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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017
ISSN 2236-1855 1304
EDUCAÇÃO DE ADULTOS: A PARCERIA DO MEB COM O MOBRAL EM TEFÉ/AM
NO REGIME MILITAR1
Leni Rodrigues Coelho2
Introdução
O presente trabalho procura analisar as práticas pedagógicas do Movimento de
Educação de Base (MEB) e do Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL) no
Município de Tefé, no Estado do Amazonas, no período da ditadura militar. A pesquisa teve
como objetivo analisar as ações pedagógicas, e os fatores que contribuíram para o
desenvolvimento do MEB e do MOBRAL no período de repressão, já que tais movimentos
apresentavam objetivos distintos, bem como compreender os propósitos políticos,
pedagógicos e ideológicos desenvolvidos no período em que o Brasil passava por grandes
transformações no âmbito econômico e social.
O estudo teve como embasamento teórico-metodológico autores como Paiva (1987),
Haddad (1991), Correa (1979), Fávero (2006), Jannuzzi (1979), e Beisingel (1974) como
também documentos oficiais dos movimentos (relatório de reunião, termo de convênio,
relação de professores, relatórios de viagem dos coordenadores, manuais pedagógicos e a
história oral temática), que a partir das análises buscou-se apreender possíveis aspectos
indicativos de peculiaridades e distinções de ambos os movimentos. Acredita-se que a
história oral se faz necessária por dar voz aos sujeitos que não tiveram suas experiências
impressas, por isso, a técnica da história oral é de suma importância para compreender as
ações desses movimentos em Tefé no período da ditadura, já que tais fontes irão registrar
suas ações em termos práticos.
Parte dos documentos que fundamentaram a pesquisa, se encontram arquivados na
Rádio Educação Rural de Tefé, pois, neste local possui um grande acervo documental,
referente ao MEB. Quanto aos documentos do MOBRAL, verificou-se que estes estavam
1 Os resultados da pesquisa são frutos do projeto de produtividade financiado pela Universidade do Estado do
Amazonas (UEA). 2
Mestre em Educação pela Universidade Federal de Uberlândia. Professora Assistente no Departamento de
Pedagogia da Universidade do Estado do Amazonas, Campus Tefé. E-Mail: <[email protected]>.
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arquivados na Prefeitura Municipal de Tefé, e na década de 1980, sofreu um incêndio, e
foram queimados vários documentos, inclusive os do MOBRAL.
Diante disso, surgiu a necessidade de trabalhar com a História Oral para que
pudéssemos analisar de forma mais consistente as ações dos movimentos. Meihy (2007,
p.18), afirma que a “História Oral é um recurso moderno, coerente com os avanços
tecnológicos que se inscreve nas pretensões de um método, capaz de promover análise de
processos sociais”. Portanto, foi elaborado um roteiro de entrevistas com perguntas
norteadoras sobre o MEB e MOBRAL e, foram entrevistados: ex-professor/monitor, ex-
alunos e ex-supervisores/coordenadores que participaram de ambos os movimentos.
Acredita-se que o tema Educação de Adultos (MEB e MOBRAL), é de grande relevância
enquanto estudo científico, uma vez que tem como pretensão minimizar as lacunas
educacionais existentes no âmbito regional, levando em consideração que são poucas as
pesquisas referentes ao MEB, e que não existem estudos sobre o MOBRAL a nível local, pois
há uma ênfase maior na historiografia no âmbito nacional.
A Gênese do MEB e do MOBRAL
O Movimento de Educação de Base (MEB), surgiu a partir da iniciativa da Igreja
Católica, sob a responsabilidade da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), sob o
decreto n° 50.370 de 21 de março de 1961. O MEB foi o único Movimento Popular que
sobreviveu ao golpe de 1964, porém, começou aos poucos a se extinguir, com exceção de
algumas regiões do norte do país. Após o golpe militar, os movimentos referentes à educação
popular foram extintos, para dar lugar a outros que atendessem aos objetivos do poder
ditatorial, que tinha se instalado a partir de 1964. Segundo Haddad (1991, p.77-78):
Com o golpe militar em 1964, houve uma ruptura no campo da política, estes chamados movimentos de educação popular desenvolvidos na primeira metade da década foram reprimidos [...] a atuação do Movimento de Educação de Base foi sendo tolhida pelos órgãos de repressão. O estado exercia a sua função de coerção com fins de garantir a normalização das relações sociais.
