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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA TESE DE DOUTORADO ESTRUTURAS DE GOVERNANÇA E UNIVERSALIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE INFRA-ESTRUTURA: a Eficiência Econômica dos Modelos Contratuais de Parceria Público - Privada. RODOLFO TORRES DOS SANTOS MATRÍCULA N º: 100702085 ORIENTADOR: Prof. RONALDO FIANI SETEMBRO DE 2006

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE ECONOMIA

TESE DE DOUTORADO

ESTRUTURAS DE GOVERNANÇA E UNIVERSALIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE INFRA-ESTRUTURA: a Eficiência Econômica dos

Modelos Contratuais de Parceria Público - Privada.

RODOLFO TORRES DOS SANTOS

MATRÍCULA N º: 100702085

ORIENTADOR: Prof. RONALDO FIANI

SETEMBRO DE 2006

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA

TESE DE DOUTORADO

ESTRUTURAS DE GOVERNANÇA E UNIVERSALIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE INFRA-ESTRUTURA: a Eficiência Econômica dos

Modelos Contratuais de Parceria Público - Privada.

RODOLFO TORRES DOS SANTOS MATRÍCULA N º: 100702085

ORIENTADOR: Prof. RONALDO FIANI

SETEMBRO DE 2006

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ESTRUTURAS DE GOVERNANÇA E UNIVERSALIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE INFRAESTRUTURA: A EFICIÊNCIA ECONÔMICA DOS MODELOS

CONTRATUAIS DE PARCERIA PÚBLICO - PRIVADA. RODOLFO TORRES DOS SANTOS.

Tese submetida ao corpo docente do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do Grau de Doutor em Economia.

Aprovada por: ____________________________________________ Prof. Ronaldo Fiani – IE/UFRJ (orientador) ____________________________________________ Prof. Hélder Queiroz Pinto Jr. _______________________________________________ Prof. Maria da Graça Derengowski Fonseca ___________________________________________________ Prof. Ana Célia Castro ____________________________________________________ Prof. Margarida Maria G. P. S. Gutierrez ____________________________________________________ Prof. Maurício Aguiar Serra

Rio de Janeiro

Setembro de 2006

181p. ; 30 cm.

Tese de Doutorado – UFRJ / Instituto de Economia, 2006

Santos, Rodolfo Torres

Estrutura de Governança e Universalização de Serviços: A Eficiência Econômica dos Modelos Contratuais de Parceria Público Privada / Rodolfo Torres dos Santos: orientação de Ronaldo Fiani – Rio de Janeiro: UFRJ, 2006

iv

v

À PATRICIA

E

À MINHA FAMÍLIA

vi

AGRADECIMENTOS

A conclusão desta etapa da vida não seria possível sem a ajuda de muitas pessoas.

Foram vários amigos e colegas que me apoiaram em momentos de dificuldade durante a

jornada do doutorado. Citar os nomes de cada uma destas pessoas seria uma tarefa certamente

incompleta e imprecisa.

Contudo, terei uma dívida eterna com duas pessoas sem as quais este trabalho não

teria sido concluído.

Ao Ronaldo Fiani, meu orientador, mas antes de tudo meu amigo, agradeço a

atenção, o comprometimento e o rigor dedicado.

À Patrícia, minha esposa e companheira de jornada, agradeço sua paciência nos

momentos de tensão e a motivação transmitida para realizar este trabalho.

vii

As opiniões expressas neste trabalho são de exclusiva responsabilidade do autor.

viii

RESUMO

A presente tese apresenta um método de análise da eficiência econômica de modelos contratuais em Parceira Público Privada (PPP) como forma de promover a universalização de serviços de infra-estrutura. A motivação principal desta tese é avaliar a relação entre a forma contratual entre Estado e agentes privados e seu reflexo para a universalização de serviços. Este tema ganha relevância a partir das possibilidades contratuais criadas pelo modelo de Parecerias Público Privadas. O primeiro ponto a ser resolvido para esta avaliação é identificar qual critério de eficiência pode ser empregado para balizar a discussão. Diante de determinadas limitações do critério normativo de Pareto e de sua incompatibilidade para o trato de questões pertinentes ao enfoque neo-institucionalista, demanda-se um critério de eficiência econômica alternativo. O conceito de adaptação de uma estrutura de governança às características da transação que esta governa é um aspecto fundamental para a performance econômica. Isto posto, a eficiência econômica das estruturas de governança entre Estado e agentes privados nos setores de infra-estrutura dependerá da complexidade do ambiente de transações. Neste aspecto, quanto maior a assimetria regional, maior a dificuldade de um único modelo contratual ser uma solução que atenda todos os atributos requeridos para a adaptação ao ambiente. Ao ampliar o conjunto de possibilidades contratuais, os modelos de PPP criam a expectativa de superar ineficiências até então irremediáveis. Todavia, os ganhos de eficiência, a partir deste novo modelo contratual, só poderão ser alcançadas caso sejam aplicados para contextos apropriados aos seus atributos. Neste intuito, uma contribuição desta tese é apresentar uma tipologia de identificação das situações de maior eficiência relativa para esta estrutura de governança. Um exemplo de aplicação deste método de análise se realiza na avaliação, em caráter preliminar, de quatro setores de infra-estrutura no Brasil considerando como critério de agregação espacial os estados da federação: telefonia fixa, rodovias, saneamento e energia elétrica.

ix

ABSTRACT

The present thesis presents a method of analysis to the evaluation of the economic efficiency of contractual models in Public Private Partnerships (PPP) in promoting universalizing of infrastructure services. The main motivation of this thesis is to evaluate how the contractual form between State and private agents impacts the level of infrastructure universal services. This subject became more relevant after the contractual possibilities created by the Public Private Partnerships model. To begin this evaluation it is important to know which efficiency criterion should be used to guide the analysis. Some limitations of the Pareto normative criterion and its incompatibility in dealing with pertinent issues for the neo-institutional approach require an alternative economic efficiency criterion. The concept of governance structure adaptation to the transaction characteristics that it governs is a basic aspect for the economic performance. In fact, the economic efficiency of the governance structure between State and private agents in the infrastructure sectors relationships will depend on the complexity of the transactions environment. In this aspect, the difficulty of a single contractual model to present solution for adaptation will be as bigger as regional asymmetry. In extending the set of contractual possibilities, the PPP models create the expectation of circumventing irremediable inefficiencies. However, efficiency improvement in this new contractual model will only be reached if there is accurate application considering its attributes. In this intention, a contribution of this thesis is to present a typology to identify situations in which this governance structure shows bigger relative efficiency. An example of application of this method of analysis is carried for the preliminary evaluation of four infrastructure sectors in Brazil, considering Brazilian states as unit of analysis: telecommunication, roads, sewerage and electric utilities.

x

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..........................................................................................................................1

I – ESTRUTURAS DE GOVERNANÇA E EFICIÊNCIA ECONÔMICA NA ABORDAGEM NEO-INSTITUCIONALISTA........................................................................4 1.1 – Introdução......................................................................................................................................4 1.2 –Análise Econômica Neo-Institucionalista e o Critério Normativo de Pareto............................5

1.2.1 – Uma Breve Apresentação do Critério Normativo de Pareto ............................................................ 5 1.2.2– Análise Econômica Neo-Institucionalista: A Incompatibilidade com o Critério de Pareto. ......... 14

1.3 – O Conceito de Eficiência Econômica na Teoria dos Custos de Transação: A Relevância da Adequação das Estruturas de Governança........................................................................................21

1.3.1 – Abordagem Normativa na Nova Economia Institucional. ............................................................ 22 1.3.2 – Eficiência Econômica na Abordagem Neo-Institucionalista: o papel das Estruturas de Governança. ................................................................................................................................................ 28 1.3.3– O Papel dos Contratos na Coordenação das Transações. .............................................................. 35

1.4 –Conclusão: Implicações para Análise de Setores de Infra-estrutura. .....................................43

II – MODELOS REGULATÓRIOS E UNIVERSALIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE INFRAESTRUTURA. .............................................................................................................47 2.1 - Introdução ....................................................................................................................................47 2.2 – Características Econômicas dos Serviços de Infra-estrutura..................................................48

2.2.1 – O Conceito de Monopólio Natural em Setores de Infra-estrutura ................................................ 48 2.2.2 - Coordenação de Investimentos e Políticas de Separação Vertical ................................................. 51

2.3 –Contratos de Concessão e a Regulação de Setores de Infra-estrutura ....................................56 2.3.1 – Regimes Clássicos de Regulação Econômica................................................................................. 57 2.3.2 – Características Econômicas do Contrato de Concessão Clássico. ................................................ 64

2.4– O Dilema da Universalização de Serviços de Infra-estrutura. .................................................70 2.4.1 – Universalização de Serviços: Aspectos Estruturais........................................................................ 72 2.4.2 - Universalização de Serviços: Aspectos Institucionais .................................................................... 77 2.4.3 - Universalização de Serviços: A Ineficiência Irremediável ............................................................. 82

2.5 – Conclusão. ....................................................................................................................................88

III – PARCERIAS PÚBLICO PRIVADAS E A UNIVERSALIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE INFRA-ESTRUTURA.............................................................................................................90 3.1 – Introdução....................................................................................................................................90 3.2 –A Eficiência de Parceira Público - Privada como Estrutura de Governança. ........................91

3.2.1 – Parcerias Público Privadas: Características Básicas e a Expansão dos Serviços de Infra-estrutura. ..................................................................................................................................................... 91 3.2.2 – A Relação Público-Privada para Provisão de Serviços de Infra-estrutura: O Novo Conjunto de Estruturas de Governança. ......................................................................................................................... 97

3.3 – Contrato de Parceria Público Privada: Critérios Preliminares de Avaliação. ....................106 3.3.1 – Contrato de Parceria Público Privado e a Expansão dos Serviços de Infra-estrutura: o Papel da Contraprestação Pública........................................................................................................................... 106 3.3.2 – Critérios para Seleção do Modelo Contratual de Parceira Público Privada............................... 115

3.4 – Conclusão ...................................................................................................................................119

xi

IV – A UNIVERSALIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE INFRA-ESTRUTURA NO BRASIL E O MARCO INSTITUCIONAL DE PARCEIRAS PÚBLICO PRIVADA...............................121 4.1 – Introdução..................................................................................................................................121 4.2 - Assimetrias Regionais e o Desafio da Universalização dos Serviços de Infra-estrutura no Brasil....................................................................................................................................................122

4.2.1 - Diferenças Estruturais entre as Unidades da Federação no Brasil. ............................................ 122 4.2.2 – O Desafio da Universalização de Serviços de Infra-estrutura no Brasil..................................... 127

4.3 - O Marco Institucional de Parceria Público Privada no Brasil: o Novo Conjunto de Estruturas de Governança.................................................................................................................136

4.3.1 – Apresentação do Marco Institucional das Parcerias Público Privadas no Brasil ...................... 136 4.3.2 – Serviços de Infra-estrutura no Brasil: O Conjunto de Estruturas de Governança. ................... 141

4.4 – Eficiência Econômica e Seleção do Modelo Contratual para Serviços de Infra-estrutura no Brasil....................................................................................................................................................144

4.4.1 - Contratos de Concessão e Universalização de Serviços: Considerações a Partir da Lei de PPP145 4.4.2 – Parceria Público Privada e o Dilema da Universalização de Serviços no Brasil: Algumas Perspectivas. .............................................................................................................................................. 147

4.5 - Conclusão....................................................................................................................................156

CONCLUSÃO........................................................................................................................159

BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................................163

xii

TABELAS, FIGURAS E GRÁFICOS

Tabela 4.1: Assimetria do PIB per capita entre as Unidades da Federação (em R$) – 1998 a 2003 ................................................................................................................................123

Tabela 4.2: Assimetria da densidade populacional entre as Unidades da Federação (em habitantes/km2) – 1998 a 2003 .......................................................................................124

Tabela 4.3: Assimetria estrutural entre as Unidades da Federação – 1998 a 2003 ................126 Tabela 4.4: Assimetria no Acesso Telefônico Fixo por 100 habitantes entre as Unidades da

Federação - 1998 a 2003.................................................................................................131 Tabela 4.5: Assimetria entre as Unidades da Federação no Consumo residencial per capita de

energia elétrica (em KWh/ano) - 1998 a 2002 ...............................................................133 Tabela 4.6: Composição do Fundo Garantidor de PPP por ações integralizadas – 2006......140

Figura 1.1: Freqüência de Distúrbios x Especificidade de Ativos ...........................................34 Figura 1.2: O Papel das Salvaguardas Contratuais...................................................................36 Figura 3.1: Conjunto de Estruturas de Governança................................................................104 Figura 3.2: Quatro Quadrantes de Ambiente de Transações ..................................................116 Figura 3.3: Tipologia de Estruturas de Governança ...............................................................118 Figura 4.1: Marcos legais e tipos contratuais em serviços de infra-estrutura.........................141

Gráfico 1.1: Custo de Governança x Especificidade de Ativos ...............................................30 Gráfico 4.1: PIB per capita x Densidade demográfica entre as UF em 2003 .......................124 Gráfico 4.2: PIB per capita x Densidade demográfica entre as UF em 2003, exceto RJ, SP e

DF ...................................................................................................................................125 Gráfico 4.3: Assimetria Estrutural entre os Estados Brasileiros comparados ao Distrito

Federal ............................................................................................................................126 Gráfico 4.4: Acesso à rede de saneamento por Unidades da Federação - 2004 ....................129 Gráfico 4.5: Acesso ao serviço de telefonia fixo por Unidades da Federação - 2004...........130 Gráfico 4.6: Acesso à iluminação elétrica por Unidades da Federação – 2004 ....................132 Gráfico 4.7: Percentual de rodovias pavimentadas por Unidade da Federação – 2004 ........134 Gráfico 4.8: Extensão da malha rodoviária em relação ao território por Unidade da Federação

2004 ................................................................................................................................135 Gráfico 4.9: Identificação da Demanda por Estruturas Contratuais segundo características

estruturais (I) ..................................................................................................................149 Gráfico 4.10: Identificação da Demanda por Estruturas Contratuais segundo características

estruturais (II) .................................................................................................................153

1

INTRODUÇÃO

O estudo de setores de infra-estrutura sempre foi um campo fértil na literatura

econômica devido à relevância e correlação com o processo de desenvolvimento econômico

das nações. A importância dos setores de infra-estrutura não se resume em sua relevância para

o desenvolvimento econômico, pois o bem-estar social depende de acesso da população a

estes serviços essenciais.

A partir da segunda metade dos anos 80 nos países desenvolvidos, o debate se

ampliou com o surgimento de propostas de mudança institucional nos setores de infra-

estrutura. A reforma teve como orientação central a transferência para o setor privado dos

serviços anteriormente operados pelo Estado. Dentre as medidas implementadas, a reforma

introduziu regimes de regulação por incentivos nos contratos de concessão para a provisão de

serviço por agentes privados.

Alguns anos depois, países em desenvolvimento deram início ao processo de reforma

dos setores de infra-estrutura nos moldes experimentados em países desenvolvidos. Grande

parte da discussão acadêmica centrou-se na forma de implementação destes modelos

institucionais. As diferenças no grau de maturidade dos ativos entre estes países e suas

implicações para o desenvolvimento do setor nem sempre receberam muita atenção. A

importância destas questões deve-se ao fato de o nível de universalização dos serviços de

infra-estrutura nos países em desenvolvimento encontrar-se em um estágio muito inferior ao

vivenciado em países desenvolvidos.

O objetivo da presente tese é estudar, sob o arcabouço teórico-metodológico da

abordagem neo-institucionalista, de que forma os arranjos institucionais que envolvem o

Estado e a iniciativa privada podem favorecer a universalização dos serviços de infra-

estrutura. Esta discussão adquire importância com o advento dos modelos contratuais em

Parceria Público Privada (PPP). Diante disto, uma questão a ser respondida é como o modelo

de PPP representa uma estrutura de governança capaz de promover a universalização de

serviços de infra-estrutura. Neste intuito, a presente tese apresenta critérios para avaliação da

eficiência econômica da forma contratual da PPP em comparação aos modelos de concessão

2

clássica e a realização de investimentos públicos.

Para alcançar este objetivo, a tese foi estruturada em quatro capítulos, além desta

introdução e da conclusão. O primeiro capítulo dedica-se a discutir quais critérios normativos

subjacentes à teoria neo-institucionalista podem ser empregados para balizar debates de

políticas públicas. No desenvolvimento da presente tese, a definição de critérios de eficiência

pertinentes ao modelo teórico neo-institucionalista é peça fundamental. A obra de Oliver

Williamson reúne elementos úteis para sistematizar a discussão sobre eficiência econômica na

teoria neo-institucionalista, ainda que preliminarmente. O conceito de adaptação de uma

estrutura de governança é elemento chave para compreender a capacidade de coordenação das

transações econômicas, sobretudo quando estas envolvem investimentos em ativos

idiossincráticos.

No segundo capítulo, após serem apresentadas as características econômicas dos

setores de infra-estrutura, discute-se a estrutura de governança entre Estado e agentes privados

após a reforma institucional. Com a finalidade de facilitar a apresentação do tema, os

determinantes do nível de universalização dos serviços serão apresentados na dimensão

estrutural e posteriormente em seus aspectos institucionais. Neste âmbito, discutem-se os

limites dos contratos de concessão clássicos na promoção da expansão da rede de ativos,

condição necessária para a universalização.

No terceiro capítulo serão apresentadas as características centrais de modelos

contratuais em Parcerias Público Privadas. Isto posto, propõe-se uma tipologia de estruturas

de governança na relação entre Estado e agentes privados para a provisão de serviços de infra-

estrutura. A vantagem da alternativa contratual em PPP para promover a universalização

dependerá de sua adequação ao perfil do projeto de investimento. A contribuição deste

capítulo será elencar elementos para avaliar a adoção de contratos em PPP.

O quarto capítulo apresenta o dilema da universalização de serviços de infra-

estrutura no Brasil com foco nas assimetrias regionais entre as Unidades da Federação. Após a

instituição do marco legal das Parcerias Público Privadas, esta alternativa contratual significa

novas possibilidades para promover o avanço da universalização dos serviços de infra-

estrutura. A eficiência econômica deste modelo dependerá de sua adequação ao objeto em que

será aplicado. Fornecer parâmetros básicos para uma avaliação preliminar das situações nas

quais a PPP se mostra como uma solução eficiente para promover o crescimento da

3

universalização dos serviços é o intuito deste capítulo.

Por fim, na conclusão resumem-se os principais pontos discutidos, enfatizando as

contribuições trazidas nesta tese para a discussão do objeto em questão. Além disso, diante do

baixo grau de maturidade da avaliação do modelo de Parceria Público Privada na literatura

econômica, especialmente no Brasil, caberá destacar as possibilidades para futuros

desenvolvimentos de pesquisa sobre o tema.

4

I – ESTRUTURAS DE GOVERNANÇA E EFICIÊNCIA ECONÔMICA NA ABORDAGEM NEO-INSTITUCIONALISTA.

1.1 – Introdução

A abordagem econômica neo-institucionalista, especialmente a Economia dos Custos

de Transação, cresceu em relevância na literatura econômica como um dos instrumentos de

explicação para a presença de diferentes formas de organização da atividade econômica

(estruturas de governança), inclusive contribuindo para proposições de políticas econômicas,

principalmente em setores de infra-estrutura.

Esta contribuição da análise neo-institucionalista ocorreu apesar da inexistência de

um amplo debate a respeito do critério de eficiência subjacente a esta escola de pensamento.

Isto porque não há um esforço muito claro em sistematizar as proposições normativas da

abordagem neo-institucionalista. Tal fato pode ser parcialmente associado à marcante

preocupação desta escola com investigação empírica e por essa abordagem ainda reunir

conceitos em fase de desenvolvimento. Apresentar uma discussão acerca de quais seriam os

critérios de eficiência que poderiam ser desenvolvidos a partir da análise neo-institucionalista

é o objetivo central deste capítulo.

Para tanto, se faz fundamental iniciar esta discussão revendo sucintamente o critério

de eficiência alocativa, hegemônico na teoria econômica. Sobretudo, é de suma importância

avaliar as possibilidades deste critério como ferramenta normativa para a abordagem neo-

institucionalista. Uma vez realizada esta discussão crítica, podem ser reunidos alguns

argumentos da literatura que permitam exercitar um debate sobre conceitos de eficiência

adequados a essa concepção teórica.

A obra de Oliver Williamson reúne elementos úteis para sistematizar a discussão,

ainda que preliminarmente, sobre eficiência econômica na teoria neo-institucionalista. O

conceito de adaptação de uma estrutura de governança é o elemento chave para compreender

a possibilidade de coordenação das transações econômicas, sobretudo quando estas envolvem

investimentos em ativos idiossincráticos. Neste capítulo são apresentados alguns modelos

contratuais no intuito de explorar a relação entre a adequação da estrutura de governança e as

características da transação.

5

Apesar do debate normativo carecer de um aprofundamento maior na abordagem

neo-institucionalista, o exercício realizado neste capítulo pode fornecer elementos importantes

para a discussão sobre a eficiência econômica dos contratos entre o Estado e o setor privado,

na provisão de serviços de infra-estrutura1. A conclusão deste capítulo esboça algumas

implicações desta análise, que serão aprofundadas no decorrer desta tese.

1.2 –Análise Econômica Neo-Institucionalista e o Critério Normativo de Pareto.

O objetivo desta seção é discutir a validade do critério normativo de Pareto para a

análise econômica neo-institucionalista. Neste intuito, apresentam-se brevemente as

características metodológicas deste conceito normativo avaliando suas limitações para

avaliação de políticas públicas. O modelo de equilíbrio geral é concebido como o modelo de

funcionamento do sistema econômico e serve de base para a formulação de postulados

normativos na teoria neoclássica.

Após esta breve apresentação, discute-se a compatibilidade entre o conceito de

Pareto e a abordagem neo-institucionalista. A partir da marcante diferença entre os supostos

de comportamento dos agentes econômicos entre o modelo de equilíbrio geral e a abordagem

neo-institucionalista, desenvolve-se o debate sobre os problemas conceituais e metodológicos

de se empregar o critério de Pareto em análises econômicas de cunho neo-institucionalista.

1.2.1 – Uma Breve Apresentação do Critério Normativo de Pareto

Qualquer intervenção pública na economia, quer seja de regulação ou de antitruste,

deve se pautar pela busca de maiores níveis de bem-estar social. Para tanto, tais políticas

públicas requerem um suporte de julgamento e decisão normativa. Os ganhos de eficiência

econômica são interpretados como melhoria de bem-estar social. Mais precisamente, haveria

uma relação biunívoca entre bem-estar social e eficiência presente em toda análise normativa.

Contudo, a definição e seleção do critério de eficiência é uma decisão quase tão complexa

quanto a variedade de teorias econômicas.

1 A definição de setor de infra-estrutura empregada não se limita às utilidades públicas (utilities), envolve também a provisão de serviços de facilidades logísticas, como rodovias, portos e ferrovias. Esta abordagem é utilizada, por exemplo, pelo Banco Mundial (2004).

O critério normativo de Pareto é o conceito tradicionalmente empregado na literatura

econômica para a discussão de políticas. Há uma relação muito forte entre este critério e o

paradigma neoclássico, principalmente no que concerne ao modelo de Equilíbrio Geral. Neste

modelo, consumidores e produtores são agentes racionais maximizadores de suas funções-

objetivo sujeitos às restrições orçamentárias (consumidores) e tecnológicas (produtores). Os

conceitos de economia do bem-estar e da teoria da escolha social possuem como modelo-base

o Equilíbrio Geral.

O critério de eficiência alocativa, muito empregado na análise de bem-estar social na

ciência econômica, deriva do conceito de Pareto. Assim, para uma melhor compreensão do

tema, vale considerar uma apresentação mais formal do critério de Pareto. Este conceito é

exibido em vários manuais de economia por diferentes autores. Uma boa exposição é feita por

Kreps (1990), a qual considera-se a seguir.

“There is a set X of social outcomes and I consumers whose preferences over the social outcomes are represented by functions Vi. (…). Outcome x is said to be Pareto superior to outcome x’ if Vi.(x) ≥ Vi.(x’) for every consumer I, with a strict inequality for at least one i. Outcome x is said to be strictly Pareto superior to x’ if Vi.(x) > Vi.(x’) for all i. (Kreps 1990: 153),

Segundo o critério de eficiência alocativa, um determinado resultado de alocação de

recursos na economia é mais eficiente que outro, se este for superior no sentido de Pareto.

Grosso modo, entende-se que uma solução ótima de Pareto ocorre caso não exista outra forma

de reorganizar a produção, exceto fazendo um indivíduo alcançar uma situação melhor com a

piora da situação de outro indivíduo.

“One outcome is Pareto superior to another if no consumer finds any worse than the second and at least one consumer finds the first strictly better. And the first is strictly Pareto superior to the second if every consumer strictly prefers the first. In such cases, we also say that the second outcome is (strictly) Pareto inferior to the first. (Kreps, 1990: 153).

Antes de avançar com esta discussão, cabe apresentar formalmente o conceito de

eficiência no sentido de Pareto.

6

∈“Given a set X’ of feasible social outcomes, an outcome x

X’ is said to be Pareto efficient or Pareto optimal in X’ if no other feasible outcome x’ ∈ X’ is Pareto superior to x. (Kreps, 1990: 154).

A base da argumentação normativa neoclássica para o emprego do critério de Pareto

encontra-se nos chamados Teoremas Fundamentais do Bem-Estar. Os teoremas de bem-estar

asseguram que o equilíbrio geral competitivo é ótimo no sentido de Pareto. O primeiro

teorema é apresentado de uma forma sucinta por Kreps: “The First Theorem of Welfare

Economics: A Walrasian equilibrium always yields a Pareto efficient allocation of the social

endowment.” (Kreps, 1990: 199).

Mais especificamente, o primeiro teorema fundamental afirma que se p* é o vetor de

preços de equilíbrio competitivo, então os vetores de oferta e demanda agregada para este p*

são os que maximizam as funções-objetivo de produtores e consumidores. Isto é, as escolhas

resultantes de p* serão Pareto ótimas. Em outras palavras, o efeito do primeiro teorema do

bem-estar é assegurar que um equilíbrio geral competitivo determina uma alocação eficiente

no sentido de Pareto dos recursos na sociedade.

Já o segundo teorema do bem-estar busca determinar a operação no sentido inverso,

ou seja, caso se apresente uma alocação ótima no sentido de Pareto esta resultará em um

equilíbrio geral competitivo. Novamente, vale recorrer à exposição de Kreps (1990).

7

i

i i

“The Second Theorem of Welfare Economics: Assume that preferences are convex, continuous, nondecreasing, and locally

insatiable. Let be a Pareto efficient allocation of the social

endowment that is strictly positive: for all i and k. Then is the allocation part of a Walrasian equilibrium, if we first appropriately redistribute endowments among the consumers.” (Kreps, 1990:200).

x0>kx x

O segundo Teorema Fundamental do Bem-Estar assegura que qualquer alocação

ótima de Pareto pode ser atingida após a redistribuição das dotações iniciais. No processo de

troca, os indivíduos se moverão de um ponto ótimo para outro, ou seja, se moverão na curva

de contrato.

O passo teórico que une o bem-estar social e a eficiência econômica no sentido de

Pareto exige algumas hipóteses fortes sobre o conjunto de preferências. Para ter validade o

segundo teorema requer que este conjunto seja completo, contínuo e transitivo. Esta é a

formato é uma condição necessária para permitir o ordenamento para qualquer.

As funções de utilidade que garantem os requisitos expressos no segundo teorema do

bem-estar são as funções do tipo quase-lineares. Funções utilidade quase-lineares, expressar

8

por U(x) = v(x)+ y, onde U é a utilidade do bem x e y é a renda do consumidor, implicam que

o p = Umg(x), sendo Umg a utilidade marginal de uma dada quantidade do bem x, e o efeito

renda seja nulo, ou seja, a função demanda independe do nível de renda. Logo, para qualquer

nível de renda se está disposto a pagar o mesmo preço pela unidade marginal do bem.

Assim, o que o segundo teorema afirma é que se todos agentes possuem preferências

quase-lineares, existe um vetor de preços tal que uma alocação eficiente de Pareto implica um

equilíbrio competitivo.

O pressuposto subjacente a esta teoria é que o processo de barganha capturará todos

os ganhos da troca, sem perdas, sem fricção, sem custos na transação. A conclusão é que a

concorrência perfeita está diretamente relacionada com eficiência econômica. Uma situação

ótima de Pareto ocorrerá quando os preços dos bens se igualem aos seus respectivos custos

marginais de produção.

A passagem da validade deste critério baseado no modelo de equilíbrio geral para

uma discussão de equilíbrio parcial não pode ser feita diretamente. Esta equivalência depende

da validade do conjunto de hipóteses acerca das preferências. Esta análise é instrumentalizada

através do conceito marshalliano de excedente de mercado, mas sob a hipótese de função

utilidade quase-linear, ou seja, efeito-renda igual a zero. Desta forma um critério objetivo de

avaliação normativa é a maximização do excedente, como uma forma de maximizar a

eficiência dos mercados. A derivação para a eficiência alocativa em equilíbrio parcial passa

pela suposição de que quanto mais um mercado em particular se aproximar da concorrência

perfeita, maior sua contribuição para a geração de bem-estar social.2

Para uma alocação eficiente de Pareto não existe outra alocação superior, porém

pode ocorrer uma multiplicidade de resultados equivalentes de Pareto. Kreps descreve este

funcionamento do segundo teorema do bem-estar da seguinte forma:

“In other words, if one imagines that it would be difficult for a social dictator to find an equitable and efficient allocation of the social endowment, and if the economy has well-functioning markets, the dictator might choose to reallocate initial endowments in an equitable fashion and then let the market take over.”(Kreps, 1990:200)

2 Esta discussão é realizada por Possas (2004: 77).

9

O segundo teorema do bem-estar descreve situações nas quais uma situação eficiente

de Pareto pode ser alcançada após a redefinição das dotações iniciais. O processo de

redefinição das dotações iniciais seria feito por um agente externo à troca. Alguns autores,

como Kreps (1990), apresentam um artifício metodológico do agente representativo, como um

“ditador esclarecido”, que redefine as dotações iniciais.

As implicações do segundo teorema para políticas públicas passam pela afirmação

que o Estado não pode intervir na formação de preços e se limitar a uma redistribuição das

dotações iniciais dos indivíduos. Segundo esta teoria, enquanto os impostos forem baseados

na dotação não haverá nenhuma perda de eficiência. Mas, quando os impostos interferirem

nas escolhas que um consumidor realiza que resulta em ineficiências. O lema desta

abordagem é que o sistema de preços não pode sofrer interferências e deve ser sempre usada

pra refletir a escassez dos bens.

Contudo, um problema central neste enfoque normativo é que a ordenação de

alocações pelo critério de Pareto não é completa, uma vez que existem condições de

ambigüidade que geram situações incomparáveis por esta regra normativa.

“It should be carefully noted that Pareto superiority is a partial ordering of social outcomes, in general. That is, we might have two social outcomes x and x’ that some consumers strictly prefer x to x’ and others prefer x’ to x. In such cases, we would say that x and x’ are Pareto incomparable.” (Kreps, 1990: 153).

Esta restrição sobre a possibilidade de comparar alocações pelo critério de Pareto

acarreta um debate sobre sua aplicabilidade para problemas de políticas públicas.

O critério de Pareto considera situações econômicas como sendo situações passíveis

de comparação se, e somente se, a utilidade (função-objetivo) de um agente econômico

melhora sem a contrapartida da piora na utilidade de outro indivíduo. Desta forma, este

critério exclui aspectos subjetivos e juízos de valor acerca do bem-estar dos indivíduos, e

beneficia-se da simplicidade de julgamento. O problema, no entanto, é que esta robustez do

critério de Pareto implica limitações para sua aplicação, sem que se cometam equívocos

conceituais e até mesmo metodológicos, na avaliação de políticas públicas.

A limitação metodológica imposta pela forte restrição à comparação de alocações

sob o critério de Pareto é discutida por Kreps (1990) na seguinte passagem.

10

“Suppose we have a point x which is Pareto dominated by some other feasible point x’, but which is not strictly Pareto inferior to any feasible point. Should we say that x’ is Pareto efficient? In the definition we have given, we do not.” (Kreps, 1990: 154).

Desse modo, as alocações ordenáveis (comparáveis no sentido de Pareto)

envolverão, inevitavelmente, temas de pouca complexidade para a decisão de política. Por

exemplo, não é possível julgar a condição de organização industrial competitiva frente à

criação de um monopólio em um determinado mercado. Isto acarretaria na transferência de

renda de consumidores para produtores e, portanto, violaria a metodologia de ordenamento de

situações comparáveis de Pareto. Tal aspecto limita a capacidade de julgamento normativo,

quando a política pública enfrenta algum dilema (trade-off) entre os agentes afetados pela

decisão.

Algumas alternativas foram traçadas para contornar este problema e preservar a

utilização do critério de Pareto. Um desses artifícios é conhecido como o critério da

compensação. No critério de Pareto a alocação x’ é Pareto-eficiente em relação à x, se todos

os agentes preferem x’ a x. Já quando se considera o critério da compensação, que é uma

aproximação do critério de maximização de riqueza agregada, se diz que x’ é Potencialmente

Pareto Eficiente (PPI)3 em relação à x, se existe alguma re-alocação de x’ de forma que todos

prefiram esta re-alocação à original x.

Assim, o critério da compensação (PPI) compara a eficiência de uma alocação à

outra caso ocorra uma compensação (pagamento) para aqueles agentes que mudaram para

pior na alocação alternativa4. O resultado esperado é que o ganhador se beneficie

suficientemente para compensar o perdedor e ainda situar-se melhor do que na alocação

anterior. De fato, este processo ocorreria através do pagamento em moeda (lump-sum) para os

perdedores do processo de re-alocação via mercado, ou por intermédio de uma autoridade

central (Estado).

O princípio da compensação é discutido por Varian (1992). O autor destaca que este

artifício é empregado a despeito da restrição imposta pelas situações não comparáveis sob o

critério de Pareto.

3 PPI é a sigla para o termo Potential Pareto Improvement. 4 Como comenta Possas (2004:76) “É desnecessário dizer que, em qualquer situação concreta, tal ressarcimento nunca é feito.”

11

“The compensation principle gives no guidance in making comparisons between Pareto efficient allocations, and it can result in inconsistent comparisons. Nevertheless, the compensation test is commonly used in applied welfare economics.” (Varian, 1992: 407).

O problema é que este critério não elimina equívocos de comparações inconsistentes

entre alocações incomparáveis. Assim, a redistribuição sob o princípio da compensação pode

ser aplicada entre alocações que não são ordenáveis pelo critério de Pareto. Como aponta

Varian (1992), apesar dos problemas metodológicos do tratamento de redistribuição de renda

sob o critério de Pareto, o critério de Pareto segue como base para a discussão de políticas

públicas.

Como argumenta Gowdy (2004), a operação do critério de Pareto depende de validar

hipóteses fortes sobre o comportamento das funções utilidade dos indivíduos. Volta-se ao

problema da hipótese das preferências quase-lineares que não supõem efeito-renda sobre a

quantidade demandada. Quando se suprime a hipótese de preferências quase-lineares o padrão

de demanda se altera quando se redistribui a renda, logo se gera uma incomparabilidade de

alocações sob o critério de Pareto.

“A basic problem for welfare economics is that the axioms of consumer choice refer to a single individual or a representative agent, and they break down in the case of two or more persons.” (Gowdy, 2004: 244-5).

No critério de Kaldor-Hicks a preocupação é a maximização da riqueza agregada.

Isto se resume a avaliar se o ganhador se beneficia em um volume superior à perda do

perdedor, independentemente e sem exigência de compensação.

“The Kaldor-Hicks criterion seems straightforward. If one person values his gains from an economic change more than a second person values her losses, potential total welfare increases so this represents a potential Pareto improvement. Such a change is justified even if no actual compensation is paid.” (Gowdy, 2004: 242).

Desta forma a “evolução” do argumento foi no sentido de negligenciar a restrição de

incomparabilidade pelo critério de Pareto para uma análise que elimina a preocupação com a

compensação. Assim, o ganho no sentido de eficiência se resume a maximizar a riqueza, sem

preocupar-se com qualquer questão distributiva.

Este critério centra-se em buscar situações em que não ocorra desperdício na

alocação de recursos. Contudo, a análise não contempla os efeitos que uma má distribuição

12

acarreta para possibilidade de geração de novos recursos na economia. Uma completa

concentração da alocação de bens pode se constituir em um ponto de ótimo no sentido de

Pareto. Gowdy (2004) explora esta preocupação da seguinte forma.

“The upshot of these results for welfare economics is that the Kaldor-Hicks PPI rationale from comparing two states of the economy has some fundamental problems that preclude its practical application. There is no theoretically justifiable way to make welfare judgments without interpersonal comparisons of utility and this is not permissible under the stringent requirements of neoclassical welfare economics.” (Gowdy, 2004: 245).

Assim, como expõe Gowdy (2004), a questão da violação da incomparabilidade de

alocação pelo critério de Pareto, que depende das suposições acerca da forma da função

utilidade dos indivíduos, foi simplesmente abolida do debate normativo.

Cabe destacar que a maximização de riqueza, ao permitir maior concentração, pode

limitar o número de transações na sociedade, uma vez que alguns indivíduos seriam excluídos

do processo de troca. O questionamento feito por Gowdy (2004) é relevante, pois nesta

análise normativa a questão distributiva foi excluída do referencial, por ser considerado um

tema subjetivo e não científico. Ao supor que as utilidades de diferentes agentes não são

comparáveis, assim como a transferência de renda entre indivíduos, então a eficiência de

Pareto não garante eqüidade.

“Output mix as well as income distribution, both ignored by PPI criterion, should be essential elements in measures of social welfare changes.” (Gowdy, 2004: 246).

Além disso, vale comentar que estes julgamentos de eficiência baseiam-se na

comparação de utilidades de um conjunto pré-definido de agentes econômicos. Desta maneira,

ou todos os potenciais interessados participam da avaliação do processo de troca no momento

do julgamento, ou estão excluídos da avaliação de política. Como expõem Furubotn e Richter

(1997:98), na presença de custos de transação positivos, a barganha da negociação pode não

gerar uma solução ótima de Pareto.

“As a practical matter, it seems to be preferable to do without the neoclassical efficiency criterion when judging institutions in a world of ‘frictions’.” (Furubotn e Richter, 1997:97).

Eggertsson (1990) exercita uma crítica ao questionar a validade de ter uma meta de

eficiência baseada no critério de Pareto para situações de política no mundo real. Para este

13

autor, o problema associado aos custos de transação pode ser tão significativo que

determinadas transações não chegam a emergir. Neste caso, as operações representadas no

modelo de equilíbrio geral não serão completas, pois não capturam a supressão de

determinadas possibilidades de troca.

As hipóteses do equilíbrio geral competitivo garantem a possibilidade de se obter

uma alocação ótima no sentido de Pareto. Se estas premissas são abandonadas, principalmente

pela introdução dos custos de transação, o novo ambiente de interação entre os agentes

econômicos deixa de ser compatível com as condições de obtenção de um nível ótimo de

Pareto.

Como visto, o critério normativo de Pareto, tradicionalmente empregado na teoria

neoclássica, é muito robusto e consistente, porém o problema é que possui fortes limitações

conceituais e metodológicas para ser empregado para discussões reais de políticas públicas. A

principal restrição é que por este critério só é possível avaliar as situações que não envolvam

ambigüidades de políticas.

Obedecer à restrição da comparabilidade pelo critério de Pareto significa a omissão

em proposições que envolvam a transferência de renda entre as partes afetadas pelas políticas.

O problema é que não parece existirem muitas questões de políticas que não envolvam em

algum grau este efeito. Uma forte restrição deriva das limitações do próprio modelo de

equilíbrio geral, pois a cada hipótese de funcionamento do modelo de equilíbrio geral que se

quebra cria-se um problema de incomparabilidade no sentido de Pareto. O fato é que o

funcionamento do mundo real e as questões de políticas públicas não se conformam à

moldura do modelo de equilíbrio geral.

A abordagem neo-institucionalista apresenta fortes críticas às suposições do modelo

de equilíbrio geral. A discussão que se segue avalia como a crítica torna incongruente o

emprego do conceito de eficiência paretiana no arcabouço teórico neo-institucionalista.

14

1.2.2– Análise Econômica Neo-Institucionalista: A Incompatibilidade com o Critério de Pareto.

A maneira de iniciar a discussão sobre questões normativas para a abordagem neo-

institucionalista passa por observar a crítica realizada por Coase (1960) quanto ao trato da

presença de externalidade e sua influência na interação entre os agentes econômicos.

O problema de externalidades sempre foi assumido na literatura econômica como

uma limitação do papel coordenativo do mercado. Mas, como mostrou Coase em 1960 com

The Problem of Social Cost (Coase 1960), externalidades não implicam ineficiência alocativa

se os direitos de propriedade forem bem definidos, ou seja, se não existirem custos de

transação. Nas primeiras definições de custos de transação, como a que encontramos em

Coase (1937), custos de transação significavam o custo de utilizar o mercado como meio de

coordenação.

Estando os direitos de propriedade bem definidos, então os agentes, livres de custos

de troca e barganha, irão transacioná-los, redistribuindo as dotações iniciais até que se atinja

uma alocação ótima. Em outras palavras, a barganha entre os agentes econômicos

internalizaria o efeito das externalidades, desde que este processo por intermédio do sistema

de trocas estivesse livre de custos.

Vale notar que esta proposição ainda requer algumas premissas básicas,

principalmente a premissa de que o efeito renda seja nulo. Se existe efeito renda, então a

alocação (dotação) inicial dos direitos de propriedade importa. Desta forma, como apontam

Furubotn & Richter (1997 p.93), do ponto de vista da distribuição, a alocação de direitos de

propriedade possui muita relevância.

Durante muito tempo o enfoque dado à proposição de Coase não seguiu à sua

principal argumentação. A intenção do autor foi destacar o papel significativo dos custos de

transação para o funcionamento do sistema econômico. A expressão “Teorema de Coase”

ficou marcada na literatura econômica como a alternativa às proposições de Pigou e às taxas

pigouvianas sobre externalidades5.

Contudo, a rigor, a operação do teorema de Coase só funciona com custos de

5 Provavelmente o sucesso desta interpretação da proposição de Coase pode ser atribuído ao fato de ser uma alternativa que, reduziria a intervenção pública.

15

transação nulos e na ausência de efeito-renda (preferências quase-lineares)6. Vale notar que

tais condições significam, grosso modo, estabelecer as hipóteses para a validade do modelo de

equilíbrio geral competitivo. No entanto, o objetivo de Coase foi exatamente destacar as

limitações destas hipóteses para dilemas de políticas no mundo real.

