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  • 7/30/2019 Ensino de Piano Para Adultosaline_maria_tomanik

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

    ALINE MARIA TOMANIK

    UM OLHAR SOBRE O ENSINO DE PIANO PARA ADULTOS

    BELO HORIZONTE

    2011

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    ALINE MARIA TOMANIK

    UM OLHAR SOBRE O ENSINO DE PIANO PARA ADULTOS

    Dissertao apresentada ao curso de Mestrado em

    Msica da Universidade Federal de Minas Geraiscomo requisito parcial obteno de grau deMestre em Msica.

    rea de concentrao: Educao Musical

    Linha de pesquisa: Estudo das Prticas Musicais

    Orientadora: Prof Dr Patrcia Furst Santiago

    BELO HORIZONTE

    2011

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    ALINE MARIA TOMANIK

    UM OLHAR SOBRE O ENSINO DE PIANO PARA ADULTOS

    Dissertao apresentada ao Curso de Mestrado em Msica na Universidade Federal

    de Minas Gerais - UFMG, em ___/___/___, como requisito parcial para a obteno

    do ttulo de Mestre em Msica, aprovada pela Banca Examinadora constituda pelas

    professoras:

    ____________________________________________________Prof Dr. Patrcia Furst Santiago EMUFMG /MG - Orientadora

    ____________________________________________________Prof. Dr. Helosa Feichas EMUFMG/MG

    ____________________________________________________Prof. Dr. Tnia Mara Lopes Canado

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    SUMRIO

    APRESENTAO DA PESQUISA ................................................................... 8

    OBJETIVOS DA PESQUISA ........................................................................... 10

    METODOLOGIA .............................................................................................. 11

    APRESENTAO DOS PARTICIPANTES DA PESQUISA ........................... 14

    Os professores de piano .................................................................................. 14

    Os alunos de piano ......................................................................................... 15

    ESTRUTURA DA DISSERTAO ................................................................. 19

    1. FORMAO PROFISSIONAL, EXPERINCIA DOCENTE E EXPERINCIAMUSICAL ........................................................................................................ 21

    1.1 O perfil do professor de piano no Brasil ..................................................... 21

    1.1.1 Introduo ............................................................................................... 21

    1.1.2 Formao pianstica de professores de piano no Brasil .......................... 22

    1.1.3 Atividades exercidas por professores de piano no Brasil ........................ 24

    Formao e prtica pedaggica ............................................................ 24

    O professor instrumentista ..................................................................... 281.1.4 Caractersticas pessoais e profissionais do professor de piano .............. 29

    2. DESENVOLVIMENTO DE HABILIDADES PIANSTICAS .......................... 33

    2.1 Introduo .................................................................................................. 33

    2.2. Comparando a aquisio de habilidades entre adultos e crianas ............ 37

    2.3 Habilidades msico/instrumentais relevantes ao ensino de piano para

    adultos iniciantes .............................................................................................. 402.3.1 Habilidades motoras e tcnicas ............................................................... 40

    2.3.2 Habilidades aurais: tocar por imitao ou de ouvido, improvisar e criar 43

    2.3.3 Leitura ao piano ....................................................................................... 47

    2.3.4 Repertrio pianstico ............................................................................... 51

    3. PROCESSOS DE ENSINO/APRENDIZAGEM ............................................ 56

    3.1. Consideraes sobre o ensino de adultos................................................. 563.2 Abordagem Tradicional .............................................................................. 60

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    3.3 Abordagem Comportamentalista ................................................................ 61

    3.4 Abordagem humanista ............................................................................... 63

    3.5 Abordagem cognitivista .............................................................................. 65

    3.6 Abordagem sociocultural ............................................................................ 68

    4. MOTIVAO, ATITUDES E RELACIONAMENTO PROFESSOR-ALUNO 71

    4.1 Motivao intrnseca .................................................................................. 73

    4.2 Motivao extrnseca ................................................................................. 75

    4.3 Teorias de motivao e o processo de ensino-aprendizagem ................... 76

    4.3.1 Teoria da autodeterminao .................................................................... 76

    4.3.2 Teoria de Metas de Realizao ............................................................... 80

    4.3.3 Teoria da Expectativa-valor ..................................................................... 82

    4.3.4 Teoria do Fluxo ou do Fluir ................................................................... 84

    4.4 Consideraes sobre o papel do professor na motivao do aluno ........... 87

    CONCLUSES ................................................................................................ 92

    ANEXOS .......................................................................................................... 95

    Anexo 1: Questionrio - Professores ................................................................ 95

    Anexo 2: Questionrio - Alunos ........................................................................ 99

    Anexo 3: Termo de consentimento livre e esclarecido ................................... 103

    Anexo 4: Parecer do Processo (COEP) ......................................................... 105

    Anexo 5: Deciso (COEP) .............................................................................. 106

    REFERNCIAS .............................................................................................. 107

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    RESUMO

    Como professora de piano h mais de 10 anos, tenho observado umaumento significativo na procura pelo estudo do instrumento por pessoas adultas

    que j possuem uma profisso definida ou esto aposentadas e, portanto, no

    pretendem se tornar msicos profissionais. Os professores de piano destes alunos,

    normalmente, consolidaram sua formao pianstica nos cursos de bacharelado em

    piano. Entretanto, tais cursos no oferecem, necessariamente, disciplinas

    pedaggicas direcionadas ao ensino de piano para adultos. A presente pesquisa

    prope uma reflexo sobre temticas relacionadas prtica de ensino de piano para

    adultos.

    Para o desenvolvimento deste estudo foi realizada pesquisa

    bibliogrfica envolvendo assuntos relacionados pedagogia pianstica, formao do

    professor de piano, processos de ensino/aprendizagem e motivao. A partir da

    pesquisa bibliogrfica elaboramos questionrios para professores e alunos de piano.

    Os tpicos destes questionrios geraram os quatro captulos deste trabalho, a saber:

    (1) formao profissional, experincia docente e experincia musical; (2)desenvolvimento de habilidades piansticas; (3) processos de ensino/aprendizagem;

    (4) motivao, atitudes e relacionamento professor-aluno.

    Esta pesquisa contou com a participao de quatro professores de

    piano e seis de seus alunos que aceitaram responder ao questionrio. As respostas

    dos participantes, juntamente com os comentrios dos autores consultados

    oferecem reflexes relevantes prtica de ensino de piano para adultos.

    Palavras-chave: ensino de piano aluno adulto - motivao

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    ABSTRACT

    As a piano teacher for over 10 years, I have observed that adults whoare either professionally established or retired, and therefore do not intend to become

    professional musicians have been demonstrating a rising interest in acquiring

    musical abilities, especially in what concerns the study of instruments. The piano

    teachers who work with such students normally consolidated their pianistic training

    courses in the bachelor's degree in piano. However, such courses do not necessarily

    provide them with pedagogical courses directed to teaching piano to adults. This

    research proposes a reflection on issues related to the practice of teaching piano to

    adults.

    To develop this literature, bibliographic research related to piano

    pedagogy, piano teacher training, teaching/ learning and motivation was made. Using

    the bibliographic research as a starting point, we prepared questionnaires for

    teachers and piano students. The topics of these questionnaires generated the four

    chapters of this work, they being: (1) training, teaching experience and musical

    experience, (2) development of pianistic skills, (3) processes of teaching / learning,

    (4) motivation, attitudes and teacher-student relationship.

    This research was attended by four piano teachers and six of their

    students who agreed to answer the questionnaire. Their answers, together with the

    comments of the consulted authors, promoted reflections relevant to the practice of

    teaching piano to adults.

    Keywords: piano teaching adult student - motivation

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    AGRADECIMENTOS

    querida professora Doutora Patrcia Furst Santiago, pelo carinho, ateno e

    pacincia na orientao deste trabalho.

    Ao meu marido e companheiro, Rafael Choairy, por todo apoio, incentivo,

    compreenso e amor em todos os momentos.

    Aos meus queridos pais, Benedicto Tomanik e Elisabeth Tomanik, exemplos de

    amor, pelo suporte dado durante toda a minha vida.

    Aos meus irmos, Raquel Tomanik e Marcelo Tomanik, pelo constante apoio e

    amizade.

    minha sogra, Pininha, por todo carinho e incentivo.

    professora Tnia Canado, por gentilmente aceitar fazer parte da banca.

    professora Helosa Feichas, por todo incentivo e amizade durante o curso e por

    gentilmente aceitar fazer parte da banca.

    professora Walnia Silva, pela amizade e apoio durante o curso.

    Aos professores, Maurcio Veloso, Carmen Vianna, Dbora Baio e Adalmrio

    Pacheco, pela participao nesta pesquisa com seus comentrios semprepertinentes.

    Aos alunos que gentilmente aceitaram participar desta pesquisa.

    Aos colegas Daniel Lemos Cerqueira e Marcus Medeiros, pelas relevantes

    sugestes na entrevista piloto.

    Aos secretrios o departamento de Ps-Graduao da Escola de Msica da UFMG,

    Alan e Geralda, pelo constante auxlio.

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    A minha sobrinha, Camila Alves, pela reviso do Abstract.

    A minha amiga de jornada, Myrna, pelas muitas conversas.

    Aos meus professores de piano Manuella Rebecca, Mrcia Fajioli, Lucas Bretas,

    Margarida Borghoff e Maurcio Veloso, responsveis pela minha formao pianstica.

    Aos meus alunos, que sempre me incentivam a pesquisar e tentar ser melhor em

    minha profisso.

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    APRESENTAO DA PESQUISA

    O homem no um ser especializado, e [...] portanto no hcomportamento que no seja capaz de adquirir, devidamenteorientado. O ser humano no tem aptides, tem potencialidades!(KAPLAN, 1987, p. 12)

    O piano muito apreciado sonora e fisicamente e, portanto, frequentemente

    procurado por aqueles que desejam aprender a tocar um instrumento musical.

    Embora tradicionalmente seu aprendizado esteja relacionado a crianas e

    adolescentes, visto que geralmente um virtuose inicia seu estudo o mais jovem

    possvel, em minha experincia como professora de piano, h 11 anos, tenho visto

    um cenrio diferente: crescente o nmero de alunos com idade entre 30 e 60 anos

    que buscam no aprendizado do piano uma forma de se envolver com msica.