Apesar de os Movimentos de Educação Popular ter sido praticamente todos extintos no
período da ditadura, percebeu-se que tal situação não aconteceu em todas as regiões do país.
O MEB na cidade de Tefé é exemplo disso, já que foi extinto somente em 2003, chegando
assim a perpassar o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL) que era um projeto
idealizado pelo governo federal.
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O MEB foi pensado e desenvolvido inicialmente em algumas regiões do nordeste e suas
ações contribuíram significativamente nas atividades do MEB na região norte. O
coordenador do MEB em Tefé viajou por várias vezes para as cidades de Natal e Aracaju em
busca de treinamento para desenvolver os programas radiofônicos. Segundo Protázio (2002,
p.14):
As arquidioceses de Natal e Aracaju foram pioneiras desta experiência educativa no Brasil, com a implantação, viabilização e aplicação de um processo educativo que se mostrou adequada para a atuação nas áreas subdesenvolvidas, onde a escassez de comunicação era uma realidade, de recursos naturais disponíveis e recursos humanos com capacidade de pensar e mudar a história que mantém ainda hoje a maioria da população em nível de submissão cultural, econômica e social incompatível com a dignidade humana e de cidadania.
A CNBB lançou um plano de movimento educativo baseado nas experiências de Natal e
Aracaju com alcance nacional. Em 21 de março de 1961, este plano foi prestigiado pelo
governo através do decreto de n° 50.370, que estabelecia mediante convênios firmados, com
o Ministério da Educação e Cultura e outros órgãos da administração federal, que iriam
fornecer recursos para a ampliação do programa educativo desenhado pelo Movimento de
Educação de Base, utilizando a rede de emissoras católicas que a partir de 1963 foi facilitado
à concessão de canais radiofônicos aos bispos que desejassem emissoras para a transmissão
de programas radiofônicos.
No que tange ao nível local, o Movimento de Educação de Base foi instalado em janeiro
de 1963, pela iniciativa de Dom Joaquim de Lange, que tinha como objetivo, oferecer uma
alfabetização que levasse o indivíduo a promoção integral, humana e cristã através de aulas
radiofônicas.
O MOBRAL foi criado através da Lei Nº 5.379 de 15 de dezembro de 1967 e começou a
se desenvolver no ano de 1970 em caráter experimental, atuando inicialmente em trinta e
duas cidades e em setembro do mesmo ano passou a ser desenvolvido em larga escala. Tal
movimento atendia aos objetivos do governo autoritário que não poderia esquecer da área de
educação e nem da escolarização de adolescentes e adultos uma vez que seria inviável com a
proposta de desenvolvimento de um grande país ao qual pregavam. No entanto, este
movimento demorou praticamente três anos para ser desenvolvido em Tefé, uma vez que foi
instalado apenas em 1973.
De acordo com Corrêa (1979), o MOBRAL se estabeleceu por meio de Comissões
Municipais (COMUM), que foram instituídas por voluntários e líderes locais para preencher
as funções e desenvolver as atividades de alfabetização. Cada COMUM segundo o autor
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supracitado tinha autonomia no desenvolvimento de suas funções, no entanto, sabe-se que
essa autonomia dependia dos resultados alcançados, caso não atendessem aos objetivos pré-
estabelecidos havia interferência dos representantes da Comissão Nacional localizada no Rio
de Janeiro.
Diante da análise documental foi possível perceber que no período da ditadura, Tefé
oferecia a população dois movimentos populares com a finalidade de promover alfabetização
para jovens e adultos, porém estes se apresentavam com objetivos diferentes.
O Fazer Pedagógico do MEB e do MOBRAL em Tefé
O MOBRAL visava erradicar o analfabetismo em apenas 10 anos de atuação, uma vez
que o índice de analfabetos no país encontrava-se elevado. Para os governantes daquele
período o importante era fazer com que as pessoas aprendessem a ler e escrever, para
atuarem no mercado de trabalho, sendo assim, a educação era considerada fator primordial
para que os dirigentes atingissem seus objetivos políticos. Segundo Jannuzzi (1979), para o
MOBRAL a educação era colocada na linha de desenvolvimento econômico, sendo ela o
principal fator para o desenvolvimento das nações.
