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ESCOLA DE DUCAÇÃO INFANTIL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO (EEI-UFRJ): A CONSTRUÇÃO DA GESTÃO DEMOCRÁTICA E PARTICIPATIVA NA CONSOLIDAÇÃO DO PROCESSO DE INSTITUCIONALIZAÇÃO E NA QUALIDADE DO ATENDIMENTO. Iolanda silva Menezes de Araújo Universidade Federal do Rio de Janeiro Escola de Educação Infantil Resumo: Este trabalho tem como objetivo apresentar a trajetória histórica e política na institucionalização da Escola de Educação Infantil e a intenção na construção dos processos democráticos e participativos, a fim de, consolidar a institucionalização da EEI como democrática. Trata-se de enfrentar o desafio de constituir uma gestão democrática que contribua efetivamente para o processo de construção de uma cidadania emancipadora, o que requer autonomia, participação, criação coletiva dos níveis de decisão e posicionamentos críticos que combatam a idéia burocrática de hierarquia. Ampliando a qualidade no atendimento às crianças, as famílias e a comunidade escolar. O estudo acompanha a instituição dos processos participativos e os desafios enfrentados na chamada da representatividade nesse processo. Situada no campo da política, a pesquisa perpassa também o campo da linguagem. No primeiro dialoga com os documentos oficiais: Constituição Brasileira, a LDB, o PNE e as orientações MEC/SEB. Dialoga ainda com estudos que discutem a gestão democrática na escola, direitos e a democracia (Paro, Freire, Cury, dentre outros).No campo da linguagem, recorremos a Bakthin que revela que a enunciação é histórica e está submetida à ordem da história. Por fim, a escolha por Walter Benjamim busca uma aproximação às suas ideias a respeito da educação, infância, linguagem, literatura, experiência, cultura e principalmente a ênfase dada ao diálogo. Palavras-chaves: Gestão democrática e participativa; Institucionalização; Educação Infantil. Introdução Escavando e recordando e se ilude, privando-se do melhor, quem só faz o inventário dos achados e não sabe assinalar no terreno do hoje o lugar no qual é conservado o velho. Walter Benjamin Para dialogar sobre gestão democrática e participativa EEI-UFRJ, faz-se necessário situar o contexto histórico e político da instituição. A Escola de Educação Infantil da Universidade Federal do Rio de Janeiro - EEI-UFRJ - foi fundada em 24 de Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade EdUECE - Livro 3 01970

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ESCOLA DE DUCAÇÃO INFANTIL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO

DE JANEIRO (EEI-UFRJ): A CONSTRUÇÃO DA GESTÃO DEMOCRÁTICA E

PARTICIPATIVA NA CONSOLIDAÇÃO DO PROCESSO DE

INSTITUCIONALIZAÇÃO E NA QUALIDADE DO ATENDIMENTO.

Iolanda silva Menezes de Araújo

Universidade Federal do Rio de Janeiro

Escola de Educação Infantil

Resumo:

Este trabalho tem como objetivo apresentar a trajetória histórica e política na

institucionalização da Escola de Educação Infantil e a intenção na construção dos

processos democráticos e participativos, a fim de, consolidar a institucionalização da EEI

como democrática. Trata-se de enfrentar o desafio de constituir uma gestão democrática

que contribua efetivamente para o processo de construção de uma cidadania

emancipadora, o que requer autonomia, participação, criação coletiva dos níveis de

decisão e posicionamentos críticos que combatam a idéia burocrática de hierarquia.

Ampliando a qualidade no atendimento às crianças, as famílias e a comunidade escolar.

O estudo acompanha a instituição dos processos participativos e os desafios enfrentados

na chamada da representatividade nesse processo. Situada no campo da política, a

pesquisa perpassa também o campo da linguagem. No primeiro dialoga com os

documentos oficiais: Constituição Brasileira, a LDB, o PNE e as orientações MEC/SEB.

Dialoga ainda com estudos que discutem a gestão democrática na escola, direitos e a

democracia (Paro, Freire, Cury, dentre outros).No campo da linguagem, recorremos a

Bakthin que revela que a enunciação é histórica e está submetida à ordem da história. Por

fim, a escolha por Walter Benjamim busca uma aproximação às suas ideias a respeito da

educação, infância, linguagem, literatura, experiência, cultura e principalmente a ênfase

dada ao diálogo.

