a carreira acadêmica [...].

O investimento no processo de formação continuada por meio da opção pela Pós-graduação Stricto Sensu, a princípio, parecia ser um obstáculo de difícil transposição para K, quesó foi superado após seu ingresso como professora de uma instituição de ensino superior. Issofez com que se animasse, retomando sua disposição para continuar sua trajetória acadêmica.

D, outra ex-estagiária perfil 1, com experiência no ensino de Língua Inglesa paracrianças, em escolas particulares e de ensino de línguas, afirmava estar “[...] preparada para daraulas para alunos de escola pública, particular ou em curso de idiomas [...]”. Confirmando o seuperfil, ainda continua com o ensino da Língua Inglesa em escolas de línguas. No entanto, paracomplementar o salário, atua também no ensino de Língua Portuguesa na rede pública e a cargahorária dessa disciplina excede a de Inglês, que é a área de sua preferência. Dando continuidadea sua formação, entrou no Mestrado em uma instituição federal e pesquisa na área de ensino-aprendizagem de Língua Inglesa.

Esse caso revela que a dupla licenciatura em Letras atua como um “bem” adquiridopelo aluno-professor, que é utilizado em situações em que precisa se reestruturar econômica eprofissionalmente.

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S era uma aluna que, apesar de inicialmente ter sérios problemas com a LínguaInglesa, sempre manifestou a vontade de ser professora dessa disciplina, mas sentia-se insegurapor causa da lacuna lingüística: “[...] confesso que no começo do curso, não me via comoprofessora, por achar que não tinha competência lingüística [...]”.

Com muito esforço, no decorrer do curso, conseguiu superar parte do problemalingüístico e firmar sua confiança e posição e se ver como professora dessa língua estrangeira:

[...] mas com o tempo vi que um professor de Língua Inglesa não éformado apenas de competência lingüística, se assim o fosse, os“americanos” poderiam vir ao Brasil e fazer com que alunos falassemInglês em 24 horas, mas um professor de Língua Inglesa é formado deembasamento teórico, de saber como, porque e para que aprenderInglês.

Atualmente, S passou no concurso do estado de São Paulo para professor deLíngua Portuguesa e, como ainda não escolheu sua vaga, é professora eventual dessa disciplinaem uma escola estadual de São Carlos (Ensino Fundamental e Médio). Diz estar feliz e que aindaquer lecionar Inglês, pois continua fazendo curso em escola de idiomas.

Essas reestruturações profissionais feitas por S, ou seja, a migração para a áreade Português confirma o papel desempenhado pela dupla licenciatura.

2.2 ALUNO PERFIL 2

Em 2002, G, que se considerava mais professora de língua materna do que delíngua estrangeira, ao avaliar sua atuação na Prática de Língua Inglesa, deixa transparecer que oproblema da disciplina na rede pública a afetou de alguma maneira e que: “[...] a área de Inglês nãoseria a minha principal especialização, tendo a necessidade de buscar seus auxílios técnicosquando necessário” (de K, sua parceira durante os estágios).

Na época, a dúvida marcada pelo verbo seria que, como modal e não temporal,explicitava atitude do falante sobre aquilo que é dito. G não confessa que a área de Inglês não é asua principal especialização. Mas, ao invés disso, usa o modal seria, que naquele momentoexpressa dúvida quanto à possibilidade de vir a atuar como professora de língua estrangeira.Atualmente, ela terminou o mestrado em Literatura na área de Ciências Sociais e para se manterdá aulas de Inglês. Já passou por várias escolas e tem estudado bastante para ensinar essalíngua:

[...] E também estou dando aulas na Aliança Idiomas. Considerandomeu histórico, é um avanço considerável. E esse avanço tem seprocessado como english speaker and teacher, já que me vi pelaprimeira vez obrigada a dar aulas todas em Inglês. Isso me deixou deinício muito insegura [...] Procuro desde então estudar mais, lerbastante em Inglês, ver mais filmes com legendas em Inglês.

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Mesmo com todo esse investimento e satisfação pessoal no ensino da LínguaInglesa, ainda não vê a possibilidade de ficar por muito tempo atuando em língua estrangeira:

[...] O fato é que para mim, dar aulas de Inglês me interessa, sobretudopelo fato de estar trabalhando como professora, que definitivamente éuma de minhas paixões. [...] Esse talvez seja um lado bom da minha“ignorância” na língua, tenho prazer em aprender com meus alunos,essa troca, acredito ser muito boa para o aprendizado deles [...] Alémdisso, o aprendizado do Inglês é muito importante para a carreiraacadêmica, a qual pretendo seguir e emprego como professor de línguaestrangeira é “um quebra galho” dos mais antigos [...] Desejo terminarmeu Mestrado e trabalhar no que realmente gosto, seja na literatura,seja na Sociais [...] Há tantas coisas que tenho estudado, lido, quemerecem ser ensinadas. E então, Inglês, just for fun. Quem sabe?

Note-se que, apesar de tudo o que tem feito, G não se sente competente o suficientepara dar aula de língua e reitera a sua vontade de trabalhar com aquilo que gosta: a Literatura.Entretanto, sua consciência acerca do seu menor desenvolvimento com relação à Língua Inglesamostra-se como um aspecto positivo, que a impulsiona a continuar estudando para melhorar aqualidade de suas aulas. Assim, ao final de seu depoimento, aponta para o seu verdadeiro sonho,sem descartar, mais uma vez, a possibilidade de ensinar Inglês como uma atividade prazerosa.

Ao migrar para um outro perfil, o ex-aluno passa a investir na área em que ele nãotinha dado tanta atenção. Essas reestruturações preenchem uma lacuna da graduação,complementando a sua formação em duas licenciaturas.

A ex-aluna P não se via como professora de Inglês e, a expectativa de reger aulasnessa língua lhe causava grande insegurança. No entanto, o seu grau de envolvimento com aPrática de Ensino foi tanto que, após o estágio, ela já considerava a hipótese de ensinar essadisciplina. Veja-se o depoimento de H, sua parceira durante os estágios, sobre a mudança deatitude de P:

[...] Fiquei satisfeita em perceber, durante as aulas, o interesse e oenvolvimento que ela dispensou aos alunos e às atividadesdesenvolvidas. Porque durante o curso a P dizia que nunca iria daraula. Após o estágio, já havia mudado de idéia, e passou a consideraressa hipótese.

Apesar de considerar essa hipótese, P, ao rever mais uma vez a sua atuaçãoprofissional futura, conclui: “No momento, não pretendo atuar na área de Língua Inglesa. Gostomuito da língua e acredito estar preparada para ministrar tal disciplina, pois tenho facilidade emaprendê-la e paciência para ensiná-la”.

De fato, P não está ensinando Inglês. Atualmente está na Itália, fazendo curso deItaliano. Gosta muito dessa língua e quer trabalhar no seu ensino quando aqui retornar, o quesignifica que continua na área de ensino de língua estrangeira.

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A ex-aluna R, com algumas características do perfil 2 mescladas com o 3, aoterminar o curso, volta para a casa dos pais e se questiona: “Medos, anseios e insegurança quese traduziam na pergunta a latejar dentro da minha cabeça: o que fazer da minha vida?”.

Para dar conta dessa questão, R tentou se preparar para o Mestrado em Análise doDiscurso, mas perdeu o prazo para inscrição. Enviou o curriculum vitae para algumas instituiçõesde Ensino Fundamental e Médio, na tentativa de dar aulas de Português e Literatura, mas nãoconseguiu nada. Dizia que: “Não arriscaria ensinar Língua Inglesa, uma vez que meu Inglês mereciaser esquartejado [...]”.

Por isso, matriculou-se na Cultura Inglesa de Ribeirão Preto. Desde então, temestudado bastante o idioma, já prestou o Cambridge First Certificate2, conseguiu um trabalho de10 horas semanais no SAC – Self Access Centre da instituição, onde dá apoio a alunos comdificuldades. Apesar de não explicitar que está investindo na futura profissão, ela diz:

Estou estudando agora para prestar o CAE3 em dezembro e ano quevem estou me organizando para ir para Brighton fazer um curso de umano na escola Saint Giles e tirar o Proficiency4 lá. Se nada disso dercerto, começamos de novo com o antigo projeto de vender salgadinhos.

Observa-se a mudança no perfil de R, que migra do ensino de língua materna epassa a investir no ensino de língua estrangeira. Assim como G, não considera sua competêncialingüística bem desenvolvida no idioma para ensiná-lo, apesar de ter sido aprovada em um examede nível avançado de Inglês. Sua conscientização a respeito da necessidade de continuarestudando a língua para se aprimorar é muito positiva, principalmente pelo fato de procurar pelaformação continuada em um país falante do Inglês como língua materna.

2.3 ALUNO PERFIL 3

Os alunos perfil 3, apesar de alguma movimentação na direção profissionaldirecionada pela licenciatura, ainda continuam atuando em outra área. Por exemplo, AM, que trabalhacomo jornalista, passou no concurso na rede pública para professor de Português, mas nãoassumiu. Também cursou uma especialização Lato Sensu em Estudos Literários na UNESP/Araraquara. SA, que trabalha na Nossa Caixa, tentou Mestrado em Lingüística Aplicada na Unicampe Lingüística na UFSCar, mas não foi bem sucedido. Já H, que, apesar das tensões, havia feitoum bom trabalho de Prática de Ensino, não se sentia preparada para ser professora:

[...] Não pretendo atuar na área de LI, pois entendo que não estoupreparada suficientemente para assumir essa responsabilidade. Tenhodificuldade com a LI. O curso diminuiu um pouco essa dificuldade,mas não o quanto eu entendo ser necessário para ensinar.

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Logo após o curso, pensou em se preparar para um curso de Pós-graduação, masnão teve condições, pois se envolveu nos assuntos domésticos. Atualmente, apesar de dizer que:“[...] sou uma dona-de-casa convicta. Não tive coragem de abandonar meu posto e me dedicar aomagistério [...]”, pensa em preparar um projeto em Lingüística e retornar aos estudos.

Os dados acima apresentados evidenciam que os ex-alunos têm um desejo muitoforte de se encontrar e de se aprimorar profissionalmente. Todos, de certa forma, estão fazendoou já fizeram algum movimento em direção a uma mudança futura e isso acarreta momentos dedúvidas, angústia e tensão.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os dados analisados demonstram que (a) um número razoável de ex-alunosprofessores egressos de 2002 está seguindo a opção profissional prevista pelo curso de graduação,evidenciando que a licenciatura está cumprindo o seu papel; (b) os ex-alunos algumas vezesmigram de perfil e, apesar dessas migrações, a maioria segue a decisão inicialmente tomada; (c)a dupla licenciatura em Letras atua como um “bem” adquirido pelo aluno-professor, que a utilizaem situações em que precisa se reestruturar econômica e profissionalmente; (d) ao migrar paraum outro perfil, o ex-aluno passa a refletir sobre a necessidade de um investimento na área emque ele não tinha dado tanta atenção anteriormente. Essas reestruturações, além de preencheremlacunas da graduação, complementam a sua formação em duas licenciaturas e são um avançoem direção à formação continuada.

O cruzamento dos relatórios com os depoimentos enviados por mensagemeletrônica mostra que os ex-alunos-professores ainda estão vivenciando situações de mudança.Nesse processo, são movidos pelo seu perfil: uma força que atua nas suas escolhas e experiênciasfeitas durante o curso de Letras e por isso ainda enfrentam momentos de ansiedade e insegurançacom relação à futura atuação profissional. No processo, essas sensações, além de, muitas vezes,revistas e transpostas, correspondem a um período de instabilidade profissional natural (início decarreira) e são recorrentes na faixa etária em que se encontram (21 a 28 anos). Talvez, a maturidadee as experiências profissionais ajudem na decisão final e na superação das dificuldades.