Seguindo o enfoque pretendido por Coase, a questão relevante é como criar soluções

perante um mundo com custos de transação positivos. Como enfatiza Dahlman (1979), por

conseqüência disto, a crítica de Coase refere-se à limitada capacidade de barganha privada, ou

a coordenação pelo mercado, não ser condição suficiente para alocação eficiente de recursos

em determinadas circunstâncias. “Transaction costs are therefore a necessary condition for

the persistence of unwanted effects from externalities” Dahlman (1979:142).

Assumido isto, o correto seria centrar a discussão sobre a causa (custos de transação)

e não sobre a conseqüência (externalidades). A análise de Coase mudou o foco de Pigou, que

se centrava em taxar o gerador da externalidade negativa. Como observa Dahlman

(1979:154), “what matter is whether we achieve a higher valued output by putting the liability

on one or other the parties involved, and not who is the source of the externality”.

Considerar o efeito de custos de transação significativos é aspecto fundamental que

distingue a abordagem neo-institucionalista da economia neoclássica. Esta concepção acarreta

mudanças na agenda de pesquisa, introduzindo questões sobre o papel de instituições e

organizações como mecanismos de coordenação dos agentes econômicos. Por conseguinte, há

reflexos sobre as variáveis-chave para a compreensão do desenvolvimento econômico. Com

efeito, a presença de custo de transação deve ser entendida como um fator central para a

análise econômica normativa. Logo é necessário que os critérios de eficiência considerem o

efeito dos custos de transação no funcionamento da economia.

“The cost of contracting and other transaction cost have profound implications for the allocation of the resources and the structure of economic organization.” (Eggertsson, 1990: 14).

A questão que se sucede é a de discutir a validade do critério de Pareto para analisar

uma economia que apresente custos de transação positivos. A primeira pergunta que surge diz

respeito a se seria válido tratar custos de transação como uma restrição adicional ainda sob o

critério de Pareto, isto é, se ao incorporarmos os custos de transação como uma grandeza

6“The existence of costless transactions is a sine qua non for the operation of the Coase Theorem” (Furubotn e Richter 1997:93.)

16

econômica significativa, se estes custos não seriam apenas uma restrição a mais na seleção

das configurações Pareto-eficientes.

Diante desta questão cabe refletir que uma vez assumida a relevância dos custos de

transação, deve-se investigar a possibilidade de erros metodológicos, ao se empregar um

critério normativo que aparentemente pertence à outra concepção do funcionamento do

sistema econômico. Em outras palavras, cabe avaliar a incompatibilidade de empregar o

critério normativo paretiano na abordagem neo-institucionalista. Isto posto, cabe ressaltar as

diferenças da abordagem neo-institucionalista em relação ao paradigma neoclássico.

A abordagem neo-institucionalista considera um conjunto de supostos

comportamentais dos agentes econômicos que a distancia da teoria neoclássica. Dentre eles

destacam-se a racionalidade limitada e o oportunismo. Além disso, o ambiente de transações

é indissociável dos efeitos da incerteza, tornando a tomada de decisão diferente do suposto na

abordagem neoclássica.

O oportunismo é apontado por Williamsom (1979:234) como conceito central na

teoria dos custos de transação e significa que os agentes atuam em seu auto-interesse, mas

com avidez neste processo. As vantagens geradas pelo oportunismo referem-se à manipulação

de informações seletivas ou distorcidas. “Opportunism refers to the incomplete or distorted

disclosure information (Williamsom, 1985: 47)

O problema do oportunismo cresce diante da presença limitada de participantes

habilitados para a transação, ou seja, em situações de small numbers. Tal fato decorre da

vantagem de ser o primeiro (first mover advantages). Por exemplo, o vencedor de uma

licitação para concessão de determinado serviço obtém vantagens anteriormente inexistentes

sobre os demais no momento da renovação (nova licitação)7.

O conceito de racionalidade limitada, proposto por Herbert Simon, é uma hipótese

alternativa à visão de racionalidade substantiva adota na teoria neoclássica. Simon (1978)

argumenta que o agente tomaria suas decisões limitadas pelas condições de previsão

permitida pelo ambiente. Vale frisar que a limitação é dada pela relação entre o agente e o

ambiente e não por padrões de comportamento irracionais. Williamson (1985) aponta duas

formas destes limites: um físico, de receber e processar as informações, e outro de linguagem, 7 Williamson (1985).

17

inaptidão de articular os conhecimentos através dos mecanismos usuais de comunicação.

Diante disso, a racionalidade se dá no procedimento (procedural rationality), com

destaque para as limitações cognitivas, ou seja, na forma de interpretar as informações obtidas

no ambiente. Torna-se mais importante o modo como os agentes se comportam no processo

decisório, em detrimento do próprio resultado da escolha racional. Assim, ao invés de buscar

a maximização de uma função objetivo que possui lacunas, o agente opta por soluções sub-

ótimas, às quais Simon atribui o termo satisfacing.

O comportamento satisfing é decorrente do reconhecimento da restrita capacidade

dos agentes operarem sua função-objetivo e não de uma limitação do conjunto de

informações. Independentemente da quantidade de informação, o agente não possui os

critérios decisórios suficientes para atingir um resultado ótimo. Inclusive a decisão se dá em

um ambiente em mudança e uma decisão tomada ex-ante não é capaz de definir um resultado

apropriado para um futuro incerto.

A incerteza, no enfoque da teoria dos custos de transação, é o terceiro elemento que

determina a dificuldade e os custos em se realizar transações econômicas. Em condições sem

a presença de incerteza, mesmo que um agente não seja considerado possuidor de

racionalidade substantiva e transacione com outros atores potencialmente oportunistas, não

haveria problemas em definir os parâmetros da troca, pois se poderiam antecipar eventuais

litígios.

Comportamentos defensivos podem ser rotinas de conduta (procedural rationality)

que reduzem os prejuízos dos erros de previsão. Estes são recorrentes em um ambiente não-

ergódigo, onde a informação recebida está repleta de imperfeições. Tal instabilidade torna

inviável a dedução atribuindo uma distribuição de probabilidades. Um aspecto refere-se a

considerar a informação não é condição suficiente para seu uso com eficácia. Um agente pode

ter muita informação, mas ter pouco conhecimento para se beneficiar disto. Pode-se dizer que

esta hipótese deriva da racionalidade limitada e da incerteza forte presente em ambientes

complexos. A abordagem da economia neoclássica simplifica a questão, resumindo o

problema de decisão dos agentes econômicos à mera obtenção de informação.

Já em situações de risco (incerteza neoclássica), os agentes são capazes de tomar a

decisão por meio de uma atribuição de probabilidade para cada cenário e definir, então, o

18

valor esperado de determinado atributo. Para Wiliamson (1985), perante a complexidade no

ambiente de transações, mesmo esta forma mais simples de incerteza eleva os custos de

transação, pois atribuir probabilidades aos eventos se torna uma tarefa mais difícil.

Williamson (1991; 1996) argumenta que uma maior incerteza se manifesta de dois

modos: O primeiro é um maior número de distúrbios ocorrendo no ambiente das transações,

mas a distribuição de probabilidade permanece inalterada. O segundo é o caso em que os

distúrbios se tornam mais relevantes, aumenta a variância da distribuição.

Segundo Farina (1997:23) a incerteza relevante para a economia dos custos de

transação se a alinha à concepção keynesiana de incerteza. Isto é, o que importa é que não se

pode prever e nem mesmo realizar seguro para certos eventos, em outras palavras, a incerteza

não é redutível ao risco.

O fundamental é a concepção conjunta e interativa entre incerteza, racionalidade

limitada e oportunismo para moldar o ambiente de transações e determinar os custos de

transação e meio de coordenação entre os agentes econômicos.

Diante das hipóteses consideradas na abordagem neo-institucionalista, não parece

coerente considerar que a interação entre os agentes econômicos se dê da mesma forma com

ou sem a presença de custos de transação. Se considerado o pressuposto comportamental de

racionalidade limitada, os custos de transação alteram a maneira de se tomar decisões. Além

disso, a incerteza no ambiente de trocas significa não ser possível assegurar de antemão a

estabilidade do resultado esperado da troca. Tais diferenças sobre o ambiente e o critério de

tomada de decisão dos indivíduos representam um passo muito maior do que adicionar uma

restrição para a tomada de decisão por agentes econômicos e possui reflexos na coordenação

do sistema econômico e, conseqüentemente, na análise normativa.

Se a abordagem neo-instucionalista e, mais particularmente, a Economia dos Custos

de Transação aponta a dificuldade do sistema de preços como estrutura de coordenação única

da atividade econômica, o critério de eficiência de alocação de recursos baseado exatamente

no sistema de preços como estrutura de coordenação também padece da mesma limitação.

Como esta abordagem não aceita a concepção do funcionamento do sistema econômico sem

custos de transação, com os agentes tomando suas decisões de posse de uma racionalidade

19

substantiva que elimina problemas de coordenação, então o processo decisório é

completamente diferente do referencial neo-institucionalista.

Desta forma, não é possível seguir utilizando o critério de eficiência alocativa para

análises normativas. Baseado nesta conclusão, caso seja considerado o modelo básico da

abordagem neo-institucionalista, parece incongruente que as políticas econômicas tenham

como base o critério de Pareto.

Portanto, prosseguir com o mesmo tratamento para questões normativas, apenas

adicionando a restrição dos custos de transação na interação entre os agentes econômicos, ou

seja, criando um problema de maximização com uma restrição adicional, significa que

qualquer situação, mesmo com diferentes níveis de custos de transação, poderia alcançar uma

solução eficiente.

Parece necessário uma análise normativa que trate a presença de custos de transação

de forma endógena ao funcionamento do sistema econômico. Considerar o desempenho

institucional em termos de uma aproximação do resultado de sistema livre de custos de

transação é um artifício que não resolve a questão, pois os custos de produção e transação são

indissociáveis do processo de trocas.

A maximização sob restrições deve ser considerada falaciosa e pouco relevante para

contemplar as preocupações expressas pela economia neo-institucionalista. Isto porque,

dependendo da interpretação do que seria uma restrição adicional, qualquer resultado fora do

idealizado é ineficiente, caso a restrição possa ser eliminada a baixo custo, em relação aos

ganhos que poderiam ser obtidos com a sua eliminação. Por outro lado também pode ser

entendido que todos são eficientes, caso se interprete que a restrição não pode ser eliminada

com custos inferiores aos ganhos. Portanto, geram-se dúvidas sobre a relevância e

aplicabilidade deste critério de julgamento, como aponta Dahlman (1979):

“The conclusion, unpalatable to many economists, would seem to be that if exists, it must be optimal, and if it does not exist it is because it is too costly, so that is optimal too.” (Dahlman, 1979: 153).

Desta forma, seja pela incerteza ou qualquer outra limitação que torne restrito o

conjunto de informações disponíveis para tomada de decisão dos agentes econômicos, os

custos de transação são significativos. Nestes casos, não parece coerente empregar o critério

normativo de Pareto, uma vez que este esteja baseado em um modelo de funcionamento do

20

sistema econômico sob perfeita informação.

“Various contractual arrangements are designed to economize on transaction costs, and transaction costs reflect the scarcity of information. If this basic insight of the NIE is correct, it is not clear how economic outcomes in a world of full information can be used as a yardstick of efficiency in real-world situations.” (Eggertsson, 1990:22)

O fato é os pontos de incompatibilidade teórica entre as abordagens neo-

institucionalista e neoclássica significam equívocos metodológicos quanto ao emprego do

critério de Pareto, como uma possível base normativa para a abordagem neo-institucionalista.

Por exemplo, freqüentemente mudanças institucionais promovem redistribuição de renda e de

riqueza e, portanto, geram ganhadores que não necessariamente encontrarão meios de

compensar os perdedores (lump-sum). Cria-se uma situação que não é neutra do ponto de vista

do conceito de Pareto. De fato, efeitos de mudança institucional, objeto típico da teoria neo-

institucionalista, consistem em uma violação do princípio conceitual básico que permite a

aplicação do ótimo de Pareto.

Diante do que foi discutido nesta seção, parece haver evidências de que o conceito de

eficiência no sentido de Pareto não é adequado para uma análise normativa, quando se

considera a abordagem neo-institucionalista como modelo básico de funcionamento da

economia. Para a análise neo-institucionalista, o sistema econômico possui características

geradoras de custos de transação, que eliminam a eficácia do sistema de preços como suposto

na economia neoclássica, em especial no modelo de Equilíbrio Geral Competitivo. Uma vez

que trocas envolvem custos, o risco é que estes possam ser capazes de eliminar o benefício

esperado por determinado agente para realizar a troca. A repercussão disto é que nem sempre

um sistema de preços fornece os elementos suficientes para coordenar as transações. Assim,

em determinados casos, significarão a redução das trocas realizadas, representando perdas

para o sistema econômico.

“Economics was too preoccupied with issues of allocative efficiency, in which marginal analysis was featured, to the neglect of organizational efficiency”. (Williamson, 1996:100).

O importante é enfatizar que assumir as concepções de análise neo-institucionalista

não significa tratar custos de transação como restrições adicionais ao modelo de equilíbrio

geral competitivo e prosseguir empregando sua contrapartida normativa. A avaliação

21

normativa de temas pertinentes à teoria neo-institucionalista deve ser pautada por critério de

julgamentos normativos próprios a esta escola de pensamento.

Eggertsson (1990:112) resume que a análise da Nova Economia Institucional não

busca encontrar estruturas de coordenação e arranjos institucionais ótimos. Este enfoque

teórico se centra no resultado econômico de estruturas alternativas. Mas isto, como observa o

autor, demanda mecanismos de comparação entre alternativas. No limite, os custos de

transação impedem que algumas trocas se realizem. Da mesma forma algumas transações

ocorrem em condições muito diferentes das supostas pelo equilíbrio geral competitivo, ou

seja, são coordenadas por mecanismos mais complexos que apenas o sistema de preços.

Como identificado na seção anterior, existem fortes limitações do referencial

normativo paretiano para o trato de questões de políticas públicas, sem que se incorra em

equívocos conceituais e metodológicos. No presente tópico aprofundou-se a discussão da

incompatibilidade deste referencial normativo com a abordagem neo-institucionalista. Esta

incongruência deriva da marcante diferença ente as hipóteses básicas de funcionamento do

sistema econômico, especialmente as associadas aos pressupostos comportamentais dos

agentes econômicos. Contudo, diante da crescente presença do enfoque neo-institucionalista

na análise de políticas públicas, sobretudo no tocante aos setores de infra-estrutura, é

fundamental apresentar quais implicações normativas derivam deste referencial teórico. A

próxima seção realiza um exercício preliminar neste sentido.

1.3 – O Conceito de Eficiência Econômica na Teoria dos Custos de Transação: A Relevância da Adequação das Estruturas de Governança.

O objetivo desta seção é discutir que critério de eficiência pertinente pode ser

empregado para análise de políticas públicas, uma vez que o conceito normativo de Pareto

parece incongruente com a abordagem neo-institucionalista. Esta discussão é realizada em

duas etapas. Na primeira discute-se numa perspectiva geral qual o conceito normativo básico

nortearia a análise neo-institucionalista.Esta não é uma tarefa simples devido à inexistência de

um debate claro a respeito do critério de eficiência subjacente a esta escola de pensamento.

22

Contudo, destaca-se o conceito de adaptação às mudanças no ambiente como um atributo

fundamental à performance econômica segundo esta escola.

Diante disso, este debate o papel da adaptação será aprofundado com base na

contribuição de Oliver Williamson acerca dos tipos de adaptação presentes em cada forma de

estrutura de governança. Na última parte desta seção, este tema será abortado destacando o

papel dos atributos contratuais em coordenar a interação entre agentes econômicos. Como

será discutida, esta coordenação se dá com o objetivo de repartir riscos e rendas associadas à

transação, principalmente quando envolvem ativos específicos.

1.3.1 – Abordagem Normativa na Nova Economia Institucional.

Não existe um consenso na abordagem neo-institucionalista acerca de qual critério

empregar em análises normativas. Tal fato deve-se a diferentes motivos. Um deles é oriundo

da grande preocupação desta escola de pensamento em descrever o funcionamento do sistema

econômico de forma alternativa ao suposto na tradição neoclássica. Como este é um processo

em andamento, a concentração de esforços para a construção de uma abordagem normativa

pode acabar em segundo plano. Além disso, a diversidade de linhas nesta escola de

pensamento dificulta o consenso sobre a questão normativa.

Para Chang (1996:61), o conceito de eficiência deve ser definido de forma mais

ampla do que está presente na teoria econômica convencional, pois deve considerar também a

dimensão dos custos de transação. Demsetz (1969) critica o que denomina nirvana approach

para representar a busca por resultados eficiente e superiores, ou seja, alocações nas quais não

haveria alternativa mais eficiente. O autor ressalta que o dilema de políticas deve se pautar

por escolhas entre arranjos institucionais reais (factíveis) e não apenas hipotéticos. “A relevant

notion of efficiency must refer to scarcity and people as they are, not as they could be.”

(Demsetz, 1969:21).

Esta concepção valoriza decisões tipo satisfing à Simon, ao invés da busca de uma

solução hipoteticamente ótima de um ponto de vista alocativo. Esta é uma preocupação típica

da abordagem neo-institucionalista, e que influencia também as condições para a discussão

normativa desta escola de pensamento. Este é o objeto da presente seção.

23

Para North, as instituições cumprem o papel de reduzir a incerteza para os processos

de trocas. Como observa o autor, a importância das instituições deriva da presença de custos

de transação positivos. “(...) because a large part of our national income is devoted to

transacting, institutions and specially property rights are crucial determinant of the efficiency

of markets.” (North, 2002).

Em um ambiente econômico com custos de transação positivos não há como pensar

em um critério de eficiência que vise alcançar a alocação ótima. Tal fato leva Dahlman (1979)

a concluir pela utilização de critérios mínimos de satisfação ao invés da busca por níveis

ótimos: “Minimum standards of acceptability (...) dispenses totally with the competitive

equilibrium as a point of reference.” (Dahlman 1979: 157)

A análise comparativa pode ter como parâmetro níveis mínimos aceitáveis de

performance, confrontando resultados obtidos com resultados desejados, servindo para avaliar

o impacto de uma política econômica. Caso determinada intervenção pública não busque

critérios ótimos, inclusive pelos trade-offs que envolvem, esta pode se pautar pelo

atingimento de metas ou objetivos pré-definidos. Nesta perspectiva trata-se de uma noção que

se assemelha ao critério de satisficing a Simon, no qual diante de uma incerteza quanto ao

resultado futuro é impossível definir ex-ante a melhor decisão.

A noção de adaptação, como defendido por North (1990), indica que nem sempre o

mais relevante é buscar uma condição ótima, uma vez que ela só será válida para determinada

conjuntura do ambiente institucional. “Adaptative efficiency is concerned with the kinds of

rules that shape the way an economy evolves through time.” (North, 1990:80) Esta eficiência

nem sempre coincidirá com a eficiência alocativa. Para North (2002) a busca de eficiência

alocativa pode fazer com que as firmas eliminem processos criativos, como aqueles

preconizados por Schumpeter.

“It is adaptative rather than alocative efficiency which should be the guide to policy. Alocative efficiency is a static concept with a given set of institutions; the key to continuing good performance is a flexible institutional matrix that will adjust in the context of evolving technological and demographic changes as well as shocks to the system.” (North, 2002).

O conceito de adaptação decorre de uma visão pragmática da abordagem neo-

institucionalista e também está associado aos supostos comportamentais para a decisão dos

24

agentes econômicos. Isto remete a um conceito normativo muito diferente do que é

preconizado pela teoria neoclássica, sobretudo por invalidar as premissas básicas para o

funcionamento do modelo de equilíbrio geral.

A noção de eficiência adaptativa é pouco difundida e discutida no debate acadêmico

da Nova Economia Institucional. Por outro lado, o fortalecimento de uma abordagem

normativa de cunho neo-institucionalista demanda critérios e medidas de eficiência

condizente com o seu arcabouço teórico. Neste intuito o conceito de adaptação é fundamental

para fortalecer uma abordagem normativa própria ao arcabouço neo-institucionalista.

North se dedica à análise do ambiente institucional, enquanto Williamson avalia as

formas organizacionais que coordenam a transação entre agentes econômicos. Embora

trabalhe em um nível de análise diferente de North, Williamson também destaca que o

relevante é atentar para a capacidade de adaptação ao invés de se buscar resultados ótimos,

porém meramente hipotéticos. Williamson (1996) aprofunda a crítica quando a busca de

resultados teóricos que não se constituam em políticas factíveis de serem implementadas.

“Transaction cost economics eschews hypothetical ideals and insists that the relevant comparisons are with feasible alternatives (…). The relevant criterion is thus that of remediableness, according to which an outcome from which no superior alternative can be described and implemented with net gains is presumed to be efficient.” (Williamson, 1996:7).

Oliver Williamson apresenta o conceito de ineficiência irremediável

(remediableness) ao destacar a preocupação com os possíveis equívocos da busca por

soluções ótimas que apenas podem ser atingidas hipoteticamente. O critério de ineficiência

irremediável significa que existem situações nas quais uma configuração ótima não pode ser

implementada. “A condition is held to be remediable if a superior feasible alternative can be

described and implemented with net gains”. (Williamson, 1996:379)

Como fica explícito na passagem abaixo, Williamson critica a abordagem normativa

na literatura econômica por pautar-se pela busca de alocações ideais, sem discutir a validade

de ser atingido resultados hipotéticos.

“The concept of remediableness has a long history. Both E.A.G. Robinson (1934) and Harold Demsetz (1969) made perceptive reference to the analytical poverty of ‘nirvana economics’, which entailed comparisons of actual forms of organization with ideals. (…)

25

Hypothetical ideals are operationally irrelevant. Within the feasible subset, the relevant test is whether an alternative can be described that can be implemented with expected net gains. This is the remediableness criterion.”(Williamson, 1996: 210)

Conforme discutido acima, fica explícita nesta passagem a preocupação de

Williamson, e de certa forma para a abordagem neo-institucionalista, de obter soluções que

não se resumam a uma possibilidade teórica. Portanto, seguindo este argumento qualquer

debate normativo deve ser guiado pela possibilidade de ser implementada uma solução.

Não obstante, Williamson deixa claro seu contraponto em relação aos critérios

normativos tradicionalmente empregados na análise econômica ao expor:

“As against the usual practice of ‘claiming’ that allocative efficiency will be enhanced “upon supplanting price supports with lump-sum taxes,” remediableness asks in addition that (1) the requisite information upon which to base the lump-sum taxes be displayed (feasibility), (2) the pay-out mechanisms be described (implementation), and (3) legitimacy of political resistance be factored in.” (Williamson, 2002: 17-18)

Os argumentos de Williamson marcam a preocupação do autor com a aplicabilidade

de avaliações normativas para o debate de políticas econômicas. Contemplar a

impossibilidade de serem alcançados resultados ótimos implica a relevância de considerar, de

forma objetiva, os aspectos que condicionam o dilema de política. Neste sentido, assim como

North, Williamson aponta para a capacidade de adaptação como o aspecto fundamental pra

determinar a performance da economia8. Mais especificamente, como será discutido na

próxima seção, o ponto central desta análise diz respeito à adequação de uma estrutura de

governança à transação que esta coordena.

“A high-performance economy will combine the capacity for autonomous adaptation (in the firm) with cooperative adaptation (in the firm) in a discriminating way.” (Williamson, 1994: 324)

A construção do conceito de adaptação de Williamson congrega argumentos de dois

autores – Hayek e Barnard. Na concepção de Hayek, a adaptação é feita de forma mais

eficiente quanto maior a descentralização dos agentes no sistema econômico, uma análise

semelhante ao papel que o sistema de preços desempenha. Na análise deste autor, não há

como as firmas servirem de instrumento de adaptação, papel reservado para o mercado. Isto

8 “Adaptation as the Central Economic Problem.” (Williamson, 1996:101)

26

decorre de sua análise ser excessivamente atomizada, não concebendo explicação para a

existência da firma. O argumento de Hayek é que o sistema de preços é uma solução mais

eficiente do que levar a informação ao controle central, para que então sejam decididas as

ações dos agentes no sistema econômico.

“Civilization advances by extending the number of important operations which we can perform without thinking about them.” (Hayek, 1945:527-8).

Visto que as transações no mercado baseiam-se numa lógica não-cooperativa, a

vantagem da sua coordenação depende da capacidade do sistema de preços transmitir todas as

informações necessárias para tomada de decisão dos agentes econômicos. A abordagem de

Hayek frisa a capacidade de auto-organização do sistema econômico, ou melhor, foca na

espontaneidade da coordenação entre os agentes. Na terminologia de Williamson (1991), a

tradição da teoria econômica sempre foi negligenciar o papel das governanças intencionais.

Uma vez que a coordenação ocorra de forma autônoma, torna-se difícil encontrar o papel de

formas organizacionais, como a firma, para o funcionamento do sistema econômico. De fato,

uma relação tecnológica de transformação de fatores em produtos (função de produção) não

possuiria a mesma relevância que as firmas apresentam no mundo real.

Assim como Hayek, Barnard considerava essencial o papel da adaptação às

mudanças no sistema econômico, porém entendia que neste processo a organização

apresentava vantagens sobre os mecanismos de mercado. Hayek se preocupava com tipos de

adaptação autônoma dos indivíduos, onde os agentes respondem a suas próprias

oportunidades no sistema de preços.

Já a adaptação na visão de Barnard envolve “that kind of cooperation among men

that is conscious, deliberate, purposeful” (Barnard:4 apud Williamson 1991:164). Assim,

existem situações incertas no ambiente econômico onde as organizações, impondo controle

(fiat), podem obter maior agilidade de reposta. O controle - a hierarquia - seria o meio pelo

qual se superaria conflitos entre agentes econômicos.

Williamson buscou conciliar os resultados antagônicos de Barnard e de Hayek,

frisando que no sistema econômico convivem as duas formas de adaptação, a do tipo A

(autônoma) e adaptação do tipo C (cooperativa). O balanço destas forças determina diferentes

estruturas de coordenação que se situam desde o extremo do mercado, onde só é necessário à

27

adaptação do tipo A, até o outro extremo representado pela firma (hierarquia), na qual ocorre

apenas adaptação do tipo C. Diante disso, foi possível incorporar à análise da economia dos

custos de transação diversas formas (híbridas) para se coordenar as transações econômicas,

superando a dicotomia make-or-buy e possibilitando o estudo de várias estruturas contratuais

presentes na economia capitalista.

Oliver Williamson destacou-se no estudo da Economia dos Custos de Transação ao

apresentar a associação entre as características das transações - os custos que estas envolvem -

e as estruturas de governança. O argumento central da economia dos custos de transação é que

quanto maior a especificidade do bem ou serviço transacionado, e quanto mais freqüente a

interação entre os agentes da transação, maior será a demanda por estruturas que governem a

relação de forma mais centralizada, ou seja, que se utilizem mais da adaptação do tipo C, com

o caso limite da firma integrada verticalmente. Neste contexto, o importante é que “(...)

integration harmonizes interests and permits an efficient (adaptive, sequential) decision-

process to be utilized”.(Williamson, 1975:84).

Portanto, uma explicação para a integração vertical seria a eliminação do conflito de

interesse e o alinhamento de incentivos através da característica hierárquica da firma,

reduzindo o problema de incerteza comportamental. Como aponta Pondé (1994:25), “a

integração vertical é uma forma de permitir a introdução de adaptações seqüenciais nas

transações através de processos administrados”.

Por outro lado, na firma perdem-se os incentivos de mercado, high-powered

incentives, que estão associados à busca por benefícios individuais dos agentes econômicos.

Tais incentivos resultam em uma redução de custos, ou seja, adaptação do tipo A. Além disto,

a firma integrada elabora sistemas de incentivos internos e realiza monitoramentos. Isso, por

sua vez, implica uma outra ordem de custos administrativos, para que sejam possíveis as

funções de caráter hierárquico. “The upshot is that internal organization degrades incentive

intensity, and added bureaucratic costs”. (Williamson, 1996: 103)

Segundo a abordagem de Williamson, o importante para o desempenho econômico

nas relações de troca é encontrar uma estrutura de governança que se adapte às características

específicas de uma determinada transação em reduzir custos. Neste intuito, em diversos casos,

o mercado, na sua forma tradicionalmente tratada na literatura microeconômica, cede espaço

para os contratos, em suas diferentes formas e, no limite, para a firma. Na próxima seção,

28

explora-se o conceito de estrutura de governança com o objetivo de obter implicações para o

debate normativo.

1.3.2 – Eficiência Econômica na Abordagem Neo-Institucionalista: o papel das Estruturas de Governança.

O modelo de escolha da forma organizacional proposto por Williamson (1991a) tem

em seu cerne que “a avaliação da eficiência de uma forma organizacional depende de quanto

apta ela se mostra para reagir às mudanças do meio ambiente - ou seja, adaptar-se” (Azevedo,

1997:97).

Williamson (1985, 1996) apresenta que as diferenças centrais da governança exercida

pelo mercado para firma derivam da forma que combinam os atributos que induzem o

comportamento das partes envolvidas na transação. Como fica explícito na passagem abaixo,

na medida que se afasta de uma estrutura, altera-se o mecanismo empregado para adaptação

às mudanças no ambiente de transações. Da mesma forma, os custos de monitoramento e de

administração da transação também se alteram na passagem de uma forma para outra.

“The main market and hierarchy trade-offs involve comparative assessments of adaptability, incentive intensity, and bureaucracy. Markets are superior in autonomous adaptability respects, employ high-powered incentives, and are less subject to bureaucratic distortions. Hierarchies enjoy the advantages in bilateral and multilateral adaptability respects, work out of lower powered incentives, and are beset by intertemporal bureaucratic distortions. (…) The least cost made of governance varies systematically with the attributes of transactions.” (Williamson, 1996:151)

Williamson (1996) constrói um modelo de análise que tem como elemento central os

dois tipos de adaptação (cooperativa versus autônoma) perante choques não antecipados,

sendo que não há como reunir sob uma mesma estrutura as capacidades de adaptação dos dois

tipos de (A e C). Isto é, na medida em que se move em direção ao ganho de adaptação tipo C,

comum às estruturas de governança hierárquicas, a capacidade específica de adaptação tipo A,

comum ao mercado, se reduz. As estruturas híbridas possuem estas duas formas de adaptação

em patamares intermediários.

“The hybrid mode is located between market and hierarchy with respect to incentives, adaptability, and bureaucratic costs. As compared with the market, the hybrid sacrifices incentives in favor of

29

superior coordination among the parts. As compared with the hierarchy, the hybrid sacrifices cooperativeness in favor of grater incentive intensity.” (Williamson, 1996:107)

Para tanto, Williamson (1991a) define uma função custo de governance, ou custo de

coordenação, para cada tipo de estrutura de governança – mercado, formas híbridas e

hierarquia. Estas funções consideram como variável independente o grau de especificidade de

ativos envolvidos (k); os demais atributos de transação (θ) são tratados como parâmetros de

deslocamento vertical da função, entre estes se destacando os elementos do ambiente

institucional e a incerteza.

No que segue, M(k,θ) representa o custo de governance pelo mercado; H(k,θ) é o

custo pela hierarquia (firma), e X(k,θ) associa-se ao custo de usar as formas híbridas de

coordenação. De acordo com as considerações a respeito da eficiência relativa das formas

organizacionais perante um maior nível de especificidade de ativos, as funções possuem as

seguintes restrições:

i) M(0,θ) < X(0,θ) < H(0,θ) - quando não há especificidade de ativos torna-se

custoso coordenar as transações por estruturas que se destaquem pela adaptação tipo C.

ii) ∂M/∂k > ∂X/∂k > ∂H/∂k – o aumento dos custos de coordenação à medida que

cresce a especificidade de ativos é maior nos mercados do que nas formas híbridas, e menor

nestas em comparação à firma.

O gráfico abaixo apresenta o comportamento das estruturas de governança para um

valor de θ fixo.

Gráfico 1.1: Custo de Governança x Especificidade de Ativos

Custos de

Governança M(k) X(k) H(k)

0 k* k** Especificidade de Ativos

As formas híbridas se viabilizam em situações em que os custos de transação tornam a

existência da firma prescindível, mas que, por outro lado, demandam arcabouços de

coordenação mais complexos do que o sistema de preços de mercado, como, por exemplo, os

contratos de longo prazo. As formas híbridas são aquelas em que a forma organizacional pode

ser representada como uma combinação entre os mecanismos de incentivo (adaptação tipo A)

e controle (adaptação tipo C). Destaca-se que a maior capacidade de adaptação do tipo C

implica maiores dispêndios de administração (monitoramento).

“As compared with markets, internal incentives in hierarchies are flat or low powered, which is to say that changes in effort expended have little or no immediate effect on compensation. This is mainly because the high-powered incentives of markets are unavoidably compromised by internal organization. (…) hierarchy uses flat incentives because these elicit greater cooperation”. (Williamson, 1996:99)

A relevância da adequação da estrutura de governança reside no nível resultante de

custos de transação e o impacto sobre o ganho da troca. Problemas de adaptação da estrutura

de governança significarão a dificuldade para o desenvolvimento de determinadas atividades

econômicas. Com efeito, o uso de estruturas de coordenação das transações demasiadamente

simples – mercado spot - pode ter como efeito um menor número de transações. Vale também

a recíproca, o emprego de estruturas excessivamente complexas para transações com

características universais gera custos de coordenação encarecedores do processo de troca.

30

31

Uma vez que os meios de propiciar o crescimento do volume das transações

(estruturas de coordenação) não são livres de custos, não existe um processo maximizador que

minimize os custos de transação. Este fato esta diretamente relacionado ao fato de o conjunto

de estrutura de governança não ser contínuo, isto é, existem estruturas alternativas com

performance diferenciada para a redução de custos de transação, sem, no entanto, eliminá-los.

Conseqüentemente, somente é possível comparar alternativas para avaliar as soluções de

maneira relativa ao invés de um resultado globalmente superior.

Diante disso, em diversos casos ocorrerá à ineficiência irremediável definida por

Williamson. Os custos de transação não podem ser eliminados pelo fato de não existir uma

estrutura de coordenação perfeita para algumas transações. Logo, o número de trocas nestas

situações, inevitavelmente, será inferior ao socialmente desejado. Por outro lado, o

surgimento de novas formas contratuais amplia a possibilidade de obter-se uma governança

mais adequada para determinadas transações. No entanto, nem sempre uma nova estrutura

emerge de forma adequada. “Many hypothetical forms of organization never arise, or quickly

die out, because they combine inconsistent features.” (Williamson, 1996:95)

Enquanto Coase afirmava que custos de transação seriam custos de se usar o

mercado, a abordagem de Williamson mostra a necessidade de comparar alternativas

(arranjos) institucionais. Certas transações podem ocorrer em diversas estruturas de

governance com diferentes níveis de eficiência relativa, onde a eficiência de determinada

transação depende da forma organizacional (ou de sua estrutura de governança). Já a

ineficiência provocada por uma estrutura organizacional pode ser expressa pelo maior custo

de governança, implicando em menor número ou volume das transações. No limite, para um

dado grau de especificidade de ativos, o custo de usar determinada estrutura de governança

inadequada poderá ser proibitivo e, neste caso, a transação não ocorrerá enquanto não for

contemplada por uma estrutura de governança apropriada. Isto decorre do fato da capacidade

de adaptação não ser infinitamente elástica.

Na análise de Williamson (1996) a necessidade de mecanismos de adaptação associa-

se à presença de distúrbios no ambiente das transações, bem como o impacto que este causa

para a inviabilizar a estrutura de governança vigente. Na presença de distúrbios altamente

conseqüentes, mecanismos mais cooperativos de adaptação são necessários: “Internal

organization, hierarchy, qualifies as a still more elastic and adaptative mode of

organization.” (Williamson, 1996:97).

32

A adequação de cada estrutura de governança se altera conforme a mudança no

ambiente das transações. Tal mudança significa uma alteração no parâmetro de deslocamento

θ. Um exemplo de efeito de deslocamento é a melhoria no sistema jurídico-institucional, em

sua capacidade de resolver litígios entre as partes de um contrato:

“An improvement in excuse doctrine, for example, would shift the cost of hybrid governance down.(…) The effect of such improvements would be to increase the use of hybrid contracting, especially as compared with hierarchy.” (Williamson, 1996:115).

O custo de utilização do sistema jurídico pode ser expresso pelo tempo para

conclusão de um processo. O desenvolvimento de mecanismos de arbitragem favorece a

formação de transações inter-firmas, que antes seriam possivelmente transações

desenvolvidas intra-firma, dado o custo de usar o aparato legal.

Um outro fato que desloca as curvas de governança é o efeito-reputação. A melhoria

na reputação desenvolvida numa transação entre duas partes (firmas) favorece o

desenvolvimento de estruturas híbridas. “Hybrid contracting will therefore increase, in

relation to hierarchy, in regimes where interfirm reputation effects are more highly perfected,

ceteris paribus” (Williamson, 1996: 116)

Além de contemplar as especificidades de ativos, a adequação das estruturas de

governança em coordenar determinada transação dependerá de sua capacidade de suportar

distúrbios. Como explica Williamson (1996:96), os distúrbios variam conforme a

conseqüência de seu impacto. Para um distúrbio com impacto pouco conseqüente, o desvio

causado em relação à eficiência original da estrutura de coordenação pode não ser suficiente

para justificar um ajustamento na estrutura de governança. No caso de distúrbios em grau

intermediário, o contrato pode prever ex-ante algum mecanismo de adaptação e ajustamento

nos termos da transação.

A principal fonte de distúrbios é a incerteza no ambiente das transações, que pode ser

associada com várias origens. Williamson destaca a importância da incerteza dos demais

termos de deslocamento da função de custo de governança e a expressa em termos de

probabilidade de distúrbios. Ainda de acordo com Williamson, as incertezas envolvidas nas

transações econômicas podem ser agrupadas em dois tipos. O primeiro diz respeito às

incertezas no ambiente das transações (ou de negócios), ou seja, mudanças nos parâmetros

básicos para as relações comerciais em determinado setor, como, por exemplo, a escassez de

33

determinado insumo básico ao processo produtivo.

O segundo tipo de incerteza refere-se ao comportamento dos agentes após o

comprometimento entre as partes de uma transação em determinado contrato. Esta incerteza

comportamental está diretamente associada à hipótese de que os agentes econômicos tendem

a agir de forma oportunista, ou seja, os agentes atuam em benefício próprio neste processo.

Como mencionado acima, para Williamson o efeito da incerteza pode se manifestar

de duas formas, sendo uma delas a probabilidade de distúrbios; outra é a magnitude do efeito

destes.

“Greater uncertainty could take either of two forms. One is that the probability distribution of disturbances remains unchanged but that more numerous disturbances occur. A second is that disturbances become more consequential (due, for example, to an increase in the variance)”. (Williamson, 1996:116).

O papel da incerteza está na distinção das várias estruturas de governança e sua

suscetibilidade aos distúrbios, sendo as formas híbridas as mais suscetíveis.

“Many of the interesting issues with which transaction cost economics is involved reduce to an assessment of adaptive, sequential decision-making. Contingent on the set of transactions to be effects, the basic proposition here is that governance structure differ in their capacities to respond effectively to disturbances.” (Williamson, 1985: 56-7)

Assim, a eficiência da estrutura de governança se justifica por sua capacidade de

suportar os distúrbios, no caso, suportar a incerteza. No entanto, na presença de uma alta

freqüência de distúrbios, as formas híbridas se apresentam mais instáveis. A conseqüência é

que as transações, cujo ambiente envolve alto grau de incerteza e possui grande probabilidade

de distúrbios, tenderão a ser governadas ou por estruturas de mercado, no caso de baixa

especificidade de ativos, ou pela firma (hierarquia), no caso de elevado grau de especificidade

dos ativos.

“Although the efficacy of all forms of governance may deteriorate in the face of more frequent disturbances, the hybrid mode is arguably the most susceptible. That is because hybrid adaptations cannot be made unilaterally (as with market governance) or by fiat (as with hierarchy) but require mutual consent.” (Williamson, 1996:116).

Como explica Willliamson, a necessidade de encontrar um consenso entre as partes

envolvidas na transação regida por uma forma híbrida significa custos de negociação. Como

mencionado acima, muitas vezes esta negociação é custosa por envolver terceiros e o sistema

legal. Se a necessidade negociações é freqüente, devido à recorrência de distúrbios, então o

uso desta forma de governança acaba sendo ineficiente. As adaptações pela forma híbrida não

podem ser feitas unilateralmente (mercado) ou por comando (hierarquia), nesta a solução

dependem de consenso.

“An increase in market and hierarchy and a decrease in hybrid will thus be associated with an increase in the frequency of disturbances.(…) the hybrid mode could well become nonviable when the frequency of disturbance reaches high levels.” (Williamson, 1996:116).

A figura abaixo é uma representação empregada por Williamson para exibir a

instabilidade das formas híbridas de governança. No eixo horizontal dispõe-se o grau de

especificidade dos ativos e no eixo vertical apresenta-se a freqüência dos distúrbios. A

freqüência dos distúrbios representa deste uma situação muito baixa, ou seja, um ambiente

estável e com pouca mudança até ambientes nos quais os níveis de incerteza tornam a

probabilidade de um distúrbio muito elevada.

Figura 1.1: Freqüência de Distúrbios x Especificidade de Ativos

Freqüência dos

Distúrbios

Híbrido

Especificidade dos Ativos 0 k* k**

Mercado

Hierarquia

Especificidade de Ativos

A instabilidade de formas híbridas suscita uma discussão mais aprofundada das

características econômicas das estruturas contratuais e sua capacidade de suportar transações

com ativos específicos e em ambientes de instabilidade gerada pela incerteza. A

34

35

complexidade de uma estrutura contratual não é trivial e em determinadas situações,

principalmente diante de investimentos em ativos específicos e com grande requerimento de

capital, demandará complexos mecanismos de salvaguardas. Diante da importância do estudo

das formas híbridas dos contratos de longo prazo na literatura em geral, e nesta tese em

particular, a próxima seção dedica-se à avaliação da eficiência destas estruturas de

governança.

1.3.3– O Papel dos Contratos na Coordenação das Transações.

Contratos, como as demais estruturas híbridas de governança, possuem o papel de

coordenar a interação entre agentes econômicos. De forma geral, esta coordenação se dá com

o objetivo de repartir riscos e rendas associadas à transação, principalmente quando envolvem

ativos específicos. A distribuição de risco e renda entre os agentes envolvidos em determinada

relação contratual dependerá dos termos que a regem.

