religião história - as religiões negras do brasil

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ACIMA,

LOGUN-EDÉ,

JOVEM

CAÇADOR.

PO

VO

Negro

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R E G I N A L D O P R A N D I

AS RELIGIÕES NEGRAS NA SOCIEDADE BRANCA

O quadro das religiões negras, ou religiões afro-brasileiras, é

bastante diversificado. Em seu conjunto, até os anos 30 deste

século, as religiões negras poderiam ser incluídas na categoria das

religiões étnicas ou de preservação de patrimônios culturais dos

antigos escravos negros e seus descendentes, enfim, religiões que

mantinham vivas tradições de origem africana. Formaram-se em

diferentes áreas do Brasil, com diferentes ritos e nomes locais

derivados de tradições africanas diversas: candomblé na Bahia,

xangô em Pernambuco e Alagoas, tambor de mina no Maranhão

e Pará, batuque no Rio Grande do Sul, macumba no Rio de Janeiro.

As religiõesnegras doBrasilPara uma sociologiados cultosafro-brasileiros

REGINALDOPRANDI é professordo Departamento deSociologia da USP eautor de, entre outroslivros, OsCandomblés de SãoPaulo: a

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grande parte se perdeu através do tempo, sen-do hoje muito difícil traduzir os versos dascantigas sagradas e impossível manter con-versação na língua do candomblé. Além doqueto, as seguintes “nações” também são dotronco iorubá (ou nagô, como os povosiorubanos são também denominados): efã eijexá na Bahia, nagô ou eba em Pernambuco,oió-ijexá ou batuque de nação no Rio Grandedo Sul, mina-nagô no Maranhão, e a quaseextinta “nação” xambá de Alagoas ePernambuco.

O candomblé de “nação” angola, de ori-gem banto, adotou o panteão dos orixásiorubás (embora os chame pelos nomes deseus esquecidos inquices, divindades bantos),assim como incorporou muitas das práticasiniciáticas da nação queto. Sua linguagemritual, também intraduzível, originou-se pre-dominantemente das línguas quimbundo equicongo. Nessa “nação”, tem fundamentalimportância o culto dos caboclos, que sãoespíritos de índios, considerados pelos anti-gos africanos como sendo os verdadeirosancestrais brasileiros, portanto os que sãodignos de culto no novo território em queforam confinados pela escravidão. O candom-blé de caboclo é uma modalidade do angolacentrado no culto exclusivo dos antepassa-dos indígenas. Foi provavelmente o candom-blé angola e o de caboclo que deram origemà umbanda. Há outras nações menores deorigem banto, como a congo e a cambinda,hoje quase inteiramente absorvidas pela na-ção angola.

A nação jeje-mahin, do estado da Bahia,e a jeje-mina, do Maranhão, derivaram suastradições e língua ritual do ewê-fon, ou jejes,como já eram chamados pelos nagôs, e suasentidades centrais são os voduns. As tradi-ções rituais jejes foram muito importantes naformação dos candomblés com predominân-cia iorubá.

Em nosso século nasceu a umbanda, quetem sido reiteradamente identificada comosendo a religião brasileira por excelência, pois,formada no Brasil, ela resulta do encontro detradições africanas, espíritas e católicas (2).Ao contrário das religiões negras tradicionaisque se constituíram como religiões de gruposnegros, a umbanda surge como religião uni-versal, isto é, dirigida a todos. A umbandasempre procurou legitimar-se pelo apagamen-to de feições herdadas do candomblé, sua

Na Bahia originou-se também o muito po-pular candomblé de caboclo e o menos co-nhecido candomblé de egum. Mais recente-mente, no Rio de Janeiro e depois em SãoPaulo, constituiu-se a umbanda, que logo sedisseminou por todo o país, abrindo, de certomodo, caminho para uma nova etapa de difu-são do antigo candomblé. O Nordeste foi ber-ço também de outras modalidades religiosasmais próximas das religiões indígenas, masque cedo ou tarde acabaram por incorporarmuito das religiões afro-brasileiras ou as in-fluenciar. Trata-se do catimbó, religião deespíritos aos quais se dá o nome de mestres ecaboclos, que se incorporam no transe paraaconselhar, receitar e curar. Esse tronco afro-ameríndio tem particularidades em diferen-tes lugares, sendo chamado de jurema, toré,pajelança, babaçuê, encantaria e cura (1).

Tudo indica que a organização das religiõesnegras no Brasil deu-se tardiamente. Uma vezque as últimas levas de africanos trazidos parao Novo Mundo nas últimas décadas do séculoXIX, período final da escravidão, foram fixa-das sobretudo nas cidades e em ocupaçõesurbanas, os africanos desse período puderamviver no Brasil em maior contato uns com osoutros, física e socialmente, com maior mo-bilidade e, de certo modo, liberdade de movi-mentos, num processo de interação que nãoconheceram antes. Esse fato propiciou con-dições sociais favoráveis para a sobrevi-vência de algumas religiões africanas,com a formação de grupos de culto orga-nizados.

Quando se fala em candomblé, geralmen-te a referência é o candomblé queto, ou dachamada “nação” queto, da Bahia, vertenteem que predominam os orixás e ritos de ini-ciação de origem iorubá. Seus antigos terrei-ros são os mais conhecidos e prestigiados doBrasil: a Casa Branca do Engenho Velho, ocandomblé do Alaketo, o Axé Opô Afonjá eo Gantois. As mães-de-santo que alcançaramgrande prestígio e visibilidade na sociedadelocal têm sido dessas casas, como Pulquériae Menininha, sua sobrinha-neta e sucessorano candomblé do Gantois; Olga, do terreirodo Alaketo; e Aninha, Senhora e Stella, docandomblé do Opô Afonjá. O candombléqueto tem tido grande influência sobre outras“nações”, que têm incorporado muitas de suaspráticas rituais. Sua língua ritual deriva doiorubá, mas o significado das palavras em

1 Para as diferentes modali-dades religiosas afro-bra-sileiras, ver Bastide 1975,1978; Carneiro 1936;Rodrigues 1935; Motta1985; Pinto 1935; S.Ferretti 1986; M. Ferretti1985, 1994; Eduardo 1948;Herskovits 1943; Corrêa1992; Oro 1994; Prandi1991a, 1993; Santos 1995;Braga 1992; Camargo1961.

2 Camargo 1961; Concone1987; Ortiz 1978.

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matriz negra, especialmente os traços referi-dos a modelos de comportamento e mentali-dade que denotam a origem tribal e depoisescrava, mantendo contudo essas marcas naconstituição do panteão. Comparado ao docandomblé, seu processo de iniciação é mui-to mais simples e menos oneroso e seus ritu-ais evitam e dispensam sacrifício de sangue.Os espíritos de caboclos e pretos-velhos ma-nifestam-se nos corpos dos iniciados duranteas cerimônias de transe para dançar e sobre-tudo orientar e curar aqueles que procurampor ajuda religiosa para a solução de seusmales. A umbanda absorveu do kardecismoalgo de seu apego às virtudes da caridade e doaltruísmo, assim fazendo-se mais ocidentalque as demais religiões do espectro afro-bra-sileiro; mas nunca completou o processo deocidentalização, ficando a meio caminho entreser religião ética, preocupada com a orienta-ção moral da conduta, e religião mágica, vol-tada para a estrita manipulação sobrenaturaldo mundo.

Desde o início as religiões afro-brasilei-ras se formaram em sincretismo com o cato-licismo, e em grau menor com religiões in-dígenas. O culto católico aos santos, numadimensão popular politeísta, ajustou-se comouma luva ao culto dos panteões africanos.Com a umbanda, acrescentaram-se à verten-te africana as contribuições do kardecismofrancês, especialmente a idéia de comunica-ção com os espíritos dos mortos através dotranse, com a finalidade de se praticar a ca-ridade entre os dois mundos, pois os mortosdevem ajudar os vivos sofredores, assimcomo os vivos devem ajudar os mortos aencontrarem, sempre pela prática da carida-de, o caminho da paz eterna, segundo a dou-trina de Kardec. A umbanda perdeu parte desuas raízes africanas e se espraiou por todasas regiões do país, sem limites de classe,raça, cor (Prandi, 1995). Mas não interferiuna identidade do candomblé, do qual se des-colou, conquistando sua autonomia. E ocandomblé também mudou. Até 20 ou 30anos atrás, o candomblé era religião de ne-gros e mulatos, confinado sobretudo naBahia e Pernambuco, e de reduzidos gru-pos de descendentes de escravos localiza-dos aqui e ali em distintas regiões do país.No rastro da umbanda, a partir dos anos 60deste século, o candomblé passou a se ofe-recer como religião também para segmen-

tos da população de origem não-africana.A presença do negro na formação social

do Brasil foi decisiva para dotar a culturabrasileira dum patrimônio mágico-religioso,desdobrado em inúmeras instituições e dimen-sões materiais e simbólicas, sagradas e profa-nas, de enorme importância para a identidadedo país e sua civilização. No que diz respeitoà religião especificamente, os cultos trazidospelos africanos deram origem a uma varieda-de de manifestações que aqui encontraramconformação específica, através de umamultiplicidade sincrética resultante do con-tato das religiões dos negros com o catolicis-mo do branco, mediado ou propiciado pelasrelações sociais assimétricas existentes entreeles, e também com as religiões indígenas ebem mais tarde, mas não menos significati-vamente, com o espiritismo kardecista.

