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Eixo: Formação de Professores A ESCOLA NORMAL DE CAMPINA GRANDE-PB: FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO INTERIOR PARAIBANO (1960 -1970) Pâmella Tamires Avelino de Sousa (UFCG) 1 Niédja Maria Ferreira de Lima (UFCG) 2 Resumo: Estudar uma instituição escolar significa mergulhar em um mar de complexidades. Muito mais do que fazer uma memória de uma instituição, estudá-la compreende problematizar fatos ocorridos na mesma, ou relacionados a ela (MAGALHÃES, 2004). Respaldadas nessa afirmativa, buscamos abordar nesse artigo um recorte da pesquisa de mestrado em educação pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG -PPGEd), sobre a implementação da Escola Normal Estadual “Padre Emídio Viana Correia” de Campina Grande - PB, criada na década de 1960, única instituição pública de formação para o magistério no nível médio do município, em funcionamento há mais de meio século. Portanto, a investigação sobre a Escola Normal Estadual, em Campina Grande - PB, busca colaborar para a constituição de um conhecimento acerca do processo de implementação e consolidação da referida Escola. Inicialmente, neste estudo, focalizaremos alguns elementos que possibilitem um conhecimento e reflexão acerca da sua história e funcionamento na década de 1960-1970, apresentando alguns dados relativos ao histórico e o público escolar dos discentes. Em relação ao período de estudo 1960 a 1970, para estudar o processo de implementação da Escola Normal de Campina Grande, respectivamente, o ano de sua criação e o último ano de vigência da LDB nº 4024/61, uma vez que a Lei nº 5692/71 desfigurou o Curso Normal. Como fontes, trabalhamos com dados históricos da Escola e fichas da vida escolar do alunado. Tais fontes foram buscadas no arquivo da Escola Normal, depois fotografadas e, em seguida, feita uma leitura dos dados contidos sobre o histórico escolar dos alunos. Consideramos a relevância de estudos de autores como Almeida (2004), Saviani (2008), Araújo (2008), Kulesza (1998), entre outros, que discutem a construção da Escola Normal como lócus de formação do magistério dos anos iniciais de escolarização, no Brasil e na Paraíba. Podemos concluir, ainda que provisoriamente, que houve um descompasso entre a criação da Escola Normal de João Pessoa, ainda no século XIX, e a de Campina Grande, criada na segunda metade do século XX. Por outro lado, a preocupação de instauração dessa Escola Normal, expressava mais que o interesse na instrução pública de qualidade. Como afirma Kulesza (2008) a escola normal, uma escola 1 Pâmella Tamires Avelino de Sousa, Universidade Federal de Campina Grande, Paraíba - Brasil, E-mail: [email protected]. 2 Niédja Maria Ferreira de Lima, Universidade Federal de Campina Grande, Paraíba - Brasil, E-mail: [email protected]

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Eixo: Formação de Professores

A ESCOLA NORMAL DE CAMPINA GRANDE-PB: FORMAÇÃO DE

PROFESSORES NO INTERIOR PARAIBANO (1960 -1970)

Pâmella Tamires Avelino de Sousa (UFCG)1

Niédja Maria Ferreira de Lima (UFCG)2

Resumo: Estudar uma instituição escolar significa mergulhar em um mar de

complexidades. Muito mais do que fazer uma memória de uma instituição, estudá-la

compreende problematizar fatos ocorridos na mesma, ou relacionados a ela

(MAGALHÃES, 2004). Respaldadas nessa afirmativa, buscamos abordar nesse artigo

um recorte da pesquisa de mestrado em educação pela Universidade Federal de Campina

Grande (UFCG -PPGEd), sobre a implementação da Escola Normal Estadual “Padre

Emídio Viana Correia” de Campina Grande - PB, criada na década de 1960, única

instituição pública de formação para o magistério no nível médio do município, em

funcionamento há mais de meio século. Portanto, a investigação sobre a Escola Normal

Estadual, em Campina Grande - PB, busca colaborar para a constituição de um

conhecimento acerca do processo de implementação e consolidação da referida Escola. Inicialmente, neste estudo, focalizaremos alguns elementos que possibilitem um

conhecimento e reflexão acerca da sua história e funcionamento na década de 1960-1970,

apresentando alguns dados relativos ao histórico e o público escolar dos discentes. Em

relação ao período de estudo 1960 a 1970, para estudar o processo de implementação da

