economia sem truques

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  • Economia sem truques

    O mundo a partir dasescolhas de cada um

    Carlos Eduardo Gonalves eBernardo Guimares

  • ndice Prlogo1. O pobre no burro2. A feia fumaa e o casaco verde-chiclete3. A lei que probe cobrar menos4. A lei que aumenta o salrio5. De caadores-coletores a guias de turismo lunar6. E eu vos declaro marido e mulheres7. O preo do futuro8. Vegetarianos, preos e bois9. As rvores da Ilha de Pscoa e as ruas de Londres10. O mercado das almas11. 289 dias12. O poder mgico da cerveja13. Casas esquisitas14. As cigarras15. Os ombros dos gigantes16. O milagre da transformao do suco de laranja em vinho17. O mercado de promessas18. Faxineiro ou aviozinho19. Pedreiros e polticos20. As leis da economgica

  • ndice didtico Prlogo1. Escolhas2. Externalidades3. Preos4. Salrios5. Produo e empregos6. Restrio orcamentria7. Taxa de juros e trocas intertemporais8. Sistema de preos e equilbrio9. Falhas de Mercado10. Desigualdade11. Falhas de governo12. Noes de econometria13. Taxao14. Previdncia15. Educao16. Comrcio17. Crdito18. Mercados ilcitos19. Instituies polticas20. As leis da economgica

  • Prlogo Este um livro que ensina economia a partir de seus princpios mais bsicos, usando exemplosldicos, mas voltado a questes prticas e importantes. Ao nosso ver, a cincia econmica modernafornece instrumentos que nos permitem compreender os fenmenos socioeconmicos e encontrarsolues que melhoram concretamente a vida das pessoas. Contudo, talvez pelo carter hermticodas tcnicas estatsticas e matemticas empregadas ou pelo linguajar especfico dos economistasacadmicos, esse entendimento normalmente no chega ao pblico. Ns acreditamos que possvelensinar a todos aqueles interessados nos debates sobre polticas pblicas a maneira do cientistaeconmico analisar os diversos fenmenos sociais. Este livro busca justamente estabelecer esse eloentre o economista acadmico e a discusso cotidiana.O livro desenvolve e aplica a questes concretas o substrato da lgica econmica, buscandoconsolidar ao longo dos captulos os pilares dessa lgica ao invs de entrar em detalhes especficosdas discusses dos jornais. Aqui, o leitor no encontrar nada sobre a reunio do Copom, nem osltimos dados da cotao do dlar. Para ensinar economia, falamos de coisas como o colapso dacivilizao que habitava a Ilha da Pscoa, a fabricao de vinho francs a partir do suco de laranja, eas casas com janelas cobertas por tijolos. No parece economia? Apenas por enquanto.Em termos de estrutura, o livro est dividido em duas partes. A primeira lana as bases tericas dopensamento econmico moderno, enquanto a segunda se dedica a aplicar esta lgica, este arcabouode raciocnio, ao entendimento de temas particularmente caros ao pas, como educao, comrcio emercados de crdito. Os doze primeiros captulos tratam dos fundamentos, enquanto os oito captulosrestantes focam em aplicaes.O ponto de partida de toda nossa anlise est nas escolhas das pessoas e em sua interao com omundo ao redor. Raciocinando a partir das escolhas individuais, mostraremos como sodeterminados os preos, os salrios, os empregos e a produo da economia. Falaremos sobre a feiafumaa que sobe apagando as estrelas, as leis que apenas parecem aumentar os salrios, o problemado pai do Woody Allen, e muitos outros casos. Em seguida, explicaremos quando e porque o governodeve intervir na economia e os princpios bsicos que nortearo as decises sobre polticaspblicas. Ficar claro porque o governo no deve interferir com os impactos sobre o preo do ourode uma charge ofensiva a Maom feita por um cartunista dinamarqus, e porque o governo deveintervir a fim de reduzir o congestionamento nas ruas de Londres.Entendida a teoria, passaremos a questes ligadas ao debate corrente no Brasil, como tributao, einstituies polticas. No falaremos sobre as particularidades das reformas discutidas na conjuntura,o que importa para ns a lgica econmica por trs de cada assunto. Por exemplo, se queremossaber sobre as polticas pblicas adequadas para a previdncia, vamos antes entender o problemadas cigarras e das formigas. Isso, no entanto, no significa que trataremos desses temas de maneiraabstrata. Para discutir estas questes, necessrio atentar para a realidade, e o livro est recheado

  • de dados reais e de histrias concretas como a de um banqueiro que ganhou o Prmio Nobel da Paz.Algumas passagens do livro podem parecer bvias, mas o bvio com freqncia desemboca nosurpreendente. Por exemplo, o fato de o traficante de drogas no emitir notas fiscais nas suas vendas bvio, mas bem menos claro que por causa disto que h tanta violncia associada ao trfico.O Brasil tem constantemente recorrido a truques de economgica para tentar resolver seusproblemas, implementando polticas pblicas que tentam remedi-los sem tocar em suas causasfundamentais. Claro est, os coelhos no tm sado da cartola. Ao longo deste livro, usaremos oarcabouo econmico tanto para desvendar os truques da economgica, como para pensar e proporsolues que de fato funcionem.

  • 1. O pobre no burro Bangladesh um pas muito pobre, bem mais pobre que o Brasil. tambm um dos maioresexportadores do mundo no setor txtil, onde se empregam mais de um milho de pessoas. Em 1992,mais de 50 mil destes empregados eram crianas de at 14 anos, meninas em sua maioria. Crianasque no estavam estudando nem brincando, crianas cuja infncia se resumia a produzir roupas queseriam vestidas por estrangeiros, e cujo salrio mensal no era suficiente para pagar a conta dealguns jantares dos estrangeiros que vestiam as roupas por elas produzidas. O trabalho infantil eraproibido por lei em Bangladesh, mas a lei no pegou.Foi ento que uma lei americana proibiu a importao para os Estados Unidos de produtos queutilizavam trabalho infantil. A lei americana pegou e, consequentemente, o trabalho infantil nasindstrias txteis de Bangladesh foi drasticamente reduzido. Cerca de 50 mil crianas foramdispensadas da dura vida nas fbricas.Mas por que ser que as crianas estavam trabalhando nas fbricas? Seria essa uma escolha de paiscruis, imposta s crianas indefesas? Bem, pais normalmente se importam com os filhos, e aindaque alguns no se importem, difcil imaginar que 50 mil crianas estivessem sendo escravizadaspelos seus pais. O que estava motivando esta escolha? Na nossa vida, estamos sempre buscando escolher o que melhor para ns. O processo decisriono fcil, simples ou indolor, e o ato da escolha no raro causa angstias, suscita dvidas e penoso para quem decide. Mas, apesar disto, a verdade que ns, voc e a populao pobre deBangladesh estamos todos sempre escolhendo, tentando buscar o melhor para nossas vidas. Atmesmo quando optamos por delegar nossas escolhas a algum, estamos decidindo no escolher, earcando com os custos e benefcios desta opo.Mas estas escolhas no so totalmente livres. Inmeras restries as condicionam, delimitam einfluenciam, como, por exemplo: (i) as limitaes de ordem financeira que todos enfrentamos (osalrio de professor universitrio no nos permite escolher viajar para o exterior de primeiraclasse); (ii) os impedimentos de natureza jurdico-legal que nos cercam (podemos acabar presos se,para comprarmos o ticket de primeira classe, resolvemos assaltar um banqueiro em sua manso); (iii)a nossa falta de informao sobre diversos temas (quanto dinheiro ser que o banqueiro guarda emsua casa? Ela fortemente vigiada por cmeras de segurana?), (iv) as normas morais que regemnosso padro de comportamento social (mesmo se a manso estiver desprotegida e a probabilidadede sermos pegos pela polcia for muito baixa, no achamos correta a escolha de assaltar obanqueiro); etc.Em resumo, as escolhas so em larga medida determinadas pelo conjunto de restries. Entretanto,estar restrito em suas opes no o mesmo que no ter opo, analiticamente diferente de noescolher. As crianas e seus pais em Bangladesh no escolheram o infeliz destino de trabalharem emtenra idade e sob condies ruins por mera ignorncia. O pobre no burro. Se eles assim o fizeram