Quanto a educação oferecida pelo MEB percebe-se que esta era diferente daquela
pensada pelo MOBRAL, uma vez que propiciava aos menos favorecidos uma educação mais
humana, como também, conscientizava-os e orientava-os de seu valor como sujeito ativo e
participativo na sociedade.
De acordo com Corrêa (1979), o MOBRAL criou as Comissões Municipais, indicadas
pelos líderes locais que tinham toda liberdade para preencher as demais funções,
principalmente a do professor. Ao analisar os dados documentais a nível local verificou-se
que o MOBRAL não fazia nenhum tipo de seleção curricular para contratar seus professores,
uma vez que tais cargos eram ocupados por indicação da COMUM em Tefé, o que convergiu
com as decisões tomadas em âmbito nacional.
No que se refere ao MEB constatou-se que o cargo de supervisor era ocupado por meio
de processos seletivos, estes eram submetidos a uma avaliação para testar seus
conhecimentos na área. Os professores monitores eram membros escolhidos pela
comunidade dentre aqueles que sabiam ler e escrever. A ex-supervisora do MEB afirma que:
“ingressei através de concurso, então teve o concurso em agosto de 1979, ai eu fui aprovada e
no dia 10 de setembro de 1979 eu já fui contratada”. (Maria: ex-supervisora do MEB)
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Dessa forma percebe-se que MEB e MOBRAL utilizavam critérios diferentes para
selecionar seus funcionários, já que o MOBRAL era por indicação dos líderes políticos e no
caso do MEB havia um processo seletivo para testar os conhecimentos dos candidatos.
Ao fazer uma análise das entrevistas concedidas pelas ex-professoras de ambos os
movimentos verificou-se que os mesmos não dispunham de formação específica para
lecionar, mesmo porque em Tefé, a população ainda não usufruía o direito de cursar uma
graduação na Universidade, uma vez que esta foi inaugurada apenas no ano de 2000. As
pessoas que possuíam melhores condições econômicas tinham que ir para outras cidades
para continuar os estudos e estas nem sempre cursava licenciatura ou mesmo retornavam
para a cidade de origem. Neste período era comum admitir alunos ao cargo de professores
mesmo não tendo concluído o ensino fundamental. Tais afirmativas se encontram no relato
da ex-professora que atuou no MEB e no MOBRAL:
Quando eu dei aula no MEB e no MOBRAL eu tinha 20 anos [...] eu estava na 5ª série, naquele tempo a gente estudava tudo, era como se fosse a 8ª serie, saia quase formada. Eles pesquisavam pela comunidade quem queria dar aula, quem tinha capacidade [...] sabia ler e escrever, como eu já dava aula pela SEDUC, eu fui. (Antônia: ex-professora do MEB/MOBRAL)
Ao analisar a documentação acerca dos movimentos pode-se dizer que apesar dos seus
objetivos serem totalmente distintos ambos os movimentos possuíam algumas características
e dificuldades semelhantes.
Segundo Corrêa (1979), o MOBRAL é um movimento municipalista, pois adotou uma
política descentralizada, em que as comissões municipais tinham autonomia e liberdade para
executar e tomar as decisões necessárias no que se refere à execução do projeto. No entanto,
Haddad (1991), afirma que o MOBRAL Central criou uma estrutura hierárquica adequada aos
objetivos políticos pré-estabelecidos, uma vez que sua intenção era a de criar uma campanha
de massa com controle doutrinário.
No que tange ao âmbito local, verificou-se que o MOBRAL tinha uma postura
hierarquia, já que as Comissões Municipais estavam atentas ao desenvolvimento das
atividades desenvolvidas pelos professores, e isso se dava através de fiscalização dos
supervisores. O processo pedagógico deste movimento era centralizador e hierárquico, uma
vez que o professor não tinha autonomia para desenvolver suas atividades, pois estas já se
encontravam pré-estabelecidas pelo MOBRAL Central, cabendo aos professores, apenas
colocá-las em prática.
