fenomenologia da ampla defesa e do contraditório

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Acelino Pontes dos Santos Lima Fenomenologia da Ampla Defesa e do Contraditório Fenomenologia da Ampla Defesa e do Contraditório - paradigmas axiológicos e jurídicos Faculdade de Ensino e Cultura do Ceará - FAECE Curso de Graduação em Direito Fortaleza 2013

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Acelino Pontes dos Santos Lima

Fenomenologia da Ampla Defesa e do ContraditórioFenomenologia da Ampla Defesa e do Contraditório

- paradigmas axiológicos e jurídicos

Faculdade de Ensino e Cultura do Ceará - FAECECurso de Graduação em Direito

Fortaleza2013

Faculdade de Ensino e Cultura do Ceará -FAECE

Curso de Graduação em Direito

Acelino Pontes dos Santos Lima

Fenomenologia da Ampla Defesa e do ContraditórioFenomenologia da Ampla Defesa e do Contraditório

- paradigmas axiológicos e jurídicos

Monografia apresentada ao Curso de Gradu-ação em Direito da Faculdade de Ensino eCultura do Ceará - FAECE, como requisitoparcial para obtenção do grau de Bacharelem Direito, sob a orientação do Prof. Ms.Marcel Moraes Mota.

Fortaleza2013

Diretora-Geral: Prof.ªMs.ª Rita Maria Silveira da SilvaCoordenador do Curso de Direito: Prof.Ms. Edenilo Baltazar Barreira FilhoBacharelando: Acelino Pontes dos Santos Lima

Ficha Catalográfica

P814f PONTES, AcelinoFenomenologia da Ampla Defesa e do Contraditório -

paradigmas axiológicos e jurídicos / Acelino Pontes. - For-taleza, 2013

66 p.

Monografia de Graduação em Direito (Bacharelado) - Faculdade de Ensino e Cultura do Ceará – FAECE, Curso de Direito. Bibliografia

Orientador: Prof.Ms. Marcel Moraes Mota.

1. Direito de Defesa 2. Contraditório 3. Fenomenologia 4. Paradigma 5. Axiologia. I. Faculdade de Ensino e Cultu-ra do Ceará – FAECE. II. Título.

CDU: 34

Para citar este documento:

Pontes, Acelino: Fenomenologia da Ampla Defesa e do Contraditório - paradigmasaxiológicos e jurídicos. Monografia de Graduação em Direito, Curso de Graduaçãoem Direito. Fortaleza: Faculdade de Ensino e Cultura do Ceará – FAECE, 2013.66 p.

III

Faculdade de Ensino e Cultura do Ceará - FAECECurso de Bacharelado em Direito

Fenomenologia da Ampla Defesa e do ContraditórioFenomenologia da Ampla Defesa e do Contraditório

- paradigmas axiológicos e jurídicos

Bacharelando: Acelino Pontes dos Santos Lima

Monografia aprovada em 26/11/2013 para obtenção do título de Bacharel em Di-reito.

Nota: 9,5

Banca Examinadora:

_________________________________________Prof.Ms. Marcel Moraes Mota

Orientador

_________________________________________Prof.Ms. Luciano Carmelo de Mesquita Prado

Examinador

__________________________________________Prof.Ms. Raimilan Seneterri da Silva Rodrigues

Examinador

_________________________________________Prof.Ms. Edenilo Baltazar Barreira Filho

Coordenador do Curso de Direito

IV

DedicatóriaDedicatória

À tia Delzira pelo carinho e apoio.

V

AgradecimentosAgradecimentos

O meu reconhecimento ao ínclito Prof.Ms. Marcel Moraes Mota, que me

iluminou nas trilhas do Direito Constitucional com muita competência e erudi-

ção, como também me assistiu na elaboração deste trabalho.

Gratias plena à Magistrada Dr.ª Adriana Aguiar Magalhães e Dr.ª Virgí-

nia Maciel Pereira pelo apoio e pelas orientações, bem como a toda a equipe se

serventuários e estagiários da 16.ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza,

bem como ao douto Promotor de Justiça Dr. Marcos William Leite de Oliveira e

ao nobre Defensor Público, Dr. Leonardo Antônio de Moura Júnior. In memori-

am, Dr. José Lima de Oliveira e Dr.ª Ana Célia Alves de Souza.

Um agradecimento especial aos colegas Jardel Luís Costa Leite e Rui Bu-

eno Ferraz pelo incentivo e constante debate nas disputationes.

Também não devo esquecer o fenômeno, que me levou a estudar Direito.

Dank und Anerkennung gelten meiner dritten alma mater, die Ludwig-

Maximilians-Universität München.

VI

EpígrafeEpígrafe

Mãos Dadas

Carlos Drummond de Andrade

Não serei o poeta de um mundo caduco.Não serei o poeta de um mundo caduco.Também não cantarei o mundo futuro.Também não cantarei o mundo futuro.Estou preso à vida e olho meus companheiros.Estou preso à vida e olho meus companheiros.Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.Entre eles, considero a enorme realidade.Entre eles, considero a enorme realidade.O presente é tão grande, não nos afastemos.O presente é tão grande, não nos afastemos.Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.

Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.

O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presenO tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presen--tes, a vida presente.tes, a vida presente.

Não há como pensar e ser futuro sem a FiNão há como pensar e ser futuro sem a Fi --losofia.losofia.

O autorO autor

VII

Ilustração 1: Drummond de AndradeFonte: Internet

ResumoResumo

Contexto: Entreprende-se a propositura de uma Fenomenologia da Ampla Defe-sa e do Contraditório, oferecendo novas perspectivas de pensar, em especial,na realidade nacional. Não obstante, as perspectivas históricas não corrobora-rem a imposição de um convívio social conforme o pensamento humanístico,delineia-se um rompimento com paradigmas e axiomas provectos. Na analiseaxiológica, acautela-se o fenômeno da Agressão Intencional-Teleológica, regidapela informalidade das relações intersubjetivas e transsubjetiva no âmbito co-munitário e da privacidade.

M etodologia : Compele-se uma análise epistemológica, axiológica e ontológicada concepção do direito à Ampla Defesa e ao Contraditório, enceta-se vínculosde conteúdo e de método, na busca de conectar uma visão de congruência, quearticule a formação de uma nova visão jurídico-ética.

Resultados: O estudo do fato revelou a concepção de opinião, de objeto do co-nhecimento e de fé, adornadas com a qualidade do a priori, encontrando noexistencialismo o ser-no-mundo (Dasein), a partir da noção de uma "tensão en-tre faticidade e validade", ou da entre o Em-si e o Para-si. Ao estudo da Axiolo-gia do devido processo legal a Legitimidade, o Desvio de Poder, a Inversão doÔnus da Prova, a Prova Diabólica e a Condenação Branca receberam atenção.Ao exame da Agressão Intencional-Teleológica apontou-se fenômenos das rela-ções intersubjetivas e transsubjetiva no âmbito comunitário e da privacidade,porquanto de extrema dificuldade para erigir uma formação da ampla defesa edo contraditório.

Conclusão: Verificou-se que o estabelecimento de uma estética e ética da am-pla defesa e do contraditório, numa situação fenomenológica como descritaneste trabalho é de extrema dificuldade. Vislumbra-se a necessidade de mu-danças socioculturais, que viabilizem a implantação de direitos fundamentais,como no caso da ampla defesa e do contraditório, de forma linear, abrangente ehorizontal, que assim permita a todos viverem humanamente.

Palavras – Chaves: Direito de Defesa. Contraditório. Fenomenologia. Paradig-ma. Axiologia.

VIII

ZusammenfassungZusammenfassung

Hintergrund: Es wird die Produktion einer umfassenden Phänomenologie derRechtsverteidigung und des Rechtswiderspruches unternomen, mit der Absichtneue Perspektiven zum Denken zu verwirklichen, vor allem in der nationalenRealität. Dennoch, die historischen Perspektiven stärken keine Induktion vonRegeln und Vorschriften, die ein soziales Beisammensein gemäß dem humanis-tischen Denken durchzusetzen versucht. Es zeichnet sich einen Bruch mit ab-getakelten Paradigmen und Axiome ab. In der axiologischen Analyse wird esvor dem Phänomen der intentional-teleologischen Aggression ermahnt, welcheim Rahmen der Gemeinschaft und der Privatsphäre durch die Informalität derintersubjektiven und transsubjektiven Beziehungen regiert wird.

Method ik : Es genötigt eine epistemologische, axiologische und ontologischeKonzeptionsanalyse des Rechts auf Verteidigung und auf Widerspruch, auf derSuche eine Kongruenzvision anzuschließen, wird es Bindungen von Inhalt undMethode zu setzen initiiert, welche die Entstehung einer neuen rechtlich-ethis-chen Vision artikuliert.

Ergebnisse: Der Weg von Tatsache bis zur Faktizität führte über Meinung, überObjekt des Wissens und über den Ausdruck des Glaubens, über Daten undErkenntnisse, die mit der Qualität a priori ausgeschmückt werden, in Existen-zialismus der Sein-in-der-Welt (Dasein) findend, auf der Grundlage einer"Spannung zwischen Faktizität und Geltung" sowie in der Gespanntheit zwis-chen den In-sich und den Für-sich. Auf die axiologische Untersuchung des ord-nungsgemäßen Verfahrens wurden die Legitimität, den Machtmissbrauch, dieBeweislastumkehr, der teuflische Beweis und die Weiße Verurteilung analysi-ert. Bei der Untersuchung der intentional-teleologischen Aggression wies aufPhänomene der intersubjektiven und transsubjektiven Beziehungen im Ge-meinschaftsbereich und in der Privatsphäre, insofern darauf eine breite Rech-tsverteidigung und den Rechtswiderspruch mit extremen Schwierigkeiten zuerrichten sind.

Schlussfolgerung: Es wurde festgestellt, dass die Errichtung einer ästhetischenund ethischen breiten Rechtsverteidigung und eines Rechtswiderspruches, wiein einer, in dieser Arbeit beschriebenen, phänomenologischen Situation extremschwierig ist. Betrachtet es als notwendig sozio-kulturellen Veränderungen, diedie Umsetzung der Grundrechte zu ermöglichen, wie im Falle der Rechtsvertei-digung und des Rechtswiderspruches in einer linearen umfassenden und hori-zontalen Form, sodass lässt jeder menschenwürdig leben.

Stichwörter: Rechtsverteidigung. Rechtswiderspruch. Phänomenologie. Paradigma. Axiologie.

IX

ListaLista dede FigurasFiguras

Figura 1: Drummond de Andrade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . VII

Figura 2: Obra Dei Delitti e Delle Pene, de Cesare Beccaria . . . 2

X

SumárioSumário

Dedicatória . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . VAgradecimentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . VIEpígrafe . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . VIIResumo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . VIIIZusammenfassung . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . IXLista de Figuras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . XSumário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . XI

1. Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11a. Justificativa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41b. Objetivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51c. Metodologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6

2. Faticidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72a. Do Fato à Faticidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72b. Omnis determinatio est negatio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 132c. Aufklärung e Mediação: filosofando no Direito . . . . . . . . . . . 15

3. Axiologia do Processo Legal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 193a. Legitimidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 203b. Desvio de Poder . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 233c. Inversão do Ônus da Prova . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 253d. Prova Diabólica & Condenação Branca . . . . . . . . . . . . . . . . 27

4. Agressão intencional-teleológica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 424a. Bullying . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 434b. Mobbing . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 454c. Síndrome do Pequeno Poder . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 464d. Intriga . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 484e. Fenomenologia do Brasileiro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50

5. Conclusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55

6. Referências Bibliográficas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60

XI

1. Introdução

“O justo é tranquilíssimo, o injus-to é sempre muito solícito.”

Epicuro

Na história da humanidade está sempre presente o anseio do homem por

pacificar conflitos e manter a ordem social. Nesse intuito, já os pré-socráticos

(SOUZA FILHO, 2011, p. 263), em especial, os socráticos (RIBEIRO, 2012, p.

203) medram por uma preocupação com os valores éticos e morais do homem,

em busca do 'dever ser' e o conflito entre o 'dever ser' e a realidade, que até

hoje perdura. Resulta dessa evolução a formulação e imposição de regras e

normas, que venham reger o convívio social.

À vista disso, o Estado foi conjurado a impor sanções para inibir e coibir

infrações às normas vigentes. Mas, nesse desígnio exsurgem a prática de arbi-

trariedades, prejulgamentos, prevalecendo uma estética da condenação sem a

devida apuração dos fatos ou sem a busca de justificativas para a conduta do

agente infrator, bem mais ainda, sem a devida oferta do direito de defesa ou

sem a presunção de inocência.

Longo é o caminho para o encontro do Estado com o devido processo le-

gal, perpassando a apuração de atos delituosos, por provas divinas1, bem

como, pelo fenômeno da Inquisição, com o uso da tortura como meio de prova

da inocência, até mesmo, pela compra da liberdade, diante de arbitrariedade

imposta pelo Estado.

Em 1764, com a prisão de Cesare Beccaria (jurista, filósofo, economista e

literato italiano), esse escreve no cárcere a obra Dei delitti e delle pene2, onde,

imbuido pelo espírito da Aufklärung3, do Iluminismo e da ética utilitarista, de-

fende que o Estado só pode impor punição na medida necessária á manuten-

1Ao criminado se obrigava o pisar em brasas, empós disso, se seus pés não externassem qualquer lesãopor queimadura, era indício de que “deus” assinalava sua inocência e, por fim, era absolvido; caso con-trário, era condenado à morte.2Dos Delitos e das Penas.3Esclarecimento pelo acordamento.

1

ção da ordem; exalta o princípio da proporcionalidade; que não é importante a

severidade da punição, mas a coerente aplicação das leis penais; repugna a

tortura e a pena de morte; sustenta o direito de defesa e a presunção de ino-

cência, bem como a equivalência da pena em face ao delito cometido e, princi-

palmente, o princípio da reserva legal (BECCARIA, [s.d.]; CALHAU, 2009). Com

esse avanço, o direito de defesa trespassa uma nova dimensão, em especial,

após a sua morte, quando resta comprovada a sua inocência.

Entretanto, somente com o surgimento da Revolução Francesa, em 1789,

o direito de defesa e o princípio da inocência auferem uma cumeeira na sua

trajetória histórica, com a promulgação dos Direitos Universais do Homem,

consagrando institutos como o devido processo legal, o direito ao contraditório

e a ampla defesa.

Ilustração 2: Obra Dei Delitti e Delle Pene, de Cesare Beccaria.Fonte: internet

2

Na visão de Gilmar MENDES (et all, p. 592), a Carta Magna brasileira de

1988 pontificou que quantos residam - inclusive estrangeiros - no território na-

cional está assegurada a garantia do pleno exercício da ampla defesa e do con-

traditório, com a qualidade de cláusula pétrea (BESTER, 2005, p. 87) e, em

particular, ao bojo de seu art. 5.º, inciso LV4. E nesse entendimento, exaltamos

não só a possibilidade das partes de marcar presença no leito de processos ad-

ministrativos como judiciais, como também, ao nível de tutela jurídica.

Com muita felicidade, sobeja José Afonso da Silva (2005, p. 189), en-

quanto alicerça o devido processo legal em três colunas fundamentais: o acesso

à justiça, o contraditório e a plenitude de defesa.

Uma contingência especial se observa na esfera administrativa, onde es-

ses dispositivos são aplicáveis em plenitude e completude. Entrementes, não

raro, estatutos e regulamentos teimam em contraditar a prescrição da Carta

Magna, “suprimindo ou cerceando a defesa” (ROZA, 2001, p.166).

Em particular, há de se analisar a condicionalidade do processo adminis-

trativo disciplinar, visto pelo conspícuo Hely Lopes Meirelles, como “meio de

apuração de punição de faltas graves dos servidores públicos e demais pessoas

sujeitas ao regime funcional de determinados estabelecimentos da Administra-

ção” (MEIRELLES, 1998, p. 567). E, à melhor leitura sobre a importância do

processo administrativo disciplinar, encontramos na avaliação do abalizado

mestre Cláudio Roza, que nos leciona dessa feição:

o ilícito administrativo não apenas ofende a disciplina e a ordem hierárquica,mas sobretudo manifesta falta de lealdade para com o espírito público relativo àfinalidade que inspirou a própria formação do Estado, e também falta de lealda-de para com a instituição a que, por seu cargo, estiver vinculado. (ROZA, p.166)

Malgrado a circunstância que o servidor público, em se envolvendo com

a prática de interdito administrativo, se expõe a uma penalidade pertinente e

proporcional à conduta, a ser aplicada à via do poder discricionário da autori-

dade administrativa, considerada a natureza e a gravidade da transgressão,

como também os danos eventualmente acarretados ao serviço público e mais

outros aspectos (BITTENCOURT, 2005. p. 107), não se presta para o enfrenta-

4“aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório eampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”

3

mento desse tipo de fenômeno, um processamento e um julgamento dessas

ocorrências eivados de vícios e a inobservância do princípio da ampla defesa e

do devido processo legal.

Em considerando esses discernimentos, nos afeta o princípio in disputa-

tione nascitur veritas erigido por Mariam Orkodashvili (2009), que “procura dis-

cutir as principais questões sobre as características e funções da universidade” e

“tenta identificar os desafios que a universidade do futuro terá de enfrentar”

(Ibid., p. 1). E ela pontifica:

O principal argumento que o [seu] ensaio faz é que, por meio da busca constan-te pela verdade, através de discussões contínuas e "disputas", a universidadedeve manter a sua função principal que é a produção de conhecimento.5 (Ibid.,p. 1)

Seguindo esses mandamentos, estamos lançando a questão da Fenome-

nologia da Ampla Defesa e do Contraditório no horizonte acadêmico, na tentati-

va de oferecer novas perspectivas de pensar a defesa e o contraditório, talvez

inciar um rompimento com paradigmas e axiomas provectos.

1a. Justificativa

A questão da ampla defesa e do contraditório, em especial, após a Carta

Cidadã de 1988, vem preocupando operadores do direito e doutrinadores com

muita frequência. A complexidade e a dificuldade do manejo desse significativo

instrumento do exercício da cidadania, exige um estudo incessante e assíduo

de sua fenomenologia.

Não raro se observa o vilipêndio e abjeção dos direitos dos brasileiros.

Embora a Nação Brasileira detenha o que se produziu de melhor tanto em rela-

ção à Carta Magna, como em relação à legislação infraconstitucional, não se

observa um proveito mínimo aceitável para o cidadão brasílio.

A nação e seus poderes ainda se afeiçoam por posições obsoletas e de

uma estética rígida. Grandes conflitos sociais e econômicos de extrema gravi-

dade, que levam a uma disputa dizimante de uma boa parte dos desagregados

5 “The main argument that the essay makes is that through constant search for the truth, through continuous discussions and „disputations‟, theuniversity should retain its core function that is the production of knowledge.”

4

nos grandes centros urbanos; fome e miséria imprimem na sociedade a estética

do ódio e da segregação de qualquer tipo de acusado.

