esquerda · e social do que há dois anos. ... alterou o calendário da iv convenção, ... em...

16
Nº 4 | 50 CÊNTIMOS MAIO 2005 BLOCO DE ESQUERDA MENSAL DESLOCALIZAÇÕES Dezenas de empresas fogem para a Ásia e Leste da Europa. O desemprego fica. Os apoios que receberam perdem-se. ENCONTRO Em Abril, os jovens do Bloco reuniram-se na sua III Conferência Nacional. Para levar o Bloco e as suas lutas a todo o País. Dias 7 e 8 de Maio, no Fórum Lisboa, o Bloco realiza a sua IV Convenção Nacional. Num novo ciclo político, com muito mais força eleitoral e social do que há dois anos. Em debate, estarão os estatutos e duas moções alternativas, com várias emendas propostas à moção “O Bloco como Alternativa Socialista”. Neste número, as entrevistas com subscritores das duas moções. EUROPA O Tratado Constitucional pode ser derrotado em França. Por razões de esquerda, em nome de mais e melhor Europa social. ES Q UERDA ASSINA O ESQUERDA: BASTA PREENCHER O CUPÃO NA PÁG. 8

Upload: tranthuy

Post on 08-Nov-2018

216 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Nº 4 | 50 CÊNTIMOS

MAIO 2005BLOCO DE ESQUERDAMENSAL

DESLOCALIZAÇÕESDezenas de empresas

fogem para a Ásia e Leste da Europa. O desemprego fica.

Os apoios que receberam

perdem-se.

ENCONTRO Em Abril, os

jovens do Bloco reuniram-se na

sua III Conferência Nacional. Para levar

o Bloco e as suas lutas a todo

o País.

Dias 7 e 8 de Maio, no Fórum Lisboa, o Bloco realiza a sua IV Convenção Nacional. Num novo ciclo político, com muito mais força eleitoral e social do que há dois anos. Em debate, estarão os estatutos e duas moções alternativas, com várias emendas propostas

à moção “O Bloco como Alternativa Socialista”.

Neste número, as entrevistas com subscritores das duas moções.

EUROPAO Tratado

Constitucionalpode ser derrotado

em França. Por razões de esquerda,em nome de mais e melhor Europa social.

ESQUERDAQQ

ASSINA O ESQUERDA: BASTA PREENCHER O CUPÃO NA PÁG. 8

Maio 2005 > 2IV CONVENÇÃO

Agarrar o nosso tempoNA SUA QUARTA CONVENÇÃO NACIONAL, O BLOCO LANÇA-SE NA DISCUSSÃO DOS CAMINHOS DE UMA ESQUERDA SOCIALISTA QUE QUER LUTAR PELA MAIORIA NO PAÍS. O DESAFIO DESTA CONVENÇÃO É PRODUZIR PISTAS E PROPOSTAS PARA UM BLOCO MAIS ÁGIL NO COMBATE E MAIS ENRAIZADO SOCIALMENTE, MAIS CAPAZ DE TRANSFORMAR A SIMPATIA EM FORÇA ORGANIZADA. Texto de Jorge Costa. Fotos de Paulete Matos

A marcação de eleições antecipadas alterou o calendário da IV Convenção, concentrando-o nos meses de Março e Abril. Nesse período, desdobraram-se as assembleias de aderentes, que pela primeira vez chegaram a todo o país e onde foi garantido o pluralismo do debate contraditório, com representantes das alternativas em presença.

Desde a última Con-venção, a mudança do quadro nacio-nal e internacio-nal foi profunda. A ocupação do

Iraque confi rma-se como linha da frente de uma guerra que o imperialismo norte-americano transformou em sistema de re-lações internacionais. Mas nem a tenacidade das resistências iraquianas, nem a crise econó-mica impediram a reeleição de George Bush. De facto, a derro-ta de Kerry nas presidenciais foi a mais grave demonstração do fracasso da alternância sem rup-tura com a lógica liberal.

Do lado das resistências, o movimento por uma alterglo-balização continuou a marcar a agenda da mobilização e do debate, desenvolvendo os Fó-runs Sociais e alguns pontos de encontro (por ocasião das ci-

meiras G8, OMC, etc) que, ape-sar de neste período não terem correspondido a conquistas de movimentos, permanecem re-ferências fundamentais para a alternativa ao neoliberalismo e para a esquerda mundial.

Na Europa, não só na subor-dinação à NATO e ao Pentágo-no, a União Europeia procura alinhar-se com o “consenso de Washington”, o dogma integral do neoliberalismo. O símbolo desta linha é a directiva Bolkes-tein, que o “Esquerda” analisou em edição anterior. Mas essa Europa do tratado constitucio-nal pode entrar em crise por vontade dos povos. Em França, o referendo europeu pode dar esse sinal já este mês com a vitó-ria do Não ao Tratado. Essa di-nâmica revaloriza os espaços de convergência da esquerda euro-peia em que o Bloco participa e promete uma maior centralida-

de para o referendo em Portugal (provavelmente simultâneo com as autárquicas de Outubro). Na agenda do debate da conven-ção, terão lugar destacado as ar-ticulações nacionais e europeias de uma campanha europeísta de esquerda pelo Não.

Novo ciclo de governo, novo ciclo de oposição

Na última Convenção, a di-reita tinha apenas uns meses de governo. Dois anos depois, o balanço é pesado: o que fi cou do populismo conservador foi um país muito mais injusto. De 2003 para 2004, novecentos mil trabalhadores perderam o enquadramento de um contra-to colectivo, enquanto a preca-riedade juvenil e a escravização dos imigrantes se aprofunda-ram. Nas estatísticas, os de-sempregados superaram o meio milhão; nas declarações fi scais, os mais ricos caíram para um décimo...

Assim, o emprego e os di-reitos do trabalho são a dis-puta central com que o novo governo deve ser confrontado. Nas urnas, o PS capitalizou as esperanças dos desfavorecidos e o apoio das elites. Esta obscu-ridade do projecto do PS justifi -ca, à esquerda, as piores expec-tativas de continuidade liberal. Como fi cou claro na campanha eleitoral, o Bloco será oposi-ção ao governo Sócrates. Nesta Convenção, além das opções para eleições autárquicas e pre-sidenciais, além da intervenção

nos referendos que se avizi-nham (Europa e aborto), o Blo-co discutirá as suas respostas e as formas de protagonizar – e impor ao governo, sempre que possível - propostas maioritá-rias na sociedade, de expansão de direitos e de modernização democrática do país.

É nessas linhas de fractura que a nossa infl uência eleitoral e social se pode desenvolver em profundidade. Para isso, é in-dispensável um Bloco militante, desdobrado em núcleos locais, de empresa e de escola, bem como em grupos de trabalho capazes de incentivar campa-nhas e articulação social. É esse Bloco que poderá criar novos enfrentamentos e pesar na polí-tica e na relação de forças.

A clareza da escolhaA marcação de eleições ante-

cipadas alterou o calendário da IV Convenção, concentrando-o nos meses de Março e Abril. Nesse período, desdobraram-se as assembleias de aderentes, que pela primeira vez chega-ram a todo o país e onde foi garantido o pluralismo do de-bate contraditório, com repre-sentantes das alternativas em presença.

O processo preparatório da Convenção foi marcado por dois debates principais: o dos estatutos (ver caixa) e o das mo-ções. As moções são teses políti-cas para orientar a condução do Bloco nos próximos dois anos. Esta Convenção escolherá entre

3 > Maio 2005

EDITORIAL | João Teixeira Lopes

Debate sem limites

Uma Convenção é um momento de defi ni-ção de rumos e de clarifi cação de opções políticas. Não há, por conseguinte, inter-ditos ou limitações de qualquer espécie à

discussão. É um direito/dever de qualquer aderente pronunciar-se, suscitar a dúvida, a opinião, o deba-te. Longe de sermos um partido sectário, amorfo, burocratizado, centralizado e fechado em si mesmo move-nos o desafi o permanente da reinvenção e do autoquestionamento. Porque o Mundo mudou, o país transformou-se e nós próprios não somos os mesmos.

Parece-me claro que não podemos embandeirar em arco com a notável vitória eleitoral das legislativas. Ela traduz, no essencial, a adequação do nosso tra-balho político nos últimos anos aos objectivos tra-çados: forte intervenção parlamentar, desabrida e muitas vezes liderante, mas também o trabalho rea-lizado no espaço colectivo: a ampla plataforma que conseguimos forjar contra a guerra imperialista, a globalização armada e a ocupação do Iraque, o mo-vimento pelo referendo à despenalização do abor-to, a crescente iniciativa nos sectores sindicais e no mundo do trabalho, a proposta de Lei das Rendas e a iniciativa popular pelo levantamento do sigilo bancário são pontos altos desse esforço. No pla-no interno multiplicamos os locais de encontro e de refl exão (Fórum das Mulheres, do Ambiente, da Água, Encontro Nacional Autárquico, escola de Ve-rão, Conferência de Jovens, Encontro do Trabalho e Imigração...), ocasiões de formar opinião e de cons-truir um património teórico-prático de actuação no quotidiano.

Entretanto, há um novo ciclo político. A exigência de reforçarmos a nossa intervenção plurifacetada é agora ainda maior. Há uma tendência histórica para um refl uxo dos movimentos populares e dos activismos sociais quando estão no poder partidos sociais-democratas. Além do mais, alterou-se pro-fundamente a correlação de forças à esquerda. A nossa responsabilidade de partido-movimento na refundação da esquerda socialista e popular é um estímulo para novas práticas de envolvimento no espaço público. Temos, pela frente, aliás, embates decisivos: Autárquicas, Presidenciais e referendos.

A Convenção é, pois, uma oportunidade de ven-cermos o que vai permanecendo de sectarismo, de desconhecimento da realidade circundante, de atra-so face às dinâmicas de mudança social. Ao mesmo tempo, constitui ocasião única e soberana de refor-ço da pluralidade que faz a nossa originalidade e a nossa força.

A CONVENÇÃO estará peran-te um total de 59 propostas de alteração aos actuais estatutos. Doze delas foram aceites pela Comissão de Revisão dos Esta-tutos (CRE), além da dezena de propostas suscitada pela Mesa Nacional cessante. Entre estas, está a criação de um novo órgão de direcção nacional - a Comis-são Política, que vem substituir as actuais comissões Executiva e Permanente (da nova Comissão Política pode resultar um secre-tariado de coordenação executi-va). É também proposta a inclu-são estatutária das Comissões Coordenadoras Distritais/Regio-nais, eleitas em assembleias e com mandato até dois anos, ca-pazes de eleger um secretariado executivo. É ainda reconhecido o estatuto de autonomia das orga-nizações madeirense e açoriana. Na Mesa Nacional cessante tem origem uma proposta que susci-tou debate: a inclusão estatutária da exclusão de aderente. Segun-

do a proposta, esta sanção poderá ser aplicada pela Mesa Nacional, garantindo recurso para a Comis-são de Direitos e mesmo para a Convenção Nacional. Os estatu-tos prevêem um inquérito prévio, com direito de defesa, e reiteram que não há no Bloco sanções apli-cáveis “por motivo de diferenças de opinião política”. Para José Casquilho, um dos signatários da moção “Por uma plataforma de democracia socia-lista” e opositor desta mudança estatutária, estamos perante a “progressiva estalinização do Bloco” e a única exclusão admis-sível seria a “auto-exclusão” com a retirada de confi ança política. Outro grupo de aderentes argu-menta no mesmo sentido (pri-meiro subscritor Serafi m Duarte): “aqueles que atentem gravemen-te contra os estatutos assumirão por si uma posição de ruptura e auto-afastamento lógico, nem outra coisa pode ser admitida”.Em defesa da actualização esta-

tutária, argumenta Luís Fazenda: “todos somos contra as expulsões e purgas que constituíram uma das mais cavilosas tragédias do socialismo perdido. Mas a organi-zação carece de protecção legal em relação a pessoas que possam abusar do nome do Bloco, dos seus bens e meios. Até qualquer colectividade de recreio tem essa faculdade”. António Louçã acres-centa: “imagine-se um tesoureiro que fi ca com o dinheiro do Blo-co. Se houver prova conclusiva, ouvidas as partes, esse aderente deve ser expulso. Outra resposta possível é “esse aderente auto-excluiu-se”. Não aceito essa téc-nica. Decretar a “auto-exclusão” de alguém, isso sim, seria seguir a tradição do PCP”.O debate dos estatutos, e as suas dezenas de votações, serão um bom teste à organização dos trabalhos... Todas as propostas, aceites pela CRE ou não, são submetidas ao voto soberano da Convenção.

duas, intituladas “O Bloco como alternativa socialista” (primei-ro subscritor Francisco Louçã) e “Por uma plataforma de de-mocracia socialista” (Teodósio Alcobia). A moção que a Con-venção aprovar será o mandato estratégico e político da futura Mesa Nacional, a direcção do movimento.

