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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
ALINE MARIA TOMANIK
UM OLHAR SOBRE O ENSINO DE PIANO PARA ADULTOS
BELO HORIZONTE
2011
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ALINE MARIA TOMANIK
UM OLHAR SOBRE O ENSINO DE PIANO PARA ADULTOS
Dissertao apresentada ao curso de Mestrado em
Msica da Universidade Federal de Minas Geraiscomo requisito parcial obteno de grau deMestre em Msica.
rea de concentrao: Educao Musical
Linha de pesquisa: Estudo das Prticas Musicais
Orientadora: Prof Dr Patrcia Furst Santiago
BELO HORIZONTE
2011
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ALINE MARIA TOMANIK
UM OLHAR SOBRE O ENSINO DE PIANO PARA ADULTOS
Dissertao apresentada ao Curso de Mestrado em Msica na Universidade Federal
de Minas Gerais - UFMG, em ___/___/___, como requisito parcial para a obteno
do ttulo de Mestre em Msica, aprovada pela Banca Examinadora constituda pelas
professoras:
____________________________________________________Prof Dr. Patrcia Furst Santiago EMUFMG /MG - Orientadora
____________________________________________________Prof. Dr. Helosa Feichas EMUFMG/MG
____________________________________________________Prof. Dr. Tnia Mara Lopes Canado
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SUMRIO
APRESENTAO DA PESQUISA ................................................................... 8
OBJETIVOS DA PESQUISA ........................................................................... 10
METODOLOGIA .............................................................................................. 11
APRESENTAO DOS PARTICIPANTES DA PESQUISA ........................... 14
Os professores de piano .................................................................................. 14
Os alunos de piano ......................................................................................... 15
ESTRUTURA DA DISSERTAO ................................................................. 19
1. FORMAO PROFISSIONAL, EXPERINCIA DOCENTE E EXPERINCIAMUSICAL ........................................................................................................ 21
1.1 O perfil do professor de piano no Brasil ..................................................... 21
1.1.1 Introduo ............................................................................................... 21
1.1.2 Formao pianstica de professores de piano no Brasil .......................... 22
1.1.3 Atividades exercidas por professores de piano no Brasil ........................ 24
Formao e prtica pedaggica ............................................................ 24
O professor instrumentista ..................................................................... 281.1.4 Caractersticas pessoais e profissionais do professor de piano .............. 29
2. DESENVOLVIMENTO DE HABILIDADES PIANSTICAS .......................... 33
2.1 Introduo .................................................................................................. 33
2.2. Comparando a aquisio de habilidades entre adultos e crianas ............ 37
2.3 Habilidades msico/instrumentais relevantes ao ensino de piano para
adultos iniciantes .............................................................................................. 402.3.1 Habilidades motoras e tcnicas ............................................................... 40
2.3.2 Habilidades aurais: tocar por imitao ou de ouvido, improvisar e criar 43
2.3.3 Leitura ao piano ....................................................................................... 47
2.3.4 Repertrio pianstico ............................................................................... 51
3. PROCESSOS DE ENSINO/APRENDIZAGEM ............................................ 56
3.1. Consideraes sobre o ensino de adultos................................................. 563.2 Abordagem Tradicional .............................................................................. 60
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3.3 Abordagem Comportamentalista ................................................................ 61
3.4 Abordagem humanista ............................................................................... 63
3.5 Abordagem cognitivista .............................................................................. 65
3.6 Abordagem sociocultural ............................................................................ 68
4. MOTIVAO, ATITUDES E RELACIONAMENTO PROFESSOR-ALUNO 71
4.1 Motivao intrnseca .................................................................................. 73
4.2 Motivao extrnseca ................................................................................. 75
4.3 Teorias de motivao e o processo de ensino-aprendizagem ................... 76
4.3.1 Teoria da autodeterminao .................................................................... 76
4.3.2 Teoria de Metas de Realizao ............................................................... 80
4.3.3 Teoria da Expectativa-valor ..................................................................... 82
4.3.4 Teoria do Fluxo ou do Fluir ................................................................... 84
4.4 Consideraes sobre o papel do professor na motivao do aluno ........... 87
CONCLUSES ................................................................................................ 92
ANEXOS .......................................................................................................... 95
Anexo 1: Questionrio - Professores ................................................................ 95
Anexo 2: Questionrio - Alunos ........................................................................ 99
Anexo 3: Termo de consentimento livre e esclarecido ................................... 103
Anexo 4: Parecer do Processo (COEP) ......................................................... 105
Anexo 5: Deciso (COEP) .............................................................................. 106
REFERNCIAS .............................................................................................. 107
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RESUMO
Como professora de piano h mais de 10 anos, tenho observado umaumento significativo na procura pelo estudo do instrumento por pessoas adultas
que j possuem uma profisso definida ou esto aposentadas e, portanto, no
pretendem se tornar msicos profissionais. Os professores de piano destes alunos,
normalmente, consolidaram sua formao pianstica nos cursos de bacharelado em
piano. Entretanto, tais cursos no oferecem, necessariamente, disciplinas
pedaggicas direcionadas ao ensino de piano para adultos. A presente pesquisa
prope uma reflexo sobre temticas relacionadas prtica de ensino de piano para
adultos.
Para o desenvolvimento deste estudo foi realizada pesquisa
bibliogrfica envolvendo assuntos relacionados pedagogia pianstica, formao do
professor de piano, processos de ensino/aprendizagem e motivao. A partir da
pesquisa bibliogrfica elaboramos questionrios para professores e alunos de piano.
Os tpicos destes questionrios geraram os quatro captulos deste trabalho, a saber:
(1) formao profissional, experincia docente e experincia musical; (2)desenvolvimento de habilidades piansticas; (3) processos de ensino/aprendizagem;
(4) motivao, atitudes e relacionamento professor-aluno.
Esta pesquisa contou com a participao de quatro professores de
piano e seis de seus alunos que aceitaram responder ao questionrio. As respostas
dos participantes, juntamente com os comentrios dos autores consultados
oferecem reflexes relevantes prtica de ensino de piano para adultos.
Palavras-chave: ensino de piano aluno adulto - motivao
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ABSTRACT
As a piano teacher for over 10 years, I have observed that adults whoare either professionally established or retired, and therefore do not intend to become
professional musicians have been demonstrating a rising interest in acquiring
musical abilities, especially in what concerns the study of instruments. The piano
teachers who work with such students normally consolidated their pianistic training
courses in the bachelor's degree in piano. However, such courses do not necessarily
provide them with pedagogical courses directed to teaching piano to adults. This
research proposes a reflection on issues related to the practice of teaching piano to
adults.
To develop this literature, bibliographic research related to piano
pedagogy, piano teacher training, teaching/ learning and motivation was made. Using
the bibliographic research as a starting point, we prepared questionnaires for
teachers and piano students. The topics of these questionnaires generated the four
chapters of this work, they being: (1) training, teaching experience and musical
experience, (2) development of pianistic skills, (3) processes of teaching / learning,
(4) motivation, attitudes and teacher-student relationship.
This research was attended by four piano teachers and six of their
students who agreed to answer the questionnaire. Their answers, together with the
comments of the consulted authors, promoted reflections relevant to the practice of
teaching piano to adults.
Keywords: piano teaching adult student - motivation
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AGRADECIMENTOS
querida professora Doutora Patrcia Furst Santiago, pelo carinho, ateno e
pacincia na orientao deste trabalho.
Ao meu marido e companheiro, Rafael Choairy, por todo apoio, incentivo,
compreenso e amor em todos os momentos.
Aos meus queridos pais, Benedicto Tomanik e Elisabeth Tomanik, exemplos de
amor, pelo suporte dado durante toda a minha vida.
Aos meus irmos, Raquel Tomanik e Marcelo Tomanik, pelo constante apoio e
amizade.
minha sogra, Pininha, por todo carinho e incentivo.
professora Tnia Canado, por gentilmente aceitar fazer parte da banca.
professora Helosa Feichas, por todo incentivo e amizade durante o curso e por
gentilmente aceitar fazer parte da banca.
professora Walnia Silva, pela amizade e apoio durante o curso.
Aos professores, Maurcio Veloso, Carmen Vianna, Dbora Baio e Adalmrio
Pacheco, pela participao nesta pesquisa com seus comentrios semprepertinentes.
Aos alunos que gentilmente aceitaram participar desta pesquisa.
Aos colegas Daniel Lemos Cerqueira e Marcus Medeiros, pelas relevantes
sugestes na entrevista piloto.
Aos secretrios o departamento de Ps-Graduao da Escola de Msica da UFMG,
Alan e Geralda, pelo constante auxlio.
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A minha sobrinha, Camila Alves, pela reviso do Abstract.
A minha amiga de jornada, Myrna, pelas muitas conversas.
Aos meus professores de piano Manuella Rebecca, Mrcia Fajioli, Lucas Bretas,
Margarida Borghoff e Maurcio Veloso, responsveis pela minha formao pianstica.
Aos meus alunos, que sempre me incentivam a pesquisar e tentar ser melhor em
minha profisso.
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APRESENTAO DA PESQUISA
O homem no um ser especializado, e [...] portanto no hcomportamento que no seja capaz de adquirir, devidamenteorientado. O ser humano no tem aptides, tem potencialidades!(KAPLAN, 1987, p. 12)
O piano muito apreciado sonora e fisicamente e, portanto, frequentemente
procurado por aqueles que desejam aprender a tocar um instrumento musical.
Embora tradicionalmente seu aprendizado esteja relacionado a crianas e
adolescentes, visto que geralmente um virtuose inicia seu estudo o mais jovem
possvel, em minha experincia como professora de piano, h 11 anos, tenho visto
um cenrio diferente: crescente o nmero de alunos com idade entre 30 e 60 anos
que buscam no aprendizado do piano uma forma de se envolver com msica.
