escola e exclusão social

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    Natlia Alves*Rui Canrio*

    Anlise Social,vol. XXXVIII(169), 2004, 981-1010

    Escola e excluso social: das promessass incertezas**

    CRISE DA ESCOLA E EXCLUSO ESCOLAR

    O mal-estar difuso, assinalado a partir do final dos anos 60, a que seconvencionou chamar crise da escola, corresponde a um dfice de legi-timidade e de sentidoque indissocivel das mutaes sofridas pela institui-o escolar ao longo do sculo XX. Estas mutaes podem ser sintetizadasnuma frmula segundo a qual a escola passou de um contexto de certezaspara um contexto de promessas,situando-se hoje num contexto de incertezas(Canrio, Alves e Rolo, 2001). Esta frmula permite dar conta do percurso,ainda que com caractersticas singulares, realizado em Portugal, de formaacelerada e contraditria, durante os ltimos trinta anos. A escola das cer-tezas corresponde escola da primeira metade do sculo, que pde funcio-nar como uma instituio que, a partir de um conjunto de valores estveisque lhe eram imanentes, fabricava cidados conformes com um modelocvico preestabelecido. Durante este perodo, apesar do seu carcter assu-midamente elitista, a escola no aparecia comprometida com a produo deinjustias sociais, favorecendo alguns percursos de mobilidade social ascen-dente em funo do mrito. O perodo dos trinta gloriosos marca, atravsdo crescimento simultneo da oferta (polticas pblicas) e da procura (cor-

    * Universidade de Lisboa.** Este texto foi produzido no mbito de um projecto internacional, financiado pela

    Comisso Europeia, subordinado ao tema Education governance, social inclusion andexclusion (EGSIE), que decorreu entre 1998 e 2000. O objectivo deste projecto consistiu

    em analisar a relao entre as transformaes dos modos de regulao do sistema educativoe os fenmenos de incluso/excluso social.

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    Natlia Alves, Rui Canrio

    rida escola), a transio de uma escola elitista para uma escola de massas,processo iniciado, de forma tmida e contraditria, em Portugal no fim dosanos 60. A expanso dos sistemas escolares e a democratizao de acessoesto associadas a uma perspectiva optimista que assinala a passagem da

    escola das certezas para a escola das promessas: uma promessa de desen-volvimento, uma promessa de mobilidade social, uma promessa de maisigualdade e justia social.

    O incio de uma recesso durvel, a partir de meados dos anos 70, quesucedeu ao crculo virtuoso do fordismo (que a sociedade portuguesa nochegou verdadeiramente a conhecer) conduz a que, relativamente escola, euforia suceda o desencanto. Paradoxalmente, a democratizao do acesso escola comprometeu-a com a produo das desigualdades sociais(Bourdieu e Passeron, 1970), sem, ao mesmo tempo, lhe permitir cumpriras suas promessas impossveis (Boudon, 1973). No podendo continuar aapresentar-se como uma instituio justa num mundo injusto (Dubet, 1999),a escola est condenada a fazer subir os nveis de frustrao do seu pblico. a passagem de uma procura optimista para uma procura desencanta-da (Grcio, 1986) que marca a entrada da escola, no incio dos anos 80,num perodo de incertezas. A raridade dos empregos passa ento a articular--se com a inflao dos diplomas, tornando-os, simultaneamente, menos ren-tveis e mais necessrios do que nunca. Esta situao permite compreenderpor que razo todos os indicadores estatsticos testemunham um acessogeneralizado a percursos escolares cada vez mais longos e se assiste, ao

    mesmo tempo, a uma cada vez maior sensibilidade a fenmenos designadospor excluso escolar, a interpretar no sentido de excluso relativa(Dubet, 1996). Em Portugal, os esforos desenvolvidos durante os anos 90para fazer cumprir a escolaridade obrigatria de nove anos confrontam-secom os resultados da investigao sociolgica, segundo os quais o diplomaterminal da escolaridade obrigatria aquele que conheceu uma desvaloriza-o mais rpida e acentuada (Grcio, 1997).

    neste contexto que deve ser situada a introduo recente, e rapidamentegeneralizada, do conceito de excluso social em Portugal. O seu uso tornou-

    -se corrente aps 1995, com a subida ao poder do governo socialista, querpara designar os principais problemas sociais, quer para qualificar as pol-ticas sociais concebidas para lhes darem resposta. A educao no foge aesta regra e, por isso, o conceito de excluso social tornou-se um ponto dereferncia comum aos decisores polticos, aos administradores, aos profes-sores e aos investigadores, que o adoptaram sem distanciamento crtico,como se correspondesse a algo de natural e objectivo, quando, obviamen-te, corresponde a uma construo social. Como referiu Esping-Andersen(1990, p. 266), estamos a deixar uma ordem social relativamente clara para

    ns e estamos a penetrar noutra cujos contornos so difceis de discernir,o que explicaria o recurso a um conjunto de novos vocbulos (como, por

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    exemplo, ps-moderno, ou ps-industrial) que tendem a substituir-se anlise. Reside aqui a fragilidade analtica do conceito de excluso social,que, como assinalou Delarue (1991), representa uma facilidade de linguagemque esconde uma dificuldade de anlise.

    No caso portugus, em termos de discursos e de polticas educativas, areferncia luta contra a excluso coexiste com a referncia igualdadede oportunidades, que constituiu o leitmotiv dos discursos e das polticaseducativas nos anos 70. A coexistncia das duas referncias exprime aespecificidade da formao social portuguesa e, portanto, da configurao doseu sistema educativo.

    A POLTICA EDUCATIVA NUM CONTEXTO DE INCERTEZA

    Com o acesso ao poder do Partido Socialista, a partir das eleies legislativasde Outubro de 1995, verifica-se uma tentativa, por parte da equipa do Ministrioda Educao, para estabelecer alguma demarcao com o passado recente atra-vs da utilizao de uma nova linguagem que se destina a introduzir uma rupturano plano discursivo1 com os anteriores governos sociais-democratas.

    MODERNIZAR E DEMOCRATIZAR: A DIFCIL CONSTRUODE UMA LEGITIMIDADE

    A educao foi apresentada como uma das prioridades polticas do go-

    verno socialista. A justificao desta prioridade e a defesa das orientaespropostas aparecem organizadas em torno de duas grandes linhas argumen-tativas: a primeira, fiel aos postulados da teoria do capital humano e aospressupostos que orientaram as medidas vocacionalistas que caracterizaramos governos sociais-democratas, coloca em evidncia uma relao de cau-salidade linear entre a educao e o desenvolvimento; a segunda, herdeira deuma concepo educativa que remonta aos ideais ocidentais do progresso,enfatiza o papel e a importncia da educao na valorizao dos indivduoscomo pessoas e na reduo das desigualdades.

    1Um dos eixos de investigao do projecto consistiu na anlise de documentos produzidospelo Ministrio da Educao durante o primeiro mandato do governo socialista (1995-1999).Constituiu-se um conjunto documental formado pelos seguintes textos: Pacto Educativo para oFuturo, Lisboa, ME, 1996; Educao Mudanas para o Futuro, Lisboa, ME, 1996;Documento Orientador das Polticas para o Ensino Bsico Educao, Integrao, Cidadania,Lisboa, ME, 1998; Documento Orientador das Polticas para o Ensino Secundrio Desenvolver, Consolidar, Orientar, Lisboa, ME, 1997; Currculos Alternativos no EnsinoBsico Guia Prtico,Lisboa, ME/Deb, 1997; Relatrio Sntese dos Territrios Educativosde Interveno Prioritria,Lisboa, ME/Deb, 1997; Educao para Todos, Uma Mudana emConstruo, cadernos Pept 2000, 1, 1993. Os textos foram analisados com o objectivo

    de identificar as narrativas que legitimam as transformaes propostas, as concepes deactores educativos e as relaes entre educao e incluso e excluso social.

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    A primeira linha argumentativa continua a organizar-se em torno de umalgica de modernizao(Correia, Stoleroff e Stoer, 1993) cuja pertinncia temcomo base um diagnstico negro da situao educativa portuguesa, em quepodemos distinguir quatro questes principais. A primeira questo, tendo como

    referente o modelo desenvolvimentista, cujo apogeu se situou nos trinta anosgloriosos que marcaram o ps-guerra, justifica a aposta na educao e naformao como um requisito indispensvel ao desenvolvimento. A ttulo deexemplo, o excerto do Pacto Educativoque a seguir se transcreve ilustrativoda aceitao acrtica da relao causal entre escolarizao e desenvolvimento:

    A educao e a formao configuram reas de prioridade poltica emPortugal. Da sua qualidade depende, em parte significativa, a sustentabilidadedo desenvolvimento do pas. A melhoria do nosso sistema de formao no

    uma condio suficiente, mas uma condio indispensvel e altamentefavorvel para o nosso desenvolvimento social.

