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Ana Carolina Costa Pereira Wellington Lima Cedro Organizadores EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: DIFERENTES CONTEXTOS, DIFERENTES ABORDAGENS

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Ana Carolina Costa PereiraWellington Lima Cedro

Organizadores

EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: DIFERENTES CONTEXTOS,

DIFERENTES ABORDAGENS

EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: DIFERENTES CONTEXTOS, DIFERENTES ABORDAGENS

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ

ReitorJosé Jackson Coelho Sampaio

Vice-ReitorHidelbrando dos Santos Soares

Editora da UECEErasmo Miessa Ruiz

Conselho EditorialAntônio Luciano Pontes

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Conselho ConsultivoAntônio Torres Montenegro (UFPE)

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Manuel Domingos Neto (UFF)Maria do Socorro Silva Aragão (UFC)

Maria Lírida Callou de Araújo e Mendonça (UNIFOR)Pierre Salama (Universidade de Paris VIII)

Romeu Gomes (FIOCRUZ)Túlio Batista Franco (UFF)

Ana Carolina Costa PereiraWellington Lima Cedro

Organizadores

1a Edição

Fortaleza - CE

2015

EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: DIFERENTES CONTEXTOS, DIFERENTES ABORDAGENS

EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: DIFERENTES CONTEXTOS, DIFERENTES ABORDAGENS

© 2015 Copyright by Ana Carolina Costa Pereira e Wellington Lima Cedro

Impresso no Brasil / Printed in BrazilEfetuado depósito legal na Biblioteca Nacional

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS

Editora da Universidade Estadual do Ceará – EdUECEAv. Dr. Silas Munguba, 1700 – Campus do Itaperi – Reitoria – Fortaleza – Ceará

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Editora filiada à

Coordenação Editorial

Erasmo Miessa Ruiz

Diagramação e CapaNarcelio de Sousa Lopes

Revisão de TextoEdUECE

Ficha Catalográfica Vanessa Cavalcante Lima - CRB 3/1166

E 21 Educação matemática: diferentes contextos, diferentes abordagens / Ana Carolina Costa Pereira, Wellington Lima Cedro (orgs). – Fortaleza: EdUECE, 2015.

214 p. ISBN: 978-85-7826-215-0

1. Ensino aprendizagem - Matemática. 2. Material didático. 3. Interdisciplinaridade. I. Título.

CDD: 510

APRESENTAÇÃO

Qual a concepção que temos da Matemática? Trata-se de uma ciência a-histórica, baseada na Lógica e na Teoria dos Conjuntos? Um conjunto de conhecimentos extraídos do mundo físico por meio dos sentidos? Ou é melhor defini-la como uma ciência viva, dinâmica, totalmente integrada na sociedade e com a qual pode-se melhorar a qualidade de vida da população?

Acreditamos que as respostas a essas perguntas podem nos ajudar a identificar o que nós conhecemos atualmente como Educação Matemática. De um modo geral concordamos com D`Ambrósio (1996)1, que concebe a Educação Matemática como um ramo da Educação em que se procura estudar e desenvolver modos mais eficientes de se ensinar Matemática, ou seja, a Edu-cação Matemática, acreditamos, representar, sim, uma substan-ciosa oportunidade de se fazer face às dificuldades e desafios ine-rentes aos processos de ensino e aprendizagem em Matemática.

Com essas características, trata-se, portanto de uma área eminentemente multidisciplinar que segundo D`Ambrósio (1986, p. 35)2, “se pratica com um objetivo geral bem específico - transmitir conhecimentos e habilidades matemáticas - através dos sistemas educativos (formal, não-formal e informal)”. Esse cará-ter multidisciplinar, inequivocamente, é o principal responsável pela vitalidade da Educação Matemática, uma vez que favorece o progresso dessa área em várias frentes de pesquisa.

1 D´AMBROSIO, U. Educação Matemática: da teoria à prática. 10. ed. Campinas, SP: Papirus, 1996 (Coleção Perspectivas em Educação Matemática).2 D´AMBROSIO, U. Da realidade à ação: reflexões sobre Educação e Matemática. 4. ed. São Paulo: Summus, 1986.

Contudo, mesmo guarnecida com tantos aspectos po-sitivos e avanços, a Educação Matemática deve, ainda assim, ser, prudentemente, considerada um campo científico em formação. Há muito o que se definir, reestruturar e fundamentar nessa área, e compete a nós, estudiosos e pesquisadores, imergir em nossas reflexões e investigações de modo que possamos assistir produti-vamente o processo de consolidação da Educação Matemática.

Neste contexto, é que dedicamos este livro a apresen-tar uma série de estudos e investigações no campo da Educação Matemática com o propósito principal de ajudar o leitor no mo-vimento de reflexão teórica sobre o processo de constituição de identidade de uma área tão diversa como a Educação Matemá-tica. Assim, este trabalho é um dos inúmeros passos necessários na delimitação e desenvolvimento do conhecimento inerente ao educador matemático.

Os sete capítulos que compõem essa coletânea tratam de quatro temáticas principais inerentes à Educação Matemática, a saber: o uso das TIC´s; o emprego das histórias em quadrinhos; a história da matemática e a formação de professores. Os dois primeiros capítulos do livro tratam das tecnologias da informação e da comunicação (TIC) e têm em comum o uso de softwares e a abordagem sobre o ensino da geometria. Em seguida, apresen-tamos mais dois capítulos que, apesar de terem focos diferentes (formação de professores e o ensino). Compartilham entre si o destaque dado ao uso das histórias em quadrinhos, como um elemento necessário tanto à formação do professor que ensina matemática como nos processos de ensino dos conhecimentos matemáticos. Um terceiro momento desta obra destaca nos dois capítulos apresentados a importância da história da matemática, que permite tanto a compreensão dos caminhos trilhados pelos

sujeitos como a possibilidade de elaboração de novas práticas educativas. A última temática abordada neste livro é a formação do professor de matemática, que é discutida aqui, em um capí-tulo, no contexto do estágio supervisionado na educação escolar indígena. Passemos agora a apresentar isoladamente cada um dos capítulos que nos ajudam a compreender a Educação Matemática nos diferentes contextos e nas diferentes abordagens.

O capítulo inicial desta obra foi escrito por Nilton José Neves Cordeiro e Márcio Nascimento da Silva; intitulado “Ma-temática e Geografia de maneira interdisciplinar: a Geometria esférica com suporte do software R”. O texto pretende apontar meios para integrar a Matemática e a Geografia de um modo que seja atraente para professores e alunos. Nesta perspectiva, os autores apresentam uma consistente e robusta proposta de ensino interdisciplinar que utiliza software R como ferramenta para o estabelecimento das conexões entre as duas disciplinas.

O segundo capítulo, chamado “a geometria do compas-so de Mascheroni via atividades com software de matemática di-nâmica”, apresenta um conjunto de atividades que tem como ob-jetivo a compreensão de aspectos da Geometria, particularmente das construções geométricas apresentadas na obra A Geometria do Compasso de Lorenzo Mascheroni (1750 – 1800), com apoio do software de matemática dinâmica, GeoGebra. Os autores neste capítulo transitam entre tendências da Educação Matemática, a saber o uso pedagógico da História da Matemática e as TIC´s, tudo isso permeado pela proposta teórica da “Investigação Ma-temática”.

O capítulo três deste livro se propõe a debater a forma-ção do professor que ensina matemática. Luis Adolfo de Oliveira

Cavalcante e Wellington Lima Cedro, apresentam os resultados de uma pesquisa realizada durante o mestrado, do autor princi-pal, na qual eles analisaram a relevância e pertinência da inserção do uso das histórias em quadrinhos nos processos formativos dos docentes, por meio do desenvolvimento de um curso de forma-ção continuada. O objetivo principal deste capítulo é enfocar como os professores se preocuparam em abordar o conhecimento matemático nas histórias em quadrinhos produzidas durante o curso de formação oferecido a eles.

No quarto capítulo, temos novamente as luzes direcio-nadas as histórias em quadrinhos. No capítulo escrito por Ana Carolina Costa Pereira, Laura Andrade Santiago e Wendy Mes-quita de Morais, intitulado “o uso de episódios históricos no ensino de matemática: uma sequência didática utilizando qua-drinhos”, é apresentada uma sequência de atividades de ensino construídas por meio do episódio histórico e dos quadrinhos, que tem como objetivo a promoção da aprendizagem significativa e autônoma dos estudantes de matemática. Vinculando o conteú-do da história da matemática e das ciências com as histórias em quadrinhos, as autoras apresentam reflexões interessantes para o desenvolvimento deste foco de pesquisas dentro da educação ma-temática.

“Obstáculos e dificuldades na aprendizagem dos núme-ros inteiros: uma análise dos estudos de Georges Glaeser” é o título do quinto capítulo desta obra. Em seu capítulo Joelma No-gueira dos Santos apresenta uma pesquisa, baseada nos estudos de Georges Glaeser, na qual ela analisa os obstáculos epistemoló-gicos citados por ele, estabelecendo as relações entre as dificulda-des dos matemáticos para entender os números relativos com os obstáculos dos alunos na visão de professores.

O sexto capítulo de autoria de Maria Gilvanise de Oli-veira Pontes, tem foco na história da Sociedade Brasileira de Edu-cação Matemática no Estado do Ceará. O relato apresentado pela autora narra os eventos marcantes e decisivos no desenvolvimen-to da Educação Matemática em terras cearenses.

Por fim, o último capítulo denominado “Educação in-dígena: o futuro professor de matemática atuando na discipli-na de estágio supervisionado” se propõe a mostrar como vem se efetivando a formação do professor indígena Tremembé na área de Matemática no Curso Magistério Indígena. O debate é apre-sentado por Sheyla Silva Thé Freitas, Valmiro de Santiago Lima e Ana Carolina Costa Pereira. Tem como pano de fundo a discipli-na de estágio supervisionado e tem como um dos seus objetivos possibilitar ao leitor o entendimento da realidade da educação indígena vivenciada no Ceará.

Para encerrar enfatizamos que deixamos para o leitor o julgamento da relevância das reflexões que aqui são apresentadas e a validade das elaborações teóricas propostas.

Organizadores.

SUMÁRIO

MATEMÁTICA E GEOGRAFIA DE MANEIRA INTERDIS-CIPLINAR: A GEOMETRIA ESFÉRICA COM SUPORTE DO SOFTWARE RNilton José Neves CordeiroMárcio Nascimento da Silva ...................................................13

A GEOMETRIA DO COMPASSO DE MASCHERONI VIA ATIVIDADES COM SOFTWARE DE MATEMÁTICA DI-NÂMICAGiselle Costa de SousaJosé Damião Souza de Oliveira ...............................................49

HISTÓRIAS EM QUADRINHOS E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA: UMA RELAÇÃO POSSÍVELLuis Adolfo de Oliveira CavalcanteWellington Lima Cedro ..........................................................85

O USO DE EPISÓDIOS HISTÓRICOS NO ENSINO DE MATEMÁTICA: UMA SEQUÊNCIA DIDÁTICA UTILI-ZANDO QUADRINHOSAna Carolina Costa PereiraLaura Andrade Santiago Wendy Mesquita de Morais ..................................................108

OBSTÁCULOS E DIFICULDADES NA APRENDIZAGEM DOS NÚMEROS INTEIROS: UMA ANÁLISE DOS ESTU-DOS DE GEORGES GLAESERJoelma Nogueira dos Santos ..................................................132

A HISTÓRIA DA SBEM NO CEARÁ: DESAFIOS E PERSPEC-TIVASMaria Gilvanise de Oliveira Pontes ......................................160

EDUCAÇÃO INDÍGENA: O FUTURO PROFESSOR DE MATEMÁTICA ATUANDO NA DISCIPLINA DE ESTÁ-GIO SUPERVISIONADO Sheyla Silva Thé FreitasValmiro de Santiago LimaAna Carolina Costa Pereira ..................................................180

AUTORES ...................................................................... 208

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CAPÍTULO 01

MATEMÁTICA E GEOGRAFIA DE MANEIRA INTERDISCIPLINAR: A GEOMETRIA ESFÉRICA

COM SUPORTE DO SOFTWARE R

Nilton José Neves CordeiroMárcio Nascimento da Silva

IntroduçãoMesmo nos dias de hoje não é difícil encontrar alunos

– quer seja na educação básica ou superior – que se questio-nam e/ou indagam seus professores sobre a utilidade de alguns conteúdos de matemática. Aulas conduzidas de maneira pou-co diversificadas, sem estímulos e a falta de habilidade por par-te de alguns professores em articular a Matemática com outras áreas do conhecimento, parecem contribuir para este quadro. A busca pelo significado dos conteúdos estudados pode ser o caminho.

Partindo dessas premissas, deve-se fazer com que o en-sino esteja diretamente ligado, também, ao interesse e a ne-cessidade dos alunos. A reflexão e a busca por estratégias que articulem o conteúdo com ferramentas e temáticas diversas, inclusive as do cotidiano, podem ser de grande valia, tornando o ensino/aprendizagem mais atraente.

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No caso específico da matemática, uma reflexão crítica sobre o papel que ela deve desempenhar na configuração curricular é imprescindível e inadiável. Em todas as sistematizações filosóficas, constatamos a importância do papel que lhe é destinado, bem como a in-fluência que dele se irradia para todos os relacionamentos disciplinares. (MA-CHADO, 1993, p. 33)

Desta forma, pretende-se aqui apontar meios para in-tegrar Matemática e Geografia de um modo que seja atraente para professores e alunos: uma proposta interdisciplinar com o uso do software R.

Interdisciplinaridade e o ensino de MatemáticaA Matemática pode facilmente ser articulada com

outras áreas, como por exemplo a Biologia, na análise do crescimento de bactérias, a Física, com modelos para as órbitas dos planetas ou a Geologia, com a datação de fósseis. Já a localização, distribuição e representação do espaço geográfico é um exemplo de articulação entre Matemática e Geografia.

Trabalhar várias áreas em um mesmo assunto é o que pode ser chamado de interdisciplinaridade, que de acordo com Silva (2010), é

[...] o processo que envolve a integra-ção e engajamento de educadores num trabalho conjunto de interação das dis-ciplinas do currículo escolar entre si e com a realidade de modo a superar a

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fragmentação do ensino. A interdisci-plinaridade é, portanto, a articulação que existe entre as disciplinas para que o conhecimento do aluno seja global, e não fragmentado. (2010, p.3)

Ainda neste artigo, Silva diz que a interdisciplinaridade no contexto escolar é a oportunidade do estudante se tornar protagonista de suas próprias ações na busca do saber tendo o professor como mediador dessa aprendizagem, o responsável por conduzir e dar possibilidades para que esse desenvolvi-mento estudantil venha acontecer.

No que tange o ensino superior, segundo Santos & Viera (2011), os professores de centros universitários e institu-tos de ensino superior não dão muita importância à interdis-ciplinaridade e nem mesmo à pesquisa. Ainda, afirmam que:

Nessas instituições, os professores são horistas, isto é, são pagos por hora-au-la, para “darem aulas” e não ensinarem. Isso significa que esses professores têm compromisso com o ensino, mas não necessariamente, com a aprendizagem e com a interdisciplinaridade. Muitos desses profissionais não têm tempo para pesquisar, ler e, especialmente preparar a aula. Com frequência, veri-fica-se que chegam na sala de aula e não sabem, sequer onde foram que pararam com a matéria na aula passada. (SAN-TOS & VIEIRA, 2011, p. 2)

As metodologias de ensino voltadas para o Ensino Su-perior não diferem em muito daquelas voltadas para o Ensino

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Médio. Em vários casos, o professor é reconhecido apenas pela sua área de investigação, uma vez que este, em geral, se limi-ta a trabalhar apenas a disciplina que lhe é direcionada. Nas universidades, em sua grande maioria, os cursos são trabalha-dos de maneira isolada com relação aos demais e a técnica da aprendizagem se restringe exclusivamente à teoria e prática (quando esta existe no curso).

Vale lembrar que a abordagem interdisciplinar no ensi-no superior é um princípio recente de organização do trabalho pedagógico, no qual se busca a interação de conceitos e mé-todos. Assim, é necessário um avanço na postura de ensinar e aprender dos professores.

Portanto, a Matemática ensinada hoje, seja na educa-ção básica ou no ensino superior, já não pode ser apresentada de maneira isolada com relação às demais disciplinas presentes no processo educacional e nem pode estar acomodada com as questões que envolvem o ambiente relacionado, embora seja comum encontrar professores que ainda trabalham dessa for-ma. E quando o aluno, por sua vez, passa a se preocupar apenas com o atual conteúdo abordado, deixando de lado os demais assuntos já estudados até então, pode provocar a fragmentação do conhecimento e o “isolamento” da Matemática como disci-plina e, por consequência, o desinteresse do estudante por esta. Segundo Sampaio & Silva (2012, p. 7), trabalhar disciplinas de forma interdisciplinar é muito importante e, ainda,

Esta integralização de disciplinas é fun-damental para o desenvolvimento cog-nitivo dos discentes, fazer relação com outras ciências e com o cotidiano cha-

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ma a atenção deles, traz interesse e, com o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) como principal porta de en-trada para o ensino superior, torna-os mais aptos a passar num vestibular.

Importante ressaltar que a interdisciplinaridade pode ser considerada como uma forma de integração da Matemáti-ca como linguagem, onde essa serve as demais áreas como fer-ramenta. Portanto, a interdisciplinaridade contribui de modo a despertar no aluno o interesse por esta, cabendo ao professor procurar caminhos novos e melhores para concretizar o co-nhecimento, de maneira responsável e conjunta.

Geometria Esférica: possibilidades na educação básica A Geometria Esférica aparece de forma implícita no

Ensino Básico e em diversas situações do cotidiano. Quando o Globo Terrestre é apresentado em uma aula de Geografia, sua forma esférica e os padrões de linhas e ângulos parecem ne-cessitar de uma compreensão além da Geometria Euclidiana: a Geometria Esférica. Aplicativos para smartphones e tablets, automóveis e até relógios fazem uso do Sistema de Posiciona-mento Global (ou Global Positioning System – GPS), que se baseia na Geometria Esférica.

Vê-se, então, um entrelaçamento entre a Matemática e a Geografia. Isso sugere que promover o conhecimento mate-mático de maneira contextualizada e interdisciplinar associado a outras áreas, em nível escolar ou superior, pode proporcionar resultados satisfatórios, como será visto através dos relatos de alguns autores a seguir.

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Alves (2004) estudou a esfera e seus elementos, asso-ciando-a com o Globo Terrestre. Abordou, em sua atividade, tópicos como “A Superfície Esférica e seus Elementos”, “As Coordenadas Geográficas”, “Os Fusos Horários”, “A Superfí-cie Esférica em Coordenadas Cartesianas”, “A Matemática do GPS” e “A Distância numa Superfície Esférica”.

Conceitos geográficos como paralelos, meridianos, latitudes, longitudes e fu-sos horários estão baseados em impor-tantes ideias geométricas que, quando trabalhadas neste contexto, conduzem o aluno a uma melhor compreensão e aprendizagem do tema. (ALVES, 2004, p. 1)

Prestes (2006) elaborou seu trabalho a partir de uma sequência de ensino com questões relacionando elementos de Geometria Esférica com conceitos utilizados para o estudo do Globo Terrestre. Para isso, utilizou a metodologia da Engenha-ria Didática, embasada em conceitos das teorias de Vergnaud e Vygotsky, buscando responder a questão “Uma Introdução à Geometria Esférica pode favorecer o estudo da Geografia do Globo Terrestre e em particular o estudo de mapas?”.

A sequência de ensino teve como sujeitos alunos da 8a. série do Ensino Fundamental, com a autora finalizando seu trabalho dizendo:

[...] pode-se concluir que um traba-lho com a Geometria Esférica, tal como foi proposto neste estudo, em face dos resultados verificados duran-

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te o desenvolvimento da sequência de ensino, contribui para o processo de compreensão de conteúdos específicos de Geografia, em especial, o estudo do Globo Terrestre e dos mapas. (PRES-TES, 2006, p. 153)

Mesmo ausente neste nível de ensino, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) para o Ensino Fundamental sugerem a importância da Geometria não Euclidiana, dizendo:

Fruto da criação e invenção humanas, a Matemática não evoluiu de forma linear e logicamente organizada. De-senvolveu-se com movimentos de idas e vindas, com rupturas de paradigmas. Frequentemente um conhecimento foi amplamente utilizado na ciência ou na tecnologia antes de ser incorpora-do a um dos sistemas lógicos formais do corpo da Matemática. Exemplos desse fato podem ser encontrados no surgimento dos números negativos, ir-racionais e imaginários. Uma instância importante de mudança de paradigma ocorreu quando se superou a visão de uma única geometria do real, a geome-tria euclidiana, para aceitação de uma pluralidade de modelos geométricos, logicamente consistentes, que podem modelar a realidade do espaço físico. (BRASIL, 1998, p. 25, grifo nosso)

Brum & Schuhmacher (2013a) afirmam que nas duas últimas décadas houve grande preocupação por parte de membros de associações de profissionais de Matemática para

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incluir conteúdos de Geometria não Euclidiana, como a Geo-metria Esférica, já mesmo nas escolas, considerados adequa-dos à formação de estudantes em consequência dos avanços teóricos da Matemática e Computação.

Segundo estes pesquisadores, a partir dessa preocupa-ção surgiram questões como:

• O ensino da Geometria não Euclidiana é um tema distante da realidade dos estudantes?;

• O modelo geométrico para representar o planeta Terra abordado nas aulas de Geografia e Matemá-tica é um plano, uma folha retangular ou uma su-perfície quase esférica?;

• Se um dos pontos de discussão é a reformulação do ensino no Brasil, por quê as Geometrias não Euclidianas ainda não são consideradas um ramo importante da Matemática por parte dos profes-sores?;

• Será que o ensino de Geometrias não Euclidianas, como a Esférica e Hiperbólica, vem causando in-quietações em professores de Matemática por ser um assunto novo e ainda desconhecido?

Estes autores ressaltam a importância de se explorar Geometria não Euclidiana, em nível escolar, inclusive emba-sados em passagens dos PCN de Matemática. Salientam que entre os objetivos do ensino de Matemática, encontra-se o de-senvolvimento do pensamento geométrico, com a recomen-dação de se explorar situações de aprendizagem que levem o estudante a resolver situações problema de localização e des-

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locamento de pontos e espaço, ler mapas, estimar e comparar distâncias. Ainda, esclarecem que para estabelecer diferenças entre objetos geométricos, conforme orienta os PCN, é pre-ciso identificar uma pluralidade de modelos geométricos na natureza, o que pode ser feito através do estudo das navega-ções com uso do sistema de localização por GPS nas aulas de Geografia, por exemplo.

Finalizando seu trabalho, Brum & Schuhmacher (2013a) questionam “Como explorar os conceitos de Geometria Esférica e Hiperbólica no Ensino Médio, a fim de desenvolver a compreensão nos estudantes para a pluralidade de modelos geomé-tricos no espaço em que vivem?”.

Buscando responder esta pergunta, adotaram como recurso a composição de uma sequência didática abordando temas de Geometria Esférica e Hiperbólica, aplicada a uma turma de 2o ano do Ensino Médio. Em algumas das atividades propostas os autores utilizaram temas relacionados à Geografia como “distâncias entre os polos Norte e Sul”, “Meridianos”, “Latitude e Longitude” para a cristalização do conhecimen-to geométrico. Assim, os autores acreditam que contribuíram com estratégias didáticas, objetivando o processo de ensino e aprendizagem dessas Geometrias.

Em outro trabalho, Brum & Schuhmacher (2013b) apresentam um relato de experiência também com alunos do 2o ano do Ensino Médio no qual sinalizaram que a assimilação de conteúdos de Geometria Esférica fora facilitada devido ao uso de metodologia que seguia os princípios da Engenharia Didática.

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A sequência didática buscou contribuir junto aos estudantes para a percepção da existência de problemas que neces-sitam ser tratados por conhecimentos da Geometria Esférica, descartando as noções comuns da Geometria Eucli-diana (BRUM & SCHUHMACHER, 2013b, p. 77)

Em uma das atividades propostas pelos autores, a qual implicou em variáveis didáticas tais como noção de reta e relação entre distância percorrida e o formato do trajeto, na análise de um tipo de resposta dada pelos estudantes eles con-cluíram:

É possível que a escolha por esta so-lução esteja condicionada à obrigato-riedade dos estudantes encontrarem geralmente uma resposta característica do ensino de Matemática, e também por desconsiderarem as noções de pon-tos cardeais, conteúdos trabalhados no ensino de Geografia desde o nível fun-damental. (BRUM & SCHUHMA-CHER, 2013b, p. 72)

Segundo os autores, os resultados do trabalho apontam uma facilitação na compreensão de conceitos de Geometria Esférica por parte dos estudantes, permitindo o desenvolvi-mento de competências para sua utilização nos problemas do cotidiano, sem desconsiderar, dito pelos mesmos, que ainda há a necessidade de aprofundamento das questões por eles le-vantadas.

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Em outro trabalho, Dueli (2013) elaborou uma se-quência de atividades interdisciplinares entre Matemática e Geografia no intuito de contribuir com o processo de ensino e aprendizagem da Geometria Esférica para alunos do 1o ano do Ensino Médio.

Uma das estratégias do autor foi utilizar materiais ma-nipuláveis pelos os alunos:

Ao trabalharem com materiais mani-puláveis, como o globo terrestre e o mapa-mundi, verificou-se uma maior assimilação dos conteúdos envolven-do a Geografia e uma maior facilidade nos cálculos matemáticos envolvidos. (DUELI, 2013, p. 93)

Dueli (2013) conclui que, ao se articular teoria e práti-ca, embasado na Engenharia Didática, foi possível atingir seus objetivos, pois com a viabilidade de inter-relacionar a Mate-mática com a Geografia e a História, atestou-se que é interes-sante trabalhar conceitos elementares de Geometria Esférica numa proposta interdisciplinar e contextualizada.

Mesmo a Geometria Esférica estando ausente no En-sino Médio, percebe-se nos PCN-Ensino Médio, o quanto é dada importância à Matemática e às inter-relações que a mes-ma pode tomar, inclusive com a Geografia:

No Ensino Médio, quando nas ciências torna-se essencial uma construção abs-trata mais elaborada, os instrumentos matemáticos são especialmente impor-tantes. Mas não é só nesse sentido que

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a Matemática é fundamental. Possivel-mente, não existe nenhuma atividade na vida contemporânea, da música à informática, do comércio à meteoro-logia, da medicina à cartografia, das engenharias às comunicações, em que a Matemática não compareça de maneira insubstituível para codificar, ordenar, quantificar e interpretar compassos, taxas, dosagens, coordenadas, tensões, frequências e quantas outras variáveis houver. (BRASIL, 2000, parte III, p. 9, grifo nosso)

Noel Filho (2012) realizou um desenvolvimento his-tórico evidenciando as relações entre a Cartografia e a Mate-mática, mais especificamente a Geometria Diferencial. Tratou questões de como na antiguidade os gregos construíram os primeiros fundamentos da Geografia (a esfericidade da Terra, seus polos, equador e trópicos, sistema de latitude e longi-tude), passando pelo Renascimento com a contribuição de cartógrafos e matemáticos tais como Pedro Nunes, Gerard Mercator e Edward Wright. Ainda, descreve a Matemática nas contribuições cartográficas de autores estudados e finaliza apontando fatos que evidenciam que trabalhos cartográficos marcam o nascimento da Geometria Diferencial como área autônoma.

Devido aos resultados positivos apontados por Noel Filho (2012) e Dueli (2013) que sinalizam favoravelmente quanto a inter-relação da Matemática inclusive com Histó-ria/História da Matemática, considera-se relevante, em nível superior, citar Pereira (2013), que faz algumas considerações acerca da Trigonometria Esférica no Brasil, afirmando que já

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no início do século XIX esse assunto fazia parte do currículo da Academia Real Militar e que neste mesmo século ela estava também no currículo do Colégio Dom Pedro II como parte inicial do estudo de Astronomia.

Pereira (2013) acredita que a Trigonometria Esférica está perdendo espaço no ensino de Matemática, pois, atual-mente, ela está presente no ensino superior fundamentalmen-te em cursos técnicos ou de engenharia. Em cursos de bacha-relado em matemática, este assunto é visto na disciplina de Geometria não Euclidiana.

A autora relata, ainda, que uma pesquisa feita em 2005 apontou apenas 5 (cinco) de 47 (quarenta e sete) Instituições de Ensino Superior abordando a temática.

Por fim, sugere atrelar Trigonometria Esférica com História da Matemática, propondo que isto seja feito através de cursos de extensão universitária, oficinas, seminários temá-ticos ou mesmos workshops.

O Software RDe acordo com o seu próprio website, o Software R é

uma linguagem e ambiente para computação estatística e grá-ficos (www.r-project.org). Porém, em Cordeiro, Sousa & Silva (2011) é dito que a gama de áreas que o R aborda atualmente ultrapassou e muito o escopo da Estatística. Hoje, pode-se tra-balhar dentre outras áreas, Ecologia, Matemática e Geografia, sendo estes dois últimos campos explorados neste trabalho.

Atualmente o R está na versão 3.1.3 (de março de 2015) e vale observar que:

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• É um software absolutamente gratuito e de livre distribuição;

• É usado nas plataformas Windows, Linux e Ma-cintosh;

• A sua implementação pode ser estendida através de pacotes adicionais que são continuamente dis-ponibilizados por colaboradores do mundo intei-ro;

• É permitida a criação e modificação de funções;

• Engloba várias áreas de conhecimento, como Es-tatística, Matemática, Economia, Geografia, etc.;

• Há um vasto conteúdo em manuais oficias e gra-tuitos.

Conforme Cordeiro, Sousa & Silva (2011) um dos grandes objetivos ao utilizar o R em Matemática é o de gastar o menor tempo possível com tecnicidades e direcionar o seu uso para os conceitos abordados em sala de aula, com uma aplicação dentro do planejamento do professor, na criação de exercícios dinâmicos e diferenciados.

Assim, pretende-se apresentar aqui o Software R como uma ferramenta didática eficiente no auxílio do ensino inter-disciplinar de conteúdos relevantes da Matemática, especifica-mente apoiados com temas da Geografia.

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Figura 1 – Tela inicial do R.Fonte: Elaborada pelos autores.

O pacote GeosphereO pacote Geosphere foi criado para implementar fun-

ções de Trigonometria Esférica para aplicações geográficas. Atualmente ele se encontra na versão 1.3-13, de abril de 2015. Neste package há quase 40 (quarenta) funções disponíveis. Dentre elas:

1. antipode – Determina uma antípoda ou verifica se dois pontos são antípodas.

2. areaPolygon - Calcula a área de um polígono em uma esfera.

3. centroid - Calcula o centroide de polígonos esfé-ricos.

4. distCosine – Calcula a menor distância entre dois pontos (ou seja, a ‘distância-grande-círculo’ ou ‘em

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linha reta’) de acordo com a Lei dos cossenos em sua versão esférica.

5. gcIntermediate – Determina, sobre um grande círculo, pontos intermediários, entre dois pontos quando estes determinam o grande círculo.

6. gcIntersect – Calcula os dois pontos onde dois Grandes Círculos se interceptam.

7. gcLat – Mostra a latitude em que um grande cír-culo atravessa/passa uma longitude.

8. gcLon – Mostra as longitudes em que um grande círculo atravessa/passa uma latitude (paralelo).

9. makePoly - Faz um polígono ou linha adicionando pontos intermediários (vértices) sobre os grandes círculos entre os pontos fornecidos.

10. mercator - Transforma pontos definidos por longi-tude/latitude em pontos na Projeção de Mercator.

11. onGreatCircle - Testa se um ponto está em um grande círculo definido por dois outros pontos.

12. perimeter - Calcula o perímetro de um polígono (ou o comprimento de uma linha) em uma esfera.

Um recurso muito interessante e útil disponibilizado pelo Geosphere é a facilidade em se desenhar o Mapa Mundi. Isso possibilita ilustrar e contextualizar, sobremaneira, várias situações práticas ao se empregar Geometria Esférica.

