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MESTRADO EM LETRAS
LINGUAGEM, INTERAÇÃO E PROCESSOS DE APRENDIZAGEM
FABIANA SOUZA VASQUES FORTES DE OLIVEIRA
A VEZ E A VOZ DO SUJEITO DA ENUNCIAÇÃO
EM AULAS DE LÍNGUA INGLESA
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Letras; Área de Concentração:
Linguagem, Interação e Processos de Aprendizagem;
Linha de Pesquisa: Linguagem, Processos Cognitivos e
Aprendizagem, da Faculdade de Letras do Centro
Universitário Ritter dos Reis, como requisito parcial para
obtenção do titulo de Mestre.
Orientadora: Profª. Drª. Noeli Reck Maggi
PORTO ALEGRE
2009
À minha querida Maria Eduarda, que
desde o mais remoto princípio de sua vida
intrauterina até sua maravilhosa e completa
existência compartilhou deste Mestrado e
minhas frequentes presenças ausentes.
AGRADECIMENTOS
A Deus, por prover infinitamente mais do que tudo aquilo que pedi ou
mesmo imaginei.
Agradeço àqueles que apoiaram emocionalmente e que assumiram
tarefas extras para que eu pudesse dedicar-me a esse trabalho:
• minha querida mãe, uma verdadeira heroína no comando de
nosso lar e no suporte do cuidado de nossa preciosa Maria
Eduarda;
• meu amado esposo, que nunca mede esforços para incentivar-me
e apoiar-me nas diferentes demandas que possuo.
À minha dedicada sogra/mãe que sempre acreditou nas minhas
possibilidades e ajudou-me de diferentes maneiras para que esse trabalho
acontecesse.
À minha tão competente Profª. Orientadora Drª. Noeli Reck Maggi, que
me acompanhou com imensa dedicação e me orientou com grande maestria
através de suas leituras, críticas e contribuições para que esse estudo
avançasse até o presente estado.
Às Profas. Dras. Terezinha Marlene Lopes Teixeira e Neiva Maria Tebaldi
Gomes pelas valiosas sugestões na banca de qualificação e por toda confiança
em mim depositada.
Aos alunos e colegas por possibilitarem que as observações em sala de
aula e as entrevistas se tornassem realidade.
À administração da mantenedora da rede de Escolas Adventistas e da
minha unidade escolar por apoiar e investir na concretização desse trabalho.
RESUMO
Este trabalho investiga razões do silenciamento do educando durante
seu processo de ensino-aprendizagem de Língua Inglesa. A pesquisa foi
realizada com alunos da 7ª série do Ensino Fundamental que pertencem a
escolas da rede privada na cidade de Porto Alegre. A metodologia, de caráter
qualitativo, serviu-se de instrumentos como observação em sala de aula,
entrevistas e oficinas. O estudo buscou fundamentação teórica a para tentar
entender as formas do silêncio na aprendizagem de uma 2ª língua, no
desenvolvimento do sujeito e na linguística da enunciação. Para tanto, foram
utilizados autores como Eni Orlandi, Bakhtin, Benveniste, Lighbown & Spada,
Vigotski e Winnicott. Com o objetivo de analisar o material empírico, foram
levantadas categorias, a fim de melhor compreender o silêncio que possui lugar
de destaque nas aulas de Língua Inglesa. O estudo revelou que os alunos
silenciam porque temem ser criticados diante de colegas mais preparados,
porque não exercitam a escrita e a fala através de situações reais. Medo,
vergonha e insegurança também foram apontados como motivos da não
verbalização, acentuados pela intervenção controladora e distanciada do
professor em relação aos alunos. Os resultados indicam que existe um
silenciamento nas aulas de Língua Inglesa, motivado por diferentes categorias:
medo de errar ao usar a palavra de forma oral; permitir-se verbalizar ou não em
função da realização de um curso; espaço de tempo bem maior destinado às
atividades escritas em detrimento das orais; papel do professor no contexto
ensino/aprendizagem de uma língua estrangeira.
PALAVRAS-CHAVE
Língua Inglesa, enunciação, silenciamento, desenvolvimento do sujeito.
ABSTRACT
This study investigates the reasons from silence in students during their
process of teaching/learning of a second language. The research was done with
students of seventh grade of secondary school who study in private schools of
the city of Porto Alegre. Methodologically a qualitative study that used
instruments such as observations, interviews and workshops. In order to
analyse the empirical material, some categories have been postulated so that
understand in a better way the silence that has a special place in the English
classes. The study has found theoretical grounds in ways of silence, individual’s
development, learning of second language and enunciation’s linguistics. For
this, the study used authors like Orlandi, Bakhtin, Benveniste, Lightbown &
Spada, Vigotski and Winnicott. The results indicate that, there is a silence at the
English classes that is motivated by different categories.
KEYWORDS:
English language, enunciation, silence, individual development.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO .................................................................................................... 8
1 A LINGUAGEM COMO ELEMENTO FUNDAMENTAL PARA CONSTITUIÇÃO DO SUJE ITO 12
2 FOMOS CRIADOS PARA A INTERAÇÃO SOCIAL ...................................................... 22
3 FOMOS CRIADOS COM POSSIBILIDADES PARA APRENDER ..................................... 36
4 MODOS DE INVESTIGAÇÃO E RESULTADOS OBTIDOS ............................................ 45
4.1 REFLEXÃO A PARTIR DAS OBSERVAÇÕES ...................................................... 46
4.2 AS ENTREVISTAS E A PROPOSTA DA OFICINA: AULA REAL X AULA DESEJADA ............. 48
4.3 O SILÊNCIO EM POSIÇÃO DE DESTAQUE ........................................................ 49
5 ENCAMINHAMENTOS FINAIS ............................................................................... 66
REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 71
APÊNDICE I ......................................................................................................... 74
APÊNDICE II ........................................................................................................ 75
APÊNDICE III ....................................................................................................... 76
APÊNDICE IV ...................................................................................................... 79
APÊNDICE V ....................................................................................................... 80
APRESENTAÇÃO
Partindo da ideia de que os alunos devem ser entendidos na sua
particularidade e ser respeitados como indivíduos, a questão que se impõe é
por qual motivo temos, em muitas salas de aula, alunos que receiam utilizar a
fala em aulas de Língua Inglesa, que não ocupam seu espaço de enunciação,
ou seja, silenciam. Este trabalho tem por objetivo identificar razões do
silenciamento do educando durante seu processo de ensino-aprendizagem de
Língua Estrangeira por volta da 7ª série do Ensino Fundamental.
A motivação que trago comigo para levar adiante esse estudo sobre o
silenciamento do aluno tem como lastro uma inquietação que me acompanha
ao longo da trajetória na Educação Básica – iniciando com Educação Infantil,
seguindo pelas Séries Iniciais, 5ª a 8ª Séries e Ensino Médio. Percebi um
silenciamento recorrente de alunos em contexto de aprendizagem de Língua
Inglesa em sala de aula na interação com o grupo. Alguns questionamentos,
tais como: por que a situação de aprendizagem de uma língua estrangeira
dificulta a verbalização do aluno em sala de aula? Por que as aulas de língua
estrangeira tornam-se instâncias de produção de silêncio, quando deveriam ser
instâncias de produção de fala? Tais questionamentos justificam essa busca
por razões para o silenciamento. O que verificamos é que o nível de
verbalização fica reduzido quando o aluno se encontra em situação de
aprendizagem de Língua Inglesa, e o silenciamento obstaculiza o processo de
formação de aprendizes autônomos.
Portanto, investigar fatores que provocam o silenciamento em aulas de
Língua Inglesa e compreender os efeitos desse silenciamento através do
encontro entre o linguístico, o psíquico, o social e o cultural – indissociáveis no
processo de utilização da voz, nos permitindo dizer que o sujeito (aluno) faz
parte de um espaço de significação que deve ser analisado historicamente – é
meu objetivo central no presente estudo. Ao abordar o fator silenciamento,
parto da ideia de que o silêncio significa, isto é, possui sentido. Para tanto,
utilizamos como suporte teórico o estudo de Orlandi (1995) a respeito do
silêncio, visto que a autora coloca o silêncio em uma condição de significar.
A seguir, são apresentadas considerações sobre a metodologia do
estudo, com a explicitação do tipo de pesquisa; sobre a descrição dos
instrumentos que constam nos apêndices e sobre a perspectiva de análise dos
dados. A bibliografia indicada orienta o presente estudo tanto nos planos
teórico quanto empírico. Portanto, para a efetivação do trabalho foi utilizada a
metodologia de estudo de caso, com observações de aulas de Língua Inglesa,
para investigar as relações e reações que aí tomam forma, como modos de
interação com o grupo, respostas, perguntas e modos de vocalização dos
alunos. Para estas observações foram levantadas categorias de acordo com
Orlandi (1995) (apêndice III). A pesquisa empírica envolveu também a
realização de entrevistas semi-estruturadas com alunos e professores
(apêndices I e II) e ainda a realização de oficinas, de modo a buscar elementos
que revelassem a visão dos alunos sobre as aulas de Inglês.
As observações e as entrevistas foram feitas em Escolas da rede
particular de ensino. Mais especificamente, a investigação foi realizada com
alunos de 7ª série do Ensino Fundamental de duas escolas dessa rede, na
cidade de Porto Alegre.
Tais entrevistas têm como intenção conhecer alguns aspectos do meio
cultural do aluno, seu envolvimento com a Língua Inglesa fora dos muros
escolares, bem como sua participação ou não nas aulas de Língua Inglesa. Os
questionamentos realizados nas entrevistas (apêndice I) buscam encontrar
caminhos para que a vez e a voz do aluno sejam respeitadas e valorizadas em
sala de aula. Com relação aos professores, objetiva-se conhecer seus
métodos, suas estratégias e seu relacionamento com os alunos, a fim de
apontar caminhos que propiciem um ambiente de sala de aula onde os alunos
se sintam confortáveis, seguros e motivados a saírem do silêncio.
Nos capítulos a seguir, pretende-se inicialmente analisar e discutir o
processo de enunciação, buscando suporte em autores como Mikhail Bakhtin e
Émile Benveniste. Apresentamos como ponto de partida Bakhtin, visto que
através da enunciação é que ocorre a interação entre as vozes sociais.
Concebendo a linguagem como uma forma de conhecimento humano, bem
como de interação social, Bakhtin considera todas as produções verbais como
dialógicas por princípio. Para ele, “um ato humano é um texto em potência e
somente pode ser compreendido (como ato humano, não como ação física)
dentro do contexto dialógico do seu tempo (como réplica, como postura plena
de sentido, como sistema de motivos)”. (1985, p. 298)
Essa concepção de Bakhtin nos permite afirmar que a interação entre as
vozes extrapola a ideia da presença física dos interlocutores, ou seja, é muito
mais do que isso, é a própria existência.
Ampliando um pouco mais a questão da enunciação, a fim de reforçar a
tentativa de entendimento dessa problemática relacionada ao silenciamento
dos alunos em sala de aula, não podemos deixar de mencionar e analisar
alguns aspectos das propostas do francês Émile Benveniste, aquele que pode
ser considerado o linguista da enunciação. Benveniste dedica-se ao estudo da
enunciação como o ato de produzir o enunciado, não o texto do enunciado. É
através da enunciação que a língua torna-se uma instância de discurso e, para
tanto, temos o surgimento de um locutor que utiliza o código, torna-se sujeito
na linguagem e pela linguagem atinge um ouvinte, produzindo outra
enunciação. Com isso, o papel do outro é fundamental.
No capítulo inicial, intitulado A linguagem como elemento fundamental
para a constituição do sujeito, busca-se compreender enunciação como sendo
o espaço do ser, do tornar-se sujeito, de confrontar-se com o outro, a
possibilidade de interação social, de participação ativa na sociedade, de
aceitabilidade, enfim, de expressão e não apenas de compreensão, em última
instância, de inclusão social.
Dando seguimento ao trabalho, no capítulo II – Fomos criados para
interação social – a abordagem volta-se para o estudo de Vigotski (1998), uma
vez que, na concepção desse autor, o desenvolvimento do indivíduo se dá a
partir da interação social. Ele entende que o desenvolvimento é fruto de uma
grande influência das experiências do indivíduo, mostrando que os sujeitos são
inicialmente sociais para mais tarde tornarem-se individuais. E, ao analisar o
sujeito, vamos também considerar o seu desenvolvimento a partir dos estudos
de Winnicott (1975), que enfatiza, justamente, o aspecto emocional e a
expressão da subjetividade. Finalmente, mas não menos importante,
analisaremos os estudos de Sara Paín (1999) a respeito da função da
ignorância, a fim de verificarmos o quanto o espaço da ignorância oportuniza
locomover-se em outras direções.
Pensando em sala de aula e nas relações que aí tomam forma, os
questionamentos e as reais oportunidades que existem para que os alunos
verdadeiramente se apropriem do conhecimento, o “uso da ignorância” nas
diversas etapas de aprendizagem oportuniza interpretações por vezes
absurdas, até chegar à suposta resposta. Enfim, objetiva-se nesse segundo
capítulo verificar e compreender os processos de interação social envolvidos
nas experiências dos aprendizes.
No capítulo III, nosso interesse volta-se para o entendimento de que
temos possibilidades de aprender, ou seja, somos capazes de participarmos de
um ambiente de aprendizagem. A partir da obra How languages are learned
(Lightbown & Spada, 1996) vamos abordar os aspectos que afetam a
aprendizagem de uma segunda língua que, sendo devidamente considerados,
oportunizam um ensino/aprendizagem de êxito. Nossa intenção nesse capítulo
é, também, mencionarmos o tema estratégias de estudo, visto acreditarmos
que o aprendizado continua fora da sala de aula, e que os alunos precisam ser
capazes de se organizar de modo independente.
Finalmente, no capítulo IV, partimos para a constatação de que mesmo
diante das condições anteriores já apresentadas, isto é, do fato de que fomos
planejados para falar, para nos relacionarmos e de que temos condições de
aprender, ainda assim o silêncio tem vez e sentido nas aulas de Língua
Inglesa. Nosso objetivo nesse capítulo é apresentarmos os passos que nos
permitiram executar esse trabalho, bem como o entendimento do silêncio a
partir de algumas categorias que foram tomando forma ao confrontarmos as
falas dos alunos advindas das entrevistas, além das imagens por eles
propostas nas oficinas com o texto de Orlandi, As formas do silêncio (1995).
Para finalizar, são apresentados os encaminhamentos finais do
trabalho. Entre esses encaminhamentos, destaca-se uma breve retomada das
contribuições dos principais autores presentes no trabalho, bem como uma
sinalização a respeito de fatores que podem ser repensados no
ensino/aprendizagem de uma segunda língua.
1 A LINGUAGEM COMO ELEMENTO FUNDAMENTAL PARA CONSTITUIÇÃO DO
SUJEITO
Somos e nos constituímos no que somos ao fazermos uso da
linguagem. É na linguagem e pela linguagem que nos desenvolvemos, nos
tornamos sujeitos ativos de nossas experiências. O tema sobre a constituição
na linguagem é um assunto que nos levaria para a interessante área da
filosofia. Contudo, adentrarmos em uma discussão filosófica, nesse momento,
soaria redutora, visto que essa discussão não é vital para a presente reflexão.
Nos parágrafos seguintes, nos dedicamos à compreensão de autores
envolvidos no estudo da enunciação.
Através da linguagem atribuímos sentido à realidade ao nosso redor,
interagimos com nossos pares, legitimamos nosso espaço de “ser”. Nas
palavras de Geraldi, confirmamos nosso argumento inicial sobre a importância
da linguagem:
Face ao reconhecimento, tácito ou explícito, de que a questão da linguagem é fundamental no desenvolvimento de todo e qualquer homem; de que ela é condição sine qua non na apreensão de conceitos que permitem aos sujeitos compreender o mundo e nele agir; de que ela é ainda a mais usual forma de encontros, desencontros e confrontos de posições, porque é por ela que estas posições se tornam públicas, é crucial dar à linguagem o relevo que de fato tem. (GERALDI, 1997 p. 4-5)
Ao nos considerarmos sujeitos falantes, utilizamos a palavra, entre
outros instrumentos, como porta de acesso para adentrarmos no mundo da
linguagem verbal. O espaço comum onde ocorre a utilização da linguagem
verbal e onde nos constituímos sujeitos é o da “conversação”, da interlocução.
Ao nos centrarmos na linguagem como um processo de interlocução e
utilizarmos esse olhar, a fim de analisarmos o ensino-aprendizagem de uma
segunda língua, precisamos inevitavelmente pensar nos sujeitos envolvidos
nesse processo como indivíduos singulares, com suas próprias histórias que,
em última instância, são histórias resultantes de interações sociais que ocorrem
através do uso da língua.
Fazer uso da voz como instrumento nos permite sair do silêncio,
participar ativamente de nosso entorno social, expressando nossos
sentimentos, opiniões, crenças, percepções interiores. É o espaço que nos
possibilita “sair do silêncio para a enunciação”. Quando esse espaço deixa de
existir, por alguma razão, acaba por gerar um processo de isolamento, de
exclusão.
Quando nos referimos à enunciação, precisamos verificar o que isso
implica na visão de autores como Bakhtin e Benveniste. Mikhail Bakhtin
preconiza aquilo que mais tarde será conhecida como uma linguística da
enunciação. Suas ideias colocam a enunciação como ponto importante a ser
analisado no que se refere aos fenômenos linguísticos, uma vez que através da
enunciação é que ocorre a interação entre as vozes sociais. Nas palavras de
Flores & Teixeira:
“[...] as ideias de Bakhtin (Voloshinov) sobre a linguagem anunciam a fundação de uma linguística que promoverá a enunciação como centro de referência do sentido dos fenômenos linguísticos, vendo-a como evento, sempre renovado, pelo qual o locutor se institui na interação viva com vozes sociais.” (2005, p. 45)
Para Bakhtin, o sentido de voz não se restringe à emissão vocal sonora,
pois é de ordem metafórica e diz respeito à memória semântico-social
depositada na palavra; a linguagem funciona como uma forma de
conhecimento humano, e o resultado da interação entre dois indivíduos
inseridos em um contexto social vem a ser a enunciação.