Segundo Masson (1999, p. 126 apudCosta, 2004, p. 1), um nmero cada vez maior
de adultos est deixando a vergonha de lado e dando os primeiros passos em vrios
instrumentos musicais. Este pblico especfico caracterizado por pessoas que j
tem uma carreira profissional definida ou que esto aposentadas e, por isso, no
pretendem se tornar msicos profissionais. Tenho observado que estas pessoas
sentem grande prazer em sua prtica pianstica e se esforam ao mximo para
alcanarem suas metas. De acordo com Costa (2004, p. 1):
[...] o perfil dessa classe de alunos varia entre aqueles que procuramaulas para dar continuidade aos estudos realizados na infncia, osque desejam encontrar um momento de relaxamento em meio s
preocupaes do dia-a-dia, os aposentados ou donas-de-casa, quequerem preencher o tempo livre com atividades de lazer eentretenimento.
A partir desta observao, e com o intuito de ampliar o estudo na rea de
ensino/aprendizagem pianstica para alunos adultos iniciantes bem como melhorar
minha prpria prtica como professora, surgiu o interesse desta pesquisa.
Encontramos pesquisas que discutem as questes relacionadas com a prtica
pedaggica do piano para crianas ou alunos profissionais, entretanto so escassos
os trabalhos com alunos que iniciam seus estudos de piano na idade adulta.
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Ao longo dos anos, como professora de piano, pude perceber que alunos
adultos chegam s aulas geralmente com objetivos definidos. Dentre estes objetivos
podemos destacar alguns: tocar em igrejas, em um grupo musical (com amigos) ou
tocar por hobby ou realizao pessoal. Como em todo aprendizado,
independentemente das metas, os resultados sero diferentes para cada aluno.
Fatores tais como, o tempo dedicado ao estudo, interesse prprio, grau de
motivao, identificao com o instrumento e interao com o professor podem
determinar o nvel de aprendizado que um aluno ir alcanar. Alm disso, a
expectativa de um aluno com relao ao seu aprendizado pianstico pode ser
completamente diferente de outro. Tal situao pode vir a ser um desafio para
muitos professores de piano. Como afirmam Glaser e Fonterrada (2006, p. 92):
Embora o modelo de ensino mais comum venha sendo questionado,pelo fato de a formao do instrumentista ainda no ter sido amideobjeto de reflexo, no que se refere ao processo deensino/aprendizagem do instrumento, a tendncia do msico-professor repetir o modelo experienciado, o que na maior parte doscasos ainda representa o modelo considerado tradicional pelosprprios msicos.
Para melhor atender ao pblico adulto que no pretende a profissionalizao,
aqueles professores de piano que tendem a preparar alunos para a execuo do
repertrio pianstico de concerto, precisaro utilizar novas abordagens de ensino.
Talvez seus alunos adultos pretendam apenas tocar, o mais rpido possvel,
determinadas msicas com as quais estejam familiarizados. Caber ao professor a
importante e, s vezes, difcil tarefa de iniciar o aluno ao piano, levando em
considerao suas expectativas e sua vivncia musical prvia. Swanwick (2003,p.66-7) esclarece:
Cada aluno traz consigo um domnio de compreenso musicalquando chega a nossas instituies educacionais. No osintroduzimos na msica; eles so bem familiarizados com ela,embora no a tenham submetido aos vrios mtodos de anlise quepensamos ser importantes para seu desenvolvimento futuro.
O aprendizado instrumental um processo que envolve a aquisio decompetncias tcnicas/musicais que viabilizem o desenvolvimento musical. No
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ensino de piano, o uso funcional do corpo, o conhecimento da geografia do teclado,
a leitura primeira vista, dentre outras questes, so algumas das habilidades que
se espera desenvolver em um aluno de nvel elementar a partir das primeiras aulas.
Sem dvida, qualquer aluno enfrentar dificuldades na aquisio de novos
conhecimentos tcnico/musicais. Entretanto, a motivao que impulsiona o
indivduo a vencer tais desafios. Especificamente, no caso do aluno adulto, o
aspecto motor geralmente a principal dificuldade. No entanto, quando este aluno
decide por si mesmo estudar piano, torna-se responsvel por sua prtica extraclasse
e tambm pelo investimento financeiro; tal fato contribui para o aumento de seu
empenho em alcanar seus objetivos. Concordo com a seguinte afirmao de Costa
(2004, p. 8):
A motivao de um adulto estudante de piano o que o faz enfrentaras limitaes relativas motricidade, graas a ela que esse alunopersiste, somado ao fato de que seus objetivos so muito claros epreviamente determinados, no como uma criana que, muitasvezes, nem sabe exatamente porque est tendo aulas de piano.
OBJETIVOS DA PESQUISA
A prtica de ensino/aprendizagem para adultos uma realidade significativa e
vemos um crescente aumento deste pblico nas aulas de piano. Entretanto,
professores de piano podem no estar plenamente preparados para a diversidade
de contextos em que iro atuar devido a limitaes em sua formao pedaggica,
uma vez que cursos de formao pianstica nem sempre oferecem disciplinas
voltadas para a pedagogia do piano em suas grades curriculares. No sentido de
contribuir para o ensino de piano para adultos, esta pesquisa tem como objetivo
geral investigar a prtica de ensino/aprendizagem pianstica para alunos que iniciam
esta atividade na idade adulta, particularmente aps estabelecerem uma carreira
profissional ou se aposentarem. A pesquisa prope ainda os seguintes objetivos
especficos:
pesquisar processos pedaggicos relacionados ao ensino de piano para
adultos;
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pesquisar sobre as habilidades msico/instrumentais essenciais ao ensino de
piano para adultos;
pesquisar sobre os aspectos motivacionais presentes na prtica deensino/aprendizagem pianstica para adultos.
Atravs desta investigao, espera-se responder s seguintes questes: (1)
Quais so os fatores que motivam o adulto a iniciar e permanecer no estudo do
piano? (2) Quais so os objetivos que estes alunos pretendem com as aulas de
piano? (3) Quais as habilidades msico/instrumentais essenciais aos alunosadultos? (4) Quais so as principais dificuldades neste processo, para alunos e
professores? (5) Quais so os benefcios alcanados com a prtica pianstica para
alunos e professores? (6) Quais as estratgias de ensino que o professor de piano
adota em seu trabalho com o adulto?
METODOLOGIA DA PESQUISA
Na primeira etapa deste estudo, de natureza qualitativa, realizamos pesquisa
bibliogrfica de trabalhos referentes rea de formao do professor de piano,
pedagogia do piano, abordagens do processo de ensino-aprendizagem e motivao,
pela viso de autores como: Boruchovitch & Bzuneck (2001), Bozzetto (2004), Costa
(2004), Glaser; Fonterrada (2007), Gonalves (1986), Guimares (2000), Kaplan
(1987), Mizukami (1986), Montandon (2004), Santiago (2004; 2006), Uszler et al.
(2000) entre outros. Segundo LaVille e Dionne (1999, p. 112), a reviso bibliogrfica:
[...] tenta encontrar essencialmente os saberes e as pesquisasrelacionadas com sua questo; deles se serve para alimentar seusconhecimentos, afinar suas perspectivas tericas, precisar e objetivarseu aparelho conceitual. Aproveita para tornar ainda maisconscientes e articuladas suas intenes e, desse modo, vendocomo outros procederam em suas pesquisas, vislumbrar sua prpriamaneira de faz-lo.
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Com base na reviso de literatura elaboramos questionrios para serem
respondidos por professores que atuam na pedagogia do piano para adultos, bem
como por alguns de seus alunos. Aps a aprovao do COEP, para testar a
qualidade dos questionrios, realizamos um estudo piloto com outros dois
professores de piano, que gentilmente aceitaram colaborar com esta pesquisa.
Posteriormente, convidamos quatro professores de piano e seis de seus alunos para
participarem da pesquisa. Os professores participantes possuem comprovada
formao acadmica e experincia na rea de ensino do piano. O grupo de alunos
participantes encontra-se na faixa etria entre 30 (trinta) e 70 (setenta) anos,
profissionais de outras reas ou aposentados. Todos eles, professores e alunos,
foram contatados pela pesquisadora por telefone e/ou pessoalmente e osquestionrios foram enviados por e-mail, bem como o termo de consentimento livre
e esclarecido. Os professores e alunos optaram por responder os questionrios via
e-mail, exceto uma aluna que no costumava utilizar o computador; neste caso a
pesquisadora foi at a sua casa e entregou o questionrio pessoalmente, voltando,
aps alguns dias, para colet-lo.
Os professores participantes concordaram em serem identificados, visto que
so profissionais reconhecidos que atuam na rea de ensino de piano em BeloHorizonte. Para facilitar ao leitor a identificao dos professores e alunos
participantes da pesquisa e para distingui-los dos autores citados, os nomes dos
professores aparecero em itlico, ao longo da dissertao. Aos alunos, foram
atribudos pseudnimos para preservar suas identidades; tais pseudnimos
aparecero sublinhados no texto.
Optamos pelo questionrio de respostas abertas visto que o mesmo promove
ao interrogado um espao para expor suas opinies. De acordo com La Ville eDionne (1999, p. 186), neste tipo de questionrio o interrogado:
[...] tem assim a ocasio para exprimir seu pensamento pessoal,traduzi-lo com suas prprias palavras, conforme seu prprio sistemade referncias. Tal instrumento mostra-se particularmente preciososquando o leque das respostas possveis amplo ou entoimprevisvel, mal conhecido. Permite ao mesmo tempo aopesquisador assegura-se da competncia do interrogado,competncia demonstrada pela qualidade de suas respostas.
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Os temas abordados nos questionrios foram divididos em 4 tpicos, a saber:
(1) Formao profissional, experincia docente e experincia musical; (2) Processos
de ensino/aprendizado; (3) Desenvolvimento de habilidades piansticas e (4)
Motivao, atitudes e relacionamento professor-aluno. Cada um destes tpicos
comportou uma srie de questes, elaboradas a partir da reviso bibliogrfica,
englobando assuntos como: motivao no aprendizado musical e pianstico,
expectativas em relao s aulas de piano, benefcios e dificuldades no processo de
aprendizado, relao professor/aluno, entre outros.
Relacionamos os dados obtidos pela pesquisa aos temas desenvolvidos na
reviso bibliogrfica, atravs da anlise de contedo, visto que esta pode se aplicar
a uma grande diversidade de materiais, como permite abordar uma grandediversidade de objetos de investigao: atitudes, valores, representaes,
mentalidades, ideologias, etc. (LA VILLE E DIONNE, 1999, p. 214).
