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Educação Em Jornada ampliada: vivências a partir da Escola

E da univErsidadE

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Realização: Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS

Av. Presidente Getúlio Vargas, 609N • Ed. Engemede • 2 andar Centro • Chapecó • Santa Catarina • Brasil • CEP 89812-000

Caixa Postal 181 • Telefone (49) 2049 1401

Coordenação editorial: Derlan Trombetta

Lisia Regina Ferreira MichelsMonica Hass

Fabiane de Andrade Leit Oto João Petry

Rodrigo Manoel Dias da SilvaJoaquim Gonçalves da Costa

Julio Murilo Trevas dos Santos

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Porto Alegre2014

Educação Em Jornada ampliada: vivências a partir da Escola

E da univErsidadE

Elsio José Corá(Org.)

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© dos autores1a edição: 2014

Projeto gráfico: Jadeditora Editoração GráficaEditoração e Capa: Rafael Marczal de LimaRevisão ortográfica: Renildo BaldiImpressão: Triunfal Gráfica & Editora

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

R332 Educação em jornada ampliada: vivências a partirda escola e da universidade / organizador Elsio José Corá. – Porto Alegre : Evangraf, 2014.

252 p. ; 21 cm.

Inclui bibliografia.

ISBN 978-85-7727-704-4

1. Educação. 2. Educação integral. 3. Qualidade (Educação). 4. Professores - Formação. 5. Educação continuada. I. Corá, Elsio José.

CDU 37

CDD 370

(Bibliotecária responsável: Sabrina Leal Araujo – CRB 10/1507)

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SUMÁRIOaprEsEntação .................................................................................................. 7

implantação da Educação intEGral no Brasil: ............................... 17rEflExõEs soBrE os dEsafios E as possiBilidadEs

Elaine Aparecida Lorenzon e Delmir José Valentini

a polÍtica nacional dE formação dE profEssorEs da Educação BÁsica: diÁloGo com a Educação intEGral na rEdE pÚBlica dE Ensino ......................................................................... 31

Lísia Regina Ferreira Michels, Aurélia Lopes Gomes e Letícia Ribeiro Lyra

currÍculo E docência nas polÍticas dE ampliação da Jornada Escolar: possiBilidadEs na formação continuada dE profEssorEs .................................................................................................... 38

Roberto Rafael Dias da Silva

proGrama mais Educação: aportE tEÓrico, acompanHamEnto E implantação nas Escolas Estaduais no sul do Brasil num Estudo dE caso. ............................................................................................ 47

Maurício Aires Vieira

Agnaldo Mesquita de Lima Júnior

a construção dE uma proposta dE Educação intEGral: do dEsafio À rEalidadE E das concEpçõEs À prÁtica ...................... 62

Carla Talgatti, Jocelei Fátima Portes De Lazzari e Juliana Wrublewski

a Educação intEGral Em tEmpo intEGral articulando saBErEs E prÁticas: a ExpEriência dE vitorino-pr ............................ 71

Dirceu Antonio Ruaro

Educação Em tEmpo intEGral dE coronEl vivida/pr: caminHos, dEscaminHos E possiBilidadEs............................................ 82

Camila Suzani Ribas e Luciane de Fraga Alves Maria

Educação Em tEmpo intEGral no municÍpio dE são João – paranÁ .................................................................................. 91

Fernanda Ribeiro de Souza e Daiane Bavaresco

a implEmEntação da Educação intEGral no municÍpio dE cHopinZinHo, paranÁ ................................................................................ 102

Zeloir Aparecida Scabeni Mendes

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acompanHamEnto do proGrama mais Educação no munÍcipio dE vacaria rs ................................................................................................ 118

Viviane Prux Branco

Educação Em tEmpo intEGral no municÍpio dE saudadE do iGuaçu – pr ................................................................................................... 130

Gislene Gonçalves de Azevedo

limitEs E possiBilidadEs dE uma Educação intEGral Em Escolas indÍGEnas ...................................................................................... 138

Cristiano Augusto Durat

Educação intEGral na Escola do campo: dEsafios E pErspEctivas .............................................................................................. 151

Rosmari T. D. Pelin e Juliana Wrublewski

do planEJamEnto À prÁtica docEntE: rElato dE implantação do proGrama mais Educação Em uma cidadE do oEstE catarinEnsE .................................................................................................. 162

Marineiva Moro Campos de Oliveira

o piBid como polÍtica puBlica dE formação dE profEssorEs E dE manutEnção dos alunos na Escola: a ExpEriência piBid/unifra ...................................................................... 171

Marcos Alexandre Alves

o Ensino da artE na Escola dE tEmpo intEGral ............................. 180Janaína Corá

Educação dE tEmpo intEGral, contriBuiçõEs À promoção da sÁudE E o comBatE a oBEsidadE infantil ..................................... 190

Leila Vagner Oro

intErdisciplinaridadE, transdisciplinaridadE E transvErsalidadE: considEraçõEs soBrE a proposta dos parÂmEtros curricularEs nacionais ......................................... 200

Adna Candido de Paula e Ernani Mügge

ExpEriência E dEmocracia: pilarEs da Educação dEWEYana ...... 215Francisco Xavier Buehrmann e Elsio José Corá

Educação E tEcnoloGia: um diÁloGo nEcEssÁrio .......................... 231Evandro Pegoraro

Ética normativa E valorEs morais ...................................................... 241Prof. Jair A. Krassuski

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Educação em Jornada Ampliada: vivências a partir da Escola e da Universidade

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Mesmo no tempo mais sombrio temos o direito de esperar alguma iluminação, e que tal iluminação pode bem provir, menos das teorias e conceitos, e mais da luz incerta, bruxuleante e frequentemente fraca que alguns homens e mulheres, nas suas vidas e obras, farão brilhar em quase todas as circunstâncias e irradiarão pelo tempo que lhes foi dado na Terra. (ARENDT, 2008, p. 9)1

A Educação brasileira, em particular, a educação escolar pública vive em “tempos sombrios”, não só pelo fato de o Brasil ocupar as últimas posições no ranking mundial, em comparação a outros países avaliados2 –, embora tenha avançado nos últimos anos na democratização e universalização do acesso e da permanência, bem como na “qualidade” –, mas, sobretudo, por ter quase sempre enclausurado no anonimato as pessoas envolvidas na educação. Nas palavras de Almeida (2011, p. 225),3

pouco interessa quem é o professor e sua relação com o mundo, se pelo menos souber aplicar os métodos prescritos ou seus alunos obtiverem os conhecimentos necessários para os provões, vestibulares e outras avaliações de larga escala. Quanto aos alunos, sabemos o que são: ricos ou pobres, negros ou brancos, onde moram e os conhecimentos que possuem ou não, mas muitas vezes, ninguém sabe quem são os alunos, já que as condições de trabalho e o modo de funcionamento da escola fazem com que o professor nem sequer saiba o nome deles. Numa educação anônima não há pessoas que se revelam, nem experiências sobre as quais possamos pensar e nas quais possamos encontrar algum sentido para a educação.

1 ARENDT, Hannah. Homens em tempos sombrios. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.2 Da última avaliação à atual (2012-2014), a educação brasileira passou da 39ª para 38ª posição do ranking em comparação com outras 40 nações, incluindo o Brasil. O indicador do ranking é formado a partir de duas variáveis: capacidade cognitiva (medida por resultados de alunos nos testes internacionais PISA, TIMSS e PIRLS) e sucesso escolar (índices de alfabetização e aprovação escolar).3 ALMEIDA, Vanessa Sievers de. Educação em Hannah Arendt: entre o mundo deserto e o amor ao mundo. São Paulo: Cortez, 2011.

APRESENTAÇÃO

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Educação em Jornada Ampliada: vivências a partir da Escola e da Universidade

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Por outro lado, uma educação escolar que pretende ser integral e em tempo integral, deve estar sempre atenta ao risco iminente do anonimato, em que as pessoas envolvidas são tornadas supérfluas, e as experiências deixam de existir. Também, ela deve estar sempre atenta à possibilidade de que, algumas experiências singulares podem aparecer, inesperadamente, em alguma escola e/ou sala de aula – algumas luzes incertas, bruxuleantes e frequentemente fracas –, nas palavras de Hannah Arendt. Essas “luzes”, contudo, desapareceram como os vaga-lumes de Pier Paolo Pasolini.4

Pasolini escreveu em 1975, no Corriere dela Sera, um artigo intitulado II vuoto del potere in Italia (O vazio de poder na Itália) em que usa a metáfora, “desaparecimento dos vaga-lumes”, como uma crítica ao fascismo italiano. O autor italiano termina o artigo dizendo: io, ancorché multinazionale, darei l’intera Montedison per una lucciola [eu, por mais multinacional que seja, daria toda a Montedison por um vaga-lume] (PASOLINI, 1975). Pasolini estava falando do “desaparecimento do humano” na sociedade presente, e que num ato de coragem e esperança trocaria a empresa química Montedison (expressão máxima de uma Itália capitalista) por um vaga-lume, ou seja, pela “aparição do humano”: por algumas experiências que ocorrem na esfera pública quando as pessoas podem revelar quem são, saindo do anonimato e do risco de estar a caminho de se tornarem supérfluas. Esse “desaparecimento dos vaga-lumes” também se faz presente na esfera educacional, quando as pessoas envolvidas nela são consideradas supérfluas, de modo que, a possibilidade de pequenos gestos de luz desaparece. Aí a educação passa por “tempos sombrios”.

Na história recente da “Educação Integral e em Tempo Integral” viveu-se em “tempos sombrios”, pois as experiências singulares do passado e de um presente próximo foram confinadas à escuridão do anonimato, senão também esquecidas. Não obstante, mesmo em tempos mais sombrios sempre há a possibilidade do aparecimento de novos vaga-lumes, de pequenos gestos de luz, resultado do agir e da fala de alguns homens e mulheres – singularidades – envolvidos na educação. A esse respeito, Arendt fala, na obra Homens em tempos sombrios, sobre alguns homens e mulheres que, mesmo em tempos sombrios, em que parece não mais existir um espaço público, um espaço de “aparição” – isto é, a experiência –, conseguiram de algum modo que, seus pequenos gestos de luz, iluminassem o mundo. Assim ela escreve,

mesmo no tempo mais sombrio temos o direito de esperar alguma iluminação, e que tal iluminação pode bem provir, menos das teorias e conceitos, e mais da luz incerta, bruxuleante e frequentemente fraca que alguns homens e mulheres, nas suas vidas e obras, farão brilhar em quase todas as circunstâncias e irradiarão pelo tempo que lhes foi dado na Terra. (ARENDT, 2008, p. 9)

4 PASOLINI, P. P. Il vuoto del potere. Disponível em <http://www.corriere.it/speciali/pasolini/potere.html> Acesso 4 ago. 2014.

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Educação em Jornada Ampliada: vivências a partir da Escola e da Universidade

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Nesta direção, se poderia falar em “tempos menos sombrios” no que se refere a “Educação Integral e em Tempo Integral”, quando parece haver o “reaparecimento de vaga-lumes”, possibilitado, em grande medida, pela implementação do Programa Mais Educação do Ministério da Educação (MEC), em várias escolas de diversos estados e/ou municípios, Brasil afora. Tal programa tem tornado possível o surgimento de algumas luzes que, certamente, podem iluminar a Educação Integral brasileira em geral, mais do que teorias e conceitos, pois a luz vem de experiências singulares. Por outro lado, serve de advertência, o que fala Almeida (2011, p. 225): “quem pensa a educação tem de tomar cuidado de não apagar essas luzes do presente e de recordar as do passado, pois elas nos lembram da tarefa da educação: cuidar de um mundo que não dispensa as pessoas, mas depende delas, e acolher as crianças e jovens que vem fazer parte dele”.

A presente obra que o leitor tem em mãos pode ser lida com esse pano de fundo. Isto porque, em cada um dos textos encontram-se algumas luzes “produzidas” por pessoas envolvidas com a educação pública brasileira, principalmente, com a “Educação Integral e em tempo integral”, as quais, por sua vez, saem do anonimato para se revelarem quem são, bem como as suas experiências singulares – ou como sugere a segunda parte do título: “vivências e perspectivas”. Neste sentido, os autores dessa coletânea buscaram cada um ao seu modo “narrar” suas vivências e/ou perspectivas no âmbito educacional em geral, e na Educação Integral em particular.

“Implantação da educação integral no Brasil: reflexões sobre os desafios e as possibilidades” de autoria de Elaine Aparecida LORENZON, Delmir José VALENTINI, procuram discutir conceitos e experiências referentes à educação integral que emergiram no decorrer dos últimos tempos, o contexto das experiências de implantação e, principalmente, a identificação dos principais desafios atuais desta modalidade de ensino, ou seja, a implantação da educação integral na sociedade brasileira. Buscam apresentar conceitos que permeiam a temática, a fim de compreender os diferentes significados que a expressão “Educação Integral” pode suscitar. A identificação destes conceitos procurou a correlação em algumas experiências de educação integral, já implementadas no decorrer da História da educação brasileira. Este estudo contribui no reconhecimento da importância da Educação Integral para a formação humana e, por meio de experiências já implantadas no Brasil, identificar aspectos que possam auxiliar na construção de novas propostas. A discussão inicial apresenta a relação existente entre escola e educação, depois mostra o desenvolvimento de conceitos de educação integral na perspectiva teórica de diferentes autores e as principais experiências de Educação Integral materializadas na sociedade brasileira. As considerações finais trazem reflexões sobre as possibilidades e os desafios que permeiam a implantação desta modalidade de ensino.

“A política nacional de formação de professores da educação básica: diálogo com a educação integral na rede pública de ensino”, as autoras Lísia Regina Ferreira MICHELS, Aurélia Lopes GOMES e Letícia Ribeiro LYRA, apresentam duas

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Educação em Jornada Ampliada: vivências a partir da Escola e da Universidade

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experiências de cursos de formação continuada, em serviço, realizadas por uma instituição de ensino superior pública em parceria com duas redes de educação municipal envolvidos com o Programa Mais Educação. O objetivo principal deste projeto, segundo as autoras, é desenvolver espaços formativos de Educação Integral e em Tempo Integral, por meio de estudos e oficinas para a formação com os gestores e professores da rede pública dos dois municípios. Destaca-se nestas experiências a relevância da postura colaborativa e participativa entre as instituições e os profissionais da educação básica.

“Currículo e docência nas políticas de ampliação da jornada escolar: possibilidades na formação continuada de professores” é o texto de Roberto Rafael Dias da SILVA. Nele, o autor expõem os pressupostos orientadores de um projeto de extensão destinado à formação continuada dos profissionais que atuam no Programa Mais Educação, no Município de Erechim/RS. O foco, da referida atividade, é o currículo escolar nas políticas de ampliação da jornada, em suas versões recentemente em curso no Brasil. A abordagem formativa foi dirigida para os processos de seleção e organização dos conhecimentos escolares, assim como para os pressupostos orientadores das práticas docentes dos profissionais que trabalham naquele contexto.

“Programa Mais Educação: aporte teórico, acompanhamento e implantação nas escolas estaduais no sul do Brasil num estudo de caso” de autoria Maurício Aires VIEIRA, Agnaldo Mesquita de LIMA JÚNIOR, versa sobre o Programa Mais Educação (PME) implantado nas escolas estaduais do Município de Jaguarão-RS, no ano de 2011-2013, em que se buscava garantir uma formação mais ampla aos discentes no turno inverso ao horário dos estudos curriculares. Para isso, o grupo PET-Pedagogia da Universidade Federal do Pampa acompanhou o processo nas escolas para auxiliar nas questões pedagógicas que surgissem com o desenvolvimento/implementação do programa. O objetivo do grupo tem sido fazer uma breve comparação entre os dispostos nas legislações regentes no PME e a aplicação realizada nas escolas observadas.

“A construção de uma proposta de educação integral: do desafio à realidade e das concepções à prática”, de autoria de Carla TALGATTI, Jocelei Fátima Portes de LAZZARI, Juliana WRUBLEWSKI, procuram explanar sobre o percurso e a construção da Educação em Tempo Integral no Sistema Público Municipal de Ensino de Erechim/RS, em especial, a Escola Municipal de Ensino Fundamental Cristo Rei. Esta escola, além de ser tomada como exemplo de implantação da Educação Integral em jornada ampliada, também trabalha com a experiência de espaços educativos além dos muros da escola. O estudo relata as experiências de reconstrução de saberes, adequação curricular, valorização da cultura local, articulação com a comunidade e políticas públicas de apoio e suporte à prática da Educação em Tempo Integral. Procura mostrar também que a proposta de Educação Integral é possível, desde que haja comprometimento, gestão democrática com a qual a comunidade escolar está envolvida e pode opinar em reuniões do Círculo de Pais e Mestres. É destacado que

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Educação em Jornada Ampliada: vivências a partir da Escola e da Universidade

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as disciplinas devem ser trabalhadas de forma articulada, rompendo com a estrutura curricular e de ensino tradicional, pois todos ensinam e todos aprendem, sendo protagonistas de sua própria história.

“A educação integral em tempo integral articulando saberes e práticas: a experiência de Vitorino-PR”, de Dirceu Antônio RUARO, apresenta um relato da educação municipal de Vitorino do Estado do Paraná, trazendo uma análise do contexto educacional local, da implantação e implementação da Educação Integral em Tempo Integral na Rede Municipal de Ensino. Aborda os pressupostos que deram embasamento à implantação da educação integral, a organização curricular, as oficinas que compõem a prática educativa, bem como os avanços e desafios de um processo de política pública de educação integral em que se dão os primeiros passos. Aponta, nas considerações finais, questões ligadas às concepções de educação integral e tempo integral, recursos humanos e financeiros necessários à política de educação integral, bem como à gestão em tempo integral. A base para a exposição apresentada no texto é a documentação da própria Secretaria Municipal de Educação, suas conquistas, avanços e desafios.

“Educação em tempo integral de Coronel Vivida/PR: caminhos, descaminhos e possibilidades”, das autoras Camila Suzani RIBAS, Luciane de Fraga ALVES MARIA, investigam a trajetória da educação integral no Município de Coronel Vivida, da sua implantação até os dias atuais. Para tanto, as autoras realizaram breve contextualização sobre as concepções de tempo e da educação em tempo integral, passando pelo relato sobre os aspectos socioeconômicos, políticos e educacionais vividenses, para então chegar à educação integral do município. Com isso, concluíram sobre a importância de o município instalar amplo processo de reflexibilidade e discussão com todos os envolvidos (sociedade em geral) acerca do tipo de homem que se quer formar, e projetem uma educação com o compromisso efetivo de uma prática emancipatória e democrática.

“Educação em tempo integral no Município de São João – Paraná” da autoria de Fernanda Ribeiro de SOUZA, Daiane BAVARESCO, apresenta a experiência da rede municipal de São João – Paraná, na implementação da educação em tempo integral nas escolas que ofertam os anos iniciais do Ensino Fundamental. O estudo foi realizado por meio de análise documental e bibliográfica, além de observação do contexto pesquisado. A partir da análise do processo de ampliação da jornada escolar na rede foi possível identificar avanços e desafios para a efetivação da proposta de educação integral e em tempo integral assumida pelo município, bem como as relações da experiência com a proposta presente no arcabouço teórico que orienta o Programa Mais Educação.

“A implementação da Educação Integral no Município de Chopinzinho, Paraná” da autoria de Zeloir Aparecida Scabeni MENDES, que versa sobre a percepção de que nesse município existem crianças em situação de vulnerabilidade social e com defasagem de aprendizagem. O que tornou fundamental analisar o processo educativo

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Educação em Jornada Ampliada: vivências a partir da Escola e da Universidade

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em desenvolvimento em que as crianças são vistas como sujeitos de direito, como o direito de aprender de modo significativo, com atividades diferenciadas. O Projeto de Educação em Tempo Integral em desenvolvimento, desde o ano de 2005, objetiva uma formação integral ao educando, oportunizando situações diferenciadas de aprendizagem, mediante a ampliação de tempos e espaços e de um grande empenho coletivo entre escola, comunidade e políticas públicas. Todas as escolas municipais ofertam educação integral às crianças que apresentam necessidade ou interesse em permanecer o dia todo na escola. O Projeto possui um arranjo educativo próprio e hoje associa orientações e recursos do Programa Mais Educação para implementá-lo. O município está oportunizando um grande processo de democratização de ensino e as unidades educativas estão associando o ato de educar e cuidar, possibilitando as crianças aquisição de conhecimentos e o desenvolvimento de habilidades que propiciarão sua integração no mundo superando desigualdades sociais históricas.

“Acompanhamento do programa mais educação no Município de Vacaria/RS: ensaios para uma educação integral em tempo integral” de Viviane Prux BRANCO. A autora expõem os caminhos trilhados do Programa Mais Educação em escolas municipais de Vacaria/RS. O texto tem como objetivo apresentar o Programa no município, as conquistas e as aspirações. Apresenta alguns gráficos sobre indicativos de alunos, reprovações, repetência, número de bolsas família, que participam do Programa Mais Educação.

“Educação em tempo integral no Município de Saudade do Iguaçu-PR” de Gislene Gonçalves de AZEVEDO mostra a importância do trabalho em Escolas de Tempo Integral nestes novos tempos. Sabendo-se o quanto é importante a criança estar em lugar onde possa, além de adquirir conhecimento, se divertir e acima de tudo assumir sua condição de criança, agregando valores fundamentais para sua formação integral. Destaca que, os profissionais da educação, tem o dever de fornecer aos alunos o melhor de cada um, fazendo com que sintam prazer por estar em nossa presença. No núcleo do seu texto, a autora apresenta brevemente as atividades desenvolvidas na Escola Municipal Padre Felipe em Tempo Integral do Município de Saudade do Iguaçu – PR.

“Limites e possibilidades de uma educação integral em escolas indígenas” de autoria de Cristiano Augusto DURAT, aponta alguns limites e possibilidades da implementação da educação integral em escolas indígenas. O texto pretende levantar questionamentos e ser instrumento de reflexão e de apontamentos necessários para garantir os direitos das populações indígenas do Brasil a uma educação escolar de qualidade, pública e diferenciada.

“Educação integral na escola do campo: desafios e perspectivas” de Rosmari T. D. PELIN, Juliana WRUBLEWSKI as autoras fazem uma análise e relato da experiência educacional, realizada a partir da ampliação da jornada escolar, na Escola Municipal de Ensino Fundamental Jaguaretê, localizada no meio rural do Município de Erechim.

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Educação em Jornada Ampliada: vivências a partir da Escola e da Universidade

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Objetivam relatar a experiência da implantação da Educação Integral na escola e sua adequação a práticas pedagógicas que atendam às demandas da educação no campo. Para tanto, desenvolvem uma série de atividades, a fim atender às expectativas da comunidade escolar com relação ao processo de ensino e de aprendizagem, bem como a implementação de práticas pedagógicas que promovam a aprendizagem dos estudantes, de modo a incidir, progressivamente, na melhoria do desempenho escolar. A fundamentação teórica baseia-se em autores, entre os quais se destacam Vasconcellos (2012), Brasil (1988; 1996; 2012), Franco (2005), Paro (2000), e Resoluções que regem o sistema educacional brasileiro. A metodologia utilizada foi à pesquisa/ação como forma de intervenção na realidade, baseada em uma construção coletiva. As ações programadas foram reuniões de estudos, debates, questionários, análises, objetivando ouvir e conhecer a opinião dos diversos segmentos e lideranças locais sobre a temática apresentada e, coletivamente, propor novas ações para implantação do Projeto Político-Pedagógico da escola. Os resultados foram observados pelos avanços significativos quanto aos estudos, discussões, análises e debates em torno do tema proposto, assim como maior envolvimento da comunidade nas decisões da escola.

“Do planejamento à prática docente: relato de implantação do programa mais educação em uma cidade do oeste catarinense” de Marineiva Moro Campos de OLIVEIRA, relata o processo de implantação do Programa Mais Educação em um município do Oeste Catarinense. No decorrer do relato, descreve a importância do planejamento das práticas dos educadores do Programa, com foco na participação coletiva e na formação continuada. Nesse intuito, foram entrevistados três monitores do Programa Mais Educação e dois professores da escola que atendem aos alunos do Ensino Fundamental da escola da Rede Municipal, localizada no Município de Xaxim/SC. Os resultados mostram que os professores entrevistados relacionam a formação continuada com o planejamento coletivo na atuação escolar, considerando-a de fundamental importância para a construção de suas práticas. Por último, constata que boas práticas docentes só são realizadas e melhoradas se forem planejadas no coletivo, sendo necessária a formação continuada focada na Educação Integral.

“O PIBID como política pública de formação de professores e de manutenção dos alunos na escola: a experiência PIBID/UNIFRA” de Marcos Alexandre ALVES. O autor faz um relato de experiência do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), do Centro Universitário Franciscano – UNIFRA, que teve início em suas atividades em setembro de 2010, com o projeto intitulado Programa de Integração das Licenciaturas para Formação Compartilhada entre Educação Superior e Educação Básica. Ao longo dos seus três anos de atuação, verifica-se que o Programa causou e causa uma série de impactos, nos contextos em que atua, por ser promotor de maior integração entre IES e Escolas. Tanto professores em serviço, quanto os alunos que participam do Programa como bolsistas, (re)significam os saberes e fazeres docentes, por meio da

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Educação em Jornada Ampliada: vivências a partir da Escola e da Universidade

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prática diária de apoio pedagógico e monitoria, de planejamento, de estudo e reflexão sobre iniciação e formação à docência, de produção de material didático-pedagógico e de textos acadêmicos. Isso se reflete no aumento do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), na maioria das Escolas atendidas pelo Programa, pois provocou uma mudança de atitude na comunidade escolar: os professores tornam-se mais comprometidos com a aprendizagem de seus alunos e apresentam metodologias diferenciadas para promover isso; os alunos tornam-se mais interessados em aprender e têm apoio para alcançar esse objetivo, e os bolsistas, mais preparados para enfrentar essa realidade. Além disso, pode-se destacar que os alunos atendidos pelo Programa permaneceram mais tempo na Escola e, consequentemente, melhoram os seus respectivos desempenho em relação ao conhecimento e nas relações interpessoais com colegas e professores. Isso, também, refletiu significativamente no índice de evasão escolar, que baixou consideravelmente nas escolas atendidas pelo Programa.

“O ensino da arte na escola de tempo integral” de Janaína CORÁ, busca refletir sobre a importância da presença da Arte na Escola de Tempo Integral e o impacto desta na formação integral dos estudantes. Alguns avanços foram percebidos no currículo e nas propostas pedagógicas no Ensino da Arte e apresentam melhorias qualitativas, como é descrito em relatos de experiências. Há a necessidade de compreender, o papel do campo da arte e as metodologias utilizadas no espaço da escola. O texto apresenta alguns caminhos, a partir de considerações feitas por diferentes autores, abordando de forma mais específica a Arte como Experiência. Alargar a percepção dos estudantes e a aproximação destes com a comunidade poderá contribuir significativamente para o encontro com a arte e as coisas da vida.

O texto “Educação de Tempo Integral, contribuições à promoção da Saúde e combate à obesidade infantil” de Leila Vagner ORO tem o propósito de investigar a trajetória da educação integral na Escola Estadual Cristo Rei no Município de Pato Branco, PR. Possui intuito de identificar como essa experiência pode Promover a Saúde e combater a obesidade infantil, tendo em vista que este se torna um problema de saúde pública, quando não tratado devidamente. Por fim, o texto estabelece uma reflexão sobre a real possibilidade da Escola de tempo integral contribuir na solução e combate da Obesidade Infantil.

“Interdisciplinaridade, transdisciplinaridade e transversalidade: considerações sobre a proposta dos parâmetros curriculares nacionais” de autoria de Adna Candido de PAULA, Ernani MÜGGE, busca, a partir da constatação, que a qualidade do ensino, oferecido nas instituições não acompanha a escalada do processo de universalização do ensino. Isto porque, os dados oriundos de diversos instrumentos de avaliação da aprendizagem demonstram que a escola brasileira está muito aquém do esperado em termos qualitativos, fazendo emergir, não raras vezes, o conceito de “fracasso escolar”. A pergunta que se impõe de imediato busca razões desse fracasso, e tenta compreendê-lo à luz das ações propostas nos documentos oficiais, na tentativa de

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Educação em Jornada Ampliada: vivências a partir da Escola e da Universidade

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estabelecer um vínculo entre a teoria e a prática. Assim, sobressaem-se, de imediato, fatores associados a propostas de intervenção pedagógica. Dada a sua presença em documentos que deram voz à LDB, a interdisciplinaridade, a transdisciplinaridade e a transversalidade merecem atenção, uma vez que essas abordagens ainda não ecoam de maneira satisfatória em grande parte das escolas brasileiras e podem, em razão disso, ter parcela de influência na aprendizagem dos alunos. Essa especulação baseia-se no fato de que uma compreensão nebulosa ou equivocada dos fenômenos pode interferir no ensino, fazendo com que haja dispersão de e nas estratégias e mau aproveitamento do tempo disponível para o que, substantivamente, interessa para a construção do conhecimento escolar. Investigar os entraves da implantação dessas práticas e iluminar possíveis caminhos significa distinguir esses conceitos em voga na contemporaneidade, marcados pela valorização da unidade e de resistência à especialização e à fragmentação do conhecimento. Para, além disso, perceber, na prática interdisciplinar, a possibilidade de valorizar a formação integral do alunado com vistas ao exercício da cidadania, objetivo destacado no processo de ensino e aprendizagem.

“Experiência e democracia: pilares da educação deweyana” dos autores Francisco Xavier BUEHRMANN, Elsio José CORÁ, procura resgatar o conceito de “experiência” como elemento central da teoria educacional desenvolvida por John Dewey (1859-1952). Para isso, percorrem a teoria pragmatista, a fim de encontrar os fundamentos que alicerçaram a teoria deweyana da educação. Analisam o valor e importância da experiência educativa constituída pelo princípio da continuidade e da interação compreendidos como indissociáveis no cenário da educação. Além de analisar o conceito de democracia como pilar que, juntamente, com a experiência sustentam o desenvolvimento de uma vida em constante ampliação. O que permite afirmar que vida, experiência, democracia e aprendizagem são interligadas intimamente, concedendo a reflexão e aquisição de novos e mais amplos conhecimentos. Por fim, realizam também um estudo acerca do movimento da escola tradicional e Escola Nova e as implicações que a teoria deweyana desenvolveu no cenário brasileiro da educação.

“Educação e tecnologia: um diálogo necessário” de Evandro PEGORARO, busca colocar em discussão a relação entre educação e tecnologia. Pois, conforme o autor, o fenômeno educativo escolar está situado num contexto social. A escola é um ambiente (lócus) onde características sociais aparecem de modo não latente. Prova disso é o uso do celular, do tablet, do netbook, do notebook pelos alunos, hábito adquirido no convívio social. A escola e o professor estão preparados para atender a essa demanda? Neste sentido, pensa as imbricações entre tecnologia e educação. O desafio é fazer com que os meios tecnológicos possam formar pessoas conscientes, críticas, humanas, politizadas, éticas, culturais e, para isso acontecer, é necessário aprender a usar adequadamente as Novas Tecnologias de Informação e da Comunicação (NTIC). Assim, a tecnologia oferece recursos que nos auxiliam, didaticamente, no processo de ensino-aprendizagem.

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“Ética normativa e valores morais” de Jair A. Krassuski. O autor trata de aspectos da teoria moral de Immanuel Kant enfatizando o caráter normativo da proposta. Os conceitos de vontade, dever e esclarecimento permitem compreender a pretendida fundamentação da moralidade e estabelecer a melhor forma de educação moral do sujeito, a saber, para Kant, o diálogo. Persiste, nas obras práticas do autor, um interesse pela educação dos agentes morais que deve ser buscada em correspondência com as exigências e o rigor da teoria moral. Os temas e problemas da filosofia prática kantiana são recorrentes no estudo da ética pela força e abrangência de sua obra no contexto cultural filosófico. Para Kant a lei moral e a ideia de uma comunidade moralmente motivada são compatíveis e desejáveis. No entanto, a instituição disponível de comunidade, a religiosa, contém discrepâncias quanto ao modo de propor a educação. O modelo é o catequético e não o do diálogo, mais adequado, segundo o autor, para a formação moral autônoma dos indivíduos. Como mostra a ética kantiana o princípio supremo da moralidade, a lei moral, permite adentrar no terreno da liberdade e da autonomia.

Eduardo MorelloInverno primaveril, agosto de 2014.

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IMPLANTAÇÃO DA EDUCAÇÃO INTEGRAL NO BRASIL:

REfLExõES SOBRE OS DESAfIOS E AS POSSIBILIDADES1

Elaine Aparecida Lorenzon2

Delmir José Valentini3

A implantação da Educação Integral no Brasil: reflexões sobre os desafios e possibilidades, procura discutir conceitos e experiências referentes à educação integral que emergiram no decorrer dos últimos tempos, o contexto das experiências de implantação e, principalmente, a identificação dos principais desafios atuais desta modalidade de ensino, ou seja, a implantação da educação integral na sociedade brasileira.

Busca-se apresentar conceitos que permeiam a temática a fim de compreender os diferentes significados que a expressão “Educação Integral” pode suscitar. A identificação destes conceitos procurou a correlação em algumas experiências de educação integral, já implementadas no decorrer da história da educação brasileira. Este estudo poderá contribuir no reconhecimento da importância da Educação Integral para a formação humana e, por meio de experiências já implantadas no Brasil, identificar aspectos que poderão contribuir na construção de novas propostas.

A discussão inicial apresenta a relação existente entre escola e educação, depois mostra o desenvolvimento de conceitos de educação integral na perspectiva teórica de diferentes autores e, embora sucintamente, as principais experiências de Educação Integral materializadas na sociedade brasileira. As considerações finais trazem reflexões sobre as possibilidades e os desafios que permeiam a implantação desta modalidade de ensino.

Educação E Escola: vÍnculo indissociÁvEl

Refletir sobre o conceito de escola implica a consciência da necessidade de mudanças na percepção dos tempos e espaços educativos, sem alterar a ideia de escola como instância inseparável da educação. Isso porque, na contemporaneidade, a

1 Artigo produzido a partir da pesquisa realizada como trabalho de Conclusão do Curso de Especialização em Educação Integral pela UFFS, nos anos de 2011 e 2012.2 Graduada em História; Especialista em Educação Integral e Técnica em Assuntos Educacionais na UFFS.3 Doutor em História pela PUC/RS; Professor Adjunto na UFFS.

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educação é um elemento-chave para a construção de uma nova racionalidade, que se torna imprescindível o seu fortalecimento como veículo responsável pela difusão do conhecimento historicamente produzido, por meio de redes articuladas que objetivem a formação completa do ser humano.

A contemporaneidade é caracterizada pela intensa tecnificação, pela emergência de uma pluralidade cultural na qual a constituição de uma identidade ultrapassa as fronteiras nacionais, em que a educação é adquirida em espaços formais e não formais. A escola, neste contexto, precisa superar o caráter de apenas servir como transmissora de informações à realidade em que está inserida. Para tal é preciso que ela (a escola), de modo contínuo, recontextualize o conhecimento científico, valorize o saber empírico, retomando valores como o espírito, a identidade comunitária e o respeito ao próximo. Pressupostos imprescindíveis ao desenvolvimento da inteligência geral, pedra de toque para um aprendizado contínuo, o que possibilita inserir a escola numa perspectiva de educação integral. (MORIN, 2010, p.21-23)

A escola, tal como a conhecemos hoje, surgiu com o projeto iluminista4 visando à difusão racional do saber para a construção de uma sociedade democrática com cidadãos autônomos. Foi na escola que atos como a leitura e a escrita universalizaram-se e se tornaram requisitos essenciais na aquisição do conhecimento. É nesta direção que se busca a reconfiguração do papel social da escola por meio da revisão e atualização de seus objetivos, com os quais se torna perceptível a necessidade de inserção do conceito de educação integral.

No Brasil, as reflexões sobre a educação integral não podem ser dissociadas das experiências já materializadas, em sua maior parte no século XX. Sua análise permite identificar a existência de alguns conceitos que nortearam (norteiam) as práticas de educação integral e que podem ser essenciais na construção de novas perspectivas e experiências inovadoras de ensino.

Educação intEGral no Brasil: alGuns concEitos

A educação integral não pode ser concebida de forma simplista e, por vezes, entendida apenas na perspectiva da ampliação do tempo de permanência do estudante na escola. A educação integral carrega um significado mais amplo, vinculado também ao sentido da formação humana contínua, o que reforça a participação do homem como sujeito histórico.

Diante desta proposição, a questão conceitual abordada por Guará (2006, p.

4 O Iluminismo foi um movimento filosófico que emergiu no século XVIII na Europa. Embasado por séculos de desenvolvimento científico e econômico caracterizou-se pela ênfase na razão em contraposição aos dogmas religiosos e tradicionais da sociedade da época. O Iluminismo defendia a emergência de uma sociedade democrática e liberal na qual o homem, esclarecido pelas ‘luzes’ da ciência e da razão, buscaria o progresso. Para o iluminismo a educação seria o caminho para transformar a sociedade e fomentar o progresso.

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16-18) identifica três ângulos pela qual a educação integral pode ser compreendida em nossa sociedade. No primeiro, a autora chama a atenção para a compreensão da educação como processo de formação humana que busca construir o homem integral tendo em vista o desenvolvimento pleno, mediante “a necessidade de desenvolvimento integrado de suas faculdades cognitivas, afetivas, corporais e espirituais, resgatando como tarefa prioritária da educação, a formação do homem compreendido em sua totalidade”. (GUARÁ, 2006, p. 16)

Neste aspecto a educação é vista como um processo que ocorre em todos os momentos da vida, originada em variados espaços, agentes e relações-, incluindo-se a questão profissional e humana. O conhecimento é visto de forma contextual, com origens no cotidiano e não restrito a ambientes institucionalizados. Tal percepção aproxima-se das propostas de educação integral elaboradas pelos anarquistas no século XIX e na ideia de paideia,5 que vê a totalidade e os espaços como pedagogia. Aproxima-se também de uma perspectiva sistêmica da vida, da cultura e da ciência, cuja prática pode ser encarada como desafio à escola brasileira.

O segundo ponto levantado por Guará (2006, p. 17) aborda a questão sob a perspectiva da educação integral e a articulação de saberes a partir de projetos integradores. Aqui se irradia um aspecto do trabalho educativo que vai além da escola, buscando integralizar os saberes acadêmicos à vida social, formando uma rede de conhecimentos e intercâmbios entre diferentes instituições. A perspectiva curricular não é abandonada e passa a unificar os saberes sistematizados com o conhecimento empírico, utilizando espaços sociais como igrejas, bibliotecas e clubes, fazendo emergir o conceito hodierno de cidade educadora.6

Como terceira percepção emerge a educação integral vinculada à ideia de ampliação do tempo escolar, em que o estudante tem seu tempo diário escolar aumentado (GUARÁ, 2006, p. 18). A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira, em seu artigo 34, fundamenta juridicamente a ampliação do tempo escolar e, em consonância com o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Constituição Federal de 1988, vislumbra a fase da idade escolar como fundamental no desenvolvimento da criança e do adolescente, o que supõem proteção e oportunidades.

Do ponto de vista histórico, as experiências mais significativas de educação integral no Brasil, estão ligadas à ampliação do tempo de permanência na escola. Materializadas, num primeiro momento, nas experiências das escolas-classe e escolas-parque (1950/60) e nos CIEPs (1980), idealizados por Anísio Teixeira e Darci Ribeiro respectivamente, visaram ao atendimento de jovens, em sua maior

5 O conceito de paidéia tem origem na Grécia antiga e pode ser sintetizado como uma ideia de formação humana que atribuía ao homem uma identidade cultural e histórica e objetivava a formação integral do sujeito nas dimensões: física, cultural, política e espiritual.6 A ideia de cidade educadora compreende o território como um espaço educativo capaz de formar seus habitantes, onde a cidade é vista na perspectiva pedagógica. Cada agente ou instituição propõe-se assumir uma responsabilidade educativa em projetos coletivos para todos os cidadãos. A escola, neste contexto, é apenas uma das instituições educativas que, a partir de ações conjuntas integra-se à vida da cidade.

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parte carentes, proporcionando atividades educativas formais conjugadas a práticas esportivas, artísticas, recreativas, de assistência social. A descontinuidade das políticas públicas, a descrença nesta configuração de ensino e a distorção acerca dos papéis da escola são apontadas como elementos inibidores da permanência e ampliação destas instituições. (GUARÁ, 2006, p. 18).

Posterior às reflexões conceituais Guará (2006, p. 18) alerta que o tempo escolar hoje existente é insuficiente para dar conta da formação exigida pela sociedade. Além do mais, ocorre uma redução da família e comunidade como instâncias unicamente responsáveis pelo tempo livre da criança e do adolescente, principalmente após a inserção da mulher no mercado de trabalho. Isso se reflete de forma mais acentuada nas parcelas mais carentes da população, potencializando a necessidade de propostas educativas de qualidade e que realmente desenvolvam um processo de aprendizado contínuo no aluno.

Na questão conceitual que envolve a educação integral no Brasil, é interessante apontar as considerações de Freitas e Galter (2007, p. 123-124), que também identificam três conceitos ligados ao tema em questão, afirmando que cada um deles reflete a especificidade social de determinado momento histórico no Brasil. Primeiramente, os autores definem a educação em período integral, com base na análise de obras da literatura brasileira. É nas obras de Raul Pompéia (O Ateneu) e de Antonio de Almeida (Memórias de um Sargento de Milícias) que os autores buscaram referências aos internatos, que funcionavam em regime de horário integral, e atendiam a uma clientela seleta e rica. Esta forma de ensino elitista manteve-se até as décadas de 1920 e 1930, do século passado, quando as mudanças no cenário econômico determinaram a escolarização em massa, acompanhado pela progressiva diminuição do tempo de permanência na escola. (FREITAS; GALTER, 2007, p. 124 – 125)

Outra definição levantada pelos autores relaciona a educação integral ao processo de formação humana. Freitas & Galter buscam os fundamentos teóricos que enriquecem este conceito no anarquismo que esteve presente de forma mais pontual na Europa, onde as relações capitalistas consolidaram-se ainda no século XIX. A educação na perspectiva anarquista correspondeu a um processo que abrangeu variados aspectos humanos, inclusive o profissional, envolvendo espaços que não eram unicamente as escolas, e que propunham superar a condição unicamente produtiva a qual o capitalismo conduzia o homem. (FREITAS; GALTER, 2007, p. 125 – 127)

Em nossa sociedade nenhuma destas percepções de educação integral foi amplamente materializada. O que se viu no Brasil, com mais ênfase a partir de 1930, foi a eclosão de um movimento denominado Escolanovismo7 que objetivou expandir o acesso da população à escola a fim de constituir uma sociedade democrática, tendo em

7 O Escolanovismo foi um movimento educacional que se difundiu no Brasil a partir da década de 1920 e tinha por preocupação refletir o papel que a educação deveria exercer dentro da sociedade liberal. Contestou a formação humanista e defendeu um ensino prático e utilitário. Emergiu no contexto econômico capitalista, o qual necessitava qualificar a massa trabalhadora.

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conta as necessidades econômicas e os interesses dos grupos dominantes. Com base na teoria pragmatista8 do norte-americano John Dewey, a escola foi vista como instância capaz de diminuir os conflitos sociais, baseando-se na reconstrução da experiência.

O pragmatismo forneceu os alicerces teóricos para as propostas de educação integral idealizada por Anísio Teixeira nas décadas de 1950 e 1960, a saber: escolas-classe e escolas- parque. Na análise de Freitas e Galter (2007, p. 128-129) tais experiências formularam um conceito de educação integrada por atribuir à escola funções sociais como saúde, segurança e alimentação, tendo em conta a vulnerabilidade em que as crianças em idade escolar se encontravam naquele momento histórico, além das demais funções educativas ministradas num regime de turno e contraturno. O fato de a primeira escola deste gênero ter sido edificada numa periferia de Salvador (Bahia) ilustra o exposto.

Este modelo influenciou as demais experiências em educação integral desenvolvidas no Brasil, tais como os Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs), concebidos por Darcy Ribeiro e implantados no Rio de Janeiro na década de 1980. Do ponto de vista curricular, nos CIEPS, as atividades também se dividiam em turno, no qual eram ministradas as aulas do núcleo comum, e no contraturno responsável pelas atividades diversificadas. Do mesmo modo emergiram na década de 1990, em nível nacional, os CAICs (Centro de Atenção Integral à Criança), que secundarizaram o objetivo de formação integral da criança e do adolescente visto a prevalência de um caráter assistencialista com fins de minimizar os efeitos da disparidade social.

Para os autores fica claro que “as políticas educacionais são um reflexo dos embates da sociedade” (FREITAS; GALTER, 2007, p. 135), e que o debate histórico em torno da educação integral engendrou diferentes conceitos. No Brasil, materializou-se com o escolanovismo uma educação integrada (escola e assistencialismo), com fins de inserir os trabalhadores na nova ordem econômica instituída pelo capitalismo. Cabe salientar que as experiências, a princípio, possuíam uma proposta pedagógica diferenciada e defendiam a oferta de um ensino igualitário a todas as crianças sem distinção social. Isso fez com que adquirissem, no contexto do qual emergiram, respaldo internacional, influenciando nos debates e possibilitando a elaboração de novas propostas para a implantação da educação integral.

Educação intEGral para o Brasil: um concEito Em construção

A preocupação com a formação integral de crianças e adolescentes foi expressa no Brasil com a Constituição de 1988, na qual a educação é concebida como direito social indispensável à formação da cidadania e à inserção profissional das pessoas. A

8 Teoria educacional defendida e posta em prática pelo professor e filósofo norte-americano John Dewey no final do século XIX e início do século XX, nos EUA. No pragmatismo o ensino prezava a associação entre a teoria e a prática e esteve diretamente vinculada ao sistema capitalista de produção.

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Constituição estabelece, também, a tripartição entre Estado, Sociedade e Família na responsabilidade de educar as novas gerações. Nesta perspectiva a educação é vislumbrada como uma ação coletiva e contínua, com responsabilidades e temporalidades ampliadas.

Em relação à educação integral, avanços significativos ocorreram a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996, sobretudo posterior à universalização do Ensino Fundamental. Isso permitiu a ampliação das discussões em torno da qualidade do ensino brasileiro e a retomada das discussões e propostas de educação integral, que até hoje estão fortemente ligadas à ideia de educação democrática proposta por Anísio Teixeira.

Em seu artigo 34, a LDB estabelece a oferta da educação integral, ao prever a ampliação do período de permanência na escola, o que é reforçado também no artigo 87, inciso 5o, no qual são previstos esforços para a ampliação progressiva do regime integral nas escolas. Outro documento importante deste tema é o Plano Nacional de Educação, instituído pela Lei NO 10.172/2001, que vislumbra a educação integral como possibilidade de formação completa do ser humano.

Neste documento é visível o direcionamento da educação integral às camadas sociais mais necessitadas, principalmente no âmbito da educação infantil. A educação integral é compreendida no Plano tanto pelo aspecto da formação integral como pelo viés da ampliação da jornada escolar, fixada em pelo menos sete horas diárias de atendimento. Questões sociais, como a minimização da fome e problemas educacionais clássicos como a repetência, também se fazem presentes, adquirindo a educação integral o desafio de solucionar tais questões. (PLANO Nacional de Educação – MEC, 2003)

O marco legal para a efetivação da educação integral da política pública permanente no Brasil ganhou forças com a criação programa “Mais Educação”,9 integrante do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Este plano preconizou a implantação da educação integral no Brasil e regulamentou seu financiamento pelo FUNDEB (Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica), para garantir percentual financeiro maior às escolas que atendem a alunos em tempo integral. Soma-se a isso o pacto firmado entre União, estados e municípios, também por decorrência do PDE, o chamado Plano de Metas Compromisso Todos Pela Educação,10 com o objetivo de conjugar esforços para garantir a qualidade da Educação Básica.

O programa Mais Educação objetiva “fomentar a Educação Integral de crianças, de adolescentes e de jovens, por meio de atividades socioeducativas, no contraturno escolar, articuladas ao projeto de ensino desenvolvido pela escola” (EDUCAÇÃO Integral: texto referência para o Debate Nacional, 2009, p. 24). O Programa pode ser caracterizado também pela “intersetorialidade” por buscar a articulação de ações pertinentes à Educação, Assistência Social, Cultura, Esporte, Meio Ambiente, envolvendo diversos ministérios e instituições públicas e privadas. As oportunidades

9 Instituído no ano de 2007, pela Portaria Interministerial de n° 17/2007.10 Instituído pelo Decreto nº 6.094/2007.

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educativas, articuladas ao projeto pedagógico, fornecidas às crianças e aos adolescentes tornam a escola mais atrativa e, ao mesmo tempo, visam à proteção social.

Embora o Programa Mais Educação correlacione Educação Integral à ampliação do tempo de permanência na escola, é perceptível uma concepção de Educação Integral que busca a articulação entre as diferentes áreas envolvidas na formação do ser humano, rompendo com a tradição disciplinar do ensino. Tal concepção de ensino é reforçada ao buscar a construção de territórios educativos extrínsecos à escola, no sentido da valorização do saber empírico e da experiência de vida dos educandos e da comunidade em que a escola está inserida. Para Moll (2011, p. 11), o Programa Mais Educação “induz à organização do tempo e do currículo na perspectiva de uma educação que amplie significativamente as dimensões, os tempos, os espaços e as oportunidades formativas”.

O Programa Mais Educação pode ser visto como parte integrante de reflexões amplas, inspirado nos resultados educacionais de países europeus e asiáticos, que há muito tempo investem grandes percentuais em educação. Além de toda questão social brasileira, acentuada com a urbanização e com a inserção da mulher na esfera produtiva, a educação integral emerge como necessária à construção de sujeitos preocupados com problemas globais e locais, capazes de valorizar a diversidade, além de fornecer às novas gerações ampliação das oportunidades profissionais.

Segundo Jaqueline Moll, a instituição do Programa Mais Educação, representa a estratégia do poder público federal na indução da ampliação da jornada escolar, mas também para a construção de um currículo permeado pela integralidade (MOLL, 2009, p. 14). A questão da ampliação da jornada escolar implica o compartilhamento da tarefa de educar, o que já é preconizado na Constituição Federal, mas também envolve a questão da desigualdade social e educativa, que segmenta escolas, rotula estudantes e materializa uma histórica dualidade educativa. Uma educação realmente integral, nas palavras de Moll, é aquela que facilitará “o acesso a um capital cultural que faça a diferença nos processos de inserção social, na perspectiva da superação da sociedade de castas que separa as classes populares das classes médias e altas do país”. (MOLL, 2009, p. 14)

No que tange à organização curricular, Moll (2009, p. 14) destaca a prática que educa de modo integral e deve ser pensada levando-se em consideração o desenvolvimento humano; este envolve as dimensões cognitivas, afetivas, éticas, sociais, físicas, biológicas e representa nova leitura do tempo e dos conteúdos escolares. Isso implica a reflexão acerca dos processos formativos e como atuam na inserção social dos seres que estão sendo educados nas escolas brasileiras. Ora, inserção social significa justamente integrar-se em algum território específico (comunidade, cidade, bairro) e compartilhar de seu cotidiano, mas também significa atuar positivamente sobre este território, exercendo-se política e eticamente. Cabe mencionar que a inserção social subentende também oportunidade de profissionalização qualitativa e crítica.

Neste sentido, a escola necessita aproximar sua pedagogia da sociedade e não permanecer restrita ao repasse dos conteúdos clássicos. O currículo escolar precisa imbuir-se das práticas sociais, culturais e das necessidades profissionais; levar em

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consideração que o educando, ao adentrar o espaço escolar, é possuidor de uma identidade e traz consigo saberes empíricos, apreendidos em diferentes espaços e contextos. Nesta ótica, a valorização do conhecimento dos atores sociais, de seus territórios, de espaços públicos, da relação com a comunidade por parte da escola, pode servir de base para a organização curricular. A escola adquire a responsabilidade de coordenar as ações educativas oriundas de diferentes instâncias demonstrando ser “um lugar de efetivação de direitos, tanto por sua capilaridade social quanto pelo caráter contínuo de realização de uma educação básica”. (MOLL, 2009, p. 14)

Integrar escola e comunidade pressupõe a compreensão da relação existente entre a leitura de mundo e a leitura da palavra, do diálogo que deve existir entre o conteúdo escolar e a realidade do educando, e do poder de transformação que a educação pode propiciar, tal como defende Paulo Freire. Nessa mesma direção, Jaqueline Moll concebe a Educação Integral de modo a associar as experiências, vivências, expressões dos alunos ao processo de aprendizagem que ocorre nas escolas, considerando a necessidade de comprometimento do poder público e dos atores sociais na sua efetivação. A autora afirma que o direito de aprender deve estar associado ao “direito à vida, à saúde, à liberdade, ao respeito, à dignidade e à convivência familiar e comunitária” ( MOLL, 2009, p. 13) e que insere na discussão a ideia do território, da comunidade ou da cidade como pedagogia, como espaço global de formação.

São estes pressupostos básicos à educação de uma sociedade que se diz democrática, e isso reafirma o vínculo entre escola e território (comunidade, bairro, cidade) e que pode ser expresso com diálogo orgânico entre o conteúdo escolar, cientificamente elaborado e as temáticas inerentes à contemporaneidade e ao lugar. É sabido que hoje não basta apenas formação específica e dentro de uma temporalidade determinada, mas sim educação que se converte numa prática contínua e que perpasse por diferentes áreas, dimensões formativas e temporalidades.

Do mesmo modo, as experiências protagonizadas pelas escolas-classe e escolas-parque, nos CIEP’s e/ou nos CAIC’s dentre outras, também podem contribuir na construção de referências para enfrentar os desafios que envolvem a implantação de uma escola integral e em tempo integral e, consequentemente, a consolidação de um ethos educativo comum a toda sociedade, onde o programa Mais Educação pode ser considerado apenas mais um passo na construção de uma longa caminhada.

considEraçõEs finais: Educação intEGral, Quais dEsafios?

Implementar a educação integral no Brasil requer a identificação e o enfrentamento de muitas questões, que se postam como desafios ao governo, à sociedade e às instituições educativas. Ao se pensar que a escola emerge como instituição responsável

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pela implantação desta modalidade de ensino, não se pode esquecer que isso requer toda uma reestruturação institucional, tanto do ponto de vista material, pedagógico, profissional e legal. Essas questões que circundam a educação integral brasileira são dilemas paralelos às problemáticas universais em torno da educação. Isso possibilita a identificação de inúmeros desafios, os quais podem ser vistos de um ponto de vista global e da perspectiva da escola brasileira.

Melo (2008, p. 46) afirma que a educação contemporânea não pode limitar-se à escola, pois “a função educativa passa a exercer grande importância na formação de uma nova sociedade, uma vez que tem como meta formar sujeitos considerando os diversos aspectos que o compõe, a fim de que estes possuam uma identidade sólida”. Isso gera preocupação com a formação do sujeito como um todo e à emergência de desafios maiores (globais), ou seja, questões sociais, éticas, profissionais e ambientais, que influem diretamente o ato educativo.

Essa nova forma de pensamento rejeita explicações unívocas e consensos universais, inserindo na sociedade uma atmosfera de incerteza e carência de marcos de referência. Isso reforça a individualidade como forma de autoproteção decorrente da instabilidade social, econômica e referencial. O próprio capitalismo, em sua vertente pós-moderna, vem a reforçar o sentimento de insegurança, por meio de ‘crises econômicas cíclicas’, da especulação financeira, da pressão à redução das alíquotas de impostos, na flexibilização da legislação trabalhista e na própria transitoriedade do capital que é indiferente às fronteiras.

Associado a esse desafio está a impossibilidade de construção de um modelo de pensamento único justamente pelo fato de que a contemporaneidade resgata a diversidade cultural, e isso implica a formulação de propostas voltadas a cada contexto. Tal situação faz emergir outro grande desafio: a busca por um princípio integrador que considere a diversidade cultural e respeite as diferenças. Nesse caso a educação integral, vista sob a perspectiva da formação humana, adquire participação fundamental, sobretudo em se tratando de Brasil com toda sua riqueza cultural.

Também existe a necessidade de conciliar a racionalidade com a subjetividade a fim de fomentar a revitalização de sentimentos coletivos em detrimento da individualidade, valorizar a solidariedade, a preocupação com o próximo e com o planeta. A educação integral possui fundamentação para materializar a questão afetiva, mas necessita ser um projeto coletivo, ou seja, abraçada pelos governos, famílias, instituições e sociedade, abarcando espaços e tempos não restritos unicamente à escola.

Outra questão potencial é promover o reencontro da Educação com os princípios universais de libertação e emancipação humana; sujeitos livres e emancipados são imprescindíveis à materialização de uma sociedade democrática. Tais princípios engendram o desafio de perceber e fomentar a curiosidade que, na criança é algo natural e convertê-la em curiosidade científica, pois “quanto mais a curiosidade

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espontânea se intensifica (...) tanto mais epistemológica ela vai se tornando” (FREIRE, 2001, p.97). São importantes, também, desenvolver uma percepção sistêmica da vida e consolidar uma cidadania global, visto que toda humanidade tem em comum o fato de habitar o mesmo planeta e dividi-lo com outras formas de vida. Tal ideia relaciona-se também com a sustentabilidade e implica o uso racional dos recursos naturais da terra e a mudança radical no modo de vida de toda população do planeta.

Outra questão significativa, posta à educação integral e também à escola, é a necessidade de vinculação do ensino às necessidades sociais e profissionais. Entra-se aqui na relação entre ciência, vida e profissionalização. Sabe-se que a ciência produz informação e tecnologia; à última, quando associada ao mercado de trabalho causa sua reestruturação e a emergência de novas relações profissionais e isso está cada vez mais frequente. Nesse sentido, vincular a educação à vida requer a análise de todo este contexto profissional o qual exige grande poder de adaptabilidade, por parte do trabalhador, e vem ao encontro da proposta de formação da educação integral. Isso não significa a defesa da adaptação do homem ao mercado de trabalho, mas sim o desenvolvimento de competências necessárias inserção crítica nele.

Propõe-se à escola brasileira, nesse sentido, o desafio de superar seu histórico caráter departamentalista e fragmentário, com fins de incorporar o conceito de educação integral e pô-lo em prática. Isso envolve o empenho, por parte da escola e das esferas governamentais, em tornar pública a compreensão do significado da educação integral e sua importância na contemporaneidade para a formação dos sujeitos. O Texto Referência para o Debate Nacional sobre a Educação Integral (2009, p.28) afirma ser a escola espaço institucionalizador de aprendizagens que, a partir da leitura, escrita e da livre discussão levam à construção da cidadania do sujeito. A proposta de educação integral defendida perpassa pela

(...) oferta de serviços públicos requeridos para atenção integral, conjugada à proteção social, o que pressupõe políticas integradas (intersetoriais, transversalizadas) que considerem, além da educação, outras demandas dos sujeitos, articuladas entre os campos da educação, do desenvolvimento social, da saúde, do esporte, da inclusão digital e da cultura. (TEXTO Referência para o debate nacional, 2009, p. 28)

Outro grande desafio para a escola brasileira é a necessidade de qualificação do tempo escolar, de modo a atuar efetivamente na formação integral do aluno. Tal desafio leva à emergência de três questões básicas, nas quais se assenta a organização das escolas: o conhecimento, o currículo e a aprendizagem, cujas dimensões precisam ser repensadas.

O esforço que se faz pertinente neste sentido, além de compreender a escola

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não somente como instituição “cuidadora”, mas responsável pela contextualização de saberes, é a viabilização de instrumentos que permitam a constante reformulação curricular. Tal reformulação não deve estar circunscrita à parte diversificada e/ou que implica a contextualização da escola em seu ambiente de inserção. Deve fazer parte de uma política pública no âmbito do Ministério da Educação, responsável pela reconstrução do currículo escolar em sua base comum, levando em consideração a flexibilidade do conhecimento e sua aplicação na sociedade.

A reconstrução curricular implica a vinculação de saberes, visto como informais, mas que estão diretamente ligados à formação/educação das pessoas, e aos conteúdos escolares. Considerando o fato de que a escola necessita inserir-se na comunidade, constituem-se como desafio a identificação e incorporação ao seu currículo dos espaços, atividades, interesses e oportunidades educativas desta realidade. Ampliar o tempo escolar implica a sua qualificação, e isso necessita reverter-se na formação completa de quem está sendo educado. Imbricada nesta questão está, também, a valorização dos saberes empíricos, das especificidades culturais brasileiras, dos tempos e dos espaços envolvidos no processo de aprendizagem e desenvolvimento do educando, cuja inserção na escola fomenta a cidadania e o respeito ao outro.

Também relacionados a estes elementos está a formação dos docentes e dos profissionais para atuar na educação integral. Se o tempo do educando e dos processos de ensino-aprendizagem são relativizados, constitui-se em desafio a formação de profissionais que detêm a tarefa de pensar e materializar esta modalidade de ensino. Que formação é necessária? Como gerenciar o tempo dos docentes na instituição? De que forma se constrói e se administra a relação entre o professor e a comunidade? De que forma transformar a escola em espaço prazeroso de aprendizagem? E o planejamento das atividades docentes junto aos educandos? Como construir em conjunto? E o horário do almoço? Como construir/fortalecer a identidade da equipe técnica e do agente educativo? E a questão da valorização profissional, em termos de carreira, de preservação e manutenção da saúde dos docentes?

São muitas questões que permeiam a formação dos recursos humanos para atuar na educação integral. É necessário refletir sobre esta questão e implementar estratégias de formação efetivas, por parte do governo e das instituições de Ensino Superior, voltadas à educação integral, que estimulem o contato e ação direta dos futuros profissionais da educação no ambiente escolar e a qualificação dos docentes em atuação.

No âmbito das escolas, necessita-se fortalecer as estratégias de formação continuada, pois é esta que reflete a escola a partir da práxis diária, bem como a implementação de Projetos Pedagógicos que viabilizem a integração escola – comunidade e gestores – docentes – agentes educativos. Não é somente a temporalidade do aluno que muda, mas também o tempo de toda a escola e, talvez, da comunidade/cidade.

Ampliar o tempo de permanência escolar implica o gerenciamento dos espaços

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internos das escolas, em reformas, construções de novos ambientes, aquisição de materiais atividades e manutenção das estruturas existentes. Isso demanda recursos financeiros, daí a necessidade de a educação integral constituir-se em política pública efetiva, ter definido claramente suas fontes de financiamento, e contar com profissionais capacitados pedagógica e administrativamente para gerenciar esses recursos, priorizando a qualificação do tempo escolar.

Outra questão pertinente é o fomento à participação comunitária no interior da escola, o que reforça os mecanismos de gestão democrática e participação. Isso é fundamental para a compreensão, por parte da sociedade, do conceito de educação integral o que pode fortalecer responsabilidades e construir uma perspectiva de cidade como pedagogia.

Pensar em educação integral na contemporaneidade requer a superação da relação existente entre educação e assistencialismo voltando-se ao propósito de formação integral do sujeito com base no desenvolvimento de competências sociais, profissionais e emocionais. E que isso seja realizado de modo a aperfeiçoar os recursos públicos, efetivar o direito a uma educação de qualidade superando o caráter fragmentário da educação brasileira. Como se pode considerar, alguns passos já foram dados, mas será que queremos caminhar nesta direção?

rEfErências

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A POLÍTICA NACIONAL DE fORMAÇÃO DE PROfESSORES

DA EDUCAÇÃO BÁSICA: DIÁLOGO COM A EDUCAÇÃO INTEGRAL NA REDE

PÚBLICA DE ENSINO

Lísia Regina ferreira Michels1

Aurélia Lopes GomesLetícia Ribeiro Lyra

As políticas educacionais brasileiras têm realizado um forte investimento na formação continuada de professores da educação básica, sendo considerada fundamental para a melhoria da qualidade da educação e para o desenvolvimento profissional docente.

O Governo Federal instituiu a Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica, por meio do Decreto n. 6755, de 29 de janeiro de 2009. No artigo 3º do referido documento, evidenciam-se os objetivos dessa política:

I – promover a melhoria da qualidade da educação básica pública;II – apoiar a oferta e a expansão de cursos de formação inicial e continuada a profissionais do magistério pelas instituições públicas de educação superior;III – promover a equalização nacional das oportunidades de formação inicial e continuada dos profissionais do magistério em instituições públicas de educação superior; IV – identificar e suprir a necessidade das redes e sistemas públicos de ensino por formação inicial e continuada de profissionais do magistério;V – promover a valorização do docente, mediante ações de formação inicial e continuada que estimulem o ingresso, a permanência e a progressão na carreira;VI – ampliar o número de docentes atuantes na educação básica pública que tenham sido licenciados em instituições públicas de ensino superior, preferencialmente na modalidade presencial;VII – ampliar as oportunidades de formação para o atendimento das políticas de educação especial, alfabetização

1 Docentes do Curso de licenciatura em Pedagogia da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS).

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e educação de jovens e adultos, educação indígena, educação do campo e de populações em situação de risco e vulnerabilidade social;VIII – promover a formação de professores na perspectiva da educação integral, dos direitos humanos, da sustentabilidade ambiental e das relações étnico-raciais, com vistas à construção de ambiente escolar inclusivo e cooperativo;IX – promover a atualização teórico-metodológica nos processos de formação dos profissionais do magistério, inclusive no que se refere ao uso das tecnologias de comunicação e informação nos processos educativos; eX – promover a integração da educação básica com a formação inicial docente, assim como reforçar a formação continuada como prática escolar regular que responda às características culturais e sociais regionais.

Para cumprir os objetivos da Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica, foram criados os Fóruns Estaduais Permanentes de Apoio à Formação Docente, em regime de colaboração entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Estes fóruns têm-se configurado num importante espaço de interlocução, entre as instituições de ensino superior, secretarias estaduais e municipais de educação com vistas ao planejamento e ao acompanhamento da formação inicial e continuada de professores.

O Ministério da Educação apoia as ações de formação inicial e continuada de profissionais do magistério ofertadas pelas instituições de ensino superior, mediante a concessão de bolsas de estudo e bolsas de pesquisa para professores, na forma da Lei no 11.273, de 6 de fevereiro de 2006, bem como auxilia os projetos por meio de apoio financeiro aos Estados, Distrito Federal, Municípios e às instituições públicas para implementação de programas, projetos e cursos de formação.

A Portaria Ministerial nº 1087, de 10 de agosto de 2011, instituiu o Comitê Gestor da Política Nacional de Formação Inicial e Continuada de Profissionais da Educação Básica, que define suas diretrizes gerais e prevê a criação de Comitê Gestor Institucional de Formação Inicial e Continuada de Profissionais da Educação Básica nas Instituições de Educação Superior e nas Instituições Federais de Educação Profissional, Científica e Tecnológica.

Nesta perspectiva de formação e articulação com a política nacional de formação de professores, foram criados em todo país, aproximadamente 80 Comitês Gestores Institucionais de Formação Inicial e Continuada de Profissionais da Educação Básica nas Instituições Federais de Educação Superior. Assim, a Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), que desde a sua origem assumiu o compromisso com a qualidade da educação básica, por meio da portaria Nº 839/GR/UFFS/2013, 28 de junho de

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2013, instituiu o Comitê Gestor Institucional de Formação Inicial e Continuada de Profissionais da Educação Básica, no âmbito da Pró-Reitoria de Graduação, com a finalidade de assegurar a indução, a articulação, a coordenação e a organização de programas e ações de formação continuada de profissionais do magistério da educação básica pública.

A partir da criação dos comitês nas universidades federais, a formação continuada de professores ganhou força e centralidade, tendo a escola pública como referência da formação, com vistas a ampliar os espaços formativos e de diálogo entre os professores. Neste sentido, Nóvoa (1992) argumenta

O diálogo entre os professores é fundamental para consolidar saberes emergentes da prática profissional. Mas a criação de redes coletivas de trabalho constitui, também, um fator decisivo de socialização profissional e de afirmação de valores próprios da profissão docente. O desenvolvimento de uma nova cultura profissional dos professores passa pela produção de saberes e de valores que deem corpo a um exercício autônomo da profissão docente. ( NÓVOA, 1992, p. 26)

A ideia de continuidade na formação docente está cada vez mais presente na política nacional de formação de professores e perpassa o debate entre os pesquisadores na área da educação. Numa perspectiva de continuidade orgânica na formação, que inicia nos cursos de licenciatura e perpassa toda a carreira docente, a formação continuada precisa ser garantida, como está previsto na Lei de Diretrizes e Bases, nº 9394/96, no artigo 63, inciso III que estabelece que as instituições formadoras devam manter os “programas de formação continuada para profissionais da educação” como parte integrante da atividade docente.

Segundo Gomes (2008, p.21), “a formação continuada de professores no Brasil tem uma história recente, intensificada a partir da década de 1980”. Acredita-se que a Formação Continuada apresenta-se como momento de aprendizagem do professor na construção da sua professoralidade. Entende-se que a construção da professoralidade aconteça

a partir da atividade realizada pelo sujeito, para produzir-se como professor, na qual se faz necessário à adoção de meios e procedimentos com vistas à apropriação de conhecimentos/saberes/fazeres próprios à área de atuação docente (...) Trata-se de uma produção particular, não solitária que se constitui a partir das redes de relações tecidas nos diferentes contextos profissionais de atuação docente. (BOLZAN e POWACZUK, 2009, p.94)

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De acordo com Veiga, Leite e Duarte (2005, p.143), a formação continuada deve estar “(...) baseada na valorização e no resgate do saber docente construído na prática pedagógica, em um processo mediado por referências teóricas e práticas”. Neste sentido, a formação continuada deve levar em consideração a experiência acumulada dos professores de educação básica e a reflexão sobre a prática docente cotidiana como tarefa fundamental do processo de formação. Enfim, a proposta é aproximar a teoria e a prática da escola, por meio de ações e reflexões conjuntas entre a universidade e a escola de educação básica, neste processo de formação. Neste caso, para a ampliação do tempo diário do aluno na escola de ensino fundamental, na perspectiva da educação integral.