Escola Normal de Campina Grande, respectivamente, o ano de sua criação e o último ano

de vigência da LDB nº 4024/61, uma vez que a Lei nº 5692/71 desfigurou o Curso

Normal. Como fontes, trabalhamos com dados históricos da Escola e fichas da vida

escolar do alunado. Tais fontes foram buscadas no arquivo da Escola Normal, depois

fotografadas e, em seguida, feita uma leitura dos dados contidos sobre o histórico escolar

dos alunos. Consideramos a relevância de estudos de autores como Almeida (2004),

Saviani (2008), Araújo (2008), Kulesza (1998), entre outros, que discutem a construção

da Escola Normal como lócus de formação do magistério dos anos iniciais de

escolarização, no Brasil e na Paraíba. Podemos concluir, ainda que provisoriamente, que

houve um descompasso entre a criação da Escola Normal de João Pessoa, ainda no século

XIX, e a de Campina Grande, criada na segunda metade do século XX. Por outro lado, a

preocupação de instauração dessa Escola Normal, expressava mais que o interesse na

instrução pública de qualidade. Como afirma Kulesza (2008) a escola normal, uma escola

1 Pâmella Tamires Avelino de Sousa, Universidade Federal de Campina Grande, Paraíba - Brasil, E-mail: [email protected]. 2 Niédja Maria Ferreira de Lima, Universidade Federal de Campina Grande, Paraíba - Brasil, E-mail: [email protected]

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do sexo feminino destinada às elites, passou a ser referenciada como local de

profissionalização para a mulher de classe média, após a urbanização das cidades. Tais

aspectos podem ser identificados no número de alunas matriculadas nas décadas de 1960-

1970. Por fim, os dados nos levam a proceder com a investigação a fim de

compreendermos melhor como se configurou a Escola Normal (espaço físico, perfil das

normalistas, docentes, currículo, solenidades e demais aspectos do cotidiano escolar) no

período de 1960 a 1970, enfim, como se desenvolveu o processo de implementação da

referida Escola no município de Campina Grande-PB.

Palavras-chave: Instituições escolares; Escola Normal; Formação de professores;

Campina Grande-PB

A ESCOLA NORMAL DE CAMPINA GRANDE-PB: FORMAÇÃO DE

PROFESSORES NO INTERIOR PARAIBANO (1960 - 1970)

Introdução

Cada instituição escolar apresenta sua história e responde aos múltiplos

determinantes de forma singular, embora inserida em um contexto maior, de modo que o

estudo de uma determinada instituição permite ressignificar aspectos inexplorados na

História da Educação, assim como propicia uma relação com os estudos mais gerais da

mesma área (SANFELICE, 2007).

Desde a terceira década do século XIX, quando foi criada a Escola Normal de

Niterói, em 1835, até a promulgação da Reforma do Ensino de 1º e 2º Graus (Lei nº

5.692/1971), essa instituição constituiu o principal lócus de formação, no nível médio,

dos professores dos anos iniciais da escolarização. Papel tão relevante já justifica a

realização de estudos concernentes à história das escolas normais, ainda mais quando se

trata de um exemplo específico, como o da Escola Normal Estadual de Campina Grande-

PB.

Assim, concordamos com Justino Magalhães (2004) quando afirma que estudar

uma instituição escolar significa mergulhar em um mar de complexidades. Muito mais do

que fazer uma memória de uma instituição, estudá-la compreende problematizar fatos

ocorridos na mesma, ou relacionados a ela. Impõe-se ao pesquisador, portanto, ultrapassar

o estrito âmbito do objeto de estudo, para buscar apreender, no contexto sócio-histórico

mais amplo, condicionantes da configuração assumida pela determinada instituição, ou

seja, mediante a articulação dialética do singular e do universal, do particular e da

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totalidade social, “[investigar] a conexão íntima entre a forma pela qual a sociedade

produz sua existência material e a instituição escolar que cria” (NOSELLA; BUFFA,

2009, p. 79).

Tal compreensão deriva do entendimento de que as instituições escolares são

[...] necessariamente sociais, tanto na origem, já que determinadas pelas

necessidades postas pelas relações entre os homens, como no seu

próprio funcionamento, uma vez que se constituem como um conjunto

de agentes que travam relações entre si e com a sociedade à qual servem

(SAVIANI, 2007, p. 5).

Em acréscimo, cabe destacar o incremento, constatado nas últimas décadas, das

pesquisas acerca da história de instituições escolares, como atestam os trabalhos

apresentados nos principais eventos acadêmicos da área, nas produções dos programas de

pós-graduação, nas linhas de pesquisas relativas à área da História da Educação.

Respaldadas nessa perspectiva, buscamos abordar nesse artigo um recorte da

pesquisa de mestrado sobre a implementação da Escola Normal Estadual “Padre Emídio

Viana Correia” de Campina Grande– PB, criada na década de 1960, única instituição

pública de formação para o magistério no nível médio do município, em funcionamento

há mais de meio século. Portanto, a investigação sobre a Escola Normal Estadual, em

Campina Grande – PB, busca colaborar para a constituição de um conhecimento acerca

do processo de implementação da referida Escola. Para tanto, inicialmente, neste estudo,

focalizaremos alguns elementos que possibilitem uma reflexão acerca da história da Escola

na década de 1960-1970, apresentando alguns dados relativos ao histórico da escola e

sobre o público escolar. Consideramos a relevância de estudos de autores como Almeida

(2004), Saviani (2008), Araújo (2008), Kulesza (1998), entre outros, que discutem a

construção da Escola Normal como lócus de formação do magistério dos anos iniciais de

escolarização, no Brasil e na Paraíba.

