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ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING PROGRAMA DE MESTRADO E DOUTORADO EM GESTÃO INTERNACIONAL CLAUDIA FALCHETTI ENTENDENDO A VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR CEGO Traços de personalidade e adaptação ao mercado de consumo São Paulo 2015

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ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING

PROGRAMA DE MESTRADO E DOUTORADO

EM GESTÃO INTERNACIONAL

CLAUDIA FALCHETTI

ENTENDENDO A VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR

CEGO

Traços de personalidade e adaptação ao mercado de consumo

São Paulo

2015

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CLAUDIA FALCHETTI

ENTENDENDO A VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR CEGO

Traços de personalidade e adaptação ao mercado de consumo

Dissertação apresentada como requisito para

obtenção do título de Mestre em

Administração, com ênfase em Gestão

Internacional, pela Escola Superior de

Propaganda e Marketing – ESPM.

Orientador: Prof. Dr. Mateus Canniatti Ponchio

São Paulo

2015

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CLAUDIA FALCHETTI

ENTENDENDO A VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR CEGO

Traços de personalidade e adaptação ao mercado de consumo

Dissertação apresentada como requisito para

obtenção do título de Mestre em

Administração, com ênfase em Gestão

Internacional, pela Escola Superior de

Propaganda e Marketing – ESPM.

Data de aprovação:

____/____/_______

Banca Examinadora:

_____________________________________

Prof. Dr. Mateus Canniatti Ponchio

(Orientador)

PMDGI-ESPM

_____________________________________

Prof. Dr. George Bedinelli Rossi

PMDGI-ESPM

_____________________________________

Profa. Dra. Nara Lúcia Poli Botelho

UNIFESP

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AGRADECIMENTOS

Agradeço e dedico este trabalho a algumas pessoas especiais e queridas que fizeram

diferença durante o curso do meu mestrado.

Aos meus pais, meus grandes amigos.

Aos colegas queridos da ESPM Guy, Michele e Tatiana que apoiaram a minha entrada

no mestrado e ajudaram em meu processo de decisão, que me ouviram e me auxiliaram a

entender o mundo do stricto senso na fase em que muitas dúvidas ainda existiam. À professora

Vivian Strehlau, em especial, de quem recebi muitos conselhos valiosos.

Aos meus chefes e parceiros Marcelo D´Emídio, Tatsuo Iwata e Alexandre Gracioso,

que sempre apoiaram meu desenvolvimento.

Ao Hiran Castello Branco, que com sua enorme generosidade, auxiliou na parceria

com a Fundação Dorina Nowill. À Fundação Dorina Nowill, que muito gentilmente cedeu seu

espaço para a realização das entrevistas e auxiliou no recrutamento dos participantes. Um

abraço especial para Regina Lopes e Eliana Cunha, dedicadas colaboradoras da Fundação.

Aos 16 participantes das entrevistas, que dedicaram seu tempo e compartilharam sua

história e experiência de vida comigo. A vocês agradeço e por vocês comprometo-me a levar

esta pesquisa e seus resultados adiante, para além da esfera acadêmica.

Aos professores do PMDGI, grandes profissionais e pessoas queridas.

Aos companheiros do dia a dia e amigos: Cláudia, Cleidinha, Cristina, Gleidson,

Henrique, Izolda, Larissa, Luciane, Maria Cecília, Rita, Sileide e Simone.

À Nara Botelho, amiga especial, que com seu conhecimento muito auxiliou no

processo de análise das entrevistas.

E por fim, ao Mateus Ponchio, orientador que se tornou parceiro de pesquisas e amigo.

Obrigada Mateus por sua dedicação, seu esforço, por sempre pensar em minha motivação, e

obrigada por compartilhar suas experiências e conhecimento auxiliando imensamente em meu

desenvolvimento.

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RESUMO

A proposta deste estudo foi examinar a vulnerabilidade percebida pelo consumidor

deficiente visual no mercado de consumo. Ao analisar as narrativas de dezesseis pessoas com

deficiência visual adquirida, foi desenvolvido um entendimento dos fatores internos e externos

que afetam seu grau de vulnerabilidade e identificadas suas estratégias de adaptação. A análise

dos dados consistiu em análise de conteúdo latente, que foca na interpretação e na busca pelo

significado de experiências particulares, eventos e estados reportados pelos respondentes. Estes

foram divididos em três perfis que se distinguem na forma em que seus recursos internos e

externos se relacionam ao lidar com a vulnerabilidade de consumo. Os resultados mostram

como o bem-estar emocional, o suporte social para a facilitação do consumo, a aceitação da

deficiência, autonomia e percepções sobre as dificuldades encontradas no mercado estão

relacionados a mecanismos de adaptação. Este material traz contribuição à literatura sobre a

vulnerabilidade do consumidor ao aprofundar a investigação da vulnerabilidade percebida pelo

consumidor deficiente visual e ao identificar fatores atenuantes ou agravantes, bem como as

estratégias de adaptação desses indivíduos. Além disso, apresenta resultados que contribuem

com o desenvolvimento de outros projetos de pesquisa que buscam entender estes consumidores

e de programas que levam ao aumento de sua qualidade de vida e seu bem-estar.

Palavras-chave: Vulnerabilidade do consumidor; adaptação do consumidor; estratégias de

adaptação; restrições de consumo; deficiência; consumidor com deficiência visual.

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ABSTRACT

The purpose of this paper was to examine the vulnerability perceived by visually

impaired consumers. By analysing the narratives of sixteen people that have acquired visual

impairment, was developed an understanding of the internal and external factors that affect their

degree of vulnerability and identified their coping strategies. Data analysis consisted of latent

content analysis, which focus on content interpretation and on a search for the meaning of the

particular experiences, events, and states reported by the respondents. These were divided into

three profiles that differ with respect to how internal and external resources are inter-related in

the face of consumer vulnerability. Results show how emotional wellbeing, consumption-

facilitating social support, acceptance, autonomy and perceptions about marketplace difficulties

relate to coping mechanisms. This study makes a contribution to consumer vulnerability

literature both by furthering the research on the vulnerability perceived by visually impaired

consumers and by identifying the mitigating or aggravating factors related to those individuals,

along with their coping strategies. Results are reported that may lead to the development of both

other research projects that aim to understand these people and programmes that lead to

improved quality of life and wellbeing for these particular consumers.

Keywords: Consumer vulnerability; consumer adaptation; coping strategies; consumption

constraints; disability; visually impaired consumers.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Modelo Conceitual da Resposta ao Estresse Preditiva do EM de Consumidores

Deficientes Visuais.................................................................................................................. 19

Figura 2 – Resposta ao Mercado dos Consumidores Deficientes Visuais ............................. 20

Figura 3 – Etapas de Desenvolvimento do Estudo.................................................................. 21

Figura 4 – Distribuição dos participantes conforme o grau de vulnerabilidade ao consumo por

fatores internos e externos........................................................................................................ 28

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Características dos participantes .......................................................................... 24

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LISTA DE SIGLAS

AV – Acuidade Visual

EM – Engajamento de Mercado

TCR – Pesquisa do Consumidor Transformadora (Transformative Consumer Research)

TSR – Pesquisa em Serviços Transformadora (Transformative Service Research)

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ................................................................................................................... 9

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 10

2 REVISÃO DE LITERATURA ........................................................................................... 14

2.1 VULNERABILIDADE DE CONSUMO .........................................................................................14

2.2 VULNERABILIDADE E ADAPTAÇÃO AO CONSUMO ...........................................................16

2.3 VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR, DEFICIÊNCIA VISUAL E ADAPTAÇÃO ..........17

3 ABORDAGEM METODOLÓGICA ................................................................................. 21

4 RESULTADOS .................................................................................................................... 27

4.1 FRAGILIDADE EMOCIONAL E DEPENDÊNCIA – GRUPO 1 .................................................29

4.2 HABILIDADES PARA O CONSUMO E INDEPENDÊNCIA – GRUPO 2 .................................31

4.3 BEM ESTAR EMOCIONAL E AUTONOMIA – GRUPO 3 .........................................................34

5 DISCUSSÃO ........................................................................................................................ 40

5.1 IMPLICAÇÕES TEÓRICAS ...........................................................................................................40

5.2 IMPLICAÇÕES GERENCIAIS ......................................................................................................43

5.3 PESQUISAS FUTURAS .................................................................................................................44

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 46

APÊNDICE A – ROTEIRO SEMI-ESTRUTURADO PARA ENTREVISTAS EM

PROFUNDIDADE .................................................................................................................. 51

APÊNDICE B – ENTREVISTA TRANSCRITA CASO EDUARDO ............................... 55

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APRESENTAÇÃO

Este material foi elaborado como requisito para obtenção do título de Mestre em

Administração, com ênfase em Gestão Internacional, pela Escola Superior de Propaganda e

Marketing – ESPM e deu origem a um artigo acadêmico submetido e aprovado para publicação

no Journal of Marketing Management, edição especial sobre a Vulnerabilidade do Consumidor,

com o título “Understanding the Vulnerability of Blind Consumers: Adaptation in the

Marketplace, Personal Traits and Coping Strategies”. O artigo, com publicação prevista para

o início de 2016, foi realizado em coautoria com o Prof. Dr. Mateus Canniatti Ponchio

(professor do Programa de Mestrado e Doutorado em Gestão Internacional da ESPM e

pesquisador na área de comportamento do consumidor) e com a Profa. Dra. Nara Lúcia Poli

Botelho (psicóloga clínica, chefe do setor de psicologia do departamento de oftalmologia da

UNIFESP e pesquisadora na área de deficiência visual).

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1 INTRODUÇÃO

No mundo, estima-se que aproximadamente 285 milhões de pessoas sejam portadoras

de deficiência visual, sendo 39 milhões cegas (World Health Organization [WHO], 2014), e no

Brasil, mais de seis milhões de pessoas declararam ter grande dificuldade para enxergar, destas,

cerca de 506 mil afirmaram ser cegas (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE],

2010). Para as pessoas deficientes visuais, desenvolver atividades de consumo, como preparar

alimentos ou ir às compras, torna-se difícil, uma vez que o ambiente de mercado parece não

estar preparado para atendê-las de maneira a reduzir o estresse vivido (Crews & Campbell,

2004). Esta falta de acesso às oportunidades de mercado (Baker, Stephens, & Hill, 2001) e a

falta de suporte social para o consumo (Bruce, Harrow, & Obolenskaya, 2007) podem contribuir

a experiência da vulnerabilidade e da exclusão social para estes indivíduos.

Apesar de a quantidade de pessoas portadoras de deficiência visual representar 3,9%

da população mundial, pouco se explora academicamente este tema, bem como pouco se noticia

na mídia a situação e dificuldades dos deficientes visuais no ambiente de consumo. “A literatura

de marketing sobre a vulnerabilidade frequentemente ignora as pessoas com deficiência crônica

significativa ou progressiva apesar de muitas pessoas viverem com esses desafios” (Pavia &

Mason, 2014, p. 1, tradução nossa). Também ao mercado e desenvolvedores de produtos e

serviços, estes consumidores parecem invisíveis (Mason & Pavia, 2006), emergindo, assim, a

necessidade de discutir as questões do deficiente visual na esfera do marketing, e criar uma

reflexão capaz de despertar a atenção de pesquisadores, profissionais de mercado,

representantes dos direitos dos consumidores e governos.