Dentro ainda deste pacote, podem ser trabalhados os seguintes assuntos: cálculo da duração do dia em uma deter-minada latitude, cálculo da menor distância entre dois pontos

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considerando o método de Meeus (a Terra é considerada um elipsoide e não uma esfera), projeção de Mercator; cálculo da direção, em graus, saindo de um ponto a outro ao longo de um Grande Círculo, dentre outras.

A interdisciplinaridade Matemática/Geografia com o recurso do Software R

Ensinar Matemática através do Software R pode ser bas-tante eficiente para o desenvolvimento da aprendizagem, bem como algumas vantagens podem ser enumeradas: a elevação do nível de aprendizagem (uma melhor visão de conteúdos abstratos), a junção entre conhecimento e uso da tecnologia e a relação entre conteúdo e prática. Desta forma, apresenta-se a seguir o Software R através dos recursos do package Geosphere, na solução e/ou abordagem de alguns problemas/questões que envolvem conceitos de Geografia e Matemática. Será mostra-da a potencialidade do R/Geosphere tanto para questões con-textualizadas em nível escolar básico quanto em nível superior.

Alves (2004, p. 1) afirma:

A utilização do globo terrestre, com suas consequentes questões envolven-do, por exemplo, cálculo de distância e ângulos sobre a esfera, ou ainda, a con-fecção de mapas por meio de diversas projeções, abre caminho para um inte-ressante trabalho interdisciplinar entre a Matemática e a Geografia.

As motivações/exemplos aqui apresentados dão conti-nuidade/aprimoramento aos trabalhos de Sales et al. (2013)

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e Santos et al. (2013), que germinaram nos Laboratórios do Curso de Licenciatura em Matemática da Universidade Esta-dual Vale do Acaraú.

Há questões extraídas de trabalhos de Brum & Schuhmacher (2013b), de vestibulares, do ENEM e, em al-gumas outras situações, adaptações são utilizadas para uma melhor conexão da abordagem de conceitos de Matemática com a Geografia.

Observem-se os seis exemplos a seguir.

Exemplo 1 – Este exemplo foi extraído de Brum & Schuhmacher (2013b) como parte da montagem da sequência didática para o ensino de Geometria Esférica (adaptado por questões didáticas):

O piloto de um avião comercial avisa a seus passageiros que sairá de São Paulo com destino a New York às 14 h e que o tempo de duração da viagem está estimado em 6 horas, com o trajeto incli-nado à direita. O copiloto se aproveita da situação e comenta com o piloto, sem saber que seu microfone está aberto, que irão fazer uma trajetória retilínea, mostrando, assim, o caminho utilizado a todos os passageiros.

(a) Você concorda ou discorda do copiloto? ________________

Explique, embasando seus argumentos em algum comentário ou cálculo matemático, que exemplifique a posição assumida por você.

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Nesta atividade os autores identificaram estratégias utilizadas pelos estudantes na resolução tais como tentativa e erro, ensaio de várias possibilidades para a busca de possíveis trajetórias utilizando representações simbólicas e textuais, e a utilização do conceito de geodésica (que são as curvas que mi-nimizam distância na superfície considerada) para compreen-são da trajetória formada pelo avião.

Figura 2 – Concepção apresentada por um estudante sobre a atividade descrita no exemplo 1 em Brum & Schuhmacher (2013b).Fonte: Brum & Schuhmacher (2013b).

Resultados interessantes foram revelados por Brum & Schuhmacher (2013b), como por exemplo, 21,42% dos estudantes que realizaram tal atividade compreenderam que o avião chegaria sem problemas ao destino caso a trajetória fosse uma reta (Figura 2). Outros 21,42%, responderam que

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o avião chegaria ao destino caso sua trajetória fosse constituída por curvas.

Com o auxílio do R, o professor poderia enriquecer a experiência mostrando a solução sugerida pelo estudante e a correta trajetória descrita pelo avião, para análise e discussão das estratégias de pensamento/desenvolvimento, bem como abordar a diferença entre as geodésicas do plano e da esfera. Para ilustrar, foram consideradas as coordenadas - latitude e longitude - das cidades de São Paulo e New York e com o uso do package Geosphere, reproduz-se uma parte do Mapa Mundi que as contém, com a localização de cada uma delas indicada por asteriscos, conforme a Figura 3.

Figura 3 – Trajetórias plana e esférica – atividade em Brum & Schuhmacher (2013b).Fonte: Elaborada pelos autores.

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Exemplo 2 – Nesta questão pode ser explorado um conceito bem simples que é o perímetro de um polígono, es-pecificamente o de um triângulo. Contudo, o contexto impli-ca em um assunto mais elaborado: o perímetro de um polígo-no sobre uma esfera:

Suponha que uma pessoa saia da cidade de São Francisco, nos Estados Unidos, com destino a São Paulo, no Brasil, e em seguida siga para Berlim, na Alemanha, de onde retorna para São Fran-cisco. Pergunta-se, qual foi a distância percorrida por esta pessoa?

Para perceber a diferença entre polígonos planos e es-féricos, são consideradas as coordenadas de três cidades: São Francisco, São Paulo e Berlim. Novamente reproduz-se par-te do Mapa Mundi, e as cidades são indicadas por asteriscos, como mostra a Figura 4.

Figura 4 – Exemplo de triângulo plano e esférico.Fonte: Elaborada pelos autores.

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Considerando que estas cidades estão situadas numa superfície esférica e que as coordenadas das mesmas são vér-tices do triângulo esférico resultante da ligação desses vértices por geodésicas (círculos máximos da esfera, isto é, círculos cujos centros coincidem com o centro da esfera) tem-se o po-lígono esférico delimitado pela linha cheia na Figura 4. Se, por outro lado, considerássemos o triângulo sobre uma superfície plana, teríamos o polígono representado pela linha tracejada, também chamada de Projeção de Mercator, cuja a ideia de sua elaboração até pode ser repassada para alunos do ensino básico, sem as tecnicidades inerentes a mesma.

Neste momento, podem-se explorar conceitos como vértices, lados e ângulos de polígonos sobre um plano ou sobre uma esfera. Também pode-se trabalhar intuitivamente ques-tões relacionadas a aproximação, uma vez que a Figura 4 su-gere uma diferença de perímetros considerando-se o triângulo plano e o esférico. A partir daí, tópicos como Lei dos Senos e Lei dos Cossenos, tanto no plano quanto na esfera, podem ser discutidos.

Voltando à distância percorrida, basta usar o comando perimeter do package Geosphere, como mostrado abaixo, e o perímetro do triângulo esférico será calculado.

>sf=c(-122.42,37.78); sp=c(-46.64,-23.55); be=c(13.39,52.52)

>pol=(rbind(sf,sp,be,sf ))

>perimeter(pol)

[1] 29823313

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São fornecidas as coordenadas geográficas das cidades e informado que tais pontos são vértices de um polígono. A resposta é o perímetro do triângulo esférico dado em metros, que corresponde a aproximadamente 29.823,31 km.

Aqui cabem algumas ressalvas, as quais são: no R o sím-bolo de separação da parte inteira da não inteira dos números é o ponto e não a vírgula; as localizações no package Geosphe-re devem ser especificadas através de latitude e longitude, em graus e nessa ordem; as localizações em graus são em notação decimal; as coordenadas de pontos nos hemisférios Sul (abaixo do equador) e Ocidental (à esquerda de Greenwich) têm sinais negativos.

Já o triângulo plano, isto é, o polígono obtido a partir da transformação de cada uma das localizações geográficas das cidades (através da longitude e latitude) para pontos da Projeção de Mercator, tem perímetro de 38.111,94 km. Por exemplo, a transformação da localização geográfica da cidade de São Paulo para a Projeção de Mercator é:

>mercator(sp)

x y

[1,] -5191941 -2698669

Exemplo 3 – Neste problema explora-se a área de triângulos planos e esféricos:

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Dado o exemplo anterior, considerando que as coordenadas geo-gráficas de cada um dos três lugares, São Francisco, São Paulo e Berlim, são vértices de um triângulo esférico, calcule a área do mesmo.

Para tal cálculo, basta usar o comando areaPolygon:

>areaPolygon(pol)

[1] 6.193994e+13

e 6,193994 x 1013

km2 é a área procurada.

Novamente, pode-se buscar o paralelo entre triângulos planos (usando a Fórmula de Heron) e esféricos, levando os alunos a refletirem sobre a diferença que seria observada nas áreas.

Exemplo 4 – Esta é uma adaptação de uma questão do vestibular de 2004-Verão da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Foram substituídos os valo-res de longitude 150 por 70. Nota-se, sem dificuldades, que a mesma tem o objetivo de abordar conhecimentos acerca de Latitude e Longitude, bem como de localização geográfica no Globo. Entretanto, pode-se ir além da Geometria Euclidiana trabalhando-se o comprimento de um segmento de curva que liga dois pontos sobre uma superfície esférica:

Se duas cidades, A e B, estiverem sobre a Linha do Equador, nas longitudes 70 Oeste e 70 Leste, elas terão, em relação a outras duas cidades, C e D, localizadas nas mesmas longitudes, porém sobre o Círculo Polar Ártico.

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A) a mesma distância em metros, pois as latitudes são iguais.

B) a distância, em metros, maior, pois os meridianos convergem para os pólos.

C) a distância, em graus, diferente, pois nos polos não há paralelos.

D) a distância, em metros, menor, pois a Terra é achatada ao longo da linha do Equador.

E) a distância, em graus, diferente, pois as longitudes são as mes-mas

O Mapa Mundi é utilizado agora completo (Figura 5) para ilustrar a situação, mostrando o posicionamento das quatro cidades. A menor distância entre as cidades A e B é indicada pela linha contínua, uma vez que ambas estão situa-das no Equador (paralelo de latitude 0). Já a menor distância entre as cidades C e D – que estão sobre o paralelo de latitude 66°33’44’’ – é indicada através da linha contínua que as liga, que é a forma planificada sobre o mapa Mundi de um grande círculo do Globo terrestre contendo as cidades C e D. Utili-zando o comando distCosine, que calcula a menor distância entre dois pontos num Grande Círculo, tem-se, em metros:

> a=c(-70,0); b=c(70,0); c=c(-70, 66.56); d=c(70, 66.56)

> distCosine(a,b)

[1] 15584729

> distCosine(c,d)

[1] 4886948

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Assim, vê-se que a distância entre as cidades A e B – que estão no Equador – é maior que a distância entre as cida-des C e D, embora as coordenadas geográficas pareçam dizer que a distância entre A e B e a distância entre C e D, em graus, são iguais.

Figura 5 – Esboço da situação descrita no Exemplo 4.Fonte: Elaborada pelos autores.

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Exemplo 5 – Aqui o software R pode auxiliar os estu-dantes numa melhor visão espacial, visto que o mapa, planifi-cação aproximada, restringe essa noção:

Duas pessoas encontram-se em um aeroporto na cidade de São Paulo cujas coordenadas são -23,55° de latitude e -46,64° de longitude. Uma pega um avião que passará pela cidade de São Francisco nos Estados Unidos, cujas coordenadas são 37,78° de latitude e -122,42° de longitude. A outra pessoa pega um avião que passará pela cidade de Berlim, na Alemanha, cujas coordena-das são 52,52° de latitude e 13,39° de longitude. Supondo que os aviões seguirão sempre a mesma direção e que ambos pousaram em um mesmo aeroporto (sabendo que este não é o aeroporto de partida), calcule as coordenadas geográficas deste aeroporto.

Mais uma vez o Mapa Mundi é usado para posicionar as cidades em questão: São Paulo (SP), São Francisco (SF) e Berlim (BE). Através do comando greatCircleBearing, cons-trói-se o Grande Círculo tracejado que contém as cidades de São Paulo e São Francisco e o Grande Círculo pontilhado ao qual as cidades de São Paulo e Berlim são pertencentes (obvia-mente por se tratar de uma planificação, não vemos, de fato, círculos). Visualmente percebe-se a intersecção desses dois grandes círculos na região asiática, perto do Japão, indicado por um asterisco (Figura 6). Através do comando gcIntersect com parâmetros dados pelas coordenadas geográficas das ci-dades, calculam-se as coordenadas dos dois pontos onde os grandes círculos se interceptam:

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Figura 6 – Um exemplo de intersecção de Grandes CírculosFonte: Elaborada pelos autores.

> gcIntersect(c(-46.64,-23.55),c(-122.42,37.78),c(-46.64,-23.55),c(13.39,52.52))

lon1 lat1 lon2 lat2

[1,] -46.64 -23.55 133.36 23.55

Assim, as coordenadas do aeroporto serão 23,55° de latitude e 133,36° de longitude (as primeiras coordenadas são relativas à cidade de São Paulo, ponto de partida).

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Exemplo 6 – Questão do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) 2008 com o qual pode-se trabalhar o con-ceito de programação de função no R. Atividade voltada para alunos do ensino superior:

O sistema de fusos horários foi proposto na Conferência Interna-cional do Meridiano, realizada em Washington, em 1884. Cada fuso corresponde a uma faixa de 15º entre dois meridianos. O me-ridiano de Greenwich foi escolhido para ser a linha mediana do fuso zero. Passando-se um meridiano pela linha mediana de cada fuso, enumeram-se 12 fusos para leste e 12 fusos para oeste do fuso zero, obtendo-se, assim, os 24 fusos e o sistema de zonas de horas. Para cada fuso a leste do fuso zero, soma-se 1 hora, e, para cada fuso a oeste do fuso zero, subtrai-se 1 hora. A partir da Lei n.° 11.662/2008, o Brasil, que fica a oeste de Greenwich e tinha qua-tro fusos, passa a ter somente 3 fusos horários. Em relação ao fuso zero, o Brasil abrange os fusos 2, 3 e 4. Por exemplo, Fernando de Noronha está no fuso 2, o estado do Amapá está no fuso 3 e o Acre, no fuso 4. A cidade de Pequim, que sediou os XXIX Jogos Olímpi-cos de Verão, fica a leste de Greenwich, no fuso 8. Considerando-se que a cerimônia de abertura dos jogos tenha ocorrido às 20h 8 min, no horário de Pequim, do dia 8 de agosto de 2008, a que ho-ras os brasileiros que moram no estado do Amapá devem ter ligado seus televisores para assistir ao início da cerimônia de abertura?

Aqui foi utilizada como estratégia principal a criação de um algoritmo com a linguagem do R, para resolver pro-blemas, ou seja, teve-se o propósito de estimular o raciocínio lógico do estudante e ao mesmo tempo aproximá-lo de uma “linguagem de programação”, até mesmo porque a linguagem do R se assemelha às linguagens C e C++.

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Criou-se a função fuso, que com o uso do package Geosphere, desenha o Mapa Mundi, faz as marcações dos me-ridianos respeitando a Conferência Internacional do Meridia-no, plota dois pontos referentes a duas localizações distintas (duas cidades, por exemplo), bem como calcula a diferença de horas entre estes dois locais. Esta função está mostrada abaixo:

fuso=function(lat1,lon1,lat2,lon2){library(geosphere)data(wrld)temp1=matrix(seq(7.5,180,by=15),nrow=12,ncol=1)temp2=matrix(seq(-7.5,-180,by=-15),nrow=12,ncol=1)temp3=matrix(rep(90,12),nrow=12,ncol=1)temp4=matrix(rep(-90,12),nrow=12,ncol=1)grafico=plot(wrld, type=”l”,col=”grey”)green=c(0,90)green_neg=c(0,-90)gci= gcIntermediate(green,green_neg)lines(gci,col=”grey”)k=as.integer(abs(lat1-lat2)/15)for(i in 1:12){points(temp1[i,],temp3[i,],pch=3)points(temp1[i,],temp4[i,],pch=3)gci= gcIntermediate(c(temp1[i,],temp3[i,]), c(temp1[i,],tem-p4[i,]))

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lines(gci,col=”grey”)points(temp2[i,],temp3[i,],pch=3)points(temp2[i,],temp4[i,],pch=3)gci= gcIntermediate(c(temp2[i,],temp3[i,]), c(temp2[i,],tem-p4[i,]))lines(gci,col=”grey”)}points(lat1,lon1,pch=8,cex=1.1)points(lat2,lon2,pch=8, cex=1.1)return(k)}

Utilizando a função acima com as coordenadas apro-ximadas das cidades, tem-se Pequim com latitude de 116,39 leste e longitude 39,91 norte. Já Macapá (resolveu-se tomá-la como referência por ser a capital do Amapá) tem latitude -51,07 oeste e longitude 0,04 norte. Alimentando a função fuso com estas informações tem-se:

>fuso(116.39,39.91,-51.07,.04)[1] 11

Bem como a confecção da Figura 7 abaixo:

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Figura 7 – Criação dos fusos horários através de algoritmo.Fonte: Elaborada pelos autores.

Além de ser verificada a ilustração através do mapa para a resolução do problema proposto, no prompt de comando do R vê-se a resposta, isto é, uma diferença de 11 horas entre as duas cidades. Desta forma, como Pequim está mais ao leste que a cidade de Macapá, aquela está 11 horas à frente, ou seja, no Amapá, os televisores devem ter sidos ligados às 9h 8min, do dia 8 de agosto de 2008.

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Considerações FinaisNão é difícil encontrar na docência de Matemática,

em nível básico e superior, a pura tecnicidade muito presente e uma pequena preocupação do professor em aprimorar sua prática docente para que ela fique mais acessível aos estudan-tes. A interdisciplinaridade parece um caminho bom a ser tri-lhado para minimizar esta problemática.

Assim, entendendo que as metodologias de ensino vol-tadas para o ensino superior não diferem em muito, em vários aspectos, daquelas voltadas para o ensino médio, ainda que re-conhecendo a diferença entre disciplina científica e disciplina escolar e, consequentemente, a Interdisciplinaridade científica e Interdisciplinaridade escolar, conforme Furlanetto (2014), acredita-se que se há um pouco de dedicação e interesse é pos-sível construir metodologias, independentemente do nível de ensino, que capturem e despertem a atenção e o prazer em aprender.

Como visto neste trabalho, há uma preocupação, re-lativamente recente, em incentivar/resgatar o ensino de Geo-metria Esférica nos ensinos básico e superior. Vários trabalhos estão surgindo neste sentido, produções de mestrado, douto-rado, artigos, etc. Fundamentalmente o que fora visto é que esta associação é feita de forma “direta”, do diálogo entre Ma-temática e Geografia, mas também há relatos positivos e exito-sos do diálogo da Geometria Esférica com História e História da Matemática.

Buscou-se mostrar aqui, também, que um suporte tec-nológico de alta qualidade, neste caso o Software R, pode ser um bom recurso e um facilitador para a concretização de uma

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proposta interdisciplinar, traçando um caminho eficaz que pode auxiliar o professor a desenvolver sua prática docente de forma mais eficiente e enriquecedora.

É possível ensinar Matemática de forma interdisciplinar com outras áreas (mais especificamente, com a Geografia) e, com o auxílio do Software R, essa proposta não só é viável, como também pode ser uma atividade bastante prazerosa e que permita aprimoramento da prática do professor, no âmbito da Educação Matemática.

Enfim, pode-se então concluir neste trabalho que a se-leção adequada de temas de Geometria Esférica imersos em situações práticas e vivenciadas em Geografia, fundamental-mente, com suporte do Software R, criam um ambiente favo-rável para o ensino de matemática, dando a oportunidade de se aprender interagindo e refletindo, evitando uma aprendiza-gem mecânica, repetitiva, sem saber o quê e o porquê se está fazendo.

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CAPÍTULO 02

A GEOMETRIA DO COMPASSO DE MASCHERONI VIA ATIVIDADES COM

SOFTWARE DE MATEMÁTICA DINÂMICA

Giselle Costa de SousaJosé Damião Souza de Oliveira

Introdução: Apresentação, problemática e referencial

teóricoTransitando entre tendências da Educação Matemáti-

ca, o uso pedagógico da História da Matemática e o uso de TIC1, e pautando no processo de Investigação Matemática2 apresentado por Ponte, Brocardo e Oliveira (2009), o presente capítulo é dividido em uma apresentação da 1) problemática e referencial teórico seguida do anúncio do resto do texto; e ain-da da exposição do 2) contexto histórico; do item que aborda os 3) blocos de atividades e; por fim, algumas 4) recomenda-ções e notas informativas.

O uso da História da Matemática em sala de aula é defendido e difundido por pesquisadores da Educação Mate-

1 Tecnologia da Informação e Comunicação.2 Em nosso trabalho utilizamos a Investigação Matemática como metodologia, seguindo os seguintes momentos de realização: exploração e formulação de questões; conjecturas; testes e reformulação; e justificativas e avaliação. (PONTE; BROCARDO; OLIVEIRA, 2009).

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mática que a apoiam e a teorizam como uma fonte de recur-sos didáticos para o ensino, para Miguel e Miorim (2008), a história pode atuar como um elemento que venha a propor-cionar uma aprendizagem significativa aos alunos, fornecendo métodos aos professores, de modo a levar os discentes a uma compreensão da matemática escolar de uma forma atrativa, com base em alguns episódios ou problemas matemáticos his-tóricos que venham a ser trabalhados em aulas. Aliada a este recurso trazemos a tendência de uso das TIC, que consiste de uma área da Educação Matemática que nas últimas déca-das vem possibilitando uma maior dinâmica nas aulas desta disciplina, pois traz em seu seio diversas mídias como softwa-res que nos propiciam utilizar atividades que permitem fazer uso do dinamismo e de outros recursos para estimularmos os alunos a realizarem investigações matemáticas em atividades que podem ser elaboradas tomando como fonte os problemas presentes na História da Matemática. A este respeito, Borba (2010) apresenta que:

Os softwares educacionais têm a capa-cidade de realçar o componente visual da matemática atribuindo um papel importante à visualização na educação matemática, pois ela alcança uma nova dimensão se for considerado o ambien-te de aprendizagem com computadores como um particular coletivo pensante [...] (BORBA, 2010, p. 03, grifo do autor).

Além disso, processo da Investigação Matemática pro-posto por Ponte, Brocardo e Oliveira (2005, p. 13) a define

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como sendo a descoberta de “[...] relações entre objetos mate-máticos conhecidos ou desconhecidos, procurando identificar as respectivas propriedades [...]”. Nesta perspectiva, defende-mos uso de atividades pautadas na História da Matemática via TIC e Investigação Matemática.

Com base nestes argumentos e a fim de melhor com-preender aspectos da Geometria, particularmente de constru-ções geométricas, esse capítulo traz dois blocos de atividades – com apoio do software de matemática dinâmica, GeoGebra – que abordam o ensino da Geometria. Em tais atividades trabalhamos problemas de construções geométricas apresen-tados na obra A Geometria do Compasso de Lorenzo Masche-roni (1750 – 1800). O objetivo desses blocos é apresentar a Geometria Euclidiana envolta por problemas históricos rela-cionados às construções geométricas, que foram executadas por Mascheroni apenas com auxílio do compasso e aqui são abordados com o apoio do Software GeoGebra para potencia-lizar (melhor compreender) seu ensino e da própria Matemá-tica. Assim, as atividades do primeiro bloco (composto por 3 atividades) abordam conteúdos diversos, a saber: na primeira atividade, dentre os conceitos que podem ser tratados, pode-mos destacar o conceito de triângulo equilátero; já a segunda atividade contém passos e reflexões da construção realizada na primeira, podendo ser abordados os conteúdos de triângulo retângulo, teorema de Pitágoras, congruência e semelhança de triângulos. Nas atividades do segundo bloco (composto por 4 atividades), o professor poderá abordar, além dos conceitos citados anteriormente, as propriedades de círculo, circunfe-rência, arcos e corda.

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Ainda com relação aos blocos enfatizamos que o pri-meiro bloco possui duas atividades que abordam conheci-mentos básicos de Geometria que Mascheroni considera ne-cessários para um bom desenvolvimento dos estudantes que tenham interesse em caminhar dentro da Geometria do Com-passo. Assim, as atividades deste primeiro bloco servem para embasar os alunos dando o suporte necessário para um bom desempenho nas atividades dos blocos seguintes. O segundo bloco de atividades possui quatro atividades, referentes à divi-são da circunferência em partes iguais. A partir das divisões da circunferência em partes iguais, podemos construir polígonos e verificarmos em quais situações estes serão regulares ou não. Tais atividades são estruturadas com os seguintes itens: título, tipo de atividade, conhecimentos prévios, objetivos, procedi-mentos e reflexão. Estas são as características gerais das ativi-dades que compõem o produto educacional fruto da disserta-ção intitulada A Geometria do Compasso (1797) de Mascheroni (1750 – 1800) em atividade com o GeoGebra, além disso, en-fatizamos que há atividades deste produto em que nos depa-raremos com recortes históricos que surgem em momentos específicos (quando necessário) para que possamos fornecer subsídios aos discentes.

Isto posto ressaltamos que, para atingir os anseios al-mejados com a realização de atividades pautadas na História da Matemática com apoio computacional (TIC) via Investi-gação Matemática, é necessário mergulharmos e estudarmos a fundo a própria história e, por este motivo, segue a apresenta-ção do contexto histórico deste trabalho.

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Contexto histórico

Figura 1 – Lorenzo Mascheroni Fonte: Eves (2004, p. 589)

Lorenzo Mascheroni foi um matemático e poeta que nasceu em Castagenta, um vilarejo da cidade de Bérgamo, ao norte da península itálica, em 13 de Maio de 1750. Seus pais eram um jovem casal de fazendeiros, Maria Ceribelli e Paolo Mascheroni dell’Omo, que o levaram para estudar no seminá-rio de Bérgamo, no qual foi ordenado sacerdote aos 18 anos de idade. Em seguida passou a ensinar Retórica em uma das esco-las do mesmo seminário, no entanto, Mascheroni não ficaria preso a esta disciplina por muito tempo, pois por volta de seus 26 anos de idade destina-se a estudar as Ciências Exatas e Filosofia. Com suas publicações nesta área assume as cadei-ras de Lógica, Metafísica, Física, Matemática Elementar e em seguida a cadeira de Cálculo Diferencial e Integral no referido seminário. Posteriormente, o reconhecimento por suas pro-duções lhe concedeu uma cadeira na Universidade de Pavia, onde também lecionou Elementos de Álgebra e Geometria, sendo lhe acrescentado depois a cadeira de Matemática Apli-

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cada. Alguns anos mais tarde, em 1789, Mascheroni assume o cargo de reitor da Universidade de Pavia, onde permaneceu por dois mandatos. Com a invasão das tropas francesas à Itá-lia, Mascheroni teve a oportunidade de conhecer Bonaparte (1769 – 1821), que divulgou na França a obra de Mascheroni intitulada A Geometria do Compasso, dando bastante reconhe-cimento ao referido matemático e poeta. Vale ressaltar que suas obras literárias (poemas) também tiveram boas repercus-sões, tanto que podemos encontrar poemas de sua autoria em coleções de clássicos italianos do século XVIII.

No que se refere à obra A Geometria do Compasso escla-recemos que é composta por 12 livros e que foi publicada pela primeira vez por Mascheroni em 1797. No ano seguinte, foi traduzida para o francês por A. M. Carette, com uma segunda edição publicada em 1828, por A. M. Carette. No ano de 1901 veio a público uma segunda edição italiana, editada por Gaetano Fazzari3. Há também uma edição alemã, publicada em 1825, em Berlim, por A. M. Carette.

É válido destacar que, dentre as edições listadas ante-riormente, para o presente trabalho fizemos uso das edições italianas e da primeira edição francesa, pois, na primeira edição italiana tínhamos que as imagens das construções estavam com uma melhor qualidade, porém os textos escritos têm páginas cortadas, fato que nos impossibilitaria estudar corretamente os problemas, sendo solucionado com a segunda edição que, por este motivo, também foi usada. A primeira edição francesa foi usada para análise do prefácio e também para comparação dos problemas e demonstrações com as demais edições, de modo

3 Gaetano Fazzari foi professor de Matemática e passou maior parte de sua vida profissional lecionando no Liceu Umberto I (disponível em: http://www.tropeamagazine.it/gaetanofaz-zari/annuario.htm/).

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que pudéssemos verificar se existia alguma contradição entre elas e ainda para melhor compor nossas traduções.

A tese perseguida por Mascheroni na obra supracita-da é que toda construção geométrica euclidiana pode ser feita apenas com o auxílio do compasso ao invés da régua e com-passo, tendo em vista que os objetos a serem construídos po-dem, todos, serem reduzidos a pontos (obtidos pela interseção de arcos/aberturas de compassos). Neste sentido, Mascheroni define a Geometria do Compasso da seguinte forma: “Chamo Geometria do Compasso aquela que, através só do compasso, sem a régua, determina a posição dos pontos” (DELL’ OMO, 1901, p. 11, tradução nossa).

O uso exclusivo do compasso é proposto por tal autor em função de uma maior necessidade de precisão nas cons-truções, justificada pelo fato da régua ser menos precisa que o compasso euclidiano (que possui abertura fixa não sofrendo alterações ao ser manuseado). A este respeito Mascheroni diz:

Eu não direi aqui em detalhes as razões pelas quais a régua foi excluída disso, as razões serão facilmente conhecidas por aqueles que têm conhecimento em trabalhos desta mesma natureza. Para mencionar em geral as vantagens que o uso do compasso tem sobre a ré-gua quando se trata de uma descrição precisa de reta, que não deve temer o exame do microscópio, basta advertir que se tratando especialmente de uma régua o quanto longa se queira, é quase impossível que ela seja tão direta que

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garanta por todo o seu traçado da posi-ção ao longo de pontos que estão nela. (DELL’ OMO, 1901, p. 4, tradução nossa)

Além disso, a precisão almejada emerge da busca de construções de instrumentos náuticos e astronômicos mais ri-gorosos e com menos erro nas rotas dos navios, por exemplo, com a construção do quadrante. Portanto, com o pensamen-to de construir algo útil, Mascheroni busca primeiramente o problema para o qual sua ideia da Geometria do Compasso con-duzisse a uma solução. Deste modo enxergou, dentro da As-tronomia, mais especificamente na construção de instrumen-tos astronômicos, a necessidade de poder dividir um círculo em partes iguais de forma que tivesse uma precisão geométrica muito rebuscada, que não era possível de se obter através do uso da régua, pois segundo Mascheroni, este instrumento traz em si imprecisões inerentes a sua construção.

Logo, a fim de comprovar sua tese Mascheroni, por mais que esteja com seus estudos voltados para construções geométricas, não abandona em um só momento o rigor mate-mático que lhe permite a garantia da veracidade das constru-ções, sobretudo, o rigor axiomático herdado dos gregos. Deste modo, faz uso, sem modesta, de demonstrações puramente algébricas, sem perder a beleza e a naturalidade de tais cons-truções. De fato, dentro da Geometria do Compasso de Mas-cheroni poderemos evidenciar que todas as propriedades que são válidas e que foram provadas na Geometria Euclidiana se-rão aceitas na Geometria do Compasso. O diferencial consiste em reduzir o instrumento de construção de dois para um. Isso mostra que Mascheroni não apresentava interesse em refutar

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o que Euclides (300 A.C – ~) tinha proposto em seus Elemen-tos, mas sim produzir uma obra que apresente contribuições para a Geometria que já era conhecida esperando, com isto, que seus novos passos pudessem lhe conduzir a resultados que culminassem em aplicações práticas.

Na referida obra, Mascheroni inicia o primeiro livro falando das noções preliminares, em que aborda algumas pro-posições e lemas para reforçar os conhecimentos básicos de Geometria.

No segundo livro, Mascheroni já adentra mais nos novos conceitos da Geometria do Compasso, tratando de problemas sobre a divisão de circunferências e arcos de círculos em partes iguais, fazendo uso somente do compasso.

No terceiro livro, são discutidos problemas a respeito da divisão e multiplicação de segmentos de retas, multipli-cações inteiras, divisões fracionárias sucessivas, dentre outras abordagens.

O quarto livro trata da resolução de problemas em que se necessita adicionar ou subtrair distâncias num segmento dado, de modo que, quando somamos dois ou mais segmen-tos, o resultado seja um novo segmento de reta, de forma que possamos garantir que passe uma reta por este novo segmento. Também são abordados problemas em que deve ser encontra-do uma paralela ou perpendicular a um segmento dado.