Tais resultados apontam para a primazia na continuidade deste estudo com dadosde alunos egressos de 2003 a 2005 e evidenciam também a necessidade de nos encontrarmoscom alguns deles em serviço, ou seja, em situação real de sala de aula. Nossa hipótese é queainda continuarão sujeitos a inúmeras reestruturações, mas os que seguirem a carreira docenteprosseguirão mantendo os níveis de excelência em relação à fundamentação teórico-práticainicialmente recebida no curso de graduação em Letras, bem como persistirão no investimentodo processo de formação continuada de professores em serviço.

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NOTAS

1 As letras entre parênteses referem-se às abreviaturas dos nomes dos ex-alunos. As setas () indicam as migrações entre as disciplinas Língua Inglesa e Língua Portuguesa, ou seja, mudança no perfil previamente

detectado na disciplina Prática de Ensino e Estágio Supervisionado.2 Primeiro exame de nível avançado da Universidade de Cambridge.3 Certificate of Advanced English, exame avançado da Universidade de Cambridge.4 Exame posterior ao CAE, o último exame de nível avançado da Universidade de Cambridge.

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INTRODUÇÃO

O Núcleo de Ensino da Unesp é um programa que tem como finalidade produzirconhecimento que possa interferir na área escolar e na formação inicial e continuada de professoresa partir da articulação entre ensino, pesquisa e extensão. Visa a melhoria da competência doseducadores e dos profissionais formados pela Unesp, por meio de parceria com SecretariasMunicipais de Educação e Diretorias de Ensino, dentre outros órgãos, dispostos a transformar adinâmica da Educação.

O projeto “Uma proposta de formação continuada de professores das séries iniciaisdo ensino fundamental visando uma mudança no processo ensino e aprendizagem de Matemática”,do Núcleo de Ensino da FCT/Unesp/Campus de Presidente Prudente, investiga o processo deformação continuada dos professores de 1ª. a 4ª. séries do ensino fundamental que ensinamMatemática nas escolas do município de Regente Feijó (SP).

Tal projeto se diferencia dos demais projetos dos Núcleos de Ensino da Unesp namedida em que investiga um processo de formação continuada no contexto de uma rede munici-pal de ensino de uma cidade do interior do estado de São Paulo. Trata-se de um processo deformação, que vai muito além de ações pontuais e que contempla a intervenção em salas de aula,com acompanhamento de gestores, que também participam das ações de formação. O municípioem questão investe no professor, objetivando o seu desenvolvimento profissional, visando ensinode qualidade, equalização de oportunidades educacionais e vivência de uma transformação so-cial. E ainda, considera importante a gestão escolar e possui um projeto estratégico, orientado pormetas de desenvolvimento.

A pesquisa desenvolvida nesse projeto é qualitativa, tipo “investigação-formação”(NÓVOA, 1991, apud CANDAU, p. 61), dada a existência de uma relação cooperativa entrepesquisadoras e sujeitos da pesquisa e o fato de não tratar-se exclusivamente de uma abordagemde pesquisa-ação e pesquisa participante, junto a 25 professoras das séries iniciais da rede mu-nicipal de ensino de Regente Feijó (SP). O processo de formação teve início em maio de 2006.Ocorreu por meio de ações didático-pedagógicas cujo ponto de partida foi o saber experiencial, aprática docente cotidiana das professoras e as dificuldades apontadas pelas mesmas. Estas

REFLETINDO SOBRE O ENSINO E APRENDIZAGEMDE FRAÇOES EM UM PROCESSO DE FORMAÇÃO

CONTINUADA DE PROFESSORES DAS SÉRIESINICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

FÜRKOTTER1, Monica; MORELATTI1, Maria Raquel Miotto ; FAUSTINO2, Monica Podsclan(FCT/Unesp)

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últimas, convertidas em problema, foram objeto principal de estudo e reflexão, buscando,colaborativamente, as soluções possíveis e necessárias, a partir da intervenção em sala de aula.A técnica de grupo focal foi utilizada para que as professoras avaliassem o processo de formaçãoinvestigado e as aprendizagens realizadas.

Neste artigo, apresentamos resultados dessa pesquisa, enfocando o perfil e asexpectativas das professoras envolvidas, as dificuldades e os avanços no processo ensino eaprendizagem de Matemática nas séries iniciais do ensino fundamental.

A FORMAÇÃO DE PROFESSORES QUE ENSINAM MATEMÁTICA NAS SÉRIESINICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Os educadores das séries iniciais do ensino fundamental possuem formação emnível médio ou curso de Licenciatura em Pedagogia.

Em tais cursos, há poucas disciplinas que trabalham conteúdos específicos daMatemática. Para Mello (2000, p. 5), a preparação nesses cursos se reduz a um conhecimentopedagógico abstrato porque é esvaziado do conteúdo a ser ensinado.

Assim, há conteúdos que os professores devem abordar com os alunos, sem nuncaterem aprendido os mesmos durante toda a sua escolaridade. Além disso, as práticas dosprofessores que ensinam Matemática mantêm-se baseadas na transmissão de informações,repetição, memorização e mecanização de algoritmos, não levando o aluno a analisar, racionar erefletir sobre os conceitos abordados.

No caso específico da formação continuada, as pesquisas apontam que asiniciativas ocorridas nas décadas de 1970 a 1990 foram “pouco eficazes na mudança dos saberes,das concepções e da prática docente nas escolas” (FIORENTINI; NACARATO, 2005, p.8), porvárias razões.

A principal delas é que esses cursos de formação continuada promoviam umaprática de formação descontínua em relação: à formação inicial dos professores; ao saberexperiencial dos professores, os quais não eram tomados como ponto de partida da formaçãocontinuada; aos reais problemas e desafios da prática escolar; e, sobretudo, porque eram açõespontuais e temporárias, tendo data marcada para começar e terminar. (FIORENTINI; NACARATO,2005, p.8)

Segundo Garcia, as críticas

referem-se ao carácter excessivamente teórico, à pouca flexibilidadeno momento de adaptar os conteúdos aos participantes, ao facto dese tratarem de actividades individuais, e portanto com escassaspossibilidades de ter impacto na escola, assim como ao facto de ignoraro conhecimento prático dos professores. (1999, p.179)

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Nóvoa (1992) ressalta o fato da formação continuada não ser um processo formativopermanente e integrado à prática e não reconhecer a escola como espaço privilegiado na formaçãode seus profissionais.

Nesse sentido, iniciativas mais recentes apontam como fundamental um processocontínuo, no qual o professor veja a sua prática como objeto de sua investigação e reflexão e noqual os aportes teóricos

não são oferecidos aos professores, mas buscados à medida queforem necessários e possam contribuir para a compreensão e aconstrução coletiva de alternativas de solução dos problemas da práticadocente nas escolas. (FIORENTINI; NACARATO, 2005, p.9)

Essa perspectiva aponta para a necessidade do professor experienciar

atitudes, modelos didáticos, capacidades e modos de organizaçãoque se pretende que venha a ser desempenhado nas suas práticaspedagógicas. Ninguém promove o desenvolvimento daquilo que nãoteve oportunidade de desenvolver em si mesmo. (PIRES, 2002, p.48)

As pesquisas também apontam

a importância da escola e do trabalho coletivo/colaborativo comoinstâncias de desenvolvimento profissional, uma vez que estasproporcionam aos professores condições de formação permanente,troca de experiências, busca de inovações e de soluções para osproblemas que emergem do cotidiano escolar. (NACARATO, 2006,p.176).

Acreditamos que um processo de formação continuada que tem como eixo a reflexãocoletiva sobre a prática, a experiência, crenças, posições, valores e imagens, poderá aprimorar acompetência dos professores e leva-los a incorporar recursos metodológicos a uma “nova” práticadocente, que propicie a construção do conhecimento através do “fazer”, e de atividades quepermitam trabalhar as competências matemáticas (experimentar, conjecturar, representar,estabelecer relações, comunicar, argumentar e validar).

Assim, os professores terão condições de tornar o conhecimento matemáticoacessível e significativo aos alunos.

OS RESULTADOS DAS DIVERSAS AVALIAÇÕES EM RELAÇÃO AAPRENDIZAGEM MATEMÁTICA

De acordo com o Sistema de Avaliação de Educação Básica (SAEB), principalavaliação sobre o aprendizado das crianças brasileiras, o desenvolvimento de habilidades básicasem Matemática vem se revelando insuficiente. Em suas seis edições, realizadas a cada doisanos, a partir de 1995, a média de proficiência dos alunos de 4ª. série do Ensino Fundamental não

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superou 190,2 em uma escala que varia de 0 a 500. No SAEB 2005, esses alunos obtiverammédia 182,4. Cabe destacar que a Matriz de Referência de Matemática do SAEB privilegia aresolução de problemas, levando em conta que a aprendizagem só se realiza quando um aluno écapaz de utilizar uma noção apreendida para resolver um problema diferente daquele que deuorigem à construção da noção, bem como quando questiona as resoluções efetuadas e asrespostas encontradas.

Outras avaliações como o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e oProgramme for International Student Assessment (PISA)3 por exemplo, revelam que a aprendizagemde Matemática tem sido, ao longo dos anos, um problema para alunos e professores do ensinofundamental e médio. Para Watanabe, as questões utilizadas no PISA

são diferentes das que normalmente são apresentadas aos nossosalunos em sala de aula. Elas exigem pouco ‘conteúdo’, pouca‘memória’, mas, nas palavras dos idealizadores do PISA, examinam acapacidade dos alunos de analisar, raciocinar e refletir ativamente sobreseus conhecimentos e experiências, enfocando competências queserão relevantes para suas vidas futuras. (2007, p. 17)

No caso específico do município de Regente Feijó, uma análise dos resultados doSARESP/2005 aponta, por exemplo, que em duas das três questões de quarta série do ensinofundamental que envolveram o conteúdo números racionais, os alunos obtiveram percentual médiode acerto abaixo de 30%. Os resultados não são muito diferentes nas demais questões, queabordaram outros conteúdos de Números e Operações, Espaço e Forma, Grandezas e Medidase Tratamento da Informação.

Dentre essas três questões, duas delas chamaram atenção pelo baixo percentualmédio de acertos. Uma delas solicitava uma outra representação escrita para a fração

4

10

, ouseja, que o aluno conhecesse sua representação decimal. A outra questão envolvia um problemade compra de bombons de chocolate preto e branco, no qual o aluno devia indicar a quantidade debombons brancos comprados, em relação ao todo. Assim, essa situação problema abordava osignificado de número, em sua representação fracionária.

Dessa forma, o desempenho dos alunos de 4ª. série da rede municipal de ensinode Regente Feijó nessas questões revela que eles ainda não identificam diferentes representaçõesde um mesmo número racional bem como não conseguem identifica-lo na resolução de situações-problema contextualizadas.

O PROCESSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA INVESTIGADO

As lideranças municipais de Regente Feijó preocupam-se com processos deformação continuada de professores. Nesse sentido, têm buscado parceria na universidade edado condições aos professores para se desenvolverem profissionalmente.