Grosso modo, assim como qualquer outra estrutura de governança, todo contrato,

combina diferentes atributos para a coordenação das transações. Como visto, a eficiência de

uma estrutura dependerá de sua capacidade de adaptação às características da transação. O

nível de esforço dos agentes é resultante destes atributos contratuais. Todavia, como o esforço

não se resume ao sistema de incentivos determinados aprioristicamente, é crucial para a

performance econômica o papel exercido pelo monitoramento e pela flexibilidade para

realizar ajustes ex-post.

A análise contratual destaca a dimensão intertemporal da transação, pois os agentes

econômicos tomam decisões em meio a um conjunto de relações recorrentes. Dessa forma, o

conceito de custos de transação pode ser expresso em termos de custos de realizar contratos

na economia; ou seja, as transações econômicas podem ser analisadas como contratos. Os

custos de transação referem-se aos dispêndios de recursos para a definição e garantir o

cumprimento de contratos. Nesta perspectiva, o conceito de contrato não se refere apenas a

aspectos jurídicos, mas também a acordos tácitos e informais que envolvem uma transação

que se desenvolve no tempo, na forma de compromissos intertemporais.

Diante disto, uma dicotomia útil para análise separa os custos de transação em ex-ante

e ex-post, os primeiros surgem pelo ato de redigir e negociar os termos da transação

(contrato), incluindo os mecanismos de incentivo para antecipar eventuais problemas durante

a execução. (Williamson, 1985:20). Não obstante, existem custos de monitorar o

cumprimento dos termos acordados e de renegociar os parâmetros do contrato, diante de

mudanças no ambiente da transação. Os custos de montar estruturas contingentes e de

correção para tais eventualidades, além do próprio fracasso destas (má adaptação), consistem

nos custos de transação ex-post.

O modelo contratual simplificado apresentado por Williamson (1985) consiste em

uma ferramenta útil para introduzir a discussão sobre os mecanismos de governança presentes

em contratos de longo prazo.

A figura abaixo apresenta diferentes estruturas de governança condicionadas por

duas características, quais sejam: k que representa o grau de especificidade dos ativos e s que

expressa as salvaguardas dispostas no contrato.

Figura 1.2: O Papel das Salvaguardas Contratuais

Estruturas de Governança e Especificidade de Ativos

A

k =0

s = 0 B

k > 0

s > 0 C

A Figura 1.2 acima, utilizada por Williamson (1985), exibe o efeito causado pelo

aumento no grau de especificidade dos ativos sobre a necessidade da constituição de

estruturas de governança, que ofereçam salvaguardas para o agente que realiza o

investimento.

As estruturas de governança estão representadas nos pontos A, B e C na Figura 1.2

acima. A representa a governança via mercado e pode ser considerada adequada, pois a 36

transação neste caso não envolve especificidade de ativos, o que é representado por k = 0,

porém implica numa opção tecnológica diferente da situação que k > 0. Para as demais

estruturas de governança a especificidade de ativos é positiva. Neste caso, o grau da

especificidade de ativos e o nível de salvaguardas para a transação definem a estrutura de

governança.

37

PP >

Esta representação também permite estabelecer a relação entre especificidade de

ativos e estruturas de governança, por um lado, e o valor do ativo transacionado, por outro

(Williamson, 1985: 32-34). Supõe-se que o agente encarregado de realizar o investimento

(fornecedor) é neutro a risco e capaz de suprir a demanda com diferentes opções tecnológicas.

Este agente também é indiferente a qualquer tipo de salvaguarda, caso represente o mesmo

nível mínimo de break-even esperado. Desta forma, para cada estrutura de governança há um

preço correspondente ao nível de salvaguardas. O preço do fornecedor cresce em função da

redução do nível de salvaguardas prestado pela contraparte da transação, logo, no presente

caso, . CB

Atenção especial deve ser dedicada à estrutura B, pois esta representa a situação em

que os ativos específicos não se encontram protegidos por salvaguardas. A ausência de

proteção ao ativo específico necessário para realizar o investimento repercute em maior preço

cobrado pelo bem ofertado. Assim, uma conseqüência do nível desproporcional de

salvaguardas em relação ao investimento realizado em ativos específicos pode ser a redução

do volume transacionado. A estrutura de governança B é uma configuração instável, pois se

trata de uma estrutura de governança demasiadamente simples para o perfil da transação. A

solução mais atrativa para o fornecedor seria optar por uma aplicação de capital em ativos não

específicos, migrando para A. A forma mais adequada para viabilizar a transação com o ativo

específico seria por meio da adoção de salvaguardas para os investimentos. Como visto

acima, a introdução de mecanismos de adaptação do tipo C não é livre de custos, donde a

explicação para seu emprego depende de um benefício superior a este dispêndio.

“Moving from less to more complex governance entails introducing added security features, reducing incentives intensity, and incurring added bureaucratic costs.” (Williamson, 2000:603).

A justificativa refere-se ao fato que o ativo específico pode ser uma solução mais

econômica em custos de produção. E, talvez principalmente, determinados bens ou serviços

só podem ser ofertados por intermédio de ativos específicos.

38

Incerteza e complexidade no ambiente de negócios, associadas com a racionalidade

limitada dos agentes, são determinantes para que as partes não possam firmar contratos livres

de ambigüidades e que possuam cláusulas que cubram todas as contingências. Se os contratos

não possuem cláusulas plenamente contingentes, então serão irremediavelmente incompletos.

O formato dos contratos incompletos é de particular importância quando a transação envolve

investimentos em ativos específicos, com implicação direta para o caso de investimentos em

infra-estrutura, devido ao problema de hold-up¸ apresentado a seguir.

Determinado fornecedor, para atender certo cliente precisa investir em um ativo k

com a característica de representar um sunk-cost e que não pode ser transferido para outros

fins sem perdas expressivas. O diferencial entre o retorno auferido pelo fornecedor com este

investimento em k para atender o seu cliente e o segundo melhor uso de k consiste em uma

quase-renda a esta transação. Caso esta relação seja coordenada apenas por preços, o

fornecedor se encontra sujeito a comportamentos oportunistas do seu cliente, que pode visar

extrair parte desta quase-renda, dado que esta seria uma estratégia racional do cliente. O risco

de se sujeitar a atitudes oportunistas, após a realização de investimentos específicos, ficou

conhecido na literatura como o “problema de hold-up”. O resultado mais grave da ameaça de

hold-up é provocar sub-investimento em k, como também, alterar qualitativamente o

investimento realizado, ao favorecer investimentos em ativos menos específicos.

O valor da quase-renda numa relação bilateral está univocamente relacionado à

especificidade de ativos, pois o grau máximo de especificidade de um ativo é a situação onde

este não possui alternativa econômica para seu emprego. A quase-renda é o diferencial do

retorno obtido com o ativo na transação corrente e sua segunda melhor aplicação (opção

externa). Logo, o valor da quase-renda está univocamente relacionado à especificidade do

ativo empregado na transação. Portanto, quanto mais específico o ativo, menor o retorno que

possui em opções externas à transação em vigor.

A segunda melhor opção para aplicação do ativo consiste em seu salvage value, isto

é, o valor residual obtido. (Monteverde e Tece, 1982:322). Em outras palavras, o conceito de

quase-renda de uma transação é um excedente em relação ao custo de oportunidade, que será

tão maior quanto menor o custo de mudança de determinada atividade econômica (switching

cost). As ações oportunistas para extrair a quase-renda vão além de barganha por reduções de

preço: podem passar por ameaça de rompimento das transações, ou seja, cancelamento de

pedidos e outros mecanismos que não são contratáveis ex-ante a custo negligenciável.

39

Além disso, sendo as transações econômicas sujeitas a eventos exógenos (distúrbios),

desencadeiam-se disputas entre as partes contratantes, refletindo novamente o caráter

incompleto dos contratos. Logo, mesmo que por hipótese um determinado contrato estimule o

investimento em um determinado ativo específico, fatores exógenos dados pela incerteza no

ambiente das transações podem forçar a renegociação do contrato. Para Söllner (1999) o

termo hold-up descreve a situação quando uma das partes possui vantagens no momento que a

outra é forçada a renegociar os termos do contrato. As ações oportunistas para extrair a quase-

renda vão além de barganha por reduções de preço; podem passar por ameaça de rompimento

das transações.

As sanções privadas seriam uma penalidade em forma de um montante fixo de

recursos financeiros, o que reduz o incentivo para ações oportunistas dos agentes. Contudo, o

hold-up torna-se provável quando as condições do ambiente de negócios se alteram

suficientemente, para levar a disputa além da capacidade de solução das salvaguardas. Cada

parte da transação compara o potencial de ganho com a adoção de uma estratégia de hold-up

com a perda de capital decorrente de sanções privadas. Como contrapartida, para um

investidor em ativo específico, o potencial de perda decorrente do fim da relação comercial é

o valor presente da quase-renda destes investimentos.

Klein (1996:451) expõe a diferença entre o preço contratado e o preço de mercado

como exemplo da mudança no ambiente de negócios ser. Este desvio de preços cria o

incentivo para o hold-up, porém, dependendo das salvaguardas acordadas, esta ameaça será

crível apenas para grandes mudanças no preço de mercado.

Grandes mudanças em preços relativos podem tornar impróprios os preços acordados

para o futuro; imperfeição nos mecanismos de enforcement e atitudes estratégicas durante a

execução dos contratos possibilitam ações oportunistas após os contratos serem firmados.

Segundo Masten e Crocker (1991), a combinação destes fatores sugere que relações

contratuais de longo prazo dificilmente são estabelecidas de forma automática.

“The advantage of renegotiations provisions is that they permit the parties to take full advantage of current information in adjusting prices. Hence they provide a high degree of flexibility.” (Masten e Crocker1991:76-77)

Mecanismos que permitam ajustamentos durante a execução dos contratos não só

resultam das vantagens da flexibilidade de adaptação, mas também da impossibilidade de

40

antecipar todos os problemas para o desenvolvimento da relação contratual diante das

mudanças no ambiente da transação.

A criação de um sistema de incentivo e de monitoramento contratual é uma condição

necessária para os investimentos em ativos específicos. Tais incentivos vão desde o ônus por

descumprimento de cláusulas contratuais até o comprometimento (commitment) de capital.

Quando a transação passa a ser regida por instrumentos ineficientes, os ganhos totais da

transação se reduzem, pois recursos reais são perdidos no período de renegociação, ou seja,

ocorre uma dissipação de renda associado com a redução das transações. A questão torna-se

mais relevante ao se considerar que tal perda de eficiência não se resume na repartição de

renda entre as partes, mas a ineficiência se reflete em sub–investimento. Segundo Lyons

(1996), não só a quantidade, mas também o tipo de investimento pode ser afetado pelo

problema de má adaptação da estrutura contratual.

A discussão que se segue auxilia a avaliação sobre a eficiência do modelo contratual

em promover o investimento em ativos específicos e garantir a realização de transações

associadas com ativos que envolvam tal perfil. O exercício de comparar dois modelos

clássicos de contratos – preço fixo e cost-plus – auxilia o entendimento da questão. Isto

porque, no que tange ao papel exercido por incentivos de alta potência e capacidade de

adaptação ex-post, cost-plus e preço fixo são casos polares que facilitam a compreensão de

situações intermediárias, dado que existe uma gama de modelos híbridos entre estes.9

A alternativa de contratos aos preços de mercado só é válida para a análise de

transações que não demandam estruturas complexas de governança10: relações comerciais

onde existe um mercado spot bem desenvolvido. A polaridade entre preço fixo e cost-plus se

reflete em termos de sistema de incentivos e, conseqüentemente, em termos de esforço para

determinada performance e distribuição de riscos. Isto não significa que a negociação não

possua restrições expressas em contrato. Novamente, trata-se do problema de encontrar o

equilíbrio entre flexibilidade e comprometimento nos contratos, pois, nos períodos de

renegociação, abre-se espaço para barganha e oportunismo, o que implica em custos de

transação ex-post até se encontrar termos mutuamente aceitos.

9 Uma discussão detalhada entre os modelos de preço fixo e cost-plus é realizada por Bajari e Tadelis (2001) 10 Entende-se o conceito de estrutura de governança como o contexto institucional onde se processam as transações. Por exemplo, as instituições responsáveis pela regulação de um determinado setor podem estabelecer regras e arbitrar conflitos de forma a reduzir os custos de transação, sem a necessidade de uma integração vertical. Ver Williamson (1985, 1996).

41

Os contratos de preço fixo distribuem assimetricamente os riscos de mudanças no

ambiente de negócios no lado do ofertante. Em contrapartida, dado um preço fixo, o

fornecedor encontra-se incentivado a empenhar-se em reduzir os custos de produção, pois se

apropriará destas economias. No entanto, este modelo de contrato possui poucos incentivos

para continuidade da transação diante de problemas exógenos de performance. Caso os custos

do ofertante subam devido a contingências, ele terá fortes incentivos para reduzir a quantidade

ofertada, no curto prazo, e para reduzir as metas de investimento em expansão da capacidade,

no longo prazo.

Os contratos tipo cost-plus sofrem da deficiência de repassar para o comprador todas

as alterações nos custos de produção. Desta forma, um fornecedor ineficiente não terá

incentivos para melhorar a sua produtividade e minimizar custos. Neste modelo, o risco de

mudanças no ambiente de negócios concentra-se no comprador.

Joskow (1988) destaca que contratos de tipo cost-plus se aproximam muito da forma

de organização da produção através de uma firma integrada verticalmente. Não obstante,

contratos deste tipo apresentam como vantagem grande flexibilidade para gerar mudanças nos

projetos de investimentos, algo relevante diante de investimentos de elevado montante e de

largo prazo de realização. Em contratos de cost-plus, como os custos são compensados

diretamente pelo comprador, cria-se um incentivo a adotar maiores padrões de qualidade nos

produtos e serviços utilizados nos projetos. Por outro lado, o comprador requer um forte

empenho de fiscalização e acompanhamento, com vistas à de mitigar gastos desnecessários

para a performance do projeto.

Portanto, neste modelo contratual deve ser considerado um gasto adicional por parte

do comprador, a título de administração do projeto. Neste tipo de contrato existe maior

tendência à minimização do prazo por parte do fornecedor, enquanto no contrato de preço fixo

há uma tendência a se conseguir a minimização de custos, diante do incentivo do fornecedor

em ampliar seu excedente líquido.

A comparação entre os modelos contratuais de preço-fixo e cost-plus pode ser

exibidos algebricamente, como se segue. Considere a seguinte regra geral de formação de

preço de um contrato:

42

(1.1) )( ccpp += β − +

serviço. do ou produçãoda realização de custo o é c contrato; no doestabeleci preço o é

:ondep

α

Os parâmetros α e β definem estratégia de repartição de risco (risk sharing),

portanto, a partir dos valores que assumam, o risco se distribui de forma diferenciada entre as

partes contratantes. Da mesma forma, é possível gerar dois casos polares a partir dessa regra,

um para o caso do cost-plus, outro para o caso do contrato por preço fixo.

Caso β = 0, a regra de preço do contrato é a seguinte:

cP (1.2) = +t-pluscos tipocontrato um de se- trataseja, ou

α

Caso α = 0 e β = 1, então a regra de preço passa a ser a seguinte:

o.a transaçãpara fixo preço um estabelece contrato o seja, ou (1.3) pP =

Casos intermediários de contrato de incentivos e distribuição de riscos ocorrem

quando 0<β<1, pois β determina a participação do fornecedor no risco do projeto, relacionado

com a incerteza sobre os custos de produção. A repartição do benefício ou prejuízo na

execução do projeto de investimento se dá numa razão β/ 1−β. Assim, caso β=0,5 o risco se

distribui igualmente entre as partes. Mas, à medida que β cresce eleva-se o risco para o

fornecedor.

Isto posto, um contrato de longo prazo que envolva ativos específicos precisa

considerar mecanismos flexíveis, que incentivem o processo de ajustamento para aumentar a

renda da transação, bem como impedir a perda ocasionada pelo processo de barganha custosa

e esforços de expropriação de renda.

“The problem is to devise a structure that encourages rent-increasing adjustments (flexibility) but discourages rent-dissipating efforts to redistribute existing surpluses (opportunism)” (Masten e Crocker, 1991:71-72)

43

Apesar das limitações de descontinuidade do conjunto de estruturas de governança e a

conseqüente ineficiência irremediável, a performance econômica de um contrato se expressa

por sua capacidade de suportar investimentos idiossincráticos, os quais repercutem no

crescimento do volume de bens ou serviços prestados por um determinado ativo específico. A

próxima seção apresenta sinteticamente como a discussão sobre eficiência de estruturas de

governança pode ser aplicada para a análise de setores de infra-estrutura.

1.4 –Conclusão: Implicações para Análise de Setores de Infra-estrutura.

A tradição da ciência econômica na análise normativa é empregar o critério de

Pareto. Tal conceito possui fortes limitações de aplicação, uma vez que o rigor imposto na

aplicação do critério de Pareto implica que vários trade-offs de política econômica não são

contempláveis por este critério. Mesmo as propostas auxiliares dentro deste paradigma

padecem de limitações que estão associadas como o modelo básico de explicação para o

funcionamento do sistema econômico, o equilíbrio geral competitivo.

A relevância dos custos de transação constitui-se em um ponto fundamental da

abordagem neo-institucionalista e que não pode ser traduzida como apenas uma restrição

adicional ao funcionamento da coordenação pelo sistema de preços. A abordagem neo-

institucionalista possui um conjunto de supostos que se distanciam da noção de

funcionamento da economia do modelo de equilíbrio geral competitivo. Esta diferença entre

as abordagens teóricas resulta na impossibilidade de se empregar o critério normativo

neoclássico para avaliações de cunho neo-institucionalistas.

A eficiência econômica no âmbito da abordagem da teoria neo-institucionalista não

se pauta pela busca de modelos hipotéticos de coordenação das transações econômicas. A

concepção de ineficiência irremediável expressa por Williamson significa que as estruturas de

governança devem ser avaliadas de forma relativa (comparativa), mas não por suposições de

superioridade absoluta de alguma forma contratual. A eficiência de determinada estrutura de

governança se refletirá na capacidade de lidar com as características da transação e se adaptar

aos distúrbios em que está submetida.

Como visto, a especificidade de ativos e a incerteza são características fundamentais

para definir o perfil das transações. Tais características determinam a composição requerida

44

entre mecanismos de adaptação do tipo C (cooperativo) e do tipo A (autônomo) da estrutura

de governança. Em termos da discussão de modelos contratuais, esta discussão é representada

pelo trade-off entre atributos high-powered incentives, como nos contratos de preço fixo, e na

capacidade de adaptação ex-post, como em contratos cost-plus.

A teoria neo-institucionalista possui um papel de destaque na produção acadêmica

que tem como objeto os setores de infra-estrutura, com ênfase para a discussão do custo de

transação de modelos contratuais entre Estado e atores privados responsáveis pela provisão

dos serviços de infra-estrutura. Apesar da clara necessidade de se balizar um debate voltado

para políticas públicas, esta discussão acadêmica não põe a ênfase adequada em conceitos

normativos pertinentes à abordagem neo-institucionalista.

A importância de se considerar a presença de custos de transação na economia foi

crescentemente incorporada nas análises de defesa da concorrência e regulação. Segundo

Joskow (1991: 55-6), recentes mudanças na legislação antitruste reconhecem que a integração

vertical e contratos verticais complexos são necessários para minimizar custos de transação e

viabilizar mais investimentos.

“The Chicago Scholl focused on explaining why vertical integration and nonstandard vertical contracts did not create or enhance market power while transaction cost economics focused on why these vertical arrangements emerged as cost-reducing responses to certain transactional characteristics” (Joskow 1991:56).

Um problema para a policy setorial é identificar as práticas contratuais que resultam

em maior eficiência adaptativa. Jenkinson e Mayer (1997:6) analisam que certas práticas

podem ser eficientes e redutoras do risco de investimentos. Segundo Chang, a política

econômica em setores de infra-estrutura deve se pautar em suprir falhas de coordenação entre

os agentes econômicos de modo a favorecer a realização de investimentos.

“Economic changes may require coordination to be successful. In a world of interdependence, the existence of a better alternative does not necessarily mean advent of change. (…) When interdependence prevails between economic agents, changes would not automatically be made without the guarantee that complementing changes would also be made.” (Chang, 1996:75)

Como expõem Puglisi e Florio (2006), a literatura sobre regulação centra a discussão

da medida da eficiência em setores de infra-estrutura em termos do crescimento da

45

produtividade, preconizada por instrumento de regulação por incentivos. As reformas

institucionais dos setores de infra-estrutura iniciadas em países desenvolvidos foram

implementadas em suas principais diretrizes em países subdesenvolvidos.

No entanto, as características estruturais dos setores são muito diferentes entre estes

países, principalmente no tocante à maturidade de sua rede de ativos e à cobertura dos

serviços de infra-estrutura. Isto significa que as características da transação são muito

diferentes, especialmente no que tange à especificidade dos ativos e à incerteza e à

conseqüência para os distúrbios no ambiente contratual. Uma vez considerada a presença

destas assimetrias, a avaliação do desempenho do setor deve ser feita de forma diferente entre

países desenvolvidos e subdesenvolvidos.

A relação entre o Estado e o setor privado para a provisão de serviços de infra-

estrutura deve ser abordada por intermédio dos modelos de análise da eficiência das estruturas

de governança. O contrato entre Estado (poder concedente) e provedor privado de serviço de

infra-estrutura (concessionário) é a estrutura de governança que pode reunir os mecanismos

de adaptação necessários para promover o investimento em ativos com alto grau de

especificidade.

Apesar dos contratos de concessão tradicional apresentarem vários atributos, a

literatura sobre a avaliação da relação entre Estado e operador privado centra-se

majoritariamente nos modelos de regulação tarifária. Parte expressiva da literatura econômica

sobre setores de infra-estrutura dedicou-se a comparar o efeito da mudança do regime de

regulação pelo custo de serviço para a feita por preço-teto. A migração de um modelo de

regulação com alta flexibilidade de ajuste ex-post para um regime de regulação por incentivos

(high powered incentives) foi um dos aspectos marcantes da reforma institucional dos setores

de infra-estrutura.

Como mencionado acima, diante da presença de forte especificidade dos ativos

mecanismos de salvaguarda, atributos de adaptação cooperativa (tipo C) serão necessários à

estrutura de governança para que as transações se desenvolvam. No caso de setor de infra-

estrutura, a opção por tecnologias com ativos de baixo grau de especificidade é uma

possibilidade remota. Portanto, os mecanismos de adaptação cooperativa na estrutura de

governança entre Estado e operador privado de serviços possuem um papel de destaque.

46

Não obstante, a preocupação com adequação da estrutura de governança cresce com

a incerteza no ambiente de negócios deste setor. A incerteza aumenta em setores que

demandam a realização de investimentos para a expansão da rede, pois a previsibilidade sobre

a expansão da demanda e oferta é menor quando comparada às regiões de elevado grau de

maturidade dos ativos da rede de serviços de infra-estrutura. Esta é uma questão pertinente na

medida que os países em desenvolvimento passaram a adotar modelos experimentados em

países desenvolvidos, apesar das características setoriais serem muito diferentes. As políticas

regulatórias para países em desenvolvimento devem contemplar esta restrição de modo a

evitar ineficiências derivadas da má seleção da estrutura de coordenação de transações

econômicas.

No caso dos países desenvolvidos, como a rede já encontra alto grau de

desenvolvimento, o foco exclusivo das mudanças institucionais pode se dar em ganhos de

eficiência produtiva e redução de custos, dado o nível de expansão da rede e o elevado grau

de difusão dos serviços. Já para os países em desenvolvimento, a expansão da rede de serviços

é um critério fundamental de avaliação da eficácia do modelo institucional vigente. Em países

subdesenvolvidos, e em especial no Brasil, a diversidade entre as regiões e entre as classes de

renda merece atenção especial da avaliação de políticas.

Condizente como a avaliação do conceito de eficiência econômica na abordagem

neo-institucionalista, o efeito de uma maior ou menor adequação da estrutura de governança

nos serviços de infra-estrutura se refletirá na capacidade de realizar investimentos em ativos

específicos e suportar os distúrbios no ambiente das transações. Isto posto, a capacidade de

adaptação da estrutura de governança é condição necessária para se alcançar o crescimento do

nível de universalização de serviços de infra-estrutura. Desta forma, um indicador da

eficiência da estrutura de governança entre concedente e concessionário pode ser expresso

pela expansão dos serviços prestados.

Dada esta apresentação preliminar da importância da estrutura de governança em

determinar a capacidade de realização de investimentos na expansão da rede, esta tese

prossegue discutindo a relação à estrutura de governança entre Estado e setor privado e seu

efeito para expansão da rede e universalização de serviços.

47

II – MODELOS REGULATÓRIOS E UNIVERSALIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE INFRAESTRUTURA.

2.1 - Introdução

No capítulo anterior foi debatido como a abordagem neo-institucionalista poderia

tratar de questões normativas. Como visto, a adequação de determinada estrutura de

governança ao objeto sob a coordenação desta é determinante para a eficiência econômica. A

seleção da forma contratual adequada define a possibilidade de realizar investimentos em

ativos específicos e em ambientes de incerteza. No entanto, não há um conjunto completo de

soluções contratuais que combinem de forma contínua atributos de incentivos de alta potência

(adaptação Tipo A) e de flexibilidade ex-post (adaptação Tipo C), existindo assim a chamada

ineficiência irremediável.

O propósito deste capítulo é apresentar a relação os modelos contratuais entre

Estado e agentes privados e a universalização de serviços de infra-estrutura. Para tanto, o

capítulo se desenvolve em três seções, além desta breve introdução e da conclusão. Na

próxima seção resumem-se as principais características econômicas dos setores de infra-

estrutura, bem como se apresenta o efeito de políticas de separação de vertical sobre a

coordenação de investimento nestes setores.

A seção 2.3 apresenta a estrutura de governança que se tornou clássica após a

reforma institucional dos setores de infra-estrutura. Sob um modelo clássico de contrato de

concessão reúnem-se atributos de incentivos de alta potência, visando à redução de custos na

provisão dos serviços. Como será demonstrada, a maior intensidade destes incentivos resulta

numa perda de flexibilidade para os ajustes ex-post.

Na seção 2.4 discute-se o problema de universalização dos serviços. Para fins

expositivos esta questão é dividida em duas dimensões. A primeira refere-se a um exercício

hipotético de identificar os determinantes estruturais da universalização de serviços, ou seja,

exibir os fatores que influenciariam o nível de expansão da rede de serviços por um operador

privado, na completa ausência de mecanismos institucionais. Após este exercício discute-se o

efeito possível dos mecanismos institucionais presentes na relação entre Estado e setor

privado, para determinar a universalização de serviços. Por fim, discute-se a eficiência da

estrutura de governança em promover a universalização de serviços.

48

Ao final deste capítulo procura-se demonstrar a demanda por estruturas de

governança alternativas na relação entre Estado e setor privado, para promover maior

universalização dos serviços. As questões daí resultantes são avaliar se, e como, modelos

contratuais de Parcerias Público Privadas poderão ser instrumentos eficientes para promover

investimentos na expansão da rede de serviços de infra-estrutura.

2.2 – Características Econômicas dos Serviços de Infra-estrutura

Os conceitos básicos que definem os setores de infra-estrutura são apresentados

nesta seção. Além dos aspectos fundamentais para determinar a característica de monopólio

natural, apresenta-se o fenômeno de externalidade de rede nestes setores. Não obstante, será

considerado o perfil de especificidade de ativos em setores de infra-estrutura e suas

conseqüência para a decisão de investir, assim como o efeito gerado sobre a necessidade de

coordenação de investimentos em um setor que apresenta forte interdependência entre os

estágios da cadeia. Como será discutido, apesar desta idiossincrasia, as políticas de introdução

da concorrência nestes setores centram-se na separação vertical destes setores. As políticas de

concorrência nestes setores apresentam aspectos favoráveis para a universalização de

serviços, mas também restringem tradicionais mecanismos de promoção de universalização de

serviços, como o artifício de subsídios cruzados.

2.2.1 – O Conceito de Monopólio Natural em Setores de Infra-estrutura

Segundo a literatura econômica, determinados setores demandam atenção especial

para a forma na qual as transações são organizadas. Especificidades técnicas e econômicas

moldam a estrutura do mercado e possuem reflexo na decisão de investir e na organização das

transações. Muitas vezes a coordenação exclusivamente pelo sistema de preços é insuficiente

e justifica a criação de regras específicas (regulação) e a constituição de órgãos de Estado para

o monitoramento da estrutura de mercado. Telecomunicações, transporte, água, saneamento e

energia, serviços essenciais ao bem-estar social, são casos típicos de setores que exigem

regulação.

49

Esses setores, muitas vezes chamados de indústrias de rede, possuem algumas

características em comum, com maior ou menor grau de similaridade, como a de

interdependência dos investimentos na sua cadeia de valor, a sub-aditividade de custos em sua

prestação de serviço, marcante presença de externalidade (de rede) no consumo de seu serviço

e, talvez principalmente, seus serviços são bens básicos para o bem-estar econômico e social.

Os ativos aplicados em indústrias de rede possuem longo prazo de maturação, são

intensivos em capital e apresentam grande irreversibilidade (sunk costs). Sobretudo, são

específicos à indústria e à atividade de destino; logo, uma vez realizados investimentos em

setores de rede, os ativos possuem valor de revenda desprezível.

Tais características envolvem estruturas de mercado concentradas, pois implicam em

barreiras à entrada e a saída, resultando em um pequeno número de alternativas de

substituição de contrapartes nas relações de troca.

Indústrias organizadas em rede apresentam grande interdependência operacional e

de investimentos entre seus agentes. No centro deste fenômeno está a presença de ativos

essenciais (essential facilities), que não podem ser duplicados facilmente sem comprometer a

viabilidade econômica das firmas. Diante disto, estruturas de coordenação operacional e de

investimentos serão mais complexas do que o sistema de preços de mercado. Os contratos de

longos prazos e diferentes mecanismos de integração vertical são meios de reduzir custos de

transação.

A análise das indústrias de infra-estrutura em rede sempre esteve associada ao

conceito de monopólio natural de suas atividades produtivas. O fenômeno de monopólio

natural decorre da presença de fortes economias de escala, implicando curvas de custo médio

e marginal declinantes em todo estágio relevante da produção. O conceito mais recente

associa a presença de monopólio natural com a sub-aditividade de custos.

Viscusi, Vernon e Harrington Jr. (1995) mostra que economias de escopo também

seriam uma justificativa para funções custo sub-aditivas; assim, economias de escala passam a

ser condição suficiente, porém não necessária para sub-aditividade de custos. Como destaca

Farina (1997: 118), caso as situações de monopólio ou oligopólio resultem de sub-aditividade

de custos, a presença de um grande número de concorrentes não é possível nem tampouco

desejável.

50

Esta situação é característica das indústrias de rede. Elas apresentam fortes

economias de escopo na operação dos serviços, tornando necessária à coordenação dos fluxos

destes serviços. Principalmente, é marcante a presença de economias de escala na construção

das redes. O fato de uma única firma ser a estrutura que minimiza os custos de produção na

indústria, o que lhe fornece demasiado poder de mercado, é a justificativa de falha de mercado

para que ocorra a regulação de setores caracterizados por um monopólio natural. O dilema de

política é buscar conciliar menor custo de produção sem resultar em prática de preços

monopolistas.

A alternativa teórica dos mercados contestáveis afirma ser desnecessária a regulação

caso uma firma possa entrar e sair deste mercado sem custos, isto é, caso não existam

barreiras à entrada e à saída. Para tanto, algumas pré-condições é a inexistência de ativos

específicos, de grandes requerimentos de capital e de investimentos caracterizados por sunk

costs. Nos setores de infra-estrutura, entretanto, tais fatores são característica essencial. Como

observa Chang (1997), não há como tratar tais setores dissociados destes atributos

básicos.“natural monopoly situations usually happen because of the need for sunk

investment.” (Chang, 1997: 713, grifo no original).

Outro aspecto a ser considerado na análise das indústrias de rede é a dimensão do

produto. Helm e Jenkinson (1997: 3) afirmam que não apenas deve-se considerar a commodity

oferecida em determinada indústria de rede, mas também a disponibilidade do seu serviço,

neste ponto enfatizando o seu caráter de serviço público. Os autores usam como exemplo a

eletricidade, setor no qual os consumidores não pagam apenas pelo seu produto, mas pela

garantia de ter o serviço a qualquer momento.

Ainda no caso do setor elétrico, Oliveira e Santana (1999) fazem a seguinte análise:

“A especificidade dos ativos (intensivos em capital, interdependentes, que geram externalidades positivas e negativas, e de custos e preço voláteis) exige uma intensa cooperação e uma coordenação centralizada ou, do contrário, fica praticamente impossível à otimização do uso dos recursos energéticos disponíveis.” (Oliveira e Santana 1999:109).

Nas indústrias de rede é de crucial importância estabelecer uma coordenação precisa

entre os estágios de produção, pois cada estágio compromete o resultado de toda a cadeia

produtiva de forma sistêmica. Neste caso, a gestão e a rentabilidade dos ativos não depende

51

exclusivamente do agente que os possui, mas também nos demais atores da indústria de rede e

da sua relação com o poder concedente. Configura-se uma situação que evidencia

complexidade dos mecanismos de governança nestes setores.

2.2.2 - Coordenação de Investimentos e Políticas de Separação Vertical

Nesta seção explora-se com mais detalhes a característica de especificidade de ativos

em setores de infra-estrutura e suas conseqüência para a decisão de investir. Além disso,

discute-se o impacto de políticas de separação vertical da cadeia dos setores de infra-estrutura.

Explorar este ponto será importante na presente tese devido ao seu efeito sobre para fins de

universalização de serviços.

Williamson (1991a: 281) afirma que a especificidade de ativos pode se apresentar de

seis diferentes formas. A primeira é especificidade de ativos gerada por fatores locacionais

(site specificity), que ocorre quando as etapas do processo de produção demandam a

proximidade geográfica para economizar em custos de transporte e estoque: mais que isto,

representam situações onde a substituição da parte na transação implica o custo de transferir

unidades produtivas. Uma segunda forma é a especificidade no tempo, que constitui um caso

particular da primeira fonte de ativos específicos; engloba processos produtivos onde o fim de

um estágio de produção e o início de outro dependem de coordenação e sincronismo.

Um terceiro aspecto que determina a especificidade ocorre quando determinado

processo produtivo requer aplicações de capital em ativos dedicados à transação, ou seja,

quando as partes desenvolvem processos ou produtos que não possuem substitutos próximos

no mercado. Nesses casos, a expansão da capacidade produtiva é dimensionada e direcionada

para determinadas demandas, na qual a interrupção do processo produtivo resulta em

ociosidade no uso do ativo e seus custos subseqüentes. Por fim, outra fonte de especificidade

é originada no aprendizado produtivo (learning by doing) desenvolvido para atender

determinada transação, e para isto Williamson atribui o termo human-asset specificity.

Os ativos aplicados em indústrias de rede possuem longo prazo de maturação, são

intensivos em capital e apresentam grande irreversibilidade (sunk costs). Sobretudo, são

específicos à indústria e à atividade de destino; logo, uma vez realizados investimentos em

setores de rede, os ativos possuem valor de revenda muito baixo. Farina et.al. (1997) afirma

52

que a principal fonte de especificidade dos ativos nas indústrias de rede é locacional (site

specificity).

Segundo Chandler (1990: 24), indústrias intensivas em capital requerem uma

cuidadosa coordenação da produção, que se expressa no relacionamento com os fornecedores

e os usuários, ou seja, na coordenação minuciosa da cadeia produtiva. Na análise deste autor,

quanto maior a intensidade de capital das instalações (dos ativos) e maior a escala eficiente

destes, maior o incentivo para se buscar algum seguro (salvaguarda) contra os efeitos danosos

dos custos de transação.

A preocupação de se investir em ativos específicos em atividades produtivas

complementares decorre do risco de se sujeitar a comportamentos oportunistas dos agentes

nos segmentos a jusante ou a montante na cadeia. Nos setores de infra-estrutura, a operação

dos ativos de determinado segmento está amarrada aos demais estágios. Devido às

externalidades de rede, a ação de um agente na cadeia tem reflexos sobre terceiros e sobre o

sistema como um todo. Neste ponto, valem argumentos como os de Langlois e Robertson

(1995) para a caracterizar as indústrias de redes como setores que necessitam de uma

abordagem sistêmica, ou seja, na qual a grande interdependência entre os estágios da cadeia

inviabiliza que investimentos sejam realizados de forma meramente autônoma.

Langlois e Robertson (1995: 37) afirmam que os custos de coordenação entre os

estágios de produção serão tão importantes quanto maior a interdependência entre estes. Mais

do que isto, os autores afirmam que a interdependência é mais relevante quando uma mudança

(investimento ou inovação) em determinado segmento da cadeia requeira mudanças

correspondentes em um ou mais segmentos distintos e a este concatenados.

Os gargalos (bottlenecks) da rede causam custos de transação na medida que estes

geram a ameaça de estratégicas apropriações de renda. Assim, quanto mais um sistêmico um

processo produtivo, menor o grau de liberdade das ações dos agentes econômicos, por

conseguinte, menor a possibilidade que cada estágio do processo invista sem estar em acordo

com as mudanças necessárias nas suas interfaces industriais.

As indústrias de rede são exemplo de interdependência dos processos produtivos.

Qualquer indefinição das responsabilidades dos agentes na cadeia produtiva tem como reflexo

a criação de um ambiente desfavorável ao investimento no setor. Logo, nestas indústrias a

53

eficácia na coordenação dos fluxos de produção é condição necessária para a realização de

investimentos. De acordo com Chang (1996), indústrias de rede estão sujeitas a riscos de

escassez de investimentos que não podem ser facilmente resolvidos pelos mecanismos de

coordenação de mercado puro.

Helm e Jenkinson (1997) também concluem que o perfil dos ativos das indústrias de

rede demanda formas mais complexas que os sinais de mercado para induzir e coordenar os

investimentos. Diante destas características, os setores de infra-estrutura de rede sempre

foram caracterizados por um arcabouço contratual complexo e de longo prazo, como também,

a integração vertical dos distintos estágios de produção.

“Given these asset characteristics it is quite rational for companies to want to sign long-term contracts with customers in order to reduce the risk of investing. In particular, long-term contracts may be needed in order to prevent the hold-up problem.(...) Investments in utilities therefore have a high sunk component and investors are exposed to ex post expropriation of returns” (Helm e Jenkinson, 1997: 6-8)

A verticalização possibilita sincronismo dos fluxos de produção e capacidade de

ajustar a capacidade de produção entre os diferentes estágios de forma mais ágil do que no

caso de firmas independentes. Newbery (2000: 173) acrescenta que a coordenação dos

investimentos é a maneira de se expandir à rede a um menor custo. Esta questão deixa de ser

polêmica quando tais atividades estão integradas em uma firma.

Para Kahn (1989) a verticalização pode propiciar benefícios de caráter dinâmico,

como se nota na seguinte passagem:

“Integration can encourage investment and innovation because of the special incentives to which it may give rise, the particular opportunities it generates, and additional ability that it may confer on a firm to mobilise resources for the purpose.” (Kahn, 1989: 260-1).

Tais incentivos e habilidades a que Kahn (1989) se refere podem ser interpretados

como uma maior adaptação cooperativa que a hierarquia proporciona. Esta forma de

coordenação permite lidar com a interdependência entre as atividades da cadeia e cria um

meio redutor dos riscos associados a investimentos em ativos específicos e em ambientes de

incerteza.

54

A capacidade de o mercado spot suprir as necessidades de coordenação entre os

agentes e funcionar como mecanismo indutor de investimentos em ativos específicos parece

limitada. 11 No entanto, as reformas instituídas nestes setores nos anos 90 tiveram como

característica a separação vertical e restrições sobre a formação de contratos de longo prazo

com objetivo de introduzir concorrência. Cabe destacar que restrições para os agentes

firmarem contratos de longo prazo terão influência sobre o tipo e montante de investimentos

realizados.

Como apresentam Helm e Jenkinson (1997: 11): “If these customers are inhibited in

signing long-term contracts with suppliers, risks cannot be assigned downstream. This will

influence the type and amount of upstream investment.”

Para Joskow (1991) certas restrições à formação de contratos verticais podem limitar

de ganhos de eficiência. Isto porque a ausência de certas formas de coordenação das

transações se reflete em maiores retornos exigidos para considerar um investimento viável.

Newbery (2000: 175) expõe que as políticas de introdução da concorrência nestes

setores se apresentam em duas formas básicas: i) o unbundling, isto é, isolar os segmentos de

monopólio natural dos segmentos potencialmente competitivos; ii) a liberalização do acesso a

terceiros das redes integradas verticalmente em uma determinada firma.

No primeiro, a vantagem da separação vertical é isolar os segmentos de monopólio

natural das outras atividades da indústria. Segundo Newbery (2000: 201), um completo

unbundling ocorre quando as firmas atuam exclusivamente em um segmento da cadeia, sem

possuir quaisquer ativos em outro segmento do setor. O principal problema associado a

verticalização é o chamado market foreclosure, situação na qual uma firma pode promover o

estrangulamento de oferta de determinados serviços às empresas concorrentes e impedir que

atuem no mercado.

A motivação para a separação vertical seria favorecer a entrada de novos agentes na

indústria. Esta política não consiste em uma tarefa simples, diante da forte interdependência

dos agentes nestes setores. A dúvida de Newbery (2000: 187) é se os benefícios trazidos pela

competição esperada pela desverticalização seriam suficientes para compensar a perda de

economias de escopo e de escala.

11Para Helm e Jenkinson, (1997: 9): “very little economic activity is governed purely by spot transactions, even where there are spot markets.”

55

A alternativa de promover acesso da rede a terceiros não envolve necessariamente a

separação vertical dos segmentos da cadeia produtiva. Caso não haja a reestruturação das

firmas estabelecidas integradas verticalmente, será necessário garantir aos entrantes a

capacidade de atender os consumidores através da rede da firma estabelecida, ou seja, garantir

livre acesso (open access) aos ativos que compõem o gargalo da rede.

Segundo Estache e Valletti (1998), o livre acesso é um meio de facilitar a

competição tanto a jusante, quanto a montante do segmento que possui características de

monopólio natural, o que demanda regulação. Estache e Valletti (1998: 3) afirmam que a

regulação do segmento de gargalo da rede pode ser feita tanto na estrutura quanto na conduta.

O âmbito da estrutura envolve o controle de fusões, onde se podem incluir restrições a joint-

ventures, e a remoção de barreiras à entrada. Já a regulação da conduta, grosso modo, resume-

se ao controle dos preços de acesso.

