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Fórum Estadual de L UTA PELA REFORMA URBANA Relatório sobre a situação do Direito à Moradia Digna no Estado do Rio de Janeiro FELRU RJ. 1 Relatório de situações de violação do Direito à Moradia Digna no Estado do Rio de Janeiro 26 de Maio 2006

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Fórum Estadual de LUTA PELA REFORMA URBANA

Relatório sobre a situação do Direito à Moradia Digna no Estado do Rio de Janeiro – FELRU RJ.

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Relatório de situações de violação do Direito à

Moradia Digna no Estado do Rio de Janeiro

26 de Maio 2006

Fórum Estadual de LUTA PELA REFORMA URBANA

Relatório sobre a situação do Direito à Moradia Digna no Estado do Rio de Janeiro – FELRU RJ.

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FELRU - GRUPO DE TRABALHO DE MORADIA CMP – Central de Movimentos Populares.

Comitê Político de Saneamento Habitação e Meio Ambiente da Baixada Fluminense Comitê Social do PAN

CONAM - Confederação Nacional de Associações de Moradores FASE - Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional

Frente Estadual Contra Remoção Fundação CDDH Bento Rubião

UNMP - União Nacional por Moradia Popular

ORGANIZAÇÃO CMP - Marcelo Braga

Comitê Social do PAN – Inalva Mendes Brito CONAM - Maria Lucia Salino

FASE - Mônica Ponte, Regina Ferreira Frente Estadual Contra Remoção - Virginia Murad

Fundação CDDH Bento Rubião - Loïc Geronnez, Valério da Silva

FELRU-RJ Associação Moradia Digna em Área Central

Associação de Moradores do Tijuaçu e Mata Machado - Alto da ao Vista Associação de Moradores de Vila Autódromo CMP/RJ - Central de Movimentos Populares

CONAM/RJ - Confederação Nacional de Associações de Moradores Cooperativa Habitacional de Esperança

Cooperativa Habitacional de Ipiíba Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Petrópolis

FASE - Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional Federação das Associações de Moradores do Rio - FAM-Rio

Federação das Associações de Moradores de Estado do Rio de Janeiro - FAMERJ FEMAB - Federação de Associações de Moradores de Belford Roxo

Fórum Popular de Acompanhamento do Plano Diretor Fundação Centro de Defesa dos Direitos Humanos Bento Rubião

IBASE - Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas MAB - Federação de Associações de Moradores de Nova Iguaçu

Movimento de Lutas nos Bairros e Favelas - MLB Movimento Nacional da Vontade Popular

Mutirões de Nova Iguaçu Ocupação Chiquinha Gonzaga

Ocupação Mem de Sá Ocupação Zumbi dos Palmares

SENGE - Sindicato de Engenheiros do Estado do Rio de Janeiro SARJ - Sindicatos de Arquitetos e Urbanistas do Rio de Janeiro

União Brasileira de Mulheres UNMP/RJ - União Nacional por Moradia Popular

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APRESENTAÇÃO

O Direito à Moradia, um direito humano protegido por diversos instrumentos internacionais, está garantido na Constituição Federal do Brasil, no seu artigo 6º, que trata dos direitos sociais básicos dos cidadãos brasileiros. Esse reconhecimento é fruto das lutas dos movimentos sociais do país que, na década de 80, lutaram pela redemocratização; organizaram-se propondo Emendas Populares para uma nova Constituição Democrática (promulgada em 1988), que incorporou o conceito de função social da cidade e de função social da propriedade; e que influenciaram a elaboração, posteriormente, das Constituições dos Estados e dos Municípios. Assim, o direito à moradia também encontra-se garantido na Constituição do Estado do Rio de Janeiro, no seu artigo 8º, bem como em muitas Leis Orgânicas dos Municípios do Estado do Rio de Janeiro. Contudo, a conquista dos direitos através das leis não implica, necessariamente, sua concretização. Embora as Constituições garantam os direitos básicos universais à existência humana, no Brasil e, em especial, no Estado do Rio de Janeiro, esses direitos são, na prática, constantemente violados, não exercendo o estado o seu papel de promotor de políticas públicas que garantam a efetividade desses direitos. Dessa forma, se por um lado av ançamos na conquista de leis que reconhecem os direitos fundamentais à existência humana, por outro lado, esses direitos são negados para a maior parte da população que, no seu dia a dia, é espoliada e sofre com a falta de moradia adequada, de transporte, de educação, de saúde, de trabalho, de cultura e lazer. O Estatuto da Cidade, Lei Federal 10.257/01 de 10 de julho de 2001, define como deve ser tratada a política urbana nos municípios. Seu objetivo é garantia da função social da propriedade e da cidade, construindo uma cidade com garantia de direitos para todos os cidadãos e todas as cidadãs, sem exclusão ou espoliação. Assim, o capítulo IV garante a gestão democrática, quando define que o planejamento das cidades deve incluir como obrigatórias: a participação da população, o controle direto sobre o projeto e, conseqüentemente, o pleno exercício da cidadania.

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Participar é um Direito A sociedade deve assumir o seu papel de forma efetiva, viabilizando meios e canais de atuação participativa. A luta dos movimentos sociais pela efetivação do direito à cidade deve ser entendida como uma luta por um direito coletivo, afastando qualquer tentativa de discriminação ou exclusão, aí incluída a exclusão territorial. Dessa forma, este dossiê tem como objetivo denunciar tentativas de exclusão territorial e violações ao direito à moradia digna, como parte dessa exclusão, que obriga grandes contingentes de população a viverem situações constrangedoras infligidas pelo próprio poder público, quando este se une em parceria aos grandes capitais imobiliários e aos empreendimentos privados, em detrimento do apoio à população desfavorecida e dos grupos mais vulneráveis do Estado. Nossa luta se dá pela busca da igualdade social e do alcance do pleno exercício do direito à cidade e à cidadania. Esse direito engloba também o direito de intervir efetivamente no planejamento da cidade. Para isso, a mobilização da sociedade e, em especial, das parcelas atingidas pelas violações e pela brutalidade do sistema é fundamental. O Fórum Estadual de Reforma Urbana, composto pela sociedade civil organizada (associações e entidades representativas de moradores, favelas, sindicatos, entidades técnicas, ambientais, ongs, entre outras) se organiza tendo como objetivo estar presente na discussão das ações que tenham impacto sobre a cidade. A mobilização e a luta dos movimentos organizados é o caminho para as mudanças com as quais esperamos alcançar a cidade que queremos, uma cidade com justiça social, democrática e participativa. Problemas Estruturais: • SEGREGAÇÃO TERRITORIAL • MERCADO IMOBILIÁRIO EXCLUDENTE • AUSÊNCIA DE SANEAMENTO AMBIENTAL Perversidades que se aliam aos problemas estruturais, de uma forma indissociável: a) Informalidade. b) Não inserção do ponto de vista ambiental. c) Precariedade dos serviços públicos de saneamento ambiental. d) Exclusão territorial.

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e) produção de habitações informalmente, sem condições muitas vezes adequadas, tendo em vista a falta de recursos e apoio técnico. Por quê? 1. Impossibilidade de a população conseguir ter acesso à moradia digna. 2. Desenvolvimento travado do mercado habitacional: A classe média se apodera de cerca de 80% do dinheiro subsidiado - FGTS - da política habitacional. A Vila do PAN, por exemplo, foi construída com dinheiro do FAT - Fundo de Amparo ao Trabalhador. 3. Mercado privado: Financiamento privado e especulativo, voltado para patamares de renda mais alta. 4. Paralisação, descontinuidade e déficit no acesso da população ao saneamento ambiental. Saneamento O déficit no acesso da população ao saneamento ambiental ainda é bastante importante. Quando comparamos acesso a serviço de saneamento com renda verificamos que os maiores déficits na acessibilidade aos serviços de saneamento concentram-se nos 40% mais pobres, que vivem tanto nas áreas rurais como na periferia das grandes metrópoles em condições precárias de habitação. A ausência de moradia legal implica na maior parte dos casos em ausência de acesso a serviços adequados de abastecimento de água e esgotamento sanitário. Ocupações: A ocupação é a regra. Não é um desapego à lei: as pessoas não têm outra alternativa para conseguirem um moradia. A população de baixa renda continua adensando as favelas existentes ou criando novas. Ou, ainda, ocupando a periferia, alongando o tecido urbano, pela construção irregular também nas áreas periféricas, ampliando-se os problemas da falta de transporte e mobilidade, de acessibilidade, de saneamento ambiental, de equipamentos públicos urbanos, entre outros. Por outro lado As ações com vistas à regularização fundiária são tímidas e percebe-se uma certa resistência daqueles poucos que têm acesso a terra à regularização fundiária das áreas informais. A regularização das áreas informais é um obstáculo à manutenção de privilégios.

