fichamento 02 [leandro aragão] - a força normativa da constituição, de konrad hesse

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO MESTRADO EM DIREITO PÚBLICO Disciplina : Direitos Humanos e Direitos Fundamentais Fichamento da obra: “A força normativa da Constituição”, de Konrad Hesse Aluno: Leandro Santos de Aragão 1

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIAPROGRAMA DE PS-GRADUAO EM DIREITOMESTRADO EM DIREITO PBLICO

Disciplina: Direitos Humanos e Direitos Fundamentais

Fichamento da obra: A fora normativa da Constituio, de Konrad Hesse

Aluno: Leandro Santos de Arago

SALVADOR - BAHIA2012

Universidade Federal da BahiaFaculdade de Direito Programa de Ps-Graduao Mestrado em Direito Pblico - 2012.2Disciplina: Direitos Humanos e Direitos FundamentaisProf. Saulo Jos Casali Bahia

Aluno: Leandro Santos de Arago

Notas de fichamento

Livro A fora normativa da Constituio (Die normative Kraft der Verfassung)

AutorKonrad Hesse

TraduoGilmar Ferreira Mendes

EditoraSergio Antonio Fabris Editor

CidadePorto Alegre

Ano1991

Edio1 ed.

Pginas35

Modo de citao:

HESSE, Konrad. A fora normativa da Constituio. Traduo Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991.

Pgina 9 (...), Ferdinand Lassalle proferiu, numa associao liberal-progressista de Berlim, sua conferncia sobre essncia da Constituio (ber das Verfassungswesen). Segundo sua fundamental, questes constitucionais no so questes jurdicas, mas sim questes polticas. que a Constituio de um pas expressa as relaes de poder nele dominantes: (...). (...). Esses fatores reais do poder formam a Constituio real do pas. Esse documento chamado Constituio a Constituio jurdica no passa, nas palavras de Lassalle, de um pedao de papel (ein Stck Papier). Essa introduo j demonstra que o trabalho de Hesse pretende ser um contraponto tese de Lassalle sobre constituio como expresso dos fatores reais de poder.

Pginas 10-11 Considerada em suas conseqncias, a concepo da fora determinante das relaes fticas significa o seguinte: a condio de eficcia da Constituio jurdica, isto , a coincidncia de realidade e norma, constitui apenas um limite hipottico extremo: que entre a norma fundamentalmente esttica e racional e a realidade fluida e irracional, existe uma tenso necessria e imanente que no se deixa eliminar. Para essa concepo do Direito Constitucional, est configurada permanentemente uma situao de conflito: a Constituio jurdica, no que tem de fundamental, isto , nas disposies no propriamente de ndole tcnica, sucumbe cotidianamente em face da Constituio real. A idia de um efeito determinante exclusivo da Constituio real no significa outra coisa seno a prpria negao da Constituio jurdica. Poder-se-ia dizer, parafraseando as conhecidas palavras de Rudolf Sohm, que o Direito Constitucional est em contradio com a prpria essncia da Constituio.

Pgina 11 Essa negao do direito constitucional importa na negao do seu valor enquanto cincia jurdica. (...). Assim, o Direito Constitucional no estaria a servio de uma ordem estatal justa, cumprindo-lhe to-somente a miservel funo indigna de qualquer cincia de justificar as relaes de poder dominantes. (....), essa doutrina afigura-se desprovida de fundamento se se puder admitir que a Constituio contm, ainda que de forma limitada, uma fora prpria, motivadora e ordenadora da vida do Estado. A questo que se apresenta diz respeito fora normativa da Constituio. (...) Qual o fundamento e o alcance dessa fora do Direito Constitucional? Todas essas passagens evidenciam a contrariedade tese da constituio como expresso dos fatores reais do poder. Hesse consegue atribuir eficcia normativa Constituio de modo autnomo, sem remisso a qualquer fator externo ao texto constitucional.

Pgina 13 Uma tentativa de resposta deve ter como ponto de partida o condicionamento recproco existente entre a Constituio jurdica e a realidade poltico-social (...). devem ser considerados, nesse contexto, os limites e as possibilidades da atuao da Constituio jurdica (...). Finalmente, ho de ser investigados os pressupostos de eficcia da Constituio (...)..

Pgina 14 (...) A radical separao, no plano constitucional, entre realidade e norma, entre ser (Sein) e dever ser (Sollen) no leva a qualquer avano em nossa indagao. (...), essa separao pode levar a uma confirmao, confessa ou no, da tese que atribui exclusiva fora determinante s relaes fticas.

