estudo de processos de transporte eletrÔnico em dispositivos a base de semicondutores orgÂnicos

103
 Universidade de São Paulo  Instituto de Física de São Carlos ESTUDO DE PROCESSOS DE TRANSPORTE ELETRÔNICO EM DISPOSITIVOS A BASE DE SEMICONDUTORES ORGÂNICOS FERNANDO ARAÚJO DE CASTRO Dissertação apresentada ao Instituto de Física de São Carlos, da Universidade de São Paulo, para obtenção do título de Mestre em Física Aplicada Orientador: Prof. Dr. Carlos Frederico de Oliveira Graeff São Carlos 2004

Upload: samuel-correa

Post on 04-Nov-2015

215 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

ESTUDO DE PROCESSOS DE TRANSPORTEELETRÔNICO EM DISPOSITIVOS A BASE DESEMICONDUTORES ORGÂNICOS

TRANSCRIPT

  • Universidade de So Paulo

    Instituto de Fsica de So Carlos

    ESTUDO DE PROCESSOS DE TRANSPORTE

    ELETRNICO EM DISPOSITIVOS A BASE DE

    SEMICONDUTORES ORGNICOS

    FERNANDO ARAJO DE CASTRO

    Dissertao apresentada ao Instituto de Fsica de So

    Carlos, da Universidade de So Paulo, para obteno do

    ttulo de Mestre em Fsica Aplicada

    Orientador: Prof. Dr. Carlos Frederico de Oliveira Graeff

    So Carlos

    2004

  • DEDICATRIA ii

    Dedico este trabalho minha famlia,

    em especial minha querida esposa,

    Mabel, a meu irmo, Gustavo, e aos

    meus pais, Srgio e Ins, que, com

    carinho, sempre me apoiaram e me

    incentivaram.

  • AGRADECIMENTOS iii

    Ao Prof. Carlos F. O. Graeff, meu orientador, pela inestimvel orientao, pelas

    oportunidades apresentadas e, principalmente, pela amizade e confiana em mim

    depositadas.

    Ao Prof. Roberto Mendona Faria, pelo apoio irrestrito a este trabalho.

    Ao amigo Dr. Lucas Fugikawa, pelas inestimveis contribuies a este trabalho,

    pelo auxlio na preparao dos diodos de MEH-PPV e nas medidas de impedncia e por

    ter cedido a figura 7.6, assim como pelas inmeras discusses.

    Ao amigo George Silva, pelas inmeras discusses e pelo inestimvel auxlio no

    aprendizado da tcnica de RMDE.

    Ao amigo Dr. Paulo Bueno, pela recente amizade, pelas timas discusses e pelo

    inestimvel auxlio sobre os resultados de impedncia.

    Ao Dr. Frank Nesch pela preparao dos OLEDs de Alq3 e pelas timas

    discusses.

    Ao amigo Carlo e Dr. Dbora Balogh, pelas dicas e pela ajuda em todas as

    horas.

    Aos Professores e amigos Dr. Francisco E. G. Guimares e Dr. Alexandre

    Marletta, por terem me introduzido pesquisa cientfica, assim como pela sua amizade e

    confiana.

    Aos colegas e professores do grupo de polmeros e do grupo ressomat, pelo bom

    ambiente de trabalho e pelas discusses oportunas. Em especial, ao Jair Junior, ao Clio

    Borges, ao Edivaldo Queiroz e ao Dr. Rodrigo Bianchi, pela amizade, pelas discusses e

    pela ajuda em todas as horas.

    Ao CNPQ pela bolsa de mestrado e ao IMMP/MCT pelo auxlio financeiro.

  • NDICE iv

    LISTA DE FIGURAS ................................................................................................... VI

    LISTA DE TABELAS .................................................................................................. IX

    LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS....................................................................X

    LISTA DE SMBOLOS................................................................................................ XI

    RESUMO .................................................................................................................... XIII

    ABSTRACT................................................................................................................ XIV

    CAPTULO 1: INTRODUO .....................................................................................1

    CAPTULO 2: POLMEROS CONDUTORES............................................................5

    2.1 Portadores de carga em sistemas conjugados...........................................................7

    2.2 Defeitos estruturais: slitons, plarons e biplarons. ..............................................8

    2.3 Diodos emissores de luz polimricos (PLEDs)......................................................10

    CAPTULO 3: RESSONNCIA PARAMAGNTICA ELETRNICA E

    RESSONNCIA MAGNTICA DETECTADA ELETRICAMENTE....................13

    3.1 Ressonncia Paramagntica Eletrnica..................................................................13

    3.1.1 Fenmenos de alargamento ou estreitamento do espectro de ressonncia .....15

    3.2 RMDE ....................................................................................................................17

    3.3 Processos Dependentes de Spin .............................................................................18

    3.4 Modelo de Lepine ..................................................................................................22

    3.5 Modelo KSM..........................................................................................................24

    CAPTULO 4: MATERIAIS E MTODOS ...............................................................25

    4.1 Confeco de dispositivos......................................................................................25

    4.1.1 Preparao dos substratos ...............................................................................25

    4.1.2 Deposio dos filmes orgnicos......................................................................26

    4.1.3 Evaporao dos contatos metlicos.................................................................29

    4.1.4 Resumo dos tipos de dispositivos estudados...................................................30

    4.2 Medidas de Ressonncia Paramagntica Eletrnica e Ressonncia Magntica

    Detectada Eletricamente...............................................................................................31

    4.3 Espectroscopia de impedncia eltrica...................................................................34

    CAPTULO 5: POLIANILINA ....................................................................................35

    5.1 Resultados ..............................................................................................................39

  • NDICE v

    5.1.1 Ressonncia Paramagntica Eletrnica...........................................................39

    5.1.2 Ressonncia Magntica Detectada Eletricamente...........................................44

    5.2 Discusso ...............................................................................................................47

    CAPTULO 6: RMDE DE DIODOS DE MEH-PPV .................................................52

    6.1 ITO/MEH-PPV/Al .................................................................................................52

    6.2 ITO/MEH-PPV/Au ................................................................................................55

    6.3 Dependncia com a temperatura ............................................................................56

    6.4 Dependncia com a corrente ..................................................................................57

    6.5 Discusso ...............................................................................................................58

    CAPTULO 7: ESPECTROSCOPIA DE IMPEDNCIA ELTRICA EM OLEDS

    DE ALQ3 ........................................................................................................................63

    7.1 Resultados e discusses .........................................................................................66

    CAPTULO 8: CONCLUSES....................................................................................77

    CAPTULO 9: BIBLIOGRAFIA .................................................................................82

  • LISTA DE FIGURAS vi

    Figura 2.1: Distribuio de probabilidade eletrnica do butadieno. (a) Orbitais localizados; (b) Orbitais no localizados. ......................................................................6 Figura 2.2: Estrutura de alguns tipos de polmeros conjugados mais comuns..................7 Figura 2.3: Ilustrao de um sliton dividindo uma cadeia de trans-poliacetileno em duas regies A e B degeneradas.........................................................................................8

    Figura 2.4: Diagramas de bandas e respectivas representaes de um sliton dentro da estrutura do trans-poliacetileno. Defeito a) carregado positivamente (S = 0), b) eletricamente neutro (S = ), e c) carregado negativamente (S = 0).................................8

    Figura 2.5: Nveis de energia de plarons, biplarons e xciton singleto em um polmero com estado fundamental no-degenerado...........................................................9

    Figura 2.6: Exemplo de curva tpica de diodo................................................................10 Figura 2.7: Diagrama de energias do ITO, MEH-PPV e diferentes ctodos metlicos..11 Figura 4.1: Esquema de remoo do ITO.......................................................................26 Figura 4.2 Esquema do aparato experimental para formao de filmes de MEH-PPV pelo mtodo spin casting. .............................................................................................27 Figura 4.3: Esquema do aparato experimental para formao de filmes de Pani pelo mtodo casting..................................................................................................................27

    Figura 4.4: Estrutura das molculas que compem o OLED a base de Alq3..................29 Figura 4.5: (a) Estrutura de dispositivo tipo sanduche, (b) dispositivo com contatos paralelos (viso da superfcie superior)............................................................................30

    Figura 4.6: (a) Absoro das microondas em um espectro de EPR com uma amplitude de modulao Hmod e (b) espectro de EPR: primeira derivada do espectro de absoro da microonda.........................................................................................................................31

    Figura 4.7: Foto do aparato experimental usado nas medidas de RPE e RMDE............32 Figura 4.8: Foto de um dispositivo de Alq3 encapsulado para medidas de RMDE........33 Figura 4.9: Ilustrao de uma medida de impedncia em uma amostra de um material de constante dieltrica e condutividade ..........................................................................34 Figura 5.1: Estrutura da polianilina.................................................................................35 Figura 5.2: Esquema genrico de dopagem da polianilina em soluo de HCl..............36 Figura 5.3: Sinal de RPE em temperatura ambiente de um filme de polianilina............39 Figura 5.4: (a) Sinal de RPE integrado (crculos abertos) de um filme de polianilina, decomposto em duas lorentzianas, uma larga (tracejada) e uma fina (pontilhada), cuja soma mostrada pela linha slida. (b) Zoom do pico de absoro para melhor visualizao das componentes...............................................................................................................40

    Figura 5.5: Dependncia da amplitude do sinal das componentes fina e larga com a temperatura.......................................................................................................................41

  • LISTA DE FIGURAS vii

    Figura 5.6: Dependncia da susceptibilidade magntica de um filme de pani com a temperatura.......................................................................................................................41 Figura 5.7: Dependncia do fator g da componente fina do espectro de RPE................42 Figura 5.8: Dependncia da largura de linha da componente dominante do sinal de RPE em funo da temperatura................................................................................................43 Figura 5.9: Sinal integrado de RMDE de um dispositivo com contatos coplanares (crculos abertos), decomposto em duas componentes, uma gaussiana larga (linha pontilhada) e uma lorentziana fina (linha tracejada). A linha slida representa a soma das componentes.....................................................................................................................44

    Figura 5.10: Sinal integrado de RMDE (crculos abertos) de um dispositivo de polianilina com contatos tipo sanduche, ajustado por uma gaussiana larga (linha slida)...............................................................................................................................45

    Figura 5.11: Intensidade do sinal de RMDE em funo da temperatura. Figura cedida por Graeff et al.[32]..........................................................................................................46

    Figura 6.1: Sinal de RMDE tpico de um PLED de MEH-PPV (crculos abertos) decomposto em duas componentes (pontilhada e tracejada). A linha slida a soma das duas componentes. ...........................................................................................................53

    Figura 6.2: (a) sinal de RMDE integrado de um PLED pssimo emissor de luz simulado por uma lorentziana, (b) sinal de RMDE integrado de um PLED bom emissor de luz composto por duas componentes, uma gaussiana e uma lorentziana...............................54