Palavras-chaves: Gestão democrática e participativa; Institucionalização; Educação

Infantil.

Introdução

Escavando e recordando – e se ilude, privando-se do melhor,

quem só faz o inventário dos achados e não sabe assinalar no

terreno do hoje o lugar no qual é conservado o velho.

Walter Benjamin

Para dialogar sobre gestão democrática e participativa EEI-UFRJ, faz-se

necessário situar o contexto histórico e político da instituição. A Escola de Educação

Infantil da Universidade Federal do Rio de Janeiro - EEI-UFRJ - foi fundada em 24 de

Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade

EdUECE - Livro 301970

junho de 1981 pela médica pediatra Drª. Dalva Sayeg, como o nome de Creche

Pintando a Infância, nas instalações do Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão

Gesteira (IPPMG). O objetivo era atender aos filhos de funcionários da instituição. No

começo a creche ficou vinculada ao hospital. Em 1987, após reestruturação política e

funcional, passou a fazer parte da estrutura da Divisão de Assistência Médica dos

Servidores – DAMS (hoje DVST). Durante este período, a instituição tinha uma função

assistencialista e o atendimento as crianças era feito por enfermeiras e por pessoa

interessada, geralmente, contratadas ou oriundas de fundações.

Em novembro de 1990 a creche passou a fazer parte da Superintendência Geral de

Pessoal e Serviços Gerais - PR-4 - tendo, a partir desse momento, como diretora Ângela

Maria dos Santos, que ficou neste cargo durante doze anos. O período de sua gestão na

creche passou por grandes conquistas, tanto em termos dos profissionais da equipe de

trabalho como de recursos materiais e visibilidade na UFRJ. Ainda durante sua gestão

entra em vigor a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN 9394/96),

estabelecendo a Educação Infantil como a primeira etapa da Educação Básica. Teve,

então, que repensar seus objetivos para assegurar uma educação de qualidade e articular

educar e cuidar. O atendimento às crianças era feito por recreacionistas, porém este cargo

foi extinto do quadro de pessoal das universidades federais na gestão presidencial de

Fernando Henrique Cardoso.

Até 2011 a instituição era destinada exclusivamente aos filhos de servidores

públicos da UFRJ e devido à demanda, desde 2006, a seleção anual para o preenchimento

das vagas disponíveis se deu por meio de edital. O edital institui o número de vagas por

faixa etária e por sorteio público. Os pais das crianças sorteadas passam por uma

entrevista multidisciplinar, que tem o objetivo de obter algumas informações sobre a

criança e estabelecer uma troca entre os pais e a escola

Nos anos mais recentes, a EEI-UFRJ tem tido a capacidade de atender 100

crianças entre 4 meses e 5 anos e 11 meses, funcionando no mesmo prédio do Instituto

de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG) com instalações adaptadas e

contando com funcionários distribuídos nos seguintes setores: direção, equipe técnica

(Psicologia, Nutrição), professores, administração, vigilância e limpeza.

Atualmente a escola conta com dezessete técnicos-professores e quinze

professores substitutos, podendo aumentar o quadro de professores substitutos, para que

os técnicos possam assumir na escola seu cargo de fato. A pretensão para o quadro

permanente de professores é o concurso para o cargo de professores EBTTs –

Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade

EdUECE - Livro 301971

Nos últimos três anos, a EEI passou por uma série de discussões sobre o papel

desta escola, como relatado anteriormente, e algumas mudanças ficaram evidentes em

decorrência de tais discussões, sejam estas da própria escola ou mesmo discussões em

caráter nacional.

Uma dessas mudanças ocorridas em 2011 foram a aprovação pelo Conselho

Nacional de Educação na Câmara de Educação Básica, da Resolução nº01 de 10 de março

de 2011 que fixa normas de funcionamento das Escolas de Educação Infantil das

Unidades de Educação Infantil ligadas à Administração Pública Federal direta, suas

autarquias e fundações. Neste documento fica fixado a necessidade da EEI “oferecer

igualdade de condições para o acesso e a permanência de todas as crianças na faixa

etária que se propõe a atender” (Art. 1º).