A formação ocorre no horário de trabalho dos professores, que são liberados de

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suas atividades de docência. As ações contam com a participação de diretores, coordenadoresdas escolas e uma supervisora de ensino. A participação desses gestores é primordial paracompreender o processo de formação, assegurar o desenvolvimento de atividades específicasno contexto da escola, e acompanhar o impacto do processo na aprendizagem dos alunos.

Embora os professores não sejam obrigados a participar das ações, aqueles que ofazem recebem um certificado e uma pontuação correspondente, que contribui para a progressãona carreira.

O processo de formação continuada investigado não tem caráter pontual deatualização e não é constituído de ações estanques e descontextualizadas da prática do profes-sor. Tem como eixo a reflexão coletiva sobre a prática, sobre a experiência de vida escolar doprofessor, suas crenças, posições, valores e imagens, com o objetivo de proporcionar a ele omáximo aproveitamento de sua capacidade produtiva. Foi motivado pelos resultados obtidos pelosalunos no Saresp/2005 nas questões relativas a conceitos matemáticos.

A partir das expectativas e dificuldades apontadas pelos professores, foramrealizados encontros quinzenais, nas dependências do Departamento Municipal de Educação eCultura (DMEC), nos quais foram desenvolvidas atividades visando potencializar a aprendizagemde conceitos matemáticos.

As ações privilegiaram a compreensão de que a teoria e a prática se renovammutuamente, constituindo um dos elementos essenciais na formação do professor, tomando comoreferência os Parâmetros Curriculares Nacionais de 1ª. a 4ª. séries e indicadores externos dedesempenho, em especial, o Saresp/2005. Os conteúdos abordados visaram qualificar o profes-sor para o enfrentamento das contradições do cotidiano, a partir do planejamento de sua açãodocente. Não se restringiram apenas à transmissão de saberes, tratando a Matemática comoferramenta de análise, questionamento e intervenção na realidade.

Após a produção de material didático pedagógico, os professores desenvolveramatividades em serviço que foram objeto de reflexão coletiva sobre as dificuldades encontradas esobre os resultados obtidos e de troca de experiências.

Assim, privilegiou-se

um trabalho colaborativo, em que os docentes se sentem à vontadepara relatar seus sucessos e fracassos. Os sucessos contribuempara a formação dos colegas e a incorporação de novas práticas. Osfracassos, quando discutidos e refletidos, possibilitam a busca dealternativas e a multiplicidade de caminhos ou estratégias.(NACARATO, 2005, p.192).Dos 33 (trinta e três) professores presentes ao primeiro encontro, 25(vinte e cinco) continuaram participando das atividades.

Esses 25 professores são do sexo feminino, cerca de 60% concluíram o ensinomédio na década de 1980, 32% na década de 1990, e duas das professoras nas décadas de 1960e 1970. A maioria delas fez magistério (72%), sendo que 24% fizeram o colegial e 4%, curso

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Formação inicial e continuada de professores

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técnico. Dentre os 24% que concluíram o ensino médio regular, posteriormente, três fizeram omagistério e uma cursou o CEFAM.

A maioria das professoras (96%) tem curso superior. Dessas, cerca de 45% fizeramo curso de Pedagogia e 37% o curso Pedagogia Cidadã4. Quanto ao tempo de magistério, 32%têm entre 6 e 10 anos, enquanto 24% têm entre 16 e 20 anos. Há ainda, 16% que atuam há menosde cinco anos e uma única professora com mais de 21 anos de exercício no magistério. Nenhumadelas possui um segundo curso superior ou curso de pós-graduação stricto sensu. Apenas 16%das professoras têm dupla jornada de trabalho, atuando em escola do município e escola da redeparticular.

No que se refere às expectativas em relação ao curso, destaca-se: “buscar novosrecursos para sanar as dificuldades dos alunos”, “preocupação com os resultados do SARESP”e “adquirir conhecimento para transmitir aos alunos”. Os professores apontaram encontrardificuldades para trabalhar com os conteúdos “números racionais”, “frações” e para “darfechamento aos conteúdos”.

Tendo em vista o exposto acima e o fato de os alunos de 4ª. série não terem obtidoum bom desempenho nas questões que abordaram Números Racionais no Saresp/2005, algumasdas atividades propostas envolveram esse conteúdo.

Cabe ressaltar que todas as professoras indicaram que trabalhavam com frações.Entretanto, foi possível identificar, no decorrer do processo de formação, que a abordagem desseconteúdo é feita de maneira muito superficial, explorando somente a parte que elas consideramter maior compreensão. Em geral, utilizam material concreto para trabalhar as partes de um todo,sem relacioná-lo às propriedades do conceito de fração, tal como a idéia de equivalência, que éfundamental na futura compreensão dos algoritmos.

Para Nunes et al,

Muitas vezes o conceito de fração é ensinado apenas como a rotulaçãode partes de um inteiro. Essa rotulação é o produto de uma duplacontagem de partes: o denominador é o número de partes em que umtodo foi dividido e o numerador é o número de partes que foram pintadas.Nossos estudos mostraram que os alunos que aprendem fraçõesapenas como uma rotina que leva a encontrar um nome para um pedaçode algo não se dão conta de aspectos de grande importância para acompreensão do conceito de frações, como a necessidade de termospartes iguais e a equivalência de frações. (2005, p. 158)

No processo de formação, as professoras foram convidadas a resolver situações-problema envolvendo o conceito de número racional e suas representações (fracionária e deci-mal). Foi possível notar que algumas professoras tinham compreensão equivocada sobre frações,tal como: representavam um inteiro apenas por 1; encontravam muita dificuldade para transformarnúmero decimal em fracionário e vice-e-versa; 0,4 é a quarta parte; para encontrar a terça partede 12, dividem 12 por 4 e tomam 3 partes; calculam a soma de frações impróprias, adicionandoos denominadores, ou seja,

1 1 1 1

3 6 4 13+ + = .

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Formação inicial e continuada de professores

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Nos últimos encontros foram propostas algumas questões abordando os conteúdostrabalhados durante todas as ações. Dentre elas, uma era semelhante à trabalhada com o mate-rial concreto, enunciada a seguir:

Nas figuras estão destacadas frações de um mesmo retângulo. Por isso você devecomparar essas frações.

Utilizando as figuras, substitua — pelos sinais > (maior), < (menor) e = (igual).a)

1

2—

1

3 e)

1

2—

2

3b) 1

3—-

1

4 f)

4

6—

2

3c) 1

6—

1

4 g)

2

6—

1

4d) 2

4—

1

2 h)

5

6—

3

4

A análise das respostas das professoras está apresentada no gráfico seguinte:

Gráfico 1 – Análise das respostas dadas à questão anterior, por 21 dos 25participantes.

Merecem um destaque os itens f, g e h. No caso do primeiro, 76% acertaram e 24%erraram. No caso do segundo, 52% acertaram e 48% erraram. No caso do terceiro, 62% acertarame 38% erraram. Tal resultado aponta que ainda há dificuldades em comparar frações e equivalênciade frações, principalmente nos casos em que a fração não é unitária.

Utilizamos, então, o grupo focal para que as professoras avaliassem os resultadosobtidos. Tal técnica de avaliação se justifica, uma vez que o grupo de professoras tem umacomposição homogênea (mesmo sexo, possuem curso superior, experiência profissional nasséries iniciais do ensino fundamental da rede municipal de ensino e participaram de todas asatividades desenvolvidas), e preserva características heterogêneas como idade e tempo de serviço,o que expressa a uniformidade e diversidade do grupo.

A dinâmica propiciou a interação e as falas evidenciaram tendências e aspectos

21

17

4

20

1

19

2

19

2

16

5

1110

13

8

0

5

10

15

20

25

a b c d e f g h

Acertos Erros

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relevantes para a avaliação do processo de formação, que foram interpretados no contexto dogrupo e complementados com os dados coletados.

Foi possível observar concordância nas opiniões das professoras quanto ànecessidade de investir mais tempo no estudo, de envolver-se mais nas ações, dedicar-se maisao curso e de assumirem-se responsáveis pelo seu desenvolvimento profissional. As professorasconcluíram que o trabalho que desenvolvem é superficial, reduzido à exploração de material con-creto, destacando somente a relação parte-todo, sem abordarem a noção de equivalência.

Esse fato causou certo desconforto e levou-as, ainda, a se despirem da certeza dosaber fazer, instituído pelos saberes da experiência e perceberem a necessidade da busca contínuade novos saberes, específicos do conhecimento matemático.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O processo de formação continuada investigado difere dos modelos tradicionaisadotados nas últimas décadas. Trata-se, efetivamente, de um processo contínuo que toma comopartida o saber experiencial dos professores, os problemas e desafios da prática escolar, e nãose caracteriza por ações pontuais e temporárias, com data marcada para começar e terminar,nas quais o aporte teórico é arbitrariamente oferecido aos professores. Conta com o apoio doSecretário Municipal de Educação, que investe nesse processo de formação na medida em que“tira” o professor da sala de aula para participar das ações didático-pedagógicas, e envolvecoordenadores pedagógicos e diretores. Conta, ainda, com o acompanhamento do supervisor deensino do município, no desenvolvimento do trabalho dos professores nas escolas.

Constatamos que existem professores que se colocam

NUMA SITUAÇÃO PASSIVA, QUE OPTAM POR UM PARADIGMA ONDE TÊM MUITOMAIS A RECEBER DO QUE A DAR OU PARTILHAR, NA MEDIDA EM QUE ESTAR NA FORMAÇÃOÉ PREFERÍVEL AO PARTICIPAR.” (PACHECO; FLORES, 1999, P.131)

A dificuldade encontrada em todo processo de formação foi envolver as participantes,e fazer com que partilhassem suas descobertas e avanços com as outras professoras da escolana qual atuam. As reflexões, na maioria das vezes, se limitaram aos encontros presenciais, nãose estendendo ao contexto escolar. A supervisora de ensino e o Secretário Municipal de Educaçãoobservaram uma mudança no discurso das professoras, e inserções de um novo fazer pedagógicono contexto escolar, entretanto, a almejada mudança no processo ensino e aprendizagem deMatemática ainda está por vir.

Relatos de algumas professoras refletem uma tomada de consciência quanto aoprocesso de formação:

Deveríamos programar mais o tempo e aproveitar melhor o HTPC.(Professora A)

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Deveríamos nos empenhar mais nos estudos. (Professora B)Não tínhamos conhecimento da existência de alguns materiais naescola. (Professora C)

A avaliação final levou-as a perceberem que precisam rever sua postura em relaçãoà formação continuada. Constataram que não basta participar de cursos, que é preciso estaremcompromissadas e envolvidas com as ações. “... Parecem ter assumido que a formação aolongo da carreira faz parte da sua vida profissional.” (PONTE; SERRAZINA, 2004, p.71).

Constata-se, portanto, que o processo de formação foi diferenciado, na medida emque está fundamentado em resultados recentes sobre formação de professores, e que levou asparticipantes a reconhecerem-se como sujeitos produtores de conhecimento e desejarem investirno seu desenvolvimento profissional.

Ainda há um caminho a percorrer e investigações a fazer, de modo a compreendermelhor os processos de formação continuada de professores para que eles possam contribuirefetivamente na almejada mudança no processo ensino e aprendizagem de Matemática.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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FIORENTINI, D.; NACARATO, A. M. (Org.) Cultura, formação e desenvolvimento profissional deprofessores que ensinam matemática: investigando e teorizando a partir de prática. São Paulo:Musa Editora, 2005.

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GATTI, B. A. Grupo focal na pesquisa em ciências sociais e humanas. Brasília: Líber Livro, 2005.

