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ESCOLA DE ENSINO REGULAR: LABORATÓRIO PARA A HOMOFOBIA E ESPAÇO PARA RESISTÊNCIA?
Rafael dos Santos Reis – Universidade Estadual de Maringá - UEM
Dra. Eliane Rose Maio (orientadora) Universidade Estadual de Maringá - UEM
Resumo A escola tem se preocupado em formar corpos e sujeitos, que atendam à demanda binária heterossexual. Por outro lado, em toda relação de poder haverá brechas que escapam, possibilitando espaços e empoderamento. Contudo, este trabalho é um recorte da pesquisa no Programa de Mestrado em Educação, pela Universidade Estadual de Maringá. Visa compreender se as experiências de homofobia influenciam a não permanência de alunas/os não heterossexuais a abandonarem a escola regular e ingressar ao CEEJA – Centro Educacional Estadual de Jovens e Adultos em uma cidade do interior do Estado de São Paulo .A metodologia a ser aplicada, estrutura-se a partir do método Snowball, com sequência ao estudo de caso e por fim, perguntas semiestruturadas para criação de dados. Muito há de ser estudado ainda, parte do abandono e o ingresso ao CEEJA de sujeitos não heterossexuais, se dão devido aos problemas de homofobia.
Palavras-chave: Educação; Escola; Sujeitos não heterossexuais; homofobia. Introdução
Dentre as várias dimensões que constituem o ser humano, a sexualidade é
uma delas. Essa compreensão nos permite pensar que o mundo é formado por
sujeitos e, quando se fala de sujeitos (no plural), entende-se por diversidade.
Compreender a diversidade como um agrupamento de multiplicidade, de diferentes
modos e aspectos; dentre essas possibilidades insere-se a sexualidade, esse
universo de várias formas de ser, como os/as não heterossexuais.
Toda essa compreensão nos leva a pensar a escola, como uma instância
responsável pela formação de corpos e sujeitos. Por ser uma extensão social, a
escola traz implicâncias políticas e econômicas que se insere na forma como cada
sujeito se estabelece. Esse feitio é tão explícito, que pode ser observado pelos
discursos fundamentalistas que classificam os sujeitos em dois polos de vivencias:
‘azul e rosa’. Essa noção que nos é ensinada se constrói a partir de uma produção
histórico-cultural, permeada em toda sociedade. Esse entendimento, na concepção
de Butler (2003, p.46) é o deslocamento estratégico dessa relação binária e da metafísica da substância em que ela se baseia pressupõe que a produção das categorias de feminismo e masculino, mulher e homem, ocorra igualmente no interior da estrutura binária. (BUTLER, 2003, p. 46).
Toda essa ideia parte do trabalho de pesquisa em andamento, no Mestrado
em Educação, na Universidade Estadual de Maringá (UEM), no Programa de Pós-
graduação em Educação (PPE), que tem como problema de investigação a maneira
como a escola regular lida com sujeitos compreendidos como não heterossexuais
que ingressam no Centro Educacional Estadual de Jovens e Adultas/os (CEEJA)
região do centro oeste do Estado de São Paulo. Levamos em consideração como
estes sujeitos se sentem em relação à escola regular, no sentido em que a escola
propicia um ambiente de violência e/ou talvez de resistência.
Desenvolvimento Não é de hoje que indivíduos não heterossexuais vivenciam fatores
determinantes em suas vidas escolares, como o preconceito e a homofobia, tanto
por alunas/os quanto por docentes. Essas hostilidades são resultadas pela falta de
conhecimento e prática cotidiana, devido a sexualidade ser um tema “escandaloso”
e silenciado enquanto conhecimento em âmbito escolar. Isso, fica evidente a partir
de dados de uma pesquisa, sobre discriminação contra homossexuais realizada pela
Universidade Federal de São Carlos
[…] no interior de São Paulo, mostrou que 32% dos homossexuais entrevistados afirmaram sofrer preconceito dentro das salas de aula e também que os educadores ainda não sabem reagir apropriadamente diante das agressões, que podem ser físicas ou verbais, no ambiente escolar. (Agência Brasil, 2016, s/p).
A falta das orientações acerca da sexualidade e diversidade sexual têm
prejudicado a vivência de uma democracia participativa em suas diversidades
sexuais, em que possam entender seus direitos e os direitos que todos/as têm,
independentemente de sua orientação sexual. Dessa forma, tem se perpetuado o
pensamento segregário que expele todo e qualquer pensamento que saia na norma
heterossexual e transfóbico ao legitimar vidas através dos crimes contra sujeitos não
heterossexuais, criando homofóbicos/as como aponta
o banco de dados do Grupo Gay da Bahia (GGB), atualizados diariamente no site quem a homofobia matou hoje, 420 LGBT foram assassinadas no Brasil em 2018: crime de ódio espalhado por todas as regiões do Brasil (GRUPO GAY DA BAHIA, 2018, s/p).