Desde sua formação em solo brasileiro,as religiões de origem negra têm sido tributá-rias do catolicismo. Embora o negro, escravoou liberto, tenha sido capaz de manter noBrasil dos séculos XVIII e XIX, e até hoje,muito de suas tradições religiosas, é fato quesua religião enfrentou-se desde logo com umaséria contradição: a própria estrutura social efamiliar às quais a religião dava sentido aquinunca se reproduziram. As religiões dosbantos, iorubás e fons são religiões de cultoaos ancestrais, que se fundam nas famílias esuas linhagens.

O tecido social do negro escravo nada ti-nha a ver com família, grupos e estratos sociaisdos africanos nas suas origens. Assim, a re-ligião negra só parcialmente pôde se repro-duzir aqui. A parte ritual da religião originalmais importante para a vida cotidiana, cons-tituída no culto aos antepassados familiares eda aldeia, pouco se refez, pois a família seperdeu, a tribo se perdeu. Na África, era oancestral do povoado (egungum) que cuida-va da ordem do grupo, resolvendo os confli-tos e punindo os transgressores que punhamem risco o equilíbrio coletivo. Quando asestruturas sociais foram dissolvidas pela es-cravidão, os antepassados perderam seu lu-gar privilegiado no culto. Sobreviverammarginalmente no novo contexto social e ri-tual. As divindades mais diretamente ligadasàs forças da natureza, mais diretamente en-volvidas na manipulação mágica do mundo,mais presentes na construção da identidadeda pessoa, os orixás, divindades de culto ge-

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nérico, estas sim vieram a ocupar o centro danova religião negra em território brasileiro.Pois que sentido poderia fazer o controle davida social para o negro escravo? Fora de suasassembléias religiosas, era o catolicismo dosenhor a única fonte possível de ligação como mundo coletivo projetado para fora do tra-balho escravo e da senzala.

Se a religião negra, ainda que em sua re-construção fragmentada, era capaz de dotar onegro de uma identidade negra, africana, deorigem, que recuperava ritualmente a famí-lia, a tribo e a cidade, perdidas para sempre nadiáspora, era através do catolicismo, contu-do, que ele podia se encontrar e se mover nomundo real do dia-a-dia, na sociedade dosbrancos dominadores, responsável pela ga-rantia da sua existência, não importa em quecondições de privação e dor. Qualquer tenta-tiva de superação da condição escrava, comorealidade ou como herança histórica, impli-cava primeiro a necessária inclusão no mun-do branco. E logo passava a significar oimperativo de ser, sentir-se e parecer brasi-leiro. Nunca puderam ser brasileiros sem sercatólicos. Podiam preservar suas crenças noestrito limite dos grupos familiares, muitasvezes reproduzindo simbolicamente a famí-lia e os laços familiares através da congrega-ção religiosa, daí a origem dos terreiros e dasfamílias-de-santo. Mas a inserção no espaçomaior exigia uma identidade nacional, porassim dizer, uma identidade que refletisse oconjunto geral da sociedade católica em ex-pansão. O fim da escravidão, a formação dasociedade nacional, o extravasamento daspopulações pelas amplitudes geográficas, coma criação de possibilidades as mais diferen-tes, tudo isso só fez reforçar a importância docatolicismo para as populações negras. Opróprio catolicismo, como cultura de inclu-são, hegemônica, não fez oposições, que nãopudessem ser vencidas, ao fato de o negromanter uma dupla ligação religiosa. Pois emSão Luís, talvez o mais vivo e denso centrocultural dos sincretismos afro-católicos, nãosão apenas os devotos das religiões negrasque são também católicos; católicas tambémsão consideradas pelos seus fiéis as própriasdivindades trazidas da África. As religiõesafro-brasileiras, em suas origens, sempre fo-ram devedoras e dependentes do catolicismo,ideológica e ritualmente. Só muito recente-mente — quando a sociedade brasileira não

precisa mais do catolicismo como a grande eúnica fonte de transcendência que possalegitimá-la e fornecer os controles valorativosda vida social —, as religiões de origem ne-gra começaram a se desligar do catolicismo.Mas isso é um projeto de mudança de iden-tidade que mal começou e que exige, antes,outras experiências de situar-se no mundocom mais liberdade e direitos depertencimento (3).

Desobrigadas, desde o nascimento, dasquestões referentes à administração da justi-ça que pressupõe princípios universalistas epactos coletivos acima dos desejos individu-ais, posto que isso era domínio exclusivo dareligião geral da sociedade geral, isto é, ocatolicismo; desinteressadas de conteúdosformadores da pessoa para o mundo profano,porque o modelo aqui é branco; alimentandoo culto de deuses que se exteriorizam e seexpressam especialmente através da forma,não é sem razão que as religiões afro-brasilei-ras desenvolveram um enorme senso ritualpresidido por inigualável senso estético, ca-paz de transbordar os limites do sagrado parase impregnar nas expressões mais profanasque modelam a identidade nacional. Ser bra-sileiro agora é ser do samba, do “camarãoensopadinho com chuchu”, do carnaval deavenida — que é tudo afro-brasileiro e nadaabsolutamente religioso. Os elementos dareligião tradicional, ao serem assimilados pelacultura nacional, deixam de ser religiosos paraserem simplesmente exóticos. E mesmo quan-do conteúdos religiosos, nessas circunstâncias,são mantidos por seus cultores, como o ebópara Exu que abre o desfile da grande escolade samba de prestígio universal, isso não temnenhuma importância para a sociedade. Esseebó, certamente privativo de um grupo quebusca firmar sua identidade religiosa singu-lar, não se publiciza a não ser como ingredi-ente estético.

UMBANDA, UMA RELIGIÃOUNIVERSAL

No Estado do Rio de Janeiro, cerca de1920, foi fundado o primeiro centro deumbanda, que teria nascido como dissidênciade um kardecismo que rejeitava a presença deguias negros e caboclos, considerados pelosespíritas mais ortodoxos como espíritos infe-riores. De Niterói, esse centro foi se instalar

3 Para outras interpretações easpectos de sincretismocatólico nas religiões afro-brasileiras, ver Valente1977; S. Ferrett i 1995;Sanchis 1995.

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numa área central do Rio em 1938. Logo se-guiu-se a formação de muitos outros centrosdesse espiritismo de umbanda, os quais, em1941, com o patrocínio da União EspíritaBrasileira, promoveram no Rio o PrimeiroCongresso de Umbanda, congresso ao qualcompareceram umbandistas de São Paulo.

A fundação, nos anos 20, daquele primei-ro centro de umbanda no Rio de Janeiro, comodissidência pública e institucionalizada dokardecismo, num processo de valorização deelementos nacionais, como o caboclo e o pre-to-velho, que são espíritos de índios e escra-vos, deve ter representado uma forma deacomodação seletiva, um movimento derearranjo entre duas alternativas confluentesna perspectiva dos fundadores da umbanda:uma mais rica em conteúdos doutrinários, aoutra mais centrada em práticas rituais. Okardecismo como religião de salvação, reli-gião da palavra, o candomblé como religiãoritualística, de manipulação do destino.

A umbanda que nasce retrabalha os ele-mentos religiosos incorporados à cultura bra-sileira por um estamento negro que se dilui ese mistura no refazer das classes sociais, numacidade que, capital federal, é branca, mesmoquando proletária; culturalmente européia;que valoriza a organização burocrática da qualvive boa parte da população residente; quepremia o conhecimento pelo aprendizadoescolar em detrimento da tradição oral; e quejá aceitou o kardecismo como religião, pelomenos entre setores importantes fora da Igre-ja Católica. “Limpar” a religião nascente deseus elementos mais comprometidos com atradição iniciática secreta e sacrificial é to-mar por modelo o kardecismo, capaz de ex-pressar ideais e valores da nova sociedaderepublicana, ali na sua capital. Os passosdecisivos foram a adoção da língua vernácula,a simplificação da iniciação, com a elimina-ção quase total do sacrifício de sangue, inici-ação que ganha, ao estilo kardecista, caracte-rísticas de aprendizado mediúnico público, odesenvolvimento do médium. Mantém-se orito cantado e dançado dos candomblés, bemcomo um panteão simplificado de orixás, jáporém há muitos anos sincretizados com san-tos católicos, reproduzindo-se, portanto, umcalendário litúrgico que segue o da IgrejaCatólica, publicizando-se as festas ao com-passo desse calendário. Entretanto, o centrodo culto no seu dia a dia estará ocupado pelos

guias, caboclos, pretos velhos e mesmo os“maléficos” e interesseiros exus masculinose femininos, as pombagiras, já cultuados emantigos candomblés baianos e provavelmen-te cariocas (Prandi, 1994b).