    Uma segunda questo, decorrente da primeira, reside na constatao donosso atraso em termos educativos, que se expressa, fundamentalmente,nos baixos nveis de habilitao escolar e correlativos baixos nveis de qua-lificao profissional, referidos com frequncia nos documentos consulta-dos, como, por exemplo, no Documento Orientador das Polticas para oEnsino Bsico,onde se afirma:

    Portugal acumulou grandes atrasos no domnio educativo, sendo aindahoje o pas europeu com os mais baixos nveis de instruo da populaoadulta, pelo que o governo atribui uma grande prioridade educao e formao, com especial nfase para a educao bsica, pois um bomcomeo vale para toda a vida.

    O atraso educativo manifesta-se ainda atravs da obsolescncia dosconhecimentos e das competncias facultadas pelo sistema educativo face s

    rpidas mutaes de carcter tecnolgico, consubstanciadas na designadasociedade do conhecimento. A interveno no domnio educativo tende,assim, a assumir contornos reactivos e defensivos, como resposta s trans-formaes da economia e da sociedade a nvel mundial e europeu, emparticular no que se refere aos processos de acelerada inovao cientfica etecnolgica. Esta terceira questo afecta no apenas o ensino bsico, mastambm o nvel secundrio, conforme se depreende do excerto retirado doDocumento Orientador das Polticas para o Ensino Secundrio:

    As mudanas culturais e tecnolgicas da sociedade do conhecimento eos novos desafios da organizao do trabalho obrigam no apenas a pensar uma

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    nova funo e um novo papel para as formaes secundrias, mas tambmnovos modos de organizao e distribuio dos recursos formativos quepossam satisfazer as necessidades de um sistema em expanso e enriquecersignificativamente reas do currculo tradicionalmente deficitrias.

    Uma quarta questo, referente ao diagnstico da situao educativa portu-guesa, a sistemtica comparao entre Portugal e os pases mais avanadosda Unio Europeia e da OCDE com base em indicadores de natureza estatstica.A abordagem comparativa baseada em indicadores estatsticos, conjugadacom a invocao da cauo de entidades supranacionais, constitui um importanteargumento para justificar e fundamentar as medidas de poltica educativa, cons-truindo para elas uma legitimidade social e poltica. O modo como o programaEducao para Todos apresentado , a este respeito, elucidativo:

    O programa Educao para Todosenquadra-se nas recomendaesda Conferncia Mundial sobre Educao para Todos, realizada em Marode 1990, em Jomtiem, sob os auspcios da UNESCO, UNICEF, PNUD,Banco Mundial e da Conferncia dos Ministros da Educao da OCDE,realizada em Novembro de 1990, em Paris.

    Nesta perspectiva, a comparao internacional sistemtica serve um duploobjectivo: ao mesmo tempo que confere visibilidade distncia que nos separados pases do centro, cria tambm as condies para que as orientaes

    defendidas para a educao sejam apresentadas como inevitveis em nome dasexigncias da integrao europeia, do desenvolvimento e da globalizao.

    Uma segunda linha argumentativa organiza-se em torno de uma lgica dedemocratizao,marcada por algum voluntarismo e orientada para trs dis-tintas orientaes de aco. A primeira orientao aponta para a tendencialsuperao do carcter tardio e inacabado da construo da escola de mas-sas em Portugal (Canrio, 1997), conforme ressalta do Documento Orien-tador das Polticas para o Ensino Secundrio:

    [...] uma muito lenta aproximao a uma escolaridade bsica que,sendo hoje de nove anos, em pouco ultrapassa o que j h vinte anos seconsiderava ser o mnimo imprescindvel para, por um lado, realizar asaprendizagens escolares de base e, por outro, inibir a sua regresso.

    Uma segunda orientao da aco educativa inscreve-se num combate sdesigualdades sociais e escolares com base numa ideia da relao entre aescola e a sociedade que podemos fazer remontar aos anos de ouro doperodo desenvolvimentista do ps-guerra. Este combate s desigualdades

    tem como referncia central o conceito que, na mesma poca, sustentouuma viso optimista dos fenmenos de expanso da escolarizao, ou seja,

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    o conceito de igualdade de oportunidades, cuja importncia enfatizada noPacto Educativo:

    A finalidade essencial do processo educativo o desenvolvimento e aformao global de todos, em condies de igualdade de oportunidades,no respeito pela diferena e autonomia de cada um.

    Uma terceira orientao da aco educativa, apesar de virada tambmpara contrariar as desigualdades escolares e sociais, no , contudo, suscep-tvel de ser confundida com a anterior, na medida em que se estrutura, noem torno do conceito clssico de igualdade de oportunidades, mas simem torno de um conceito cuja passagem rpida a slogan o carregou deimpreciso e ambiguidade (Dubar, 1996; Dubet, 1996): o conceito de ex-cluso social. Este conceito, que emerge num contexto em que os progres-sos da democratizao do sistema educativo so evidentes e constantes,traduz, necessariamente, uma realidade muito diferente daquela em que secolocaram (nos anos 60 e 70) as questes da escola e da igualdade.

    As duas lgicas argumentativas que identificmos a de modernizaoe a de democratizao no tm o mesmo peso na retrica discursivagovernamental. a primeira que se afirma como lgica dominante, exprimin-do a viso, comum s instncias de deciso da Unio Europeia, de umasubordinao funcional das polticas educativas relativamente a uma

    racionalidade econmica de desenvolvimento assente na trilogia produtivida-de-competitividade-emprego (Nvoa, 1996).

    PROFESSORES E ALUNOS: A CONSTRUO SUBJECTIVA DOS ACTORES

    No que diz respeito aos professores, estamos perante uma retrica queguarda traos da ambiguidade que marcou o modo como estes profissionaisforam encarados no perodo da reforma educativa: eles eram vistos, em simul-tneo, como os garantes da reforma e como os principais obstculos sua

    concretizao. A poltica de esbatimento de conflitos conduz a que nesteconjunto documental o estatuto do professor seja enfatizado pela positiva,atribuindo-se-lhes um papel privilegiado enquanto agentes de mudana. Nosdocumentos analisados eles so frequentemente definidos como profissionaisaltamente qualificados e fora motriz da inovao. A importncia simblicaque conferida aos professores, a par da complexidade de conhecimentos quelhes so exigidos para o desempenho das suas funes, acompanhada porum discurso recorrente em torno da valorizao do profissionalismo docente.

    Este discurso de valorizao da profisso docente aparece sistematica-

    mente associado atribuio de uma acrescida responsabilizao, traduzi-da na proliferao de modalidades de reforo dos mecanismos de controle

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    exercidos sobre os professores, como o caso da formao contnua, dareorganizao dos tempos de trabalho ou da anunciada inteno de proceder regulamentao de disposies importantes, como as relativas avaliaodo desempenho, criando um regime de avaliao do trabalho docente ba-

    seado no incentivo ao mrito. possvel sintetizar a viso sobre a figura do professor, que nos sugerida pelos documentos analisados, pondo em evidncia a articulaoentre uma retrica de reforo da autonomia, diversificao de papis eresponsabilizao do professor e uma outra que advoga o reforo dos me-canismos de controle sobre o exerccio profissional, naquilo que se podeconfigurar como uma espcie de autonomia sob tutela (Canrio e Correia,1998). Esta situao paradoxal concomitante com um tendencial esbati-mento, pelo menos para uma parte do professorado, dos traos de profissoliberal que caracterizaram o exerccio da profisso docente, segundo o pa-

    radigma do ensino secundrio. Por sua vez, o reconhecimento da comple-xidade crescente das tarefas pedidas aos professores concomitante com aenfatizao de uma viso predominantemente tcnica desta profisso.

    No que diz respeito aos alunos, a escola -nos apresentada como umainstituio que, com base num conjunto de valores que lhe seriam imanentes,fabrica indivduos segundo uma dimenso tripla: a dimenso da pessoa, a docidado e a do profissional, esta ltima com uma presena mais forte nodocumento que traa as orientaes para o ensino secundrio. Aquilo que nos proposto nestes documentos uma viso idealizada do aluno, a ideia do que

    ele deveria ser, a partir de um funcionamento de qualidade do sistemaescolar. Esta viso idealizada (em abstracto, os alunos so bons) contrastafortemente com a viso que nos proposta dos alunos concretos que nosso referidos quer a propsito dos grupos de risco abrangidos pelos currculosalternativos, quer a propsito dos pblicos escolares (e respectivas famlias)das zonas consideradas de interveno prioritria. Num e noutro caso, do-minante uma imagem negativa em que os alunos, pelos seus atributos pessoaise sociais, se constituem, em si mesmos, em o problema. Em CurrculosAlternativos no Ensino Bsico Guia Prtico,os alunos-alvo desta medidade poltica educativa so caracterizados nos seguintes termos:

    [...] jovens em que foram detectadas caractersticas comportamentaise de aprendizagem muito problemticas e que correm o risco de aban-dono da escolaridade obrigatria por vrias razes (familiares, econmi-cas, psicolgicas falta de motivao pessoal, etc.).