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NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. In NÓVOA, A. (org.). Os professores ea sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992.

NUNES, T. et al. Educação Matemática I: números e operações numéricas. São Paulo: Cortez,2005.

PACHECO, J. A.; FLORES, M. A. Formação e avaliação de professores. Porto: Porto Editora,1999.

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PIRES, C. M. C. Reflexões sobre os cursos de Licenciatura em Matemática, tomando comoreferência as orientações propostas nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação deprofessores da Educação Básica. Educação matemática em revista. Revista da SociedadeBrasileira de Educação Matemática. São Paulo, n.11a, p. 44-56, abr. 2002.

PONTE, J. P.; SERRAZINA, L. Práticas profissionais dos professores de Matemática. Quadrante,n. 13(2), 51-74, 2004. Disponível em: <http://www.educ.fc.ul.pt/docentes/jponte/artigospt.htm.Acesso em: 08 abr. 2007.

WATANABE, R. Nossos alunos sabem pensar? Revista do Professor de Matemática, São Paulo,62, p. 12-17, 1º. quad. 2007.

NOTAS

1 Docente do Departamento de Matemática, Estatística e Computação (DMEC), credenciada no Programa de Pós-graduação em Educação, Mestrado, da Faculdade de Ciências e Tecnologia, Unesp/Campus de Presidente Prudente.2 Aluna do Curso de Licenciatura em Matemática, bolsista do Núcleo de Ensino da Faculdade de Ciências e Tecnologia, Unesp/Campus de Presidente Prudente.3

O PISA é

um programa internacional de avaliação comparada, cuja principal finalidade é produzir indicadores sobre a efetividade dos sistemas educacionais, avaliando o desempenho de alunos na faixa dos 15 anos,idade em que se pressupõe o término da escolaridade básica obrigatória na maioria dos países. Coordenado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), é realizado de 3 em 3 anos e avalia habilidades dos estudantes em Leitura, Matemática e Ciências. Em 2003, a área principal de avaliação

foi Matemática e contou com a participação de 250.000 adolescentes (5235 brasileiros) de 40 países. (http://www.inep.gov.br/internacional/pisa/).4

Projeto institucional da Unesp, elaborado a partir de solicitação da Pró-Reitoria de Graduação. Refere-se ao desenvolvimento de curso de formação em nível superior para professores em exercício na Educação Infantil e nas primeiras séries do Ensino Fundamental, ligados, preferencialmente, às redes públicas de ensino municipal.

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INTRODUÇÃO

Neste artigo pretende-se socializar os resultados da pesquisa realizada no períodode 2004 a 2005, que surgiu da questão/problema: Será que a dificuldade encontrada na maioriados/as professores/as em lidar com o tema sexualidade explicaria a ansiedade encontrada desses/as ao se verem diante das manifestações da sexualidade de crianças e suas curiosidades sobreo corpo e a sexualidade?

Com certeza os cursos superiores de formação de professores/as podem ajudarno questionamento e reflexão sobre práticas pedagógicas relacionadas com o tratamento do temasexualidade na escola e nas instituições de educação infantil, tendo em vista que o currículo e asformas de organização escolar, bem como as formas de interação entre os sujeitos que circulamna escola, estão relacionados com a construção das identidades de gênero e sexualidade das epelas crianças.

Sendo assim, partia-se da compreensão de que as representações sociais queos/as professores/as têm do corpo e da sexualidade orientará suas práticas educativas junto àscrianças.

O objetivo era conhecer as Representações Sociais que as alunas matriculadasno ano de 2004, no curso de Habilitação para o Magistério em Educação Infantil, da FCT/Unesptêm sobre corpo e sexualidade. Vinte alunas de vinte e quatro alunos/as matriculados/as sedispuseram a participar da pesquisa, sendo que onze já atuavam na instituição de EducaçãoInfantil.

Pretendia-se encontrar no estudo das Representações Sociais dos sujeitos: quaisseriam as suas certezas e dúvidas sobre seu corpo e sua sexualidade; seus medos e angústias;seus desejos e expectativas; quais associações fazem entre o modo como concebem o própriocorpo e sua sexualidade e o trabalho com o assunto junto a crianças pequenas. Como elas vêemo seu papel como professoras na formação das concepções sobre gênero e sexualidade? Quaisas dificuldades que vivenciam no que diz respeito a sua própria sexualidade? Enfim, quais asrepresentações sociais de alunas que se prepararam no curso superior para atuar nas instituiçõesde educação infantil têm sobre corpo e sexualidade? Isto posto, propôs-se analisar a hipótese daexistência de uma correlação entre as representações sociais do grupo estudado e as dificuldades/ansiedades em geral manifestas pelos docentes em exercício durante suas práticas educativas

REFLEXÕES ACERCA DA TRÍADE: FORMAÇÃOINICIAL DE PROFESSORE(A)S, REPRESENTAÇÕES

SOCIAIS E SEXUALIDADE

CABICEIRA, Geisa Orlandini ; GUIMARÃES, Célia Maria (FCT/Unesp)

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ao tratar do assunto com alunos. Entende-se que a confirmação da hipótese oferecerá alternativasde trabalho aos formadores de professores e aos alunos/as em processo de formação inicial combase nos valores, opiniões, sentimentos que podem condicionar suas práticas educativas futuras.

Deste modo, pesquisar as Representações Sociais que essas alunas têm sobrecorpo e sexualidade, apresenta relevância educacional, social e acadêmica para professores eformadores de professores porque “... é preciso abordar a aprendizagem dos docentes a partir dacompreensão de como eles chegaram a pensar, agir e aprender da maneira como o fazem”.(FERNANDE CRUZ, 1995, p.177).

Bernardi (1985) trata da relação entre a percepção do adulto-professor sobre asexualidade da criança e seu trabalho com educação sexual na escola.

[...] o adulto tem medo da sexualidade infantil e juvenil porque estas colocam emcrise a sua sexualidade, que ele adora chamar de madura. Reconhecer de modo concreto, e nãoabstratamente como se costuma fazer, a sexualidade das crianças e dos jovens, reconhecerexigências e direitos, admitir que se trata de uma sexualidade autêntica [...] significa ter que revernão só a conduta geral frente aos menores, mas também o próprio comportamento sexual doadulto a começar pela postura frente ao prazer. Significa recolocar em discussão toda afundamentação sexofóbica do nosso sistema, e por isso mesmo o próprio sistema. (BERNARDI,1985, p.21-22).

A criança está em pleno desenvolvimento psíquico, biológico, cognitivo, afetivo esocial e em processo de formação da sua identidade. Neste sentido recebem as influencias dosadultos que com seus saberes, concepções, crenças e tabus, ensinam valores socialmenteconstruídos, fundamentados em conceitos deterministas e normativos acerca do corpo e dasexualidade. É preciso que o professor conheça a sexualidade das crianças e sua particularidade,porque é uma fase singular para a construção da identidade pessoal e social do ser humano, etambém é necessário que o professor avalie o seu relacionamento com o seu próprio corpo esexualidade e, seus respectivos procedimentos frente à sexualidade das crianças.

O autor apresenta críticas à educação sexual na escola, que trabalha em suasaulas temas referentes à fisiologia do aparelho reprodutor, preceitos morais, educação para omatrimônio, destituindo a sexualidade como algo intrínseco ao ser humano.

A maneira como a sexualidade é ou era vivida, depende de uma gama de fatoresque a influenciam: geração, raça, nacionalidade, religião, classe, etnia. No decorrer dos temposas concepções sobre a sexualidade variam.

As muitas formas de fazer-se mulher ou homem, as várias possibilidades de viverprazeres e desejos corporais são sempre sugeridas, anunciadas, promovidas socialmente (ehoje possivelmente de forma mais explícitas do que antes). Elas são também renovadamentereguladas, condenadas ou negadas. (LOURO, 1999, p.9).

A concepção que homens e mulheres têm de seus corpos, apesar de subjetiva, seadequa à sociedade, ou seja, as identidades são socialmente construídas (WEEKS, 1999),expressando-se na ascensão das regras sócio-culturais (moral, ética, lógicas que são mecanismos

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de censura) que se manifestam em forma de costumes, moda, tradição e hábitos. O processo doconvívio e do saber, a normatização através de verdades a serem seguidas, reforça as redes depoder, que também são experimentadas pelos sujeitos no espaço escolar.

Meninos e meninas vivenciam cotidianamente os modelos e papéis que lhes sãoimpostos, [...] são adestrados e lhes são inculcados hábitos primários desde a infância. E quantomais simples esses gestos e hábitos, mais fundamentais, mais determinantes. (MURARO, 1983,p.23). Vivenciam padrões rígidos de comportamentos rotulados pela mídia, pela moda, pelosmodelos estereotipados, pelo sexismo, pelo androcentrismo, de modo que parecem ser tãofamiliares, tão normais.

Como se encontra a formação dos professores enquanto pessoas que fazem parteda vida, da construção do conhecimento e da identidade dos alunos?

Dessa forma entende-se que, considerando as particularidades do desenvolvimentoda criança de 0 a 6 anos, a Educação Infantil cumpre as funções indissociáveis de educar ecuidar. Esse processo educativo requer a formação profissional – disposta em lei – a educadora(e o educador?), que tem como herança a concepção sexista da Educação Infantil, basicamentecomposta por mulheres, que, muitas vezes são leigas. (CAMARGO; RIBEIRO, 1999, p. 59).

O(a) professor(a) que atua em creches e pré-escolas precisa avaliar a sua posturamediante os valores, as crenças, os tabus e as representações sociais que têm do corpo e dasexualidade, pois o mesmo se enquadra em uma sociedade padronizada, na qual vivencia papéisde gênero, de comportamento, sofreu e sofre repressões e normas a serem seguidas. Osprofessore(a)s são expostos aos valores normativos e disciplinadores da sociedade em que vivem,precisa junto com a instituição de educação infantil (funcionários, direção...) refletir a respeito daspráticas educativas e o trabalho que realiza com as crianças em relação ao corpo e a sexualidade,e também que concepções e conceitos fundamentam a sua prática, como chegaram a fazer domodo que fazem e o porquê que fazem assim, e através de um trabalho coletivo, rever as suaspráticas, descobrir meios para que se trabalhe a educação sexual na instituição de educaçãoinfantil questionando o sexismo, as relações de gênero, as oposições binárias (masculino/feminino,negro/branco), observando a singularidade desta fase do ser humano.

Nunes (2000), afirma que:

Os educadores que evitam abordar a discussão sobre a sexualidadeinfantil, que não buscam informações para o seu aperfeiçoamento eque nada desenvolvem para adquirir uma habilidade didática paratrabalhar o assunto estão radicados na omissão e na irresponsabilidade,pois o descurar da sexualidade significa abdicar da educação integralda criança. (NUNES, 2000, p.118).

Logo, é preciso que os seus profissionais conheçam mais e melhor quem são elesmesmos, seus preconceitos, vergonhas e conhecimentos sobre o assunto. Em seguida, é precisovoltar a atenção para o que pensam, o que desejam e quais são as suas necessidades. Refletirsobre as práticas educativas dos docentes acerca do trabalho com educação sexual na escola e

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a implicação destas na vida e na formação dos indivíduos significa a importância em conhecer asrepresentações sociais das alunas (algumas já professoras e outras em formação) da Habilitaçãopara o Magistério em Educação Infantil do curso de Pedagogia da Faculdade de Ciências eTecnologia, campus de Presidente Prudente, sobre o corpo e sexualidade.