Na umbanda que se consolidará a partirde então, a presença da entidade no transeritual volta-se mais para a cura, limpeza,aconselhamento dos fiéis e clientes, afastan-do-se de outro ideal kardecista: o de comuni-cação com os mortos com o fim de estenderao mundo dos espíritos atrasados e sofredo-res a doutrinação evangélica caridosa, e rece-ber dos espíritos de luz orientação para odesenvolvimento de virtudes na terra, curasdo corpo e da alma, evolução espiritual dosvivos e dos mortos.

Quando a umbanda nascia, a Igreja Cató-lica lutava pela reiteração da autoridade dahierarquia romanizada, proclamava-se a re-ligião brasileira única, ou única via de diálo-go e intermediação entre o “povo” e o Estadoda ditadura Vargas. Nunca tendo aceitado oespiritismo kardecista, cuja base de prestígiofirmava-se sobre enorme rede de filantropiae adesão de uma intelectualidade da peque-na-burguesia tradicional urbana, a IgrejaCatólica sequer se pronunciava oficialmentesobre a umbanda em seu período inicial, tra-tada por ela, como por intelectuais leigos daépoca, como baixo espiritismo, portanto for-ma degenerada do kardecismo. Só no finaldos anos 1940 a Igreja iria declarar-se aber-tamente contra a umbanda, reconhecendo-aipso facto como religião, e religião inimiga,e importante inimigo. Desligado da IgrejaCatólica desde a república, o Estado, na prá-tica, funcionou por muito tempo como umaespécie de braço armado da Igreja contra oscultos e práticas de origem africana, indígenae mesmo do catolicismo de cura pré-ultramontano. Até o final da ditadura Vargas,assim como antes e pouco depois, a umbandaexperimentou amargamente sistemática per-seguição por parte dos órgãos policiais, comojá experimentara o candomblé da Bahia du-rante a primeira metade do século, o xangôpernambucano nos anos 30 e o xangô alagoanopraticamente dizimado nos anos 20.

Do Rio de Janeiro, a umbanda instala-see se expande em São Paulo rapidamente, de-pois pelo país inteiro. Três décadas depoisserá analisada e festejada como a religiãobrasileira. A adoção da umbanda por São

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Paulo dá-se publicamente. Sua presença nacidade ocorre com grande visibilidade, aindaque os terreiros fossem obrigados a registrar-se nas delegacias policiais. A partir do finaldos anos 50, as festas populares públicas quearregimentam a maior quantidade de devotose simpatizantes são as festas de Iemanjá naspraias de Santos e Praia Grande, nos dias 8 e31 de dezembro de cada ano. Como no Rio deJaneiro e em muitas outras cidades brasilei-ras. A popularização da umbanda em SãoPaulo é já então definitiva, pois que São Pau-lo já é também a metrópole de todos os bra-sileiros, a multidão de cada um, o mercado detodas as coisas e causas, o capricho de todosos gostos, o templo de todos os deuses.

A umbanda, ritualmente muito próximado candomblé dos ritos angola e caboclo, emque já estão esquecidos os inquices bantos,substituídos pelos orixás nagôs, procura in-corporar na doutrina em formação as verda-des teologais do cristianismo – fé, esperançae caridade –, as grandes virtudes católicasadotadas pelo kardecismo, e procura empres-tar desta religião seus modelos de organiza-ção burocrática e federativa. Não logra intei-ramente nem uma coisa nem outra.

Seu panteão tem à frente orixás-santos doscandomblés e xangôs, mas o lugar de desta-que está ocupado por entidades desencarnadassemi-eveméricas, à moda kardecista e africa-na, ou encantados de origem desconhecida, àmoda dos cultos de maior influência indíge-na: os catimbós, os candomblés de caboclos,as encantarias, de onde também se originamcertas práticas rituais, como o uso de bebidaalcoólica e tabaco. A umbanda é a religiãodos caboclos, boiadeiros, pretos velhos, ci-ganas, exus, pombagiras, marinheiros, crian-ças. Perdidos e abandonados na vida, margi-nais no além, mas todos eles com uma mesmatarefa religiosa e mágica que lhes foi dadapela religião de uma sociedade fundada namáxima heterogeneidade social: trabalharpela felicidade do homem sofredor. Ékardecista esta herança da prática da carida-de, que no kardecismo sequer separa o mun-do dos vivos do mundo dos mortos, pois estestambém precisam de ajuda na sua saga emdireção à luz, o desenvolvimento espiritual.É para praticar a caridade que as entidades daumbanda vêm nas sessões do culto; para issosão chamadas durante a metamorfose ritualem que o sacerdote iniciado abandona seus

papéis de mortal para dar lugar à personalida-de dos encantados e dos espíritos. Vêm para“trabalhar”, como se diz, trazendo para asaflições de toda ordem explicações e solu-ções – quantas vezes imploradas em desespe-ro. Explicações e soluções que pertencem aum mundo onde acredita-se não haver os li-mites da temporalidade e da materialidadeterrenas que nos ameaçam traiçoeiramente acada instante e em cada situação de nossasvidas. Ali onde nossa racionalidade não con-ta, posto que aqui, neste nosso mundo, elaestá limitada por nossa condição humana,nossa fragilidade cármica de desejos, frustra-ções e apego à materialidade do corpo, nossodesespero diante da dor, nossa mísera incom-petência de sermos como desejamos e comoos outros desejam que sejamos.

A história dessas religiões aparentadas,porque mediúnicas, porque elos de uma mes-ma cadeia simbólica da nossa própria históriacomo sociedade em formação, porque expe-riências de concepções de mundo, da vida eda morte, tão instigantes, a história dessasreligiões que são o candomblé, o kardecismo,a umbanda, e mais o tambor de mina, o batu-que, a pajelança, o catimbó, tudo isso impreg-nado dos secularizados valores cristãos docatolicismo pré-Restauração e pré-VaticanoII, essa história decifra-se com a história dasociedade. A sociedade é a esfinge. Mas parao crente, o convertido, a religião é a decifra-ção da sociedade. A fé é a privação da dúvida,como alguém já disse.

O refluxo do kardecismo em favor daumbanda, que se verifica decisivamente nadécada de 50, é capaz de espelhar um movi-mento de reordenamento das classes sociaisiniciado nos anos 30, mas muito mais decisi-vamente, um refazer da imagem que se expe-rimenta dessa mesma sociedade. Não é só omomento do nacionalismo, mas também daintervenção do Estado numa política econô-mica que prepara o país para as mudançasprofundas que se darão no sistema produtivono segundo pós-guerra, quando a atividadeprodutiva urbana do eixo Rio–São Paulo rou-ba a cena da produção rural, quando as rela-ções de trabalho de base familiar e as profis-sões rurais perdem definitivamente para oprimado do assalariamento ao modo capita-lista, individual, impondo-se na constituiçãoda sociedade brasileira princípios

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universalistas de qualificação profissional,competição pelos postos de trabalho,monetarização das relações de troca, enquan-to novas classes médias se moldam pela pos-sibilidade de ascensão social individualiza-da. Já é outra a sociedade.

A umbanda, de certo modo, rompe com aconcepção kardecista do mundo: aqui não émais uma terra de sofrimentos onde devemosajustar contas por atos de nossas vidas ante-riores. Trazendo do candomblé a idéia, aindaque desbotada, pouco definida, de que a ex-periência neste mundo implica a obrigaçãode gozá-lo, a idéia de que a realização dohomem se expressa através da felicidadeterrena que ele deve conquistar, a umbandaretrabalha a noção culpada da evoluçãocármica kardecista, assim como, através dapropiciação ritual, descobre a possibilidadede alteração da ordem. É necessário que cadaum procure a sua realização plena, mesmoporque o mundo com o qual nos deparamos éum mundo que valoriza o individualismo, acriatividade, a expansão da capacidade deimaginação, a importância de subir na vida.Este pormenor é essencial.

Por esta forma de ver o mundo, a umbandase situa como uma religião que incentiva a

mobilidade social, porém mais importante doque isso é o fato de que essa mobilidade estáaberta a todos, sem nenhuma exceção: pobresde todas as origens, brancos, pardos, negros,árabes... o status social não está mais impres-so na origem familiar. Trata-se agora, paracada um, de mudar o mundo a seu favor. Eessa religião é capaz de oferecer um instru-mento a mais para isso: a manipulação domundo pela via ritual. As cidades grandes doSudeste, depois todas as outras, conhecem odespacho. Exu está solto pelas ruas e encru-zilhadas do Brasil.

