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ESTRESSE E INCLUSÃO ESCOLAR: INFLUÊNCIAS E REFLEXOS NA
PRÁTICA DOCENTE
Rosana Vieira BASTOS
P.M.U.E.M.B.SHOPPING PARK
Marisilda Sacani SANCEVERO
UFU/UNIUBE
RESUMO
O processo de investigação aqui sistematizado estruturou-se na busca dos aspectos
históricos e legais que determinam Educação Especial e a Inclusão Escolar, bem
como a análise e discussão dos conceitos de estresse, mal-estar docente e Síndrome
de Burnout e suas interfaces com a inclusão escolar. Esse trabalho centrou-se em
como esses fatores podem ou não afetar o processo de inclusão do aluno com
deficiência nas escolas de ensino regular. Também se buscou compreender as
interfaces entre a Educação Especial e Educação Inclusiva no contexto da diversidade
social e cultural, tendo em vista o desenvolvimento do processo de ensino
aprendizagem na efetivação da inclusão tanto escolar como social. Como se sente o
aluno com deficiência inserido no meio de todos os outros discentes? Este aluno ao
adentrar numa instituição escolar, com uma dinâmica diferente do ambiente familiar
que vivia até então, será que tem percepção do estresse do professor, que ao mesmo
tempo precisa atender os alunos “ditos normais” e, voltar sua atenção e prática
docente ao aluno com deficiência? São indagações que conduziram o
desenvolvimento da pesquisa que deu origem a esse artigo. Trata-se, de um
constructo teórico que busca evidências nas abordagens e estudos feitos por autores
como CODO, W. (2002), JESUS (2002), LIPP, M. (2002), MANTOAN (1997)
NAUJORKS, M. I. (1993), PADILHA, A. M. (2004), MÉSZAROS (2008) dentre outros,
no sentido de perceber se há relação entre o processo de inclusão e o mal-estar
docente. Diante do estresse a que se sujeita o professor, como enfrentar os desafios
desse mal docente, a fim de que a inclusão escolar sai da possibilidade e se efetive de
fato e com sucesso? A pesquisa evidenciou que as situações estressantes podem ser
amenizadas e, por meio das informações sobre: estresse, bem-estar, inclusão,
formação continuada profissão docente, poder-se-á constituir uma forma de
conscientização para que se busquem meios de lidar com diferentes obrigações e
diversidades cultural, social e comportamental a que todos estão sujeitos no dia a dia.
Trabalhar o lado emocional dos sujeitos nas instituições escolares a fim de orientá-los
a reconhecer seus sentimentos de frustração/ satisfação, direcionando lhes um novo
olhar para os alunos, colegas e para si mesmo é a premissa fundamental para a
educação no Séc. XXI.
Palavras – chave: Estresse; Prática Pedagógica; Inclusão escolar.
ESTRESSE E INCLUSÃO ESCOLAR: INFLUÊNCIAS E REFLEXOS NA
PRÁTICA DOCENTE
INTRODUÇAO
O movimento mundial pela inclusão, como uma ação política, cultural,
social e pedagógica, desencadeou a defesa do direito de todos os alunos
pertencerem a uma mesma escola, de estarem juntos, aprendendo e
participando sem nenhum tipo de discriminação. A educação inclusiva passa
então a constituir-se um paradigma educacional fundamentado na concepção
de direitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores
indissociáveis.
Como pedagoga, especializada em Educação Especial, vivencio uma
prática pedagógica que cotidianamente reafirma o interesse em aprofundar a
questão da prática docente e sua relação com a inclusão escolar, procurando
compreender as interfaces entre Estresse, Síndrome de Burnout, ou Mal Estar
Docente e o processo de inclusão escolar e, como esses fatores podem ou não
afetar o processo de inclusão do aluno com deficiência nas escolas de ensino
regular.
Nesse contexto, o estudo teve como objetivo geral evidenciar até que
ponto o processo de inclusão sofre influências do estresse do professor e, se
por outro lado, a inclusão tem acentuado o estresse no professor.