    Figura 6.3: Sinal de RMDE de um diodo de ITO/MEH-PPV/Au (crculos abertos) ajustado pela derivada de uma curva tipo gaussiana (linha slida)..................................55

    Figura 6.4: Sinal de RMDE de um diodo de ITO/MEH-PPV/Au (crculos abertos) decomposto em duas componentes (pontilhada e tracejada). A linha slida a soma das duas componentes.............................................................................................................56

    Figura 6.5: Dependncia da amplitude do sinal de RMDE com a temperatura para a) LEDs com diferentes eficincias de emisso de luz; b) diodo em que a injeo de eltrons bastante minimizada (no emite luz).A linha em preto representa a mxima amplitude esperada utilizando o modelo de Lepine.........................................................57

    Figura 6.6: Dependncia do sinal de RMDE com a corrente para um diodo bipolar (quadrados cheios) e um diodo hole-only (crculos abertos)............................................58 Figura 7.2: Componentes real (a) e imaginria (b) da resposta de impedncia de um OLED operando em modo direto em diferentes voltagens dc. No detalhe em (a) mostrada a dependncia de Z com Vdc em f 0............................................................67

    Figura 7.2: Componentes real (a) e imaginria (b) da resposta de impedncia de um OLED operando em modo reverso em diferentes voltagens dc.......................................68

  • LISTA DE FIGURAS viii

    Figura 7.3: Diagrama de energias do HOMO (inferior), LUMO (superior) e nvel de Fermi (dos eletrodos) em relao ao nvel de vcuo para as camadas que compem o OLED. .............................................................................................................................69

    Figura 7.4: Componentes real (a) e imaginria (b) da capacitncia complexa para um OLED operando em modo reverso...................................................................................70

    Figura 7.5: Componentes real (a) e imaginria (b) da capacitncia complexa do OLED operando em modo direto ................................................................................................71

    Figura 7.6: Componente real da capacitncia complexa para diferentes valores de voltagem dc: (a) de 0V a 2,5 V; e (b) de 3 V a 6 V. Em (b) Vdc = 0 V tambm mostrado para comparao...............................................................................................72

    Figura 7.7: Componente real da capacitncia complexa para um PLED (a) e um dispositivo hole-only (b), ambos de MEH-PPV e operando em modo direto e em modo reverso. Figura cedida por L.F. Santos.............................................................................73

    Figura 7.8: Diagrama de energias do HOMO e do LUMO do MEH-PPV e do nvel de Fermi dos eletrodos usados no PLED e no hole-only.......................................................74

  • LISTA DE TABELAS ix

    Tabela 4.1: Resumo dos dispositivos analisados com a configurao de cada tipo........30

    Tabela 7.1: Relaes entre as quatro funes de representao de medidas de

    impedncia mais usuais....................................................................................................64

  • LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS x

    Al alumnio

    -NPD N,N-difenil-N,N-bis(1-naftil)-1,1-bifenil-4,4-diamina Alq3 tris(8-hidroxiquinolato) de alumnio (III)

    Au ouro

    bulk volume do material a que se refere

    CuPc ftalocianina de cobre

    FFCLRP Faculdade de Filosofia Cincias e Letras de Ribeiro Preto

    gap diferena de energia entre o HOMO e o LUMO.

    GPBG Grupo de Polmeros Bernhard Gross

    HOMO orbital molecular mais alto ocupado

    IFSC Instituto de Fsica de So Carlos

    LiF fluoreto de ltio

    LUMO orbital molecular mais baixo desocupado

    MEH-PPV poli(2-metxi, 5-(2'-etil-hexilxi)-1,4-fenileno vinileno)

    Pani polianilina

    PPV poli(p-fenileno vinileno)

    RESSOMAT Grupo de Ressonncia Magntica e Materiais

    RMDE ressonncia magntica detectada eletricamente

  • LISTA DE SMBOLOS xi

    BE polianilina na forma de base de esmeraldina

    p+, p- plaron positivo, plaron negativo

    bp+, bp- biplaron positivo, biplaron negativo

    C capacitncia

    C parte real da capacitncia

    C parte imaginria da capacitncia

    E diferena de energia diferena de fase Hpp largura de linha pico-a-pico N variao do nmero de spins N/N variao relativa do nmero de spins / variao relativa da condutividade, amplitude do sinal de RMDE constante dieltrica parte real da constante dieltrica parte imaginria da constante dieltrica g fator de Land, fator de desdobramento espectroscpico, fator g

    H0 campo magntico externo esttico

    H1 campo magntico oscilante

    L largura da amostra

    me massa do eltron

    mS nmero quntico magntico

    B magneton de Bohr n nmero de intervalos

    N nmero de spins

    N+ nmero de spins ocupando o estado ms = +

    N- nmero de spins ocupando o estado ms = -

    freqncia da microonda 0 freqncia de ressonncia pS probabilidade que dois spins de um grupo de spins estejam antiparalelos

  • LISTA DE SMBOLOS xii

    pT probabilidade que dois spins de um grupo de spins estejam paralelos

    S momento angular de spin

    SE polianilina na forma de sal de esmeraldina

    * condutividade complexa dc condutividade esttica parte real da condutividade parte imaginria da condutividade T1 tempo de relaxao spin-rede

    T2 tempo de relaxao transversal ou spin-spin

    diss constante de tempo de dissociao do par de spins SF tempo caracterstico de inverso de spin ~ quando usado antes de um nmero significa aproximadamente

    freqncia angular susceptibilidade magntica Y admitncia

    Y parte real da admitncia

    Y parte imaginria da admitncia

    Z impedncia

    Z parte real da impedncia

    Z parte imaginria da impedncia

  • RESUMO xiii

    RESUMO

    O objetivo deste trabalho foi de estudar processos de transporte eletrnico em

    dispositivos a base de semicondutores orgnicos atravs de tcnicas avanadas, como

    ressonncia magntica detectada eletricamente (RMDE) e espectroscopia de impedncia

    eltrica em corrente alternada. Alm destas, medidas de ressonncia paramagntica

    eletrnica (RPE) convencional tambm foram realizadas de forma a complementar as

    medidas de RMDE. Os dispositivos e materiais estudados foram: (hole-only e PLED) de

    MEH-PPV, polianilina e OLED multicamadas de Alq3 e -NPD. A tcnica de RMDE mede a variao de condutividade da amostra na condio de ressonncia magntica,

    permitindo relacionar processos microscpicos com os seus efeitos nos processos de

    transporte eletrnico. Os estudos de RPE e RMDE em polianilina mostraram uma

    transio entre os tipos de spin observados em funo da temperatura. Os resultados

    obtidos indicam que o sinal de RPE se deve principalmente a estados de superfcie,

    enquanto a tcnica de RMDE permite observarmos tambm estados do volume,

    dependendo da forma de preparao dos dispositivos e dos parmetros utilizados nas

    medidas. O sinal de RMDE foi atribudo ao hopping de plarons intercadeias

    polimricas. Nos dispositivos de MEH-PPV, o sinal de RMDE apresenta duas

    componentes, uma foi atribuda fuso de plarons negativos para formar biplarons

    negativos e a outra foi atribuda fuso de plarons positivos. A deficincia na emisso

    de luz de alguns dos PLEDs estudados foi atribuda ao desbalanceamento de injeo de

    cargas, que pode ser observado pela diferena de intensidade entre as componentes do

    sinal. Nos OLEDs a base de Alq3, medidas de espectroscopia de impedncia eltrica em

    funo da voltagem dc (Vdc) mostraram um acmulo de cargas nas interfaces internas do

    dispositivo, em baixas tenses. Entretanto, para valores mais altos de Vdc, quando

    comea o processo de recombinao, foi observado um fenmeno pouco estudado na

    literatura, conhecido como capacitncia negativa. Possveis abordagens a este

    problema foram propostas.

  • ABSTRACT xiv

    ABSTRACT

    The subject of this work is the investigation of electronic transport processes in

    organic semiconductors based devices using advanced techniques, such as electrically

    detected magnetic resonance (EDMR) and ac electrical impedance spectroscopy.

    Electron Paramagnetic Resonance (EPR) measurements were also carried out to

    complement the EDMR results. The studied devices and materials were: MEH-PPV

    hole-only devices and PLEDs, polyaniline and multilayer Alq3 and -NPD based OLEDs. EDMR measures the sample conductivity variation during magnetic resonance

    condition, which allows relating microscopic processes to its effects on electronic

    transport processes. EPR and EDMR investigations on polyaniline showed a transition

    between two kinds of observed spins as a function of temperature. The results indicate

    that EPR probes especially surface paramagnetic states, while EDMR allows observing

    both surface and bulk paramagnetic states, depending on how devices are prepared and

    on some measurement parameters. The EDMR signal was assigned to interchain

    hopping of plarons. On MEH-PPV devices, the EDMR signal was composed of two

    lines, one was attributed to negative plarons fusion to form negative biplarons and the

    other was assigned to positive plarons fusion. The light emitting deficiency presented

    by some of the PLEDs investigated was assigned to a misbalanced charge injection,

    what could be observed by the difference between the intensity of the two components.

    Impedance spectroscopy measurements on Alq3 based OLEDs as a function of the dc

    voltage (Vdc) showed charge accumulation at the inner interfaces of the device at low

    Vdc values. However, at higher Vdc values, when recombination starts to take place, a

    strange phenomenon, usually called negative capacitance, was observed. Possible

    approaches were proposed.

  • Captulo 1: Introduo 1

    Captulo 1

    INTRODUO

    No incio dos anos 60, houve um grande interesse no estudo de cristais

    moleculares que apresentavam atividades eletrnicas e optoeletrnicas devido s suas

    propriedades de transporte e de recombinao eletrnicas [1,2]. Essas propriedades, tais

    como retificao de corrente e emisso de luz devido a fenmenos foto e

    eletroluminescentes, eram at ento somente estudadas em semicondutores inorgnicos.

    Entretanto, a baixa mobilidade eletrnica dos cristais orgnicos associado s suas frgeis

    propriedades mecnicas no permitiram o seu sucesso em aplicaes na rea de

    dispositivos. Por esse motivo, esses estudos foram pouco a pouco sendo abandonados. A

    descoberta dos polmeros de conduo eletrnica no final dos anos 70 [3] fez renascer o

    interesse das pesquisas relacionadas a processos de conduo eletrnica em sistemas

    orgnicos. Os polmeros conjugados, que mostraram uma grande variao em sua

    condutividade eltrica sob dopagem qumica so os grandes responsveis por essa nova

    adequao, elevando os materiais polimricos categoria de materiais de grau

    eletrnico. Os semicondutores orgnicos exibem propriedades de retificao quando

    interfaciados a metais e, sob determinadas condies, apresentam propriedades

    luminescentes. cada vez mais relevante, portanto, compreendermos os mecanismos de

    injeo, transporte e recombinao de portadores de carga nesses semicondutores

  • Captulo 1: Introduo 2

    orgnicos medida que estes materiais se firmam como elementos ativos de dispositivos

    eletrnicos e opto-eletrnicos [4,5,6,7,8]. O sucesso dessas aplicaes pode ser medido

    pelos grandes investimentos realizados por empresas do setor [9,10,11]. Dentre as

    caractersticas mais atraentes do ponto de vista tecnolgico est o baixo custo aliado

    possibilidade da produo de dispositivos com reas grandes, como displays [12].