O kardecismo sempre se pensou comoreligião intelectualizada, nascido que foi sobo racionalismo do século XIX. Abandonouno Brasil a intenção de ser também ciência,sob orientação de seu mais importante lídernos últimos dois quartos deste século, Fran-cisco Xavier, para quem “aquele que crê nãoprecisa fazer experiências”. Sua enorme ca-pacidade de organização e de constituiçãoburocrática jamais foi plenamente alcançadapela umbanda: o kardecismo é uma religiãoque deu certo numa sociedade em que “cadaum conhecia seu lugar”. Os líderes espíritasforam pequenos intelectuais de uma pequenaburguesia urbana tradicional, escolarizada,

5

FILHAS-DE-SANTO

EM CERIMÔNIA DE

INICIAÇÃO.

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filhos de famílias com um mínimo de statuse com certa visibilidade social, vivendo nummundo em que os papéis sociais estavam for-temente definidos pela origem familiar e so-cial, e que encontravam no espiritismo umaforma de partilhar idéias e ideais anticlericais,abraçando uma religião cristã, filantrópica,erudita, que aposta nos homens por sua boavontade, por sua capacidade de adesão livre,e que é socialmente conformista. Ainda quemuitos pobres ou uma maioria de pobres cons-tituíssem as bases do kardecismo, do final doséculo passado até poucos anos após 1950, aexistência da religião dependia muito dessacamada média letrada que optara intencio-nalmente por essa religião como alternativacristã ilustrada. Poucos foram no Brasil oslíderes carismáticos do kardecismo. A pró-pria liderança de Chico Xavier impõe a ne-cessidade de produção e estudo de uma lite-ratura, psicografada, que ensina e que salvaatravés da reflexão.

Já o modelo de liderança da umbandatem muito do candomblé, em que todo opoder – verdade e preceito – está nas mãosdo pai ou mãe-de-santo e emana do deus ouespírito que o cavalga, cada um em seu ter-reiro. Na umbanda não há codificaçãofundante, não há um pai fundador, mas simvários e antagônicos entre si. Não há autori-dade superior e nem pensamento disciplina-do que se sobreponha ao carisma do chefe dacasa. A liderança e o governo espiritual sãoentendidos, nas religiões afro-brasileiras,como sendo decorrência do desejo e da de-terminação de divindades e encantados, eque podem mudar constantemente de acor-do com o humor da entidade sobrenaturalque comanda o grupo de culto.

Num país e numa época em que o bem-estar social, em todas as formas de assistên-cia material e previdenciária, não é assumidocomo dever do Estado, a maneira como okardecismo realiza a virtude da caridade, queé assistência espiritual mas também sanitáriae material, fez dele importante parceiro noconjunto da sociedade civil, como as socie-dades de misericórdia católicas, com quempor muito tempo dividiu papéis no cuidadodos desvalidos e desamparados, fossem cri-anças, adultos ou velhos. Foi isso um grandetrunfo do espiritismo em sua defesa contra apregação católica anti-kardecista e em favorde seu reconhecimento institucional pela so-

ciedade. A umbanda se proporá e em parterealizará uma obra assistencial à moda espí-rita, mas já muito menos significativa.

No Estado Novo o governo federal não sóregulamenta o trabalho assalariado, comoinstitui a previdência social e as aposentado-rias. Grande parte das tarefas das obras filan-trópicas e assistenciais vai sendo incorpora-das pelo Estado, que passa também a financi-ar órgãos não-governamentais de assistência,especialmente hospitais, asilos, orfanatos.Vão se criando na população expectativas porserviços sociais que passam a ser reivindica-dos como direitos pela população junto aosgovernos federal, estadual e municipal. Cadavez mais o Estado se embrenhará nessas ques-tões. Ainda que os serviços oferecidos sejamruins, sua prestação não é mais um benefícioda caridade laica ou religiosa, é direito docidadão. Corrói-se o campo de atuação socialdo kardecismo filantrópico.

O kardecismo, uma das chaves daumbanda, é uma religião de transe, da expe-riência religiosa pessoal, e ao mesmo tempouma religião da palavra, da pregação doutri-nária codificada em livros religiosos de auto-ridade incontestável. Dotado de um códigomoral e doutrinário explícito e de procedi-mentos condutores da experiência religiosapúblicos e publicados, a iniciação nokardecismo adotou uma pedagogia do não-segredo, do não-mistério. Essa univer-salização contribuiu enormemente para umaacentuada unificação burocrático-insti-tucional. Mas a umbanda carrega tambémconsigo parte duma norma muito cara aoscandomblés, que é a do segredo, do recolhi-mento iniciático, da infalibilidade da mãe-de-santo, da autoridade ex-cathedra do orixáacima de qualquer preceito, tendo por conse-qüências enormes dificuldades de unificaçãodoutrinária e institucional. Nunca será reli-gião unificada. Nunca terá um único código.Sempre será sectária e divisionista, como ocandomblé.

O ideal de transe consciente kardecista eo transe modelar inconsciente que a umbandatrouxe do candomblé têm também significa-do nas formas diferentes de sociabilidade quese estabelecem nesses grupos religiosos. Osacerdote umbandista não é doutrinariamen-te nem moralmente responsável pelo uso quedele faz a entidade que o possui. Para os

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kardecistas as virtudes e habilidades intelec-tuais do médium condicionam e interferemna plena manifestação do espírito incorpora-do. Essa diferença leva a noções muito distin-tas de código moral, autoridade, responsabi-lidade e poder.

Embora o candomblé não faça distinçãoentre o bem e o mal, no sentido judaico-cris-tão, uma vez que o seu sistema de moralidadebaseia-se na relação estrita entre homem eorixá, relação esta de caráter propiciatório esacrificial, e não entre os homens como umacomunidade em que o bem do indivíduo estáinscrito no bem coletivo, a umbanda, por suaherança kardecista, preservou o bem e o malcomo dois campos legítimos de atuação, mastratou logo de os separar em departamentosestanques. A umbanda se divide numa linhada direita, voltada para a prática do bem e quetrata com entidades “desenvolvidas”, e numalinha da “esquerda”, a parte que pode traba-lhar para o “mal”, também chamadaquimbanda, e cujas divindades, “atrasadas”ou demoníacas, sincretizam-se com aquelasdo inferno católico ou delas são tributárias.Essa divisão, contudo, pode ser meramenteformal, como uma orientação classificatóriaestritamente ritual e com frouxa importânciaética. Na prática, não há quimbanda semumbanda nem quimbandeiro que não sejaumbandista, pois são duas faces de uma mes-ma concepção religiosa.

Assim, estão do lado “direito” os orixás,sincretizados com os santos católicos, e queocupam no panteão o posto de chefes de li-nhas e de falanges, que são reverenciados,mas que pouco ou nada participam do “traba-lho” da umbanda, isto é, da intervenção má-gica no mundo dos homens para a solução detodos os seus problemas, que é o objetivoprimeiro da umbanda enquanto religião ritu-al. Ainda do lado do “bem” estão o caboclo(que representa a origem brasileira autêntica,o antepassado indígena) e o preto-velho (sím-bolo da raiz africana e marca do passadoescravista e de uma vida de sofrimentos epurgação de pecados). Na “esquerda” estãoos exus masculinos e as pombagiras,sincretizados com demônios católicos, sem-pre dispostos a trabalhar “para o mal”, visan-do sempre o bem de seus adeptos, amigos eclientes. Embora religião surgida neste sécu-lo, durante e em função do processo intensode urbanização e industrialização, o panteão

da umbanda é constituído sobretudo de enti-dades extraídas de um passado histórico queremonta pelo menos ao século XIX. Ela nun-ca incorporou, sistematicamente, os espíritosde homens e mulheres ilustres contemporâ-neos que marcam o universo das entidades doespiritismo kardecista.

As respostas que os umbandistas encon-tram ao se enfrentarem com a sociedade emmudança, o sentido que eles experimentamao lidar religiosamente com este mundo queeles podem manipular, e a noção de poder deorigem religiosa que eles conhecem e usampodem levar muitos deles ao desejo de senti-rem ampliadas essas respostas, essas possibi-lidades de manipular o mundo, esse poder. Aumbanda não terá sido em suas vidas a reli-gião final. É enorme o número de ex-umbandistas hoje filiados ao candomblé.