  • foi por ser esta sua melhor opo disponvel entre as vrias e pssimas alternativas possveis.O problema das crianas em Bangladesh era o conjunto de alternativas disponveis, e no a escolhade trabalhar na fbrica em si. Mas por que esta distino importa?Em 1992 mais de 50 mil crianas estavam escolhendo trabalhar para a indstria txtil de Bangladesh,escolha esta que a lei americana as impediu de manter. As conseqncias da lei foram trgicas paraas crianas. Elas no deixaram o trabalho para ingressar na escola, nem tampouco passaram a curtiras tardes brincando nos parques. A realidade mostrou-se menos idlica: elas se tornaram prostitutas,trombadinhas, ou foram trabalhar quebrando pedras na pedreira. Em suma, saram da fbrica para seenvolver em atividades ainda piores. Alm disto, algumas mes tiveram que abandonar seusempregos para cuidar dos filhos, acentuando o problema de pobreza destas famlias.Se os propositores da lei proibindo a importao de produtos que utilizam trabalho infantil tivessempensado que a escolha prvia das crianas era fruto de um restrito conjunto de alternativasdisponveis e no de burrice, eles no teriam se surpreendido com o fiasco que se mostrou a lei.Afinal de contas, se fosse uma opo vivel para as famlias pobres de Bangladesh mandarem seusfilhos para as escolas e parques, elas o estariam fazendo antes da entrada em vigor da lei norte-americana.No demorou para que as conseqncias negativas da lei fossem percebidas e, em 1995, aps doisanos de penosa negociao, um novo e melhor acordo foi firmado entre a associao das industriastxteis de Bangladesh e a UNICEF. Este acordo tinha como ponto principal prover melhoresalternativas s crianas. O documento explicitamente solicitava que, para o bem das prpriascrianas, as fbricas no as demitissem at que estas tivessem disponvel uma alternativa melhor.Com o apoio financeiro internacional e trabalho das organizaes locais, alternativas comearam aser desenvolvidas. A boa noticia que j se detectam melhoras.[1]A todo instante, dezenas de indivduos escolhem ser assaltantes, entrar na prostituio, trabalharincontveis horas no canavial sob sol inclemente, ou em condies precrias na indstria txtil.Nenhuma destas escolhas nos soam como minimamente desejveis. A muitos de ns elas causaro,com plenitude de razo, indignao e revolta contra o grau de injustia social que refletem. Quais asescolhas que se apresentam, por exemplo, a um indivduo nascido em uma favela violenta de umagrande metrpole ou no interior de um estado pobre do Nordeste brasileiro?Saber que ele tentar escolher da melhor maneira possvel dentre suas opes, todas muito ruins, nosoa nada animador, mas importante ter em conta que o problema de fundo no se resolver atacandoas escolhas em si, e sim melhorando o leque de opes disponveis para os mais desprovidos.Alterar forosamente as escolhas destas pessoas, ao invs de focar na melhora das possveisalternativas, nada resolve e provavelmente apenas piorar uma situao que j em si ruim. Semelhante idia se aplica ao caso da prostituio voluntria de adultos. Todo ano vrios turistasdesembarcam no Brasil motivados pelo clima, pelas praias e pelo turismo sexual. Ao mesmo tempo,h inmeras campanhas contra o turismo sexual em vrias cidades onde a atividade turstica parterelevante da economia local.A escolha da prostituio como profisso est, de acordo com alguns especialistas, ligada a

  • complicados fatores familiares e psicolgicos. Mas, como no exemplo anterior, parte da explicaopara a deciso de vender o corpo decorre da falta de alternativas melhores e no de ignorncia sobreo fardo da profisso. Sendo assim, proibir a prostituio de adultos pode agradar aos que queremuma cidade livre de prostitutas, mas no vai contribuir para melhorar a vida delas. Por qu? Porque aproibio no cria magicamente postos de trabalho em outros lugares, no aumenta o nveleducacional da prostituta, e nem transfere renda para ela poder alimentar seus filhos. Comoanteriormente, entender que uma escolha que julgamos ruim decorre, com alta probabilidade, dasalternativas ainda piores a que uma pessoa tem acesso, primordial para desenhar estratgias depolticas pblicas que gerem bons resultados.Neste livro, estaremos sempre raciocinando a partir das escolhas individuais. A lgica empregadapela cincia econmica moderna para analisar os diversos fenmenos que nos cercam centra-se nasescolhas dos indivduos e nas restries que afetam e limitam estas escolhas. O que motiva estaabordagem metodolgica?Em um plano mais terico, so dois os motivos que nos levam a partir do pressuposto que oindivduo escolhe o que melhor pra si. A primeira mais filosfica e tem a ver com a ideiaprimria de respeito s preferncias e liberdades individuais. Os nossos pais gostam mais depicadinho com jil do que de sashimi de salmo. Esta preferncia nos soa estranha, esquisita, masfor-los a comer o sashimi no vai ajud-los, no vai torn-los mais felizes.A segunda mais prtica e est relacionada ao fato de os indivduos terem melhor informao arespeito de suas alternativas e de toda sorte de restries que os acometem, do que o tm governante,o poltico e o estudioso. O trabalhador de Bangladesh e a prostituta brasileira conhecem melhor doque ningum o seu mundo e as suas opesApesar de na grande maioria dos casos ter mais opes melhor do que ter menos, existem certascircunstncias onde restringir seu prprio campo de escolha pode acabar sendo benfico. Em geral,isto verdade nas situaes onde difcil resistir ao que chamaremos genericamente de tentaes,mesmo sabendo que ceder a elas pode gerar perdas significativas para o indivduo. Ulisses, o navegador da Odissia de Homero, mostrou ter entendido bem esta questo. Ao navegarpor mares povoados por sereias, sedutoras porm mortais, e sabendo que no poderia resistir a seuchamado uma vez escutada a doce melodia de seu canto, ele pede a seus auxiliares que amarrem suasprprias mos haste do navio. Basicamente, ele pede, para seu prprio bem, que lhe retirem umaopo: a de mergulhar para encontrar as sereias. Ao amarrar as prprias mos, Ulisses sai ileso daaventura.Da mesma forma, em casa de diabtico, melhor no entrar doce. Pode ser difcil resistir tentaode comer um bombom, mas extremamente importante que o diabtico no os saboreie. Algunsdiabticos mais racionais e controlados no vo comer doce mesmo que haja uma caixa dedeliciosos chocolates na estante da sala. Mas retirar esta opo do alcance do diabtico pode ajuda-lo a no ceder a esta tentao. Um dos autores deste livro tem dificuldades enormes de no comprarlivros ao entrar em uma boa livraria. Uma sada que ele encontrou para evitar gastar parte importantedo seu oramento com esta compulso foi buscar passar bem longe da livraria - amarrando as

