experiÊncia estÉtica contemplativa, um caminho … de toledo... · trabalho de conclusão de...
TRANSCRIPT
Luiza de Toledo Souza Miranda Barbosa
EXPERIÊNCIA ESTÉTICA CONTEMPLATIVA, UM CAMINHO ALTERNATIVO PARA SE ATINGIR O
SAGRADO
Pontifícia Universidade Católica São Paulo
2008
2
Luiza de Toledo Souza Miranda Barbosa
EXPERIÊNCIA ESTÉTICA CONTEMPLATIVA, UM CAMINHO ALTERNATIVO PARA SE ATINGIR O
SAGRADO
Trabalho de conclusão de curso como exigência parcial para graduação no curso de Psicologia, sob orientação da Profa. Elisa Maria de Ulhoa Cintra.
Pontifícia Universidade Católica São Paulo
2008
3
Agradecimentos:
Agradeço a todos que hoje fazem parte da minha vida, parte de mim, e
por isso, estão contidos neste trabalho.
À minha família querida: Mãe, Pai, Chel, etc. por serem minha base.
Especialmente ao meu afilhado Miguel, por me presentear com toda sua
criancice.
Aos meus velhos amigos joseenses por proporcionarem momentos de
re-conhecimento, especialmente às queridas e sempre presentes: Anita,
Camila, Isabela e Tatiane; e os lindos Rodrigo e Sara, que me inspiram a sentir
a poesia do dia-a-dia.
Também, aos novos amigos paulistanos por darem cor ao meu cotidiano
(aqui sem nomes, por serem muitos).
À minha orientadora Elisa pela liberdade de criação.
E ao meu terapeuta Luis, por sua abertura paciente para o diálogo.
4
Área de conhecimento: 7.07.02.04-7 - Estados Subjetivos e Emoção
Título: Experiência estética contemplativa, um caminho alternativo para se
atingir o sagrado.
Orientando: Luiza de Toledo Souza Miranda Barbosa
Orientador: Profª. Elisa Maria de Ulhoa Cintra
Palavras-chave: Fenomenologia, experiência religiosa, experiência estética.
Resumo
O presente trabalho teve como objetivo verificar se a experiência estética
contemplativa pode ser aproximada à experiência religiosa no sentido de
proporcionar um contato com o sagrado. Para isso foi realizada uma revisão
bibliográfica dos temas a fim de chegar-se a essência destas experiências, e a
posterior análise sobre suas proximidades. O trabalho foi realizado em quatro
etapas. Na primeira etapa é desenvolvida uma exposição sobre a concepção
de homem utilizada no trabalho: através de conceitos de autores da abordagem
fenomenológica fala-se sobre o homem e seu eterno e angustiante contato com
o não-ser, e sua condição relacional, de só ser reconhecido como existente
quando em contato com os outros seres. Na segunda etapa desenvolve-se
uma apresentação sobre a experiência religiosa como caminho habitualmente
utilizado para se alcançar o sagrado, e de que maneira o sagrado se manifesta
nestas experiências. A terceira etapa do trabalho faz uma caracterização da
experiência estética contemplativa e sua relação com a beleza. Ao final, na
quarta etapa, apresenta-se uma discussão sobre as idéias apresentadas e faz-
se uma aproximação entre as experiências religiosa e estética contemplativa
com a ajuda de um texto de Clarice Lispector. Além disso, a partir do que foi
discutido é estabelecido um paralelo entre estas duas experiências que
conduzem ao sagrado e o processo terapêutico.
5
Sumário:
I. Introdução......................................................................................6
II. Metodologia.................................................................................12
III. Concepção de Homem utilizada................................................14
-Paul Tillich: O ser e o não-ser do Homem..................................................14
-Martin Buber: Homem, um ser em relação.................................................19
IV. O Sagrado e/ou a Experiência Religiosa...................................23
-O Sagrado e sua característica irracional – Rudolf Otto............................23
-Manifestações do Sagrado: as hierofanias – Mircéa Eliade.......................26
-Relação entre concepção de homem (Paul Tillich e Martin Buber) e
experiência religiosa (Rudolf Otto e Mircéa Eliade)..................................30
V. A Experiência Estética................................................................32
-O que é estética e como conseguimos experiênciá-la...............................32
-A relação da arte com a beleza: contemplação..........................................38
VI. Discussão e conclusão..............................................................42
-Texto: Estado de Graça, de Clarice Lispector............................................42
-Aproximação ao processo terapêutico.......................................................47
VII. Referências bibliográficas.........................................................50
6
I - Introdução:
Neste trabalho eu pretendo apresentar um estudo que diz respeito à
dimensão do sagrado. Este tema foi escolhido já que desde criança está
presente em minha vida e sempre me chamou atenção. Lembro que quando de
visita em pequenas cidades do interior participava de festas religiosas, como
quermesses, festas de santos padroeiros, etc. e com o passar do tempo, no
participar destas comemorações, comecei a perceber que, durante seus
principais rituais, as pessoas que os freqüentavam, pareciam entrar em estado
de transe, em contato com algo que fugia da “normalidade”.
Posso citar como exemplo aqui as procissões católicas que presenciei,
onde as rezas eram faladas, ou cantadas repetidamente por alguns e se
misturavam ao zumbir das lamentações de outros; ao esforço físico, causado
por andar longas distancias numa peregrinação debaixo de sol, às vezes de
joelhos; geralmente com roupas fechadas; carregando imagens de santos,
imagens estas que na maioria das vezes tinham um aspecto macabro com
feições de sofrimento e súplica, etc. Me parecia que aquelas pessoas, durante
todo o ritual, não funcionavam no seu modo de ser habitual, estavam
nitidamente experienciando a religiosidade de forma muito profunda.
Todo aquele conjunto, que me vem à memória como algo ‘esfumaçado’,
um tanto triste, mas nem por isso menos cativante, proporcionava um ambiente
que parecia favorecer a ligação (ou re-ligação) com um universo que foge ao
racional. Além disso, ao escutar suas conversas e preces reparava como a
experiência religiosa ocupava um lugar de destaque em suas vidas: as pessoas
apresentavam dedicação total à religião, tomando-a como motivação de vida e
preenchimento completo do ser. Parecia-me que eles vivenciavam algo
‘sagrado’.
Com o passar do tempo pude conviver com pessoas que também
pareciam manter contato com esta ‘coisa’ que faz fugir à normalidade, porém
este contato em nada tinha relação com a religião. Estas pessoas pareciam
entrar em contato com o mundo inefável, ou seja, que não pode se exprimir por
palavras, encantador, inebriante, do sagrado, através de outros caminhos, e a
7
experiência estética parecia ser o caminho mais utilizado. É importante deixar
claro que quando me refiro à experiência estética não faço menção à
experiência da criação de uma obra de arte, como pintar um quadro, escrever
uma poesia, mas sim à experiência da contemplação da obra de arte, quando
se lê a poesia e observa o quadro.
Intuí, então, que tanto a experiência religiosa quanto a experiência
estética poderiam ser canais de ligação, igualmente eficazes, com o sagrado, e
resolvi me aprofundar no tema para entender até que ponto esta intuição
poderia ter fundamento.
Comecei a estudar o tema do sagrado com uma revisão bibliográfica de
autores da área da fenomenologia que pareciam me dar pistas de que eu
estava no caminho certo.
Tillich (1976) diz que o homem é um ser que tem que estar a todo o
momento se auto-afirmando frente à possibilidade do não-ser, isso lhe causa
muita ansiedade. O autor chega a nomear três tipos de ansiedade, em que o
ser sente-se ameaçado pelo não-ser, são elas: a ansiedade da morte, na qual
o que está sendo ameaçado é a condição material/biológica do ser; a
ansiedade da insignificação, na qual tudo passa a ser visto como trivial, sem
valor, inclusive o próprio sujeito; e a ansiedade da condenação, na qual o
homem, sendo seu próprio juiz se culpa por não ter se envolvido com algo que
lhe dizia respeito. Como são interligadas, quando o homem entra em contato
com uma dessas ansiedades, as outras duas também são mobilizadas, o que
lhe causa grande angústia.
Croatto (2001) parece ir pelo mesmo caminho de Tillich (1976) ao dizer
em sua obra que o homem é um ser que, por definição, tem como
característica o ‘estar sempre em busca’, isto está relacionado com a sensação
de incompletude, de não plenitude que emerge quando o indivíduo pode refletir
sobre si e sobre o mundo. Esta possibilidade de buscar algo, ‘fazer projetos’,
gera neste ser tanto a consciência de necessidades, que podem ser receptivas
(comida, presentes), ou expressivas (amor, amizade), quanto a consciência de
limitações (fragmentação, finitude, falta de sentido). Na tentativa de escapar do
8
sofrimento, ele é impelido a buscar saídas que anulem os limites e saciem as
necessidades. É nesse momento que o homem busca a religião como forma de
entrar em contato com realidades de vida totalizadoras, transcendentais,
sagradas. “O ser humano é, na realidade, ‘menos’ do que deseja ser; mas é
sempre, no desejo, um ‘mais’ que não chega a se concretizar por inteiro”
(Croatto, 2001, p. 44).
Eliade (2001) diz em sua obra que a religião, através de suas hierofanias
(hieros-sagrado e fania-manifestação), tem a capacidade de retirar o homem
da homogeneidade do cotidiano, ou seja: a religião faz com que o mundo do
homem passe de uma realidade marcada pelo caos da relatividade, na qual
nada possui valor absoluto a uma realidade absoluta, estruturada, na qual as
coisas passam a ser ter algum sentido.
Voltando a Croatto (2001), o homem, então, parece atingir seu objetivo
ao experienciar a religião, pois, através dela, suas necessidades são saciadas
nas mais variadas realidades de ordem transcendente: fisicamente (por
milagres de cura, comida ou bebida milagrosa, etc), psiquicamente (com a paz
da ‘glória’, com o amor plenificante, etc) e socioculturalmente (com a irrupção
de um mundo novo com leis que o regem). Além disso, nela as limitações são
superadas, pois se permite a passagem do sentimento fragmentário ao
totalizador, no qual tudo está dado, não havendo necessidade de busca.
Também passa-se do finito ao eterno, ao pensar-se em idéias como glória
eterna, vida eterna, reencarnação. A partir disso, muitas coisas, que antes
desta vivência não tinham razão de ser, passam a fazer sentido.
Então, um ponto a ser investigado é se a arte tem a função de negar os
limites e saciar as necessidades, trazendo totalidade, plenitude, numinosidade,
podendo, assim, saciar as necessidades do homem física, psíquica e
socioculturalmente. Já que, segundo relatos coletados por Paiva (2004) de
pessoas intimamente relacionadas com arte, essa funciona como alimento
básico, preenchimento completo da pessoa, dedicação total, etc.
Buber (1979) diz que somente podemos experimentar esta sensação de
plenitude, de sentir-se existente como totalidade quando mantemos uma
9
relação do tipo Eu-Tu com o mundo. Neste modo de relacionar-se, o homem
dialoga com um outro entrando em contato com a ‘inteireza’ do “Tu”, assim,
reconhecendo a existência do outro, é também reconhecido por ele. Porém, o
autor deixa claro que podemos nos relacionar de forma Eu-Tu não somente
com pessoas, mas com qualquer ser do mundo, dependendo da abertura do
sujeito, sendo estes seres vivos ou não.
Paiva (2004), em sua pesquisa sobre como artistas plásticos entendiam
a relação da experiência de criação da arte com a experiência religiosa, mostra
uma visão semelhante à de Croatto (2001), mas inova ao acrescentar que
várias outras áreas de interesse podem ter, para o homem, a mesma função
que a da religião:
Entendida substantivamente, isto é, no sentido denotativo que lhe confere socialmente a linguagem, a religião tem como objeto o sobrenatural. Entendida funcionalmente, isto é, segundo as funções que se crêem por ela asseguradas na vida individual e social, a religião equivale à realidade fundamental que confere sentido às grandes interrogações da existência e pode identificar-se com a ciência, o empenho político, o prazer e o esporte. (Paiva, 2004, ¶37).
