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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO 1663 ESPAÇO SAGRADO E A SACRALIZAÇÃO DO ESPAÇO: UM ESTUDO DE CASO DA IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS NA CIDADE DE FORTALEZA - CEARÁ CHRISTOVAM REIS DOS SANTOS FILHO 1 Resumo O presente trabalho propõe realizar uma interpretação a respeito da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) Templo Central de Fortaleza -- enquanto forma simbólica espacial. A análise da manifestação no espaço é compreendida na perspectiva da gênese, estruturação, cotidiano e consequentemente formação de uma paisagem simbólica. O esteio teórico-metodológico se relaciona nos pressupostos da Geografia da Religião, nos quais permitem a compreensão da formação de um lugar sagrado onde a vivência e a percepção dos fiéis da igreja norteia o discurso de uma sacralidade ali existente. A pesquisa se realizará por observações em campo, entrevistas e registros fotográficos, além das leituras referentes aos conceitos. O objetivo é compreender como se forma o espaço sagrado concretizado por pela igreja. Palavras-chave: Geografia da Religião, Lugar sagrado, Formas simbólicas espaciais. Igreja Universal do Reino de Deus. Abstract This paper intent to build an interpretation about the Universal Church of the Kingdom of God (UCKG) - Central Temple of Fortaleza as a way of a symbolic space. The analysis in space expression is understood in the perspective of the genesis, the structure, the daily life and consequently formation of a symbolic landscape. The theoretical and methodological underpinning is based on assumptions of Religion Geography, in which allow the understanding of the formation of a sacred place where the living and the perception of the faithful guides the speech of an existing sacredness. The survey will be held by field observations, interviews and photographic records, in addition to readings related to the concepts. The objective is to understand how it forms the sacred space embodied by the church. Keywords: Geography of Religion, Sacred place, spatial symbolic forms. Universal Church of the Kingdom of God. 1. Introdução Na ciência geográfica temos a Geografia Cultural como um campo científico para a compreensão dos aspectos culturais enquanto fenômenos da espacialidade. Portanto, pretende entender e analisar a dimensão espacial da cultura. Nesse aspecto, as diferenças compostas pelas comunidades humanas trazem diferentes manifestações no espaço. O amparo teórico-metodológico da Geografia da Religião nos permite a compreensão da formação de um lugar sagrado onde a vivência e a percepção 1 Acadêmico em nível de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual do Ceará. E-mail de contato: [email protected]

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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO

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ESPAÇO SAGRADO E A SACRALIZAÇÃO DO ESPAÇO: UM

ESTUDO DE CASO DA IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS

NA CIDADE DE FORTALEZA - CEARÁ

CHRISTOVAM REIS DOS SANTOS FILHO1

Resumo O presente trabalho propõe realizar uma interpretação a respeito da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) – Templo Central de Fortaleza -- enquanto forma simbólica espacial. A análise da manifestação no espaço é compreendida na perspectiva da gênese, estruturação, cotidiano e consequentemente formação de uma paisagem simbólica. O esteio teórico-metodológico se relaciona nos pressupostos da Geografia da Religião, nos quais permitem a compreensão da formação de um lugar sagrado onde a vivência e a percepção dos fiéis da igreja norteia o discurso de uma sacralidade ali existente. A pesquisa se realizará por observações em campo, entrevistas e registros fotográficos, além das leituras referentes aos conceitos. O objetivo é compreender como se forma o espaço sagrado concretizado por pela igreja. Palavras-chave: Geografia da Religião, Lugar sagrado, Formas simbólicas espaciais. Igreja Universal do Reino de Deus. Abstract This paper intent to build an interpretation about the Universal Church of the Kingdom of God (UCKG) - Central Temple of Fortaleza – as a way of a symbolic space. The analysis in space expression is understood in the perspective of the genesis, the structure, the daily life and consequently formation of a symbolic landscape. The theoretical and methodological underpinning is based on assumptions of Religion Geography, in which allow the understanding of the formation of a sacred place where the living and the perception of the faithful guides the speech of an existing sacredness. The survey will be held by field observations, interviews and photographic records, in addition to readings related to the concepts. The objective is to understand how it forms the sacred space embodied by the church. Keywords: Geography of Religion, Sacred place, spatial symbolic forms. Universal Church of the Kingdom of God.