Portanto, enunciação para Bakhtin
é pois uma atividade intrinsecamente dialógica, em que o reconhecimento de si se dá pelo reconhecimento do outro. Em cada palavra há ‘vozes’ que podem ser infinitamente longínquas, anônimas, quase despersonalizadas [...] inapreensíveis, e vozes próximas que soam simultaneamente. (FLORES &TEIXEIRA, 2005, p. 57 -58)
O que se verifica é que Bakhtin privilegia a interação social e acaba por
criticar a descrição formal e normativa. Na citação abaixo, entendemos um
pouco melhor essa crítica que Bakhtin faz a Saussure:
Segundo Bakhtin (Voloshinov), ao objetivismo abstrato interessa o sistema de regularidades fonéticas, gramaticais e lexicais que tem a função de garantir a unidade da língua. Esse objetivismo somente admite o ato individual de criação quando ligado a um sistema lingüístico imutável, em um dado momento histórico, e supra-individual. As leis desse sistema obedecem ao princípio da imanência. Existe, pois, ‘um fosso que separa a história do sistema lingüístico [...] da abordagem não histórica, sincrônica’. Trata-se de uma noção de língua que considera a convencionalidade e arbitrariedade do sistema lingüístico sem referência do signo à realidade ou ao indivíduo. O que interessa é a relação entre os signos, dentro do sistema do qual se deve explicar a lógica interna. (FLORES & TEIXEIRA, 2005, p. 48)
Na perspectiva de Bakhtin não há possibilidade de desvincular o uso da
palavra de um contexto histórico de utilização, não há possibilidade de se
categorizar a palavra como estática, é simplesmente ir de encontro a algo que
é mutável.
Vale ressaltar a noção de diálogo em Bakhtin (1988), uma vez que para
o senso comum o diálogo estaria vinculado à troca que ocorre face a face. Em
Bakhtin é um espaço de tensão entre vozes. Para ele, como o dialogismo está
ligado à interação da linguagem exterior e interior do nosso corpo, o diálogo
passa a ser parte fundamental da língua. Para o autor, todas as produções
verbais, independente do tipo, são dialógicas por princípio. “No conjunto da
obra de Bakhtin, as relações dialógicas são entendidas como espaços de
tensão entre vozes sociais.” (FLORES & TEIXEIRA, 2005 p. 58). As relações
dialógicas vão para além do diálogo, elas são mais amplas e complexas. Nesse
sentido é importante lembrar a função da palavra nesse processo de interação.
Em sua obra Marxismo e filosofia da linguagem, verificamos que:
[...] toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro. Através da palavra, defino-me em relação ao outro, isto é, em última análise, em relação à coletividade. A palavra é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros. Se ela se apóia sobre mim numa extremidade, na outra apóia-se sobre o meu interlocutor. A palavra é o território comum do locutor e do interlocutor. (BAKHTIN, 1988, p. 113)
Essa perspectiva nos permite entender que, mesmo que por algum
instante haja um locutor dono da palavra, não se pode deixar de admitir que a
palavra foi escolhida a partir de um estoque social de signos. Precisamos levar
em conta as condições reais da enunciação, considerando que a “enunciação é
o produto da interação de dois indivíduos socialmente organizados e, mesmo
que não haja um interlocutor real, este pode ser substituído pelo representante
médio do grupo social ao qual pertence o locutor.” (BAKHTIN, 1998, p. 112). A
noção de enunciação é bem marcada nesse ponto, visto que, embora o locutor
não seja real e venha a ser uma representação da comunidade na qual está
inserido, permanece a ideia de interação verbal realizada através da
enunciação.
Para compreendermos as escolhas das palavras, que possivelmente vão
variar de acordo com os laços de interação entre os participantes da
enunciação, é muito importante analisarmos os indivíduos envolvidos nesse
processo, suas experiências, vivências, os pares incluídos em suas trocas, ou
seja, seu entorno social. Se a relação for entre os mais chegados – pai, mãe,
irmão – certamente vai ser diferente entre aluno e professor ou até mesmo
entre aluno e aluno, os quais, muitas vezes, possuem níveis de proficiência
diferenciados. Portanto, a hierarquia social entre as interações é fator marcante
no processo enunciativo. Nesse ponto mencionamos novamente as
considerações de Bakhtin (1998) já citadas anteriormente, relacionadas ao fato
de a palavra comportar duas faces, já que procede de alguém e se dirige para
alguém.
De acordo com Martins, em Enunciação e diálogo, temos que “a
comunicação, enquanto relação de alteridade, constituidora do ‘eu’ pelo
reconhecimento do ‘tu’ é [...] o núcleo a partir do qual Bakhtin constrói o
princípio do dialogismo [...]”. (MARTINS, 1990, p. 18). Isso nos leva a
questionarmos até que ponto temos uma sala de aula onde realmente ocorre
uma comunicação efetiva.
Nesse sentido, entendemos que eu vai ter voz a partir do momento em
que for valorizado como tu, e então nos confrontamos com os processos de
ensinar/aprender que ocorrem nas escolas, uma vez que, na maioria dos
casos, temos uma hierarquização dos lugares ocupados pelos interlocutores.
De acordo com essa perspectiva, nos lembramos das palavras de Bakhtin no
que diz respeito à noção de interlocutor:
A palavra dirige-se a um interlocutor: ela é função da pessoa desse interlocutor: variará se tratar de uma pessoa do mesmo grupo social ou não, se esta for inferior ou superior na hierarquia social, se estiver
ligada ao locutor por laços sociais mais ou menos estreitos. (BAKHTIN, 1998 p. 112).
No cenário de sala de aula, os interlocutores que nos interessam são
professor/aluno e os papéis que ocupam. O professor ocupa seu papel de
poder institucional para promover e controlar a interlocução. Muitas vezes, o
acesso ao conhecimento ocorre através da reprodução de informações que
estão relacionadas a um sentido que é historicamente dominante.
O papel do aluno parece ser o de receber e utilizar informações através
da mediação do professor; a problemática que surge é que, uma vez que
analisamos a “interação de vozes” a partir de Bakhtin, nos deparamos com
uma situação em que, na maioria das vezes, não temos confronto de vozes
que representam diferentes perspectivas ideológicas. Se temos um sentido
dominante nas salas de aula, qual seja o discurso que vem do professor,
possivelmente teremos um silenciamento por parte dos alunos. Esses não
estão sendo chamados a ocupar seus lugares sociais, apenas são convidados
à compreensão e não à expressão. O processo de interação está deixando de
ocorrer na relação de ensino. Ou, ainda melhor, nas palavras de Fiorin:
O ser é um evento único. É para a existência do ser humano concreto que se volta Bakhtin. Sua filosofia primeira não construirá leis gerais, mas será uma fenomenologia dos eventos. A unicidade do ser humano existe na ação, no ato individual e responsável. Viver é agir e agir em relação ao que não é o eu, isto é, o outro. Eu e outro constituem dois universos de valores ativos, que são constitutivos de todos os nossos atos. As ações concretas realizam-se na contraposição de valores. (FIORIN, 2006, p. 17)
A partir dessa perspectiva, verificamos que quando o agir não acontece
em relação ao outro temos uma negação com relação à estrutura da
enunciação, uma vez que esta é tida como puramente social, conforme Bakhtin
(1988). Para haver enunciação é imprescindível a participação de falantes,
portanto quando temos um ato de fala individual estamos na via contrária da
enunciação. Não estamos agindo em relação ao outro, com o outro e para o
outro.
Ampliando um pouco mais a questão da enunciação, a fim de reforçar a
tentativa de entendimento dessa problemática relacionada ao silenciamento
dos alunos em sala de aula, não podemos deixar de verificar alguns aspectos
das propostas do francês Émile Benveniste, aquele que pode ser considerado
o linguista da enunciação. Benveniste (1989) questionou o sistemático estudo
do texto, apontando para a importância de analisar a subjetividade que é
inerente a qualquer enunciado. Seus estudos voltam-se para o sujeito que
enuncia, o ato da enunciação, categoria essa que até então não tinha parte nas
preocupações linguísticas. Para esse autor, o sujeito ocupa lugar de destaque
e o ato enunciativo é o espaço da subjetividade, portanto ele reintegra o sujeito
e a subjetividade aos estudos linguísticos. Em sua obra Problemas de
Linguística Geral II, Benveniste apresenta a distinção entre o “emprego das
formas” e o emprego da língua. Ele não desconsidera o pensamento de
Saussure, uma vez que aceita algumas propostas saussurianas, tais como a
noção de signo, por exemplo. Contudo propõe uma nova maneira de ver essas
questões, de interpretá-las. Afirma que “a enunciação é este colocar em
funcionamento a língua por um ato individual de utilização.” (BENVENISTE,
1989, p. 82)
Portanto, ao empregarmos a língua significa que ocorre enunciação, o
que é bem diferente de empregarmos formas, pois isso está relacionado
apenas à estrutura da língua. Benveniste dedica-se ao estudo da enunciação
como o ato de produzir o enunciado, não o texto do enunciado. É evidente que
estamos diante de uma dicotomia, qual seja: o emprego das formas X o
emprego da língua. Benveniste faz a separação da linguística das formas da
linguística da enunciação. Cabe à primeira a descrição e a organização das
regras que regem a sintaxe da língua. A segunda admite a anterior e
acrescenta ao objeto de estudo a enunciação. Em última análise, a linguística
das formas visa ao emprego da lógica da língua, enquanto que a linguística da
enunciação preocupa-se com o uso de toda a língua, até mesmo o das suas
formas. É através da enunciação que a língua torna-se uma instância de
discurso e para tanto temos o surgimento de um locutor que utiliza o código,
torna-se sujeito na linguagem e pela linguagem atinge um ouvinte e forma outra
enunciação. Com isso, o papel do outro é fundamental. A seguinte citação nos
possibilita verificar esse processo:
[...] mas imediatamente, desde que ele se declara locutor e assume a língua, ele implanta o outro diante de si, qualquer que seja o grau de
presença que ele atribua a este outro. Toda enunciação é, explícita ou implicitamente, uma alocução, ela postula um alocutário. (BENVENISTE, 1989, p.84)
Acredito importante incluirmos nesse estudo uma brilhante interpretação,
de Dany-Robert Dufour, que a partir de sua leitura de Benveniste chama o
sistema de triádico da enunciação (eu-tu/ele). Deparamo-nos com uma nova
via para que se utilize a teoria de Benveniste, isto é, um caminho que vai para
além da análise linguística stricto sensu. É um apontar para a necessidade de
uma translinguística.
Para Dufour é no espaço da interlocução que ocorre uma relação
trinitária: “[...] ‘eu’ diz a ‘tu’ histórias que ‘eu’ obtém de ‘ele’. No centro de nossa
realização mais imediata como ser falante, encontram-se esses três termos,
irredutíveis uns aos outros.” (DUFOUR, 2000 p. 16-17). Para situar um pouco
melhor esse autor, acrescento as considerações de Teixeira (2004), que
desenvolve a ideia de que a linguística da enunciação altera o paradigma da
ciência, uma vez que essa linguística repousa sobre princípios unário e
terciário, e não o binário.
Interessante citar a interpretação de Dufour em sua obra Os Mistérios da
Trindade a respeito dos papéis “eu, tu, ele”:
O ‘eu’ é aquele que assume a presença diante de um ‘tu’ - não há outros meios de se estar presente a não ser assinalando-se a outro e não há nenhuma definição de presença que não retome essa constatação. Falar, dizer ‘eu’, define instantaneamente um ‘aqui’ e um ‘agora’, isto é, um ponto no tempo e no espaço a partir do qual pode ser falado o mundo. O ‘eu’, pois, está conectado à presença. Mas o que se torna o locutor que cessa de dizer ‘eu’? Torna-se ‘tu’. O ‘tu’ designa aquele que acaba de falar ou aquele que vai falar. (DUFOUR, 2000, p.55)
O que percebemos é que constantemente, de forma alternada,
passamos a ocupar dois papéis a fim de nos constituirmos como sujeitos
falantes e interativos. Mas onde o “ele” se configura nessa relação?
É preciso que o espaço interlocutório da copresença obtenha um lugar para a ausência. Ela está inscrita ali sob a forma do “ele”. Posso dizer de outra maneira: para ser um, é preciso ser dois, mas quando se é dois, de imediato se é três. O espaço dual da fala não pode ser compreendido sem a trindade. A ausência, o “ele”, é o que representa, a todos os instantes, a única perspectiva do homem. (DUFOUR, 2000, p. 55)
Percebemos que um “eu” institui um “tu” para falar de um “ele” e nesse
sistema temos a comunicação humana. Dufour, citando Lacan a respeito desse
eu-tu na língua, acrescenta: “Tudo o que se diz tem sob si um eu que o
pronuncia. É no interior dessa enunciação que o tu aparece” (2000, p. 69). O
que verificamos é um estreitamento de opiniões de autores aqui mencionados,
que colocam a língua em um sistema de pronomes, qual seja: “Quando um
sujeito fala, ele diz ‘eu’ a um ‘tu’, a propósito d’ele”.
Portanto, os papéis EU/TU na enunciação não existem isoladamente,
são complementares e ao mesmo tempo reversíveis. Benveniste declara:
[...] a consciência de si mesmo só é possível se experimentada por contraste. Eu não emprego eu a não ser dirigindo-me a alguém, que será na minha alocução um tu. Essa condição de diálogo é que é constitutiva da pessoa, pois implica em reciprocidade que eu me torne tu na alocução daquele que por sua vez se designa por eu. (1988, p. 287)
Quando os participantes desse sistema de fala, que poderíamos
metaforizar como sendo um jogo, não assumem seus papéis, ou melhor, não
aceitam as regras desse jogo, a tendência é que ocorra um silenciamento.
Se esses papéis não estão sendo devidamente entendidos e valorizados
no espaço escolar, muito possivelmente teremos um silenciamento por parte
dos alunos, uma vez que deixam de ocupar esse espaço de “ser” na
enunciação. E nesse ponto claramente observamos o diálogo entre Bakhtin e
Benveniste no que diz respeito à enunciação. O espaço do ser, do tornar-se
sujeito, de confrontar-se com o outro. É a possibilidade de interação social, de
participação ativa na sociedade, de aceitabilidade, enfim, de expressão e não
apenas de compreensão, em última instância de inclusão social. Incluo também
nesse diálogo o autor Alastair Pennycook, estudioso das áreas de linguagem e
educação. No dizer de Pennycook, temos um conceito para voz que também
está intimamente ligado à questão de nos tornarmos sujeitos ativos e com
capacidade de interações, ou seja:
Formas de nos fazer entender, nos definir como participantes ativos no mundo; nos tornando agentes no processo de fazer história; construindo elos nas relações complexas que informam a consciência e nos posicionam com relação aos outros; nos possibilitando sair do silêncio para a enunciação de uma forma revolucionária ou de
oposição gestual, de escrita, de leitura, de produção oral divergente.” (PENNYCOOK, 1994, p.115-138)
É a respeito das práticas interativas que ocorrem ou deixam de ocorrer
no espaço de sala de aula que lançamos os olhares de forma mais atenta. Para
tanto, nos apegamos a diferentes áreas do conhecimento, tais como a
linguística e a psicologia, por exemplo. Em cada área procuramos pelo
entendimento dos diferentes sentidos das interações que ocorrem na sala de
aula. Quem é este sujeito que está inserido em uma sala de aula, a fim de
aprender uma segunda língua, isto é a Língua Inglesa? Que sentido possuem
as interações produzidas na sala de aula, interações essas que, muitas vezes,
estão inseridas em um contexto puramente preocupado com a forma do
enunciado e não com o ato em si da enunciação? Ou ainda, muitas vezes,
temos a valorização de um sentido unívoco e transparente, muito claro para o
professor ou para o livro didático e completamente inatingível para o aluno.
Geraldi (1997), em sua obra Portos de passagem, propõe ser a
linguagem fator fundamental no desenvolvimento do sujeito, primordial em um
contexto de sala de aula, por exemplo, para novos conceitos serem
aprendidos, para que os confrontos de posições ocorram. É de suma
importância o espaço da enunciação ser altamente valorizado, a fim de ocorrer
a constituição dos sujeitos. Pensar a linguagem dessa forma é constatar a
necessidade de respeitarmos a singularidade dos sujeitos envolvidos, levando
em conta suas histórias, e que esses estão em contínuo desenvolvimento. Para
tanto, não podemos nos esquecer que a língua é um sistema do qual o sujeito
vai se apropriar conforme suas necessidades, de que as interações entre os
envolvidos se instituem como fator importante para a constituição desses
sujeitos e de que essas interações estão vinculadas a um contexto social e
histórico. Vista dessa forma a questão do uso da linguagem, entende-se a
necessidade de analisar a singularidade dos envolvidos no processo
enunciativo. Estamos diante de um estudo que implica sujeitos enunciando-se
através das formas linguísticas e que esse sujeito, ao estar participando de
uma aula de língua estrangeira, não se sinta como um exilado, possa ocupar
seu lugar na enunciação para continuar a existir.
Portanto, nossa reflexão parte para a análise das interações sociais que
tomam lugar no espaço de sala de aula, uma vez que acreditamos sermos
sujeitos capazes de interagir. E, mesmo estando no silêncio, acreditamos se
fazer necessário analisá-lo, pois existe sentido nele. Para os menos atentos,
pode soar incompreensível estar no sentido sem utilizar a voz. Especialmente
em um momento em que a sociedade supervaloriza os meios que possibilitam
o falar, como o telefone, o fax, a internet, entre outros.