Bello (1997) parece concordar ao dizer que a vivência do sagrado é
inerente ao ser humano, e que, por isso, qualquer atividade realizada com e
como rito pode conduzir a ela. Juntando a essas considerações a idéia de ser o
homem religioso aquele que em seu comportamento, vive a ação da força
transcendente, manifestada em objetos ou seres revestidos de poder (Croatto,
2001), pergunto se a experiência estética da contemplação não poderia exercer
o papel da experiência religiosa, já que, segundo Paiva (2004) na experiência
estética da criação, ou, expressão:
O artista tem em relação ao objeto de arte ‘reverência’ religiosa e ‘distanciamento’. O objeto de arte ‘é sacralizado’ porque tem valor como ‘portador de uma verdade religiosa e sagrada’ a verdade daquele artista. (Paiva, 2004, ¶24)
Assim como no caso da religião, segundo Duarte (1991, p.55), “é no
sensível – e não no conceitual, no intelectual - que reside o ser do objeto
estético.” E “durante a experiência estética o pensamento (conceitual) não se
dá de forma idêntica ao seu desempenho na experiência cotidiana: ali ele está
10
em equilíbrio com a imaginação e o sentido”, agindo de forma transcendental.
Ou seja, estas duas vivências passam pela abstração, abandonando o
concreto imediato, podendo, quando intensas, envolver o individuo por inteiro,
arrebatá-lo, colocá-lo em êxtase, mobilizando afetos, cognições, emoções,
sentidos, segundo afirmação de Paiva (2004).
Langer (1980) diz que a arte se caracteriza por ser a criação de formas
simbólicas do sentimento humano, e é exatamente por essa razão que a arte
possui a capacidade de envolver o individuo por inteiro, fazendo-o transcender-
se. Por ser símbolo, a obra de arte evoca sensações, fala sobre coisas que não
conseguimos expressar muito bem com a linguagem cotidiana. Segundo May
(1992), isso acontece porque o símbolo aparece aos espectadores como a
‘melhor forma’ de representar algo que estava obscuro, algo a que não tinham
muito acesso até então. O contato com o inefável acaba, então, por arrebatar o
homem.
Porém o contato com o transcendente da arte só ocorre quando o
indivíduo entra realmente em contato com a obra. Segundo Bachelard (2005)
quando vemos uma obra de arte de modo contemplativo, sem ansiedade e pré-
concepções, abertos à sua ‘inteireza’ e dinamismo próprio, ela aparece a nós
como uma novidade, desvelando algo que estava encoberto.
Por trazer à luz verdades que estavam encobertas, a arte possui um tom
de mistério: “Eu disse da religião que ela começa onde o conhecimento factual
se eleva em temor, confiança e louvor. O mesmo vale para a arte” (Arnheim,
1991, apud Paiva, 2004, ¶7). Nesta frase está presente a idéia de Otto (1992)
dos três principais modos de vivenciar os momentos de contato com o
numinoso: o mysterium, o tremendum e o fascinans. Respectivamente, estes
três momentos estariam ligados àquilo que nos é estranho, o ‘totalmente outro’;
ao terror místico que denota atitude de sumo respeito; e àquilo que cativa,
fascina, gerando felicidade. Estes três momentos de contato com o numinoso
estariam, segundo o autor, presentes em todas as religiões, e para Arnheim
(1991, apud Paiva, 2004, ¶7) a arte também estaria ligada a sentimentos de
mistério, quando o ser se coloca diante de algo desconhecido, algo além de si,
11
o totalmente outro, que pode despertar espanto e terror, e/ou fascínio e
felicidade.
É a partir destas idéias que minha pergunta se desenvolve: procuro
entender o que há de semelhante entre estas duas experiências (religiosa e
estética). Sendo a experiência religiosa um caminho habitualmente relacionado
e utilizado na busca do sagrado, questiono se a experiência estética
contemplativa pode ser um caminho alternativo à religião nesta procura do
sagrado.
Quanto à abordagem fenomenológica, escolhi-a, porque esta se mostra
muito adequada ao estudo do tema do sagrado, pois a partir dela visa-se
chegar à essência dos fenômenos. Sendo essência entendida por Moreira
(2002) como maneiras características do aparecer de qualquer fenômeno, sem
as quais, o próprio fenômeno não pode ser pensado. Além disso, Moreira diz
que para se ter acesso às essências o único ponto de partida seria a
experiência comum de um dado fenômeno por indivíduos diversos, sem o
auxílio de quaisquer teorias científicas.
Goto (2004) parece concordar com essa idéia ao afirmar que um estudo
do sagrado a partir do método fenomenológico é importante, pois se limita em
aprofundar no que é visto, iluminar ou compreender um fenômeno, eliminado a
pretensão de julgá-lo. A tentativa de compreensão do sagrado através desta
abordagem seria essencial, pois na verdade o que estamos estudando são os
estados experienciados pelas pessoas quando o sagrado se manifesta. Ou
seja, não estamos estudando o sagrado em si, mas “os estados de ânimo em
que o homem se afina com o mundo da transcendentalidade” (Goto, 2004,
p.88), a relação dos indivíduos com este mundo, ou neste caso, indivíduo com
o além-mundo.
Assim, através do estudo da essência das experiências religiosa e
estética contemplativa poderia compreender se a minha intuição sobre estas
experiências como canais paralelos de contato com o sagrado faz sentido.
12
II – Metodologia:
O presente trabalho teve como objetivo verificar se a experiência
estética contemplativa pode ser aproximada à experiência religiosa, no sentido
de proporcionar um contato com o sagrado. Para isso foi realizada uma revisão
bibliográfica dos temas, dando-se preferência a autores de abordagem
fenomenológica, a fim de chegar-se à essência destas experiências, e à
posterior análise sobre suas proximidades. Como já dito anteriormente,
essência se caracteriza como a maneira característica do aparecer de qualquer
fenômeno, sem a qual o próprio fenômeno não pode ser pensado.
O trabalho foi realizado em quatro etapas:
Na primeira etapa é desenvolvida uma exposição sobre a concepção de
homem utilizada neste estudo, para que o leitor possa ter uma compreensão
prévia sobre o protagonista das experiências às quais nos referimos: através
dos conceitos de Paul Tillich fala-se sobre o homem e seu eterno e angustiante
contato com o não-ser, e através dos conceitos de Martin Buber fala-se do
homem e sua condição relacional, de só ser reconhecido como existente
quando em contato com os outros seres.
Na segunda etapa, a partir das idéias dos teólogos/fenomenólogos
Rudolf Otto e Mircéa Eliade, desenvolve-se uma apresentação sobre a íntima
relação entre a experiência religiosa e o sagrado: fala-se sobre a experiência
religiosa como caminho habitualmente utilizado para se alcançar o sagrado, e a
maneira como ele se manifesta nestas experiências.
A terceira etapa do trabalho começa com uma caracterização da
experiência estética a partir dos conceitos da esteta Susane Langer, e, através
de outros autores, como os fenomenólogos Gaston Bachelard e Rollo May, é
explicitada a relação entre arte, beleza e contemplação.
Ao final, na quarta etapa, apresenta-se uma discussão sobre as idéias
apresentadas e faz-se uma aproximação entre as experiências religiosa e
estética contemplativa, com a ajuda de um texto de Clarice Lispector, chamado
13
“Estado de Graça”. Além disso, a partir do que foi discutido é estabelecido um
paralelo entre estas duas experiências que conduzem ao sagrado e o processo
terapêutico. Isso é possível porque o setting analítico é aqui compreendido
como um ambiente que tem como função propiciar ao paciente a
transformação de sentido de suas experiências profanas em experiências
sagradas, ou seja: do trivial ao significativo, do obscuro ao iluminado, do
aprisionamento á liberdade, da dor à cura.
14
III - Concepção de Homem utilizada:
Para que os leitores entendam quem é este Homem ao qual me refiro,
protagonista da experiência religiosa e da experiência estética, dedico este
primeiro capítulo a explicação da concepção de Homem que utilizei.
Elegi, dois autores: Paul Tillich e Martin Buber por acreditar que suas
obras falam de diferentes pontos cruciais que delimitam o Homem segundo um
olhar fenomenológico.
De Paul Tillich utilizarei a idéia do homem como um ser para morte,
acompanhado pelo eterno não-ser. Já de Martin Buber utilizarei a idéia do
homem como um ser em relação, sendo a abertura, ou a intencionalidade do
homem em questão, a definidora de como ocorre essa relação.
- Paul Tillich: O ser e o não-ser do Homem
Paul Tillich (1976) entende que o Homem nunca está pronto, acabado,
ele está, na verdade, em incessante movimento, como um eterno vir a ser. Ele
está a todo o momento mantendo contato com novas possibilidades de ser, e
mais que isso, nestes momentos ele se da conta de que sendo de uma
maneira, ele não é de todos os outros infinitos modos. Então, segundo o autor,
o ser abarca dentro de si mesmo o não-ser, que esta sempre ali, tendo que ser
superado. Por isso, o homem, por toda sua vida, não passa por apenas um
segundo sequer em que pode dizer: -Eu sou isso, sempre fui isso e sempre
serei isso.- A única afirmação possível seria então: –Eu sou!- Independente do
predicado adotado na frase o homem está sempre sendo alguma coisa.
Logo o homem está, por toda sua existência, em um processo de
continua auto-afirmação, tem que estar sempre se afirmando frente àquilo que
o ameaça, frente ao seu não-ser. Para Tillich (1976), neste momento em que o
indivíduo toma ciência do seu possível não-ser, sendo este não-ser uma parte
constituinte de seu ser, ocorreria a ansiedade.
O autor utiliza a coragem como forma de interpretação do ser-em-si, pois
esta seria uma ferramenta para o homem se afirmar frente àquilo que ameaça
15
levá-lo a sua negação. Então, a coragem uniria em si o ser e o não-ser. Isso
acontece, pois a coragem é usualmente descrita como potência de enfrentar o
medo, ou seja, ela somente se manifesta em momentos em que o não-ser
ameaça o ser e este tem de se auto-afirmar.
Aí creio que faz-se necessário uma distinção entre ansiedade e medo.
Para o autor, o medo possui um objeto definido, com o qual é possível interagir
(atacar, analisar, etc.), e é próprio, porque cada pessoa possui o seu. Já na
ansiedade não existe a definição de um objeto, ele é justamente a negação de
tudo. A ansiedade provoca reações inadequadas, pois como não existe um
centro que possa ser atacado e analisado o indivíduo perde totalmente a
direção. O único objeto é o nada, a ameaça do absoluto não ser. Medo e
ansiedade são coisas distintas, mas caminham juntas. Qualquer medo,
pesquisado a fundo esconde uma ansiedade existencial. Porém se esforça em
aparecer como medo, pois assim pode ser enfrentado pela coragem.
Para Tillich (1976), o não-ser é dependente do ser, ou seja, não existe a
negação sem sua prévia afirmação. Por isso o não-ser subjuga a existência de
um ser, pois mesmo quando se descreve um ente em termos de não-ser,
pressupõe-se que há alguma coisa e não simplesmente a negação total, o
nada. E, por causa disso, as qualidades do nada são dependentes deste ser,
ele só as obtém porque mantém relação com o ser, ele é tudo que é negado ao
ser.
A partir disso é possível falar em qualidades do não-ser, ou, de tipos de
ansiedade. O autor acredita que seja possível falar em três maneiras do não-
ser ameaçar o ser, e, portanto três modos de ansiedade que pertencem a toda
existência. É importante ressaltar que, por pertencerem a toda existência não
dizem respeito a um estado anormal da mente, como na ansiedade neurótica e
psicótica. Ou seja, estas ansiedades existenciais estão sempre presentes na
vida do indivíduo, embora geralmente uma se sobressaia temporariamente. As
três ansiedades seriam: a ansiedade do destino e da morte, a ansiedade da
vacuidade e da insignificação e a ansiedade da culpa e da condenação.
16
•A ansiedade do destino e da morte:
Esta ansiedade seria a mais básica e universal, já que diz respeito a
uma ameaça ao ser como existência. Na ansiedade do destino e da morte a
auto-afirmação ôntica (do grego, on=ser) é ameaçada pelo não-ser. Ela se
revela inescapável, pois todos os homens têm consciência de sua finitude
material e biológica. E, como pra fenomenologia o ser só se dá pela relação
dual eu-mundo (eu me relacionando no mundo com os outros entes), quando o
homem, em sua morte, fecha seus olhos para o mundo, o eu,
necessariamente, também desaparece.