    Segundo Masson (1999, p. 126 apudCosta, 2004, p. 1), um nmero cada vez maior

    de adultos est deixando a vergonha de lado e dando os primeiros passos em vrios

    instrumentos musicais. Este pblico especfico caracterizado por pessoas que j

    tem uma carreira profissional definida ou que esto aposentadas e, por isso, no

    pretendem se tornar msicos profissionais. Tenho observado que estas pessoas

    sentem grande prazer em sua prtica pianstica e se esforam ao mximo para

    alcanarem suas metas. De acordo com Costa (2004, p. 1):

    [...] o perfil dessa classe de alunos varia entre aqueles que procuramaulas para dar continuidade aos estudos realizados na infncia, osque desejam encontrar um momento de relaxamento em meio s

    preocupaes do dia-a-dia, os aposentados ou donas-de-casa, quequerem preencher o tempo livre com atividades de lazer eentretenimento.

    A partir desta observao, e com o intuito de ampliar o estudo na rea de

    ensino/aprendizagem pianstica para alunos adultos iniciantes bem como melhorar

    minha prpria prtica como professora, surgiu o interesse desta pesquisa.

    Encontramos pesquisas que discutem as questes relacionadas com a prtica

    pedaggica do piano para crianas ou alunos profissionais, entretanto so escassos

    os trabalhos com alunos que iniciam seus estudos de piano na idade adulta.

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    Ao longo dos anos, como professora de piano, pude perceber que alunos

    adultos chegam s aulas geralmente com objetivos definidos. Dentre estes objetivos

    podemos destacar alguns: tocar em igrejas, em um grupo musical (com amigos) ou

    tocar por hobby ou realizao pessoal. Como em todo aprendizado,

    independentemente das metas, os resultados sero diferentes para cada aluno.

    Fatores tais como, o tempo dedicado ao estudo, interesse prprio, grau de

    motivao, identificao com o instrumento e interao com o professor podem

    determinar o nvel de aprendizado que um aluno ir alcanar. Alm disso, a

    expectativa de um aluno com relao ao seu aprendizado pianstico pode ser

    completamente diferente de outro. Tal situao pode vir a ser um desafio para

    muitos professores de piano. Como afirmam Glaser e Fonterrada (2006, p. 92):

    Embora o modelo de ensino mais comum venha sendo questionado,pelo fato de a formao do instrumentista ainda no ter sido amideobjeto de reflexo, no que se refere ao processo deensino/aprendizagem do instrumento, a tendncia do msico-professor repetir o modelo experienciado, o que na maior parte doscasos ainda representa o modelo considerado tradicional pelosprprios msicos.

    Para melhor atender ao pblico adulto que no pretende a profissionalizao,

    aqueles professores de piano que tendem a preparar alunos para a execuo do

    repertrio pianstico de concerto, precisaro utilizar novas abordagens de ensino.

    Talvez seus alunos adultos pretendam apenas tocar, o mais rpido possvel,

    determinadas msicas com as quais estejam familiarizados. Caber ao professor a

    importante e, s vezes, difcil tarefa de iniciar o aluno ao piano, levando em

    considerao suas expectativas e sua vivncia musical prvia. Swanwick (2003,p.66-7) esclarece:

    Cada aluno traz consigo um domnio de compreenso musicalquando chega a nossas instituies educacionais. No osintroduzimos na msica; eles so bem familiarizados com ela,embora no a tenham submetido aos vrios mtodos de anlise quepensamos ser importantes para seu desenvolvimento futuro.

    O aprendizado instrumental um processo que envolve a aquisio decompetncias tcnicas/musicais que viabilizem o desenvolvimento musical. No

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    ensino de piano, o uso funcional do corpo, o conhecimento da geografia do teclado,

    a leitura primeira vista, dentre outras questes, so algumas das habilidades que

    se espera desenvolver em um aluno de nvel elementar a partir das primeiras aulas.

    Sem dvida, qualquer aluno enfrentar dificuldades na aquisio de novos

    conhecimentos tcnico/musicais. Entretanto, a motivao que impulsiona o

    indivduo a vencer tais desafios. Especificamente, no caso do aluno adulto, o

    aspecto motor geralmente a principal dificuldade. No entanto, quando este aluno

    decide por si mesmo estudar piano, torna-se responsvel por sua prtica extraclasse

    e tambm pelo investimento financeiro; tal fato contribui para o aumento de seu

    empenho em alcanar seus objetivos. Concordo com a seguinte afirmao de Costa

    (2004, p. 8):

    A motivao de um adulto estudante de piano o que o faz enfrentaras limitaes relativas motricidade, graas a ela que esse alunopersiste, somado ao fato de que seus objetivos so muito claros epreviamente determinados, no como uma criana que, muitasvezes, nem sabe exatamente porque est tendo aulas de piano.

    OBJETIVOS DA PESQUISA

    A prtica de ensino/aprendizagem para adultos uma realidade significativa e

    vemos um crescente aumento deste pblico nas aulas de piano. Entretanto,

    professores de piano podem no estar plenamente preparados para a diversidade

    de contextos em que iro atuar devido a limitaes em sua formao pedaggica,

    uma vez que cursos de formao pianstica nem sempre oferecem disciplinas

    voltadas para a pedagogia do piano em suas grades curriculares. No sentido de

    contribuir para o ensino de piano para adultos, esta pesquisa tem como objetivo

    geral investigar a prtica de ensino/aprendizagem pianstica para alunos que iniciam

    esta atividade na idade adulta, particularmente aps estabelecerem uma carreira

    profissional ou se aposentarem. A pesquisa prope ainda os seguintes objetivos

    especficos:

    pesquisar processos pedaggicos relacionados ao ensino de piano para

    adultos;

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    pesquisar sobre as habilidades msico/instrumentais essenciais ao ensino de

    piano para adultos;

    pesquisar sobre os aspectos motivacionais presentes na prtica deensino/aprendizagem pianstica para adultos.

    Atravs desta investigao, espera-se responder s seguintes questes: (1)

    Quais so os fatores que motivam o adulto a iniciar e permanecer no estudo do

    piano? (2) Quais so os objetivos que estes alunos pretendem com as aulas de

    piano? (3) Quais as habilidades msico/instrumentais essenciais aos alunosadultos? (4) Quais so as principais dificuldades neste processo, para alunos e

    professores? (5) Quais so os benefcios alcanados com a prtica pianstica para

    alunos e professores? (6) Quais as estratgias de ensino que o professor de piano

    adota em seu trabalho com o adulto?

    METODOLOGIA DA PESQUISA

    Na primeira etapa deste estudo, de natureza qualitativa, realizamos pesquisa

    bibliogrfica de trabalhos referentes rea de formao do professor de piano,

    pedagogia do piano, abordagens do processo de ensino-aprendizagem e motivao,

    pela viso de autores como: Boruchovitch & Bzuneck (2001), Bozzetto (2004), Costa

    (2004), Glaser; Fonterrada (2007), Gonalves (1986), Guimares (2000), Kaplan

    (1987), Mizukami (1986), Montandon (2004), Santiago (2004; 2006), Uszler et al.

    (2000) entre outros. Segundo LaVille e Dionne (1999, p. 112), a reviso bibliogrfica:

    [...] tenta encontrar essencialmente os saberes e as pesquisasrelacionadas com sua questo; deles se serve para alimentar seusconhecimentos, afinar suas perspectivas tericas, precisar e objetivarseu aparelho conceitual. Aproveita para tornar ainda maisconscientes e articuladas suas intenes e, desse modo, vendocomo outros procederam em suas pesquisas, vislumbrar sua prpriamaneira de faz-lo.

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    Com base na reviso de literatura elaboramos questionrios para serem

    respondidos por professores que atuam na pedagogia do piano para adultos, bem

    como por alguns de seus alunos. Aps a aprovao do COEP, para testar a

    qualidade dos questionrios, realizamos um estudo piloto com outros dois

    professores de piano, que gentilmente aceitaram colaborar com esta pesquisa.

    Posteriormente, convidamos quatro professores de piano e seis de seus alunos para

    participarem da pesquisa. Os professores participantes possuem comprovada

    formao acadmica e experincia na rea de ensino do piano. O grupo de alunos

    participantes encontra-se na faixa etria entre 30 (trinta) e 70 (setenta) anos,

    profissionais de outras reas ou aposentados. Todos eles, professores e alunos,

    foram contatados pela pesquisadora por telefone e/ou pessoalmente e osquestionrios foram enviados por e-mail, bem como o termo de consentimento livre

    e esclarecido. Os professores e alunos optaram por responder os questionrios via

    e-mail, exceto uma aluna que no costumava utilizar o computador; neste caso a

    pesquisadora foi at a sua casa e entregou o questionrio pessoalmente, voltando,

    aps alguns dias, para colet-lo.

    Os professores participantes concordaram em serem identificados, visto que

    so profissionais reconhecidos que atuam na rea de ensino de piano em BeloHorizonte. Para facilitar ao leitor a identificao dos professores e alunos

    participantes da pesquisa e para distingui-los dos autores citados, os nomes dos

    professores aparecero em itlico, ao longo da dissertao. Aos alunos, foram

    atribudos pseudnimos para preservar suas identidades; tais pseudnimos

    aparecero sublinhados no texto.

    Optamos pelo questionrio de respostas abertas visto que o mesmo promove

    ao interrogado um espao para expor suas opinies. De acordo com La Ville eDionne (1999, p. 186), neste tipo de questionrio o interrogado:

    [...] tem assim a ocasio para exprimir seu pensamento pessoal,traduzi-lo com suas prprias palavras, conforme seu prprio sistemade referncias. Tal instrumento mostra-se particularmente preciososquando o leque das respostas possveis amplo ou entoimprevisvel, mal conhecido. Permite ao mesmo tempo aopesquisador assegura-se da competncia do interrogado,competncia demonstrada pela qualidade de suas respostas.

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    Os temas abordados nos questionrios foram divididos em 4 tpicos, a saber:

    (1) Formao profissional, experincia docente e experincia musical; (2) Processos

    de ensino/aprendizado; (3) Desenvolvimento de habilidades piansticas e (4)

    Motivao, atitudes e relacionamento professor-aluno. Cada um destes tpicos

    comportou uma srie de questes, elaboradas a partir da reviso bibliogrfica,

    englobando assuntos como: motivao no aprendizado musical e pianstico,

    expectativas em relao s aulas de piano, benefcios e dificuldades no processo de

    aprendizado, relao professor/aluno, entre outros.

    Relacionamos os dados obtidos pela pesquisa aos temas desenvolvidos na

    reviso bibliogrfica, atravs da anlise de contedo, visto que esta pode se aplicar

    a uma grande diversidade de materiais, como permite abordar uma grandediversidade de objetos de investigao: atitudes, valores, representaes,

    mentalidades, ideologias, etc. (LA VILLE E DIONNE, 1999, p. 214).