2 FOMOS CRIADOS PARA A INTERAÇÃO SOCIAL
Até aqui verificamos como se dá o processo de enunciação, a partir
desse ponto colocamos em destaque a interação que deve ocorrer entre os
indivíduos envolvidos no processo. A discussão, a partir desse ponto, se dá
mediante a convicção de que os alunos devem ser entendidos na sua
particularidade e ser respeitados como indivíduos, possuindo e garantindo seu
espaço de interação, seu espaço de ser. Nesse ponto é bastante útil
lembrarmos que: “O respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um
imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos
outros.” (FREIRE, 1996, p. 66)
Ao analisarmos interação social, faz-se necessário atentarmos para
questões iniciais da formação do sujeito e estudarmos o desenvolvimento do
indivíduo a partir de questões emocionais, sociais, linguísticas, ou seja, das
experiências do indivíduo. Quando nos referimos ao desenvolvimento inicial do
sujeito, não podemos deixar de mencionar Winnicott, pediatra de formação
psicanalítica que estuda o desenvolvimento emocional. Ao nos inquietarmos
com pré-adolescentes e adolescentes que estão silenciando em sala de aula, é
importante que verifiquemos o desenvolvimento inicial desse sujeito e, para
tanto, recorrer à obra de Winnicott é muito importante, uma vez que ele aborda
justamente essa etapa humana. Começando pelo entendimento da palavra
infante (lactente) em sua obra O Ambiente e os processos de maturação:
Na verdade a palavra infante significa ‘sem fala’ (infans), e não é útil pensar na infância como a fase anterior à apresentação das palavras e uso das palavras como símbolos. O corolário é que ela se refere à fase em que o infante (lactente) depende do cuidado materno que se baseia na empatia materna mais do que na compreensão do que é ou poderia ser verbalmente expresso. (WINNICOTT, 1983. p. 41)
Nessa fase, o cuidado materno é de suma importância, visto que um
importante aspecto nessa etapa é a dependência. Uma criança, para possuir
um ego forte e estável, depende do grau de complementação com o ego do
cuidador. O espelho primeiro da criança é a mãe e, quando esse espelho está
em situação caótica, a criança pode sentir-se fragmentada. Algumas propostas
de Winnicott (1983) precisam ser abordadas nesse momento a fim de
entendermos um pouco melhor como se dá o relacionamento paterno-infantil,
uma vez que estamos investigando essa fase inicial da criança com o objetivo
de detectarmos algumas possíveis razões para o travamento/silenciamento que
ocorre no espaço escolar.
Nesse ponto é muito útil mencionarmos a fala da aluna F11, no decorrer
da entrevista, referindo-se à utilidade ou não das aulas de inglês. Ela afirma
que as aulas são a única forma de contato com o idioma, pois em casa a mãe
não valoriza o uso dessa segunda língua, ou seja, a mãe nunca incentivou ela
e a irmã a se evolverem com uma segunda língua. Ela afirma, ainda:
Quando cheguei aqui na escola na quinta série eu não tinha nenhuma base, eu tive que correr atrás...assim eu não sabia que ‘girl’ era menina e ‘boy’ era menino. Agora eu escuto alguma coisa nas músicas e filmes e consigo entender e digo: olha só mãe consegui entender, quer que eu traduza?
Essa fala nos sinaliza o quanto é significativo o papel dessa mãe na
aprendizagem. No início, a aluna comenta que a mãe não incentivou o uso do
inglês e que chegou à escola sem base alguma. No final, ela retoma o papel da
mãe, apontando o quanto a participação dela é importante no seu processo de
aprendizagem. O que nos permite comprovar a enorme importância da
mãe/cuidador na fase inicial de uma criança.
Para uma criança atingir independência, Winnicott (1983) afirma que
existe a necessidade de um cuidado paterno satisfatório e que esse cuidador
deve ser suficientemente bom. Isso significa que é necessário passar por
algumas etapas, tais como: a dependência absoluta (holding), quando mãe e
lactente vivem juntos; a dependência relativa, quando já correm algumas
ausências da mãe, compensadas por algumas presenças do pai; e finalmente a
independência, quando pai, mãe e lactente vivem juntos, com uma relativa
autonomia do bebê. A caminhada para a independência tem origem desde a
dependência absoluta na fase do holding, passando pela dependência relativa,
1 As siglas “F” e “M” significam feminino e masculino, respectivamente, e a numeração serve
para diferenciar os sujeitos e seus depoimentos.
quando o lactente se dá conta da necessidade de detalhes do cuidado
materno, até a independência, quando já ocorre o desenvolvimento de meios
para ir vivendo sem cuidado real. Qualquer situação de prejuízo, no que se
refere ao cuidador, trará sérios danos a esse sujeito. Essa fase inicial é de
suma importância, como podemos perceber através da seguinte passagem:
As bases da saúde mental do indivíduo, no sentido de ausência de psicose ou predisposição à mesma (esquizofrenia), são lançadas por este cuidado materno, que quando vai bem dificilmente é percebido, e é uma continuação da provisão fisiológica que caracteriza o estado pré-natal. Esta provisão ambiental é também a continuação da vitalidade dos tecidos e da saúde funcional que (para o lactente) provê um apoio ao ego silencioso, mas vitalmente importante. Deste modo a esquizofrenia ou a psicose infantil ou uma predisposição à psicose em uma data posterior se relacionam com uma falha da provisão ambiental. (WINNICOTT, 1983, p. 49)
Assim, verificamos a importância da provisão ambiental no
estabelecimento das relações objetais, dos processos de simbolização, a
grande significação do cuidado materno, a fim de que o sujeito tenha uma
existência de um verdadeiro sentido de ser e não de isolamento ou
aniquilamento.
Com ‘o cuidado que ele recebe de sua mãe’ cada lactente é capaz de ter uma existência pessoal, e assim começa a construir o que pode ser chamado de continuidade do ser. Na base dessa continuidade do ser o potencial herdado se desenvolve gradualmente no indivíduo lactente. Se o cuidado materno não é suficientemente bom então o lactente realmente não vem a existir, uma vez que não há a continuidade do ser; ao invés a personalidade começa a se construir baseada em reações a irritações do meio. (WINNICOTT, 1983, p. 53)
É inegável que as palavras acima confirmam o quão vital é o cuidado
materno na formação do ser. O valor da vida familiar é seguramente um
aspecto fundamental, e penso que nesse aspecto temos um terreno fértil de
análises e reflexões em nossa busca por respostas para o silenciamento dos
alunos em sala de aula.
Ampliando essa reflexão sobre a fase inicial do sujeito, podemos
continuar nossa análise apresentando o mesmo autor, com relação às suas
reflexões no que diz respeito à criatividade. Faz-se necessário referenciar o
conceito de criatividade desenvolvido por Winnicott (1975). Ele analisa
criatividade não do ponto de vista da obra de arte, mas sim de “viver”, ser
capaz de sentir e exercitar esse ser. Novamente aparece a idéia de ser, de
existência pessoal significativa, e a reafirmação da fase inicial do bebê, a fim
de que se constitua um sujeito criativo, o que percebemos através das
seguintes palavras:
[...] há em primeiro lugar a necessidade de proteção do relacionamento bebê-mãe e bebê-genitor, no estádio primitivo do desenvolvimento de todo o menino ou menina, de forma a que possa ser criado o espaço potencial em que, devido à confiança, a criança brinque criativamente. (WINNICOTT, 1975, p. 152)
Essa citação nos permite reconhecer a importância do espaço potencial,
ou seja, espaço do brinquedo; e o brincar é símbolo da confiança, nascida do
vínculo com a mãe. Portanto, confiança e fidedignidade acabam por gerar um
espaço potencial:
Um bebê pode ser alimentado sem amor, mas um manejo desamoroso, ou impessoal, fracassa em fazer do indivíduo uma criança humana nova e autônoma. Onde há confiança e fidedignidade há também um espaço potencial, espaço que pode tornar-se uma área infinita de separação, e o bebê, a criança, o adolescente e o adulto podem preenchê-la criativamente com o brincar, que, com o tempo, se transforma na fruição da herança cultural. (WINNICOTT, 1975, p. 150)
Essa relação de confiança é algo que se prolonga pela vida, uma vez
que depende da experiência de confiança que se deve estabelecer desde a
mãe e o bebê, passando pela criança e a família, até o adulto e a sociedade. E
quando essa relação, considerada por Winnicott (1975) como sagrada para o
indivíduo, se estabelece de forma saudável temos um sujeito que usufrui de um
viver criativo. Em contrapartida, quando ocorrem situações em que não se
podem gerar condições para o estabelecimento do espaço potencial, quando
ocorre o fracasso da confiança, consequentemente teremos restrições com
relação ao brincar e possíveis condições patológicas. Winnicott afirma:
Contudo, para o bebê (se a mãe puder proporcionar as condições corretas), todo e qualquer pormenor de sua vida constitui exemplo do viver criativo. Todo objeto é um objeto ‘descoberto’. Dada a oportunidade, o bebê começa a viver criativamente e a utilizar objetos reais, para neles e com eles ser criativo. Se o bebê não receber essa oportunidade, então não existirá área em que possa brincar, ou ter experiência cultural, disso decorrendo que não existirão vínculos com a herança cultural, nem contribuição para o fundo cultural. (WINNICOTT, 1975, p. 141)
O que se percebe da citação acima é que esse sujeito, privado dessa
etapa de instituir-se criativamente, começa a viver um processo de fracasso
gradativo no que diz respeito à sua condição de estabelecer-se como um
sujeito criativo, ou seja, “estar vivo”, com relação à realidade externa, às
relações desse sujeito com a escola, às relações com professores, colegas e o
modo de expressão do pensamento.
Complementando esse aspecto dos resultados positivos que se
estabelecem a partir da relação de confiança com a família, tivemos a
oportunidade de comprovação desse ponto quando alguns alunos, ativos
falantes nas aulas, responderam à primeira questão da entrevista (apêndice I)
a respeito da utilização do inglês em outros ambientes, fora da escola. Eles
comentaram que é muito legal falar com o pai, a mãe, os irmãos... e que desde
cedo a família usa o inglês em vários momentos, principalmente nas
brincadeiras.
O aluno M1 nos relata: “Eu utilizo normalmente em casa, com meu
irmão, entre família, com meus tios, que a maioria deles sabe falar. E é muito
bom falar em inglês.”
É muito visível o quanto esse aluno consegue ser autônomo, criativo e
seguro em suas participações em sala de aula, e o que justifica esse
comportamento, entre outros fatores, é o espaço privilegiado em sua relação
familiar.
Até aqui voltamos nossos olhares para o desenvolvimento inicial de um
sujeito e suas implicações na formação desse ser. A partir de então
precisamos considerar o desenvolvimento da linguagem na formação desse
sujeito, fator fundamental para que se tenha um sujeito autônomo e ativo no
processo enunciativo. Para tanto, abordamos a obra de Vigotski, cujas
propostas vão de encontro às correntes de pensamento aceitas em sua época,
como, por exemplo, o pensamento inatista, defensor da idéia de que o
indivíduo já nasce com certas características, tais como inteligência e estados
emocionais pré-determinados.
Na concepção de Vigotski (2005), o desenvolvimento do indivíduo se dá
a partir da interação social, das experiências dele. Com relação ao que
expressa em sua obra Pensamento e Linguagem, afirma que no início da
existência humana há estágios denominados pré-linguístico – no que diz
respeito à linguagem – e pré-intelectual – no que se refere ao pensamento.
Esses fenômenos, com origens distintas, vão se cruzar em determinado
momento, estabelecendo uma nova forma de comportamento, como
observamos abaixo:
Mas a descoberta mais importante é que, num certo momento, mais ou menos aos dois anos de idade, as curvas da evolução do pensamento e da fala, até então separadas, encontram-se e unem-se para iniciar uma nova forma de comportamento. (VIGOTSKI, 2005, p. 53)
Após esse processo, a criança faz sua grande descoberta: cada coisa
possui uma identificação, um nome. A partir desse momento, surgem duas
situações, conforme percebemos através da seguinte passagem:
Esse instante crucial, em que a fala começa a servir ao intelecto, e os pensamentos começam a ser verbalizados, é indicado por dois sintomas objetivos inconfundíveis: (1) a curiosidade ativa e repentina da criança pelas palavras, suas perguntas sobre cada coisa nova (“o que é isto?”); e (2) a conseqüente ampliação de seu vocabulário, que ocorre de forma rápida e aos saltos. (VIGOTSKI, 2005, p. 53)
É muito interessante perceber o quanto a criança torna-se motivada
devido à necessidade de construir novas palavras, e a formulação das
perguntas a conduz à aprendizagem de símbolos ligados aos objetos. Nesse
processo de desenvolvimento, Vigotski (2005) reconhece que quando
pensamento e fala se unem é então que ocorre o pensamento verbal, ou
melhor, o pensamento transforma-se em verbal e a fala torna-se racional.
Importante lembrar que o pensamento verbal está intimamente ligado ao
entorno social e não é uma forma de comportamento inato, isso fica claro na
passagem abaixo:
O pensamento verbal não é uma forma de comportamento natural e inata, mas é determinado por um processo histórico-cultural e tem propriedades e leis específicas que não podem ser encontradas nas formas naturais de pensamento e fala. (VIGOTSKI, 2005, p. 63)
Ainda pensando nesse fenômeno da ligação entre pensamento e fala, é
possível afirmar que o significado das palavras pode ser entendido como um
estado característico do pensamento verbal. Após essa apresentação
introdutória sobre o desenvolvimento da linguagem, em nossa busca reflexiva
pelo entendimento dos motivos pelos quais pode ocorrer um
travamento/silenciamento por parte dos alunos em sala de aula, no que diz
respeito ao uso da voz, torna-se relevante analisarmos o que Vigotski (2005)
propõe sobre a formação de conceitos.
O ponto alto com relação à formação de conceitos é o meio utilizado
para que essa etapa se efetive. De acordo com Vigotski (2005), o material
sensorial e a palavra são partes indispensáveis à formação de conceitos.
Nesse sentido, as funções psíquicas são mediadas e os símbolos são o meio
para a sua direção e dominação. Esse símbolo passa a ser ligado à estrutura e
torna-se elemento indispensável. A palavra também possui seu papel na
formação de conceitos e, em primeira instância, desempenha a função de
intermediária na formação de um conceito; mais tarde, torna-se o símbolo
essencial. Esses processos que resultam na formação de conceitos são fruto
de uma evolução, como podemos verificar na citação abaixo:
O desenvolvimento dos processos que finalmente resultam na formação de conceitos começa na fase mais precoce da infância, mas as funções intelectuais que, numa combinação específica, formam a base psicológica do processo da formação de conceitos amadurece, se configura e se desenvolve somente na puberdade. Antes dessa idade, encontramos determinadas formações intelectuais que realizam funções semelhantes àquelas dos conceitos verdadeiros, uma relação semelhante à do embrião com o organismo plenamente desenvolvido. Equiparar os dois significa ignorar o prolongado processo de desenvolvimento entre o estágio mais inicial e o estágio final. (VIGOTSKI, 2005, p. 72)
O que se verifica é que a formação de conceitos resulta de uma
atividade complexa em que as principais funções do intelecto estão envolvidas.
E novamente o uso da palavra supera em importância fatores como
associação, construção de imagens, inferências, entre outras, visto que o uso
da palavra é que valida esses fatores, pois é ela que possibilita a realização
das operações mentais. Segundo Vigotski, “o novo e significativo uso da
palavra, a sua utilização como um meio para a formação de conceitos, é a
causa psicológica imediata da transformação radical por que passa o processo
intelectual no limiar da adolescência.” (2005, p. 73)
Existe, para Vigotski (2005), uma trajetória para a formação de conceitos
que inclui três fases, sinteticamente abaixo representadas:
o Primeiramente surge a necessidade de solucionar um problema que
visa agrupar alguns objetos. O que o sujeito visualiza é uma espécie
de amontoado composto por objetos desiguais. A criança percorre
algumas etapas para solucionar o problema, entre elas o método de
tentativa e erro, e baseia-se na organização de seu campo visual.
o Na segunda etapa aparecem os pensamentos complexos. Nesse
momento, os objetos isolados ligam-se na mente da criança, não
apenas devido às impressões subjetivas dessa criança, mas também
devido às relações que existem entre os objetos.
o Na última fase é quando ocorre o desenvolvimento da abstração. A
criança começa a abstrair, a isolar elementos e a analisá-los
separadamente.
Ainda segundo o autor, “o emprego da palavra é parte integrante dos
processos de desenvolvimento, e a palavra conserva a sua função diretiva na
formação dos conceitos verdadeiros, aos quais esses processos conduzem”.
(VIGOTSKI, 2005, p. 101). Portanto, é de grande importância o conhecimento
por parte de educadores da complexidade que existe na formação de
conceitos, do grande potencial intelectual que se faz necessário para que o uso
da palavra aconteça de forma efetiva. Em se tratando de um aprendizado de
língua estrangeira, saliente-se que, segundo Vigotski (2005), trata-se de um
processo semelhante ao da formação de conceitos no que tange ao
desenvolvimento mental da criança, ou seja, é um processo consciente e
deliberado desde o início.
Na língua materna, os aspectos primitivos da fala são adquiridos antes dos aspectos mais complexos. Estes últimos pressupõem uma certa consciência das formas fonéticas, gramaticais e sintáticas. No caso de uma língua estrangeira, as formas mais elevadas se desenvolvem antes da fala fluente e espontânea. (VIGOSTSKI, 2005, p. 136)
De acordo com esse autor, o papel da língua materna é de grande
importância para o sucesso do aprendizado de uma segunda língua. É o que
nos fica bem apresentado no trecho a seguir:
O êxito no aprendizado de uma língua estrangeira depende de um certo grau de maturidade na língua materna. A criança pode transferir para a nova língua o sistema de significados que já possui na sua própria. O oposto também é verdadeiro – uma língua estrangeira
facilita o domínio das formas mais elevadas da língua materna. A criança aprende a ver a sua língua como um sistema específico entre muitos, a conceber os seus fenômenos à luz de categorias mais gerais, e isso leva à consciência das suas operações lingüísticas. (VIGOSTSKI, 2005, p. 137)
O que verificamos é que o processo de fala em Língua Estrangeira é
algo que requer um estudo árduo, visto que as formas mais complexas da
língua precisam ser desenvolvidas a fim de que se possa obter a verbalização.
Eis a necessidade de um professor reflexivo, a fim de que se estruturem aulas
de Língua Estrangeira tendo em mente que, conforme Vigotski, “o aprendizado
é uma das principais fontes de conceitos da criança em idade escolar, e é
também uma poderosa força que direciona o seu desenvolvimento,
determinando o destino de todo o seu desenvolvimento mental.” (2005, p. 107)
Ao tratar do papel do aprendizado na vida das crianças, menciono
alguns resultados obtidos a partir das imagens propostas pelos alunos nas
oficinas: em suas sugestões para a sala de aula desejada, eles propõem que,
ao invés de a professora ficar de costas para a turma e escrever “silence
please” no quadro, ela estivesse sorrindo, de frente para a turma, e que
escrevesse “happy”. Em outra imagem eles sugerem que a professora usasse
mais o inglês do que o português. Isso nos permite concluir que os próprios
alunos estão sinalizando a necessidade de adequações tanto no aspecto de
relacionamento como de metodologia no processo de ensino.
