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68 Estilos da Clínica, 2009, Vol. XlV, n° 26, 68-89 Psicóloga, Especialista em Psicologia Clínica pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e em Psicoterapia com Orientação Psicanalítica da Infância e Adolescência pelo Centro de Estudos, Atendimento e Pesquisa da Infância e Adolescência (CEAPIA). Psicóloga, professora do Programa de Pós-graduação em Psicologia do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). RESUMO Este trabalho discute a impor- tância da relação pais/bebê em situações de malformação fetal e internação em UTI Neonatal, através do relato de um acompa- nhamento psicológico realizado em um hospital público de Porto Alegre, RS. Durante o acom- panhamento, foram observadas reações de negação, autoacusação, sentimentos de culpa e dificulda- des dos pais para a vinculação com o recém-nascido. Através do atendimento realizado, os pais puderam compreender melhor a realidade de seu filho, conseguin- do se aproximar do bebê, parti- cipar dos cuidados básicos e for- mar um vínculo afetivo. Des- taca-se a importância do acom- panhamento psicológico às famí- lias de bebês em situação de in- ternação hospitalar no período pós-natal. Descritores: UTI; neonatal; relação pais/bebê; malformação congênita. Dossiê ara Brazelton e Cramer (1992), durante os nove meses de gestação a mãe alimenta dúvidas, receios e ambivalências a respeito do filho, assim como também a fantasia de uma criança perfeita. Quando nasce um bebê saudável, o vínculo, que foi se estabelecendo na medida em que o feto se desen- volvia ainda no útero da mãe, se fortalece a cada dia que passa. Já quando ocorre alguma intercorrência, seja por prematuridade, como por algum tipo de malformação congênita ou uma doença grave, e este NO LIMITE ENTRE A VIDA E A MORTE: UM ESTUDO DE CASO SOBRE A RELAÇÃO PAIS/BEBÊ EM UMA UTI NEONATAL Lisiane Baldissarella Débora Dalbosco Dell’Aglio P

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68 Estilos da Clínica, 2009, Vol. XlV, n° 26, 68-89

Psicóloga, Especialista em Psicologia Clínica pela Universidade

Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e em Psicoterapia com

Orientação Psicanalítica da Infância e Adolescência pelo Centro

de Estudos, Atendimento e Pesquisa da Infância e Adolescência

(CEAPIA).

Psicóloga, professora do Programa de Pós-graduação em

Psicologia do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio

Grande do Sul (UFRGS).

RESUMO

Este trabalho discute a impor-tância da relação pais/bebê emsituações de malformação fetal einternação em UTI Neonatal,através do relato de um acompa-nhamento psicológico realizadoem um hospital público de PortoAlegre, RS. Durante o acom-panhamento, foram observadasreações de negação, autoacusação,sentimentos de culpa e dificulda-des dos pais para a vinculaçãocom o recém-nascido. Através doatendimento realizado, os paispuderam compreender melhor arealidade de seu filho, conseguin-do se aproximar do bebê, parti-cipar dos cuidados básicos e for-mar um vínculo afetivo. Des-taca-se a importância do acom-panhamento psicológico às famí-lias de bebês em situação de in-ternação hospitalar no períodopós-natal.Descritores: UTI; neonatal;relação pais/bebê; malformaçãocongênita.

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ara Brazelton e Cramer (1992), duranteos nove meses de gestação a mãe alimenta dúvidas,receios e ambivalências a respeito do filho, assimcomo também a fantasia de uma criança perfeita.Quando nasce um bebê saudável, o vínculo, que foise estabelecendo na medida em que o feto se desen-volvia ainda no útero da mãe, se fortalece a cada diaque passa. Já quando ocorre alguma intercorrência,seja por prematuridade, como por algum tipo demalformação congênita ou uma doença grave, e este

NO LIMITE ENTRE AVIDA E A MORTE: UM

ESTUDO DE CASOSOBRE A RELAÇÃO

PAIS/BEBÊ EM UMA UTINEONATAL

Lisiane Baldissarella

Débora Dalbosco Dell’Aglio

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bebê tem que ficar sob os cuidadosde uma Unidade de Tratamento In-tensivo Neonatal (UTI Neo), é comose, para a mãe, se confirmassem to-dos os temores presentes no períodode gestação. Neste momento, é preci-so que a mãe trabalhe o luto pela per-da do filho idealizado (Debray, 1988;Soulé, 1987). Assim, a notícia de umfilho com malformação repercute emmuitos sentidos da vida de um casal,podendo prejudicar o vínculo destespais com seu filho e, consequente-mente, os primeiros cuidados básicospara com este.

O recém-nascido e a UTI

Quando um bebê nasce com al-guma malformação, além de ter queir para uma UTI Neonatal, que é umambiente cheio de estímulos doloro-sos, visuais e auditivos, tem tambémque se separar de sua família imedia-ta. Wirth (2000) refere que mãe e bebêjá foram separados abruptamente pelotrauma da hospitalização, sendo ne-cessário restabelecer o vínculo entreambos.