Cabe à Sociedade manter e valorar os princípios básicos dos Direitos Hu-

manos e não se deixar levar pela voluptuosidade do vingar o direito ferido, mui-

to menos ainda, a suposição deste. É uma questão de humanitarismo, que a

cada fato não esclarecido ou suspeita se tente destruir a legalidade, para entro-

nizar uma nação sem razão, enquanto o momento exige que os interesses indi-

viduais devam fluir nos fins da própria nação.

Fundar uma Fenomenologia da Ampla Defesa e do Contraditório, à ex-

pressão de paradigmas axiológicos e jurídicos, no ambiente acadêmico é de ex-

trema relevância. Ao tempo em que nos esvaímos em conflitos comunitários,

regionais, nacionais e internacionais de grandeza centenária, como a guerra

urbana do tráfico de substâncias ilícitas, como também, em outras comunida-

des e nações, se esbarra em crises e em inconciliações infindas que prejudicam

e até depredam a vida comunitária e a sociedade como um todo. A presente

evolução poderá promover uma nova qualidade de transindividualidade e de in-

tersubjetividade, especialmente, de uma nova essência na distribuição de justi-

ça.

1b. Objetivos

A partir da análise epistemológica e ontológica da concepção de direito à

ampla defesa e ao contraditório, procura-se, sob abrangência teleológica, esta-

belecer vínculos de conteúdo e de método, para conectar uma visão de congru-

ência, que articule a formação de uma nova visão jurídico-ética nos seus con-

tructos da teoretização da subjetividade, quando da aplicação prática, em espe-

cial, enquanto produção estética e ética, sem menosprezar a legalidade.

Ainda, a título de objetivo específico, se faz inevitável um estudo pontual

da formulação de conceitos e axiomas soerguidos na doutrina, que se possa

enfrentar no côngruo ético do particularismo e do universalismo, bem como em

sua problemática. Dentro desse enigmatismo, se dará ênfase à avaliação crítica

e ontológica do direito de defesa e do contraditório como instituto de articula-

ção.

5

Por fim, também a título de objetivo específico, se faz inevitável um estu-

do pontual de fenômenos da ampla defesa e do contraditório, que retrate a rea-

lidade judicial, judicante e conflitual comunitário, à luz dos princípios defendi-

dos pelos Direitos Humanos, pela Constituição Federal, pela jurisprudência e

pela doutrina.

1c. Metodologia

Neste estudo, se aplica método qualitativo com abordagem descritiva, in-

terpretativa, observacional, analítica de dados por acesso ao respectivo ambi-

ente físico ou via internet. Da revisão literária e da jurisprudência, aclara-se e

ultima-se conceitos essenciais para o manejo do estudo, identificando embasa-

mento para o desenvolvimento do trabalho. Daí, também se consubstancia as-

pectos e perspectivas de reconhecida dessuetude no convencional do juízo.

Na análise de conteúdo referente à bibliografia, à jurisprudência e à dou-

trina, o uso da ferramenta ‘internet’ foi de importância prima, em especial, pela

atualidade instantânea.

Na extensão do procedere metodológico sequencial, será realizado o estu-

do da Faticidade, quando se funda uma nova perspectiva epistemológica, de

uma novel teorização do fato. No bojo do trabalho, entremostra-se com robusta

compleição uma nova visão de uma metafísica do fato, quando dá expressão à

verdade, ao juízo e a fatos reais, transcendentais e a priori, como importantes

ferramentas conceptualis.

6

2. Faticidade

“A nossa maior glória não reside nofato de nunca cairmos, mas sim emnos levantarmos sempre depois decada queda.”

Confúcio

No amplo sentido ontológico e, até teleológico, a compreensão fatológica

do emblema de fatos, que implica na observância da ampla defesa e do contra-

ditório, exige ainda um tratamento metafísico próprio. Situações diversificadas

e de uma amplitude quase sem finitude, podem levar o cidadão ao manejo des-

ses princípios fundamentais - eivados de vincos pelo direito natural, enquanto

momento fundante - sem a devida consciência do objeto da sua defesa ou até

da possibilidade em si.

Na propriedade analítica e metafísica vai-se encontrar um marco na ima-

nência fatológica, outro na transcendência ontológica e outro na metafísica. As-

sim, o toldar do direito do cidadão ou lhe impor penalidade em consequência a

um simples furto - na imanência do objeto subtraído – bem como, no resultado

de um cenário de intriga - na transcendência da trama estruturada de uma

bisbilhotice ou cizânia – exige um esclarecimento, no âmbito do devido proces-

so legal, que promova o restabelecimento de direito ferido.

2a. Do Fato à Faticidade

A primeira utilização do termo fato (Tatsache6) advém de Gotthold Eph-

raim Lessing (1778) no seu opúsculo Über das Wörtlein Tatsache7 (GABRIEL,

1996, p. 209). Lessing formula um conteúdo teológico para o verbete, notada-

mente, inaugura uma discussão sobre a possibilidade de o cristianismo poder

encontrar fundamento em fatos reais.

6Fato7Sobre a palavrinha fato

7

Já em Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716), vamos encontrar uma dife-

renciação no conceito fato: as Tatsachenwahrheiten8 e as Vernunftwahrheiten9.

Porquanto, Leibniz, assim como também David Hume (1711-1776), entendem

fato como resultado da experiência empírica, excluindo as verdades matemáti-

cas, justo pois especulativas. (STREMINGER, 2011)

Com o advento do criticismo em Immanuel Kant (1724-1804), encontra-

mos na sua obra Kritik der Urteilskraft10 uma inovação metafísica, quando cote-

ja a concepção de fato com as Sachen der Meinung11 (opinabile), com as Thatsa-

chen12 (scibile) e com as Glaubenssachen13(mere credibile) (KANT, 1977). Assim,

imagina o pensador alemão 'fato' com a qualidade no ramo dos objetos do co-

nhecimento, forjado por três instâncias: opinião (subjetivo-geral), conhecimento

(objetivo-geral) e fé (subjetivo-particular). E Kant avança bem mais, para ele,

'fato', enquanto res facti, cinge todos os dados e achados a priori, inclusive

abrangendo também o espaço especulativo; ou seja, lhe aufere uma dimensão

transcendental. Decididamente, nessa via de pensamento, Kant rompe com to-

das as conjunturas metafísicas aplicadas, até então, ao estudo do 'fato'.

Mais adiante no tempo, Gottlob Frege (1848-1925) se empenha em distin-

guir fatos e circunstâncias no mundo da mente, de tal modo, que os pensa-

mentos estão relacionados com a intenção, que por sua vez, se expressam por

certos sinais lógico-linguísticos, que ele chama de frases e lhe dá a qualidade

de coisa-em-si. Essas, são as portadoras de valores de verdade. Em sentido

contrário, postula Bertrand Russell (1872-1970) os fatos como extensão das

frases. Com esses autores a noção de fato vai se relacionar intimamente com a

linguagem.

Martin Heidegger (1889-1976) numa apreciação hermenêutica da razão

filosófica, reconfigura sua ontologia, tributando ao existir não mais a qualidade

de objetualidade, “mas como algo aberto à faticidade do existir”. Seguindo a tri-

lha heideggeriana de uma “hermenêutica da faticidade”, de cujo momento fun-

8Verdades de fato9Verdades de razão10Crítica do Juízo11Matérias de opinião12Fatos reais13Questões de fé

8

dante é a percepção básica do Dasein14, enquanto ser-no-mundo, daí conclui

SANTOS, que:

a hermenêutica torna-se uma característica essencial do existir humano, à medi-da que o fato de ser-no-mundo significa e é captado pelo ser em seu velar e des-velar-se. [2012, p. 73]

Essa concepção só se bem entende, afastando-se da tradicional tradução

de hermenêutica como interpretação e partindo para uma nova vereda estética

do conceito 'hermenêutica', que a liga à vida e ao existir, “desenvolvida por Sch-

leiermacher e Dilthey” [SANTOS, 2012, p. 74].

Seguindo essa circunspecção, ao tratarmos de hermenêutica de fatos, es-

tamos buscando diretamente um discernimento ligado à vida e ao existir.

Mas, ainda temos por enfrentar o niilismo nietzschiano e o seu entendi-

mento de que o homem é incapaz de apropriar-se da verdade ou do ser-em-si

do objeto de conhecimento; em contrário, segundo Nietzsch, ele forma tão so-

mente metáforas remetentes à coisa. Isso nos confronta com uma percepção do

fato, totalmente adversa daquela que deseja ver o senso jurídico, senão veja-

mos na seguinte citação de SANTOS:

“Contra o positivismo, que permanece junto ao fenômeno afirmando ‘só há fa-tos’, eu diria: não, justamente fatos não há, há apenas interpretações” (NIETZS-CHE apud CASA NOVA, 2001, p. 3115). [2012, p. 75]

Retomando o pensamento de Heidegger, lemos em SANTOS o seguinte:

A verdadeira ontologia, ao contrário, deve estar aberta à faticidade do ser, eisque a determinação do objeto da hermenêutica - o fático - está, agora, à base dainterpretação e não mais suspensa e limitada à linguagem, metáfora ou concei-tos que o homem cria para apreendê-lo.

Por facticidade, o autor entende “a designação para o caráter ontológico de ‘nosso’ser-aí ‘próprio’ […]. Esse ser-aí em cada ocasião” (HEIDEGGER, 2012, p. 13). Note-mos que o ponto de partida não é mais a linguagem, em sentido estrito, mas o ‘fático’enquanto constituído pela sua abertura, pela sua capacidade de estabelecer relação com oontológico: “fático chama-se algo que ‘é’ articulando-se por si mesmo sobre um caráterontológico, o qual é ‘desse modo’” (HEIDEGGER, 2012, p. 13). [2012, p. 77]

Aqui encontramos um momento importante nessa evolução, que estabe-

lecerá a diferença no pensamento de Nietzsche: a faticidade. Esse conceito liga

o 'ser-aí' próprio com a ocasião e, até ao acaso, como vamos ver mais a frente14 Ser aqui15CASA NOVA, M. A. Interpretação enquanto princípio de constituição do mundo. Cadernos Nietzsche,n. 10, 2001, p. 27-47.

9

com Konrad Utz. Heidegger arquiteta, assim, uma exígua ponte entre o niilismo

nietzschiano e o positivismo.

Mas, é com Habermas que faticidade toma compleição. Inicialmente, ele

vislumbra uma relação no binômio direito e moral pela racionalidade comuni-

cativa. Explicita que as teses kantianas, expoente do Idealismo Alemão, carece

de uma renovação. Daí, parte Habermas para a construção dos conceitos Ética

Discursiva e Razão Comunicativa, faceando assim a ética kantiana com os en-

genhos da razão comunicativa e com escora numa Ética da Responsabilidade

(veja Princípio da Responsabilidade16 em JONAS [1979, p. 36]).

HECK reporta sobre a visão habermasiana de relação entre o direito e a

moral nos seguintes termos (HECK, 2006, p. 19).

Habermas entende, à ocasião, que direito e moral se complementam. “Mais doque essa relação complementar”, escreve, “nos interessa, porém, o entrelaça-mento simultâneo de moral e direito”.17 O interesse é discretamente crítico emrelação a Kant, quando constata que a moral não mais está suspensa sobre o di-reito, como ocorre no direito racional, mas “desloca-se para dentro do direitopositivo sem, contudo, nele desaparecer”.18

Naturalmente, para Habermas, como nos ensina com grande proprieda-

de o renomado Manfredo de OLIVEIRA (2010, p.17), a moral tem uma funda-

mentação pós-metafísica. Posto isso, há de se melhor entender esse “entrelaça-

mento simultâneo de moral e direito” proposto por Habermas. Mesmo assim, é

esse o entendimento habermasiano de então, que oferta à moral o propósito de

legitimar o direito, porquanto a situando num universo superior ao direito.

Essa posição de complementariedade, Habermas vai emendar posterior-

mente para uma “relação de complementação recíproca” (apud HECK, 2006, p.

20). E assim, encerramos a exposição desses aspectos preliminares sobre a

postura habermasiana acerca da relação moral – direito.

16 Das Prinzip Verantwortung: “Handle so, daß die Wirkungen deiner Handlungen verträglich sind mit der Per-manenz echten menschlichen Lebens auf Erden”. [Aja de modo que os efeitos da sua ação sejam compatíveis com a permanência de autêntica vida humana sobre a Terra.]17HABERMAS, Jürgen. Recht und Moral (Tanner Lectures 1986). In: Faktizität und Geltung. Beiträge zurDiskurstheorie des Rechts und des demokratischen Rechtsstaats. 3. Aufl. Frankfurt a. Main: Suhrkamp,1993, p. 568. “Mehr als dieses komplementäre Verhältnis interessiert uns jedoch die gleichzeitige Versch-ränkung von Moral und Recht”(apud HECK, 2006, p. 19)18Ibidem. (S)ie [die Moral] wandert ins positive Recht ein, ohne darin aufzugehen”. (apud HECK, 2006, p. 19)

10

Emporisso, Habermas contribui fundamentalmente para a teoria do con-

ceito faticidade, pelo que continuamos na leitura de HECK com o seguinte tex-

to:

As alterações na trajetória habermasiana que envolvem o modo de conceber asrelações entre moral e direito refletem a substituição do facto da razão kantianopor um discurso neutro sob ponto de vista deontológico. Segundo Kant, é emvirtude do poder vinculante da lei moral que o homem tem simultaneamenteconsciência de sua liberdade e a certeza de pertencer a um mundo não submeti-do à causalidade das leis naturais. “A garantia da realidade objetiva do princí-pio superior da razão pura prática”, escreve W. Kersting, “está na facticidade darazão de determinar sem rodeios a vontade na pretensão de ser, ela própria,vontade”.19 Tal facticidade, Habermas não a percebe – como Kant – no conceitodo respeito pela lei moral, mas a toma exemplarmente, já na segunda edição(1973) de Conhecimento e interesse (1968), como inserção da comunidade idealde comunicação na práxis da vida de sistemas sociais20 e, mais recentemente,como escopo imanente à linguagem.21 À luz das substituições feitas, a facticida-de da razão pura prática corre o risco, na última década do século XX, de nãoser mais ou não ser outra coisa do que uma charada de mau gosto. Habermasescreve: “Tão somente uma fundamentação do princípio moral, que não se dápor satisfeito em apontar para um facto da razão, pode esvaziar a suspeita deum sofisma etnocêntrico”.22 (HECK, 2006, p. 20-21)

Daí anota HECK:

Descredenciada como lei moral, a facticidade kantiana da autonomia da vonta-de dá lugar em Habermas à “figura de pensamento da autolegislação” que, des-codificada teórica e discursivamente, revela que “os destinatários de direito são,ao mesmo tempo, os seus autores”, ao mostrar a origem simultânea da autono-mia privada, em acepção kantiana, e da autonomia pública, de estirpe rousseau-niana.23 A troca da razão pura kantiana qua vontade (facto da razão) pelo exercí-

19KERSTING, Wolfgang. Wohlgeordnete Freiheit. Immanuel Kants Rechts- und Staatsphilosophie. Frank-furt a/Main: Suhrkamp, 1993, p. 123. “Die Garantie der objektiven Realität des obersten Grundsatzes der reinenprak-tischen Vernunft liegt in der Faktizität des Anspruchs der Vernunft, den Willen unmittelbar zu bestimmen, indem Anspruch, selbst Wille zu sein […]”. (apud HECK, 2006, p. 20)20HABERMAS. Erkenntnis und Interesse. 6. Aufl. Frankfurt a/Main: Suhrkamp, 1973, p. 416-417. “Weildie em-pirische Rede allein durch die Grundnormen vernünftiger Rede möglich ist, ist die Diskrepanz zwischen ei-ner realen und einer unvermeidlich idealisierten (wenn auch als ideal unterstellten) Kommunikationsgemeinschaftnicht nur in Argumentation, sondern bereits in die Lebenspraxis gesellschaftlicher Systeme eingebaut – vielleichtlässt sich in dieser Form die kantische Lehre vom Faktum der Vernunft erneuern” (frase conclusiva do posfácio àsegunda edição). (apud HECK, 2006, p. 20)21Idem. Vorstudien und Ergänzungen zur Theorie des kommunikativen Handelns. 3. Aufl. Frankfurt a.Main: Suhrkamp, 1989, p. 498. “(U)nd wenn es sinnvoll ist, den philosophischen Begriff von Vernunft anhandder Rolle zu rekonstruieren, die diese Geltungsansprüche in Verständigungsprozessen alttäglicher oder argumenta-tiver Art spielen; dann lässt sich das der Sprache innewohnende Telos der Verständigung, in Analogie zum Kantis-chen Sprachgebrauch, eine ‘Vernunfttatsache’ nennen”. (apud HECK, 2006, p. 20)22Idem. Treffen Hegels Einwände gegen Kant auch auf die Diskursethik zu? In: Erläuterungen zurDiskursethik. Frankfurt a. Main: Surhkamp, 1991, p. 12. “Nur eine Begründung des Moralprinzips, die ja ni-cht schon durch den Hinweis auf ein Faktum der Vernunft geleistet wird, kann den Verdacht auf einen ethnozen-trischen Fehlschluss entkräften”. (apud HECK, 2006, p. 21)23Idem. Zur Rekonstruktion des Rechts (I): Das System der Rechte. In: Op. cit., p. 135. “Die Gleichursprün-glichkeit von privater und öffentlicher Autonomie zeigt sich erst, wenn wir die Denkfigur der Selbstgesetzgebung, wonach die Adressaten zugleich die Urheber ihrer Rechte sind, diskurstheoretisch entschlüsseln”. (apud HECK,

11

cio da autolegislação (figura de pensamento) equivale a um translado semânticoda moral, quer dizer, essa abandona a razão prática e passa a integrar os domí-nios da razão teórica. Com isso, a ética do discurso assume as feições cognitivasda ação comunicativa habermasiana.24 (HECK, 2006, p. 21)

Resolutamente, retoma Habermas as concepções hegelianas ao formular

a sua Ética do Discurso. A estafante exposição em volta de justiça e solidarie-

dade, para desenvolver um conceito de ética demonstrada pela obtenção dos

processos do agir comunicativo, dentro de uma lógica hegeliana, não inova,

mais confunde. Já a troca da autonomia da vontade em Kant, pela autolegisla-

ção dialética em Habermas, dificilmente trará um avanço na questão.

Ultimando em Habermas, constata-se na sua doutrina que o direito só

pode ser entendido a partir da noção de uma "tensão entre faticidade e valida-

de". Nesse contexto, Faticidade, ao entendimento habermasiano, situar-se-ia

na esfera dos fatos, das coisas como elas são e funcionam, na perspectiva do

êxito real, insensível às demandas do certo ou do errado. (HABERMAS, 1993)

No afinco de fundar uma Filosofia do Acaso (Philosophie des Zufalls), es-

boça Konrad UTZ (2005) pertinentes questionamentos, que ajuda a se colher

um melhor entendimento da questão da faticidade, mesmo enquanto acaso.