Entre os programas de formação continuada que a Universidade Federal da Fronteira Sul implantou por meio do COMFOR, para o período 2013-2014, destacamos, neste artigo, o Programa Mais Educação, na perspectiva da Educação Integral, no Campus Chapecó. O curso de extensão “Educação Integral e em tempo integral: formação e acompanhamento da implementação nos municípios de Chapecó/SC e Vitorino/PR” é um projeto institucional em parceria com as duas secretarias de educação municipais e oferece a oportunidade da formação continuada em serviço para professores e gestores das redes. Este projeto vem ao encontro da proposta do governo federal de induzir políticas de apoio à formação docente de professores da educação básica pública. Acredita-se que a formação continuada tem sido um dos fatores favoráveis à melhoria da qualidade no ensino no Brasil. (FOERSTE,2005)

O oferecimento da educação em tempo integral em cinquenta por cento das escolas públicas de educação básica está previsto na meta 6 do Plano Nacional de Educação, correspondente ao decênio 2011 – 2020. A implantação e implementação de uma política de educação integral, considerando a ampliação da jornada escolar e a expansão de oportunidades formativas são políticas de governo, tanto no nível federal, quanto estadual e municipal, é uma iniciativa que objetiva garantir a qualidade da educação pública. Juntamente com a adoção de políticas para o tempo integral aprofundam-se também as reflexões sobre a educação integral, no sentido de ampliar as oportunidades de aprendizagem de crianças e jovens, por meio da formação de todas as dimensões que constituem a existência humana. Esta agenda traz para a Universidade a necessidade de pensar a formação inicial e continuada dos professores da educação básica na perspectiva da educação integral em tempo ampliado.

Diante desse contexto, professores da UFFS aprovaram o projeto de extensão de formação continuada em serviço que conta com apoio financeiro da Ação Orçamentária 20 RJ2 e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. O objetivo principal deste projeto é desenvolver espaços formativos de Educação Integral e em Tempo

2 Ação 20 RJ destina-se ao “Apoio à Capacitação e formação inicial e continuada de professores, profissionais, funcionários e gestores para educação básica”. (BRASIL. MEC. DOCUMENTO ORIENTADOR/RENAFORM, 2014, p.5)

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Integral, por meio de estudos e oficinas para a formação com os gestores e professores da rede pública dos dois municípios envolvidos com o Programa Mais Educação. Foi prevista uma carga horária de total de 192 horas em cada município, com duração de 12 meses: no período entre outubro de 2013 a setembro de 2014. No Município de Vitorino/PR, que já regulamentou o tempo integral em 100% das suas escolas, 75 profissionais da educação, que compõem a rede municipal de ensino, participam da formação. No Município de Chapecó/SC, três escolas da rede municipal que aderiram ao Programa Mais Educação, cerca de 10% do total de escolas do município, foram indicadas pela Secretaria Municipal de Educação para a realização do curso, que iniciou com 70 cursistas.

A equipe de trabalho do projeto é formada por uma coordenação geral e uma coordenadora adjunta em cada município, responsáveis por organizar o trabalho do grupo. Cada curso, conta ainda com cinco professores supervisores que são servidores técnicos das redes e da universidade atuam, principalmente, na relação entre cursistas, professores e coordenadores nas questões referentes à organização dos encontros, registro e elaboração dos relatórios pedagógicos, técnicos e financeiros.

A metodologia do curso se efetiva por meio de encontros presenciais sistemáticos realizados por vinte professores pesquisadores de diferentes áreas dos cursos de História, Geografia, Matemática, Língua Portuguesa e Educação Física, Gestão Escolar, Informática, Políticas e Legislação Educacional, Inclusão, Planejamento e Currículo, que conversam as temáticas entre si e buscam trabalhá-las cada um com sua ênfase, com o objetivo de oferecer aos professores e gestores da rede, formação teórico-prática. Os conteúdos propostos no curso partem das discussões sobre a escola de tempo integral e a educação integral, assim constituídos: Educação integral e tempo integral no Brasil: perspectivas e debates; Ampliação da jornada escolar: tempos e espaços formativos; Políticas Públicas em Educação Integral: um estudo do programa Mais Educação; Cidade Educadora: uma introdução ao debate sobre os novos territórios educativos; As novas configurações curriculares para a escola de tempo integral; A docência na escola de tempo integral: desafios aos educadores na contemporaneidade; Educação integral e infância na cultura contemporânea; Gestão, intersetorialidade e financiamento da escola de tempo integral; Educação, linguagens e processos educativos.

Optou-se por encontros dialógicos uma vez que um dos objetivos era discutir e refletir sobre problemáticas relacionadas ao ensino-aprendizagem apresentadas pelos profissionais da educação e também para se promover a apropriação do conhecimento científico, que segundo Bolzan e Powaczuk (2009) apontam a importância das interações dos professores entre si como instância de aprendizagem do “ser docente”.

Embora o curso tenha sido pensado, inicialmente, de forma separada para cada polo e cada um com estrutura própria, a realização dos encontros de planejamento

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entre a coordenação, os professores pesquisadores e supervisores levou o grupo a optar pelo trabalho integrado. Isso definiu o formato que está sendo ministrado o curso, aspecto julgado importante e significativo quando se pensa e propõe a formação integral, que não pode prescindir do trabalho integrado e articulado. Guará (2006) identifica como uma das perspectivas da educação integral a articulação entre aprendizagens como princípio organizador do currículo escolar em que se enfatiza a integração dos conhecimentos em abordagens interdisciplinares, transdisciplinares e transversais.

Os professores pesquisadores produzem um material, que é base para atividades semipresenciais e à distância. Estas atividades que visam à efetivação no cotidiano escolar dos conhecimentos trabalhados nos encontros presenciais resultam na produção e testagem de materiais didáticos nas escolas.

Este projeto desde sua concepção assumiu o compromisso com a produção de conhecimento na área. Neste sentido, o trabalho foi sistematizado e culminou com a publicação de dois Cadernos Pedagógicos e dois livros. Com o objetivo de difundir e socializar a práticas e reflexões sobre a Educação Integral e tempo Integral foi realizado um Seminário em cada município.

A realização do projeto demonstra que há um empenho das secretarias na formação continuada dos professores e gestores das suas redes, tendo a educação integral e em tempo integral como horizonte. A parceria entre Universidade e rede de educação básica corroborando com a implantação da política nacional de formação de professores quando prevê “apoiar a oferta e a expansão de cursos de formação inicial e continuada a profissionais do magistério pelas instituições públicas de educação superior”. (MEC, 2009, ARTIGO 3, INCISO II)

Analisamos que o trabalho coletivo e participativo com os professores pesquisadores no desenvolvimento do curso, planejamento das atividades de forma colaborativa entre as áreas do conhecimento tem demonstrado a possibilidade do trabalho integrado na escola.

A experiência de formação continuada em Vitorino e Chapecó nos remete a ressaltar a importância do trabalho coletivo e de destacar o papel dos professores e gestores das redes como produtores de conhecimentos profissionais. Acredita-se que, quando a universidade não vai com uma postura “colonizadora”, impositiva sobre escola e sim por uma postura colaborativa entre universidade e rede básica, há a possibilidade de transformar a prática escolar. Neste trabalho relatado, os professores da universidade utilizaram a teoria como mediadora para ressignificar a prática pedagógica dos professores e gestores das redes. E estes puderam falar, refletir e escrever sobre a prática pedagógica deles.

De acordo com André (2010, p.176)

Queremos conhecer mais e melhor os professores e seu trabalho docente porque temos a intenção

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de descobrir os caminhos mais efetivos para alcançar um ensino de qualidade, que se reverta numa aprendizagem significativa para os alunos. Isso supõe, por um lado, um trabalho colaborativo entre pesquisadores da universidade e os professores das escolas, e por outro lado um esforço analítico muito grande, seja no interior dos grupos de pesquisa, seja entre grupos para reunir elementos que ajudem a reestruturar as práticas de formação.

Para finalizar, destacamos a relevância da experiência realizada em regime de colaboração entre a união, municípios e a universidade, tendo em vista a ampliação e a qualidade da formação continuada em serviço. Após avaliação entre todos os sujeitos envolvidos no processo, traçamos uma meta para dar continuidade à formação por meio da oferta de um curso em nível de especialização em Educação Integral.

rEfErências

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CURRÍCULO E DOCêNCIA NAS POLÍTICAS DE AMPLIAÇÃO DA JORNADA ESCOLAR:

POSSIBILIDADES NA fORMAÇÃO CONTINUADA DE PROfESSORES

Roberto Rafael Dias da Silva1

“[...] o maior empobrecimento provém da falta de ideias, da erosão da criatividade e da ausência de debate produtivo. Mais do que pobres, tornamo-nos inférteis”. (Mia Couto)

Escolhemos as palavras do escritor Mia Couto, em sua coletânea Pensatempos: textos de opinião, para iniciar nossa participação nesta obra que compila importantes reflexões sobre as políticas e práticas de ampliação da jornada escolar no Brasil contemporâneo. Espaços, como este, possibilitam-nos ampliar nossos campos de problematização sobre uma temática atualmente em disputa – o currículo e a formação de professores para a educação em jornada ampliada. Entretanto, tal campo de disputa, em nossa leitura, tem se apresentado com uma ausência de debate produtivo e, consequentemente – na metáfora proposta por Mia Couto –, infértil. Não nos comprometemos com a responsabilidade de produzir respostas, definir percursos ou ainda indicar linhas de reflexão privilegiadas. Assumimos a possibilidade de mobilizar ideias que, eventualmente, possam produzir ressonâncias nos debates que serão estabelecidos em nossos contextos profissionais.

O presente capítulo, então, apresenta os pressupostos teóricos que orientaram a construção do projeto de extensão “Currículo e docência em experiências de ampliação da jornada escolar: acompanhamento da implementação do Programa Mais Educação no Município de Erechim/RS”, desenvolvido na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) – campus Erechim, no período entre os anos de 2013 e 2014. A referida atividade foi construída em parceria com a Secretaria Municipal de Educação de Erechim (RS) e contou com financiamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

Nossa preocupação inicial situava-se no âmbito de produzir inserções acadêmicas junto com a temática da educação integral, assim como em estreitar parcerias com a referida secretaria. Nessas condições, desencadeamos um plano de formação

1 Doutor em Educação. Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). E-mail: [email protected].

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continuada para os gestores, professores comunitários, monitores e estagiários que atuavam na implementação do referido programa. Produzimos, em nossa estratégia formativa, três iniciativas que envolviam diferentes sujeitos e articulavam-se as formas de intervenção específicas. Com isso, pensamos em três ações distintas e complementares que favorecessem uma diversificação das estratégias formativas, a saber: a) a realização de um curso com 80 (oitenta) horas-aulas, destinado aos profissionais que atuam no município; b) a execução de seis oficinas, em cada escola participante do projeto, para os monitores e estagiários que atuam no programa Mais Educação; c) a organização, publicação e socialização de dois livros que complementem nossa ação formativa no referido contexto.

Assim, diversificamos atividades para o atendimento de públicos diferenciados na forma de atuação com o contexto nas políticas de ampliação da jornada escolar. Importa ainda reiterar nosso recorte analítico – as questões do currículo e da docência nas políticas de educação integral. Direcionamos nossa abordagem para os processos de seleção e organização dos conhecimentos escolares, assim como para os pressupostos orientadores das práticas profissionais dos profissionais que trabalham naquele contexto. Com esse compromisso, reconhecemos a relevância do papel da universidade na produção de novos conhecimentos acerca deste campo emergente nas políticas contemporâneas de escolarização. A crítica acadêmica que, de certa maneira, perfaz nossa abordagem à temática, associa-se a um compromisso com uma pauta democratizadora para a educação pública de nosso país. O investimento na construção de novas condições de escolarização, incita-nos, de acordo com Moll (2012), ao “enfrentamento das desigualdades sociais historicamente corroboradas pelo sistema educacional por meio da entrada tardia e, em geral, em condições adversas das camadas populares na escola”. (p. 130)

Do ponto de vista da composição temática da atividade de extensão relatada neste texto, vale assinalar ainda nossa preocupação com as questões atinentes ao conhecimento escolar. Distanciamo-nos de abordagens teóricas que recomendam as políticas de educação integral somente como uma forma de proteção social ou ainda como estratégia para aumentar o investimento econômico nos processos educativos destinados aos jovens brasileiros. Associamo-nos ao entendimento da instituição escolar como espaço de formação intelectual, que garanta democraticamente o acesso ao “universo intelectual e letrado da cultura elaborada” (GIOLO, 2012, p. 96). Uma escola que, mesmo que esteja “sob suspeita” (GABRIEL, 2008), possa seguir contribuindo para a composição de novos arranjos formativos e novas possibilidades de empoderamento que, de forma contingente e historicamente situada, ressignifiquem e ampliem seu potencial democrático.

Assim sendo, neste texto, apresentaremos os cinco pressupostos que orientaram nossa estratégia de formação continuada dos profissionais que atuam nas políticas e práticas de ampliação da jornada escolar em nosso contexto. A ressignificação da

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transmissão cultural na agenda educacional contemporânea (DUSSEL; CARUSO, 2003), a reflexão sobre as formas curriculares contemporâneas (FORQUIN, 2011), o enfrentamento do avanço das políticas neoliberais (SANTOMÉ, 2011), o conhecimento escolar como objeto incontornável das políticas educacionais (GABRIEL; FERREIRA, 2012) e a aprendizagem profissional docente (PACHECO, 2013) serão objeto de algumas tematizações neste texto. Sumarizando esta discussão inicial, vale ainda indicar que apenas discutiremos algumas balizas orientadoras, provisoriamente posicionadas, em nossas práticas formativas junto com os professores de nosso tempo, sem a pretensão de torná-las únicas ou universais. Tal como assinalamos na epígrafe deste texto, de Mia Couto, intencionamos produzir ideias e debates produtivos, estimulando a fertilidade de novas práticas.

1. o EnfrEntamEnto das polÍticas nEoliBErais

Nas últimas duas décadas, temos notado uma intensificação da presença de práticas neoliberais nas políticas curriculares de nosso País (LIBÂNEO, 2012). As diferentes perspectivas têm nos auxiliado a perceber a emergência de uma nova gramática formativa, centrada na competitividade, na meritocracia e na livre escolha.2 O sociólogo português Licínio Lima (2012) sugere que se trata de uma visão reducionista da escolarização, concentrando seus objetivos “de forma estreita na esfera econômica capitalista, que revela as concepções subordinadas de educação e de aprendizagem” (p. 18). Sob tais condições, o próprio conhecimento não mais é posicionado como um bem público; mas, percebido como um “bem comercializável e objeto de competição mundial”. (p. 21)

Do ponto de vista do pensamento curricular, Santomé (2011) argumenta que as instituições educacionais têm sido deslocadas em sua função pública. Na atualidade, em seu diagnóstico, “a educação aparece como a chave para encontrar uma vaga de trabalho e tornar-se rico, prestando muito pouca atenção, ou nenhuma, às dimensões éticas, políticas e sociais que tingem a vida cotidiana nas instituições escolares” (SANTOMÉ, 2011, p. 53). Uma das características emergentes destas práticas educacionais é a liberdade de escolha, favorecendo a constituição de um homo eligens – um sujeito de escolhas. Nesta perspectiva, os sujeitos escolares “em função de seus recursos econômicos, estariam capacitados apenas para escolher e consumir no mercado de bens de consumo”. (p. 57)

Com outras ferramentas de análise, Veiga-Neto (2013) defende que nas condições das políticas neoliberais, as políticas de currículo passam a atribuir visibilidade à avaliação, em uma espécie de “delírio avaliatório”. Com a intenção de problematizar a questão, o pesquisador brasileiro sugere que em tal prática, além de fomentar uma

2 Em outro momento (SILVA, 2013), produzimos um diagnóstico das políticas de escolarização desenvolvidas sob as condições do capitalismo contemporâneo.

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“vontade de competir”, os próprios sujeitos são regulados por outras estratégias. As políticas curriculares, nessas condições, podem ser lidas como “um acentuado desvio à direita, aqui entendido como uma forte ênfase na avaliação, manifestada nas mais diferentes formas de avaliar e nas mais diferentes instâncias da vida humana”. (VEIGA-NETO, 2013, p. 173)

O primeiro pressuposto que procuramos pôr em ação, em nossas práticas formativas com professores da educação básica, alicerçou-se na perspectiva de produzir estratégias de enfrentamento da lógica neoliberal, tão presente em nossos espaços de trabalho. Desejávamos realizar um investimento na educação integral não com a intenção explícita de melhorar o IDEB das escolas, preparar os alunos para as avaliações de larga escala, ou mesmo, produzir ações de proteção ou contenção sociais aos sujeitos em condição de vulnerabilidade. Orientávamos nossa ação para uma formação humana, instável e provisória; mas, capaz de produzir insurgências críticas aos regimes neoliberais.

2. a rEssiGnificação da transmissão cultural na aGEnda Educacional contEmporÂnEa

Em decorrência da produção de enfrentamentos críticos à lógica neoliberal que perfaz a escolarização contemporânea, o segundo pressuposto que utilizamos para a composição de nosso projeto de extensão passa pela ressignificação da transmissão cultural na agenda educacional de nosso tempo. Em uma sociedade marcada pelo curto prazo, pela meritocracia e pelo consumo (SENNETT, 2008), a transmissão cultural pode revitalizar importantes dimensões. No final de sua conhecida genealogia das formas de ensinar, Inés Dussel e Marcelo Caruso (2003) provocam-nos a pensar sobre o futuro das salas de aula, sobre os dilemas da profissão e de suas formas de intervenção social. Ao longo dos últimos cinco séculos, a figura docente foi modificada e redefinida, fazendo com que a docência fabricada na Modernidade Pedagógica não mais exista em seus moldes originais, “embora seus legados ainda nos rondem”. (p. 236)

Ampliando o escopo de suas provocações, os historiadores latino-americanos ainda indicam a impossibilidade de prever as condições do futuro para essa profissão. Porém, nesse âmbito, fazem uma importante ressalva.

Em todo caso, a função de transmitir a cultura provavelmente continuará existindo; e até o momento, por muitos motivos, e apesar de sua crise, a escola é a instituição mais eficaz e poderosa para produzir este efeito. Desejamos que o faça melhor, que o faça integrando os novos saberes e indivíduos que hoje pululam em nossos mundos, que o faça repensando suas próprias tradições [...]. (p. 237)

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Para além de formas didáticas simples ou mais sofisticadas, a leitura produzida por Dussel e Caruso informa-nos sobre um lugar ainda ocupado pela pedagogia. “A pedagogia é, antes de tudo, uma prática que reflete sobre as formas de transmissão da cultura, e a própria prática de transmiti-la” (p. 238). Na esteira dessa argumentação, temos defendido que os estudos contemporâneos sobre a docência.3, em geral, precisam ponderar a relevância e a urgência de produzir uma reflexão crítica sobre os modos de transmissão cultural mobilizados nas diferentes cenas pedagógicas. As práticas de formação inicial ou continuada de professores não ficariam alheias a esse movimento.

3. o rEdimEnsionamEnto da QuEstão da QualidadE

Na medida em que buscamos produzir um distanciamento crítico das práticas de inspiração neoliberal e percebemos a necessária revitalização da transmissão cultural na escola, um dos aspectos que, em nossa leitura, também precisava ser redimensionado era a questão da qualidade em educação. Atualmente predomina uma visão de qualidade centrada nas avaliações de larga escala, assumindo uma forma produtivista e performativa (MOREIRA, 2013b). Inspirados em Moreira (2010, p. 220), argumentamos que “uma educação relevante e de qualidade capacita o sujeito a ir além de uma forma restrita de viver seu cotidiano e a participar ativamente na mudança de seu ambiente”.

Tal concepção de qualidade justapõe-se a uma definição de currículo diferenciada, na qual seu propósito “não é apenas transmitir conhecimentos passados, é capacitar a próxima geração de modo que ela possa construir sobre esse conhecimento, criando um conhecimento novo, pois é assim que as sociedades humanas progridem e os indivíduos se desenvolvem” (YOUNG, 2013, p. 11). Partindo do conhecimento escolar, as experiências formativas que se dão na escola se tornariam mais relevantes na medida em que operassem na ampliação do repertório dos sujeitos escolares. De acordo com Moreira (2010), tal configuração escolar “trata-se da aquisição dos saberes e das habilidades básicas que permitam lidar com o mundo dos instrumentos, dos costumes e das linguagens”. (p. 220)

Ao organizarmos uma prática de formação continuada para os profissionais que atuam em escolas com jornada ampliada, nosso terceiro pressuposto vinculava-se à necessidade de redimensionar a questão da qualidade na escola. Para além de utilizar as oficinas do programa Mais Educação para “reforçar” o desempenho dos estudantes visando às avaliações de larga escala, defendemos uma ampliação do potencial formativo daqueles espaços. Colocamos em ação uma concepção de qualidade que favorecesse a ampliação do repertório cultural dos estudantes, com conhecimentos escolares relevantes (MOREIRA, 2010). A seguir exploraremos a questão do conhecimento.

3 Em estudo recente (SILVA; CORRÊA, 2013), realizamos uma revisão das tendências investigativas sobre a docência no Brasil, tomando como ponto de partida os anos de 1960.

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4. o conHEcimEnto Escolar E sua rElEvÂncia

Em nosso projeto de formação continuada, fizemos uso de uma concepção de conhecimento escolar que reconhece sua relevância social e política para a democratização da educação pública. Como sugerem Gabriel e Ferreira (2012), citadas neste texto, embora situado em campo controverso, o conhecimento escolar ainda serve para pensar a escolarização, desde que situado em outras articulações. Buscando essas articulações, juntamente com Moreira (2013a), entendemos que a instituição escolar “além de ensinar conhecimentos que melhor expliquem o mundo (o que certamente precisa fazer), procure subsidiar e comprometer o aluno em direção a esforços pela mudança deste mundo” (p. 41). O conhecimento na escola, nessa concepção, apresenta-se como uma questão curricular central, tanto de ordem epistemológica, quanto de justiça social.

A abordagem sociológica de Michael Young (2013), em seus estudos contemporâneos, permite-nos estreitar a aproximação com a objetividade do conhecimento a ser ensinado nas escolas.

Eu suponho que a questão do currículo ‘qual conhecimento?’ é tanto uma questão epistemológica que define o que deve constituir o direito dos estudantes em estágios diferentes e em áreas de especialização diferentes, como uma questão de justiça social sobre o direito ao conhecimento por parte de todos os alunos sem se levar em consideração se o conhecimento é rejeitado ou considerado difícil. Se algum conhecimento é ‘melhor’, como podemos negá-lo a todos os alunos e permitir que alguns, como fazemos na Inglaterra, sejam limitados ao ‘conhecimento sem poder’ a partir da idade de 14 ou 16? (YOUNG, 2013, p. 20)

A retomada do conhecimento escolar, no debate curricular atual, traz implicações significativas para as práticas de ampliação da jornada.4 Como lembram-nos Gabriel e Cavaliere (2012), ainda que as formas escolares estejam em crise, “isso não significa que ela já tenha sido condenada e esvaziada de qualquer possibilidade de subversão” (p. 292). Nossas ponderações acerca do currículo da educação integral, ainda conforme as autoras, compreenderiam “o currículo escolar não como algo imutável, e reconhecer que os conteúdos não são objetos estáveis e universais, tampouco uma adaptação didatizada do conhecimento científico, mas construções específicas, tanto do ponto de vista político como epistemológico” (GABRIEL; CAVALIERE, 2012, p. 292). Nessa direção, ao planejarmos uma prática de formação continuada para professores da educação básica, optamos por delinear uma concepção centrada na

4 Silva et al. (2014) discutem a relevância do conhecimento escolar em propostas curriculares de ampliação da jornada, valendo-se do conceito de “justiça curricular”, de Robert Connell.

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relevância política e epistemológica do conhecimento escolar em nossos currículos. Aliás, esse pressuposto também visibiliza-se na própria concepção de formação de professores mobilizada.

5. a ênfasE no profissionalismo E na aprEndiZaGEm profissional docEntE

Por fim, o quinto pressuposto orientador de nossa atividade de formação continuada remete-se a um entendimento da docência e da formação docente. Para além de um discurso voluntarista que tem se tornado comum nas experiências de educação integral, reconhecemos o conhecimento como uma das principais formas de atribuição de legitimidade e de qualidade ao trabalho docente (MOREIRA, 2013b). Não desprezando determinados discursos que atribuem ênfase ao esforço pessoal, ao comprometimento ou à vocação, dimensionamos que “fortalecer o profissionalismo implica, ainda, uma ampla discussão dos conhecimentos especializados a serem incluídos na formação docente” (MOREIRA, 2013b, p. 89). Mesmo reconhecendo a imprescindibilidade dos saberes produzidos na ação pedagógica (SILVA, 2011), destacamos a importância de investimentos na formação técnica dos professores.

Tal pressuposto, contemporaneamente, ancora-se na perspectiva de “uma aprendizagem profissional docente” (PACHECO, 2013), na qual se compreende que “a complexidade do ser professor se constrói na base de uma diversidade de saberes, necessariamente articulados e ligados à teoria e à prática educacionais, que de modo algum podem ser hierarquizados” (p. 57). Dessa perspectiva deriva-se um entendimento da formação docente que ultrapasse modelos técnicos ou burocráticos, ou ainda modelos subjetivistas e motivacionais. A prática da formação docente, do modo como a dimensionamos em nosso projeto de extensão, supõe a atribuição de relevância aos saberes profissionais, posicionados de forma entrelaçada aos conhecimentos especializados, potencializando uma aprendizagem profissional docente.

6. considEraçõEs finais

Com o presente texto, pretendemos sumarizar os pressupostos orientadores de nossa atividade de extensão destinada aos profissionais que atuam junto com o programa Mais Educação, no Município de Erechim (RS). O enfrentamento das políticas neoliberais, a ênfase no conhecimento escolar, a ressignificação da noção de qualidade na educação e mesmo a constituição de novas formas de aprendizagem profissional docente, foram alguns dos pressupostos que orientaram nossa ação. Reiteramos, por fim, nossa disposição em seguirmos realizando investimentos teóricos na direção de compreendermos o currículo e as políticas que os referenciam. A aposta nas formas

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democráticas de escolarização como delineamos, ao longo deste texto, supõe uma centralidade do conhecimento escolar – tanto em uma dimensão epistemológica, quanto no âmbito da justiça social.

rEfErências

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PROGRAMA MAIS EDUCAÇÃO: APORTE TEÓRICO, ACOMPANHAMENTO E

IMPLANTAÇÃO NAS ESCOLAS ESTADUAIS NO SUL DO BRASIL NUM ESTUDO DE CASO.

Maurício Aires Vieira1

Agnaldo Mesquita de Lima Júnior2

1 introdução

Educação integral é um dos temas mais ouvidos quando se fala de educação ultimamente. É iminente a demanda da sociedade por mais educação e de qualidade3 e neste cenário foi criado o programa do governo federal denominado “Mais educação” (PME). Este programa, criado pela Portaria Interministerial de N° 17 de 24 de abril de 2007 e conforme disposto no próprio documento, tem por objetivo servir como base de fomento da educação integral para crianças, jovens e adolescentes no turno contrário ao turno normal, contribuindo com a execução de atividades socioeducativas para assim garantir uma formação mais ampla dos estudante deste programa e que a partir de 2010, já trouxe mudanças em avançar na ideia de turno e contraturno, explicitando a necessidade de um currículo novo, integrado e uma nova composição curricular, em que as crianças perpassem o dia nas escolas, com atividades diversificadas e vencendo a cansativa e monótona carga horária disciplinar e mecanizada que o sistema brasileiro, nos dias atuais, ainda oferece.

No Brasil, em que mais de 201 mil habitantes têm seus/suas filhos/as matriculados em escolas de nossos 5.570 municípios (192.676 escolas da rede pública: 38,5% do campo e 61,5 urbanas),4 surge a necessidade de pensarmos a permanência do/a aluno/a na escola com aprendizagens significativas (pela leitura pela palavra e no mundo) e da superação da reprovação como “parte” da metodologia do ensino, mudando o olhar e o enxergar em um novo paradigma, em que avancemos na constituição global do sujeito, superando as fragmentações disciplinares de que o mundo contemporâneo reflete.

1 Doutor em Educação. Professor Adjunto da Universidade Federal do Pampa. Tutor do Grupo PET-Pedagogia. Professor Permanente do Mestrado Profissional em Educação/Campus Jaguarão. Atualmente é Diretor do Campus Jaguarão/UNIPAMPA.2 Bolsista do Grupo PET-Pedagogia da Universidade Federal do Pampa.3 Não nos referimos a mais educação da mesma educação e, sim, de um novo modelo de educação, realmente impregnada de qualidade na sua execução/resultado.4 Dados coletados do Ministério da Educação (MEC), sítio eletrônico.

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O interesse político do estado brasileiro surgiu devido ao crescimento nas camadas populares da sociedade brasileira da consciência de que o tempo ofertado aos alunos no ambiente escolar ainda é muito curto e de baixa qualidade. Dessa forma, segundo Moll (2012, p. 27) “o direito à educação levou ao direito a mais educação e a mais tempo de escola.” Porém, o entendimento deste direito, faz parte de uma noção de coletividade, que ainda necessita de maior participação por parte da sociedade como um todo, como podemos ver no trecho a seguir:

O mundo contemporâneo interpela gestores, professores, educadores e toda comunidade educativa a (re)pensar o currículo das escolas buscando o diálogo entre os conhecimentos tradicionais com a cultura, as novas tecnologias, as competências sociais e toda diversidade de aprendizagens possíveis no mundo moderno.(LOMONACO E SILVA, 2013, p.22)

No Município de Jaguarão, no extremo sul do Estado do Rio grande do Sul, fronteiriço com a Cidade de Rio Branco/UY, o programa teve início no ano de 2011, porém apenas algumas escolas aderiram neste período. No final de 2012, com suporte da Secretaria Municipal de Educação do Município, todas as escolas municipais aderiram ao programa e algumas estaduais mantidas pela Coordenadoria Regional da Educação5 assinalaram a aderência ao PME.

Baseado nesses fatos apontados, o grupo PET-Pedagogia da Unipampa Campus Jaguarão, no sentindo de investigação/ação optou em um acompanhamento do PME nas escolas estaduais do município, para detectar e auxiliar nas problematizações/contextualizações que surgissem com o desenvolvimento/início do programa. Para isso, os bolsistas do grupo PET-Pedagogia foram alocados em dez escolas públicas do município, sendo sete escolas municipais e três estaduais, com o objetivo de fazer uma breve comparação entre o disposto nas legislações regentes do PME e aplicação realizada nas escolas observadas. Para esse estudo, reportaremos as informações e detalhamentos, exclusivamente, do acompanhamento das escolas estaduais.

Para o início da pesquisa, os bolsistas instrumentalizaram-se com referenciais teóricos que abordassem o conceito de Educação Integral, bem como toda legislação vigente e regimental do PME. Neste primeiro momento, ficou acordado que os bolsistas iriam realizar um estágio de acompanhamento e observação da rotina nas escolas que implementaram o PME, para identificar e colaborar com as problematizações que por ventura viessem a surgir. A partir do exposto, os bolsistas iniciaram suas atividades

5 A Coordenadoria Regional de Educação (5 CRE) atende a 18 (dezoito) municípios da região sul do RS, dentre eles o município citado. No Município de Jaguarão contamos com 8 escolas estaduais (extraídos do sítio eletrônico da Coordenadoria, http://www.educacao.rs.gov.br/pse/html/busca_escolas.jsp, em 14 jun. 2013).

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de observação no mês de março de 2013, porém com intuito de coletar dados/informações desde sua implantação, ou seja, o ano letivo de 2011.

2 BasEs lEGais E aportEs tEÓricos

Ancorados em Vieira e Rocha (2013) num estudo de arte, constatamos que há na legislação educacional brasileira6 inúmeros textos que abordam os dispositivos constitucionais, as leis e os decretos pertinentes à área/temática/aderência da educação integral; neste sentido realizamos um breve levantamento das principais leis que indicam em nossa concepção a implementação da escola de tempo integral como caminho seguro para a promoção da educação integral visando ao desenvolvimento do direito a uma educação pública de qualidade para todo cidadão brasileiro. Tal levantamento parte da intencionalidade de trazer à tona todos os dispositivos legais que podem servir de base, amparo e justificativa para a criação do PME que atualmente é a principal estratégia do governo federal para a promoção da educação integral no cenário educacional brasileiro.

Procedemos ao início de nosso levantamento pela Constituição Federal do Brasil, 1998 (CF) mais especificamente em seu art. 205 que define a educação como: “direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

Também frisamos o art. 206 que trata das bases e princípios em que o ensino será ministrado no qual destacamos os parágrafos I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II – liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; VII – garantia de padrão de qualidade. Lembramos também o art. 208 que descreve quais as garantias efetivas são disponibilizadas pelo Estado em cumprimento ao seu dever com a educação. Já no art. 227, que reforça o dever da família, da sociedade e do Estado em assegurar com absoluta prioridade à criança, ao adolescente e ao jovem, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade entre outros.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, lei que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional e diz em seu título V, capítulo II, seção III, art. 34 que: “a jornada escolar no ensino fundamental incluirá pelo menos quatro horas de trabalho efetivo em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o período de permanência na escola” (Grifos

6 Legislação educacional, em sentido amplo, é o conjunto das normas jurídicas sobre Educação que delineiam a ação do Estado, estabelecem diretrizes para as políticas públicas, proclamam princípios, direitos e deveres principalmente por meio da Constituição Federal de 1988 e da LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996.

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nossos.). E prevê ainda em seu título IX, art. 87, § 5º que: “serão conjugados todos os esforços objetivando a progressão das redes escolares públicas urbanas de ensino fundamental para o regime de escolas de tempo integral”. (LDB, 1996)

De acordo com Vieira (2014) a educação integral em seu debate na implantação de uma educação de qualidade, está refletida no novo Plano Nacional de Educação (PNE-2014/2024) aprovado em 25.06.2014, transformado na Lei Ordinária 13.005/2014 (DOU 26/06/14 Pág 001 Col 01. Edição Extra) que prevê, em sua meta 6, oferecer educação em tempo integral em cinquenta por cento das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, a 25% (vinte e cinco por cento) dos (as) alunos (as) da educação básica, prevendo para tanto, estratégias como estender progressivamente o alcance do programa nacional de ampliação da jornada escolar; institucionalizar e manter, em regime de colaboração, o programa nacional de ampliação e reestruturação das escolas públicas; fomentar a articulação da escola com os diferentes espaços educativos; atender às escolas do campo na oferta de educação em tempo integral. Neste sentido o PME está coerentemente relacionado a estas estratégias, pois surgiu como uma política pública educacional em construção para atender às demandas da educação integral e integra as ações do PDE 2014-2024. (PDE)

Segundo Moll (2009), o Fundo Nacional de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEB, Lei nº 11.494/2007)7 retomou o ideal de educação integral ao estabelecer o financiamento diferenciado para matrículas em tempo integral, contabilizadas pelo Censo Escolar nos registros da jornada escolar com duração igual ou superior a sete horas diárias.

Lembramos que, em 2007, foi apresentado à sociedade brasileira o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) 8 tendo o Plano de Ações Articuladas (PAR) do MEC incorporado a suas ações; o PAR coloca à disposição dos estados, municípios e Distrito Federal, instrumentos eficazes de avaliação e de implementação de políticas de melhoria da qualidade da educação, sobretudo da educação básica pública.

Neste cenário, o Plano Nacional de Educação (PNE) que vigorou de 2001 a 2010, disposto na Lei nº 10.179/01, apresentou a educação em tempo integral como objetivo do Ensino Fundamental e, também, da Educação Infantil; e estabeleceu como meta a ampliação progressiva da jornada escolar para um período de, pelo menos, sete horas diárias, sendo um avanço para esse diálogo. Face ao exposto, percebemos que os princípios básicos que norteiam a educação brasileira partem do reconhecimento dos direitos humanos e dos deveres da sociedade, da família e do Estado atrelado à promoção da superação das dicotomias visando à constituição de cidadãos críticos e atuantes, cientes de seu lugar no mundo e na promoção da construção de identidades igualitárias.

7 Anteriormente tínhamos o FUNDEF. Mais informações no sítio eletrônico do MEC.8 PDE Escola é um programa voltado para o aperfeiçoamento da gestão escolar democrática e inclusiva que busca auxiliar a escola, por meio de uma ferramenta de planejamento estratégico, disponível no Sistema Integrado de Monitoramento Execução e Controle (SIMEC), a identificar os seus principais desafios e, a partir daí, desenvolver e implementar ações que melhorem os seus resultados, oferecendo apoio técnico e financeiro para isso.

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Partindo deste pressuposto, a Secretaria de Educação continuada, Alfabetização e Diversidade (SECADI) incorporou em seus desafios a promoção da Educação Integral, e, com ela, a perspectiva de ampliar tempos, espaços, atores envolvidos no processo e oportunidades educativas em benefício da melhoria da qualidade da educação dos milhares de alunos/as brasileiros/as.

Desta perspectiva é que nasce o PME, por meio da portaria Interministerial n° 17/2007, que integra as ações do PDE e se consolida pelo Decreto de Lei n° 7.083 de 27 de janeiro de 2010, que em seu primeiro artigo já dispõe sobre esta finalidade.

Art. 1º O Programa Mais Educação tem por finalidade contribuir para a melhoria da aprendizagem por meio da ampliação do tempo de permanência de crianças, adolescentes e jovens matriculados em escola pública, mediante oferta de educação básica em tempo integral.

§ 1º Para os fins deste Decreto, considera-se educação básica em tempo integral a jornada escolar com duração igual ou superior a sete horas diárias, durante todo o período letivo, compreendendo o tempo total em que o aluno permanece na escola ou em atividades escolares em outros espaços educacionais.

§ 2º A jornada escolar diária será ampliada com o desenvolvimento das atividades de acompanhamento pedagógico, experimentação e investigação científica, cultura e artes, esporte e lazer, cultura digital, educação econômica, comunicação e uso de mídias, meio ambiente, direitos humanos, práticas de prevenção aos agravos à saúde, promoção da saúde e da alimentação saudável, entre outras atividades.

§ 3º As atividades poderão ser desenvolvidas dentro do espaço escolar, de acordo com a disponibilidade da escola, ou fora dele sob orientação pedagógica da escola, mediante o uso dos equipamentos públicos e do estabelecimento de parcerias com órgãos ou instituições locais.

O PME promove a ampliação da jornada escolar no ensino fundamental e a organização curricular na perspectiva da Educação Integral, trazendo em seu artigo 3º os seguintes objetivos do programa:

I – formular política nacional de educação básica em tempo integral; II – promover diálogo entre os conteúdos escolares e os saberes locais; III – favorecer a convivência entre

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professores, alunos e suas comunidades; IV – disseminar as experiências das escolas que desenvolvem atividades de educação integral; e V – convergir políticas e programas de saúde, cultura, esporte, direitos humanos, educação ambiental, divulgação científica, enfrentamento da violência contra crianças e adolescentes, integração entre escola e comunidade, para o desenvolvimento do projeto político-pedagógico de educação integral. (BRASIL, 2010)

O Decreto anuncia a implementação da educação integral em tempo integral como política nacional e também prevê o diálogo com aquelas experiências que já vêm sendo desenvolvidas, tanto no que se refere aos conteúdos escolares, à convivência entre os sujeitos, da comunidade escolar e destes com a comunidade em seu entorno, bem como agregar a escola com as instituições, políticas e programas sociais existentes, na busca da integração entre escola e comunidade. Inicialmente, o programa visava a atender em caráter prioritário as escolas que apresentaram baixo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB,9 localizadas em capitais e regiões metropolitanas. Já em 2010, o programa se estendeu a todas as regiões do Brasil e vem se ampliando progressivamente de modo a atender a todos os municípios do Brasil, em pelos menos uma escola: em comparação com 2008, o programa atende a 6 milhões de crianças em 49.426 escolas numa expansão de 139% (dados do Censo Escolar 2013). O crescimento, por exemplo, no RS, foi da ordem de 185% de matrículas em tempo integral entre o período 2010-2013, podendo ser desenvolvido em convênio com estados e municípios, nas escolas de ensino fundamental e médio.

Partindo das informações obtidas durante o levantamento supracitado verificamos que o ano de 2010 mostrou-se de grande importância para a consolidação da educação integral. Logo no início deste ano assinalamos o Decreto Presidencial que estabeleceu o PME e na sequência no mês de abril a inclusão do tema na Conferência Nacional de Educação, fechando o ano com o tema se incorporando nas discussões do Plano Nacional de Educação (PNE), para o decênio 2011-2020, aprovado recentemente, como PNE 2014-2024, conforme já citamos anteriormente.

Conforme Gomes e Bisognin (2011) a ampliação da jornada escolar no ensino fundamental, prevista na LDB/1996 e nas regulamentações subsequentes, levou a intensificar o estudo da educação integral e em tempo integral. Os sistemas de ensino, em especial os sistemas municipais de educação, passaram a adotar políticas de oferecimento de educação integral e a criar escolas de tempo integral, o que vêm ampliando, gradativamente, o tempo de permanência do estudante nas escolas de ensino fundamental pelo país, mesmo que de forma imperceptível.

O desenvolvimento das políticas públicas de educação integral e em tempo integral, na visão Gomes (2008):

9 Para mais esclarecimentos ler a nota técnica do site institucional do MEC.

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(...) tem girado em torno, principalmente, do aumento de permanência do aluno na escola, pela consideração de que o tempo dedicado à educação escolar está abaixo do necessário para que se desenvolva uma educação de qualidade e, na perspectiva da educação integral, que vise o desenvolvimento da formação do homem pleno. (GOMES, 2008, p. 14)

Sabemos que os filhos das classes privilegiadas sempre tiveram acesso à educação de tempo integral no Brasil, primeiro durante o período colonial com os colégios jesuíticos, logo após no período imperial com os liceus, que ofereciam educação de tempo integral para a elite. Entretanto, com o passar dos tempos às escolas privadas passaram a receber um número elevado de estudantes e por consequência desta demanda as atividades escolares passaram a concentrar-se em um único turno regular de estudos, no entanto, o público atendido por estas instituições continuou a ter acesso à educação de tempo integral, por meio do contraturno, para a formação complementar na própria escola ou em outros espaços culturais esportivos ou científicos. (GIOLO, 2012, p. 94, in KLEIN, 2012, p. 38)

Segundo apontado por Cella (2010, p. 22) a história da constituição e funcionamento da educação brasileira desde a vinda dos jesuítas ao Brasil possibilita uma série de leituras e, em até determinada medida, consegue identificar as razões que explicam por que a educação pública brasileira ainda é tão deficitária. A educação ofertada no Brasil ao longo da nossa história privilegiou a formação das elites dominantes, ou seja, apenas tinham acesso à cultura letrada aqueles que poderiam vir a tornar-se parte da elite que dirigiria o país, pois ao restante da população caberia o trabalho, especialmente braçal, que não demandaria o conhecimento das letras.

Entretanto, a educação de tempo integral para os filhos das classes menos favorecidas começa a ser debatida no território nacional no final da década de 20 com o movimento que deu origem a Escola Nova,10 que pretendia a renovação do ensino no Brasil, e foi fortemente influenciado por um conceito essencial do movimento de Dewey,11 pois ele acreditava que as escolas deviam deixar de serem meros locais de transmissão de conhecimentos e tornar-se pequenas comunidades de aprendizagens.

Conforme Gomes (2008, p. 28), a Escola Nova foi resultado das reflexões sobre a escola progressiva desenvolvida por Dewey e dos métodos ativos propostos pelo italiano Pestalozzi; surge no cenário mundial o movimento da Escola Nova. Desencadeado na primeira metade do Século XX, na Europa e na América, o movimento tinha como proposta a renovação do ensino para pôr fim ao autoritarismo,

10 Psicólogo Edouard Claparède (1873-1940) e o educador Adolphe Ferrière (1879-1960), entre muitos outros, foram os expoentes na Europa. Mais detalhes, em Cella (2010), entre as páginas 18 e 38.11 John Dewey (1859-1952), filósofo norte-americano que influenciou educadores de várias partes do mundo. No Brasil inspirou o movimento da Escola Nova, liderado por Anísio Teixeira, ao colocar a atividade prática e a democracia como importantes ingredientes da educação (In: revistaescola. abril.com.br/historia/pratica-pedagogica/john-dewey-428136.shtml).

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à rigidez, à centralidade do papel do professor no processo educacional e à ênfase à memorização característicos da educação tradicional.

A reorganização importa em nada menos que trazer a vida para a escola. A escola deve ser o lugar aonde a criança venha a viver plena e integralmente. Só vivendo, a criança poderá ganhar os hábitos morais e sociais de que precisa, para ter uma vida feliz e integrada, em um meio dinâmico e flexível tal qual o de hoje. (TEIXEIRA, 2000, p. 40)

Ainda para Gomes (2008), no Brasil, este movimento influenciou os educadores reunidos na Associação Brasileira de Educação – ABE – que, em 1932, lançam o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova. O manifesto, de acordo com Lemme (1984, p. 172) “tornou-se, indiscutivelmente, um documento histórico, não somente pelo seu caráter abrangente, como comentamos, na definição de uma política nacional de educação e ensino, mas também porque foi o único no gênero em toda história da educação no Brasil”.

Decorrente dos ideais da Escola Nova, em 1932, foi lançado o “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova” que compunha um movimento pela renovação educacional instalado no Brasil durante o período da Segunda República.12 De acordo com Cella (2010 p. 25), entre as experiências da educação de tempo integral no Brasil tivemos na Bahia o “Centro Educacional Carneiro Ribeiro” (CECR) idealizado por Anísio Teixeira. O Centro Educacional Carneiro Ribeiro (CECR) foi instalado na Bahia em 1950, idealizado pelo educador Anísio Teixeira, cuja estrutura era composta por quatro “escolas-classe” e uma “escolas-parque”, e visava a atender a jovens das classes populares em regime de período integral” (PARO et al. 1988, p. 191). As escolas-classe eram de nível primário, tinham capacidade para mil alunos cada e funcionavam em dois turnos. A escola-parque era composta por sete pavilhões, destinados às diversas práticas educativas propostas, em que os alunos podiam completar sua educação.

O Centro Educacional Carneiro Ribeiro foi criado para a formação das camadas populares, visando a contribuir na solução de problemas sociais, especialmente a pobreza, oportunizando a essas crianças uma formação integral, que contemplava não somente os conteúdos escolares mínimos, mas tinham a oportunidade de experimentar e conhecer outras formas de aprender, seja em atividades físicas, de socialização, oficinas de trabalhos manuais, dança, música, dentre outras possibilidades ofertadas na escola. Sua concepção fazia parte de uma proposta de educação de Anísio Teixeira para o governo federal e que poderia vir a ser aplicada em todo país. Na Bahia, a

12 Período da Segunda República (1930 – 1936) vários acontecimentos sociais, políticos e econômicos culminaram na nova CF de 1934 (a segunda da República, por isto o período ficou conhecido como Segunda República) foi a primeira que dispôs a educação como direito de todos, devendo ser ministrada pela família e pelos Poderes Públicos.

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experiência de educação de tempo integral foi implantada no bairro da Liberdade, considerado um dos mais pobres naquele período. (CELLA, 2010)

Moll (2009, p. 13) destaca as Escolas-Parques e os CIEPS como iniciativas voltadas ao desenvolvimento da educação integral. Vários caminhos já foram trilhados em diálogo com ideias sobre educação integral ao longo do século XX. Dentre eles, é preciso ressaltar duas iniciativas: as escolas-parque, idealizadas por Anísio Teixeira, e os centros integrados de educação pública (CIEPs), pensados por Darcy Ribeiro. Guardadas suas especificidades, as duas propostas projetavam-se como políticas públicas e propunham a ampliação do tempo escolar por meio de atividades nos campos dos esportes, das artes, da iniciação ao trabalho, entre outras. Acontece que, submetidas à descontinuidade das políticas sociais e educacionais, essas duas experiências tiveram vida curta.

O que se caracteriza como uma educação integral, mediante o legado desses pensadores e as mudanças dos contextos históricos, é o reconhecimento da necessidade de ampliar e qualificar o tempo escolar, superando o caráter parcial e limitado, que as poucas horas diárias proporcionam, em estreita associação com o reconhecimento das múltiplas dimensões que caracterizam os seres humanos. A parcialidade e a limitação em questão são agravadas por contextos territoriais de vulnerabilidade social que expõem crianças, adolescentes e jovens às violências simbólicas e físicas que marcam uma sociedade desigual, na qual as possibilidades de acesso à ciência, à cultura e à tecnologia estão vinculadas ao pertencimento a uma classe social. (MOLL, 2009)

Conforme Vieira e Rocha (2013), vale, ainda ressaltar, que desde 2009, o MEC por suas diretorias, vem instrumentalizando e colaborando com todos os estados e municípios para o entendimento desta ação indutora de educação integral, conforme o documento enviado aos secretários municipais de todo o Brasil (gestores) que disponibilizava aportes teóricos para a fundamentação da proposta tais como: Educação Integral – Texto Referência para o Debate Nacional (Série Mais Educação); Programa Mais Educação: Gestão Internacional no Território (Série Mais Educação); Escola que Protege: enfrentando a violência contra criança e adolescentes; Bairro-Escola: passo a passo; Redes de Aprendizagem: boas práticas aprender (CD ROOM) de municípios que garantem o direito de aprender; Muitos Lugares para Aprender: Tecendo Redes para Educação Integral, Caderno CENPEC nº 2 – Educação Integral (CD ROOM).

3 caractEriZaçõEs da Escola Estadual Em anÁlisE/acompanHamEnto

A escola analisada encontra-se em um bairro de classe média situada na zona central da Cidade de Jaguarão/RS. Em suas mediações encontram-se órgãos públicos como APAE, Brigada Militar, Exército e Asilo Municipal. O comércio no entorno da

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escola é de médio/grande porte, com lojas, supermercados e escritórios de vários setores/segmentos. As ruas de acesso são de calçamento rústico, com algumas exceções. Os alunos da escola em sua maioria residem em bairros periféricos à escola. Atualmente a escola conta com uma estrutura física perfeita para o programa: laboratório de informática, uma pequena biblioteca (que está sendo reformada e ampliada), quatro quadras poliesportivas (uma coberta, duas de cimento e uma de grama), um extenso pátio, um amplo refeitório, um laboratório de química, um consultório médico, uma praça com brinquedos e quinze salas de aula e de gestão. Dessas salas, apenas três são destinadas ao programa, além do laboratório de informática e da biblioteca. Dos outros espaços utilizados pela gestão do programa, podemos citar as quadras poliesportivas que são utilizadas diariamente seja pelos oficineiros ou para a recreação do turno da manhã.

Os laboratórios de informática e a biblioteca são bem utilizados pelos oficineiros a fim de um melhor suporte técnico aos alunos, porém necessitam de prévio agendamento destes espaços. Vale ressaltar que a biblioteca é equipada com televisão e material audiovisual para os alunos assistirem a filmes e documentários. Porém os outros espaços físicos da escola são pouco ou talvez nunca utilizados pelo programa, como o laboratório de química e o consultório médico.

4 dEsEnvolvimEnto do proGrama mais Educação na Escola colaBoradora

A observação da implantação do programa foi realizada nos períodos de março a novembro de 2013. Foi realizado um acompanhamento das oficinas e da organização do programa em todas as manhãs de terças-feiras e quintas-feiras, na escola observada que aderiu ao programa em outubro de 2011. Pela análise de dados, podemos comparar que o programa conta hoje com cerca de cem crianças, divididas em três turmas. As idades variam bastante, com o mais novo possuindo seis anos e o mais velho doze anos. O programa contempla crianças do primeiro ao quinto ano (anos iniciais do ensino fundamental). As turmas são divididas de acordo com a série/ano em que os/as alunos/as se encontram matriculados/as. As oficinas ministradas no programa são Matemática, Alfabetização/Letramento, Espanhol, Dança, Teatro e Informática. As três primeiras se encontram no campo do acompanhamento pedagógico, que segundo o Passo a Passo do MEC, são obrigatórias. A quarta e a quinta se encontram no macrocampo Culturas e Artes e a última por sua vez encontra-se na delimitação Inclusão Digital. (Manual Passo a Passo, MEC, 2011)

Pela observação, pode-se perceber que as oficinas que mais chamam a atenção dos estudantes são as de Informática, Dança e Teatro. As demais oficinas são respeitadas pelos alunos, porém com certos lamentos. A escolha das oficinas foi realizada a partir da disponibilidade de oficineiros que se candidatam em cada início

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de ano letivo. Outra questão que deveria ser analisada em profundidade seria o Projeto Político-Pedagógico da Escola. Porém, apesar de não ter sido feita a análise detalhada, as oficinas se integram diretamente com o Projeto Político-Pedagógico da escola.

Sabe-se também que na sociedade da informação, a busca de respostas instantâneas, sintéticas e mastigadas, que nem sempre são aprofundadas, realmente estão se transformando em conhecimento. É preciso mudar o eixo do ensinar para optar pelos caminhos que levem a aprender. (PPP DA ESCOLA, 2007)

A oficina de informática está diretamente ligada a esta afirmação, o que prova que a escolha desta oficina está de acordo com o Projeto Político-Pedagógico da Escola, assim como as demais, que também vão ao encontro do referido documento. No momento inicial do diagnóstico foram realizadas, de maneira informal, diálogos com os oficineiros buscando informações a respeito de sua prática e atuação no Programa, tais como sua formação, a sua relação com a comunidade, seu objetivo dentro do programa e a perspectiva futura para o desenvolvimento do PME.

Da análise inicial das falas dos oficineiros, foi possível chegar a algumas considerações, tais como: os oficineiros da escola são todos do sexo feminino, e têm faixa etária entre 21 e 37 anos. São todas universitárias da Universidade Federal do Pampa, não moram todas na mesma comunidade da escola e foram contratadas/inseridas por indicações e entrevistas com a própria escola. As oficineiras, apesar de não morarem na mesma comunidade dos/as alunos/as, buscam conhecer os pais e responsáveis destes discentes, além de entender a realidade em que eles/as se encontram, a fim de desenvolver uma maior integração/conhecimento com crianças integrantes do Programa.

5 rotinas do proGrama

Diariamente, os jovens entram no programa às oito horas e são encaminhados pelos pais à sua sala (vale ressaltar que os pais já conhecem a rotina do PME, bem como seus horários e a sala de trabalho/atividade de seus filhos). Ao chegarem à sala, os estudantes são recebidos pelo oficineiro que ministrará a primeira oficina do dia. Às oito horas e quinze minutos, os alunos são encaminhados pelo oficineiro ao refeitório, momento em que é servido o café da manhã juntamente com as outras turmas. Uma observação interessante que se pode encetar, é que neste momento, os alunos entram em contato com outras faixas etárias, e demonstram certa intimidade entre si, demonstrando estarem ambientados com essa rotina. Após o café, o oficineiro retorna com a turma para a sala de aula, onde ocorre então a primeira oficina do dia. Esta oficina tem duração mais ou menos até às nove horas e quarenta e cinco minutos,

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horário em que os alunos são encaminhados então para o intervalo.Durante o intervalo, a coordenadora do PME juntamente com as oficineiras

oferece brinquedos e materiais ludopedagógicos para que sejam desenvolvidas atividades em grupo, como corda para pular, bolas de futebol, basquete, vôlei e bambolês. Às dez horas, os estudantes retornam com outro oficineiro para sua sala de aula, onde ocorre a segunda oficina do dia. Os discentes permanecem nesta oficina até às onze horas e quinze minutos, quando ocorre uma transição de oficineiros entre as salas. Vale ressaltar que esta transição é auxiliada pela coordenadora do programa. Em seguida, ocorre a terceira oficina do dia, que tem duração até às onze horas e quarenta minutos. Após esta oficina, os alunos são encaminhados pelos oficineiros até o refeitório, onde almoçam com a supervisão da coordenadora e das merendeiras. Na sequência, das doze horas às treze horas e quarenta minutos, a coordenadora juntamente com o auxílio da orientadora pedagógica da escola desenvolve uma atividade de relaxamento, para o descanso pós-almoço.13 Para exemplificar esta atividade, podemos citar filmes que são assistidos pelos alunos, rodas de conversa, yoga, músicas de relaxamento etc. Com o término das atividades, as crianças passam então desenvolver as rotinas da arquitetura do cotidiano do turno normal ou regular da escola.

6 proBlEmatiZaçõEs Encontradas

Ao longo desses meses de acompanhamento do PME nas escolas estaduais, algumas reflexões e problematizações foram emergindo sobre o funcionamento desta metodologia/estratégia de trabalho para todos os envolvidos no processo e/ou currículo em adaptação para receber o Programa. Um fato que chamou bastante atenção foi o de alunos/as com problemas de suposto “mau comportamento” serem afastados/suspendidos do programa como forma de punição, que entra em desacordo com Moll (2012) ao lidar com este tipo de postura e/ou atitude adotada pela escola:

A intenção da secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e diversidade (SECADE/MEC) de tantas escolas e redes municipais é se contrapor a visões de protagonismos negativos reconhecendo e fortalecendo presenças afirmativas dessas infâncias e adolescências é disputar imaginários sociais e políticos do povo. (MOLL, 2012, p.38)

Tal atitude da escola mostra um pequeno despreparo ao lidar com situações de conflito, porém chama a atenção pelo fato de as crianças ao serem advertidas da possibilidade de afastamento do programa por conta das falas e/ou encaminhamentos

13 Exemplificando, somente as escolas estaduais permanecem com as crianças/estudantes no horário compreendido pelo almoço. Nas escolas municipais, os estudantes após o almoço, retornam às suas residências e, posteriormente, voltam à escola para as atividades consideradas no turno regular.

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dos oficineiros, demostravam um pequeno receio de não participarem das atividades, externalizando o apego/carinho com o programa; opção, essa, que talvez tenha sido o caminho, ainda espinhoso e/ou contraditório da escola ao implementar o Programa em sua fase embrionária.

Outra questão a ser analisada, é a reorganização do currículo e da rotina escolar atual. Moll (2012) observa que seria insuportável para nossas crianças e adolescentes outro turno da mesma escola, com reprovações opressivas, repetências, evasões e tão extensos deveres de casa. Nas três escolas observadas, o currículo escolar continua o mesmo, sem intercâmbio e/ou diálogo com as atividades do PME. Isso faz com que o programa seja malvisto pelos próprios professores do turno normal ou outro turno, que acreditam que o programa atrapalha o desenvolvimento dos alunos, pois os deixa sem tempo para a realização das atividades de casa e/ou descanso.

Se observarmos o que Moll (2012) diz acerca da reorganização não apenas do currículo escolar, mais também de toda rotina da escola:

Esses programas não se propõem somente a apenas ampliar o tempo, mais a reorganizar com radicalidade os tempos-espaços do viver a infância adolescência, [...] Assumida esta radicalidade, seremos obrigados a repensar e reorganizar toda lógica em que planejamos o tempo-espaço, desde a enturmação até a sequenciação dos conteúdos, das aprendizagens e das avaliações. [...] Somos obrigados a articular os tempos-espaços no ordenamento curricular e os tempos-espaços do viver concreto, [...].(MOLL, 2012, p.43 )

A partir deste pensamento, a direção da escola juntamente com a coordenação do programa está, atualmente, repensando e reorganizando todo o currículo e a lógica escolar seguida, para uma melhor aprendizagem e um espaço escolar mais harmonioso para os/as alunos/as.

7 considEraçõEs finais

A partir das observações e do acompanhamento, foi possível perceber que a escola analisada, como um indicador do trabalho iniciado pela política estadual nas demais escolas, têm se esforçado para a implantação e o bom desenvolvimento do programa. Porém, têm esbarrado na falta de experiência e de capacitação por parte da coordenação e dos oficineiros, e talvez, pela distância da Coordenadoria Regional de Educação, que se situa a 120 km de distância das escolas estaduais no município. A organização da escola para o PME tem sido feita da melhor forma, aproveitando bem o tempo e o espaço físico da escola, buscando recursos na comunidade e tentando sempre estar inserindo todas as atividades na rotina normal da escola.

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Em relação aos oficineiros, percebe-se que todos têm disponibilidade de atuar e contribuir no Programa, comprometidos com a assiduidade e pontualidade, razão fortemente marcada pela constatação da maioria advir de cursos universitários em andamento, notando uma grande preocupação com o desenvolvimento das tarefas e apropriação de conhecimentos e embasamentos legais referentes à educação integral.

Este programa serviu de base também para a criação do Grupo de estudos de educação integral em região de fronteira (GEEIF), que debate o PME no município, desde 2013, com discussões entre professores, profissionais da educação e da comunidade em geral, por meio de materiais teóricos e trocas de experiências e saberes.

Tanto deste acompanhamento, como de outros educandários, surgiu a ideia de um evento na área da educação integral a fim de socializar as experiências e implementações do programa na região; evento, esse, que foi proposto pelo Grupo PET-Pedagogia em novembro de 2013 e que contou com um público aproximado de 800 ouvintes, 80 palestrantes, divididos entre 29 mesas temáticas, além de proporcionar a troca de experiências e atividades culturais entre os participantes.

rEfErências

BRASIL. [Lei Darcy Ribeiro (1996)]. LDB: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional [recurso eletrônico]. – 7. ed. – Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2012. 44 p. – (Série legislação; n. 95).

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BRASIL. Lei nº 11.494, de 20 de junho de 2007. Regulamenta o fundo de manutenção e desenvolvimento da educação básica e de valorização dos profissionais da educação – FUNDEB, de que trata o artigo 60 do ato das disposições constitucionais transitórias; altera a Lei 10.195, de 14 de fevereiro de 2001; revoga dispositivos das Leis 9.424, de 24 de dezembro de 1996, 10.880, de 9 de junho de 2004, e 10.845, de 5 de março de 2004; e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 21 jun. 2007.

CELLA, Rosinei. Educação de tempo integral no Brasil: história, desafios e perspectivas – Universidade de Passo Fundo – Mestrado em Educação, 2010.

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MOLL, Jaqueline (org.). Caminhos da educação integral no Brasil: direito a outros tempos e espaços educativos. Porto Alegre: Penso, 2012.

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VIEIRA, Maurício Aires. Dos macrocampos à composição curricular: traçados da implementação da educação integral em região de fronteira. Grupo PET-Pedagogia, Campus Jaguarão/UNIPAMPA. 2014. Mimeo.

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A CONSTRUÇÃO DE UMA PROPOSTA DE EDUCAÇÃO INTEGRAL: DO DESAfIO À

REALIDADE E DAS CONCEPÇõES À PRÁTICA

Carla Talgatti 1

Jocelei fátima Portes De Lazzari 2

Juliana Wrublewski 3

1 introdução

A Educação Integral é uma realidade em construção no território nacional que se evidencia fortemente na atualidade pela implantação do Programa Mais Educação. Outras experiências em décadas passadas como as Escolas-parques/ Escolas-classes pensadas por Anísio Teixeira e os Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs) idealizados por Darcy Ribeiro, já apontavam para a ampliação do tempo e a investida em atividades extracurriculares. Essa construção desenha configurações emergentes de mudança no campo educacional, reafirmação de novos conhecimentos, de novos espaços educativos, metodologias, avaliações, estabelecendo uma reorganização temporal e espacial da escola.

A LDB 9.394/96, em seu art. 87 menciona a conjugação de esforços objetivando a progressão das redes escolares públicas urbanas de ensino fundamental para o regime de escolas de tempo integral.

A Constituição Federal de 1988, mesmo não mencionando o regime de tempo integral, em seu artigo 6º, defende a educação como direito social. Já o artigo 205, menciona que a educação é um direito de todos e dever do Estado e da família, com o objetivo de preparar para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Nessa perspectiva, essa educação é defendida na LDB 9.394/965, Art. 34, com uma jornada para o ensino fundamental de quatro horas de trabalho em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o período de permanência na escola.

Com a Portaria Normativa Interministerial nº. 17 de 24/04/07 determina a criação do Programa Mais Educação que objetiva incentivar a educação integral de crianças, adolescentes e jovens, por meio do desenvolvimento de atividades socioeducativas no contraturno escolar. É importante ressaltar também que o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990, garante às crianças e aos adolescentes a proteção integral e todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana.

A criação do Decreto nº. 7.083 em seu artigo 1º de 27 de janeiro de 2010

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estabelece que o Programa Mais Educação deve contribuir para a melhoria da aprendizagem por meio da ampliação do tempo de permanência de crianças, adolescentes e jovens matriculados em escola pública, mediante oferta de educação básica em tempo integral. A jornada escolar deve ser de igual ou superior a sete horas diárias durante todo o período letivo, compreendendo o tempo total que o aluno permanece na escola ou em atividades escolares em outros espaços educacionais.

De acordo com os incisos 2º e 3º do mesmo Decreto, a jornada escolar diária será ampliada com o desenvolvimento das atividades pedagógicas que poderão ocorrer no espaço escolar ou fora, com orientação pedagógica da escola, equipamentos públicos e parcerias com órgãos ou instituições locais.

Em consonância com a perspectiva da educação em tempo integral nas Escolas Públicas Municipais, em 2010 a Secretaria Municipal de Educação de Erechim, implanta no Sistema Público de Ensino, por adesão, o Programa Mais Educação do Governo Federal, complementando uma proposta de educação integral iniciada em 2001 com o PROETI – Programa de Educação em Tempo Integral. Hoje a educação integral em jornada ampliada no Sistema Municipal é oferecida pela junção de atividades do Programa Mais Educação, contrapartidas do município e parcerias com outras instituições. (WRUBLEWSKI, 2012)

Mediante esse cenário educativo, a Escola Municipal de Ensino Fundamental Cristo Rei foi escolhida como projeto piloto para a implantação da Educação Integral em Jornada Ampliada no Município de Erechim. Essa construção é um desafio para a reestruturação curricular, ressignificação de tempo, espaço e da prática pedagógica. No sentido de protagonizar um ensino de qualidade que possibilite o desenvolvimento integral do indivíduo em todas as suas dimensões.

2 a traJEtÓria da Escola cristo rEi na implEmEntação da Educação intEGral

Anteriormente ao Programa Mais Educação, a Escola Cristo Rei já oferecia atividades de educação integral em jornada ampliada pelo PROETI, mas em três dias da semana. Em 2010 passa a oferecer atividades estruturadas a partir do Programa Mais Educação, seguindo as orientações previstas no Manual Operacional do mesmo Programa, os quais se organizam em áreas denominadas macrocampos, contendo atividades afins e os estudantes passam a permanecer mais de 7 horas diárias na Escola.

O entendimento do objetivo do Programa Mais Educação gerou dúvidas quanto a sua operacionalização e sistematização. As discussões foram presentes durante todo o processo de implantação, envolvendo a comunidade escolar. Os primeiros momentos elucidaram concepções teóricas acerca da proposta de ampliação da jornada escolar, a fragmentação de tempos e espaços educativos, o reconhecimento de saberes oriundos de atores sociais e a superação de práticas pedagógicas tradicionais. O que seriam por

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sua vez temáticas relevantes durante os quatro anos que a escola vive, reconstrói e reinventa sua intencionalidade educativa.

Desde 2010, a escola em conjunto com a comunidade escolar opta por atividades a serem desenvolvidas conforme o Manual da Educação Integral, realizando um cadastro no Sistema Integrado de Monitoramento, Execução e Controle (SIMEC) e agora, a partir deste ano no Programa Dinheiro direto na Escola Interativo – PDDE Interativo – , onde as vagas são preenchidas com base no Censo Escolar do ano anterior. Fazem parte da proposta de educação integral atividades oriundas do Programa Mais Educação e outras contrapartidas do município que oferecem estagiários, professores e empresas licitadas.

A proposta da educação em tempo integral ainda está em construção, com debates que visam ao fortalecimento dos vínculos com a comunidade escolar, em reuniões com a participação dos educadores, pais, Secretaria Municipal de Educação, o Círculo de Pais e Mestres – CPM e o Conselho escolar. A Professora Comunitária coordena as atividades do Programa Mais Educação em consonância com a equipe diretiva, articulando projetos, atividades pedagógicas, culturais e/ou esportivas, oportunizando aprendizagens significativas. Uma gestão democrática deve basear-se em ação coletiva, em que são potencializados recursos e pessoas para que de forma articulada promovam iniciativas educacionais.

2.1 rEorGaniZação curricular: pErspEctivas E dEsafios

Com essa nova perspectiva de educação em tempo integral já não se concebe um currículo tradicional com disciplinas desarticuladas e fragmentadas. É imprescindível que se faça uma reestruturação do Projeto Político-Pedagógico (PPP), em que se busca uma ação intencional com um compromisso definido coletivamente. Dialogar sempre, pois um desacordo pode ser benéfico, quando as pessoas buscam argumentos, comunicando-se com os outros de maneira mais efetiva em prol de objetivos comuns à escola.

