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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE41a PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE NATAL – RN
PROMOTORIA DE DEFESA DO MEIO AMBIENTE
Exma. Sra. Juíza de Direito Titular da 18ª Vara Cível desta Comarca de Natal/RN por privatividade
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO RIO GRANDE DO NORTE, pela sua 41ª
Promotoria de Justiça, em substituição legal, com atribuições junto a uma das Promotorias de
Justiça de Defesa do Meio Ambiente desta Comarca de Natal/RN, com fundamento nos art.
129, III, da Constituição Federal; no art. 84, III da Constituição Estadual; no art. 67, IV, d da
Lei Complementar Estadual n° 141 de 9 de fevereiro de 1996; art. 5°, caput da Lei 7.347 de 24
de julho de 1985, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, interpor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA
contra MARIA APARECIDA SOUZA PINTO DE ARAÚJO, CPF 138.899.314-72, ANA
LEILA PINTO NÓBREGA DE ARAÚJO, CPF 077.661.784-27, LILIANA PINTO
NÓBREGA DE ARAÚJO, CPF nº 029.670.944-12 e LUCIANO PINTO NÓBREGA DE
ARAÚJO, todos residentes e domiciliadas na Rua João do Vale, 03, Conjunto COOPHAB,
Emaús, Natal/RN, pelas razões fáticas e jurídicas adiante aduzidas.
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1. DOS FATOS
1.1. Por ocasião de vistoria conjunta da COVISA e do Ministério Público, no dia
28.2.11 (fls. 05/06), realizada em virtude de diversos relatos informais trazidos ao
conhecimento deste representante do Parquet - bem como da verificação in loco pelo mesmo,
em mais de uma ocasião -, foi constatada a ocorrência do uso indevido e habitual de um
terreno aberto de grandes dimensões situado na Rua Eleusis Magnus Lopes Cardoso com a Av.
do Sol, Candelária, como ponto de despejo de lixo domiciliar, entulho e resíduos de poda,
principalmente por carroceiros.
1.2 No intuito, pois, de identificar o proprietário do referido terreno e, bem assim,
chamá-lo à responsabilidade para com a necessária correção do apontado estado de
irregularidades do seu imóvel, foi instaurado o Procedimento Preparatório nº 151/2011,
posteriormente convertido no Inquérito Civil nº 07/11, que ora lastreia o presente pleito.
1.3 Inicialmente, foi requisitada à URBANA uma vistoria no terreno em questão
(fls. 07), para que se verificasse o seu estado de conservação/manutenção, ao que a referida
Companhia informou que o terreno se encontrava limpo, na ocasião da vistoria requisitada,
pois a própria URBANA estava realizando periodicamente a limpeza do referido imóvel
(fls. 08, 09 e 10).
1.4 Havendo, assim, a necessidade de identificar o proprietário do terreno em
questão para que o mesmo procedesse à limpeza, bem como ao fechamento do seu imóvel -
obrigação expressamente determinada pela legislação municipal -, foi realizada audiência
com a SEMURB e a URBANA (fls. 15) no intuito de obter tal identificação.
1.5 Inicialmente, a SEMURB informou que o imóvel em comento era de
propriedade do Município, razão pela qual foi proposta ao mesmo a celebração de um TAC, no
sentido do ente público promover a limpeza e o fechamento do terreno em questão. O ente
público não ser manifestou.
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Depreendendo-se, pois, o desinteresse do Município na solução da questão
posta, e, considerando o longo tempo que já perdura o estado de irregularidades relatado,
vislumbrou-se a necessidade da intervenção do Poder Judiciário para a correção do ilícito em
comento, situação.
1.6 Surgida, então, a necessidade de provocação do Judiciário, fez-se necessária, a
comprovação idônea acerca da propriedade do imóvel em questão, qual seja, através da
respectiva matrícula e registro imobiliário.
1.7 Foram, então, requisitadas aos Cartórios do 7º e 6º Ofício de Notas (fls. 26, 28,
40) informações a respeito do imóvel em questão.
O 6º Ofício de Notas apresentou a matrícula daquele (fls. 42 e ss), bem como
informou que, inicialmente, o referido terreno havia sido adquirido do Estado do Rio Grande
do Norte pelo Sr. Francisco Levi Nóbrega de Araújo. Posteriormente, porém, o respectivo ato
aquisitivo foi cancelado, em virtude de determinação judicial, emanada no âmbito de ação
promovida pela Petrobrás, na qual esta afirmava ser a proprietária do imóvel (fl. 41).
