escritos sobre o brasil, o direito, as cidades e as religiões

110

Upload: claudio-henrique-de-castro

Post on 22-Jul-2016

222 views

Category:

Documents


4 download

DESCRIPTION

 

TRANSCRIPT

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito,as Cidades e as Religies

    Claudio Henrique de Castro

  • Este livro foi diagramado e produzido sob demanda, uma encomenda do autor que detm todos os direitos de contedo, comercializao, estoque e distribuio dessa obra.

    Projeto grficoJssica Juliatto da Rocha // designer

    DiagramaoJssica Juliatto da Rocha // designer

    Reviso gramatical tcnicaAdo Lenartovicz

    ISBN: 978-85-912570-6-5

    Ficha catalogrfica elaborada por Maury Antonio Cequinel Junior Bibliotecrio CRB9/896

    Castro, Claudio Henrique deC355

    Escritos sobre o Brasil, o direito, as cidades e as religies./ Claudio Henrique de Castro. Curitiba : Edio sob demanda, 2015.

    110 p.

    1. Direito 2. Cidades 3. Religio 4. Poltica 5. Eleio 6. Corrupo7. Transporte Coletivo I.Ttulo

    CDU 34

  • P R E F C I O

    Escrever um prefcio sempre um desafio. Pela origem etimolgica da palavra, pre-

    fcio formada por prae-, antes, mais fari, falar. Quer dizer o que falado antes. Assim,

    a se cumprir integralmente o seu objetivo, significa ter amplo conhecimento do que vai se

    exposto a seguir e explicar, de forma a facilitar a leitura, do que trata a publicao.

    Nem sempre fcil se explicar o Direito e suas novas vertentes que so desenhadas a

    cada dia, acompanhando a evoluo da sociedade e, em especial, da tecnologia.

    Falar do Direito, normalmente enveredar por termos complexos, buscar expresses

    em latim, se estender ao longo de pginas e pginas, mostrar conhecimento do vernculo.

    Felizmente para mim, que tenho conhecimento superficial da cincia por fora da

    prtica jornalstica de mais de 40 anos, no o caso de mais esta publicao do professor e

    advogado Cludio Henrique de Castro.

    Como em seus livros anteriores, fruto de amplo conhecimento da matria e de uma

    experincia que se acumula num extenso currculo, o autor trata de temas diversos do Di-

    reito com a fluidez necessria para ser entendido pelo leitor comum de jornal ou das pginas

    da Internet, onde alis publicou vrios deles.

    Sem deixar de se referenciar ao que preveem os textos legais, Castro analisa com

    fluncia temas da atualidade poltica brasileira, assuntos polmicos desarmamento, ped-

    gio urbano, dentre eles fatos da cultura do brasileiro, como o famoso jeitinho e at a po-

    lmica extradio do ex-diretor do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato. Neste caso, o autor

    foi o primeiro a prever, com expressiva antecedncia, que o governo italiano promoveria a

    extradio em artigo publicado no site www.paranaextra.com.br.

  • Trata-se, portanto, de uma obra muito atual, de temas que fazem parte de nosso

    cotidiano, alguns nos afetando de forma direta, onde a facilidade de interpretao um

    dos pontos fortes.

    sim, um livro sobre o Direito. Mais ainda: uma publicao que d direito a qualquer

    cidado entender facilmente e refletir sobre uma realidade que est prxima a ele e que,

    num primeiro momento estampada numa manchete da imprensa, pode parecer distante

    embora no instante seguinte passe a fazer parte de seu dia a dia.

    Uma boa e fcil leitura,

    Nilson PohlJornalista

  • S U M R I O

    O que o Brasil? 11

    Procura-se 12

    As Abolies que podem ser feitas no Brasil 13

    O homo sapiens corruptus brasiliensis 15

    O Brasil politicamente volvel 17

    O jeitinho brasileiro 19

    A proteo jurdica das promessas de campanha 21

    O que o Brasil? 23

    A nuvem do impeachment paira sobre a Repblica brasileira 25

    Alguns vestgios da Monarquia no Brasil 27

    Breves notas sobre o Anurio Brasileiro de Segurana Pblica 2014 30

    Das razes para votar e ser votado 32

    A misria das propostas eleitorais no Brasil 34

    O Brasil e o Futuro da Democracia 37

    O poder das frases de efeito e o futuro do Brasil 39

    As coincidncias entre o Futebol e o Estado Brasileiro 41

    A Copa do Mundo nossa 43

    Reviso histrica dos heris de 1964 45

    Algumas razes dos rolezinhos brasileiros 47

    As razes dos reis 48

    Algumas consideraes sobre a delao premiada 49

    Breves comentrios sobre a extradio do Henrique Pizzolato 56

    O mensalo, as leis, o artigo e as aes dos magistrados no STF 58

    As leis e emendas constitucionais votadas no esquema do mensalo 60

    Sobre o Direito 63

    O Caso Bruno e a acusao sem corpo 64

    O vcio de iniciativa na jurisprudncia do STF 66

  • A ilegalidade do estatuto do desarmamento em face do referendo de 2005 68

    A epidemia do Ebola e o Direito Sade Pblica 72

    Breves comentrios sobre a nova lei do terceiro setor 74

    As inovaes da lei que fixa cotas em concursos 76

    Cidades e suas questes fundamentais 79

    A desintegrao da RIT e suas consequncias jurdicas 80

    Pedgio urbano, uma realidade prxima? 82

    As recentes alteraes do Cdigo de Trnsito estabelecidas pela Lei n 12.971/2014 84

    Consideraes a respeito do uso da Polcia Militar nos estdios de futebol 86

    A urgncia das blitzes em Curitiba 89

    A epidemia das mortes do trnsito nas estradas brasileiras 90

    Quanto vale o patrimnio histrico de uma cidade? 92

    As operaes-padro como forma de reivindicao 93

    Destruio anunciada 95

    Velozes e furiosos no trnsito brasileiro 96

    Sobre as Religies 99

    A Justia e o perigo da intolerncia religiosa 100

    O respeito liberdade religiosa 106

  • O que o Brasil?

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    12

    Procura-se

    21 maio 2015

    Procura-se para emprego imediato. Candidato (a) no precisa ter experincia, nem

    boa aparncia. Procura-se quem tenha nvel mdio, graduao ou ps-graduao, mas

    que saiba ler, escrever e compreender textos. Procura-se quem no fique o dia inteiro no

    whatsApp, internet, facebook e outras redes sociais no aparelho celular ou no computa-

    dor, principalmente quando estiver falando com algum, assistindo a uma palestra, atra-

    vessando a rua ou no trnsito dirigindo. Procura-se quem conhea e saiba usar as expres-

    ses: por favor; bom dia; boa tarde; boa noite; em que posso ajud-lo e saiba atender telefone

    e dizer: al, bom dia, em que posso ajud-lo, at logo. Procura-se quem seja discreto e no

    fique de fofoca no ambiente de trabalho e que, principalmente, trabalhe, cumpra o horrio

    e faa as coisas com alegria, presteza, responsabilidade e satisfao. Que no seja corrupto,

    que seja honesto e tenha carter.

    Os benefcios so: tima remunerao, plano de sade completo, plano de aposenta-

    doria, estabilidade, possibilidade de crescimento na carreira, benefcios famlia, ambien-

    te de trabalho excelente, carga horria flexvel e grande incentivo aos estudos. O governo

    de nosso pas possui um baixo ndice de corrupo, alta competncia em administrar as

    finanas pblicas, um poder Judicirio clere, estabilidade governamental e economia

    prspera e em crescimento.

    Procura-se onde esto estes candidatos e onde se localiza este pas.

  • 13

    O que o Brasil

    As Abolies que podem ser feitas no Brasil

    13 maio 2015

    O Brasil e os negros comemoram hoje, 13 de maio, os 127 anos da Abolio da Escravatura.

    poca, no aconteceu a reforma agrria que, naquele momento histrico, faria a

    plena insero dos negros na vida econmica do pas.

    Na dcada de 40 do sculo passado tivemos a ideologia do branqueamento, exacerba-

    da por Getlio Vargas e seu flerte com o nazismo e as ideologias racistas europeias justa-

    mente no momento que surgiu a classe mdia no Brasil.

    Atualmente, ainda em sua esmagadora maioria, as telenovelas brasileiras colocam

    os negros em papis secundrios e serviais, numa forte construo preconceituosa contra

    este majoritrio segmento racial.

    Sem os negros no teramos as riquezas dos ciclos econmicos, da msica popular; da

    culinria e, acima de tudo, da alegria no rosto dos brasileiros (Darcy Ribeiro).

    Diante disso, relacionamos aqui algumas abolies que se podem e devem fazer no

    Estado brasileiro:

    1. A abolio da lentido dos processos cveis e criminais que atrasam o julgamento

    de milhares de causas;

    2. A abolio da impunidade nos delitos de trnsito e nos delitos do colarinho branco;

    3. A abolio do jeitinho e da malandragem, com uma nova realidade tica e moral;

    4. A abolio da corrupo escancarada no financiamento das campanhas eleito-

    rais e das relaes do toma-l-d-c entre o poder Executivo e o Legislativo em

    votaes importantes;

    5. A abolio da fome, dos surtos epidmicos (Dengue e outras); do dficit habita-

    cional e da no universalizao do ensino em todos os nveis;

    6. E, para finalizar e principalmente, a abolio dos preconceitos: contra os negros e

    pardos; contra as religies afro-brasileiras; contra os pobres; contra os velhos; con-

    tra as mulheres; contra os obesos; contra os diferentes, as pessoas portadoras de

    necessidades especiais e os mais variados grupos tnicos: amerndios, bolivianos,

    haitianos e por a afora.

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    14

    No futuro, poderemos comemorar plenamente o dia 13 de maio, consagrador da igual-

    dade, sem distines de qualquer natureza, como prev o art. 5 da Constituio Brasileira.

    Mas h um longo caminho para ser trilhado.

  • 15

    O que o Brasil

    O homo sapiens corruptus brasiliensis

    14 abr. 2015

    A Criminologia estuda os perfis dos autores e dos seus respectivos delitos. Investiga-

    dores experientes, sem leitura nenhuma de manuais, conseguem traar o perfil de crimino-

    sos com profundidade, sem sequer ter lido qualquer linha sobre o tema.

    Assim, estupradores teriam desvios de condutas caractersticos que os identificariam,

    os pedfilos teriam brinquedos em casa ou entenderiam o universo infantil, os viciados em

    drogas, certas caractersticas fsicas decorrentes do uso das drogas, olheiras profundas. Os

    cleptomanacos, aqueles que cometem pequenos furtos, normalmente passaram por trans-

    tornos psicolgicos.

    Os psicopatas so frios, sem sentimentos, inteligentes, dissimulados e com um perfil conser-

    vador; quase sempre sofreram na infncia algum trauma terrvel que lhes retirou a sensibilidade.