A partir do ano de 2012 depois de inúmeras discussões com a comunidade escolar,

foi aberto o acesso para os filhos de estudantes da UFRJ, também através de sorteio

público. Em 2013 a escola conseguiu atingir o objetivo primordial que viria a caracterizar

sua atuação como escola pública de acesso universal. Agora não só a comunidade

universitária, servidores e estudantes, mas todas as comunidades externas teriam acesso

e permanência na EEI.

Outro artigo de extrema importância da Resolução diz respeito à inclusão das

Unidades de Educação Infantil no organograma da universidade: “No exercício de sua

autonomia, atendidas as exigências desta Resolução, as universidades devem definir a

vinculação das Unidades de Educação Infantil na sua estrutura administrativa e

organizacional e assegurar recursos financeiros e humanos para o seu pleno

funcionamento”. Atendendo a esta necessidade, no dia 08 e agosto de 2013 a proposta de

institucionalização da EEI foi discutida no Conselho Universitário – CONSUNI – e por

unanimidade aprovada à criação da Escola de Educação Infantil como Órgão Suplementar

co Centro de Filosofia e Ciências Humanas - CFCH. No dia 29 de agosto de 2013, em

Sessão Especial do CONSUNI, foi aprovada a alteração do Parágrafo Único do Artigo 51

do Estatuto da UFRJ em decorrência da criação da Escola de Educação Infantil como

Órgão Suplementar do CFCH.

Todas estas mudanças trazem qualidade para a EEI-UFRJ no que tange ao

atendimento, ao acesso e a estrutura, mas o grande desafio, no momento, é ampliar a

qualidade nos processos de participação da comunidade escolar nas decisões. Para isso, a

discutir gestão democrática e participativa na escola é de suma importância. Nesse

Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade

EdUECE - Livro 301972

processo, a EEI-UFRJ tem se comprometido, através do Grupo Gestor, organizar e

instituir o Conselho Deliberativo e eleições para diretor.

Gestão democrática e participativa na escola

O Brasil enfrenta profundas desigualdades sociais, econômica e culturais,

configurando-se na sociedade capitalista como país dependente. Em decorrência, vive um

processo histórico de disputa de vários interesses sociais, por vezes inteiramente opostos.

Nesse processo, homens e mulheres, organizando-se em várias instituições, fazem, a todo

o momento, a história dessa sociedade. Passamos por várias fases do processo capitalista,

incluindo períodos ditatoriais, em que aprendemos o valor de lutar pela reconquista e pela

garantia da democracia. Construímos, assim, a democracia representativa, em que todos

os dirigentes são eleitos por votos dos cidadãos (presidente da República, governadores,

prefeitos, senadores, deputados e vereadores).

As conquistas históricas trazidas por essa democracia representativa serão

ampliadas e novos avanços reais para a grande maioria da população serão conquistados

quando a democracia for se tornando, cada vez mais, uma democracia participativa. Esta

amplia e aprofunda a perspectiva do horizonte político emancipador da democracia. Isto

é: uma democracia em que todos os cidadãos, como sujeitos históricos conscientes, lutam

pelos seus direitos legais, tentam ampliar esses direitos, acompanham e controlam

socialmente a execução desses direitos, sem deixar de cumprir, em contrapartida, os

deveres constitucionais de todo cidadão.

Esse cidadão não apenas escolhem os governantes, mas assume sua condição de

sujeito, exercendo seu papel dirigente na definição do seu destino, dos destinos de sua

educação e da sua sociedade. Nessa perspectiva, ser cidadão, como dizia Paulo Freire, é

o ser político, capaz de questionar, criticar, reivindicar, participar, ser militante e

engajado, contribuindo para a transformação de uma ordem social injusta e excludente.

Em nossa sociedade, a escola pública, em todos os níveis e modalidades da

Educação Básica (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio), tem como

função social formar o cidadão, isto é, construir conhecimentos, atitudes e valores que

tornem o estudante solidário, crítico, ético e participativo.