Ao longo do debate conven-cional, a moção “Por uma pla-taforma de democracia socialis-ta” não foi objecto de qualquer proposta de emenda ou adenda. Já a moção “O Bloco como al-ternativa socialista” integrou vários contributos. Apenas duas emendas foram rejeitadas: sobre a participação no Partido da Es-querda Europeia (PEE) e sobre política eleitoral autárquica. Ambas são assinadas por Cris-tina Portella, João Pascoal e Ra-quel Varela (a segunda também por Gil Garcia, António Grosso e Carla Mendes).

Quanto às autárquicas, a emenda de Cristina Portella e outros “exclui, à partida, coliga-ções com o PS”. Justifi cando a rejeição, a moção subscrita por Francisco Louçã entre outros sublinha a defesa de candidatu-ras autónomas do Bloco como regra geral. Para os subscritores da moção, o erro da emenda é tratar qualquer possibilidade de convergência “como questão abstracta de princípio, favore-cendo o controlo maioritário do PS”.

Quanto ao PEE, a emenda propõe a manutenção pelo Blo-co do actual estatuto de obser-vador: “os partidos nacionais que compõem este agrupamen-to indiciam políticas sobre as quais se pode ter sérias dúvi-das”, escrevem os proponentes da emenda. Para a moção, que propõe a plena participação do Bloco no PEE, “a emenda não faz sentido: se fossem razões

programáticas absolutas que motivassem reserva em relação ao PEE, então nem deveríamos participar como observador”, estatuto que impede a formula-ção de propostas próprias.

Nas nossas mãosO antigo cinema Roma, onde

hoje fi ca a Assembleia Munici-pal de Lisboa, já recebeu muitas vezes o Bloco. Ali se realizou a nossa primeira reunião pública, ainda em 1998, e também a III Convenção Nacional, há dois anos. Em Fevereiro passado, o Fórum Lisboa transbordou no comício da campanha eleitoral. Agora, na sua IV Convenção, o Bloco procura responder aos de-safi os nacionais e europeus, em nome de uma esquerda socialis-ta com infl uência de massas. De regresso ao Fórum, trata-se de agarrar o nosso tempo e fazer as escolhas de uma esquerda nova. Está nas nossas mãos.

EstatutosAs regras da casa

Maio 2005 > 4NACIONAL

BLOCO E INDEPENDENTES AVANÇAM EM SALVATERRAO BE apresentou as candida-turas à Câmara Municipal e à Assembleia Municipal de Sal-vaterra de Magos, tendo como cabeças de lista Ana Cristina Ribeiro, actual Presidente da Câmara Municipal, e Pedro Choy, conhecido activista da defesa das medicinas alter-nativas e tradicionais, tam-bém residente no concelho de Salvaterra.Com cerca de 20 mil habitan-tes e uma componente rural ainda signifi cativa, o municí-pio de Salvaterra de Magos tem feito nos últimos anos um grande esforço para vencer problemas de infraestrutura-ção e de carência de equipa-mentos essenciais que não foram resolvidos nas décadas de 80 e 90. A renovação do acordo político entre o Bloco e a equipa de independentes de Salvaterra decorre, natu-ralmente, do reconhecimen-to mútuo da cooperação e do trabalho de aplicação de um exigente programa eleitoral que foi cumprido, com uma marca muito forte - a política de proximidade com as po-pulações.Para o novo mandato, o pro-grama defi nirá objectivos e instrumentos para o desen-volvimento estratégico e terá uma acentuada componente de intervenção nas áreas so-ciais, da cultura, da cidada-nia e da juventude. Um dos maiores desafi os que começa já a ser colocado, é o da ges-tão do crescimento no limiar entre o rural e o urbano, com-batendo a mera suburbani-zação do rural resultante da pressão exercida pela expan-são da Área Metropolitana de Lisboa. Avançar, nos próximos qua-tro anos, com um novo ciclo de políticas para o desenvol-vimento, faz parte de uma “visão de futuro construído de forma harmoniosa e sus-tentável, com respeito pelos valores ambientais e uma profunda preocupação so-cial, sem excluir deste pro-gresso as populações mais desfavorecidas e marginali-zadas, aquelas que são sem-pre esquecidas pelos que confundem progresso com a especulação e o lucro”, re-feriu Ana Cristina Ribeiro no discurso de apresentação da candidatura.

MÁRIO DURVAL ENCABEÇA CANDIDATURA NO BARREIROMário Durval e Humberto Can-deias, são os primeiros candi-datos das listas do Bloco para a Câmara e Assembleia Muni-cipal do Barreiro. Na sessão de apresentação pública, Má-rio Durval denunciou o cami-nho das políticas neoliberais, também nas autarquias, que esquecem a riqueza do per-curso histórico e cultural do Barreiro e pretendem trocá-lo por outro de carácter especu-lativo. Em vez de cidade do trabalho e do saber industrial, apenas conseguem perspecti-var uma nova cidade dormitó-rio da periferia de Lisboa.“No lugar da Quimigal pre-tendem fazer uma urbani-zação de 5000 fogos, no es-paço CP quererão mais uma urbanização de centenas de fogos, aproveitando a proxi-midade das novas estações de Coina e Penalva surgirá um novo dormitório que será apodado de Nova Centralida-de do Concelho. Esta política do betão e do cifrão, de mãos dadas, já tem os seus frutos. Neste momento, já existem cerca de 5000 fogos desabi-tados no concelho, cada vez mais degradados” – subli-nhou Mário Durval.Uma das preocupações da candidatura do BE incide na necessidade de promover a transparência total da Câma-ra e desafi a todas as forças políticas concorrentes a de-fi nirem-se perante questões como: existem dossiês na Câmara Municipal que não possam ser acedidos por qualquer cidadão? Quais? Em que circunstâncias? Como se pode agilizar a consulta de documentos pelos cidadãos? Como se pode desenvolver o espírito de serviço público nos serviços camarários? Qual o li-mite aceitável para a entrada de assessores “de confi ança” no apoio aos eleitos?O BE do Barreiro assume o compromisso de tudo fazer para quebrar o ciclo dos favo-res partidários que tem estado presente na Câmara Munici-pal desde sempre e declara a sua confi ança nos trabalhado-res da autarquia. Defende que é a qualidade dos eleitos que conquista a confi ança dos tra-balhadores da Câmara e não a condição partidária dos tra-balhadores que garante essa mesma confi ança.

Candidaturas do Bloco Novas políticas para as autarquias

A direita já escolheu os seus líderes. Em Pombal, no XXVII Congresso do PSD, Marques Mendes foi eleito por uma muito mais curta margem de votos do que se previa. Men-des obteve 497 votos contra 381 de Luís Filipe Menezes. O resultado de Menezes sur-preendeu. Em Lisboa, o CDS/PP também foi a votos. Quan-do começado o XX Congresso

não havia ainda candidatos à liderança declarados. À fal-ta de escolha, Telmo Correia avançou. Mas acabou por ser ultrapassado contra o regres-so do velho CDS, mais confes-sional. Telmo Correia desistiu perante a vitória certa de Ri-beiro e Castro, novo Presiden-te do CDS. Os dois congressos evidenciaram o estado de cri-se da direita portuguesa.

Direita Os líderes da crise

Argumentando com a possi-bilidade de uma participação reduzida de eleitores, o Presi-dente da República decidiu, no dia 2 de Maio, não marcar o referendo à descriminaliza-ção da Interrupção Voluntária da Gravidez. A realização do referendo fora aprovada, por larga maioria, na Assembleia da República. Assim, o refe-rendo fi ca nas mãos do próxi-

mo Presidente da República, cuja posição sobre a matéria ninguém sabe qual será. O Bloco de Esquerda conside-rou que, caso a maioria não encontre uma solução para que o referendo se realize ainda este ano, a Assembleia da República deve assumir as suas responsabilidades legislativas antes da própria consulta.

Aborto Sampaio não marca referendo

O Tribunal de Júri de Ponta Delgada recusou-se a aplicar, aos condenados no proces-so de pedofi lia de Lagoa, um artigo do Código Penal que diferencia a idade de consen-timento conforme se trate de uma relação heterossexual ou homossexual. O juiz Araú-jo de Barros considerou que a Constituição, no seu artigo 13º, proíbe a discriminação em função da orientação se-xual. E que o abuso sexual de menores tem sempre a mes-

ma gravidade, mesmo que se trate de uma relação en-tre pessoas de sexo diferen-te. Um Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 2003, criticado duramente por este juiz, tinha considerado que os crimes de abuso heteros-sexual com adolescentes se-riam “mais normais”. Houve, ainda no governo anterior, vontade de mudar os artigos 174 e 175 do Código Penal, de constitucionalidade mais do que duvidosa.

Homossexualidade Juiz contraria preconceito

«Tenho evitado responder a

essa questão, o que sugere de alguma

forma que tenho as minhas

dúvidas, embora os senhores

tenham a ideia de que eu não tenho dúvidas»

CAVACO SILVA

“Decidi não convocar o referendo

proposto pela Assembleia da República sobre a IVG

porque entendi não estarem asseguradas as condições

mínimas adequadas a

uma participação significativa dos portugueses”

JORGE SAMPAIO

«O eleitorado validou a

dissolução da Assembleia da

República» PAULO PORTAS

NO CONGRESSO DO CDS/PP

Acampanha pelo “sim” à consti-tuição Europeia tem uma espe-cial predilecção pela juventude, e

quanto mais inocente, melhor. Depois do presidente francês, Chirac, ter escolhido começar a sua cruzada numa emissão televisiva sobre a Constituição Europeia, em que “dialogava” com 83 jovens previamente escolhidos, onde foi proposi-tadamente reduzido o número de desempregados, eis a vez do primeiro-ministro Raffarin discursar, em Amiens, perante 200 estudantes, descritos pelo diário Liberation, como “pouco informados e nada ofensivos”. Apesar desta reconhecida capa-cidade de afastar contestatários incómodos, a campanha dos partidários desta constituição europeia tem corrido mal. O governo de direita, a direcção

do partido socialista e a corren-te maioritária dos verdes não têm conseguido convencer o eleitorado das vantagens deste tratado.Algumas medidas já foram to-madas para inverter a situação. O estado-maior da campanha conseguiu impedir in extremis uma intervenção televisiva do presidente da Comissão Euro-peia, Durão Barroso, com receio que a sua falta de habilidade en-terrasse definitivamente os par-tidários do “sim”. Um diplomata francês, a coberto do anonima-to das grandes verdades, che-gou a garantir à imprensa que

se Barroso “tivesse sabido ficar quieto relativamente à directi-va Bolkestein, como lhe pediu Chirac, não estaríamos no pon-to em que estamos”. Neste mo-mento, a última grande aposta do governo francês é organizar um corrupio de governantes, estadistas de todos os feitios e latitudes para influenciar os franceses.Nos principais órgãos de comu-nicação social gauleses, têm-se multiplicado alertas que garan-tem que a Europa sucumbirá a uma negativa no referendo. O chanceler alemão Gerhard Schröeder afirmou que os argu-

mentos dos partidários do “não” eram “totalmente ilógicos” e in-dignos. Na capa do conivente “Nouvel Observateur”, o an-tigo presidente da Comissão Europeia Jacques Delors acusa, com a mão trémula e espetada em riste, de serem mentirosos aqueles que fazem campanha pelo “não”. Mas quem são estes terríveis espectros que aterrorizam a Eu-ropa? Os partidários do “não” juntaram-se, recentemente, no Zénith de Paris. No mesmo dia em que o presidente Chirac assegurava na televisão peran-te uma plateia de jovens que

era preciso “não ter medo da Europa”, milhares de pessoas reuniam-se para ouvir as inter-venções de militantes de movi-mentos sociais, como a ATTAC, a Fundação Copérnico, o AC! (Agir contra o desemprego) e sindicatos; às quais se juntaram as intervenções de socialistas, ecologistas e comunistas do PCF e da LCR. A esquerda e os movimentos sociais não se afirmam contra a Europa, nem contra a existência de uma constituição. Aquilo que este movimento plural, lançado pelo chamado “Apelo dos 200”, defende é uma Europa em que as leis constitucionais assentem em processos democráticos de elaboração, nomeadamente a convocação de uma assembleia constituinte europeia; e em que o texto constitucional que daqui resulte afirme o primado do so-cial, e não a ditadura do neolibe-ralismo. Finalmente, o chamado