    A ESCOLA: CONSTRUINDO NOVOS MODOS DE REGULAODO SISTEMA EDUCATIVO

    Um fenmeno de descoberta da escola enquanto organizao socialmarcou a investigao e a interveno educativas a partir dos anos 80 (Ca-

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    nrio, 1996). Esta tendncia para evoluir de um pensamento centrado numsistema escolar para um outro centrado num sistema de escolas est bempresente nos textos analisados, que acentuam a necessidade de colocar aescola no centro das preocupaes, considerando-a o lugar nuclear do

    processo educativo ou o espao privilegiado para a funo educativa ecentro das polticas educativas. Alm disso, ela -nos tambm apresentadacomo uma comunidade educativa, desenvolvendo uma competnciamobilizadora de toda a comunidade envolvente.

    Esta perspectiva supe uma reapreciao do papel desempenhado peloEstado (Charlot, 1994 e 1998), que tende a evoluir do conceito de Estadoeducador para o de Estado regulador, em que emerge a sua funo arbitral.Assim, prope-se no Pacto Educativo:

    Redefinir o papel do Estado, favorecendo uma maior participao das

    diversas foras sociais nas decises e na execuo de polticas educativas,em todos os nveis da administrao, o que permitir assegurar umequilbrio dinmico entre, por um lado, as funes centrais de concepo,arbitragem, regulao e identificao/correco das assimetrias.

    Esta redefinio implica um processo de descentralizao das polticaseducativas, com a respectiva transferncia de poderes para as instnciaslocais, nomeadamente escolas e autarquias, passando a caber s instnciascentrais de deciso poltica um papel de estmulo e de regulao normati-

    va. A inteno de construir novos modos de regulao do sistema educativopode ser sistematizada, a partir da anlise dos textos, em torno de trsorientaes fundamentais: territorializao das polticas, diversificao dasofertas, poltica de incluso.

    Relativamente ao processo de territorializao, possvel distinguir umaprimeira dimenso, tributria de preocupaes de racionalizao de modos degesto. As medidas que vo no sentido de racionalizar a rede escolar encer-ramento de escolas rurais, criao de agrupamentos de escolas, para efeitosde gesto, incentivo constituio de parcerias inserem-se nesta linha de

    preocupaes, que enfatiza as formas de colaborao e articulao entreescolas de diferentes ciclos, bem como outros actores sociais, situados nummesmo territrio. Inscrevem-se tambm nesta linha racionalizadora e tcnicaa enfatizao da importncia dos processos de avaliao, nomeadamente dasescolas e, mais recentemente, dos alunos, bem como a presena sistemticada referncia busca da qualidade (Barroso, 1997).

    Uma segunda grande orientao refere-se diversificao das ofertasformativas, o que, sem colocar em causa a existncia de currculos nacio-nais construdos com base na definio de um conjunto nuclear de apren-

    dizagens e competncias (como sustentado nos documentos), supe acapacidade de gerir uma inevitvel tenso entre a uniformizao e a hetero-

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    geneidade. Esta diversificao, inicialmente circunscrita ao ensino secund-rio, estende-se agora escolaridade obrigatria, com o lanamento de me-didas como os currculos alternativos, ou o 9. ano mais um, entre outras.

    Uma terceira grande orientao diz respeito s preocupaes com a ex-

    cluso/incluso social. Sem que em momento algum se apresente um signi-ficado preciso, a utilizao da palavra excluso ou se inscreve numadeclarao de intenes de carcter universal ou surge associada exclusoescolar, preveno do insucesso e do abandono. O modo como a expres-so excluso utilizada nestes textos aproxima-a do que se designa porlugares-comuns, ou topoi (Amossy e Pierrot, 1997). Os topoiso banalida-des que, ao serem universalmente aceites, se transformam em verdades queno precisam de ser questionadas. So princpios gerais que servem de apoioao raciocnio mas no so raciocnios. Quem os emite nunca se identifica

    como o seu autor. So quase sempre apresentados como sendo objecto deum consenso no seio de uma comunidade.Nesta perspectiva, a palavra excluso faz parte de um conjunto mais

    vasto onde pontificam expresses como qualidade da educao, sociedadedo conhecimento, formao e educao ao longo da vida, que congregamum acordo generalizado em torno de um significado que, ao ser aceite comonico e universal, no precisa de ser explicitado. No entanto, quando pro-curamos analisar a relao entre os modos de regulao e incluso e exclusosocial que melhor podemos compreender o sentido destes dois ltimos termos.

    Nos textos em anlise, a relao entre estes dois fenmenos conceptualizadacom base na perspectiva da equidade. Ou seja, a poltica educativa concebidano sentido de accionar um conjunto de medidas que propiciem um acessomais equitativo das diferentes categorias de alunos ao sistema educativo, pro-movendo a sua incluso. As medidas preconizadas incidem fundamentalmentesobre trs domnios distintos: o currculo; a aco social e a educao especial.

    MUDANAS NA EDUCAO: O PONTO DE VISTA DE POLTICOSE DE QUADROS SUPERIORES DO MINISTRIO

    A CENTRALIDADE DA ESCOLA

    As imagens que os entrevistados2veiculam da escola dividem-se entreuma viso optimista, francamente minoritria, e uma outra, mais pessimista,

    2Foram realizadas entrevistas a cinco responsveis polticos pela educao (ministros,secretrios de Estado), a trs quadros superiores da administrao e aos dirigentes das duasmaiores federaes de sindicatos de professores. Com estas entrevistas pretendeu-se recolher

    informaes sobre a forma como os entrevistados analisam as alteraes que nos ltimosquinze anos se registaram no sistema educativo portugus e a sua articulao com a proble-

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    partilhada pela generalidade dos polticos e quadros superiores do ME. A visooptimista mantm-se fiel concepo de escola que esteve subjacente expanso dos sistemas educativos no ps-guerra e ao aumento da procurasocial de educao e est bem patente nas palavras de um dos entrevistados

    quando afirma:[A escola ] a instituio mais generosa da democracia, porque ainda

    a nica que pode atenuar os efeitos das desigualdades [E10].

    Todavia, para a maioria dos entrevistados, a descrena e a desconfianaso as tnicas dominantes de um discurso que recupera alguns dos argumen-tos geralmente enunciados para justificar a crise da escola. A viso pessi-mistaveiculada resulta, no essencial, do questionamento do pressuposto quedurante aproximadamente trs dcadas sustentou a procura optimista da edu-

    cao. A existncia de uma relao directa entre qualificaes escolares, em-prego e mobilidade social ascendente posta em causa e apresenta-se comoo elemento-chave dos discursos que os entrevistados produzem sobre a escola:

    A escola, pelo prprio processo de massificao, j no vista pelaspessoas como um veculo de mobilidade social, embora seja consideradaainda uma condio necessria, embora no suficiente. Por outro lado, ainstituio escolar tem uma inrcia que faz com que ela reproduza para aescola de massas a filosofia e a lgica de funcionamento da escola elitista.

    As expectativas que so criadas so expectativas que so falsificadas pelaprpria realidade social [E 4].

    No captulo das mudanas, a reconfigurao dos processos de regulaodo sistema educativo tambm uma temtica recorrente que vai ao encontroda ideia, repetida insistentemente pelas equipas ministeriais socialistas, de co-locar a escola no centro das polticas educativas. Neste contexto, as prin-cipais mudanas referidas organizam-se em torno de trs aspectos essenciais:gestoe autonomiadas escolas, participaode actores sociais tradicional-

    mente afastados das questes educativas e papel do Estadona educao.O modelo de gesto e administrao das escolas suscita entre os entre-

    vistados opinies diferenciadas. De um lado, temos os que a ele aderemincondicionalmente; do outro, os que o rejeitam e criticam abertamente. Noque respeita s opinies favorveis, elas organizam-se em torno de duas ideiasfundamentais: a aproximao da escola comunidade e a construo de

    mtica da excluso/incluso social. A este eixo de anlise associa-se um outro atravs do qualse procura analisar as narrativas dos entrevistados com base nas categorias e nas imagens a

    que recorrem e nos argumentos que desenvolvem, bem como a forma como definem os vriosactores educativos.

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    mecanismos de auto-regulao e controle que contribuem para conferir aosestabelecimentos de ensino uma responsabilidade acrescida:

    [Com este modelo] as escolas esto mais integradas nos territrios, asescolas agrupam-se umas com as outras e tm de dar resposta s neces-

    sidades locais, sem perderem as orientaes, que so orientaes nacio-nais e de natureza geral [E10].

    Antigamente no havia este rgo [a assembleia de escola] e eles [osprofessores] no eram controlados, eles eram exclusivos. Agora eles soscontrolados e tm de explicar aos seus parceiros o que que fazem e oque que no fazem [E7].

    As crticas avanadas incidem sobre dois aspectos distintos: a incapa-cidade deste modelo de introduzir mudanas significativas no governo das

    escolas, por um lado, e a sobrevalorizao da dimenso administrativa, poroutro. No essencial, o modelo acusado de fazer depender as decises dosprotagonistas tradicionais e de subordinar os aspectos pedaggicos aos as-pectos administrativos:

    O que est a ocorrer so processos administrativos tendentes a alteraros rgos de gesto e de administrao da escola e mais nada [] Mudamos rgos e muda o funcionamento para ficar mais ou menos na mesma, o que eu acho, porque os actores so os mesmos [E3].