Segundo Tillich (1976), a ansiedade da morte abarca em si a ansiedade
‘destinamental’, pois se caracteriza como absoluta e irremediável (sabe-se que
a morte é certa) frente à imprevisibilidade do destino (não se sabe como e
quanto vai viver). As causas que determinam nossa existência já nos são
dadas, estão ai em nossa frente, vindas do mundo (como um destino), sem a
possibilidade de serem previstas e controladas. Elas não têm um propósito de
acontecerem, e ficamos contingentes a elas. Esta “impenetrável escuridão do
destino” causa ansiedade. A ameaça do não-ser frente às contingências do
destino é relativa, mas só causa ansiedade porque nela esta contida a ameaça
absoluta da morte, que é onipresente.
Para lidar com esta eterna presença da morte, tentamos transformar
ansiedade em medo, pois o medo possui um objeto definido, dando a
possibilidades de lutarmos corajosamente contra estes objetos corporificados.
Mas, sabemos que no fundo o que causa a ansiedade não são determinados
objetos e sim a situação humana.
•A ansiedade da vacuidade e insignificação:
O indivíduo pode se auto-afirmar tanto ônticamente, como de forma
espiritual. A auto-afirmação espiritual se dá a todo o momento em que o ser
participa intencionalmente de suas criações. Quando ele está inteiro no seu
agir e age de modo espontâneo. As coisas que são dadas a ele não são
17
recebidas de modo passivo, mas transformadas de modo que faça sentido ao
ser. Ou seja, quando ele transforma o seu mundo de modo criativo.
Nesse caso, a auto-afirmação espiritual é ameaçada pelo não-ser por
duas formas de ataque: vacuidade e insignificação. A ameaça de insignificação
esta para a ameaça da morte assim como a da vacuidade está para o destino.
Ou seja, A ansiedade da insiginficação é absoluta e abarca nela a ansiedade
da vacuidade.
Um exemplo do sentimento de ansiedade da vacuidade e insignificação
é quando o homem passa por uma desilusão amorosa. Nela uma devoção que
tinha se desvanece abruptamente por algum acontecimento externo ou
processos interiores. O que antes fazia sentido passa a não significar mais
nada. Frente a essa falta de sentido o homem se sente perdido, e pode tentar
inconsequentemente achar algo que supra esse vazio temporário, porém, na
verdade, não é possível forçar um centro de devoção espiritual, ele só
acontece naturalmente.
Tillich (1976) afirma que a dúvida sobre as coisas é condição de nossa
vida espiritual, estamos sempre nos questionando a cerca das coisas com as
quais nos relacionamos, porém quando a dúvida deixa de ser um método pelo
qual o homem conheçe as coisas e passa a ser duvida total, no caso de se
questionar se a coisa realmente existe, ela nos transporta ao desespero
existencial. Por isso os homens se apegam tanto a verdades raramente
contestadas, como tradições e convicções. Não porque estas não possam ser
questionadas, mas porque geralmente não são. A fim de não sofrer com a
dúvida, o homem não pergunta. Ele renuncia da sua liberdade em favor da
significação, como uma auto-agressividade fanática. Porém esta agressividade
pode ser estendida a qualquer indivíduo que ameace sua certeza.
Quando um ser está totalmente envolvido com um significado, a ponto
de entender que aquele é todo o seu mundo, frequentemente ele prefere retirar
sua vida, acabando com sua auto-afirmação ôntica do que se desfazer de sua
auto-afirmação espiritual. Logo, o não-ser ameaça ambos os lados, se ele
ameaça o ôntico também ameaça o espiritual e vice versa: “-Se não tenho um
18
sentido pelo qual viver, prefiro tirar a minha vida, e por outro lado, se vou
morrer um dia, para que viver cri-ativamente.”
•A ansiedade da culpa e condenação:
Além de ameaçar a auto-afirmação ôntica e espiritual do homem, o não-
ser pode ameaçar um terceiro modo de auto-afirmação: a moral.
Desde que é jogado no mundo, o homem se torna responsável por si
mesmo e por suas ações, ele, enquanto vive sua vida, também é responsável
por prestar contas a si mesmo. O homem é responsável por controlar seus atos
para que consiga concretizar o que já é em sua potencialidade. Porém, por ser
livre, de vez em quando o homem, frente suas infinitas possibilidades de ser,
pode extraviar-se de si mesmo, contradizendo sua própria essência. A cada
vez que escolhe um modo de ser elimina todos os outros. Quando isso
acontece, após algum tempo ou após refletir sobre sua escolha estes outros
modos deixados de lado lhe parecem que poderiam ter sido mais
interessantes, no sentido que ‘combinariam’ mais com sua essência. Então,
como o homem é seu próprio juiz, se cobra e se culpa por suas escolhas. A
ansiedade da culpa levada ao extremo pode causar a auto-rejeição, por ter sido
o culpado por ter perdido o próprio destino.
Para tentar fugir desta culpa o homem é capaz de inventar dês-culpas
para se justificar, como a anomismo: “-Tinha que acontecer deste jeito, eu não
tive intenção” - e o legalismo: “-Eu sou livre para escolher e por isso tinha que
experimentar outras possibilidades.”
Como nos outros modos de ansiedade o não-ser moral pode ser
distinguido, mas não separado do ôntico e espiritual. Quando um modo de
auto-afirmação é abalado, todos se movimentam consequentemente.
Pode-se perceber então que só resta ao homem, já que sua morte é
certa, encontrar coisas em vida que dêem sentido a sua história, o homem
precisa se ligar a algo que encoraje-o de ‘lutar’ por sua vida . Para que isso
aconteça é necessário que o homem esteja a maior parte do tempo
inteiramente presente em seus atos, ou seja, que não viva passivamente,
19
aceitando o que vem de fora. O homem precisa se conhecer bem, para saber
distinguir o que lhe pertence ou não, o que faz sentido ou não.
Para isso ele não pode ‘comprar’ a verdade do outro como se fosse sua,
não pode aceitar o mundo como uma imposição, uma coisas já pronta, um fim.
Ele tem de entrar em contato com esse mundo, conhecendo a sua verdade na
relação com as coisas. Verdade esta que não é fixa como um discurso que se
repete, mas mutável como um diálogo que se constrói. Só conhecemos a nós
mesmo através do diálogo, caso contrario ou eu ou o mundo são vistos como
verdades imutáveis, prontas, como meros objetos, como um isso.
E nesse momento podemos inserir o segundo autor, Martin Buber.
-Martin Buber: Homem, um ser em relação
Buber (1979), apesar de não ser considerado de fato um fenomenólogo,
adota a visão da fenomenologia existencial e entende o homem como um ser
em relação, ou seja, o homem só existe enquanto se mantém em relação com
o mundo e com os outros seres. Então, o autor se propõe a compreender o que
há de essencial nesse relacionar entre homens, entre homem e mundo, e entre
homens e Deus.
Para a realização desta ontologia da relação o autor adota as palavras-
princípio (grundwort) Eu e Tu, pois as considera como portadoras do ser, ou
seja, é na relação Eu-Tu que o homem se introduz na existência entendendo o
mundo e sendo visto como homem pelo outro.
Na relação Eu-Tu existe um diálogo que somente se dá quando existe
uma reciprocidade como ação totalizadora, ou seja, através do inter-humano
um indivíduo reconhece o outro como existência, como ser. Um não existe sem
o outro, há a confirmação mútua. Este modo de se relacionar é entendido por
Buber (1979) como essencial do homem. Neste momento o homem se
comporta com uma atitude ontológica de perceber a existência do outro, e
assim, também se perceber.
20
Porém, às vezes um indivíduo pode relacionar-se com outro através de
uma atitude cognoscitiva e objetivante do outro; o homem quer apenas se
utilizar do outro como mero objeto. Neste caso o homem quer impor-se diante
do outro, ordená-lo, estruturá-lo. O outro é visto como objeto descartável e
acaba por perder sua totalidade, sendo visto como uma soma de
características. Isso acontece nas relações Eu-Isso.
Logo, para o autor existe uma dupla possibilidade do homem se
relacionar com o mundo, o tipo de relação vai depender da intencionalidade do
Eu, da disposição do Eu quando se volta para o mundo. Além disso, a relação
Eu-Isso é vista como posterior ao Eu-Tu. Ou seja, só se pode estabelecer uma
relação reflexiva e cognoscitiva do outro a partir do momento que já reconheço
o outro como existente. Primeiro há a contemplação e depois o conhecimento.
Quando o homem se relaciona pelo modo Eu-Tu com o mundo, está agindo de
modo contemplativo e aceita o outro como pessoa, e quando se relaciona pelo
modo Eu-Isso, está agindo de modo cognoscitivo tratando o outro como objeto,
o outro não é encontrado como outro em sua alteridade.
Contudo, o autor não condena o mundo do Isso. Para ele este mundo
habitado por um ‘Eu’, ser egótico, e um objeto manipulável é extremamente
importante para a existência humana, pois é nele que o ‘Eu’ se relaciona de
modo a experienciar e utilizar o outro, podendo criar regras e estudar uns aos
outros, fazendo “ciência”. Por isso não se pode considerar, só pelo fato de ser
o diálogo o sentido mais profundo da existência, que a relação Eu-Isso seja
inferior à Eu-Tu, pelo contrário, ela é humana e só por isso já se caracteriza
como autêntica. Buber (1979) apenas acredita que este modo de relacionar-se
não pode ser o sustentáculo ontológico do inter-humano.
É importante lembrar que no nosso vocabulário tanto o pronome pessoal
‘Tu’, segunda pessoa do singular, como o pronome demonstrativo ‘Isso’ são
usados pra referir-se a coisas que estão presentes no momento. Porém o que
diferencia um ‘Tu’ de um ‘Isso’ é que o ‘Isso’, por ser objeto de experiência, ou
uma ferramenta para uma finalidade tem de possuir características fixas,
objetivas, tem de possuir ‘extensão’, já o ‘Tu’ é inefável, irredutível a um certo
numero de qualidades, pois corre o risco de se transformar em um objeto, em
21
um Isso. E nesse caso o diálogo já não existe mais, pois como o outro possui
características fixas não necessita mais de um Eu. Ou seja, quando eu dialogo
com alguma coisa, eu dependo da coisa e a coisa depende de mim para que a
relação exista, nesse momento eu estou me relacionando com um ‘Tu’. Porém,
quando eu falo de alguma coisa, eu parto do pressuposto de que ela possui
características fixas, eu a objetifico, e por isso eu posso utilizá-la, consumi-la.
Também é interessante pensar que usualmente a palavra ‘Tu’ passa
uma sensação de proximidade bem maior que a palavra ‘Isso’ que parece estar
distante. Podemos questionar diretamente um ‘Tu’ que respeitamos, mas
criamos pré-conceitos de um ‘Isso’ que rebaixamos.
Porém, para Buber (1979), exite ainda um modo de se relacionar que se
assemelha ao modo Eu-Tu, mas que se dá quando o homem se relaciona com
Deus. Sendo fiel a sua concepção do homem se constituir como um ser em
relação, a primeira preocupação do autor foi reaproximar Homem e Deus, com
a intenção de tornar possível a “conversa com Deus”, o diálogo entre eles.
Porém esta reaproximação não está no âmbito de conhecer o que é Deus em
si, saber exatamente o que ele é, pelo contrário, o autor diz que não
precisamos saber nada sobre Ele para conseguirmos manter contato. Deus, ou
o Tu-eterno, como Buber o chama, nunca vai poder ser conhecido, pois ele é o
totalmente outro, não possui qualidades ou características fixas. Ele é o Tu-
eterno, pois nunca vai poder ser transformado em um Isso, em um objeto de
observação ou culto. Mais uma vez, o que importa não é a coisa em si, mas a
relação. Buber (1979) diz que não podemos falar Dele, mas falar com Ele.