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Todo arcabouço legal foi montado de forma a dificultar o acesso de uma população significativa à estrutura fundiária e à ordem jurídica. Por isso, a reforma urbana envolve a reforma do planejamento urbano e do direito urbano. O que fazer? Há uma urgência no enfrentamento dos problemas decorrentes da produção informal da cidade. É preciso construir uma prática urbana que atenda ao conjunto de produção da cidade e, em especial, aos setores mais desfavorecidos e excluídos. O conjunto da produção da cidade tem de ser discutido a partir da função social da propriedade, conforme determinam: a Constituição Federal e o Estatuto da Cidade. Os assentamentos irregulares têm de fazer parte da cidade. Dessa forma, é preciso olhar para a cidade, reconhecer a diversidade de usos que se desenvolvem e as desigualdades sociais que se expressam no território, para repensar e intervir no padrão de crescimento da cidade, provendo condições de vida digna de modo que o DIREITO À CIDADE se torne uma realidade para todos e para todas. O Fórum Estadual de Luta pela Reforma Urbana - Rio de Janeiro O Fórum Estadual de Luta pela Reforma Urbana do Rio de Janeiro (FELRU) foi constituído a partir do Comitê Estadual da Marcha da Reforma Urbana e pelo Direito à Cidade, organizado em 2005. Está formado por mais de 25 entidades, que vem se reunindo regularmente para levar a luta pela reforma urbana e o direito à cidade no Estado. A reforma urbana é mais do que nunca necessária e, são seus princípios, de realização da função social da cidade e da propriedade, de priorização dos investimentos nas áreas carentes, de gestão democrática e participativa das cidades que orientam as propostas do FELRU. Situação Geral no Estado do Rio de Janeiro A Moradia no Estado do Rio de Janeiro A situação da moradia no Estado do Rio de Janeiro reflete bem a situação em que se encontra o país, um país onde 10% da população concentra 75% da nossa riqueza, que tem um déficit habitacional de mais de 7 milhões de moradias e que, num universo de aproximadamente 45 milhões de moradia, mais de 10 milhões são consideradas inadequadas, pela falta de, ao menos, um dos serviços

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básicos (energia elétrica, rede de abastecimento de água, rede coletora de esgoto ou fossa séptica, ou lixo coletado direta ou indiretamente). Déficit Habitacional e inadequação das moradias no estado Os estudos sobre o déficit habitacional e a inadequação das moradias foram desenvolvidos pela Fundação João Pinheiro, em 2000. O déficit habitacional é entendido como a necessidade de construção de novas moradias, seja em função de reposição do estoque de domicílios existente, seja em função do incremento desse estoque. A inadequação está relacionada aos problemas na qualidade de vida dos moradores: carência de serviços de infra-estrutura, adensamento excessivo, inadequação fundiária urbana, depreciação dos domicílios e inexistência de unidade sanitária domiciliar interna. Segundo as estimativas da Fundação João Pinheiro, válidas para o ano de 2000, o déficit habitacional no Estado do Rio de Janeiro atinge cerca de 505.000 moradias (que representam, percentualmente, 11,9% do total dos domicílios particulares permanentes existentes no estado), sendo 390.000 na Região Metropolitana. O componente do déficit com maior peso é o de famílias conviventes, com cerca de 338.000 unidades, seguido pelo ônus excessivo com aluguel, com 108.000 unidades. De forma semelhante aos números para o Brasil, o déficit está concentrado (80%) nas faixas de renda até 3 salários mínimos. Esses números mostram a gravidade do problema habitacional no Estado, levando a um crescimento permanente das favelas e ocupações de terras ou de imóveis existentes, dada a não existência de políticas públicas para a viabilização do acesso à terra e à moradia. Na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, a taxa de crescimento das “favelas” (o setor subnormal, segundo a terminologia do Censo do IBGE) é seis vezes maior do que nas demais áreas da cidade (o setor normal). A Região Metropolitana, que concentra 80% da população do estado, concentra também a maior parte do déficit habitacional, particularmente o componente do ônus excessivo com aluguel, que é mais importante na RMRJ que no restante do estado. Se, em termos quantitativos o déficit está concentrado na metrópole, isso não significa que a situação no interior do estado seja mais favorável. Pelo contrário, verifica-se que os municípios rurais do interior apresentam grande precariedade no seu estoque de moradias, com o déficit atingindo cerca de 20% do parque domiciliar existente em alguns casos. É nesses municípios que também encontramos maior relevância do componente habitação precária, o que mostra

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a falta de alternativas e de recursos para a construção segura e saudável de habitações. Também apresenta quadro de extrema gravidade a inadequação das moradias existentes, principalmente no que diz respeito ao acesso à infra-estrutura. Cerca de 320.000 unidades habitacionais apresentam deficiências de acesso a pelo menos um dos serviços básicos (energia elétrica, abastecimento de água, esgotamento sanitário e coleta de lixo). Como ocorreram melhorias significativas no acesso à energia, a maior parcela da inadequação de infra-estrutura refere-se aos serviços de saneamento, particularmente o esgotamento sanitário, o que implica ameaças à saúde da população. A ausência de políticas efetivas de ampliação da acessibilidade ao saneamento leva a que, mesmo nos casos em que existem redes, ocorra ainda uma situação de precariedade, já que as redes locais muitas vezes foram implantadas pelos próprios moradores, sem respeito às técnicas corretas. É comum, nos assentamentos populares, ver redes de água passando por dentro de "valões" ou "valas negras", canais que levam o esgoto doméstico até os rios mais próximos. Na época das chuvas (geralmente no verão) ocorre o retorno das águas contaminadas para dentro dos domicílios, ocorrendo surtos de leptospirose e outras doenças de contaminação hídrica. Um problema importante e recorrente, para o qual não existem estatísticas, é o das enchentes periódicas, causando deslizamentos de encostas e alagamentos de bairros populares periféricos. Esse problema é reflexo da situação climática, principalmente da região metropolitana, com chuvas fortes no verão, e também do processo de urbanização que, principalmente nos assentamentos populares, não respeitou os limites naturais à ocupação urbana. Criaram-se barreiras ao escoamento superficial das águas, desmatando encostas e matas ciliares e agravando a já precária capacidade de drenagem dos morros e das áreas de baixada. A época das chuvas é temida pela população pelas suas conseqüências nas ameaças à sua segurança e à sua integridade física. Completando o breve quadro da situação habitacional do estado, o estudo da Fundação registra cerca de 540.000 domicílios urbanos particulares que, na data do recenseamento, estavam desabitados. Ou seja, mais que o déficit apurado. Portanto, os dados revelam como é urgente e necessário uma política pública urbana que regule a propriedade privada fazendo ela cumprir a sua função social e que combata as graves distorções encontradas em nossas cidades.

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ESTIMATIVAS DO DÉFICIT HABITACIONAL - 2000

DÉFICIT HABITACIONAL PERCENTUAL DO TOTAL DOS DOMICÍLIOS PARTICULARES PERMANENTES

ESPECIFICAÇÃO Total urbano rural Total urbano rural

Norte ... 411.625 ... ... 20,2 ...

Nordeste 2.631.790 1.729.057 902.733 23,0 21,2 27,5

Sudeste 2.412.460 2.257.496 154.964 11,9 12,2 8,8

Rio de Janeiro 505.287 494.199 11.088 11,9 12,1 7,1

RM Rio de Janeiro 390.805 388.319 2.486 11,7 11,7 9,3

Sul 690.312 589.144 101.168 9,6 9,9 7,8

Centro-Oeste 488.482 427.622 60.860 15,4 15,6 14,5

Brasil (1) 6.656.526 5.414.944 1.241.582 14,8 14,5 16,5

Total das RMs (2) 1.951.677 1.891.356 60.321 13,7 13,7 14,4

Demais áreas (1) 4.704.849 3.523.588 1.181.261 15,3 15,0 16,6 Fonte: Dados básicos: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Sinopse Preliminar do Censo Demográfico, 2000; Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), 1999 (microdados) Elaboração: Fundação João Pinheiro (FJP), Centro de Estatística e Informações (CEI)

CRITÉRIOS DA INADEQUAÇÃO DOS DOMICÍLIOS URBANOS DURÁVEIS - 2000

ESPECIFICAÇÃO ADENSA- MENTO EXCESSIVO

INADEQUAÇÃO FUNDIÁRIA URBANA

CARÊNCIA DE INFRA- ESTRUTURA

INEXISTÊN-CIA DE UNIDADE SANITÁRIA

INADEQUAÇÃO POR DEPRECIAÇÃO

Norte 184.822 56.346 1.165.622 162.865 20.124

Nordeste 385.916 432.270 4.010.073 714.738 195.798

Sudeste 1.133.647 650.406 2.155.271 315.379 505.510

Rio de Janeiro 214.618 118.741 751.208 43.630 213.392

RM Rio de Janeiro 176.876 99.561 519.482 30.454 120.635

Sul 198.062 325.923 1.469.648 179.154 100.735

Centro-Oeste (3) 122.492 43.799 1.460.462 94.565 14.502

Brasil 2.024.939 1.508.744 10.261.076 1.466.701 836.669

Total das RMs 985.852 760.245 2.525.443 359.738 367.674 Fonte: Dados básicos: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Sinopse Preliminar do Censo Demográfico, 2000; Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), 1999 (microdados) Elaboração: Fundação João Pinheiro (FJP), Centro de Estatística e Informações (CEI)

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1. SITUAÇÕES DE VIOLAÇÃO DO DIREITO HUMANO À MORADIA DIGNA E AS DENÚNCIAS NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO A realidade da situação da moradia no Estado do Rio de Janeiro é, como se viu, alarmante. O quadro de conflitos no estado nestes últimos anos aumentou consideravelmente, ampliando-se as situações de violação do direito humano à moradia digna. Quadro este que levou a diversas denúncias, encaminhadas pelos movimentos sociais organizados ao Fórum Nacional de Reforma Urbana e à Frente Nacional de Saneamento Ambiental. Estas denúncias foram apresentadas à Plataforma Nacional de Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (DHESCA) em 2005 e durante a reunião de planejamento e avaliação do Projeto Relatores Nacionais em DHESCA, realizada no início do ano de 2006, em Brasília. Vindo em defesa das comunidades fragilizadas e destituídas, a Relatoria Nacional do Direito à Moradia Adequada agendou Missão ao Rio de Janeiro para reconhecimento da situação, acatamento de denúncias e realização de audiência pública, com entidades e grupos atingidos por quaisquer tipos de violações ao direito à moradia digna. Assim, o Fórum Estadual de Luta pela Reforma Urbana aglutinou quatro denúncias de violação no estado e os respectivos relatórios, produzidos pelas comunidades vítimas das situações e suas assessorias, neste breve documento. São as seguintes as denúncias que este relatório pretende apresentar a partir de agora: 1. falta de saneamento ambiental na Baixada Fluminense; 2. violações do direito de moradia em uma comunidade de Jacarepaguá, situada em área de influência dos jogos Pan-Americanos: Vila Autódromo; 3. violações do direito à moradia em comunidades ameaçadas pelo Ministério Público, sob a alegação de ocuparem áreas de preservação; 4. tentativas de remoção de moradores de ocupações em prédios públicos na área central da cidade do Rio de Janeiro.