    Neste novo modelo, o conselho pedaggico uma espcie de assessorda direco executiva da escola e, portanto, l est subvertido aquilo quens considervamos ser a maior herana vinda do 25 de Abril, que eraperceber-se que a escola no podia ser gerida administrativamente, tinhade ser gerida pedagogicamente [E5].

    O discurso dos entrevistados sobre a temtica da participao apresentaalgumas particularidades que importa reter. Em primeiro lugar, apesar de al-guns dos interlocutores recorrerem metfora da abertura da escola aomeio, a ideia de participao por eles transmitida incide, exclusivamente,sobre a participao institucional na gesto dos estabelecimentos de ensino,aspecto que congrega, alis, a unanimidade de opinies favorveis. A segundaparticularidade reside nas dvidas que alguns entrevistados colocam quanto efectiva participao dos novos parceiros, nomeadamente pais e autarquias.Para estes, o principal problema parece residir na dificuldade em ultrapassaros efeitos da inexistncia de uma cultura de participao na sociedade portu-guesa. Essa dificuldade expressa por um dos entrevistados quando afirma:

    Eu acho que, quer seja em associaes de pais ou no, a participao

    dos pais dentro das escolas tem de ser mais considerada no que se refereaos aspectos de administrao, isto , nos rgos de gesto. Na minha

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    perspectiva, acho que, se nunca se comear essa participao dos encar-regados de educao, nunca se criar uma cultura de participao dosencarregados de educao. Eu acho que a participao dos autarcas importante, eu sei que difcil [E6].

    No quadro das mudanas em curso, no de estranhar que uma dastnicas do discurso dos entrevistados incida sobre a necessidade dereconfigurar o papel do Estado. A defesa de um Estado regulador , nestecontexto, a opinio dominante. O consenso generalizado em torno de umnovo papel do Estado na educao estende-se tambm ao domnio maisconcreto da definio das suas competncias. Regulao, acompanhamento,tutela e financiamento so as competncias atribudas pela generalidade dosentrevistados ao Estado. Esta unanimidade de opinies apenas quebrada porum dos polticos entrevistados que, fazendo eco do discurso neoliberal da

    privatizao e livre escolha (Whitty, Power, Halpin, 1998), exprime, nosseguintes termos, o seu pensamento:

    A minha utopia para a educao bsica e secundria o sistemaradicalmente descentralizado, onde o essencial das tarefas e da respon-sabilidade competem s comunidades. A escola devolvida s comuni-dades [] Passa-se-lhes o oramento segundo uma capitao qualquer eelas decidem, contratam os professores, fazem o plano estratgico daescola, o projecto educativo [] O Ministrio da Educao no deve ser

    o prestador dos servios educativos e o gestor do sistema, como hoje,de uma forma absurda [E2].

    OS FACTORES DE MUDANA

    As narrativas sobre as mudanas na educao organizam-se em torno detrs ideias fortes: as mudanas sociais, os novos alunos e a influncia dosorganismos internacionais. As mudanas sociais referidas pelos entrevistadosso, na sua maioria, identificadas com a transio da sociedade industrial para

    a sociedade do conhecimento, com a difuso de modelos de organizao detrabalho ps-fordista e com o aumento da multiculturalidade. O segundo as-pecto ao qual polticos e quadros superiores atribuem algumas das mudanasrecentes consiste na chegada escola dos novos alunos. Estes novos alunosdeixam de ser os filhos das classes mdias para passarem a ser os filhos dosdrogados, os filhos das famlias desestruturadas ou, mais recentemente,os filhos do rendimento mnimo garantido. A terceira ideia forte desenvolve--se em torno da importncia dos organismos internacionais e da forma comoeles influenciam a poltica educativa nacional. Fazendo eco do que defendido

    por alguns autores (Nvoa, 1996), os entrevistados rejeitam liminarmente aexistncia de uma poltica educativa comum ao nvel da UE e so unnimes

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    em afirmarem a autonomia do governo nacional. Admitem, contudo, que setrata de uma autonomia relativa. Algumas das medidas tomadas so o resultadodirecto da influncia dos organismos internacionais e daquilo que alguns ape-lidam de uma agenda comum. A ideia de uma agenda poltica comum

    apresentada nos seguintes termos:O ensino pr-escolar, a rede pblica do pr-escolar, a formao dos

    professores, tudo isto so assuntos que vo da frica do Sul at Sucia [E8]

    No existe uma poltica educativa comum, existe uma agenda polticacomum [] marcada por influncias recprocas, por programas, porfinanciamentos [E3].

    Uma das linhas de orientao da aco governativa dos ltimos anos estru-

    tura-se em torno do primado do combate excluso social. Com efeito, otermo excluso social tem vindo a invadir o discurso recente sobre polticaeducativa e a luta contra os fenmenos de excluso social tem estado naorigem de algumas das medidas tomadas no mbito das polticas sociais, dasquais o rendimento mnimo garantido , sem dvida, a mais emblemtica.

    Entre os entrevistados, a excluso social objecto de duas interpretaesdistintas. Para uns um fenmeno interno escola; para outros o resultadode transformaes sociais mais vastas. A excluso centrada na escola con-funde-se, num primeiro momento, com os problemas de insucesso e de

    abandono para, em seguida, ser apresentada como indutora de futuras situa-es de excluso social. Neste caso, a excluso define-se pelo no acesso escola, a aprendizagens com sucesso e, consequentemente, a um empregonum futuro mais ou menos prximo:

    A excluso social est ligada excluso educativa. E a exclusoeducativa significa que nem sequer vo escola, ou vo escola e notm sucesso, ou vo escola e so afastados. Se quiser, h estas formastodas de insucesso, porque aqueles que no vo escola tambm tminsucesso, simplesmente nem chegam a ir l; por isso que a palavraexcluso educativa [E8].

    A excluso como resultado de fenmenos sociais novos que ocorrem nassociedades actuais , no entanto, a verso dominante entre os entrevistados.Recusando-se, nalguns casos, a reduzir a excluso a problemas da esferaestritamente educativa, ela surge associada s transformaes que tm vindoa registar-se no sistema econmico ou apresentada como uma consequnciadas polticas neoliberais das duas ltimas dcadas:

    A internacionalizao das economias e a globalizao dos mercadosforam acompanhadas de um fenmeno terrvel de internacionalizao e

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    globalizao da excluso daqueles que se vem afastados do processo dedesenvolvimento porque no so participantes activos. O sistema temvindo a colocar na beira do caminho grupos profissionais, grupos etrios,regies, pases inteiros [E1].

    A excluso social uma realidade terrvel. No meu entender, umarealidade terrvel e tem contornos novos. Eu diria que a marca maisevidente das polticas neoliberais [E5].

    PROFESSORES E ALUNOS: AS IMAGENS DOS ACTORES

    A imagem que polticos e quadros superiores veiculam dos professoresconstri-se, quase exclusivamente, por referncia relao directa que estesprofissionais da educao estabelecem com os alunos. Para os entrevistados, opapel dos professores continua a ser inquestionvel, definindo-se, exclusivamen-te, por via da relao pedaggica. Curiosamente, no existe qualquer referncia interveno dos docentes no contexto mais alargado que a escola. O quedomina a imagem do professor como aquele que ensina, aquele que forma:

    O que se pede aos professores do ensino bsico que a crianaaprenda a ler e a escrever. No ensino secundrio, o que se pede aosprofessores que preparem os alunos para terem boas notas no final do12. ano [E3].

    A importncia que atribuda figura do professor surge acompanhada dareferncia a alguns aspectos que, de um modo geral, esto na origem do quese designa por mal-estar docente. A desvalorizao do estatuto e da imagempblica do professor e a diversidade de tarefas que so chamados a desem-penhar so referncias a que os professores recorrem com alguma insistnciapara explicarem o desconforto com que vivem a profisso e a que polticose quadros superiores no parecem ser estranhos:

    H uma imagem pblica degradada da profisso docente [E4].

    Eu acho que os professores esto sujeitos, dentro das escolas, a algunsproblemas [E6].

    Aquilo que se exige dos professores, nalgumas situaes, so verdadei-ras atrocidades [E5].

    O discurso sobre os professores , no entanto, marcado por uma elevadaambiguidade. Ao mesmo tempo que se exalta o papel central que desempenhamna sociedade e se verifica uma compreenso relativamente s tenses que atra-

    vessam o exerccio da profisso, esse mesmo discurso deixa tambmtransparecer o sentimento de desconfiana com que estes profissionais tm sido

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    olhados pelo poder poltico e pela administrao. Este sentimento de des-confiana exprime-se, principalmente, atravs dos argumentos que soavanados para justificar, quer o carcter obrigatrio da formao cont-nua, quer a necessidade de introduzir mecanismos de avaliao de desem-penho dos docentes.