O quinto livro trata de problemas sobre distâncias pro-porcionais. Nele, são abordados problemas em que devemos encontrar distâncias proporcionais a duas ou mais distâncias dadas, assim como problemas de como dividir um segmento em partes proporcionais a segmentos dados.

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O sexto livro discute alguns métodos para encontrar raízes de números racionais.

Já no sétimo livro, são abordados problemas a respei-to das interseções de circunferências; circunferências e retas; e entre retas.

No oitavo livro, são tratadas situações sobre a constru-ção, multiplicação e divisão de ângulos utilizando apenas o compasso, bem como alguns problemas envolvendo as razões trigonométricas: seno, cosseno, tangente e secante.

No nono livro, são discutidas as construções de figuras semelhantes e polígonos regulares.

No décimo livro, são abordados problemas em que te-mos de circunscrever e inscrever círculos em polígonos regu-lares e/ou qualquer.

O décimo primeiro livro trata de uma coleção de pro-blemas resolvidos – retirados de outros autores (por exemplo, Pappo e Ozanam, dentre outros) – envolvendo área de figuras dadas; a determinação de figuras semelhantes a figuras dadas; construção de elipse; e espirais partindo de arcos de círculos.

Por fim, no décimo segundo livro é apresentada uma lista de problemas diversos os quais Geometria do Compas-so sozinha não é capaz de resolver, sendo então necessário o uso da régua. Tais problemas são resolvidos apenas por apro-ximação. Este é o único livro em que não há só Geometria do Compasso, no entanto, mesmo dispondo de tais situações problemas apresentados na obra de Mascheroni, trabalhamos em nosso produto educacional (blocos de atividades) com os três primeiros livros e neste capítulo de livro trazemos dois.

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Levando em consideração o cerne da obra, o conhe-cimento de Mascheroni e suas motivações, juntamente com o contexto de sua produção, apresentamos a seguir algumas atividades que foram elaboradas como fruto de uma pesquisa de mestrado supracitada.

Nestas atividades temos o interesse mostrar uma inte-ração entre o trabalho com a História da Matemática e as TIC, levando-os a enxergarem que o trabalho com mais de uma tendência da Educação Matemática faz com que a interação de uma com a outra possa enriquecer o ensino da Matemá-tica, mostrando que algo do passado pode servir ao presente e pode ser envolto por recursos computacionais, estimulando assim professores a diversificarem suas aulas dando ainda mais significado.

Blocos de atividades

Considerações gerais sobre os blocos e Software GeogebraApresentamos aqui dois blocos de atividades pauta-

das na Geometria do Compasso de Mascheroni via Software Geogebra e Investigação Matemática. O primeiro deles possui 2 atividades e o segundo um total de 4 atividades. Por este mo-tivo, sugere-se que sua aplicação ocorra em quatro encontros com duração média de duas horas aula, sendo um encontro destinado ao primeiro bloco e dois ao segundo bloco. Além disso, recomenda-se que exista um encontro (duração de 100 minutos aproximadamente), preliminar às atividades, destina-do ao estudo de aspectos relevantes da Geometria do Compasso e Mascheroni (via slides, exposição dialogada e pesquisas), as-

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sim como, um momento de sondagem com relação aos co-nhecimentos do GeoGebra. Havendo ou não conhecimento do mesmo, o professor pode optar ou não por fazer uma breve apresentação do software e suas ferramentas, contudo, é im-prescindível que seja feita a atividade preliminar, que segue, de familiarização das principais ferramentas usadas nas atividades dos blocos (construções da Geometria do Compasso).

1. Atividades de familiarização com o Geogebra e apresenta-ção algumas de ferramentas

Em nossos estudos da Geometria do Compasso estare-mos trabalhando com o Software GeoGebra, pois trata-se de um software de matemática dinâmica que possui, dentro de seu conjunto de ferramentas, uma que nos possibilita realizar as mesmas ações que o compasso euclidiano (abertura fixa) fa-voreceu a Mascheroni. Esta ferramenta, do software, também é chamada de Compasso.

a) Conhecendo a Compasso

Figura 2 – Ferramenta Compasso Fonte: Arquivo pessoal

A ferramenta Compasso possibilita que, a partir de dois pontos quaisquer, possamos construir uma circunferência e movê-la para centrá-la em qualquer outro ponto situado na janela de visualização do GeoGebra. Este fato nos permite transpor medidas sem que seja necessário o uso da régua, ou seja, ao construir uma circunferência, com este passo, na ver-

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dade estamos tomando uma abertura de compasso para obter-mos um raio.

Para testar tal ferramenta, acione seu ícone e construa uma circunferência4 de abertura qualquer clicando em dois pontos quaisquer na janela de visualização. Em seguida, esco-lha um ponto para centrar a circunferência construída. Estes pontos mencionados não obrigatoriamente precisam ser de-terminados anteriormente a construção da circunferência.

b) Conhecendo a ferramenta Interseção de Dois Objetos

Para marcar a interseção de dois objetos construídos, construa uma reta e uma circunferência que se cruzam (inter-ceptam) em um ou dois pontos.

Agora, para marcarmos os pontos de interseção, tere-mos que selecionar a ferramenta Interseção de Dois Objetos. Para isto, clique na seta do segundo ícone na barra de ferra-mentas e clique na quarta ferramenta para habilitá-la. Poste-riormente, clique em cada um dos objetos construídos (reta e circunferência). Observe que o(s) ponto(s) de interseção(ões) foi(ram) marcado(s).

Realize a construção de outros objetos (exemplo, seg-mentos de reta, semirretas, circunferências, dentre outros) e determine seus pontos de interseção. Discuta com seus colegas o que está ocorrendo com suas construções com relação às interseções:

4 No software as aberturas de compassos, registradas pela ferramenta Compasso, aparecem como uma circunferência, como se tivéssemos feito toda a volta em torno de um dos pon-tos do arco ficando outro ponto obtido pela interseção da circunferência com outro objeto. Contudo, há também a ferramenta Circunferência que se diferencia da Compasso pelo fato de variar com o raio, enquanto que a Compasso tem abertura fixa.

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Observe que, ao marcarmos as interseções entre as cir-cunferências, a ordem em que clicamos para selecionar as cir-cunferências altera a ordem em que os pontos são nomeados, por exemplo, se tivermos duas circunferências de raio AB com centros A e B respectivamente. Se clicarmos na circunferên-cia de centro A e em seguida na circunferência de centro B os pontos de interseção superior e inferior, serão marcados C e D, respectivamente. Se selecionarmos as circunferências na ordem contrária, as interseções, superior e inferior, serão mar-cadas D e C, respectivamente.

c) Verificando como fazer Destaque

Construa uma circunferência. Agora você pode se per-guntar, como poderemos destacar a circunferência construída? O GeoGebra oferece ferramentas para destacarmos as figuras. Uma das formas de destacar uma construção no GeoGebra é através da mudança de cor. Vejamos como realizar esta ação. Para isso, note que na Janela de Visualização podemos exibir a Barra de Estilo. Esta barra nos oferece o menu de ferramentas que nos permite destacarmos as figuras construídas alterando a cor, a espessura e o preenchimento. Então, para alterarmos as configurações das figuras basta clicarmos na figura que desejamos destacar e em seguida irmos à Barra de Estilo e fazer-mos as alte-rações necessárias. Outro detalhe é que todas essas configura-

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ções podem ser escolhidas antes de realizarmos as construções. Se desejarmos fazer isso devemos proceder da seguinte forma: após termos selecionada a ferramenta, devemos ir à Barra de Estilo e alterarmos as configurações, assim quando realizarmos a construção, ela já estará com os destaques que queremos. Para testar, faça isto com as construções do item anterior. Caso a janela de visualização esteja com muitas construções, abra uma nova janela de visualização e realize novas construções.

d) Medição de Ângulo e Exibição de Objeto

Vejamos agora duas outras ferramentas que serão úteis no decorrer da realização das atividades, são elas: Ângulo e Exibir Objeto.

Vamos construir duas retas concorrentes e marcar o ponto de interseção entre elas. A primeira reta passa pelos pontos A e B, a segunda passa por C e D, o ponto de inter-seção será o ponto E, habilite a ferramenta Ângulo e meça o ângulo AÊC. Poderemos agora, esconder as retas deixando, na janela de visualização, apenas os pontos e o ângulo medido. Para isso, basta clicar com o botão direito do mouse sobre as retas (uma de cada vez) e em seguida clicar na opção Exibir Objeto, assim teremos na tela somente os pontos e o ângulo.

Tendo conhecido um pouco sobre os blocos e as principais ferramentas, do Software Geogebra, que usaremos nas atividades, apresentamos a seguir os dois blocos iniciando com o Bloco I in-titulado Preliminares para Geometria do Compasso e inspirado no livro I nomeado por Preliminares da obra de Mascheroni.

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Bloco I: Preliminares para Geometria do CompassoNeste bloco, temos três atividades preparatórias para os

demais blocos de atividades.

Os objetivos deste bloco de atividades:

1. Levar o participante a aprender a manusear, de forma correta, as ferramentas do Software Geoge-bra que estaremos utilizando com alta frequência nas atividades dos demais blocos.

2. Realizar construções geométricas básicas com o software.

3. Trabalhar com as preliminares para a Geometria do Compasso.

Atividade 1: Encontrar um terceiro ponto equidistante de dois pontos dados.

Tipo de atividade: Atividade individual.

Conhecimentos prévios: Conhecer o sistema operacio-nal Windows, Linux ou qualquer outro que tenha o Software GeoGebra instalado; conhecer a janela inicial do GeoGebra e as ferramentas apresentadas anteriormente.

Objetivo da atividade: Encontrar um ponto equidis-tante a dois pontos dados e familiariza-se com as ferramentas, Compasso e Interseção de Dois Objetos, do software GeoGebra.

Procedimentos:

1. Esconda os eixos. Para isto, clique com o botão direito do mouse na janela de visualização, em se-guida clique na opção Eixos.

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2. Na barra de ferramentas, no 2º ícone, selecione a ferramenta, Ponto e marque os pontos A e B. Para isto, clique na janela de visualização, mar-cando o ponto A, em seguida clique a direita de A (com certa distância), marcando o ponto B.

3. Na barra de ferramentas, no 6º ícone, selecione a ferramenta, Compasso . Em seguida, clique nos pontos A e B para abrir o arco desejado e depois no ponto A, para marcar o centro. Assim terá cons-truindo a circunferência com centro A e raio AB.

4. Na barra de ferramentas, no 6º ícone, selecione a ferramenta Compasso . Em seguida clique nos pontos A e B, depois no ponto B. (Você construiu uma circunferência de raio AB com centro em B).

5. Na barra de ferramentas, no 2º ícone, selecione a ferramenta Interseção de Dois Objetos , clique na circunferência de centro A e em seguida na circunferência de centro B, nomeie os pontos das interseções superior e inferior com as letras C e c5 respectivamente. Para isso, clique com o botão direito do mouse no ponto D e em seguida clique na opção renomear para c.

Reflexões/Investigando:

a) Como podemos utilizar as ferramentas do Geo-Gebra para verificar que o ponto C é equidistan-te dos pontos A e B? Que ou quais ferramenta(s)

5 Mascheroni, em suas construções, não utiliza a nomenclatura atual para marcação de pontos, com apenas letras maiúsculas. Em suas construções são utilizadas letras maiúsculas e minúsculas para nomear pontos.

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pode(m)-se usar? Que conteúdo matemático está relacionado a esta garantia?

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b) Qual a justificativa matemática para o ponto C ser equidistante dos pontos A e B?

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c) Mova o ponto A ou B e verifique se esta proprieda-de de igualdade não se altera. Por quê?

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d) Há outro ponto equidistante a A e B? Por quê?

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Atividade 2: Encontrar um ponto D pertencente a uma circunferência de raio com uma unidade AB6 e centro A de modo que a medida de BD seja igual a .

6 Mascheroni usa para segmento diferente da usual .

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Tipo de atividade: Atividade individual

Conhecimentos prévios: Conhecer o sistema operacio-nal Windows, Linux ou qualquer outro que tenha o Software GeoGebra instalado e conhecer a janela inicial do GeoGebra.

Objetivo da atividade: Encontrar uma corda de medi-da , na circunferência, bem como, familiarizar-se com as fer-ramentas, Compasso e Interseção de Dois Objetos, do software.

Procedimentos:

1. Esconda os eixos. Para isto, clique com o botão direito do mouse na janela de visualização, em se-guida clique na opção Eixos.

2. Na barra de ferramentas, no 2o ícone, selecione a ferramenta, Ponto e marque os pontos A e B. Para isto, clique na janela de visualização, marcan-do o ponto A, em seguida clique a direita de A, marcando o ponto B.

3. Na barra de ferramentas, no 6o ícone, selecione a ferramenta Compasso e altere a cor da ferra-menta. Para isto, na barra de estilo da janela de visualização, clique na opção, Cor e Transparência, e selecione a cor Cíano. Em seguida, clique nos pontos A e B (para abrir o arco), depois no pon-to A (assim terá construindo a circunferência com centro A e raio AB).

4. Na barra de ferramentas, no 6o ícone, selecione a ferramenta Compasso . Como antes, altere a cor

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da ferramenta para preto. Em seguida clique nos pontos A e B (abertura do compasso), depois no ponto B. (Você construiu uma circunferência de raio AB com centro em B).

5. Na barra de ferramentas, no 2o ícone, selecione a ferramenta Interseção de Dois Objetos , clique na interseção superior entre a circunferência de centro A e a circunferência de centro B, marcando o ponto da interseção com a letra C. (geralmente automático).

6. Na barra de ferramentas, no 6o ícone, selecione a ferramenta Compasso . Clique novamente nos pontos A e B, em seguida clique no ponto C. (Você construiu uma circunferência de raio AB com cen-tro em C).

7. Na barra de ferramentas, no 2o ícone, selecione a ferramenta Interseção de Dois Objetos , clique na interseção (que está à esquerda, que é a que não está marcada) entre a circunferência de centro A e a circunferência de centro C, obtendo o ponto D.

8. Na barra de ferramentas, no 6o ícone, selecione a ferramenta Compasso . Clique novamente nos pontos A e B, em seguida clique no ponto D. (Você construiu uma circunferência de raio AB com centro em D).

9. Na barra de ferramentas, no 2o ícone, selecione a ferramenta Interseção de Dois Objetos , clique na interseção (que está à esquerda, que é a que não está marcada) entre a circunferência de centro A, e a circunferência de centro D, obtendo o ponto E.

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Reflexões/Investigando:

a) Como podemos garantir, com o GeoGebra, que BE é diâmetro da circunferência de centro A?

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b) Agora, acione conteúdos matemáticos que permi-tam mostrar isso sem o Geogebra.

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c) Com o GeoGebra, prove que o segmento BD tem medida e descreva suas conclusões.

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O Bloco II que segue é intitulado Divisões da circun-ferência e inspirado no livro II nomeado por Da divisão da circunferência e de arcos de círculo da obra de Mascheroni.

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Bloco II: Divisões da circunferênciaEste bloco é composto por 4 atividades que inicializam

o estudo dos problemas da Geometria do Compasso.

Objetivos deste bloco de atividades:

1. Verificar que é possível dividir uma circunferência em partes iguais, utilizando apenas as ferramentas, Compasso e Interseção de Dois Objetos, do Software GeoGebra.

2. Identificar a necessidade da construção de circun-ferências de mesmo raio para garantir a divisão de uma circunferência em partes iguais.

Atividade 1: Divisão de uma circunferência em seis partes iguais.

Tipo de atividade: Atividade individual

Conhecimentos prévios: Saber manusear as ferramen-tas Compasso e Interseção de Dois Objetos, do Software GeoGe-bra. Conhecer a definição: “polígono regular, polígono cujas medidas dos lados entre si, e as medidas dos ângulos também são iguais entre si” (RIBEIRO, 2009, p. 277).

Objetivos da atividade:

1. Verificar que é possível dividir uma circunferência em partes iguais, utilizando apenas as ferramentas Compasso e Interseção de Dois Objetos, do Software GeoGebra.

2. Identificar a necessidade da construção de circun-ferências de mesmo raio, para garantir a divisão de uma circunferência em partes iguais.

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3. Construir e dividir uma circunferência de raio AB em seis partes iguais.

Procedimentos: Com o Software GeoGebra e com as ferramentas indicadas a seguir execute os seguintes passos.

1. Esconda os eixos da janela de visualização.

2. Construa duas circunferências de raio AB com centro em A e B.

3. Destaque a circunferência de centro A com a cor Cíano. Para isto, clique na circunferência de cen-tro A, em seguida clique, no 3º ícone, da barra de estilo, Cor e Transparência, selecione a cor Cíano.

4. Marque as interseções superior e inferior entre as circunferências de centro A e centro B, nomeie com as letras C e c, respectivamente.

5. Construa uma circunferência de raio AB com cen-tro em C.

6. Marque a interseção (que está à esquerda, que é a que não está marcada) entre as circunferências de centro A e centro C e nomeie com a letra D.

7. Construa uma circunferência de raio AB com cen-tro em D.

8. Marque a interseção (que está à esquerda, que é a que não está marcada) entre as circunferências de centro A e centro D e nomeie com a letra E.

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Atenção: Observe que nosso objetivo é chegar à divisão da circunferência em seis partes. Já dividimos a circunferência de raio AB e centro A em 6 partes iguais? Caso sim, justifique e, caso não, pelo que já foi realizado nesta construção, o que pode ser feito para isso ocorrer?

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1. Construa uma circunferência de raio AB com cen-tro em E.

2. Marque a interseção (que está a inferior, pois é a que não está marcada), entre as circunferências de centro A e centro E. Depois, nomeie-a com a letra d.

Reflexões/Investigando:

a) O que são polígonos regulares? Com os pontos encontrados na construção anterior é possível construir polígonos regulares? Se possível, indique qual(is) verificando com o Geogebra. Caso não, justifique.

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b) Quais subdivisões da circunferência estão presen-tes na construção realizada?

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Atividade 2: Divisão da circunferência em quatro par-tes iguais.

Tipo de atividade: Atividade individual

Conhecimentos prévios: Saber manusear as ferramen-tas Compasso e Interseção de Dois Objetos, do Software GeoGe-bra.

Objetivo da atividade: Dividir uma dada circunferên-cia em quatro partes iguais.

Procedimentos: Retornemos a construção realizada an-teriormente. (com o mesmo arquivo anterior).

1. Usando a ferramenta Exibir Objeto, esconda as cir-cunferências que foram construídas para executar a divisão em seis partes iguais. (Sugestão: utilize a janela de álgebra ou o botão direito do mouse).

2. Construa duas circunferências de raio BD, centra-das nos pontos B e E. (destaque as circunferências construídas com esta abertura, com a cor azul).

3. Tome o ponto de interseção superior entre as novas circunferências. Nomeie a interseção com letra a.

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4. Construa uma circunferência centrada em B com raio Aa. (destaque a circunferência construída com esta abertura, com a cor vermelha).

5. Marque os pontos de interseção entre esta nova circunferência e a circunferência centrada em A. Nomeie as interseções com letras F e f.

Reflexões/Investigando:

a) Temos 4 pontos que dividem a circunferência cen-trada em A em 4 partes iguais? Caso sim, quais são esses pontos? Caso não, justifique.

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Recorte Histórico:Problema: Dividir a circunferência do circulo em qua-

tro partes iguais (fig. 9).

Solução: Na mesma circunferência se faça para o raio com o primeiro compasso (§ 10, 8). Será (15, liv. 4). Se faça para com o segundo compasso; e com o terceiro compasso. A circunferência terá sido dividida em quatro partes iguais .

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Figura 3 – fig. 9 da primeira edição de 1797.Fonte: Mascheroni Dell’Omo (1797, p. 265)

Demonstração. Sendo um diâmetro (15, liv. 4); e ten-do os triângulos , todos os lados iguais, (e já que são iguais os ângulos) mas ângulos iguais a, (8, liv. 1); eles serão retos (13, liv. 1). Portanto (47, liv. 1); e subtraindo (de ambos os lados tem-se). Você pode fazer isso por causa do fato de que; assim (§ 2). Será, portanto , e, portanto, também . Assim, no triângulo o ângulo será reto (48, liv. 1), e daí também (uma consequência) o ângulo (13, liv. 1). Serão, portanto, os arcos , iguais entre eles, e cada um deles será um quarto de círculo, bem como os arcos.

a) De posse da construção e da obra de Mascheroni (observe o trecho anterior), redija uma justificativa utilizando conceitos matemáticos que respaldam a veracidade da mesma, ou seja, que garantem que dividimos a circunferência em quatro partes iguais.

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b) Na construção de seu argumento, o teorema de Pitágoras lhe dá contribuições para fazer alguma afirmação? Se sim, quais?

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c) Estudando a demonstração do Mascheroni, quais conceitos e resultados da Geometria Plana podem ser localizados?

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Atividade 3: Divisão de uma circunferência em doze partes iguais.

Tipo de atividade: Atividade individual.

Conhecimentos prévios: Saber manusear as ferramen-tas Compasso e Interseção de Dois Objetos, do Software GeoGe-bra.

Objetivo da atividade: Dividir uma dada circunferên-cia em doze partes iguais.

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Procedimentos: Retornemos a construção realizada ante-riormente para divisão da circunferência em quatro partes iguais. Daremos os novos passos para executarmos a divisão da mesma circunferência em doze partes iguais. Primeiro, utilizemos um artifício de esconder objetos no GeoGebra para deixarmos a construção anterior apenas com a circunferência de centro A e os pontos B , C, D, E, F, c, d, f e a que foram determinados pelas interseções das circunferências na construção anterior.

1. Usando a ferramenta Exibir Objeto, esconda as cir-cunferências que foram construídas para executar a divisão em quatro partes iguais. (Sugestão: utilize a janela de álgebra ou o botão direito do mouse).

Reflexões/Investigando:

a) Antes de prosseguirmos com a nova construção, será que na atual construção já existe algum arco

que tenha medida de do comprimento da cir-cunferência? Caso sim ou não, justifique.

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1. Com o primeiro compasso de medida AB, cons-trua uma circunferência centrada no ponto a.

2. Marque as interseções entre a nova circunferência e a circunferência centrada em A. Nomeie os pon-tos com as letras G e H. (De modo que G fique a direita de H).

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3. Com o terceiro compasso de medida Aa, (alterando a cor da ferramenta para vermelha) construa duas circunferências centrando-as nos pontos G e H.

4. Marque as interseções (não marcadas) destas duas novas circunferências com a circunferência centra-da em A. Nomeie os pontos com as letras g e h. (De modo que g fique a direita de h).

5. Com o primeiro compasso, de medida AB, cons-trua uma circunferência e centre-a no ponto F.

6. Marque as interseções entre a nova circunferência e a circunferência de centro A. Nomeie os novos pontos de interseção com os pontos N e O. (De modo que N fique a direita de O).

7. Com o primeiro compasso, de medida AB, cons-trua duas circunferências centradas em N e O.

8. Marque as interseções (não marcadas) entre as duas novas circunferências e a circunferência de centro A. Nomeie os pontos de interseção com n e o.

Recorte Histórico:Problema: Dividir a circunferência em doze partes iguais.

Solução: Nestas circunstâncias, como no § 27 fig. 9, (ver imagem 3) fazer . A cir-cunferência estará dividida em doze partes iguais nos pontos B, N, C, F, D, O, E, o, d, f, c, n.

Demonstração: Sendo retirados os arcos BC, DE dos ar-cos arcos BF, FE; que permanecem CF, FD serão iguais. Sendo então CD a sexta parte da circunferência (§ 29); será CF sua

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metade, ou seja . Será ainda CF = CN por causa de FN = CD; assim também CN = NB por causa de FN = CB. E, do mesmo modo se demonstrara que todas as outras partes da circunferência são a décima segunda parte.

Reflexões/Investigando:

a) Elabore uma justificativa para a subdivisão em doze partes presente na atual construção, obser-vando a demonstração dada por Mascheroni para tal construção.

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b) Na construção podemos destacar alguma outra di-visão em partes iguais da circunferência de centro A? Caso sim, quais são os pontos desta outra divi-são? Caso não, por quê?

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Atividade 4: Divisão de uma circunferência em cinco partes iguais.

Tipo de atividade: Atividade individual.

Conhecimentos prévios: Saber manusear as ferramentas Compasso e Interseção de Dois Objetos, do Software GeoGebra.

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Objetivo da atividade: Dividir uma dada circunferên-cia em cinco partes iguais.

Procedimentos: Para realização desta atividade tomare-mos a construção da divisão da circunferência em doze partes iguais. (ver arquivo anterior).

1. Usando a ferramenta Exibir Objeto, esconda as cir-cunferências que foram construídas para executar a divisão em doze partes iguais. (Sugestão: utilize a janela de álgebra ou o botão direito do mouse).

2. Com o terceiro compasso de medida Aa, (cor ver-melha) construa duas circunferências centrando-as nos pontos N e O.

3. Marque o ponto de interseção inferior entre as duas novas circunferências, que está interno a cir-cunferência de centro A. Nomeie este ponto de interseção com a letra b.

4. Com a ferramenta Compasso, construa uma nova circunferência de raio Bb, que representará nosso quarto compasso (cor verde). Centre esta circunfe-rência no ponto B.

5. Marque os pontos de interseção, superior e infe-rior, entre a nova circunferência e a circunferência de centro A. Nomeie os pontos de interseção, su-perior e inferior, com as letras Q e q, respectiva-mente.

6. Com o quarto compasso de medida Bb, (cor ver-de) construa uma nova circunferência e centre-a no ponto Q.

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7. Marque a interseção (que está à esquerda, que é a que não está marcada) entre a nova circunferência e a circunferência de centro A. Nomeie a interse-ção com a letra S.

8. Com o quarto compasso de medida Bb, (cor ver-de) construa uma circunferência e centre-a em S.

9. Marque a interseção inferior entre a nova circun-ferência e a circunferência de centro A. Nomeie o ponto de interseção com a letra s.

Reflexões/Investigando:

a) Notemos que a circunferência de centro A encon-tra-se dividida em cinco partes iguais nos pontos B, Q, S, s e q. De que maneira podemos verificar, através do GeoGebra, a veracidade desta constru-ção? Justifique?

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b) Que outras divisões da circunferência podem ser deduzidas com os pontos encontrados até esta construção?

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Recomendações e notas informativasNo que diz respeito ao Bloco II de atividades temos que

atentar para o detalhe de que, na Geometria do Compasso, não utilizamos a régua e, por este motivo, estamos impedidos de a traçarmos. Contudo, segundo Mascheroni, para ter/defi-nir uma reta não é necessário que tenhamos que traçá-la, mas apenas conhecermos dois de seus pontos, que poderão ser de-terminados apenas com o auxílio do compasso. De fato, com dois pontos, por exemplo, definimos uma reta que passa por eles. Vale esclarecer que um segmento de reta também é deter-minado a partir de seus dois pontos extremos, sem que seja ne-cessário traçá-lo. Assim, para Mascheroni dois pontos definem uma reta e um segmento de reta, mas a diferença está no fato que a primeira passa por eles e a segunda inicia e termina neles.

Outro detalhe relevante é que a Geometria do Compasso apresenta conceitos diferentes da Geometria Euclidiana para polígonos. Assim, enquanto que na Euclidiana um polígono é definido como sendo uma figura formada pelos seus lados e seus ângulos, na Geometria de Mascheroni, o polígono es-tará determinado quando forem conhecidos todos os pontos de seus vértices. Por exemplo, para Euclides o triângulo é um polígono fechado formado por três lados e três ângulos, para Mascheroni basta conhecermos os três vértices (três pontos não colineares), para que possamos dizer que temos um triângulo.

De modo geral, estas diferenças surgem pelo fato de que em tal Geometria, tudo se resume a pontos (em função do uso exclusivo do compasso).

Outro ponto importante neste segundo bloco consiste no fato que, ao realizarmos as construções deste bloco, no-

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tamos que Mascheroni não segue as regras de notações para denominação de pontos, pois ele utiliza letras minúsculas para denominar pontos, enquanto que nos dias atuais é recomendado que se utilize letras maiúsculas, porém devemos levar em consideração o fato de que no século XVIII não se existiam tais regras de normatização.

Na atividade 2 do Bloco II, verificamos a inserção de um recorte histórico que apresenta um trecho da obra de Maschero-ni, usado como auxílio nas investigações propostas isto porque consideramos que um dos pontos de destaque da Geometria do Compasso está evidenciado quando estudamos suas demonstra-ções. De fato, neste momento Mascheroni faz uso de todo e qualquer resultado (que lhe seja necessário para garantir a vera-cidade de suas construções em demonstrações que seguem um fino rigor algébrico) presente em Os Elementos de Euclides.

Por fim, destacamos que Mascheroni, em sua obra, não apresenta todas as divisões possíveis de frações unitárias de arcos de circunferência e que, ao final da atividade 4 do segundo Bloco, os alunos são levados a fazer descobertas de resultados não contidos na obra pois podem identificar alguns arcos que possibilitam realizar divisões da circunferência em outras partes iguais diferentes das que são indicadas na obra, por exemplo, a divisão da circunferência em 30 partes iguais. Aludimos isto ao fato do software potencializar as descober-tas/investigações em função da não necessidade de repetir os passos já executados em atividades anteriores, mas em maior quantidade, e, além disso, ser possível observar uma constru-ção já pronta sendo reproduzida passo a passo e não apenas o resultado final, dando tempo para levantamento de inferên-cias juntamente com aprofundamento da obra e aspectos da

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própria Matemática. Aliás, vale observar que desejamos neste trabalho ir além do conhecimento da Geometria o Compasso e apresentar mais sobre a própria Matemática, particularmente no tocante a realização de construções geométricas e a Ma-temática envolta germinada especialmente pela restrição do instrumento, que implica em construções mais delongadas, contudo, com mais aspectos matemáticos acionados para sua garantia e que vão além da própria Geometria.

Referências

BORBA, Marcelo de Carvalho. Softwares e internet na sala de aula de matemática. In: Encontro Nacional de Educação Matemática, 10., 2010, Salvador. Anais... Salvador: Universidade Católica do Salvador, 2010.

DELL’OMO, Lorenzo Mascheroni. La Geometria del Compasso. 2 ed. Palermo: era nova, 1901.

______. La Geometria del Compasso. ed. Pavia ano V della Repubbli-ca Francesa, 1797.

EUCLIDES. Os Elementos. Tradução: Irineu Bicudo. São Paulo: Unesp, 2009.

EVES, Howard. Introdução à História da Matemática. Tradução: Hy-gino H. Domingues. Campinas: Editora da UNICAMP, 2004.

MIGUEL, Antônio; MIORIM, Maria A. História na Educação Ma-temática: propostas e desafios. 1 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2008.

PONTE, João Pedro da; BROCADO, Joana; OLIVEIRA, Hélia. In-vestigações Matemáticas na Sala de Aula. 2. ed. Belo Horizonte: Au-têntica, 2009.

RIBEIRO, Jackson da Silva. Projeto radix: matemática, 9º ano. São Paulo: Scipione, 2009.

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CAPÍTULO 03

HISTÓRIAS EM QUADRINHOS E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA: UMA

RELAÇÃO POSSÍVEL

Luis Adolfo de Oliveira CavalcanteWellington Lima Cedro

Fundamentados nas ideias da Teoria Histórico Cultu-ral (THC) emergente do Materialismo Histórico Dialético (MHD) proposto por Marx, acreditamos que o conhecimento é o resultado social e histórico das relações que o homem esta-belece com/sobre a natureza. Nesta perspectiva, a aprendiza-gem se dá em uma dimensão social, na qual, o sujeito apreen-de mediado pelas ferramentas criadas pelos seus antepassados.

No meio educacional não é diferente. São inúmeras as possibilidades de ferramentas pedagógicas que o professor pode fazer uso para contribuir para a aprendizagem dos estu-dantes. Uma destas ferramentas são as histórias em quadri-nhos (HQ).