Também se buscou compreender as interfaces entre a Educação
Especial e Educação Inclusiva no contexto da diversidade social e cultural,
tendo em vista o desenvolvimento do processo de ensino aprendizagem na
efetivação da inclusão tanto escolar como social. Como se sente o aluno com
deficiência inserido no meio de todos os outros discentes? Este aluno ao
adentrar numa instituição escolar, com uma dinâmica diferente do ambiente
familiar que vivia até então, será que tem percepção do estresse do professor,
que ao mesmo tempo precisa atender os alunos “ditos normais” e, voltar sua
atenção e prática docente ao aluno com deficiência? São indagações que
conduziram o desenvolvimento da pesquisa que deu origem a esse artigo.
Sendo assim, definiu-se como caminho metodológico a pesquisa
bibliográfica por possibilitar o aprofundamento do tema por meio de pesquisas
de estudiosos da área, trata-se, portanto de um constructo teórico que busca
evidências nas abordagens e estudos feitos por autores, no sentido de
perceber se há relação entre o processo de inclusão e o mal - estar docente.
Tem-se por base a abordagem qualitativa, pois o conhecimento não se reduz a
um rol de dados isolados, conectados por uma teoria explicativa; o sujeito
observador é parte integrante do processo de conhecimento e interpreta os
fenômenos, atribuindo-lhes um significado onde ocorre uma relação dinâmica
entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o
objeto, pois como afirma CHIZZOTTI (1999, p.79) “o objeto não é um dado
inerte e neutro; está possuído de significados e relações que sujeitos concretos
criam em suas ações”.
O processo de investigação aqui sistematizado estruturou-se na busca
dos aspectos históricos e legais que determinam Educação Especial e a
Inclusão Escolar, bem como a análise e discussão dos conceitos de estresse,
mal-estar docente e Síndrome de Burnout e suas interfaces com a inclusão
escolar.
1. EDUCAÇÃO ESPECIAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA: BASES LEGAIS E
HISTÓRICAS
A partir de 1985, o governo brasileiro buscou pôr em prática uma nova
política educacional que garantisse a universalização da escolarização. O
processo de democratização do ensino surge juntamente com a ideia de justiça
social, haja vista, o ensino fundamental ser instituído como gratuito e
obrigatório além de um direito de todos sem exceção.
Nesta perspectiva, o Ministério da Educação/Secretaria de Educação
Especial apresenta a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva
da Educação Inclusiva, que acompanha os avanços do conhecimento e das
lutas sociais, visando constituir políticas públicas promotoras de uma educação
de qualidade para todos os alunos. (MEC/SEESP, 2001).
Assim, a Constituição Federal de 1988, Art.3º, inciso IV defende a visão
de “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor,
idade e quaisquer outras formas de discriminação” e, ainda o Art. 205 definiu
que a qualificação para o trabalho além de direito é um exercício da cidadania
que garante o pleno desenvolvimento da pessoa. Já o Art. 206, inciso I,
estabelece a “igualdade de condições de acesso e permanência na escola”
como um dos princípios para o ensino, como dever do Estado, a oferta do
atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de
ensino (art. 208). Pela Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva
da Educação Inclusiva- MEC/SEESP- a educação especial foi organizada
como atendimento educacional especializado substitutivo ao ensino comum,
com distintas compreensões, terminologias e modalidades que conduziram ao
surgimento de instituições especializadas, escolas especiais e classes
especiais. Essas instituições, fundamentada no conceito de
normalidade/anormalidade, passam a fazer atendimento clínico-terapêutico
fundamentado pelos testes psicométricos cujos diagnósticos, definiam as
práticas escolares para os alunos com deficiência.
Em 1994, o Brasil, participa da Conferência Mundial sobre Necessidades
Educativas Especiais: Acesso e Qualidade, realizada em Salamanca, na
Espanha, e assume o compromisso de que até o ano de 2015, todas as
crianças terem acesso ao ensino fundamental, de forma gratuita e obrigatória.
O governo pretende com isso transformar a educação brasileira em um sistema
inclusivo, significando, que em termos curriculares, as escolas públicas
deverão ser planejadas, e os programas de ensino organizados, respeitando as
diferentes características e necessidades de aprendizagem do alunado. .