1. Introdução

Na ciência geográfica temos a Geografia Cultural como um campo

científico para a compreensão dos aspectos culturais enquanto fenômenos da

espacialidade. Portanto, pretende entender e analisar a dimensão espacial da

cultura. Nesse aspecto, as diferenças compostas pelas comunidades humanas

trazem diferentes manifestações no espaço.

O amparo teórico-metodológico da Geografia da Religião nos permite a

compreensão da formação de um lugar sagrado onde a vivência e a percepção

1 Acadêmico em nível de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade

Estadual do Ceará. E-mail de contato: [email protected]

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norteia o discurso de uma sacralidade ali existente. Logo, propomo-nos a aprofundar

a pesquisa sobre o espaço sagrado que ocorre na Igreja Universal do Reino de

Deus (IURD).

Para isso, adotamos autores que abordam a temática da Geografia

Cultural, especificamente aqueles que discorrem sobre a apreensão da paisagem e

do sagrado, enquanto forma simbólica, como Rosendahl (1996), Claval (2003;

2006), Cosgrove (2003) e Costa (2011; 2015). Com estes autores, objetivamos

compreender como se organiza o espaço sagrado representado pela IURD por meio

das práticas cotidianas dos fiéis, assim como também identificar os elementos que

compõem o espaço sagrado na dimensão objetivada pela paisagem e entorno,

entender como a sacralidade desse espaço influi no cotidiano dos fiéis pertencentes

a esta igreja e conhecer os atores que participam e organizam o Templo Central da

IURD.

As igrejas, enquanto instituições religiosas, podem ser representadas por

suas formas simbólicas espaciais, sobretudo no espaço urbano, e constituem parte

da paisagem cultural adquirindo formas diversas, nos quais os templos são as

formas mais representantes. Espacialmente, essa manifestação obedece às

especificidades dos lugares, nos quais os templos funcionam como locais onde os

fiéis buscam um direcionamento visando obtenção de espiritualidade junto à

realização dos desejos materiais.

O presente trabalho propõe realizar uma interpretação a respeito da Igreja

Universal do Reino de Deus (IURD) – Templo Central de Fortaleza, Ceará -

enquanto forma simbólica espacial. Este templo localiza-se no centro da cidade de

Fortaleza - CE, uma área comercial que atrai um grande fluxo de pessoas. A Igreja

Universal do Reino de Deus é orientada pelo neopentecostalismo, a terceira onda do

corte histórico-institucional do pentecostalismo (Mariano, 2012). O templo comporta

milhares de pessoas e está inserido na paisagem urbana, sendo visitados por várias

pessoas, oriundos de diferentes locais da cidade. A análise de sua manifestação

espacial é alçada na perspectiva da gênese, estruturação, cotidiano e

consequentemente formação de uma paisagem simbólica.

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2 – Metodologia para o estudo

Os passos iniciais desta pesquisa centralizam-se na leitura da bibliografia

e de outras fontes que ainda estão em fase de trabalho. Esta busca de referências

se consubstancia através de leituras, fichamentos e resenhas para uma maior

sistematização do referencial teórico, que oferecem parâmetros iniciais para

alimentação da hipótese do trabalho. A leitura se divide em três grupos:

compreensão do espaço sagrado, descrição da igreja e interpretação espacial e

social do fenômeno. Estes grupos respaldam e encaminham os outros passos da

pesquisa.

A fundamentação teórica da pesquisa é fundamental nessa etapa, pois

nos direciona para uma forma de interpretar o objeto sem perder de vista os

conceitos chave para a Geografia. Temos um direcionamento tanto no entendimento

sobre a produção espacial como as relações sociais envolvidas nele. A descrição do

lugar observado se pauta nessas leituras iniciais como uma maneira de corroborar a

metodologia aqui utilizada. Aqui cabem as compreensões e discussões de forma,

estrutura, função e processo, conforme Milton Santos (1982). A forma que uma

igreja possui e sua função perante a sociedade. Como essa forma influencia na sua

função ou até que ponto a função justifica a forma.