A EMEF Cristo Rei, em 2014, reorganizou o PPP da escola pensando em qualificar a educação, desenvolvendo ações compartilhadas em que o currículo seja organizado a orientar as experiências escolares em torno do conhecimento, atualizando as necessidades e novos interesses da comunidade. Desse modo, além da sala de aula, o currículo se materializa em todo e qualquer espaço que pode ser ocupado para promover a pluralidade de saberes.

Conforme o Caderno Pedagógico do Programa Mais Educação, Acompanhamento Pedagógico (2010, p.14):

Partindo, então, do princípio de que o direito de aprender está relacionado a outros domínios além da escola, reconstruir o Projeto Político-Pedagógico implica superar a fragmentação

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das experiências educativas e promover o desenvolvimento de um conjunto articulado de oportunidades de aprendizagem, potencializadas em diferentes espaços da comunidade e da cidade.

Repensar a prática pedagógica faz com que os envolvidos no processo ensino e aprendizagem renovem o seu jeito de pensar e compreender o mundo. E, um dos grandes desafios é renovar a ação do ensino tradicional, desconstruir conceitos, compreender que a educação é ir além, é garantir o envolvimento de todos os profissionais de maneira ética e comprometida.

2.2 o tEmpo E o Espaço

A ampliação do tempo diário na escola supõe uma qualidade nas atividades propostas, articuladas com as disciplinas comuns do currículo e os diversos projetos desenvolvidos ao longo do ano letivo. Como exemplo, a EMEF Cristo Rei inicia as suas atividades às sete horas e trinta minutos estendendo-as até às dezesseis horas, incluindo o horário de almoço realizado na escola. Do mesmo modo observam-se também os espaços destinados às experiências educativas, onde a ruptura dos muros da escola fica evidenciada pela utilização de espaços dentro da comunidade, praças, ruas, ginásios esportivos e tantos outros que legitimam esses saberes. Mesmo dentro da escola, a sala de aula não é espaço certo e definido, qualquer lugar pode se transformar espaço educativo.

O Caderno Pedagógico do Programa Mais Educação (2010, p.10) refere-se à disposição do tempo e espaço:

Nessa abordagem, o conceito de Tempo refere-se não só à extensão da jornada escolar, em termos de quantidade de horas propostas pelo programa, como também à qualidade das atividades a serem desenvolvidas. O conceito de Espaço refere-se a todos os lugares em que a vida em sociedade ocorre e que podem ser potencializados como espaços educativos.

Com a ampliação do tempo na escola se faz necessário uma reorganização desse tempo e também da utilização dos espaços. Na EMEF Cristo Rei os lanches e almoço são divididos pensando no conforto e agrupamento dos estudantes conforme as turmas em que eles estão distribuídos. Os recreios também são organizados de acordo com as turmas. Também se fez necessário a criação de um “escovódromo”, pois a higiene é imprescindível diante de tantas horas na instituição.

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Foram criadas algumas salas que podem ser agendadas pelos educadores que desejem utilizar com os alunos como: a Gibiteca (sala de leituras de gibis, revistas e jornais); laboratório de ciências e jogos matemáticos para os estudantes dos primeiros até os sextos anos, além do laboratório de ciências para os estudantes dos anos finais; sala de vídeo, biblioteca e dois laboratórios de informática, além de um netbook por aluno que está na própria sala de aula. Cada sala de aula é usada por uma única turma, são eles que trocam de lugar conforme a atividade proposta pelo educador.

2.3 saBErEs E os suJEitos

As possibilidades educativas como ampliação do tempo na escola possibilitam intensificar o desenvolvimento de projetos educativos que contemplam diferentes saberes oriundos da historicidade dos sujeitos e ações educativas que reconhecem e valorizam os saberes construídos nas práticas vivenciais. Os saberes que circundam entre os sujeitos que atuam no contexto escolar são muitos e devem ser reconhecidos pelas práticas que respeitem essa diversidade.

Pensando nisso, a escola avança na ruptura de um currículo tradicionalista, reconhecendo fortemente a presença do currículo oculto, viabilizando estratégias pedagógicas que incentivam o desenvolvimento dos estudantes em torno de seu cabedal de experiências e de usa prática social.

Além da grade curricular estruturada com base nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), a EMEF Cristo Rei tem a intencionalidade progressiva em estruturar um currículo que ofereça possibilidades para o desenvolvimento de diversas formas de linguagens e de expressões. A escola promove intervenções durante as regências de classe, com professores do quadro funcional, monitores, estagiários e contrapartidas do município, e educadores com competência específica para área de atuação como: Banda Escolar, Karatê, Dança Escolar, SENAC (Informática Educativa) e Teatro.

Os professores do quadro funcional trabalham desenvolvendo atividades relacionadas à língua portuguesa, línguas estrangeiras (inglês e Espanhol), educação ambiental, psicomotricidade e musicalização. Os estagiários acompanham as práticas educativas e auxiliam nos recreios, na entrada e na saída dos estudantes, no refeitório durante os lanches e almoços, pois em todos os momentos a aprendizagem acontece em todas as dimensões, o tempo todo e com todos os envolvidos no processo. Os monitores do Programa Mais Educação desenvolvem atividades dentro dos macrocampos. No ano de 2014 a escola desenvolve atividades de Orientação de Estudos e Leitura, Tecnologias Educacionais, Educação Patrimonial, Jornal Escolar e Esporte na Escola. Os estagiários trabalham com psicomotricidade, história e ciências sociais e com projetos desenvolvidos pela escola.

A partir dessas experiências, observa-se que o saber está relacionado a outros domínios além da escola que deve ser sustentável ao longo do tempo para conduzir a

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outras experiências subsequentes. Com isso, cada ser integrante do processo educativo precisa refletir de forma crítica sobre o seu papel de educador, responsável por fazer parte de um trabalho coletivo.

Conforme o Caderno Pedagógico do Programa Mais Educação, Acompanhamento Pedagógico (2010, p.11):

A valorização da pluralidade de saberes e o reconhecimento de distintas formas de conhecimento e suas expressões no mundo contemporâneo contribuem para a “construção de um projeto de sociedade democrática, promovendo uma interação em rede com diferentes espaços sociais da cidade”. Esta construção implica compreender a educação como responsabilidade e compromisso coletivos, prevendo movimentos de cooperação e de diálogos constantes entre as diferentes instituições educativas.

Nessa perspectiva de possibilitar a pluralidade de saberes, a escola reconhece o fazer pedagógico a partir de diferentes sujeitos e atores sociais, valorizando a singularidade, que advém de diferentes culturas e espaços sociais. A diferença é ilimitada, ela é múltipla, pois vai produzindo outras diferenças indefinidamente. É na multiplicidade dos acontecimentos do cotidiano que podemos buscar outras lógicas do mundo e assim cultuar a plenitude da vida.

2.4 a orGaniZação da EQuipE dirEtiva E a GEstão dialÓGica

É pela gestão que se organiza todo o trabalho pedagógico no ambiente escolar, desde a tomada de decisões até a efetivação das ações. O planejamento e a organização são fatores essenciais para melhorar a produtividade. Um bom líder gerencia de forma democrática a sua equipe de trabalho, e as pessoas que a compõem não precisam saber resolver tudo, mas o diretor precisa dar espaço para a equipe e utilizar o potencial do grupo, gerenciando o tempo. Quanto mais efetivas individualmente as pessoas são, mais a equipe aumenta o seu desempenho.

Na perspectiva da Educação em tempo integral, também se faz necessário requalificar e reorganizar os gestores da equipe diretiva e de apoio, no sentido de reconhecer a atuação de cada sujeito no processo, respeitando as suas limitações e aprendendo continuamente a reinventar-se, desenhando práticas de gestão que venham ao encontro do cenário educacional da escola. Sendo assim, o gestor tem a necessidade de respeitar as diferenças, pesquisando, dialogando, apontando e planejando ações que melhore a qualidade do ensino com o incentivo contínuo do protagonismo entre estudantes, professores, monitores, estagiários, funcionários e pais, visando à gestão participativa.

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O dinamismo resultante das relações educativas e dos novos saberes advindos de práticas educacionais a partir da implantação de um projeto piloto em Educação Integral, também requer que o gestor reconheça a importância da participação consciente e esclarecida das pessoas nas decisões sobre a orientação e execução de seu trabalho. O diálogo é um fator fundamental na construção do sentimento de pertencimento e comprometimento em um trabalho com ação participativa, que é singular, mas se integra no coletivo na busca de um objetivo comum.

Assim sendo,

[...] é fundamental ressaltar a importância de escutar e interpretar os atores que estiverem envolvidos no processo de avaliação institucional, pois eles permitirão explicitar aquilo que por vezes está oculto, fazendo emergir o qualitativo, além de compreender com olhar interno e externo de maneira a se concretizar de fato, a meta-avaliação e atingindo, se possível, a sua plenitude. (LOBO, 2006, p.29)

Esse modelo de gestão está em construção na escola e tem sido ao longo desses quatro anos um desafio, pois os sujeitos estão se reconstruindo e experimentando novas possibilidades, demandas essas que se desenham no contexto escolar a partir dos ideais da educação integral.

A gestão nas modalidades diretivas e de apoio implementam e proporcionam momentos de formação continuada e diálogo que visam ao aperfeiçoamento profissional teórico e prático no contexto de trabalho, fortalecendo práticas pedagógicas com postura positiva em suas ações sem medo de mudanças e desafios.

Os gestores da equipe de apoio (professora comunitária, professora de apoio, coordenadores dos macrocampos e coordenadores dos anos iniciais e finais do Ensino Fundamental) disponibilizam encontros sistemáticos, individualizados e coletivos, de planejamento, formação e troca de experiências. A Secretaria Municipal de Educação também disponibiliza formação continuada, inclusive em parceria com outras instituições como o caso da Universidade Federal Fronteira Sul (UFFS).

A gestão compreende que existe a necessidade de reinventar-se continuamente pela intencionalidade de seus atores e no entendimento de que como seres da práxis (ação-reflexão) podem promover uma educação emancipatória de qualidade com a Educação Integral. Nesse sentido, a formação continuada é fundamental para alicerçar processos formativos na esfera humana, profissional e ética.

3 considEraçõEs finais

A Educação Integral em jornada ampliada é uma construção permanente, que se reinventa, avança, retrocede por entender que existe um movimento constante de aprimoramento advindo de paradigmas educacionais e territoriais do nosso tempo.

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Reconhecer novos saberes, institucionalizar práticas educativas que desenvolvam as diferentes dimensões e oportunizem o desenvolvimento integral do ser, requer movimentos constantes em torno da reinvenção diária dos sujeitos desse processo, no sentido de respeito à pluralidade cultural e suas histórias de vida. O sentimento de pertencimento, a formação continuada, a troca de experiências fortalecem o desenvolvimento de uma escola integral que prima pela aprendizagem de qualidade, inclusiva e democrática com sujeitos protagonistas em um tempo que se operam grandes mudanças.

Os diferentes sujeitos – suas histórias, saberes e ações pedagógicas, o reconhecimento de outros espaços educativos e um trabalho intersetorial –, marcam um desejo conjuntural possível e fundamental no processo de implantação da educação integral.

A gestão escolar, nesse sentido, deve ser democrática e participativa reconhecendo juntamente com a comunidade escolar as suas limitações, valorizar e incentivar o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas, incentivar o diálogo e a formação continuada, promovendo um ambiente estimulador para a aprendizagem, avançando para ações intersetoriais.

Desse modo, o processo de construção e implantação da Educação Integral na escola passa de forma significativa pelos sujeitos que dele fazem parte, assumindo significados reais no seu contexto. Não se constitui em um estereótipo, mas em verdades de domínio humano, ligados às relações que os próprios sujeitos criaram no tempo e no espaço, sendo assim uma construção sócio-histórica de todos e para todos.

rEfErências

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 5 out. 1988.

_______. Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei n.9.394, de 20 de dezembro de 1996. Brasília, DF, 1996.

_______. Portaria Normativa Interministerial n.17, de 24 de abr. de 2007. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 abr. 2007c.

_______. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei n.8.069, de 13 jul. 1990. Brasília, DF, 1990.

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_______. Ministério da Educação. Manual da Educação Integral. Brasília, 2011. Disponível em http://portal.mec.gov.br. Acesso em 3 jul. 2014.

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ERECHIM. Projeto Político-Pedagógico da EMEF Cristo Rei. Prefeitura Municipal de Erechim: Secretaria Municipal de Educação, 2014.

LOBO, Clever Eduardo Zuim. Avaliação Institucional: Um estudo comparativo entre duas universidades. Dissertação de Mestrado. Campinas: PUC, 2006.

WRUBLEWSKI, Juliana. A Educação Integral em Jornada Ampliada no Município de Erechim/RS: uma experiência em construção. In: CORÁ, E. J. et al. Contribuições da UFFS: para Educação Integral em Jornada Ampliada. Chapecó, 2012.

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A EDUCAÇÃO INTEGRAL EM TEMPO INTEGRAL ARTICULANDO SABERES E

PRÁTICAS: A ExPERIêNCIA DE VITORINO-PR

Dirceu Antonio Ruaro 1

1 introdução

O grande desafio da Educação Municipal de Vitorino 2 é o de cumprir com a Missão estabelecida a partir da ação da ideia de Paulo Freire de que é necessário “Educar para o desenvolvimento humano e para a mudança da sociedade”.

Para que isso fosse possível no município, era necessário tomar um posicionamento e fazer opções. A opção do Governo Municipal de Valdir Picoloto (2005-2012) foi de transformar a educação municipal. A transformação anunciada passava pela opção de uma nova maneira de se pensar e fazer a educação municipal.

A opção para a Rede Municipal era de que, de fato, “a escola deve fazer a diferença” e, para que isso fosse possível iniciou-se o processo de implantação da educação integral. Primeiramente de forma experimental, em 2009-2010 e, na forma legal, via Lei Municipal, em 2011.

2 a rEdE municipal dE Educação dE vitorino – paranÁ

O Município de Vitorino, como a imensa maioria dos municípios paranaenses pertence ao Sistema Estadual de Educação. A tendência atual das reformas educacionais em curso no Município de Vitorino tem como ponto central a gestão da secretaria e das unidades escolares. O Município conta com uma rede de três unidades municipais que atendem à educação infantil, ao ensino fundamental – anos iniciais – e à educação

1 Professor – Pedagogo-Psicopedagogo Clínico e Institucional – Gestor de Educação Pública – Educador – Doutor em Educação. Secretário Municipal de Educação, Cultura, Esporte e Lazer de Vitorino – Paraná. www.dirceuruaro.com.br e-mail [email protected] 2 O Município de Vitorino tem seu nome dedicado ao cacique indígena Vitorino Condá que se aliou aos brancos para defendê-los de outros índios arredios aos colonizadores. Em fins do século XIX já havia um povoado na localidade que se dedicava à produção de erva-mate e à criação de porcos. Entre os anos de 1920 e 1925 o povoado tornou-se um entreposto dos tropeiros que faziam o caminho entre os municípios de Barracão e Clevelândia. Surgiram então os primeiros comerciantes no povoado que se tornou Distrito de Clevelândia em 1951 e, em 1960 tornou-se município sendo desmembrado deste. O Censo de 2010 indicou uma população de 6.513 habitantes. A economia do município gira em torno da produção de soja, milho, gado e produção de forragens. A agroindústria produz alimentos, madeira, material elétrico e mecânico. A localização geográfica do município é no sudoeste do Paraná, apresentando clima subtropical, úmido, temperatura média de 22º e inferior de 18º. A área do município é de 306.238 km2.

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de jovens e adultos, também anos iniciais, com um total geral de 644 alunos (2014 – Censo Escolar).

As três unidades escolares municipais estão situadas na sede do município, não havendo nenhuma escola na zona rural.

Mesmo pertencendo a Rede Estadual de Ensino, como Sistema, a educação no município está a cargo da Secretaria Municipal de Educação, Cultura, Esporte e Lazer, que é a responsável por conduzir o processo educacional na Rede Municipal.

A Secretaria Municipal de Educação, Cultura Esportes e Lazer, tem como missão implementar uma educação pública de qualidade, por meio de processo participativo, visando à formação integral em tempo integral do educando para efetiva construção de um processo educativo que engloba formação e desenvolvimento humano, social, artístico, cultural desportivo para o aumento da qualidade da aprendizagem na direção de uma formação mais completa que pressupõe o desenvolvimento do ser humano-cidadão-aluno.

Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) são os seguintes os dados oficiais da realidade educacional em Vitorino, tendo como referência o ano de 2011:

Quadro I: Anos Iniciais do Ensino Fundamental – Brasil (2005 a 2011)

Fonte: http://www.inep.gov.br. portal IDEB, acesso em 15 de junho de 2014

Conforme o Quadro I tem-se uma panorâmica da educação básica brasileira dos anos inicias Ensino Fundamental – Brasil nos anos de 2005 a 2011, permitindo inferir que, de fato, após a adoção de medidas de desempenho da educação, houve acréscimo na média geral.

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Quadro II: IDEB – Município de Vitorino de 2005 a 2011

Fonte: http://www.inep.gov.br. portal IDEB, acesso em 15 de junho de 2014

O Quadro II apresenta, especificamente, as metas projetadas e observadas no Município de Vitorino de 2005 a 2011. A comparação especial que se pode fazer, a partir desse quadro é que o IDEB Vitorinense atinge a meta de 2019, ainda em 2009, demonstrando que a meta da Secretaria Municipal de Educação vem sendo cumprida, que é de desenvolver uma educação pública de excelência.

A Secretaria Municipal de Educação está organizada por meio de Gerências e Unidades Escolares às quais têm atribuições na Lei Municipal 959/2007 sendo que, a Gerência de Ensino, tem como foco desenvolver ações para o ensino e a aprendizagem.

Em relação à proposta pedagógica, ela é elaborada e acompanhada pela Gerência de Ensino e as Coordenações Pedagógicas das Unidades Escolares e da Educação em Tempo Integral.

3 a implantação E implEmEntação da Educação intEGral

A Educação Integral em Tempo Integral teve essa concepção adotada na Rede Municipal de Educação de Vitorino, após discussões e estudos sobre que tipologia de educação integral seria significativa para a Rede.

Assim, significando uma educação escolar ampliada em suas tarefas sociais e culturais a implantação ocorreu em 2011, por meio da Lei Municipal Nº 1170/2011 estabelecendo a forma de atuação na Rede Municipal de Ensino.

3.1 prEssupostos

Alguns pressupostos foram considerados no processo de implantação e implementação da proposta.

Inicialmente, questões ligadas ao Currículo foram discutidas, analisadas e adotadas de forma que contemplassem o desenvolvimento humano, social e cidadão dos alunos.

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A forma de ação pedagógica contemplada foi a das ações interdisciplinares de maneira a agilizar e pensar o ensino em todas as suas dimensões. Por isso, a questão do “tempo” foi considerada essencial para a tomada de decisões. Duas questões primordiais foram consideradas: o tempo quantidade e o tempo qualidade.

Assim adotou-se a concepção de tempo escolar quantidade/qualidade ao se organizar a extensão do tempo nas atividades de tempo integral nas unidades escolares da Rede.

Além da forma de ação pedagógica e da questão do tempo, outro pressuposto foi a questão do espaço físico. Considerando que as atividades pedagógicas do Projeto de Implantação da Educação em Tempo Integral são complementares à jornada escolar, elas podem ser desenvolvidas no próprio espaço físico da unidade escolar ou em espaços alternativos como os oferecidos na Secretaria Municipal de Educação, no Ginásio de Esportes e na Biblioteca Cidadã.

Outra questão considerada essencial para a proposta foi a dos profissionais que devem atuar no processo pedagógico. A decisão foi de que as atividades educativas devem ser desenvolvidas por professores, de preferência, concursados e efetivados na Rede Municipal.

Essa decisão levou a Secretaria a propor mudanças na Lei de Planos, Cargos e Salários, incluindo docentes para as áreas esportivas, culturais e sociais, necessários para a implantação da proposta.

3.2 a orGaniZação curricular

Ao organizar a proposta curricular, partiu-se do princípio de que não existem modelos predefinidos e ideais para uma proposta que pretende ser local e inovadora no contexto em que é desenvolvida.

Ainda assim, a Secretaria Municipal de Educação buscou produzir um currículo capaz de integrar as diferentes áreas do conhecimento em consonância com as ideias de formação do aluno-cidadão, priorizando práticas pedagógicas capazes de propiciar a construção de valores que possibilitem a convivência e os relacionamentos interpessoais adequados a uma nova sociedade que se sedimenta.

Assim, de acordo com o contexto local, foi pensada uma matriz curricular voltada às necessidades dos alunos, fazendo uma integração entre o currículo básico do turno regular com as oficinas curriculares contempladas na extensão da carga horária.

As oficinas curriculares foram organizadas tendo em vista a concepção de educação integral em tempo integral e contemplam as áreas de linguagem e matemática, atividades culturais, esportivas e motoras além de atividades de formação pessoal e social.

No momento, a questão curricular passa por reflexão e deverá ser reorganizada para dar conta da implantação do turno único, em pelo menos duas das unidades

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escolares a funcionarem em 2015 e, ao mesmo tempo, dar suporte as ações pedagógicas da unidade que ficará com o turno estendido, ou contraturno.

De qualquer forma, o novo formato da Escola Integral em Tempo Integral no Município de Vitorino exige inovações no modelo curricular para além de conteúdos de ensino e aprendizagem, trazendo também conteúdos socioculturais, esportivos que tragam à tona vivências relacionadas à qualidade de vida, ao exercício da cidadania, à convivência, às relações interpessoais e contribuições para o desenvolvimento pleno da pessoa.

3.3 as oficinas pEdaGÓGicas QuE compõEm o currÍculo

A organização do tempo/espaço/ações pedagógicas da Educação Integral em Tempo Integral no Município de Vitorino, foi organizada dentre as diferentes possibilidades de organização didático-pedagógica tendo como foco as Oficinas Pedagógicas.

Para a Secretaria Municipal de Educação e Coordenação da Educação em Tempo Integral, essa é a forma mais adequada e promissora de desenvolver as ações pedagógicas nas quais se devem integrar os conteúdos de aprendizagens por meio de metodologias interdisciplinares.

A concepção que orientou a adoção das Oficinas Pedagógicas foi a de que essa é a forma, para contexto municipal de Vitorino, de favorecer o envolvimento do aluno, despertando o interesse e a participação, além de possibilitar escolhas para frequentar as oficinas de seu interesse, uma vez que a gama oferecida provoca, justamente, a escolha pela atividade que mais adequado ao perfil pessoal de cada um.

3.3.1 Oficina Pedagógica de Acompanhamento da Aprendizagem – Essa Oficina tem como base o apoio metodológico, procedimentos e materiais voltados às atividades pedagógicas e lúdicas para o ensino e a aprendizagem da Matemática, de práticas de leitura e escrita, de História, de Geografia e das Ciências, contextualizado em projetos de trabalho educacional, de acordo com a necessidade e com respeito ao tempo de aprendizado de cada criança é a única oficina obrigatória para todos os alunos.

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Alunos da Oficina de Acompanhamento Pedagógico – Registro feito em 16 de junho pela Coordenação da Educação em Tempo Integral.

3.3.2 Oficina Pedagógica de Canto Coral – A Oficina Pedagógica de Canto Coral tem como objetivo o desenvolvimento da capacidade de tornar a criança capaz de desenvolver vários tipos de vozes (falar, cantar, sussurrar, gritar, cantarolar), desenvolverem o controle da voz (cantar diferentes alturas de maneira afinada) e desenvolver um repertório de canções.

Registro da apresentação da Peça “Trajetória de Maria”, no dia 9 de maio de 2014, no Ginásio de Esportes, na Homenagem ao dia das mães.

3.3.3 Oficina Pedagógica de Arte Circense – A Oficina Pedagógica de Arte Circense é frequentada por alunos da Rede Pública (tanto da Rede Municipal quanto Estadual) e visa ao desenvolvimento de conhecimentos, atitudes, habilidades artísticas e culturais para a atuação performática circense em espaços cênicos criados, produzidos e apresentados pelas crianças e jovens.

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Participação dos alunos de “Arte Circense” na apresentação da Peça, “Trajetória de Maria”, no dia 9 de maio de 2014.

3.3.4 Oficina Pedagógica de Dança – A Oficina Pedagógica de Dança tem por objetivo o desenvolvimento das possibilidades expressivas do próprio movimento, utilizando gestos diversos e o ritmo corporal nas suas brincadeiras, danças, jogos e demais situações de interação.

Meninas da Oficina de danças participando da peça “Trajetória de Maria”, em homenagem às mães, no dia 9 de maio de 2014.

3.3.5 Oficina de Artes Plásticas – Essa Oficina está pensada com o objetivo de desenvolver o olhar crítico das crianças a partir de vivências relacionadas à história da arte, história da humanidade e compreensão das expressões artísticas; essa oficina oferece atividades da educação infantil ao 5º ano.

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3.3.6 Oficina Pedagógica de Artes Cênicas – A Oficina Pedagógica de Artes Cênicas é oferecida com a intenção de provocar o desenvolvimento da representação, concentração, corporeidade.

3.3.7 Oficina Pedagógica de Capoeira – Essa Oficina tem como objetivos favorecer: o desenvolvimento e a melhoria da relação interpessoal com atividades em grupo; a espontaneidade, raciocínio lógico e rápido, criatividade e imaginação em jogos, brincadeiras (dirigidas e livres) e historinhas trabalhadas em aula; o equilíbrio, força, reflexo, concentração, coordenação motora, etc. com os movimentos da capoeira, dos alongamentos, aquecimentos e das recreações; o ritmo e musicalidade com os instrumentos da capoeira (pandeiro, caxixi, agogô, atabaque e o berimbau) e músicas cantadas em aula.

3.3.8 Oficina Pedagógica de Karatê – Potencializar o desenvolvimento das manifestações de defesa pessoal, arte, filosofia e esporte do Karate-Do é o objetivo dessa Oficina.

3.3.9 Oficina Pedagógica de empreendedorismo – Tem como meta desenvolver o espírito empreendedor autonomia de pensamento, valoração, iniciativa, criar soluções criativas, ação para empreender.

3.3.10 Oficina Pedagógica de Violão – Tem por objetivo auxiliar no raciocínio lógico, cognitivo, atenção, concentração, coordenação motora, ritmo.

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Alunos participantes da Oficina de Violão-registro feito em 16 de junho pela Coordenação do Tempo Integral.

3.3.11 Oficina Pedagógica de Xadrez – Essa oficina é ofertada com a possibilidade de contribuir no desenvolvimento do raciocínio lógico.

3.3.12 Oficina Pedagógica Tênis de Mesa – Por ser um esporte individual o aluno precisa conhecer a si mesmo, trabalhando os fatores intrapessoais como a autoestima e, por isso, essa oficina é oferecida no sentido de motivar e auxiliar no desenvolvimento de capacidades físicas, (coordenação motora, raciocínio rápido, velocidade, resistência).

3.3.13 Oficina Pedagógica de Banda – Apesar de ser uma das oficinas mais “barulhentas” oferece a possibilidade de melhoria das relações sociais, autoestima, disciplina, ritmo, coordenação, além, da melhoria no processo de pensamento abstrato, condicionamento físico e responsabilidade.

3.3.14 Oficina Pedagógica de Flauta – Essa oficina, além do contato com a leitura musical, estimula a criatividade e a socialização, e auxilia no desenvolvimento psicomotor e sua lateralidade, melhora a capacidade de memorização, atenção, exercitando o físico, o raciocínio e o emocional das crianças.

3.3.15 Oficina Pedagógica de Futsal – O esporte é considerado importante para auxiliar no desenvolvimento da cognição, no desenvolvimento motor e na ampliação da cultura esportiva dos alunos e, por isso essa oficina é ofertada.

3.3.16 Oficina Pedagógica de Tecnologias Educacionais – A oficina de tecnologia educacional utiliza basicamente os laboratórios de informática e prepara os alunos para o uso do computador auxiliando na comunicação, participação, altamente interativos, dialógicos e intertextuais.

3.3.17 Oficina Pedagógica de Corrida de Orientação – A Orientação explora valores como: trabalho em equipe, atividade física, o respeito à natureza. Além de analisar, interpretar e elaborar (mapas, gráficos e tabelas), orientação espacial, localização.

3.3.18 Oficina Pedagógica de Jardinagem Escolar – Cuidado com o ambiente escolar, como espaços de cuidado, práticas de espermacultura, de feição pela vida, cultivo de plantas, arborização e de práticas que auxiliam a repensar, reduzir, recusar, reutilizar e reciclar na vida cotidiana.

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4 avanços E dEsafios

Diante das Oficinas acima descritas e dos resultados que se apresentam por meio do IDEB, desde 2009 e, ainda, pela frequência e participação dos alunos nas oficinas pedagógicas que compõem o currículo escolar da Rede Municipal de Educação de Vitorino, pode-se considerar que há um Projeto Político de Educação em desenvolvimento.

Talvez esse seja o maior avanço. A educação integral em tempo integral é política pública no Município de Vitorino-PR, por força de lei municipal. A implantação da Educação em Tempo Integral representou uma nova fase em 2011 e, atualmente, os projetos iniciais, transformados em Oficinas Pedagógicas, são o ponto alto da transformação educacional.

A formação dos professores e oficineiros da educação em tempo integral é outra ação desenvolvida com muito cuidado e atenção. Atualmente um convênio inédito com a Universidade Federal da Fronteira Sul tem demonstrado que, de fato, esse é o caminho. É preciso formar adequadamente os docentes e oficineiros para que se tenha uma educação integral e em tempo integral de qualidade.

Apesar de todos os avanços ainda há desafios a serem vencidos. Por isso, a conversa, o diálogo, o planejamento em conjunto, a busca de metodologias e de práticas que deem conta deste “fazer diferente” é um desafio que permanece constante.

Por mais que se encontrem espaços alternativos, a escola de tempo integral precisa construir seus espaços. Salas multifuncionais, auditório, espaços de esporte e de lazer. O Município de Vitorino reformou e ampliou suas unidades escolares de forma que contempla, hoje, todas as necessidades das ações do tempo integral, sejam elas de cunho pedagógico, cultural ou esportivo.

E a questão dos recursos? Esse talvez seja o maior desafio. Quem vai financiar a educação em tempo integral? Não se pode ficar na ilusão.

É o próprio município. Mesmo com programas como o “Mais Educação”, ainda é incipiente a participação efetiva do Governo Federal nas necessidades imediatas de manutenção dos programas.

5 considEraçõEs finais

Mesmo com o sucesso da experiência e o avanço que se tem tido, é preciso permanecer atentos para algumas questões como a da compreensão do que seja a educação integral em tempo integral e suas finalidades. As concepções determinam o saber e o fazer na escola.

Outra questão que não pode ser descuidada é relacionada aos recursos humanos: a contratação de pessoas para atuarem no processo precisa ser feita por meio de concurso público e para isso, é preciso rever, repensar e redimensionar os planos de cargos e salários.

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Outra situação delicada é a da gestão da escola em tempo integral. A educação em tempo integral pede gestão compartilhada e, a grande maioria do pessoal da educação ainda não tem experiência suficiente para isso, apesar de estar caminhando.

Por fim, é preciso estar atento à questão de recursos. É ilusório pensar que se receberão valores, investimentos ou financiamento de outras esferas governamentais. O que se recebe é tão pouco que se não for bem planejado, faltará recursos para coisas básicas.

rEfErências

PORTAL EDUCACENSO. Disponível http://educacenso.inep.gov.br. Acesso em 15 jun, 2014.

Município de Vitorino, PR. Lei Municipal N.º 959/2007. Dispõe sobre a organização, cria órgãos e define atribuições na estrutura administrativa do Município de Vitorino, PR. Vitorino, PR 2007.

Município de Vitorino, PR. Lei Municipal Nº 1170/2011. Implantação da Educação em Tempo Integral, Vitorino, PR, 2011.

Município de Vitorino, PR. Relatório Ações Desenvolvidas Tempo Integral. Secretaria Municipal de Educação, Cultura, Esporte e Lazer, Vitorino-PR, 2014.

Município de Vitorino, PR. Relatório Informações Educacionais Municipais (Secretaria Municipal de Educação, Cultura, Esportes e Lazer – documento interno), Vitorino, PR, 2014.

Município de Vitorino, PR. Secretaria Municipal de Educação, Cultura, Esporte e Lazer de Vitorino, PR. Documento Interno de Implantação da Educação Integral em Tempo Integral. Documento Interno, 2009.

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EDUCAÇÃO EM TEMPO INTEGRAL DE CORONEL VIVIDA/PR: CAMINHOS, DESCAMINHOS E POSSIBILIDADES

Camila Suzani Ribas1

Luciane de fraga Alves Maria2

1 introdução: E

O tempo é um dado essencial para a compreensão de todos os processos da vida humana. O homem moderno utiliza somente uma palavra para dar significado ao tempo, porém, na Grécia antiga, as pessoas que lá viviam empregavam dois significados: Chrónos e Kairós.

O Chrónos era o deus que representava o tempo cronológico; marcado pelas mudanças de estações, pelo dia e pela noite, sol e lua. É o tempo que podemos contar nos relógios, celulares e diversos outros aparelhos eletrônicos. Já o Kairós, era o deus que representava o tempo subjetivo, tinha o significado para os gregos de momento certo/oportuno, tempo em que algo especial acontece.

A história de Chrónos3e outras histórias mitológicas podem mostrar as complicadas e variadas relações de tempo utilizadas pela sociedade. De acordo com Ferreira e Arco-Verde (2001, p.3) “O Sol, a Lua e o Dia, bem como a Noite e o Sono são divindades mitológicas responsáveis pela marcação do tempo, as quais auxiliam na interpretação desses fenômenos da natureza. Esses fenômenos constituem, até hoje, os elementos científicos para a medição do tempo”.

Entretanto, com o passar dos anos e com os novos estudos e conceitos advindos da ciência, o calendário e o relógio encarregaram-se das funções dos fenômenos naturais, apoderando-se não apenas da orientação, mas também da vida social da humanidade, tornando-a escrava desse tempo calculado. De acordo com Arco-Verde (2012) essa pressão do tempo, constituindo-se como aspecto de código social, acaba

1 Professora de educação física do município de Chopinzinho, PR, e-mail: [email protected] Professora municipal de Coronel Vivida, PR, e-mail [email protected] Na mitologia grega, Cronos era o filho de Urano (o céu) e de Géia ou Gê (a Terra). Incitado pela mãe e ajudado pelos irmãos, os titãs, castrou o pai – o que separou o céu da terra – tornou-se o primeiro rei dos deuses. Seu reinado, porém, era ameaçado por uma profecia segundo a qual um de seus filhos o destronaria. Para que não cumprisse esse vaticínio, Cronos devorara todos os seus filhos que lhe dava a sua mulher, Réia, até que esta conseguiu salvar Zeus. Este, quando cresceu, arrebatou o trono do pai, conseguiu que ele vomitasse os outros filhos, ainda vivos, e o expulsou do Olimpo, banindo-o para Tártaro, lugar de tormento. Segundo a tradição clássica, Cronos simbolizava o tempo e por isso Zeus, ao derrotá-lo, conferira a imortalidade aos deuses.

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por gerar problemas que ainda esperam soluções. E um deles é o emprego do tempo destinado à escola.

A escola que, assim como tantos outros, é entendida como um tempo social, também estabelece horários e calendários para a vida das pessoas. Para Arco-Verde (2012, p. 85) “[...] a compreensão do significado do tempo escolar em suas variáveis é importante na elaboração de possibilidades educacionais para estudantes, instituições escolares e projetos pedagógicos”. A autora ainda complementa (Ibid) que é necessário reaver as reflexões e perceber que o tempo não é único, mas plural, distinto, individual e coletivo e que não existe apenas um tempo escolar, mas sim, tempos escolares compreendidos como espaço, como relação com os acontecimentos e como objeto histórico que foi construído pelo homem. Assim como na Grécia antiga, ainda se tem dificuldade de articular o tempo objetivo com o deus Kairós; ou seja, o tempo dado na escola e o tempo necessário do estudante.

A partir dessa problemática, a educação vem sendo repensada, e há um movimento em favor da necessidade de ampliação da jornada escolar. Apesar das discussões a respeito do tema terem ganhado maior destaque nas últimas décadas; nos anos 1950, o intelectual brasileiro Anísio Teixeira já refletia sobre a curta quantidade de dias/horas destinados a atividade escolar; para o autor:

(...) A escola primária visando, acima de tudo à formação de hábitos de trabalho, de convivência social, de reflexão intelectual, de gosto e de consciência, não pode limitar as suas atividades a menos que o dia completo. Deve e precisa ser de tempo integral para os alunos e servida por professores de tempo integral. (TEIXEIRA, 1977, p.79 apud COSTA e ROSA, [s./d.])

De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1996, o tempo escolar deve ser cumprido com, no mínimo, 200 dias letivos e 800 horas de aulas por ano e acrescenta ainda no artigo 5º que “Serão conjugados todos os esforços objetivando a progressão das redes escolares públicas urbanas de ensino fundamental para o regime de escolas de tempo integral”. (Brasil, 1996, Lei 9394/96, art. 87, 5º, IX)

A ampliação da jornada escolar é um caminho para implantação da educação em tempo integral, porém, há muitas controvérsias sobre o tema em questão. Segundo Ferreira e Arco-Verde (2001) enquanto muitos pais pedem por um atendimento ampliado, outros criticam a obrigatoriedade de uma jornada tão extensa. Para Cavaliere (2002, p.1) “às vezes o tempo de escola é considerado excessivo e outras vezes insuficiente. Quase sempre é criticado por seu referencial lógico-quantitativista e por submeter o tempo das crianças ao tempo dos adultos sendo um fator perturbador da relação pedagógica”.

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Contudo, entre as várias justificativas para ampliação da jornada escolar, Cavaliere (2007, p. 1016) aponta:

a) ampliação do tempo como forma de se alcançar melhores resultados da ação escolar sobre os indivíduos, devido à maior exposição desses às práticas e rotinas escolares; (b) ampliação do tempo como adequação da escola às novas condições da vida urbana, das famílias e particularmente da mulher; (c) ampliação do tempo como parte integrante da mudança na própria concepção de educação escolar, isto é, no papel da escola na vida e na formação do indivíduo.

Diante dessas argumentações e direcionando maior destaque para a última alternativa acima; na qual se projeta o ponto de partida da educação integral, pois de nada adiantará aumentar o tempo escolar se não houver mudança de fato no papel da escola na vida e formação dos estudantes. Setubal e Carvalho (2012, p. 114) compreendem que “uma política efetiva de educação integral com certeza não se traduz, apenas, em aumentar o tempo de escolarização, antes significa mudar a própria concepção e o tipo de formação oferecida às novas gerações”.

Segundo Cavaliere (2007), no Brasil, cresce o número de projetos na educação básica pública que têm como característica marcante a criação da jornada integral. A concepção de educação integral que se fala, está associada à formação integral do sujeito, ou seja, de acordo com Guará (2006, p. 16) “a ideia filosófica de homem integral agrega-se a necessidade de desenvolvimento integrado de suas faculdades cognitivas, afetivas, corporais e espirituais resgatando como tarefa prioritária da educação, a formação do homem compreendido em sua totalidade”.

Na primeira metade do século XX, aponta Brasil (2009), encontram-se várias investidas a favor da educação integral, entretanto, as propostas e experiências vinham de matrizes ideológicas bastante diversas e até contraditórias. Como por exemplo, para o Movimento Integralista – a partir dos escritos de seu chefe nacional, Plínio Salgado – as bases que compunham a educação integral eram o nacionalismo cívico, a espiritualidade e a disciplina, visando a uma caracterização político-conservadora. Quanto aos anarquistas as bases eram autonomia, igualdade e liberdade humana, consequentemente uma visão política emancipadora.

Conforme um dos intelectuais do Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, Anísio Teixeira apud Brasil (2009, p.15):

[...] pensando na implementação de um Sistema Público de Ensino para o país, propunha uma educação em que a escola “desse às crianças um programa completo de leitura, aritmética e escrita, ciências físicas e sociais, e mais artes industriais, desenho, música, dança e educação física, saúde

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e alimento à criança, visto não ser possível educá-la no grau de desnutrição e abandono em que vivia”.

Com isso, entende-se que a concepção de Anísio Teixeira em relação à educação integral é mais próxima – porém não completamente – da formação integral do indivíduo que se fala atualmente, ou seja, como visto anteriormente, formação do homem em sua totalidade. As obras deixadas pelo referido autor têm servido como base e inspiração para o estudo, incorporação e melhoria da educação integral nos dias atuais.

Com essa intenção de melhorar a educação brasileira, um dos pontos que a educação integral vem levantando é a de que a escola sozinha não consegue realizar efetivamente o seu papel. Guará afirma que (2006, p. 15) “isoladamente, nenhuma norma legal, concepção ou área da política social dá conta do atendimento completo pretendido pelas propostas de educação integral”. Ou seja, o que se pretende hoje é a articulação com todos os setores que envolvem a sociedade, para assim, buscar a lógica da formação integral do sujeito.

Para Brasil (2009, p. 25) “a articulação entre Educação, Assistência Social, Cultura e Esporte, dentre outras políticas públicas, poderá se constituir como importante intervenção para a melhoria do desempenho escolar e da permanência na escola, principalmente em territórios mais vulneráveis”. A relação com a comunidade também é uma ação muito importante para propiciar melhor aprendizado, com isso o aluno aprende a integrar sua vida escolar com a vida social.

Portanto, como comenta Moll (2008), os processos educativos atualmente, ultrapassam a instituição escolar – passam impreterivelmente pela escola – porém, devem articular-se às diversas redes de políticas culturais, sociais e de equipamentos públicos. Ou seja, para ela, educação integral supõe escola pública de qualidade e para todos em articulação com esses espaços, políticas e atores.

2 Educação intEGral no municÍpio dE coronEl vivida

2.1 traJEtÓria HistÓrica do municÍpio dE coronEl vivida: aspEctos socioEconÔmicos, polÍticos E Educacionais:

O Município de Coronel Vivida (PR), como outras regiões do Brasil, antes da vinda dos europeus para cá, era habitada pelos índios Caingangues, Xoclengue e Tupi-Guarani. Após a chegada do homem branco no país, o atual território vividense ficou sob o domínio espanhol. Os primeiros habitantes foram sofrendo influências da cultura espanhola pela formação (das chamadas Reduções Jesuíticas), dando base

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para a estrutura e colonização inicial do território. A partir disso, essas Reduções Jesuíticas foram sendo destruídas pelos bandeirantes paulistas de origem portuguesa, que tinham o objetivo de conquistar territórios indígenas, avançando pela região e ampliação de seus domínios. (CORONEL VIVIDA, 2001)

No século XVII, com a expedição do bandeirante Zacarias Dias Cortes, que chegou aos campos de Palmas, segundo Coronel Vivida (2001), povoando e iniciando moradias e agrupamentos que mais tarde, deram origem a povoação e a vila denominada posteriormente de Freguesia de Palmas, que mais tarde constituíram-se nos atuais municípios de União da Vitória, Mangueirinha, Chopinzinho e Coronel Vivida, e em 1853, a Província do Paraná desmembrou-se de São Paulo. O caboclo encontrado nesta região é oriundo da miscigenação entre bandeirantes e índias.

Houve também, a migração oriunda principalmente do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, quando as pessoas eram expropriadas de suas terras devido à falta de titulação, buscando novos espaços para produzir e sobreviver, vindo a situar-se nessa região do sudoeste do Paraná. Como a base de sua cultura era a unidade familiar, produziam apenas para a sobrevivência e posteriormente a trabalhar com a agropecuária de consumo. Com o tempo as atividades logo se expandiram para a criação de porcos com a finalidade de venda, extração da erva-mate e da madeira.

Conforme essas atividades extrativistas e primárias cresciam em importância econômica, aumentava o número de pessoas na região; a “Frente Pioneira” advinda do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina é que vai definitivamente colonizar a região, a partir de 1918, com descentes alemães e italianos com intenção de explorar a madeira e a erva-mate, negócios considerados lucrativos na época. (CORONEL VIVIDA, 2001)

Atualmente, Coronel Vivida possui uma população de aproximadamente 23 mil habitantes, distribuídos entre zona urbana e rural, e hoje sua economia baseia-se na agricultura e no comércio.

No setor educacional, o município conta com estabelecimentos que atendem a todos os níveis de ensino: da educação infantil à educação superior. A Rede Estadual de Ensino conta com cinco escolas onde é ofertado o atendimento em nível de ensino fundamental séries finais e ensino médio. Na Rede Municipal de Ensino possuem dez escolas que atendem à educação infantil e ao ensino fundamental, séries iniciais.

O município possui vários programas de educação que envolve outros departamentos como meio ambiente, cultura e esporte. Faz parcerias também com o setor privado que realiza projetos juntamente com os estudantes das escolas vividenses.

2.2 Escola intEGral: proGrama municipal dE Educação Em tEmpo intEGral

No ano de 2001 surge uma proposta para implantação da educação integral nas

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escolas municipais. Com a consultoria educacional e pedagógica, foram conjugados vários esforços e estudos para chegar ao então chamado “Escola Integral: Programa Municipal de Educação em Tempo Integral”. Este programa amparou-se legalmente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação – Lei nº 9394/96 – que e seu artigo n.º 34 estabelece que “[...] em relação à jornada escolar devem ocorrer pelo menos 4 horas de trabalho efetivo em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o período de permanência na escola”.

O Programa de Educação em Tempo Integral da Rede Municipal de Educação de Coronel Vivida propôs, na época, um currículo escolar que se apresentava em duas partes componentes e complementares: parte pedagógica e parte diversificada. A primeira subdividida em dois módulos que de acordo com Coronel Vivida (2001) composta por:

a) Temas Gerais do Currículo: – Atividades comunitárias: Educação para a cidadania, liberdade e equidade social; – Iniciação para o trabalho – Oficinas: Trabalho e Desenvolvimento; – Desenvolvendo futuros atletas: Esporte, recreação e lazer; – Valorização da diversidade: Multiculturalidade/Regionalidade cultural; – Educação em valores humanos: Ética e cidadania; – Educação ambiental e produtiva: Preservação da vida e do meio ambiente: ecologia; – Educação e questões de gênero: Orientação sexual e respeito à diversidade; – Vida e saúde: drogas e bebidas; – Educação e inclusão sociocultural-econômica e política.

E o segundo módulo era composto por:b) Especificidades de cada área temática do Currículo.A parte diversificada do currículo, segundo Coronel Vivida (2001), era

desenvolvida em atividades complementares à parte pedagógica, com a realização de projetos partindo das necessidades e interesses de cada escola apresentando peculiaridades condizentes à permanência e à formação da criança e do jovem na unidade escolar. A execução desses projetos era feita com planejamento, estruturação e adequação de recursos pedagógicos, físicos e financeiros e de acordo com a realidade local.

Nas Escolas Municipais São Cristóvão e Tiradentes os alunos eram atendidos na parte diversificada nas dependências das próprias escolas; já nas outras Escolas Municipais como a Paulino Stédile e Pequeno Príncipe, estas deslocavam seus alunos para realizarem as referidas atividades em outro local que possuía um espaço físico mais amplo e otimizado.

O Programa Municipal de Educação em Tempo Integral nos moldes em que foi iniciado teve duração de quatro anos. Após este período, passou por modificação; os alunos de todas as escolas eram reunidos e atendidos em um único espaço: o Complexo Esportivo Barro Preto. Foi aumentado o número de oficinas oferecidas e diminuído os dias de trabalho; passou-se a trabalhar três dias por semana ao invés de cinco.

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2.3 o proGrama Jornada ampliada fontE dE talEntos

No ano de 2009, foi modificado o nome do projeto que passou a chamar Programa de Jornada Ampliada Fonte de Talentos. Esse projeto funciona até hoje nas dependências do Complexo Esportivo Barro Preto, localizado no Bairro Jardim Maria da Luz. Possui estrutura ampla com várias salas de aula, banheiros, secretaria, sala de informática, quadra poliesportiva, campo de futebol, refeitório.

Esse programa contempla boa parte, porém não todos os alunos da rede municipal de ensino de Coronel Vivida. Para frequentar o projeto é necessário fazer solicitação de vaga na secretaria da escola em que a criança está matriculada. Cada escola possui um número limitado de vagas para a participação no programa, com exceção das Escolas Municipais Dr. Ulisses Guimarães e Tiradentes, em que todos os alunos matriculados na escola frequentam o Programa de Jornada Ampliada.

Os alunos participam em contraturno ao período letivo regular; os que frequentam o Programa Jornada Ampliada Fonte de Talentos pela manhã, chegam ao estabelecimento com transporte escolar, tomam café, realizam suas atividades nas oficinas e após almoçarem, são direcionados às suas respectivas escolas. Para os estudantes que cursam o programa no período vespertino, esses chegam ao meio-dia, almoçam, participam das oficinas, realizam o lanche e após são levados para casa. O horário de funcionamento é das 9h às 16h, cinco vezes por semana: segunda a sexta-feira.

Quanto ao corpo docente, o presente programa conta com três professores do quadro do magistério do município, cinco professores contratados por uma empresa terceirizada e três professores/estagiários; estes distribuídos nas seguintes oficinas: dança, teatro, língua italiana, karatê, musicalização, contação de histórias, futsal, tênis de mesa, LIBRAS e jogos de tabuleiro.

A partir do ano de 2011, a Escola Municipal Tiradentes começou a receber uma verba federal do Programa Mais Educação; no ano de 2012, após solicitação de adesão, a Escola Municipal Ulisses Guimarães também foi contemplada com esses recursos; por fim, no ano de 2013, três escolas do campo aderiram ao Programa Mais Educação – Escola Rural Municipal Vista Alegre, Escola Rural Municipal Maria da Luz, Escola Rural Municipal Santa Lúcia – nas quais o contraturno acontece nas próprias escolas.

3 considEraçõEs finais

Durante os vários caminhos percorridos neste trabalho, desde as concepções de tempo e da Educação em Tempo Integral até a experiência do Município de Coronel Vivida, acabaram levando a algumas considerações cabíveis de destaque.

Primeiramente, como foi mencionada, a ampliação da jornada escolar por si só não garante a qualidade da educação, é preciso esforços e uma mobilização de todos os

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envolvidos de uma forma geral e a escola não pode trabalhar isoladamente.A concepção de educação integral, que se refere à formação integral do indivíduo,

como já mencionado anteriormente, está ligada a ideia de desenvolvimento integrado de todas as suas potencialidades (cognitivas, corporais, afetivas e espirituais). Ou seja, como afirma Rosa (2010, p. 4) “a educação integral na escola de tempo integral [...] deverá ter como eixo norteador do planejamento e da ação educativa [...] a ideia da formação humana integral com vistas à emancipação individual e coletiva fruto de um trabalho educativo emancipado”.

Diante disso, parte-se do pressuposto de que é necessária uma prática pedagógica que esteja de acordo com os princípios da educação integral, ou seja, uma escola sozinha não dá conta de realizar o novo sentido que ganhou nos últimos anos, e para que se tenha uma educação de fato transformadora é imprescindível esforços de todos os setores de políticas públicas, setor privado, comunidade e família.

O Programa Municipal de Jornada Ampliada – Fonte de Talentos funciona em turno e contraturno, e pelo fato de ter sua estrutura física distante das escolas municipais atendidas, muitas vezes, não dialoga os conteúdos escolares e as capacidades e competências dos educandos. Outro fato que nos leva à reflexão é a elaboração de um currículo unificado – que contemple as necessidades da população vividense – e a obrigatoriedade da matrícula no Programa de Jornada Ampliada.

Para ter-se uma educação integral, com vistas à emancipação, é importantíssimo que o docente entenda, de fato, a filosofia de uma educação integral, ou seja, é preciso que se capacite os profissionais para trabalharem com essa educação. Pois, se não for mudada a visão do professor em relação ao ensino tradicional e este não entender o sentido de educar integralmente, tendo compromisso com uma prática libertadora e com uma construção da sociedade democrática, não haverá mudança.

Dessa maneira, compreende-se que para haver transformação na educação integral do Município de Coronel Vivida, é necessário discutir/rediscutir com todos os envolvidos o conceito de educação integral e as possíveis maneiras de sua realização nas escolas. É importante, também, ter objetivos bem determinados e compartilhados com a toda a sociedade para reflexão sobre o tipo de homem que se quer formar.

rEfErências

ARCO-VERDE, Y. F. S. Tempo escolar e organização do trabalho pedagógico. Em Aberto, Brasília, v. 25, n.88, p. 83-97, jul./dez. 2012.

BRASIL. Lei n. 9394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da Republica Federativa do Brasil, Brasília, 23 dez. 1996.

_____. Portaria nº17, de 20 de abril de 2007. Diário Oficial da União, Brasília, 24 abr. 2007.

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_____. Educação Integral: texto referência para o debate nacional. Brasília: Mec, Secad, 2009.

CAVALIERE, A. M. Quantidade e racionalidade do tempo de escola: debates no Brasil e no mundo. Teias, Rio de Janeiro, ano 3, n.º 6, jul./dez. 2002.

_____. Tempo de escola e qualidade na educação pública. Educação e Sociedade, Campinas, vol. 28, n.100 – especial, p. 1015-1035, out. 2007.

_____. Educação integral: uma nova identidade para a escola brasileira? Educação e Sociedade, Campinas, vol.23, n.81, p. 247-270, dez. 2002.

CORONEL VIVIDA – SEMED – Prefeitura Municipal (2001). Escola Integral: Programa Municipal de Educação em Tempo Integral – Gestão IvanirOgliari – 2001-2004. (Dra. Zita Ana L. Rodrigues e Ms. Adriana M.R. Lovo – consultoras).

COSTA, V. L.; ROSA, A. V. N. Reflexões sobre a ampliação da jornada escolar na educação brasileira. Disponível em http://www.anpae.org.br/seminario/ANPAE2012/1comunicacao/Eixo01_19/Valdeney%20Lima%20da%20Costa_int_GT1.pdf Acesso em ago.2013.

CRONOS. In: Nova Enciclopédia Barsa. São Paulo: Barsa Consultoria Editorial Ltda, 2001.

FERREIRA, V. M. R.; ARCO-VERDE, Y. F. S. Chrónos e Kairós: o tempo dos tempos da escola. Educar, Curitiba, Editora da UFPR, nº 17, p.63-78, 2001.

GUARÁ, I. M. F. R. É imprescindível educar integralmente. Cadernos Cenpec: Educação Integral, n.º 2, São Paulo: Cenpec, 2006.

MOLL, J. Educação Integral na perspectiva da reinvenção da escola: elementos para o debate brasileiro. In: Salto para o Futuro: Educação Integral, ano XVIII, boletim 13, ago. 2008.

ROSA, S. V. L. Reflexões sobre a educação integral na perspectiva da escola unitária de Antonio Gramsci. Anais do XIX Simpósio de estudos e pesquisas da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás, 2010.

SETUBAL, M. A.; CARVALHO, M.C.B. Alguns parâmetros para a educação integral que se quer no Brasil. Em Aberto, Brasília, v.25, n.88, p.113-123, jul./dez. 2012.

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EDUCAÇÃO EM TEMPO INTEGRAL NO MUNICÍPIO DE SÃO JOÃO – PARANÁ

fernanda Ribeiro de Souza1

Daiane Bavaresco

1 introdução

Amplos debates têm sido travados na última década por educadores, gestores e pesquisadores em direção à construção de uma concepção contemporânea de educação integral, para qual tem tido destaque o reconhecimento da necessária ampliação da jornada escolar, diante das funções cada vez mais amplas assumidas pela escola pública no atual estágio de desenvolvimento da sociedade.

Neste sentido, a educação em tempo integral como política em construção assume, nas experiências em curso, diferentes perspectivas teóricas e configurações concretas. De modo geral, a educação em tempo integral tem sido pensada sob os aspectos da ampliação das oportunidades educativas e formação integral dos sujeitos, bem como da proteção e garantia dos direitos básicos às crianças e aos adolescentes, para os quais, em muitos casos a escola se configura como ambiente central de acesso à cultura, à alimentação, à assistência e à proteção.

Neste processo de construção de uma proposta de educação integral renovada, as experiências de educação integral, historicamente desenvolvida, e em curso no nosso país, configuram-se como fonte de referência para se identificar práticas exitosas e desafios rumo à elaboração de uma agenda pública para a educação integral.

Diante disto, o presente artigo tem, por intuito, apresentar a experiência de educação em tempo integral em desenvolvimento na rede municipal de educação de São João, Estado do Paraná, com vistas a contribuir com elementos para o debate acerca dos avanços e limites para a efetivação de uma proposta de educação integral e em tempo integral num contexto mais amplo. Caracterizando o modo como tem se organizado os tempos, espaços e currículo escolar. O estudo apresenta cunho qualitativo e foi realizado por meio de pesquisa bibliográfica, documental e observações no contexto pesquisado.

1 Professoras da rede municipal de educação de São João, PR. E-mails: [email protected] e [email protected]

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2 a implantação da Educação Em tEmpo intEGral na rEdE municipal dE são João – pr

O Município de São João localiza-se na região Sudoeste do Paraná e pertence ao Núcleo Regional de Pato Branco. A rede municipal de educação, à qual delimitamos esta análise por desenvolver a experiência em tempo integral desde 2010, enquanto que as escolas da rede estadual de educação iniciaram este processo somente em 2014, conta com dois centros de Educação Infantil e seis escolas que ofertam os anos iniciais do Ensino Fundamental, com um total de 1.002 crianças matriculadas na rede, sendo 401 matrículas na Educação Infantil e 601 nos anos iniciais do Ensino Fundamental.

Faz-se necessário explicitar que no Estado do Paraná, a organização das redes escolares configura-se, salvo algumas exceções, de acordo com a proposta da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº. 9.394/96), pela responsabilidade dos municípios na oferta da Educação Infantil e dos anos iniciais Ensino Fundamental, enquanto ao Estado cabe a oferta dos anos Finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio.

O município implementou uma proposta de educação em tempo integral nos anos iniciais e finais do Ensino Fundamental em uma escola piloto, no ano 2000, na perspectiva de posteriormente atender a todos os estudantes da rede municipal e estadual de todas as escolas do município. Os estudantes participavam de uma jornada de cerca de 9 horas diárias com atividades complementares no contraturno, que se configuravam em oficinas como esporte, artesanato, Língua Portuguesa, Matemática, dentre outras. No entanto, a experiência não teve continuidade, retornando a oferta do turno de 4 horas diárias no ano de 2001.

Em 2010, a educação em tempo integral foi retomada diante de compromissos políticos assumidos pelo prefeito da época, Clóvis Mateus Cucolotto (2005-2008/2009-2012), e foi sendo progressivamente implantada na rede, iniciando o atendimento em jornada de cerca de 9 horas diárias em duas escolas que atendem aos anos iniciais do Ensino Fundamental, abrangendo todos os alunos matriculados nas duas instituições (cerca de 110 estudantes). Os alunos participavam das oficinas três dias por semana; nos outros dois dias letivos, frequentavam a escola no contraturno apenas estudantes com defasagem de aprendizagem para participar de atividades de reforço escolar.

A ampliação da jornada escolar nas outras instituições municipais não foi possível neste primeiro momento devido ao fato de não apresentarem condições físicas para abrigar os estudantes em tempo integral.

As escolas selecionadas para a ampliação da jornada localizavam-se na área rural do município e apresentavam condições estruturais mínimas para o atendimento dos estudantes no contraturno. Neste sentido, não foram realizados investimentos na infraestrutura física das escolas, sendo utilizados e improvisados os espaços e salas de aula

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já existentes para a realização das atividades na jornada ampliada. Assim, as atividades desenvolvidas ocuparam espaços como o Ginásio de Esportes das comunidades e, em alguns casos, as salas de aula foram divididas e até mesmo montadas no Ginásio de Esportes, o que engendra, de certo modo, uma precarização na qualidade dos espaços escolares, muitas vezes reduzidos, pouco iluminados e ventilados.

A organização do tempo escolar estendido se deu mantendo a fragmentação entre o turno regular, em que eram desenvolvidas as atividades da base curricular comum e o contraturno, no qual foram implantadas atividades educativas diferenciadas, como: Agricultura (Horta Escolar e Jardinagem), Arte Culinária, Artesanato, Comunicação e Uso de Mídia, Coral, Dança, De Olho na Leitura, Direitos Humanos em Educação, Informática na Educação, Educação para o Trânsito, Esporte e Recreação, Inglês, Matemática e Português (Reforço Escolar), Musicalização, Teatro e Xadrez. (SÃO JOÃO, 2010, p. 05)

O Projeto de Educação Integral (2010) desenvolvido pela Equipe Pedagógica da Secretaria Municipal de Educação apresenta uma perspectiva de educação em tempo integral pautada, para além da ampliação do tempo escolar, no alargamento das oportunidades de aprendizagem e formação, vinculando-se a proposta de educação integral como formação integral das capacidades humanas.

A ideia da formação integral do homem como ser multidimensional exige uma composição de estratégias e alternativas políticas e pedagógicas para repensarmos o modo de funcionamento das instituições educativas, com o objetivo de colocá-las a favor da lógica da inclusão e da formação integral das crianças e adolescentes. A palavra integral significa inteiro, completo, total. Portanto, defender uma educação integral, é defender uma educação completa, que pense o ser humano por inteiro, em todas as dimensões. Não só em tempo, mas principalmente em qualidade, rimar e unir quantidade e qualidade. Não adianta apenas aumentar a quantidade, sem melhorar a qualidade. (SÃO JOÃO, 2010, p. 02)

A proposta de formação integral das múltiplas dimensões humanas foi implementada por meio da oferta de atividades artísticas, culturais, esportivas, cientíticas e profissionalizantes, com vistas a potencializar as aprendizagens e incluir novos conhecimentos e elementos culturais ao cotidiano da escola. No ano de 2011, mais uma escola passou a atender aos estudantes em tempo integral, após uma readequação nos espaços físicos que também não envolveu investimentos por parte do governo. A partir deste ano letivo, o atendimento no contraturno foi ampliado para os cinco dias letivos semanais e para todos os estudantes matriculados nas três instituições, permanecendo a mesma organização curricular que vinha sendo desenvolvida, salvo

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as particularidades de atividades selecionadas por escola, que esbarram nas condições estruturais, pedagógicas e humanas que cada uma apresenta.

Ainda em 2011, duas instituições do município foram selecionadas e vinculadas ao Programa Mais Educação, passando a operar sob a lógica do Programa a partir do ano letivo de 2012, ano em que a educação em tempo integral foi implantada em mais uma unidade escolar do município, totalizando quatro unidades em jornada ampliada, todas localizadas na área rural.

Atualmente, das seis unidades escolares municipais, quatro ofertam a educação integral para todos os estudantes matriculados. Apenas duas instituições do município, localizadas na área urbana, não atendem em regime integral, em virtude do grande número de matriculas e da estrutura física que não suporta o atendimento da demanda em jornada estendida, ofertando o turno regular de 4 horas diárias nos dois períodos de atendimento.

Em 2013, as quatro escolas de tempo integral do município foram selecionadas no Programa Mais Educação, cuja proposta agregou novas possibilidades ao cotidiano escolar.

3 o proGrama mais Educação como EstratÉGia dE indução da Educação Em tEmpo intEGral na rEdE municipal dE são João – pr

O Programa Mais Educação, instituído pela Portaria Normativa Interministerial nº. 17/2007 integra as metas propostas no Plano Nacional de Educação (PNE, 2010), configurando-se estratégia de indução da ampliação da jornada escolar para o regime de tempo integral nas escolas públicas brasileiras. O Programa Mais Educação apresenta-se como política intersetorial que articula os diversos ministérios, ações e programas, bem como as três esferas de poder numa relação colaborativa em torno da escola como espaço de ampliação das oportunidades educativas e proteção e acesso aos direitos fundamentais. Para além da ampliação do tempo, o Programa fundamenta-se na concepção de educação integral considerada sob o aspecto da formação do ser humano em suas diversas dimensões. (BRASIL, 2009a)

O Artigo 1º da Portaria Interministerial nº 17/2007 explicita a proposta do Programa:

O programa será implementado por meio do apoio à realização, em escolas e outros espaços socioculturais, de ações socioeducativas no contraturno escolar, incluindo os campos da educação, artes, cultura, esporte, lazer, mobilizando-os para a melhoria do desempenho educacional, ao cultivo de relações entre professores, alunos e suas comunidades, à garantia de proteção social da assistência social e à formação para a cidadania,

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incluindo perspectivas temáticas dos direitos humanos, consciência ambiental, novas tecnologias, comunicação social, saúde e consciência corporal, segurança alimentar e nutricional, convivência e democracia, compartilhamento comunitário e dinâmica de redes. (BRASIL, 2007)

A proposta orientadora do Programa prevê a valorização da diversidade cultural, articulando a comunidade e a escola no processo educativo. Também propõe a ampliação dos espaços educativos para outros espaços da comunidade, assumindo a perspectiva de “Cidade Educadora”, apontando a possibilidade de ampliar a educação para espaços públicos e sociais, como museus, parques, praças, cinema, teatro, entendendo que a educação se dá também em espaços não escolares e formais. (BRASIL, 2009b)

Quanto à configuração curricular proposta pelo Programa, para além da organização curricular fragmentada em turno e contraturno, considera-se necessária a progressiva construção de uma organização curricular integrada, que supere a separação entre turno regular e atividades complementares. Do mesmo modo, a relação não hierárquica entre os saberes escolares e os saberes comunitários é abordada na organização do currículo e da proposta pedagógica das escolas, que deve ter relação com o movimento da comunidade, a cultura, as experiências que a constituem e, que, portanto, constituem também a escola e a vida dos educandos que nela se inserem. (BRASIL, 2009c)

De acordo com o Texto Referência para o Debate Nacional (BRASIL, 2009a, p. 27)

(...) É necessário que o conjunto de conhecimentos sistematizados e organizados no currículo escolar também inclua práticas, habilidades, costumes, crenças e valores que estão na base da vida cotidiana e que, articulados ao saber acadêmico, constituem o currículo necessário à vida em sociedade.

Inicialmente, o Programa abrangeu regiões periféricas de cidades com mais de 200.000 habitantes, estudantes expostos a situações de risco e vulnerabilidade social, bem como instituições com Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB – inferior a 2,5. Na medida em que foi ocorrendo a ampliação do Programa e dos recursos, os critérios foram sendo alterados, englobando um número maior de escolas localizadas em cidades com número menor de habitantes, bem como instituições escolares localizadas no campo. Em 2013, o Programa chegou a um total de 49.483 escolas vinculadas no país. No Estado do Paraná, são 1.481 escolas vinculadas, sendo, destas, 774 unidades mantidas pelos municípios e 707 mantidas pelo Governo Estadual.

No Município de São João, as escolas vinculadas ao Programa Mais Educação em 2013 passaram a ofertar as atividades selecionadas somente em 2014 para todos os

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estudantes matriculados nas quatro instituições, mantendo a organização em turno e contraturno que já vinha sendo desenvolvida nos anos anteriores.

O Programa Mais Educação oferta atividades para serem desenvolvidas no turno ampliado, organizando-as por áreas do conhecimento em macrocampos. Como as quatro escolas do município localizam-se no campo, foram ofertados macrocampos específicos para estas escolas, sendo eles: Acompanhamento Pedagógico; Agroecologia; Cultura, Artes e Educação Patrimonial; Educação em Direitos Humanos; Esporte e Lazer; Iniciação Científica; Memória e História das Comunidades Tradicionais. As escolas poderiam optar por quatro atividades dentro dos macrocampos, sendo obrigatória a adesão à atividade Campos do Conhecimento, do Macrocampo Acompanhamento Pedagógico.

A tabela a seguir apresenta as atividades selecionadas nos macrocampos ofertados pelo Programa Mais Educação a cada uma das unidades escolares:

Tabela 1: Macrocampos e Atividades selecionadas pelas Escolas no PME:

Ano Macrocampo/Atividade

Escola Municipal do Campo Nossa Senhora de Fátima – EIEF

2012 Acompanhamento Pedagógico/Campos do Conhecimento

Cultura, Artes e Educação

Patrimonial/Práticas Circenses

Cultura, Artes e Educação

Patrimonial/Danças

Memória e História das Comunidades

Tradicionais/ Cineclube

2013 Acompanhamento Pedagógico/Campos do Conhecimento

Cultura, Artes e Educação

Patrimonial/Contos

Cultura, Artes e Educação

Patrimonial/Teatro

Esporte e Lazer/Brinquedoteca

Escola Municipal do Campo São Pedro – EIEF

2012 Acompanhamento Pedagógico/Campos do Conhecimento

Cultura, Artes e Educação

Patrimonial/Práticas Circenses

Cultura, Artes e Educação Patrimonial/Cineclube

Esporte e Lazer/Recreação e Lazer/

Brinquedoteca

2013 Acompanhamento Pedagógico/Campos do Conhecimento

Cultura, Artes e Educação

Patrimonial/Contos

Cultura, Artes e Educação

Patrimonial/Teatro

Esporte e Lazer/Brinquedoteca

Escola Municipal do Campo Imaculada Conceição – EIEF

2013 Acompanhamento Pedagógico/Campos do Conhecimento

Cultura, Artes e Educação Patrimonial/Cineclube

Educação em Direitos Humanos/

Arte Gráfica e Mídias

Esporte e Lazer/Ciclismo

Escola Municipal do Campo Nossa Senhora de Lourdes - EIEF

2013 Acompanhamento Pedagógico/Campos do Conhecimento

Cultura, Artes e Educação Patrimonial/Cineclube

Educação em Direitos Humanos/

Arte Gráfica e Mídias

Esporte e Lazer/Brinquedoteca

Fonte: Sistema Integrado de Monitoramento, Execução e Controle

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A organização das atividades selecionadas pelo Programa Mais Educação no currículo da Escola se dá por meio da adaptação delas aos espaços e recursos humanos disponíveis. Neste sentido, elas são incorporadas em atividades, já em prática, nas experiências, por exemplo, a ementa proposta para a atividade Arte Gráfica e Mídia e Cineclube é trabalhada na atividade Informática na Escola. As atividades atualmente em curso nas experiências de jornada ampliada do município são: Acompanhamento Pedagógico (Campos do Conhecimento), Artes, Artesanato, Circo, Coral, Dança, Esporte, Futsal, Informática, Italiano, Inglês, Horta, Recreação e Lazer, Leitura, Jogos de Mesa, Musicalização, Teatro e Violão.