Acadêmicos investigaram a vulnerabilidade do consumidor levantando definições,

possíveis causas e fatores de resolução (por exemplo, Anastasiou & Kauffman, 2013; Baker,

Gentry, & Rittenburg, 2005; Elms & Tinson, 2012; Meekosha, 2004; Pavia & Mason, 2014), e

acredita-se que a pesquisa sobre a vulnerabilidade do consumo tenha evoluído o suficiente para

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que se possa focar o entendimento mais minucioso de um de seus pilares. Como um dos

motivadores deste estudo é proporcionar material relevante para aplicação em projetos que de

fato contribuam para melhorias nas condições e bem estar de consumidores, buscamos maior

entendimento sobre os fatores que podem auxiliá-los em sua adaptação ao consumo. De acordo

com Özçağlar-Toulouse e Burroughs (2014), é importante que os pesquisadores da Pesquisa do

Consumidor Transformadora (Transformative Consumer Research [TCR]), grupo no qual se

enquadra este estudo, participem do desenvolvimento de programas que traduzam os resultados

de pesquisa em diferenças reais e positivas na vida dos consumidores. Por esse motivo, o

objetivo deste estudo é o de analisar a vulnerabilidade percebida pelo consumidor deficiente

visual, identificando fatores atenuantes ou agravantes e as estratégias de adaptação utilizadas

por esses indivíduos no ambiente de mercado.

No campo do Marketing, estudos anteriores trabalharam com amostras de indivíduos

com níveis variados de deficiência visual (como daltonismo e cegueira). Os objetivos eram:

explorar como consumidores com deficiência visual experimentam o ambiente de consumo

(Baker, 2006; Baker et al., 2001) e como percebem os mercados online (Kaufman-Scarborough

& Childers, 2009); examinar fatores que influenciam o engajamento de mercado (EM)

(Balabanis, Mitchell, Bruce, & Riefler, 2012); entender as preferências destes consumidores

por atributos de serviços (Faria, Silva, & Ferreira, 2012); e examinar a publicidade acessível

para os consumidores daltônicos (Kaufman-Scarborough, 2001). Outros estudos investigam os

indivíduos com deficiência visual a partir de perspectiva clínica e psicológica (por exemplo,

Bergeron & Wanet-Defalque, 2013; Bruce et al., 2007; Hayeems, Geller, Finkelstein, & Faden,

2005; Matsunaka, Inoue, & Miyata, 2002).

Neste estudo, foram entrevistadas 16 pessoas com deficiência visual adquirida, não

congênita. 14 participantes são cegos e dois têm 5% de acuidade visual. Porque adquiriram a

deficiência visual, eles foram capazes de distinguir entre a dificuldade de realizar atividades de

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consumo antes e depois da perda da visão, o que proporciona a esta pesquisa ineditismo na

literatura. Acreditamos na importância de dar voz ao consumidor deficiente visual, dada a

perspectiva única destes consumidores em relação às interações de mercado, que são

notadamente diferentes daqueles com visão normal, para que os trabalhos na área da

vulnerabilidade do consumidor se desenvolvam.

Nossos resultados permitem que sejam realizados avanços em modelos conceituais

existentes no momento e que se referem à vulnerabilidade do consumidor deficiente visual.

Balabanis et al. (2012) propuseram um modelo teórico sobre o enfrentamento do estresse para

entender como os consumidores com deficiência visual lidam com o EM. Em nosso estudo,

fornecemos elementos que expandem o modelo de Balabanis et al. (2012) e, portanto, auxiliam

na entrega de uma explicação mais detalhada para o envolvimento em atividades relacionadas

ao consumo. Especificamente, apresenta-se uma série de comportamentos de enfrentamento

reportados pelos informantes e discute-se associações com características individuais e

ambientais. Baker et al. (2001) desenvolveram um modelo conceitual para explicar como a

independência (entendida em termos de cuidados pessoais – a possibilidade de uma pessoa

tomar conta de si mesma e de sua casa sem a assistência de outros) e a dependência (entendida

como a confiança em outra pessoa para a obtenção de satisfação de necessidades reconhecidas)

dos deficientes são manifestadas no mercado de consumo. Seu modelo enfatiza a natureza

complexa, de domínio específico e, por vezes, complementar destes construtos, bem como os

vários modos de adaptação pessoal à deficiência visual ou perda da visão. Nossos resultados

estão em linha com o modelo de Baker et al. (2001), que acreditamos poder ser reforçado pela

ênfase no senso pessoal: a vulnerabilidade de uma pessoa no mercado de consumo não é

construída apenas pelo ambiente, mas também por questões individuais. O modo como uma

pessoa entende e lida com sua deficiência denomina-se esquema mental; este comportamento

resulta da assertividade das respostas individuais ao ambiente de consumo.

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Espera-se apresentar resultados que poderão contribuir para o desenvolvimento de

programas que se traduzam em melhoria na qualidade de vida e no bem-estar dos consumidores

deficientes visuais. As próximas seções deste trabalho estão organizadas da seguinte forma:

revisão da literatura sobre vulnerabilidade do consumidor e adaptação ao consumo; descrição

dos procedimentos metodológicos; análise da informação coletada junto a 16 consumidores

deficientes visuais; e considerações finais.

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2 REVISÃO DE LITERATURA

Este capítulo compreende uma revisão de literatura a respeito da vulnerabilidade do

consumidor e de sua adaptação ao consumo.

2.1 VULNERABILIDADE DE CONSUMO

Neste estudo, a vulnerabilidade do consumidor com deficiência visual foi examinada

a partir da identificação de valores e crenças relacionados as experiências e pontos de vista dos

respondentes. O construto vulnerabilidade de consumo adotado foi proposto por Baker et al.

(2005):

A vulnerabilidade de consumo é um estado de impotência que decorre de um

desequilíbrio nas interações de mercado ou do consumo de mensagens de marketing

e produtos. Ela ocorre quando o controle não está nas mãos do indivíduo, gerando

uma dependência de fatores externos (por exemplo, comerciantes) para que se crie

equidade no mercado. A vulnerabilidade real surge a partir de interações de estados e

características do indivíduo, e condições externas em um contexto onde metas de

consumo podem ser dificultadas e a experiência afete percepções pessoais e sociais

de si. (Baker et al., 2005, p. 134, tradução nossa).

De acordo com Baker et al. (2005), a vulnerabilidade de consumo pode ser sentida por

qualquer pessoa e experimentada a partir de acontecimentos em qualquer fase da vida, mediante

doença, restrição de renda, perda do emprego ou desastres naturais. Os autores definem a

vulnerabilidade do consumidor como uma condição, não um status, e explicam que, embora

alguns grupos de pessoas estejam mais propensos a experimentar a vulnerabilidade, não

significa que estejam sempre vulneráveis. Sugerem que a vulnerabilidade está intimamente

ligada à identidade e transformação, uma vez que o autoconceito do consumidor é ameaçado

ao experimentar a vulnerabilidade. Contextos de consumo que contribuem para o indivíduo

sentir-se vulnerável afetam sua percepção de competência e aceitação social, bem como sua

segurança e perspectivas de futuro.

A vulnerabilidade do consumidor tem sido investigada a partir de diferentes

perspectivas. Hunter-Jones (2010) explorou o construto ao estudar o consumo de turismo por

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cuidadores de idosos e pacientes com câncer. Walsh, Mitchell, Kilian e Miller (2010) estudaram

a vulnerabilidade cognitiva dos consumidores ao avaliar semelhanças entre produtos.

Piacentini, Hibbert e Hogg (2014) estudaram a vulnerabilidade de consumo vivida por pessoas

em transição entre a vida com auxílio de cuidadores e a vida com independência. Elms e Tinson

(2012) defendem que a vulnerabilidade real é reforçada por dificuldades de realização do

consumo, afetando significativamente a habilidade do sujeito em fazer compras corretamente,

o que gera exclusão, isolamento e estigma, mesmo que apenas por período temporário,

impactando a autoimagem e a percepção de pertencimento. Anastasiou e Kauffman (2013)

complementam essa linha de argumentação ao propor que as limitações do indivíduo com

deficiência existem devido ao contexto social em que vivem.

Pavia e Mason (2014) também atentam às situações que levam a pessoa à

vulnerabilidade e estudam o grupo de consumidores vulneráveis em função de alguma condição

que definem como improvável de desaparecer, incluindo pessoas portadoras de deficiência

mental ou física. Estes autores apresentam um modelo em que duas dimensões para a

vulnerabilidade são verificadas conforme a situação que as ocasiona, podendo tal situação ser

classificada como reversível ou não; mutável ou estática. Sob tal ótica, este estudo busca

entender a adaptação entre indivíduos que experimentam a vulnerabilidade a partir de uma

condição irreversível e estática. De acordo com aqueles autores, para atendê-los, o mercado

deve fornecer equipamentos e sistemas que auxiliem em sua adaptação ao consumo, uma vez

que passam a viver em situação de maior dependência de outras pessoas. Commuri e Ekici

(2008) defendem que classificando grupos de indivíduos para a pesquisa em classes que sejam

mais ou menos propensas a experimentar um conjunto semelhante de condições, os

profissionais de marketing e os responsáveis por políticas públicas terão potencial de exercer

influência sobre a experiência de vulnerabilidade, em vez de simplesmente responder a ela.

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2.2 VULNERABILIDADE E ADAPTAÇÃO AO CONSUMO

As pessoas que experimentam a vulnerabilidade não são sujeitos passivos, ao

contrário, eles usam estratégias cognitivas, emocionais e comportamentais para lidar com a

situação (Heckhausen & Schulz, 1995). As estratégias de enfrentamento, ou coping strategies,

mediam os efeitos do estresse à vulnerabilidade, ou seja, a partir da qualidade e disponibilidade

destas estratégias, o sujeito torna-se mais vulnerável ou mais resistente às situações (Antoniazzi,

Dell’Aglio, & Bandeira, 1998).

A situação de estresse é contextual, muda com o tempo e envolve interação entre o

indivíduo e o ambiente. Folkman (2010) explica que as coping strategies referem-se a

pensamentos e comportamentos da pessoa para lidar com demandas internas e externas

ocasionadas por eventos estressantes, e podem ser classificadas em estratégias focadas no

problema, focadas na emoção ou focadas no significado. As estratégias de adaptação focadas

no problema atuam na situação que deu origem ao stress, tentando mudá-la; as estratégias

focadas na emoção são definidas como um esforço para regular o estado emocional associado

ao evento estressante; enquanto as estratégias focadas no significado estão associadas a valores

e crenças, como a revisão de objetivos e prioridades pessoais.

