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Cooperaçãojudiciáriaem matéria civilna UniãoEuropeia

Um guia para asprofissões jurídicas

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O espaço de liberdade, segurança e justiça visa facilitar a vida quotidianados cidadãos, tanto no exercício dos seus direitos como no recurso aostribunais para respeito dos mesmos. Os advogados desempenham umpapel crucial em direito civil em toda a União Europeia, agindo muitasvezes como a principal porta de acesso dos cidadãos europeus ao respeitodos seus direitos.

É essencial que os advogados estejam cientes da importante evolução ocorrida nocampo da cooperação judicial em matéria civil nos últimos anos. Foi nessa perspectivaque a Comissão Europeia decidiu lançar uma campanha de comunicação com infor-mações facilmente acessíveis sobre estes importantes desenvolvimentos.

Por estas razões, foi elaborado um guia de bolso que contém informações sobre oespaço de cooperação judicial em matéria civil e sobre o impacto que ela pode ter nasua actividade quotidiana. Espero que este guia constitua uma ajuda e lhe proporcioneuma melhor compreensão deste assunto complexo e cada vez mais importante.

Com os meus melhores cumprimentos,

António Vitorino

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I. INTRODUÇÃO 2

1. “A Cooperação Judiciária em matéria Civil” 32. Rumo a um verdadeiro espaço de justiça 33. O “acervo comunitário” em justiça civil 24

II. COOPERAÇÃO JUDICIÁRIA EM MATÉRIA CIVIL E COMERCIAL 6

1. O Regulamento “Bruxelas I” 72. O conflito de leis – diplomas e propostas 113. O futuro desenvolvimento da cooperação judiciária em matéria civil e comercial 14

III. DIREITO DA FAMÍLIA 17

1. O Regulamento “Bruxelas II” 172. O novo Regulamento substitutivo do Regulamento “Bruxelas II” 18

IV. O REGULAMENTO RELATIVO AOS PROCESSOS DE INSOLVÊNCIA 20

V. A COOPERAÇÃO JUDICIÁRIA EM MATÉRIA PROCESSUAL 23

1. O Regulamento relativo à citação e notificação de actos 232. O Regulamento relativo à obtenção de prova 243. A Rede Judiciária Europeia em matéria civil e comercial 25

VI. ACESSO À JUSTIÇA 26

1. A directiva sobre o apoio judiciário 262. Proposta de directiva relativa à indemnização das vítimas da criminalidade 27

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Tem-se verificado um importante desenvolvimento do Direito Comunitário que, noentanto, permanece ignorado pela maior parte dos profissionais de direito. O DireitoInternacional Privado está no limiar de se transformar num ramo de Direito Comunitárioautónomo, com um âmbito que extravasa o das leis internas dos Estados-Membros.A União Europeia (UE) passou a ter poderes para legislar em matéria de DireitoInternacional Privado com o Tratado de Amesterdão, tendo desde então aprovadomúltiplos actos legislativos no campo da “cooperação judiciária em matéria civil”.

Este novo campo jurídico de actuação tem reflexos na prática de todos os Europeusque trabalham na área do Direito Civil, independentemente de serem Juízes, Advogadosou outros profissionais do Direito. O princípio da livre circulação de bens, serviços epessoas tem encorajado a mobilidade entre os cidadãos da União Europeia e fomentadoas actividades comerciais entre Estados-Membros. É cada vez mais frequente osprofissionais do direito depararemse com problemas jurídicos transfronteiriços, quedizem respeito, nomeadamente, a contratos de compra e venda internacionais, aspectosjurídicos relativos à circulação de turistas e acidentes de viação no estrangeiro, ouquestões relativas à propriedade sobre bens imóveis sitos noutros Estados-Membros.Também no que respeita ao Direito da Família, as relações jurídicas plurilocalizadas emmatéria de estatuto pessoal que envolvem pessoas de nacionalidades distintas, bemcomo as questões jurídicas emergentes de casos de responsabilidade familiar eparental constituem, actualmente, um problema jurídico comum e frequente. Nos diasde hoje, mesmo as pequenas e médias empresas – PMEs – estão activas no mercadodoméstico europeu, pelo que repetidamente se deparam com problemas e questõesjurídicas reguladas pelo Direito Comunitário. Nenhum profissional jurídico que exerça asua profissão numa Europa de fronteiras abertas, onde se multiplicam as relaçõesjurídicas transfronteiriças, se pode permitir ignorar estes desenvolvimentos legais.

I . INTRODUÇÃO

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“A Cooperação Judiciária em matéria Civil”

A expressão cooperação judiciária em matéria civil tem a sua origem noTratado de Maastricht – TUE (Tratado da União Europeia), que no seu TítuloVI (‘Disposições relativas à Cooperação no domínio da Justiça e dosAssuntos Internos’), Artigo K.1, definiu a cooperação judiciária em matériacivil, como uma questão de interesse comum para os Estados-Membros.Com o Tratado de Amesterdão, esta política de cooperação que, atéentão, tinha sido unicamente dirigida aos Estados-Membros, foi elevada aonível de competência legislativa específica da Comunidade Europeia. Assim,na alínea c) do artigo 61.º do Tratado da Comunidade Europeia (TCE) declaraa competência legislativa da Comunidade para adoptar medidas nesta matéria,o que inclui, segundo o artigo 65.º do Tratado da Comunidade Europeia:

■a melhorar e simplificar:- o sistema de citação e notificação transfronteiriço dos actos judi-

ciais e extrajudiciais;- a cooperação em material de obtenção de meios de prova;- o reconhecimento e a execução das decisões em matéria civil e

comercial, incluindo as decisões extrajudiciais;

■b romover a compatibilidade das normas aplicáveis nos Estados-Membros em matéria de conflitos de leis e de jurisdição;

■c eliminar os obstáculos à boa tramitação das acções cíveis,promovendo, se necessário, a compatibilidade das normas deprocesso civil aplicáveis nos Estados-Membros.

O termo que exprime a cooperação entre Estados-Membros (a um nívelgovernamental) é parte de um domínio que constitui actualmente um ramoautónomo do Direito Comunitário, com conceitos e princípios próprios. O

1 Título IV do Tratado da Comunidade Europeia, que inclui os artigos 61.ºe 65.º, é aplicável a todos os Estados-Membros da União Europeia, comexcepção da Dinamarca.

Rumo a um verdadeiro espaço de justiça

As regras de cooperação judiciária em material civil baseiamse norespeito pelo princípio da igual importância e da igualdade de direitos dossistemas judiciais de cada um dos Estados-Membros e das suas decisões.No seu cerne encontrase também a colaboração transfronteiriça entretribunais e autoridades judiciárias. A importância da existência de regrasuniformes nesta matéria é evidente: se cada Estado-Membro pudessedecidir unilateralmente qual a lei a aplicar a cada relação jurídica pluriloca-lizada e quais as decisões dos tribunais de outros Estados-Membros quepoderiam ser reconhecidas, então o resultado seria uma completa ausênciade segurança jurídica para os cidadãos e empresas comunitárias, relati-vamente a saber qual a jurisdição competente e à lei aplicável.

A segurança jurídica constitui um pré-requisito do sucesso do MercadoComunitário Europeu. O Conselho Europeu de Tampere, em 15 e 16de Outubro de 1999, formulou a intenção de criar “um verdadeiro EspaçoEuropeu de Justiça”, baseado no princípio de que os cidadãos e asempresas não deverão ser impedidos ou desencorajados de exerceremos seus direitos por razões de incompatibilidade ou complexidade dossistemas jurídicos e administrativos dos Estados-Membros. Reconhecidaa necessidade de uma actuação de âmbito comunitário para um melhoracesso à justiça por todos os cidadãos, o Conselho Europeu de Tampereestabeleceu três prioridades de acção: o reconhecimento mútuo dasdecisões judiciais, o incremento das melhor acesso à justiça naEuropa e uma maior convergência em matéria civil.

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De entre estas prioridades, o princípio do reconhecimento mútuoconstitui “a pedra angular“ da cooperação judiciária em matéria civil. OConselho para a Justiça e Assuntos Internos aprovou em 30 deNovembro de 2000, um projecto de programa de medidas destinadas aaplicar o princípio do reconhecimento mútuo das decisões em matériacivil e comercial. O seu objectivo último é o de que as decisões jurisdi-cionais sejam reconhecidas e executadas num outro Estado-Membro,sem que haja a necessidade de qualquer etapa processual intermédiaou, por outras palavras, suprimir o exequatur.

Neste verdadeiro Espaço Europeu de justiça, esperase que o desenvolvi-mento futuro da cooperação judiciária em matéria civil facilite a circulaçãodos cidadãos da Comunidade, bem como das actividades comerciais.

O “acervo comunitário” na justiça civil

No âmbito da cooperação judiciária em material civil, o chamado “acer-vo comunitário” já atingiu um estádio de desenvolvimento bastante signi-ficativo e que toca a todas as matérias incluídas no artigo 65.º do Tratadoda Comunidade Europeia, tais como a jurisdição, o reconhecimentomútuo e execução de sentenças, a cooperação entre Estados-Membros e o acesso à justiça. Deste modo, já foram aprovados nestamatéria – que se aplica a todos os Estados-Membros, com excepção daDinamarca – vários actos legislativos e outros estão em fase de dis-cussão ou de projecto:

Jurisdição, reconhecimento mútuo e execução de sentenças:- regulamento “Bruxelas I”, relativo à competência judiciária, ao

reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil ecomercial.

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- regulamento “Bruxelas II”, relativo à competência, ao reconheci-mento e à execução de decisões em matéria matrimonial, e umnovo Regulamento do Conselho (“Bruxelas II bis”), relativo às mes-mas matérias, que irá substituir o Regulamento “Bruxelas II”.

- regulamento relativo aos processos de insolvência.

Cooperação entre Estados-Membros (estes instrumentos visam aper-feiçoar a cooperação judiciária em termos processuais):

- regulamento relativo à citação e à notificação dos actos judiciais eextrajudiciais em matéria civil e comercial nos Estados-Membros.