    Pelas recentes, ou nem tanto, notcias de corrupo a que a nao assiste, perplexa,

    anotamos algumas caratersticas que podem ser percebidas em sujeitos que podemos cha-

    mar de homo sapiens corruptus brasiliensis.

    Vamos a uma breve anlise dessa nova descoberta cientfica.

    Possuem um perfil quase sempre cativante, mas h excees; em momentos difceis

    sempre sorriem, fazem de conta que no so parte do problema; esto incumbidos de resol-

    ver as crises, mas nunca revelam objetivamente como e quando iro fazer isto. Sabem fazer

    pequenos discursos e normalmente falam por ltimo em solenidades.

    Vivem e respiram promessas, so utpicos, dizem que algum dia haver uma mu-

    dana e repetem que esto fazendo de tudo para que isto ou aquilo melhore.

    Possuem algumas frases de efeito sobre a moralidade e a tica, que cabvel em

    todas as ocasies. Alguns discursam de improviso sobre a austeridade e sempre so contra

    a corrupo e os corruptos.

    Uma caracterstica notvel desses personagens a de ter na memria alguns ditados

    apropriados para a cada ocasio.

    Ainda, de que, independente da sua formao cultural ou educacional eles conhecem

    todas as garantias constitucionais do processo penal, tais como a presuno de inocncia, o

    direito de ficar em silncio e o direito ao contraditrio e da ampla defesa.

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    16

    Suas justificativas ou defesas so da negativa geral de tudo que se lhes impute e que

    todos sempre fizeram assim h anos ou que o sistema assim ou, ainda, que normal.

    Se ainda no foram descobertos, afirmam que esto verificando o problema, que vo

    determinar investigaes rigorosas e acima de tudo iro afastar os envolvidos. Apesar disto,

    so hbeis conciliadores de interesses.

    Outro trao marcante o de que no sabem de nada; tudo lhes passa despercebido e que

    realmente ficam chocados (as) com os acontecimentos e surpresos com as denncias em curso.

    Organizados em agremiaes, so muito inteligentes em gerir seus interesses e

    essencialmente so nutridos por recursos advindos do povo.

    Finalmente, o homo sapiens corruptus brasilienses surge em decorrncia das pradarias

    da impunidade, dos campos da incompetncia e das serras de omisso.

    H mais de quinhentos anos habitam a terra brasilis e recentemente comearam a se preo-

    cupar. Ainda no esto em extino pela sua grande populao que infesta o pas, mas a caa

    predatria, autorizada legalmente, pode diminuir sensivelmente a populao desses seres.

  • 17

    O que o Brasil

    O Brasil politicamente volvel

    09 abr. 2015

    No Presidencialismo normal, o Poder Executivo o que executa e o Poder Legislativo

    quem legisla.

    Agora, no Presidencialismo la brasileira o Legislativo submisso ao Presidente em

    troca de verbas oramentrias e de nomeaes em cargos de primeiro e segundo escales.

    Assim, no Brasil, o Executivo amigo do Legislativo com a famosa barganha de favores, o

    toma-l-da-c, do consagrado para voc poder sorrir tem que me fazer sorrir.

    No Parlamentarismo normal, o Poder Legislativo quem manda e o Poder Executivo

    submisso ao Parlamento.

    Agora, o Parlamentarismo, quando vigeu no Brasil, teve vida curta: foi institudo

    para dar um golpe branco e para barrar a posse do ento vice-presidente Joo Goulart que

    substitura Jnio Quadros; pouco depois tivemos o golpe de 1964.

    Neste momento de denncias de corrupo e do enfraquecimento dos ndices de po-

    pularidade da atual Presidenta, qual sistema est vigendo de fato no pas?

    Os ministros de Estado parecem estar numa sala de aula de Jardim de Infncia, onde

    h uma roda das cadeiras e, quando a professora desliga a msica, todos tm que se sentar, e

    sempre sobram um ou dois em p que tem que sair.

    Sem uma articulao poltica e apoio, o Poder Executivo fica sentado na calada com

    o chapu arriado esperando as determinaes do Poder Legislativo.

    No fundo, nunca houve uma barganha tica; as trocas sempre so compromissadas a

    favores, a desmandos e a liberaes milionrias de verbas.

    No quadro atual o Poder Legislativo demite e nomeia ministros, nomeia presidentes

    das estatais, devolve medidas provisrias ao Palcio do Planalto e principalmente, manda na

    agenda poltica do Brasil por meio da pauta de votaes.

    O poder do Executivo resume-se ao poder de veto que pode ser derrubado por vo-

    tao qualificada no Congresso Nacional, e diante da atual e vertiginosa perda da maioria

    naquelas casas legislativas, Senado e Cmara, o Poder Executivo est combalido e frgil para

    sequer dar os rumos do pas.

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    18

    No h nenhuma barganha; h sim, um grande refm chamado Presidncia da Re-

    pblica. H factoides, aqui e ali, h pacotes grandiloquentes que no mudam nada e no se

    direcionam a lugar algum.

    E o pior, a gua est batendo nos joelhos da economia e subindo.

    Quais as razes deste estado de coisas? A profunda perda da confiana causada pelos

    escndalos formidveis que imantam os principais personagens do Executivo e do Legislativo.

    A perda da confiana neste presidencialismo com feies parlamentaristas, ou des-

    te presidencialismo la brasileira, importa uma soluo muito simples e constitucional: a

    cassao e o impedimento de todos os envolvidos, contudo, processos de cassao e de im-

    pedimento foram concebidos para no funcionarem de forma clere e dessa forma o povo

    assiste corroso dos poderes sem entender o que realmente est acontecendo.

    Afinal, quem est mandando no Brasil? Uma Presidente enfraquecida e com seus

    partidos de apoio roendo as cordas ou os dois personagens ensopados de denncias que se

    julgam os Rasputins da Repblica?

    Em resumo, estamos politicamente volveis, como disse Machado de Assis na obra:

    O Alienista.

  • 19

    O que o Brasil

    O jeitinho brasileiro

    07 abr. 2015

    O jeitinho est na alma e no sentido do Brasil, pela plasticidade do perdo ao pecado

    da tica catlica, pela colonizao portuguesa, pela poltica que ajusta solues sempre con-

    ciliatrias e, essencialmente, pela corrupo entranhada no Estado brasileiro.

    Onde h abundncia de leis, h corrupo, pois, quando as leis no so cumpridas,

    elas precisam ser repetidas e aperfeioadas. Em Roma foi assim: as leis eram republicadas

    para se fazerem cumprir.

    Burlar as leis a vida das elites polticas. Arrumar brechas e escapatrias para o es-

    casso cumprimento das normas no Brasil faz parte da vida republicana.

    Transgredir as normas de trnsito, aqueles vai que d, s por um instante, bebi,

    mas estou bem praxe. H toda uma tica que permeia os consagrados bordes: voc

    sabe com quem est falando; quem tem padrinho no morre pago; para os amigos tudo,

    para os inimigos os rigores da lei; ou, ainda, para os amigos a jurisprudncia.

    Sempre h uma possibilidade, um jeitinho para resolver os problemas dos aliados, dos

    amigos, dos achegados. A lgica do jeitinho pressupe laos de amizade ou de parentesco.

    Aos desconhecidos a fila, aos amigos a rapidez no procedimento burocrtico. Dir-se-ia que o

    Brasil o pas dos despachantes, sempre h um atravessador que conhece os meandros do

    Estado e vai facilitar as coisas.

    Neste sentido, todos que financiam as campanhas polticas garantem a si as portas

    abertas para as conversas sobre obras, servio tudo que alimente o sistema de manuteno

    do poder e as reeleies sucessivas. O desvio de dinheiro pblico uma pequena e necess-

    ria consequncia para a chamada caixinha de campanha, o percentual para a campanha,

    a ajuda, o presentinho.

    H, sem dvida, uma especial curvatura das leis, e muitas vezes a ausncia delibera-

    da de normas, para se propiciar o combate a certos procedimentos institucionalizados de

    corrupo e de privilgios.

    Dir-se-ia que a corrupo do Estado est historicamente institucionalizada pelas leis e

    o ganho de certos grupos econmicos est cada vez mais protegido pela ausncia de regula-

    o e leis anticorrupo. Pacotes so anunciados, mas a reforma poltica nunca acontecer.

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    20

    A prescrio processual penal e as pequenas-grandes falhas processuais so as gran-

    des aliadas do jeitinho e da impunidade; todo processo judicial guarda uma pequenina se-

    mente de nulidade processual, tem-se apenas que descobri-la. como aquele gro de feijo

    da fbula que cresce at as nuvens.

    As penas, os procedimentos e as medidas processuais sobre delitos de corrupo so

    fracos e insuficientes, e esto longe dos padres penais dos pases desenvolvidos. Por outro

    lado, h um profundo esquecimento eleitoral dos escndalos que se sucedem em todas as

    esferas de poder e de governos.

    H a ausncia ou uma grande insuficincia de fora jurdica; as leis so insuficientes

    e todas discutveis nos tribunais.

    O cdigo jurdico se subordina ao cdigo poltico, e neste ltimo impera a malandra-

    gem. A paternidade desse sistema est nos partidos polticos, o ltimo refgio do coronelis-

    mo no Brasil, com seus caciques, donatrios e senhores feudais.

    As elites polticas comeam a se incomodar com as investigaes de seus privilgios

    institucionalizados; alguma coisa, ainda que pequena, est mudando.

    Coloca-se a mo por cima dos lbios quando alguma cmera pode estar filmando.

    Constroem-se salas prova de escutas. Nenhuma palavra dita por telefone ou escrita no

    correio eletrnico. Nenhum torpedo remetido. Conversas reservadas em restaurantes,

    nem pensar, pois h o perigo de escutas ambientais.

    O jeitinho tem novas faces diante do medo das investigaes em curso.

    Os governantes nunca sabem de nada e nunca sabero, eles sempre esto alienados de tudo

    o que acontece a sua volta. As responsabilidades jurdicas e polticas nunca sobram para eles.

    As sucesses de escndalos evidenciam que no se pode desenvolver o Brasil, em ter-

    mos econmicos e ticos, onde prevalece a tica do jeitinho.

    O Estado brasileiro corrupto, e h quinhentos anos vige o patrimonialismo, onde h

    a prevalncia dos interesses particulares sobre os interesses pblicos.

    H uma parcela da populao que luta contra esta corrupo histrica e ainda se

    indigna. desse grupo de pessoas que pode surgir uma proposta de refundao legal e

    tica no pas.

  • 21

    O que o Brasil

    A proteo jurdica das promessas de campanha

    12 fev. 2015

    Pesquisas recentes mostram que a vida em sociedade impe que as pessoas mintam

    no seu cotidiano. As mentiras dirias so, at certo ponto, inofensivas.

    Quando as mentiras ou falsidades, envolvem obrigaes contratuais, por exemplo, o

    direito pune os mentirosos, ou os descumpridores de seus deveres de boa-f e lealdade con-

    tratual, a regra das tutelas no plano civil e do consumidor.

    Sorrimos quando no queremos sorrir, e a sociedade impe ritos que obrigam certas

    atitudes que geram uma teia de falsetes a que todos se submetem.