Sua análise, se inicia com a abordagem metafísica, que logo abandona, pois ca-

racteriza o esforço metafísico como uma redução e isso não serviria ao esclare-

cimento do progresso científico. Enfoca a seguir, a questão do paradigma do

Gründewissen25, quando reluta em aceitar, sob o argumento de que a humani-

dade desde tempos imemoriáveis investiga o paradigma das razões ou do co-

nhecimento das razões, buscando enfim a razão final ou absoluta, mas dada, a

antes referida redução, não se pode alcançar um pleno conhecimento das ra-

zões. Ainda observa o autor alemão, uma troca de paradigmas (Paradigmenwe-

chsel), implementada preferencialmente por Kant e pelas ciências naturais, que

nos revela consistir o ser como ele próprio se constitui e que é independente de

qualquer razão de ser. Finalizando, apura o preclaro filósofo alemão, que o

Princípio da Redução na sua essência é uma composição (Konstruktion), um

2006, p. 21)24DUTRA, Delamar V. Kant e Habermas. A reformulação discursiva da moral kantiana. Porto Alegre: Edi-pucrs, 2002, p. 103-107. (apud HECK, 2006, p. 21)25Conhecimento das razões

12

simples conceito formal (Formalbegriff), porquanto não pode conter qualquer

substância (Gehalt). (UTZ, 2005, p. 16-37)

2b. Omnis determinatio est negatio26

Essa assertiva atribui Hegel a Spinoza. Na realidade, Spinoza escreve na

Carta 50 a Jarig Jelles literalmente: determinatio negatio est (determinação é

negação), casualmente, ao discutir o princípio da relação geométrica. Já para

Hegel, numa palestra sobre a História da Filosofia, esse princípio é a ideia-cha-

ve de Spinoza, que fala de como cada determinação, que eu dou a um objeto,

outras disposições são excluídas, portanto, qualquer determinação positiva é

cotejada com uma negativa. (WALTHER,1992)

Determinação é a negação posta como afirmativa e é a proposição de Spi-

noza. Esta proposição é extremamente importante; unicamente a negação,

como tal, é uma abstração sem forma, no entanto, a filosofia especulativa não

deve ser acusada de fazer negação ou de colocar o nada como finalidade: a ne-

gação é tão pouco um final, em si, para a filosofia, tanto quanto a realidade

lhe é posta como verdade. Nesse nada, incidi a negação geral, ou de uma forma

mais concreta, a limitação, o finito, a restrição; determinatio est negatio é o

grande enunciado de Spinoza. (HEGEL, 1831)

WALTER (1992. p. 4) relata, na espécie, sobre o seguinte escrito da lavra

de Spinoza:

No que diz respeito à afirmação de que esta figura é uma negação e não algopositivo, é óbvio que o assunto em sua totalidade, considerada sem limitação[indefinido consideratam], não pode ter figura, e essa figura só se aplica aos cor-pos finitos e determinados. Para quem diz que ele percebe uma figura, significa,assim, o indicativo, simplesmente, de que apreende uma coisa determinada e asmodalidades de sua determinação. Esta determinação, portanto, não pertence àcoisa em relação a sua existência [ESSE], pelo contrário, é a sua não-ser [nãoESSE]. Então, figura não é nada, mas determinação, e determinação é negação

26Toda determinação é negação.

13

[Quia ergo figura non aliud, quam determinatio, et determinatio negatio est], a figurapode ser nada mais do que a negação, como já foi dito.

Já para Sartre, na sua visão existencialista, o nada vai se apropriar de

outra idealização, como podemos ler em SANTANA (2006, p. 4):

Diante do Em-si está o Para-si, que para Sartre é a consciência. Dito de outra for-ma, o ser do ser humano antes de ser designado com o Para-si, era plena positi-vidade, plena identificação consigo mesmo, um Em-si, que por ventura decaiuem processo de nadificação27, que rumou ao Para-si. Contudo, esta nadificação éa própria interrogação de si sobre si, que resulta que a descompreensão do serEm-si ao Para-si é dado pelo ato da interrogação do Em-si diante de si próprio.Esse desgarramento do ser em relação a si, esta separação é proporcionada pelonada. Sartre descreve: (…) “o nada é esse buraco no ser, essa queda do Em-si a si, pelaqual se constitui o Para-si. Mas essa queda não pode ‘ser tendo sido’ salvo se a sua exis-tência emprestada for correlata a um ato nadificador do ser. Esse ato perpétuo pelo qualo em si se degenera em presença a si é o que denominaremos de ato ontológico. O nada éo ato pelo qual o ser coloca em questão seu ser ou seja, precisamente a consciência ouPara-si”. (SARTRE. 2002, p. 127-128)

Para Sartre “o nada da realidade humana advém pela interrogação que ao

buscar um ser na consciência constata o nada”. E essa interrogação sartreana

é essencialmente metafísica, mas só se desenvolve no ambiente da condição

humana, fundada em “algo que faz parte da estrutura do ser humano, o que

está no âmago do ser, que é (o) nada”. O dualismo gerado por Sartre rompe com

a metafísica tradicional. Enquanto, a metafísica tradicional busca pela causa,

pelo fundamento, Sartre busca pelo que denomina de “princípio possibilitador”,

“isto é, o que possibilita a constituição da consciência, a possibilidade de ser”.

(apud SANTANA, 2006, p. 6.)

Ao analisar a questão do omnis determatio est negatio, Konrad Utz (2005)

se envolve inicialmente com o quesito da Bestimmung [determinação], que lhe

dá as qualidades de simplesmente existir, e, em certa medida, de existente a

forma vigorosa e original. Aponta ainda a divergência reinante, se sobre essa

existencialidade da determinação tem o caráter de existencialidade no mundo

(Vorhandenheiten in der Welt) ou de existencialidade na consciência (Vorhande-

nheit im Bewuβtsein); ou ainda, se as duas formas são possíveis. Informa-nos

então, que Aristóteles antecedeu Spinoza na análise do fenômeno.27Nadificação (néantisation) que deriva de nadificar, cuja tradução mais aproximada de néantiser, neolo-gismo francês criado por Sartre, que significa “‘secretar’ o nada nas partes do mundo estranhas à situação do sujeito, ‘esvaziá-las’ e ‘eliminá-las’, de alguma “maneira” "(cf. RUSS, 1994, p. 194). A nadificação, para Sartre, tem dois sentidos: a realidade humana surge emergindo dela o não-ser e por ela é que o mundo se acha suspenso no nada, ou seja, a consciência não é o mundo tal como não é uma identidade como se apresen-ta o mundo. (apud SANTANA, 2006, p. 4)

14

Em seguida, acudindo-se de Kant aquele autor alemão insere na discus-

são do acima aludido fenômeno, a faticidade (no sentido de Gegebenheit28) em

relação a possibilidade, que não obrigatoriamente necessitam ocorrer simulta-

neamente, mas sensíveis ao empírico.

Daí conclui o ínclito autor alemão, como a seguir se mostra:

Mas, se não existe a possibilidade de assumir o regresso como completado em"algum lugar", em qualquer esfera, sendo que, aquilo que deve constituir a de-terminação além da negação, em parte alguma de fato existe, então existe nada,assim nada factual pode existir, o que a determinação é além da negação – e issoé, como já visto, impossível.29 (UTZ, 2005, p. 45)

Dada essas implicações, se faz necessário o apuro ontológico da questão

sub examine dentro de uma análise profícua e cientificamente fundada com o

desiderato de agenciar uma reengenharia metafísica da faticidade no âmbito do

Direito, posto que urge eleger a necessidade de uma compreensão aberta e es-

peculativa, como fundamental, para a abordagem desse conceito.

Também encontramos nos escritos de Russell (1912, p.122) que não é o

encontrar a verdade o grande fruto da contemplação filosófica (perfeitamente

também aplicável ao Direito), mais ainda, é intentar a busca da verdade, e isso,

por causa dos próprios problemas, porque esses problemas ampliam as concep-ções que temos acerca do que é possível, enriquecem a nossa imaginação inte-lectual e diminuem a arrogância dogmática que impede a especulação mental;mas sobretudo porque, graças à grandeza do universo que a filosofia contem-pla, a mente também engrandece e se torna capaz daquela união com o univer-so que constitui seu bem supremo”.

2c. Aufklärung30 e Mediação: fi losofando no Direito

O filosofar no Direito é de fundamental importância para um bom desem-

penho do manejo da Justiça como um todo. Uma dimensão importantíssima

neste cenário é a contribuição de Kant no que afeta a questão da Aufklärung.

Nesse conceito soerguido por Kant (1977; 1985) se vislumbra algumas impor-

tantes concepções, em relação à faticidade, que se pode contemplar a atividade28Situação29“Wenn aber nicht mehr die Möglichkeit besteht, den Regress “irgendwo', in irgendeiner Sphäre als abgeschlossen anzunehmen, i.e. wenn es nirgendwo dasjenige, was die Bestimmung über die Negation hinaus ausmachen soll, tatsächlich gibt, dann gibt es nichts, dann kann nichts Tatsächliches gegeben sein, was die Bestimmung über die Negation hinaus ist – und das ist, wie gesehen, unmöglich.”30Iluminação, esclarecimento, acordamento.

15

do operador do direito. De início, ele anota que a „Aufklãrung é a emergência do

homem de sua própria autoinfligida imaturidade”31. Kant explica com precisão o

termo Unmündlichkeit [imaturidade]: “Imaturidade é a incapacidade de uso de

seu entendimento sem a orientação de um outro”32.

E Kant (Ibd.) continua:

Assim é difícil individualmente para cada pessoa se livrar da imaturidade, quequase se tornou a sua natureza. 33

[...]

Consequentemente, existem só poucos que conseguiram se desvendar da ima-turidade pela transformação do próprio espírito, e ainda empreender um andarseguro. 34

Como observado, Kant implica na necessidade da ‘orientação de um ou-

tro’ para que as pessoas comuns consigam encontrar a Aufklärung, que mais

ainda se faz imprescindível no momento em que Kant (1783) discorre sobre o

juízo sintético e o analítico.

Uma das mais importantes obras de Hegel (2005), Fenomenologia do Es-

pírito35 trata essencialmente da consciência, da autoconsciência e da razão. Em

outra obra, “Linhas Fundamentais da Filosofia do Direito”36 (HEGEL, 1997),

esse autor alemão oferece grandes ensinamentos filosóficos na área do Direito,

o que naturalmente qualifica o filósofo a uma atividade de ‘orientação de um

outro’ nesses dois ambientes profissionais. Ainda, Gelamo (2008, p. 156) e No-

velli, (2005) discorrem em referência a Hegel37 sobre sua atividade como peda-

gogo, quando o primeiro inclui ensinar Hegel “que os alunos podem aprender o

exercício da abstração, a qual se configura como essencial para o pensamento fi-

losófico.” Dessa acepção, se pode concluir que Hegel vislumbra na lógica a ci-

31“Aufklärung ist der Ausgang des Menschen aus seiner selbst verschuldeten Unmündigkeit.“32„Unmündigkeit ist das Unvermögen, sich seines Verstandes ohne Leitung eines anderen zu bedienen.“33„Es ist also für jeden einzelnen Menschen schwer, sich aus der ihm beinahe zur Natur gewordenen Unmündigkeitherauszuarbeiten.“34„Daher gibt es nur wenige, denen es gelungen ist, durch eigene Bearbeitung ihres Geistes sich aus der

Unmündigkeit her aus zu wickeln, und dennoch einen sicheren Gang zu tun.“35 Phänomenologie des Geiste.36 Grundlinien der Philosophie des Rechts.37 HEGEL, F. (1809-1822): Escritos pedagógicos. México: Fondo de Cultura Econômica, 1991 (Apud: Gelamo,

Rodrigo Pelloso: O Ensino da Filosofia e o Papel do Professor-Filósofo em Hegel. Trans/Form/Ação, SãoPaulo, 31(2): 153-166 2008).

16

ência que contribui para esse fenômeno, fundamentando no caráter abstrato e

num conteúdo que se distancia da realidade imediata, pois

[...] para Hegel, a filosofia exige empenho reflexivo e analítico, o que não se ob-tém preso à avalanche dos interesses materiais. Desta forma, a filosofia nãodeve sofrer uma popularização, mas o povo deveria ser elevado ao nível da filo-sofia. Hegel não é favorável às concessões e facilitações, mas ao mesmo temponão desconhece o contexto dentro do qual a filosofia é praticada. Nem todostêm os requisitos necessários para o exercício filosófico, porém é possível tê-losna medida em que se submeterem à empreitada que se deve assumir para ad-quirir o exigido. A filosofia, como tal, possui um conteúdo específico na medidaem que se interessa por certos temas e de um modo todo particular, do qual oindivíduo, interessado no exercício do filosofar, deve se apropriar. A apropria-ção do conteúdo da filosofia implica a concomitante e necessária apropriação datambém perspectiva filosófica. Hegel insiste nesse aspecto ao sustentar a prima-zia do conteúdo em relação àquele que o apreende. (NOVELLI, 2005, p. 136)

A antes abordada ‘orientação de um outro’ kantiano, exsurge também em

Hegel como ‘mediação mediada’, quando ele analisa a aprendizagem da filosofia

com também a do filosofar, ao que relata com muita propriedade Novelli (2005,

p. 147):

A aprendizagem da filosofia ou do filosofar através de sua história também in-dica que, para Hegel, ninguém aprende sozinho, mas sempre através da media-ção de um outro. O professor, os colegas, os textos são mediações pelas quais aaprendizagem se realiza. A mediação é o momento pelo qual o real se efetiva ouobtém status do ser como existente. Entre os textos e os colegas destaca-se a me-diação do professor, pois este pode atuar como uma mediação mediada, isto é,que já assumiu para si a história da filosofia. Mais do que um facilitador o pro-fessor se põe como um paradigma para os alunos, uma vez que ele mesmo nãochega à história da filosofia senão através da experiência pessoal com ela. Oprofessor também não é um reprodutor, pois sua mediação não determinarácomo a história da filosofia deverá ser compreendida, visto que o processo dofilosofar produz o filósofo e este, como tal, poderá continuar indagando. Alémdisso, a mediação situa sempre a perspectiva do todo ou da superação da singu-laridade pela relação com algo mais.

Em todo esse complexo e amplo percurso ontológico e metafísico, sobeja

a esplendorosa importância da Filosofia como apoio fundamental do Direito,

que em sendo fruto de seu estudo e, embora esse conteúdo espelhe contradi-

ções, dela se torna, sem qualquer perda de sua essência, robusta substância

para o seu diversificado ofício de operar o Direito.

À guisa de complemento, se tomarmos a Filosofia do Direito a título de

arquétipo, verificamos que todo o arcabouço teórico da Ética, desde Aristóteles,

encontra uma aplicação prática súbita, que se torna assim a base fundamental

das ciências jurídicas. Enquanto se avalia as ações sob o prisma de 'bom' e

17

'ruim', em consequência se analisa os aspectos de Direito e de Justiça, como

também assim, se adjetiva conformações violadoras de regras morais e éticas.

Ao filosofar no Direito, estamos questionando qualidades aferentes à ontologia

e à metafísica, ao instituir e ao legitimar, ao resguardar direito natural e direito

positivo; fazer aforar a sequência de importâncias, preferências legais e legíti-

mas das normas legais, bem como as revogações. Tudo isso é transunto crista-

lino da prática da Filosofia no âmbito do Direito.

Dos Filósofos, que se dedicaram ao estudo dos fundamentos do Direito,

apontamos entre os mais proficientes: Hugo Grotius, Niccolò Machiavelli, Tho-

mas Hobbes, G. W. F. Hegel, Hans Kelsen, Gustav Radbruch, H. L. A. Hart, Nik-

las Luhmann, Jürgen Habermas, John Rawls, Ronald Dworkin e Robert Alexy;

no Ceará, especificamente, destacamos Raimundo de Farias Brito, Clóvis Bevi-

láqua, Quintino Cunha, Paulo Bonavides, Manfredo A. de Oliveira, Oscar

d'Alva, Raimundo B. Falcão e Arnaldo Vasconcelos.

18

3. Axiologia do Processo Legal

“Não é a chancela da autoridadeque valida o ato e o torna respeitá-vel e obrigatório. É a legalidade apedra de toque de todo ato adminis-trativo.”

Hely Lopes Meirelles.

Nas mais diversas esferas e dissimílimos processos é corrente não ofere-

cer aos acusados o amplo e irrestrito direito de defesa e ao contraditório, que é

constitucional e indiscutível, previsto no art. 5º, inciso LV da Carta Magna. Na

grande maioria dos casos, os membros da comissão processante não detêm,

sequer, uma percepção básica na linhagem. Seguem uma 'receita de bolo' ela-

borado por uma pessoa sem a qualificação, o que, indubitavelmente, leva a

todo tipo de vícios. Decididamente, qualquer tipo de 'receita de bolo' se mostra

totalmente imprestável para a complexa atividade processual, mesmo em sim-

ples conflitos comunitários, com menor propriedade ainda, no âmbito adminis-

trativo ou no trabalhista, ou ainda em qualquer esfera formal.

De outra forma, o acusado muitas vezes preencheu todas as formalida-

des e cumpriu, na íntegra, as normas legais regulamentadoras dos atos objeto

do processo, mesmo assim são expostos ao constrangimento do processamen-

to, não raro por motivos ímprobos.

Ademais, o documento inicial da denúncia deve preencher as exigências

da legislação vigente para receber validade como prova, pois em não sendo

apresentado em seu original (ou cópia autenticada) e nem vindo a denúncia

acompanhada de comprovante para as alegações feitas resta vazia a incrimina-

ção.

Finalmente é válido evocar aqui o artigo 5º, incisos LIII (ninguém será

processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;), LV (aos litigi-

antes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são as-

segurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela ineren-

tes;), XXXV (a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou amea-

19

ça a direito;), XXXVI (a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico per-

feito e a coisa julgada;) e art. 166 do CC/2002 (É nulo o negócio jurídico quan-

do: I – celebrado por pessoa absolutamente incapaz; II – for ilícito, impossível ou

indeterminável o seu objeto; III – o motivo determinante, comum a ambas as par-

tes, for ilícito; IV – não revestir a forma prescrita em lei; V – for preterida alguma

solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; VI – tiver por obje-

tivo fraudar lei imperativa; VII – a lei taxativamente o declarar nulo, ou proi-

bir-lhe a prática, sem cominar sanção.) e 167 do mesmo diploma legal (É nulo o

negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na

substância e na forma.)

Dada a circunstância física de impossibilidade da abordagem de todo o

arrabalde axiológico da defesa e do contraditório, passamos a abordar especifi-

camente alguns poucos componentes dessa esfera jurídica, para não sobrepu-

jar o ambiente monográfico.

3a. Legitimidade

Não só nas ciências jurídicas, o conceito de Legitimidade recebe impor-

tância. A palavra advém do termo latino legitimus e também é objeto de estudo

da Sociologia e das Ciências Políticas. Daí resulta o Princípio da Legitimidade,

que após a fundação da ONU, tomou um lugar fundante nas relações interna-

cionais em geral e, em especial, no Direito Internacional.