Para Thomaz, Lima, Tavares eOliveira (2005), quando o bebê correrisco de morte, os pais sentem medode estabelecer ligação afetiva fortecom o filho, porque ele pode não so-breviver. Assim, esse momento é mar-cado pela coexistência de sentimen-tos ambíguos e a esperança de que eleviva é mesclada com desejos de mor-

te. Questão importante diz respeito aofato de que esses pais irão enfrentar arotina de uma UTI Neonatal, onde oseu bebê precisará permanecer parasobreviver: “De repente, o primeirocolo desse bebê é a incubadora. Essebebê que esperavam estar acarician-do, mostrando aos familiares e ami-gos, está cheio de fios, picado por agu-lhas, sob luzes, aparelhos sofisticadose correndo risco de morrer” (Souza& Barros, 1999, p.132). O sentimen-to dos pais a respeito das “máquinassalvadoras” pode ser ambivalente; poruma parte, expectativa quase mágicaem relação a elas, graças às quais suacriança sobrevive e os obriga a umamissão completa; por outra parte, co-existe um sentimento de repúdio de-vido à distância que essas máquinasinterpõem entre eles e a criança e,consequentemente, sentem-se excluí-dos (Viziello, Zorzi & Bottos, 1992,citados em Thomaz et al., 2005). Nes-sa situação a mãe pode querer fugirou proteger-se sob a depressão paranão cuidar do bebê. Essas respostasnão podem ser consideradas anormaise sim respostas previsíveis. O surpre-endente é que os pais conseguem su-perar esses sentimentos, começamtudo novamente, criando um vínculocom o bebê. Para tanto, eles passampor “estágios” à medida que formamo apego ao bebê. Antes, porém, vemuma reação de luto, que é inevitável. Estareação é pela perda do bebê perfeitoque esperavam, como também pelos“defeitos” que produziram no bebê.Para superar esse sentimento de cul-

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pa é preciso tempo e um árduo traba-lho pessoal (Brazelton, 1988).

Scochi, Kokuday, Riul, Rossanez,Fonseca e Leite (2003) apontam queo fato da mãe não poder pegar o bebêno colo, aconchegá-lo e embalá-lo ébastante frustrante. Mesmo quando jáé possível tocá-lo e acariciá-lo dentroda incubadora, muitas mães se ame-drontam diante dessa situação. Essemedo se justifica pela autoestima afe-tada, pelo ambiente da UTI Neo e pelafalta de autoconfiança na capacidadede criar o filho. Além disso, acrescen-tam que o choque pela hospitalizaçãode um bebê pode ser compreendidoquando observamos os pais seremconfrontados com um ambienteestressante e confuso, impotentes paraassumirem os cuidados com seu filhoque apresenta risco de vida. Esses sen-timentos podem ser atenuados ou re-forçados de acordo com a oportuni-dade que essa mãe tem ou não departicipar, de alguma forma, dos cui-dados de seu filho. O estabelecimen-to do vínculo e apego pode ser preju-dicado pela falta de oportunidades damãe interagir com seu filho, gerandodesordens no relacionamento futurode ambos. Pesquisas mostram que ocomportamento de apego se desen-volve desde a vida intrauterina e queé fundamental o contato entre mãe efilho nos momentos iniciais da vidapós-natal (Bowlby, 1984; Brazelton,1988).

Gomes, Quayle, Neder, Leone eZugaib (1997) apontam que, enquan-to a mãe não pode segurar o filho, o

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contato físico por meio do toque é desejável, assim como os cuida-dos para manter a produção do leite materno. Seu armazenamentodeve ser estimulado e, quando possível, o leite deve ser dado porsonda, até o momento em que, então, a mãe possa segurá-lo eamamentá-lo. Isto contribui para a manutenção do vínculo, pois amãe se sente satisfeita em dar algo que é seu, aproxima-se da “nor-malidade”, fazendo com que não se sinta excluída, minimizando ainsegurança e tornando-se mais participativa no cuidado com o fi-lho.

Muitas vezes, a mãe se sente incapaz de cuidar de seu filhodentro de uma UTI Neonatal e acaba se ausentando, tanto da UTIquanto do próprio hospital, por achar que a equipe cuida bem me-lhor dele do que ela mesma. Isso confirma os sentimentos da mãede ser incapaz de ter gerado um filho saudável e de cuidar dele.Wirth (2000) afirma que os pais, neste momento, podem estar comuma autoestima mais baixa, sentindo que falharam em algum mo-mento, além de sentirem-se culpados por tudo o que está aconte-cendo. A mesma autora segue enfatizando que o ambiente hospita-lar tem que ser acolhedor e continente às angústias, medos e osofrimento destes pais, para que eles também possam cuidar melhorde seu filho. A angústia inicial dos pais frente a tudo o que aconteceue ainda acontece vai sendo substituída por um olhar mais humano eadmirado para seu filho, que está ali indefeso, cheio de fios e demáquinas ligadas ao seu corpo e que mal pode ser tocado (Guedeney& Lebovici, 1999), ou seja, os pais podem gradualmente “narcisisar”seu filho (Bleichmar, 1987).

Por outro lado, há aqueles pais que fazem do hospital sua se-gunda, ou melhor, sua primeira casa, pois passam mais horas lá den-tro do que em qualquer outro lugar. E isso também pode ter umsignificado: o de estar reparando algum mal que pensam ter causadoao seu filho. Nestes momentos é importante que eles possam tam-bém se sentir acolhidos, entendidos, contidos pela equipe, para quenão se descuidem deles mesmos, pois um hospital já é um ambientemuito estressante. Numa UTI, especialmente, estão os casos maisgraves e as maiores chances de óbitos, desencadeando um maiorestresse, medos e angústias dos pais frente ao que pode vir a aconte-cer com seu filho. Esta situação se torna pior quando os pais come-çam a perceber que alguns bebês já estão retornando para casa. Isso,aos poucos, pode desestimular a luta pela vida, trazendo sentimen-tos depressivos (Guedeney & Lebovici, 1999). Por isso se faz muito

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importante que a equipe hospitalarpossa acolher e cuidar destes pais, osquais se encontram indefesos e ate-morizados (Caron, 2000; Guedeney &Lebovici, 1999).