No caso do MEB, embora este tivesse uma concepção diferente acerca da educação
também, havia controle no que se refere ao trabalho didático pedagógico desenvolvido pelo
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professor em sala de aula. A ex-supervisora do MEB afirma que: “Na escola a gente
supervisionava para ver os trabalhos dos monitores e como era que estava, o desempenho dos
alunos”. (Maria: ex-supervisora do MEB)
As entrevistas realizadas com as ex-professoras do MEB e do MOBRAL revelam que a
estrutura e organização hierarquia da Comissão Municipal do MOBRAL em Tefé não
ocorreram de forma tão intensa, pois segundo os relatos das ex-professoras, os supervisores
visitam uma vez ao mês as escolas, isso, quando iam. Acredita-se que essa situação se deve ao
fato de não haver recursos financeiros suficientes para contratar funcionários para fiscalizar
o trabalho do professor de uma forma mais efetiva, já que as comunidades se encontravam
distantes e por isso eram necessários recursos financeiros para contratar um número maior
de funcionários como também assumir a manutenção dos barcos que era o meio de
transporte utilizado para chegar até as comunidades. No que diz respeito ao MEB constatou-
se que a fiscalização era mais frequente, pois existia um número maior de funcionários.
Segundo a ex-supervisora do MEB as visitas feitas ás comunidades tinham os seguintes
objetivos:
Eu passava nas comunidades, é ajudando, por exemplo: a documentação da comunidade, então a minha contribuição era verificar o que aquela comunidade queria, se precisava do estatuto ou o registro do cartório para tirar o CNPJ, o que realmente ela estava precisando. Então eles passavam, a gente estava com essa questão da organização de ver como era que estava e como poderia ser possível. Na escola a gente supervisionava para ver os trabalhos dos monitores e como era que estava, o desempenho dos alunos. Em algumas comunidades trabalhavam com o clube de mães e dentre essas mães procurávamos saber o que elas estavam querendo; quais os trabalhos delas. (Maria: ex-supervisora do MEB)
De acordo com Corrêa (1979), o MOBRAL não era um programa centralizador e
hierárquico, uma vez que seus programas tinham caráter revolucionário e aberto para que as
pessoas participassem e discutissem com toda liberdade os problemas enfrentados naquele
contexto. No entanto, isso não passava de um discurso oficial utópico, e que diverge da
realidade local, pois o que ocorreu em Tefé foi o desenvolvimento de um movimento que
reproduziu os interesses da elite governamental. Jannuzzi (1979) menciona que o MOBRAL
não teve a preocupação em desvelar a realidade do aluno, muito menos fazê-lo um cidadão
consciente, pois isto põe em risco o interesse da classe dirigente que pretendia apenas
capacitá-lo para desenvolver uma função específica no mercado de trabalho.
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Diante das entrevistas realizadas com os sujeitos envolvidos no MOBRAL verificou-se
que as atividades desenvolvidas pelo Movimento em Tefé já vinham todas pré-definidas pelo
MOBRAL Central, cabendo aos supervisores treinar e vigiar os monitores para executá-las,
sem modificações. Isso se pode perceber no depoimento do ex-supervisor do MOBRAL: “Já
vinha uma cartilha, todo o material que o professor pegava e repassava aos alunos [...] já
tinha toda uma estrutura, que chegava e tinha que ser executada”. (Pedro: ex-supervisor do
MOBRAL). Diante de tais afirmações percebe-se que foi adotado um método antidialógico,
em que professores e alunos não participavam do processo de construção de conhecimento.
Constatou-se também que o MEB apesar da fiscalização dos supervisores tinha uma
postura mais democrática, já que as atividades pedagógicas eram pensadas e desenvolvidas
com base nas experiências adquiridas nos encontros realizados com os monitores,
supervisores e coordenadores do programa. Neste momento os professores podiam criticar o
que não estava dando certo, sugerir melhorias e expor suas ideias. Sendo assim, o MEB
adotou o método dialógico, do qual o professor, aluno e comunidade trabalhavam juntos com
respeito, humildade e paciência, acreditando que ambos são capazes de problematizarem a
realidade de maneira crítica, buscando soluções para a melhoria de todos os homens e
mulheres.