    A primeira etapa desta anlise foi a definio das categorias analticas. Os

    questionrios elaborados para esta pesquisa foram organizados em tpicos

    selecionados segundo o modelo de definio misto, no qual categorias so

    selecionadas no incio, mas o pesquisador se permite modifica-las em funo do que

    a anlise aportar. (LA VILLE E DIONNE, 1999, p. 219).A segunda etapa consistiu em um recorte dos contedos que foram

    ordenados dentro de categorias. Tais elementos constituem as unidades de anlise.

    (LA VILLE E DIONNE, 1999, p. 216). Nesta pesquisa, agrupamos as repostas dos

    participantes de acordo com os captulos que seriam estruturados a partir das

    seguintes categorias: formao e experincia musical; habilidades

    musico/instrumentais relevantes ao ensino de piano; processos de

    ensino/aprendizagem; motivao, atitudes e relacionamento professor-aluno.A terceira e ltima etapa foi a anlise qualitativa de contedo, segundo a

    estratgia nomeada por La Ville e Dionne (1999, p. 227) como construo iterativa

    de uma explicao, na qual o pesquisador elabora pouco a pouco uma explicao

    lgica do fenmeno ou da situao estudados, examinando as unidades de sentido,

    as inter-relaes entre essas unidades e entre as categorias em que elas se

    encontram reunidas. (LA VILLE E DIONNE, 1999, p. 227).

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    APRESENTAO DOS PARTICIPANTES DA PESQUISA

    Os professores de piano

    Carmen Vianna

    Bacharel em piano, Carmen iniciou seus estudos em msica aos cinco anos

    de idade e, aos doze anos, comeou a dar aulas de piano para principiantes na

    mesma faixa etria, com a superviso de sua av sua primeira professora de

    piano. Para adultos, Carmen leciona piano e teclado desde 1977 e trabalha com

    diversas faixas etrias desde ento. Atualmente professora e correpetidora na

    Escola de Msica da UEMG alm de atuar eventualmente como pianista.

    Dbora Baio

    Bacharel e Mestre em piano pela UFMG, Dbora iniciou seus estudos

    musicais aos sete anos de idade. Iniciou suas atividades como professora aos 19

    anos, no Ncleo Villa-Lobos de Educao Musical, onde atua nos dias de hoje.

    Antes disso, trabalhou como estagiria durante um ano no CMI UFMG. Seutrabalho com alunos adultos iniciou desde quando terminou o curso de graduao.

    Atualmente leciona piano para crianas, adolescentes e adultos (aulas particulares e

    em grupo). Embora sua atuao ocorra mais em sala de aula do que nos palcos,

    Dboratambm atua como pianista.

    Maurcio Veloso

    Maurcio Bacharel em piano pela UFMG. Cursou mestrado e doutorado no

    instrumento pela Indiana University School of Music. Iniciou seus estudos em msica

    aos seis anos de idade com aulas particulares e, antes de ingressar na graduao,

    estudou em conservatrio.

    Professor na Escola de Msica da UFMG, Maurcioleciona piano desde 1987;

    desde o incio tem trabalhado com alunos adultos. Na UFMG atende a alunos do

    Curso de Extenso e do Bacharelado em Piano. A faixa etria predominante de seus

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    alunos adultos est entre 30 e 60 anos. Alm de seu trabalho como professor atua

    regularmente como pianista em concertos e recitais, como recitalista e camerista.

    Adalmrio Pacheco

    Adalmrio iniciou seus estudos em msica aos seis anos de idade com

    professora particular. Aos onze anos, ingressou no Conservatrio Brasileiro de

    Msica e aos treze, no Conservatrio Mineiro de Msica, hoje Escola de Msica da

    UFMG, no CFM. Concluiu Mestrado na mesma instituio, sob a orientao do

    professor Maurcio Veloso.

    Adalmrio iniciou suas atividades como professor de piano em 1986, em

    escola particular de msica, onde lecionava para alunos de todas as idades:

    crianas, jovens e adultos. Nesta mesma poca, era estagirio de percepo

    musical na EMUFMG, na qual ingressou como professor em 1993. Atualmente, a

    faixa etria predominante de seus alunos de 20 a 60 anos. Ele ministra aulas de

    piano individuais e em grupo.

    Alm de suas atividades como professor, Adalmrioatua como correpetidor

    de cantores e instrumentistas, solista em concerto com orquestra ou obras

    sinfnicas e corais e esporadicamente realiza recitais solo.

    Os alunos de piano

    Amanda

    Faixa etria: acima de 50 anos

    Profisso: psicloga aposentada

    Amanda iniciou seus estudos de piano aos 6 anos de idade. Aos 11,

    interrompeu o curso e, alguns anos depois, comeou a ter aulas de violo. Aos 30

    anos, aproximadamente, tentou retomar o estudo de piano por 3 vezes com

    professores diferentes. Devido a vrias circunstncias da vida ela no continuava.

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    Amanda frequenta aulas de piano particulares h 9 anos e, em grupo, h

    quase 2 anos. Alm do prazer de tocar o instrumento, ela busca o desenvolvimento

    pianstico e musical para que possa lecionar teoria e piano para crianas e iniciantes

    e, para isso, se dedica pelo menos duas horas por dia ao estudo do instrumento. A

    preferncia musical, tanto no repertrio que ela ouve quanto nas msicas que gosta

    de tocar, abrange msica clssica, chorinho, valsas e MPB. Amanda costuma ler e

    pesquisar assuntos referentes ao piano alm de frequentar shows e concertos.

    Daniela

    Faixa etria: acima de 50 anos

    Profisso: professora universitria aposentada

    Daniela estuda piano com sua atual professora h mais ou menos trs anos.

    Seu principal objetivo no estudo do instrumento incentivar seus netos atravs da

    prpria prtica pianstica; segundo ela, uma de suas netas, de 8 anos de idade, j

    est tendo aulas de piano por sua influncia. Elatambm busca preencher o tempo

    de aposentada com uma atividade agradvel. Daniela costuma frequentar

    concertos e ouvir msicas em casa, de estilos variados. Quanto ao repertrio, gosta

    de tocar msicas clssicas e populares desde que estas tenham um ritmo mais

    lento e que a dificuldade seja compatvel com [seu] atual estgio.

    Daniela estudou piano anteriormente, mas interrompeu o curso por motivos

    como: casamento, filhos, mudana de cidade, trabalho e estudo, no

    necessariamente nesta ordem. Ela afirma que tocava piano informalmente, mas no

    considera que esta prtica tenha influenciado sua formao musical.

    Carlos

    Faixa etria:30-40 anos

    Profisso:cirurgio-dentista

    Carlos estuda piano com sua atual professora h dois anos e oito meses.

    Para este aluno, o estudo do instrumento um hobby, contudo, tem o hbito de ler epesquisar sobre assuntos relacionados ao piano. Ele costuma frequentar shows e

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    concertos alm de ouvir msicas de diferentes estilos em sua casa. Quanto ao

    repertrio, prefere tocar msica erudita e trilha sonora de filmes.

    Carlos estudou piano e guitarra anteriormente, mas, interrompeu o cursoporque no se identificava com o repertrio estudado na poca; alm disso, seus

    pais e professora insistiam para que ele tocasse em festas e reunies sociais, o que

    ele detestava.

    Mrcio

    Faixa etria:40-50 anosProfisso:administrador

    Mrcio estuda piano com seu atual professor h seis meses. Ele pretende,

    com o estudo do instrumento, ler partitura e tocar piano plenamente e entender

    profundamente de teoria de forma a poder escrever o que [ele] mesmo harmonizou

    alm de acompanhar o coral do qual faz parte. Mrcio tem grande interesse sobre

    assuntos relacionados ao piano, frequenta concertos e shows de rock e ouve

    msicas em casa, de estilos variados. Segundo ele, [seu] tocador de MP3 umasalada s!

    Mrcio estudou piano e violo quando mais jovem, porm no via rendimento

    em suas aulas e, consequentemente, ficava desanimado. Ele relata algumas

    experincias musicais realizadas anos antes que, segundo ele, contriburam muito

    para sua formao musical:

    Mrcio: Aos doze anos aprendi a tocar violo por cifra. No entendiao porqu das cifras, mas tocava bem. At compus msica e tocavaem banda. Aos vinte anos tentei aprender piano por msica pelaprimeira vez. Decorei algumas performances ao piano, soava bonito,mas eu no conseguia aprender a ler partitura.

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    Marina

    Faixa etria:acima de 50 anos

    Profisso:aposentada

    Marina aluna de seu atual professor h cinco anos. Ela afirma sua

    preferncia pela msica erudita, seja no repertrio que gosta de tocar ou nas

    msicas que ouve em casa; alm disso, costuma frequentar concertos e ler textos

    relacionados ao piano. Seu objetivo com o estudo do instrumento aproveitar o

    mximo da vontade de aprender a tocar piano para satisfazer um sonho, pois para

    [ela] uma alegria saber tocar mesmo que seja um pouco, pois [se encanta] com o

    piano.

    Em 1963, Marina estudou piano por dois anos e violo por um tempo, de

    ouvido. Parou com o estudo do piano porque a famlia se desfez do instrumento.

    Ela afirma que estudava piano por achar bonito e ter muita vontade de aprender e

    no caso do violo, ela participava de um grupo de dana portuguesa. Segundo

    Marina, estas experincias contriburam muito [para sua formao musical], pois

    ficou a grande motivao de querer um dia poder estudar para tocar bem um

    instrumento, principalmente o piano. E s [pde] faz-lo depois que [se aposentou].

    Cludia

    Faixa etria: acima de 50 anos

    Profisso: Professora universitria aposentada

    Cludia sempre gostou do piano e, ainda criana, mostrou grande interesse

    em aprender o instrumento, mas no teve oportunidade. Quando se aposentou, em

    2005, resolveu iniciar o estudo pianstico. Comeou com aulas de teclado eletrnico

    por dois anos e depois passou para o piano. Devido a problemas familiares ela

    interrompeu o curso por alguns momentos. Ela aluna de sua professora atual

    desde agosto de 2010. Cludia frequenta concertos e recitais; aprecia msica

    clssica, folclrica e MPB tanto para ouvir quanto no repertrio que gosta de tocar;

    alm de pesquisar e ler sobre a vida dos compositores. Seu objetivo com o estudo

    do piano manter a mente ativa, aprender coisas novas alm de gostar muito doinstrumento.