No âmbito legal a Constituição Federal, Art.208 preconiza o atendimento
à pessoa com deficiência na rede de ensino regular o que vem fortalecer a
educação inclusiva superando a ideia de integração escolar. O Art. 7º, Inciso
XXXI da Constituição de 1988 – proíbe quaisquer discriminações no tocante a
salários e critérios de admissão do trabalhador com deficiência, sendo que o
Art. 37 reconhece e abre mercado de trabalho aos deficientes físicos,
destinando-lhes até 20% das vagas dos concursos públicos.
Em 1989 pela Lei nº7853 temos a Fundamentação Civil-Constitucional
dos Direitos dos Deficientes. O Art. 8º tipifica o preconceito contra a pessoa
portadora de deficiência com pena de reclusão de um a quatro anos e multa,
distribuído em seis incisos, tais como dificultar inscrição de aluno deficiente em
estabelecimento de ensino, dificultar acesso a cargo público, negar
injustificadamente vaga de trabalho, negar assistência médica, deixar de
cumprir ordem judicial expedida na ação civil ou obstar por qualquer forma a
sua propositura.
Seguindo na defesa dos direitos das pessoas com deficiência em 1991
temos a Lei nº. 8.213 que em seu Art. 93 destina de 2 a 5% das vagas em
empresas, com mais de 100 empregados, aos deficientes. Sendo que a Lei
10.690 de 16.06.2003, Art. 1º, IV – facultou a aquisição de veículo, com
isenção de IPI, às pessoas com deficiência visual, mental severa ou profunda,
ou autista, diretamente ou por intermédio de seu representante legal.
Pela a aprovação da Lei nº 9394/1996 - Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional – LDB - apesar de admitir a substituição do direito de
acesso à educação pelo atendimento ministrado em ambientes “especiais”, não
contempla o direito de escolha do aluno ou dos pais, prevendo as situações em
que se dará a educação especial.
Em relação a esse item específico da LDB, em outubro de 2001, foi
aprovado o Decreto Nº 3.956 da Presidência da República que admite que o
acesso e o encaminhamento a ambientes especializados só pode ocorrer por
opção dos titulares do direito à educação, isto é: dos alunos, seus pais ou
responsáveis e nunca por imposição das escolas regulares, como acaba
acontecendo na prática. Assim o Brasil, através desse Decreto internalizou o
documento no qual foi signatária na Convenção Interamericana para
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Pessoas com
Deficiência, a Convenção da Guatemala.
Além disso, em 2003, surge o Manual da Procuradoria Geral dos Direitos
dos Cidadãos contendo várias orientações pedagógicas que visam à
transformação da escola no sentido de melhor atender os alunos, na
perspectiva da educação inclusiva. Assim, no Brasil a defesa dos direitos e
condições favoráveis às pessoas com deficiência passa a ser objeto de
atenção dos governos estaduais. Exemplo disso é a aprovação da Resolução
Nº 01/2003- CEE/RN – (Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do
Norte).
Observa-se assim, que as Leis, Decretos, Emendas e Artigos a
Constituição Federal tem por objetivo buscar efetivar a Educação Especial e,
consequentemente a inclusão das classes minoritárias, principalmente das
pessoas com deficiência. A implantação das salas de recursos nas escolas
vem garantir e reconhecer que as pessoas com deficiência tenham condições e
potencialidades para frequentar a escola regular. A lei contempla os direitos
físicos do cidadão, mas não prevê o estado psíquico emocional dos sujeitos
quando estes são colocados em situações para as quais estão
desestruturados, sendo assim seu lado psicoemocional e, o estresse passam a
ser considerados vilões da profissão docente, acarretando inúmeros
sofrimentos devido a sintomas físicos e psíquicos, provocando licenças
médicas, prejudicando o andamento das instituições educacionais. Nesta
perspectiva, Lipp (2002) considera que essa problemática tão recorrente
deveria ser olhada mais atentamente por parte do Estado criando:
[…] Estratégias de enfrentamento e sugerindo medidas
saudáveis de combate ao stress do professor, com base em
quatro pilares fundamentais: alimentação antisstress,
relaxamento, atividade física e, acima de tudo, monitoração de
pensamentos a fim de evitar cognições distorcidas que se
constituam em uma fábrica interna de stress, dentre outros
aspectos psicológicos a serem considerados. (LIPP, 2002,
p.52).
