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1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X "EU VIM AQUI FAZER UMA CONFISSÃO": AS ENCRUZILHADAS DA PESQUISA SOBRE ABORTO PROVOCADO NO CONTEXTO DE CRIMINALIZAÇÃO. Paula Rita Bacellar Gonzaga 1 Lina Maria Brandão de Aras 2 Resumo: O presente trabalho apresenta reflexões sobre os impasses e avanços vivenciados ao longo do da pesquisa de mestrado 'Eu quero ter esse direito à escolha": Formações discursivas e itinerários abortivos em Salvador' desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo da Universidade Federal da Bahia. A criminalização do aborto, prevista no Código Penal de 1940, impõe dificuldades à pesquisa sobre a temática do abortamento, produzindo impasses jurídicos no campo da produção do conhecimento e fortalecendo nas mulheres medo de falar sobre essa experiência. Diante disso a realização da referida pesquisa se deu a partir do questionamento dos processos de identificação e seleção das participantes, o que culminou numa inversão metodológica onde a exposição da proposta, em redes de mulheres, possibilitou que 12 interlocutoras se identificassem e sinalizassem interesse em participar desse trabalho. O uso de entrevistas narrativas possibilitou que essa experiência, majoritariamente mantida em sigilo, pudesse ser relatada a partir da construção de cada interlocutora. Foram relatados 22 itinerários abortivos, as entrevistas foram transcritas e trabalhadas a partir da proposta de análise do discurso foucaultiana através da qual foi possível privilegiar analiticamente as concepções dessas mulheres sobre sexualidade, reprodução, o Estado e o controle de seus corpos e sobre a constituição dos seus sentimentos sobre a interrupção provocada. Palavras-chave: Aborto, Formações Discursivas, Itinerários Abortivos, Análise do Discurso Introdução Quais os desafios de se pesquisar sobre aborto provocado num país onde a prática é crime, o conservadorismo religioso organiza a política nacional e onde o mito do amor materno como instinto simbiótico da maternidade ainda opera na vida das mulheres? Quais os impedimentos institucionais, afetivos, jurídicos, morais e sociais de se ter como problema de pesquisa itinerários abortivos vivenciados na clandestinidade? Me deparei com essas e muitas outras questões ao longo da minha trajetória acadêmica, afinal, por que mulheres que conseguiram sobreviver sem 1 Doutoranda em Psicologia Social na Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil. 2 Professora Titular da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia, Salvador, Brasil.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

"EU VIM AQUI FAZER UMA CONFISSÃO": AS ENCRUZILHADAS DA

PESQUISA SOBRE ABORTO PROVOCADO NO CONTEXTO DE

CRIMINALIZAÇÃO.

Paula Rita Bacellar Gonzaga1

Lina Maria Brandão de Aras2

Resumo: O presente trabalho apresenta reflexões sobre os impasses e avanços vivenciados ao

longo do da pesquisa de mestrado 'Eu quero ter esse direito à escolha": Formações discursivas e

itinerários abortivos em Salvador' desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Estudos

Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo da Universidade Federal da Bahia. A

criminalização do aborto, prevista no Código Penal de 1940, impõe dificuldades à pesquisa sobre

a temática do abortamento, produzindo impasses jurídicos no campo da produção do

conhecimento e fortalecendo nas mulheres medo de falar sobre essa experiência. Diante disso a

realização da referida pesquisa se deu a partir do questionamento dos processos de identificação e

seleção das participantes, o que culminou numa inversão metodológica onde a exposição da

proposta, em redes de mulheres, possibilitou que 12 interlocutoras se identificassem e

sinalizassem interesse em participar desse trabalho. O uso de entrevistas narrativas possibilitou

que essa experiência, majoritariamente mantida em sigilo, pudesse ser relatada a partir da

construção de cada interlocutora. Foram relatados 22 itinerários abortivos, as entrevistas foram

transcritas e trabalhadas a partir da proposta de análise do discurso foucaultiana através da qual

foi possível privilegiar analiticamente as concepções dessas mulheres sobre sexualidade,

reprodução, o Estado e o controle de seus corpos e sobre a constituição dos seus sentimentos

sobre a interrupção provocada.

