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INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 152 – DEZEMBRO/2015 15 EVOLUÇÃO DOS SISTEMAS DE CULTIVO DE MILHO NO BRASIL Aildson Pereira Duarte 1 Claudinei Kappes 2 Abreviações: EUA = Estados Unidos; K = potássio; N = nitrogênio. 1 Engenheiro Agrônomo, Dr., Pesquisador Científico, Instituto Agronômico, Campinas, SP; e-mail: [email protected] 2 Engenheiro Agrônomo, Dr., Pesquisador, Fundação MT, Rondonópolis, MT; e-mail: [email protected] INTRODUÇÃO A competitividade da agricultura brasileira no cenário mundial depende, principalmente, da produtividade e da lucratividade das culturas em relação aos prin- cipais produtores mundiais. Embora a participação efetiva do Brasil no mercado internacional de milho seja recente – as exportações anuais atingiram pelo menos 20 milhões de toneladas a partir de 2012 –, o país poderá se consolidar como importante fornecedor mundial deste cereal. Neste artigo, são abordados os principais fatores limitantes para a cultura de milho e a evolução dos siste- mas de cultivo, os quais têm possibilitado aumentos crescentes de produtividade e assegurado renda aos agricultores. O BRASIL NO CENÁRIO MUNDIAL O Brasil é o terceiro maior produtor mundial de milho, sendo suplantado apenas pelos Estados Unidos (EUA) e pela China, que produzem 350 e 220 milhões de toneladas de grãos, respectivamente. O país diferencia-se por produzir duas safras ao ano sem o uso de irrigação, com produção total na última safra (2014/15) de 85 milhões de toneladas, sendo a segunda safra (54,7 milhões de toneladas) superior à primeira (30,7 milhões de toneladas), como ocorre desde 2012, quando a segunda safra se tornou a mais expressiva. A área total de milho na safra 2014/15 atingiu 15,8 milhões de hectares, sendo 6,2 e 9,6 milhões na primeira e na segunda safra, respectivamente (CONAB, 2015). No entanto, a produtividade média nacional ainda é próxima de 5 t ha -1 , muito inferior à de 10 t ha -1 obtida nos EUA. Ao selecionar regiões pro- dutoras específicas, verifica-se que a produtividade triplicou nos últimos 30 anos, atingindo valores iguais ou superiores a 7,0 t ha -1 e 5,0 t ha -1 na primeira e na segunda safra, respectivamente. Ressalte-se que esses valores não refletem o excelente nível tecnológico alcançado por parte dos produtores, os quais têm obtido produtividades acima de 12 t ha -1 e 8 t ha -1 na primeira e na segunda safra, respectivamente, pois as médias são atingidas em ambientes muito diversos e em diferentes épocas de semeadura e sistemas de cultivo. FATORES CLIMÁTICOS LIMITANTES À CULTURA O clima tropical e subtropical geralmente não favorece a expressão máxima do potencial genético da cultura de milho em decorrência, principalmente, das elevadas temperaturas noturnas e poucas horas de insolação direta. Além disso, ocorrem veranicos, provocando estresses hídricos e, na safra de verão, também estresse térmico (elevadas temperaturas). Na região sudoeste do estado de São Paulo, em baixa alti- tude, as temperaturas mínimas e máximas diárias atingem picos de 20 °C a 30 °C, respectivamente, nos meses de novembro a março (Figura 1A). No norte do Mato Grosso, a temperatura máxima é elevada o ano inteiro, especialmente nos meses de agosto e setembro, com valores superiores a 35 °C (Figura 1B). Nas duas regiões, as tempera- turas mínimas são mais amenas nos meses de maio, junho e julho, mas cerca de 5 °C mais baixas em São Paulo, comparado ao Mato Grosso. A série histórica do Instituto Agronômico (IAC), Campinas, SP, indica que o valor das maiores médias diárias de luz solar é de aproximadamente 7,5 horas por dia, em abril, julho e agosto, enquanto o das menores médias é de 6,0 horas por dia, em dezem- bro e janeiro (Figura 2). A menor insolação direta ocorre no verão devido à elevada nebulosidade e a duração dos dias mais longos do ano ser de apenas 13,4 horas. Ao contrário, na região do Corn Belt americano, a média diária de insolação é superior a 8 horas nos meses de maio a agosto, atingindo 10 horas no mês de julho, quando ocorre a duração máxima do dia, de aproximadamente 15 horas. As chuvas, por sua vez, são concentradas no período de verão no Mato Grosso, onde o inverno é seco, e melhor distribuídas ao longo do ano no sudoeste de São Paulo, região de transição climática para inverno úmido, típico do sul do país. EVOLUÇÃO DOS SISTEMAS DE CULTIVO E INCREMENTO DE PRODUTIVIDADE O advento e a tecnificação do milho safrinha foram responsá- veis pela grande transformação da cultura de milho no Brasil. Houve mudança espacial, com o avanço da cultura para o Centro-Oeste e recentemente para os chapadões do Maranhão, Piauí e Tocantins, com perda de área em regiões tradicionais de cultivo de milho, especial- mente em regiões de baixa altitude (Paraná e São Paulo), e temporal, com a maior parte da área de milho verão sendo substituída pela de soja, passando a ser cultivado preferencialmente na segunda safra em sucessão a esta leguminosa. Esse sistema teve grande aceitação a partir da consolidação do plantio direto (Figura 3), por proporcionar redução do tempo entre a colheita da soja e a semeadura do milho. A área da segunda safra poderá aumentar ainda mais, por exemplo, no estado do Mato Grosso, onde apenas 3,4 milhões de hectares, dos 8,9 milhões de hectares, foram cultivados com milho em sua sucessão, ou seja, 37% da área de soja (CONAB, 2015).