A capacidade de enfrentamento é crucial para a adaptação e para o bem-estar de

consumidores com doenças crônicas, conforme Pavia e Mason (2004), que discorrem também

sobre o papel benéfico do consumo para a autoimagem, e argumentam que o consumo é

facilitador no processo de adaptação do indivíduo que passa por uma transição. Em outras

palavras, o consumo aumenta o poder de si mesmo, ou do self. A maneira como a pessoa lida

com os desafios do mercado e seu sucesso neste enfrentamento afeta sua autoimagem e a sua

percepção sobre a imagem dos outros em relação a ele mesmo. Balabanis et al. (2012)

verificaram que aumentos no bem estar individual estão associados a maiores engajamentos de

mercado para os consumidores com deficiência visual, e o nível de estresse percebido no

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ambiente de consumo depende do estilo de adaptação do indivíduo, ou de sua capacidade de

enfrentamento,

Meekosha (2004) propõe que indivíduos com limitações funcionais apenas têm

limitações sociais porque o ambiente e a sociedade em que vivem os discriminam. Dependendo

do contexto, situação ou região em que a pessoa vive, uma série de fatores sociais podem

aumentar a sensação de vulnerabilidade, bem como, por outro lado, facilitar a adaptação do

sujeito que enfrenta a situação adversa ou de estresse. No ambiente de consumo, por exemplo,

a acessibilidade é um problema mundial (Baker, Stephens, & Hill, 2002) e elementos logísticos

do mercado não são necessariamente desenvolvidos para os deficientes (Baker & Kaufman-

Scarborough, 2001). Os ambientes tendem a limitar, restringir, segregar e até mesmo oprimir

os indivíduos com habilidades consideradas diferentes (Mazurik, Desjardins, de Grosbois,

Poldma, & Gelech, 2014), além de representar riscos para sua segurança (Dos Santos & De

Carvalho, 2012).

2.3 VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR, DEFICIÊNCIA VISUAL E ADAPTAÇÃO

A participação no contexto de consumo para as pessoas com deficiência e para os seus

familiares é diferente da participação no consumo para as pessoas consideradas não deficientes.

Esta diferença pode gerar uma sensação de isolamento ou anormalidade para estes indivíduos

ou grupos (Baker et al., 2005). Crews e Campbell (2004) associaram a perda da visão ao

aumento na depressão e no estresse familiar e indicaram que pessoas cegas são duas vezes mais

propensas a sofrer de depressão ou ansiedade do que os indivíduos sem problemas sensoriais.

Em estudo realizado por Horowitz e Reinhardt (2000) foi identificado também que

aproximadamente um terço dos adultos mais velhos com deficiência visual apresenta sintomas

de depressão, o que em parte acontece porque, ao contrário de outras deficiências físicas

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relacionadas à idade, a perda de visão pode estar associada a um estado de completa

dependência e desamparo.

O tempo necessário para se adaptar à deficiência visual varia de pessoa para pessoa. Os

indivíduos que perdem a visão passam por algumas fases típicas, relacionadas a seu preparo

físico e psicológico para se engajar ao mercado tendo a condição da falta de visão. Quanto mais

tempo estas pessoas têm para se adaptar à situação e desenvolver seus mecanismos de

adaptação, maior é a probabilidade de serem capazes de se reengajar ao mercado (Hayeems et

al., 2005). Outro fator de impacto sobre o ajustamento do consumidor é a aceitação de sua

deficiência. Baker et al. (2002) identificou que alguns consumidores, os que tiveram maior

dificuldade em aceitar a perda da visão, estavam inclinados a continuar agindo como se não

tivessem a deficiência, e acabavam não buscando recursos que pudessem ajudá-los a se adaptar.

A quantidade de apoio proveniente de familiares e amigos também pode ajudar a pessoa com

deficiência visual em sua adaptação. Este apoio pode acontecer de duas maneiras: quando o

deficiente recebe ajuda de outros para realizar suas atividades, ou quando tem suas atividades

feitas por outras pessoas (Matsunaka et al., 2002).

Foram identificados dois modelos conceituais que explicam o engajamento dos

consumidores com deficiência visual no mercado de consumo. Um deles, representado na

Figura 1, foi proposto por Balabanis et al. (2012), que afirma que o EM de consumidores

deficientes visuais pode ser explicado por um conjunto de recursos externos (número de amigos

e familiares e qualidade do suporte recebido), características da deficiência (duração e

severidade) e recursos internos (bem estar subjetivo). Os autores reportam evidências de que a

amplitude do apoio social de amigos aumenta o EM dos consumidores com deficiência visual;

o bem estar subjetivo está associado a maior EM destes consumidores; e a duração da

deficiência da pessoa pode contribuir positivamente com seu EM.

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Figura 1 – Modelo Conceitual da Resposta ao Estresse Preditiva do EM de Consumidores

Deficientes Visuais

Fonte: Balabanis et al. (2012)

Baker et al. (2001) desenvolveu um modelo conceitual (Figura 2) que explica como a

independência e a dependência dos deficientes é manifestada no mercado de consumo. Como

ressaltado pelos autores, a resposta ao mercado de consumo dos consumidores deficientes em

termos de independência e dependência é influenciada por uma variedade de fatores ambientais,

incluindo fatores físicos, logísticos e interpessoais, habilidades de adaptação, e esforços

percebidos pela pessoa associados a pedir ajuda (que pode ser entendido como a decisão entre

o tempo pessoal e esforço, versus os custos emocionais e sociais de pedir ajuda aos outros).

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Figura 2 – Resposta ao Mercado dos Consumidores Deficientes Visuais

Fonte: Baker et al. (2001)

Foi adotado neste estudo o conceito de vulnerabilidade do consumidor de Baker et al.

(2005) como nossa estrutura de referência. Em linha com os componentes desse modelo, os

fatores internos mencionados aqui incluem características individuais (biológicas e

psicológicas); e estados individuais (luto, humor, motivação, transições e outros). Os fatores

externos citados em nosso estudo incluem discriminação, repressão, estigmatização,

distribuição de recursos e elementos físicos e logísticos. Estes fatores internos e externos são

identificados nos relatos dos participantes do estudo e analisados na seção de resultados. A

partir de tais resultados, são realizadas propostas para a evolução dos modelos de Balabanis et

al. (2012) e Baker et al. (2001).

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21

3 ABORDAGEM METODOLÓGICA

O capítulo de abordagem metodológica compreende os itens indicados na Figura 3.

Figura 3 – Etapas de Desenvolvimento do Estudo

Fonte: Lima (2010)

Como recomendado por diversos autores (por exemplo, Baum, 1995; Goulding, 2005;

Holstein & Gubrium, 1994; Leedy, 1997; Williams, 2007), foi conduzida pesquisa exploratória

qualitativa para desenvolver uma compreensão do sujeito deficiente visual conforme a sua

própria percepção sobre a deficiência no mercado de consumo, por meio da aplicação de

entrevistas em profundidade, seguindo os princípios da fenomenologia. Macedo, Boava e

Antonialli (2012) explicam que a fenomenologia estuda o indivíduo e seu mundo intersubjetivo

nas relações sociais, e entende que as motivações, crenças, valores, costumes e conhecimentos

vivenciados influenciam a percepção de mundo do indivíduo. Assim, entendemos que as

relações de consumo possam ser investigadas sob a ótica da fenomenologia uma vez que ela

considera “o processo de significação que o ser humano atribui a sua ação” (Macedo et al.,

2012, p. 222).

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22

As entrevistas foram individuais, viabilizando uma situação em que o pesquisado

pudesse sentir-se confortável para falar sobre assuntos pessoais como as emoções sentidas e o

processo de luto vivenciado pela perda da visão (Kvale, 1996). A estratégia de amostragem

utilizada neste estudo é a de julgamento, uma vez que foram pesquisados indivíduos que

tiveram experiências específicas (Marshall, 1996) de vulnerabilidade de consumo. Uma

característica que a pessoa deveria ter para ser um entrevistado neste estudo era a deficiência

visual adquirida. Este critério permitiu acessar pessoas que em seu dia a dia vivenciam situações

de mercado que podem aumentar sua vulnerabilidade devido à própria deficiência,

discriminando a existência de dificuldades de consumo antes e depois da perda visual. A

amostra foi composta por dois participantes, identificados neste estudo como Dora e Danilo,

com visão subnormal (5% de AV – Acuidade Visual) e 14 respondentes cegos. As causas da

deficiência dos participantes são descritas no Quadro 1.

A Fundação Dorina Nowill, instituição para cegos, foi escolhida como parceira neste

estudo devido a seu reconhecimento no Brasil, sua trajetória, tradição e qualidade nos serviços

prestados. A Fundação auxiliou no recrutamento de pessoas com as características desejadas

para a presente pesquisa. Esta fundação oferece tratamento gratuito a pessoas com deficiência

visual conforme suas necessidades, proporcionando condições para seu desenvolvimento e

visando a inclusão social. Também produz livros em braile falados e digitais acessíveis e os

distribui gratuitamente para pessoas com deficiência visual e para cerca de 2.500 escolas,

associações, bibliotecas e organizações que os atendem em todo o Brasil

(http://www.fundacaodorina.org.br/). Desde sua fundação em 1946, mais de 17.000 pessoas já

foram atendidas, mais de 1.600 obras em áudio foram produzidas pela instituição e cerca de

900 títulos digitais foram disponibilizados em formato acessível. Atualmente, o fluxo mensal é

de 1000 pessoas com deficiência visual nesta Fundação.

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23

O processo de coleta de informações foi composto por imersão dos pesquisadores nas

questões das necessidades especiais por meio de relacionamento com o público a ser

pesquisado, amigos e especialistas envolvidos com este seguimento da população, bem como

pela leitura de notícias sobre o tema, e por entrevistas individuais em profundidade feitas

presencialmente. Todas as entrevistas foram gravadas em áudio e transcritas para análise de

conteúdo. Quatro especialistas atuantes na área da deficiência visual – uma psicóloga, duas

assistentes sociais e um diretor de ONG – auxiliaram na validação do roteiro de pesquisa.

Durante as entrevistas, foi solicitado aos informantes que pensassem a respeito de suas

experiências de consumo antes e depois da perda visual, suas experiências de consumo mais

recentes, e também que fornecessem exemplos positivos e negativos de suas experiências de

consumo, reações, emoções e fatores que os auxiliaram a consumir com maior satisfação e

melhores resultados. Os entrevistados reportaram também sobre sua história e as primeiras

dificuldades de consumo enfrentadas após a aquisição da deficiência.

As entrevistas foram realizadas entre os meses de julho e setembro de 2014 e duraram

cerca de 65 minutos cada uma. 13 das 16 entrevistas foram realizadas na própria instituição

Dorina Nowill e três foram feitas nas dependências da ESPM. Os dois locais foram escolhidos

visando à comodidade e facilidade de acesso para os entrevistados e foram utilizadas para as

conversas salas fechadas e em que o pesquisado pudesse sentir-se confortável. Para a validação

das interpretações das entrevistas, foi mantido contato posterior com os participantes. O Quadro

1 apresenta características da amostra e para preservar a identidade dos participantes, foram

utilizados nomes fictícios.