O autor propõe, a partir daí, uma unidade, uma comunhão entre Deus,
Homem e Mundo, que não acontece quando se quer, com tempo e lugar
determinados, mas no aqui e agora, sendo que qualquer lugar é lugar e
qualquer tempo é tempo para Sua presença. Por isso, propõe que o homem
realize o ‘divino’ no mundo, realize teofanias (teo-deus, fania-manifestações).
Segundo ele é responsabilidade do homem realizar e instaurar o divino no
mundo. Isso acontece pois, como já dito desde o começo, Buber (1979) dá
toda ênfase ao Eu, ao ser que é suporte e fundamento da relação.
22
Por causa disso o autor se coloca contra as místicas que propõem o
êxtase ou o aniquilamento de si mesmo, já que na primeira só existe o eu e na
segunda não existe o eu. Só com o ‘Eu’ ou sem um ‘Eu’ não existe relação.
23
IV – O Sagrado e/ou a Experiência Religiosa:
Pesquisei autores como Rudolf Otto e Mircéa Eliade a fim de entender
melhor o meu objeto de estudo, o Sagrado. A princípio achei que seria possível
estudar separadamente as essências do Sagrado, da experiência religiosa e da
experiência estética, e por isso tinha como plano inicial escrever capítulos
separados para estas essências. Porém a partir das minhas pesquisas pude
perceber que a essência do sagrado e da experiência religiosa estão
intimamente relacionadas, já que toda bibliografia por mim encontrada nessa
área já ligava as duas, ou falava delas como se fossem uma só. Por isso, ao
estudar a essência do Sagrado, já estava, automaticamente, estudando a
essência da experiência religiosa. Então resolvi juntá-las em um único capítulo.
-O Sagrado e sua característica irracional: Rudolf Otto
Escolhi iniciar com Rudolf Otto, já que este lida com o tema abordando
apenas um de seus aspectos: o seu lado não racional, pois acredita que o
fenômeno do sagrado está apenas no âmbito do irracional e inefável.
Para Otto (1992) o sagrado é aquilo que está presente em todas as
religiões, e sem ele, as religiões não seriam possíveis. Ele explica que com o
passar do tempo o homem religioso foi desvirtuando o significado real do termo
sagrado, e adquirindo o hábito de associá-lo a tudo aquilo que é perfeitamente
bom e absolutamente moral. Nas religiões semíticas e bíblicas, por exemplo, a
raiz SACER traz consigo a idéia de bem absoluto, como nos santos católicos.
Mas ele discorda e diz que quando o elemento moral acompanha a experiência
do sagrado não é de maneira nenhuma fundamental, ou seja, são elementos
diferentes que podem caminhar juntos eventualmente.
Porém o autor se encarrega de estudar em sua obra o sagrado em seu
caráter originário, que para ele, tem como marca sua relação com o inefável e
irracional. Otto (1992) adota, então, o termo numinoso (do latim, numem=deus)
para se designar a este modo de enxergar o sagrado. E afirma que por estar no
âmbito do irracional, não é só através da religião que o numinoso pode se
24
manifestar. Ele pode ocorrer em outros domínios, como em experiências que
envolvam o ‘belo’. Segundo Otto (1992):
A alma encontra-se num estado qualitivamente diferente se experimenta um prazer, um contentamento, uma alegria, o prazer estético, a exaltação moral ou, finalmente, a beatitude religiosa do recolhimento. Estes estados têm entre si relações e analogias e é por isso que se podem incluir num conceito comum e formar uma mesma categoria de experiências psíquicas, em oposição a outras. (p. 26).
Por esta relação com o irreal, o autor diz que seu objeto de estudo, o
numinoso, só pode ser compreendido através de sua vivência, ou seja, quando
o individuo passa por uma experiência numinosa. Se evidencia, a partir daí,
uma dificuldade do estudo do numinoso: exatamente pelo fato de não fazer
parte do mundo real, cotidianamente vivido, somente se torna possível
apreendê-lo através de comparações (relações ou oposições) com outros
fenômenos que se apresentam em outros domínios da vida do sujeito no
âmbito do real. Isso acontece pelo fato de que, nos momentos de contato com
o numinoso, o individuo experiência um estado de recolhimento solene e de
arrebatamneto, que assemelha-se a sentimentos encontrados em outros
momentos da vida, como reconhecimento, confiança, amor, segurança, etc.
Após essa elucidação inicial, passo ao que seriam os elementos
constituintes do numinoso e que seriam experimentados quando se está em
relação com ele. Otto (1992) cita em sua obra as idéias de Schleiermcher, um
filósofo que diz poder esclarecer o sentimento relacionado à experiência
religiosa. Ele afirma que este sentimento poderia ser comparado a um
sentimento de ‘dependência’. Segundo o filósofo esta dependência religiosa se
diferencia dos outros tipos de dependência pelo seu caráter absoluto, frente a
todas as outras que, para ele, se mostram relativas. Este caráter absoluto se
dá através do ‘sentimento de criatura’.
Na experiência de criatura o indivíduo depara-se com sua insignificância
perante o cosmos e vivencia um sentimento de humildade frente à grandeza do
universo. Este sentimento, para o homem religioso, representa um curvar-se
25
reconhecendo sua pequenez e conseqüente fragilidade perante a imensidão de
Deus.
Então, Otto (1992) se utiliza desta idéia de Schleiermcher, mas afirma
que o filósofo erra ao reduzir toda a experiência religiosa a um sentimento de
dependência. Para o autor o sentimento de criatura seria apenas um dos
momentos de apreensão do numinoso. Além disso, esse sentimento de criatura
surgiria como efeito de um outro modo de experienciar o numinoso: o
sentimento de ‘terror’. Como, por exemplo, em histórias de castigos divinos que
causam o sentimento de medo frente à vontade de Deus e consequentemente
um sentimento de impotência e pequenez frente a ele.
Porém, este medo sentido na relação com o numinoso supera em
grande escala o medo sentido de qualquer objeto real. O individuo fica
interditado frente àquilo que está acima de toda criatura e se recolhe. Além
disso, o real objeto causador do medo permanece velado, não é concebido e
não pode ser compreendido, por estar no âmbito do inefável. Otto (1992)
denomina esta experiência de mysterium tremendum.
Para o autor o mysterium tremendum seria a primeira forma de interagir
com algo que não está no domínio do racional, se constituindo como uma
experiência que diz respeito a uma capacidade de sentir totalmente fora do
comum. O terror caracteriza-se, então, como um atributo do numem (divino) e
mesmo na fé mais pura ele está presente e a enobrece com sua presença.
Como por exemplo, em vários momentos de escritos religiosos fica evidente a
idéia de que tudo deve calar-se na presença de Deus, e curvar-se perante Ele.
Otto (1992) diz, então, que no sentimento de criatura, o indivíduo se
relaciona com o elemento do terror e com o elemento do poder
(preponderância absoluta de Deus). Elegendo o termo tremendum para
exprimir o primeiro elemento, e termo majestas para exprimir o segundo
elemento. Então, seria exatamente como a ‘tremenda majestas’ que o
sentimento de criatura se relacionaria; todos nós nos sentiríamos cinza e pó
frente a este ‘superpoder’.
26
Além disso, o numinoso tem um outro modo de se manifestar que
constitui junto com o tremendum uma união estranha de contrastes. Para o
autor o mysterium, mesmo possuindo um lado espantoso, também seduz por
produzir um prazer inebrienate. Este elemento, que põe o sujeito, maravilhado
seria o fascinans. Para compreender este elemento poderíamos compará-lo ao
sentimento de benevolência, amor e compaixão sentidos na bem-aventurança
religiosa, porém, eles só nos dão uma leve noção do que sente-se em contato
com o fascinans. Segundo Otto (1992) é algo a mais do que isso, que
justamente por ser componente do numinoso é incomunicável, inexplicável.
Otto (1992) se utiliza de uma passagem do Apóstolo Paulo da bíblia para
falar da inefabilidade desta experiência:
“Nesse instante, experimentei apenas uma grande
alegria e um deleite inexprimíveis. É de todo impossível
descrever a experiência. Era como o efeito de uma grande
orquestra, quando todas as notas se fundem numa harmonia
que, no ouvinte, apenas desperta a sensação de que a sua
alma se eleva e quase estoura de arrebatamento.” (p. 57)
Por ser entendido como um componente do numinoso, transmissor de
uma paz que ultrapassa toda a razão, seria, então, a ele que estaria
relacionado o sentimento de ‘salvação’. Por detrás das expressões simbólicas
obscuras e amedrontadoras, o homem religioso está certo de um bem maior,
um bem que arrebata e salva.
Então Otto (1992) entende que o contato com o numinoso, através da
religião, é marcado por estes dois momentos, o mysterium tremendum e o
mysterium fascinans. Estes trazem para o dia-a-dia do homem religioso,
comandado pela razão, a ligação com algo que vai além, algo irracional e maior
que ele, que dá sentido às suas vidas.
-Manifestações do Sagrado: as hierofanias – Mircéa Eliade
Outro ponto de vista é o do historiador das religiões e fenomenólogo,
Mircéa Eliade. Este autor também se ocupou em estudar o sagrado, porém
27
abordando o tema de maneira mais abrangente, ou seja, não se focando
apenas no seu caráter irracional.
Para Eliade (2001) o sagrado pode ser identificado como algo de ordem
totalmente diferente do que estamos acostumados no ‘mundo real’, no mundo
cotidiano e profano. O sagrado teria, então, um modo diferente de se
manifestar, para o qual o autor adotou o termo hierofania (do grego,
hieros=sagrado e fania=manifestação), que quer dizer que alguma realidade
sagrada está se manifestando em objetos que fazem parte deste mundo
profano. Os exemplos vão desde os mais simples aos mais complexos: de um
amuleto à encarnação de Deus em Jesus Cristo. Por isso, segundo Eliade
(2001), para o homem religioso toda a natureza pode ser vivenciada como uma
manifestação do sagrado.
Uma característica marcante de toda hierofania é que quando um objeto
é visto como sagrado, ele se torna outra coisa (uma coisa divina), mas continua
a ser ele mesmo (uma coisa profana), pois continua a participar do meio
cósmico envolvente, ou seja, o objeto se torna um paradoxo. Ele se torna a
união entre divino e profano, por ser divino e profano.
Segundo Eliade (2001), a principal função de uma hierofania é romper
com a homogeneidade do espaço profano. No mundo profano, ou seja,
cotidiano, a homogeneidade acontece quando os atos e acontecimentos do
dia-a-dia se dão sem a possibilidade de se questionar sobre eles. Neste modo
de agir não há a espaço para a reflexão, tudo é realizado mecanicamente de
modo a reproduzir algo acontecido no passado. Justamente por causa da falta
de reflexão, as coisas não são imbuídas de sentidos, elas apenas passam pela
vida do sujeito. Este é o mundo profano, marcado pelo caos da relatividade, ou
seja, nele nada possui valor absoluto, por si só. As coisas são apenas meios,
instrumentos para uma finalidade que não está no agora, está sempre no
futuro. Por isso, os pontos de referência aparecem e desaparecem segundo as
contingências diárias.
Como não é possível viver em meio a este caos, para acabar com a
ansiedade provocada por esta relatividade de valores o indivíduo suplica por
28
um sinal de Deus, que lhe de caminho, referencias, etc. Então as hierofanias se
mostram como a revelação de uma realidade absoluta, estruturada e estável. A
hierofania cosmifica o caos. Ou seja, para o homem religioso, a manifestação
do sagrado funciona como um ponto de referencia e, por isso funda um mundo,
um cosmos, pois acaba com a relatividade do caos.
Aqui percebemos a inversão de ponto de vista do qual estamos
acostumados: o mundo real e eficiente (cosmos) passa a ser considerado
como o mundo religioso e o mundo da relatividade e das experiências
subjetivas (caos) como o mundo da cotidianidade.
Para melhor assimilar esta idéia é importante entender o que o autor
considera como caos e cosmos. Para Eliade (2001), caos se relaciona com
tudo aquilo que é desconhecido, inabitado e por isso, não é considerado
participante do meu mundo ainda. Por oposição, cosmos seria tudo que eu
habito, que me é familiar, que faz parte do ‘meu mundo’. Para transformar caos
em cosmos é necessário que o homem se habitue, através da repetição
intencional, ao que era desconhecido. Essa repetição, porém, nada tem a ver
com a repetição passiva dos atos do cotidiano, ela é vivida de forma ativa, o
sujeito esta ali totalmente presente e concentrado em seu ato. Nesse caso a
repetição pode ser vista como uma cerimônia, faz-se a mesma ação diversas
vezes até que se torne um ritual, adquirindo um novo sentido, se torna con-
sagrado. Logo, tudo que faz parte do cosmos é de algum modo santificado.