1.8 Diante de tal informação, foi realizada audiência com representante da Petrobrás
(fl. 53), ocasião na qual este afirmou que a empresa é a proprietária do terreno em questão,
esclarecendo que em relação a este imóvel chegou a ser promovida uma ação de usucapião
pelos demandados, herdeiros do Sr. Francisco Levi Nóbrega de Araújo, tendo sido julgada
improcedente pela Justiça Estadual e já transitado em julgado.
Confirmada, pois, em razão do apontado, a propriedade da Petrobrás, esta
ingressou com ação de reintegração de posse. Todavia, no âmbito desta, os referidos
herdeiros do Sr. Francisco Levi Nóbrega de Araújo, ora demandados, interpuseram
embargos de terceiro, tendo a Justiça reconhecido a posse em favos destes.
1.9 Uma vez sucumbente no referido pleito, a Petrobrás ingressou com a respectiva
ação rescisória, cujo mérito ainda está pendente de apreciação.
Portanto, até o presente momento, para todos os efeitos legais, os demandados
são os únicos detentores legítimos da posse do terreno em questão, sendo, por conseguinte,
inequívoca e exclusivamente, dos réus a responsabilidade pela conservação do referido
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imóvel e, bem assim, pelos ilícitos e danos provocados, direta ou indiretamente, pela omissão
daqueles.
1.10 Constatada, assim, com meios idôneos, a titularidade da posse do terreno em
questão, foram empreendidas várias diligências para localizar os demandados, para fins de
propor uma solução consensual para a correção do problema ora tratado.
Foram expedidas várias notificações aos réus (fls. 150 a 153, 157 a 160, 164 a
169 e 175 a 183), remetidas a endereços diversos, obtidos junto ao TRE e na ficha do imóvel
em questão constante na Secretaria Municipal de Tributação, diligenciando-se para a
efetivação daquelas em mais de uma oportunidade, tendo, todavia, restado frustradas tais
diligências, em todos os endereços informados até aquele momento, em razão da não
localização do endereço, da inexistência da numeração informada e, por último, em razão da
mudança dos demandados para endereço desconhecido.
1.11 Não obstante a pendência da localização dos réus, foi requisitado à URBANA
que informasse o montante das despesas operacionais suportadas pela Companhia com a
limpeza do terreno em questão, sendo por aquela informado o valor de R$ 92.674,56 (noventa
e dois mil, seiscentos e setenta e quatro reais e cinquenta e seis centavos), referente ao
período compreendido de janeiro a dezembro de 2011 (fls. 184 a 187).
1.12 Posteriormente, foi obtido outro endereço dos demandados (fls. 189 a 192).
Assim, finalmente, houve êxito na localização dos mesmos e feitas as devidas notificações para
comparecer à audiência de conciliação nesta 41ª Promotoria de Justiça (fls. 194 a 196).
Todavia, os demandados não compareceram à referida audiência, como
também não apresentaram qualquer justificativa para tanto, conforme certidão de fl. 197.
1.13 Depreende-se, assim, de forma clara, o desinteresse dos demandados em
diligenciar para a solução do problema, que vem sendo, pois, suportado pela coletividade e
pelo Poder Público.
1.14 Assim, tendo em vista a existência do dano ambiental – que ainda não foi
solucionado, apenas reduzido em face das ações empreendidas pela URBANA no terreno
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particular dos réus – bem com para prevenir outros impactos ambientais ainda maiores,
vem o Ministério Público, para resguardar direitos difusos ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, propor a presente ação civil pública.
2. DOS DANOS AMBIENTAIS PROVOCADOS PELOS RÉUS
2.1 Embora, infelizmente, seja comum nas grandes cidades a existência de lixões e
terrenos abandonados onde se acumula lixo, a conduta dos réus extrapolou os limites do
razoável, provocando uma situação de constante desequilíbrio ambiental nas imediações do
terreno em questão, sem falar nos riscos de danos à saúde da população ali residente, ainda não
avaliados, pela presença inevitável de insetos, roedores e outros vetores de doenças, atraídos
pelo lixo acumulado diariamente.