Estes exemplos mostram o reflexo da hostilidade e o papel da homofobia no
cenário social, em que a referência normativa e padronizada, que direciona a
criação das identidades, reproduz sujeitos dentro de códigos culturais construídos
no decorrer da história. Quando algum sujeito subverte o padrão de reconhecimento
macho e fêmea, acaba sendo atravessado pelo o que Borrilo (2010, p. 101) apontou
em sua obra intitulada Homofobia: História e crítica de um preconceito, “em uma
sociedade em que os ideais de natureza sexual e afetiva são construídos com base
na superioridade psicológica e cultural da heterossexualidade, parece difícil esquivar
os conflitos interiores resultantes de uma não adequação a tais valores”.
Geralmente, o que é transmitido dentro das instituições de ensino sobre
sexualidade se detém no campo biológico, apenas no universo preventivo (Infecções
Sexualmente Transmissíveis (IST), gravidez na adolescência, métodos
contraceptivos). Entendemos apenas como uma didática instrumental e técnica da
sexualidade e não uma reflexão acerca do desejo, dos afetos e da própria
sexualidade. Neste sentido, a escola se torna cúmplice da patologização da
sexualidade, no momento em que não desenvolve uma reflexão e não cria espaço
para a discussão.
Por outro lado, em toda relação de poder há brechas que escapam,
possibilitando fissuras que podem dar espaços a posturas de fala e empoderamento.
Isso pode ser percebido em um novo material da Secretaria do Estado de São Paulo
(2019) nomeado como Guia de Transição, um documento que transpassa o
Currículo Oficial do Estado de São Paulo, a Base Nacional Comum Curricular
(BNCC) (BRASIL, ano) e o Currículo Paulista (SÃO PAULO, 2019). Esse Guia
apresenta orientações desde questões pedagógicas, didáticas e sobretudo,
competências gerais da Educação básica a serem desenvolvidas no decorrer das
atividades de ensino em cada área do conhecimento. Nessas competências, em
número de 10 (dez), possibilitam tratar de assuntos que envolvem questões de
sexualidade, gênero e violências como no caso a 9ª, que pretende exercitar a empatia e o diálogo, a resolução de conflitos, e a cooperação fazendo-se respeitar e promovendo o respeito ao outro e aos direitos humanos, com acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceito de qualquer natureza. (SÃO PAULO, 2019, p. 2).
Segundo a Secretaria de Estado e Educação de São Paulo (SÃO PAULO,
2019), esse material por ser flexível, pode ser adaptado e reeditado pelo/a
professor/a de acordo com cada realidade em que está inserido/a. Abrem-se
caminhos para desconstrução e conhecimento, ao que cernem vivências plurais de
direitos humanos, propiciando um ambiente que seja menos agressor e mais resistente.
Considerações finais Por integrar uma parte dos estudos que temos realizado, e considerando
estar em percurso, a escola regular sempre foi um desafio a ser superado, assim
como a educação em seu todo, principalmente ao que tange às questões de
sexualidade e os problemas que acarretam, por exemplo as várias formas de violência contra sujeitos não heterossexuais.
Assim, percebemos que, por um lado a escola de ensino regular pode ser
um laboratório de violência, não somente por ser um espaço propício devido suas
condições tradicionais e culturais, mas também, se não houver estudos e
posicionamento dos/as responsáveis como é o caso dos/as gestores/as ou
professoras/es, sendo eles/as também protagonistas em construir uma nova escola,
continuaremos a trilhar caminhos dolorosos de vidas ceifadas por não haver um
local de fala e empoderamento que os/as incluem.
Referências BORRILO Daniel. Homofobia: História e crítica de um preconceito. Belo Horizonte: Autêntica, 2010. BRASILIA. Ministério da Saúde Conselho Nacional de Saúde resolução nº 196, de 10 de outubro de 1996. Disponível em: <conse-lho.saude.gov.br/resolucoes/1996/reso196.doc> Acesso em 08/04/2017. BUTLER Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. JUNQUEIRA Rogério Diniz, “A homofobia não é um problema. Aqui não há gays nem lésbicas!” Estratégias discursivas e estados de negação da discriminação por orientação sexual e identidade de gênero nas escolas. Disponível em: <http://www.clam.org.br/bibliotecadigital/uploads/publicacoes/1890_892_junqueira171-722-3-PB.pdf>. Acesso em :05/03/ 2019. SITE AGÊNCIA BRASIL: Pesquisa mostra que discriminação contra homossexuais está presente em escolas. São Paulo; 2016 Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2016-03/pesquisa-mostra-que-discriminacao-contra-homossexuais-esta-presente-em>. Acesso em 06/03/2019.
SITE GGB. Grupo Gay da Bahia. “Assassinato LGBT no Brasil: Relatório”. 2018 Disponível em: <https://grupogaydabahia.com.br/2016/01/28/assassinato-de-lgbt-no-brasil-relatorio 2015/>. Acesso em: 05/03/ 2019.