Para auxiliar o esclarecimento destas idéias podemos estabelecer uma
relação entre os conceitos de Eliade (2001) de cosmos e caos e os conceitos
de Almeida de simbólico e diabólico. Para Almeida (2002), quando o homem
realiza um ritual, repete varias vezes a mesma ação de forma presente, ele re-
vive a ação de forma ativa, viva; com a ação viva ele pode se beneficiar de
toda sua energia e força, que não percebe no modo cotidiano. Neste momento
o indivíduo re-significa o ato, lhe dá sentido, tornando-o símbolo, ou, coisa
sagrada. A palavra símbolo vem do grego: syn=simultaneidade e ballo=jogar, e
por isso se mostra como elemento agregador. É a coisa mesma, mas ao
mesmo tempo é coisa sagrada, é uma hierofania. Então símbolo traz o homem
para perto do sagrado, do cosmos.
29
Em oposição ao simbólico encontra-se o diabólico (dia=dois), tudo aquilo
que desune, dispersa. Para Almeida (2002), hoje em dia vivemos numa cultura
da desintegração que privilegia o individual, no sentido de não compartilhado,
em detrimento do totalizador. Neste momento de crise as pessoas vão em
busca de algo que lhes tragam uma promessa de imediata melhora de vida.
Isso denota uma desesperada tentativa de religação com algo que lhes traga
um sentido de existir, por isso estas pessoas acabam por se entregar a fetiches
e objetos de devoção transitórios que se diluem com o tempo. Tudo isso só
aprofunda o desligamento inicial, causando uma angústia ainda maior, uma
aproximação do caos.
Outro autor que aborda o tema do caos e cosmos é Martini (2002), para
ele a capacidade de transcendência de caos a cosmos é entendida como
inerente ao ser humano, e se caracteriza por integrar ao mundo em que vive
tudo que lhe é desconhecido. Vemos, então novamente a idéia de Buber
(1979), discutida no capítulo da condição do homem, de que toda pessoa
possui esta capacidade de iluminação do que lhe era turvo, de desvelamento
do oculto, de cosmificação do caos. E, segundo Martini (2002), o abandono
dessa capacidade pode ser encarado como trágico, já que paralisa o indivíduo
na mediocridade. Neste caso o sujeito não inaugura nada, recebe todas as
coisas prontas e as repete, como maquina. Quando a transcendência acontece
o ser humano articula em si os limites impostos pelas suas contingências com
suas próprias necessidades. Assim ele se insere de forma criativa na
coletividade, socializando-se. Neste sentido, o verdadeiro homem religioso, que
se re-liga as coisas de modo a habitá-las, dá sentido ao seu caos. Através da
religião o homem organiza o mundo, o cosmifica, o sacraliza. A religião faz com
que o homem transcenda no plano simbólico.
A partir de tudo isso é interessante pensar que como cada homem é
responsável por seu cosmos e seu caos, por isso ele escolhe o Universo que
está pronto a assumir. O homem brinca de Deus criando seu mundo como uma
escolha existencial. Por isso o homem que mantém contato com o sagrado, no
caso o homem religioso, é o homem mais livre e mais aberto ao mundo, pois
30
este não o é imposto, mas criado por ele através de sua vivência na forma mais
intensa.
Este modo de existir aberto ao mundo faz com que o homem não
possua apenas a dimensão humana, mas também uma dimensão trans-
humana (a cósmica). Ele se mantém consciente de sua humanidade, mas sabe
que também é cosmos. Assim, estando tão próximo à natureza, conhecendo-a
tão de perto, o homem se conhece. Ocorre aí uma homologação (homo-mesmo
logos-ordem, cosmos): um micro (homem) e um macro(natureza)-cosmos
paralelos. E como todo cosmos só se faz cosmos porque foi sacralizado em
algum momento, o homem neste momento é sagrado, está livre do mundo
profano, está em comunicação com Deus, em estado de graça.
-Relação entre concepção de homem (Paul Tillich e Martin Buber) e
experiência religiosa (Rudolf Otto e Mircéa Eliade)
Fazendo um paralelo entre as idéias contidas no Capítulo II (de Tillich e
Buber) e as idéias de Otto e Eliade, pode-se pensar algumas coisas. Em
primeiro lugar pensando no mysterium tremendum de Otto (1992), em que o
autor diz que o homem fica interditado quando se depara com sua pequenez e
fragilidade em relação ao mundo e a ‘majestosa’ vontade de Deus, acredito que
este momento tem relação com um movimento do homem em direção a si
mesmo. Ele passa de um modo de ser autômato do cotidiano, em que tudo é
relativo, no qual as normas que regem sua vida dependem do que a sociedade
impõe no momento, para um modo de ser em que ele se depara consigo
mesmo, interrompe o fluxo do cotidiano para pensar em sua existência e em
seus valores.
Este seria um primeiro passo para o homem entrar em contato com o
sagrado: o movimento de estar disposto a estar ‘presente’ no mundo, agora e
inteiro. Conhecer realmente o mundo, sentí-lo. Porém, como diz Tillich (1976),
esta disposição causa certo sofrimento, pois a partir do momento em que se
escolhe não aceitar um mundo pronto e sim desbravar o seu próprio é que o
homem se depara com a imensidão desconhecida á sua frente. Ele fica alguns
instantes interditado, apavorado, ansioso. Depara-se com outras existências
31
misteriosas, que até então haviam passado despercebidas, pelo fato de estar
sempre atarefado cumprindo ordens. Ele não as compreende estas existências
misteriosas por serem totalmente outras: tem medo, tem vontade de controlá-
las, dar nomes as estas ‘coisas’, para conseguir ordená-las.
Quando o homem consegue resistir ao impulso inicial de tudo controlar e
prever – que transforma tudo ao seu redor e a si mesmo em instrumentos ou
‘Issos’ – e coloca-se aberto ao outro em sua diferença, reconhecendo-o em sua
existência, poderá dirigir-se a ele perguntando: -Como TU te chamas? Quem
és TU?. E poderá ficar surpreso ao ouvir o outro responder: -Eu sou o seu
mundo, que você acaba de inaugurar, não te vês em mim?. E a partir daí
começaria um diálogo que irá transforma o ‘Isso’ em ‘Tu’, algo de valor, algo
sagrado.
Este seria então o meu entendimento do verdadeiro homem religioso, o
homem que religa-se consigo mesmo através das manifestações sagradas do
mundo, das hierofanias. E, pensando isso, passo a acreditar que o exemplo
dado na introdução deste trabalho dos fiéis em procissão não seria a melhor
ilustração deste homem religioso. Talvez eles se caracterizem como homens
de fé, visto que a fé tem alguma coisa de futuro, de projeto, de finalidade que
não se encaixa no aqui e agora do diálogo sagrado. Aliás, ali naquela cena,
apesar de aquelas pessoas aparentarem nitidamente estar experimentando um
estado ‘anormal’ de consciência, eles não pareciam estar dialogando com
nada, pareciam estar em contato apenas consigo mesmas, com seus
sofrimentos, com suas questões. Eram um bando, mas estavam sós.
32
V – A Experiência Estética
Neste capítulo discorrerei sobre a experiência estética e para isso
utilizarei alguns autores alternadamente de forma que um complemente a idéia
do outro. Começarei o texto com as idéias da esteta Susane Langer pelo fato
de ser dela as definições de estética, arte, etc. que usarei para desenvolver
meu trabalho. E incluirei os outros autores no decorrer do texto.
- O que é estética e como conseguimos experiênciá-la
Segundo Langer (1980) ‘estética’ é um departamento especial da
filosofia que pode ser definido de várias formas: “a ciência do belo”, “a teoria ou
filosofia do gosto”, “a ciência das belas-artes”, ou “a ciência da expressão”. Por
isso, para a autora, a estética apresenta-se como um campo um tanto confuso
do conhecimento que aborda todas estas questões. Ainda fica difícil entender,
no caso de um trabalho que se propõe a discutir estética, se ele irá falar sobre
as belas-artes, ou sobre o belo, que é algo maior; sobre as formas de
expressão, algo maior ainda; ou, sobre o gosto que se relaciona com o belo,
porém está ligado também à moda e a cultura vigente, sendo mais subjetivo.
Todas estas definições já são suficientes para causar bastante confusão
a quem lê um trabalho sobre estética, de modo desinformado. Visto que cada
uma dessas definições discorre sobre temas gerais como: gosto, emoção,
forma, representação, imediatidade e ilusão de forma pouco clara, e apesar de
estarem relacionados, pelo menos indiretamente, às vezes se mostram de
modo antinômico.
A confusão se agrava ainda mais, uma vez que podemos nos relacionar
com as obras de arte através de duas perspectivas: a da expressão
(relacionada ao autor da obra de arte) e da impressão (relacionada ao
espectador da obra de arte). E dependendo da perspectiva adotada os temas
gerais mudam de sentido. As perguntas mais freqüentes relacionadas à
primeira perspectiva são: “O que induz um artista a realizar tal obra de arte, o
que ele quer dizer com ela, o que faz parte dela?” Já as perguntas relacionadas
33
à segunda perspectiva são: “O que significam as obras de arte em relação aos
espectadores, o que é isso que sente-se em presença delas?”.
Já na introdução deste trabalho, ao apresentar a pergunta que
fundamenta este estudo, tive a intenção de deixar claro que gostaria de
abordar a experiência estética a partir da perspectiva contemplativa, ou seja,
através da perspectiva do espectador. Logo, meu trabalho está relacionado ao
segundo conjunto de perguntas de Langer (1980): sobre o significado da obra
de arte e as vivências que este contato proporciona ao homem.
Além disso, aprofundando um pouco mais, e tentando encaixar este
trabalho dentre as definições de estética oferecidas pela autora acima citada,
acredito que este texto abordará a estética a partir da questão do belo, não a
qualquer beleza, e sim a beleza das artes, não só das belas-artes, como
pintura, poesia, etc., e sim de toda aquela arte que é arte acima de tudo. Ou
seja, segundo Langer (1980), mesmo que possua uma função específica, a
obra final é considerada obra de arte quando “é a criação de formas simbólicas
do sentimento humano”. Por exemplo, um tecido ou um jarro, no dia-a-dia de
alguns observados como utensílios, instrumentos, podem ser considerados tão
arte quanto uma música ou uma pintura se vistos por outros como símbolos,
como formas puras, como imagens.
Adotando a perspectiva de Langer (1980), creio que faz-se necessária
agora uma explicação sobre a que me refiro quando falo de símbolos, formas
ou imagens antes de nos aprofundarmos mais especificamente na beleza que
estes símbolos, formas ou imagens podem carregar. Poderíamos começar,
então, com a frase: A “Forma Significante” é a essência de toda arte.
Essa frase seria, segundo Langer (1980), uma definição de tudo que
chamamos de artístico, interligando todas as formas de arte, assim como
estipulando seus limites e poderes e demonstrando a sua função. Essa
definição de arte como “Forma Significante” introduzida por Langer (1980) em
seu texto, e retirada das idéias do crítico de arte Clive Bell, explicita a
capacidade simbolizadora da arte. Creio ser importante aqui ressaltar que, para
a autora, a arte tem função de símbolo e não de sinal. Essa diferença é
34
importante considerar, visto que o sinal nos remete a um objeto, uma situação,
enquanto que o símbolo nos remete a uma idéia, um mundo.
Quando olhamos uma placa de transito entendemos seu significado
imediatamente, porque ela nos remete a um objeto (um obstáculo) ou uma
situação (pista escorregadia) imediata. Uma placa de transito é, portanto, um
sinal. Entretanto, no momento que estamos contemplando uma obra de arte,
todo um conjunto de idéias é evocado, um mundo novo vem a nós, repleto de
sensações.