Nesse ponto, acredito na importância que o espaço de sala de aula
possui para a formação dos alunos. Contudo, acrescento a necessidade de
valorizarmos o aprendizado que continua fora de sala de aula e de quanto o
papel do professor pode ajudar nesse processo, no sentido de orientar os
alunos em como organizar seu próprio aprendizado de maneira independente.
Eis a necessidade de desenvolver aulas que destaquem estratégias de estudo,
visto que essas desempenham um papel essencial no aprendizado de idiomas.
E quando falhas, dificuldades ou até mesmo o não uso das palavras
ocorrem, há que se verificar a ocorrência de possíveis interferências nas
etapas de amadurecimento dessa criança.
Nessa continuidade pela busca do entendimento a respeito das
possíveis razões que levam ao silenciamento, a não verbalização por parte dos
alunos, considera-se importante destacar uma temática muito bem
desenvolvida por Sara Paín (1999), qual seja: A função da ignorância. Por que
o sujeito ignora? Por que deseja conhecer ou por que está impedido de
conhecer? De posse desses questionamentos, reafirmo a importância de
entendermos a plenitude do papel da ignorância. Podemos considerá-la vital no
que diz respeito ao entendimento do nosso organismo, caso contrário
enlouqueceríamos se ficássemos pensando nos batimentos cardíacos, no
sistema circulatório, por exemplo. Esses funcionamentos são automáticos, só
nos damos conta quando algo está errado. Esse tipo de ignorância é
fundamental, conforme citação abaixo:
Essa ignorância essencial deve ser concebida como uma propriedade [faculdade] e não como carência do pensamento. Com efeito, ela não provém das limitações próprias dos dispositivos do conhecimento no homem, mas, ao contrário, provém de sua extraordinária plasticidade. (PAÍN, 1999, p. 25)
Um outro grau da ignorância está ligado à aquisição do conhecimento,
que necessariamente passa por um processo de aprendizagem, como
percebemos a seguir:
O ser humano não possui relações diretas com os acontecimentos puramente “naturais”. Por um lado, a maioria dos objetos que o rodeiam, da alimentação à linguagem, são produtos da técnica humana; de outro, as relações físicas, bem como as relações arbitrárias existentes entre os objetos, constituem uma elaboração mais ou menos estimulada pelo meio social. Tanto os objetos do desejo como os objetos do conhecimento povoam um universo cujo código é exterior ao indivíduo. Precisamente, é o conteúdo desse código que se destina a substituir a ausência dos comportamentos instintivos. O modo de falar, de construir um abrigo ou de criar as crianças não são atividades espontaneamente desenvolvidas pelos homens. Cada um é obrigado a aprender, em todos os detalhes, os atos que garantem a sua sobrevivência e da espécie. (PAÍN, 1999, p. 25)
E quando abordamos a questão da aprendizagem, ao nos depararmos
com as práticas de sala de aula, eis que de forma inquietante nos
perguntamos: até que ponto existe espaço para a ignorância na sala de aula?
Até que ponto existe um tempo para que o aluno se aproprie do conhecimento,
fazendo uso da ignorância em suas etapas, criando interpretações até mesmo
absurdas, até chegar à suposta resposta? Será que o aluno está sendo
chamado a ocupar o lugar de participante na construção do conhecimento?
Está ocorrendo um processo de interação, e o percurso desses alunos está
sendo respeitado? Existe uma tendência de considerar o conhecido como algo
óbvio? Muito mais se poderia questionar, no que diz respeito à aquisição do
conhecimento, mas por hora fiquemos com as palavras de Sara Paín:
Na constituição das estruturas do pensamento, o papel da ignorância é fundamental. Com efeito, perante o caráter inacabado de uma interpretação da realidade, dois caminhos são possíveis: o caminho do dogmatismo, que se obstina em sustentar certos postulados negando os fatos novos que os põem em questão, e o caminho da ignorância, que tenta apresentar explicações intuitivas, a saber, metafóricas. Mais dinâmicas e abertas sobre os fatos do que as postulações dogmáticas, as hipóteses ignorantes são suscetíveis de enfrentar as contradições teóricas ou experimentais que suprimem aquilo que as obriga a mudar continuamente de argumentos, a fim de encontrarem esse estado de equilíbrio que constitui o conhecimento em cada momento de sua evolução. Todo conhecimento de que a criança se apropria, de acordo com suas possibilidades de compreensão, contém uma margem de ignorância que a criança completa por meio de uma interpretação, talvez absurda, mas justamente por causa disso, demandante de uma busca na pesquisa. O erro deve, pois, ser formulado para poder ser controvertido, remanejado, ultrapassado. A possibilidade de imaginar diversas soluções para um problema permite pô-las à prova, seja experimentalmente, seja dedutivamente, para chegar a encontrar uma solução que não contradiga o estado atual dos conhecimentos. (PAÍN, 1999, p. 100)
Nesse sentido, temos muito clara a presença de uma dicotomia, isto é,
dogma x ignorância. O que nos resta, portanto, é analisar, sinalizar e buscar
alternativas para que o ambiente pedagógico atinja níveis de equilíbrio a fim de
dosarmos esses dois caminhos que se descortinam no processo do
ensinar/aprender. Com a intenção de encontrar respostas para essa
inquietação relacionada à não verbalização dos alunos, abordamos questões
desenvolvidas por diferentes autores.
Primeiramente, compreendemos através dos textos de Winnicott a fase
inicial do sujeito, a importância do cuidado materno, a formação de um ego
forte que está intimamente ligado ao grau de complementação com o ego do
cuidador. Também verificamos o processo de formação de um sujeito criativo,
isto é, alguém capaz de ser e exercitar-se criativamente. As palavras a seguir
clarificam melhor essa ideia:
Descobrimos que os indivíduos vivem criativamente e sentem que a vida merece ser vivida ou, então, que não podem viver criativamente e têm dúvidas sobre o valor do viver. Essa variável nos seres
humanos está diretamente relacionada à qualidade e à quantidade das provisões ambientais no começo ou nas fases primitivas da experiência da vida de cada bebê. (WINNICOTT, 1975, p. 102)
Diante disso, ao nos depararmos com alunos que estão em processo de
silenciamento – ou já estão em uma condição de isolamento na sala de aula –
podemos desenvolver um olhar no sentido do entendimento de que esse aluno
pode ter vivido privações em sua fase inicial. Seu espaço potencial pode ter
sido comprometido, seu relacionamento de confiança com o cuidador pode ter
fracassado. Na medida em que o professor tem esse conhecimento e, mais
ainda, conhece seus alunos individualmente, pode funcionar como uma ponte
que possibilite a esse aluno buscar respostas e estratégias para alcançar
melhores condições de vida. E ainda mais, o professor que consegue fazer
uma análise crítica de sua sala de aula e busca verificar se esse ambiente está
oferecendo condições necessárias para que os alunos possam se desenvolver
criativamente, está promovendo esse relacionamento de confiança, que é
imprescindível para o desenvolvimento do ser. Enfim, esse professor deve
estar focado no que venha a ser viver criativamente, tal como percebemos na
passagem a seguir: “de uma ou de outra forma nossa teoria inclui a crença de
que viver criativamente constitui um estado saudável, e de que a submissão é
uma base doentia para a vida”. (WINNICOTT, 1975, p. 95)
A seguir buscou-se entender o desenvolvimento da linguagem,
verificando que existe um momento em que, de acordo com Vigotski (2005),
ocorre “[...]a maior descoberta da vida da criança [...]” Quando essa consegue
identificar objetos pelos seus nomes e passa a representá-los simbolicamente,
é nesse momento que surge o pensamento verbal. Nesse ponto é
importantíssimo levar em consideração os estímulos sociais, a interação com
outras crianças e com os adultos. São esses fatores que desempenham papel
importante na aprendizagem e compreensão da criança. A questão que se
apresenta é: e quando essa interação é muito pobre ou, ainda pior, quase
inexistente? Seria ingenuidade não levantar essa hipótese, uma vez que esse
processo inicial de interação pode fracassar, o desenvolvimento inicial dessa
criança pode ter sofrido privações, seu relacionamento com o adulto, e mais
especificamente com o cuidador, pode ter sido prejudicado. Nas palavras de
Vigotski, de forma mais clara, percebemos a importância da interação social:
O caminho do objeto até a criança e desta até o objeto passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é o produto de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas ligações entre história individual e história social. (VIGOTSKI, 1998, p. 40)
Quando essa criança está desafiada a solucionar um determinado
problema e se defronta com alguma dificuldade, ela pede ajuda, como bem
lembra Vigotski, ao afirmar que
qualquer obstáculo aos esforços da criança para solucionar o problema pode interromper sua atividade. O apelo verbal da criança a outra pessoa constitui um esforço para preencher o hiato que a sua atividade apresentou. Ao fazer uma pergunta a criança mostra que, de fato, formou um plano de ação para solucionar o problema em questão, mas que é incapaz de realizar todas as operações necessárias. (VIGOTSKI, 1998, p. 39)
Portanto, se esse apelo verbal da criança não foi bem atendido, muito
provavelmente ela começará a desenvolver lacunas em sua aprendizagem,
bem como poderá diminuir suas tentativas de buscar ajuda, ou seja, silenciar-
se, isolar-se. Pensando no espaço de sala de aula, o mesmo pode ocorrer se
esse aluno apelar verbalmente, buscando ajuda frente a um problema, e não
for devidamente atendido. Gradualmente pode ir perdendo sua voz, criando,
assim, novos mecanismos para solucionar suas questões. Eis a necessidade
de o professor possuir um olhar muito bem orientado no sentido de desenvolver
um ambiente propício para que as interações entre os alunos e entre
professor/aluno ocorram de maneira satisfatória, possibilitando, se não as
respostas para as dificuldades que vão surgindo no processo de resoluções de
problemas, pelo menos sinalizações de encaminhamento para solução.
Um outro aspecto abordado nesse texto diz respeito à formação de
conceitos e, nesse ponto, as relações de ensino desempenham papel
fundamental, uma vez que ocorre a mediação que conduz o aluno a apropriar-
se e a utilizar mecanismos intelectuais, habilidades e estratégias que se
desencadeiam em desenvolvimento cognitivo. É nesse sentido que a escola
desempenha um papel decisivo para a elaboração de conceitos e tomada de
conhecimento por parte do aluno de seus processos mentais. A elaboração de
conceitos não se desenvolve naturalmente, ela ocorre nas relações de
interação. É pela mediação do outro que a criança/aluno vai utilizando e
elaborando novos conceitos. Através das palavras, o mediador apresenta
significados e sentidos no seu entorno social. O professor precisa fazer
mediação o tempo todo. Quando a mediação for empobrecida, quando o meio
ambiente não proporcionar novas descobertas ou, ainda, quando o mediador
apenas se utilizar de dogmas em sala de aula e não propiciar o espaço da
expressão, da dúvida, certamente haverá um silenciamento por parte dos
alunos, visto que esse professor/mediador está deixando de chamar o aluno
para ocupar o seu lugar de participante na construção do conhecimento. As
lacunas que esses alunos possuem na busca de solução para seus problemas
não estão sendo levadas em conta, conforme o próprio Vigotski afirma:
Se o meio ambiente não apresenta nenhuma dessas tarefas ao adolescente, não lhe faz novas exigências e não estimula o seu intelecto, proporcionando-lhe uma série de novos objetos, o seu raciocínio não conseguirá atingir os estágios mais elevados, ou alcançará com grande atraso. (VIGOTSKI, 2005, p. 73)
Finalmente discutimos o papel da ignorância no espaço de sala de aula, e, para
tanto, nos referenciamos no trabalho de Sara Paín. E levantamos a possibilidade de que
o silenciamento do aluno possa estar ligado à supervalorização de dogmas em sala de
aula, deixando completamente de lado a possibilidade de ignorância, ou seja, o aluno
não tem espaço para o questionamento, para o momento de uma interpretação absurda,
por exemplo, mas que faz parte das etapas que levam à contínua busca pelo
conhecimento. O exagero no uso de dogmas não estará funcionando como um
silenciador?
Em face de todas essas análises relacionadas à formação do sujeito, verifica-se
que é através das interações saudáveis, que devem ocorrer nos principais locais de
formação desse sujeito, tais como lar, escola e comunidade, que desfrutaremos de um
futuro com crianças mentalmente enriquecidas, produtivas, criativas; física e
emocionalmente completas. Visualizando nossos dias atuais, isso parece soar utópico?
Talvez. Mas o que se verifica é que, para muitos, isso depende de melhores
informações, de maior conscientização, motivação e esforço coletivo por parte dos
envolvidos na formação de mentes autônomas e criativas, afinal para isso é que fomos
criados.
3 FOMOS CRIADOS COM POSSIBILIDADES PARA APRENDER
Partimos do pressuposto de que todos os alunos envolvidos em um
ambiente de aprendizagem possuem condições de êxito. No entanto, o que
verificamos é que muito se tem estudado, discutido e proposto a respeito do
fracasso escolar.
Em se tratando de aprendizagem de uma segunda língua, o que se
verifica é uma grande dificuldade nas salas de aula de escolas regulares. Meu
interesse é especificamente rever alguns aspectos do ensino/aprendizagem de
uma segunda língua, buscando constatar que, via de regra, os alunos
apresentam condições de aprendizagem, contudo temos salas de aula em que
o silêncio impera em lugar da verbalização.
Muitos métodos a respeito do ensino de línguas entram e saem de cena
no sistema educacional. A ideia é de que sempre os novos métodos vêm para
serem mais efetivos do que os anteriores. O ponto de interesse desse capítulo
é enfocar o aspecto de que somos aprendizes, ou seja, temos condições de
aprender, sem buscar analisar algum método específico de ensino.
Sem dúvida que a aprendizagem de uma língua é um dos fascinantes e
complexos aspectos no desenvolvimento humano. Que pai, mãe e familiares
não ficam em estado de graça ao ouvirem os primeiros sons de uma criança?
Adentrar no campo de estudo a respeito da aprendizagem de um língua é algo
excitante, bem como assustador. Como entender a capacidade de uma criança
que aprende palavras e ainda as agrupa de forma a construir uma sentença
significativa? São questões como essas que despertam o interesse de
especialistas de diferentes áreas, tais como linguistas, psicólogos,
fonoaudiólogos, entre outros. O que se tem é um conjunto de teorias que visam
explicar como uma língua é aprendida.
Os neuropsicólogos que estudam a linguagem tentam compreender como utilizamos e combinamos palavras (ou signos, no caso de uma linguagem gestual) para formar frases e transmitir os conceitos elaborados pelo cérebro. Investigam também como compreendemos palavras expressas por outros e de que forma o cérebro as transforma em conceitos. A linguagem surgiu e se manteve ao longo da evolução porque constitui um meio de comunicação eficaz, sobretudo para conceitos
abstratos. Ela nos auxilia a estruturar o mundo em conceitos e a reduzir a complexidade das estruturas abstratas a fim de apreendê-las: é a propriedade de “compreensão cognitiva”. (DAMÁSIO A.; DAMÁSIO, H., 2004)
A aquisição da linguagem é um dos ramos da Linguística que mais tem
se desenvolvido e atraído a atenção de muitos interessados. Os resultados
obtidos em estudos sobre aquisição da linguagem têm sido de grande valor,
não somente para um melhor desempenho no ensino de línguas, como
também uma melhor compreensão por parte do pesquisador, bem como do
professor, a respeito do desenvolvimento da linguagem como elemento
fundamental na interação social.
Ao abordarmos a aprendizagem de uma segunda língua, estaremos
envoltos por aspectos como inteligência, personalidade, motivação, estilo de
aprendizagem, entre outros. Frente a isso se faz necessário desenvolvermos
uma postura reflexiva em relação ao processo de ensino-aprendizagem de uma
segunda língua, resultando em aulas mais criativas e eficientes.
Muitos são os aspectos que poderíamos analisar com relação ao ensino
de uma língua estrangeira. Entretanto, aqui analisaremos a abordagem
conexionista no que diz respeito à aprendizagem da L2, visto estarmos
interessados no estudo sobre o cérebro e a linguagem, pois “o paradigma
conexionista parte da premissa de que o processamento cognitivo está
relacionado à maneira pela qual os neurônios se interconectam no cérebro.”
(MOTA; ZIMMER, 2005, p. 155)
O que percebemos é que existe uma preocupação com a maneira como
a mente humana pensa e aprende, isto é, há um interesse pelo processo
mental necessário para o aprendizado. Dessa forma, memória e aprendizagem,
tidos como processos cognitivos, são estudados levando em conta sua base
física e o meio ambiente. Analisando a aprendizagem de L2 dessa maneira,
percebemos que há uma maior ênfase com relação ao papel do aprendiz, visto
que o foco está na mente dele. Nesse sentido, reforço a ideia da importância
de um professor reflexivo, uma vez que as diferenças individuais
desempenham um papel extremamente importante no ensino de línguas
estrangeiras.