- regulamento relativo à cooperação entre os Estados-Membros nodomínio da obtenção de provas em matéria civil e comercial.

- decisão relativa à criação de uma rede judiciária europeia emmatéria civil e comercial adoptada pelo Conselho

Em matéria de acesso à justiça:- directiva relativa à melhoria do acesso à justiça nos litígios trans-

fronteiriços

Até à data, foram apresentados os seguintes projectos de actoscomunitários:

- indemnização das vítimas da criminalidade (Livro Verde e propos-ta de directiva);

- modos alternativos de resolução dos litígios (Livro Verde);- proposta de Regulamento do Conselho que cria um título executi-

vo europeu para créditos não contestados, a fim de permitir tornaras decisões jurisdicionais relativas a créditos não contestados numEstado-Membro executáveis em toda a Comunidade, sem neces-sidade de qualquer procedimento intermédio no Estado-Membroem que se visa a execução do crédito;

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- injunções de pagamento e procedimentos relacionados comacções de pequeno montante (Livro Verde);

- lei aplicável às obrigações contratuais (Livro Verde);- proposta de Regulamento “Roma II” sobre a lei aplicável às

obrigações extracontratuais.

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I I . COOPERAÇÃO JUDICIÁRIAEM MATÉRIA CIVIL E COMERCIAL

As regras sobre conflitos de competência e conflitos de leis em matériacivil e comercial situamsse no âmago da cooperação judiciária emmatéria civil. No que respeita ao processo civil internacional, aexistência de algumas diferenças entre as regras de direito interno queregulam a matéria da competência e do reconhecimento de decisõesimpede o funcionamento “saudável” do mercado interno. É essencialhaver disposições legais unificadoras das regras de conflitos decompetência em matéria civil e comercial que simplifiquem as forma-lidades dos actos, com vista a efectuar o reconhecimento e execução dedecisões proferidas noutro Estado-Membro de uma forma simples ecélere. Não obstante, estas disposições carecem ser completadas pelasregras de direito dos conflitos correspondentes..

A Sociedade A do Estado-Membro 1 reservou à Sociedade B,organizadora de feiras de exposição para negócios, comadministração central no Estado-Membro 2, uma área de 500metros quadrados de espaço para exposição e serviçoscorrespondentes numa feira comercial de três dias no Estado-Membro 2, na qual planeara participar na qualidade deexpositor. Cinco dias antes do início da feira, o principalcliente da Sociedade A informa-a de que não vai poder participarna feira, o que leva a Sociedade A a cancelar a sua reserva.Por este aviso ter sido tardio, a Sociedade B já não conseguearrendar os 500 metros quadrados a nenhum outro expositor.Quando interpelada para pagar a renda relativa ao espaço de500 metros quadrados, a Sociedade A recusa-se a cumprir.

A Sociedade B deseja intentar demandar judicialmente aSociedade A e quer saber qual a melhor forma para o fazer.

O sistema de processo civil europeu em matéria civil e comercial,que actualmente radica no Regulamento 44/2001 (“Bruxelas I”),trouxe um maior nível de segurança jurídica a situações como asdo caso sub judice. Na verdade, este Regulamento contém regrassobre conflitos de competência iguais para todos os Estados-Membros que são parte deste sistema. Segundo o referidoRegulamento, o julgamento que for realizado num dos Estados-Membros adquire um reconhecimento e executoriedade iguaisem todos os Estados-Membros envolvidos. Além do mais, ofacto de existirem normas que estabelecem uma identidade deregras de conflitos de leis assegura que em toda a Comunidadeos Tribunais decidam os mesmos assuntos de acordo com asmesmas regras.

Ao abrigo do Regulamento “Bruxelas I”, a Sociedade B podeoptar entre dois modos possíveis de actuação. Em primeiro lugar,pode optar por intentar uma acção perante o tribunal da sede daSociedade A, no Estado-Membro 1, pois segundo a regra geral doartigo 2.º, as acções podem ser intentadas perante o tribunal dasede do Réu. Em segundo lugar, a Sociedade B pode preferirintentar a acção nos próprios tribunais do Estado-Membro 2, quetem competência ao abrigo do n.º 1, alínea b), do artigo 5.º doRegulamento “Bruxelas I”, por ser este o local em que se deviater cumprido a obrigação. Uma decisão de provimento proferidapelo tribunal competente do Estado-Membro 2 seria reconhecidae poderia ser executada (mediante um processo simplificado) emqualquer Estado-Membro em que a Sociedade A tenha bensimóveis. Não deve pois a Sociedade B preocuparse com apossibilidade de os tribunais decidirem segundo diferentes leis.Ao abrigo da Convenção de Roma de 1980, que se aplica a todos

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os Estados-Membros da União Europeia, são as suas normasconflituais que determinam qual a lei aplicável. (crf. infra, CapítuloII 2. Convenção de Roma).

O Regulamento “Bruxelas I”

O Regulamento n.º 44/2001 (“Bruxelas I”), relativo à competênciajudiciária e ao reconhecimento e execução de decisões em matériacivile comercial, de 22 de Dezembro de 2000, entrou em vigor a 1 deMarço de 2002, substituindo a Convenção de Bruxelas de 1968, queincidia sobre as mesmas matérias e que ainda se continua a aplicar àDinamarca e a alguns territórios ultramarinos de certos Estados-Membros.A Convenção de Lugano, que em grande parte corresponde à Convençãode Bruxelas em termos de conteúdo, aplicase aos processos querespeitam à Islândia, Noruega, Polónia e Suíça.

O Regulamento cobre o essencial da matéria civil e comercial, com excepçãodas matérias fiscais, aduaneiras e administrativas. Encontramse aindaexcluídas do seu âmbito de aplicação determinadas matérias de DireitoCivil, tais como o estado e a capacidade jurídica das pessoas singulares,os regimes matrimoniais, os testamentos e as sucessões ou asfalências.

1.1 O sistema jurisdicional do Regulamento “Bruxelas I”

O Regulamento “Bruxelas I” traça o esboço de um sistema jurisdicionalfechado, que atribui competência aos tribunais dos Estados-Membrospara decidir litígios transfronteiriços. O tribunal competente no sistemajudicial interno de um Estado-Membro, que tenha competência

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jurisdicional à luz do Regulamento, é então designado pelas regrasinternas de processo civil do Estado-Membro.

A Sociedade A do Estado-Membro 1 vendeu uma máquina àSociedade B do Estado-Membro 2. A Sociedade B tinhaformulado uma proposta de compra, a qual dispunha, inter alia,que o contrato de compra e venda estava sujeito às condiçõescontratuais gerais da Sociedade B, que se encontravaminscritas no verso da proposta. Nestas condições, encon-travase uma cláusula designativa do foro, que estabeleciacomo competente o Tribunal C, sito no Estado-Membro 2. ASociedade A aceitou a oferta por via de uma carta deconfirmação. Após a entrega da máquina, a Sociedade Breclamou que a máquina não funcionava e intentou no Tribunal Cuma acção de indemnização contra a Sociedade A. No decursodo processo, a Sociedade A alegou a falta de competênciajurisdicional do Tribunal C, sublinhando que ao abrigo das leisdo Estado-Membro 1, a cláusula designativa do foro, inseridanas cláusulas contratuais gerais formuladas por uma daspartes, apenas será válida, caso tenha sido expressamenteaceite, por assinatura, pela contra-parte.

Nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Regulamento “Bruxelas I”,as partes, das quais pelo menos uma se encontre domiciliada noterritório de um Estado-Membro, podem convencionar que umtribunal ou os tribunais de um Estado-Membro têm competênciapara decidir quaisquer litígios que tenham surgido ou quepossam surgir de uma determinada relação jurídica. Essacompetência será exclusiva, a menos que as partes convencionemem contrário. No âmbito do Regulamento “Bruxelas I”, a validade

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formal da escolha de uma cláusula de foro deve resultar exclusiva-mente do Regulamento, que prevê um conjunto autónomo de regrasque prevalecem sobre as regras correspondentes, previstas nalegislação processual civil interna dos Estados-Membros. (cfr. infra)

Regra geral: competência do tribunal do domicílio do Réu

Nos termos do artigo 2.º do Regulamento “Bruxelas I”, a regra geral emmatéria de competência é a de que as pessoas domiciliadas no territóriode um Estado-Membro devem ser demandadas, independentemente da suanacionalidade, perante os tribunais desse Estado (domicílio do deman-dado). O domicílio é determinado de acordo com a lei do Estado-Membrodo tribunal onde é proposta a acção. Para as pessoas colectivas e para associedades, o domicílio é definido em função do lugar da sede social, daadministração central ou do estabelecimento principal. Se o requerido nãotiver o seu domicílio num Estado-Membro, o artigo 4.º do Regulamentodetermina que a competência dos tribunais será regulada em cadaEstado-Membro pela lei desse Estado-Membro, sem prejuízo da aplicaçãodas regras de competência exclusiva e de extensão de competência.

Regras de competência alternativas e especiais

Os artigos 5.º a 7.º do Regulamento propõem como alternativa à referidaregra geral de competência um conjunto de regras especiais de compe-tência. O requerente pode optar entre intentar a acção nos tribunais dolugar do domicílio do requerido, ou então, nos tribunais de qualquer outroEstado-Membro, desde que seja com base numa regra de competênciaespecial. Na prática, a regra de competência especial mais relevante éaquela que decorre do n.º 1 do artigo 5.º e que respeita a matérias contra-tuais, com excepção das relativas a contratos de trabalho. A competência

internacional sobre a causa reside no tribunal do lugar onde foi ou devaser cumprida a obrigação em questão. No caso dos dois contratostípicos que predominam nos processos transfronteiriços europeus, o lugarde cumprimento da obrigação abarca todas as obrigações que possamemergir do mesmo contrato. Deste modo, e salvo convenção em contrário,no caso da venda de bens, o lugar do cumprimento da obrigação é o lugarnum Estado-Membro onde, nos termos do contrato, os bens foram oudevam ser entregues, e no caso da prestação de serviços, é o lugar onde,nos termos do contrato, os serviços foram ou devam ser prestados.