Porém, um símbolo não é algo que usamos apenas de modo sensual,
para evocar sensações, mas é também um recurso do qual nos servimos para
falar sobre coisas que não conseguimos expressar muito bem. Usamos o
símbolo quando não temos domínio de como nos expressar sobre determinado
fenômeno, quando entramos em contato com o inefável. Neste caso, para
Langer (1980), diversas obras de arte podem ser usadas somente para evocar
sensações, porem dessa forma não estariam exercendo a função ultima de
arte, de ser símbolo. Neste caso também, se ainda continuam sendo obras de
arte, mesmo só servindo para provocar sensações, então teríamos que
considerar como artistas também os cozinheiros, perfumistas, etc.
Para que um símbolo funcione, ele tem de manter alguma forma lógica
em comum entre a idéia evocada, e a ‘coisa’ simbolizadora (em seu livro a
autora usa o termo ‘objeto’ ao invés de ‘coisa’, porém preferi utilizar o segundo
termo por achar mais fácil de encaixar os variados tipos de imagens que
podem constituir um símbolo). Então fica a pergunta, se possuem uma forma
lógica congruente seria então a coisa que remete à idéia ou a idéia que remete
à coisa? Para resolver esta questão adota-se como símbolo, como evocador,
aquele que posso controlar: a coisa, a forma.
Todo símbolo tem uma forma, a melhor forma de representar as idéias
que evoca. Por exemplo, uma pintura, ou um poema tem uma forma, uma
organização que faz com que expresse determinado conjunto de idéias, porém
quando mudamos algumas palavras do poema, ou algumas cores da pintura o
35
mundo que elas inauguram já é outro e o sentimento despertado pode mudar
ou desaparecer. Por isso falamos em ‘melhor forma’.
Rollo May (1992) parece concordar com Langer (1980), pois também
afirma que a obra de arte está associada à ‘melhor forma’. Para May (1992),
quando uma forma organiza o que antes permanecia ininteligível ela se torna a
melhor forma. May (1992) se utiliza de uma idéia já discutida no capítulo da
experiência religiosa, sobre a origem da palavra símbolo, que significa reunir,
juntar, ordenar. Então a obra de arte teria essa capacidade de conseguir
organizar, dar forma a algo que antes eu não conseguia compreender, que
estava desorganizado, misturado ao caos. Resumindo, a obra de arte é um
símbolo, o símbolo é uma forma, a melhor forma, a forma que organiza, que
cosmifica, que faz com que eu consiga me apoderar do que antes não fazia
sentido. Ela me aproxima do inefável e faz com que eu possa dialogar com ele.
Ela me aproxima de mim mesmo, me livrando de minha confusão.
Também, Langer (1980) ressalta a diferença do simbolismo artístico de
outros simbolismos, como a linguagem, por exemplo. Para a autora, tanto a
obra de arte como a linguagem são simbolismos que possuem elementos
articulados entre si constituindo um sentido. Um discurso é um símbolo
complexo composto por palavras e cada palavra é, também, um símbolo
associativo independente com uma referência fixada pela convenção. Um
conjunto de palavras, evocadoras de idéias simples, cria um discurso que
evoca uma idéia complexa, porém no discurso a mesma idéia evocada tem de
ser compartilhada por todos os ouvintes. Isso acontece porque no caso da
linguagem compartilhamos de um vocabulário ‘fixo’.
Já uma música, por exemplo, apesar de também ser formada por um
conjunto de notas que por si só podem evocar idéias, e de conjuntamente
evocarem idéias mais complexas, nem sempre as idéias evocadas são
compartilhadas por todos os ouvintes. Neste caso, o tipo de idéias evocadas
por uma música dependeria da abertura da pessoa, ou seja, de como cada
pessoa se encontra e de como cada pessoa compreende a música naquele
momento em que a escuta. Para Langer (1980) a arte tem ‘importe’, ou seja,
ela traz consigo um conjunto de idéias ou sentimentos que uma expressão
36
(som, imagem, etc) desperta em um meio social dado que vai além do que esta
expressão designa ‘normalmente’.
Novamente May (1992), no que parece concordar com Langer (1980),
afirma que o símbolo artístico é múltiplo em significados, e atribui essa riqueza
de conteúdo aos seus espectadores. São eles que, com sua abertura, seu
modo único de se relacionar com as coisas, atribuem diferentes significados ao
símbolo. A função do símbolo é de apenas despertar reações que estavam
adormecidas, mas que já pertenciam ao indivíduo. Porém, para que a forma
toque realmente o sujeito, de forma a simbolizar algo para ele, exige que o
mesmo esteja inteiramente presente com a forma, sentindo-a de maneira
diferente da que sente as ‘coisas’ do dia-a-dia.
É por isso que Langer (1980), no início deste texto, nos traz a idéia de
que até um objeto, um utensílio do cotidiano, pode ser visto como obra de arte.
A obra de arte para poder ser simbolizadora precisa passar uma impressão de
alteridade, ou seja, ela tem que causar estranheza. Esta estranheza acontece
justamente por ela despertar algo em nós, espectadores que até então não era
de nosso domínio, algo que não tínhamos contato. Assim, mesmo quando a
obra é uma imitação, uma reprodução ou uma representação de algo que já é
conhecido por nós, como uma escultura, sentimos como se estivéssemos
vendo aquela forma pela primeira vez. Não nos parece a coisa mesma, parece
uma outra coisa. A obra de arte destaca-se então de seu cenário real e adquire
um caráter virtual, ela é uma abstração.
Alias, Langer (1980) utiliza as idéias de Schiller em seu livro e afirma
que toda obra de arte é abstrata. É o modo como ela nos aparece, sua
‘aparecência’, seu ‘schein’, que faz de um objeto uma obra de arte. Por
olharmos para ela de forma desinteressada, sem ansiedade, sem finalidade,
apenas contemplando a obra, é que conseguimos nos ater somente à sua
aparência, à forma, à imagem que ela inaugura e deixar de lado o seu caráter
de utensílio.
Durante este texto falei algumas vezes deste aspecto de novidade, de
inauguração que a obra de arte traz, porém pode-se pensar que uma obra
37
como uma produção, e neste caso ela teria uma história, a história do artista
que a criou. Vale lembrar, no entanto, que neste estudo estamos abordando a
obra de arte a partir do olhar de seu espectador.
Segundo Bachelard (2005), quando o homem entra em contato com as
coisas verdadeiramente, encontrando-as como elas se apresentam a ele, na
sua ‘aparecência’, e não como o mundo diz que são; quando ele se relaciona
de modo a contemplar as coisas ao invés de utilizá-las para um fim
programado, ele pode devanear, pode imaginar, pode fazer poesia. Ao entrar
em contato com a obra de arte, utilizando a alma, o homem habita as coisas,
se familiariza a elas de um modo próprio, os pensamentos passam de
autômatos a intencionais, e por esse fato as coisas fazem sentido. Como nos
coloca o autor, o poema liberta o ser ao zombar das censuras, dos
entendimentos pré-estabelecidos. Nesse momento o espectador já não está
aprisionado, vitimado pelo cotidiano, ele é um homem feliz.
Por ser uma coisa totalmente nova, até então não conhecida, a imagem
poética, ou a ‘Forma Significante’ (como estávamos nomeando até agora) tem
um dinamismo próprio, possui um modo de ser próprio. Ela acaba de se
desvelar e por isso não tem passado. Não interessa ao espectador da obra de
arte o passado do artista, o artista não é a obra, e, por exemplo, todas as
causas que levam um poeta a escrever a poesia não são o passado da poesia.
Mais uma vez: a imagem poética não tem passado por ter acabado de nascer.
Independente do drama que o artista venha ilustrar através da obra de arte, ela
tem uma felicidade que lhe é própria. A partir do momento que o artista cria a
obra, esta já não lhe pertence. E talvez essa seja a causa de nos sentirmos
autorizados a nos envolver totalmente com a verdadeira arte, ela não tem
dono.
É em decorrência disso que, quando lemos um poema que nos toma por
inteiro sentimos que podíamos ter sido nós mesmos o autor de tal poema,
sentimos que ele nos diz respeito, nos pertence. E Bachelard (2005) retoma a
idéia de que a arte inaugura algo em nós que já estava lá, mas ainda não
conhecíamos, estava no escuro. Toda imagem poética (forma significante)
38
provoca um abalo em cada um de nós a ponto de provocar uma mudança.
Sentimo-nos transcender, vivemos o não-vivido.
Aquela ‘melhor forma’ ressoa em nós trazendo recordações do passado
e sentimentos relacionados a essas recordações, e nesse momento nosso
espírito vibra. Porém, antes de ressoar, a poesia repercute em nós, nos invade,
tocando a alma. Esse sentimento de inundação é anterior ao pensamento, à
ordem, às associações. É nesse momento que sentimos que entramos em
contato profundo conosco, nos conhecemos transcendendo nosso modo
cotidiano de experimentar as coisas, chegando ao sentido próprio e original
destas coisas.
- A relação da arte com a beleza: contemplação
Até aqui explicitado o que entendo por símbolo, forma e imagem, creio
que posso entrar no tema da beleza que a obra de arte, símbolo do sentimento
humano, forma significante ou imagem poética, podem ‘carregar’.
Duarte (1986) compreende a beleza como não sendo uma característica
que os objetos possuem e nem um tipo de consciência que o homem tem. Ou
seja, um objeto por si só não é belo nem feio, e também, não é o homem que
deposita esta qualidade nos objetos. A beleza está no encontro de um
determinado sujeito, que apresenta-se afetivamente disponível para encontrar
o mundo, de forma a conseguir perceber modos de aparecer de um objeto, e
isso o toca de alguma forma. Então, segundo o autor, para que a beleza seja
vivenciada é necessário que haja uma afinação entre sujeito (eu) e objeto
(outro). A experiência do belo pressupõe eu e outro em um encontro. Duarte
parece ter se baseado nas idéias de Dufrene (1972) que afirma que o objeto
estético é aquele que nos toma mais fortemente do que qualquer outro objeto,
por ser a união do significante (relacionado aqui com o objeto) e do sensível
(relacionado com o sujeito).
Além disso, pode-se acrescentar que, segundo May (1992), quando um
indivíduo experiencia a beleza, por exemplo, ao contemplar uma obra de arte
ou uma paisagem, sente, ao mesmo tempo, uma paz que traz serenidade e
39
uma alegria estimulante. Isso acontece, pois desde os gregos a beleza esta
intimamente ligada com a harmonia, ou seja, uma coisa bela é uma coisa
harmônica. Nela nada falta e nada sobra, tudo se encaixa perfeitamente. Ela é
a unidade e tudo está explicitamente dado na ‘melhor forma’. E como já dito
anteriormente por ser a ‘melhor forma’, sentimos que nada ali poderia ser
mudado, pois corremos o risco de deixar de ser tocado por ela. A obra está
pronta, acabada, e só nos toca por ser daquele modo.
Por possuir esta característica de ‘melhor forma’ a beleza está, segundo
May (1992), intimamente relacionada com a verdade. Uma coisa bela é uma
coisa verdadeira, e uma coisa verdadeira é uma coisa bela. Uma coisa falsa
nunca poderá ter relação com beleza, já que se caracteriza, a priori, como uma
falta. A beleza é plena.
May (1992) e Duarte (1991) afirmam que por vivenciarmos a sensação
de plenitude ao experienciar a beleza, esta possui um caráter atemporal, pois
durante a experiência não pensamos em passado ou futuro, estamos
inteiramente no aqui e agora, apenas com ela, como afirma Bachelard (2005),
ela não tem passado e, também, não se pode fazer projetos para o futuro se
não já estamos modificando-a. Neste momento tudo em volta fica suspenso,
nossa realidade cotidiana é deixada de lado e nos comportamos de forma
diferente. Isto talvez se deva ao fato de a beleza, como já dito anteriormente e
reforçado agora pelas idéias de May (1992), excitar ao mesmo tempo em que
acalma o ser.
Ela é o duo em uno: interna e externa, serena e estimulante, ativa e
passiva. A experiência da beleza se constitui em um paradoxo e, como todo
paradoxo, é difícil de ser explicada. Langer (1980) define paradoxo como “um
termo absurdo ou proposição autocontraditória que continua a funcionar no
pensamento sério, sistemático, embora seja patente o escândalo lógico” (p.