GLOBALJORNAL DA DELEGAÇÃO DO BLOCO DE ESQUERDA NO GUE/NGL NO PARLAMENTO EUROPEU

Referendo em FrançaUm novo Maio de 68

A POSSIBILIDADE DOS FRANCESES RECUSAREM ESTA CONSTI-TUIÇÃO EUROPEIA PODE ABRIR O CAMINHO À DISCUSSÃO DE UMA EUROPA MAIS DEMOCRÁTICA E COM UM MAIOR PRIMADO DO SOCIAL Texto de Nuno Ramos de Almeida

EPA

/oliv

ier

Hos

let

S

Maio 2005 > II

POIS É | Miguel Portas

O dia seguinte

Àesquerda, sobra um argumento em fa-vor do Tratado Constitucional: mais vale uma Constituição que nenhuma. Que esta é hiper-liberal, já se sabe. Que

é militarista e pró-Nato, também. E que em maté-ria de democracia e direitos, deixa mais que muito a desejar, idem idem aspas aspas. Se fosse uma Constituição para Portugal, nenhum socialista a compraria. Nem mesmo um social-liberal... Mas como é para essa entidade “ainda estranha”, a Eu-ropa, o Tratado teria a virtude de a tornar “menos estranha” aos cidadãos. Ou seja: esta Constituição seria um mal menor.

Sucede que na equação não existem apenas más escolhas. Partindo da rejeição deste Tratado, é possível reclamar para a Europa uma Magna Car-ta assente num processo democrático – seja ele a eleição de uma Constituinte europeia, seja o de se dotar o próximo Parlamento Europeu de poderes constituintes.

As circunstâncias em que este Tratado pode vir a ser rejeitado representam uma oportunidade rara para a Europa. Se o “Não” vencer em França, tal ocorrerá pelas melhores razões. Porque uma maio-ria de franceses rejeita a sua natureza hiper-libe-ral. Mais importante ainda, este “Não” é inconfun-dível com o “Não” soberanista, que sonha com o regresso ao tempo dos Estados-nação, essa utopia regressiva que marca o pensamento conservador e que na esquerda encontra ainda os seus adeptos.

O “Não” francês aponta a alternativa de um me-lhor Tratado Constitucional. Fá-lo, ancorando-se nas razões dos protestos populares contra as polí-ticas liberais. A sua virtualidade é a de exigir, não o fi m da Europa, mas infl exões decisivas na cons-trução europeia.

Faz mais ainda: confronta os líderes europeus com a sua própria cegueira. Nas vésperas do 25 de Abril, Jorge Sampaio declarava no seu melhor inglês que o processo de ratifi cação deveria conti-nuar apesar de um “Não” em França. Ou seja, que as elites devem comportar-se como se nada tivesse ocorrido. No limite, que devem alterar as regras a meio do jogo. Eis a consequência do “Não” fran-cês: iluminando a cegueira, provocará realinha-mentos importantes na Europa. A partir de 30 de Maio, o “Não” terá muitos e muitos mais adeptos. É esta nova arrumação de forças que anuncia um tempo de refundação assente na democracia.

“não” de esquerda sustenta uma Europa que contribua para a paz e que não inscreva na sua cons-tituição uma ligação umbilical à Nato e à estratégia belicista dos Estados Unidos da América.Contra esta vaga social, subli-nhando a ideia que a história acontece da primeira vez em tragédia e da segunda vez em comédia, encontra-se uma das fi guras cimeiras do Maio de 68 e dirigente dos verdes Daniel Cohn-Bendit, que num debate em Estrasburgo ouviu do pre-sidente do Grupo da Esquerda Europeia, Francis Wurtz, aquilo que muito o irritou: é “fascinante ver como um símbolo da revol-

ta na juventude se transformou num herói do conformismo”.Em resposta, Cohn-Bendit acu-sou a esquerda de cegueira, es-talinismo e nacionalismo. Para ele, e para os muitos que apoiam este texto constitucional, só é possível ser a favor da Europa quando se defende o “sim”.Uma posição que já em 1997 o sociólogo Pierre Bourdieu tinha identifi cado da seguinte manei-ra:“À Europa que o pensamento dos banqueiros nos quer a toda a força impor, é necessário opor não, como alguns, uma recu-sa nacionalista da Europa, mas uma recusa progressista à Euro-

pa neoliberal dos bancos e dos banqueiros. Estes têm interesse em fazer acreditar que toda a recusa da Europa que eles nos propõem, seria simplesmente uma recusa à Europa. Recusar a Europa dos bancos, é recusar o pensamento dos banqueiros, que, a coberto do neoliberalis-mo, faz do dinheiro a medida de todas as coisas, do valor dos ho-mens e das mulheres, e de todas as dimensões da existência.A resistência à Europa dos ban-queiros e à restauração conser-vadora que eles nos preparam, não pode ser senão europeia”.Depois do dia 29 Maio, pode es-tar a nascer uma nova Europa.

Francisco Louçã participou num comício promovido pela LCR a 8 de Abril (na foto), e falou-nos brevemente deste combate político.

Quais são as consequências de uma eventual vitória do “não” no referendo francês?F.Louçã: Aparecem muitos ar-gumentos tremendistas de que a Europa acabava. Mas eles são totalmente falsos. A recusa do tratado constitucional pela Fran-ça ou por qualquer outro país, de tal modo que se interrompa esse processo, não anula todos os outros tratados que são ante-riores ao tratado constitucional (os tratados de Amesterdão, Ma-astricht, Nice, etc...), que aliás são abundantemente reprodu-zidos no tratado constitucional. A arquitectura institucional da União Europeia, tal como esta existe, mantém-se sem qualquer alteração. O que o “não” obriga é a reconsiderar todo o processo constitucional e a reabrir o pro-cesso; e a fazê-lo nas duas direc-ções que é necessário: primeiro, fazer um verdadeiro processo constitucional democrático; e, em segundo lugar, ter em conta as razões da França, e conside-rar o que é necessário fazer para haver uma perspectiva social na

política europeia. Hoje a força do “não” de esquerda em França, é a de ser uma posição europeista – a única que afi rma uma alter-nativa para a Europa.

Qual é o segredo da unidade deste vasto sector da esquerda política e social francesa pelo “não”?F.Louçã: Atenção, este sucesso é muito difícil de reproduzir em outros países da Europa. O que permitiu a união dos sectores do partido socialista francês, de parte dos verdes, do PCF e da LCR e dos movimentos sociais e sindicais foi uma plataforma política bastante clara pela qual se rejeita o tratado europeu. A campanha tem sido feita com participações cruzadas nos co-mícios de vários partidos e mo-vimentos, mas o que solidifi ca esta unidade são pontos de vista muito próximos do que tem de ser o futuro imediato da Europa, e nomeadamente a ideia de que o “não” a esta Constituição tem que signifi car mais Europa e não menos Europa.

S

Em Bloco pelo NãoMiguel Portas e Francisco Louçã participam em várias iniciativas da campanha pelo “não” em FrançaDIRIGENTES do Bloco têm esta-do na campanha eleitoral do re-ferendo francês. O eurodeputado Miguel Portas participou numa iniciativa convocada pela Funda-

ção Copérnico e a rede Transform, em Paris, que juntou inúmeros activistas de movimentos euro-peus pelo “não”. Miguel Portas vai estar ainda presente no en-

cerramento da campanha unitá-ria dos movimentos que apelam ao chumbo do Tratado Constitu-cional, que se vai realizar no dia 26 de Maio, em Bordéus.

Fern

ando

Bap

tista

III > Maio 2005

EPA

/cla

udio

Ono

rati

Bento XVIA recusa da modernidadeTexto de José Manuel Pureza

Aeleição de Joseph Ratzinguer para Papa constitui mo-tivo de refl exão para quem se em-

penha em alargar o espaço da abertura à emancipação social. É claro que os crentes que lu-tam de mãos dadas com não crentes pela liberdade e pela justiça não precisam de autori-zação do Papa para seguirem o seu caminho. É claro que a co-munidade dos crentes é muito mais ampla e diversa do que os seus transitórios líderes podem determinar. A questão essencial não é pois a dos equilíbrios de poder internos à Igreja Católica mas sim, creio, a dos sinais que, com esta eleição, a Igreja dá de si mesma ao mundo, como ela se mostra e apontando para que agenda de acção. A actua-ção social e política dos católi-cos fl uirá, como sempre, muito para lá de quaisquer estruturas de comando. Mas é óbvio que nem o modo como o mundo vê a Igreja pode ser indiferente a esta nem o modo como a Igreja se apresenta a si própria pode ser indiferente ao mundo. E sobretudo àqueles que querem mudar um e a outra.

Há uma velha resistência do conservadorismo católico con-tra a modernidade que está por resolver. O desconforto que a autonomia de um mundo pós-cristão causa a esse conserva-dorismo revela-se muito para lá do anacronismo de algumas das

posições de maior notoriedade no plano da moral individual (designadamente sexual). Não, não é só a aberrante recusa do sacerdócio das mulheres (que, aliás, contraria uma velha tradi-ção da Igreja antiga). Não, não é só a recusa de aceitar a liberda-de sexual fora dos códigos fami-liares tradicionalistas. É muito mais do que isso. Num plano macro, o legado de João Paulo II deixou duas marcas muito mais profundas desse desconforto e dessa questão não resolvida. A primeira foi a do sentido de fundo da sua crítica quer aos regimes do “socialismo real” quer ao “capitalismo selvagem”. A segunda foi a do tratamento disciplinar dado aos teólogos e teólogas que situaram a sua investigação no terreno dos de-senvovimentos contemporâneos das ciências sociais (sob mando do então Cardeal Ratzinger). Une-as um mesmo princípio: o do primado absoluto da verda-de sobre a liberdade.

A interpretação que o conser-vadorismo católico vem dando a esta subalternização da liberda-de teve em Joseph Ratzinger um arauto qualifi cado. Não é outro o sentido da sua condenação da suposta “ditadura do relativis-mo”. Não é outro o sentido da sua defesa de que fora da Igreja Católica não há salvação. Não é outro, enfi m, o sentido da con-sideração das outras religiões como formas defi citárias de fé.

Por isso, com esta eleição, a

imagem que a Igreja Católica dá de si mesma ao mundo é a de um fechamento na defesa da ortodoxia e não a da ousadia na escolha de dinâmicas da moder-nidade portadoras de potencial emancipador (como a igualdade entre mulheres e homens ou a inestimável riqueza da multi-culturalidade pós-colonial e dos seus impactos no campo reli-gioso). A suspeição diante do desvario do mundo moderno e a vontade de o reconduzir a um universo de princípios ances-trais prevalece sobre a abertura criteriosa às dinâmicas de mu-dança.

Agora vem o tempo dos tes-tes que confi rmarão ou não o sentido inquietante desta esco-lha. Dois deles deverão merecer especial atenção. O primeiro é o da liberdade de investigação e de conformação do discurso teológico. Ou seja, nada mais do que a adopção dos direitos humanos básicos como princí-pio rector do relacionamento interno na Igreja. Bento XV pôs fi m à crise modernista do início do século XX e às perseguições então feitas a teólogos do ag-giornamento. Bento XVI, pelo seu percurso anterior situa-se em posição oposta. O segun-do teste é o da colegialidade. Suspeição do mundo e centra-lização da governação eclesial são irmãs gémeas. Entre cultura democrática e unipessoalidade, qual a opção da Igreja de que Bento XVI é Papa?