O artigo 5.º estabelece ainda regras de competência especiais para umleque variado de matérias, onde se incluem a obrigação de alimentos, aresponsabilidade civil por danos causados, a acção de restituição, oulitígios relativos à exploração de uma sucursal, agência ou de qualqueroutro estabelecimento. O n.º 3 do artigo 5.º, que prevê a competênciasobre danos em matéria extracontratual, tem vindo a assumir umaimportância crescente. As acções em matéria extracontratual (obrigaçõesdelituais e “quase delituais”) devem ser suscitadas perante o tribunaldo lugar onde ocorreu ou poderá ocorrer o facto danoso. O Tribunal deJustiça das Comunidades Europeias já determinou que este lugar éaquele em que o dano se produz, ou alternativamente, o lugar onde aacção danosa foi praticada.

Extensão de competência e comparência do requerido

A regra relativa aos pactos atributivos de jurisdição encontrase consa-grada no artigo 23.º. É uma das regras do Regulamento “Bruxelas I” maisimportantes e das mais frequentemente utilizadas. A extensão decompetência é, regra geral, permitida. Não obstante, existem limitaçõesconsagradas pelas regras em benefício das partes em matéria deseguros, consumidores e de contratos individuais de trabalho. Além do

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mais, a regra da competência exclusiva do artigo 22.º não pode serenfraquecida pela extensão de competência.

No caso supra referido, as duas Sociedades de Estados-Membrosdistintos discutem a validade da cláusula atributiva de jurisdiçãoprevista nas condições gerais da proposta formuladas pelaSociedade B. A solução pode ser alcançada a partir do artigo23.º do Regulamento “Bruxelas I”.

No que respeita aos requisitos formais, o artigo 23.º do Regulamento“Bruxelas I” estabelece um conjunto de regras diferenciadas. Aregra fundamental é a de que o pacto atributivo de jurisdiçãodeve revestir a forma escrita, apesar de não ser exigido umdocumento escrito assinado por ambas as partes. A troca dedeclarações escritas ou a confirmação por escrito de acordosverbais também preenche os requisitos de forma, o que sucedeainda quando for adoptada uma forma que se mostre de acordocom os usos que as partes tenham estabelecido entre si ou, nocomércio internacional, com os usos que as partes conheçam oudevam conhecer e que, em tal comércio, sejam amplamenteconhecidos e regularmente observados pelas partes em contratosdo mesmo tipo, no ramo comercial considerado.No exemplo referido, a Sociedade B emitiu uma declaração decompra que a Sociedade A aceitou e confirmou por escrito. Nestadeclaração de compra, a Sociedade B fez uma referência explícitaàs cláusulas contratuais gerais, tornando-as acessíveis à SociedadeA, numa linguagem comummente utilizada por ambas as partes.A cláusula atributiva de jurisdição prevista nas cláusulascontratuais gerais da Sociedade B preenche, portanto, osrequisitos previstos no n.º 1 do artigo 23.º do Regulamento

“Bruxelas I”, atribuindo, consequentemente, ao tribunal C umajurisdição exclusiva sobre este caso.

Para além dos casos em que a competência resulte de outras dispo-sições do Regulamento “Bruxelas I”, é competente o tribunal de umEstado-Membro perante o qual o requerido compareça, de acordo como seu artigo 24.º. Esta regra não é aplicável quando a comparência tivercomo único objectivo arguir a incompetência ou quando existiroutro tribunal com competência exclusiva por força do artigo 22.º. Estaregra tem uma grande importância prática porque força o requerido a tercerteza de que o tribunal é competente, antes de comparecer peranteele. Uma vez aceite, a atribuição da jurisdição já não poderá serrevogada e a jurisdição do tribunal encontrase exclusivamente fixada.

Regras relativas às competências especiais em matériade seguros, contratos celebrados por consumidores e contratosindividuais de trabalho

São previstas regras especiais em matéria de seguros, contratoscelebrados por consumidores e contratos individuais de trabalho. Estescontratos distinguemse por neles existir uma necessidade de tutela docontraente mais fraco. O Regulamento “Bruxelas I” dotouse de regrasespeciais nestes campos, com o intuito de tornar acessível uma jurisdiçãoconveniente ao contraente mais fraco, dada a sua maior necessidadede tutela – i.e. o segurado, o consumidor ou o trabalhador.

A Senhora A, residente no Estado-Membro 1, encomendou umlivro a uma livraria da Internet, tendo pago adiantadamente o

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preço no valor de € 26,80. O livro encomendado nunca chegoua ser recebido. A Senhora A veio a descobrir que a livraria daInternet era uma sociedade domiciliada no Estado-Membro 2.A Senhora A está decidida a agir judicialmente e pretendesaber onde deve intentar a acção. A livraria, por seu turno,alega que as suas cláusulas contratuais gerais de venda esta-belecem que os tribunais do Estado-Membro 2 são os compe-tentes para julgarem o litígio.

Segundo o n.º 1 do artigo 16.º do Regulamento “Bruxelas I”, oconsumidor pode intentar uma acção contra a outra parte nocontrato, quer perante os tribunais do Estado-Membro em cujoterritório estiver domiciliada essa parte, quer perante o tribunaldo lugar onde o consumidor tiver domicílio. O n.º 1, alínea c), doartigo 15.º prevê que o consumidor poderá fazer tal escolha, se ocontrato tiver sido concluído com uma pessoa que tenha umaactividade comercial ou profissional no Estado-Membro dodomicílio do consumidor ou que dirija essa actividade, porquaisquer meios, a esse Estado-Membro ou a vários Estados,incluindo esse Estado-Membro, e o dito contrato seja abrangidopor essa actividade. Como esta regra não pode ser afastada porum acordo das partes prévio ao nascimento do litígio, a SenhoraA pode, em consequência, demandar judicialmente a livrariaperante o tribunal competente do lugar da sua residência.

Competências exclusivas

O artigo 22.º do Regulamento “Bruxelas I” enumera as situações queautorizam a existência de competências exclusivas, nos casos em que

vigorar a presunção de uma conexão particularmente mais estreita comos tribunais de um determinado Estado-Membro ou onde existir umaespecial necessidade de segurança jurídica. Nestas situaçõesincluemse, entre outras, os processos que tenham por objecto direitosreais sobre imóveis e de arrendamento de imóveis, processos emmatéria de inscrição, de validade de patentes ou de outros direitos depropriedade industrial. Em todas as situações que o artigo 22.º refere, asacções não poderão ser intentadas perante outros tribunais, tais como otribunal do domicílio do requerido ou qualquer outro tribunal que aspartes possam ter escolhido num pacto atributivo de jurisdição.

Medidas provisórias e cautelares

O artigo 31.º do Regulamento “Bruxelas I” determina que as medidasprovisórias podem ser requeridas às autoridades judiciais de um Estado-Membro, na medida em que se encontrem previstas na lei desse mesmoEstado. Esta regra aplicase ainda que, por força do Regulamento, otribunal competente para conhecer o mérito da causa seja o tribunal deoutro Estado-Membro.

1.2 A litispendência comunitária

A regra de litispendência europeia obsta a que os tribunais dos diversosEstados-Membros alcancem decisões contraditórias em acções com amesma causa. Quando acções com a mesma causa e entre as mesmaspartes forem submetidas à apreciação de tribunais de diferentes Estados-Membros, qualquer tribunal, que não aquele em que a acção foi submetidaem primeiro lugar, suspenderá oficiosamente a instância, até que seja fixadaa competência do tribunal em que a acção foi submetida em primeiro lugar.Esta é uma regra de grande importância em processos transfronteiriços.

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1.3 Reconhecimento e exequatur das decisões proferidas portribunais de outros Estados-Membros

O Regulamento “Bruxelas I” simplificou as formalidades necessárias aum reconhecimento e a um exequatur célere das decisões proferidaspela jurisdição de outro Estado-Membro, mediante um procedimentosimples e uniforme.

Reconhecimento

De acordo com o artigo 33.º, as decisões proferidas num Estado-Membrosão automaticamente reconhecidas nos outros Estados-Membros, semnecessidade de recurso a qualquer processo especial. O reconhecimentoapenas poderá ser recusado num número restrito de casos de naturezaexcepcional. De entre estes casos deve ser destacado, pela importânciaprática que reveste, o referente aos julgamentos à revelia previsto no n.º 2do artigo 34.º, que diz respeito à situação em que o acto que iniciou ainstância, ou qualquer acto equivalente, não foi comunicado ou notificadoao réu revel, em tempo útil e de modo a permitirlhe a defesa. Uma decisãonão será reconhecida se tiverem sido desrespeitadas as regras decompetência exclusiva em matéria de seguros, contratos celebrados porconsumidores e contratos individuais de trabalho (n.º 1 do artigo 35.º).Para os demais casos, o n.º 3 do artigo 35.º proíbe expressamente ocontrolo de competência dos tribunais do Estado-Membro de origem. O artigo 36.º determina que as decisões estrangeiras não podem, emcaso algum, ser objecto de revisão de mérito.

Execução

As decisões que tenham força executiva no Estado-Membro em queforem proferidas podem ser declaradas executórias e executadas emqualquer outro Estado-Membro. A parte que pretender a execução de

uma decisão noutro Estado-Membro deve requerer ao tribunal queproferiu a decisão que emita uma certidão (conforme com a certidãopadrão constante do Anexo V ao Regulamento) confirmando a sua exe-cutoriedade. O tribunal ou autoridade competente que cada Estado-Membro tiver designado para fiscalizar o pedido de declaração de exe-cutoriedade limitase a exercer um controlo formal sobre os documentosque acompanharem o requerimento. Qualquer das partes pode seguida-mente interpor recurso para um dos tribunais indicados em anexo aoRegulamento. O recurso só pode incidir sobre a execução da decisão. ORegulamento “Bruxelas I” indica claramente que o único caso para nãoexecução é quando a decisão for contrária à ordem pública.