A escolha das atividades, de acordo com o Projeto de Educação Integral do município seria realizada a partir de pesquisa envolvendo a participação dos pais, professores e alunos (SÃO JOÃO, 2010), no entanto, constata-se que o envolvimento de pais, alunos e inclusive do coletivo dos professores na seleção das atividades efetiva-se parcialmente ou não se efetiva no contexto escolar. O que tem se verificado é a avaliação das atividades em curso em um ano letivo para a definição da oferta (ou não) no próximo ano. Esta avaliação é realizada periodicamente por meio de questionários com os estudantes, abordando o que eles pensam a respeito de cada atividade. Com os professores, a educação em tempo integral é discutida nas reuniões de Conselho de Classe e Reunião Pedagógica, bem como, em reuniões anuais com a Equipe Pedagógica da Secretaria de Educação, nas quais ocorre um intenso debate a respeito do andamento das atividades de educação em tempo integral. A participação destes na seleção das atividades ofertadas pelo Programa, no entanto, centraliza-se mais na figura do diretor e da Equipe Pedagógica da Secretaria de Educação. O envolvimento dos pais na elaboração e definição do currículo e da Proposta Pedagógica não tem ocorrido nestas escolas.

A contratação de professores para atuar nas atividades é realizada, de acordo com o que prevê o Projeto de Educação Integral do Município (SÃO JOÃO, 2010), por meio da atribuição de carga horária extraordinária a professores efetivos do quadro municipal que já atuam na escola, ou mesmo que atuam em outras instituições, bem como por meio de Processo Seletivo Simplificado Municipal (PSS), para a classificação em ambos, segue-se critérios como: maior nível de formação e tempo de serviço. Também é realizada a contratação de estagiários pelo Centro de Integração Empresa Escola (CIEE) e de monitores, conforme prevê a proposta do Programa Mais Educação.

A centralização do trabalho do professor em uma única escola favorece a integração do trabalho pedagógico realizado por ele, assim como, possibilita avanços no sentido da articulação curricular entre as atividades e os conhecimentos que são trabalhados no turno regular e no contraturno, estabelecendo avanços no sentido da construção de um currículo integral. Percebe-se um esforço dos gestores no sentido de favorecer este tipo de contratação para o trabalho nas escolas de tempo integral.

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No entanto, a figura do estagiário e do monitor continua sendo indispensável no desenvolvimento das atividades. De acordo com o Manual Operacional de Educação Integral (BRASIL, 2013), o monitor deve ser, preferencialmente, estudante universitário com formação específica nas áreas de desenvolvimento das atividades ou pessoas da comunidade com habilidades apropriadas, além de estudantes do EJA ou Formação de Docentes que possam contribuir com competências e saberes. O trabalho do monitor configura-se em um trabalho voluntário, cuja remuneração aplica-se a gastos com transporte e alimentação.

A Proposta do Programa assume a contratação de monitores como meio para articular os saberes da comunidade, da universidade, do professor em formação, com os saberes da escola. No entanto, verifica-se uma precarização do trabalho destes sujeitos, que, em muitos casos não apresentam qualificação e formação para atuar nas atividades e, o que se agrava pelo fato de não haver por parte da rede a oferta de formação a esses educadores. Além disso, diante remuneração simbólica que recebem, acabam desmotivados para o desenvolvimento de um trabalho com qualidade, responsabilidade, criatividade e dedicação, como consequência, a rotatividade destes educadores torna-se alta.

Outro aspecto que se relaciona diretamente à qualidade do trabalho docente e a construção de uma proposta articulada e efetiva de educação integral é a formação dos profissionais e comunidade escolar em geral (pais, estudantes, funcionários, docentes, gestores e equipe pedagógica) para este trabalho, tanto no que se refere à inclusão destes no debate a respeito da concepção de educação integral e em tempo integral que se quer construir, quanto no que se refere à formação específica para atuar nas atividades diversificadas que a jornada ampliada acrescenta na escola, neste caso, direcionada aos professores.

Percebe-se que a educação em tempo integral tem sido implantada nas escolas da rede sem que se tenha propiciado sequer debates a respeito do tema, o que deflagrou, num momento inicial, sentimentos de rejeição à proposta por parte de pais, estudantes e inclusive professores. Da mesma forma, não houve nenhuma iniciativa em promover qualquer tipo de formação continuada para esses profissionais, acarretando uma série de entraves à efetivação de uma proposta de educação integral com qualidade no município.

O Programa Mais Educação também propõe a figura do Professor Comunitário, que deve ser designado entre os professores da escola para coordenar as atividades em tempo integral e articular os saberes comunitários e escolares, bem como, o trabalho pedagógico dos dois turnos da escola. Na rede municipal de São João, esta função vinha sendo desempenhada por um integrante da Equipe Pedagógica da Secretaria Municipal de Educação, que, além de coordenar a educação em tempo integral nas quatro unidades escolares, também acumulava outras funções, o que comprometia seu envolvimento com as práticas do cotidiano das escolas. Somente no ano letivo de

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2014, foi designado um professor com 20 horas semanais para coordenar as escolas de tempo integral, o que ainda pode dificultar o desempenho de suas funções, já que escola oferta atividades diariamente nos dois turnos.

O Caderno Rede de Saberes do Programa Mais Educação (BRASIL, 2009c) também ressalta a importância de reformular o Projeto Político-Pedagógico da escola, adequando-o a oferta da educação em tempo integral. Neste sentido, a definição das atividades, da concepção teórica e epistemológica de educação integral que a escola irá adotar deve ser discutida e definida coletivamente e, deste modo, assumida por todos os envolvidos para que se concretize e venha ao encontro das necessidades do contexto em que se efetiva. No entanto, assim como não foram propiciados momentos de debate e formação sobre o tema, a reformulação dos Projetos Políticos-Pedagógicos para o atendimento em tempo integral foi realizada pela Equipe Pedagógica do Departamento de Educação sem a participação dos coletivos escolares.

A rede municipal de educação garante aos docentes efetivos e contratados por PSS, ampliação de jornada 6 horas semanais para cada 20 horas de contrato, destinadas ao planejamento. No entanto, não foi possível organizar estes momentos de planejamento de modo que haja interação entre professores que atuam nas mesmas atividades e professores que atuam no turno regular com os que atuam no contraturno, o que favoreceria a articulação entre o trabalho pedagógico realizado na escola, possibilitando processos de integração curricular. Deste modo, os momentos de planejamento são organizados pelos diretores conforme disponibilidade dos horários de cada um, de forma fragmentada.

O único momento de discussão sobre a educação em tempo integral na rede é o encontro anual que é coordenado pela Equipe Pedagógica da Secretaria de Educação, no entanto, somente participam professores que atuam em atividades do contraturno, o que de certo modo, compromete o debate, pois não envolve professores do turno regular, contribuindo para acentuar a fragmentação entre as práticas desenvolvidas nos diferentes turnos da escola.

4 considEraçõEs finais

A educação em tempo integral no Município de São João tem sido progressivamente implantada nas instituições escolares do campo, oportunizando aos estudantes matriculados nestas instituições a participação a atividades esportivas, artísticas e culturais anteriormente distantes das possibilidades de acesso deles, uma vez que, por tratar-se de comunidades campesinas, a instituição escolar apresenta papel central como elemento de divulgação científica e cultural.

Garante-se, também, a estes estudantes, e em especial para aqueles com defasagem, mais tempo para a aprendizagem das diversas áreas do conhecimento, o que possibilita, por meio de uma formação mais ampla e diversificada, melhora no

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seu processo de formação. No entanto, visto que a educação em tempo integral é um processo em

construção no país, as experiências em andamento, na mesma medida em que buscam a ampliação qualitativa e do tempo escolar, enfrentam dificuldades inerentes à própria estrutura física e pedagógica instituída na escola.

Neste sentido, verifica-se dentre os principais desafios à construção de uma proposta de educação integral e em tempo integral, principalmente, a ausência de processos de formação continuada para a comunidade escolar, aspecto crucial para possibilitar mudanças, para inovar o modo como se constrói e efetivam as práticas pedagógicas na educação integral.

Também se observa que o currículo permanece com uma organização tradicional, fragmentado, sem maiores articulações e mudanças no sentido de atender à proposta da educação integral contida no PME e na Proposta de Educação Integral do município. Do mesmo modo, a ausência de uma proposta político-pedagógica específica para as escolas de tempo integral, construída coletivamente, tanto por professores do turno regular quanto do contraturno, envolvendo pais, estudantes e funcionários, fragmenta e enfraquece os processos formativos, produzindo o efeito “mais do mesmo”, em que o tempo escolar ampliado não produz mudanças nas práticas escolares como um todo, tendendo a repetir no contraturno o mesmo formato do turno regular.

O caminho na construção de novas dinâmicas escolares é sempre complexo, pois exige desconstrução e renovação da estrutura escolar, o que esbarra em questões estruturais, financeiras e pedagógicas. O modo como tem se dado a ampliação da jornada escolar na rede municipal de São João representa bem este processo, no entanto, somente ao se deparar e enfrentar estas questões será possível modificar os processos educativos e avançar em direção a uma escola em jornada ampliada que possibilite a formação integral de seus educandos.

rEfErências

BRASIL. Decreto nº 7.083, de 27 de Janeiro de 2010, dispõe sobre o Programa Mais Educação, Diário Oficial da União. Brasília, D.F, 2010.

_______. Lei n, 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez. 1996.

_______. Ministério da Educação. Educação Integral: Texto referência para o debate nacional. MEC: Brasília, 2009a. (Série Mais Educação).

_______. Ministério da Educação. Gestão Intersetorial no Território. MEC: Brasília, D.F. 2009b. (Série Mais Educação).

________. Ministério da Educação. Manual Operacional de Educação Integral. MEC: Brasília,

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D.F. 2013.

________. Ministério da Educação. Rede de Saberes Mais Educação: Pressupostos para projetos pedagógicos de educação integral. MEC: Brasília, D.F. 2009c. (Série Mais Educação).

_______. Portaria Normativa Interministerial nº. 17, de 20 de abril de 2007. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2007.

SÃO JOÃO. Projeto de Educação Integral. Secretaria Municipal de Educação de São João, 2010.

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A IMPLEMENTAÇÃO DA EDUCAÇÃO INTEGRAL NO MUNICÍPIO DE CHOPINZINHO,

PARANÁ

Zeloir Aparecida Scabeni Mendes

1 introdução

O Município de Chopinzinho localizado na microrregião de Pato Branco e na mesorregião do Sudoeste do Paraná, distante 409 km da capital Curitiba, conta com uma população de 20.077 habitantes.

No ano de 2005, era possível observar pelas ruas do Município de Chopinzinho, uma parcela de crianças em situação de vulnerabilidade social. Em contato com pais e educadores destacava-se a preocupação com a defasagem na aprendizagem de várias crianças. Tornava-se necessário oportunizar situações de cuidado, de segurança e de aprendizado diferenciado a essas crianças.

Objetivando garantir proteção e desenvolvimento integral as suas crianças a administração municipal juntamente com uma equipe de educadores, analisou a possibilidade de ampliação do tempo na escola para que o período ocioso das crianças fosse ocupado com atividades educativas. A equipe analisou práticas pedagógicas em desenvolvimento e planejou ações diferenciadas de aprendizagem para elevar a qualidade do ensino ofertado. Decidiram colocar as crianças no centro das políticas públicas, afirmando-as como sujeitos de direito e assumindo como prioridade o atendimento a suas necessidades.

O município passou a desenvolver o Projeto de Educação em Tempo Integral que apresenta como objetivo principal: proporcionar uma educação voltada ao desenvolvimento integral do educando, visando à aquisição de conhecimentos, habilidades e valores, elevando a qualidade do ensino e favorecendo a formação do verdadeiro cidadão por meio da ampliação de tempos, espaços e oportunidades educativas.

A educação das crianças é a tarefa mais importante da nossa

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vida. Nossos filhos são os futuros cidadãos do país e do mundo. Eles serão os forjadores da história. [...] educar uma criança correta e normalmente é mais fácil que reeducá-la. Uma educação correta a partir da mais tenra idade não é tarefa muito difícil como muitos acreditam. Não há pai nem mãe que não possa realizá-la com facilidade se realmente nela se empenha, e, por outro lado, é uma tarefa gratificante, agradável, feliz. (MAKARENKO, 1981, p.17)

Educar significa propiciar situações de cuidados, brincadeiras e aprendizagens orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o desenvolvimento das capacidades infantis de relação interpessoal, de ser e estar com os outros em uma atitude básica de aceitação, respeito e confiança.

Planejou-se construir uma escola capaz de assumir e de se comprometer com o desenvolvimento integral da criança, pautada em valores humanos, compreendendo a educação como uma tarefa de todos (família, professores, comunidade escolar e sociedade).

2 a implantação da primEira Escola Em tEmpo intEGral

O local escolhido para a implantação da primeira escola foi bem centralizado, com área verde disponível e por onde passava toda a linha de transporte escolar para que fosse possível trazer os alunos de todos os bairros. Foi organizado o espaço (adaptações de espaço físico, aquisição de materiais didáticos, pedagógicos e de expediente) e convidada uma equipe de profissionais para iniciar o projeto.

Com o objetivo de oferecer à sociedade um ensino que priorizasse os conhecimentos específicos da grade curricular e condicionasse a oportunidade do aprendizado integral com diversas oficinas dando a todos os participantes a oportunidade do desenvolvimento pleno nas mais diversas áreas do conhecimento humano, foi criada a “Escola Municipal de Excelência”.

A escola iniciou suas atividades atendendo, aproximadamente, a 25 alunos por turma, séries iniciais do Ensino Fundamental, da 1ª à 4ª séries (na época), em turno único, iniciando as atividades às 7h40min e encerrando às 17horas.

A Escola Municipal de Excelência foi contemplada com o Programa Integração AABB Comunidade, tendo como maior parceiro o Banco do Brasil. O Programa consiste em uma proposta de complementação educacional, baseada na valorização da cultura do educando e de sua comunidade, fundamentada no Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Essa complementação é efetivada por meio de atividades lúdicas desenvolvidas em áreas como saúde e higiene, esporte e linguagens artísticas, possibilitando a construção de conhecimentos e o acesso à cidadania.

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3 o rEspaldo lEGal da Educação Em tEmpo intEGral

A oferta de Educação em Tempo Integral encontra respaldo legal na Constituição Federal, artigos 205, 206, e 207; Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº 9.089/90; LDB 9394/96, artigos 34 e 87; PNE, Lei 10.172/01; Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação e de Valorização dos Profissionais da Educação, Lei nº 11.494/07 e Resolução CNE/CEB Nº 7/10.

Para ofertar Educação em Tempo Integral em Chopinzinho, foi necessário, antes de tudo, assegurar o atendimento a todas as necessidades exigidas pela universalização do Ensino Fundamental, analisando de forma criteriosa os recursos públicos municipais e considerando o disposto no artigo 157, da Lei Orgânica Municipal,

Art.157 – § 2º – A distribuição dos recursos assegurará, prioritariamente, o atendimento das necessidades do ensino obrigatório, com a implantação gradativa do ensino em tempo integral, em caráter optativo pelos pais ou responsáveis, nos termos do sistema nacional, estadual e municipal de educação. (Lei Orgânica Municipal, 2006, p. 91)

A primeira experiência de ampliação do tempo de permanência das crianças na escola e oferta de atividades diferenciadas, denominadas oficinas pedagógicas, estava obtendo sucesso. A administração objetivou ofertar educação integral em todas as escolas gradativamente. O regime de funcionamento, desde então, segue o disposto no Artigo 24 da LDB 9694/96 que estabelece:

Art. 24 – A educação básica, no nível fundamental e médio, será organizada de acordo com as seguintes regras comuns: I – a carga horária mínima anual será de oitocentas horas, distribuídas por um mínimo de duzentos dias de efetivo trabalho escolar, [...]; Art. 34 – A jornada escolar no ensino fundamental incluirá pelo menos quatro horas de trabalho efetivo em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o período de permanência na Escola. [...] O ensino fundamental será ministrado progressivamente em tempo integral, a critério dos sistemas de ensino.

No contexto em que se preconiza a Educação Integral, o projeto político-pedagógico é construído considerando as experiências que são vividas na escola, sem ficar restrito ao ambiente de sala de aula e aos conteúdos que representam os conhecimentos científicos. O trabalho desenvolvido oferece às crianças diferentes

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linguagens, valorizando suas vivências, modificando o próprio ambiente escolar e produzindo conhecimento.

4 orGaniZação E Estrutura das Escolas Em tEmpo intEGral

O Município de Chopinzinho iniciou o projeto de implantação em 2005, atendendo, aproximadamente, a cem alunos – Escola Municipal de Excelência. No ano de 2007, inaugurou-se a Escola Municipal Maria Evanira Silvério para atender a mais 130 alunos, em turno único.

A partir do ano de 2008, o projeto foi sendo expandido para as demais escolas, ofertando-se Educação em Tempo Integral para os educandos que apresentassem interesse ou necessidade em permanecer o dia todo na escola. Atualmente duas escolas ofertam educação integral em turno único e nove escolas ofertam jornada ampliada. Nas Escolas de Tempo Integral – Turno Único – é obrigatória a frequência de todos os alunos o dia todo. Nas Escolas com Jornada Ampliada, a modalidade é opcional, sendo que o aluno pode frequentar o ensino regular em um turno e fazer a opção pela educação integral no turno contrário, permanecendo o dia todo na escola.

A Administração Municipal objetivou ofertar a modalidade em todas as escolas da rede e conseguiu efetivar o processo de implantação de Educação em Tempo Integral no ano de 2012.

Tabela – Processo de Integralização das Escolas Municipais

ESCOLAS MUNICIPAIS Data de Integralização

Escola Municipal de Excelência 02/03/2005

Escola Municipal Maria Evanira Silvério 12/03/2007

Escola Municipal Presidente Tancredo Neves 10/04/2008

Escola Municipal Coronel Santiago Dantas 16/07/2008

Escola Municipal Tasso Azevedo da Silveira 04/05/2009

Escola Rural Municipal Visão do Futuro 03/08/2010

Escola Rural Municipal Presidente Costa e Silva 02/05/2011

Escola Rural Municipal Nilo Peçanha 16/05/2011

Escola Rural Municipal Professora Angélica Dalla Costa Battistuz

27/03/2012

Escola Rural Municipal Prudente de Moraes 09/04/2012

Escola Rural Municipal Mário Béttega 04/05/2012Fonte: Secretaria Municipal de Educação de Chopinzinho, PR

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O Sistema Municipal de Ensino aprovou o desenvolvimento das atividades educativas e pedagógicas em todas as escolas municipais – Ensino Fundamental (séries iniciais).

O período educativo compreende nove horas e meio diárias, sendo o início das atividades às 7h30min e encerramento às 17 horas. As crianças permanecem no horário do almoço, oferecido na própria escola, sendo este compreendido como parte das atividades pedagógicas, estando sob a responsabilidade de profissionais educadores no ambiente escolar.

Na Base Nacional Comum os conteúdos curriculares estão organizados por área de conhecimento, sendo respectivamente: Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Ensino Religioso. A Parte Diversificada é composta por sete Macrocampos que contemplam trinta e oito Oficinas Pedagógicas. O Projeto apresenta ementas que orientam os profissionais educadores em relação ao trabalho educativo com os alunos.

Pela análise de sua realidade as escolas planejam e escolhem as oficinas pedagógicas que são mais adequadas ao trabalho educacional que objetivam desenvolver.

A Secretaria Municipal de Educação disponibiliza todos os recursos materiais necessários ao desenvolvimento das oficinas, auxilia na organização dos espaços físicos e no arranjo de novos espaços e coordena o processo pedagógico e de formação de professores.

A escolha por macrocampos aconteceu, em 2013, seguindo orientações da legislação vigente (Núcleo Regional de Educação, SEED e Governo Federal), contemplando a concepção de Educação Integral em nível nacional, bem como as ações do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) que propõe a participação no Programa Mais Educação, sendo esta uma das políticas públicas que auxiliam escolas e municípios a desenvolver esta nova modalidade de educação.

A Secretaria Municipal de Educação segue as normas citadas, promovendo e organizando um arranjo educativo próprio, somando-o às condições oferecidas pelo Programa Mais Educação, reconhecendo que a temática educação integral está pautada no conjunto de políticas para qualificação da educação e conta com uma agenda pública nacional.

As escolas que estão cadastradas no Programa Mais Educação desenvolvem as atividades previstas de acordo com o plano de atendimento que elaboraram juntamente com sua equipe. As escolas podem ainda, escolher outras atividades (oficinas pedagógicas) de outros macrocampos que compõem o Projeto de Educação em Tempo Integral do município para completar o trabalho educativo, visto que o tempo de permanência das crianças na escola é de nove horas e meia.

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MACROCAMPOS OFICINAS PEDAGÓGICAS

1 Acompanhamento/Aprofundamento Pedagógico

Orientação de Estudos e Leitura (Alfabetização/Letramento, Matemática,Língua Portuguesa: ênfase em Leitura e Produção de Texto; Ciências, História, Geografia e Línguas Estrangeiras)

2 Educação Ambiental, Desenvolvimento Sustentável e Economia Solidária e Criativa/

Educação Econômica

Horta Escolar e/ou ComunitáriaJardinagem EscolarEconomia Solidária e Criativa/Educação EconômicaUso eficiente da Água e Energia

3 Esporte e Lazer

Corrida de Orientação – Esporte na Escola/Atletismo e Múltiplas Vivências Esportivas (basquete; futebol; futsal; handebol; tênis de mesa; voleibol; xadrez tradicional e xadrez virtual) Tae kwon do – Ginástica Rítmica Recreação e Lazer/Brinquedoteca

4 Cultura, Artes,Educação Patrimonial

Artesanato Popular – Canto Coral – Danças – Desenho – Educação Patrimonial – Hip-Hop – Iniciação Musical de Instrumentos de Cordas – Iniciação Musical por meio de Flauta Doce – Leitura: organização de Clubes de Leitura Mosaico – Pintura – Práticas Circenses – Teatro

5 Promoção da Saúde Promoção da SaúdePrevenção de Doenças e Agravos à Saúde

6 Comunicação, Uso de Mídias,Cultura Digital e Tecnológica

Fotografia – História em Quadrinhos – Jornal Escolar – Rádio Escolar – Vídeo – Tecnologias Educacionais

7 Educação em Direitos Humanos Educação em Direitos Humanos

O tempo médio de realização das oficinas, maior que a duração das aulas regulares do núcleo comum e sua organização com número menor de alunos em relação às classes regulares favorecem bons resultados.

A oficina escolar é uma das metodologias criadas por Freinet para organizar as vivências em sala de aula. Nessa metodologia está contemplada a sua concepção de criança [...] vista como um ser histórico, um ser afetivo, um ser

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inteligente e criador de cultura como o adulto, artífice de seu próprio desenvolvimento e saber. Não adota a imagem de uma criança que aprende por abstração, mas que adquire os conhecimentos como alguém que está imerso na realidade e que participa intensamente do cotidiano. (ELIAS E SANCHES, 2007)

No passado,

A palavra “oficina” era utilizada para nomear um espaço no qual o artesão ensinava o aprendiz a fazer algo, um trabalho, um ofício. Nessa situação o aprendiz aprendia “fazendo”. Essa palavra é usada hoje, na prática educativa, para denominar um jeito de ensinar e aprender baseado no princípio do “aprender fazendo”. (CENPEC, 2009, p. 61)

O trabalho pedagógico desenvolvido nas oficinas fortalece o respeito às diferenças individuais sendo que o tempo é fator importante, pois na oficina o tempo disponibilizado para cada criança aprender é diferente. A aprendizagem acontece por meio da interação e da troca de saberes, o trabalho coletivo ganha lugar, porque as pessoas aprendem mais umas com as outras.

As atividades desenvolvidas nas Oficinas Pedagógicas têm como base a interdisciplinaridade e a articulação curricular com as áreas de conhecimento da Base Nacional Comum, privilegiando o aproveitamento qualitativo do tempo educativo na “perspectiva de que o horário estendido represente uma ampliação de oportunidades e situações que promovam aprendizagens significativas” (GONÇALVES, 2006, p. 4), enriquecendo o currículo e tendo o professor e sua ação docente como mediadores desse processo.

Os coordenadores pedagógicos das escolas acompanham o planejamento das aulas das oficinas pedagógicas, oportunizando meios de integração entre os professores da escola. Quando a escola estrutura coletivamente o processo de aprendizagem ofertado aos seus alunos, identifica os pontos positivos do trabalho e planeja as ações e as intervenções necessárias para o sucesso de cada aluno.

As unidades escolares elaboram propostas de trabalho para atender aos alunos que apresentam defasagens de aprendizagem e aqueles que necessitam de atendimento educacional especializado para que tenham seus direitos garantidos na escola e que seu processo educativo aconteça de modo significativo.

O compromisso com as crianças e a preocupação com a aprendizagem, assim como a seriedade com o princípio da inclusão e o respeito a todos os aprendizes asseguram uma ação didática que contempla o acompanhamento necessário e um currículo inclusivo.

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Em relação aos macrocampos, o Acompanhamento Pedagógico é obrigatório, portanto, desenvolvido em todas as escolas. É um macrocampo que desenvolve, por meio de suas oficinas, atividades com o objetivo de melhorar o desempenho escolar favorecendo a compreensão de conceitos e procedimentos escolares, incentivando a leitura e o hábito dos estudos. Exige comprometimento de todos os educadores com o avanço das capacidades de comunicação, interpretação e expressão das crianças e do mesmo modo o ato de ler, escrever, ouvir e falar que são competências transversais a todas as dimensões do conhecimento e que não estão circunscritas ao estudo da Língua Portuguesa, uma vez que é a chave para a aprendizagem em qualquer dimensão.

As atividades desenvolvidas no Macrocampo Cultura, Arte e Educação Patrimonial,

[...] partem da noção de que a arte potencializa o desenvolvimento cognitivo, afetivo e simbólico envolvido no ato de conhecer, bem como potencializa o desenvolvimento individual a partir de processos de identificação cultural. A educação patrimonial é essencial à democratização do acesso, benefícios e resultados que provoca em termos de desenvolvimento humano e aprendizagens. Pela amplitude de seus campos conceituais – criação/produção, percepção/análise e conhecimento da produção – fornecem elementos para o conhecimento da forma de pensar e sentir presente nos diferentes países, épocas e povos. Possibilitam ainda compreender as várias culturas e o eu de cada criança. (CENPEC, 2009, p.49)

A participação dos alunos nas oficinas pertencentes ao Macrocampo Cultura e Arte desenvolve consideravelmente a atenção e a concentração, contribuindo significativamente para a evolução da sua aprendizagem. Todas as escolas ofertam oficina pedagógica de artesanato popular e grande parte dos alunos apresenta interesse pelo aprendizado das técnicas artesanais, aperfeiçoando suas habilidades manuais, seu raciocínio e explorando sua criatividade, além da produção de belíssimos trabalhos.

Outra oficina que tem apresentado resultados positivos é a oficina de dança. Entre os vários ritmos trabalhados nas escolas a dança circular tem se apresentado como novidade e está conquistando e motivando alunos, professores e funcionários, proporcionando prazer, socialização, afetividade e alegria, melhorando o clima escolar.

Do mesmo modo, a oficina de prática circense que além de empolgar e envolver os alunos e toda a comunidade escolar pela beleza das acrobacias desenvolve habilidades físicas, motoras, espírito de equipe e trabalho coletivo.

As oficinas ligadas ao Macrocampo Esporte e Lazer

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[...] oferecem práticas diversas como modalidades esportivas, jogos, ginástica, dança e situações lúdicas. A oferta de atividades motoras e esportivas visa desenvolver as potencialidades físicas individuais (respeitando-se as características pessoais) e a socialização a partir da construção de regras e estratégias de associação e colaboração. As diversas modalidades ofertadas buscam, além de ampliar o repertório motor das crianças, propiciar vivências para o desenvolvimento de valores e atitudes como respeito, cooperação, solidariedade, confiança, senso crítico; atitudes positivas em relação ao ambiente escolar e a convivência coletiva; além de incutir noções de saúde, higiene, participação e cidadania. (CENPEC, 2009, p. 50)

Nas atividades ligadas à Cultura Digital, as crianças são estimuladas a fazer uso dos recursos das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs), sendo que as oficinas são muito disputadas e valorizadas pelos alunos, devido à diversidade de aprendizagens que permitem.

As atividades desenvolvidas pelas escolas buscam a integração entre os saberes da família e da comunidade. Os Macrocampos Educação Ambiental, Desenvolvimento Sustentável e Economia Solidária e Criativa Educação Econômica; Promoção da Saúde e Educação em Direitos Humanos têm por objetivo possibilitar as crianças estabelecerem conexões, a partir de sua realidade e sua história com as diversas áreas do conhecimento. As atividades se estruturam a partir de relações entre saberes escolares e comunitários.

5 o traBalHo pEdaGÓGico

A organização das atividades contempla em um dos turnos atividades da Base Nacional Comum, ministradas pelo professor regente com formação em magistério ou pedagogia e pelo professor de Educação Física. O almoço é servido na escola e no outro período os alunos participam de oficinas pedagógicas coordenadas por professores com habilidades na área de atuação.

Há parceria com a Secretaria Municipal de Esportes em relação ao trabalho dos profissionais e à utilização dos espaços: ginásios, quadras esportivas, praças e parquinhos, bem como parcerias com as comunidades e associação de moradores nos bairros, onde são utilizados centros comunitários e campos de futebol. Os profissionais que atuam nas demais oficinas pedagógicas são, em sua maioria, estudantes do Curso de Pedagogia, Educação Física, Artes Visuais e de Formação de Docentes.

O horário do almoço é computado como carga horária de efetivo trabalho escolar porque é apresentado na proposta pedagógica curricular, sendo passível de controle

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de frequência e de responsabilidade de corpo docente habilitado, conforme Parecer nº 02/2003 CNE/CEB.

Durante o almoço as crianças são orientadas nos seguintes aspectos: cuidados com a alimentação, utilização adequada dos utensílios; comportamento durante as refeições e no refeitório. Após almoçarem são orientados na escovação dos dentes e sobre a importância desse hábito de higiene no seu cotidiano. Em seguida têm como opção de atividades: assistir à televisão; momento de descanso na sala de aula utilizando para isso colchonetes, almofadas e tapetes ou podem desfrutar de momento livre no pátio ou saguão da escola e realizar brincadeiras.

As atividades da parte diversificada envolvem maior ludicidade e atenção ao trabalho coletivo. Aprender a viver em sociedade tendo sua individualidade respeitada, evidenciando elementos constitutivos na formação do ser humano como o respeito, a sensibilidade, a amizade, a responsabilidade, a cortesia no tratamento para com os demais.

5.1 articulação EntrE as atividadEs

Todos os educadores são orientados em relação à composição de uma oficina, objetivos, metodologia, bem como a importância da articulação das atividades nela desenvolvidas com aquelas desenvolvidas no currículo regular, para que essa metodologia não se torne um conjunto de atividades desarticuladas e sem objetivo. Além disso, identificar e acompanhar os resultados que vão sendo obtidos no processo torna-se vital para legitimar o trabalho da oficina pedagógica.

Quando o ensino é trabalhado de forma interdisciplinar, o currículo é menos fragmentado despertando o interesse e a curiosidade das crianças, pois o que se estuda sempre está vinculado a questões reais e práticas, estimulando-os a analisar os problemas reais e a procurar alguma solução para eles, incentivando a formação de pessoas criativas e inovadoras.

Tomando como inspiração o Texto Desencadeador do Debate Nacional sobre a Política Curricular da Educação Básica (2012), orienta-se que as ações do Projeto de Educação em Tempo Integral sejam trabalhadas na perspectiva da formação integral dos sujeitos e que, portanto, reconheçam os educandos como produtores de conhecimento, priorizando os processos capazes de gerar sujeitos inventivos, autônomos, participativos, cooperativos e preparados para diversas inserções sociais, políticas, culturais, capazes de intervir e problematizar as formas de produção na sociedade atual.

Na perspectiva de uma educação integral torna-se fundamental a atenção à indissociabilidade do educar/cuidando ou do cuidar/educando, que incluem acolher, garantir segurança e alimentar a curiosidade, a ludicidade e a expressividade das crianças, reafirmando os três princípios:

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I – Éticos: de justiça, solidariedade, liberdade e autonomia; de respeito à dignidade da pessoa humana e de compromisso com a promoção do bem de todos, contribuindo para combater e eliminar quaisquer manifestações de preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.II – Políticos: de reconhecimento dos direitos e deveres de cidadania, de respeito ao bem comum e à preservação do regime democrático e dos recursos ambientais; da busca da equidade no acesso à educação, à saúde, ao trabalho, aos bens culturais e outros benefícios; da exigência de diversidade de tratamento para assegurar a igualdade de direitos entre os alunos que apresentam diferentes necessidades; da redução da pobreza e das desigualdades sociais e regionais.III – Estéticos: do cultivo da sensibilidade juntamente com o da racionalidade; do enriquecimento das formas de expressão e do exercício da criatividade; da valorização das diferentes manifestações culturais, especialmente a da cultura brasileira; da construção de identidades plurais e solidárias. (Resolução nº07/10 – CNE/CEB que estabelece as DCN’s para o Ensino Fundamental de nove anos, art. 6º)

A educação escolar integral não pode desvalorizar o aspecto afetivo presente nos processos educacionais. As estratégias de ensino permitem olhar para as crianças de forma inteira, contemplar o modo como se expressam considerando a grande diversidade e incentivando experiências variadas, inclusive experiências desenvolvidas em conjunto por escolas, organizações e comunidades.

As atividades desenvolvidas devem permitir o desabrochar da sensibilidade, do pensamento, da criação, melhorar a comunicação entre as pessoas, ampliar as leituras de mundo e de repertórios educando para a paz.

6 a prEsEnça do profEssor

O tempo ampliado para oportunizar mais aprendizagens às crianças está diretamente relacionado ao tempo que o professor precisa para ampliar seu conhecimento em relação à escola de tempo integral, para compreender a amplitude da sua formação educativa.

É importante que o professor analise contextos além da escola, que conheça o contexto da educação integral no país e em especial no Município de Chopinzinho, concebendo os princípios que direcionam para a efetivação de um ideal de formação humana.

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A formação do professor e dos demais profissionais que atuam na escola de educação em tempo integral é decisiva para que o projeto obtenha sucesso. Desta forma, o professor e a escola contribuem de modo mais significativo para o desenvolvimento da criança e de suas capacidades de apropriação e conhecimento das potencialidades corporais, afetivas, emocionais, estéticas e éticas, colaborando para a formação de crianças felizes e saudáveis.

O papel dos educadores é viabilizar as aprendizagens, criando condições favoráveis de ensino. É mostrar que aprender faz parte da vida e que por isso mesmo, pode e deve ser algo prazeroso e desafiador que, no final das contas, vai ter significados importantes na vida de cada pessoa. (PADILHA, 2009, p.11)

Para garantir aprendizagem adequada “[...] faz parte da definição da Educação em Tempo Integral a qualidade docente, que considero a condição primordial para o sucesso deste tipo de proposta” (DEMO, 2008, p.07). A formação continuada do professor é considerada primordial para que este profissional esteja habilitado a trabalhar com os alunos da escola de educação em tempo integral.

O trabalho pedagógico depende de planejamento por parte do professor e de sua ação pedagógica, organizando informações sobre as crianças, selecionando materiais de uso e desenvolvendo metodologias diferenciadas para envolver cada criança no processo de ensino. Estes são pilares básicos para que as intenções docentes sejam concretizadas e todas as crianças aprendam o que lhes é de direito.

A relação professor-aluno é pautada no respeito, no afeto, no diálogo, na valorização de conhecimentos, e acima de tudo no compromisso com uma aprendizagem significativa baseada em valores humanos. Além disso, estimula ações solidárias, onde aluno e professor aprendem a ser tolerantes e socialmente afetivos.

7 novos dEsafios da Escola dE tEmpo intEGral no municÍpio dE cHopinZinHo

A educação integral impõe o desafio de tratar o conhecimento de forma multidimensional, exige um planejamento de ensino capaz de fazer composições entre diversos campos do conhecimento. Pressupõe a integração de saberes, contextualizando-os e favorecendo o estabelecimento de relações (local/global, partes/todo, presente/passado) para que as crianças aprendam a organizar e reorganizar continuamente o conjunto de informações e experiências que encontram na escola e fora dela.

Devido ao processo de integralização da educação em todas as instituições de ensino das séries iniciais e também a existência de cinco CMEIs (Centros Municipais de Educação Infantil) em tempo integral a demanda por educadores no município

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é grande. Há poucos profissionais com habilitação em música, teatro e língua estrangeira e observa-se ainda, rotatividade de professores entre a Rede Municipal e a Rede Estadual de Ensino.

Outro diferencial encontra-se nas formas variadas de contratação – ampliação de carga horária para professores efetivos; empresa terceirizada; contratos na forma de bolsa auxílio para estagiários e Programa Mais Educação.

Estas particularidades interferem significativamente no desenvolvimento do Projeto de Educação em Tempo Integral. Várias vezes a sequência do trabalho é interrompida porque o profissional mudou de rede de ensino e o trabalho é recomeçado por outro. Soma-se ainda o tempo de adaptação professor/aluno/escola e vice-versa. Outras vezes não há profissional com habilidade para dar continuidade a oficina que estava em desenvolvimento na escola, fazendo-se necessário novo arranjo educativo.

O trabalho desenvolvido pelos profissionais educadores envolve analisar significativamente a realidade e planejar ações educativas que representem uma educação formadora para a vida, com as quais a escola passa a ser o centro formativo, transforma-se como espaço de referência dos direitos de cidadania da população. Para tanto, é necessário que todos aqueles que convivem no espaço escolar compreendam sua função educativa e envolvam-se no planejamento coletivo, sendo este um ideal constante.

A formação de professores e de coordenadores pedagógicos envolve a reflexão sobre a prática pedagógica da educação integral; o estudo e o planejamento de ações de ensino e aprendizagem; o desenvolvimento de atividades que envolvam a comunidade escolar e, principalmente, a integração dos professores que atuam na Educação em Tempo Integral em escolas municipais, socializando conhecimentos e compartilhando experiências.

Observa-se que é fundamental um planejamento coletivo sobre os caminhos da educação integral no município e um constante repensar sobre a utilização dos espaços físicos para enriquecer o processo educativo.

A Educação em Tempo Integral que se está conhecendo, desenvolvendo e construindo no Município de Chopinzinho deve ser vista como fenômeno cultural. É importante analisar as suas manifestações e concepção para compreender a relação ensino-aprendizagem nesta modalidade de ensino, o despertar do aprendente e do ensinante para o ato de buscar o saber e a autonomia, o respeito ao outro e a vivência coletiva.

7 considEraçõEs finais

Estar mais tempo na escola significa ter mais tempo para conhecer os alunos, observar e acompanhar de perto seu desenvolvimento, seu aprendizado e estimular o desabrochar de suas potencialidades. Neste sentido, a educação integral contempla maior número de profissionais envolvidos com o processo educativo, dando atenção especial a cada

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criança, oferecendo oportunidades e situações variadas e significativas de aprendizagem. Oportuniza ainda, condições dignas de acesso e permanência para as crianças na escola, alimentação adequada, materiais de boa qualidade, evitando a exclusão e a marginalidade e elevando a qualidade de ensino.

Para que a educação seja um direito de todos e de cada um deve ser construída por meio do diálogo com toda a comunidade escolar, desta forma a prática pedagógica será planejada de modo a possibilitar acesso ao conhecimento e estabelecerá vínculos com o local onde as crianças vivem.

A implantação da educação integral em todas as escolas do município foi um enorme desafio. A ampliação do tempo de permanência das crianças na escola exigiu rever, refletir e replanejar o processo de ensino em desenvolvimento, bem como a formação das equipes de profissionais e o investimento de recursos na educação. O contexto de estruturação dos espaços físicos das escolas envolveu planejamento, novos arranjos educativos e grande dedicação, paciência e criatividade de todos os profissionais.

Os alunos têm apresentado grandes progressos em sua aprendizagem, demonstrado e descoberto novas habilidades e capacidade de aprendizagem. Pela participação das atividades nas oficinas pedagógicas estão se desenvolvendo de forma integral, se descobrindo como pessoas e valorizando sua cultura, seu contexto.

As atividades desenvolvidas nas escolas são pautadas em valores humanos e desta forma, alunos e professores aprendem e realizam, o tempo todo, ações solidárias e de respeito ao outro e a vida. As atividades artísticas e culturais têm despertado criatividade, sensibilidade e valorização pelas diversas formas de cultura, de trabalho e de aprender.

Muitas destas experiências foram proporcionadas a partir da adesão ao Programa Mais Educação, ao qual se associou política pública e trabalho pedagógico, numa parceria em que a escola tem autonomia para coordenar o processo educativo e os alunos têm suas necessidades atendidas e são bem orientados em sua formação.

Os professores têm apresentado motivação e interesse em participar de concursos municipais, regionais e estaduais, estão observando o resultado do seu trabalho e sendo reconhecidos por ele, pois os alunos estão aprendendo. Sua dedicação tem sido ampliada também em relação à formação continuada, estão buscando conhecimento e desta forma o trabalho pedagógico será enriquecido.

A educação integral é um projeto que vai auxiliar as crianças a construir um projeto de vida pessoal, contribuirá para a sua formação humana. As crianças que têm acesso a uma educação de qualidade desenvolvem mais autonomia, tornam-se mais críticas e vão atuar positivamente na sociedade. A educação em tempo integral representa oportunidades educativas, cuidado, democratização do ensino e desenvolvimento do Ser Humano em sua integralidade.

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rEfErências

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CORÁ, Élsio José; LOSS, Adriana Salete; BEGNINI, Sérgio (Orgs). Contribuições da UFFS: para educação integral em jornada ampliada – Chapecó, 2012.

DEMO, Pedro. Algumas condições da escola de tempo integral. Mediação, Porto Alegre, 2008.

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MOREIRA, Antônio Flávio Barbosa – Indagações sobre currículo: currículo, conhecimento e cultura Antônio Flávio Barbosa Moreira; Vera Maria Candau; organização do documento Jeanete Beauchamp; Sandra Denise Pagel; Aricélia Ribeiro do Nascimento. – Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2007.

PADILHA, P. R. Currículo Intertranscultural. Novos itinerários para a educação. São Paulo: Cortez: Instituto Paulo Freire, 2004.

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RABELO, Marta Klumb Oliveira. Educação Integral como política pública: a sensível arte de (re)significar os tempos e os espaços educativos. In: MOLL, Jaqueline et al. Caminhos da educação integral no Brasil: direito a outros tempos e espaços educativos. Porto Alegre: Penso, 2012. p. 118-128.

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ACOMPANHAMENTO DO PROGRAMA MAIS EDUCAÇÃO NO MUNÍCIPIO DE VACARIA RSENSAIOS PARA UMA EDUCAÇÃO INTEGRAL

EM TEMPO INTEGRAL

Viviane Prux Branco1

1 introdução

Antes de iniciar os relatos sobre a educação do nosso município se faz necessário uma breve contextualização. Vacaria hoje conta com 61.345 mil habitantes, distribuídos em uma área de 2.124 Km² em seis distritos além da sede. Distante a 240 km da capital, Porto Alegre, o Município de Vacaria está localizado ao norte do Estado na divisa com Santa Catarina, sendo assim considerado como a “Porteira do Rio Grande”. Reconhecido pelo seu tradicional Rodeio Crioulo Internacional, é também cortado pelas BR 285 e BR 116, o que torna nosso município bem conhecido pelo transporte de cargas.

Nossa rede de ensino compreende um total de 6.239 educandos devidamente matriculados em 10 (dez) Escolas de Educação Infantil, 10 (dez) Escolas de Ensino Fundamental na sede e em sete Escolas de Ensino Fundamental do Campo e, ainda, a oferta da modalidade EJA em cinco escolas da sede.

Na área educacional o município tem registrado grandes avanços e conquistas, neste caso tem sido contemplado, nos últimos anos com novas escolas para a Educação Infantil do Programa Proinfância entre outros Programas Educacionais.

A universalização e o acesso à educação em Vacaria toma uma proporção significativa quando se adere aos Programas como GEEMPA, Correção de Fluxo, Programa Mais Educação, Programa PNAIC – Pacto Nacional para a Alfabetização na Idade Certa, Atleta na Escola, Programa Saúde do Escolar (DST AIDS, Projeto Olhar), Programa e Direito à Diversidade, dos quais procuram atender às necessidades educacionais da rede municipal de ensino.

Na área pedagógica muito se tem investido em Formações com palestrantes renomados da nossa região e do restante do país, como: Celso dos Santos Vasconcelos,

1 Licenciada em Ed. Física – UNIPLAC 2004 (Universidade do Planalto Catarinense); Pós-graduada em Ciência da Saúde UNIPLAC 2005 (Universidade do Planalto Catarinense); Licenciada em Filosofia 2011 pela UCS (Universidade de Caxias do Sul); Coordenadora do Programa Mais Educação nas Escolas Estaduais pela 23° CRE 2011e 2012; Coordenadora do comitê Serra e Mar Programa Mais Educação RS 2012; Atual Coordenadora do Programa Mais Educação das escolas municipais de Vacaria RS.

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Cipriano Luckesi, Maria Luiza Xavier, José Pacheco, Maria Luísa Rodrigues Flores, Maria Otília Susin, Vanderlei Carbonara, Gaudêncio Frigoto, palestras no Programa E CARTA, Seminários de Pesquisa, entre outros.

O foco do presente artigo está no Programa Mais Educação que é desenvolvido nas dez (10) Escolas Municipais de Ensino Fundamental da sede, que atende a cerca de 1200 alunos no turno inverso, o que representa 26% das matrículas de ensino fundamental. Apresentarei, assim, alguns dados sobre número real de alunos atendidos, aprovação, repetência, alunos contemplados com o Programa Bolsa Família e o Programa Mais Educação em nosso município. Sendo suas contribuições, seus desafios e sua perspectiva criadora de uma nova educação em nosso município.

2 soBrE o proGrama mais Educação no municÍpio dE vacaria rs

(...) A escola como um espaço de ensino – aprendizagem será então um centro de debates, ideias, soluções, reflexões, aonde a organização popular vai sistematizando sua própria experiência. O filho do trabalhador deve encontrar nesta escola os meios de autoemancipação intelectual, independente dos valores da classe dominante. A escola não é só um espaço físico. É um clima de trabalho, uma postura, um modo de ser (FREIRE, 2005, p.16)

O Programa mais Educação instituído pela Portaria Interministerial n° 17/2007, PDE (Plano de Desenvolvimento da Educação), que induz a ampliação da jornada escolar e organização curricular, oferece oportunidades educativas e compartilhamento da tarefa de educar entre os profissionais da educação e de outras áreas, às famílias e a diferentes autores sociais, sob a coordenação da escola e dos professores.

O Programa mais Educação tem como objetivo:

(...) contribuir para formação integral de crianças, e adolescentes e jovens, por meio da articulação de ações, de projetos e programas do Governo federal e suas contribuições às propostas, visões e práticas curriculares das redes públicas de ensino e das escolas, alterando seu ambiente escolar e ampliando a oferta de saberes, métodos, processos e conteúdos educativos. (BRASIL, 2007, Art 1°)

Como ideal de uma educação pública e democrática, a proposta de educação integral, está presente na Legislação Educacional Brasileira, nos artigos 205, 206 e 227; no estatuto da criança e do Adolescente (Lei n° 9089/1990); na LDB (Lei n°

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10.179/2001), no Fundo Nacional de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Lei n° 11.494/2007) e no Plano de Desenvolvimento de Educação. Compreendendo, assim, o ser humano em suas múltiplas dimensões e como ser de direitos, (PASSO A PASSO SEB/MEC, 2013). Vistas de ampliar tempos, espaços, atores envolvidos no processo e oportunidades educativas em benefício da melhoria da qualidade da educação dos nossos educandos.

O Programa atende, prioritariamente, às escolas de baixo IDEB, situadas em capitais, regiões metropolitanas e grandes cidades em territórios marcados por situações de vulnerabilidade social; atualmente, municípios do interior também têm sido contemplados, que requerem a convergência prioritária de políticas públicas e educacionais.

Nosso município sozinho não tem condições de exercer todo esta demanda de legislação e enfrentamento as vulnerabilidades sociais que se aproximavam a cada dia de nossas escolas sem um financiamento para que aconteça com qualidade a ampliação da jornada escolar. Segundo Jaqueline Moll, apud Jareta (2011, p.4) a ampliação da jornada escolar é uma condição fundamental para democratizar o acesso à cultura e a uma maneira de diminuir as diferenças sociais. Desta forma o Governo Brasileiro oportuniza com o Programa Mais Educação, repasse financeiro que amplia a jornada escolar do nosso município de quatro horas diárias para sete horas diárias.

O Município de Vacaria aderiu ao Programa Mais Educação no final do ano de 2011, com sete escolas. As demais escolas (três) aderiram no final de 2012. Totalizando hoje 10 escolas municipais com o Programa Mais Educação. Tem como contrapartida da gestão municipal uma carga horária de 40h para professor coordenador do programa na escola e uma merendeira a mais por escola.

As figuras 1,2,3,4,5,6 e 7 demonstram o desempenho de nossas escolas com esta nova oportunidade educativa:

Escolas Iniciadas em 2011 que corresponde a

1ª ADESÃO: 04/10/2011 a 05/12/2011 = 2 meses 21/03/2012 a 20/07/2012 = 4 meses 06/08/2013 a 06/12/2012 = 4 meses (totalizando 10 meses)

2ª ADESÃO: 14/03/2013 a 14/07/2013 = 4 meses 05/08/2013 a 05/12/2013 = 4 meses 06/03/2014 a 06 /05/2014= 2 meses (totalizando 10 meses)3ª ADESÃO: 05/05/2014 a 05/07/2013 = 4 meses 05/08/2014 a 05/12/2014 = 4 meses 02/03/2015 a 02 /07/2015= 2 meses (totalizando 10 meses)

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Figura 1: Dados estatísticos da Escola Municipal Ensino Fundamental Pedro Álvares Cabral

Fonte: Secretaria de Educação de Vacaria RS, setor Controle escolar. Junho 2014

Figura 2: Dados estatísticos da Escola Municipal Ensino Fundamental Duque de Caxias

Fonte: Secretaria de Educação de Vacaria RS, setor Controle escolar. Junho 2014

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Figura 3: Dados estatísticos da Escola Municipal Ensino Fundamental Dom Henrique Gelain

Fonte: Secretaria de Educação de Vacaria RS, setor Controle escolar. Junho 2014

Figura 4: Dados estatísticos da Escola Municipal Ensino Fundamental Coronel Avelino Paim

Fonte: Secretaria de Educação de Vacaria RS, setor Controle escolar. Junho 2014

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Figura 5: Dados estatísticos da Escola Municipal Ensino Fundamental General Osório

Fonte: Secretaria de Educação de Vacaria RS, setor Controle escolar. Junho 2014

Figura 6: Dados estatísticos da Escola Municipal Ensino Fundamental Cecy Sá Brito

Fonte: Secretaria de Educação de Vacaria RS, setor Controle escolar. Junho 2014 Figura 7: Dados estatísticos da Escola Municipal Ensino Fund. Juventina M. de Oliveira

Fonte: Secretaria de Educação de Vacaria RS, setor Controle escolar. Junho 2014

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Quadro de Média geral das oito escolas iniciadas em 2011:

Figura 8: Média geral das sete escolas iniciadas em 2011

Fonte: Secretaria de Educação de Vacaria RS, setor Controle escolar. Junho 2014

Consideramos neste quadro a oscilação de todos os dados de uma adesão para outra. Percebemos pelos quadros anteriores individuais, algumas escolas têm mais alunos que outros, compensado alguns números. Mas se consideramos o que indica a repetência, esta teve uma pequena baixa.

Seguimos para as escolas com menos tempo de Programa Mais Educação na Escola que aderiram em 2012.

Escolas iniciadas em 2012, que corresponde a:

Representado nas figuras: 9,10 e 11.

1ª ADESÃO: 16/10/2012 a 16/12/2012 = 2 meses 14/03/2013 a 14/07/2013 = 4 meses 05/08/2013 a 05/12/2013 = 4 meses (totalizando 10 meses)

2ª ADESÃO: 03/03/2014 a julho 2014 = 4 meses 05/08/2014 a dez 2014 = 4 meses 02/03/2015 a 02 /05/2015= 2 meses (totalizando 10 meses)

Figura 9: Dados estatísticos da Escola Municipal Ensino Fund. Nabor Moura de Azevedo

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Fonte: Secretaria de Educação de Vacaria RS, setor Controle escolar. Junho 2014

Figura 10: Dados estatísticos da Escola Municipal Ensino Fund. Soli Gonzaga dos Santos

Fonte: Secretaria de Educação de Vacaria RS, setor Controle escolar. Junho 2014

Figura 11: Dados estatísticos da Escola Municipal Ensino Fundamental Inácio de Souza Pires

Fonte: Secretaria de Educação de Vacaria RS, setor Controle escolar. Junho 2014

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Quadro de Média geral das três escolas iniciadas em 2012:

Figura 12: Dados estatísticos das escolas iniciadas em 2012

Fonte: Secretaria de Educação de Vacaria RS, setor Controle escolar. Junho 2014

Diante do exposto, os dados ainda estão sendo agregados timidamente não permitindo uma conclusão eficiente, mas é um passo para um olhar mais profundo do Programa em nosso município, um olhar mais profundo para a ampliação da jornada escolar.

A retomada de teóricos para nos alicerçar faz parte no momento em que o turno dito “normal” de nossas escolas não entende o porquê do programa na escola, sendo que na maioria das escolas não há interpretação curiosa e sensata do presente, no momento em que vive a educação em Vacaria, e vontade unânime de fazer mais pela educação. Reconhecemos, acima de tudo, o esforço das direções para que o programa aconteça em suas escolas, mas o mais do mesmo prevalece em boa parte das escolas. Aqui está uma das batalhas, pois a ampliação de jornada escolar já está dada, a questão agora é como integrar a educação integral, ou seja, o padrão das escolas de Educação em tempo integral que temos hoje, quando pela manhã ela é uma unidade tradicional e à tarde se transforma num espaço lúdico com atividades artísticas desconectadas de um projeto, deve mudar, diz Castro (2013 p. 3). E que de fato os dados implícitos acima possam vir a ter resultados promissores.

A instrumentação teórica para que o programa de fato se consolide e dê frutos dentro da escola e consequentemente na educação é imprescindível. Sendo assim, apresento alguns pensadores motivadores: “Só existirá democracia no Brasil no dia em que se montar no país a máquina que prepara as democracias”. “Essa máquina é a da escola pública”. (Vera e Silva apud Anísio Teixeira, 1998, p38-40).

Freire citado por Moll e Leclerc (2012, p.37).

Não será essa escola, [sem uma verdadeira comunidade de trabalho, de estudos e artes, plástica e dinâmica, com pluralidade de atividades] de quatro e até três horas diárias,

Escolas Iniciadas com Programa Mais Educação em 2012

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parada mais de três meses ao ano [...] que irá integrar esse educando academizado com as realidades, agora, desgraçadamente nacionalizadas. Escola que, diminuída no seu tempo, está intimamente ligada à falsa concepção que temos de sua instrumentalidade – falsa concepção que Anísio Teixeira chama de “concepção mágica ou mística da escola”. [...]

A essa escola verbalista, propedêutica, antidemocrática, por isso mesmo cada vez mais superposta à sua comunidade, oponhamos uma outra escola. [...] centrada na comunidade e formadora de hábitos, “deverá, assim, organizar-se para dar ao aluno, nos quatro anos de seu curso atual e nos seis a que se deve estender”, diz Anísio Teixeira, “uma educação ambiciosamente integrada e integradora”. Para tanto, continua o mestre brasileiro, “precisa, primeiro, de tempo: tempo para se fazer uma escola de formação de hábitos (e não de adestramento para passar em exames) e de hábitos de vida, de comportamento, de trabalho e de julgamento moral e intelectual”. (FREIRE, 2001, p. 87-88, 92)

De acordo com Arroyo citado por Moll (2012, p. 33) “Se um turno já é tão pesado para tantos milhões de crianças e adolescentes condenados a opressivas reprovações, repetências, evasões e para extensos deveres de casa – mais uma dose dele será insuportável.”

A união de esforços vai além da teoria, perceber a escola com uma variedade de espaços sociais faz com que esta tenha de buscar novos parceiros para melhorar a qualidade da educação. A “escola cresceu”, pensamentos e oportunidades educativas já fazem parte do cotidiano do Município de Vacaria RS, desta forma não podendo mais retroceder.

Que este breve estudo possa dar uma ideia do processo educacional no âmbito do Programa Mais Educação e fomentar a vontade integral de uma educação integral em nosso município.

3 considEraçõEs finais

Diversas inspirações e projeções de futuro tomam conta de nossa gestão, pensar num profissional como o grande protagonista desta história e tentar formá-lo, informá-lo e sensibilizá-lo, que este Programa Mais Educação e consequentemente a

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Educação Integral2 em Tempo Integral3 é algo que vem de dentro pra fora. O professor impregnado com a teoria se inspirará a superar modelos padronizados de educação, aproveitará de forma transversal esse tempo deixando de lado esta sociedade fragmentada e de conteúdos isolados. Desta forma, o nosso despertar para Educação Integral em Tempo Integral está sendo construída à medida que monitoramos a consolidação do Programa Mais Educação nas escolas municipais.

Enquanto a administração procurou trazer formações para nossos educadores do turno regular com temas sobre interdisciplinaridade e educação integral, nas reuniões mensais com os Coordenadores do Programa nas Escolas levamos artigos na área para que possam levar até a escola e discutir em reuniões pedagógicas com os demais colegas do turno “normal”. Como estratégia para o pleno desenvolvimento da Educação Integral em Tempo Integral, em nosso município, caberia termos cursos de extensão na área de Educação Integral para professores, oficineiros, maior incentivo por parte das universidades para com a oportunidade de bolsas ao oferecer pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID), Projetos Políticos-Pedagógicos ligados ao turno inverso, valorização do profissional em tempo integral na escola, e ampliação de espaços físicos, que a instituição universitária crie cadeiras nesta área para ir aproximando as licenciaturas desta realidade, potencializando assim a Educação Integral em tempo Integral. Mas enquanto isso não se cristaliza, o incentivo quanto a práticas envolvendo várias disciplinas é fortemente sugerido às direções nas respectivas reuniões mensais.

Diante destes anseios, preservo aqui a vontade de atingir mais e mais a Educação Integral em Tempo Integral, e este caminho está sendo trilhado no andar; o estudo precisa ser aprofundado e pensado em conjunto, a diversidade de agentes educativos, neste objetivo, não se limita a uma secretaria, uma gestão, mas a toda uma escola. Isso requer visão ampliada e comprometida com a educação.

2 Ana Cavaliere (2010) a Educação integral seria a ação educacional que envolve diversas e abrangentes dimensões da formação dos indivíduos. Quando associada à educação não intencional, diz respeito aos processos socializadores e formadores amplos que são praticados por todas as sociedades, por meio do conjunto de seus atores e ações, sendo uma decorrência necessária da convivência entre adultos e crianças. [...] Quando referida à educação escolar, apresenta o sentido de religação entre a ação intencional da instituição escolar e a vida no sentido amplo.3 Jaqueline Moll (2010) refere-se a “escola de tempo integral”: Em sentido restrito, refere-se à organização escolar na qual o tempo de permanência dos estudantes se amplia para além do turno escolar, também denominada, em alguns países, como jornada escolar completa. Em sentido amplo, abrange o debate da educação integral – consideradas as necessidades formativas nos campos cognitivo, estético, ético, lúdico, físico-motor, espiritual, entre outros – no qual a categoria “tempo escolar” reveste-se de relevante significado tanto em relação a interessados e principalmente para os Coordenadores do Programa nas escolas, formação para sua ampliação, quanto em relação à necessidade de sua reinvenção no cotidiano escolar.

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rEfErências

BRASIL. Portaria Interministerial n° 17, de 24/04/2007. Institui o Programa Mais Educação, que visa a fomentar a educação integral de crianças, adolescentes e jovens, por meio do apoio de atividades socioeducativas no contraturno escolar. Disponível em http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=14887&Itemid=817. Acessado em 6 jul. 2014.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 28ª ed. São Paulo: Saraiva 2001. (Coleção Saraiva de Legislação).

____. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível em http://www.planalto.gov.br/civil-03/leis/L9394.htm. Acessado em 06/07/2014.

____. Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), nº 11. 494/07 de 20 de junho de 2007.

____. Plano de Desenvolvimento da Educação – Decreto nº 6094 de 24 de abril de 2007.

____. Programa Mais Educação: Passo a Passo. – Brasília: Mec, Secad, 2013.

____. Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei 8.069 de 13 de julho de 1990

CASTRO, A. Emília. – UFPernambuco. Porvir.org. 2013. http://porvir.org/porpensar/a-educacao-integral-deixa-escola-mais-humana Acessado em 24 jun. 2014.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005, 42. ed.

JARETA, Gabriel- Revista Educação Agosto 2011. http://revistaeducacao.uol.com.br/textos/156/mais-tempo-para-que-234746-1.asp Acessado em 24 jun. 2014.

MOLL, Jaqueline & Leclerc Gesuína de Fátima Elias, Políticas de educação integral em jornada ampliada: Gesuína (Organizadoras) Em Aberto, Brasília, v. 25, n. 88, p. 1-214, jul./dez. 2012.

____. Caminhos da Educação Integral no Brasil: Direito há Outros Tempos e Espaços Educativos. Por Jaqueline Moll e Colaboradores. Porto Alegre: Penso 2012

VERA E SILVA, Adriana. Anísio Teixeira: ele rimou com democracia. Nova Escola. São Paulo. V.13, n.º114, ago.1998. p. 38-40

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EDUCAÇÃO EM TEMPO INTEGRAL NO MUNICÍPIO DE SAUDADE DO IGUAÇU – PR

Gislene Gonçalves de Azevedo1

1 introdução

O texto discorre sobre o que se compreende por Educação em Tempo Integral e como é desenvolvida no Município de Saudade do Iguaçu, PR. Dá-se ênfase ao trabalho que é feito na Escola Municipal em Tempo Integral Padre Felipe em relação ao atendimento aos alunos por meio de oficinas que priorizam despertar o prazer e alegria, mesmo estando na escola dia todo.

O Município de Saudade do Iguaçu foi emancipado em 1º de março de 1992, pela Lei Estadual n° 9.941, o núcleo foi alçado à categoria de Município, com território desmembrado do Município de Chopinzinho – PR e denominação alterada para Saudade do Iguaçu. Nome este, segundo contam os antigos moradores, daqueles que voltaram para o Rio Grande do Sul e diziam sentir saudades do Iguaçu (Rio Iguaçu), ficando o nome da cidade. A instalação oficial deu-se em 1º de janeiro de 1993. Hoje tem uma população de aproximadamente 5.500 habitantes, a principal economia é a criação de gado leiteiro, algumas indústrias têxteis e plantação de milho e soja.

A educação é muito valorizada, sendo que existe um projeto, no qual o estudante de ensino superior e cursos técnicos não pagam transporte e ganham uma bolsa-auxílio no valor de 200 reais para faculdade particular, 100 reais para cursos técnicos e 60 reais para faculdade federal, estadual e a distância. Hoje o município conta com aproximadamente 140 alunos estudando em faculdades da região.

A Escola Municipal Padre Felipe atende, aproximadamente, a 470 crianças do 1º ao 5º ano, com sistema de apostilado do Sefe: Sistema Educacional Família e Escola. Conta com uma infraestrutura excelente, com salas de aulas climatizadas e com TV, ginásio de esportes, sala de dança, biblioteca com acervo de aproximadamente 1000 livros e refeitório com bufê. A escola, oferece auxílio pelo apoio de uma estagiária para as turmas de 1º ano e turmas com alunos inclusos.

No Município de Saudade do Iguaçu, a Educação em Tempo Integral foi implantada no ano obrigatório. Devido a problemas com pais, a lei foi alterada no ano seguinte. Com a Lei 587/2010, 7 de dezembro de 2010 ficou instituída, no Município, o Programa Escola de Tempo Integral de caráter facultativo.

Foi instituído pela administração Municipal e a Secretaria de Educação com o objetivo de ofertar atividades diversificadas para as crianças que passam o dia longe da

1 Coordenadora do Projeto de Tempo Integral da Escola Municipal Padre Felipe do Município Saudade do Iguaçu, PR, e-mail: [email protected]

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presença dos pais. É fundamental ressaltar que devido aos novos padrões da sociedade, na qual pai e mãe precisam trabalhar para se ter um status indicado pela sociedade de consumo, que se vive cada dia mais na correria, as crianças ficam desprotegidas longe da presença dos pais e mais suscetíveis a perigos.

A ideia de implantação de Educação em Tempo Integral teve boa aceitação por parte dos pais e também dos alunos. Os pais compreenderam que a criança quando assistida por um profissional recebe uma formação social, psicológica, e biológica de qualidade.

Nas atividades extracurriculares, os estudantes poderão adquirir diversas habilidades em diferentes áreas, formando, assim, um indivíduo como um todo, reformando os modelos e paradigmas da educação na sociedade.

Uma sociedade só pode existir se umas séries de funções são constantemente preenchidas (produção, gestação e educação, gestão da coletividade, resolução dos litígios, etc.), mas ela não se reduz a só isso, nem suas maneiras de encarar seus problemas são ditados de uma vez por todas por sua natureza; ela inventa e define, para si mesma, tanto novas maneiras de responder as suas necessidades, como as novas necessidades. (CASTORIADIS, 1992, p. 141)

Hoje, no ano de 2014, a escola atende a alunos das turmas de 4º e 5º ano do ensino fundamental, com aceitação de 90%. Temos aproximadamente 115 alunos frequentando a escola. As refeições contam com o acompanhamento da nutricionista.

Em conversa com a administração municipal atual sobre a Escola em Tempo Integral, o prefeito afirmou que o funcionamento é ótimo, promove uma preparação para a vida, não é algo enlatado, engessado e hoje se consolida no município de forma excelente. Disse também que com a evolução do ensino, “não existe pensar em Educação sem pensar em Tempo Integral, o nosso grande desafio está em atender a todos com qualidade”.

O projeto da Escola em Tempo Integral acontece em um pavilhão alugado, o desafio é a construção de um espaço próprio já com salas de música com acústica e atendimento para as demais oficinas, o objetivo é ampliar gradativamente até chegar ao atendimento de 100%. No ano de 2015, deve-se iniciar a execução do Projeto de construção do espaço para atender, exclusivamente, à Escola em Tempo Integral. Atualmente a administração tem a escola em Tempo Integral como forma de contribuição para o município, conclui o prefeito.

Sabemos da importância de uma educação de qualidade nos moldes e padrões que a sociedade exige hoje, pois o estudo é a única forma que podemos ajudar nossas crianças a terem um futuro melhor.

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Abaixo descreve o cardápio do almoço, no mês de junho para exemplificar o estudo:

Entende-se por Educação em Tempo Integral uma educação de qualidade que ultrapasse os muros da escola e possa ampliar horizontes do ensino, possibilitando ao educando diversas formas de aprendizagem, para uma formação mais completa. Nessa proposta, os alunos estudam matérias da Base Nacional Comum no período matutino e no outro período desenvolvem atividades extracurriculares, que compreendemos por oficinas. Segundo Moll (2012) deve-se ter o cuidado de trabalhar uma Educação Integral que se projete a formação e o desenvolvimento humano pleno e múltiplo possível, sem esquecer a base do currículo.

Uma proposta de Escola em Tempo Integral precisa ser adequada dentro dos contextos em que vivem esses alunos, associando atividades que lhes sejam aplicáveis. Atividades que podem ser fora do espaço escolar, como as visitas a museus, praças, parques, bibliotecas entre outras.

Educação em Tempo Integral não pode ser vista como um mero depósito de crianças, mas sim como um lugar de aprendizagem significativa para a vida; que possam desfrutar de educação de qualidade que os incentive ao convívio em sociedade, que possamos criar sujeitos críticos e acima de tudo cidadãos.

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2 planEJamEntos dos profEssorEs da Escola Em tEmpo intEGral dE saudadE do iGuaçu – pr

Outro documento de análise para compreender como a Educação em Tempo Integral, se constitui como elemento na formação da identidade da comunidade são os planejamentos das atividades que extrapolam a base nacional comum, que são os projetos que estão vinculados à Educação em Tempo Integral, com os quais cada município opta por suas matérias ou oficinas, que precisam constar nos planejamentos das escolas.

Percebemos pelos planejamentos os anseios dos professores em trabalharem com os alunos de uma forma lúdica e prazerosa, ao mesmo tempo aprendendo os conteúdos solicitados.