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1.1. SITUAÇÃO DE SANEAMENTO NA BAIXADA FLUMINENSE

ENCHENTES E ALAGAMENTOS NA BAIXADA FLUMINENSE Vivemos em um país de dimensões continentais, com um produto interno bruto (PIB) o qual nos coloca entre as doze maiores potências mundiais e, não obstante, somos o segundo país mais desigual do mundo, com indicadores sociais extremamente precários. Embora o Brasil disponha hoje de 12 (doze) regiões metropolitanas com mais de 3 (três) milhões de habitantes cada uma e tenha vivido um acelerado e desigual processo de urbanização desde a década de 30 - sendo efetivamente um país que concentra 80% da sua população nos centros urbanos - a realidade de acesso a serviços e direitos providos por políticas urbanas ainda é bastante deficitária. No entanto, esse déficit não é homogêneo em relação a toda população. São aquelas que vivem nas periferias urbanas e nas favelas, em sua maioria pessoas negras, as quais estão mais vulneráveis à desigualdade e à violação de direitos. Na região metropolitana do estado do Rio de Janeiro (RMRJ) há a Baixada Fluminense, uma região que expressa as condições de segregação e desigualdade de nossa sociedade. Uma das áreas que mais expressam a desigualdade vivida pelas populações pobres e periféricas relaciona-se à temática de saneamento ambiental. O Banco Mundial calcula que a maior parte das doenças de veiculação hídrica, entre elas a diarréia e esquistossomose, poderia ser evitada em até 22% caso as pessoas tivessem acesso à água limpa. Por conta da falta da universalização do serviço de saneamento ambiental, dados do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (1998) demonstram que, em média, 65% das internações hospitalares de crianças menores de 10 anos estão associadas à falta de saneamento básico, sendo esta também a principal responsável pela morte por diarréia de menores de 5 (cinco) anos no Brasil. A FUNASA aponta que 15 crianças de 0 a 4 anos morrem no Brasil por dia pela falta de saneamento – ou seja, uma criança de 0 a 4 morre a cada 96 minutos. A Baixada Fluminense abriga três milhões e meio de habitantes – dos oito milhões que vivem na região metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ) – e concentra uma população que, em média, tem renda familiar de até dois salários mínimos1, é negra, jovem e feminina em sua maioria. Nos oito municípios2 que conformam a

1 O salário mínimo brasileiro está, atualmente, em R$ 350,00 (aproximadamente U$ 150). 2 Conformam essa região os seguintes municípios: Duque de Caxias, Mesquita, Nova Iguaçu, Belford Roxo, Nilópolis, São João de Meriti, Queimados e Japeri.

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região da Baixada, a realidade dos serviços de saneamento ambiental é precária em todos os seus componentes3 e, particularmente, no que se refere à prevenção de enchentes na região. Neste sentido, a região, outrora caracterizada pela existência de manguezais e rebaixada em relação ao nível do mar sofreu acelerada, adensada e desordenada ocupação, abandonada de qualquer forma de provisão pública que ordenasse o espaço ou o dotasse de infra-estrutura prévia.

Nossa concepção acerca do problema das enchentes e alagamentos na Baixada Fluminense

O problema das enchentes e dos alagamentos na Baixada Fluminense não é resultado da natureza, do volume de chuvas, da sua localização em relação ao nível do mar ou da ação natural dos ventos. Por mais que estes sejam fatores relevantes, o que está em questão é o formato de organização e planejamento

3 Teoricamente compõem o conceito de saneamento ambiental políticas democráticas, com controle social e integradas nas áreas de: (i) água (adução, tratamento, distribuição); (ii) Esgotamento (coleta, tratamentos, disposição); (iii) Urbanização (pavimentação, micro-meso e macro drenagem, com dragagem dos rios e afluentes); (iv) resíduos sólidos (coleta seletiva, tratamento e disposição, combate de vetores).

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de nossas cidades, tendo em vista que existem soluções técnicas para todos esses fenômenos. Há, no entanto, uma forte naturalização quanto à violação desses direitos – como se fosse natural ocorrerem todos os anos inundações na região. Este é um problema muito grave, pois afeta milhares de pessoas proporcionando uma diversidade de danos, como a grande incidência de doenças de veiculação hídrica, ocasionada por contato da população com esgoto, a perda ou a danificação de casas e de utensílios domésticos e até mesmo a morte. Cabe ressaltar que a população afetada não é só a que se encontra nas margens dos rios, pois diversas residências sofrem com a ausência ou a precariedade da rede de drenagem existente. Outro segmento bastante afetado é o dos pescadores de peixes, caranguejos e siris, que deixaram de obter seu sustento dos rios e mangues da Baixada. Os pescadores sobreviventes, além do sofrimento obtido com a diminuição da quantidade e da diversidade de peixes, lutam para poder alcançar a Baía de Guanabara, tendo em vista que os rios da Baixada estão mortos e o processo de assoreamento coloca em risco a possibilidade de pescar na Baía. O caso da Associação dos Pescadores do Porto da Chacrinha em Duque de Caxias é dramático, tendo em vista que se situam a 10 minutos de barco, do canal de Chacrinha, no mangue até a entrada da Baía, e têm dificuldades para alcançá-la pela falta de água no canal. O assoreamento dos rios e canais e a ausência ou a precariedade da rede de drenagem, associados à ocupação ribeirinha para fins industriais e de moradia, ao desmatamento, à inexistência de estações de tratamento de esgotos, à crescente impermeabilização do solo com o asfaltamento das vias, juntamente com a coleta e destino inadequado do lixo, provocam enchentes e alagamentos e colocam grande parte da população da Baixada Fluminense em situação de risco sócio-ambiental, provocando mortes, perdas materiais, aumento de doenças e má qualidade de vida. DESCRIÇÃO DOS PONTOS CRÍTICOS

Muitos são os pontos de enchentes e alagamentos na Baixada Fluminense, em especial, nas áreas periféricas, ainda que nos centros das cidades na região também sejam constantes com grandes prejuízos para as economias locais. Abaixo, passamos a descrever alguns dos pontos mais críticos de enchentes na Baixada Fluminense e no município de Magé, por conta de sua proximidade geográfica com a região e pelo forte impacto das chuvas nos últimos anos. Este

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trabalho de identificação, bem como da estimativa de pessoas atingidas, foi realizado pelas lideranças do Comitê Político de Saneamento, Meio Ambiente e Habitação da Baixada Fluminense, residentes nos respectivos municípios.

MUNICÍPIO: São João de Meriti

LOCALIZAÇÃO SITUAÇÃO IMPACTOS Bairro Jardim Paraíso

Assoreamento do Canal Alberto de Oliveira e obstrução da comporta do Canal Auxiliar do Rio Sarapuí

Cerca de 500 famílias residentes no bairro

Bairros Jardim Nóia e Vila São João

Assoreamento do Rio Sarapuí e falta da rede de drenagem nos bairros

Todo o bairro do Jardim Nóia e parte da Vila São João com milhares de famílias e casas próximas ao rio

Praça da Bandeira

Alagamento das casas do entorno do Valão da Rua Minas Gerais por conta do assoreamento do Canal São Paulo

Cerca de 200 famílias atingidas

MUNICÍPIO: Belford Roxo

LOCALIZAÇÃO SITUAÇÃO IMPACTOS Bairros Lote XV, Santa Marta, Vila Pauline, Vale do Ipê e Parque Amorim

Assoreamento do Canal do Outeiro no Lote XV e não funcionamento das bombas da comporta do Canal

Milhares de moradores residentes nos bairros

Bairros Babi, Santa Maria e São Bernardo

Alagamento do Iguaçu Botas no bairro Babi com impacto nos bairros próximos

Cerca de 1000 famílias residentes nesses bairros

Bairro Santa Amélia

Assoreamento no Canal Santa Amélia

Cerca de 300 famílias

Bairros Heliópolis, Parque das Palmeiras e Xavantes

Assoreamento do Canal Maxambomba

Cerca de 300 famílias

Bairro Guaraciaba

Desvio no Rio da Prata para atender aos interesses da empresa de transporte Itapemirim,

Cerca de 100 famílias

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de transporte Itapemirim, causando a enchente no bairro

Bairros Jardim Redentor, Jardim Gláucia, Santa Teresa, Calundu e Guaxa

Assoreamento do Rio Sarapuí, na divisa com o município de São João de Meriti

Cerca de 500 famílias residentes nesses bairros

MUNICÍPIO: Duque de Caxias

LOCALIZAÇÃO SITUAÇÃO IMPACTOS

Bairro Jacatirão Assoreamento do Rio Jacatirão

Cerca de 1.500 famílias

Bairro Pilar Assoreamento do Rio Calombé agravada pelas obras de duplicação da Av. Pres. Keneddy

1.000 famílias atingidas diretamente e cerca de 2.000 indiretamente no restante do bairro