Para isso, é indispensável socializar o saber sistematizado, historicamente

acumulado, como patrimônio universal da humanidade, fazendo com que esse saber seja

criticamente apropriado pelos estudantes, que já trazem consigo o saber popular, o saber

da comunidade em que vivem e atuam. A interligação e a apropriação desses saberes

Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade

EdUECE - Livro 301973

pelos estudantes e pela comunidade local representam, certamente, um elemento decisivo

para o processo de democratização da própria sociedade.

A escola pública poderá, dessa forma, não apenas contribuir significativamente

para a democratização da sociedade, como também ser um lugar privilegiado para o

exercício da democracia participativa, para o exercício de uma cidadania consciente e

comprometida com os interesses da maioria socialmente excluída ou dos grupos sociais

privados dos bens culturais e materiais produzidos pelo trabalho dessa mesma maioria.

A contribuição significativa da escola para a democratização da sociedade e para

o exercício da democracia participativa fundamenta e exige a gestão democrática na

escola. Nesse sentido, a forma de escolha dos dirigentes, a organização dos Conselhos

Escolares e de toda a comunidade escolar para participar e fazer valer os seus direitos e

deveres, democraticamente discutidos e definidos, é um exercício de democracia

participativa. Assim a escola pública contribuirá efetivamente para afirmar os interesses

coletivos e construir um Brasil como um país de todos, com igualdade, humanidade e

justiça social.

Para Vitor H. Paro (1998), que discute a gestão de unidades educacionais

alicerçado sobre os pilares de participação democrática. A gestão compartilhada na

escola só faz sentido como prática social que qualifica o processo educativo na construção

da revolução sócio-antropológica emancipadora. Este é o processo histórico em

construção que faz sentido, superando o autoritarismo fundado na imposição anti-

educativa e evitando a falácia da democratite, fundada na irresponsabilidade coletiva. A

indignação crescente da sociedade civil com o estado da educação brasileira vem

acompanhada de uma enorme e fundada esperança, que resgata o próprio e real sentido

da intervenção educativa escolar. Dois eixos se fundam e alicerçam uma gestão

democrática conseqüente: 1. O sentido social da educação que emerge o novo mundo do

trabalho e as novas demandas que se exige pensar e trabalhar em equipe, tornando

exigente e complexa a parceria e co-responsabilidade na sua gestão; o conhecimento

como nova base da relação, produção material, excluindo pessoas e por outro lado,

constituindo como oportunidade para a construção de uma nova sociedade; o tempo livre

gerado pelo desemprego, aposentadorias, folgas semanais e outros, tornam-se desafio de

transformá-lo em tempo para conviver e curtir e não para servir o senhor, nosso deus

capital. 2. A concepção de aprendizagem e conhecimento, fundada de experiências

recentes pedagógicas. A educação no sentido amplo é um processo de produção histórica

humana; num sentido restrito, é uma prática social que contribui no processo dessa

Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade

EdUECE - Livro 301974

história, através da aprendizagem e do conhecimento. O conhecimento pode ser entendido

como produto ou informação – o saber histórico acumulado pela a humanidade – ou

processo ou construção – é a construção do saber, onde conteúdos são trabalhados no ato

pedagógico e o importante é que o aluno compreenda, construa seu dizer, a sua própria

palavra e desenvolva a sua competência para exercer o direito de se pronunciar. Este

processo implica a intersubjetividade, parceria, partilha e se opõe a toda forma de redução

à mercadoria.

Paro ainda defende que a emancipação humana é um processo antropossocial,

coletivo e individual, social e antropológico, forjado na história da humanidade e das

pessoas, desenvolvendo três características humanas: i. o pensamento – é a capacidade de

intervir inteligentemente, trabalhar mentalmente o real, elaborando um projeto de

mudança do mesmo. A escola é um espaço social, o que privilegia o desenvolvimento de

aptidões cognitivas de todos e de cada um, reforça a responsabilidade sócio-política da

escola de construir o futuro. ii. a convivência – as pessoas se produzem historicamente

no encontro com as outras pessoas. Esta convivência é indispensável para o processo de

construção e si. A escola é o espaço de intervenção educativa onde pessoas se qualificam

para a aventura de conviver, implicando numa construção de aptidões atitudinais,

parcerias, encontros de convivência das demandas e se concretiza na gestão democrática.

iii. o encantamento – e a possibilidade de encontrar e construir sentido para suas vidas e

para o mundo. Na escola a avaliação deve ser vista como um processo de

acompanhamento da construção da celebração de aprender, avançar na construção do

conhecimento e mediar uma melhora na relação pedagógica.