Surgimento das Escolas Normais

Desde a terceira década do século XIX, quando foi criada a Escola Normal de

Niterói, em 1835, até a promulgação da Reforma do Ensino de 1º e 2º Graus (Lei nº

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5.692/1971), essa instituição constituiu o principal lócus de formação, no nível médio,

dos professores dos anos iniciais da escolarização. Após o Ato Adicional à Constituição

do Império, surge a primeira Escola Normal brasileira. Como, por esse Ato, o ensino

elementar e, por consequência, a instrução de professores tornam-se responsabilidades

das províncias, “ao longo do século XIX foram surgindo escolas normais nas várias

províncias que constituíam o Império Brasileiro, num processo intermitente em que essas

instituições eram criadas, em seguidas fechadas e depois reabertas”. (SAVIANI, 2008,

p.7)

De início, muitas províncias, dentre elas a paraibana, antes de criarem a Escola

Normal, adicionaram aos liceus uma cadeira de Pedagogia (KULESZA, 1998).

De acordo com Araújo; Freitas; Lopes (2008), entre o período de 1835 a 1960,

registra-se a gênese e implantação de 20 Escolas Normais, sendo a Paraíba, em uma

perspectiva cronológica, a décima quarta província a criar sua Escola Normal. Segundo

Kulesza (2008, p.263), a Escola Normal paraibana fora instaurada a partir da lei 761,

“promulgada em 7 de dezembro de 1883 e regulamentada em 30 de junho de 1884, [que]

havia extinguido o Liceu Paraibano, implantando uma Escola Normal de dois graus”.

Ainda em conformidade com o autor citado, a preocupação de instauração das

escolas normais expressava mais que o interesse na instrução pública de qualidade: “ela

era uma escola do sexo feminino destinada às elites, (...) servindo muito mais para

preparar a mãe e a esposa, necessárias para uma sociedade em mudança, do que para

formar uma futura professora” (KULESZA, 2008, p.270). Apenas com a urbanização das

cidades, correlacionada à diversificação de classes sociais, a Escola Normal passou a ser

referenciada como local de profissionalização para a mulher de classe média.

O processo histórico esclarece nitidamente que a Escola Normal, inicialmente

pensada como local para preparação dos docentes que melhorariam a instrução primária

pública, sofre interferências do meio social, adaptando-se às perspectivas da sociedade na

qual está inserida. Para Saviani (2008, p.8), “a consolidação das escolas normais no Brasil

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resultou de um longo, difícil e oscilante processo que só veio a atingir ponto de maturação

nos anos 50 e 60 do século XX”.

Similarmente, para a profissão docente, a segunda metade da década de 1940 e a

década de 1950 constituem o “momento de consolidação de uma ‘cultura pedagógica’

que cunhou o professor como um ‘ser especial’, detentor de um saber imprescindível e

necessário, portador de uma missão: salvar as crianças da ignorância” (MARTINS, 2010,

p. 14, destaques do original).

O Decreto-Lei n° 8.530, de 2 de janeiro de 1946, conhecido como Lei Orgânica

do Ensino (BRASIL,1946), estruturava uma nova organização aos cursos normais,

dividindo-os em dois ciclos, conforme explicita Saviani:

o primeiro correspondia ao ciclo ginasial do curso secundário e tinha

duração de quatro anos. Seu objetivo era formar regentes do ensino

primário e funcionaria em Escolas Normais regionais. O segundo ciclo,

com a duração de três anos, correspondia ao ciclo colegial do curso

secundário. Seu objetivo era formar os professores do ensino primário

e funcionaria em Escolas Normais e nos Institutos de Educação. Estes,

além dos cursos citados, contariam com Jardim de Infância e Escola

Primária anexos e ministrariam também cursos de especialização de

professores primários para as áreas de educação especial, ensino

supletivo, desenho e artes aplicadas, música e canto e cursos de

administradores escolares para formar diretores, orientadores e

inspetores escolares. (SAVIANI, 2009, p.146) Tal modelo predominaria no contexto nacional até a aprovação da Lei n. 5.692, de 11 de

agosto de 1971, que reforma a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 4024/1961)

e institui o Ensino de 1º e 2º Graus, em decorrência da qual o curso Normal transforma-se na

habilitação profissional Magistério, do ensino de 2º grau. Conforme Almeida (2004, p.92)

A legislação, ao defender escolaridade obrigatória dos 7 aos 14 anos,

proporia a formação profissional dos professores que iriam atuar nas

séries iniciais do 1° grau através de uma habilitação de 2° grau, a

Habilitação Específica do 2° Grau para o Magistério (HEM),

extinguindo assim o curso normal.