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Page 1: EVOLUÇÃO DOS SISTEMAS DE CULTIVO DE MILHO NO BRASIL · modalidade de cultivo. A partir do início da década de 1990 foram desenvolvidas tecnologias apropriadas para o cultivo do

INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 152 – DEZEMBRO/2015 15

EVOLUÇÃO DOS SISTEMAS DE CULTIVO DE MILHO NO BRASIL

Aildson Pereira Duarte1

Claudinei Kappes2

Abreviações: EUA = Estados Unidos; K = potássio; N = nitrogênio.

1 Engenheiro Agrônomo, Dr., Pesquisador Científico, Instituto Agronômico, Campinas, SP; e-mail: [email protected] Engenheiro Agrônomo, Dr., Pesquisador, Fundação MT, Rondonópolis, MT; e-mail: [email protected]

INTRODUÇÃO

A competitividade da agricultura brasileira no cenário mundial depende, principalmente, da produtividade e da lucratividade das culturas em relação aos prin-

cipais produtores mundiais. Embora a participação efetiva do Brasil no mercado internacional de milho seja recente – as exportações anuais atingiram pelo menos 20 milhões de toneladas a partir de 2012 –, o país poderá se consolidar como importante fornecedor mundial deste cereal. Neste artigo, são abordados os principais fatores limitantes para a cultura de milho e a evolução dos siste-mas de cultivo, os quais têm possibilitado aumentos crescentes de produtividade e assegurado renda aos agricultores.

O BRASIL NO CENÁRIO MUNDIALO Brasil é o terceiro maior produtor mundial de milho,

sendo suplantado apenas pelos Estados Unidos (EUA) e pela China, que produzem 350 e 220 milhões de toneladas de grãos, respectivamente. O país diferencia-se por produzir duas safras ao ano sem o uso de irrigação, com produção total na última safra (2014/15) de 85 milhões de toneladas, sendo a segunda safra (54,7 milhões de toneladas) superior à primeira (30,7 milhões de toneladas), como ocorre desde 2012, quando a segunda safra se tornou a mais expressiva. A área total de milho na safra 2014/15 atingiu 15,8 milhões de hectares, sendo 6,2 e 9,6 milhões na primeira e na segunda safra, respectivamente (CONAB, 2015). No entanto, a produtividade média nacional ainda é próxima de 5 t ha-1, muito inferior à de 10 t ha-1 obtida nos EUA. Ao selecionar regiões pro-dutoras específicas, verifica-se que a produtividade triplicou nos últimos 30 anos, atingindo valores iguais ou superiores a 7,0 t ha-1 e 5,0 t ha-1 na primeira e na segunda safra, respectivamente. Ressalte-se que esses valores não refletem o excelente nível tecnológico alcançado por parte dos produtores, os quais têm obtido produtividades acima de 12 t ha-1 e 8 t ha-1 na primeira e na segunda safra, respectivamente, pois as médias são atingidas em ambientes muito diversos e em diferentes épocas de semeadura e sistemas de cultivo.