Ao estudo da teoria da Legitimidade no recinto do Estado e do domínio,

destacou-se o filósofo alemão Franz Oppenheimer (médico, sociólogo, economis-

ta e sionista), que na leitura do ilustrado sociólogo (muitas vezes também to-

mado como filósofo) Karl Marx, aquele define legitimidade como o conteúdo e a

vida do poder do Estado. Daí, se toma que o filósofo alemão sustenta o caráter

ideário, enquanto que o jurista, geralmente, se apega a uma descrição formal

jurídica.

Já na sociológica o conceito de legitimidade só pode encontrar embasa-

mento na realidade. O povo confere a norma ao Estado pelo 'entusiasmo' ou

'renúncia', fato esse, que é compreendido como legitimação. Pelo fato de que, a

maioria da população sustenta o sistema político com o uso desse dualismo, a

20

estabilidade é realizada e o poder se impõe. Se essa 'compreensão' se torna fra-

ca, então a estabilidade do domínio estatal é fraca. Dessa forma, a legitimidade

sociológica e o poder de domínio (do Estado) seguem de mãos dadas, mesmo no

sentido da louva do magnânimo Carlos Drummond de Andrade.

Seguindo a trilha de Max Weber (1864-1920) vamos atinar o conceito de

dominação, através do qual Weber vai diferenciar a dominação legítima em três

categorias: a tradicional, a carismática e a racional. A tradicional expressa-se

pela fé ou crença nas boas intenções dos dominadores ou autoridade patriar-

cal; a carismática manifesta-se pelo poder carismático pessoal do dominador,

que Weber deseja ver como uma força revolucionária de romper as forças políti-

cas reinantes; já a racional toma como alicerce a crença da legalidade da or-

dem institucional e o direito de determinar daqueles, que foram designados por

aquela para exercerem o domínio (domínio legal). Isso dado, lembra Weber, que

a base para a validade de todo domínio legítimo é a pretensão de legitimidade

dos dominadores e a crença dos dominados na legitimidade. Dessarte, na do-

minação tradicional, a suposta "santidade" da ordem tradicional, com suas res-

pectivas instituições, procedimentos e normas de ação (por exemplo, por man-

do dos céus) é a base vigente; na dominação carismática essa base se expressa

na devoção emocional a uma pessoa por força de suas atribuídas propriedades

extraordinárias e na dominação racional, seria a crença na legalidade das insti-

tuições constituídas com suas normas e regras. (WEBER, 1964. p. 159)

A partir desses pressupostos, se pode depreender, que a legitimidade so-

ciológica do domínio estatal não pode derivar de outro princípio senão do domí-

nio estatal (ou da violência estatal, como diria Walter Benjamin), qual seja a o

poder factual do próprio Estado. Todavia, ela não é formal-jurídica, mas sujeita

ao poder concreto do Estado. A Legitimidade conhece da sua concretude de si

própria, ou melhor, através do estabelecer o poder, o direito e a (nova) ordem,

como também, por intermédio da solidificação de uma legalidade e legitimidade

formal-jurídicas próprias.

Na doutrina pátria, encontra-se na lição de Cretella Júnior uma precisa

definição de legitimidade, in verbis:

Legítimo é o ato administrativo, se editado de acordo com as normas jurídicasvigentes; ilegítimo, em caso contrário. (CRETELLA Júnior, 1964, p. 38)

21

Enquanto isso, o grande mestre Hely Lopes Meirelles clama pela confor-

mação, formal e ideológica, com a lei, conforme se toma abaixo:

A ilegitimidade, como toda fraude à lei, vem quase sempre dissimulada sob asvestes da legalidade. Em tais casos é preciso que a Administração ou o Judiciá-rio desçam ao exame dos motivos, destaquem os fatos e vasculhem as provasque deram origem à prática do ato inquinado de nulidade. Não vai nessa atitu-de qualquer exame do mérito administrativo, porque não se aprecia a conveni-ência, a oportunidade ou a justiça do ato impugnado, mas unicamente a suaconformação, formal e ideológica, com a lei em sentido amplo, isto com todosos preceitos normativos que condicionam a atividade pública. (LOPES MEIREL-LES, 1998, pag. 164).

Ainda, seguindo os ensinamentos do ínclito mestre Hely Lopes Meirelles,

apontamos o que segue:

O Conceito de ilegalidade ou ilegitimidade, para fins de anulação do ato admi-nistrativo, não se restringe somente à violação frontal da lei. Abrange, não só aclara infringência do texto legal, como também o abuso, por excesso ou desviode poder, ou por relegação dos princípios gerais do direito. Em qualquer dessashipóteses, quer ocorra atentado flagrante à norma jurídica, quer ocorra inob-servância velada aos princípios do direito, o ato administrativo padece de víciode ilegitimidade e se torna passível de invalidação pela própria Administraçãoou pelo Judiciário, por meio de anulação." (Ibd.)

Também é extremamente importante a obediência literal e ao espírito da

lei, como nos ensina a seguir e com as melhores das propriedades a professora

Carolina Zockun:

É certo que a obediência à lei não somente se restringe à sua literalidade, mas,principalmente, a seu espírito, à sua consagração como instrumento de agrega-ção de valores e princípios de uma sociedade em dado espaço e tempo.

J.J. FERREIRO LAPATZA acrescenta que a força da lei advém do fato de ser amais genuína forma de representação da vontade popular. Assim, continua omestre, o princípio da legalidade adverte que só a lei pode regular determina-das matérias, precisamente aquelas que garantem uma organização social base-ada na liberdade individual38. (ZOCKUN, [s.d.], p. 2)

38Apud LAPATZA, J. J. FERREIRO. (“El Princípio de Legalidad y La Reserva de Ley”. Revista de DireitoTributário. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, nº 50, página 7). Na íntegra e no original o autoraverba: “El rango de la Ley, la fuerza de la Ley, en nuestro ordenamiento, como en todos aquellos quetratan de organizar una democracia pluralista de acuerdo con el principio de la división de poderes, deri-va, insistimos de que ella es la expresión más genuina y representativa de la voluntad popular. La Ley re-presenta la vonluntad de autoformación de una colectividad que no reconoce otros poderes que los queemanan del conjunto de los ciudadanos que forman parte de ella. Refleja las normas que la comunidad seda a si misma a través de sus representantes y debe contener, por tanto, el entramado básico del sistemajurídico, aquel en que se basa y encuentra apoyo el resto de la normativa que configura el ordenamiento.Pues sólo reservando a la ley tal entramado básico el sistema garantiza la primacia de la voluntad popu-lar.El principio de legalidad, según el cual la Ley y sólo la Ley ha de regular ciertas maetrias [sic], precisa-mente aquellas que garantizan una organización social basada en la libertad individual, incorpora, esen-

22

3b. Desvio de Poder

Também conhecido como 'Desvio de Finalidade' é um conceito muito co-

nhecido nos feitos em face de autoridades. Ele se encontra inserido logo no art.

2.º da Lei N.º 4.717/1965, que rege a Ação Popular. Mas, essencialmente, o

Desvio de Poder ou de Finalidade constitui um ato de improbidade administra-

tiva, que está previsto, de forma larga, na Lei N.º 8.429/1992.

Decididamente, é um ilícito com uma enorme dificuldade probatória,

posto ter em seu cerne a intenção de simular, de mascarar. Resta patente, que

o gestor, ao praticar a antijuricidade, se arvora em simulação, em mascaração,

em atender à 'necessidade do serviço' ou até no 'interesse público'.

CRETELLA Jr. reputa esse fenômeno a título de sintomas, à leitura da

doutrina francesa, ad litteram:

Entre os índices ou sintomas denunciadores do desvio de poder a doutrinafrancesa, baseada em decisões do Conselho de Estado, aponta os seguintes: (a)pressa com que o ato foi editado, (b) inexistência dos motivos apresentados peloadministrador para justificar a decisão tomada, (c) desigualdade de tratamentodos interessados, (d) caráter sistemático de certas interdições, (e) caráter geralatribuído à média que deveria permanecer particular, (f) circunstâncias locaisque antecederam a edição do ato. CRETELLA JUNIOR, 1980, pag. 311).

O ambiente é extremamente vasto e abrange todas as áreas do Direito,

admitindo três principais espécies: o excesso de poder, o desvio de poder e o

desvio de finalidade, ainda, conforme o caso, pode acarretar nulidade absoluta

ou relativa.

In casu, trata-se de “poder exercido em sentido diferente daquele em vista

do qual fora estabelecido” (CRETELLA JUNIOR, 2000, p. 291) De modo definiti-

vo, o gestor, que se excede nesse tipo de delito, está revestido da necessária

competência para tal fim. Entrementes, no exercício de suas funções legais se

afasta do fim legal (ou do espírito da lei) para perseguir finalidade desseme-

lhante ao visado pelo instrumento legal. Além de tudo, sua natureza e seu dis-

cernimento de justeza, no mínimo intrincada, revestem-se duma acepção, na

qual o elemento fim é instalado em ênfase, para mascarar o afastamento da fi-

nalidade ou do interesse público. Na prática do desvio de poder, o gestor “usa

de sua competência, de acordo com as formas prescritas em lei”, (...) “para exer-cialmente, la idea de que en una sociedad libre sólo la comunidade puede darse a sí misma, a través desus representantes, normas sobre tales materias.”

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cer o poder que lhe é posto nas mãos”, não, entretanto, “para perseguir” o fim le-

gítimo, não obstante persegue “fim diverso daquele que a lei lhe conferira”. (Ibd.,

p. 292)

Um outro momento importante nessa controvérsia é o instituo do poder

de discricionariedade da administração, que grandemente e não raro leva ao

abuso de poder. Todavia, a discricionariedade, em sua propositura ontológica e

teleológica, essencialmente a título de liberdade de eleição, deve transitar entre

alternativas igualmente justas, ou entre indiferentes jurídicos, pois a decisão

da administração encontra fundamento em parâmetros extrajurídicos, remeti-

dos ao juízo subjetivo da Administração, pela impossibilidade de inserção no

texto normativo. (ZOCKUN, [s.d.], p. 7; apud ENTERRÍA39)

Suplanta ainda Zockun, apud Celso Antônio Bandeira de Mello40, que

esse

corretamente, rechaça a ideia de que a eleição é sempre entre indiferentes jurídi-cos. Na verdade, diz o autor, consoante demonstrar-se-á a breve tempo, que aoadministrador cabe fazer, não qualquer escolha, mas a melhor opção possívelpara o caso concreto. (ZOCKUN, [s.d.], p. 7)

A abalizada lente desvenda que “a margem de liberdade só existe quando

a lei a conferir ao administrador”, para em seguir constatar que “existência de

prévia lei, não há que se falar em competência discricionária, posto que a lei é o

único instrumento jurídico que validamente atribui competências”. Em vista disso

complementa que “o princípio da legalidade fundamento e limite da atuação dis-

cricionária”. (ZOCKUN, [s.d.], p. 7)

Utilizando-se de Eduardo Garcia de Enterría leciona a autora antes refe-

rida:

Não há, pois, discricionariedade à margem da lei, senão justamente somente emvirtude da lei e na medida em que a lei haja disposto.41

39ENTERRÍA, EDUARDO GARCÍA DE E FERNÁNDEZ, TOMÁS-RAMÓN. Curso de Derecho Adminis-trativo. Madrid: Editora Thomson Civitas, 12ª Ed. P. 466-467.40BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio: Discricionariedade e Controle Jurisdicional. São Paulo: EditoraMalheiros, 2ª Ed., 2003.41ENTERRÍA, EDUARDO GARCÍA DE E FERNÁNDEZ, TOMÁS-RAMÓN. Curso de Derecho Adminis-trativo. Madrid: Editora Thomson Civitas, 12ª Ed., página 462. No original: “No hay, pues, discrecionali-dad al margen de la Ley, sino justamente solo en virtud de la Ley y em la medida en que la Ley haya dis -puesto”. (apud ZOCKUN, [s.d.], p. 7)

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Com maior relevância temos a inquirição sobre hipótese da matéria dis-

cricionariedade adunar-se com a liberdade de escolha. Nesse sentido, assim se

pronuncia Afonso Rodrigues Queiró:

o poder discricionário da Administração nunca é uma ‘livre’ escolha ou livreatividade. É, pelo menos, sempre limitado, dirigido, regulado, ligado, pelo ‘fim’da lei, pela ‘ratio legis’, fim que jamais falta (...)42

Mas, quem melhor traça um landmark entre a discricionariedade e a ar-

bitrariedade é o conspícuo Hely Lopes Meirelles, quando assim se expressa:

Discricionariedade é liberdade de agir dentro dos limites legais; arbitrariedadeé ação fora ou excedente da lei, com abuso ou desvio de poder.43

3c. Inversão do ônus de prova

O notório adagium popular alemão “Was mir nützen soll, muss ich auch

behaupten und beweisen”44 traduz com naturalidade a quem cabe o ônus da

prova. É o equivalente alemão do nosso “quem alega, deve provar” e traduz o

espírito do art. 333 do Códex processual civil brasileiro:

Art. 333 - O ônus da prova incumbe:

I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;

II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo dodireito do autor.

Perpassando a problemática da prova e suas constituições vislumbramos

a ostentação de três características fáticas: a controvertida, a relevante para a

causa e a determinada, mas que,

nos termos do artigo 333 do Código de Processo Civil, cabe ao autor o ônus deprovar o fato constitutivo de seu direito, e ao réu o de provar os fatos extintivos,impeditivos e modificativos do direito do autor. Ainda, ao réu cabe assumirdois ônus, sendo eles: o de provar a inexistência do fato colocado ou de provaros fatos extintivos, impeditivos ou modificativos do direito do autor. [RIBEIROJUNIOR, 2010]

42QUEIRÓ, Afonso Rodrigues. A Teoria do “Desvio de Poder” em Direito Administrativo. Revista de Di-reito Administrativo. Vol. VII, páginas 52-80, Editora Renovar, páginas 73-74. (apud ZOCKUN, [s.d.], p. 7)43MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Editora Malheiros, 24ª Ed., 1999,página 120. (apud ZOCKUN, [s.d.], p. 8)44O que me traz proveito, tenho que defender e provar.

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Entretanto, como vamos ver mais adiante, há casos em que a prova se

mostra extremamente difícil - ou até impossível – de ser constituída e há casos

de prova negativa, que não se pacificam nessas alternativas e conceituações

dispostas no Códex processual. Essas situações são indigitadas pela doutrina e

pela jurisprudência como Probatio diabolica, entendidas sob a égide de teoria

dinâmica da distribuição do onus probandi.

Esse fenômeno já perpassa todo o ambiente jurídico e encontra na inver-

são do ônus da prova uma âncora, que nem sempre saneia as questões envol-

vidas na erupção prática da problemática. Aqui, se ressalte, com ênfase, a pro-

va negativa de fato indeterminado, que deixa transparecer toda a complexidade

do evento.

Preferencialmente, a aplicação do instituto da inversão do ônus da prova

é sempre a favor do hipossuficiente.

O embasamento do ônus da prova à luz do Códex processual pátrio ado-

ta duas teorias: a estática e a dinâmica. Enquanto a estática amarra o onus

probandi a quem alega, a dinâmica onera quem puder suportar. Em geral, a te-

oria estática domina no nosso ordenamento jurídico (AZÁRIO, 2006), mas há

várias exceções, onde o emprego da teoria dinâmica se reveste de grande re-

levância, isso sem desprezo da visão solidarista45, apontada por Azário (op. cit.,

p. 119) e defendida pelo jurista argentino Augusto Mario Morello46.

Notadamente a teoria dinâmica é aplicada nas relações consumeristas

(GUILHERME, 2010), eximindo assim, o consumidor da produção da prova dia-

bólica.

Nesse sentindo, o Superior Tribunal de Justiça tem decidido pela aplica-

ção da teoria dinâmica, com o fundamento de que

a prova direta, material ou imediata é rigorosamente impossível em caso dessaespécie. Impor ao autor que a faça significa, em verdade, impor-lhe a chamadaprova diabólica, de produção impossível, porque os afastamentos dos cargos, àépoca, eram disfarçados; assim, por exemplo, quando militar o servidor, afas-tava-se por indisciplina ou insubordinação; quando civil, por ato de abandono eoutras alegações com a mesma finalidade e do mesmo teor. Destarte, compete à

45 “bien entendida funcionalidad del principio de cooperación (o de efectiva colaboración) que a su vez radica en el más comprensivo y de mayor furza operativa que es el de solidaridad. Y ambos en el de buena fé”46 MORELLO, Augusto Mario. La prueba: tendencias modernas. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1991. (apud AZÁRIO, 2006)

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Instituição que promoveu o ato demissionário demonstrar a inexistência de mo-tivação política.47

O Código de Defesa do Consumidor aponta como situação de prova dia-

bólica dois momentos no bojo de seu texto, conforme tomamos abaixo:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:[...]VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônusda prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímila alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias deexperiências;[…]Art. 38. O ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunica-ção publicitária cabe a quem as patrocina.

Sem qualquer dubiedade, o instituto da inversão do ônus da prova é um

elemento imprescindível na composição da ampla defesa e do contraditório, em

caso de patente hipossuficiência do acusado no que concerne à produção de

prova.

3d. Prova Diabólica & Condenação Branca

Na área criminal esse fenômeno fulmina a chamada presunção de ino-

cência, consagrada pelo artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, produ-

zindo uma verdadeira Condenação Branca com o embasamento da absolvição

por falta de prova.

A complexidade do Direito trás aos seus operadores novos desafios, que

urgem por soluções atuais e que exigem a formulação de uma metafísica jurídi-

ca, que atenda à finalidade última do direito. A complexidade da hodiernidade

exige do Direito uma adequação e formulação de soluções, que ofereçam à soci-

edade a plenitude na garantia dos direitos do jurisdicionado.

Dentre esses desafios se encontra o repto da acima referida prova diabó-

lica, que insta por uma solução e adequação doutrinária, viabilizada por uma

análise profunda e transcendente, sem que, ao entendimento de Spinoza, se

afaste da imanência jurídica.

A probatio diabolica tem suas raízes no processo inquisitório medieval e

não pode prevalecer no nosso ordenamento jurídico com os efeitos, que apre-

47 STJ, Resp 823.122 DF, Quinta Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ 18/fev/2008.

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sentava nessa época de trevas. Em sobrepujando, que se faz, sem causar detri-

mento a um processo dialético e formal, a favor do hipossuficiente.

O fenômeno da prova diabólica é conhecido no Direito Internacional pela

denominação latina de Probatio diabolica, sempre no sentido da exigência da

apresentação de uma prova impossível ou da negativa indeterminada [CARPES,

2008]. Em alguns países essa prova recebe também alguma característica es-

pecífica:

• Devil’s proof (2012) [em inglês]: com o significado genérico de prova im-

possível, mas com estreita ligação com a ferramenta da inversão do ônus

da prova.