2.2 Com efeito, tal desequilíbrio se caracteriza como dano ambiental, porquanto se
insere no conceito de Impacto Ambiental, tido como o resultado da intervenção humana no
meio ambiente de modo que possa provocar, verbis:
“(...) qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e
biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de
matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou
indiretamente, afetam
I - saúde, a segurança e o bem estar da população;
II - as atividades sociais e econômicas;
III- a biota;
IV - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; e
V a qualidade dos recursos ambientais"1.
3. DA ATIVIDADE NOCIVA E O DIREITO MUNICIPAL
1 Resolução CONAMA 01/86.___________________________________________________________________________
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3.1 A atividade nociva ali praticada é vedada pela Lei Municipal n° 4.100, de 19
de junho de 1992 - Código do Meio Ambiente do Município de Natal , em face de seus
relevantes efeitos impactantes, verbis:
"Art. 6° - Para fins desta Lei, considera-se:
….........................................................................................................
III. poluição ambiental, a alteração dos agentes e fatores
ambientais, causada por qualquer forma de energia ou matéria que,
direta ou indiretamente:
a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;
d) afete as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; "
(grifos)
3.2. Além disso, o mesmo diploma legal é inciso, ao estabelecer que, verbis:
"Art. 14. E vedado o lançamento no meio ambiente de qualquer
forma de matéria, energia, substância ou mistura de substância,
em qualquer estado físico, prejudiciais ao ar atmosférico, ao solo,
ao subsolo, às águas, à fauna e à flora, ou que possam torná-lo:
I - impróprio, nocivo ou ofensivo à saúde e/ou ao bem-estar
público; e
II - danoso aos materiais, prejudicial ao uso, gozo e segurança da
propriedade, bem como ao funcionamento normal das atividades da
coletividade ".
(grifos)
3.3 Não menos importante a Lei Orgânica de Limpeza Urbana de Natal (Lei
Municipal n° 4.748/96), obriga os proprietários de terrenos não edificados a mantê-los
limpos e conservados, verbis:
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"Art. 39 - Todo o proprietário de terreno não edificado, com frente
para vias e logradouros públicos, é obrigado:
I — a mantê-lo capinado, drenado e em perfeito estado de limpeza;
II- a guardá-lo, fiscalizá-lo e evitar seja o mesmo usado como
depósito de lixo, de detritos e resíduos de qualquer natureza."
(grifos)
3.4 Buscando, inequivocamente, estabelecer a máxima eficiência da referida medida
preconizada pela Lei de Limpeza Pública, o Código de Obras de Natal (Lei Complementar
Municipal n° 55/04), obriga os proprietários de terrenos não edificados a murá-los, de modo a
mantê-los limpos e conservados, verbis:
Art. 101 - Os terrenos não edificados são obrigatoriamente
fechados no alinhamento das suas divisas com o logradouro
público, tendo seu fechamento altura mínima de um metro e oitenta
centímetros (1,80m).
Parágrafo único. O disposto no caput do artigo não se aplica aos
terrenos que estejam situados em Zonas Especiais ou áreas do
patrimônio público, hipótese em que são submetidos à legislação
própria.
(grifos)
4. DOS DIREITOS E GARANTIAS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS AO
MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO
4.1 A Carta Magna Brasileira, logo em seu artigo 1º traz o seguinte principio
fundamental constitucional:
"Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela
União indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito
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Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e
tem como fundamentos
….........................................................................................
III - a dignidade da pessoa humana" (grifos)
4.2 Por dignidade da pessoa humana, deve-se entender o respeito a seus
sentimentos, sua dor, prover a qualidade moral de sua existência, assegurar ao indivíduo que
seus direitos sejam respeitados, direitos estes que devem garantir sua hora e sua moral.
4.3 Obviamente, não se pode considerar digna a situação de um cidadão ou de um
grupo de pessoas que é forçado a conviver ao lado de um terreno com acúmulo de lixo, e,
consequentemente, com o constante mau cheiro, a presença de insetos e roedores, risco de
contaminação por doenças, risco de queimadas, etc.
4.4 Assim, em seu artigo 6º, a Constituição Federal do Brasil determina que o
cidadão tem direito à saúde e à segurança:
"art.6º - São direitos sociais a educação, a saúde, o
trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a
proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados, na forma desta Constituição" .