As fontes documentais revelaram que teoricamente os movimentos possuírem objetivos
distintos, embora ambos caminharam lado a lado, enfrentando muitas vezes os mesmos
problemas, superando as mesmas dificuldades e adotando os mesmos critérios. Em 1973, o
MEB e MOBRAL, trabalhavam em parcerias, pois o MOBRAL não possuía infraestrutura e
funcionários para fazer a supervisão nas comunidades e por isso contava com o apoio do
MEB, que geralmente cedia parte de seus funcionários bem como os barcos para que os
supervisores chegassem até as comunidades. Percebeu-se que no convenio firmado entre os
movimentos, o MEB se responsabilizava pela educação funcional nas comunidades rurais
pertencentes ao município de Tefé e o MOBRAL ficava responsável pela distribuição dos
materiais didáticos e o pagamento dos monitores. De acordo com a ex-supervisora:
Existia uma parceria entre o MEB e o MOBRAL, os dois tinham o mesmo objetivo de alfabetizar, sendo que o MOBRAL era voltado só mesmo para a leitura e a escrita e o MEB era uma alfabetização ou uma educação mais ampla, uma evangelização e uma educação que a gente acostumava dizer para a vida, ler e escrever, mas também reivindicar os seus direitos é cumprir com seus deveres, é viver em comunidade, buscar melhorias não só pra si, mas para o grupo comunitário em geral. Reivindicar escolas, saúde, o pagamento dos professores, buscar melhoria para a agricultura, melhores preços de seus produtos, então o MEB via assim a coisa bem mais ampla. E o MOBRAL se dedicava apenas ao ler e escrever, o alfabetizar para dominar a escrita e a leitura. E ai os dois caminhavam com esses objetivos e praticante a
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relação dos dois era educar. Eles tinham bom relacionamento e trabalhavam em parcerias. (Maria: ex-supervisora do MEB)
Em relação ao pagamento dos monitores foi encontrado divergência, uma vez que os
documentos revelaram o pagamento dos professores mesmo que irrisório e atrasado, no
entanto as entrevistas realizadas com ex-monitores do MOBRAL, afirmam o não recebimento
do salário, sendo este o principal motivo da desmotivação em trabalhar no movimento.
Alguns monitores do MEB afirmaram que receberam uma gratificação, enquanto outros
afirmaram que não receberam pagamento algum, pois trabalhavam de forma voluntária.
Os dois movimentos pregavam o discurso de que o método de alfabetização adotado
estava baseado nos princípios de Paulo Freire, já que pensavam em uma pedagogia
libertadora. No entanto, as entrevistas revelaram que no caso do MOBRAL a concepção
freiriana foi completamente destorcida. Segundo o ex-supervisor do MOBRAL “[...] O que
fizeram foi pegar alguma coisa da pedagogia Freiriana, colocaram como alguns objetivos do
MOBRAL e distorceram completamente, na prática não era bem assim que funcionava”.
(Pedro: ex-supervisor do MOBRAL)
De acordo com Jannuzzi (1979), Paulo Freire pensa a práxis social, como construção de
um mundo refletido com o povo, já o MOBRAL objetivou trazer o povo ao modelo de mundo
idealizado pela elite. Dessa forma, o MOBRAL propôs um método que não levava em conta a
realidade dos alunos, além disso, não propiciou uma educação reflexiva, pois partia do
pressuposto de que apenas alguns homens (elite) tinha a capacidade de pensar e reconhecer
o que era melhor para toda a sociedade. Quanto ao MEB, acreditava que o aluno tinha através
da alfabetização a possibilidade de dialogar acerca dos problemas enfrentados pela
sociedade, tendo assim, consciência de seus direitos e deveres.
Em Tefé, o ensino-aprendizagem dos alunos, ficou de certa forma comprometido, pois
na maioria das comunidades além do professor não ter formação específica, não possuíam
também escolas ou estas se encontravam em situações bastante precárias, sendo o professor,
obrigado a lecionar na sua própria casa ou nas casas comunitárias. Em termos de iluminação,
Tefé e região utilizava a lamparina, ou o lampião, pois não dispunham de energia elétrica
nesse período. De acordo com as entrevistas realizadas com os ex-alunos percebeu-se que a
falta de energia elétrica também contribuiu de forma significativa nas dificuldades de ensino-
aprendizagem dos alunos de ambos os movimentos.