A relação pais/bebê commalformação

A relação pais/bebê é algo quevai se construindo desde a concepção,ou a partir do momento em que fi-cam sabendo da gestação. O vínculoda mãe com seu filho se fortalece gra-dualmente a partir do momento emque este vai se desenvolvendo e quesão percebidos os movimentos fetais(Caron, 2000). Após o nascimento deuma criança normal, a mãe pode, aospoucos, reconhecer as necessidadesbásicas de seu filho e se adaptar às suascaracterísticas, ou seja, ao seu própriotemperamento, passando a ser conti-nente a ele. Essa capacidade é chama-da por Bion (1959) de Rêverie, que é apossibilidade da mãe de detectar econter as necessidades, angústias e asdemandas de seu filho. Mas isso tam-bém depende muito de como foramas primeiras experiências com sua pró-pria mãe. Como relatam Brazelton eCramer (1992), todas as experiênciasda mulher com seus pais influencia-rão na sua adaptação ao novo papel:o de ser mãe.

Em contrapartida, quando nasceum bebê com algum tipo de malfor-mação, o choque é tão grande que,

num primeiro momento, ela pode seafastar de seu filho, com medo do quepode encontrar ao vê-lo. A formaçãodo vínculo pode ser mais tardia, oumais difícil de ser estabelecida ou ain-da nem chegar a acontecer. “O lutoantes da morte aparece quando existeum mau prognóstico para o bebê. Hápais que entram em luto prematuro,como se já não adiantasse fazer nadae podem começar a desinvestir o bebê.Antecipam o luto na tentativa de di-minuir o sofrimento. Outros, ainda,negam o risco de morte e passam ater certeza de que o filho viverá, deque ele lutará para viver. Os sentimen-tos de onipotência dos pais ficam pro-jetados no bebê” (Falcão & Varaschin,2002, p. 86).

Ter que se deparar com umamalformação de um filho é como en-xergar suas próprias fraquezas e inca-pacidades. Os medos e as angústiasficam mais no nível de fantasias e aforma de vínculo vai depender doprognóstico dado pelo médico res-ponsável (Klaus & Kennel, 1993). Omedo de se apegar à criança e esta vira morrer, mais cedo ou mais tarde,gera muitos sentimentos ambivalen-tes, e pode fazer com que os pais, ouse afastem cada vez mais do filho do-ente, ou o superprotejam, ultrapassan-do seus próprios limites enquanto se-res humanos. Rolland (1998) tambémrefere que, quando existe algum do-ente na família que envolve uma amea-ça de perda, os familiares se deparamcom muitos sentimentos ambivalen-tes, ou possuem um desejo de distan-

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ciamento e fuga dessa situação insu-portável ou se tornam superprotetorese vigilantes. Para Moreira (2007), a si-tuação de fragilidade do bebê e o es-tado de angústia livre podem condu-zir a mãe a uma “fuga para asanidade”, ou seja, a um distanciamen-to desse bebê que ela não sabe se vaiviver.

Padovani, Linhares, Carvalho,Duarte e Martinez (2004) afirmamque a família com um bebê hospitali-zado passa a experenciar a separaçãoe a incerteza sobre a evolução clínicae sobrevivência do bebê. Neste con-texto, níveis de ansiedade e sentimen-tos de tristeza e melancolia podem serexacerbados diante dessa situação deconflito e estresse. Em seu estudocom pais de bebês hospitalizados naUTI Neonatal foram observados al-tos níveis de ansiedade, depressão ehostilidade, revelando problemas deajustamento psicossocial por partedos pais. Para estes autores, o ajusta-mento familiar ou habilidade para re-alizar mudanças no sistema familiar apartir de um evento estressor, a fimde manter seu equilíbrio e funciona-mento, está relacionado aos recursosinternos e sociais da família e às es-tratégias familiares de enfrentamentoda situação durante a fase de interna-ção do bebê na UTI (Padovani et al.,2004).

Assim, a partir dos aspectos teó-ricos apresentados, este trabalho tevecomo objetivo discutir a importânciada relação pais/bebê em situação deinternação em UTI Neonatal, através

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do relato e discussão de uma experiência profissional, de atendi-mento psicológico a um casal. O acompanhamento psicológico foirealizado com os pais de um bebê que nasceu com atrofia cerebral eque permaneceu na UTI Neonatal de um hospital público de PortoAlegre, por um período de três meses. Atendendo a aspectos éticos,os pais deram seu consentimento para participar do estudo e foramomitidos os nomes e informações que pudessem identificar o casal.

Evolução do acompanhamento psicológico

O primeiro contato com o casal (M. mãe e J. pai) foi realizadono quarto do hospital, no dia do nascimento de F., que nasceu atermo e de cesariana, mas recebeu o diagnóstico de atrofia cerebral,sendo encaminhado logo em seguida para a UTI Neo. M. ainda nãotinha conseguido ver seu filho e parecia não acreditar na gravidadedo estado do bebê. J., que já tinha visitado o filho, mostrava-se bas-tante emotivo e preocupado com o mesmo, dizendo que não acredi-tava no que estava acontecendo e que faria de tudo para ajudá-lo.No momento em que relatava isso, emocionou-se. Porém, M. pare-cia “anestesiada”, não se dando conta da real situação.

Nos primeiros contatos com o casal, M. dizia ter engravidadopor descuido e que, quando descobriram a gravidez, ficaram umpouco assustados, mas depois acabaram aceitando e gostando daideia. M. referia ter realizado todo o acompanhamento pré-natal dobebê, juntamente com seu esposo e que, no quinto mês de gestação,descobriram, através de uma ecografia, que o feto tinha um proble-ma em um dos ventrículos do umbigo, mas não deram muita impor-tância, pois segundo seu médico não era “nada demais” (sic).