Diversos autores têm dedicado suas pesquisas a com-preender as contribuições das HQ ao processo educacional. Autores como Acevedo (1990), Araújo; Costa e Costa (2008), Cirne (1970), Luyten (1985a, 1985b, 1985c, 2000) e Ver-gueiro (2012), têm, ao longo dos anos, demonstrado possibi-

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lidades interessantes para o uso das histórias em quadrinhos com fins educacionais. Estas possibilidades perpassam por elementos como o aumento da motivação do estudante (TO-NON, 2009) e, um pouco mais específico ao conhecimento matemático, estimular o raciocínio lógico e imaginação do leitor (ARAUJO; COSTA; COSTA, 2008).

Contudo, apesar das pesquisas sobre a utilização das HQ em âmbito educacional crescerem ao longo dos anos, isto não se reflete em um processo de formação de professores que possibilite aos docentes trabalharem com esta ferramenta. Nesta perspectiva, torna-se de grande importância oferecer ao professor a possibilidade de apropriar-se deste instrumento, proporcionando-lhe os conhecimentos tanto teóricos quanto práticos para a implementação de uma proposta pedagógica que faça uso dos elementos dos quadrinhos.

Visando possibilitar a professores a utilização de his-tórias em quadrinhos em sala de aula, realizamos um curso de formação com educadores matemáticos da Educação Bási-ca do município de Goiânia. Este curso foi realizado duran-te uma investigação de Mestrado em Educação em Ciências e Matemática, tendo como produto a dissertação intitulada “No dia mais claro: um estudo sobre o sentido atribuído às histórias em quadrinhos por professores que ensinam mate-mática em formação”1.

Nesta perspectiva, este capítulo tem por objetivo, rela-tar parte das experiências vividas durante este curso de forma-ção. Mais especificamente, focaremos em como os professores 1 CAVALCANTE, L. A. de O. No dia mais claro: um estudo sobre o sentido atribuído às histórias em quadrinhos por professores que ensinam matemática em formação. Disser-tação – Mestrado em Educação em Ciências e Matemática, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2014.

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se preocuparam em abordar o conhecimento matemático nas histórias em quadrinhos produzidas durante o curso.

Uma problemática emergente: a formação de professoresPercebendo a carência que o professor tem em sua for-

mação inicial em trabalhar com as HQ, organizamos e plane-jamos um curso que possibilitasse a um grupo de 12 profes-sores que ensinam matemática2, participantes de um projeto intitulado “Observatório de Educação (OBEDUC)”, as con-dições necessárias para incorporar as HQ à sua prática pedagó-gica. Escolhemos este grupo de professores, pois eles têm como foco de estudo semanal textos que corroborem com as ideias da THC. Isso não implica que os encontros do grupo têm como objetivo o aprofundamento nas teorias vygotskya (nem tão pouco marxistas), mas que, na condução de suas ativida-des, são realizados recortes que vão ao encontro destas teorias.

Assim, acreditamos que por estes professores estarem estudando frequentemente sobre a THC, e elaborando ativi-dades segundo os ideais de processo educacional abordados dentro desta teoria, nosso trabalho seria pautado em como inserir as HQ neste processo. A escolha de outros sujeitos para a pesquisa poderia até comprometer a pesquisa, ao passo que o tempo que gastamos na discussão de “como se inserir as HQ no processo educacional?”, poderia repousar primeiro em “de que processo educacional estamos falando?” ou “quais são os objetivos do processo educacional?”.

2 O termo “professores que ensinam matemática” vem do fato de que nem todos os pro-fessores eram formados em matemática. Alguns dos professores eram pedagogos e o grupo ainda contava com um professor de física. No entanto, todos trabalham com matemática no contexto escolar.

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Deste modo, o curso foi construído para estes partici-pantes, que estudam sobre a THC, que discutem uma educa-ção matemática voltada para a humanização e que oportunize ao sujeito se inserir e intervir criticamente na sociedade na qual estão inseridos.

Analisando as competências e reflexões necessárias para a construção de uma HQ que trate do conhecimento mate-mático, estimamos oito encontros (um encontro por semana) com duração de duas horas cada um. Entretanto, na estru-turação do curso, percebemos que haviam eixos temáticos que se complementavam. Optamos então por condensar os encontros dois a dois, com exceção dos dois últimos encon-tros, sendo os oito encontros realizados em cinco semanas. O curso, para os professores participantes, teve como objetivo a produção de HQ para uso em suas práticas educacionais.

Para isso, o curso foi baseado tanto em atividades teó-ricas quanto práticas. Dessa forma, julgamos ser importante a discussão e a reflexão do processo educacional que queremos e sobre os elementos das Histórias em Quadrinhos, suas par-ticularidades, potencialidades e limitações, tanto quanto sua produção segundo a visão de educação/matemática discutida.

Para atingirmos estes objetivos, ao longo do curso foi solicitado que os 12 participantes se dividissem em 4 grupos, cada um com 3 integrantes. Ao final do curso, pelo menos um dos participantes de cada grupo deveria aplicar a HQ produzi-da em suas práticas educacionais. Para ser possível a produção destas HQ, organizamos o curso da seguinte forma:

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1a semana – 1o e 2o encontro: Foi rea-lizada uma discussão sobre como o co-nhecimento matemático é tratado nas HQ. Buscávamos uma conscientização no tocante da superação de uma pro-dução de HQ em que uma personagem aparecesse apenas falando sobre um de-terminado conceito matemático, sem a preocupação de construir uma história, trabalhar a personalidade e o contex-to das personagens. Sob este aspecto, refletimos com os professores sobre o que as histórias em quadrinhos podem acrescentar a mais do que os livros di-dáticos e as aulas conceituais.

2a semana – 3o e 4o encontro: Propo-mos aos professores uma reflexão sobre os elementos que compõem as HQ. Nas concepções deles, percebemos dois tipos de elementos (os pré-textuais e os gráficos). Assim, nesta 2ª semana, con-ceituamos os elementos pré-textuais – roteiro, argumento e storyboard. Foi solicitado que os professores organizas-sem os grupos, e cada grupo produzisse um roteiro de uma HQ que envolvesse o conhecimento matemático.

3a semana – 5o e 6o encontro: Nesta semana foi debatido sobre os elemen-tos gráficos – requadro, calha, desenho, balão e recordatório e letras. Foram criadas conceituações para cada um destes elementos. Nesta semana os professores começaram a produzir suas histórias em quadrinhos.

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4a semana – 7o encontro: Esta sema-na foi separada para que os professores produzissem suas HQ, com base no roteiro elaborado na 2ª semana. Assim, os grupos se reuniram para discussão de suas histórias e produção das HQ. 5a semana – 8o encontro: O último encontro foi realizado para que houves-se uma apresentação das HQ produzi-das pelos grupos. Tínhamos o intuito de discutir se cada história conseguiria atingir seu objetivo educacional, ser-vindo para reflexão dos alunos e apren-dizagem significativa do conhecimento matemático.

Com esta formatação, os participantes realizaram atividades que os levaram a refletir sobre a importância dos elementos pré-textuais e gráficos das HQ. Planejamos ativi-dades em que os participantes sentiam a necessidade destes elementos, para, posteriormente, formalizá-los. Esta ideia de elaboração do curso está pautada nos conceitos de desenvolvi-mento humano segundo a THC. Isso se deve ao fato de que acreditamos que quando uma determinada situação é criada por meio de uma necessidade, faz-se emergir um sentido para a realização de ações para a solução desta situação.

A necessidade, neste caso, era trabalhar o conhecimen-to matemático de forma significativa. Assim, durante o curso, percebemos que um dos sentidos apresentados pelos profes-sores foi como tratar o conhecimento matemático nas HQ, ou seja, como trabalhar o conhecimento matemático em suas histórias de forma que pudesse contribuir para reflexões por parte do aluno, proporcionando um conhecimento realmente

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significativo. Estudamos este sentido atribuído pelos profes-sores como: o conhecimento matemático nas HQ. A seguir apresentamos como o conhecimento matemático surgiu nos discursos dos professores, e como foi tratado nas HQ produ-zidas por cada grupo.

O conhecimento matemático nas HQO professor tem como papel social possibilitar ao alu-

no o aprendizado da cultura e formas de intervir, ressignificar e transformar o mundo que o cerca. Assim, o docente deve fornecer as ferramentas necessárias para que os estudantes te-nham um aprendizado significativo, desenvolvendo modos de pensar criticamente, sendo capazes de desenvolver competên-cias como argumentar, resolver problemas e relacionar os con-ceitos trabalhados em sala de aula a uma realidade concreta (LIBÂNEO, 2004; NUNES, 2000).

Estas concepções de como trabalhar em prol de um aprendizado realmente significativo permeou os discursos dos participantes ao longo do curso. Logo no primeiro encontro, disponibilizamos aos participantes histórias em quadrinhos diversas que pudessem ser utilizadas em contexto educacional.Nesta perspectiva, tentamos fazer com que os participantes do curso refletissem sobre a forma como os conceitos escolares são tratados nas histórias em quadrinhos, e se esta forma de tratamento poderia contribuir para o aprendizado de qualida-de dos estudantes. Além disso, julgamos importante também que eles já tivessem uma ideia de como abordar o conheci-mento matemático nas HQ, de forma que corroborassem com os ideais de educação debatidos e defendidos pelo grupo.

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Com a dinâmica proposta neste primeiro encontro, al-guns participantes passaram a acreditar que seja significativo que os próprios professores construam suas HQ, pois ele já tem em mente os seus objetivos de ensino, podendo construir suas histórias baseadas nestes objetivos. Além disso, o profes-sor ainda pode escolher como trabalhar os conceitos dentro da história, ou seja, se apresenta os conceitos para os estudantes de forma pronta ou se faz com que o aluno reflita na constru-ção deste conceito.

Com base nessa concepção, emergiram também a ideia de que da forma como as histórias em quadrinhos vêm sendo utilizadas por livros didáticos, provas e demais elementos edu-cacionais não há uma conexão entre a história e os conteúdos da matéria. Dessa forma, é importante salientar que sem um trabalho de triagem adequado por parte do professor, é possí-vel que o aluno receba o material e acredite em certas falácias contidas nas histórias, tomando uma visão de Ciência estereo-tipada e equivocada (PIZARRO, 2009).

Assim, as histórias em quadrinhos colaboram para que os estudantes se relacionem com os conhecimentos tratados em ambiente escolar, podendo contribuir para construção, ampliação ou ressignificação de conceitos. Estas ideias estão em consonância com as ideias de Sforni (2003) que argumen-ta que os conhecimentos que o sujeito se depara em ambiente escolar devem oferecer novos significados sobre o mundo, am-pliando sua percepção e modificando sua forma de agir e de pensar, contribuindo para sua humanização.

Dessa forma, as HQ´s podem contribuir positivamen-te para o processo de humanização dos sujeitos. Entretanto,

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qualquer ferramenta de ensino deve ser bem planejada, pois se utilizadas sem o devido cuidado e triagem por parte do profes-sor podem atrapalhar os alunos, passando-lhes determinadas visões que não refletem a realidade (chamaremos estas formas de utilização que podem atrapalhar o aluno de utilização de forma equivocada).

Esta utilização de forma equivocada pode reforçar uma série de hábitos ou concepções que não refletem a realidade. Podem ser passadas, por exemplo, visões deturpadas de ciência (como cientistas só aparecendo de jaleco, trabalhando sozi-nhos e sendo os detentores absolutos da verdade) ou visões estereotipadas de personagens (como sujeitos que usam óculos são mais inteligentes que os outros).

Durante o curso, uma das histórias em quadrinhos produzidas reforça figuras estereotipadas e alguns hábitos er-rôneos. Apesar de encontrarmos no discurso de todos os pro-fessores uma concepção de Educação Matemática que possa realmente contribuir para a formação integral do aluno, esta HQ não corresponde completamente a este ideário de educa-ção. Na história em questão uma das personagens está estu-dando raiz quadrada na escola (figura 1). A professora passa uma tarefa, afirmando dar dez pontos para quem conseguir achar a raiz quadrada de 36. Tonico, um menino que vive na roça, vai para casa e arranca os pés de mandioca, em busca das 36 raízes quadradas. Eis que surge um amigo seu que sabe um pouco mais de matemática do que ele.

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Figura 1: Tonico e a raiz quadrada.Fonte: Os autores

O quadrinho “Tonico e a raiz quadrada” foi produzi-do por um grupo composto de duas professoras formadas em matemática e uma professora formada em pedagogia. Durante o curso, chamamos este grupo de Grupo 4. Os desenhos utili-zados para a produção da história foram feitos pelo pesquisa-dor, bastando apenas que os participantes compusessem cada quadrinho por meio de sobreposição de imagem.

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Apesar de definir bem um contexto e dar uma inter-pretação para o conhecimento matemático, esta história não corrobora tanto com as teorias educacionais dentro THC, dis-cutidas pelo grupo do OBEDUC. Isto ocorre pelo fato de não contribuir para a reflexão, pois apresenta uma ideia pronta, que é “passada” para o aluno, sobre raiz quadrada. A utilização em sala de aula fica restrita às aulas sobre este conteúdo.

Dessa forma, “Tonico e a raiz quadrada” reforça alguns hábitos errôneos. A transposição de um texto matemático (de-finição do conceito de raiz quadrada) para um balão de fala (na última página) fortalece nos estudantes algumas concep-ções de que para aprender matemática deve-se decorar e me-morizar um conceito. Esta memorização garante que o aluno resolva um problema (como na história a personagem resolveu a raiz quadrada de trinta e seis) e alcance média máxima.

Além deste hábito, a história destaca dois estereótipos: a da pessoa de jaleco branco, reforçando o estereótipo daquele que detém o conhecimento (no caso o cientista) e o menino que vive na roça, reforçando o estereótipo de que o roceiro não tem conhecimento científico. O quadrinho pode ser utilizado em sala de aula, entretanto, o professor deve tomar o devido cui-dado, discutindo estes elementos estereotipados, para que não contribua para o desenvolvimento de preconceitos na criança.

Neste sentido, a história apresenta elementos que deve-mos trabalhar para superar, tanto para que possamos oportu-nizar um aprendizado significativo, quanto para que a ciência seja vista de forma melhor pela comunidade. Uma ciência que seja feita coletivamente, cooperativamente e de forma dinâmi-ca que reforce o aprendizado e não somente o decorar.

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Lutamos pela superação deste tipo de história, pois o que acompanhamos em alguns casos é a utilização de forma equivocada das HQ. Luyten (1985c) argumenta que algumas histórias em quadrinhos, principalmente naquelas presentes em livros didáticos, vêm sendo fortemente influenciadas pelo caráter comercial, ocorrendo diversas distorções. Segundo a pesquisadora de quadrinhos, alguns dos elementos mais co-muns nestas obras didáticas que utilizam HQ são: quadrinhos com excesso de texto e imagens muito chamativas em detri-mento do conteúdo.

A autora ainda discute que esta prática tem apenas dado uma nova roupagem para velhas imagens. Assim, é comum acontecer casos em que textos matemáticos são transportados para balões sem nenhuma adaptação. Alguns livros didáticos, por exemplo, utilizam-se de personagens e balões (um tipo de linguagem que remete às Histórias em Quadrinhos), mas o que se faz é transportar um texto matemático ou lançar perguntas que nada têm a ver com o contexto para o balão. Encontra-mos um exemplo disso na coleção Matemática e Realidade, de Gelson Iezzi, Osvaldo Dolce e Antônio Machado3 (Figura 2):

Figura 2 - Quadrinhos e livros didáticos.Fonte: Iezzi; Dolce; Machado (Editora Atual. 2009, p. 184) 6o ano.

3 Não questionamos a forma como o conhecimento matemático é abordado no livro, pois os autores se esforçam bastante em contextualizar os conceitos. Questionamos apenas a forma de utilização da linguagem das HQ.

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O livro em questão traz, a todo momento, referências às histórias em quadrinhos como na situação exposta ante-riormente. Entretanto, não há um cuidado em tratar o co-nhecimento, apenas de deixar o conteúdo mais atrativo por meio dos desenhos. Percebemos, tomando-se por base este exemplo, que as histórias em quadrinhos, apesar de serem um elemento que pode contribuir positivamente para as aulas de matemática, e em âmbito mais geral na educação como um todo, utiliza-se este recurso se preocupando apenas em atri-buir aos conceitos matemáticos um visual mais agradável ao aluno. Defendemos o uso de HQ como algo contribuinte para o desenvolvimento da imaginação, leitura, raciocínio lógico, criticidade e autonomia.

Sob esta ótica, Vergueiro (2012) argumenta que a uti-lização das HQ como forma de relaxar ou de descansar dos livros didáticos, quadro e giz, lista de exercícios e outros ma-teriais vistos como mais nobres, aos olhos de alguns profis-sionais, pode levar a resultados opostos aos previstos inicial-mente. A utilização como forma de descanso pode contribuir para a criação de uma barreira de leitura das HQ por parte dos alunos, na medida em que esta ferramenta vai ser com-preendida como um elemento que não favorece o estudo, mas apenas o descanso.

Esta postura adotada por nós foi compartilhada pelos participantes do curso. Assim, ao longo do curso discutimos que, segundo nossa visão de educação, as HQ construídas não deveriam apresentar conceitos matemáticos prontos, mas fazer o aluno refletir para construir estes conceitos, entendendo a neces-sidade de sua criação e em quais contextos podem ser aplicados.

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Uma das HQ produzidas durante o curso, “A festa do Tangran” (figura 3), apresenta esta característica. Apesar das personagens serem entes geométricos, os textos da HQ não tratam de forma explícita de conceitos referentes à geometria. Entretanto, em uma aula de matemática, o professor pode uti-lizar esta história para introduzir polígonos, classificando as personagens da história quanto ao número de lados.

São diversas as possibilidades de utilização dessa histó-ria em contexto educacional. A forma de utilização e os con-teúdos explorados ficam à escolha do professor, dependendo dos objetivos de ensino tratados inicialmente.

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Figura 3: A festa do Tangram.Fonte: Os autores

A história “A festa do Tangran” foi produzida por um grupo que chamamos de Grupo 2 que era composto de dois professores de matemática e um professor de física. Os par-ticipantes optaram por produzi-la tomando por base os seus próprios desenhos, sem nenhuma ajuda externa.

Graficamente, a HQ foi bem produzida, optando por traços mais básicos. Os textos nos balões, por outro lado, fo-ram bem pensados, para que em nenhum momento atribuís-sem respostas prontas para os estudantes, mas que fizesse com que eles refletissem sobre os conceitos matemáticos ao longo da história.

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Além disto, o texto colabora para discussão de um tema que estava em voga na época de produção da história: o bullying. A discriminação por parte de uma maioria direcio-nada a uma minoria que não se encaixa nos padrões impostos pela sociedade é uma temática fortemente presente na histó-ria. “A Festa do Tangran”envolve alguns elementos presentes no cotidiano (como o bullying) e também estudos relativos à geometria, como por exemplo: propriedades de círculos, triângulos e quadriláteros; Tangran e suas possibilidades de montagem; inscrição e circunscrição, dentre outras.

É uma história que um professor de matemática pode utilizar em diversos momentos, no ensino fundamental, como na introdução dos polígonos (6o ano) trabalhando a ideia de plano, nas propriedades de figuras geométricas (7o ano) e no estudo da inscrição ou circunscrição (8o e 9o ano).

Dessa forma, a história tem um aspecto educativo que faz o aluno refletir sobre os conceitos matemáticos presentes nos balões e nos desenhos, mas sem perder sua beleza estética. Acreditamos que para uma primeira história em quadrinho construída pelos integrantes do grupo ficou um trabalho real-mente notável.

A história apresenta um simbolismo bem trabalhado, em que as personagens, apesar de serem figuras geométricas, se assemelham aos humanos em seus costumes e relações so-ciais, bem como no mundo que habitam. Além disso, uma das personagens é descriminado por ser redondo, remetendo à exclusão social sofrida pelos obesos. Esta característica de “A festa do Tangran” é identificada por Mendonça (2008). A au-tora argumenta que a linguagem das histórias em quadrinhos,

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tanto por meio do texto, quanto por meio dos desenhos, (re)cria as relações sociais em um contexto sociocomunicativo di-ferente. As relações e os papeis sociais são representados pelas personagens em suas interações no decorrer da trama.

Mesmo que as personagens sejam apenas figuras geo-métricas, com traços que fujam totalmente aos de um ser humano, eles têm semelhança com a realidade em seus com-portamentos, elementos do meio social e dificuldades que os excluídos sociais passam cotidianamente. Estes temas recebem igual importância na produção da história, pois contribuem para uma reflexão que extrapola os conhecimentos escolares.

Esta história incorporou bem os ideais de educação matemática defendidos pelos professores participantes do OBEDUC. Diferentemente do grupo que produziu o quadri-nho “Tonico e a raiz quadrada”, que pouco contribuiria para trabalhar o conhecimento matemático de forma significativa. Entretanto, é importante ressaltar que esta foi a primeira pro-dução de HQ que envolva o conhecimento matemático de cada um dos professores que participou do curso.

Assim, apesar de nem todas as HQ tratarem o conhe-cimento matemático de forma contextualizada e significativa, como defendido pelo grupo OBEDUC, acreditamos que boa parte dos professores teve a oportunidade de compreender os elementos das HQ. Antes do curso, poucos destes profissio-nais pensariam em utilizar as HQ em aulas de matemática. A maioria desmistificou muitas ideias simplistas ou precipitadas, incorporando os quadrinhos à sua prática, conseguindo cons-truir suas próprias histórias.

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O desfecho da históriaAo longo do curso, os professores se esforçaram em

produzir histórias em quadrinhos que incorporassem estes ele-mentos. A reflexão fez parte da história “A festa do Tangran”, pois possibilitam a apreensão de conhecimentos matemáticos, não de forma passiva, mas com base na reflexão. A história de “Tonico e a raiz quadrada” não incorpora estes elementos, sendo necessário ainda a intervenção do professor para que o aluno não tome para si visões estereotipadas (discutidas ante-riormente).

Acreditamos que a produção da HQ “A festa do Tan-gran” com estas características foi possível porque os profes-sores participam do OBEDUC, que os auxiliam a construir atividades que façam o aluno refletir e perceber a importância do conhecimento matemático. Entretanto, é possível perce-bermos que apesar de os professores estarem imersos em um ambiente de discussões sobre um processo educacional pauta-do na THC, nem todos conseguiram produzir histórias com as características desta teoria.

Com base nestas histórias construídas acreditamos que é importante que além de proporcionar os meios necessários para o professor trabalhar com as HQ em contexto educacio-nal, é necessário promover reflexões para que os quadrinhos produzidos possam realmente contribuir para um aprendiza-do significativo. As histórias em quadrinhos produzidas pelos professores devem informar, formar e promover reflexões sobre os conceitos estudados (CAMPOS; LOMBOGLIA, 1985b).

Todavia, para uma primeira criação de histórias em quadrinhos, que tratam do conhecimento matemático, de um

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modo geral, os participantes se saíram bem, tendo produzido histórias que possam ser incorporadas à prática de cada um dos professores ali presentes, podendo gerar discussões em sala de aula que possam contribuir positivamente para o aprendi-zado dos estudantes.

Referências

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CAPÍTULO 04

O USO DE EPISÓDIOS HISTÓRICOS NO ENSINO DE MATEMÁTICA: UMA SEQUÊNCIA DIDÁTICA

UTILIZANDO QUADRINHOS

Ana Carolina Costa PereiraLaura Andrade Santiago

Wendy Mesquita de Morais

Principais motivaçõesMuito se tem discutido sobre a dificuldade da apren-

dizagem dos alunos no nível fundamental e médio. Pesquisas apontam que dentre as disciplinas escolares, a matemática é considerada a mais difícil. Um dos motivos por parte dos estu-dantes é que a matemática é estudada fora de um contexto real e está cheia de fórmulas para decorar. No ponto de vista do professor, essa dificuldade está relacionada à falta de interesse dos estudantes, principalmente em relação ao modo como a Matemática é apresentada em sala de aula. Segundo Mendes (2009) é através de um ensino mais prático e dinâmico por parte do professor e dos estudantes, relacionado com brinca-deiras, atividades práticas e experimentais que o aprender da matemática se tornam mais eficaz.

Devido a esses motivos, cresce um movimento que busca inovações metodológicas de ensino para que o profes-

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sor torne sua aula mais atrativa, denominado Movimento de Educação Matemática. Dentre essas metodologias, a história da matemática pode auxiliar na construção do conhecimento e na evolução de conceitos matemáticos. Segundo Groenwald (2004, p. 47):

o enfoque histórico é uma proposta metodológica que permite ao alu-no descobrir a gênese dos conceitos e métodos que aprenderá em aula. Em outras palavras este enfoque permitirá ao aluno fazer relação das ideias mate-máticas desenvolvidas em sala de aula com suas origens. O conhecimento da história da matemática proporciona uma visão dinâmica da evolução dessa disciplina, buscando as idéias originais em toda sua essência.

A busca pelas origens dos conceitos pode levar o estu-dante a conhecer a matemática sob um ponto de vista diferen-te do que tradicionalmente lhe é ensinado, levando-o a perce-ber que a matemática não é uma ciência pronta e acabada, mas que sofre modificações ao longo de sua história.

Atualmente a história da matemática, na maioria das vezes, é utilizada em sala de aula apenas como elemento mo-tivador ao desenvolvimento do conceito, principalmente na introdução de conteúdos resumindo-se a contar histórias “en-graçadas” focado em fatos e datas decorrentes das biografias dos matemáticos.

No que se refere a inserção da história da matemática nos livros didáticos de Matemática do Ensino Fundamental,

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percebemos que esse recurso inclui citações históricas no de-senvolvimento de seus textos de maneira imprópria. Segundo Bianchi (2006, p. 03) “muitas vezes esta inserção se resume na apresentação de biografias de alguns matemáticos, de datas ou curiosidades históricas, sem a devida compreensão ou adequa-ção desta abordagem”. Notamos que, mais uma vez, o uso da história da matemática na sala de aula poderia agregar outros recursos e atingir objetivos que podem ir além de “contação de histórias”.

Nesse sentido, a união entre esses “fatos” sobre a his-tória da matemática e outros artifícios, como por exemplo, a confecção de quadrinhos, construção de instrumentos mate-máticos, etc, podem fornecer uma ferramenta que pode ser uti-lizada no entendimento de conteúdos matemáticos. De acordo com D’Ambrósio (1996, p. 31):

é muito difícil motivar com fatos e si-tuações do mundo atual uma ciência que foi criada e desenvolvida em outros tempos em virtude dos problemas de então, de realidade, de percepções, ne-cessidades e urgências que nos são estra-nhas. Do ponto de vista de motivação contextualizada, a matemática que se ensina hoje nas escolas é morta. Poderia ser tratada como um fato histórico.

Essa motivação contextualizada referida por D’Am-brósio (1996), não necessariamente deve vir de momentos no cotidiano do aluno, mas como ele mesmo menciona, pode ser “um fato histórico” que foi importante dentro do desenvolvi-mento de um conceito.

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Esse fato histórico pode ser inserido, por exemplo, a partir de episódios históricos da matemática, verdades e/ou mentiras (ou interpretações errôneas), que estão em livros, textos de história da matemática e que chegam às salas de aula.

Segundo Nobre (2004, p. 531) “é tradição na história do conhecimento científico o batismo de determinadas teorias com o nome de seu descobridor, ou do cientista que teve a maior dose de contribuição para se chegar a determinado re-sultado”. Muitas histórias são contadas sem provas concretas, como é o caso da história antiga da Matemática como, por exemplo, os feitos de Tales de Mileto, a autoria de Os Ele-mentos por Euclides, e até o caso de Arquimedes, gritando nu pelas ruas: Eureca! Eureca!

Figura 1 - Cena de Arquimedes na banheira. Fonte: http://www.ahistoria.com.br/arquimedes/.

Além de informações históricas, sem provas concretas, ainda existem informações históricas distorcidas (disputa aca-dêmica – Newton x Leibniz), informações históricas ocultas (Idade Média - Período das Trevas) que fazem parte do univer-so científico da história da matemática.

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Todos esses fatos históricos que entram na sala de aula permitem ao aluno uma viagem ao passado, e, adicionando a ele outro recurso, permitirá ao professor abordar conteúdos empregando estratégias diferenciadas, atingindo os objetivos propostos. Atrelado a esses fatos ou episódios, nomenclatura que iremos adotar, pode-se propor uma sequência de ensino por meio de atividades ligadas a história preservando as expe-riências manipulativas e visuais do estudante.

Nesse sentido, iremos propor sequências de atividades construídas por meio do episódio histórico e do quadrinho, vi-sando promover uma aprendizagem significativa e autônoma.

Entendendo o que é um episódio e sua utilização no en-

sino de matemáticaAo perguntar o que é um episódio, a primeira ação é

ir a um dicionário, para entender seu conceito. No dicionário Aurélio Buarque de Holanda (2015), encontramos que um episódio é um “Incidente acessório, mas intimamente relacio-nado com a ação principal de uma produção literária. Cena acessória num quadro. Aventura; fato; passo; lance. Parte ou divisão de uma obra literária, de uma série de televisão, de um filme, etc”.

No dicionário Michaelis (2015) um episódio é um “In-cidente relacionado com a ação principal numa obra literária ou artística. Cena acessória que se junta à ação principal dum quadro. Variedade ou incidente no tema de alguma composi-ção musical. Fato acessório”.

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Percebemos que em ambos os dicionários, episódio tem sua finalidade relacionada a aspectos culturais voltados para a ação. Dessa maneira, iremos adotar como episódio uma nar-rativa que apresente um acontecimento solto ou fato isolado, relacionado com uma série de outros fatos. Ele pode ser cons-truído de diversas maneiras: na forma de um texto curto, num vídeo produzido, em uma peça teatral, em forma de uma pa-ródia ou música, ou mesmo em uma história em quadrinhos.

Um episódio ocorrido na história da matemática é um fato que conta uma descoberta matemática em uma extensão menor, podendo ser uma história ou estória, verdade ou fic-ção, que mostre um momento em que a sociedade teve ideias que deram forma a nossa cultura e ao seu desenvolvimento.

Nesse sentido, um episódio de história da matemáti-ca pode estar presente na sala de aula de diversas formas. Ele pode ser apresentado de forma lúdica e com problemas curio-sos, como uma fonte de pesquisa, como introdução de um conteúdo ou atividades. Também podemos apresentar a mate-mática de uma forma mais filosófica, com atividades diferen-ciadas que vão além de exercícios de memorização e fórmulas, que possibilita ser vista de uma forma mais contextualizada.

O uso do episódio ajuda a fazer uma integração entre conteúdos de matemática e outras disciplinas, uma vez que acompanha o desenvolvimento da sociedade, pois ele mostra a forma na qual os homens construíam suas ideias, devido uma necessidade prática, cultural, econômica, política ou social. Corroborando com D’Ambrósio (1999, p. 97), “acredito que um dos maiores erros que se pratica em educação, em particu-lar na Educação Matemática, é desvincular a Matemática das outras atividades humanas”.

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Essa relação entre episódios históricos e ensino de ma-temática pode contribuir para uma experiência docente e dis-cente no sentido de possibilitar mais ferramentas (recursos) direcionadas ao ensino e a aprendizagem da matemática.

Assim sendo, vincular a Matemática com aconteci-mentos que foram importantes no decorrer de sua história pode torná-la mais viva, que não se limita a um sistema de regras e verdades rígidas, mas é algo humano e envolvente. A seguir, apresentaremos alguns episódios construídos com fatos ocorridos durante a história da matemática.

Episódios e Quadrinhos: conectando ideiasO uso de quadrinhos voltados para o ensino de Mate-

mática embora um pouco incipiente, vem ganhando forças no cenário brasileiro, sobretudo com o aparecimento desse artifí-cio em avaliações conhecidas nacionalmente: ENEM, SAEB, Prova Brasil e as próprias provas de vestibulares. Esse fato im-pulsionou o uso de quadrinhos na sala de aula, em particular nas aulas de matemática.

Antes conhecida apenas como forma de lazer, hoje estampadas em enunciados de provas. Muitas já conhecidas por nós leitores desse gênero literário, outras confeccionadas por amadores, direcionadas estritamente ao uso na educação. Mas utilizar o quadrinho se reduz a encontrá-lo apenas como elemento secundário em um texto? A resposta é não, pois a função do quadrinho na educação perfaz outras dimensões inerentes ao próprio saber, seja ele construído ou não.