Os aspectos emocionais dos sujeitos não tem sido alvo de preocupação
por parte das instituições governamentais, e com isso tem-se tornado um fator
de risco ao profissional impedindo-o, por sua vez, que desempenhe suas
funções de forma eficiente, prejudicando os alunos no desenvolvimento do
processo ensino aprendizagem, pois os alunos com deficiência também
necessitam de atenção e cuidados pedagógicos.
A legislação do ensino da educação brasileira garante, como foi visto, a
matrícula e acesso a qualquer criança em suas unidades e estas devem
possuir profissionais habilitados a lidar com as particularidades dos distúrbios e
deficiências de cada aluno, além de lhes oferecer material apropriado para
cada deficiência, garantido assim a Inclusão. No entanto muitos fatores têm
dificultado o cumprimento dessa legislação. Em se tratando particularmente da
Educação Especial, apesar da lei determinar a inclusão de alunos com as mais
variadas deficiências, o que se percebe de fato é o docente ser mais exigido e
consequentemente sentir-se desgastado profissionalmente.
Na sociedade todos têm papel preestabelecido a exercer e, a escola
reproduz as condições da sociedade limitando a possibilidade de superação
dos problemas tanto dos alunos deficientes, quantos dos “ditos normais”.
Mantoan e Sassaki (1997) mesmo com essa visão de reprodução social
argumentam ser possível a inclusão, pois:
o objetivo é incluir um aluno ou um grupo de alunos que já foram anteriormente excluídos; a meta primordial da inclusão é a de não deixar ninguém no exterior do ensino regular, desde o começo. As escolas inclusivas propõem um modo inclusão causa uma mudança de perspectiva educacional, pois não se limita a ajudar somente os alunos que apresentam dificuldades na escola, mas apoia a todos, professores, alunos, pessoal administrativo, para que obtenham sucesso na corrente educativa geral. (MANTOAN e SASSAKI, 1997, p 114):
Esta é uma educação inclusiva desejada, no entanto se faz necessário
que docentes tenham um melhor preparo, com orientações corretas e uma
maior sensibilização quanto às potencialidades dos alunos com necessidades
educativas especiais. "A educação de excepcionais deve, no que for possível,
enquadrar-se no sistema geral de educação, a fim de integrá-los na
comunidade" (Art. 88. MEC, 1977).
Portanto , por mais árdua que seja a prática docente, está nas mãos
destes fazer com que a educação tenha como ponto de partida e chegada o
aluno real, no sentido de desenvolver uma prática pedagógica sem exclusão e
voltada para o desenvolvimento pleno do educando conforme determina a
LDB- lei nº 9394/96.
2. Estresse Docente e Prática Pedagógica na Era da Inclusão
Diante da institucionalização por lei que garante a inclusão do aluno com
deficiencia na escola regular Padilha (2004) destaca que: “juntar crianças em
sala de aula não lhes garante o ensino, não lhes garante que a escola esteja
cumprindo o seu papel, e não lhes garante aprendizagem e, não lhes garante
desenvolvimento”. Essa consideração de Padilha tem como consequência a
necessidade de se planejar e prover recursos materiais e humanos adequados
para suprir a construção de valores, conhecimentos e habilidades necessárias,
proporcionando aos alunos senso crítico, consciência e sentimento de
responsabilidade para exercício da cidadania.
O aluno com deficiência ao adentrar na escola, se depara com uma
diversidade de ideias, comportamentos muito adversos à sua realidade; se
dentro do lar se vê protegido cheio de cuidados, na escola o atendimento não
se iguala ao doméstico. As instituições escolares com seus profissionais
desempenhando diversas atividades e funções buscam lidar o melhor que
conseguem diante as mais variadas histórias de vida que ali se adentram. Será
que essa realidade coloca em risco o processo ensino aprendizagem do aluno
incluído?