    Relativamente formao contnua, o facto de o Estatuto da Carreira Do-cente contemplar a frequncia de aces de formao como condio indis-pensvel para a progresso na carreira, consagrando assim a sua obrigatorie-dade, referido de uma forma positiva pelos entrevistados, que nele vem umamedida para combater o reduzido empenhamento de alguns professores no seuaperfeioamento profissional. Por seu turno, os argumentos avanados parajustificar a introduo de mecanismos de avaliao de desempenho soreveladores, quer da desconfiana que paira sobre o corpo docente, quer dochoque entre os diferentes objectivos que podem ser preconizados com tal

    avaliao: sustentar a progresso na carreira; contribuir para o desenvolvimen-to profissional ou das organizaes (Curado, 1997). Da anlise das entrevistas possvel identificar uma concepo minoritria, defendida apenas por doisdos entrevistados, segundo a qual a avaliao deve ser encarada numa pers-pectiva de desenvolvimento profissional. A esta concepo contrape-se umaoutra que v na avaliao um instrumento para premiar o mrito e castigar odesleixo, com as consequentes repercusses na progresso na carreira.O excerto que se segue exprime, de uma forma exemplar, esta concepo:

    Nenhuma carreira se faz sem avaliao e apenas por antiguidade. Tem

    de haver, inclusivamente para a credibilidade do sistema educativo peran-te a sociedade, mecanismos que permitam premiar os melhores, aquelesque so mais competentes, mais devotados, que preparam mais as aulas,que estudam, que se actualizam, e que castiguem os piores, aqueles queso preguiosos, que no querem saber dos alunos, que no preparam asaulas, etc. [E2].

    Diversidade e heterogeneidade so as palavras-chave a que todos recor-rem quando se referem populao estudantil actual. Muito mais lacnicos

    quando se referem aos alunos do que quando falam dos professores, osentrevistados identificam como principais transformaes as que ocorrem nacomposio social, cultural e tnica do pblico escolar, as quais atribuem massificao e democratizao do sistema educativo:

    O 9. ano tornou-se obrigatrio e, realmente, isso est praticamenteinstitudo em todo o lado, quer sejam ciganos, africanos, emigrantes ilegais,brancos [E9].

    Um dos aspectos mais interessantes do discurso sobre os alunos , sem

    dvida, a sobrevalorizao do social. Em caso algum os entrevistados sereferem aos alunos como aprendentes. Quando solicitados a pronunciarem-se

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    sobre o que distingue o pblico escolar actual do de h quinze anos, sosempre e exclusivamente as suas caractersticas sociais que so enunciadas:

    Eu diria que, antigamente, quando um aluno chegava ao 7. ano deescolaridade, h quinze anos, ou no chegava, ou, quando chegava, tinha

    uma determinada base que hoje j no se verifica. Hoje cada vez menoschegam alunos com uma base de formao slida, julgo que isto verdade[] Comeam a emergir alunos filhos de drogados, filhos de famlias noconstitudas, alunos filhos de famlias complexas e tambm com sintomasde violncia maiores em determinadas reas. Portanto, acho que os profes-sores se confrontam, nos dias de hoje, com uma populao escolar maisdifcil, mais difcil no sentido em que est mais diversificada e mais distanteda cultura de base que os professores enquanto alunos tiveram [E6].

    A sobrevalorizao da dimenso social sobre a cognitiva na construoda imagem do aluno que veiculada pelos entrevistados reproduz, ainda quecom matizes diferentes, a dificuldade em gerir a heterogeneidade crescenteda populao estudantil, frequentemente reiterada por parte dos professores.

    PROFESSORES: UMA IDEOLOGIA DEFENSIVA

    Os professores constituem, no quadro da Unio Europeia, um dos gruposprofissionais mais numerosos, correspondendo a quase 3% da populaoactiva e, em nmeros absolutos, a cerca de 4 milhes de efectivos. Noconjunto dos pases europeus, o nmero total de professores duplicou du-rante os ltimos trinta anos. Este crescimento quantitativo do grupo profis-sional dos professores, que acompanhado pelo reconhecimento da suaimportncia, , contudo, atravessado por uma ambiguidade fundamental.

    Esta ambiguidade manifesta-se por uma inflao retrica sobre a missodos professores (tendente a conferir-lhes um crescente prestgio social),concomitante com a instaurao de modalidades de controle que implicam umareal depreciao das suas competncias. Os professores encontram-se, assim,mergulhados num quadro marcado por tenses contraditrias em que ele-

    mentos de afirmao profissional se misturam com lgicas de desvalorizaoe de controle autoritrio da profisso (Nvoa, 1998, p. 167).

    MUDANA EDUCATIVA: UMA VISO MARCADA PELO CEPTICISMOE PELA INCERTEZA

    Relativamente s mudanas verificadas no passado recente, e identifica-das pelos professores3como positivas e mais importantes, aquela que mais

    3Foram entrevistados 31 professores. Todos os entrevistados eram docentes em escolase jardins-de-infncia integrados em TEIPs (Monte da Caparica, Damaia, Galinheiras, vora e

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    explcita e consensualmente apontada , sem dvida, a democratizao doacesso aos diferentes nveis do sistema escolar. Incluem-se nesta perspec-tiva quer a poltica de expanso da educao pr-escolar (prioridade assumi-da pelo governo socialista), quer o prolongamento da escolaridade obrigat-

    ria, quer ainda o aumento da procura do ensino secundrio.Uma segunda mudana assinalada como importante e, ao mesmo tempo,implcita ou explicitamente considerada positiva reporta-se ao conjunto dealteraes verificadas no mbito curricular que remetem para uma mudananos processos de trabalho pedaggico utilizados com os alunos. nestadimenso de relao directa com os alunos que as mudanas do currculoso claramente valorizadas, mas apenas pelos professores do ensino bsico:

    Pronto, resumindo as grandes mudanas, so de aulas mais directivas,mais centradas no professor, para novas pedagogias, para aulas mais

    centradas nos alunos [prof. 19].Fazer as aulas vivas, activas, com os alunos a participar, foi a grande

    reviravolta [prof. 22].

    Um terceiro aspecto em que so identificadas mudanas de sinal clara-mente positivo diz respeito melhoria das condies de trabalho dos profes-sores. Esta melhoria integra referncias quer ao estatuto da profisso docen-te e poltica de formao contnua, quer s condies materiais eapetrechamento das escolas.

    Mas, se estas referncias positivas existem e so significativas, apesar deminoritrias, o que dominante no discurso dos professores sobre as grandestendncias de mudana do sistema educativo uma atitude de cepticismoquese desdobra em duas grandes vertentes. A primeira diz respeito ao carctervirtual das mudanasproduzidas pelo processo de reforma educativa:

    Mas, em termos concretos, depois da aplicao dessas situaes sescolas e aos professores, nem sempre as inovaes trazidas por essalegislao se transformaram em grandes alteraes prticas [prof. 2].

    As polticas educativas mudam no papel, mas depois, na prtica, as

    pessoas acabam por fazer da mesma forma [prof. 26].

    A segunda vertente do cepticismo reporta-se interiorizao de um dis-curso retrgrado sobre o facilitismo, verso portuguesa dos discursossobre o abaixamento do nvel, no sistema de ensino. A adopo do slogando facilitismo exprime um cepticismo crtico e profundo relativamente aosentido global das mudanas verificadas. Expressa-se aqui o dilema vivido

    Paos de Ferreira) e nas escolas secundrias da sua rea de influncia. Os objectivos destas

    entrevistas so semelhantes aos das realizadas aos polticos e quadros superiores do Ministrioda Educao (cf. nota 2).

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    pela instituio escolar e pelos professores, sujeitos ao duplo constrangimen-to da selecoe da democratizao:

    Uma mudana significativa foi, no sei se estou a ser muito exagerada,mas penso que se est a caminhar para o facilitismo, para um aligeirar das

    coisas, o que vai ter srias consequncias [...] nos primeiros anos areforma criou um esprito pouco favorvel por causa da burocracia, emque o aluno s retido em situao excepcional. Ora isso influenciou elevou, de algum modo, a que os valores mnimos tenham sido tornadoscada vez mais mnimos [prof. 5].

    [...] penso que as leis e, a meu ver, o prprio sistema foram pervertidos.H uma grande preocupao com o sucesso e tem-se acrescentado umadiminuio do nvel de exigncia do aluno de ano para ano [prof. 12].

    Este ponto de vista marcado pelo cepticismo, sobre o passado recente,projecta-se, relativamente ao futuro numa viso simultaneamente vaga e nebu-losa, mas marcada pela incerteza. As previses relativamente aos grandestemas que estaro no centro do debate e da aco educativa restringem-se transposio dos temas que constituem a actual agenda, nomeadamente: omodelo de gesto das escolas e o seu regime de autonomia, os problemasrelacionados com a carreira docente e a formao de professores, o alarga-mento da rede da educao pr-escolar, a reforma dos planos de estudo e dosprogramas, principalmente do ensino secundrio, onde esse tema estava emdiscusso. Se o passado olhado com cepticismo, o futuro no encaradode forma optimista. Resta a alguns refugiarem-se no discurso do desejo:

    Eu gostaria era que se estabilizassem as escolas, se fizesse umaconsciencializao e uma avaliao do que as escolas fazem de bem feitoe desenvolvessem isso ao mximo do ponto de vista das experinciaspedaggicas, das metodologias, dos modelos pedaggicos. Gostaria queisso acontecesse, mas tenho algum receio [prof. 1].