A primeira etapa desta anlise foi a definio das categorias analticas. Os
questionrios elaborados para esta pesquisa foram organizados em tpicos
selecionados segundo o modelo de definio misto, no qual categorias so
selecionadas no incio, mas o pesquisador se permite modifica-las em funo do que
a anlise aportar. (LA VILLE E DIONNE, 1999, p. 219).A segunda etapa consistiu em um recorte dos contedos que foram
ordenados dentro de categorias. Tais elementos constituem as unidades de anlise.
(LA VILLE E DIONNE, 1999, p. 216). Nesta pesquisa, agrupamos as repostas dos
participantes de acordo com os captulos que seriam estruturados a partir das
seguintes categorias: formao e experincia musical; habilidades
musico/instrumentais relevantes ao ensino de piano; processos de
ensino/aprendizagem; motivao, atitudes e relacionamento professor-aluno.A terceira e ltima etapa foi a anlise qualitativa de contedo, segundo a
estratgia nomeada por La Ville e Dionne (1999, p. 227) como construo iterativa
de uma explicao, na qual o pesquisador elabora pouco a pouco uma explicao
lgica do fenmeno ou da situao estudados, examinando as unidades de sentido,
as inter-relaes entre essas unidades e entre as categorias em que elas se
encontram reunidas. (LA VILLE E DIONNE, 1999, p. 227).
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APRESENTAO DOS PARTICIPANTES DA PESQUISA
Os professores de piano
Carmen Vianna
Bacharel em piano, Carmen iniciou seus estudos em msica aos cinco anos
de idade e, aos doze anos, comeou a dar aulas de piano para principiantes na
mesma faixa etria, com a superviso de sua av sua primeira professora de
piano. Para adultos, Carmen leciona piano e teclado desde 1977 e trabalha com
diversas faixas etrias desde ento. Atualmente professora e correpetidora na
Escola de Msica da UEMG alm de atuar eventualmente como pianista.
Dbora Baio
Bacharel e Mestre em piano pela UFMG, Dbora iniciou seus estudos
musicais aos sete anos de idade. Iniciou suas atividades como professora aos 19
anos, no Ncleo Villa-Lobos de Educao Musical, onde atua nos dias de hoje.
Antes disso, trabalhou como estagiria durante um ano no CMI UFMG. Seutrabalho com alunos adultos iniciou desde quando terminou o curso de graduao.
Atualmente leciona piano para crianas, adolescentes e adultos (aulas particulares e
em grupo). Embora sua atuao ocorra mais em sala de aula do que nos palcos,
Dboratambm atua como pianista.
Maurcio Veloso
Maurcio Bacharel em piano pela UFMG. Cursou mestrado e doutorado no
instrumento pela Indiana University School of Music. Iniciou seus estudos em msica
aos seis anos de idade com aulas particulares e, antes de ingressar na graduao,
estudou em conservatrio.
Professor na Escola de Msica da UFMG, Maurcioleciona piano desde 1987;
desde o incio tem trabalhado com alunos adultos. Na UFMG atende a alunos do
Curso de Extenso e do Bacharelado em Piano. A faixa etria predominante de seus
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alunos adultos est entre 30 e 60 anos. Alm de seu trabalho como professor atua
regularmente como pianista em concertos e recitais, como recitalista e camerista.
Adalmrio Pacheco
Adalmrio iniciou seus estudos em msica aos seis anos de idade com
professora particular. Aos onze anos, ingressou no Conservatrio Brasileiro de
Msica e aos treze, no Conservatrio Mineiro de Msica, hoje Escola de Msica da
UFMG, no CFM. Concluiu Mestrado na mesma instituio, sob a orientao do
professor Maurcio Veloso.
Adalmrio iniciou suas atividades como professor de piano em 1986, em
escola particular de msica, onde lecionava para alunos de todas as idades:
crianas, jovens e adultos. Nesta mesma poca, era estagirio de percepo
musical na EMUFMG, na qual ingressou como professor em 1993. Atualmente, a
faixa etria predominante de seus alunos de 20 a 60 anos. Ele ministra aulas de
piano individuais e em grupo.
Alm de suas atividades como professor, Adalmrioatua como correpetidor
de cantores e instrumentistas, solista em concerto com orquestra ou obras
sinfnicas e corais e esporadicamente realiza recitais solo.
Os alunos de piano
Amanda
Faixa etria: acima de 50 anos
Profisso: psicloga aposentada
Amanda iniciou seus estudos de piano aos 6 anos de idade. Aos 11,
interrompeu o curso e, alguns anos depois, comeou a ter aulas de violo. Aos 30
anos, aproximadamente, tentou retomar o estudo de piano por 3 vezes com
professores diferentes. Devido a vrias circunstncias da vida ela no continuava.
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Amanda frequenta aulas de piano particulares h 9 anos e, em grupo, h
quase 2 anos. Alm do prazer de tocar o instrumento, ela busca o desenvolvimento
pianstico e musical para que possa lecionar teoria e piano para crianas e iniciantes
e, para isso, se dedica pelo menos duas horas por dia ao estudo do instrumento. A
preferncia musical, tanto no repertrio que ela ouve quanto nas msicas que gosta
de tocar, abrange msica clssica, chorinho, valsas e MPB. Amanda costuma ler e
pesquisar assuntos referentes ao piano alm de frequentar shows e concertos.
Daniela
Faixa etria: acima de 50 anos
Profisso: professora universitria aposentada
Daniela estuda piano com sua atual professora h mais ou menos trs anos.
Seu principal objetivo no estudo do instrumento incentivar seus netos atravs da
prpria prtica pianstica; segundo ela, uma de suas netas, de 8 anos de idade, j
est tendo aulas de piano por sua influncia. Elatambm busca preencher o tempo
de aposentada com uma atividade agradvel. Daniela costuma frequentar
concertos e ouvir msicas em casa, de estilos variados. Quanto ao repertrio, gosta
de tocar msicas clssicas e populares desde que estas tenham um ritmo mais
lento e que a dificuldade seja compatvel com [seu] atual estgio.
Daniela estudou piano anteriormente, mas interrompeu o curso por motivos
como: casamento, filhos, mudana de cidade, trabalho e estudo, no
necessariamente nesta ordem. Ela afirma que tocava piano informalmente, mas no
considera que esta prtica tenha influenciado sua formao musical.
Carlos
Faixa etria:30-40 anos
Profisso:cirurgio-dentista
Carlos estuda piano com sua atual professora h dois anos e oito meses.
Para este aluno, o estudo do instrumento um hobby, contudo, tem o hbito de ler epesquisar sobre assuntos relacionados ao piano. Ele costuma frequentar shows e
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concertos alm de ouvir msicas de diferentes estilos em sua casa. Quanto ao
repertrio, prefere tocar msica erudita e trilha sonora de filmes.
Carlos estudou piano e guitarra anteriormente, mas, interrompeu o cursoporque no se identificava com o repertrio estudado na poca; alm disso, seus
pais e professora insistiam para que ele tocasse em festas e reunies sociais, o que
ele detestava.
Mrcio
Faixa etria:40-50 anosProfisso:administrador
Mrcio estuda piano com seu atual professor h seis meses. Ele pretende,
com o estudo do instrumento, ler partitura e tocar piano plenamente e entender
profundamente de teoria de forma a poder escrever o que [ele] mesmo harmonizou
alm de acompanhar o coral do qual faz parte. Mrcio tem grande interesse sobre
assuntos relacionados ao piano, frequenta concertos e shows de rock e ouve
msicas em casa, de estilos variados. Segundo ele, [seu] tocador de MP3 umasalada s!
Mrcio estudou piano e violo quando mais jovem, porm no via rendimento
em suas aulas e, consequentemente, ficava desanimado. Ele relata algumas
experincias musicais realizadas anos antes que, segundo ele, contriburam muito
para sua formao musical:
Mrcio: Aos doze anos aprendi a tocar violo por cifra. No entendiao porqu das cifras, mas tocava bem. At compus msica e tocavaem banda. Aos vinte anos tentei aprender piano por msica pelaprimeira vez. Decorei algumas performances ao piano, soava bonito,mas eu no conseguia aprender a ler partitura.
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Marina
Faixa etria:acima de 50 anos
Profisso:aposentada
Marina aluna de seu atual professor h cinco anos. Ela afirma sua
preferncia pela msica erudita, seja no repertrio que gosta de tocar ou nas
msicas que ouve em casa; alm disso, costuma frequentar concertos e ler textos
relacionados ao piano. Seu objetivo com o estudo do instrumento aproveitar o
mximo da vontade de aprender a tocar piano para satisfazer um sonho, pois para
[ela] uma alegria saber tocar mesmo que seja um pouco, pois [se encanta] com o
piano.
Em 1963, Marina estudou piano por dois anos e violo por um tempo, de
ouvido. Parou com o estudo do piano porque a famlia se desfez do instrumento.
Ela afirma que estudava piano por achar bonito e ter muita vontade de aprender e
no caso do violo, ela participava de um grupo de dana portuguesa. Segundo
Marina, estas experincias contriburam muito [para sua formao musical], pois
ficou a grande motivao de querer um dia poder estudar para tocar bem um
instrumento, principalmente o piano. E s [pde] faz-lo depois que [se aposentou].
Cludia
Faixa etria: acima de 50 anos
Profisso: Professora universitria aposentada
Cludia sempre gostou do piano e, ainda criana, mostrou grande interesse
em aprender o instrumento, mas no teve oportunidade. Quando se aposentou, em
2005, resolveu iniciar o estudo pianstico. Comeou com aulas de teclado eletrnico
por dois anos e depois passou para o piano. Devido a problemas familiares ela
interrompeu o curso por alguns momentos. Ela aluna de sua professora atual
desde agosto de 2010. Cludia frequenta concertos e recitais; aprecia msica
clssica, folclrica e MPB tanto para ouvir quanto no repertrio que gosta de tocar;
alm de pesquisar e ler sobre a vida dos compositores. Seu objetivo com o estudo
do piano manter a mente ativa, aprender coisas novas alm de gostar muito doinstrumento.
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Cludia considera sua formao musical muito pequena. Ela afirma que no
teve outras atividades musicais nem tocou informalmente antes de iniciar o estudo,
quando se aposentou. Entretanto, sempre foi apreciadora de msica tendo
assistido muitos concertos de instrumentistas e orquestras.