Um aspecto importante do conexionismo é o “processamento de
informação”, ou seja, a maneira como as pessoas recebem a informação, a
processam e agem diante dela, conforme percebemos na citação abaixo:
De acordo com Shanks (1993), a idéia central do conexionismo está no processamento de informação do cérebro, que se dá através de redes neuroniais – cujas células nervosas, os neurônios, comunicam-se umas com as outras através da transmissão de impulsos elétricos. Um princípio básico do conexionismo é que a maioria das redes neuroniais do cérebro, senão todas, passam por mudanças sutis que ocorrem nas sinapses entre os neurônios. Ao estimular certos subconjuntos de neurônios com mais freqüência do que outros, as experiências de mundo dos indivíduos vão reforçando certas sinapses e tornando alguns padrões de atividades elétricas mais fortemente impressos do que outros. Esses padrões formariam a base da memória e do aprendizado. (MOTA; ZIMMER, 2005, p. 165)
A abordagem conexionista coloca a aprendizagem de L2 orientada pelo
desempenho, como vemos na seguinte passagem:
A orientação da abordagem conexionista pelo desempenho funda-se no pressuposto chave de que o estímulo lingüístico é rico o suficiente para que o aprendiz capture as regularidades do sistema lingüístico. De acordo com essa visão: a) o ambiente lingüístico apresenta muitas regularidades distribucionais que norteiam a aprendizagem da linguagem; b) a aquisição da linguagem envolve a exploração das restrições probabilísticas existentes em vários tipos de informação lingüística e não lingüística; c) não há uma divisão estrita entre conhecimento lingüístico e extra-lingüístico: a eficácia da aprendizagem depende tanto da estrutura do insumo quanto do conhecimento prévio (lingüístico e de mundo); d) a informação distribucional pode fornecer evidência negativa implícita. (MOTA; ZIMMER, 2005, p. 168)
Ao abordarmos especificamente a aprendizagem, conforme Mota e
Zimmer (2005), entendemos que o conexionismo resgata, nos estudos da
aquisição da linguagem, a importância do desenvolvimento e da mudança
gradual operada à medida que a língua estrangeira vai sendo aprendida. Ellis
afirma
[...] que a abordagem funcionalista da linguagem é a que mais se presta para o estudo da aprendizagem da L2 de um ponto de vista conexionista, uma vez que o funcionalismo enfatiza o processo de desenvolvimento e a interação, e a aprendizagem lingüística assemelha-se a outras habilidades complexas cujo desenvolvimento demanda muito tempo. (ELLIS, 1999, p.35)
Frente a essa rápida apresentação de alguns aspectos da abordagem
conexionista, cabe ainda destacar um importante fator, qual seja: memória –
que se torna significativa nessa abordagem. Parece que uma simples e
tradicional definição para memória é a capacidade de arquivar informação por
curto ou longo período de tempo. Na abordagem conexionista temos que:
O conexionismo modificou radicalmente a noção que se tinha sobre a memória em geral e a memória de trabalho em particular, que passa a ser vista como um mecanismo de ativação de processamento da memória perene (SOUGNÉ e FRENCH, 1997), dispensando noções como armazenadores e tornando obsoletas divisões como as existentes entre memória de trabalho e memória de longo prazo. Na visão conexionista, a memória de trabalho corresponderia ao tempo durante o qual um determinado padrão elétrico estaria ativado, mediante um insumo que, no caso da leitura, seriam as letras ou frases de um texto. (MOTA; ZIMMER, 2005, p. 165)
E ainda mais, a citação a seguir reforça a ideia da indissociabilidade
entre conhecimento e processamento da informação:
Os pesquisadores tradicionalmente postulam a existência de uma memória de trabalho para o processamento e o armazenamento temporário, separado da representação do conhecimento na memória de longo prazo. Em nosso ponto de vista, nem o ‘conhecimento’ nem a ‘capacidade’ são primitivos que possam ser manipulados independentemente na teoria ou em modelos computacionais. (...) Na nossa visão, o conhecimento lingüístico de longo prazo não é funcionalmente separado do locus do processamento. (MACDONALD; CHRISTIANSEN, 2002, p. 38)
O que se conclui, portanto, é que nessa visão conexionista não existem
armazenadores separados de memória, visto que nem ao menos admite a
divisão entre memória e processamento cognitivo.
Ao se pensar em aprendizagem de L2 a partir do paradigma
conexionista, temos como contribuições o que verificamos a seguir:
As contribuições feitas pelo paradigma conexionista à aprendizagem da L2 residem precisamente no fato de esse paradigma mudar o foco da estrutura para o processamento. Ou seja, em vez de enfatizar o papel de estruturas como a memória de trabalho na aprendizagem da L2, os pesquisadores conexionistas investigam como os aprendizes da L2 processam a informação lingüística, abordando conjuntamente o conhecimento lingüístico e o processamento do insumo da L2 e da L1 na pesquisa em L2. (MOTA; ZIMMER, 2005, p. 177)
Diante dessa abordagem, fica evidente que há um longo caminho a ser
percorrido tanto para o pesquisador como para o professor nessa área de L2
para uma aprendizagem efetiva. Por hora cabe a tentativa de pensar em
alternativas de melhoria no processo de ensino-aprendizagem de língua
estrangeira, quem sabe através do estudo e da apropriação de elementos
relativos a abordagens como a conexionista e do levantamento de outros
aspectos que poderiam estar influenciando no fracasso de algumas salas de
aula.
Faz-se necessário destacarmos alguns fatores que afetam a
aprendizagem de uma segunda língua, conforme Lightbown e Spada (1993),
aspectos como inteligência, personalidade, motivação, estilos de aprendizagem
podem ser levados em conta, entendendo que estamos diante de
características individuais que apresentam grande complexidade. Esses fatores
que afetam o aprendizado de uma segunda língua são muito complexos e
difíceis de serem mensurados, por isso geram diferentes interpretações.
Portanto, nossa intenção não é apresentar esses fatores como categorias que
definem ou não o êxito na aprendizagem, mas sim como fatores que podem
afetar a aprendizagem do aluno, e esses fatores são sugeridos a partir da
experiência de sala de aula, bem como de acordo com as entrevistas
realizadas com o público alvo desse estudo.
Com relação ao aspecto inteligência, de acordo com as autoras, muitos
estudos demonstram que o fator inteligência é mais significativo no que diz
respeito à aprendizagem de habilidades em que a instrução é mais formal, ou
seja, na leitura, na escrita, na análise estrutural da língua (gramática), na
aquisição do vocabulário, do que no desenvolvimento de habilidades de ouvir e
falar. Então, se temos atividades que priorizam o estudo da forma da língua em
detrimento do uso da língua em situações comunicativas, o fator inteligência
terá um grande peso para o sucesso do aluno. Levando em conta algumas
respostas dos alunos à entrevista, referentes ao item tipo de atividades
propostas pelos professores que geram maior participação oral dos alunos,
percebemos que a maioria das atividades são aquelas em que os alunos
precisam responder aos exercícios do livro no momento da correção. Contudo,
insistindo nesse ponto, perguntamos sobre as atividades que produzem maior
segurança em participar. Obtivemos como resultado aquelas atividades formais
em que o fator inteligência é muito mais exigido do que em atividades com
instruções menos formais, em que o aluno sente-se mais à vontade e, quem
sabe, mais confortável em expressar-se oralmente.
No que diz respeito ao aspecto personalidade, podemos sugerir algumas
hipóteses que podem influenciar na aprendizagem de uma segunda língua.
Nas entrevistas realizadas, muitos dos alunos responderam como um dos
motivos para a não verbalização e para a timidez, que tem como consequência
o desencorajamento dos alunos de se arriscarem, de contribuírem oralmente
nas aulas. Isso parece muito claro nessa faixa etária observada e entrevistada,
visto que esses alunos são mais autocríticos do que alunos de uma quinta
série, por exemplo, em que as participações são muito mais espontâneas.
Lightbown e Spada (1993) afirmam que, de acordo com alguns estudos,
os fatores relacionados à personalidade, por exemplo, afetam mais as
habilidades relacionadas às regras linguísticas. Isso ficou muito claro nas
entrevistas em que os alunos demonstram maior interesse em realizar as
atividades orais diretamente com a professora e não com os colegas, evitando
com isso o confronto “face to face” com o colega, que pode gerar situação de
deboche.
O fator motivação tem um forte papel no sucesso da aprendizagem de
uma segunda língua. As autoras mencionam que não se sabe ainda se é a
motivação que produz sucesso na aprendizagem ou o sucesso na
aprendizagem que produz motivação. O que verificamos, através de uma das
perguntas da entrevista referente ao uso da Língua Inglesa extra sala de aula,
é que aqueles alunos que responderam que utilizavam a língua em casa com a
família, para se comunicar com amigos, para entender letras de música, para
manipular jogos eletrônicos, entre outros, foram os que demonstraram maior
interesse em participar e usar a Língua Inglesa em sala de aula. Nesse sentido
pode ser definida em termos de necessidade comunicativa. Aqueles alunos que
possuem ambição profissional, vontade de viajar, desejo de conhecer e
interagir com outras culturas, visivelmente demonstram maior interesse em
utilizar a língua. Em contrapartida, muitos responderam que só utilizavam o
inglês na escola, no período de Língua Inglesa, e que sofriam pressão externa
(família, professores) para que alcançassem resultados satisfatórios; estes
alunos praticamente não possuíam motivação externa.
Um último aspecto muito relevante diz respeito aos diferentes estilos de
aprendizagem. As pesquisas mostram que diferentes aprendizes aprendem
uma mesma tarefa de diferentes formas, usando diferentes estratégias. Alguns
não aprendem sem visualizar a tarefa abordada; esses pertencem ao grupo
dos visuais. Outros precisam somente ouvir; são os auditivos. Alguns, precisam
memorizar e memorizar até que a nova informação faça sentido, entre outros.
Enfim, cada um precisa viver o novo conhecimento de uma forma que faça
sentido para si. É claro que todos nós usamos esses diferentes caminhos,
aprofundando aquele que melhor nos possibilita adquirir novos conhecimentos.
Como resposta à pergunta sobre a escolha das atividades de que mais
participam, houve diferentes respostas, referindo-se à leitura, escrita e
“games”, por exemplo. Eis a importância de propor tarefas que valorizem
diferentes estilos e que encorajem os alunos a desenvolverem suas estratégias
de aprendizagem. Faz-se necessário, no mínimo, desconfiar de métodos e
livros didáticos que se propõem a atingir os diferentes estilos de aprendizagem.
Ao mencionarmos estilos de aprendizagem não podemos esquecer de
levar em conta que a aprendizagem deve continuar fora da sala de aula e que
os alunos necessitam gerenciar seu próprio aprendizado. Para isso, faz-se
necessário orientá-los para o desenvolvimento de estratégias de estudo.
Partimos da definição de estratégias de estudo feita por Rebeca Oxford,
em sua obra Language Learning Strategies, ao afirmar que “ações específicas
adotadas pelo aluno para tornar o aprendizado mais simples, mais rápido, mais
divertido, mais auto-direcionado, mais eficaz e com maior possibilidade de ser
transferido a novas situações”(1990, p. 8). Ampliando o conceito de estratégias,
podemos citar Brown (2000, p. 113) que conceitua “estratégias” como sendo
métodos específicos de abordar um problema ou tarefa, modos de operação
para alcançar um fim particular, modelos planejados para controlar e manipular
certas informações. Podem variar de momento a momento, também variam
intra-individualmente, uma vez que cada um de nós possui formas diferentes
para resolver um problema. Já para Ellis (1994, p. 529), o conceito geral de
estratégia consiste na atividade mental e comportamental relacionada a alguns
estágios específicos no processo geral de aquisição da língua ou de seu uso.
É muito importante utilizar o espaço de sala de aula para capacitar os
alunos a adquirirem estratégias de estudo e como utilizá-las. Os alunos devem
possuir a capacidade de analisar criticamente seu aprendizado, a fim de que
possam progredir. Por que ensinar estratégias?
Ao ensinar estratégias, estamos possibilitando ao aluno o entendimento
de que o aprendizado deve ser compartilhado entre aluno, professor, família e
comunidade. O aluno deve chegar ao nível de utilizar a língua alvo de forma
independente, assumindo o controle de seu aprendizado. Sara Cotterall e Hayo
Reinders (2005), em sua obra Estratégias de Estudo: guia para professores,
apresentam diferentes tipos de estratégias:
• As cognitivas, que atuam no aprendizado da língua-alvo, tais como:
ensaio – repetir oralmente e de forma escrita algo, sucessivamente.
• Elaboração: associar mentalmente o novo com o que já era
conhecido.
• Aproximação: escolha de uma palavra com sentido mais geral do que
a palavra alvo para expressar um significado. Ex.: mean of
“transportation” para descrever seu novo “car”.
• Paráfrase: utiliza-se esse meio quando não se conhece a palavra na
língua-alvo.
As estratégias metacognitivas buscam revelar aos alunos o que podem
fazer por eles mesmos. Um exemplo é, ao ter que realizar uma atividade de
produção escrita, os alunos primeiramente elaboram um esboço com itens que
devem levar em conta.
As estratégias sociais/afetivas possibilitam aos alunos administrar seus
sentimentos e sua interação com os colegas. Cooperação (trabalho em equipe
para resolver um problema), questionamentos para elucidar dúvidas, falar
consigo mesmo para adquirir autoconfiança são alguns exemplos de
estratégias sociais.
Portanto, verifica-se a importância de que o aluno seja conduzido a
desenvolver suas próprias estratégias no que diz respeito à aprendizagem de
L2, até mesmo devido ao fato de que o aprendizado deve continuar fora da
sala de aula. Logo, os alunos precisam saber como organizar seu próprio
aprendizado de maneira independente. Um professor que não valoriza a
inserção de estratégias em seu plano de ensino, a fim de que os alunos
possam aprender as que mais beneficiam seu aprendizado, estaria
colaborando para um possível silenciamento.
Acredito que pensar e refletir sobre o planejamento das aulas de Língua
Inglesa nos permitirá levar em conta esses aspectos sobre a aprendizagem,
uma vez que estaríamos considerando a necessidade individual dos alunos e
respeitando seu processo de aprendizagem, levando-os a desempenharem
suas posições de sujeitos ativos no processo de ensino/aprendizagem e não
meros indivíduos passivos. Sujeitos que verbalizam e não silenciam na
aquisição de uma segunda língua.
4 MODOS DE INVESTIGAÇÃO E RESULTADOS OBTIDOS
Com o objetivo de observar, identificar e estudar a existência de
silenciamento dos alunos nas aulas de Língua Inglesa, bem como, a partir da
compreensão deste processo, pensar em estratégias de ação a fim de
aprimorar as condições de ensino/aprendizagem, foram realizadas
observações, entrevistas e oficinas (apêndices I, II, III e IV), a fim de buscar as
informações para o desenvolvimento da presente investigação. A seguir,
começo a relatar os passos que foram realizados no desenvolvimento do
trabalho.
Primeiramente busquei duas turmas de sétima série de escolas
particulares de Porto Alegre. Acertados os trâmites legais com a equipe
pedagógica de cada escola, bem como com as respectivas professoras,
passamos a executar os passos para a realização do trabalho. Começamos
com as observações das turmas, tendo como roteiro de observações o que
está proposto no apêndice III. A seguir, com o consentimento das professoras
de cada turma, combinamos, no final de uma das aulas de observações, que
começaríamos as entrevistas e que os alunos seriam chamados
aleatoriamente. Realizamos as entrevistas nas próprias escolas, em um
ambiente mais reservado. As entrevistas foram gravadas para em um momento
posterior serem transcritas. Finalmente realizamos as oficinas em períodos
regulares das turmas, com a aprovação dos alunos, professoras e equipe
pedagógica das escolas.
Importante comentar que a justificativa para o uso do método estudo de
caso, previamente anunciado na apresentação desse trabalho, diz respeito ao
fato de que estamos diante de uma observação detalhada de um determinado
contexto, qual seja, o estudo da condição de silenciamento em sala de aula de
alunos de sétima série nas aulas de Língua Inglesa. Essa metodologia se
apresenta bastante pertinente, visto que queremos entender “um caso
particular levando em conta seu contexto e sua complexidade” (ANDRÉ, 1995
p. 51).
4.1 REFLEXÃO A PARTIR DAS OBSERVAÇÕES
A primeira turma foi observada em uma sala de aula de Língua Inglesa
com estrutura física e espaço adequados: boa iluminação, quadro amplo e
compatível para o uso didático, mesas e cadeiras confortáveis e em bom
estado de conservação, higiene e limpeza regularmente preservadas. Por
vezes, o reflexo da luz solar ultrapassando as cortinas parecia causar
desconforto ao grupo. Embora se tratasse de uma sala ambientada para o
estudo de Língua Estrangeira, as paredes e painéis não traziam elementos
para visualizar conteúdos da disciplina.
Com relação à intervenção da professora, percebeu-se um tom de voz
agradável e domínio de classe relativo, visto que, em alguns momentos, a
turma se dispersava das tarefas propostas. Em muitos momentos, a professora
tentou promover o envolvimento dos alunos, obtendo resultados positivos.
A apresentação do conteúdo foi feita de maneira clara, segura e
adequada, fazendo a intervenção necessária ao nível que estava sendo
apresentado. Foi estabelecida a interação inicial, a fim de verificar o que já era
conhecido dos alunos para, só então, apresentar novas informações.
Em várias situações foi feito o levantamento de dificuldades, permitindo
esclarecimento de possíveis dúvidas. A professora priorizou momentos em que
verificava, junto à turma, o entendimento sobre a atividade. A relação teoria e
prática ficou pouco explicitada, visto que os alunos utilizavam a estrutura
gramatical desenvolvida apenas no contexto das atividades previstas pelo livro
– não extrapolaram com produções extra livro didático.
Os momentos de participação oral ficaram restritos à correção das
atividades do livro. O atendimento aos alunos parecia atender às demandas do
grupo. A professora, ao circular pela sala, atendia a cada aluno no que lhe era
solicitado, demonstrando atenção individualizada.
Com relação ao grupo, observou-se que as conversas paralelas
favoreceram a dispersividade na atenção ao foco proposto. Os alunos pouco
verbalizavam em Língua Inglesa. Numa turma de trinta e quatro alunos, apenas
quatro manifestam-se espontaneamente para participar, enquanto os demais
precisaram ser convocados pela professora, a qual teve, muitas vezes, que
insistir. Se pudéssemos enumerar as entradas espontâneas, teríamos quatro,
frente a doze dirigidas pelo professor. O nível de interesse em participar
parecia baixo, frente às propostas dirigidas pela professora. A reação diante da
solicitação variava desde a aparente normalidade até as manifestações de
negação, insegurança e medo. O que se verificou é que os alunos, em sua
maioria, manifestavam temor, e até rejeição, diante de uma possível
participação individual. O grupo optou pela participação coletiva, em que as
vozes se misturavam, enquanto a voz individual ficava minimizada.
A segunda turma observada possuía uma sala de aula com um
excelente ambiente físico, iluminação adequada, um bom quadro, mesas e
cadeiras em excelente estado, higiene e limpeza da sala muito boas. Um
aspecto, bastante preocupante, é que, semelhante à primeira turma observada,
não havia painéis ou elementos visuais referentes à disciplina na sala. Em se
tratando de uma língua estrangeira, sabe-se que os recursos visuais são de
suma importância.
A professora demonstrou um tom de voz agradável, persistiu durante
todo o tempo no envolvimento dos alunos com a tarefa, mas em vários
momentos a turma se dispersou com outros assuntos. A professora apresentou
domínio sobre o conteúdo, promoveu interação inicial, identificando, nas
respostas dos alunos, o conhecimento prévio da matéria.