    Ou como afirma, lapidarmente, um outro professor:

    Espero que o governo arranje uma soluo mgica de estabilizar ocorpo docente [prof. 24].

    As mudanas em curso no que diz respeito aos processos de regulao dosistema escolar organizam-se em torno de trs questes principais: a questodo governo das escolas, modelo de gesto,relaes de poder entre os esta-belecimentos de ensino e os diferentes nveis da administrao central e local,ou seja, a questo da autonomiae as relaes de parceria a instituir a nvellocal, quer dizer, os processos de participao. A posio dos professores

    face a estas questes decorre do facto de estes assumirem uma posioessencialmente reactiva s propostas e decises da adminitrao, que detm

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    sempre a iniciativa. Atravs das entrevistas, os professores manifestam sobre-tudo dvidas, receios, por vezes anseios, mas dificilmente estruturam umpensamento crtico slido e fundamentado. Por isso, podemos caracterizarcomo defensivoe distanciado(remetendo para a administrao a responsabi-lidade de eventuais falhanos) o ponto de vista expresso pelos professores.

    A substituio das formas tradicionais de controle, exercidas a prioricom base em prescries e normativos precisos a partir do centro, pormodos de regulao local e de controle a posteriori constitui o cerne doprojecto de reforo da autonomia dos estabelecimentos de ensino prossegui-do pela administrao. O acordo de princpio relativamente ao reforo daautonomia comum ao conjunto dos entrevistados. , contudo, pertinentediscernir entre dois modos distintos de conceber, ainda que de forma impl-cita, a autonomia das escolas. Para a maioria, a autonomia aparece comoalgo que outorgados escolas pelo poder central, oscilando as posies

    entre uma adeso com reservas ou uma viso positivamente cptica:

    Eu no sei at que ponto essa autonomia tem vantagens. No sei bemo que eles querem fazer [...] No sei at que ponto vai haver mudanas.Eu no sou contra, mas ainda no sei como que , nem em que moldesvai aparecer, mas estou aberta s inovaes [prof. 26].

    Eu acho que no papel est a mudar muita coisa, mas depois, na prtica,a pessoa diz que tem autonomia, mas quando quer fazer qualquer coisa nopode fazer [...] Agora tem de ser posto na prtica, porque ns aqui, na

    escola, nessa coisa da autonomia, se quisermos fazer qualquer coisa, temosde ir sempre ao ministrio pedir autorizao [prof. 31].

    Para um outro grupo, minoritrio, a autonomia encarada como algo quej existe e que construdo,no contexto da prpria escola, pelos respectivosactores:

    Acho que os principais obstculos somos sempre ns [...] muitovantajoso que as escolas tenham a maior autonomia possvel, porque nstemos de trabalhar em funo da localidade onde estamos, no ? [...]

    E claro que essa autonomia extremamente necessria para que nspossamos trabalhar de acordo com as necessidades reais dos alunos quetemos. essencial que sejamos ns a ter, sei l, a grande fatia do bolo eque o ministrio nos ajude essencialmente, mais que nos ordene ou mandefazer, no ? [prof. 21].

    Relativamente questo da participao, o discurso da totalidade dosentrevistados situa-se na perspectiva do politicamente correcto e por issono h vozes desfavorveis, nem abertamente crticas, em relao ao prin-

    cpio da participao, na vida e nas decises da escola, de outros parceiros.Os dois grandes tipos de interlocutores identificados pela generalidade dos

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    entrevistados a propsito da participao so, por um lado, os paise, poroutro lado, os autarcas. As referncias a outros tipos de parceiros (como, porexemplo, os empresrios) permanecem a um nvel inteiramente residual. Ospais e os autarcas so vistos pelos entrevistados como elementos exterioresao estabelecimento de ensino, concretizando-se a participao a partir deuma dinmica de fora para dentro da escola. Ou seja, a efectividade daparticipao decorre principalmente (segundo o discurso dos entrevistados)de os respectivos parceiros virem ou no escola. A partir desta perspec-tiva, a caracterstica mais marcante dos discursos o de se exprimirem soba forma dejuzos de valor,quer sobre os pais, quer sobre os autarcas. dassuas qualidades intrnsecas e da sua disponibilidade que depende o grau departicipao. Essas apreciaes podem ser divididas em apreciaes positivase negativas,sendo, em ambos os casos, mais numeroso o segundo grupo.A apreciao positiva dos pais decorre da interaco directa com as famlias

    no desenvolvimento do trabalho pedaggico, o que acontece nos primeirosnveis de ensino ou, numa perspectiva de tipo representativo, no caso dasescolas em que h um ncleo activo na associao de pais:

    Logo no incio do ano ponho os pais vontade, dizendo-lhes que a boaarticulao entre os pais e o professor, at por causa do rendimentoescolar, ptima. Por isso, qualquer coisa que eu preciso dos pais euobtenho [prof. 6].

    [...] houve uma grande abertura e uma grande presena dos pais, quecomearam a sentir que podiam activamente dizer mais alguma coisa(prof. 9].

    As apreciaes negativas so, como atrs referimos, muito mais nume-rosas e constituem-se como uma acusao aos pais, colocando, implicita-mente, a escola e os professores na situao de vtimas:

    Se se quer que os pais participem nalgumas decises, que dem algumaopinio, eles no vm, no querem saber [prof. 7].

    Os pais deveriam ser muito mais activos. Deveriam comear por vir

    mais vezes aqui escola obter informaes. Deveriam comear por a edepois interessar-se mais pela vida dos filhos [prof. 8].

    [...] as escolas fazem actividades para os pais, mas eles no apare-cem, porque esto na taberna, no caf [...] porque eles acham que istono lhes diz nada (Prof. 12);

    OS PROFESSORES, A BATALHA DA QUALIDADE E A LUTA CONTRAA EXCLUSO

    Os vocbulos qualidade e excluso constituem os elementos centraisde uma retrica governamental destinada a legitimar, justificar e dar um

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    sentido s suas polticas educativas, nomeadamente no que se refere smudanas dos modos de regulao do sistema escolar, organizadas em tornoda trilogia autonomia-gesto-participao. O uso insistente destes vocbulostende a retirar-lhes operacionalidade, como conceito, convertendo-os em

    meros slogans. Os dois vocbulos, frequentemente associados num mesmodiscurso, remetem para as duas vertentes das polticas educativas recentes:a modernizaoe a democratizao. compreensvel, tratando-se de umalinguagem que imposta de fora, que os professores exprimam dificuldadesem lidarem e definirem-se perante este tipo de conceitos. tambm com-preensvel que os professores tentem reinterpretar a pertinncia destes con-ceitos luz do diagnstico que fazem da situao educativa e que no coincidente com o diagnstico da administrao.

    A retrica da qualidade inscreve-se numa perspectiva poltica de reforodas dimenses selectivas e competitivas da escola, ao mesmo tempo que, noquadro de uma lgica gerencialista, defende a transposio para a realidadeescolar de procedimentos de gesto de tipo empresarial (Barroso, 1997). Estetipo de orientao no apenas coloca novos tipos de exigncias aos professores(ao nvel da sua avaliao, por exemplo), como conflitual com as finalidadesde democratizao, que tendem a ser responsabilizadas pela degradaodo nvel do ensino. Este quadro tende a encerrar os professores numasituao, paradoxal, de duplo constrangimento, perturbador do ponto de vistacognitivo. A dificuldade em lidar com a noo de qualidade evidente nosdiscursos dos professores e exprime-se por um conjunto de afirmaes vagasou mesmo incongruentes que traduzem o carcter indefinvel de tal vocbulo:

    O sistema educativo deve assegurar uma qualidade de ensino que incluao mximo de pessoas [prof. 1].

    A pessoa tem de aprender a dar a tal qualidade, que ir de encontro criana [prof. 4].

    O que qualidade? Pois . Eu acho to difcil que agora at estou a terdificuldade para definir o que isso de qualidade [prof. 11].

    Relativamente ao entendimento do conceito de excluso, a partir daanlise das entrevistas, possvel identificar dois posicionamentos distintos,mas em tudo semelhantes aos evidenciados por polticos e quadros superioresdo ME. Para um primeiro grupo, a uma nova terminologia no correspondenada de substancialmente diferente a nvel dos fenmenos. A excluso,fenmeno interno instituio escolar, corresponde velha problemtica doinsucesso e do abandono escolar:

    Realmente h uma mudana de vocabulrio, mas, na sua essncia, h

    a algo que se complementa. Isto , quem tem mais tendncia para aexcluso social quem tem mais insucesso escolar [prof. 23].

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    Para o segundo grupo, que exprime a tendncia dominante, a exclusocorresponde a um conjunto de fenmenos sociais novos que tendem a invadire a contaminar a realidade escolar, perturbando o seu funcionamento:

    Eu acho que estamos com problemas novos porque tudo aquilo que

    o mundo est a atravessar e que ns vemos nas televises e nos jornaise nos outros meios de comunicao social, muitas dessas coisas, muitasvezes, so transportadas para a escola e [...] um bocado difcil de seviver dentro da escola com esse tipo de situaes [prof. 13].