Com o constructo teórico realizado, seguem-se visitas in loco, para

observar o fenômeno identificado pela manifestação de um fenômeno que se

espacializa, aqui representado pela IURD, momento este que podemos realizar a

observação de uma forma simbólica espacial. Para o campo utilizamos o método

exploratório, que “são estudos exploratórios que têm por objetivo descrever

completamente determinado fenômeno, como, por exemplo, o estudo de um caso

para o qual são realizadas análises empíricas e teóricas.” (LAKATOS, 1996, p. 188).

O registro de campo contempla imagens fotográficas, visitas ao templo,

configurando espacialidades e temporalidades distintas, com o intuito de verificar a

vivência e o comportamento dos fiéis naquele templo sagrado.

Por meio desta observação, espera-se extrair informações que

documentos oficiais não permitem analisar. As fotos e textos informativos são

aparentes e geralmente os dados são estatísticos, porém a visita em campo, com

momentos de interação com os fiéis, permite analisar as reações e emoções

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sentidas naquele lugar. Esses sentimentos e sensações são descritas e anotadas

após um período de visitas e convivência com o grupo.

Para o entendimento do fenômeno em questão, cercaremo-nos dos

aportes teóricos calcados na Fenomenologia para estabelecer o método de pesquisa

com a finalidade de interpretar os dados obtidos com a observação in loco. Segundo

Rocha (2003), “A Fenomenologia é o campo de análise da essência dos fenômenos,

tantos materiais (naturais), quanto imateriais (culturais, ideais).”. É por este método

que pretendemos ter uma visão singular do objeto, analisando não somente sua

aparência, mas também suas essências demonstradas pela paisagem e pelas

interações e percepções do lugar em análise. Também é útil este método para

percepção e compreensão dos discursos dados pelos entrevistados em campo, suas

impressões e sensações sobre o lugar e sobre as ações lá praticadas. Desse modo,

tomamos por base esse método para analisar o fenômeno que é o espaço sagrado,

representado pelo Templo Central da Igreja Universal do Reino de Deus em

Fortaleza-CE.

Além das visitas em campo, realizar-se-ão entrevistas com

administradores da instituição e fiéis que frequentam o templo central da IURD em

Fortaleza - CE. A maneira de execução das entrevistas serão semiestruturadas, pois

“combinam perguntas abertas e fechadas, onde o informante tem a possibilidade de

discorrer sobre o tema proposto.” (Boni & Quaresma, 2005). Essas entrevistas terão

como finalidade, analisar e interpretar geograficamente as impressões que os fiéis

têm daquele espaço. O público aferido será amostral, pois se trata de uma pesquisa

qualitativa, onde o importante é os detalhes expressos pelos entrevistados.

Em seguida, estabelecerá interpretação e relação dos dados com as

perguntas iniciais da pesquisa buscando respondê-las por meio dos resultados

obtidos com as entrevistas. Aqui se buscará dar substância e responder aos

objetivos propostos em nossa pesquisa. O método norteador, como afirmado antes,

será a fenomenologia, linha de pensamento que procura compreender os

fenômenos observados, no qual o sujeito é quem descreve o objeto (Spósito, 2004).

Isto permitirá manter foco em descrever, analisar, pontuar, e interpretar uma

manifestação que ocorre no espaço geográfico. As entrevistas nos fornecerão

elementos para que possamos compreender a relação entre os sujeitos e o espaço

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sagrado, possibilitando entender o objeto apontado pelo pesquisador e assim obter

considerações sobre o assunto.

A indagação principal está focada para a ideia de como se organiza o

espaço sagrado na Igreja Universal do Reino de Deus; quais elementos compõem o

espaço sagrado dessa igreja; como o espaço sagrado modifica o cotidiano dos fiéis

e; quem são os atores sociais que participam da produção do templo.