Considerando as coisas do ponto de vista da instituição da sociedade, podemos dizer que esta pode proporcionar – ou não pode deixar de proporcionar – ao indivíduo, a possibilidade de encontrar, e fazer existir para ele, um sentido na significação social instituída. (CASTORIDIS, 1992, p. 364)

É preciso planejar as coisas tanto na vida pessoal como na vida profissional, precisamos traçar metas, cumprir objetivos para podermos dar início ao nosso trabalho na tentativa de transformar ou melhorar em que for necessário e possível.

O planejamento de modo geral, deve estar adequado a cada realidade vivida pelo professor com seus alunos, pois é fundamental a escrita por professor de seu planejamento, que não deve ser visto como burocracia e sim como um eixo norteador que aponte caminhos para percorrer com seus alunos. Deve ser adequado para que consiga desenvolver um trabalho que esteja no nível em que seus alunos se encontram.

Nas escolas em Tempo Integral, os planejamentos não devem fugir dessas características também, adequando sempre os conteúdos a realidade de seus alunos.

As oficinas que fazem parte da Educação em Tempo Integral no Município de Saudade do Iguaçu são: Português, Matemática, Arte Circense, Artesanato, Recreação, Violão, Flauta, Clavieta, Percussão, Sopro (Saxofone, Clarinete e Trompete), Cavaquinho, Dança, Informática e Atleta do Futuro (SESI), também existem parcerias com o município que são oficinas optativas de Tae kwon do, Futsal e Handebol.

É possível ver a diferença no desenvolvimento de uma criança que estuda em período integral em relação àquela que não participa. Ela possui uma facilidade enorme em aprender diversas atividades, precisa se ocupar com coisas úteis, que possam fazer sentido a sua vida.

A escola em Tempo Integral oferece oportunidades, mostrando que é possível se fazer uma educação de qualidade séria e comprometida com o conhecimento, aliada

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à diversão e brincadeiras que devem fazer parte do cotidiano das crianças. Promove a ampliação de tempos, espaços e oportunidades educativas e o compartilhamento na tarefa de educar e cuidar. Isso reflete numa proposta que promove o crescimento do indivíduo por uma ação coletiva que permite um desenvolvimento saudável, almejando um futuro satisfatório, de oportunidades de acesso mais igualitário.

As oficinas contribuem para a interação, socialização e respeito à diversidade, sensibilizando para uma cidadania responsável com atitudes permeadas e sistematizadas em valores. Segundo Castoriadis (1992, p. 178), o homem é um animal inconscientemente filosófico, que faz a si mesmo as perguntas da filosofia dos fatos, e é um animal poético que forneceu no imaginário respostas a essas perguntas.

Entrar em contato com a realidade é o primeiro passo de que precisamos para depois começar a planejar. Os planejamentos das Escolas em Tempo Integral são um pouco diferenciados, pois trabalham de maneira mais lúdica e diferenciada das matérias do Currículo Nacional Comum.

Para assegurar a permanência destas crianças na escola precisamos de oficinas atrativas e que ao mesmo tempo possam oferecer subsídios suficientes para que elas possam se desenvolver em todos os seus aspectos. Para uma educação de qualidade se faz necessária a abrangência de todos os aspectos da criança para que, além dos diversos conhecimentos, possa na vida adulta entrar no mercado de trabalho com um pouco mais de condição para o exercício da função.

Para Castoriadis (1992, p.181) é a necessidade social que cria a raridade, ou seja, vivemos em um mundo onde precisamos estar conforme o que a sociedade impõe, seja na alimentação, vestuário ou meio de transporte que acaba se tornando uma “necessidade social”.

Dessa forma, as oficinas propostas para o Tempo Integral, no caso específico do Município de Saudade do Iguaçu, viabilizam maior discernimento por parte dos educandos diante de diversas atividades promovidas para o pleno domínio de suas capacidades. Por meio do jogo, os alunos aprendem a lidar com desafios, problemas, situações que envolvem perdas, bem como desenvolvimento de demais habilidades. Com as linguagens, seja matemática ou língua portuguesa bem como musicalização, é possível favorecer aos educandos momentos de concentração, desenvolvimento de raciocínio lógico, aprimoramento de questões argumentativas/discursivas, apropriação da escrita e sociabilização.

O trabalho educativo desenvolvido em escolas desta natureza agudiza a curiosidade, estimula as interações e correlações e facilita a construção do conhecimento pelo envolvimento dos sujeitos nos processos do ensinar e do aprende, tornando as tarefas educativas mais prazerosas e agradáveis, pela significativa oportunidade de “fazer junto” o que seja de real e de comum interesse. (RODRIGUES & RIBAS, 2011, p 11.)

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Podemos ressaltar que a Educação em Tempo Integral vem avançando a respeito da visão que a sociedade compõe. Hoje, podemos dizer, que uma educação de qualidade, pautada em objetivos sérios e comprometidos, pode ser encontrada facilmente em nossa escola.

Segundo Rodrigues e Ribas (2001), o desenvolvimento dos projetos das escolas em Tempo Integral, devem possibilitar uma formação escolar cujas bases estimulem a formação de conceitos de cidadania, autonomia e reflexão, para que possam atuar com competência, dignidade e responsabilidade transformando seus contextos sociopolíticos e culturais.

Acima de tudo, essas crianças que permanecem na escola o dia todo têm a possibilidade de participar de brincadeiras com crianças da mesma idade, adquirir experiências, e se socializar, entre outros aspectos.

O projeto revela que podemos dar uma educação digna para nossas crianças, com atividades que possam despertar um aprendizado que favoreça na vida profissional e pessoal, pois a permanência no ambiente escolar livra a criança de vícios e riscos. Também se tornam mais saudáveis, pois praticam atividades físicas e brincadeiras que desenvolvem suas habilidades motoras.

Podemos dizer que os projetos trabalhados nessa escola são de diferentes áreas do conhecimento, aqui vou citar alguns desses objetivos para entendermos o que se trabalha.

Na área musical temos oficinas de flauta, violão, clavieta e percussão. Sabe-se que a música tem importante papel na formação dos indivíduos, uma vez que, além de adquirir sensibilidade aos sons, ela desenvolve diversas qualidades, como concentração, coordenação motora, socialização, respeito a si e ao grupo, disciplina, respeito com o diferente, integração, cooperação e outras características que colaboram na formação do caráter. A música sensibiliza e desperta atitudes positivas no enfrentamento de uma convivência em sociedade, além de trabalhar com os sentidos da audição, visão e tato e receber estímulos para aprender a falar mais rápido, sem timidez e com maior vocabulário. O conjunto dessas características traz benefícios que vão acompanhá-los até a fase adulta.

Também contamos com oficinas de informática, artesanato, recreação e dança. Todos esses conteúdos são adaptados à realidade de nossos alunos. As atividades Lúdicas são ingredientes indispensáveis no relacionamento entre as pessoas, bem como uma possibilidade para que afetividade, prazer, autoconhecimento, cooperação, autonomia, imaginação e criatividade cresçam, permitindo que o outro construa por meio da alegria e do prazer de querer fazer e construir. Quando as crianças brincam, demonstram prazer e alegria em aprender. Elas têm oportunidade de lidar com suas energias em busca da satisfação de seus desejos. Dessa forma, é desejável buscar, conciliar a alegria da brincadeira com a aprendizagem escolar.

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Na área de recreação fazemos o resgate de jogos e brincadeiras que estão se perdendo com o tempo, como por exemplo: O carrinho de rolimã, pular elástico, pular tábua, bola de gude, entre outras. Dessa forma, podemos dizer que crianças que se encontram em escolas desta natureza terão um aprendizado maior que outras crianças, pois terão o convívio com diferentes atividades que lhes tornarão pessoas com mais habilidades, se destacando assim nas diferentes áreas de conhecimento.

3 considEraçõEs finais

Por último, podemos dizer que a Escola em Tempo Integral do nosso município, trabalha de forma que a criança sinta prazer em participar das atividades; temos diversos projetos desenvolvidos durante o ano, entre esses o principal é a gravação de um CD instrumental, em estúdio. Dessa forma, podemos dizer que temos um diferencial que é a essência de um trabalho de qualidade. As músicas do CD são escolhidas pelos professores, ensaiadas e, logo após, gravadas. Com o CD pronto fazemos a apresentação para a população mostrando os talentos de nossa Escola. No dia do lançamento do CD é feita a gravação de um DVD ao vivo que é entregue aos pais juntamente com cópia do CD para que possam desfrutar em suas casas um pouquinho do trabalho de seus filhos. Dentre as músicas gravadas, está um dos grandes sucessos musicais: Asa Branca, de Luiz Gonzaga.

Temos crianças que se destacam na área musical, outras na área esportiva, mas todos incluem uma capacidade muito grande em aprender rapidamente o que é proposto. Podemos ressaltar que hoje a Escola em Tempo Integral do Município de Saudade do Iguaçu vem fazendo seu papel no aprendizado dessas crianças de maneira clara e objetiva, para que elas possam, no futuro, usufruir de uma educação que contemple todas as áreas do conhecimento não somente o português ou a matemática.

Cabe a nós, professores e sociedade, trabalhar de forma correta para que nossos filhos possam desfrutar de vida saudável, estudando o dia todo, pois as ruas de hoje não são como quando nós tínhamos essa idade e podíamos brincar livremente.

Assim sendo, é fundamental ressaltar que estar na escola aos cuidados de professores capacitados e aprender um pouco sobre as diversas áreas deixam esses meninos e meninas com um conhecimento que jamais alguém poderá tirar, dando-lhes a oportunidade de ter um futuro com melhores condições de vida.

rEfErências

CASTORIADIS, C. A instituição imaginária da sociedade. 6. ed. Paz e terra. Rio de Janeiro, 1982.

CAVALIERE, A. M. Anísio Teixeira e a educação integral. Paidéia (Ribeirão Preto) v.20 n.46 Ribeirão Preto May/Aug. 2010. Disponível em http://dx.doi.org/10.1590/S0103-

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863X2010000200012.

FERREIRA, N.T.; COSTA, V.L.M. Esporte, jogo imaginário social. Rio de Janeiro, Shape, 2003.

MOLL, J. Caminhos da Educação Integral no Brasil, direitos a outros tempos e espaços. 1. ed. Ed. Penso, 2012. p. 504.

PPP da Escola Municipal Padre Felipe – Saudade do Iguaçu – PR.

Projeto apresentado a Pós-Graduação da UFFS – Universidade Federal da Fronteira Sul, Educação Integral na Visão Imaginária da sociedade. Gislene Gonçalves de Azevedo, 2014.

RIBEIRO, D. O Livro dos CIEPs. Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Ed. Bloch, 1986. Disponivel em www.uff.br/gef/anais-vii.doc.doc

RODRIGUES, Z. A. L.; RIBAS, A. Ideário pedagógico: Para a educação em escolas em Tempo Integral. 2011, impressão gráfica Xingu, Brasil.

SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO. Prefeitura Municipal de Educação. Acesso em 6 jan. 2014, www.saudadedoiguacu.pr.gov.br

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LIMITES E POSSIBILIDADES DE UMA EDUCAÇÃO INTEGRAL EM ESCOLAS

INDÍGENAS

Cristiano Augusto Durat 1

1 introdução

Não seria estranho ouvir essa frase: “A escola indígena tem que ser de chão batido e coberta com folha de palmeira”, se ela não fosse dita em um curso de formação para professores das escolas indígenas da rede pública de ensino do estado do Paraná. A escola até pode ser de chão batido e coberta com folhas de palmeira, mas por livre escolha e desejo da comunidade indígena. Infelizmente, a frase em si, expressa o pensamento de boa parte da sociedade brasileira sobre os povos indígenas do Brasil, de que para se manter como índio, devem permanecer do mesmo modo como foram encontrados há mais de quinhentos anos. Não sabemos, exatamente, quais motivações levaram à professora convidada para esta atividade formativa, a manifestar tal comentário, mas podemos aprender e reverter essa afirmação em algo positivo para as comunidades indígenas: precisamos qualificar o debate sobre a Educação Escolar Indígena e promover um diálogo com outras políticas públicas para a educação nos últimos anos, sobretudo com a Educação Integral. Ambas têm como um dos seus pilares o envolvimento da Comunidade no processo formativo de seus estudantes e o direito a tempos e espaços educativos próprios.

Na década de noventa, do século XX, as sociedades indígenas intensificaram sua luta para garantir uma educação escolar que permitisse e valorizasse o seu modo de ensinar os seus saberes tradicionais, seus valores, suas crenças, suas práticas e seus rituais, sem desconsiderar os conhecimentos produzidos pela humanidade. Embora o discurso hegemônico entre indígenas fosse a de que a escola é uma importante instituição para os índios “disputarem direitos no mundo dos brancos”, ela foi ressignificada nos últimos anos como um espaço de proteção e o lugar em que as crianças se alimentam. Antes de avançarmos em nossa discussão, convém esclarecer, rapidamente, o que é uma educação indígena para depois aprofundarmos com mais elementos a educação escolar indígena.

Pois bem, educação indígena é a transmissão dos saberes tradicionais do grupo,

1 Professor de História da Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS – Campus de Laranjeiras do Sul/PR

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do convívio dos jovens com os mais velhos por meio da oralidade e da memória. É o modo como os grupos repassam os saberes tradicionais, culturais e organizativos para os indivíduos durante seu ciclo de vida. Segundo Bartomeu Meliá, os povos indígenas superaram vários períodos e contextos históricos de assimilação e integração com uma ação pedagógica, que permitiu não somente o modo de ser indígena, mas que souberam lidar com situações novas, readaptando-as à sua cultura, dando um novo significado (MELIÁ, 1999, p. 12). Essa dinâmica reafirma e ressignifica o modo de ser indígena, proporcionando aos seus membros o fortalecimento das relações com os elementos da natureza e do convívio em sociedade. Nesse processo, todos os membros do grupo são educadores, pois são eles os responsáveis pela manutenção da tradição oral, da continuidade dos mitos e rituais, dos cantos, das danças e principalmente da cultura material e imaterial. (BITTENCOURT; SILVA, 2002, p.63)

É quase consenso, entre os estudiosos da temática indígena, afirmar um período bastante extenso, para a educação escolar para os índios, cuja periodização se estende do século XVI ao século XX. Nas primeiras décadas de colonização do Brasil, com a chegada do Governador-Geral do Tomé de Souza os missionários jesuítas foram os principais agentes de conversão dos indígenas. Foi nesse contexto, que tivemos as primeiras instituições escolares para os filhos dos agentes coloniais mais abastados, no qual eram incluídas crianças indígenas retiradas do convívio dos seus familiares. O objetivo principal da escola para os indígenas era a assimilação para o mundo civilizado dos não índios. Portanto, o discurso predominante e as leis criadas para estas situações se resumiam em duas palavras: catequese e civilização. Segundo Wilmar D’Angelis, trazer os indígenas para conviver com a sociedade luso-brasileira, significava preparar a mão de obra indígena para o desenvolvimento colonial. (D’ANGELIS, 2012, p. 19)

Outro aspecto relevante para essa discussão é o modo como a educação era tratada nas missões jesuíticas. O grande diferencial identificado no trabalho dos missionários juntos aos índios guaranis foi manter as crianças vivendo com suas famílias. E mais, os índios poderiam, de acordo com sua habilidade, optarem pelos seguintes ofícios: o canto, a música, a pintura, o artesanato, o bordado a escultura, etc. Evidentemente, que os objetivos da missão não se resumiam nessas atividades educativas, mas, transformá-los em índios convertidos à cristandade (SANTOS, 2006, p.106). Mesmo com todo esse aparato assimilacionista, os índios guaranis reafirmavam em lugares em que não eram vigiados pelos missionários, sua ação pedagógica, ou seja, o modo de ser indígena.

Estremecidas as relações entre a Coroa Portuguesa e ordem religiosa dos Jesuítas, sobretudo com o trabalho que os padres vinham desenvolvendo entre os índios nas missões, o Primeiro-ministro de Portugal, conhecido como Marquês de Pombal, oficializava novas diretrizes para tratar das questões indígenas no Brasil, por meio do Diretório, que se deve observar nas Povoações dos índios do Pará e Maranhão enquanto Sua Majestade não mandar o contrário, no ano de 1757 (Diretório apud MOREIRA

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NETO, 1988, p. 166-205). Por Alvará de 8 de junho de 1759, as leis Diretório passaram a vigorar em todo território brasileiro. Entre tantas questões tratadas no documento, que iam desde administração dos aldeamentos não mais por ordens religiosas até a emancipação gradual desses espaços em vilas, com a presença de figuras representativas da Coroa Portuguesa, como juízes e vereadores, a educação dos índios também deveria seguir alguns princípios, entre eles: a língua geral, praticada pelos índios e missionários deveria ser substituída, imediatamente pela língua portuguesa e, segundo Isabelle Braz Peixoto da Silva, a educação dos índios teria fracassado frente à “cultura ancestral”, sempre presente no cotidiano. (SILVA, 2006, p. 83)

Revogado por Carta Régia, em 12 de maio de 1798, o Diretório dos Índios foi substituído em 1845, com o Regulamento acerca das Missões de catequese e civilização dos índios (CARNEIRO DA CUNHA, 1992). O Regulamento reintroduzia os missionários no trabalho com as populações indígenas do Brasil, não mais os jesuítas, mas agora os padres capuchinhos. Toda uma estrutura foi montada para anular qualquer herança catequética dos antigos catequistas do período colonial, embora na prática, a experiência dos jesuítas se fazia presente nesses aldeamentos imperiais.

Houve mudanças significativas na condução desses aldeamentos imperiais, até mesmo para as escolas, tanto para as crianças indígenas, quanto para os adultos. No Art. 4º, § 6º, o Diretor-geral do aldeamento tinha a responsabilidade de solicitar às Assembleias Legislativas “[...] a criação de Escolas de Primeiras Letras para os Lugares onde não baste Missionário para esse ensino.” (Regulamento apud CUNHA, 1992). Os princípios orientadores dessas instituições era ensinar os indígenas a ler, escrever e contar para que alcançassem um determinado estágio de desenvolvimento humano. Para essa finalidade, foram criados dentro dos aldeamentos ofícios dirigidos por leigos e até negros escravos e libertos capacitados para ensinar aos indígenas atividades que iam desde a agricultura, produção de açúcar e o envolvimento destes na navegação dos rios da região (MARCANTE, 2012). Para custear essas despesas e para manter essas escolas os aldeamentos deveriam se autossustentarem. Além de manter armazenado um montante significativo de alimentos para o sustento do aldeamento, o excedente era vendido para os viajantes comerciantes próximos, e o dinheiro arrecadado deveria custear todas as despesas, inclusive o pagamento dos freis e dos demais empregados desse empreendimento imperial. Essa política não obteve muitos resultados positivos, foram pouquíssimos os casos em que crianças indígenas estiveram presentes nessas escolas primárias, na sua grande maioria eram motivados pelos presentes que recebiam para estar ali diariamente, pedrinhas de rapadura e pequenas porções de sal. (AMOROSO, 1998)

Essa política indigenista imperial vigorou até 1910, quando já no período republicano, foi criado o SPI – Serviço de Proteção aos Índios. Inicia-se uma nova fase no tratamento do governo brasileiro com os diversos grupos indígenas espalhados pelo território nacional. O princípio motivador do SPI era a integração do índio à sociedade brasileira por meio do trabalho. O pensamento da época, expressa o trabalho

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como o único canal de sobrevivência das populações indígenas e, além da educação, eles deveriam cuidar da sua higiene, da saúde, aprender ofícios para se sustentarem. Em outras palavras transformarem-se em trabalhadores assalariados. Nesse ínterim, os índios iam abandonando seu modo de vida tradicional, seus costumes, sua cultura e principalmente sua língua materna. (CADERNO SECAD, 2007, p.14)

Em 1967, o Serviço de Proteção aos Índios foi extinto, em meio há uma série de denúncias de corrupção dentro da instituição. No mesmo ano foi criada a Fundação Nacional do Índio – Funai. Instituída no contexto do pós-guerra, a Funai tinha como meta implantar uma política indigenista reconhecida internacionalmente. Nesse período, vários países latino- americanos estavam firmando convênio com Summer Institute of Linguistics – SIL,2 missão evangélica que tinha dupla função: servir como missionário para o público evangélico e a de linguista para os grupos nacionais (BARROS, 2004, p. 46). O trabalho desenvolvido pela SIL é assessorado por linguistas e estes, têm a responsabilidade de registrarem as línguas indígenas, elaborarem materiais didáticos e, em certa medida promover a formação de professores indígenas para atuarem nas escolas, financiadas pela missão evangélica. O resultado desse convênio entre o governo brasileiro e a SIL foi a constituição de índios convertidos aos princípios missionários evangélicos de seus membros que atuavam como mediadores nas escolas indígenas. Esses agentes indígenas a serviço da SIL tinham a responsabilidade de traduzir materiais para a língua indígena, em especial, a Bíblia (D’ANGELIS, 2012, p.23). Segundo Wilmar D’Angelis, o trabalho da SIL foi pela implantação de um sistema de ensino de língua indígena calcado nos princípios e metodologia do chamado bilinguismo de substituição ou de transição. (D’ANGELIS, 2012, p.23)

Concomitante ao trabalho desenvolvido pela SIL, nas décadas de 60 e 70, surgiram organizações não governamentais em defesa das questões indígenas. Conforme Mariana Kawall Leal Ferreira destaca, a Comissão Pró-Índio de São Paulo (CPI/SP), o Centro Ecumênico de Documentação e Informação (CEDI), a Associação Nacional de Apoio ao Índio (ANAÍ) e o Centro de Trabalho Indigenista (CTI); e mais, a Igreja Católica também faz um movimento de apoio às causas indígenas criando duas organizações: a Operação Anchieta (OPAN) e o Conselho Indigenista Missionário (CIMI). (FERREIRA, 2001, p. 87)

Essas organizações foram fundamentais para que os índios iniciassem uma articulação em defesa dos seus direitos, por um projeto diferenciado e construído para e com os indígenas de todo território brasileiro. Todo esse movimento proporcionou, no contexto pré-constitucional, garantias importantes para as sociedades indígenas na Carta Constitucional de 1988, que passa a reconhecê-los como sujeitos de direito e garante uma educação específica e diferenciada nos Artigos 210, 215 e 230. (CADERNOS SECAD, 2007, p. 16)

2 Segundo Maria Cândida Drumond Mendes Barros, a Summer Institute of Linguistics, é uma missão evangélica especialista na tradução do Novo Testamento para línguas ágrafas. A tradução configura um padrão de evangelização próprio para comunidades rurais pequenas, falantes de línguas ágrafas e que conservam o predomínio da comunicação “face a face”. (Barros, 2004, p. 47)

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O primeiro ato significativo, pós-constituição, foi o Decreto Presidencial nº 26, de 1991. O decreto transferia o ensino das escolas indígenas, antes responsabilidade da Funai para o Ministério da Educação. Por sua vez, as secretarias estaduais e municipais passaram a organizar a educação escolar indígena em conformidade às diretrizes do MEC.

Imbuídos de organizar a educação escolar no Brasil, surge a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, Lei nº 9304, de 1996. Sem a pretensão de aprofundar todo o documento, importa-nos passar rapidamente pelo Título VIII – Das disposições Gerais, nos artigos 78 e 79. Os dois artigos referem-se, especificamente, à educação escolar indígena em que o primeiro orienta o sistema de ensino do Brasil e seus programas educacionais, apresentarem projetos de ensino e pesquisa para garantir uma educação bilíngue e intercultural. O Art. 78 garante aos grupos indígenas o reconhecimento das memórias históricas, da sua identidade étnica, das línguas e dos saberes tradicionais. Ou seja, o estado reconhece a necessidade de financiar projetos educacionais que contemple as necessidades indígenas. O Art. 79, reafirma o compromisso da união com os sistemas de ensino da federação, enaltecendo a participação indígena nas decisões sobre à educação escolar. (BRASIL, 1988)

Dispositivos legais foram criados para garantir às populações indígenas os direitos garantidos na Constituição de 1988, de uma educação intercultural e bilíngue. Para orientar as escolas indígenas no território brasileiro o Conselho Nacional de Educação (CNE), por meio da Resolução nº 3, de 1999, normatizou o funcionamento das escolas indígenas (D’ANGELIS, 2012, p. 25). No mesmo ano, o MEC apresentava aos povos indígenas o Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas – RCNEI, cujo fundamento, se pauta pelo reconhecimento da multietnicidade, pluralidade e diversidade, educação e conhecimentos indígenas, como guardiões de saberes e conhecimentos próprios de se relacionar com a natureza, com o homem, e o sobrenatural; autodeterminação, reafirmando o direito de decidiram sobre o futuro do seu grupo; e o reconhecimento de que os povos indígenas fazem parte de uma comunidade educativa indígena. (RCNEI, 1999, p. 23)

A sociedade brasileira só reconhece a participação indígena como sujeitos de fato, com garantias de direitos e responsáveis pelas suas decisões nas vésperas de completar 500 anos. Os avanços na educação escolar indígena durante esses cinco séculos foi de forma muito lenta. Felizmente, após Constituição de 1988, esse quadro se alterou significativamente, e os povos indígenas garantiram uma educação diferenciada, bilíngue e intercultural. Entretanto, temos pouquíssimas experiências em que ela esteja acontecendo, realmente. Importa dizer, que políticas públicas em processo de estruturação no país, como a Educação Integral, podem contribuir para que tenhamos, parafraseando Bartomeu Melía, uma educação indígena dentro da escola. Só aí vamos ter uma educação bilíngue de fato. Fazer isso não é enfraquecer a escola, é o contrário. É o único jeito de a escola ser indígena. (MELIÁ apud PAULA, 1999, p. 87)

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Educação intEGral Em Escolas indÍGEnas

Tardiamente, o estado reconhece por meio de suas políticas a importância e lugar de respeito dos povos indígenas na constituição da sociedade brasileira, atribuindo as secretarias estaduais e municipais de educação, a responsabilidade para organizarem uma escola que contemple as demandas dos próprios indígenas. Sabemos, entretanto, que o reconhecimento dessa especificidade, não garante a efetiva aplicação do que está na lei. O RCNEI é um dos vários exemplos de como a educação escolar indígena vem sendo aplicada nos estados da federação. Há um esforço contido no Referencial, de reconhecimento e valorização dos povos indígenas presentes no território brasileiro, do acúmulo de conhecimento adquirido ao longo de milhares de anos. ao destacar que:

[…] os povos indígenas vêm elaborando, ao longo de sua história, complexos sistemas de pensamento e modos próprios de produzir, armazenar, expressar, transmitir, avaliar e reelaborar seus conhecimentos e suas concepções sobre o mundo, o homem e o sobrenatural. O resultado são valores, concepções e conhecimentos científicos e filosóficos próprios, elaborados em condições únicas e formulados a partir de pesquisa e reflexões originais. (RCNEI, p. 22)

A grande questão que se apresenta para as escolas indígenas é reconhecer e incorporar esses conhecimentos acumulados do grupo indígena, pela equipe pedagógica, no cotidiano da escola. Essa dificuldade é mais agravante em lugares onde não se tem professores indígenas e sim, não indígenas, conduzindo e decidindo os rumos da escola. O modelo de escola presente para os índios é o mesmo de uma escola não indígena. Ou seja, as secretarias estaduais de educação, na sua grande maioria, criam departamentos para a educação escolar indígena nos seus núcleos regionais, gerenciados por um professor não indígena. O discurso que se tem é a de que as secretarias estão estruturadas e atendem à demanda das políticas públicas para a educação escolar indígena, de acordo com as demandas dos povos indígenas. Na verdade, o problema se agrava ainda mais, quando a equipe pedagógica das escolas é orientada a colocar a disciplina Língua Indígena na sua grade curricular, para garantir o cumprimento das normas contidas no RCNEI, de um ensino bilíngue. Nosso propósito não é discutir todos os problemas que existem na educação escolar indígena até porque outros pesquisadores da temática já apontaram essas questões e outras tantas. As questões aqui expostas é apenas uma amostra da complexidade que é garantir uma instituição escolar que contemple a demanda dos povos indígenas. Entretanto, existem algumas alternativas viáveis para melhorar esse cenário a partir daquilo que já temos em termos de políticas públicas para a educação escolar indígena: o diálogo com a educação integral.

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Nós últimos anos, a Educação Integral tem sido um tema bastante discutido nas instituições de ensino, desde a educação básica, como forma de implantação e ao ensino superior, por meio de debates e produções acadêmicas favoráveis e contrárias à proposta. De acordo com Jaime Giolo, o tema não é recente na história da educação brasileira, houve aqui e acolá experiências marcantes acerca da educação integral. O grande problema apontado pelo autor é que a educação integral nunca foi uma proposta para as classes populares, para o ensino público propriamente dito, pois demandava recursos públicos adicionais para sua efetivação. A educação integral sempre fez parte da elite brasileira por meio de atividades oferecidas pelas escolas privadas no contraturno, tais como: aulas de língua estrangeira, aula de reforço, laboratório, informática, balé, equitação, tênis, música, dança e teatro. (Giolo, 2012, p. 94)

O Texto Referencial para o Debate Nacional acerca da Educação Integral expõe novos elementos e as possibilidades do que pode ser, efetivamente, a Educação Integral:

Educação Integral é fruto de debates entre o poder público, a comunidade escolar e a sociedade civil, de forma a assegurar o compromisso coletivo com a construção de um projeto de educação que estimule o respeito aos direitos humanos e o exercício da democracia. Esses debates representam a valorização da pluralidade de saberes e a criação de momentos privilegiados em que se possa compreender a importância das distintas formas de conhecimento e suas expressões no mundo contemporâneo. (EDUCAÇÃO INTEGRAL, 2009, p. 27. [Grifo nosso.])

O que se pretende, afinal, é aproximar a comunidade da vida escolar de forma que a instituição de ensino faça a mediação entre os saberes científicos e os saberes tradicionais, equivalente ao que propõe a Educação Escolar Indígena ao apontar a comunidade educativa como a principal referência para garantir uma prática pedagógica condizente à sua realidade escolar. (RCNEI, 1999, p. 65)

Não é estranha ou desconhecida da sociedade brasileira a importância dada pelos povos indígenas à sua comunidade, agora reconhecida pelas políticas públicas como fundamental para o desenvolvimento de ações e práticas pedagógicas que estimulem e garantam a identidade do grupo étnico. Portanto, é imprescindível para a escola indígena a participação da comunidade no ambiente escolar. Não apenas a presença física, mas os saberes dos velhos, dos curandeiros, dos xamãs, das lideranças, dos caciques, dos pais e outros sujeitos que compõem a dinâmica da comunidade, pois todos, sem exceção, agregam conhecimentos e ajudam a conduzir o planejamento curricular. (RCNEI, 1999, p. 65)

A Comunidade Educativa, vista como uma dimensão ética para os povos indígenas, aproxima-se do que Torres denominou de Comunidade de Aprendizagem:

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Uma comunidade de aprendizagem é uma comunidade humana organizada que constrói um projeto educativo e cultural próprio para educar a si própria, suas crianças, seus jovens e adultos, graças a um esforço endógeno, cooperativo e solidário, baseado em um diagnóstico não apenas de suas carências, mas, sobretudo, de suas forças para superar carências. (Torres, 2003, p. 83)

Tanto a Comunidade Educativa como a Comunidade de Aprendizagem exigem uma aproximação entre a comunidade em que está inserida a escola. Apenas nas últimas décadas os povos indígenas têm conseguido garantir a incorporação dos conhecimentos étnicos no projeto político-pedagógico da escola de maneira a garantir a interculturalidade e permite reordenar e reinterpretar os saberes trazidos pelo patrimônio intelectual, social e moral, à luz de um novo contexto e na relação com outros conhecimentos. (RCNEI, 1999, p. 65)

Independente da proposta, seja ela da Educação indígena ou Educação Integral, pretende-se ampliar o espaço de ensino-aprendizagem dos educandos, reafirmando a importância da comunidade como agente transformador e garantidor de princípios, valores identitários e culturais. Isso não diminui o papel da escola na formação desses sujeitos, pelo contrário, a escola necessita dessa ampliação formativa para que de fato possamos chegar mais próximo possível de uma educação integral: O desenvolvimento integral dos estudantes não pode ser considerado como responsabilidade exclusiva das escolas, mas também, de suas comunidades, uma vez que, somente juntas podem re-significar suas práticas e saberes. (Educação Integral, 2009, p. 33)

3 tEmpos E Espaços Educativos

Vou chamar o velho, vou conversar com ele e mostrar como os jovens querem conhecer e querem aprender, porque o jovem de hoje não sabe a medicina da mata. Agora nós vamos começar a pesquisar com os velhos. Antigamente os jovens sabiam toda a medicina, as mulheres também sabiam todos os remédios da mata. Hoje poucos sabem, eles têm poucos conhecimentos, também na história, na matemática e na língua indígena têm poucos conhecimentos. Hoje é tudo mais difícil. (Francisco Luiz, professor Yawanawá, AC)

O depoimento de um professor indígena é emblemático ao expor um dos principais problemas atuais das comunidades indígenas: o pouco interesse dos jovens indígenas pelo conhecimento étnico. No entanto, sua fala nos revela algo muito importante: a escola é um espaço de preservação dos saberes tradicionais. Mas, para ocupar esse espaço de aprendizado é preciso construir uma relação concreta entre

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a escola e a comunidade, neste caso, indígena, com raízes fortes projeto político- pedagógico. Nessa relação dialógica é importante que os espaços da escola sejam, também, espaços da comunidade, assim como a comunidade, a casa de reza, a lavoura, a mata, o rio, as plantas sejam espaços de ensino para os estudantes indígenas.

A Educação Integral busca uma compreensão ampliada do que é um espaço escolar ao estabelecer conexões com arquivos regionais, museus, parques tecnológicos, visitas em espaços culturais, enfim. Retornamos ao que Torres já havia sinalizado sobre a Comunidade de Aprendizagem: […] todos os espaços são educadores – toda a comunidade e a cidade com seus museus, igrejas, monumentos, locais como ruas e praças, lojas e diferentes locações [...]. (Torres apud Educação Integral)

É importante ressaltar, que o sucesso pretendido manifesto no projeto pedagógico, de fortalecer o vínculo com a comunidade necessita muito mais do que apenas ações planejadas, esporadicamente. É fundamental a ampliação do tempo do estudante na escola, com reais possibilidades de envolvimento da comunidade. E o entendimento do que fazer com esse tempo escolar ampliado, tem sido um dos principais motivos de discordância sobre a efetividade da Educação Integral. Muitas instituições escolares ampliam o tempo do estudante na escola com o falso entendimento de que alunos com baixo rendimento necessitam de salas de apoio à aprendizagem no contraturno.

Em pesquisa realizada, recentemente, em um Projeto Político-Pedagógico de uma escola indígena, observamos certo descompasso no entendimento acerca da Educação Integral, do que se deve ou do que se pretende proporcionar ao estudante. Parece prevalecer, a tônica da hiperescolarização em disciplinas com as quais o estudante indígena mais tem dificuldades. Segundo o Projeto Político-Pedagógico:

A Sala de apoio é imprescindível, pois possibilita o professor em contraturno trabalhar a oralidade e leitura escrita em língua portuguesa, já em matemática possibilita trabalhar as formas espaciais, quantidade nas suas operações básica elementares, reconhecer as características dos triângulos e quadriláteros, porcentagem, interpretação de tabelas, quatros operações e situações problemas. (PPP, 2013, p. 39)

As disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática são os principais problemas de aprendizagem encontrados na escola, muito em decorrência dos professores não indígenas que estão em sala de aula, e não falam a língua materna daquele grupo étnico. Outro agravante está relacionado ao tempo contratual dele na escola. Poucos professores concursados aceitam trabalhar nas terras indígenas. Abre-se um processo seletivo anual para contratar professores para atuarem nas escolas indígenas, muitas vezes com licenciaturas inconclusas, sem conhecimento do grupo indígena, da sua história, da sua organização social, do seu modo de vida, enfim. Essa situação repete-se anualmente.

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Embora, tenhamos professores comprometidos com o ensino nessas instituições, boa parte não assume uma postura mais séria em relação a melhoria do ensino, comprometendo o aprendizado desses estudantes. O modo como algumas escolas indígenas estão estruturadas na atualidade, compromete o desenvolvimento da Educação Integral, em razão do descompasso entre os professores não índios em uma escola dentro de uma comunidade indígena, pois é quase nula a democratização da gestão (EDUCAÇÃO INTEGRAL, 2009, p.38). A comunidade não é reconhecida pela escola como um espaço importante de aprendizado para o estudante indígena, e sua participação é apenas para resolver problemas do qual a escola não tem autonomia:

A instituição trabalha em parceria com as Lideranças da Comunidade. Nesse sentido, quando há problemas graves com os educandos em relação a frequência escolar, indisciplina ou outras situações que não possam ser resolvidas pela gestão da escola, são convocadas as lideranças para, juntamente com a direção, equipe pedagógica e pais de aluno, buscar ajuda com outras instituições da rede de apoio e proteção como o Conselho Tutelar e a Patrulha Escolar. Todo esse processo, quando ocorrido é lavrado em Ata. (PPP, 2013, p. 21)

No contexto em que a escola está inserida é fundamental a participação da comunidade na vida escolar. É preciso o reconhecimento pela equipe gestora da escola, especialmente aquelas em que boa parte dos professores não são indígenas, de dialogar com a comunidade educativa. Ou seja, com aqueles sujeitos que ocupam um lugar importante na vida social do grupo étnico, dar um reordenamento naquilo que a escola não consegue preencher. A relação da escola com a comunidade não pode se reduzir à composição de conselhos escolares e associações de pais, mestres e funcionários. A pedagogia indígena precisa se fazer presente na vida escolar, mas para isso é fundamental o reconhecimento pela equipe pedagógica dos saberes tradicionais na formação do estudante.

A escola, com toda sua equipe, devem planejar suas estratégias pedagógicas com a comunidade, mas de uma forma que essas ações ganhem vida, não apenas no PPP, mas com os todos os sujeitos envolvidos nesse grande desafio. É lógico que as dificuldades para sua efetividade são imensas nas comunidades indígenas, pela falta de comprometimento dos professores em dar espaço para a comunidade manifestar seu conhecimento na escola. Um dos principais problemas nessa relação é o total desconhecimento que os professores têm sobre o grupo indígena ao qual ele está lecionando. A equipe gestora precisa constantemente, proporcionar momentos de formação aos professores sobre a história do grupo indígena, o modo como se organizam socioculturalmente, sua cosmologia, sua visão de mundo, enfim. Precisamos reconhecer que o professor só poderá planejar ações com a comunidade se ele tiver

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um mínimo de informações sobre o grupo étnico. Caso contrário, qualquer proposta não alcançará o sucesso pretendido.

Entretanto, não podemos atribuir totalmente aos professores, o insucesso na educação escolar indígena e na educação integral. Há um conjunto de situações que podem inviabilizar as duas propostas, entre elas a falta de oportunidade para os estudantes conhecerem outros espaços formativos, em virtude de que as escolas estão localizadas dentro da Terra Indígena (TI), há quilômetros de distância das grandes cidades. Grande parte da população dos municípios onde as TI estão localizadas, ignoram a presença deles. Inclusive, sofrem discriminação constantemente. Por sua vez, é quase impossível encontrar profissionais com formação em música, teatro e outras, que se disponibilizem a trabalhar nas comunidades indígenas.

Enfim, convém destacar que o governo federal tem feito um esforço contínuo para mudar o cenário da educação do país, por meio de financiamento de programas e projetos. O Programa Mais Educação é um bom exemplo. De acordo com Gesuína Leclerc, o Programa mais Educação é uma ação conjunta entre os Ministérios do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, da Cultura, do Esporte e da Educação, que por meio do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, financia ações nas escolas que aderem à Educação Integral. O programa, por meio de financiamento, incentiva à ampliação do tempo de permanência dos estudantes, por meio de ações coordenadas pela equipe gestora da escola (LECLERC, 2012, p. 308). Essas ações estão articuladas em duas frentes: uma na escola, criando subsídios para sua manutenção e funcionamento com ampliação do tempo na escola, e outra, fora do ambiente escolar, articuladas com a comunidade.

Analisando o projeto político-pedagógico de uma escola indígena, identificamos que a instituição aderiu ao Programa Mais Educação, mas não especifica o que é oferecido para os alunos do ensino fundamental no contraturno. Segundo o PPP, o Programa Mais Educação objetiva aumentar a jornada escolar das crianças, para que não fiquem as margens de uma estrada federal, que passa no meio da comunidade e ao lado da escola indígena (PPP, 2013). A escola e a comunidade, para esta ação, tentam resolver um problema sério de atropelamento que ocorre constantemente naquela comunidade. Evidentemente, que estamos longe de operacionalizar o Programa Mais Educação no que realmente ele se propõe.

4 considEraçõEs finais

É comum ouvirmos em espaços escolares e universitários, que os resultados de uma política pública para a educação só serão sentidos a longo prazo. Mas, é fato que podemos acelerar esse processo a partir da nossa prática em sala de aula, participando da gestão da escola e reforçando o diálogo com a comunidade em que está inserida a escola.

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Gostaria de acrescentar um breve comentário à epígrafe deste texto: imaginem o quanto seria produtivo e interessante para o estudante, se o professor pudesse articular várias áreas de conhecimento com as pouquíssimas informações ali contidas. Como exemplo, poderíamos fazer uma excelente discussão sobre o grupo étnico, articulando disciplinas como história, antropologia, e sociologia; os conceitos da matemática, da física e da biologia. Ou seja, conhecimentos científicos produzidos pela humanidade. Entretanto, a educação escolar indígena exige muito mais que isso. É imprescindível à participação da comunidade na formação dos estudantes com os saberes tradicionais acumulados há milhares de anos. Mas para isso, a escola precisa se transformar e, nesse caso é extremamente importante o que Freire e Shor nos ensinam: […] a transformação não é só uma questão de métodos e técnicas […]. A questão é o estabelecimento de uma relação diferente com o conhecimento e com a sociedade. (FREIRE; SHOR, 1996)

rEfErências

AMOROSO, Marta Rosa. Catequese e evasão: etnografia do aldeamento indígena São Pedro de Alcântara, Paraná (1855-1895). Tese de Doutoramento. São Paulo: Departamento de Antropologia, FFLCH-USP, 1998.

BARROS, M. C. D. M. A missão Summer Institute of Linguistics e o indigenismo latino-americano: história de uma aliança (décadas de 1930 a 1970). Revista de Antropologia, São Paulo, USP, 2004, v. 47, nº1.

BITTENCOURT, C. M. F.; SILVA, A. C. da. Perspectivas históricas da educação indígena no Brasil. In: PRADO, M. L. C.; VIDAL, D. G.(org). À margem dos 500 anos: reflexões irreverentes. São Paulo: Edusp, 2002, p. 64-81.

BRASIL. Constituição Federal. Brasília: Imprensa Oficial, 1988.

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EDUCAÇÃO INTEGRAL NA ESCOLA DO CAMPO: DESAfIOS E PERSPECTIVAS

Rosmari T. D. Pelin Juliana Wrublewski

1 introdução

Durante muito tempo, a educação do campo ficou esquecida pelas políticas públicas, negando à população campesina o acesso à educação de qualidade. Afirmar esse pressuposto de esquecimento parece irreal, mesmo em tempos em que muitas mudanças permeiam o campo educativo, na busca pela igualdade de direitos e pela qualidade na educação. É importante salientar que essa luta pela igualdade de direitos, e aqui se frisa o direito à educação, já iniciou há muito tempo e se materializou em legislação pela Constituição Federal de 1988, a qual em seu artigo 206 (BRASIL, 1988) especifica alguns princípios do direito de igualdade de condições para o acesso e permanência na escola e garantia de padrão de qualidade, que possibilitou aos sistemas de ensino a gestão da escola com mais autonomia para atender às especificidades e às particularidades do ensino de acordo com a realidade.

A Lei n.º 9.394, denominada Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional (BRASIL, 1996), além de garantir os princípios de acesso e permanência na escola, visando, também, à qualidade do ensino, estabelece em seu artigo 34, que a jornada escolar no ensino fundamental incluirá pelo menos quatro horas de trabalho efetivo em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o período de permanência na escola, sendo acrescido pelo parágrafo segundo, que a critério dos sistemas, o ensino fundamental será progressivamente ministrado em tempo integral. Por isso, a educação integral está no alvo das discussões das políticas públicas educacionais para qualificar a educação e ganha força a cada ano, por buscar aprimorar e articular o desenvolvimento da educação pública e se faz como estratégia para a superação das desigualdades sociais e também aumentar os índices de desenvolvimento da Educação em todo o país.

Nesta perspectiva, a implantação da Educação em Tempo Integral na Escola Municipal de Ensino Fundamental Jaguaretê, localizada no meio rural, interior de Erechim/RS, ocorreu no início deste ano de 2014, com o Programa Mais Educação e parceria da Prefeitura Municipal de Erechim com o Governo Federal, trazendo nova proposta à comunidade escolar: atender a todos os estudantes, desde o Pré-A até a 8ª

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série em tempo integral como possibilidade de igualdade de direitos às comunidades que habitam o campo. Os estudantes do Ensino Fundamental participam de várias atividades oferecidas pelo Programa como: Arte Gráfica e Literatura, Iniciação Científica, Agroecologia – Canteiros Sustentáveis, Campos do Conhecimento além de outras atividades, em contrapartida, a Prefeitura Municipal oferece para qualificar o tempo de permanência dos estudantes na Escola: Música, Leitura e Produção Textual, Histórias em Quadrinhos, Hora do Conto, Inglês, Esportes, Informática Educativa; e em parceria com a Fundação Banco do Brasil o Programa AABB Comunidade. Na Educação Infantil, são proporcionados as atividades de Hora do Conto, Informática Educativa, Psicomotricidade, Musicalização, Inglês e Cultura Italiana.

A fim de relatar e analisar a experiência da Educação Integral na escola do campo,1 buscou-se reestruturar o Projeto Político-Pedagógico (PPP), objetivando a sua adequação às práticas pedagógicas que atendam às expectativas da educação no campo, pelo envolvimento da comunidade escolar num processo de gestão democrática. Para tal, perseguiram-se os seguintes objetivos específicos: analisou-se e implementou-se o PPP existente, elencando mudanças necessárias para atender às expectativas da comunidade escolar, a fim de contribuir na reestruturação das práticas pedagógicas do processo ensino e aprendizagem, contemplando a jornada ampliada; buscou-se contribuir para a melhoria da qualidade do atendimento educacional nas modalidades de ensino que a escola oferece, sistematizando os saberes e contribuições dos diferentes segmentos da comunidade escolar; procurou-se garantir a participação da comunidade escolar na reestruturação dos processos de educação integral, com reuniões e assembleias realizadas no espaço escolar; registrando e sistematizando as contribuições, análises, debates, ideias e sugestões obtidas durante as reuniões e questionários; implementando práticas pedagógicas que promovam a aprendizagem dos estudantes, de modo a incidir progressivamente na melhoria do desempenho escolar.

Buscou-se, por meio desta implantação, abrir as possibilidades de participação da comunidade com a escola, pois participar implica não só se fazer presente nos eventos, reuniões e atividades, participar envolve expressão de ideias, anseios, expectativas, conhecimentos, além de outros elementos que caracterizam a efetiva participação, tal como a colaboração.

O trabalho teve como procedimentos metodológicos reuniões para estudo do PPP existente, análises, discussões da pesquisa-ação (FRANCO, 2005) entre os diversos segmentos da comunidade escolar, visando a garantir a participação e o envolvimento de mais pessoas possíveis neste processo.

1 De acordo com Caldart (2002, p. 18) as denominações “escola do campo” e “escola no campo” possuem os seguintes significados: “Do – o povo tem direito a ser educado no lugar onde vive. No – o povo tem direito a uma educação pensada desde o seu lugar e com a participação, vinculada a sua cultura e as suas necessidades humanas e sociais”.

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2 a Educação intEGral na Escola do campo – possiBilidadEs

O Brasil é um grande produtor de alimentos, mas, segundo o ministro Aloizio Mercadante (BRASIL, 2012, p.1), o país tem uma dívida com as populações camponesas, e destaca:

Nós temos, aproximadamente, 30 milhões de pessoas que vivem no campo, o Brasil é a segunda maior agricultura do mundo, produz 300 bilhões de dólares e exporta quase 95 bilhões de dólares, no entanto nós não temos uma política específica de educação para a população que vive no campo brasileiro.

Assim, apesar do campo abrigar apenas 13% dos estudantes brasileiros, metade das escolas do Brasil estão localizadas na esfera rural. Ironicamente, porém, a média dos anos em que um aluno permanece na sala de aula neste meio é de apenas 4 anos, em contraposição ao aprendiz das cidades, o qual contabiliza uma escolaridade de 7 anos.

Além disso, pelo menos 50% das escolas rurais apresentam uma estrutura precária, com somente uma classe, ao contrário do perímetro urbano, no qual mais da metade dos estabelecimentos de ensino tem espaço para mais de 300 estudantes. Um dos fatores que mais propiciaram praticamente o abandono destas escolas foi a saída dos agricultores para os centros urbanos, o que provocou uma redução do nível demográfico no ambiente rural.

Pensando em reverter este quadro o Governo Federal lançou, em março de 2012, o Programa Nacional de Educação do Campo (Pronacampo), a fim de oferecer apoio técnico e financeiro aos Estados, Distrito Federal e Municípios para implementação da política de educação no campo, atendendo a escolas rurais e quilombolas. No campo, 23,18% da população com mais de 15 anos é analfabeta e 50,95% não concluiu o ensino fundamental. O Pronacampo baseará suas ações em quatro eixos: gestão e práticas pedagógicas, formação de professores, educação de jovens e adultos e educação profissional e tecnológica. Uma das ações previstas é a educação contextualizada, que promova a interação entre o conhecimento científico e os saberes das comunidades.

Porém, pensar a Educação não é tarefa somente do Poder Público, mantenedora ou dos professores. É tarefa também de quem mais se utiliza dela como meio de apropriação e construção do conhecimento: a comunidade escolar. Nesta perspectiva, foi aplicado um questionário às famílias no intuito de verificar e sistematizar os saberes e contribuições da comunidade escolar – segmento pais. O questionário possibilitou a aproximação da Escola com as famílias, além de transformá-las em sujeitos ativos

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de um processo de mudança e situações de aprendizagem para todos, ouvindo suas opiniões em relação ao processo educativo, sendo um dos instrumentos para o enriquecimento dos estudos e melhor conhecimento sobre o que/como a comunidade pensa o processo educativo desenvolvido na escola. Pelo questionário, visto já como uma forma de participação, as famílias puderam expressar o seu pensamento, suas expectativas e necessidades em relação à escola e seu processo de educação em tempo integral. Esse saber presente na comunidade contribuiu, de forma significativa, na reestruturação do Projeto Político-Pedagógico, possibilitando a reorganização de algumas atividades desenvolvidas no turno integral, pois as necessidades identificadas foram colocadas como pauta e desafios da gestão.

Por isso, já dizia Vasconcellos (2012):

[...] São as pessoas, os sujeitos que historicamente assumem a construção de uma prática transformadora. Antes de mais nada, precisamos de uma ‘matéria-prima’ fundamental: as pessoas, que buscam, sonham, pensam, interrogam, desejam. Numa concepção libertadora, sujeitos, projetos e organização devem se articular a partir do fundamental, que são as pessoas, construtoras e destinatárias da libertação. (VASCONCELLOS, 2012, p.37)

Sendo o processo fruto de um trabalho coletivo, alicerçado no direito de igualdade, no respeito e na justiça, vai além do simples querer. Existem pressupostos fundamentais para que a Gestão Democrática aconteça de fato, sendo imprescindíveis a participação e a autonomia.

3 pEsQuisa-ação

Trata-se de uma pesquisa-ação com base em Franco (2005) realizada a partir das experiências da implantação do tempo integral efetivado no início deste ano, na escola do campo.

Os sujeitos do estudo foram todos os envolvidos na comunidade escolar, ou seja, direção, coordenação, professores, monitores, estagiários, estudantes, funcionários, pais e responsáveis. Todavia, houve uma fase do processo que utilizou a aplicação de um questionário destinado aos pais e responsáveis pelos estudantes, que foi respondido por 69 famílias, caracterizando-os também como sujeitos do estudo.

O instrumento de coleta de dados na fase de pesquisa de campo com pais e responsáveis, foi um questionário semiestruturado contendo cinco questões abertas, o qual foi desenvolvido pela Professora Comunitária conjuntamente com a Coordenadora da Diretoria de Educação Integral da mantenedora. As perguntas objetivaram descobrir a opinião dos pais e responsáveis sobre o Programa Mais Educação e a contribuição

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deste na aprendizagem dos filhos; sentem-se satisfeitos com o Programa, apontando o que, na opinião dos respondentes, poderia ser diferente; avaliar e dar sugestões quanto à alimentação e ao transporte escolar; os projetos desenvolvidos atendem às expectativas e; finalizando o questionário perguntou o que poderia ser melhor na escola.

Após a coleta de dados, os questionários foram analisados e as respostas semelhantes foram agrupadas na forma de tabelas para facilitar a compreensão e a análise propriamente dita.

4 a socialiZação dos saBErEs E ExpEctativas da comunidadE

A tabulação dos dados do questionário possibilitou a interação do que as famílias esperam da escola, a satisfação do trabalho realizado e o que poderia ser diferente. Dessa forma, a socialização dos saberes e expectativas da comunidade abrem novas possibilidades de mudança nos rumos do processo educativo.

A primeira pergunta do questionário se referia ao Programa Mais Educação, se as atividades diversificadas ali mencionadas estariam contribuindo na aprendizagem do (a) filho (a) e de que forma. As respostas de 64 famílias foi de satisfação em relação ao programa e elencaram que as atividades diversificadas estão contribuindo para a melhora de diversos aspectos na vida dos filhos, como evidenciam as seguintes falas dos respondentes:

Meu filho (a) está mais atencioso, dedicado, prestativo, convive melhor, organizado, responsável, escreve melhor, tem mais tempo para estudar, sua autoestima aumentou. Está adquirindo mais conhecimento para a vida. Tem acesso a diversas atividades novas, oportunidade de aprendizado. Aprendizado psíquico, moral e emocional.

Seu desempenho escolar aumentou. Tem mais vontade de ir para a Escola, pois tem atividades novas. Se expressa melhor. Aumento do raciocínio Lógico. Os resultados com certeza virão mais tarde, no decorrer da vida. Incentivo a permanência no campo, com as atividades ligadas a este meio.

O nível de satisfação está muito bom e é um indicativo de que a ampliação da jornada escolar está trazendo resultados significativos na aprendizagem dos filhos e também na autoestima. Foi importante rever as questões que não estavam satisfazendo a comunidade escolar e fazer adequações possíveis e necessárias para melhorar ainda mais o processo de educação integral na escola.

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A questão que buscou saber como as famílias avaliam o Programa Mais Educação, demonstrou que 67 famílias encontram-se satisfeitas e apenas duas famílias estão insatisfeitas, conforme evidencia o Gráfico 1.

Gráfico 1 – Avaliação do Programa Mais Educação

Fonte: Dados da pesquisa

Nesta questão, os pais fizeram as seguintes considerações:

Inserir ainda mais atividades ligadas ao campo, para valorizar o meio onde eles vivem. Grande avanço na Informática Educativa, Artes, Iniciação Científica, Oficinas de Jogos, Violão, Inglês que será a língua mais falada no mundo e todos precisamos saber. As atividades são dinâmicas, que ensinam para o futuro. Aprendem outras línguas. AABB Comunidade que integra com a cidade. Na agroecologia, meu filho(a) me ensina também em casa.

É importante destacar o interesse para que haja mais atividades voltadas às práticas agrícolas, no intuito de manter o interesse pela permanência no campo. Sabe-se que os jovens auxiliam nos trabalhos da propriedade, por isso, cada realidade precisa fazer as adequações necessárias, de forma a manter a coerência entre as necessidades da comunidade escolar e os projetos educacionais vigentes, em nível de Ministério da Educação. Nesta perspectiva, todas as atividades relacionadas ao Programa Mais Educação na Escola para o ano de 2015 foram escolhidas com a comunidade escolar, por meio de um bilhete enviado às famílias com as atividades previstas para que assinalassem o que viria ao encontro dos interesses dos estudantes e pais. Após, foi feito o levantamento das mais solicitadas e junto ao PDDE Interativo, feita a adesão das atividades para o ano seguinte.

Por isso, na definição dos rumos da escola, a comunidade precisa ser protagonista das mudanças necessárias para que o processo educativo seja o reflexo dos anseios, ideais, necessidades, baseadas no diálogo e na troca de ideias, fortalecendo ainda mais o processo de gestão democrática. Assim, Paro, destaca que:

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[…] se estamos interessados na participação da comunidade na escola, é preciso levar em conta a dimensão em que o modo de pensar e agir das pessoas que aí atuam facilita/incentiva ou dificulta/impede a participação dos usuários. Para isso, é importante que se considere tanto a visão da escola a respeito da comunidade quanto sua postura diante da própria participação popular [...]. (PARO, 2000, p.47)

A questão para avaliar e sugerir a Alimentação Escolar trouxe como resposta o alto nível de satisfação, pois 68 respondentes afirmaram se encontrarem satisfeitos, complementando com os seguintes apontamentos: cardápio diversificado e com qualidade, sendo sugerido o acréscimo de suco no almoço e que fosse servido mais um lanche à tarde.

Sobre esta questão é necessário fazer as seguintes ponderações: os estudantes já recebem um lanche à tarde, sendo que neste período há colheita de frutas do pomar da escola, sendo possível servi-los antes de irem para casa. As nutricionistas orientaram a servir uma fruta cítrica ao invés de suco para facilitar a digestão.

O transporte escolar também foi avaliado de forma positiva: 62 famílias satisfeitas, quatro insatisfeitas e três que não avaliaram. As considerações que fizeram foram:

Estradas com complicações, podendo provocar acidentes.Reorganizar horário do transporte, passa muito cedo. Estudantes sem transporte por causa do trajeto perigoso. Os transportadores são bem atenciosos e responsáveis.

Em atenção a estas considerações, a equipe escolar fez os ajustes para melhor atender às necessidades dialogando com os transportadores e a mantenedora. Quanto às estradas precárias com trajetos perigosos, as reivindicações foram encaminhadas ao poder público municipal para que fossem tomadas as providências cabíveis.

A pergunta de número quatro enfocava se os projetos desenvolvidos atendiam às expectativas das famílias. Um total de 62 famílias considerou satisfatórios os projetos, três insatisfatórios e quatro não avaliaram a questão, conforme pode ser verificado no gráfico 2.

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Gráfico 2 – Avaliação dos projetos desenvolvidos

Fonte: Dados da pesquisa

Com relação a esta questão, algumas considerações foram feitas pelos respondentes como:

No início não achamos interessante, mas no decorrer estamos vendo mudanças significativas. Estão se preparando para o mercado de trabalho. Contribuem para o aprendizado. Minhas filhas estão aprendendo na Agroecologia, o que eu não tenho tempo para ensinar. Nossos filhos estão nos ensinando também.

As contribuições das famílias foram significativas para a escola, pois revelaram a forma de pensar, trazendo possibilidades da continuidade no processo de educação integral e as possíveis adequações necessárias da escola e da mantenedora. Vasconcellos (2012) destaca a importância da participação coletiva como possibilidade de organização dos sujeitos na articulação e decisão sobre os caminhos a seguir, aumentando as chances de materialização das ações planejadas. Portanto, é uma estratégia para que os sujeitos sejam contemplados de acordo com as suas convicções e suas propostas para a qualificação do processo.

O retorno da comunidade escolar tem sido tão efetivo que recentemente a Escola foi palco da gravação do Programa Campo e Lavoura, exibido pela Rede Globo no dia 20 de abril do corrente ano. A reportagem enfatizou a importância de se manter na escola atividades diversificadas que, a partir do Programa Mais Educação, vem contribuindo para que a comunidade escolar possa interagir na escola como forma de valorização das atividades que exercem na propriedade.

A última questão abre a possibilidade dos respondentes opinarem sobre o que poderia ser diferente na escola. Dentre os apontamentos estão os seguintes:

Continuar com o cuidado da alimentação. Conscientizar que o mercado de trabalho exige pessoas preparadas e

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aperfeiçoadas. Que todos utilizem o uniforme. Cuidar com a exposição ao Sol. Assegurar que as crianças não percam o Mais Educação. Na Escola está tudo muito bom [resposta dada por grande número de famílias]. Acompanhamento odontológico na UBS.

Fazendo uma análise destas considerações, percebe-se que a escola está no rumo certo, qualificando o seu processo a cada dia e a adesão ao Programa Mais Educação veio para somar na vida de toda a comunidade escolar. Algumas considerações fazem com que a Equipe Escolar e demais profissionais que atuam na escola busquem novas alternativas para contemplar as expectativas de todos os envolvidos.

5 rEdimEnsionando as prÁticas na Educação no campo

O Programa Mais Educação possibilita diversas alternativas de trabalho na escola e junto com ele, a Educação em Tempo Integral. Nesta perspectiva, o recurso federal oriunda do programa, possibilitou a aquisição de diversos recursos pedagógico e didáticos para incorporar e dinamizar as práticas pedagógicas do processo ensino e aprendizagem. A jornada ampliada também trouxe a oportunidade para que os estudantes pudessem vivenciar diversas atividades diferenciadas. Pelas respostas das famílias obtidas no questionário, algumas práticas estão sendo redimensionadas para contemplar as expectativas da educação na escola no campo. A atividade de canteiros sustentáveis traz um pouco da prática cotidiana das famílias para a escola. Os estudantes têm a oportunidade de trocar ideias com os monitores e professores sobre qual a melhor alternativa de plantio, de organização dos espaços da horta, formas de adubação e irrigação, formas de plantio e épocas afins, além de outros. A escola está organizando um seminário da Agricultura Familiar para o segundo semestre deste ano, com o objetivo de trazer as famílias para relatar sobre a produção na propriedade e sobre a qualidade de vida existente no meio rural. Atividades integradas com o ensino comum acontecem sistematicamente, integrando parcerias da Emater/RS e o Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor (CAPA), com palestras e outras atividades, vinculando ainda mais os processos à educação no campo.

Outras atividades de visitação às propriedades para conhecer as formas de produção agrícola, também fazem parte da rotina da educação integral, onde os estudantes podem conhecer um pouco da realidade das famílias que integram o campo.

É importante salientar que os estudantes participam de atividades no meio urbano, pelo Programa AABB Comunidade. Essa atividade se torna fundamental para que os estudantes não fiquem apenas no espaço rural, mas conheçam o espaço

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urbano, de forma a contemplar outros espaços de aprendizagem. Essa alternância entre espaço rural e urbano está sendo positiva não restringindo a viver e aprender somente na sua realidade, mas sim expandir seus horizontes de vivências e construção do conhecimento.

6 considEraçõEs finais

A experiência de Educação em Tempo Integral, vivenciada pela escola neste ano de 2014, está fortalecendo o processo ensino e aprendizagem. As atividades diversificadas contemplam a realidade do campo, fazendo relação com o ensino regular. Considera-se que é preciso fortalecer ainda mais o entrelaçamento das atividades da jornada ampliada com o ensino comum, ou seja, estreitar mais as pontes de reflexão e envolvimento neste processo de implantação. Claro que é o primeiro ano e no decorrer da caminhada, os interlocutores perceberão que o espaço de educação integral precisa ser um espaço que traga possibilidades de ampliação dos conhecimentos e o desenvolvimento de habilidades aos sujeitos envolvidos, de forma que venham a colaborar para o enfrentamento dos desafios atuais.

A estruturação da logística do atendimento ao estudante em jornada ampliada implicou na disposição de recursos humanos, materiais, espaços e tempos, sendo tais recursos disponibilizados pela mantenedora para atender a esta nova prática. Frisa-se aqui, também, o permanente diálogo da escola, comunidade e mantenedora, para que as adequações, ajustes e demais demandas fossem feitas e atendidas de forma a contemplar as necessidades decorrentes. Consideram-se significativas as vivências da população campesina e, nesta perspectiva, a escola tem um grande compromisso social de potencializar as aprendizagens inerentes às atividades agrícolas (agricultura, agroindústrias, demais culturas do campo) no intuito de valorizar e despertar o interesse do estudante e da família pela permanência no campo e a necessidade de buscar a qualidade de vida neste meio.

A escola, portanto, precisa buscar constantemente, a implementação do Projeto Político-Pedagógico de forma a atender às expectativas da comunidade escolar e manter a consonância com as leis educacionais que fomentam a educação. A Educação em Tempo Integral trouxe à comunidade escolar a oportunidade de construção de uma nova história.

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DO PLANEJAMENTO À PRÁTICA DOCENTE: RELATO DE IMPLANTAÇÃO DO PROGRAMA

MAIS EDUCAÇÃO EM UMA CIDADE DO OESTE CATARINENSE

Marineiva Moro Campos de Oliveira 1

1 introdução

Embora a prática do professor seja unidade do planejamento, constitui objeto de estudo na formação continuada, formação em que todos os esforços centram-se em oferecer ao aluno condições para a aquisição e assimilação do conhecimento transmitido pelo professor, e ao professor possibilitar o planejamento de suas práticas. Apesar de, muitas vezes, ainda, essas formações chegam à escola de modo pronta e acabada, o que podemos perceber no caso de palestras.

Legitima-se a importância da ampla intervenção e coletividade dos professores; quando estruturadas, essas formações continuadas, principalmente para a Educação Integral, que visa ampliar a jornada escola e assim construir percursos e itinerários com o intuito ampliara a promoção do aprendizado do aluno. No Programa Mais Educação, do Município de Xaxim/SC, no qual se descreve esse relato, é o professor quem prepara as condições de aprendizagem a partir da problematização da a realidade, a fim de que os estudantes encontrem soluções, o que leva ao desenvolvimento de diversas competências e habilidades, cujo sucesso depende do planejamento das aulas por parte do professor.

O objetivo deste estudo é relatar as dificuldades encontradas ao iniciar o Programa Mais Educação. No ano de 2013, foram entrevistados três monitores do Programa, dois professores da escola da Rede Municipal de Xaxim/SC, na qual ocorre o Programa Mais Educação e relatos da coordenadora do Programa Mais Educação. Assim, apresenta-se como ocorreu o planejamento das práticas dos professores do Programa com as quais pode-se evidenciar a necessidade da construção do planejamento de forma coletiva.

A fim de dar conta desse objetivo, na seção seguinte, discute-se sobre o Programa

1 Pedagoga da Rede Municipal de Ensino, Mestranda em Educação do Programa de Mestrado em Educação da UNIOESTE – Campus de Francisco Beltrão. Grupo de Pesquisa Representações, espaços, tempos e linguagens em experiências educativas – RETLEE. [email protected].

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Mais Educação, o primeiro contato com o programa; as relações dos educadores do programa na construção do planejamento de suas práticas; as formações continuadas que contribuam com as práticas dos professores do Programa Mais Educação. Na sequência, apresentamos a metodologia utilizada para a realização da pesquisa; seguida da apresentação e análise dos resultados, parte em que se discutem os resultados. Por fim, descrevem-se as escritas finais.

2 adEsão ao proGrama mais Educação pEla Escola

O Governo Federal brasileiro na busca por ofertar uma escola pública que desenvolva seu trabalho na perspectiva de Educação Integral, cria o Programa Mais Educação que abrange todo território brasileiro. Este Programa é uma ação que busca oferecer aos alunos de escola pública uma educação integral, ampliando o tempo da jornada escolar com a realização de atividades socioeducativas em turno oposto da sua participação no currículo obrigatório. (Brasil, 2007).

O Município de Xaxim/SC aderiu em apenas uma escola, de periferia, o Programa Mais Educação no ano de 2011. Buscava-se com esse programa proporcionar aos alunos uma educação que contemplasse o seu desenvolvimento pleno considerando o aspecto afetivo, intelectual, moral e social que constitui o ser como um todo.

Desse modo, as oficinas escolhidas foram de Recreação e Lazer, Cine Clube, Banda Fanfarra, Matemática, Letramento e Horta, a escolha dessas deu-se por acreditar que essas pudessem colaborar efetivamente para o desenvolvimento pleno e integral do indivíduo, propiciando uma aprendizagem significativa que verdadeiramente prepare o indivíduo para a vida social.

Ao escolher as oficinas, a preocupação foi quanto ao espaço físico para que essas pudessem ser realizadas. Firmou-se, então, parceria com o Centro de Atendimento à Criança e ao Adolescente (CEACA), cujo local foi utilizado para a realização da oficina de Cine Clube; os almoços e as demais oficinas foram na própria escola.

2.1 a EscolHa dos monitorEs E o primEiro contato com o proGrama mais Educação

A parceria com o CEACA estabelecida pensou-se, então, em contratar monitores, que poderiam assumir as oficinas. A escolha recaiu nos estagiários que atuavam no CEACA; assim, contrataram-se doze (12) de diferentes áreas. Para o almoço foi possível contar com as cozinheiras do CEACA e algumas da escola; para a oficina da horta foi contratado um senhor da comunidade, que era presidente da Associação de Pais e Professores (APP); nessa oficina a professora da disciplina de Ciências da escola auxiliou. Para as demais, contrataram-se dois (2) monitores por oficina, que cursavam o Ensino Médio, salvo em dois casos que cursavam psicologia e Educação Ambiental.

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Ao iniciar o Programa, depara-se com a necessidade do planejamento que segundo Vasconcellos (2000, p. 79) “[...] planejar é antecipar mentalmente uma ação ou um conjunto de ações a ser realizadas e agir de acordo com o previsto. Planejar não é, pois, apenas algo que se faz antes de agir, mas é também agir em função daquilo que se pensa”.