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Dentre as formas de inserção do uso de quadrinhos nas aulas de matemática podemos contabilizar pelo menos quatro delas: a construção de quadrinhos com os alunos, a própria confecção do quadrinho pelo professor, utilizar quadrinhos expostos nas mídias ou utilizar quadrinhos confeccionados para o fim educacional.1

Nas duas primeiras alternativas um elemento dificul-tador seria a técnica de construir o quadrinho. Embora exis-tam vários vídeos disponibilizados na internet para ajudar a ultrapassar esse obstáculo, ainda assim é um fato que pode retrair o uso desse possível recurso metodológico.

Nossa experiência com a utilização do quadrinho no ensino de matemática voltado principalmente para a forma-ção inicial de professores nos tem mostrado que já não é uma barreira o não saber desenhar. Dependendo do que será pro-posto um “bonequinho com a cabeça grande e com o corpo e pernas feitos de pauzinhos” já é o suficiente para empregar esse recurso. Na figura 2 apresentamos uma tirinha de traçado simples do renomado Luis Fernando Veríssimo:

Figura 2 - Exemplo de quadrinho com traçado simples.Fonte: Veríssimo (2010).

1 Ver mais detalhes dessas inserções em Pereira (2014).

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Entretanto, mesmo com a habilidade para o desenho ou com a falta dela, sem um roteiro bem elaborado, dificil-mente obteremos êxito no produto desenvolvido. O roteiro de uma tirinha é uma ferramenta necessária para o desenvol-vimento da história na qual irá ser apresentada, tendo ele a função de passar uma mensagem de forma clara e específica.

Ele é um guia no qual leva o criador da tirinha a não se perder do conteúdo que está sendo programado. Ele deve ser bem elaborado e seguir alguns passos, contendo pontos que jamais poderão ser esquecidos para a elaboração da tira. Um dos pontos que é essencial para um tirinha bem feita é a escolha da história.

Nesse sentido, podemos relacionar o roteiro da tirinha com o episódio discutido anteriormente. O episódio, já cons-truído, facilita o processo de criação do quarinhos, pois en-tendemos que é a partir da uma história pronta que se define melhor as ideias e os detalhes da narrativa que se pretende criar. Dessa maneira é de extrema importância ter uma ideia geral da história e o episódio servirá como suporte para a cria-ção de um material.

Episódios de história da matemáticaConstruir um episódio voltado para a história da ma-

temática requer leitura e dedicação para quem está propondo esse recurso. Primeiramente, devemos escolher o conteúdo do qual o episódio irá tratar e a partir dele fazer um levantamento sobre sua história, sob um ponto de vista social/cultural, de aplicação ou mesmo puramente matemático. Nesse ponto é importante pesquisar em fontes “confiáveis”, sejam em livros,

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artigos, revistas científicas, sites ligados a universidades, ou ou-tros. Em relação à narrativa, não deve conter uma linguagem “pesada”, nem ser longa, porém deve chegar ao leitor de forma compreensível e direta.

Nossa sugestão é escolher temas que, no cotidiano es-colar, apresentem dificuldade de aprendizagem para o aluno e favoreçam ultrapassar alguns obstáculos epistemológicos his-tóricos. Outro ponto é o título do episódio que deve estar em consonância com o tema e o conceito desenvolvido.

Dessa maneira, construímos nossos primeiros episó-dios pautados nos seguintes conteúdos: introdução ao sistema de numeração, probabilidade, proporcionalidade, frações e introdução às potências. As fontes utilizadas foram os livros clássicos de história da matemática: Eves (2004), Katz (2010), Boyer e Merzbach (2012) e Cajori (2007); sites de história da matemática: MacTutor History of Mathematics2; vídeos produ-zidos pela BBC - British Broadcasting Corporation e traduzidos pela UNICAMP3 e a M3 - Matemática Multimídia4 desenvol-vido pela UNICAMP.

A seguir, apresentaremos dois exemplos de episódios construídos em conjunto com os quadrinhos confeccionados.

2 http://www-history.mcs.st-and.ac.uk/. 3 Todos os vídeos estão disponíveis no canal do youtube da univesptv: https://www.you-tube.com/user/univesptv. 4 O portal principal da coleção M³ Matemática Multimídia, que contém recursos educacionais multimídia em formatos digitais desenvolvidos pela Unicamp: http://m3.ime.unicamp.br/.

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Pastor de ovelhas... em uma necessidade de contar!Há muito tempo, um pastor sentiu a necessidade de

controlar o seu rebanho. Ele percebeu que precisava saber a quantidade de ovelhas que voltavam do pasto, então pensou: “por que eu não utilizo pedrinhas para controlar o meu re-banho?” Ele soltou suas ovelhas no pasto e para cada uma que passava, ele colocava uma pedra dentro de um saquinho. Quando o pastor ia buscar suas ovelhas, ele retirava do saqui-nho uma pedra por ovelha que passava. Com esse processo, se sobrassem pedras, ele ficaria sabendo que havia perdido ove-lhas. Caso contrário, se tivesse pedras a menos, o pastor ficaria feliz, pois teria ganhando mais ovelhas para o seu rebanho! Dessa forma ele conseguiu manter o controle.

FFigura 3 - Pastor de ovelhas... em uma necessidade de contar!Sem contar... Não dá!Fonte: Elaborada pelas autoras.

Tales em... O desafio da pirâmideUm famoso matemático e filósofo grego, também co-

merciante, chamado Tales de Mileto, era um homem cheio de contatos com outros povos. Por conta disso, decidiu viajar para o Egito e, nessa viagem, Tales foi desafiado. Deram-lhe

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um problema: qual é a altura da grande pirâmide de Quéops construída por volta de 2500 a.C. Partindo do princípio de que existe uma razão entre a altura do objeto e o comprimento da sua sombra, Tales teve uma brilhante ideia. Ele fixou uma vara no extremo da sombra da pirâmide, surgindo assim, a sombra da vara, formando triângulos semelhantes. Tales pôde calcular a altura da pirâmide.

Figura 4 - Tales em... O desafio da pirâmideO DesafioFonte: Elaborada pelas autoras.

A partir do episódio e do quadrinho é possível cons-truir sequências didáticas para que esse material possa ser apli-cado como um recurso didático nas aulas de matemática.

Construindo sequências didáticasUma sequência didática é o conjunto de atividades

conectadas, delineadas para ensinar um determinado conteú-do, passo a passo, estruturada e ajustada com os objetivos que estão sendo propostos pelo professor de modo a alcançar a aprendizagem de seus alunos. É uma maneira de planejamen-

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to e tornará as aulas do professor mais organizadas e alinha-das as diretrizes atuais. Segundo Zabala (2008, p. 18) uma sequência didática é “um conjunto de atividades ordenadas, estruturadas e articuladas para a realização de certos objetivos educacionais, que têm um princípio e um fim conhecido tan-to pelo professor como pelos alunos”.

Dentro do campo da pesquisa, a sequência didática pode ser encontrada na Teoria das Situações Didáticas de Guy Brousseau (1986) e na segunda fase da Engenharia Didática de Michele Artigue (1988)5 como elemento da análise a priori. Segundo Teixeira e Passo (2013, p. 162):

uma sequência didática é uma série de situações que se estruturam ao longo de uma quantidade prefixada de aulas. Devidamente estruturadas, essas situa-ções têm como objetivo tornar possível a aquisição de saberes bastante claros, sem esgotar o assunto trabalhado. Des-se modo, uma sequência didática não pode, a priori, ter seu tempo de dura-ção estipulado de acordo com o progra-mado, pois o seu cumprimento leva em conta as necessidades e as dificuldades dos alunos durante o processo.

Nesse sentido, estruturar sequências didáticas pode propiciar uma melhoria no ensino e na aprendizagem da ma-temática, pois necessariamente envolve os três eixos base da educação: o professor, o aluno e o saber – o conhecimento do conteúdo matemático. Outro ponto é o caráter investigativo

5 Ressaltamos que a Teoria das Situações Didáticas é à base da metodologia da Engenharia Didática.

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que a atividade pode possibilitar, estruturando a construção do conhecimento de modo a experimentar, a generalizar, a abstrair, e a formar significados a partir dos conceitos estu-dados.

Essas sequências, nesse estudo, elucidam uma escola de concepção de aprendizagem do professor, uma vez que ele reflete o modo de ver como os alunos se apropriam de um de-terminado conhecimento matemático, a partir de atividades organizadas e orientadas.

Partindo da elaboração dos episódios e da confecção das tirinhas, propomos a construção de uma sequência didá-tica com o objetivo de posteriormente aplicá-la na educação básica. Utilizamos a estrutura de roteiro de atividade escolar para facilitar a padronização. Dessa maneira alguns elementos foram considerados: cabeçalho; objetivos do roteiro de ati-vidade; providências para a realização das atividades; pré-re-quisitos; descrição dos procedimentos; observações; material utilizado; referências adicionais; descrição da atividade para o professor e para o aluno.

No cabeçalho, consideramos importante conter eixo temático, tema, tópico, título e ano. No que se refere ao eixo temático, iremos utilizar o que os Parâmetros Curriculares Nacionais definem como blocos de conteúdos: números e operações; espaço e forma; grandezas e medidas; e tratamento da informação. O tema é o conteúdo geral da sequência didá-tica, enquanto o tópico é um subtema. O título é o nome da atividade que deverá ser realizada e o ano é o nível escolar em que o aluno pode desenvolver as atividades.

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As demais sessões serão: objetivos do roteiro de ati-vidade; providências para a realização das atividades; pré-re-quisitos; descrição dos procedimentos; observações; material utilizado; e referências adicionais.

Para as atividades, orientamos que na estrutura tenha inicialmente um texto referindo-se ao professor, apresentando o objetivo central e um resumo da atividade. Em seguida, que seja apresentada a descrição da atividade para o professor e para o aluno.

Na produção das sequências didáticas para os episódios “Pastor de ovelhas... Em uma necessidade de contar” e “Tales em... O desafio da pirâmide”, tivemos focos em segmentos educacionais diferenciados: ensino fundamental I e ensino fundamental II.

No primeiro episódio, “Pastor de ovelhas... Em uma necessidade de contar”, tivemos como eixo temático: Núme-ros e Operações; tema: Sistemas de numeração; tópico: Intro-dução ao princípio de contagem; e ano: pode ser utilizado de 4o ao 6o ano. Os objetivos foram pautados em: Apresentar a história da origem dos números; Mostrar a ideia de número e numeral; Explorar diferentes representações para os números decimais; Decomposição dos algarismos de base decimal.

O professor poderá iniciar a aula perguntando aos alu-nos o que eles sabem sobre a história dos números, em segui-da, entregará o episódio, Pastor de ovelhas... Em uma necessi-dade de contar!. Posteriormente, o professor fará uma leitura junto aos alunos e questionará que ideias eles extraíram. A seguir, fará uma leitura do quadrinho e iniciará uma discus-são sobre a importância dos números para a sociedade. Após

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as leituras e discussões, o professor entregará aos alunos uma atividade6 utilizando o modo de contagem correspondente a esse episódio, no qual poderá usar pedrinhas ou outros itens disponíveis em sala de aula.

Em relação às atividades propostas, sugerimos quatro, mas iremos expor apenas uma delas.

Atividade Após a reflexão da leitura do episódio e da tirinha, o

professor pode dar a ideia do que é número e como é chamado e representado. Além de ficar ao seu critério mostrar aos seus alunos outras formas de representação. Em seguida, o profes-sor pode aplicar o exercício abaixo:

Considere o grupo de dedos de uma mão e o grupo das vogais do alfabeto:

(I) (II)

Figura 5 - Representação de números.Fonte: Elaborada pelas autoras.

• Os dois grupos têm a mesma quantidade?

• Qual o nome e símbolos que associamos a quanti-dade dos elementos dos dois grupos?

6 Essa atividade foi confeccionada previamente, porém, devido a sua extensão, não iremos inserí-la no texto, citaremos apenas alguns exemplos.

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Na tirinha “sem contar... não dá!” no primeiro quadro do quadrinho, podemos observar a quantidade de ovelhas que já estão no pasto. Em seguida, responda:

• Que nome você dá à quantidade de ovelhas do pri-meiro quadro?

• Qual símbolo que associamos a quantidade de ovelha?

No segundo episódio “Tales em... O desafio da pirâ-mide”, tivemos como eixo temático: Grandezas e Medidas; tema: Semelhança; tópico: Semelhança de triângulos; e ano: pode ser utilizado de 9o ano. Os objetivos foram pautados em: Apresentar as contribuições de Tales para a matemática; Dis-cutir a forma que historicamente foi estudado semelhança de triângulo; Estudar semelhança de triângulo; Fazer aplicações sobre semelhança de triângulo.

O professor iniciará a aula indagando aos alunos o que eles sabem sobre um objeto ser semelhante a outro, ou o que é semelhança. Nesse momento ele pode enfatizar a ideia de semelhança na vida real e fazer o questionamento: como sa-bemos qual é a altura no mastro da bandeira sem medi-la? Em seguida, ele entregará o episódio “Tales em... O desafio da pirâmide”, e discutirá7 com os alunos de qual forma Ta-les conseguiu resolver o problema. Será que tinha fita métrica na época? Será que ele subiu na pirâmide? Nesse momento o professor pode falar um pouco sobre a biografia de Tales e sua contribuição para a matemática.

7 Nesse momento o professor pode direcionar sua aula para a atividade 01 do roteiro.

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Após a discussão, ele pode explicar o método pensado por Tales para resolver o problema e indicar algumas ativida-des teóricas, aplicada e experimental para os alunos realizarem em sala ou em casa.

Sugerimos três atividades a serem trabalhadas sobre o conteúdo, disponibilizamos também orientações para o pro-fessor e para o aluno.

Atividade 01Após a leitura e discussão do episódio e da tirinha, o

professor pode aprofundar mais um pouco sobre a história do desafio da pirâmide. Em seguida, ele pode aplicar a atividade abaixo:

1. De acordo com a tirinha, Tales teve outra ideia. Que ideia foi essa? Como ele a executou? Com ela, Tales conseguiu vencer o desafio? Em segui-da o professor poderá dar início à parte teórica do conteúdo.

2. Considerado que Tales foi desafiado a medir a pi-râmide de Quéops e que hoje já sabemos que sua medida original é de 149,9m de altura e sua base tinha aresta 230,28m, desafio você agora a medir o comprimento da sombra “Y” relativa à altura da pirâmide, partindo do pressuposto de que a vara tinha 2m e a sombra da vara tinha 3m.

Utilize como recurso a representação a seguir (Figura 6):

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Figura 6 - Esquema de semelhança da pirâmide de Quéops.Fonte: Elaborada pelas autoras.

3. Tales foi desafiado, agora será você! Logo, desa-fio a calcular a altura da estátua de Iracema que se encontra na Praia de Iracema, com as seguintes condições:

• Você irá imaginar que, assim como Tales, terá uma vara de 3 metros.

• Você irá fixar a vara e ir se distanciando dela até dois metros.

• Você já sabe que sua distância até a estátua é de 8 metros.

Agora resolva o desafio que foi lhe dado, podendo usar como recurso a figura a seguir (Figura 7):

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Figura 7 - Esquema de semelhança da estátua de Iracema.Fonte: Elaborada pelas autoras.

Atividade 02Após a leitura do episódio “Tales em... O desafio da

pirâmide”, realize uma experiência prática com os alunos, pe-dindo para eles calcularem a altura do mastro da bandeira ou posto da escola. Realize a atividade em um dia ensolarado, pois é necessário ter a sombra dos objetos. Iremos precisar de um bastão de madeira (cabo de vassoura e fita métrica).

Problema a resolver: Calcule a altura do mastro da bandeira ou posto da escola. Para isso vocês podem utilizar esse bastão de madeira e uma fita métrica, sem subir no poste. Remonte os passos feito por Tales, personagem do episódio e do quadrinho para resolver esse problema.

Ao final, o professor deve discutir as possíveis soluções encontradas pelos alunos.

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Atividade 03Após a leitura e discussão do episódio “Tales em... O

desafio da pirâmide”, leve os alunos ao laboratório de infor-mática da escola e apresente o objeto de aprendizagem: Me-dindo Objetos através de Semelhança de Triângulos, disponí-vel na página http://rived.mec.gov.br/atividades/matematica/medindo_objetos/. Desenvolva com eles as etapas do objeto, escolhendo como opção a cidade do Egito para realizar as me-dições. Relembre com eles o episódio e a tirinha discutida na aula e deixe-os resolverem as perguntas, orientando as dúvidas quando surgirem. Essa atividade pode ser realizada em duplas.

Percebam que as atividades são, na maioria das vezes, de forma questionadora e discursiva, direcionando a perspec-tiva de educação atual, que mobilize o aluno a ser agente ati-vo nesse processo, assim como questionador da sua própria aprendizagem. Nossa intenção é suscitar uma iniciativa nessa potencialidade didática e possibilitar ao professor a construção de outras atividades em forma de vídeos, textos, histórias em quadrinhos, entre outros.

Considerações FinaisA junção do estudo de episódios da história da mate-

mática com quadrinhos ainda é embrionário. Nossos primei-ros estudos nos levaram a uma aplicação por meio de um cur-so de extensão universitária ofertado no primeiro semestre de 2015 na Universidade Estadual do Ceará – UECE, intitulado: “Utilizando a interfase dos quadrinhos para estudar história da matemática” que objetivava propor roteiros de atividades com quadrinhos confeccionados exclusivamente para inserir o

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estudo da história da matemática, marcando assim nosso pri-meiro contato com o assunto. A partir disso, buscamos funda-mentações mais estruturadas que pudessem embasar pesquisas futuras.

Percebemos que existe uma grande potencialidade nes-sa proposta, porém precisamos ampliar o uso desse o material e aplicar empiricamente com professores que estão atuando em sala de aula e com seus alunos. Ressaltamos que o professor deve apreender a proposta e assumir uma postura inovadora ao trabalhar com o uso de episódios da história da matemática com quadrinhos no ensino.

Dessa maneira, o professor pode confeccionar seus próprios episódios e consequentemente seus quadrinhos para qualquer conteúdo desejado e aplicar em algum momento de sua aula: introdução, discussão, ou finalização de conteúdo estudado; enunciado de exercícios ou provas; ou mesmo como proposta de trabalhos interdisciplinar, feiras culturais, semi-nários, etc.

Nossa pretensão é explorar mais esse assunto e fazer chegar esse tipo de pesquisa às mãos dos professores, princi-palmente para que proporcione diferentes recursos metodoló-gicos para o uso na sala de aula.

Almejamos que se torne mais frequente o uso dos quadrinhos nas aulas de matemática, não só como um elemento motivador, mas como uma ferramenta didática que articule diferentes domínios da Matemática, assim como expor interrelações entre a Matemática e outras disciplinas.

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CAPÍTULO 05

OBSTÁCULOS E DIFICULDADES NA APRENDIZAGEM DOS NÚMEROS INTEIROS: UMA

ANÁLISE DOS ESTUDOS DE GEORGES GLAESER

Joelma Nogueira dos Santos

Não existem números absurdos, irracionais, irregulares, inexplicáveis, ou surdos; e, sim, que, entre eles (os números), há uma tal excelência e coe-rência, que temos meios de medir a noite e o dia, em sua admirável perfeição (Si-mon Stevin).

A história à luz de Carl Benjamim Boyer: como os mate-máticos encararam os números negativos?

Os números inteiros negativos levaram cerca de 1600 anos para serem conceituados e compreendidos. Do início de seu desenvolvimento até sua finalização, muitos matemáticos traba-lhavam com esses números de maneira não formal e sem domi-ná-los totalmente por falta de uma compreensão epistemológica. Vamos agora fazer uma breve análise histórica dos fatos desde os séculos I e II a.C. aproximadamente até o século XIX d.C.

Os primeiros povos que aparecem historicamente ma-nuseando a ideia de sobra e de falta foram os chineses. Embora a compreensão desses valores fosse ainda bem rudimentar, por

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volta dos séc. I e II a.C. já manipulavam números inteiros por meio de um sistema de barras vermelhas e pretas para valores positivos e negativos, respectivamente, conforme se pode ler em Boyer (1974, p. 147):

a idéia de números negativos parece não ter causado muitas dificuldades aos chineses pois estavam acostumados a calcular com duas coleções de barras – uma vermelha para coeficientes posi-tivos ou números e uma preta para os negativos. No entanto não aceitavam a ideia de um número negativo poder ser solução de uma equação (BOYER, 1974, p. 147).

Diofante de Alexandria no final do séc. III d.C. foi considerado um dos principais estudiosos da época a fazer referência a regra dos sinais. Embora não atribuísse uma im-portância considerável aos números negativos, citava-os como aquilo que falta (Glaeser, 1985).

No séc. VII d.C, o trabalho dos hindus sobre conheci-mento desses números ficou em evidência. Brahmagupta tra-balhou com os negativos ao pesquisar resoluções de equações quadráticas, em que apareciam raízes negativas. Daí a citação dos mesmos em sua obra:

As contribuições de Brahmagupta à álgebra são de ordem mais alta que suas regras de mensuração, pois aqui achamos soluções gerais de equações quadráticas, inclusive duas raízes mes-mo quando uma delas é negativa. A

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aritmética sistematizada dos números negativos e do zero, na verdade, encon-tra-se pela primeira vez em sua obra. Equivalentes das regras sobre grandezas negativas eram já conhecidas através dos teoremas geométricos dos gregos sobre subtração, como por exemplo, (a–b) (c – d) = ac + bd – ad – bc, mas os hindus as converteram em regras numéricas sobre números negativos e positivos (BOYER, 1974, p.160).

Ainda sobre o conhecimento hindu, observou-se que Bháskara (1114-1185) apontou um número positivo, tendo duas raízes quadradas, uma positiva e outra negativa, mas deixou claramente mostrado em seus estudos a impossibilidade de se ex-trair raiz quadrada de um número negativo (GLAESER, 1985).

Os gregos já conheciam as regras de sinais referentes a esses números. Para tanto, valiam-se de observações geométri-cas, as mesmas apresentadas por Brahmagupta.

Figura 1 - representação geométrica para justificar as regras de sinais.Fonte: Da autora.

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Porém, foram os hindus que transformaram em regras numéricas de quantidades positivas e negativas e passaram o conhecimento para os árabes que compreendiam, mas não as aceitavam por completo. Boyer (1974, p. 169) afirma que embora “os árabes rejeitassem as raízes negativas e grandezas negativas, conheciam as regras que governavam o que chama-mos de números com sinal”mostrando que os árabes também conheciam as regras geométricas. Entretanto, excluíam quais-quer cálculos envolvendo números negativos.

Na época renascentista, nos séculos XV e XVI, mui-tas operações eram feitas por comerciantes ao vender ou tro-car mercadorias e essa prática fez com que os matemáticos se dispusessem a trabalhar com um novo tipo de número que indicava as perdas e as dívidas: os números negativos.Um co-merciante, por exemplo, armazenava sacas com 10kg de arroz. Quando vendia 7kg colocava o restante em outra saca que já tinha 10kg, escrevia o número 3 com dois tracinhos na frente para lembrar que havia 3kg a mais na saca do que a quantida-de inicial.Essa prática comercial foi o início da formalização do sinal indicativo.

Percebendo que a notação era prática, os comerciantes passaram a usar o si-nal de positivo (+) ou de negativo (-) na frente dos números para indicar ga-nho ou perda de quantidades. Os nú-meros com sinal – (menos) passaram a ser chamados de negativos e usados para representar as soluções de opera-ções como 6–9, por exemplo, (PIRES, CURI E PIETROPAOLO, 2002, p. 103).

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A primeira menção de um número negativo com quan-tidade isolada é feita por Nicolas Chuquet (séc. XV d.C.), em sua obra Triparty com equações do tipo 4x = – 8, mostrando forte influência dos estudos de Fibonacci.

Michel Stifel (1487–1567), em seus estudos sobre equações quadráticas, procurou trabalhar com raízes positivas, pois as negativas ele próprio recusava. Stifel chamava as quan-tidades negativas de números absurdos.

Usando coeficientes negativos em equações, Stifel pôde reduzir a multiplicidade de casos de equações quadráticas ao que parecia como uma única forma; mas teve que explicar, por uma regra especial, quando usar + e quando -. Ainda mais, até ele recusou admitir números negativos como raízes de uma equação. Stifel, um ex-monge [...] foi um dos muitos autores a di-fundir os símbolos “alemães” + e – às custas da notação “italiana” p e m. Co-nhecia muitíssimo bem as proprieda-des dos números negativos, apesar de chamá-los “numeri absurdi” (BOYER, 1974, p. 206).

Gerônimo Cardano (1501–1576) em sua obra Ars Magna traz conhecimento sobre resolução não apenas de equações quadráticas, mas também cúbicas e quárticas a partir de informações adquiridas de NiccoloTartaglia (1500–1557) e de Ludovico Ferrari (1522–1565). Em suas contribuições considerava resultados negativos, mais complicados que os re-sultados irracionais e chamou os números negativos de núme-

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ros fictícios. Como afirma Boyer (1974, p. 210): “Os núme-ros negativos causaram dificuldades maiores porque não são aproximáveis por números positivos, mas a noção de sentido sobre uma reta tornou-os plausíveis. Cardano usou-os embora chamando-os de “numerificti””. Mesmo com sua postura em relação aos valores negativos, a partir desse século e graças a ele que os inteiros relativos passaram a ser reconhecidos.

A idéia de números negativos, porém, só foi plenamente aceita no séc. XVI, a partir da divulgação das idéias de Gerônimo Cardano (1501–1576), que demonstrou que os débitos po-dem ser associados a números negati-vos e que estes se aplicam regras ma-temáticas muito semelhantes às dos números positivos (PIRES, CURI E PIETROPAOLO, 2002, p. 73).

François Viète (1540–1603) e Albert Girard (1590–1633), figuras consagradas do período moderno da matemática já conheciam as raízes negativas e imaginárias em seus estudos sobre equações, porém, Viète, mesmo generalizando a resolução de equações, recusava-se a aceitar coeficientes ou raízes negativos. Diferente de Girard que compreendia e aceitava tanto valores positivos como negativos, contribuindo assim para o desenvolvi-mento das relações entre coeficientes e raízes de uma equação e, posteriormente, para o estudo dos números complexos.

Coube a Girard em 1629, em Invention nouvelle enl’algebre, enunciar claramen-te as relações entre raízes e coeficientes, pois ele admitiu raízes negativas e ima-

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ginárias, ao passo que Viète reconhecia apenas as raízes positivas. De um modo geral Girard percebia que as raízes negativas são orientadas em sentido oposto ao dos números positivos, an-tecipando assim a idéia de reta numé-rica. “O negativo em geometria indica um retrocesso”, ele disse, “ao passo que o positivo é um avanço”. Parece que a ele também se deve a percepção de que uma equação pode ser tantas raízes quanto indica seu grau. Girard conser-vou as raízes imaginárias das equações porque elas exibem os princípios gerais na formação de uma equação a partir de suas raízes (BOYER, 1974, p. 224).

Thomas Harriot (1560–1621), contemporâneo de Viète, tinha noção das relações estudadas por Girard, mas não as utilizavam, pois não compreendia os números negativos. Sobre o assunto Boyer (1974, p. 224) afirma que “Harriot conhecia as relações entre raízes e coeficientes e entre raízes e fatores, mas como Viéte ele era prejudicado por não reconhe-cer raízes negativas e imaginárias”.

Simon Stevin (1548–1620) utilizou a aritmética e a geometria para explicar a multiplicação de sinais: “mais multi-plicado por mais, dá produto mais, e menos multiplicado por menos, dá produto mais, e mais multiplicado por menos ou menos multiplicado por mais, dá produto menos” (Glaeser, 1985, p. 48).

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GEOMÉTRICA ARITIMÉTICA

Figura 2 - Boletim GEPEM nº 17, ano 1985. pág. 48/9.

Nas demonstrações geométrica e aritmética apresenta-das na figura 2, Stevin tentou convencer todos que há uma explicação lógica na regra de sinais. Porém, não se arriscava a justificar a mesma por meio de resolução de equações. A partir dessas demonstrações, os matemáticos passaram a utilizar a regra quando necessário, pois evitávamos uso de números ne-gativos embora a fase de exploração do cálculo nesse período da história da humanidade os forçasse a utilizar as regras. A postura de Stevin diante dos números negativos é primeira manifestação clara do que Glaeser (1985) chama de ‘sintoma de evitação’, atitude dos matemáticos da época para utilizar apenas cálculos com números positivos.

René Descartes (1596–1650) foi um exemplo evidente do ‘sintoma de evitação. Embora tenha desenvolvido a regra de sinais em sua obra La géométrie, fazia referência aos números negativos como números falsos. Descartes em seu sistema de coordenadas cartesianas procurou estabelecer relações apenas com coordenadas positivas (no primeiro quadrante). Com re-

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lação ao sistema de eixos, mostrou sem detalhar as semirretas opostas que o formam, pois “nunca entendeu completamente o significado de coordenadas negativas” (BOYER, 1974, p. 251).

Pierre de Fermat (1601–1665), outro célebre exemplo de matemático que evitou trabalhar com números negativos, propôs um método diferente e, em alguns casos, os resultados com raízes falsas (negativas) fossem aceitáveis para a resolução de equações diofantinas. Isso porque “Fermat, como Descar-tes, não usava abscissas negativas” (BOYER, 1974, p. 254).

Ainda sobre o ‘sintoma de evitação’ podemos afirmar que Jaques Ozanam, ainda no séc. XVII d.C., publicou um dicionário de matemática, reservando um espaço para os tipos de números e não mencionou os negativos, mas ao destacar o assunto raiz, citou as raízes verdadeiras, falsas e imaginárias. A classificação de raiz falsa mostrou o quanto o valor negativo foi rejeitado e, embora os matemáticos o evitassem em seus cálculos, só confirmava cada vez mais sua importância diante da compreensão desse número (GLAESER, 1985).

Colin Maclaurin (1698–1746), em seu Tratado dos Fluxos afirmou que utilizar número negativo na álgebra era mais ou menos parecido com algo que não tinha fundamen-to real. Já no Tratado de Álgebra, Maclaurin mostrou que há duas espécies de quantidades, uma positiva e uma negativa e que esta última não está menos favorecida de regras que a primeira. Mas ao analisá-la como quantidade isolada, afirmou que não era possível conceber qualquer tipo de compreensão, mas no contexto algébrico era aceitável. De maneira simples ele tentou se explicar utilizando a igualdade +a - a = 0. Se mul-tiplicarmos os dois membros da igualdade por uma quantida-de n qualquer obteremos o valor zero ou, utilizando símbolos

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+n.a - n.a = 0. Partindo da mesma ideia, no princípio mul-tiplicativo com -n, tem-se (-n).(+a) = -n.a. Como os valores devem se anular então (-n).(-a), só poderia ser +n.a. Logo, -n.a + n.a = 0. Com isso Maclaurin quase entendeu os números negativos, se não fosse uma visão formalista que dele se apo-derou por causa das regras de sinais, fugindo basicamente da compreensão ao finalizar sua explicação.

Leonard Euler (1707–1783) assim como os outros ma-temáticos, manipulava de maneira grandiosa os números rela-tivos quando se tratava de cálculo, mas a compreensão pedagó-gica de Euler sobre o assunto ficou a desejar. Isso se evidenciou quando resolveu escrever uma obra mais didática e se viu na obrigação de justificar as regras de sinais (GLAESER, 1985).

Alexis Claude Clairout (1713–1765) em nada contri-buiu para seu desenvolvimento dos números relativos. Utili-zou um método de forma que passassem despercebidas todas as dúvidas sobre os negativos, mesmo não havendo documen-tação suficiente para mostrar sua omissão. Seu parecer sobre resultados negativos não era convincente, chegava a afirmar que às vezes quando essas respostas apareciam era pelo fato das questões estarem mal elaboradas. Essa falta de compreensão sobre os inteiros relativos era geral entre os matemáticos.

A maior parte dos autores achava ne-cessário demorar-se longamente sobre as regras que governavam a multipli-cação de números negativos, e alguns rejeitavam categoricamente a possi-bilidade de multiplicar dois números negativos (BOYER, 1974, p. 337,338).