    A mentira, num sentido geral, foi um poderoso instrumento no desenvolvimento hu-

    mano, pois a busca pela alimentao por grupos de caadores garantia por meio de embos-

    cadas e trapaas a captura das presas que serviram para a sobrevivncia humana.

    O sistema poltico garante e preserva os cidados das mentiras eleitorais na medida

    em que os candidatos, por meio dos partidos polticos cumprem as suas agendas de campa-

    nha, tal qual as enunciaram e convenceram o povo.

    Em resumo, tudo que dito nas campanhas eleitorais, as medidas anunciadas, as pro-

    messas de campanha e todo o rosrio de aes prometidas vinculariam, em teoria, as aes

    e as propostas dos Poderes Executivo e Legislativo.

    Ocorre que no poucas vezes as promessas eleitorais evaporam-se e novos discursos

    se constroem aps as vitrias eleitorais, alterando substancialmente o contedo original das

    promessas de campanha.

    No se tem na legislao brasileira um recurso jurdico para o eleitorado utilizar,

    quando for coletivamente enganado, isto , quando houver um flagrante descompasso entre

    o discurso da campanha e a prtica do exerccio dos Poderes Legislativo e Executivo.

    Nos Estados Unidos tem-se o recall poltico, ou a rechamada, isto , a possibilidade ju-

    rdica de nova avaliao eleitoral que ocasiona a queda dos polticos mentirosos, corruptos,

    incompetentes ou omissos.

    Assim, sem mecanismos de retirada dos membros do Legislativo e do Executivo,

    tem-se que o mandato o exerccio da irresponsabilidade por prazo determinado.

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    22

    Propostas eleitorais, vagas e gerais, geram um baixo comprometimento de atuao

    durante os mandatos.

    Para proteger o eleitorado temos apenas a figura do impeachment de alguns cargos de

    relevo na esfera federal e os crimes de responsabilidade, tambm regulados por lei federal.

    Restaria ainda a figura da renncia, ato personalssimo, que independe da vontade

    coletiva do eleitorado.

    A base legal que viabiliza as mentiras coletivas das promessas das campanhas elei-

    torais dos Poderes Executivo e Legislativo deve ser revista para se evitarem surpresas, me-

    didas abruptas e rumos absolutamente diferentes das promessas partidrias e de palanque,

    que tm constantemente ocorrido no Brasil.

    Somente uma profunda reforma poltica tornar possveis novos mecanismos de

    controle, pelo eleitorado frente aos Poderes Legislativo e Executivo, sobre os responsveis

    pelos discursos proferidos nas campanhas eleitorais.

  • 23

    O que o Brasil

    O que o Brasil?

    19 dez. 2014

    O Brasil tem n definies feitas por socilogos, historiadores, todo tipo de doutores,

    literatos, jornalistas e tantos outros que pensam em radiografar a alma do nosso pas.

    A brasilidade uma mistura que tem na sua composio o carnaval, o futebol, a m-

    sica, as comidas tpicas, as cachaas, o jogo de cintura e o jeitinho.

    E os valores morais e ticos, quais so os nossos preferidos?

    Numa palavra: o perdo.

    Em outra: o jeitinho.

    O perdo de tudo e a todos, o perdo que vem das entranhas do catolicismo, de todas

    as mazelas histricas que passaram e passamos. O perdo nos faz rir, nos faz chorar, nos traz

    a impunidade, nos traz o esquecimento dos escndalos que se sobrepem.

    Podemos construir uma nao vitoriosa? Podemos pisar na Lua? Podemos povoar

    Marte? Podemos colocar um satlite num asteroide? Sim, podemos.

    O que nos falta? Vergonha na cara, um Estado sem corrupo, um povo educado e

    cioso de progresso? Falta-nos ordem, falta-nos o progresso, falta-nos infraestrutura, falta-nos

    Educao de excelncia?

    Faltam-nos estadistas? Falta-nos um So Sebastio, que ir nos curar de todos os nos-

    sos males? Falta-nos a reflexo de aonde queremos chegar e de quanto representa a coletivi-

    dade prspera sobre as individuais?

    O Brasil um poltico empossado por uma medida judicial, com milhares de votos e

    com um mandado de priso pela Interpol?

    O Brasil a maior empresa brasileira repleta de contratos duvidosos e superfatura-

    dos? a preocupao com o 13 terceiro e as festas do final do ano e o Carnaval?

    O Brasil um sonho individual? Um sonho de no passar mais fome, de no ter priva-

    es, de conseguir chegar l, sabe-se l o que represente isso.

    Onde esto nossos sonhos coletivos? Na poltica? No Congresso Nacional? Nas leis e

    no Poder Judicirio? De algum dia se ter uma sociedade justa e democrtica?

    Um Brasil geogrfico, um gigante territorial, um todo constitudo pela maior biomas-

    sa e biodiversidade que o mundo conhece na Amaznia legal?

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    24

    Outro Brasil, o histrico, uma alternncia de imperadores, monarcas, ditadores civis

    e militares, num breve e curtssimo perodo de democracia.

    Finalmente, um Brasil, pas do futuro, que est por vir, e ainda no veio, e que deze-

    nas de geraes aguardam o seu despertar pujante.

    Ainda no sabemos o que o Brasil, mas sabemos que podemos fazer dele o que qui-

    sermos; basta-nos um projeto nacional de prosperidade, envolvido em valores ticos e morais.

  • 25

    O que o Brasil

    A nuvem do impeachment paira sobre a Repblica brasileira

    21 nov. 2014

    As recentes denncias do caso Petrolo que apontam para desvios de bilhes de

    reais da Petrobras, podem comprovar que os financiamentos dos candidatos ao Poder Le-

    gislativo e Executivo foram bancados pelas empresas que se beneficiaram regiamente das

    obras e servios, em esquemas fraudulentos.

    Esses fatos, se fossem precipitados antes das eleies de 2014 poderiam arrastar e

    comprometer diversos partidos e candidaturas. A verdade veio tona aps as eleies, de-

    pois de uma disputa eleitoral imprevisvel e acirrada.

    Pode-se comprovar que a vala do financiamento das campanhas passou por dinhei-

    ros obtidos em fraudes e corrupo; essa seria a grande e inevitvel concluso a que se che-

    garia a partir dos fatos apurados na operao Lava-Jato e na CPI da Petrobras.

    Poucas vozes bradam por uma profunda reforma poltica que encerre o ciclo perver-

    so do financiamento das campanhas pela corrupo de Estado.

    A alcunha de operador no nova na poltica brasileira. Ser chamado de opera-

    dor confere pessoa o status de ministro, de eminncia parda, de Cardeal Richelieu (o

    arquiteto do absolutismo em Frana), daquele que manda nos bastidores, por detrs das

    cortinas do poder.

    Com a titubeante economia, a maioria voltil no Congresso Nacional, o burburinho

    das ruas, somados s pginas dos jornais apontando nomes de relevo do governo federal, po-

    de-se desaguar num processo de impeachment. S que, desta vez, poder envolver tambm

    o Vice-Presidente, pela magnitude dos financiamentos eleitorais. O esquema que pode se

    desenhar parece ter beneficiado a maioria dos partidos eleitorais brasileiros.

    Cairia a Repblica, e elegeramos quem sobrasse.

    O argumento seria talvez a improbidade na administrao (art. 85, V, CF), depois da

    Presidente e do Vice-Presidente, assumiria o Presidente da Cmara dos Deputados (art. 80,

    CF), cujo cargo poderia ser ocupado novamente por um desafeto declarado da Presidente e

    as eleies, convocadas, noventa dias, depois de aberta a ltima vaga (art. 81, CF).

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    26

    Se os atuais mandatrios e eleitos conseguirem se descolar do Petrolo, ser outro

    cenrio, ainda com muitos desgastes; o inevitvel pode ocorrer.

    A caixa de Pandora foi aberta, e o pas poder pagar as consequncias de serem rele-

    vadas eventuais verdades inconvenientes, que muitos talvez soubessem ou apenas imagi-

    navam que existiam.

  • 27

    O que o Brasil

    Alguns vestgios da Monarquia no Brasil

    17 nov. 2014

    A famlia real foi exilada do Brasil aps a proclamao da repblica (1889)1, e ainda

    esto pendentes as desculpas oficiais do governo brasileiro aos seus descendentes, tamanho

    o trauma do exlio. Havia, naquele momento o medo do retorno da monarquia e a derrocada

    dos valores republicanos recm-implantados.

    Para lembramos os 125 anos do episdio, enumeramos alguns valores monrquicos

    seguidos de teses republicanas para refletirmos se ainda persistem traos monrquicos no

    Brasil ou se realmente estamos numa repblica:

    1. A perpetuao no poder, para assegurar a estabilidade do governo, monrquica;

    a repblica contrria reeleio sucessiva e ao continusmo, inclusive nos car-

    gos de direo do Parlamento, contudo, a reeleio aprovada em 1997 assegurou

    a continuidade do poder executivo nos municpios, estados e na Unio, sendo que

    poucos conseguem enfrentar o poder da mquina do Estado numa reeleio;

    2. A nomeao de parentes, amigos e apadrinhados em cargos honorficos e em tri-

    bunais monrquica; j a repblica contrria ao nepotismo, ao empreguismo e

    conduo dos amigos aos cargos pblicos, contudo, no Brasil se utiliza das esta-

    tais e dos milhares de cargos em comisso para nomear aliados e apadrinhados;

    3. O auxlio financeiro aos componentes da Corte e afins, com emprstimos, doaes

    e dinheiros dos impostos pagos pelo povo monrquica; a repblica no conhece

    os favores de Estado para grupos econmicos e para as famlias amigas do poder;

    contudo, no Brasil os despojos do errio so partilhados pelos que financiam re-

    giamente as campanhas eleitorais do Legislativo e do Executivo;

    4. Na monarquia tem-se o princpio da pessoalidade, isto , os sobrenomes devem

    prevalecer, as famlias devem permanecer no poder, e o amplo poder poltico se

    perpetua; na repblica o Estado impessoal, as famlias no proliferam, e h am-

    pla alternncia no poder; contudo, no o que vemos no Brasil h dcadas;

    1 Para verificar toda famlia real exilada em 1889 consulte-se: http://www.imagensviagens.

    com/br5_petropolis.htm

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    28

    5. Na monarquia os grandes grupos econmicos so necessariamente conver-

    gentes e afiliados ao poder, a economia gerida pelos interesses de poucos,

    h o autoritarismo esclarecido de Estado; na repblica, preside-a o interesse

    popular e no o interesse de poucos, contudo, no Brasil h um grande volume

    de recursos destinados aos grupos econmicos que financiam as campanhas

    eleitorais, h sim, pessoalidade;

    6. Na monarquia o interesse coletivo e no de poucos; na repblica a vontade

    popular e no de alguns; contudo, no Brasil, pela ausncia de partidos polticos

    estruturados, prevalece o toma-l-da-c de cargos e de nomeaes, que transfor-

    mou o Estado num loteamento de interesses exclusivamente privados;