Palavras-chave: Aborto, Formações Discursivas, Itinerários Abortivos, Análise do Discurso

Introdução

Quais os desafios de se pesquisar sobre aborto provocado num país onde a prática é crime,

o conservadorismo religioso organiza a política nacional e onde o mito do amor materno como

instinto simbiótico da maternidade ainda opera na vida das mulheres? Quais os impedimentos

institucionais, afetivos, jurídicos, morais e sociais de se ter como problema de pesquisa itinerários

abortivos vivenciados na clandestinidade? Me deparei com essas e muitas outras questões ao

longo da minha trajetória acadêmica, afinal, por que mulheres que conseguiram sobreviver sem

1Doutoranda em Psicologia Social na Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil. 2Professora Titular da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia, Salvador,

Brasil.

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Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

sanções penais e sociais a interrupções de gravidezes não desejadas aceitariam me contar sobre

essas histórias? Por que elas desejariam trazer para o campo da linguagem e da escrita

experiências até então segredadas em absoluto?

O Movimento feminista tem debatido a questão do aborto como um direito da mulher ao

próprio corpo e da gestão da sua própria capacidade reprodutiva, afirmativas com as quais

coaduno, e as quais acrescentamos outro ângulo de análise nesse texto. Ao criminalizar o aborto,

ao se investir tão copiosamente em discursos punitivos e recriminatórios sobre essa prática, no

campo político e religioso, se furta das mulheres não apenas o direito aos seus corpos e suas

potencialidades reprodutivas, mas também o direito de falar sobre suas histórias, sobre

experiências não traumáticas ou não degradantes de abortamento. Existe uma história sobre

abortamento que é a história das mulheres que abortaram e que a penalização, jurídica e moral,

impede de ser contada, produzindo inclusive, impactos na produção de conhecimento sobre esse

fenômeno.

Muito do que se sabe sobre a magnitude do aborto no Brasil atualmente é baseado em

estimativas advindas dos números de internações em unidades do Sistema Único de Saúde (SUS)

o que por si implica em uma defasagem imensa quando consideramos que se feito em condições

salubres e seguras o aborto é um procedimento de baixa complexidade e que pode ser finalizado

sem complicações ou sem intervenções hospitalares. Por outro lado, é pouco provável que todos

os casos de abortos com complicações sejam notificados como tal, visto que as mulheres temem

revelar o motivo da internação e que os profissionais muitas vezes não estão preparados para

abordarem a questão. A extensão desse limbo onde o fenômeno do abortamento se encontra pode

ser representado pelos achados de Diniz, Medeiros e Madeiro (2017) que indicam que pelo

menos 1 em cada 5 mulheres residentes nas zonas urbanas do país aos 40 anos vai ter realizado

ao menos um aborto, desse valor total quase metade busca os serviços de saúde devido a

complicações, as demais mulheres, como escuta-las?

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Em busca de histórias não contadas a pesquisa de mestrado “‘Eu quero ter esse direito à

escolha’: Formações discursivas e itinerários abortivos em Salvador”3 desenvolvida no Programa

de Pós-Graduação em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo da

Universidade Federal da Bahia objetivou compreender como formações discursivas operam nos

itinerários abortivos de mulheres soteropolitanas e é a partir dessas narrativas que surge a

necessidade de refletir sobre como produzir conhecimento sobre um fenômeno profundamente

estigmatizado e que ainda implica em sanções penais e sociais para as mulheres? Desse modo,

esse texto propõe analisar a dimensão do segredo em contexto de criminalização como um

dispositivo discursivo de silenciamento político das mulheres que vivenciaram abortamentos e

que reitera desconhecimento, preconceitos e violências institucionais, simbólicas, físicas e

psicológicas contra as mulheres, além de produzir impedimentos no campo científico, como a

dificuldade de acesso a essas mulheres.

Mas enfim, quem são essas mulheres?

Clandestinas: Somos muitas.

O caminho até as informantes apresentava impedimentos de cunho jurídicos e morais:

como abordar mulheres sobre uma possível experiência de interrupção voluntária de gravidez

sendo que essa ainda é uma prática considerada crime, passível de punição com privação de

liberdade, e ainda é um tema de grande comoção e retaliação social? Me deparava diante de um

dilema crucial: como escutar as histórias que escaparam do ambiente hospitalar, que não estão

contabilizadas ou escritas, como escutar histórias que não foram contadas? Nesse sentido a

pesquisa passa por uma virada metodológica, a compreensão do fenômeno do abortamento como

uma experiência que é largamente negada e recriminada às mulheres, propus que coubesse a elas

me contarem, caso desejassem, essas história, desse modo não fui eu, enquanto pesquisadora, que

identifiquei as minhas interlocutoras, mas sim, foram elas que escolheram dividir suas narrativas

comigo. A partir de um texto de apresentação que compartilhei por e-mail com um grupo de

3A dissertação foi defendida em banca pública realizada em 28 de janeiro de 2016 na Faculdade de Filosofia e

Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia.