A regulação torna-se uma atividade mais complexa e não menos com a introdução

do livre acesso à rede. Novas atividades passam a compor o quadro regulatório, com a

formulação de regras para as tarifas de acesso e a arbitragem de conflitos quanto aos critérios

do acesso às redes. “Regulating for competition has proved much more difficult than

regulation of monopoly” (Helm e Jenkinson 1997: 10)

Estache e Valletti (1998: 23) frisam ainda que há o problema da tarifa de acesso

estar sujeita a múltiplos critérios, onde diferentes objetivos e políticas propõem métodos

alternativos para o cálculo da tarifa. Os autores concluem que o mecanismo de preço de

acesso não deve ser utilizado para múltiplos fins, e sim para criar instrumentos alternativos

para promoção de finalidades específicas, por exemplo, garantir a viabilidade econômica de

ativos de rede ainda não amortizados.

Estache e Valletti (1998) também consideram importante ter atenção ao problema de

hold-up nos setores em que o acesso é liberado aos ativos específicos e de longo prazo para

reposição do capital investido.

“Once relevant investments are sunk, there may be post-contractual opportunism on the part of competitors. The entrants do not want to contribute to financing of the new investment and the incumbent ends up stuck with a larger than fair share of the cost. If anticipated by the incumbent and if bottleneck has no other potential use (asset specificity), the risk deters initial and future investment. This

56

is referred to as the ‘hold-up’ problem.” (Estache e Valletti 1998:22)

Em resumo, nas situações que o setor de infra-estrutura é fortemente demandante de

investimentos, as políticas de desverticalização criam incertezas sobre a remuneração do

capital investido. O efeito é a possível redução de investimentos nestes setores. Não obstante,

a atividade regulatória envolverá maiores níveis de custo e complexidade. A discussão sobre

os regimes clássicos de regulação econômica é realizada na próxima seção.

2.3 –Contratos de Concessão e a Regulação de Setores de Infra-estrutura

Nesta seção são apresentados os regimes clássicos de regulação. A regulação pelo

custo de serviço foi amplamente empregada antes do processo de reforma institucional. Esta

reforma estabeleceu o regime de preço-teto como modelo básico de regulação tarifária

presente nos contratos de concessão de serviços de infra-estrutura. Como será discutido, não

há como afirmar a superioridade absoluta de um destes modelos, uma vez que cada um possui

uma vantagem relativa para atender determinado objetivo. De fato, seus atributos contratuais

apresentam uma combinação diferente de mecanismo de adaptação de alta potência e de

flexibilidade ex-post.

Além disso, o objetivo desta seção é apresentar o modelo clássico de contrato de

concessão e seus atributos de coordenação entre Estado e setor privado. Estes modelos de

concessão além de serem o arcabouço formal de relacionamento entre Estado e agentes

privados, reúne dois aspectos fundamentais para a discussão de universalização de serviços. O

primeiro é que está em suas cláusulas o regime regulatório, usualmente o modelo de

regulação por preço-teto. O segundo é definir o pagamento ao Estado de um valor de outorga

para a exploração do serviço de infra-estrutura durante um prazo delimitado.

57

2.3.1 – Regimes Clássicos de Regulação Econômica.

Durante a década de 90, no Brasil e outros países em desenvolvimento, serviços de

infra-estrutura foram transferidos para a operação e provisão pela iniciativa privada. O

modelo clássico de transferência desta atribuição ao setor privado ocorre por meio de

contratos de concessão. Em virtude deste processo, o Estado deixa a função de provedor dos

serviços para exercer atividades regulatórias.

O início do processo de reforma institucional nos setores de infra-estrutura iniciou-se

na década de 80 nos países desenvolvidos, com destaque para a Inglaterra. A introdução da

proposta de regulação por preço-teto (price cap),12 em substituição ao tradicional modelo de

custo de serviço (rate of return regulation13), obteve grande difusão entre os países que

introduziram mudanças institucionais nestes setores.14 (Armstrong, Cowan e Vickers, 1994:

165).

O modelo regulatório por preço-teto consiste em fixar um limite máximo para o

reajuste do preço em um determinado período, enquanto a regulação pelo custo de serviço

regula (restringe) o lucro da firma regulada. Mais precisamente, esta regulação impõe um

limite ao reajuste de preços no valor de um índice geral de preços, menos um fator de

desconto dos ganhos de produtividade. Portanto, numa perspectiva geral, a regulação por

preço teto deve ser analisada nestes dois parâmetros chave, o indexador de preços e o fator de

produtividade.

Quanto ao indexador de preços, deve-se utilizar um índice geral para tornar claro o

procedimento regulatório, inclusive para os consumidores. A escolha de um índice restrito, ou

específico, além de possivelmente ser menos transparente, pode gerar uma circularidade entre

o índice de preços e a tarifa regulada. Índices setoriais poderiam proporcionar à firma

regulada o poder de influenciar o resultado obtido na apuração dos preços, dada a participação

de seu insumo na demanda da indústria específica.

O fator de produtividade (fator X) é a variável que o regulador possui para induzir o

regulado a um comportamento que privilegia a redução de custo, além de repassar aos

12 Sendo mais preciso, a proposta chamava-se RPI-X (Retail Price Index). Nesta impõe-se um limite superior ao reajuste dos preços regulados. 13 O rate of return regulation é uma proposta regulatória que impõe um limite à taxa de lucro obtida pela firma regulada.

consumidores os ganhos esperados de produtividade. Contudo, tal escolha deve considerar um

nível de retorno salutar ao funcionamento da firma regulada, ou seja, o fator de produtividade

não deve ser a origem de dificuldades financeiras para o concessionário. Por outro lado,

também não pode negligenciar os possíveis ganhos de produtividade passíveis de serem

repassados aos consumidores. A determinação do fator de produtividade deve considerar o

ritmo de mudança tecnológica de cada setor, no intuito de exigir ganhos de produtividade

maiores dos setores tecnologicamente mais dinâmicos.

Um outro fator característico da regulação pelo regime de preço-teto é a

possibilidade de se estabelecer preços tetos diferenciados entre produtos, ou mesmo entre

classes de consumidores. Desta forma, a regulação por este modelo pode limitar a capacidade

da firma regulada utilizar-se de subsídios cruzados nas tarifas.

Baseado no estabelecimento de um limite à taxa de retorno da empresa regulada, a

regulação pelo custo de serviço, tem como princípio a mensuração da base de capital e das

despesas da firma decorre problemas de assimetria de informação entre regulador e regulado,

o que eleva os custos de transação numa relação contratual.

Para uma melhor compreensão da regulação pelo custo de serviço, Viscusi, Vernon e

Harrington Jr. (1995) apresenta o seguinte modelo de cálculo deste procedimento regulatório.

58

n

)(1

RBscqpi

iii +=∑=

(2.1)

Sendo:

RB: base de ativos da firma regulada; s : taxa de retorno regulada; pi : vetor de

preços dos n serviços ofertados; e qi. : vetor de quantidade destes serviços.

Neste modelo RB é a base de ativos da firma regulada sobre o qual incide a taxa de

retorno (s) permitida (contratada) pelo regulador. Neste cálculo, pi representa o vetor de

preços dos n serviços ofertados e qi. o vetor de quantidade destes serviços.

Esta fórmula informa que os custos deverão ser cobertos pelas receitas e que a

diferença (lucro) daí resultante seria o valor do produto da taxa regulada pela base de ativos.

59

Estando a taxa de lucro limitada pelo parâmetro s, o montante de lucros a ser obtido varia de

acordo com a base de ativos operacionais (RB)15 a ser considerada para o cálculo.

Diante da presença de assimetrias de informação entre regulador e regulado, existe a

possibilidade de ações oportunistas quanto à declaração do real valor de RB e quanto a que

despesas devem ser consideradas. Tal oportunismo seria favorecido em ambiente inflacionário

e em setores de constante inovação tecnológica, obrigando a um encurtamento do intervalo de

revisão contratual devido às alterações no valor dos ativos.

Segundo Viscusi, Vernon e Harrington Jr. (1995: 379), a análise da regulação pelo

custo de serviço poderia ser dividida em dois aspectos, um referente ao lado direito da

equação (2.1) (rate level problem) e um segundo, chamado de rate structure problem,

referente ao lado esquerdo da equação. O problema central do lado direito da equação é

encontrar um nível de taxa de retorno apropriado ao bom funcionamento da firma, sem gerar a

inviabilidade financeira, assim como superar as dificuldades em determinar quais são os

ativos operacionais da firma e quais valores devem ser computados.

Quanto aos problemas de rate structure, trata-se da discriminação entre

consumidores e produtos ofertados. O lado esquerdo da equação apresenta a receita gerada

pela venda de todos os produtos que a firma estaria habilitada a ofertar, sem discutir os preços

praticados em mercados específicos. Isto possibilita a prática de subsídios cruzados, e o

financiamento intra-setorial para a expansão de serviços em regiões de baixa rentabilidade.

Existem vários critérios de avaliação do modelo de regulação por preço-teto, tendo

como parâmetro a regulação pelo custo de serviço. Os aspectos que possuem maior destaque

são o custo do aparato regulatório; o incentivo à eficiência produtiva das firmas; o incentivo

aos investimentos na expansão e a qualidade do serviço.

Embora todas estas questões sejam importantes, para fins de universalização de

serviços é fundamental a garantia à expansão da rede de serviço, principalmente em países

sub-desenvolvidos. Nestes países as redes se encontram em fase muito incipiente, quando

comparadas aos países desenvolvidos e, assim, se encontrem mais sujeitas aos efeitos de

incerteza do comportamento de demanda. Contudo, cabe abordar de forma breve os demais

15 O termo ativo operacional refere-se ao capital fixo empregado exclusivamente na atividade fim da empresa, desta forma, por exemplo, excluem-se os ativos do escritório central de uma firma multidivisional.

60

critérios de avaliação dos modelos regulatórios, antes de aprofundar a discussão sobre o tema

de incentivo aos investimentos.

O custo da regulação é um critério relevante, não só pela ótica dos recursos

requeridos para atuação do órgão regulador, mas também pela possibilidade de captura. No

caso de regulação pelo custo de serviço existe a necessidade de mensurar a base de capital da

firma regulada, para assim aferir o seu retorno em determinado período. Tal procedimento

requer, então, um aparato regulatório capaz de apurar quais ativos devem ser alocados na base

de cálculo para aplicação da taxa s.

Adotando a abordagem dos custos de transação, a presença de assimetria de

informação entre a firma e o regulador e comportamentos oportunistas quanto à declaração de

dados contábeis, sobretudo os dados de RB, propiciam o surgimento de custos de transação na

regulação por custo de serviço. Neste aspecto, a regulação por preço-teto sempre foi tida

como uma alternativa mais econômica, pois as funções do regulador seriam mais simples,

objetivas e transparentes.

O procedimento regulatório com o preço-teto torna-se simplificado, por não estar

ligado diretamente aos dados contábeis da empresa regulada. Ao contrário da regulação por

custo de serviço, uma regulação por preço teto, teoricamente, quebra o vínculo entre o custo

da firma regulada e o processo de fixação de preços (Braeutigam e Panzar 1993: 193). Isto

cria os incentivos para redução de custos e de ganhos de produtividades. Devido a esta

indução de comportamento, a literatura se refere a modelos de preço-teto como regulação por

incentivos, nas quais a prática regulatória seria mais simples. Nos termos da abordagem da

Economia dos Custos de Transação, isto significa que a relação entre Estado (regulador) e

concessionário será regida por uma estrutura de governança que prioriza os incentivos de alta

potência (adaptação tipo A).

Porém, a regulação por preço teto na prática é mais complexa que expressa na

concepção teórica. “The price cap scheme have resulted in a complicated, more intrusive, less

transparent system than was originally intended.”(Xavier, 1995: 614). Grande parte das

dificuldades e problemas fica a cargo da determinação do fator X, pois deve ser calculado de

forma a permitir um retorno adequado ao funcionamento da firma, como também a

redistribuição dos ganhos de produtividade. O fato é que a complexidade dos modelos de

regulação por incentivos, sobretudo os que envolvem separação vertical da cadeia produtiva,

61

geram custos de regulação mais elevados do que os supostos teoricamente. Dadas estas

considerações, não se pode afirmar com tanta certeza que a economia em custo de regulação

se apresenta como um grande mérito da reforma institucional.

Quanto ao incentivo à eficiência produtiva, a regulação por preço-teto induz o

concessionário a buscar ganhos de produtividade acima do valor X estabelecido. Os ganhos

excedentes ao fator X serão apropriados até pelo menos a revisão desse fator. Logo, quanto

mais eficiente em reduzir seus custos, maior o ganho da firma regulada, reforçando o perfil de

regulação por incentivos.

Um aspecto negativo da regulação por custo de serviço decorre do meio pelo qual a

firma pode obter o nível de lucro permitido. Para isto, caso aumente desnecessariamente os

custos, gerando o fenômeno de “custos inflados”, não terá forte impacto sobre sua

remuneração do capital investido. Alternativamente, o montante de lucro pode ser elevado por

intermédio da expansão da base de capital, sobre a qual a taxa de retorno é calculada.

(Braeutigam e Panzar, 1993). Portanto, um concessionário regulado por custo de serviço tende

a incorporar ativos independentemente do retorno marginal que este venha a proporcionar.

Tanto a expansão de capacidade, sem relação direta com o retorno produtivo real que

esta traz, e o aumento indiscriminado de custos significam ineficiência produtiva, pois a

maximização de lucros da firma não tem contrapartida na minimização de custos. A

assimetria de informação entre o regulado e regulador permite a negligência do provedor de

serviço quanto ao controle de custos. O custo no qual o regulador incorreria para monitorar

plenamente a eficiência produtiva do concessionário é elevado em qualquer modelo

regulatório.

A qualidade do serviço ofertado pelo regulado é um parâmetro relevante para a

análise das propostas regulatórias devido ao impacto sobre a utilidade dos consumidores.

Além disto, deve-se atentar ao fato de reduções na qualidade significarem aumento de preços

de forma implícita (Xavier 1995: 611). Sobretudo, este é um aspecto importante quando

tratamos de regulação por preços-teto, na qual a firma pode utilizar a queda da qualidade para

obter um maior retorno sobre o capital investido. O fator X induz à redução de custos, mas

também, gera uma tendência ao sub-investimento para melhoria da qualidade dos serviços, já

que este esforço representaria uma elevação do seu nível de custo.

62

Como no caso da expansão dos serviços prestados a consumidores de baixo retorno,

a qualidade do serviço tende a ficar abaixo da média dos demais usuários. Isto é reflexo do

menor nível de receita por ativo empregado para a provisão destes usuários. Diante disso, são

necessários esforços adicionais de monitoramento contratual, como expõem Armstrong,

Cowan e Vickers. (1994: 180): “Both theory and evidence of British Telecom quality

problems in the early years after privatization indicate that a price cap must be supplemented

by quality regulation.”

Alguns autores, como Armstrong, Cowan e Vickers (1994), diante desta limitação da

regulação por preço-teto, afirmam que a forma de monitoramento complementar da qualidade

é o estabelecimento de metas para a qualidade do serviço. Para Xavier (1995: 611): “Ensuring

that quality of service for low-revenue customers also improves may require formal

regulatory monitoring assessment and publication of performance information.”

No entanto, segundo a análise de Barzel (1997), a regulação da qualidade não

consiste em uma tarefa fácil, principalmente para produto (serviço) cujos atributos dos

serviços sejam de difícil mensuração. Este é o caso de vários serviços de infra-estrutura na

medida que as condições de qualidade podem sofre variações nas especificações técnicas, por

exemplo, regularidade da freqüência da energia disponível. Coloca-se em dúvida a eficácia de

tais aparatos regulatórios, devido à complexidade de se regular a qualidade do serviço e dado

o custo de se obterem informações sobre uma variável a qual o regulado possui maior grau de

controle. O resultado é um maior custo regulatório (monitoramento contratual) do que suposto

teoricamente para os modelos de preço-teto.

Quanto à regulação por custo de serviço, a qualidade do serviço prestado tende a não

sofrer reduções, na medida que o custo decorrente dos investimentos em qualidade são

incorporados ao cálculo da taxa de retorno s permitida pelo regulador. Esta tendência amplia-

se na medida que a taxa de retorno contratada pelo regulador for superior ao custo de capital.

Na regulação por custo de serviço existe incentivo para o investimento em expansão

da rede de ativos. Ao aumentar a base de ativos, reduz-se a taxa de retorno observada pelo

regulador, porém o volume de lucros obtido é maior. Além disto, caso a taxa de retorno

contratada seja maior que a taxa de juros referencial (preço do capital), há um subsídio ao

capital da firma regulada que induz a substituição de trabalho por capital. Este fenômeno é

conhecido na literatura sobre regulação como efeito Averch-Johnson. Diante disto, o

63

crescimento do lucro da firma regulada implica na expansão da rede de ativos, sem considerar

a correspondência direta em relação ao retorno obtido com a receita marginal gerada a partir

do investimento adicional (Viscusi, Vernon e Harrington Jr., 1995: 387-91).

Diante disto, sob um regime de preço-teto, e dado o direito de propriedade da firma

sob a expansão da produção (rede), alguns potenciais consumidores (usuários) podem ter sua

demanda não atendida. A lógica econômica da expansão da rede obedece à densidade de

utilização dos serviços. Para um mesmo nível de renda per capita, regiões com baixa

densidade populacional são menos atrativas pelo menor retorno que esta expansão da rede

proporciona. A expectativa é que o retorno marginal obtido com a expansão da rede neste

caso pode ser inferior ao custo deste investimento.

Já na regulação por custo de serviço, investir em tais mercados torna-se rentável na

medida que se obtém o retorno pela base de capital (RB), independentemente do retorno

específico que apresentaria determinado consumidor (ou categoria de consumidor) como

ocorre na regulação por preços-teto. Diante desta limitação do price cap em garantir expansão

da rede, os reguladores estabelecem cláusulas ad hoc, como metas de investimento que se

somam às metas de qualidade.

Por seu turno as metas estão sujeitas a custo de monitoramento de averiguar o

cumprimento dos planos de investimento, ou seja, cresce o custo de governance

comparativamente à concepção original do regime de preço-teto. Novamente, não uma

evidência clara sobre as vantagens em termos de custo de regular por preços-teto em relação à

regulação por custo de serviço.

Diante dos tópicos discutidos acima, é fácil intuir que o regime de preço-teto será um

modelo mais adequado quanto menor a demanda por investimentos em expansão da rede no

contexto em que for aplicado. Isto porque: i) reduz o custo da regulação; ii) mantém os

incentivos em redução de custos; iii) lida de forma mais simples com a questão da qualidade;

iv) reduz o problema de criar metas para a forçar a universalização sob um regime que tem

por natureza reduzir tais aplicações de capital. Em outras palavras, por ser um modelo que

preza pela introdução de incentivos de alta potência, requisitos de coordenação adicionais que

demandem atributos de perfil mais cooperativo serão de difícil conciliação com esta proposta

regulatória.

64

A comparação entre países desenvolvidos com redes de infra-estrutura densas e

maduras e países em desenvolvimento com redes incipientes é importante. Nota-se, portanto,

possíveis situações de conflito ao aplicar o mesmo modelo com regiões onde as

idiossincrasias locais demandam resultados muito diferentes. Vale notar que tal diversidade

pode estar presente em um mesmo país. O Brasil é o exemplo claro devido as suas

disparidades regionais.

Os regimes de regulatórios são circunscritos aos contratos que regem a relação entre

regulado (concessionário) e regulador (poder concedente). Na próxima seção discutem-se as

características principais dos contratos de concessão clássicos.

2.3.2 – Características Econômicas do Contrato de Concessão Clássico.

Nesta seção apresentam-se as principais características de contrato de concessão

clássico de um serviço de infra-estrutura, complementando a discussão realizada na seção

anterior sobre os principais modelos regulatórios. O instrumento formal que rege a relação

entre poder concedente e concessionário é o contrato de concessão que descreve, entre outros

aspectos, o modelo regulatório adotado. Trata-se de uma estrutura de governança que

coordena a relação entre Estado e setor privado na provisão de serviços de infra-estrutura.

O contrato de concessão garante o direito a operar um ativo essencial para a prestação

de serviço de infra-estrutura e para tanto ser remunerada, por um determinado período de

tempo. Ao término do contrato de concessão o direito de propriedade retorna ao Estado, que

pode realizar nova licitação.

Em certas situações a concessão envolve a construção de ativos específicos à

operação. A presença de ativos específicos resulta no clássico problema de hold-up, na

relação entre as partes de um contrato de concessão. O risco de um término antecipado de um

contrato resultará na ausência de atores privados na provisão de serviços públicos, mas

também na maior remuneração de capital exigida pelo ator privado. O incentivo para investir

depende da duração do contrato devido à natureza específica dos ativos e seu perfil sunk cost.

Diante das características envolvidas na prestação de serviços de infra-estrutura, o

perfil dedicado de seus ativos e o longo prazo de concessão, o contrato será inevitavelmente

incompleto. Os atributos de regulação por incentivos são uma ferramenta para reduzir o custo

65

de monitoramento, mas não se trata de uma solução integral diante de alto grau de incerteza.

A probabilidade de distúrbio cresce em ambientes mais instáveis ou em processo de mudança,

como em setores de infra-estrutura não maduros. Tentar antecipar todos os pontos de possível

conflito pode ser mais custoso e impreciso. Um contrato que introduza meios de endogenizar

o ajustamento entre as partes, com atributos de adaptação ex-post (tipo C), favoreceria o

investimento de atores privados em ativos específicos.

“Disadvantages of concessions include the need for complex design and monitoring systems when multiple targets are involved, the inability to cover every conceivable contingency, and the difficulty in enforcing contracts.” (Guasch, 2005: 31).

Três aspectos básicos caracterizam um contrato de concessão: i) valor de pagamento

pelo ente privado vencedor da licitação ao Estado (valor da concessão ou outorga), ii)

montante esperado de remuneração do concessionário pela prestação do serviço; iii) forma de

viabilizar a remuneração do concessionário. A forma como estes aspectos são dispostos no

contrato de concessão determina o sistema de incentivos entre as partes e os custos de

transação durante a execução do contrato.

O concessionário (firma regulada) é o vencedor de um processo licitatório responsável

pela seleção de uma melhor proposta para a concessão. Procedimentos licitatórios podem

selecionar o vencedor pela menor tarifa cobrada dos usuários do serviço ou pelo maior valor

de pagamento de outorga ao Estado pela cessão temporária dos direitos de propriedade para a

prestação de serviços.

Em contextos de grande necessidade de investimentos para expansão da rede, o

pagamento de da outorga onerosa pode ser um fator complicador para a universalização. Isto

por que a remuneração do concessionário precisa cobrir os ativos investidos na expansão, mas

também o pagamento ao Estado pelo direito de prover o serviço.16

Um contrato, como qualquer estrutura de governança, determina a repartição de renda

entra as partes. O ponto é como se define esta repartição numa relação contratual entre poder

concedente e concessionário. Uma interpretação mais simples resultaria em negar a relação de

repartição de renda entre estas partes porque não se evidencia uma transação comercial.

Todavia, o fato de ocorrer um pagamento pelo direito de propriedade para a exploração de

16 No próximo capítulo será apresentado como os contratos de concessão em PPP se diferenciam de contratos de concessão clássicos no quesito de pagamento pela outorga.

66

serviço e que ao final do contrato o valor residual dos ativos retorna ao Estado estabelece uma

relação de troca. Esta questão aumenta em importância com o montante de investimentos a

serem realizados pelo agente privado, não só pelos maiores requisitos de remuneração deste,

mas pela criação de quase-renda associada aos ativos específicos e seu risco de hold-up pelo

poder concedente.

A sujeição a mudanças nas “regras do jogo” têm impacto ainda mais significativo

sobre a formação da expectativa de retorno sobre um ativo específico. A remuneração do

capital empregado dependerá da relação como o regulador, dado que este possui poder

decisório sobre variáveis importantes para o desempenho do concessionário. Como explica

Farina et. Al. (1997: 60), diante do perfil de ativos específicos e irrecuperáveis (sunk costs), a

obtenção de receitas necessárias para a provisão do retorno do capital privado dependerá da

continuidade na prestação de serviços.

Segundo Menard (2001), os sunk costs incorridos nos investimentos em ativos de

indústrias em rede requerem garantias de retorno do capital, ou seja, salvaguardas para o risco

de perda da quase-renda de ativos específicos. Caso os direitos de propriedade sobre os ativos

específicos estejam sujeitos a uma redefinição, e se a compensação a ser paga nesta

redefinição seja inferior à quase-renda do ativo, então os agentes passarão a incorporar este

risco no cálculo de viabilidade de sua decisão de investir.

O efeito daí decorrente é que a ausência de salvaguardas implique o direcionamento

dos recursos para outras finalidades. Como, no caso de setores de infra-estrutura não há

opções de ofertar serviços sem o envolvimento de ativos específicos, o efeito pode ser a

menor participação de agentes privados. Como abordado no capítulo anterior sobre a relação

entre especificidade de ativos e salvaguardas, isto significa que em determinadas situações à

ausência de salvaguardas, ou seja, sem estruturas de governança mais cooperativas, o

resultado pode ser a ausência de investimentos nestes setores.

Apesar dos benefícios dos incentivos de alta potência em reduzir custos, as

limitações de um contrato antecipar todos os potenciais conflitos entre as partes significam

uma ausência de garantia perfeita à apropriação de retorno. Nos termos da abordagem de

Williamson, isto significa que sempre haverá uma ineficiência irremediável que implicará

investimento em setores de infra-estrutura, assumido por agentes privados, em níveis

inferiores ao socialmente desejável. Chang (1997: 713) afirma que as reformas regulatórias

67

dedicam grande atenção ao estabelecimento de um credible commitent entre regulador e

regulado. Tal comprometimento muitas vezes representa inflexibilidade para alteração do

contrato17 para buscar adaptações a mudança no ambiente econômico das transações.

Novamente, este problema esta diretamente relacionado à idiossincrasia dos

investimentos envolvidos e a incerteza no ambiente das transações. Por exemplo, a incerteza

de demanda requer mecanismos de compensação ao concessionário, pois, caso contrário,

haverá reflexo sobre o montante e perfil dos novos investimentos no setor. Estes problemas

serão tão maiores quanto mais incipiente o grau de desenvolvimento do setor.

Os modelos de regulação econômica criam a estrutura de incentivos e determinam o

esforço da firma regulada na redução de custos, na manutenção da qualidade do serviço e na

expansão dos serviços. A distribuição dos riscos é conseqüência do modelo adotado, tendo no

preço-teto e no custo de serviço casos polares. Estes modelos de regulação econômica são

análogos aos modelos de contratuais de preço fixo e de cost-plus e sugerem, grosso modo, um

modelo de remuneração variável e de remuneração fixa, respectivamente.

A regulação por custo de serviço é de fato um contrato tipo cost-plus, onde os riscos

de sobre custos de investimento e operação, como qualquer risco tecnológico, são repassados

ao demandante. No caso do contrato de concessão, o regulador como intermediante do usuário

do serviço chancela os custos incorridos pelo concessionário e remunera o capital privado. Tal

contrato não cria incentivos para a redução de custos, uma vez que o concessionário não se

apropria deste benefício, ou melhor, o retorno de seu capital está livre deste risco.

“Any rewarding system that gives the firm a fixed net remuneration, such as cost-plus payment, tends to generate poor incentives to improve upon an existing situation.” (Crampes e Estache 1997: 5)

Por outro lado, como discutido acima, contratos no formato de cost-plus serão mais

favoráveis para adaptações perante as incertezas tecnológicas e de demanda, pois permitem os

ajustes e não expõem integralmente o investidor privado. Consoante a este fator, neste modelo

criam-se incentivos para a expansão do serviço, bem como a garantir a qualidade do mesmo

devido ao investimento ser remunerado pela base de capital empregada e estar mais protegido

17 “A estabilidade estrita das regras é uma renúncia ao aprendizado. [Embora seja] o mecanismo fundamental de garantia de apropriabilidade do retorno gerado pelos ativos específicos e irrecuperáveis.” . (Farina et.al., 1997:65)

68

a riscos. No entanto, o monitoramento deste tipo de contrato é muito mais custoso decorrente

do detalhamento de informações assimétricas ser muito elevado.

O regime de regulação por preço-teto cria esforços do concessionário para a redução

de custo. De fato, trata-se de um típico caso de contrato de preço fixo, onde todos os custos,

salvo eventos de força maior, devem ser absorvidos pelo prestador de serviço. Como

corolário, não há incentivos para a expansão de rede ou quaisquer investimentos que o

regulado não tenha respaldo no retorno do capital empregado. No entanto, regras regulatórias

complementares, como metas de expansão e de qualidade pretendem ser o enforcement para

se contrapor à rigidez criada em um contrato de preço fixo. Esta regulação complementar

reduz o benefício em economizar nos dispêndios com monitoramento. Logicamente, quanto

menor a necessidade de mudanças, ou seja, quanto menor o nível de investimentos

necessários para a prestação de serviços menor este custo.

“Without some sharing of the risks facing potential concessionaire, none will be attracted. In those cases (and depending on where risks come from), rate-of-return regulation allows a risk sharing with users of service that is not as easily structured under price-cap regulation.” (Crampes e Estache 1997: 13)

Assim como existe um conjunto de soluções híbridas entre os modelos contratuais de

cost-plus e preço fixo, é possível conceber modelos regulatórios que combinem elementos da

regulação pelo custo de serviço ou por preço-teto. Para Crampes e Estache (1997) pode ser

considerada a existência de um conjunto de possibilidades contratuais entre o preço fixo e o

cost-plus, sendo mais indutores de redução de custo e de participação privada18 em

investimentos, respectivamente. De fato o autor concebe que modelos que mesclem

remuneração fixa e variável tendem a ser mais interessante19.

“The reward of the franchise through market sales and/or through subsidization will be a compromise between poorly-incentive-but-secure cost-plus rules and low-cost-inducing-but risky price-cap rules.” (Crampes e Estache, 1997: 5)

O fato é que a eliminação de custos de transação ex-post dificilmente ocorre. Passa-se

de uma substituição de um monitoramento contratual extenso e constante por um crescimento

18 Estache e Crampes (1997) corroboram o que foi expresso aqui por enfatizar que um sistema de cost-plus reduz os ricos e consigo a remuneração do capital para a participação de uma licitação de concessão. 19 Este conceito será retomado no próximo capítulo ao se discutir os modelos contratuais em Parceria Público Privada

69

na renegociação dos termos do contrato de concessão, sujeitando a incerteza desta

negociação. Guasch (2005:78) argumenta que a incidência de renegociações contratuais

cresce quanto maior for a alocação de riscos para o concessionário. Este é um resultado

corroborado no estudo de Laffont et. al. (2003) para os contratos de concessão na América

Latina, no qual os autores identificaram a associação entre a adoção da regulação por preço

teto e os pedidos de renegociação contratual.

Assim, consoante aos argumentos da Economia dos Custos de Transação, a presença

de custos de transação ex-post é inexorável às estruturas de governança na delegação de

serviço de infra-estrutura à iniciativa privada, sob o modelo clássico de concessão. Em outras

palavras, os modelos contratuais que busquem antecipar todas soluções por meio de

incentivos de alta potência poderão implicar maior número de renegociações a posteriori.

Quanto menor a flexibilidade dos mecanismos contratuais em promoverem a

adaptação às mudanças no ambiente de transações, maior a necessidade renegociações

contratuais entre concessionário e poder concedente. A conseqüência é o crescimento de

processos de revisão do equilíbrio econômico financeiro de contratos de concessão.

Guasch (2005) percebeu a presença da ineficiência irremediável na definição de uma

estrutura de governança em contratos de concessão de setores de infra-estrutura. Diante disso,

qualquer afirmação de vantagens inequívocas de um determinado modelo parece uma

conclusão precipitada.

“The economic literatures suggests that incomplete contracts can lead to inefficiencies that are exacerbated by weak enforcement and in some cases can also lead to ex-post inefficiencies that cannot be resolved even through renegotiation”(Gash, 2005 : 77)

Dadas as limitações, o importante parece ser encontrar a estrutura relativamente mais

eficiente para as características da transação. Um processo de renegociação contratual, apesar

de seus custos intrínsecos, pode promover ganhos de eficiência. “Renegotiation can be seen

as a way of correcting past mistakes” (Guasch, 2005:71). O problema é se não existirem

parâmetros básicos que definem os termos dessa negociação no modelo contratual e

regulatório. Isto ocorre em modelos de concessão que vislumbrem antecipar todas soluções

ex-ante. O efeito prático disso é que o resultado do processo de renegociação pode ser de

difícil antecipação e ser uma fonte adicional de incerteza.

70

Vale enfatizar que as limitações do contrato e seus riscos estão diretamente associados

com o grau de incerteza no qual a transação se insere. Assim, diante do perfil específico e

dedicado dos ativos em setores de infra-estrutura e quanto maior o requerimento de

investimentos em ativos novos (green field), condição necessária à expansão de serviços para

a universalização, mais complexa a relação de delegação do serviço a agentes privados.

Portanto maior a capacidade de adaptação requerida da estrutura de coordenação.

“If the project needs some preliminary specific investment as for most infrastructure projects, the firm should have some leadership in the renegotiation process to prevent an under-investment that would occur if the regulator were the one who can decide when and how to renegotiate.” (Crampes e Estache 1997: 7)

A incerteza de mercado e de custos derivada de um investimento novo não se

apresenta somente para o monitoramento ex-post dos contratos, mas também custos de

transação ex-ante, devido à dificuldade de se obter informações precisas para definir os

termos do contrato. Em suma, conceder um direito de exploração de um mercado incipiente é

muito mais difícil que fazê-lo em mercados maduros em ativos e em demanda.

Na próxima seção aprofunda-se a discussão realizada nesta seção tendo como foco as

dificuldades e instrumentos para a promover o crescimento da universalização dos serviços de

infra-estrutura.

2.4– O Dilema da Universalização de Serviços de Infra-estrutura.

A universalização de serviços é tratada por diferentes abordagens na literatura e seu

conceito acaba por ter várias definições. Contudo, a definição mais geral para o termo

associa-se com acesso aos serviços de infra-estrutura, apesar de alguns autores buscarem não

só considerar o acesso à rede de utilidades, mas também o padrão de consumo. O fato é que

objetivo principal da discussão sobre universalização dos serviços é voltado para as formas de

garantir que o maior número possível de pessoas estejam conectados à rede de serviços.

Estache e Goicochea (2005) destacam três aspectos básicos para determinar a

performance de setores de infra-estrutura, como se nota na seguinte passagem:

“A particular sector is considered to improve its economic performance if access to the service increases among the population, if

71

the services becomes more affordable, and/or if quality of the service improves.” (Estache e Goicochea 2005: 2)

Vale o comentário que o acesso é a condição básica para que os indicadores de

modicidade e de qualidade dos serviços possam ser discutidos. Neste sentido, para o debate de

universalização, a avaliação dos determinantes de um maior nível de acesso é peça central.

Contudo, o acesso residencial à rede de serviço é apenas uma proxy da universalização do

serviço, uma vez que o nível de utilização pode ser precário. Em energia elétrica, por

exemplo, diversas aplicações de energia elétrica podem ser substituídas pelo consumidor por

energético de menor custo apesar de sua qualidade muito inferior. Este processo ocorre sem

afetar o indicador de acesso.20

Outro aspecto é que dependendo da fonte de informação tais medidas capturam o

acesso informal ao serviço, como as ligações clandestinas à rede de água ou energia.

“Access indicators should measure the extent to which people have the right to obtain or make use of or take advantage of infrastructure services – it does not necessary mean they use the service.” (Estache e Goicochea, 2005: 2)

Em geral, como apresentado por Estache e Goicochea (2005), as medidas de acesso

expressam o nível de acesso a determinado serviço de infra-estrutura como uma medida que

aponta a quantidade de pessoas providas dentre uma população. Por exemplo, linhas

telefônicas por 100 habitantes ou Km de rodovia por população da região. Como será

apresentada na primeira parte desta seção, uma explicação parcial do nível de universalização

dos serviços associa-se com alguns determinantes estruturais, como a renda per capita e a

densidade demográfica de uma região.

O debate pertinente para esta tese refere-se à relação entre modelos de regulação por

incentivos e a expansão da rede de ativos de infra-estrutura, condição necessária para a

universalização dos serviços. O aparente trade-off está na defesa do financiamento da

universalização via subsídios cruzados versus o argumento que este objetivo seria alcançado

por meio da concorrência entre operadores de serviços. Esta discussão será apresentada na

segunda parte desta seção. A última parte desta seção explora os limites da estrutura de

20 Por exemplo, apesar de uma residência estar assistida de energia elétrica, seus residentes podem empregar o carvão vegetal para aplicações de propriedades térmicas. O uso de ferro a carvão ao invés de ferro-elétrico é uma destas situações.

72

governança vigente após a reforma promover a superação do dilema da universalização de

serviços.

2.4.1 – Universalização de Serviços: Aspectos Estruturais

Nesta seção discute-se o perfil da renda e do espaço que determinam a viabilidade da

expansão de serviços de um setor de infra-estrutura de rede. Estas características representam

uma restrição estrutural à universalização dos serviços promovida por investimento privado.

O exercício aqui realizado possui fins meramente explicativos, uma vez que não existe

situação em que um setor de infra-estrutura não se apresente sob a influência de determinantes

institucionais da universalização dos serviços.

A prestação de serviço em um setor de infra-estrutura de rede consiste em

disponibilizar uma rede física de suprimento ou transmissão de uma commodity, seja gás

natural, eletricidade, água, ou voz e dados, no caso das telecomunicações. O objetivo

principal destas atividades reside em conectar (integrar) os usuários à rede e, pelo nível de

utilização desta, auferir sua remuneração.

Nesta atividade econômica, o espaço é elemento fundamental na geração de valor.

Isto porque não há como ofertar para um indivíduo de forma isolada aos demais de sua região.

De fato, a viabilidade da expansão da rede de serviços para determinada região dependerá do

conjunto de consumidores e não de demandantes isolados. Em outras palavras, os usuários de

uma região encontram-se numa relação de interdependência.

Uma vez caracterizado que os serviços de infra-estrutura não podem ser definidos

abstraindo-se o espaço econômico, vale destacar que não só os custos da provisão de serviço

estão diretamente relacionados com a área de cobertura da rede, mas também a receita

auferida pelo concessionário. No entanto, a receita depende também da capacidade de

utilização da rede de seus usuários, isto é, depende da renda per capita da região coberta. Não

obstante o nível de renda per capita de determinada região, quanto maior a densidade

populacional da região, maior a relação benefício-custo da prestação de serviços de rede.

Dado que na provisão de serviços de infra-estrutura, o espaço cumpre papel

fundamental na determinação da performance econômica das firmas nestes setores, parece

fundamental dar atenção especial à forma desta rede, principalmente à densidade da rede e à

73

cobertura da rede. Associado a isto, está o papel da demanda, isto é, a intensidade dos fluxos

na rede, especialmente para os ramos marginais da rede.

“Companies face high costs in supplying lower-income customers as their unit consumption is relatively low, because they may live in topographically difficult, expensive to reach, sites, and because affordability and therefore demand is low.” (Mitlin, 2004: 4).

Dymond et.al. (2002) discute que a dificuldade para viabilidade econômica destes

serviços com um operador privado, na ausência de subsídios para atividade, se apresenta em

dois aspectos: um é o isolamento geográfico, outro é o baixo nível de renda per capita. Pode-

se somar a esse fato que quanto menor a densidade populacional, para um dado nível de renda

per capita, menor a viabilidade econômica destas operações. Isto porque na tarefa de

expansão da rede sempre existirá um custo fixo por área coberta.

Portanto, não só os benefícios potenciais (receitas esperadas) obtidos por uma

concessionária de serviços de rede estão referenciados ao espaço, mas também os seus custos

dependem da área de cobertura. O mais vantajoso para a operação privada ocorre quando a

rede cobre uma região densamente povoada e de alta renda per capita, significando um alto

montante de renda disponível para o consumo dos serviços por região atendida e um custo de

expansão marginal da rede mais baixo.

Isto posto, parece fundamental que sejam considerados alguns indicadores estruturais

do espaço econômico para a avaliação de setores de infra-estrutura. Uma opção é a densidade

populacional da região de operação, outro é a renda per capita da população do espaço

tomado como referência. Para completar o quadro de análise, deve-se contemplar o

requerimento de capital por área de cobertura da rede. Os dois primeiros conferem o potencial

da demanda por área coberta, representando uma proxy de receita por usuários, o último

traduz o investimento por área de cobertura. Assim, podem-se criar índices que exibam a

viabilidade potencial da rede para um determinado espaço de atuação.

Downesa e Greenstein (2002) estudaram a universalização da internet nos EUA

exibindo a influência das características geo-econômicas na determinação da facilidade de

acesso à rede. Enquanto em regiões urbanas e densamente povoadas existe um abundante

número de provedores, regiões rurais não possuem nenhum provedor de acesso à Internet. O

fato é que há requisitos mínimos para viabilizar a entrada de um provedor em uma

determinada região. Portanto, existe uma influência entre tais fatores e a estrutura de mercado.

Trata-se, assim, de aspectos fundamentais para o debate da universalização de serviços de

infra-estrutura de rede.

A dimensão geográfica tem impacto direto nos custos de expansão da infra-estrutura

de serviços. As variáveis pertinentes para considerar o papel da geografia nos custos dos

serviços são a topografia e a demografia de cada país ou região. Um grande problema a ser

resolvido para a expansão de serviços de infra-estrutura e sua almejada universalização passa

pelo fato que muitas vezes regiões de maior custo para a expansão da rede coincidem com as

regiões de menor receita por usuário. Os segmentos sociais que mais se beneficiariam com a

universalização, muitas vezes, estão localizados em áreas de difícil acesso, como a zona rural

e/ou de renda muito baixa para arcar com os custos de instalação e manutenção da rede.

Segundo Dymond et. al. (2002: 26) fatores estruturais - como forte desigualdade de

renda, grandes dimensões geográficas, distribuição desfavorável da população no espaço -

representam reais desafios aos prestadores de serviços de telecomunicações. Segundo a

classificação destes autores, o Brasil situar-se-ia no grupo de países de maior dificuldade

estrutural para a expansão dos serviços de telecomunicações. Já o enfoque pretendido na

presente seção busca agregar o conjunto das características estruturais circunscritas em

determinado espaço para determinar o nível potencial de expansão.

Como visto acima, a avaliação do desempenho econômico de um operador de

serviços de infra-estrutura requer uma análise que incorpore a geografia da rede, não só nas

características físicas da área de atuação, como também na dimensão sócio-econômica. Vale,

portanto, apresentar uma representação para o comportamento destas variáveis na provisão de

serviços de infra-estrutura.