  • prprias mos (ps?) como Ulisses. O n no est se mostrando dos mais firmes, contudo, pois umavez no shopping center onde se encontra a dita livraria, quase impossvel para ele manter ocompromisso de no entrar (e impossvel entrar livraria e sair sem livros!). Sua prxima tentativa abolir os jantares de fim de semana em restaurantes do shopping onde se acha a famigerada livraria.Mas mesmo nos poucos casos onde o individuo escolhe em prejuzo prprio, importante analisar osfenmenos socioeconmicos a partir de sua deciso individual. Quando levamos a srio a ideia deque trabalhadores, consumidores, empresrios, cidados e governantes esto sempre escolhendo ereagindo aos incentivos, fica muito mais fcil entender o funcionamento da economia e analisar oimpacto de polticas pblicas. Por outro lado, quando se abandona este pressuposto, descamba-separa o que apelidamos aqui de economgica, com srias consequncias adversas para a economia.Nossas escolhas se alteram de acordo com as condies do ambiente que nos cerca, ou maisprecisamente, com as diversas variveis que afetam os custos e os benefcios de cada uma de nossaspossveis escolhas. Essas mudanas em face de modificaes no ambiente esto na raiz doentendimento do funcionamento de uma economia de mercado.O exemplo mais tpico e usual de reao a mudanas no ambiente tem a ver com o impacto devariaes dos preos dos bens que consumimos. Quando sobe o preo da manteiga, por exemplo, osconsumidores aumentam a procura por margarinas, um substituto razoavelmente prximo para muitos.J quando o pozinho francs fica mais caro na padaria e as pessoas passam a consumi-lo em menorescala, cai tambm a demanda por manteiga, dado que ambos so em geral consumidos em conjunto.Alm de escolher o que compramos, escolhemos trabalhar ou no, como e onde.Em um feriado prolongado de muito calor, quando a volta de milhares de carros do litoralcongestiona as estradas, rapidamente aparecem, como que surgidos do nada, grupos de vendedoresambulantes de gua e refrigerante. Essas pessoas esto escolhendo trabalhar no feriado, reagindo oportunidade temporria de ganhos mais altos propiciada pela combinao de calor eengarrafamento. Nossas opes de trabalho dependem de nossa formao, que tambm fruto de uma escolha. Todosos anos, entre 800 e 1500 alunos sados dos cursos de graduao em economia prestam uma espciede vestibular para ingressar nos programas de mestrado de economia oferecidos pelas diversasescolas do pas. Em anos em que o mercado de trabalho para economistas juniores encontra-seaquecido, muitos deles deixam de lado a escolha de estudar para a prova de ingresso no mestrado edecidem entrar no mercado de trabalho. Nestes anos, os candidatos inscritos para a prova nacionaldo mestrado em economia raramente passam de 1000. Mas quando a economia do pas vai mal, e omercado de trabalho por conseqncia torna-se temporariamente menos atraente para os formandosda graduao em economia, a demanda pelos cursos de mestrado cresce vigorosamente, podendoalcanar o teto do intervalo acima sugerido. Os recm formados esto escolhendo de acordo com ascondies do ambiente que os cerca, adiando a entrada no mercado de trabalho para um momentomais propcio, e aproveitando o interregno para aprimorar suas habilidades no curso de mestrado.Produtores e vendedores escolhem produzir e vender de acordo com as caractersticas da demanda.Ambulantes e pequenos comerciantes encontrados nas caladas das grandes ruas e avenidas, que

  • costumeiramente ofertam ao pblico passante mltiplas bijuterias, capas de celular, e at funcionamcomo intermedirios financeiros comprando tickets refeio, rapidamente reaparecem nas esquinascom pencas de guarda-chuvas, de R$ 5 e R$ 10, quando a chuva pega o transeunte no contra-poferecendo uma boa oportunidade de lucro para os vendedores. A deciso do que ofertar dosambulantes no , portanto, rgida: ela muda quando muda o ambiente.O inchao dos departamentos financeiros das empresas em pases que vivenciam perodos deinflaes altas e crnicas outro exemplo de reao s condies do ambiente. Quando a inflao muito alta, to ou mais importante que produzir com qualidade, ter uma boa estratgia de marketing,selecionar com cuidado os fornecedores, ou desenvolver novos produtos, ter um departamento definanas que seja bastante eficiente em proteger as receitas da firma da eroso inflacionria,utilizando para tal os mais diversos instrumentos financeiros disponveis. Mas quando a inflao cai,o tamanho e a importncia estratgica dos departamentos de finanas nas empresas diminui a olhosvistos. Mais recursos (humanos e financeiros) passam ento a ser alocados para os departamentos decriao de novos produtos, ou para os de vendas. Empresrios e acionistas esto constantementedecidindo em que departamento focar mais recursos em funo da alterao do entornomacroeconmico.Nos Estados Unidos, um pas de muitos obesos, existe uma quantidade enorme de lojas ofertandoroupas apenas para pessoas que pesam mais de uma tonelada; no Brasil, onde o ambiente outro com menos obesos estas lojas so muito mais raras. A deciso sobre o que produzir depende dascaractersticas dos consumidores.Os polticos, representantes do povo, tambm esto escolhendo. Nas democracias do incio dosculo XIX, apenas os ricos e os instrudos votavam. As escolhas das plataformas de campanha dospolticos levavam isto em considerao e, consequentemente eram ainda muito incipientes programasde transferncia de renda aos pobres, ou escolas pblicas gratuitas. Mas ento se deu uma mudanade ambiente: os pobres passaram a votar tambm. O que aconteceu com as escolhas dos polticos?Elas mudaram de acordo com a mudana dos incentivos. Se o pobre vota, os olhos do poltico a elese voltam. E com a extenso do sufrgio, os governos comearam a financiar escolas, hospitaispblicos e programas de transferncia direta de renda com impostos (majoritariamente pagos pelosmais ricos).De maneira similar, o aumento da longevidade das pessoas aumentou ao longo do sculo XX aparticipao de idosos na populao total. Apoiar programas de transferncia de renda para umgrupo amplo de eleitores os idosos foi-se tornando cada vez mais uma escolha interessante paraos polticos, e deu-se como consequncia um aumento dos gastos pblicos com penses na segundametade do sculo XX.Em resumo, as pessoas esto escolhendo a todo instante. No entanto, como vivemos em sociedade,decises individuais frequentemente geram consequncias que no se limitam a quem as toma,afetando outros no seu entorno de maneira negativa ou positiva. Este fato gera importantesconsequncias econmicas e o tema do nosso prximo captulo.

  • 2. A feia fumaa e o casaco verde-chiclete da escritora americana Fran Lebowitz a frase: o seu direito de usar um casaco de polister verde-chiclete termina onde comeam os direitos do meu olho. Se ela fosse economista, provavelmenteexporia o mesmo pensamento de maneira diferente, ressaltando que nossas escolhas podem afetar osoutros. No caso especfico, que a roupa que escolhemos propicia uma viso agradvel ou no aosolhos daqueles que nos vem passar. Sim, a frase no soaria muito divertida, mas chamaria atenopara o fato de que embora estejamos sempre escolhendo o que preferimos, no necessariamenteestamos escolhendo o que o melhor levando-se em conta todas as pessoas envolvidas e afetadaspela nossa deciso.Caetano Veloso, na msica Sampa, apresenta queixa contra a feia fumaa que sobe apagando asestrelas. Quando as fbricas poluentes e os donos de automveis velhos escolhem lanar no arenormes nuvens de fumaa negra, o nosso cu fica mais triste e o ar menos saudvel. No captulo 1,argumentamos que interferir diretamente nas escolhas dos indivduos lhes era prejudicial. Mas eneste caso, devemos respeitar a deciso individual das empresas de poluir o ar?Nosso bom senso nos diz que no, e ele est correto. Mas importante entender exatamente porque.O diferente aqui em relao aos exemplos do captulo anterior que a emisso de fumaa gera umdano para os outros que no ressarcido pelos agentes poluidores.Quando decidimos, comparamos os custos e os benefcios que obteremos em cada uma dasalternativas que se nos apresentam. Entretanto, como estamos interagindo o tempo todo emsociedade, s vezes os custos e benefcios das nossas escolhas recaem sobre outros, seja de maneirapositiva, ou de maneira negativa. A estes impactos da escolha individual, que transcendem os limitesdo indivduo, os economistas do o nome de externalidades.Nossa escolha de sujar ou limpar nossa casa deve ser respeitada, pois arcamos com todos os custos econseqncias desta opo. A nossa deciso de sujar o mundo, poluindo o ar, no. Ela no podereceber o mesmo tratamento, pois os custos de um mundo mais poludo no incidem apenas sobrequem decide poluir.Quando uma empresa produtora de papel lana dejetos txicos oriundos do processo de produo emum rio, matando seus peixes e contaminando sua gua, sua ao gera prejuzos para a populaoribeirinha que nele costuma pescar, recolher gua doce, ou banhar-se, e at mesmo para o cidadoque fica desagradado ao presenciar a triste cena de dejetos ou espuma qumica navegando rio abaixo.O ato da empresa prejudica pessoas no envolvidas na deciso de poluir. Ele gera externalidadesnegativas.Tambm h uma externalidade negativa quando um proprietrio de terras do Mato Grosso promoveuma queimada em seu terreno com vistas a abrir espao para futuras plantaes. Ao faz-lo, ele lanano ar uma quantidade de gs carbnico que leva a uma deteriorao da qualidade de vida de outraspessoas. verdade que a pior qualidade do ar tambm afeta o proprietrio, mas isto no constitui