Acabar com esta espiral!O conhecido realizador britânico Ken Loach enviou um texto que foi lido num comício da LCR pelo “não” à Constituição“DEPOIS da guerra fria que divi-diu a Europa, apresentaram-nos esta Constituição como um passo em frente. Mas em que direcção ela nos leva? É, como afi rmam os sociais-democratas, um meio para garantir os direitos sociais através da Carta dos direitos fun-damentais? Ou não passa de uma etapa suplementar para garantir um quase Estado, que garantiria antes de tudo os interesses do grande patronato e nos amarra-ria a uma política internacional militarista? Eu penso que é nes-ta última direcção que aponta a Constituição.Vejamos um exemplo: a directiva Bolkestein, que parece qualquer coisa à James Bond. Esta direc-tiva permite que assalariados de países onde os direitos sociais são menores e os salários bai-xos, venham trabalhar nestas condições para países em que os salários são mais elevados. Em consequência, as conquistas dos trabalhadores destes países mais desenvolvidos são sabotadas. (...) A Constituição tem inscrita religiosamente a noção de um mercado interno onde a concor-rência é livre e não falseada. In-terdita todo o controle de capital e planeamento económico.Os serviços públicos e a gestão dos bens comuns mais essen-ciais – como a água, a energia ou os transportes – devem continuar a ser desmantelados no interesse do capital privado.As questões sociais ou ambien-

tais são ignoradas. Mas há pior. A nova política comercial comum porá fi m ao direito de veto sobre o comércio de serviços de saúde, de educação, de cultura e do au-diovisual. O Acordo Geral do Co-mércio e Serviços será o quadro em que estas actividades se vão passar a processar. Este acordo implica que as multinacionais estrangeiras podem introduzir sem restrições a concorrência nestes sectores. Tendo como consequência a inevitável priva-tização total. (...)Se assim acontecer, vão ser destruídas as indústrias e as comunidades locais. A pobreza vai aumentar. As multinacionais vão avançar. É por isto que nós devemos opor-nos a esta via de construção europeia. O Conselho Europeu confi rmou as ligações que conectam a União Europeia à Nato, a qual inclui na sua dou-trina militar a estratégia de um ataque nuclear preventivo. Nes-tes últimos anos, vimos dema-siadas guerras de exploração. Os dirigentes políticos do meu país são particularmente culpados. Participaram, atrás dos Estados Unidos, em guerras de agressão sem terem sido ameaçados. Ma-taram mais de 100 mil iraquia-nos. E para quê? Pela defesa do capital e, em particular, do capi-tal dos EUA. É este o futuro que eles nos re-servam. É uma espiral infernal, que nos atira para baixo, e à qual temos que nos opor.”

O que dizem as sondagensOs estudos feitos em França revelam que a questão social é determinante na posição política dos franceses no referendo

UM ESTUDO publicado pelo diá-rio francês Liberation revela que aqueles que são contra esta Cons-tituição Europeia são largamente maioritários na esquerda (66%); nas pessoas com idade para traba-lhar (o “sim” só é maioritário nos franceses com mais de 65 anos); e a recusa da Constituição ganha em quase todas as profi ssões, ex-ceptuando quadros e comercian-tes (entre os operários a intenção de votar “não” chega aos 75% ). Por sua vez, todas as análises fei-

tas à evolução das intenções de voto revelam que o momento de-cisivo da viragem deu-se quando começou a ser discutida em Fran-ça a directiva de liberalização dos serviços Bolkestein: no dia 1 de Setembro de 2004, o “sim” tinha 69% das intenções de voto e só quando os franceses se aperce-beram das implicações das polí-ticas neoliberais de liberalização dos serviços, em Março de 2005, é que o “não” tomou a dianteira nas sondagens.

Maio 2005 > IV

A longa espera de um povoSAHARA OCIDENTAL

EM MARÇO, UMA DELEGAÇÃO DO PARLAMENTO EUROPEU DESLOCOU-SE À REGIÃO DE TINDUFF, NO SUDOESTE DA ARGÉLIA, ONDE SE ENCONTRAM OS ACAMPAMENTOS DE REFUGIADOS SARAUÍS. UM MÊS DEPOIS, ESTRASBURGO DECIDIA A REPOSIÇÃO DOS NÍVEIS DE AJUDA HUMANITÁRIA DA UNIÃO, EM RECUO DESDE 2002. MAS FALTA O ESSENCIAL: A APOSTA DA EUROPA NO REFERENDO SOBRE A AUTODETERMINAÇÃO, QUE MARROCOS RECUSA. Texto e fotos de Miguel Portas

C onheceis a narrativa bíblica da errança de um povo no deserto ao longo de 40 anos. Há muito de mito nessa aventura e, no entanto, ela é nossa.

No caso dos sarauis, não é de mito mas de factos de história contemporânea que falamos. Este povo espera há 30 anos no deserto dos desertos do Sahara.

Não procura a terra prometida. Quer simplesmente regressar, soberano, à sua terra.

Como jornalista conheci muitos campos de refugiados. Como descobri na Etiópia que existe o quarto mundo, o lugar onde um povo anda, anda e anda, porque andar é o seu modo de sobreviver. Mas nunca vi nada como os campos de Tinduff.

Ali nas areias não há electricidade, mas a solidariedade trouxe painéis solares.

Ali não há gota de água, mas a fornecida pela ajuda chega por igual a cada refugiado.

Assim como a farinha, o açúcar ou o azeite. E a dignidade.Porque os sarauis dependem da ajuda, mas não são pedintes.Este Parlamento tem por isso uma responsabilidade que é

uma urgência: repor os níveis de apoio humanitário e a sua variedade.

Mas tem também uma urgência que é uma responsabilidade: a verdadeira ajuda é a que pode, fi nalmente, dispensar a ajuda. A Europa deve comprometer-se com o referendo para a autode-terminação, em actos e não só em palavras.

Porque eles, os sarauis, têm o tempo. E nós o relógio.

Intervenção de Miguel Portas no Plenário do Parlamento Europeu

Eles têm o tempo, nós o relógioO MURO: Maior do que a Muralha da China, sobrevive, esquecido pelo Mun-do, em pleno século XXI. Erguido por Marrocos no território que ocupou em 1976, tem 1.500 quilómetros de pedra e um a cinco milhões de minas espa-lhadas nas proximidades, separando os refugiados sarauís das suas famílias. A ocupação marroquina levou ao êxodo de 70 a 80 mil sarauís. Refugiaram-se no sudoeste da Argélia, onde criaram uma República no exílio. As frontei-ras e o Parlamento simbolizam a terra libertada.

DAYRA: ou campo de refugiados. Inicialmente, cada um deles reunia as pessoas de acordo com os povoamentos anteriores ao êxodo. Hoje já não é assim. Mas em todos vigoram regras que garantem a distribuição igualitária dos 5 bens da ajuda humanitária: água, azeite, lentilhas, açúcar e farinha. As dayras situam-se na Hammada, literalmente, o “deserto do deserto” do Sahara. Aphad, o motorista, mostrou-nos a única árvore da região num raio de 150 km... Ao contrário do que os guias turísticos anunciam, o deserto é rugoso, áspero, agreste e impróprio.

V > Maio 2005

A longa espera de um povoEM MARÇO, UMA DELEGAÇÃO DO PARLAMENTO EUROPEU DESLOCOU-SE À REGIÃO DE TINDUFF, NO SUDOESTE DA ARGÉLIA, ONDE SE ENCONTRAM OS ACAMPAMENTOS DE REFUGIADOS SARAUÍS. UM MÊS DEPOIS, ESTRASBURGO DECIDIA A REPOSIÇÃO DOS NÍVEIS DE AJUDA HUMANITÁRIA DA UNIÃO, EM RECUO DESDE 2002. MAS FALTA O ESSENCIAL: A APOSTA DA EUROPA NO REFERENDO SOBRE A AUTODETERMINAÇÃO, QUE MARROCOS RECUSA. Texto e fotos de Miguel Portas

O que falta?Simplesmente, vontade...NO FIM do século XIX, a Espanha proclamou o seu pro-tectorado sobre as terras entre o Cabo Bojador e o Cabo Branco, em frente das ilhas Canárias. Aí vivia, em terras impróprias para a agricultura, um povo nómada, sem or-ganização estatal, mas independente dos reinos vizinhos. O domínio espanhol sobre o Sahara ocidental apenas se concretizará na década de 30, poucos anos antes de se iniciarem os processos de descolonização...Em 1966, a Assembleia Geral da ONU reclama da potên-cia administrante um referendo sobre a autodetermina-ção, que Marrocos apoiou. A partir da década de 70, a resistência organiza-se. A 10 de Maio de 1973, é fundada a Frente Polisário. “Não será pelas armas que arrancaremos a liberdade”, proclamou. Mas os anos seguintes forçá-la-ão a uma guerra desigual.Em 1974, o rei de Marrocos, Hassam II, passa a opor-se a qualquer referendo. E um ano mais tarde, em Novembro de 1975, lança uma “marcha verde” de 350 mil marro-quinos sobre o Sahara ocidental, devidamente protegida pelo exército. Três meses mais tarde, a 26 de fevereiro de 1976, a Es-panha abandona o território, depois de ter assinado com Marrocos e a Mauritânia a transferência dos seus poderes administrativos. Caía por terra a promessa de referendo. Espanha comportava-se no Sahara ocidental como Por-tugal em Timor: depois de um colonialismo de pacotilha, abandona os sarauís à sua sorte...A República Árabe Sarauí Democrática (RASD) é criada no dia seguinte e seguiram-se 15 anos de guerra. O saldo foi pesadíssimo: 70 a 80 mil sarauís refugiaram-se na mais inóspita das regiões do Sahara, a hammada, inteiramente dependentes da ajuda humanitária internacional...Em 1991, as duas partes assinam um cessar-fogo e o Con-selho de Segurança da ONU aprova uma missão para o território. Em 1997, o antigo secretário de Estado norte-americano, James Baker, negoceia um novo plano de paz, onde se prevê, antes do referendo, um período de autono-mia, e a inclusão desta hipótese na pergunta a fazer sobre o futuro do Sahara ocidental. Os sarauís decidiram correr o risco deste compromisso e subscreveram o plano. Quem não o fez foi Marrocos. De 2003 para cá, o impasse voltou a ditar as suas leis. A ONU pode, contudo, forçar a solução. Basta que co-loque este confl ito ao abrigo, não do artigo 6º da Carta das Nações Unidas – que prevê o acordo entre as par-tes – mas do artigo 7º - que permite impor a resolução independentemente do acordo entre as partes. Marrocos não negociará enquanto não for obrigada a isso. E é aqui que a Europa deveria entrar com uma posição única. Para isso, é indispensável uma mudança na posição espanho-la, amarrada aos acordos de pesca e fosfatos que fez com Marrocos... nas águas e areias de que é, ainda hoje, a potência administrante!

CINEMA: Neste deserto vivem hoje 160 mil sarauís. Os mais antigos esperam há 28 anos. Os mais novos não conhecem o seu país. Mas uns e outros puderam assistir à segunda edição de um Festival internacional de cinema. Com écran de drive in e electricidade a gerador, derivada de painéis solares. Os driver’s eram escassos, mas a festa, rara, foi de arromba. Três centenas de europeus ligados ao cinema estiveram no fes-tival. Cada um dormiu e comeu nas Jaymas dos refugiados. Eu fi quei com a família Saleh, a quem estou eternamente grato. Durante três dias comi o rancho dos refugiados. E adormeci à luz das estrelas.

EDUCAÇÃO: todas as crianças frequentam a ins-trução primária. A

RASD tem ainda uma escola com o

7º ano de escolaridade. Por isso, centenas de adoles-centes, sem discriminação de sexo, partem para estu-dos secundários em Cuba, Espanha, Argélia ou Síria. Outras actividades - da tecelagem aos equipamentos

culturais e de formação profi ssional - antecipam o dia em que este povo regressará, soberano, à sua terra.

SIDA: Embharca estudou medicina em Cuba. De regresso, o seu traba-lho inclui a formação e prevenção sobre a Sida. As primeiras distri-buições de preservativos suscitaram reacções de desagrado. Mas, mais limitadamente, continua a fazer-se. O drama dos serviços de saúde é, contudo, a penúria de medicamen-tos. Esta farmácia, por exemplo, serve 400 adolescentes do 7º ano...

Maio 2005 > VI

AA experiência come-çou há 5 anos, com apenas 12 alunos fi lhos de imigrantes portugueses. Hoje

são mais de 130, numa comuni-dade imigrante que terá, talvez, mil crianças a frequentar o en-sino básico em toda a cidade de Hamburgo.