• Teuflischer Beweis (2011) [em alemão]: mormente aplicada na relação

patrimonial.

• Prueba inquisitorial (2011) [em espanhol): como no título já se aplica,

se vislumbra uma intimidade com os processos da Inquisição e com o

antigo Regime espanhol, onde a presunção da inocência, “muitas vezes

incorriam em absurdos lógicos dos quais os acusados não podiam se li-

vrar (por exemplo, se você confessar, você é culpado, se você não confes-

sar, nem mesmo sob tortura, é porque o diabo lhe deu força para su-

portá-la e, portanto, também é culpado)”.

• Prova del diavolo (2011) [em italiano]: esse instituto é utilizado no direi-

to italiano no âmbito do direito patrimonial, especificamente, nas ques-

tões de usucapião.

No direito brasileiro a

Prova diabólica é a chamada prova impossível ou excessivamente difícil de serproduzida, como a prova de fato negativo, sendo que tal problema reside naprova do fato negativo indeterminado, pois, salvo melhor juízo, não há comoprovar, por exemplo, que alguém nunca trabalhou para determinado emprega-dor. [D'Andrea et alia, 2008]

Entrementes, há grande divergência na abordagem doutrinária da aplica-

ção desse instrumento, já por demais recorrente nos nossos tribunais. Re-

vela-se daí uma corrente expressiva, que ver na teoria dinâmica um obstáculo

ao direito fundamental e ao processo justo (CARPES, 2008).

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Além de exsurgir no âmbito do Direito do Consumidor, como visto no tó-

pico anterior, a Prova Diabólica encontra-se presente noutras áreas do direito:

a. Direito Econômico

A literatura aponta uma “situação anacrônica atual em relação à fraude

de execução” (FREITAS, 2010). Esse fato se dá pelo seguinte:

O Superior Tribunal de Justiça, em 20/03/2009, editou a Súmula 375 que prevê:“o reconhecimento da fraude de execução depende de registro da penhora dobem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente.” (Ibid.)

Com a exigência de prova de má-fé entende Freitas, que está substancia-

da a produção da Prova Diabólica, dificultando assim o reconhecimento da

fraude de execução. Mas, como o próprio autor indica, essa súmula surgiu no

trato com julgados específicos em casos de fraude contra credores, que, a seu

ver, embora semelhantes, são institutos díspares. Daí, conclui Freitas, que

tal mescla acabou por desvirtuar a realidade do reconhecimento judicial da fraude.(Ibid.)

b. Direito Penal

Nesse âmbito, se apresenta um exemplo de Prova Diabólica encontrado

em apaixonada crítica formulada por um procurador de Justiça no Rio Grande

do Sul, que embora seja favorável ao hipossuficiente, certamente será difícil de

o enquadrar em ambiente ético. Antes, de entrarmos no objeto, tenta-se revelar

uma ideia do animus do autor ao formular a citada crítica, através da citação

de um trecho de seu texto:

Temos de construir as bases para um pensamento crítico que denuncie equívo-cos como o voto que abordarei na sequência, da lavra do ministro Luiz Fux. Acrítica que exporei não tem a pretensão de ser algo do tipo J’accuse, de EmileZola, em que este fazia contundente manifesto contra a injustiça cometida con-tra o capitão Dreyfus. Posso, no máximo, estar indignado como Zola. (STRECK,2011)

A partir daí, Streck aponta uma série de supostos equívocos praticados

pelo Ministro Lux (STF). Em determinado momento, ele aponta o uso da teoria

da actio libera in causa, na concessão de um Habeas corpus. Segundo a teoria

da actio libera in causa (ação livre na causa) “considera-se imputável quem se

29

põe em estado de inconsciência ou de incapacidade de autocontrole, seja dolosa

ou culposamente, e nessa situação comete o crime” (RAMOS, 2005). Essa teoria

é fundada na expressão da responsabilidade penal objetiva, que foi abolida

com o advento da Lei 7.209, de 11.7.1984, que produziu a reforma da Parte

Geral do Código Penal.

Pelo relato do procurador, o Ministro concedeu o Habeas Corpus

invocando algo que não consta no Código Penal: a teoria da actio libera in causa.Ou seja, tivesse o STF coerência nas decisões, portanto, respeitasse o STF a ori-gem do direito fruto de suas decisões, teríamos, a partir de agora, algo inu-sitado: nunca mais se conseguirá acusar alguém por dolo eventual na hipóteseem que o autor dirija embriagado e atropele (e mate). A tese do voto: somentese pode acusar alguém por dolo eventual se ficar demonstrado que o agente “seembriagou com o propósito de cometer um crime”. Prova, pois, diabólica. Im-possível de se fazer. Aliás, nunca houve no mundo um processo julgado nessesentido. A velha actio libera in causa não é um princípio. E tampouco é uma re-gra. Nem mais se estuda essa tese nas salas de aula. Porém, o ministro Fux pro-feriu um belo voto. Pergunto: e os efeitos colaterais dessa decisão? (STRECK,2011)

c. Direito do Trânsito

Em ação agravo de instrumento (nº 83474/2011) e afirmando “que cabe

aos órgãos de trânsito e não ao motorista a demonstração das notificações de in-

frações de trânsito”, a 4.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso

concedeu tutela por unanimidade ao autor. A decisão foi fundamentada nas

Súmulas nº 12748 e 31249 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), conforme

consta abaixo:

O relator da ação, desembargador Mariano Alonso Ribeiro Travassos, concordoucom a argumentação da empresa de que há margem para aplicação, em carátercautelar, da Súmula 127 do STJ quando a autoridade de trânsito propositalmentenão discrimina, ao expedir o extrato do veículo solicitado pelo condutor via inter-net, se as infrações apuradas foram na condição de flagrância ou não, e se houveou não a notificação do condutor. Até porque não é ônus do Impetrante/Agravan-te colacionar prova negativa (probatio diabólica) de suas alegações nos autos doprocesso, arguiu. Destarte, devem ser aplicadas as Súmulas n.º 312 e 127, ambasdo Superior Tribunal de Justiça. (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MATO GROSSO,2012)

48 É ilegal condicionar a renovação da licença de veículo ao pagamento de multa, da qual o infrator não foi notificado.49 No processo administrativo para imposição de multa de trânsito, são necessárias as notificações da au-tuação e da aplicação da pena decorrente da infração.

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d. Direito Ambiental

O meio ambiente está no foco das preocupações de toda a sociedade

mundial. Os países com grandes riquezas ambientais assumem assim uma

responsabilidade ímpar ante as demais, pelo ônus da preservação e da susten-

tabilidade.

Na defesa do meio ambiente os STJ inaugurou com a teoria dinâmica, ao

REsp 1.049.822-RS, reconhecendo a hipossuficiência da sociedade nas ques-

tões ambientais, que ao relato de BRAGA (2009, p. 2) o aresto assim restou

substanciado:

Resumidamente, o Superior Tribunal de Justiça se dividiu. A tese vencedora foi aencabeçada pelo relator, Min. Francisco Falcão, acompanhado pelos Mins. LuizFux e Benedito Gonçalves, que votaram pelo não provimento do recurso, alegan-do que não pode haver óbices à propositura de ações que visem a defesa de direi-tos fundamentais, pois a responsabilidade ambiental é de interesse público e a so-ciedade é hipossuficiente, motivo pelo qual deve ser transferido ao empreendedoro ônus da prova de que sua conduta não gerou riscos ambientais, em atenção aosprincípios da precaução e da prevenção.

e. Anistia Política

Outra situação em que o Direito pátrio aplica a teoria dinâmica se refere

às demandas no âmbito da Anistia Política conforme pontifica o artigo 8º do

Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, ad litteram:

Art. 8º. É concedida anistia aos que, no período de 18 de setembro de 1946 até adata da promulgação da Constituição, foram atingidos, em decorrência de mo-tivação exclusivamente política, por atos de exceção, institucionais ou comple-mentares, aos que foram abrangidos pelo Decreto Legislativo nº 18, de 15 de de-zembro de 1961, e aos atingidos pelo Decreto - Lei nº 864, de 12 de setembro de 1969 ,asseguradas as promoções, na inatividade, ao cargo, emprego, posto ou gradua-ção a que teriam direito se estivessem em serviço ativo, obedecidos os prazos depermanência em atividade previstos nas leis e regulamentos vigentes, res-peitadas as características e peculiaridades das carreiras dos servidores públicoscivis e militares e observados os respectivos regimes jurídicos:(Omitto)§ 5º - A anistia concedida nos termos deste artigo aplica-se aos servidores pú-blicos civis e aos empregados em todos os níveis de governo ou em suas funda-ções, empresas públicas ou empresas mistas sob controle estatal, exceto nosMinistérios militares, que tenham sido punidos ou demitidos por atividadesprofissionais interrompidas em virtude de decisão de seus trabalhadores, bemcomo em decorrência do Decreto - Lei nº 1.632, de 4 de agosto de 1978 , ou pormotivos exclusivamente políticos, assegurada a readmissão dos que foram atin-gidos a partir de 1979, observado o disposto no § 1º. (Destaquei)

31

A regulamentação dessas disposições constitucionais

acima citadas foi efetivada através da Lei nº 10.559/02, que assim se expressa:

Art. 1.º O Regime do Anistiado Político compreende os seguintes direitos: I - declaração da condição de anistiado político; (omitto)Art. 2o São declarados anistiados políticos aqueles que, no período de 18 de se-tembro de 1946 até 5 de outubro de 1988, por motivação exclusivamente políti-ca, foram:(omitto)VI - punidos, demitidos ou compelidos ao afastamento das atividades remune-radas que exerciam, bem como impedidos de exercer atividades profissionaisem virtude de pressões ostensivas ou expedientes oficiais sigilosos, sendo tra-balhadores do setor privado ou dirigentes e representantes sindicais, nos ter-mos do § 2 o do art . 8 o do Ato das Disposi ções Constitucionais Transitórias ; (omitto)IX - demitidos, sendo servidores públicos civis e empregados em todos os ní-veis de governo ou em suas fundações públicas, empresas públicas ou em-presas mistas ou sob controle estatal, exceto nos Comandos militares no que serefere ao disposto no § 5o do art. 8o do Ato das Disposições ConstitucionaisTransitórias;(omitto)XI - desligados, licenciados, expulsos ou de qualquer forma compelidos aoafastamento de suas atividades remuneradas, ainda que com fundamento nalegislação comum, ou decorrentes de expedientes oficiais sigilosos.” (Desta-quei)

Pelo exposto, com fundamento nos dispositivos acima

referidos, assiste ao hipossuficiente o direito personalíssimo ao reconhecimento

e declaração da condição de anistiado, desde que apresente a relação de causa-

lidade. Nesse sentido, vejamos o seguinte acórdão:

DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO.ANISTIA. DEMISSÃO POR MOTIVAÇÃO POLÍTICA. PROVA DIRETA OUMATERIAL. IMPOSSÍVEL. ATO DEMISSÓRIO DISSIMULADO. CONTEXTODEMONSTRATIVO DA NOTA POLÍTICA DA DEMISSÃO DO RECORREN-TE. PROVA EM CONTRÁRIO QUE COMPETE À ADMINISTRAÇÃO. INA-PLICABILIDADE DA SÚMULA 7/STJ. VALORAÇÃO DA PROVA. RECURSOCONHECIDO E PROVIDO.1. A prova, nos casos de concessão de anistia para fins de reintegração ao servi-ço público, é sempre indireta e deve decorrer da interpretação do contexto edas circunstâncias do ato apontado como de motivação política.2. A prova direta, material ou imediata é rigorosamente impossível em casodessa espécie. Impor ao autor que a faça significa, em verdade, impor-lhe a cha-mada prova diabólica, de produção impossível, porque os afastamentos doscargos, à época, eram disfarçados; assim, por exemplo, quando militar o servi-dor, afastava-se por indisciplina ou insubordinação; quando civil, por ato deabandono e outras alegações com a mesma finalidade e do mesmo teor.Dest'arte, compete à Instituição que promoveu o ato demissionário demons-trar a inexistência de motivação política.3. Na presente hipótese, o contexto da demissão do recorrente, revelado pela (I)sua participação ativa em movimentos então denominados esquerdistas ou sub-

32

versivos, (II) a perseguição e a Jurisprudência/STJ - Decisões Monocráticas de-missão de pessoas próximas, inclusive familiares, (III) o forte conceito que man-tinha na Universidade, sem qualquer mácula em sua conduta profissional e aca-dêmica, bem como (IV) o fato de ter sido anistiado pelo Ministério do Trabalhoem face de sua demissão da Petrobras, demonstram a motivação política do seuafastamento dos quadros da UNB.4. Não se cuida, aqui, de mero reexame de matéria fático-probatória, realmenteincabível em sede recursal especial, mas de valoração da prova, abstratamenteconsiderada, passível de realização nesta instância.5. A questão da prova direta não é a nuclear no processo de anistia e nem mes-mo constitui o fulcro do pedido, porque em hipótese que tal a avaliação do plei-to há de seguir a trilha do art. 8o. Do ADCT e da Lei 10.559/02 (Lei de Anistia),elaborada com o ânimo de pacificar o espírito nacional, aproximar os contráriose instalar o clima de recíprocas confianças entre grupos d'antes desentendidos.6. Recurso Especial conhecido e provido." (REsp 823122/DF, 5.ª Turma, Rel. Mi-nistro ARNALDO ESTEVES LIMA, Rel. p/ Acórdão Ministro NAPOLEÃO NU-NES MAIA FILHO, DJ de 18/02/2008.) (Destaquei)

f. Direito do Trabalho

No direito trabalhista o ônus da prova está sempre a cargo do emprega-

dor, pela sua reconhecida hipersuficiência ante o contratado. Nesse ambiente,

a inversão do ônus probatório é por demais relevante em se tratando de aci-

dente do trabalho.

Como cediço, em casos de descumprimento de normas de segurança por

parte do empregado, eximirá o empregador do ônus indenizatório. Com o ad-

vento da lei n.º 11.430/2006 não mais estará o trabalhador com o ônus de

provar o nexo causal para acidentes e incapacitações, mas sim na incumbência

do empregador comprovar que eventuais acidentes ou incapacidades não são

decorrentes das atividades, indevidamente, desenvolvidas pelo empregado no

ambiente de trabalho (PONTES, 1990).

Ainda no âmbito trabalhista, deve-se realçar o Princípio da Não Discrimi-

nação ancorado na “Constituição Federal, em especial os arts. 3º, IV, 5º, caput,

XLI e XLII, e 7º, XX, XXX, XXXI e XXXII; e em vários diplomas legais brasileiros,

como na Lei nº 9.029/95, que se aplicam, em especial, às relações de emprego”

(CHEHAB, 2010, p. 53). O mesmo autor, amparado no texto da Convenção nº

111 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, define discriminação

como “toda distinção, exclusão ou preferência, com base em raça, cor, sexo, reli-

gião, opinião política, nacionalidade ou origem social, que tenha por efeito anular

ou reduzir a igualdade de oportunidade ou de tratamento no emprego ou profis-

são” (Ibid.).

33

Para o trabalhador discriminado é impossível provar 'distinção', 'exclu-

são' ou 'preferência', motivo pelo qual se mostra obrigatório a inversão do ônus

probatório diabólico, “sob pena de sua omissão ser inconstitucional, por deixar

de tutelar o direito fundamental à tutela jurisdicional adequada, efetiva e célere

prevista no art. 5º, XXXV e LXXVIII, da CF.” (Ibid., p. 59 apud CAMBI50).

g. Direito Securitário

Na matéria de cobertura de seguro de vida em casos de suicídio, o Supe-

rior Tribunal de Justiça, ao julgar o Agravo de Instrumento de n.º

1.244.022/RS, inovou com recente interpretação do caput do art. 79851, mo-

mento em que

prevaleceu o entendimento apresentada pelo ministro Luis Felipe Salomão, nosentido de que o suicídio cometido durante os dois primeiros anos de vigênciado contrato de seguro de vida, período de carência, a seguradora só estará isen-ta do pagamento da indenização securitária, se comprovar que o ato do segura-do foi premeditado. (MARENSI, 2011)

Conquanto, seja o setor securitário também atingido pela legislação con-

sumerista, é de grande validade tratar essa matéria motu proprio, pelo fato de a

questão de mérito ser de grande proeminência, pois toca direito fundamental e

natural, qual seja, o direito à vida. Demais, o fato da seguradora ficar obriga a

provar se “o segurado teria premeditado, ou não, o suicídio quando da contrata-

ção do seguro de vida” (ibid.), certamente vai gerar grande polêmica na juris-

prudência, com maior propriedade ainda, na doutrina.

Se nos enveredarmos na jurisprudência, pelo que se toma da ementa a

seguir exposta, está de permeio o princípio da presunção da boa-fé e resta cla-

ra a aplicação da teoria dinâmica no presente caso, senão vejamos:

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE CO-BRANÇA. SEGURO DE VIDA. SUICÍDIO COMETIDO DENTRO DO PRAZODE 2 (DOIS) ANOS DE INÍCIO DE VIGÊNCIA DA APÓLICE DE SEGURO.NEGATIVA DE PAGAMENTO DO SEGURO. ART. 798 DO CC/2002. INTER-PRETAÇÃO LÓGICO-SISTEMÁTICA. BOA-FÉ. PRINCÍPIO NORTEADOR DODIPLOMA CIVIL. PRESUNÇÃO. NECESSIDADE DE PROVA DA PREMEDI-

50 CAMBI, Eduardo: Neoconstitucionalismo e neoprocessualismo: direitos fundamentais, políticas públicas e prota-gonismo judiciário. São Paulo: RT, 2009. P. 361.51 Art. 798 – O beneficiário não tem direito ao capital estipulado quando o segurado se suicida nos primei-ros 2 (dois) anos de vigência inicial do contrato, ou da sua recondução depois de suspenso, observado odisposto no parágrafo único do artigo antecedente.