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24

Quadro 1 – Características dos participantes

Pseudônimo Idade

Duração da

Entrevista

(minutos)

Estado civil Grau de

Instrução Profissão

Nível de

renda

familiar

Tempo com

deficiência

visual

Causa da

deficiência visual

Alexandre 26 88 Casado Superior

incompleto

Revisor de

Publicações Braille Baixo 13 anos

Catarata

congênita não

tratada

Alice 35 66 Casado Superior

cursando

Revisora de

Publicações Braille Baixo 11 anos

Descolamento de

retina

Amanda 15 46 Solteiro Médio

cursando

Estudante de

Ensino Médio Baixo 12 anos

Glaucoma

congênito

Beto 22 55 Solteiro Superior

cursando

Assistente de

Relacionamento

com Clientes

Baixo 13 anos Glaucoma

congênito

Carlos 67 45 Casado Superior

completo

Empresário de

Seguros /

Engenheiro

Aposentado

Alto 18 anos Descolamento de

retina

Danilo 24 75 Solteiro Superior

completo Engenheiro Médio 3 anos

Descolamento de

retina

Denis 40 50 Casado Fundamental

incompleto

Assistente de

Mercado

Aposentado

Muito

Baixo 3 anos

Retinopatia

diabética

Diego 27 75 Solteiro Médio

incompleto

Atendente de

Hospital

Aposentado

Baixo 2 anos Glaucoma

congênito

Dora 44 55 Casado Superior

incompleto Terapeuta / Artesã Médio 2 anos

Má formação

arteriovenosa

cerebral

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25

Eduardo 34 58 Casado Superior

completo

Revisor de

Publicações Braille Baixo 21 anos

Glaucoma

congênito

Gabriel 38 69 Divorciado Médio

completo

Massoterapeuta /

Taxista

Aposentado

Baixo 2 anos Ferimento por

arma de fogo

Guilherme 60 92 Divorciado Médio

completo

Empresário de

Publicidade /

Consultor

Alto 14 anos Síndrome de Von

Hinter-Lindau

Ivan 48 62 Casado Superior

completo

Engenheiro

Aposentado

Médio

Alto 3 anos

Descolamento de

retina

João 56 79 Casado Superior

completo

Economista

Aposentado Médio 8 anos

Descolamento de

retina

Leonardo 36 65 Casado Fundamental

completo

Massoterapeuta /

Taxista

Aposentado

Baixo 14 anos Descolamento de

retina

Raquel 50 55 Casado Superior

completo Assistente Social Médio 21 anos

Retinose

Pigmentar

Fonte: Autor (2015)

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A análise das informações foi do tipo análise de conteúdo latente, que privilegia

a interpretação do conteúdo e a busca pelos significados das palavras relatadas pelos

entrevistados e conteúdo de suas declarações (Rossi, Serralvo, & João, 2014). De acordo

com Hsieh e Shannon (2005), a utilização desta estratégia de análise fornece ao

pesquisador insights de como as palavras são de fato utilizadas.

De acordo com McMillan e Schumacher (2006), os resultados de uma pesquisa

são válidos na medida em que as suas explicações para o fenômeno e a realidade tenham

alto grau de congruência. Assim, foram adotadas as seguintes práticas para a garantia de

credibilidade e validade do estudo: na etapa de coleta de informações, a estratégia adotada

para aumentar sua validade foi o uso de triangulação e as fontes de informações utilizadas

foram coleta de opinião de especialistas, busca de informações em jornais e revistas, e

entrevistas individuais; e na etapa de análise de informações a validade foi ampliada por

meio de análise das transcrições por mais de um pesquisador; bem como a checagem e

revisão dos resultados.

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27

4 RESULTADOS

A partir das narrativas dos respondentes das entrevistas, foram analisadas suas

vulnerabilidades percebidas e identificados os fatores agravantes ou redutores da

vulnerabilidade, bem como as estratégias de adaptação utilizadas no ambiente de

consumo. Percebeu-se também a existência de três diferentes graus de vulnerabilidade ao

consumo entre os participantes, que foram divididos em três grupos: Grupo 1 (G1) –

vulnerabilidade alta; Grupo 2 (G2) – vulnerabilidade média e; Grupo 3 (G3) –

vulnerabilidade baixa, em relação à forma como os fatores de adaptação e recursos

internos e externos ao indivíduo relacionam-se entre si, e a forma como estão relacionados

com a vulnerabilidade de consumo percebida. A Figura 4 ilustra a distribuição dos

participantes conforme o grau de vulnerabilidade ao consumo por fatores internos e o

grau de vulnerabilidade ao consumo por fatores externos ao indivíduo.

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Figura 4 – Distribuição dos participantes conforme o grau de vulnerabilidade ao consumo

por fatores internos e externos.

Fonte: Autor (2015)

A seção de resultados alcançados está organizada em três partes, de acordo com

os grupos formados a partir do grau de vulnerabilidade dos participantes. Poucas

estratégias de adaptação são citadas pelos respondentes do G1, Dora e João, que também

expressaram maior vulnerabilidade emocional, alta dependência de auxílio de outras

pessoas e falta de aceitação da deficiência; seguindo, são apresentados os casos alocados

no G2, Carlos, Danilo, Denis, Guilherme e Ivan, que expuseram ter sentido menor

vulnerabilidade ao passo que enfrentaram e aceitaram sua deficiência, e demonstraram

bem-estar e aceitação moderados e independência crescente; e ao final, são relatadas as

percepções de dificuldades enfrentadas no mercado de consumo do G3, formado por

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Alexandre, Alice, Amanda, Belo, Eduardo, Gabriel e Raquel, que demonstraram bem-

estar emocional significativo e autonomia e aceitação da deficiência.

De maneira geral, a interpretação das narrativas mostrou que quanto melhores os

recursos internos do indivíduo, menores os efeitos da situação problemática em suas

vidas, o que corrobora com os resultados de Folkman e Moskowitz (2004). Acredita-se

que quanto maior o bem estar emocional, mais facilidade de interação em situações

sociais de consumo as pessoas demonstram. Entretanto, no presente estudo, mesmo os

sujeitos emocionalmente mais estáveis, sofreram influência de fatores externos que

representaram empecilhos para a adaptação, sobre os quais esses sujeitos não tiveram

controle.

4.1 FRAGILIDADE EMOCIONAL E DEPENDÊNCIA – GRUPO 1

Os respondentes que apresentaram estratégias de adaptação mais fracas foram

Dora e João. Ambos declararam deixar todas as atividades de compra sob

responsabilidade de seus cônjuges. Dentre as dificuldades emocionais que os dois

apresentaram observou-se a não aceitação da deficiência, autoestima diminuída, sintomas

depressivos e de ansiedade. O caso de Dora exemplifica esta característica, pois aos 41

anos de idade começou a ter dificuldades para enxergar em decorrência de uma má

formação arteriovenosa que afetou sua visão. Em dois anos, a acuidade visual de Dora

passou de 45% para apenas 5%, uma experiência com a qual lida com dificuldades.

Na ocasião da entrevista, aos 44 anos, ela apresentava sintomas depressivos e

não aceitação de sua deficiência. Demonstrou vulnerabilidade e resistência ao consumo,

e apego às experiências passadas. Seu discurso sobre os fatores externos de adaptação ao

consumo era carregado por dificuldades de origem interna. A resistência ao consumo com

autonomia foi demonstrada em alguns trechos de sua fala, como:

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30

Sempre gostei de comprar sozinha, ficar olhando as coisas, olhar vitrine. Eu

tinha o costume de ir quase diariamente a lojas. Hoje eu passo no shopping e

para mim é uma tortura porque não vejo mais vitrine ou as roupas. Agora se

eu preciso comprar alguma coisa, meu marido vai comigo e ele que vê para

mim. Perdi o gosto por comprar. (Dora, 44).

João perdeu a visão 8 anos antes da data da entrevista, e como Dora, apresentou

apego às experiências passadas e não aceitação de sua deficiência. Ele era fotógrafo

profissional e a perda da visão representou a perda do prazer em admirar os resultados de

seu trabalho. Uma característica que ficou evidente durante as entrevistas foi o quanto ele

tornou-se resistente ao consumo depois de perder a visão.

Eu gostava muito de carro. Gostava de mexer e também da parte visual. Tudo

era ligado à parte visual. Então pra mim, perder a visão está sendo ruim. Foi

pior, mas ainda está sendo ruim. (João, 56)

Ele também demonstrou autoestima reduzida e dificuldade de comunicação, o

que gera barreiras para lidar com outras pessoas no ambiente de consumo:

A pessoa quase nunca me explica o que eu quero saber. Não sei se eu que não

consigo falar exatamente o que eu preciso. (João, 56).

Muitas pessoas em condições de vulnerabilidade de consumo buscam suporte

social, que ao ser obtido, auxilia no modo como lidam com esta condição (Baker et al.,

2005), aumentando o seu EM (Balabanis et al., 2012). De acordo com estudo de Reinhardt

(2001) envolvendo pacientes idosos, o suporte social positivo de amigos e familiares pode

estar associado a uma redução de sintomas depressivos, maior satisfação com a vida e

melhor adaptação à perda da visão. João, no entanto, apresentando grande desejo por

maior autonomia e resistência ao suporte social para o consumo, demonstrou insatisfação

com sua situação:

A maior complicação para mim é que eu não gosto de pedir favor, e

infelizmente, no meu caso, acabo tendo que pedir, porque a gente não tem

como fazer tudo, temos que pedir auxílio para alguém. E eu não gosto disso.

Muitas vezes para comprar alguma coisa é complicado porque eu não sei se a

pessoa vai descrever, falar, ou entender aquilo que eu estou querendo saber.

(João, 56).

Dora expressou insatisfação em relação à consciência social sobre as barreiras

ao consumo enfrentadas pelas pessoas com deficiência visual:

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31

No ambiente de consumo você é meio alienígena. As pessoas não sabem o que

fazer com você. Isso vem do desconhecimento, da falta de informação.

Existem muitos deficientes visuais, mas muitos ficam enclausurados em casa.

Os que saem acabam tendo que se virar, e as pessoas que não entendem ficam

sem saber o que fazer. Na mídia, por exemplo, não tem nada que divulgue

nossas necessidades. (Dora, 44).

Pavia e Mason (2014), ao buscar entendimento para o que chamaram de

invisibilidade do consumidor frente ao mercado, destacaram que uma das possíveis

causas desta invisibilidade é que parte dos deficientes tende a consumir de maneira

privada, fora de horários de pico, diminuindo o entendimento de que a questão da

deficiência é de fato um problema social. Em uma sociedade opressora, em que a cultura

dita o modo de pensar e se comportar, a resposta à deficiência é caracterizada pelo

preconceito; e o posicionamento adotado pelo deficiente perante os outros, com medo da

exclusão, repulsa e estigma, tende a manter este preconceito.