Professores e dirigentes precisam entender a diversidade social e
cultural para que estabeleçam novos paradigmas, para que o desempenho no
seu trabalho seja mais eficiente, saindo das formas tradicionais e, com
eficiência atender as diferentes demandas. É certo que a infância e a juventude
passam por transformações comportamentais e que se ajustam às novidades
com rapidez e desenvoltura, mas em contrapartida percebe-se que os adultos
se colocam como sendo de “outra” geração não aceitam às novas situações
dificultando assim sua compreensão e aceitação das tais mudanças e, com
essas comparações os adultos não conseguem assimilar e lidar
adequadamente com a nova realidade social. Assim, Ramalho, Nunēz,
Gauthier, (2003, p.103) com base nessa dificuldade questionam: “que tipo de
profissional da educação devemos pensar”?
A comunicação atual se tornou interativa, propiciando aos jovens uma
melhor informação e visão das diferenças e dos diferentes, mesmo que se
perceba discriminação por parte de colegas, os deficientes têm conseguido
adentrar e, permanecer dentro das salas de aula de ensino regular cabendo ao
professor trabalhar a questão da inclusão e, a deficiência do seu aluno para
que toda a turma tenha um procedimento acolhedor e solidário. É certo que as
instituições escolares precisam urgente de investimentos sistemático, efetivo,
pois a falta desses recursos ocasiona grande estresse nos profissionais da
educação, transformando o ambiente escolar em um local de permanência
obrigatória, sem o menor vínculo afetivo com o mesmo.
No Brasil, os professores trabalham em péssimas condições e
com poucos recursos. Mas eles sabem da importância do seu
trabalho e continuam fazendo de tudo para ensinar seus
alunos. Em um quadro como este, onde um trabalho tão
essencial é feito em condições tão ruins, o profissional acaba
se desgastando emocionalmente. (CODO, 2002, p.1).
Nesta perspectiva, cabe abordar o estresse, o mal-estar docente e a
síndrome de Burnout buscando compreender esse fenômeno da escola
contemporânea.
3. INTERFACES ENTRE ESTRESSE, SÍNDROME DE BOURNOT, MAL-ESTAR
DOCENTE E A EDUCAÇÂO INCLUSIVA
Sendo o professor um dos agentes que movimenta o sistema
educacional, desde que a docência passou a ser um trabalho assalariado deu-
se o primeiro passo para gestão e controle do mesmo, tal como ocorre nas
empresas capitalistas e organizações escolares, (NOVAES, 1992; ARROYO,
1980; SAVIANI, 2002). Tais imposições trouxeram a perda de qualidade de
vida para o docente e, a degradação e fragmentação da profissão ficaram
evidenciadas e divididas entre o trabalho técnico e a inserção da figura do
especialista na educação:
Os educadores são trabalhadores inseridos em uma
sociedade capitalista, vendem sua força de trabalho e o preço
que custa o seu trabalho (salário e remuneração) deve ser
igual ao preço que custa para a manutenção e reprodução
desta mesma força de trabalho. No caso dos professores, isto
implica em sobrevivência do trabalhador e sua família,
transporte adequado para se chegar ao trabalho, mais compra
de livros, vídeo, TV a cabo, computadores, o custo dos cursos
que têm a fazer e quanto mais for necessário para manter sua
mercadoria (conhecimento) passível de ser utilizada no
mercado. (CODO, et.al., 1999, p. 193).
Segundo, Mészaros (2002, p.16) “no reino do capital, a educação é ela
mesma, uma mercadoria”, essa capitalização veio transformar a prática
pedagógica num trabalho para suprir o mercado capital, onde é preciso
satisfazer o “sistema vigente” não importando qualquer sentimento a favor ou
contra a essa situação. É, portanto, notório a falta de motivação inicial para a
profissão docente, como fator de mal-estar e desejo de abandono desta
atividade profissional. (JESUS, 1996, p. 21).
Enguita (1991), ao discutir a proletarização da profissão docente
demonstra que os professores se consomem entre o profissionalismo e a sua
capacidade de viver apenas com seu salário, sendo que “a perda do controle
sobre seus meios de produção, o objetivo de seu trabalho e a organização de
sua atividade”, sujeita o docente a processos pelo qual perpassa todo
“trabalhador assalariado. “A proletarização traz consigo grande insatisfação e
cansaço quando não se é reconhecido de acordo com seus esforços e
necessidades ocasionando no docente, sentimentos de que seu trabalho é
difícil e sem valor”. (ENGUITA (1991, p. 41-61). E, esse contexto em que se
encontram os profissionais da educação é porta aberta para os males como o
estresse e síndrome de Burnout.
