entrevista especial aprendendo com a netflix a construir ... · funcionários, análises de...

11
ENTREVISTA ESPECIAL Aprendendo com a Netflix a construir uma cultura de liberdade e responsabilidade Compilado de NewsLetter Knowledge@Wharton, editada por Wharton School, escola superior de Administração vinculada à Universidade da Pensilvânia (EUA) Recuperação Judicial: evolução na jurisprudência sinaliza que chegou a hora e a vez do produtor rural desfrutar dos benefícios da Lei 11.101/2005 - Pág. 6 Trabalhista: maioria dos ministros do STF declara constitucional a terceirização das atividades meio e fim das empresas - Pág. 8 Propriedade intelectual: copiar desenho industrial de concorrente, sem autorização, causa dano moral - Pág. 15 BOLETIM DE INFORMAÇÕES E TENDÊNCIAS DA CESAR PERES ADVOCACIA EMPRESARIAL EDIÇÃO 19 - TERCEIRO TRIMESTRE DE 2018 As empresas operam em ambientes incertos. Para enfrentar desafios inesperados e aproveitar as oportunidades emergentes, elas precisam manter uma cultura que equilibre liberdade com responsabilidade. Essa é uma lição que a Netflix aprendeu quando se desenvolveu rapidamente como uma organização na qual os funcionários sabem exatamente como criar valor para os clientes e para a empresa. Ao fazê- lo, construiu uma cultura inovadora – como descrita no famoso Deck de Cultura da Netflix –, com práticas que vão além das noções convencionais de retenção de funcionários, análises de desempenho anuais e pagamento de bônus, diz Patty McCord, ex-chefe de talentos da Netflix, em seu livro ‘‘Poderoso: Construindo uma Cultura de Liberdade e Responsabilidade’’. Em seu papel posterior como consultora, McCord descobriu que as startups têm uma chance melhor de construir as equipes e os comportamentos certos do que as organizações mais antigas e maiores, onde, normalmente, regras indesejadas e processos desgastados pelo tempo restringem a inovação. Ela compartilhou essas e outras ideias sobre gestão de talentos com a Knowledge@Wharton em uma entrevista recente. PÁGINA 3 A NETFLIX Fundada em 29 de agosto de 1997, em Scotts Valley, Califórnia, Estados Unidos, a Netflix se tornou uma provedora global de filmes e séries de televisão via streaming (tecnologia que envia informações multimídia, através da transferência de dados, utilizando redes de computadores, especialmente a internet). Até 2010, a empresa funcionava como um serviço de entrega de DVDs alugados (delivery). Quando a startup mudou de rumo, começou a tirar o sono de um concorrente atrás do outro, inclusive da gigante Blockbuster. Hoje, depois de revolucionar o próprio negócio, acumula prêmios de prestígio por seu conteúdo original, tem cerca de 3,5 mil funcionários e atende mais de 100 milhões de usuários em 190 países com seu serviço de streaming. Em 2017, a empresa declarou uma receita de US$ 11,6 bilhões. Na base de todo este sucesso está a sua cultura organizacional, referência no mundo corporativo. Foto: Banco de Imagens Wharton/Internet

Upload: others

Post on 06-Jul-2020

1 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

ENTREVISTA ESPECIAL

Aprendendo com a Netflix a construir uma cultura de liberdade e responsabilidadeCompilado de NewsLetter Knowledge@Wharton, editada por Wharton School, escola superior de Administração vinculada à Universidade da Pensilvânia (EUA)

Recuperação Judicial: evolução na jurisprudência sinaliza que chegou a hora e a vez do produtor rural desfrutar dos benefícios da Lei 11.101/2005 - Pág. 6

Trabalhista: maioria dos ministros do STF declara constitucional a terceirização das atividades meio e fim das empresas - Pág. 8

Propriedade intelectual: copiar desenho industrial de concorrente, sem autorização, causa dano moral - Pág. 15

BOLETIM DE INFORMAÇÕES E TENDÊNCIAS DA CESAR PERES ADVOCACIA EMPRESARIAL

EDIÇÃO 19 - TERCEIRO TRIMESTRE DE 2018

As empresas operam em ambientes incertos. Para enfrentar desafios inesperados e aproveitar as oportunidades emergentes, elas precisam manter uma cultura que equilibre liberdade com responsabilidade. Essa é uma lição que a Netflix aprendeu quando se desenvolveu rapidamente como uma organização na qual os funcionários sabem exatamente como criar valor para os clientes e para a empresa. Ao fazê-lo, construiu uma cultura inovadora – como descrita no famoso Deck de Cultura da Netflix –, com práticas que vão além das noções convencionais de retenção de funcionários, análises de desempenho anuais e pagamento de bônus, diz Patty McCord, ex-chefe de talentos da Netflix, em seu livro ‘‘Poderoso: Construindo uma Cultura de Liberdade e Responsabilidade’’.

Em seu papel posterior como consultora, McCord descobriu que as startups têm uma chance melhor de construir as equipes e os comportamentos certos do que as organizações mais antigas e maiores, onde, normalmente, regras indesejadas e processos desgastados pelo tempo restringem a inovação. Ela compartilhou essas e outras ideias sobre gestão de talentos com a Knowledge@Wharton em uma entrevista recente.

PÁGINA 3

A NETFLIXFundada em 29 de agosto de 1997, em Scotts Valley, Califórnia, Estados Unidos, a Netflix se tornou uma provedora global de filmes e séries de televisão via streaming (tecnologia que envia informações multimídia, através da transferência de dados, utilizando redes de computadores, especialmente a internet).

Até 2010, a empresa funcionava como um serviço de entrega de DVDs alugados (delivery). Quando a startup mudou de rumo, começou a tirar o sono de um concorrente atrás do outro, inclusive da gigante Blockbuster.

Hoje, depois de revolucionar o próprio negócio, acumula prêmios de prestígio por seu conteúdo original, tem cerca de 3,5 mil funcionários e atende mais de 100 milhões de usuários em 190 países com seu serviço de streaming. Em 2017, a empresa declarou uma receita de US$ 11,6 bilhões.

Na base de todo este sucesso está a sua cultura organizacional, referência no mundo corporativo.

Foto: Banco de Imagens Wharton/Internet

Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 3

Uma banca de advocacia que se pretenda inovadora no segmento do Direito Empresarial tem de entregar a seus clientes mais do que soluções jurídicas para litígios pon-tuais. Tem de procurar entender o que o cliente busca e tentar ajudá-lo no seu próprio campo de atuação. Afinal, agregar o maior valor possível ao propósito empresarial deve ser o grande diferencial da Cesar Peres Advocacia Empresarial.

Este mantra é repisado, à exaustão, a advogados, sócios e colaboradores desde que o escritório foi fundado, quando o grupo pioneiro dividia uma pequena sala de um modesto prédio comercial localizado no Bairro Teresópolis, lá no comecinho desta jornada.

Passados 23 anos e já usufruindo de uma infraestrutura ampla e moderna, finalmente, o escritório consegue materializar este objetivo em sua plenitude. A novíssima sede da Rua Dom Pedro II, no elegante Bairro São João, oferece as condições ideais para receber administradores de empresas, empreendedores, contadores, econo-mistas, chefes de recursos humanos nos seus Ciclos de Palestras. São encontros que oportunizam atualização técnica sobre temas importantes relacionados ao direito e à gestão dos empreendimentos empresariais.

Por isso, esta edição traz como um dos destaques matéria que valoriza esta iniciativa do escritório, pois a interação entre advogados, clientes e parceiros tem se mostrado muito produtiva para todos os envolvidos. Tanto que a sede nova, por sua localização estratégica, virou referência e ponto de encontro de empresários, sócios-administradores e chefes de departamentos jurídicos que afluem a Porto Alegre para resolver os mais diversos problemas.

A Entrevista Especial, o maior destaque editorial, por exemplo, tem tudo a ver com este compromisso com a gestão dos negócios. Em entrevista feita pela Know-ledge@ Wharton — periódico on-line de análise de Administração de Negócios da Wharton School, da Universidade da Pensilvânia (EUA) —, a consultora de recursos humanos Patty McCord revela alguns ‘‘segre-dos’’ do sucesso da Netflix. Com a reprodução deste belo conteúdo, o Index se soma aos esforços de partilhar capital intelectual da Wharton com seus leitores – grande parte formada por profissionais da gestão.

As demais matérias, que abordam decisões judiciais relevantes, estão em sintonia com o leque de especia-lização do grupo de advogados da Casa: ambiental, propriedade intelectual, recuperação de crédito, recupe-ração judicial, societário, trabalhista e tributário.

Os advogados, aliás, colaboraram bastante para enri-quecer o debate jurídico. No nicho de Recuperação de Crédito, Flávia Webster convida o leitor a uma viagem através da lei e da jurisprudência, para que decida se é vantagem ou não ajuizar ações revisionais de contratos bancários em momentos de crise econômica.

No tributário, o advogado Geovane Machado Alves dis-corre sobre uma alternativa para abater dívidas fiscais: a Dação em Pagamento de Bens Imóveis, possibilidade inserida no Código Tributário Nacional (CTN) pela Lei Complementar 104/2001.

No segmento jurídico da Recuperação Judicial, Pedro Leal Pacheco mostra por que precisamos avançar muito, ainda, no tratamento das pequenas e médias empresas – o setor que mais dá emprego formal no Brasil. Sem ajustes legais, o chamado ‘‘tratamento diferenciado’’ ficou só no papel.

No Direito do Trabalho, o advogado Rafael Montano Rossi fala sobre a penhora de bens pessoais de sócios e administradores de empresas condenadas na Justiça do Trabalho na fase de execução, quando o ex-empregado sai vitorioso na reclamatória.

A advogada Vanessa Oliveira Soares, coordenadora da área de Propriedade Intelectual, aborda o risco de apropriação indevida de marcas e domínios no âmbito da internet. Tudo para evitar que o site comercial caia nas mãos de terceiros, com evidente intenção de desvio de clientela.

Finalmente, o advogado Rogério Lopes Soares, especia-lizado em Contratos Comerciais, aborda a importância do Memorando de Entendimento nas negociações que antecedem a assinatura do contrato para formação de uma startup. Trata-se de documento estruturante mais utilizado para a formação destas empresas, no Brasil e no exterior.

Boa leitura e até a próxima edição!

Knowledge@Wharton – O que defi-ne a cultura de uma empresa?