    7. Na monarquia h o patrimonialismo, isto , o patrimnio de Estado do rei e

    de sua famlia; na repblica h a coisa pblica (res publica), isto , o Estado de

    todos, serve a todos e deve distribuir riquezas para reduzir as desigualdades

    sociais, contudo, no Brasil o enriquecimento dos detentores de cargos pblicos

    sempre mal explicado, a coisa pblica serve aos interesses privados, e o patri-

    monialismo continua a todo vapor;

    8. Na monarquia h palcios, prncipes, princesas, viscondes, condes e fidalgos; na

    repblica h cidados e to somente cidados, e todos so iguais perante a lei sem

    nenhuma distino, contudo, no Brasil h o chamado carteirao, o sabe com

    quem est falando e toda sorte de privilgios aos detentores de cargos pblicos e

    pessoas que possuem influncias graas ao poder poltico e econmico;

    9. Na monarquia, h a religio oficial; j na repblica h a pluralidade de religies,

    no h uma religio oficial, contudo, no Brasil, as bancadas neopentecostais es-

    to arruinando o Estado laico;

    10. Na monarquia, a famlia real tem limites de gastos, os filhos nascem predestina-

    dos para os cargos que iro ocupar; na repblica h a alternncia no poder, todos

    tm acesso aos cargos pblicos, no somente alguns poucos; contudo, no Brasil,

    as famlias do poder que se instalaram no Congresso Nacional, nas assembleias

    legislativas e nas cmaras municipais, cada vez mais elegem seus filhos e apani-

    guados, provando que os custos das campanhas eleitorais so um fator de grande

    excluso para a participao popular na poltica;

  • 29

    O que o Brasil

    11. Na monarquia, o rei tem que ser culto e possuir uma civilidade exemplar, ao es-

    tilo da Corte, para guiar os destinos da nao; na repblica, o povo escolhe seus

    lderes e no fica refm das famlias e de grupos que esto no poder desde sem-

    pre, contudo, no Brasil, diante do esvaziamento das lideranas polticas, pelo

    regime militar, h uma grande ausncia de lderes, com cultura, conhecimento

    e acima de tudo senso do dever pblico;

    12. Na monarquia, fala-se em impunidade, aos amigos do rei tudo, aos inimigos do

    rei, os rigores da lei, assim a lei desigual na sua aplicao; na repblica a lei

    igual para todos, contudo, no Brasil a lei mais igual para alguns e menos igual

    para outros. Valem os ditados populares: quem no tem padrinho morre pago

    e aos amigos tudo, aos inimigos os rigores da lei.

    Certamente o Brasil ainda est na transio da monarquia para a repblica, e talvez,

    se a famlia real no tivesse sido exilada, tivssemos rei, rainha e tudo mais, com muito me-

    nos custos para os cofres pblicos.

    Afinal, a conta da corrupo em nosso pas estimada em 100 (cem) bilhes ao ano, e

    certamente uma famlia real sairia muito mais barato ao povo, mas isto passado, pagamos

    caro para a proclamao da repblica, uma quartelada de rompante, bem-sucedida, mas que

    ainda no foi implantada no pas.

    Falta-nos uma substancial reforma poltica e leis penais severas contra os crimes con-

    tra a Administrao Pblica, mas isto um sonho Republicano bastante distante.

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    30

    Breves notas sobre o Anurio Brasileiro de Segurana Pblica 2014

    12 nov. 2014

    No Brasil no podemos mais falar no brasileiro cordial (Srgio Buarque de Holanda),

    nem no homem conciliador (Gilberto Freyre).

    A sociedade brasileira altamente violenta, seja nos elevados nveis de homic-

    dios, das mortes no trnsito e apesar dos esforos governamentais, pela misria ainda,

    de dez milhes de brasileiros.

    Outrora o catecismo ensinado pelos padres no Brasil colonial aos escravocratas era mo-

    derao e benevolncia e para os escravos pacincia, resignao e obedincia (Leonardo Boff)1.

    Os reflexos histricos desta pregao crist nunca deram conta dos desafios da necessria pa-

    cificao histrica que deve ser promovida pelos governos municipais, estaduais e pela Unio.

    Quando se estuda a violncia no Brasil cogitam-se solues penais e de represso po-

    licial, mas no se estudam os necessrios investimentos sociais e na preveno dos delitos.

    a lgica do tratamento das consequncias e no das causas.

    Por outro lato, os crimes do colarinho branco e de alto escalo social, no entram nas es-

    tatsticas porque, ainda no Brasil, a grande exceo que os ricos e dirigentes da poltica e tribu-

    nais no sejam enviados para o regime de recluso e ocupem, efetivamente, as penitencirias.

    Esta impunidade dos estratos superiores da sociedade brasileira corri, desde

    sempre, as nossas instituies. Reina a desconfiana sobre o cumprimento das leis, nos

    polticos e no Estado brasileiro.

    O instrumento da violncia no Brasil a arma de fogo (71,1% dos casos), mas a legis-

    lao probe aos cidados portarem armas para se defenderem. a proteo e a segurana

    legal aos que delinquem.

    Vive-se um estado de insegurana pblica.

    De outra sorte, as eleies de 2014, do Legislativo e Executivo, traduzem a baixssima

    possibilidade de renovao na poltica, posto que a grande parte dos eleitos produto da

    mquina do financiamento das campanhas eleitorais.

    1 BOFF, Leonardo. Quo cordial o povo brasileiro? In http://leonardoboff.wordpress.

    com/2014/10/31/quao-cordial-e-o-povo-brasileiro/

  • 31

    O que o Brasil

    Editado pelo Frum Brasileiro de Segurana Pblica o Anurio2, deste ano, trouxe

    dados atuais para refletirmos:

    1. A cada 10 minutos uma pessoa assassinada no Brasil. A violncia armada

    representa 71,1% em 2013;

    2. 81% concordam que fcil desobedecer s leis no Brasil;

    3. 32% confiam no Poder Judicirio. 33% confiam na Polcia e 48%, no Ministrio Pblico;

    4. 192 bilhes (2013) so os custos com a violncia, segurana pblica, prises e uni-

    dades de medidas socioeducativas;

    5. Em cinco anos os policiais brasileiros mataram o equivalente ao montante de

    trinta anos nos EUA;

    6. Quanto ao Poder Judicirio, 4% acreditam que rpido; 29%, que honesto e 32%

    confiam nele;

    7. Ainda no item confiana, os menos confiveis so Partidos Polticos (6%), Con-

    gresso Nacional (17%), e Governo Federal (31%). E os mais confiveis: Foras

    Armadas (65%), Igreja Catlica (55%) e Ministrio Pblico (48%);

    8. Quanto honestidade, a maioria dos juzes (55%), a maioria dos policiais (51%), a

    maioria dos advogados (44%) so honestos;

    9. Quanto s leis: 81% ( fcil desobedecer as leis no Brasil e, sempre que possvel,

    as pessoas escolhem dar um jeitinho ao invs de seguir as leis) e 57% (existem

    poucas razes para uma pessoa seguir as leis no Brasil);

    10. No Distrito Federal onde os entrevistados mais acreditam que as pessoas es-

    colhem o jeitinho (84%).

    Enquanto as instituies estiverem naufragando na credibilidade e na confiana do

    povo brasileiro, no se pode afirmar que vivemos numa democracia.

    Somos ainda aspirantes a um Estado que distribua justia e bem-estar social.

    Muitas leis, pouco direito. Muitas instituies, pouca confiana. Muitos culpados,

    poucos condenados. Muitos discursos, pouca efetividade.

    A refundao tica, moral e jurdica, no Brasil, passa por uma reinveno do Estado

    brasileiro. Todos ns somos resultado da Histria que fazemos e vivemos.

    2 Frum brasileiro de Segurana Pblica, 2014, In http://www.forumseguranca.org.br/

    produtos/anuario-brasileiro-de-seguranca-publica/8o-anuario-brasileiro-de-seguranca-publica

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    32

    Das razes para votar e ser votado

    13 out. 2014

    O fenmeno da escolha no momento do voto, ainda um mistrio para publicitrios,

    cientistas polticos, jornalistas, malandros e curiosos.

    A beleza encanta eleitores, o discurso pela mudana ou do time que est ganhando

    no se mexe, o slogan ou frase de efeito, a abundncia de aparies, na televiso, nas redes

    sociais, em cartazes e nas notcias, segurar criancinhas, rezar em missas e cultos, comer

    buchadas de bode e pratos tpicos, tudo vale votos.

    A ausncia de escolaridade na maior parte do eleitorado brasileiro combinada com as

    promessas de soluo para as carncias sociais, repete a velha elite poltica brasileira reno-

    vada por filhos, netos, sobrinhos, primas e toda parentela; o continusmo a marca na pol-

    tica brasileira e nos poderes constitudos. Poucos dominam a manada. O enlace dos meios de

    comunicao, instituies financeiras e grandes empresas faz o resto.

    Os partidos apresentam-se como agremiaes obrigatrias, cujo clculo do tempo de

    exposio vale ouro para emplacar candidaturas. Milhares, milhes e bilhes so doados

    pelos grandes e mdios grupos econmicos, bancos, construtoras e empresas de interesses

    variados, tudo visando contratos com o Estado e favores diversos.

    Cada um tem um preo, e assim se constri a frgil democracia brasileira que combi-

    na obras e servios para o Estado com o financiamento de campanhas eleitorais.

    A pequena parcela de pessoas que disputam um cargo no poder legislativo e executi-

    vo, no tem formao apropriada para exercer o cargo que pretendem. No executivo, ausen-

    te um mnimo de conhecimento ou competncia em gesto ou administrao, no legislativo,

    qui o conhecimento bsico de como funcionam as leis e a Constituio.

    A campanha uma corrida pela exposio, pelo sorriso, pelo discurso que o eleito-

    rado quer ouvir. Um misto de sensaes, palavras, emoes e imagens. Uma construo

    frgil e com tempo curto para entreter, distrair e convencer o eleitorado a votar em

    determinado personagem.

    A racionalidade da escolha superficial; o que conta o emocional, o lrico, o conceito

    abstrato. Voto nele porque ele bom, voto nela porque mulher, voto nesse ou naquele, por

  • 33

    O que o Brasil

    que os polticos no merecem meu voto, voto porque bonita, da minha religio, porque

    prometeu etc., e assim caminha a linguagem abstrata do convencimento para teclar nme-

    ros na urna eletrnica.

    O acompanhamento das aes, das promessas eleitorais ou da coerncia da atividade

    no executivo ou parlamentar, praticamente no existe. O lamaal de denncias ou escndalos

    redunda, em muitos casos, no famoso rouba, mas faz ou no mero esquecimento das massas

    pelo futebol, pelo final da novela ou por novos escndalos que se sucedem toda semana.

    A vida segue, a girndola roda e as eleies repetem a espetacular teia de acertos e

    conchavos na qual o povo uma engrenagem facilmente conduzida.