3 – Discussão

Para responder as inquietações da presente pesquisa, nossa bibliografia

se embasa primeiramente na compreensão do método fenomenológico, que diz

respeito à análise da essência do fenômeno (Rocha, 2003). Criado por Edmund

Husserl, a Fenomenologia é “ir ao encontro das coisas em si mesmas” (HUSSERL,

2008, p. 17). Ou seja, é um método de investigação que visa conhecermos de forma

qualificada o objeto de nossa pesquisa, um mergulho na capacidade de ver aquela

manifestação como resultante das relações de vivência entre as pessoas que se

materializaram por meio de práticas, tradições, comportamentos, paisagens ou

discursos.

Dentre os autores que buscam a perspectiva fenomenológica, destaca-se

Merleau-Ponty, que parte do pressuposto de que o corpo é a chave para a

compreensão, isto é, as essências se estudam pela percepção (Souza, 2013). Para

Merleau-Ponty “o corpo é um eu natural e como que o sujeito da percepção”

(MERLEAU-PONTY, 2006, p. 278). Portanto, deve-se analisar o objeto pela

percepção, e este é mediado pelo corpo como um elemento conector entre o sujeito

e o objeto. Desta percepção se compreende o fenômeno, o modo que se apresenta.

Como nosso objeto é um fenômeno religioso, compreendemos que nossa

percepção se molda no entendimento de que ele faz parte de um conjunto de

valores admitidos pelo sistema econômico vigente que perpetua certas concepções

de visão de mundo e reprodução do sistema. Durkheim em seu livro “Elementos de

uma vida religiosa” nos coloca que a religião e suas cerimônias cumprem um papel

social, apresentação várias pessoas coletivamente em uma celebração. Estes atos e

rituais se passam em um lugar no espaço, daí ser de interesse à Geografia.

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O ramo da Geografia que tem apreciado os estudos na área da religião é

a Geografia Cultural. Nas palavras de Paul Claval, temos nesta abordagem que

A Geografia Cultural está associada às experiências que os homens têm da

terra, da natureza e do meio ambiente, estuda a maneira pela qual eles os

modelam para responder suas necessidades, seus gostos e suas

aspirações e procura compreender a maneira como eles aprendem a se

definir, a construir sua identidade e a se realizar. (CLAVAL, 2006. p. 89).

Diante disso, a geografia cultural possui um papel social e uma

empreitada a corresponder. Para Cosgrove (2003, p. 103) “a tarefa da geografia

cultural é apreender e compreender essa dimensão da interação humana com a

natureza e seu papel na ordenação do espaço”. Portanto, objetiva-se a concepção

da dimensão cultural no espaço geográfico.

Destarte, entendemos a Igreja Universal do Reino de Deus como uma

espacialidade por meio dos sentidos, uma visão humanista da realização do espaço.

Isso por que a “se a geografia cultural se dedica à experiência que os homens têm

do mundo, da natureza e da sociedade, ela deve partir daquilo que os sentidos lhes

revelam” (Claval, 2006). É pelas sensações que as pessoas captam da realidade

que elas imprimem suas percepções. Isso faz da geografia cultural “subcampo

específico da geografia [...] focalizada na análise dos significados que os diversos

grupos sociais atribuem aos objetos e ações em suas espaçotemporalidades.”

(Corrêa, 2003). Os significados que elas extraem dos objetos e formas simbólicas

construídas pelas pessoas, assim como é em um templo religioso.

Essas formas simbólicas são construídas no espaço, tendo nele um

elemento participante dessa construção. Por isso partimos do conceito de espaço

para chegar ao entendimento de espaço sagrado. A seguir delimitaremos o conceito

espacial, o sagrado e suas manifestações para chegarmos o conceito de espaço

sagrado que a IURD representa.

O templo da Igreja Universal do Reino de Deus – Templo Central de

Fortaleza – CE é resultado das relações sociais existentes no espaço, no qual este

também se apresenta produtor espacial, pois influencia e afeta o modo de relação

das pessoas. Faz parte, portanto de uma da formação socioespacial (Santos, 1992).