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    Cludia considera sua formao musical muito pequena. Ela afirma que no

    teve outras atividades musicais nem tocou informalmente antes de iniciar o estudo,

    quando se aposentou. Entretanto, sempre foi apreciadora de msica tendo

    assistido muitos concertos de instrumentistas e orquestras.

    ESTRUTURA DA DISSERTAO

    Os quatro tpicos dos questionrios supracitados serviram de suporte para os

    temas dos quatro captulos que compem este estudo, nos quais os comentrios

    dos autores consultados se mesclaram s respostas dos participantes da pesquisa,

    promovendo um dilogo entre eles.

    O primeiro captulo Formao profissional, experincia docente e

    experincia musical - trata da formao musical e experincia docente dos

    professores de piano no Brasil.

    O segundo captulo Desenvolvimento de habilidades piansticas - trata do

    desenvolvimento das habilidades e competncias musicais e piansticas

    consideradas essenciais ao ensino de piano, segundo a opinio de autores comoGONALVES (1989),MONTANDON (2004), SANTIAGO (2006), entre outros, bem

    como dos professores e alunos participantes. De acordo com a reviso de literatura

    e com as respostas dos questionrios, selecionamos algumas habilidades que sero

    discutidas no contexto de ensino de piano para adultos.

    O terceiro captulo Processos de ensino/aprendizagem - apresenta um

    breve resumo das principais abordagens do processo de ensino-aprendizagem, pela

    viso de autores como MIZUKAMI (1986), FERRACIOLO (1999) GLASER eFONTERRADA (2006), entre outros. Alm disso, as respostas dos entrevistados

    apontam caractersticas de metodologias utilizadas em aulas de piano para adultos

    iniciantes.

    O quarto e ltimo captulo Motivao, atitudes e relacionamento professor-

    aluno - abrange algumas teorias modernas da motivao. Por meio das respostas

    dos questionrios dos participantes, tais teorias foram relacionadas com o processo

    de ensino-aprendizado pianstico para adultos. As opinies dos participantes

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    apontam ainda consideraes a respeito de atitudes e relacionamento professor-

    aluno.

    Desta forma, esperamos favorecer a ampliao e o desenvolvimento de

    metodologias de ensino de piano para adultos, tambm promovendo a reflexo

    daqueles que atuam nesta instncia da pedagogia do piano.

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    CAPTULO 1 - FORMAO PROFISSIONAL, EXPERINCIA DOCENTE E

    EXPERINCIA MUSICAL

    1.1 O perfil do professor de piano no Brasil

    1.1.1 Introduo

    Assim, se existe hoje entre ns uma fecunda e j tradicional culturapianstica, tal fato se deve quelas prendadas sinhs e melenudossinhs de outrora, que desde os albores do sculo XIX exercitaram opiano, transmitindo o seu gosto de gerao em gerao; comoigualmente se deve aos professores [...] (REZENDE, 1970, p. 11)

    O professor de piano surgiu no Brasil a partir da popularizao deste

    instrumento no pas. Segundo Rezende (1970, p. 14) no incio do sculo XIX, com a

    chegada de D. Joo VI, iniciou-se no Brasil um verdadeiro ciclo do piano.

    Acompanhado de sua famlia e Corte, D. Joo VI produziu profundas modificaes

    no modus vivendi dos brasileiros, com repercusses favorveis sobre o ambiente

    musical. (citaes completas p. 14). Tratados firmados com a Inglaterra e a abertura

    dos portos determinaram a entrada dos primeiros pianos no pas.

    Naquela poca o piano era para poucos. Entretanto, como destaca Leite (In:

    FUCCI AMATO,2007), a partir da segunda metade do sculo XIX, com a chegada

    ao Brasil de imigrantes europeus, formou-se uma nova elite que transferiu seus

    padres, hbitos e culturas ao pas; dentre estes, a valorizao do estudo e da

    prtica pianstica. No incio do o sculo XX, com o aumento do poder aquisitivo das

    famlias imigrantes estabelecidas no Brasil o piano passou a ocupar espao em

    casas de classe mdia e um novo comrcio surgiu no pas: as lojas especializadasem vendas de partituras e mtodos. Concomitantemente surgiram novos

    profissionais: os afinadores de piano e os professores particulares (geralmente

    imigrantes) e, para completar este cenrio, as escolas especializadas no ensino

    musical com nfase especial dada educao pianstica: os conservatrios.

    Os conservatrios musicais eram escolas tradicionais de influnciaeuropeia e revelavam como objetivo, durante toda a sua existncia, aqualidade performtica de seus alunos, privilegiando uma tcnicarequintada para a interpretao do repertrio de grandes mestres damsica erudita. (FUCCI AMATO, 2001, p. 89)

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    1.1.2 Formao pianstica de professores de piano no Brasil

    A formao piansica do professor de piano acontece, geralmente, atravs de

    aulas particulares, conservatrios, escolas e universidades de msica; desta forma,

    desde seu surgimento no Brasil este profissional vem atuando nestas instituies

    e/ou em sua prpria casa. Os professores participantes desta pesquisa possuem

    formao pianstica nas principais universidades de Belo Horizonte e atuam na

    profisso h considervel tempo. Todos possuem mestrado e, um deles, doutorado.

    Entretanto, ao serem questionados sobre instituies de ensino e professoressignificativos, eles no deixaram de mencionar seus primeiros anos de estudo e/ou

    seus primeiros educadores.

    Carmen: Desde os dois anos de idade, conscientemente, ouvindomeu av estudando/tocando msica erudita e popular e minha avlecionando piano e acordeom. A partir dos cinco anos comecei a teraulas de msica/piano com minha av at fazer o vestibular em1977.

    Maurcio:Estudei inicialmente - dos 6 aos 12 anos - com professoraparticular, no interior do estado; posteriormente, j com 18 anos,ingressei em Conservatrio, ainda no interior do estado; mais tarde,aos 20 anos, ingressei na Escola de Msica da UFMG para cursarBacharelado em Msica/Piano.

    Dbora indica figuras relevantes em sua formao pianstica, ao longo do

    tempo: nos primeiros anos de estudo, Snia LAbbate e Maria Clara Paes Leme. No

    curso de graduao, na Escola de Msica da UFMG, seus professores foram

    Eduardo Hazan, Berenice Menegale e Magdala Costa. No mestrado, na mesmainstituio, ela estudou com Lucas Bretas e Guida Borghoff. Dboraainda destaca

    aulas particulares com Daisy de Luca (SP) e com Maria Lcia Coutinho e Celina

    Szrvinsk (BH), bem como aulas particulares, cursos e master classes com Luiz

    Senise, Jayme Guimares e Snia Vieira.

    Adalmrioexpe uma experincia negativa com sua primeira professora de

    piano.

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    Adalmrio:Iniciei meus estudos aos seis anos, com uma professorano interior, Ipanema, MG, daquelas que no tocam nada e batem namo dos alunos, que deixam os alunos tocando e vo fazer outrascoisas.

    Entretanto, ele cita, alm de professores e instituies, outros lugares em que

    teve oportunidade de trabalhar e adquirir experincia, bem como profissionais da

    rea musical que foram significativos em sua formao, como descrito abaixo.

    Adalmrio: Aos onze ingressei no Conservatrio Brasileiro deMsica, com uma professora muito boa, Irm Ceclia, era um colgiointerno, eu morava em outra cidade e ia para l nos fins de semana

    fazer aulas de piano e percepo musical. Aos treze ingressei noConservatrio Mineiro de Msica, hoje Escola de Msica da UFMG,no CFM; estudei piano com Lucas Bretas, Magdala Costa, LgiaBecker, percepo com Mauro Macedo e Maria Lgia Carvalho SouzaLima, todos muito importantes para a minha formao e gosto einteresse pela msica e pelo instrumento. Aos dezessete entrei paraa Graduao na Escola de Msica da UFMG, com a professoraMaria Lcia Coutinho Collen, a quem devo a maior parte de minhaformao tcnica no instrumento.

    possvel observar, nas respostas de Adalmrio, prticas externas aocontexto acadmico que refletiram positivamente em sua formao musical e

    pianstica. Ele conta que, aos dezesseis anos, entrou para uma banda de bailes e

    que o contato com estes msicos experientes contribuiu para seu amadurecimento

    musical. Alm disso, ele relata:

    Adalmrio:[...] eu sempre ia a festivais, fazia muitos contatos, nunca

    fui adepto de uma s escola de piano, nunca me considerei discpulode ningum. J no final de minha graduao comecei acompanhandoos alunos de canto do professor Amim Feres e entrei para o CoralMadrigal de Ouro Preto no qual fiquei por 10 anos, e acredito ter sidoa minha solidificao em formao musical, tive contato de perto comregentes e obras importantes, como por exemplo, o MaestroMagnani,o Maestro Davi Machado, o prprio Amim e outros que iamaos festivais em Ouro Preto, onde eu ficava at por dois meses diretoacompanhando cantores e correpetindo o coro, alm de integrar ocoral como cantor.

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    Finalmente, Adalmrio nos conta sobre sua continuidade de estudos no

    contexto acadmico:

    Adalmrio: Formei aos 23, mas tive aulas com vrios professores [...]estudei algum tempo com professores particulares, como LusSenise, a prpria Maria Lcia e outros. Aos 43 conclu o Mestradosob a Orientao do Prof. Maurcio Veloso, a quem tenho grandeapreo e reconhecimento pelas coisas que aprendi com ele.

    Analisando as respostas dos professores participantes possvel constatar

    que todos iniciaram seus estudos com professores particulares de piano. Em seu

    estudo, sobre professores particulares de piano atuantes na cidade de Porto Alegre,

    Bozzetto (2004) entrevistou treze profissionais com idades entre 62 a 79 anos eafirma a importncia dos mesmos em nosso pas. A autora afirma (2004, p. 11):

    No Brasil, o professor particular de piano responsvel por umaparcela do ensino de msica que no se encontra nas instituiesescolares. Atuam em casa ou a domiclio h considervel tempo,educando crianas, jovens e adultos, preparando msicos e/oufuturos profissionais na rea.