PATTY MCCORD – Eu sou muito antro-póloga cultural. São as histórias que as pessoas contam. É a maneira como as pessoas operam quando ninguém está olhando. São os valores que você preza, que você sabe que seus colegas prezam também. São as expectativas de como as pessoas vão se comportar,

o que é punido e o que é recompensa-do.Toda empresa tem uma cultura um tanto singular. No varejo, por exem-plo, você pode analisar os dados so-bre o que seus clientes estão fazendo em todo o mundo, em tempo real. A conectividade muda a maneira como pensamos sobre o trabalho e os clien-tes. Isso afeta a cultura também. Há uma proximidade com o que estamos fazendo que não existia antes.

Knowledge@Wharton – O que você acha que tornou a cultura da Net-flix tão diferente?

PATTY MCCORD – Honestamente, não sei se foi tão diferente. Aqui está a coisa mais importante que fizemos [referindo-se ao livro]: acabamos de escrever. Então, Reed [Hastings, CEO da Netflix] e eu trabalhamos juntos em outra empresa, que tinha uma cultura

Difusão de conhecimentos sobre gestão empresarial reforça compromisso com o sucesso do clienteIndex Boletim é uma

publicação da Cesar Peres Advocacia

Empresarial

Endereço: Rua Dom Pedro II, 568

90550-142 Porto Alegre RS

Tel.: 51 3232 5544 E-mail geral:

[email protected]

Jornalista Responsável: Andréa Lucas (Registro

Profissional 6713)

Concepção gráfica e editoração:

Icono Comunicação

Tel.: 51 2117 1886 www.icono.com.br

Perguntas ou comentários: envie sua mensagem para

[email protected]

Receba a versão eletrônica deste

informativo.

Acesse www.cesarperes.com.br e faça seu cadastro.

Implantar a cultura de liberdade com responsabilidade é mais fácil numa startupO mundo inteiro admira a Netflix, não só pela inovação do negócio de streaming como pelos resultados alcançados no mercado. Tirando os ativos de tecnologia e os ferramentais de marketing, a verdade é que a empresa se tornou referência mundial por uma cultura peculiar no trato com seus funcionários e colaboradores, baseada no binômio ‘‘liberdade e responsabilidade’’.No sentido prático, a empresa acredita que é mais produtivo tratar seus colaboradores como adultos responsáveis do que criar uma série de regras a respeito de como eles devem se comportar, ‘‘como se fossem crianças em uma escola primária’’, nas palavras de Patty McCord, ex-vice-presidente da área de Gente da Netflix.Acompanhe um pouco da história da implantação desta cultura corporativa e algumas revelações do livro ‘‘Poderoso’’, de Patty McCord, a partir do podcast produzido e transcrito pela Wharton, com adaptação da redação do Index.

EXPEDIENTE

MANAGER

EDITORIAL

ENTREVISTA

César Peres

Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 2

Foto: Banco de Imagens Wharton/Internet

Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 4 Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 5

muito diferente. Ela evoluiu para essa cultura de empresa genérica que todos nós parecemos ter. Nós tínhamos todas as mesmas regras e processos e fize-mos as coisas do jeito que todo mundo sempre faz. E, então, nós as chamamos de ‘‘melhores práticas’’, que é o que acontece quando copiamos uns aos outros. Na Netflix, decidimos descre-vê-las e experimentar um pouco. Nós apenas decidimos prestar atenção a isso.

Knowledge@Wharton – Poderia nos falar sobre o seu papel no con-vívio cultural da Netflix? Como isso aconteceu, como evoluiu?

PATTY MCCORD – Nós fizemos isso por um par de razões. Primeiro de tudo, Reed e eu não escrevemos [as ‘‘melho-res práticas’’]. Foi um documento cola-borativo que fizemos com quem estava na gerência na época. Foi também uma apresentação em PowerPoint. Por isso, não ficou à mostra nos corredores da empresa, porque não havia cópia im-pressa. (...) A primeira parte foi anotar os comportamentos que valorizamos em nossos companheiros de equipe. Eu queria descrever “comportamentos” e não “valores”. É uma distinção impor-tante, porque os valores são aspiracio-nais. Comportamentos são o que você realmente faz. Portanto, se valoriza-mos a honestidade, devemos ter algo no sistema que a recompense ou puna o comportamento contrário. O próximo capítulo foi sobre o alto desempenho. E nós descrevemos isso depois que tive-mos uma grande demissão. Acabamos com bem poucas pessoas na empresa, mas estávamos focados. Percebemos que quando tínhamos as pessoas cer-tas, o foco certo e os prazos certos as pessoas operavam de forma bastante independente. Era sobre adultos, so-bre saber o que se está fazendo. Era sobre ter pessoas que são apaixona-das pelo trabalho que se precisa fazer. Montar a infraestrutura real para que isso acontecesse – contar com pessoas de alto desempenho em todos os tra-balhos – provavelmente levou cerca de quatro anos. Eu tive que me livrar dos planos de melhoria de desempe-nho, porque isso é uma coisa estúpida quando você está se apresentando. Eu precisava de gerentes que teriam de ser claros sobre o trabalho que deveria feito – não como você se apresentou no ano passado. Então, eu tive que repensar se deveria ou não fazer uma revisão anual de desempenho. (...) Ao longo dos anos, aprendi a questionar tudo e a desconsiderar as coisas que

não importavam à parte colaborativa. Quando redigíamos os capítulos, sen-távamos com todo o mundo e questio-návamos: ‘‘o que vocês acham disso?; isso é realmente trabalho?; podemos realmente fazer isso?; quais são os in-convenientes?; como pensamos sobre isso?’’ O documento inteiro levou 10 anos para ser escrito. Nós o usamos como um documento interno. Reed e eu nos reuníamos com 10 funcionários de cada vez nos primeiros dois meses de trabalho, para conversar sobre isso.

Knowledge@Wharton – Quais são os elementos de uma cultura de li-berdade com responsabilidade? O que acontece com a criação de tal cultura?

PATTY MCCORD – Nós valorizamos muito a liberdade. Valorizamos muito as pessoas que tiveram bom senso e fi-zeram a chamada ‘‘coisa certa’’. Que-ríamos que as pessoas pudessem fazer a coisa certa dentro de um determina-do contexto, mostrando inteligência e bom senso. Mas percebemos que, se usássemos apenas a palavra “liberda-de”, isso implicava [a liberdade] fazer qualquer coisa. Nós realmente não queríamos dar liberdade às pessoas para fazer qualquer coisa. Nós junta-mos liberdade com responsabilidade. Isso também implica confiabilidade e resultados.

Knowledge@Wharton – Pode dar exemplos de comportamentos que você incentivava para tornar as pessoas mais produtivas?

PATTY MCCORD – Sutileza não é meu forte. Para nós, o importante era gastar tempo para clarear as coisas. Em torno da bondade, por exemplo, e suas con-sequências. Quando você tem clareza sobre o que precisa ser feito, fica claro sobre quem você serve fazendo isso. Essa é, geralmente, a cutucada.

Na Netflix, fizemos muitos testes. Mas havia certas coisas que queríamos que fossem feitas e melhoradas até uma certa data. Esse período de tempo im-pulsiona o comportamento.

Knowledge@Wharton – A cultura é algo que uma empresa pode criar por sua própria vontade, como um ato de escolha? Ou você acha que tem de lidar com seu legado histó-rico na cultura que herda?

PATTY MCCORD – Definitivamente, ambos. Quanto mais longos forem o legado e a história e mais profundos

os hábitos, mais difícil será mudar. Sou convocada por corporações muito grandes que percebem que não podem inovar, porque não são mais ágeis. Mas querem aprender a fazer isso agora. Uma das coisas mais difíceis é que, em corporações americanas muito gran-des, em particular, tudo faz parte de uma iniciativa corporativa global. Há esse valor em torno da consistência e mesmice que eu não acho que nos ser-ve muito bem. Na Netflix, gostaríamos de testar A / B [opções]… e ver qual delas se comporta adequadamente. Não é que as grandes corporações não entendam a necessidade de mudar, porque entendem. Vamos tomar o caso dos bancos. A Fintech [do inglês, finan-ce and technology; termo utilizado para as inovações e o uso de novas tecnolo-gias por empresas do setor financeiro para a entrega de serviços financeiros] está parando muitos grandes ban-cos. Estão tomando pequenas partes da fera e vão transformá-la. Bancos grandes têm dificuldade em separar os mesmos em entidades menores.

Knowledge@Wharton – Como você cria equipes para trabalhar de for-ma coesa e que também se sintam fortalecidas e motivadas? Você fez isso de forma eficaz na Netflix?

PATTY MCCORD – Não foi sempre, por-que tropeçamos algumas vezes. Quan-do percebíamos que estávamos indo na direção errada, mudávamos o rumo.

Essa é uma realidade que ocorre em todas as organizações. Mas o segredo é a clareza sobre o jogo final — sobre o que você está tentando alcançar e por quê. Eu chamo de ‘‘contexto’’ ou a ‘‘configuração constante do contex-to’’. Frequentemente, digo às empre-sas iniciantes: ‘‘uma das pessoas mais importantes da sua equipe é o CFO [chief financial officer]’’. Se puder ensi-nar a todos, na empresa, como ler uma declaração de lucros e perdas, então você terá uma capacidade que atenda a você e a eles pelo resto de suas car-reiras. Eles entendem como funciona e onde eles se sentam na organização.

Knowledge@Wharton – É mais fá-cil implantar esta cultura num am-biente em que tudo esteja come-çando? Em que ponto você precisa de regras, regulamentos e políticas para gerenciar esse processo, ao invés de, simplesmente, dispensá--los, como defende no livro?

PATTY MCCORD – Se você opera em um ambiente regulamentado, como ban-cos, empréstimos, assistência médica ou segurança, existem regras e regula-mentações que são realmente críticas. A razão de ser mais fácil implantá-la nas startups é porque trata-se de um ambiente aberto à experimentação, que ainda não conta com regras. Você também não tem os comportamentos institucionalizados associados às re-gras. Alguém poderia dizer: “Eu sei que é uma boa ideia, mas você não pode fazer isso, porque você precisa pedir permissão primeiro’’. O proble-ma, para grandes instituições, não são apenas as regras. É o comporta-mento institucional ligado a estas. Dia destes, em consulta a outra empresa, estávamos falando sobre sua complexa estrutura de bônus. Cada pessoa tinha seus próprios objetivos. Seus objetivos foram implementados para os obje-tivos da equipe. As metas da equipe foram implementadas nos objetivos do departamento, nas metas da divisão e nas metas corporativas. (...) Eu os fiz mergulhar e calcular o custo de admi-nistrar esse processo, em tempo de ge-renciamento, em tempo de execução, em tempo administrativo e em tempo de software. Disse-lhes que este era o tempo em que não estavam trabalhan-do para o seu cliente. Há uma falta real de ROI [métrica que permite saber exatamente qual o retorno de cada in-vestimento feito dentro de um período de tempo predeterminado].