Bases legais da Gestão Democrática

Há toda uma legislação educacional, definida pelos espaços parlamentares

competentes, influenciados pelos movimentos sociais organizados, que pode ser acionada

para favorecer a gestão democrática da escola. Entre os princípios que devem nortear a

educação escolar, contidos na nossa Carta Magna – a Constituição de 1988 –, em seu art.

206, assumidos no art. 3º da Lei n. 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional – LDB), consta, explicitamente, a “gestão democrática do ensino público, na

forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino” (inciso VIII do art. 3° da LDB).

Trata-se de enfrentar o desafio de constituir uma gestão democrática que contribua

efetivamente para o processo de construção de uma cidadania emancipadora, o que requer

autonomia, participação, criação coletiva dos níveis de decisão e posicionamentos críticos

que combatam a idéia burocrática de hierarquia. Para tanto, é fundamental que a escola

Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade

EdUECE - Livro 301975

tenha a sua “filosofia político-pedagógica norteadora”, resultante, como já mencionado,

de uma análise crítica da realidade nacional e local e expressa em um projeto político-

pedagógico que a caracterize em sua singularidade, permitindo um acompanhamento e

avaliação contínuos por parte de todos os participantes das comunidades escolar

(estudantes, pais, professores, funcionários e direção) e local (entidades e organizações

da sociedade civil identificadas com o projeto da Escola).

A autonomia da escola para experienciar uma gestão participativa também está

prevista no art. 17 da LDB, que afirma: “os sistemas de ensino assegurarão às unidades

escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia

pedagógica e administrativa e de gestão financeiras observadas às normas gerais de

direito financeiro público”.

A LDB é mais precisa ainda, nesse sentido, no seu art. 14, quando afirma que os

sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na

educação básica de acordo com as suas peculiaridades, conforme os seguintes

princípios: I – participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto

pedagógico da escola; II – participação das comunidades escolar e local em conselhos

escolares ou equivalentes.

Cabe lembrar, ainda, a existência do Plano Nacional de Educação (PNE),

aprovado como Lei n. 10.172, de 9 de janeiro de 2001. Esse Plano estabelece objetivos e

prioridades que devem orientar as políticas públicas de educação no período de dez anos.

Dentre os seus objetivos, destaca-se a democratização da gestão do ensino público,

salientando-se, mais uma vez, a participação dos profissionais da educação na

elaboração do projeto pedagógico da escola e a participação das comunidades escolar

e local em conselhos escolares ou equivalentes, bem como a descentralização da gestão

educacional, com fortalecimento da autonomia da escola e garantia de participação da

sociedade na gestão da escola e da educação.

O importante, então, é utilizar esses instrumentos segundo uma visão de mundo

compromissada com a construção de uma educação básica realmente cidadã.

Elementos básicos da Gestão Democrática

Há elementos significativos para efetivar de fato a gestão democrática e podem se

apresentar de várias maneiras, na esfera escolar, as principais são: na constituição e

atuação do Conselho escolar; na elaboração do Projeto Político Pedagógico, de modo

coletivo e participativo; na definição e fiscalização da verba da escola pela comunidade

Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade

EdUECE - Livro 301976

escolar; na divulgação e transparência na prestação de contas; na avaliação institucional

da escola, professores, dirigentes, estudantes, equipe técnica; na eleição direta para diretor

(a).

Há muito tempo o termo conselho faz parte da história da humanidade. Desde a

antiguidade os conselhos são estruturas políticas que se encontram entre as mais antigas

já registradas. Em geral, os conselhos se tratavam de conselho de anciãos, sacerdotes ou

de notáveis, cujo papel era aconselhar os soberanos no que tange a aspectos religiosos ou

em momentos de crise. Para Riscal (2010),

Encontramos referencias a estes conselhos na Ilíada e na Odisséia e a famosa

Gerúsia, conselho de anciãos da antiga Esparta com poder legislativo, criado

por volta do século VIII a.C., constituiu um dos modelos políticos mais citados

ao longo da história. O conselho de ancião, no período da monarquia, teria

dado origem ao senado romano e inúmeros reinos bárbaros se organizavam

politicamente tendo um rei assessorado por um conselho de notáveis.