FATORES CLIMÁTICOS LIMITANTES À CULTURA

O clima tropical e subtropical geralmente não favorece a expressão máxima do potencial genético da cultura de milho em decorrência, principalmente, das elevadas temperaturas noturnas e poucas horas de insolação direta. Além disso, ocorrem veranicos,

provocando estresses hídricos e, na safra de verão, também estresse térmico (elevadas temperaturas).

Na região sudoeste do estado de São Paulo, em baixa alti-tude, as temperaturas mínimas e máximas diárias atingem picos de 20 °C a 30 °C, respectivamente, nos meses de novembro a março (Figura 1A). No norte do Mato Grosso, a temperatura máxima é elevada o ano inteiro, especialmente nos meses de agosto e setembro, com valores superiores a 35 °C (Figura 1B). Nas duas regiões, as tempera-turas mínimas são mais amenas nos meses de maio, junho e julho, mas cerca de 5 °C mais baixas em São Paulo, comparado ao Mato Grosso.

A série histórica do Instituto Agronômico (IAC), Campinas, SP, indica que o valor das maiores médias diárias de luz solar é de aproximadamente 7,5 horas por dia, em abril, julho e agosto, enquanto o das menores médias é de 6,0 horas por dia, em dezem-bro e janeiro (Figura 2). A menor insolação direta ocorre no verão devido à elevada nebulosidade e a duração dos dias mais longos do ano ser de apenas 13,4 horas. Ao contrário, na região do Corn Belt americano, a média diária de insolação é superior a 8 horas nos meses de maio a agosto, atingindo 10 horas no mês de julho, quando ocorre a duração máxima do dia, de aproximadamente 15 horas. As chuvas, por sua vez, são concentradas no período de verão no Mato Grosso, onde o inverno é seco, e melhor distribuídas ao longo do ano no sudoeste de São Paulo, região de transição climática para inverno úmido, típico do sul do país.

EVOLUÇÃO DOS SISTEMAS DE CULTIVO E INCREMENTO DE PRODUTIVIDADE

O advento e a tecnificação do milho safrinha foram responsá-veis pela grande transformação da cultura de milho no Brasil. Houve mudança espacial, com o avanço da cultura para o Centro-Oeste e recentemente para os chapadões do Maranhão, Piauí e Tocantins, com perda de área em regiões tradicionais de cultivo de milho, especial-mente em regiões de baixa altitude (Paraná e São Paulo), e temporal, com a maior parte da área de milho verão sendo substituída pela de soja, passando a ser cultivado preferencialmente na segunda safra em sucessão a esta leguminosa. Esse sistema teve grande aceitação a partir da consolidação do plantio direto (Figura 3), por proporcionar redução do tempo entre a colheita da soja e a semeadura do milho. A área da segunda safra poderá aumentar ainda mais, por exemplo, no estado do Mato Grosso, onde apenas 3,4 milhões de hectares, dos 8,9 milhões de hectares, foram cultivados com milho em sua sucessão, ou seja, 37% da área de soja (CONAB, 2015).

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Figura 1. Média diária da precipitação pluvial e das temperaturas mínimas e máximas em 1Assis, SP (A), no período de 1988 a 2014 (27 anos), e em 2Sorriso, MT (B), no período de 2005 a 2014 (10 anos), na sequência de julho a junho.

Fonte: 1Instituto Agronômico (IAC); 2Somar Meteorologia.