  • uma externalidade negativa. Externalidade apenas a parte do impacto que incide sobre os outros.E os exemplos no param por a: jogar bituca de cigarro pela janela; no desligar o celular nocinema; andar no nibus lotado sem usar desodorante; dirigir perigosamente; sair de carro em umhorrio de trnsito intenso (aumentando o trfego para os que j esto tentando chegar no trabalho);entrar no elevador e apertar o stimo quando algum no elevador se dirige ao dcimo andar (e,portanto, atrasado pela sua parada no stimo); roubar; conversar alto na biblioteca; buzinar notrnsito; fumar em lugar fechado, so todos casos de externalidades negativas. So instncias onde aao privada afeta adversamente o bem-estar de outros.O fato de uma ao provocar externalidades negativas no significa que ela no deva ser tomada. Porexemplo, a ambulncia que passa correndo na minha frente para chegar um pouco antes ao seudestino atrasa a minha viagem em alguns segundos. Mas os segundos para a pessoa que precisa deatendimento mdico so mais importantes do que para mim. Ento, a ao do motorista daambulncia no deve ser coibida porque seus benefcios compensam suas externalidades negativas.Da mesma maneira, avies poluem o ar, mas a viagem de avio deve ser evitada apenas se os custospara todos provenientes da externalidade negativa a poluio superarem os benefcios lquidosdiretos da ao para os passageiros ou seja, o benefcio do transporte menos os outros custos daviagem.Um exemplo srio e bastante importante de externalidade negativa, que recebe a alcunha de tragdiados comuns, ocorre quando a ao privada e desarticulada de vrios indivduos exaure,rapidamente, algum precioso recurso que comum a todos.Imaginemos o caso de um pasto pblico, onde todos os criadores de gado de uma certa regio podemlevar seus bezerros para engorda. Se o pedao de terra em questo fosse propriedade de um nicofazendeiro, ele procuraria economizar um pouco dos recursos do pasto para o futuro, e decidiriaquantos bezerros a ele levar tendo em conta que um nmero excessivo de bezerros hoje exauriria osrecursos disponveis para os bezerros de amanh. Mas se outros fazendeiros podem tambm alialimentar seus respectivos rebanhos, a economia feita por um dado fazendeiro pode ser facilmenteapropriada pelos bezerros dos outros. Em vista disto, se o fazendeiro considera apenas os custos ebenefcios que recaem sobre si mesmo, ele optar por levar o mximo possvel de bezerros ao pasto,antes que o capim disponvel seja consumido por outros rebanhos.Onde exatamente encontra-se a externalidade negativa neste exemplo? No fato de que cada bezerro amais que um certo fazendeiro opta por levar ao pasto se traduz em menor quantidade de gramadisponvel para os outros rebanhos, prejudicando assim os outros fazendeiros.Se todos fazendeiros desconsideram as externalidades na sua tomada de deciso, todos tentaroextrair o mximo possvel do pasto no curtssimo prazo. O resultado desta falta de coordenao entreos fazendeiros que os recursos do pasto se deterioram muito rapidamente.O problema da tragdia dos comuns, exemplificado no pargrafo precedente , em muitos casosconcretos, extremamente srio, podendo levar pases ao caos econmico-social e a guerras civis. ocaso, por exemplo, de muitas naes que possuem grande quantidade de preciosos recursos naturais.A guerra dos diamantes em paises africanos como Serra Leoa uma triste ilustrao de como os

  • incentivos e escolhas individuais (ou de grupos) que tentam vorazmente se apropriar dos diamantesque jazem nas minas do pas podem levar a um rompimento completo do tecido social. Para oshabitantes de Serra Leoa, os diamantes so uma maldio, no uma beno.Mas os reflexos das aes privadas que ultrapassam os limites do indivduo tambm podem serpositivos.De fato, muitas decises pessoais podem aumentar o bem-estar de pessoas alheias ao processo deescolha privado. Por exemplo, a deciso individual de se educar um dos mais citados atosgeradores de externalidades positivas. Pessoas mais educadas (no sentido amplo da palavra)convivem melhor em sociedade, votam melhor nas eleies onde se escolhem os representantes quetomaro decises afetando a todos, disseminam parte de seus novos conhecimentos a seus colegas detrabalho, criam filhos mais educados, respeitam mais as leis de trnsito, etc.Outros exemplos de externalidade positiva so: cuidar do quintal, ou enfeit-lo para a semana deNatal, propiciando uma viso agradvel aos transeuntes; organizar a comunidade para realizao detarefas coletivas; convidar os amigos para desfrutar de um saboroso jantar na sua casa, etc. Uma vez estabelecido o conceito de externalidades negativas e positivas, a pergunta que se seguenaturalmente se levamos estes impactos sobre os outros em considerao quando estamosdecidindo. Quando no levamos, a escolha privada difere da escolha que seria ideal para asociedade como um todo.Conta a Bblia que Jesus Cristo aconselhava ao ser humano amar o prximo como a si mesmo. Emlinguagem mais mundana, o conselho era considerar os custos e benefcios de suas aes nos outroscomo se estes incidissem sobre si mesmo. 500 anos antes de Cristo, Confcio ensinava a jamaisimpor aos outros o que voc no escolheria para si.[2] No linguajar do economista, o mandamentocristo e a filosofia de Confcio poderiam ser expressos como: atribua s externalidades de seusatos o mesmo valor que voc atribui aos efeitos de suas aes sobre si mesmo.Os exemplos pouco animadores citados acima deixam claro que o conselho cristo no seguido risca. Claro, no somos todos inveterados egostas que pensamos sempre, e exclusivamente, em nsmesmos. Consideraes altrustas explicam em alguma medida o cuidado de muitas pessoas empreservar o meio-ambiente, e a realizao de doaes financeiras de variadas naturezas. Mastampouco levamos sempre em conta na sua integridade os efeitos de nossas escolhas sobre os outros.Caso contrrio, como explicar a ao do motorista que lana guimba de cigarro pela janela e dirigede modo irresponsvel, a poluio dos rios pelas fbricas, pessoas roubando as outras, a guerra pordiamantes em alguns pases da frica ou os 1000 assassinatos que ocorrem semanalmente no Brasil?Como veremos em captulo futuro, quando os efeitos de uma dada externalidade forem de fatorelevantes, torna-se necessria e desejvel a interveno do ente governamental para coibi-la. Ditode outro modo, confiar no bom corao dos donos das fbricas para deter a poluio do ar no boasoluo. Cabe ao governo tentar fazer com que o dono da fbrica leve em conta nas suas decises osefeitos indesejveis da poluio no ar.Levando a definio de externalidades ao p da letra, a verdade que a grande maioria de nossasaes afeta o bem-estar das outras pessoas, ainda que apenas superficialmente. Em vista disto, e

  • como veremos em captulo futuro, para que a interveno governamental faa sentido na prtica, osefeitos das aes de algum sobre o bem-estar dos outros precisam ser significativos. Poluioencaixa-se nesta definio prtica, roubar e fumar em espao fechado tambm, mas e casacos verde-chiclete? No entendemos muito de moda, mas somos contra o governo interferir na deciso dealgum vestir uma roupa mais extica porque ela no agrada o transeunte que se veste maisconservadoramente. De uma maneira geral, quando a interveno do Estado depende de um juzo devalor deste tipo, nossa primeira reao desaprov-la. Voltando msica de Caetano, precisodistinguir a feia fumaa que sobe apagando as estrelas da deselegncia discreta das meninas deSampa.