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mulheres do meu círculo de conhecimento (colegas de graduação, mestrado, professoras, ex-

colegas de trabalho, amigas e companheiras de movimentos feministas) sinalizei meu interesse

em escutar histórias sobre itinerários abortivos, que esse era meu problema de pesquisa e que

caso, a pessoa pudesse ou conhecesse alguém que pudesse contribuir com esse projeto poderia

me contatar. A mensagem foi compartilhada em um grupo fechado da rede social facebook onde

todas as integrantes eram mulheres e também encaminhado por e-mail para outras mulheres a

quem essa primeira rede identifcou como possíveis interlocutoras.

Doze mulheres me procuraram. Atali, Bastet, Brigid, Sarasvati, Picê, Zarina, Tanit,

Thêmis, Yara, Perséfone, Kali, Dandara4 são as doze interlocutoras que foram entrevistas ao

longo do ano de 2015 e que narraram seus itinerários abortivos e suas reflexões sobre

contracepção, maternidade, aborto, reprodução, machismo, justiça e família. Kali, Zarina,

Thêmis, Tanit souberam da pesquisa por pessoas conhecidas em comum e após sinalizarem

interesse em participar tive acesso aos seus contatos e marcamos as entrevistas. Bastet, Brigid,

Picê, Yara, Dandara e Sarasvati eu conhecia anteriormente ao momento de realização do projeto,

mas ao saberem do meu tema me contataram sinalizando interesse em contribuir. Atali e

Pérsefone me procuraram diretamente após receberem a carta de apresentação pelo grupo de

facebook anteriormente citado. As idades no momento das entrevistas variavam entre 26 e 65

anos, Bastet e Thêmis se auto declaram como brancas, Yara, Brigid, Dandara, Tanit e Pérsefone

como negras e Zarina, Sarasvati, Kali, Atali e Picê como pardas. Foram narrados 22 itinerários

abortivos, sendo compreendido como itinerário abortivo o conceito adaptado a partir da literatura

socioantropológica e sua definição original de itinerários terapêuticos que compreende a gama de

estratégias de indivíduos diante do adoecimento (AREND; ASSIS e MOTTA, 2012). O conceito

de itinerários abortivos, então, concerne ao repertório de métodos e técnicas utilizadas por

mulheres desde a identificação do atraso menstrual até as estratégias de abortamento

efetivamente.

4Todos os nomes são fictícios de modo a garantir o sigilo das identidades das interlocutoras.

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Dentre as 22 narrativas de itinerários abortivos (Atali-1; Brigid -1; Bastet -1; Dandara -1;

Picê -1; Sarasvati -2; Zarina -3; Pérsefone- 4; Tanit -2; Kali -02; Thêmis – 03; Yara – 1), 13 foram

provocados por via medicamentosa com uso do comprimido identificado pelas interlocutoras

como cytotec5; 8 foram realizados em clínicas comuns de ginecologia situadas em bairros de

classe média e classe alta na cidade de Salvador – Ba e um foi realizado na casa uma vizinha da

interlocutora Pérsefone, que na época contava 16 anos e foi levada a essa casa por sua mãe, onde

o aborto foi provocado mecanimanete, por sonda com conteúdo desconhecido pela adolescente.

Entre todos esses casos, sete implicaram em complicações que levaram a buscar por atendimento

em serviço de saúde: seis deles na rede pública e um na rede privada. Isso reflete um grupo de

mulheres que narra abortos provocados ao longo de um período de ascensão econômica e

intelectual (Formatura, ingresso no mestrado, ingresso na faculdade, início de novo emprego,

emprego com viagens de campo, planos de mudança de cidade) e de iniciação da prática sexual

heterossexual (gravidezes que ocorrem no fim da adolescência ou início da vida adulta, por erro

no uso da pílula anticoncepcional, com o primeiro ou segundo parceiro fixo, logo após primeira

relação sexual ou após violência sexual). As transições marcam as ponderações que elas fazem

sobre si mesmas, seu desejo ou não desejo pela maternidade, a descrença no parceiro no exercício

da paternidade e a concepção de que levar uma gravidez a termo implica em assumir,

majoritariamente toda responsabilidade por um possível filho.