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Enquanto alguns matemáticos rejeitavam a ideia de trabalhar com números relativos discriminando-os, outros aceitavam e declaravam publicamente sua incompreensão a respeito do assunto. Jean Le Rond d’Alembert (1717–1783) foi um deles, não economizou motivos para justificar sua falta de entendimento sobre o número negativo. D’Alembert escre-veu um artigo onde admitia o quanto era difícil fixar a ideia de quantidade negativa e que os próprios pesquisadores con-tribuíram para complicá-la.

Outra figura que se rendeu à incompreensão dos nú-meros negativos foi Lazare Carnot (1753–1823). Era o mais fiel leitor de d’Alembert e tinha grande prestígio entre os estu-diosos da área. Embora com uma excelente imagem adquirida, teve que admitir sua falta de compreensão sobre os números negativos. Afirmava claramente que não entendia a existência de uma quantidade negativa: como seria possível subtrair uma quantidade maior de uma quantidade menor? Usou outro argumento, exemplificando dessa vez: se -2 é menor que 1, então (-2)² deveria ser menor que 1².

Essas questões levantadas por Carnot são de origem epistemológica comprovando mais uma vez que a incom-preensão dos números inteiros relativos ainda predominava entre os matemáticos. A partir de dúvidas como essas levanta-das por Carnot, foi produzido um desenvolvimento no estudo desse conjunto. Com essas interrogações outros matemáticos foram em busca de novos conceitos, inclusive na geometria.

Pierre Simon de Laplace (1749–1827) tinha uma con-cepção platônica a respeito desses números. Achava que a multiplicação dos relativos já existia na natureza, o trabalho

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seria encontrá-la. Em suas palestras na Escola Normal Supe-rior mostrara a dificuldade diante da regra de sinais.

(A regra dos sinais) apresenta algumas dificuldades: custa conceber que o pro-duto de -a por -b seja o mesmo que o de a por b. Para tornar sensível essa ideia observaremos que o produto de -a por +b é-ab (porque o produto nada mais é que -a repetido tantas vezes quantas são as unidades existentes em b). Ob-servaremos, a seguir, que o produto de -a por (b-b) é nulo, pois o multiplica-dor é nulo; assim já que o produto de -a por +b é -ab, o produto de -a por -b deve ser de sinal contrário, ou igual a + ab para destruí-lo (LAPLACE apud GLAESER, 1985, p. 94).

O discurso de Laplace foi uma reafirmação da postura de Euler, no lugar de uma justificativa lógica e convincente pareceu mais uma imposição para a regra ser aceita, tendo como argumento a distributividade da multiplicação, sem contar com um modelo unificante para a regra, mas apenas um caráter formal.

Augustin Cauchy (1789–1857), ao lançar sua obra des-tinada à Escola Politécnica, diferencia números (reais positi-vos) de quantidades (números negativos). Ele tenta distinguir o caráter dinâmico que o número tem da quantidade indicada pelo sinal que representa um estado, utilizando para isso ad-jetivos. Os sinais (+) ou (-) precedendo o número designava quantidade positiva e quantidade negativa, respectivamente.

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Essa convenção feita por Cauchy alertou os estudiosos para a diferenciação de sinais operatórios que indicam uma ação, aumentar ou diminuir, por exemplo, dos sinais predica-tivos que indica estado positivo ou negativo. Procurou mos-trar em seu trabalho uma maneira razoável de compreender a regra de sinais da adição e da subtração e conseguiu facilitar o entendimento para operar com números inteiros relativos, mas para multiplicar, não teve êxito em seus argumentos. Na tentativa de encontrar outra maneira de justificar a regra de sinais para a multiplicação levou em consideração as noções de Maclaurin e Laplace sobre o assunto. Surgiu então a ideia de apresentar seu estudo de maneira formal trabalhando com símbolos e valor absoluto. Mas não seria tão fácil conseguir esse intento, pois de início, o próprio Cauchy acabou con-fundindo os dois tipos de sinais: o operatório e o predicativo. Utilizou argumentos que mostraram claramente sua incom-preensão. Primeiramente ele representou por N um número qualquer fazendo p=+N e q=–N o qual podemos também escrever +p=+ N e +q=-N, sendo o oposto –p=-N e -q=+ N. Substituindo os valores ele justificou:

p=+p=+(+N)=+Nq=+q=+(-N)=-N-p=-(+N)=-N-q=-(-N)=+NDentro da perspectiva equivocada de Cauchy, o sinal do

resultado é a multiplicação dos sinais anteriores. Posteriormen-te apresentou-se insatisfeito com seu trabalho, pois havia uma necessidade maior de operações com símbolos, pois os números complexos já eram estudados nessa época (GLAESER, 1985).

Foi quando Carl Friedrich Gauss (1777–1855) utili-zou a ideia trabalhada na representação de números comple-

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xos descoberta por CasparWessel (1745–1818) e que ficou durante trinta anos desconhecida. Desde a época de Girard os números reais de um modo geral, positivos, negativos e o zero, podiam ser representados por pontos em uma reta. Com esse conhecimento Gauss conseguiu entender os números relati-vos atribuindo-os o nome de inteiros gaussianos, trabalhando com raízes negativas e imaginárias (BOYER, 1974).

A estruturação e compreensão dos números intei-ros começam a se fundamentar em meados do século XIX. Hermann Hankel (1839–1873), com sua teoria dos núme-ros complexos, mostrou um método viável de estruturar a aritmética de maneira geral, embora tenha utilizado ideias já desenvolvidas anteriormente por outros matemáticos. Este tratou do assunto de maneira formal já que estava mais do que comprovado a incompetência na compreensão e no ensino das regras de sinais. Karl Weierstrass (1815–1897) colaborou nos trabalhos de Hankel tentando “separar o cálculo da geometria e baseá-lo no conceito de número apenas”. Essa tentativa pode ter contribuído para uma noção mais coerente para dos nú-meros negativos e para que a partir dali pudessem ser tratados com mais compreensão (BOYER, 1974, p. 410).

O fato dos números negativos levarem cerca de 1600 anos para serem compreendidos mostra claramente que os mes-mos não partem de simples ideia filosófica de negação, mas que existe toda uma questão epistemológica por trás de sua cons-trução. Esse breve relato histórico nos mostrou o quanto o do-mínio dos números inteiros foi instigado entre os matemáticos que os manipulavam muitas vezes sem compreendê-los. Embo-ra a tentativa de entender esse campo numérico tenha durado um pouco mais que um século e meio, podemos observar que com ela deu-se também sua organização e sistematização.

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Atualmente nossos alunos questionam de uma manei-ra ou de outra a aprendizagem dos números relativos, assim como nossos professores. Com essa pesquisa, baseada nos estudos de Georges Glaeser, realizamos uma análise dos obs-táculos epistemológicos citados por ele, traçando um parale-lo entre as dificuldades dos matemáticos para entender esses números com as dos alunos na visão de GLAESER (1985) e TEIXEIRA (1992).

Os obstáculos epistemológicos apontados por Georges Glaeser

A aprendizagem dos números inteiros tem como pres-suposto o domínio dos números naturais e suas experiências no decorrer da vida escolar envolvendo situações de sobra e falta, de perdas e ganhos. As operações de adição, subtração, multiplicação e divisão em apresentam propriedades e de-ficiências1. Esse campo numérico se baseia na ideia de que sempre, associado a um elemento n, obtém-se n+1. A ideia de sucessor aparece como elemento forte para definir os números naturais a partir do axioma da Indução do matemático Giu-seppe Peano (Santos, 2013).

A dificuldade surge quando precisa abstrair a ideia de antecessor, pois sua limitação já foi estabelecida pelo elemento zero no campo dos naturais. Segundo Teixeira (1992, p. 94), o domínio de mostra uma série de operações lógico-mate-máticas como “conceituar, fazer correspondências, classificar, ordenar, compor, reverter, compensar” ligadas às propriedades

1 Quando nos referimos à deficiência estamos querendo dizer a impossibilidade de efetuá-las em algumas situações como, por exemplo, (2-5) ∉ .

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que regem esse conjunto. Elas servirão de base para a aprendi-zagem dos números inteiros. Para Piaget (2002) isso é possível porque a construção do conhecimento ocorre em níveis dife-rentes de estruturação, por meio de um processo em espiral. Ou seja, o conhecimento que foi elaborado passa a se proje-tar como conhecimento prévio para o conhecimento que será construído.

Na visão de Teixeira (1992, p. 92), a “construção do conceito de número inteiro, do ponto de vista do matemático, é uma ampliação dos naturais, sendo esta perspectiva neces-sária para demonstrar que as leis do sistema de numeração seguem sendo cumpridas”.

A história dos números inteiros mostra que a ‘obediên-cia’ das propriedades desse conjunto ao sistema de numera-ção teve uma evolução lenta e Glaeser (1985) em seus estudos analisa as dificuldades de compreensão que os matemáticos tiveram e compara com as dificuldades dos estudantes nos dias de hoje. Os obstáculos epistemológicos apontados por ele são resultado de um estudo que envolve uma investigação experi-mental e também histórica e mostram os números relativos no passado, na visão dos matemáticos. Em seu artigo aponta seis obstáculos epistemológicos apresentados pelos matemáticos na compreensão dos números inteiros relativos.

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Figura 3 – Lista provisória dos obstáculos epistemológicos apontados por Georges Glaeser.Fonte: Boletim GEPEM nº 17, ano 1985. pág. 39, 40.

No quadro a seguir, fez uma indicação com os sinais + ou – dos obstáculos transpostos por dez matemáticos que estu-daram os números relativos. Os obstáculos que Glaeser (1985) não conseguiu identificar no quadro foram simbolizados pelo sinal de interrogação.

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Assim, o símbolo + na coluna 01, por exemplo, na linha associada a Descartes, indica que este matemático em seu traba-lho de compreensão dos números inteiros transpôs o obstáculo 1, enquanto que o sinal – na coluna 02 associada a D’Alembert indica que esse matemático não transpôs o obstáculo 2.

Figura 4 – Relação dos matemáticos e os obstáculos epistemológicos apresentados por eles.Fonte: Boletim GEPEM nº 17, ano 1985, pág. 42.

Os números inteiros levaram mais de 1500 anos para serem conceituados e compreendidos definitivamente pelos matemáticos. Atualmente, as dificuldades de aprendizagem do conjunto continuam. Professores questionam ainda as causas dessas barreiras.

Piaget (2002) em seu estudo sobre epistemologia gené-tica não deixou de lado uma análise sobre os números negati-vos. Para ele, considerar um número como algo estático e não

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levar em conta seu caráter dinâmico já seria um obstáculo. Em sua teoria afirma que uma ação seja ela motora ou se dando por meio da intuição ou percepção é que gera uma operação. “Uma operação é então, psicologicamente, uma ação qualquer (reunir indivíduos ou unidades numéricas, deslocar, etc.), cuja origem é sempre motora, perceptiva ou intuitiva” (PIAGET, 2002, p. 48). A partir dessa ideia levanta uma questão: se todo conceito matemático passa por esse processo dinâmico, en-tão o número negativo foge à regra? Há em sua compreensão, ausência de percepção ou intuição? Na visão piagetiana, não.

A aprendizagem significativa dos números inteiros deve ser considerada não apenas no sentido de entender suas propriedades, mas de aplicá-los num contexto mais amplo. Para isso, é necessária uma reestruturação do sujeito no que se refere ao conceito de número. Essa reestruturação exige alguns conceitos previamente estabelecidos para se confrontar com as novas situações referentes aos números relativos no intuito de transpor as barreiras epistemológicas que vão surgindo.

Os obstáculos 1 e 2 retratam bem essas modificações diante da subtração a-b quando b>a, pois a experiência que o aluno tem dos números naturais faz com que tal situação gere um conflito do antigo com o novo conhecimento. Dessa forma, deve tomar consciência da existência de uma situação em que os números em questão, positivo ou negativo, não são mais quantidades apenas, mas fazem parte de todo um contex-to situacional, realidades reversas. À medida que vai abstrain-do ideia de sobra ou de falta, faz com que surjam novas inte-grações, toma consciência de que essas relações mostram um único universo para os números inteiros (TEIXEIRA, 1992).

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A ideia de que um número negativo é menor que um número positivo faz com que o sujeito observe que há um pon-to que separa esses dois gêneros. Nesse momento ela se defronta com o obstáculo 3: tentar entender que esse conjunto numéri-co é geometricamente, a unificação de duas semirretas opostas. Associado ao obstáculo 3 está o obstáculo 4, pois diferenciar o zero absoluto do zero origem é uma dificuldade apontada ao longo da história dos inteiros. Os obstáculos apontados por Glaeser (1985) na figura - 04 mostra claramente que alguns chegaram a superar os obstáculos 5 e 6 sem que o 3 e o 4 tivesse sido, como foi o caso de Colin Maclaurin (1698–1746).

Os obstáculos 3 e 4 mostram o quanto é difícil enten-der os inteiros relativos como ampliação do conjunto dos nú-meros naturais. Segundo Teixeira (1992), o confronto começa quando o zero origem aparece, pois este, em sua função já permite valores menores que ele. No conjunto o elemento zero absoluto é visto como ausência de quantidade e a difi-culdade que o aluno encontra é diferenciá-lo do zero como origem, pois até então, não existe nenhum valor abaixo dele. Na situação em que se apresenta é visto como ponto de re-ferência convencionado, e não como uma representação de nenhuma quantidade. Vemos mais uma vez a necessidade de compreender os conceitos e propriedades dos números natu-rais para servir como base de entendimento dos números in-teiros relativos.

O obstáculo 5 mostra a dificuldade de transição do ope-ratório concreto para o operatório formal. Segundo Andreatta (1970), a criança no nível das operações concretas constrói e coordena o pensamento etapa por etapa, junta toda uma base

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para definir ou decodificar um conceito, caminha lentamente nesse período e mesmo refletindo com base no empírico, amplia muito pouco o mundo real. Já no nível formal, o sujeito consi-dera todas as combinações possíveis na elaboração de conceito ou ideia. Nesse período vai aos poucos formulando hipóteses, verificando-as, deduzindo-as, rejeitando-as quando não convém e chegando à descoberta de uma lei fundamentada na abstração.

Para Piaget (2002), o que é mais importante nesse pe-ríodo é a distinção feita entre o real e o possível, na qual o sujeito agora reflete sobre cada ação, abstraindo o necessário para a construção do conhecimento. Quando o sujeito passa a ter noção de número negativo ocorre uma reorganização de conceitos, observando uma reestruturação de conhecimento por meio de esquemas de ação que são a assimilação e a aco-modação, havendo nesse processo equilíbrios e desequilíbrios.

As operações formais fornecem ao pen-samento um novo poder, que consiste em destacá-lo e libertá-lo do real, permi-tindo-lhe assim, construir a seu modo as reflexões e teorias [...]. Toda nova capacidade da vida mental começa por incorporar o mundo em uma assimila-ção egocêntrica, para só depois atingir o equilíbrio, através de uma acomodação ao real (PIAGET, 2002, p. 60).

Quando o indivíduo se depara com os números ne-gativos, começa a assimilar esse conhecimento que vai de encontro ao conhecimento já existente, que são os números naturais. Ao se confrontarem ocorre o desequilíbrio seguido da acomodação e um novo equilíbrio surge, adequando e am-

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pliando, nesse caso, conceitos e propriedades que venham a servir para os números relativos.

O equilíbrio é atingido quando a refle-xão compreende que sua função não é contradizer, mas, se adiantar e interpre-tar a experiência. Este equilíbrio, en-tão, ultrapassa amplamente o do pensa-mento concreto, pois, além do mundo real, engloba as construções indefinidas da dedução racional e da vida interior (PIAGET, 2002, p. 60-61).

Um novo conceito se sobrepõe em harmonia com o antigo, no caso do número negativo há uma dificuldade maior visto que este dá ideia de negação ao positivo, ideia de con-tradição. Quando o sujeito supera o obstáculo 5 automati-camente supera o obstáculo 6, pois segundo Teixeira (1992) o número negativo só é compreendido no momento em que ocorre a transição do fazer como ato mecânico para o como fazer e por que fazer, esse fato é característica da passagem dos estágios de desenvolvimento concreto para o formal. As regras de sinais agora aparecem para justamente substituir as opera-ções concretas, por meio de uma abstração reflexionante para apresentar os números inteiros mediante um aspecto mais de-dutivo. Assim, como em há operações com soma de quan-tidade ou subtração de quantidade, o número inteiro também tem caráter dinâmico, embora apresente um duplo sentido. Um sentido representa uma quantidade de sobra ou de falta quando aparece seguido de sinais indicativos (+) ou (-), res-pectivamente, indicando estado, o outro sentido é operatório.

Glaeser (1985) afirma que após as construções no con-junto é necessário compreender alguns aspectos centrais que

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envolvem o número como operador e o porquê da operação. Com as propriedades já estabelecidas, as operações passam a ganhar novo significado e se ampliam.

Vejamos o caso da adição. Nos números naturais o sinal é de natureza exclusivamente operatória, nos inteiros a adição ou acresce ou decresce e o seu próprio conceito passa a ser ampliado. Teixeira (1992, p. 98) afirma que a “adição deixa de ser apenas acrescentar (um dos casos) para ter um novo significado, mais genérico, de associação ou composi-ção”. No caso da subtração também há o que considerar. Para compreendê-la precisamos do invariante da inversão, e não apenas do conceito de retirar. Devemos dar um sentido mais transformador, o que não é tão fácil. Embora o aluno desen-volva todas essas estruturas e passe a entendê-las, no momento em que são simplificadas, ocorre uma perda na compreensão das ideias e propriedades da operação, porque o próprio sinal indicativo acaba sendo confundido com um sinal operatório.Observemos os exemplos a seguir:

(+7)+(+2)=+7+2=+9(-7)+(-2)=-7-2=-9(+7)+(-2)=+7-2=+5(-7)+(+2)=-7+2=-5

O aluno precisa saber que nos dois primeiros há uma adição enquanto que nos dois últimos, ao inverter um dos operadores, a subtração surge na transformação. Segundo Tei-xeira (1992, p. 99) a “subtração nada mais é que a composição entre operadores, ou seja, uma adição”.

A multiplicação nos números inteiros relativos tam-bém sofre modificações. Nos naturais ela nos dá a ideia de adi-

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ção de parcelas iguais. No conjunto dos números inteiros além dessa função o operador multiplicativo faz transformações de acréscimo ou decréscimo, principalmente quando se depara com a multiplicação de dois números negativos. (DANTE, 2009; IEZZI, DOLCE, MACHADO, 2009).

Na multiplicação, portanto, é preciso com-preender que há uma duplicidade de ope-rações: as que multiplicam os conjuntos equivalentes, ao mesmo tempo em que há operações de transformação que se aplicam aos números, fazendo-os manter ou inver-ter sua posição na região a que pertenciam (TEIXEIRA, 1992, p. 100).

Portanto, o obstáculo 6 é um dos mais complexos e está intimamente ligado ao obstáculo 5. O aluno, ao sair do operatório concreto para o formal, consegue abstrair melhor essas relações de inversão e de transformação, se essa transição não for bem trabalhada será inevitável para ele criar, mesmo de maneira equivocada um modelo unificador de regras de sinais, surgindo, assim, os obstáculos 5 e 6 para a aprendizagem dos inteiros relativos. “Aprender o caráter dos números inteiros significa não só desenvolver os esquemas necessários no con-texto de cada um dos modelos, mas, sobretudo abstrair desses esquemas a sua forma mais geral” (TEIXEIRA, 1992, p. 102).

Portanto, dentro desse processo de aprendizagem do conjunto há um conjunto de esquemas a serem aplicados na construção de conceitos e operações. Esse desenvolvimento não é tão simples, requer alguns mecanismos de abstração e de generalização que tornam possível a compreensão desse conjunto e a superação dos obstáculos e dificuldades.

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O que podemos considerar sobre o ensino de números inteiros

Um aspecto importante para o ensino dos números in-teiros é sua aplicação, ou seja, o aluno precisa transcender o processo mecanizado de conceituação e manipulação apenas para entender melhor esse campo numérico e, em seguida, conseguir com o domínio do conceito e da técnica, aplicá-lo. A variedade de situações facilita uma melhor compreensão desse conjunto, pois com ela o aluno pode adquirir habilida-des para posteriormente contextualizar esses números.

Essa ideia confirma a visão de Lima, (1999, p. 77) quando afirma que “o ensino da Matemática deve abranger três componentes fundamentais que denomina de conceitua-ção, manipulação e aplicações”. Explica que a dosagem certa consegue estabelecer um ensino equilibrado e que garante a aprendizagem. A conceituação tem como objetivo estabelecer a ideia, formalizar o enunciado das proposições e definições.

A manipulação tem um caráter algébrico, facilitando a habilidade do aluno em seus cálculos. Já a aplicação é o aspec-to em que o conceito é empregado com o domínio da mani-pulação, desde situações simples do dia a dia às mais comple-xas questões científicas, através de modelos matemáticos.

A aprendizagem operatória dos números inteiros im-plica no uso de algumas invariantes ou propriedades contidas no próprio conjunto como também a construção de alguns esquemas de aprendizagem. Para construir ações e trabalhar com os invariantes e os esquemas faz-se necessário abstrair um pouco a realidade dos inteiros relativos em contextos onde esses elementos estão inseridos. Esse processo, facilitando a

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compreensão, ajuda também a facilitar a aprendizagem (PIA-GET, 2002).

A diversidade de aplicações com as operações de nú-meros inteiros fazem com que os alunos assimilem melhor a aprendizagem desse conjunto desde que as situações analisa-das, das mais simples às mais complexas, não sejam apenas reproduções mecânicas, mas consigam subsidiar um melhor desenvolvimento epistemológico. Os modelos matemáticos de inteiros relativos ligados ao dia a dia devem ser conside-rados como ponto de partida, ou seja, como sugestão, todo conteúdo precisa ser iniciado com uma situação-problema. No caso dos números negativos devem ser explorados com ênfase, pois sua compreensão vai além da ideia de ampliação dos naturais, mas abrange todo um conceito de negação ou de realidade reversível (LORENZATO, 2006).

O não entendimento da ideia do número negativo, de sua função e utilização; a falta de aplicação para mostrar cla-ramente sua existência, para compreender subtração quando o primeiro termo é menor que o segundo; seu significado no desenvolvimento e na finalização de operações; como também a não compreensão da lógica dos inteiros na reta numérica foram pontos destacados pelos estudos de Glaeser (1985). A análise de seu artigo nos fez buscar interrogações consideráveis como: que outros obstáculos existem além dos epistemológi-cos em relação à aprendizagem de números inteiros? Que ou-tras metodologias podem ser aplicadas para facilitar o ensino do conjunto ? Como o professor poderia buscar novas meto-dologias? Está o professor capacitado para fazer uma mediação necessária diante das dificuldades do processo de ensino e de

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aprendizagem dos números negativos? A falta de uma contex-tualização histórica na sala de aula pode ser considerada como barreira no ensino do conjunto ? Espera-se que as questões aqui levantadas possam posteriormente, respondidas de modo que nos auxiliem com métodos adequados para melhor com-preensão aprendizagem dos números inteiros.

Referências

ANDREATTA, Maria Carrilho Fernandes. Exame de alguns esque-mas mentais que caracterizam a transição do pensamento operató-rio concreto ao operatório formal, segundo Piaget, e seu significado pedagógico. Dissertação (Mestrado em Educação) – Departamento de Metodologia do Ensino e Educação Comparada da Universidade de São Paulo, São Paulo, 1970.

BOYER, Carl Benjamin, História da Matemática. Tradução de Elza F. Gomide. São Paulo: Edgard Blucher, 1974.

DANTE, Luiz Roberto. Tudo é matemática. 6º ano. 3. ed. São Paulo: Ática, 2009.

IEZZI, Gelson; DOLCE, Osvaldo; MACHADO, Antônio. Matemáti-ca e realidade. 6º ano. 6. ed. São Paulo: Atual, 2009.

GLAESER, Georges. Epistemologia dos números relativos. Boletim GEPEM, Rio de Janeiro, n.17, p. 29-124, 1985.

LIMA, Elon Lages. Conceituação, manipulação e aplicações – Os três componentes do ensino da matemática. Revista do professor de Mate-mática. Rio de Janeiro, nº 41, 3º quadrimestre, p. 01-06, 1999.

LORENZATO, Sergio. Para aprender matemática. Campinas: Autores Associados, 2006. (Coleção Formação de professores).

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PIAGET, Jean. Seis estudos de Psicologia. Tradução de Maria Alice Magalhães D’Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva, 24. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002.

PIRES, Célia Carolino; CURI Edda; PIETROPAOLO, Ruy. Educação Matemática. São Paulo: Atual, 6ª série, 2002.

SANTOS, Joelma Nogueira. A construção do conceito de número natural e o uso das operações fundamentais nas séries iniciais do ensino fundamental: uma análise conceitual. Dissertação (Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática) – Centro de Ciências, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2013.

TEIXEIRA, Leny Rodrigues Martins. Aprendizagem escolar de núme-ros inteiros: análise do processo na perspectiva construtivista piagetiana. Tese (Doutorado em Psicologia) – Centro de Pós-Graduação em Psicolo-gia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1992.

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CAPÍTULO 06

A HISTÓRIA DA SBEM NO CEARÁ: DESAFIOS E PERSPECTIVAS

Maria Gilvanise de Oliveira Pontes

IntroduçãoNo Brasil, nos últimos vinte e sete anos, a Educação

Matemática tem se destacado como um campo de ação, estu-dos e pesquisas. A cada ano, vem aumentando o número de eventos realizados nas diversas partes do país, com a finalida-de de trocar ideias e socializar experiências desenvolvidas por grupos de matemáticos, educadores matemáticos, pedagogos e psicólogos, buscando melhorias e novas estratégias para o ensino de Matemática (PONTES, 1998).

Tais eventos têm servido para fortalecer e multiplicar os adeptos desse ramo de pesquisa. Com isso, a Educação Ma-temática vem adquirindo respeito e credibilidade no campo científico. No Brasil, esse movimento nasceu com a SBEM em 1988 e, no Ceará, em 2002, com a criação da Regional DR-CE pela sétima Diretora, Célia Maria Carolino Pires, cuja primeira diretora foi Maria Gilvanise de Oliveira Pontes, que atuou até 2013. A quantidade de pesquisadores e pesquisas em Educação Matemática é ainda muito restrita, mas cresce pouco a pouco.

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As pesquisas em Educação Matemática têm contri-buído para melhorar, de forma significativa, os processos de ensino e de aprendizagem da Matemática. Observa-se que as reformas curriculares e o desenvolvimento de propostas pe-dagógicas estão cada vez mais presentes no ambiente escolar. Entretanto, ainda se percebe que, raramente, nas aulas de Matemática, o estudante testemunha a ação do profissional matemático na identificação e na solução do problema. O que ele nota, normalmente, é uma solução bonita, elegante, sem dúvidas, sem obstáculos e bastante eficiente, em que o professor espera que ele também consiga resolver problemas matemáticos com a mesma eficiência e rapidez, como afirma Caraça (1989). Desse modo, é necessário que o professor veja o ensino de Matemática como uma disciplina de investigação, que deve estar voltada para ajudar o aluno a compreender e explicar a sua realidade, como enfatiza D’ Ambrosio (1993). No entanto, o que se verifica, até mesmo nos cursos de for-mação de professores, é que este ensino está voltado para me-morização e aplicação de fórmulas, totalmente desvinculado da realidade e interesse do aluno. Segundo a referida autora (1993, p. 36),

[...] infelizmente, o processo de trans-missão de conhecimento utilizada na experiência matemática da maioria dos nossos alunos do terceiro grau, não deixa que os alunos analisem a Mate-mática como uma área de pesquisa e investigação. Assim como no processo de construção do conhecimento para cada aluno, a essência do processo tem que ser a pesquisa.

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Refletir sobre a sua prática docente e inovar é dever do professor, com o intuito de investigar novas formas de ensi-no e de aprendizagem, mas isso exige profunda mudança de mentalidade, o que é difícil, principalmente para o professor de Matemática. Assim, na sua formação inicial e continuada, é fundamental que isso aconteça. Nessa perspectiva, faz-se ne-cessário que o professor conheça os passos históricos por que o homem passou para a construção do conhecimento matemá-tico e conheça as necessidades mentais e sociais que contribuí-ram para a construção do conhecimento matemático, a fim de que, na sua aplicação em sala de aula, o professor possa ajudar o aluno a recompor os seus conhecimentos matemáticos e uti-lizá-los da melhor forma possível, no meio social em que vive (BORGES NETO & DIAS, 1999).

Partindo dessas reflexões, em 1987, duas educadoras matemáticas cearenses, preocupadas com esta situação, par-ticiparam da semente de criação da Sociedade Brasileira de Educação Matemática – SBEM, na PUC-SP, por ocasião do I Encontro Nacional de Educação Matemática - I ENEM. As educadoras vêm acompanhando ativamente os trabalhos des-sa comunidade científica, apresentando sua contribuição em congressos, encontros regionais, nacionais e internacionais. No plano de expansão da SBEM, está prevista a criação de Diretorias Regionais - DR, nas diversas unidades da federação. No Ceará, até junho do ano 2001, a SBEM contava com 66 associados, o que ensejava a criação da SBEM-CE.

Nesse sentido, o grupo de professores de Matemática do Núcleo de Educação Continuada e a Distância – NECAD da Universidade Estadual do Ceará- UECE, sob a nossa coor-denação resolveu realizar a I Jornada Cearense de Educação

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Matemática – I JCEM, com o tema Influência e Função da Educação Matemática nos Conhecimentos Humanos, com a finalidade de possibilitar intercâmbio entre os pesquisadores da Educação Matemática para incentivar a participação em eventos científicos nessa área, a criação e a manutenção de la-ços interpessoais e afinidades profissionais.

O referido evento teve como objetivo criar a Diretoria Regional da Sociedade Brasileira de Educação Matemática no Ceará - SBEM-CE, com o intuito de congregar educadores comprometidos com a Educação Matemática. Os objetivos específicos adotados para a realização desse evento foram: discutir sobre a trajetória da Educação Matemática e os seus atuais desafios; socializar experiências vivenciadas em sala de aula e atividades desenvolvidas por educadores matemáticos cearenses; e divulgar trabalhos científicos de pesquisadores em Educação Matemática.

A atuação da SBEM-CE, no período 2002 a 2013A I Jornada Cearense de Educação Matemática – I

JCEM objetivou a criação da SBEM-CE. O evento foi rea-lizado nos dias 08 e 09 de agosto de 2002, nas dependências da UECE, na cidade de Fortaleza, com um público de 420 pessoas, composto por professores interessados em Educação Matemática, alunos de Licenciatura em Pedagogia e Matemá-tica, educadores e pesquisadores em geral que atuam nas redes pública e privada do Ensino Fundamental, Médio e Superior. Na jornada, foram desenvolvidas várias atividades: uma con-ferência de abertura; 05 sessões de comunicação científica, 07 palestras e 21 oficinas, que ocorreram no campus da UECE, no Itaperi.

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Iniciamos o evento no dia 08/07/2002, às 10h, com a apresentação de 19 trabalhos científicos distribuídos em cin-co sessões. Percebeu-se uma grande participação do público, aproximadamente 110 pessoas, por meio dos seus questiona-mentos e reflexões. Além disso, houve alguns relatos de expe-riência dos participantes. Vale ressaltar que todos os trabalhos inscritos estavam ligados à temática da I Jornada Cearense de Educação Matemática e que muitos professores presen-tes nunca tinham participado desse tipo de atividade. Desse modo, os grupos apresentaram um grande entusiasmo nas discussões levantadas.