    Sem a revoluo na educao no mudaremos este cenrio vicioso e mal-acabado, que

    chamam de democracia.

    Entre as razes para votar e ser votado h o enorme interesse econmico em man-

    ter tudo como est para ver como que fica. Mudanas no cenrio da segurana pblica,

    da sade e na educao so apenas promessas que se esvaziam e se repetem de dois em

    dois anos, nas eleies.

    Enquanto isso, o Brasil est se desindustrializando; estamos cada vez mais atrs

    nos rankings mundiais na educao; a produo cientfica do Brasil insignificante, nos

    esportes rareiam as medalhas e na gesto do dinheiro pblico o Estado continua corrupto

    e insacivel na tributao.

    Precisamos de um projeto nacional para mudar esta realidade; nossas leis, as eleies

    e a democracia ainda no nos bastam e no resolveram nossos dilemas histricos.

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    34

    A misria das propostas eleitorais no Brasil

    11 set. 2014

    Das propostas eleitorais em voga, podemos afirmar que todas tratam de sade, edu-

    cao e segurana, as que combatem a corrupo de Estado e prometem alterar ou melho-

    rar o cenrio poltico brasileiro sem enunciar que tipos de mudanas sero feitas ou como

    objetivamente ocorrero.

    Dos candidatos ao Poder Executivo, da Presidncia da Repblica e dos Governadores

    dos Estados, podemos classificar as propostas em:

    a. Genricas, com temas amplos e sem a explicao de como sero implantadas, ten-

    dem a ser esquecidas e repetidas por todos os candidatos;

    b. Dependentes do Poder Legislativo para aprovao, tais como reforma poltica, tri-

    butria etc, que no dependem exclusivamente do Poder Executivo;

    c. Fantasiosas ou utpicas, propostas que no tm a mnima condio de serem im-

    plantadas em decorrncia da insuficincia de oramento;

    d. De longo prazo, propostas que ultrapassam o mandado, mas que mesmo as-

    sim, so enunciadas;

    e. De marketing poltico, aquelas que devem ser enunciadas em decorrncia de pes-

    quisas de opinio eleitoral e de tendncias recentes s eleies.

    Dos candidatos ao poder legislativo, de senadores, de deputados federais e depu-

    tados estaduais:

    a. Genricas, com temas amplos e sem explicao de que forma sero implementa-

    das pelo Poder Executivo. No nos esqueamos de que o Poder Legislativo apenas

    prope e vota as leis;

    b. Inconstitucionais, propostas que no sero votadas, pois flagrantemente incons-

    titucionais, mas do gosto popular; pena de morte, priso perptua etc;

    c. De outra esfera de governo; por exemplo, de leis de competncia federal, enunciadas

    por candidatos de esfera estadual e vice-versa;

    d. De polticas de governo, propostas que so eminentemente de competncia do

    Poder Executivo e que jamais podero ser implantadas pelo Legislativo;

  • 35

    O que o Brasil

    e. De marketing poltico, aquelas que devem ser enunciadas em decorrncia de

    pesquisas de opinio eleitoral e de tendncias recentes s eleies.

    H numa faixa de candidatos com a completa ausncia de propostas, em tom de goza-

    o, deboche ou negao poltica, ou focadas em pessoas que exerceram funes de noto-

    riedade pblica, humoristas, jogadores de futebol, cantores, atores, religiosos etc.

    E por fim, h temas que no esto na pauta de discusso dos polticos, pois podem

    ferir sentimentos de parcela do eleitorado ou interesses dos financiadores de campanha, so

    temas esquecidos ou intocveis, mas que interessam grande maioria da populao.

    Alguns desses temas proibidos: juros bancrios e grandes obras (dos financiadores de

    campanhas, bancos e construtoras); mobilidade urbana (as cidades esto um caos); sistema

    prisional (idem); poder judicirio (lentido dos processos e ausncia de democracia interna);

    educao e polticas de privatizao (o alto custo e a baixa qualidade); qualidade dos servios

    de telefonia, internet (os mais caros do mundo com baixssima qualidade e sem fiscalizao);

    poltica salarial dos trabalhadores; reforma agrria (em choque com os setores do agrobusi-

    ness); crescimento sustentado; polticas econmicas e industrializao; reforma poltica (em

    choque com os interesses da prpria classe poltica); reforma tributria (com a consequente

    distribuio de rendas para os municpios e estados geradores de riquezas); remunerao dos

    agentes polticos (em constante aumento e em choque com os interesses da classe poltica);

    estado laico (em contraposio s bancadas religiosas e seu poder econmico).

    Todos, sem exceo, so contra a corrupo, embora vivamos num Estado corrupto.

    Nos debates de candidatos vemos a alternncia de acusaes e personalismos, h uma

    completa ausncia de propostas, projetos, modos de gesto para implant-los. Discutem-se

    personalidades e no projetos.

    Em sntese, h uma aridez nas propostas e um verdadeiro deserto de discusses sobre

    temas que verdadeiramente interessam populao.

    No nos sentimos representados pelos candidatos que a esto e nem motivados pelos

    cavaletes espalhados pela cidade. A propaganda eleitoral no rdio e na televiso uma repe-

    tio de enunciados vazios e incoerentes; o tdio a marca dos programas eleitorais.

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    36

    No nos sentimos motivados para votar. Prossegue, historicamente, a falsa renovao

    gerada pelas famlias e parentelas do poder.

    H uma descrena na poltica; vota-se porque o voto obrigatrio.

    H uma tremenda falta de lideranas, faltam partidos polticos, falta participao e

    h uma grande omisso dos cidados. Isso tudo propicia a ascenso e a manuteno da classe

    poltica que nos governa e transforma o Brasil num pas essencialmente atrasado, cartorial,

    corrupto, sem tica, e patrimonialista.

    A misria das propostas elege nossa classe poltica; no podemos reclamar; somos

    resultado desse amlgama de pessoas que se dispem a nos governar e legislar.

  • 37

    O que o Brasil

    O Brasil e o Futuro da Democracia

    26 ago. 2014

    famosa a frase dita por Abraham Lincoln em discurso: A Democracia o Governo

    do Povo, pelo Povo, para o Povo.

    O Brasil busca a modernidade e aqui afirma-se que estamosnuma democracia.

    Ser?

    Em pesquisa recente da USP sobre a democracia brasileira, 79% dos entrevistados

    consideram no haver igualdade perante a lei no pas, 64% no tm confiana no Poder Ju-

    dicirio, 76 % no confiam no Congresso Nacional, 86% no confiam nos partidos polticos,

    45% acham que a democracia pode funcionar sem o Congresso e 46%, sem os partidos.1

    Neste cenrio ps-ditadura militar, quando j se passaram vinte e sete anos da

    promulgao da Constituio de 1988, temos alguns dilemas ainda no resolvidos:

    1. Os partidos polticos no so representativos do povo e no possuem sequer ideolo-

    gia, ou programa de governo. Representam grupos de interesses com personalida-

    des que se lanam candidatos. No h, nem internamente, democracia nos partidos;

    2. O coronelismo poltico no interior do Brasil, gerado pela troca de recursos pblicos

    com os carentes de recursos, ainda elege s custas dessa massa humana de manobra;

    3. A existncia ainda do toma-l-da-c de recursos pblicos, que moeda de troca nos

    apoios em votaes do Congresso Nacional com o Poder Executivo, das assembleias

    legislativas com os governadores e das cmaras municipais com os prefeitos;

    4. O clculo do voto de legenda, no qual os candidatos bem votados aumentam o

    coeficiente eleitoral e elegem os candidatos menos votados (sem representao

    direta), a exemplo de partidos nanicos;

    5. Os volumosos recursos das campanhas eleitorais doados por corporaes, grupos

    financeiros ou setores de interesse e o posterior comprometimento dos eleitos

    que, muitas vezes, no representam os interesses do povo ou da maioria;

    6. O grave problema da corrupo endmica no Estado que se alastra em estatais,

    ministrios, secretarias de governo estaduais e municipais e rgos pblicos, con-

    jugado com a tradicional e histrica impunidade do sistema jurdico brasileiro;

    1 http://josealvaromoises.com.br/2014/06/17/falhas-do-imperio-da-lei-e-suas-implicacoes/

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    38

    7. O grande dficit democrtico na escolha dos membros diretivos dos tribunais pela

    no participao das bases corporativas que representam, nem muito menos do

    povo (veja o exemplo democrtico das eleies e escolhas nos pases desenvolvidos);

    8. O decrscimo no nvel de qualidade da escolaridade na populao brasileira, a

    ausncia de investimentos estratgicos na educao e a consequente perda da

    conscincia poltica e da importncia na democracia;

    9. A corroso do Estado laico (que no possui religio) e o grande avano das banca-

    das das novas religies de massa;

    10. A ausncia de uma reforma poltica que possa retirar, democraticamente, muitos

    dos atuais atores da poltica brasileira e as suas oligarquias familiares, e realmen-

    te renovar a elite poltica brasileira (exemplo das reeleies do Poder Executivo e

    na no desincompatibilizao dos membros do poder Legislativo);

    11. O grande dficit em projetos de desenvolvimento econmico e a ausncia de re-

    forma tributria para distribuir estrategicamente os recursos pblicos em prol

    do desenvolvimento.

    Acima disso, h, sobretudo, uma crise institucional, moral e tica, no sentido de que o

    capitalismo internacional produziu a sensao de abandono coletivo e a ausncia de repre-

    sentao de interesses do povo.

    Falta-nos o comprometimento do Estado com as causas sociais, com a gesto estratgi-

    ca do Estado. Falta-nos uma elite poltica que seja comprometida e governe pelo povo e para

    o povo e no para os seus interesses pessoais (patrimonialista).

    Algum dia, no futuro, teremos uma democracia no Brasil.

  • 39

    O que o Brasil

    O poder das frases de efeito e o futuro do Brasil

    19 ago. 2014

    Senso crtico o exerccio de reflexo, nova anlise, dos fatos que nos cercam no dia a

    dia. Todos ns avaliamos nossas aes, nossos atos e suas consequncias.

    A tica e a moral se valem da avaliao das condutas que, se tomadas, desencadeiam

    consequncias. Os conceitos do bem e o mal orientam as atitudes.

    O senso crtico serve para se avaliar se tal ou qual conduta est ou no, correta dentro

    de um mundo de valores.

    Em sntese: os valores morais, religiosos, familiares, filosficos e legais deveriam

    orientar a conduta das pessoas.

    O senso crtico serve para questionarmos tudo isto e avanarmos para o aprimora-

    mento das nossas condutas, das nossas instituies, e, por que no dizer ?, do nosso pas.

    Votar uma atitude de anlise de valores.

    No cenrio atual as redes sociais tm ganhado espao nos jovens. Apesar de termos

    os infoexcludos, isto , aqueles que no esto conectados com as mdias de informtica,

    expressiva parcela dos jovens brasileiros tem se conectado por torpedos no celular,

    whatsApp, twiter, facebook, instagram, e-mails e tudo mais que serve para incessantemente

    passar informaes uns aos outros.