Fica evidente que o ambiente histórico é o principal condicionador das mudanças sociais,

sendo possível observar que as Escolas Normais, constituem-se como instituições que sofrem

interferência do contexto social determinante, no Brasil estas atravessaram o Império e a

República marcada por afirmações e reformulações. Nesse contexto da década de 60 e 70 a

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perspectiva tecnicista vigorava devidamente influenciando a educação como ação técnica. As

instituições que chegam aos anos de 1940 e 1950 como espaços importantes na formação de

professores em todo o país, após o golpe militar de 1964, vai sofrer mudanças mais uma vez,

considerando que era preciso atender a mudança política ocasionada pelo golpe militar.

O momento de desvalorização da profissão fica evidente, uma vez que a transformação

da Escola Normal em mais uma habilitação fez com que o curso perdesse suas características

especificas e identidade. A presença de normalistas das classes mais abastadas se distancia cada

vez mais, permitindo a inserção de moças de classes mais populares que procuravam uma

profissão a fim de contribuir com o rendimento familiar. Outro marco desse período é a inserção

das cadeiras noturnas do curso.

Somente com a promulgação da Constituição de 1988 que surge a proposta de uma nova

elaboração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Criada no ano de 1996, a Lei

9.394 de dezembro de 1996 considera novos percursos para a educação nacional. No que concerne

a formação de professores nas Escolas Normais fica disposto no artigo 62 à necessidade da

educação docente em nível superior. “A formação profissional será efetivada nos institutos

superiores de educação através do curso normal superior” (ALMEIDA, 2004, p.94).

Atualmente, o curso normal vem sofrendo outras alterações, a desvalorização profissional

se acentua cada vez mais fortemente atingindo até os profissionais dos institutos superiores

públicos. Fazer um curso em nível médio já não é mais uma aspiração profissional, uma vez que

atrelada as universidade públicas têm as concorrentes privadas, caracterizando a formação de

professores hoje em dia como uma fábrica de fornecimento de diplomas.

Feminização do magistério no contexto nacional

O processo de inserção da mulher na vida profissional ocorreu por meio do

magistério. (ALMEIDA, 2004). Anterior as aspirações do ideário republicano a mulher

não possuía uma significação enquanto sujeito social, seu papel era destinado aos ofícios

domésticos e religiosos. Grande parte desse pensamento vigorava dos ensinamentos

doutrinais de ênfase religiosa, pois se considerava a mulher um ser propenso ao pecado e

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que, portanto deveria ser domesticado e vigiado, cabendo essa atividade ao homem.

Assim as mulheres tinham como destino o casamento ou a vida religiosa.

No que se refere à educação feminina, essa era também restrita, uma vez que

apenas algumas famílias permitiam que as filhas aprendessem algumas instruções.

Quando esta concessão lhe era permitida, normalmente as meninas não chegavam a sair

de suas casas, sendo assim uma educação privada, com características nas prendas

domésticas e voltada apenas para as classes mais abastadas.

Tal forma de pensamento perdurou por muito tempo e ainda transcende seus

vestígios em alguns pensamentos ditos modernos. Essa condição educacional persistiu

por bastante tempo, mesmo quando as meninas começaram a ter acesso à educação

escolar junto com os meninos. Ou seja, as meninas não seguiam o mesmo percurso, pois,

logo os meninos se adiantavam e prosseguiam em classes separadas, enquanto elas

voltavam para a educação de como ser uma boa mãe e uma boa dona de casa.

Essa configuração de moldagem feminina vai propiciar o pensamento engajador

da feminização do magistério. Ainda em conformidade com Almeida (2004), com a

instauração da república o pensamento liberal ganha entusiasmo e em seus preceitos a

educação resplandecia como mecanismo propulsor para diminuição dos problemas

sociais, tais como o analfabetismo.

Arraigado desde o surgimento dos processos formativos brasileiros, nota-se que a

educação não era uma preocupação do governo para com as classes populares, de modo

que fora criado assim uma população sem qualquer tipo de instrução que crescia

avassaladoramente, o que favorecia dados de analfabetismo alarmantes. Assim, com o

ideário no auge se impõe a necessidade de criação de instituições escolares para educação

primária, porém com esse anseio se fazia de grande importância também profissionais

instruídos para essa atividade. Desse modo, junto com a efervescência da educação

primária será cogitada uma formação instrutiva para a mulher.