    Apesar do atual estgio de desenvolvimento tecnolgico de dispositivos a base

    destes materiais orgnicos, os mecanismos de injeo, transporte e recombinao,

    responsveis pela eficincia desses sistemas, ainda so pouco compreendidos e h muita

    controvrsia sobre o tema na literatura [4,13,14]. Parte desta pouca compreenso advm

    da dificuldade de se relacionar medidas de grandezas macroscpicas com sua origem

    microscpica ou mesmo de se compreender em que regio do dispositivo1 est

    ocorrendo o processo que estamos interessados em estudar.

    A possibilidade de se separar os diferentes fenmenos e estudar a dinmica dos

    portadores de cargas nas diferentes regies do material particularmente importante em

    dispositivos compostos por mais de uma camada orgnica. Experimentalmente, isto

    pode ser obtido por medidas de resposta em freqncia, como a espectroscopia de

    impedncia eltrica em corrente contnua (ac). Basicamente, uma voltagem oscilante no

    tempo [V(t) = Vaccos(t)] aplicada ao dispositivo a ser estudado e a resposta em corrente obtida na mesma freqncia mas com um certa defasagem em relao a V(t).

    Em baixas freqncias, somente os portadores (ou processos) mais lentos iro responder

    perturbao em freqncia. Em freqncias intermedirias, alguns portadores mais

    lentos vo deixando de responder at que, em altas freqncias, apenas os portadores

    com maior mobilidade, aqueles presentes nos eletrodos, iro contribuir para a resposta

    do sistema. Assim, possvel selecionar os processos a serem estudados, permitindo

    uma correlao da resposta em freqncia com a estrutura do dispositivo, por exemplo,

    atravs da mobilidade dos portadores em cada camada.

    Por outro lado, a possibilidade de se investigar o ambiente microscpico destes

    materiais dada por mtodos de ressonncia magntica, como ressonncia

    paramagntica eletrnica (RPE) ou ressonncia magntica nuclear (RMN). Entretanto, 1 Por exemplo, no volume do material orgnico ou prximo interface com o eletrodo metlico.

  • Captulo 1: Introduo 3

    enquanto os mtodos de ressonncia magntica permitem acesso a informaes

    microscpicas sobre centros paramagnticos, eles no so capazes de revelar muita

    informao sobre atividades de transporte e recombinao. Devido a esta limitao,

    mtodos experimentais foram desenvolvidos para combinar a sensibilidade microscpica

    e seletividade da RPE com outros mtodos como condutividade ou fotoluminescncia. A

    descoberta de processos de recombinao que dependem do spin eletrnico remonta s

    primeiras medidas de ressonncia magntica detectada opticamente (RMDO ou, da sigla

    em ingls, ODMR) realizadas por Geschwind et al. [15,16] em 1959. Nestes

    experimentos, configuraes de spin em estados eletrnicos excitados so manipulados

    por RPE, levando a uma mudana relativa entre os processos de recombinao, que

    podem ser observadas por medidas de luminescncia. Alternativamente deteco de

    RPE por medidas de luminescncia, processos de transporte dependentes de spin podem

    ser detectados por mudanas na condutividade, ou fotocondutividade do material. Este

    mtodo chamado de ressonncia magntica detectada eletricamente (RMDE, ou do

    ingls, EDMR), e tambm conhecido pelos nomes: condutividade dependente de spin

    (CDS), ressonncia paramagntica eletrnica detectada eletricamente (EDEPR), entre

    outras. As primeiras medidas de RMDE foram realizadas por Maxwell e Honig [17,18]

    que investigaram o impacto da RPE no espalhamento de portadores de carga em

    impurezas em 1966.

    Os mtodos que combinam RPE com deteco de variveis macroscpicas so

    muito mais sensveis do que as medidas de RPE convencional e, portanto, podem ser

    aplicados a materiais e dispositivos onde o nmero de defeitos paramagnticos muito

    pequeno para possibilitar uma investigao por medidas de ressonncia convencional.

    Essas tcnicas so adequadas ao estudo do processo de transporte e recombinao em

    filmes finos semicondutores, orgnicos e inorgnicos, e seus dispositivos. Em particular,

    a tcnica de Ressonncia Magntica Detectada Eletricamente (RMDE) tem sido

    empregada com sucesso no estudo dos processos de transporte e recombinao em

    semicondutores cristalinos [18,19,20,21], em semicondutores amorfos, micro ou poli-

    cristalinos [22,23,24,25,26,27,28,29,30] e em semicondutores orgnicos

    [31,32,33,34,35,36,37].

  • Captulo 1: Introduo 4

    Descrio do trabalho

    Este trabalho tem por objetivo estudar processos de transporte em dispositivos

    eletrnicos base de trs diferentes semicondutores orgnicos: polianilina (Pani); poli(2-

    metxi, 5-(2'-etil-hexilxi)-1,4-fenileno vinileno) (MEH-PPV); e tris(8-

    hidroxiquinolato) de alumnio (III) (Alq3); atravs de tcnicas avanadas, como

    ressonncia magntica detectada eletricamente e espectroscopia de impedncia eltrica.

    No CAPTULO 2, sero introduzidos conceitos bsicos sobre os semicondutores

    orgnicos, em especial sobre polmeros condutores. No CAPTULO 3, sero

    introduzidos conceitos fundamentais sobre as tcnicas de ressonncia paramagntica

    eletrnica e ressonncia magntica detectada eletricamente, e sobre como processos

    eletrnicos podem depender da orientao dos spins envolvidos. No CAPTULO 4,

    sero descritos os mtodos de preparao dos dispositivos utilizados, assim como as

    tcnicas de medidas de RMDE e impedncia. No CAPTULO 5, sero apresentados e

    discutidos os resultados de medidas de RPE e RMDE em dispositivos de polianilina. O

    CAPTULO 6 apresenta e discute os resultados de medidas de RMDE em diodos de

    MEH-PPV. No CAPTULO 7, sero apresentados e discutidos os resultados de medidas

    de impedncia eltrica em dispositivos de Alq3. No CAPTULO 8, sero apresentadas

    as principais concluses e as perspectivas futuras.

    O Grupo de Ressonncia Magntica e Materiais (RESSOMAT FFCLRP -

    USP) o primeiro grupo de pesquisa brasileiro a introduzir a tcnica de RMDE no pas

    e, em colaborao com o Grupo de Polmeros Bernhard Gross (GPBG IFSC - USP),

    aplic-la a dispositivos polimricos [36,37]. Este trabalho mostrar que a tcnica de

    ressonncia magntica detectada eletricamente pode trazer informaes importantes para

    uma melhor compreenso dos mecanismos de transporte em semicondutores orgnicos,

    tendo a vantagem de permitir o estudo destes materiais na forma de dispositivos

    eletrnicos reais e no apenas na forma de filmes finos ou em soluo.

  • Captulo 2: Polmeros Condutores 5

    CAPTULO 2

    POLMEROS CONDUTORES

    Um polmero uma molcula de cadeia longa formada por muitas (poli)

    unidades (meros) idnticas repetidas. Em geral, so compostos de carbono e

    hidrognio2, porm, eventualmente podem aparecer outros tomos, como, por exemplo,

    oxignio ou nitrognio, ligados cadeia principal. Muita pesquisa cientfica destinada

    s propriedades e aplicaes de materiais polimricos, devido a grande quantidade de

    diferentes molculas, com diferentes caractersticas, que podem ser sintetizadas. Como

    exemplo, diferentes polmeros podem ser utilizados tanto como isolantes em

    revestimento de fios de alta tenso [38,39], quanto como camada ativa

    (eletroluminescente) em displays [9,10,11].

    Neste trabalho, o interesse voltado aos polmeros com propriedades eletrnicas,

    que, em geral, so polmeros conjugados. Um polmero dito conjugado quando h uma

    alternncia de ligaes simples e duplas entre os carbonos da sua cadeia principal. A

    estrutura eletrnica destes materiais pode ser descrita em termos da sobreposio entre

    orbitais pz adjacentes provenientes da hibridizao sp2 dos tomos de carbono [40]. Os

    carbonos da cadeia polimrica principal so unidos pelas fortes ligaes (ligaes

    2 Da a denominao de materiais orgnicos.

  • Captulo 2: Polmeros Condutores 6

    simples formadas pelos orbitais sp2), enquanto que os orbitais pz se superpem em um

    plano perpendicular ao da cadeia, formando orbitais preenchidos e vazios *.

    Figura 2.1: Distribuio de probabilidade eletrnica do butadieno. (a) Orbitais localizados; (b) Orbitais no localizados [41].

    Como estes materiais podem ser tratados aproximadamente como condutores

    unidimensionais, existe uma separao (gap) energtica entre o orbital molecular mais

    alto ocupado (HOMO, highest occupied molecular orbital) e o orbital molecular mais

    baixo desocupado (LUMO, lowest unoccupied molecular orbital), devido instabilidade

    de Periels [42]. Em geral, nestes polmeros condutores, o gap de energia da ordem

    de 1,5 a 4,0 eV, semelhante ao de semicondutores inorgnicos.

  • Captulo 2: Polmeros Condutores 7

    A figura 2.2 apresenta os nomes e frmulas estruturais de alguns polmeros

    condutores. Apesar de ter sua conjugao interrompida pela presena de nitrognios

    amina, a polianilina, cuja estrutura simplificada mostrada nesta figura, tambm se

    comporta como um sistema conjugado.

    2.1 Portadores de carga em sistemas conjugados

    Como j foi mencionado na introduo deste trabalho, o interesse em processos

    de conduo em sistemas orgnicos renasceu no final da dcada de 1970 [3] devido

    descoberta de que polmeros conjugados poderiam ter sua condutividade eltrica

    aumentada atravs de dopagem qumica, sob ao de agentes oxidantes ou redutores. O

    papel destes agentes o de retirar (ou introduzir) um eltron na banda (*). A carga lquida introduzida no sistema leva a uma relaxao estrutural da cadeia polimrica,

    ocasionando uma certa localizao da densidade de carga eletrnica. Vamos ver o que

    significa esta relaxao estrutural.

    n

    n

    OR2

    OR1

    n s n

    sn

    R

    N n

    Poliacetileno Poliparafenileno vinilenoPPV

    Poli(2,5 dialcoxi) parafenilenovinileno (e.g.: MEH-PPV)

    sn

    O O

    nPoliparafenileno - PPP Politiofeno- PT

    Polipirrol - PPy Poli(3-alquil) tiofeno -P3AT (R = metil,

    butil, etc.) Polietileno dioxitiofenoPEDOT

    nN N N N

    H H

    Polianilina - PANI

    Figura 2.2: Estrutura de alguns tipos de polmeros conjugados mais comuns.