No período da tarde, às 14h, aconteceu a abertura ofi-cial da jornada, com a fala da coordenadora do evento, profes-sora Maria Gilvanise de Oliveira Pontes, seguida da palavra da VII presidente da SBEM Nacional, a professora Célia Maria Carolino Pires (MUNIZ, 2013), que proferiu a conferência A Trajetória da Educação Matemática e seus Atuais Desafios. Contou com um público em torno de 410 pessoas. Ao final da conferência, houve uma calorosa discussão acerca do tema em questão, em que os presentes apresentaram muitas dúvidas e buscavam alternativas viáveis para o ensino de Matemáti-ca. Logo em seguida, tomou posse a Diretoria provisória da SBEM/CE, composta por: secretário executivo – Maria Gilva-nise de Oliveira Pontes; primeiro secretário – Maria Ivoneide Pinheiro de Lima; segundo secretário – Maria Ivonisa Alencar Moreno; terceiro secretário Francisco Martins de Souza; pri-meiro tesoureiro – Hipólito Peixoto de Oliveira; e segundo tesoureiro – Acácio Freitas.

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Posteriormente, os participantes foram convidados a deslocar-se para as salas de aula, a fim de participarem das seguintes palestras, que aconteceriam simultaneamente:

• A Matemática Grega: de Tales e Euclides – Prof. Francisco Martins de Souza;

• Análise do Livro Didático - Prof. Cleiton B. Vas-concelos;

• Por onde anda a Matemática – Prof. Acácio Freitas• Desenvolvimento do Raciocínio Matemático –

Prof. Hermínio Borges Neto;• Malba Tahan: um educador matemático – Prof.

Gilberto Telmo S. Marques;• Perspectivas Contemporâneas na Formação de

Professores – Prof. João Batista Carvalho Nunes;• Análise do Nível de Raciocínio Matemático e da

Conceitualização de Conteúdos Aritméticos e Al-gébricos no Ensino Fundamental: considerações acerca do Telensino Cearense.

No dia seguinte, no período da tarde, foram realizadas 17 oficinas de Matemática:

• Geometria Dinâmica com o Software Cabri-Géo-mètre – Maria José de Araújo;

• Tangram – Profa. Mércia de Oliveira Pontes e Pro-fa. Neuma Leandro Evangelista;

• Ábaco – Profa. Rosa Cristina Aires de Oliveira• Números Decimais com Material Dourado – Pro-

fa. Sandra Maria Rodrigues;• Dinâmica de Grupo – Profa. Marbênia Gonçalves;• O Ensino de Cônicas na Sala de Aula – Prof. Eraldo;• O Uso da Calculadora nas Aulas de Matemática –

Prof. Alan Arraes S. de Alencar;

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• Jogo de trocas com Sucatas – Profa. Yvone Franco;• Dobraduras – Profa. Cristiane; • Confecção de Paradidáticos de Matemática – Prof.

Dimas Machado;• Tratamento da Informação – Prof. Hipólito Pei-

xoto; • Jogos Matemáticos em Sala de Aula – Prof. José

Euvaldo Bezerra Santos; • Laboratório de Matemática: um recurso didático

no ensino de PA na Sexta série – Profa. Ana Cláu-dia M. Pinheiro;

• Introdução ao estudo de medidas – Profa. Paula Sandra F. Monteiro;

• Blocos lógicos – Profa. Maria Ivonisa Alencar Mo-reno;

• Material Cuisenaire – Profa. Ivoneide Pinheiro Lima;

• Régua de Frações.

A realização das oficinas ocorreu simultaneamente e ti-nha como objetivo despertar o público para o uso de materiais concretos nas aulas de Matemática; resgatar o caráter investigati-vo do professor, ou seja, estimular a ação do professor como pro-fessor-pesquisador; e apresentar caminhos por meio de indica-ção de leituras para inovação do ensino da disciplina em questão.

Desse modo, as oficinas contaram com um grande pú-blico, aproximadamente 380 pessoas. Foi um momento de descontração e rico em aprendizagens. Os participantes de-monstraram interesse em aprender a manipular os recursos pe-dagógicos apresentados e, principalmente, discutir a melhor maneira de trabalhar a Matemática, em sala de aula.

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Dando prosseguimento às ações da SBEM-CE, em 2003, nos dias 06 a 08/06, foi realizada a II Jornada Cearense de Educação Matemática – II JCEM, com o tema: A Forma-ção Pedagógica do Professor de Matemática, cuja Conferência de Abertura, intitulada Educação Matemática na Prática Edu-cativa, teve como autor o Prof. Dr. Luiz Roberto Dante, da Unesp/Rio Claro-SP, contando com o aval da Editora Ática.

Figura 1 - Cerimônia de Abertura da II JCEM.Fonte: Da autora.

No dia 07/06, de 8h às 12h e de 14h às 15h40, houve 14 minicursos simultâneos:

• A calculadora como ferramenta para o ensino de Matemática – Prof. Alan Arraes S. de Alencar;

• Algarismos romanos revisitados: uma contribuição ao estudo do sistema de numeração – Prof. Fran-cisco Edison E. de Sousa;

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• Álgebra interativa: desenvolvendo o pensamento algébrico com o uso de novas tecnologias – Prof. José Aires de Castro Filho;

• Análise do livro didático – Prof. Cleiton B. Vas-concelos;

• A resolução de problemas na aprendizagem mate-mática nas séries iniciais do ensino fundamental – Profa. Paula Sandra F. Monteiro;

• Fatoração algébrica com uso de material concre-to – Profa. Ana Carolina C. Pereira e graduanda Andréa Maria F. Moura;

• Filosofia Matemática e Platonismo – Prof. Francis-co Martins de Souza;

• Jogo de trocas como fundamentação para sistemas de numeração - Prof. Vagner Pinto Dieb;

• Laboratório de Geometria Plana e Espacial – Prof. Dr. Rômulo Marinho do Rego – UFPB;

• Matemática: uma ferramenta interdisciplinar – Profa. Rosa Cristina Aires de Oliveira e Profa. Sandra Maria Rodrigues;

• Materiais Didáticos e jogos no ensino de Mate-mática – Profa. Dra. Rogéria Gaudêncio do Rego -UFPB;

• O Construtivismo na Educação Matemática – Profa. Ivanice Montezuma de C. Pinheiro;

• Jogos Matemáticos com lápis e papel para uso em sala de aula – Prof. José Euvaldo Bezerra Santos;

• Uso da fita métrica nas aulas de Matemática: uma prática que estimula a autonomia do aluno – Pro-fa. Elisabeth Matos Rocha.

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Das 16h às 18h, aconteceram palestras simultâneas:

• As Novas Tecnologias e o Ensino de Matemática – Prof. Dr. José Aires de Castro Filho;

• História da Matemática no Ceará: o século XIX –Prof. Ms. George Pimentel – URCA/UFRN;

• Laboratório de Estudos e Pesquisa da Aprendiza-gem Científica – LEPAC – Profa. Dra. Rogéria Gaudêncio do Rego – UFPB;

• Malba Tahan, um precursor da Educação Mate-mática. Prof. Gilberto Telmo S. Marques;

• Sequência Fedathi – Prof. Dr. Hermínio Borges Neto – UFC;

• Uso da História da Matemática no ensino – Prof. Dr. Iran Abreu Mendes – UFC;

• As Políticas Públicas para o Ensino Médio na área de Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias – Prof. Dr. Humberto Carmona – UECE/SEDUC.

No dia 08, de 8h às 10h, realizaram-se várias comuni-cações científicas.

O encerramento se deu às 10h30, com a Conferência do Prof. Dr. Francisco Martins de Souza – UECE, intitulada O Teorema de Godel e os fundamentos da Matemática.

Era intenção da SBEM-CE realizar, anualmente, a Jor-nada Cearense de Educação Matemática -.JCEM.

Dadas as circunstâncias, a III Jornada Cearense de Educação Matemática – III JCEM só foi realizada no perío-

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do de 29 a 31 maio de 2008, no Instituto Federal do Ceará, àquela época, denominado de Centro de Educação Federal e Tecnológico – CEFET, com as seguintes atividades:

No dia 29/05/08:

• Cerimônia de Abertura com o Prof. Dr. Hermínio Borges Neto e composição da chapa para eleição da SBEM-CE a se realizar, por aclamação, por oca-sião da cerimônia de encerramento;

• Conferência de Abertura com a Profa. Dra Nilza E. Bertoni sobre o tema A SBEM e a Educação Matemática.

No dia 30/05/08, no horário de 8h às 12h30, reali-zaram-se sessões de minicurso. Na parte da tarde, de 14h às 16h, duas Mesas Redondas simultâneas: MR1- Tecnologias e Modelagem Matemática, com a participação dos Prof. Aires, Hermínio e Júlio Wilson, e MR2 - Formação de Professores de Matemática, com as Profas. Dra Nilza Bertoni – UnB e Maria Lúcia Monteiro da Silva - UFAL.

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Figura 2 - Cerimônia de Abertura da III JCEM.Fonte: Da autora.

No horário de 16h às 18h, houve a apresentação de vá-rios pôsteres, que vão aqui listados com seus respectivos autores:

• PO01 - Modelagem Matemática no ensino de Tri-gonometria – Odimógenes Soares Lopes;

• PO02 - O bom professor: características essenciais à docência em Matemática – Maria José Araújo e Hermínio Borges Neto;

• PO03 - Transversalidade: uma tendência no ensi-no de Matemática – Rodney Marcelo Braga dos Santos;

• PO04 - A ludicidade no desenvolvimento da aprendizagem da Tabuada – Elisângela, Camilo e outros;

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• PO05 – A Construção do Origami como prática educativa no ensino de Geometria Plana – Daniele Luciano, Danilo Barros e outros;

• PO06 – Utilizando software matemático como mediador do ensino do gráfico de funções quadrá-ticas – Marcos Monte Cruz e Luiza Santos Pon-tello;

• PO07 – Aprendizagem significativa de Matemá-tica na 5ª série do ensino fundamental através de Resolução de Problemas;

• PO08 – A importância dos jogos no estágio das operações concretas no ensino fundamental;

• PO09 – Prática pedagógica dos professores de En-sino Superior – Benedita Marta G. Costa;

• PO10 – Análise das tensões térmicas em materiais cerâmicos – Reinaldo Rodrigo C. Gomes, orient. Francisco Camilo da Silva;

• PO11 – Gangorra Interativa: aprendizagem con-ceitual de grandezas – Maria Lavor S. de Melo, Francisco Herbert, Castro Filho e Mauro Pequeno;

• PO12 – Estudo da perda da biodiversidade com uma abordagem da educação ambiental no ensino de Matemática - Antônia;

• PO13 – Vida, Filosofia e obra de Tales de Mileto: algumas indicações para o ensino de Matemática – Fabrício Bandeira Silva, Francisco Regis V. Alves e Aluísio Cabral de Lima;

• Exposição de Poliedros – Prof. Dr. João de Deus Lima - UERN.

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Figura 3: Exposição de Poliedros da III JCEM.Fonte: Da autora.

No dia 31/05/08, no horário de 8h às 10h, acontece-ram simultaneamente três Mesas Redondas: MR1 - Licencia-turas em Matemática no Ceará, com a participação da Profa. Luiza Pontello – IFCE, Luciano – UECE e Plácido – UFC, e MR4 – As sociedades científicas: SBM, SBEM e SBHMat, com a participação do Prof. Dr. João Lucas Barbosa, Prof. Dr. Paulo Figueiredo e Jonh A. Fossa, respectivamente, membros de cada sociedade.

Das 10h30 às 11h30, o Prof. Dr. Paulo Figueiredo, da UFPE, e presidente em exercício da SBEM proferiu a confe-rência de encerramento, após a qual a nova diretoria composta foi eleita por aclamação, cujos membros são:

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Diretora - Maria Gilvanise de Oliveira Pontes –CED/UECE.

Vice: Dalci de Sousa Araújo – UFS/Cefet-Pirambu.

1º Secretário: Hermínio Borges Neto – UFC.

2º Secretário: Maria José Araújo Sousa – UVA.

3º Secretário: Francisco Edisom E. de Sousa - UECE/Feclesc.

1º Tesoureiro: Luciana de Lima – UAB/Cefet.

2º Tesoureiro: Flávio Alexandre Falcão do Nascimento- UECE/Fafidam.

3º Tesoureiro: Zelalber – URCA e CEFET Juazeiro do Norte.

Nesse momento, foram criados 6 polos e escolhidos seus representantes:

• Zona Norte: Benedita Marta G. Costa – UVA.

• Zona Sul: Bárbara Paula Bezerra Leite – URCA.

• Centro-Sul: Francisco Camilo da Silva – CEFET-CE/UNED/Cedro.

• Inhamuns: Maria Ivoneide Pinheiro do Lima – FECLIN.

• Sertão Central: Francisco Edisom Eugenio de Sousa – FECLESC.

• Zona Jaguaribana: Acácio Lima de Freitas – FA-FIDAM.

Essa diretoria, cuja gestão deveria durar para o triênio 2008 a 2011, atuou precariamente, tendo em vista que a di-retora e a vice, na condição de aposentadas, não contavam com a participação dos outros membros que estavam na ati-

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va, trabalhando, em geral, três experientes. Desse modo, isso perdurou até 2013, quando se realizou eleição para a nova diretoria da SBEM-CE, sendo eleitos os seguintes membros, para atuarem no triênio 2013 a 2016.

O diretor, Cleiton Batista Vasconcelos, foi violenta-mente tirado do nosso meio no dia 21/04/2014, deixando uma lacuna irreparável na SBEM e na comunidade de Edu-cadores Matemáticos do Brasil. A nova diretoria foi formada por:

• Diretor Regional: Cleiton Batista Vasconcelos (UECE).

• Vice-Diretora Regional: Ana Carolina Costa Pe-reira (UECE).

• Primeira Secretária: Jeanne D’arc de Oliveira Pas-sos (UECE).

• Segundo Secretário: Miguel Jocélio Alves da Silva (UVA).

• Primeiro Tesoureiro: Eugeniano Brito Martins (SEDUC-CE).

• Segundo Tesoureiro: Rodrigo Lacerda Carvalho (UECE).

• Suplente: Luiza Pontello (IFCE).

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Figura 04: Diretoria da SBEM (2013-2016).Fonte: Da autora.

Dificuldades apresentadas na três jornadas e sucessos obtidos

Um dos obstáculos encontrados foi o número reduzido de professores que trabalharam para a realização dos eventos, ficando um pequeno grupo sobrecarregado. Foram vários os motivos para que esse fato acontecesse, como falta de tempo, pois a grande maioria dos professores trabalha diariamente nos três turnos, além de terem outros compromissos já agendados.

O fato de os eventos terem sido realizados em fins de semana, ou seja, na sexta, no sábado e no domingo, por isso se tornaram bastante cansativos, principalmente no período final da tarde, já que os participantes, na sua grande maioria, têm no decorrer da semana um ritmo de trabalho e de estudo muito exaustivo.

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Outro fator que dificultou bastante a abertura da I JCEM foi a realização do jogo do Brasil na copa 2002, que aconteceu no sábado, às 8h30. Isso nos obrigou a mudar a programação do evento para o turno da tarde, tendo a confe-rência da Professora Célia Maria Carolina Pires, prevista para este horário, de ser transferida para a tarde.

O atraso dos materiais de apoio, nas salas de comuni-cações científicas e o não comparecimento de um dos coorde-nadores foram outras dificuldades encontradas, pois atrasou o início das atividades.

O cancelamento de algumas oficinas, por diversos motivos, foi outro obstáculo encontrado, tendo em vista a decepção dos participantes dessas oficinas e o trabalho que a equipe de coordenação teve para distribuir as pessoas para outras salas.

As três jornadas, embora tenham tido dificuldades, foram plenas de sucesso tendo em vista o envolvimento de alunos de Cursos de Licenciatura em Matemática, dos cursos de Especialização em Ensino de Matemática, de professores da Educação Básica e do Ensino Superior, conforme consta na descrição dos três eventos.

Considerações finaisConsideramos que as três Jornadas Cearenses de Edu-

cação Matemática foram bastante relevantes, pois possibili-taram a implantação da regional da Sociedade Brasileira de Matemática no Estado do Ceará, que será um dos meios de intercâmbio entre os profissionais de Matemática e as pesqui-

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sas, além de proporcionar aos professores e alunos levantar questões acerca do ensino de Matemática.

Para uma completa mudança positiva no atual ensino de Matemática, são necessárias mais discussões e encontros dessa natureza, pois o ensino dessa disciplina tem como ob-jetivo proporcionar aos alunos legítimas experiências mate-máticas. Em outras palavras, esse ensino deve possibilitar ao educando experiências semelhantes às dos matemáticos. Tais experiências, conforme D’Ambrosio (1993; p. 36), devem se caracterizar “[...] pela identificação de problemas, solução des-ses problemas e negociação entre o grupo de alunos sobre a legitimidade das soluções propostas”.

Desse modo, é fundamental que o professor esteja ca-pacitado tecnicamente para trabalhar nestas perspectivas, ou seja, a formação investigativa do professor de Matemática é um grande desafio para o momento atual, na busca de iden-tificar e contornar os obstáculos e as dificuldades encontradas pelos alunos no processo de aprendizagem, tanto no seu pro-cesso histórico do conhecimento como em situações de apren-dizagem. Acreditamos que esse poderá ser um dos passos para alavancar a Educação Matemática no Brasil.

Referência

AMBROSIO D’ Beatriz S. Formação de Professores de Matemática para o Século XXI: o grande desafio. Revista Pro-Posições. São Paulo: Uni-camp, 1993. v. 4, no 1[10].

CARAÇA, Bento. de Jesus. Conceitos Fundamentais de Matemática. 9. ed. Lisboa: Livraria Sá da Costa, 1989.

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BORGES NETO, H. & DIAS, A.M I. Desenvolvimento do raciocínio lógico-matemático no 1º Grau e Pré-Escola. Cadernos da Pós-Gradua-ção em Educação: Inteligência – enfoques construtivistas para o ensino da leitura e da matemática. Fortaleza, UFC, 1999, v. 2.

MUNIZ, Nancy Campos. Relatos de memórias: a trajetória históri-ca de 25 anos da Sociedade Brasileira de Educação Matemática (1988-2013) – São Paulo: Livraria da Física, 2013.

PONTES, Maria Gilvanise de Oliveira. Tendências da Educação Mate-mática no Ceará. XII Encontro de Pesquisa Educacional do Nordeste - EPEN - Educação Matemática. Natal: EDUFRN, 1998.

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CAPÍTULO 07

EDUCAÇÃO INDÍGENA: O FUTURO PROFESSOR DE MATEMÁTICA ATUANDO NA DISCIPLINA DE

ESTÁGIO SUPERVISIONADO

Sheyla Silva Thé FreitasValmiro de Santiago Lima

Ana Carolina Costa Pereira

IntroduçãoPara sobreviver e preservar sua cultura, o índio precisou

camuflar-se por um período longo na história do Brasil, uma vez que eram tidos como incapazes pelas leis brasileiras. Esse quadro reverteu-se com a Constituição Federal de 1988, na qual passaram a ser reconhecidos e respeitados em suas práti-cas culturais próprias. A partir de então os índios começaram a ter vez e voz na sociedade brasileira, passando a exercer seus direitos de cidadãos reconhecidos pela constituição.

Com o Decreto Presidencial nº 26, de 1991, a edu-cação escolar indígena passa a integrar o sistema de ensino regular em todos os níveis e modalidades de ensino, conforme as normas do MEC (Ministério da Educação e Cultura).

Os direitos educacionais específicos dos povos indíge-nas passaram a ser reconhecidos e reafirmados com o Decreto nº 1.904/96, que criou o Programa Nacional de Direitos Hu-manos que assegurou “às sociedades indígenas uma educação escolar diferenciada, respeitando seu universo sociocultural”.

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A promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Edu-cação – LDB (1996) reconhece as necessidades sociais e cul-turais identificadas pelo conjunto da sociedade brasileira e respaldadas pela comunidade acadêmica, visando à formação de um cidadão crítico e atuante. As necessidades e exigências tecnológicas cada vez mais prementes da sociedade globali-zada forjam as nações a buscarem adequação às várias trans-formações na área da educação, visto que têm que ofertar aos cidadãos um ensino de qualidade dentro dos padrões exigidos pelas constantes transformações que passa o planeta.

Com isso, a partir da implantação dos PCN’s na edu-cação básica, a missão da escola passou a ser a de identificar, analisar, avaliar e definir de forma criteriosa qual a proposta pedagógica que contempla estratégias e metodologias de en-sino mais adequadas à realidade de seus professores e alunos, tendo em vista a diversidade de contextos socioculturais e eco-nômicos em que se encontram inseridos.

No tocante à questão da escolarização dos povos indí-genas, conforme Aguiar (2003, p.150-151) a Nova Lei de Di-retrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) estabeleceu em seu Art. 78, que:

O Sistema de Ensino da União, com a colaboração das agências federais de fomento à cultura e de assistência aos índios, desenvolverá programas inte-grados de ensino e pesquisa, para oferta de educação bilíngue e intercultural aos povos indígenas, com os seguintes objetivos: I – proporcionar aos índios, suas comunidades e povos, a recupera-

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ção de suas memórias históricas; a rea-firmação de suas identidades étnicas; a valorização de suas línguas e ciências; II- garantir aos índios, suas comunida-des e povos, o acesso às informações, conhecimentos técnicos e científicos da sociedade nacional e demais sociedades indígenas e não indígenas.

Nesse sentido, com a tarefa desafiadora de interco-nectar indivíduos pertencentes a diferentes contextos sociais, todas as instituições de ensino, de modo particular, as uni-versidades, passaram a pensar o seu projeto pedagógico tendo como foco a universalidade do ensino e a integração das cultu-ras. Isso leva à necessidade de um projeto de educação voltado para as diversas nações indígenas que habitam vários recantos do Brasil, com o objetivo de manter suas raízes étnicas, seus costumes, suas línguas, suas culturas e identidades.

A escola, segundo o Referencial Curricular Nacional para Educação Indígena - RCNEI, instrumento surgido a par-tir dos PCN’s deve estar em consonância com esse objetivo:

[...] deve reconhecer e manter a diver-sidade cultural e linguística; promover uma situação de comunicação entre ex-periências socioculturais, linguísticas e históricas diferentes, não considerando uma cultura superior à outra; estimular o entendimento e o respeito entre seres humanos de identidades étnicas dife-rentes, ainda que se reconheça que tais relações vêm ocorrendo historicamente em contextos de desigualdade social e política (BRASIL, 2005, p. 24).

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Ainda conforme esse documento, para que a escola possa se adequar à diretriz pedagógica é mister que se valorize e se respeite a língua de cada povo indígena, pois:

[...] as tradições culturais, os conheci-mentos acumulados, a educação das gerações mais novas, as crenças, os pen-samentos e as práticas religiosas, as re-presentações simbólicas, a organização política, os projetos de futuro, enfim, a reprodução sociocultural das socieda-des indígenas é na maioria dos casos, manifestada através do uso de mais de uma língua (idem, p. 25).

A preconizada valorização e o respeito à língua materna dos povos indígenas, pressupõe que a educação escolar indí-gena se efetive dentro do processo de ensino e aprendizagem na sala de aula.

A Secretaria de Educação do Estado do Ceará - SE-DUC passa a ser um interlocutor na mediação da formação dos professores indígenas no Ceará. Tendo como objetivo ha-bilitar professores indígenas para a docência nos anos iniciais do ensino fundamental. Essa formação tenciona que os do-centes venham a atuar como agentes transformadores dentro de suas próprias comunidades.

Diante do exposto, visando ao entendimento da rea-lidade da educação indígena, este trabalho se propõe mostrar como vem se efetivando a formação do professor indígena Tremembé na área de Matemática no Curso Magistério Indí-

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gena1, referente à disciplina de estágio supervisionado, promo-vido pela SEDUC-CE (2008-2014).

Educação indígena diferenciadaA educação indígena diferenciada vem perpetuar a cul-

tura deste povo. Fazendo com que seus conhecimentos sejam passados e transmitidos de geração para geração. Mas, o que vem a ser educação diferenciada? Segundo o RCNEI (2005, p. 22),

é uma educação que envolve a multiet-nicidade, a pluralidade e a diversidade onde agrega complexos sistemas de pensamentos e modos próprios, arma-zenar, expressar, transmitir, avaliar e reelaborar seus conhecimentos e suas concepções sobre o mundo, o homem e o sobrenatural.

Contudo as escolas indígenas possuem um currícu-lo amplo, além das disciplinas básicas, comuns estabelecidas pelo MEC, conta também com outras atividades paralelas, nas quais a comunidade participa, entre elas: o Torém (ritual sagrado para o povo Tremembé), oração do povo Tremembé (diferenciada); resgate da cultura com as lideranças (na qual os mais velhos resgatam da memória acontecimentos significati-vos para a aldeia); pajé (tem a função de cuidar da saúde men-tal e física do seu povo, repassa conhecimentos tradicionais das plantas para a comunidade); entre outras, essas atividades 1 Magistério Indígena – Nível médio, direcionado para o magistério, promovido pela SEDUC-CE. A segunda turma iniciou em 2007, devido a burocracia reiniciou o curso em 2008.

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são vivenciadas no ambiente escolar e os alunos participam ativamente de todas.

Conforme o RCNEI (idem, p. 23) “a comunidade pos-sui sua sabedoria para ser comunicada, transmitida e distribuí-da por seus membros; são valores e mecanismos da educação tradicional dos povos indígenas”, são experiências que se so-mam e aprimoram os conhecimentos de cada povo indígena.

As comunidades indígenas socializam seus conheci-mentos mutuamente, aprendem com os mais velhos e, prin-cipalmente, com os mais novos. Juntos aprendem e ensinam ao mesmo tempo; todos da comunidade são importantes. A educação diferenciada indígena agrega valores, reconhece e mantém a diversidade intercultural e linguística de seu povo, respeitando os demais.

Maher (2006, p. 17) menciona que na Educação In-dígena,

o ensino e a aprendizagem ocorrem de forma continuada, sem que haja cortes abruptos nas atividades do cotidiano. [...] o ensinar e o apren-der são ações mescladas, incorpora-das à rotina do dia a dia, ao traba-lho e ao lazer e não estão restritas a nenhum espaço específico. A escola é todo o espaço físico da comuni-dade.

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O Magistério Indígena no Estado do CearáO Magistério Indígena II – Nível Médio na Modalida-

de Normal é promovido pela Secretaria de Educação do Esta-do do Ceará e tem como objetivo habilitar professores indíge-nas para a docência nos anos iniciais do ensino fundamental, que atuam nas escolas indígenas da rede pública do Ceará, qualificando-os para o exercício do magistério. Sua missão é formar professores indígenas como meio de garantir um maior e melhor desempenho nos processos de ensino e aprendiza-gem dos alunos atendidos nessas escolas.

Os encontros de estudo foram realizados em etapas in-tensivas e intermediárias. A etapa intensiva compreendia os meses de janeiro e julho, e as etapas intermediárias ocorreram em conformidade com os cronogramas e acordos entre a coor-denação do curso e as lideranças indígenas que determinavam as datas para a realização dos estudos.

Para um melhor aproveitamento do processo ensino e aprendizagem, a turma foi desmembrada em três Polos, a saber: Polo I – Fortaleza: abrange os municípios de Aquiraz, Aratuba, Canindé, Caucaia, Maracanaú e Pacatuba. Polo II – Acaraú: contempla os municípios de Acaraú, Itapipoca e Ita-rema. Polo III – Crateús: engloba os municípios de Crateús, Monsenhor Tabosa, Novo Oriente, Poranga, Quiterianópolis e Tamboril. O Magistério Indígena II – Nível Médio contabi-lizou uma carga horária de 3240h/a.

Maher (2006, p. 25) corrobora explicando o porquê desta carga horária extensa:

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Os programas para o Magistério In-dígena destinam-se a formar um tipo de professor que, na maior parte dos casos, já atua na escola de sua comu-nidade e tem pouca experiência de es-colarização formal: ele sempre traz em sua bagagem um amplo domínio dos conhecimentos acumulados por seu povo, mas seu conhecimento sobre os nossos saberes acadêmicos é restrito. [...]. Sendo assim, os currículos dos Cursos de Formação para o Magistério Indígena são bastante extensos.

De fato, a maioria dos professores indígenas que esta-vam atuando em sala de aula, não tinha se quer terminado o ensino fundamental, questão essa que impulsionou as coorde-nadoras juntamente com alguns alunos liderança a refletirem essa formação e estabelecerem algumas regras para os alunos/professores indígenas continuarem essa formação.

Ressaltamos que os professores indígenas para partici-par desse curso precisavam ter cursado no mínimo o 6o ano do ensino fundamental, exigência da coordenação do curso com aprovação dos participantes. Essa exigência foi necessária, devido o curso conter a base no ensino fundamental II. Sendo assim, eles precisavam compreender o que estava sendo abor-dado em nível de conteúdo programático.

Outro ponto que estimulou a participação desses alu-nos foi o fato de que o curso passaria a ser pré-requisito para os docentes indígenas ao exercício do magistério, como também um passaporte para o ingresso em concurso público a ser reali-zado, visto que até o presente momento eles compõem apenas o quadro funcional referente aos contratos temporários.

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Essa formação contemplou as seguintes etnias2 do Es-tado do Ceará: Tapeba, Tremembé, Pitaguary, Jenipapo, Ka-nindé, Potyguara, Tabajara, Kalabaça, Kariri, Anacé, Gavião e Tubiba-Tapuia. Como mostra a figura 01:

Figura 01: Mapa do Ceará delimitando os municípios com suas respectivas etnias.Fonte: Povos Indígenas no Ceará: organização, memória e luta, 2007.

A disciplina de Matemática foi ministrada para as 12 et-nias, entretanto, no estágio supervisionado, foram contempla-das as comunidades Tremembé, notadamente a de Itapipoca.2 Ressaltamos que atualmente existem 14 etnias no Ceará. Mencionamos 12 etnias por termos trabalhado ativamente com elas. As etnias de Jucá (Parambu) e Tupinambá (Crateús) não foram contempladas.

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Como afirmamos anteriormente esse curso compreen-de uma carga horária de 3240h/a que foram distribuídas em três componentes curriculares: Base Nacional Comum (880h/a), Formação Especifica (640h/a) e Formação Pedagó-gica (1720h/a), dessas 800h/a, são destinadas ao Estágio Su-pervisionado.

No que se refere à Base Nacional Comum, o curso con-templa as disciplinas básicas do currículo vigente nas escolas regulares: Língua Portuguesa, Matemática, História, Geogra-fia, Ciências Físicas e Biológicas e arte. Essas disciplinas são consideradas básicas porque os aprendizes irão desenvolver suas competências e habilidades no que se referem aos con-teúdos formativos.

Na Formação Específica contemplam disciplinas que levarão os alunos a refletirem suas condições, identidade, cultura, etc. Os discentes irão estudar: Políticas Indigenis-tas, Introdução à Antropologia, História da Educação Esco-lar Indígena, Atividades Individuais e Coletivas, Intercâmbio Cultural. Essas disciplinas irão resgatar fatos históricos viven-ciados por antepassados indígenas, ofertando-lhes a oportuni-dade de construírem um futuro fundamentado na valorização do seu povo, da sua cultura, da sua identidade e da sua vida.

A Formação Pedagógica é a mais extensa dos com-ponentes curriculares devido à necessidade de dialogar com outros saberes e contempla as seguintes disciplinas: Didática, Estrutura e Funcionamento; Fundamentos Sociológicos, Psi-cológicos, Históricos e Filosóficos; além de algumas modali-dades de ensino: Tecnologias da Informação e Comunicação na Educação e Estágio.

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No tópico que se refere à Formação Pedagógica estão contempladas as disciplinas de Estágio Supervisionado, perfa-zendo um total de 800h/a. Essa disciplina foi organizada em três momentos distintos e significativos: 1. O primeiro mo-mento (60h/a) foi direcionado aos estudos teóricos, metodo-lógicos e encaminhamentos das atividades práticas de estágio, como também reflexões sobre a identidade do professor indí-gena da educação básica do estado do Ceará; a importância do Estágio como instrumento de diálogo entre teoria e prática e o memorial como recurso formativo; 2. O segundo momen-to (220h/a) contemplou o memorial reflexivo, a escrita e a produção de conhecimento do professor indígena do Ceará; memorial de Formação: quando as memórias narram a his-tória da formação; ofício de escrever a vida: memória (auto)biográfica e história da educação; memorial: fazendo-me pro-fessor(a). Momento marcante, no qual os aprendizes recorre-ram as suas memórias vivas e adormecidas para resgatar sua verdadeira história de vida. 3. O terceiro e último momento (520h/a) foi dirigido à organização e acompanhamento do processo de ensino-aprendizagem nas escolas indígenas; aná-lise do trabalho pedagógico do estagiário na escola indígena; reflexão sobre o cotidiano de uma escola indígena e elabora-ção de estratégias de intervenção; orientação das atividades a serem desenvolvidas no exercício da docência de forma articu-lada com a prática profissional e o registro formal de todo o processo em um relatório reflexivo. O intuito é proporcionar ao professor estagiário uma reflexão de sua prática pedagógica com base no conhecimento desenvolvido no curso de Magis-tério Indígena II, buscando a articulação, teoria e prática de acordo com a realidade da escola indígena.