Inicialmente, considerando o crescimento das cidades as Escolas Normais

situavam-se nesse lócus e eram prioritariamente ocupadas por jovens da elite social,

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ficando assim as zonas interioranas afastadas da instrução e também as classes mais

populares. Essa visão permanecia, pois a educação feminina estava voltada para o caráter

civilizatório, ou seja, era necessário manter o equilíbrio “Essa educação em nível médio

e com um objetivo definido sem mais delongas, deveria bastar, e as jovens brasileiras

cresceriam com o destino profetizado de serem esposas, mães e, em caso de necessidade,

professoras” (ALMEIDA, 2004, p.75).

A vocação e o destino das mulheres começa a sofrer um rompimento quando o

número de Escolas Normais cresce alvo da maior procura por instrução das moças. A

economia nacional se desenvolvia e assim foi propicio o crescimento desse nível de

ensino. Os homens passam a ser minoria e quando se dispunham a carreira educacional

procuravam cargos mais administrativos, reafirmando a consolidação feminina ao

processo educacional dentro de sala de aula. Para as mulheres e principalmente os

movimentos sociais, o ingresso no magistério foi a primeira conquista feminina, que

embora continuasse responsável pelo lar e família e a vocação da docilidade a

amabilidade possuía agora um trabalho e um meio de escolha um pouco distanciado dos

grilhões masculinos.

Portanto, a educação, por um longo período, foi destinada somente aos homens e

ministrada também por eles. As mulheres foram inseridas aos poucos neste processo e as

formas de ensino eram diferentes das destinadas aos meninos. A educação feminina era

voltada em transformá-las em esposas “perfeitas” e mães cheias de valores e princípios.

Em momento nenhum, esta primeira forma de ensino esteve voltada para a emancipação

feminina e em desenvolver seu intelecto. (ROSA, 2011, p.3)

Somente com o período pós-republicano, o movimento feminista vai ganhar força

e gerar um propulsor desenvolvimento na forma de pensar das mulheres. Inicialmente

questionasse os valores e indaga-se a participação efetiva feminina nas decisões

individuais, políticas e sociais.

Os procedimentos metodológicos adotados

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Para o alcance do objetivo aqui proposto, nossa investigação sobre a primeira

Escola Normal Pública de Campina Grande levou em conta o contexto de sua

implantação, bem como aspectos de seu funcionamento, sendo alguns: os sujeitos da

escolarização, os discentes, buscando estabelecer relações com o âmbito mais amplo das

escolas normais do Estado e do país.

Em relação ao período de estudo- 1960 a 1970, para estudar o processo de

implementação da Escola Normal de Campina Grande, respectivamente, o ano de sua

criação e o último ano de vigência da LDB nº 4024/61, uma vez que a Lei nº 5692/71

desfigurou o Curso Normal.

No que se refere às fontes, é relevante destacar, inicialmente, que as consideramos

como documentos ou vestígios materiais elaborados no passado, sejam esses longínquos

ou mais ligados ao tempo presente, não direcionados ao pesquisador, mas para atender as

necessidades específicas do momento no qual foram produzidos. Nesse sentido,

compartilhamos da compreensão de que “documento algum é neutro, e sempre carrega

consigo a opinião da pessoa e/ou do órgão que o escreveu [ou o formulou]” (BACELLAR,

2005, p.63).

Como fontes, trabalhamos com dados históricos da Escola3 e fichas da vida

escolar do alunado. Tais fontes foram buscadas no arquivo da Escola Normal Estadual

Padre Emídio Viana Correia. Elas foram fotografadas e depois feita uma leitura dos dados

contidos sobre o histórico escolar dos alunos.

Nesse sentido, em conformidade com Godoy (1995), a pesquisa configura-se

predominantemente, como de cunho bibliográfico e documental. Ainda conforme a

autora, a pesquisa documental é constituída pelo exame de materiais que ainda não

3 Algumas informações relativas à história da Escola Normal Estadual Padre Emídio Viana Correia, foram extraídas da pesquisa mais ampla intitulada “Escola Normal Estadual Padre Emídio Viana Correia-Campina Grande-PB: criação e consolidação (1960-1970)”, em andamento na UFCG. As autoras integram a equipe desse projeto.

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receberam um tratamento analítico ou que podem ser reexaminados com vistas a uma

interpretação nova ou complementar. Pode oferecer base útil para outros tipos de estudos

qualitativos e possibilita que a criatividade do pesquisador dirija a investigação por

enfoques diferenciados. Além disso, os documentos são uma fonte não-reativa e

especialmente propicia para o estudo de longos períodos de tempo (GODOY, 1995, p.3,

parênteses no original).

A Escola Normal em um município do interior paraibano: alguns vestígios

O município de Campina Grande, localizado no interior do estado da Paraíba, nas

primeiras décadas do inicio do século XX, apresenta um expressivo desenvolvimento

econômico, devido à grande participação do comércio. Na década de 1930, a exportação

de algodão incrementa esse crescimento, chegando a ser denominada de Liverpool

Brasileira.