  • Captulo 2: Polmeros Condutores 8

    2.2 Defeitos estruturais: slitons, plarons e biplarons.

    No trans-poliacetileno, no estado fundamental, defeitos estruturais, chamados

    slitons, podem inverter a seqncia entre as ligaes (simples/dupla ou dupla/simples).

    Neste sistema, estas duas regies so degeneradas, ou seja, apresentam a mesma energia.

    O nome sliton se deve sua localizao e translao sem perda de energia. O resultado

    da formao de tal defeito pode ser representado pelo esquema da figura 2.3, onde,

    embora a cadeia permanea eletricamente neutra, um eltron do carbono assinalado () se encontra desemparelhado.

    Figura 2.3: Ilustrao de um sliton dividindo uma cadeia de trans-poliacetileno em duas regies A e B degeneradas [61].

    Esse sliton, portanto, possui carga nula, spin e leva formao de um estado

    no-ligante, degenerado e localizado, no meio do gap entre e * [43]. Quando uma carga lquida introduzida na cadeia polimrica so nestes defeitos estruturais que ela

    ir se localizar, dando origem a um sliton eletricamente carregado e com spin total nulo

    (figura 2.4).

    +

    S+ S0 S-

    a) b) c)

    Figura 2.4: Diagramas de bandas e respectivas representaes de um sliton dentro da estrutura do trans-poliacetileno [61]. Defeito a) carregado positivamente (S = 0), b) eletricamente neutro (S = ) e c) carregado negativamente (S = 0).

  • Captulo 2: Polmeros Condutores 9

    Todos os demais polmeros conjugados, porm, apresentam estas duas regies,

    onde a seqncia de ligaes invertida, com energias diferentes, ou seja, um estado

    fundamental no-degenerado [40,44]. Para que a relaxao estrutural seja estvel, os

    defeitos nesses materiais sempre ocorrem juntamente com a presena de um anti-defeito

    (ou anti-sliton), de modo que a seqncia de energia mais alta fique entre eles [43].

    Estes defeitos so chamados plarons (p). Um plaron um estado formado por um

    sliton carregado e um sliton neutro, levando formao de dois nveis no meio do

    gap, um ligante e outro antiligante. O resultado disso uma quase-partcula, dotada de

    carga eletrnica (q = +e, plaron positivo, p+; ou q = -e, plaron negativo, p-) e momento

    de spin (s = ). Esse defeito, portanto, atua como um portador de carga e de spin

    eletrnicos, mas que acompanhado de uma distoro estrutural da cadeia polimrica.

    Atualmente, acredita-se que esta distoro da cadeia, no caso do PPV, se estenda por

    entre 4 a 5 unidades monomricas [45]. Quando dois plarons de mesma carga se

    encontram eles podem formar um outro tipo de defeito, chamado biplaron (bp), que

    pode ser positivo (bp++) ou negativo (bp--) dependendo do sinal da carga dos plarons

    que o formaram. Este novo defeito possui spin nulo e carga +2 ou -2.

    Alm disso, quando dois plarons de cargas opostas se encontram eles podem

    formar um estado excitado chamado xciton, que pode ser singleto (S = 0) (figura 2.5e)

    ou tripleto (S = 1), dependendo da orientao relativa entre os spins que o formaram

    (antiparalelos ou paralelos, respectivamente). Os xcitons singletos podem relaxar

    radiativamente (emitindo luz) para o estado fundamental. Acredita-se que seja este o

    mecanismo responsvel pela luminescncia nestes materiais [46,47] aps a injeo de

    a) b) c) d) e)

    p-

    q = -e S =

    bp--

    q = -2e S = 0

    p + q = +e S =

    bp ++ q = +2e S = 0

    S 1 * q = 0 S = 0

    Figura 2.5: Nveis de energia de plarons, biplarons e xciton singleto em um polmero com estado fundamental no-degenerado.

  • Captulo 2: Polmeros Condutores 10

    cargas (formao de plarons) atravs de contatos metlicos (eletroluminescncia) ou

    por foto-gerao (fotoluminescncia).

    2.3 Diodos emissores de luz polimricos (PLEDs)

    Na dcada de 1980, verificou-se que uma fina camada de polmero condutor

    entre dois eletrodos metlicos poderia retificar correntes eltricas, dependendo da

    escolha dos metais e das propriedades semicondutoras do polmero (40,44,48). A curva

    de corrente por tenso (I vs. V) caracterstica de diodo mostrada na figura 2.6. A

    corrente no modo direto (V > 0), vrias ordens de grandeza maior (em alguns casos,

    106) do que no modo reverso.

    -10 -8 -6 -4 -2 0 2 4 6 8 10

    0,0

    5,0x10-6

    1,0x10-5

    1,5x10-5

    2,0x10-5

    2,5x10-5

    3,0x10-5

    Curva tpica de diodo

    Cor

    rent

    e (A

    )

    Tenso (V)

    Figura 2.6: Exemplo de curva tpica de diodo.

    Em 1990, foi reportado o primeiro PLED, diodo emissor de luz usando um

    polmero conjugado como camada ativa [46]. A confirmao da potencialidade de

    aplicao destes materiais em dispositivos opto-eletrnicos despertou o interesse de

    vrias empresas, como Philips, Uniax, Kodak, entre outras. O grande investimento em

    pesquisa e desenvolvimento de produtos baseados em eletrnica orgnica permitiu o

    aparecimento de diversos prottipos e produtos que j comearam a ser comercializados

    [9,10,11]. Entretanto, apesar do rpido desenvolvimento tecnolgico, muitos fenmenos

  • Captulo 2: Polmeros Condutores 11

    responsveis pelo funcionamento destes dispositivos ainda permanecem mal

    compreendidos.

    Um fator importante no desempenho dos PLEDs a escolha dos metais usados

    como eletrodos. A funo destes materiais de controlar a injeo de cargas (eltrons e

    buracos) no polmero condutor [40,4,49].

    A figura 2.7 ilustra o diagrama de energia para um PLED de MEH-PPV com

    nodo de xido de estanho e ndio (ITO) e diferentes ctodos metlicos [50,51]. Os

    valores das funes trabalho apresentados podem variar de acordo com a pureza do

    metal utilizado e/ou da interao entre o metal e o polmero [51]. Podemos ver pela

    figura 2.7 que, para facilitar a injeo de eltrons e buracos, o catodo deve possuir uma

    funo trabalho baixa, prxima energia do LUMO do polmero, e o anodo deve possuir

    um alto valor de funo trabalho, prximo energia do HOMO. Em geral, utiliza-se o

    ITO como anodo em PLEDs devido a sua transparncia luz visvel e alta funo

    trabalho. Apesar de o clcio ser o ctodo mais adequado para a injeo de eltrons, sua

    alta reatividade na presena de gua e oxignio limita a sua utilizao.

    Acredita-se que a eletroluminescncia nestes materiais ocorra da seguinte forma

    [46,47]. Portadores positivos e negativos so injetados pelo nodo e pelo ctodo,

    respectivamente. A eficincia desta injeo depende da barreira energtica entre a

    funo trabalho do metal e a energia do HOMO ou do LUMO do polmero (injeo de

    buracos e eltrons, respectivamente). Uma vez injetadas, estas cargas do origem a

    HOMO

    LUMO

    Eg

    ITO

    ITO

    Ca

    Ca (2.87 - 3.00 eV)

    Evcuo

    Mg (3,67 - 3,80 eV) In (4.12 - 4.20 eV) Ag (4.26 - 4.74 eV) Al (4.06 - 4.41 eV) Cu (4.65 - 4.70 eV) Au (5.10 - 5.47 eV)

    e

    MEH-PPV

    (2,8-3,0 eV)

    (2,1-2,3 eV)(4,6-4,9 eV)

    Figura 2.7: Diagrama de energias do ITO, MEH-PPV e diferentes ctodos metlicos.

  • Captulo 2: Polmeros Condutores 12

    plarons positivos e negativos que podem se mover pela influncia do campo eltrico

    aplicado. Estes portadores de carga podem (a) ser aprisionados por armadilhas no

    polmero, (b) formar um xciton, que pode ou no decair emitindo luz, ou (c) atravessar

    a camada polimrica e atingir o seu contra-eletrodo.

  • Captulo 3: RPE e RMDE 13

    CAPTULO 3

    RESSONNCIA PARAMAGNTICA ELETRNICA E

    RESSONNCIA MAGNTICA DETECTADA

    ELETRICAMENTE

    Neste captulo, vamos ver como os processos eletrnicos geralmente dependem

    do spin dos estados envolvidos. Antes, porm, vamos considerar o caso simples de um

    spin S = (ex. um eltron) a fim de entender como funcionam as medida de RPE

    convencional e de RMDE.

    3.1 Ressonncia Paramagntica Eletrnica

    O spin de um eltron isolado sujeito a um campo magntico externo H0 poder se

    orientar paralelo ou antiparalelo direo do campo, tendo, portanto, dois possveis

    nveis de energia para ocupar, correspondendo a mS = + e mS = - , respectivamente,

    onde mS o nmero quntico magntico que caracteriza os nveis de energia (mS = -S, -

    S+1, ..., S). Estas duas orientaes diferem em energia (desdobramento Zeeman), sendo

  • Captulo 3: RPE e RMDE 14

    esta diferena dada por E = gBH0, onde B o magneton de Bohr3 e g o fator de Land ou fator de desdobramento espectroscpico, conhecido como fator g, e vale

    2,002319 para o eltron livre. Nas medidas de RPE, o valor do fator g difere do valor

    escalar encontrado para o eltron livre como um meio de aproximar as interaes com o

    momento angular orbital e de incorporar os efeitos das interaes com a rede no

    movimento dos eltrons. Como, em equilbrio trmico, o estado de menor energia (mS =

    - ) estar mais povoado do que o de maior energia (mS = + ), o campo H0 levar a

    uma polarizao de um sistema de N spins.

    Transies entre estes nveis podem ser induzidas aplicando-se um campo

    magntico oscilante H1, perpendicular a H0, quando a freqncia de oscilao de H1

    igual freqncia de ressonncia 0 = E/h = gBH0/h. Em RPE, geralmente, esta freqncia est na faixa de microondas (GHz). As transies induzidas por H1 vo

    mudar a situao de equilbrio tendendo a igualar o nmero de spins nos dois nveis

    (condio de saturao). Elas podem ser de dois tipos: absoro estimulada ou emisso

    estimulada. A primeira ocorre quando um spin invertido de mS = - para mS = + ,

    absorvendo um fton da radiao eletromagntica ressonante. O processo inverso,

    transio do estado mS = + para mS = - leva emisso de um fton ressonante. A

    inverso de spin ocorre em um tempo caracterstico SF. Como existem mais eltrons no estado mS = - , o efeito observado o de absoro das microondas.