M. teve alta do hospital dois dias após o nascimento de F., massuas visitas ao filho se tornaram constantes. A partir de então, ocontato com o casal foi bastante frequente. Num primeiro momen-to, M. lamentava muito a situação e se questionava sobre o que esta-va acontecendo com eles, destacando o fato do médico não tê-losalertado nos pré-natais realizados de que tratava-se de algo mais gra-ve. Parecia inconformada. Mesmo assim, M. passava os dias ao ladoda incubadora do filho, olhando e acariciando-o, mesmo não tendonenhuma resposta, nenhum retorno de sua dedicação, uma vez queele estava em coma induzido. J. oscilava entre seu trabalho, dar apoio

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para a esposa e para seu filho. Atravésdas entrevistas com o casal, a mãe tor-nou-se aos poucos mais sensível a seubebê e a ela própria e, com isso, co-meçou a colocar em palavras para seufilho o que estava acontecendo. Nosprimeiros encontros, os pais ficaramum pouco confusos e surpresos, di-zendo não acreditarem que ele ouvi-ria, já que estava em coma induzido,além de preocupados com o fato deas pessoas acharem que estavam “lou-cos” (sic). Após algum tempo, M. e J.começaram a conversar e a cantar paraseu filho, dizendo se sentirem muitomelhor e mais próximos dele. Cadamovimento do bebê era percebidocomo uma forma de resposta frenteaos cuidados dispensados por seuspais.

Devido à sua malformação, ha-via dias em que F. se agitava mais, oque segundo a equipe era por causada dor que deveria sentir. Frente a isso,M. dizia que essa agitação de F. a an-gustiava muito, por não saber comoacalmá-lo, por se sentir impotentefrente a tudo o que dizia respeito aoseu filho. Houve momentos em quese sentia inferior à equipe de enferma-gem, comentando que elas cuidavammelhor de seu filho do que ela própria,chegando a verbalizar que tinha certoreceio em tocá-lo e machucá-lo, então,preferia que a equipe tomasse contadele. A partir disso, passamos a refle-tir sobre seus medos e angústias e elagradualmente sentia-se em condiçõesde maternar mais seu filho. Depoisque M. e J. começaram a fazê-lo, pas-

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saram a interagir e a participar muitomais dos cuidados do bebê, chegan-do a discutir os procedimentos reali-zados e se informar mais sobre seuquadro clínico junto à equipe.

O prognóstico de F. era muitoruim, o bebê não conseguia ficar forado oxigênio e passava a maior partedo tempo sedado, devido também àsconvulsões. Os procedimentos médi-cos eram frequentes e inevitáveis eisso deixava seus pais ainda mais tris-tes e preocupados. M. chegava averbalizar que tinha medo de ficardeprimida e que tentava o tempo todose reerguer para estar ao lado do fi-lho. A partir do momento em que ocasal passou a interagir e a se respon-sabilizar por alguns cuidados de seufilho, F. passou a responder mais, poisjá conseguia permanecer mais tempocom os olhos abertos. Assim, seus paispassaram a acreditar numa melhora,chegando a fazer planos para quandoele saísse do hospital. M. e J. conver-savam com o filho, encorajando-o acontinuar lutando, procurando mos-trar seu amor. F. os olhava atentamen-te e seus espasmos musculares maispareciam uma resposta aos estímulosde seus pais.

Mas como não poderia ser dife-rente numa UTI Neonatal, ocorriammuitos óbitos de outros bebês, o queajudava a aumentar a angústia do ca-sal, que temia que o mesmo aconte-cesse com seu filho. M. se culpava portudo o que estava acontecendo comele, dizia que estava assim porque de-cidiu engravidar muito tarde, uma vez

que tinha medo de engordar, de es-tragar seu corpo com o qual se preo-cupava tanto, e que se tivesse tido umfilho mais cedo, talvez nada disso ti-vesse acontecido. Chegaram a realizartodos os exames possíveis para des-cartar qualquer hipótese genético-he-reditária do problema.

Em alguns momentos, F. conse-guiu sair do oxigênio e ir para o colodos pais. Mas F. oscilava entre a incu-bação e a extubação, às vezes três ve-zes ao dia, e, consequentemente, ohumor e a confiança de poderem vi-ver tudo aquilo que haviam planejadojunto ao filho, principalmente no quediz respeito a M., também oscilavaentre o desespero e a esperança. J.mostrava-se mais otimista e alternavaentre o hospital e o trabalho, o qualtambém exigia muita dedicação. Ain-da dizia que sua esposa tinha que sedistrair mais e não ficar o tempo todono hospital. Já M. se queixava que oesposo não entendia seu sofrimento,que não tinha desejo e nem condiçõesemocionais para fazer qualquer outracoisa que não ficar ao lado de F., eque isso estava deixando-a mais de-primida. Referia também que seu es-poso não a compreendia e que era elequem estava fora da realidade, “negan-do a situação de F.” (sic). Em parte,M. concordava com J., dizendo quenão tinha mais ânimo para fazer coi-sas que antes lhe davam prazer. Por-tanto, toda vez que ligava para seuesposo, este largava o que estava fa-zendo e corria para o hospital.

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Como o quadro de F. era bastante comprometedor, havia mo-mentos em que ele ficava muito mal. M. chegava a verbalizar que sefosse para seu filho ficar sofrendo desta forma, preferia que ele “sefosse e descansasse” (sic). Quando falava sobre isso, emocionava-semuito e falava com dificuldade. Então, comparava seu filho a outrosrecém-nascidos que estavam piores que ele mas que acabaram sain-do da UTI.

F. chegou a sair da UTI Neo e ir para uma sala intermediária,onde foi retirada a sonda, o que o possibilitou mamar no seio de suamãe, assim como permanecer mais tempo em seu colo. M. pôdetambém dar banho em seu filho, fazer sua higiene, entre outros cui-dados básicos. Comentava, nesses momentos em que podia ama-mentar e cuidar do filho, o prazer que ele estava lhe proporcionan-do. Também dizia que o que mais queria era que ele pudesse usar asroupas que compraram para esperá-lo, que pudesse usufruir o seuquarto, que haviam decorado com muito amor e dedicação.