ESTRUTURA DA DISSERTAO
Os quatro tpicos dos questionrios supracitados serviram de suporte para os
temas dos quatro captulos que compem este estudo, nos quais os comentrios
dos autores consultados se mesclaram s respostas dos participantes da pesquisa,
promovendo um dilogo entre eles.
O primeiro captulo Formao profissional, experincia docente e
experincia musical - trata da formao musical e experincia docente dos
professores de piano no Brasil.
O segundo captulo Desenvolvimento de habilidades piansticas - trata do
desenvolvimento das habilidades e competncias musicais e piansticas
consideradas essenciais ao ensino de piano, segundo a opinio de autores comoGONALVES (1989),MONTANDON (2004), SANTIAGO (2006), entre outros, bem
como dos professores e alunos participantes. De acordo com a reviso de literatura
e com as respostas dos questionrios, selecionamos algumas habilidades que sero
discutidas no contexto de ensino de piano para adultos.
O terceiro captulo Processos de ensino/aprendizagem - apresenta um
breve resumo das principais abordagens do processo de ensino-aprendizagem, pela
viso de autores como MIZUKAMI (1986), FERRACIOLO (1999) GLASER eFONTERRADA (2006), entre outros. Alm disso, as respostas dos entrevistados
apontam caractersticas de metodologias utilizadas em aulas de piano para adultos
iniciantes.
O quarto e ltimo captulo Motivao, atitudes e relacionamento professor-
aluno - abrange algumas teorias modernas da motivao. Por meio das respostas
dos questionrios dos participantes, tais teorias foram relacionadas com o processo
de ensino-aprendizado pianstico para adultos. As opinies dos participantes
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apontam ainda consideraes a respeito de atitudes e relacionamento professor-
aluno.
Desta forma, esperamos favorecer a ampliao e o desenvolvimento de
metodologias de ensino de piano para adultos, tambm promovendo a reflexo
daqueles que atuam nesta instncia da pedagogia do piano.
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CAPTULO 1 - FORMAO PROFISSIONAL, EXPERINCIA DOCENTE E
EXPERINCIA MUSICAL
1.1 O perfil do professor de piano no Brasil
1.1.1 Introduo
Assim, se existe hoje entre ns uma fecunda e j tradicional culturapianstica, tal fato se deve quelas prendadas sinhs e melenudossinhs de outrora, que desde os albores do sculo XIX exercitaram opiano, transmitindo o seu gosto de gerao em gerao; comoigualmente se deve aos professores [...] (REZENDE, 1970, p. 11)
O professor de piano surgiu no Brasil a partir da popularizao deste
instrumento no pas. Segundo Rezende (1970, p. 14) no incio do sculo XIX, com a
chegada de D. Joo VI, iniciou-se no Brasil um verdadeiro ciclo do piano.
Acompanhado de sua famlia e Corte, D. Joo VI produziu profundas modificaes
no modus vivendi dos brasileiros, com repercusses favorveis sobre o ambiente
musical. (citaes completas p. 14). Tratados firmados com a Inglaterra e a abertura
dos portos determinaram a entrada dos primeiros pianos no pas.
Naquela poca o piano era para poucos. Entretanto, como destaca Leite (In:
FUCCI AMATO,2007), a partir da segunda metade do sculo XIX, com a chegada
ao Brasil de imigrantes europeus, formou-se uma nova elite que transferiu seus
padres, hbitos e culturas ao pas; dentre estes, a valorizao do estudo e da
prtica pianstica. No incio do o sculo XX, com o aumento do poder aquisitivo das
famlias imigrantes estabelecidas no Brasil o piano passou a ocupar espao em
casas de classe mdia e um novo comrcio surgiu no pas: as lojas especializadasem vendas de partituras e mtodos. Concomitantemente surgiram novos
profissionais: os afinadores de piano e os professores particulares (geralmente
imigrantes) e, para completar este cenrio, as escolas especializadas no ensino
musical com nfase especial dada educao pianstica: os conservatrios.
Os conservatrios musicais eram escolas tradicionais de influnciaeuropeia e revelavam como objetivo, durante toda a sua existncia, aqualidade performtica de seus alunos, privilegiando uma tcnicarequintada para a interpretao do repertrio de grandes mestres damsica erudita. (FUCCI AMATO, 2001, p. 89)
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1.1.2 Formao pianstica de professores de piano no Brasil
A formao piansica do professor de piano acontece, geralmente, atravs de
aulas particulares, conservatrios, escolas e universidades de msica; desta forma,
desde seu surgimento no Brasil este profissional vem atuando nestas instituies
e/ou em sua prpria casa. Os professores participantes desta pesquisa possuem
formao pianstica nas principais universidades de Belo Horizonte e atuam na
profisso h considervel tempo. Todos possuem mestrado e, um deles, doutorado.
Entretanto, ao serem questionados sobre instituies de ensino e professoressignificativos, eles no deixaram de mencionar seus primeiros anos de estudo e/ou
seus primeiros educadores.
Carmen: Desde os dois anos de idade, conscientemente, ouvindomeu av estudando/tocando msica erudita e popular e minha avlecionando piano e acordeom. A partir dos cinco anos comecei a teraulas de msica/piano com minha av at fazer o vestibular em1977.
Maurcio:Estudei inicialmente - dos 6 aos 12 anos - com professoraparticular, no interior do estado; posteriormente, j com 18 anos,ingressei em Conservatrio, ainda no interior do estado; mais tarde,aos 20 anos, ingressei na Escola de Msica da UFMG para cursarBacharelado em Msica/Piano.
Dbora indica figuras relevantes em sua formao pianstica, ao longo do
tempo: nos primeiros anos de estudo, Snia LAbbate e Maria Clara Paes Leme. No
curso de graduao, na Escola de Msica da UFMG, seus professores foram
Eduardo Hazan, Berenice Menegale e Magdala Costa. No mestrado, na mesmainstituio, ela estudou com Lucas Bretas e Guida Borghoff. Dboraainda destaca
aulas particulares com Daisy de Luca (SP) e com Maria Lcia Coutinho e Celina
Szrvinsk (BH), bem como aulas particulares, cursos e master classes com Luiz
Senise, Jayme Guimares e Snia Vieira.
Adalmrioexpe uma experincia negativa com sua primeira professora de
piano.
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Adalmrio:Iniciei meus estudos aos seis anos, com uma professorano interior, Ipanema, MG, daquelas que no tocam nada e batem namo dos alunos, que deixam os alunos tocando e vo fazer outrascoisas.
Entretanto, ele cita, alm de professores e instituies, outros lugares em que
teve oportunidade de trabalhar e adquirir experincia, bem como profissionais da
rea musical que foram significativos em sua formao, como descrito abaixo.
Adalmrio: Aos onze ingressei no Conservatrio Brasileiro deMsica, com uma professora muito boa, Irm Ceclia, era um colgiointerno, eu morava em outra cidade e ia para l nos fins de semana
fazer aulas de piano e percepo musical. Aos treze ingressei noConservatrio Mineiro de Msica, hoje Escola de Msica da UFMG,no CFM; estudei piano com Lucas Bretas, Magdala Costa, LgiaBecker, percepo com Mauro Macedo e Maria Lgia Carvalho SouzaLima, todos muito importantes para a minha formao e gosto einteresse pela msica e pelo instrumento. Aos dezessete entrei paraa Graduao na Escola de Msica da UFMG, com a professoraMaria Lcia Coutinho Collen, a quem devo a maior parte de minhaformao tcnica no instrumento.
possvel observar, nas respostas de Adalmrio, prticas externas aocontexto acadmico que refletiram positivamente em sua formao musical e
pianstica. Ele conta que, aos dezesseis anos, entrou para uma banda de bailes e
que o contato com estes msicos experientes contribuiu para seu amadurecimento
musical. Alm disso, ele relata:
Adalmrio:[...] eu sempre ia a festivais, fazia muitos contatos, nunca
fui adepto de uma s escola de piano, nunca me considerei discpulode ningum. J no final de minha graduao comecei acompanhandoos alunos de canto do professor Amim Feres e entrei para o CoralMadrigal de Ouro Preto no qual fiquei por 10 anos, e acredito ter sidoa minha solidificao em formao musical, tive contato de perto comregentes e obras importantes, como por exemplo, o MaestroMagnani,o Maestro Davi Machado, o prprio Amim e outros que iamaos festivais em Ouro Preto, onde eu ficava at por dois meses diretoacompanhando cantores e correpetindo o coro, alm de integrar ocoral como cantor.
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Finalmente, Adalmrio nos conta sobre sua continuidade de estudos no
contexto acadmico:
Adalmrio: Formei aos 23, mas tive aulas com vrios professores [...]estudei algum tempo com professores particulares, como LusSenise, a prpria Maria Lcia e outros. Aos 43 conclu o Mestradosob a Orientao do Prof. Maurcio Veloso, a quem tenho grandeapreo e reconhecimento pelas coisas que aprendi com ele.
Analisando as respostas dos professores participantes possvel constatar
que todos iniciaram seus estudos com professores particulares de piano. Em seu
estudo, sobre professores particulares de piano atuantes na cidade de Porto Alegre,
Bozzetto (2004) entrevistou treze profissionais com idades entre 62 a 79 anos eafirma a importncia dos mesmos em nosso pas. A autora afirma (2004, p. 11):
No Brasil, o professor particular de piano responsvel por umaparcela do ensino de msica que no se encontra nas instituiesescolares. Atuam em casa ou a domiclio h considervel tempo,educando crianas, jovens e adultos, preparando msicos e/oufuturos profissionais na rea.