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Para Milton Santos (1997) o espaço geográfico constitui "um sistema de

objetos e um sistema de ações" que:

é formado por um conjunto indissociável, solidário e também contraditório,

de sistemas de objetos e sistemas de ações, [grifo nosso] não

considerados isoladamente, mas como um quadro único na qual a história

se dá. (SANTOS, 1997. p. 39)

A Igreja Universal do Reino de Deus resulta desse sistema de objetos,

formados por elementos simbólicos e pelos sistemas de ações, que são as relações

de vivências e manifestações socioespaciais. Esse conjunto indissociável forma um

quadro único, materializando-se no templo como espaço simbólico.

O diferencial que o templo tem em relação a outros lugares é a sua

sacralidade. Pois “o sagrado manifesta-se sempre como uma realidade de ordem

inteiramente diferente da das realidades „naturais‟.” (ELIADE, 1969). Essa realidade

se manifesta, revela-se por meio de atos específicos. Essa manifestação chamamos

de hierofania. Eliade a coloca como “algo que se nos mostra”. O templo da IURD é

sagrado pelo fato de se revelar aos seus frequentadores, e estes “ao aceitar a

hierofania, experimenta um sentimento religioso em relação ao objeto sagrado”

(ROSENDAHL, 1996). Há uma aceitação de que naquele lugar se manifesta algo,

diferente do que ele vive no cotidiano.

Essa diferença é representada pelo par sagrado-profano, que são

opostos, mas complementares. Nas palavras de Rosendahl (1996) “o sagrado e o

profano se opõem e, ao mesmo tempo se atraem. Jamais, porém se misturam”. Ou

seja, há uma percepção que se a hierofania se manifesta, há um profano que se

opõe, daí se ter um local que centraliza as ações hierofânicas. O templo religioso se

faz presente de uma centralidade, torna-se um ponto fixo absolluto (Eliade, 1969).

Assim, o espaço onde ocorre a hierofania é um espaço sagrado. Neste

local o homem “se encontra”, vivendo uma realidade diferente. Em seu livro Espaço

e Religião: uma abordagem geográfica, Rosendahl esclarece que

o espaço sagrado é um campo de forças e de valores que eleva o homem

religioso acima de si mesmo, que transporta para um meio distinto daquele

no qual transcorre sua existência. É por meio de símbolos, dos mitos e dos

ritos que o sagrado exerce sua função de mediação entre o homem e a

divindade. E é o espaço sagrado, enquanto expressão do sagrado, que

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possibilita ao homem entrar em contato com a realidade transcendente

chamada deuses, nas religiões politeístas, e Deus, nas monoteístas.

(ROSENDAHL, 1996. p. 30)

A IURD ocupa um papel de lugar sagrado. Costa (2011, p. 35) aponta que

“O lugar sagrado é um mundo pleno de significados, sendo também um espaço

mítico que responde com sentimento e imaginação às necessidades humanas

fundamentais.”. As pessoas sentem necessidades e desejos que são

correspondidas pelas visitas ao templo e as práticas litúrgicas, dando sentido aos

símbolos que ali existem, e esses, por sua vez, renovam e alimentam as

necessidades das pessoas.

Isso é alentado pelos atores que atuam neste espaço. Isto é,

a instituição religiosa referenda um corpo sacerdotal que possui o

monopólio das coisas sagradas apoiando-se em princípios de visão

relacionados às disposições de crença, as quais, por sua vez, orientam as

representações que revigoram esses princípios. (GIL FILHO, 2008. p. 50).

Este corpo sagrado exerce uma orientação simbólica, juntamente com a

manifestação do sagrado e, completando, a experiência dos fiéis ao frequentar o

templo. Estes são os atores que fazem da IURD um lugar sagrado.

O lugar sagrado produzido espacialmente pela relação do fiel da IURD

com o lugar sagrado se concretiza também pelos geossímbolos ali criados. Essas

representações simbólicas revestem-se de um poder que gera um interacionismo

entre as formas espaciais e o sujeito (Costa, 2009). Ele ressalta as formas

simbólicas espaciais, ou seja, a formação de geossímbolos que fazem parte da

formação de lugares, por meio da atribuição de significados no espaço considerado

real para o homem religioso.