O bebê permaneceu não mais que dois dias fora da UTI, tendoque voltar devido às crises convulsivas que começou a apresentar.Então, novamente foi entubado e sedado. Seus pais já não sabiammais o que pensar e começaram a dizer que a equipe médica nuncatinha uma resposta para dar sobre o estado de seu filho e isso osangustiava muito. Chegaram a verbalizar que as convulsões se de-ram por causa do contraste que havia tomado para fazer a tomografia.Após este episódio, durante três dias, M. passou a ir para casa maiscedo, voltando no fim da tarde com seu esposo e ficando até a meia-noite. Dizia que não adiantaria ficar mais tempo, já que ele estavasedado mesmo e que não podia fazer mais nada além de “rezar mui-to para que ele ficasse bem, fosse aqui na Terra, fosse lá em cimacom Deus” (sic).

A expressão de cansaço e desesperança estava a cada dia maisestampada no rosto do casal, mas eles continuavam a visitar seufilho todos os dias, permanecendo muitas horas ao seu lado. Noentanto, F. foi tendo cada vez mais convulsões, mesmo sedado, atéque não resistiu. Seu óbito ocorreu após três meses de internação.M. dizia que já estava esperando e até rezando para que seu filhoparasse de sofrer tanto. Para ela, J. estava inconformado e muitotriste.

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Discussão

Muitas fantasias estão presentesno decorrer de toda a vida gestacio-nal da mulher com relação ao bebêque está por nascer. São nove mesesde espera e angústia frente ao desco-nhecido. Soulé (1987) afirma que onascimento de um filho vem infligir amegalomania materna de criar um fi-lho perfeito, tendo que renegar o fi-lho imaginário tão importante na suafantasia e no seu sonho. Dessa for-ma, a mãe tem que fazer o luto poreste filho tão idealizado e esperado,aceitando o bebê real. Porém, quan-do nasce um filho com algum tipo demalformação, essa aceitação do bebêreal pode ser mais complicada, pois,além de não encontrar o filho ideali-zado e perfeito, são constatadas limi-tações, que podem confirmar algumasfantasias relacionadas a sua incapaci-dade de gerar um filho saudável.Numa visão psicanalítica, pode-se su-por que os ataques imaginários que amenina faz em relação ao corpo damãe com seus excrementos veneno-sos e destrutivos fazem-na fantasiarque possui fezes más dentro dela, le-vando-a a ter uma criança má, defei-tuosa, feia, anormal (Klein, 1997). Ouseja, esta fantasia se confirma quan-do a mãe tem um bebê malformado,pois acredita que pode ter feito malpara o seu filho, apresentando senti-mentos de culpa. Ao mesmo tempo,deparar-se com um filho com malfor-mações fere o narcisismo dos pais.

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Belli e Silva (2002) referem que a acei-tação do filho real é mais bem supe-rada quando a equipe consegue intro-duzir os pais na participação e nainteração com o bebê, bem como nafamiliarização do novo ambiente emque se encontram (UTI Neonatal). Apartir disso, vê-se a importância depoder ampliar os cuidados e a aten-ção que a equipe tem que dispensaraos pais quando se encontram numasituação tão delicada como esta, aju-dando a minimizar o sofrimento e aangústia dos mesmos (Belli, 2000;Lamego, Deslandes & Moreira, 2005).

Em contrapartida, Gaíva eScochi (2005) apontam que, apesar dapresença da mãe numa UTI Neonatale de seu papel de maternagem, emgeral não há um acolhimento,tampouco uma relação de parceriaentre equipe e família do bebê, cha-mando atenção para a necessidade deuma ampliação nestas intervenções,de modo que a equipe pudesse tornara família mais autônoma para promo-ver a saúde e a qualidade de vida dobebê. Em 1995, Belli já havia consta-tado o grande interesse das mães emparticiparem mais dos cuidados de seufilho, bem como de se interarem so-bre o estado de saúde do mesmo esobre os procedimentos clínicos rea-lizados pela equipe.

Um diagnóstico patológico podecausar um choque traumático nas pes-soas que o recebem. No caso descri-to neste estudo, pode-se observar oestado emocional dos pais ao recebe-rem o diagnóstico de Atrofia Cerebral

do filho recém-nascido. Diziam nãoacreditar no que estava acontecendo,além de apresentarem certa confusão,já que o médico que realizou todos ospré-natais não havia mencionado qual-quer problema mais sério com seu fi-lho. Constatou-se a forte angústia e adificuldade de ambos em aceitar oocorrido. Nos primeiros dias, eracomo se estivessem negando a situa-ção do filho, o que pode ser observa-do no comportamento da mãe, quese recusava a ir visitá-lo na UTI, fa-lando que não podia acreditar no queestava acontecendo, que não podia serverdade e que devia haver algo erra-do no diagnóstico. Para Botella e Bo-tella (2002), diante de uma situaçãotraumática, na qual a percepção e arealidade ficam alteradas porque o egonão consegue dar conta de tamanhaexcitação externa, tendo que utilizarmecanismos de defesa para suportara realidade, pode-se entender que: “é

no caráter negativante, na perda pelo ego de

seus recursos, que compreendemos a quali-

dade traumática. A desorganização brutal

originar-se-ia, acreditamos, não numa per-

cepção, mas na ausência de sentido do vio-

lento excesso de excitação e do estado de de-

samparo do ego, na impossibilidade para o

ego de representá-los para si” (p. 93).No entanto, Kübler-Ross (2002)

acredita que este processo de nega-ção é normal quando uma pessoa re-cebe um diagnóstico por alguém nãomuito familiar e muitas vezes, de for-ma abrupta ou prematura. Comple-menta que a negação é uma formasaudável da pessoa lidar com aquele

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momento tão doloroso, funcionando como uma espécie de para-choque para, só depois, poder se recuperar e usar outras medidasmenos radicais.