    Transies espontneas de inverso de spin tambm podem ocorrer devido

    movimentao trmica de tomos ou portadores de carga. Estas transies so bastante

    complicadas microscopicamente, mas podem ser descritas macroscopicamente por uma

    constante de tempo T1, conhecida como tempo de relaxao spin-rede. T1 o tempo

    caracterstico com o qual a polarizao de spins em equilbrio trmico restabelecida,

    aps ter sido perturbada por um campo alternado H1. O seu efeito o de contrabalanar

    a influncia do campo H1 no grau de polarizao de spins N/N. Para T1 > SF o sistema ficar praticamente saturado (N = 0). 3 B = e/2m, onde e e m so, respectivamente, a carga e a massa do eltron e a constante de Plank dividida por 2.

  • Captulo 3: RPE e RMDE 15

    Portanto, o que se observa em RPE so mudanas na magnetizao da amostra

    induzidas por transies de spin a partir do monitoramento da absoro de microondas

    pela amostra.

    3.1.1 Fenmenos de alargamento ou estreitamento do espectro de ressonncia

    Classicamente a interao de um campo magntico (H) com o vetor

    magnetizao (M) vai provocar um torque no momento de spin resultante que o far

    precessionar em torno da direo de Ho, que vamos chamar de direo z. Postulando

    mecanismos de decaimento e tempos de relaxao (T1 e T2) diferentes para as

    componentes horizontal e vertical da magnetizao, Bloch [52] criou uma teoria clssica

    modificada capaz de descrever satisfatoriamente os fenmenos associados ressonncia,

    como absoro de microondas, formas de linha e efeitos de relaxao. O tempo T1,

    tambm conhecido como tempo de relaxao spin-rede est relacionado relaxao da

    componente Mz, paralela ao campo Ho, enquanto T2, tambm conhecido como tempo de

    relaxao transverso, est relacionado ao tempo de decaimento de qualquer componente

    da magnetizao transversa ao campo Ho (Mx ou My).

    Os spins do sistema precessionam independentemente, com diferentes fases entre

    as suas componentes, em torno do campo magntico. As componentes transversas de

    dois spins precessionando no mesmo sentido, com uma diferena de fase de 180, se

    cancelam, mas as suas componentes longitudinais se somam. As diferenas de fase entre

    os spins do sistema podem apresentar uma distribuio tal que a resultante da

    magnetizao transversa seja muito baixa, ou zero, mesmo quando a componente Mz

    grande. Alm disso, a relao entre as fases destes spins, tendo freqncias de precesso

    ligeiramente diferentes, vai estar em constante mudana. Processos que destruam a

    coerncia de fase contribuem para o decaimento da magnetizao transversa, alterando o

    valor de T2.

    Se todos os spins alinhados pelo campo H0 permanecessem em fase, a largura da

    curva de ressonncia tenderia a zero, exceto pelo alargamento devido ao princpio de

    incerteza. Entretanto, vrios tipos de interaes podem levar a uma defasagem de alguns

  • Captulo 3: RPE e RMDE 16

    spins em relao ao grupo. Esta defasagem significa uma distribuio de freqncias de

    precesso dos spins em relao direo do campo H0. Dessa forma, haver uma

    distribuio de estados com diferentes energias e, portanto, um alargamento da linha de

    ressonncia. Quanto maior a defasagem, maior o alargamento. A seguir, vamos ver

    como o movimento de spins e a coliso com centros paramagnticos podem alterar a

    largura de linha do espectro de RPE.

    Efeito de Motional Narrowing (estreitamento por movimento)

    Vamos assumir que um campo local permanece com valor H por um tempo

    . A seguir, ele salta, randomicamente para Hz. Uma mudana de campo como esta, na prtica, ocorre porque o spin se move relativamente a seus vizinhos, por exemplo, por

    difuso. Em um tempo , um spin vai precessionar uma fase angular extra alm de sua precesso normal [52], dada por:

    = nHz, onde o fator giromagntico. Aps n intervalos como este, a defasagem quadrtica mdia 2 ser dada por:

    2 = n 2 = n n2 Hz2 2 O nmero de intervalos n em um tempo t simplesmente n = t /. Se tomarmos T2 como o tempo mdio4 para que um grupo de spins em fase em t

    = 0 se defasem de 1 radiano, ns temos:

    22221 zn HT

    = ou

    222

    1zn HT

    =

    Podemos notar, portanto, que um mais curto, ou seja, um movimento mais rpido, leva a uma linha de ressonncia mais estreita, uma vez que a largura de linha

    proporcional ao inverso do tempo de relaxao 1/T2. O movimento estreita a linha de

    4 O tempo de memria de fase no necessariamente o mesmo da relaxao spin-spin, mas estritamente equivalente ao tempo de relaxao T2 obtido pelas equaes de Bloch. Normalmente, porm, estas trs constantes temporais so usadas como numericamente equivalentes e so designadas por T2.

  • Captulo 3: RPE e RMDE 17

    ressonncia porque ele permite que um dado spin experimente vrios campos Hz, alguns

    dos quais fazem com que ele aumente a fase, e outros com que ele diminua a fase. A

    defasagem, portanto pequena, ocorrendo por um movimento randmico de pequenos

    passos, cada um muito menor que um radiano.

    Por outro lado, quando no h nenhum movimento, um dado spin experincia um

    campo local constante. Ele precessiona mais rpido ou mais lento do que a mdia, e a

    defasagem de um grupo de spins vem da acumulao de fase positiva ou negativa.

    Alargamento da linha por coliso

    A diferena do fenmeno descrito anteriormente em relao ao alargamento de

    linha por coliso grande. Com o motional narrowing, no h mudana de fase

    quando Hz est mudando de um valor para outro porque a variao muito rpida, mas

    existe uma mudana de fase durante o tempo em que Hz persiste. Assim, um movimento

    mais rpido diminui o tempo que Hz persiste, diminuindo a perda na memria da fase em

    cada intervalo. No caso da coliso, a fase da oscilao alterada a cada evento. Como a

    freqncia no perturbada entre as colises, no h perda de memria de fase exceto

    durante a coliso. Como cada coliso leva a uma perda de memria de fase, uma maior

    taxa de coliso produz uma memria de fase mais curta e, portanto, maior largura de

    linha.

    3.2 RMDE

    Na Ressonncia Magntica Detectada Eletricamente, assim como nas demais

    tcnicas que aliam RPE a medidas de grandezas macroscpicas, as mudanas na

    magnetizao da amostra so monitoradas por variaes das taxas de transio de

    processos dependentes de spin. Em RMDE medimos a variao relativa (/) da condutividade da amostra durante a condio de ressonncia. Como veremos adiante,

    processos eletrnicos podem depender do spin das entidades envolvidas.

  • Captulo 3: RPE e RMDE 18

    Um experimento de RMDE sempre envolve uma transio de spin relacionado a

    transporte ou recombinao de cargas, sendo, portanto, adequado ao estudo de processos

    de conduo. A primeira conseqncia disto uma maior sensibilidade em relao a

    RPE convencional, caracterstica relevante para tecnologias de baixa dimensionalidade

    onde o nmero de spin participando dos processos muito reduzido. As razes disto

    ficaro claras mais adiante.

    Alm disso, nas medidas de RPE, o substrato, ou qualquer material que entre

    junto com a amostra na cavidade ressonante do espectrmetro no deve ser ativo a RPE,

    restringindo os materiais que podem ser utilizados. Isto no ocorre nas medidas de

    RMDE, o que torna esta tcnica interessante para o estudo de dispositivos que

    normalmente esto embutidos em uma matrix que nem sempre inativa a RPE (por

    exemplo, transistores de filme fino, TFTs).

    3.3 Processos Dependentes de Spin

    Agora que vimos rapidamente o princpio da RPE convencional e algumas

    diferenas entre esta e a tcnica de RMDE, vamos ver como se d, pelo menos

    qualitativamente, a origem da dependncia com o spin nas transies eletrnicas em

    semicondutores. Para isto vamos ver como o spin pode afetar o destino de um eltron ou

    buraco durante sua passagem por uma amostra semicondutora em trs casos: no

    espalhamento, no tunelamento e na recombinao. Pelo menos dois spins diferentes

    esto envolvidos em cada um destes casos: o eltron considerado, mais um segundo

    eltron, um buraco ou um centro paramagntico (ex. defeito). Ao se aproximarem

    espacialmente, estes dois spins vo interagir e os processos subseqentes dependero da

    orientao relativa entre eles. Como descrito acima, cada um dos spins orientado ou

    paralelo ou antiparalelo ao campo magntico H0, tal que o par de spin formado pode

    estar tanto em uma configurao ou em uma configurao . Estas duas possveis

    configuraes trazem diferentes conseqncias para o par de spins, como ser discutido

    a seguir.

  • Captulo 3: RPE e RMDE 19

    i) Espalhamento dependente de spin:

    Se ambos o eltron e o spin doador localizado esto paralelos, o princpio de

    excluso de Pauli requer que a componente espacial da funo de onda seja

    anti-simtrica, (ex. antiligante), por outro lado, se os spins esto no estado

    singleto, anti-simtrico, a componente espacial da funo de onda tem que

    ser simtrica, causando uma ligao do tipo covalente entre o eltron doador

    e o eltron livre. Isto leva a uma pequena, mas perceptvel diferena entre as

    sees de choque de espalhamento (maior no caso paralelo), que foi descrita

    por Honig [18] e foi confirmada experimentalmente por vrios grupos

    [17,53].

    ii) Tunelamento dependente de spin:

    Aps o tunelamento o estado ser ocupado por dois eltrons, que, de acordo

    com o princpio de Pauli, precisam ter uma funo de onda assimtrica (spins

    antiparalelos). Portanto, apenas pares antiparalelos podem contribuir para o

    processo de tunelamento, enquanto que os pares paralelos no podero

    contribuir. Existe, assim, uma severa regra de seleo dependente de spin

    para o processo de tunelamento.

    iii) Recombinao ou amardilhamento dependente de spin:

    O mesmo argumento usado para o caso do tunelamento pode ser aplicado.

    Aps o evento de amardilhamento ou de recombinao, ambos os spins

    ocuparo o mesmo orbital eletrnico e, portanto, de acordo com o princpio

    de excluso de Pauli, devem estar antiparalelos. Assim, apenas pares nesta

    configurao podem realizar esta transio enquanto pares de spins paralelos

    no podem.

    A partir do que foi discutido acima, podemos resumir algumas caractersticas

    comuns s transies dependentes de spin. Na presena de um campo magntico

  • Captulo 3: RPE e RMDE 20

    externo, H0, ambos a polarizao de spins e o longo tempo de vida de recombinao de

    pares tripletos, produzem um excesso de pares paralelos em comparao a pares

    antiparalelos. A ressonncia de spin causa uma converso deste excesso de tripletos em

    singletos, aumentando, portanto, a taxa de transio dos processos dependentes de spin.