CANDOMBLÉ, AGORA TAMBÉMUMA RELIGIÃO PARA TODOS

Por volta de 1950, a umbanda já tinha seconsolidado como religião aberta a todos, nãoimportando as distinções de raça, origemsocial, étnica e geográfica. Por ter a umbandadesenvolvido sua própria visão de mundo,bricolage européia-africana-indígena, símbo-lo das próprias origens brasileiras, ela podese apresentar como fonte de transcendênciacapaz de substituir o velho catolicismo ouentão juntar-se a ele como veículo de renova-ção do sentido religioso da vida. Depois dever consolidados os seus mais centrais aspec-tos, ainda no Rio de Janeiro e São Paulo, aumbanda espalhou-se por todo o país, poden-do ser também agora encontrada vicejandona Argentina, no Uruguai e outros países la-tino-americanos, além de Portugal (4).

Durante os anos 1960, contudo, algo sur-preendente começou a acontecer. Com a lar-ga migração proveniente do Nordeste embusca das grandes cidades industrializadas noSudeste, o candomblé começou a penetrar obem estabelecido território da umbanda, evelhos umbandistas começaram a se iniciarno candomblé, muitos deles abandonando osritos da umbanda para se estabelecer comopais e mães-de-santo das modalidades maistradicionais de culto aos orixás. Neste movi-mento, a umbanda é remetida de novo aocandomblé, sua velha e “verdadeira” raizoriginal, considerada pelos novos seguidores

4 Sobre a presença das reli-giões afro-brasileiras empaíses do Cone Sul, verOro, 1993; Frigerio &Carozzi, 1993; Pi Hugarte1993; Prandi, 1991c; naVenezuela, Polallak-Eltz,1993; em Portugal,Pordeus Jr. ,1995.

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como sendo mais misteriosa, mais forte, maispoderosa que sua moderna e embranquecidadescendente.

Nesse período da história brasileira, asvelhas tradições até então preservadas naBahia e outros pontos do país encontraramexcelentes condições econômicas para se re-produzirem e se multiplicarem mais ao sul; oalto custo dos ritos deixou de ser um cons-trangimento que as pudesse conter. E mais,naquele período, importantes movimentos declasse média buscavam por aquilo que pode-ria ser tomado como as raízes originais dacultura brasileira. Intelectuais, poetas, estu-dantes, escritores e artistas participaram des-sa empreitada, que tantas vezes foi bater àporta das velhas casas de candomblé da Bahia.Ir a Salvador para se ter o destino lido nosbúzios pelas mães-de-santo tornou-se um mustpara muitos, uma necessidade que preenchiao vazio aberto por um estilo de vida modernoe secularizado tão enfaticamente constituídocom as mudanças sociais que demarcavam ojeito de viver nas cidades industrializadas doSudeste, estilo de vida já, quem sabe?, eivadode tantas desilusões (Prandi, 1991a).

O candomblé encontrou condições soci-ais, econômicas e culturais muito favoráveispara o seu renascimento num novo território,em que a presença de instituições de origemnegra até então pouco contava. Nos novosterreiros de orixás que foram se criando en-tão, entretanto, podiam ser encontrados po-bres de todas as origens étnicas e raciais. Elesse interessaram pelo candomblé. E os terrei-ros cresceram às centenas.

Os anos durante os quais o candomblé viráa se instalar em São Paulo, grosseiramentedos meados dos 60 aos primeiros anos dos 70,e que estamos habituados a chamar simples-mente de “os anos 60”, marcam um períodode fundamentais efervescências no plano dacultura e das mentalidades; profundas são asmudanças em relação aos modos de vida eaos códigos intelectuais. Na Europa, nos Es-tados Unidos, no Brasil. No Brasil, sobrema-neira no Sudeste, nas grandes cidades, nametrópole paulista.

São os anos da contracultura, da recupe-ração do exótico, do diferente, do original. Ajuventude ocidental ilustrada se rebela, tomagosto pelas civilizações orientais, seus mis-térios transcendentais e ocultistas (lembremo-nos dos Beatles e da peregrinação da juven-

tude americana e européia em busca dos gurusdo Himalaia). Valoriza-se a cultura do outro.No Brasil, valoriza-se a cultura indígena. Aantropologia redimensiona a etnografia parafazer política indigenista. E valoriza-se acultura negra, sobretudo a negro-baiana. Asociedade sai em busca de suas raízes. É pre-ciso voltar para a Bahia – “por que não?” –,acampar em Arembepe. Abrir as portas dapercepção, ir em busca do prazer, da expan-são da sensibilidade, de gratificações imedi-atas para o corpo e para a mente.

O inconformismo e o desprezo pela cultu-ra racional, essa mudança de rumos, está nasclasses médias. Não obstante, vale lembrarque o movimento se mostra de forma genera-lizada através da mídia, que já é eletrônica, eprovoca novos gostos, traz novas informa-ções. A intelectualidade brasileira de maiorlegitimidade nos anos 60 participará ativa-mente de um projeto de recuperação de ori-gens, que vai remeter muito diretamente àBahia.

Em 1964, através da antiga TV Excelsior,Elis Regina canta “Arrastão”, de Ruy Guerrae Edu Lobo: “Eh, meu irmão me traz Iemanjápra mim/ Nunca jamais se viu tanto peixeassim...” Da modernidade da Bossa Novapartia-se para a recuperação do conteúdo deuma brasilidade “legítima”. Iemanjá, diga-sede passagem, já é muito conhecida no Sul-Sudeste através da umbanda. Mas, na medidaem que a referência passa a ser a Bahia, oorixá passa a ser referido como o da Bahia,isto é, o do candomblé. São anos de produçãode uma nova forma de cantar em que elemen-tos da cultura do candomblé vão se firmandocom legitimidade entre as classes médiasconsumidoras do que se produz de mais avan-çado no país. Da Bossa Nova à Tropicália, osbaianos estão na ponta da renovação da mú-sica popular brasileira. A música “Canto deOssanha” de Vinícius e Baden, ainda comElis, mas já pela TV Record, é novo marco.Virão Caetano Veloso, Gilberto Gil, GalCosta, Maria Bethânia, entre os mais impor-tantes. Tudo leva à Bahia: o Cinema Novo, asartes cênicas. Com O Pagador de Promes-sas, filme de Anselmo Duarte adaptado dapeça de Dias Gomes, o Brasil se reconhece ese faz reconhecer nas telas do mundo inteiro.Iansã, Santa Bárbara da promessa, está nocentro do enredo: o padre contra, o povo afavor. O paladar do país experimenta o sabor

NA OUTRA PÁGINA,

IEMANJÁ,

A GRANDE MÃE

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do azeite de dendê. Aprendemos a gostar deacarajé, vatapá, bobó, caruru...

Essa enorme publicidade e popularidadeque a Bahia e a cultura negro-baiana vão al-cançando, através também da literatura deJorge Amado, de peças de teatro como Zum-bi (“...ziquizira posso tirar..., Upa Neguinhona estrada...”), apresenta-nos às veneráveismães-de-santo dos candomblés de Salvador:primeiro Olga do Alaketo, depois, e definiti-vamente, Menininha do Gantois. Nas vozesde Gal e Bethânia, e tantos outros, o Brasilinteiro aprende a cantar, de Caymmi, “AOxum mais bonita está no Gantois... Ai, mi-nha mãe, minha mãe Menininha...”. Pelamúsica popular aprendemos os nomes dossantos, que também são os da umbanda, masagora é necessário ir até a Bahia para pedir abênção de Mãe Menininha do Gantois, parajogar os búzios e ler a sorte, para experimen-tar o sabor do feitiço, o verdadeiro.

Esse consumo, que não é do pobre, mas édo jovem, do estudado, do branco metropolita,leva primeiro essa classe média aos terreirosda Bahia: há um novo universo no mercadoreligioso interno, à altura das formas maisoriginais e herméticas do Oriente. Mas ametrópole não vai pagar por muito tempo opreço de ir tão longe. Quer que a Bahia sejarefeita aqui, em São Paulo, por que não? Equando o candomblé chegar, sua clientela jáestará de prontidão. Uma clientela de classemédia, aliás, indispensável para garantir ainfra-estrutura dessa religião, clientela quese ampliará e se diversificará muito, eviden-temente. De toda sorte, já temos aí uma pré-condição importante. E o povo-de-santo quedescerá da Bahia, para essa nova fronteira dametrópole do Sudeste, e que aqui abrirá ter-reiros e fará filhos-de-santo, refazendo aqui areligião de lá, oferecendo aqui os feitiços eadivinhações lá aprendidos, vai querer ser,todo ele, um filho do candomblé do Gantois,um filho de Mãe Menininha. Mas isso é outrahistória...

É nesse contexto (econômico, social ecultural), que o candomblé chega e se instalaem São Paulo. Como religião, abstratamente,reforçará idéias de que a competição na soci-edade é bem mais aguda do que se podia pen-sar, que é preciso chegar a níveis de conheci-mento muito mais densos e cifrados, que opoder religioso tem amplas possibilidades dese fazer aumentar. Na prática, enquanto gru-

po de culto, comunidade de fiéis, permitirá otrânsito num espaço em que não há separaçãoentre a intimidade e a publicidade. Onde,portanto, não há nada a esconder ou reprimir,com relação a si mesmo e com relação aosdemais. Onde também podemos ser o quesomos, o que gostaríamos de ser e o que osoutros gostariam que fôssemos. A um mesmotempo.