As representações sociais são elaborações psicológicas e sociais, construídaspelos indivíduos e com os indivíduos e possuem uma dupla função: tornar familiar o que é estranho/ameaçador e perceptível o que é invisível. É o conhecimento habitualmente denominado deespontâneo, ingênuo, vulgar, do senso comum ou pensamento natural por oposição ao pensamentocientífico (MOSCOVICI, 1978, 1981, 1984b).

O conceito de representação social, segundo Moscovici (1984), enquanto objetode estudo da Psicologia Social, tem como base, a articulação do social e do psicológico. A realidadede vida cotidiana constitui o conhecimento social, o saber do senso-comum. Esse conhecimentoelaborado e praticado se expressa através das experiências, do pensamento, da comunicação eda interação dos indivíduos com os indivíduos.

Moscovici (1978, 1984b) denomina este tipo de conhecimento de conhecimentoprático. Explica que este se constitui a partir de nossas experiências, das informações,conhecimentos e modelos de pensamento recebidos e transmitidos por intermédio da cultura, daeducação e da comunicação social. Por isso, em muitos dos seus aspectos é conhecimentosocialmente elaborado e compartilhado. As representações sociais se definem, por um lado, pelaexistência de um conteúdo: informações, imagens, opiniões, atitudes, valorações, etc. Este conteúdose relaciona com um objeto, ou seja, um trabalho a realizar, um acontecimento, uma pessoa, etc.Por outro lado, são as representações sociais de um sujeito em relação com outro sujeito(GUIMARÃES, 2000).

Sendo assim, a representação social é tributária da posição que os sujeitos ocupamna sociedade, na economia, na cultura. Por isso, Moscovici, (1978, 1981) enfatiza que todarepresentação social é representação de algo e de alguém. Não é uma duplicação do real ou doideal, nem a parte subjetiva do objeto ou a parte objetiva do sujeito. É o processo que estabelecea relação do sujeito com o mundo e com as coisas – o objeto. (JODELET, 1986. p. 473)

Num sentido amplo, o conceito de representação social, designa uma forma depensamento social. As representações sociais constituem modalidade de pensamento práticoorientado para a comunicação, a compreensão e o domínio do contexto social, material e ideal.Tanto é verdadeiro que apresentam características específicas em relação à organização dosconteúdos, das operações mentais e da lógica.

As representações sociais orientam as ações enquanto reconstituem os elementosdo ambiente no qual o comportamento acontece, integrando-o a uma rede de relações a qualpertence seu objeto. Quando o sujeito se defronta com uma realidade difícil de compreendê-lacomo um todo, passa a construir representações que permitam compreendê-la e interpretá-la,restituindo ao sujeito equilíbrio.

Cada indivíduo elabora e lança mão de Representações Sociais de algo que tem

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relação com o grupo ao qual pertence. Não se trata de opiniões sobre o objeto de representaçãoou imagens. As Representações Sociais são aplicadas ao objeto e promovem transformaçãopara convertê-lo em conhecimento que pode ser utilizado e compartilhado quotidianamente, regendocomportamentos. As Representações Sociais são elaboradas e compartilhadas socialmente einfluenciam sobremaneira a forma como os grupos sociais e os indivíduos vêem a realidade, secomunicam e agem. As Representações Sociais explicitam como um grupo se relaciona com umdado objeto social, servem de guia de ação, orientam a comunicação e a relação com o mundo eos outros. Também, oferecem referências para interpretação da realidade e favorecem a construçãode valores, necessidades, interesses de um mesmo grupo. Diferentes grupos representam ummesmo objeto segundo uma forma própria.

O conhecimento apreendido do objeto passa a fazer parte das conversas e aparecena forma de frases, visões, jargões, ditados, preconceitos, estereótipos, soluções, etc., tendo umefeito de realidade para o indivíduo. Geralmente o grupo usa termos para representar um objetoque fazem concluir seu emprego no contexto social. (GUIMARÃES, 2000).

Ao discutirmos sobre corpo e sexualidade e representações sociais, não podemosdeixar de pensar nos sujeitos que vivem em uma sociedade normativa e padronizada. Sujeitosque vivenciam através dos meios de comunicação de massa, da cultura, da ideologia, da educaçãoos modelos e estereótipos, condutas sexuais, valores, tabus, normas e padrões rígidos sociais.Esses sujeitos são dotados de conhecimento, vivências, experiências, não são sujeitos passivos,podem modificar e transformar o meio em que vivem. Embora, vivamos em uma sociedade cujosmodelos são apoiados em oposições binárias que (re)produzem as diferenças, partindo de umaidentidade considerada padrão( homem, heterossexual, branca, cristão, etc.), modelo de sujeitouniversal, em negação do que não se enquadra a norma (mulher, homossexual, negro) e, sendoesses modelos repercutidos na escola, é preciso questionar como e/o porquê que essas diferençassão dadas como naturais e universais.

A análise dos dados seguiu etapas, previamente organizadas, de acordo comoapresenta Bardin (1977):

Antes de qualquer agrupamento por classificação (ventilação das unidadessignificativas em categorias, rubricas ou classes) começamos por reunir e descontar as palavrasidênticas, sinônimas ou próximas a nível semântico (BARDIN, 1977, p. 52-53).

A 1ª Categoria: “Vivência do corpo e sexualidade feminina: que valores expressamna produção da identidade de gênero” trata de como os sujeitos da pesquisa apresentam as suasrepresentações sociais de corpo e sexualidade e os valores que sustentam e expressam as suasvivências corporais e de sua identidade de gênero. Como sentem o próprio corpo, quais valoreslhe atribuem e como exercem a sua sexualidade. Também nesta categoria é abordado se o gruporompe com os papéis sociais, papéis sexuais e de gênero produzidos socialmente.

Essa primeira categoria traz as respostas analisadas das vinte alunas da Habilitaçãoem Educação infantil. Em relação aos papéis sociais, sexuais e de gênero o grupo de alunasquestiona os papéis que a sociedade estabelece. Rompem com a idéia de que a mulher tem que

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esperar o marido para satisfazê-lo sexualmente, afirmam que a mulher tem desejo de manterrelação sexual. Não concordam com o papel social vigente que induz a mulher a ser dona decasa, mesmo que contribua financeiramente com seu trabalho fora de casa. As alunas defendemque precisa haver uma divisão de tarefas entre homens e mulheres, devido ao fato das mulheresexercerem várias funções (cuidar dos filhos, ajudarem no orçamento familiar, organizar a casa)na sociedade.

Podemos chegar a conclusão que acerca dos papéis sociais destinados aoshomens e as mulheres, o grupo rompe com a norma, no que diz respeito a mulher estar destinadaa função de dona de casa e ao espaço privado.

Em relação ao papel da mulher na sociedade elas afirmam que as mulheres queremescolher a maneira como devem viver e o que é melhor para as suas vidas, podendo planejar ealcançar os seus próprios objetivos. Elas não concordam com o fato de a mulher trabalhar forainfluenciar de forma negativa na educação dos filhos. Trabalhar fora não desprivilegia a condiçãode ser mãe. O grupo rompe com a função da maternidade como sendo o papel social maisimportante na vida da mulher. Devido ao fato das mulheres estarem idealizando outros objetivospara as suas vidas, ser mãe não é o objetivo central e nem único.

Ao ser tratada a análise das representações sociais de corpo e sexualidadeaparecem também às representações sociais de gênero que o grupo apresenta, desde os valoresque atribuem às suas próprias identidades de gênero e como se constituem como mulher e sepercebem enquanto atores ativos sociais e históricos.

A associação livre das palavras homem e mulher mostra como as alunas se vêmcomo mulher e reforçam concepções sexistas. Atributos como razão, competição, inteligência,não são expressos pelo grupo como atributos femininos. Ao observar as associações que fizeramda palavra homem, percebe-se atributos como: inteligência, força, razão, coragem.

O grupo, em alguns momentos, indica lutar contra a opressão e a subjugaçãofeminina, entretanto, elas se mostram confusas ao expressarem o que pensam de si próprias edo seu papel na sociedade. Fazem críticas à sociedade e aos padrões normativos, porém, acabamcolocando-se em uma condição de submissão e de inferioridade em relação aos homens.

Em relação a vivencia da sexualidade e da ruptura dos papéis sexuais impostospela sociedade o grupo se manifesta de modo romper com algumas normas sociais.

O grupo assume posição contrária em relação a mulher proporcionar prazer aohomem sem buscar o seu próprio prazer. Acredita que ao fingir orgasmo, a mulher se condicionaa não buscá-lo e de não apresentar ao parceiro a sua falta. Logo, a mulher deve buscar junto comseu parceiro o prazer, assim podendo ambos descobrir o que lhes dá prazer.

Ao tratar do tema da masturbação o grupo a define como uma forma de conhecero próprio corpo, quebrando o tabu da masturbação como pecado e proibido.

Em relação à liberdade sexual entre homens e mulheres, não é assimilada a idéiade a mulher ter mais de um parceiro ao mesmo tempo. Na afirmativa “as mulheres podem termais de um parceiro(a)”, não questiona a traição e as relações extraconjugais; apenas apresenta

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um fato que vem acontecendo em nossa sociedade, que é a busca e a escolha de parceiro(a)pelas mulheres, o que a mídia chama de “ficar”, o namoro sério não aparece nesse tipo de relação,ao mesmo tempo em que a mulher (garota) ou homem (garoto) está com uma pessoa pode estarou “ficar” com outra(s).

Em relação às vivencias sexuais algumas consideram adeptas dos valores cristãos,embora relatem que nem sempre cumprem com o que acreditam, os valores da igreja. Comoexemplo, uma aluna expôs a dificuldade que tem de vivenciar outro modo de relação sexual, queseria a relação anal. Isso se deve ao fato de que a prática do sexo anal possui uma carga devalores relacionados à igreja e a medicina higienista do século XIX, sendo esta prática consideradacomo pecaminosa, imoral e patológica.

De fato, alguns valores expostos pelo grupo expressam tabus, crenças cristãs efazem parte das representações sociais desses sujeitos, como as relações sexuais que nãovisam a procriação (sexo anal, sexo oral, sexo com pessoa do mesmo sexo, masturbação) e anão manutenção da instituição família são classificadas como imorais. Na associação livre depalavras, sexo obteve várias associações com casamento, apenas uma aluna, das vinte ligoucasamento ao sexo. O grupo associa sexo ao casamento, mas não casamento ao sexo,. Deveser porque nossa sociedade produz e transmite valores como: virgindade, casamento, maternidadee paternidade.

O grupo não apresenta em suas respostas uma função passiva em situações quetratam da relação sexual, no entanto, algumas atribuem à masturbação uma prática egoísta econdena como sendo pecado. É necessário mostrar que quinze mulheres do grupo associarama masturbação ao ato de descobrir o corpo e de ter prazer consigo mesma.

Percebe-se que o grupo expressa indignação com a condição social da mulher,bem como os papéis destinados ao seu sexo. Criticam os meios de comunicação, a mídia e ospadrões estéticos, entretanto, concebem o corpo sobre o prisma da saúde e da estética.

Observa-se que o grupo faz referencia à condição da mulher em nossa sociedade,as relações de gênero, a libertação sexual feminina e ao corpo feminino.

Em relação à liberdade sexual da mulher, o grupo questiona como a sociedade e amídia, assim como os meios de comunicação têm tratado o corpo feminino, vulgarizando-o e otratando como mercadoria. Apresentam em suas respostas críticas a mídia e a manipulação queesta faz do corpo feminino. Outro aspecto relevante é que o grupo atribui a libertação sexualfeminina como a possibilidade das mulheres experimentarem situações que seriam antes somentevivenciadas por homens, como exemplo, praticar o sexo antes do casamento.