Sempre que percebia a necessidade, fazia levantamento das
dificuldades, mas realizava isso de maneira individual, circulando pela sala. A
relação teoria e prática ocorria, apenas, através das atividades sugeridas no
livro. Não existia uma tarefa sequer em que os alunos utilizassem a teoria
fazendo vínculo com suas próprias vivências. Os momentos de participação
oral ficavam reduzidos a dar respostas de atividades realizadas no livro. O nível
de ouvidoria e afetividade da professora era muito bom, contudo ela
demonstrava a necessidade de melhorar o fator disciplinar da turma, parando a
aula e tentando negociar estratégias de comportamento.
Com relação aos alunos, o nível de participação nas atividades era muito
fraco, beirando o total desinteresse. A verbalização era precária, pois em uma
turma de vinte e seis alunos ocorreram quatro participações espontâneas e dez
dirigidas pela professora. Entre essas solicitações dirigidas, a reação dos
alunos foi de medo e insegurança, chegando ao ponto de rejeitarem a
participação.
4.2 AS ENTREVISTAS E A PROPOSTA DA OFICINA: AULA REAL X AULA DESEJADA
Foram realizadas 35 entrevistas com alunos de sétima série de turmas
diferentes. Eles se mostraram bem solícitos no momento das entrevistas, as
quais foram gravadas e posteriormente transcritas. Os depoimentos desses
alunos foram de suma importância para a verificação de nosso objeto de
estudo.
Também foi realizada uma oficina, intitulada aula de Inglês real X aula
de Inglês desejada, em duas turmas de sétima série de escolas diferentes
(apêndice IV).
O tema propunha aos alunos que expressassem aquilo que
verdadeiramente desejavam em uma aula de Língua Inglesa. Para tanto,
deviam partir do real, ou seja, daquilo que observavam das suas próprias
aulas, levando em consideração localização espacial, postura do(a)
professor(a) e dos(as) colegas.
O foco da investigação foram as expectativas e ideais desses alunos no
que diz respeito a uma aula de Inglês agradável, em que todos pudessem
sentir-se confiantes para participar oralmente. Para tanto os alunos utilizaram
cartolina, papel pardo, giz de cera, lápis, borracha, régua, tesoura e lápis de
cor, entre outros materiais artísticos, para, através de desenho, pintura, recorte
e colagem reproduzirem a sala de aula desejada e a real.
Sugerimos a proposta e coordenamos os trabalhos dessa oficina. Os
alunos mostraram-se, de modo geral, bastante interessados e colaboradores
frente ao que lhes foi solicitado durante as atividades, uma vez que o convite
para participar foi feito durante as observações que fiz das aulas de Inglês com
a permissão da professora e da coordenação pedagógica.
Os passos para a realização do trabalho foram os seguintes:
apresentação da proposta que os alunos deveriam executar e formação dos
grupos por afinidades com quatro ou cinco componentes. Na sequência, os
alunos combinaram as estratégias que iriam utilizar a fim de executar a
atividade. Nesse momento, comecei a circular pelos grupos para ouvir os
comentários realizados pelos alunos. A partir dessa etapa os alunos
começaram a realizar os desenhos tanto da sala de aula real como a da que
eles desejavam. O tempo de duração dessa atividade foi o equivalente a dois
períodos de aula e o local foi a própria sala de aula dessas turmas.
4.3 O SILÊNCIO EM POSIÇÃO DE DESTAQUE
Até este ponto foram apresentados aspectos que evidenciam que
possuímos capacidades que nos possibilitam tornar-nos sujeitos que
verbalizam e que interagem através da voz. Verificamos que na esfera do plano
ideal planejamos contextos de sala de aula em que os alunos interagem
espontaneamente, com confiança e segurança. Contudo, ao encararmos a
esfera do plano real visualizamos uma ruptura, visto que o ideal de termos
salas de aula com alunos confortavelmente interagindo fica alterado pelo real,
onde o silêncio ocupa um lugar de destaque.
Diante desse quadro real é que se faz necessário compreender de
maneira mais significativa/profunda esse silêncio que se instala em aulas de
Língua Inglesa. Para alguns um pouco mais desatentos, e por que não dizer
ingênuos, é incompreensível pensar que estar no silêncio é também estar no
sentido, ou seja, o não falar também nos permite estar no sentido, significar.
Isso soa ainda mais estranho quando pensamos em nossos dias, em que se
fala a todo instante e se ouve muito pouco. Haja vista que usualmente somos
invadidos por uma comunicação que inviabiliza o diálogo, nos apresentando
um conteúdo que não propicia a reflexão. Enfim, o verbalizar, mesmo que
sejam mensagens artificiais e pouco consistentes, torna-se a máxima de nosso
tempo. Por isso acredito na importância de considerar o silêncio como
elemento que possui sentido e precisa ser estudado.
Assim sendo, esse capítulo propõe discutir questões ligadas às formas
do silêncio e vai de encontro à concepção de que silêncio é nada, é sem
sentido, como até mesmo Shakespeare apresenta na célebre frase “o resto é
silêncio”. (1997, p. 139)
A partir do trabalho de Eni Orlandi, intitulado As formas do silêncio
(1995), desenvolvendo e verificando a noção de que o silêncio é e significa,
nosso interesse visa à compreensão do silêncio que ocorre nas aulas de
Língua Inglesa. Tão séria é essa questão do silêncio, como podemos
considerar a partir da citação: “No início é o silêncio. A linguagem vem depois”
(ORLANDI, 1995, p. 29). Podemos comparar com o relato bíblico referente à
criação, em que nada existia, tudo era sem forma e vazio e, a partir da quebra
do silêncio, ou seja, a partir do comando da voz de Deus, tudo se fez. Outro
momento de silêncio é o da criança que ainda não verbaliza, não utiliza a
linguagem oral. Portanto, esses momentos iniciais são de silêncio e certamente
silêncios que significam.
Verifica-se que para Orlandi (1995) a linguagem verbal não ocupa
espaço privilegiado de significar; o silêncio traz consigo também a possibilidade
de significar e ainda mais: pode carregar diferentes sentidos. Parece paradoxal
dizer que o silêncio significa, mas é exatamente assim que acontece e, em se
tratando de silêncio em sala de aula, podemos destacar os diferentes sentidos
do silêncio que ocorre nas aulas de Língua Inglesa.
Vale lembrar Orlandi:
Acredito que o mais importante é compreender que: 1. Há um modo de estar em silêncio que corresponde a um modo de estar no sentido, e de certa maneira, as próprias palavras transpiram silêncio. Há silêncio nas palavras; 2. O estudo do silenciamento (que já não é silêncio mas ‘pôr em silêncio’) nos mostra que há um processo de produção de sentidos silenciados que nos faz entender uma dimensão do não-dito absolutamente distinta da que se tem estudado sob a rubrica do ‘implícito’. (ORLANDI, 1995, p. 11)
E ainda mais:
O conceito de silêncio, em nossa perspectiva, recobre uma região teoricamente diferente da do implícito. O implícito é o não-dito que se define em relação ao dizer. O silêncio, ao contrário, não é o não-dito que sustenta o dizer mas é aquilo que é apagado, colocado de lado excluído. (ORLANDI, 1995, p. 106)
Faz-se necessário deixar claro que nossa intenção é entender o silêncio
como elemento que significa e é justamente por isso que ancoramos nossos
estudos na perspectiva da autora a respeito do silêncio. Em seu trabalho,
Orlandi faz distinção entre o silêncio, justificando da seguinte forma:
[...] já que para nós, o sentido do silêncio não é algo juntado, sobreposto pela intenção do locutor: há um sentido no silêncio. O silêncio foi relegado a uma posição secundária como excrescência, como o ‘resto’ da linguagem. Nosso trabalho o erige em fator essencial como condição do significar. (ORLANDI, 1995, p.12)
Pensando por essa perspectiva, vale acrescentar que o próprio Bakhtin
abordou o silêncio. E o fez distinguindo-o da quietude. A quietude está
relacionada à ausência de som e o silêncio está associado à enunciação, ao
sentido. É a partir do silêncio que a enunciação parte. Acredito ser bastante
pertinente entrelaçarmos esses autores no que diz respeito ao entendimento do
silêncio.
Particularizando nosso entendimento sobre o silêncio nas aulas de
Língua Inglesa, o presente estudo elege esta perspectiva teórica como um
aspecto de destaque, não como subalterno, papel que parece ocupar em nossa
sociedade que exalta a comunicação, o bombardeio de linguagens, a frenética
necessidade de estarmos sempre dizendo. É nesse sentido que a autora
posiciona o silêncio como ocupante presente e não como ausência/falta. De
igual forma, a partir de uma experiência de ensino de Língua Inglesa, bem
como das observações, entrevistas e oficinas realizadas para a execução
desse trabalho, elegemos o silêncio como fator que precisa ser considerado,
avaliado, discutido, a fim de buscarmos alternativas para um melhor ambiente
de ensino/aprendizagem em Língua Estrangeira. Para tanto, destacamos
algumas categorias para o silêncio, observadas nas salas de aula a partir dos
instrumentos realizados na produção desse trabalho. Os dados levantados na
pesquisa empírica estão demonstrados no apêndice V, instrumento que revela
onde as falas dos alunos aproximam-se das categorias. A seguir, para uma
melhor compreensão, ocorre um desdobramento dessas categorias,
associadas às falas dos alunos.
Em sua obra As formas do silêncio, Eni Orlandi (1995) trata sobre o
silêncio, em parte da obra, a partir de um contexto político, qual seja, a
ditadura. Então, desenvolve parte de seu texto abordando o silêncio do
oprimido. Fazendo uma transposição para o contexto de sala de aula é bem
possível percebermos uma situação paralela. Em vários momentos é possível
verificar situações de medo e risco ao usar a palavra, preferindo, com isso, o
uso do silêncio. Assim, nossa primeira categoria para entender o silêncio está
relacionada à seguinte citação: “Menos se sabe, menos se diz, menos se
arrisca”. (ORLANDI, 1995 p. 119) Essa citação fica evidente a partir das
entrevistas realizadas em duas das questões, respondidas pelos alunos, que
dizem respeito a esse tópico de participar oralmente. Na questão três,
perguntamos: Qual a reação do aluno quando convocado a participar nas aulas
de Inglês? E na questão sete perguntamos se eles conseguiam perceber as
razões para que os alunos não verbalizassem nas aulas. Foi grande o número
de respostas em que os alunos relataram medo e vergonha ao se sentirem
convocados a participar. A seguir menciono alguns depoimentos:
Professora, tem muita gente que fora daqui brinca com o inglês, canta música em inglês, sabe, não tá nem aí. Agora, quando chega na sala, parece que, nossa, muda completamente, sabe! Não gostam de falar Inglês. Às vezes até por vergonha mesmo. Por ficar sem graça. Enquanto está tocando a música tu tá lá, numa boa! Agora, quando está na sala de aula, com exercícios, e...pra falar aquela palavra que a gente não sabe mesmo, nunca ouviu, é mais difícil! É mais questão de ficar sem graça mesmo na frente dos colegas. (F1 referindo-se à questão sete) Ah, dá um nervosismo, porque Inglês é uma língua muito enrolada pra falar. É complicada. Dá um nervosismo. Ah...eu não sei falar! (F2 referindo-se à questão três) Ah, eu não sou muito bom em Inglês, mas daí eu peço pra profe pra não ir, porque não sou bom e tenho medo de errar. (M2 referindo-se à questão três) Ou é ficar bagunçando ou é porque tem vergonha dos colegas de errar. (M2 referindo-se à questão sete) Me dá um frio na barriga, fico muito nervosa, porque no ano passado fui apresentar um trabalho e eu desmaiei. Daí, até hoje eu tenho aquele receio. Fico muito nervosa. Não consigo falar. Eu fico com muito medo das pessoas rirem de mim, porque no jardim era sempre assim, sabe. Daí eu cresci com esse receio. Tenho muita vergonha de ser exposta ao debocharem de mim. (F3 referindo-se à questão três)
Aí, eu fico nervosa, mas tento me acalmar pra poder me expressar direitinho. (F4 referindo-se a questão três) Ah...eu me sinto...bah...eu me sinto...me dá um calafrio. Bá...a profe me chama. É porque eu nunca fui bom em Inglês. Nunca entendi direito. Mas, mesmo assim, eu tento entender, pra quando a profe me chamar eu mostrar pra ela que eu não sei tudo. Fico meio nervoso. (M3 referindo-se à questão três) Eu não gosto de participar porque eu tenho vergonha. Não sei. Nas outras aulas também eu tenho vergonha. Sou tímida. Na maioria das vezes tenho medo de errar. (F5 referindo-se à questão três) É medo de errar por não saber direito, pois não é a nossa língua. (F5 referindo-se à questão sete) Bá, muito nervoso. Bá! Vergonha dos colegas. E como eu não faço curso, como muitos aqui na sala, há palavras que eu não sei pronunciar. (F6 referindo-se à questão três) A vergonha e o medo de falar perto de todo mundo. (F6 referindo-se à questão sete) Envergonhado, pois não sei algumas coisas. (M4 referindo-se à questão três) Sinto bastante vergonha, porque tem que falar em público, diante dos colegas. (F7 referindo-se à questão três) Há alguns que não têm tanta vergonha de falar em público, de errar; e outros, com mais dificuldade, preferem trabalhar no livro. (F7 referindo-se à questão sete) Tenho medo de errar (F8 referindo-se à questão três) Medo de não saber. (F9 referindo-se à questão três) Vergonha dos colegas de errar. (F9 referindo-se à questão sete) Assim...sempre...pra ler um enunciado de um exercício ou mesmo pra responder um tema que foi dado, e tudo. Mas assim, a maioria, falando de inglês né profe, não gosta de falar na frente. Até em outras matérias tem gente que vai lá e fala, e tudo! Mas quando é inglês, eles não gostam. Eu gosto de falar, mas às vezes no inglês eu me sinto desconfortável. Com esse medo, sabe?! Ah, tipo, vou errar a pronúncia! Às vezes até sabe, mas começa a enrolar. Eu leio na minha mente, tudo certinho, com a pronúncia e tudo, agora, quando vou falar, dá uma trava, assim, e eu não consigo falar direito. (F1
referindo-se à questão sobre em que tipos de atividades a participação dos alunos é solicitada.)
Certamente os depoimentos nos esclarecem os tipos de sentimentos
que são despertados em situações em que os alunos deveriam participar
oralmente. Sentimentos como medo, vergonha, nervosismo parecem ser uma
constante nas respostas. A maioria fica temerosa quanto à exposição frente
aos colegas, dizem não saber a forma ou a pronúncia correta de falar. O que
se percebe é que a maioria desiste de falar, opta pelo silêncio ou, ainda pior,
somatiza – como no caso da aluna F3, que relata um episódio de desmaio em
função de uma prova oral. Tal situação ganha um sentido tão grave,
despertando uma reação tão séria a ponto de o emocional desencadear uma
reação física. São poucos os alunos que, mesmo sentindo-se desconfortáveis
frente à situação, buscam alguma estratégia de sobrevivência. Vemos essa
reação no depoimento da aluna F4: “Aí, eu fico nervosa, mas tento me acalmar
pra poder me expressar direitinho”. Ou, ainda, o aluno M3: “Ah... eu me sinto...
bá... eu me sinto... me dá um calafrio. Bá... a profe me chama. É porque eu
nunca fui bom em inglês. Nunca entendi direito. Mas, mesmo assim, eu tento
entender, pra quando a profe me chamar eu mostrar pra ela que eu não sei
tudo. Fico meio nervoso.”
O que se verifica é que alguns estão tentando sobreviver, mesmo com
medos e inseguranças, o que nos permite dizer que o profissional em
educação precisa urgentemente desenvolver esse olhar mais amplo no sentido
de buscar, junto com esses alunos, estratégias para melhores condições de
aprendizagem em que seus sentimentos de medo, vergonha, insegurança
possam ser passo a passo superados.
Nesse aspecto, podemos retomar uma autora já mencionada no
trabalho, Sara Paín (1999), no que diz respeito à função da ignorância, visto
que o observado e o relatado pelos alunos mostra-nos o medo de falar, ou de
ao menos arriscar. Isso se relaciona diretamente com o texto de Sara Paín
(1999) no sentido de que o aluno não se permite, ou ainda, não lhe é permitido
ocupar um espaço em que ele possa ignorar. Significa ocupar um espaço em
que tenha a possibilidade de tentar e retentar, errar se necessário for, a fim de
elaborar suas hipóteses para alcançar a possível resposta para a situação em
foco. Fica evidente que esse aluno nem ao menos conhece a existência de um
espaço em que ele pode, sim, criar, permitir-se testar até chegar a um
resultado satisfatório. Paín (1999) fala sobre a necessidade de se prover um
ambiente de aprendizagem que leve em conta esse espaço do ignorar,
justamente para que tenhamos menos medos, e por que não dizer pânico, ao
sermos convidados a verbalizar em uma aula de Língua Inglesa – haja vista o
depoimento da aluna F3, que ao precisar dar conta de um teste oral chega a
desmaiar, tal é sua condição emocional. Conforme a autora, a ignorância tem
um importante poder, e não podemos deixar de lado essa condição. O trecho
abaixo nos mostra justamente a sua opinião a respeito de como podemos tratar
a ignorância:
O que parece-nos importante é precisamente tratar a ignorância como tal, como uma fonte de saber do que como um tabu em que o não–dito passa sob a forma de dogma. A ignorância constitui, na história, a matéria prima do conhecimento, de tal modo que cada geração avança trabalhando a ignorância que ela recebe em herança, ao mesmo tempo que o saber. (PAÍN,1999, p. 28)
Uma segunda possibilidade para entendermos o silenciamento diz
respeito ao sujeito sentir-se ou não autorizado a dizer. Orlandi (1995) procura
compreender o silêncio relacionando-o à questão da autoria e da censura. A
seguir temos sua definição de censura:
A censura tal como a definimos é a interdição da inscrição do sujeito em formações discursivas determinadas, isto é, proíbem-se certos sentidos porque se impede o sujeito de ocupar certos lugares, certas posições. Se se considera que o dizível define-se pelo conjunto de formações discursivas em suas relações, a censura intervém a cada vez que se impede o sujeito de circular em certas regiões determinadas pelas suas diferentes posições. Como a identidade é um movimento, afeta-se assim esse movimento. Desse modo, impede-se que o sujeito, na relação com o dizível, se identifique com certas regiões do dizer pelas quais se representa como (socialmente) responsável, como autor. (ORLANDI, 1995, p. 107)
Mais adiante, a autora comenta que a censura, portanto, está
relacionada às relações do sujeito com o dizível – pensando dessa forma, não
podemos falar em autocensura. “A censura sempre coloca um ‘outro’ na
jogada”. (ORLANDI, 1995, p. 108)
Ao realizar as entrevistas podemos apontar esse “outro”, que
desencadeia esse processo de permitir-se verbalizar ou não, como a realização
de um curso de Inglês fora da escola, ou seja, os alunos que frequentam
cursos de Inglês sentem-se confortáveis, bem como autorizados a participar
oralmente das aulas, em contraposição, um outro grupo sente-se retraído,
diminuído por não ter acesso a um curso de Inglês, desencadeando, com isso,
um processo de silenciamento. Nesse caso, percebemos que a censura atua
poderosamente no dizer daqueles que não têm acesso a um curso. O dizer
destes torna-se silenciado em relação ao dizer desse “outro” que participa de
um curso. Esses que não se inserem em um contexto de cursinho, utilizam o
silêncio para se inscrever no espaço do sentido.