A experiência pedagógica da escola Rodolph Ross merece ser relatada: iniciou-se com uma tur-ma mista de fi lhos de imigrantes portugueses e de alemães. Uns e outros aprendem, desde a pri-meira classe, não apenas alemão, mas também português. Não se trata do ensino do português como primeira língua estran-geira. Na realidade, é a “língua parceira” do alemão, porque o ensino de algumas disciplinas se faz, ao mesmo tempo, nas duas línguas. E com duas professoras, uma portuguesa e outra alemã.

Por causa da preparação de um relatório de iniciativa para o Parlamento Europeu – sobre a integração das comunidades imigrantes por via do sistema público de ensino – visitei este projecto pedagógico. Ao fi m de quatro anos de escola, os mi-údos não apenas entendem as duas línguas, como as escrevem. E, milagre, até os alemães se de-

senrascam num muito razoável português falado. Numa turma de 4ª classe, dialoguei com eles em português. As professoras introduziram o visitante na aula de Estudo do Meio falando ora em português ora em alemão. Os miúdos tinham perguntas escritas para me fazerem – em português. Um pouco adiante, passaram a espontâneas. Noutra turma, de 2º ano, uns trabalha-vam em grupo, outros individu-almente. A anarquia era apenas aparente. O método pedagógico que a escola segue é um siste-ma de estações com tarefas para serem executadas. Naquele dia, uns faziam umas, outros, ou-tras. Nesta classe pude apreciar as vantagens de aulas orientadas por dois professores. O sistema permite um acompanhamento individualizado às diferentes tarefas que os miúdos têm pela frente e desenvolve extraordina-riamente a responsabilidade e o poder de iniciativa. Eu gostava de ter aprendido naquela escola, apesar de não me queixar da-quelas por onde passei...

O exemplo multiplica-se

Como a experiência correu bem nos dois primeiros anos, a novidade foi passando de família

em família. Desde 2003, a escola tem aberto inscrições para duas turmas por ano, sob este méto-do. Hoje, tem listas de espera... De todos os lados da cidade, há pais portugueses que se “vi-ram” para colocar os seus fi lhos nesta escola pública. E cresce o interesse dos pais alemães, em particular os mais de maior for-mação, pelo projecto. Porque ele permite aos seus fi lhos a apren-dizagem de uma terceira língua, para além do alemão e do inglês, na idade em que aprender lín-guas é muito mais simples.

Última inovação, a Rodolph Ross alargou entretanto ao se-gundo ciclo o projecto bilingue. Algumas turmas do secundário (as que têm alunos vindos da Primária em ensino bilingue) têm a disciplina de português e ainda uma outra disciplina cur-ricular é dada na nossa língua – o que estabelece um princípio de continuidade que consolida a formação bilingue.

O sistema público de ensino em Hamburgo, tem, além desta escola de “língua parceira”, ou-tras seis que procuram respon-der a outras tantas comunidades imigrantes: a espanhola e turca (com 2 escolas cada) e ainda uma polaca e outra com fi lhos de ita-lianos. Em todas elas, o princi-pio da turma mista é defendido. É ele que eleva a auto-estima da segunda geração pela língua ma-terna – porque contactam diaria-mente com miúdos alemães que também a estão a aprender.

Periodicamente, as escolas en-contram-se para monitorizar este método inovador que, de resto, não é incompatível com outras formas de promover as línguas maternas em terras distantes.

HAMBURGO

O ensino a duas vozesNUMA ESCOLA PÚBLICA DE HAMBURGO, HÁ TURMAS MISTAS DE CRIANÇAS ALEMÃS E FILHOS DE IMIGRANTES PORTUGUESES. NOS PRIMEIROS 4 ANOS DE ESCOLARIDADE APRENDEM, AO MESMO TEMPO, EM ALEMÃO E PORTUGUÊS. A EXPERIÊNCIA RESULTA PARA TODOS E PODE SER GENERALIZADA Texto e fotos de Miguel Portas

Em cima: livro escolar alemão com “aditamento” em português. Para aprender em duas línguas.Em baixo: Rosa Gomes, professora portuguesa bilingue, com alunos de turma mista.

VII > Maio 2005 EXPERIÊNCIA ASSOCIATIVA

Estamos nos subúr-bios, os prédios são quase todos iguais, aqui vivem milhares de pessoas e mui-

tas são imigrantes. Estamos no bairro da Arrentela. Junto a um pequeno espaço verde, colocado numa selva de betão, está a sede da associação Khapaz, criada por jovens do bairro. A música, o hip-hop e o rap juntou-os. As melodias que cantam não são as de Caetano Veloso, mas a letra de Haiti podia ser uma previsão do futuro presente das vistas dos su-búrbios das nossas cidades: “Pra ver do alto a fi la de solda-dos, quase todos pretos Dando porrada na nuca de ma-landros pretos De ladrões mulatos E outros quase brancos Tratados como pretos

Só pra mostrar aos outros quase pretos (E são quase todos pretos) E aos quase brancos pobres como pretos Como é que pretos, pobres e mulatos E quase brancos quase pretos de tão pobres são tratados”.No espaço da associação orga-nizam-se actividades musicais, informática, aulas de criolo, des-porto. Muita coisa num espaço pequeno. Chullage é músico, fundador da associação e um dos principais activistas da Kha-paz , em que participam mais de 140 pessoas, trinta delas activa-mente. Este fi lho de pais cabo-verdianos (Ilha de S. Antão) co-meçou a ouvir música pela mão do pai, também ele músico. Com 15 anos escreveu as primeiras letras, desde sempre espelho do

seu pensamento sobre a socieda-de. Os títulos das canções do seu CD Rapresálias são exemplo dis-so: “Sina de um Gajo, Foda-se”,” À-Pala de Quem Não Come”, “A Igualdade é uma Ilusão”, “Lutar Pela Nossa Vida”, “O Nosso Mo-vimento”. Há alguns anos os jovens que gostavam do hip-hop criaram o seu espaço e fi zeram a Khapaz. A existência da associa-ção foi uma dura luta: inicialmen-te, a junta de freguesia e alguns vizinhos viam com maus olhos estes jovens que pretendiam um espaço seu. “Chegavam a defen-der que não podemos acolher, no bairro, mais pretos”. É difícil aos jovens lutarem pelos seus direi-tos, até porque a todos os fi lhos de imigrantes que nasceram, em Portugal, depois de 1982, é-lhes recusada a nacionalidade portu-guesa e não podem votar. Todos

os dias, nos actos mais absurdos, são discriminados. Youruba (como o culto reli-gioso africano), por exemplo, é dos poucos jovens que con-segue jogar futebol. A maioria dos jovens imigrantes não tem essa hipótese, porque a lei, que também se aplica aos pequenos clubes, os impede de ter mais do que um jogador estrangeiro. À nossa frente vai nomeando ami-gos a quem não se lhes permite que joguem à bola e vai rindo: “devem estar à espera que ga-nhemos uma medalha, como a Naide Gomes, para nos fazerem portugueses”.No dia em que visitamos a asso-ciação, está marcada uma aula de criolo. A professora chama-se Ana Josefa e é responsável, tam-bém, por um projecto de dina-mização desta língua na Escola

do Vale da Amoreira, chamado ÁfrikaBibo (África Viva). Aqui como na escola, pretende-se que os jovens refl ictam na riqueza da sua língua e “dêem mais valor à sua identidade e à dos seus pais”. Josefa garante que este processo “de ganhar estima pelas suas ori-gens” é fundamental para a afi r-mação e a integração dos jovens.Enquanto a tarde passa, há quem dance ao som duma batida da moda. Ouve-se uma melodia que susurra: “Não há ninguém que se compare contigo és a mulher angolana mais bonita”. Lá fora, o dia continua, o racismo e a discri-minação também. Para Chullage é necessário que os imigrantes ganhem poder e o processo de conhecer a própria história e a sua língua é fundamental. Até porque, “conhecer a nossa histó-ria é ter mais poder”, garante.

A ASSOCIAÇÃO CHAMA-SE KHAPAZ SIGNIFICA QUE “CÁ HÁ PAZ” E SER “CAPAZ”. JUNTA DEZENAS DE JOVENS DA ARRENTELA, NO SEIXAL, QUE SE UNIRAM POR CAUSA DA MÚSICA E TÊM ORGULHO NAQUILO QUE SÃO. APRENDER AS SUAS LÍNGUAS É UMA PARTE IMPORTANTE DESTA AFIRMAÇÃO Texto de Nuno Ramos de Almeida. Foto de Paulete Matos

“Conhecer a nossa história é ter mais poder”

Maio 2005 > VIIIPATENTES DE SOFTWARE

ESQUERDA/GLOBAL | JORNAL DA DELEGAÇÃO DO BLOCO DE ESQUERDA NO GUE/NGL NO PARLAMENTO EUROPEU | WWW.MIGUELPORTAS.NETEDIÇÃO: MIGUEL PORTAS COORD. EDITORIAL: DANIEL OLIVEIRA E NUNO RAMOS DE ALMEIDA COORD. FOTOGRAFIA: PAULETE MATOS CONSELHO DE REDACÇÃO: CARLOS SANTOS, CARMEN HILÁRIO, DANIEL

OLIVEIRA, JORGE COSTA, LUÍS BRANCO, LUÍS LEIRIA, PAULETE MATOS, RENATO SOEIRO IMPRESSÃO: RAINHO & NEVES, LDA / STA. Mª DA FEIRA DEP. LEGAL: 219778/04 DISTRIB: GRATUITA TIRAGEM: 10 MIL EX.

Está agendado para o início de Julho no Parlamento europeu um segundo debate e voto sobre a di-

rectiva europeia que permite que programas de computador (software) sejam patenteados. Num ano em que directivas como a dos serviços (a já fa-mosa directiva Bolkestein) mobilizam protestos em toda a Europa, uma questão aparen-temente tão exótica como a da pantenteabilidade de software pode passar despercebida. Mas isso seria trágico. Ao contrário dos Estados Unidos, a Euro-pa é actualmente uma espécie de território livre de patentes de software, por força de uma convenção aprovada em 1973 Mas está em marcha desde há quase vinte anos um processo, capitaneado pela “máfi a das patentes”, para acabar com esta excepção europeia e estender as patentes de software ao ve-lho continente.

Diferença entre patentes e direitos

de autorMas, afi nal, o que há de erra-

do em patentear software? Para responder a esta questão, é pre-ciso em primeiro lugar distin-guir patentes, por um lado, e di-reitos de autor (copyright), por outro. Qualquer autor de um determinado software tem a sua obra protegida pelo copyright.

Este é obtido de forma gratui-ta e permite que o trabalho não seja apropriado por outrem sem autorização. O sistema de co-pyright tem sido extremamente efi caz para proteger os direitos dos autores e constituiu-se na principal fonte de riqueza das empresas da área.

O sistema de patentes, po-rém, é algo bem diferente. Por ele, o detentor de uma patente fi ca com todos os poderes sobre a obra patenteada, durante 20 anos. Neste espaço de tempo, o dono da patente pode decidir discricionariamente quem pode ou não utilizar a sua obra, e a que preço. Pode, por exemplo, pedir qualquer valor, mesmo o mais disparatado.

Ainda assim, o sistema de pa-tentes tem protegido de forma efi caz os inventores. Por que não usá-lo então para os criado-res de software? Por razões que têm a ver com a própria natu-reza do software. Um programa de computador é um conjunto de fórmulas matemáticas, algo-ritmos, rotinas de programação, ideias abstractas. Ora ninguém se pode arrogar a um poder dis-cricionário sobre quem pode ou não pode usar um algoritmo. Por exemplo: se o teorema de Pitágoras tivesse sido patentea-do, não seria possível a constru-ção nem a arquitectura.

Um programa de computa-dor, aliás, é criado quase como se fosse um lego: o criador apro-

veita fórmulas, rotinas, algorit-mos pré-existentes e combina-os de forma a obter o resultado pretendido. É um pouco como a música. Se Haydn tivesse pa-tenteado a sua obra, por exem-plo, o seu discípulo Mozart estaria em sérias difi culdades. Quer isto dizer que a música de Mozart é uma cópia de Haydn? Claro que não: mas sem as es-truturas musicais ou as harmo-nias de Haydn, Mozart não seria o que foi.