Bairro Vila Maria Helena (próximo Rio-Magé)

Assoreamento da Vala Sete

Cerca de 300 famílias

Bairro Parque Paulista Falta de saneamento no bairro com grande concentração de residências

Cerca de 700 famílias

MUNICÍPIO: Nova Iguaçu

LOCALIZAÇÃO SITUAÇÃO IMPACTOS Bairro de Comendador Soares nos sub-bairros de Ouro Preto, Ouro Fino, Ouro Branco e Ouro Verde

Assoreamento do Rio Botas

Cerca de 6.000 famílias dos sub-bairros de Comendador Soares

Bairros Bom Jesus e Parque Boa Ventura

Assoreamento do Rio Gabenga que deságua no Rio Guandu

Cerca de 5.000 famílias desses bairros

Bairro da Grama Assoreamento do Rio das Velhas

Cerca de 3.000 famílias

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MUNICÍPIO: Nilópolis

LOCALIZAÇÃO SITUACAO IMPACTOS Bairro Cabral Assoreamento do Rio Pavuna Meriti Cerca de 50 famílias Bairro Nova Olinda

Assoreamento do Canal do Pavuna Meriti Cerca de 20 famílias

MUNICÍPIO: Mesquita

LOCALIZAÇÃO SITUACAO IMPACTOS Bairro Jacutinga Assoreamento do Rio da Prata entre os

municípios de Mesquita e Nova Iguaçu Cerca de 260 famílias atingidas diretamente (10% do total) com grandes prejuízos materiais e 2.340 famílias indiretamente de todo o bairro

Bairro Banco de Areia

Alagamento da Praça Pindorama em função da ausência de drenagem na Rua Maricá

Cerca de 3.000 famílias

MUNICIPIO: Queimados

LOCALIZAÇÃO SITUAÇÃO IMPACTOS

Bairro de Santo Expedito

Assoreamento do Rio dos Cachorrinhos Cerca de 80 famílias são atingidas diretamente

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MUNICÍPIO: Magé

LOCALIZAÇÃO SITUAÇÃO IMPACTOS

Conjunto do BNH em Santo Aleixo

Assoreamento do Rio Roncador que com as fortes chuvas invade o conjunto residencial

Cerca de 20 casas são atingidas diretamente

Área rural do município

Assoreamento do Rio Suruí Prejuízo para os pescadores e agricultores

Bairro Ipiranga Assoreamento do canal Ipiranga Moradores do bairro

Elementos para a elaboração de um Plano de Prevenção às Enchentes e Alagamentos na Baixada Enfrentar a questão das enchentes e alagamentos na Baixada Fluminense requer adotar uma abordagem integrada de saneamento ambiental, envolvendo tanto as ações referentes às obras de macro, meso e micro drenagem e dragagem dos rios, quanto às ações referentes à educação ambiental, coleta e destino do lixo adequado, arborização, construção de redes de esgoto e estações de tratamento, bem como do controle sobre as indústrias poluidoras. Além disso, torna-se fundamental implementar uma política habitacional que viabilize o direito de homens e mulheres a uma moradia digna com infra-estrutura adequada, livre de riscos ambientais e com acesso aos equipamentos e serviços urbanos. O enfrentamento do problema das enchentes e alagamentos na Baixada requer a adoção de duas diretrizes básicas: i) os três níveis de governo são responsáveis e devem pactuar entre si e com a sociedade a divisão de responsabilidades e atribuições na formulação e na gestão da política de saneamento, através da institucionalização do Fórum de Saneamento Ambiental da Baixada Fluminense, aprovado na Conferência das Cidades da Baixada em 2005; ii) adoção de ações preventivas e enfrentamento das causas do problema, através da elaboração de um diagnóstico com metas de curto, médio e longo prazo e recursos previstos a fim de possibilitar a sua implementação.

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Convênio com o Ministério das Cidades para a realização do diagnóstico do saneamento ambiental Acreditamos que o convênio, assinado em abril de 2004, entre a Associação de Prefeitos da Baixada, Ministério das Cidades, CEDAE, FASE e Comitê de Saneamento Ambiental da Baixada para a realização do diagnóstico dos serviços de saneamento ambiental é um importante instrumento para colocar em prática as duas diretrizes sinalizadas acima. No caso das enchentes e alagamentos na Baixada é preciso ter um diagnóstico do problema que considere:

(1) a situação dos rios, canais e afluentes em termos do grau de assoreamento, ocupação das margens dos rios e das áreas de polders (área destinada para absorção de grande quantidades de água) por habitações, empresas e indústrias;

(2) o grau de poluição dos rios pelas residências, empresas e indústrias; (3) a qualidade dos muros de contenção e da barragem de Gericinó; (4) a qualidade das estações de tratamento de esgotos que não estão

funcionando; (5) a extensão e qualidade da rede de drenagem e da rede de esgotos e dos

pontos críticos de alagamentos e retorno do esgoto para as residências; (6) as moradias em situação de risco ambiental; (7) a existência de programas de educação ambiental que diminua o volume

de lixo jogado em canais, valões e rios; (8) a existência de programas de preservação ambiental e de combate aos

desmatamentos; (9) a existência de programas habitacionais e da demanda existente por

moradia; (10) o controle da erosão também responsável pelo assoreamento. REIVINDICAÇÕES

Ações emergenciais a) Dragagem e limpeza dos rios pela SERLA; b) Mutirão de limpeza dos rios e conscientização dos moradores quanto ao

problema do lixo nos rios; c) Identificação das residências em áreas de risco ambiental, orientação de

segurança para os moradores e criação de estrutura de apoio para possíveis desabrigados;

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d) Institucionalização do Fórum (Governo e Sociedade) de Saneamento Ambiental da Baixada Fluminense, que teria as seguintes atribuições iniciais: i) formular plano emergencial de prevenção às enchentes; ii) instituir grupo de trabalho para dar início ao diagnóstico de saneamento ambiental (convênio assinado em 2004 com o Ministério das Cidades), tendo como objetivo formular um plano integrado de intervenção; e iii) iniciar o processo de constituição do Sub-Comitê de Bacia da Baía de Guanabara Baixada Fluminense, conforme modelo preconizado em lei para gestão dos recursos hídricos. Cabe ressaltar que a criação do Fórum e do Sub-Comitê de Bacia são deliberações da II Conferência das Cidades da Baixada.

Ações de curto e médio prazo a) Colocar em funcionamento as estações de tratamento de esgotos e os

reservatórios de água através da construção dos troncos coletores e da duplicação da adutora de água da Baixada, previstas no PDBG;

b) Elaboração do Plano de Saneamento Ambiental da Baixada Fluminense, integrando ações referentes ao abastecimento, tratamento e monitoramento da qualidade da água; à coleta e tratamento de esgoto; à dragagem dos rios; ao controle da poluição dos rios pelas indústrias; à educação ambiental e ao incentivo à coleta seletiva do lixo; à arborização e reflorestamento. O plano deve também estabelecer interfaces com a política de habitação a fim de diminuir a ocupação das margens dos rios.

c) Instituição de Fundo Nacional, Estadual e Municipal de Saneamento Ambiental a fim de garantir a execução do Plano e a continuidade das ações.

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1.2. SITUAÇÃO DE COMUNIDADES EM VIAS DE REMOÇÃO EM FUNÇÃO DOS JOGOS PAN AMERICANOS Comunidade Vila Autódromo - Associação de Moradores, Pescadores e Amigos da Vila Autódromo. Baixada de Jacarepaguá - Rio de Janeiro O PAN e seu “LEGADO” A realização dos jogos Panamericanos vai gerar grandes impactos urbanos que afetam toda a cidade. Dessa forma, esse Mega Evento desvela (põe a nu) o projeto neoliberal de transformação da cidade em empresa, privilegiando os interesses dos grandes capitais imobiliários e de interesses privados, em detrimento de investimentos públicos que beneficiariam a população. O legado do PAN não está vinculado à melhoria da qualidade de vida da maioria dos habitantes da cidade, mas, ao contrário, surge como um enorme Leviatã que atinge principalmente as comunidades mais carentes, situadas no entorno dos equipamentos. Essas comunidades encontram-se, neste momento, ameaçadas de remoção, além de desestruturação de toda uma vida construída, sua cultura e trabalho, suas teias de relações sociais e afetivas. Não existem projetos de urbanização, saneamento ou regularização nas comunidades no entorno dos equipamentos do PAN. Só o que se ouve falar e em remoções, remoções... CARACTERIZAÇÃO DA SITUAÇÃO DE VIOLAÇÃO A Comunidade de Vila Autódromo, originária de pescadores, sofreu, no passado, esbulho de suas terras, hoje encontra-se oprimida, com seus direitos sociais negados, sob forte opressão social, que interfere desastrosamente nas vidas de seus moradores, gerando uma incapacidade das famílias de fazerem planos até no curto prazo (construir telhado, quarto, banheiro, nascimento, batizado, cursos, trabalho, etc.), por conta das ameaças de remoção praticadas pelo poder público municipal, que se alia e dá suporte ao poder privado, imobiliário. As condições da Comunidade do ponto de vista daqueles que nada têm, são até boas: temos Associação legalizada e atuante, água encanada informal, luz formal, casas de alvenaria, coleta de lixo, mas entendemos que a sociedade ética e justa é aquela que dá direitos e obrigações iguais para todos, direitos inalienáveis, planejamento e projetos para o futuro, porque o que temos no presente é o que se segue: uma separação espacial e geográfica, espoliação e exclusão social, um “apartheid” praticado por uma política de secessão entre a “cidade dos ricos” e a “cidade dos pobres”.