4.2 HABILIDADES PARA O CONSUMO E INDEPENDÊNCIA – GRUPO 2

Os participantes alocados no G2 demonstraram maior capacidade para lidar

adequadamente com os aspectos internas de origem emocional, cognitiva ou

comportamental, porém ainda apresentando certa resistência ao consumo. O impacto das

dificuldades internas em relação aos problemas de mercado pareceu ser menor no G2

comparativamente ao G1, dadas as vivências depressivas terem sido relatadas de forma

menos intensa, e a maior aceitação da deficiência, embora os problemas de consumo de

origem externa ainda sejam frequentemente apontados. As estratégias de adaptação ao

consumo mais citadas por estes participantes foram o recebimento de ajuda de pessoas

próximas (mesmo quando insatisfeitos com a falta de autonomia) e a mudança nos hábitos

de consumo.

Guilherme falou sobre algumas mudanças que fez em seu dia-a-dia quando

perdeu a visão, como começar a utilizar recursos auditivos em seu computador, telefone

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32

celular e aparelho de televisão; escolher locais de consumo em que considerasse receber

um serviço melhor e então, frequentá-los preferencialmente; ordenar suas notas de

dinheiro por valor na carteira; e utilizar cartão do banco mais que as notas. Apesar de

querer independência, após perder a visão, Guilherme também recorreu à contratação de

dois funcionários que o auxiliam em sua rotina diária. É divorciado, tem filhos adultos e

passa seus dias em companhia de seus cuidadores. Em dias de folga de seus auxiliares,

enfrenta dificuldades emocionais, declarando sentir mais solidão do que quando

enxergava.

Eu queria um pouco mais de autonomia. Tenho motorista, mas de domingo ele

não trabalha. Quando estou sozinho, tenho que chamar taxi, o porteiro precisa

me ajudar a ir ao restaurante ou a um lugar tomar um sorvete. Ser cego

amplifica a solidão, por mais habilitado que você seja. Alguns cegos são

corajosos pra caramba. Admiro os caras que saem sozinhos com a bengala.

Eles têm muita habilidade. Eu fiz o curso de bengala, mas parei no meio porque

não estava tendo facilidade para aprender. (Guilherme, 60).

De acordo com o modelo conceitual de Baker et al. (2001), a resposta dos

consumidores portadores de deficiência visual ao mercado em termos de independência

e dependência é determinada por uma série de fatores ambientais, que são os fatores

físicos, logísticos e interpessoais. No grupo de fatores interpessoais, entre nossos

participantes, foram diversas as declarações de comportamento inadequado por parte dos

prestadores de serviços. Uma situação deste tipo foi relatada por Denis:

Tem gente que age de má fé. Você pergunta se aquilo é tal produto e a pessoa

fala que é. Ai quando você chega em casa, vê que ele te deu o produto errado.

O povo pensa que se você não tem visão, então não vale nada. Uma vez fui

comprar carne e isso aconteceu comigo. Pedi contrafilé e me deram coxão

duro. (Denis, 40)

Denis também experimentou algumas circunstâncias originadas pelo

preconceito que o levaram a trauma e medo. Este medo provocou certa fragilidade

emocional, porém ele demonstra resiliência ao continuar buscando maior autonomia para

o consumo e demais situações sociais. Denis reside em um bairro na periferia de São

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33

Paulo, em uma região de baixa renda, e acredita que em locais como este as pessoas são

menos educadas e não tão prestativas quanto nas regiões mais abastadas da cidade. Em

sua opinião, as pessoas tendem a ser nestes locais, menos atenciosas, ou menos

habilidosas com os clientes no ambiente de consumo:

Na maioria dos comércios as pessoas não dão atenção, principalmente na

periferia, onde eu moro. Lá é pior do que aqui no bairro. Já fui agredido na

feira, uma mulher me deu um murro no peito. E se tento falar alguma coisa as

pessoas dizem que feira não é lugar para cego. Na periferia não respeitam o

deficiente. Aqui o pessoal já é mais atencioso, acho que o nível, a classe é mais

alta. Na periferia muita gente não conhece o que é bengala de deficiente visual,

pensa que tenho problema na perna. Pensei em fazer uma placa, um crachá,

falando que sou deficiente visual, na frente e nas costas. (Denis, 40).

Danilo apresenta autonomia suficiente para realizar diversas atividades por conta

própria, como sair sozinho, utilizar o transporte púbico e trabalhar. Apesar de ter perdido

sua visão três anos antes da época da entrevista, afirma ser bem sucedido

profissionalmente:

Mesmo com toda essa dificuldade, no meu trabalho eu me destaquei e virei

coordenador de planejamento. Mesmo com tudo isso que me aconteceu,

consegui evoluir e crescer no meu trabalho. (Danilo, 24)

No entanto, as dificuldades do ambiente de consumo ainda o incomodam

bastante e fazem com que sua autonomia neste tipo de situação seja reduzida. Danilo

apresenta dependência acentuada de outras pessoas para realizar compras, preferindo

deixar que as situações de consumo sejam gerenciadas por seus acompanhantes. De

acordo com Baker et al. (2001), embora a independência possa custar à pessoa tempo e

esforço, para muitos os custos sociais e emocionais de pedir ajuda podem ser maiores.

Não gosto de precisar de alguém para me falar quanto custa. Se for alguém que

conheço tudo bem, mas ter que perguntar para vendedoras me irrita. Acabo

saindo para comprar só quando alguém vai junto. (Danilo, 24).

Ivan perdeu a visão aos 45 anos e aos 48 afirma ser independente para realizar

atividades cotidianas como ir a consultas médicas ou reuniões com amigos, porém, em

situações de consumo declara realizar todas as suas compras com o auxílio da esposa ou

da filha. Considera melhor simplificar na situação de consumo para não perder tempo.

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34

Esta estratégia de adaptação que adotou para facilitar o consumo após a perda da sua visão

deixa clara a sua dificuldade de enfrentamento e vulnerabilidade ao consumo:

Uma das primeiras compras que eu fiz após perder a visão foi a compra de um

tênis. Descrevi ao vendedor como eu queria que fosse o modelo e recebi várias

opções. Então, tive que pedir mais detalhes sobre cada um deles para tentar

montar na cabeça a imagem do produto. Mas depois cheguei à conclusão de

que é mais fácil simplificar, pedir um tênis todo branco ou todo preto. Você

tem que simplificar para não perder seu tempo e o tempo da pessoa que está te

atendendo, e também para não errar na compra. Não dá para ficar inventando

muita coisa não. (Ivan, 48).

4.3 BEM ESTAR EMOCIONAL E AUTONOMIA – GRUPO 3

Os participantes do G3 apresentaram mais facilidade em aceitar a deficiência e,

diferente dos casos do G1 e do G2, este grupo não relata tanta carga emocional nas

situações de mercado. As pessoas deste grupo demonstraram racionalizar mais seus

problemas e citaram maior variedade de estratégias de adaptação para lidar com as

dificuldades impostas pelo mercado. Tais estratégias foram classificadas da seguinte

maneira: mudança nos hábitos de consumo (como comprar produtos e serviços diferentes;

escolher os locais preferidos de consumo e passar a frequentá-los preferencialmente;

comprar por internet), educação da sociedade (um esforço para moldar o ambiente para a

sua necessidade) e recebimento de ajuda de outros usuários.

Raquel perdeu a visão gradualmente, tendo tido a primeira manifestação da

deficiência durante a infância. Aos 29 anos, quando já havia perdido totalmente a visão,

começou a frequentar a Dorina Nowill e a contar com o suporte social oferecido pela

Fundação, que acredita ter facilitado sua adaptação à cegueira. Raquel aceita sua

deficiência e demonstra autoestima elevada e comunicação assertiva. Estas características

pessoais, adquiridas ao longo do tempo, o alto suporte social da família e o apoio de

profissionais de psicoterapia e assistência social, proporcionaram ferramentas para que

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ela pudesse lidar com as situações sociais e com os problemas advindos do ambiente de

consumo:

Antes eu tinha muita dificuldade de lidar com a deficiência e eu fugia de

situações sociais. Acho que quanto mais você está adaptado com sua

deficiência, mais facilidade você tem. A pessoa que perdeu a visão

recentemente e ainda não lida bem com a deficiência visual não sabe como

agir. Muitas vezes é agressiva, acha que o outro tem obrigação de saber ajudá-

la e não sabe. (Raquel, 50).

Exemplifica sua atuação no mercado de consumo:

Sei me comunicar muito bem, o que facilita o consumo. Num restaurante self

service, por exemplo, é necessário pedir ajuda para que alguém me leve ao

buffet de alimentos, fale o que tem e coloque o que você escolher no seu prato.

São dificuldades por conta da falta da visão, mas são coisas que você consegue

resolver com a comunicação e a boa vontade do funcionário. (Raquel, 50).

Para pacientes em instituições especializadas, o suporte técnico dos profissionais

da instituição aos usuários contribui para sua qualidade de vida (Gentry & Goodwin,

1995; Rosenbaum & Smallwood, 2013). Neste estudo, a assistência social e a psicoterapia

foram os tipos de suporte social profissionais mais citados. Alice descreve os benefícios

do tratamento psicológico para a aceitação da deficiência que obteve na Fundação Dorina

Nowill, para lidar com os desafios cotidianos:

Aprendi na terapia que não é porque encontrei alguém ruim hoje, que vou

encontrar amanhã também. Não encontro só pessoas boas, que me dão o braço,

me ajudam a atravessar a rua; muitas pessoas não se importam, não dão

nenhum tipo de ajuda. Na terapia ficou muito claro para mim que minha vida

não seria fácil fora de casa e que eu teria que encarar. Fazer com que as coisas

sejam mais fáceis depende muito de nós mesmos, pois não somos

autossuficientes, precisamos de ajuda das outras pessoas e temos que ter

consciência de quando esta ajuda é necessária e quando se pode fazer sozinho.

(Alice, 35).

Alice perdeu sua visão repentinamente e, além do suporte profissional, o apoio

da família foi essencial para que pudesse ter um rápido ajustamento. Como estratégia de

adaptação, Alice passou a selecionar seus locais preferidos de consumo e passou a

frequentá-los preferencialmente:

Com o passar do tempo, acabei sabendo de quais lojas me agradava o serviço.

Aprendi a identificar as lojas que eu gosto, em que sou bem atendida. (Alice,

35).

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Os participantes do G3, em comparação aos demais grupos, não apresentaram

sintomas depressivos ou preconceito em relação à própria deficiência, demonstraram

aceitar mais sua condição, ter auto estima mais elevada e menos sintomas de ansiedade.

Eles foram os que relataram uma maior variedade de estratégias de enfrentamento para

lidar com os desafios impostos pelo mercado, e tais estratégias aumentam a satisfação em

situações de consumo, reduzindo também a vulnerabilidade percebida. Tal condição é

proporcionada em grande parte por características individuais e pelo suporte social

disponível. Sinclair e Wallston (1999) definiram o conceito vulnerabilidade psicológica

como um indicador de um déficit de recursos de enfrentamento pessoais.