Qualquer das partes pode interpor recurso da decisão sobre o pedido dedeclaração de executoriedade, seguindo o procedimento especial descritonos artigos 43.º a 46.º. Quando uma decisão tiver de ser reconhecida, nadaimpede o requerente de recorrer a medidas provisórias, incluindo caute-lares, nos termos da lei do Estado-Membro requerido, sem ser necessáriaa declaração de executoriedade. Sublinhese, contudo, que a declaração deexecutoriedade implica a autorização para tomar tais medidas.

O conflito de leis – diplomas e propostas

A harmonização das regras de conflito, que deve ser distinguida daharmonização das regras de direito substantivo, visa estabelecer regrasuniformes relativamente à lei aplicável às obrigações contratuais.

2.1 A Convenção de Roma de 1980 e propostas de umRegulamento “Roma I”

Convenção de Roma

A Convenção de Roma sobre a lei aplicável às obrigações contratuais,

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que entrou em vigor em Abril de 1991, vigora actualmente em todos osEstados-Membros, apesar de ainda subsistirem diferenças substantivasrelativamente a alguns aspectos, em virtude da variedade das formas nasua implementação e das reservas feitas pelos Estados-Membros acertas regras da Convenção.

A Convenção aplicase às obrigações contratuais nas situações queimpliquem um conflito de leis – mesmo que a lei designada seja a de umEstado não Contratante – com a excepção de determinadas matérias,tais como as obrigações contratuais relativas a testamentos e sucessõespor morte ou ao regime de bens no matrimónio. As regras da Convençãode Roma são, assim, as únicas regras de Direito Internacional Privadoaplicáveis nos Estados-Membros em matéria de obrigações contratuais.

As partes signatárias de um contrato podem escolher o direito aplicávelà totalidade ou a uma parte do contrato. Se as partes não tiveremescolhido expressamente a lei aplicável ao contrato, o contrato seráregulado pela lei do país com o qual apresente uma conexão maisestreita que, em regra, será o país da residência habitual da parte queestá obrigada a fornecer a prestação característica do contrato ou, se setratar de uma sociedade, associação ou pessoa colectiva, pela lei dopaís da sua administração central (por exemplo, num contrato decompra e venda, a prestação característica do contrato é a realizadapelo vendedor). Quando o contrato tiver por objecto direitos reais sobrebens imóveis, vigora a presunção de que o contrato apresenta umaconexão mais estreita com o país onde o imóvel se situa. Quanto aocontrato de transporte de mercadorias, a lei aplicável é determinada deacordo com o lugar da carga ou descarga das mercadorias ou com olugar do estabelecimento principal do expedidor.

Sem prejuízo de outros contratos, as referidas presunções não serão

admitidas se resultar do conjunto das circunstâncias que o contratoapresenta uma conexão mais estreita com outro país, pois nesse caso,é a lei desse país que se aplica.

Foram consagradas regras especiais que visam tutelar a parte mais fraca emmatéria de contratos celebrados por consumidores e contratos indivi-duais de trabalho. No caso dos contratos celebrados por consumidores,salvo convenção em contrário, tais contratos são regulados pela lei dopaís em que o consumidor tenha a sua residência habitual, sempre queexista uma conexão com esse país, nos termos do artigo 3.º e do n.º 2do artigo 5.º. Relativamente aos contratos individuais de trabalho, na faltade escolha da lei pelas partes, o contrato é regulado pela lei do país emque o trabalhador, no cumprimento do contrato, presta habitualmente oseu trabalho. Se o trabalhador não prestar habitualmente o seu trabalhono mesmo país, o contrato é regulado pela lei do país em que estejasituado o estabelecimento que o contratou. No entanto, nos termos don.º 2 do artigo 6.º, se resultar do conjunto das circunstâncias que o contratode trabalho apresenta uma conexão mais estreita com outro país, a leireguladora do contrato é a lei desse outro país. No caso dos consumidores,consagrase a regra geral de que em circunstância alguma pode a escol-ha pelas partes da lei aplicável ter como consequência privar o consumi-dor da protecção que lhe garantem as disposições imperativas da lei dopaís em que tenha a sua residência habitual. No caso dos contratosindividuais de trabalho, o trabalhador não pode ser privado da protecçãoque lhe garantem as disposições imperativas da lei do país em que este,ou esta, presta habitualmente o trabalho, no cumprimento do contrato.

Na hipótese da organização de feiras de negócios, a SociedadeB, que havia recebido um cancelamento extemporâneo dareserva de um amplo espaço para exposições (ver supra,

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página 6), a Sociedade B pretende ter a certeza de que o contratoque realizou com a Sociedade expositora A se encontra reguladopelas regras da sua lei interna, i.e., pela lei do Estado-Membro 2.

As organizadoras de feiras comerciais estipulam, em regra, nascondições gerais de realização da feira que os contratos cele-brados com os expositores são regulados pelas leis do Estado emque a sociedade organizadora tem o seu estabelecimentoprincipal. O n.º 1 do artigo 3.º consagra o princípio da liberdade deescolha da lei pelas partes contratantes. Se a Sociedade B tivesseoptado pela inclusão de uma cláusula em que escolhesse a lei,seria a lei escolhida aquela que se aplicaria ao contrato.De outro modo, a lei aplicável teria que ser encontrada de acordocom a regra do país com o qual o contrato apresente uma conexãomais estreita. Neste contrato, o arrendamento de um espaço paraexposições e dos serviços da feira conexos, pela Sociedade B,constitui a prestação característica do contrato. Esta prestação émanifestamente distinta da obrigação de contra-prestar com opagamento, que constitui uma obrigação mais geral. Emconsequência, a lei aplicável ao contrato é a do Estado-Membro 2,no qual a Sociedade B tem a sua administração central.

Propostas de substituição da Convenção de Roma por umRegulamento “Roma I”

A Comissão Europeia publicou um Livro Verde sobre a lei aplicável àsobrigações contratuais, recorrendo à designação de “RegulamentoRoma I”, como esboço de título, no dia 14 de Janeiro de 2003. Na verdade,a substituição da Convenção por um instrumento da Comunidade iria

superar as limitações intrínsecas à Convenção de Roma, enquantoTratado Internacional. Este instrumento da Comunidade iria igualmenteestabelecer – do mesmo modo que o faz, genericamente, na cooperaçãojudiciária em matéria civil – o Tribunal de Justiça das ComunidadesEuropeias como juiz último no que respeita à interpretação das suasregras, competência que o Tribunal ainda não alcançou em face daConvenção de Roma. Por último, encontrase actualmente, também emfase de discussão, a actualização de algumas das normas daConvenção de Roma, mormente, no tocante à adaptação do artigo 5.º àlei aplicável aos consumidores nas transacções electrónicas.

2.2 A proposta de um Regulamento “Roma II”

Apesar de o Regulamento “Bruxelas I” abranger tanto as obrigaçõescontratuais como as extracontratuais, até ao momento, apenas as regrassobre a lei aplicável às obrigações contratuais têm sido harmonizadas naComunidade Europeia. Por este motivo, em 22 de Julho de 2003, aComissão Europeia apresentou uma proposta para um Regulamento“Roma II”, sobre a lei aplicável às obrigações extracontratuais.

Alguns aspectos das obrigações extracontratuais encontramse excluídosdo âmbito da proposta de Regulamento, tais como as obrigaçõesextracontratuais decorrentes das relações de família ou de relaçõesequiparadas, regimes de bens no matrimónio e as sucessões. ORegulamento proposto distingue entre as regras de conflitos de leis emfunção de duas grandes categorias de obrigações extracontratuais: asresultantes de um facto ilícito e as resultantes de um outro facto que nãoseja ilícito.

A regra proposta relativamente às obrigações extracontratuais derivadasde um facto ilícito determina como aplicável a lei do país em que

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ocorre o dano, ou em que é provável que este ocorra. O propósito deconfirmar a regra da lex loci delicti commissi é o de assegurar a certezajurídica e de conseguir alcançar um equilíbrio razoável entre o autor pre-sumido do dano e a pessoa lesada. Contudo, quando o autor presumi-do do dano e a pessoa lesada tiverem a sua residência habitual nomesmo país, a lei aplicável é a desse país. A proposta de Regulamentocontém uma cláusula geral de excepção, cujo objectivo consiste emintroduzir uma relativa flexibilidade, permitindo ao tribunal adaptar estaregra rígida ao caso concreto, bem como aplicar a lei que correspondeao centro de gravidade da situação, sempre que a obrigação encontreuma conexão manifestamente mais estreita a um outro país. Aproposta de Regulamento contém ainda regras especiais que se aplicama alguns áreas específicas do Direito, tais como a responsabilidadedecorrente dos produtos, a concorrência e práticas desleais ou apropriedade intelectual.

Quanto às obrigações extracontratuais derivadas de outros factos nãoilícitos – como o enriquecimento sem causa ou a gestão de negócios –as regras da proposta de Regulamento asseguram que a obrigação sejaregulada pela lei do Estado que apresenta uma ligação mais estreita como facto de onde emerge a obrigação, deixando ainda uma suficienteliberdade aos tribunais de adaptação da regra aos sistemas nacionais.

Há a possibilidade de as partes escolherem a lei aplicável às obrigaçõesextracontratuais após o surgimento do litígio (não é admitida nenhumaescolha ex ante). A escolha da lei deverá ser expressa ou resultar clara-mente das circunstâncias do caso. A liberdade de escolha da lei pelaspartes encontrase, no entanto, restringida quando todos os elementos dasituação se localizem num país que não aquele cuja lei foi escolhida eencontra-se excluída quando estiverem em causa direitos de propriedade

intelectual. Refirase ainda que a aplicação de uma lei estrangeira nãopode ser manifestamente incompatível com a ordem pública do Estadodo foro.