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Não temos pavimentação e nem perspectivas de, não temos saneamento básico, creches, escolas, transporte, lazer, cultura, segurança, luxo este que é oferecido aos condomínios vizinhos. Trabalhamos, construímos nossas casas, pagamos impostos, passeamos, nossas crianças brincam nas ruas, nossos idosos, todos nós pisamos na lama e cuidamos, na medida do possível, do nosso próprio esgoto. Não é pela comparação invejosa, mas antes pelo desejo de ter uma boa saúde social e mental, por que os nossos vizinhos (conjunto da Aeronáutica) têm segurança social, honra, mérito, urbanização, área livre e, sobretudo, o reconhecimento da sociedade de que eles são cidadãos, e nós, não? Queremos também este reconhecimento, pois não ameaçamos, não poluímos e não conspiramos contra a sociedade. Reivindicamos o respeito ao nosso direito à terra, legalização de nossas casas, urbanização, permanência dos pescadores e seus descendentes próximo à Lagoa de Jacarepaguá, a extinção ação judicial que nos acusa de “poluição ambiental, estética e visual”, nos chamando de “invasores”. E como proposta, o compartilhamento ambiental e a pavimentação da Comunidade. Número de famílias atingidas: Cerca de 500 (quinhentas) famílias. Número de pessoas atingidas: Cerca de 2000 (duas mil) pessoas atingidas na comunidade pela violação do Direito à Moradia. A Resistência da Comunidade contra as tentativas de remoção A história da resistência popular na Vila Autódromo pode ser dividida em três fases: A primeira fase vai até 1993. Em 1972 os terrenos que compõem a área foram desapropriados para a construção do Autódromo. Nesse período, a expansão da Barra da Tijuca trouxe para a região um grande número de operários da construção civil. Em conseqüência o número de moradores da comunidade cresce. O início da segunda fase é em 1993. Nesse ano a Prefeitura do Rio de Janeiro impetra uma ação de desapropriação, alegando dano ambiental e urbanístico. É o surgimento do conflito ambiental. No mesmo ano, o Governador, Leonel Brizola, inicia uma ação de regularização fundiária para dificultar o despejo. A partir desse ponto, foi estabelecida uma luta jurídica sobre a propriedade da área e sobre as responsabilidades por danos ambientais. A fase mais recente tem início em 2005. A utilização do Autódromo nos Jogos Pan-Americanos traz o argumento de que a comunidade “polui” as imagens que irão ser veiculadas pelo mundo afora. Daí a gana que a prefeitura tem de limpar a cidade (dos pobres), pois é uma mercadoria e deve ser assim vendida. Isso é

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uma forma indigna de tratar a moradia. Moradia é um DIREITO, não uma mercadoria. Os Jogos Pan-Americanos ameaçam desalojar quatro comunidades. Na Barra: Vila Recreio I, Vila Recreio II, Jardim Gardênia, Camorim, Vila Autódromo e Belém-Belém, no Engenho de Dentro. Entender a resistência da Vila Autódromo ajuda quem está se iniciando na luta pela terra. A mudança no espaço social da Barra da Tijuca traz uma mudança na percepção dos moradores Descobriram que tinham sido rebaixados à categoria de invasores. Em contrapartida, aprenderam que, no caso dos pobres, o direito fundamental à moradia, consagrado pelo artigo 6º da Constituição Federal de 1988, só sai dos livros para o mundo real pela luta incansável das comunidades que sofrem diversos tipos de violações a esse direito. No caso de Vila Autódromo, a Associação de Moradores foi organizada e nos confrontos com a polícia: confrontos oficiais (ações de reintegração de posse onde a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro era o autor da ação. Formavam o pólo passivo 198 famílias, alvos da ação) e confrontos clandestinos (ações feitas na calada da noite, para intimidar os moradores), além de ações de intimidação explícita da prefeitura, tal como a tentativa recente (documentada) de destruição da Igreja local, em construção. Quando da impetração da Ação de Reintegração de Posse da Vila Autódromo por parte da Prefeitura em 1994 o então governador Leonel Brizola inicia uma ação de regularização fundiária, com a lavratura de 84 Termos de Concessão de Uso, com direito real resolúvel, pelo prazo de 40 anos, renováveis por 99 anos. Essa medida impediu o despejo. Retirou os moradores da frente da ação. Como a área era do Estado havia sido comprada para a construção do Autódromo e a Vila Autódromo estava no terreno remanescente o mesmo podia resguardar os ocupantes. Apesar de toda a ciranda jurídica sobre a propriedade da área já apontada na seção - histórico fundiário e disputa jurídica da área. Foi dado Termo de Concessão de Uso, pelo então Governador Leonel Brizola, pois a lei não permite entrega de Título de Propriedade em área pública. Dessa forma, foi assegurado o direito de morar, fruir e usufruir a área a 142 famílias. Histórico dos Pescadores Conforme os arquivos nacionais - Biblioteca Nacional - RJ. Em 1887 foi qualificada pela Marinha do Brasil a função de pescador. O Capitão de Fragata Fernando de Nabuco Donosor sabendo que os pescadores eram os verdadeiros

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conhecedores da geografia do mar, de seus portos e rotas, criou a qualificação de Pescador Profissional, inclusive com o objeto de obter informações sobre posições estratégicas de defesa do nosso litoral. Em 1906 criou-se a 1ª Colônia de pesca do Brasil, exatamente em Jacarepaguá que se confundia (como até hoje) com a Barra e o Camorim. O acesso às lagoas e as praias era conhecido por caminho das pedrinhas, (hoje Ladeira São Gonçalo do Amarante, e o Caminho do pescador (hoje Avenida Salvador Allende). Por esta época, o complexo da Lagoa de Jacarepaguá e suas lagoinhas (aterradas dando lugar ao Rio Centro e ao Autódromo) constituía um berçário natural, alimentado pelos rios, córregos e o mar. As colônias de pescadores inicialmente implantadas em três partes estratégicas no Brasil, com objetivos de observação militar foram: 1 colônia, Rio de Janeiro (de Sepetiba até a Ilha do Governador) 2ª Colônia, Espírito Santo e a 3ª Colônia, Bahia de São Salvador. Em 1924, desdobrou-se a 1ª colônia (RJ.) em várias colônias de pescadores, atualmente a nossa é a Z-13 (abrange de Leme até o Recreio). No Governo do presidente Getúlio Vargas, anos 40, com a política trabalhista, valorizando a figura do pescador, Getúlio cedeu sessenta mil contos de réis para a sede da colônia, que era em Jacarepaguá, se transferir para Copacabana, onde está até hoje. Observamos que os primeiros habitantes de Copacabana foram os pescadores e que nenhum mora atualmente na praia ou próximo, habitam eles hoje, em morros, favelas ou nas ruas. Com o processo de urbanização desenfreado dos bairros da zona sul, em especial Copacabana (inicio do século XX) os pescadores do Caju, Ramos, Ilha do Governador, sob a pressão imobiliária, a poluição ambiental, industrial, uma legislação mais sindicalista e operaria, as grandes obras públicas, reduziram estas colônias de pescadores em apenas referencias históricas. Reduzidos, os núcleos de pesca se transformaram por força de sua organização social em Associação de pesca, com o objetivo de maior intercâmbio entre os municípios. E seguindo a tendência histórica, sua geográfica e economia em Associação de Pescadores e moradores. A nossa Associação teve sua origem quando ainda vigorava o sistema de Capatazia criado pela Marinha do Brasil, que até hoje ainda nomeia a figura do Capataz. A Capatazia da Colônia em nossa área - Barra - Jacarepaguá era coordenada (1970) pelo Capataz Marco Aurélio, vulgo Russo, que sem condições de administrar uma grande área, cobiçada por

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especuladores imobiliários, pressionada pelo crescimento urbano, sofrendo toda espécie de degradação ambiental, teve sua figura de capataz extinta. Russo habitava com sua família e mais dezenas de pescadores, inclusive a família do falecido Tenório em área do entorno da Lagoa de Jacarepaguá. Com a construção do Rio Centro (Centro de Convenções e os prédios), todos os pescadores desta área foram expulsos. O pescador Tenório se abrigou próximo ao Autódromo e Russo próximo do Rio Centro (Camorim). Tenório foi assassinado por ocupar esta área e Russo mora hoje em favela do Camorim e é catador de ferro velho. Histórico da Comunidade Quando o Rio de Janeiro ainda era Estado da Guanabara, quando ainda não havia SERLA, FEEMA, Secretaria do Meio Ambiente, nem sequer havia ali luz da Light, quando ninguém queria morar pelas bandas da Barra e Jacarepaguá, porque era área rural, local deserto e inóspito, cheio de mosquitos, sem iluminação, água encanada e transporte, só pescadores ali habitavam por necessidade e necessidade de sobrevivência. Desde 1962 aqueles pescadores ocupavam as margens da Lagoa de Jacarepaguá, que eles denominavam Lagoinha, parte da qual foi aterrada em 1975 para as construções do Autódromo de Jacarepaguá e de um conjunto residencial para a Aeronáutica. Tanto estas construções quanto o aterro das pequenas lagoas existentes no local empurraram aqueles pescadores para uma estreita faixa de terra entre os muros do Autódromo e a sinuosa margem da lagoa. A atual comunidade Vila Autódromo, nos seus quarenta anos de existência, originou-se daqueles pioneiros pescadores e suas famílias, passando sua história por quatro ciclos: 1º ciclo: Grupo de pescadores liderados pelo Srs. Pernambuco ( mora ate hoje na casa 48 da margem da lagoa), Tenório e Natal ( estes falecidos ). Naquela época tais pescadores e suas famílias viviam exclusivamente da pesca e trocavam o pescado por verduras com o Sr. Cornélio e Dna. Maria, que mantinham hortas próximas à Lagoa. 2º ciclo: Construção do Rio Centro 3º ciclo: Construção do Autódromo de Jacarepaguá 4º ciclo: Construção do Metrô. Com as grandes obras dos anos 70, muitos núcleos de pescadores foram deslocados e migraram para a região, formaram novas comunidades (Camorim,