Knowledge@Wharton – Se você ti-

vesse uma varinha mágica para lidar com essa situação, o que você defenderia?

PATTY MCCORD – Eu defendo que eles joguem fora e vejam se há alguma di-ferença. Parem de premiar com bônus por um ano e vejam se o mundo, como você conhece, chega ao fim. Eu aposto que não vai. É preciso prestar atenção nas coisas sem torná-las um processo.

Knowledge@Wharton – Fazer o que está dizendo exigiria o que você chama de prática da “honestidade radical”. Gostaria de saber se você pode falar um pouco sobre o que isso significa e como funcionava na Netflix.

PATTY MCCORD – Aprendi com os en-genheiros com quem trabalho. É um comportamento aprendido. Veja como os engenheiros são conectados: o mundo deles é bom ou ruim, certo ou errado, preto ou branco, zero ou um. E qualquer coisa entre [este dualismo] é suspeita. Eu aprendi, através de ten-tativa e erro, quando comecei a falar com eles sobre recursos humanos. Algo como: ‘‘bem, o sistema está em-poderado o suficiente para que você se envolva em resultados que criarão um ambiente de felicidade, de bem-es-tar’’. Eles apenas reviravam os olhos. Se eu fosse anotar essa frase e olhá-la de novo, não falaria nada. Eu aprendi a falar o que falam. Aprendi a aplicar comportamentos baseados em dados e em fatos.

Knowledge@Wharton – O foco no futuro pode ajudar a construir uma cultura de liberdade e responsabi-lidade?

PATTY MCCORD – Absolutamente. Eu disse a um grupo de CEOs iniciantes que a maior fumaça a ser notada em sua empresa, ou o maior potencial de incêndio, é a nostalgia — querer que as coisas sejam do jeito que costuma-vam ser, querer que a cultura perma-neça a mesma, querer mantê-la do jei-to que era. Você tem que assumir que haverá crescimento e mudança. Você tem de estar constantemente tentando descobrir onde vai estar o seu cliente, quem será o seu cliente e o que preci-sa fazer de diferente quando o cenário mudar. Não importa querer que nossas empresas continuem as mesmas; nos-sos clientes não querem. O mundo vai continuar sem nós, gostemos ou não.

‘‘Implantar a cultura da liberdade com responsabilidade é mais difícil em organizações que

têm atividades excessivamente

reguladas, porque essas

regras moldam o comportamento institucional’’

‘‘Na Netflix, decidimos

descrever e prestar atenção nas

‘melhores práticas’, experimentando um

pouco’’

ENTREVISTA

Foto: Banco de Imagens Wharton/Internet

Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 6 Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 7

A hora e a vez de pensar no produtor rural

RECUPERAÇÃO JUDICIAL

As empresas do agronegócio que se encon-tram em dificuldades podem se recuperar mais adiante dos tombos do mercado porque contam com as benesses da Lei de Falências e Recuperação Empresarial (Lei 11.101/2005). Já o produtor rural, a base de todo o agro, só tem este direito se provar dois anos de atividade empresarial. Com a crise pegando todo mundo, sair desta sinuca-de-bico é um grande desafio.

A preocupação não passou ao largo dos de-bates no seminário ‘‘Reestruturação e Recu-peração de Empresas’’, realizado pela TMA Brasil, em junho, em Porto Alegre. No painel ‘‘O Agronegócio e a Recuperação Judicial’’, o sócio e fundador da Cesar Peres Advocacia Empresarial (CPAE) disse que o produtor, por não ter acesso ao crédito para custear toda a sua atividade, enfrenta grandes dificuldades. Em consequência, vem se endividando com os seus fornecedores – quem lhe vende a semen-te, o adubo, o defensivo. ‘‘Na safra seguinte, esse mesmo produtor estará ‘apertado’ para conseguir o insumo. E talvez não consiga ob-ter outro crédito para continuar sua lavoura”, complementou o advogado César Peres.

Falando especificamente do agronegócio gaú-cho, César enfatizou que 99% dos produtores locais não têm inscrição na Junta Comercial. Logo, não podem recorrer à recuperação judi-cial se estiverem endividados. Só quem opera nessa atividade como empresa pode contar com os benefícios da Lei 11.101/2005. Nos seus 13 anos de existência, completados em junho, a Lei permitiu que mais de cinco mil empresas da indústria, comércio e prestação de serviços ajuizassem pedidos de recuperação judicial em todo o país.

Para terem acesso ao benefício da Lei, as em-presas em dificuldade, antes de tudo, precisam provar o exercício da atividade empresarial há

mais de dois anos, como exige o artigo 48. Comprovado esse exercício, passam a ter direi-to a uma série de vantagens, além de evitar o processo de falência: alongamento dos prazos de pagamento e redução da dívida, realização de acordos coletivos de trabalho, melhor diá-logo com os credores e, o mais importante, a suspensão das ações e execuções judiciais em curso.

Já as cooperativas e os produtores rurais pes-soas físicas vivem outra realidade, pois, apesar de produzirem e comercializarem produtos do agro, não são empresários à luz do Código Ci-vil (Lei 10.406/2002).

No caso do produtor rural, destacou, a legisla-ção brasileira permite que ele assuma tanto a forma civil quanto a empresarial, como sinaliza o artigo 971 do Código Civil. No primeiro caso, isso significa que pode atuar como pessoa fí-sica ou como sociedade simples; no segundo, tornar-se empresário individual ou formar uma sociedade empresária, com a devida inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis.

Como a maioria está na condição de pes-soa física, acaba sofrendo os efeitos da crise do agronegócio, que se agravou a partir de 2015. Não tendo como arcar com seus com-promissos, milhares de produtores enfrentam o risco real de perderem o seu patrimônio pessoal para pagar os credores. Nesse rol, figuram grandes produtores de grãos (soja, milho e arroz, principalmente), que, além dos financiamentos públicos, contraíram muitas dívidas para poder formar a lavoura ou pre-parar o rebanho. Esse grupo, que poderia re-correr à recuperação judicial, ainda é barrado pela Justiça.

Em artigo publicado no jornal Zero Hora, edi-ção de 2 de agosto, César chamou a atenção dos ruralistas gaúchos para uma recente de-cisão do Tribunal de Justiça de São Paulo que,

se ganhar corpo, pode mudar este quadro. A Corte entendeu que, tratando-se de exercício de atividade rural por pessoa jurídica, admi-te-se a comprovação do prazo por meio da Declaração de Informações Econômico-Fiscais da Pessoa Jurídica (DIPJ), desde que entregue

no prazo ao fisco. Esta possibilidade vem em-butida no parágrafo 2º do artigo 48 da Lei 11.101/2005, incluída pela Lei 12.873, de 2013.

O jurista Fábio Ulhoa Coelho, em recente pa-recer, reconhece, primeiro, que exigir apenas do produtor a prova de requisito temporal para fins de recuperação judicial afronta o princípio da igualdade, insculpido no artigo 5º da Constituição. E, segundo, que a solução para a inclusão dos produtores vem mesmo com o referido parágrafo 2º do artigo 48 da Lei. E com um detalhe: já que a DIPJ não existe mais, como principal instrumento de prestação de contas ao fisco, o produtor pode se valer da Escrituração Contábil Fiscal (ECF), criada pela Receita Federal.

Em outras palavras, o produtor rural pessoa física faz jus à recuperação judicial, mesmo que tenha providenciado o seu registro exclu-sivamente no intuito de preencher o requisito relacionado à empresarialidade. Como a Lei não preceitua um prazo mínimo de existência do registro na Junta, para admitir a recupera-ção, qualquer que tenha sido a data da ins-crição prova o requisito, desde que anterior ao pedido.

O seminário da TMA Brasil contou também com as presenças de outros painelistas de renome na seara recuperacional, como o juiz Daniel Carnio Costa, titular da 1ª Vara de Fa-lências e Recuperações Judiciais de São Paulo; o desembargador Ney Wiedemann Neto, da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul; o professor e advogado Cássio Cavalli, da Fundação Getúlio Vargas/RJ; e o contador, professor e consultor de gestão em-presarial João Carlos Miranda, sócio da Mirar Gestão Empresarial. Todos estes especialistas, aliás, já foram entrevistados pela redação do Index.

A necessidade de provar dois anos de exercício de atividade empresarial ainda afasta os agricultores dos benefícios da lei recuperacional. Mas as recentes decisões da Justiça podem mudar esta realidade.

‘‘A Lei 11.101/2005 não foi criada somente para recuperar a empresa, mas para bene-ficiar a sociedade como um todo, já que evita o fechamento de sociedades empresariais, mantém empregos, garante o recolhimento de tributos e fomenta a economia local. Na Serra gaúcha, por exemplo, encontramos diversas empresas que têm uma representa-tividade enorme na região. O fechamento destas empresas representaria uma perda muito grande.”

A manifestação partiu do coordenador da área de recuperação judicial de CPAE, advo-gado Wagner Machado, convidado do programa ‘‘Espaço Jurídico’’, na Rádio Bandei-rantes (AM e FM), de Porto Alegre. O programa, que tratou da recuperação judicial no agronegócio, foi ao ar no dia 18 de agosto, com edição e apresentação do jornalista Gerson Anzzullin.

Para Wagner, assim como o encerramento das atividades de uma empresa impacta na economia, também o endividamento de um produtor rural reflete negativamente na sua região. Como as atividades agrícolas e pecuárias são a base da economia, dá para ima-ginar o estrago no agribusiness, que responde por quase 1/4 do produto interno bruto (PIB), estimado em R$ 6,6 trilhões, em 2017, segundo levantamento da Confederação Nacional da Agricultura.

Wagner reconheceu, por outro lado, que o Poder Judiciário, aos poucos, vem modifican-do suas decisões. ‘‘A jurisprudência vem evoluindo no sentido de exigir que o produtor apenas demonstre que tem a atividade no período de dois anos. Com isso, ele pode, sim, fazer o registro até mesmo previamente antes do pedido de recuperação’’, infor-mou.

Antes de pensar na recuperação judicial como solução, advertiu o advogado, o mais importante é analisar o negócio como um todo, porque nem todos precisam tomar esse caminho. “Nós atendemos alguns produtores que estão utilizando ferramentas e mecanismos de reestruturação sem, necessariamente, buscar a recuperação judicial’’, atestou. O trabalho prévio à recuperação ou a qualquer mecanismo de soerguimento, para Wagner, é mais importante que o próprio processo e envolve vários especialistas, como o administrador, o contador, o próprio advogado, entre outros. “Aqui, a gente brinca que o trabalho de reestruturação é um trabalho de alfaiate. Ele vem, tira as medidas e desenha algo que sirva para o cliente”, finalizou.