Em primeiro lugar, deve ser definido o custo fixo da prestação de serviço

referenciado à área de cobertura da rede. Vale expressar o requerimento de capital (I) por área

de atuação numa proxy do dispêndio em capital fixo por área (Km2) de atuação.

74

Assi

2

2

por Km tosinvestimen demonetária unidade : Kmemexpressa serviços de provisão de região :

m

κ

κ

SSI =

(2.2)

Para uma determinada área, um prestador de serviços de infra-estrutura incorre em

um dado investimento I. O valor de I é fixo e independente da receita líquida obtida nesta área

coberta, apenas é função de sua região de operação.

No entanto, a receita auferida em determinada área de cobertura depende de suas

características sócio-econômicas, entre as quais dois aspectos são fundamentais: a renda per

capita da região e a concentração da população no espaço. A renda per capita é uma proxy da

receita média em potencial por usuário de determinada região. Por outro lado, quanto maior a

concentração da população no espaço, maior a medida de receita líquida de custos variáveis

(Rl) por área coberta.

75

)()( ++

_

_

áreana populaçãoda densidadea área;da capita per renda a

:sendo , ),(

dy

dyrlRl =

(2.3)

Esta função pode ser exibida como uma hipérbole eqüilátera, gerando um mapa de

curvas de nível que expressam diferentes patamares de receita líquida desta operação.21

O importante é que, para uma mesma área coberta, tanto maior será a receita líquida

auferida, quanto maior for à renda per capita e a densidade populacional da área de prestação

de serviços.

Além disso, o lucro da provisão de serviços de uma determinada área pode ser

representado por:

FRl −=π (2.4)

Sendo:

F : custo fixo de prestar serviço numa área de tamanho dado

O mapa de curvas de nível que descreveria esta função representa diferentes

situações de viabilidade econômica para operar numa área de determinado espaço. A condição

21 Assim, esta função teria as características semelhantes a uma função do tipo Cobb-Douglas. βαdAyRl =

76

de break-even de um provedor de serviços corresponde à situação na qual a receita líquida de

custos variáveis iguala os custos fixos de prover serviços.

Supondo a impossibilidade de discriminação de preços, fato comum em setores

regulados, a mesma tarifa é cobrada em regiões com diferentes condições estruturais. Não

obstante, determinadas regiões não seriam economicamente viáveis, pois o custo fixo de

prestar o serviço em determinada área não seria coberto pela receita líquida auferida na

mesma. Os mecanismos de financiamento da provisão de serviços em regiões de inviabilidade

econômica dependerão do modelo contratual que coordena a relação entre Estado e operador

privado.

De forma a simbolizar esta situação, considere que um típico concessionário abrigue

dois tipos de clientes, um de alta e outro de baixa rentabilidade. O importante é avaliar como

se processa o mecanismo de subsídio cruzado entre estes grupos. Talvez seja importante

expressar esta assimetria entre os grupos através de uma medida de heterogeneidade entre a

média da parcela rentável e a média não rentável. Analiticamente, esta diferença poderia ser

apresentada pela distância entre cada curva de nível representativa para a curva de nível de

valor zero, ou seja, condição de lucro zero. Isto é, alguns indivíduos estariam dispostos a

pagar a tarifa média de prestação de serviço, caso tal acesso fosse fornecido. Por outro lado,

existem pessoas que mesmo vivendo em regiões de cobertura da rede não se encontram

conectadas à rede de serviços.

Diante disso, para o estudo do processo de universalização de serviços de infra-

estrutura deve ser contemplada a dimensão institucional, sobretudo destacando sua capacidade

de superar as restrições estruturais discutidas acima sem gerar riscos de inviabilidade

financeira de prestadores de serviço privados. O fato é que quanto mais heterogênea

determinada região em termos de renda e demografia, maior a limitação para que um modelo

contratual apresentar uma solução eficiente.

A seção seguinte aborda a dimensão institucional na determinação da universalização

de serviços, mais precisamente discute-se as possíveis conseqüências das políticas

regulatórias no mecanismo de financiamento da universalização dos serviços.

77

2.4.2 - Universalização de Serviços: Aspectos Institucionais

O intuito desta seção é discutir a relação entre o nível de universalização dos serviços

e o modelo institucional adotado após a reforma de setores de infra-estrutura. As reformas dos

setores de infra-estrutura modificaram a forma contratual (estrutura de governança) que rege a

relação entre o Estado e os atores privados na provisão destes serviços. Esta mudança possui

reflexo imediato nos mecanismos de incentivo à expansão da rede de serviços e ao maior grau

de universalização. Para países em desenvolvimento esta questão cresce em importância,

diante do baixo patamar de universalização dos serviços. Parker et.al. (2005) em países em

desenvolvimento é fundamental discutir a forma pela qual a regulação prioriza a

universalização dos serviços.

Segundo Rosston e Wimmer (2000) existiriam duas justificativas para os subsídios à

universalização dos serviços. A primeira é o caráter de bem essencial, como qualquer serviço

de infra-estrutura, a outra seria a característica de efeito rede (network effect) de um maior

número de usuários adensando a rede. A relevância, em termos econômicos, da

universalização de serviços envolve a presença de economias provenientes das externalidades

de rede. (Panzar, 2000). No entanto, a busca de maiores níveis de universalização não se

resume apenas às decisões econômicas.

Tradicionalmente os serviços de infra-estrutura eram providos por firmas

monopolistas, muitas vezes estatais. 22 Os regimes tarifários envolviam práticas de subsídio

cruzado como meio de prover acesso em regiões deficitárias.23 O uso de recursos fiscais foi

outro expediente empregado para viabilizar a expansão dos serviços de infra-estrutura e

propiciar um maior grau de universalização, este mecanismo era facilitado na medida que as

utilidades eram providas por uma empresa estatal.

O modelo institucional que empregava subsídios cruzados e/ou fiscais passou a

sofrer diversas críticas, que culminaram com o processo de reforma desses setores. A maior

crítica referia-se ao baixo incentivo do modelo anterior à reforma para a redução de custos,

fato fortemente ligado à regulação pelo custo de serviço. Nos países desenvolvidos com rede

22 Além disso, alguns serviços eram providos de forma pública, sem a tarifação do usuário, como ocorre no caso de rodovias não pedagiadas. 23 Segundo a definição de Viscusi, Vernon e Harrington Jr. (1995:462), subsídios cruzados ocorrem quando o preço de um produto é estabelecido de forma a gerar receitas extraordinárias para subsidiar a oferta de outros produtos pela firma regulada. Desta forma, a receita gerada na oferta de um mercado é usada para cobrir os custos de prover os serviços de outro.

78

de ativos de infra-estrutura em estágio maduro, a introdução de novas formas contratuais entre

poder concedente e prestador de serviço tinha com objetivo principal a redução de custos.

“Many regulators have switched from rate-of-return regulation to price or revenue-cap regulation to increase the incentive for firms to minimize costs and ensure that consumers eventually benefit from these cost reductions.” (Estache e Rossi, 2002: 146).

Outra crítica ao modelo pré-reforma deriva de uso de recursos ficais, principalmente

em cenários macroeconômicos de restrição fiscal.

“The reverse of the low tariff medal was high levels of cost recovery and the resulting fiscal cost. The taxpayers were covering the gaps between average cost and average effective tariffs. (Estache, 2002: 2).

Como argumentam Estache, Gomez-Lobo, Leipziger (2000), apesar dos mecanismos

de subsídio cruzado e a possibilidade de recursos fiscais propiciarem a viabilidade econômica

para a expansão dos serviços, tais modelos tem o grande problema de apresentarem como

efeito uma estrutura de custos distorcida. Esta distorção nos custos também eleva a tarifa

média, donde o subsídio necessário para abranger os consumidores de provisão deficitária

aumenta. O subsídio cruzado entre os usuários industriais/comerciais e os residenciais

tenderia a favorecer a usuários com renda suficiente para arcar com a provisão do serviço ao

nível de custo de produção eficiente.

A introdução nos contratos de concessão de serviços de infra-estrutura regimes de

regulação por preço-teto visando redução de custos representa uma mudança na combinação

de incentivos de alta potência e custos de monitoramento. Com efeito, os instrumento para a

promoção da universalização dos serviços e a capacidade de adaptação aos distúrbios no

ambiente de negócios também se altera.

O argumento favorável à reforma institucional como motor de universalização de

serviços decorre da expectativa de redução de custos associado ao regime de incentivos

regulatórios. Por outro lado, tais benefícios serão limitados quando a universalização

depender de investimentos para a expansão da rede de serviços em regiões de baixa

rentabilidade. Como expõe Estache (2002: 2):“Unless the reforms could generate affordable

new access, the poor were nor really concerned by the utility privatization wave.”

79

Como discutido neste capítulo, a expansão ocorre até o limite da redução de custos24

incentivada por regimes de preço-teto, mas este também reduz o ímpeto natural para expandir

a rede em áreas de baixo retorno por capital investido. Vale observar que os ganhos de

produtividade também não se limitam ao esforço do concessionário sob regime de regulação

por incentivo, mas também da mudança da fronteira tecnológica, que beneficiaria qualquer

provedor do serviço.

“A related regulatory challenge is how to document the fact that firm’s efficiency gains can come from two different sources. Gains can come from shifts in the frontiers reflecting efficiency gains at the sectoral level. But efficiency gains at the firm can also reflect a catching-up effect.” (Estache e Rossi, 2002: 146).

Com as reformas institucionais dos setores de infra-estrutura alterou-se a viabilidade

os métodos de promoção de acesso universal com a mudança na relação entre Estado e atores

privados nestes setores. A questão subjacente no processo de reforma institucional dos setores

de infra-estrutura é se as políticas de concorrência seriam o motor suficiente para promover a

expansão dos serviços para regiões e classes de consumidores de menor lucratividade, apesar

de ser eliminada a possibilidade de subsídio cruzado intra-firma.

No regime de preço-teto o regulador pode permitir a diferenciação de preços entre as

classes de consumidores definindo, entretanto, um preço-teto médio. Esta opção pode trazer

sérias conseqüências para a universalização, uma vez que isto pode ser usado como um

instrumento de financiamento para a concorrência em mercados não-cativos. Isto seria um

subsídio cruzado, mas na verdade no sentido contrário a sua concepção original, isto é, um

subsídio da universalização às avessas, apesar de ser um modelo benéfico para a reduzir

custos de provisão de serviços.

Com as reformas institucionais, não só a prática de subsídios cruzados para atender

regiões periféricas tornou-se menos aceita, mas sua eliminação foi uma das principais

motivações da reforma25.

24 Vale lembrar a preocupação para que a redução de custo não ocorra em detrimento da qualidade do serviço prestado, o que significa uma elevação implícita dos preços. 25 “with privatization it will often be advisable to reduce or eliminate the implicit cross-subsidies in the tariff structure or at least increase their transparency through a redesign.” (Estache, Gomez-Lobo e Leipziger, 2000).

80

Existe uma premissa que partir das reformas, com a introdução de políticas de

concorrência nos segmentos com menor barreira à entrada, haveria um ganho em termos de

maior concorrência, com reflexo imediato na promoção da universalização dos serviços. O

debate dos setores de infra-estrutura centrou-se sobre a performance do modelo regulatório

em prover a universalização dos serviços ao resumir que a introdução de pressões

competitivas se transmitira diretamente aos segmentos excluídos da sociedade, ou às regiões

periféricas. A expansão seria reflexo direto da concorrência e seria um sinônimo de redução

da exclusão do acesso aos serviços.

“The outcome of reform seems to have been that most residential consumers gained from telecoms and electricity price changes, but that poorest received the lowest absolute gains and gained a lower than average proportion of their incomes. In gas, water and sewerage there have been losses across the board with the largest relative losses in income falling on the low-income groups”. (Parker, et.al. 2005: 13)

Teoricamente, espera-se que os novos entrantes tenham o chamado comportamento

cream-skimming ao ofertar apenas os serviços para os segmentos lucrativos. A suposta

redução de rendas diferenciadas nos segmentos lucrativos impossibilita o subsídio cruzado

aos segmentos não lucrativos.

“Unlike general taxation which is quite neutral for the utility industry, cross subsidies in a competitive environment will create incentives form ‘cream skimming’ high paying customers and to ignores low paying customers.” (Estache, Gomez-Lobo e Leipziger, 2000: 26).

O efeito do cream-skimming é eliminar este mecanismo intra-setorial de

financiamento à expansão dos serviços em regiões e/ou clientes pouco rentáveis. O problema

para a universalização para estes segmentos decorre do fato da concorrência entre os

operadores das concessões por grandes clientes, corporativos e não cativos, com maior

benefício marginal por ativo empregado. Portanto, o crescimento da concorrência em

determinados segmentos de mercado pode surtir resultados indesejados para fins de

universalização.26 “A private operator will have an incentive to expand and serve customers

who generate surplus to the detriment of the groups, possibly poorer, that receive the

subsidies.” (Estache, Gomez-Lobo e Leipziger, 2000: 9).

26 "Economic theory and regulatory experience suggest that cross subsidies are incompatible with open entry and competition.”(World Bank, 2004: 20).

81

O segundo efeito é a retração dos mecanismos de subsídio cruzado como forma de

prover o acesso às regiões de baixa renda. Como aponta Panzar (2000: 214), num cenário sem

a presença de subsídio cruzado, a restrição de promover a universalização dos serviços

encontra limitações devido à redução de receitas líquidas das classes de consumidores de

renda mais elevada.

Os regimes de regulação por incentivos e as políticas de introdução da concorrência

tem como efeito a redução de custos de provisão dos serviços. E, desta forma seriam

instrumentos favoráveis à universalização de serviços. Por outro lado, a perda de artifícios de

subsídio cruzado, como visto, pode dificultar a universalização de serviços. O fato é que não

há uma solução sem ambigüidade, mas sim um trade-off de políticas. Como não há uma

solução ótima, a definição de políticas deve se guiar pela adequação do modelo adotado às

características do ambiente de transações em que será empregado.

Como afirmam Boylaud & Nicoletti (2000), a análise dos modelos regulatórios

poderia ser agrupada em dois grupos. O primeiro tem como certo o efeito fortemente positivo

da competição na promoção de benefícios líquidos para o setor, em particular a

universalização dos serviços. Assim, o objeto de política limitar-se-ia a buscar qual o modelo

regulatório capaz de prover maior concorrência, muitas vezes simplificada em uma estrutura

de mercado com um maior número de agentes. O outro grupo de análise dedica-se a avaliar

como, e se de fato, a concorrência possui reflexos na melhor performance do setor, não só em

redução de preços, mas também em termos da universalização dos serviços.

A eficácia das políticas de introdução da concorrência em promover a redução do

nível de preços depende de várias hipóteses simplificadoras da análise, pois se atribui

características gerais ao setor que possui enormes peculiaridades por ser indústria de rede. A

relação entre menor preço e maior expansão dos serviços só é válida para indivíduos que

estejam integrados à rede, no entanto, a expansão para regiões periféricas depende de

investimentos em expansão da cobertura física da rede. Este é um movimento totalmente

diferente dos setores de bens de consumo, como discutido anteriormente.

Vale observar que existem que dois possíveis efeitos da concorrência sobre a

expansão dos serviços. O primeiro é tornar mais efetiva a expansão nas regiões de alta

rentabilidade, devido à atratividade de determinados mercados, tanto para as firmas

estabelecidas como para as entrantes.

82

Em outras palavras, o desafio é prover a universalização dos serviços sob modelos

regulatórios contratuais que restringem a possibilidade de subsídios cruzados entre classes de

consumidores. O problema é que operadores de serviços públicos privados podem se mostrar

desinteressados em relação à expansão de serviços onde não for lucrativo. Para Valletti (2000:

207) existe de fato um trade-off entre concorrência e provisão de acesso universal. Diante

deste quadro, se as características estruturais de uma determinada região sob concessão de um

operador impõem restrições ao avanço destes serviços, então a eficiência da regulação ocorre

quando regiões menos favorecidas para provisão deste serviço superam esta restrição

estrutural.

2.4.3 - Universalização de Serviços: A Ineficiência Irremediável

Nesta seção aprofunda-se a discussão sobre as limitações do modelo de concessão

privada, sob regime de regulação por incentivos, alcançarem a expansão da rede em regiões

cuja atratividade do investimento seja reduzida. Esta dificuldade, de relevância ímpar em

países em desenvolvimento, suscitou um debate sobre possíveis alternativas para a indução da

de maiores níveis de universalização de serviços. Esta é uma discussão em aberto na

literatura, mas que, mesmo na perspectiva de entusiastas da reforma institucional, aponta-se

para a necessidade de uma revisão dos modelos contratuais entre Estado e setor privado nestes

setores.

Um efeito percebido por Chisari, Estache e Waddams Price (2003) foi que usuários

residenciais foram mais expostos ao crescimento de preços após a reforma que os clientes

industriais/comerciais. Os autores reconhecem que os pobres são os últimos favorecidos pelo

crescimento de acesso através das reformas, fato tão mais grave quanto mais assimétrica for a

realidade de renda em uma determinada região de concessão.

“What regulatory reform experience has demonstrated is that many operators perceive poor financial returns from supplying the poor and postpone such supply as long as possible, unless specific policy requirements force them to do otherwise.” (Chisari, Estache e Waddams Price 2003: 25)

Chisari, Estache e Waddams Price (2003) reconhecem o conflito direto entre a

viabilidade financeira e a extensão da cobertura da rede por operadores privados. Para que a

prestação do serviço de infra-estrutura seja auto-sustentável, o processo de reforma

83

necessariamente envolve o aumento de tarifas que tenham sido estabelecidas abaixo do custo

de provisão.27

“In the pre-reform era, universal service obligation was funded, at least in theory by subsidies and more commonly, cross subsidies. But with privatization and market liberalization it is impossible to maintain significant cross-subsidies in the structure of prices” (World Bank, 2004: 25)

Uma alternativa comum nos contratos de concessão clássicos é o uso de metas de

universalização dos serviços. Como visto neste capítulo, estes mecanismos auxiliares no

contrato de concessão geram dúvidas sobre a eficácia do regime de preço-teto ser uma

solução mais simples e econômica de recursos para a regulação setorial. Parker et.al (2005)

também chamam a atenção para a limitação da capacidade do corpo técnico de agências

regulatória, sobretudo no caso de países em desenvolvimento, na medida que o esforço

necessário dos concessionários de serviço é maior, ao lidar com a dificuldade de acesso para a

população pobre.

De fato, o mecanismo de metas só pode ser empregado em uma solução

complementar o que causa estranheza se considerado como solução em contextos regionais

que apresentem um desafio estrutural muito significativo para a expansão dos serviços.28

“Service obligations can be built into regulatory contracts to ensure that services are expanded into poorer areas. However, it is just as possible that regulation will exacerbate poverty if such concerns do not weigh highly within regulatory offices, particularly at a time when cross-subsidies are removed after the introduction of competition.” (Parker et.al., 2005: 14)

Os fundos de universalização de serviços serviriam de compensação aos operadores

por serviços prestados em situações não-viáveis, ou seja, regiões ou clientes de baixo retorno

na prestação de serviços. Em geral tais fundos saem da operação em regiões densamente

povoadas e regiões urbanas para servir regiões rurais e de baixa renda.

Grilli (2004) expõe que um sistema de fundos ou metas requer a apurada definição e

seleção da população beneficiada.

27 “In the case of Argentina the effects of rebalancing in all the utilities seems to be regressive, with the main negative effects on the poorest segment of the population.” (Parker et.al 2005:13) 28 “There was however very little discussion on commitment made with respect to financing of these USO (Universal Service Obligation).” (Estache 2004:7)

84

“One of the most incontrovertible economic statements insists that once a regulator or a public authority decides to implement a consumer subsidy scheme this has to be targeted to those specific households that are non-subscribers to the network or are at risk of dropping off the network without it.” (Grilli, 2004: 297).

Assim, para uma boa definição de mecanismos de promoção de universalização de

serviço é fundamental um profundo conhecimento das características sócio-econômicas da

população excluída do acesso ao serviço. O reverso deste fato é que seu emprego significa

maiores custos de monitoramento por parte do poder concedente. Para Parker et.al. (2005) a

dificuldades de um contrato de concessão crescem com o sistema de metas.

“A number of concession agreements have included service expansion targets to benefit the poor, which again highlights the importance of effective regulation, in this case in designing and monitoring concessions.” (Parker et.al 2005: 15)

Como afirma Grilli (2004), quanto melhor definido o sistema de subsídio cruzado,

menor será o peso arcado pela sociedade, ou seja, um mecanismo bem definido de

financiamento de acesso aos serviços é aquele que beneficia apenas os que estão excluídos

dos serviços (desconectados da rede).

A grande dificuldade de soluções de subsídio é gerarem efetivamente a destinação de

recursos para os indivíduos que realmente o necessitam, caso contrário ocorrer desperdício de

recursos. Mas vale observar que isto só têm efeito para expandir os serviços para usuários que

se encontram em regiões atendidas pela infra-estrutura física da rede, sem, no entanto poder

arcar com o preço da tarifa. A questão é muito mais complexa quando há necessidade de

expandir-se a rede física, neste caso, como discutido acima, o entrave passa pela remuneração

do investimento privado.

As metas e os fundos de universalização são mecanismos ad-hoc no modelo de

reforma institucional com separação vertical e incentivo a custo eficiência como o price-cap:

“USO (Universal Service Obligation) is essentially an ad hoc mechanism, driving prices away

from their strict allocative efficiency.” (Chisari, Estache e Waddams Price 2003: 38)”

O efeito direto destas políticas é que o grau de complexidade da regulação setorial e

para a alocação de recursos de fundos de universalização é muito superior ao argumentado

pela simplicidade da relação entre Estado e agentes privados na reforma institucional.

85

Não obstante, contratos de concessão clássicos possuem atributos limitados para

alinhar o interesse entre as partes para obtenção de maiores níveis de universalização entre as

partes. Mesmo na opinião do Banco Mundial, tradicionalmente defensor das reformas

institucionais, observa-se a percepção das limitações destes contratos. “The main challenge of

infrastructure concession is writing enforceable contracts that cover all the contingencies that

might arise over time.” (Banco Mundial, 2004: 106).

É interessante notar o paradoxo em pressupor que a provisão pelo setor público é

ineficiente, mas a mesma crítica não se faz sobre a habilidade e o custo governamental para

selecionar, identificar e monitorar os beneficiados por esquemas de subsídio direto aos

usuários. Mitlin (2004) reconhece que a necessidade de uma maior capacitação regulatória

para lidar com metas e fundos de universalização, em relação à regulação tarifária sem metas

complementares. Como contempla Valletti (2000: 205) a proposição de metas de

universalização é vaga e discricionária, de forma que o debate sobre o tema encontra-se em

aberto e com difícil consenso.

Além disso, se o papel cumprido pelo regulador cresce em importância para a

obtenção de maiores patamares de universalização de serviço, maior deve ser sua neutralidade

para que grupos de interesse não desviem o foco do regulador. Isto ocorre porque o perfil

difuso do público demandante de políticas de universalização de serviços não tende a ter

capacidade de organização suficiente para defender seus interesses.29 Por exemplo, um fundo

de universalização pode ser capturado para outras finalidades alheias ao processo de expandir

a rede de serviços de infra-estrutura para integrar novos usuários à rede.

Não obstante, como observado na seção anterior, vale frisar que estes mecanismos

encontram limites diante das restrições estruturais de uma determinada região concedida

dispor de recursos para a expansão dos serviços. Chisari, Estache e Waddams Price (2003: 46)

apontam como uma alternativa à ampliação da área concedida como mecanismo de obter

maior viabilidade para a universalização.

No entanto, isto não resolve a questão dos incentivos para universalização e

tampouco reduz o custo de regulação e, sobretudo, diante de grandes assimetrias na mesma

região de concessão a complexidade para o contrato de concessão se potencializa. De fato,

29 “The weaker the regulatory structure, the less likely generally that the concerns of the poor will be accommodated in public policy decision.” (Estache, Gomez-Lobo e Leipziger 2000: 14).

86

quanto maior a diferença entre as classes de consumo e regiões, maior a dificuldade para que

um mesmo modelo atenda todos objetivos.

Em resumo, fica o resultado que os artifícios complementares para viabilizar a

expansão da universalização dos serviços geram o crescimento da complexidade e custos da

regulação. Vale ressaltar que estes mecanismos assessórios aos contratos de concessão elevam

o custo de monitoramento sem oferecer atributos de adaptações flexíveis (tipo C). Tal fato

decorre da concepção básica de um contrato de concessão que prioriza os atributos

highpowered incentives.

A rigidez e a dificuldade de adaptação dos contratos de concessão se expressam na

necessidade de revisões do contrato de concessão, fato especialmente marcante nos países em

desenvolvimento, provavelmente fruto das desigualdades regionais internas a estes países e o

grande desafio de promover níveis adequados de universalização de serviços. Guasch (2004)

ao examinar mais de 1000 contratos de concessão na América Latina entre a segunda metade

dos anos 80 e 2000 constatou que aproximadamente 30% são renegociados e este patamar

cresce para setores que como transporte (54%) e água (74%).

O resultado de processos de renegociação do contrato pode ser um aumento do

prazo, uma maior tarifa ou redução de investimentos. De fato, o resultado pode levar a maior

rentabilidade do concessionário sem a contrapartida de maior expansão dos serviços. O

benefício de alguns programas de metas e fundos de universalização se torna incerto quando o

concessionário aciona processos de revisão contratual por alegar desequilíbrio econômico

financeiro do contrato de concessão.

Diante deste quadro, mesmo na perspectiva do Banco Mundial, tradicionalmente

defensor de posturas não intervencionistas, a presença da intervenção estatal seguirá

fundamental para avançar na universalização de serviços em países em desenvolvimento. “If

funding through general tax revenue is too difficult or costly, second generation reforms

should focus on new methods to raise subsidies” (World Bank, 2004: 68)

Apesar da conclusão do Banco Mundial (2004) pela necessidade de algum esquema

de subsídios para elevar o acesso (universalização), não se demonstrou nesta análise como

equacionar os subsídios num ambiente de regulação por incentivos. O princípio geral

defendido pelo Banco Mundial (2004) redunda em políticas ad-hoc, trata-se de uma

87

perspectiva de focalização para o público definido para ser subsidiado, sem endogenizar tal

solução à estrutura de governança entre Estado e agentes privados. Portanto, não se elimina as

questões levantadas sobre a eficácia e o custo de monitoramento desta solução contratual, ou

seja, não se cria mecanismos de adaptação para adaptação ex-post.30

“The upshot is that if governments fail to correct this exclusion of the poor through specific policies, the poor will be as excluded post-privatization as they were before.” (Estache, Gomez-Lobo e Leipziger 2000: 5).

Apesar de realizarem uma avaliação em relação à qualidade da provisão dos serviços,

a conclusão de Estache, Gomez-Lobo e Leipziger (2000) é que um certo grau de flexibilidade

nos contratos de concessão se faz necessário para que se alcança um maior grau de

universalização de serviços.

“The recommendation here is to avoid setting targets base on developed country benchmarks that may make the service too expensive for poorer households. Flexibility may be in order as regards this issue. This means leaving some flexibility in contract to allow the company, the regulator and the users in the futures to agree to a different price/quality combination when it is convenient.” (Estache, Gomez-Lobo e Leipziger 2000: 24).

Parece clara a necessidade se alcançar novas formas contratuais entre Estado e setor

privado para expandir a universalização num ambiente que limita artifícios de subsídio

cruzado, com os efeitos de regulação por preço-teto para a expansão do serviço em regiões de

baixa rentabilidade para operadores privados. Percebe-se assim um potencial dilema para

universalização, no qual a estrutura de governança entre Estado e setor privado que envolva a

regulação por preço-teto e políticas de concorrência.

Não obstante, qualquer solução ad-hoc possui limitações de implementação e

eficácia, de fato há uma ineficiência irremediável associada com as dificuldades de

coordenação do modelo contratual que regula a provisão do serviço de infra-estrutura por

operadores privados. A eficiência irremediável se refere às limitações da estrutura de

governança vigente para a promoção de um maior nível de universalização.

30 “Understanding poor people’s willingness to pay and their demand for services is critical to assessing the effects of reform and expanding access.”(World Bank, 2004:268)

88

2.5 – Conclusão.

Neste capítulo foram apresentadas as características básicas dos setores de infra-

estrutura destacando a necessidade de grandes requerimentos de capital para investimentos na

construção da rede ativos para a operação de serviços. O reflexo é a grande proporção dos

custos fixos na estrutura de custos, conferindo a estas atividades um perfil de monopólio

natural. Além disso, a grande interdependência entre investimentos na cadeia de valor destes

setores demanda estruturas contratuais apropriadas para a realização dos investimentos.

Diante destas condições de contorno dos setores de infra-estrutura as políticas e

modelos de regulação possuem papel significativo. Os modelos de regulação que regem a

relação entre Estado e provedor privado de serviços de infra-estrutura foram discutidos com

ênfase na distinção entre os modelos de regulação por incentivos (ex. price-cap) e regulação

por custo de serviço para efeitos de expansão da rede de ativos, condição necessária para

universalização.

O tema da universalização de serviço de infra-estrutura foi abordado buscando isolar

para fins de apresentação os determinantes estruturais dos aspectos institucionais. A

introdução de algumas políticas de concorrência e o modelo de regulação por preço-teto,

apesar do benefício da indução à redução de custos de provisão dos serviços, elimina artifícios

tradicionalmente empregados para a expansão da rede e universalização.

Este dilema cresce com o baixo grau de maturidade da rede, portanto trata-se de um

aspecto de relevância ímpar para o caso de países em desenvolvimento, como o Brasil. Além

disso, como mencionado anteriormente, esta ineficiência se agrava caso o país apresente

expressiva heterogeneidade de renda e demografia. Esta característica é mais comum em

países em desenvolvimento do que nos países dsenvolvidos.

As soluções ad-hoc, como metas de expansão de serviços, são implementadas como

alternativas para contornar os problema de universalização, mas possuem o efeito de restringir

a viabilidade econômica da provisão de serviços de infra-estrutura por agentes privados.

Ademais, tais alternativas resultam em maiores custos de transação para a atividade

regulatória. O fato é que, dado a presença de operadores privados da rede de serviços, a

universalização encontrará limites para sua expansão, sobretudo quando se restringe os meios

de financiamento intra-setorial. Desta forma, parece haver uma lacuna no conjunto de

possibilidades contratuais que resulta em uma ineficiência da estrutura de governança vigente.

89

No próximo capítulo apresenta-se à alternativa de modelos contratuais em Parcerias

Público Privada. Uma vez que envolva uma estrutura de governança diferente para a provisão

dos serviços de infra-estrutura, caberá avaliar se e como tais modelos podem representar uma

resposta mais eficiente para promover a expansão da rede e elevar o nível de universalização.

90

III – PARCERIAS PÚBLICO PRIVADAS E A UNIVERSALIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE INFRA-ESTRUTURA.

3.1 – Introdução

O objetivo deste capítulo é avaliar se o modelo de concessão em PPP pode ser uma

estrutura de governança alternativa eficaz para a expansão e universalização de serviços. O

importante será identificar quando este modelo deve ser empregado, em detrimento de

contratos de concessão convencionais, ou da realização dos investimentos pelo próprio setor

público. Neste sentido, será discutido se, e como o arranjo institucional de Parceria Público

Privada (PPP) pode ser um instrumento para superar as limitações do modelo convencional de

concessão de serviços de infra-estrutura no tocante à universalização dos serviços. Não

obstante, cabe discutir em que condições o modelo contratual em PPP poderá substituir o

investimento público.

O presente capítulo está estruturado em duas seções centrais, além desta introdução e a

conclusão. Na próxima seção serão apresentadas as características gerais do modelo de

Parceria Público Privada (PPP). Pelo fato de ser um tema novo, uma perspectiva prudente é

abordá-lo em comparação com modelo clássico de contrato de concessão. A discussão das

possibilidades de contratação entre setor público e privado a partir de uma tipologia de

estrutura de governança à la Williamson é um exercício útil para a compreensão de um tema

ainda incipiente na literatura econômica.

Na terceira seção realiza-se a discussão sobre o modelo de Parceria Público Privada. A

apresentação de um modelo formal, ainda que de forma preliminar, auxilia o entendimento da

função da contrapartida pública, para viabilizar o investimento em setores de infra-estrutura.

Nesta seção também será apresentada uma tipologia de estruturas de governança, no intuito de

prover uma ferramenta de seleção do modelo contratual de acordo com as características do

ambiente das transações. Como será discutido, os benefícios do arranjo institucional de

parcerias entre o setor público e privado para provisão de serviços de infra-estrutura

dependerão da adequação destes contratos vis-a-vis outras estruturas de governança, como

concessão clássica e iniciativa pública.

O mais importante nesta tarefa é identificar as condições que definem a adequação da

PPP frente a outras opções. Esta é a contribuição deste capítulo. Neste intuito, são elencados

91

alguns aspectos básicos para a seleção da estruturas de governança. Além disso, diante do

caráter incipiente do tema, alguns critérios de avaliação de contratos de PPP serão abordados.

Neste intuito, a comparação entre as categorias de contraprestação fixa e variável, será um

tema recorrente nos futuros desdobramentos da discussão acerca de modelos de PPP no

Brasil.

3.2 –A Eficiência de Parceira Público - Privada como Estrutura de Governança.

Por tratar-se de um assunto relativamente novo, principalmente no Brasil, há uma

multiplicidade de interpretações para o conceito de PPP. Este é um fator que dificulta a

avaliação do tema. Esta seção apresenta as características básicas do modelo contratual de

Parceria Público Privada. Assim, o objetivo será apresentar os aspectos mais relevantes que

definem esta forma contratual, principalmente os que propiciem o entendimento do modelo de

PPP para o caso brasileiro.

Após esta apresentação, discutem-se como os modelos de PPP constituem estruturas

de governança alternativas aos contratos de concessão clássica, assim como aos investimentos

realizados integralmente pelo Estado. Não obstante, apresenta-se a forma do conjunto de

estruturas de govenança entre Estado e agentes privados na provisão de serviços de infra-

estrutura, considerando os modelos contratuais em PPP. Realizar a análise da eficiência

econômica como uma estrutura de governança é um enfoque capaz de propiciar um

direcionamento para a discussão deste tema.

3.2.1 – Parcerias Público Privadas: Características Básicas e a Expansão dos Serviços de Infra-estrutura.

Parte significativa dos estudos que dizem respeito à apreciação do modelo de PPP

dedica-se à avaliação do efeito sobre as finanças públicas do comprometimento de recursos

públicos. Neste debate, uma defesa da adoção do modelo de Parcerias advém do esperado

impacto favorável em relação à restrição fiscal para a realização de investimentos e da

argumentação a favor da superioridade do setor privado em reduzir custos de investimentos e

92

operação de serviços.31 Assim, a justificativa macroeconômica geral para a PPP associa-se à

discussão sobre restrições fiscais para investimentos públicos. Diante disso, boa parte da

literatura preocupa-se em comparar este modelo contratual como alternativa à obra pública.

“In a developing economy external finance can be vital for public investments with high social returns. In a developed economy no such argument applies. The case for private financing depends on its contribution to micro-efficiency.” (Spackman, 2002: 289).

Não faz parte do escopo da presente tese discutir a adoção da PPP sob a ótica

macroeconômica. Porém, diante de um volume limitado de recursos para investimento

público, o emprego deste modelo pode ser um mecanismo alternativo para a expansão de

serviços de infra-estrutura. Condizente com a discussão realizada até aqui, esta eficiência

dependerá da adequada seleção da estrutura de governança às características da transação. O

modelo contratual de PPP poderia, em princípio, promover ganhos de eficiência associados

com o crescimento do volume das transações, quanto maior o volume de investimentos

viabilizados com o mesmo montante de recursos públicos. Em outras palavras, a iniciativa de

Parcerias Público – Privadas poderia estabelecer uma espécie de efeito multiplicador do

investimento público.

Na avaliação da Comissão Européia (2003), os arranjos institucionais em PPP surgem

de diferentes formas e seu conceito está em construção. A dificuldade em se discutir o modelo

de PPP deriva do fato de ser um tema em estágio infante e, portanto com diferentes

interpretações. Não obstante este fato, o conceito de parceria resulta na possibilidade de

várias proposições criativas, multiplicando a dificuldade de definição.O propósito desta seção

não é exaurir os vários conceitos de PPP existentes, mas apenas apresentar seus princípios

básicos.

Como reconhece Spackman:

“The UK concept of public-private partnerships has extended widely since the late 1990´s to include complete or partial privatizations and joint ventures, as well as contracting out of public services with private financing.” (Spackman, 2002:298).

Outro fator complicador é a falta de clareza sobre a distinção entre o conceito

tradicional de concessão e de PPP. Inclusive, certa polêmica deriva de que alguns interpretam

31 Spackman ( 2002:288) aborda que “the fact that privately financed capital spending is off-budget is often the main reason for private financing”

93

a PPP como um contraponto ao investimento público e outros como uma substituição da

concessão usual. Com o auxilío da abordagem da Economia dos Custos de Transação, espera-

se exibir aqui um meio superar esta perspectiva dicotômica e demonstrar que estas são

diferentes estruturas de governança, cada qual com sua eficiência relativa.

No próximo tópico desta seção será apresentada uma tipologia de estruturas de

coordenação para a provisão de serviços de infra-estrutura. Antes, porém, cabe discutir a

característica básica de um modelo de PPP e seus possíveis méritos e vantagens para a de

promoção da universalização de serviços, do ponto de vista da teoria institucionalista.

Apesar da multiplicidade de modelos possíveis de PPP e das diferentes experiências

internacionais32 é possível encontrar um denominador comum para este arranjo institucional.

Trata-se de um contrato que delega ao setor privado, por um período determinado, um direito

de propriedade para operação de um ativo. Este contrato pode considerar, por exemplo, a

concessão para um investidor explorar uma região com a prestação de um serviço público,

mesmo que para tanto seja necessário construir uma rede de ativos.

A definição de Savas (2005) parece um ponto de partida apropriado para a discussão

das características básicas de um modelo de PPP.

“Infrastructure projects are increasingly being built through public-private partnerships (PPPs) (...) an arrangement where government states its need for capital-intensive, long-lived infrastructure and the desired facility is built using a complex combination of government and (mostly) private financing and then operated by private entity under a long term franchise, contract, or lease.” (Savas, 2005:7).

Em termos gerais uma PPP pode ser entendida como um contrato entre o Estado e um

agente privado, tratando-se de um contrato de concessão com especificações adicionais e que,

portanto, pode assumir comprometimentos (commitments) que não são factíveis em contratos

de concessão usuais, sem incorrer em custos de monitoramento significativos.33 Não parece

incorreto afirmar que as PPP’s consistem em contratos entre o poder público e o setor privado

32 Uma resenha interessante de experiências internacionais de PPP foi feita por Coutinho (2005). 33 Nas próximas seções este ponto será detalhado, enfatizando as relações entre setor público e privado que envolvam investimentos em ativos específicos e com alto grau de incerteza.

94

com a finalidade de prover equipamentos e serviços de infra-estrutura e outros serviços

públicos.34

Os contratos de PPP se fundamentam na contratação de um serviço, ao invés de um

ativo fixo. Tal diferença é visível em relação à obra pública. O setor público contrata um

serviço e não um volume de ativos associados com um cronograma (uma obra pública), ou

seja, remunera o ente privado por um serviço prestado dentro de especificações técnicas de

qualidade. Dario Peirone (2003: 24) argumenta que existem economias decorrentes do fato do

agente responsável por arcar com os riscos de investimento ser o mesmo que operará o

serviço. Portanto, uma condição básica dos projetos de PPP é que o setor privado deve

assumir os riscos de projeto, financiamento e operação.

Embora a discussão de modelos de PPP centre-se no seu emprego em iniciativas de

projetos independentes de concessões já estabelecidas, este conceito pode ser interpretado de

forma mais geral. Uma concessão tradicional com outorga onerosa significa que o serviço

delegado ao setor privado (área de concessão) não só possui uma demanda suficiente para

viabilizar a remuneração do capital privado, mas também a cessão de direito de propriedade

por parte do Estado de forma onerosa, isto é, com um pagamento por parte do agente privado

que recebe a concessão.

No entanto, como foi discutido no capítulo anterior, numa mesma região podem estar

reunidas diferentes condições estruturais de mercado, incluindo sub-regiões que isoladamente

não representariam viabilidade para um operador privado. Nesta situação, a outorga onerosa é

efetivamente superior ao montante de recursos pagos ao poder concedente, uma vez que sub-

regiões deficitárias devem ser atendidas devido ao cumprimento de metas de expansão de

serviço.

Assim, de forma análoga, também é possível discutir a possibilidade de uma

participação pública para viabilizar a expansão de investimentos em expansão da rede de

concessões já estabelecidas. O veículo pelo qual isso poderia ocorrer seria por meio de

procedimentos de re-equilíbrio econômico financeiro de contratos, resultando na redução do

pagamento pela outorga em contrapartida a expansão da rede de serviços. Portanto, é possível

34 Outros serviços que não de infra-estrutura, como serviços de saúde, segurança e educação que, como será apresentado no próximo capítulo, são mais adequados ao modelo brasileiro de PPP administrativa, enquanto que os serviços de infra-estrutura (utilities) são mais associáveis ã PPP patrocinada.

95

que este investimento adicional ao plano básico de concessão seja estabelecido na forma de

uma PPP.

Dois princípios básicos balizam qualquer iniciativa de contratação em PPP. O primeiro

princípio diz respeito à utilização de recursos públicos (Value for Money) e o outro princípio

pondera a necessidade de transferência de riscos para o setor privado (Risk Transfer).

Considerada a abordagem econômica de contratos apresentada no capítulo anterior, fica

evidente que este dois princípios possuem elevada interdependência, uma vez que a repartição

de riscos e rendas na relação contratual se desenvolve juntamente com a estrutura de

incentivos definida no contrato.35 Não obstante o fato destes dois princípios serem dois

aspectos básicos de uma PPP, sua operação não é simples, devido ao perfil incompleto do

contrato. Nas palavras de Peirone (2003: 20): “ both are difficult measures because there are

no set rules and they have to be applied subjectively: any decisions are open to later

challenge by controlling bodies.”

O princípio do Value for Money é o princípio de demonstração da melhor utilização

dos recursos públicos frente às alternativas para viabilizar determinado empreendimento.

Trata-se de uma demonstração de que o recurso empregado para o contrato de PPP gera um

valor superior ao valor gerado diretamente por intermédio de gastos públicos. No caso

britânico o projeto é submetido a uma análise detalhada de custo, incluindo o risco

transferido, e realizando uma comparação entre a alternativa estatal (obra pública) e com a

participação do setor privado. (Comissão Européia, 2003).