34

TAÇÃO PARA AFASTAR-SE A COBERTURA SECURITÁRIA. PRECEDENTE.ACÓRDÃO DO TRIBUNAL. ANÁLISE DE PROVAS. AFASTADA A PREME-DITAÇÃO. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SENEGA PROVIMENTO.1. Nas razões do recurso especial, não foi evidenciada de que forma o acórdãorecorrido teria vulnerado os arts. 130, 330, 331 e 332 do CPC. Incidência da Sú-mula 284/STF.2. A interpretação do art. 798, do Código Civil de 2002, deve ser feita de modo acompatibilizar o seu ditame ao disposto nos arts. 113 e 422 do mesmo diplomalegal, que evidenciam a boa-fé como um dos princípios norteadores da redaçãoda nova codificação civil.3. Nessa linha, o fato de o suicídio ter ocorrido no período inicial de dois anosde vigência do contrato de seguro, por sí só, não autoriza a companhia segura-dora a eximir-se do dever de indenizar, sendo necessária a comprovação inequí-voca da premeditação por parte do segurado, ônus que cabe à Seguradora, con-forme as Súmulas 105/STF e 61/STJ expressam em relação ao suicídio ocorridodurante o período de carência.4. "O artigo 798 do Código Civil de 2002, não alterou o entendimento de que aprova da premeditação do suicídio é necessária para afastar o direito à indeni-zação securitária." (REsp 1077342/MG, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, Ter-ceira Turma, julgado em 22/06/2010, DJe 03/09/2010).5. Não há de se falar em violação ao art. 333, I, do CPC, uma vez que, nos ter-mos do precedente citado, compete à Companhia Seguradora a prova da ocor-rência de premeditação no suicídio ocorrido nos primeiros dois anos de vigên-cia do contrato, para se eximir do pagamento da cobertura securitária contrata-da.6. Na hipótese, a Corte Estadual expressamente consignou que os elementos deconvicção dos autos evidenciam que o suicídio não foi premeditado. Enten-der-se de forma diversa demandaria necessária incursão nos elementos fá-tico-probatórios dos autos, com o consequente reexame de provas, conduta ve-dada em sede de recurso especial, ante o óbice previsto na Súmula 7/STJ, con-soante afirmado na decisão ora agravada.7. Agravo regimental a que se nega provimento.

Com essa decisão, entendeu o STJ que a má-fé, in casu, deve ser com-

provada, em contrário, se aplicará o que pontificam as súmulas 10552 do STF e

6153 do STJ.

No tocante à aplicação do aqui analisado instituto em desfavor do hipos-

suficiente, veremos exemplos de casos, em que a carga probatória dinâmica

onera o hipossuficiente.

h. Direito Eleitoral

Recentemente, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) fixou o prazo de 180

dias, após a diplomação do candidato, para os procuradores eleitorais ingres-

52 Salvo se tiver havido premeditação, o suicídio do segurado no período contratual de carência não exi-me o segurador do pagamento do seguro.53 O seguro de vida cobre o suicídio não premeditado.

35

sarem com ações na Justiça contra doadores ilegais. Analisando essa questão,

a Vice-Procuradora-Geral eleitoral, Sandra Cureau, lamentou a decisão em en-

trevista exclusiva à Folha, assim se pronunciando:

Vou recorrer sim. Foi uma decisão judicial. Vou ter que basear o recursos naquebra do princípio da segurança jurídica e da anterioridade. Não existe prazofixado na lei. Se o tribunal resolver fixar um prazo tem que ser para as próximaseleições. Não havia dispositivo legal que havia prazo para entrar com a ação. Otribunal mandou muito tempo depois os dados. É uma prova diabólica, não temcomo fazer uma prova dessa. Vamos perder todas as ações e, consequentementea lisura do processo eleitoral vai ficar muito abalada. (CUREAU, 2010)

i. Direito Tributário

Tramita no Congresso Nacional o PLP 469/2009, no intuito de atualizar

o Código Tributário Nacional, no que se refere às possibilidades de responsabi-

lização tributária dos sócios e administradores. A respeito do artigo 134/CTN,

a propositura manufatura a inversão da chamada presunção de inocência,

consagrada pelo artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, concebendo a

heteróclita necessidade de provar o que já prognosticado à suficiência pela pró-

pria Constituição, a boa-fé.

Porquanto, a modificação proposta intenta a transferência do ônus tribu-

tário das sociedades para seus sócios, gerentes e assemelhados, conforme se

toma abaixo:

Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obriga-ção principal, pelo contribuinte, respondem subsidiariamente com este nos atosem que intervierem ou pelas omissões de forem responsáveis: (...) VIII. o admi-nistrador ou gestor que: a) deixar de provar que empregou, no exercício de suaatividade, o cuidado e a diligência que se costuma dispensar à administração denegócios, cumprindo com o dever de diligência que a lei lhe incumbe. (CÂ-MARA DOS DEPUTADOS, 2009) (Destaquei)

Resta cristalina a subsistência da prova diabólica nesse dispositivo, já

que o futuro ditame legal obriga a hipossuficiente por demonstrar que não pra-

ticou alguma conduta imprevisível, que é algo impossível e, numa inversão, até

aqui, não acolhida pela jurisprudência pátria.

j. Responsabilidade Civil

Um ambiente extremamente sensível tomamos de CARPES (2008, p. 96-

97), conforme segue:

36

Outro exemplo de probatio diabolica é encontrado nas ações de responsabili-dade civil por erro médico. Em tais casos, é a vítima e, portanto, a parte autora,quem normalmente se encontra na condição de hipossuficiente em relação aomédico, pois é pessoa leiga na medicina, de sorte a não conhecer, por exemplo,quais os métodos existentes, por exemplo, para a realização de uma simples ci-rurgia de catarata ou quais os exames são necessários para a realização de umacirurgia de redução de estômago.

Evidentemente existe dificuldade na produção da prova da culpa do médico,não apenas quanto ao contexto da sua culpa, mas também quanto à caracteri-zação dos demais elementos constitutivos da responsabilidade civil, como aocorrência do dano e o nexo de causalidade. A vítima normalmente encontra-seem posição afastada das provas que serviriam para demonstrar a ocorrência dosfatos constitutivos da responsabilidade do profissional, pois os dados relativosao acompanhamento da enfermidade encontram-se nos prontuários médicos,na posse do próprio profissional ou da clínica em que trabalha. Não raro, é omédico que também acaba retendo os exames, circunstância que, por óbvio,também dificulta o acesso à prova. Sem falar no ato cirúrgico em si, momentoem que, no mais das vezes, a vítima se encontra sedada, o que lhe impede deobservar as circunstâncias em que se deu o evento danoso, nem as pessoas queo testemunharam. A dificuldade na produção da prova é evidente, o que a tor-na uma autêntica probatio diabolica.

O exercício da medicina é geralmente tida como atividade-meio, porquan-

to subjugada á responsabilidade civil subjetiva. Somente, nos ambientes da ci-

rurgia plástica se encontra na jurisprudência a aplicação da caracterização de

atividade-fim, acarretando assim o princípio da responsabilidade civil objetiva.

Porém, não raro, há casos na relação médico-paciente, em que o paciente

está absolutamente impossibilitado de produzir provas, em especial, quando

essa produção depende de conhecimento médico-científico específico, com mai-

or propriedade ainda, quando o paciente não está em poder de todas as suas

faculdades, como no acima citado exemplo da sedação ou o da anestesia geral.

k. Direito Administrativo

No ambiente administrativo a constituição da prova diabólica se torna

mais frequente do que em outros ramos do Direito. Mas, um dos setores mais

sensíveis é o do Conselho de Ética da Câmara dos Deputados. De lá toma-se o

paradigma a elucidar neste estudo.

Escolheu-se o Processo de n.º 017/05 (Representação nº 54/05) que teve

como denunciado o ex-deputado federal Etivaldo Vadão Gomes (PP-SP) repre-

sentado sob a acusação de que teria infringido o art. 4º, inciso II do Código de

Ética e Decoro Parlamentar, por envolvimento no “Escândalo do Mensalão”. O

citado parlamentar, que em 2011 findou falindo a uma acusação sustentada

37

pelo Ministério Público de São Paulo no “Escândalo no Denacoop” (MINISTÉ-

RIO PÚBLICO FEDERAL(SP), 2011), foi absolvido por falta de provas e com a

seguinte motivação:

No mérito, tem-se que todas as provas produzidas neste Conselho e, particular-mente, nas investigações desenvolvidas pela CPMI dos Correios, pelo Ministé-rio Público e pela Polícia Federal demonstraram não ter ocorrido qualquer tipode quebra de decoro parlamentar pelo Deputado Vadão Gomes.O princípio constitucional reza que o direito processual penal, aplicável subsidi-ariamente aos processos administrativos disciplinares, estabelece que o ônus daprova compete à acusação quanto aos fatos que demonstrem a autoria e materi-alidade do delito.Tal disposição visa evitar que o acusado de um processo crime ou processo ad-ministrativo disciplinar como o presente, veja-se obrigado a fazer a chamada “prova diabólica” ou de fatos negativos.[…]No caso em tela, em reforço à insuficiência de indícios simples para estear umdecreto condenatório, todas as provas convergiram para a absolvição do Repre-sentado. (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2005, p. 2-3)

Outrossim, ao contrário da práxis na área penal, onde a jurisprudência

institucionalizou a Condenação Branca, o Direito Civil, inclusive em casos po-

lêmicos como o acima relatado, aplica impreterivelmente o princípio constituci-

onal da presunção da inocência.

A presunção da inocência deveria ter idêntica aplicação tanto no proces-

so civil quanto no processo penal. Mas, essa premissa não encontra ressonân-

cia na práxis do direito pátrio, como se verifica a seguir:

Embora os conhecidos conceitos de presunção absoluta (praesumptiones juris etde jure) e de presunção relativa (praesumptiones juris tantum) sejam comuns aambas as esferas, deve-se notar que a lei civil e a lei penal tratam da presunçãoem geral de maneira sensivelmente diversa.Na esfera civil, basta folhear o atual Código para encontrar algumas situaçõesespecíficas em que é permitido, de maneira expressa, o uso da presunção: pre-sunção de morte simultânea daqueles que falecem na mesma ocasião, quandonão é possível determinar se um morreu primeiro do que o outro (art. 8º); o pa-gamento da última cota periódica implica a presunção de pagamento das an-teriores (art. 322); a entrega de título de crédito ao devedor implica a presunçãode pagamento do crédito respectivo (art. 324); presumem-se concebidos naconstância do casamento os filhos nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, de-pois de estabelecida a convivência conjugal, ou os nascidos nos trezentos diassubsequentes à dissolução da sociedade conjugal (art. 1597, I e II), entre outroscasos. (ALMEIDA, 2010)

A comunicação das duas áreas embasa-se no art. 65 usque 67/CPP, in

verbis:

38

Art. 65. Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido oato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cum-primento de dever legal ou no exercício regular de direito.Art. 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil po-derá ser proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexis-tência material do fato.Art. 67. Não impedirão igualmente a propositura da ação civil:I - o despacho de arquivamento do inquérito ou das peças de informação;II - a decisão que julgar extinta a punibilidade;III - a sentença absolutória que decidir que o fato imputado não constitui crime.

Daí resulta que, em casos de sentenças absolutórias na área criminal, só

beneficiará ao réu, sentença em cujo bojo seja “categoricamente, reconhecida a

inexistência material do fato”.

Mas, em grande parte das acusações penais sem fundamento sólido, é

praticamente exigido do réu que apresente prova de negativa, da inexistência

material do fato, qual seja a Prova Diabólica. Assim, resta o réu absolvido por

falta de provas, o que chamamos de Condenação Branca, visto que, no cível, o

hipossuficiente subsistirá, em se aplicando o disposto no art. 66/CPP, como se

condenado fosse.

Essa premissa não se aplica nem mais no entendimento, ainda severa-

mente arcaico, da Igreja Católica, que elege o seguinte pontificado:

Para o Papa, o direito relaciona-se umbilicalmente com a dignidade da pessoahumana, de maneira que o direito é ontologicamente a justiça e o bem, nestesentido o direito não se esgota na lei. (NOGUEIRA, 2012)

Dignidade humana deve prevalecer nas relações jurídicas, com maior

propriedade ainda, no processo judicial, em especial, na sua expressão da pre-

sunção da inocência com mesmo peso no cível, quão no penal. Pois, em assim

não se procedendo, certamente se exporá o hipossuficiente há uma situação,

como a levantada pelo douto Ministro Napoleão Maia Filho, do STJ, conforme

se extrai abaixo:

Imagine-se um servidor público processado pela prática de um fato que se con-figura, ao mesmo tempo, como ilícito penal (crime em tese) e como ilícito ad-ministrativo (infração disciplinar em tese), correndo em paralelo ambos os fei-tos sancionatórios; segundo a compreensão que apregoa a "independência dasinstâncias", nada haveria a anotar quanto à simultaneidade dos procedimentos,de vez que distintos, diferentes os objetivos e inconfundíveis as sanções. Mesmose aceitando essa lógica procedimental, não há como ocultar que os proce-dimentos poderiam chegar a resultados diversos e mesmo opostos, podendoocorrer de o Servidor ser inocentado em um e condenado no outro, como aliásocorre com não rara frequência.

39

Imagine-se agora que a esse mesmo servidor público foi aplicada a sanção dedemissão, ao fim do procedimento disciplinar, pela prática da dita infração,mas veio ele a ser absolvido "por falta de provas" no processo criminal; dir-se-á,com base na "independência das instâncias", que será nenhuma a repercussãodessa absolvição na esfera administrativa, pelo que a sanção de demissão, nocaso, deverá prevalecer e ser mantida, pois somente haveria repercussão na ins-tância administrativa "se a absolvição tivesse se dado pela demonstração dainocência do acusado, pela comprovação de que o fato não ocorreu ou de que oimputado não contribuiu para a sua prática" (art. 386 do CPP). (MAIA FILHO,2009)

Assim, a dignidade humana enaltecida pelo Papa se perde nos trâmites

processuais, dizimada por uma legislação eticamente inexequível, justamente

com ranço medieval.

Decididamente, até este momento persiste na doutrina e na jurisprudên-

cia uma extensa polêmica sobre a aplicação da Probatio Diabolica. Entremen-

tes, se mostra importante não focar a aplicação em desfavor do hipossuficiente,

pois fundamentalmente fere de morte os primordiais direitos naturais e funda-

mentais do homem e da sociedade, em especial, o princípio da presunção de

inocência.

Ressalte-se aqui a questão da Condenação Branca (absolvição penal por

falta de provas), que também fere diretamente o Direito da Personalidade.

Como direitos da personalidade conhecemos a expressão da inerência ontológi-

ca à pessoa e à sua dignidade. Prima facie, encontramos na concepção de gran-

dezas como a vida, a integridade física, a honra, a imagem, o nome e a intimi-

dade a configuração inicial formal desses direitos, que como direitos funda-

mentais da pessoa natural, exsurgem como bem indispo nível, inalienável, irre - nunciável, imodificável, in transmissível e imprescrití vel .

A imagem física apreende-se objetivamente, através dos sentidos físicos.

A fama, a priori, depreende-se subjetivamente, a partir da conceituação de que

goza o homem na comunidade social em que vive. A evidenciação da fama de

alguém, com sua solidificação, ultrapassa o subjetivismo e passa a compor a

própria imagem daquela pessoa, de forma indissociável.

Pelo que ensina a renomada Maria Helena Diniz, como tutela do direito à

imagem e dos direitos a ela conexos, como a fama, entende-se “o direito: à pró-

pria imagem, ao uso ou à difusão da imagem; à imagem das coisas próprias e à

imagem em coisas, palavras ou escritos em publicações; de obter imagem ou de

40

consentir em sua capitação por qualquer meio tecnológico. O direito à imagem é

autônomo, não precisando estar em conjunto com a intimidade, a identidade a

honra etc. Embora possam estar, em certos casos, tais bens a ele conexos, isto

não faz que sejam partes integrantes um do outro”.54

Ainda vale lembrar o que encontramos em CUNHA, citando SILVA (2000),

que “considera que o direito à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem

das pessoas são direitos conexos do direito à vida, pronunciado no caput do art.

5º. Destaca, ainda, que prefere utilizar a expressão 'direito à privacidade', num

sentido genérico e amplo, abarcando todas as manifestações da esfera íntima,

privada e da personalidade”.55

Com tudo isso, resiste a necessidade de um estudo amplo da questão da

teoria dinâmica, que implique na formulação de uma metafísica própria, des-

vendando a polêmica crescente na abordagem do presente tema.

54 DINIZ, Maria Helena: Parte Geral. Apud Fiúza, Ricardo (Coord.): Novo Código Civil Comentado. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 31 a 32.55 Cunha, Maria Inês M. S. Alves da: Os Direitos de Personalidade e o Contrato Individual de Trabalho. Rev. TST, Brasília, vol. 70, nº 1, jan/jul 2004. P. 91-100.

41

4. Agressão intencional-teleológica

“De tanto ver triunfar as nulidades,de tanto ver prosperar a desonra, detanto ver crescer a injustiça, de tan-to ver se agigantarem os poderesnas mãos dos maus, o homem che-ga a desanimar da virtude, a rir-seda honra, a ter vergonha de ser ho-nesto.”

Rui Barbosa.

A relação do humano com o humano é um dos problemas mais discuti-

dos e mais complexos da nossa realidade. Não há como negar a tendência indi-

vidual e egoística do ser humano em todas as suas relações com o universal.

Constatamos sempre a tendência de uma relação do eu para o eu, enquanto o

dever ser obriga o desenvolvimento da relação do eu para o tu e para o nós,

ainda o da relação do eu com a natureza e a com o universo. Aqui reside a

grande dificuldade do homem.

Dentro dessa óptica, se faz necessário procurar, no âmago da existência

do homem e de seu ontológico, o surgir de fundamentos, que levam o homem a

apresentar desvios de comportamento na sua relação com a alteridade, com a

comunidade, com o seu habitat e com o universo.

O terceiro milênio nos surpreendeu com o surgimento de várias novas

desviações comportamentais do homem, que geram grandes conflitos sociais,

econômicos e filosóficos, conflitos de extrema gravidade, que levam às disputas

bélicas dizimantes, à fome e à miséria, em especial, à miséria espiritual.

A partir dessa evolução eclode uma preocupação e tensão na gestão de

indivíduos. A convivência das pessoas em grupos, instituições e empresas se

tornam foco de grandes conflitos, gerando novas doenças e síndromes.

Destarte, se faz necessário um estudo aprofundado sobre esses fenôme-

nos, para se conseguir vislumbrar melhores tempos na relação comunitária e

social, quando o princípio da ampla defesa e do contraditório, embora aparen-

42

temente impossível de ser exercitado em tais situações, possa encontrar ata-

laia.

4a. Bullying

A circunspeção do conceito Bullying (do inglês bully = “valentão”), termo

originário da língua inglesa, nos leva a caracterizá-lo como atos de violência fí-

sica ou psicológica, intencionais e, obrigatoriamente, de caráter repetitivo, pra-

ticados por individuo ou grupo de indivíduos, com o objetivo de intimidar ou

agredir outro indivíduo (ou grupo de indivíduos) incapazes de se defender, com

expressão “verbal (insultar, ofender, falar mal, colocar apelidos pejorativos,

“zoar”), física e material (bater, empurrar, beliscar, roubar, furtar ou destruir per-

tences da vítima), psicológica e moral (humilhar, excluir, discriminar, chantagear,

intimidar, difamar), sexual (abusar, violentar, assediar, insinuar), virtual ou ci-

berbullying (bullying realizado por meio de ferramentas tecnológicas: celulares,

filmadoras, internet etc.)” (SILVA, 2010).