Acabar com a concorrência

Se parece tão evidente que não se devem patentear ideias abstractas e se o sis-tema de copyright defende os direitos de autor, porque há então tanto empenho em defender as patentes de software? Os defensores das patentes dizem que elas são a única forma de defender a inovação. A verdade é exac-tamente oposta: as patentes impedem a inovação. Por-quê? Pelo simples motivo de que, a serem impostas por lei, as 30 mil patentes de software existentes e as ou-tras que venham a ser con-cedidas impedem que uma pequena empresa, que não pode dar-se ao luxo de ter um departamento jurídico, tenha qualquer possibilida-de de saber se o seu softwa-re está ou não a violar uma

patente. Visto de outra forma, registar uma patente não custa menos de 30 mil euros, o que a torna inviável para as pequenas empresas. Quem pode registar patentes? As grandes empresas do sector. Quem tem dezenas ou centenas de advogados de paten-tes ao seu serviço para processar qualquer concorrente por viola-ção de patentes? Idem. A verda-de é que as patentes de software têm um único objectivo: permi-

tir às grandes multinacionais de software destruir a concorrência, aumentando assim os seus lu-cros e práticas monopolistas.

É por tudo isto que, em Ju-lho, o Parlamento europeu tem responsabilidades acrescidas. Barrar as patentes de software na Europa não é só uma ques-tão de liberdade e de justiça: é também uma condição essen-cial para defender a inovação e o conhecimento na Europa.

Boas perspectivasOs activistas do software livre fazem o ponto da situação sobre a disputa nas instituições europeias sobre patentesPARA João Miguel Neves, da Associação Nacio-nal para o Software Livre (Ansol), as perspec-tivas de que o Parlamento Europeu mantenha as emendas aprovadas na primeira discussão – mantendo assim a não-patenteabilidade do software – são boas. “Até porque o relator mu-dou e agora é o socialista francês Michel Rocard, que é contra as patentes de software.” Coordenadas pela Foundation for a Free In-formation Infrastructure (Fundação para uma Infra-estrutura de Informação Livre), organiza-ções de toda a Europa preparam acções para sensibilizar os eurodeputados a manter o seu voto. “Ainda esta semana vai sair um anúncio no European Journal, que é distribuído no Par-

lamento Europeu.” Para Junho, explica João Neves, está a ser preparada em Bruxelas uma conferência co-ordenada pela FFII com a participação de es-pecialistas da área de patentes, empresários, cientistas e profi ssionais de software para sen-sibilizar e informar os deputados. “É preciso esclarecer muito bem quais são as emendas que vão no sentido de manter livre de patentes o software ”, observa João Neves. Em Portugal, a campanha contra as patentes é coordenada pela Ansol, pela Assoft (Associação Portuguesa de Software) e a Anetie (Associação Nacional das Empresas das Tecnologias de Informação e Electrónica).

Ataque à inovaçãoTexto de Luís Leiria

Loja de terrorSe as patentes de software forem legalizadas, um simples site de comércio electrónico teria que negociar o uso de nada me-nos que 20 patentes (assinaladas na imagem com números).

O próprio conceito de loja de comércio electrónico (1) está patenteado; há patentes para o carrinho de compras virtual (3), o pagamento por cartão de crédito (9), a encomenda por telemóvel (2); o vídeo através da net (streaming) (7), a janela de visualização (preview), entre outras.

Para saber mais sobre patentes de software:http://www.nosoftwarepatents.com/http://swpat.ffi i.org/http://www.ansol.org/ansolwiki/PatentesDeSoftware

http://swpat.ffii.org

Livros

Clique aqui para ampliar

As joaninhas são insectos muito úteis. Consomem os parasitas. Contudo, litigadores de patentes de software são geralmente demasiado grandes para elas.

�1. Loja online: Vender coisas sobre uma rede utilizando um servidor, cliente e processador depagamentos, o utilizando um cliente e um servidor - EP803105 e EP738446

�2. Encomendar por telemóvel: Vender sobre uma rede de telemóvel - EP10904943. Carrinho de compras: Carrinho electrónico de compras - EP807891 e EP7842794. [CDs] [Filmes] [Livros]: Paletas tabuladas - EP6891335. Link para figura: janela de visualização prévia - EP5371006. Ver/descarregar filme: Distribuição de dados vídeo pela rede - EP9338927. Ver filme: Streaming vídeo ("vídeo on-demend segmentado") - EP6336948. Formato do MP3: Formato audio comprimido, coberto por várias patentes, p.e. EP2875789. Cartão de crédito: Pagar utilizando o cartão de crédito pela Internet - EP820620 e EP77958710. Prenda: Encomendar prendas para alguém via internet providenciando o seu endereço de email -

EP92794511. Pedir empréstimo: Pedido automatizado de empréstimo - EP71574012. VISA: Assinatura digital na imagem demonstra que a loja foi aprovada para pagamentos VISA -

EP79865713. Envio de ofertas: Enviar ofertas em resposta a pedidos - EP98601614. Enviar a vendedor: Reencaminhar encomendas a vendedores - EP21730815. Base de dados de suporte: Sistema de suporte em rede utilizando bases de dados - EP67313516. Extracos de capítulos: a TV como metáfora para obter diferentes segmentos de vídeo - EP67065217. Imagem da joaninha: Formato JPEG - EP26604918. Resultados relacionados: Mostrá-los se o cliente gostar dos actuais - EP62891919. Código de descontos: Permitir que estes sejam introduzidos pelos clientes - EP37084720. Gravar na loja: Reprodução material de informação armazenada em local remoto - EP195098

Ver filme no Browser

Enviar como prenda

Pedir empréstimo

Compre banda sonora(mp3)

Compre filme

Exclusivo: descarregueimediatamente o que compra!

Emergênica no Comércio Electrónico Europeu

Se não tivermos o seu pedido em stock, será imediatamente enviado a um vendedor afiliado!

�Obtenha ajuda

directaente da base dedados de suporte!

Sim, desejo receber ofertas especiais!�

Extractos de capítulos: click neles para os ver na TV acima!

Gostou doresultado dapesquisa?

Poderágostar

tambémdestes:

1. A Dama e oPássaro2. Incomodandosenhoras3. Assaltante deSenhoras4. Patentes desoftware e outroserros parasites5. Incomoda-me,incomodo-te

Pague com cartão de crédito

<Introduzadescontoseaplicável>

NOVO:

encomende por

telemóvel!

Adicionar ao carrinho

FilmesCDs

Vá a uma das nossas

lojas e misture/

queime o seu próprio

DVD à la carte!

http://webshop.�i.org/

A sua loja online está �����������

Original patents and concept by Ole Tange, Foto da joaninha © http://www.toflidium.com, VISA e o logo VISA são marcas registadas da VISA International.Todas as outras marcas e nomes de mercado são propriedade dos seus respectivos donos. Os editores não estão afiliados sob forma alguma à VISA ou

qualquer outro dono de uma marca envolvida.

Extractos de capítulos: click

��

Enviar como prenda

<Intr

Adicionar ao carrinho

queime o seu próprio �

encomende por �

���a ��

Filmes

E

Clique aqui para ampliarpara elas.para elas.

Vá a uma das nossas

Vá a uma das nossas �

Compre banda sonora

mpra!

1.Pá2

demasiado grandes

<

Vá a uma das nossas

Vá a uma das nossas <

��

queime o seu próprio

queime o seu próprio

DVD à la carte!

��

Se não tivermos o seu pedido em stock, será imediatamente enviado a um vendedor afiliado!

���

comodo te

������

Compre banda sonora

Compre filme

li

Compre banda sonora

P�

Se não tivermos o seu pedido em stock, será imediatamente enviado a um vendedor afiliado!

Sim, desejo receber ofertas especiais!

������

��

http://webshop.

a onono�

Enviar como prenda

e crédito

��

5.incc

����

��

5 > Maio 2005

Muitas das em-presas usam e abusam de dinheiros pú-blicos subven-

cionados pelo Estado português ou pela UE, sem concluírem pla-nos a que teriam sido obrigadas. Algumas delas forjam falências fraudulentas, quase sempre com total impunidade. Outras são vítimas da sua própria falta de modernização tecnológica por preferirem a cegueira dos salá-rios baixos. No Fundão, tudo corria bem com as Confecções Eres. Boas encomendas e muito trabalho. De repente, a empresa come-çou a deslocar matérias-primas e maquinaria para a Bulgária. Resultado: 483 trabalhadoras no desemprego. Em Castelo de Paiva, a empresa de calçado C & J Clarks, com 588 trabalha-dores, era considerada a mais produtiva do grupo. Deslocali-zou-se para a Roménia e para a China. A Melka, no Cacém, rumou à Rússia. Fechou em Fe-vereiro de 2004, lançando para o desemprego 300 trabalhado-res. A têxtil Brax fechou portas a 30 de Janeiro de 2004. Em Serzedo, Gaia, colocando no desemprego 450 trabalhado-res. A empresa alegou falta de liquidez para pagar salários em atraso e indemnizações, devido a uma dívida à banca de um mi-lhão de euros e a uma quebra de encomendas provocada pela falência de 600 clientes, quase todas empresas dependentes de multinacionais. Diversas em-presas de vários sectores anun-ciam a redução dos níveis de

emprego, da ameaça dos postos de trabalho ou deslocalização de produção, como na Rhode, Euronadel, Philips.A ECCO`let, a Gerry Weber, a Bawo, Schuh-Union, a Siemens, a Longa Vida/Nestlé, a Yazaki, a Borealis, a Goela Fashion, a Ma-conde, a Eurotextil. A lista não termina. Empresas que procu-ram agora no Leste da Europa, na Índia, na Indonésia, na China ou no Norte de África mão-de-obra infantil e escravizada, tra-balhadores sem direitos sociais mínimos. «Obter ganhos espe-culativos a curto prazo, gerando desemprego e pondo em causa a estabilidade social da região onde se situam», assim defi niu, em 2003, o Parlamento Europeu, os objectivos das vagas de desloca-lização que se assistem em vários países europeus e especialmente em Portugal. O governo anterior passou ao lado da atitude “perdedora” das multinacionais e não optou pela via de uma contratualização com

o investimento estrangeiro, que garantisse uma duração mínima do investimento, geradora de um volume de emprego de qualida-de, bem como a regularização das ajudas públicas e comunitá-rias e das penalizações no caso de violação ou deslocalização do contratualizado, legislando e regulamentando nesse sentido. O actual governo PS tarda em reagir.Nem a actual situação de deze-nas de empresas têxteis que cor-respondem a milhares de postos de trabalho, da Philips, da Yazaki Saltano e da ex-Indelma (ver cai-xa) parece fazer tocar o sinal de alarme.

Os predadoresTexto de José Casimiro. Foto de Paulete Matos

DESLOCALIZAÇÕES

#1Legislação que assuma a necessidade de contratu-alizar com o investimento estrangeiro a duração mí-nima desse investimento, a sua dimensão, o volume de emprego e as suas garan-tias e a incorporação direc-ta e indirecta nacional.

#2 Prestação de garantias por parte das empresas que pretendam benefi ciar de subsídios, incentivos ou benefícios fi scais.

#3 Quando existam ajudas pú-blica e comunitária, devem ser defi nidas penalizações, como a obrigação de re-embolso e indemnização ao Estado Português e ao município, a ser determi-nadas nas instâncias judi-ciais nacionais e da União Europeia.

#4 No caso em que tenham existido apoios públicos, as empresas devem ser res-ponsabilizadas por despe-dimentos, tendo em conta as consequências sociais e económicas para os tra-balhadores, suas famílias, e também para as regiões onde as unidades estejam instaladas. Deve ser garan-tida a responsabilização civil e criminal dos gesto-res, o arresto judicial auto-mático dos bens das em-presas e a fi xação de uma indemnização equivalente ao dobro daquela a que te-riam direito de acordo com a legislação actualmente em vigor, sem prejuízo de outros montantes devidos face à ilicitude dos despe-dimentos.

#5Consagração da extensão dos privilégios creditórios imobiliários dos trabalha-dores às indemnizações devidas por cessação do contrato de trabalho.

#6 O produto dos reembolsos e das indemnizações das empresas que violarem a contratualização com o Es-tado e com os Municípios, deverá servir para apoiar a dinamização económica e o nas Regiões afectadas pela deslocalização e a promo-ção do emprego.