A hipótese implícita na aplicação do princípio de Value for Money é que os ganhos de

redução de custos de manutenção e investimento, pela atuação do agente privado, serão mais

do que suficientes para compensar a maior remuneração do capital exigida por estes agentes.

No entanto, como mencionado acima, a opção de participação do setor privado não se resume

à determinada estrutura contratual única, envolvendo diferentes alternativas, incluindo as

concessões clássicas. Desta forma, se for ampliado o foco para incluir o valor de ativo que, ao

término do contrato, retorna para o Estado, este princípio não é uma exclusividade do modelo

de PPP.

De fato, a implementação de qualquer forma de relacionamento entre o setor público e

privado deve deixar claro a eficiência na utilização de recursos e ativos públicos. Mais

35 Ver Comissão Européia (2003)

96

precisamente, trata-se de uma avaliação da adequação do modelo contratual. Pode-se abordar

esta avaliação como uma comparação da eficiência relativa entre diferentes estruturas de

governança.

A repartição dos riscos entre setor público e privado é tão, ou mais importante para a

definição da PPP que o princípio do Value for Money. A diretriz básica da PPP é que cada

tipo de risco deve ser alocado para o agente que possua maior capacidade de suportá-lo e

mitigá-lo. Porém, quanto maior for o risco percebido pelo setor privado, mais salvaguardas

serão demandadas pelos agentes privados. Como visto no capítulo I, em ambientes de

incerteza e, conseqüentemente maior probabilidade de distúrbios, a exigência da parte que

investe em ativos específicos é um maior nível de salvaguardas. No caso de uma cobertura de

salvaguardas inapropriada, a conseqüência será uma maior remuneração exigida para o capital

investido.

O princípio de valoração do recurso público e da repartição, embora de forma menos

explícita, também se apresentam na definição de contratos de concessão usual. A diferença

para o modelo PPP dependerá da definição das especificidades do contrato em coordenar a

relação entre o ente público e privado. Os atributos da estrutura de governança é o que

distinguirão como estes princípios se diferenciam entre PPP, concessão e obra pública. O

corolário disto é a importância de se reunir critérios de seleção da estrutura de governança de

acordo com as características da transação.

Na seção 3.3 é realizada uma proposta de tipologia de identificação da estrutura de

governança apropriada às características dos investimentos em infra-estrutura necessários para

a universalização. Antes disto, é necessário ter clareza sobre a tipologia de estruturas de

governança para os contratos entre setor público e privado.

97

3.2.2 – A Relação Público-Privada para Provisão de Serviços de Infra-estrutura: O Novo Conjunto de Estruturas de Governança.

No tópico acima foi mencionado que os contratos de PPP são julgados pela literatura

com contrapontos às concessões comuns e à realização de investimentos públicos. O objetivo

desta seção é apresentar que esta avaliação dicotômica pode e deve ser superada. Para tanto,

uma alternativa é a discutir de uma tipologia de estruturas de governança.

Após a apresentação das características básicas de um contrato de PPP fica claro que

estes guardam aspectos comuns aos contratos de concessão clássicos, principalmente por

tratarem do mesmo objetivo de delegação de serviços públicos ao setor privado. De fato, estes

contratos são estruturas alternativas para coordenar a participação de atores privados em

atividades de caráter público, proteger o interesse dos usuários dos serviços e reger a

administração de recursos governamentais, seja pelo recebimento de outorgas ou pelo

pagamento de contribuições a concessionários.

Crampes e Estache (1997), mesmo que não se referindo diretamente ao modelo de

PPP, destacam que a remuneração de um operador privado pode ser composta de receita

auferida junto aos usuários ou alguma forma de subsídio estatal.

“The cost coverage and the net profit payment to the service provider can flow from two sources: from the market and from any kind of public subsidy.” Crampes e Estache (1997:5)

Em termos estruturas de governança, pode-se entender a concessão comum como um

mecanismo menos complexo, porém útil em situações nas quais as incertezas e as dinâmicas

de mudança podem ser alocadas ao setor privado, ou seja, em situações de menor

probabilidade de distúrbio. No caso de investimento em setores de infra-estrutura a incerteza é

função do grau de confiança no retorno esperado pelos investidores, ou seja, é função do grau

de desenvolvimento do setor.

Vale lembrar que o conjunto de formas de delegação de serviços de infra-estrutura ao

setor privado inclui a completa transferência do ativo por meio de privatização. Nessas

situações, o ativo não retorna à competência do setor público para nova licitação, trata-se de

uma transferência definitiva, mas isto não significa dispensar a regulação sobre a empresa

privatizada. Os setores de aviação civil e de transporte rodoviário de passageiros são típicos

exemplos desta categoria. Nestes casos o peso relativo de ativos fixos para a prestação de

98

serviços é muito inferior ao presente nos demais casos de setores de infra-estrutura. Não

obstante, estes serviços possuem menor nível de barreiras à entrada, logo, trata-se de situações

em que os incentivos de alta potência podem ser o atributo de adaptação suficiente.

O extremo oposto à privatização é a realização do investimento diretamente pelo setor

público, dispensando os gastos com a formação de contratos complexos para coordenar os

investimentos. Arcar com o custo de transação ex-ante para estabelecer a forma contratual

adequada e os dispêndios de monitoramento desta ex-post só se torna viável caso a

transferência de riscos e rendas ocorram em um montante suficiente para diluir este efeito. Em

outras palavras, em determinadas situações, a especificidade de ativos e as incertezas sobre os

termos do investimento significam que o custo de escolher uma opção externa é maior do que

o de realizar o empreendimento diretamente, apesar do custo mais elevado de realizar o

investimento diretamente. Um exemplo disto, e o nível de custo mais elevado apresentado em

empreendimentos públicos.

Saussier (2003) estudou a organização do setor de água na França, aplicando a

abordagem dos custos de transação. No entanto, o autor realizou uma análise puramente

dicotômica (make or buy), pois agrupou sob a mesma categoria de estrutura de governança

diferentes formas de delegação de serviços aos atores privados, incluindo genericamente

contratos de PPP e de concessão comum.

Vale ressaltar que a proposta realizada aqui se difere da apresentada por Saussier

(2003), por visar identificar as diferenças entre os modelos contratuais de concessão de

serviços de infra-estrutura ao setor privado. Diante disso, embora as diferentes alternativas

contratuais não constituam um espaço contínuo de contratos, elas apresentam um número

muito maior de opções com o advento da PPP.

Em suma, parece factível e relevante empregar a tipologia de estruturas de governança

de Williamson como ferramenta para analisar a seleção de contratos de PPP. O importante é

considerar a eficiência da adoção deste modelo contratual, conforme as especificidades do

objeto. No entanto, para compor a pretendida tipologia de estruturas de governança, resta

detalhar as possibilidades contratuais inerentes ao modelo de Parceira Público Privada.

No tópico anterior discutiram-se as características gerais do modelo de PPP, no

entanto os contratos deste arranjo institucional podem se apresentar com diferentes formatos,

99

sobretudo na forma de disposição da contribuição pública no empreendimento. Os contratos

de PPP podem ser diferentes de acordo com a alocação de risco entre os agentes, o retorno

financeiro esperado com a operação de serviço aos usuários e a forma de contribuição dos

recursos públicos para a remuneração do capital privado no projeto. Alguns modelos

contratuais em PPP, principalmente para serviço de saúde, educação e segurança, toda

remuneração do concessionário é composta por pagamento realizado pelo setor público.

Existem outras incitativas contratuais, como experimentadas no Chile, na qual o contrato tem

seu término definido com o atingimento de determinado valor presente de remuneração do

parceiro privado.36

Apesar do grande número de possibilidades contratuais, grosso modo o arranjo

institucional da PPP pode ser agrupado em duas categorias, conforme a forma de contribuição

do setor público para a remuneração de operador privado, doravante referida como

contraprestação pública37 38.

i) Contraprestação fixa;

ii) Contraprestação variável.

No modelo de contraprestação fixa, o Estado remunera parcial ou totalmente o

concessionário privado através de pagamento periódico fixo, para um dado patamar de

qualidade de serviço pré-definido contratualmente. Portanto, uma vez que o serviço esteja

disponibilizado na qualidade estabelecida em contrato, o Estado está comprometido em

realizar os pagamentos ao parceiro privado, mas, caso o nível de qualidade encontre-se

inferior ao definido, o pagamento pode ser reduzido em todo ou parte, além de acionar, como

previsto, outros mecanismos de sanção.

Desta maneira, na PPP de contraprestação fixa existem óbvios mecanismos de

enforcement, com limite na liquidação do contrato (caducidade da concessão). No entanto, o

custo de transação ex-post de realizar o monitoramento da qualidade fica a cargo do poder

concedente, não muito diferente do que ocorreria numa concessão comum de outorga

onerosa. Vale lembrar a observação de Barzel (1997), de que a multiplicidade de atributos de

36 Ver Engel, Fischer e Galetovich (2003; 2006). 37 Contraprestação pública é a terminologia empregada no marco institucional do modelo de Parcerias Público Privadas no Brasil, objeto de análise do próximo capítulo. 38 Ver Silveira e Brito (2005).

100

uma transação torna precário o monitoramento dos contratos e o efeito de reduções de

qualidade é equivalente a uma elevação implícita de preços.

A correspondência de um contrato de PPP com contraprestação fixa com as

características do modelo de contratos de preço fixo é significativa. Isto porque nos contratos

de preço fixo os benefícios de redução de custos serão integralmente absorvidos pelo

concessionário. Por outro lado, o concessionário se encontra mais exposto a distúrbios pelo

fato de possuir um volume de receita garantido pelo Estado.

O problema para o setor público é que um valor da contraprestação fixa além do

necessário para viabilizar o investimento significa uma perda de eficiência, pois menos

empreendimentos poderão ser realizados com este volume de recursos, quer via PPP ou

investimento público. Neste caso, o mais eficiente seria reduzir o lucro do agente privado

nesse projeto, para viabilizar outro empreendimento. Note que este é um típico exemplo da

limitação do critério de Pareto, mas adequado a uma abordagem normativa a partir da

economia neo-institucionalista, conforme foi discutido no capítulo I.

Os contratos de PPP com contraprestação variável podem se apresentar com vertentes

diferenciadas, mesmo porque se trata de uma categoria de contratos que permite uma maior

flexibilidade na modelagem de contratos. Algumas experiências geraram um estigma negativo

sobre este tipo de contrato, como o modelo de pedágio-sombra (shadow toll) empregado nas

rodovias portuguesas39. O problema deste caso foi adotar uma contraprestação pública em

função crescente do volume de tráfego observado na rodovia. Neste sentido, ao invés de

ocorrer um compartilhamento de riscos com o setor privado, o Estado assumiu um risco pró-

cíclico, pois à medida que a remuneração oriunda das tarifas aumentava, crescia junto o

pagamento público. Assim, o interessante é que a participação pública funcione no sentido

inverso da arrecadação de tarifas, ou seja, atuando como uma compensação contra-cíclica.

As propostas de contraprestação variável devem ser estabelecidas considerando o

conceito de salvaguarda para o estímulo à participação privada em atividades cuja atratividade

não ocorreria de maneira espontânea. Por parte do agente público, a adoção de uma

contraprestação variável é propícia, na medida em que a demanda de serviço revelada torne a

concessão livre da necessidade da contraprestação pública. Inclusive, dependendo da forma

do contrato, a contribuição pode se tornar uma espécie de outorga onerosa.

39 Ver Coutinho (2005)

101

É, portanto fundamental conceber que esta categoria de modelo introduz a

possibilidade de adoção de cláusulas de risk-sharing, com rebatimento sobre o volume de

recursos públicos destinados ao agente privado. Isto, entretanto, não implica a perda de

incentivos de alta potência para redução de custos, uma vez que os ganhos de produtividade

seguem serão apropriados pelo parceiro privado. Neste sentido, os modelos de PPP de

contraprestação variável reúnem características que os tornam situações híbridas entre

modelos de cost-plus e preço fixo, pois preservam em alguma medida os highpowered

incentives para redução de custos, mas introduz uma proteção à remuneração do capital

privado como ocorre em contratos e cost-plus, com maior participação atributos de adaptação

do tipo C.

Neste sentido, o modelo de PPP atenderia a demanda apontada por Crampes e Estache

(1997) por algum instrumento de risk sharing alternativo à total assimetria definida no regime

de preço-teto.40 Estes elementos contratuais são uma forma de viabilizar investimentos

privados em mercados que não se apresentam atrativos devido, entre outros fatores, ao grau

de incerteza. Como aponta Laffont, et. al. (1997:26) “a minimum income guarantee would be

included as a mean to make risky concessions attractive to private agents.”

Contratos com garantia de receita mínima funcionam como uma espécie de take-or-

pay parcial. Mais precisamente, é possível considerar que certos modelos de PPP de

contraprestação variável envolvam uma combinação dos incentivos do take-or-pay com o

risk-sharing.

No entanto, contratos que envolvem mecanismo de pagamento derivado de um

monitoramento de variáveis de performance não devem ser considerados com uma solução

universal. A criatividade em propor contratos com este formato deve contemplar seu custo de

implantação e de monitoramento. Neste aspecto deve ser compreendida a observação de

Barzel (2002: 15) “A necessary condition for sharing is that the output is easily identifiable

and divisible because the sharing of the gains is what renders the collaboration self-policing,

to some degree.”

Para Laffont et.al. (1997), o uso de modelos contratuais com garantia mínima deve ser

acompanhado por um artifício de auto-seleção de alguns termos contratuais. Embora os

40 A conclusão de Estache e Crampes (1997) é a existência de vantagens de regimes híbridos, principalmente para reduzir a possibilidade de não ocorrer investimentos.

102

autores não sejam explícitos, pode se considerar que neste caso deve existir um menu de

contratos como um instrumento auxiliar no mecanismo de leilão. Crampes e Estache (1997:8)

também enfatizam a importância de um de menu de contratos, como forma de selecionar e

revelar as informações do agente privado. Para os autores, este seria um meio de facilitar as

negociações e ajustes durante a execução do contrato.

Ao comparar os modelos de contraprestação fixa e variável em termos de estrutura de

governança, cabe destacar a contraprestação variável possui mais atributos de adaptação tipo

C, uma vez que permite um nível de comprometimento mais elevado entre as partes

contratantes. Não obstante, este tipo de modelo contratual em PPP representa uma estrutura

contratual mais complexa. Trata-se de uma alternativa para projetos com elevado nível de

incertezas, que reduzem o grau de confiança na viabilidade do investimento com capital

privado.

A contraprestação variável significa um instrumento de ajustamento endógeno dos

contratos. A incerteza de demanda e de custos de implantação do projeto resulta na

incapacidade de antecipar ex-ante qual a estrutura contratual mais adequada. Outro fator que

demanda estruturas de coordenação mais cooperativas e mais seguras é o volume em termos

de requisitos de capital próprio do investimento. Projetos muito grandes em volume de

recursos elevam o nível de risco, demandando estruturas mais seguras para as partes. Em

termos de estruturação do contrato, isso equivale a lidar com um nível de incerteza maior e

corresponde também a maior complexidade contratual na estrutura de governança.

Se não existe incerteza de demanda significativa, a contraprestação fixa pode ser

melhor. Caso hipoteticamente não existisse incerteza, definir uma contraprestação fixa ou

variável seria um tema superado. Em suma, as PPP de contraprestação variável significam de

fato uma estrutura de governança mais complexa que as de contraprestação fixa e devem,

portanto, serem aplicadas em projetos cuja especificidade dos investimentos e o nível de

incerteza justifique sua adoção.

A tipologia de Williamson de estruturas de governança estabelece como casos

extremos a transação coordenada pelo mercado e no outro pólo a transação ocorrendo intra-

firma. Entre estes dois extremos um conjunto de soluções híbridas sem, contudo, constituir

um contínuo de soluções. Nos termos do presente estudo, a obra pública seria o análogo para

a firma como estrutura de governança do investimento público direto, no outro extremo a

103

firma privatizada não-regulada é a solução mais próxima de mercado, como estrutura de

coordenação.

No entanto, o mais interessante nesta analogia é a definição das formas híbridas

representada pelos contratos de concessão e PPP. Como mencionado acima, os contratos de

PPP são estruturas mais complexas do que os contratos de concessão usual. Da mesma forma,

os contratos de PPP que dispõem de mecanismos de contraprestação variável, ao

proporcionarem mecanismos de compartilhamento de riscos e de rendas, representam uma

estrutura com mais atributos de adaptação cooperativa do que a PPP com contraprestação

fixa.41

A tipologia de estruturas de governança na relação entre setor público e privado para a

provisão de serviços de infra-estrutura combina de várias maneiras os atributos de

coordenação das transações. Em outras palavras, cada estrutura de governança apresenta seu

mix de atributos Tipo A (high powered incentives) e Tipo C (flexibilidade ex-post). Como

discutido no capítulo I, cabe ressaltar que esta combinação entre os atributos não se expressa

em uma função contínua, portanto determinadas transações que não encontram a ponderação

perfeita entre incentivos de alta potência e flexibilidade ex-post. Portanto, e como era de se

esperar, na relação entre Estado e setor privado segue válido o conceito de ineficiência

irremediável de estruturas de governança. A diferença é que, com os modelos contratuais em

PPP, o espaço de estruturas de governança torna-se mais completo logo, a preocupação com a

seleção da estrutura relativamente mais adequada torna-se um tema de destaque para política

setorial. A figura abaixo auxilia a apresentação das estruturas de governança.

41 Na seção 3.4 retoma-se a discussão sobre a seleção de estruturas de governança.

Figura 3.1: Conjunto de Estruturas de Governança

Adaptação Tipo A A

B

104

As figuras em forma de representam as alternativas organizacionais da relação entre

Estado e setor privado para coordenar a provisão de serviços de infra-estrutura.

A figura A representa a empresa privada (ou privatizada), na qual só não se trata de

uma relação spot pelo fato da empresa estar submetida a controles regulatórios do Estado.

Porém, isto acontece num nível muito mais reduzido e menos complexo do que as empresas

concessionárias de serviços de infra-estrutura. A maior mobilidade dos ativos, como menor

perfil de sunk cost e a presença de um maior número de agentes reduzem a interdependência

bilateral e, como visto, o risco de hold-up nos investimentos. Como mencionado acima,

exemplos de serviço de infra-estrutura com este perfil são os transporte rodoviário de

passageiro e a aviação civil.

A figura B simboliza as concessionárias de serviço de infra-estrutura regidas pelo

contrato de concessão clássico, com pagamento de outorga ao Estado. Trata-se de uma relação

regida por um contrato de longo prazo, com alguns mecanismos mitigadores de riscos

necessários para o investimento em ativos específicos. Este aspecto não se apresenta em A.

No entanto, principalmente ao envolver a regulação por regime de preço-teto, destaca a ênfase

por atributos de coordenação do tipo A. Como discutido acima, este modelo contratual possui

C

D

E

Adaptação Tipo C

105

mecanismos limitados para gerar incentivos e segurança de investimentos em expansão de

rede, sobretudo nas em regiões críticas em termos do nível de universalização de serviços.

Os modelos de contratuais em PPP com contraprestação fixa estão representados na

elipse C. Nesta, a estrutura de coordenação é mais cooperativa que a B e permite lidar com

investimentos mais complexos, incertos e específicos na medida que uma parcela do risco é

assumido pelo Estado, por intermédio de uma contribuição fixa ao empreendedor privado que

arcar com os investimentos em ativos específicos.

A figura D representa a PPP com contraprestação variável, que da mesma forma que

em C estabelece um relacionamento em um contrato de longo prazo entre as partes. Como já

discutido, a maior possibilidade de mitigação e compartilhamento de riscos, bem como meios

de distribuição de rendas permite a este modelo contratual adaptar-se ex-post às condições

expressas por investimentos com grande grau de incerteza e alto grau de especificidade de

ativos. Tal mecanismo reduz o risco de hold-up e viabiliza a participação de agentes privados

que, sob estruturas de governança mais simples, tenderiam a recusar o empreendimento.

Por fim, a figura E é a estrutura de governança análoga à firma no modelo de

Williamson. Uma vez que determinados empreendimentos, seja pelo alto grau de incerteza, ou

pelo perfil de especificidade de ativos, constituem-se em uma transação demasiadamente

complexa e incerta, com elevados custos de transação. A introdução de mecanismos de

organização por meio diferente da obra pública implicará tanto no baixo interesse do setor

privado, como pelo alto custo de formalização e monitoramento contratual.

Em suma, o que foi apresentado é uma alternativa de classificação de diferentes

modelos contratuais de delegação ao setor privado de serviços públicos. Trata-se de um passo

preliminar para encaminhar a discussão da forma de aplicação de modelos de PPP em setores

de infra-estrutura. Contudo, a avaliação de contratos de PPP demanda mais esforços,

principalmente para destacar as diferenças da forma de adaptação e coordenação existentes

entre PPP de contraprestação fixa e de contraprestação variável. Com isto será possível

concentrar a discussão sobre a seleção de estruturas de governança, permitindo encontrar as

condições que favorecem o emprego de modelos contratuais em PPP.

106

3.3 – Contrato de Parceria Público Privada: Critérios Preliminares de Avaliação.

Esta seção aprofunda o debate sobre o modelo contratual de Parceira Público Privada,

principalmente ao discutir em maior detalhe o papel exercido pela contraprestação pública em

viabilizar a expansão dos serviços de infra-estrutura. Neste intuito discute-se brevemente

como o modelo contratual em PPP pode ser interpretado como um multiplicador para os

recursos públicos para investimento em infra-estrutura. Portanto, esta forma contratual

configura-se como um aspecto ainda mais importante em países em desenvolvimento, pois

reúnem a carência de ativos de infra-estrutura, assim como apresentam recorrentemente

restrições fiscais. Além disso, uma representação do mecanismo de contraprestação variável

será apresentada com o objetivo de discutir seu papel em tornar viável empreendimentos de

infra-estrutura para agentes privados.

No entanto, o objetivo principal desta seção é construir uma tipologia de estruturas de

governança para a relação entre Estado e setor privado na provisão de serviços de infra-

estrutura. Como discutido acima, a adequação entre a estrutura de governança e a transação

que esta governa é o fator determinante da eficiência econômica. Assim, a tipologia

construída é um método de análise que torna possível uma primeira aproximação para seleção

da forma contratual. Logicamente, este método não torna dispensável considerar as

idiossincrasias de cada caso avaliado.

3.3.1 – Contrato de Parceria Público Privado e a Expansão dos Serviços de Infra-estrutura: o Papel da Contraprestação Pública

Como visto acima, modelos de PPP justificam-se na medida em que se apresentam

como alternativa de governança para investimentos em serviços de infra-estrutura, isto é,

ampliam o espaço de contratos factíveis. Determinados projetos, sem a presença de

contraprestação pública garantindo um montante de receita seja por pagamento fixo ou uma

garantia (variável), só poderiam ser realizados por meio de obra pública.

Desta maneira, a exclusão desta estrutura de governança implica que a realização de

determinados empreendimentos, necessários para ampliar o nível de universalização dos

serviços, dependeria de investimento público direto. Não obstante este fato, como foi

discutido no capítulo anterior, a conjugação de universalização de serviço e concessão privada

sob regulação por incentivos é uma tarefa difícil, sobretudo em países em desenvolvimento

com baixo grau de maturidade de sua rede de infra-estrutura.

Considerada a relevância e a existência de um conjunto de situações a serem ocupados

por modelos de PPP, os volumes de investimento gerado por estes modelos dependerá da

capacidade da contraprestação pública ser mitigadora de riscos e promotora da viabilidade

econômica para o capital privado em setores de infra-estrutura. Diante de um montante fixo e

limitado de recursos públicos disponíveis para a formação de parcerias, quanto menor o

volume de contribuição pública despendida por contrato, maior o número de

empreendimentos que poderão ser estruturados por este modelo, ou maior o número de

projetos que poderão ser encaminhados em outro arranjo institucional. Assim,

contraprestações em excesso em casos particulares reduzirão a capacidade de estabelecer

outros projetos, seja em PPP, seja de outra forma que demande recursos públicos.

Uma forma de analisar a participação pública por projeto é comparar a receita auferida

com a contraprestação pública com o montante de investimento, ambos trazidos a valor

presente. Considerando py o valor presente da receita oriunda da contraprestação pública e I

os investimentos, então a relação entre estes pode ser expresso da seguinte forma:

ψ = Ι / y p (3.1)

A valorização do recurso público investido (value for money) ocorre quando ψ > 1,

pois caso contrário o investimento público seria uma alternativa mais econômica.

Considerando que esta participação provavelmente se apresentará de forma diferente entre os

contratos, vale exibir o seu valor médio, conforme definido abaixo:

Isto posto, vale apresentar o efeito da participação pública no agregado sobre a

capacidade de ampliar o volume de investimentos em serviços de infra-estrutura. Segue-se na

equação 3.2 abaixo, uma forma de agregar os projetos.

ii

iii

projetocada de ãoparticipaça :sendo

(3.2)

ϕ

ψϕ∑=Ψ

107

108

Se cada projeto individual apresentar um montante de investimento superior à

contrapartida pública empenhada, conseqüentemente esta relação valerá no conjunto. Desta

forma, o valor de Ψ, média ponderada da relação entre investimento e participação pública

dos projetos, será um valor maior que um.

Considerando um orçamento disponível para investimento público em setores de infra-

estrutura limitado. Este volume de recursos, o montante de ativos gerados com este recurso,

após a formatação de contratos de PPP, pode ser em até Ψ vezes superior ao recurso inicial

para investimentos públicos.

Visto desta maneira, o modelo de PPP possui um efeito multiplicador dos recursos

públicos para investimentos em infra-estrutura. Portanto, a justificativa para utilização de

recursos públicos expressa no princípio do value for money pode ser satisfeita não só em

projeto individual, mas também no agregado.

No entanto, na representação acima não se considerou vantagens relativas do setor

privado para a realização de investimentos e manutenção dos serviços com menor nível de

custo, algo que traria mais vantagens para a utilização de modelos de PPP. Esta é a

justificativa usualmente empregada na literatura para a delegação de serviços para a iniciativa

privada. Como visto acima, o benefício de modelos de PPP para ampliar os investimentos de

infra-estrutura ocorre sem considerar este fato estilizado.42

Se quanto menor o valor médio de contraprestação maior será a eficiência deste

modelo, então maior também será a eficiência de contratos de PPP em promover, coeteris

paribus, a universalização de serviços visto que viabiliza maior volume de investimentos.

Desta forma, o Estado poderia definir metas e parâmetros para a participação pública em

iniciativas de PPP.

A definição do patamar de participação relativa se torna uma tarefa mais complexa

quando a contraprestação pública é do tipo variável. Nestes casos, existirá apenas uma

estimativa para o valor presente da contribuição pública. A seguir, apresenta-se um modelo

simplificado para facilitar a discussão acerca da forma de definição do montante de recursos

públicos em um modelo de PPP com contraprestação variável.

42 Por outro lado, existe um custo de definição de redigir e definir os contratos em PPP que também, por simplificação, foi desconsiderado.

O interesse de investidores privados em participar de empreendimentos de infra-

estrutura dependerá da expectativa de remuneração do capital investido. Considerando que a

tarifa para a prestação dos serviços infra-estrutura será objeto de regulação, ou seja, terá um

limite superior, então o principal vetor de crescimento de receita ao longo do tempo

responsável pela viabilidade do projeto para investidores privados será a evolução da

quantidade demandada de serviços de infra-estrutura. Assim, coeteris paribus, a viabilidade

do investimento pra agentes privados dependerá da quantidade demandada.

Conforme discutido no capítulo II, o retorno do investimento cresce quanto maior a

renda per capita e a densidade populacional. Em outras palavras, por unidade de ativo

investido, a quantidade demandada dependerá do comportamento da renda per capita e da

densidade populacional no decorrer do período de concessão. Desta forma, Uma maneira de

apresentar esta característica é considerar a quantidade demandada expressa por:

109

++−

),,( ii dytQQ = (3.3)

Sendo:

t a tarifa regulada do serviço,

y a renda per capita da região de concessão; e

d a densidade populacional.

Assim, dada a tarifa definida para provisão dos serviços, se a demanda esperada de

serviços por usuários (Q) não for suficiente para atingir a taxa mínima de remuneração do

capital privado (r*)43, então será remota a possibilidade de estabelecer uma concessão

clássica, mesmo sem o pagamento de outorga. Nestas situações, os contratos em PPP podem

ser uma forma de viabilizar o investimento.

A participação pública necessária para viabilizar o investimento ocorre por meio de

uma contribuição governamental ao empreendimento que incrementa a receita obtida pelo

agente privado.

43 Esta taxa é uma remuneração esperada na projeção de um fluxo de caixa de um projeto de investimento. Se a taxa interna de retorno (TIR) de um investimento for inferior a remuneração mínima exigida (r*) por agentes privados, então não haverá interesse pelo empreendimento. Um aspecto fundamental para tanto é a estimativa de demanda do serviço prestado a partir do ativo investido.

Logo, a função receita (R) do operado privado define-se por:

110

TtQR = + (3.4)

Considerando T definido como um montante fixo de recursos monetários, então o

contrato de PPP será do tipo de contraprestação fixa.

t a tarifa paga pelos usuários do serviço.

T o volume de recursos públicos pagos ao operador privado; e

Sendo:

Alternativamente, pode-se definir T como volume de recursos variável, isto é uma

contraprestação variável. Neste intuito, existem duas possibilidades: uma é defini-la em

função de quantidade de serviço; outra é estabelecê-la em função da tarifa.

Caso se defina em função de uma tarifa, significa que a tarifa paga pelo usuário tu é

diferente da tarifa recebida pelo prestador de serviço t. Isto porque o Estado complementa a

tarifa paga pelo usuário em t p, ou seja:

pu

p=

ttt += (3.5)

Neste caso, o valor da contraprestação T será expresso por:

QtT (3.6)

No entanto, cabem alguns comentários a respeito desta alternativa de modelo de PPP

com contraprestação variável. O primeiro aspecto é que a definição de uma tarifa subsidiada

traz a tona à necessidade de apurada identificação dos usuários favorecidos pela tarifa

especial. Como discutido no capítulo II, existe o problema de gerar benefícios para usuários

com condições de arcar com a tarifa sem subsídio. O segundo comentário diz respeito ao

possível efeito shadow toll, como ocorrido nas concessões rodoviárias portuguesas. Conforme

comentado na seção anterior, quanto maior a quantidade demandada pelos usuários, maior a

contraprestação pública. O problema é que caso a demanda ultrapasse o esperado, significa

que se estará incorrendo em pagamentos públicos em quantidade superior ao necessário para

viabilizar o empreendimento com participação privada. Uma vez incorrido neste problema, os

custos de renegociação do contrato entre Estado e agente privado serão elevados, logo,

representado dificuldade de adaptação da estrutura de governança.

O terceiro comentário, e talvez o mais importante, se refere à necessidade de gerar

salvaguardas para investimentos em condições de incerteza, como os projetos green field.

Uma vez que a contrapartida pública varia com a quantidade demanda, por definição incerta

em empreendimentos novos, então existe um problema desta alternativa não gerar a

salvaguarda para investimentos em ativos específicos. Isto porque a soma da receita de

usuários e contraprestação pública ficaria abaixo do necessário para remunerar o capital

investido.

Uma alternativa de contrato de PPP se dá com uma variação da contraprestação de

acordo com a quantidade demandada pelos usuários. Uma vantagem é que os ajustes na

contraprestação são mais simples de serem implementadas, economizando em custos de

monitoramento, assim como reduzindo a probabilidade de processos de renegociação

contratual.

Neste caso, a contraprestação variável assume a seguinte forma:

p= tQT (3.7)

Sendo t a mesma tarifa paga pelos usuários e Q p a quantidade assegurada pelo Estado.

Vale destacar que a tarifa t é estabelecida observando critérios de modicidade, mas

sem considerar nenhum mecanismo de subsídio na estrutura tarifária.

Segue-se que a função receita pode ser re-escrita da maneira abaixo:

( )pt QQQ +=

tQR , (3.8)

= :onde

Definindo a contraprestação variável desta forma garante-se a salvaguarda para o

investimento nos ativos específicos para a provisão de serviços de infra-estrutura, pois o

Estado retira a incerteza de demanda sobre o empreendimento. Contudo, um instrumento

contratual em contraprestação variável deve incorporar meio de compartilhamento de

resultado ao longo do período do contrato.

111

O primeiro aspecto é criar mecanismos que evitem contribuições públicas acima do

necessário para viabilizar o investimento. Desta forma, considerando Q* a demanda que gera

remuneração do capital privado, então se pode reescrever a quantidade assegurada da seguinte

forma:

tp * QQQ −= (3.9)

A equação 3.9 pode ser reescrita da seguinte maneira:

*

tQ

onde)1(

Q

QQ

=

−=

φ

φ *p

(3.10)

Logo, a quantidade demanda percebida pelo agente provado passa a ser:

*t )1( QQQ φ−+= (3.11)

Seguindo esta regra de ajustamento, o concessionário sempre terá uma quantidade

demanda de *Q independentemente de sua composição entre consumo de usuários e de

contribuição pública. Assim, tudo mais constante, este agente terá garantido uma taxa

remuneração mínima para o capital investido (r*).

Vale lembrar que reduções de custo serão absorvidas integralmente pelo prestador de

serviço. Apesar da segurança para a remuneração do investimento criada por este modelo de

contrato de PPP, não se cria incentivo para negligência na administração da estrutura de

custos, ao contrário da regulação pelo custo de serviço ou em qualquer contrato de perfil cost-

plus.

Existem três situações para o comportamento da quantidade assegurada pelo Estado.

01 onde III; caso ,

01 onde II; caso ,

0 1 onde I; caso ,

*

*

<∴>>

=∴==

>∴<<

TQQ

TQQ

TQQ

t

t

φ

φ

φ*t

(3.12)

112

113

A regra de contraprestação, como definida nesta seção poderia gerar situação tanto de

contribuição de recursos públicos para a firma concessionária, caso I, como o pagamento

desta ao governo numa espécie de outorga onerosa, caso III. Existe uma única situação que

não gera pagamentos de parte a parte, caso II: é a situação cuja demanda de usuários garante,

coeteris paribus, a remuneração do capital privado.

O modelo contratual de contraprestação variável também pode ser definido, sem

grandes complicações adicionais, estabelecendo com limites de piso e teto para a

contraprestação pública, gerando um mecanismo mais preciso para o compartilhamento de

risco. O piso é definido para fins de contraprestação como o valor máximo que o setor público

garantiria ao parceiro privado. Uma alternativa é definir a proporção de compartilhamento de

ganho no caso III, da mesma forma que for definido a garantia pública no caso I.

Neste modelo, o montante de contraprestação pública se define em termos de valor

esperado, atribuindo-se probabilidades para cada um dos casos. Considerando que o caso II é

representado por apenas um ponto, então assumir para fins de simplificação que este cenário

possui probabilidade nula não gera grande perda de poder explicativo à análise. Esta

probabilidade dependerá da evolução da demanda pelo serviço ao longo do contrato de

concessão e será dependente dos fatores estruturais de renda per capita e de densidade

populacional.

Como discutido acima, diferentemente de setores de bens de consumo, os serviços de

infra-estrutura são essenciais à cesta de consumo, donde a sua demanda tem um perfil menos

preço-elástico que os demais bens. A demanda por acesso e certas características dos setores

de infra-estrutura pelo lado da oferta, como sub-aditividade de custos, favorecem a hipótese

simplificadora que a demanda pelo acesso aos serviços tende a ter um perfil cumulativo ao

invés de cíclico. Diante disto, o montante de recursos públicos destinados a determinado

empreendimento será função do crescimento da demanda no longo prazo.44.

Assim, a projeção de crescimento de demanda será um elemento central pra

compreender o papel da participação do setor público. Assim, cabe algum comentário sobre

processos de difusão e crescimento de demanda no longo prazo.

44 Para fins de definição de um contrato de PPP, haverá uma projeção de demanda que balizará tanto a decisão do setor público como do investidor privado.

114

Geroski (2000) apresentou uma resenha de modelos de difusão, onde a variedade

atende às especificidades do problema avaliado. Para fins de ilustração deste tópico, vale

apresentar o modelo epidêmico, tem por característica descrever um processo de difusão em

uma curva S, isto é, uma função logística de difusão. Com base em modelo de difusão, o

Estado deve avaliar qual o valor esperado de contraprestação considerando uma estimativa

para o parâmetro de difusão dos serviços após a implantação da infra-estrutura. A difusão no

caso de serviços de infra-estrutura, principalmente em regiões de rede incipiente, será

determinada pela a probabilidade de indução de demanda gerada pela disponibilidade de um

serviço inexistente previamente, ao menos com o nível qualidade na condição que passa a ser

ofertada.45

Em termo da presente discussão, considerar a existência deste efeito pode ser uma

avaliação pertinente da evolução dos serviços de infra-estrutura. Isto porque além da demanda

projetada de crescimento da utilização do serviço, em muitos casos, diante da baixa

maturidade de serviços de infra-estrutura em países em desenvolvimento, a expansão da rede

de serviços pode ter um significativo efeito de indução de demanda.46

Independentemente das idiossincrasias setoriais, este efeito indução de demanda

envolverá grande incerteza de mensuração47 e, portanto se apresenta como um risco para o

setor público no caso da adoção de termos fixos de contraprestação, uma vez que negligenciar

este efeito provavelmente resultará em um volume de recursos destinados ao parceiro privado

superior ao necessário para garantir a atratividade do investimento.

Por outro lado, diante da incerteza sobre o comportamento deste parâmetro, os

agentes privados dificilmente o incorporarão na definição de sua taxa de remuneração de

capital desejada para a realização do investimento. Desta forma, o uso de contratos com

contraprestação variável pode ser visto não só como uma garantia de remuneração mínima

para o parceiro privado, mas como um seguro para o setor público contra o excesso de

empenho de recursos em um determinado empreendimento.

Contudo, atingir o nível ótimo de contraprestação não é factível diante do alto grau

45 Outra fonte deste efeito é o feedback entre o investimento em infra-estrutura e o crescimento da renda. 46 Geroski (2000). 47 Visto que dependerá de uma de história prévia para sua apurada aferição.

115

de incerteza e a complexidade para a formação de contratos (ineficiência irremediável). De

fato, como discutido no Capítulo I, critérios de eficiência num ambiente com custos de

transação significativos devem atentar para a perseguição de índices de satisfação ao invés de

otimização. É fundamental frisar que, apesar da importância do efeito multiplicador de

recursos públicos para a expansão dos serviços de infra-estrutura, a eficiência do modelo de

PPP passa pela apurada seleção da modalidade de contraprestação fixa ou variável. Isto é,

corroborando o que foi dito acima, a eficiência dependerá da boa adequação entre os projetos

individualmente como sua estrutura de coordenação.

3.3.2 – Critérios para Seleção do Modelo Contratual de Parceira Público Privada

Na seção 3.2 discutiram-se os modelos contratuais de PPP como estruturas de

coordenação, assim como concessão comum e obra pública. Para fornecer critérios de

avaliação de contratos de PPP, vale detalhar as possibilidades de emprego de cada tipo de

contrato de concessão a fim de subsidiar a discussão de seleção da forma contratual. Apesar

da relevância desta proposição no presente nível de generalidade, logicamente, este processo

se completa com a inclusão de parâmetros específicos ao setor sob avaliação.

Porém, o primeiro passo a ser dado na definição de modelos contratuais em setores de

infra-estrutura é identificar as suas diretrizes gerais. Neste intuito, esta seção também

apresenta um conjunto de indicadores para análise de uma alternativa de concessão em PPP.

Como visto acima, se a estrutura de coordenação for excessivamente complexa,

incentivará um menor número de transações, pois reduzirá recursos para investimento, isto é,

reduzirá a disponibilidade de recursos para a estruturação de contratos em PPP. Vale lembrar

que o estabelecimento destas estruturas envolve custos de administração e monitoramento

que, se mal empregados, representarão ineficiência na seleção contratual. Por outro lado, se a

estrutura for demasiadamente simples para as características do investimento, não

proporcionará a atratividade e a segurança para investimentos sob incerteza envolvendo ativos

específicos, portanto, reduzindo o número de transações.

Não há, contudo, uma solução ótima na seleção da estrutura de governança, devido à

impossibilidade de antecipar ex-ante todos os aspectos que influenciarão o relacionamento

entre as partes, bem como a inexistência de um contínuo de opções de formas contratuais.

Assim, algum nível de ineficiência irremediável persistirá na relação entre Estado e agentes

privados. Contudo, vale o critério da observação da natureza e o perfil do investimento e sua

complexidade na busca do modelo contratual mais próximo às necessidades de cada

empreendimento.

Para melhor entendimento desta questão para contratos de PPP, recorre-se aqui a uma

tipologia de situações, a partir de algumas características que definem o ambiente de

transações no setor de infra-estrutura. Como apresentado na figura 3.2 abaixo, no eixo

horizontal apresenta-se a dimensão estrutural para o investimento em serviço de infra-

estrutura.

Quanto maior o valor no eixo horizontal, maior a renda per capita e a concentração da

população no espaço favorecendo a viabilidade (remuneração) do investimento privado. No

eixo vertical se expressa o inverso do grau de complexidade da transação, associado à

incerteza de demanda e de custos de execução de um investimento novo (green field). Assim,

quanto maior o valor em vertical, menos sujeito aos problemas de incerteza e de

especificidade de ativos se encontra o investimento. Considera-se, obviamente, que os

investimentos em ativos de infra-estrutura de rede possuem o perfil de alta especificidade, e

demanda-se assim maior nível proteção (salvaguarda) para realizar investimentos.

Figura 3.2: Quatro Quadrantes de Ambiente de Transações

I

III

II

IV

Destaca-se na Figura 3.2 a formação de quatro situações (I, II, III, IV) representativas

de quatro tipos de casos para avaliação da estrutura de governança a ser empregada. 116

117

No caso I as condições estruturais não são favoráveis para viabilizar a remuneração de

investidores privados, mas o perfil dos investimentos necessários não se constitui no caso

mais grave de especificidade de investimento. A dificuldade para definir o modelo contratual

de concessão clássica se centra na baixa expectativa de remuneração do capital privado por

intermédio do pagamento realizado pelos usuários do serviço.

Desta forma, a demanda por uma forma contratual em PPP demanda apenas viabilizar

a atração de investimentos privados. Portanto, a participação pública através de uma

complementação de receita na forma de uma contraprestação fixa tende a ser um modelo

contratual adequado.