(grifos)
4.5 Além disso, a Constituição Federal, em seu art. 225 e seus respectivos incisos e
parágrafos, determina que todos têm direito ao meio ambiente equilibrado, impondo ainda ao
Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e de preservá-lo.
5. RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS AMBIENTAIS
5.1 Assim, ocorrendo este tipo de fato, deve ser invocado o Princípio da
Responsabilidade e recompor-se o meio ambiente atingido, não somente por se tratar de um
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patrimônio de todos, mas porque qualquer violação do Direito de alguém pela conduta ilícita
de outrem, implica na consequente obrigação de reparar.
5.2 Com efeito, a responsabilidade por danos ambientais é um dos temas mais
importantes para o Direito Ambiental e encontra albergue na própria Carta Política do país,
consubstanciando, basicamente, o Princípio do Poluidor Pagador (art. 225, § 3°).
5.3 E esta responsabilidade é sempre objetiva, ou seja, independente de culpa,
consoante as lições de Hely Lopes Meirelles, onde, em excepcional artigo de doutrina, afirma
que, verbis:
“(...) a responsabilidade do réuu na ação civil pública é
objetiva, pois independe de culpa no fato que a enseja (art.
14, §1º, da Lei 6.938/81), bastando que o autor demonstre
o nexo causal entre a conduta do réuu e a lesão ao meio
ambiente a ser protegido e indique o dispositivo legal
infringido”2.
5.4 De fato, aponta a Lei 6.938/81, também chamada de Lei da Política Nacional do
Meio Ambiente, que:
"art. 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela
legislação federal, estadual e municipal, o não
cumprimento das medidas necessárias à preservação ou
correção dos inconvenientes e danos causados pela
degradação da qualidade ambiental sujeitará os
transgressores:
..............................................................................................
§ 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas
neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da
existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos
causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua
atividade. O Ministério Público da União e dos Estados 2 Proteção ambiental e ação civil pública,RT, 611/11
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terá legitimidade para propor ação de responsabilidade
civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente."
(grifos)
5.5 Por derradeiro, é importante destacar, conforme lição de Edis Milaré, que, em
sede de dano ambiental, a responsabilidade objetiva tem as seguintes características:
prescindibilidade de culpa, irrelevância da licitude da atividade e inaplicabilidade das
excludentes3, o que, a toda evidência, estão presentes no caso em apreço.
3 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 2ª ed. São Paulo: RT, 2002. p. 434.___________________________________________________________________________
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6. DA ACUMULAÇÃO DOS PEDIDOS DE FAZER OU NÃO FAZER E DE
INDENIZAR
6.1 Esta Promotoria de Justiça, diante do grande acúmulo de demandas ambientais,
traduzidas como um verdadeiro pedido coletivo de socorro pela sociedade, em defesa do meio
ambiente, vem defendendo a tese de que a simples correção ou ajuste da conduta ilícita não
repara integralmente o dano ambiental provocado pelo infrator.
Diante do caso concreto, pode-se vislumbrar a existência do dano e sua
consequente reparação em três planos: a) abster-se de poluir (obrigação de não fazer); b)
reparar os danos patrimoniais provocados (obrigação de fazer); e c) indenizar os danos
extrapatrimoniais provocados (obrigação de dar), a curto, médio e longo prazo,
respectivamente.
6.2 A uma primeira leitura do art. 3º da Lei n° 7.347/85 e o art. 14, § I, da Lei n°
6938/81, porém, tal cumulação não seria possível, especialmente daquelas definidas na própria
Constituição Federal.
Assim, para esclarecer melhor o assunto, é importante divisar alguns
fundamentos constitucionais que dão suporte à defesa do meio ambiente ecologicamente
equilibrado, aqui deduzidos com base em apontamentos feitos pelo Ministério Público do
Estado do Rio Grande do Sul.
6.3 Deve-se analisar o tema inicialmente pela premissa de que o direito processual é
instrumental e dotado da necessária plasticidade, devendo ajustar-se às características do bem
de vida que se pretende tutelar, razão pelo qual a cumulação de pedidos em ação civil pública
ambiental não se deve ser descolada dos princípios norteadores do direito ambiental.