Pginas 14-15 A norma constitucional no tem existncia autnoma em face da realidade. A sua essncia reside na sua vigncia, ou seja, a situao por ela regulada pretende ser concretizada na realidade. Essa pretenso de eficcia (Geltungsanspruch) no pode ser separada das condies histricas de sua realizao, que esto de diferentes formas, numa relao de interdependncia, criando regras prprias que no podem ser desconsideradas.

Pgina 15 (...), a pretenso de eficcia de uma norma constitucional no se confunde com as condies de sua realizao; a pretenso de eficcia associa-se a essas condies como elemento autnomo. A Constituio no configura, portanto, apenas expresso de um ser, mas tambm de um dever ser; ela significa mais do que o simples reflexo das condies fticas de sua vigncia, particularmente as foras sociais e polticas. Graas pretenso de eficcia, a Constituio procura imprimir ordem e conformao realidade poltica e social. (...). A fora condicionante da realidade e a normatividade da Constituio podem ser diferenciadas; elas no podem, todavia, ser definitivamente separadas ou confundidas. (...). Para usar a terminologia acima referida, Constituio real e Constituio jurdica esto em uma relao de coordenao. aqui, Hesse tenta compatibilizar o lado jurdico de uma Constituio com o lado poltico dela. Ela no nega a existncia de fatores polticos influenciando ou moldando o texto constitucional; ele apenas acha que esses fatores so indiferentes para a anlise e aplicao jurdicas. A esfera poltica indiferente para a aplicao jurdica.

Pgina 16 (...) A Constituio adquire fora normativa na medida em que logra realizar essa pretenso de eficcia. Essa constatao leva a uma outra indagao, concernentes s possibilidades e aos limites de sua realizao no contexto amplo de interdependncia no qual esta pretenso de eficcia encontra-se inserida. (...), a compreenso dessas possibilidades e limites somente pode resultar da relao da Constituio jurdica com a realidade.

Pgina 18 (...) Se no quiser permanecer eternamente estril, a Constituio entendida aqui como Constituio jurdica no deve procurar construir o Estado de fora abstrata e terica. Ela no logra produzir nada que j no esteja assente na natureza singular do presente (individuelle Beschaffenheit der Gegenwart). Se lhe faltam esses pressupostos, a Constituio no pode forma e modificao realidade; onde inexiste fora a ser despertada fora esta que decorre da natureza das coisas no pode a Constituio emprestar-lhe direo; se as leis culturais, sociais, polticas e econmicas imperantes so ignoradas pela Constituio, carece ela do imprescindvel germe de sua fora vital.(...) A norma constitucional somente logra atuar se procura construir o futuro com base na natureza singular do presente.

Pgina 19 (...), a fora normativa da Constituio no reside, to-somente, na adaptao inteligente a uma dada realidade. A Constituio jurdica logra converter-se, ela mesma, em fora ativa, que se assenta na natureza singular do presente (individuelle Beschaffenheit der Gegenwart). Embora a Constituio no possa, por si s, realizar nada, ela pode impor tarefas. A Constituio transforma-se em fora ativa se essas tarefas forem efetivamente realizadas, se existir a disposio de orientar a prpria conduta segundo a ordem nela estabelecida, se, a despeito de todos os questionamentos e reservas provenientes dos juzos de convenincia, se puder identificar a vontade de concretizar essa ordem. (...), pode-se afirmar que a Constituio converter-se- em fora ativa se fizerem-se presentes, na conscincia geral particularmente, na conscincia dos principais responsveis pela ordem constitucional -, no s a vontade de poder (Wille zur Macht), mas tambm a vontade de Constituio (Wille zur Verfassung). para Hesse, a Constituio tem uma fora deontolgica. Apesar de criticar a tese de Lassalle, a tese de Hesse, contraditoriamente, tambm se fundamenta num critrio poltico-abstrato (a tal vontade de Constituio)

Pgina 19 Essa vontade de Constituio origina-se de trs vertentes diversas. Baseia-se na compreenso da necessidade e do valor de uma ordem normativa inquebrantvel, que proteja o Estado contra o arbtrio desmedido e disforme. Reside, igualmente, na compreenso de que essa ordem constituda mais do que uma ordem legitimada pelos fatos (e que, por isso, necessita de estar em constante processo de legitimao). mais uma evidncia da incongruncia terica da crtica de Hesse, que busca a legitimao da eficcia social do texto constitucional num critrio poltico (assim como Lassale, to criticado por Hesse).