RECUPERAÇÃO NO AGRO LEVOU O ADVOGADO WAGNER MACHADO AO ESPAÇO JURÍDICO, NA BAND

Foto: Adobe Stock

Foto: Assessoria TMA Brasil

César Peres Sócio-diretor da Cesar Peres Advocacia Empresarial

Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 8 Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 9

STF declara constitucional a terceirização de atividades meio e fim das empresas

TRABALHISTA

O Supremo Tribunal Federal declarou cons-titucional a terceirização de serviços nas atividades meio e fim das empresas na sessão do dia 30 de agosto. O placar: 7 votos a 4. A decisão do Plenário deve li-berar, para regular prosseguimento, cerca de quatro mil processos sobrestados nas instâncias inferiores.

Toda a discussão ficou centrada em cima da Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que proíbe a terceirização. Para a maioria dos ministros, não há lei que proíba a prática nem comprovação de que essa modalidade de prestação de serviço precarize o trabalho ou viole a dignidade do trabalhador.

A decisão não alcança a sentença judicial contra a qual não cabem mais recursos, em que já se escoou o prazo decadencial de ação rescisória, explicou o ministro Luiz Fux. Segundo ele, demais esclarecimentos podem ser feitos por ‘‘provável’’ recurso de Embargos de Declaração.

Conforme o entendimento prevalecente, não se pode violar a livre-iniciativa e a livre concorrência, uma vez que há princípios que asseguram às empresas liberdade em busca de melhores resultados e maior com-petitividade. ‘‘A Constituição Federal não impõe a adoção de um modelo específico de produção. A Constituição Federal não veda a terceirização’’, afirmou o ministro Luís Roberto Barroso, relator de uma das ações em discussão.

Ele lembrou ainda que a Justiça do Traba-lho tem entendido que é possível terceiri-zar a atividade-meio, mas o mesmo não vale para a atividade-fim. “O medo do desemprego assombra as novas gerações. Nós temos que ser passageiros do futuro, e não prisioneiros do passado. É inevitável que, nesta realidade, o Direito do Trabalho em países de economia aberta passe por mudanças. É preciso assegurar, a todos os trabalhadores, emprego, salários dignos e a maior quantidade de benefícios que a economia comportar.”

O entendimento vencedor foi seguido pelos ministros Luiz Fux, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cármen Lúcia. A divergência, aberta pelo ministro Luiz Edson Fachin, foi seguida pelos ministros Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio.

Os vencidos argumentaram que, por falta de legislação, é justa a limitação de jurispru-dência. Para eles, é inviável o afastamento da Consolidação das Leis Trabalhistas à con-tratação de mão de obra interposta. Com essa permissividade, não haverá geração de emprego, ou seja, apenas será determinado se o posto de trabalho é direto e protegido ou se é precário e terceirizado.

A presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, argumentou que a terceirização não é causa da precarização do trabalho nem viola, por si só, a dignidade do trabalho. Se isso acontecer, disse, há o Judiciário para impedir tais abusos. (Com informações do site Conjur/jornalista Gabriela Coelho).

O Plenário do STF, em sua maioria, entende que a terceirização não precariza nem viola a dignidade do trabalho, já que a Constituição assegura a liberdade aos agentes econômicos.

Motorista que permanece na área de abastecimento, enquanto outro trabalhador abastece o veículo, não tem direito a adicio-nal de periculosidade. Com esse entendimento, a 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho liberou uma usina de Pontal, no interior de São Pau-lo, de pagar esse tipo de verba a um mo-torista de caminhão.

Permanência em área de abastecimento não gera periculosidade a motorista

Segundo o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Re-gião (Campinas-SP), o empregado ficava habitual-mente na área de risco durante o carregamento do caminhão na destilaria e durante o abastecimento do veículo. O procedimento ocorria quatro ou cinco vezes por semana e demorava em média 15 minutos. Nesse tempo, o motorista ficava ao lado do frentista.

Com base nesse quadro, o TRT-15 havia en-tendido ser devido o adicional de periculo-sidade. “Basta que a exposição do empre-gado aos agentes perigosos seja inerente às suas atividades para que se reconheça o contato intermitente, ficando assegurado o direito ao pagamento do respectivo adicio-nal”, registrou o acórdão.

No Recurso de Revista encaminhado ao TST, para combater a decisão do TRT-15, a usi-na sustentou não ter ficado caracterizado o trabalho em contato permanente com infla-máveis ou explosivos. Segundo a empresa, a atividade do motorista se dava fora da área de risco, com ingresso apenas eventual na área de abastecimento.

O relator, ministro Walmir Oliveira da Costa, lem-brou que a Norma Regulamentadora 16 do Minis-tério do Trabalho, que trata do adicional de pericu-losidade, tem alcance restrito ao operador de bomba e aos trabalhadores que operam na área de risco. Citando diversos precedentes da Subseção 1 Especializada em Dis-sídios Individuais (SDI-1) do TST, o ministro destacou que o mero acompanhamento do serviço não se enquadra no Anexo 2 da NR-16, que lista as atividades e as operações perigosas com inflamáveis.

Foto: Adobe Stock

Foto: Adobe Stock

Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 10 Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 11

Ciclo de Palestras mantém clientes e parceiros em constante atualização

DIFUSÃO DO CONHECIMENTO

Se os prognósticos se confirmarem, o Ci-clo de Palestras da Cesar Peres fechará o ano de 2018 com a frequência de 300 assistentes. Nada mau para uma inicia-tiva que começou tímida, reunindo 8/10 pessoas, há cerca de um ano, e que hoje congrega mais de 20 convidados por en-contro – sócios, gerentes, coordenadores de área, supervisores, contadores. Junto com os convidados palestrantes e os ad-vogados do time da Casa, eles transfor-maram a sede de CPAE num ponto de encontro e o novo auditório num fórum de debates jurídicos.

‘‘Estes eventos servem para atender ao nosso compromisso de manter os clien-tes e possíveis novos clientes informados acerca dos assuntos que estão em evi-dência e que podem, de alguma forma, impactar em suas operações’’, esclarece o advogado Luciano Becker Soares, um dos sócios dirigentes do escritório e respon-sável por implantar a estrutura da nova sede. ‘‘Estamos concretizando o projeto de aliar o conhecimento e a prática do meio empresarial com a técnica jurídica’’,

comemora.

Luciano informa que o Ciclo de Palestras tem periodicidade mensal, com início em março e término em novembro. No fecha-mento desta edição, sete eventos haviam sido realizados, reunindo, aproximada-mente, 160 pessoas. Até o fim do ano, devem ser realizados mais quatro even-tos – com expectativa de público superior a 100 assistentes. No final do exercício anual, o número total de assistentes deve chegar à casa dos 300.

FORMATO DE WORKSHOPO formato dos encontros se assemelha a um workshop. Pela manhã, é servido coffee break inicial de 30 minutos, para oportunizar o convívio entre os convida-dos e membros do escritório, seguido de uma palestra com duração de 1h30min. Após a exposição do tema, os convidados são estimulados a fazer questionamentos, para dissipar dúvidas ou complementar informações. Algumas questões se trans-formam em verdadeiros debates entre pa-

lestrante e público, se estendendo além dos 15 minutos regimentais. Encerrados os trabalhos, é servido mais um coffee break, para fins de descontração e net-working.

O advogado Geovane Machado Alves, coordenador das áreas tributária e socie-tária, diz que o Ciclo oferece aos gestores a oportunidade de se atualizarem sobre temas importantes relacionados ao direi-to e à gestão de seus empreendimentos. Neste ano, a sua área foi responsável por cinco dos sete eventos realizados, com pú-blico médio de 20 pessoas, entre clientes, parceiros e convidados. No cômputo ge-ral, foram abordados os seguintes temas: reforma trabalhista, recuperação de em-presas, caracterização de grupo econômi-co, responsabilidade tributária do sócio e as punições administrativas no âmbito da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que trata de Direito Aeronáutico.

As áreas trabalhista e tributária, aliás, se-gundo levantamento inédito do Instituto Brasileiro de Pesquisa e Análise de Dados, são as responsáveis pelos maiores volu-mes de processos e as que recebem mais recursos dos departamentos jurídicos das empresas. Na sequência, aparecem as ações comerciais e de direito do consu-midor, ambientais, direito administrativo, societário, concorrencial, previdenciário,

sindical e de tecnologia. Da mesma for-ma, naquela pesquisa, a área trabalhista foi indicada como uma das três que mais recebem recursos das companhias por 76% dos executivos ouvidos. Novamente, o segundo lugar ficou com o campo tri-butário, apontado por 68% dos diretores.

PONTO DE ENCONTROSegundo Luciano, muitos clientes do in-terior do Estado aproveitam as datas de eventos para trazer e/ou reunir-se com outros parceiros de negócios, pois o es-critório disponibiliza toda a sua estrutura para que eles possam receber seus con-tatos na Capital. Na nova sede do escri-tório, situada à Rua Dom Pedro II, 568, Bairro São João, o que não falta é espaço, tecnologia, conforto e requinte. Tudo para oferecer um ambiente acolhedor, confor-tável e de aspecto moderno a advogados, clientes, parceiros e convidados dos Ci-clos de Palestras.

A casa, toda remodelada, conta com uma sala de reuniões para 16 pessoas, outra para 12, além da biblioteca, que também pode servir como sala de reuniões para quatro pessoas. O auditório, onde ocor-rem as palestras, acomoda 25 pessoas. Há 29 vagas de estacionamento. Todo o mobiliário foi feito sob medida (linha Idélli Corporativo), e os móveis de varejo

(linha Kappesberg Premium) foram pen-sados nas boas práticas, respeitando os mais exigentes padrões de ergonomia. Para isso, o escritório foi assessorado por um de seus clientes, o Grupo K1, de Tu-pandi (RS). A iluminação seguiu o mesmo modelo. Há ainda o ‘‘espaço gourmet’’ e o ‘‘espaço de descompressão’’.

Ao promover a discussão dos temas mais relevantes em direito e gestão, a Equipe CPAE reforça o compromisso com o sucesso de clientes e parceiros.

Foto: Adobe Stock

CESARPERESCiclo de Palestras

Luciano Becker Soares Sócio-diretor da Cesar Peres Advocacia Empresarial

Geovane Machado Alves Especialista nos segmentos Tributário e Societário

Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 13Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 12

SOCIETÁRIO

O prazo de 10 anos previsto no artigo 205 do Código Civil não vale quando acionistas cobram prestação de contas referente ao pagamento de dividendos, de juros sobre capital próprio e de outros rendimentos. Foi o que decidiu a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao aplicar o período de três anos da Lei 6.404/76 (que regula as sociedades por ações) no caso de um acionista que que-ria ter informações sobre uma instituição financeira.