Yazaki SaltanoNum distrito com mais de 30 mil trabalhadores desempregados, com particular incidência nas mulheres, a ameaça de deslocalização de parte da produção da Yazaki Saltano abre uma nova crise social em mais uma grande unidade indus-trial de Ovar com a ameaça da perda de 500 postos de trabalho. No entanto, esta foi uma em-presa que recebeu benefícios e incentivos, como a compra do terreno de 20 hectares a um escudo o metro quadrado.A decisão de redução de mão-de-obra, através do encerramento «gradual e defi nitivo do turno nocturno», é o culminar de todo um processo de redução de efectivos que esta multinacional de componentes electrónicos vem fazendo já algum tempo, passando a privilegiar o trabalho precário, como o recurso abusivo ao trabalho temporário. Depois de vários anos de utilização de apoios fi nanceiros, incluindo o negócio da compra do terreno em que os japoneses instalaram esta em-presa. A autarquia, que agora é de maioria PS, não tomou qualquer posição quanto ao provável encerramento da produção.No entanto, a posição da Yazaki é clara: a mão-de-obra portuguesa deixou de ser competitiva para a estratégia da Estrutura Europeia da empresa.

Alcoa Fujikura, ex-IndelmaA multinacional norte-americana Alcoa Fujikura quer mandar funcionários da sua unidade em Portugal para o desemprego, transferindo traba-lho para outros países. Estão em causa mais de 1000 postos de trabalhoOs trabalhadores, maioritariamente mulheres, como é usual no sector de fabricação de material eléctrico, vivem em permanente desassossego, porque a administração já abriu um processo de redução de pessoal, por meio de rescisões «por mútuo acordo», sem defi nir qualquer limite. A instabilidade social e laboral tem vindo a compe-lir os trabalhadores a aceitar a rescisão. A situação da Alcoa resulta do desvio de clientes e produtos da fábrica portuguesa para outras uni-dades da multinacional. A deslocalização da produção para a República Checa acontece quando se aproxima o fi m do plano decrescente de encomendas para os mo-novolumes produzidos na Autoeuropa e o começo de um novo fornecimento da cablagem eléctrica para o VW Golf Cabrio.Para criar emprego e para se modernizar, a uni-dade teve, há cerca de três anos, direito a bene-fícios superiores a 10 milhões de euros, concedi-dos pelo Estado português à Indelma, adquirida pela Alcoa ao grupo Siemens.O fornecimento das cablagens para o modelo de luxo que a Volkswagen vai começar a produzir na Autoeuropa foi ganho, em concurso, pela Alcoa internacional e garante trabalho por vários anos. A proposta vencedora foi elaborada com base nos preços, na localização e na qualidade da fábrica portuguesa, a única unidade do grupo Alcoa que fornece o complexo automóvel de Palmela.

O Bloco defende a contratualização de investimento estrangeiro

Maio 2005 > 6DEBATES DA CONVENÇÃO

1.Este resultado mostra-nos a di-mensão do eleitorado receptivo à mensagem do Bloco. Torna-se crucial que o Bloco consiga consolidar os eleitores, demons-trando coerência com os princí-pios e práticas, que retratam a sua imagem. Temos que desen-volver um profundo “trabalho de casa”.

2.Nesta matéria é particularmen-te importante que a voz das estruturas locais seja valoriza-da. Dada a natureza das Autár-quicas, o difícil será resistir à tentação de mostrar o que não se tem! A necessidade de cres-cimento orgânico não deve ser feito a qualquer custo.Candidaturas desenfreadas po-derão resultar numa total desca-racterização do Bloco, advindo consequências negativas, que podem pôr em causa um cresci-mento sustentado do Bloco. Co-ligações pré-eleitorais e fi losofi a de “mal menor” provavelmente terão resultados negativos no futuro do Bloco.Sobre as Presidenciais: na pri-meira volta devemos ter um candidato de esquerda que transborde o aparelho bloquis-ta, alguém com “capital de prestígio” capaz de defender uma candidatura em que se possam rever os activistas dos movimentos sociais e todos os que procuramos envolver na tal maioria social com uma cultura e prática de esquerda combati-va e fracturante!

3.As experiências anteriores em Portugal de “contagem de ban-deiras” não foram um bom exemplo de como valorizar a autonomia dos movimentos so-ciais. Não é disputando a hege-monia, repetindo erros de outros, que se anula a velha prática de correia de transmissão dos par-tidos “todo sabedores” para os movimentos com agendas im-portadas.Precisa dar-se real espaço às associações, quase todas em Portugal, com vivências muito intermitentes e de lideranças demasiado personalizadas. Res-peitar os timings sem “inventar” pressas que podem fazer festa, mas não criam raízes!

4.O descrédito do movimento sin-dical é fruto da falta de credibi-lidade dos dirigentes sindicais, por prática de uma política dis-tanciada dos trabalhadores. As direcções sindicais não podem agir como um grupo de “ilumi-nados”, que advoga saber o que interessa ou não aos trabalha-dores. A conquista de alguns lugares de direcção, nas cúpu-las sindicais, não deve ser a po-lítica primeira dos bloquistas; É fundamental que os dirigentes tenham uma prática coerente com o seu estatuto de represen-tantes dos trabalhadores, dis-cutindo e defi nindo objectivos a atingir, com a cumplicidade e empenho de todos os trabalha-dores representados.Não partilhamos da lógica que opõe as comissões de traba-lhadores às comissões sindi-cais. Ambos os espaços fazem

sentido, procurando a partir do envolvimento nos locais de tra-balho, engrandecer a participa-ção e acabar com os estatutos “blindados” dos sindicatos.

5.A discussão pública do Tratado Constitucional, é crucial para obtermos uma outra Europa so-cial, daí ser fundamental um debate longo e aprofundado, do que está em jogo, devendo o Bloco empenhar-se na exigên-cia (ele próprio promovendo) do debate público.O referendo ao aborto.A redução do horário de traba-lho, o combate ao desemprego e à precarização do trabalho.Pelos serviços públicos de qua-lidade – saúde, ensino, segu-rança social, distribuição de água...Estas são as propostas do con-creto... que talvez todos seja-mos capazes de subscrever.Importa construir propostas, que ainda não foram amadure-cidas, sobre poder autárquico e a sua relação com a defesa do ambiente, do desenvolvimento sustentado, da cultura...Sabemos muitas perguntas, precisamos de juntar mais gen-te que pense e construa as res-postas.Estamos certos de que devemos continuar a dinamizar múltiplas agendas em todas as áreas onde o Bloco foi a “pedra no charco”.

6.A única estratégia possível em relação ao Tratado Constitucio-nal será conseguir a vitória do “não”, num qualquer país da Comunidade.

7.As preocupações com as “ves-tes” – crescimento eleitoral – descurou o cuidado a ter com o desenvolvimento do “corpo”! – crescimento orgânico.

8.Questionamos qual o tipo de de-mocracia interna pretendido. Os bloquistas não podem ser ade-rentes passivos e dispostos a se-guir caminhos colocados na sua frente. O nosso crescimento or-gânico só será consistente se os aderentes tiveram voz activa nas políticas e caminhos a seguir.

9.A expectativa será sempre a prática de uma democracia di-recta! Não aceitamos que, em políticas estruturantes, não haja debate e confronto de opiniões, que nos torne cúmplices do re-sultado fi nal. O argumento da inviabilidade e da urgência não pode ser a regra. O debate terá de ser o suporte das políticas a defender.É exigência da democracia, para que ela seja efectiva e não apenas “representativa”, a transparência, em todos os níveis do movimento, de quais são (em cada caso concreto) os organismos que respondem pe-las decisões.Não gostamos desta opção de reduzir a preparação da con-venção a um contra-relógio entre subscritores de moções. Construir caminho é procurar a inclusão da diversidade, não buscar a “digladiação” nem o unanimismo.

Não gostamos da forma jornalís-tica de reduzir tudo às sínteses.Como já ouvimos em outras bo-cas, sabemos o que não quere-mos e continuamos a procurar um caminho alternativo que faça da política um instrumen-to de transformação da vida em sociedade.

10.Partilhamos as estratégias de política internacional e nacional afi rmadas pelos órgãos dirigen-tes do Bloco.Ouvimos num dos debates pre-paratórios desta convenção que a moção “oponente” é tão abrangente que, para se ser con-tra, tem de se sair do Bloco...Propomos que, dando conte-údo à estratégia generalista e concensualizada, se implemen-te uma estratégia que faça da participação dos activistas a primeira matriz para realmente trazermos à actividade política a tal esquerda moderna e subs-tantivamente nova!Não vimos pedir que nos entre-guem a representatividade; pro-pomo-nos participar, ser parte do todo, integrando e valorizan-do igualmente, a cada uma das decisões estruturantes da con-dução política (internacional ou nacional) todos os bloquistas.A nossa estratégia é dizer que o mais anónimo activista pode ter um papel activo, infl uenciar e enriquecer as causas em que o Bloco se empenha, tanto como o mais conhecido parlamentar.A democracia representativa não é o fi m da História.Esta é a estratégia em que apos-tamos para mudar o mundo.

Teodósio Alcobia* subscritor da Moção “Por uma Plataforma de Democracia Socialista”

POR ESCRITO, OS SUBSCRITORES DAS DUAS MOÇÕES DE ORIENTAÇÃO EM DEBATE NESTA CONVENÇÃO RESPONDERAM A 10 PERGUNTAS SOBRE AS PRIORIDADES DO BLOCO DE ESQUERDA, A SUA POLÍTICA NACIONAL E INTERNACIONAL E A SUA VIDA INTERNA:

1. O Bloco teve um grande

crescimento eleitoral nas

últimas eleições legislativas. O que é que

muda com este resultado?

2. Qual deve ser a estratégia para

os próximos actos eleitorais?

3. Que avaliação

fazem do trabalho do Bloco junto

dos movimentos sociais?

4. E no movimento

sindical?

5. Na intervenção

política nacional, quais devem ser as prioridades do Bloco para os próximos dois anos?

* Com colaboração dos outros subscritores que foi possível contactar.

7 > Maio 2005

1.Muda a responsabilidade: com 365 mil votos e 8 deputados, o Bloco ganha uma infl uência de massas e consegue um peso que não tinha até agora. Esse é o resultado de uma linha políti-ca e de uma intervenção social ao longo de cinco anos. Mas precisamos de estar preparados para o aumento da responsabi-lidade, e o Bloco deve ser capaz de apresentar alternativas de políticas ao governo Sócrates, como deve ser capaz de maior protagonismo nos movimentos populares.

2.Nas eleições autárquicas e pre-sidenciais, a Moção que propo-mos defende a apresentação de alternativas que construam pro-postas programáticas concretas. O Bloco deve apresentar candi-daturas abertas a independen-tes e que sejam portadoras de transformações na democracia urbana e na gestão autárquica.Nas presidenciais, um dos de-bates mais importantes é na-turalmente a questão do Trata-do Constitucional Europeu e a visão estratégica do combate ao liberalismo, que separa os socialistas do Bloco dos situa-cionistas da Comissão Barroso. O Bloco deve apresentar por-ta-vozes que construam nestas eleições uma visão alternativa, uma proposta socialista que mobilize uma parte importante do eleitorado.

3.O Bloco dinamizou o espaço unitário do Fórum Social Portu-guês, que foi um pequeno pas-so no sentido da mobilização

de correntes e agendas sociais diversas. Ao mesmo tempo, aprendemos com o fórum mun-dial e com o europeu como se deve cruzar esta esquerda polí-tica e a esquerda social. É nesse mesmo sentido que em Portugal apoiamos os movimentos pela descriminalização do aborto, os movimentos contra a discri-minação dos homossexuais, os processos de afi rmação da cida-dania cosmopolita. O Bloco está empenhado nestes movimentos, mas precisa de crescer muito mais, porque essa é a condição para conhecer, agir e apoiar o crescimento dos movimentos sociais.

4.O Bloco representa hoje uma importante corrente sindical de base, empenhada num movi-mento de convergências unitá-rias para a revogação do Código Laboral e para forçar a renego-ciação dos contratos colecti-vos, criando as condições para a resposta ao desemprego. Nas últimas eleições, centenas de dirigentes sindicais nacionais e membros de comissões de trabalhadores apoiaram as pro-postas do Bloco. Militantes do Bloco foram eleitos para muitas comissões de trabalhadores das maiores fábricas do país. Esse trabalho de construção da al-ternativa de um sindicalismo democrático de base é uma das grandes prioridades do Bloco.