  • 3. A lei que probe cobrar menos Em 1992, transitou pela Assembleia Legislativa de So Paulo um projeto de lei que obrigavacinemas, teatros, circos e casas de espetculo a cobrarem o dobro do preo do ingresso de todaspessoas que no tivessem a carteirinha de estudante. Cobrar mais barato, qualquer valor inferior aodobro do preo cobrado aos estudantes, seria ilegal.Esta lei da entrada-dobrada para os no portadores de carteirinha foi aprovada no dia 13/05/1992 evigora at os dias de hoje, sendo mais conhecida pelo nome de lei da meia-entrada. O texto da leicoloca que todo estudante tem direito a pagar metade do preo cobrado s demais pessoas emcinemas, circos, espetculos teatrais, esportivos, musicais e de lazer. Para entendermos porque a leida meia-entrada tem impactos idnticos a uma lei que estabelecesse entrada dobrada para os noestudantes, precisamos antes entender como os preos so formados em uma economia de mercado,quais so os fatores que os afetam.Os preos dos bens em uma economia de mercado so uma escolha das firmas. Lembrando que asescolhas variam com as condies do ambiente, neste captulo focaremos nossa anlise nas variveisque jogam papel fundamental na determinao dos preos.O principal objetivo de qualquer empresa a obteno de lucro. s vezes, porm, elas tomamdecises que parecem no estar diretamente ligadas a este objetivo. Por exemplo, algumas aesvisam estabelecer reputao de longo prazo e ampliar a fatia de mercado da empresa. Uma maneirade faz-lo vender temporariamente o bem a preo inferior ao seu custo de produo. Esta ao defato prejudica a lucratividade da empresa no momento presente, mas ao mesmo tempo, contribui paramaior lucro no futuro, pois atrai mais clientes, alguns dos quais continuaro comprando o bemquando seu preo voltar ao normal.A deciso sobre o preo de venda, assim como as outras escolhas importantes da empresa, se pautarpelo objetivo de obter os maiores ganhos possveis.Mas se em uma economia de mercado, as empresas so livres para escolher o preo de seus bens etm em vista somente o lucro, no natural esperar que elas escolham preos excessivamente altos,prejudicando o bem-estar do consumidor final?Vejamos. Quanto mais alto o preo de um bem, maior a receita obtida por unidade vendida domesmo. Mas como os consumidores reagem a um preo mais alto escolhendo outro bem substituto, ousimplesmente escolhendo comprar o mesmo bem em menor quantidade, menor ser tambm o nmerode unidades vendidas. O resultado lquido de uma elevao de preos sobre o lucro , portanto, emprincpio, incerto. Assim um aumento exagerado do preo no acarretar em lucro maior para a firmaporque a queda nas vendas mais que compensar a elevao do ganho por unidade vendida. Portanto,a empresa nunca escolher preos excessivamente alto que no maximizam seu lucro.Um exemplo concreto relacionando o preo da entrada no cinema com o lucro dos donos do cinemailustra este ponto. Se o preo do ingresso cobrado for muito baixo, digamos de R$ 2, o faturamento

  • ser pequeno mesmo que o cinema fique cheio. J se o valor do ticket for de R$ 100, o cinema ficarvazio e a receita tambm ser pfia. Nenhuma das duas estratgias levam a um bom lucro. Paramaximiz-lo, a empresa escolhe um preo intermedirio que gera uma boa receita por unidadevendida e ao mesmo tempo capaz de atrair uma boa clientela. Este preo no Brasil gira hoje emtorno de R$ 30 para no-estudantes, e R$ 15 para estudantes.Mas dizer que a empresa escolhe o preo para maximizar seu lucro no nos esclarece l muita coisa. importante entender que condies do ambiente afetam esta relao entre preo e lucro porquemudanas nestas condies so a base da explicao para as diferenas nos preos escolhidos pelasempresas. De uma maneira geral, o preo escolhido pela empresa depender crucialmente de doisfatores: (i) o custo do produto para a empresa e (ii) a sensibilidade da demanda dos consumidoresaos preos.Vejamos primeiro o impacto do componente custo. Custos mais altos comprimem o lucro porunidade, e medida que este diminui, torna-se mais interessante para a empresa aumentar o preo,ainda que isso implique em alguma reduo da quantidade vendida.Um exemplo numrico ajuda a entender este ponto. Pensemos em uma empresa cogitando elevar seupreo de R$20 para R$21. Ela considera que este aumento causar uma reduo de 20% na demandapelo seu bem. Vale a pena ento aumentar o preo?A resposta depende do custo unitrio de produo. Se este, por exemplo, de R$19, o lucro porunidade R$1 ao preo de R$20. Se o preo sobe para R$21, o lucro por unidade passa a ser R$2.Portanto, com a elevao, o lucro por unidade dobra e a quantidade vendida se reduz em 20%: nestecaso vale a pena subir o preo para R$21.Agora, suponha que o custo unitrio de produo R$10. Sendo o preo R$20, o lucro por unidadevendida R$10. Com o preo de R$21, o lucro por unidade vendida R$11. Assim, ao preo deR$21 a quantidade vendida 20% menor e o lucro por unidade 10% maior que no caso do preo aR$20. Com o custo mais baixo, portanto, no vale a pena subir o preo. O ponto ressaltado pelo exemplo acima vale em geral: dado um certo comportamento da demanda,custos maiores fazem com que seja interessante para a empresa cobrar preos maiores.A empresa no repassa a variao dos custos aos consumidores porque considera justo que elespaguem pelo aumento, ou, no caso simtrico, porque elas vem como coerente que elescompartilhem dos benefcios de uma reduo dos custos. Nada disso foi levado em conta no exemploacima. A relao positiva entre preos e custos no depende dos sentimentos da empresa por seusclientes. Uma empresa que apenas objetiva maximizar o lucro cobra preos mais altos quando oscustos so maiores.Um importante fator que afeta o custo do bem a produtividade da empresa - a medida de quanto elaproduz por unidade de insumo empregado.H algumas dcadas, dizia o Baro de Itarar que pobre, quando come frango, um dos dois estdoente. O frango, antes caro e inacessvel ao pobre, hoje a carne mais barata disposio dosconsumidores. O motivo? No a benevolncia do avicultor, mas os fortes ganhos de produtividade

  • vivenciados no setor.Da mesma maneira, os avanos tecnolgicos tm aumentado a produtividade na fabricao deaparelhos eletrnicos. Isto reduz custos e, consequentemente, o preo dos produtos. Por exemplo,televisores com tela plana, que antes no eram viveis comercialmente, hoje j so encontrados naslojas e, no futuro, provavelmente, custaro ainda menos.Avanos tecnolgicos no so a nica maneira que as empresas encontram para reduzir custos. Porexemplo, grandes redes de supermercado, como Carrefour e Wal Mart, tm alto poder de barganhacom seus fornecedores e assim conseguem comprar destes a preos mais baixos. por isto que seuspreos aos consumidores tendem a ser menores que os dos pequenos armazns.Alm do custo, o outro fator que determina os preos a chamada elasticidade-preo da demanda.Diz-se que a demanda pelo bem elstica quando um aumento do preo acarreta forte reduo devendas, e inelstica no caso oposto. Quanto maior a elasticidade, menor ser o preo de vendaescolhido pela empresa.Um exemplo numrico ilustra este ponto. Consideremos novamente uma empresa cogitando elevar opreo do seu bem de R$20 para R$21. O custo de produzir uma unidade do bem igual a R$19,independentemente da quantidade produzida. Note que a mudana aumentar o lucro por unidade deR$1 para R$2. Vale a pena ento aumentar o preo?A resposta depende da elasticidade, ou seja, de quanto a demanda reage a uma mudana no preo. Secom o preo a R$21, a demanda se reduz em 20%, vale a pena cobrar mais caro. Neste caso, o lucropor unidade dobra, mais do que compensando a queda de 20% nas unidades vendidas.Por outro lado, se o aumento do preo derruba a demanda para um tero do seu valor inicial, cobrarmais barato, R$ 20, mais lucrativo. Com a demanda mais elstica, apesar de o lucro por unidadedobrar, as vendas caem para menos da metade e, portanto, o lucro total se reduz.Novamente, o ponto estabelecido pelo exemplo geral: quanto menor o impacto dos preos nademanda, maiores sero os preos que maximizam o lucro. Se aumentos de preo acarretam grandeperda de vendas, melhor para a empresa cobrar preos baixos.Um fator muito importante para determinar a elasticidade da demanda de um determinado bem ograu de concorrncia enfrentado pela empresa. Se a concorrncia acirrada, um pequeno aumento depreos leva a grande queda na demanda e uma queda dos preos atrai grande numero decompradores. Neste caso, as empresas escolhero vender seus produtos a preos prximos dos seuscustos.Quando a concorrncia acirrada, as empresas que no conseguirem produzir a um custo prximo dodas empresas mais eficientes acabaro sendo varridas do mercado. Por qu? Sendo o preo de vendaprximo ao custo de produo, as empresas com custos menores vendero seus produtos a preosinferiores aos custos de produo das empresas menos eficientes. Para que estas obtenham um lucropor unidade vendida razovel, o preo de venda precisaria ser significativamente mais alto que o dasmais eficientes, implicando, portanto, em uma quantidade vendida muito baixa.Em alguns casos, a concorrncia to grande que a escolha da empresa praticamente ditada pelo