Rocha-Coutinho (2006) defende o uso da narrativa oral como uma das melhores formas

do pesquisador acessar não apenas os fatos e atividades, como também os sentimentos e a

experiência emocional dos participantes da pesquisa. Assim, a escolha pela utilização de

entrevistas narrativas compreende a necessidade de que sejam essas mulheres as autoras dessas

histórias, privilegiando seu modelo de organização do pensamento, de explanação e o tempo que

cada uma requer para abordar os aspectos mais delicados desses itinerários, afinal a entrevista

narrativa é uma técnica utilizada para gerar histórias (BAUER; JOVCHELOVITCH, 2002), as

quais têm compromisso não apenas com a verdade, mas com a verdade vivenciada por cada

sujeito. Em consonância com essa perspectiva as narrativas foram trabalhadas a partir da análise

5Cytotec é o nome fantasia de um dos medicamentos produzido a partir do componete misoprostol.

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do discurso e da concepção de Foucault (2014) de que a produção, circulação, legitimação,

organização e distribuição dos discursos obedece a uma necessidade que seus perigos e poderes

sejam conjurados, controlados. Diante da problemática do aborto a análise do discurso cabe para

se pensar como as formações discursivas foram legitimadas historicamente para chegarem à

contemporaneidade com status de verdade, porque essas formações e não outras?

Como aponta Gregolin (2001) o sentido que reconhecemos para algo é um sentindo

construído e cimentado a partir de um processo que excluiu outras possibilidades de sentido e

significância. Logo se no Brasil contemporâneo o aborto ainda segue envolto numa névoa de

segredo, crime e pecado é porque essas formações discursivas cimentaram suas defesas e

segregaram outras formações que poderiam ter se sobressaído. A análise das narrativas

produzidas nessa pesquisa não pretende generalizar experiências, mas sim, reconfigurar, ainda

que pontualmente, no cenário do debate sobre o aborto a centralidade das figuras, o aborto é

exaustivamente comentado em campanhas políticas, cultos religiosos, ambientes familiares e na

maioria das vezes o consenso da penalização impossibilita que as mulheres que efetivamente

vivenciaram essa experiência possam, se assim desejarem, falar sobre isso. Aborto continua

sendo um tema maldito no Brasil e como veremos no relato das interlocutoras, admitir ter

abortado implica em sanções nas relações pessoais, familiares e profissionais.

“na verdade eu falo, eu tenho tranquilidade de falar sobre aborto, sobre a quantidade de

abortos que eu fiz, não tenho problema nenhum em falar sobre isso. O problema está na

pessoa que escuta isso. Você não pode hoje chegar em um jantar de amigos que estejam

comentando sobre aborto e falar: ‘eu fiz aborto’, ou ‘eu fiz três abortos’. As pessoas te

olham diferente, você deixa de ser uma pessoa admirável. Você deixa de ser uma

estudiosa da agressão contra a mulher, você deixa de ser uma pessoa que foi bem no seu

curso inteiro da faculdade, você deixa de ser uma boa profissional, não porque você fez

um aborto, mas porque você tirou a vida, a suposta vida de uma criança, que pode ser

que não existisse. Então é difícil pra pessoa que aborta falar sobre isso abertamente, até

mesmo dentro da sua família, as pessoas não aceitam o aborto, te veem de uma forma

diferente, tem uma visão muitas vezes realmente de pecado, de assassinato. Que é muito

discutível, né? Você entra aí nas questões religiosas, nas questões do direito, inúmeras

questões até saber se você foi ou não uma assassina, se você matou ou não um feto.

Então, as pessoas te olham diferente, te julgam de fato.” (THÊMIS)

Desse modo o texto segue com a proposta de refletir sobre os efeitos da manutenção do

aborto entre interditos. Quais as histórias não ditas dessas mulheres e quais estratégias elas

utilizam para elaborar significados e interpretações para experiências tão largamente recriminadas

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na sociedade, mas que efetivamente, não encontram muitos espaços possíveis para serem

narradas em primeira pessoa?