    A entrevista realizada por Bozzetto aponta que a maioria dos entrevistados

    considera essencial ter titulao, diploma ou um curso especfico na rea para

    exercer a profisso de professor de piano. Contudo, ressaltam a importncia da

    qualidade dessa formao para impedir a desqualificao profissional. (BOZZETTO,

    2004, p. 82-83)

    1.1.3 Atividades exercidas por professores de piano no Brasil

    Formao e prtica pedaggica

    Se por um lado, a formao pianstica adquirida ao longo dos anos

    aperfeioada nos conservatrios e universidades, a formao pedaggica nem

    sempre est presente nestas instituies, especialmente se tratando dos cursos de

    bacharelado. Muitos autores que tm se dedicado a investigar o perfil do professorde piano no Brasil observaram que, de fato, existe uma lacuna na formao

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    pedaggica destes profissionais e a tendncia do msico-instrumentista ensinar de

    maneira semelhante ao que vivenciou quando aluno (SANTIAGO, 2004; GEMESIO,

    2010; SCARAMBONE, 2008; OLIVEIRA, 2007; CANDA, 2006; BOZZETTO, 2004;

    GLASER & FONTERRADA, 2004; ARAJO, 2005;). Contudo, a experincia de cada

    professor vai sendo construda ao longo de suas carreiras como pianistas e

    professores, por meio de suas prprias prticas em diferentes situaes; em outras

    palavras, o instrumentista-professor constri e reconstri seus conhecimentos

    conforme a necessidade de utilizao dos mesmos, seus percursos formativos,

    profissionais e de suas experincias. (CANDA, 2006, p. 4). Como destaca

    Gemesio (2010, p. 121):

    Os saberes que so significados e validados nas situaes detrabalho vivenciadas pelos professores so, principalmente, ossaberes da sua experincia como aluno, mas tambm estofundamentados em uma experincia que vai sendo construda aospoucos, formada por diferentes saberes que emergem da prpriaprtica, saberes intuitivos e tcitos, muitas vezes no refletidos eincorporados ao seu repertrio pessoal de conhecimento.

    Esta realidade tambm observada por Bozzetto (2004, p. 103):

    Alm das instituies oficiais de formao profissional, osprofessores se formam em outros espaos, como no da experinciaque advm da prtica pedaggica, da sua ao como docente, doseu relacionamento com os alunos, do contexto no qual est inseridoe onde ele se constri.

    Os professores participantes desta pesquisa afirmaram que no havia no

    currculo do curso de graduao, disciplinas a respeito de pedagogia do piano.Adalmrioafirma sentir falta, em sua formao, de bases tericas sobre didtica do

    instrumento:

    Adalmrio: Sinto um pouco de falta de formao em mtodos. svezes sou cobrado pelos colegas da UFMG dizendo que tenho quedar aulas de didtica do instrumento, e no me sinto combases tericas para isto. Acho que falta, na formao do graduando,

    muito de teoria em educao musical e didtica, uma vez que ele vaiatuar profissionalmente, em quase cem por cento das vezes, comoprofessor.

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    Apesar da ausncia de disciplinas didticas na graduao, os professores

    participantes consideram satisfatria a formao pedaggica que adquiriram.

    Novamente os primeiros professores foram citados como referncias pedaggicas

    bem como outros educadores com os quais os entrevistados j tiveram aulas. Alm

    disso, geralmente a prtica docente ocorre antes da formao acadmica

    universitria por meio de troca de experincias e observaes de aulas dos colegas

    atuantes na rea. Dbora e Maurcio indicam a experincia prtica como fonte

    primria de sua formao pedaggica:

    Dbora:Minha formao pedaggica se deu ao acaso. Aos 19 anos,fui procurada para dar aulas de piano a duas crianas e foi a prpriaPatrcia Furst quem me encaminhou ao Ncleo Villa-Lobos [deEducao Musical de Belo Horizonte]. [...] Foi assim que tudocomeou para mim! Na faculdade, no tive orientao para isso. Foino Ncleo, atuando na sala de aula, pondo a mo na massa, que,de fato, aprendi a gostar de ser professora. Assistia a muitas aulas,observava meus colegas mais experientes com ateno e contei coma orientao e a pacincia da Betnia Parizzi e da Rosa Lcia dosMares Guia.

    Maurcio: Minha formao pedaggica deu-se a partir de minhaformao pianstica, de maneira muito prtica. Pude atuar comomonitor de Percepo Musical na Escola de Msica da UFMG ecomo professor de Piano e Percepo Musical em escola particularde msica.

    Para Adalmrio, os ensinamentos que recebeu de Violeta Gainza foram

    determinantes em sua formao pedaggica; tais ensinamentos foram relatados

    pelo professor e sero descritos no prximo captulo. Alm disso, Adalmrio nosconta sobre sua formao prtica:

    Adalmrio:[...] comecei a dar aulas de piano numa escola particularde msica, chamada Escola de Artes, que funcionava na Rua Tupis,80, no fundo da Igreja Metodista, o Maestro Mrcia Miranda Pontesfoi o idealizador desta escola. Outros professores do nosso meioderam aula l, o Prof. Maurcio Veloso, a Professora Marisa Simese outros.

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    Adalmrio tambm explica que, naquela poca, ele trabalhava como

    estagirio na graduao, com turmas de percepo musical, orientado pela

    professora Lgia Souza Lima e com a orientao pedaggica de sua professora de

    piano, Maria Lcia Coutinho.

    Carmen indica a observao informal e a prtica formal como importantes

    bases de sua formao pedaggica:

    Carmen:Primeiramente foi observando minha av lecionando piano,acordeom e teoria musical para crianas, jovens e adultos. Maistarde, aos dezenove anos (1978), tive a oportunidade de iniciar umtrabalho como professora de rgo eletrnico, sob a superviso deuma equipe de msicos e maestros da Yamaha Music Foundation[...] Primeiramente minha av com sua psicologia de normalista e osmtodos e metodologia que adotava para a iniciao musical aopiano. Em seguida a Yamaha Music Foundation com suascontribuies quanto s capacitaes pedaggicas e metodologiaspara o ensino de instrumentos em grupo, alm dos investimentos emseminrios e master classes sempre com msicos e professoresexperientes.

    Ela ainda observa a ausncia de disciplinas de formao pedaggica em seu

    contexto acadmico de estudo pianstico:

    Carmen:Quando cursei o Bacharelado em Piano (antiga FUMA, hojeEscola de Msica da UEMG) no havia no currculo nenhumadisciplina voltada para a rea pedaggica. No entanto, desde muitojovem - talvez por influncia da minha av sempre me habituei aprocurar um olhar didtico pedaggico nas condutas de todos osmeus professores, seja na rea musical ou no. Observava o quemais funcionava em sala de aula, e principalmente o que no deviaser seguido. Estava sempre atenta forma como os contedos eramapresentados, percebia como era a receptividade de cada colega e

    ciente das dificuldades ou facilidades procurava delinear um outrocaminho, uma nova alternativa.

    Todos os professores desta pesquisa demonstram sua longa prtica

    pedaggica precoce, o que refora a ideia de que, pondo a mo na massa, como

    diria Dbora, professores de piano efetivam sua formao pedaggica. Carmen

    iniciou sua prtica como professora de piano em 1977; Maurcio, em 1987; Dbora,

    aos 19 anos e Adalmrio, em 1986.

    Alm disso, os professores trabalham com diferentes faixas etrias e emdiversos contextos, seja ministrando aulas particulares em casa, em escolas

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    particulares de msica ou universidades; tanto para alunos que busquem a

    profissionalizao quanto para aqueles que estudam por hobby, o que requer grande

    flexibilidade por parte destes profissionais. Na maioria das vezes, esta realidade no

    a mesma que vivenciaram na poca em que eram alunos. Como afirma

    Scarambone (2008, p. 4):

    A atuao do professor de piano tem sido ampliada de forma quelidar com a diversidade de espaos, diversidade de interesses eperfis dos alunos se torna um desafio por apresentar situaes noprevistas ou experimentadas. Antigamente, o professor de pianopodia ser identificado com o professor particular, que dava aulasindividuais, ou professores de conservatrio, ou mais raramente

    professores do ensino superior. O foco do ensino era em transmitirconhecimentos e tcnicas necessrios para formar o alunoconcertista, desenvolvendo um ensino considerado excludente paraaqueles que no se adequassem s exigncias desse modelo.

    O professor instrumentista

    Os questionrios apontaram um fator em comum em relao s atividades

    que os professores realizam: todos eles atuam, mesmo que eventualmente, na reada performance, como pianistas correpetidores e/ou solistas, como possvel

    observar nas seguintes respostas de Carmen, Maurcioe Adalmrio questo sobre

    o tema.

    Carmen: Correpetidora dos alunos de canto, cordas e sopros doCurso Bsico Fundamental que participam do projeto Bsico Atuante,por mim coordenado h cinco anos na Escola de Msica da UEMG.Apresentaes eventuais como pianista em recepes, repertriosemi-clssico e popular nacional e internacional.

    Maurcio:Apresento-me regularmente em concertos e recitais, comorecitalista e camerista.

    Adalmrio: Atuo como correpetidor de cantores e instrumentistas,circunstancialmente como solista em concerto com orquestra ouobras sinfnico corais, recitais solo espordicos. Minha atuaocomo concertista muito pequena no meio musical, pela simplesfalta de pacincia de sentar no banco do instrumento e estudar,muito ou ao menos satisfatoriamente, como fazem os pianistas que

    esto atuando.

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    Dbora, por outro lado, enfatiza o aspecto pedaggico da sua atuao:

    Dbora: Minha atuao ocorre mais em sala de aula do que nospalcos. Em outubro de 2010, toquei as Cenas Infantis (Robert

    Schumann), a 4 mos, com a pianista Fernanda Zanon no teatro daFundao de Educao Artstica. Foi uma tima experincia!

    A realidade do profissional instrumentista-professor observada no apenas

    entre os professores de piano; Glaser (2006) atenta para o fato de no existir uma

    separao clara entre professor de msica e instrumentista:

    O fato de os instrumentistas lecionarem com regularidade reflete nos a procura deles por alunos interessados em estudar instrumento,mas tambm espelha no existir uma separao acentuada entre aatuao como instrumentista e como professor de instrumento navida do msico profissional. Isso quer dizer que, embora tocar elecionar sejam atividades completamente diferentes, podem ser (eso) exercidas pelo mesmo profissional, o que uma peculiaridadeda rea musical e permite afirmar que todo instrumentista potencialmente um professor de seu instrumento. (GLASER, 2006, p.92)

    1.1.4 Caractersticas pessoais e profissionais do professor de piano

    Segundo Carmen, aprender a ensinar um constante exerccio. Face s

    diversas realidades e diferentes perfis de alunos que frequentam aulas atualmente,

    necessrio que o professor de piano desenvolva caractersticas pessoais eprofissionais que iro auxiliar sua prtica docente. Na pesquisa de Bozzetto (2004,

    p. 82) os professores participantes apontaram algumas caractersticas como

    fundamentais ao professor particular de piano, tais como: amplo conhecimento geral;

    boa formao musical; domnio e conhecimento de seu instrumento; experincias e

    conhecimentos de gneros como peras, msica de cmara e msica sinfnica alm

    de conhecimento de harmonia, contraponto, anlise e teoria musical. No que diz

    respeito s caractersticas pessoais, a pacincia foi destacada em muitos

    depoimentos, alm da responsabilidade e uma postura tica e social. Ter um bom

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    relacionamento com seus alunos e gostar do que faz tambm fundamental

    (BOZZETTO, 2004 p. 83-84).