    Falar ao telefone tornou-se raro, remeter uma carta escrita pelos correios algo em

    extino, ler livros para poucos.

    A onda da comunicao rpida tem consigo mensagens curtssimas, de baixo conte-

    do. O contato presencial entre as pessoas escasso, todos esto correndo busca de tarefas e

    ao mesmo tempo se comunicam por meio de mensagens telegrficas; em resumo, uma frase

    ou palavra resumem tudo.

    Tudo ao mesmo tempo: falar e teclar mensagens, andar na rua e olhar para aparelhos

    celulares, mandar torpedos ao volante ou enquanto se alimenta. A vida se encurtou pela

    grande quantidade de mensagens que se remetem e se respondem.

    As informaes so curtssimas, uma linha, uma palavra. No se constroem mais pa-

    rgrafos. Rareiam a introduo, o desenvolvimento e as concluses.

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    40

    A linguagem se reduz dia aps dia.

    Num mundo desses impossvel ficar meia hora com algum sem que o telefone to-

    que, sem que a pessoa no se distraia, sem que tenha que responder a uma mensagem.

    A epidemia do ebola uma realidade que espera chegar ao mundo desenvolvido e a

    outros continentes. A violncia urbana corre a passos largos. A corrupo do Estado aumen-

    ta e cobra seu preo antes e depois das eleies. A mobilidade urbana fica no discurso. Todos

    os assuntos so discutidos de forma superficial.

    Neste momento eleitoral as propostas de candidatos (as) so um amontoado de frases

    de efeito. Fala-se o que o eleitor deseja escutar.

    Palavras, gestos, imagens.

    No h uma construo intelectual ou de profundidade nas propostas.

    Os temas so vagos e gasosos.

    Efetivamente no se tem conhecimento de como o Poder Legislativo ir legislar ou

    como o Poder Executivo ir governar. O passado pode nos dizer algo, mas no temos tempo

    para analis-lo, pois a vida corre.

    Os partidos polticos so incolores.

    Sem sabermos ao certo o que ser dos nossos destinos coletivos ou qual o futuro pol-

    tico, vivemos a superficialidade das frases de efeito.

    O destino do Brasil merece uma profunda reflexo crtica.

  • 41

    O que o Brasil

    As coincidncias entre o Futebol e o Estado Brasileiro

    08 jul. 2014

    A propsito da Copa de 2014 do Mundo e a partida entre a Alemanha e o Brasil, lista-

    mos alguns pontos de contato entre o futebol e o Estado brasileiro.

    O Direito, em face da Copa do Mundo, recebeu vrias inovaes pelas imposies do

    Caderno de Exigncias da FIFA, e todo o pacote de alteraes transitrias s quais se subme-

    teu o Brasil para sediar a Copa do Mundo de 2014.

    Em 2006 foi confirmada a Copa no Brasil.

    Tivemos oito anos para realizar toda a infraestrutura necessria, tal como a modernizao

    dos aeroportos, das vias urbanas, dos metrs, da mobilidade, da estrutura hoteleira e muito mais.

    A seleo brasileira teve oito anos para se preparar. Mas, tambm em matria de

    futebol, deixamos tudo para a ltima hora, para o ltimo minuto, para o ltimo jogo,

    para a ltima tentativa.

    Antes da partida entre Brasil e Alemanha, no nibus da seleo se ouviam sambas e

    pagodes, muita alegria, pouco foco e nenhuma concentrao, tudo iria dar certo.

    No deu.

    Foram construdos, a toque de caixa, doze estdios; alguns, milionrios; outros, bilio-

    nrios, com capacidade reduzida de espectadores.

    A estrutura do futebol brasileiro est nas mos de alguns clubes, talvez doze, na sua

    maior parte, altamente endividados na Previdncia Social. A estrutura da base do futebol

    brasileiro praticamente no existe, e nossos craques so na maior parte exportados para os

    outros continentes ricos, organizados e prsperos.

    A paixo nacional o futebol, somos a ptria de chuteiras, o pas da bola. Vale a emo-

    o. Pensamos que no final tudo d certo, contamos com a superstio, com o acaso, com a

    sorte, com a jogada espetacular.

    No Estado brasileiro no temos planejamento; a racionalidade e o planejamento no fazem

    parte da agenda dos governos. As obras de ocasio guiam nossos governantes e o Legislativo.

    Nossa seleo perdeu de goleada, sete, um nmero mgico; at agora no aceitamos

    isto. Dois viadutos ruram, e at agora no sabemos o que aconteceu. Ou melhor, no fundo,

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    42

    sabemos exatamente o que ocorreu. Sabemos que depender da sorte no garantia de xito,

    nem nos jogos de azar.

    A participao do Brasil nas Olimpadas tambm no , nem nunca foi significativa. No

    temos poltica de Estado nos esportes; rareiam as medalhas. O futebol no foge mais desta lgica.

    A grande lio que podemos tomar deste episdio: precisamos de planejamento estrat-

    gico e temos que banir a corrupo das estruturas cartoriais do futebol e do Estado brasileiro.

    Os sete baldes de gua fria que recebemos podem nos despertar do bero esplndido.

    necessrio que conquistemos um Estado que garanta aos seus cidados a sade e

    a educao de alta qualidade e inteiramente gratuita, que garanta segurana, mobilidade

    urbana com dignidade de primeiro mundo, essa a verdadeira Copa do Mundo, a copa das

    nossas vidas, no nosso cotidiano.

    Depois viro as outras Copas!

  • 43

    O que o Brasil

    A Copa do Mundo nossa

    19 maio 2014

    No Brasil, herdeiro de quatrocentos anos de escravido e as mais variadas diferenas

    sociais, quatro elementos unem a sociedade, so eles: o futebol, o carnaval, a praia e Deus.

    A causa fundamental das manifestaes est no fato de que poucos podero assistir

    s partidas dentro dos estdios. Aps a Copa seguramente os estdios se tornaro espaos

    de poucos afortunados. Lembremos a extino das gerais no Maracan; a regra de ouro da

    FIFA afastar o povo dos estdios.

    De outra sorte, os jogadores da seleo, na sua maioria, no esto dentro dos cam-

    peonatos brasileiros, mas na primeira diviso dos campeonatos europeus. Passes milio-

    nrios e arrivederci, Brasile!

    O carnaval, pertencente s escolas de samba e seus financiadores, cada vez mais

    longe do povo. Ressalve-se o ressurgimento dos blocos de rua no Rio de Janeiro ocorrido

    h uns quatro anos atrs.

    Sobram a praia e Deus.

    A falta de segurana e a ausncia de ordem, seja na segurana pblica, na alta taxa

    mortes no trnsito ou na impunidade dos crimes de colarinho branco, atestam a vigncia da

    Lei de Gerson, cada um tem que sempre levar vantagem em tudo.

    Quando a Copa comear, daqui a poucos dias, viro as manifestaes populares pela

    grande contradio que se estabeleceu entre o luxo dos estdios e a falcia governamental

    na segurana, na educao e na sade pblica.

    O legado da Copa ser a descoberta de que o Brasil tem recursos pblicos para erguer

    grandes obras, estdios bilionrios, mas que realmente no d a mnima para o povo, cada

    vez mais exaurido pelo fisco, refm da sade e do ensino privados.

    Falta-nos a determinao e um mnimo de gesto da coisa pblica, em todos os nveis

    da Federao brasileira.

    Falta-nos vergonha na cara para no elegermos a canalha que nos dirige h mais

    de 500 anos, falta-nos a leitura da Constituio que assegura um mar de direitos e ns

    d bacias de gua fria.

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    44

    Cada centavo que ergueu os estdios foi pago com o trabalho e o suor de milhes de

    brasileiros. hora de dizermos um no ao descaso sade, segurana pblica, precariza-

    o da educao, ausncia de mobilidade nas cidades, rodovias e aeroportos.

    A Copa do Mundo nossa. Quando o Brasil nos pertencer?

  • 45

    O que o Brasil

    Reviso histrica dos heris de 1964

    17 abr. 2014

    No h duas histrias;h verses comprovadas ou no. Tnhamos um presidente elei-

    to que foi deposto por um golpe militar.

    A vivncia republicana foi prejudicada e diante de fatos altamente reprovveis sob o

    ponto de vista da moralidade, dos direitos humanos, da cidadania, da tica, da democracia,

    da justia e da Repblica brasileira; podemos lanar as seguintes premissas:

    O perodo abrangido pela ditadura militar brasileira se deu de 31 de maro de 1964 at

    15 de maro de 1990 com a posse de Collor de Mello, portanto, 26 anos de durao.

    Pelos crimes de Estado praticados neste perodo, independente da Lei de Anistia (que

    inconstitucional pelos julgamentos recentes da Comisso Interamericana de Direitos Hu-

    manos), todos os crimes devem ser investigados e punidos, em especial, os crimes de seques-

    tro e desaparecimento, crimes permanentes que no prescrevem.

    Todas as homenagens efetuadas neste perodo devem ser revistas, a construo do

    iderio local, regional e nacional sobre personagens que apoiaram, foram atores principais

    ou contriburam, direta ou indiretamente para o regime autoritrio, merecem reviso.

    Essa reviso deve ser feita por lei de carter nacional, autorizadas as assembleias legisla-

    tivas, cmaras municipais e o Congresso Nacional para constiturem comisso para este mister.

    Qualquer manifestao de carter local, regional ou nacional, especialmente em clu-

    bes militares, academias de polcias militares ou congneres, deve ser punida na forma mi-

    litar disciplinar competente.

    Quanto redemocratizao do pas e o fortalecimento da Democracia, para se evitar

    qualquer sombra de retorno dos militares ao poder recomenda-se:

    1. O fortalecimento incondicional do Ministro da Defesa, que deve ser sempre um civil;

    2. Desministerializao completa das foras armadas, perda absoluta do status de

    ministrio das trs foras armadas;

    3. A despolitizao de clubes militares, reavaliando-se a continuidade das manifes-

    taes polticas dos inativos;

    4. Completo repdio a qualquer tipo de comemorao do golpe militar de 1964 e a

    seus atores principais e secundrios com a edio de lei a respeito do tema;

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    46

    5. Retirada de todas as auto-homenagens, medalhas e similares daqueles que fo-

    ram os principais atores do golpe militar;

    6. Ressignificao do sentimento histrico que ensinado de forma deturpada e

    ideologizada de modo ditatorial nas academias militares quanto tomada de

    poder pela fora e dos atos arbitrrios que foram praticados naquele perodo;

    7. A (re) construo do princpio de absoluta submisso dos militares ao poder civil

    democraticamente eleito.

    Esta foi a sntese do painel proferido no dia 31 de maro de 2014 no evento Debate sobre

    o Direito e os 50 anos do golpe de 1964, promovida na Universidade Tuiuti do Paran, com

    apoio do Centro Heleno Fragoso de Direitos Humanos e o Instituto Cidadania, tica e Justia.