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Imagine ler a luz da lamparina, você uma pessoa com 50, 70 anos com uma vista totalmente deteriorada, tendo que estudar a luz da lamparina, que é uma luz vermelhinha, que quando a gente está muito perto, o nariz fica cheio de borrãozinho, isso era muito difícil. (José: ex-aluno do MOBRAL)
Nesse sentido, percebe-se as inúmeras dificuldades enfrentadas tanto pelos alunos,
quanto pelos monitores e supervisores de ambos os movimentos. Além das dificuldades
supracitadas foram constatadas também: à distância enfrentada pelos alunos que tinham na
maioria das vezes que se deslocar de uma comunidade para outra, onde tinham aulas do
MOBRAL e do MEB, o cansaço depois de um dia inteiro de trabalho na agricultura fazia com
que muitos alunos desistissem, a fome, os problemas de vista, o que dificultava a
aprendizagem e até mesmo a idade, pois tais alunos pertenciam a uma faixa etária acima de
35 anos. Todas essas dificuldades fizeram com que muitos alunos desistirem dos estudos,
gerando assim um índice considerável de evasão escolar.
Quanto aos supervisores, o fator distância também foi citado como um dos pontos
negativos nos dois movimentos. O cargo de supervisão exigia disponibilidade para viajar
pelas comunidades a fim de supervisionar o trabalho pedagógico dos monitores. Essas
viagens eram feitas via fluvial, a equipe tinha que viajar por muitas horas sentadas na mesma
posição, era disponibilizado um barco de pequeno porte e pouca potência o que dificultava a
chegada dos funcionários nas comunidades. Outra dificuldade enfrentada se deu em relação
aos insetos/pragas (carapanã, mutucas) que os atacavam as margens dos rios, deixando
assim a viagem mais longa e cansativa e às vezes chegavam a contrair doenças durante o
percurso da viagem.
De acordo com Corrêa (1979), o MOBRAL criou vários programas que priorizavam as
áreas profissionalizantes, cultural, de saúde e ação comunitária. Em âmbito local constatou-
se que foram oferecidos pelo MOBRAL alguns cursos profissionalizantes: corte, costura,
treinamento de parteiras e artesanato. No MEB eram organizadas atividades na agricultura
como, por exemplo: plantio de roças, hortas, campo de futebol, limpeza em área com
pequeno povoado, casas, lago comunitário, reformas habitacionais, cuidados com a criação
de animais domésticos, festas cívicas e populares, dos santos padroeiros e tantas outras
atividades coletivas. No entanto, o MEB tinha como prioridade desenvolver atividades
agrícolas em roças comunitárias, uma vez que a equipe do MEB tinha como finalidade
arrecadar recursos financeiros para melhorar a qualidade de vida do povo ribeirinho, bem
como para custear necessidades imprevistas como socorrer doentes, comprar combustível,
construir casas comunitárias ou mesmo a sede da escola. Nesse sentido pode-se dizer que a
atuação do MEB ia além de fazer com que essas pessoas aprendessem a ler e escrever.
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Segundo Corrêa (1987), o MOBRAL veio transformar o quadro educacional, social e
econômico da sociedade mais carente do país. No entanto, não foi possível constatar tais
mudanças no âmbito local, já que as fontes em análise revelaram que á situação
socioeconômica dos alunos não foi alterada a partir do ingresso no movimento, uma vez que
tal projeto não dava condições aos alunos para prosseguirem seus estudos. A atuação do
MOBRAL se limitava aos anos iniciais do ensino fundamental e tinha duração de apenas
cinco meses, o que na opinião dos professores comprometia a qualidade do ensino-
aprendizagem. Percebeu-se também que a maioria dos ex-alunos e ex-monitores do
MOBRAL, não progrediram no âmbito social e intelectual e que ainda permanecem nas
comunidades ribeirinhas sendo desprovidos dos direitos a educação, saúde e saneamento
básico.
Os documentos revelaram o seguinte perfil dos alunos do MOBRAL: eram adultos com
mais de 35 anos de idade, na sua grande maioria chefes de família, que trabalhavam em
situações precárias, com carga horária extensa e por isso ao chegar à sala de aula já estavam
cansados e preocupados com os filhos pequenos que haviam deixado sozinhos em casa
dificultando assim o andamento do ensino-aprendizagem. Além disso, as salas de aulas eram
desconfortáveis, havia inúmeros insetos, o que comprometia a concentração dos alunos, já
que estes tinham que se defenderem dos ataques destes insetos.