A boa remuneração da cultura da soja e a oferta de milho o ano todo, reduzindo a sazonalidade dos preços durante o ano, inviabilizou a produção comercial de milho em lavouras de baixa produtividade na safra de verão, as quais ainda persistem apenas

Figura 3. Semeadura direta de milho sobre a palha de soja.

para consumo dos grãos na propriedade. Assim, o milho verão ficou concentrado em regiões de elevada altitude, onde as temperaturas noturnas são mais amenas e o estresse hídrico/térmico é menos frequente, e com ênfase na rotação com a soja. A semeadura foi antecipada para o mês de setembro ou início de outubro, a partir do início e estabilização das chuvas, possibilitando que os estádios iniciais de desenvolvimento das plantas ocorressem sob temperatu-ras mais amenas e que o início do enchimento dos grãos ocorresse antes do período de grande nebulosidade. Nessas condições, têm sido obtidas as maiores médias de produtividade brasileiras, mas ainda inferiores a 300 sc ha-1, que é o padrão superior americano.

Nota-se que o aumento na produtividade de milho na pri-meira safra (Figura 4) ocorre pela concentração da produção em regiões e épocas mais favoráveis e também pelo lançamento de cultivares de alto potencial produtivo e modernização das práticas culturais, destacando-se o adensamento populacional (de pelo menos 65 mil plantas por hectare), o aumento das doses na aduba-ção, especialmente da nitrogenada, a melhoria na uniformidade de distribuição das sementes e a proteção efetiva das plantas contra pragas e doenças, incluindo a tecnologia transgênica Bt e os fun-gicidas, respectivamente.

Figura 2. Número médio de horas de insolação direta por mês (janeiro a dezembro) em 1Moline, IL, EUA (41° 30' N), no período de 1943 a 1987 (45 anos), e em 2Campinas, SP (22º 54' S), no período de 1775 a 2006 (32 anos).

Fonte: 1GCMD; 2Banco de Dados do Instituto Agronômico (IAC).

A

B

Figura 4. Produtividade média de milho na primeira e segunda safras nas regiões do cerrado (Goiás e Mato Grosso) e tradicional de cultivo de milho (Paraná, São Paulo e Mato Grosso do Sul) no período de 1984 a 2015.

Fonte: CONAB (2015).

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Já o aumento da produtividade do milho safrinha (segunda safra em sucessão à soja, e sem irrigação) decorre de fatores mais complexos, pois a cultura é desenvolvida em ambientes com elevada frequência de estresse hídrico e, ao sul do paralelo 22, com estresse pelo frio, incluindo geadas (DUARTE, 2004). Acrescenta-se que há 30 anos os agricultores pioneiros utilizavam a semente como único insumo, e mesmo assim de cultivares poucos adaptados a esta modalidade de cultivo. A partir do início da década de 1990 foram desenvolvidas tecnologias apropriadas para o cultivo do milho safrinha, quando o IAC implantou a primeira rede de pesquisa dire-cionada a ele, destacando-se: lançamento e/ou posicionamento de cultivares adaptados para cultivo outono-inverno e com resistência a doenças, antecipação da época de semeadura, adoção do sistema plantio direto e manejo adequado da adubação.

O aumento mais expressivo na produtividade do milho safrinha ocorreu a partir do início deste século (Figura 4 e Figura 5), devido, principalmente, à antecipação da colheita da soja e, conse-quentemente, da semeadura do milho safrinha. Isso ocorreu com o aparecimento da ferrugem asiática da soja no Brasil na safra 2001/02 e com a demanda urgente e imperiosa por cultivares de ciclo mais curto para semear mais cedo.

rendimento operacional contribuiu para antecipar a semeadura do milho safrinha, principalmente neste estado.