Assim, torna-se necessário entender o significado de estresse e mal
estar docente para assim evidenciar as possíveis relações dos mesmos com a
prática da inclusão escolar.
Falar de estresse do professor torna-se um tema de grande
complexidade, e questionar se o aluno com deficiência também se nutre de
estresse, requer muitas pesquisas haja vista, ser uma novidade esse aluno
estar adentrando nas escolas de ensino regular e, até mesmo no mercado de
trabalho ocupando sua posição na sociedade.
O conceito de estress foi muito utilizado na área da Física para explicar
a relação entre força e reação dos corpos, sendo inserida na medicina por
Hans Selye (1936), caracterizado por ele, como sendo uma alteração
endocrinológica que ocorre no organismo quando este se vê em situação que
exija da pessoa uma reação mais forte que lhe foge do âmbito normal.
Hans Selye descreveu a Síndrome de Adaptação Geral (SAG), que
corresponde ao stress biológico, distinguindo-o em três estágios. O primeiro
estágio chamado de Reação de Alarme é quando acontece liberação de várias
substâncias como a adrenalina, o hormônio aldosterona, corticóides como o
cortisol e hidrocortisona, entre outros, evidenciando significativa alteração no
organismo. Na segunda fase, a Fase da Resistência, surge quando a ação do
estressor se prolonga exigindo do organismo uma maior adaptação. Na terceira
etapa, identificada como Fase do Esgotamento, manifesta-se quando a ação
do estressor permanece por um longo período e, essa pressão constante vai
gerando esgotamento da energia de adaptação do organismo. Nesse ponto o
organismo já se encontra alterado tanto psicoemocional, quanto no físico /
biológico.
De acordo com, Marilda Lipp (1996), diretora do Centro Psicológico de
Controle do Estresse e autora e organizadora de diversos estudos sobre o
assunto, é preciso diferenciar os estressores externos dos internos; os
estressores externos se evidenciam a partir de eventos ou condições fora do
organismo, que o afetam, independente da vontade da pessoa e, segundo
Lipp, convém usar o termo estressor para indicar o agente estimulante ou a
situação que desencadeia o desequilíbrio no organismo e a palavra estresse
deve ser utilizada como identificador do processo psicofisiológico em que o
organismo se encontra. Para NAUJORKS, (2002) a banalização do termo
estresse, camufla sua gravidade e importância na vida do indivíduo, pois cada
indivíduo desenvolve determinados sintomas ou doenças de acordo com seus
recursos psicológicos e, sua capacidade para lidar com a situação ou, ainda,
de acordo com sua constituição e herança genética. Cabe destacar que certa
dose de estresse faz parte da vida, pois, é uma sensação que avisa o corpo e a
mente de que algo novo surge e, terá que experimentar, mas não é
conveniente que essa sensação se transforme num sentimento de frustração e
desolação por se ver diante de situações e pessoas que fogem do seu controle.
Selye (1965) evidencia em seus estudos a existência de duas formas de
respostas ao estresse, ou seja:
A existência de um estresse capaz de evocar respostas
positivas, relativas a bem-estar psicofísico, ao qual
denominou de eutresse (do grego eu, bem) e um estresse
que anuncia consequências negativas, o distress (do grego
di, mal). Este tem afetado um número crescente de
trabalhadores em todo o mundo, causando, além de
sofrimento físico e mental, prejuízos financeiros também
crescentes às empresas e ao sistema de previdência e
seguridade social. Estudos médicos vêm confirmando a
importância do estresse nas doenças do coração, de pele,
gastrintestinais, neurológicas e em distúrbios ligados ao
sistema imunológico e emocional. (SELYE, 1965, s/n)
O organismo humano cria defesa psicológica quando se vê diante de
adversidades que lhe foge ao controle que o obriga a elaborar estratégia
natural dentro de si, buscando se resguardar. Algumas vezes este conjunto de
sentimentos de forte valor emocional vivenciada pelo professor dificulta o
processo de intervenção na produção e apropriação dos conhecimentos dos
alunos contribuindo para a exclusão e não inclusão dos mesmos.