17), é importante notar que o paradoxo não é deixado de lado pelos estetas
como bobagens inconsistentes, pois apresenta uma função. Para Langer
(1980) se um paradoxo existe e se mostra verdadeiro, no sentido de
representar uma sensação sólida de importância e conexão lógica, então ele
deve ser compreendido.
40
May (1992) parece concordar com o que diz Langer (1980) ao afirmar
que o paradoxo deve ser respeitado, porém para o autor, quando se trata da
beleza, não devemos ter a pretensão de explicá-la a partir de nossa linguagem
discursiva. Pois, além de se configurar como tarefa inviável por não possuirmos
léxico suficiente para falar sobre o que é inefável, em geral corremos o risco de
objetivá-lo em demasia, e como o belo se caracteriza justamente pelo diálogo
em equilíbrio de um ‘eu’ e um ‘outro’ ele já não estará sendo contemplado por
inteiro. Isso acontece porque quando discorremos sobre o belo o coisificamos,
ele passa a ser um objeto sobre o qual se fala e não com que se fala. Ele não
passa de formas sem vida, deixando o objeto de ser um paradoxo. Somente
quando conseguimos devanear, unindo o fora objetivado (o outro, a forma) e o
dentro subjetivado (o eu, a minha abertura) conseguimos entrar em contato
com a beleza. Essa seria a causa de nos mantermos em silêncio quando diante
de uma coisa bela, parece que conversamos conosco mesmos.
Por se caracterizar como um diálogo a obra de arte flui prazerosamente,
ela não é algo que temos que aceitar, como um discurso, aliás, segundo Duarte
(1991) uma das causas que faz com que certa obra de arte cause desprazer é
quando ela se caracteriza como discurso político ou como denúncia, neste
caso não conseguimos nos desligar do mundo para ligarmos conosco mesmo
porque a obra tem um objetivo final que está intimamente ligado ao mundo
cotidiano. Não é possível uma suspenção. Também, pode ocorrer o sentimento
de desprazer quando o espectador se mistura totalmente com a obra, nesse
caso não existe, espectador e obra, eu e tu, existe uma coisa só,
impossibilitando o diálogo. Isso ocorre em casos de neuroses profundas, pré-
psicoses ou psicoses.
Para Duarte (1991), existe uma outra forma que faz com que obra de
arte não cause prazer, porém nesse caso o espectador não sente desprazer,
mas sim indiferença em relação a ela. Para este autor esta indiferença nada
tem a ver com satisfação, como quando comemos muito e não sentimos apetite
frente a uma comida saborosa. Pelo contrário, sempre estamos dispostos a
experiênciar a beleza. A causa da indiferença em relação a uma obra de arte é
que não estamos educados sentimentalmente para contemplar tal obra. Tanto
41
Duarte como Dufrenne (1972), afirmam que é necessário que se ‘aprenda’ a
contemplar a arte de modo que ao nos familiarizamos com os códigos estéticos
tornamo-nos mais sensíveis as nossas sutilezas interiores.
42
VI – Discussão e conclusão:
Gostaria de iniciar a discussão deste trabalho com um texto de Clarice
Lispector. Acredito que este texto possa nos ajudar a encontrar um caminho
que nos guie até mais próximo da resposta à nossa questão inicial, que
consiste em encontrar os pontos de aproximação entre a experiência religiosa
e a experiência estética contemplativa, no que dizem respeito à busca pelo
sagrado:
Estado de Graça,
Quem já conheceu o estado de graça reconhecerá o que vou dizer. Não me
refiro a inspiração, que é uma graça especial que tantas vezes acontece com os que
lidam com arte.
O estado de graça de que falo não é usado para nada. É como se viesse
apenas para que soubesse que realmente se existe. Neste estado, além da tranqüila
felicidade que se irradia de pessoas e coisas, há uma lucidez que só chamo de leve
porque na graça tudo é tão, tão leve. É uma lucidez de quem não adivinha mais: sem
esforço, sabe. Apenas isto: sabe. Não perguntem o quê, porque só posso responder
do mesmo modo infantil: sem esforço, sabe-se.
E há uma bem-aventurança física que a nada se compara. O corpo se
transforma num dom. E se sente que é um dom porque se está experimentando, numa
fonte direta, a dádiva indubitável de existir materialmente.
No estado de graça vê-se às vezes a profunda beleza, antes inatingível, de
outra pessoa. Tudo, aliás, ganha uma espécie de nimbo que não é imaginário: vem do
esplendor da irradiação quase matemática das coisas e das pessoas. Passa-se a
sentir que tudo que existe – pessoa ou coisa – respira e exala uma espécie de
finíssimo resplendor de energia. A verdade do mundo é impalpável.
Não é nem de longe o que mal imagino deve ser o estado de graça dos santos.
Esse estado jamais conheci e nem sequer consigo adivinhá-lo. É apenas o estado de
graça de uma pessoa comum que de súbito se torna totalmente real porque é comum
e humana e reconhecível.
As descobertas nesse estado são indizíveis e incomunicáveis. É por isso que,
em estado de graça, mantenho-me sentada, quieta, silenciosa. É como numa
anunciação. Não sendo porém precedida pelos anjos que, suponho, antecedem o
estado de graça dos santos, é como se o anjo da vida viesse me anunciar o mundo.
43
Depois, lentamente, se sai. Não como se estivesse estado em transe – não há
nenhum transe – sai-se devagar, com um suspiro de quem teve o mundo como este é.
Também já é um suspiro de saudade. Pois tendo experimentado ganhar um corpo e
uma alma e a terra, quer-se mais e mais. Inútil querer: só vem quando quer e
espontaneamente.
Não sei por quê, mas acho que os animais entram com mais freqüência na
graça de existir do que os humanos. Só que eles não sabem, e os humanos
percebem. Os humanos têm obstáculos que não dificultam a vida dos animais, como
raciocínio, lógica, compreensão. Enquanto que os animais têm a esplendidez daquilo
que é direto e se dirige direto.
Deus sabe o que faz: acho que está certo o estado de graça não nos ser dado
frequentemente. Se fosse, talvez passássemos definitivamente para o outro lado da
vida, que também é real mas ninguém nos entenderia jamais. Perderíamos a
linguagem em comum.
Também é bom que não venha tantas vezes quanto eu queria. Porque eu
poderia me habituar à felicidade – esqueci de dizer que em estado de graça se é muito
feliz. Habituar-se à felicidade seria um perigo. Ficaríamos mais egoístas, porque as
pessoas felizes o são, menos sensíveis a dor humana, não sentiríamos a necessidade
de procurar ajudar os que precisam – tudo por termos na graça a compensação e o
resumo da vida.
Não, mesmo se dependesse de mim, eu não quereria ter com muita freqüência
o estado de graça. Seria como cair num vício, iria me atrair como um vício, eu me
tornaria contemplativa como os fumadores de ópio. E se aparecesse mais a miúdo,
tenho certeza que abusaria: passaria a querer viver permanentemente em graça. E
isto representaria uma fuga imperdoável ao destino simplesmente humano, que é feito
de luta e sofrimento e perplexidades e alegrias menores.
Também é bom que o estado de graça demore pouco. Se durasse muito, bem
sei, eu que conheço minhas ambições quase infantis, eu terminaria tentando entrar
nos mistérios da Natureza. No que eu tentasse, aliás, tenho certeza de que a graça
desapareceria. Pois ela é a dádiva, e se nada exige, desvaneceria se passássemos a
exigir dela uma resposta. É preciso não esquecer que o estado de graça apenas uma
pequena abertura para uma terra que é uma espécie de um calmo paraíso, mas não é
a entrada nele, nem dá o direito de se comer dos frutos de seus pomares.
Sai-se do estado de graça com o rosto liso, os olhos abertos e pensativos e,
embora não se tenha sorrido, é como se o corpo todo viesse de um sorriso suave. E
sai-se melhor criatura do que se entrou. Experimentou-se alguma coisa que parece
redimir a condição humana, embora ao mesmo tempo fiquem acentuados os estreitos
44
limites dessa condição. E exatamente porque depois da graça a condição humana se
revela na sua pobreza implorante, aprende-se a amar mais, a perdoar mais, a esperar
mais. Passa-se a ter uma espécie de confiança no sofrimento e em seus caminhos
tantas vezes intoleráveis.
Há dias que são tão áridos e desérticos que eu daria anos de minha vida em
troca de uns minutos de graça.
Neste texto, Clarice Lispesctor fala de um modo de estar no mundo que
se assemelha muito ao que estávamos chamando, até aqui, de experienciar o
sagrado, este modo se chama o ‘estado de graça’. Clarice afirma que o estado
de alma ao qual se refere não deve ser igualado à inspiração dos artistas, nem
ao estado de graça dos santos, é o ‘estado de graça’ de uma pessoa comum.
Isso também acontece em meu trabalho, já que em nenhum momento falei
sobre artistas ou santos. Discorri apenas sobre contempladores de obras de
arte e homens religiosos, ou seja, pessoas comuns.
A autora parece estar discorrendo sobre o mesmo modo de estar no
mundo dos contempladores e religiosos, o modo ‘Eu-Tu’, já que é apenas nesta
maneira de abrir-se ao mundo, ao totalmente outro, que nos re-conhecemos.
Buber (1979) diz que o homem é um ser que está sempre se relacionando com
o mundo, porém pode fazê-lo de duas formas: através de uma atitude
cognoscitiva, a qual trata o outro como objeto (um ‘Isso’) com características
fixas, que servem de instrumento para se atingir uma finalidade; ou de modo
dialógico, ou seja, reconhecendo o outro em sua alteridade como existente.
Esse segundo modo de se relacionar com o mundo faz com que o outro não
possua características fixas, sendo necessário que, a todo o momento, seja
mantido um diálogo entre ‘Eu e Tu’. Este outro se apresenta, neste modo,
como uma obra aberta a ser relida e refeita por aquele que contempla.
Buber (1979) não condena o modo ‘Eu-Isso’ de estar no mundo, já que
afirma que é através dele (quando estamos frente a um mero objeto) que
conseguimos produzir ‘ciência’ e passá-la adiante. Clarice parece concordar, já
que afirma que se o ‘estado de graça’ fosse nos dado freqüentemente “talvez
passássemos definitivamente para o outro lado da vida, que também é real
45
mas ninguém nos entenderia jamais. Perderíamos a linguagem em comum”
(Lispector, 1975, p.102).
No modo de se relacionar ‘Eu-Tu’ também produzimos conhecimento,
porém neste caso ele é totalmente diferente do ‘cientifico/verificável’. Isso
acontece porque apesar de produzirmos conhecimento através do diálogo com
um outro desconhecido, esta produção é totalmente diferente da que estamos
acostumados. Neste diálogo ao conhecer o outro (“Tu”) também tenho acesso
a um auto conhecimento (“Eu”).
Este conhecimento produzido no diálogo, não tem uma finalidade. Como
afirma Clarice: Apenas isto: sabe-se. Mas sabe-se de que? Sabe-se de si. O
transcendente, neste caso, me leva a mim mesmo. Inverto a frase do texto:
ganho a terra, uma alma e um corpo. Através do profundo contato com o
mundo, como este se apresenta, experimento a dádiva indubitável de existir
materialmente. É isso que acontece com os homens que entram em contato
com o sagrado através dos símbolos da religião e da arte.
Os símbolos, por serem paradoxiais, podem ser entendidos como os
melhores representantes do ‘totalmente outro’. Eles fazem parte do mundo,
mas ao mesmo tempo estão apartados deste, estão suspensos. Por isso
facilitam o contato com o transcendente. O símbolo não tem finalidade
instrumental, ele possui uma dimensão de totalmente fora, totalmente estranho,
totalmente outro, mas ainda sim está aqui-e-agora, e é por isso que mesmo
estando quase desencarnado consigo me dirigir a ele. Posso estar totalmente
com ele, formar uma unidade. O diálogo pressupõe dois em consonância, Eu e
Outro – Outro e Eu. Habitando o mundo do outro, a sua verdade, conheço a
minha verdade.