Como agência de serviços religiosos ofe-recerá ao não-devoto um tipo de serviço emque o sagrado, o estritamente religioso, épouco exigente para quem busca uma reli-gião não para ser ou por ser religioso, massimplesmente para a solução de um problemanão resolvido por outros meios. Aos olhos docliente, a densa sacralidade do candomblépode passar despercebida. Isso permitirá aohomem de mentalidade laicizada das classesmédias – de onde sai o grosso da clientela docandomblé na metrópole – um menor ou nuloenvolvimento religioso quando se trata de umasolução ad hoc: posto que pensada comomagia executada pelo sacerdote e menos comointervenção de uma divindade espiritual queele tem que enfrentar face to face na umbanda.Este deslocamento da magia em relação aoplano da religião, no sentido de que a magiapode ser exercida e pensada como práticaautônoma, às vezes até se vale de procedi-mentos aparentemente científicos, isto é, to-talmente dessacralizados e racionais. Só queagora é a religião que dá legitimidade paraessa mágica “autônoma” e, por isso, nem éconsiderada magia, nem julgada perniciosapara a sociedade.

Essa legitimidade de elementos de umacultura negra, ou de origem africana, cujoceleiro mais importante é a Bahia, essalegitimação da “raiz”, gestada pela classemédia intelectualizada do Rio e de São Paulo,que adota os artistas e intelectuais baianos,inclusive, propaga-se pela mídia eletrônica echega a todas as classes sociais. Também entreos pobres, que não viviam esse desejo de re-torno e rebeldia que atracou no Porto da Bar-ra, subiu a ladeira do Gantois na Federação ese embrenhou pelo Matatu de Brotas. E sealastrou inclusive entre umbandistas, que comesforço buscavam desde muito apagar justa-mente essa mesma origem não branca de suareligião, essa Bahia, essa África. No imagi-nário desse crente, crente que é pobre, o orixá“original”, cantado e cortejado por aquele que

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é mais rico, mais escolarizado, famoso e maisbem sucedido na vida, esse orixá cultuado àmoda “antiga”, à moda dos candomblés, vaise revelando mais forte, mais rico, mais “au-têntico”, mais poderoso. Mais que nunca,numa sociedade como a de agora, “é precisoestar atento e forte”, nas palavras do inventorda Tropicália. O novo adepto do candomblédiria: mais forte.

O sacerdócio e organização dos ritos parao culto dos orixás são complexos, com todoum aprendizado que administra os padrõesculturais de transe, pelo qual os deuses semanifestam no corpo de seus iniciados du-rante as cerimônias, para serem admirados,louvados, cultuados. Os iniciados, filhos efilhas-de-santo (iaô, em linguagem ritual),também são popularmente denominados “ca-valos dos deuses” uma vez que o transe con-siste basicamente em um mecanismo pelo qualcada filho ou filha se deixa cavalgar pela di-vindade, que se apropria do corpo e da mentedo iniciado, num modelo de transe inconsci-ente bem diferente daquele do kardecismo,em que o médium, mesmo em transe, devesempre permanecer atento à presença do es-pírito. O processo de se transformar num “ca-valo” é uma estrada longa, difícil e cara, sem-pre com a presença do sacrifício de sangue(Prandi, 1991b; Motta, 1991).

Para começar, a mãe-de-santo deve de-terminar, através do jogo de búzios, qual é oorixá dono da cabeça daquele indivíduo(Prandi, 1994a). Ele ou ela recebe então umfio de contas sacralizado, cujas cores sim-bolizam o seu orixá, dando-se início a umlongo aprendizado que acompanhará o mes-mo por toda a vida. A primeira cerimôniaprivada a que a noviça (abiã) é submetidaconsiste num sacrifício votivo à sua própriacabeça (ebori), para que a cabeça possa sefortalecer e estar preparada para algum diareceber o orixá no transe de possessão. Parase iniciar como cavalo dos deuses, a abiãprecisa juntar dinheiro suficiente para co-brir os gastos com as oferendas (animais eampla variedade de alimentos e objetos),roupas cerimoniais, utensílios e adornos ri-tuais e demais despesas suas, da família-de-santo, e eventualmente de sua própria famí-lia durante o período de reclusão iniciáticaem que não estará, evidentemente, disponí-vel para o trabalho no mundo profano.

Como parte da iniciação, a noviça perma-nece em reclusão no terreiro por um númeroem torno de 21 dias. Na fase final da reclusão,uma representação material do orixá do inici-ado (assentamento ou ibá-orixá) é lavada comum preparado de folhas sagradas trituradas(amassi). A cabeça da noviça é raspada e pin-tada, assim preparada para receber o orixá nocurso do sacrifício então oferecido (orô).Dependendo do orixá, alguns dos animaisseguintes podem ser oferecidos: cabritos,ovelhas, pombas, galinhas, galos, caramujos.O sangue é derramado sobre a cabeça da no-viça, no assentamento do orixá e no chão doterreiro, criando este sacrifício um laço sa-grado entre a noviça, o seu orixá e a comuni-dade de culto, da qual a mãe-de-santo é acabeça. Durante a etapa das cerimôniasiniciáticas em que a noviça é apresentada pelaprimeira vez à comunidade, seu orixá gritaseu nome, fazendo-se assim reconhecer portodos, completando-se a iniciação como iaô(iniciada jovem que “recebe” orixá). O orixáestá pronto para ser festejado e para isso évestido e paramentado, e levado para juntodos atabaques, para dançar, dançar e dançar.

No candomblé sempre estão presentes oritmo dos tambores, os cantos, a dança e acomida. Uma festa de louvor aos orixás (to-que) sempre se encerra com um grande ban-quete comunitário (ajeum, que significa “va-mos comer”), preparado com carne dos ani-mais sacrificados. O novo filho ou filha-de-santo deverá oferecer sacrifícios e cerimôni-as festivas ao final do primeiro, terceiro esétimo ano de sua iniciação. No sétimo ani-versário, recebe o grau de senioridade (ebômi,que significa “meu irmão mais velho”), es-tando ritualmente autorizado a abrir sua pró-pria casa de culto. Cerimônias sacrificiais sãotambém oferecidas em outras etapas da vida,como no vigésimo primeiro aniversário deiniciação. Quando o ebômi morre, rituaisfúnebres (axexê) são realizados pela comuni-dade para que o orixá fixado na cabeça duran-te a primeira fase da iniciação possa desligar-se do corpo e retornar ao mundo paralelo dosdeuses (orum) e para que o espírito da pessoamorta (egum) liberte-se daquele corpo, pararenascer um dia e poder de novo gozar dosprazeres deste mundo.

O candomblé, seguido de perto pelaumbanda, opera em um contexto ético no qual

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a noção judaico-cristã de pecado tem poucaou nenhuma importância, não faz sentido. Adiferença entre o bem e o mal depende basi-camente da relação entre o seguidor e seudeus pessoal, o orixá. Não há um sistema demoralidade referido ao bem-estar da coletivi-dade humana, pautando-se o que é certo ouerrado na relação entre cada indivíduo e seuorixá particular. A base moral está inscrita nocotidiano pelo catolicismo ou pelos valoresnão religiosos da sociedade. A ênfase da re-ligião, emblematicamente do candomblé, estáno rito e na iniciação, que é quase interminá-vel, gradual e secreta. O culto demanda sacri-fício de sangue animal, oferta de alimentos evários ingredientes. A carne dos animais aba-tidos nos sacrifícios votivos do candomblé écomida pelos membros da comunidade reli-giosa, enquanto o sangue e certas partes dosanimais, como patas e cabeça, órgãos inter-nos e costelas, são oferecidos aos orixás.Somente iniciados têm acesso a essas ceri-mônias, conduzidas em espaços privativosdenominados quartos-de-santo. Uma vez queo aprendizado religioso sempre se dá longedos olhos do público, a religião acaba por serecobrir de uma aura de sombras e mistérios,embora todas as danças, que são o ponto altodas celebrações, ocorram sempre no barra-cão, que é o espaço aberto ao público. Ascelebrações de barracão, os toques, consis-tem numa seqüência de danças, em que, umpor um, são honrados todos os orixás, cadaum se manifestando no corpo de seus filhos efilhas, sendo vestidos com roupas de coresespecíficas, usando nas mãos ferramentas eobjetos particulares a cada um deles, expres-sando-se em gestos e passos que reproduzemsimbolicamente cenas de suas biografiasmíticas. Essa seqüência de música e dança,sempre ao som dos atabaques, é designadaxirê, que em iorubá significa “vamos brin-car”. O lado público do candomblé é semprefestivo, bonito, esplendoroso, esteticamenteexagerado para os padrões europeus, e extro-vertido.