Labirintos morais, políticos, religiosos e jurídicos em itinerários abortivos

A primeira interdição nas narrativas sobre aborto aparece vinculada a grupo familiar. A

repreensão de familiares mais próximos é o temor que mais eficientemente regula escolhas,

acesso e relatos sobre abortamento. Millet (1975) define a família como uma unidade do

patriarcado que opera para sustentá-lo e para ensinar aos indivíduos os valores desiguais de

temperamento e comportamentos entre os sexos; nesse sentido as interlocutoras omitem de seus

familiares o que poderia ser lido como uma infração dos códigos socialmente estabelecidos para

as mulheres: a gravidez fora do matrimônio e a indução do abortamento voluntariamente. Num

primeiro momento o desconhecimento da família é uma medida preventiva, visto que todas as

informantes acreditam que a família não apoiaria a ideia da interrupção e insistiria pela

manutenção da gravidez ainda que indesejada, mas quando reavaliam os motivos pelos quais as

famílias seguem sem saber mesmo tendo se passado anos, as interlocutoras identificam que essa

descoberta pode impactar nos afetos familiares sobre elas:

“Da minha família ninguém, ninguém sabe, porque [pausa] acho que rola também aquela

coisa, eu acho que vou decepcionar muito, eu tenho isso comigo, não que eu seja uma

filha exemplar, maravilhosa, eu sempre fui muito rebelde em tudo, mas assim eu acho

que não precisa, é aquela coisa assim, se você não pode ajudar também não prejudique,

não é que eu queria limpar minha imagem não, minha mãe sabe que eu não sou nenhuma

santa, não que isso seja uma coisa: “Ó que erro, tá errado” não, mas sei lá acho que não

precisa disso sabe?” (TANIT)

Pra mim foi muito traumático, foi horrível, principalmente porque não tinha apoio

nenhum da família, eu fazia isso porque se a família não ia aceitar, ninguém ia aceitar

fazer, preferia que eu assumisse as consequências do ato, então eu fazia, fiz sozinha

praticamente, um amiga que foi me buscar e me deixou lá em casa, mas eu que tive que,

tive que assumir todas as consequências, então o emocional ficou muito abalado.

(ZARINA)

E eu falo isso hoje com mais naturalidade, não espalho pra todo mundo porque foi uma

coisa que não chegou pra minha família, eu não tive coragem de dizer. (KALI)

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O peso da moralidade que recai sobre as mulheres é imposto por uma série de

instrumentos de controle da sexualidade feminina que reverberam na construção da identidade

das mulheres e que alteram o auto-conceito que elas constroem de si próprias (GONZAGA,

2015). A ideia de que uma prática sexual ou reprodutiva determinam posições sociais para

sujeitos é parte de um modelo patriarcal de sociedade que não é efetivo em coibir tais práticas,

mas é bastante eficaz na hierarquização de indivíduos, na exploração da capacidade reprodutiva

das mulheres e na destituição dos sujeitos como detentores de direitos sobre seus corpos e

desejos. Nesse sentido é fundamental que se estabeleça a ligação entre os discursos

recriminatórios que cercam o aborto com toda uma estrutura linguistica, política, cultural e social

que também cercam a sexualidade feminina como um todo, isso fica nítido no relato de

Pérsefone:

“Só que eu não tive coragem de contar para ninguém, nem pra ele. Só que eu não sabia o

que fazer, eu tinha dezesseis anos, ia ser uma decepção muito grande pra minha mãe,

minha mãe é uma figura muito central na minha vida. Aí eu não tive coragem de contar

pra ninguém, então eu fiquei vivendo aquilo sozinha e eu comecei a me aterrorizar

quando eu via que minha menstruação não vinha. Aí eu ficava desesperada, toda noite eu

rezando, pedindo a Deus pra não estar grávida.... sempre teve essa coisa muito forte de

pecado, de que mulher não pode ter sexo, de que as meninas têm que se guardar pro

casamento. Essa coisa do tradicionalismo, minha família toda e eu me sentia muito

culpada, era tudo muito confuso na verdade, eu era uma criança.Aí quando chegou lá

que viram que eu estava grávida mesmo foi horrível, minha mãe começou a chorar e

quando eu vi minha mãe chorando eu comecei a me sentir péssima por causa disso,

porque, sei lá. Aí minha mãe me levou pra casa e foi na casa dele conversar com ele,

com a mãe dele, com a família dele, só que minha mãe sabia que ele não era o tipo de

homem que ela queria pra mim. A mãe dele ficava dizendo que ele ia casar comigo, mas

minha mãe não queria que ele casasse comigo só porque eu tava grávida e ao mesmo

tempo ela não queria uma filha grávida, solteira e em casa... Eu tinha que ser uma boa

filha e uma boa filha não engravidava, uma boa filha não fazia sexo, uma boa filha,

entendeu? Eu queria ser uma boa filha. É bobagem, mas isso em mim é forte, a imagem

da minha mãe, o que minha mãe representa pra mim é muito forte. Entendeu?A questão

da minha mãe era muito essa, que eu era mulher, eu era uma menina, que eu não era

casada, que as pessoas iam me chamar de puta, de não sei o quê, entendeu? E até hoje

minha mãe é assim . (PERSÉFONE)