    Note que um aumento da taxa de transio no implica em um aumento do sinal de

    RMDE, por exemplo. O efeito do aumento da taxa de transio na condutividade, por

    exemplo, pode ser de aument-la ou diminu-la, dependendo do processo que estamos

    observando.

    Outra caracterstica a se notar que os espectros de transies dependentes de

    spin nos trazem informaes sobre ambos os estados paramagnticos envolvidos na

    transio: para transformar um estado tripleto em um singleto (e vice-versa), possvel

    inverter tanto um quanto o outro spin do par, de modo que ambas as transies

    ressonantes de spin iro contribuir para a composio do espectro de ressonncia. Em

    princpio, este processo permite a identificao de ambos os estados paramagnticos

    envolvidos na transio, o que faz estas tcnicas experimentais particularmente teis

    para a investigao de complexos mecanismos de transporte e recombinao. Note,

    entretanto, que existem situaes em que apenas um sinal de ressonncia de spin

    observado. Um exemplo o transporte de portadores por hopping em uma banda de

    defeitos, como, por exemplo, dangling bons em Si cristalino ou amorfo [22]. Neste caso,

    as assinaturas de ambos os estados iniciais de tunelamento so idnticas. Um segundo

    exemplo ocorre quando um dos dois nveis paramagnticos envolvidos tem tempo de

    vida de spin (T1) ou propriedades estruturais muito diferentes do outro. Neste caso, uma

    das duas linhas de ressonncia pode ser muito mais larga do que a outra, de modo que

    para uma dada relao sinal-rudo apenas a componente mais estreita pode ser

    detectada5. Esta situao tipicamente o caso de amardilhamento de eltrons da banda

    de conduo por doadores em semicondutores cristalinos, onde a ressonncia devido aos

    eltrons de conduo no observada [22].

    Outra caracterstica importante que processos dependentes de spin so vrias

    ordens de grandeza mais sensveis deteco de defeitos paramagnticos do que 5 A largura de linha do espectro depende do inverso do tempo de relaxao T2.

  • Captulo 3: RPE e RMDE 21

    medidas de RPE convencional. A razo para esta maior sensibilidade uma

    transformao da deteco da inverso de spin por absoro diretamente, devido a

    transies entre os nveis Zeeman (energia de algumas dezenas de eV), para transies entre diferentes nveis eletrnicos governados por regras de seleo de spins (energias de

    at 1eV). Este aumento de sensibilidade se torna cada vez mais importante na medida

    em que a dimenso dos dispositivos eletrnicos vai sendo reduzida. Por exemplo, em um

    processador Pentium 4, a dimenso do canal ativo de um transistor tpico da ordem de

    10-9 cm2. Por outro lado, a densidade de estados paramagnticos na interface SiO2/Si,

    usado em tecnologia CMOS, de aproximadamente 1010 a 1012 cm-2. Portanto, neste

    transistor h em torno de 10 a 1000 estados paramagnticos. O limite de deteco dos

    espectrmetros de RPE modernos de aproximadamente 109 spins por Gauss de largura

    de linha. No caso do Si e do SiO2, as larguras de linha de RPE so da ordem de 10 G, o

    que significa que, na melhor situao, 1010 spins podem ser medidos usando RPE

    convencional. Comparado com o nmero esperado de spins ativos no transistor, de 10 a

    1000, a falta de sensibilidade clara [22,54]. O aumento de sensibilidade no caso de

    fotocondutividade dependente de spin em a-Si:H foi demonstrado por Kawachi et al.

    [28] usando estruturas de transistores de filme fino (TFT) com diferentes dimenses.

    razovel esperar que para estruturas de dispositivos menores a sensibilidade das

    transies dependentes de spin possa ser ainda melhorada, at a capacidade de se

    detectar um nico spin [55].

    Um ponto que preocupa um pouco aqueles que no esto familiarizados com os

    processos dependentes de spin o relativo pequeno efeito da ressonncia de spin em

    uma observvel macroscpica dependente de spin, tal como a fotoluminescncia,

    fotocondutividade ou condutividade por hopping. Normalmente, as mudanas relativas

    A/A de uma amplitude de sinal A so da ordem de 10-8, ..., 10-2, dependendo da potncia de microondas, temperatura e detalhes do processo observado. Nos materiais

    orgnicos estudados neste trabalho a amplitude dos sinais foi da ordem de 10-4 a 10-6.

    Este pequeno efeito dependente de spin, no entanto, no implica que apenas uma

    pequena frao dos estados paramagnticos est diretamente envolvida no processo

  • Captulo 3: RPE e RMDE 22

    dependente de spin. Ao contrrio, teorias quantitativas de transies dependentes de spin

    prevem tais pequenos efeitos, e bastante progresso tem sido obtido no entendimento de

    quais parmetros afetam a relativa mudana do sinal, A/A, em situaes especficas. O primeiro modelo quantitativo descrevendo variaes ressonantes na fotocondutividade,

    /, o modelo de polarizao de spins considerado por Lepine [56] para o caso de recombinao de foto-portadores com estados de superfcie em Si cristalino. A seguir,

    vamos us-lo como exemplo ilustrativo, apesar de hoje j sabermos que a realidade

    bem mais complicada.

    3.4 Modelo de Lepine

    Como j foi dito anteriormente, em equilbrio trmico, sem a presena do campo

    de microondas H1, os dois nveis Zeeman, separados energeticamente devido ao campo

    magntico H0, tero diferentes nmeros de ocupao, N+ < N- (onde N+ e N_ representam, respectivamente, o nmero de ocupao dos estados mS = + e mS = - ).

    Para h0

  • Captulo 3: RPE e RMDE 23

    Enquanto a probabilidade de se formar pares paralelos dada por:

    ( )( )

    +=

    +

    = ++ 2

    22

    22 11 NNP

    NNN

    NNNpT

    Portanto, devido polarizao de spins existem mais tripletos do que singletos, e

    a diferena dada por: 22

    2

    22

    2

    =

    = NNP

    NNPpp ST

    aqui foi usada a aproximao N- N/2.

    Como foi discutido anteriormente, o campo H1 atua no sentido de destruir a

    polarizao de spin e assim reduzir o excesso de populao de tripletos a zero. Os pares

    tripletos, porm, no podem se recombinar enquanto os singletos podem, de modo que a

    variao relativa da fotocondutividade controlada por recombinao / ser dada por: 2

    02

    2

    =

    kT

    hNN

    Isto significa que, segundo o modelo de Lepine, o mximo valor da variao

    relativa da condutividade devido a RPE dada pela diferena relativa de populao entre

    os nveis Zeeman. Uma vez que, se temos inicialmente um excesso de tripletos e estes

    no podem se recombinar, a fotocondutividade s ir variar quando ocorrer inverso de

    um dos spins do par para a formao de um par singleto.

    Note que a ressonncia de spin diminui a fotocondutividade devido ao aumento

    da taxa de recombinao. Para ressonncia de spin em banda X, o valor mximo

    esperado de 6x10-7 em T = 300 K, que deveria aumentar com a diminuio da

    temperatura e com o aumento da freqncia de microondas.

    Os sinais observados experimentalmente, entretanto, especialmente em

    semicondutores inorgnicos desordenados, em geral, so muito mais intensos [30] e

    apresentam dependncias com a temperatura e com a freqncia muito menores do que

    as previstas. De fato, a dependncia segundo a equao acima s observada em alguns

    poucos casos, apesar de que a dependncia fundamental do spin com a polarizao deve

    sempre estar presente.

  • Captulo 3: RPE e RMDE 24

    3.5 Modelo KSM

    As discrepncias entre o modelo de Lepine e os resultados experimentais podem

    ser explicadas em parte por um modelo terico alternativo (conhecido como modelo

    KSM) proposto por Kaplan, Solomon e Mott [57], que assume que antes da transio

    dependente de spin, ambos os spins esto envolvidos em um par ligado. Se os dois spins

    esto em uma configurao singleto eles podem fazer a transio, com uma constante de

    tempo caracterstica transio. Para pares na configurao tripleto, a mesma transio proibida por regra de seleo de spin. Portanto pares tripletos vo permanecer ligados

    neste estado pr-transio at que uma das trs possibilidades ocorra:

    Um dos dois spins espontaneamente invertido, o que, na mdia, ocorre em um tempo caracterstico T1 (tempo de relaxao spin-rede);

    Um dos dois spins invertido devido ao campo da microondas em ressonncia, o que ocorre com uma constante de tempo SF = 1/H1;

    O par ligado se dissocia com uma constante de tempo diss, por exemplo por excitao trmica, antes que uma inverso, espontnea ou induzida,

    ocorra.

    Nos dois primeiros casos, o tripleto transformado em um singleto e,

    portanto, pode fazer a transio. No terceiro caso, o par quebrado antes que ocorra

    a transio e todo o processo comea novamente, ou seja, os spins podem formar

    novos pares pr-transio.

    Neste modelo, a variao mxima devido ressonncia ocorrer para a

    condio transio

  • Captulo 4: Materiais e Mtodos 25

    CAPTULO 4

    MATERIAIS E MTODOS

    4.1 Confeco de dispositivos

    A confeco de diodos orgnicos segue basicamente as seguintes etapas:

    preparao dos substratos; deposio do(s) filme(s) orgnico(s); evaporao dos

    eletrodos metlicos; conexes dos eletrodos com o circuito externo; e encapsulamento.

    Em geral, utiliza-se como substrato uma placa de vidro coberta com xido de estanho e

    ndio (ITO), que pode ser obtido comercialmente. O ITO muito utilizado como

    eletrodo (anodo) por ser um condutor transparente a luz visvel e ser um bom injetor de

    buracos na maior parte dos semicondutores orgnicos.

    4.1.1 Preparao dos substratos

    A limpeza e o tratamento da superfcie do substrato sobre o qual o filme orgnico

    depositado de fundamental importncia para a obteno de uma amostra de boa

    qualidade. Primeiramente, preparada a geometria do nodo. Como o substrato j

    comprado com o ITO depositado, necessrio proteger a rea a ser utilizada como

  • Captulo 4: Materiais e Mtodos 26

    eletrodo e remover o restante do ITO. A rea a ser protegida coberta com uma fita

    adesiva e uma soluo de p de zinco diludo em gua aplicada sobre o ITO

    descoberto. Em seguida, mergulhamos o substrato em cido clordrico (HCl) 1M. Aps

    alguns minutos, a reao do cido com o p de zinco deixa a regio prateada. Com um

    cotonete raspamos suavemente est regio at a completa remoo do ITO. Aps esta

    etapa, lavamos os substratos com gua milli-Q em abundncia para eliminar qualquer

    vestgio de HCl. Retiramos, ento a fita adesiva e mergulhamos os substratos em

    acetona. A acetona aquecida at comear a ferver e ento deixamos resfriar. Em

    seguida, repetimos este procedimento trocando a acetona por lcool isoproplico.