Com isso, Marco Aurélio Bellizze, minis-tro relator do caso no STJ, restringiu o dever de prestar contas ao período de três anos.

O autor ajuizou ação de exigir contas, alegando que o banco não estava pagando nenhum dividendo ou qualquer outro provento de direito sobre as suas ações.

O pedido foi inicialmente acatado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, que condenou o banco a apresentar contas detalhadas referentes ao período de 19 anos.

A instituição interpôs Recurso Especial no STJ, argumentando que a pretensão prescreveu três anos depois que os divi-dendos foram colocados à disposição do acionista, conforme a Lei 6.404/76.

Em análise de mérito, o ministro Marco Aurélio Bellizze confirmou a tese da defesa, pois “a pretensão de obter a prestação de contas afeta ao pagamento de dividendos é indissociável da pre-tensão de obter a correlata reparação, devendo-se, por isso, observar seu prazo prescricional previsto em lei específica”, e não do Código Civil.

Para o ministro, o artigo 205 do Código

deve ser aplicado subsidiariamente, sendo necessário primeiro analisar se o pedido está especificado no âmbito do artigo 206 ou em outras leis especiais. “Havendo disparidade entre o prazo prescricional da pretensão de exigir contas e o prazo prescricional da preten-são de satisfação de crédito oriundo da relação de administração ou gestão de bens alheios, este último deve prevalecer, a fim de se preservar a utilidade da via eleita”, escreveu no voto.

“A ação de exigir contas deve se revelar útil, a um só tempo, à pretensão de exigir contas e, caso apurado crédito existente em favor do demandante, também à sua satisfação. A pretensão de exigir contas não pode ser concebida como uma mera manifestação de emu-lação da parte demandante, devendo apresentar-se hábil, desde logo, a atingir estas finalidades”, concluiu.

Com esse entendimento, a 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul determinou o regular prossegui-mento de um pedido de homologação de acordo, que havia sido rejeitado pelo juízo de primeiro grau.

Os litigantes negociaram a quitação de um contrato de fi-nanciamento bancário, em troca da extinção das demandas revisional e de busca e apreensão do bem financiado (com a renúncia de prazo).

O julgador de origem entendeu que não tinha por que deferir o pedido, por já ter sido prestada a jurisdição demandada. Conforme a decisão, reconhecer os termos após o trânsito em julgado seria uma prática ‘‘incorreta e desnecessária’’.

O banco envolvido recorreu, sustentando ser possível homolo-gar o acordo após a prolação de sentença. Argumentou que, nos termos do artigo 840, do Código Civil, é lícito aos interes-sados prevenirem ou terminarem o litígio mediante concessões mútuas.

O relator no TJ-RS, desembargador André Luiz Planella Villari-nho, afirmou que o Código de Processo Civil autoriza a auto-composição a qualquer tempo e diz que cabe ao magistrado ‘‘velar pela duração razoável do processo’’ (artigo 139).

‘‘Outrossim, o art. 840 do Código Civil dispõe que é lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante concessões mútuas, de modo que, em se tratando de direitos patrimoniais disponíveis, é viável a apresentação de pedido de homologação de acordo mesmo após o trânsito em julgado da ação, conforme os artigos 841 e 843 do mesmo diploma legal’’, complementou no acórdão.

Villarinho ainda citou o artigo 200 do CPC. O dispositivo diz que os atos das partes, ‘‘consistentes em declarações unila-terais ou bilaterais de vontade, produzem imediatamente a constituição, a modificação ou a extinção de direitos processu-ais’’. O voto foi seguido por unanimidade.

Acionista pode pedir prestação de contas no prazo de três anos, diz STJ

Juiz não pode negar homologação de acordo em revisional, mesmo com trânsito em julgado

O prazo de 10 anos previsto no artigo 205 do Código Civil não vale quando acionistas cobram prestação de contas referente ao pagamento de dividendos, de juros sobre capital próprio e de outros rendimentos.

A celebração de acordo entre as partes num litígio financeiro pode ser submetida à homolo-gação judicial em qualquer tempo, mesmo que a ação já tenha transitado em julgado.

Foto: Adobe Stock

RECUPERAÇÃO DE CRÉDITO

Foto: Adobe Stock

Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 14 Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 15

PROPRIEDADE INTELECTUAL

Com esse entendimento, a 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve sentença que condenou uma fábrica de toldos de Novo Hamburgo a pagar R$ 30 mil, a título de reparação, a uma empresa que produz coberturas de vinil em Porto Alegre. A conduta de usar desenho registrado, sem autorização, está tipificada nos artigos 187 e 188 do Código da Propriedade Industrial (Lei 9.279/1996).

O colegiado recursal apontou que o produto da ré traz diferenças ‘‘meramente artísticas’’ em relação ao original, sem demonstrar novidade nos termos do artigo 96 do referido Código, que dispõe sobre o registro de dese-nhos industriais.

Além da reparação moral, a ré foi condenada a pagar lucros cessantes, estando sujeita também à multa diária no valor de R$ 500 se não se abstiver de confeccionar, industrializar, vender, locar ou utilizar qualquer tipo de imagem relacionada ao objeto registrado.

O acórdão, da relatoria do desembargador Ney Wiedemann Neto, foi lavrado com entendimento unânime entre os membros do colegiado.

LITÍGIO CONCORRENCIAL

Na ação indenizatória movida contra a con-corrente, a empresa autora alegou que tem permissão para fabricar e vender produtos originados de um desenho industrial em forma de ‘‘pirâmide arqueada’’, registrado junto ao INPI. No entanto, afirmou, a ré vem fabricando produtos similares, com o intuito de confundir o consumidor. Além de não ter autorização para usar o desenho, estaria oferecendo o produto a um preço menor, causando prejuízos comerciais.

Em contestação, a ré disse que a simples visualização da descrição e das fotografias dos produtos apresentados nos autos permite perceber que não há semelhança capaz de induzir o consumidor a erro. Alegou que só

através de exame técnico qualificado é que se poderia tirar a dúvida, visto que os produtos produzidos pela autora não são semelhantes àqueles que fabrica.

PALAVRA DA PERÍCIA

Na primeira instância, a juíza Nara Rejane Klein Ribeiro, da 4ª Vara Cível da Comarca de Novo Hamburgo, autorizou a produção de prova pericial. O perito observou que o consu-midor leigo tem grande dificuldade para dife-renciar uma ou outra estrutura de cobertura, pois os pequenos detalhes técnicos e estéticos que as caracterizam são imperceptíveis.

Para o perito, se os mínimos detalhes diferenciais entre os produtos têm ‘‘caráter meramente artístico’’, não se pode falar de originalidade do produto da ré, passível de registro como desenho industrial, de acordo com o artigo 98 do Código de Propriedade Industrial.

Copiar desenho industrial de concorrente, sem autorização, causa dano moralUsar desenho industrial de um produto sem autorização ofende a imagem, a identidade e a cre-dibilidade da empresa proprietária do registro do desenho junto ao Instituto Nacional da Pro-priedade Industrial. Uma vez demonstrada a falsificação do produto, a parte lesada nem precisa provar os prejuízos para ter direito à indenização por danos morais.

Foto: Adobe Stock

A Receita Federal eliminou a regra que permitia vincular imóveis no Cadastro de Imóveis Rurais (Cafir) a mais de um imóvel no Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR). É o que diz a Instrução Normativa 1.807/2018, publicada no Diário Oficial da União de 25 de maio.

O procedimento de vinculação entre o código de imóvel no Sistema e o Número do Imóvel na Receita Federal (Nirf) no Cafir era feito, em regra, de forma que um único código de imóvel fosse vinculado também a um único número.

A nova norma altera a instrução normativa antiga (1.581/2015) e

elimina hipóteses de exceção que estavam previstas nos artigos 6º e 7º. Assim, resta, para o caso de vinculação de mais de um código de imóvel no SNCR a um único Nirf, apenas a hipótese de descontinuida-de provocada por perda de destinação em alguma parcela componen-te do imóvel rural.

Com isso, a vinculação de um imóvel no Cafir a mais de um imóvel cadastrado será admitida quando ficar comprovado que a perda de destinação rural de alguma parcela componente do imóvel tenha provocado sua descontinuidade, resultando em mais de um imóvel cadastrado no SNCR.

RECEITA FEDERAL ELIMINA REGRA QUE VINCULA IMÓVEL NO SNCR

Ministério Público passa a ter acesso ao Cadastro Ambiental Rural

MEIO AMBIENTE

Para Raquel Dodge, o CAR ‘‘é uma das joias da coroa’’ do Brasil. ‘‘Cadastro importan-tíssimo, construído ao longo de anos, que contém informações muito relevantes para resolver a questão fundiária do país e cuidar do nosso patrimônio ambiental. Esta é uma aproximação fundamental entre Ministério Público e Ministério do Meio Ambiente.’’

O ministro Edson Duarte, acompanhado do diretor-geral do SFB/MMA, Raimundo Deusdará Filho, destacou sua satisfação pela formalização de um trabalho conjunto que já existe na prática e ressaltou o Ministério Pú-blico como um grande e estratégico parceiro na defesa do interesse ambiental. ‘‘Não há, no mundo, banco de dados como o CAR.

Este acordo ajuda o Brasil a consolidar sua política de desenvolvimento do meio ambien-te’’, comemorou.

O conselheiro Luciano Nunes, presidente da Comissão do Meio Ambiente do CNMP, disse que ‘‘a sociedade ganha um importante instrumento para auxiliar nas investigações na seara ambiental, identificando de forma mais efetiva e célere os proprietários das reservas ambientais e propriedades rurais’’.

Para finalizar, Raquel Dodge falou que o Mi-nistério Público Federal lançou, recentemente, a segunda fase do Projeto Amazônia Protege. ‘‘Com o uso do CAR, até outubro, o MPF já terá ajuizado cerca de 3.500 ações civis pú-

blicas contra os que tiverem desmatado áreas superiores a 60 hectares. Isso mostra que essa base de dados tem a missão institucional de fazer justiça ambiental’’, falou.

Com a assinatura do termo, CNMP e SFB/MMA poderão firmar parcerias com Estados, Municípios, órgãos públicos e instituições privadas e do terceiro setor nacionais ou internacionais, para execução de ativida-des operacionais, visando ao alcance dos objetivos e metas do acordo. O acordo, cujo prazo de vigência é indeterminado, não gera transferência de recursos ou obrigações financeiras de qualquer espécie entre os partícipes.