Algumas respostas retratam a liberdade sexual feminina como uma conquista. Hojea mulher pode expressar os seus desejos e vivenciar a sua sexualidade com menos repressãodo que antes. No entanto, afirmam que as mulheres são estigmatizadas e sofrem preconceitospor sua busca pela liberdade sexual.

Por mais que busquem a igualdade entre os gêneros apresentam momentos deconflito em relação ao que elas acreditam e pensam sobre a sexualidade feminina e as relações

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de gênero. Ao estimularmos respostas que dizem respeito o que representam sobre a liberdadesexual feminina, ergue-se uma barreira que, de acordo com suas respostas nos fazem regredirhá séculos atrás e fica vigente o discurso normatizador das condutas sexuais femininas.

A segunda categoria “Gênero, Sexualidade e os Profissionais da Educação Infantil,”apresentará a análise das categorias anteriores 2 e 5, que foram pensadas no início da elaboraçãodos instrumentos da pesquisa.

O que se pretendeu na elaboração dessa categoria foi apresentar a importânciaque as alunas atribuem ao trabalho de educação sexual na educação infantil e se apresentamconhecimentos sobre a sexualidade das crianças, de como ela é vivenciada pela criança. Quaisas dificuldades que apresentam em tratar desse tema em sala de aula?

Como o grupo representa a infância influenciará na atuação com as crianças e notratamento da manifestação de sua sexualidade. Foi com esse intuito que foi pedido ao grupo queescrevessem o que viesse à mente tudo o que representa infância. A associação que mais apareceuforam palavras que remetem à infância como sendo uma fase feliz, pura, inocente. Concepçõesnaturalizantes e essencialistas sobre a infância.

Em relação à sexualidade das crianças o grupo apresenta falta de conhecimento eentendimento suficiente para lidar com o assunto. O grupo reconheceu que a criança temsexualidade, como foi analisado em outros instrumentos aplicados, no entanto, não apresentamconhecimento científico sobre o tematil.

O uso da associação livre de palavras referentes ao professor de educação infantile a sexualidade da criança, objetivava-se captar como o grupo concebe a postura que o(a)sprofessore(a)s devem ter ao trabalhar com o tema da sexualidade e as suas atitudes em situaçõescotidianas na sala de aula. Todas as mulheres do grupo enumeram várias competências quequalificam o professor como profissional ao lidar com a sexualidade infantil, como fazer cursos decapacitação que estão relacionados com esse tema, participar de palestras, seminários, refletirconstantemente sobre as suas práticas com as crianças.

Em relação ao conhecimento sobre a sexualidade da criança, o grupo apresentapouco conhecimento. Por mais que não tenham conhecimento sobre o assunto, o fato de teremfeito o curso de Pedagogia e terem disciplinas que tratam da sexualidade, elas poderiam ao menossaber que sexualidade da criança não se manifesta como a do adulto.

No âmbito das práticas educativas, isso se torna um problema, pois com o conceitode que a sexualidade da criança é igual a do o adulto, o (a) professor (a) de educação infantil podeao se deparar com as manifestações da sexualidade das crianças tratá-la de forma indevida,como ao tratar a curiosidade de uma criança em conhecer o corpo da outra ou de um adulto fosseanormal.

Em relação o tratamento de meninos e meninas são presentes as relações dedesigualdade de gênero como parte das suas representações. Como a necessidade de um maiorcontrole das meninas em relação aos meninos, e que existem algumas brincadeiras e atividadesque são exclusivas de meninos e outras de meninas.

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De acordo com a análise dos outros instrumentos da pesquisa, como já foi relatado,o grupo tem consciência da existência da sexualidade infantil e a importância desse assunto sertratado pela Instituição de Educação Infantil, bem como assumem não terem conhecimentosuficiente pata lidar em suas práticas cotidianas com a sexualidade.

Em relação à escolha da profissão de professor de educação infantil, o grupo mostraque optou em ser professor (a) de Educação infantil porque acreditam ter um papel importante naformação da criança e também apresentam consciência de que as suas práticas educativasinfluenciam nas vidas das crianças com que trabalham/trabalharão.

O grupo analisado apresenta em sua maioria professoras que já atuam na Instituiçãode Educação Infantil e que também relatam em suas respostas dificuldades em tratarem do assuntoda sexualidade das crianças e de suas manifestações, nos fazendo refletir que essas dificuldades,por se tratarem da falta de conhecimento teórico sobre o tema poderão influenciar de forma negativaem suas práticas educativas e cotidianas.

CONCLUSÕES

Nessa pesquisa de abordagem qualitativa para a qual foi adotada a análise deconteúdo os resultados nos instigam a levarmos essa reflexão ao âmbito da Instituição de EducaçãoInfantil, o quanto é importante refletirmos e questionarmos as concepções sexistas que regem anossa sociedade, bem como, os padrões normativos que modelam as condutas sociais e sexuaisdos indivíduos, os quais se manifestam através das instituições escola, igreja, família e o Estadoque inculcam por mecanismos de coerção e técnicas de controle, muitas vezes sutis, maneirasde viver a vida. Esses dispositivos adentram as mais íntimas formas de vivenciar a sexualidade,as identidades sexuais são anuladas à apenas uma identidade, a heterossexual, como se fosseinata e comum a todos.

Chega-se a conclusão que um pouco mais da metade do grupo não apresentaconhecimento científico sobre a sexualidade da criança, no entanto afirmam com clareza que oprofessor precisa buscar conhecimento sobre o assunto, que precisa fazer cursos, pesquisas eestudos. Precisa ter conhecimento da sua própria sexualidade, e não estabelecer os seus própriosvalores, como também, avaliar as suas próprias concepções sobre criança.

Cabe aos professores como agentes da instituição escola refletir sobre os valorese as concepções que apresentam sobre o próprio corpo e sexualidade. É papel primordial daInstituição de Educação Infantil de propiciar aos professores e profissionais que nela atuamconhecimento sobre o tema, como oferecer subsídios para o trabalho de educação sexual naescola, com apoio da família e profissionais que trabalham na instituição. Muitas vezes, como é ocaso constatado nessa pesquisa, o Curso Superior que forma professores para atuarem comcrianças não tratam da sexualidade com foco nestas, formando professores despreparados paralidarem com o tema em suas práticas escolares cotidianas.

Percebe-se que ao pretendermos investigar as rs de corpo e sexualidade, construiu-

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se uma categoria que captou as rs que alunas têm sobre gênero e relações de gênero. Apesar dogênero e sexualidade apresentarem conceitos epistemológicos diferentes, é quase impossível,pelos menos, o que constatamos nessa pesquisa, ao abordar a questão da sexualidade não sedeparar com a de gênero. Não seria inconveniente se colocássemos no título da pesquisarepresentações sociais de corpo sexualidade e gênero de alunas em processo de formação inicialno curso de Habilitação em EI.

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1) INTRODUÇÃO

O ser humano, através de suas ações, faz história. Com o passar dos anos estahistória é transformada por ele próprio, arraigado em uma sociedade de classes que, muitasvezes, pela função que desempenha e, em especial a de professor, permanece à margem, emfunção do poder econômico e da sua desvalorização profissional. A prática pedagógica é umaação na dimensão social, com uma extensa bagagem cultural. Portanto, a ação docente reflete aconstrução de saberes. Durante a formação profissional, em sua fase inicial, o aluno (aqui entendidocomo futuro profissional da Educação Física) vivencia diferentes tipos de aulas que, indiretamente,marcarão a sua atuação enquanto professor. Na graduação ele delimita e alicerça (ou acreditafazer isso) essas práticas, e quando da sua inserção profissional, retransmite grande parte doque vivenciou. E neste momento de formação inicial que os futuros docentes irão alterar a suapercepção da área na escola, conforme atesta Carreiro da Costa (1996). Caso não ocorra estamudança, a concepção negativa da disciplina e as crenças prévias que antes possuíam oacompanharão durante a carreira docente.

O presente estudo justificou-se diante da necessidade manifestada pelosprofessores de Educação Física da rede municipal de Ibiporã, Estado do Paraná, durante osencontros nos grupos de estudos nos estabelecimentos de ensino, bem como quando daimplantação, pela Secretaria Municipal de Educação, da Assessoria Pedagógica de EducaçãoFísica em 2006, objetivando, assim, alicerçar a base conceitual no trabalho docente, através deuma busca constante pelos saberes inerentes à prática pedagógica.

O objetivo foi diagnosticar quais os saberes que os professores de Educação Físicade uma rede municipal de ensino (1ª a 4ª séries) no Estado do Paraná, possuem em relação àprática pedagógica.

A análise dos conteúdos das respostas do questionário definitivo serviu paradiagnosticar quais são os saberes inerentes à prática docente de Educação Física, oportunizandoa compreensão da realidade epistemológica do quadro docente, suas dúvidas, incertezas econceituação sobre o fazer docente, e se a práxis atual influencia de forma positiva (se conseguemdar praticidade a esse conhecimento) ou negativa (quando não há a operacionalização disso, pordesconhecimento, individualismo exacerbado, comodismo ou inércia).

Assim, como objetivos deste estudo, destacam-se: a) Diagnosticar quais saberescompõe a base conceitual dos professores de Educação Física da rede municipal de ensino; b)

SABERES DOCENTES E A BASE CONCEITUAL:ESTUDO DE UMA REALIDADE DOCENTE

OLIVEIRA, Emerson José de (SME-Ibiporã/SEED-Pr/LaPEF-UEL); PALMA, José AugustoVictória (UEL/CEFE/LaPEF)

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Contribuir para implementar um processo de formação contínua para os docentes da área. c)Verificar a relação da construção desses saberes (individualmente ou coletivamente).

FORMAÇÃO PROFISSIONAL

Para Bueno (2000) formação é definida como arranjo, disposição, constituição.Segundo Garcia (1999) em alguns países como França e Itália, tal conceito é utilizado para nosreferirmos à educação, preparação, ensino, etc., e em países cujo idioma deriva do inglês é maisutilizado o termo educação (teacher education), ou o de treino (teacher training). No Brasil asdiscussões em torno da formação do professor intensificaram-se durante o período de debatesque antecedeu a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) – Lei no.9394 de 1996 – após a qual professores e pedagogos foram denominados “profissionais daeducação”.

A formação de professores concebe um encontro entre pessoas adultas, umintercâmbio entre formador e formando, com uma finalidade de transformação, desenvolvida numcontexto organizado e institucional mais ou menos demarcado (Garcia, 1999). Constitui umprocesso de desenvolvimento individual e de grupo, destinado a adquirir ou aperfeiçoar capacidades,vislumbrando os âmbitos acadêmico e pedagógico.