Um aspecto muito interessante ao se detectar esse tipo de silêncio é
verificar que o "não dizer" nesse caso está ligado à interdição e não ao "não
saber dizer". Os alunos sentem-se em condições desprivilegiadas em relação
aos demais e assim não se sentem autorizados a falar. Ao entrevistarmos os
alunos, fizemos a seguinte pergunta: Consegues perceber as razões para que
os alunos não verbalizem nas aulas de inglês? Algumas das respostas que
passo a transcrever a seguir nos permitem visualizar o tópico até aqui tratado.
Só três que fazem curso, a maioria não sabe e não participa. Os que fazem curso sabem mais, quando tem trabalho em grupo todos querem fazer com eles. (M3) O inglês de escola é muito fraco, tem que usar mais o do curso. Eu já fiz curso. (M5) Normal pra quem já fez curso; pra quem nunca fez curso é uma reação muito forte. (M5 referindo-se à seguinte questão: qual tua reação quando convocado a participar nas aulas de inglês?) É porque devem achar que inglês é um “bicho-de-sete-cabeças”, porque logo que ela entra num curso, a gente vê que é fácil; e quando nunca fala Inglês faz tempestade num copo d’água. É medo, insegurança. (M5) Aqui na escola tem muita gente que ainda não entende. O nível da aula não é tão alto assim. Eu, por exemplo, já fiz curso de Inglês e aí eu entendo mais alguma coisa. Agora vou fazer outro curso de Inglês.(M6)
Fica evidente que o estar frequentando um curso de inglês, ou já ter
participado de um curso, é a garantia de ter melhores condições de
acompanhamento das aulas regulares de Inglês na escola. Parece funcionar
como um sinal de permissão para participar. No depoimento do aluno M5,
percebemos que ele consegue descentrar-se e ver nos demais colegas a
interdição em participar oralmente, pois afirma: “normal pra quem já fez curso;
pra quem nunca fez curso é uma reação muito forte.” (M5 referindo-se à
seguinte questão: qual tua reação quando convocado a participar nas aulas de
inglês?)
Ao verificarmos esses depoimentos e pensarmos nessa questão da
censura é inevitável que retomemos os trabalhos de Winnicott (1975), autor
que dedicou grande parte dos seus estudos clínicos às manifestações
espontâneas e criativas em crianças, jovens e adultos. Para Winnicott, o
verdadeiro “self” se expressa na medida em que o sujeito é capaz de um gesto
espontâneo, experimentado inicialmente pela influência de um meio ambiente
facilitador. Para tanto, é necessário que o sujeito em desenvolvimento possa
interagir com uma mãe "suficientemente boa", no dizer do autor, o que significa
a presença de um cuidador pouco invasivo na vida da criança ou do jovem,
embora esteja presente. Na visão do autor, esse ambiente facilitador é de
suma importância para o desenvolvimento dessa criança, é o que concluímos
através da citação que segue:
O espaço potencial entre o bebê e a mãe, entre a criança e a família, entre o indivíduo e a sociedade ou o mundo depende da experiência que conduz à confiança. Pode ser visto como sagrado para o indivíduo, porque é aí que este experimenta o viver criativo. (WINNICOTT, 1975, p. 142)
Como vemos, um viver autônomo e criativo está intimamente ligado ao
desenvolvimento ou, ainda melhor, ao ambiente inicial dessa criança.
A terceira categoria levantada para entender o silêncio diz respeito à
preferência dos alunos por atividades escritas, e a partir das observações
pode- se notar um espaço de tempo bem maior para as atividades escritas do
que para as orais. Pudemos observar que, em um período de cinquenta
minutos, setenta por cento do tempo é destinado à escrita. Isso nos remete à
seguinte citação: “Escrever é uma relação particular com o silêncio.”
(ORLANDI, 1995, p. 85) Novamente o contexto em que a autora apresenta
essa sentença diz respeito ao período da ditadura, em que muitas pessoas
escreveram autobiografias com intuito de poder dizer, durante um período de
censura, utilizando a vida particular através da escrita para denunciar a vida
pública e, com isso, através da ficção poder dizer o que era proibido. No
contexto em que estamos interessados, isto é, o de ensino/aprendizagem de
Língua Inglesa, detectamos que a escrita funciona como uma forma de dizer
sem o compromisso de estar totalmente correto.
A escrita permite o distanciamento da exposição pública, visto que
possivelmente apenas o professor vai ler a produção escrita do aluno e não é
certo que isso ocorra, pois na maioria das vezes essa correção funciona
coletivamente, permitindo que o próprio aluno faça os ajustes necessários. O
que nos permite evidenciar desse tipo de atividade é, infelizmente, a falta de
propostas em que o aluno precisa ser autor, isto é, sujeito do seu discurso, ser
capaz de produzir um texto com suas marcas pessoais e não apenas um mero
repetidor de informação. Nesse ponto, um autor pode contribuir para a
confirmação desse aspecto: Freud (1908) que, em Obras Psicológicas
Completas, no capítulo Escritores Criativos e Devaneios, reforça a ideia de que
na infância o processo imaginativo já começa a se construir, e isto verificamos
a seguir:
Será que deveríamos procurar já na infância os primeiros traços de atividade imaginativa? A ocupação favorita e mais intensa da criança é o brinquedo ou os jogos? Acaso não poderíamos dizer que ao brincar toda criança se comporta como um escritor criativo, pois cria um mundo próprio, ou melhor, reajusta os elementos de seu mundo de uma nova forma que lhe agrade? Seria errado supor que a criança não leva esse mundo a sério; ao contrário, leva muito a sério a sua brincadeira e dispende na mesma muita emoção. (FREUD, 1980, p. 149)
É notável a importância que essa fase inicial, a fase do brincar, possui
na formação de um ser criativo, ativo em suas produções, a fim de não termos
alunos meros repetidores, mas, antes, alunos ativos, autônomos, imaginativos,
enfim, produtivos.
A partir de questões como: a participação dos alunos é solicitada em
aula em que momento e de que forma? Ou: no decorrer das aulas, quais
atividades propiciam maior participação verbal dos alunos? Os depoimentos a
seguir nos esclarecem o tipo de atividade que mais acontece nas aulas:
A da atividade de fazer no livro, porque daí eles conversam, mas conversam falando sobre inglês, e fazem os exercícios juntos. (M7) Na maioria é na do livro. Daí ela pergunta de um em um na fila. (F10) A profe vai perguntar e eles ficam respondendo. Daí tem alguns que nem ouvem muito, assim, ficam conversando. Aí depois, ela vai fazendo atividades no quadro. Quando ela faz junto, todo mundo vai indo, mas quando cada um faz o seu, a maioria fica conversando. (F10) Quando ela dá exercícios e pede pra responder. Só isso. (F2) Nas horas de exercícios. (M2) Nos textos que ela dá. Daí é pra traduzir, e ganha nota. É escrito, nada falado. (M2) Atividades no livro. Tarefas. Exercícios. (M8) Acho que é nas tarefas do livro. Uma é lendo, outra corrigindo. (M3) No livro. Também ela põe o CD no rádio e a gente vai escrevendo. Falar é um pouco trabalhoso. (F6) Quando ela dá exercícios, assim pra fazer, no livro ou no caderno. São atividades mais escritas. (M9) Ela solicita bastante dos alunos, mais atividades de gramática. (M4) Livro, atividades no livro para entregar, pra ganhar nota. Atividade escrita. (M4) Ela pede mais nas atividades de correção (F8) Em textos, corrigir atividades. É que ajuda a melhorar mais no inglês. (F11)
Os depoimentos nos autorizam concluir que os alunos são mais
expostos a atividades escritas e de uso da estrutura da língua, ou seja,
atividades gramaticais. A aluna F6 acaba por concluir : “...e a gente vai
escrevendo. Falar é um pouco trabalhoso”. O aluno M4 nos esclarece o que é
bastante solicitado: “Ela solicita bastante dos alunos, mais atividades de
gramática”. E o aluno M9 nos mostra quais são as atividades mais
desenvolvidas: “Quando ela dá exercícios, assim pra fazer, no livro ou no
caderno. São atividades mais escritas.”
A escrita parece estar funcionando como um modo de reação à
imposição do dizer formalmente correto, com estrutura e pronúncias corretas.
Ela permite que se tenha sentido mesmo estando em silêncio. Mesmo que
esse sentido seja o previsível, o esperado pelo professor, aquele que o livro
didático traz como resposta. A escrita vai possibilitando o distanciamento da
interação verbal, bem como dos pares. Essa ausência de trocas certamente
não é saudável em contexto algum, especialmente em um ambiente de
aprendizagem. Vigotski (1998) autor que já mencionamos, pode novamente
reforçar essa questão da importância das interações no processo de
ensino/aprendizagem.
Quando abordamos interação, precisamos retomar o que Vigotski
propõe como sendo zona de desenvolvimento proximal, em que frente a uma
situação de resolução de problema a cooperação é fator essencial para o
sucesso do aluno. A passagem a seguir nos deixa isso mais claro:
A discrepância entre a idade mental real de uma criança e o nível que ela atinge ao resolver os problemas com o auxílio de outra pessoa indicam a zona de seu desenvolvimento proximal [...] A experiência nos mostra que a criança com a zona maior de desenvolvimento proximal terá um aproveitamento muito melhor na escola. (VIGOTSKI, 2005, p. 128-129)
Em sua obra A formação social da mente, o autor acima mencionado
argumenta que aprendizado e desenvolvimento estão intimamente ligados
desde o primeiro dia de vida da criança. E, por esse desenvolvimento, parte do
sucesso está ligado à interação com o outro. Tal é a grandeza de entendermos
a zona de desenvolvimento proximal, visto que não apenas compreendemos as
funções que ainda não amadureceram como também aquelas que estão por
vir. O texto a seguir nos esclarece um pouco mais esse ponto:
A zona de desenvolvimento proximal define aquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de maturação, funções que amadurecerão, mas que estão presentemente em estado embrionário. Essas funções poderiam ser chamadas de “brotos” ou “flores” do desenvolvimento, ao invés de “frutos” do desenvolvimento. O nível de desenvolvimento real caracteriza o
desenvolvimento mental retrospectivamente, enquanto a zona de desenvolvimento proximal caracteriza o desenvolvimento mental prospectivamente. (VIGOTSKI, 1998, p. 113)
Ter consciência desse processo no percurso do aluno pela escola
certamente trará grandes benefícios para todo o entorno do aluno. Em se
tratando de aprendizagem de uma segunda língua, mais necessário faz-se
vivenciar esse processo de cooperação, seja com o professor ou com um
colega, visto que o desconhecido é maior ainda, pois trata-se de uma segunda
língua. Comprovamos que a interação no processo de aprendizagem é vital
quando lemos a passagem a seguir:
[...] o aprendizado desperta vários processos internos de desenvolvimento, que são capazes de operar somente quando a criança interage com pessoas em seu ambiente e quando em cooperação com seus companheiros. Uma vez internalizados, esses processos tornam-se parte das aquisições do desenvolvimento independente da criança. (VIGOTSKI, 1998, p. 117-118)
Essa questão da cooperação com os companheiros apresentou-se muito
visível quando a grande maioria dos grupos propôs, em seus desenhos nas
oficinas, que deveriam sentar-se em duplas ou grupos no espaço da sala de
aula e não mais na tradicional disposição das filas em que cada aluno possui a
visão da nuca do companheiro da frente.
Retomando, ainda, as falas dos alunos nas entrevistas, quando
perguntamos sobre a utilização do Inglês em situações não escolares (questão
1 do apêndice I), verificamos que muitos dos que optam pelo silêncio em aula
não utilizam o inglês em casa, por exemplo, não possuem nenhum tipo de
interação com os seus familiares nessa segunda língua. Não identificamos, na
pesquisa realizada, diálogo na família em que o Inglês seja o alvo dos
interesses. O que notamos é que essas trocas com os familiares são bem
importantes, a fim de conquistar uma confiança maior ao realizar os diálogos
na escola. Portanto, a história familiar, o nível de interações que acontecem em
seus lares, bem como a herança cultural desse aluno, certamente vão ter uma
forte influência no seu desempenho na escola.
Uma quarta e última categoria que nos propomos a investigar diz
respeito ao papel do professor no contexto de ensino/aprendizagem de uma
língua estrangeira. Orlandi (1995), tratando da questão do autoritarismo, nos
permite entender a função do sujeito no discurso:
No autoritarismo, não há reversibilidade possível no discurso, isto é, o sujeito não pode ocupar diferentes posições: ele só pode ocupar o ‘lugar’ que lhe é destinado, para produzir os sentidos que não lhe são proibidos. A censura afeta, de imediato, a identidade do sujeito. (ORLANDI, 1995, p. 81)
A partir das observações, entrevistas e oficinas podemos levantar
indicadores de que determinadas posturas assumidas pelo professor em sala
de aula podem gerar como consequência o apagamento das falas dos alunos.
Em muitas ocasiões, o professor assume o espaço de falante autorizado da
segunda língua, que sabe usar o idioma fluentemente, que tem o controle
absoluto sobre a forma correta de falar, o que fala por último ou, ainda pior, o
que fala sozinho. Não podendo esquecer que o livro didático também recebe tal
autoridade, a ponto de definir o que está certo ou errado com relação às falas
dos alunos. A própria posição do professor na sala desencadeia essa condição
de autoritarismo – o professor posicionado na frente, em pé, em oposição ao
aluno sentado, o que parece gerar uma dicotomia ativo X passivo. Outro
aspecto que contribui para essa condição pode ser o tom da voz do professor,
um tom que impõe autoritarismo já contribui para um apagamento oral do
aluno. Importante mencionar que, embora a fala tenha uma aparência suave,
traz subjacente a ela uma postura autoritária. A opção por realização de
atividades em que é necessário um bom desempenho na parte
formal/estrutural da língua é exemplo de uma maneira de manter a posição de
autoritarismo, uma vez que a palavra final, em termos de correção, vem do
professor ou daquele aluno que possui domínio da língua alvo. Foi a partir dos
resultados das oficinas e das entrevistas que muito se pode comprovar dessa
condição que o professor, em muitos momentos, desempenha. A seguir, passo
a relatar algumas manifestações dos alunos tanto nas oficinas como nas
entrevistas:
Com a professora me sinto mais segura porque se eu errar, ela pode me corrigir, e assim eu aprendo. (F11 referindo-se à questão em que os alunos respondiam com quem se sentiam melhor: ao participar com a professora ou com os colegas.)
Os resultados das oficinas foram surpreendentes nesse aspecto do
papel do professor e, também, a respeito da condição dos alunos. Na maior
parte dos desenhos da sala de aula que eles possuem hoje, a posição do
professor é em pé na frente da sala ou de costas escrevendo no quadro. Em
um dos desenhos, a professora está em pé escrevendo ”silence please”. Outro
aspecto que muito apareceu nos desenhos foi a posição dos alunos na sala de
aula, ou seja, todos em filas, um atrás do outro. E, ainda mais, o fato de a sala
estar praticamente sem cartazes e elementos tecnológicos. A proposta da sala
de aula desejada colocava em contradição justamente os aspectos
anteriormente citados. Nessa sala de aula desejada, tínhamos professoras que
estavam sentadas, atrás da sala, ou até mesmo em um canto da sala em
posição de observadora, praticamente espiando os alunos que estariam
trabalhando em conjunto e não em filas. O que se verificou é que o professor
oportunizaria atividades para que os alunos pudessem se expressar, a sala
possuiria muitos elementos visuais referentes à disciplina, bem como recursos
tecnológicos, tais como TV, DVD, notebook, etc. O fato de eles proporem a
disposição da turma em duplas ou grupos nos mostra claramente a
necessidade de interação entre os pares e, ainda mais, a presença da
professora como observadora em situações em que eles estariam
conversando, dando suas opiniões em inglês. Em um dos desenhos, temos a
contraposição da professora escrevendo “silence please” no quadro e na sala
desejada ela escreveria “happy”. Algumas frases da sala de aula desejada são
interessantes de mencionarmos na íntegra conforme proposto pelos alunos:
Ao entrar na sala a professora teria que se comunicar com nós em inglês. Que todos os alunos participassem. Nós amamos dar nossa opinião. Todos aprendem mais. Eu gosto quando faço trabalho com diferentes pessoas, eu posso conhecer mais a respeito dos meus colegas. Uma aula legal tem mais trabalhos em grupo.
Eu quero ouvir e falar mais. Mais cor e coisas energéticas para incentivar a aula. Juntos vamos fazer uma aula melhor. Nós gostaríamos de ter jogos na aula. Nós queremos mais conversação, música, desafios...
As falas acima nos evidenciam a necessidade de maior envolvimento
dos alunos, até mesmo na produção das aulas, visto sugerirem os tipos de
atividades de que gostariam, bem como a dinâmica das aulas. Parece que, nas
aulas propostas por eles como sendo as reais, existe uma centralização na
figura do professor e uma falta de “cor”. O fato de eles proporem estar
sentados juntos também nos remete à necessidade de formação de vínculo
entre os pares, a fim de conseguirem se comunicar com segurança. Um dos
desenhos propostos mostra um quadro na sala de aula desejada com as
seguintes sentenças escritas em inglês/português: “You can/Você pode”, “You
get/ Você consegue”. E, nesta mesma proposta de sala, os alunos estariam
sentados em duplas e nas mesas estaria escrito respeito/maturidade. Em
contraposição à sala de aula real, onde nas mesas estão escritos apelidos dos
colegas e todo tipo de pichação.