Para o grande público, desatento para odifícil lado da iniciação, o candomblé é vistocomo um grande palco em que se reprodu-zem tradições afro-brasileiras igualmentepresentes, em menor grau, em outras esferasda cultura, como a música e a escola de sam-ba. Para o não-iniciado dificilmente se con-cebe que a cerimônia de celebração no can-

domblé seja algo mais que um eterno dançardos deuses africanos. No emaranhado de rit-mos, danças e transes, poucos não-iniciadosdistinguem o candomblé da umbanda, tantasvezes compartilhando o mesmo terreiro e omesmo grupo de culto.

Conseqüência de sua própria concepçãode moralidade e prática de manipulação má-gica, as religiões negras foram se responsabi-lizando pelo atendimento a uma grande de-manda por serviços mágico-religiosos de umalarga clientela que não necessariamente tomaparte em qualquer aspecto das atividades doculto. No candomblé, os clientes procuram amãe ou pai-de-santo para o oráculo do jogode búzios, através do qual problemas sãodesvendados e oferendas são prescritas parasua solução. O cliente paga pelo jogo de bú-zios e pelo sacrifício propiciatório (ebó) even-tualmente recomendado. O cliente, em geral,fica sabendo qual é o orixá dono de sua cabe-ça e pode mesmo comparecer às festas emque se faz a celebração de seu orixá, podendocolaborar com algum dinheiro no preparo dasfestividades, embora não sele nenhum com-promisso com a religião. O cliente sabe quasenada sobre o processo iniciático e nunca tomaparte nele. Entretanto, ele tem uma duplaimportância: antes de mais nada, sua deman-da por serviços ajuda a legitimar o terreiro eo grupo religioso em termos sociais. É daclientela que provém, na maioria dos terrei-ros, uma substancial parte dos fundos neces-sários para as despesas com as atividadessacrificiais. Comumente, sacerdotes e sacer-dotisas do candomblé que adquirem alto graude prestígio na sociedade inclusiva gostamde nomear, entre seus clientes, figuras impor-tantes dos mais diversos segmentos da soci-edade.

Segundo o candomblé, cada indivíduopertence a uma divindade específica, que é osenhor de sua cabeça e mente e de quem her-da características físicas e de personalidade.É prerrogativa religiosa do pai ou mãe-de-santo descobrir a origem mítica através dojogo de búzios. Esse conhecimento é absolu-tamente imperativo no processo de iniciaçãode novos devotos e mesmo para se fazeremprevisões do futuro para clientes, assim comopara resolver seus problemas. Embora naÁfrica haja registro de culto a cerca de 400orixás, apenas duas dezenas deles sobrevive-ram no Brasil. A cada um destes cabe o papel

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de reger e controlar forças da natureza e as-pectos do mundo, da sociedade e da pessoahumana. Cada um tem suas próprias caracte-rísticas, elementos naturais, cores simbóli-cas, vestuário, músicas, alimentos, bebidas,além de se caracterizar por ênfase em certostraços de personalidade, desejos, defeitos, etc.Nenhum orixá é nem inteiramente bom, neminteiramente mal. Noções ocidentais de beme mal estão ausentes da religião dos orixás noBrasil. E os devotos acreditam que os homense mulheres herdam muitos dos atributos depersonalidade de seus orixás, de modo queem muitas situações a conduta de alguém podeser espelhada em passagens míticas que rela-tam as aventuras dos orixás. Isso evidente-mente legitima, aos olhos da comunidade deculto, tanto as realizações como as faltas decada um.

De fato, o seguidor do candomblé podesimplesmente tomar os atributos do seu orixácomo se fossem os seus próprios e tentar separecer com ele, ou reconhecer através dosatributos da divindade bases que justificamsua conduta. Os padrões apresentados pelosmitos dos orixás podem assim ser usados comomodelo a ser seguido, ou como validaçãosocial para um modo de conduta já presente.Um iniciado pode, ao familiarizar-se com seusestereótipos míticos, identificar-se com elese reforçar certos comportamentos, ou sim-plesmente chamar a atenção dos demais paraeste ou aquele traço que sela sua identidademítica. Mudar ou não o comportamento nãoé importante; o que conta é sentir-se próximodo modelo divino.

Além de seu orixá dono da cabeça, acre-dita-se que cada pessoa tem um segundo orixá,que atua como uma divindade associada quecomplementa o primeiro. Diz-se, por exem-plo: “Sou filho de Oxalá e Iemanjá”. Geral-mente, se o primeiro é masculino, o segundoé feminino, ou vice-versa, como se cada umtivesse pai e mãe. A segunda divindade tempapel importante na definição do comporta-mento, permitindo operar-se com combina-ções muito ricas. Como cada orixá particularda pessoa deriva de uma qualidade do orixágeral, que pode ser o orixá em idade jovem oujá idoso, ou o orixá em tempo de paz ou deguerra, como rei ou como súdito, etc., etc., asvariações que servem como modelos sãoquase inesgotáveis.

Às vezes, quando certas características

incontestes de um orixá não se ajustam a umapessoa tida como seu filho, não é incomumnos meios do candomblé duvidar-se daquelafiliação, suspeitando-se que aquele iniciadoestá com o “santo errado”, ou seja, mal-iden-tificado pela mãe ou pai-de-santo responsá-vel pela iniciação. Nesse caso, o verdadeiroorixá tem que ser descoberto e o processo deiniciação reordenado. Pode acontecer tam-bém a suspeita de que o santo está certo, masque certas passagens míticas de sua biogra-fia, que explicariam aqueles comportamen-tos, estão perdidas. No candomblé sempre setem a idéia de que parte do conhecimentomítico e ritual foi perdida na transposição daÁfrica para o Brasil, e de que em algum lugarexiste uma verdade perdida, um conhecimentoesquecido, uma revelação escondida. Pode-se mudar de santo, ou encetar interminávelbusca desse conhecimento “faltante”, buscaque vai de terreiro em terreiro, de cidade emcidade, na rota final para Salvador, reconhe-cidamente o grande centro do conhecimentosacerdotal e do mais legítimo axé. Essa bus-ca, às vezes, pode levar até a África e não raroà mera etnografia registrada pela antropolo-gia daqui e de lá. Reconhece-se que falta“alguma coisa” que precisa ser recuperada,completada. A construção da religião, de seusdeuses, símbolos e significados estará sem-pre longe de ter se completado. Os seguido-res, evidentemente, nunca se dão conta disso.

Quando as religiões negras se organiza-ram no Nordeste, no século XIX, elas permi-tiam ao iniciado a reconstrução simbólica,através do terreiro, da sua comunidade tribalafricana perdida. Primeiro elas eram o elo como mundo original. Representavam o meca-nismo através do qual o negro africano e bra-sileiro podia distanciar-se culturalmente domundo dominado pelo opressor branco. Onegro podia contar com um mundo negro,fonte de uma África simbólica, mantido vivopela vida religiosa dos terreiros, como meiode resistência ao mundo branco, que era omundo do trabalho, do sofrimento, da escra-vidão, da miséria. Bastide mostrou como ahabilidade do negro, durante o período colo-nial, de viver em dois diferentes mundos aomesmo tempo era importante para evitar ten-sões e resolver conflitos difíceis de suportarsob a condição escrava (Bastide, 1978). Logo,o mesmo negro que reconstruiu a África noscandomblés reconheceu a necessidade de ser,

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que as estruturas sociais tinham mais o as-pecto de estamentos que de classes, agoraele tem o sentido de escolha pessoal, livre,intencional: alguém adere ao candomblé nãopelo fato de ser negro, mas porque sente queo candomblé pode fazer sua vida mais fácilde ser vivida, porque então talvez se possaser mais feliz, não importa se se é branco ounegro. Estimativas recentes obtidas atravésde surveys nacionais atestam que os negrosainda hoje marcam maior presença nas reli-giões afro-brasileiras, onde somam, entrepardos e pretos, 42,7% da população adultabrasileira. Sua presença relativa sobe aindamais no candomblé, originariamente a gran-de fonte de identidade negra, em que che-gam a 56,8% — a única modalidade religi-osa em que o negro é a maioria dos fiéis.Mas há muito branco nas religiões afro-bra-sileiras (51,2%) e mesmo no candomblé, emque representam 39,9%. Em números abso-lutos, os maiores contingentes negros são,evidentemente, católicos e em segundo lu-gar, evangélicos (Prandi, 1995).