Ao constatar que de alguma forma o controle não foi eficaz a mãe de Pérsefone se vê

diante de um dilema, aceitar que a filha se case com alguém que ela não aprova, que a filha não

deseja, para não ter de admitir uma gravidez fora do casamento ou considerar a possibilidade de

abortar? De acordo Foucault (1988) o matrimônio é posto como referencial centrífugo no que se

refere à sexualidade legítima e reprodutiva. É através desse modelo que as formas improdutivas

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de sexualidade serão desqualificadas e expostas aos vocábulos de abominação e rechaço social,

como justificar a gravidez de uma adolescente que não é casada sem que ela seja desqualificada

por isso? As considerações que Pérsefone e sua mãe fazem perpassam os valores que são

estabelecidos para as mulheres socialmente na lógica do patriarcado; abortar é uma infração a

esse modelo de mulher virginal e maternal, ser mãe na adolescência implica enfrentar sanções

sociais e desqualificação pelo que seria uma prática sexual ilegitima, fora do matrimonio, por

fim, aceitar o casamento implica em fadar uma adolescente a tutela de outro jovem que já havia

dado sinais de agressividade. A desaprovação da mãe de Pérsefone ao rapaz que a mesma

namorava pesa mais do que seus valores religiosos e faz com ela proponha que a filha interrompa

a gestação. No ano seguinte Pérsefone é espancanda por esse namorado, aos 17 anos, grávida

pela segunda vez dele, na rua onde ela morava; diante dessa situação a mãe propõe ajuda-la a

abortar mais uma vez, é a partir desse segundo abortamento que Pérsefone consegue romper com

esse namoro abusivo que já durou quase dois anos. Apesar de ter contado com o apoio da mãe

religiosa nos dois primeiros itinerários abortivos, Pérsefone diz que ao receber a carta com a

apresentação sobre a pesquisa decide que é momento de falar, porque ninguém sabe que ela já

abortou quatro vezes e como isso abala suas relações:

eu acho que eu vim participar disso aqui meio que pra fazer uma confissão, sabe? Foi

fazer uma confissão. As pessoas, ninguém sabe que aconteceu isso comigo. Sabe

pontualmente, mas que aconteceu quatro vezes ninguém sabe e aí isso me, isso me traz

muitos problemas, conflitos e aí quando eu recebi esse e-mail, não foi nem no e-mail, foi

num grupo no face … A pessoa que postou lá nem me conhece, ainda assim eu pensei

que era hora de eu falar sobre isso e poder ajudar uma pesquisa ou ajudar as mulheres,

enfim. E aí é isso. Vou tentar falar. (PERSÉFONE)

Ao identificar a proposta da pesquisa como um espaço possível de relatar sua história,

Pérsefone faz uma associação com a confissão, Para Foucault (1988) a confissão consiste num

ritual de discurso onde aquele que requer a confissão, o faz por desejo de avaliar, analisar, julgar,

punir ou purificar aquele que se confessa, a instauração desse instrumento de punição tão

largamente difundido reverbera em efeitos profundos naquele que fala fazendo-o acreditar que

esse é o caminho necessário para a absolvição. Ao identificar na proposta da pesquisa um

contexto possível para contar sua história, Pérsefone entende que mais do que absolvição sua

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narrativa pode produzir benefícios para outras mulheres, mulheres que assim como ela precisam

segredar essa experiência.

O fato de ter ou não ter alguma referência de aborto concluído sem denúncia ou morte no

seu círculo de familiares, amigas e colegas é uma questão recorrente entre as interlocutoras. A

ausência de alguém com quem conversar sobre a experiência produz ainda mais insegurança ao

longo do itinerário abortivo, dificulta o acesso a medicamento efetivo e aumenta os riscos do

procedimento, visto que a demora implica no avanço da gestação:

Eu não tinha contato com ninguém, eu pensei até em conversar com uma colega minha

que falou sobre isso em sala e tal, só que eu lembro que ela falou de uma forma tão

negativa que eu fiquei com medo dela ficar falando que era horrível e eu ficar pensando

que ia ser da mesma forma comigo. Eu queria alguém que tivesse uma opinião diferente,

porque a gente também, não sei como foi o processo, eu sabia que não seria fácil, mas

seu eu tivesse o alguém com um relato de tanta dificuldade eu acho que eu ficaria com

mais medo, mais receio, enfim. Eu senti muita falta disso, de ter alguém pra conversar,

alguém que já tivesse passado pela experiência, que aconselhasse. Aí eu vi o quanto a

questão dessa lei do aborto, como seria diferente. (YARA)