Portanto, temos o Templo Central de Fortaleza da Igreja Universal do

Reino de Deus um local onde a sacralidade está inserida por meio da delimitação

espacial do lugar, intensificada pela sua representação simbólica, a partir de uma

hierofania ali presente, que se manifesta por meio dos atores envolvidos com aquele

espaço sagrado. Entretanto, podemos ainda avançar mais na discussão que por

hora ainda se encontra em andamento.

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4. Resultados

Os símbolos existentes na igreja são carregados de significados que só

podem ser recebidos a quem frequenta o templo e participa da hierofania. Esses

símbolos são percebidos em momentos distintos, quando o fiel busca aquele lugar

sagrado. Primeiramente há a grandiosidade das formas do próprio templo, onde há

uma clara limitação de onde termina o espaço profano e começa o espaço sagrado.

Esse limite é ressaltado com o nome da igreja, as escadarias e o fino acabamento

das colunas e portas, fazendo que o fiel realmente se transfira do cenário urbano

para um lugar cósmico, onde ele pode transpassar.

Em segundo momento temos os símbolos dentro do templo. A primeira

sensação é de grandiosidade, pois é um local para muitas pessoas sentadas, onde

elas terão o conforto no tempo sagrado que ali ocorre. Na parte do altar é onde se

localiza os símbolos de maior expressão: o púlpito, dois telões para facilitar a visão

de quem se senta mais afastado do altar e os adornos de fundo em vidro trabalhado

em estilo gótico e acima os dizeres “Jesus Cristo é o Senhor”. Estes elementos dão

sentido ao lugar, é o que realmente compõem a sacralização do espaço, pois

transmitem uma sensação de potência e a quem está lá coparticipante dessa

potência, pois ele recebe o contato com o “Senhor” por meio da adoração, isto é, da

hierofania.

E um terceiro momento, temos a figura do sacerdote como aquele que

legitima a ação dos fiéis e propicia a mediação entre o transcendente, invisível, mas

sentido, com o real, o visível, o espaço sagrado e os fiéis que renovam a sacralidade

a cada momento de encontro.

Esses atributos conferem uma singularidade à sua forma simbólica

espacial da Igreja Universal do Reino de Deus. O local deixa de ser apenas uma

relação de observador e objeto, mas passa a ser atuante direto na sua

espiritualidade, pois mesmo que a divindade se mostre onipresente, há locais

específicos para sua manifestação e esses lugares são percebidos como algo além

de receptáculo, mas elemento fundante de uma renovação mental para aquele que

se desloca para o cotidiano profano.

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5 – Considerações finais

A partir de leituras, observação e conhecimento prévio, objetiva-se que a

Igreja Universal do Reino de Deus é um local de refúgio social, onde as relações

sociais se desviam da situação vivente do cotidiano.

Nos espaços sagrados há uma separação do vivido cotidiano com um

vivido desejado. As pessoas que frequentam a IURD usufruem de um lugar místico,

mas também real, uma vez que está concretizado por uma construção e

demarcação de espaço, sendo distinto o sagrado do profano. O místico se torna

presente por meio da hierofania, que é o “ato da manifestação do sagrado”

(Rosendahl, 1996), algo que se revela pelo sagrado que está ligado ao lugar onde é

praticada.

No objeto em análise, pressupõe-se que os seus frequentadores

percebem esse espaço sagrado como centro de força e ajuda para combater as

adversidades sociais produzidas no espaço profano. A sacralização desse espaço o

torna imponente e o transforma num local de esperança, enquanto a hierofania se

manifesta.

A Igreja Universal do Reino de Deus é um centro de poder que se

manifesta no meio de um espaço caótico (nessa concepção, sem ordem, sem um

ponto fixo absoluto, conforme Eliade) e fluente de pessoas oferecendo preencher o

vazio gerado pelas relações profanas. Essa instituição se presente na paisagem

como um elo entre o homem e o transcendental.

No entanto, a pesquisa ainda se encontra em andamento e sem maiores

conclusões. Ainda há procedimentos que devemos realizar no trabalho que nos

auxiliarão na obtenção de mais qualificadas considerações, uma vez que a proposta

do presente trabalho é ir além das aparências e buscar a compreensão das

essências. Porém, certamente haverá maiores esclarecimentos com cronograma

totalmente concluído.

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