O desatar de laços étnicos que, no cursodas últimas três décadas, tem transformadoo candomblé numa religião para todos, tam-bém propiciou um nada desprezível alarga-mento da oferta de serviços mágicos para apopulação exterior aos grupos de culto.Uma clientela já acostumada a compor vi-sões de mundo particulares a partir de frag-mentos originários de diferentes métodos efontes de interpretação da vida. O candom-blé oferece símbolos e sentidos hoje muitovalorizados pela música, literatura, artes emgeral, os quais podem ser fartamente usa-dos pela clientela na composição dessa vi-são de mundo caleidoscópica, sem nenhumcompromisso religioso. O cliente de classemédia que vai aos candomblés para jogarbúzios e fazer ebós é o bricoleur que tam-bém tem procurado muitas outras fontesnão-racionais de sentido para a vida e decura para males de toda natureza. Certa-mente o candomblé deste cliente é bemdiferente do candomblé do iniciado, masnenhum deles contradiz o sentido do outro.

O candomblé é uma religião cujo centroé o rito, as fórmulas de repetição, poucoimportando as diferenças entre o bem e omal no sentido cristão. O candomblé admi-nistra a relação entre cada orixá e o serhumano que dele descende, evitando, atra-

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OSSÃE, ORIXÁ

DAS FOLHAS.

sentir-se e se mostrar brasileiro, como únicapossibilidade de sobrevivência, e percebeuque para ser brasileiro era absolutamenteimperativo ser católico, mesmo que se fossetambém de orixá. O sincretismo se fundaneste jogo de construção de identidade. Ocandomblé nasce católico quando o negroprecisa ser também brasileiro.

Quando o candomblé, a partir dos anos1960, deslancha a caminho de se tornar re-ligião universal, afrouxa-se seu foco nas di-ferenças raciais e ele vai deixando para trásseu significado essencial de mecanismo deresistência cultural, embora continue a pro-ver esse mecanismo a muitas populaçõesnegras que vivem de certo modo econômicae culturalmente isoladas em regiões tradici-onais do Brasil. As novas condições de vidana sociedade brasileira industrializada fa-zem mudar radicalmente o sentido socioló-gico do candomblé. Se até poucas décadasatrás ele significava uma reação à segrega-ção racial numa sociedade tradicional, em

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vés da oferenda, os desequilíbrios dessarelação que podem provocar a doença, amorte, as perdas materiais, o abandonoafetivo, os sofrimentos do corpo e da almae toda sorte de conflito que leva à infelici-dade. Como religião em que não existe apalavra no sentido ético, nem a conseqüen-te pregação moral, o candomblé (juntamentecom a umbanda, que contudo tem seu as-pecto de religião aética atenuado pela in-corporação de virtudes teologais dokardecismo, como a caridade) é sem dúvi-da uma alternativa religiosa importante tam-bém para grupos sociais que vivem numasociedade como a nossa, em que a ética, oscódigos morais e os padrões de comporta-mento estritos podem ter pouco, variado eaté mesmo nenhum valor.

Embora a religião faça parte do domí-nio da intimidade, a relação do indivíduocom a sociedade, que ela dota de significa-dos, acaba por conectá-la com os processosmais gerais e coletivos da sociedade, comoa política, acarretando, conseqüentemente,efeitos da religião nas escolhas dos segui-

dores no que diz respeito à política partidá-ria (5).

O candomblé é uma religião que afirmao mundo, reorganiza seus valores e tam-bém reveste de estima muitas das coisasque outras religiões consideram más: porexemplo, o dinheiro, os prazeres (inclusiveos da carne), o sucesso, a dominação e opoder. O iniciado não tem que internalizarvalores diferentes daqueles do mundo emque vive. Ele aprende os ritos que tornama vida neste mundo mais fácil e segura,mundo pleno de possibilidades de bem-es-tar e prazer. O seguidor do candomblé pro-picia os deuses na constante procura domelhor equilíbrio possível (ainda que tem-porário) entre aquilo que ele é e tem e aqui-lo que ele gostaria de ser e ter. Nessa pro-cura, é fundamental que o iniciado confiecegamente em sua mãe-de-santo. Guiadopor ela, o fiel aprende, ano após ano, a re-petir cada uma das fórmulas iniciáticasnecessárias à manipulação da força sagra-da da natureza, o axé. Não se pode ser docandomblé sem constantemente refazer o

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FILHAS-DE-SANTO

DESCANSANDO.

5 Sobre as religiões afro-bra-sileiras e escolha político-partidária, ver Prandi,1991b, 1992; Pierucci &Prandi, 1995.

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rito, como não se pode ser evangélico semconstantemente examinar a própria consci-ência à procura da culpa que delata a pre-sença das paixões que precisam ser exorciza-das. O bom evangélico, para se salvar da da-nação eterna, precisa aniquilar seus desejosmais escondidos; o bom filho-de-santo preci-sa realizar todos os seus desejos para que oaxé, a força sagrada de seu orixá, de quem écontinuidade, possa se expandir e se tornarmais forte. Aceitando o mundo como ele é, ocandomblé aceita a humanidade, situando-ano centro do universo, apresentando-se comoreligião especialmente dotada para a socie-dade narcisista e egoísta em que vivemos.

Porque o candomblé não distingue entreo bem e o mal do modo como aprendemoscom o cristianismo, ele tende a atrair tam-bém toda sorte de indivíduos que têm sidosocialmente marcados e marginalizados poroutras instituições religiosas e não-religio-sas. Isso mostra como o candomblé aceita omundo, mesmo quando ele é o mundo darua, da prostituição, dos que já cruzaram asportas da prisão. O candomblé não discri-mina o bandido, a adúltera, o travesti e todotipo de rejeitado social. Mas se o candomblélibera o indivíduo, ele também libera o mun-do: não tem para este nenhuma mensagemde mudança; não deseja transformá-lo emoutra coisa, como se propõem, por exemplo,os católicos que seguem a Teologia da Li-bertação, sempre interessados em substituireste mundo por outro mais justo. O candom-blé se preocupa sobretudo com aspectosmuito concretos da vida: doença, dor, de-semprego, deslealdade, falta de dinheiro,comida e abrigo — mas sempre tratando dosproblemas caso a caso, indivíduo a indiví-duo, pois não se trabalha aqui com a noçãode interesses coletivos, mas sempre com ade destino individual. O candomblé tambémpode ser a religião ou a magia daquele que jáse fartou dos sentidos dados pela razão, ci-ência e tecnologia, e que deixou de acreditarno sentido de um mundo totalmente desen-cantado, que deixou para trás a magia, emnome da eficácia do secular pensamentomoderno. Talvez o candomblé possa ser areligião daquele que não consegue atinar como senso de justiça social suficiente para re-solver muitos dos problemas que cada indi-víduo enfrenta no curso de sua vida pelomundo desencantado.

O candomblé também oferece a seus ini-ciados e simpatizantes uma particular possi-bilidade de prazeres estéticos, que se espar-rama pelas mais diferentes esferas da arte eda diversão, da música à cozinha, do artesa-nato à escola de samba, além da fascinaçãodo próprio jogo de búzios, o portão de entra-da para o riquíssimo universo cultural dosorixás. O candomblé ensina, sobretudo, queantes de se louvar os deuses, é imperativolouvar a própria cabeça; ninguém terá umdeus forte se não estiver bem consigo mes-mo, como ensina o dito tantas vezes repeti-do nos candomblés: “Ori buruku kossi orixá”,ou “cabeça ruim não tem orixá”. Para os quese convertem, isso faz uma grande diferençaem termos de auto-estima.

Na nossa sociedade das grandes metró-poles, se a construção de sentidos dependecada vez mais do desejo de grupos e indiví-duos que podem escolher esta ou aquelareligião, ou fragmentos delas, a relevânciados temas religiosos igualmente pode seratribuída de acordo com preferências pri-vadas. A religião é agora matéria de prefe-rência de tal sorte que até mesmo escolhernão ter religião alguma é inteiramente acei-tável socialmente. Assim, os deuses africa-nos apropriados pelas metrópoles da Amé-rica do Sul não são mais deuses da tribo,impostos aos que nela nascem. Eles sãodeuses numa civilização em que os indiví-duos são livres para escolhê-los ou não,continuar fielmente nos seus cultos ou sim-plesmente abandoná-los.

O candomblé pode também significar apossibilidade daquele que é pobre e social-mente marginalizado de ter o seu deus pes-soal, que ele alimenta, veste e ao qual dávida no transe, para que ele possa ser honra-do e homenageado por toda uma comunida-de de culto. Quando a filha-de-santo se dei-xa cavalgar pelo seu orixá, a ela se abre comopalco o barracão em festa, para o que talvezseja a única possibilidade na sua pobre vidade experimentar uma apresentação solo, deestar no centro das atenções, quando seuorixá, paramentado com as melhores roupase ferramentas de fantasia, há de ser admira-do e aclamado por todos os presentes, quiçáinvejado por muitos. E por toda a noite, ocavalo dos deuses há de dançar, dançar edançar. Ninguém jamais viu um orixá tãobonito como o seu.

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