É uma anunciação, faz-se a luz, e saindo do escuro vejo o mundo e me
vejo nele. Passo do temor frente à escuridão do mundo ao fascínio da
existência. Tudo está claro, existe um sentido. A forma como o outro chega até
mim me toca, pois eu estava atento à sua aparição, apenas o esperava, calmo,
sem pré-concepções. E por não possuir juízos prévios, esta forma do outro me
parece a forma mais apropriada, a ‘melhor forma’. Sem finalidade, a forma é
46
bela porque é plena, nada falta e nada sobra. Ela é verdadeira no que diz
respeito à sua existência.
Infelizmente, como dito anteriormente ela é bela para mim, porque eu a
esperava e ela apareceu. E por isso, “As descobertas nesse estado são
indizíveis e incomunicáveis. É por isso que, em estado de graça, mantenho-me
sentada, quieta silenciosa.” (Lispector, 1975, p.102). Como em uma oração,
uma meditação. Não é possível explicar essa beleza, ela é inefável, e nem
pode-se exigir dela nada além desta sensação leve e suave de ‘ser-com’.
Nunca sentimos fastio ao experimentar a graça, mas uma hora, sem mais
porquê, sai-se deste seu estado.
Aos poucos aterrisa-se novamente, neste local em que, como diz Tillich
(1976) estamos condenados ao destino, à vacuidade, à culpa. Porém, como
escreve Clarice, voltamos da graça melhor do que entramos, somos capazes
de aceitar os estreitos e pobres limites da condição humana. Na graça
aprendemos a amar mais, a perdoar mais e a esperar mais.
Agora, pode-se compreender o que aproxima a experiência religiosa e a
experiência estética contemplativa: tanto uma quanto a outra nos possibilitam,
através de suas hierofanias, seus símbolos, que entremos em ‘estado de
graça’. Ambas proporcionam este momento de re-ligação. Nos re-aproximamos
do mundo e de nós mesmos, de nossas verdades. A partir delas damos sentido
a nossa existência, nos sentimos realmente presentes no mundo. Somos
inteiros e recebemos o mundo inteiro.
Atualmente, porém, vivemos em uma sociedade de custo-benefício, as
coisas apresentam valor enquanto nos servem para que consigamos atingir
uma finalidade. O valor das coisas está em seu ‘objetivo’, ou seja, no que as
torna objetos de consumo. Elas são usadas e descartadas porque não nos
dizem respeito, foram adquiridas para um fim. Por isso as usamos como
ferramentas, estamos sempre as utilizando para um projeto de futuro, um ainda
não. Assim, preocupados com o por vir, não temos tempo de contemplá-las em
sua pura existência, no aqui-e-agora.
47
Este futuro pelo qual nos ocupamos, não é o futuro do vir-a-ser, das
próprias potencialidades, em que constrói-se a si mesmo a cada minuto
presente em busca do sentido; é um futuro instrumental, em que utilizamos as
coisas no agora para chegarmos a um final já programado, geralmente ditado
pela sociedade. Hoje em dia, raramente estamos construindo a nós mesmos
juntamente com o mundo, pelo contrário, recebemos um manual, um discurso
pronto e obedecemos sem prestar atenção se realmente nos cabe.
É por isto que nesta sociedade, mesmo depois de conquistar muitos
objetivos, não raramente, nos sentimos vazios, sozinhos, e questionamos se
realmente conquistamos algo de Valor. O Valor a que me refiro aqui é diferente
do valor de uso, é o Valor da coisa por ela mesma, no que ela me toca por ser
quem é, em tudo que ela tem de Sagrado. Fica claro, então, a importância de o
homem passar por experiências religiosas e estéticas contemplativas, ambas,
enquanto busca do Valor, da Verdade, do Sagrado, proporcionando seus
‘estados de graça’ que fazem com que consigamos suportar melhor os dias
áridos e desérticos, confiando que haja um sentido para nossa existência.
-Aproximação ao processo terapeutico
Observando a sociedade atual pude notar que devido às características
citadas acima, salvo raras exceções, os homens parecem não ter interesse, ou
tempo de se dedicar a experiências que os levem a este contato com o
Sagrado.
Pode soar estranho pensar isto, visto que a cada momento vimos surgir
uma nova religião, uma nova seita, etc. Porém estas parecem não
proporcionam a verdadeira re-ligação, parecem impor verdades, que são
‘compradas’ por seus fiéis sem devida reflexão. O Deus dessas religiões é um
Deus tão ‘bonzinho’, que faz com que os religiosos nem tenham que entrar em
contato com suas angústias, suas questões, consigo mesmos. Tudo está
pronto, e se você seguir à risca as normas da igreja seu futuro está garantido,
pelo menos o futuro que este Deus programou para você. Por outro lado,
cresce cada vez mais o número se pessoas que se dizem não religiosas, ou
que não acreditam na existência de um Deus.
48
Também vê-se que a nossa cultura, representação maior das
manifestações artísticas de um povo, já quase não tem força. Hoje é preferível
comprar a cultura alheia porque não temos tempo de ir atrás da nossa. Engole-
se esta cultura estrangeira de uma só vez, sem degustá-la, talvez para assim
não perceber que ela não nos diz respeito. Além do mais, por incrível que
pareça, a cultura alheia é de mais fácil acesso: mais barata, mais divulgada,
etc. Enquanto isso a nossa cultura, que proporcionaria um momento de
reencontro conosco, mantém-se marginalizada, escondida, ridicularizada, e
quando ‘bem tratada’ inacessível pelo seu alto custo.
Como comentado, atualmente os homens tratam os outros como coisas,
objetos para um fim, se tornando objetos também. Tem-se que seguir regras,
normas de funcionamento, manuais, para atingir a finalidade imposta pela
sociedade. Vez ou outra, quando estes homens acham que não vão dar conta
de seu isolamento, de suas carencias, surge a indicação de um bom ‘auto-
ajuda’ que vai instruí-lo a encontrar um modo mais ‘prazeroso’ de chegar ao
‘seu’ objetivo e ser feliz. Porém ai novamente os homens estão seguindo
passos, indo pelo caminho de outros, e não desbravando o seu próprio.
Por tudo isso, e mais, que sem experienciar momentos de contato
consigo mesmos, de re-ligação, um contato com uma realidade sagrada, o
homem sente-se muitas vezes apartado de si mesmo, sem rumo, sem um
sentido que guie sua existência. Parece não ter um ponto de apoio, sente-se
ansioso, querendo controlar a si mesmo como se fosse objeto. Quer encaixar-
se nas normas da sociedade, porém nem sabe se estas têm sentido para ele.
Então, a partir da leitura de textos de alguns autores, como Cardella
(2002), Cardinalli (2000), Juliano (1999) e Pompéia (2000) sobre a
psicoterapia, pude pensar que o setting terapêutico pode ser visto como um
espaço atualmente utilizado para que o homem se re-encontre: experiencie
momentos sagrados. Este homem que procura a terapia vem em busca de
socorro, geralmente está sofrendo, ‘patologizado’. Está tão imerso neste modo
de ser que a sociedade impõe que não consegue entrar em contato consigo
mesmo, não sabe quem é realmente. Seu sintoma parece surgir como um
pedido para que ele pare, se olhe, se sinta.
49
Procurar a terapia seria o primeiro passo para que o homem abandone
este modo restrito de ser: o modo da reprodução, que lhe causa sofrimento.
Quem procura terapia quer se cuidar, se tocar, envolver-se consigo mesmo,
quer refletir. E, no caso, o trabalho do terapeuta é exatamente devolver o
paciente para si mesmo, como um espelho e, assim, ajudar a re-instituir um
diálogo dele consigo mesmo. O psicólogo convida o paciente a transformar o
discurso pronto que recita a si mesmo, no qual se utiliza de fundamentos
adotados do cotidiano, em diálogo, com a finalidade de aprofundar-se no real
significado do que diz.
O terapeuta instiga este diálogo através de um método, o não saber, o
não julgar, o não ter pré-concepções, e o olhar interessado, o acolhimento, a
tentativa de compreensão. Ou seja, ele quer que o paciente se olhe com
estranheza, como um outro, pois a alteridade não traz respostas e sim enigmas
que instigam a ir mais fundo. Olhando para sua vida como quem contempla
uma obra de arte, abrindo-se e envolvendo-se com ela sem julgamentos e
sentindo-se acolhido, o paciente sente-se autorizado a envolver-se, encantar-
se com sua história. Assim, de modo pré-reflexivo e sem as censuras do dia-a-
dia, o homem fica livre para nomear as coisas como as sente realmente,
clareá-las. Sai-se do escuro, verdades são desveladas.
Estas verdades, porém são pessoais, singulares e liberam do sintoma,
deixando-o livre para desenvolver-se em busca do sentido próprio. Entrando
em contato real com a obra que é a própria vida, envolvendo-se consigo
mesmo o homem pode desenvolver-se. Fazemos poesia com a própria vida e
por isso passamos a achá-la bela, desse modo, com a terapia também
aprendemos “a amar mais, a perdoar mais, a esperar mais. Passa-se a ter uma
espécie de confiança no sofrimento e em seus caminhos tantas vezes
intoleráveis.” (Lispector, 1975, p.103).
50
VII - Referências bibliográficas:
-ALMEIDA, Cleide Rita Silvério. O homem contemporâneo e a
sacralidade. In: Ribeiro, Jorge Claudio. (ed.) O humano, lugar do sagrado.
Sétima edição. São Paulo: Olho d’água, 2002. p. 47-54.
-BACHELARD, Gaston (1989). A Poética do Espaço. São Paulo: Martins
Fontes, 2005.
-BELLO, Angelo Ales. Culturas e Religiões: Uma leitura fenomenológica.
Bauru: Edusc, 1998.
-BUBER, Martin (1974). Eu e Tu. São Paulo: Cortez e Moraes, 1979.
-CARDELLA, Beatriz Helena Paranhos. A construção do psicoterapeuta:
uma abordagem gestáltica. São Paulo: Summus, 2002.
-CARDINALLI, Ida Elizabeth. Daseinsanalyse e psicoterapia. Revista da
Associação Brasileira de Daseinsanalyse. São Paulo, n.9, p. 11-18, 2002.
-CROATTO, José Severino. As linguagens da experiência religiosa. São
Paulo: Paulinas, 2001.
-DUARTE, João Francisco. O que é beleza. São Paulo: Brasiliense,
1991.
-DUFRENNE, Mikel. Estética e filosofia. São Paulo: Editora Perspectiva,
1972.
-ELIADE, Mircea (1992). O Sagrado e o Profano: A essência das
religiões. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
-GOTO, Tommy Akira. O fenômeno religioso: A fenomenologia em Paul
Tillich. São Paulo: Paulus, 2004.
-JULIANO, Jean Clark. A arte de restaurar histórias: libertando o diálogo.
São Paulo: Summus, 1999.
51
-LANGER, Susane. Sentimento e forma. São Paulo: Editora Perspectiva,
1980.
-LISPECTOR, Clarice. Seleta. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio
Editora, 1975.
-MARTINI, Antonio. O provisório e o transcendente. In: Ribeiro, Jorge
Claudio. (ed.) O humano, lugar do sagrado. Sétima edição. São Paulo: Olho
d’água, 2002. p. 33-37.
-MAY, Rollo. Minha busca da Beleza. Petrópolis: Vozes, 1992.
-MOREIRA, Daniel Augusto. O Método Fenomenológico na pesquisa.
São Paulo: Thomson – Pioneira, 2002.
-OTTO, Rudolph. O Sagrado. Lisboa: Edições 70, 1992.
-PAIVA, Geraldo José et. al. Experiência religiosa e experiência estética
em artistas plásticos: perspectivas da psicologia da religião. Psicologia:
Reflexão e Crítica. v.17 n.2. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-
79722004000200010>. Acesso em: 8 out. 2008.
-POMPÉIA, João Augusto. Uma caracterização da psicoterapia. Revista
da Associação Brasileira de Daseinsanalyse. São Paulo, n.9, p. 19-30, 2002.
-ROMEIRO, Alexandre Anderson. Imaginação e Liberdade em Gaston
Bachelard. São Paulo, 2007. 50 p. Trabalho de conclusão de curso -
Faculdade de Psicologia, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
-TILLICH, Paul. A coragem de ser. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.