Através do contato com este casal, na UTI Neonatal, pode-seobservar a importância, para esses pais, de poderem colocar em pa-lavras seus sentimentos, bem como sua presença junto ao filho.Brazelton (1988) destaca a necessidade dos pais de entender a co-municação do bebê para melhor conhecer suas potencialidades ecapacidades. Neste caso, mesmo com um bebê numa situação bemmais delicada, como era o caso de F., em coma induzido, foi avaliadoque algum canal de comunicação poderia ser estabelecido entre ospais e o bebê. No início, estes pais ficaram um pouco confusos ecom medo de que os outros os achassem “loucos” (sic) por estaremconversando com seu filho, já que era recém-nascido e ainda estavasedado, ou seja, não acreditavam que ele pudesse escutá-los. Depoisque os sentimentos de descrença frente às possibilidades de seu fi-lho foram trabalhados, durante as sessões de atendimento, os paisficaram mais sensíveis a ele e a si próprios, conseguindo colocar empalavras o que estava acontecendo, permitindo, aos poucos, se apro-ximarem do bebê real, formando o vínculo.

A partir do momento que a mãe pôde se aproximar mais dofilho real, bem como da realidade propriamente dita, começaram aemergir muitos outros sentimentos. Através do atendimento reali-zado, a mãe foi podendo pensar num motivo que pudesse ter causa-do a patologia do filho e percebeu que se sentia culpada, acreditan-do ter causado algum mal para ele. Isso foi observado quando sereferiu ao fato de não ter engravidado mais cedo, atribuindo o fato àidade tardia em que engravidou. Como sabemos, ao ter um filho, amãe reedita suas próprias experiências infantis com sua mãe, assim,esta culpa que M. dizia sentir pode estar relacionada às primeirasrelações objetais, bem como sua conflitiva edípica, que a fazem acre-ditar que pode danificar os bebês que carrega dentro de si, confor-me os processos descritos pela psicanálise (Klein, 1997).

Através dos encontros realizados com a mãe, foram possibilita-dos momentos em que pudesse falar sobre esses sentimentos, divi-dindo seus medos e angústias e, acima de tudo, sendo compreendi-da. Só então, pôde compreender melhor a realidade de seu filho,permitindo se aproximar desse bebê real, com suas limitações, liga-das ao estado clínico. Moreira (2007) refere que a situação de fragili-dade do bebê e o estado de angústia livre podem conduzir a mãe a

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uma “fuga para a sanidade”, ou seja,a um distanciamento desse bebê queela não sabe se vai viver. A partir deentão, F. começou a reagir mais, per-manecia mais tempo com os olhosabertos e as trocas entre a tríade co-meçaram a acontecer. Pensamos queF. pôde estabelecer uma continuida-de entre ele e seus pais, pois toda vezque abria e/ou fechava seus olhos,encontrava-os ao seu lado, acarician-do-o e conversando com ele. Essaconstância permite uma continuida-de e, talvez, de forma rudimentar, al-gum tipo de integração do Eu. Win-nicott (1956/2000) refere que umbebê, num primeiro momento, tem oobjeto como um prolongamento desi, e só através de uma mãe suficien-temente boa é que ele pode diferen-ciar aos poucos o eu do não-eu, ouseja, o papel da mãe é que gradual-mente dá lugar para um existir do eudo recém-nascido, integrando-o.

O estado clínico de F. oscilavamuito e, quando este apresentava umamelhora, seus pais verbalizavam osprojetos futuros que haviam feito paraquando ele saísse do hospital, masquando ele piorava, o desespero e adesesperança reapareciam, principal-mente na mãe. Nestes casos, é comumque, frente a uma realidade tão sofri-da e dolorosa, o psiquismo faça usode alguns mecanismos de defesa como intuito de proteger-se do sofrimen-to insuportável, entre eles a negaçãoe a dissociação (Laplanche & Pontallis,1995). Para Zavaschi, Lima e Palma(2000), é comum que pacientes ou

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familiares utilizem mecanismos de defesa tais como negação, disso-ciação e projeção. Quando a dor é insuportável, a negação pode serutilizada para evitar entrar em contato com a gravidade da doença.Os familiares muitas vezes dissociam o conhecimento de que dis-põem sobre a enfermidade e projetam sobre a equipe a responsabi-lidade da possível piora do quadro clínico, atribuindo à equipe, porexemplo, retardo no diagnóstico ou nos procedimentos terapêuti-cos, como causa do mau prognóstico. No caso dos pais de F., podeser observada uma dissociação em alguns momentos mais críticos,onde o risco de morte era maior. Em alguns momentos cada umrepresentava um lado da situação, ou seja, um negando a realidade eo outro se deprimindo, já em outros momentos, se mostravam maisunidos. M. se queixava que J. “negava” (sic) o que estava acontecen-do e que não a compreendia, exigindo que fizesse algo que não po-dia no momento, que era sair, se distrair. J. dizia que M. estava muitochorosa, que precisava reagir, e que brigava com ele porque acredita-va que F. pudesse superar o quadro clínico, muitas vezes, negando asituação de forma mais maníaca. Para Padovani et al. (2004), a avalia-ção clínica dos pais de bebês internados em UTI neonatal possibilita aidentificação de mães com maior dificuldade no enfrentamento adap-tativo da situação de estresse psicológico, possibilitando assim o pla-nejamento e a execução de adequada intervenção psicológica pre-ventiva.