Novamente percebemos a urgente necessidade de envolvimento de
todos no processo de ensino/aprendizagem de uma segunda língua, garantindo
que os alunos possam ter um bom desempenho nas aulas de Língua Inglesa.
Frases como "você pode", "você consegue", propostas por eles mesmos, nos
mostram não apenas uma fala a respeito de seus desejos, mas um grito de
pedido de ajuda.
Diante desse quadro manifesto pelos alunos, percebemos que muitas
vezes o professor assume o seu papel de falante solitário na sala de aula, não
levando em consideração o espaço de fala do outro; nesse contexto, o aluno.
Parece não haver uma condição adequada em promover a integração com o
outro, a demarcação como sujeito em relação ao outro. A partir da citação a
seguir, verificamos bem essa necessidade de troca, de constituir-se como
sujeitos falantes:
A incompletude é uma propriedade do sujeito (e do sentido), e o desejo de completude é que permite, ao mesmo tempo, o sentimento de identidade, assim como, paralelamente, o efeito de literalidade (unidade) no domínio do sentido: o sujeito se lança no seu sentido (paradoxalmente universal), o que lhe dá o sentimento de que este sentido é uno. Se o sentimento de ‘unidade’ permite ao sujeito identificar-se, por outro lado, sem incompletude e o conseqüente movimento haveria asfixia do sujeito e do sentido, pois o sujeito não poderia atravessar, e não seria atravessado, pelos diferentes discursos já que não poderia percorrer os deslocamentos (os limites) das diferentes formações discursivas. O outro (e os outros) é o limite mas também é o possível. (ORLANDI, 1995, p. 81)
Quando a autora menciona atravessar e ser atravessado por diferentes
discursos, não podemos deixar de retomar Benveniste (1988), visto que o autor
desenvolve a questão da condição do sujeito no discurso. Se não me constituo
como sujeito, não está dada para mim essa condição de me inserir no discurso.
A linguagem é o meio pelo qual o homem se constitui como sujeito. E um “eu”
institui um “tu” para falar de alguma coisa. E quando não somos chamados
para ocupar essa posição de tu estamos deixando de nos constituir como
pessoas. Nas palavras do autor, lemos o trecho abaixo:
A consciência de si mesmo só é possível se experimentada por contraste. Eu não emprego eu a não ser dirigindo-me a alguém, que está na minha alocução um tu. Essa condição de diálogo é que é constitutiva da pessoa, pois implica em reciprocidade – que eu me torne tu na alocução daquele que por sua vez se designa por eu. (BENVENISTE, 1988, p. 286)
Na realidade de sala de aula é de fundamental importância que todos os
sujeitos envolvidos tenham condições de se constituir como pessoas.
Retomando as frases de alguns alunos, expressando seus desejos para as
aulas de inglês – “que todos os alunos participassem”; “nós amamos dar nossa
opinião, todos aprendem mais”; “eu quero ouvir e falar mais” – entendemos que
não estamos apenas no campo das ideias, mas, muito mais do que isso,
estamos diante de um pedido real que parte dos grandes envolvidos no
processo de aprendizagem – os alunos, que se posicionam firmemente na
busca por melhores condições de ensino. Saindo do silêncio e verbalizando a
certeza de que: “juntos vamos fazer uma aula melhor.”
5 ENCAMINHAMENTOS FINAIS
A experiência como professora de Ensino Fundamental (I e II) e Ensino
Médio alertou-me para o fato de que, na escolaridade inicial, as crianças, em
sua grande maioria, desejam inscrever-se no espaço da enunciação a ponto de
o fazerem, muitas vezes, sem respeitar os momentos de fala dos demais
colegas. Em contrapartida, ao chegarem por volta da sétima série do Ensino
Fundamental silenciam, especialmente nas aulas de Língua Inglesa.
Compreender esse momento na trajetória desses alunos, bem como um pouco
do desenvolvimento humano, tornou-se uma busca instigante, o que resultou
nesse estudo.
Envolvido pelas dificuldades dos alunos ao se expressarem verbalmente
nas aulas de Inglês e inspirado pelos estudos linguísticos, psicológicos e
teorias sobre aprendizagem de uma segunda língua, este estudo buscou
elementos empíricos em salas de aula de alunos de sétima série de escolas de
ensino privado em Porto Alegre.
Nossa pretensão com esse trabalho, ao colocar o silêncio em posição de
destaque, é criar uma zona de desconforto em nosso fazer pedagógico, ou
seja, fazer com que nos desacomodemos a fim de transitarmos, saindo das
certezas e enfrentando as dúvidas, deixando a tranquilidade e encarando a
instabilidade para que conquistemos melhores condições no ensino e na
aprendizagem de uma segunda língua.
Para tanto, nossa proposta convocou diferentes autores com suas
contribuições a fim de buscarmos um entendimento mais amplo a respeito do
sujeito da enunciação que, por vezes, perde sua vez e voz no ato da
enunciação.
Iniciamos compreendendo a linguagem como elemento fundamental
para constituição do sujeito. Para tanto, buscamos em Bakhtin a convicção de
que a linguagem funciona como uma forma de conhecimento humano, de
interação social. Para o autor, todas as produções verbais são dialógicas por
princípio. Isso nos remete à ideia de que todas as produções verbais implicam
um outro.
Ao abordar a ideia do outro, inevitavelmente trouxemos para nossa
discussão as concepções de Benveniste que se dedica ao estudo da
enunciação, do ato enunciativo. Para Benveniste (1989), a partir do momento
que nos colocamos na posição de locutor e assumimos a língua, pressupomos
um interlocutor. Portanto, temos um eu e um tu que não existem isoladamente,
são complementares e ao mesmo tempo reversíveis.
Ao partirmos dessas teorias, tanto de Bakhtin como de Benveniste, que
serviram para iluminar nossa perspectiva de entendimento a respeito do uso da
linguagem, tivemos que considerar outros autores a fim de compreendermos o
sujeito da enunciação que, por vezes, torna-se silenciado.
Winnicott auxiliou-nos a compreender a fase inicial da criança que,
quando vive privações nessa etapa da vida, possivelmente terá maiores
dificuldades em permitir-se fazer uso da fala.
Vigotski nos permitiu entender o desenvolvimento da linguagem e a
importância da interação para a elaboração de conceitos, nos possibilitando
verificar que os alunos que possuem uma empobrecida mediação e um
ambiente que não gera descoberta, como consequência terão maior dificuldade
em ocupar seu espaço de fala em sala de aula.
Sara Paín nos sinaliza o papel da ignorância em sala de aula como uma
possibilidade de incerteza e um espaço para levantamento de hipóteses sobre
o desconhecido. A reduzida familiaridade com este tema e a formalidade do
ensino nos levam a concluir que a falta de oportunidade de levantar hipóteses
até chegar a um possível resultado e a “controladora” presença do(a)
professor(a) em sala de aula desfavorecem o êxito do aluno.
Na continuidade do trabalho, destacamos alguns aspectos que
influenciam no aprendizado de uma segunda língua. Conforme Lighbown &
Spada, fatores como inteligência, personalidade, motivação, estilos de
aprendizagem têm grande importância na aquisição de uma língua estrangeira.
Até esse ponto do texto, partimos do pressuposto de que, em um
ambiente com as condições adequadas, desde o contexto familiar até o escolar
e o entorno social, o aluno possui condições adequadas para o sucesso em
sua aprendizagem e principalmente para fazer uso de seu espaço de fala. No
entanto, na continuidade do trabalho, nos deparamos com a situação de
silêncio, em que os alunos não recebem, bem como não se dão, o direito a
ocupar lugar na enunciação, a exercer sua singularidade.
A partir de então, o processo de silenciamento passa a fazer parte da
nossa discussão. Partimos da noção de silêncio desenvolvida por Eni Orlandi,
um silêncio que significa, que tem sentido. Não estamos nos referindo à
quietude, mas sim ao silêncio que traz consigo algumas questões subjacentes.
Tais questões ficaram bem esclarecidas quando cruzamos as falas dos alunos
com as categorias levantadas a partir do estudo de Eni Orlandi (apêndice V).
As razões para o silenciamento incluem desde o medo em arriscar-se em uma
exposição oral, passando pelo fato de os alunos não se sentirem autorizados a
falar na presença de colegas que realizam cursos fora da escola. Outra razão
para o silenciamento pode ser atribuída ao fato de o espaço destinado às
atividades escritas em sala de aula ser bem maior em relação às demais
habilidades, como a fala, por exemplo. Pode ser considerada também a
postura que o professor desempenha diante da turma, exercendo, muitas
vezes, uma atitude de autoritarismo.
É expressiva a quantidade de alunos que silenciam em função do medo
de arriscar, de usar o seu espaço de enunciação. Observa-se um acentuado
número de alunos em que o medo e a ênfase em atividades escritas propiciam
o silêncio. (categorias 1 e 3, apêndice V).
Silenciam por medo, vergonha, insegurança e, também através da
escrita, acabam por não verbalizar oralmente durante a aula. Há que se
repensar nas propostas lançadas em aula, visto que a escrita parece ocupar
papel de destaque nas atividades sugeridas.
À medida que ia assistindo às aulas, ouvindo os alunos e verificando os
resultados das oficinas, deparei-me com as difíceis condições dos alunos nos
momentos em que eram solicitados a falar. As reações iam de um extremo ao
outro. Enquanto F4 relata que “tenta se acalmar para poder se expressar
direitinho”, não deixa de afirmar que fica nervosa, mas se esforça para obter
um resultado satisfatório. F3 não consegue administrar o nervosismo,
chegando ao ponto de desmaiar, devido ao fato de ter que apresentar um
trabalho de forma oral.
A partir dos desenhos dos alunos, propostos através das oficinas, foi
possível refletir sobre a importância do papel do professor, visto que eles
demonstram desejar uma intervenção pedagógica que utilize mais o Inglês em
situações reais de comunicação. Os professores não apenas estariam
repassando comandos de atividades, mas poderiam fazer regularmente a
mediação entre o conteúdo trabalhado e o aluno. Os alunos sinalizam também
a necessidade de um professor menos controlador, ou seja, aquele que em
alguns momentos da aula torne-se um observador, permitindo que o espaço de
fala dos alunos possa ocorrer de forma mais espontânea.
Este estudo permite “dar-nos conta” de que estamos diante de uma
cena diária no quadro escolar, em que algumas vozes estão em processo de
silenciamento ou já se encontram silenciadas há bastante tempo. Mas, muito
mais do que identificar os motivos do silenciamento, é despertar o desejo, a
necessidade de que precisamos cada vez mais compreender nosso aluno
como um ser completo e singular, que precisa de um espaço de criação, de
interação, ou seja, de poder “ser” desde a mais tenra infância, a fim de usufruir
de uma vida adulta saudável. Nas palavras de Wordsworth – poeta inglês: “A
infância deixa rastros em nossa memória, como sulcos num rosto ou num
campo lavrado”.
Quando entendemos a importância de cada etapa na vida de uma
criança/aluno, nos deparamos com a responsabilidade que cada participante
envolvido na construção desse ser deve possuir.
É de fundamental importância que a família – os cuidadores – propiciem
um ambiente motivador para que essa criança se desenvolva, se dê o direito a
ocupar seu espaço no contexto social. Machado de Assis, nosso grande autor
da Literatura Brasileira, citando um poeta, escreve que “o menino é o pai do
homem”, despertando nosso entendimento para o peso que a infância possui
na formação de nossa vida adulta
No cenário escolar, os envolvidos no processo de ensino precisam
compreender as etapas pelas quais os alunos passam até adquirir e fazer uso
do objeto do conhecimento. Respeitar o arriscar de cada aluno em uma aula de
Língua Inglesa, a fim de que ele possa construir suas hipóteses, passando
pelos seus vários momentos de ignorância. Entender e proporcionar aos
alunos o que Benveniste (1988) desenvolve a respeito da importância dos
papéis do “eu” – “tu” no espaço da enunciação. Mais do que compreender, é
preciso vivenciar uma postura pedagógica de inquietação, de busca por
melhores condições para os envolvidos no contexto escolar. Já é tempo de não
apenas sonharmos, mas também de agirmos no sentido de devolvermos aos
alunos as plenas condições para que tenham um desenvolvimento harmônico
de suas capacidades.
REFERÊNCIAS
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APÊNDICE I
Roteiro de entrevista semi-estruturada a ser aplicada com os alunos
1. Em que momento utilizas o inglês em situações não escolares?
2. As aulas de Inglês possibilitam uma compreensão sobre essa nova
língua? Consegues utilizar o que aprendes?
3. Qual tua reação quando convocado a participar nas aulas de Inglês?
4. A participação dos alunos é solicitada em aula? Em que momento e
de que forma?
5. Em que tipos de situações te sentes melhor para participar? Em
atividades com os colegas ou diretamente com o professor(a). Por
quê?
6. Como percebes a condução que o(a) professor(a) dá aos trabalhos,
em termos de participação, com os(as) que verbalizam e com os(as)
que não verbalizam?
7. Consegues perceber as razões para que os alunos não verbalizem
nas aulas de Inglês?
8. No decorrer das aulas, quais atividades propiciam maior participação
verbal dos alunos?
APÊNDICE II
Roteiro de entrevista semi-estruturada a ser aplicada com os professores
1. Em que ano concluiu a graduação?
2. Como tem sido sua formação continuada?
3. Há quanto tempo atua no magistério?
4. Durante esse tempo, qual a abordagem utilizada no ensino de Língua
Estrangeira?
5. Que estratégia utiliza em sala de aula e considera eficiente no ensino de
Língua Inglesa?
6. O que considera relevante na relação professor-aluno e que fortalece o
nível de participação verbal do aluno?
7. Que importância tem a participação do aluno?
8. Em que situações da sua prática pedagógica se faz ouvir a voz do aluno
de forma verbal participativa?
9. Que fatores julga levar os alunos ao silenciamento?
10. Que estratégias utiliza para os alunos que verbalizam pouco (ou não
verbalizam) em sala de aula?
11. Que tipos de atividades propiciam maior participação oral dos alunos?
12. Quais estratégias/recursos podem ser considerados profiláticos para o
silenciamento dos alunos?
APÊNDICE III2
Roteiro de observação
1. Ambiente físico:
Excelente Muito bom Bom Deficitário
Iluminação ( ) ( ) ( ) ( )
Cortinas ( ) ( ) ( ) ( )
Quadro ( ) ( ) ( ) ( )
Mesas ( ) ( ) ( ) ( )
Cadeiras ( ) ( ) ( ) ( )
Higiene e
Limpeza ( ) ( ) ( ) ( )
Painéis (com elementos da disciplina – se sala
ambiente) ( ) ( ) ( ) ( )
Análise descritiva dos itens observados:
2. Professor(a):
a. Postura:
Tom de voz ( )
agradável
( )
alto
( )
baixo
Domínio de classe ( )
sim
( )
não
( )
às vezes
Promove envolvimento dos
alunos
( )
sim
( )
não
( )
às vezes
Análise descritiva dos itens observados:
b. Conteúdo:
Domínio ( ) ( ) ( )
2 Instrumento construído pela equipe pedagógica do Colégio Adventista de Porto Alegre (2006)
e adaptado para o presente estudo.
muito bom bom regular
Adequação ( )
muito bom
( )
bom
( )
regular
Promove interação inicial ( )
muito bom
( )
bom
( )
regular
Parte do conhecido para o desconhecido ( )
sim
( )
não
( )
às vezes
Levantamento de dificuldades ( )
sim
( )
não
( )
às vezes
Verificação do que ficou entendido ( )
sim
( )
não
( )
às vezes
Relação teoria x prática ( )
sim
( )
não
( )
às vezes
Promove momentos de participação oral ( )
muito bom
( )
bom
( )
regular
Análise descritiva dos itens observados:
c. Atendimento aos alunos:
Muito bom Bom Regular
Atenção ( ) ( ) ( )
Ouvidoria ( ) ( ) ( )
Circula na sala ( ) ( ) ( )
Paciência ( ) ( ) ( )
Afetividade ( ) ( ) ( )
Análise descritiva dos itens observados:
3. Aluno:
Muito bom Bom Regular
Nível de atenção ( ) ( ) ( )
Nível de participação ( ) ( ) ( )
Interesse ( ) ( ) ( )
Verbalização ( ) ( ) ( )
Reação à solicitação de participação ( )
aceitam
( )
rejeitam
( )
temerosos
Análise descritiva dos itens observados:
APÊNDICE IV
Roteiro das Oficinas
• Título: Aula real x Aula desejada
• Número de participantes: duas turmas de sétima série (61 alunos)
• Tema proposto: Através de imagens, ilustrar aquilo que eles têm
como a aula de Inglês real e aquilo que eles desejam para uma
aula mais interessante.
• Materiais disponíveis: papel cartaz, papel pardo, canetas hidrocor,
lápis de cor, giz de cera, tinta, tesoura, régua...
• Tempo: dois períodos de 50 minutos cada.
• Local: Escolas particulares de Porto Alegre
APÊNDICE V
Categorias para entender o silenciamento
Categorias Entrada dos
alunos
1. “Menos se sabe menos se arrisca” (ORLANDI, 1995 p.
119) – Medo e risco ao usar a palavra de forma oral.
F1, F2, F3, F4,
F5, F6, F7, F8,
F9, M2, M3 e M4.
2. Sujeito sentir-se ou não autorizado a dizer. Orlandi
(1995) procura compreender o silêncio relacionando-o à
questão da autoria e da censura – permitir-se verbalizar
ou não em função da realização de um curso.
M1, M5 e M6.
3. “Escrever é uma relação particular com o silêncio”
(ORLANDI, 1995, p. 85) – espaço de tempo bem maior,
destinado às atividades escritas em detrimento das
orais.
F10, F11, M2,
M7, M8 e M9.
4. Papel do professor no contexto de ensino/aprendizagem
de uma língua estrangeira - Orlandi (1995) tratando da
questão do autoritarismo.
F11.
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