    Nesta pesquisa, os professores foram questionados a respeito dascaractersticas pessoais e profissionais indispensveis ao professor de piano.

    Qualidades como flexibilidade e conhecimento musical foram apontadas. As

    respostas de Maurcioe Dboracoincidem:

    Maurcio: Flexibilidade, bom senso, conhecimento musical epianstico, prtica pianstica (atividade como performer),conhecimento do repertrio e da literatura relacionada.

    Dbora:Boa formao pianstica, vivncia do repertrio musical (noapenas direcionado ao piano), hbito de leitura, presena nos recitaise concertos de msica, conhecimento sobre as culturas geral ebrasileira, pacincia, flexibilidade para lidar com diferentes tipos dealunos (gostos e bagagens musicais especficos).

    Para Carmen, caractersticas pessoais como sinceridade e honestidade so

    imprescindveis para que outras caractersticas profissionais possam brotar egerminar:

    Carmen: Apresentar um ser ideal requer muita audcia eresponsabilidade. Mas acredito que sinceridade, honestidade comseus propsitos e dos outros, ateno, compreenso, considerao erespeito so caractersticas pessoais imprescindveis a qualquer bomrelacionamento interpessoal. A partir delas, as outras caractersticasprofissionais iro brotar e germinar. O importante que a terra sejaadequada ao cultivo.

    Adalmriofala sobre diversificao, sensibilidade e formao musical geral:

    Adalmrio: Acho que a diversificao. Como j disse anteriormente, oprofessor deve ser o integrador do aluno. [...] Acho que o professordeve adquirir sensibilidade para ver qual a motivao potencial doaluno em relao sua escolha do instrumento, desde as primeirasaulas. [...] Outra caracterstica que tambm acho fundamental aformao geral do professor em reas ditas tericas comocontraponto, estruturao, apreciao musical e teoria geral damsica e outras. Isto com certeza ajudar ao professor a edificar oseu aluno de forma horizontal.

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    Estas respostas correspondem s caractersticas que os alunos participantes

    da pesquisa esperam de um bom professor de piano. Daniela afirma que ele deve

    ser um bom pianista e ter sensibilidade e pacincia para ensinar. Para Marina, o

    professor precisa ser educado, acolhedor, tranquilo, paciente e com disponibilidade.

    Para Amanda, ele precisa ter conhecimento na rea e didtica; ser paciente,

    animado, dedicado e gostar de gente. Cludia, Carlos e Mrcio afirmam:

    Cludia: Competncia, profissionalismo, gostar de ensinar, incentivaros alunos. Saber reconhecer os objetivos e as limitaes de cadaaluno.

    Carlos: Em minha opinio um professor deve ter um conhecimentoterico e prtico bastante slido daquilo que se prope a ensinar.Deve ter a capacidade de perceber as habilidades e limitaes deseus alunos elaborando, na medida do possvel, um plano detrabalho individualizado para cada um deles. Quanto scaractersticas pessoais deve gostar de ensinar ser organizado e termuita pacincia.

    Mrcio: Primeiro ter o talento de perceber qual a maior necessidadedo aluno, qual a sua maior dificuldade, seu ponto mais fraco. E entoconhecer e trazer para a sala de aula material de primeira categoria

    para trabalhar aquele assunto com o aluno. Tambm entendo comoprimordial a capacidade de ensinar de forma formal, mas, amigvel eeducada. Por ltimo desejvel que ele toque muito bem.

    Nesse sentido, concordamos com a afirmao de Scarambone (2007, p. 151):

    De outra forma, hoje o professor de piano e de outros instrumentospossui um campo variado de atuao e um pblico diversificado.

    Assim, o professor de instrumento deve considerar o amplo perfil dosalunos (crianas, adultos) e seus interesses na aprendizagem doinstrumento (instrumento como acompanhante, aprendizagem porlazer, acompanhamentos em igrejas, formao de concertistas). Arealidade do trabalho do instrumentista demanda uma flexibilidade deatuao.

    A formao pianstica do professor consolidada no estudo acadmico; por

    outro lado, a maioria dos cursos de bacharelado em piano no oferecem disciplinas

    pedaggicas no currculo. Desta forma, o instrumentista-professor desenvolve suasprprias prticas pedaggicas por meio de sua experincia profissional, o que

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    muitas vezes pode funcionar, mas reflete a lacuna ainda existente na formao geral

    do pianista que, como diria Adalmrio, vai atuar profissionalmente, em quase cem

    por cento das vezes, como professor.O professor de piano precisa estar preparado

    para lidar com a realidade do ensino de piano nos dias atuais, que aponta diferentes

    contextos de aprendizagem, bem como a diversificada clientela que procura

    aprender o instrumento. Conhecimento musical, prtica pianstica e flexibilidade so

    algumas das caractersticas essenciais ao trabalho docente, conforme indicado

    pelos professores e alunos participantes desta pesquisa. Acreditamos que tais

    caractersticas podem ser desenvolvidas e aprimoradas na carreira pedaggica do

    professor de piano, pois, segundo Carmen, aprender a ensinar um constante

    exerccio.

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    CAPITULO 2 - DESENVOLVIMENTO DE HABILIDADES PIANSTICAS

    2.1 Introduo

    O aprendizado instrumental um processo complexo e exige do aluno a

    aquisio de competncias e habilidades tcnico/musicais indispensveis para o

    bom desempenho do instrumento escolhido. Em tal processo, vrios fatores esto

    envolvidos, desde o aspecto motor compreenso esttica de uma obra musical.

    Entretanto, de acordo com sua experincia e conhecimento musical e considerando

    o perfil, idade e objetivos de seus alunos, o professor os orienta na aquisio de

    habilidades consideradas como essenciais para a prtica pianstica. Segundo

    Kaplan (1987, p. 66):

    A tcnica de execuo de um instrumento musical notadamente ado piano se constitui em um dos atos mais complexos, do ponto devista da coordenao psicomotora, realizados pelo ser humano. Noseu aspecto mais amplo, pressupe o conhecimento e acompreenso do valor simblico de sinais (notas, valores, etc.) e suarealizao atravs de uma srie de movimentos sucessivos degrande preciso que exigem uma ordem no tempo e uma orientaoe estruturao no espao.

    Devido a sua complexidade, o processo de aprendizagem pianstica se d

    atravs de diversas estratgias que promovam o desenvolvimento de tais

    competncias e habilidades, alm disso, espera-se que o ensino instrumental seja

    efetivamente musical. Swanwick (1994, p. 7) afirma que:

    A ao complexa de se tocar um instrumento no pode ser abordadaseguindo-se um nico mtodo ou apenas utilizando-sesistematicamente um mesmo livro, pgina aps pgina. Aaprendizagem musical acontece atravs de um engajamentomultifacetado: solfejando, praticando, escutando os outros,apresentando-se, integrando ensaios e apresentaes em pblicocom um programa que tambm integre a improvisao. Precisamostambm encontrar espao para o engajamento intuitivo pessoal doaluno, um lugar onde todo o conhecimento comece e termine.

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    Concordamos com a afirmativa de Reis (2000, p. 25): durante os primeiros

    estgios do aprendizado instrumental de uma criana que ocorre a introduo de

    princpios que guiaro sua conduta musical futura. Embora uma boa orientao no

    seja garantia de aprendizado efetivo, o professor precisa ter em mente a

    responsabilidade na formao musical de alunos iniciantes visto que uma

    orientao deficiente pode comprometer ou adiar, na melhor das hipteses, uma

    realizao instrumental satisfatria, (REIS, 2000, p. 25). Reis (2000, p.27) afirma

    ainda que, para que possa manifestar-se expressivamente atravs de sua

    performance, o aluno de nvel elementar precisa desenvolver determinadas

    competncias musicais e piansticas, tais como:

    senso rtmico;

    noes de fraseado, toque e articulao;

    definio de planos sonoros;

    percepo da organizao estrutural;

    uso simples do pedal;

    percepo da dimenso esttica da msica.

    Gonalves (1989), na srie Educao Musical atravs do Teclado,prope um

    curso bsico para o ensino integrado de msica e instrumento. Diferente da proposta

    tradicional cujo ncleo do processo ensino/aprendizagem a formao do solista

    por meio da prtica de tcnica e repertrio, a metodologia adotada nesta srie visa o

    desenvolvimento da musicalidade do aluno atravs da prtica de outras habilidades

    funcionais como acompanhamento e criao, visando a formao do instrumentista

    que ir tocar solo ou em conjunto e em diferentes situaes.

    Quando o ncleo deste processo passa a ser ocupado pela prticade HABILIDADES FUNCIONAIS NO USO DO TECLADO, nota-seque a formao do aluno torna-se mais abrangente, adequando-ses exigncias profissionais dos dias que vivemos, sem ignorar anecessidade da prtica de msica para o lazer que tambmcaracteriza nossa poca. (GONALVES, 1989, p. viii)

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    Segundo a autora, guardadas as propores estabelecidas pelas etapas que

    [os alunos] vm vencendo, as habilidades que devem ser praticadas desde o incio

    do processo ensino/aprendizagem so as seguintes (p. viii):

    saber usar o teclado tocando por imitao ou por audio (de ouvido);

    ler msica no teclado (texto musical, cifras, primeira vista);

    harmonizar no teclado;

    acompanhar;

    transportar;

    criar (improvisar, compor);

    dominar a tcnica instrumental; executar repertrio (solo; conjunto);

    analisar e ouvir criticamente.

    A autora enfatiza que estas habilidades s tem significado quando integradas

    e desenvolvidas no sentido de levar comunicao e expressividade da

    linguagem musical. (p. viii) A srie EMaT1 prope o desenvolvimento musical de

    iniciantes por meio de etapas que o aluno dever vencer: musicalizao;alfabetizao musical e desenvolvimento da musicalidade esta ltima est

    presente em todos os nveis que o aluno se encontre.