Pode-se entender que o fato dos pais de F. estarem sempre aoseu lado, conversando e o estimulando, permitiu a este responderaos movimentos internos e externos constantes. Isso colaborou,mesmo dentro de um quadro clínico tão comprometedor, para queF. conseguisse permanecer um tempo mais longo sem o oxigênio, oque ocorreu no seu segundo mês de vida. Com esta evolução, aequipe decidiu transferi-lo para uma sala de cuidados intermediáriosda Neonatologia. Este momento possibilitou à mãe trazer algumasdas roupas de seu filho, permanecer um tempo mais longo com F.no colo, podendo, inclusive, amamentá-lo no seio e não apenas atra-vés de uma sonda. Surgiu também a possibilidade de dar o banho,de trocá-lo, enfim, de exercer o seu papel de mãe, realizando algoque tanto esperava e sonhava. M. falava sobre seus sentimentos derealmente ser mãe, pois só então podia cuidar dele realmente. Deacordo com Fonseca (2002), se faz necessário que a equipe médicainsira a mãe, gradativamente, no cuidado de seu filho dentro de umaUTI Neonatal. Almeida et al. (2003) apontam que os recém-nasci-

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dos pré-termos apresentam melho-ras quando estimulados por suasmães, sugerindo uma orientação psi-cológica que acolha as mães, nestemomento tão delicado em que se en-contram, após o nascimento do bebê.Thomaz et al. (2003) também afir-mam que as mães precisam de maisapoio da equipe hospitalar, sendo im-portante a existência de um espaçopara ouvi-las, compreendendo o mo-mento em que estão vivendo e in-centivando a sua participação na ro-tina da UTI neonatal.

Muitas vezes, M. se queixava denão poder exercer seu papel de mãe,chegando a verbalizar que achava quea equipe de enfermagem conseguiacuidar melhor de seu filho do que elaprópria, mostrando certo medo emmachucá-lo (revelando seus aspectosagressivos inconscientes vividos nes-ta situação, bem como a raiva por terum filho malformado e por estar pas-sando por tudo isso). Através dos co-mentários de M., também se podeobservar a rivalidade, bem como osentimento de impotência que os paissentem em relação à equipe que, de-vido às circunstâncias, acabam cuidan-do e manejando mais o bebê. Soulé(1987) nos ajuda a compreender es-tes sentimentos quando comenta quea mãe pode considerar a equipe dohospital com sentimentos muito am-bivalentes, ou seja, ao mesmo tempoem que reconhece seu trabalho, tam-bém sente ódio, inveja e ciúmes, co-locando-se em competição com asenfermeiras que cuidam de seu bebê.

Linhares, Carvalho, Bordin, Chime-lo, Martinez e Jorge (2000) tambémenfatizam o fato das mães se senti-rem incompetentes com relação aoscuidados de seu filho. Outro fator im-portante é que as mães percebemseus filhos muito frágeis e acabam as-sumindo um papel mais passivo ecauteloso frente aos seus cuidados,evitando assim, manipulá-los (Almei-da, Tachibana, Ulle, & Fernandes,2003). Porém, depois de muitos en-contros, em que estes sentimentosforam trabalhados, a mãe foi perce-bendo que seu papel era muito im-portante para a saúde mental e, con-sequentemente, física de seu filho.No entanto, este período não foimuito longo, não durou mais de umasemana, e o quadro clínico de F. pio-rou consideravelmente, tendo queretornar para a UTI e ser entubadodevido às várias convulsões que apre-sentou num só dia.

Após este episódio, os pais co-meçaram a culpar os médicos pelapiora do filho, alegando que as con-vulsões se deram pela ingestão doscontrastes para realizar os exames derevisão, o que não achavam necessá-rio no momento, já que ele estava“bem” (sic). Frente ao desespero e àdesesperança, observou-se que o ca-sal precisou responsabilizar os médi-cos por esta situação estressora e frus-trante, com o intuito de aliviar osentimento de culpa por terem gera-do um filho malformado. Para Freud(1920/1969a), em seus estudos em“Além do Princípio de Prazer”, fren-

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te a alguma excitação interna desprazerosa, o aparelho psíquico, parasuportar essa dor, colocará a culpa deste desprazer como sendo algovindo do exterior e não do interior. Bowlby (1985) também concor-da com essa situação, referindo que, quando a morte de alguém que-rido e amado é iminente, os pais vivenciam uma espécie de torpor etendem a direcionar toda a ira e as explosões para os profissionaisde saúde.

A partir de então, F. só piorou e M., durante os atendimentos,foi se deparando com seus sentimentos de dor, angústia e medo,dando-se conta de que iria perder seu filho. Aqui, o contato com arealidade se instalou de forma mais consistente. As convulsões, bemcomo o prognóstico revelado pelos médicos a partir de então, leva-ram M. a aceitar e a elaborar o luto pela perda real do filho, ficandolivre de um mundo de fantasias. A partir de então, passou a frequen-tar menos a UTI Neonatal, isto é, começou a se afastar por umtempo mais longo de seu filho. Com relação a isso, Freud (1917/1969b), em seus estudos sobre “Luto e Melancolia”, aborda que oluto é um processo natural frente à perda de um objeto amado, ondeo sujeito retira a libido do objeto que foi afastado ou não mais existe,sendo uma reação saudável, pois a pessoa vai desvinculando a libidodo objeto. Druon (1996) aponta que os pais, diante de tanta dor,tendem a antecipar o luto, ou seja, deixam de investir no bebê paraevitarem mais sofrimento, pois acreditam que não adianta fazer maisnada. Dias depois, o bebê foi a óbito. Pode-se observar, assim, oprocesso vivido por seus pais, que puderam aceitar perdê-lo,vivenciando diferentes momentos e sentimentos.