A entrevista realizada por Bozzetto aponta que a maioria dos entrevistados
considera essencial ter titulao, diploma ou um curso especfico na rea para
exercer a profisso de professor de piano. Contudo, ressaltam a importncia da
qualidade dessa formao para impedir a desqualificao profissional. (BOZZETTO,
2004, p. 82-83)
1.1.3 Atividades exercidas por professores de piano no Brasil
Formao e prtica pedaggica
Se por um lado, a formao pianstica adquirida ao longo dos anos
aperfeioada nos conservatrios e universidades, a formao pedaggica nem
sempre est presente nestas instituies, especialmente se tratando dos cursos de
bacharelado. Muitos autores que tm se dedicado a investigar o perfil do professorde piano no Brasil observaram que, de fato, existe uma lacuna na formao
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pedaggica destes profissionais e a tendncia do msico-instrumentista ensinar de
maneira semelhante ao que vivenciou quando aluno (SANTIAGO, 2004; GEMESIO,
2010; SCARAMBONE, 2008; OLIVEIRA, 2007; CANDA, 2006; BOZZETTO, 2004;
GLASER & FONTERRADA, 2004; ARAJO, 2005;). Contudo, a experincia de cada
professor vai sendo construda ao longo de suas carreiras como pianistas e
professores, por meio de suas prprias prticas em diferentes situaes; em outras
palavras, o instrumentista-professor constri e reconstri seus conhecimentos
conforme a necessidade de utilizao dos mesmos, seus percursos formativos,
profissionais e de suas experincias. (CANDA, 2006, p. 4). Como destaca
Gemesio (2010, p. 121):
Os saberes que so significados e validados nas situaes detrabalho vivenciadas pelos professores so, principalmente, ossaberes da sua experincia como aluno, mas tambm estofundamentados em uma experincia que vai sendo construda aospoucos, formada por diferentes saberes que emergem da prpriaprtica, saberes intuitivos e tcitos, muitas vezes no refletidos eincorporados ao seu repertrio pessoal de conhecimento.
Esta realidade tambm observada por Bozzetto (2004, p. 103):
Alm das instituies oficiais de formao profissional, osprofessores se formam em outros espaos, como no da experinciaque advm da prtica pedaggica, da sua ao como docente, doseu relacionamento com os alunos, do contexto no qual est inseridoe onde ele se constri.
Os professores participantes desta pesquisa afirmaram que no havia no
currculo do curso de graduao, disciplinas a respeito de pedagogia do piano.Adalmrioafirma sentir falta, em sua formao, de bases tericas sobre didtica do
instrumento:
Adalmrio: Sinto um pouco de falta de formao em mtodos. svezes sou cobrado pelos colegas da UFMG dizendo que tenho quedar aulas de didtica do instrumento, e no me sinto combases tericas para isto. Acho que falta, na formao do graduando,
muito de teoria em educao musical e didtica, uma vez que ele vaiatuar profissionalmente, em quase cem por cento das vezes, comoprofessor.
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Apesar da ausncia de disciplinas didticas na graduao, os professores
participantes consideram satisfatria a formao pedaggica que adquiriram.
Novamente os primeiros professores foram citados como referncias pedaggicas
bem como outros educadores com os quais os entrevistados j tiveram aulas. Alm
disso, geralmente a prtica docente ocorre antes da formao acadmica
universitria por meio de troca de experincias e observaes de aulas dos colegas
atuantes na rea. Dbora e Maurcio indicam a experincia prtica como fonte
primria de sua formao pedaggica:
Dbora:Minha formao pedaggica se deu ao acaso. Aos 19 anos,fui procurada para dar aulas de piano a duas crianas e foi a prpriaPatrcia Furst quem me encaminhou ao Ncleo Villa-Lobos [deEducao Musical de Belo Horizonte]. [...] Foi assim que tudocomeou para mim! Na faculdade, no tive orientao para isso. Foino Ncleo, atuando na sala de aula, pondo a mo na massa, que,de fato, aprendi a gostar de ser professora. Assistia a muitas aulas,observava meus colegas mais experientes com ateno e contei coma orientao e a pacincia da Betnia Parizzi e da Rosa Lcia dosMares Guia.
Maurcio: Minha formao pedaggica deu-se a partir de minhaformao pianstica, de maneira muito prtica. Pude atuar comomonitor de Percepo Musical na Escola de Msica da UFMG ecomo professor de Piano e Percepo Musical em escola particularde msica.
Para Adalmrio, os ensinamentos que recebeu de Violeta Gainza foram
determinantes em sua formao pedaggica; tais ensinamentos foram relatados
pelo professor e sero descritos no prximo captulo. Alm disso, Adalmrio nosconta sobre sua formao prtica:
Adalmrio:[...] comecei a dar aulas de piano numa escola particularde msica, chamada Escola de Artes, que funcionava na Rua Tupis,80, no fundo da Igreja Metodista, o Maestro Mrcia Miranda Pontesfoi o idealizador desta escola. Outros professores do nosso meioderam aula l, o Prof. Maurcio Veloso, a Professora Marisa Simese outros.
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Adalmrio tambm explica que, naquela poca, ele trabalhava como
estagirio na graduao, com turmas de percepo musical, orientado pela
professora Lgia Souza Lima e com a orientao pedaggica de sua professora de
piano, Maria Lcia Coutinho.
Carmen indica a observao informal e a prtica formal como importantes
bases de sua formao pedaggica:
Carmen:Primeiramente foi observando minha av lecionando piano,acordeom e teoria musical para crianas, jovens e adultos. Maistarde, aos dezenove anos (1978), tive a oportunidade de iniciar umtrabalho como professora de rgo eletrnico, sob a superviso deuma equipe de msicos e maestros da Yamaha Music Foundation[...] Primeiramente minha av com sua psicologia de normalista e osmtodos e metodologia que adotava para a iniciao musical aopiano. Em seguida a Yamaha Music Foundation com suascontribuies quanto s capacitaes pedaggicas e metodologiaspara o ensino de instrumentos em grupo, alm dos investimentos emseminrios e master classes sempre com msicos e professoresexperientes.
Ela ainda observa a ausncia de disciplinas de formao pedaggica em seu
contexto acadmico de estudo pianstico:
Carmen:Quando cursei o Bacharelado em Piano (antiga FUMA, hojeEscola de Msica da UEMG) no havia no currculo nenhumadisciplina voltada para a rea pedaggica. No entanto, desde muitojovem - talvez por influncia da minha av sempre me habituei aprocurar um olhar didtico pedaggico nas condutas de todos osmeus professores, seja na rea musical ou no. Observava o quemais funcionava em sala de aula, e principalmente o que no deviaser seguido. Estava sempre atenta forma como os contedos eramapresentados, percebia como era a receptividade de cada colega e
ciente das dificuldades ou facilidades procurava delinear um outrocaminho, uma nova alternativa.
Todos os professores desta pesquisa demonstram sua longa prtica
pedaggica precoce, o que refora a ideia de que, pondo a mo na massa, como
diria Dbora, professores de piano efetivam sua formao pedaggica. Carmen
iniciou sua prtica como professora de piano em 1977; Maurcio, em 1987; Dbora,
aos 19 anos e Adalmrio, em 1986.
Alm disso, os professores trabalham com diferentes faixas etrias e emdiversos contextos, seja ministrando aulas particulares em casa, em escolas
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particulares de msica ou universidades; tanto para alunos que busquem a
profissionalizao quanto para aqueles que estudam por hobby, o que requer grande
flexibilidade por parte destes profissionais. Na maioria das vezes, esta realidade no
a mesma que vivenciaram na poca em que eram alunos. Como afirma
Scarambone (2008, p. 4):
A atuao do professor de piano tem sido ampliada de forma quelidar com a diversidade de espaos, diversidade de interesses eperfis dos alunos se torna um desafio por apresentar situaes noprevistas ou experimentadas. Antigamente, o professor de pianopodia ser identificado com o professor particular, que dava aulasindividuais, ou professores de conservatrio, ou mais raramente
professores do ensino superior. O foco do ensino era em transmitirconhecimentos e tcnicas necessrios para formar o alunoconcertista, desenvolvendo um ensino considerado excludente paraaqueles que no se adequassem s exigncias desse modelo.
O professor instrumentista
Os questionrios apontaram um fator em comum em relao s atividades
que os professores realizam: todos eles atuam, mesmo que eventualmente, na reada performance, como pianistas correpetidores e/ou solistas, como possvel
observar nas seguintes respostas de Carmen, Maurcioe Adalmrio questo sobre
o tema.
Carmen: Correpetidora dos alunos de canto, cordas e sopros doCurso Bsico Fundamental que participam do projeto Bsico Atuante,por mim coordenado h cinco anos na Escola de Msica da UEMG.Apresentaes eventuais como pianista em recepes, repertriosemi-clssico e popular nacional e internacional.
Maurcio:Apresento-me regularmente em concertos e recitais, comorecitalista e camerista.
Adalmrio: Atuo como correpetidor de cantores e instrumentistas,circunstancialmente como solista em concerto com orquestra ouobras sinfnico corais, recitais solo espordicos. Minha atuaocomo concertista muito pequena no meio musical, pela simplesfalta de pacincia de sentar no banco do instrumento e estudar,muito ou ao menos satisfatoriamente, como fazem os pianistas que
esto atuando.
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Dbora, por outro lado, enfatiza o aspecto pedaggico da sua atuao:
Dbora: Minha atuao ocorre mais em sala de aula do que nospalcos. Em outubro de 2010, toquei as Cenas Infantis (Robert
Schumann), a 4 mos, com a pianista Fernanda Zanon no teatro daFundao de Educao Artstica. Foi uma tima experincia!
A realidade do profissional instrumentista-professor observada no apenas
entre os professores de piano; Glaser (2006) atenta para o fato de no existir uma
separao clara entre professor de msica e instrumentista:
O fato de os instrumentistas lecionarem com regularidade reflete nos a procura deles por alunos interessados em estudar instrumento,mas tambm espelha no existir uma separao acentuada entre aatuao como instrumentista e como professor de instrumento navida do msico profissional. Isso quer dizer que, embora tocar elecionar sejam atividades completamente diferentes, podem ser (eso) exercidas pelo mesmo profissional, o que uma peculiaridadeda rea musical e permite afirmar que todo instrumentista potencialmente um professor de seu instrumento. (GLASER, 2006, p.92)
1.1.4 Caractersticas pessoais e profissionais do professor de piano
Segundo Carmen, aprender a ensinar um constante exerccio. Face s
diversas realidades e diferentes perfis de alunos que frequentam aulas atualmente,
necessrio que o professor de piano desenvolva caractersticas pessoais eprofissionais que iro auxiliar sua prtica docente. Na pesquisa de Bozzetto (2004,
p. 82) os professores participantes apontaram algumas caractersticas como
fundamentais ao professor particular de piano, tais como: amplo conhecimento geral;
boa formao musical; domnio e conhecimento de seu instrumento; experincias e
conhecimentos de gneros como peras, msica de cmara e msica sinfnica alm
de conhecimento de harmonia, contraponto, anlise e teoria musical. No que diz
respeito s caractersticas pessoais, a pacincia foi destacada em muitos
depoimentos, alm da responsabilidade e uma postura tica e social. Ter um bom
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relacionamento com seus alunos e gostar do que faz tambm fundamental
(BOZZETTO, 2004 p. 83-84).