Trafegar na história do Bullying nos leva à constatação de que se trata

essencialmente de uma grave intimidação, “embora muitos entendam que se

trata daquela velha brincadeira, que sempre existiu às vezes sem graça, em que

pessoas são apelidadas conforme suas particularidades, na verdade, o bullying

não é uma brincadeira” (ESCOREL; BARROS, 2008)

Ressaltamos aqui, a título de exemplo, algumas situações características

do Bullying: espalhar comentários desairosos; recusa em se socializar com a ví-

tima; intimidar outras pessoas que desejam se socializar com a vítima; criticar

o modo de vestir ou outros aspectos socialmente significativos (incluindo a et-

nia da vítima, religião, incapacidades, etc); apor denominações como “baleia”,

“filhinho de papai”, “playboy”, “neguinho”, “negão”, “CDF” e muitos outros ape-

lidos e caracterizações que são aplicados em todos os ambientes sem qualquer

restrição ou reflexão.

Nessa linha de percepção, o fenômeno Bullying resulta na incapacidade

de criação de um bom clima de relacionamento nas comunidades e grupos, re-

sultando em grandes prejuízos, inclusive de vidas humanas.

43

Dentro dessa análise não se deve deixar de discorrer sobre o ciber-

bullying que infesta a rede mundial de computadores (internet) com um efeito

multiplicador do sofrimento das vítimas em proporções inimaginável, com uma

velocidade instantânea e abrangência mundial. De forma perversa e fulminante

se produz humilhação, maltratação, constrangimento, bem como terrorismo

psicológico em larga escala e com dimensões que extrapolam qualquer contro-

le.

Como efeito direto nas vítimas, causado pela prática do Bullying, se

aponta: “baixo rendimento escolar, absenteísmo e evasão escolar, deficits de

atenção e concentração, depressão, transtornos ansiosos, estresse, ideações sui-

cidas, alterações do humor” (ESCOREL; BARROS, 2008).

A legislação brasileira caracteriza a incidência do Bullying como crime. O

artigo 146 do Código Penal prevê o que se segue:

Art. 146 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depoisde lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, anão fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda: Pena - detenção,de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.

Ameaçar alguém também é crime e o autor deverá responder na justiça,

conforme indica o artigo 147 do mesmo diploma legal, in verbis:

Art. 147 - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outromeio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave: Pena - detenção, de 1 (um) a6 (seis) meses, ou multa.

No Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n.º 8.069/90) encontramos

em seu artigo 5º, in litteris:

Art. 5.º - Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de ne-gligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido naforma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos funda-mentais.

Mais adiante o mesmo Estatuto, em seu art. 17, aduz ad litteram:

Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física,psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da ima-gem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços eobjetos pessoais.

44

De forma idêntica, o Estatuto do Idoso oferece proteção a pessoas acima

de 60 anos de idade, impondo punibilidade às infrações por atentado, ação ou

omissão.

4b. Mobbing

Leymann (apud GUIMARÃES; RIMOLI, 2006) define Mobbing

como o fenômeno no qual uma pessoa ou grupo de pessoas exerce violênciapsicológica extrema, de forma sistemática e recorrente e durante um tempo pro-longado – por mais de seis meses e que os ataques se repitam numa frequênciamédia de duas vezes na semana – sobre outra pessoa no local de trabalho, coma finalidade de destruir as redes de comunicação da vítima ou vítimas, destruirsua reputação, perturbar a execução de seu trabalho e conseguir finalmente queessa pessoa ou pessoas acabe abandonando o local de trabalho (Leymann, 1990,p. 121).

Em seu livro “Mobbing” (1990, p. 8) ainda arrazoa Leymann (apud GUI-

MARÃES; RIMOLI, 2006):

[...] os conflitos são inevitáveis [...] não estamos falando aqui, do conflito. Nosreferimos a um tipo de situação comunicacional que ameaça infligir ao indivi-duo graves prejuízos psíquicos e físicos. O mobbing é um processo de destrui-ção; compõe-se de uma série de atuações hostis que, se vistas de forma isolada,poderiam parecer anódinas, mas cuja repetição constante tem efeitos pernicio-sos.

Ainda citando os mesmos autores GUIMARÃES et RIMOLI (2006, p.187-

188), esses classificam 5 fases na evolução do Mobbing, que abaixo se indica:

1ª) Fase de conflito: Conflitos interpessoais normais entre pessoas com interes-ses e objetivos distintos ou até mesmo incompatíveis geram problemas pontu-ais, atritos e choques entre as pessoas, os quais poderiam ser resolvidos de for-ma positiva através do diálogo. Caso contrário, quando estes conflitos pontuaiscomeçam a estigmatizar-se, se produz um ponto de inflexão nas relações, cons-tituindo-se em ponto de partida de uma escalada de enfrentamentos.

2ª) Fase de mobbing ou de estigmatização: Nesta fase, o assediador põe em práti-ca toda uma estratégia de humilhações de sua vítima, utilizando para isso, siste-maticamente e durante um tempo prolongado, uma série de comportamentosperversos, cujo objetivo é ridicularizar e isolar socialmente a vítima. Esta segun-da fase já é propriamente o mobbing. A vítima não consegue acreditar no queestá acontecendo e pode chegar inclusive à negação das evidências mediantepassividade ou a evitação do fenômeno para o resto do grupo ao qual pertence.Esta fase é de grande duração (segundo Leymann, de um a três anos) e servepara estigmatizar a vítima com o consentimento e inclusive com a colaboraçãoativa ou passiva do meio.

45

3ª) Fase de intervenção na empresa: A direção da empresa toma conhecimentodo conflito, caso não se trate de uma estratégia empresarial pré-concebida, naqual a origem do problema estaria na própria empresa. Duas formas de atuaçãopodem ser postas em prática, geralmente pelo departamento de recursos huma-nos ou pela direção de pessoal [...].

4ª) Fase de marginalização ou exclusão da vida laboral: Esta última fase se en-cerra com a vítima abandonando seu emprego, muito provavelmente depois dehaver passado por vários e prolongados períodos de licença. Os(as) trabalhado-res(as) das administrações públicas defrontam-se ao pedir mudanças do localde trabalho, com poucas ocasiões nas quais as mesmas se materializam. Nasempresas privadas parte das vítimas decide permanecer/aguentar heroicamen-te em seu posto de trabalho passando por um calvário que tem consequênciasdeletérias para sua saúde. Alguns sofrem o agravamento do problema, tantodentro como fora da empresa. Nos casos mais extremos, os trabalhadores(as)assediados podem chegar ao suicídio.

De todo o exposto, se reputa que o Mobbing é um fenômeno que se de-

senvolve preferencialmente no ambiente de trabalho. Entrementes, isso não

impede que o mesmo venha ocorrer no ambiente da ‘grande família’, das ONGs,

instituições em geral e agremiações de todo o tipo, em especial nas agremia-

ções de caráter político, religioso, militâncias, nas instituições de ensino etc.

Da mesma forma, a legislação indicada no tópico anterior, conforme o

caso específico, também pode ser aplicada à prática do Mobbing, pois esse

apresenta efeitos e danos equivalentes aos causados pelo Bullying.

4c. Síndrome do Pequeno Poder

Para definir essa síndrome, não se pode deixar de analisar o relato do

cronista SEGRETO (2006) sobre fatos e atos da História do Brasil:

Na história da escravidão no Brasil, os capitães-do-mato eram contratados porseus senhores para “caçar” escravos fugidos. Estabelecer uma aliança com o“senhor” dava, ao capitão-domato, uma aura de prestígio: o oprimido invertia arelação de opressão quando, surgida a oportunidade de “poder”, passava a per-seguir. Colocar o oprimido contra o oprimido foi – e ainda é – uma forma atrozde o opressor perpetuar o ideário de opressão1. E esse método pode ser identifi-cado, por exemplo, em estratégias disciplinares aparentemente ingênuas adota-das já em nossas escolas: o professor que (ainda?) elege um determinado alunopara “capitão-domato” dentro de sala de aula. O menino-capitão é designadopara delatar os colegas de classe que, porventura, transgridam as normas esta-belecidas. Nessa dinâmica de troca de papéis, as representações se invertem, e a“autoridade” do professor passa a ser incorporada pelo menino-capitão queprojeta, em sua relação com seus iguais, a aura de poder que acredita lhe atri-buir prestígio e status. Obviamente, a dinâmica metodológica dessas relaçõesocorre, na maioria das vezes, inconsciente no que tange às causas, porém extre-mamente consciente de seus efeitos. É através dessa contínua luta pelo “posto

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do opressor” que, ao longo de nossa história, construímos e cristalizamos a ide-ologia do poder.

Esse conceito de ‘menino-capitão’ inegavelmente é o que melhor evidencia

o 'protagonista' da Síndrome do Pequeno Poder: alguém frágil, pequeno, inex-

periente, adquire autoridade sobre outros. Daí exsurge o conflito de personali-

dade que leva ao exercício do poder de forma totalmente desacordada com a

personalidade do detentor desse poder. Esse conflito vai determinar a relação

entre o ‘chefe’ e os comandados.

Daí, verificamos um ‘espetáculo de poder’, onde o frágil, pequeno e inex-

periente se expõem à necessidade de ser chefe, senhor, dominador. É a pura

opressão em nome de uma ilusão do ser o que não se é.

Esse fenômeno também é descrito como “uma atitude de autoritarismo

por parte de um indivíduo que ao receber um poder, o usa de forma absoluta-

mente imperativa sem se preocupar com os problemas periféricos que posa vir a

ocasionar” (WIKIPÉDIA, [s.d.]). Contudo, também ocorre identicamente e sem-

pre em estado de falta de culpa, quando um indivíduo não se conscientiza de

sua pequena parcela de poder e tenta exorbitar de sua autoridade e poder.

A desenvoltura desse distúrbio sindromal realça um superficial encanto

para o portador, mas finda por coisificar as pessoas, usando-as e descartando-

as conforme suas necessidades e de como lhe servem. As pessoas se tornam

ferramentas a mister das “próprias manifestações neuróticas, alucinógenas e

delíricas” (PRATA, 2010).

Há autores que desejam ver a associação da Síndrome do Pequeno Poder

com outros distúrbios psicológicos como a Síndrome da Personalidade Posses-

siva e Obsessiva ou Síndrome do Narcisismo Maligno (Ibd.). Realmente, há co-

nexão através de sintomática comum. Entrementes, vemos como fatores bem

mais válidos na constituição do quadro psíquico-patológico da Síndrome do Pe-

queno Poder com outras tessituras indicadas pelo próprio PRATA (2010):

[...] (PATRIARCALISMO) relações familiares e de gênero entre o homem e amulher, (ADULTOCENTRISMO) relações familiares entre pai e filhos e (SU-BORDINAÇÃO) assimetria de relações de gênero entre homem e mulher e ain-da de ingerência exacerbada da chefia para com os chefiados.

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Com base em SAFFIOTI (1989) vislumbramos a dimensão de que o pro-

blema é social e não individual. E realmente há uma conotação social quando

vemos alguns exemplos como os abaixo indicados:

• Vou chamar o meu advogado!

• Vou telefonar para o meu contador!

• Estou indo para uma consulta com o meu Médico!

• Eu estou fazendo um evento!

• Eu convoquei esta reunião!

Como se verifica acima, as frases só têm efeito no ambiente social, mas

jamais na individualidade. Assim, o efeito só se realiza no ambiente das rela-

ções sociais e comunitárias. Daí, tenha assim concluído SAFFIOTI (1989).

4d. A Intriga

Num ensaio sobre o tema, o autor relata sobre a intriga o que segue

(PONTES, 1998; 2011):

A anatomia da intriga revela três elementos básicos: o intrigante, o intriguista eo intrigado. O Intrigante é geralmente pessoa de nível intelectual extremamentebaixo, descontente com seus próprios feitos e realizações e que, por sentimentode inveja e de até ódio, procura prejudicar àqueles que têm a coragem de pro-duzir e realizar em benefício da comunidade. O intriguista (veículo de divulga-ção e propagador) tem como característica principal uma frágil personalidade,permitindo facilmente sua manipulação pelo intrigante; outra premissa é a suamarcante incapacidade ou impossibilidade de avaliar a verossimilidade das in-formações recebidas. O intriguista e intrigante jamais procuram a verdade dosfatos. O intrigado tem obrigatoriamente como qualidades natas a inteligência eo impulso de realizar, construir e criar, qualidades estas, que incomodam.

A exemplificação de um quadro típico de intriga se demonstra no relato

abaixo (Ibid.):

Na sua formação, a intriga requer uma estória com fatos contrários ao ideal e,principalmente, à realidade (ex.: o padre visita regularmente uma amante). Nosegundo momento requer, que ao ser repassada a estória, o intriguista esteja in-telectualmente incapacitado, física- ou ideologicamente impossibilitado de cap-tar a verdade nos fatos. No exemplo apresentado, dificilmente os paroquianosindagar-se-iam com o pároco sobre um seu possível relacionamento amoroso. Éimportante ressaltar, que a malha da intriga, jamais repassa a estória a alguémdo conhecimento ou da amizade do intrigado, sob pena de a intriga ser esclare-

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cida e perder assim seu efeito social, econômico e político. Há quem discutatambém o efeito da intriga sobre o poder, mas existe: se ela não intenta em ga-nho de poder para o intrigante, implica em perda de poder para o intrigado.

Contudo, ressalta ainda o autor em seu essay (Ibid., apud WEISCHE-

DEL, 1956-1964):

Existe um comprometimento decisivo do intriguista na propagação da intriga.Ele desconfia da falsidade da estória e evita repassá-la para os íntimos do intri-gado; no íntimo, deseja que ela prospere como se isto apagasse seus infortúniospessoais. Portanto, consciente ou não, há sempre uma co-responsabilidade porparte dos intriguistas, até porque não possuem a habilidade nem mesmo de cri-ar as suas próprias estórias e tentam embebedar-se dos efeitos da astúcia daobra alheia.

A intriga é, em essência, uma mentira estruturada. Kant definiu-a “como uma de-claração intencionalmente não verdadeira feita a outro homem“e que “prejudica sempreuma outra pessoa, mesmo quando não um outro homem determinado e sim a humanida-de em geral, ao inutilizar a fonte do direito.”

Inclusive, ainda citando Kant, o autor acrescenta em seu supracitado

trabalho a classificação que Kant formula na anatomização da intriga, expressa

nas seguintes máximas sofísticas da mentira estruturada (Ibid., apud id.):

1. “Fac et excusa. Apodera-te da ocasião favorável para te apossares de teu pró-prio poder. A justificação será exposta com muito mais facilidade e elegância,depois do fato” consumado, quando se tem tempo suficiente para dissimular aviolenta posse da situação. Além do que, o se antecipar pela violência é bemmais fácil e sem necessidade de refletir ou de procurar motivos válidos e con-vincentes, tampouco se precisa vencer objeções dos que defendem o Direito.“Esta própria ousadia dá uma certa aparência de convicção interior à legitimi-dade do fato, e o deus bonus eventus é em seguida o melhor advogado.”

2. “Si fecisti, nega. Os delitos que tu mesmo cometeste, por exemplo, os que leva-ram teu povo ao desespero e à revolta, nega-os, declarando não teres a culpadeles; afirma, ao contrário, que a culpa é do humor desobediente dos súditos,ou também, se te apoderas de um povo vizinho, a culpa é da natureza do ho-mem, que, quando não se antecipa ao outro em violência, pode contar segura-mente que este segundo se antecipará e se apoderará dele.”

3. “Divide et impera. Isto é: se existem em teu povo certos chefes privilegiados,que unicamente te escolheram como seu chefe supremo (primus inter pares), de-sune-os um depois do outro e introduz a discórdia entre eles e teu povo; fica en-tão ao lado do último, sob o pretexto mentiroso de maior liberdade, e assimtudo dependerá de tua vontade absoluta.”

Tais estruturações vêm de encontro ao que queremos demonstrar. A in-

triga, tanto quanto o Bullying, o Mobbing e a Síndrome do Pequeno Poder contri-

buem essencialmente no hoje contemporâneo para destruir as relações sociais,

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como ‘As Moscas’ de Sartre (2005), no período de resistência ao nazismo. Pois,

assim conclui o autor em seu ensaio aqui analisado:

E a conclusão de Kant em 1781: “Estas máximas políticas não enganarão a nin-guém, pois são todas já universalmente conhecidas.” Mas a realidade é outra:estas máximas foram ao longo dos tempos estruturando a intriga, que tambémvem dizimando não só o Estado, como também a sociedade emergente, pela fra-gilidade da sua estrutura funcional.

A violência mais brutal na intriga é quando da revelação pública de seu enredo,por sequer envergonhar os intrigantes e intriguistas, mas tão somente o seu in-sucesso. E o maior absurdo é, como relata Kant, que “lhes resta sempre a honrapolítica, sobre a qual podem contar com segurança, isto é, a honra do aumentode seu poderio, seja qual for o meio pelo qual o tenham conquistado.”

Enquanto o cidadão estiver em busca da verdade (por mais enveredada que es-tiver) estará sempre imune à intriga, mas enquanto colher as informações sobemoção, estará passível a ser manipulado como agente ativo da mentira estrutu-rada, da intriga.

O método mais antigo e usado na política é a intriga. Infelizmente esta vi-

rose tem afetado em muito o relacionamento entre lideranças. Os dicionaristas

definem a intriga como ação de mexerico, cilada ou de traição, mas, popular-

mente, ela é conhecida, simplesmente, como fofoca.

4e. Fenomenologia do Brasileiro

Na sua análise sobre a situação do Homem no Brasil, em seu trabalho

“Fenomenologia do Brasileiro”, Vilém Flusser anota:

O homem é um ente essencialmente perdido e, quando se dá conta, procura en-contrar-se. (FLUSSER, 1994)

E diz mais:

“Esta sentença pode ser lida em vários níveis, por exemplo, no nível religiosoou no nível de um bandeirante no sertão, e seu sentido é sempre este: a decisãode tomar caminho (ou abrir caminho) depende sempre de um mapa da situaçãona qual o homem se encontra. Isto significa que toda decisão depende não ape-nas da posição das coisas, mas também da imagem que fazemos da posição dascoisas (provavelmente isto tem muito a ver com o problema da liberdade).”(Ibid.)

A grande questão do brasileiro, ainda é ‘a decisão de tomar caminho’, não

muito distante disso estamos nós no aqui e agora. Tomando como introito des-

50

ta análise, recorremos à lição exposta a título de conclusão do acima referido

trabalho, que nos ensina:

Eis o diagnóstico e o prognóstico para o brasileiro atual do ponto de vista deum imigrante que se engaja nele e com ele: o Brasil é país miserável, há fome ehá doenças, grande parte da população vegeta em primitividade secundária,encontra-se condicionado por natureza pérfida e forças externas. Em tal situa-ção de miséria, porém, existem germes de um projeto brasileiro, o qual, median-te síntese de elementos heterogêneos, visa a uma nova maneira de vida huma-na, digna, lúdica e criadora.

[...] O projeto, embora apenas germe, está aqui, não é mera fantasia, por maisque várias ideologias o queiram negar porque o projeto se opõe ao progressopor elas visado.