Os fatores externos de mercado que contribuem positivamente para esta

adaptação, no entanto, não são frequentemente relatados. Apenas um caso deste tipo foi

compartilhado por um dos participantes. O caso refere-se ao atendimento em uma loja de

roupas femininas relatado por Alice:

Eu fui a uma loja de roupas femininas, pedi para meu filho chamar a vendedora

e ela prontamente me atendeu. Perguntei se alguém poderia me auxiliar e ela

mesma me auxiliou. Ela me levou em cada canto da loja, subimos e descemos

escadas, falou tudo que havia na loja, falei o que queria e ela me mostrou os

tecidos, as cores das roupas, modelos, me ajudou a escolher, falou quais cores

combinavam com meu tom de pele (e realmente combinavam), me levou até o

caixa, fiz o pagamento e ela me acompanhou até a saída da loja. E todas as

vezes que vou a esta loja é o mesmo atendimento, mesmo sendo várias

vendedoras. Todas fazem o mesmo atendimento. (Alice, 35).

Os problemas de mercado, por outro lado, em algumas situações inviabilizam o

consumo. Alexandre exemplifica com uma situação em que o suporte ao deficiente visual

não estava disponível:

Uma vez fui à pinacoteca e não pude visitar. Cheguei lá e voltei porque não

havia monitor. Questionei, mas infelizmente não havia ninguém para me

acompanhar. (Alexandre, 26).

Alexandre está acostumado a realizar atividades sozinho e para ter

independência para o consumo necessita de um ambiente que seja preparado para recebê-

lo e servi-lo adequadamente. O mesmo acontece com Eduardo. Ele relata casos em que a

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falta de qualificação dos funcionários para o suporte ao deficiente visual origina o mal

atendimento e insatisfação do consumidor:

No mercado peço para o gerente disponibilizar a ajuda de algum funcionário,

mas nem sempre o funcionário é qualificado para atender alguém com

deficiência. Pode ser uma pessoa da faxina, do caixa, um empacotador, um

funcionário que às vezes sabe menos do que eu sobre os produtos. Por

exemplo, canso de ir ao mercado e ter que explicar o que é leite de soja. Ás

vezes a instrução do funcionário é tão pouca que ele não sabe o que são os

produtos. Outro dia um garoto me atendeu e não sabia o que era iogurte natural.

Você depende do funcionário e também de o funcionário ter qualificação, o

que muitas vezes não ocorre. (Eduardo, 34).

Quando consumidores com deficiência visual percebem desigualdade nas

experiências de mercado eles podem encarar tal experiência como uma oportunidade para

educar os outros sobre suas capacidades reais (Baker, 2006). Eduardo compartilha a

estratégia de adaptação adotada para contornar problemas originados no ambiente de

consumo. Com muita paciência, ele conseguiu moldar o mercado que frequenta,

conseguindo enfim realizar suas compras com mais facilidade:

Se eu quero alguma coisa, tenho que construir, e para isso, é preciso paciência.

O mercado que frequento hoje é melhor que antes. O pessoal hoje consegue

me atender e antes eu chegava e ficava muito tempo esperando. Acho que

minha postura e paciência ajudou o mercado a mudar. Paciência é preciso por

que a melhoria não acontece de um dia para o outro, mas quando realmente

não tem jeito, eu desisto daquele estabelecimento. (Eduardo, 34).

Outro desafio relatado neste grupo é o preconceito da sociedade em relação ao

deficiente visual. Gabriel comenta:

Em alguns restaurantes em vez de nos perguntarem o que queremos,

perguntam para o acompanhante que enxerga. Eu falo para a pessoa perguntar

pra mim que eu mesmo respondo. Não sei o que se passa na cabeça destas

pessoas. Quando isso acontece comigo, ensino o atendente como lidar conosco.

(Gabriel, 38).

Uma característica comum entre os participantes do G3 é que todos se sentem

habilitados a saírem sozinhos para o consumo. Beto tomou a iniciativa de morar longe

dos pais em busca de oportunidades profissionais aos 20 anos. Consegue comunicar-se

bem e lidar com as dificuldades dos atendentes com facilidade:

Em um caso eu cheguei a falar assim para o vendedor: ‘olha, pode ficar calmo,

se você não está confortável para me atender pode chamar outro vendedor, não

tem problema. Falei bem claramente, tive que ser bem direto.’ (Beto, 22).

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38

O depoimento de Beto reforça o estudo de Rimmer, Riley, Wang, & Rauworth

(2005), que observaram que alguns atendentes mostravam-se desconfortáveis ou

impacientes ao auxiliarem pessoas com dificuldades de mobilidade ou deficiência visual.

Dos Santos e De Carvalho (2012) também relataram que os funcionários às vezes estão

despreparados para oferecer serviços adequados para pessoas com deficiência visual.

Como estratégia para facilitar o consumo, alguns participantes declaram dar

preferência ao comércio eletrônico, muito embora relatem limitações de acessibilidade

em alguns websites, assim como em estudo de Kaufman-Scarborough e Childers (2009),

em que os participantes relataram que a interface entre os vários tipos de recursos de

acessibilidade e as tecnologias específicas da internet podem tornar partes de um site

inutilizáveis, ineficazes ou hostis durante o processo de consumo online. Beto esclarece

alguns benefícios e obstáculos deste canal:

Eu prefiro fazer compras online. Sou fã, principalmente por poder ter acesso

aos detalhes e especificações do produto. Mas não é todo site que eu consigo

utilizar. Existem algumas normas que regulamentam a inclusão de

acessibilidade na web, porém, alguns sites deixam isso um pouco de lado. Por

causa disso, algumas vezes que eu tento fazer compra por internet o consumo

se complica um pouco. Por exemplo, outro dia para finalizar a compra eu

precisava selecionar o tipo de cartão de crédito que eu iria utilizar, porém no

site só havia os ícones, sem a descrição dos mesmos. (Beto, 22).

Pessoas com deficiências também enfrentam dificuldades causadas pela falta de

acessibilidade na comunicação de Marketing. De acordo com (Kaufman-Scarborough,

2001), estas pessoas geralmente não são incluídas nas listagens de público-alvo em

projetos de pesquisa que testam o marketing mix. Neste tipo de pesquisa, a amostra de

respondentes tende a ser recrutada com base em variáveis demográficas e de estilo de

vida e pouca atenção é dada ao recrutamento de participantes portadores de deficiências.

Quando alguns respondentes de nosso estudo foram questionados sobre como se

mantinham informados sobre novos produtos ou serviços, foi possível observar que há

dependência de outros para obter informações sobre lançamentos. São os casos de Raquel

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39

e Eduardo:

Eu fico sabendo de novos produtos apenas se alguém me fala ou quando vejo

em alguma propaganda. (Raquel, 50)

Às vezes uma loja abre e eu só fico sabendo quando alguém comenta, por que

só quem enxerga vê os cartazes, a divulgação. No mercado, por exemplo, eu

não sei das promoções, pois as placas e o jornal não são acessíveis para nós.

Outra coisa que vejo como um risco muito grande para o deficiente é que não

colocam a data de validade em braile. Existe uma lei para colocar o nome e

algumas características em braile nos medicamentos, mas não inclui o prazo

de validade, que também é muito importante. (Eduardo, 34)

Amanda foi a única adolescente entrevistada neste estudo e, apesar de sua idade,

sua experiência vale ser citada. É deficiente visual deste os três anos de idade, conta com

alto suporte social da família e de profissionais especializados. Apresenta aceitação de

sua deficiência e demonstra não ter preconceito algum em suas falas. Algumas

dificuldades de mercado foram mencionadas, porém, sem carga emocional negativa, e às

vezes com bom humor e naturalidade, demonstrando bem estar emocional mesmo diante

de problemas ocasionados por fatores externos – por exemplo, o caso abaixo sobre a

ausência de informações em braile em embalagens de alimentos:

Uma vez fui fazer sucrilhos com leite. Foi muito engraçado. Coloquei o

sucrilhos no potinho e fui colocar o leite, mas o leite estava tão estranho. Só aí

eu percebi que era creme de leite de caixinha. (Amanda, 15).

O bem estar e a autoestima elevada possivelmente auxiliaram Amanda a

conduzir esta situação com facilidade. Os problemas apresentados pareceram menos

relevantes para Amanda, quando comparados aos demais participantes. Esse fator pode

ser justificado pela deficiência ter sido adquirida aos três anos de idade e, de acordo com

Botelho, Volpini e Moura (2003), o convívio precoce com a perda visual e sua integração

no processo de modificação natural do desenvolvimento contribuem para que a pessoa

tenha maior facilidade em reintegrar-se à vida.

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40

5 DISCUSSÃO

Neste estudo, examinamos a vulnerabilidade percebida por 16 consumidores

deficientes visuais. Analisando suas narrativas, desenvolvemos uma compreensão sobre

os fatores internos e externos que influenciam seu grau de vulnerabilidade no mercado de

consumo, identificando também suas estratégias de adaptação. Os principais fatores

internos identificados foram o bem estar emocional, aceitação, autoestima, sintomas

depressivos e ansiedade, e preconceito em relação à própria deficiência. Entre os fatores

externos, os destaques foram o suporte social para facilitar o consumo, o contexto social

e os aspectos do mercado, como acessibilidade física, disponibilidade de informação

sobre produtos e serviços em braile e a qualidade do serviço prestado pelos atendentes.

As seguintes estratégias de adaptação foram citadas nas narrativas: escolha do local de

consumo preferido levando em conta a conformidade entre o serviço prestado e suas

necessidades; mudança nos produtos e serviços escolhidos para simplificar a compra;

busca por auxílio de outras pessoas para o consumo; uso preferencial do cartão do banco

em vez de dinheiro em espécie; esforço para educar a sociedade; compras online; e uso

de dispositivos eletrônicos para obter informação e realizar transações.

A partir do relato de diferentes níveis de vulnerabilidade percebida pelos

consumidores com deficiência visual e de como fatores internos e externos ao indivíduo

se relacionam com a vulnerabilidade, este estudo apresenta também algumas implicações

teóricas.

5.1 IMPLICAÇÕES TEÓRICAS

Este estudo contribui para o desenvolvimento dos modelos conceituais de

Balabanis et al., (2012) e de Baker et al. (2001). Estas contribuições são apresentadas a

seguir:

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O modelo proposto por Balabanis et al., (2012) afirma que o EM é influenciado

por recursos externos, incluindo a quantidade e qualidade percebida do suporte recebido

de familiares e amigos; características da deficiência, como duração e severidade; e

recursos internos, incluindo o bem estar subjetivo. Os autores indicam duas fontes de

suporte: familiares e amigos. Em nossa opinião, o modelo seria beneficiado com a

incorporação do suporte dos concorrentes de mercado (como a qualidade do auxílio

provido pelos atendentes no varejo e a existência de recursos de acessibilidade), uma vez

que as características físicas e interpessoais do mercado de consumo interagem com as

características individuais e moldam o engajamento do consumidor. Os autores

identificam quatro tipos de estratégias de adaptação ao consumo denominadas: (1)

esquiva, (2) esquiva apesar da vontade, (3) realização com auxílio de outro / por outra

pessoa; e (4) realização por si só. Adicionalmente, uma estratégia mista (realização às

vezes com auxílio e às vezes sem) também é considerada pelos autores. Os resultados de

nosso estudo mostram que os comportamentos de adaptação ao consumo formam um

domínio mais amplo e mais complexo que o proposto por Balabanis et al., (2012). As

características individuais e o ambiente em que vivem os portadores de deficiência visual

devem ser mais bem compreendidos para que se entendam os diferentes motivos que

levam estas pessoas a evitarem situações de consumo e, quando as enfrentam, para que

se conheçam a qualidade da relação de consumo e o bem estar experimentados pelo

consumidor. Em nossa opinião, dada associação entre características individuais e

ambientais podem ser mais exploradas.