    Posteriormente, todos os substratos so lavados cuidadosamente com gua milli-Q em

    abundncia. Antes da deposio do polmero, os substratos so tratados com plasma de

    oxignio.

    4.1.2 Deposio dos filmes orgnicos

    i) MEH-PPV

    A etapa seguinte consiste da deposio do polmero MEH-PPV diludo em

    clorofrmio pela tcnica spin-coating. Basicamente, uma soluo do polmero

    despejada sobre toda a rea do substrato e este posto para girar, de modo a espalhar

    homogeneamente a soluo sobre ele e evaporar o solvente. A espessura dos filmes

    obtidos pode variar desde, aproximadamente, 50 a 2000 nm, dependendo, basicamente,

    da concentrao, da viscosidade da soluo e da velocidade de rotao dos substratos.

    Substrato com ITO Fita Adesiva

    Soluo de p de Zn

    ITO removido

    HCl

    Figura 4.1: Esquema de remoo do ITO.

  • Captulo 4: Materiais e Mtodos 27

    Aps a obteno dos filmes, eles so secados em vcuo (1 mbar), a temperaturas entre 60 e 100 oC, por no mnimo 2 horas, para liberao de quaisquer

    resqucios de solventes. Os filmes utilizados nos dispositivos tinham entre 300 e 400 nm

    de espessura.

    ii) Polianilina (Pani)

    Os filmes de Pani foram obtidos pelo mtodo casting. A Pani, obtida

    comercialmente e dissolvida em n-metil-pirrolidona (NMP), em concentrao de 0,1 M,

    despejada cuidadosamente sobre uma placa de vidro previamente tratada, como

    Placa aquecedoracom controle de

    temperatura

    Termmetro

    Placas de vidro

    Figura 4.3: Esquema do aparato experimental para formao de filmes de pani pelo mtodo casting.

    Substrato

    Plataforma giratria

    a) Soluo de MEH-PPV b)

    c)

    Substrato

    Filme de MEH-PPV

    d)

    Figura 4.2: Esquema do aparato experimental para formao de filmes de MEH-PPV pelo mtodo spin casting.

  • Captulo 4: Materiais e Mtodos 28

    descrito anteriormente. O substrato aquecido a aproximadamente 60C at que o

    solvente evapore. Temos assim um filme formado sobre o vidro. Aps o resfriamento

    temperatura ambiente, o substrato com o filme de Pani submerso em gua milli-Q.

    Aps algumas horas, o filme polimrico se desprende do substrato. Com a ajuda de uma

    folha de papel retiramos o filme de Pani da gua e o prensamos entre duas folhas de

    papel liso para secarmos o polmero, com a ajuda de placas planas de vidro. Esta ltima

    etapa pode levar dias. Finalmente, temos um filme de Pani auto-sustentado que pode ser

    cortado na dimenso desejada.

    iii) Alq3 A confeco dos diodos de Alq3 foi realizada em Lausanne, Sua, pelo Dr.

    Frank Nuesch no Laboratoire dOptolectronique des Matriaux Molculaire (LOMM),

    na cole Polytechnique Fdrale de Lausanne (EPFL), em colaborao com o professor

    Dr. Libero Zuppiroli. A deposio das molculas orgnicas para a confeco dos

    dispositivos multicamadas de Alq3 foram feitas por evaporao a vcuo.

    N

    N

    N

    N

    N N

    NN

    Cu

    CuPcAlq3

    Al

    ON O

    N

    N

    O

    N

    -N PD

    N

    N

    N

    N

    N

    N N

    NN

    Cu

    CuPcAlq3

    Al

    ON O

    N

    N

    O

    Alq3

    Al

    ON O

    N

    N

    O

    N

    -N PD

    N N

    -N PD

    N

    Figura 4.4: Estrutura das molculas que compem o OLED a base de Alq3.

    Todos os materiais foram obtidos comercialmente e purificados por sublimao

    gradiente antes de serem utilizados. As molculas orgnicas so evaporadas

  • Captulo 4: Materiais e Mtodos 29

    termicamente dentro de uma cmara em ultra alto vcuo (< 5 x 10-7 mbar) a uma taxa de

    0,1 nm/s. Sobre o ITO, uma camada de 10nm de ftalocianina de cobre (CuPc)

    evaporada para melhorar a injeo de buracos. Em seguida evaporada uma camada de

    40nm de N,N- difenil N,N-bis(1-naftil)-1,1bifenil - 4,4diamina (-NPD), usada como camada transportadora de buracos e bloqueadora de eltrons. Sobre o NPD

    evaporado 60nm de Alq3, usado como camada transportadora de eltrons e emissoras de

    luz. Sobre esta camada foi evaporada uma fina camada (0,8 nm) de fluoreto de ltio

    (LiF) para melhorar o contato com o eletrodo metlico.

    4.1.3 Evaporao dos contatos metlicos Para definir a geometria dos catodos usamos mscaras previamente

    confeccionadas no formato desejado. Os metais utilizados foram alumnio (Al) e ouro

    (Au). Ambos so evaporados termicamente em alto vcuo. Aps a metalizao, os

    contatos so testados para verificar a existncia de curto-circuito. Em seguida so feitas

    as conexes externas. Para isso usamos fios de cobre conectados aos eletrodos por tinta

    prata. Para a conexo com o ITO, raspamos cuidadosamente um pedao do filme

    orgnico, deixando o eletrodo descoberto. Como estes materiais orgnicos se degradam

    facilmente por foto-oxidao, os dispositivos foram encapsulados em tubos de quartzo.

    Todos os dispositivos foram confeccionados em estrutura tipo sanduche, exceto parte

    dos dispositivos de Pani, cujos contatos foram colocados paralelos em uma mesma

    superfcie do filme auto-sustentado.

  • Captulo 4: Materiais e Mtodos 30

    Figura 4.6: (a) Estrutura de dispositivo tipo sanduche, (b) dispositivo com contatos paralelos (viso da superfcie superior).

    Nos dispositivos de MEH-PPV, quando usamos Au como catodo, a injeo de

    eltrons praticamente nula devido alta barreira energtica entre o nvel de Fermi do

    metal e o LUMO do polmero. Por isso, vamos cham-los, daqui a diante, de diodos

    hole-only6. Entretanto, em altos campos eltricos uma pequena injeo de carga negativa

    pode ocorrer, devido, em especial, ao grande nmero de defeitos na interface metal-

    polmero. Nos diodos de MEH-PPV, com Al como catodo, ocorre a injeo tanto de

    portadores de carga positiva quanto negativa. A partir daqui vamos nos referir a eles

    como diodos bipolares ou PLEDs, devido ao fato de apresentarem eletroluminescncia.

    4.1.4 Resumo dos tipos de dispositivos estudados

    Material ativo Configurao Eletroluminescente?

    ITO/MEH-PPV (360nm)/Al Sim MEH-PPV

    ITO/MEH-PPV (360nm)/Au No

    Alq3

    ITO/CuPc(12nm)/-NPD(40nm)/Alq(60nm) /LiF(0.8nm)/Al

    Sim

    Polianilina Contatos com tinta prata em paralelo ou

    contatos tipo sanduche

    No

    Tabela 4.1: Resumo dos dispositivos analisados com a configurao de cada tipo. 6 Hole-only um termo em ingls usado para designar diodos cuja corrente composto por portadores de carga positiva (hole = buraco, only = s, somente).

    a) b)

    +

    _ substrato polmero

    Eletrodos metlicos

  • Captulo 4: Materiais e Mtodos 31

    4.2 Medidas de Ressonncia Paramagntica Eletrnica e Ressonncia Magntica Detectada Eletricamente

    Durante as medidas de ressonncia, um gerador de microondas7 produz a

    radiao continuamente em intensidade e freqncia constantes, enquanto varremos o

    campo magntico externo (H0). Quando este atinge um valor tal que a distncia

    energtica entre os nveis de spin equivalente freqncia () da microonda (h = gBH0), a radiao absorvida e a intensidade de microondas na cavidade diminui (vide figura 4.6). Entretanto, em geral no obtemos uma curva de absoro como na figura

    4.6a, mas sim a primeira derivada desta curva (figura 4.6b). Isto ocorre, pois uma

    modulao superposta varredura linear do campo magntico para permitir a deteco

    do sinal por um amplificador lock-in.

    Nas medidas de RMDE, ao invs de medirmos a absoro de microondas pela

    amostra, um potencial eltrico aplicado ao dispositivo ligado em srie com uma

    resistncia de referncia. Durante a condio de ressonncia a condutividade da amostra

    pode aumentar ou diminuir, causando uma variao na queda de potencial sobre o

    resistor. Esta variao detectada por um amplificador Lock-in sincronizado na

    freqncia de modulao do campo magntico.

    7 No nosso caso o gerador de microondas um Klystron.

    HH mod

    E = h

    H

    g = h/BH

    E = h = gBH

    a) b)

    Absoro de microondas

    Sinal de RPE

    Figura 4.6: (a) Absoro das microondas em um espectro de EPR com uma amplitude de modulao Hmod e (b) espectro de EPR: primeira derivada do espectro de absoro da microonda

  • Captulo 4: Materiais e Mtodos 32

    Para a realizao de estudos da forma de linha das curvas de RPE e de RMDE foi

    utilizado o software ORIGIN. Verificou-se, aps algumas tentativas de ajuste dos

    espectros, que a convergncia das curvas aos dados experimentais acontece muito mais

    rapidamente quando o espectro est na forma integral. Por isso, a maior parte dos

    espectros ser representada desta forma, com exceo daqueles em que a visualizao

    mais clara na forma de derivada. O modelo de ajuste utiliza curvas gaussianas e

    lorentzianas, que so descritas, respectivamente, por:

    ( ) ( ) 022

    C YW

    XX2exp

    2/WAXY +

    =

    ( ) ( ) 022C YWXX4WA2XY ++=

    onde os parmetros a serem ajustados so: o campo central8 ou centro do pico de

    ressonncia (XC); a largura do pico meia altura (W); a linha de base (Y0); e a rea sob a

    curva a partir da linha de base (A).

    Figura 4.7: Foto do aparato experimental para medidas de RPE e RMDE.

    8 Valor do campo magntico em que a absoro de microondas mxima.

  • Captulo 4: Materiais e Mtodos 33

    O espectrmetro utilizado foi um Varian E-4 que opera em banda X,

    aproximadamente 9 GHz, acoplado a um freqencmetro e a um amplificador lock-in

    adaptados para serem controlados remotamente por computador atravs de conexes

    GPIB. Para as medidas de RMDE, uma fonte de tenso, um pr-amplificador, um pico-

    ampermetro e uma caixa de resistores foram acoplados aos sistemas descritos

    anteriormente.