[...] Fazer mais automóveis, ou mais um livro, seria tão absurdo quanto o é naEuropa e nos Estados Unidos. A sensação do absurdo não caracteriza o Brasiljustamente porque existe o projeto.

[...] quem se engaja nele poderá dizer, na hora da morte, que não viveu inteira-mente sem sentido - embora tal afirmativa vá passar pelo crivo da hora da mor-te, cheirando, no momento, perigosamente, a demagogia.

O problema é este: no fundo, quando se trata de dar sentido à vida, quando setrata de engajar-se, quando se trata de "um novo homem", é da religiosidadeque se trata. (Ibid.)

O projeto aqui apontado, nem sempre fica claro para os brasileiros, que

gostam de ver os projetos dos outros e pouco se interessam pelo seu próprio

projeto. E quando tem projeto, ‘é da religiosidade que se trata’ ...

Em Sartre, d’As Moscas’ vislumbramos com entusiasmo extremo o seu

engajamento pela resistência e apontamento da tragédia francesa ante o terror

nazista e a conivência criminosa dos colaboracionistas. Mas em nenhum mo-

mento reconhecemos qualquer paralela com o nosso cotidiano. Muito nos preo-

cupa encontrar o significado das moscas, de Oreste, de Eletra e de outros per-

sonagens e fenômenos da peça sartreana, mas jamais encontrar em nós o nos-

so cotidiano e os nossos fenômenos existencialistas.

Ao delinear as paralelas simbólicas aqui apontadas, necessita-se obriga-

toriamente reconhecer os fenômenos que aterrorizam os oprimidos, a guiza de

exemplo, refletidos no nosso cotidiano, postula-se os fenômenos comportamen-

tais humanos aqui tratados.

Retomando o caminho ontológico, tomamos de Russell (1912, p.119), que

ensina ser “exclusivamente entre os bens do espírito que o valor da filosofia deve

51

ser procurado”. Mas, será que seria um bem no sentido kantiano do conceito

Vermögen56? Tudo indica que sim, pois aquele autor vislumbra na filosofia a

função a precursora da ciência especial: astronomia, psicologia, etc. Disso se

deva concluir que ela também seja precursora de outros bens espirituais como

a felicidade e a sabedoria, do patrimônio ético do homem, bem como de todos

os parâmetros de orientação da vida, numa ligação ontológica e indisponível,

ainda presente em toda a amplitude do agir do ser humano. Por fim, em Rus-

sell, encontramos também que a Filosofia visa o conhecimento, pelo que se

conclui ser o bem filosófico russelliano Vermögen, bem do espírito, patrimônio

cultural e científico, sabença, erudição.

Com Russell o conflito posteriormente alçado se apresenta mais aparente

do que real, já que “os problemas para os quais já se tem respostas positivas

vão sendo colocados nas ciências, enquanto que aqueles para os quais não se

encontrou até hoje nenhuma resposta exata, continuam a constituir esse resíduo

que denominamos de filosofia” (Ibid.). É a questão da qualidade precursora da

Filosofia: as ciências exatas lançam-lhe as questões, a Filosofia devolve solu-

ções. E nessa convicção, Russell nos ensina: “O valor da filosofia, na realidade,

deve ser buscado, em grande medida, na sua própria incerteza.”

Dessas reflexões, em analisar a crise do relacionamento humano, partin-

do da fenomenologia humana, pensando com Sartre, com Russell ou com Kant,

decididamente, se chega sempre à conclusão de que somente a Filosofia poderá

apresentar a decisiva contribuição para o apaziguamento das relações entre

humanos. Apresenta-se como de grande produtividade e representa potente fa-

tor de crescimento pessoal e intelectual refletir sobre as paralelas existentes

entre a tragédia de ‘As Moscas’ com as tragédias do nosso cotidiano.

Anualmente, são gastos imensas somas de recursos financeiros para

combater ou reparar os efeitos nefastos dos fenômenos implicantes ou distur-

bantes nas relações humanas, que se apresentam como cardiopatias, pressão

arterial alta, distúrbios endocrinológicos, câncer do aparelho digestivo, doenças

e anomalias psíquicas graves, estresse severo, síndrome de dupla personalida-

de e outros mais.

56 Traduzido no sentido dicionarista: patrimônio, bens, recursos, capacidade.

52

A ação dos nazistas e seu terror pararam com o fim da segunda guerra

mundial. Mas, ainda perduram até hoje os efeitos, as ‘moscas’ então produzi-

das, para aqueles que não refletem e traçam paralelas entre os nocivos fenôme-

nos do hoje, e daqueles que motivaram Sartre à escritura de ‘As Moscas’. E não

estão com Sartre, as novas ‘moscas’: Bullying, Mobbing, Síndrome do Pequeno

Poder, a Intriga. Mesmo assim, esses fenômenos se mostram, hoje, tão eficien-

tes quanto nocivos para desenvolver nas relações humanas grandes devasta-

ções, como então as moscas simbólicas de Sartre.

Decididamente, a essência do simbolismo e teatrologia no hoje está mui-

to próxima da ação nazista de então; forma idêntica produzem ‘moscas’ em to-

dos os ambientes de que fazem parte ou agem. Por isso, seguir o imperativo ca-

tegórico kantiano é uma obrigação geral sem qualquer restrição ou exceção.

Uma outra grande questão, que caracteriza o brasileiro é a estética, que

ele concebe para a Nação Brasileira, que impede mudanças sociais fundantes,

para as quais o brasileiro aguarda soluções ou da 'justiça' ou do Governo. Den-

tre outros, se ressalta os seguintes fenômenos estéticos gerados e mantidos pe-

los brasileiros: o Estado está obrigado a oferecer às autoridades (secretário de

estado ou municipal, chefe de ente público, senador federal, desembargador,

juiz federal etc.), obrigatoriamente, luxo e carro oficial com motorista, caso con-

trário, a autoridade perde sua 'legitimidade'; o transporte público deve ser lota-

do acima do máximo permitido e ter como paradigma a velocidade, descuidan-

do da garantia do conforto e da segurança dos passageiro, pois o desejado é o

uso do 'carro particular'; a fila (nos bancos, nas paradas de ônibus', no cinema,

nos self-service's, nos serviços públicos etc.) e o miserável pertencem à paisa-

gem brasílica; a Saúde Pública deve ser ineficiente e congestionada, pois o de-

sejado é o 'plano de saúde'. Tudo tem que ser errado e ineficiente no Brasil,

caso contrário não seria Brasil.

Recentemente, o portal alemão Deutsche Welle (2013) divulgou uma re-

portagem, na qual o sociólogo Martin Gegner, doutor em sociologia urbana da

Universidade Técnica de Berlim e professor visitante da USP, que assim se ex-

pressa sobre as questões sociais no Brasil:

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O Brasil ainda mantém a tradição de privilegiar o automóvel em detrimento dotransporte coletivo, e alterar esse panorama demanda não só políticas públicas,mas uma mudança na mentalidade do brasileiro.

[…] O Brasil ainda vive a influência do ideal modernista de urbanismo, em queas cidades são planejadas em função do carro, com prédios e garagens grandes,com bairros ligados por grandes vias rodoviárias. O grande exemplo disso éBrasília.

[…] No Brasil ela [a bicicleta] é vista como lazer e não como transporte. Na Ale-manha, as grandes cidades estão cobertas de ciclovias e as pessoas usam a bici-cleta para ir trabalhar.

[…] O custo do VLT é muito menor que o do metrô, porque qualquer obra sub-terrânea é muito cara e lenta. As pessoas associam isso ao bonde de antigamen-te, mas não tem nada a ver. É um transporte rápido, de massa e confortável. (id.)

Essas reflexões do sociólogo alemão Gegner em face do transporte públi-

co no Brasil, aparentemente está fora deste contexto, mas espelha com perfei-

ção a postura do brasileiro perante a sociedade como um todo e impregna os

vínculos de inter e de transubjetividade no hodierno nacional. E é a mesma

qualidade de postura e de estética que a sociedade brasileira aplicada ante o

devido processo legal.

Se tomarmos como exemplo os milhares programas televisivos 'informati-

vos' da 'realidade como ela é' do tipo 'Barra Pesada', sob o manto do 'jornalismo

policial', aos milhares distribuídos por todo o território nacional, enaltecendo e

ensinando a prática do crime, muito mais ainda, gerando o espírito de vingan-

ça ante os acusados, sem qualquer desassossego com o Direito da Personalida-

de dos 'acusados', já a partir da ocorrência do fato, isso só lembra o processo

dos tempos medievais, a inquisição.

Refletir se faz necessário. Em especial nesta questão. Não há como pen-

sar e ser futuro sem a Filosofia.

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5. Conclusão Final

A presente abordagem articula momentos fenomenológicos de alguns

momentos fundamentais da ampla defesa e do contraditório, em especial, na

realidade nacional, sem obrigatoriamente se preocupar com a inquietude entre

a defesa ante o fato ou ante o tipo, que já é um fenômeno em si.

As perspectivas históricas apontadas não nos ofereceram grandes espe-

ranças para a indução da imposição de regras e normas, que venham impor

um convívio social conforme o pensamento humanístico forjado durante milê-

nios. A mente humana está sempre à frente do hoje, do real.

Acolitado pelos discernimentos e afetado pelo princípio in disputatione

nascitur veritas alçados por Mariam Orkodashvili (2009), lança-se a questão da

Fenomenologia da Ampla Defesa e do Contraditório no horizonte acadêmico, na

tentativa de oferecer novas perspectivas de pensar a Defesa e o Contraditório,

talvez inciar um rompimento com paradigmas e axiomas provectos, mas, com

certeza, sempre na trilha fenomenológica.

Verificou-se que a compreensão do emblema de fatos, como possibilidade

em si, exige ainda um tratamento metafísico próprio.

O percurso do conceito fato à faticidade nos levou à primeira concepção

do termo fato, notadamente, no âmbito religioso (com Lessing); nos levou tam-

bém às Verdades de fato [Tatsachenwahrheiten] e às Verdades de razão [Ver-

nunftwahrheiten] (com Leibniz); à concepção de opinião, de objeto do conheci-

mento e à expressão da fé, adornados com a qualidade de dados e achados a

priori (em Kant).

À lição de Frege, se encontra o conceito fato ancorado no ambiente da

linguagem, pois fato, na sua concepção, se expressa por certos sinais ló-

gico-linguísticos, no sentido de frases com a qualidade de coisa-em-si; já quan-

do, Russel entende ser fato extensão das frases. Heidegger enfrenta a questão

pela vertente da hermenêutica e introduz o conceito da faticidade do existir, ou

seja, fato trespassa o existencialismo encontrando o ser-no-mundo (Dasein).

Nietzsch, em afronto ao positivismo, provoca o rompimento com todas as

linhas até então apresentadas, para alvidrar uma propositura niilista, pela in-

55

capacidade do homem de apropriar-se da verdade ou do ser-em-si do objeto de

conhecimento, porquanto ele forma tão somente metáforas remetentes à coisa.

Somente com Habermas a faticidade toma compleição, quando a coloca

na esfera do binômio direito e moral (numa “relação de complementação recí-

proca”) subjugada à racionalidade comunicativa, dentro de um contexto da sua

Ética Discursiva e da sua Razão Comunicativa. Ultimando em Habermas, se

constata na sua doutrina que o direito só pode ser entendido a partir da noção

de uma "tensão entre faticidade e validade". Então, segundo Habermas, fato se

entrelaça com validade.

Mas, há ainda a ligação do conceito fato com a determinação, que é ana-

lisada por Spinoza, Hegel e Utz, quando determinação é explicada como nega-

ção (Omnis determinatio est negatio). Um retorno ao niilismo?

Com Sartre, o fato ajusta-se na tensão entre o Em-si e o Para-si, dentro

de um encadeamento existencialista.

Neste cenário, se ressalta a contribuição de Kant com a inauguração do

conceito Aufklärung (definida por Kant como “a emergência do homem de sua

própria autoinfligida imaturidade”) e a Mediação em Hegel. Nesse sentido o fato

só obtém validade (no sentido jurídico) pela expressão de maturidade do agen-

te, ou, com Hegel, pela mediação.

No estudo da Axiologia do devido processo legal, asseverou-se que, nas

mais diversas esferas e dissimílimos processos, é corrente não oferecer aos

acusados o amplo e irrestrito direito de defesa e ao contraditório. Dentro desse

contexto, à análise da problemática da Legitimidade se constatou com Weber a

existência de três qualidade básicas de dominação legítima: a tradicional, a ca-

rismática e a racional. Avança-se com Crettela Júnior, que exige para a legiti-

midade a concordância com as normas jurídicas vigentes e, com Hely Meireles,

com quem não basta tão somente a obediência à norma jurídica, mas também

exige observância velada dos princípios do direito. Afinal, com Carolina

Zockun, que clama pela obediência ao espírito da lei, como exigência essencial

para a configuração da legitimidade.

Num outro momento, o Desvio de Poder ou de Finalidade subsistiu no

âmbito da pesquisa, de cujo nascedoiro na legislação remonta, estranhamente,

do tempo da Ditadura Militar com a Lei N.º 4.717/1965, que rege a Ação Popu-

56

lar. A prática dessa antijuricidade implica em simulação, em mascaração, em

atender à suposta 'necessidade do serviço' ou ao enganoso 'interesse público'.

Nesse entrecho, com Zockun, com Celso de Mello, com Eduardo de Enterría e

com Afonso Queiró se chega ao corolário do Desvio de Poder pelo instituto da

discricionariedade. Entretanto, justo nesse ponto crucial, subsiste a cognição

de que a discricionariedade é o estatuto, pelo qual o gestor encontra a melhor

opção possível para o caso concreto, sem abandonar princípio da legalidade,

que fundamenta e limita o agir discricionário; a arbitrariedade se contrapõe à

discricionariedade por agir fora do âmbito da lei ou de seu espírito.

Ao diligenciar o instituto da inversão do ônus da prova, percorre-se a

análise do conceito da Probatio diabolica, identificado-a como prova de extrema

dificuldade de produção ou até impossível de ser constituída, bem como o con-

ceito da prova negativa. Aqui se dá realce ao uso desse instituto a favor do hi-

possuficiente e ao emprego, na espécie, da teoria dinâmica.

A Prova Diabólica mereceu um estudo específico para resultar na funda-

mentação do conceito da Condenação Branca soerguido pelo autor. A dita pro-

batio diabolica tem suas raízes no processo inquisitório medieval, motivo pelo

qual não pode subsistir no ordenamento jurídico contemporâneo, porém é co-

nhecida no Direito Internacional como Devil’s proof [em inglês], como Teuf-

lisher Beweis [em alemão], como Prueba inquisitorial [em espanhol] e como Pro-

va del diavolo [em italiano]. São apresentados exemplos práticos dessa casuali-

dade no Direito Econômico, no Penal, no do Trânsito, no Ambiental, nos casos

de Anistia Política, no Direito do Trabalho, no Securitário, todos esses casos

sempre a favor do hipossuficiente.

No tocante à aplicação do aqui analisado instituto em desfavor do hipos-

suficiente, foram apreciados exemplos do Direito Eleitoral, do Tributário, em

casos de Responsabilidade Civil e do Direito Administrativo.

Arvorando-se do Princípio da Presunção da Inocência e do Direito da Per-

sonalidade no conflito entre a absolvição por falta de prova no ambiente penal e

a sua incomunicabilidade no ambiente civil, o autor alça o conceito da Conde-

nação Branca, produzida - com embasamento na absolvição por falta de prova -

pela fulminação da chamada presunção de inocência, consagrada pelo artigo

5º, inciso LVII, da Constituição Federal.

57

Em por último, se dedica o autor ao estudo do que intitula Agressão In-

tencional-Teleológica para apontar fenômenos desenvolvidos na relação do hu-

mano com o humano com a tendência de uma relação do eu para o eu, em pre-

juízo do dever ser da relação do eu para o tu e para o nós, mais ainda, o da re-

lação do eu para com a natureza e a para com o universo.

Essa ambiência se rege pela informalidade das relações intersubjetivas e

transsubjetiva no âmbito comunitário e da privacidade, porquanto de extrema

dificuldade para erigir uma formação da ampla defesa e do contraditório, dei-

xando a vítima absolutamente hipossuficiente e ao capricho do agente agres-

sor.

São analisados os fenômenos do Bullying (atos de violência física ou psi-

cológica, intencionais e, obrigatoriamente, de caráter repetitivo, praticados por

individuo ou grupo de indivíduos, com o objetivo de intimidar ou agredir outro

indivíduo ou grupo de indivíduos incapazes de se defender), do Mobbing (vio-

lência psicológica extrema, de forma sistemática e recorrente e durante um

tempo prolongado sobre outra pessoa no local de trabalho, com a finalidade de

destruir as redes de comunicação da vítima ou vítimas, destruir sua reputação,

perturbar a execução de seu trabalho e conseguir finalmente que essa pessoa

ou pessoas acabe abandonando o local de trabalho (LEYMANN, 1990, p. 121)),

da Síndrome do Pequeno Poder (alguém frágil, pequeno, inexperiente, adquire

autoridade sobre outros, daí exsurgindo o conflito de personalidade que leva ao

exercício do poder de forma totalmente desacordada com a personalidade do

detentor desse poder), da Intriga (uma mentira estruturada, sempre com o in-

tuito de prejudicar uma outra pessoa, mesmo a humanidade em geral, quando

dizima a fonte do direito (PONTES, WEICHEDEL, KANT)), e a Fenomenologiado Brasileiro (demonstrando que muitos dos nossos problemas de conflito so-

cio-jurídico se assentam na própria postura social-ética dos brasileiros, na es-

tética que constroem para a Nação, e que teimam em não alcançar a maturida-

de no sentido da Aufklärung de Kant).

Resta extremamente difícil estabelecer uma estética e ética da ampla de-

fesa e do contraditório, como preconizada na Carta Magna brasileira e na De-

claração dos Direitos Humanos da ONU, numa situação fenomenológica como

descrita no Capítulo 4 deste trabalho. Porquanto, urge urdir o Brasil, que os

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brasileiros desejam e abandonar a estética do errado e do ineficiente construí-

da desde o chamado 'descobrimento'.

Nesse sentido, nos ensina o consagrado Prof. Manfredo de Oliveira (2010,

p. 385), quando fala da necessidade básica a título de exigência ética suprema:

O que está em jogo é uma síntese entre identidade (todos os seres humanos sãofins em si mesmos) e diferença (todos possuem o direito a serem reconhecidosnaquelas diferenças que não põem em questão a igualdade fundamental). Destaforma, a “necessidade”57 básica que marca a vida humana é criar um mundo derelações sociais, onde ele possa viver humanamente; ou seja, na base do respeitoa seu ser e em comunhão com os outros.

A partir dessas mudanças socioculturais se pode falar na implantação de

direitos fundamentais como no caso da ampla defesa e do contraditório de for-

ma linear, abrangente e horizontal em toda a Nação Brasileira.

57“Necessidade e tomada, aqui, no sentido ético da exigência Fundamental.”

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