  • 47

    O que o Brasil

    Algumas razes dos rolezinhos brasileiros

    19 jan. 2014

    O rolezinho uma manifestao social. Vamos aos sentimentos que podem ser os

    motivos para explicar um pouco este recente fenmeno:

    No podemos comprar o que est dentro dos shoppings. Vamos trabalhar como

    serviais, zeladoras, seguranas, vendedoras, garagistas e domsticas que sempre

    vo servir e no protagonizar os espaos de domnio econmico social. E, quem

    sabe?, vamos concluir um curso superior e, por um acaso de uma genialidade e de

    esforo, poderemos chegar presidncia do Supremo Tribunal Federal.

    Mesmo que algum acerte o bilhete premiado da mega-sena, no ser admitidos

    nos crculos sociais pelos que frequentam esses espaos.

    O Bolsa famlia no nos permite comprar nos shoppings, nem mesmo consumir

    os sanduches industrializados que vendem l. No mximo conseguimos atender

    aos que comem l.

    Algum conhecimento em informtica nos permitiu fazer um ORKUT e agora

    o FACEBOOK, e isso nos une pela msica, pela classe social e pela maneira de

    pensar o mundo.

    A gritaria das ruas foi implodida pelos blacbloks, e no somos marginais que que-

    bram tudo e entram em choque com a polcia. Queremos direitos que nos foram

    assegurados desde h muito, e muito pouco colocados em prtica.

    Vamos fazer a transposio do carnaval para outros lugares, com enredo e a ba-

    tida da senzala. Depois do samba, atualizamos para o funk e outras batidas musi-

    cais. No vamos nos limitar quarta-feira de cinzas.

    As cotas raciais e sociais so muito pouco para nos libertamos da pobreza que

    nos imposta. Queremos cultura, queremos educao, queremos poder aquisi-

    tivo, queremos, acima de tudo nos sentirmos vitoriosos. Somente unidos vamos

    conseguir isto.

    No seremos mais enganados pelos partidos polticos e pelos poderes constitudos

    que no nos representam e que nunca nos representaram. Somos brasileiros e

    merecemos cidadania e respeito na real!

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    48

    As razes dos reis

    18 dez. 2013

    A ideia do governo comandado por famlias reais remonta a egpcios, hebreus, cal-

    deus, romanos e muitos outros povos do Oriente Antigo.

    Fala-se inclusive da comunicao dos reis com deuses.

    H quem especule que os deuses eram extraterrestres que deram poderes sobrenatu-

    rais para os reis governarem a turba rude e ignara.

    Seja como for, os reis governavam at onde iam suas foras fsicas e mentais e eram

    sucedidos por seus abenoados filhos ou descendentes.

    A histria poltica paranaense repleta de continusmos, famlias e sobrenomes que

    se sucedem nos poderes, como se acreditassem num carter divino que concede a eles o di-

    reito de exercerem o poder sobre o povo esse ente indefinido e inodoro.

    J faz tempo, a ideia do poder monrquico foi suplantada pelas Revolues Francesa

    e Americana, dos fins do sculo XVIII.

    As famlias reais europeias reinam, mas no governam; ficaram reduzidas a uma es-

    pcie de novela das oito para o divertimento dos sditos.

    Vive-se a alternncia no poder porque se sabe que quem o exercita tende a cometer

    abusos, mesmo nas democracias.

    Os reis exerciam o poder absoluto por se julgarem infalveis, sbios e investidos de

    algo sobrenatural. A eles o povo devia reverncia, o beija-mo, o ajoelhar e abaixar a cabea.

    A ideia ressurgida neste ente enigmtico intitulado FunCAP do Clube Atltico Pa-

    ranaense, no nova na histria do mundo ocidental. Porm, j foi testada por sculos e se

    concluiu que a melhor forma de administrao, com todos os seus defeitos, ainda a demo-

    cracia, com a alternncia no poder.

    Reis e ditadores existiram na histria brasileira, mas isto acabou.

    Numa democracia, seja na poltica ou no futebol, apenas podemos conviver com reis

    Momos, a Festa de Reis e o Rei Pel, mais ningum!

  • 49

    O que o Brasil

    Algumas consideraes sobre a delao premiada

    05 dez. 2014

    1. O que delao premiada

    A delao premiada a entrega pelo delator de detalhes do crime, dos autores, dos

    coautores, do produto do crime e da possibilidade de recuperao do produto do crime,

    em troca de uma reduo ou alterao substancial da pena. No direito comparado tem-

    se similitude nos EUA (plea bargaingin), na Espanha (delincuente arrependido) e Alemanha

    (Kronzeugenrelegelung).

    O Supremo Tribunal Federal apreciou o instituto em 1997 (HC 75261/MG Min. Oc-

    tavio Gallotti), conferindo-lhe constitucionalidade.

    As previses normativas recentes no direito brasileiro em matria de delao premia-

    da encontram-se nas seguintes leis:

    1. No Cdigo Tributrio Nacional, Lei 5.172/66, art. 138, quando se criou a figura da

    delao espontnea que prev que a responsabilidade excluda pela denncia

    espontnea da infrao, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo de-

    vido e dos juros de mora, ou do depsito da importncia arbitrada pela autoridade

    administrativa, quando o montante do tributo dependa de apurao;

    2. Na Lei dos Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, 7.492/86, art. 25, 2

    (confisso espontnea): se o delator revelar a trama delituosa, ter sua pena redu-

    zida de um a dois teros;

    3. Na Lei dos Crimes contra a Ordem Tributria e Econmica, 8.137/90, com nova

    redao dada pela Lei 8.176/91, art. 16, pargrafo nico (confisso espontnea):

    ter a sua pena reduzida de um a dois teros;

    4. Na Lei 9.269/96 que alterou o Cdigo Penal no art. 159, 4 (colaborao em crime

    de extorso mediante sequestro); neste caso, se o delator denunciar autoridade,

    facilitando a libertao do sequestrado, ter sua pena reduzida de um a dois teros;

    5. Na Lei de Proteo a Vtimas e Testemunhas 9.807/99, art. 14 (colaborar voluntaria-

    mente): o indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigao

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    50

    policial e o processo criminal na identificao dos demais coautores ou partcipes

    do crime, na localizao da vtima com vida e na recuperao total ou parcial do

    produto do crime, no caso de condenao, ter pena reduzida de um a dois teros;

    6. Na Lei de Drogas 11.343/06, art. 41 (colaborar voluntariamente): indiciado ou

    acusado que colaborar voluntariamente com a investigao policial e o processo

    criminal na identificao dos demais coautores ou partcipes do crime e na recu-

    perao total ou parcial do produto do crime, no caso de condenao, ter pena

    reduzida de um tero a dois teros;

    7. Na Lei do Sistema de Defesa da Concorrncia, 12.529/2011, art. 86 (Programa de

    Lenincia colaborar efetivamente) que prev que o Cade, por intermdio da

    Superintendncia-Geral, poder celebrar acordo de lenincia, com a extino da

    ao punitiva da administrao pblica ou a reduo de 1 (um) a 2/3 (dois teros)

    da penalidade aplicvel, nos termos deste artigo, com pessoas fsicas e jurdicas

    que forem autoras de infrao da ordem econmica, desde que colaborem efeti-

    vamente com as investigaes e o processo administrativo, nos casos que tipifica;

    8. Na Lei dos Crimes de Lavagem de Capitais, 9.613/88, com nova redao pela Lei

    12.683/2012, art. 1, 5 (colaborar espontaneamente): a pena poder ser reduzida

    de um a dois teros e ser cumprida em regime aberto ou semiaberto, facultando-se

    ao juiz deixar de aplic-la ou substitu-la, a qualquer tempo, por pena restritiva de

    direitos, se o autor, coautor ou partcipe, colaborar espontaneamente com as autori-

    dades, prestando esclarecimentos que conduzam apurao das infraes penais,

    identificao dos autores, coautores e partcipes, ou localizao dos bens, direitos

    ou valores objeto do crime;

    9. Na Lei Anticorrupo, 12.846/13, art. 7, VII, se prev que ser considerada, den-

    tre outros, a cooperao da pessoa jurdica para a apurao das infraes, e no art.

    16, (Acordo de Lenincia), se prev que a autoridade mxima de cada rgo ou en-

    tidade pblica poder celebrar acordo de lenincia com as pessoas jurdicas res-

    ponsveis pela prtica dos atos previstos nesta Lei, que colaborem efetivamente

    com as investigaes e o processo administrativo, sendo que dessa colaborao

    resultem os itens que disciplina nos seus incisos;

  • 51

    O que o Brasil

    10. Na Lei de Organizao Criminosa, 12.850/13, art. 4 (colaborao premiada), se

    prev que o juiz poder, a requerimento das partes, conceder o perdo judicial,

    reduzir em at 2/3 (dois teros) a pena privativa de liberdade ou substitu-la pela

    restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente

    com a investigao e com o processo criminal, desde que dessa colaborao adve-

    nha um ou mais dos resultados que tipifica.

    2. A natureza jurdico-cnonica da delao premiada

    A natureza jurdica de muitos institutos penais repousa no Direito Cannico, e neste

    sentido, entendemos que os institutos que mais se assemelham delao premiada no Direi-

    to Cannico so o do sacramento da penitncia e o das indulgncias que se encontram nos

    cnones 959 e 992 no Cdigo Cannico da Igreja Catlica:

    Cn. 959 No sacramento da penitncia, os fiis que confessem os seus pecados ao ministro legtimo, estando arrependidos de os terem cometi-do, e tendo tambm o propsito de se emendarem, mediante a absolvio dada pelo mesmo ministro, alcanam de Deus o perdo dos pecados come-tidos depois do baptismo, ao mesmo tempo que se reconciliam com a Igreja que vulneraram ao pecar.()Cn. 992 Indulgncia a remisso, perante Deus, da pena temporal, de-vida pelos pecados j perdoados quanto culpa; remisso que o fiel, devi-damente disposto e em certas e determinadas condies, alcana por meio da Igreja, a qual, como dispensadora da redeno, distribui e aplica auto-ritativamente o tesouro das satisfaes de Cristo e dos Santos. (Grifamos.)

    A interlocuo entre o autor, coautor ou partcipe com a autoridade que investiga,

    se assemelha interlocuo entre o fiel e o proco na confisso para a obteno do perdo

    da pena cannica por meio da diminuio, atenuao ou alterao substancial da pena, por

    outra de natureza diversa.

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    52

    3. Sobre as tratativas delatrias e a reduo proporcional das penas ao delator

    A tratativa da delao, entre acusado/indiciado e a autoridade que investiga, ocorre

    em um nico momento processual, mas indubitavelmente, a barganha da pena passa por

    tratativas mais longas, no sentido de que o estabelecimento da possibilidade da incidncia

    do quantum debeatur da pena depender do grau e da amplitude da delao.

    Note-se que nesta discusso, no h a figura do juiz, mas a da autoridade que investiga

    e que posteriormente oferece a denncia. H sim, um prognstico da pena posto que se des-

    conhece o grau de eficcia das provas e da comprovao ftica quanto delao oferecida.