Três princípios merecem destaque: o da prevenção, o da máxima reparação do
dano ambiental e o do poluidor-pagador.
O princípio da prevenção é basilar em matéria ambiental, concernindo à
prioridade que deve ser dada às medidas que evitem o nascimento de atentados ao ambiente, de
molde a reduzir ou eliminar as causas de ações suscetíveis de alterar a sua qualidade. Os
objetivos do direito ambiental são basicamente preventivos. Sua atenção está voltada
basicamente para o momento anterior à consumação do dano - o do mero risco. Diante da
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pouca valia da simples reparação, sempre incerta e, quando possível, onerosa, a prevenção é a
melhor, quando não a única solução.
O princípio da máxima reparação ou da reparação integral do dano causado
ao meio ambiente traduz esse uma idéia que merece ser acolhida em toda a sua amplitude. Esse
princípio - haurido da teoria geral da responsabilidade civil - prega, em linhas gerais, que todos
os efeitos adversos provenientes da conduta lesiva devem ser objeto de reparação, para que ela
possa ser considerada completa. Estado o direito ao meio ambiente sadio e ecologicamente
equilibrado indiscutivelmente associado ao mais sagrado dos direitos do homem - o direito à
vida - impende, em matéria ambiental, que a reparação do dano se dê da forma mais completa
possível.
Por força desse importante princípio, é possível afirmar que, no direito
brasileiro, não há espaço para estabelecimento de limites máximos para indenizações (secção
vertical) nem para limitar as espécies de reparações (secção horizontal).
Por último, é importante igualmente destacar o princípio do poluidor-pagador,
segundo o qual os custos sociais externos que acompanham o processo produtivo devem ser
internalizados, ou seja, os agentes econômicos devem levá-los em conta ao elaborar os custos
da produção e, consequentemente, assumi-los.
A simples posse de um terreno, como aqui tratado, que é mantido sem utilização
pelos seus titulares, por mero interesse especulativo imobiliário, produz EXTERNALIDADES
NEGATIVAS, porque os impactos negativos (danos ao meio ambiente e à saúde humana) são
socializados pela coletividade, ao contrário do impacto positivo (valorização do imóvel), que é
individualizado somente pelo particular proprietário ou possuidor. Acrescente-se a isto o fato
de que os demandados, no presente caso, ainda vêm se beneficiando de não desembolsar
qualquer despesa com a limpeza do seu terreno, obrigação atribuída pela lei exclusivamente
àqueles, e, que no entanto, vem sendo suportada pela URBANA, em detrimento do erário e do
próprio serviço regular de limpeza pública.
Com a aplicação do princípio do poluidor-pagador, procura-se, pois, corrigir
este ônus imposto à sociedade, impondo-se a internalização dos custos com o impacto negativo
produzido pelo empreendimento ou atividade ao gerador ou degradador.
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6.4 Como visto anteriormente, a partir do conceito de impacto ambiental é que se
pode chegar ao conceito de dano ambiental, conforme José Rubens Morato Leite, para quem,
verbis:
"dano ambiental deve ser compreendido como toda lesão
intolerável causada por qualquer ação humana (culposa ou
não) ao meio ambiente, diretamente, como macrobem de
interesse da coletividade, em uma concepção totalizante, e
indiretamente, a terceiros, tendo em vista interesses
próprios e individualizáveis e que refletem no macrobem"4
Por esse motivo o dano ambiental sempre implicará em uma ruptura no
equilíbrio ecológico, podendo afetar exclusivamente os recursos naturais, quando, então, se
estará diante do chamado "dano ecológico puro", ou atingir bens ambientais que impliquem
lesão na qualidade de vida humana e outros valores agregados, tais como a propriedade
privada.
O dano ambiental assemelha-se ao lançamento de substâncias contaminantes no
meio ambiente como a queda de uma pedra na água, que provoca uma série de ondas que se
expandem, com efeitos imediatos e mediatos, muitas vezes de difícil previsão.
6.5 Em virtude deste caráter complexo do dano ambiental, a sua reparação deverá ser
sempre integral, buscando-se a completa recomposição do ecossistema degradado. Esse,
inclusive, o sentido do art. 225, § 3o, da Constituição Federal de 1988, combinado com o art.
14, § I, da Lei 6938/81.