    ALUNOS: O INCONTORNVEL OBSTCULO DA HETEROGENEIDADE

    As rpidas e acentuadas mudanas registadas nas ltimas dcadas dospblicos escolares esto presentes, como no podia deixar de ser, no discur-so dos entrevistados. Para um grupo que constitui uma minoria absolutaessas mudanas so vistas como positivas, traduzindo-se numa atitudemarcada pela empatia em relao aos alunos:

    Nos estudantes h uma diferena enorme [...] agora so mais rebeldes.Por um lado, bom, porque falam mais, participam mais, tm mais vontade com os professores [...] Antigamente, os alunos eram maispassivos, com mais medo do professor, que ia ali despejar matria, comose costuma dizer [prof. 7].

    Acho que tm um bocadinho mais vontade de aprender, esto maismotivados, gostam mais de estar na escola, isso tambm muito impor-tante [...] Os midos so muito agradveis e so simpticos. Acho que um meio muito acolhedor aqui na escola. Em geral, eles gostam de vir paraa escola [prof. 14].

    Sendo esta postura a excepo, a quase totalidade dos professores or-ganiza o seu discurso a partir de uma viso negativa e desvalorizadadosnovos pblicos escolares. A palavra-chave desse discurso a heterogenei-

    dade. Mutaes internas da instituio escolar, decorrentes da poltica dedemocratizao de acesso, bem como fenmenos de natureza social,extrnsecos escola (migraes, crise urbana) esto na origem do cresci-mento exponencial da populao escolar e da sua diversidade interna. Essadiversidade claramente identificada como a razo principal dos disfuncio-namentos da instituio escolar. A heterogeneidade aparece como um obs-tculo de fundo ao tipo de trabalho pedaggico que os professores pensamdever desenvolver. Alguns limitam-se a verificar a existncia objectiva damudana, deixando implcito o seu carcter negativo, tido como evidente:

    Os pontos de partida das crianas so muito diferentes, h muitas assime-trias [prof. 1].

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    Para outros professores, as dificuldades sentidas perante os novos pbli-cos escolares so o resultado directo de a escola ser invadida por proble-mas sociais novos, ou que se agravaram, no exterior:

    A comunidade onde a escola est inserida uma comunidade queprecisava de ser muito trabalhada, mas a escola sozinha no conseguir[...] um bairro com estratos sociais muito diferentes, muitos problemasde droga, muitos problemas de abandono do lar, os pais muito tempo forade casa, s regressam noite. Passe o termo, esto-se borrifando para osfilhos [prof. 22].

    Ns aqui apanhamos com imensos midos que no sabem estar numaaula, no sabem estar numa rua, no sabem estar em stio nenhum [...]alguns deles vm de uma cultura completamente diferente da nossa [...]

    eles, no fundo, reproduzem um bocado em casa os costumes de CaboVerde e depois [...] muito difcil integrarem-se na nossa sociedadecomo ela est organizada [prof. 31].

    Outros ainda apontam, de forma explcita, o processo de democratizaodo acesso escola como a causa primeira das dificuldades:

    O facto de ficarem na escola at ao 9. ano fez com que houvessealunos muito diferentes dentro da sala de aula. Antigamente chumbavampor faltas e agora vo-se mantendo e a escola tem de fazer alguma coisapor eles [...] Eu tinha alunos que comeavam a dar problemas e chumba-vam-nos logo e agora a escola j no os pode excluir sem mais nem menos.Esse um grande problema que se pe escola, porque at ali era fcil. difcil lidar com essa heterogeneidade [prof. 20].

    Por fim, um outro grupo de entrevistados assinala a contradio essencialentre a organizao escolar e os problemas postos pela heterogeneidade dosalunos. Como refere Joo Barroso (1995), a organizao escolar tem a suagnese na passagem de uma relao dual (mestre-aluno) para uma relao

    mestre-classe, com a finalidade de ensinar muitos como se fossem um s.So as exigncias de um ensino simultneo que impem processos uniformesde ensino que conduzem a tratar o pblico escolar como homogneo. Estaresposta da instituio escolar, que tende a reduzir a complexidade inerente diversidade do pblico escolar, tem o seu sinal mais expressivo na refernciaao aluno mdio que tem estado subjacente ao pensamento e aco pedag-gicos (Canrio, 1999). , precisamente, esta nostalgia da homogeneidadeperdida que atravessa o discurso dos professores:

    H dez, quinze anos trabalhava-se para o aluno mdio. Toda a interven-o educativa era trabalhada e planificada em funo do aluno mdio, de

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    modo que os que tivessem direito a sobressair sobressaam pela positiva,e depois havia os que estavam na cauda, que estavam sempre no canto.Mas estes meninos que estavam no canto deixaram de ser dois ou trs parapassarem a ser gruposmais consistentes em termos de nmero e preciso

    dar resposta [prof. 1].

    PROFESSORES: A DIFCIL RECONFIGURAO PROFISSIONAL

    A percepo de que a evoluo da profisso docente tem vindo a sermarcada por uma degradao do estatuto social e profissional constitui aideia relativamente qual possvel identificar uma maior convergncia deopinies por parte do conjunto de professores entrevistados. Este sentimentode perda, que est no cerne do famoso mal-estar docente, , essencial-

    mente, referido a dois aspectos que mutuamente se reforam: por um lado,o estatuto remuneratrio; por outro lado, o grau de reconhecimento social.

    Sendo este o pano de fundo geral, destacam-se trs problemas que ali-mentam o mal-estar docente. O primeiro problema resulta do facto de aadministrao central ter dos professores uma viso instrumental no que serefere produo de mudanas no sistema escolar. Trata-se de conceber osprofessores, como afirmou um ministro da Educao, como uma alavancahumana para aplicar as reformas. O segundo problema consiste em, para-lelamente a uma degradao do estatuto social do professor, este ser cha-

    mado a dempenhar uma cada vez maior diversidade de funes e de, aomesmo tempo, pesarem sobre ele elevadssimas expectativas sociais:

    Acho que toda a gente espera sempre muito. O Ministrio espera muito,os directores regionais esperam muito, os pais esperam muito... [prof. 3].

    Eu acho que hoje se espera muito mais de um professor. Hoje espera--se tudo, no se espera que ele seja s professor. Muitas vezes espera-seque ele seja o pai, a me, o psiclogo, e no s o transmissor deconhecimentos. Mas penso que o professor tem agora um papel mais

    alargado [prof. 20].A diluio dos contornos clssicos da profisso docente acompanhada

    de condies mais penosas de exerccio profissional. Mas esta diversidadede funes e a elevao do nvel de expectativas que pesam sobre os pro-fessores so manifestaes de uma questo mais profunda que diz respeito transformao daquilo que durante muito tempo foi visto como o essencialda profisso docente. Um dos entrevistados sintetiza bem esta mudana:

    Dantes a gente limitava-se a trabalhar com os midos e no havia mais

    nada. Agora so os projectos, h as reunies, quer dizer, agora o trabalhodo professor no s com os alunos, tudo o que o rodeia [prof. 22].

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    A necessidade de tomar em considerao no apenas os alunos, mastudo o que os rodeia, corresponde a uma mutao da profisso docente(Hirschorn, 1993). As rpidas mutaes em curso parecem lanar os pro-fessores numa situao perturbante em que tentam ler os acontecimentos do

    presente com o recurso a referentes conceptuais do passado. Por isso, umdos traos marcantes da viso que das mudanas educativas tm os profes-sores , inequivocamente, um olhar nostlgicosobre o passado, onde pareceresidir a idade de ouro da escola e dos professores. O presente encaradono duplo registo da lamentao e do temor. No surpreende, pois, que apostura dos professores seja, de forma tendencial, uma postura sobretudoreactivas medidas tomadas pela administrao. Os professores suportamas mudanas, mas renunciam iniciativa. O futuro encarado com a incer-teza e a perplexidade de quem no domina as condies de exerccio da suaprofisso e, por isso, dificilmente pode fazer raciocnios de carcterantecipativo. no quadro de uma ideologia defensiva da profisso que odiscurso dos professores parece fazer sentido.