Quanto aos alunos do MEB, percebeu-se que ocorreram melhoria na qualidade de vida,
e isso ocorreu pelo fato de que estes, tiveram a oportunidade de produzir e cultivar hortas
comunitárias, produzindo assim uma grande quantidade de hortaliças que eram vendidos
por um preço melhor, gerando mais recursos no âmbito familiar e aos próprios moradores da
comunidade.
Outro fator que deve ser levado em consideração em Tefé é que a maioria os alunos
tinham baixa estima e não acreditavam na possibilidade de alcançar melhores condições de
vida. Os dados da pesquisa revelam que estes alunos se sentiam idosos, e por isso não teriam
mais chances para progredir em termos econômico, profissional e intelectual. No entanto, os
alunos consideravam o fato de aprender ler e escrever um grande privilégio, uma vez que
estes não sabiam assinar seu próprio nome.
No que se refere ao MEB, verificou-se que os alunos pertenciam a uma faixa etária mais
jovem que iam desde os 12 anos de idade, sendo que os alunos até os 15 anos estudavam no
período da manhã e os alunos que tinham a idade posterior aos 15 estudavam no turno da
noite. Apesar das diferentes faixas etárias dos alunos sua grande maioria era composta por
adultos que não tiveram a oportunidade de estudar no ensino regular na idade própria.
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É interessante ressaltar que os alunos do MOBRAL desconheciam os reais objetivos do
movimento e talvez, por isso acreditavam que tal movimento propiciou bons frutos e que
apesar de ser um projeto eleitoreiro, proporcionou a muitos alunos a alfabetização, algo tão
almejado pela população carente. Podemos perceber tais afirmações no relato concedido pelo
ex-aluno do MOBRAL:
O MOBRAL era um projeto de Suplência, dentro de um projeto ditatorial, avalio como um projeto bom, de instrução, de oportunizar as pessoas que nunca tinha chegado à sala de aula, que nunca aprenderam a ler e escrever, que só pegava no paneiro, na mandioca, no teçado, então considero um projeto bom em si, apesar de estar num governo ditatorial, que permitiu a milhões de pessoas adquirir a luz do saber, que é dominar as silabas e chegar as conversações das palavras, visava um projeto que bem ou mal cumpriu a parte pedagógica de suplência. (Antonio: ex-aluno do MOBRAL)
No entanto, alguns alunos discordaram das opiniões supracitadas, apresentando certo
descontentamento acerca do MOBRAL. Na concepção destes alunos o projeto não passou de
uma perda de tempo, pois não proporcionava condições necessárias para um bom
aprendizado, faltavam professores qualificados, materiais didáticos e motivação por parte
dos alunos.
No que se refere aos alunos do MEB, verificou-se que estes demonstraram satisfação,
por terem feito parte desse movimento, acreditando na sua importância para a formação dos
sujeitos envolvidos e para o desenvolvimento das comunidades.
Diante da análise documental verificou-se que a atuação do MOBRAL em Tefé/AM,
divergiu do discurso oficial pregado por Corrêa, ou seja, existe divergência entre teoria e
prática. Nesse sentido, pode-se afirmar que o movimento apresentou ideologias políticas, e
que pouco contribuiu para desenvolvimento social e econômico dos sujeitos envolvidos no
processo.
Quanto ao MEB, o objetivo central era o de contribuir para a elevação da qualidade de
vida de seus alunos, dando a estes a oportunidade de conhecer e buscar seus direitos, bem
como propiciá-los conhecimentos para se defenderem das injustiças sociais. O interessante é
que muitos desses alunos conseguiram progredir em seus estudos, chegando a cursar
faculdade e atuar em cargos públicos (professores, vereadores, entre outros), o que nos
permite dizer que de certa forma o MEB conseguiu através de suas atividades alcançar os
seus objetivos.
Portanto, as fontes documentais revelaram que os dois movimentos apesar de possuir
objetivos distintos, tiveram inúmeras semelhanças no que tange as ações didático-
pedagógicas. Acredita-se que este trabalho tem sua importância, uma vez que possibilitou
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novos conhecimentos acerca da educação de jovens e adultos em Tefé/AM, já que irá
contribuir como referência bibliográfica aos futuros pesquisadores interessados na história
do MEB e do MOBRAL à nível local.
Referências
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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017
ISSN 2236-1855 1316
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