CUSTO DE PRODUÇÃO DO MILHO SAFRINHA

O custo de produção do milho safrinha é geralmente menor do que o do milho verão, principalmente devido à economia na adu-bação nitrogenada, que é suprida parcialmente pelo nitrogênio (N) dos restos culturais da soja. No entanto, a demanda de adubação tem aumentado com a melhoria da produtividade, e a referida economia deverá se tornar relativamente menor, para evitar a deficiência de N no sistema de sucessão soja-milho safrinha. Para o estado de Mato Grosso, estima-se que os custos de produção, considerando apenas os custos variáveis – sem computar depreciação de máquinas, custo da terra, remuneração do capital e impostos –, estão próximos a R$ 1.309,79 e R$ 1.451,62, com o emprego de média e alta tecno-logia, respectivamente, sendo que os fertilizantes representam cerca de 40% dos custos, independentemente do nível tecnológico (Tabe- la 1). Para o sudoeste do estado de São Paulo, os custos de produção estimados, considerando também apenas os custos variáveis, são de R$ 1.217,00 e R$ 1.629,80, sendo que os fertilizantes correspon-dem a 32% e 38% do custo total, com a utilização de média e alta tecnologia, respectivamente. Confirma-se que um dos diferenciais do milho safrinha, em relação à safra de verão no Brasil e nos EUA, é o baixo gasto com fertilizantes quando se utiliza média tecnologia, a qual ainda é empregada pela maioria dos produtores. O preço do adubo nitrogenado, que era relativamente baixo nos EUA, agora está em patamar próximo ao do Brasil, ou seja, são necessários cerca de 10 kg de grãos para comprar 1 kg de N.

FATORES CRÍTICOS NOS SISTEMAS DE CULTIVO

Diante da realidade do clima e das grandes transformações ocorridas nos últimos anos na agricultura brasileira, questiona-se quais seriam os fatores críticos que poderiam ser melhorados, prioritariamente, visando aumentar a produtividade da cultura de milho e a lucratividade do agricultor. A questão de logística para o escoamento da produção no Brasil Central é recorrente, pois é onde se encontra o maior ponto de estrangulamento relativo à exportação, bem como a maior oportunidade de inserção do país no mercado internacional de milho visando aumentar as vendas antecipadas e a pré-fixação do preço, a exemplo da soja, fatores que diminuem as incertezas sobre o valor do milho a cada safra.

Quanto aos sistemas de cultivo, dois fatores merecem grande atenção: a uniformidade de desenvolvimento das plantas e a adubação de arranque. As lavouras norte-americanas se destacam em relação às brasileiras por apresentarem, além da maior dispo-nibilidade diária de luz e uso de irrigação nas regiões com maior

Figura 5. Evolução na área e na produtividade média de milho segunda safra no Mato Grosso.

Fonte: CONAB (2015).

Figura 6. Ilustração hipotética do deslocamento da época de semeadura da soja e do milho safrinha no Mato Grosso. Fonte: Adaptada de Kappes (2013).

Em Mato Grosso, tem aumentado a preferência por cultivares de soja de hábito de crescimento tipo indeterminado para semear no final de setembro, embora a grande maioria das cultivares ofertada no mercado seja do tipo determinado. A antecipação da época de semeadura da soja ao longo do tempo, desde novembro até setembro, é ilustrada na Figura 6. Acres-centa-se que o emprego de implementos agrícolas com elevado

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Tabela 1. Estimativas do custo de produção do milho safrinha nos sistemas de produção com média e alta tecnologia no estado do Mato Grosso1 e na região paulista do Médio Paranapanema2 (média dos anos 2014 e 2015).

EstadoInsumos

Serviços3 TotalSementes Fertilizantes Defensivos

Média tecnologia (produtividade esperada: 5 t ha-1)

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - (R$/ha) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

Mato Grosso 289,11 518,09 365,28 137,31 1.309,79São Paulo 225,00 386,00 198,00 408,00 1.217,00

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - (% do custo total) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

Mato Grosso 22,1 39,6 27,7 10,5 100,0São Paulo 18,5 31,7 16,3 33,5 100,0

Alta tecnologia (produtividade esperada: 7 t ha-1)

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - (R$/ha) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -Mato Grosso 374,39 614,68 321,23 141,33 1.451,62

São Paulo 306,00 626,00 243,00 454,80 1.629,80- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - (% do custo total) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

Mato Grosso 26,1 42,3 21,9 9,8 100,0São Paulo 18,8 38,4 14,9 27,9 100,0

Fonte: 1IMEA (2015) e 2Pecchio (2015).3 Despesas com operação de máquinas e mão de obra.

ocorrência de seca, maior uniformidade das espigas. No Brasil, é comum o arranque inicial pouco vigoroso e a presença de plantas sem espigas (“dominadas”) e/ou espigas pequenas ou mal formadas (grãos ausentes ou leves na ponta do sabugo).