A fim de reparar o dano ambiental, cumpre assinalar que a reparação in natura
da área degradada deverá ser buscada como a primeira alternativa, de sorte a possibilitar à
coletividade a fruição do bem ambiental perdido. Se todavia, a restauração natural não for de
todo em todo possível, encontrando-se diante de um dano irreversível, nem por isso a avaliação
técnico-cientifica poderá deixar de ser feita, quer na sua vertente de aferição da amplitude e
extensão do dano, quer na procura de soluções reparatórias. Esta última reduzir-se-á, contudo,
à constatação da irreversibilidade do prejuízo, concluindo por uma inevitável indenização
4 LEITE, J. R. Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial São Paulo: RT. 2000. p. 167.
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pecuniária ou por qualquer outro tipo de reparação alternativa, que não a reconstituição natural,
já excluída.
6.6 A indenização, contudo, não é apenas uma medida subsidiária, mas, cumulativa,
a partir de interpretação literal do art. 3º, da Lei 7347/85. É preciso, portanto, esclarecer o
suporte fático para cumulação dos pedidos, a fim de se observar o princípio da reparabilidade
integral do dano ambiental.
O dano ambiental reparável mediante prestações específicas, tais como o
replantio de espécies nativas, a descontaminação de corpos hídricos, a colocação de filtros e
sistemas de contenção de poluição, será reparado através de obrigações de fazer ou de não
fazer. Todavia, parte desse dano, muitas vezes, não tem como ser reparado in natura, como no
caso concreto. Como reparar o desconforto de noites não dormidas por problemas de doenças?
Como reparar o transtorno provocados por muriçocas, baratas e outros insetos e roedores?
É evidente que os réus tiraram proveito econômico dessa situação, pois mantêm
o terreno desocupado para especular com o crescimento da cidade e a inevitável valorização do
mesmo.
Até aí, não estariam agindo de forma ilícita.
Ocorre, porém, que os demandados não mantêm o terreno limpo e murado, ônus
do proprietário ou possuidor inerente ao obrigatório cumprimento da função socioambiental da
propriedade, e que é infinitamente menor do que o proveito econômico que pode ser obtido
com a futura utilização do imóvel.
6.7 Na esteira desse raciocínio, deve-se apontar que a Lei n° 8.844/94 (denominada
Lei Antitruste) alterou o artigo 1º da Lei n° 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), de molde a
propiciar a responsabilidade pelos danos morais ou extrapatrimoniais coletivos, esmiuçando e
tornando concreta uma previsão outrora albergada pela Constituição Federal.
Trata-se da consagração, em nosso ordenamento jurídico, da reparação de toda e
qualquer espécie de dano coletivo, no que toca a sua extensão, como aponta José Rubens
Morato Leite, para o qual, verbis:
"Essa fundamentação legal faz surgir um dano
extrapatrimonial ambiental sem culpa, em que o agente
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estará sujeito a reparar a lesão por risco de sua atividade e
não pelo critério subjetivo ou da culpa. Ademais, conforme
já reportado, o valor pecuniário desta indenização será
recolhido ao fundo para recuperação dos bens lesados de
caráter coletivo. A lei não especifica, mas é inquestionável
a possibilidade de cumulação do dano patrimonial e
extrapatrimonial"5
O reconhecimento da dimensão moral ou extrapatrimonial do dano ambiental
difuso é defendido pela doutrina e desenvolvido a partir das alterações introduzidas pela Lei
8.884/94 no sistema da ação civil pública, que passa a admitir ações de responsabilidade por
danos morais e patrimoniais causados, bem como a partir da construção pretoriana que admite
a reparação de danos morais impostos a pessoas jurídicas.
Com a aceitação de que a proteção dos valores morais não está restrita aos
valores morais individuais da pessoa física, tem-se o primeiro passo para que se admita a
reparabilidade do dano moral em face da coletividade que, apesar de ente despersonalizado,
possui valores morais e um patrimônio ideal que merece proteção.
No caso do dano ecológico, a primeira premissa é perceber que este dano não
consiste apenas e tão-somente na lesão ao equilíbrio ecológico, afetando igualmente outros
valores precípuos da coletividade a ele ligados, a saber: a qualidade de vida e a saúde. Estes
valores estão intimamente inter-relacionados, de modo que a agressão ao ambiente afeta
diretamente a saúde e qualidade de vida da comunidade. Portanto, as lesões a direitos difusos e
coletivos também poderão produzir danos morais, pois qualquer abalo no patrimônio moral da
coletividade também merece reparação.