O Ministério do Meio Ambiente (MMA) e o Serviço Florestal Brasileiro (SFB) vão disponibilizar aos membros do Ministério Público o acesso aos dados do Cadastro Ambiental Rural (CAR). O termo do acordo de cooperação técnica de informações foi assinado em 12 de junho pela presidente do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), Raquel Dodge, e pelo ministro do Meio Ambiente, Edson Duarte, no edifício-sede do CNMP, em Brasília.

Foto: Adobe Stock

Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 16 Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 17

Não pagar valores declarados de ICMS que foram cobrados dos clientes caracteriza apropriação indébita tributária. Este é o entendimento da 3ª Seção do Supe-rior Tribunal de Justiça, que negou Habeas Corpus de empresários condenados nesta situação.

Segundo reportagem do jornal Valor Econômico, o HC foi proposto pela Defensoria Pública de Santa Catarina, que alegava que deixar de recolher ICMS declarado seria inadimplemento fiscal e não crime.

O ministro-relator Rogério Schietti Cruz destacou a re-levância social e econômica do tema. Para ele, a prática deve ser entendida como crime, para que os empresá-rios não considerem ser vantajoso não pagar os valores declarados.

“O fato de o agente [empresa devedora de impostos] registrar, apurar e declarar em guia própria ou em livros fiscais o imposto devido não tem o condão de elidir ou exercer nenhuma influência na prática do delito, visto que este não pressupõe a clandestinidade”, disse o ministro-relator.

A decisão pacifica um tema sobre o qual havia diver-gência dentro do STJ. A 5ª Turma já havia decidido que tratava-se de inadimplência e não crime.

Votaram contra a criminalização os ministros Jorge Mussi, Maria Thereza de Assis Moura e Sebastião Reis Júnior. Seguiram o relator, criminalizando a conduta, os ministros Reynaldo Soares da Fonseca, Felix Fischer, Antônio Saldanha, Joel Paciornik e Néfi Cordeiro.

INADIMPLÊNCIA NO ICMS PASSA A SER CRIME, DECIDE STJ

TRIBUTÁRIO

Com este entendimento, a 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul derrubou decisão de primeiro grau e, a pedido da Fazenda estadual, autorizou a penhora de 5% sobre os recebíveis de cartão de crédito da empresa inadimplente com o recolhi-mento de ICMS.

O juízo de primeira instância havia nega-do o pedido por entender que a Fazenda não tentou localizar outros bens passíveis de constrição, além de considerar inad-

missível a penhora de créditos aleatórios, sem a devida identificação de sua origem e o quanto representam para a manuten-ção da atividade da executada.

O fisco recorreu, alegando que a empresa executada acumula débitos que superam R$ 11 milhões, dos quais R$ 10 milhões estão sendo cobrados judicial-mente. Disse ainda que fez diligências e que não se trata de ‘‘inadimplência ocasional e temporária’’, mas reitera-da, pois há anos a devedora recolhe o

tributo dos clientes e não repassa o valor correspondente ao erário.

Também declarou que os recebíveis de cartão de crédito se equiparam à penho-ra de dinheiro, prioritária no rol legal de constrição.

O relator do recurso na 1ª Câmara Cível do TJ-RS, desembargador Sérgio Grassi Beck, disse que a Fazenda conseguiu de-monstrar que não existem bens passíveis de constrição suficientes para garantir a execução fiscal.

Foto: Adobe Stock

TJ-RS autoriza penhora sobre recebíveis de cartão de crédito para pagar dívidas de ICMSA penhora de recebíveis de cartão de crédito equipara-se ao faturamento da empresa e pode ser decretada pelo Judiciário contra uma empresa inadimplente com o fisco, desde que não exista outro bem para constrição e seja fixado percentual capaz de manter a atividade empresarial, sob pena de a medida judicial tornar inócuo o processo.

Os requerimentos de penhora via sistema BacenJud mostram que não foram en-contrados valores em contas bancárias, assim como o Registro de Imóveis deu resposta negativa. Nesta linha, entendeu possível a penhora de recebíveis de car-tão de crédito, num percentual que não

inviabilize a empresa (5%). A medida, conforme Beck, tem sido aceita pelo Superior Tribunal de Justiça.

‘‘Registro que, em que pesem os argu-mentos apresentados pelo Estado do Rio Grande do Sul, pondera-se que, mais vale receber algum valor aos poucos

que nada, pois caso a empresa deixe de operar por falta de capital de giro, em razão da penhora excessiva, o Estado não terá meios de haver seu crédito, mesmo porque não foram encontrados bens em nome da devedora passíveis de penhora’’, concluiu o desembargador.

Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 18 Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 19

A dação em pagamento como meio alternativo para a quitação de dívidas fiscais

Recentemente, o Plano Anual de Fiscalização da Receita Federal do Brasil (RFB) para 2018 e Resultados de 2017 revelou dados importantes sobre as ações fiscalizatórias realizadas no âmbito da União Federal. Segundo as estatísticas apresentadas, em 2017, o montante de crédito tributário constituído de ofício, por meio de autuações fiscais, alcançou o valor de R$ 204,99 bilhões. Isso representa um montante 68,5% maior do que o valor lançado em 2016 (R$ 121,66 bilhões). Aliás, o resultado de crédito tributário em 2017 é o maior já lançado pela Fiscalização da Receita Federal.

Em um cenário como este, é comum surgirem questionamentos entre os contribuintes, especialmente quanto à possibilidade de quitação de tributos, de forma alternativa. Neste sentido, a Dação em Pagamento de Bens Imóveis, inserida no Código Tributário Nacional (CTN) pela Lei Complementar 104/2001, constitui uma dessas possibilidades de extinção do crédito tributário, diferente do pagamento propriamente dito.

Segundo dispõe o inciso XI do artigo 156 do CTN, caberá ‘‘a dação em pagamento em bens imóveis, na forma e condições estabelecidas em lei’’. Trata-se, portanto, de prescrição normativa de eficácia limitada, subordinada à intermediação de outra norma, dispondo sobre a forma e as condições para sua implementação. No caso, o CTN, na sua condição de lei complementar destinada a ‘‘estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária (CF, art. 146, III)’’, apenas permitiu aquela modalidade de extinção do crédito tributário, mas não a impôs obrigatoriamente, cabendo, assim, a cada ente federativo, editar norma própria regulamentadora da matéria.

Sobre o tema, o jurista Leandro Paulsen, na obra Direito Tributário, Constituição e Código Tributário à luz da Doutrina e da Jurisprudência, afirma que ‘‘as leis federais, estaduais e municipais que venham a autorizar a dação em pagamento de bens deverão definir a forma e as condições que tal se dará, sendo essencial, quanto a isso, a definição dos critérios para a avaliação dos imóveis’’.

Desta forma, em 16 de março de 2016, foi editada a Lei 13.259, que tratou da dação em pagamento de bens imóveis no âmbito da União Federal. De acordo com a citada norma federal, o crédito tributário inscrito em Dívida Ativa da União poderá ser extinto, mediante dação em pagamento, a critério do credor, desde que: (I) a dação seja precedida de avaliação do bem ou dos bens ofertados, que devem estar livres e desembaraçados de quaisquer ônus, nos termos de ato do Ministério da Fazenda; e (II) abranja a totalidade do crédito ou créditos que se pretende liquidar com atualização, juros, multa e encargos legais, sem desconto de qualquer natureza, assegurando-se ao devedor a possibilidade de complementação em dinheiro de eventual diferença entre os valores da totalidade da dívida e o valor do bem ou dos bens ofertados em dação.

Naquela ocasião, o legislador excluiu expressamente a aplicação da Lei 13.259/2016 aos créditos tributários referentes ao Simples Nacional.

Contudo, objetivando regulamentar o procedimento em questão, em 8 de fevereiro de 2018, foi editada a Portaria 32 da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Dentre as disposições trazidas pela normativa federal, vale destacar as seguintes: (a) não serão aceitos os imóveis de difícil alienação, inservíveis ou que não atendam aos critérios de necessidade, utilidade e conveniência, a serem aferidos pela Administração Pública; (b) a dação em pagamento se dará pelo valor do laudo de avaliação do bem imóvel; no caso, se urbano, este será emitido por instituição financeira oficial; se rural, pelo Incra, cabendo ao devedor arcar com os custos de avaliação do imóvel; e (c) se o bem ofertado for avaliado em montante superior ao valor consolidado do débito inscrito em Dívida Ativa da União que se objetiva extinguir, sua aceitação ficará condicionada à renúncia expressa, em escritura pública, por parte do devedor proprietário do imóvel, ao ressarcimento de qualquer diferença.

Após a análise de toda documentação, caberá à PGFN se manifestar sobre a conveniência e oportunidade da dação em pagamento do bem imóvel para a recuperação do crédito tri-butário inscrito em Dívida Ativa da União. Na hipótese de a manifestação ser favorável, irá submeter o processo administrativo à apreciação da Coordenação-Geral de Estratégias de Recuperação de Crédito (CGR/PGFN), que deverá decidir quanto à aceitação da proposta de dação como forma de extinção das inscrições em Dívida Ativa da União.

Como se vê, em que pese constituir uma forma alternativa para a extinção do crédito tributário, há que se avaliar precisamente a adequação desta modalidade a cada caso concreto. Ademais, uma vez que a aceitação do bem imóvel passa necessariamente por uma análise de conveniência e oportunidade por parte da Administração Pública, uma eventual negativa não obsta que tal bem seja objeto de futuro pedido de penhora, para fins de garantia do crédito tributário em aberto. Isso poderia ocasionar sua alienação em hasta pública, por valor aquém daquele que havia sido avaliado.

Ações revisionais de contrato bancário em momento de crise. Vale a pena?

Diante da prolongada crise política e econômica do país, agravada pela greve dos cami-nhoneiros, houve aumento considerável de pessoas e empresas que procuram entender um pouco mais sobre as ditas ações revisionais de contratos bancários. A pergunta é: vale a pena revisá-los? Nas linhas seguintes, convido o leitor a tirar as suas próprias conclusões.

Com a edição da Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça, que uniformizou o entendimento de que o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras, houve uma avalanche de interposição de ações revisionais, pois antes de tal pronunciamento jurisprudencial não havia exigências para requerer a revisão dos contratos bancários.

As petições iniciais eram genéricas, sem qualquer tipo de embasamento, carentes de razões e essência. Abusava-se dos efeitos do processo para não dar seguimento ao que foi livremente acordado.