5.Além da resposta nas eleições autárquicas e presidenciais e nos referendos sobre a Consti-tuição e sobre o aborto, a prio-ridade do Bloco é responder à questão social mais importante, o desemprego. O desenvolvi-

mento da organização social e da actividade nas empresas e entre os jovens é a grande prio-ridade para os dois anos. O Blo-co tem de se construir como um grande movimento de milhares de militantes sociais e de orga-nizadores dos movimentos so-ciais e populares.

6.O Bloco articula-se com movi-mentos e partidos que na es-querda europeia se comprome-tem com a recusa do Tratado em nome dos seus princípios liberais, da imposição do Direc-tório das grandes potências e do apoio às guerras da Nato. Temos participado em comícios de ou-tros partidos em França, na Sui-ça, na Bélgica e contamos com o apoio de socialistas críticos, comunistas e outros dirigentes da esquerda europeia para a nossa campanha pelo “Não da Esquerda”.

7.O Bloco foi a maior mudança na esquerda portuguesa desde há mais de 20 anos. Tem dado um contributo fundamental para a refl exão política, para a renova-ção da acção e para a transfor-mação da esquerda e confronto com a direita. O Bloco supera a história passada de organi-zações com menor organização social e infl uência política – foi assim que vencemos o secta-rismo e o propagandismo, tão marcados no passado das es-querdas.

8.Existem limitações que decor-rem de uma cultura de pouca participação popular na política e das condições em que o Bloco iniciou a sua vida – e mesmo de erros de organização. É por isso necessário melhorar a partici-pação e dar mais vida – o que quer dizer mais regularidade e mais poder – aos núcleos lo-cais e sectoriais do Bloco. Mas o Bloco é sem a menor dúvida o partido mais democrático em Portugal, o único que reconhe-ce o direito de tendência, que publica sem censura as contri-buições escritas dos aderentes, que facilita a divulgação das moções alternativas e que pres-ta contas transparentes.

9.A publicação do “Esquerda”, o jornal do Bloco, e o desenvolvi-mento do site (www.bloco.org), têm contribuído para melhorar a informação aos aderentes. Mas acho que é preciso desenvolver muito mais a informação dos núcleos e estender a organiza-ção das conferências sectoriais, que são um modelo de partici-pação que é fundamental para ao Bloco.

10.Existem grandes diferenças en-tre as duas moções, visto que a que se nos opõe não sugere ne-nhuma política para a activida-de do Bloco nos próximos anos.Quem vota nessa moção fi ca sem saber o que farão os seus eleitos – o que é uma forma de viciar a democracia e de impe-dir a seriedade da representa-ção. Aliás, os subscritores dessa moção pretendiam apresentar

lista para a Mesa Nacional mas não queriam ser obrigados a apresentar uma moção política. Existe portanto uma grande di-ferença acerca da democracia: na nossa opinião, a democracia começa pela responsabilidade dos candidatos em apresenta-rem as suas posições. E valia a pena que o fi zessem, porque só ao longo do debate é que se descobriu que os subscritores da moção alternativa escon-diam a defesa de coligações autárquicas generalizadas com o PS. Esse é evidentemente um ponto importante: se a nossa moção for aprovada, o Bloco apresentará candidatos onde te-nha trabalho organizado e pes-soas capazes de representar as populações, de forma geral.Por outro lado, o argumento da democracia interna, que tem sido o único utilizado pela mo-ção contrária, é surpreendente. O Bloco é o único partido portu-guês com direito de tendência; publicam-se todos os contribu-tos dos militantes; as moções alternativas defendem o seu ponto de vista; têm condições iguais na Convenção. Não existe nenhuma limitação à democra-cia no Bloco. O que falta é mais organização social, mais núcle-os de empresa, mais trabalho organizado nos sectores popu-lares, mais aderentes no Bloco, que façam do nosso moviemen-to uma força determinante na luta social em Portugal.E é nesse sentido que temos evoluido, ao longo dos últimos cinco anos. É por isso mesmo que o Bloco supera e rejeita o ambiente quezilento das orga-nizações muito pequenas que, sem infl uência social, reduziam a sua actividade à proclamação da pureza ideológica,. ao pro-pagandismo e ao sectarismo. O Bloco é e será sempre um movi-mento democrático que organiza a esquerda socialista e popular.

Mariana Aiveca*subscritora da Moção “O Bloco como Alternativa Socialista”

DEBATES DA CONVENÇÃO

6. Tendo em conta

o referendo ao Tratado

Constitucional, que estratégia deve seguir o Bloco no seu

trabalho com a restante esquerda

europeia?

7. O Bloco teve um

nascimento pouco comum. Que

balanço fazem do caminho que se fez desde o seu nascimento até

agora?

8. Há democracia

interna no Bloco de Esquerda?

9. Que propostas

têm para o aprofundamento da democracia

no Bloco?

10. O que distingue a

vossa moção da moção oponente?

restante esquerda

* Deputada, membro do CN da CGTP

Maio 2005 > 8

A assinatura anual do “Esquerda” é de 8 euros (incluindo despesas de envio). Recorte ou fotocopie, preencha e envie este cupão juntamente com um cheque ou vale postal à ordem de Bloco de Esquerda para: Bloco de Esquerda, Av. Almirante Reis, 131, 2º, 1150-015 Lisboa ou vale postal à ordem de Bloco de Esquerda para: Bloco de Esquerda, Av. Almirante Reis, 131, 2º, 1150-015 Lisboa

CUPÃO DE ASSINATURA:NOME: ADERENTE? (SIM/NÃO):

MORADA:

TELEFONE: E-MAIL:

JUNTO CHEQUE Nº: DO BANCO:

QUERES FAZER SUGESTÕES, CRÍTICAS OU PUBLICAR A TUA OPINIÃO NO “ESQUERDA”? ESCREVE PARA BLOCO DE ESQUERDA - “ESQUERDA”, AV. ALMIRANTE REIS, 131, 2º, 1150-015 LISBOA OU [email protected]. NO CASO DE QUERERES VER A TUA CARTA PUBLICADA NO JORNAL, O TEXTO NÃO PODERÁ TER MAIS DE 1000 CARACTERES E A DECISÃO SOBRE A SUA PUBLICAÇÃO ESTÁ SUJEITA AOS CRITÉRIOS EDITORIAIS DA DIRECÇÃO DO JORNAL.

Um dos principais desafi os da Coor-denadora Nacional de Jovens do Blo-co, eleita na Con-

ferência, será o de conferir uma dinâmica nacional à actividade política da juventude. Tendo-se desfeito o mito do Bloco como partido exclusivamente urba-no, importa agora consolidar e incentivar o crescimento de dinâmicas políticas em muitas localidades por todo o país.

As conclusões da conferência foram no sentido de potenciar a intervenção social junto das pessoas, nas escolas, nas ruas e nos locais de trabalho. Os jo-vens do Bloco não se querem fe-char sobre si mesmos, mas con-tribuir para o fortalecimento de dinâmicas políticas alargadas, que juntem muitos jovens na luta contra todas as discrimina-ções e por mais direitos sociais. Simultaneamente, têm presente a importância de ampliar a ca-pacidade organizativa com mais núcleos em escolas, faculdades e locais de trabalho. Isso é cons-truir e fortalecer o Bloco.

Mas os jovens do Bloco sa-bem que não existe organiza-ção sem política. E é por isso que devem ser uma lufada de ar fresco permanente nos lo-cais onde intervêm. Mobilizar para o próximo Fórum Social Português temático em Évora, participar, em Junho deste ano, dentro do possível, na mani-festação internacional contra a cimeira dos G-8, na Escócia, e culminar o ano lectivo com o segundo acampamento de jo-vens do Bloco, mais participado do que o primeiro e com maior qualidade política.

Os jovens do Bloco vão estar em todas as lutas justas, contra

as guerras imperialistas e por um ensino gratuito, contra a ho-mofobia e o machismo, pela le-galização de todos os imigrantes e pela defesa da saúde pública e do ambiente contra a co-incine-ração. E querem ligar as lutas, mostrar a sua transversalidade, levando para as escolas e facul-dades muito mais do que os te-mas meramente estudantis.

Bloco sem “jota”Saiu reforçada desta confe-

rência a ideia de que os jovens do Bloco não são nem querem ser uma jota, fechada sobre si mesma e alheada da construção global do Bloco de Esquerda. Mais autonomia e capacidade de intervenção política dos jovens não signifi cam uma diminuição da participação no Bloco. Pelo contrário, permite levar o Blo-co mais longe nas mobilizações sociais. Por isso, a Conferência decidiu que os jovens se empe-nharão em todas as campanhas políticas que o Bloco vai ter pela frente: o combate contra esta constituição neoliberal da União Europeia; a luta urgen-te pelo «sim» no referendo do aborto; e as próximas eleições autárquicas, onde o Bloco se apresenta como alternativa de esquerda, com as mãos limpas e vontade transformadora.

O principal dia de trabalho foi o de sábado, que foi preenchi-do por debates sectoriais sobre todos os temas da Conferência. De manhã, apontaram-se cami-nhos para um feminismo jovem e combativo (que tem como próxima batalha o referendo do aborto), discutiu-se a ocupação imperialista do Iraque e as di-nâmicas dos Fóruns Sociais e debateram-se novas políticas para encarar o problema da to-

xicodependência e a urgência da legalização das drogas le-ves. A parte da tarde começou com a Educação: divididos em duas comissões – Ensino Supe-rior e Ensino Secundário –, os activistas estudantis do Bloco discutiram formas e ideias de mobilização para um combate permanente por um Ensino Pú-blico, gratuito, para todos e que dê prazer. Para já, e em relação ao Ensino Superior, destacou-se a luta contra o processo de Bolo-nha, que vai obrigar os estudan-tes a pagar caro o segundo ciclo de formação, e contra a propina máxima, que se vai generali-zando e que este Governo PS já veio dizer que é para fi car.

Ainda houve tempo para três debates em simultâneo: contra a homofobia (neste momento os jovens do Bloco empenham-se na mobilização para a manifes-

tação de dia 15 de Maio, em Vi-seu, contra os violentos ataques homofóbicos que aí têm ocorri-do), por um país e um Mundo ecologicamente sustentáveis (ne-cessariamente não capitalista e eco-socialista) e por leis e com-portamentos antiracistas e anti-xenófobos. Ainda antes do jan-tar, houve mais um debate sobre a crescente precariedade laboral que afecta cada vez mais jovens, delineando-se uma campanha nacional dos jovens do Bloco pelo emprego com direitos.

Nova CoordenadoraO último dia da Conferência

serviu para que, em Plenário, os jovens discutissem e apro-vassem as suas prioridades po-líticas e formas de organização. Para a Coordenadora Nacional, surgiram duas listas cada qual com a sua moção: a lista enca-

beçada por José Soeiro («Todas as cores da Alternativa»), e a lista encabeçada por Flor Neves («Por um Bloco militante e uma juventude radical, combativa e socialista»). A primeira obteve 85 votos, com 15 eleitos, e a segunda obteve 45 votos, com 8 militantes eleitos. A nova Co-ordenadora Nacional de jovens é agora composta por 23 diri-gentes, de 10 distritos (Lisboa, Coimbra, Porto, Braga, Viseu, Guarda, Bragança, Évora, San-tarém e Aveiro).

O encerramento da Confe-rência esteve a cargo de Fran-cisco Louçã, Natasha Nunes e Manuel Ramos. A abertura dos trabalhos, no dia 8 de Abril, contou com as intervenções dos dois primeiros subscritores das duas moções alternativas e da nova deputada do Bloco de Es-querda, Helena Pinto.

EM COIMBRA, NOS PASSADOS DIAS 8, 9 E 10 DE ABRIL, TEVE LUGAR A III CONFERÊNCIA DE JOVENS DO BLOCO. ESTE FOI O ACONTECIMENTO QUE MAIS JOVENS JUNTOU DESDE A FUNDAÇÃO DO BLOCO DE ESQUERDA Texto de Miguel Reis e Flor Neves. Foto de André Beja

Construir a alternativa em todo o país

III CONFERÊNCIA DE JOVENS