6.8 A cumulação de pedidos aqui defendida é acolhida pelo Tribunal de Justiça do
Rio Grande do Sul, nos seguintes termos:
"AÇÃO CIVIL PÚBLICA. USO DE PRAÇA. PEDIDOS
CUMULADOS. ART. 3o, DA LEI 7347/85. PAGAR OU FAZER. A
conjunção 'ou' não é simplesmente exclusiva, pois há de se ver na
5 LEITE. José Rubens Morato. op. cit. p. 286.___________________________________________________________________________
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norma possibilidade de cumulação objetiva de ações, por fatos-
fundamentos diversos, como inclusive pedido eventual em ordem
sucessiva (AI 592088082), 1ªa Câmara Cível, Rel. Des. Milton dos
Santos Martins, j. 22.09.92).
"APELAÇÃO CÍVEL. REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO CIVIL
PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. SÍTIO ARQUEOLÓGICO.
RETIRADA DE AREIA. Demonstrados nos autos os danos causados
em decorrência do proceder da demandado e da falia de
fiscalização do Município, impunha-se a procedência da ação. A
perícia atesta danos irreversíveis, de modo que é cabível a
restauração do que for possível mais a indenização dos danos.
Apelação improvida. Sentença confirmada em reexame.” (AP
70000687921, Capão da Canoa – 1ª Câmara Especial Cível, Rel.
Des. Adão Sérgio do Nascimento Cassiano, j. 20;06.01).
Em aresto versando sobre demanda reparar prejuízos causados à Mata Atlântica, o E.
Tribunal de Justiça Paulista decidiu, litteris:
“INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL – ATO ILÍCITO –
DANO CAUSADO POR DESMATAMENTO DA MATA NATURAL
ATLÂNTICA EM PROPRIEDADE PARTICULAR -
COMPROVAÇÃO EFETIVA DO DANO ECOLÓGICO - ART. 186,
II, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA - VERBA A SER FIXADA
NA FASE DE LIQUIDAÇÃO, POR ARBITRAMENTO SENTENÇA
CONFIRMADA - RECURSO NÃO PROVIDO. A obrigação de
recompor em parte área desmaiada não exclui a obrigação de
indenizar os irreversíveis danos ambientais. Agredindo-a, embora
em seu próprio domínio rural, o réu fica sujeito à intervenção do
Estado para a devida recomposição do dano que causou " (TJSP –
3ª Câm. Cível - Ap. Cível n° 200.388-1 -j. em 7.12.1993 - JTJ'-
LEX153/123).
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6.9 Verifica-se do exposto a tendência crescente de materialização dos princípios da
máxima reparação do dano ambiental, da prevenção e do poluidor-pagador, privilegiando-se a
coletividade frente ao poluidor que deixa de ser beneficiado com o perdão de reparar somente
parte do dano causado ao meio ambiente.
É a hipótese dos autos, na qual os réus, com deliberada omissão, deram
causa à degradação ambiental e a todos os transtornos acima referidos, que podem e
devem ser aferidos a título de reparação às pessoas prejudicadas.
6.10 Portanto, em que pese as redações dos art. 14, § Io, da Lei da Política Nacional
do Meio Ambiente (Lei 6.938/81) e do art. 3o da Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/85),
ambas empregando a conjunção alternativa “ou”, em vez da conjunção aditiva “e”, é possível a
cumulação dos pedidos de indenização pelos danos materiais provocados ao meio ambiente e a
reparação pelos danos morais, à luz dos princípios já invocados, mercê de uma exegese
sistemática e teleológica, conduzida à máxima efetivação da tutela do meio ambiente hígido,
enquanto direito fundamental da pessoa humana.
Mesmo a interpretação gramatical, sem dúvida alguma a mais pobre de todas,
conduz à admissão da cumulatividade, quando se tem em conta que o art. 4º, VII, da Lei n°
6.938/81, ao aludir a um dos objetivos da Política Nacional do Meio Ambiente, utiliza ambas
as conjunções acima referidas - e/ou - em dispositivo que hospeda os princípios do poluidor-
pagador e do usuário-pagador.