Em conformidade com as escritas de Vasconcellos, entende-se que planejar é antecipar ações, mas, que para isso, antes é necessário conhecer sobre o que se vai planejar, e, nesse sentido, surge a necessidade de expor os objetivos do Programa de forma esclarecedora evitando possíveis dúvidas sobre o que é o Mais Educação, assim seria o primeiro passo para a construção do planejamento.

Nesse sentido, organizou-se um momento de apresentação do Programa Mais Educação à comunidade, a todos da unidade escolar incluído os estagiários do Programa. Após, organizou-se um momento de planejamento, no qual alguns, poucos, professores da escola se dispuseram em auxiliar na elaboração do planejamento. A dificuldade encontrada foi que os professores conduziam essa elaboração de maneira igual à do currículo obrigatório escolar. Moll (2004, p.410) afirma que o planejamento deve ser diferenciado, não se trata de esvaziamento de conhecimento, trata, pois, de uma necessidade de estruturar um planejamento coerente com a proposta do Programa Mais Educação, que de acordo com a autora:

É uma estratégia para atingir a Educação Integral vista como o modelo ideal para possibilitar o desenvolvimento integral do indivíduo, de maneira a prepará-lo para vida por meio de práticas educacionais significativas. Surgiu em 2007, através da iniciativa do Governo Federal, tal política traz o ideal de desenvolver, em todo território brasileiro, uma Educação Integral.

No entanto, para a concretização de um ideal desse porte, muito ainda havia de se fazer, principalmente na questão de que o Programa fosse aceito por todos, pois, além de auxiliar na aprendizagem do aluno, possibilita melhoras em seu comportamento, pois, com a participação nas oficinas esse interage e conhece ambientes diferentes do, em geral, tradicional de sala de aula.

2.2 a construção do planEJamEnto na Escola

É na relação com o outro que as unidades podem ser contempladas, nessa premissa, Sacristán (1999, p. 99), evidencia a importância da coletividade.

Ação genuinamente humana, aquela que merece esse nome, é sempre reflexiva, ou seja, possui efeitos duradouros na pessoa que a realiza, e não somente no meio que se desenvolve.

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Somos feitos por aquilo que fazemos, pelo modo como agimos, então, um efeito desse reflexo da ação (reflexão é o processo ou o resultado de refletir e de reflexionar) é a geração da consciência sobre a ação, que é manifestada na forma de representações, de lembranças ou de esquemas cognitivos e crenças que podem ser comunicadas, nutrindo a memória do material para pensar sobre as ações passadas e presentes e para orientar outras futuras.

Pensar em ações passadas e presentes como norte de ações futuras é um ato de coletividade, o qual se busca com o Programa Mais Educação. Essa coletividade pode ser entendida como estratégia de estabelecer uma relação entre professores e monitores para que ocorra a construção de um planejamento coletivo que é “Um processo de racionalização, organização e coordenação da ação docente, articulando a atividade escolar e a problemática do contexto social”. (LIBÂNEO1994, p. 222)

No coletivo é que ocorre a integração e a interação com vistas a obter resultados positivos no processo de ensino e aprendizagem do aluno, pois, trocas de conhecimentos podem ser estabelecidas melhorando e adaptando o planejamento. Salienta-se que a busca pela coletividade e a interação entre professores e monitores, dar-se-á pela necessidade de que as práticas dos monitores atendam à demanda das oficinas e de certo modo que sejam diferenciadas do currículo formal da escola.

Ao adentrar-se nesse debate, evidencia-se a real necessidade de que haja um processo de formação continuada com a temática de Educação Integral, mas que essa seja pensada de acordo com os estudos de Mizukami (2002) a qual destaca que se deve pensar principalmente que aprender a ensinar e a se tornar professores são processos contínuos e não eventos voltados à resolução de problemas imediatos, ou seja, não pode ser uma breve apresentação dos objetivos, mas uma longa discussão e alteração desses.

Acredita-se que com formações continuadas com a temática, os professores da escola e os monitores poderiam estar em comunhão de ideias para a construção de planejamentos que auxiliem na melhora do processo de ensino-aprendizagem de nossos alunos.

3 o rElato dE como ocorrEu o planEJamEnto do proGrama mais Educação

No primeiro dia, segunda-feira do mês de outubro de 2001, inicia-se o Programa Mais Educação na Escola. Neste dia, após a apresentação breve dos objetivos do Programa para a comunidade e a todos da escola, nos reunimos em uma sala com a direção da escola, os monitores, e dois professores; o anseio começa logo no primeiro dia, os professores que deveriam estar presentes para o debate e a construção do primeiro planejamento não ficaram.

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Continuando2 na reunião, lembro que pegamos alguns livros com títulos relacionados com as oficinas, os dois professores que ficaram uma de Ciência e um de Geografia, nos auxiliaram no planejamento de todas as oficinas; esse planejamento foi elaborado para uma semana, assim, seria um teste até que os livros didáticos que a escola havia comprado, exclusivos para os monitores, chegassem.

Os monitores, nesse momento, só ouviram e escreveram no caderno, afinal não tinham a experiência de estar sozinho como gerentes de classe. Após as escritas, as leituras e os debates, os monitores começaram a indagar sobre como poderiam aplicar aquelas atividades, os professores auxiliaram e muito, nesse momento, sanando as dúvidas e principalmente incentivando-os a construírem sua autonomia.

Na terça-feira, momento de receber as crianças, aproximadamente 30 crianças por oficina, divididas em dois turnos –15 por monitores –, passei o tempo todo nas salas para possível auxílio, finalizamos o dia. Marcamos para nos encontrarmos 30 minutos antes do início no dia seguinte, assim foi feito.

Quarta-feira, 30 minutos antes, todos estavam na escola, conversamos sobre como foi o primeiro dia, empolgados, os monitores respondem que gostaram, mas que perceberam que algumas coisas deveriam ser ajustadas para o próximo planejamento. Terminado o tempo para conversa, inicia o turno novamente.

Os dias se passaram e finalmente chega sexta-feira, dia de planejamento. Reunimo-nos novamente na escola logo no fim da tarde, e solicitamos que os professores da escola permanecessem para nos auxiliar; conseguimos a presença de cinco, os mesmos dois e agora um de matemática, um de Musical e outro de Língua Portuguesa. Iniciamos a conversa sobre os anseios, as dificuldades e as felicidades da semana; muitos relatos positivos e alguns de dificuldades.

Os professores se reuniram cada um com a dupla de monitores que atuavam na oficina relacionada com as suas áreas; os monitores de oficinas, das quais nenhum professor da área compareceu, foram orientados pela direção e coordenação. Os materiais didáticos haviam chegado, assim, os professores conseguiram construir outra visão de planejamento, pois, até o momento pensavam que as oficinas funcionariam como um reforço pedagógico, o que passa longe de ser.

Com a participação de alguns professores inicia-se o momento de planejamento coletivo, quando professores e monitores constroem juntos a proposta de atividades; após os relatos de dificuldades, assim, tudo foi feito para que essas fossem evitadas. Conclui-se então o planejamento para mais uma semana.

No decorrer dos dias, dos meses, sempre solicitamos a participação de mais professores, mas o que conseguimos foram os mesmos cinco que “abraçaram o Programa” e contribuíram e muito com seus conhecimentos e principalmente experiências.

2 Utilizou-se o termo na primeira pessoa do singular devido a ser o relato da autora, que atuou como coordenadora do Programa Mais Educação da escola que é o campo da pesquisa.

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3.1 rElato E três monitorEs

Inicia-se o relato dos monitores sobre suas experiências acadêmicas, eles descrevem que cursam o Ensino Médio, finalizam no ano corrente, 2011, e que mesmo atuando como estagiários na área do magistério não têm conhecimento do que é um planejamento, que sentem dificuldades em planejar suas práticas e salientam a importância de auxiliadores, professores da escola no momento dessa construção. Quanto aos auxílios Libâneo (1994, p. 34) descreve que:

O planejamento escolar é uma tarefa docente que inclui tanto a previsão das atividades em termos de organização e coordenação em face dos objetivos propostos, quanto a sua revisão e adequação no decorrer do processo de ensino. O planejamento é um meio para programar as ações docentes, mas é também um momento de pesquisa e reflexão intimamente ligado à avaliação.

Constata-se que o planejamento é um processo racional, organizacional e com intensa ação docente, um fato que articula toda a atividade escolar em seu contexto social, e que deve ser construído de forma coletiva, com a participação democrática e construtiva de quem já detêm certas experiências. Os monitores continuam e relatam que:

[...] trocas de saberes possibilitam a construção de novos saberes que com a teoria se transformam em conhecimentos, mas não somos bem aceitos pelos professores da escola, nós não, o Programa, parece que eles nunca tem tempo de participar de nossos planejamento. [...]. (Monitor 1 e 2) 3

Destaca-se que os monitores sentem dificuldades na questão de planejamento e relacionamento com os professores, pois, precisam de auxílio e poucos se submetem a ajudar. Ainda:

[...] quando começamos dois professores nos auxiliavam no planejamento, claro que tínhamos o auxílio da coordenadora, mas percebemos uma enorme diferença, e positiva, no momento em que os outros, poucos, foram chegando, conseguíamos conversar e debater assuntos de aulas, de como dar aula, dos motivos das atividades e como essas auxiliam na concretização dos objetivos do Programa [...] (Monitor 3)4

3 Monitor 1 oficina de Letramento, Monitor 2 oficina de matemática4 Monitor 3, oficina de Cine Clube

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Com base nesses relatos, é possível perceber que a coletividade na construção de um planejamento pode mudar o rumo de muitas práticas, beneficiando e ampliando o conhecimento de nossos alunos.

3.2 rElatos dE dois profEssorEs

O relato dos professores é entorno de formação inicial e continuada relacionada com a Educação Integral e o Programa Mais Educação, um professor participa dos planejamentos coletivos e outro, muitas vezes convidado, ainda não participa.

O primeiro professor participante do planejamento do Programa, relata que:

[...] acredito que a maior dificuldade de muitos professores em estabelecer relação com o programa está relacionada com a formação inicial que não apresenta um aporte sobre o que é a Educação Integral, claro, sei que és algo novo, mas que então, deveria se pensar em formação continuada direcionada aos professores da escola com essa temática. (Professor participante 1)5

O que o professor apresenta é a necessidade de formação e conhecimento sobre as propostas do Programa, quais objetivos se quer alcançar e quais caminhos seguir. Apresenta, ainda, uma inquietação sobre a necessidade de que unidades de formação inicial proporcionem conhecimento sobre o que é Educação integral, o que ainda, a unidade, escola, pense em um processo de formação continuada a esses professores com o intuito de apresentar a Educação Integral e formas de se trabalhar com ela.

Segundo Moll (2004), o Programa Mais Educação pode ser apresentado como uma possibilidade de proporcionar aos indivíduos educação que busca contemplar o seu desenvolvimento pleno considerando o aspecto afetivo, intelectual, moral e social que o constitui o ser como um todo, mas que para isso faz-se importante a troca de conhecimento por parte de quem detém experiências na escola.

Com isso, adentra-se na questão de planejamento, e ressalta-se o seguinte relato:

[...] não conheço direito o Programa, não participo porque não sei certo como contribuir, acredito que precisaria de mais formação, conhecimento sobre a Educação Integral, é difícil auxiliar na construção de um planejamento que você não tem domínio da temática, assim, evito participar. (Professor participante 2)6

A partir dos relatos dos professores, pode-se apresentar que a formação

5 Professor de Geografia6 Professor de Artes

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continuada seria uma possibilidade de efetivação de um planejamento coletivo, pois, com a proposta do Programa sendo conhecidos por todos, facilitaria a interação e as contribuições de professores e monitores.

4 procEdimEntos mEtodolÓGicos

Com base nos procedimentos técnicos adotados em relação às fontes de informação e procedimentos de coleta de dados, o estudo em questão é caracterizado como pesquisa de campo e foi realizado na escola da rede municipal do Município de Xaxim/SC, com três (3) monitores do Programa Mais Educação e dois (2) professores da escola.

Para a coleta de dados, utilizamos um questionário semiestruturado, com perguntas abertas e objetivas sobre o Programa Mais Educação, a formação, a coletividade no planejamento de suas práticas e formação continuada.

Tendo em vista os procedimentos técnicos, trata-se de uma pesquisa descritiva, em função de ser um relato de experiências de uma determinada população, especificamente, a visão de monitores e professores do Programa Mais Educação acerca do planejamento de suas práticas e a formação continuada. Gil (2002) explica que esse tipo de pesquisa observa, registra, analisa e correlaciona fatos ou fenômenos (variáveis) sem manipulá-los.

5 considEraçõEs finais

No decorrer do relato, observamos que os professores da escola e os monitores do Programa Mais Educação estão, sim, preocupados em planejar suas aulas, mas apresentam dificuldades e relacionam essas dificuldades na falta de formação continuada na perspectiva de Educação Integral. Além disso, mostrou que a grande maioria ainda não conhece efetivamente a proposta educacional do Programa Mais Educação, por falta de não ocorrer formações relacionadas à temática. Constatação menos positiva foi observar ainda, que por parte da escola falta pensar em proporcionar momentos de coletividade para professores da escola e professores do programa, pois, a interação não deve ocorrer somente na hora do planejamento.

É essencial que os docentes, juntamente com a equipe diretiva, criem condições para que ocorra a formação continuada de caráter coletiva, dialógica, e que esta venha ao encontro das necessidades dos docentes, aqui apresentada, que são de planejar as práticas relacionando-as com a proposta do Programa Mais Educação.

Neste sentido, a contribuição individual por parte de cada professor, para que ao final as contribuições sejam coletivas, podem auxiliar na construção de planejamento que contribua no processo de ensino-aprendizagem, mas para isso, é necessário um planejamento participativo entre toda a comunidade escolar.

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Conclui-se que em se tratando de planejar as práticas, convém frisar a importância de asseverar aos docentes formações continuadas que possibilitem o conhecimento das propostas e que conduzam a reflexão sobre como contribuir e mudar o cenário da educação brasileira.

rEfErências

ALMEIDA, Benedita de. Formação continuada de professores e escrita: pontos de ancoragem. In: ______. A escrita na formação continuada de professoras alfabetizadoras: práticas de autoria. 2007. 251f. Tese (Doutorado) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007.

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BRZEZINSKI, Iria. Políticas contemporâneas de formação de professores para os anos iniciais do ensino fundamental. Educ. Soc., Campinas, vol. 29, n. 105, p. 1139-1166, set./dez. 2008. Disponível em <http://www.cedes.unicamp.br> Acesso em 30 maio 2013.

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LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo. Editora Cortez, 1994.

MIZUKAMI, M. G. N. REALI, A . M. M. R.(orgs) Formação de professores, práticas pedagógicas e escola. São Carlos: EdUFSCar, 2002.

MOLL, Jaqueline. Ciclos na escola e tempos na vida. Porto Alegre: Artmed, 2004.

POPKEWITZ, Thomas S. Reforma educacional: uma política sociológica B poder e conhecimento em educação. Trad. Beatriz Afonso Neves. Porto Alegre, Artes Médicas, 1997.

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O PIBID COMO POLÍTICA PUBLICA DE fORMAÇÃO DE PROfESSORES

E DE MANUTENÇÃO DOS ALUNOS NA ESCOLA: A ExPERIêNCIA PIBID/UNIfRA

Marcos Alexandre Alves1

1 introdução

O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), do Centro Universitário Franciscano – UNIFRA iniciou suas atividades em setembro de 2010, com o projeto intitulado Programa de Integração das Licenciaturas para Formação Compartilhada entre Educação Superior e Educação Básica. O projeto se sustentou sobre cinco eixos norteadores: indissociabilidade entre teoria e prática; conhecimento compartilhado; interdisciplinaridade como atitude articuladora e dinamizadora do currículo; pesquisa em educação e (re)construção dos saberes docentes. Desses eixos derivaram nove metas, para que se pudesse focar o trabalho dos subprojetos associados ao projeto institucional: 1) selecionar e instrumentalizar bolsistas de iniciação à docência, assim como os professores supervisores das escolas públicas agregados às áreas dos cursos de licenciatura para atuação no Programa; 2) conhecer a realidade, identificar indicadores e analisar as questões e os fatores de ensino e aprendizagem das escolas selecionadas; 3) construir colaborativamente plano(s) de trabalho(s) e materiais didático-pedagógicos, por licenciatura envolvida, considerando as especificidades de cada contexto escolar, bem como a qualidade do processo de ensino e aprendizagem; 4) constituir práticas interdisciplinares e colaborativas de trabalhos educativos, tendo por finalidade contribuir para a qualidade do Ensino Fundamental e Médio em escolas públicas; 5) desenvolver atividades de monitoria e apoio pedagógico, no sentido de melhorar os indicadores correlacionados à qualidade da Educação Básica; 6) contribuir com a formação continuada dos professores das redes públicas de ensino e da Instituição de Ensino Superior – IES, assim como dos alunos e dos professores bolsistas envolvidos no Programa, no sentido de (re)construir saberes e fazeres da profissão docente; 7) implementar o Ambiente Virtual de Aprendizagem da UNIFRA, objetivando incentivar e fomentar o uso das Tecnologias da Informação

1 Doutor em Educação – UFPel. Mestre em Filosofia – UFSM. Licenciado em Filosofia – FAFIMC. Professor Adjunto – Centro Universitário Franciscano – UNIFRA. Coordenador Institucional – PIBID/CAPES/UNIFRA.

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e Comunicação (TICs), na IES e nas comunidades escolares, pelos docentes e discentes; 8) construir e publicar relatórios, artigos, entre outros documentos, com a finalidade de fomento à produção escrita, às relações teórico-práticas e de registro das observações e reflexões sobre o cotidiano escolar, na educação básica, em especial as ações concretizadas pelo Programa; e 9) realizar encontros periódicos da comissão PIBID para acompanhamento, avaliação e encaminhamentos das atividades dos subprojetos.

O projeto PIBID/UNIFRA constituiu-se de uma equipe composta por 8 professores coordenadores de área: Filosofia, Geografia, História, Letras Inglês, Letras Português, Matemática, Pedagogia, Química; 20 professores supervisores da educação básica e 120 estudantes desses cursos de licenciatura. Essa equipe conseguiu aproximar as distâncias e consolidar parcerias entre a IES e as Escolas de Ensino Básico, e proporcionar conhecimentos significativos para ambos os níveis da educação.

A experiência compartilhada entre os diferentes sujeitos que integram a educação básica e superior se consolidou gradativamente a partir das atividades desenvolvidas pelo Programa, as quais qualificaram e oportunizaram que os objetivos e metas fossem alcançados plenamente. A inserção no espaço escolar possibilitou avaliar criticamente o ensino em espaço-tempo real, sobre múltiplas dimensões, promovendo o (re)planejamento do processo de formação docente e desenvolvimento de estratégias de manutenção dos alunos na escola. Os alunos bolsistas, as escolas, alunos das escolas, a IES, enfim, todos os envolvidos articularam ações que refletiram em sala de aula e no cotidiano dos alunos, com o incentivo à cidadania por meio da prática pedagógica.

O Programa gestou as condições necessárias para a formação de educadores mais responsáveis, comprometidos e melhor preparados para o mercado de trabalho, ou seja, os acadêmicos se tornam mais seguros para o exercício de sua profissão. Nesse sentido, o Programa tem representando uma excelente oportunidade de incentivo à docência para os acadêmicos das licenciaturas e também uma oportunidade para os alunos de escolas públicas experienciarem atividades diferenciadas de leitura, interpretação e produção textual. Além das práticas leitoras e de escritas associadas aos ambientes virtuais e tecnologias, valorizou a formação dos alunos das licenciaturas, a educação continuada dos professores em serviço nas escolas, proporcionou, a partir práticas docentes, em consonância com teorias recentes, uma melhora na educação dos alunos das escolas públicas, não só em termos de conteúdo, mas nas relações inter-humanas e no desenvolvimento da ética na formação e atuação profissional.

Assim, os acadêmicos bolsistas, os professores supervisores, os alunos das escolas e as IES articulam ações formativas que refletiram em sala de aula e no cotidiano de centenas de alunos, com o incentivo ao desenvolvimento da cidadania por meio da prática docente. O PIBID/UNIFRA qualificou a prática pedagógica do futuro professor e do professor em serviço, e estimulou a criação e a produção de metodologias específicas para o ensino de qualidade. Isso aconteceu por meio das

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inserções nos diferentes subprojetos, nas atividades desenvolvidas em turno inversos tais como: oficinas pedagógicas, apresentação de teatro, jogos, gincanas, apresentações musicais, contação de poesia, estudos em grupos, aulas de reforço para tirar dúvidas dos alunos com dificuldades em alguma disciplina envolvida no projeto. Nesse sentido, o Programa auxiliou não só na formação docente e dos professores em serviço, mas contribuiu significativamente no processo de manutenção dos alunos na escola.

2 o piBid como polÍtica dE formação dE profEssorEs E dE manutEnção dos alunos na Escola

No início do projeto, tudo se constituiu em desafio: entender a dinâmica do Programa, constituir os grupos colaborativos, criar as parcerias com/nas escolas, construir os espaços de atuação, (re)pensar as práticas docentes, planejar atividades inovadoras, etc.

Ao longo dos seus três anos de atuação, pôde-se verificar que o Programa causou e causa uma série de impactos, nos contextos em que atua, por ser promotor de maior integração entre IES e Escolas. Tanto professores em serviço, quanto os alunos que participam do Programa como bolsistas, (re)significam-se nos saberes e fazeres docentes, por meio da prática diária de apoio pedagógico e monitoria, de planejamento, de estudo e reflexão sobre iniciação e formação à docência, de produção de material didático-pedagógico e de textos acadêmicos. Isso se reflete no aumento do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), na maioria das Escolas atendidas pelo Programa, pois provocou uma mudança de atitude na comunidade escolar: os professores tornam-se mais comprometidos com a aprendizagem de seus alunos e apresentam metodologias diferenciadas para promover isso; os alunos tornam-se mais interessados em aprender e têm apoio para alcançar esse objetivo, e os bolsistas, mais preparados para enfrentar essa realidade. Além disso, pode-se destacar que os alunos atendidos pelo Programa permaneceram mais tempo na Escola e, consequentemente, melhoram os seus respectivos desempenho em relação ao conhecimento e nas relações interpessoais com colegas e professores. Isso, também, refletiu significativamente no índice de evasão escolar, que baixou consideravelmente nas escolas atendidas pelo Programa.

Esses impactos afetam não só a escola, mas também a IES e seus cursos de licenciatura, que têm o papel primordial de iniciar a formação do professor que atuará na Escola de Educação Básica. Também, avançou-se no entendimento de que o PIBID não é um projeto desvinculado dos cursos. Criou-se um espaço de discussão sobre as dificuldades que a docência vem enfrentando, principalmente, os cursos de licenciatura, como uma espécie de câmara de licenciaturas, da qual faz parte o Programa, para pensar estratégias de enfrentamento das dificuldades. Além disso, vem sendo implementada uma cultura de pesquisa, em que grande parte dos projetos de

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pesquisa e iniciação científica, propostos pelos professores dos cursos de licenciatura, tenham como foco questões educacionais diretamente vinculadas à formação docente.

Como consequência das ações do Programa envolvendo os cursos de licenciatura, percebe-se maior adesão dos coordenadores e professores desses cursos ao Projeto; maior motivação e (re)significação da prática docente; maior mobilização dos cursos e professores com relação às ações propostas; maior valorização dos cursos de licenciatura; maior participação em eventos, oficinas e atividades promovidos por esses cursos; aumento considerável na produção científica: artigos publicados em revistas da área, trabalhos completos e/ou resumos apresentados e publicados em Anais de eventos; qualificação das aulas e dos debates, pois os alunos trazem para a IES as suas experiências, vivências e dificuldades e, junto com os docentes, buscam o aperfeiçoamento da e na Educação; melhoria nas relações humanas entre professores e acadêmicos, proporcionando um momento de troca de leituras e relatos das suas experiências didático-pedagógicas; maior interconexão dos cursos de licenciatura com as Escolas participantes (direção, professores e alunos) e IES (professores, acadêmicos de diferentes cursos); maior aproximação entre os cursos de licenciatura e fortalecimento do caráter interdisciplinar que permeia o ensino de graduação, em seus diferentes cursos; maior integração interdisciplinar entre os professores das diversas licenciaturas, no planejamento e oferecimento de oficinas pedagógicas para os bolsistas e supervisores das escolas; maior valorização dos acadêmicos (bolsistas/PIBID), que estão cada vez mais apresentando um perfil docente, (apresentações de trabalhos acadêmicos em eventos e nas práticas de ensino e nos estágios curriculares). Desse modo, verifica-se maior valorização dos bolsistas, enquanto futuro professores, por participarem do Programa, sobretudo, em um cenário sociocultural em que pouco se tem valorizado as licenciaturas e a atividade docente.

Observa-se, ainda, que houve/há uma melhor utilização dos espaços da escola como ambientes de efetiva aprendizagem: laboratórios, bibliotecas, pátio, concha acústica, sala de recursos, auditório, entre outros. Esses espaços foram amplamente explorados para práticas diferenciadas, como oficinas, jogos didáticos e mostras de trabalhos. Destaca-se ainda que esses espaços revitalizados ganharam significado na prática docente e contribuem para o efetivo processo de ensino-aprendizagem, tornando as aulas mais dinâmicas e atrativas para os alunos. Além disso, houve/há estímulo à leitura de textos diversos e em diversas modalidades. Entre os bolsistas dos diversos níveis, a leitura de textos teóricos sobre ensino-aprendizagem e sobre as áreas específicas é constante e aperfeiçoa a prática docente e melhora as suas capacidades de leitura, interpretação e produção textual. Com isso, também, se percebe que entre os alunos da educação básica, a leitura de textos diversos (filosóficos, literários e didáticos), adequados aos componentes curriculares trabalhados, vem se tornando uma prática rotineira e motivadora que contribuiu tanto com a escrita quanto com a capacidade de comunicação oral.

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Outro impacto do Programa diz respeito à mobilização das Escolas com relação às ações propostas pelos subprojetos. Na maioria destas, há um espaço destinado ao Bolsistas do Programa e as suas demandas constituem-se em prioridade, já que as Escolas reconhecem os benefícios trazidos pelo Projeto à sua comunidade. Percebe-se que houve uma sensível melhoria na relação aluno-aluno e professor-aluno, na rede de Educação Básica pública, reduzindo os índices de violência entre os atendidos pelo Programa. O professor em serviço, hoje, sofre com um conjunto de situações sociopolíticas que o fazem sentir-se mal diante da profissão. Uma dessas situações é a violência (física e psicológica) que enfrenta, na sala de aula, a qual decorre, muitas vezes, das dificuldades de proporcionar aos seus alunos um ambiente de aprendizagem adequado e estimulante. Com a ajuda dos bolsistas do Programa, os professores supervisores conseguem oferecer esse ambiente propício para a aprendizagem, diminuindo a relação que todos os envolvidos têm com a violência em âmbito escolar. E como consequência natural disso tudo, houve melhora na frequência, no envolvimento e no desempenho dos alunos da educação básica.

Além disso, há maior integração dos cursos de licenciatura do Centro Universitário Franciscano – UNIFRA com as Escolas públicas de Ensino Fundamental e de Ensino Médio participantes do Projeto. Essa integração pode ser percebida em ações concretas, como a criação de um espaço de discussão sobre as licenciaturas; no envolvimento da IES com a formação continuada de professores da rede pública que estão atuando como supervisores no Programa, assim como de outros professores parceiros dos processos colaborativos (fóruns de discussão, oficinas e palestras nas escolas envolvidas); nas produções decorrentes do Programa junto com Trabalhos Finais de Graduação – TFG; na parceria e cooperação entre a UNIFRA, a 8ª CRE/RS e a SMDE – Santa Maria – RS, no fomento a projetos de formação inicial e continuada de professores.

A proposta do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID), que buscou desenvolver e ampliar cada vez mais o diálogo entre a IES e a Escola, tem causado impacto significativo na formação de professores, nas licenciaturas envolvidas, na educação básica, na pós-graduação e nas escolas participantes.

Em relação à formação de professores, destaca-se que os bolsistas que integram o Programa, de modo geral, têm demonstrado uma postura diferenciada, ou seja, mais comprometida, crítica e autônoma em relação ao seu próprio processo formativo. Esses alunos, futuros professores, têm participado de atividades de pesquisa e ensino, ao participarem ativamente de eventos acadêmicos e atividades desenvolvidas nas escolas conveniadas, que contribuem para a formação plena desses profissionais. Do mesmo modo, os professores já atuantes que integram o Programa têm retomado conceitos, revisto crenças e repensado suas práticas, de modo a atender, cada vez mais, aos interesses e às necessidades dos alunos da Escola básica.

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Em relação às licenciaturas envolvidas, percebe-se o intercâmbio e construção de conhecimento entre os próprios alunos no Ensino Superior e destes com seus supervisores nas Escolas conveniadas, o que contribui para o fortalecimento do diálogo entre IES e Escola, permitindo, assim, uma formação que atenda aos contextos reais (não ideais) de ensino e aprendizagem.

Em relação à educação básica, observa-se um interesse cada vez maior por parte de professores e alunos em desenvolver e executar propostas diferenciadas ou inovadoras de ensino e aprendizagem, que geralmente são pensadas e desenvolvidas em parceria com os futuros professores. Essas propostas são pensadas e discutidas a partir das demandas, interesses e contextos nos quais se inserem os alunos da educação básica.

Em relação à pós-graduação, constata-se que tanto os bolsistas quanto os professores- supervisores têm desenvolvido estudos que permitem a sua inserção em Programas de Pós-graduação, uma vez que, ao produzirem, apresentarem e publicarem trabalhos acadêmicos adquirem perfis de pesquisadores mais autônomos e reflexivos. Nesse sentido, o Programa representa uma oportunidade extremamente válida de aprimoramento acadêmico, porque conduz à pesquisa acadêmica e à formação de profissionais cada vez mais qualificados.

Em relação às escolas participantes, pode-se dizer que houve uma retomada de postura por parte dos gestores, que permitiram a inserção do Projeto nos contextos considerados, visando principalmente à melhoria da qualidade do ensino e da aprendizagem dos alunos atendidos. Os professores-supervisores, que aderiram à proposta, mostram-se dispostos a rever sua própria atuação, de modo a incrementá-la e, ao mesmo tempo, contribuir para a formação de futuros professores. As direções e Coordenações pedagógicas das escolas envolvidas puderam acompanhar as atividades e perceber a relevância do Programa como contribuinte na melhoria da qualidade da aprendizagem, da relação interpessoal e manutenção dos alunos na Escola, na qualificação dos futuros professores e, principalmente, na formação continuada dos professores supervisores.

De modo geral, o maior impacto que se observa é a aproximação cada vez mais nítida entre IES e Escola, que permite uma reflexão contínua sobre o processo de formação de futuros professores e de professores já atuantes, contribuindo para a melhoria do ensino nas escolas públicas, de modo a beneficiar seus aprendizes (alunos das Escolas de educação básica). O diálogo entre professores em formação – inicial ou continuada – e professores formadores é crucial para a efetiva qualificação de professores e indispensável à promoção de um trabalho diferenciado, autêntico e inovador na educação básica.

Destaca-se, ainda, que as reuniões com a Coordenação Institucional – PIBID/UNIFRA, têm se constituído como um fórum de trocas e desenvolvimento de propostas integradas, além de proposição de soluções de problemas, sugestões de

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atividades e colaboração com e para o desenvolvimento de atividades integradas e interdisciplinares. Essas mesmas trocas e colaborações puderam ser efetivadas nas escolas, por iniciativa dos supervisores, integrando os diferentes Subprojetos do Programa, atuantes em cada escola parceira. Além disso, sublinha-se o envolvimento de outros grupos das escolas parceiras, não integrantes do Programa na colaboração e realização de atividades e ações colaborativas. Deste modo, percebe-se que o Programa provocou maior aproximação entre as licenciaturas e o caráter interdisciplinar que permeia o ensino de graduação, em seus diferentes cursos.

O Programa contribui para o aprimoramento dos cursos de licenciatura da IES. Isso fica evidente a partir da participação nos eventos, oficinas e atividades realizadas pelos subprojetos. Deste modo, nas apresentações de artigos, trabalhos, nas publicações, nos debates, os mesmos problemas são dialogados com todos os docentes e discentes, buscando-se um aperfeiçoamento na Educação. Os alunos desenvolveram também pesquisas específicas e foram inseridos nos projetos dos professores, que os orientaram na produção especializada, entretanto, sempre tendo em vista a formação docente. Com efeito, tanto professores quanto acadêmicos (futuros docentes) se mantêm em constante vinculação. Esse diálogo entre profissionais dos cursos proporciona um momento de troca, de relatos das suas experiências didático-pedagógicas em eventos científicos e/ou educacionais. Percebe-se que essa interconexão que o PIBID proporciona interliga para um aperfeiçoamento na Educação, Escolas (Direção, professores e alunos), IES (professores, acadêmicos de diferentes cursos). Ainda, houve uma troca com outras IES, exemplo UNIVATES, PUCRS, UNISINOS, UFPEl, URI, UNISC e UFSM na participação dos bolsistas em eventos. Assim, o PIBID se constitui como um centro de desenvolvimento docente que afeta todos na Escola e na IES.

Portanto, percebe-se que os Bolsistas de Iniciação à Docência, vinculados ao Programa, possuem uma postura diferenciada com relação aos alunos da educação básica. Nos momentos de inserção nas Escolas conveniadas, demonstram maior comprometimento e seriedade em relação à sua própria formação. Além disso, os alunos que integram o Programa ingressam na pesquisa mais cedo, porque estão continuamente pesquisando e discutindo temas, conceitos e experiências, a fim de elaborar e socializar pesquisas em eventos acadêmicos diversos. Os alunos bolsistas se sentem valorizados por participarem de um projeto de iniciação à docência, que visa a uma proposta diferenciada de formação de professores.

Por fim, uma das implicações do PIBID tem sido maior procura dos alunos atendidos pelo Projeto, pelos cursos de licenciatura no vestibular e nas demais formas de ingresso da IES. Todas as licenciaturas da UNIFRA perceberam que o trabalho bem-feito na Escola incentiva os alunos a valorizarem o ser professor e a buscarem a licenciatura como opção de carreira.

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3 considEraçõEs finais E pErspEctivas

A título de conclusão deste pequeno relato-experiência, acerca do PIBID como Projeto de manutenção dos alunos na Escola e que implica, consequentemente, a diminuição da evasão escolar, pode-se traçar as seguintes considerações: as Escolas de educação básica sentem-se apoiadas e valorizadas pelo desenvolvimento do projeto, por outro, na IES, os futuros professores e os professores formadores conseguem identificar as demandas da profissão docente e relacionar teoria e prática como elemento norteador dos processos formativos dos futuros professores.

A inserção no espaço escolar, como proposta de ação desse Programa, possui a fundamental função de avaliar criticamente o ensino em espaço-tempo real, sobre múltiplas dimensões, promovendo, assim, o (re)planejamento do processo de formação docente. Nesse sentido, o PIBID representa uma significativa ação governamental de incentivo à docência e de valorização das licenciaturas e da Educação Básica. Os alunos bolsistas, os professores supervisores das escolas e os seus alunos, a IES, enfim, todos os envolvidos articulam ações que refletem em sala de aula e nos seus cotidianos, com o incentivo à cidadania por meio da prática pedagógica; nesse sentido, colaboram com a formação de educadores mais responsáveis, comprometidos e melhor preparados para o mercado de trabalho. As práticas desenvolvidas pelos bolsistas PIBID visam não só à educação em termos de conteúdo, mas à ética na formação e atuação profissional.

Portanto, o PIBID/UNIFRA qualifica a prática pedagógica do futuro professor e do professor em serviço, bem como estimula a criação e a produção de metodologias específicas para o ensino de qualidade. Para a continuidade do Programa, pretende-se continuar a fomentar a participação em eventos científicos da área, com apresentação e publicação de trabalhos científicos; a construção de artigos científicos referentes aos resultados encontrados; o trabalho de forma integrada em pesquisa, nas várias áreas técnicas, e sua aplicação no ensino; o uso de ambientes virtuais; a atualização das páginas do Facebook dos subprojetos, com registro, imagens e fotos das atividades desenvolvidas; a disponibilização, no site do projeto PIBID/UNIFRA os trabalhos apresentados e/ou publicados; a produção colaborativa de livros e cadernos didáticos; a criação e disponibilização, no site MAIS UNIFRA, dos conteúdos didáticos digitais; a publicação de pesquisa em eventos na instituição; a promoção do Seminário Interdisciplinar PIBID/UNIFRA; a organização interdisciplinar de Oficinas Pedagógicas, para atender às necessidades das escolas e/ou dos supervisores. Pois, entende-se que essas ações contribuem sobremaneira para a manutenção dos alunos na Escola. Além disso, pretende-se desenvolver um conjunto de ações tendo em vista a melhoria da aprendizagem e das relações inter-humanos dos alunos (familiares, colegas, professores, gestores, bolsistas) atendidos pelo Programa.

Enfim, o PIBID/UNIFRA, por meio de seu novo Projeto Institucional, objetiva o fortalecimento da inter-relação e interlocução entre educação superior e educação básica, no sentido de qualificar a formação inicial e permanente de professores para

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a atuação pedagógica interdisciplinar, bem como [re]significar e otimizar a gestão universitária e escolar. Objetivamente, a proposta visa a um planejamento de projetos pedagógicos integrados entre os subprojetos, envolvendo temáticas relacionadas às questões socioambientais, à ética, à cidadania e à diversidade sociocultural, por meio de encontros dos grupos de trabalho, com vistas à proposição de atividades interdisciplinares e que valorize a transversalidade.

rEfErências

ALMEIDA, L. R. Evasão escolar no ensino médio: um diagnóstico dos Alunos da Escola Pública noturna do, Rio Grande do Sul – Brasil. Rev. Int. Investig. Cienc. Soc. Vol. 7 nº2, 2011. p. 83-118.

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FRANCISCHETT, M. N.; GIROTTO, E. D.; MORMUL, N. M. O PIBID como política pública de permanência no ensino superior e de formação de professores: um estudo de caso. Revista Educere Et Educare. Vol. 7, nº 13, 2012, p. 82-102.

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O ENSINO DA ARTE NA ESCOLA DE TEMPO INTEGRAL

Janaína Corá 1

1 aprEsEntação

Há pouco mais de uma década, iniciaram as primeiras discussões em buscas de formas e maneiras de alavancar a educação pública brasileira. A principal perspectiva dessa discussão é de universalizar o acesso, a permanência e a aprendizagem do estudante na escola pública, ou seja, a construção do ideal da Educação Integral. Ampliar o tempo na escola dos estudantes para possibilitar, de forma geral, a promoção da inclusão educacional. Reestruturar a escola, conforme a trilogia de cadernos da Série Mais Educação publicada em 2009, no que se refere a “saberes, currículo e aprendizagem, relação escola-comunidade; tempos e espaços [...] formação de professores” (MOLL, 2009a, p. 10), para responder aos desafios da educação de seu tempo histórico.

Com a aprovação da Lei nº 11.274/2006, que institui o Ensino Fundamental de nove anos, aumentando o tempo/ano de permanência na escola – pois pretende “Assegurar a todas as crianças um tempo mais longo de convívio escolar com maiores oportunidades de aprendizagem” (BRASIL, 2006) – é mais um passo a ser considerado nesta proposta. E a Escola de tempo integral uma nova tendência na formação.

Este anseio pela Educação Integral na Escola de tempo integral e o debate sobre o espaço escolar já foram vistos no Brasil anteriormente. As Escolas-Parque, construídas em Brasília, entre 1960 e 1964, com a orientação de Anísio Teixeira. E mais tarde, no Rio de Janeiro, sob a coordenação de Darcy Ribeiro, os Centros Integrados de Educação Popular (CIEP’s).

Nestas, mesmo que pontuais, ganham destaque os projetos arquitetônicos e a ampliação das funções da escola. Hoje, a Educação Integral quer “constituir-se como legado qualificado e sustentável”, conforme o programa Mais Educação do governo federal. (MOLL, 2009a, p. 7)

Como a Educação Integral é também caracterizada pela ideia de uma formação humana o mais completa possível, rompendo o limite do espaço escolar para integrá-lo à comunidade. Cabe refletir sobre a importância do Ensino da Arte nesta formação,

1 Professora de Arte na Rede Pública Estadual de Santa Catarina e Artista Visual

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e articular estratégias e proposições: Por que a disciplina de Arte na formação humana? Por que Arte na escola de tempo integral?

Primeiro, cabe lembrar, que a disciplina de Arte sempre foi problematizada. Mas somente com a nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da Educação em 1988, começa a ser discutida sua obrigatoriedade. Em dezembro de 1996, finalmente é aprovada a Lei nº 9.394. Estudada e divulgada, sua implantação é prevista para o ano letivo de 1998, a disciplina de “Artes” passa a ser obrigatória em todas as séries da Educação Básica.

Por isso mesmo, as primeiras grandes transformações na disciplina ocorreram somente nas décadas de 80 e 90. Deste período, surge a Metodologia Triangular, concebida em 1960, por professores de Arte da Inglaterra e Estados Unidos, adaptada por Ana Mae Barbosa ao contexto brasileiro como Proposta Triangular.

A Proposta Triangular quebrava com os conceitos existentes, propagados nas escolas e propunha três ações: a criação (fazer artístico), leitura da obra de arte e contextualização. Apesar de inicialmente, a proposta priorizar a Arte Europeia nesta triangulação, aos poucos essa interpretação foi sendo superada, e os professores de Arte começaram a considerar a produção de arte local e nacional. O artesanato, os costumes, as tradições e o folclore também passam a ser incluídas nestes saberes. E a leitura da imagem também foi revista, não apenas para obras de arte, mas também para as vivências diárias, para o patrimônio material e imaterial de uma comunidade, por exemplo. E a contextualização não apenas pela via histórica, como a biografia do artista. Além é claro, da música, a dança e o teatro. Experiências com a nova abordagem foram desenvolvidas nas escolas, pela formação docente no campo da arte. A Proposta Triangular foi fundamental e interferiu qualitativamente no processo e na melhoria do ensino da arte em todo o país.

Os esforços em conquistar espaço e valorizar a disciplina continuaram. Com a reformulação do texto da Lei (9.394/96), que não definia, quais áreas deveriam ser trabalhadas na escola, a especificação da obrigatoriedade da música, valorizou e promoveu a ofertas de cursos nesta linguagem. Recentemente, a Câmara dos Deputados (2014) aprovou a proposta que estabelece como “disciplinas obrigatórias da educação básica as artes visuais, a dança, a música e o teatro”. Entretanto, é importante dizer que a obrigatoriedade das diferentes áreas não amplia o número de aulas nas séries/ano. Além disso, a Proposta Curricular de Santa Catarina (1998), afirma que o professor deve priorizar em sua atuação, a área de conhecimento de sua habilitação, ou seja, Artes Visuais ou Artes Cênicas, ou Música, ou Dança.

Essa perspectiva da disciplina de Arte tem sido ampliada com uma prática mais concreta. Novos modos de despertar estes estudantes: partilhar, mediar, interagir, resignificar, experimentar, duvidar, interpretar, elaborar, para a concepção de sensibilidade como desenvolvimento dos sentidos. Levar para a escola, imagens e sons, do cinema, da arquitetura, da dança, do artesanato, das mídias, das tecnologias, da comunidade, do cotidiano e da História da Arte, para a concepção de criação como

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elaboração. Neste século, valoriza-se a leitura dos campos do sentido arte, o tempo histórico pode ser interpretado por comparação, não por sequencialidade.

O Ensino da Arte na Escola de tempo integral, que pretende ser coerente com o processo histórico que vivemos, não pode servir a interesses outros que não sejam o de valorizar a arte como disciplina, que vem gradativamente conquistando seu espaço no currículo escolar.

Nesta direção, considera-se que vários pesquisadores no Brasil e fora dele concordam com o conceito de Arte como Experiência. Conforme Barbosa (2010, p. 11):

Elaborado em 1934 por John Dewey, esse conceito circulou entre os pragmatistas e fenomenologistas com sucesso, mas não teve aceitação entre artistas e críticos de arte durante o alto modernismo. O pós-modernismo retoma o conceito embebendo-o em um contextualismo esclarecedor, que amplia a noção de experiência e lhe dá densidade cultural. É, portanto, natural que os estudos culturais da Arte/Educação tomem como base a experiência como argumento cognitivista.

Barbosa (2010, p. 12) aproxima John Dewey de Elliot Eisner e Paulo Freire, quanto ao encontro das ideias dos três:

[...] nos alertam acerca da importância da arte para permitir a tolerância à ambiguidade e a exploração de múltiplos sentidos e significações. Essa dubiedade da arte torna-a valiosa na educação. Em arte não há certo ou errado, mas sim o mais ou menos adequado, o mais ou menos significativo, o mais ou menos inventivo.

Incorporando o desenvolvimento cognitivo, para refinar os sentidos e alargar a imaginação, ainda para Barbosa (2010, p. 17), “Por meio dele se afirma a eficiência da Arte para desenvolver formas sutis de pensar, diferenciar, comparar, generalizar, interpretar, conceber possibilidades, construir, formular hipóteses e decifrar metáforas”.

Estes conceitos também podem ser identificados nos Territórios Educativos que fundamentam o Programa Mais Educação da Educação Integral. Porque articula a identidade, e valoriza a diversidade. Promove a consciência crítica, referencial da mudança, como defende Freire. Elliot Eisner reelabora a noção de educação como processo de aprender, no sentido de como inventar a nós mesmos. E a aproximam de Dewey e Paulo Freire. Ainda para Barbosa (2010, p. 17), “Para ambos, a educação é mediatizada pelo mundo em que se vive, formada pela cultura, influenciada por

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linguagens, impactada por crenças, clarificada pela necessidade, afetada por valores e moderada pela individualidade”.

2 rElato dE ExpEriências

A compreensão da arte como componente curricular da Educação Integral e, sobretudo, como linguagem, expressão e produção de sentidos e conhecimento, tem produzido experiências que apontam para essas mudanças de paradigmas, de ações e de atitudes para este novo currículo que surge. O Ensino da Arte que apesar de ainda ser em muitos espaços (escola e universidade) desconsiderado e negligenciado, pode alçar novos rumos. As articulações entre os processos cognitivos, acompanhadas da aproximação dos saberes da escola, com os sabores da comunidade em que cada escola está inserida, são fundamentais para a construção de um indivíduo mais crítico, mais autônomo e porque não dizer mais humano, consciente e sensível/desperto.

Em 2006, em Joinville (SC), foi realizado um trabalho voltado para o projeto de Escola Pública em Tempo Integral (EPI). Coordenado pela professora Silvia Sell Duarte Pillotto e por Eliana Stamm, resultou na publicação “A Arte como propulsora da integração escola e comunidade”. Houve a preocupação em investir na formação continuada dos professores, e a busca constante por novas formas de organizar o currículo e utilizar as diversas linguagens da arte como desencadeadoras e condutoras do processo educativo.

A premissa desta experiência como relatam as autoras, era desenvolver uma aprendizagem que vai muito além daquela possibilitada por apostilas e livros didáticos.

Permitir que o estudante se aventure para além dos limites da sala de aula e dos muros da escola é possibilitar intercâmbio e trabalho com colegas e professores de outras séries e com toda a comunidade. Essas atitudes desenvolverão o espírito de cooperação e autonomia e estimularão a integração da escola ao sistema social mais amplo, pois hoje vemos a escola confinada a seu espaço, cada vez mais isolada e com muros mais altos. (PILLOTTO; STAMM, 2007, p. 13)

Apresentado para cerca de 240 professores da rede pública, neste projeto foram desenvolvidos tópicos conceituais e metodológicos para dar suporte à reflexão das ações propostas nas oficinas. E a descrição de três diferentes experiências educativas, realizados em três escolas de tempo integral, de cidades diferentes daquela regional.

Os projetos desenvolvidos nas escolas, com realidades, espaços, estudantes e comunidades diferenciadas valorizaram a história local, as relações de afeto e de cuidado com memórias individuais e coletivas, a participação da comunidade, a

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valorização/utilização da poesia/sonhos/perspectivas daqueles estudantes e a articulação dos espaços formais e não formais de aprendizagem. Valorizando exposições que estavam acontecendo concomitantemente ao projeto, utilizando/pesquisando espaços disponíveis na cidade para exposição dos resultados e mediando ideias e necessidades dos estudantes, as professoras envolvidas descobriram a preciosidade do Ensino da Arte na escola de tempo integral. A eficiência do trabalho com os estudantes foi vista no resultado dos trabalhos finais nas exposições realizadas, visita à rádio local, visita dos poetas da cidade na escola e até mesmo um recital de poesias, entre outros.

Em experiências como estas, constroem-se redes de significações entre o que se ensina o que se aprende e os sentidos contidos nessas relações. Como prevê o caderno Rede de Saberes Mais Educação:

Considera-se que o saber é produzido socialmente pelo conjunto das pessoas por elas estabelecidas em suas atividades práticas, isto é, no seu trabalho, deve-se levar em conta que o indivíduo aprende, compreende e transforma as circunstâncias ao tempo em que é por elas transformado. (MOLL, 2009b, p. 28)

Considera-se o “acervo” de conhecimentos que são desenvolvidos fora da escola, conhecimentos gerados a partir da interpretação, tão necessários quanto os saberes de domínio da escola.

Conforme escrevem Pilotto e Stamm (2007, p. 31): “Os conteúdos e conceitos desenvolvidos na escola devem propiciar a discussão sobre as diversas culturas, costumes, tradições, produções/manifestações artísticas e espaços culturais, relacionando esses conhecimentos, formais e não formais, ao presente e ao passado”.

A arte como experiência trilha um caminho que valoriza a percepção, a emoção, com a cultura e a comunidade personalizada pelo processo de gerar significados. O quanto se aprende no outro e em si próprio por intermédio do outro e no outro, o que por sua vez reflete no contexto. Para Derrida (2001, p. 36), “Toda experiência é experiência do sentido. Tudo aquilo que aparece a consciência, tudo aquilo que existe para uma consciência em geral, é sentido”. Sabe-se que os fenômenos estão relacionados aos meios visuais, sonoros, que são articulados pela arte, e podem ser ativados pelas ações do sujeito que lhe confere sentido.

Para complementar, afirmam que: “Ao se expressar, os alunos articulam o universo de saberes disponíveis com o esforço de apropriar/elaborar/resignificar sobre a realidade em que vivem. Os códigos culturais são acionados e se desvelam nas emoções contidas na subjetividade de cada um”. (PILOTTO; STAMM, 2007, p. 34)

Por este caminho, estabelece-se sentido na visita ao museu, na conversa com os grupos de mães que produzem artesanato, na interpretação do desenho urbano da cidade ou observação e compreensão de uma forma arquitetônica. As relações

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são construídas e os “muros” que separam a escola da comunidade ficam menores. Tornam-se menos assustadores, deslumbram-se novas perspectivas e horizontes. O sentimento de pertença é elaborado, olhando e percebendo o outro e o espaço, codifica-se a capacidade de olhar para si mesmo.

No viés da educação em tempo integral, para as artes, as pontes construídas não são fixas. As respostas não são eternas, elas mudam, conforme os agentes envolvidos, a comunidade e as necessidades dos estudantes. E provavelmente existem/devem existir trilhas ainda a serem descobertas, pela troca entre professores, crianças e jovens interessados nesta busca. Essa postura pode representar um gesto da emancipação da disciplina no cenário da Escola de tempo integral.

Em seu mais recente livro, Arte/Educação: Ensinar e Aprender no Ensino Básico, as professoras Silvia Pillotto e Letícia Bohn (2014) apontam indicadores de aprendizagem. Perfilando os processos de aprendizagem que resignificam contextos com base nos saberes e nas experiências como uma tendência contemporânea, fundamentada no respeito pelas diferenças e na construção de identidades e autonomia. Segundo as organizadoras do livro, se verificou imprescindível ao desenvolvimento sensível e cognitivo do estudante. De forma sintetizada, Pillotto e Bohn (2014, p. 26) escrevem que para o 1º ao 5º ano, o estudante alcance:

[...] interação no mundo da arte/cultura com vistas a expressar-se por meio de textos visuais, sonoros e corporais, construindo poéticas e diálogos, socializando-os no seu entorno; relações com os espaços imagéticos e reais; [...] estabelecendo relações entre conceitos e experimentações; [...] se expresse de forma poética; estabeleça relação com as imagens da cultura visual e suas produções, socializando suas percepções e ideias [...] experiencie variados suportes, materiais, objetos [...] desenvolva processos de leitura sobre a cidade e seus espaços artísticos-culturais, despertando seu sentimento de pertença; [...] potencialize sua capacidade nos processos de leitura visual cotidiana.

Estes indicadores de aprendizagem apontam também para os desafios a ser enfrentados pelo professor de arte na escola de tempo integral. E as necessidades de ampliação de políticas culturais que envolvam ações compartilhadas entre escolas, espaços culturais, e o caminho desejado, escola em direção à comunidade e a comunidade rumo à escola. Para o 6º ano ao 9º ano os indicadores propõem que:

Compreenda a arte como parte integrante do seu cotidiano por intermédio de estudos reflexivos e vivências estéticas; se aproprie da história da arte/cultura, como integrante das suas construções de identidade; entenda a história como

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processo não linear, que agrega noções de tempo-espaço-lugar; [...] entenda que o passado está presentificado na contemporaneidade. [...] desenvolva um olhar crítico sobre a cultura visual; se aproprie das tendências da arte contemporânea, ampliando sua compreensão de mundo e suas relações entre sujeito e espaço; identifique seus processos de criação, aprimorando a percepção visual, criação e imaginação. (PILLOTTO; BOHN, 2014, p. 26)

Segundo Pillotto e Bohn (2014, p. 27), “A intenção dos indicadores de aprendizagem não é padronizar, e sim apontar alguns caminhos possíveis para docentes e estudantes construírem sua própria trajetória de ensino e aprendizagem”. Não são resoluções, são possibilidades nesta construção que é aprender a aprender arte e aprender a fazer e ensinar Arte.

Para Martins e Picosque (2012, p. 115) o professor é um escavador de sentidos. “Como andarilhos no território da arte, quais imagens podem compor nossa curadoria do ensinar-aprender arte? Quais perguntas e ações podem provocar experiências?”. Em 2003, como coordenadoras da Ação Educativa da 4ª Bienal do Mercosul, produziram o material educativo, com o mote: “A Arte não responde. Pergunta”. Para Martins e Picosque (2012, p. 115-116):

Um professor que mantém viva a curiosidade, que gosta de estudar, investigar imagens para sua prática na sala de aula e levar seus alunos ao encontro da linguagem da arte sem forçar uma construção do sentido “correto” ou único, veste sandálias de professor-pesquisador, envolvendo com a mais fina atenção sua pele pedagógica, dando sustentação para pisar em terras ainda desconhecidas. Não lida com as certezas e com o reducionismo simplistas, mas com a compreensão e a articulação da complexidade. Por isso mesmo, seu caminhar se dá no presente, no lugar da pergunta, da questão, da dúvida, movido por passos de andar sinuoso [...].

Neste tempo contemporâneo, conturbado, carente, contraditório e muitas vezes perverso, a sala de aula ainda é/pode ser um espaço de possibilidades e cruzamentos.

3 proposição Educativa

Em 2007, realizamos uma experiência no ensino da arte, na Escola de Educação Básica Bom Pastor (fundada em 1947) em Chapecó (SC), sobre o espaço arquitetônico desta mesma escola. O objetivo foi promover uma prática em arte-educação que abordasse a representação plástica das formas arquitetônicas da escola,

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pela sensibilização/percepção do olhar dos estudantes. Lugar de convívio cotidiano e parte integrante da história da cidade, a escola abrigava uma atmosfera que era povoada de memórias individuais e coletivas. O lugar que se transformou ao longo dos anos, de uma humilde construção de madeira erguida pelas irmãs Franciscanas – suas fundadoras – ao prédio que ocupa um considerável espaço no centro da cidade, testemunhou com sua comunidade, alunos, pais, professores e funcionários muitos acontecimentos que ajudam a delinear a história da Cidade de Chapecó, incluindo suas conquistas e descréditos. Sempre com um expressivo número de alunos matriculados, formou gerações.

Um primeiro registro foi realizado como Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), no Curso de Educação Artística, na Universidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC) – Chapecó e reconhecido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), que classificou na fase regional do Prêmio Rodrigo Melo Franco Andrade em 2002, na categoria Educação Patrimonial, o que motivou a continuidade e aprimoramento desta experiência.

A metodologia incluiu uma incursão na história local da cidade e da escola, com fotos e vídeos. Aproximação com obras, de artistas que utilizaram o tema arquitetura na pintura, também foi objetivado, complementando o desenvolvimento da sensibilização dos estudantes. Assim como, uma expedição cultural na escola por espaços conhecidos e outros inexplorados ou “proibidos”. A reflexão sobre a relação que criamos sobre estes lugares, que até então não era consciente, deu estrutura a um estudo de texto.

Neste contexto, as significações para os estudantes do Ensino Médio, foram ampliadas, o que deu suporte à elaboração da representação plástica, o fazer artístico. A elaboração de uma escrita poética sobre a trajetória de cada aluno naquele espaço, com suas vivências, relações e lembranças, seguido de um registro fotográfico das formas arquitetônicas da escola, e depois a realização de fotomontagens que integraram as fotos produzidas pelos alunos e fotos antigas do arquivo escolar e do acervo particular das irmãs Franciscanas de Maria Auxiliadora. Fez-se ainda, a interferência com desenhos e/ou pinturas sobre as imagens. Resultando numa exposição na escola e na Câmara de Vereadores de Chapecó, por ocasião do aniversário de 60 anos naquele ano, partilhando com os demais alunos, professores e toda a comunidade, os resultados da experiência.

Enfim, uma possibilidade de ação educativa, com saberes cotidianos e universais, uma vez que articulou patrimônio local, histórico e cultural, num processo fundamental na construção da identidade dessa comunidade. Uma proposição que também pode aproximar o estudante com sua realidade para ampliar sua percepção do seu entorno urbano. Por se tratar de uma realidade específica, o objeto escolhido para convocar o olhar à visualidade da imagem, no caso, a própria escola, encontrou terreno fértil para a “escavação” dos sentidos. Neste quadro, cabe ao professor caminhar para o

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encontro de imagens, despertar no imaginário dos estudantes e provocar diálogos e significações, a partir do seu cotidiano, e articulá-los com a História da Arte. Esta prática descreve parte do projeto realizado, que teve continuidade nos anos seguintes.

Para Clarck (apud MARTINS; PICOSQUE, 2012, p. 78):

Nós somos os propositores: nós somos o molde, cabe a você soprar dentro dele o sentido da nossa existência. Nós somos os propositores: nossa proposição é o diálogo. Sós, não existimos. Estamos à sua mercê. Nós somos os propositores: enterramos a obra de arte como tal e chamamos você para que o pensamento viva através de sua ação. Nós somos os propositores: não lhe propomos nem o passado, nem o futuro, mas o agora.

Compreender o percurso do Ensino da Arte na escola e o encaminhamento dado a esta na Escola de tempo integral é uma necessidade premente. Ofertar a disciplina, não garante o que será feito com ela, nem tampouco a garantia do compromisso da formação docente, contínua, e a infraestrutura necessária.

Para o professor não basta mais ter o “domínio” conceitual, histórico, estético e artístico da arte. É necessária uma construção permanente, na qual os conhecimentos, as identidades e a consciência planetária são realimentadas, no sentido de ampliar o universo do professor para outros campos de conhecimento [...] Tão importante como conhecer e vivenciar a arte é compreendê-la no espaço/lugar e no tempo culturalmente construídos. (PILLOTTO; STAMM, 2007, p. 40)

Esperamos que as ações do presente, das políticas públicas culturais e dos professores de Arte na escola e na Escola de tempo integral, detone o impacto da Arte na formação humana.

rEfErências

BARBOSA, Ana Mae (org.). Arte/educação contemporânea: consonâncias internacionais. São Paulo: Cortez, 2010.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Emendas Constitucionais. Emendas Constitucionais de Revisão. Brasília, DF, 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 19 jun. 2014.

______. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da

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educação nacional. Brasília: Presidência da República, 1996. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm>. Acesso em 17 jun. 2014.

______. Lei n. 11.274, de 06 de fevereiro de 2006. Altera a redação dos arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade. Brasília: Presidência da República, 2006. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11274.htm>. Acesso em 17 jun. 2014.

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Educação aprova dança e teatro como disciplinas obrigatórias do ensino básico. 4 nov. 2013. Disponível em <http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/EDUCACAO-E-CULTURA/456284-EDUCACAO-APROVA-DANCA-E-TEATRO-COMO-DISCIPLINAS-OBRIGATORIAS-DO-ENSINO-BASICO.html>. Acesso em 19 jun. 2014.

DERRIDA, J. Posições. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.

MARTINS, Mirian; PICOSQUE, Gisa. Mediação cultural para professores andarilhos na cultura. São Paulo: Intermeios, 2012.

MOLL, Jaqueline (org.). Educação integral: texto de referência para o debate nacional. Brasília: MEC/Secad, 2009a.

______. Rede de saberes mais educação: pressupostos para projetos pedagógicos e de educação integral: caderno para professores e diretores de escolas. Brasília: Ministério da Educação, 2009b.

PILLOTTO, Silvia Sell Duarte.; BOHN, Letícia Ribas Diefenthaeler (org.). Arte/Educação: ensinar e aprender no ensino básico. Joinville: Univille, 2014.

PILLOTTO, Silvia Sell Duarte; STAMM, Eliana. A arte como propulsora da integração escola e comunidade. Joinville: Univille, 2007.

SANTA CATARINA. Secretaria de Educação. Proposta Curricular de Santa Catarina. Florianópolis: COGEN, 1998.

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EDUCAÇÃO DE TEMPO INTEGRAL, CONTRIBUIÇõES À PROMOÇÃO DA SÁUDE E

O COMBATE A OBESIDADE INfANTIL

Leila Vagner Oro 1

1. introdução

A escola tem assumido, na última década, compromissos e responsabilidades que ultrapassam a sua tradicional função social de apenas alfabetizar e inserir os alunos no universo cultural das ciências. Com isso, vários estados e municípios no país, se mobilizaram e ainda mobilizam projetos para atender a essa nova construção da educação pública no Brasil; por meio de parcerias com todos os setores que envolvem a sociedade de forma geral.

O objetivo deste trabalho é verificar a importância dos projetos de Esporte, e Promoção a Saúde da Escola com o Programa Mais Educação do Ministério de Educação do Governo Federal, na prevenção da obesidade infantil.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS, 2008), a obesidade é considerada uma doença multifatorial, que envolve fatores genéticos e ambientais, sendo caracterizada pelo desequilíbrio entre a ingestão calórica e os gastos energéticos. Wanderley e Ferreira (2010) afirmam no seu estudo que atualmente a obesidade vem sendo considerada a mais relevante desordem nutricional, tanto em países desenvolvidos como em países em desenvolvimento, devido ao aumento de sua incidência.

Esse trabalho resgata, com uma revisão bibliográfica sobre o tema, a trajetória histórica das experiências de escolarização pública de tempo integral no Brasil. Trouxe informações a respeito da educação integral no Município de Pato Branco; relatando um pouco de sua história, aspectos socioeconômicos e educacionais para chegar à implantação do projeto de educação integral, e como vem sendo realizado atualmente, trás informações sobre a política educacional brasileira que conta hoje com um

1 Licenciada em Educação Física pela Fadep Faculdade de Pato Branco e Pós-Graduada em Educação de Tempo Integral pela Universidade Federal da Fronteira Sul UFFS. Professora de Educação Física Ensino Fundamental I e II Colégio Mater Dei e Colégio Vicentino Nossa Senhora das Graças em Pato Branco/PR.

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programa e uma agenda de educação integral. A Portaria interministerial nº 17, de 24 de abril de 2007 (BRASIL, 2007c), institui o Programa Mais Educação com a parceria formal dos ministérios do Desenvolvimento Social e Combate à fome, da Cultura, do Esporte e o da Educação.

Identificam-se também os projetos da Escola Estadual Cristo Rei, que promovem ações educativas e atividades físicas com o objetivo de auxiliar no combate a obesidade infantil com ações esportivas e de promoção à saúde, articulando com as linhas estratégicas do Programa Mais Educação.

A proposta de pesquisa, sobre a obesidade infantil, em um Colégio Estadual de Pato Branco, teve como proposta identificar as ações desenvolvidas, a partir dos projetos de Esporte e Lazer, oferecidos aos alunos, e analisado como um problema de saúde pública, que se vem manifestando ao longo do tempo, e que merece toda a atenção e compreensão, dos profissionais da educação.

Por fim, esse trabalho poderá contribuir na melhoria das condições de vida, na intervenção para controlar a obesidade infantil e para a promoção de uma alimentação saudável e atividade física ao longo da infância e adolescência.

2 o proGrama mais Educação

A política educacional brasileira que conta hoje com um programa e uma agenda de educação integral. A Portaria interministerial nº 17, de 24 de abril de 2007 (Brasil, 2007c), institui o Programa mais educação com a parceria formal dos ministérios do Desenvolvimento Social e Combate à fome, da Cultura, do Esporte e o da Educação.

Destaca-se, ainda, os artigos 205, 208 e 227 da Constituição Federal:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do estado e da família, será promovida e incentivada com a elaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:I – ensino fundamental, obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para todos que a ele não tiveram acesso na idade própria;II – progressiva universalização do ensino médio gratuito; III – atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), lei nº 8.069/1990, em seu Capítulo IV, artigo 53, reforça a obrigatoriedade do acesso e permanência na escola.

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Art. 53. A criança e o adolescente têm direito a educação, visando ao pleno desenvolvimento da sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se lhes:I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;II – direito de ser respeitado por seus educadores.

O plano nacional de Educação, Lei nº 10.171/01 (Brasil, 2001), traz a educação

em tempo integral como objetivo do ensino fundamental e, também, da educação infantil, com a meta da ampliação progressiva da jornada escolar para um período de, pelo menos, sete horas diárias, com previsão de professores e funcionários em número suficiente. O fundo de manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de valorização dos profissionais da Educação (Lei nº 11.494/2007) (Brasil, 2007b), em seu décimo artigo, considera o tempo integral como um dos tipos de matrículas com diferenciação das ponderações para distribuição proporcional de recursos. O Plano de Desenvolvimento da Educação, por meio do Decreto nº 6.253/2207, assumiu o que foi estabelecido no Plano Nacional de Educação e definiu em seu artigo 4.º a duração do tempo integral:

Considera-se educação básica em tempo integral a jornada escolar com duração igual ou superior a sete horas diárias, durante todo o período letivo, compreendendo o tempo total que um mesmo aluno permanece n a escola ou em atividades escolares. (Brasil, 2007a)

A ênfase sobre como as ofertas educativas e os arranjos educativos locais possibilitam o desenvolvimento de projetos políticos-pedagógicos de educação integral requer a explicitação dos macrocampos de atividades.

Trata-se de linguagens, vivências e conhecimentos, agrupados por familiaridade, que são financiadas segundo os materiais necessários para seu desenvolvimento, (custeio e capital) e destinação de valores financeiros para organizados e até seis atividades, quando do preenchimento de seu plano de atendimento, por exemplo: acompanhamento pedagógico, Meio Ambiente, Esporte e lazer, Direitos Humanos, Cultura e Arte, Cultura digital, Prevenção e promoção à saúde, Comunicação e uso de mídias, Iniciação à investigação das ciências da natureza e à Educação econômica.

3 oBEsidadE infantil E prEvalência no Brasil

É consenso que a obesidade infantil vem aumentando de forma significativa e que ela determina várias complicações na infância e na idade adulta. Na infância, o manejo pode ser ainda mais difícil do que na fase adulta, pois está relacionado a

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mudanças de hábitos e disponibilidade dos pais, além de uma falta de entendimento da criança quanto aos danos da obesidade.

De acordo com relatos da Organização Mundial da Saúde, a prevalência de Obesidade infantil tem crescido em torno de 10 a 40% na maioria dos países europeus nos últimos 10 anos. A obesidade ocorre mais frequentemente no primeiro ano de vida, entre cinco e seis anos e na adolescência.

No Brasil, foram realizados dois grandes inquéritos, em 1989 e em 1996, posteriormente analisados de forma crítica por Taddei et al. Foi observado que, nesses 7 anos, houve mudanças relevantes na prevalência de obesidade entre crianças menores de cinco anos de idade. Observou-se aumento da prevalência nas regiões menos desenvolvidas e redução em regiões mais desenvolvidas. Tanto os aumentos quanto as reduções ocorreram mais intensamente entre filhos de mães com maior grau de escolaridade e entre crianças menores de dois anos de idade das respectivas regiões.

3.1 oBEsidadE infantil E atividadE fÍsica

O exercício é considerado uma categoria de atividade física planejada. A aptidão física, por sua vez, é uma característica do indivíduo que engloba potência aeróbica, força e flexibilidade. O estudo desses componentes pode auxiliar na identificação de crianças e adolescentes em risco de obesidade. A criança e o adolescente tendem a ficar obesos quando sedentários, e a própria obesidade poderá fazê-los ainda mais sedentários. A atividade física, mesmo que espontânea, é importante na composição corporal, por aumentar a massa óssea e prevenir a osteoporose e a obesidade.