O caso II retrata uma região com perfil de superior em temos de renda per capita e de

concentração espacial da população, ou seja, trata-se de uma região favorável para auferir

receitas de usuários de serviços de infra-estrutura por unidade de ativo empregado. Além

disso, representa-se nesta categoria o investimento cujo grau de incerteza é baixo, ou seja,

regiões na qual o grau de novidade (green field) não é significativo. Por exemplo, nesta região

os investimentos resumem-se à melhoria de capacidade da rede ativos existentes. A conjunção

destes fatores faz do caso II uma situação onde a complexidade do investimento favorece o

emprego de concessões clássicas, inclusive com a possibilidade de pagamento ao setor

público de outorgas capturadas no leilão de seleção de prestadores de serviço.

O caso III, ao reunir condições estruturais mais restritivas e alto grau de incerteza

associada ao investimento, torna a transação altamente complexa para ser coordenada por

concessões clássicas e mesmo por uma contraprestação fixa. Em situações descritas neste caso

a necessidade de garantia mínima de remuneração tende a ser elevada e no limite se aproxima

da necessidade de uma transação intra-firma, isto é, uma obra pública.

Portanto, a alternativa que favorece a participação privada no empreendimento se faz

um garantia (salvaguarda) de receita mínima através de um modelo de PPP com

contraprestação variável. Contudo, uma vantagem desta solução é permitir o uso de incentivos

para a redução de custos, pois os benefícios decorrentes da redução de custos serão

apropriados pelo operador privado. De fato, o contrato de PPP não gera o conforto para um

concessionário como em um contrato cost-plus. No entanto, a probabilidade elevada de

distúrbios tende a deixar a estrutura contratual excessivamente instável, favorecendo a opção

por obra pública.

Por fim, o caso IV representa a situação cuja dimensão estrutural da região possui

características favoráveis à viabilidade de operações privadas, no entanto a incerteza e a

necessidade de mobilização de recursos para um investimento green field demanda maior

segurança para a realização de investimentos em ativos específicos por intermédio de capital

privado. Nesta situação não é factível uma concessão clássica garanta a plena capacidade

coordenação entre as partes na transação.

Por outro lado, a definição de um valor de contraprestação fixa em uma PPP não é

tarefa simples, dado o baixo intervalo de confiança para o ritmo de difusão da utilização dos

serviços de infra-estrutura. O risco é definir-se um nível de contraprestação excessivo, logo a

utilização de mecanismos de compartilhamento de riscos e receitas pode ser uma solução

interessante, principalmente na perspectiva do setor público. Isto posto, vale retorna ao

diagrama alocando a estrutura de governança na relação entre setor público e privado mais

apropriada às características do investimento.

Figura 3.3: Tipologia de Estruturas de Governança

Contrato de Concessão Clássico

PPP Fixa

PPP Variável PPP Variável

ou Obra pública

A distribuição dos projetos no diagrama dependerá das especificidades do caso

estudado, portanto alterando a relevância relativa de cada quadrante do diagrama. Países em

desenvolvimento, com grande necessidade de investimentos novos (green field) em infra-

estrutura e cujas condições estruturais não favorecem a participação privada, tendem a

apresentar um maior número de projetos no quadrante IV, isto é, apresentam maior demanda

por modelos de contraprestação variável.

118

119

Esta análise serve como auxiliar para a definição do modelo contratual a partir da

observação das características regionais do empreendimento e da intensidade de ativos

necessários para a prestação de serviços a partir do estabelecimento da concessão. Esta

metodologia auxilia a evitar algumas possíveis ineficiências associadas ao uso de modelos

contratuais excessivamente complexos ou demasiadamente simples para um empreendimento.

Portanto, trata-se de um guia para a identificação de estruturas de governança mais eficientes,

dentre o limitado conjunto de possibilidades, para prover a expansão da rede de ativos.

3.4 – Conclusão

A Economia dos Custos de Transação fornece a base conceitual para a avaliação do

papel de contratos na coordenação das atividades econômicas entre as partes envolvidas numa

relação que se desenvolve no tempo. Um contrato de concessão que estabelece os termos de

relacionamento entre o setor público e privado em determinado empreendimento encaixa-se

como objeto de análise da teoria dos custos de transação. Se eficiência da estrutura de

governança determina a viabilidade de determinados investimentos, então a forma contratual

adotada entre Estado e setor privado será peça fundamental para determinar a capacidade de

expansão dos serviços de infra-estrutura.

No capítulo anterior discutiu-se o problema de universalização de serviços de infra-

estrutura em duas dimensões: estrutural e institucional. A dificuldade da universalização surge

do descompasso entre soluções institucionais e estruturais, ou seja, estruturas de governança

que se adequem à complexidade do desafio que se apresenta.

No presente capítulo foi apresentado que o modelo de PPP, nas versões de

contraprestação fixa e variável, preenchem lacunas no espaço de estruturas de governança na

relação entre setor público e privado, visando à provisão dos serviços de infra-estrutura.

Contudo, isto não significa que a participação direta do Estado na provisão de determinados

serviços não é eliminada. Os modelos de PPP encaixam-se entre a solução de fazer (obra

pública) e a concessão clássica. Neste sentido, a tipologia de estrutura de governança auxilia

na compreensão do perfil de empreendimentos que requerem estruturas contratuais em

modelos de PPP.

120

A justificativa tradicional para a formação de contratos de PPP, exposta no conceito de

Value for Money, supõe que a vantagem advenha da capacidade gestão privada ser superior.

Buscou-se demonstrar aqui que esta suposição não é uma condição essencial para as

vantagens da adoção do modelo de PPP, dada a presença de um mecanismo multiplicador de

recursos públicos para investimentos por intermédio de PPP.

Assim, quer pelo efeito de multiplicar a capacidade de recursos públicos para

investimentos em infra-estrutura, quer pela criação de um número maior de possibilidades de

estruturas de governança, responde-se de forma afirmativa à questão acerca de se os modelos

contratuais em PPP representam uma forma contratual eficiente.

Além disso, a resposta de como isto ocorre depende da seleção adequada do modelo

contratual em relação às características da transação que irá governar. A dimensão estrutural

(renda versus espaço) e o perfil de investimentos novos necessários para a universalização

foram selecionados como características do ambiente de transações para construir uma

tipologia de estruturas de governança. A partir disto, é possível discutir com mais critério o

emprego de modelos contratuais em PPP. Esta avaliação será mais precisa quanto menor a

agregação regional empregada para definir a dimensão estrutural da tipologia.

Em termos gerais, os modelos de PPP criam instrumentos que possibilitam a

adequação da delegação de serviços públicos em regiões com condições estruturais

desfavoráveis à universalização de serviços sob contratos clássicos de concessão. As

estruturas de governança possíveis a partir destes modelos são mais flexíveis para serem

adaptadas aos problemas de países em desenvolvimento. Isto abre espaço para a superação de

uma grande dificuldade apresentada pela aplicação de paradigmas de regulação e concessão

de serviços de infra-estrutura concebidos para lidar com o grau de maturidade de rede de

serviços dos países desenvolvidos.

No próximo capítulo, após ser apresentada a questão da universalização dos serviços

de infra-estrutura no Brasil, será discutido o marco institucional das Parcerias Público

Privadas no Brasil. O intuito será aplicar a discussão feita no presente capítulo para uma

avaliação preliminar do modelo PPP como um instrumento de expansão da rede de serviços.

121

IV – A UNIVERSALIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE INFRA-ESTRUTURA NO BRASIL E O MARCO INSTITUCIONAL DE PARCEIRAS PÚBLICO PRIVADA.

4.1 – Introdução.

No capítulo anterior foi apresentada a alternativa dos modelos de PPP e sua relevância

como uma estrutura de governança para a relação entre setor público e privado na expansão

de setores de infra-estrutura. A proposta deste capítulo é apresentar o desafio de

universalização dos serviços de infra-estrutura e discutir preliminarmente as alternativas

criadas pelo marco institucional de PPP. Para isto este capítulo está organizado em três

seções.

A seção 4.2 aborda o problema de universalização dos serviços tendo como corte

regional as Unidades da Federação. A discussão é feita apresentando dados para os setores de

telecomunicações, energia elétrica, saneamento e rodovias. A assimetria no grau de

universalização destes serviços entre os estados brasileiros reflete, grosso modo, a grande

assimetria exibida em aspectos estruturais como renda per capita e densidade populacional.

Na seção 4.3 apresenta-se o marco institucional das Parcerias Público Privadas (PPP)

no Brasil. A Lei das PPP de dezembro de 2004 soma-se aos marcos institucionais da Lei de

Concessões e Lei de Licitações, para definir o conjunto de possibilidades de relação entre

Estado e agentes privados. De posse deste quadro, compõe-se o conjunto de estruturas de

governança para setores de infra-estrutura no Brasil.

A seção 4.4 traça perspectivas para a relação entre Estado e setor privado na provisão

de serviços de infra-estrutura com o advento das possibilidades contratuais em PPP.

Adicionalmente, a tipologia discutida no capítulo anterior será aplicada para o caso dos

setores de infra-estrutura no Brasil, com desagregação regional no nível de unidades da

federação.

Como será discutida neste capítulo, esta avaliação preliminar aponta para um número

relativamente grande possibilidades de aplicação de contratos em PPP, quer em

contraprestação fixa, como em contraprestação variável. Da mesma forma, indica-se as

122

situações nas quais a concessão clássica é a estrutura de governança mais eficiente, bem como

aponta que ainda há espaço para ser ocupado pela participação direta do Estado.

4.2 - Assimetrias Regionais e o Desafio da Universalização dos Serviços de Infra-estrutura no Brasil.

Nos capítulos anteriores foi destacada a importância da dimensão estrutural de renda

per capita e densidade demográfica como um dos fatores determinantes da viabilidade

econômica da provisão de serviços de infra-estrutura por agentes privados. Não obstante,

quanto maia assimétrica for esta condição estrutural entre sub-regiões de uma mesma área de

concessão, maior a dificuldade que um mesmo modelo contratual se apresente como uma

estrutura de governança eficiente para o conjunto. Esta seção apresentada a assimetria entre os

estados brasileiros quanto aos aspectos estruturais de renda per capita e densidade

populacional.

Além disso, nesta seção discute-se brevemente a diferença no grau de universalização

dos serviços de infra-estrutura, mantendo o corte regional nas Unidades da Federação. A

discussão é feita apresentando dados para os setores de telecomunicações, energia elétrica,

saneamento e rodovias. A assimetria no grau de universalização destes serviços entre os

estados brasileiros reflete, grosso modo, a grande assimetria de renda e densidade

demográfica.

4.2.1 - Diferenças Estruturais entre as Unidades da Federação no Brasil.

No capítulo II concluiu-se que a concentração espacial da população e o maior nível

de renda per capita compõem a dimensão estrutural para determinar a viabilidade econômica

de operadores privados de serviços de infra-estrutura, sobretudo quando se demanda

investimentos na construção da rede de ativos para a provisão dos serviços. Para fins da

presente tese, o corte regional de análise é a unidade da federação (UF). A partir destas, serão

expressas as assimetrias regionais em temos de PIB per capita e de densidade demográfica.

A grande desigualdade de renda no Brasil é um tema discutido na literatura. Dado o

escopo deste trabalho, não cabe reproduzir os determinantes desta assimetria, apenas

apresentar seu comportamento entre os estados da Federação. Vale observar que o uso de

dados de PIB per capita por Unidade da Federação desconsidera que a desigualdade de renda

intra-estado é um aspecto importante para a viabilidade comercial de prestação de serviços de

infra-estrutura. Outra limitação é que a densidade demográfica é expressa nesta tese sem

considerar áreas tais como reservas ambientais, que não exigem expansão da rede ativos para

provisão dos serviços de infra-estrutura.

Na discussão sobre a diversidade regional, um conceito útil e que será empregado

nesta tese é o de coeficiente de variação. Uma vez que tanto média (μ) e desvio padrão (σ)

são estatísticas sensíveis à escala, o coeficiente de variação (σ/ μ ) é uma medida

adimensional. Logo, ela não sofre a influência da unidade medida e permite fazer

comparações entre variáveis diferentes. Outra maneira de apresentar este resultado é em

forma percentual. Por exemplo, um coeficiente σ/ μ de 1,2 representa 120% de dispersão em

relação à média da população. Hoffman (1998) explica que o Coeficiente de Variação é uma

medida útil para expressar tanto dispersão como concentração populacional, como índices de

Gini.

Tabela 4.1: Assimetria do PIB per capita entre as Unidades da Federação (em R$) – 1998 a 2003

1998 1999 2000 2001 2002 2003coefiente de variação 2 ,67 2 ,49 2 ,60 2 ,58 2 ,47 2 ,36

desvio padrao 14 .722 14 .380 16 .729 17 .775 18 .829 3 .722 m édia 5 .520 5 .774 6 .429 6 .895 7 .632 8 .798

Assim etria do PIB per cap ita entre as U nidades da Federação

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE

A Tabela 4.1 acima apresenta o PIB per capita do Brasil entre 1998 e 2003, bem como

duas medidas de assimetria entre as Unidades da Federação: o desvio padrão e o coeficiente

de variação. O desvio padrão aumentou ao longo do período, acompanhando o crescimento da

renda per capita. O coeficiente de variação, ao expurgar o efeito da escala, é uma medida

mais apropriada para avaliar a evolução da desigualdade entre os estados brasileiros. Este

coeficiente apresentou uma redução de 11,4% entre os anos de 1998 e 2003, representando

uma ligeira redução da assimetria entre os estados. Contudo, o seu valor absoluto ainda

expressa uma significativa assimetria entre as Unidades da Federação.

De forma semelhante, a Tabela 4.2 abaixo apresenta o comportamento da assimetria

entre os estados brasileiros quanto à densidade demográfica, medida em habitantes por 1.000

123

km2. Observa-se uma significativa diferença entre as Unidades da Federação, uma vez que o

desvio padrão supera em 5 vezes a média. Tal assimetria manteve-se praticamente constante

entre os anos de 1998 e 2003.

Tabela 4.2: Assimetria da densidade populacional entre as Unidades da Federação (em habitantes/km2) – 1998 a 2003

1998 1999 2000 2001 2002 2003coeficiente de variação 5 5 5 5 5 5

desvio padrão 429 434 451 457 463 469 média 85 86 90 91 92 93

Assimetria na Densidade Populacional entre as Unidades da Federação

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE

Como foi discutido no capítulo II, o relevante para determinar a viabilidade de um

operador privado na prestação de serviço de infra-estrutura é a combinação de renda per

capita e densidade populacional, que exprime a renda disponível para o consumo de serviços

por área de cobertura. No intuito de comparar esta condição estrutural entre as Unidades da

Federação apresenta-se abaixo o Gráfico 4.1 de dispersão, tendo nos eixos a densidade

demográfica e o PIB per capita, ambos no ano de 2003.

Gráfico 4.1: PIB per capita x Densidade demográfica entre as UF em 2003

0

50000

100000

150000

200000

250000

300000

350000

400000

0 2000 4000 6000 8000 10000 12000 14000 16000 18000 20000

PIB per capita (R$)

habi

tant

es p

or 1

000

Km

2

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE

A disparidade de Unidades da Federação como São Paulo, Rio de Janeiro e Distrito

Federal, em relação às demais Unidades Federação, é tão acentuada, que gera uma distorção 124

na visualização da dispersão. Eles são os estados com maior renda per capita e maior

densidade populacional. Assim, o Gráfico 4.2 abaixo expurga os três estados mais

discrepantes do limite superior para reapresentar a informação.

Gráfico 4.2: PIB per capita x Densidade demográfica entre as UF em 2003, exceto RJ, SP e DF

0

20000

40000

60000

80000

100000

0 2000 4000 6000 8000 10000 12000 14000

PIB per capita ( R$)

habi

tant

es p

or 1

000

Km

2

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE

Mesmo após a exclusão do Rio de Janeiro, São Paulo e Distrito Federal, a dispersão

entre as Unidades da Federação segue muito elevada. Esta assimetria na estrutura de renda e

demografia entre os estados representa ambientes econômicos muito diferentes para a

provisão de serviços de infra-estrutura.

Outra forma de discutir esta disparidade regional é por intermédio do produto das

variáveis listadas para a análise. Com isto, chega-se ao indicador proxy da renda anual por

área, expresso em R$ por km2. Quanto maior a renda na área atendida pela rede de serviços de

infra-estrutura, maiores são as possibilidades de a tarifa cobrada dos usuários remunerar o

investimento realizado para a provisão do serviço.

Como seria de se esperar, a diferença apresentada neste indicador entre os estados

brasileiros é significativa, como pode ser visto no Gráfico 4.3 abaixo. O Distrito Federal, caso

mais favorável, apresenta um resultado de aproximadamente de R$ 6.500 / km2, enquanto em

Roraima, pior caso, atinge-se apenas R$ 7 / km2. A diferença é de 870 vezes entre os dois

estados. O Gráfico 4.3 apresenta a disparidade entre os estados brasileiros tendo como

referência seu distanciamento do caso do Distrito Federal.

125

Gráfico 4.3: Assimetria Estrutural entre os Estados Brasileiros comparados ao Distrito Federal

0,00%

10,00%

20,00%

30,00%

40,00%

50,00%

60,00%

70,00%

80,00%

90,00%

100,00%

Distrito

Federa

l

Rio de

Jane

iro

São Pau

lo

Santa

Catarin

a

Espirit

o San

to

Sergipe

Paraná

Rio Gran

de do

Sul

Pernam

buco

Alagoa

s

Rio Gran

de do

Nort

e

Minas G

erais

Paraíba

Ceará

Bahia

Goiás

Mato G

rosso

do Sul

Maranh

ão

Rondô

niaPiau

í

Mato G

rosso

Pará

Amapá

Amazon

asAcre

Tocan

tins

Roraim

a

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE

A Tabela 4.3 a seguir mostra a evolução do coeficiente de variação do produto das

variáveis estruturais: PIB per capita e densidade populacional. Como era de se esperar, o

resultado mostra uma acentuada disparidade entre os estados do Brasil: a assimetria medida

supera 7 vezes o valor da média.

Tabela 4.3: Assimetria estrutural entre as Unidades da Federação – 1998 a 2003

1998 1999 2000 2001 2002 2003coeficente de variação 7,68 6,92 7,59 7,72 7,59 7,28

desvio padrão 4.745 4.539 5.856 6.441 7.068 7.740 média 618 655 771 835 932 1.063

Assimetria Estrutural entre as Unidades da Federação

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE

Esta acentuada assimetria nas condições estruturais entre os estados brasileiros tende a

se refletir em disparidades no grau de universalização dos serviços de infra-estrutura.

Todavia, não se pode esperar um paralelismo perfeito entre desigualdade na dimensão

estrutural e na universalização de serviços, devido à influência das políticas de investimento e

126

127

subsídios estatais, previamente à reforma dos setores, e à introdução de concessionários de

capital privado.

Contudo, vale mencionar que a diferença apresentada entre os setores decorre não só

das políticas regulatórias, mas também de políticas de investimento público anteriores à

mudança institucional. No tópico abaixo se apresenta uma breve descrição da universalização

de alguns serviços de infra-estrutura entre os estados da Federação.

4.2.2 – O Desafio da Universalização de Serviços de Infra-estrutura no Brasil.

Uma vez considerada a presença de limitações estruturais para a universalização de

serviços, representada pelas dificuldades em expandir os serviços para além de determinadas

fronteiras geográficas ou de renda, as políticas regulatórias e modelos contratuais entre Estado

e setor privado cumprem papel fundamental para elevar o acesso aos serviços de infra-

estrutura. Durante o período de intensa participação estatal em setores de infra-estrutura em

países em desenvolvimento, sua provisão dependia de gasto público direto e se confundia com

outras prioridades sociais. A partir da reforma destes setores, com a transferência ao setor

privado da operação dos serviços, a expansão da rede passou a depender muito mais de

recursos intra-setoriais do que do repasse de recursos orçamentários.48

Na perspectiva de organismos multilaterais, as reformas institucionais em setores de

infra-estrutura foram consideradas como uma solução definitiva para provisão destes serviços

em países em desenvolvimento. A expansão seria reflexo direto do ganho de eficiência

alocativa e teria como quase sinônimo a redução da exclusão do acesso aos serviços.49 No

entanto, como foi discutido no capítulo II, existem alguns passos omitidos nesta avaliação,

que resultam de um problema de diagnóstico. A limitação estrutural para estas políticas e os

problemas para o financiamento da expansão dos serviços decorre do fato de a rede de ativos

em setores de infra-estrutura encontrar-se em estágio inicial de desenvolvimento e não em sua

maturidade plena como nos países desenvolvidos.

No caso brasileiro, a disparidade regional cria diferentes circunstâncias para se

48 E mesmo no período de preparação para a reforma, os subsídios estatais foram sendo substituídos por aumentos tarifários.Neste ponto uma boa análise é feita por Wohlers e Plaza (2000). 49 Esta discussão foi realizada no capítulo II.

128

realizar os investimentos em setores de infra-estrutura. Dado que as condições estruturais de

cada região implicam a diferença da eficiência do modelo institucional, então a diversidade

regional do Brasil deve ter um peso significativo para a definição dos modelos contratuais,

mais do que usualmente se supõe na literatura sobre o tema.

A reforma institucional dos setores de infra-estrutura no Brasil seguiu, grosso modo,

o mesmo modelo aplicado a países desenvolvidos. Trata-se de um modelo centrado no

princípio de concessão dos serviços a operadores privados, regulados por modelos de preço-

teto e sujeitos às políticas de desverticalização da cadeia produtiva, com o objetivo de se

alcançar a concorrência na provisão dos serviços.

Uma vez que os contratos de concessão clássicos previam pagamentos ao Estado

pela outorga do serviço, então as tarifas cobradas dos usuários deveriam ser suficientes não só

para remunerar o capital do investidor, como também para honrar os compromissos

assumidos nos contratos de concessão. Adicionalmente, a regulação por preço-teto é

reconhecida como um modelo que somente incentiva o investimento do concessionário,

quando o concessionário reconhece neste, marginalmente, o retorno adequado sobre o capital

investido. Este modelo de reforma dos setores de infra-estrutura ocorreu de forma muito

semelhante em todo país. Isto é, as assimetrias regionais não foram ponto determinante na

definição dos modelos contratuais que regulam a provisão dos serviços por concessionários

privados.

Isto posto, cabe apresentar alguns dados para retratar o grau de difusão dos serviços

entre os estados brasileiros. Recorrendo aos dados da PNAD – Pesquisa Nacional por

Amostra de Domicílios – apresenta-se a seguir o percentual de domicílios providos por

serviços de telefonia fixa, saneamento50 e energia elétrica. Cabe observar que estas estatísticas

referem-se somente ao acesso à infra-estrutura, sem se referir à intensidade de utilização

destes serviços. Desta forma, não retratam de forma plena a assimetria entre os estados

brasileiros. Este ponto será retomado mais adiante.

Não obstante, a assimetria entre os estados se apresenta de forma diferente de acordo

como o setor em estudo. Não faz parte do escopo desta tese aprofundar a discussão sobre os

determinantes do grau de universalização em cada setor. O objetivo é fomentar uma discussão

50 Trata-se de serviços de coleta de esgotamento sanitário nos temos da pesquisa.

geral sobre a eficiência de modelos contratuais, ou seja, trata-se de uma ilustração preliminar

da metodologia discutida no capítulo anterior. O Gráfico 4.4 apresenta a diversidade no

percentual de acesso dos domicílios brasileiros ao serviço de saneamento entre as Unidades da

Federação no Brasil.

Gráfico 4.4: Acesso à rede de saneamento por Unidades da Federação - 2004

Acesso à Rede de Saneamento (2004)

0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

1

São Pau

lo

Distrito

Federa

l

Minas G

erais

Rio de

Jane

iro

Espírit

o San

to

Sergipe

Paraná

Bahia

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buco

Goiás

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Nort

e

Rio Gran

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Sul

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rosso

Maranh

ão

Mato G

rosso

do Sul

Alagoa

s

Amazon

asPiau

i

Amapá

Roraim

a

Tocan

tins

Rondô

nia Pará

Fonte: IBGE/PNAD 2004

O percentual médio de acesso aos serviços de saneamento no Brasil é de 46% em

2004 e a assimetria entre os estados brasileiros no acesso a estes serviços, como base na

PNAD, se expressa por um coeficiente de variação de 3.63, valor de magnitude superior à

assimetria do PIB per capita, tal como visto acima.

Um aspecto de importante a ser observado neste setor é que a métrica de consumo se

encerra no seu acesso a rede de ativos, diferentemente de outros serviços públicos, tais como

energia e telecomunicações. Em ambos, o acesso à rede de ativos é a condição necessária para

a efetiva utilização do serviço. Este é um fato que dificulta ainda mais a viabilidade do

investimento privado. Por outro, caso o serviço de fornecimento de água se encontre sob a

mesma concessão cria-se maior capacidade de remuneração dos investimentos.

129 Logicamente, a combinação de expressivos requerimentos de capital para

investimentos e a dificuldade de obtenção de receita pela cobrança pela prestação de serviço

constitui-se em uma dificuldade especial para a concessão destes serviços à iniciativa privada.

Um setor em condição oposta é o de telecomunicações, cuja demanda crescente de serviços

intensivos em informação resulta em forte associação entre a intensidade de utilização dos

serviços e o crescimento da renda.

O Gráfico 4.5 apresenta o percentual de acesso de serviços de telefonia fixa nos

domicílios dos diferentes estados brasileiros, com base na pesquisa PNAD de 2004.

Gráfico 4.5: Acesso ao serviço de telefonia fixo por Unidades da Federação - 2004

Acesso ao Serviço de Telefonia Fixa (2004)

0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

1

Distrito

Fede

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Sul

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Mato G

rosso

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Roraim

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Sergipe

Pernan

buco

Rio Gran

de do

Nort

e

Paraíba Pará

Toca

ntins

Ceará

Bahia

Alagoa

s

Maranh

ãoPiau

i

O percentual médio de acesso aos serviços de telefonia fixa no Brasil é de 46% e a

assimetria entre os estados brasileiros no acesso aos serviços de telefonia fixa em 2004, com

base na PNAD de 2004, se expressa por um coeficiente de variação de 2,22, valor da mesma

ordem de grandeza da assimetria do PIB per capita.

Fonte: IBGE/PNAD 2004

Em 1996, de cada 100 telefones só 31 tinham receita operacional superior ao custo

de manutenção e isso só ocorria em 10% dos municípios brasileiros, incluindo situações

extremas. No caso do Piauí, somente 4 em cada 100 municípios proporcionavam receita

operacional líquida positiva51. Um exemplo de como a viabilidade da operação de grande

51 Wholers e Plaza, 2000

130

parte do sistema de telefonia no Brasil se dava por subsídio cruzado.

No atual modelo, o espaço para o mecanismo de subsídio cruzado está muito

reduzido. Vale lembrar que a lógica do regime de preço-teto impõe que a viabilidade das

linhas seja garantida individualmente, ou seja, se um ativo não é rentável, não há mecanismos

que compensem tal investimento como no caso da regulação por custo de serviço.

Uma outra forma para apresentar a assimetria entre as Unidades da Federação é

utilizando os dados da ANATEL de acessos telefônicos fixo por 100 habitantes. A Tabela 4.4

abaixo apresenta a evolução da média de acessos no Brasil, do desvio padrão entre os estados

e do respectivo coeficiente de variação. A assimetria expressa pelo coeficiente de variação

fica em torno de duas vezes o valor da média.

Tabela 4.4: Assimetria no Acesso Telefônico Fixo por 100 habitantes entre as Unidades da

Federação - 1998 a 2003

1998 1999 2000 2001 2002 2003coefiente de variação 2,40 2,30 2,36 2,00 2,01 2,02

desvio padrao 32,63 38,62 48,52 49,18 48,65 48,36média 13,60 16,80 20,60 24,60 24,20 23,90

Assimetria na Acesso Telefônico Fixo por 100 habtiantes entre as Unidades da Federação

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da ANATEL

No setor de energia elétrica também foram introduzidos mecanismos de

desverticalização da cadeia produtiva, isolando os segmentos de geração, transmissão e de

distribuição de energia. Apesar de a distribuição ser o segmento responsável por promover a

expansão da rede de serviços aos usuários, sua performance depende da relação com a cadeia

à montante e das formas pelas quais as rendas são repartidas ao longo desta.

O Gráfico 4.6 a seguir, também com base na amostra domiciliar do IBGE, apresenta

o grau de universalização do serviço de energia elétrica entre os estados brasileiros. A

diferença em relação aos demais setores é facilmente percebida, dado que o patamar médio é

muito superior aos demais casos. No entanto, não parece a princípio inadequada a

consideração de que se trata aqui do serviço com maior essencialidade para o bem estar. Além

disso, acesso à energia elétrica é uma condição necessária para utilização de vários bens de

consumo. Logo, o acesso a esta utilidade pode ser percebido como fundamental e prioritário

para os consumidores. Apesar disto, alguns estados chegam a apresentar um déficit de acesso

131

à energia de até 17% dos domicílios particulares.

Gráfico 4.6: Acesso à iluminação elétrica por Unidades da Federação – 2004

Acesso à Iluminação Elétrica (2004)

0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

1

Distrito F

ederal

São P

aulo

Rio de

Jane

iro

Espírito

Santo

Santa

Catarin

a

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Goiás

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Alagoa

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Ceará

Mato G

ross

o

Rondô

nia

Roraim

a

Amazon

as

Bahia

Pará

Piaui

Acre

Maran

hão

Toca

ntins

O percentual médio de acesso aos serviços de energia elétrica no Brasil é de 96% e

assimetria entre os estados brasileiros neste serviço em 2004, como base na PNAD de 2004,

se expressa por um coeficiente de variação de 0,29. Como esperado, a essencialidade do

serviço se reflete em indicadores de acesso muito mais favoráveis do que os de outros

serviços. Um ponto importante é que esta medida pode ser influenciada por acessos informais,

ou seja, ligações elétricas não credenciadas pelo concessionário prestador do serviço.

Fonte: IBGE/PNAD 2004

Contudo, o percentual de domicílios com acesso à rede elétrica não reflete

precisamente o grau de universalização dos serviços, pois omite a diferença de nível de

consumo realizado entre os estados. Ao comparar o nível de consumo residencial por

habitante entre os estados da federação percebe-se enorme assimetria. São Paulo, o estado

com maior consumo residencial per capita, apresentava mais de 1.000 vezes o consumo

residencial por habitante de Sergipe em 2002. A Tabela 4.5 abaixo apresenta indicadores de

assimetria no consumo residencial per capita de energia elétrica entre as unidades da

federação. Para fins de universalização de serviços vale observar que, em uma perspectiva

regional, menor a assimetria ocorrerá quanto maior a taxa de crescimento do grupo de estados

que apresentam baixo consumo residencial por habitante.

132

Tabela 4.5: Assimetria entre as Unidades da Federação no Consumo residencial per capita de

energia elétrica (em KWh/ano) - 1998 a 2002

1998 1999 2000 2001 2002coefiente de variação 34 33 33 32 32

desvio padrao 479 484 491 427 416 média 16.115 16.166 16.279 13.653 13.169

Assimetria entre as Unidades da Federação no Cosnumo Residencial per capita em KWh/ano

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da Eletrobrás

Aplicar o mesmo modelo regulatório em regiões tão diferentes gera resultados

bastante diversos. A diferença do contexto implica diferentes desempenhos de cada

alternativa institucional. No caso brasileiro, a dimensão continental e a disparidade regional

criam diferentes mercados de energia elétrica, que possuem características e necessidades

específicas. Logo, as condições estruturais de cada região resultam na diferença da eficácia de

cada modelo adotado.

Por fim, cabe apresentar o setor de prestação de serviços rodoviários, cuja fonte

dados é o Ministério dos Transportes. O indicador de disponibilidade de serviço se apresenta

numa medida pouco distorcida e de mais fácil mensuração do que o número de usuários do

serviço. O Gráfico 4.7 a seguir apresenta o percentual de rodovias pavimentadas dentre as

rodovias existentes em cada Unidade da Federação.

Vale lembrar que tal indicador deve ser considerado como uma medida

superestimada, porque a condição da via não é ponderada neste dado. Assim, mesmo que uma

rodovia originalmente pavimentada se encontre em estado equivalente a uma rodovia sem

pavimento, mas este efeito não é capturado na informação apresentada. Apesar deste efeito, o

setor rodoviário apresenta o pior nível de universalização dentre os demais setores de infra-

estrutura apresentados nesta tese.

133

Gráfico 4.7: Percentual de rodovias pavimentadas por Unidade da Federação – 2004

Percentual de Rodovias Pavimentadas (2004)

0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

1

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FED

ERAL

SERGIP

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RIO D

E JA

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O

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BA

ESPÍ

RITO

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BAHIA

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O DO S

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DO S

UL

PIAU

Í

SANTA

CAT

ARIN

A

MAT

O GROSS

O

ROND

ÔNIA

AMAP

Á

Fonte: Ministério dos Transportes, 2004

O percentual médio de provisão de rodovias pavimentadas sobre o total no Brasil é

de apenas 14% e a assimetria entre os estados brasileiros se expressa por um coeficiente de

variação de 3,4, um valor significativamente superior à assimetria do PIB per capita. Outra

forma de medir o grau de difusão da rede de serviços rodoviários se faz através de um

indicador que compara a extensão da malha rodoviária com a área servida por esta rede de

ativos, ou seja, uma razão entre km de rede e a área do estado em km2. O Gráfico 4.8

apresenta o comportamento deste indicador, em percentual, entre as Unidades da Federação.

134

Gráfico 4.8: Extensão da malha rodoviária em relação ao território por Unidade da Federação 2004

0,0%

5,0%

10,0%

15,0%

20,0%

25,0%

DISTR

ITO F

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RIO D

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NEIRO

SÃO P

AULO

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Á

SERGIP

E

RIO G

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PARAÍ

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BAHIA

MARANHÃO

TOCANTI

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PIAUÍ

MATO G

ROSSO DO S

UL

MATO G

ROSSO

RONDÔNIA

ACRE

RORAIMA

PARÁ

AMAPÁ

AMAZONAS

Fonte: Ministério dos Transportes, 2004.

A média ponderada pela população de cada estado deste indicador é 0,63, enquanto o

coeficiente de variação é de 3,8. O resultado deste indicador aponta não só a expressiva

carência deste serviço na média nacional, mas também o fato de ser mal distribuído entre os

estados da Federação.

Um comentário geral para vários setores de infra-estrutura, é o fato das tarifas

possuírem um mesmo patamar para regiões com um custo de vida muito diferente e com

assimetria fortes na renda per capita. Vale como exemplo o setor de telefonia fixa, no qual as

tarifas de assinatura de serviço somente diferem entre os estados brasileiros devido à

incidência de alíquotas diferentes de impostos indiretos, como ICMS, mas não retratando o a

renda por habitante da região52.

As limitações para a continuidade da evolução do acesso, ocorrida no setor de

telecomunicações, é um resultado esperado e condizente com a discussão realizada no

capítulo anterior. Nas duas próximas seções explora-se em que medida o modelo de Parceria

Público Privada pode ser um mecanismo para promover o crescimento do grau de

universalização de serviços nos setores de infra-estrutura.

52 ANATEL, 2006

135

136

4.3 - O Marco Institucional de Parceria Público Privada no Brasil: o Novo Conjunto de Estruturas de Governança.

A presente seção apresenta o recente marco institucional que estabeleceu os termos

para a realização de contratos em Parceria Público Privada no Brasil. A chamada Lei das

PPPs, instituída em dezembro de 2004, estabelece relações com a Lei de Concessões e Lei de

Licitações, como será discutido na seção. A Lei de PPP estabeleceu a possibilidade de

contratos de PPP em âmbito federal, estadual e municipal, quer na modalidade de

contraprestação fixa ou variável.

Como será apresentado, com o advento da Lei de PPP´s ampliou-se o conjunto de

modelos contratuais entre Estado e agentes privados. Desta forma, como será apresentado,

cresce o número de possíveis estruturas de governança para a provisão de serviços de infra-

estrutura no país. Caberá à próxima seção discutir, ainda que em caráter preliminar, quando

tais modelos se mostram como uma estrutura de governança eficiente.

4.3.1 – Apresentação do Marco Institucional das Parcerias Público Privadas no Brasil

Após discussão iniciada em 2002, a Lei 11.079 de 30 de dezembro de 2004

estabeleceu o marco institucional das Parcerias Público Privadas no Brasil, conhecida como a

Lei das PPPs, instituindo as regras básicas de licitação e contratação deste modelo. A Lei

define como sendo Parcerias Público Privadas (PPPs) como contratos administrativos de

concessão de serviços públicos. A provisão destes serviços, segundo o conceito expresso na

lei, pode envolver ou não a cobrança de tarifa de usuários, mas prevê uma contraprestação do

setor público ao setor privado.

O 4º artigo da Lei 11.079 estabelece as diretrizes das PPPs no caso brasileiro. Destaca-

se a busca por eficiência econômica no emprego de recursos da sociedade (value for money),

observando os direitos dos usuários dos serviços e dos entes privados encarregados de sua

provisão. Como se encontra explícito na Lei, uma das funções de um contrato de PPP é

definir de forma objetiva a repartição de riscos entre as partes, atentando para a viabilidade

financeira dos projetos de parceria, sem ferir os princípios de responsabilidade fiscal na

celebração e execução dos contratos.

137

A forma de relacionamento com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) gerou

polêmica na definição deste marco institucional de PPPs no Brasil.53 A LRF estabelece

controles de fluxo e de estoque do endividamento público, afetando a questão da classificação

para os gastos com contrapartida pública nos contratos de PPP. Caso se interprete como uma

‘contratação de serviço’, seria definida como uma despesa corrente; se classificado como uma

‘aquisição de ativo’, se enquadraria como uma variação da dívida pública. Esta é uma

polêmica ainda não solucionada em termos de procedimentos de contabilidade pública. (Brito

e Silveira, 2005)

A Lei limita o total de gastos com contraprestação pública da União a 1% da receita

corrente líquida54 em determinado ano. Não obstante, dispõe-se de outros mecanismos de

controle de participação pública. Um exemplo é a impossibilidade do poder público deter a

maioria do capital votante da sociedade de propósito específico (SPE), controladora de uma

PPP. Como salientam Brito e Silveira (2005: 10), crer no advento da contratação por PPP

como superação de restrições fiscais para a execução de investimentos públicos é uma

interpretação errônea. Projetos de PPP mal definidos e geridos podem agravar o problema

fiscal. De fato, na perspectiva esboçada no capítulo anterior, a eficiência desta forma

contratual dependerá da sua adequação ao seu objeto.

O conceito de PPP no Brasil possui um sentido mais estrito, na medida em que na

provisão dos serviços públicos o agente privado arca com a elaboração de projeto,

financiamento, construção e operação de ativos, que ao término da relação contratual serão

transferidos ao ente público: “O setor público torna-se parceiro na medida em que ele é

comprador, no todo ou em parte, do serviço prestado.” (Brito e Silveira, 2005:8).

A contratação de uma PPP pode ser realizada pela administração pública direta ou

indireta. O objeto dos contratos de PPPs exclui a possibilidade de contratos para fornecimento

exclusivo de mão-de-obra ou realização de obras. A relação entre as partes será regida por um

contrato de longo prazo, expresso em lei como sendo superior a 5 anos e limitado a 35 anos,

já consideradas eventuais prorrogações. A contraparte do contrato numa PPP será o vencedor

de uma licitação cujo critério de seleção é a menor contraprestação pública, enquanto que nas

53 Brito e Silveira (2005) 54 Considerando a Receita Corrente Líquida Federal de 2005, dispõe-se de aproximadamente R$ 3 bilhões para gastos anuais com contraprestação pública em projetos de PPP. Donde, as maiores limitações para a realização de PPP’s serão o estoque e não o fluxo de recursos, fato que reforça a relevância da apurada definição do emprego da estrutura contratual para a eficiência do modelo de PPP no Brasil.

138

concessões clássicas o critério de leilão se dá pelo maior valor de outorga ao Estado. Além

disso, foi estabelecida também a restrição de R$ 20 milhões como valor mínimo do contrato.

Este critério pode ser justificável diante da presença de custos significativos para o

estabelecimento dos termos do contrato de natureza complexa.

A Lei de PPPs versa sobre duas modalidades de concessão: (i) Patrocinada e (ii)

Administrativa. A PPP Patrocinada se aplica aos setores de infra-estrutura, valendo o artifício

da contraprestação pública como fonte de receitas, ao invés de uma outorga onerosa como no

caso concessão clássica55.

Já a PPP Administrativa tem como única fonte de receitas a contraprestação pública.

Embora não esteja definida na Lei a relação entre o tipo de modalidade e o escopo do serviço

público, as concessões em PPP Administrativa identificam-se com atividades de interesse

mais difuso na sociedade, como saúde, educação e segurança. Nestas atividades, predomina o

perfil de bem-público no sentido econômico estrito. Nestes casos, a cobrança ao usuário não

se aplica facilmente, como no exemplo típico do serviço de coleta de lixo.

Os contratos de concessão em PPP Patrocinada possuem nos serviços de infra-

estrutura seu objeto mais afim, uma vez que é possível identificar os usuários diretos do

serviço prestado pelo concessionário. Como visto, esta modalidade de concessão se aplica aos

serviços discutidos na presente tese.

De fato, o objetivo de delegação de provisão de serviços de infra-estrutura por meio de

contratos de longo prazo é o mesmo de contratos de concessão clássicos, mas com a diferença

da participação do poder público na remuneração pelo serviço prestado em complementação

ao pagamento de usuários. Como discutido no capítulo anterior, o pagamento de

contraprestação pública pode ser feito por meio de pagamentos fixos ou variáveis. A Lei

brasileira permite ambas as categorias de modelo contratual em PPP. Em especial, destaca-se

que o pagamento deve estar vinculado à qualidade de serviço prestado.

A Lei de PPPs cria a possibilidade de reunir sob um mesmo agente privado as

responsabilidades de elaboração, construção e operação de projetos de infra-estrutura. Os

benefícios e economias da integração destas atividades na mesma unidade decisória são

integralmente capturados pelos agentes privados.

55 Segundo Brito e Silveira (2005) a vantagem desta terminologia é sua facilidade de remissão à legislação prévia de licitação e concessão.

139

Não obstante, a Lei permite distribuir riscos tradicionalmente de responsabilidade da

Administração Pública, tais como: caso fortuito, força maior, fato do príncipe e área

econômica extraordinária. Tal possibilidade é uma inovação frente à tradição de contratos

administrativos do setor público, considerando a prerrogativa de manutenção de equilíbrio

econômico financeiro do contrato56. Por outro lado, criam-se mecanismos de assunção de

risco de demanda pelo poder público, parcial ou integralmente, mas também meios de

compartilhamento dos ganhos do parceiro privado provenientes da queda do seu risco de

crédito.