A desuniformidade ocorre desde a emergência das plantas, mesmo quando são utilizadas sementes com elevado vigor e tratadas contra pragas de solo (Figura 7). Quanto mais rápida e uniforme a emergência, menor o tempo no qual as plântulas ficam expostas às pragas e aos patógenos. Além disso, o trânsito de colhedoras em solo muito úmido compacta as faixas de solo, e a deficiência na regulagem do picador de palha causa distribuição desuniforme dos restos culturais. Esses fatores levam à desuniformidade na pro-fundidade de semeadura; logo, em uma mesma área, as sementes são depositadas tanto em sulcos rasos como em muito profundos, podendo ou não aderir ao solo. Outra possível causa é o manejo inadequado da adubação, o que dificulta o arranque vigoroso de todas as plantas, por exemplo, devido ao efeito salino da adubação com potássio (K) no sulco ou à deficiência de N quando toda a adubação é aplicada a lanço, principalmente depois da emergência das plantas, como ocorre no Mato Grosso.

É importante mencionar que muitas áreas são cultivadas continuamente sob sistema de sucessão soja-milho safrinha há mais de dez anos, e a ausência de rotação de culturas e o amplo escalonamento da semeadura ao longo do ano têm agravado os problemas de plantas daninhas, pragas e doenças nas lavouras. A “ponte verde” entre lavouras aumenta o potencial de inóculo dos patógenos e possibilita inúmeros ciclos de pragas, aumentando os custos com o manejo fitossanitário, ao contrário do que ocorre nos países de clima temperado, nos quais a estação de cultivo é definida e existe interrupção do ciclo biológico pelo frio extremo.

Assim, o aumento da competitividade brasileira na produção de milho depende, além de medidas estruturais, da continuidade do aperfeiçoamento das práticas de manejo. Os sistemas de cultivo de milho têm evoluído muito, maximizando o aproveitamento do ambiente e aumentando a lucratividade de exploração da terra, mas ainda existem grandes diferenças na produtividade entre lavouras den-tro de uma mesma região, tanto na primeira como na segunda safra.

Figura 7. Emergência desuniforme de plantas na linha de semeadura.

REFERÊNCIASCONAB. Companhia Nacional de Abastecimento. Acompanhamento da safra brasileira de grãos, v. 2 – safra 2014/15 – n.12: Décimo segundo levantamento, set. 2015. Brasília, 2015. 134 p.

DUARTE, A. P. Milho safrinha: Características e sistemas de produção. In: GAL-VãO, J. C. C.; MIRANDA, G. V. (Ed.). Tecnologias de produção de milho. Viçosa: Editora UFV, 2004. p. 109-138.

IMEA. Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária. Custo de produção de soja e de milho – safras: Mato Grosso. Cuiabá, 2015. Disponível em: <http://www.imea.com.br>. Acesso em: 05 nov. 2015.

KAPPES, C. Sistemas de cultivo de milho safrinha no Mato Grosso. In: SEMINÁRIO NACIONAL DE MILHO SAFRINHA, 12., 2013. Anais... Dourados: Embrapa/UFGD, 2013. p. 1-21. CD-ROM

GCMD. Global Change Master Directory. Historical sunshine and cloud data in the united States. Disponível em: <http://gcmd.nasa.gov/records>. Acesso em: 05 nov. 2015.

PECCHIO, M. S. Sistemas de produção do milho safrinha no Médio Vale Paranapa-nema, estado de São Paulo. In: SEMINÁRIO NACIONAL DE MILHO SAFRINHA, 13., 2015. Anais... Maringá: UEM/IAPAR/EMAER, 2015. p. 592-602. CD-ROM