Baseando-se no artigo 51, inciso IV, parágrafo 2º, do CDC, os contratos eram revisados de ofício pelo Poder Judiciário; ou seja, o juiz declarava nulas cláusulas contratuais sem expresso pedido do autor da ação revisional.

Não obstante, diante da insistência de uma legislação protetiva do consumidor brasileiro, as instituições financeiras abusavam da hipossuficiência consumista para cobrar, sem limi-tes, taxas e juros em patamares superiores aos praticados no mercado financeiro externo.

Assim, a aplicação “nua e crua” da ordem pública das regras sobre o abuso de direito contra os consumidores causou um colapso no tráfico jurídico, levando o STJ a intervir e a pacificar entendimentos sobre o assunto como forma de evitar o descontrole e a inseguran-ça jurídica sobre o tema.

A intervenção do STJ iniciou com a aprovação de três súmulas, quais sejam: 379, 380 e 381. A primeira limita os juros moratórios a 1% ao mês; a segunda obstaculiza a caracteri-zação da mora; a última, por fim, veda o julgamento de ofício.

As citadas súmulas oferecem maior transparência ao sistema, trazendo, ao mesmo tempo, segurança jurídica aos contratos que se enquadram nesses quesitos.

Posteriormente, o STJ, aplicando a regra processual dos recursos repetitivos, a qual deter-mina que todos os próximos julgamentos devem ser decididos da mesma forma, julgou os Recursos Especiais 1.061.530-RS (DJ: 10/03/2009) e 973.827/RS (DJ: 27/06/2012).

Em resumo, houve a pacificação da matéria principal que envolve as revisionais de contra-to, conforme listado abaixo.

Juros remuneratórios: serão revisados somente nos casos de discrepância substancial da média praticada pelo mercado, na ‘‘praça’’ do empréstimo. Nestes casos, deve ser aplicada a taxa média estipulada pelo Banco Central.

Capitalização: somente será revisada se não for expressamente pactuada no contrato. En-tretanto, o STJ entende como previsão expressa o simples fato de existir a anotação de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal; ou seja, se o resultado da multiplicação por 12 da taxa mensal foi inferior à descrita como taxa anual, os critérios de previsão foram cumpridos. Exemplo: taxa mensal: 1,97% (*12= 23,64%); taxa anual: 26,48%.

Juros moratórios: cobrança possível, desde que pactuados até o limite de 12% ao ano (artigo 406 do Código Civil combinado com o artigo 161, parágrafo 1º, do Código Tributário Nacional).

Multa: penalidade aceita até o limite de 2% sobre o valor inadimplido (artigo 52, parágra-fo 1º, do CDC).

Comissão de permanência: contratualmente prevista, é permitida, mas não cumulada com juros moratórios, multa ou correção monetária.

Quanto ao afastamento da mora: a descaracterização da mora dependerá do reconhe-cimento da abusividade nos encargos exigidos no período de normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização).

Quanto à antecipação de tutela judicial: dependerá da demonstração de que a cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ, bem como do depósito da parcela incontroversa ou a prestação de caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz.

As delimitações acima coagiram grande parte das instituições financeiras a rever as suas cláusulas contratuais, adequando-as a este novo cenário.

Atualmente, é possível afirmar que essa evolução na questão formal, em prol do respeito mútuo contratual e da melhor celeridade processual, surtiu efeitos na segurança jurídica dos contratos bancários. Embora persistam questões a serem discutidas, pontos positivos podem ser extraídos e aproveitados em litígios de natureza bancária, desde que aplicados em consonância com o ordenamento jurídico e com as regras lançadas pelo nosso tribunal superior.

Flávia Webster

Advogada especializada em Direito e Processo Civil e em Recuperação de Crédito

O tratamento preferencial às micro e pequenas empresas na recuperação judicial

A Constituição de 1988 contempla, no artigo 170, tratamento privilegiado para empresas de pequeno porte. Isso explica por que as microempresas (MEs) e empresas de pequeno porte (EPPs) já representam 98,5% do total de empresas privadas, geram 27% do PIB e respondem por 54% dos empregos formais; ou seja, empregam mais trabalhadores com carteira assinada do que as médias e grandes. Segundo dados atualizados do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), o número destas empresas ultrapassou a casa dos 4 milhões.

Dada a importância deste universo, era de se presumir que a promulgação da Lei de Falências e Recuperação de Empresas – LFRE (Lei 11.101/05) traria benefícios ‘‘diferen-ciados’’ às empresas de pequeno porte. Entretanto, não foi o que se verificou, pois as supostas vantagens – contempladas nos artigos 70, 71 e 72 – resultaram na inviabilização do plano especial. É uma pena, pois o intuito deste plano era tornar o processo recupera-cional mais célere e menos oneroso para este universo empresarial.

A LFRE diz que, no plano especial, o pagamento dos credores, por exemplo, se inicia em até 180 dias após o ajuizamento da ação e deve ser feito no prazo máximo de 36 meses, período inferior à grande parte dos planos tradicionais apresentados. Além disso, não é designada Assembleia Geral de Credores, ficando a cargo do juiz a aprovação (ou rejei-ção) do plano de recuperação. Isso, em tese, simplifica o procedimento, mas, na realidade, traz insegurança jurídica às empresas, que ficam ‘‘na mão’’ do Judiciário, já que, no proce-dimento padrão, a incumbência do juiz é somente homologar o plano.

Quase uma década após a sua promulgação, foi criada a Lei Complementar 147/2014, que alterou a Lei Complementar 123/2016 e trouxe algumas mudanças para esse cenário. Uma delas foi a inclusão de todos os créditos (desde que sujeitos ao plano tradicional) no plano especial, que anteriormente só abrangia os créditos quirografários. Ainda, foi imposta uma redução à remuneração do administrador judicial, que teve o seu teto salarial minorado de 5% para 2% sobre o valor do passivo, objetivando a redução de despesas.

A possibilidade de parcelamento dos débitos tributários, instituída pela Lei 13.043/2014, foi outra conquista para os empresários. As MEs e EPPs foram contempladas com prazo de parcelamento 20% maior em relação às demais, totalizando 100 meses para pagamento da dívida tributária. Este ganho foi altamente positivo, já que os créditos tributários não se sujeitam à recuperação e formam parte expressiva dos passivos das empresas em crise.

Além desses benefícios concedidos aos micro e pequenos empresários na qualidade de devedores, a LC 147/2014 ainda os contemplou enquanto credores. Destaca-se a criação de uma nova classe de credores, destinada aos titulares de créditos de ME ou EPP, conforme o artigo 41 da LFRE. Embora essa alteração tenha sofrido críticas por parte de alguns doutrinadores, pode ser considerada um importante avanço na medida em que: 1) os créditos do micro e pequeno empresário são separados daqueles oriundos de instituições financeiras e de fornecedores de grande porte, o que lhes garante maior poder de negociação com a empresa devedora; 2) o seu voto na Assembleia Geral de Credores passa a ser por cabeça, independentemente do valor do crédito, o que garante maior poder a cada um desses empresários, valorizando o credor em detrimento do valor de seu crédito – assim como ocorre na classe trabalhista.

Difícil mensurar se esses avanços legislativos recentes são suficientes para garantir o tra-tamento preferencial às empresas de pequeno porte nos moldes previstos pelo legislador constitucional. Contudo, são alarmantes os dados de que quase 50% das MEs e EPPs não “sobrevivem” aos seus dois primeiros anos, taxa que aumenta para 60% após quatro anos, o que denota as dificuldades ainda vivenciadas pelos pequenos empresários.

Logo, verifica-se que o plano especial previsto na LFRE sofreu importantes alterações após a aprovação da LC 147/2014. Contudo, há diversos empecilhos para a sua aplicação. É o caso da ausência de prazo de blindagem prevista no artigo 6º, parágrafo 4º, da LFRE (pe-ríodo de 180 dias, em que são suspensas todas as ações e execuções contra a devedora); plano de recuperação engessado, visto que há prazo máximo de 36 meses para quitação dos débitos; e insegurança jurídica, em razão da ausência de instalação da Assembleia Geral de Credores.

Portanto, há que se reconhecer que existe uma tendência legislativa no sentido de priorizar um tratamento diferenciado a essas empresas. No entanto, no âmbito da recuperação judicial, ainda são necessários ajustes, uma vez que muitas micro e pequenas empresas “abrem mão” do plano especial e optam pelo procedimento padrão, pois, assim, usufruem do período de blindagem, possuem (quase) total liberdade na elaboração do plano de recuperação judicial e dependem menos do Poder Judiciário para que esse seja aprovado.

ARTIGOS

O desvio de clientela pela real possibilidade de apropriação de site comercial por terceiros

Trinta anos se passaram desde que a primeira conexão com a rede mundial de computadores foi registrada no Brasil, no Laboratório Nacional de Computação Científica, órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia localizado no Rio de Janei-ro. À época, o LNCC estabeleceu uma conexão com a Universidade de Maryland (EUA) de 9.600 bits por segundo. Desde então, muita coisa evoluiu em nosso país. Com a popularização da internet, a comunicação e o relacionamento interpessoal se aprimoraram, assim como a maneira de fazer negócios. Novas formas de comprar, vender e pagar revolucionaram a gestão dos negócios. Esse é o lado bom.

Com o aumento da frequência do uso da internet, por outro lado, surgiram os crimes cibernéticos, cada dia mais comuns e mais aprimorados. Por consequência, surgiram novas formas de soluções de litígios.

Um dos crimes mais comuns e também mais antigos é o typosquatting, que consiste da cópia da interface e do endereço de um site verdadeiro, trocando algumas letras. Tal adulteração leva o consumidor a acreditar que está acessando a página original e, com isso, acaba fornecendo seus dados pessoais e senhas. Às vezes, o delito é imperceptível, de forma que o usuário só se dá conta da apropriação de seus dados tempos depois, quando recebe a informação de que compras foram feitas em seu cartão de crédito, bem como efetivadas transferências em suas contas bancárias.

Por vezes, o infrator deseja obter lucro sobre um negócio já consolidado. Assim, registra o nome de domínio de uma marca conhecida ou expressão oriunda da mesma marca, objetivando o faturamento na venda do endereço ao seu real titular ou mesmo o desvio da clientela do concorrente. Este crime é conhecido como cybersquatting ou ciberespeculação; ou seja, o registro especulativo – abusivo – de marca registrada de terceiro como domínio de internet.

O Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) estabelece os procedimentos para registro de nomes de domínio. Neste sentido, o nome de domínio será concedido para aquele que o requerer primeiro. Assim, constitui obrigação e responsabilidade exclusivas do requerente a escolha do domínio ao qual se candidatou.