  • mercado. Isto geralmente ocorre quando muitos produtores fabricam bens praticamente idnticos. Porexemplo, um exportador de laranjas pode vender grandes quantidades de seu produto ao preovigente no mercado, mas no conseguir vender quase nada se tentar cobrar preos um poucomaiores porque laranja laranja mesmo.J se h pouca concorrncia, seja porque os consumidores no tm boas informaes sobre opesalternativas, seja porque os concorrentes esto localizados geograficamente muito longe, seja porqueno h outros produtores de um certo bem, os preos sero significativamente mais altos que oscustos.Produtos difceis de serem substitudos devido a alguma caracterstica especfica que os tornamnicos sob os olhos do consumidor so mais caros justamente porque mudanas de preo tm menorimpacto sobre as vendas. Se o preo de um prato especial que s aquele restaurante francs de seubairro serve se eleva, suas idas ao restaurante, caso voc goste muito de comida francesa, diminuempouco. Porque o prazer de uma refeio l praticamente insubstituvel, a elasticidade aos preos baixa, e a comida cara. Note que restaurantes no so escassos em um determinado bairro, masbons restaurantes franceses sim. E justamente esta escassez no quesito qualidade que lhe confere opoder de cobrar bem acima do custo do prato.De um modo geral, as empresas tentam diferenciar seus produtos, seja por meio de inovaestecnolgicas que do caractersticas especiais ao produto, seja via anncios publicitrios quevalorizam a marca, justamente para convencer os seus clientes que o que oferecem um bem ouservio diferente da concorrncia. Esta diferenciao faz com que aumentos de preos no causemgrandes quedas na demanda e, portanto, possibilita empresa cobrar mais caro e lucrar mais.O grau de concorrncia tambm influenciado pelo comportamento dos consumidores. Se as pessoasprocuram bastante antes de comprar, as vendas sero mais afetadas pelo preo e, portanto, as lojascobraro preos mais baixos. O advento da internet tornou mais fcil, rpido e barato compararpreos, aumentando a concorrncia e reduzindo o nvel dos preos de alguns produtos.Se vrios consumidores procuram bastante, de loja em loja, antes de comprar, os preos sero maisbaixos para todos os consumidores mesmo aqueles que no se dedicam a encontrar boas barganhas.De fato, o executivo que entra na livraria com pressa querendo um exemplar de Economia semTruques para o amigo secreto da empresa que comea em 15 minutos est disposto a pagar pelolivro mais do que um aposentado que j passou em 8 lojas pesquisando o melhor preo. A busca doaposentado pelo preo mais baixo gera uma externalidade positiva para o executivo, que pagariamais pelo livro se todos fossem como ele. Se o mundo tem muito aposentado, o preo do livro menor; se ele habitado por muito executivo apressado, o preo mais alto.Mas a externalidade positiva que o aposentado gera para o executivo s se materializa porque emgeral as empresas no podem discriminar preo, ou seja, no podem cobrar mais do executivo do quedo aposentado pelo mesmo livro.Em algumas ocasies, no entanto, as empresas cobram mesmo preos diferentes dependendo docliente ou, pelo menos, arrumam artifcios indiretos para cobrar mais de quem tem mais disposiopara pagar. As montadoras de automveis, por exemplo, encontraram uma maneira interessante de

  • faz-lo, que vender carros novos com e sem acessrios adicionais (teto solar, pra-choquesdiferenciado, etc) e cobrar bem mais pelo carro com acessrios. Deste modo, a concessionria almde vender o carro bsico para grande nmero de compradores tambm consegue extrair mais dosconsumidores mais ricos, dispostos a pagar caro pelo automvel da marca escolhida com osacessrios desejados. Os acessrios servem para a empresa diferenciar os clientes mais sensveis apreo (que levam o carro sem acessrio), dos menos sensveis a preo (que optam pelo carro comacessrio). O lucro dela assim mais alto que no caso onde ela s vendesse carros sem acessrios(sem explorar a disposio a pagar mais dos menos sensveis a preo), e que no caso onde elaofertasse somente carros com acessrios (espantando os clientes mais sensveis a preo).Empresas reas fornecem outro exemplo de discriminao de preos quando vendem tickets para aclasse executiva que custam mais que o dobro do preo do ticket da classe econmica. Algunsclientes esto dispostos a pagar caro para viajar com mais luxo. Outros preferem preos mais baixosa maior conforto. Para a companhia area interessa ter as duas classes, uma para cada tipo de cliente.Acontece que, neste caso, a empresa concorre com ela mesma ou, melhor dizendo, a viagem na classeexecutiva concorre com a passagem na classe econmica. Assim, se a viagem do passageiro daclasse econmica desconfortvel, a opo de viajar de executiva se torna mais atraente. No toaque na classe econmica a cadeira reclina pouco e seu joelho fica apertado contra as costas dopassageiro que viaja na fila da frente. Se a classe econmica fosse confortvel, como o avio cumprebasicamente a funo de levar o cliente de um ponto a outro, mesmo os menos sensveis a preo nose disporiam a pagar tanto a mais apenas para usufruir algumas regalias, como uma comida melhor ouum vinho caro. No seria muito custoso melhorar o assento da classe econmica, mas a companhiaarea precisa que o passageiro da econmica tenha pouco conforto para conseguir vender assentosmais caros na executiva, discriminando preos e extraindo um lucro maior daqueles com maiorcapacidade de pagar.Se a concorrncia no mercado de passagens areas fosse to acirrada quanto no mercado de laranjas,uma companhia area no conseguiria discriminar preos dessa maneira, pois uma empresaconcorrente teria incentivos para criar avies apenas com a classe econmica e com poltronas maisconfortveis, e assim atrair a clientela disposta a pagar um pouquinho a mais pelo conforto extra.A concorrncia menos acirrada no mercado de viagens areas do que no mercado de laranjas pormotivos inerentes ao tipo de atividade e por conta da legislao. De fato, complicado e demoradoentrar no ramo de transporte areo, demora-se para estabelecer uma reputao com a clientela e paramontar a estrutura necessria para operar, e os ganhos de escala fazem com que empresas maioressejam mais eficientes. Portanto, h poucas companhias em operao. Mas aspectos da legislaocolaboram para reduzir a competio ao estabelecer que a maior parte dos vos entre dois pases spossam ser operados por companhias com base em um dos dois pases por exemplo, vos diretosentre Brasil e Inglaterra s podem ser operados por empresas brasileiras ou britnicas.H alguns anos, a Unio Europia aboliu este tipo de restrio para vos entre pases membros. Apartir desta liberalizao, novas empresas entraram no mercado de transporte areo e hoje se pagamuito menos para viajar de avio pela Europa. Como dissemos anteriormente, maior competio