Nesta pesquisa, os professores foram questionados a respeito dascaractersticas pessoais e profissionais indispensveis ao professor de piano.
Qualidades como flexibilidade e conhecimento musical foram apontadas. As
respostas de Maurcioe Dboracoincidem:
Maurcio: Flexibilidade, bom senso, conhecimento musical epianstico, prtica pianstica (atividade como performer),conhecimento do repertrio e da literatura relacionada.
Dbora:Boa formao pianstica, vivncia do repertrio musical (noapenas direcionado ao piano), hbito de leitura, presena nos recitaise concertos de msica, conhecimento sobre as culturas geral ebrasileira, pacincia, flexibilidade para lidar com diferentes tipos dealunos (gostos e bagagens musicais especficos).
Para Carmen, caractersticas pessoais como sinceridade e honestidade so
imprescindveis para que outras caractersticas profissionais possam brotar egerminar:
Carmen: Apresentar um ser ideal requer muita audcia eresponsabilidade. Mas acredito que sinceridade, honestidade comseus propsitos e dos outros, ateno, compreenso, considerao erespeito so caractersticas pessoais imprescindveis a qualquer bomrelacionamento interpessoal. A partir delas, as outras caractersticasprofissionais iro brotar e germinar. O importante que a terra sejaadequada ao cultivo.
Adalmriofala sobre diversificao, sensibilidade e formao musical geral:
Adalmrio: Acho que a diversificao. Como j disse anteriormente, oprofessor deve ser o integrador do aluno. [...] Acho que o professordeve adquirir sensibilidade para ver qual a motivao potencial doaluno em relao sua escolha do instrumento, desde as primeirasaulas. [...] Outra caracterstica que tambm acho fundamental aformao geral do professor em reas ditas tericas comocontraponto, estruturao, apreciao musical e teoria geral damsica e outras. Isto com certeza ajudar ao professor a edificar oseu aluno de forma horizontal.
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Estas respostas correspondem s caractersticas que os alunos participantes
da pesquisa esperam de um bom professor de piano. Daniela afirma que ele deve
ser um bom pianista e ter sensibilidade e pacincia para ensinar. Para Marina, o
professor precisa ser educado, acolhedor, tranquilo, paciente e com disponibilidade.
Para Amanda, ele precisa ter conhecimento na rea e didtica; ser paciente,
animado, dedicado e gostar de gente. Cludia, Carlos e Mrcio afirmam:
Cludia: Competncia, profissionalismo, gostar de ensinar, incentivaros alunos. Saber reconhecer os objetivos e as limitaes de cadaaluno.
Carlos: Em minha opinio um professor deve ter um conhecimentoterico e prtico bastante slido daquilo que se prope a ensinar.Deve ter a capacidade de perceber as habilidades e limitaes deseus alunos elaborando, na medida do possvel, um plano detrabalho individualizado para cada um deles. Quanto scaractersticas pessoais deve gostar de ensinar ser organizado e termuita pacincia.
Mrcio: Primeiro ter o talento de perceber qual a maior necessidadedo aluno, qual a sua maior dificuldade, seu ponto mais fraco. E entoconhecer e trazer para a sala de aula material de primeira categoria
para trabalhar aquele assunto com o aluno. Tambm entendo comoprimordial a capacidade de ensinar de forma formal, mas, amigvel eeducada. Por ltimo desejvel que ele toque muito bem.
Nesse sentido, concordamos com a afirmao de Scarambone (2007, p. 151):
De outra forma, hoje o professor de piano e de outros instrumentospossui um campo variado de atuao e um pblico diversificado.
Assim, o professor de instrumento deve considerar o amplo perfil dosalunos (crianas, adultos) e seus interesses na aprendizagem doinstrumento (instrumento como acompanhante, aprendizagem porlazer, acompanhamentos em igrejas, formao de concertistas). Arealidade do trabalho do instrumentista demanda uma flexibilidade deatuao.
A formao pianstica do professor consolidada no estudo acadmico; por
outro lado, a maioria dos cursos de bacharelado em piano no oferecem disciplinas
pedaggicas no currculo. Desta forma, o instrumentista-professor desenvolve suasprprias prticas pedaggicas por meio de sua experincia profissional, o que
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muitas vezes pode funcionar, mas reflete a lacuna ainda existente na formao geral
do pianista que, como diria Adalmrio, vai atuar profissionalmente, em quase cem
por cento das vezes, como professor.O professor de piano precisa estar preparado
para lidar com a realidade do ensino de piano nos dias atuais, que aponta diferentes
contextos de aprendizagem, bem como a diversificada clientela que procura
aprender o instrumento. Conhecimento musical, prtica pianstica e flexibilidade so
algumas das caractersticas essenciais ao trabalho docente, conforme indicado
pelos professores e alunos participantes desta pesquisa. Acreditamos que tais
caractersticas podem ser desenvolvidas e aprimoradas na carreira pedaggica do
professor de piano, pois, segundo Carmen, aprender a ensinar um constante
exerccio.
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CAPITULO 2 - DESENVOLVIMENTO DE HABILIDADES PIANSTICAS
2.1 Introduo
O aprendizado instrumental um processo complexo e exige do aluno a
aquisio de competncias e habilidades tcnico/musicais indispensveis para o
bom desempenho do instrumento escolhido. Em tal processo, vrios fatores esto
envolvidos, desde o aspecto motor compreenso esttica de uma obra musical.
Entretanto, de acordo com sua experincia e conhecimento musical e considerando
o perfil, idade e objetivos de seus alunos, o professor os orienta na aquisio de
habilidades consideradas como essenciais para a prtica pianstica. Segundo
Kaplan (1987, p. 66):
A tcnica de execuo de um instrumento musical notadamente ado piano se constitui em um dos atos mais complexos, do ponto devista da coordenao psicomotora, realizados pelo ser humano. Noseu aspecto mais amplo, pressupe o conhecimento e acompreenso do valor simblico de sinais (notas, valores, etc.) e suarealizao atravs de uma srie de movimentos sucessivos degrande preciso que exigem uma ordem no tempo e uma orientaoe estruturao no espao.
Devido a sua complexidade, o processo de aprendizagem pianstica se d
atravs de diversas estratgias que promovam o desenvolvimento de tais
competncias e habilidades, alm disso, espera-se que o ensino instrumental seja
efetivamente musical. Swanwick (1994, p. 7) afirma que:
A ao complexa de se tocar um instrumento no pode ser abordadaseguindo-se um nico mtodo ou apenas utilizando-sesistematicamente um mesmo livro, pgina aps pgina. Aaprendizagem musical acontece atravs de um engajamentomultifacetado: solfejando, praticando, escutando os outros,apresentando-se, integrando ensaios e apresentaes em pblicocom um programa que tambm integre a improvisao. Precisamostambm encontrar espao para o engajamento intuitivo pessoal doaluno, um lugar onde todo o conhecimento comece e termine.
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Concordamos com a afirmativa de Reis (2000, p. 25): durante os primeiros
estgios do aprendizado instrumental de uma criana que ocorre a introduo de
princpios que guiaro sua conduta musical futura. Embora uma boa orientao no
seja garantia de aprendizado efetivo, o professor precisa ter em mente a
responsabilidade na formao musical de alunos iniciantes visto que uma
orientao deficiente pode comprometer ou adiar, na melhor das hipteses, uma
realizao instrumental satisfatria, (REIS, 2000, p. 25). Reis (2000, p.27) afirma
ainda que, para que possa manifestar-se expressivamente atravs de sua
performance, o aluno de nvel elementar precisa desenvolver determinadas
competncias musicais e piansticas, tais como:
senso rtmico;
noes de fraseado, toque e articulao;
definio de planos sonoros;
percepo da organizao estrutural;
uso simples do pedal;
percepo da dimenso esttica da msica.
Gonalves (1989), na srie Educao Musical atravs do Teclado,prope um
curso bsico para o ensino integrado de msica e instrumento. Diferente da proposta
tradicional cujo ncleo do processo ensino/aprendizagem a formao do solista
por meio da prtica de tcnica e repertrio, a metodologia adotada nesta srie visa o
desenvolvimento da musicalidade do aluno atravs da prtica de outras habilidades
funcionais como acompanhamento e criao, visando a formao do instrumentista
que ir tocar solo ou em conjunto e em diferentes situaes.
Quando o ncleo deste processo passa a ser ocupado pela prticade HABILIDADES FUNCIONAIS NO USO DO TECLADO, nota-seque a formao do aluno torna-se mais abrangente, adequando-ses exigncias profissionais dos dias que vivemos, sem ignorar anecessidade da prtica de msica para o lazer que tambmcaracteriza nossa poca. (GONALVES, 1989, p. viii)
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Segundo a autora, guardadas as propores estabelecidas pelas etapas que
[os alunos] vm vencendo, as habilidades que devem ser praticadas desde o incio
do processo ensino/aprendizagem so as seguintes (p. viii):
saber usar o teclado tocando por imitao ou por audio (de ouvido);
ler msica no teclado (texto musical, cifras, primeira vista);
harmonizar no teclado;
acompanhar;
transportar;
criar (improvisar, compor);
dominar a tcnica instrumental; executar repertrio (solo; conjunto);
analisar e ouvir criticamente.
A autora enfatiza que estas habilidades s tem significado quando integradas
e desenvolvidas no sentido de levar comunicao e expressividade da
linguagem musical. (p. viii) A srie EMaT1 prope o desenvolvimento musical de
iniciantes por meio de etapas que o aluno dever vencer: musicalizao;alfabetizao musical e desenvolvimento da musicalidade esta ltima est
presente em todos os nveis que o aluno se encontre.