    O termo musicalidade, compreendido, no como a designao de umdote inato, mas como capacidade de entender e fazer msica, naverdade, no se confina a uma etapa. perene. A pessoamusicalmente educada tem sempre oportunidade de desenvolver aprpria musicalidade, a sua qualidade de msico. (GONALVES,

    1987, p. 1)

    Montandon (2004) apresenta um relato de sua experincia na universidade de

    Braslia como professora da disciplina piano complementar obrigatria para todos

    os cursos, exceto para alunos do curso de bacharelado em piano. A autora acredita

    que a disciplina deveria preparar os alunos para o mercado de trabalho, em diversas

    reas de atuao: professores de aulas prticas e tericas, regentes e

    correpetidores, visto que o mercado de trabalho para o msico tem mudado,

    1Sigla utilizada pela autora da srie Educao Musical atravs do teclado.

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    exigindo msicos mais versteis, mais abrangentes, mais flexveis e mais criativos,

    onde somente o conhecimento terico e o tocar bem um instrumento no so mais

    suficientes. (MONTANDON, 2004, p. 108) Ela ressalta ainda que tal disciplina est

    presente em muitas grades curriculares de cursos de graduao em msica e ,

    geralmente, ministrada em grupo. Entretanto, o contedo o mesmo de uma aula de

    piano individual, no havendo distino entre o ensino do piano enquanto

    instrumento musical ou como instrumento auxiliar na formao do msico.

    (MONTANDON, 2004 p. 105)

    Face a esta situao, Montandon (2004, p. 109) prope uma lista de

    habilidades que considera essenciais para a formao do aluno de piano:

    ler notao para piano;

    tocar em diferentes regies do teclado desde o incio,

    tocar com ambas as mos, melodias homofnicas e polifnicas

    harmonizar melodias populares e folclricas simples

    transpor

    improvisar ou criar frases musicais, acompanhamentos, pequenas peas

    arranjar

    tirar de ouvido

    tocar sozinho ou em grupo, repertrio de diferentes pocas e estilos

    relacionar o conhecimento de outras disciplinas na execuo do piano.

    Santiago elaborou uma proposta semelhante para as disciplinas Teclado I e II,

    ministradas na Escola de Msica da UFMG para a formao musical de licenciandos

    e material pedaggico para a disciplina Teclado V, adotado no Curso de Licenciaturaem Msica - Ensino a Distncia - UNB/Programa Universidade Aberta do Brasil2.

    Segundo sua proposta, as habilidades msico/instrumentais necessrias ao

    aprendizado do teclado so: desenvolvimento motor, leitura primeira vista, ouvido

    e transposio, harmonia no teclado, estilos musicais brasileiros, repertrio e prtica

    de conjunto.

    Os professores participantes apontaram as habilidades que consideram

    necessrias ao ensino de piano e acreditam que tais habilidades devem ser2 SANTIAGO, Patrcia Furst. Apostilas para o ensino de Teclado, material no publicado, p. 4, 2009/2011.

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    trabalhadas com todos os alunos, independente da faixa etria. Carmen, Dborae

    Maurcioofereceram os seguintes comentrios sobre o assunto:

    Carmen: Considero algumas habilidades, tais como: domnio esegurana ao explorar a topografia do instrumento; controle dasonoridade desejada; capacidade de reconhecer e transferir a notalida na pauta e sua imediata localizao no instrumento;entendimento e realizao de frases musicais; memorizao departituras; desprendimento para dar continuidade msica, emdetrimento de alguns esbarros (capacidade de criar e improvisar);habilidade de se controlar e se perceber enquanto estuda,conscientizando-se de seus gestos e aguando a percepo doresultado sonoro obtido etc. [...] Estas habilidades, a meu ver,independem da faixa etria.

    Dbora: Em relao a outras habilidades tcnicas ou musicais(formatao de mo, conhecimento das cifras ou da pauta,consistncia do som), penso que devem ser trabalhadas com todosos alunos: adultos, adolescentes ou crianas.

    Maurcio:Basicamente um bom controle motor, alguma flexibilidade

    fsica e resistncia.

    Os alunos participantes desta pesquisa tambm concordam que estas

    habilidades so essenciais a uma boa performance. Cludia no v possibilidade

    de desenvolvimento [ao piano] sem a aquisio das habilidades. Carlos afirma:

    Sem dvida. Penso que a qualidade do desempenho de uma pessoaao piano determinada pelo somatrio de todas essas habilidades.

    2.2 Comparando a aquisio de habilidades entre adultos e crianas

    As expectativas dos alunos adultos iniciantes tendem a ser bem definidas por

    seus objetivos, por exemplo, aprender a tocar piano para acompanhar um coral,

    participar de um grupo musical ou tocar piano como uma atividade de lazer. Tais

    objetivos devem nortear o trabalho do professor de piano, que poder estabelecer as

    habilidades piansticas/musicais que considera necessrias e que, paralelamente,

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    vo de encontro s expectativas deste pblico especfico, sem ignorar a diferena

    existente entre alunos adultos e crianas.

    Os professores participantes apontam algumas vantagens na prtica comalunos adultos. Dboraconsidera os adultos mais calmos e menos barulhentos;

    Maurcio afirma que eles esto sempre atentos e participativos. Para Carmen,

    estes alunos so mais atenciosos e menos agitados durante as aulas, so mais

    persistentes, vibram mais com pequenas conquistas e ainda acatam as [suas]

    propostas de estudo, mostram-se atentos ao que pedido e se esforam para

    alcanar os objetivos musicais.

    Quanto s dificuldades em se trabalhar com esta clientela, Carmenconsideraa autocrtica um fator que pode dificultar o processo de ensino/aprendizagem:

    Carmen: Autocrtica muito severa que reflete um comportamentoinseguro acompanhado por uma srie de justificativas. Quando estequadro comea a ser recorrente, tenho conversas regulares com osalunos para lembr-los que o estudo musical deve continuar sendoaquele prazer to desejado em suas vidas. E foi justo por este motivoque eles procuram um educador musical.

    Para Maurcio, alunos que tenham frequentado aulas de piano anteriormente,

    podem trazer alguns vcios difceis de serem trabalhados; outras vezes tm

    dificuldade em aceitar novos conceitos.

    Uszler et al. (2000, p. 60-61), descrevem as vantagens e desvantagens que o

    aluno adulto apresenta em relao ao estudo do piano. Algumas das vantagens, na

    viso destes autores, so as seguintes:

    o instrumento feito para uma pessoa adulta: o adulto alcana facilmente o

    pedal e as extremidades do teclado;

    o adulto alto o suficiente para enxergar toda a extenso do teclado com

    facilidade;

    o adulto possui um bom desenvolvimento de habilidades motoras queadquiriu ao longo dos anos.

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    Quanto s desvantagens, os autores observam que os adultos, geralmente:

    so perfeccionistas e esperam a perfeio imediata do toque, o que acaba

    gerando tenses desnecessrias;

    so autocrticos;

    podem apresentar maior cansao fsico ou distrao durante as aulas.

    Em relao aquisio de habilidades por parte dos alunos adultos,

    comparativamente s crianas e adolescentes, respostas dos professores

    participantes refletem diferentes pontos de vista. Em relao ao tempo para

    aquisio de habilidades piansticas, Maurcioe Dboraacreditam que os adultos

    levam mais tempo do que adolescentes e crianas. Por outro lado, Maurcioafirma

    que aos adultos mais difcil adquirir agilidade e destreza, s crianas

    concentrao. Para Dbora os adultos, sobretudo acima de 60 anos, tm maior

    dificuldade em relao memria, articulaes (legato, staccato), intensidade

    (crescendo, diminuendo) e coordenao motora. Quanto dedicao e persistncia

    no estudo, Dbora acredita que isto depende do temperamento do aluno. Para

    Maurcio, esta persistncia maior nos adultos. J em relao ao tempo de estudoextraclasse, os dois concordam que no depende da faixa etria, mas, de outros

    fatores. Carmenresume suas opinies na seguinte afirmao:

    Carmen:Espera-se que a mobilidade dos dedos de uma criana ouadolescente seja menos tensa e rgida do que a de um adulto. Assimcomo a memorizao dos smbolos musicais seria mais eficiente emuma cabea menos preocupada com tantos afazeres e

    responsabilidades. No entanto, estas expectativas tm sofridomutaes, por motivos j mencionados anteriormente, que incluemfalta de tempo generalizada, agitao e excesso de compromissos.

    Os alunos participantes desta pesquisa apontam diferentes opinies a

    respeito das habilidades que consideram mais difceis de serem adquiridas. Para

    Carlos e Daniela, a capacidade de improvisar ao piano uma habilidade difcil; para

    Amanda, alm da improvisao, a independncia e velocidade dos dedos; para

    Marina, a leitura primeira vista, o ritmo e articulaes; Cludia tem dificuldades em

    executar corretamente o que est na partitura (ritmo, andamento e tcnica); para

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    Mrcio, o dedilhado a principal barreira a ser vencida. Com relao s

    habilidades consideradas mais fceis, Carlos considera a leitura; para Daniela e

    Amanda, a leitura e o senso rtmico so habilidades mais fceis; Marina tem

    facilidade em memorizar as partituras; Cludia entende rapidamente a partitura de

    forma terica; Mrcio aprende facilmente a contar o tempo da msica.

    2.3 Habilidades msico/instrumentais relevantes ao ensino de piano para

    adultos iniciantes

    Com base nas afirmaes dos pedagogos citadas anteriormente e nas

    repostas dos entrevistados desta pesquisa, apontamos algumas das habilidades

    msico/instrumentais que acreditamos serem as mais relevantes para o ensino de

    piano para adultos iniciantes, a saber: (1) Habilidades motoras e tcnicas; (2)

    Habilidades aurais - tocar por imitao ou de ouvido, improvisar e criar; (3) Leitura;

    (4) Repertrio. Estas habilidades sero discutidas em mais detalhes a seguir.

    2.3.1 Habilidades motoras e tcnicas

    O elemento essencial da execuo pianstica o movimento.