  • leva a menores preos.Em outras ocasies, as empresas so obrigadas por lei a cobrar diferenciado dos seus clientes, como o caso dos cinemas, teatros e casas de espetculos no Brasil. Estes estabelecimentos so obrigadosa discriminar preo entre os que tm e os que no tm carteirinha de estudante. De acordo com a leibrasileira, a meia-entrada em cinemas, circos, espetculos teatrais, esportivos, musicais e de lazer um direito garantido a todo estudante e, portanto, ao escolher o preo, os estabelecimentos vo levarem conta: os seus custos, a relao entre o preo e a demanda dos dois grupos com e semcarteirinha e a obrigatoriedade de o preo dos com carteirinha ser metade do preo dos semcarteirinha.A escolha do preo se dar seguindo a mesma linha de raciocnio desenvolvida acima, com a nicadiferena que a empresa escolher um preo para estudantes e outro preo para os no-estudantes,sendo este obrigatoriamente o dobro daquele.Dadas as elasticidades das demandas dos dois grupos e os custos, adicionar uma condio adicionalque a empresa precisa respeitar do tipo preo dos estudantes deve ser metade do dos outros gera omesmo resultado final que adicionar um condio do tipo preo dos outros deve ser o dobro do dosestudantes. O impacto nos preos da lei da meia-entrada para os estudantes idntico ao impacto dalei da entrada-dobrada para os outros.Seguindo o mesmo raciocnio, estipular meia-entrada para todos o mesmo que abolir a meia-entrada, e de fato a UNE tem se mostrado veementemente contra qualquer iniciativa de meia-entradapara todos.Tomando um exemplo concreto: um ingresso na pista do show da Ivete Sangalo, realizado em SoPaulo no dia 30/10/2006 custava R$60 para estudantes e R$120 para os outros. Se no houvesse a leida meia-entrada, a casa de shows escolheria um preo apenas, a ser cobrado igualmente de todos. AR$60, o faturamento seria pequeno porque muita gente querendo entrar no encontraria ingresso, e aR$120 para todos haveria pouco pblico. O preo escolhido no dia aps a abolio da lei dacarteirinha estaria entre R$60 e R$120.Qual a lgica por trs da lei da meia-entrada? A justificativa comumente apresentada que oseventos culturais complementam a educao dos estudantes. Seria benfico, portanto, que osestudantes pudessem frequentar mais eventos deste tipo. Entretanto, a lei no cria os eventos culturaisnum passe de economgica, no reduz custos, nem cria recursos para os estabelecimentos queproveem estes servios. O que ela faz simplesmente transferir parte do custo dos estudantes para osoutros consumidores. Ou, colocado de outro modo, os no portadores da carteirinha subsidiam aentrada dos que a possuem.Portanto, para decidirmos sobre a propriedade ou no da lei da meia-entrada para estudantes (ou,equivalentemente, lei da entrada-dobrada para os outros), temos que pensar se julgamos correta ouno essa transferncia de custos que aumenta o acesso de estudantes a eventos culturais s custas doafastamento de no estudantes destes mesmos eventos.No Brasil, uma pequena parte da populao tem acesso educao superior. Com a lei da meia-

  • entrada, essa pequena parte da populao paga em shows, teatros e cinemas metade do preo pagopelos que j se formaram (e no falsificaram a carteira de estudante) e pelos que nunca tiveramacesso educao superior. A maior parte daqueles que no tiveram a oportunidade de fazer umcurso universitrio que em geral esto em estratos de renda menos favorecidos vo achar difcildesembolsar de R$ 120 a R$ 200 para assistir a Ivete Sangalo. Mais ainda, os poucos que o fizeremestaro de fato pagando parte da conta dos estudantes que assistem a Ivete de camarote por R$ 100.Faz sentido uma poltica pblica que implementa este tipo de transferncia?Muitos dos que nunca entraram na universidade escolhem no ir ao cinema assistir a um bom filmepor conta do preo do ingresso. Alguns reais a menos no preo do cinema trariam um pouco maiseducao, cultura e divertimento justamente queles que menos recursos tem. Por conta disto, no nosagrada uma lei que obriga os cinemas, teatros e casas de espetculos a transferir parte do preo dolazer dos estudantes aos que nunca tiveram a chance de estudar. um erro comum achar que uma lei estabelecendo que os estudantes portadores de carteirinhapagaro metade do preo do ingresso no alterar o preo para os outros. Os defensores de talpoltica parecem raciocinar erroneamente da seguinte maneira: a medida baratearia a entrada para osestudantes sem piorar a situao dos no-estudantes, que pagariam o mesmo que antes. Mas os preosno esto fixos! So as empresas que escolhem os preos e as quantidades dos seus produtos em umaeconomia de mercado, no o governo. Se uma lei obriga a empresa a cobrar menos de certo grupo,ela se ajustar cobrando mais de outro.H vrias leis de carteirinha de estudante por a. Outras propostas de polticas pblicas tambmparecem se basear na ideia de que as empresas no reagiro a elas. Por exemplo, as leis quecongelam os preos dos produtos no mudam os custos de produo nem as demandas dosconsumidores, mas probem as empresas de vender seus produtos a um preo mais alto. Se a empresadecide respeitar a lei, ela reagir produzindo menos, o que gerar racionamento e filas. Um litro deleite que custaria R$2,20, custar, por exemplo, R$1,90 mais trinta minutos na fila para os queconseguirem comprar.Se para no deixar muitas famlias sem acesso ao leite a compra de mais de um litro por famlia proibida, ou seja, se h racionamento, a primeira unidade custar R$2,20 e a segunda no poder sercomprada (o que o mesmo que dizer que seu preo infinitamente elevado). Como no caso doscinemas, as leis podem regular o preo do leite, mas no do origem a mais vacas, no criam leite doalm.Alm destes transtornos, o congelamento afetar as decises futuras sobre preos, investimentos,quantidade produzida, etc, que refletiro os medos de um prximo congelamento.Como j dito, as empresas escolhem o preo de acordo com seus custos e com a demanda dosconsumidores. Assim, leis que aumentam os custos das empresas encarecero seus produtos. Porexemplo, uma lei que efetivamente proba as fbricas de autopeas de utilizar uma tecnologia quepolui o ar tem como resultado um mundo mais limpo e carros mais caros. Talvez queiramos comosociedade que esta lei seja implementada, mas preciso ficar claro que ela no traz benefcios degraa.

  • O estatuto do idoso fornece um outro exemplo. Ele permite que certas pessoas viajem gratuitamenteem nibus interestaduais, mas visto que a lei no cria nibus nem reduz o preo do petrleo nosmercados internacionais, os outros passageiros acabam arcando com a maior parte dos custos,subsidiando assim a passagem mais barata do idoso. Novamente, no estamos neste caso tecendojuzo de valor, mas importante ter em mente que o preo para os outros passageiros no est fixo,no imune lei.Por outro lado, algumas leis contribuem para reduzir preos. As leis que obrigam restaurantes aexibirem os preos de seus pratos na porta, ou postos de gasolina a apresentarem seus preos emlugar visvel e letras garrafais, facilitam a aquisio de informao pelo consumidor. Sendo maisfcil obter informao sobre a concorrncia, o consumidor reage mais a preos e, portanto, passa aser mais lucrativo para as empresas cobrar preos menores.As leis que impedem a empresa de vender gato por lebre atravs de manipulao de informao,alm de importantes em si, tambm estimulam a concorrncia. Ao reduzir a quantidade de informaofalsa divulgada pelas empresas, a lei permite que o consumidor experimente produtos de outrasmarcas no estabelecidas e no precise ficar preso a uma nica empresa em que confia. umimportante papel do governo, portanto, assegurar a transmisso de informaes relevantes nasrelaes comerciais e garantir o cumprimento dos contratos. Desta maneira, o consumidor podeescolher com menos receio, forando indiretamente um aumento da competio entre as empresas.Em resumo, para entender a formao de preos preciso centrar a ateno em custos e na relaoentre demanda e preos. Impostos sobre os produtos tm impactos em custos e, portanto, afetam ospreos. No toa que a empresa que sonega impostos pode escolher cobrar menos pelo seuproduto para ganhar um cliente que busca preos mais baixos algum j ouviu falar de algummdico ou dentista que cobra preos diferentes com recibo e sem recibo? J o custo de umescova de dente na farmcia do aeroporto em So Paulo custa muito mais que na farmcia da esquinano porque os custos so mais altos naquela, mas porque a falta de alternativas para quem seencontra prestes a embarcar sem uma escova de dente torna a demanda pouco sensvel ao preo. Leisou mudanas no ambiente afetando alguma destas duas variveis afetaro, pois, os preos. O resto economgica.