    MODOS DE REGULAO E INCLUSO E EXCLUSO ESCOLAR

    A importao para o campo educativo da problemtica da excluso, fa-zendo corresponder, de modo simtrico, um fenmeno que seria exterior escola (excluso social) a um outro fenmeno, este interno escola (exclu-

    so escolar), exprime, no um agravamento dos problemas especificamenteescolares, mas sim uma maior sensibilizao por parte da instituio escolara fenmenos de natureza social cuja origem se situa no mundo do trabalho.As mutaes (ou metamorfoses) verificadas no mundo do trabalho estono cerne de fenmenos de dualizao social (Dubet e Martucelli, 1998) queconfiguram o que se convencionou chamar a nova questo social (Castel,1995; Rosanvalon, 1995). A centralidade da crise do mundo do trabalhotraduz-se, nos pases ricos da Europa ocidental, por um fenmeno de de-semprego estrutural de massas e pelo carcter precrio da relao de traba-

    lho que se afirmam a partir da dcada de 70, na sequncia dos choquespetrolferos. nesta precariedade crescente dos trabalhadores assalariadosque reside o fundamento para o fenmeno que Castel designa por regressoda vulnerabilidade de massa, que est no cerne do fenmeno denominadoexcluso social. esta vulnerabilidade de massa que d fundamento auma leitura da realidade social como uma realidade dual, polarizada entre osincludos no mercado de trabalho, com rendimentos e nveis de consumomuito elevados, e os excludos do mercado de trabalho, que sobrevivemcom base em polticas sociais de carcter paliativo.

    Os rpidos progressos tecnolgicos das ltimas dcadas tornaram pos-sveis nveis elevados de acrscimo de produtividade, associadas ao cresci-

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    mento exponencial do volume global de riqueza produzida, concomitantes,porm, com consequncias sociais graves, nomeadamente o agravamento eproduo de novas desigualdades (Fitousi e Rosanvalon, 1996). O agrava-mento dos problemas sociais (desemprego, precariedade, nova pobreza,

    degradao urbana), bem como das desigualdades, acentuou-se em Portugaldurante a ltima dcada, de forma concomitante com o surto de progressoe modernizao que sucedeu adeso Comunidade Europeia. O ressur-gimento das ameaas coeso social (materializadas, como no sculo XIX,por uma questo social polarizada na existncia de classes perigosas)constitui o resultado combinado das transformaes do mundo do trabalhoe do enfraquecimento dos laos sociais decorrentes da hegemonia da lgicado mercado, que conduziu a processos de integrao econmica supranacional,que se traduzem por um processo de mercantilizao de tudo (Wallerstein,

    1999) e por uma monetarizao da vida social, em que o mercado vampirizaa democracia (Perret, 1999).A instituio escolar que promoveu o acesso massivo escolarizao,

    como instrumento de polticas pblicas baseadas na igualdade de oportuni-dades, est ela tambm profundamente afectada pelas mudanas do seucontexto. As mudanas verificadas no mundo do trabalho, que esto na raizdos fenmenos de excluso social, decorrem de processos de integraoeconmica supranacional em que o poder financeiro tende a sobrepor-se aosmecanismos institucionais tradicionais de exerccio do poder poltico no

    quadro dos Estados nacionais (Crouch e Streeck, 1996; Habermas, 1998;Wallerstein, 1999a). As mutaes sofridas pelo Estado inscrevem-se noprocesso de transformao do Estado-Providncia, que no perodo areo dofordismo consubstanciou o compromisso poltico entre a democracia e ocapitalismo. A crise desse compromisso (Santos, 1990 e 1998) est asso-ciada a um conjunto de fenmenos aparentemente contraditrios: um acessomais democrtico a nveis cada vez mais elevados de escolarizao concomitante com desigualdades sociais mais acentuadas; o progresso tec-nolgico e o consequente aumento de produtividade, em vez de gerarem

    emprego, aparecem associados, na Europa, a formas estruturais de desem-prego de massas; o aumento exponencial da capacidade de produzir riquezaafirma-se em paralelo com a emergncia, no corao dos pases ricos, deformas extremas de pobreza. Este quadro o resultado de um processo demodernizao, de progresso e de novas formas de regulao social queconvidam a reequacionar o papel da educao e da escola.

    As relaes entre a economia, o Estado e a escola no correspondem alaos de natureza funcional, regidos por princpios de causalidade linear. H,contudo, processos de mudana que so concomitantes e relaes de

    isomorfismo cuja descrio ajuda a compreender as interdependncias queligam estas trs dimenses. A escola das certezas representou um instrumen-

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    to fundamental na construo do Estado-nao, expresso poltica do capi-talismo liberal, marcado por violentos afrontamentos entre o capital e otrabalho, nomeadamente no perodo entre 1914 e 1945. O fim do Estadoliberal, a grande transformao, segundo a expresso de Polanyi (1983),

    coincide com o incio de um perodo de crescimento (fordismo) em que aproduo e o consumo de massa tm a sua contrapartida poltica no com-promisso consubstanciado no Estado-Providncia. A escola de massas, es-cola das promessas, isomorfa da grande empresa fundada sobre a produostandardizada e as economias de escala. Num contexto de tendencial plenoemprego, a relao estre a escola e o mundo do trabalho encarada comouma relao de adequao.

    A crise econmica e a crise de governabilidade do mundo capitalista, noincio dos anos 70, marcou o incio de uma nova etapa. A acelerao dos

    processos de integrao econmica supranacional, ou seja, a globalizao,significa instituir novos modos de regulao da vida econmica e poltica querelativizam a importncia do quadro nacional, abrem a crise do Estado--Providncia e instituem novas formas de controle e explorao do trabalho(Bernardo, 1991). A este perodo corresponde a escola das incertezas,que,tendo sofrido um processo de fragmentao analtica, j no uma ins-tituio, (Dubet e Martucelli, 1996 e 1998). Os novos modos de regulaodo sistema educativo, bem ilustrados pelas polticas educativas em Portugalna ltima dcada, que se exprimem por um novo vocabulrio (projecto,

    autonomia, local, avaliao, qualidade), traduzem a insero da es-cola das incertezasnaquilo a que Boltanski e Chiapello (1999) chamam onovo esprito do capitalismo. Mais do que fenmenos de privatizao e,portanto, de dicotomia entre o Estado e o mercado, o que est em causa nocaso portugus a importao para o campo da educao da cultura do novomanagement.

    A utilizao que tem vindo a ser feita do conceito de excluso social noquadro europeu remete para dois tipos principais de entendimento: o primei-ro, dominante no mundo anglo-saxnico, encara os fenmenos de excluso

    por oposio a uma concepo integrada e no conflitual do social, de raizdurkheimiana, em que a coeso social assegurada pelo acesso equitativodos cidados a um conjunto crescentemente alargado de bens individuais ecolectivos. Nesta perspectiva, a excluso exprime imperfeies ou disfuncio-namentos de um Estado-Providncia que tem como referncia o tipo idealdo modelo social-democrata proposto por Esping-Andersen; o segundo,dominante no mundo francfono, encara a excluso social como umfenmeno de oposio entre os que estariam in e out,dualizao social,territorializada (crise urbana), que viria substituir-se ao paradigma dos

    conflitos capital-trabalho, fundados na explorao. Ora nenhum destes doissentidos fornece um quadro conceptual adequado descrio e compreen-

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    so das transformaes sofridas desde os anos 80 pelas sociedades capita-listas ocidentais congruente com a informao emprica disponvel, nomea-damente no caso portugus (Canrio, Alves e Rolo, 2001). Mais do quedesignar uma realidade de facto, o conceito de excluso social representa,

    nos anos 90, uma proposta de releitura da realidade social que est longe deser neutra. O conceito desempenha um papel ideolgico na medida em quecontribui para naturalizar o funcionamento econmico decorrente da globa-lizao e das polticas ultraliberais que a tm sustentado (Forrestier, 2000),deslocando o debate da questo social do terreno da igualdade e da justiapara o terreno do controle social e da caridade (Roger, 2000; Wacquant,1998 e 1999).

    No caso da formao social portuguesa, a introduo do conceito deexcluso significa operar uma mudana de paradigma no modo de percep-

    cionar a realidade social e as suas mudanas nos ltimos vinte e cinco anos.Em meados dos anos 70, aps a revoluo de Abril de 1974, os problemaseconmicos eram equacionados em termos de desenvolvimento,os proble-mas sociais em termos de pobreza, mas sobretudo de explorao, e osproblemas educativos em termos de democratizao. Hoje os problemaseconmicos so equacionados em temos de adequao realidade (inelut-vel) da globalizao,os problemas sociais so vistos como problemas deexclusoe os problemas educativos so problemas de modernizao,em quea perspectiva da qualidade veio substituir-se perspectiva da pertinncia.

    no quadro de uma tendencial subordinao das polticas educativas lgica econmica prevalecente, comum ao conjunto da Unio Europeia, queganham sentido as mudanas iniciadas ou anunciadas no sistema educativoportugus. A enfatizao da centralidade do estabelecimento de ensino, daautonomia e do local, deve ser compreendida no quadro das transformaesdo Estado que tende a exportar problemas para a periferia, difundindo aspotenciais fontes de conflito e procurando construir formas de legitimidadecompensatria (Delamotte, 1998).

    Um dos resultados mais interessantes da investigao conduzida nos l-

    timos trs anos sobre a relao entre os modos de regulao do sistemaeducativo e os fenmenos de excluso/incluso social, no quadro da socie-dade portuguesa, consiste no reexame crtico de um conceito que, partida,se impunha como natural. Um trabalho de desconstruo sociolgica doproblema da excluso social impe-se como necessrio, pois s essetrabalho, como sugere Lahire (1999), permite pensar e imaginar outros pro-blemas e outras formas de os colocar.

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