O modelo de Baker et al. (2001) para consumidores com deficiência visual

mostra que três fatores influenciam a resposta ao mercado: fatores ambientais, habilidades

de adaptação percebidas e custos percebidos. Baseados nos resultados de nosso estudo,

acreditamos que tal modelo possa ser expandido com a inclusão de uma nova dimensão

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42

denominada “esquema mental”. Sugerimos o uso deste construto como definido por Beck

(1967): uma estrutura cognitiva que filtra, codifica e avalia os estímulos a que o

organismo é submetido. A partir de seu conjunto de esquemas, o indivíduo é capaz de se

orientar em relação ao tempo e espaço, e categorizar e interpretar experiências de maneira

significativa. O esquema mental molda a forma como cada indivíduo percebe e regula sua

condição de deficiência visual, integrando-a a sua existência no mundo. Se o esquema

mental é estruturado e organizado, a pessoa será capaz de se comportar de maneira

estruturada e organizada mesmo quando deparando-se com situações adversas, uma vez

que terá as estratégias cognitivas e emocionais necessárias para isso.

A interpretação das narrativas de nossos respondentes mostrou que quanto

melhores os recursos internos dos indivíduos, menores os efeitos das situações

problemáticas em suas vidas, o que corrobora com os resultados de Folkman e Moskowitz

(2004). Entende-se que o bem estar emocional elevado esteja ligado à maior facilidade

em lidar com situações sociais, incluindo situações de consumo e, entre as pessoas com

esta característica, as estratégias de adaptação ao consumo são mais frequentemente

utilizadas e também mais variadas. Por outro lado, nosso estudo mostra que os fatores

externos representam obstáculos que estão fora do controle do indivíduo ou de sua rede

de contatos, incluindo família e amigos, mesmo para as pessoas que são mais estáveis

emocionalmente. Verificamos que o bem estar emocional possui papel regulador entre as

necessidades de adaptação dos indivíduos em situações adversas e suas respostas às

condições estressantes, uma vez que os recursos internos estão ligados a maior facilidade

em lidar com situações sociais, incluindo as de consumo.

Por fim, nossos resultados estão em linha com os de Baker et al. (2002) e

Matsunaka et al. (2002), que indicaram a aceitação e o suporte social, respectivamente,

como fatores que auxiliam as pessoas deficientes visuais a se adaptar ao mercado de

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consumo. Nós também notamos que o tempo que a pessoa leva para se adaptar à

deficiência visual varia de pessoa para pessoa, em linha com estudo de Hayeems et al.

(2005).

5.2 IMPLICAÇÕES GERENCIAIS

Comparados a indivíduos que apresentam menos deficiências, os problemas de

mercado, como a falta de preparo para atender os deficientes visuais, representam

barreiras mais difíceis para se transpor. A cegueira é uma condição não remediável e

estática e, em linha com as recomendações de Pavia e Mason (2014), acreditamos que o

mercado de consumo deveria prover recursos ou sistemas para auxiliar esses

consumidores, uma vez que se deparam com situações de consumo em que dependem

altamente de outras pessoas. Também parece haver muito a ser feito na esfera da

comunicação de Marketing; pessoas portadoras de deficiência visual são frequentemente

desconsideradas como público-alvo e pouca atenção é dada a estratégias de comunicação

dos produtos e serviços para este público.

Outra informação relevante é a condição social em que a pessoa vive, que pode

influenciar de forma positiva ou negativa a sua adaptação ao ambiente e, portanto, a sua

resposta à situação de vulnerabilidade. Os relatos nas entrevistas apontaram percepções

de que, principalmente em regiões de periferia da cidade de São Paulo, se faz pouco no

ambiente de consumo para se proporcionar conforto e bem estar para os deficientes

visuais. De acordo com os resultados obtidos, parece que as empresas fornecedoras de

produtos ou serviços ao consumidor se mostram desinteressadas em fornecer atendimento

adequado e ambiente acessível para o público pesquisado. O desinteresse pode ser

financeiro, uma vez que esta parcela da população pode ser entendida como relativamente

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44

pequena e pouco representativa de consumidores, uma questão que deverá ser explorada

em estudos futuros.

Nos casos analisados, outro ponto chama a atenção: o preparo da mão-de-obra

para alguns serviços ainda é limitado. Questiona-se, então, como seria possível treinar

uma pessoa para atender cada cliente conforme sua necessidade, se esta pessoa ainda não

possui muitas vezes nem as competências básicas para um atendimento convencional,

como o conhecimento dos produtos vendidos no local ou a capacidade de ler rótulos ou

fazer contas sem dificuldade. Este problema tem origem na educação básica da população

brasileira e, de qualquer maneira, configura-se como um problema gerencial importante

que também pode afetar outros mercados.

5.3 PESQUISAS FUTURAS

A análise dessas questões pode ser complementada com observações de campo

de indivíduos cegos em situação de consumo. Este tipo de abordagem tem o potencial de

enriquecer estudos que objetivem entender as complexidades inerentes ao conceito da

vulnerabilidade do consumidor. Futuras pesquisas precisam também testar e compreender

aspectos dos serviços ao consumidor ao lidar com consumidores com deficiência visual,

buscando contribuições práticas para a sociedade, em linha com as sugeridas pela

Pesquisa em Serviços Transformadora (Transformative Service Research [TSR]),

definida por Anderson et al. (2013) como a intersecção da pesquisa em serviços e a TCR.

É importante entendermos até que ponto os mecanismos de mercado devem garantir

proteção aos deficientes visuais, por exemplo, por meio de políticas de regulação dos

mercados públicos mais ativos.

Espera-se que os relatos de nosso estudo sobre as características do mercado

como entendidas pelos consumidores estudados possam auxiliar na identificação das

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45

alterações necessárias para minimizar as dificuldades sentidas por estes indivíduos em

atividades de consumo. Acreditamos que os resultados deste estudo complementam e

aprofundam os já existentes na literatura, contribuindo para o desenvolvimento dos

projetos de pesquisa que visam entender a vulnerabilidade do consumidor e dos

programas que objetivam a melhoria da qualidade de vida e do bem-estar para os

indivíduos em situação de vulnerabilidade ao consumo.

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APÊNDICE A – ROTEIRO SEMI-ESTRUTURADO PARA ENTREVISTAS EM

PROFUNDIDADE

Cadastro de Participante para Entrevistas em Profundidade

Questão Caso

I1. Nome

I2. Gênero (F / M)

I3. Idade

I4. Escolaridade

I5. Profissão

I6. Estado Civil

I7. Filhos

I8. Religião

I9. Telefone

I10. E-mail

Parte I – Ocorrência da Deficiência Visual (entender histórico do entrevistado)

P1. O que ocasionou sua deficiência visual?

P2. Há quanto tempo isto aconteceu?

P3. Quantos anos você tinha nessa época?

P4. Quanto tempo decorreu entre diagnóstico e perda total da visão?

P5. Sob que circunstâncias isto ocorreu? (Familiar, profissional, financeira...)

P6. Como você se sentiu?

P7. Qual foi seu 1º pensamento?

P8. Qual foi sua 1ª atitude no momento em que você soube da deficiência visual?

Parte II – Dificuldades de Consumo (entender fatores emocionais e cognitivos)

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Agora, farei a você algumas perguntas relacionadas às suas experiências de

consumo. Quando falarmos em “consumir”, devemos pensar tanto em produtos, quanto

serviços, e em todas as fases de uma compra, desde a busca por informações até o acesso

e ato do consumo no mercado, em shoppings, lojas, restaurantes, mercados, hospitais, ou

qualquer outro local de compra de produtos ou serviços.

P9. Você já encontrou alguma dificuldade para consumir após a perda total de

sua visão?

Para “não” em P9 perguntar: P22, P26, P28 – P34, P37, P40, P43 – P47.

Apenas para “sim” em P9 (válido de P10 a P42):

P10. Você se lembra de qual foi a 1ª dificuldade de consumo que você encontrou

ao adquirir a deficiência visual? Qual foi?

P11. Como você se sentiu?

P12. Qual foi sua atitude naquele momento?

P13. Nos primeiros meses após a perda da visão, quais eram as dificuldades de

consumo mais frequentes para você?

P14. Como você se sentia nestas ocasiões?

P15. Quais eram suas atitudes?

P16. Você pediu ajuda a algum amigo, familiar ou profissional?

P17. Hoje você ainda tem alguma dificuldade de consumo?

Apenas para “sim” em P17 (válido para P18 e P19):

P18. Descreva.

P19. Como você reage ao passar por uma situação de consumo como esta?

P20. Como você se sente em relação a isso?

Parte III – Fatores de Adaptação ao Consumo (entender fatores comportamentais e

externos)

P21. Você considera que hoje você tem mais facilidade ou dificuldade para

consumir do que na época da perda da visão?

Apenas para “facilidade” em P21 (válido de P22 a P27):

P22. O que mais te ajudou mais a consumir com mais facilidade?

P23. Quanto tempo depois da perda da visão você percebeu que isso te ajuda a

consumir com mais facilidade?

P24. Como você tomou conhecimento disto? Em qual contexto?

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P25. Como você se sentiu ao “descobrir” que isto poderia te auxiliar no contexto

de consumo?

P26. Alguma outra coisa / fator facilitou ou facilita o consumo para você?

Qual/quais?

P27. Com qual frequência você sente que estes fatores te ajudam?

P28. Você recebe ajuda de alguém (amigo, familiar, profissional) para

consumir?

P29. Como é esta ajuda que você recebe?

P30. Com qual frequência você consome com o auxílio de alguém?

P31. E para se preparar para o contexto de consumo, você recebe alguma ajuda

ou orientação? Descreva como ela é e a frequência.

P32. Você utiliza algum objeto ou recurso externo (como bengala, cão guia, lupa,

etc..) em contextos de consumo?

P33. Você recebe ou recebeu treinamento para a utilização deste recurso?

P34. Você acha que sua condição econômico-financeira, ou de sua família

impactou de alguma maneira sua adaptação (ou não adaptação ao consumo) após a perda

da visão?

P35. O que você acha que poderia te auxiliar ou reduzir mais as dificuldades que

você sente em contextos de consumo?

P36. Como você acha que conseguiria obter este novo recurso, ou mecanismo

de adaptação ao consumo?

P37. Você considera que a sua religião pode ter impactado de forma positiva ou

negativa no seu processo de adaptação ao consumo?

Parte IV – Avaliações do Contexto de Consumo (explorar fatores externos e

recomendações para mercado)

P38. Existe algum produto ou serviço que você considere mais difícil de comprar

/ consumir dada sua deficiência visual? Por quê?