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Rio das Pedras, Muzema) e agregaram-se as já existentes, como a Vila Autódromo, e organizaram-se em Associações de Pescadores e Moradores. As construções do Rio Centro e do Autódromo trouxeram ainda muitos trabalhadores, que por não terem moradia ou morarem muito longe, acabaram transferindo-se para a região com as respectivas famílias, quando não formaram simplesmente novas famílias, integrando-se desta forma com os habitantes originais. Com o final da última grande construção daquela época, a do Metrô, nova leva de operários migrou para a região em busca das oportunidades de trabalho propiciadas pelas construções e pelos novos condomínios da Barra e da pesca farta na Lagoa. Aquela mescla de pessoas de diferentes origens formou a comunidade Vila Autódromo, que conseguiu se organizar juridicamente em 1987, ao fundar a Associação dos Moradores e Pescadores da Vila Autódromo - AMPAVA , com estatuto, sede própria, CGC, e demais formalidades legais. A partir daí a comunidade conquistou luz elétrica, água encanada, fossas assépticas e sumidouros em todas as residências, telefones, ruas traçadas, documentação formal e registro na Marinha e no Ibama para os remanescentes sessenta pescadores profissionais, duas igrejas evangélicas e um núcleo da Pastoral das Favelas da Igreja Católica. Tudo construído e organizado pelos próprios moradores, sem qualquer apoio governamental a despeito do IPTU pago por boa parte dos moradores com base na mesma planta de valores aplicada na Barra da Tijuca. Em 1989, quando tínhamos na Prefeitura o Dr. Marcelo Alencar, este autorizou o assentamento, ali, de várias famílias oriundas da Comunidade Cardoso Fontes. Em 1994 a antiga Secretaria da Habitação e Assuntos Fundiários do RJ, através do Processo Administrativo E-200011057/93, em decisão publicada no D.O. de 04/04/94, assentou legalmente na Vila Autódromo mais sessenta famílias. Em 1997 cento e quatro famílias receberam titulação do Governo do Estado. Em 1998 os moradores da faixa marginal da Lagoa receberam Concessão de Uso Real por noventa e nove anos da antiga Secretaria da Habitação e Assuntos Fundiários do RJ, publicada no D.O. de 31/12/98. Em 12/01/2005 a Câmara Municipal do Município do Rio de Janeiro decretou parte da comunidade Área de Especial Interesse Social. (Projeto 75-A/2004). Atualmente 90% da comunidade têm casas de alvenaria emboçadas e pintadas,

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com geladeiras e televisores. Parte significativa já dispõe de condução própria, uma necessidade dada a deficiência do transporte publico que serve a comunidade. Pode-se constatar “In loco” os bons hábitos sociais e a responsabilidade ambiental da comunidade, que é também ordeira, pacifica e produtiva, preocupa-se em manter uma relação harmoniosa e respeitosa com a Lagoa e seu ecossistema. Observa-se também na comunidade grande evolução social das famílias, que, ao longo dos anos conduziram seus filhos para o estudo e a formação profissional, ganhando assim a sociedade cidadãos formados mecânicos, eletricistas, pintores, bombeiros, costureiras, pedreiros, técnicos, professores, artistas, engenheiros, comerciantes e micro empresários. Os Sentimentos da Comunidade Entendemos que a sociedade ética é aquela que tece compromissos de longo prazo, com direitos inalienáveis e obrigações, planejamento e projetos para o futuro, compromissos do tipo “ compartilhamento fraterno”, reafirmando o direito de todos e um seguro social contra os erros e desventuras, porque a atribuição que nos dão de “favelados” “feios” e "poluidores” não é uma questão de escolha, é antes o resultado da segregação. Somos lançados em um mundo de modernidade sem modernismo e a natureza dos “direitos humanos” é o direito a ter a diferença reconhecida e continuar diferente sem temor, todos em condições de igualdade. E a injustiça que sentimos não é pela comparação de inveja, mas antes pela separação geográfica/espacial, cultural e econômica. Por que podem condomínios, shoppings e outros empreendimentos no entorno das Lagoas? Por que não há nenhum pescador morando próximo à orla das praia ou lagoas do Rio de Janeiro? Observamos com amargura que não há estudo sobre os desempregados, os sem teto, os que moram nas ruas, enquanto uma elite global de negócios da indústria e do turismo está em uma zona protegida da cidade. É a sucessão dos bem-sucedidos, dos poderosos que atribuem generosos benefícios a si próprios a partir dos recursos da sociedade e que nos condena cada vez mais a uma miséria sem perspectiva e removidos, espoliados, enquanto esta elite global vive num mundo acolchoado, perfeito em que tudo pode ser feito e refeito, num mundo onde não há lugar para duras realidades, como a pobreza, nem para a indignidade, nem para a humilhação de ser incapaz de participar do “jogo do consumo”. Somos a comunidade dos fracos e dos oprimidos.

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Desejamos ser vistos como uma comunidade que não é descartável, que tem uma história, a história da laboriosa construção da nossa memória. Cada passo que nos afasta da nossa casa, da nossa comunidade é mais uma catástrofe que empilha destroços sobre destroços, nos faz sentir como hebreus escravos no Egito, enquanto grupos imobiliários ou políticos privilegiados podem desfrutar de segurança existencial, luxo negado ao resto da população. Desenraizados, não haverá para nós dignidade, mérito e honra. Seguir outro caminho, sem alma, sem laços, sem identidade, sem companhia, sem vizinhos, obedecer aos decretos e as remoções, sem chance de escolha é desumano e nos leva a detestar a tudo e a todos. Destruir os laços comunitários que nos mantêm em uma comunidade natural, seria nos submeter pela coação, nua e sem sentido, à perda da dignidade, mérito e honra. E a imagem que vai nos restar é a de que o lugar de nossas casas não passa agora de pegadas, espaços vazios, lembranças apagadas pelos ventos, como já aconteceu no passado. O lugar para onde iremos estará vazio de valor moral, de memória. De hospitalidade, repulsivo. Desapareceram o carteiro que nos conhece, a escola que nossos filhos estudam, a igreja que freqüentamos. Nestes lugares estarão os Condomínios, os Shoppings os Resorts, (Marapendi é testemunha) as cadeias de boutiques impessoais. O aconchego do nosso lar, nossos laços de sangue devem ser buscados diariamente, na linha de frente, na luta diária, reconstruindo sempre a nossa unidade através de um acordo e de um entendimento comum, mesmo que seja um único acordo disponível. REIVINDICAÇÕES Situação Atual e o pedido à SERLA : Cada passo que nos afasta da nossa Comunidade será visto por nós como uma iniqüidade. O balanço do passado nos indica que não houve nenhuma ação protetora a favor dos pescadores e do seu “habitat”. A afirmação de que causamos poluição ambiental é proferida por pessoas privilegiadas social e culturalmente, não falam por nós, mas por aqueles que consideram o mundo uma ostra de sua propriedade e mundo este que só está disponível para um grupo

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seleto de pessoas, que por sua vez não aceitam que podemos viver em uma época que pode ser ao mesmo tempo de emancipação, inclusão, autonomia, compromisso social e ambiental, nos tornando portadores de direitos, de sentimentos de segurança, compartilhamento, parceria, evitando que todos nós fiquemos catatônicos e frustrados em nossas ações, e dando às nossas vidas um sentido humano. A nossa permanência aqui não oferece riscos à sociedade e nem ao meio ambiente. Pelo contrário, sendo uma comunidade originalmente de pescadores, é do nosso interesse que a lagoa não seja poluída, pois é dela que tiramos parte do nosso sustento. Reivindicações de Vila Autódromo 1. Extinção da ação judicial movida pela prefeitura contra os ocupantes de Vila Autódromo; 2. Setor Lagoa, Procuradoria do Estado: Concessão de uso para Área de Especial Interesse Público para fins de moradia de interesse social; 3. Obter Compensação Ambiental, através da SERLA ; 4. Pavimentação das vias de acesso e das vias internas à comunidade.

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1.3. SITUAÇÃO DAS FAVELAS EM VIAS DE REMOÇÃO POR “AMEAÇAS” AO MEIO-AMBIENTE O processo social de construção do meio ambiente como problema social. Como investigar problemas ambientais, considerando que a sua enunciação torna-se objeto de disputa em vários fóruns? Problemas ambientais só se tornam públicos à medida que são veiculados por indivíduos ou grupos. Os atores que participam das arenas de disputa em torno da definição de assuntos públicos não podem ser considerados meros narradores do estado do meio ambiente. Nesse sentido, é importante chamar a atenção para o fato de que o discurso ambientalista poder ser usado para perseguir os desfavorecidos. Temos observado, desde setembro de 2005, o retorno do discurso e da prática indiscriminada de remoção de populações, sob a alegação de um falso preservaconismo ambiental, a serviço dos interesses imobiliários. O capital imobiliário esconde-se atrás do discurso da ordenação de áreas urbanas para propor a remoção de populações tradicionais em áreas ocupadas e consolidadas na cidade. DOSSIÊ DA VIOLAÇÃO DO DIREITO À MORADIA DAS FAVELAS DO ALTO DA BOAVISTA Situadas no Bairro do Alto da Boavista que tem uma extensão territorial de 3.149, 57 hectares, um Posto de Saúde, sete escolas e um total de 1.463 imóveis residenciais. Umas 40, são mansões de 15 mil metros quadrados,, umas 400, residências de padrão de alta classe média e o restante são imóveis construídos dentro das nove favelas existentes, que são casas de alvenaria, em sua maioria de apenas um cômodo. Existem casas muito antigas, algumas construídas em 1890. Muitas das mansões transformaram-se em casas de festas, pelo menos 12, alugadas para datas especiais como casamentos e festas de 15 anos. A paisagem do Alto da Boavista é dominada quase exclusivamente pelo verde e pelos casarões, em terrenos de até 40 mil metros quadrados. Nesse bairro encontra-se o Parque Nacional da Tijuca, constituído de florestas, rios, cascatas, cachoeiras e mananciais, que pela sua beleza atrai um público de 30 mil visitantes por mês.