Consideramos a formação de professores como a preparação eemancipação profissional do docente para realizar crítica, reflexiva eeficazmente um estilo de ensino que promova uma aprendizagemsignificativa nos alunos e consiga um pensamento-ação inovador,trabalhando em equipe com os colegas para desenvolver um projetoeducativo comum. (MEDINA e DOMÍNGUEZ, 1989, apud GARCIA,1999, pg. 23)

FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES

A formação inicial dos professores é uma função que, progressivamente ao longoda história, vem sendo realizada por instituições específicas, por um pessoal especializado emediante um currículo que estabelece a seqüência e conteúdo instrucional do programa deformação. A formação inicial de professores segundo Garcia (1999) cumpre três funções: a)Desenvolvimento e experiência de futuros professores, de modo a assegurar uma preparaçãocondizente com as funções profissionais que o professor deverá desempenhar, b) A instituiçãoformativa tem a função de controle de certificação, ou permissão para poder exercer a profissãodocente e c) A instituição de formação de professores tem a dupla função de ser, por um lado,agente de mudança do sistema educativo, mas, por outro, contribuir para a socialização ereprodução da cultura dominante. Porém, tendo a instituição de ensino superior uma formaçãoorientada na necessidade de um conhecimento prático (Pacheco, 1995), ela acaba fornecendoapenas um lado prático e utilitário onde os conteúdos são apenas pincelados, surgindo, portanto,

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a necessidade da implantação, realização e a colaboração do poder público aos programas deformação continuada em serviço, assegurando aos docentes a possibilidade de adquirir aqualificação adequada exigida pelas leis vigentes no País.

A formação de professores, em especial, precisa dar-se conta, commais energia, das estruturas epistemológicas e de poder que ajuda aconstruir (...). É preciso que se ressignifique o sentido da prática,articulando-a com o da pesquisa. Nesse contexto, a teoria adquire umsignificado insubstituível. (MORAES, PACHECO e EVANGELISTA(orgs.) 2003, pg. 78).

FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES

Para Luckesi (1994) o professor é aquele que, tendo adquirido o nível de culturanecessário para o desempenho de sua atividade, dá direção ao ensino e à aprendizagem. Ele faráa mediação entre o coletivo da sociedade (os resultados da cultura) e o individual do aluno,exercendo o papel de um dos mediadores entre o universal da sociedade e o particular do aluno,e para isso o docente precisa ter competência, habilidade e comprometimento. Portanto, o pro-fessor aprende a ensinar pela via do exercício da qual resulta uma socialização burocrática(estruturas escolares,...) e socialização didática (ambiente da sala de aula,...). A socialização éformadora de saberes, de olhares, de significados.

(...) a ação do professor é permeada por conhecimentos práticos quese mostram em suas ações cotidianas e também por uma “reflexãodurante a ação” (...) proporcionando a compreensão do conhecimentosubjacente à sua ação prática. (MORAES, PACHECO eEVANGELISTA, 2003, pg. 88).

Quando a apropriação dos conhecimentos se realiza no âmbito escolar, aquientendida como forma institucionalizada, o professor desempenha a mediação necessária entreo aluno e o conhecimento. A atividade pedagógica do professor é um conjunto de ações intencionaisconscientes, dirigidas para um fim específico.

A compreensão do significado da prática docente deve ser promovida pelasinstituições responsáveis pela formação inicial e continuada dos professores. Na graduação esses“futuros professores” devem despertar do comodismo e da certeza de que, ao final, estarão aptosa ingressarem no magistério. No caso dos professores, o significado de seu trabalho é formadopela finalidade da ação de ensinar. Estas etapas podem ser consideradas individualmente, mascom certeza exigem uma apreciação grupal, ou seja, quando os professores da mesma ou dediferente etapa trabalham juntos, numa mesma atividade de formação profissional (Garcia, 1999).

FORMAÇÃO CONTINUADA EM EDUCAÇÃO FÍSICA

A formação continuada de professores tem sido objeto de muitos estudos. Palma(2001) considera que o processo histórico da formação profissional em Educação Física aponta

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que ele tem-se fixado exclusivamente na técnica, no aprender a ensinar, ficando o aprender aaprender sem espaço no processo. Betti (1992) afirma que saber como ensinar movimentos nãoé o suficiente. É imperativo que se tenham claras as razões do processo o que, certamente,implicará em posicionamentos de ordem filosófica, sociológica, política e psicológica.

Entendemos que a formação continuada de professores fomenta o trabalho coletivo,pois contempla a construção de um saber, que alicerça a base conceitual do professor, ao mesmotempo em que enriquece o aprendizado.

Uma capacitação que envolva o professor com situações que opermitam refletir e pesquisar sobre o seu fazer pedagógico, tendo oseu cotidiano escolar e sua sala de aula como ponto de partida, comoprocesso, e como ponto de chegada, contribuirá com o desenvolvimentoprofissional e com a construção de um projeto educacional. (PALMA,2001, pg. 04).

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Toda a pesquisa necessita da delimitação de um problema, sendo seu cerne, ouseja: o que se deseja pesquisar. Foi utilizado um estudo exploratório, com a pesquisa sendo decampo, de caráter qualitativo que teve por intenção analisar os pensamentos dos docentes sobreos saberes inerentes à prática da Educação Física Escolar. Primeiramente foi aplicado umquestionário piloto com uma profissional da área. Após análise e correção foi aposto aos nove (9)docentes de Educação Física do município de Ibiporã no mês de Maio de 2006.

A coleta de dados via questionário foi definitiva. A abordagem qualitativa serviuoportunamente para entender a natureza de um fenômeno social, no caso específico os saberesdocentes.

Foram organizados dois tipos de questionários, ambos com questões abertas efechadas, sendo que o primeiro abordou toda a identificação funcional de cada entrevistado(graduação, tempo de atuação profissional, especialização e aperfeiçoamentos na área) e osegundo englobou várias particularidades inerentes à ação docente e aos seus saberes. Osquestionários foram respondidos num único dia, durante o Grupo de Estudos da disciplina, sendo,posteriormente, as respostas agrupadas em quadros demonstrativos, delineando-se as palavras-chaves e a partir desse entendimento, analisadas.

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Quadro 1

Conforme o quadro 01 verificamos que conteúdos são apontados como temas,bem como o tema Esporte sendo mencionado como conteúdo, denotando uma tendência para aprática esportivista e a preocupação com o fazer. Porém, ao analisarmos esses posicionamentos,ressaltamos que a tematização para a Educação Física sugere uma amplitude maior. Soares etall. (1992, pg. 24), destaca que a expectativa da Educação Física Escolar, que objetiva a reflexãosobre a cultura do movimento “[...] coopera para a afirmação dos interesses de classes dascamadas populares”, no instante em que amplia uma reflexão pedagógica sobre os valores [...]”,onde observamos a solidariedade suprindo o individualismo, cooperação confrontando a disputa,distribuição em confronto com apropriação, mormente enfatizando a liberdade de expressão dosmovimentos, ou melhor, a emancipação, negando a superioridade e submissão do homem pelohomem.

Cultura é o principal conceito para a educação física, porque todas asmanifestações culturais humanas são geradas na dinâmica cultural.(...) trata do ser humano nas suas manifestações culturais relacionadasao corpo e ao movimento humanos, historicamente definidas comojogo, esporte, dança, luta e ginástica. (DAOLIO, 2004, pg. 03)

Cultura é, portanto, o processo pelo qual o homem transforma a natureza, bemcomo os resultados dessa transformação. Neste processo de autoprodução, o homem produz,simultaneamente e em ação mútua, a cultura. Não existe cultura sem homem, da mesma formaque não existe homem sem cultura, sendo que ela se objetiva em instrumentos e idéias, mediadospela técnica, e sua essência consiste no processo de produção, conservação e reprodução desteselementos, conforme Saviani (1996).

Categoria Professores Total Estudo de conteúdos específicos (Esporte) EF 01 – EF 02 – EF 03 – EF 06 – EF 07 – EF 08 –

EF 09 07

Danças EF 01 – EF 03 – EF 09 03 Avaliação em Educação Física EF 04 – EF 05 – EF 06 02 Inclusão EF 02 – EF 06 02 Organização Curricular EF 04 01 Processo ensino aprendizagem EF 04 01 Educação Física Escolar EF 06 01 Repensar a Educação Física EF 08 01

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Quadro 2

Analisando o quadro 02 percebemos que a escolha se deu devido ao gosto pelaárea, numa relação direta com o rol de vivências que as atividades anteriormente proporcionaram,e não pela docência. Seguramente, a fase de formação inicial foi determinante na escolha.

A fase de formação inicial é o período durante o qual o futuro professoradquire os conhecimentos científicos e pedagógicos e as competênciasnecessárias para enfrentar adequadamente a carreira docente. Se estafase de formação não promover a alteração de concepções préviasincorretas sobre a escola, a Educação Física e o ensino que osestudantes transportam para o curso, estas idéias irão exerce umainfluência permanente e decisiva nas suas crenças, perspectivaspedagógicas e comportamentos quando forem professores de EducaçãoFísica. (COSTA, 1996, pg. 03)

Entendemos que a Educação Física precisa direcionar suas novas ações, dentroda perspectiva de sociedade em que se insere. O simples executar, mencionado nas respostas,deve ser, gradativamente e em longo prazo, substituído pela reflexão na e da ação motora. Ointeresse epistemológico deve impulsionar seus profissionais a conhecerem realmente a área, abuscarem opções para seus questionamentos. Para Tani (apud Guedes, 2001) esse interessedeve levar o pesquisador a se questionar ou a ser questionado sobre a sua efetiva contribuição daEducação Física.

Quadro 3

De acordo com o exposto no quadro 03, foram apontadas muitas colocações, porém

Questão 02 Indique as razões pelas quais escolheu o curso de Educação Física para a sua

formação profissional?

Categoria Professores Total Por gostar da área de Educação Física EF 01 - EF 03 – EF 04 – EF 05 – EF 06 – EF 09 06 Por gostar de esportes EF 01 - EF 02 – EF 05 – EF 06 – EF 07 05 Por gostar de atividade física EF 02 – EF 06 02 Porque era a segunda opção EF 07 01 Entender o sujeito bio-pisco-social EF 05 01 Trabalhar corpo, saúde e não ficar em sala. EF 02 01

Questão 03 Quais as principais funções que os professores de Educação Física devem

desempenhar em seus contextos de trabalho? Enumere (1) para a primeira, (2) para a segunda e assim sucessivamente.

Categoria Professores Total Desenvolver nos alunos valores morais, cívicos e sociais. EF 06 – EF 07 – EF 08 03 Desempenho da atividade docente EF 01 – EF 04 – EF 08 03 Reconhecimento e respeito pelos outros professores EF 01 – EF 06 02 Conhecer os conteúdos e planejar suas aulas EF 02 01 Desenvolver o trabalho pertinente á área EF 04 01 Despertar no aluno o entendimento e o gosto pela área EF 06 – EF 07 01 Desenvolvimento pleno do aluno EF 07 01 Ser mediador no processo EF 05 01 Não responderam EF 03 – EF 09 02

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tudo muito vago, indicando que os professores compreendem o seu papel no processo, porémnão conseguem definir as principais funções do profissional, Obviamente que os entrevistadosdesenvolvem seus respectivos trabalhos nas escolas onde atuam, dentro dos conhecimentos econcepções aprendidos em seus respectivos processo de formações, porém ao não conseguiremdefinir quais as principais atribuições, denota-se um quadro de desentendimento da profissãodentro do contexto escolar, pois o professor de Educação Física também é um sujeito atuante naescola, um facilitador do processo ensino aprendizagem, preocupado com sua profissão, semprebuscando novos conhecimentos e transformando-os em competências, e nunca ser tratado comocoadjuvante, ou um mero recreacionista, muito menos o sempre prestativo e útil nos infortúniosescolares (falta de professores, organizador de todas as atividades e muito mais). Nesse campode operacionalização da ação docente, o perfil delineado atribui novas tarefas e responsabilidadesao professor. Para Moraes et. Al. (2003) ser professor atualmente é viver intensamente o seutempo, conviver, ter consciência e sensibilidade. Cabe a este professor: comprometer-se com asua prática; planejar suas ações; zelar pela aprendizagem dos alunos; associar teoria e práticamediante capacitação em serviço. Dar uma virada nas suas atribuições, defrontar acertos e erros,transcender sua prática docente diante das mudanças constantes do meio.