Assim, resumidamente, é cabível a cumulação de obrigações de fazer com
indenização em duas hipóteses quando houver:
a) danos reversíveis associados a danos irreversíveis ao meio
ambiente ou quando a causa de pedir fundar-se em fato-fundamento
diverso, os quais deverão, nessa hipótese, também ser reparados
mediante indenização, em razão dos princípios do poluidor-
pagador, da reparabilidade integral do dano ambiental e da
prevenção, bem como do caráter de fundamentalidade do direito ao
meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado.
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b) houver lesão à qualidade de vida e outros valores significativos
para determinada coletividade.
Deve ser priorizada a reparação do dano ambiental in natura frente à
indenização, admitindo-se, porém, a cumulação quando configurados os pressupostos
alinhados nas conclusões anteriores, como se configura o caso concreto aqui deduzido.
7. DO PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA
7.1 Isto posto, demonstrado o fumus boni iuris, através de farta documentação
acostada aos autos e os fundamentos jurídicos acima expostos, além de estar configurado o
periculum in mora, pela urgência caracterizada pelos constantes danos provocados aos
vizinhos do terreno de propriedade dos réus, impossibilitando aos primeiros qualquer defesa
contra a proliferação do lixo, de forma irreversível e irreparável.
Além de tudo isso, é importante que o Poder Judiciário dê respostas rápidas e
adequadas à crescente degradação ambiental verificada, tornando-se imperiosa a sua imediata
intervenção para preservar o meio ambiente, profundamente agredido pelo descaso e a
deliberada omissão dos demandados.
7.2 Portanto, ante a verossimilhança do direito e do risco de dano irreparável ou
difícil reparação, REQUER o Ministério Público a concessão initio litis da Tutela Antecipada,
com base no art. 273 do CPC, no sentido de que seja determinado aos réus que providenciem a
limpeza e que murem o terreno aqui tratado, conservando-o limpo, em face dos danos
ambientais provocados pela suas condutas negligentes, sob pena de multa por
descumprimento dessas medidas.
7.3 Requer, ainda, a designação à Urbana, no prazo de 30 dias, para que faça uma
vistoria no terreno aqui tratado, com o objetivo de verificar o cumprimento da tutela antecipada
acima requerida, que espera seja deferida.
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8. DOS DEMAIS PEDIDOS
Requer ainda o Ministério Público, ao final da ação, a confirmação da tutela
liminar e a procedência dos pedidos adiante arrolados com a:
a) a condenação dos réus em uma obrigação de dar, a título de
indenização pelo passivo ambiental gerado por sua conduta ilícita,
em face da impossibilidade de se reparar in natura e de forma
integral o meio ambiente, cujo montante deverá ser fixado por
perícia técnica, considerando a extensão e gravidade do dano,
incluindo aí as despesas já efetuadas pela Urbana para a limpeza do
terreno;
b) a citação dos réus para responder aos termos da presente ação, no
prazo legal, sob pena de revelia;
c) a produção de todas as provas admitidas em direito, como
documentos, depoimento pessoal, sob pena de confissão, oitiva de
testemunhas, realização de perícias e inspeções judiciais;
d) a publicação da liminar - que confia seja concedida - nos jornais
de grande circulação da cidade, às expensas dos réus, haja vista o
grande efeito pedagógico e preventivo que esta medida certamente
irá proporcionar na defesa do meio ambiente;
e) a publicação de edital no Diário Oficial, sobre o teor deste pedido,
na forma do art. 94 da Lei 8.078/90 (CDC), a fim de que os
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interessados possam intervir no processo como litisconsortes, sem
prejuízo de ampla divulgação pelos meios de comunicação social
por parte dos órgãos de defesa do consumidor; ao final, seja julgada
procedente a presente ação em todos os seus termos, condenando-se
os requeridos no ônus da sucumbência e demais cominações legais;
e
f) a condenação dos réus ao pagamento de custas e demais
despesas judiciais, inclusive, honorários de peritos.
Dá-se o valor da causa a quantia de R$ 1.000,00 (hum mil reais) para efeitos
legais.
Pede deferimento,
Natal, 10 de Agosto de 2011
JOÃO BATISTA MACHADO BARBOSA
Promotor de Justiça
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