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Dessas nove favelas existentes, em algumas já foi realizado o programa bairrinho da prefeitura, que é um programa de urbanização das comunidades de até 500 moradores, com o objetivo de implantar infra-estrutura e demarcar os limites da comunidade. Estas ocupações são antigas. Começaram a ocorrer no ano de 1956 e existem hoje, aproximadamente 6400 famílias residindo nestas favelas. Não possuem titulação dos terrenos. A população mais jovem constituída de 20% do total, encontra-se desempregada. O percentual de mulheres chefes de família é 25 %. Os moradores mais antigos, são de famílias de funcionários do antigo Departamento de Obras da prefeitura. Não existe tratamento de esgoto no Alto da Boavista. O esgoto é despejado diretamente nos rios existentes na área. O abastecimento de água da região ocorre do uso das nascentes d' água existentes no local. Situação Atual: Sentença do Ministério Público Estadual. Em outubro de 2005, o Ministério Público Estadual, pede remoção de 14 favelas situadas em áreas que eles consideram de risco e de preservação ambiental. Nessas comunidades de passíveis de remoção, encontram-se oito, no Alto da Boavista que são 1. Fazenda; 2. Furnas; 3. Agrícola; 4. Sitio Biquinha; 5. Mata Machado; 6. Tijuaçu; 7. Morro do Banco; 8. Açude As outras encontram-se em: Jacarepaguá, no Jardim Botânico, na Gávea . Sabemos que é necessário estudar todos esses casos com o veredito de remoção, para que possamos observar que interesses realmente estão em jogo. O nosso dossiê é um trabalho sobre o Alto da Boavista, já que esse local abriga e envolve um maior número de comunidades. Somos defensores da preservação do meio ambiente, precisamos de um meio ambiente saudável e equilibrado para sobreviver. Mas somos defensores também do direito à moradia, do direito às populações que ocupam áreas onde a

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decretação e o tombamento como sítios de preservação chegaram muito tempo depois de a ocupação estar consolidada. No Alto da Boavista convive-se há muitos anos com o verde das florestas, com os rios e cascatas, as favelas e os casarões. Por que só agora em 2005, e, somente as favelas passaram a se constituir ameaças ao meio ambiente? A que interesses realmente atende essa sentença?

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1.4. SITUAÇÃO DE OCUPAÇÕES NA ÀREA CENTRAL DO RIO DE JANEIRO RELATÓRIO SOBRE A OCUPAÇÃO CHIQUINHA GONZAGA As áreas centrais da cidade do Rio de Janeiro são, ao mesmo tempo, espaços de abandono e de possibilidade de “engorda” de terrenos pela especulação imobiliária. Infelizmente, estão nessa situação prédios públicos, abandonados há 10 ou até há 20 anos. No entanto, SE MORADIA É UM DIREITO (e vimos que, com a função da propriedade definida pelo Estatuto da Cidade isso é real e pode ser exigido) OCUPAR É UM DEVER!!! Assim, grupos de famílias de sem teto vieram, ao longo dos últimos anos, ocupando prédios públicos vazios e abandonados no Centro. Encontraram prédios reduzidos quase a escombros e os reabilitaram, fizeram de suas salas, suas casas, ali acontecem atividades sociais, culturais, aulas de alfabetização, reforço escolar para as crianças em idade escolar, entre outras. Tudo é discutido pelo coletivo. Toda uma história vem sendo escrita por essas famílias, que ocupam prédios do INSS, entre outros, nasa áreas centrais do Rio. Essa convivência comunitária, politizada, organizada é uma nova maneira de ocupar espaços, é uma nova história do urbanismo sendo escrita pelas mãos das famílias que necessitam e não são atendidas nas suas reivindicações, famílias que não podem mais esperar por planos e projetos que não saem do papel. Por isso, essas ocupações fazem parte deste relatório. E todas, em suas especificidades, devem ser ouvidas, reconhecidas e não podem ser frustradas em seus anseios, que são tão simples: comer e morar. Ou seja: VIVER! 1. IDENTIFICAÇÃO 1.1 Relatório: 01/06 1.2 Data: 16 de maio de 2006 1.3 Assunto: Histórico e Situação da Ocupação Chiquinha Gonzaga 1.4 Relator: Jobson Lopes dos Santos 2. APRESENTAÇÃO E OBJETIVOS Com o objetivo de auxiliar à Missão Conjunta das Relatorias do Direito Humano à Moradia Adequada no que se refere à informações sobre o nosso movimento, a Ocupação Chiquinha Gonzaga apresenta um relato de sua luta pela posse do imóvel situado na rua Barão de São Félix, 110.

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3. HISTÓRICO Na noite de 23 de julho de 2004, cerca de 40 famílias sem teto, entre moradores/as de rua ou abrigos e que não conseguem arcar com aluguel ocuparam o prédio nº 110 da Rua Barão de São Félix, próximo à central do Brasil, no Rio de Janeiro.O imóvel de 12 andares pertence ao Incra, (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), e encontrava-se vazio e abandonado há pelo menos 21 anos. A ocupação recebeu o nome de "Chiquinha Gonzaga", em homenagem às mulheres que lutam por liberdade e dignidade. Imediatamente os ocupantes iniciaram as atividades para o restabelecimento das instalações elétricas e hidráulicas. No inicio da semana seguinte uma comissão da Chiquinha se reuniu com a superintendência do Incra, que se comprometeu em não entrar com a reintegração de posse do prédio, movimentação jurídica que acabou acontecendo antes da ocupação completar uma semana. No dia 03 de agosto, em protesto à reintegração de posse, houve uma manifestação em frente ao prédio ocupado. Durante os meses seguintes a ocupação conseguiu demonstrar de forma inegável sua capacidade de administrar o prédio. Várias atividades culturais foram realizadas, aulas de alfabetização, oficinas e palestras deram função social ao prédio. Diante da mobilização social e Política em torno da Ocupação Chiquinha Gonzaga e contando com o apoio do Ministério das Cidades, o INCRA acabou por não dar prosseguimento a ordem de reintegração de posse em setembro de 2005. Ordem que se mantém sob suspensão. A partir desse momento começaram as negociações para a cessão de uso do imóvel, que passaria à Secretaria de Patrimônio da União (SPU) e posteriormente á Associação de Habitação Popular da Ocupação Chiquinha Gonzaga (AHPOCG). No entanto essa transferência não se efetivou até hoje devido à morosidade dos órgãos competentes (SPU e INCRA) o que só prejudicou à Ocupação pois, sob o argumento de que estaria não se responsabilizava mais pelo imóvel, o INCRA ordenou à concessionária de energia elétrica do município do Rio de Janeiro (LIGHT) o corte do fornecimento da energia elétrica da Ocupação Chiquinha Gonzaga, deixando a Ocupação sem luz desde Outubro de 2005. 4. CARACTERIZAÇÃO DA SITUAÇÃO Atualmente na Ocupação Chiquinha Gonzaga vivem 65 famílias e o seu sustento vem, basicamente, do comércio informal. O que torna a Ocupação uma ocupação basicamente habitada por “camelôs”. Das cerca de 40 crianças, todas em idade escolar estão matriculadas na rede pública de ensino. Há atualmente em curso uma série de Oficinas, um curso de Alfabetização de Adultos e, através

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da parceria com o Sindicato dos Profissionais em Processamento de Dados (SindPD), Pré-Vestibular. Além dos cursos, oficinas, exibições de vídeos (projeto chamado “Cine Pipoca”), vários grupos e entidades utilizam as dependências da Chiquinha Gonzaga para reuniões, seminários, alojamento, etc, o que transforma a Ocupação Chiquinha Gonzaga num de um espaço de moradia e num instrumento importante para a articulação dos movimentos sociais. 5. PROBLEMAS Os ocupantes se sentem prejudicados pelo demora na solução de seus problemas, mesmo com o posicionamento favorável de todos os órgãos envolvidos (INCRA, MCs, SPU) e, além disso, estarem com o fornecimento de energia elétrica cortado sem necessidade alguma, já que os ocupantes por várias vezes demonstraram o seu interesse no pagamento das taxas, e convivendo com todos os transtornos que uma situação dessas pode trazer, já houve vários acidentes do prédio devido à falta de iluminação, há muitos idosos e crianças no prédio, além dos problemas com a impossibilidade de guardar alimentos e outros. 6. REIVINDICAÇÕES 2 A Ocupação Chiquinha Gonzaga defende a desapropriação do imóvel nos termos do artigo 183, § 4.º inciso III da Constituição Federal, e da legislação prevista no artigo 5.º inciso XXIV; 3 Que imediatamente após a desapropriação inicie-se a cessão de uso para a Secretaria de Patrimônio da União (SPU) e a regularização da situação das famílias ocupantes e cadastradas. 4 Que ao mesmo tempo proceda-se à inclusão das famílias no programa PRÓ-MORADIA, instituído pela Instrução Normativa nº 21, de 14 de julho de 2005. 5 Inclusão nos projetos envolvendo a resolução 460.