No entanto, a educação pública no município apresentava debilidades, uma vez

que, no ano de 1932, a rede de ensino particular contava com 17 estabelecimentos,

enquanto havia, na cidade, apenas um Grupo Escolar Estadual. Ademais, grande parte da

população não era alfabetizada, assim, configurando-se uma “dissonância entre ‘a

Liverpool brasileira’ e a cidade ‘mais analfabetizada’,[...] na terceira década do século

XX, [o que] constitui, em efeito, uma permanência de um traço presente desde a formação

da vila” (RODRIGUES; SILVA, 2004, p.7).

Ainda como exemplo da debilidade no campo da educação, no que concerne à

formação de professores, a Escola Normal no município de Campina Grande somente

virá a ser constituída no ano de 1960, enquanto a capital do estado, João Pessoa, conta

com essa instituição desde 1883 (KULESZA, 2008). Além disto, o estudo da criação de

uma determinada instituição escolar, como a Escola Normal, exige a consideração de que

Uma instituição implica em um ato de estabelecer, de fundar de criar.

Uma vez realizado tal ato, ela se encontra instituída, mas é o movimento

histórico de uma dada instituição que revela o seu processo instituinte,

seja nas dimensões organizativa, administrativa e espacial - física, seja

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nas dimensões curricular, docente e discente. Mas, para além de tais

aspectos intra-institucionais, estão também presentes os norteamentos

de ordem política, reveladores das aspirações e dos projetos, bem como

de suas efetivações (ARAÚJO; FREITAS; LOPES, 2008, p.26).

No entanto, ao se tratar da formação de professores para o município de Campina

Grande vemos uma distante preocupação. A cidade apesar de interiorana possuía uma

significativa relevância comercial o que lhe garante, nos anos 1960, o lugar de uma das

cidades interioranas mais importantes da Região Nordeste, chegando a arrecadar mais

impostos do que a capital do Estado, João Pessoa.

Devido ao crescimento urbano, diversas instituições escolares foram surgindo na

cidade, de modo que, na década de 1960, Campina Grande contava com 156 escolas

primárias municipais, 48 escolas primárias estaduais, 13 escolas primárias particulares,

cinco estabelecimentos de ensino secundário, uma escola de aprendizagem industrial, e

15 escolas primárias supletivas federais.

No que diz respeito ao ensino secundário, ratifica-se a debilidade da rede pública,

uma vez que, dos cinco estabelecimentos existentes, apenas um pertence à rede pública:

o Colégio Estadual Dr. Elpídio de Almeida, conhecido como Colégio Estadual da Prata,

criado pelo Decreto n° 456, de 18/07/1952.

Em se tratando da formação de professores, a situação é idêntica, já que a cidade

contava, até o início da década de 1960, apenas com instituições equiparadas à Escola

Normal, o Instituto Pedagógico, atual Colégio Alfredo Dantas (CAD) estabelecimento

particular, cuja equiparação ocorrera ainda na década de 1929. Conforme Andrade, Cury

(2013), o instituto fora a primeira escola particular de Campina Grande, funcionava nos

níveis primários e secundário, chegando a contribuir com o sistema educacional com as

Escolas Anexas, dentre elas, a Escola Normal de João Pessoa.

Ampliou-se os cursos, e funda cursos profissionais também, Normal e técnico-

comercial, sendo apenas em 1929, pelo Decreto n.1615, de 09 de Dezembro de 1929, do

Governo do Estado, integrou o Instituto pedagógico nas prerrogativas da Escola Normal

Oficial do Estado. (LIMA, 2013, p.5)

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Somente no primeiro ano da década de 1960, é criada a primeira instituição

pública voltada à formação de professores, a Escola Normal Estadual de Campina

Grande, cuja trajetória sintetizada é apresentada, por Beléns; Amorim, como segue:

Em 08 de Abril de 1960, foi criada a Escola Normal Estadual na gestão

do Governador José Fernandes de Lima. A Escola, que no princípio

contava com duas salas de aula, uma para abrigar os 25 alunos e outra

para servir de diretoria, secretaria e arquivo, no ano de 1962 já contava

com 70 normalistas distribuídas pelas três séries do ensino normal. Em

três anos, o salto foi ainda maior. Em 1965, a escola contava com 275

alunas e funcionava durante todo o expediente da manhã. Nos anos de

1980 a 1992, a Escola Normal funcionou nos turnos da manhã e da tarde

já em prédio próprio onde se localiza até hoje.