Além de versar sobre o relacionamento entre as partes pactuantes de um contrato de

PPP, a Lei disponibiliza o mecanismo de assunção de controle por financiadores (step-in

right), no caso de inadimplência, ou de baixos níveis de retorno que antecipem a

inadimplência. No entanto, devem-se observar as disposições de caráter de concessão de

serviço público, garantindo a continuidade da prestação da utilidade e mantendo a segurança

de provisão dos serviços aos seus usuários. Ou seja, o contrato pode requerer garantias do

agente privado nos limites aplicáveis às concessões clássicas.

A finalidade do mecanismo de step-in é gerar o comprometimento dos financiadores

nos investimentos de infra-estrutura. Vale lembrar que os empreendimentos deste setor

envolvem uma estrutura de capital com grande participação de dívida sob modelos de project

finance. Uma vez que os financiadores possam assumir o contrato de PPP, a continuidade da

provisão do serviço fica mais assegurada. (Pinto, 2006)

A participação de recursos públicos na receita dos concessionários ainda é motivo de

receio de eventuais participantes de um processo licitatório para a provisão de um serviço

público. O arranjo institucional de PPPs no Brasil buscou criar segurança jurídica para o

recebimento da contrapartida pública. Diante disto, o Decreto 5.411/05 autorizou a

integralização de quotas com ações de empresas brasileiras detidas pela União no Fundo

Garantidor de PPP (FGP).

Apesar do capital autorizado para o FGP ser de R$ 6 bilhões, as ações, de grande

liquidez, possuem atualmente um valor estimado de aproximadamente R$ 3,5 bilhões.

Embora fosse razoável adotar certo grau de alavancagem do capital do fundo em relação ao

56 Cabe mencionar que o conceito de equilíbrio econômico financeiro refere-se ao re-estabelecimento das condições inicialmente previstas no contrato, não significando um meio de reposição de perdas geradas, por exemplo, por má gestão do serviço.

volume de recursos empregados às parcerias, este expediente não foi permitido, a fim de gerar

maior grau de confiança aos agentes privados.57

Contudo, não parece errôneo supor que uma vez difundido este tipo de iniciativa e que

o pagamento de contrapartida pública se torne um procedimento usual, uma reputação

positiva permita maior desvinculação entre o capital do FGP e o volume de contratos em PPP.

O fundo garantidor (FGP) é integrado por ações de grande negociação na BOVESPA, logo

conferindo grande liquidez ao fundo. A liquidez do FGP é um requisito necessário para dar

maior grau de confiança desta garantia prestada aos contratos de PPP.

A composição destas ações integralizadas ao FGP está apresentada na Tabela 4.6

abaixo.

Tabela 4.6: Composição do Fundo Garantidor de PPP por ações integralizadas – 2006

E m presa Classe Quantidade (unid.) de açõesCTE E P O N 9.556 .150 .967E LE TRO P A ULO O N 3.335 .596 .142B B O N 30 .000 .000

O N 14.178P N 15 .226 .023O N 1.850 .494P N 499 .416

P E TRO B RÁ S O N 970 .584US IM INA S P NB 365 .813

O N 12.425 .061 .863P NB 40 .920O N 20.000 .000 .000

P NB 17 .595 .501 .100CO E LB A O N 14 .004 .288

O N 38 .267 .848P NA 122 .911 .656

CO M G Á S O N 7 .231 .564O N 166 .896 .894

P NA 832 .625 .407O N 9.578P N 163 .288P N 163.288P N 336 .285

CE LP E

CO E LCE

G E RDA U

RHO DIA -S TE R

CV RD

E M B RA E R

TRA CTE B E L

E LE TRO B RÁ S

Fonte: Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão

Embora a Lei de PPPs estabeleça os parâmetros principais deste tipo de contrato entre

setor público e privado, as especificidades de cada contrato definirão os sistemas de

incentivos e os mecanismos de monitoramento, e, conseqüentemente, a repartição de riscos e

rendas entre as partes. Conforme expresso na Lei, os contratos de PPP podem se diferenciar

no grau de risco que é alocado ao parceiro público e ao privado, como também no retorno

57 Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, 2006.

140

financeiro projetado para o investimento, oriundo da capacidade de arrecadação de tarifas

junto aos usuários finais dos serviços.

4.3.2 – Serviços de Infra-estrutura no Brasil: O Conjunto de Estruturas de Governança.

A instituição da possibilidade de formação de contratos nos termos de PPPs ampliou o

conjunto de modelos contratuais possíveis entre setor público e privado. A Lei das PPPs se

insere entre os conceitos de licitação e de concessão na Constituição brasileira. O advento da

Lei 11.079 criou uma nova modalidade contratual entre setor público e privado, porém isto

não elimina as funções exercidas pelos marcos legais da Lei de Licitações Públicas 8.666/93 e

das leis definidoras das regras de concessões (8.987/95 e 9.074/95).

Assim, qualquer processo licitatório em regime público deve obedecer aos

condicionantes da Lei 8.666, bem como os marcos gerais de uma concessão que estão

expressos na Lei 8.987. O fato de não prescindir destas regras aponta a complexidade legal de

contratos sob a Lei de PPPs. A Figura 4.1 abaixo ilustra esta relação entre os marcos legais e

os tipos contratuais em serviços de infra-estrutura.

Figura 4.1: Marcos legais e tipos contratuais em serviços de infra-estrutura

OBRA

PÚBLICA

LEI 8.666

LEI 8.987 e 9.074

CONCESSÃO

COMUM

LEI 11.079

PPP

Fonte: Elaboração própria

A necessidade da contratação de prestação de serviços à administração pública com

prazo igual ou inferior a 5 anos seguirá sendo regido pelo regime da Lei 8.666. Este regime

contratual não se captura a sinergia da integração vertical das etapas de concepção, construção

e operação de um ativo, como é possível pela PPP.

141

142

A limitação temporal da Lei de Licitações (5 anos) também é um empecilho para a

contratação de serviços cujo retorno do capital investido dependa de um longo prazo de

operação dos ativos. Trata-se de um mecanismo para ser empregado numa compra de serviço

e/ou produto atendendo às especificações da administração pública. Na mesma Lei, dispõe-se

que o Estado deve arcar com os riscos extraordinários; desta forma, o re-equilíbrio financeiro

do contrato é automático e compulsório. Portanto, a relação é muito próxima a um contrato do

tipo cost-plus.

Nas Leis de Concessões o equilíbrio econômico-financeiro de um contrato é

considerado inalterado quando suas condições de definição inicial se mantêm. Portanto, como

destaca Pinto (2006), o que existe é um princípio de manutenção e não de geração de

equilíbrio econômico-financeiro. Na perspectiva do autor, a falta de clareza na alocação de

riscos gera uma vantagem para o concessionário no momento de renegociações contratuais.

Assim, a vantagem introduzida pela PPP seria a possibilidade de explicitar esta repartição de

riscos e espera-se com isto reduzir a probabilidade de solicitação de revisões do equilíbrio

econômico-financeiro por parte do concessionário.

Se no limite ocorre a banalização do instrumento de re-equilíbrio do contrato, perde-se

o efeito de indução ao comportamento de custo-eficiência de uma regulação por preço-teto e

se aproxima de uma regulação por custo de serviço. O efeito mais deletério é que isto venha a

ocorrer sem a contrapartida de incentivos aos investimentos em expansão de serviços, que

seria o resultado clássico de um cost-plus58.

De modo geral, o fato é que o contrato de PPP dispõe de mecanismos para o

compartilhamento de riscos entre parceiro público e privado, enquanto a Lei de Concessões

supostamente atribuía todo risco ao concessionário. No entanto, como discutido por Campos

Neto e Soares (2006), a experiência das concessões rodoviárias brasileiras mostra que

transferir os riscos integralmente ao concessionário foi uma pretensão que não se concretizou.

Isto porque as renegociações contratuais por meio de solicitações de revisão do equilíbrio

econômico-financeiro têm o efeito de gerar uma rentabilidade mínima para o concessionário.

Em linha com o que foi discutido na seção 2.4.3 do capítulo II, este é um exemplo das

limitações dos contratos de concessão definir ex-ante todos aspectos necessários para

adaptação, o efeito disto é o custo e a incerteza de renegociações contratuais ex-post.

58 A discussão sobre os procedimentos de re-equilíbrio será retomada na próxima seção.

143

Como visto acima, o expediente de repartição de riscos também deve ser entendido

como uma necessidade de proteção para viabilizar a remuneração de serviços de infra-

estrutura por agentes privados, através de, por exemplo, compartilhamento de risco de

demanda ou estabelecimento de um nível mínimo de receita. Um ponto básico do conceito

contratual de PPP, como entendido no caso brasileiro, é o fato que o parceiro privado deve

arcar com o risco de variações de custos de investimento e de operação, dado serem variáveis

que este agente possui maior controle. Por outro lado, esta é uma forma de preservação de

incentivos para reduzir custos, instrumento comum aos modelos de regulação por preço-teto.

O arranjo institucional da PPP permite a formação de contratos mais flexíveis, com

maior poder de adaptação para absorver mudanças no longo período envolvido em uma

concessão de um serviço de infra-estrutura. Uma leitura menos atenta pode levar à conclusão

que este mecanismo é mais favorável ao parceiro privado, mas tal interpretação ignora o fato

que a definição contratual ex-ante não é um mecanismo perfeito de coordenação de transações

econômicas, com ativos específicos e em ambiente de incerteza.

Outro aspecto importante é que a partir do marco legal da PPP fica estabelecida a

presença de penalidades aplicáveis tanto à administração pública quanto ao parceiro privado,

em caso de inadimplemento contratual. A Lei define sanções proporcionais à gravidade da

falta e aos compromissos assumidos. O efeito disto é a redução assimetrias de poder de

barganha e risco de ações oportunistas, principalmente o de hold-up em função de

investimentos específicos. Contudo, mais relevante do que estabelecer penalidades mútuas é o

fato da PPP combinar mecanismos de adaptação e compartilhamento de riscos e rendas com

incentivos de alta potência para reduzir custos, típicos de regulação por incentivos.

Desta forma, o conjunto de estruturas de governança, incluindo a possibilidade de

formação de contratos de PPP, tornou-se mais completo e passou a contemplar sistemas mais

flexíveis de relação entre setor público e privado. Fruto desta inovação institucional, cresce o

conjunto de estrutura de governança factíveis a serem aplicadas para a delegação de serviços

de infra-estrutura no país. Este espectro de possibilidades contratuais varia desde a mais

hierárquica, expressa pela realização de um investimento público por uma empresa estatal ou

contrato de curto prazo para uma obra pública, até a concessão clássica, ou mesmo a

privatização para determinados casos. No intervalo entre essas formas contratuais, tem-se as

PPPs, em suas modalidades Administrativa e Patrocinada.

144

Da mesma forma, como apresentado no capítulo anterior, na medida em que se

caminha para estruturas de governança mais complexas - solução de fazer - aumentam os

mecanismos de adaptação cooperativa. Com isto, eleva-se a eficiência em promover um maior

número de transações na presença de investimentos em ativos específicos e com grande

incerteza. Em setores de infra-estrutura, isto significa maior facilidade de investimentos em

expansão da rede em regiões de baixa atratividade para investidores privados.

No entanto, em contrapartida aumenta o custo de a montagem e monitoramento destas

estruturas e, por conseguinte, a introdução de dissipações de recursos em princípio

necessários para a expansão da rede de ativos de infra-estrutura. A adequação da forma

organizacional aos requerimentos de coordenação dos investimentos é a chave para os ganhos

de eficiência e, portanto, para a universalização de serviços de infra-estrutura. Na seção que se

segue serão discutidas as situações em que os modelos contratuais de PPP se apresentam

como solução eficiente para a expansão da rede.

4.4 – Eficiência Econômica e Seleção do Modelo Contratual para Serviços de Infra-estrutura no Brasil.

Uma vez apresentado o novo conjunto de estruturas de governança após a

possibilidade de contratos em PPP, a questão remanescente é iniciar o debate sobre a

identificação de situações nas quais os modelos de PPP se apresentem como a forma

contratual relativamente eficiente. Este é intuito principal desta seção. Não obstante, uma

avaliação realizada é sobre as possibilidades criadas a partir do conceito contratual de PPP em

contextos de concessões clássicas já estabelecidas. Esta é a discussão realizada na primeira

parte desta seção.

A segunda parte desta seção, e talvez a mais importante, especula sobre a identificação

de situações de eficiência relativa dos contatos de PPP vis-a-vis o contrato de concessão

clássica e o investimento público. Será aplicada a tipologia apresentada no capítulo anterior

para alguns setores de infra-estrutura no Brasil, mantendo as Unidades da Federação como o

nível de agregação espacial.

145

4.4.1 - Contratos de Concessão e Universalização de Serviços: Considerações a Partir da Lei de PPP

O Brasil reúne algumas experiências de concessão de serviços de infra-estrutura ao

setor privado, iniciadas após o ano de 1995, marco da Lei de Concessões. Apesar da literatura

avaliar as iniciativas de concessão destes serviços pautando-se pela perspectiva setorial,

existem similaridades na regulação e no modelo de delegação destes serviços pelo Estado que

permitem discuti-los em conjunto, a despeito de perda de singularidades.

A diversidade regional entre as Unidades da Federação, nas condições para a

viabilidade econômica de operadores de serviços, cria condições para que a assimetria se

reflita na universalização dos serviços de infra-estrutura no Brasil. Diante disso, as

alternativas institucionais possuem importância significativa na solução do problema da

universalização.

O processo de concessão dos serviços de infra-estrutura no Brasil foi estabelecido em

conjunto com os modelos regulatórios de preço-teto. No capítulo II abordaram-se as

limitações dos modelos de regulação por preço-teto para induzir a universalização de serviços,

dado que a expansão da rede só se justifica quando o investimento marginal for remunerado

pelos usuários beneficiados por este.

Esta limitação é menor quando existem as condições estruturais para a expansão dos

serviços por operadores privados. No entanto, um mesmo tipo básico de contrato de

concessão, com mecanismo de preço-teto, foi empregado em regiões com perfis estruturais

muito diferentes entre si. Para Unidades da Federação como São Paulo ou Brasília tal modelo

não gera dúvidas sobre sua eficácia na promoção de um maior patamar de universalização de

serviços. O mesmo não pode ser dito para estados mais pobres e de baixa concentração da

população no espaço.

A solução do latente impasse criado pelo instrumento de delegação de serviços por

concessões clássicas e assimetria regional poderia, em tese, ser solucionado por duas

alternativas. A primeira seria estabelecer modelos regulatórios no contrato de concessão que

incentivassem os investimentos na expansão da rede de ativos, independentemente de sua

146

rentabilidade marginal. Em outras palavras, a alternativa seria empregar modelos de regulação

pelo custo de serviço.

Por outro lado, seriam perdidos os incentivos de redução de custos e aumentariam os

gastos com monitoramento dos contratos, como foi visto no segundo capítulo. Contudo, para

fins de universalização de serviços, permaneceria a impossibilidade de uma determinada área

de concessão gerar recursos suficientes para remunerar o capital do investido na expansão de

serviços.

A segunda alternativa consiste em reunir, sob uma mesma área de concessão, regiões

que congreguem sub-regiões superavitárias e deficitárias, garantindo a remuneração de um

provedor privado de serviços de infra-estrutura. Assim, via subsídios cruzados, poder-se-ia

alcançar um maior nível de universalização para as regiões deficitárias. Porém, diante da

necessidade de detalhamento de grande quantidade informações assimétricas, a

implementação desta alternativa envolve significativos custos de transação ex-post para o

monitoramento do contrato, mesmo se a regulação for pautada por preço-teto.

Cabe lembrar que o uso de mecanismos de subsídio cruzado é afetado pelas políticas

de separação vertical dos setores de infra-estrutura. Uma vez que usuários corporativos, como

segmentos industriais, podem realizar arbitragem com o seu consumo – o que não é factível

para os clientes cativos (residenciais) – perdem-se fontes superavitárias para financiar regiões

e classes de consumo com baixa atratividade para um operador privado.

A solução para a universalização de serviços de infra-estrutura em regiões deficitárias

no Brasil apresenta-se como uma tarefa complexa de ser resolvida com o modelo contratual e

regulatório empregado nas concessões brasileiras. A assimetria entre o grau de difusão dos

serviços entre as Unidades da Federação não apenas tende a se manter, como também não

seriam encontradas soluções fáceis caso fosse empregada à regulação por custo de serviço.

A redefinição de modelos regulatórios, como regulação por custo de serviço, ou ainda

o retorno à verticalização setorial, envolvem elevado custo de implementação, que pode não

ser compensado pelos benefícios em termos de universalização de serviços em regiões

deficitárias. A má reputação e a perda de credibilidade do marco regulatório ensejariam

problemas nas regiões onde o modelo se exibe como uma solução adequada de estrutura de

governança.

147

Diante das restrições apresentadas, para ampliar o grau de universalização parece ser

imprescindível à adoção de algum mecanismo de suporte e fundos públicos para a

remuneração de capital investido com esta finalidade. Para as concessões estabelecidas, uma

alternativa depois de identificadas as limitações para a expansão do serviço é realizar os

procedimentos de adição de investimentos na expansão da rede. A respeito desta discussão

pode-se especular que o mecanismo de re-equilíbrio econômico-financeiro de contratos de

concessão pode ser empregado para viabilizar investimentos em a expansão da rede de

serviços. Neste sentido, tais investimentos seriam extraordinários, demandados pelo poder

concedente e não previstos na outorga.

Na próxima seção aplica-se a tipologia discutida no capítulo anterior para a

identificação de contextos favoráveis ao emprego de modelos contratuais em PPP vis-a-vis

outras estruturas de governança.

4.4.2 – Parceria Público Privada e o Dilema da Universalização de Serviços no Brasil: Algumas Perspectivas.

Diante da assimetria na universalização dos serviços de infra-estrutura, conclui-se pela

necessidade de introduzir maior foco regional na avaliação de políticas regulatórias no Brasil.

Tendo em vista esta necessidade, discute-se, de forma preliminar nesta seção, como o modelo

de PPP se situaria na seleção de estruturas de governança para setores de infra-estrutura no

Brasil.

No intuito de destacar a metodologia de análise proposta, adota-se o corte regional por

Unidade da Federação, como acima. Neste aspecto, a abordagem proposta nesta tese pode ser

utilizada para futuros estudos empíricos com unidades sub-regionais menores do que uma

Unidade da Federação, como, por exemplo, município ou microrregião. Esta é uma

perspectiva útil, pois algumas experiências de PPP em âmbito estadual e mesmo municipal

serão implantadas. Não obstante, da mesma forma que existe uma forte assimetria entre

Unidades da Federação, esta disparidade se reproduz internamente em cada uma delas.

A seleção apropriada do modelo contratual deve contemplar as características

estruturais que determinam a viabilidade da provisão por agentes privados e o grau de

A seguir realiza-se uma ilustração para o caso dos setores de infra-estrutura discutidos

na seção 4.2. Desta forma, nos Gráficos 4.9 e 4.10 que se apresentam na seqüência, o eixo

horizontal representa a dimensão estrutural (renda x espaço), enquanto o eixo vertical

representa o grau de difusão dos serviços, medida inversa do perfil de “investimentos novos”.

A probabilidade de um projeto de infra-estrutura ter o perfil de “investimento novo”

pode ser definida como função do grau de desenvolvimento do setor. Assim, quanto menor a

difusão do serviço, maior é a chance que seja necessária a realização investimentos com alto

grau de incerteza para promover a universalização. Para tais empreendimentos, como

discutido acima, demandam-se mecanismos de salvaguardas para a proteção de recursos

investidos em ativos específicos.

Ademais, é possível realizar o cruzamento entre setor e Unidades da Federação na

alocação de estruturas de governança. Os setores de infra-estrutura considerados neste

exercício são os mesmos discutidos acima neste capítulo: rodovias, saneamento, telefonia fixa

e energia elétrica.

maturidade do investimento, como apresentada na tipologia de estruturas de governança

discutida no capítulo anterior.

148

149

0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

1

0 0,05 0,1 0,15 0,2 0,25 0,3 0,35 0,4 0,45 0,5 0,55 0,6 0,65 0,7 0,75 0,8 0,85 0,9 0,95 1

telefone fixo energia elétrica saneamento rodovias

SC

CEGO SE

RS

AL

RN

Ip

Gráfico 4.9: Identificação da Demanda por Estruturas Contratuais segundo características estruturais (I)

150

No Gráfico 4.9 acima, horizontalmente encontra-se a condição estrutural, representada

pelo produto de renda per capita e densidade demográfica. Diante da forte assimetria entre as

Unidades da Federação, para uma melhor visualização, foram excluídos os casos do Distrito

Federal, São Paulo e Rio de Janeiro. Os outros estados foram ordenados de forma que o maior

valor passasse ao valor unitário com os demais seguindo uma seqüência relativa, forma

semelhante ao apresentado na seção 4.2.159.

Assim, para cada medida estrutural do eixo X de um estado dispõe-se na vertical o

grau de difusão de cada um dos serviços (energia, telefonia, rodovias e saneamento). Por

exemplo, para Santa Catarina, o estado de melhor situação estrutural no gráfico, os setores de

energia e telefonia apresentam um indicador de universalização superior a 70%, enquanto o

setor de rodovias fica abaixo de 20%. Alguns estados foram destacados em elipses que

apresentam suas siglas indicadas, nas quais os setores de infra-estrutura encontram-se

circundados pela respectiva elipse. Desta forma, quanto mais longilínea a elipse maior a

diferença entre no grau de universalização de serviços entre setores destacados para um

mesmo estado da federação.

Antes de proceder à análise deste gráfico, vale expressar algumas ressalvas. A

primeira é lembrar que se trata de um método indireto de identificação da estrutura de

governança apropriada. Considerando as características das Unidades da Federação, indica-se

o perfil do ambiente de negócios para a realização de um contrato entre Estado e agente

privado. No entanto, determinados empreendimentos não são aderentes a este critério, seja

pelo grau de agregação espacial elevado ou por idiossincrasias de um projeto propiciarem

uma viabilidade privada diferenciada. Por exemplo, uma rodovia que uma região de produção

agrícola a um porto, pode superar as restrições de renda local e favorecer uma concessão

clássica.

A segunda ressalva diz respeito à excessiva assimetria entre as Unidades da Federação,

gerada pela variável densidade demográfica. Não foram retiradas do cálculo áreas que não

envolverão a cobertura de serviços de infra-estrutura, por serem áreas despovoadas, tais como

reservas florestais, isto tende a subestimar a estimativa de viabilidade operacional privada de

alguns estados, principalmente no caso dos estados do Norte do país.

59 A ordem dos estado no eixo ficou disposta da seguinte forma: SC, ES, SE, PR, RS, PE, AL, RN, MG, PB, CE, BA, GO, MS, MA, RO, PI, MT, PA, AP, AM, AC, TO, RR.

151

Para fins de seleção de estruturas de governança vale considerar os quatro quadrantes

como apresentado no capítulo anterior, seção 3.3. O quadrante superior-esquerdo reúne as

situações de baixa rentabilidade esperada, mas difusão de serviços acima de 50%, sendo

representada apenas por setores de energia elétrica e telefonia fixa. A única exceção fica por

conta do setor de saneamento em Minas Gerais. Neste quadrante, como no quadrante

superior-direito, o perfil de “investimento novo” tende a ser menor, na ausência de outros

mecanismos de incentivo. Desta forma, no quadrante superior-esquerdo encontram-se

situações favoráveis para adoção de PPP com contraprestação fixa, ou para o artifício de re-

equilíbrio, nos setores nos quais o modelo de concessão clássico já foi implementado.

O quadrante superior-direito, apesar de uma baixa probabilidade de ocorrer um

investimento novo (green field), a condição estrutural tende a ser mais favorável para a

remuneração do capital privado investido. Assim, esta região reúne as situações onde o

modelo contratual de concessão clássica tende a ser uma solução relativamente eficiente.

O quadrante inferior-esquerdo representa as situações que demandam estruturas de

coordenação mais complexas, como modelos de PPP com contraprestação variável ou

mesmo obra pública. Há incerteza no perfil do investimento e as condições estruturais são

muito restritivas para operação privada gerar retorno adequado aos investimentos. Vale notar

que, apesar do sucesso do modelo de concessões em telefonia fixa, este setor possui nove

estados neste quadrante, quais sejam: Roraima, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pará,

Tocantins, Ceará, Bahia, Maranhão e Piauí.

O círculo Ip destaca o cruzamento entre setores e estados da federação, nos quais a

estrutura de governança mais favorável tende a ser o investimento público. Este círculo é

composto por estados do Norte e do Nordeste do país, como Roraima, Tocantins, Amapá,

Piauí, Maranhão, nos setores de saneamento e rodovias. Trata-se de situações nas quais o

nível de distúrbio tende a ser muito elevado, e demandando custosas estruturas de

monitoramento e de renegociação contratual, mesmo em estrutura de PPP.

Por fim, o quadrante inferior-direito apresenta as situações estruturais que podem se

refletir em uma viabilidade para provisão privada acima da média nacional. Porém, este

quadrante conta com um alto grau de incerteza para os investimentos. Nestes casos, um

modelo de PPP com contraprestação variável pode ser aplicado, pois mitigaria o risco do

investimento privado e evitaria que o Estado venha a contribuir desnecessariamente para o

A seguir, o gráfico 4.10 reapresenta a mesma análise, porém considerando apenas a

renda per capita como variável estrutural no eixo horizontal. Isto permite mostrar

simultaneamente todas as Unidades da Federação, ao reduzir o grau de assimetria da variável

estrutural. Os resultados acima permanecem válidos.

empreendimento privado, se o efeito indução de demanda após o investimento for

significativo. Neste mesmo quadrante, nos pontos mais próximos ao quadrante superior-

direito, algumas experiências de concessão clássica podem ser a melhor alternativa.

152

0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

1

0 0,05 0,1 0,15 0,2 0,25 0,3 0,35 0,4 0,45 0,5 0,55 0,6 0,65 0,7 0,75 0,8 0,85 0,9 0,95

0,05

0,15

0,25

0,35

0,45

0,55

0,65

0,75

0,85

0,95

1

telefone fixo energia elétrica saneamento rodovias

153

Gráfico 4.10: Identificação da Demanda por Estruturas Contratuais segundo características estruturais (II)

O Gráfico 4.10 propicia a visualização das diferenças setoriais. Fica clara a demanda

por estruturas de governança mais complexas como PPP para o setor de rodovias e o setor de

saneamento. O setor de saneamento é, com algumas exceções, o setor demandante de

estruturas de governança com perfil mais cooperativo, como os modelos de PPP. Este setor é

o que apresenta maior dispersão entre os estado brasileiros.

O setor de rodovias também se apresenta como um demandante de modelos

contratuais em PPP para viabilizar a participação privada nos investimentos. Contudo para

este setor de rodovias cabe um comentário importante. O indicador utilizado para demonstrar

o grau de universalização deste serviço entre as Unidades da Federação, ao considerar o

percentual de rodovias pavimentadas sobre a extensão total das rodovias, pode ser uma

medida excessivamente rigorosa. É possível que na extensão total das rodovias o correto deva

ser expurgar vias vicinais e de acesso. Não obstante, o segmento de rodovias pode apresentar

projetos específicos que se apresentem maior viabilidade do que a expressa por este método

indireto de identificação de estruturas de governança.

Como nota-se no gráfico, o setor de telefonia fixa é que mostra maior correlação com

a renda per capita do estado. Assim, diante da forte assimetria na renda per capita entre as

unidades da federação, o resultado é que os estados mais pobres apresentem um grau de

universalização muito abaixo da média nacional. Desta forma, ao se considerar uma análise

desagregada, criam-se dúvidas se as concessões clássicas são de fato um sucesso absoluto

para o setor de telefonia fixa.

Assim como a telefonia fixa, o setor de energia elétrica apresenta forte correlação

coma renda per capita das Unidades da Federação. No entanto, pelo indicador empregado na

análise verifica-se que o patamar médio de universalização deste serviço é muito superior aos

demais. Como observado acima, este resultado merece algumas ressalvas. O primeiro aspecto

é que este indicador pode ter capturado ligações informais ao serviço, logo superestimado o

resultado. Outra ressalva é que independentemente do grau de formalidade deste acesso, o

nível de utilização do serviço por habitante segue apresentando uma disparidade muito grande

entre os estados brasileiros.

Como comentado acima, na perspectiva regional destaca-se que vários estados

demandam modelos como as PPP em diferentes setores, como fica claro na visualização do

quadrante inferior-esquerdo. Não obstante, em casos limites, é possível supor que a obra

154

pública será a melhor alternativa, dado a alta probabilidade de distúrbios na relação contratual

entre Estado e agente privado.

Assim, o modelo de PPP não deve ser visto como uma solução universal, na qual

todos os problemas para o desenvolvimento dos serviços de infra-estrutura no país estariam

solucionados. Cabe destacar que a concessão tradicional mostra-se como modelo eficiente,

principalmente em regiões de alta renda e densamente povoadas. Por outro lado, outros

contextos regionais apresentam necessidades de investimento nestes setores que,

possivelmente, não dispensariam iniciativas exclusivamente públicas.

Ademais, as limitações de recursos disponíveis para aplicação em contratos de PPP

exigem grande rigor na priorização dos projetos a serem contemplados neste modelo. Tal fato

reforça a relevância da tipologia de estruturas contratuais e dos critérios de avaliação de

contratos PPP apresentados nesta tese.

O cenário de grande restrição fiscal no país acaba por limitar a capacidade de realizar

investimentos públicos, mas também limita as possibilidades de projetos em PPP. Neste

contexto, a seleção setorial se destaca. O sucesso do modelo de PPP no Brasil dependerá da

formação de um fundo de recursos para serem empregados em contraprestações públicas.

Para este fundo, uma alternativa de fonte de recursos importante poderia ser a arrecadação de

outorgas em concessões clássicas. Este deve ser visto como um caminho natural para a

realização de investimentos em infra-estrutura com o modelo de PPP.

Nesse caso, os recursos empregados em contraprestação pública consistiriam de um

mecanismo de subsídio intra-setorial com a intermediação do poder público. As arrecadações

de outorga nas regiões em que a concessão clássica é uma estrutura de governança eficiente

poderiam financiar o pagamento de contraprestação de contratos de PPP, nas regiões em que

estas seriam a alternativa contratual mais eficiente.

Visto desta forma, reduz-se a percepção de um subsídio orçamentário em favor de um

arranjo intra-setorial. Trata-se de um mecanismo que simula o efeito de subsídio cruzado, sem

a perda dos incentivos de alta potência para a parte contratada (concessionário) reduzir custos.

Por fim, diante do atual estágio da discussão sobre a relevância do modelo de

contratos em PPP para o caso brasileiro, talvez o mais importante seja debater métodos de

análise do presente do objeto. Se no caso da presente tese a unidade de corte foi o Estado da

155

Federação, para outros interesses pode-se enfatizar a seleção de estruturas de governança,

diante da assimetria apresentada intra-Estados. Por exemplo, a seleção da forma contratual

para o setor de saneamento de um mesmo estado pode envolver concessão clássica para a

capital e uma PPP no interior.

4.5 - Conclusão

O presente capítulo discutiu o nível de universalização dos serviços de alguns setores

de infra-estrutura entre os estados do Brasil. Como esperado, a diversidade regional brasileira

de renda e densidade populacional se reproduz, em maior ou menor grau, no nível de difusão

dos serviços na população.

A superação desta desigualdade regional na universalização da infra-estrutura encontra

limitações sob a estrutura de governança de contratos de concessão clássicos com pagamento

de outorga ao Estado e com regulação por preço-teto. Em relação à capacidade financeira e

aos investimentos na expansão da rede, esta estrutura de governança é menos adequada

quanto menor o retorno esperado na aplicação de capital. Sob esse critério, a prática de um

preço-teto em contratos clássicos de concessão será tão eficaz quanto menor a necessidade de

expansão dos serviços.

O dilema da relação entre a condição financeira das empresas e a expansão da rede de

serviços de infra-estrutura no Brasil, sem a possibilidade de subsídios cruzados

(financiamento intra-setorial), é um exemplo das contradições de se forçar um resultado que

está além da capacidade do modelo contratual. Portanto, o modelo adotado é ineficiente em

vários contextos regionais no Brasil. Ele se apresenta como uma estrutura de governança

demasiadamente simples para a complexidade de um investimento em ativos específicos e

com forte incerteza de demanda.

Neste contexto, o arranjo institucional das Parcerias Público Privadas se apresenta

como uma alternativa de estrutura de governança para viabilizar um ritmo mais acelerado para

convergência entre os estados brasileiros no processo de universalização de serviços. No

presente capítulo, defendeu-se a validade do marco institucional de PPP no Brasil na

formação de estruturas de governança mais adequadas para lidar com as especificidades de

156

investimentos, em determinados ambientes de transação. Isto posto, avaliou-se em que

situações tal modelo pode ser empregado, seguindo como critério básico os ganhos em termos

de adequação às características do empreendimento, conforme discutido no capítulo III.

Nos setores que as concessões tradicionais foram combinadas com regulação por

incentivo, uma forma de obter maiores patamares de universalização pode ser atingida pelo

artifício de re-equilíbrio econômico-financeiro de contratos. Isto pode ocorrer destacando-se

do contrato original os investimentos incrementais para a expansão da rede e simulando,

somente nestes investimentos, o expediente da contraprestação pública, para garantir a

viabilidade econômica do empreendimento adicional. Contudo, este expediente não elimina a

necessidade de avaliação da eficiência da forma contratual, discutida no capítulo III.

A seguir, foi realizado um exercício de avaliação preliminar de seleção de situações

favoráveis ao modelo de Parceiras Público Privadas entre os estados brasileiros. Conforme

discutido acima, o espaço para o emprego deste modelo contratual de forma eficiente decorre

do cruzamento da probabilidade de um investimento novo - que pode ser medido pelo nível

médio de difusão de determinado serviço de infra-estrutura - com a dimensão estrutural da

região em gerar a viabilidade para o investimento por agentes privados.

Esta avaliação preliminar aponta para um número relativamente grande possibilidades

de aplicação de contratos em PPP, quer em contraprestação fixa, como em contraprestação

variável. Da mesma forma, indica-se as situações nas quais a concessão clássica é a estrutura

de governança mais eficiente, bem como se aponta que ainda há espaço para ser ocupado por

participação direta do Estado.

Uma vez verificado que os modelos de PPP são uma estrutura de governança eficiente

para a promoção da universalização dos serviços e que no Brasil, em um recorte por estados

da Federação, há espaços onde este modelo seria uma alternativa favorável para a

universalização de serviços, então a obtenção de fontes de recursos para a participação

pública torna-se uma tarefa fundamental.

Neste intuito, a sugestão feita neste capítulo centra-se no aproveitamento de recursos

de outorgas em regiões de concessão tradicional para o uso em contraprestação pública em

regiões deficitárias, candidatas ao modelo contratual em PPP. Isto simula o mecanismo de

subsídios cruzados, mas com a intermediação estatal para a definição de prioridades, ao

157

mesmo tempo em que se preservam os incentivos aos concessionários para a redução dos

custos de provisão dos serviços, como pretendido na regulação por preço-teto.

Contudo, no presente capítulo destaca-se a proposta de critério de avaliação. Uma

menor agregação regional, empregando microrregiões, por exemplo, possibilitará uma análise

mais minuciosa a partir do método proposto. Vale lembrar que a Lei de PPP possibilita a

formação de parcerias de estados e municípios com o setor privado. Isto reforça a necessidade

de um instrumento de mapeamento e seleção de estrutura de governança. Com este intuito, o

critério proposto aqui pode ser empregado para níveis regionais mais desagregados.

158

CONCLUSÃO

A relevância dos serviços de infra-estrutura para o bem estar social dos indivíduos na

sociedade moderna é um ponto inequívoco. A forma de prover a universalização destes

serviços é um tema imprescindível para o debate acadêmico e de políticas públicas, sobretudo

em países em desenvolvimento como o Brasil. Assim, a motivação geral de investigação desta

tese foi o de identificar os determinantes para a universalização dos serviços de infra-

estrutura, destacando o papel assumido pela forma contratual que rege a relação entre Estado

e iniciativa privada.

A partir da reforma dos setores infra-estrutura realizada nos países em

desenvolvimento a partir da década de 90, gerou-se intenso debate sobre a forma de

implementação de modelos experimentados em países desenvolvidos. No entanto, esta

discussão não enfatizou o papel exercido pelas condições estruturais de renda e espaço na

definição das características básicas da relação contratual entre Estado e agentes privados.

No entanto, a preocupação básica da literatura sobre o tema, principalmente em

países em desenvolvimento, deve se pautar pela preocupação de atingir maiores patamares de

universalização dos serviços de infra-estrutura e não pela adoção de qualquer modelo

institucional como um fim em si mesmo. Neste sentido, a presente tese relacionou a dimensão

estrutural ao modelo institucional que rege a transferência de responsabilidade na provisão de

serviços de infra-estrutura.

Nesta tarefa, o arcabouço teórico da Nova Economia Institucional, recorrentemente

empregada em estudos de regulação e organização industrial de setores de infra-estrutura,

mostra-se como uma adequada matriz conceitual. Diante do caráter eminentemente normativo

e seus rebatimentos para políticas públicas, demandam-se critérios de eficiência, condizentes

com esta abordagem teórica, para balizar a discussão pretendida na tese. Contudo, apesar da

grande relevância da teoria neo-institucionalista para o objeto em questão, o debate normativo

nesta escola de pensamento acabou ofuscado pelo grande interesse de investigação empírica

nesta literatura.

A conclusão do primeiro capítulo foi que a eficiência econômica no âmbito da

abordagem neo-institucionalista não deve se pautar pela busca de modelos hipotéticos de

coordenação das transações econômicas. A concepção de ineficiência irremediável expressa

159

por Williamson (1991a, 1996) significa que as estruturas de governança devem ser avaliadas

de forma relativa (comparativa), e não pela suposta superioridade absoluta de alguma forma

contratual hipotética. A eficiência de determinada estrutura de governança se reflete na

capacidade de lidar com as características da transação se adaptar aos distúrbios em que está

submetida. A discussão realizada no capítulo I sobre critérios de eficiência pertinentes à

abordagem neo-institucionalista não só serviu de guia para o exercício realizado nesta tese,

mas também pode ser útil para outros estudos que envolvam debates de políticas públicas.

No capítulo II, após a apresentação de características básicas dos setores de infra-

estrutura e dos modelos institucionais empregados na reforma destes setores, foi discutida a

questão da universalização dos serviços. Para o entendimento do problema, os determinantes

estruturais da universalização dos serviços foram isolados de sua dimensão institucional. Com

isto, concluiu-se que a eficiência na provisão de uma maior universalização de serviços de

infra-estrutura depende da sintonia entre condições estruturais de uma região à estrutura de

governança que rege a relação entre Estado e setor privado na provisão dos serviços. Neste

sentido, a estrutura de governança resultante da reforma institucional pode representar

ineficiências em regiões demandantes de investimentos de expansão da rede de ativos,

condição que se apresenta de forma intensa em países em desenvolvimento.

Os modelos de Parceria Público Privada (PPP) foram avaliados como uma forma de

suprir as potenciais lacunas deixadas pelos arranjos institucionais anteriores. A contribuição

do capítulo III foi destacar que as PPP devem ser compreendidas como uma estrutura de

governança que amplia o conjunto de possibilidades de cooperação entre Estado e iniciativa

privada para a provisão de serviços de infra-estrutura. Neste intuito, foi esboçada uma

tipologia de estruturas de governança, destacando as situações em que os modelos de PPP se

mostram relativamente mais eficientes.

Os modelos de PPP criam instrumentos que adequam a delegação de serviços públicos

em regiões com condições estruturais desafiadoras à universalização de serviços. As

estruturas de governança possíveis a partir destes modelos são mais flexíveis para serem

adaptadas aos problemas de países em desenvolvimento. Isto abre espaço para a superação de

uma grande dificuldade na aplicação de paradigmas de regulação e concessão de serviços de

infra-estrutura concebidos para lidar com o grau de maturidade de rede dos países

desenvolvidos. Conclui-se pela validade de modelos contratuais em PPP como alternativas

160

eficientes para a provisão de serviços de infra-estrutura, desde que alocados adequadamente

às características da do investimento.

O quarto capítulo cumpriu o objetivo de investigar o desafio da universalização de

serviços no Brasil e os contornos básicos do marco institucional da PPP na lei brasileira. A

assimetria nas condições estruturais de renda per capita e densidade populacional entre as

Unidades da Federação significa a demanda de um amplo conjunto de estruturas de

governança para a provisão de serviços de infra-estrutura.

A grande desigualdade no nível de universalização de serviços traz indícios da

limitação das formas contratuais até hoje empregadas em promover mudanças substanciais no

patamar de acesso à infra-estrutura no país. Neste sentido o marco das PPP’s no Brasil

sinaliza a possibilidade de mudança neste cenário e promoção de ganhos de eficiência.

O capítulo IV trouxe um exercício de avaliação preliminar do espaço possível de ser

preenchido por modelos de PPP, tendo as Unidades da Federação como critério de corte

regional. Os resultados apontam para um espaço significativo para o emprego de modelos de

PPP em vários estados. Partindo do método de análise proposto neste estudo, é possível

encontrar resultados mais minuciosos para estudos com um corte regional mais desagregado.

Vale lembrar, que esta proposta se trata de um método indireto de seleção, não dispensando

que as especificidades de projetos isolados sejam contempladas.

Vale lembrar que a Lei de PPP possibilita a formação de parcerias de estados e

municípios com o setor privado. Isto reforça a necessidade de um instrumento de mapeamento

e seleção de estrutura de governança. Assim sendo, a presente tese colabora para o debate

acadêmico ao definir, a partir da análise normativa da teoria neo-institucionalista, critérios

para avaliação da universalização dos serviços como critério de eficiência em setores de infra-

estrutura, sendo fundamental a adequação entre a dimensão estrutural e modelo contratual

adotado entre Estado e setor privado.

Portanto, na medida que o modelo de PPP se constitui como uma estrutura de

governança para esta finalidade, os ganhos de eficiência promovidos por este modelo

dependerão na seleção apurada de sua aplicação. Neste aspecto os critérios discutidos e

propostos para avaliar contratos de PPP tiveram uma aplicação preliminar para o caso

brasileiro. Em suma, vale destacar que a contribuição deste trabalho foi apresentar um

direcionamento para futuros esforços de investigação, sobretudo os que destaquem as

161

especificidades de cada setor de infra-estrutura que, para fins de obter o avanço aqui

pretendido, ficaram em plano secundário.

162

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