A possibilidade de ser acompanhada e orientada, por sua vez, aparece como um

diferencial nas narrativas das interlocutoras que contaram com esse suporte:

Bem, eu contei muito com o apoio da minha irmã, porque a gente não tinha dinheiro. Do

ponto de vista da solidariedade da minha irmã, que é uma coisa que quando eu lembro eu

fico, ufa, que bom que tinha alguém que eu podia falar, que eu podia chegar e dizer,

‘olha, eu tô passando por isso’, porque com minhas outras irmãs eu não falei. E acredito

que se eu tivesse falado teria me apoiado, principalmente minha irmã mais velha.

(SARASVATI)

Sim, isso é essencial, isso é essencial. Se não você enlouquece, você enlouquece,

principalmente eu que sou o tipo de pessoa que não sei esconder as coisas, não sei

[pausa] fingir que estou bem, por exemplo, então, imagine que se eu não tivesse essa

minha amiga, na verdade, na segunda vez foram três amigas importantíssimas eu digo a

elas sempre que se um dia elas decidirem acabar a amizade eu serei grata eternamente de

qualquer jeito, sabe? Porque elas foram essenciais na minha vida. (TANIT)

Quando Tanit diz que ao ajuda-la as amigas foram essenciais em sua vida ela remete a

realidade do aborto clandestino no Brasil, onde casos como o de Jandira Magdalena, cujo corpo

apareceu desmembrado, mutilado, carbonizado e com um tiro na nuca dias após ela sair de casa

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para fazer um aborto ou de Elisangela, deixada na porta de um hospital no Rio de Janeiro com um

tubo de plástico dentro de si e perfurações uterinas e intestinais que a levaram a morte; são

histórias reais que de tempos em tempos são trazidas a grande mídia para lembrar as mulheres de

que algumas pagarão com a vida o preço pela negação da maternidade, ainda que pontualmente.

A retaliação contra as mulheres que abortam passa pela criação de um pânico moral sobre a

questão, fala-se o tempo inteiro sobre, nas igrejas, na televisão, no cenário político, mas os

discursos audiveis são aqueles que identificam as mulheres como infratoras de uma lei que

deveria reger suas existências, a maternidade. Assim como propõe Foucault (2005) ao propor o

conceito de racismo de Estado, compreendendo racismo para além da raça, mas como a seleção

de grupos sociais que interessam ou não interressam ao Biopoder, as mulheres que abortam são

aquelas a quem se pode deixar morrer, pois suas vidas seriam um meio para um fim, a

reprodução, negar isso viola uma estrutura patriarcal ancorada nessa contínua redução da mulher

a sua capacidade reprodutiva.

Swan (2007) denuncia que a imposição de uma função orgânica como identidade

essencial a outrem é a reduzir indivíduos a destinos corpóreos inevitáveis, no caso das mulheres a

maternidade é a função que justifica sua existência, mesmo quando essas são expoentes em suas

áreas profissionais e desenvolvem outras atividades a maternidade ainda é uma temática central,

tornando o aborto uma infração que corrompe as boas referências que elas possam ter

conquistado em seus círculos sociais:

No meu trabalho eu trabalho com pessoas que são esclarecidas, são pessoas voltadas

pras ciências sociais, ciências naturais, pro direito, mas quando elas olham pra uma

questão como essa, elas não identificam como uma questão científica, elas identificam

como uma questão emotiva. Então, a sociedade por si tem a cultura do aborto como algo

errado. Se você é criado numa sociedade onde o aborto é legal, onde o aborto é comum,

você não cresce com esse conceito mal formulado de que fulana que fez um aborto

cometeu um crime, fulana que fez um aborto é errada. Eu acho que as pessoas olham

muito pra questão da cultura mesmo. A cultura do aborto é uma questão marginalizada,

então você vira uma marginal. Você que assume o lugar de uma professora, uma

profissional, que é uma mulher bem sucedida, quando se descobre que você fez um

aborto, o preconceito, fatalmente, aparece ali. Você perde ponto pra aquelas pessoas,

ainda que sejam pessoas esclarecidas, ainda que sejam pessoas que são reconhecidas

pelo que fazem, mas muitas vezes isso não tá ligado a você ter nível superior. (THÊMIS)