O futuro desenvolvimento da cooperação judiciáriaem matéria civil e comercial

A Comunidade tem desenvolvido esforços no sentido de tornar maispermeáveis as poucas barreiras que ainda subsistem entre os sistemasjudiciais dos Estados-Membros. O Conselho Europeu de Tampere exortoua “uma maior redução dos trâmites intermediários que ainda sãonecessários para o reconhecimento e a execução de uma decisão ousentença no Estado requerido”, tendo por objectivo último o reconheci-mento automático e a execução de decisões judiciais em matéria civil ea completa abolição do processo de exequatur.

3.1 Proposta de um Regulamento pela Comissão para a criaçãode um Título Executivo Europeu para créditos não contestados

A proposta de Regulamento do Conselho (COM/2002/0159 final) quecria o Título Executivo Europeu para créditos não contestados criaum sistema que permite a livre circulação de decisões judiciais, transac-ções e actos autênticos em todos os Estados-Membros, estabelecendonormas mínimas cujo respeito torna desnecessário qualquer procedi-mento intermédio no Estado-Membro de execução previamente aoreconhecimento e à execução. O Regulamento em análise aplicase emmatéria civil e comercial, independentemente da natureza do órgãojurisdicional.

A expressão “crédito não contestado” compreende todas as situações

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em que o credor, na falta manifesta de qualquer contestação do devedorsobre a natureza e o montante de um crédito pecuniário líquido, obteveuma decisão judicial contra o devedor, ou um acto executório queimplique a confissão do devedor, quer se trate de transacção homologa-da pelo tribunal quer se trate de um acto autêntico.

Proferida uma decisão relativa a um crédito não contestado numEstado-Membro, o credor pode escolher entre a sua certificaçãoenquanto Título Executivo Europeu para créditos não contestadose o sistema de reconhecimento e execução de decisões doRegulamento (CE) n.º 44/2001. A decisão relativa a um crédito nãocontestado, certificada enquanto Título Executivo Europeu no Estado-Membro de origem, será reconhecida e executada nos outros Estados-Membros sem necessidade de qualquer processo especial no Estado-Membro de execução.

O Senhor A propôs uma acção judicial de condenação nopagamento de dívida contra o Senhor B no Estado-Membro 1,em que ambos se encontram domiciliados. O Senhor B nãodeduziu oposição durante a acção judicial e foi condenadopelo tribunal a pagar 10 000 euros ao Senhor A. Como o SenhorB tinha recentemente transferido todos os seus bens para umbanco no Estado-Membro 2, o Senhor A pretende saber comoé que pode tornar a decisão executável no Estado-Membro 2.

Actualmente, o Senhor A deve pedir uma declaração de executo-riedade no Estado-Membro 2, onde pretende que a decisão sejaexecutada. O procedimento de exequatur, previsto no Regulamento44/2001 (“Bruxelas I”), envolve a adopção de procedimentos num

Estado-Membro diverso daquele em que foi proferida a decisão,trazendo maiores custos e uma certa demora judicial.

Ao abrigo do futuro Regulamento, que cria o Título ExecutivoEuropeu para créditos não contestados, o Senhor A tem umasegunda opção ao seu dispor: o Senhor A pode requerer notribunal de origem a certificação enquanto título executivo europeuao tribunal de origem, a qual seria reconhecida e executada noEstado-Membro 2, sem necessidade de qualquer processo especial.

Esta Regulamento vai proporcionar um benefício real aos credores quepassam a ter acesso a um processo rápido e eficiente de execução noestrangeiro, sem que haja necessidade de envolvimento das autoridadesjudiciárias do Estado-Membro em que se procura conferir executorie-dade à decisão e sem as consequentes despesas e demoras que talimplica. O Regulamento é mais uma parte de um conjunto de medidascom a finalidade de aprofundar a implementação do princípio do recon-hecimento mútuo de julgamentos e outras decisões proferidas por auto-ridades judiciais.

De facto, deixa de haver necessidade da intervenção dos tribunais de umsegundo Estado-Membro, bem como da necessidade de uma tradução,devido à utilização de formulários normalizados multilíngues para acertificação. O tribunal de origem emitirá a certidão de Título ExecutivoEuropeu, utilizando o formulário normalizado constante do Anexo I, quedeverá ser preenchido na língua da decisão.

O Regulamento estabelece normas mínimas, a respeitar no processoque conduz à decisão, a fim de garantir que o devedor tomaconhecimento da acção judicial intentada contra si, dos requisitos de que

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depende a sua participação activa no processo tendo em vista contestaro crédito e das consequências da sua falta de participação. Os tribunaisdo Estado-Membro de origem podem examinar exaustivamente se asnormas processuais mínimas foram integralmente respeitadas antes deordenarem a passagem da certidão de Título Executivo Europeunormalizada que confere transparência a esse exame e aos seusresultados. Em Fevereiro de 2004, o Conselho adoptou uma posiçãocomum tendo em vista a aprovação deste Regulamento, tendo estedocumento sido já enviado para o Parlamento Europeu, para umasegunda leitura.

3.2 A proposta para a criação de um procedimento de injunçãode pagamento europeu e para um novo instrumento que criaum procedimento europeu respeitante aos créditos depequeno montante

A Comissão Europeia apresentou, em 20 de Dezembro de 2002, o “LivroVerde relativo a um procedimento de injunção de pagamento e amedidas destinadas a simplificar e acelerar os procedimentosrespeitantes aos créditos de pequeno montante”.

No que respeita ao procedimento de injunção de pagamento, o “Livro Verde” inclui uma ampla lista de questões relevantes com afinalidade de estimular a discussão pública sobre a criação de umprocedimento rápido e eficiente para a recuperação daqueles créditosque se presume permanecerem não contestados. Uma propostalegislativa para um Regulamento neste âmbito foi aprovada pelaComissão em Março de 2004.

3.3 Resolução dos litígios em instâncias extrajudiciais – desenvolvimento de modos alternativos de resolução doslitígios civis e comerciais na União Europeia

No dia 19 de Abril de 2002, a Comissão Europeia publicou um LivroVerde sobre os modos alternativos de resolução dos litígios (ARL) emmatéria civil e comercial. O seu objectivo era fazer o ponto da situação anível dos desenvolvimentos nacionais, comunitários e internacionais e deconsultar os Estados-Membros e as partes interessadas quanto àspossíveis medidas a tomar. Os modos alternativos de resolução delitígios constituem procedimentos extrajudiciais utilizados para aresolução de litígios em matéria civil e comercial que normalmentecontam com a colaboração das partes litigantes na busca de umasolução para o seu litígio e com uma terceira parte que se encontra numaposição neutra. Os modos alternativos de resolução de litígios são vistoscomo um importante elemento na procura de mecanismos de reso-lução de litígios justos e eficientes ao nível da União Europeia.

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I I I . DIREITO DA FAMÍLIA

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O Regulamento “Bruxelas II”

O Regulamento (CE) n.º 1347/2000, de 29 de Maio de 2000, relativo àcompetência, ao reconhecimento e à execução de decisões emmatéria matrimonial e de regulação do poder paternal em relação afilhos comuns do casal (“Regulamento Bruxelas II”) entrou em vigorno dia 1 de Março de 2001.

O Regulamento é aplicável aos processos cíveis relativos ao divórcio,separação de pessoas e bens ou anulação do casamento, bemcomo aos processos relativos ao poder paternal em relação aos filhoscomuns do casal, por ocasião das acções matrimoniais referidas. Paraestes processos, o Regulamento contém regras que estabelecem:

- a competência dos tribunais dos Estados-Membros, - o reconhecimento e a execução de decisões proferidas por

tribunais de outros Estados-Membros.

A Senhora A é cidadã do Estado-Membro 1 e está casadacom o Senhor B com quem viveu durante três anos na casadeste, sita no Estado-Membro 2. A Senhora A tomou adecisão de se divorciar e regressar ao seu país natal, ondevive a sua família, e gostaria de partir o mais cedo possível ede intentar a acção de divórcio no seu país de origem. Já háduas semanas que a Senhora A não fala com o Senhor B ereceia que a questão do divórcio se possa converter numproblema sério.

O n.º 1 do artigo 2.º do Regulamento “Bruxelas II” estabelece acompetência dos tribunais do Estado-Membro em cujo território

1 se situe a residência habitual dos cônjuges, a sua última residênciahabitual, na medida em que um deles ainda aí resida, ou a nacio-nalidade comum de ambos os cônjuges (no caso do Reino Unidoe da Irlanda é o ‘domicílio’ de cada um dos cônjuges). Depois dea Senhora A regressar ao seu país de origem só poderá intentaruma acção de divórcio perante um tribunal do Estado-Membro 1,numa das seguintes situações:

- Se ela conseguir convencer o Senhor B a apresentar um pedidoconjunto de divórcio, então serão competentes os tribunais dosdois Estados-Membros em que qualquer um dos cônjuges tenhaa sua residência habitual. Após regressar ao seu país de origem,a Senhora A poderia intentar a acção de divórcio perante umtribunal deste Estado-Membro (desde que ela aí tivesse a suaresidência habitual) ou então, perante um tribunal do Estado-Membro 2, o Estado da residência habitual do Senhor B.

- Na hipótese de o Senhor B recusar o pedido conjunto, aSenhora A apenas poderia intentar a acção nos tribunais doseu Estado-Membro de origem, se aí tiver residido pelo menosdurante seis meses imediatamente antes do pedido. Se aSenhora A decidisse ir residir para um terceiro país, do qual nãoseja cidadã, a acção de divórcio apenas poderia ser intentadanos tribunais desse Estado-Membro se esta aí tiver resididopelo menos durante um ano imediatamente antes do pedido.