Como meio alternativo às morosas demandas judiciais que tramitam em nosso país, o mesmo órgão criou, em 2010, o Sistema de Administração de Conflitos de Internet (SACI - Adm), objetivando a solução de litígios entre aquele que regis-trou o domínio e terceiros que eventualmente questionem a legitimidade do ato registral. O procedimento se limita a determinar a manutenção, o cancelamento ou a transferência do domínio. Se a parte visa à reparação de danos, advinda do registro indevido, deverá pleiteá-la judicialmente.

O procedimento é implementado por instituições aprovadas e credenciadas pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), de livre escolha do reclamante. São estas, atualmente: a Câmara de Comércio Brasil Canadá (CCBC), reconhecida em nível nacional e internacional em virtude das atividades de seu centro de mediação e arbitragem; a Organização Mundial de Propriedade Inte-lectual (OMPI); e a Associação Brasileira de Propriedade Intelectual (ABPI), através de seu Centro de Soluções de Disputas, Mediação e Arbitragem em Propriedade Intelectual (CSD-PI).

Ao fazer a reclamação, o requerente deverá expor os motivos pelos quais entende ter sido o domínio indevidamente registrado, o eventual uso de má-fé, expondo seus prejuízos, bem como comprovar identidade existente entre o domínio e marca, nome de estabelecimento, nome empresarial, nome civil, nome de família ou patronímico, apelido ou nome artístico conhecido de sua titularidade. Ao todo, o procedimento leva, em média, 100 dias (https://registro.br/dominio/saci-adm.html), podendo ser prorrogado por, no máximo, 12 meses. É um prazo relativamen-te célere, se considerarmos uma ação judicial, que normalmente tramita durante anos.

Assim, para que não ocorram riscos de apropriação indevida por terceiros, sempre sugerimos aos nossos clientes que o pedido de registro da marca e do domínio sejam procedidos concomitantemente.

Advogado especializado em Direito Tributário

Geovane Machado Alves

Advogado especializado em Direito Empresarial e Recuperação de Empresas

Pedro Leal Pacheco Vanessa Pereira Oliveira Soares

Advogada especializada em Contratos e Negócios da Propriedade Intelectual

Index Boletim - Terceiro trimestre de 2018Pág. 20

Penhora de bens pessoais na execução trabalhista

O Direito reconhece personalidade jurídica própria às sociedades, isso é, aos grupos de pessoas que se unem para buscar um propósito comum. Esse instituto visa a proteger os integrantes da sociedade de responder com seu patrimônio pessoal pelas obrigações sociais e, assim, reduzir os riscos que afastam pessoas capazes da realiza-ção de empreendimentos que poderiam ter impacto relevante na sociedade.

Apesar disso, não é segredo que essa proteção não é uma garantia, pois o Poder Judiciário brasileiro tem a peculiar tendência de desconsiderá-la sempre que a entender como um entrave à execução de suas sentenças.

Independentemente da forma societária, a responsabilidade patrimonial dos sócios sempre será subsidiária. Isso é, o sócio tem – ou deveria ter – garantido o exauri-mento do patrimônio da sociedade antes que se intentasse a execução de seus bens pessoais. Nos casos em que a responsabilidade do sócio é limitada, ele somente poderia responder pela parcela não integralizada do capital social ou da parte do capital social que subscreve, a depender do caso.

Trata-se de ponto em que o Judiciário parece ignorar as disposições legais. Embora a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) nada preveja sobre o tema, os juízes do trabalho têm aplicado a Teoria Menor da Desconsideração, segundo a qual a mera insuficiência de patrimônio da sociedade é razão suficiente para desconsideração da personalidade. Essa teoria é adotada pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC) e pela Lei de Crimes Ambientais, aplicados por analogia.

Assim, não é incomum que sócios ou mesmo administradores de empresas sofram restrições em seu patrimônio pessoal sem sequer terem ciência de que são deman-dados em um processo judicial. Essas restrições tampouco respeitam a limitação da responsabilidade, podendo atingir todo o patrimônio da pessoa física, embora ainda se respeitem as hipóteses de impenhorabilidade absoluta previstas no Código de Processo Civil (CPC).

A Lei 13.105/15, que instituiu o novo Código de Processo Civil, previu em seus arti-gos 133 a 137 a necessidade de instauração de um incidente processual, chamado “incidente de desconsideração da personalidade jurídica”. Em nosso entendimento, esse instituto trouxe maior segurança ao empresariado. Afinal, o direito material há muito previa a possibilidade de afastamento do manto protetivo da pessoa jurídica, mas, inexistindo procedimento específico para seu uso, era frequente que a pessoa fí-sica sofresse constrições patrimoniais sem ter seu direito à defesa observado. Ao que parece, o Judiciário ainda tem dificuldade em distinguir a empresa de seus sócios.

Essa dificuldade se estende à Justiça do Trabalho, como não poderia ser diferente. Não era comum sequer informar o advogado da parte que esta estava prestes a ter sua pessoa jurídica afastada, sendo os sócios quase sempre apanhados de surpresa por bloqueios em seus bens e contas bancárias.

A Lei 13.467/17, conhecida popularmente como “Reforma Trabalhista”, inseriu na Consolidação o artigo 855-A, que determina a instauração do já referido incidente antes de se responsabilizar patrimonialmente os sócios.

Contudo, a resistência dos magistrados trabalhistas à Reforma também não é segre-do algum e, uma vez que poucas execuções originadas após sua entrada em vigor chegaram aos tribunais, ainda não se sabe como estes reagirão. A Seção Especia-lizada em Execução do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (Rio Grande do Sul) tem entendido por não aplicar o artigo 855-A nos processos em andamento. A 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho, promovida pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), divulgou enunciados no mesmo sentido, entendendo que não se aplica o incidente no processo trabalhis-ta.

Apesar da insistência, cabe lembrar que a lei está em vigor e tem observância obrigatória, mesmo porque não se vislumbra inconstitucionalidade a ser alegada no artigo 855-A da CLT. Pelo contrário, trata-se de dispositivo que empresta vigência ao direito à ampla defesa previsto pela Constituição Federal e que, certamente, não impede a satisfação dos direitos dos trabalhadores.

Rafael Montano Rossi

Advogado especializado em Direito e Processo do Trabalho

O Memorando de Entendimento como mitigador de custos de transação na constituição da startup

Startup nada mais é do que um negócio inovador forjado num ambiente de extrema incerteza, com imprevisíveis e indesejáveis desdobramentos se não devidamente men-surados. E por que é assim? Simplesmente, porque no mundo high-tech das startups se verifica um altíssimo nível de incerteza, insegurança, desconhecimento e inexperiência. Consequências do perfil ‘‘adolescente e aventureiro’’ dos formadores deste tipo de empresa, que buscam nesse ecossistema a maior escalabilidade possível. Quanto mais incerteza ou desconhecimento, maiores serão os custos da transação – e isso só se vem a descobrir mais tarde.

O sucesso em que se transformou o Vale do Silício, a ‘‘meca da inovação’’ alavancada por jovens norte-americanos, no entanto, prova que a criação informal de sociedades e projetos empresariais nem sempre leva a litígios, porque aquele mercado conta com instrumentos jurídico-administrativos adequados para mitigá-los. Aliás, na gênese do nascimento de todos os embriões empresariais, reina a informalidade e grande liber-dade de ação – o que dizer, então, da ‘‘efervescência da juventude’’ numa incubadora tecnológica?

Os atos só vão ter consequências econômicas, financeiras e sociais quando a intenção dos empreendedores sair da seara da palavra e passar para a do mundo registral, dos documentos, com a assinatura do contrato entre os sócios. A partir deste ponto, sim, começa o ‘‘jogo de gente grande’’, e o Direito cumpre um papel importantíssimo ao mapear quem assume quê responsabilidades antes e durante a execução do contrato.

No início da relação societária, a expectativa das partes relacionadas é de sempre alcançar a maximização de resultados com a parceria que ora se avizinha. Por conseguinte, em muitos casos, as partes tendem a não estabilizar relações; ou seja, propositadamente, ocultam, omitem e sonegam informações. Caso fossem reveladas, algumas acabariam por diminuir e até eliminar as chances da concretização do projeto societário almejado. Tais omissões podem ser substrato para a incidência do dolo omis-so, delito tipificado no artigo 147 do Código Civil. O dispositivo diz, literalmente: ‘‘Nos negócios jurídicos bilaterais, o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou qualidade que a outra parte haja ignorado constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela o negócio não se teria celebrado’’.

Não é demais lembrar que a jurisprudência e a doutrina reconhecem nitidamente a responsabilidade civil pré-contratual, a qual vem calcada no princípio da boa-fé objetiva e sedimentada no que se costuma denominar de ‘‘dano de confiança’’.

Assim, antes da assinatura do contrato principal, as partes envolvidas podem (e devem!) se valer de um instrumento valiosíssimo para mitigar custos de transação e da assimetria informacional: o Memorando de Entendimentos; tradução livre de Memo-randum of Understanding (MOU). Este pode limitar os objetivos da nova empresa e o espectro de atuação dos agentes envolvidos, definindo as obrigações de cada player para a confecção do contrato principal. Trata-se da tomada e registro da livre manifes-tação das partes sobre o propósito negocial que está sendo implementado, detalhando aspectos que, se omitidos, poderiam influenciar a própria formalização do contrato. Em palavras mais simples, seria uma ‘‘vacina’’ para evitar a invalidação do negócio jurídico mais adiante, por erro, dolo, lesão, estado de necessidade, entre outros.

O próprio instrumento será um dos meios para provar que a manifestação de vontade se deu de forma livre e desimpedida, sem trazer consigo máculas que se prestem a uma posterior invalidação do negócio jurídico, servindo, assim, como ferramenta para a mitigação dos custos de transação. Nessa linha, a forma de confecção deve ser a mais transparente possível, devendo ser arrolado pelas partes relacionadas o maior número de fatos e diretrizes então vivenciados neste período pré-contratual.

O Memorando de Entendimentos também servirá como prévio meio de proteção da inovação buscada (pesquisa & desenvolvimento), prestando-se, subsidiariamente, para o registro de obrigações sobre a confidencialidade dos dados obtidos. Ou seja, o Memorando, como contrato jurídico atípico, poderá ser confeccionado com a amplitu-de e a disposição que as partes assim pretenderem lançar neste instrumento. Dentro do ecossistema das startups, o Memorando de Entendimento, ao lado do Acordo de Confidencialidade, é o documento estruturante mais utilizado para a formação destas empresas.

Rogério Lopes Soares

Advogado especializado em Contratos Comerciais e Mestrando em Direito das Empresas e dos Negócios

ARTIGOS