    (KAPLAN, 1987, p.29)

    Santiago (2004, p. 26) ressalta que pedagogos do piano no oferecem uma

    definio clara e unificada sobre a tcnica; entretanto possvel perceber dois

    pontos de vista antagnicos a respeito do assunto. Para alguns pedagogos, tcnica

    e msica so indivisveis - a tcnica a prpria arte. (NEUHAUS, 1973: 2;

    ROSSELINI, 2002: 3 apudSANTIAGO, 2004, p. 26). Nesse sentido, as habilidades

    tcnicas devem ser trabalhadas de forma a viabilizar o fazer musical. Por outro lado,

    outros pedagogos defendem a separao entre tcnica e musicalidade (CHING,

    1946; FIELDEN, 1943; LEIMER 1972 apudSANTIAGO, 2004, p. 30). Para estes, a

    tcnica compreendida como um treinamento muscular que deve ser praticado

    separadamente da msica.

    De acordo com Santiago (2004, p. 31), os dois pontos de vista apresentadosacima oferecem desafios ao professor de piano. O primeiro - tcnica e msica como

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    inseparveis -, pode fazer com que o professor se envolva muito mais nos aspectos

    musicais e deixe comprometido o desenvolvimento tcnico; o segundo - tcnica e

    msica como indivisveis - pode reforar um treinamento puramente mecnico e

    comprometer o fazer musical. Concordamos com a autora que tcnica e

    musicalidade devem ser, na medida do possvel, desenvolvidas lado a lado.

    Frana (2001, p. 37) considera a tcnica como o conjunto das competncias

    funcionais necessrias realizao de atividades musicais especficas, como, por

    exemplo, produzir um crescendo na performance ou transformar um motivo na

    composio. A autora critica a associao do conceito de tcnica a nveis

    avanados de realizao musical, apoiada no pensamento de Paynter, que tcnica

    tambm pode ser simplesmente fazer o que voc pode com o que voc tem, com omelhor da sua capacidade (PAYNTER, 1977, p. 9 apud FRANA, 2001, p. 38).

    Frana ressalta ainda que deve-se tomar cuidado para que o desenvolvimento

    tcnico no se sobreponha ao desenvolvimento da musicalidade. A mesma autora

    afirma que:

    Se atravs do fazer musical ativo que a compreenso sedesenvolve e se revela, o cuidado com o desenvolvimento tcnico

    inevitvel. O fazer musical envolve tanto a compreenso de (ousensibilidade a) tais elementos quanto as habilidades tcnicasnecessrias para identific-los e control-los. (FRANA, 2001, p. 37)

    De acordo com Kaplan (1987, p. 17), existem n tcnicas, tantas quantos

    intrpretes e obras para esse instrumento [o piano] existem, entretanto, nem todas

    apresentam o mesmo nvel de eficincia. Assim, o autor conclui que a tcnica

    consiste em conseguir o mximo de rendimento com o mnimo de esforo (1987, p.

    18).

    Sendo a execuo pianstica uma atividade motora, a postura adequada, o

    posicionamento correto de braos, mos e dedos, so alguns requisitos bsicos

    para uma performance satisfatria desde as primeiras aulas. Cabe ao professor

    observar e orientar seus alunos desde o incio do aprendizado para evitar o

    surgimento de possveis problemas ou para que os mesmos sejam corrigidos o mais

    rpido possvel; caso contrrio, o aluno poder adquirir maus hbitos posturais, oque acarretaria no apenas problemas tcnicos, mas tambm fsicos.

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    Importante fator no incio da aprendizagem instrumental o cultivo de bons

    hbitos e conscincia corporal. A prtica de alongamentos e exerccios de

    respirao, bem como o cuidado postural so indispensveis (PVOAS, 2007, p. 6),

    lembrando que o professor desempenha papel crucial ao orientar e demonstrar bons

    hbitos. Kaplan (1987, p. 46) afirma que os hbitos so o resultado da

    transformao de atos voluntrios em automatismos; para o autor a aquisio e

    reorganizao dos mesmos constitui a base sobre a qual ir se construir a tcnica.

    De acordo com HSU (1997, p. 127 apudCABEZAS, 2006, p.1)

    Embora haja uma longa tradio em tocar e no ensino do piano,educadores e msicos necessitam adquirir mais conhecimento eentendimento sobre a prpria anatomia e as funes biomecnicasde seus corpos e mos. H uma tremenda necessidade de guiartodos os msicos, inclusive os pianistas, no aprendizado de como seexpressar musicalmente sem se lesionar.

    Santiago (2007, p. 5) reflete sobre esta questo:

    A m coordenao do organismo como um todo e as concepesinadequadas a respeito da execuo de aes motoras noinstrumento esto, frequentemente, associadas. Por outro lado, umorganismo bem orientado em termos motores (que busca realizar asaes adequadas para os fins almejados) e bem coordenado em simesmo (que preza uma atitude postural adequada ao tocar e queevita tenses e esforos desnecessrios), pode realizar aes maiscoerentes no aprendizado e na performanceinstrumental.

    Nesse sentido, a ao motora pianstica abrange muito mais do que as pontas

    dos dedos. Fonseca e Santiago (1997, p. 12) consideram que os movimentos

    fundamentais para o aprendizado do teclado devero envolver de incio todo o

    membro superior e sugerem que tais movimentos iniciais devem conduzir um

    contato da mo inteira ao teclado. O trabalho especfico com os dedos dever ser

    introduzido aps o aluno usar todo o brao de forma equilibrada e sem tenses.

    Outra questo fundamental aquisio de habilidades o uso do feedback,

    atravs do qual o aluno obtm um retorno sobre seu desempenho (HALLAM, 1998,p. 128; PVOAS, 2007, p. 5). Sobretudo no desenvolvimento de habilidades

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    motoras, o aluno precisa receber esse retorno para que possa corrigir erros e manter

    o que est correto. Pvoas (2007, p. 5) ressalta que existem dois tipos de feedback:

    o intrnseco e o extrnseco. O primeiro, parte do prprio sujeito por meio de seus

    rgos sensoriais e est relacionado com o nvel de habilidade do executante. Este

    tipo de feedback mais efetivo em movimentos lentos, visto que nos movimentos

    rpidos, o tempo de resposta no acompanha o movimento. (PIEKARZIEVCZ, 2004

    apud PVOAS, 2007, p. 5) J o feedback extrnseco pode ser fornecido pelo

    professor ou atravs de gravaes que podero ser assistidas posteriormente e,

    desta forma, refora o feedbackintrnseco.

    Concordamos com Santiago3 que, o desenvolvimento motor culmina na

    formao tcnica do aluno. No entanto, a tcnica muito mais do que um processo

    motor. Nesse sentido a autora conclui que:

    Para o melhor desenvolvimento tcnico, precisamos ento considerara conscincia do uso corporal (que inclui busca de estados deequilbrio e tnus muscular, flexibilidade e mobilidade corporal, abusca de estados funcionais do uso do tronco, braos e mos); odesenvolvimento motor (que inclui o conhecimento de abordagensmotoras e dos fundamentos tcnico/musicais); o aspecto musical(que inclui a busca por umarealizao musical expressiva).

    2.3.2 Habilidades aurais - tocar por imitao ou de ouvido, improvisar e criar

    De acordo com Feichas (2006, p. 84 apudCOUTO, 2008, p. 36-37) o aspecto

    aural considerado o mais importante no processo de aprendizagem da msicapopular, visto que, por meio dele, os msicos adquirem conhecimento e habilidades

    musicais. Para Lilliestam (1996, p. 195 apudCOUTO, 2008, p. 36) as prticas aurais

    compreendem criar, atuar, lembrar e ensinar msicas sem o uso de notao

    escrita, em outras palavras, o fazer musical de ouvido.

    3SANTIAGO, Patrcia Furst. Apostilas para o ensino de Teclado, material no publicado, 2009-2011, p. 10

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    A partir de atividades como copiar msicas de ouvido de gravaes,observar e imitar colegas e parentes, os msicos populares adquiremsuas capacidades para improvisar e criar; tambm desenvolvendo o

    ouvido harmnico, rtmico e meldico para atuarem na performance.(COUTO, 2008, p. 36-37)

    Segundo Gonalves (1989, p. 4) a habilidade de tocar por imitao ou de

    ouvido deve ser praticada no incio, uma vez que proporciona a familiaridade com

    todo o teclado e um senso de pianismo que, de outra forma, seria por muito tempo

    adiado. Nesta etapa, o aluno no precisar se preocupar com a leitura e sua

    ateno estar focada em outros aspectos tais como a posio correta das mos,

    sua conduta corporal e o conhecimento da estrutura do teclado alm de poder desde

    o incio se expressar musicalmente; estes fatores iro inclusive auxiliar no processo

    de leitura. Franois Couperin (apud Gonalves, 1989, p. 4) no sculo XVIII j

    aconselhava:

    No se deve comear a mostrar a notao musical acrianas, antesque elas tenham uma certa quantidade de peas nos dedos. quase impossvel que, olhando para o livro, os dedos deixem de sair

    da boa posio e se contoram. Alm do mais, a memria se formabem melhor quando se aprende de cor. (Primeira edio de Lrt deToucher le Clavecin, 1717)

    Corroborando este pensamento, Emonts (1994, apud REIS, 2000, p. 23)

    afirma que:

    O caminho mais natural para estabelecer e fomentar a relao dacriana com o instrumento consiste em estimul-la para que encontre

    no teclado todas as melodias que j conhece e as toque de ouvido.Para este fim, no so adequadas somente as canes infantis ou asfolclricas, mas tambm outras melodias que podem ser escutadasem casa, na escola, no rdio ou televiso.

    Santiago ressalta que a habilidade de tocar de ouvido essencial formao

    do msico instrumentista uma vez que requer uma escuta musical atenta e

    persistente e que favorece o desenvolvimento da capacidade de ouvir a si mesmo,

    alm de ser uma atividade prazerosa. (SANTIAGO, 2006, p. 56)

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    Da mesma forma, Suzuki (apud GONALVES, 1989, p. 4) explica que a

    leitura musical deve ser ensinada depois que a sensibilidade, a habilidade de

    execuo e a memria da criana tenham sido suficientemente treinadas. Swanwick

    (1994, p. 13) tambm aconselha:

    Sempre d prioridade fluncia intuitiva baseada na percepoauditiva antes da escrita e da leitura analticas. Nos primeiros dias,pelo menos, a msica deve ser articulada livremente antes de seintroduzir a notao. No precisamos da anlise limitada de umapartitura impressa nossa frente todas as vezes que tocamos. Aconscincia auditiva vem antes disso, ela a base, o verdadeirofundamento musical e tambm o ponto culminante do conhecimento

    musical.

    Adalmrio relata, no questionrio desta pesquisa, os ensinamentos que

    recebeu de Violeta Gainza, os quais procurou guardar na memria. Segundo ta