A Senhora A deverá estar consciente de que o Senhor B (cujaintenção parece ser a de continuar a residir na actual residênciahabitual de ambos os cônjuges) se encontra numa posição maisfavorável, pois este poderá intentar a acção de divórcio peranteum tribunal do Estado da sua residência imediatamente, ao

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passo que a Senhora A terá que aguardar seis meses. Se o SenhorB decidisse intentar uma acção de divórcio, a sua acção impediriauma acção subsequente da Senhora A. O n.º 1 do artigo 11.º doRegulamento “Bruxelas II” determina que, quando acções com omesmo pedido, a mesma causa de pedir e entre as mesmas partesforem instauradas em tribunais de Estados-Membros diferentes, acompetência pertence ao tribunal em que a acção foi instauradaem primeiro lugar, devendo o segundo tribunal suspenderoficiosamente a instância (excepção de litispendência).

O Regulamento “Bruxelas II” aplicase somente à dissolução do vínculomatrimonial, sem tratar de questões como a culpa dos cônjuges, os efei-tos patrimoniais do casamento, as obrigações de alimentos ou outraseventuais medidas acessórias.

Os critérios de competência aceites no Regulamento “Bruxelas II”baseiamse no princípio de que deve existir um vínculo efectivo entre ointeressado e o Estado-Membro com competência, permitindo às partesoptar entre sete critérios alternativos de competência.

O tribunal em que for exercida a competência em matéria matrimonialtambém é competente para qualquer questão relativa ao poder paternalde filhos comuns, desde que o filho tenha a sua residência habitual nesseEstado-Membro. Se o filho tiver a sua residência habitual noutro Estado-Membro, os tribunais do Estado-Membro com competência em matériamatrimonial serão ainda competentes relativamente ao poder paternal,desde que, pelo menos um dos cônjuges exerça o poder paternal emrelação a esse filho, e se a competência desses tribunais tiver sido aceitepelos cônjuges e corresponder aos superiores interesses do filho.

A decisão proferida num Estado-Membro deve ser reconhecida emtodos os outros Estados-Membros, com base no princípio da confiançamútua, pelo que os motivos de não reconhecimento foram reduzidos aomínimo necessário. Não se exige nenhum procedimento especial comvista à actualização dos registos do estado civil de um Estado-Membrocom base numa decisão em matéria de divórcio, separação de pessoase bens ou anulação do casamento proferida noutro Estado-Membro. É igualmente um princípio básico à luz do Regulamento “Bruxelas II” edo Regulamento “Bruxelas I” a proibição do Estado requerido controlara competência ou o mérito da decisão do Estado de origem. Asdecisões proferidas sobre o exercício do poder paternal podem serreconhecidas e executadas noutro Estado-Membro, depois de teremsido declaradas executórias pelo tribunal competente no Estado-Membro em que se pretende a declaração de executoriedade (“exe-quatur”). A decisão sobre o pedido de declaração de executoriedadepode ser revista em sede de recurso.

O novo Regulamento substitutivo do Regulamento “Bruxelas II”

O escopo de aplicação do Regulamento “Bruxelas II” demonstrou ter sido demasiado exíguo no que respeita às matérias deresponsabilidade parental. Por este motivo, a Comissão apresentou,em 2002, uma proposta de Regulamento com a finalidade desubstituir o Regulamento “Bruxelas II” e que alarga o seu âmbito atodas as decisões judiciais em matéria de responsabilidade parental,independentemente do estatuto matrimonial dos pais e de ocasamento estar pendente. Este novo Regulamento foi aprovado em

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27 de Novembro de 2003 e entrará em vigor em 1 de Março de 2005.

O novo Regulamento integra regras especiais sobre o rapto de criançaspelos pais na União Europeia. Estas regras aplicamse às situações emque a criança é deslocada, ou retida ilicitamente, em violação dos direi-tos de custódia. O novo Regulamento procura gerar um efeito dissuasi-vo sobre o rapto de crianças no interior da UE e assegurar o regressoimediato da criança (caso o rapto tenha lugar). As suas normas comple-mentam e reforçam a Convenção de Haia de 25 de Outubro de 1980sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, que vigoraem todos os Estados-Membros.

A regra geral sobre que competência, que atribui a competência aos tri-bunais do Estado-Membro da residência habitual da criança, pode repre-sentar um risco para a criança cujos pais pretendam intentar a acçãoperante um juiz da sua nacionalidade, na esperança de receber deste umtratamento mais favorável. Para evitar que estas situações ocorram, oRegulamento mantém a competência dos tribunais do Estado-Membroda residência habitual da criança antes do rapto, preservando o direito àúltima palavra, mesmo após o rapto ter ocorrido. Os tribunais do Estado-Membro para o qual a criança foi raptada podem proferir uma decisão nosentido de não permitir o regresso da criança. Esta decisão pode, noentanto, ser afastada por uma decisão posterior sobre a custódia dacriança proferida pelos tribunais competentes do Estado-Membro emque a criança residia antes do rapto.

A criança deve ser ouvida durante o processo, excepto se tal for consi-derado inadequado. Uma decisão de regresso da criança deve serreconhecida e executada sem que seja exigido nenhum processo espe-

cial (exequatur), desde que se encontrem satisfeitos certos procedimen-tos de salvaguarda da criança (por exemplo, a criança ter tido a oportu-nidade de ser ouvida). A eliminação do exequatur serve para assegurarum regresso expedito da criança. Os processos de exequatur podem sermorosos, especialmente em caso de oposição da contra-parte. O juiz daresidência habitual deve cooperar com o juiz de origem que tomou adecisão de não regresso da criança e que, por exemplo, recebeu astranscrições da audiência da criança.

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IV. O REGULAMENTO RELATIVO AOS PROCESSOS DE INSOLVÊNCIA

Temse verificado uma necessidade premente de regulamentar a um nível comunitário os processos de insolvência que produzem efeitostransfronteiriços, de um modo não restrito às fronteiras internas dosEstados-Membros. Cada vez mais, as actividades das empresasproduzem efeitos transfronteiriços pelo que urge evitar quaisquer incen-tivos que levem as partes a transferir bens ou acções judiciais de umEstado-Membro para outro, no intuito de obter uma posição mais favorávelao abrigo da lei. O bom funcionamento do Mercado Interno exige que osprocessos de insolvência que produzem efeitos transfronteiriços seefectuem de forma eficiente e eficaz. Estes objectivos não podem serconcretizados de modo satisfatório a nível nacional, o que fez sentir anecessidade de um acto normativo da Comunidade em matéria decompetência, reconhecimento e direito aplicável neste domínio.

O Regulamento (CE) n.º 1346/2000, de 29 de Maio de 2000, relativoaos processos de insolvência, estabelece pela primeira vez um quadrode interacção compulsória entre os Estados-Membros da UE, quantoaos processos de insolvência com efeitos transfronteiriços. ORegulamento relativo aos Processos de Insolvência entrou em vigorem 31 de Maio de 2002 e aplicase a todos os processos que se iniciemapós esta data.

O Regulamento relativo aos Processos de Insolvência é aplicável aosprocessos de insolvência, independentemente de o devedor ser umapessoa singular ou colectiva, um comerciante ou um não comerciante.Os processos de insolvência estão indicados no n.º 1 do artigo 1.º eenumerados nos Anexos A e B do Regulamento. Para que oRegulamento seja aplicável, os processos devem ser oficialmenteintroduzidos e legalmente eficazes no Estado-Membro de abertura do

processo colectivo de insolvência, bem como ser processos quedeterminem a inibição parcial ou total da administração ou disposiçãode bens e a designação de um síndico.

O Regulamento contém regras de competência que estabelecem qualé o Estado-Membro cujos tribunais são competentes para a abertura econdução do processo de insolvência. O princípio base é o de queexiste apenas um processo de insolvência de alcance universal, queconsiste no processo de insolvência principal com um escopo universal eem processos secundários eventualmente instaurados. De acordo como artigo 3.º, os órgãos jurisdicionais do Estado-Membro em cujoterritório está situado o centro dos interesses principais do devedor sãocompetentes para a abertura do processo principal de insolvência. Osprocessos nacionais que abrangem apenas bens que se encontrem noEstado-Membro de abertura – “processos de insolvência secundários” –correm paralelamente ao processo principal (n.º 2 do artigo 3.º eCapítulo III). A abertura de um processo nacional antes do processoprincipal tem a designação de “processo territorial” até que sejaaberto o processo principal.

Os processos principais de insolvência e os processos secundários deinsolvência são conduzidos separadamente e normalmente por síndicosdiferentes. Porém, estes processos apenas podem contribuir para umaeficaz liquidação do activo se houver uma coordenação dos processosparalelos pendentes. A condição essencial é de que haja uma cola-boração estreita entre os diversos síndicos baseada, nomeadamente,num suficiente intercâmbio de informações. Para assegurar o papeldominante do processo principal, devem ser atribuídas ao síndico desteprocesso várias possibilidades de intervenção nos processos secundários

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simultaneamente pendentes. Qualquer credor que tenha residênciahabitual, domicílio ou sede na Comunidade tem o direito de reclamar osseus créditos sobre o património do devedor em cada processo deinsolvência pendente na Comunidade. Para assegurar um tratamentoequitativo dos credores, a distribuição do produto terá, porém, de sercoordenada. Cada credor pode conservar o que tiver obtido no âmbito deum processo de insolvência, mas só tem o direito a participar nadistribuição do activo noutro processo quando os credores do mesmograu tiverem obtido uma quota de rateio equivalente com base norespectivo crédito (n.º 2 do artigo 20.º). O direito e as condições em queo credor pode requerer a abertura de um processo secundário sãodeterminados pela lei do Estado-Membro em cujo território sejarequerida a abertura do processo secundário (artigo 29.º). Também nestasituação, os efeitos deste processo são limitados aos bens do devedorsituados nesse Estado-Membro (n.º 2 do artigo 3.º e artigo 27.º).

A Sociedade A é constituída de acordo com a lei do Estado-Membro 1, onde tem a sua actividade principal e os seusinteresses principais. A Sociedade A requereu a abertura deprocesso de insolvência perante o tribunal competente doEstado-Membro 1, o qual abriu o respectivo processo deinsolvência e designou o síndico. A Sociedade B, sediada noEstado-Membro 2, é credora da Sociedade A. A Sociedade Brelembra o facto de que a Sociedade A mantém um estabele-cimento no Estado-Membro 2, que inclui um amplo armazém ebens imóveis. A Sociedade B pretende saber qual o melhormodo de salvaguardar os seus interesses na decorrência doprocesso de insolvência.