Hábitos sedentários, como assistir a televisão e jogar video game, contribuem para uma diminuição do gasto calórico diário. Então além do gasto metabólico de atividades diárias, o metabolismo de repouso também pode influenciar a ocorrência de obesidade. O aumento da atividade física, portanto, é uma meta a ser seguida, acompanhada da diminuição da ingestão alimentar. Com a atividade física, o indivíduo tende a escolher alimentos menos calóricos. Em relação à atividade física, geralmente a criança obesa é pouco hábil no esporte, não se destacando.

A criança dever ser motivada a manter-se ativa, e essa prática dever ser incorporada preferencialmente por toda a família.

3.2 oBEsidadE infantil E HÁBitos alimEntarEs

Vários fatores influenciam o comportamento alimentar, entre eles fatores externos (unidade familiar e suas características, atitudes de pais e amigos, valores sociais e culturais, mídia, alimentos rápidos, conhecimentos de nutrição e manias alimentares) e fatores internos (necessidades e características psicológicas, imagem

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corporal, valores e experiências pessoais, autoestima, preferências alimentares, saúde e desenvolvimento psicológico).

Os pais exercem forte influência sobre a ingestão de alimentos pelas crianças. Entretanto, quanto mais os pais insistem no consumo de certos alimentos, menor a probabilidade de que elas os consumam. Na primeira infância, recomenda-se que os pais forneçam as crianças refeições e lanches saudáveis, balanceados, com nutrientes adequados o que permitam às crianças escolher a qualidade e a quantidade que elas desejam comer desses alimentos saudáveis.

A obesidade e o sedentarismo são responsáveis por grandes dispêndios no custo total de saúde pública. Essa tendência foi maior nas famílias pobres do que nas famílias ricas. E sendo assim o número de obesos é grande.

Um dos fatores responsáveis pelo maior excesso de peso e obesidade é sem dúvida o sedentarismo ou a insuficiente prática de atividade física regular. A falta de incentivo de muitos, e ainda mais a ocupação no trabalho, como das secretárias. Os dados da população americana avaliados por Blair evidenciaram que a ingestão energética não tem aumentado nos últimos 40 anos, época em que a prevalência de obesidade incrementou dramaticamente. (MATSUDO, 2009,)

A clara explicação sobre epidemia de obesidade no mundo inteiro está na diminuição de atividades físicas e gasto calórico diário, e lembrar a dramática diminuição de atividade física foi feito mais pela redução da atividade moderada do que da vigorosa, sendo que das atividades moderadas foi a caminhada, que mais sofreu redução. Tornamo-nos sedentários, principalmente porque paramos de andar.

A obesidade e o sedentarismo são responsáveis por grandes dispêndios no custo total de saúde pública. Essa tendência foi maior nas famílias pobres do que nas famílias ricas. E sendo assim o número de obesos é grande. Um dos fatores responsáveis pelo maior excesso de peso e obesidade é sem duvida o sedentarismo ou a insuficiente prática de atividades físicas regulares. A falta de incentivo de muitos, e ainda mais a ocupação no trabalho. Os dados da população americana avaliados por Blair evidenciou que a ingestão energética não tem aumentado nos últimos 40 anos, época em que a prevalência de obesidade incrementou dramaticamente. (MATSUDO, 2009, p.2)

Ainda, segundo o autor,

a obesidade constitui-se hoje em um grande problema de saúde pública sendo causa mundial de grande número de mortes e de doenças associadas. Pessoas com excesso de peso corporal apresentam risco elevado de desenvolverem

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doenças cardíacas, hipertensão arterial (pressão alta), dislipidemia (colesterol e triglicerídeos elevados), diabetes e problemas articulares. Estima-se que mais de 80% dos casos de diabéticos tipo 2 (aqueles que não precisam de insulina) podem ser atribuídos à obesidade. Dentro destas estimativas 75% dos casos de hipertensão arterial e 70% dos casos de doenças cardiovasculares estejam relacionados ao excesso de peso. (MATSUDO, 2009, p.2)

O trauma causado pelo elevado peso corporal sobre os quadris e sobre os joelhos além da dor crônica fazem com que o obeso se movimente cada vez menos aumentando o ganho de peso e consequentemente piorando as doenças associadas (hipertensão, diabetes). Doenças psiquiátricas como a depressão e problemas de autoestima também são muito comuns no paciente obeso. Nas ultimas décadas, a prática regular de atividade física foi internacionalmente reconhecida como um importante componente da vida diária por promover benefícios na saúde, independentemente da idade e gênero. Devido à pouca informação da população a respeito da atividade física, alimentação, e vários outros fatores que implicam a saúde, as pessoas estão cada vez mais obesas, diabéticas, sedentárias, pois os hábitos alimentares e peso inadequado estão trazendo doenças sérias para a população no nosso cotidiano.

A obesidade pode interferir na aptidão física, que ocorre usualmente quando a ingestão de energia excede o gasto, ou seja, podemos gastar energia mediante exercícios físicos de mudanças tanto na postura e mobilidade que estão associados às rotinas da vida diária. Considerando que o tempo no local de trabalho e percentualmente o que mais pode influenciar no nosso padrão de atividade física total no dia, o tipo de atividade física que realizamos na nossa atividade ocupacional torna-se fator determinante no gasto energético total diário. Dependendo da atividade física ocupacional, podemos gastar mais ou menos energia durante o dia com as mudanças de comportamento, aliadas importantes das estratégias de prevenção e tratamento da obesidade e sedentarismo. A obesidade e o sedentarismo são responsáveis por grandes dispêndios no custo total de saúde pública. Essa tendência foi maior nas famílias pobres do que nas famílias ricas, e sendo assim o número de obesos é grande.

O número de pessoas obesas, hoje, está crescendo bastante, elas se ocupam e estão preocupadas com o trabalho e estudos, esquecendo-se de ter uma reeducação alimentar, e assim, prejudicando sua saúde e até a ter doenças cardiovascular que podem levar à morte. O crescimento do campo da saúde do trabalhador explicitou que as situações de risco presentes nos ambientes de trabalho modificam também o padrão de saúde da população em geral, e também porque o processo de produção pode alterar as condições ambientais, que influenciam a saúde de distintos grupos humanos.

A renda estrutura as possibilidades de vida de toda a população, mormente no que diz respeito ao consumo de bens e as oportunidades de trabalho; apesar de o país

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possuir renda per capita de mais de 4.000 dólares anuais, sua distribuição situa-se entre as piores do mundo (IBGE, 2000). Convém ressaltar, ainda, diferenças espaciais entre grupos populacionais especiais, aos riscos laborais ambientais. A diferença encontra-se entre as regiões sudeste e nordeste em torno de 40%, quando se comparam os percentuais regionais. Por mais absurda que seja essa diferença percentual situava-se, em 1999, em torno de 60% para os estados do Piauí e do Maranhão.

As desigualdades entre sudeste e nordeste se traduzem quando se verifica que os trabalhadores não remunerados são, aproximadamente, 17% e 4% dentre todos os trabalhadores do nordeste e do sudeste, respectivamente. Em 1999, quase 75% desse tipo de trabalho não eram remunerados. Temos a desigualdade plantada sobre exploração primitiva (IBGE, 2000). O Brasil torna claras as desigualdades gravíssimas encontradas na população brasileira, entre gêneros e raça ou cor implica, mesmo excluindo-se a herança genética pessoal, enormes diferenças nas possibilidades de “viver a vida”, desde seu início.

3.3 HistÓria E proJEtos da Escola Estadual cristo rEi

A história da caminhada que foi percorrida pela Escola Cristo Rei demonstra, mais uma vez, que ninguém ou entidade se faz grande sem a soma das muitas contribuições, sem as muitas ações que se juntam.

Com este espírito, ergue-se o Grupo Escolar Cristo Rei, no ano de 1960. Uma construção com duas salas de aula e um gabinete, quando recebe a primeira professora, a senhora Ivair Farias Sabino, uma professora municipal, trabalhando em uma escola estadual.

As poucas carteiras eram de madeira de pinho e os lugares duplos; no alto, esculpido, um buraco para portar o tinteiro. Essas primeiras carteiras tinham, na maioria, quase a mesma largura da sala de aula, deixando apenas um vão para servir de passagem. Nelas cabiam tantas crianças quanto tivessem na sala de aula.

As crianças atentas, bem juntinhas, nas aulas multisseriadas, apesar da proximidade, não ousavam nem conversar. As ordens da professora eram seguidas à risca. A professora representava uma autoridade. Ela representava a figura austera do pai de cada aluno.

E assim nasce a escola Cristo Rei, um pouco diferente das outras primeiras escolas que nascem com a vila. As moradas com algumas famílias mais aglomeradas, além da Igreja, sentiram necessidade de uma escola.

O diferencial foi que essa escola foi a primeira a ser construída na entrada da cidade que, por sua vez, começou também a ser povoada pelo sul, lugar em que chegaram os primeiros desbravadores e colonizadores, seguidos dos migrantes vindos do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina.

A escola nasceu sob os auspícios de Lei Estadual, Decreto nº 67/81. A Escola

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Cristo Rei está localizada, hoje, no Bairro Pinheirinho e não mais no Bairro Cristo Rei, que hoje possui outra escola, a Escola Irmã Dulce.

O bairro foi crescendo. E para atender ao desenvolvimento e à necessidade de expansão, em 1986, foi instalado o ensino de 5ª a 8ª série, sob a Resolução nº 4407/93. Em novembro de 1998, tomando novos rumos a Educação do Paraná, a SEED (Secretaria Estadual de Educação) solicitou a cessação do ensino de 1ª a 4ª série da Escola Cristo Rei. A partir dessa solicitação, as séries iniciais seriam mantidas pela Prefeitura de Pato Branco.

A municipalização do ensino de 1ª a 4ª série e da Pré-Escola aconteceu em todo o Paraná por determinação do Governo Jayme Lerner. Em todo o Estado, as escolas de Ensino Fundamental (até 4ª série) e de Educação infantil passaram a ser atendidas pela prefeitura municipal.

A nova escola precisava ser “batizada”. Por isso, realizou-se um concurso com a participação dos professores, pais e alunos, para a escolha do nome. O nome escolhido foi “GÊNESIS”.

Em 1999, teve início o ano letivo com novos professores, sob a direção da professora Velamar Cagnin, a primeira diretora da Escola Municipal GÊNESIS. A Escola Municipal GÊNESIS, continuou ocupando as dependências do mesmo prédio, isso até 2002, data em que a nova escola passou a ocupar o prédio municipal construído na Rua Bartolomeu Bueno, no mesmo Bairro Pinheirinho.

Escola Cristo Rei, uma escola em Pato Branco, já traz no nome uma filosofia de Vida, o compromisso com a Verdade. É o nome de quem se propôs de quem ensinou que o mundo representado pelos homens precisa tornar-se mais fraterno, mais justo. Só então Ele poderá sentar-se em um Trono e Reinar entre os homens de Boa Vontade.

4. rEsultado E discussõEs

O tempo integral, como pode ser constatado nas diversas experiências levadas a efeito mundo afora e também no Brasil, permite organizar as atividades escolares segundo métodos adequados do ensinar e do aprender.

Os projetos ofertados pelo Colégio Estadual Cristo Rei, visam contribuir na maior permanência do aluno na Escola, com isso, participando dos projetos ofertados, que contribuem na melhoria da saúde e trazem conhecimentos de uma alimentação adequada tornando-os ativo às atividades diárias. A Escola ofertou, no ano de 2013, um número reduzido de projetos para suprir a demanda de atividades complementares, proposta como ampliação da jornada escolar, pela Secretaria de Estado da Educação, com o intuito de projetar uma oferta de educação integral, a partir das políticas públicas traçadas pelo governo atual. Os projetos do Colégio Estadual Cristo Rei articulam-se com o projeto mais educação, com a possibilidade de

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combater a obesidade infantil, caracterizado pelas atividades de Futsal e Xadrez com o eixo Esporte e Lazer e Prevenção e Promoção à Saúde. Esta condição poderia ser ampliada com a cultura e arte, danças, lutas e arte circense, mas o Colégio ainda não tem aprovação para estes projetos, no ano de 2013, previsto para 2014, pela adesão ao programa Mais Educação.

Nosso país apresenta números preocupantes no que diz respeito à obesidade infantil. Segundo o IBGE, o peso das crianças brasileiras vem aumentando, sendo que os piores resultados foram encontrados em crianças a partir dos cinco anos de idade. Os dados da pesquisa ainda indicaram que, hoje, uma em cada três crianças de cinco a nove anos, está acima do peso. O fenômeno é grave, também, na faixa etária entre 10 e 19 anos, idades em que a obesidade gira em torno de 20%.

Por fim, combater a obesidade infantil vai proporcionar condições de vida mais ativa e de atividade física mais regular, tratando assim do direito à saúde, seja de caráter individual ou de caráter coletivo, superando uma visão reducionista de saúde e obesidade infantil ao proporcionar os projetos e programas esportivos e de lazer.

5. considEraçõEs finais

Conclui-se, então, que se torna essencial uma intervenção precoce, no tratamento da obesidade infantil, de modo a alcançar o peso ideal correspondente à estatura e ao sexo da criança, garantindo a ingestão da quantidade de nutrientes necessária, de modo a não afetar o seu crescimento e desenvolvimento. Uma vez que prevenir a obesidade infantil poderá ser a melhor forma de combater esta epidemia, assim podendo informar e sensibilizar a estilo de vida e padrões de alimentação saudáveis no sentido de promover a saúde e o bem-estar da população.

Sendo assim, os projetos do Colégio Estadual Cristo Rei, em consonância com o Programa Mais Educação podem auxiliar os educadores a estabelecerem ações específicas relacionadas a Obesidade Infantil em vistas a promover a atividade física regular e a adoção de um estilo de vida ativo para a promoção da saúde e qualidade de vida.

rEfErências

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INTERDISCIPLINARIDADE, TRANSDISCIPLINARIDADE E

TRANSVERSALIDADE: CONSIDERAÇõES SOBRE A PROPOSTA DOS PARÂMETROS

CURRICULARES NACIONAIS

Adna Candido de Paula1 Ernani Mügge2

1. aprEsEntação

A Constituição da República Federativa do Brasil (1988), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96) e o Plano Nacional de Educação – PNE (2001), a partir de suas diretrizes, propõem e promovem mudanças significativas no sistema de ensino e, consequentemente, na realidade educacional brasileira. Conforme a Constituição, no seu § 205, a educação é direito de todos e dever do Estado e família, “visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Igualmente a LDB prevê “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola” (Art. 3º), traçando incumbências à União, aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e às escolas para que se garantam os direitos e se alcancem os objetivos. O PNE, criado para vigorar de 2011 a 2020, apresenta dez diretrizes objetivas e 20 metas; entre as primeiras, encontram-se a universalização do atendimento escolar e a melhoria da qualidade de ensino.

Essas iniciativas estão, aos poucos, modificando o panorama da educação brasileira, especialmente no que diz respeito ao acesso à escola, ao ampliar as oportunidades de escolarização à população. No entanto, questões relativas à qualidade do ensino oferecido nas instituições não acompanham a escalada do processo de universalização do ensino. Dados oriundos de diversos instrumentos de avaliação da aprendizagem demonstram que a escola brasileira está muito aquém do esperado em termos qualitativos, fazendo emergir, não raras vezes, o conceito de “fracasso escolar”.

1 Docente da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM)2 Docente da FEEVALE.

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A pergunta que se impõe de imediato busca razões desse fracasso, e tenta compreendê-lo à luz das ações propostas nos documentos oficiais, na tentativa de estabelecer um vínculo entre a teoria e a prática. Assim, sobressaem-se, de imediato, fatores associados a propostas de intervenção pedagógica. Dada sua presença em documentos que deram voz à LDB, a interdisciplinaridade, a transdisciplinaridade e a transversalidade merecem atenção, uma vez que essas abordagens ainda não ecoam de maneira satisfatória em grande parte das escolas brasileiras e podem, em razão disso, ter parcela de influência na aprendizagem dos alunos. Essa especulação baseia-se no fato de que uma compreensão nebulosa ou equivocada dos fenômenos pode interferir no ensino, fazendo com que haja dispersão de e nas estratégias e mau aproveitamento do tempo disponível para o que substantivamente interessa para a construção do conhecimento escolar.

Investigar os entraves da implantação dessas práticas e iluminar possíveis caminhos significa distinguir esses conceitos em voga na contemporaneidade, marcados pela valorização da unidade e de resistência à especialização e à fragmentação do conhecimento. Para, além disso, é perceber, na prática interdisciplinar, a possibilidade de valorizar a formação integral do alunado com vistas ao exercício da cidadania, objetivo destacado no processo de ensino e aprendizagem.

2. a lEGislação E os concEitos

Interdisciplinaridade, transdisciplinaridade e transversalidade são temas recorrentes nos debates sobre educação básica no Brasil, especialmente nos escritos das últimas décadas. No entanto, apesar dessa presença, os conceitos e sua aplicabilidade nunca receberam a devida centralidade na escola, o que, de certa maneira, enfraqueceu os termos, a ponto de eles serem utilizados para designarem quaisquer movimentos em direção a uma visão abrangente de um dado fenômeno. Nesse sentido, qualquer projeto que minimamente transcenda um conteúdo específico passa a atender ao que é proposto nos documentos.

Na construção do currículo – e na sua execução – as abordagens requerem cuidados, pois está em jogo uma concepção de mundo que sustenta as práticas pedagógicas. Por um lado, eles definem os procedimentos de ensino; por outro, orientam o processo de aprendizagem. Nesse sentido, é possível afirmar que, uma vez acolhidas essas abordagens, torna-se indispensável à reorganização de toda a estrutura escolar.

Para compreender as expectativas em torno das abordagens propostas, é válido recuperar, mesmo que brevemente e com um recorte temporal, o percurso histórico que promoveu sua aparição. A interdisciplinaridade, termo surgido na Europa, principalmente na França e na Itália, nos anos 1960, já influenciou a Lei de Diretrizes e Bases (Lei nº 5692/71). No entanto, nesta, não passou da superficialidade, uma vez

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que se resumiu, apenas, na junção de algumas disciplinas nas séries iniciais (1ª a 4ª série): os conteúdos de História e Geografia deram lugar a Estudos Sociais e Ciências Físicas e Biológicas a Ciências. Mas é a partir dos desdobramentos da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 – Referencial e Parâmetros Curriculares Nacionais –, que esse conceito, bem como os de transdisciplinaridade e transversalidade ganham relevância nas discussões sobre os processos pedagógicos. Esse fenômeno pode ser compreendido como reflexo dos objetivos traçados pela LDB, que prevê, no Art. 22, como finalidades, “desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores”.

Na medida em que uma visão íntegra da realidade é fundamental para a percepção crítica do contexto e, consequentemente, para o exercício da cidadania, é possível compreender os esforços de especialistas em educação, responsáveis pela elaboração de normas e diretrizes de ensino, de propor e incentivar atividades que contemplem o diálogo entre as disciplinas e favoreçam, assim, essa visão totalitária do mundo.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais surgem, gradativamente, após a promulgação da LDB: em 1997, são publicados os PCNs para as quatro primeiras séries do Ensino Fundamental, em 1998, para o terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental (5ª a 8ª série) e o RCNEI (Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil), e, em 2000, os PCNEM. Os Parâmetros Curriculares Nacionais “constituem um referencial de qualidade para a educação” [...], caracterizando-se por sua “natureza aberta”, permitindo adaptações de acordo com as necessidades locais. Nesse sentido, não possuem caráter impositivo (PCN, 1997a, p. 13). O objetivo dos Parâmetros é oferecer subsídios aos sistemas de ensino, particularmente aos professores, para a construção e/ou reconstrução do currículo, tendo por base o projeto pedagógico.

Os PCNs para as quatro primeiras séries do Ensino Fundamental, na Introdução, chamam atenção de que “optou-se por um tratamento específico das áreas, em função da importância instrumental de cada uma, mas contemplou-se também a integração entre elas” (PCN, 1997a, p. 41). Assim, na medida em que realçam e reconhecem a importância da especificidade de cada área, introduzem, de maneira a favorecer a integração entre elas, os Temas Transversais – Ética, Saúde, Meio Ambiente, Orientação Sexual, Pluralidade Cultural –, justificando que a educação para a cidadania requer a apresentação de questões sociais, para a aprendizagem e a reflexão dos alunos (PCN, 1997b, p. 29). Indica que, “por tratarem de questões sociais, os Temas Transversais têm natureza diferente das áreas convencionais. Sua complexidade faz com que nenhuma das áreas, isoladamente, seja suficiente para abordá-los. Ao contrário, a problemática dos Temas Transversais atravessa os diferentes campos do conhecimento” (PCN, 1997b, p. 29). Por essa razão, alertam que “a proposta de transversalidade pode acarretar algumas discussões do ponto de vista conceitual, como, por exemplo, a da

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sua relação com a concepção de interdisciplinaridade” (PCN, 1997b, p. 31). Os dois conceitos – transversalidade e interdisciplinaridade – conforme os Parâmetros,

se fundamentam na crítica de uma concepção de conhecimento que toma a realidade como um conjunto de dados estáveis, sujeitos a um ato de conhecer isento e distanciado. Ambas apontam a complexidade do real e a necessidade de considerar-se a teia de relações entre os seus diferentes e contraditórios aspectos. Mas diferem uma da outra, uma vez que a interdisciplinaridade refere-se a uma abordagem epistemológica dos objetos de conhecimento, enquanto a transversalidade diz respeito principalmente à dimensão da didática. (PCN, 1997b, p. 31)

No Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, publicado no ano seguinte, observa-se um discurso afinado com o dos PCNs destinados para as séries iniciais do Ensino Fundamental. O mesmo objetivo que sustenta os Temas Transversais assinala a proposição dos Eixos de Trabalho Formação Pessoal e Social, que favorece os processos de construção da identidade e a autonomia das crianças, e Conhecimento de Mundo, que orienta “para a construção das diferentes linguagens pelas crianças e para as relações que estabelecem com os objetos de conhecimento: Movimento, Música, Artes Visuais, Linguagem Oral e Escrita, Natureza e Sociedade e Matemática”. O documento adverte que cabe “aos professores ter consciência, em sua prática educativa, que a construção de conhecimentos se processa de maneira integrada e global e que há inter-relações entre os diferentes eixos sugeridos a serem trabalhados com as crianças”. (RCN, 1998, p. 7).

Mais adiante, o Referencial esclarece a perspectiva que fundamenta os conteúdos, que gira em torno de sua finalidade, e orienta para a integração que deve ocorrer entre eles:

Os conteúdos são compreendidos, aqui, como instrumentos para analisar a realidade, não se constituindo fim em si mesmos. Para que as crianças possam compreender a realidade na sua complexidade e enriquecer sua percepção sobre ela, os conteúdos devem ser trabalhados de forma integrada, relacionados entre si. Essa integração possibilita que a realidade seja analisada por diferentes aspectos, sem fragmentá-la. (RCN, 1998, p. 53, 54)

Os PCNs para as séries finais do ensino fundamental igualmente mantêm a proposta de integração, destacando que “o tratamento dos conteúdos deve integrar conhecimentos de diferentes disciplinas, que contribuem para a construção de instrumentos de compreensão e intervenção na realidade em que vivem os alunos”

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(PCN, 1998, p. 58). Da mesma forma que os Parâmetros para as séries iniciais, os PCNs para as séries finais também elencam Temas Transversais, acrescentando, aos já previstos para a etapa anterior, Trabalho e Consumo.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio – PCNEM (BRASIL, 1999) apresentam a organização dos currículos em três áreas (Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias e Ciências Humanas e suas Tecnologias),3 favorecendo a interlocução de conhecimentos entre as matérias, mas preservando os referenciais próprios de cada componente curricular. Compõem o primeiro grupo, as disciplinas de língua portuguesa, língua estrangeira moderna, educação física, arte e informática; o segundo, química, física, biologia e matemática; o terceiro, história, geografia, sociologia, antropologia, política e filosofia. Assim, entende-se que, a partir da junção das disciplinas em áreas, é possível desenvolver projetos que apontem diferentes pontos de vista, para o mesmo objeto. Ao chamar atenção para o fato de que “a interdisciplinaridade do aprendizado científico e matemático não dissolve nem cancela a indiscutível disciplinaridade do conhecimento” (PCN, 1999, p. 6), os Parâmetros propõem a coexistência das duas práticas no espaço escolar.

Assim, dada a relevância que assume a abordagem interdisciplinar nos diversos documentos que orientam as práticas educacionais, o termo, complexo desde o conceito até a prática, merece estudos permanentes. A reflexão a que se propõe neste texto tem como fim a articulação entre a prática interdisciplinar e os objetivos apresentados nos Parâmetros Curriculares, especificamente, no que concerne à abordagem dos Temas Transversais, Ética, Saúde, Meio Ambiente, Orientação Sexual, Pluralidade Cultural, Trabalho e Consumo.

3. a intErdisciplinaridadE E os tEmas transvErsais dos pcns

A correlação entre a transversalidade e a interdisciplinaridade já está indicada no próprio parâmetro curricular: “A proposta de transversalidade pode acarretar algumas discussões do ponto de vista conceitual como, por exemplo, a da sua relação com a concepção de interdisciplinaridade, bastante difundida no campo da pedagogia (PCN, 1997b, p. 31)”. Antes de abordar diretamente esta correlação, no âmbito da educação fundamental, faz-se necessário analisar, em profundidade, as especificidades das práticas inter-, pluri- e transdisciplinar. Aparentemente, os prefixos dos termos oferecem o indicativo da prática, mas há, ainda, algumas concepções equivocadas,

3 Em 2010, por meio da Resolução nº 7, de 14 de dezembro de 2010, os componentes curriculares obrigatórios do Ensino Fundamental também são organizados de acordo com as áreas de conhecimento: I – Linguagens (Língua Portuguesa, Língua Materna, para populações indígenas, Língua Estrangeira moderna, Arte e Educação Física); II – Matemática; III – Ciências da Natureza; IV – Ciências Humanas (História, Geografia); V – Ensino Religioso. (p. 4 http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/rceb007_10.pdf)

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sobretudo, de senso comum em relação a estas, cujas especificidades estão marcadas nas diferentes metodologias.

A pluridisciplinaridade,4 ou multidisciplinaridade é o encontro de pesquisadores e professores de disciplinas diferentes em torno de um tema comum, quando cada um conserva a especificidade de seus conceitos e métodos. Trata-se de aproximações paralelas que tendem a um objetivo comum pelas contribuições específicas. A pluridisciplinaridade não pressupõe diálogo e, consequentemente, modificações nos métodos das disciplinas envolvidas. Por isso, o que ocorre é uma coexistência de línguas diferentes. A transdisciplinaridade tem sua especificidade marcada pelo prefixo trans-, o mesmo usado em transgressão, transversal e transpassar cuja preposição latina trans significa “além de”, “para lá de”, “depois de”. Em 1972, Jean Piaget, nos Proceedings, assim definiu a prática transdisciplinar:

Enfim, à etapa das relações interdisciplinares, podemos ver suceder uma etapa superior, que seria a “transdisciplinaridade”, que não se contentaria em esperar pelas interações ou reciprocidades entre pesquisas especializadas, mas situaria essas ligações no interior de um sistema total sem fronteiras estáveis entre as disciplinas.5 (PIAGET, 1972, p. 144)

O modo transdisciplinar representa a última etapa evolutiva das práticas que aproximam disciplinas, na qual os sujeitos abandonam seus pontos de vista particulares de cada disciplina para produzir um saber autônomo que resultariam novos objetos e novos métodos. Interessa, nesta abordagem, analisar, comparativamente, os objetivos dos Parâmetros Curriculares sobre os Temas Transversais com alguns dos artigos da “Carta da Transdisciplinaridade.”6 O § 2 da carta dispõe sobre “O reconhecimento da existência de diferentes níveis de realidade, regidos por lógicas diferentes, é inerente à atitude transdisciplinar; qualquer tentativa de reduzir a realidade a um único nível regido por uma única lógica não se situa no campo da transdisciplinaridade” (CETRANS, 2002, p. 194). O reconhecimento de que a noção de “realidade” é problemática pode ser inferido da percepção de que há “diferentes níveis de

4 Estas definições foram amplamente apresentadas e discutidas no capítulo “Interdisciplinaridade”, do livro SEVERO, Cristine Gorski & PAULA, Adna Candido de. No mundo da linguagem: Ensaios sobre identidade, alteridade, ética, política e interdisciplinaridade. São Carlos: Pedro & João Editores, 2010.5 Tradução livre dos autores.6 Em 1994, realizou-se o “I Congresso Mundial de Transdisciplinaridade”, no Convento de Arrábida, em Portugal. Por ocasião deste evento, foi redigida a “Carta da Transdisciplinaridade”, assinada por 62 participantes, de 14 países. Essa carta traz uma série de considerações que registram a urgência de se pensar em um sistema de ensino abrangente e livre de preconceitos em relação às áreas do conhecimento. Esta carta, assim como a Declaração de Veneza “A Ciência diante das Fronteiras do Conhecimento”, de 1986, e a declaração “Uma visão mais ampla da Transdisciplinaridade”, redigida como ponderações a propósito da “Conferência Transdisciplinar Internacional”, realizada em Zurique de 27 de fevereiro a 1º de março, estão presentes no livro Educação e Transdisciplinaridade II (2002).

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realidade”. Está é uma importante noção que não está presente nos objetivos dos PCNs, que defendem uma ideia de educação voltada para a “realidade”:

A transversalidade diz respeito à possibilidade de se estabelecer, na prática educativa, uma relação entre aprender conhecimentos teoricamente sistematizados (aprender sobre a realidade) e as questões da vida real e de sua transformação (aprender na realidade e da realidade). (PCN, 1997b, p. 31)

Os temas transversais são efetivamente uma possibilidade de introduzir os alunos nos universos plurais das diferentes realidades, inclusive, eles permitem uma reflexão sobre o próprio conceito de “realidade”, mas para que isso ocorra a prática de aproximação disciplinar tem que ser problematizada, discutida, refletida e isso não é o que fica claro com a leitura dos PCNs. De acordo, ainda, com o § 5, da “Carta da Transdisciplinaridade”: “A visão transdisciplinar é resolutamente aberta, na medida em que ela ultrapassa o campo das ciências exatas devido ao seu diálogo e sua reconciliação, não somente com as ciências humanas, mas também com a arte, a literatura, a poesia e a experiência espiritual” (CETRANS, 2002, p. 195). As três últimas áreas de conhecimento das humanidades – literatura, poesia e experiência espiritual – não são contempladas nos Temas Transversais dos PCNs, e seriam estes de fundamental importância, inclusive, para discutir a noção de “realidade”.

A literatura, apesar de sua histórica parceria com a escola, no contexto geral da educação brasileira, ainda não recebe o devido reconhecimento por parte dos docentes, apesar de sua propensão de atuar sobre o sujeito-leitor, envolvendo-o em um processo de autoconhecimento e de revelação da malha social e induzindo-o a posicionar-se criticamente diante dela e diante dos procedimentos expressivos da linguagem. A desvalorização da literatura no ambiente escolar pode encontrar suas razões na própria relação entre professor e texto literário. Conforme estudos da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (MILANI, 2003. p. 36), 41% dos docentes leem ao menos um livro por mês, 34% leem eventualmente e 25% não responderam ou não costumam ler. Somados os dois últimos segmentos, obtém-se um índice expressivo de quase 60% de professores pouco afeitos à leitura. Em decorrência disso, o tratamento dispensado ao texto literário não poderia ser outro. O ensino religioso, por sua vez, é historicamente negligenciado na educação básica no Brasil e, quando ocorre, fica a cargo de um representante da Igreja Católica. É possível observar que as Escolas não têm cumprido com o disposto no art. 33 da Lei nº 9.394/96, que é retomado na Resolução nº 7, de 14 de dezembro de 2010.7 O Brasil, um país reconhecido

7 § 6º O Ensino Religioso, de matrícula facultativa ao aluno, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui componente curricular dos horários normais das escolas públicas de Ensino Fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural e religiosa do Brasil e vedadas quaisquer formas de proselitismo, conforme o art. 33 da Lei nº 9.394/96.

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mundialmente pelo sincretismo e pelo pluralismo religioso, deveria ser exemplo de tolerância e de maturidade educacional inserindo o tema da religião, e suas formas de expressão, como um de seus temas transversais, o que cumpriria exemplarmente o disposto no § 9, da “Carta da Transdisciplinaridade”: “A transdisciplinaridade conduz a uma atitude aberta em relação aos mitos, às religiões e àqueles que os respeitam num espírito transdisciplinar”. (CETRANS, 2002, p. 196)

Outrossim, ao se considerar a importância de uma formação básica que aproxima e estabelece a ligação entre os conteúdos abordados, em sala de aula, e as diversas realidades vividas pelos indivíduos, é preciso considerar o papel que a imaginação e a sensibilidade desempenhariam nesta conexão, como aponta o § 11 da “Carta da Transdisciplinaridade”: “Uma educação autêntica não pode privilegiar a abstração no conhecimento. Deve ensinar a contextualizar, concretizar e globalizar. A educação transdisciplinar reavalia o papel da intuição, da imaginação, da sensibilidade e do corpo na transmissão dos conhecimentos”. (CETRANS, 2002, p. 196)

Apesar dos esforços empreendidos pelo grupo signatário da “Carta da Transdisciplinaridade” e do documento “Uma visão mais ampla de transdisciplinaridade,”8 a análise da atual conjuntura da educação básica brasileira indica que a transdisciplinaridade é uma prática complexa, que exige maturidade e um exercício preparatório para que sua efetiva realização ocorra. A interdisciplinaridade tem sido apontada como uma prática possível, rica e, consequentemente, uma preparação natural para a prática transdisciplinar. A interdisciplinaridade supõe um diálogo e uma troca de conhecimentos, de análises, de métodos entre duas ou mais disciplinas. Ela implica que haja interações e um enriquecimento mútuo entre vários especialistas. A especificidade está marcada no prefixo inter-, que é uma preposição e um provérbio latino que significa “no interior de dois; entre; no espaço de”. É o prefixo de palavras como interlocução, inter-relação, intermédio, intercâmbio. A interdisciplinaridade pressupõe dois ou mais elementos em relação.

A interdisciplinaridade, por pressupor um diálogo entre as disciplinas, reorganiza os campos teóricos em jogo, procedendo como uma tradução de linguagens, às dos saberes envolvidos, sem negar as dificuldades e os limites inerentes a esse exercício. A interdisciplinaridade promove a autorreflexão. Contudo, mesmo figurando como um caminho possível e desejável, a interdisciplinaridade não está a salvo de investigação epistemológica. Ela corre o risco de se tornar uma simples justaposição de aproximações, o que a transformaria em prática pluridisciplinar, e pode, por outro lado, transgredir os limites disciplinares e se transformar em prática transdisciplinar. A palavra de ordem na prática interdisciplinar é diálogo e a forma como ele acontece define a produtiva ou a problemática interdisciplinaridade.

8 Em 2000, ocorreu a “Conferência Transdisciplinar Internacional”, realizada em Zurique, de 27 a 1º de março. Novamente, outras considerações foram elaboradas e constituíram o documento intitulado “Uma visão mais ampla de transdisciplinaridade”.

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Novamente, é preciso correlacionar a prática interdisciplinar com as orientações dos PCNs, quanto aos temas transversais.

Ambas — transversalidade e interdisciplinaridade — se fundamentam na crítica de uma concepção de conhecimento que toma a realidade como um conjunto de dados estáveis, sujeitos a um ato de conhecer isento e distanciado. Ambas apontam a complexidade do real e a necessidade de se considerar a teia de relações entre os seus diferentes e contraditórios aspectos. Mas diferem uma da outra, uma vez que a interdisciplinaridade refere-se a uma abordagem epistemológica dos objetos de conhecimento, enquanto a transversalidade diz respeito principalmente à dimensão da didática. (PCN, 1997b, p. 31)

Não fica clara a diferença observada nos PCNs entre a transversalidade e a interdisciplinaridade, uma vez que a abordagem epistemológica é um recurso didático, o que as aproxima e não as diferencia. A noção de interdisciplinaridade disposta nos PCNs é correta e está de acordo com aquela proposta pela grande maioria de estudiosos sobre o tema. De fato, “a interdisciplinaridade questiona a segmentação entre os diferentes campos de conhecimento, produzida por uma abordagem que não leva em conta a inter-relação e a influência entre eles – questiona a visão compartimentada (disciplinar) da realidade sobre a qual a escola, tal como é conhecida, historicamente se constituiu” (PCN, 1997b, p. 31). Igualmente é correta a afirmação de que na

prática pedagógica, interdisciplinaridade e transversalidade alimentam-se mutuamente, pois o tratamento das questões trazidas pelos Temas Transversais expõe as inter-relações entre os objetos de conhecimento, de forma que não é possível fazer um trabalho pautado na transversalidade tomando-se uma perspectiva disciplinar rígida. (PCN, 1997b, p. 31)

Contudo, a interdisciplinaridade não suprime as fronteiras, ela aponta para as aproximações e distanciamentos, preservando e reconhecendo as especificidades disciplinares. De acordo com os PCNs, a transversalidade, ao contrário da interdisciplinaridade, “promove uma compreensão abrangente dos diferentes objetos de conhecimento, bem como a percepção da implicação do sujeito de conhecimento na sua produção, superando a dicotomia entre ambos” (PCN, 1997b, p. 31). Suprimir a dicotomia não é um bom recurso didático, que ensina aos alunos a não enfrentar as diferenças, reconhecendo as especificidades e as plurais identidades dos saberes, levando-os a apagar as diferenças, a não respeitar os limites. Quantos desdobramentos didáticos não poderiam ser aproveitados se o foco estivesse, no tratamento dos temas transversais,

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exatamente na dicotomia das relações interdisciplinares. Grosso modo, reconhecendo as especificidades disciplinares, os alunos teriam a oportunidade de ter acesso às áreas de conhecimento e poderiam, assim, ter um panorama mais claro de uma futura escolha profissional. Seria interessante, como recurso didático, apoiado na dicotomia entre as disciplinas, explorar o que define os interesses específicos para os profissionais das áreas. Ao contrário de tratar a disciplinaridade como impedimento para uma compreensão ampla do ser humano, ela poderia ser tratada como aquilo que confere especificidade na diversidade, ela cumpriria o mesmo papel que a transversalidade, no sentido de abrir

para a inclusão de saberes extraescolares, possibilitando a referência a sistemas de significado construídos na realidade dos alunos. Os Temas Transversais, portanto, dão sentido social a procedimentos e conceitos próprios das áreas convencionais, superando assim o aprender apenas pela necessidade escolar de “passar de ano”. (PCN, 1997b, p. 31)

A relação entre identidade e alteridade, tão discutida nos dias atuais em diferentes âmbitos do conhecimento, poderia ser introduzida na escola a começar pelo reconhecimento do que confere identidade a uma determinada disciplina. O que faz da sociologia uma disciplina diferente da filosofia, por exemplo, quais as especificidades de cada área, o que as aproxima sem as tornar iguais? Esta perspectiva se encontra, inclusive, nos próprios PCNs: “Há um sério trabalho educativo a ser feito no âmbito do convívio escolar e a especificação dos conteúdos de cada tema favorece a reflexão e o planejamento desse trabalho”. (PCN, 1997b, p. 39)

É necessário, portanto, criar artificialmente condições para o exercício interdisciplinar. A metodologia deverá evitar que uma disciplina se transforme em discurso-objeto de investigação de disciplinas outras, reduzindo-se a um simples receptáculo de projeções teóricas destas. Se assim for, a assimetria teria lugar na prática interdisciplinar, o que não reflete o ideal, além de oferecer aos contrários à prática interdisciplinar argumentos fortes para a sua contestação. A única maneira de superar essa dificuldade consiste em realizar uma série de permutações de posição em que cada disciplina implicada propõe sucessivamente paradigmas para a crítica de outras. A sucessividade, dialógica por excelência, garante que problemas, temas e metodologias circulem entre as disciplinas, figurando ora como perguntas, ora como respostas. Assim se configura a autorreflexão das disciplinas envolvidas na prática interdisciplinar. Observar como o “outro” a analisa, permite à disciplina se conhecer outra mente e descobrir focos de atenção que talvez jamais tenha visto antes da experiência interdisciplinar. Um último tema a ser discutido na prática interdisciplinar é a dimensão ética aí implícita. Considerada como a prática dialógica, por natureza, a interdisciplinaridade constitui-se como uma figura ideal da comunicação intersubjetiva no seio da escola. Ela pressupõe o engajamento em

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uma pesquisa coletiva, a diversidade de opiniões e a incerteza do resultado. Nesse sentido, a prática interdisciplinar é dialética e consiste em relativizar as identidades e as diferenças. O diálogo entre as disciplinas exige que as vozes sejam ouvidas, em suas especificidades, seus contextos, para que a diferença seja incluída e não rechaçada. Deve-se evitar a todo custo o nivelamento e as aproximações forçadas.

Dito de outro modo: cada disciplina desde sempre pertence a um contexto que a marca e do qual ela não consegue se liberar. Muito pelo contrário, inserida na sua própria história enquanto disciplina, mas também determinada por condições externas para ela não disponíveis, nenhuma área científica consegue escamotear seu próprio ser envolvido num horizonte mais amplo, dentro do qual ela vê seu processo de investigação determinado. (FLICKINGER, 2007, p. 123)

Nada deve ser desconsiderado ou anulado no processo dialógico das disciplinas, nem suas especificidades, muito menos sua história, sua tradição, porque o crescimento conjunto só se dá pelo jogo dialético entre elas, e entre o novo e a tradição. Como aponta o linguista russo Mikhail Bakhtin, não existe lugar ideológico neutro, assim como não há disciplina sem ideologia, sem história, sem identidade. Por trabalhar na interface de vários saberes, a interdisciplinaridade constitui-se como um terceiro, um entre-lugar, em que há uma circulação de saberes. A prática dialógica da interdisciplinaridade assegura aos agentes envolvidos – estudantes e professores – relativizar os conceitos de realidade e verdade, ela ensina que a verdade é plural, assim como a realidade. Esta também é a perspectiva dos signatários da “Carta da Transdisciplinaridade” que defendem, no § 3:

A transdisciplinaridade é complementar à aproximação disciplinar: faz emergir da confrontação das disciplinas dados novos que as articulam entre si; oferece-nos uma nova visão da natureza e da realidade. A transdisciplinaridade não procura o domínio sobre as várias outras disciplinas, mas a abertura de todas elas àquilo que as atravessa e as ultrapassa. (CETRANS, 2002, p. 194)

Para que a interdisciplinaridade cumpra seu papel de quebrar com paradigmas disciplinares e que instaure uma prática dialógica, é preciso que os estudantes estejam associados a essa metodologia, nos trabalhos práticos e nos seminários que lhes são propostos. É preciso, igualmente, que se crie uma tradição de estudos interdisciplinares que “contamine” todos os níveis hierárquicos do sistema escolar. Este exercício exige leituras, atualizações constantes, corpus bibliográfico amplo e diversificado, e reavaliações constantes da prática e do discurso que a circunscreve.

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A interdisciplinaridade foge da dicotomia improdutiva e pressupõe um movimento dialético com vista ao crescimento da identidade e da alteridade disciplinares.

Aceitar o ser diferente das disciplinas sem querer assemelhá-las uma à outra pressupõe uma postura ética de reconhecimento e de responsabilidade mútua, tal como estes conceitos a expressam: reconhecer a si mesmo no outro, e estar pronto para dar as respostas exigidas pela pergunta do outro. (FLICKINGER, 2007, p. 123)

É nesse sentido que não há como negar a dimensão ética dessa prática, que deve ser pensada, para além das aproximações entre disciplinas, no domínio das relações interpessoais dos agentes, do face a face. Se as relações interdisciplinares promovem, como tem se provado com algumas práticas, o crescimento daquelas que estão envolvidas, imagina-se que operaria transformações consideráveis nas relações entre professores e alunos. O não apagamento das fronteiras, que é a característica da interdisciplinaridade, culminaria na realização dos objetivos almejados pelos PCNs no que tange aos temas transversais. A educação básica deveria, conforme orienta os PCNs, formar cidadãos capazes de se posicionar “de maneira crítica, responsável e construtiva nas diferentes situações sociais, utilizando o diálogo como forma de mediar conflitos e de tomar decisões coletivas” e, ainda, estar apto a “desenvolver o conhecimento ajustado de si mesmo e o sentimento de confiança em suas capacidades afetiva, física, cognitiva, ética, estética, de inter-relação pessoal e de inserção social, para agir com perseverança na busca de conhecimento e no exercício da cidadania” (PCN, 1997b, p. 9), contudo, não se forma um cidadão com essas qualidades ensinando-os a “apagar” as diferenças e transpor as dicotomias. É interessante observar que o § 13, da “Carta da Transdisciplinaridade”, já aponta este como um erro na formação ética de um ser humano:

A ética transdisciplinar recusa toda atitude que se negue ao diálogo e à discussão, seja qual for sua origem – de ordem ideológica, científica, religiosa, econômica, política ou filosófica. O saber compartilhado deveria conduzir a uma compreensão compartilhada baseada no respeito absoluto das diferenças entre os seres, unidos pela vida comum sobre uma única e mesma Terra. (CETRANS, 2002, p. 196)

4. a caminHo da articulação

A prática interdisciplinar a partir do respeito às especificidades de cada disciplina, para obter êxito no âmbito escolar, e considerando seu caráter coletivo,

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requer a instituição de uma estrutura em que vários segmentos devem estar articulados, distinguindo-se pelo protagonismo de seus agentes em um processo dinâmico e dialógico. A constituição dessa estrutura demanda, em primeiro lugar, a disposição de seus integrantes em aderir à proposta, a partir da convicção de que se trata de algo importante para a educação. Articulados em torno de um objetivo comum, os profissionais de cada segmento – equipe diretiva, pedagógica, corpo docente e discente – têm papéis específicos, e devem atender a demandas que lhe são próprias e significativas, na construção de condições para a execução de um trabalho interdisciplinar. Entre outras coisas, cabe aos gestores escolares coordenar o processo, organizando tempos e espaços para debate e planejamento e fomentando a participação de todos com vistas a um pacto cooperativo. Pelas atribuições que lhe são inerentes, cabe à equipe pedagógica papel importante na leitura da caminhada e na construção de estratégias que permitam alcançar os objetivos. Para Celso Vasconcellos,

o Professor Coordenador Pedagógico (PCP) é o intelectual orgânico do grupo, qual seja, aquele que está atento à realidade, que é competente para localizar os temas geradores (questões, contradições, necessidades, desejos) do grupo, organizá-los e devolvê-los como um desafio para o coletivo, ajudando na tomada de consciência e na busca conjunta de formas de enfrentamento. (VASCONCELLOS, 2011)

Abertura ao novo, domínio teórico e disposição para trabalhar em conjunto são algumas características esperadas dos professores. A perspectiva proposta neste trabalho não dialoga com acomodação, rotina e enclausuramento. Na medida em que se propõe ao diálogo, à pesquisa, fazendo emergir, muitas vezes, opiniões controversas, ela adentra o campo das incertezas. Assim, o sujeito envolvido está constantemente diante do desconhecido – portanto, em contato com o novo.

O domínio teórico igualmente é uma exigência basilar, na medida em que o processo vai exigir do professor não só o conhecimento específico de sua área de atuação, como o aprofundamento nas questões que definem a identidade das demais, visto que o método, nesta proposta de trabalho interdisciplinar, é enfocar, analisar e compreender o fenômeno respeitando a dicotomia presente nas disciplinas. Na medida em que constrói, paulatinamente, uma gama de conhecimentos cada vez maior sobre sua área de conhecimento, maior também será a possibilidade de ele visualizar o que lhe é próprio e o que é do outro, e mais refinado será seu olhar sobre as temáticas que surgirem diante dele. Nessa perspectiva, o professor reconhece a necessidade de aprofundamento disciplinar, assumindo uma relação dinâmica em relação ao conhecimento: estuda, pesquisa, questiona, dialoga e, assim, se prepara

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para os novos desafios que sua profissão lhe impõe. O desenvolvimento da dinâmica de estudos pode integrar a formação continuada de professores, prevista em lei.9

Na medida em que cada área de conhecimento busca identificar suas semelhanças e diferenças com as demais, elaborando um olhar crítico sobre elas, e entrelaçando conteúdos com temáticas do contexto, se expressa, também, a necessidade de os sujeitos envolvidos, a partir de uma atitude de humildade, aprimorarem habilidades que o trabalho coletivo postula. Para tal, novamente é necessária disposição, por parte do professor, de se envolver, de fato, em um ambiente de construção coletiva, em que suas convicções e certezas são permanentemente relativizadas.

Se a escola é um espaço privilegiado de construção de conhecimento e de socialização do indivíduo, ela também é, por excelência, o lugar em que um saber particularizado, diante de sua relevância, busca interlocução, de maneira que a palavra circule, na acepção mais profunda do verbo.

rEfErências

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: introdução aos parâmetros curriculares nacionais. Brasília: MEC/SEF, 1997a. Disponível em http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: apresentação dos temas transversais, ética. Brasília: MEC/SEF, 1997b. Disponível em http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro081.pdf.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial curricular nacional para a educação infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998. Disponível em http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/rcnei_vol1.pdf.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: introdução aos parâmetros curriculares nacionais. Brasília : MEC/SEF, 1998. Disponível em http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/introducao.pdf.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio. Brasília: MEC/SEMTEC, 1999. Disponível em http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/ciencian.pdf.

CETRANS. “A Evolução Transdisciplinar na Educação: Contribuindo para o Desenvolvimento Sustentável da Sociedade e do Ser Humano”. In: Educação e

9 A Resolução nº 4, de 13 de julho de 2010, que define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica, observa, no Art. 58, que “A formação inicial, nos cursos de licenciatura, não esgota o desenvolvimento dos conhecimentos, saberes e habilidades referidas, razão pela qual um programa de formação continuada dos profissionais da educação será contemplado no projeto político-pedagógico”.

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transdisciplinaridade II. Coordenação executiva do CETRANS (Orgs.). São Paulo: TRIOM, 2002.

FLICKINGER, Hans-Georg. “O Fundamento Hermenêutico da Interdisciplinaridade”. In: Inovação e interdisciplinaridade na universidade. Jorge Luis Nicolas Audy e Marília Costa Morosini (Orgs.). Porto Alegre: EDIPUCRS, 2007.

MILANI, Aloísio. “Por que professor não gosta de ler?” Revista Educação, ano VII, nº 77. set. 2003.

PIAGET, Jean. “L’interdisciplinarité – Problèmes d’enseignement et de recherche dans les universités”. In: Proceedings. Paris: OCDE, 1972.

VASCONCELLOS, Celso. Disponível em http://www.celsovasconcellos.com.br/index_arquivos/Page4256.htm.

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ExPERIêNCIA E DEMOCRACIA: PILARES DA EDUCAÇÃO DEWEYANA

francisco xavier Buehrmann1

Elsio José Corá 2

1 introdução

O presente estudo parte do interesse em contribuir teoricamente para o debate em torno da Educação Integral, buscando investigar a teoria educacional deweyana. Espera-se, encontrar ‘novas’ compreensões deste conceito por meio da adoção da experiência reorganizada e reconstruída continuamente. Para isso, acreditasse no emprego da democracia como possibilidade de formação de sujeitos críticos e membros ativos, nos avanços da sociedade da qual participam.

Compreende-se que a relevância da concepção deweyana de educação, embasam práticas que visam profundamente a alterar a estrutura escolar e sua metodologia de ensino. Porém, merece atenção a forma como ele entende esse processo, pois, “[...] enquanto vivo, eu não estou, agora, preparando para viver e daqui a pouco, vivendo. Do mesmo modo eu não me estou em um momento preparando para educar-me e, em outro, obtendo o resultado dessa educação.” (TEIXEIRA, 1959, p. 8-9). Ou seja, as coisas não surgem do nada, o processo educacional é trabalhoso e não se obtém resultados imediatos. É necessária uma construção gradativa das experiências e ter a consciência de que existe certo decurso de tempo em cada fase da experiência.

Por este motivo não será possível contentar-se somente com os processos de preparação para um determinado período da vida, muito menos permitir a dissociação entre a vida e a educação. A educação será concebida como uma experiência de vida, que se desencadeia no cotidiano das pessoas e as conduzirá para uma formação reflexiva. “É inconcebível pensar vida, experiência e aprendizagem separadas, uma vez que se vive, experimenta e aprende simultaneamente.” (LEITE, 2010, p. 25). Isto somente será realidade por meio da interação social, pois a partir dela o homem conseguirá

1 Licenciado em Filosofia pela Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS. E-mail: [email protected]. 2 Doutor em Filosofia, docente da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), Campus Chapecó.

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estimular sua imaginação, ampliar suas experiências, criar responsabilidades e mesmo refletir sobre seus experimentos. Dessa forma, espera-se, com isso, contribuir para o debate da educação no cenário brasileiro com o objetivo de repensar novos tempos e espaços educacionais.

2 o praGmatismo E o carÁtEr da ExpEriência Em JoHn dEWEY

Charles Sanders Pierce, Willian James e John Dewey são os mais clássicos nomes admitidos como fundadores do movimento filosófico norte-americano denominado de pragmatismo. O termo “pragmatismo” se origina da palavra grega pragma, que significa “ação”, e da qual derivam palavras como prático(a). A força desse movimento é visualizada no fim do século XIX e se estende pelo século XX. Historicamente este termo foi introduzido na filosofia por Charles Sanders Pierce, no ano de 1878, em um artigo intitulado “Como tornar claras nossas ideias”. Pierce admite que para o desenvolvimento do significado de um pensamento seria necessário apenas determinar qual conduta estaria apta a produzi-lo: “aquilo é para nós o seu único significado” (JAMES, 1974, p. 10). Este seria o princípio desenvolvido por Pierce, porém esquecido inteiramente durante cerca de vinte anos. Somente em 1898, Willian James apresentou uma adaptação desse princípio, na Conferência Concepções Filosóficas e Resultados Práticos, na qual esclarece que,

[...] para atingir uma clareza perfeita em nossos pensamentos em relação a um objeto, pois, precisamos apenas considerar quais os efeitos concebíveis de natureza prática que o objeto pode envolver – que sensações devemos esperar daí, e que reações devemos preparar. Nossa concepção desses efeitos, seja imediata, seja remota, é, então, para nós, o todo de nossa concepção do objeto, na medida em que essa concepção tenha uma significação positiva. (1974, p. 10)

É notável não haver nada de novo no método pragmático. Porém, o equívoco presente em inúmeros adeptos do pragmatismo, fez com que James (1974) provocasse a necessidade do abandono das abstrações, das insuficiências, dos sistemas fechados e inadequados do princípio racionalista, para assumir o retorno ao concreto e ao adequado, e também para os fatos e ações. Reinstaura-se, assim, o pragmatismo como transformador das teorias em “instrumentos e não em respostas aos enigmas, sobre as quais podemos descansar”. (JAMES, 1974, p. 12)

James percebe como escopo “um método e, em segundo lugar, uma teoria

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genética do que se entende por verdade” (JAMES, 1974, p. 17). Com isso, o filósofo aceita o pragmatismo tanto como um método quanto como uma teoria da verdade e agrega mais um elemento ao pragmatismo: o de corresponder a “atitude de orientação” para a filosofia, do “olhar além das primeiras coisas, dos princípios, das ‘categorias’, das supostas necessidades; e de procurar pelas últimas coisas, frutos, consequências, fatos”. (JAMES, 1974, p. 13)

Deduz-se, assim, que o pragmatismo seja completamente maleável e por este motivo enxerta novos fatos em velhas opiniões. Acreditando-se que “[...] os novos conteúdos em si não são verdadeiros, simplesmente aparecem e são. A verdade é o que dizemos a respeito deles, e quando dizemos que aparecem, a verdade é satisfeita pela simples fórmula aditiva.” (JAMES, 1974, p. 16, grifo do autor). Supõe-se, ainda, que a verdade é uma ferramenta do pragmatismo que permite ser “uma classificação para todos os tipos de valores definitivos de trabalho em experiência” (JAMES, 1974, p. 18). Por isso, conforme afirma Rodrigues (2008), caberá a John Dewey transmitir todo o legado do pensamento pragmatista ao século XX.

O empenho em seus estudos revelou sua constante preocupação no desenvolvimento de uma nova filosofia, principalmente relacionada à educação e alicerçada no conceito de experiência. Com a abordagem em várias de suas obras, Dewey (1976) alega que as palavras experiência e experimento não se explicam por conta própria, porém o que significam é parte do problema que o filósofo norte-americano explorou, conforme Teixeira (1959, p. 01):

[...] o universo é um conjunto infinito de elementos, que se relacionam de maneira a mais diversa possível. A multiplicidade e variedade dessas relações o fazem essencialmente precário, instável e o obrigam à perpétua transformação. Pode-se mesmo dizer que tudo existe em função dessas relações mútuas, pelas quais os corpos agem uns sobre os outros, modificando-se reciprocamente. Esse agir sobre outro corpo e sofrer de outro corpo uma reação é, em seus próprios termos, o que chamamos de experiência.

Além disso, a experiência pode ser concebida, conforme Dewey, como ação ativa/passiva à medida que representa uma ação e uma reação. “Todas as nossas experiências envolvem um contexto situacional, que não é apenas espacial ou temporal, mas também continuamente mutável e potencialmente rico de significado, conhecimento e valor.” (GRACIANO, 2012, p. 33). Essas transformações vão além do biológico, pois ao homem é oferecida a possibilidade da reflexão, da reconstrução e da reorganização das experiências. Isso revela o quão importante é a experiência no processo de adaptação do indivíduo ao meio no qual está inserido. Com isso,

[...] quanto mais é o homem experimentado, mais aguda

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se lhe torna a consciência dessas falhas, e das contradições e dificuldades de uma completa inteligência do universo. É isso que dá ao homem a divina inquietação, que o faz permanentemente insatisfeito, e permanentemente empenhado na constante revisão de sua obra. (TEIXEIRA, 1959, p. 05)

Dewey (1976, p. 31) busca esclarecer que a experiência “[...] não se processa apenas dentro da pessoa. Passa-se aí por certo, pois influi na formação de atitudes, de desejos e de propósitos [...]”. Por isso, é possível assegurar que a experiência se faz necessária: primeiro para alargar os conhecimentos do homem; segundo, porque, à medida que a educação é inserida, se inicia o processo da reconstrução e da reorganização das experiências. Diante disso, é possível guiar melhor as experiências futuras. Isso não assenta o homem primeiramente como “um ser conhecedor, mas antes um ser ativo e participativo”. (CASTELLER, 2008, p. 12)

Sendo assim, “[...] a crença de que toda educação genuína se consuma através de experiência não quer dizer que todas as experiências são genuínas e igualmente educativas. Experiência e educação não são termos que se equivalem.” (DEWEY, 1976, p. 14). A experiência pode tanto ser educativa como também deseducativa, por isso que os termos não são de igual valor. As chamadas experiências deseducativas geram uma estagnação no ser humano de tal maneira que produzem a insensibilidade, a incapacidade de responder aos apelos da vida – o que resulta num fechamento dos caminhos que levam para novas experiências.

O caráter da experiência exerce grande influência sobre as atividades; por esse motivo, segundo Dewey (1976, p. 16), “[...] não basta insistir na necessidade de experiência, nem mesmo em atividade do tipo de experiência. Tudo depende da qualidade da experiência por que se passa.” “Cada experiência pode ser vivida, intensa e ‘interessante’, mas sua desconexão vir a gerar hábitos dispersos, desintegrados, centrífugos.” (DEWEY, 1976, p. 14). Por este motivo a educação deve sempre estar alicerçada em experiências que se prolonguem e permitam frutificar sobre experiências subsequentes.

2.1 o “CONTINUUM EXPERIENCIAL” E o princÍpio da intEração

Na análise realizada acerca da experiência, Dewey (1976) anuncia o valor da verdadeira experiência educativa e aponta-a como constituída pela continuidade e pela interação, que são partes necessárias no processo do ensino e aprendizado. A experiência é o que é e, neste cenário, os dois princípios são indissociáveis, são os aspectos longitudinais e transversais da experiência.

O “continuum experiencial” ou o princípio da continuidade “significa que toda e qualquer experiência toma algo das experiências passadas e modifica de

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algum modo as experiências subsequentes” (DEWEY, 1976, p. 26). Este princípio corresponde a uma força que está em marcha, e esta estabelece uma ponte, uma ligação entre as experiências que cada indivíduo desenvolve com a realidade na qual se encontra. Somente no processo de continuidade dos acontecimentos e dos fatos é que se compreende a experiência como condição para a obtenção da verdade, que deve unicamente ser entendida como práxis, útil/social e moralmente para a solução dos problemas das pessoas. Já a interação, o segundo princípio fundamentador da experiência, é encontrado na relação que certa experiência estabelece “entre o crescimento do mundo interno e subjetivo da mente da criança e o crescimento ou aperfeiçoamento do meio em relação ao qual objetivamente transcorre a experiência educativa” (ANDRADE, 2007, p. 36). Assim,

[...] devido ao princípio da continuidade, algo é levado de uma para a outra. Ao passar o indivíduo de uma situação para outra, seu mundo, seu meio ou ambiente se expande ou se contrai. Depara-se vivendo não em outro mundo, mas em parte ou aspecto diferente de um e mesmo mundo. O que aprendeu como conhecimento ou habilitação em uma situação torna-se instrumento para compreender e lidar efetivamente com a situação que segue. O processo continua enquanto a vida e a aprendizagem continuem. A unidade substancial do processo decorre do fator individual, elemento integrante da experiência. Quando esse fator se rompe, o curso da experiência com tal ruptura entra em desordem. E o mundo se divide. (DEWEY, 1976, p. 37-38)

Diante do exposto acerca da importância da continuidade e da interação no processo educacional, o autor adverte para não cairmos no erro de considerar a escola tradicional como aquela que não desenvolve experiências. O que acontece nesta situação diz respeito ao desenvolvimento de atividades que não estão em sintonia com a vida, com o cotidiano dos estudantes. As experiências educativas, talvez desenvolvidas naquele espaço, muitas vezes são inúteis para os estudantes, à medida que não são aplicáveis ao dia a dia.

A nova proposta é exigente e desafiadora. “Vida, experiência, aprendizagem – não se pode separar. Simultaneamente vivemos, experimentamos e aprendemos. [...] A experiência alarga, deste modo, os conhecimentos, enriquece o nosso espírito e dá, dia a dia, significação mais profunda à vida.” (TEIXEIRA, 1959, p. 07). A experiência educativa nos concede a reflexão; e como fruto dessa reflexão, a aquisição de novos conhecimentos. É

[...] isso que consiste a educação. Educar-se é crescer, não já no sentido puramente fisiológico, mas no sentido espiritual,

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no sentido humano, no sentido de uma vida cada vez mais larga, mais rica e mais bela, em um mundo cada vez mais adaptado, mais propício, mais benfazejo para o homem. (TEIXEIRA, 1959, p. 07)

Com isso o verdadeiro desenvolvimento que aqui se espera alcançar corresponde ao “[...] desenvolvimento da experiência, pela experiência. E isto será impossível, se não providenciarmos um meio educativo que permita o funcionamento dos interesses e forças que forem selecionadas como mais úteis.” (DEWEY, 1959, p. 67)

Dessa forma, por meio da educação, se assegura a existência da sociedade graças à contínua renovação da experiência. Esse assegurar a existência por meio do processo educativo refere à educação como algo que não se processa no vácuo, pelo contrário,

[...] ela é sempre uma resposta a estímulos específicos ou gerais, nascidos do próprio organismo e do meio em que o indivíduo vive. [...] Este meio se constitui exatamente das condições que promovem ou impedem, estimulam ou inibem as atividades características do nosso organismo. E são tais condições que determinam a direção do processo educativo. (TEIXEIRA, 1959, p. 15. [Grifo do autor.])

Nesse sentido a constatação de Dewey, em relação às teorias educacionais, diz respeito à exclusão da questão principal da vida, que é a reconstrução da experiência em andamento. É notável que a proposta deweyana vise a desenvolver uma metodologia para que todo o conhecimento seja conduzido à prática e, sendo assim, deveria levar em consideração a experiência de cada membro da sociedade, não como ação isolada da pessoa no mundo, mas como a possibilidade da interação com os outros. Essa interação é fundamental, pois é por meio dela que a cultura, os costumes, as experiências vão sendo transmitidas. Processa-se, assim, a reconstrução e a reorganização como forma de aperfeiçoamento das experiências futuras, isto é, para melhor dirigir o curso das experiências porvindouras faz-se necessário modelar as experiências que vivenciamos.

2.2 ExpEriência E dEmocracia: pilarEs da Educação para o dEsEnvolvimEnto dE uma vida Em constantE ampliação

A insistência da teoria deweyana busca apontar a contínua reorganização e reconstrução das experiências como necessárias para a introdução de mudanças no espaço natural e social do qual o indivíduo faz parte. Consequentemente,

[...] um dos grandes méritos da teoria de educação de Dewey foi o de restaurar o equilíbrio entre a educação tática e não

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formal recebida diretamente da vida, e a educação direta expressa das escolas, integrando a aprendizagem obtida através de um exercício específico a isto destinado (escola), com a aprendizagem diretamente absorvida nas experiências sociais. (TEIXEIRA, 1959, p. 14)

A concepção deweyana de educação está elaborada a partir da base de que educação é vida, ou seja, vida e educação se mesclam. E esta “vida é um processo que se renova a si mesmo por intermédio da ação sobre o meio ambiente” (DEWEY, 1979, p. 01). Da mesma forma, a vida, assim como a experiência, se mantém pela contínua renovação por que passa. Esta renovação, Dewey salienta, não acontece automaticamente, acontece no agrupamento social. Por isso se deve evitar sempre o direcionamento da criança para a aquisição de conhecimentos isolados. Aprender se constitui aqui como uma atividade permanente do organismo que possibilite uma efetiva participação nas atividades associadas. “Para Dewey o fim da educação não é vida completa, mas progressiva, vida em constante ampliação e em constante ascensão.” (TEIXEIRA, 1959, p. 47). Prima-se aqui pela formação de indivíduos autônomos e reflexivos, e pelo abandono imediato daquilo que engessa o processo educacional.

Educação é vida, e viver é desenvolver-se, é crescer. Vida e crescimento não estão subordinados a nenhuma outra finalidade, salvo mais vida e mais crescimento. O processo educativo, portanto, não tendo nenhum fim além de si mesmo, é o processo de contínua reorganização, reconstrução e transformação da vida. Na frase de Dewey, o hábito de aprender diretamente da própria vida, e fazer que as condições da vida sejam tais que todos aprendam no processo de viver, é o produto mais rico que pode a escola alcançar. (TEIXEIRA, 1959, p. 30-31)

Certamente “nesta civilização em perpétua mudança, só uma teoria dinâmica da vida e da educação pode oferecer solução adequada aos problemas novos que surgem e que surgirão” (TEIXEIRA, 1959, p. 48). E a escola se constitui como um meio importante de transmissão e de transformação da realidade. Por este motivo a escola deverá promover esse ambiente, cuja interação resulte em experiências cada vez melhores. Deverá possuir um caráter humanizador, de larga tolerância, inteligente e hospitaleiro. A escola, por ser a casa da confraternização de todas essas influências, deverá tornar-se facilmente um espaço no qual as pessoas tenham interesse de participar.

A vida não significa uma mera existência passiva e isolada. Ela necessita interagir com o meio ambiente e com o ambiente social dos quais faz parte. A escola deve

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corresponder a este espaço de interação. Deve assumir o caráter de uma pequena comunidade, na qual seja possível aprender, ensinar e trocar experiências. “Ela deve ser a instituição pela qual a sociedade transmite a ‘experiência adulta’ à criança.” (TEIXEIRA, 1959, p. 44). Segundo Dewey (1959), a escola deve fazer da experiência seu pilar de sustentação. A experiência deve ser adquirida pela criança de maneira espontânea no espaço escolar. Por isso, o professor, neste ambiente, é “o elemento essencial da situação em que o aluno aprende, e sua função é, precisamente, a de orientar, guiar e estimular a atividade através dos caminhos conquistados pelo saber e experiência do adulto” (TEIXEIRA, 1959, p. 45). “O ideal não é acumulação de conhecimentos, mas o desenvolvimento de capacidades.” (DEWEY, 1959, p. 55-56). Não estamos “preparando” o indivíduo para viver, em vez disso, há o anseio de inserir na pessoa o desejo de continuar a aprender.

E neste cenário a democracia corresponde aquela que permite a contínua interação dos membros com o meio no qual se encontram. Na verdade, a “democracia é mais do que uma forma de governo; é primacialmente, uma forma de vida associada, de experiência conjunta e mutuamente comunicada”, caracteriza Dewey (1979, p. 93).

Para Silva (2010, p. 91),

[...] o desenvolvimento possibilitado pela educação deve facultar aos sujeitos a maximização de condições e potencialidades que a experiência do mundo pode oferecer, como leque de opções de realização de qualidades e de faculdades individuais. Nesse sentido, a educação extravasa os limites da escola e deve se constituir como programa político de direcionamento da sociedade para a vida verdadeiramente democrática.