No Brasil, a criação e a atuação de órgãos de apoio, decisão e controle público da

sociedade civil na administração pública têm um significado histórico relevante. Nesse

sentido, chama-se a atenção para o fato de que a reivindicação de ampliação de espaços

institucionais de participação e deliberação junto aos órgãos governamentais fazia parte

das lutas políticas pela democratização da sociedade.

Na educação, essa organização de espaços colegiados se realiza em diferentes

instâncias de poder, que vão do Conselho Nacional aos Conselhos Estaduais e

Municipais, e Escolares. Esses espaços e organizações são fundamentais para a definição

de políticas educacionais que orientem a prática educativa e os processos de participação,

segundo diretrizes e princípios definidos nessas várias instâncias. A construção de uma

escola pública democrática, plural e com qualidade social demanda a consolidação e o

inter-relacionamento dos diferentes órgãos colegiados.

A EEI-UFRJ ainda não possui um conselho, esse é um dos compromissos

firmados com a decania do CFCH – Centro de Filosofia e Ciências Humanas – do qual a

escola faz parte. O Grupo Gestor já iniciou o processo eletivo dos representantes de cada

setor da escola, já foi escolhido o representante da equipe técnica, dos professores, dos

pais e da gestão, entretanto, no momento, não foi possível efetivar de fato o Conselho

Deliberativo – essa nomenclatura deriva dos conselhos usados na própria universidade –

por causa da greve dos TAEs em andamento, impossibilitando assim a finalização do

processo de implementação do Conselho Deliberativo.

Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade

EdUECE - Livro 301977

Outro elemento básico importante da gestão democrática, de emancipação e

justiça social é o Projeto Político Pedagógico. No sentido etimológico, o termo projeto

vem do latim projectu, particípio passado do verbo projicere, que significa lançar para

diante. Plano, intento, desígnio. Empresa, empreendimento. Redação provisória de lei.

Plano geral de edificação (Ferreira 1975, p.1.144).

Ao pensarmos na construção dos projetos de nossas escolas, planejamos o que

temos a intenção de realizar. Projetamos para frente, com o que temos na busca do

possível. Antevendo um futuro que transforme o presente. Gadotti sinaliza:

Todo projeto supõe rupturas com o presente e promessas para o futuro. Projetar

significa tentar quebrar um estado confortável para arriscar-se, atravessar um

período de instabilidade e buscar uma nova estabilidade em função da

promessa que cada projeto contém de estado melhor do que o presente. Um

projeto educativo pode ser tomado como promessa frente a determinadas

rupturas. As promessas tornam visíveis os campos de ação possível,

comprometendo seus atores. (1994, p. 579)

A EEI já possui o seu projeto político pedagógico, iniciado a sua construção no

ano 2006, ainda na direção da Profª Eliana Bhering. A princípio o projeto foi construído

com a participação da direção, coordenação pedagógica e dos professores, não houve a

participação das famílias e de outros funcionários da escola. Atualmente, o projeto

político pedagógico passou por algumas mudanças em suas bases teóricas e no seu

currículo, porém a participação de todos os sujeitos da comunidade escolar na construção

do PPP ainda não foi concretizada. Talvez pela a dificuldade de proporcionar momentos

de participação de todos os sujeitos envolvidos dentro do cotidiano escolar, ou pela

dificuldade de representatividade dos diversos setores da escola.

Outro elemento de suma importância para uma gestão com qualidade e realmente

democrática é a eleição para diretores. A participação de toda a comunidade escolar no

processo é imprescindível. A eleição para diretores demonstra transparência no processo

de escolha de seus dirigentes, o que fortalece a unidade da escola e a qualidade do serviço

prestado a comunidade. Cury salienta:

Cabe a quem representa o interesse de todos, sem representar o interesse

específico de ninguém, dar oportunidade de acesso, a todos, deste valor que

desenvolve e potencializa a razão individual e o abre para as dimensões

cognitivas, sociais e políticas. O mandamento legal de quem administra um

estabelecimento escolar público o torna um representante de posturas, atitudes

e valores centrados na democracia. (2002, p. 171).