O termo musicalidade, compreendido, no como a designao de umdote inato, mas como capacidade de entender e fazer msica, naverdade, no se confina a uma etapa. perene. A pessoamusicalmente educada tem sempre oportunidade de desenvolver aprpria musicalidade, a sua qualidade de msico. (GONALVES,
1987, p. 1)
Montandon (2004) apresenta um relato de sua experincia na universidade de
Braslia como professora da disciplina piano complementar obrigatria para todos
os cursos, exceto para alunos do curso de bacharelado em piano. A autora acredita
que a disciplina deveria preparar os alunos para o mercado de trabalho, em diversas
reas de atuao: professores de aulas prticas e tericas, regentes e
correpetidores, visto que o mercado de trabalho para o msico tem mudado,
1Sigla utilizada pela autora da srie Educao Musical atravs do teclado.
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exigindo msicos mais versteis, mais abrangentes, mais flexveis e mais criativos,
onde somente o conhecimento terico e o tocar bem um instrumento no so mais
suficientes. (MONTANDON, 2004, p. 108) Ela ressalta ainda que tal disciplina est
presente em muitas grades curriculares de cursos de graduao em msica e ,
geralmente, ministrada em grupo. Entretanto, o contedo o mesmo de uma aula de
piano individual, no havendo distino entre o ensino do piano enquanto
instrumento musical ou como instrumento auxiliar na formao do msico.
(MONTANDON, 2004 p. 105)
Face a esta situao, Montandon (2004, p. 109) prope uma lista de
habilidades que considera essenciais para a formao do aluno de piano:
ler notao para piano;
tocar em diferentes regies do teclado desde o incio,
tocar com ambas as mos, melodias homofnicas e polifnicas
harmonizar melodias populares e folclricas simples
transpor
improvisar ou criar frases musicais, acompanhamentos, pequenas peas
arranjar
tirar de ouvido
tocar sozinho ou em grupo, repertrio de diferentes pocas e estilos
relacionar o conhecimento de outras disciplinas na execuo do piano.
Santiago elaborou uma proposta semelhante para as disciplinas Teclado I e II,
ministradas na Escola de Msica da UFMG para a formao musical de licenciandos
e material pedaggico para a disciplina Teclado V, adotado no Curso de Licenciaturaem Msica - Ensino a Distncia - UNB/Programa Universidade Aberta do Brasil2.
Segundo sua proposta, as habilidades msico/instrumentais necessrias ao
aprendizado do teclado so: desenvolvimento motor, leitura primeira vista, ouvido
e transposio, harmonia no teclado, estilos musicais brasileiros, repertrio e prtica
de conjunto.
Os professores participantes apontaram as habilidades que consideram
necessrias ao ensino de piano e acreditam que tais habilidades devem ser2 SANTIAGO, Patrcia Furst. Apostilas para o ensino de Teclado, material no publicado, p. 4, 2009/2011.
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trabalhadas com todos os alunos, independente da faixa etria. Carmen, Dborae
Maurcioofereceram os seguintes comentrios sobre o assunto:
Carmen: Considero algumas habilidades, tais como: domnio esegurana ao explorar a topografia do instrumento; controle dasonoridade desejada; capacidade de reconhecer e transferir a notalida na pauta e sua imediata localizao no instrumento;entendimento e realizao de frases musicais; memorizao departituras; desprendimento para dar continuidade msica, emdetrimento de alguns esbarros (capacidade de criar e improvisar);habilidade de se controlar e se perceber enquanto estuda,conscientizando-se de seus gestos e aguando a percepo doresultado sonoro obtido etc. [...] Estas habilidades, a meu ver,independem da faixa etria.
Dbora: Em relao a outras habilidades tcnicas ou musicais(formatao de mo, conhecimento das cifras ou da pauta,consistncia do som), penso que devem ser trabalhadas com todosos alunos: adultos, adolescentes ou crianas.
Maurcio:Basicamente um bom controle motor, alguma flexibilidade
fsica e resistncia.
Os alunos participantes desta pesquisa tambm concordam que estas
habilidades so essenciais a uma boa performance. Cludia no v possibilidade
de desenvolvimento [ao piano] sem a aquisio das habilidades. Carlos afirma:
Sem dvida. Penso que a qualidade do desempenho de uma pessoaao piano determinada pelo somatrio de todas essas habilidades.
2.2 Comparando a aquisio de habilidades entre adultos e crianas
As expectativas dos alunos adultos iniciantes tendem a ser bem definidas por
seus objetivos, por exemplo, aprender a tocar piano para acompanhar um coral,
participar de um grupo musical ou tocar piano como uma atividade de lazer. Tais
objetivos devem nortear o trabalho do professor de piano, que poder estabelecer as
habilidades piansticas/musicais que considera necessrias e que, paralelamente,
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vo de encontro s expectativas deste pblico especfico, sem ignorar a diferena
existente entre alunos adultos e crianas.
Os professores participantes apontam algumas vantagens na prtica comalunos adultos. Dboraconsidera os adultos mais calmos e menos barulhentos;
Maurcio afirma que eles esto sempre atentos e participativos. Para Carmen,
estes alunos so mais atenciosos e menos agitados durante as aulas, so mais
persistentes, vibram mais com pequenas conquistas e ainda acatam as [suas]
propostas de estudo, mostram-se atentos ao que pedido e se esforam para
alcanar os objetivos musicais.
Quanto s dificuldades em se trabalhar com esta clientela, Carmenconsideraa autocrtica um fator que pode dificultar o processo de ensino/aprendizagem:
Carmen: Autocrtica muito severa que reflete um comportamentoinseguro acompanhado por uma srie de justificativas. Quando estequadro comea a ser recorrente, tenho conversas regulares com osalunos para lembr-los que o estudo musical deve continuar sendoaquele prazer to desejado em suas vidas. E foi justo por este motivoque eles procuram um educador musical.
Para Maurcio, alunos que tenham frequentado aulas de piano anteriormente,
podem trazer alguns vcios difceis de serem trabalhados; outras vezes tm
dificuldade em aceitar novos conceitos.
Uszler et al. (2000, p. 60-61), descrevem as vantagens e desvantagens que o
aluno adulto apresenta em relao ao estudo do piano. Algumas das vantagens, na
viso destes autores, so as seguintes:
o instrumento feito para uma pessoa adulta: o adulto alcana facilmente o
pedal e as extremidades do teclado;
o adulto alto o suficiente para enxergar toda a extenso do teclado com
facilidade;
o adulto possui um bom desenvolvimento de habilidades motoras queadquiriu ao longo dos anos.
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Quanto s desvantagens, os autores observam que os adultos, geralmente:
so perfeccionistas e esperam a perfeio imediata do toque, o que acaba
gerando tenses desnecessrias;
so autocrticos;
podem apresentar maior cansao fsico ou distrao durante as aulas.
Em relao aquisio de habilidades por parte dos alunos adultos,
comparativamente s crianas e adolescentes, respostas dos professores
participantes refletem diferentes pontos de vista. Em relao ao tempo para
aquisio de habilidades piansticas, Maurcioe Dboraacreditam que os adultos
levam mais tempo do que adolescentes e crianas. Por outro lado, Maurcioafirma
que aos adultos mais difcil adquirir agilidade e destreza, s crianas
concentrao. Para Dbora os adultos, sobretudo acima de 60 anos, tm maior
dificuldade em relao memria, articulaes (legato, staccato), intensidade
(crescendo, diminuendo) e coordenao motora. Quanto dedicao e persistncia
no estudo, Dbora acredita que isto depende do temperamento do aluno. Para
Maurcio, esta persistncia maior nos adultos. J em relao ao tempo de estudoextraclasse, os dois concordam que no depende da faixa etria, mas, de outros
fatores. Carmenresume suas opinies na seguinte afirmao:
Carmen:Espera-se que a mobilidade dos dedos de uma criana ouadolescente seja menos tensa e rgida do que a de um adulto. Assimcomo a memorizao dos smbolos musicais seria mais eficiente emuma cabea menos preocupada com tantos afazeres e
responsabilidades. No entanto, estas expectativas tm sofridomutaes, por motivos j mencionados anteriormente, que incluemfalta de tempo generalizada, agitao e excesso de compromissos.
Os alunos participantes desta pesquisa apontam diferentes opinies a
respeito das habilidades que consideram mais difceis de serem adquiridas. Para
Carlos e Daniela, a capacidade de improvisar ao piano uma habilidade difcil; para
Amanda, alm da improvisao, a independncia e velocidade dos dedos; para
Marina, a leitura primeira vista, o ritmo e articulaes; Cludia tem dificuldades em
executar corretamente o que est na partitura (ritmo, andamento e tcnica); para
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Mrcio, o dedilhado a principal barreira a ser vencida. Com relao s
habilidades consideradas mais fceis, Carlos considera a leitura; para Daniela e
Amanda, a leitura e o senso rtmico so habilidades mais fceis; Marina tem
facilidade em memorizar as partituras; Cludia entende rapidamente a partitura de
forma terica; Mrcio aprende facilmente a contar o tempo da msica.
2.3 Habilidades msico/instrumentais relevantes ao ensino de piano para
adultos iniciantes
Com base nas afirmaes dos pedagogos citadas anteriormente e nas
repostas dos entrevistados desta pesquisa, apontamos algumas das habilidades
msico/instrumentais que acreditamos serem as mais relevantes para o ensino de
piano para adultos iniciantes, a saber: (1) Habilidades motoras e tcnicas; (2)
Habilidades aurais - tocar por imitao ou de ouvido, improvisar e criar; (3) Leitura;
(4) Repertrio. Estas habilidades sero discutidas em mais detalhes a seguir.
2.3.1 Habilidades motoras e tcnicas
O elemento essencial da execuo pianstica o movimento.