A literatura na área aponta a presença de sentimentos de medo,incerteza e angústia por parte dos pais de filhos com malformação,assim como o processo de luto pelo filho idealizado durante toda agestação e a aceitação do filho real (Brazelton & Cramer, 1992). Poroutro lado, quando os pais se dão conta que o prognóstico de seufilho é reservado podem antecipar a elaboração do luto com o obje-tivo de se desligarem do filho para evitar maior sofrimento. Druon(1996) refere o luto pela perda real, ou seja, pelo óbito e também osmecanismos de defesas que o psiquismo utiliza para poder enfrentaresta situação. Contudo, pode-se perceber a importância da psicolo-gia neste ambiente, para realizar um acompanhamento destes pais,neste momento tão doloroso e sofrido, auxiliando a equipe para queesta seja capaz de receber e acolher estas pessoas. Para Zavaschi etal. (2000), a equipe deve centrar sua intervenção na informação clara

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e verdadeira sobre a doença do paci-ente, procurando manter um balançocuidadoso entre dirigir essa famíliapara a realidade e, ao mesmo tempo,respeitar que mantenham a esperan-ça, permitindo que usem da negaçãoquando o sofrimento for insuportá-vel, sob pena de abandono precoceda criança.

Considerações finais

Este estudo aponta a importân-cia de uma compreensão e maiorempatia por parte dos profissionais dasaúde frente às angústias e medos dospais de recém-nascido que se encon-tra hospitalizado numa UTI Neonatal,desde o nascimento, por algum tipode malformação. A equipe, neste mo-mento, pode ajudar na vinculação datríade (pais/bebê), auxiliando-os aparticiparem dos cuidados de seu fi-lho, bem como esclarecendo os pro-cedimentos realizados e o quadro clí-nico do bebê, ou seja, acolhendo estespais no ambiente hospitalar.

O caso relatado neste trabalhopossibilita uma reflexão sobre todosos processos de enfrentamento pelosquais os pais passam no período dehospitalização do filho numa UTINeonatal, facilitando uma melhorcompreensão sobre seus sentimentos,a função materna e a formação dovínculo entre os pais e o bebê. Du-rante o acompanhamento destes pais,pode-se observar mais claramente a

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importância do trabalho da psicolo-gia dentro do ambiente hospitalar. Oacompanhamento psicológico realiza-do permitiu ajudá-los a pensar sobrea situação, falar sobre seus sentimen-tos e, com isso, possibilitar uma apro-ximação com seu filho, podendo exer-cer a função de pais, dentro dos limitespossíveis. Destaca-se, também, a im-portância do papel da psicologia jun-to aos profissionais das equipes dohospital, que também se mostram sen-sibilizados com as situações vivencia-das e que nem sempre estão prepara-dos para lidar com as famílias. Énecessário que estes profissionais tam-bém possam ouvir os pais, compre-ender o momento vivenciado por elese incentivar a participação nos cuida-dos com o bebê. Porém, para que issopossa acontecer é preciso que haja umrepensar, não só das práticas de assis-tência nos hospitais, mas das própriascondutas dos profissionais das UTIsNeonatal. Além disso, os própriosprofissionais da psicologia precisamestar preparados teórica e tecnicamen-te para lidarem com as demandas deum ambiente hospitalar, necessitandouma constante atualização profissio-nal, que permita um exercício efetivode sua função.

Assim, o profissional da psicolo-gia pode e deve desenvolver trabalhosjunto aos pais de crianças hospitaliza-das, especialmente em situações demalformação congênita, que permi-tam identificar suas dificuldades frenteao estresse psicológico, possibilitan-do o planejamento e execução de uma

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adequada intervenção psicológica pre-ventiva. Desta forma, os familiarespoderão participar tanto como cola-boradores no tratamento da criançacomo beneficiários do mesmo, tendoem vista que também necessitam deatendimento por estarem implicadosna situação de doença e internação.

Destaca-se, porém, uma carênciade estudos que investiguem especifi-camente o vínculo pais-bebê em si-tuações de malformação congênita.Tais estudos poderiam contribuirpara uma maior compreensão da di-nâmica familiar que ocorre nestescasos, e assim poderiam subsidiar aprática clínica de psicólogos e outrosprofissionais que atuam em UTIs.Dessa forma, sugere-se que pesqui-sas sejam desenvolvidas neste contex-to, permitindo uma maior avaliaçãodestas situações, assim como o desen-volvimento de práticas profissionaisespecíficas.

WITHIN THE LIMITS OF LIFE ANDDEATH: A CASE STUDY ON THEPARENTS/BABY RELATIONSHIP IN ANEONATAL ICU

ABSTRACT

This paper discusses the importance of parents/babyrelationship in cases of fetal malformation andhospitalization in neonatal ICU, through the casestudy of a psychological accompaniment in a publichospital in Porto Alegre, RS. During the follow up,reactions of denial, self-accusation, feelings of guiltand difficulties of the parents to bond to the newbornwere observed. Through the psychological care, parentscould better understand the reality of their child, wereable to get closer to the baby, participate in the basiccare, and develop an emotional bond with the child.

This study shows the relevance of psychologicalaccompaniment of families with hospitalized babiesin the postnatal period.

Index terms: ICU; neonatal; parents/babyrelationship; congenital malformation.

EL LÍMITE ENTRE LA VIDA Y LAMUERTE: UN ESTUDIO DE CASO SO-BRE LA RELACIÓN PADRES/BEBÉ ENLA UTI NEONATAL

RESUMEN

Este trabajo discute la importancia de la relaciónpadres/bebé en situaciones de malformación fetal einternación en UTI Neonatal, a través del relato deun acompañamiento psicológico realizado en un hos-pital público de Porto Alegre, RS. Durante elacompañamiento, fueron observadas reacciones denegación, auto-acusación, sentimientos de culpa ydificultades de los padres para la vinculación con elrecién-nacido. A través de la atención realizada, lospadres pudieron comprender mejor la realidad de suhijo, consiguiendo aproximarse del bebé, participarde los cuidados básicos y formar un vínculo afectivo.Se destaca la importancia del acompañamiento psi-cológico a las familias de bebés en situación deinternación hospitalaria en el periodo post-navidad.

Palabras clave: UTI; neonatal; relación padres/bebé; malformación congénita.

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Recebido em setembro/2008.

Aceito em janeiro/2009.

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