Pginas 19-20 Assenta-se tambm na conscincia de que, ao contrrio do que se d com uma lei do pensamento, essa ordem no logra ser eficaz sem o concurso da vontade humana. (...)Quanto mais o contedo de uma Constituio lograr corresponder natureza singular do presente, tanto mais seguro h de ser o desenvolvimento de sua fora normativa.

Pgina 21 (...) Abstradas as disposies de ndole tcnico-organizatria, ela deve limitar-se, se possvel, ao estabelecimento de alguns poucos princpios fundamentais, (...).(...) A constitucionalizao de interesses momentneos ou particulares exige, em contrapartida, uma constante reviso constitucional, com a inevitvel desvalorizao da fora normativa da Constituio. (...)Finalmente, a Constituio no deve assentar-se numa estrutura unilateral, se quiser preservar a sua fora normativa num mundo em processo de permanente mudana poltico-social. (...) Um timo desenvolvimento da fora normativa da Constituio depende no apenas do seu contedo, mas tambm de sua prxis. Esses trechos, principalmente o ltimo citado, mostram que Hesse tambm se fundamenta num critrio poltico de Constituio. O campo da prxis, da prtica, o campo poltico por excelncia.

Pgina 22 Igualmente perigosa para fora normativa da Constituio afigura-se a tendncia para a freqente reviso constitucional sob a alegao de suposta e inarredvel necessidade poltica. Cada reforma constitucional expressa a idia de que, efetiva ou aparentemente, atribui-se maior valor s exigncias de ndole ftica do que ordem normativa vigente. (...)Finalmente a interpretao tem significado decisivo para a consolidao e preservao da fora normativa da Constituio. A interpretao constitucional est submetida ao princpio da tima concretizao da norma (...).(...) Se o direito e, sobretudo, a Constituio, tm a sua eficcia condicionada pelos fatos concretos da vida, no se afigura possvel que a interpretao faa deles tabula rasa. Ela h de contemplar essas condicionantes, correlacionando-as com as proposies normativas da Constituio.

Pgina 23 Em outras palavras, uma mudana das relaes fticas pode ou deve provocar mudanas na interpretao da Constituio. Ao mesmo tempo, o sentido da proposio jurdica estabelece o limite da interpretao e, por conseguinte, o limite de qualquer mutao normativa. (...)(...), finalidade (Telos) de uma proposio constitucional e sua ntida vontade normativa no devem ser sacrificadas em virtude de uma mudana da situao.(...) A dinmica existente na interpretao construtiva constitui condio fundamental da fora normativa da Constituio, e, por conseguinte, de sua estabilidade. Caso ela venha a faltar, tornar-se- inevitvel, cedo ou tarde, a ruptura da situao jurdica vigente.

Pgina 25 Se os pressupostos da fora normativa encontrarem correspondncia na Constituio, se as foras em condies de viol-la ou de alter-la mostrarem-se dispostas a render-lhe homenagem, se, tambm em tempos difceis, a Constituio lograr preservar a sua fora normativa, ento ela configura verdadeira fora viva capaz de proteger a vida do Estado contra as desmedidas investidas do arbtrio. No , portanto, em tempos tranquilos e felizes que a Constituio normativa v-se submetida sua prova de fora. Em verdade, esta prova d-se nas situaes de emergncia, nos tempos de necessidade.

Pgina 25 A Constituio no est desvinculada da realidade histrica concreta do seu tempo. Todavia, ela no est condicionada, simplesmente, por essa realidade. Em caso de eventual conflito, a Constituio no deve ser considerada, necessariamente, a parte mais fraca. Ao contrrio, existem pressupostos realizveis (realizierbare Voraussetzungen) que, mesmo em caso de confronto, permitem assegurar a fora normativa da Constituio. Somente quando esses pressupostos no puderem ser satisfeitos, dar-se- a converso dos problemas constitucionais, enquanto questes jurdicas (Rechtsfragen), em questes de poder (Machtfragen). Nesse caso, a Constituio jurdica sucumbir em face da Constituio real.

Pgina 27 Em outros termos, o Direito Constitucional deve explicitar as condies sob as quais as normas constitucionais podem adquirir a maior eficcia possvel, propiciando, assim, o desenvolvimento da dogmtica e da interpretao constitucional. Portanto, compete ao Direito Constitucional realar, despertar e preservar a vontade da Constituio (Wille zur Verfassung), que, indubitavelmente, constitui a maior garantia de sua fora normativa. Essa orientao torna imperiosa a assuno de uma viso crtica pelo Direito Constitucional, pois nada seria mais perigoso do que permitir o surgimento de iluses sobre questes fundamentais para a vida do Estado.

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