Antes da entrada em vigor do Regulamento relativo aos Processosde Insolvência, a Sociedade B podia tentar obter um título exe-cutivo judicial que lhe permitisse executar os bens da SociedadeA sitos no Estado-Membro 2. O efeito das decisões judiciais rela-tivas aos processos de insolvência tinha um alcance restrito aoEstado-Membro em que tais decisões fossem tomadas, nãoimpedindo, frequentemente, a adopção de execuções individuaisnoutros Estados-Membros. Devido às regras do Regulamento, estasituação mereceu uma alteração substancial. Actualmente, apartir do momento de abertura do processo de insolvência numEstado-Membro, preclude a possibilidade de recurso a execuçõesindividualizadas nos restantes Estados-Membros, pelo que, combase nas regras do Regulamento relativo aos Processos deInsolvência, a Sociedade B deve reclamar os seus créditos noâmbito do processo aberto no Estado-Membro 1.

Quando uma sociedade tem a propriedade sobre bens imóveisnoutro Estado-Membro, que não aquele em que se desenrola oprocesso principal de insolvência (como é o caso da Sociedade A),o Regulamento relativo aos Processos de Insolvência oferecea possibilidade de serem abertos os designados “processossecundários”. O recurso a este tipo de processos encontrasesubordinado ao preenchimento de determinadas condições. Os efeitos dos processos secundários limitamse aos bens dodevedor situados no território do Estado-Membro da abertura doprocesso secundário. Será, portanto, aconselhável que aSociedade B determine se os processos secundários deverãoser intentados no Estado-Membro 2 e se se encontram preenchidasas condições especiais que permitem ao credor recorrer a taisprocessos.

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De acordo com o princípio contido no n.º 1 do artigo 4.º do Regulamento rela-tivo aos Processos de Insolvência, a lei aplicável ao processo de insolvênciae aos seus efeitos é a lei do Estado-Membro em cujo território é aberto oprocesso. A lex concursus determina todos os efeitos processuais e materiaisdos processos de insolvência sobre as pessoas e relações jurídicas emcausa. O Regulamento estabelece ainda, quanto às matérias por eleabrangidas, normas uniformes sobre o conflito de leis que substituem,dentro do respectivo âmbito de aplicação, as normas internas de DireitoInternacional Privado. Prevêemse regras conflituais especiais para situaçõesem que estão em causa direitos e relações jurídicas com um conteúdoparticularmente significativo (por exemplo, direitos reais, compensação, reservade propriedade ou contratos de trabalho) (Artigos 5.º a 10.º). Estas excepçõesà regra geral têm como fim a tutela de expectativas legítimas e a certeza nastransacções operadas que envolvam Estados-Membros diversos daquelesem que os processos tenham sido abertos.

O regulamento prevê o reconhecimento imediato de decisões relativas àabertura, tramitação e encerramento dos processos de insolvência abran-gidos pelo seu âmbito de aplicação, bem como de decisões proferidas emconexão directa com esses processos.

Em princípio, toda a decisão que determine a abertura de um processo deinsolvência deve ser reconhecida em todos os Estados-Membros (artigo 16.º),produzindo, sem mais formalidades, os mesmos efeitos que lhe são atri-buídos pela lei do Estado de abertura do processo (artigo 17.º), excepto seproduzir efeitos manifestamente contrários à ordem pública desse Estado(artigo 26.º). Além do mais, a designação de síndico e todos os poderes quelhe são reconhecidos pela lei do Estado de abertura do processo sãoplenamente reconhecidos em todos os Estados-Membros (artigo 18.º).

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V. A COOPERAÇÃO JUDICIÁRIA EM MATÉRIA PROCESSUAL

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O Regulamento relativo à citação e notificação de actos

Para que haja um bom funcionamento da cooperação entre as autori-dades judiciais do Estados-Membros da União Europeia, é necessárioque a transmissão de actos judiciais e extrajudiciais seja efectuada demodo célere e seguro. O Regulamento (CE) n.º 1348/2000, de 29 deMaio de 2000, relativo à citação e à notificação dos actos judiciais eextrajudiciais em matéria civil e comercial nos Estados-Membros,diz respeito à transmissão de actos de um Estado-Membro para outroEstado-Membro para efeitos de citação ou de notificação. EsteRegulamento vigora em todos os Estados-Membros desde 31 de Maiode 2001, com excepção da Dinamarca. Em matéria de transmissão deactos, aplicase a Convenção de Haia de 1965, relativa à citação e ànotificação de actos entre a Dinamarca e os outros Estados-Membros.

A Sociedade A do Estado-Membro 1 intentou uma acção deindemnização de elevado valor contra a Sociedade B doEstado-Membro 2. 14 meses após o início do processo, otribunal decidiu à revelia, dando provimento ao pedido daSociedade A. A Sociedade A requereu então uma declaraçãode executoriedade da decisão para que esta fosse executávelno tribunal competente do Estado-Membro 2, no qual aSociedade B é proprietária de bens imóveis. No entanto, apósum exame cuidado do caso, o tribunal considerou que setinham verificado vícios na citação da Sociedade B. Emconsequência, o exequatur foi negado. Alguns meses depois, aSociedade B instaurou um processo de insolvência e aSociedade A vêse forçada a desistir da sua pretensão.

1 O funcionamento correcto das citações e notificações tem umaimportância fundamental nos processos judiciais. Um vício nasua realização pode comprometer seriamente os interessesjurídicos das partes. Nos últimos anos, a citação e notificação departes em Estados terceiros temse revelado fonte de inúmerasdificuldades nos litígios transfronteiriços. A existência de regrassimples e práticas para as citações e notificações transfronteiriçasconstitui uma das mais importantes condições para um correctofuncionamento do sistema processual civil europeu.

Este Regulamento teve o propósito de simplificar o mecanismo dacitação e notificação nos processos transfronteiriços. Para o efeito, todosos Estados-Membros designaram entidades locais, designadas de“entidades de origem” e “entidades requeridas”, responsáveisrespectivamente pela transmissão e recepção de actos judiciais eextrajudiciais. O acto a transmitir deve ser acompanhado de um pedido,de acordo com o formulário normalizado anexo ao Regulamento. Aentidade de origem procede ao envio do acto e respectivo pedido paraa entidade requerida que tiver sido designada no Estado em que o actodeva ser praticado. Esta entidade requerida procede ou manda procederà citação ou notificação do acto, quer segundo a lei do Estado-Membrorequerido, quer segundo a forma própria pedida pela entidade deorigem, a menos que essa forma seja incompatível com a lei daqueleEstado-Membro. A entidade requerida pode recusar a recepção do actoque deva ser praticado se este não estiver redigido na língua oficial doEstado-Membro requerido ou numa língua do Estado-Membro de origemque o destinatário compreenda. Quando estiverem cumpridas asformalidades relativas à citação ou notificação do acto, a entidaderequerida lavra uma certidão de cumprimento, que será enviada à

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entidade de origem. Quer a entidade de origem, quer a entidade reque-rida devem utilizar o formulário constante do anexo ao Regulamento. AComissão Europeia elaborou um manual prático com indicação das enti-dades requeridas em cada Estado-Membro. Cada Estado-Membro desi-gnou uma “entidade central” encarregada de fornecer informações àsentidades de origem e de procurar soluções para as dificuldades quepossam surgir por ocasião da transmissão de actos para efeitos de cita-ção ou notificação.

O Regulamento estabelece ainda os seguintes meios de transmissão deactos: transmissão por via diplomática ou consular, citação ou notificaçãode actos por agentes diplomáticos ou consulares ou citação ou noti-ficação directamente pelo correio. Os interessados num processo judicialtambém podem promover as citações e notificações de actos judiciaisdirectamente por diligência de oficiais de justice, funcionários ou outraspessoas competentes do Estado-Membro requerido, salvo se esseEstado-Membro tiver comunicado que se opõe às citações e notificaçõesde actos judiciais por “via directa” no seu território.

O Regulamento relativo à obtenção de prova

Nos processos transfronteiriços é muitas vezes essencial, para umadecisão num processo em matéria civil ou comercial pendente notribunal de um Estado-Membro, a obtenção de provas noutro Estado-Membro. O Regulamento (CE) n.º 1206/2001, de 28 de Maio de 2001,relativo à cooperação entre os tribunais dos Estados-Membros nodomínio da obtenção de prova em matéria civil ou comercial criouum sistema aplicável a toda a Comunidade de transmissão e execução

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de pedidos de obtenção de provas entre tribunais e traçou critériosprecisos relativamente à forma e ao conteúdo do pedido. ORegulamento é aplicável em toda a Comunidade desde 1 de Janeiro de2004, excepto na Dinamarca. Na Dinamarca, aplicase a Convenção deHaia sobre a Obtenção de Provas no Estrangeiro em Matéria Civil eComercial de 18 de Março de 1970. No entanto, nem todos osEstados-Membros assinaram esta Convenção.

O Regulamento estabelece duas formas de obtenção de prova noutroEstado-Membro. O tribunal do foro de um Estado-Membro poderequerer ao tribunal competente de outro Estado-Membro a obtençãodas provas necessárias, ou pode obter as provas directamente noutroEstado-Membro. O Regulamento fundase no princípio da transmissãodirecta entre tribunais, segundo o qual os pedidos com vista à obtençãode provas são directamente transmitidos pelo “tribunal requerente” ao“tribunal requerido”. Cada Estado-Membro elaborou uma lista dostribunais competentes para efectuar a obtenção de provas ao abrigo doRegulamento. Esta lista indica igualmente o âmbito de competênciaterritorial desses tribunais. Além disso, cada Estado-Membro designouuma entidade central encarregada de fornecer informações aos tribunaise de procurar soluções para as dificuldades que possam surgir emrelação a um pedido.