P39. Como poderia melhorar?

P40. E existe algum produto ou serviço que você tenha mais facilidade para

comprar / consumir e por quê?

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P41. Qual a principal dificuldade que você tem/encontra em locais de consumo

como mercados, shoppings, lojas, restaurantes, hospitais, ou qualquer outro local de

compra de produtos ou serviços?

P42. Como poderia melhorar?

P43. Gostaria de te pedir para pensar em um ambiente de consumo em que você

se sinta bem para comprar produtos ou serviços. Que tipo de local é este?

P44. Quais recursos, objetos, fatores você acha que contribuem para que esta

experiência de consumo seja positiva?

P45. Qual destes fatores é o mais importante para que a sua experiência de

consumo seja positiva?

P45a. Se eu tivesse uma loja e precisasse dar um treinamento para meus

vendedores, qual deveria ser a principal coisa para eu ensiná-los para que eles pudessem

atender um deficiente visual corretamente? (questão incluída em 24/07)

P46. Você acha que as empresas e prestadores de serviço se importam com o

bem-estar das pessoas cegas para o consumo?

P47. E o governo e instituições públicas? Fazem alguma coisa para facilitar o

consumo entre as pessoas cegas?

Conclusão da Entrevista

Finalizamos aqui nossa conversa. Eu gostaria de agradecer sua contribuição para

a minha pesquisa e de informar que ao final da análise de resultados, eu poderei

disponibilizar as conclusões a você, se for de seu interesse.

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APÊNDICE B – ENTREVISTA TRANSCRITA CASO EDUARDO

Questão Caso

I1. Identificação Eduardo

I2. Gênero (F / M) Masculino

I3. Idade 34 anos

I4. Escolaridade Ensino superior completo

I5. Profissão Revisor de publicações braille

I6. Estado Civil Casado (esposa tem visão subnormal)

I7. Filhos 1 filha – 5 anos (não deficiente)

I8. Religião Evangélico

O que ocasionou deficiência?

Nasci com glaucoma, tratei, fiz cirurgias, mas perdi a visão direita aos seis anos. Com 12

anos enxergava pouco, mas conseguia ainda ler, até que levei uma pancada no olho e a

retina descolou. Perdi a visão esquerda com 13 anos.

Sabia que um dia perderia a visão do olho esquerdo?

Sim, mas não sabia que seria pela pancada aos 12 anos. Só tinha a impressão que um dia

eu perderia.

Como era o contexto?

Somos oito irmãos. Eu frequentava escola normal, sem recursos, a professora e os colegas

me auxiliavam nas aulas, ou eu chegava perto da lousa para copiar as coisas.

Quando perdi a visão, fiquei em tratamento dos 13 aos 14 anos para poder voltar à sala

comum. Aos 14 voltei para a sala comum.

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Como foi para você perder a visão?

Foi ruim, mas costumo dizer que não tive ‘aquele’ trauma, revolta... Eu tentei inventar

um sistema de escrita para mim, mas o que queria mesmo era voltar a estudar. Eu já

desconfiava que não fosse voltar a ver.

Um dia em casa vi uma revista de escola dominical e vi uma figura de um homem cego

lendo a bíblia com os dedos. Então imaginei que era possível cego ler.

A professora ajudou a entrar na escola com sala de recursos, e assim foi.

Meus pais me protegiam por conta da deficiência, mas sempre me deram liberdade. Eu

corria na rua com meus irmãos, brincava de carrinho de rolimã, ia à igreja, frequentava

grupo de jovens.

Por conta da deficiência eu ficava chateado às vezes quando meus irmãos saiam e eu não

podia, mas eu me divertia também. Mas não tive muita tristeza, depressão. Eu confiava

que Deus cuidava de mim, confiava que ele não ia me deixar paralisado naquela situação.

E acredito até hoje.

Desde que perdeu a visão encontrou dificuldade para consumir?

Sim, tem coisa que é perto de casa e você não sabe que existe até que alguém comente

sobre aquilo com você. Quem enxerga, vê os cartazes, a divulgação...

No mercado, por exemplo, você não sabe as promoções, tem placa, tem o jornal, mas não

são coisas acessíveis para o deficiente visual.

Em um hospital, às vezes você tem um direito, tem a placa escrita e você não sabe.

No ônibus, tem uma placa com o telefone para atendimento, reclamação, achados e

perdidos, mas o cego não tem como ver o número.

Outra coisa que vejo como um risco muito grande para o deficiente são os produtos que

consumimos e que tem data de validade. O pessoal criou uma lei para colocar braile nos

medicamentos, com o nome, miligramas etc, mas não tem o prazo de validade, que

também é muito importante.

Outro dia, por exemplo, minha filha teve uma intoxicação alimentar com uma manteiga

que tinha lá em casa. Ela estava vencida e eu e minha esposa não percebemos.

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Conte um exemplo de dificuldade de consumo sentida na época em que perdeu a

visão.

No começo eu tinha dificuldade com livros, queria ter acesso, mas não tinha. A revista de

escola dominical, por exemplo, que eu lia quando enxergava, não tinha acesso ao

deficiente. Até hoje eles não têm, não disponibilizam na internet, não têm em áudio.

Eu precisava que outra pessoa lesse para mim. Cheguei a ligar na publicadora, mas nunca

conseguiram enviar para mim por e-mail e também informaram que não havia em áudio.

Alguma outra dificuldade?

Com alimentos. Eu sempre tinha que perguntar para meus pais o que era aquilo, do que

era a lata. Para alguns alimentos, a embalagem é sempre a mesma, como sardinha e óleo;

mas uma lata de ervilha e de milho não tem como saber, são iguais. Só muda o rótulo.

Para remédios também, sempre precisava perguntar qual era o remédio.

Era chato quando eu precisava saber e a outra pessoa não queria parar para explicar. Ou

quando eu queria um refrigerante e precisava esperar até que alguém fosse ao bar para

me trazer. Ou para comprar um doce. Eu mesmo não tinha o acesso, a autonomia.

Para colocar um CD no rádio, também precisava pedir a alguém. Até hoje CD é algo que

consumimos e não vem nada escrito em braile na mídia.

E como você se sentia tendo que pedir?

Chateado, por que quando não interessava para os outros eu tinha que esperar. Às vezes

eu ‘enchia o saco’ até que alguém parava para me ajudar.

Hoje ainda tem alguma dificuldade?

Sim, por exemplo, em casa não gosto da TV aberta, mas os canais por assinatura não tem

acessibilidade. Para mexer nos canais, todas as informações aparecem na tela e tudo é

clicado com o controle. Eu penso, poxa vida, para eu assinar um produto desses e ter que

ficar chamando o vizinho para ficar colocando em determinado canal, eu não quero! Por

isso uso muito o Youtube.

Algo que eu gostaria que mudasse é a acessibilidade da TV por assinatura.

Para ver DVD pela TV também não consigo, só pelo computador. Pra assistir pela TV,

se não cai direto no português, tenho que chamar um vizinho.

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Também tenho dificuldade no mercado ou em lojas, pois sempre dependo de alguém ir

comigo fazer as compras.

No mercado peço para o gerente disponibilizar a ajuda de algum funcionário, mas nem

sempre o funcionário é qualificado para atender alguém com deficiência. Pode ser uma

pessoa da faxina, do caixa, um empacotador, um funcionário que às vezes sabe menos do

que eu sobre os produtos. Por exemplo, canso de ir ao mercado e ter que explicar o que é

leite de soja. Ás vezes a instrução do funcionário é tão pouca que ele não sabe o que são

os produtos. Outro dia um garoto me atendeu e não sabia o que era iogurte natural. Você

depende do funcionário e também de o funcionário ter qualificação, o que muitas vezes

não ocorre.

Em loja sempre levo minha esposa, pois ela enxerga um pouco e sabe meu gosto. Outro

dia a moça queria me empurrar uma camiseta rosa e depois uma laranja. Eu não gosto

destas cores, mas como eu não enxergo, ela queria que eu aceitasse.

Alguns funcionários falam que ficou bonito, mas não sabem descrever o produto. Isso

impede muito o consumo.

Você acha que hoje tem mais facilidade ou dificuldade para consumir?

Acho que tudo é questão de você se adaptar. Por exemplo, no mercado que eu vou perto

de casa eu já tive atritos, já tive caso de deixar as compras no caixa por conta de ser mal

atendido.

Mas eu também tive meus erros na época, por que a gente que é deficiente corre o risco

de achar que o mundo gira em torno da gente, e não é assim. A sociedade não tem culpa

de você ser cego, então não posso querer que as pessoas me entendam ou saibam na ponta

da língua como me tratar. No mercado, por exemplo, às vezes a pessoa não teve nem

instrução suficiente. Vai querer que a pessoa entenda seu ponto de vista?

Tem cego que acha ruim que a pessoa pegue no braço... Poxa vida, a pessoa não sabe...

Uma pessoa que me auxiliou na rua um dia me perguntou: mas não sou eu quem segura

no seu braço? E eu expliquei que não, que era eu, pois assim eu conseguia sentir seus

movimentos.

O que você acha que ajudou a melhorar o mercado?

Acho que foi eu tentar fazer eles entenderem o que era preciso para me atender.

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Se eu quero alguma coisa, tenho que construir, e para isso, é preciso paciência. O mercado

que frequento hoje é melhor que antes. O pessoal hoje consegue me atender e antes eu

chegava e ficava muito tempo esperando. Acho que minha postura e paciência ajudou o

mercado a mudar. Paciência é preciso por que a melhoria não acontece de um dia para o

outro, mas quando realmente não tem jeito, eu desisto daquele estabelecimento.

E você sempre teve esta postura e esta paciência?

Não. Eu ganhei mais isso com o amadurecimento, com o entendimento de que o mundo

não gira ao meu redor. Minha esposa me ajudou muito com essa minha mudança.

Tem algum tipo de consumo que você peça ajuda a alguém?

Roupa. Não confio nos vendedores para a escolha da cor.

Agora, calçado, móveis, eletrônicos para a casa, escolho sozinho, somente com a ajuda

do vendedor.

Banco eu uso apenas o Bradesco, pois é o que tem mais opções de acessibilidade.

Conte uma experiência de consumo muito positiva.

Vou contar um caso de aviação, da TAM. Não tenho nenhuma reclamação deles. Eles

pegam a gente, nos atendem, nos levam até a sala de espera, levaram nossa filha ao

banheiro, atendeu na cabine quando o avião pousou e nos deixaram no taxi.

Em outras empresas não existe este atendimento. Na Azul e na Gol, você precisa declarar

que é deficiente. Na TAM não. Eles perceberam que eu era deficiente e vieram me

atender. Já viajei quatro vezes pela TAM e todas foram muito positivas.

Qual o fator mais importante para facilitar o consumo?

A boa vontade de quem atende, porque faz com que a pessoa encontre caminhos para

solucionar a dificuldade.

O pior erro que pode acontecer é o descaso. A empresa não se importar, não ver você

como cliente e sim como alguém que está ali te chateando. Dizer: ‘por que não chamou

alguém para vir com você?’