O estresse característico do ambiente de trabalho é denominado “estresse
ocupacional”. Quando ocorre a cronificação do estresse ocupacional, como
resposta e forma, mesmo que inadequada de enfretamento, pode vir a ocorrer
o que tem sido designado como síndrome de burnout. O mal-estar ou Burnout
é um conjunto de sintomas que a pessoa apresenta devido a dificuldades em
corresponder às exigências profissionais, que vão além da sua capacidade de
resposta:
O Burnout é a resposta a um estado prolongado de estresse, ocorre pela cronificação deste, quando os métodos de enfrentamento falharam ou foram insuficientes. Enquanto o estresse pode apresentar aspectos positivos ou negativos, o Burnout tem sempre um caráter negativo (distresse). Por outro lado, o Burnout está relacionado com o mundo do trabalho, com o tipo de atividades laborais do indivíduo (BENEVIDES- PEREIRA et al, 2003, p. 45).
Muitas vezes na literatura confunde-se estresse e burnout. Estudiosos
do assunto definem que o estresse pode ter efeitos positivos ou negativos,
enquanto o burnout é sempre negativo, manifestado não só pelo estresse em
si, mas principalmente pela incapacidade do sujeito de desenvolver formas
emocionais adequadas para lidar com o estresse. Assim, o estresse recorrente
pode levar ao mal-estar, ainda que o mal-estar não seja um sintoma inevitável
do estresse (MARTINEZ, 1989, 24).
Feudenberger (1974, apud JESUS, p 18) relata que mal-estar é a
frustração que o sujeito sente por não alcançar os resultados esperados e
reconhecidos pelo seu esforço e empenho. E, qualquer pessoa pode sentir
estresse, mas Burnout atinge somente aqueles que têm ideais, motivação e
investimento muito altos e, que não se sentem reconhecidos, e gratificados no
alcance dos seus objetivos (MALASCH, apud JESUS, 2002).
Assim questiona-se: Será que essa pode ser considerada uma das
razões pela qual os profissionais da educação começam a entregar os
“pontos”, diminuindo seu interesse e esforço, na sua prática docente, na
tentativa de manter sua estabilidade emocional, se desligando afetivamente da
relação com seus alunos?
De acordo com, Lipp (2002, p. 112) problemas semelhantes ocorram em
várias ocupações, porém em relação ao trabalho docente: “o dano que um
professor pode causar é muito maior, pois o estresse é emocionalmente
contagiante”.
A baixa motivação afeta os professores em geral - pelos vários motivos
já citados pelos autores pesquisados - percebe-se que o mal-estar docente tem
sido alvo de estudos extenso, mas ao mesmo tempo em que tem sido tratado
como algo “normal” dentro da profissão, os agravantes do mal-estar na
docência vão se aprofundando nos aspectos negativos, criando um círculo
vicioso a tal ponto de não se perceber os aspectos positivos desta atividade
profissional, que também existem.
Sendo assim, é preciso reconhecer que o percurso profissional
caracterizado pela motivação e bem-estar profissional contribui para o bem-
estar do aluno na escola (JESUS, 2002). Se o professor não acredita na sua
profissão ou não tem “gosto” de ensinar, o aluno capta essa atitude,
proporcionando-lhe um desinteresse e pouco envolvimento no processo de
ensino-aprendizagem. Importante frisar também que:
A concretização de reformas educativas e a qualidade do ensino também requerem o bem-estar dos professores Nomeadamente, considera-se que o debate em torno da profissão docente é um dos aspectos mais relevantes na análise da qualidade do ensino, pois a concretização dos processos de reforma dos sistemas educativos passa pelo empenhamento dos professores. (ESTEVE,1991; KAUFMAN, 1984; OCDE, 1992; POPPER, 1989; SACRISTÁN, 1991. Apud JESUS, 2002, p. 24).