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Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

Eu não falo sobre isso. Eu me posiciono politicamente porque eu acho importante pra

sociedade que a gente quer construir e tal, mas eu não conto sobre isso. Eu tô falando

com você porque eu acredito no seu trabalho, na importância desse tema e porque você

me garantiu o anonimato, mas a gente precisa falar sobre isso né? Hoje se alguma

mulher precisar da minha ajuda, por mais que os meios sejam arriscados, eu ajudo. Se eu

precisar contar a minha história pra uma mulher se sentir menos sozinha, eu conto. A

gente precisa falar mais sobre isso, porque o pessoal é político também. Porque a gente

passa isso muito sozinha, né? Eu tomei essa decisão sozinha, o cara sumiu, mas eu tive

meu irmão pra ligar, minha amiga. E quem não tem ninguém? (DANDARA)

Dandara aborda um ponto fundamental, o pessoal é político. A máxima da segunda onda

feminista se faz primordial no debate sobre abortamento, os corpos femininos estão no centro do

projeto colonial moderno (LUGONES, 2008) sobre eles muito se diz e faz, porque eles

representam os territórios que os colonizadores ambicionavam controlar, explorar, governar,

deter e calar. Ao identificar que é necessário falar sobre isso, Dandara rompe mais uma vez com o

lugar de passividade que o modelo colonial prevê para as mulheres, além de abortar, falar sobre

as histórias de aborto também é uma infração. Por mais que se veja ora a demonização ora a

patologização dessas mulheres, o fato é que ao se escutar histórias de aborto é possível identificar

que as mulheres que abortam são mais do que, são muitas. Entre as interlocutoras temos Bastet se

graduou em filosofia, Zarina que ao consegui ascender economicamente apoiou todos os

sobrinhos no momento de ingresso na universidade, Dandara, Sarasvati e Picê são psicólogas,

Thêmis é analista jurídica e se dedica ao combate a violênica contra a mulher, Kali é professora e

no momento da entrevista estava elaborando uma experiência de violênica sexual, fato que

também marcou a trajetória de Perséfone e Brigid, ambas trabalham no campo das artes cênicas;

Yara e Atali estavam no meio da graduação quando foram entrevistadas, ambas eram as primeiras

da família a ingressar em instituições federais de ensino, assim como Tanit que tinha se graduado

e feito pós graduação e hoje apoiava a atuação feminista da irmã, inclusive academicamente. A

ocultação compulsória – visto que raros são os espaços seguros da penalização jurídica e moral

em que possam falar- das narrativas de abortamento reverbera num apagamento da experiência

pessoal e política dessas mulheres, mulheres que todos os dias estão atuando, produzindo,

colaborando, mas que costumeiramente são reduzidas a corpos que romperam com seus destinos.

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Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

As mulheres brasileiras que abortam são clandestinas e lembremos que a clandestinidade

é a única forma de vida atuante politicamente em regimes que autoritariamente violam nossos

direitos.

Referências

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I came here to make a confession: the crossroads of a research about provoked abortion in

the criminalization context.

Astract: The present work seeks to bring reflections on the impasses and advances lived during

the master's research entitled '"I want to have the right to choose": Discursive formations and

abortive itineraries in Salvador'", developed in the Postgraduate Program in Interdisciplinary

Studies on Women, Gender and Feminism of the Federal University of Bahia. It should be noted

that the maintenance of abortion criminalization, foresee by the Penal Code of 1940, imposes

significant difficulties on research about abortion. These difficulties produce legal impasses in the

field of knowledge production and strengthen the fear of talking about this experience in the

women. In view of what was said, this research was based on questioning the identification

processes and selecting the participants which culminated in a methodological inversion which

the exposure of the proposal by the researcher in women's networks allowed 12 interlocutors to

identify and signal the Interest in participating in this work. The use of narrative interviews

allowed this experience, all then kept confidential, to be reported based on the discursive and

temporal construction of each interlocutor. Altogether, 22 abortive itineraries were reported, all

interviews were transcribed and worked on the basis of the discourse analysis of Foucault.

Through which it was possible to analyze analytically the conceptions and reflections of these

women about their own sexual and reproductive experiences, about the role of the State in the

control of their bodies and in the constitution of their feelings about the interruption provoked.

Keywords: Abortion: Discursive Formations, Abortion Itineraries, Discourse Analysis