    A intensidade do sinal de RMDE (/) pode ser calculada da seguinte forma:

    ganhoRAIVAmplitude

    =

    )()()(

    ,

    onde I(A) o valor da corrente fora do estado de ressonncia, R() o valor da resistncia ligada em srie com a amostra, a Amplitude a intensidade do sinal em

    volts e ganho o ganho fornecido pelo pr-amplificador, que, nas medidas

    apresentadas nesta dissertao, foi de 50 vezes.

    A temperatura da amostra pde ser variada usando um criostato de fluxo de

    nitrognio. Para caber dentro da cavidade do espectrmetro, o tamanho dos dispositivos,

    incluindo o encapsulamento, no pde exceder 12 x 4 mm.

    Figura 4.8: Foto de um dispositivo encapsulado para medida de RMDE.

  • Captulo 4: Materiais e Mtodos 34

    4.3 Espectroscopia de impedncia eltrica

    A tcnica de espectroscopia de impedncia consiste na deteco das

    componentes da corrente em uma amostra que esto em fase e em quadratura com uma

    dada tenso alternada, ao mesmo tempo em que feita uma varredura na freqncia de

    oscilao. A partir da amplitude da corrente e de sua defasagem com a tenso aplicada,

    pode-se calcular a impedncia complexa da amostra, que pode ser expressa da seguinte

    forma:

    )("iZ)('Z)(Z* +=

    onde Z() e Z() so, respectivamente, a componente real e imaginria da impedncia complexa Z*().

    Figura 4.9: Ilustrao de uma medida de impedncia em uma amostra de um material de constante dieltrica e condutividade .

    O sistema experimental utilizado composto, basicamente, por um analisador de

    impedncia/fase Solartron (modelo SI1260), operando em freqncias desde 101 (quase

    esttico) at 107 Hz. Tenses alternadas (Vac), de 0 a 3 V de amplitude, podem ser

    aplicadas sobre nveis dc (Vdc) entre 41 e 41 V, fornecidas pelo prprio equipamento,

    para a anlise da impedncia da amostra.

    E

    L

    A

    V dGerador V(t)= Vac cos(t)

    ~Analisador

    impedncia/fase

  • Captulo 5: Polianilina 35

    CAPTULO 5

    POLIANILINA Neste captulo, feita uma anlise de possveis processos de transporte em filmes

    e dispositivos de polianilina atravs de medidas de RPE e RMDE, em funo da

    temperatura. A polianilina um forte candidato para aplicaes em dispositivos

    eletrnicos [60] devido, principalmente, sua fcil obteno e ao controle da sua

    condutividade atravs de dopagem qumica. Sua frmula estrutural consiste de uma

    frao de unidades reduzidas (contendo grupos amina: y) e uma frao de unidades

    oxidadas (contendo grupos imina: 1-y), como mostra a figura 5.1. Desse modo, seu

    estado pode variar de completamente oxidado (quando y = 0) a completamente reduzido

    (y = 1).

    Figura 5.1: Estrutura da polianilina [61].

  • Captulo 5: Polianilina 36

    Processo de Dopagem

    Em soluo aquosa de cido clordrico, a PANI pode ter sua condutividade

    aumentada em mais de 10 ordens de grandeza. Essa variao ocorre atravs da

    protonao do nitrognio do grupo imina e, conseqentemente, pela formao de um

    plaron positivo. No seu estado no dopado, os pares de eltrons anti-ligantes,

    associados hibridao sp3 dos seus nitrognios amina e imina, classificam-na como

    base de Brnsted (espcie aceitadora de prtons), sendo denominada de base

    esmeraldina (BE) quando y = 0 5, . Quando a Pani BE est na presena de um cido de Brnsted (espcie doadora de prtons), ela passa a ser encontrada na forma de um sal

    denominado de sal de esmeraldina (SE) possuindo condutividade vrias ordens de

    grandeza maior do que a encontrada na forma de BE. O cido comumente utilizado o

    cido clordrico (HCl), por ser um cido forte, com alto grau de dissociao em meio

    aquoso, porm vrios outros cidos tambm podem ser utilizados [61,62]. Este processo

    de dopagem reversvel e o retorno ao polmero original, processo de desdopagem ou

    desprotonao, por exemplo, em soluo aquosa de hidrxido de amnio (NH4OH),

    acarreta pouca ou nenhuma degradao da sua cadeia polimrica principal.

    Figura 5.2: Esquema genrico de dopagem da polianilina em soluo de HCl [61].

  • Captulo 5: Polianilina 37

    Nos filmes de polianilina, durante o processo de dopagem, algumas regies so

    mais protonadas do que outras e, conseqentemente, mais condutoras. Isto torna a

    anlise dos processos de transporte ainda mais complexa uma vez que temos regies

    mais ou menos condutoras distribudas aleatoriamente pelo filme polimrico, e cujos

    tamanhos variam de acordo com o nvel de dopagem da amostra.

    Modelos de conduo

    Medidas de RPE in-situ, em funo da dopagem, mostraram que a quantidade de

    spins cresce com o aumento da dopagem atingindo um valor mximo e, ento,

    diminuindo. Por outro lado, um aumento da condutividade da polianilina com o aumento

    do nvel de protonao observado mesmo depois que o nmero de spins comea a

    diminuir. Devido a esta discrepncia entre o nmero de plarons criados pela dopagem e

    o aumento da condutividade, diferentes modelos para os mecanismos de conduo na

    polianilina foram propostos. Os mais aceitos atualmente so os modelos de rede

    polarnica e de biplarons [63,64]. Segundo o modelo de biplarons, com o aumento da

    dopagem, plarons so mais oxidados em biplarons, que, apesar de serem desprovidos

    de spin, atuam como portadores de carga. Ou seja, contribuem para a condutividade,

    porm no para o sinal de RPE. Por outro lado, o modelo de rede polarnica, sugere que,

    com o aumento da concentrao de plarons (aumento da dopagem), plarons vizinhos

    se agrupam para formar uma rede de plarons, que corresponde a uma banda

    semipreenchida no gap original da Pani (no dopada) e, portanto, pode conduzir eltrons

    como no caso de metais. Em baixos nveis de dopagem, a concentrao de plarons

    baixa e todos contribuem para o sinal de RPE individualmente. Quando a concentrao

    de plarons aumenta, para formar a rede polarnica, os spins se rearranjam,

    semipreenchendo os nveis da nova banda de energia. Somente os spins ocupando nveis

    de energia prximos ao nvel de Fermi contribuem para o sinal de RPE, explicando,

    assim, a diminuio deste sinal. Alguns autores observaram a formao de biplarons

    com o aumento do nvel de dopagem [65], ao passo que outros autores mostraram que o

    modelo de biplarons no apropriado para Pani em sua forma condutora (dopada) [66].

  • Captulo 5: Polianilina 38

    Apesar dos resultados aparentemente contraditrios, talvez a composio entre a

    formao de biplarons em baixos nveis de dopagem e a formao de uma rede

    polarnica em mais altas dopagens seja o modelo mais correto para descrever o processo

    de conduo na polianilina. Jozefowics et al. [67] mostraram que a forma como a Pani

    preparada leva a diferenas significativas no seu comportamento em relao dopagem.

    Eles estudaram dois mtodos de preparao. Primeiro mtodo (BE1): pode ser preparado

    por sntese qumica de p de SE ou deposio eletroqumica de filmes de SE com

    subseqente converso para BE1 com NH4OH. Segundo mtodo (BE2): p de BE

    dissolvido em NMP e depois filmes de BE2 so formados diretamente com esta soluo.

    As amostras estudadas nesta dissertao so do tipo BE2. Por medidas de difrao de

    raios-X os autores mostraram que a polianilina no-dopada BE1 um material

    praticamente amorfo e a medida em que a dopamos com HCl, uma nova estrutura

    cristalina vai aparecendo. Medidas de susceptibilidade magntica () mostraram um aumento quase linear de com a dopagem. Entretanto, nos filmes de Pani BE2, at uma dopagem de, aproximadamente, 25%, nenhuma mudana observada no espectro de

    raios-X. Acima deste nvel, um novo padro de difrao observado e vai aumentando a

    medida em que o padro da Pani no-dopada diminui. Nas medidas de susceptibilidade,

    praticamente independente do nvel de dopagem at ~25%. A partir da, aumenta rapidamente. Portanto, enquanto esperado para uma rede polarnica observado tanto em BE1 quanto em BE2, protonao nas regies amorfas de BE2 levam a formao de

    defeitos desprovidos de spin (biplarons). O estado introduzido pela protonao na parte

    amorfa de BE2 vai permanecer desprovida de spin at que mxima protonao da regio

    amorfa seja atingida, depois a protonao passa para a parte cristalina causando o

    aumento de . A formao de biplarons em baixos nveis de dopagem, seguida do aparecimento de conduo metlica, em altas dopagens, foi tambm observada por

    Harima et al. [68] em filmes de poli(3-metil tiofeno).

  • Captulo 5: Polianilina 39

    5.1 Resultados

    5.1.1 Ressonncia Paramagntica Eletrnica

    Todas as medidas de RPE em filmes de polianilina foram realizados com

    potncia de microondas de 50mW para evitar a saturao do sinal. A figura 5.3 mostra o

    sinal de RPE de um filme de polianilina no-dopada medido em temperatura ambiente.

    A largura de linha pico-a-pico de 2,6 G e o fator g igual a 2,0031. Estes valores esto

    de acordo com os encontrados na literatura, apesar de que os valores reportados de

    largura de linha de espectros de EPR em polianilina variam bastante, desde 0,29 G [66] a

    ~23 G [69]. Essas diferenas se devem ao efeito de oxignio e/ou umidade sobre as

    medidas. Sabe-se que a presena de oxignio alarga a linha de ressonncia devido a

    interaes magnticas dos plarons com o estado tripleto da molcula de oxignio [70].

    Alm disso, como este alargamento estaria baseado na coliso de plarons e oxignio, o

    que seria proporcional freqncia de hopping destes portadores de carga, a largura de

    linha induzida por oxignio aumenta com o aumento da mobilidade dos plarons.

    3180 3200 3220 3240 3260 3280 3300

    -1,0x10-4

    -5,0x10-5

    0,0

    5,0x10-5

    1,0x10-4

    T = 300 KHpp = 2.6 Gfator g = 2.0031

    Sin

    al d

    e E

    PR

    Campo Magntico (G)

    Figura 5.3: Sinal de RPE em temperatura ambiente de um filme de polianilina.

  • Captulo 5: Polianilina 40

    Analisando a forma de linha dos espectros de EPR foi observado que o sinal no

    pode ser ajustado por apenas uma curva (figura 5.4). O sinal, na realidade composto

    por duas curvas lorentzianas, uma fina (pontilhada), com largura de linha a meia altura

    de ~ 4 G, e uma larga (tracejada), com largura de linha que varia entre 30 e 40 G. Na

    figura 5.4b, mostrado com maior detalhe o pico de absoro e as componentes do

    sinal.

    Em toda a faixa de temperatura estudada, de