Foi no ano de 1981 que a Escola Normal Estadual passou a chamar-se

Escola Normal Estadual Padre Emídio Viana Correia. De 1993 a 1996,

a Escola funcionou durante os três turnos subordinada à Secretaria de

Educação e Cultura passando, em 1997, a fazer parte do Centro

Paraibano de Educação Solidária, ao qual pertence até hoje, assim como

à Terceira Gerência Regional de Ensino da Secretaria Estadual de

Educação (BELÉNS; AMORIM, 2009, p.4-5)

No entanto, o que se demonstra nesta instituição é que sua consolidação perdurou

por mais algum tempo, uma vez que o início de suas atividades ocorre em um espaço

cedido pelo Grupo Escolar Solon de Lucena. Ainda por anos seguintes, até 1966 a escola

ocupou os espaços cedidos, neste ano em destaque o Colégio Anita Cabral, ocupando

somente no ano de 1970, mas precisamente no dia 10 de maio, o seu prédio próprio.

Conforme o Jornal Diário da Borborema (1959), a solidificação de uma escola

normal no município era uma aspiração da sociedade campinense, e em torno de sua

construção havia interesses e interferências do governo municipal, por meio da prefeitura

e do governo federal, com o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP).

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO OU ESCOLA NORMAL DE

CAMPINA GRANDE – Procurando satisfazer a justa aspiração da

sociedade campinense, de possuir uma Escola Normal dotada de

instalações modernas, a convite do Prefeito Elpídio de Almeida foi o

Secretário de Educação à Campina Grande escolher um dos dois

terrenos oferecidos pela Prefeitura Municipal para edificação desse

futuro estabelecimento.

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Na entrevista anteriormente aludida, também prestava conta dessa

tarefa junto ao Instituo Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), a cujo

ilustre Diretor, professor Anízio Teixeira entregou um memorial,

datado de 18.2.1959, solicitando duas obras especiais para a Paraíba, a

Escola Experimental de João Pessoa e o Instituo de Educação de

campina Grande, valendo frisar que o referido documento fora instruído

com as plantas dos terrenos destinados e tais obras. (DIÁRIO DA

BORBOREMA, 1959).

Desta feita, é notório que os projetos e planos para a construção da instituição já

vigoravam com antecedência frente à criação da escola. Ademais, seu funcionamento

antecipado, isto é, ante da consolidação do prédio, configura a preocupação da sociedade

em possuir não apenas uma instituição, mas, profissionais que trabalhassem com a

educação.

Diante de tais argumentos, foram realizadas consultas ao arquivo central da

escola, a fim de buscar fontes e dados acerca do movimento político-social de criação da

escola e dos sujeitos que compunham tal processo histórico, desde agentes educacionais

quanto a políticos e alunos. Neste artigo, será focada a primeira década de funcionamento

da escola 1960-1970, apresentando aspectos históricos da sua impmentação e dados

relativos às fichas de matrículas dos sujeitos da escolarização - os discentes.

Conforme o Histórico da Escola4, a princípio, a escola foi chamada de Escola

Normal Estadual. A partir do projeto de Lei 54/81 de 09 de julho de 1981 a escola mudará

de nome para Escola Normal Padre Emidio Viana Correia. Esse nome deriva de uma

homenagem feita ao padre que foi um educador campinense.

Durante o período aqui mencionado para estudo a escola contou com três

diretores.

Quadro 1: Diretores da Escola Normal no período de 1960 - 1970

4 A Escola Normal Estadual Padre Emídio Viana Correia, possui um acervo próprio, com dados referentes ao surgimento e funcionamento da instituição.

Diretor Período Gestão Governamental

Dr. Antônio Carlos Escorel 1960 a 1962 José Fernandes de Lima e Pedro Moreno Gondim

Prof. Fernando Silveira 1963 a 1966 Pedro Moreno Gondim

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Nesse período, a presença do ser masculino nos espaços de formação educacional

se configurava como cargos administrativos, isto é fora da sala de aula (ALMEIDA,

2004). O Quadro 1, permite visualizar que a Escola Normal de Campina Grande também

passará por esse modelo destacado por Almeida (2004), pois de acordo com o registro

consultado no acervo escolar, apenas no ano de 1976 uma mulher assumirá o cargo de

diretora da referida escola.

No que concerne ao número de matrículas, como já mencionado, inicialmente, em

1960 a escola possuía um número restrito de alunos, chegando à conclusão do curso de

magistério dessa primeira turma apenas 43 alunas. Cabe-se a observação que em todas as

fichas consultadas foram identificadas somente alunas do sexo feminino. Ou seja, desde

o seu ano de criação a escola já se preconizava como espaço formativo apenas para as

moças, reforçando, portanto, o processo de feminização do magistério em curso, na

formação de professores no Brasil.