(KAPLAN, 1987, p.29)
Santiago (2004, p. 26) ressalta que pedagogos do piano no oferecem uma
definio clara e unificada sobre a tcnica; entretanto possvel perceber dois
pontos de vista antagnicos a respeito do assunto. Para alguns pedagogos, tcnica
e msica so indivisveis - a tcnica a prpria arte. (NEUHAUS, 1973: 2;
ROSSELINI, 2002: 3 apudSANTIAGO, 2004, p. 26). Nesse sentido, as habilidades
tcnicas devem ser trabalhadas de forma a viabilizar o fazer musical. Por outro lado,
outros pedagogos defendem a separao entre tcnica e musicalidade (CHING,
1946; FIELDEN, 1943; LEIMER 1972 apudSANTIAGO, 2004, p. 30). Para estes, a
tcnica compreendida como um treinamento muscular que deve ser praticado
separadamente da msica.
De acordo com Santiago (2004, p. 31), os dois pontos de vista apresentadosacima oferecem desafios ao professor de piano. O primeiro - tcnica e msica como
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inseparveis -, pode fazer com que o professor se envolva muito mais nos aspectos
musicais e deixe comprometido o desenvolvimento tcnico; o segundo - tcnica e
msica como indivisveis - pode reforar um treinamento puramente mecnico e
comprometer o fazer musical. Concordamos com a autora que tcnica e
musicalidade devem ser, na medida do possvel, desenvolvidas lado a lado.
Frana (2001, p. 37) considera a tcnica como o conjunto das competncias
funcionais necessrias realizao de atividades musicais especficas, como, por
exemplo, produzir um crescendo na performance ou transformar um motivo na
composio. A autora critica a associao do conceito de tcnica a nveis
avanados de realizao musical, apoiada no pensamento de Paynter, que tcnica
tambm pode ser simplesmente fazer o que voc pode com o que voc tem, com omelhor da sua capacidade (PAYNTER, 1977, p. 9 apud FRANA, 2001, p. 38).
Frana ressalta ainda que deve-se tomar cuidado para que o desenvolvimento
tcnico no se sobreponha ao desenvolvimento da musicalidade. A mesma autora
afirma que:
Se atravs do fazer musical ativo que a compreenso sedesenvolve e se revela, o cuidado com o desenvolvimento tcnico
inevitvel. O fazer musical envolve tanto a compreenso de (ousensibilidade a) tais elementos quanto as habilidades tcnicasnecessrias para identific-los e control-los. (FRANA, 2001, p. 37)
De acordo com Kaplan (1987, p. 17), existem n tcnicas, tantas quantos
intrpretes e obras para esse instrumento [o piano] existem, entretanto, nem todas
apresentam o mesmo nvel de eficincia. Assim, o autor conclui que a tcnica
consiste em conseguir o mximo de rendimento com o mnimo de esforo (1987, p.
18).
Sendo a execuo pianstica uma atividade motora, a postura adequada, o
posicionamento correto de braos, mos e dedos, so alguns requisitos bsicos
para uma performance satisfatria desde as primeiras aulas. Cabe ao professor
observar e orientar seus alunos desde o incio do aprendizado para evitar o
surgimento de possveis problemas ou para que os mesmos sejam corrigidos o mais
rpido possvel; caso contrrio, o aluno poder adquirir maus hbitos posturais, oque acarretaria no apenas problemas tcnicos, mas tambm fsicos.
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Importante fator no incio da aprendizagem instrumental o cultivo de bons
hbitos e conscincia corporal. A prtica de alongamentos e exerccios de
respirao, bem como o cuidado postural so indispensveis (PVOAS, 2007, p. 6),
lembrando que o professor desempenha papel crucial ao orientar e demonstrar bons
hbitos. Kaplan (1987, p. 46) afirma que os hbitos so o resultado da
transformao de atos voluntrios em automatismos; para o autor a aquisio e
reorganizao dos mesmos constitui a base sobre a qual ir se construir a tcnica.
De acordo com HSU (1997, p. 127 apudCABEZAS, 2006, p.1)
Embora haja uma longa tradio em tocar e no ensino do piano,educadores e msicos necessitam adquirir mais conhecimento eentendimento sobre a prpria anatomia e as funes biomecnicasde seus corpos e mos. H uma tremenda necessidade de guiartodos os msicos, inclusive os pianistas, no aprendizado de como seexpressar musicalmente sem se lesionar.
Santiago (2007, p. 5) reflete sobre esta questo:
A m coordenao do organismo como um todo e as concepesinadequadas a respeito da execuo de aes motoras noinstrumento esto, frequentemente, associadas. Por outro lado, umorganismo bem orientado em termos motores (que busca realizar asaes adequadas para os fins almejados) e bem coordenado em simesmo (que preza uma atitude postural adequada ao tocar e queevita tenses e esforos desnecessrios), pode realizar aes maiscoerentes no aprendizado e na performanceinstrumental.
Nesse sentido, a ao motora pianstica abrange muito mais do que as pontas
dos dedos. Fonseca e Santiago (1997, p. 12) consideram que os movimentos
fundamentais para o aprendizado do teclado devero envolver de incio todo o
membro superior e sugerem que tais movimentos iniciais devem conduzir um
contato da mo inteira ao teclado. O trabalho especfico com os dedos dever ser
introduzido aps o aluno usar todo o brao de forma equilibrada e sem tenses.
Outra questo fundamental aquisio de habilidades o uso do feedback,
atravs do qual o aluno obtm um retorno sobre seu desempenho (HALLAM, 1998,p. 128; PVOAS, 2007, p. 5). Sobretudo no desenvolvimento de habilidades
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motoras, o aluno precisa receber esse retorno para que possa corrigir erros e manter
o que est correto. Pvoas (2007, p. 5) ressalta que existem dois tipos de feedback:
o intrnseco e o extrnseco. O primeiro, parte do prprio sujeito por meio de seus
rgos sensoriais e est relacionado com o nvel de habilidade do executante. Este
tipo de feedback mais efetivo em movimentos lentos, visto que nos movimentos
rpidos, o tempo de resposta no acompanha o movimento. (PIEKARZIEVCZ, 2004
apud PVOAS, 2007, p. 5) J o feedback extrnseco pode ser fornecido pelo
professor ou atravs de gravaes que podero ser assistidas posteriormente e,
desta forma, refora o feedbackintrnseco.
Concordamos com Santiago3 que, o desenvolvimento motor culmina na
formao tcnica do aluno. No entanto, a tcnica muito mais do que um processo
motor. Nesse sentido a autora conclui que:
Para o melhor desenvolvimento tcnico, precisamos ento considerara conscincia do uso corporal (que inclui busca de estados deequilbrio e tnus muscular, flexibilidade e mobilidade corporal, abusca de estados funcionais do uso do tronco, braos e mos); odesenvolvimento motor (que inclui o conhecimento de abordagensmotoras e dos fundamentos tcnico/musicais); o aspecto musical(que inclui a busca por umarealizao musical expressiva).
2.3.2 Habilidades aurais - tocar por imitao ou de ouvido, improvisar e criar
De acordo com Feichas (2006, p. 84 apudCOUTO, 2008, p. 36-37) o aspecto
aural considerado o mais importante no processo de aprendizagem da msicapopular, visto que, por meio dele, os msicos adquirem conhecimento e habilidades
musicais. Para Lilliestam (1996, p. 195 apudCOUTO, 2008, p. 36) as prticas aurais
compreendem criar, atuar, lembrar e ensinar msicas sem o uso de notao
escrita, em outras palavras, o fazer musical de ouvido.
3SANTIAGO, Patrcia Furst. Apostilas para o ensino de Teclado, material no publicado, 2009-2011, p. 10
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A partir de atividades como copiar msicas de ouvido de gravaes,observar e imitar colegas e parentes, os msicos populares adquiremsuas capacidades para improvisar e criar; tambm desenvolvendo o
ouvido harmnico, rtmico e meldico para atuarem na performance.(COUTO, 2008, p. 36-37)
Segundo Gonalves (1989, p. 4) a habilidade de tocar por imitao ou de
ouvido deve ser praticada no incio, uma vez que proporciona a familiaridade com
todo o teclado e um senso de pianismo que, de outra forma, seria por muito tempo
adiado. Nesta etapa, o aluno no precisar se preocupar com a leitura e sua
ateno estar focada em outros aspectos tais como a posio correta das mos,
sua conduta corporal e o conhecimento da estrutura do teclado alm de poder desde
o incio se expressar musicalmente; estes fatores iro inclusive auxiliar no processo
de leitura. Franois Couperin (apud Gonalves, 1989, p. 4) no sculo XVIII j
aconselhava:
No se deve comear a mostrar a notao musical acrianas, antesque elas tenham uma certa quantidade de peas nos dedos. quase impossvel que, olhando para o livro, os dedos deixem de sair
da boa posio e se contoram. Alm do mais, a memria se formabem melhor quando se aprende de cor. (Primeira edio de Lrt deToucher le Clavecin, 1717)
Corroborando este pensamento, Emonts (1994, apud REIS, 2000, p. 23)
afirma que:
O caminho mais natural para estabelecer e fomentar a relao dacriana com o instrumento consiste em estimul-la para que encontre
no teclado todas as melodias que j conhece e as toque de ouvido.Para este fim, no so adequadas somente as canes infantis ou asfolclricas, mas tambm outras melodias que podem ser escutadasem casa, na escola, no rdio ou televiso.
Santiago ressalta que a habilidade de tocar de ouvido essencial formao
do msico instrumentista uma vez que requer uma escuta musical atenta e
persistente e que favorece o desenvolvimento da capacidade de ouvir a si mesmo,
alm de ser uma atividade prazerosa. (SANTIAGO, 2006, p. 56)
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Da mesma forma, Suzuki (apud GONALVES, 1989, p. 4) explica que a
leitura musical deve ser ensinada depois que a sensibilidade, a habilidade de
execuo e a memria da criana tenham sido suficientemente treinadas. Swanwick
(1994, p. 13) tambm aconselha:
Sempre d prioridade fluncia intuitiva baseada na percepoauditiva antes da escrita e da leitura analticas. Nos primeiros dias,pelo menos, a msica deve ser articulada livremente antes de seintroduzir a notao. No precisamos da anlise limitada de umapartitura impressa nossa frente todas as vezes que tocamos. Aconscincia auditiva vem antes disso, ela a base, o verdadeirofundamento musical e tambm o ponto culminante do conhecimento
musical.
Adalmrio relata, no questionrio desta pesquisa, os ensinamentos que
recebeu de Violeta Gainza, os quais procurou guardar na memria. Segundo ta