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RELATÓRIO SOBRE A OCUPAÇÃO ZUMBI DOS PALMARES 1. IDENTIFICAÇÃO 1.1 Relatório: 01/06 1.2 Data: 14 de maio de 2006; 1.3 Assunto: Histórico e Situação da Ocupação Zumbi dos Palmares; Relator: Jobson Lopes dos Santos. 2. APRESENTAÇÃO E OBJETIVOS Com o objetivo de auxiliar à Missão Conjunta das Relatorias do Direito Humano à Moradia Adequada no que se refere a informações sobre o nosso movimento, a Ocupação Zumbi dos Palmares apresenta um relato de sua luta pela posse do imóvel situado na Avenida Venezuela 53, Praça Mauá. 3. HISTÓRICO Desde 25 de Abril deste ano (2005), cerca de 120 famílias estão ocupando o prédio da Avenida Venezuela n.º 53, de propriedade do INSS, e que se encontrava abandonado há pelo menos 10 (dez) anos. Limpamos a maior parte do imóvel e recuperamos as instalações hidráulicas, sanitárias e elétricas, desenvolvemos vários projetos sociais, como aulas de alfabetização, reforço escolar, capoeira e fotografia. Os ocupantes são pessoas que estavam em vias de ser despejados de suas moradias anteriores, ou não tinham mais como arcar com o aluguel e, portanto, fizeram da Ocupação Zumbi dos Palmares sua moradia definitiva. São mais de 300 pessoas morando e dando vida a um imóvel público até há pouco abandonado e oferecendo risco à comunidade ao redor. A ocupação foi fruto de um processo de organização de mais de 9 (nove) meses, com reuniões semanais, onde foram aprovados o regimento interno e o cadastro dos sem-teto. Assim organizados, estamos colocando em prática o que sucessivos governos (federal, estadual e municipal) prometem mas nunca realizam: localizar famílias de baixa renda com necessidade de moradia e transformar prédios públicos abandonados em projetos de moradia popular. Desde o primeiro momento, procuramos o INSS, propondo trabalhar juntos para regularizar a ocupação e viabilizar a participação do poder público em nosso projeto de moradia popular. Já em nosso primeiro encontro, onde, entre outros, estava presente o Sr. Sérgio Artur de Nascimento, nos foi informado que o Instituto era legalmente impossibilitado de doar ou ceder de alguma forma o imóvel (segundo o INSS devido à Lei Federal n.º 9702/97), e que nossas alternativas eram ou adquirir o imóvel (inviável devido à baixa renda das famílias ocupantes) ou buscar alternativas junto ao Ministério das Cidades. Fizemos então contato com o Ministério das Cidades, e no dia 16 de Agosto

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reunimo-nos em Brasília com a Sr.ª Margareth Makito Uemura, responsável pela Secretaria Nacional do Programa de Reforma Urbana. Do contato não resultou nenhuma solução concreta. 4. CARACTERIZAÇÃO DA SITUAÇÃO A Ocupação Zumbi dos Palmares encontra-se sob ameaça de despejo desde o dia 18/05/2006, tendo os moradores 30 dias para desocupar o Prédio. Na Ocupação Zumbi dos Palmares vivem atualmente 120 famílias. A maioria dos moradores da Zumbi dos Palmares tem por ocupação atividades ligadas à informalidade como a de camelô, catador e outras. No entanto há projetos que dentro em breve estarão gerando renda dentro da ocupação. Um exemplo de projeto desse tipo é a parceria com a Associação das Baianas de Acarajé (ABARAJÉ). Este projeto pretende capacitar as mulheres para a fabricação de doces e salgados e artigos de corte e costura ligados à tradição das baianas cuja origem está intimamente ligada à região da Gamboa. No que se refere à Educação podemos afirmar com tranqüilidade que, das cerca de 50 crianças, todas em idade escolar estão matriculadas na rede pública de ensino e para elas, dentro da Zumbi, são desenvolvidas, além de atividades recreativas, reforço escolar e aulas de inglês. Quanto aos adultos são oferecidas atividades de reforço escolar, alfabetização e, através da parceria com o Sindicato dos Profissionais em Processamento de Dados (SindPD), Pré-Vestibular. 5. PRINCIPAIS REIVINDICAÇÕES E PROPOSTAS A Ocupação Zumbi dos Palmares, depois de uma série de reuniões, encaminhou as seguintes propostas sobre o destino do prédio ao Ministério das Cidades: 1) Que a União desaproprie o prédio por utilidade pública/interesse social, nos termos do artigo 183, § 4.º inciso III da Constituição Federal, e da legislação prevista no artigo 5.º inciso XXIV; 2) Que imediatamente após a desapropriação inicie-se a regularização da situação das famílias ocupantes e cadastradas, preferencialmente com a manutenção da propriedade da União e a cessão de uso aos moradores nos termos da Lei 009.636/1998; 3) Que ao mesmo tempo proceda-se à inclusão das famílias no programa PRÓ-MORADIA, instituído pela Instrução Normativa nº 21, de 14 de julho de 2005.

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REIVINDICAÇÕES GERAIS Tudo o que foi visto acima remete a questões que ainda não foram equacionadas na sociedade brasileira. Existe uma necessidade de criar um novo olhar sobre a cidade: Planejar a cidade a partir da ótica e das necessidades dos excluídos, social e territorialmente falando. Isso engloba a ampliação do acesso da população a moradias dignas pela garantia e oferta de áreas equipadas com serviços urbanos e infra-estrutura. Engloba o DIREITO À CIDADE. Criação de uma política habitacional com oferecimento de unidades subsidiadas para famílias de 0 a três salários mínimos. Combate e denúncia de qualquer tipo de prática - discurso ou ação - usada para acirrar a segregação territorial. Respeito pelas diferenças. Reconhecimento a todos os moradores, sem discriminações, da cidadania e do direito à apropriação da cidade e do território de moradia. Reconhecimento da luta por uma ocupação menos desigual do território. Positivação e resignificação da palavra FAVELA no cenário da cidade. Reconhecimento e regularização das áreas de ocupação quilombola. Identificação de TODAS as áreas ocupadas visando à sua delimitação como Áreas de Especial Interesse Social, permitindo a urbanização e a regularização fundiária dos terrenos ocupados. REIVINDICAÇÕES: 1. Fim da ameaça de despejo e inicio imediato de negociação entre todos os atores envolvidos. 2. Regularização urbanística e fundiária das áreas de assentamentos precários ocupadas por famílias de baixa renda nos municípios e no estado. Nos processos de regularização, as mulheres chefes de família, negras, deverão ter prioridade para a titulação da terra e da moradia. 3. Criação do Fundo Municipal e do Fundo Estadual para Moradia Popular (FMMP e FEMP), com previsão de recursos dos orçamentos municipal e estadual, fundos que deverão ser geridos pelos Conselhos Municipal e Estadual das Cidades, com representação paritária entre sociedade e governo. A representação nos conselhos deverá respeitar a eqüidade de gênero em todos os segmentos. 4. Criação dos Conselhos Municipais e Estaduais das Cidades, com caráter deliberativo e representação da sociedade civil organizada na mesma proporção por segmento do Conselho Nacional das Cidades, tendo com função principal a formulação e monitoramento de políticas, projetos e programas urbanos e de

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gestão do FMMP e FEMP. A representação nos conselhos deverá respeitar a eqüidade de gênero em todos os segmentos. 5. Implementação de programas e projetos de habitação de interesse social para famílias com renda de 0 a 3 salários mínimos. 6. Transformação imediata de prédios e outros imóveis públicos estaduais e municipais desocupados, abandonados ou parcialmente utilizados, situados prioritariamente nas áreas centrais, em projetos de habitação de interesse social para a população com renda de 0 a 3 salários mínimos, com o cadastramento das famílias feitas em conjunto pelo poder público e movimentos de sem-teto. Implementação em alguns prédios e outros imóveis públicos de Centros de Reabilitação Humana, voltados para a população de rua. 7. Destinação dos alojamentos em construção e a serem construídos na Vila do Pan 2007, após a realização dos jogos, para moradia de famílias com renda de 0 a 5 salários mínimos. 8. Implementação da Assistência técnica e jurídica gratuita pelos governos municipais e estadual para reforma, construção e regularização da moradia popular das famílias com renda de 0 a 3 salários mínimos. 9. Criação de uma Comissão de Acompanhamento Jurídico e de Combate aos Despejos Forçados, composta por representantes das comunidades envolvidas, dos Movimentos de Moradia, dos governos estaduais e municipais, do Ministério Público, da Defensoria Pública, de ongs e instituições de pesquisa de assessoria aos movimentos, com o objetivo de evitar os despejos, construir soluções para o problema de moradia e denunciar abusos cometidos pelas partes envolvidas. 10. Combate a qualquer iniciativa pública ou privada que tenha como resultado a segregação urbana, como por exemplo, a construção de muros e cancelas, a colocação de grades, etc. 11. Garantia da prestação dos serviços de saneamento (redes de abastecimento d'água, de esgotamento sanitário, de drenagem e coleta de lixo) para toda a população, estabelecendo tarifas sociais para a população de baixa renda. 12. Elaboração dos planos diretores participativos e implementação dos instrumentos previstos no Estatuto da Cidade, para que a cidade e a propriedade cumpram a sua função social.

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Anexos ao Relatório de situações de violação do

Direito à Moradia Digna no Estado do Rio de Janeiro

26 de Maio 2006

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