Sendo o professor um dos agentes que movimenta o sistema
educacional, não convém que estes fiquem presos às suas amarguras, é
preciso se preocupar em buscar capacitação adequada, bem como apoio
psicoemocional, pois além da proletarização do trabalho o processo de
inclusão requer ferramentas necessárias para compreender e orientar o aluno
com ou sem deficiência. Não pode recair sobre os discentes a culpa pela falta
de condições e reconhecimento profissional evitando assim que se
transformem em agentes estressores. Com isso questiona-se: será que o mal-
estar docente que interfere diretamente no seu desempenho profissional, é
intensificado com a presença do aluno incluído, ou se este é apenas mais um
dos agentes causadores desse mal?
De fato, é muito importante investigar sobre essa problemática que
atinge acentuadamente o professorado na expectativa de serem encontradas
soluções para esse problema. Portanto, se faz necessário que professores se
adaptem às transformações ocorridas na sociedade e, nas escolas, pois como
afirma Nóvoa (1995, p.28): “Não basta mudar o profissional; é preciso mudar
também os contextos em que ele intervém (...). As escolas não podem mudar
seu empenhamento dos professores; e estes não podem mudar sem uma
transformação das instituições em que trabalham”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa realizada evidenciou a necessidade em se resgatar o direito
do cidadão com deficiencia, sua identidade social e cultural por meio do
convívio e trocas de experiências diárias, é fundamental para sua autonomia
enquanto sujeito atuante na sociedade o que lhe permitirá oportunidade de
mostrar suas capacidades e competência.
Nesse aspecto, a escola exerce papel determinante ao possibilitar essa
inserção e educação para que os alunos se tornem mais solidários e humanos
ao mesmo tempo em que a diversidade sócio-cultural passa a ser algo natural
no dia-a- dia das crianças com e sem deficiência. A esse respeito Stainback
afirma “Que a razão mais importante para o ensino inclusivo é o valor social
“precisamos de instituições e docentes que promovam aceitação social ampla”,
pois é a partir da escola que se «prática a ideia das diferenças e que elas são
aceitas e respeitadas”. STAINBACK, 1999, p. 26 e 27).
Não se pode negar que um dos maiores empecilho para que o processo
de inclusão se dê, continua sendo a falta de informações, orientações e
formação tanto na graduação, bem como na formação continuada dos
professores, limitando o atendimento dos alunos com deficiência em sala de
aula e não a deficiência propriamente dita. A inserção dos alunos com
deficiência nas mãos de profissionais e instituições sem o devido preparo é
quase perverso, mas se forem também esperar pela boa vontade da
sociedade, escolas e instituições se prepararem psicologicamente e
profissionalmente para recebê-los, continuarão sendo privados dos seus
direitos de cidadão social e profissional, escondidos e isolados da vida fora do
seu lar.
Neste contexto, a inquietude emocional dos docentes é uma realidade
que exige medidas, urgentes para que a inclusão escolar seja efetivada com
qualidade no seu atendimento, pois se a inclusão da pessoa com deficiência
fracassar nas instituições escolares o que esperar do mundo fora das escolas.
As situações estressantes podem ser amenizadas e, por meio das informações
sobre os temas: estresse, bem-estar, inclusão, formação continuada sobre sua
profissão, poder-se-á constituir uma forma de conscientização para que se
acalmem e busquem meios de lidar com diferentes obrigações e diversidades
cultural, social e comportamental a que todos estão sujeitos no dia- a - dia.
O estresse, mal-estar (Burnout) devem e precisam ser estudado,
analisado, pesquisado a fim de que se busquem meios de conviver com as
situações sem que para isso ocasione doenças e baixas médicas. Trabalhar o
lado emocional dos sujeitos nas instituições escolares orientando - os a
reconhecer seus sentimentos de frustração/ satisfação, direcionando lhes um
novo olhar para os alunos, colegas e para si mesmo é a premissa fundamental
para a educação no Séc. XXI.
Dessa forma, o profissional da educação precisa estar ciente para ver e
aceitar que o aluno com deficiência tem potencialidades e capacidades não
bastando, portanto, colocar os mesmos na sala de aula regular, somente para
que se cumpra a lei, é preciso dar-lhes a devida educação, sendo esse o
motivo que o leva a escola.
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