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Segundo Pimenta e Lima (2010) o  estágio supervi-sionado corresponde ao momento em que o aluno entra em contato com o universo da educação, em seu contexto inicial de formação e compreende o espaço onde irá desenvolver seus conhecimentos junto às instituições públicas e privadas, cor-relacionando a teoria e a prática.

Como podemos observar o Estágio Supervisionado proporciona ao professor estagiário uma reflexão sobre sua prática pedagógica, propiciando uma articulação entre a teoria e a prática de acordo com a realidade da escola indígena. Essa qualificação contribui para a formação do professor indígena que atua na disciplina de Matemática, levando-o a diversificar suas aulas, tornando-as mais dinâmicas e prazerosas, dando-nos a oportunidade de observarmos esses profissionais desem-penhando o papel de educador de forma exemplar.

As discussões estão condizentes com os estágios super-visionados da formação dos professores dos cursos superiores, em conformidade com o pensamento de Buriolla (1999, p. 10) apud Pimenta e Lima (2010, p. 62) “o estágio é o lócus onde a identidade profissional é gerada, construída e referi-da; volta-se para o desenvolvimento de uma ação vivenciada, reflexiva e crítica e, por isso, deve ser planejado gradativa e sistematicamente com essa finalidade”.

O estágio propicia ao discente vivenciar a realidade, experimentar as emoções e os desafios de uma sala de aula. Momento ímpar no qual o discente aplicará as teorias e práti-cas estudadas. De fato, construirá sua identidade profissional e ao mesmo tempo facilitará o processo ensino e aprendizagem na interação com seus alunos. É o momento de prática, no

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qual os conhecimentos técnicos e teóricos adquiridos duran-te a graduação passam a ser aproveitados e adquirem outros significados diante da realidade escolar. A escola é o campo de estágio. Portanto, a disciplina de Estágio Supervisionado é de suma importância para o desenvolvimento profissional do futuro docente seja ele indígena ou não.

Diante do que foi exposto, nosso estudo será direcio-nado à disciplina de estágio supervisionado, no qual iremos dirigir nosso olhar sensivelmente à disciplina de Matemática nas escolas indígenas Tremembé, situada em Itapipoca/CE.

Conhecendo a etnia TremembéDe acordo com o Marco Referencial dos Povos Indíge-

nas do Estado do Ceará, a SEDUC e o Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará – IPECE afirmam que des-te o período colonial, o povo Tremembé vem sendo citado em documentos, relatos de missionários, viajantes e cronistas como Trammambé ou Tarammambé. Nos séculos XIX e XX eram tratados como caboclos remanescentes ou descendentes de índios. Essa configuração mudou com a constituição de 1988, na qual o indígena passa a ser valorizado e respeitado pela carta Magna e, consequentemente, pela população.

O povo indígena Tremembé do Ceará habita atual-mente os municípios de Itapipoca, Itarema e Acaraú. Está si-tuado na Região Norte do Estado do Ceará. Segundo o Pajé Luiz Caboclo (2007, p. 45), “o nome Tremembé vem dos ‘tre-medaú’, espécie de córrego de lama movediça, coberto por es-cassa água”, no qual os nativos utilizavam esses tremedaú para

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escapar de capangas e soldados. De acordo com a figura 02, podemos observar os três municípios onde estão localizadas as aldeias Tremembé.

Figura 02: Mapa do Ceará delimitando os municípios onde estão situados o Povo Tremembé.Fonte: Povos Indígenas no Ceará: organização, memória e luta, 2007, p. 33.

Os Tremembé3 vivem da agricultura, da pesca, da caça e de benefícios sociais. O artesanato é feito de cipó, palha de carnaúba, barro, sementes, etc. Têm como tradição dançar o Torém, ritual sagrado praticado por eles com o objetivo de

3 Conforme convenção estabelecida em 1953, entre linguistas e antropólogos, ficou estabelecido que o substantivo gentílico referente ao nome de um povo indígena seria grafado com maiúscula e nunca pluralizado. Por se tratar de designativo de um povo, de uma sociedade, de uma coletividade única e não apenas de um conjunto de indivíduos. (Olhar – Formação de Professores indígenas: repensando trajetórias de Grupioni, 2006, p. 14).

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buscar força e fortalecimento através dos encantados para lu-tar e vencer as dificuldades existentes.

Quanto aos Tremembé situados em Itapipoca, vieram de Almofala em Itarema – CE, devido à seca do quinze, fato histórico, ocorrido em 1915. O que os impulsionou a desbra-var novas terras a fim de sobreviverem.

Segundo as memórias dos antepassados e relatos dos mo-radores indígenas Tremembé, quando chegaram a essa terra de-pararam-se com índios de outras etnias que não se identificaram.

A comunidade indígena de Itapipoca vive em uma área de aproximadamente 3.100 hectares, localizada entre o rio Mundaú e a praia da Baleia, mais precisamente, no distrito de Marinheiros, pertencente ao município de Itapipoca/CE. As aldeias são rodeadas por dunas móveis e fixas e muitas lagoas temporárias que enchem no inverno e secam no verão. Essa população é constituída por aproximadamente 500 índios e estão distribuídos nas aldeias: Buriti de Baixo, Buriti do Meio, Munguba e São José. A maioria desses indígenas só assumiu sua identidade publicamente no ano de 2002.

Somente em 2005 conseguiram uma Educação Dife-renciada para a aldeia. A escola E.D.E.F.M. de Buriti funcio-nava em condições precárias no salão comunitário da comu-nidade e nos alpendres das casas de algumas professoras, sem as condições mínimas para efetivar o ensino e a aprendizagem carecendo urgentemente de uma infraestrutura física. Então, no dia 03 de setembro de 2010 foi inaugurada a Escola Indí-gena Brolhos da Terra, atendendo as comunidades de São José e Buriti, oferecendo uma educação que valoriza a cultura do povo Tremembé.

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É interessante ressaltar a origem dos nomes das aldeias de São José e Buriti. A aldeia São José recebeu esse nome em homenagem a uma escultura de São José feita de ouro encon-trada nas dunas de areia naquela região e a aldeia Buriti devi-do a uma vasta vegetação nativa de buriti naquela localidade. Assim, os nomes não se distanciavam da realidade vivida pelos nativos em seu habitat natural. Um estudo antropológico foi efetuado nas terras indígenas Tremembé em Itapipoca, no ano de 2009; esse documento foi aprovado e, recentemente, obti-veram a posse de suas terras publicadas no Diário Oficial da União, no entanto uma empresa contestou essa decisão.

A Constituição Federal de 1988 no Título VIII – Da Ordem Social, no capítulo VIII que trata o tema – Dos Índios afirmam:

Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, lín-guas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradi-cionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. (p. 146)Art. 232. Os índios, suas comunida-des e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo. (p. 146)

Como supracitado na Lei nº 6001/73 que afirma:Art. 1º Esta Lei regula a situação jurí-dica dos índios ou silvícolas e das co-munidades indígenas, com o propósito de preservar a sua cultura e integrá-los,

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progressiva e harmoniosamente, à co-munhão nacional.Parágrafo único. Aos índios e às comu-nidades indígenas se estende a proteção das leis do País, nos mesmos termos em que se aplicam aos demais brasileiros, resguardados os usos, costumes e tradi-ções indígenas, bem como as condições peculiares reconhecidas nesta Lei.

Diante de tudo que foi mencionado até o presente mo-mento, podemos recordar que os índios Tremembé de Itapi-poca tomaram posse dessas terras em 1915 em uma época que o Ceará vivenciou um longo período de seca. A comunidade indígena aguarda sentença final da justiça.

Contando uma históriaIniciamos os trabalhos como orientadora na disciplina

de estágio supervisionado orientando dez discentes do Polo II – Acaraú. Esse número pode ser considerado pequeno, mas, diante das dificuldades de adentrar as reservas indígenas, esse número passa a ser bem expressivo. Visitamos quatro escolas indígenas, a saber: Escola Indígena Brolhos da Terra – aldeia Munguba, Escola Indígena Tremembé Rosa Suzana da Rocha – aldeia São José, Escola Indígena Tremembé de Queimadas – aldeia de Queimadas e Escola Tremembé de Passagem Rasa – aldeia Passagem Rasa.

Ao visitar as escolas indígenas percebemos que algumas delas estão sendo padronizadas na sua estrutura física, cuja vis-ta topológica assemelha-se a um cocar, conforme figura 03:

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Figura 03: Vista topológica de uma escola indígena Fonte: www.googlemaps.com.br acessado em 19/05/2015 às 22h50min /imagem de domínio público

Essa é uma imagem da Escola Indígena Ita-ará em Pa-catuba, CE– 060 km 15 (vista de cima) realmente tem um formato de um cocar. O que nos remete a uma escola dife-renciada a começar por sua estrutura. A área circular acima é o espaço onde são realizados os rituais sagrados como a dança específica de cada povo. As salas de aula ficam contornando o círculo, que devido o calor intenso do nordeste, essa área está sendo coberta. Em relação à secretaria, biblioteca, sala de in-formática, cozinha/cantina e banheiros ficam na área interna. A Escola possui uma infraestrutura adequada, que favorece um clima de interação plena entre os gestores, docentes, dis-centes e comunidade.

Direcionaremos nosso olhar apenas à Escola Indígena Brolhos da Terra, na qual observamos quatro estagiárias. Ex-periência rica e prazerosa que pudemos vivenciar e observar

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a prática docente dessas futuras professoras na disciplina, Es-tágio Supervisionado de Matemática, referentes ao segundo semestre de 2013.

O estágio foi realizado no Ensino Fundamental I, nas turmas do 2o e 3o ano, com 12 alunos em cada turma, no período matutino, cujos alunos estavam na faixa etária des-tinada a esse segmento (7 a 11 anos). As salas de aula têm uma infraestrutura adequada, possuem ventiladores, quadro branco, mesa para o professor e cadeiras com braço de apoio para o material escolar dos aprendizes. O espaço interno esco-lar foi idealizado e projetado para que sua ambientação receba iluminação e ventilação natural, como confirmamos em lócus.

A estrutura da aula está baseada em um planejamento prévio, no qual as estagiárias preliminarmente realizaram uma pesquisa junto às docentes titulares para diagnosticar o nível cognitivo dos alunos, conhecendo assim, a realidade de cada sala de aula. Vale ressaltar que o planejamento é um fator im-portante dentro do processo de ensino e aprendizagem de qual-quer modalidade de ensino. Uma aula bem elaborada estimula a participação do aluno, levando-o a novas aquisições de saberes.

Entretanto, se uma aula não for bem planejada, causa frustração para os envolvidos nesse processo de aprendizagem. Por isso o docente necessita planejar, refletir sobre sua ação, pensar sobre o que faz antes, durante e depois de cada aula. Lembrando que o planejamento é flexível e à medida que o professor sentir necessidade fará o replanejamento necessário da sua práxis, nos moldes operantes pedagógicos. O aprendiz, nesse processo, se torna coadjuvante no planejamento das au-las. Claramente percebemos que o planejamento efetivo cons-titui uma atividade contínua e flexível.

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Nas aulas observadas foram trabalhados assuntos en-volvendo as quatro operações, com ênfase em adição, subtra-ção e multiplicação. Percebemos que as docentes iniciaram suas aulas resgatando os conhecimentos prévios dos alunos por meio de conversas, estimulando-os a perguntarem e a responderem suas próprias indagações. É interessante que o professor inicie sua aula fazendo um levantamento sobre o que os alunos sabem a respeito do tema a ser estudado. Essa abordagem é fundamental, pois estimula os saberes dos alunos preparando-os para novos conhecimentos. Na década de 60 Ausubel apud Moreira (2011) asseverava que os conhecimen-tos prévios trazidos intrinsecamente pelos discentes era uma teoria que alicerçava ações didáticas.

A partir dos conhecimentos prévios, as professoras uti-lizaram recursos como livros paradidáticos, situações proble-mas contextualizados na realidade dos participantes. Estimu-laram a atenção dos presentes através de contação de história, atraindo a participação e interação do grupo. Nessa rede de aprendizagem acontecem as trocas de experiências discentes mediado pela ensinante.

As metodologias utilizadas foram diversificadas, insti-gando ativamente a participação dos alunos. Através da leitura e escrita matemática, os alunos socializaram saberes, interagin-do suas descobertas e aprendizagens. As docentes discorriam os assuntos abordados tópico por tópico, faziam perguntas e os discentes respondiam, verificavam a aprendizagem conti-nuamente e conduziam os alunos a refletirem diante dos con-teúdos abordados.

De acordo com RCNEI (2005, p. 160):

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A Matemática torna-se significati-va para quem a estuda, à medida que ela contribui para entender o mundo local e também o mais amplo. Além dos conhecimentos envolvendo rela-ções quantitativas ligadas às atividades cotidianas, o estudo da Matemática contribui para o desenvolvimento de capacidades relacionadas ao raciocínio e à abstração. No campo da Matemá-tica, é possível imaginar, criticar, errar, criar modelos e representações, desco-brir que o conhecimento que às vezes parece que vem pronto e acabado não é uma verdade absoluta.

Dessa forma, o ensino de Matemática, na comunidade indígena, torna-se atrativo; os alunos interagem e socializam os conhecimentos adquiridos de forma ampla e significativa.

Maher (2006, p. 18) “constatou em lócus que o mo-delo de aprendizagem indígena passa pela demonstração, pela observação, pela imitação, pela tentativa e erro”. Nós com-provamos o mesmo modelo de aprendizagem, praticado no ensino da Matemática nesse palco de saberes e aprendizagens indígenas. Ao utilizarem os materiais manipulativos, as esta-giárias, primeiro, explicavam como iriam trabalhar; os alunos observavam, imitavam e depois eles mesmos iam resolvendo suas situações problemas por tentativa e erro, (veja figura 04). O interessante é que os próprios alunos estabeleciam parcerias entre si, compartilhando experiências de aprendizagem cole-tivamente. Os materiais utilizados no ensino da Matemáti-ca foram: sementes silvestres, grãos de feijão, ábaco, material dourado, livro didático, paradidático e computador.

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Figura 04: Aluna desenvolvendo situações problema utilizando grãos de feijãoFonte: Acervo do autor

Esses materiais induziam a curiosidade desses atores em relação ao ensino e aprendizagem da Matemática escolar.

Um exemplo dessa prática foi vivenciado por uma das estagiárias, quando dividiu a aula em dois momentos signifi-cativos: o primeiro, na própria sala de aula, relacionando teo-ria e prática: expôs o conteúdo, explicou e motivou os alunos a perguntarem e a praticarem os exercícios propostos; o segundo momento, levando os alunos à sala de informática para juntos aprimorarem os conhecimentos adquiridos (vide figura 05).

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Figura 05: Alunos aprimorando os conhecimentos na sala de informática Fonte: Acervo do autor

Utilizou o site4, ocasião em que as crianças puderam revisar todo o conteúdo abordado (adição, subtração e mul-tiplicação) através do programa de tabuada. Alguns alunos utilizaram o material dourado para realizar as atividades e di-namizar o processo educativo.

Os aprendizes se envolveram ativamente nos exercícios propostos pelas professoras e a cada atividade os discentes de posse dos materiais manipulativos resolviam as situações pro-blemas que iam surgindo, sob a coordenação da facilitadora. O que fica evidente é a promoção espontânea dos participantes na socialização com o grupo através de varias formas de intera-ção. A docente monitorava essas correções, fazendo as devidas inferências e apontando positivamente o sucesso individual e coletivo dos participantes no processo de aprendizagem.

4 www.escolagames.com.br/jogos/tabuadaDino/.

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Todas as estagiárias antes de concluir suas aulas faziam uma retrospectiva de todo o assunto abordado durante a aula, buscando relacioná-lo significativamente com o cotidiano do estudante. Ao concluir as aulas todos os alunos eram convi-dados pelas professoras para juntos encerrarem as atividades do turno com o ritual sagrado o Torém. Os alunos corriam para o pátio, soltavam suas bolsas e/ou materiais escolares no chão e imediatamente formavam um grande círculo de mãos dadas e iniciavam sua oração. Depois, alguns alunos do gênero masculino vão para o interior do círculo tocar e cantar músicas sagradas; pela autonomia deles em relação ao ritual do Torém, provavelmente, trata-se de futuras lideranças, veja figura 06. Após cantarem e dançarem, eles encerram suas atividades do turno, dirigindo-se ao transporte escolar.

Figura 06: Ritual sagrado, dança do TorémFonte: Acervo do autor

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Assim, aplicando essas metodologias, as futuras pro-fessoras de matemática vão construindo e reconstruindo sua identidade profissional. Conforme Dubar (1997, p. 13) apud Pimenta e Lima (2010, p. 63):

a identidade humana não é dada, de uma vez por todas, no ato do nasci-mento: constrói-se na infância e deve reconstruir-se sempre ao longo da vida. O indivíduo nunca constrói [sua iden-tidade] sozinho: depende tanto dos julgamentos dos outros, como das suas próprias orientações e auto definições. [Assim] a identidade é produto de su-cessivas socializações.

É através da vivência e da maturidade que o professor vai, paulatinamente, construir e reconstruir sua identidade profissional. E para tal, ele precisará se aperfeiçoar nos co-nhecimentos científicos, adquirindo competências e habilida-des para trilhar os caminhos da sabedoria, para tornar-se um profissional capaz de estimular e aguçar a curiosidade de seus alunos, para que esses possam também trilhar o caminho do saber.

Considerações FinaisO ensino da Matemática vem sendo contextualizado

de acordo com os PCN’s e, especificamente, o RCNEI docu-mento direcionado para as escolas indígenas que contempla as competências e habilidades exigidas na base educacional nacional.

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As estagiarias apropriaram-se de várias teorias, entre elas a de Ausubel, na qual o indivíduo traz conhecimentos pré-existentes que levam a auferir novas aprendizagens que enriquecem os mecanismos do conhecer e aprender significa-tivamente. Trabalharam com jogos, instigando a curiosidade dos discentes, levando-os a várias descobertas, estimulando-os à vontade de saber e descobrir mais e mais.

De acordo com o contexto social das escolas indíge-nas, as ensinantes favoreceram e facilitaram o ensino da Ma-temática, propiciando vivências prazerosas em seus discentes; exploraram os materiais manipuláveis como ábaco, material dourado entre outros, motivando a aprendizagem e enaltecen-do o processo de ensino da Matemática nessa comunidade.

Utilizaram os recursos como: jogos estruturados e não estruturados, livros didáticos, paradidáticos e tecnologias dis-poníveis, as docentes mediavam e facilitavam o caminho do saber, tornando assim o ensino da Matemática mais signifi-cativo. Como percebemos em lócus, os discentes sentem-se seguros e motivados em socializar esses conhecimentos que a cada dia ampliam-se mais.

Tivemos a confirmação de que as docentes utilizam e ou adaptam as atividades que foram ministradas no decorrer do curso do Magistério Indígena II – Nível Médio. Verifica-mos que as estagiárias estavam aplicando os conteúdos e me-todologias estudadas em sala de aula, conforme a realidade de suas turmas.

As futuras professoras indígenas demonstraram des-treza e habilidade em relação aos conteúdos programáticos, como também aos materiais manipuláveis, tendo o cuidado

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de contextualizar a teoria e a prática, proporcionando aos seus aprendizes um ensino significativo. Com muita competência, conseguiram transformar as maçantes aulas de Matemática da aldeia em verdadeiro momento de integração e socialização, no qual vimos discentes interessados e comprometidos em compartilhar e ampliar saberes, participando ativamente das atividades propostas.

Essas professoras indígenas souberam disfrutar cada conteúdo estudado e assim socializar o ensino e aprendizagem da melhor forma possível em sala de aula. Percebemos que a maioria dessas profissionais são graduadas ou estão em proces-so de graduação. A necessidade de uma formação qualificada para atuarem na escola é uma realidade nas comunidades in-dígenas.

Hoje, os professores indígenas reconhecem a impor-tância da qualificação profissional e estão fazendo de suas es-colas diferenciadas um lugar de oportunidade onde sociali-zam todas as suas experiências, abrindo portas para um futuro promissor, no qual o estágio supervisionado passa a ser um veículo que conduz à aplicação das teorias e práticas, trazendo a essa escola um ensino de Matemática contextualizado e sig-nificativo para os aprendizes.

Esse estudo é apenas um ensaio inicial sobre a prática docente na disciplina de Matemática na educação indígena. Em outro momento iremos retornar às discussões em torno da efetivação desses conhecimentos adquiridos no decorrer da formação desses docentes.

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Referências

AGUIAR, Ubiratan. LDB: memória e comentários/Ubiratan Aguiar, Ricardo Martins. Fortaleza: Livro Técnico: 2ª Edição, 2003, 178p.

BRASIL, Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN. Lei nº. 9.394 de 1996. Brasília: Ministério da Educação, 1996.

_______. Ministério da Educação. Referenciais para a formação de professores indígenas/ Secretaria de Educação Continuada, Alfabeti-zação e Diversidade - SECAD / MEC - Brasília: MEC 2ª edição, 2005.

_______. Ministério da Educação e Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indí-genas. Brasília: MEC/SEF, 2005.

GRUPIONI, Luís Donisete Benzi (Org.). As leis e a educação escolar indígena. Brasília: MEC / SEF, 2005. 2ª edição. (Programa Parâmetros em Ação de Educação Escolar Indígena). 

MOREIRA, Marco Antonio. Aprendizagem significativa: a teoria de David Ausubel. Marco Antonio Moreira, Elcie F. Salzano Masini. 2ª reimp. 2011.

PIMENTA, Selma Garrido. Estágio e docência / Selma Garrido Pimen-ta, Maria Socorro Lucena Lima; revisão técnica José Cerchi Fusari, - 5. ed – São Paulo: Cortez, 2010. (Coleção docência em formação. Série saberes pedagógicos).

SILVA, Isabelle Braz Peixoto da. Memorial da Cultura Cearense, do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura. (2007). Povos Indígenas no Ceará: organização, memória e luta. Coordenação: Isabelle Braz Peixoto da Silva. Fortaleza: Gráfica Ribeiro’s.

______. Resolução 3/99 do Conselho Nacional de Educação.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6001.htm: Acessado em: 18/05/2015, às 15h.

http://www2.ipece.ce.gov.br/SWAP/swapii/salvaguardas/marco_lo-gico_indigenas.pdf. Acessado em: 10/05/2015, às 13h.

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AUTORES

Ana Carolina Costa Pereira é licenciada em Matemática pela Universidade Estadual do Ceará (2001), tem mestrado em Educação Matemática pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2005) e doutorado em Educação pela Uni-versidade Federal do Rio Grande do Norte (2010). Atualmente é coordenadora de curso de Matemática da Universidade Aberta do Brasil, professora Adjunta da Universidade Estadual do Ceará, líder do Grupo de Pesquisa em Educação e História da Matemá-tica e Diretora da Sociedade Brasileira de Educação Matemática - Regional do Ceará. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Ensino de Matemática, atuando principalmente nos seguintes temas: Geometria, Livros Didáticos, História da Mate-mática, Educação Matemática e História da Educação Matemáti-ca. E-mail: [email protected]

Giselle Costa de Sousa é licenciada em Matemática pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2001 e 2003) e tem mestrado em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2005), na linha de pesquisa em Educação Ma-temática. É doutora em Educação linha Educação Matemática pela UFRN (2008). Além disso, concluiu o curso de técnico em Estradas pela ETFRN, hoje IFRN (1997). Atualmente é profes-sora adjunta do Departamento de Matemática da UFRN. Tem experiência na área de Matemática, com ênfase em História da Matemática, atuando principalmente nos seguintes temas: Histó-ria da Matemática, Relações entre Hist. da Mat. e TIC, Geogebra, Cálculo, Educação Matemática, Lógica e George Boole. Atuou como professora convidada no Instituto de Formação Superior Presidente Kennedy - IFESP (2007). É coordenadora do PIBID

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de Matemática da UFRN/Natal desde 2008 e professora do Pro-grama de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e Mate-mática - PPGECNM/UFRN. E-mail: [email protected]

Joelma Nogueira dos Santos é professora de Matemá-tica do Instituto Federal do Ceará - IFCE, Campus Camocim. Tem experiência na área de Matemática, com ênfase em Educa-ção Matemática. Concluiu o mestrado profissional em Ensino de Ciências e Matemática (ENCIMA) pela Universidade Fede-ral do Ceará (UFC). É Especialista em Ensino de Matemática pela Universidade Estadual do Ceará (UECE) cuja formação está direcionada para o Ensino e a Aprendizagem da Matemática. É Especialista em Gestão e Avaliação da Educação Pública pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) a qual está voltada para a Gestão do Currículo. E-mail: [email protected]

José Damião Souza de Oliveira é licenciado em Ma-temática pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2012) tem mestrado em Ensino de Ciências Naturais e Matemá-tica pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2014). Atualmente é professor efetivo da rede estadual do ensino básico do Rio Grande do Norte e Professor Supervisor do Programa Ins-titucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID-Matemática UFRN). Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Ensino de Matemática, atuando principalmente nos seguintes temas: História da Matemática, Tecnologia da Informação e Co-municação e Geometria do Compasso. E-mail: [email protected]

Laura Andrade Santiago é licencianda em Matemática pela Universidade Estadual do Ceará. Atualmente é monitora da disciplina de Laboratório de Matemática e integrante do Grupo de Pesquisa em Educação e História da Matemática. Linha de

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pesquisa: Um estudo sobre a concepção do uso de história em quadrinhos como recurso metodológico. E-mail: [email protected]

Luis Adolfo de Oliveira Cavalcante é licenciado em Matemática pela Universidade Federal de Goiás (2010), especialista em Educação Matemática (2012) e mestre em Educação em Ciências e Matemática (2014) pela mesma instituição. Atua como professor de Matemática na Unidade Integrada Professor Venerando de Freitas do SESI/GOIÁS e é docente da Faculdade Integrada de Goiás (FIG). E-mail: [email protected]

Márcio Nascimento da Silva é bacharel (2001) e mes-tre (2003) em Matemática pela Universidade Federal do Ceará (UFC), professor do curso Licenciatura de Matemática da Uni-versidade Estadual Vale do Acaraú (UVA) desde 2005. Atualmen-te vem trabalhando mais de perto com a formação dos futuros professores de Matemática da Região Norte do estado do Ceará atuando como coordenador de área do subprojeto de Matemáti-ca do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação a Docência (PIBID) na UVA. Além de colaborador do Laboratório de Esta-tística e Matemática Aplicada (LEMAP), também é coordenador do Laboratório de Vídeos Didáticos (LAVID) onde são desen-volvidos projetos de produção de audiovisuais voltados para ensi-no, aprendizagem e divulgação da Matemática. E-mail: [email protected]

Maria Gilvanise de Oliveira Pontes é professora da UECE, licenciada em Matemática (1975) e Pedagogia (1976) por esta universidade, com especialização em EAD pela UnB (2000), mestrado e doutorado em educação pela UFC (1986) e UNICAMP (1996), respectivamente. Atua em formação de

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professores, pela UECE, na área de Matemática, desde 1995. Na FAFIDAM, coordenou dois importantes projetos de investiga-ção: Formação de grupos de pesquisa em Ciências e Matemática, com financiamento do SPEC/PADCT/CAPES e Integração en-tre a Matemática e a Língua Materna, com apoio do CNPq e da FUNCAP. Atuou na PROGRAD, como assessora técnico-peda-gógica, coordenou várias turmas do Curso de Especialização em Ensino de Matemática e a área de Matemática no Programa de Formação de Professores do NECAD/CED/UECE, faz parte do corpo docente do Curso de Mestrado Acadêmico Intercampi em Educação FAFIDAM/FECLESC da UECE e do Mestrado em Informática Educativa - MPCOMP. E-mail: [email protected]

Nilton José Neves Cordeiro é bacharel em Atuária pela Universidade Federal do Ceará (1999), tem mestrado em Esta-tística pela Universidade Federal de Pernambuco (2002). Desde 2005 é professor do Curso de Licenciatura em Matemática da Universidade Estadual Vale do Acaraú. Atualmente coordena o Laboratório de Estatística e Matemática Aplicada – LEMAP e o Laboratório de Informática da Matemática – LIMA, onde de-senvolve pesquisas/projetos sobre ensino/aprendizagem em Ma-temática, com ênfase em Estatística e Probabilidade. É professor colaborador do Laboratório de Vídeos Didáticos – LAVID, tam-bém do Curso de Matemática. Tem atuado, principalmente, nas seguintes áreas: Estatística, Educação Estatística e Probabilidade. E-mail: [email protected]

Sheyla Silva Thé Freitas é licenciada em Pedagogia com habilitação em Matemática e Física pela Universidade Estadual Vale do Acaraú (2001), licenciada em Letras com habilitação em Espanhol pela Universidade Estadual do Ceará (2012), Mes-tranda em Ciências da Educação pela Universidad Americana,

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especialista em Gestão Educacional pela Universidad Americana (2014), especialista em Metodologia do Ensino Fundamental e Médio pela Universidade Estadual Vale do Acaraú (2002). Atual-mente professora convidada dos cursos de Matemática e Pedago-gia Universidade Aberta do Brasil – UECE, professora formadora na área de Matemática na Educação Indígena e Programa Brasil Alfabetizado pela SEDUC-CE, consultora em Jogos Matemáti-cos na área da Educação Infantil e Ensino Fundamental I pela Editora Moderna. E-mail: [email protected]

Valmiro de Santiago Lima é licenciado em Matemática pelas Universidades Estadual e Federal do Ceará (UECE – 2002 e UFC – 2015), licenciado em Física pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (2011), mestrando em Ciências da Educação pela Universidad Americana, especialista em Docência Universitária pela Universidade Americana (2014), especialista em Ensino de Matemática pela Universidade Estadual do Ceará (2007). Atualmente professor convidado dos cursos de Matemática e Pedagogia Universidade Aberta do Brasil – UECE, professor formador na área de Matemática na Educação Indígena pela SEDUC-CE, consultor na área de Matemática do Ensino Fundamental II, Médio e do Projeto Aprova Brasil pela Editora Moderna. E-mail:[email protected]

Wellington Lima Cedro é Doutor em Educação (área de Ensino de Ciências e Matemática) pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Atualmente é professor Adjunto do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade Federal de Goiás (IME/UFG). Atua no curso de licenciatura em Mate-mática e na especialização em Educação Matemática, ambos os cursos ofertados pelo IME/UFG. Atualmente é o coordenador do curso de Mestrado em Educação em Ciências e Matemática da UFG (2015-2016) e foi subcoordenador no período de 2011

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a 2014. Na Educação Matemática, os seus trabalhos e pesquisas enfatizam a formação de professores e as atividades de ensino e aprendizagem de estudantes, tendo como base teórica a Teoria histórico-cultural. Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisa sobre a Atividade Matemática (GeMAT) do IME/UFG; Mem-bro do GEPAPe (Grupo de Estudos e Pesquisas sobre a Atividade Pedagógica) da FEUSP; Diretor da Regional Goiás da Sociedade Brasileira de Educação Matemática (2013-2016). E-mail: [email protected]

Wendy Mesquita de Morais é licenciando em Matemá-tica na Universidade Estadual do Ceará, foi aluna de intercambio na Universidade do Porto (2013-2014). Atualmente é bolsista da pró-reitoria de extensão, integrante do Grupo de Pesquisa em Educação e História da Matemática. Linha de pesquisa: Um es-tudo sobre a concepção do uso de história em quadrinhos como recurso metodológico. E-mail: [email protected]