    No h a previso de um avano processual sistmico das tratativas, isto , um ponto

    de no retorno (point of not return) das tratativas, posto que a amplitude da delao deve, em

    tese, ser proporcional reduo da pena.

    Assim, a amplitude da delao proporcional ao grau de informaes relevantes do

    contedo da delao e a comprovao da ocorrncia dos delitos e seus autores.

    Esta fase ainda investigatria, diante da delao por si, por no apresentar necessaria-

    mente um grau de certeza e verdade para se inferirem certezas processuais, nem indcios sufi-

    cientes, sem a persecuo penal e a comprovao dos elementos materiais e autorais da delao.

    De outra sorte, haveria um compromisso entre o delator e a autoridade que investiga

    para o aprimoramento e desenvolvimento da persecuo penal.

    A reflexo da viabilidade, ou no, da delao seria eminentemente feita entre o advo-

    gado e o delator, aps as tratativas com a autoridade que investiga, pois requer-se conheci-

    mento tcnico quanto ao cumprimento da pena e sobre os prognsticos processuais.

    Feito o acordo, desencadeia-se a fase de persecuo do resultado da delao, ou de

    outras medidas para a comprovao delatria.

    H nisto um compromisso processual penal, para o qual podemos recorrer ao dispos-

    to no art. 852 do Cdigo Civil que prev:

    Art. 852. vedado compromisso para soluo de questes de estado, de direito pessoal de famlia e de outras que no tenham carter estri-tamente patrimonial.

  • 53

    O que o Brasil

    Apesar de prever especificamente o compromisso no Direito Civil, este o fundamento

    para o Termo de Ajustamento de Conduta de interesses difusos coletivos e individuais homo-

    gneos, prevendo a cominao de multa e outras medidas em caso de seu descumprimento.

    Pondere-se que, apesar de a delao no possuir natureza privada compromissria,

    parece-nos que h sim, um compromisso no momento da delao e a proporcionalidade da

    imposio de pena. E, no obstante, o sistema de direito privado no se comunicar direta-

    mente com o Direito Penal e Administrativo sabe-se que, por fundamento cientfico, o Direi-

    to um todo integrado, racional e lgico.

    O elemento patrimonial seria inerente aos delitos penais, posto que h a possibilidade da

    indenizao por dano na ao ex delicto prevista nos arts. 63 a 67 do Cdigo de Processo Penal.

    4. O contraditrio diferido na delao premiada e a questo das provas ilcitas

    Na delao premiada a informao deve ser eficaz (HC 174.286-DF STJ), entretanto, a

    eficcia da informao pode depender da investigao de fato ou pessoa, sem o contraditrio

    pleno, isto , sem a divulgao do contedo da delao.

    Nesta seara, entram em jogo princpios constitucionais e a possibilidade de, no curso da

    investigao, surgirem exacerbaes indevidas ao devido processo legal. Contudo, avalie-se

    que o inqurito no processo, e o contraditrio pleno est presente apenas na fase processual

    penal e no na investigao que visa a formao e o desvelamento do iter criminis.

    H a vedao da obteno de prova ilcita, nos termos do art. 157 do Cdigo de Pro-

    cesso Penal, includa pela Lei 11.690/08:

    Art. 157. So inadmissveis, devendo ser desentranhadas do processo, as pro-vas ilcitas, assim entendidas as obtidas em violao a normas constitucionais ou legais. (Redao dada pela Lei 11.690, de 2008) 1 So tambm inadmissveis as provas derivadas das ilcitas, salvo quando no evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras. (Includo pela Lei 11.690, de 2008) 2 Considera-se fonte independente aquela que por si s, seguindo os trmites tpicos e de praxe, prprios da investigao ou instruo criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova. (Includo pela Lei 11.690, de 2008) 3 Preclusa a deciso de desentranhamento da prova declarada inadmissvel, esta ser inutilizada por deciso judicial, facultado s partes acompanhar o incidente. (Includo pela Lei 11.690, de 2008)

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    54

    Se a delao premiada for declarada invlida por ilicitude, esta declarao contamina

    toda a sequncia de provas decorrentes da delao pelo nexo causal decorrente.

    Vislumbra-se, por outro lado, a possibilidade de delaes sucessivas. Isto , na medida

    em que acusados ou indiciados adentram o processo, vo celebrando acordos de delao,

    reduzindo suas penas e incriminando toda sorte de coautores e partcipes.

    Se todos delatarem todos, a pena ser reduzida conjuntamente, e o delito torna-

    se atenuado. Neste sentido deve-se ter em vista a recuperao patrimonial decorrente

    e no apenas a delao e a prova produzida em virtude das informaes surgidas a

    partir da delao.

    Forma-se a convico penal na fase investigatria, sem a regularidade do processo

    pela ameaa das penas impostas. Neste sentido haveria a discusso relevante se se pode-

    riam declarar nulas as delaes sucessivas, isto , aquelas decorrentes das delaes iniciais,

    sem que ainda se tivesse formado completamente a persecuo penal antes mesmo do ofe-

    recimento da denncia.

    5. guisa de concluso

    Ao fim de concluir, podemos afirmar que a delao premiada ainda carece de um iter

    processual autnomo, inobstante o louvvel fim que se busca na reconstruo fidedigna do

    delito e de seus autores.

    A natureza jurdica da delao premiada procede de institutos do Direito Cannico,

    no qual o processo inquisitrio incompatvel com as garantias processuais constitucionais,

    mormente o da garantia da imparcialidade do poder judicirio.

    Embora, se grifem em alguns diplomas legais a espontaneidade da delao no de

    se supor a liberalidade neste agir, pois a motivao ao delinquente a reduo ou alterao

    substancial da pena decorrente da delao.

    Pelo alto grau de sofisticao da delinquncia patrimonial, mais refinados, se-

    guros e revestidos de legalidade e constitucionalidade devem ser os mecanismos pro-

    cessuais para a investigao penal, entretanto, sem se atingirem as garantias consti-

    tucionais vigentes.

  • 55

    O que o Brasil

    Nenhum ordenamento jurdico penal pode garantir processualmente o pacto de si-

    lncio entre os delinquentes, e a delao premiada visa justamente abrir este silncio com a

    reduo ou alterao da pena do delator.

    tambm certo que a divulgao prematura de delaes premiadas deve conter

    severas reservas pela concreta possibilidade de divulgaes sensacionalistas de delaes em

    curso que maculam a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, bens

    jurdicos esses constitucionalmente protegidos pelo art. 5, inciso X, da Constituio Federal.

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    56

    Breves comentrios sobre a extradio do Henrique Pizzolato

    17 fev. 2014

    1. O que prev a Constituio italiana

    A Constituio Italiana (1948) no admite a extradio de estrangeiros por crimes

    polticos, nos termos do art. 10:

    Art. 10 O ordenamento jurdico italiano adequa-se s normas do direito internacional geralmente reconhecidas. A condio jurdica do estrangeiro regulamenteda pela lei, em conformidade com as normas e os tratados inter-nacionais. O estrangeiro, ao qual seja impedido no seu pas o efetivo exerccio das liberdades democrticas garantidas pela Constituio italiana, tem direito de asilo no territrio da Repblica, segundo as condies estabelecidas pela lei. No admitida a extradio de estrangeiros por crimes polticos.

    Neste caso, por ter dupla cidadania Pizzolato no estaria abrangido por este dispositivo.

    Segue no seu art. 26 a Constituio Italiana:

    Art. 26 A extradio do cidado somente pode ser permitida quando expres-samente prevista pelas convenes internacionais. Em hiptese alguma pode ser admitida por crimes polticos.

    Temos dois obstculos para a extradio; o primeiro, a necessidade da existncia de con-

    veno internacional e o segundo, tratar-se de crime poltico. Nenhum dos dois est preenchido.

    2. O que prev o Tratado entre a Itlia e o Brasil e o Cdigo Penal Italiano

    A questo de a condenao ser poltica seria na hiptese de inimigos polticos conde-

    n-lo, e isto uma contradictio in terminis, posto que o governo no momento do julgamento

    era o mesmo do partido poltico de Pizzolato.

    A Conveno Internacional entre a Itlia e Brasil, prev no seu artigo II:

    1. Ser concedida a extradio por fatos que, segundo a lei de ambas as partes, constiturem crimes punveis com uma pena privativa de liberdade pessoal cuja durao mxima prevista seja superior a um ano, ou mais grave.2. Ademais, se a extradio for solicitada para a execuo de uma pena, ser necessrio que o perodo da pena ainda por cumprir seja superior a nove meses.

  • 57

    O que o Brasil

    3. Quando o pedido de extradio referir-se a mais de um crime e al-gum ou alguns deles no atenderem s condies previstas no primeiro pargrafo, a extradio, se concedida por um crime que preencha tais condies, poder ser estendida tambm aos demais. Ademais, quando a extradio for solicitada para a execuo de penas privativas de liber-dade pessoal aplicada por crimes diversos ser concedida se o total das penas ainda por cumprir for superior a nove meses. (ACQUARONE, Ap-pio Claudio. Tratados de extradio: construo, atualidade e projeo do relacionamento bilateral brasileiro. Braslia: IRB: Fundao Alexandre de Gusmo, 2003, p. 315 e ss.).

    O Cdigo Penal Italiano no seu art. 13 prev:

    Art. 13- Estradizione -Lestradizione regolata dalla legge penale italiana, dalle convenzioni e dagli usi internazionali.Lestradizione non ammessa, se il fatto che forma oggetto della domanda di estradizione, non preveduto come reato dalla legge italiana e dalla legge stra-niera.Lestradizione pu essere conceduta od offerta, anche per reati non preveduti nelle convenzioni internazionali, purch queste non ne facciano espresso di-vieto.Non ammessa lestradizione del cittadino, salvo che sia espressamente con-sentita nelle convenzioni internazionali.

    Em sntese, no haveria a extradio caso os crimes cometidos no Brasil no tivessem

    correspondncia na legislao italiana.

    Vejamos:

    A condenao de Pizzolato no Brasil foi de 12 (doze) anos e sete meses, por crimes de

    formao de quadrilha, peculato e lavagem de dinheiro. H correspondncia desses delitos

    na Itlia, no Cdigo Penal Italiano: Peculato (art. 314), lavagem de dinheiro (art. 648 bis).

    Em sntese, a legislao talo-brasileira sobre a matria.

    Assim, a extradio de Pizzolato apenas uma questo de tempo. Certamente ser con-

    cedida, pois esto plenamente preenchidos todos os pressupostos legais para sua concesso.

    Piano piano si va lontano.

  • Escritos sobre o Brasil, o Direito, as Cidades e as Religies

    58

    O mensalo, as leis, o artigo e as aes dos magistrados no STF

    30 nov. 2012

    No dia 20 de setembro foi publicado aqui um artigo do advogado Claudio Henrique

    de Castro onde ele afirmava no ttulo que as leis aprovadas sob o esquema do mensalo so

    inconstitucionais(v