(...) novas exigências educacionais pedem (...) um novo professor capaz de ajustarsua didática às novas realidades da sociedade, do conhecimento, do aluno, dos meios decomunicação. O novo professor precisaria, no mínimo, de adquirir sólida cultura geral, capacidadede aprender a aprender, competência para saber agir na sala de aula... (LIBÂNEO, 1998, pg. 28)

Entendemos que as transformações nas condições objetivas das nossas escolasnão estão sujeitas apenas na nossa ação como profissionais da educação, mas também naprópria concepção da área. Enquanto não construirmos um novo sentido para a nossa incumbência,acepção essa que está ligada ao papel da escola, esse vácuo, persistirá.

Quadro 4

Questão 04 Quais saberes são necessários aos professores de Educação Física para

desempenharem suas funções em seus contextos de trabalho?

Categoria Professores Total Diagnosticar necessidades individuais e coletivas EF 03 – EF 04 – EF 09 03 Domínio e conhecimento teórico e prático da área EF 02 – EF 06 – EF 08 03 Trabalhar a interdisciplinaridade EF 01 – EF 04 02 Criatividade EF 01 01 Saber lidar com indisciplina EF 01 01 Domínio e desenvolvimentos dos conteúdos EF 08 01 Estar sempre aberto aos novos conhecimentos EF 04 01 Respeito EF 07 01 Participar das atividades escolares EF 09 01 Especificidade da profissão (saberes, relações, etc.). EF 05 01

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De acordo com o quadro 04, verificamos que esse grupo tem noção dos saberesnecessários à docência de Educação Física, e percebemos que a heterogeneidade deconsiderações lhe é característico, porém não explicitados devidamente. Entendemos, no entanto,que os saberes profissionais são conhecimentos mobilizados e empregados na prática docentecotidiana, que se originam e que servem para dar significado às circunstâncias que lhe sãopeculiares. Devem delinear, além de seu perfil e inquietude profissional, a estruturação das aulas,pois o conhecimento direciona toda a docência e seus reais questionamentos (o que é ensinar,para que ensinar, como se aprende, para que se aprende) cotidianos avalizam a pesquisa e aformação continuada. Garcia (1999) define esses conhecimentos não somente como áreas dosaber pedagógico (conhecimentos teóricos e conceituais), mas também como áreas do saberfazer (esquemas práticos de ensino), assim como de saber por que (justificação da prática).Esses saberes (esquemas, regras, hábitos, procedimentos, tipos, categorias, etc.) não são inatos,mas produzidos pela socialização, isto é, através do processo de imersão dos indivíduos nosdiversos mundos socializados (famílias, grupos, amigos, escolas, etc.), nos quais eles constroem,em interação com os outros sua identidade pessoal e social (Tardif, Raymond, 2000). Os saberesdo professor, longe de serem fundamentados unicamente no trabalho em sala de aula, derivam,em grande parte, de pré-concepções do ensino e da aprendizagem transmitidas da história esco-lar (formação inicial). As experiências escolares anteriores e as relações determinantes comprofessores contribuem também para moldar a identidade pessoal dos docentes e seuconhecimento prático.

Quadro 5 - O que é ensino?

Quadro 6 - O que é ensinar?

Diante do exposto nos quadros 05 e 06 percebemos que ensinar é transmitirconhecimentos para alguém e ensino significa tudo aquilo que aprendemos de novo. Entendemos,no entanto, que o ensino e o ensinar envolvem procedimentos que o professor desenvolve deacordo com a sua realidade escolar, na troca de experiências, na mediação dos conhecimentospara alguém e ensino significa tudo aquilo que aprendemos de novo. Entendemos, no entanto,

Questão 05 Para você o que é ensino? E o que é ensinar?

Categoria Professores Total Transmitir conhecimentos EF 04 / EF 07 / EF 09 03 Troca de conhecimentos EF 03 / EF 08 02 É a forma de aprender algo novo, EF 01 01 É assimilar tudo que é passado (teoria & prática) EF 02 01 Sistematização dos saberes EF 05 01 Formação de indivíduos para a vida EF 06 01

Categoria Professores Total Repassar o conhecimento, aprendendo em conjunto. EF 01 / EF 02/ EF 06 03 Gostar do que executa EF 01 / EF 03/ EF 07 03 Ter paciência EF 01 / EF 05 02 É um dom EF 04 01 Sistematização dos saberes EF 09 01 Proporcionar situações de aprendizagem EF 08 01

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que o ensino e o ensinar envolvem procedimentos que o professor desenvolve de acordo com asua realidade escolar, na troca de experiências, na mediação dos conhecimentos, pois quemensina também aprende, na construção cultural daquela comunidade onde os alunos convivem.Januário (1996) entende o ensino como uma atividade intencional e estruturada de um professorno seio do processo formativo, com vista à consecução de determinados objetivos pedagógicos.Compreendemos, também, que o ensinar engloba o estudar, o pesquisar, o buscar, o socializar, atroca de experiências e vivências. O ensino é o processo que englobas as ações educativas, edeve ser constantemente realimentado, repensado, revisado e operacionalizado. Ambas assituações (ensino/ensinar) aglutinam particularidades que os mesmos ainda não identificam,pois somente se adquire com o ato de pesquisar, estudar e buscar. Não são meras definições quedefinem o papel das ações, mas suas atitudes que as fundamentam. Percebemos que devembuscar a compreensão de ensino e do ensinar, seja refletindo sua ação (a prática docente) a partirda teorização (o estudo e a pesquisa), pois são situações importantíssimas que devem serconstantemente redimensionadas, entendidas e refletidas, e não se fecham em pequenasdefinições.

Quadro 7

De acordo com o exposto no quadro 07, constatamos que o aprender se resumeao assimilar, absorver, adquirir, conhecer, apropriar-se, adaptar-se, dando ênfase às situaçõescomuns do cotidiano escolar, o que não está totalmente errado. Entendemos, contudo, que oaprender engloba a compreensão daquilo que está sendo construído, contextualizar e aplicar noseu cotidiano, pois é dentro do seu contexto social, no qual o indivíduo está culturalmente inserido,que se deve operacionalizar o conteúdo aprendido, trazendo para a sua realidade. O tempo deaprendizagem dos alunos depende muito das características de instrução do professor e daqualidade e adequação das tarefas proporcionadas (Januário, 1996). É conceber o ensinodiferentemente do que vem sendo desenvolvido, é dar sentido ao que foi entendido, ou no sentidoamplo, é transcender. Paulo Freire (1997) em seu livro Pedagogia da Autonomia nos demonstraque: a) Aprendemos a vida toda. Não há momento próprio para aprender; b) Aprender não é acumularconhecimentos. Aprendemos determinado conteúdo não para acumular conhecimentos, datas,informações, mas para entender como aconteceu todo o processo; c) O importante é aprender apensar (a realidade, não o pensamento), aprender a aprender; d) É o sujeito que aprende atravésda sua experiência. Não é um coletivo que aprende; e) Aprende-se o que é significativo para o

Questão 06 Para você o que é aprender?

Categoria Professores Total

Aquisição de novos conhecimentos EF 02 / EF 04 / EF 07 03 Buscar informações EF 01 / EF09 02 Conhecer algo novo EF 05 01 É apropriar, compreender modificar, discordar e melhorar os conhecimentos.

EF 08 01

Sistematização dos saberes EF 03 01 Formação de indivíduos para a vida EF 06 01

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projeto de vida da pessoa. Aprende-se quando se tem uma concepção de vida; f) É preciso tempoara aprender e para sedimentar informações. Não dá para injetar dados e informações na mentede ninguém. Exige-se também disciplina e dedicação e g) Quem ensina aprende ao ensinar equem aprende ensina ao aprender.

Quadro 8

Conforme o quadro 08, notamos que a avaliação serve para avaliar odesenvolvimento do aluno, suas aptidões, se ele aprendeu ou não, se os objetivos foram alcançados.Compreendemos, entretanto, a avaliação como um processo dialógico e cooperativo, através doqual educandos e educadores aprendam sobre si mesmo neste processo. É urgente encaminhá-la a partir da efetiva relação professor-aluno, em prol do bem da educação em nosso país,contrapondo-se à concepção sentenciva adotada até hoje (Hoffmann, 2000). A avaliação doprocesso ensino-aprendizagem em Educação Física serve para verificar se realmente o alunoaprendeu, onde se pretende chegar e como chegar ao que tange à ação motora, objetivando queo aluno vivencie, aprenda e aplique no seu cotidiano, servindo também para rever a atuaçãoprofissional, desde que os professores tenham o entendimento claro e objetivo em suasconcepções. A avaliação é essencial à educação. Compreender e reconduzir a avaliação numaperspectiva construtivista numa ação consensual nas escolas e universidades objetivando o sentidoda revisão de sua prática. Questionar-se e questionar é fundamental para uma perspectivaconstrutivista de avaliação (Hoffmann, 2000).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do entendimento das análises percebemos que os entrevistados anseiampor um processo de formação contínua diferente do que proporcionado atualmente nos meiosescolares, pois diante da necessidade de rever conceitos e procedimentos, o início é o estopimpara mudanças procedimentais, a partir do entendimento, da busca, a estruturação da teoria tãodisseminada nos meios educacionais, a ressignificação, a transcendência. Uma educaçãorealizada com base em princípios do senso comum só poderá estar a serviço de uma perspectivasocial dominante. A prática educacional não poderia, nem deveria, de forma alguma, atuar combase em elementos do senso comum, pois tem por objetivo formar consciências e acreditamos,

Questão 07 Para que serve a avaliação do processo ensino-aprendizagem em Educação

Física?

Categoria Professores N° Aferir conhecimentos EF 01 / EF 02 / EF 07 / EF 08 / EF 09 05 A metodologia do professor EF 01 / EF 02 / EF 05 / EF 07 / EF 08 05 Dificuldades dos alunos EF 01 / EF 06 02 Considerar se os objetivos foram alcançados EF 03 / EF 09 02 O processo ensino-aprendizagem EF 01 / EF 04 02 Diagnosticar os alunos e possíveis talentos esportivos EF 02 01

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consciências críticas, capazes de compreender, propor e agir em função de novas perspectivasde vida. Por isso, é preciso filosofar e ultrapassar os limites do senso comum como entendimentoe como orientação para a nossa prática (Luckesi, 1994), ocasionando um processo reflexivo.Para Contreras (1990, apud Libâneo, 1998) qualquer processo de reflexão que se cultive, versaobrigatoriamente a analogia entre este conjunto de pensamentos, ações a realizar e as querealmente se realizam. O que a reflexão pretende é sempre melhorar estas relações. Para quepossa exercer o seu papel, o professor deve ser dono de conhecimentos e habilidades satisfatórios,e assim contribuir com o aluno no processo de promoção cultural. Conhecimentos e habilidadesque, num processo contínuo, o docente vai construindo, reformulando, melhorando, e acabamservindo de base conceitual à sua práxis. Portanto, sugestiona-se que um processo de formaçãocontinuada seja implementado gradativamente no referido município onde, através de reuniõesperiódicas, os docentes estudem, expressem suas inquietações, compartilhem vivências,socializem saberes, e reconstruam suas bases conceituais apoiada no entendimento da suaatuação profissional enquanto professor de Educação Física.

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