Por isso, “em uma sociedade democrática existe maior reciprocidade, interesse e cooperação entre seus membros e grupos sociais que a integram” (SCHMIDT, 2009, p. 139). Almeja-se a sociabilidade democrática que abarca o livre e pleno desenvolvimento dos indivíduos. A mais ampla cooperação e interdependência são desejadas nesse espaço. Assim, mais que uma configuração de poder, “a democracia aparece aqui como modo de vida, fundado na autonomia conscientemente dirigida dos indivíduos para participar e partilhar de interesses e aspirações comuns”. (SILVA, 2010, p. 124)

Dessa maneira, se considera uma sociedade somente sendo democrática à medida que “prepara todos os seus membros para com igualdade aquinhoarem de seus benefícios e em que assegura o maleável reajustamento de suas instituições por meio da interação das diversas formas de vida associada” (DEWEY, 1979, p. 106). Ou seja, a continuidade da experiência é garantida pela contínua interação entre seus membros, fator primordial para a ampliação e enriquecimento da experiência.

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3 o dEBatE acErca da Escola tradicional E da Escola nova

Bem sabemos que a estrutura sobre a qual está assentada a discussão entre a Escola Tradicional e a Escola Nova corresponde diretamente ao desenvolvimento da experiência. Segundo o modelo da escola progressista, esse conceito deve sofrer uma constante reorganização e reconstrução para ser enriquecido quando percebidas as conexões e continuidades existentes naquilo que se está realizando. Isso reforça a ideia de que a educação é essencialmente formadora do espírito.

Por outro lado, o modelo tradicional contrapõe-se a essa ideia e acredita que a

[...] educação não é um processo de desdobramento das qualidades internas nem o aperfeiçoamento de faculdades existentes no espírito. É antes a formação do espírito pelo estabelecimento de certas associações ou conexões de conteúdo por meio da matéria apresentada do exterior. A educação se efetua pela instrução tomada em sentido estritamente literal; é uma edificação feita, de fora para dentro, no espírito. (DEWEY, 1979, p. 75)

Por este motivo a escola tradicional é considerada aquela que “leva em conta tudo o que é educativo, menos a essência da educação, que é a energia vital buscando oportunidades para seu eficaz exercício” (DEWEY, 1979, p. 78). Dessa maneira, não acontece a formação da personalidade mental e moral do indivíduo, tampouco o processo da reorganização e da reconstrução – necessárias para o bom desempenho das atividades.

Para o autor, o esquema tradicional de ensino possui, em essência, “[...] o esquema da imposição de cima para baixo e de fora para dentro. Impõem padrões, matérias de estudo e métodos de adultos sobre os que estão ainda crescendo lentamente para a maturidade”. (DEWEY, 1976, p. 5). O aprender está direcionado para a aquisição daquilo que consta nos livros e à mente dos mais velhos. Ensina-se algo acabado, e ousa-se acreditar que o futuro em tudo será semelhante ao passado.

Todavia isso não nos permite desconsiderar o passado; pelo contrário, o saber do passado e sua herança são de grande importância quando incorporados ao presente.

O presente, em suma, gera os problemas que nos levam a procurar sugestões no passado [...]. O passado é um grande recurso para a imaginação; ele acrescenta uma nova dimensão à vida, mas com a condição de que seja visto como passado do presente e não como outro mundo sem relação com o presente. A doutrina que menospreza o ato presente de viver e de crescer e desenvolver-se – que é a única coisa sempre

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presente – volta-se naturalmente para o passado, porque o alvo futuro que se determinou é remoto e vazio. (DEWEY, 1979, p. 82, [Grifo do autor.])

Esse descontentamento com o modelo tradicional de ensino possibilitou o surgimento do movimento denominado de “Escola Nova” ou “progressista”. Esse modelo teórico educacional vem para se opor à atividade externa e torná-la livre; ao aprender por livros e professores pelo aprender por experiência; “à aquisição por exercício e treino de habilidades e técnicas isoladas, a sua aquisição como meios para atingir fins que respondam a apelos diretos e vitais do aluno; [...] a fins e conhecimentos estáticos opõe-se a tomada de contato com um mundo em mudança”. (DEWEY, 1976, p. 7)

Numa sociedade progressiva, a educação precisa eliminar a existência dos males sociais e modelá-la de tal forma a “[...] adquirir hábitos melhores, de modo que a futura sociedade adulta seja mais perfeita que as suas próprias sociedades atuais” (DEWEY, 1979, p. 85), isto é, a percepção íntima e necessária da unidade da experiência real com a educação. Não se pode transformar o espaço em que se vive sem considerar esta unidade fundamental da experiência vivida com a educação.

Neste espaço o educador “tem que olhar para o futuro, [...] alimentar uma visão de longo alcance” (DEWEY, 1976, p. 77). Deve conferir as potencialidades dos conteúdos para o posterior desenvolvimento dos hábitos reflexivos nos estudantes. Isso não significa, segundo Santos (2011), aumentar as dificuldades dos problemas somente para exigir maior desempenho intelectual dos educandos. Pelo contrário,

[...] grande parte da arte da educação reside em tronar a dificuldade dos novos problemas suficientemente grande para dar trabalho ao espírito, mas suficientemente pequena para que ao lado da confusão natural originada pelos seus elementos novos, existam pontos claros e familiares, de que possam brotar sugestões utilizáveis. (Dewey, 1979, p. 172)

Consequentemente o pensador norte-americano acredita que compete ao educador auxiliar na obtenção de condições necessárias para o estudante vencer as possíveis dificuldades na vida cotidiana. Mas, para isso, faz-se necessário que o estudante esteja familiarizado com o passado e mergulhado num sentimento vivo e palpitante de presente.

Com o surgimento da Escola Nova, o educador passou a olhar para a metodologia do ensino de sua disciplina, pois no exercício de sua função passou a “[...] selecionar as coisas que, dentro da órbita da experiência existente, tenham possibilidade de suscitar novos problemas, os quais, estimulando novos modos de observação e julgamento, ampliarão a área para experiências posteriores”. (DEWEY, 1976, p. 76)

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Considera-se que a verdadeira doutrina é aquela que “enxerga na criança o impulso e a tendência e, na experiência organizada da espécie, o termo e o alvo dessa tendência” (TEIXEIRA, 2000, p. 20). Este foi o diferencial da escola nova que adere ao ideal democrático como fio condutor e auxiliador do processo educacional. Nela as atividades se processam com o máximo de oportunidades e de continuidade para alcançar o pleno crescimento e desenvolvimento das forças de compreensão e de reflexão do homem (TEIXEIRA, 2000). “Não se educa diretamente, mas indiretamente através de um meio social.” (TEIXEIRA, 1959, p. 19). Isso significa, conforme Teixeira (1959, p. 19), que as escolas são

[...] meios organizados intencionalmente para o fim expresso de influir moral e mentalmente sobre os seus membros. É, pois, na preparação desse meio especial de educação – a escola – que podemos e devemos dispor as condições pelas quais a criança venha a crescer em saber, em força e em felicidade.

Para isso, segundo Teixeira (1959), há três características essenciais para esse crescimento:

[...] primeiro, deve prover um ambiente simplificado, para permitir o acesso da criança. Longe vão os tempos em que a própria vida ainda era tão simples que as crianças nela podiam diretamente participar. Hoje, a civilização ganhou inexprimível complexidade, constituindo-se de uma série de artes, de ciências e de instituições que somente anos de estudo nos habilitam a compreender e a praticar. A escola deve simplificar esse ambiente complexo para que a criança gradualmente lhe venha conhecer os segredos e nele participar. Segundo, deve organizar um meio purificado, isto é, onde se eliminem certos aspectos reconhecidamente maléficos do ambiente social. A escola não visa a perpetuar na sociedade os seus defeitos. Em uma sociedade progressiva, ela é o órgão específico de uma constante melhoria, pela qual desejamos legar a nossos filhos a possibilidade de uma vida mais feliz que a nossa. Terceiro, deve prover um ambiente de integração social, de harmonização de tendências de conflito, de larga tolerância inteligente e hospitaleira. [...] A escola deve ser a casa da confraternização. (TEIXEIRA, 1959, p. 20–21, [Grifos do autor.])

Todo esse esforço da educação deve levar à construção de uma sociedade mais perfeita e democrática. E consequentemente toda essa organização deve representar a meta para qual a educação deve sempre estar a tender. O que se deve buscar é a aquisição

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e o desenvolvimento de bons hábitos de crítica e de reflexão. Tal propósito somente será alcançado à medida que se observa como e onde são desenvolvidas as atividades. “Quanto mais adequadas forem nossas observações, mais variado será o quadro de condições e embaraços que se apresentam e mais numerosas serão as alternativas entre as quais deveremos escolher” (DEWEY, 1979, p. 111). Consequentemente, “[...] agir com um objetivo é o mesmo que agir inteligentemente” (DEWEY, 1979, p. 111). Assim,

[...] em uma sociedade verdadeiramente democrática onde existam oportunidades apropriadas para a reconstrução dos hábitos e das instituições sociais, consequentes de uma justa distribuição de benefícios e interesses, a finalidade da educação se refletirá nas pessoas pelo desenvolvimento da capacidade do aprendizado constante. (SANTOS, 2011, p. 50)

Somente por “[...] meio de um dar e receber recíprocos, o professor recebendo, mas não tendo medo de dar também” a sua parcela de contribuição para a construção do conhecimento ao longo do processo ensino-aprendizagem dentro de uma sociedade que prima pela democracia possibilitará oportunidades apropriadas, que refletirão no desenvolvimento de novas e constantes capacidades de aprendizado – disso podemos esperar como resultado seres críticos, reflexivos e autônomos. Afinal, “o homem é um animal de conquista” (TEIXEIRA, 2000, p. 21). E, conforme Dewey (1976, p. 97), “[...] o único fundamento para antecipar o insucesso de se tomar este caminho está no perigo de que experiência e método experimental não sejam adequadamente concebidos”.

4 anÍsio tEixEira E a HErança dEWEYana no Brasil

“Valores que se perdem. Valores que se ganham. Inquietação de conservadores” (TEIXEIRA, 2000, p. 13). É com essa frase que Anísio Teixeira (1900-1971) inicia sua “pequena introdução à filosofia da educação” buscando apontar que no período de transições que se está vivendo, “[...] a cada nova crise que surge, surge uma nova inquietação entre os homens, preocupados com os valores que se vão perdendo nas idas e vindas da transformação social” (TEIXEIRA, 2000, p. 13). E na tentativa de encontrar culpados, costuma-se investir sempre contra a escola.

Essa desastrosa atitude de continuamente culpar a instituição escolar, fez com que Anísio Teixeira se apropriasse da filosofia deweyana e viesse a produzir teoricamente uma articulação entre o conceito de experiência, pragmatismo, democracia e Escola Nova. Ao retornar para o Brasil seu empenho foi na luta pela implantação da escola pública e democrática, além de exigir a educação integral num contexto de profundas

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resistências. Surge assim, durante a década de 20, no cenário brasileiro a chamada Escola

Nova. Conforme Ribeiro (2004, p.172) sua proposta “introduzia novas técnicas e ideias pedagógicas” que visam à transformação do ambiente escolar num espaço “[...] onde os alunos sejam livres na escolha das suas atividades, livres no planejá-las e livres no executá-las” (TEIXEIRA, 2000, p. 17). Elimina-se desta forma “[...] o ensino tradicional que mantinha fins puramente individualistas” (RIBEIRO, 2004, p. 172), e se investe esforços na defesa da

[...] educação por meio de atividades construtoras contínuas, estriba-se no fato de que elas abrem ensejo para estabelecer-se um ambiente social. Em vez de uma escola localizada separadamente da vida, com lugar para se estudarem lições, teremos uma sociedade em miniatura, na qual o estudo e o desenvolvimento sejam incidentes de uma experiência comum. [...] tudo isto atuando para aumentar a percepção de conexões. (DEWEY, 1979, p. 394)

A insistência de Anísio Teixeira foi pelo desenvolvimento de uma educação voltada para “[...] o ideal de liberdade e de igualdade de oportunidades para todos em matéria de educação”, salienta Ribeiro (2004, p. 173), inclusive possibilitando a formação integral do educando. Dessa maneira, Teixeira (2000, p. 56) afirma que “[...] o eixo da escola se desloca para a criança”. Conforme já visto, isso implica o rompimento com o modelo tradicional de ensino, o desapego ao modo livresco, artificial e mecânico de trabalho em sala de aula, para adoção de uma nova metodologia de ensino que extrapolasse a simples instrução. Assim, seria possível desenvolver uma nova ordem de vida social, na qual “[...] o homem não só terá oportunidades para a expressão máxima dos seus valores, como lhe assistirá permanentemente o dever de se exprimir de sorte a não reprimir valores de ninguém, mas antes, facilitar a máxima expressão de todos eles”. (TEIXEIRA, 2000, p. 35)

Consequentemente, este novo modelo de escola “[...] deve vir a ser o lugar em que a criança venha a viver plena e integralmente. Só vivendo, a criança poderá ganhar os hábitos morais e sociais de que precisa” (TEIXEIRA, 2000, p. 40). Além disso, “a escola precisa dar à criança não somente um mundo de informações singularmente maior do que o da velha escola [...] como ainda lhe cabe o dever de aparelhar a criança para ter uma atitude crítica de inteligência, para saber julgar e pensar as coisas”. (TEIXEIRA, 2000, p. 41)

Consequentemente, segundo Teixeira (2000, p. 53), “[...] educar é uma arte tão alta que não se pode subordiná-la aos métodos de imposição possivelmente adaptáveis às tarefas mecânicas”. Por este motivo Teixeira é consolidado como o educador brasileiro que mais contribui na criação de políticas públicas voltadas pra a educação.

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Pois, conforme Teixeira (2000, p. 53) “[...] a única finalidade da vida é mais vida” diante de um ambiente no qual a transformação e o progresso são constantes.

Dessa forma, “[...] à medida que formos mais livres, que abrangermos em nosso coração e em nossa inteligência mais coisas, que ganharmos critérios mais finos de compreensão, nessa medida nos sentiremos maiores e mais felizes” (TEIXEIRA, 2000, p. 54). Este constitui o mais refinado ideal a ser buscado. Pois, “nesta civilização em perpétua mudança, só uma teoria dinâmica da vida e da educação pode oferecer solução adequada aos problemas novos que surgem e que surgirão” (TEIXEIRA, 1959, p. 48). Todo este esforço da educação deve culminar na construção de uma sociedade mais perfeita e democrática.

5 considEraçõEs finais

Ao concluirmos o presente estudo ressaltamos a importância do movimento pragmatista desenvolvido por Charles Sanders Pierce e Willian James como correspondendo ao movimento que em sua essência abandonou as abstrações e insuficiências do princípio racionalista, para buscar o retorno ao concreto e ao adequado, aos fatos e também ações. Este princípio, que posteriormente é transmitido ao século XX por Dewey, corresponde ao pilar que fundamenta o conceito de experiência deweyano. Consequentemente, vimos como essa nova filosofia buscou apontar a experiência como sendo necessária e fundamental para o desenvolvimento da educação. Assim, percebeu-se a reconstrução e a reorganização como peças fundamentais que permitem revelar a constante adaptação do indivíduo ao meio no qual está inserido.

Todavia, essa experiência fundada no pragmatismo, não é algo que se processa no vácuo ou somente dentro das pessoas. Pelo contrário, ela é sempre uma resposta aos estímulos do ambiente no qual as pessoas estão inseridas, bem como, correspondente a uma força que está em marcha e que necessita do princípio da continuidade e da interação para o seu êxito. Toda essa insistência nos dois princípios deve tornar possível a formação de melhores experiências no futuro. Pois conforme analisado nos escritos deweyanos, na medida em que reconstruir e também reorganizarmos nossas experiências e, inserirmos a democracia, nessa mesma medida se ampliará nossa compreensão acerca daquilo que podemos conhecer e que também nos permitirá conduzir melhor nossas experiências futuras.

Portanto, experiência e democracia são elementos essenciais que nos levam a crer que a educação está profundamente ligada a vida, ou seja, elas se mesclam. A vida não significa mera existência passiva e isolada. Ela necessita interagir com o meio ambiente e com o meio social dos quais faz parte. Isso reforça a necessidade da escola assumir o caráter de uma pequena comunidade, cujo ideal seja facultar aos sujeitos condições necessárias para o sua interação e desenvolvimento. Isso reconstitui

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a metodologia a ser aplicada pelos educadores, pois se passa a enxergar no educando o verdadeiro impulso necessário para a ampliação da área de experiências futuras, além de desenvolver nele o hábito da reflexão, exigido para enfrentamento do dia a dia.

Consequentemente, foi a partir dessa intenção que Anísio Teixeira buscou, após longos anos de estudo da teoria deweyana, trazer para o Brasil o ideal que possibilitasse a liberdade e a igualdade de oportunidades para a manifestação das experiências no espaço social. Assumiu-se o desapego pelo modo livresco, mecânico e artificial do trabalho em sala de aula, e, adotou-se uma metodologia que extrapolou a simples instrução, possibilitando o acesso de todas as classes sociais ao ensino público, estatal, democrático, com ensino de qualidade além do acesso à educação integral.

Por fim, acredita-se que somente uma educação pautada na democracia, na participação da vida social e na reorganização e reconstrução das experiências possibilitará uma sociedade mais perfeita e democrática. Pois, “nesta civilização em perpétua mudança, só uma teoria dinâmica da vida e da educação pode oferecer solução adequada aos problemas novos que surgem e que surgirão” (TEIXEIRA, 1959, p. 48). Este, portanto, constitui o mais refinado ideal a ser por nós buscado.

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EDUCAÇÃO E TECNOLOGIA: UM DIÁLOGO NECESSÁRIO

Evandro Pegoraro

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O ser humano na interação com a realidade instituiu a ciência, tornando-a um modo de compreender fenômenos incompreendidos. Assim, quando um acontecimento natural é explicado de modo racional, lógico e coerente, faz-se ciência. Ela, portanto, dá segurança ao homem diante de acontecimentos naturais (ou sociais) que lhe causam estranhamento. Por isso, uma das visões – do senso comum – que se tem de cientista é a de pronunciar a verdade. As pessoas às vezes dizem: Ele sabe o que está dizendo! ou Isso é científico! A explicação do cientista tira a dúvida das pessoas causada por algum acontecimento; ela dá segurança.

A tecnologia é um instrumento da ciência que visa a uma finalidade prática. Logo, ciência está para a teoria (explicação racional da realidade) como a tecnologia caracteriza-se por ser prática, buscando resultados imediatos. Por exemplo: a invenção da roda e do computador são tecnologias que possuem uma teoria científica. E mais: o carro é uma tecnologia e há nele muitos conceitos físicos. Mas o que é afinal a tecnologia? Eis como Bueno (apud BRITO, 2011, p. 33) a define:

um processo contínuo pelo qual a humanidade molda, modifica e gera a sua qualidade de vida. Há uma constante necessidade do ser humano de criar a sua capacidade de interagir com a natureza, produzindo instrumentos desde os mais primitivos até os mais modernos, utilizando-se de um conhecimento científico para aplicar a técnica e modificar, melhorar, aprimorar os produtos oriundos do processo de interação deste com a natureza e com os demais seres humanos.

O fenômeno educativo escolar está situado num contexto social. A escola é um ambiente (lócus) onde características sociais aparecem de modo não latente. Prova disso é o uso do celular, do tablet, do netbook, do notebook, pelos alunos, hábito adquirido no convívio social. A escola e o professor estão preparados para atender a essa demanda? Queremos pensar as imbricações entre tecnologia e educação. Nosso grande desafio

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é fazer com que os meios tecnológicos possam formar pessoas conscientes, críticas, humanas, politizadas, éticas, culturais e, para isso acontecer precisamos aprender a usar adequadamente as Novas Tecnologias de Informação e da Comunicação (NTIC).

Soares (2000) aborda no seu artigo Educomunicação: um campo de mediações que educação e comunicação foram criadas, separadamente, pela racionalidade moderna. Ou seja, de um lado a educação, escolar, responsável pela “transmissão do saber necessário ao desenvolvimento social” (SOARES, 2000, p. 12), e, de outro, a comunicação “responsabilizando-se pela difusão das informações, pelo lazer popular e pela manutenção do sistema produtivo através da publicidade” (SOARES, 2000, p. 13). Apesar disso, muitos teóricos da educação se propõem integrá-las, em especial na América Latina, tais como Paulo Freire e Célestin Freinet, e, também, muitos teóricos da comunicação, tais como Jesús Martín-Barbero e Mário Kaplún. Contribuiu também para a aproximação dos dois campos o barateamento dos equipamentos tais como o computador e o acesso à internet.

A tecnologia oferece recursos que nos auxiliam, didaticamente, no processo de ensino-aprendizagem. Conforme os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) (apud BRITO, 2011, p. 38) as denominadas NTIC são definidas como

recursos tecnológicos que permitem o trânsito de informações, que podem ser os diferentes meios de comunicação (jornalismo impresso, rádio e televisão), os livros, os computadores, etc. [...] Os meios eletrônicos incluem as tecnologias mais tradicionais, como rádio, televisão, gravação de áudio e vídeo, além de sistemas multimídias, redes telemáticas, robótica e outros.

São consideradas tecnologias educacionais todos os recursos tecnológicos que no ambiente escolar interfiram no processo de ensino-aprendizagem.

Muitos consideram o computador como a mais importante tecnologia educacional nas escolas, isso não é verdade. Desde que utilizado no contexto escolar com a finalidade didático-pedagógica, com objetivo de promover o ensino-aprendizagem, podemos ter muitas outras. É tecnologia educacional também o cartaz, o mural, o quadro de giz, ainda que sejam independentes da eletricidade. Por outro lado, há os dependentes da energia tais como o retroprojetor, a televisão, o videocassete, o gravador, o computador, o rádio etc.

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O computador é um daqueles instrumentos inventados para facilitar a vida do ser humano. Há quem considere o ábaco como o primeiro de todos. O moderno surgiu na década de 1940 – durante a Segunda Guerra Mundial – a partir do estudo

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de várias personalidades de diferentes países, tais como o alemão Konrad Zuze, o norte-americano John Von Neumann e o inglês Alain Turing. O eletrônico, o ENIAC, foi construído em 1946, nos EUA, e consumia cerca de 200 quilowatts de energia. Somente podia manuseá-lo quem o projetava. No final da década de 1940, inventou-se um menor, mais rápido, que consumia em torno de 5 quilowatts, e podia ser usado por especialistas. Na década de 1960, os EUA mostraram ao mundo computadores ainda mais rápidos, menores e baratos. O uso deles começou a se expandir nas empresas, de tal modo que podiam ser usados por mais de uma pessoa. No início da década de 1980, chegaram ao mercado os primeiros microcomputadores, a partir da invenção do microprocessador, pela Intel Corporation, utilizado inicialmente em máquinas de calcular, no início da década de 1970. Eles invadiram definitivamente o modo de vida das empresas e das pessoas e sua popularidade aumentou muito a partir da criação de programas dedicados à edição de textos, às planilhas, à comunicação e ao entretenimento. Os atuais são milhares de vezes mais rápidos que seus antepassados da década de 1940.

O computador como uma das tecnologias educacionais é visto, de modo geral, por um lado como benéfico e, por outro, como nocivo. Assim, por exemplo, Setzer (apud BRITO, 2011) defende que o uso dos computadores no ensino fundamental pode formar alunos- máquinas. No seu manifesto contra o seu uso por crianças e adolescentes diz: “Indivíduos do mundo: lutemos conscientemente contra um mau uso dos computadores – a informática no ensino de 1º grau. Comecemos a colocar a tecnologia a serviço da humanidade, e não esta a serviço das máquinas!” (SETZER apud BRITO, 2011, p. 86). Para ele, os computadores poderiam ser usados pelos jovens, como meio educativo, somente a partir dos 17 anos.

Por outro lado, por exemplo, Papert (apud BRITO, 2011), seguidor do construtivismo de Jean Piaget, diz que o uso deles pode ser uma ferramenta útil no processo de apropriação de conhecimento. Nesse sentido, é oportuno ler a contribuição de Chaves (apud BRITO, 2011, p. 85), entusiasta na informática na educação, ao dizer que

devemos nos preocupar com a questão da informática na educação porque as evidências disponíveis, embora não tão amplas e contundentes quanto se poderia desejar, demonstram que o contato regrado e orientado com o computador em uma situação de ensino/aprendizagem contribui positivamente para a aceleração do desenvolvimento cognitivo e intelectual, em especial no que diz respeito ao raciocínio lógico e formal, à capacidade de pensar com rigor e de modo sistemático.

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Ainda falta em nossas escolas uma prática das tecnologias educacionais, por exemplo, no uso de computadores. Há no Brasil um projeto em fase de experimento, o Projeto Um Computador por aluno (UCA), desde 2007. Para mais detalhes pode-se consultá-lo no site http://www.uca.gov.br/institucional/index.jsp. Conforme Brito e Purificação (2011), apesar de esforços, as políticas educacionais voltadas para o acesso e uso de tecnologias educacionais, no Brasil, é lento. Além disso, pesquisas indicam que onde há laboratório de informática (tanto em escolas públicas quanto particulares) há falhas no seu aproveitamento, tal como atesta Costa (apud BRITO, 2011, p. 89-93). Alguns dos impasses são: a) o que se trabalha nem sempre está de acordo com os conteúdos trabalhados em sala de aula; b) supervalorização para se tê-lo, e às vezes, montado num lugar antes utilizado para certas atividades pedagógicas, às quais perdem o seu espaço físico; c) apesar do atrativo, não há uma inovação em termos de metodologia e o ensino continua tradicional; d) a tecnologia usada na escola é desenvolvida por um pequeno número de professores; e) o professor recebe um treinamento – quando recebe –, de poucas horas, o que não lhe dá segurança para a tarefa e, além disso, quando um técnico atende ao laboratório, nem sempre está disponível por causa do seu horário de trabalho; f) há um despreparo por parte do professor para explorar as potencialidades do computador e, por isso, ele, geralmente, passa a desempenhar a função de simples executor de tarefas, de softwares. Repito: falta nas escolas ainda uma prática do uso de tecnologias educacionais.

No texto Tecnologia e Educação: algumas considerações sobre o discurso pedagógico contemporâneo, as autoras Peixoto e Araújo (2012) fazem um estudo sobre as abordagens feitas em relação ao uso das tecnologias de informação e de comunicação (TICs), em especial o computador, na educação escolar, no período de 1997 a 2007 no Brasil. Conforme elas são apresentadas duas visões em relação ao uso do computador na educação escolar.

Elas têm suas raízes filosóficas no início da modernidade quando autores como Francis Bacon e René Descartes enfatizaram o poder da razão metodológica como critério para conhecer a realidade. A partir daí, valoriza-se a ciência com uma finalidade prática, em oposição à ciência metafísica antiga e medieval. Esses dois pensadores seriam caracterizados pelos autores da Escola de Frankfurt (Adorno e Horkheimer) de protagonistas de uma razão instrumental, responsável por um desenvolvimento da ciência sem pensar nas suas consequências. Ou seja, na contemporaneidade há críticas em relação a uma ciência moderna baseada numa razão autônoma que pretende ser senhora da natureza. Algumas das suas consequências negativas foram: o aumento da desigualdade social, duas grandes guerras permeadas por genocídios e o surgimento de uma sociedade consumista.

A primeira é a instrumentalista, que entende que as TICs são um meio pedagógico no processo de ensino-aprendizagem. Ela entende, assim como se acreditou no início da modernidade, que as tecnologias são um meio indispensável para uma sociedade

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tornar-se melhor. Nesse sentido, ela parece não ser uma posição má, sua decadência está no fato de somente acreditar nas tecnologias como meio pedagógico, usando-as na perspectiva instrucionista.

Por outro lado, há a sua visão determinista, defendendo a urgência de as escolas apropriarem-se delas tendo em vista o progresso e a harmonia com a sociedade. Nesse caso, há um otimismo cego em relação ao uso das TICs, tida como “um novo paradigma pedagógico e deveria ser imposta ao meio escolar como condição para uma educação em sintonia com o seu tempo” (2012, p. 264). Nessa visão não há um controle das tecnologias por parte dos sujeitos; simplesmente eles precisam dobrar-se a elas. Nessa perspectiva, o progresso da sociedade e, por decorrência da educação, estaria numa reverência em relação à tecnologia. Contudo, sabemos que não basta apenas tirar o livro do aluno e dar-lhe um tablet para que ele aprenda.

Fazendo um panorama dos discursos contemporâneos que orientam o uso do computador na educação escolar, as autoras classificaram-nos em dois. O primeiro defende o uso do computador como didático-pedagógico seguindo as orientações teóricas de Pierre Lévy, Paulo Freire, Jean Piaget e Lev Vygotsky. Esses teóricos (em especial os três últimos) possuem em comum o fato de o professor ser mediador no processo de ensino-aprendizagem na utilização das TICs, no caso do computador.

O segundo é o discurso que aborda o computador como político-pedagógico, no qual a abordagem é mais ampla, pois busca tratar de temas como a exclusão digital, os efeitos nocivos dessa tecnologia e as ideologias aí presentes. Nessa perspectiva emergem questões filosóficas, sociológicas e políticas em relação ao uso do computador. Nela aparecem autores como Michel Foucault, Edgar Morin, Paulo Freire, Manuel Castells, Maria Luiza Belloni, Raquel Goulart Barreto e Nelson de Luca Pretto. Enquanto os primeiros possuem uma visão otimista em relação ao uso do computador os últimos destacam cuidados que se deve ter ao usá-los.

As autoras chamam a atenção para o fato de que todos esses pensadores, que fundamentam tanto um discurso quanto outro, não são usados apropriadamente. Embora fundamentem teoricamente uma orientação para o uso dos computadores, a abordagem feita por eles carece de solidez, falta orientação teórica sólida, “na maioria dos estudos que discursam sobre os usos do computador na educação escolar, embora os conceitos nos quais estes se baseiam apresentam relação com os temas trabalhados, nem sempre a vinculação dos referidos conceitos com o tema se apresenta de forma clara” (PEIXOTO; ARAUJO, 2012, p. 261). Conforme elas, isso aparece de forma clara no uso de conceitos de autores como Lévy, Castells e Freire.

A internet tem sua origem no auge da Guerra Fria, 1969, quando os Estados Unidos da América criaram uma rede de computadores, sem um centro administrativo para que, em caso de bombardeio, suas informações continuassem intactas e a rede continuasse ativa. Por aproximadamente duas décadas ela ficou sob o uso restrito em ambientes acadêmicos e científicos. A rede, tal como a conhecemos hoje (comercial),

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foi uma inovação da década de 1990. Ela foi liberada comercialmente nos EUA no ano de 1987. No Brasil, começou a ser explorada comercialmente em 1995.

Conforme Brito e Purificação (2011), a escola frente às NTIC possui, de modo geral, três alternativas: ou as ignora, ou as acompanha freneticamente, ou se apropria dela como um instrumento, meio salutar de apoio, no processo educativo, controlando-as. A última alternativa é a mais difícil, porém temos de enfrentá-la. Se considerarmos a influência das NTIC no âmbito escolar temos que pensar na formação de professores – inicial e continuada –, nos meios postos à disposição pela escola e, também, o modo como a sociedade (e por decorrências nossos alunos) as utilizam.

Quanto às tecnologias educacionais precisamos superar duas visões simplistas. A primeira, a de que elas por si resolvam os problemas educacionais. A segunda, elas não podem ser tratadas simplesmente como um meio de transmissão de conteúdos. É preciso apropriar-se delas, aprender a manuseá-las, estabelecer uma relação de ferramenta salutar no processo de construção de conhecimento. É um erro pensar que tais recursos por si só dão conta de formar indivíduos cidadãos críticos, enfim, plenos. Nesse processo, o papel do professor continua sendo indispensável. Os recursos estão para serem servidos pelo professor e não o professor estar a serviço dos recursos. O humano está acima do tecnológico e não o contrário. O uso das tecnologias educacionais deve ser incorporado no modo de ser do trabalho do professor. Para o bom uso delas é preciso cuidar dele.

No caso da internet como meio educacional, uma das questões para se pensar é: o que fazer para que os alunos não entreguem trabalhos (acadêmicos) copiados? Tanto no caso do computador quanto no da internet a interferência, monitoramento, do professor serão imprescindíveis. Nesse sentido, a prática de pesquisa do professor pode ser significativa. Definitivamente o papel do professor como mediador do processo ensino-aprendizagem está longe de ser descartado. Urge formarmos professores que incorporem em suas práticas as tecnologias educacionais, pois não podemos negá-las e muito menos sermos ingênuos a tal ponto de identificá-las como panaceia da educação.

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Conforme Soares (2000), de modo geral, hoje, há um avanço das comunicações e um engessamento no que se refere à educação. A educação escolar tradicional, linear, baseada no saber do professor e no aluno como alguém passivo, está sendo superada pelo novo paradigma da cultura de massa. Hoje os alunos possuem acesso a muitas informações, o que era impensável há décadas. Eles são nativos, ou seja, nasceram num ambiente virtual, numa realidade virtual. Isso abarca, cronologicamente, os jovens nascidos a partir da década de 1990, momento em que a internet tornou-se comercial. Em oposição aos nativos há o grupo dos migrantes, os quais viveram algum

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tempo sem o ambiente virtual e, posteriormente, foram forçados a aprender essa nova cultura, ou linguagem. A maioria dos professores atuais se encaixa nesse segundo grupo.

Acerca do distanciamento entre educação e comunicação escreve Soares (2000, p. 18):

O discurso educacional é mais fechado e enquadrador, oficial, mas autorizado. Validado por autoridades, não é questionado. Neste sentido, é autoritário, posto que é selecionado e imposto em forma de currículo a alunos e professores. O discurso comunicacional , ao contrário, é desautorizado, desrespeitoso e aberto, no sentido de que está sempre à procura do novo, do diferente, do inusitado. Enquanto a educação está presa ao Estado – fragilizado, sem poder e pobre –, naquilo que o Estado tem de pior, que é a burocracia; a comunicação vincula-se ao mercado, aprimora-se constantemente, tem liberdade na construção do seu ‘currículo’ e de sua forma de agir.

Nesse contexto, como fica o ambiente escolar? Como ele está digerindo essas novas mentes virtuais? “Estaríamos vivendo o desmanche da civilização do livro e dos conteúdos seriados e sistematizados, entrando no mundo veloz, contingente, fluido e mutável da civilização audiovisual, cuja marca é a incerteza e a expectativa do novo, a cada minuto?” (SOARES, 2000, p. 15). O ambiente escolar não pode fechar os olhos para as TICs. Se ele não considerar essa realidade virtual permanecerá abstrato, anacrônico. A escola precisa estar atenta aos seus sujeitos, ao modo de vida deles e, a partir daí, planejar e desempenhar o seu papel (ou até repensar seu papel?). Se isso não for feito a escola ficará sem sentido e seus sujeitos não terão prazer em aprender, estudar. Este é o desafio: integrarmos comunicação e educação.

As TICs não são problema, porém um desafio. Comunicação não pode ser vista como uma ferramenta, mas como um modo de ser do ser humano. As ferramentas criadas pelo homem e que o ajudam na comunicação não podem colocar-se à frente de quem as projetou. Elas são uma decorrência do desejo de o homem querer se comunicar. O homem não pode perder o posto de criador, artífice, daquilo que criou. Nesse sentido, urge um novo paradigma baseado no diálogo, relação, interação. Conforme Paulo Freire (apud SOARES, 2000, p. 20): “Ser dialógico é vivenciar o diálogo, é não invadir, é não manipular, é não sloganizar. O diálogo é o encontro amoroso dos homens que, mediatizados pelo mundo, o pronunciam, isto é, o transformam e, transformando-o, o humanizam”. Nesse contexto o professor detentor do saber é destronado. Professor e aluno põem-se numa relação horizontal e não mais vertical.

Pensando na articulação entre educação e comunicação criou-se um grupo de pesquisadores, o Núcleo de Comunicação e Educação (NCE) no Departamento de

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Comunicação e Artes da Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP). Essa inter-relação é também denominada de educomunicação, uma vinculação em livre processo de consolidação. Nesse sentido, torna-se fundamental o diálogo entre o discurso da escola (arbitrário, linear) e o discurso da comunicação que flui, é livre. A esse diálogo dá-se o nome de interdiscursividade. A consolidação desse campo em expansão abarca a mediação tecnológica na educação, referindo-se, diretamente, ao uso das TICs nos processos educativos. “Trata-se de uma área que vem ganhando exposição devido à rápida evolução das descobertas tecnológicas e de sua aplicação ao ensino, tanto o presencial quanto o a distância”. (SOARES, 2000, p. 22)

Os autores Fofonca e Ambrogi (2013) nos trazem uma abordagem acerca das tecnologias digitais e perguntam pelo tipo de formação aí presente. Eles falam de tecnologias digitais da informação e da comunicação (TDIC), de modo detalhado por identificá-las nas comunidades virtuais de aprendizagem (CVA), nos ambientes virtuais de aprendizagens (AVA), nas redes sociais variadas com público e finalidades variadas, nos blogs e nos recursos educacionais abertos (REA). A preocupação com um ambiente virtual é o pano de fundo do texto deles, o qual possui como espinha dorsal o surgimento da internet comercial a partir da década de 1990. Esses são ambientes emergentes que estão mudando a forma formal (escolar) e informal (social) de educação.

considEraçõEs finais

A tecnologia e a educação escolar surgiram distantes, porém com o tempo o entrelaçamento se impôs. Por exemplo, o computador foi inventado não como finalidade educativa, contudo, aos poucos, com sua popularização, a escola sentiu-se pressionada a adotá-lo. Seu uso divide opiniões: há os favoráveis e os desfavoráveis como instrumento didático pedagógico. Peixoto e Araújo (2012) classificam em duas as correntes que fundamentam o seu uso: a instrucionista (ou conteudista) e a determinista que entende que a escola desenvolve-se paralelamente com a sociedade utilizando-o. Ambas são reducionistas, pois desconsideram o papel reflexivo para o seu uso e, nesse sentido, o papel do professor como mediador.

Nos textos de Soares (2000) e de Fofonca e Ambrogi (2013) há o indicativo de que temos uma escola tradicional que resiste às TICs, ou às TDIC e, por isso, há urgência de que esse impasse seja superado com a sua abertura a essa nova demanda. O futuro dela depende dessa abertura aos novos meios de se ensinar e aprender. O desafio lançado é justamente conciliar educação e novas tecnologias no processo de ensino-aprendizagem. O ambiente escolar não pode ser uma redoma de vidro. A escola é social, e como tal reflete o que a sociedade experimenta. O seu papel não é somente fazer uma corrida atrás do novo, porém, usar o novo, (re)significando seu papel

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de transmitir o conhecimento elaborado historicamente. A escola e os professores têm o importante papel de educar seus alunos para o uso das novas tecnologias com criticidade, compromisso com a formação humana e científica. O papel do humano na construção do conhecimento ainda torna-se imprescindível. Torna-se importante também pensar como formar os professores nesse novo contexto de mudança que parece não ter limite.

As autoras Peixoto e Araújo (2012) constaram que as orientações teóricas acerca do uso do computador na educação continuam sendo, de forma clara, as clássicas tais como o construtivismo de Piaget e Vygotsky, o instrucionismo de Skinner e a educação popular de Paulo Freire, os quais orientam as questões no interior da escola, quando se referem às tecnologias. Já autores como Castells e Lévy são utilizados para tratar da nova organização da sociedade tecnológica.

Elas destacam que as tecnologias não devem ser usadas nem como simples instrumento pedagógico nem como a salvadora das panaceias educativas. Isso porque ambas, se não forem bem consideradas podem manifestar seus efeitos negativos. Por exemplo, no caso da visão instrumental pode haver um uso simplesmente tecnicista-instrucionista, o que resultaria numa formação unilateral. No caso da determinista o seu uso pode levar o ser humano a isolar-se das relações humanas concretas. O melhor caminho seria usar as tecnologias como instrumento – o que parece não termos a escolha de não fazer – e cuidar para que não as usemos como remédio para todos os males da educação. É a posição mais difícil, porém a mais sensata e trabalhosa.

No dizer de Justino (2013), a pesquisa na prática educativa é imprescindível. Ela é princípio educativo. Donald Schön, pedagogo estadunidense, – apoiando-se no pensamento de John Dewey – desenvolveu a ideia da reflexão na educação, que defende a necessidade da prática educativa caminhar ao lado da pesquisa. Sua concepção é a de que o professor deve trabalhar refletindo o antes, o durante e o depois de sua prática. Nesse sentido, o professor precisa integrar-se no processo, deixando de ser passivo. O professor que reflete sua prática tem como pressuposto a pesquisa contínua. Pedro Demo é também um defensor da pesquisa como princípio educativo.

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rEfErências

BRITO, Glaucia da Silva e PURIFICAÇÃO, Ivonélia da. Educação e novas tecnologias: um (re) pensar. Curitiba: InterSaberes, 2011.

FOFONCA, Eduardo e AMBROGI, Ingrid Hötte. Ambiência Virtual Emergente: a cultura dos processos formativos mediados por tecnologias digitais na contemporaneidade. Revista Ação Midiática – Estudos em Comunicação, Sociedade e Cultura. UFPR, v. 2, n. 5, p. 1-12, 2013.

JUSTINO, Marinice Natal. Pesquisa e recursos didáticos na formação e prática docentes. Curitiba: InterSaberes, 2013.

PEIXOTO, Joana e ARAUJO, Claudia Helena dos Santos. Tecnologia e Educação: algumas considerações sobre o discurso pedagógico contemporâneo. Revista Educação e Sociedade, Campinas, v. 33, n. 118, p. 253-268, jan./mar. 2012.

SOARES, Ismar de Oliveira. Educomunicação: um campo de mediações. Revista Comunicação & Educação. São Paulo, (19): p. 12-24, set./dez. 2000.

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ÉTICA NORMATIVA E VALORES MORAIS

Prof. Jair A. Krassuski 1

Este artigo apresenta reflexões a partir das aulas de ética normativa, ministradas por mim nos últimos anos e nele pretendo expor as características gerais da teoria moral de Immanuel Kant (1724-1804); no segundo momento, pretendo apontar alguns traços pertinentes da proposta em relação a uma perspectiva de educação e valores. O interesse pela relação entre moralidade e formação moral retorna constantemente nos estudos sobre a moral kantiana e sua abrangência. Isso pode ser constatado no início da Fundamentação da metafísica dos costumes,2 (1785-1786), quando Kant trata de explicitar o conceito de vontade. Ele afirma que, “a fim de elucidar o conceito de uma vontade altamente estimável em si, de uma vontade boa independentemente de qualquer intenção ulterior, conceito já inerente a todo entendimento são e que precisa não tanto de ser ensinado quanto apenas de ser explicado” (FMC 397, [Grifo meu.]), é preciso examinar o conceito de dever. Temos nesta passagem, além da menção ao que ele entende por educar, de três conceitos importantes para a moral, a saber: vontade, dever e esclarecimento. O termo explicado aparece contraposto ao de ensinado e a tradução nos remete ao conceito de esclarecido. O interesse pela formação moral aparece concomitante à tarefa de indicar a bases da moralidade: a vontade boa não é algo que possa ser ensinado, mas apenas esclarecido, segundo Kant.

Seguindo a tradição iniciada por Platão no diálogo sobre a moral do Menon, Kant acena para o problema, a saber, se na educação moral, a virtude é adquirida pelo ensino ou pela prática. Para mostrar qual o possível fundamento da moral, nas três seções que compõem a Fundamentação da metafísica Kant aponta para o princípio da moralidade e reafirma sua convicção de que a humanidade precisa emancipar-se de tudo o que impede orientar as decisões de modo livre e autônomo. Ao afirmar que a boa vontade não precisa ser ensinada por ser inerente ao são entendimento sugere uma concepção de autoaprendizagem do sujeito que deve esclarecer-se e tomar, principalmente do ponto de vista moral, decisões por sua própria conta. A emancipação é tarefa da filosofia como reflexão crítica, ou metafísica, pois a moral somente pode ser proposta se enraizada em princípios a priori. O tema do esclarecimento é objeto de outros textos do autor, já que as consequências da crítica estendem-se pelo domínio prático em diferentes situações.

Para melhor contextualizarmos alguns conceitos da solução normativa da moral,

1 Professor Associado – Universidade Federal de Santa Maria – RS2 KANT, Immanuel. Grundlegung zur Metaphysik der Sitten. Kants Gesammelte Schriften, IV. As citações seguem a edição portuguesa da Fundamentação da metafísica dos costumes, segundo a tradução de António Pinto de CARVALHO. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1964.

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faremos uma rápida consideração de alguns textos do mesmo período da elaboração da Fundamentação da metafísica. No ensaio Resposta à pergunta: o que é o Iluminismo? (1784), escrito poucos anos antes do ensaio sobre a moral, Kant enfatiza a importância do esclarecimento para a emancipação do homem. Ele afirma: “O Iluminismo é a saída do homem da sua menoridade de que ele próprio é culpado. A menoridade é a incapacidade de se servir do entendimento sem a orientação de outrem” (RPI, VIII, 033). A continuidade do texto mostra o quanto Kant considera importante a decisão e a coragem do sujeito, pois “tal menoridade é por culpa própria se a sua causa não reside na falta de entendimento, mas na falta de decisão e de coragem em se servir de si mesmo sem a orientação de outrem” (RPI, VIII, 033). Estas passagens nos conduzem ao ponto central da reflexão normativa da moral: a moralidade somente tem sentido se resulta da decisão autônoma do sujeito. No final do texto, ele enfatiza a necessidade de libertar-se pelo uso do próprio entendimento, principalmente, no que tange à religião por ser ela constantemente tomada como fonte da autoridade e base da moral: “Pus o ponto central do Iluminismo, a saída do homem da sua menoridade culpada, sobretudo nas coisas de religião, porque em relação às artes e às ciências os nossos governantes não têm interesse algum em exercer a tutela sobre os seus súditos; por outro lado, a tutela religiosa, além de ser mais prejudicial, é também a mais desonrosa de todas” (RPI, VIII, 033). Como se percebe, o interesse pelos assuntos morais, religiosos e políticos está na raiz do projeto do esclarecimento, do “pensar por si mesmo” e tem como ideia central a dignidade do ser humano. Nenhum domínio da atividade racional humana poderia ficar fora desse esforço de emancipação:

Pensar por si mesmo significa procurar em si próprio (isto é, na sua própria razão) a suprema pedra de toque da verdade; e a máxima de pensar sempre por si mesmo é a Ilustração (Aufklärung). [...] Servir-se da sua própria razão quer apenas dizer que, em tudo o que se deve aceitar, se faz a si mesmo esta pergunta: será possível transformar em princípio universal do uso da razão aquele pelo qual se admite algo, ou também a regra que se segue do que se admite? (SOP, VIII, 144)

Portanto, a tarefa da moral é responder a qual princípio normativo deve-se obedecer para a autonomia e a universalidade das ações. Ao enfatizar a dignidade humana como algo irredutível, Kant quer evidenciar que os problemas morais possuem, exclusivamente, uma solução humana. A moral que subsiste à crítica racional é a que se apresenta independente dos apelos e motivações da sensibilidade mas que, ao mesmo tempo, não se submete à religião e à figura de Deus das teorias morais teleológicas. Kant configura o domínio da moralidade em total autonomia da autoridade política ou religiosa, considerando o sujeito moral centro absoluto das decisões morais: “Em religião, igualmente, para Kant, a função crítica da razão, razão

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como autoconhecimento, é o instrumento primário do homem para o esclarecimento e autoaperfeiçoamento” (WOOD, 1970, p. 201). O significado sistemático da religião em relação à moral, à cultura e à história é importante para o projeto crítico kantiano, no entanto, não possui competência fundacional para a moralidade. O que a religião pode auxiliar é em alcançar o aperfeiçoamento moral para o indivíduo e para a comunidade, ou seja, uma função formativa e cultivadora da moralidade. Também no texto A religião nos limites da simples razão,3 publicado, na sua íntegra, em 1794, além do debate filosófico, aparecem os interesses pessoais, as condições históricas, políticas e culturais do final da modernidade e do iluminismo alemão. Estes textos proporcionam uma compreensão do conceito moderno de liberdade que, em Kant, “ao nível do pensamento, e, em seguida, no que concerne à política, fez de todas as determinações da liberdade princípios suscetíveis de edificar um novo pensamento e um novo mundo” (ROSENFIELD, 1988, p. 20). Como são muitos os aspectos envolvidos na teoria moral retomaremos a seguir alguns pontos importantes da proposta kantiana.

Kant manifesta uma preocupação constante com as questões morais desde suas primeiras obras. Ao escrever a Fundamentação da metafísica, o rigor para estabelecer o fundamento último das ações morais que se distancie do senso comum, passa a ser central para todo o sistema prático da filosofia e para o significado que a metafísica assume na filosofia crítica. Este breve tratado de moral não pretende apresentar ou propor um novo princípio para a moral, o que já havia sido indicado anteriormente, mas, fornecer uma nova fórmula para o princípio da moralidade. Portanto, precisamos saber o que um ser racional deve fazer para que suas ações possam ser consideradas moralmente boas. A resposta somente pode ser fornecida pela razão e de forma a priori, ou seja, sem recorrer à experiência. Kant parte do pressuposto de que apontar um fundamento corresponde à razão e não à sensibilidade humana. Para embassar a moral não é permitido recurso à antropologia, à teologia ou à figura de Deus. O fundamento da moralidade deve ser mostrado, e este é o objetivo da Fundamentação da metafísica. Em três seções encontramos o desenvolvimento da proposta no que se refere à metodologia e aos princípios que conduzem à lei moral. A argumentação segue de forma dedutiva ou analítica, no primeiro momento (regressiva) e a priori no segundo momento, mostrando que não há nada de empírico no seu princípio. A regra em questão é o princípio do dever, a lei moral, proposta de forma totalmente a priori para orientar e determinar a experiência. Kant descreve os passos de uma fundamentação da moral com o objetivo esclarecer e indicar como e possível fornecer uma base (Grundlegung) metafísica aos costumes (moralidade). O Prefácio inicia com a distinção da filosofia em formal e material para enfatizar que determinado saber é

3 KANT, IMMANUEL. Die Religion innerhalb der Grenzen der blossen Vernunft. Kant’s Werke, Band VI, Berlin, 1914. A Religião nos limites da simples razão. Lisboa: Edições 70, 1992. As citações correspondem às da Academia, e a tradução para o português é de Artur MORÃO.

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puro quando constituído de proposições necessárias e universais, não derivadas da experiência que, para Kant, é sinônimo de a priori. Uma fundamentação exige bases metafísicas para assegurar o valor absoluto e universal da lei moral: “Uma metafísica dos costumes é, pois, rigorosamente necessária, não só por motivo de necessidade da especulação, a fim de indagar a origem dos princípios práticos, que existem a priori em nossa razão, mas também porque a própria moralidade está sujeita a toda espécie de perversões, enquanto carecer deste fio condutor e dessa norma suprema de sua exata apreciação”. (FMC, IV, 390)

No entanto, para propor a vida moral segundo estas exigências, não serve a simples decisão de negar as inclinações empíricas e tudo o que provém da sensibilidade. Após estabelecer o princípio último da moralidade é preciso mostrar que o agente moral é obrigado incondicionalmente pela lei moral. Novamente, cabe à razão assentar, de modo seguro e definitivo, a “determinação do princípio supremo da moralidade” (FMC, IV, 392) que ela, após elevar-se do conhecimento vulgar ao princípio supremo da moralidade e, posteriormente, invertendo o caminho, partindo desse princípio e das suas origens às consequências concretas de sua aplicação, é a única capaz de fornecer as bases seguras do agir humano. A tarefa da ciência moral é determinar as leis a priori da vontade, sem recurso à experiência, aos sentidos e a moventes heterônomos que possam ser propostos como fim para tal fundamentação. Em continuidade, compete à ciência moral tudo o que diz respeito à aplicação da lei moral às situações concretas da vida humana, tirando daí as consequências da submissão da experiência à moralidade.

A Fundamentação da metafísica, portanto, estabelece a base para a ciência ética e mostra como princípios totalmente a priori devem determinar de modo apodíctico, a ação moral. Para um ser dotado de razão e não somente de sensibilidade, a natureza ou a experiência não pode consistir no fundamento último do agir. Kant sabe que o ser humano não é perfeitamente racional e não há contradição em pensar que um perfeito ser racional é um ser que sempre pensa “racionalmente”. Sendo assim, para um ser submetido ao mundo dos sentidos e pertencente ao mundo racional, como é o homem, o valor absoluto das ações deve provir da sua racionalidade que somente pode encontrar-se na vontade: “Não é possível conceber coisa alguma no mundo, ou mesmo fora do mundo, que, sem restrição, possa ser considerada boa, a não ser uma só: uma boa vontade” (FMC, IV, 393). O homem é o único ser capaz de dar a si mesmo o princípio de determinação da vontade, a “condição indispensável para ser feliz”. (FMC, IV, 393) O conhecimento da lei prática e a determinação puramente racional da vontade somente são possíveis pela razão: “A vontade é o que distingue o homem como um ser racional dos seres naturais como os animais, que se orientam por leis dadas pela natureza e não por leis concebidas por conta própria”. (HÖFFE, 2005, p. 164)

Além da boa vontade, afirma Kant, nada há no mundo ou fora dele que possa ser tomado como bom. Essa é a condição que articula a vida moral de sujeitos racionais.

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Kant entende que o princípio que determina o querer é racional e que a vontade é um princípio autônomo: “A tese de que a autonomia da vontade é o princípio supremo da moralidade é a culminância do argumento analítico ou regressivo das duas primeiras partes do Groundwork” (ALLISON, 1998, p. 99). Enquanto disposição fundamental, a boa vontade é a determinação de agir com a única finalidade de fazer por dever, que Kant contrasta com o princípio da felicidade, denominado por ele princípio da heteronomia, o qual determina a ação a partir de moventes externos: “A acusação de Kant contra todas as teorias morais heterônomas, isto é, todas as teorias, exceto a sua, é que elas reduzem o imperativo categórico a hipotético”. (ALLISON, 1998, p. 100)

As determinações que provêm do domínio da natureza regem a conduta, necessariamente, e permitem atribuir, “metaforicamente”, uma vontade também aos seres irracionais. Seguindo seus impulsos, os animais realizam a vontade da natureza, e não uma vontade própria. A vontade é livre somente quando as leis da ação são dadas pelo próprio sujeito da ação, de forma totalmente autônoma. Agindo pelo princípio da autonomia, “tudo quanto se refere de algum modo ao que é empírico desaparece por si mesmo, uma vez que, se a razão, só por si mesma, determina o comportamento [...], ela o deve fazer necessariamente a priori” (FMC, IV, 427). Para o ser humano, agente moral contingente, a lei da autonomia da vontade é um imperativo que, para Kant, tem sua origem na razão prática pura, de modo totalmente a priori. A regra prática expressa no imperativo categórico é produto da razão e prescreve a ação, qual meio para o efeito, considerado como intenção. O agente moral necessita dessa regra que se apresenta a todo ser racional como um “dever ser”, que exprime a compulsão objetiva da ação. Kant estava convencido de que, se a vontade fosse unicamente determinada pela razão, as ações ocorreriam segundo o princípio moral.

Ao mostrar a determinação da vontade pelo imperativo categórico Kant pretende impossibilitar que princípios heterônomos, como a felicidade, sejam tomados como fundamentos do agir e afasta também o ceticismo e o empirismo éticos, segundo os quais se poderia agir meramente por motivações empíricas, como se os princípios da moral dependessem da experiência: “Kant realiza, em sua fundamentação da ética, quatro tarefas fundamentais: determina o conceito de moralidade, aplica-o à situação dos seres racionais finitos, desembocando no imperativo categórico; descobre a origem da moralidade na autonomia da vontade e busca demonstrar, com o fato da razão, a realidade da moralidade; desse modo, depois de rebater o empirismo ético, considera ter superado também, radicalmente, o ceticismo ético”. (HÖFFE, 2005, p. 165)

No sentido que Kant pretende, a moralidade é possível porque o ser humano é um ser autônomo, capaz de ordenar as ações pelo imperativo categórico que ele próprio é autor. Pela sua constituição racional o homem é o único ser capaz de agir obedecendo a leis auto-impostas, independentemente de qualquer motivação externa. Por essa capacidade moral, o ser humano torna-se digno de ser chamado como tal: “Todas as

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coisas na natureza operam segundo leis. Apenas um ser racional possui a faculdade de agir segundo a representação das leis, isto é, segundo princípios, ou, por outras palavras, só ele possui vontade” (FMC, IV, 412). Portanto, o que pode ser considerado bom, de modo absoluto, em uma ação, é a sua realização por puro respeito à lei moral, segundo o princípio prático que reúne essas condições, o imperativo categórico.

O motor da teoria moral kantiana é a lei moral. Este princípio prático se expressa na forma do imperativo categórico, também denominado imperativo da moralidade, e prescreve que esse princípio objetivo possa ser observado, universal e necessariamente, por todos os seres racionais. Concomitantemente, ele deve ser capaz de constranger o sujeito, interiormente, à obediência da lei, ou seja, deve ser uma máxima que, efetivamente, comande. O ser racional, por respeito a essa lei, deseja que ela se torne um princípio válido para todos os seres racionais: “A representação de um princípio objetivo, na medida em que coage a vontade, denomina-se mandamento (da razão), e a fórmula do mandamento chama-se IMPERATIVO” (FMC, IV, 413). Ações morais são as que se expressam pelo dever, de forma apodíctica, ou seja, conforme a estrutura lógica formal dos juízos sintéticos a priori, segundo princípios, na forma do imperativo categórico: “Todos os imperativos são expressos pelo verbo dever, e indicam, por esse modo, a relação entre uma lei objetiva da razão e uma vontade que, por sua constituição subjetiva, não é necessariamente determinada por essa lei (uma coação)” (FMC, IV, 413). No entanto, um ser racional não deve agir somente em conformidade com a lei moral, mas praticar as ações por causa da lei moral. Somente nessa condição a ação ocorrerá, segundo o fundamento universal e necessário do dever. A partir da demonstração de como são possíveis juízos sintéticos a priori, Kant vai adiante, considerando como essas condições racionais fundamentam o comportamento moral humano.

A lei fundamental da razão prática, expressa no imperativo categórico, possui três formulações diversas na Fundamentação da metafísica, que se referem, conforme o próprio Kant, à mesma lei, diferenciando-se apenas na ênfase de cada uma dessas formulações: a primeira, “procede apenas segundo aquela máxima, em virtude da qual podes querer, ao mesmo tempo, que ela se torne em lei universal” (FMC, IV, 421), enfatiza a autonomia da lei como regra universal; a segunda, enfatiza o respeito à dignidade da pessoa: “Procede de maneira que trates a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de todos os outros, sempre ao mesmo tempo como fim, e nunca como puro meio” (FMC, IV, 429); e a terceira, prioriza a legislação para a comunidade moral ou o reino dos fins: “Todas as máximas, oriundas de nossa própria legislação, devem concorrer para um reino possível dos fins como para um reino da natureza” (FMC, IV, 436). A primeira formulação, a mais conhecida, é denominada o princípio supremo do direito, por obrigar a reconhecer e respeitar os direitos e as obrigações dos outros como escolhas livres e autônomas.

Após ter mostrado a regra da moralidade, Kant passa a considerar as ações morais

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a partir deste princípio, ou seja, problematizar sobre o acordo entre a vontade e a lei universal que o sujeito dá a si mesmo de forma totalmente a priori. A moralidade de uma ação, como insiste Kant, consiste em executá-la por dever, ou seja, em concordância com a máxima autoimposta pelo próprio sujeito; é desta forma, que o agente moral manifesta sua constituição última de ser racional, livre e autônomo, capaz de agir de modo absolutamente incondicionado e verdadeiramente livre. Já naquelas ações realizadas conforme o dever, a retidão da ação consiste apenas na concordância do ato e da obediência à lei externa, válidas como ações legais e que não são, conforme o rigor da Fundamentação da metafísica, ações morais.

O princípio da moralidade que se expressa no imperativo categórico é o princípio autônomo que estrutura o domínio ético-prático de todo o sistema kantiano. Portanto, o princípio da moralidade não depende da religião ou de um legislador supremo para a sua fundamentação ou observância: “A lei não é respeitável, por ter sido estabelecida por Deus: ela é respeitável em si, absolutamente, porque a descobrimos primeiro em nós, estamos certos dela por uma espécie de revelação racional” (ALLISON, 1998, p. 129). O caráter absoluto da lei moral é o fundamento irremovível da determinação da ação “pressupondo a liberdade da vontade” (FMC, IV, 461), que se opõe a todo princípio heterônomo.

O conceito de autonomia e os elementos básicos da psicologia moral fazem parte da ideia kantiana da liberdade, porém não de forma acabada. Para Kant, o homem age moralmente persuadido “pela ideia da dignidade de um ser racional que não obedece a nenhuma outra lei que não seja, ao mesmo tempo, instituída por ele próprio” (FMC, IV, 434). Por sua vez, a autonomia tem como princípio “escolher sempre de modo tal que as máximas de nossa escolha estejam compreendidas, ao mesmo tempo, como leis universais, no ato de querer” (FMC, IV, 440), cujo fundamento explicativo é a liberdade. Podemos definir uma ação autônoma como aquela que, na sua realização, ocorreu com total independência de causas determinantes heterogêneas e que uma ação livre implica, reciprocamente, a autonomia: “A autonomia é, pois, o princípio da dignidade da natureza humana, bem como de toda natureza racional”. (FMC, IV, 436)

A autonomia é central na vida moral e não pode ser confundida com a autarquia, pois, na visão de Kant, o ser humano partilha o mundo moral com outros agentes, ou seja, interage com interdependência e reciprocidade. A liberdade recebe diferentes soluções na obra de Kant, sendo que, na terceira seção da Fundamentação da metafísica, ele inicia com a definição da liberdade como propriedade da causalidade da vontade de “agir independentemente de causas estranhas que a determinam” (FMC, IV, 446). Na acepção positiva, a liberdade contrapõe-se ao acontecer espontâneo da natureza, que obedece à necessidade causal.

A causalidade por liberdade aplicada ao domínio teórico-especulativo da natureza impossibilitaria a própria compreensão do mundo. A causalidade da natureza

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e a causalidade por liberdade apresentam-se em aparente contradição, ou dualismo, que a razão não pode aceitar. Kant resolve o que pareceria um paradoxo, com a afirmação de que o homem pertence, simultaneamente, ao mundo da necessidade causal ou fenomênica e ao mundo absoluto da liberdade, numênico. Pertencer a dois mundos é a solução que ele entende ser a mais satisfatória para a antinomia. Conforme essa distinção, no domínio fenomênico, as leis da natureza possuem validade, necessariamente; no domínio numênico, a causalidade por liberdade regula a vida moral e determina as ações: “Afirmo que a todo ser racional dotado de vontade devemos atribuir necessariamente também a idéia da liberdade, mercê da qual somente ele pode agir” (FMC, IV, 448). Ser racional, o homem pertence ao mundo numênico e suas leis, única esfera em que é, realmente, livre, e, pela sua sensibilidade, participa do mundo fenomênico da natureza. Kant explicita: “Introduzindo-se, assim, por meio do pensamento num mundo inteligível, a razão prática não ultrapassa, de fato, seus limites; só os ultrapassaria, se quisesse, entrando nesse mundo, intuir-se, sentir-se nele” (FMC, IV, 458). Por pertencer a dois mundos, o homem não é um ser perfeito, mas perfectível, que encontra no mundo inteligível da liberdade a possibilidade do seu aperfeiçoamento, desde que adote como fundamento de sua conduta o princípio da moralidade e se reconheça nele. A razão o afasta do mundo da natureza e o conduz ao mundo da liberdade e do incondicionado, apresentando um verdadeiro projeto de melhoramento no nível prático-moral.

Colocadas as características gerais da teoria moral kantiana, gostaria de apontar para alguns desdobramentos desta perspectiva moral caracterizada como uma forte solução normativa da ética. Fica evidente que, para Kant, cabe à teoria moral apontar os princípios e as regras que determinam as ações. Para este propósito não serve a ideia de bem como movente das ações morais, o que diferencia a perspectiva normativa da perspectiva teleológica da moral. A ética normativa não é a única abordagem da vida moral e das condições necessárias para a realização de ações que tenham valor moral. O que a distingue das demais teorias morais é o caráter absoluto motivador da proposta, a lei moral, apresentado como princípio formal das ações morais. Não agimos movidos pela felicidade, prazer ou fins que uma determinada ação possa proporcionar, mas puramente por dever. Kant estabelece a relação da moralidade com a educação e a formação de valores morais, pois sabe que o ser humano é perfectível. Na sua proposta, o aspecto mais importante é o lugar que ocupa o sujeito: o ser humano jamais pode ser tomado como um meio para alcançar fins, pois ele é um fim em si mesmo. Kant estrutura a teoria moral a partir da irredutibilidade da lei moral para o agir humano Não devemos considerar a felicidade ou o prazer das nossas ações, pois o valor moral da ação não reside no que dela esperamos. Este é o único modo garantir a dignidade do ser humano, para Kant, o valor mais alto do universo. A vida social e individual deve ser pautada pela lei da moralidade, pois ela preserva aquilo que os seres humanos são na sua constituição fundamental: seres racionais, livres. A

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educação é processo de aperfeiçoamento moral do sujeito, como indivíduo e espécie. A vida moral recebeu várias soluções ao longo dos séculos e, neste processo, a filosofia percebeu a exigência de explicitar que “na sua estrutura, a Ética discute – além dos conceitos fundamentais normativos comuns – o agir do indivíduo, deixando para a Política a investigação de instituições e constituições” (HÖFFE, 2008, p. 170). As exigências éticas foram submetidas também ao âmbito dos direitos humanos, dos direitos dos animais, da ecologia, do meio ambiente, etc. A investigação moral dos filósofos modernos conduziu a importantes mudanças que alicerçaram conquistas formidáveis: a dignidade da pessoa humana, a atuação da figura do estado, a distinção entre moralidade e legalidade, a autonomia da ética e da política, entre outras apropriações. A compreensão do que compete à moral e sua abrangência mostra que a autonomia da política conduziu ao “império da lei”, mudança que foi decisiva para que um número sempre maior de indivíduos e de grupos sociais acedesse ao sistema jurídico de direitos e deveres, das leis laicas do estado moderno. Na modernidade, indivíduos e sociedades passaram a organizar-se pelo complexo sistema de normas e de leis sob um poder comum garantidor das condições básicas de vida. As ameaças naturais, os conflitos e instabilidades inerentes das disputas e interesses tiveram uma resposta de estabilidade e prosperidade fundada na certeza de que a ciência conduz melhor as questões práticas da vida que a antiga metafísica. Por sua vez, no terreno da teoria moral, amadureceu a necessidade de orientar as ações do indivíduo, mas também do estado respeitando o direito e os valores morais inerentes a ele, principalmente a igualdade e a liberdade. Os filósofos contribuíram para o avanço nas questões morais, acalentando uma ambição de propor regras morais, valores e argumentos morais que pudessem ser assumidos e aplicados a todos os homens, ou seja, capazes de abarcar o maior número possível de indivíduos. Esta pretensão aparece como desafio concreto à moral e à política pela explicitação das teorias morais e da investigação dos temas morais.

Espero ter contribuído com estes parágrafos para salientar que as questões morais continuam pertinentes para a reflexão em muitos âmbitos da vida e da sociedade. Quase sempre iniciamos este diálogo pela pergunta: onde se originam os valores morais? Se a questão esboçada por Kant no início da Fundamentação da metafísica ainda tem sentido, ela aponta para o que pretendemos com a discussão de valores morais no contexto educacional: consolidar valores a partir do diálogo e do respeito. Certamente, qualquer proposta neste sentido deve levar em conta as condições morais fundamentais levantadas por Kant há mais de dois séculos: a dignidade do ser humano e a liberdade são moralmente irredutíveis para um ser racional. As respostas a estas questões buscam a sua justificação na experiência, na religião, na metafísica, na ciência ou na compreensão do que é a natureza humana. Em qualquer destas perspectivas morais permanece a tomada de decisão moral no sentido normativo de Kant ou noutro e pede uma resposta sincera à pergunta: queremos que a perspectiva moral

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faça parte de nossas vidas? Caso a resposta seja afirmativa, a proposta kantiana pode ter algum significado moral propedêutico.

A teoria moral de Kant foi motivada pelos ideais iluministas, principalmente pelas leituras das obras de Jean J. Rousseau sobre educação e pedagogia. Kant estava convencido que os melhores resultados da educação moral, quanto à didática, eram aqueles alcançados pelo diálogo. Por este motivo ele era crítico à didática usada na catequese, defendida pelas autoridades religiosas prussianas. Enquanto a primeira envolve aluno e professor em perguntas e respostas, na forma participativa de diálogo, a segunda privilegia o professor e sua fala. O filósofo alemão entendia ser necessário colocar a moralidade como o centro da mudança de mentalidade, como pretendida o Iluminismo do final do século XVIII. Para este pretensioso projeto emancipatório, o esclarecimento dos sujeitos era a condição para saída do estado de menoridade e de dependência. A liberdade não é dada aos indivíduos, mas a condição inerente dos agentes morais para conduzir uma vida correta e boa, não podendo ser mitigada ou tutelada. O agir humano foi investigado exaustivamente ao longo dos séculos e os filósofos, políticos e pedagogos mostraram a impossibilidade de compreender o que é a ética e a conduta humana sem referir-se à liberdade. A liberdade é condição da moralidade e como valor deve ser desejado e garantido. Para finalizar, após todas estas considerações, uma definição apropriada da ética poderia ser formulada da seguinte maneira: a ética é a reflexão sobre os valores e fundamentos da moralidade, as implicações e as consequências das escolhas morais para seres racionais e livres.

rEfErência

ALLISON, Henry E. Kant’s Theory of Freedom. Cambridge: Cambridge University Press, 1998.

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