Nos dias atuais a EEI tem experenciado uma realidade de gestão em que as decisões não

estão apenas centradas em uma única pessoa, mas em grupo que chamamos de Grupo Gestor.

Este grupo é composto por professores que estavam em sala e pela a falta de candidatos a

Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade

EdUECE - Livro 301978

diretores, assumiram a escola. Desde o início o Grupo Gestor se propôs a dirigir a escola de

maneira democrática e participativa. A nomeação do Grupo Gestor não aconteceu por eleição,

mas foi validado pelos demais funcionários.

O Grupo Gestor tem buscado implementar os processos de participação para que seja

constituído na escola um Conselho Deliberativo e eleição para diretor. O Conselho Deliberativo

Sá um órgão colegiado que irá decidir as questões da escola juntamente com o diretor. Esse

processo ainda está e fase de implementação, mas já podemos ver a participação mais atuante dos

funcionários das famílias no processo.

A instituição do Conselho Deliberativo e a eleição para diretor ainda não ocorreu de fato

por causa da greve nas IFES dos Técnicos Administrativos em Educação em andamento. Porém

todo o processo já esta sendo articulado para que assim que a greve termine seja possível dar

andamento a instituição do Conselho Deliberativo e A eleição para diretor.

Segundo Paro:

É preciso, pois, começar por lutar contra esse papel do diretor (não, entretanto,

contra a pessoa do diretor). A este respeito é preciso aprofundar as reflexões

de modo a que se perceba que, ao se distribuir a autoridade entre os vários

setores da escola, o diretor não estará perdendo poder - já que não se pode

perder o que não se tem – mas dividindo responsabilidade. E, ao acontecer isso,

quem estará ganhando poder é a própria escola.

Paro ainda defende que à medida que se consegue a participação de todos os setores da

escola (professores, funcionários, alunos e pais) nas decisões de seus objetivos e no seu

funcionamento, será fortalecido a comunidade escolar no sentido de pressionar os escalões

superiores na conquista de sua autonomia e de recursos. Conseqüentemente a qualidade no

processo ensino-aprendizagem ocorrerá com mais eficácia.

Para Freire, o processo de democratização da escola é pensado pelo diálogo, do

respeito ás diferenças e da garantia da liberdade de expressão. É um processo de

aprendizado coletivo que se dá no cotidiano. Esse é um ato político, pois, depende dos

atores sociais envolvidos, na sua participação efetiva nas discussões coletivas e tomadas

de decisões.

Mikhail Bakthin que revela que a enunciação é histórica e está submetida à ordem

da história. Bakhtin diz que um discurso se constitui em oposição a outro discurso. É essa

relação de aposição que dá historicidade ao discurso, no sentido da exigência do outro,

da dialética que não exclui, mas que convida a todo o momento à interação do EU-

OUTRO numa atividade constante, tornando o encontro muito mais vivo. Entrar no

diálogo, numa perspectiva bakthiniana é possuir a sensibilidade da escuta e da

contrapalavra, em um movimento em que “as palavras e as réplicas são vivas e as

consciências estão em interação”. Para Bakthin, se não houver a dialogia das vozes resta

Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade

EdUECE - Livro 301979

apenas a dialética, com perguntas e respostas distanciando-se do diálogo como ação

responsiva. É nesse devir da palavra e da contrapalavra que a alteridade é vivida e a vida

é alterada.

Considerações Finais

Atualmente, a EEI tem avançado no que tange aos processos de construção de

participação, pois reconhece ser necessário para consolidar-se como uma escola pública

de fato e de direito, na busca por uma educação emancipadora, colegiada e dialógica.

Sabe-se que não é uma construção fácil, pois a prática da participação não é dada e sim

aprendida, conquistada. Para isso, o caminho deverá ser construído sobre a égide da

participação, da construção do diálogo e da escuta.

Libâneo (2001) ressalta que a construção de uma escola, voltada às mudanças

transformações nas quais estamos vivendo, não é um trabalho isolado. Não é possível

construir uma escola diferente senão existir um projeto coletivo, com ações

estrategicamente coordenadas e o mais importante: a participação efetiva de todos que

nela estão envolvidos.

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