O Regulamento define critérios precisos relativamente à forma e aoconteúdo do pedido, que constam de um formulário específico em anexosao diploma. Os pedidos de obtenção de prova devem ser prontamenteexecutados pelo tribunal requerido, no prazo máximo de 90 dias a contarda data da recepção do pedido. Não sendo possível a execução do

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pedido dentro deste prazo, o tribunal requerido deve informar do facto otribunal requerente, comunicandolhe os motivos que obstaram à suarápida execução.

Um pedido de audição de uma pessoa não será executado se a pessoaem causa invocar o direito de se recusar a depor ou indicar estar proibidade depor nos termos da legislação do Estado-Membro do tribunalrequerido ou da legislação do tribunal requerente. Fora estes casos,apenas em restritas circunstâncias de índole excepcional pode haverrecusa em depor.

O tribunal requerente, no seu pedido com vista à obtenção de provas,deve especificar se as partes e, se for caso disso, os seus representantesestarão presentes na obtenção de provas, ou se são solicitados aestarem presentes. O tribunal requerido executará o pedido de acordocom a legislação do seu Estado-Membro. A obtenção de provas podeainda ser executada segundo um procedimento especial, previsto na leido Estado-Membro do tribunal requerente, no caso de este último osolicitar. O tribunal requerido tem que atender a essa solicitação, amenos que tal procedimento seja incompatível com a lei do seu Estado-Membro. O Regulamento estabelece também que a obtenção de provaspode ser feita mediante recurso a tecnologias modernas, tais como avideoconferência e a teleconferência.

O requerimento para a obtenção directa de provas deve ser apresentadoà entidade central ou à autoridade competente do outro Estado-Membro, a qual só pode recusar a solicitação em circunstâncias excep-cionais. A obtenção directa de provas apenas poderá ocorrer se for feita

numa base voluntária, sem recorrer a medidas coercivas. A obtenção deprovas é efectuada por um magistrado ou por outra pessoa, por exemploum perito designado segundo a legislação do Estado-Membro dotribunal requerente

A Rede Judiciária Europeia em matéria civil e comercial

Em 1 de Dezembro de 2002, foi criada a Rede Judiciária Europeia emmatéria civil e comercial com vista a facilitar a cooperação judiciária entreEstados-Membros e a fornecer informações ao público para facilitar oseu acesso aos sistemas jurisdicionais nacionais. O seu fim foi tambémo de implementar e actualizar, passo a passo, um sistema informativodireccionado ao público, de modo a facilitar o referido acesso aossistemas jurisdicionais nacionais, particularmente através de um sítio naInternet. Este sistema informativo, que tem que ser editado em todas aslínguas oficiais da UE, está actualmente a ser criado através do seguintesítio na Internet http://europa.eu.int/comm/justice_home/ejn/

Em todos os Estados-Membros, encontramse disponíveis um ou maisPontos de Contacto, de modo a fornecer às autoridades judiciais eadministrativas informação completa e actualizada sobre a Lei dos outrosEstados-Membros e a permitirlhes solucionar problemas transfronteiriçoscom os quais se confrontam.

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VI . ACESSO À JUSTIÇA

A directiva sobre o apoio judiciário

Numa Europa de fronteiras abertas, são muitas as situações quepodem levar a que os cidadãos se vejam envolvidos em litígiosperante tribunais de outros Estados-Membros. Os litígios transfrontei-riços não envolvem necessariamente grandes empresas, podem, pelocontrário, afectar pequenas empresas e pessoas singulares comrecursos financeiros mais modestos. Estes litígios podem ser bastantedispendiosos, mormente quando estejam em causa créditos avul-tados. Genericamente, a litigância transfronteiriça requer aconstituição de defensor no Estado-Membro em que o litígio é levadoa tribunal, bem como a prestação de assistência jurídica por um advo-gado do Estado-Membro do qual a parte é um nacional, além defrequentemente implicar a realização de traduções, deslocações eoutros custos extra.

A Directiva 2002/8/CE do Conselho foi aprovada pelo Conselho emJaneiro de 2003. A sua finalidade passa por ultrapassar os obstáculosexistentes em matéria de acesso ao apoio judiciário, permitindo quetodos os cidadãos da União Europeia possam beneficiar do apoiojudiciário noutro Estado-Membro em condições idênticas àquelas quebeneficiariam no seu próprio Estado. O objectivo da Directiva consisteem melhorar o acesso à justiça nos litígios transfronteiriços, atravésdo estabelecimento de regras mínimas comuns relativas ao apoiojudiciário no âmbito desses litígios. A transposição da Directiva parao direito interno dos Estados-Membros deverá ser efectuada, na suamaior parte, até ao dia 30 de Novembro de 2004. Quanto às secçõesrelativas ao apoio judiciário pré-contencioso com vista a um acordoprévio a uma eventual acção judicial, o prazo para implementação daDirectiva termina em 30 de Maio de 2006.

1É comunicado ao Senhor A, cidadão do Estado-Membro 1, quefoi intentada acção judicial contra si no Estado-Membro 2. Estaacção tem um valor aproximado de 235 000 euros, resultadodos danos alegadamente causados pelo seu filho de 12 anosdurante as férias que o Senhor A e a sua família passaram noEstado-Membro 2. O Senhor A, que tem duas filhas, masnenhum filho, foi informado que uma firma de advogados doEstado-Membro 2 requeria um mínimo de 8 000 euros para orepresentar em juízo, sendo que apenas uma pequena partedeste montante seria recuperável, caso o Autor perdesse aacção. O Senhor A e a sua família têm um rendimento líquidomensal de 1 850 euros. Esta família está muito preocupadacom os custos deste processo e não sabe como contactar comum advogado local do Estado-Membro 2. O prazo fixado pelotribunal para o Senhor A apresentar a sua contestação estáprestes a expirar.

A difícil situação em que o Senhor A se encontra é um exemplotípico de um dos muitos obstáculos com que os cidadãos dosdiversos Estados-Membros se deparam, quando se encontramenvolvidos em litígios transfronteiriços. Este problema colocasecom particular acuidade naqueles casos em que a acção é inten-tada no tribunal de um Estado-Membro diferente daquele do Réu,o que implica, em regra, a necessidade de recorrer a serviços deassistência jurídica e representação forense em dois Estados-Membros distintos. Somemse a isto os problemas linguísticos ede custos e pode de facto erigirse um muro de dificuldades. Naverdade, podem existir não só barreiras linguísticas, que impli-cam dispendiosas traduções de documentos, mas também cus-

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tos conexos que podem resultar, por exemplo, da necessidadede a parte comparecer presencialmente perante o tribunal deoutro Estado-Membro. .

A presente Directiva aplicase a casos de litígios transfronteiriços denatureza civil ou comercial, mas apenas se a parte que requerer o apoiojudiciário tiver domicílio ou residência habitual num Estado-Membroque não aquele da situação do tribunal ou no qual a decisão vai serexecutada. O seu fito é promover a aplicação do princípio daconcessão de apoio judiciário em litígios transfronteiriços às pessoasque não disponham de recursos suficientes, na medida em que esseapoio seja necessário para assegurar um acesso efectivo à justiça. Dereferir ainda que a Directiva contém disposições destinadas a sim-plificar e acelerar a transmissão dos pedidos de apoio judiciário, porintermédio de uma coordenação da cooperação judicial entre Estados-Membros.

O apoio judiciário é concedido ou recusado pela autoridade competentedo Estado-Membro do foro ou do Estado-Membro onde a decisão deveser executada. O apoio judiciário não deve cobrir apenas o processojudicial, mas também a execução de instrumentos autênticos noutroEstado-Membro e procedimentos extrajudiciais, desde que a sua utilizaçãoseja exigida por lei ou autorizada pelo tribunal. O apoio judiciário devegarantir a assistência judiciária e a representação do beneficiário emjuízo, bem como a dispensa ou a assunção dos encargos do beneficiáriocom o processo, bem como os encargos directamente relacionadoscom o carácter transfronteiriço do litígio, tais como os que se prendemcom interpretação, tradução de documentos exigidos ou despesas dedeslocação.

O Estado do domicílio do beneficiário do apoio judiciário deve ajudálo napreparação do pedido de apoio judiciário e deve providenciar pelatransmissão deste ao Estado-Membro do foro. Os Estados-Membrosdevem designar as autoridades competentes para o envio (“autoridadesde transmissão”) e para a recepção (“autoridades de recepção”) dospedidos de apoio judiciário. A fim de facilitar a transmissão dos pedidos,deve ser criado um formulário tipo para os pedidos de apoio judiciário epara a transmissão desses pedidos.

Proposta de directiva relativa à indemnização das vítimas da criminalidade

Em 16 de Outubro de 2002, a Comissão Europeia propôs umadirectiva relativa à compensação das vítimas da criminalidade, como objectivo de estabelecer um conjunto de regras mínimas de com-pensação por parte do Estado às vítimas de crimes cometidos nosEstados-Membros e de facilitar o acesso à compensação em casostransfronteiriços. A proposta de directiva visa obrigar todos os Estados-Membros a providenciar por uma indemnização adequada às vítimas e agarantir um acesso fácil a uma indemnização estatal, independente-mente do Estado da UE em que a pessoa foi vítima do crime. Umacooperação mais estreita entre as autoridades nacionais facilitará oacesso a uma indemnização nas situações transfronteiriças.

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Actualização

Após a finalização da presente brochura, foram adoptados os seguintes textos:

- Regulamento (CE) n.º 805/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de Abril de 2004, que cria otítulo executivo europeu para créditos não contestados

- Directiva relativa à indemnização das vítimas da criminalidade

Além disso, a Comissão apresentou uma proposta de regulamento que cria um procedimento europeu de injunção depagamento. Prevê-se que, até ao final do ano, sejam apresentadas propostas sobre a mediação e a resolução de pequenoslitígios.

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