Os dados apresentados no quadro que segue, mostram o número de matrículas

identificados no período de 1963 – 1970, e nos dão base para uma análise prévia das

matrículas efetivadas. As fichas consultadas, neste momento do estudo, num total de oito

fichas de matrícula, trazem informações relevantes sobre a documentação exigida no ato

da matrícula, exigências comprobatórias e certificadoras, para que as alunas pudessem

cursar o magistério.

Ano Número de matrículas

1963 27

1964 43

1965 97

1966 53

Dr. Estácio Tavares

Wanderley

1967 a 1971 Agrípino Filho

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1967 144

1968 130

1969 138

1970 171

Quadro 2: Quantidade de alunas matriculas por ano.

O número de alunos corresponde ao período da matrícula, não contabilizando o

número de discentes em turmas ativas na escola por ano. Além disso, por se tratar de uma

pesquisa em andamento, ainda não são conhecidos os processos de oscilações referentes

aos números de matrículas.

Nesse sentido, em conformidade com as fichas de matrícula, pode-se constatar

que houve uma oscilação na quantidade alunas matriculada nos anos posteriores a 1960.

A partir de 1963, o número de alunas diminui, passando a ser apenas 27. No ano seguinte

há um pequeno crescimento chegando a 43 alunas, somente no ano de 1965 haverá um

crescimento expressivo superando o ano de inauguração da escola, nesse ano a instituição

passa a contar com 97 alunas. Em 1966, ocorre novamente uma insuficiência no número

de alunas, totalizando a quantidade de 53 discentes.

Somente no ano seguinte, isto é em 1967 no ano seguinte, registra-se um

crescimento no número de matrículas que se estenderá até o final da década em estudo,

sendo no ano citado a quantidade de 144 alunas matriculadas, seguindo-se em 1968 por

130 alunas e, nos dois seguintes anos, 1969 e 1970, possuíam-se 138 e 171 discentes

respectivamente.

Ainda relativo as fichas de matrícula, essas eram compostas de algumas

exigências comprobatórias e certificadoras de que as alunas podiam cursar o magistério.

Assim, para efetivação da matrícula eram exigidos: atestado de boa saúde, de vacinação

contra varíola, certificado de conclusão do curso ginasial, certidão de bom

comportamento, requerimento de matrícula e pagamento de uma taxa para efetivação da

matrícula. Além destas informações, as fichas eram compostas por notas de um exame

vestibular previamente realizado para seleção das alunas, estas eram avaliadas em

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Português e Matemática (escrito e oral) e em outras disciplinas das quais não se esclarece

o procedimento da prova, História do Brasil, Geografia, Ciências e Francês.

Contabilizada a média da aluna, somado aos documentos se realizava as matrículas.

É evidente que a forma de seleção das alunas conota uma figura do

comportamento que a moça e futura docente deveriam exercer na sociedade. Conforme

Santos (2014, p.170) “a formação se inicia com o processo de seleção, classificação,

hierarquização, inclusão e exclusão que se inscreve no corpo”. De modo que se fazia

necessário uma pré-seleção das alunas que viriam a se tornar professoras, relacionando

ainda o papel de uma boa mãe como uma boa professora.

Apontamentos finais

Considerando os aspectos abordados neste estudo, podemos concluir, ainda que

provisoriamente, que na criação da Escola Normal Estadual Padre Emídio Viana Correia,

em Campina Grande-PB, houve um descompasso entre a criação da Escola Normal de

João Pessoa, ainda no século XIX, e a de Campina Grande, na segunda metade do século

XX. Por outro lado, a preocupação de instauração dessa Escola Normal, expressava mais

que o interesse na instrução pública de qualidade. Como afirma Kulesza (2008) a escola

normal, uma escola do sexo feminino destinada às elites, passou a ser referenciada como

local de profissionalização para a mulher de classe média, após a urbanização das cidades.

Tais aspectos podem ser identificados no número de alunas (normalistas) matriculadas

nas décadas de 1960-1970.

Os dados evidenciados no histórico da escola ainda mostram forte influência da

religião no imaginário da sociedade e da escola, da qual atribui seu nome ao de um

educador religioso do período. A presença do homem já aparece como função

administrativa reafirmando que a sala de aula e o ensino para com as crianças se

configuram em uma ação maternal, isto é feminina. No que diz respeito as fichas de

matrículas, estas compõe dados importantes do corpo discente constituinte da escola, e

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estas são similares a outros estudos de outras escolas normais que enobrecem a visão da

professora como um ser idealizado de pureza e delicadeza para desempenho da missão

educadora.

Por fim, os dados nos levam a proceder a investigação para compreendermos

melhor como se configurou a Escola Normal (espaço físico, perfil das normalistas,

docentes, currículo, práticas escolares, solenidades e demais aspectos do cotidiano

escolar) no período de 1960 a 1970, enfim, como se desenvolveu o processo de

implementação da referida Escola no contexto da educação paraibana.

Referências

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