  • 4. A lei que aumenta o salrio A Constituio Brasileira, promulgada em 1988, menciona como um direito dos trabalhadoresurbanos e rurais, o gozo de frias anuais remuneradas com um tero a mais do que o salrio mensalnormal (artigo 7, inciso XVII). Os trabalhadores j tinham direito a frias remuneradas antes de1988, mas sem receber o adicional de um tero do seu salrio mensal. Passados aproximadamentevinte anos da promulgao da lei, qual o seu impacto sobre os nossos salrios? Estamos ganhandoanualmente equivalente a um tero de um salrio mensal a mais?O salrio um preo, o preo do trabalho. No capitulo anterior, examinamos como as empresasescolhem os preos dos bens que vendem. Neste captulo, a vez de nos perguntarmos como determinado este preo especial chamado salrio. A lgica similar a da determinao dos preosdos bens.Salrios dependem da interao entre empresas e trabalhadores. E so trs os fatores jogando papelimportante nesta interao, a saber: (1) as escolhas das empresas que demandam trabalhadores; (2)as escolhas dos trabalhadores, que vendem seu trabalho; e (3) o processo de barganha entre empresase trabalhadores.A demanda das empresas por mo-de-obra depende do balano entre custos e benefcios trazidospelos empregados, de seu efeito lquido sobre o lucro da empresa. Para ela, o custo de umtrabalhador a mais o seu salrio acrescido de todos os impostos atrelados ao pagamento dofuncionrio e demais custos indiretos (custos de contratao, administrativos, etc). J o beneficio deum trabalhador adicional na empresa depende de quanto ele ajuda a empresa produzir mais, oureduzir os custos de produo, melhorar a distribuio e o marketing, etc. Se os benefcios decontratar esse trabalhador superarem os custos, a empresa escolhe contrat-lo.Para analisar o que se passa do outro lado, o da oferta de mo-de-obra, temos que entender asescolhas dos trabalhadores, dado que as pessoas escolhem se querem trabalhar ou no e, tambm,quanto querem trabalhar. O que est por trs desta deciso?O benefcio fundamental do trabalho o salrio, mas h outros, como o aprendizado que o trabalhoproporciona - e que pode ser til no futuro - a satisfao pessoal, etc. O custo de trabalhar para umaempresa o tempo que se gasta no emprego e que poderia ser utilizado em outras atividades, como:desfrutar do lazer (ir a praia, ler um livro, namorar, jogar futebol); trabalhar para a famlia (cuidardas crianas, cuidar da casa e da horta); ou trabalhar por conta prpria (fazer mapa astral, venderpo de mel, realizar projetos de arquitetura). Estas atividades compem o que chamado de custode oportunidade do emprego e com elas que as pessoas comparam a opo de trabalhar para umaempresa. Assim, uma pessoa decide ofertar sua mo-de-obra s firmas apenas se os benefcios doemprego superam o custo de oportunidade, ou seja, os benefcios da mais atraente destas opesalternativas.O terceiro elemento que entra na determinao do trabalho a barganha que se desenrola entre

  • empresas e trabalhadores. Empresas querem pagar menos, trabalhadores querem receber mais. Comono caso dos produtos, um importante elemento para se definir o preo do trabalho (o salrio) acompetio: empresas competem entre si pelos trabalhadores e trabalhadores competem entre sipelos empregos. A competio entre as empresas tende a elevar os salrios, enquanto a por empregostende a reduzi-los.Em situaes em que o poder de barganha das empresas alto, por exemplo, porque no existemalternativas disponveis interessantes aos trabalhadores, os salrios tendero a ser mais baixos. Jem situao reversa, por exemplo, no caso de existirem vrias empresas em busca de um certo tipode trabalhador, os salrios tendero a ser mais elevados. Um dos papis dos sindicatos detrabalhadores e patronais justamente o de reduzir a competio entre seus membros para assimaumentar o poder de barganha do grupo como um todo.Um dos fatores que aumenta o poder de barganha dos trabalhadores sua capacidade de migrar entreempresas ou abrir seu prprio negcio. Alguns economistas consideram que mudanas ocorridas naeconomia mundial a partir dos anos 70 alteraram a relao de barganha levando a um aumento narenda dos trabalhadores mais qualificados.A ideia a seguinte: no mundo inteiro, vicejavam no perodo entre o ps-guerra e os anos 70,empresas muito grandes onde eram desenvolvidas inmeras tarefas relativas ao processo deproduo (as empresas eram ditas verticalizadas). Devido a menor presso competitiva e tambm aomenor fluxo de tecnologia e de comrcio, cada empresa tocava suas operaes de maneira bastanteprpria, no havendo como hoje tanta convergncia dos processos produtivos em direo ao maiseficiente. Os trabalhadores, portanto, eram muito familiarizados com o processo produtivo dos seuslocais de trabalho, mas sabiam menos dos processos das outras empresas. Por serem suashabilidades mais especficas empresa a que pertencia, era mais difcil mudar de emprego.Sair e abrir um novo negcio tambm no era geralmente uma alternativa vivel. Os mercados decapitais eram menos desenvolvidos, sendo mais difcil levantar recursos suficientes para se abriruma nova empresa.Em resumo, os trabalhadores qualificados nesta poca tinham oportunidades mais restritas fora dagrande empresa e isto enfraquecia o seu poder de barganha, o que afetava adversamente seu salrio eas condies de trabalho.Com o passar do tempo, desenvolveram-se novas tecnologias flexveis que tornaram a empresapequena mais eficiente; o mercado financeiro se desenvolveu e aprofundou suas operaes definanciamento, possibilitando o trabalhador insatisfeito com a firma sair e abrir um novo negcio; ecresceu o fluxo de tecnologia entre setores e pases, levando a certa convergncia do processoprodutivo que aumentou a capacidade de migrao do trabalhador de uma empresa para outra.Todos estes fatores contriburam para aumentar o poder de barganha dos trabalhadores qualificados,o que em parte explica a melhora em seus salrios e condies de trabalho vivenciadas desde ento.Similarmente ao caso dos preos, apenas mudanas que afetem o interesse das firmas pelostrabalhadores, o destes em ofertar trabalho, ou a barganha entre ambos que levaro a alteraes delongo prazo, concretas, nos salrios.

  • A lei que estabelece a remunerao de um tero a mais que o salrio normal no ms de frias dostrabalhadores no mudou a produtividade do trabalhador, e no alterou os benefcios que ele traz empresa. Tampouco afetou o custo de oportunidade do trabalhador, ou o jogo de barganha entrefirmas e trabalhadores. Cheira, portanto, a truque.No curto prazo, a lei deu sim aos trabalhadores uma remunerao real extra, mas como nenhum dostrs determinantes do salrio se alterou, com o passar do tempo, e medida que empresas etrabalhadores foram se adaptando ao novo ambiente e assinando novos contratos de trabalho, esteganho foi sumindo. O ajuste se deu no salrio mensal pago pela empresa, agora menor no montantenecessrio para compensar a obrigatoriedade de se pagar um tero a mais por ano.Em uma economia de mercado, os salrios mensais, assim como os preos, no esto fixos. Portanto,vinte anos depois, nada mudou por conta da lei obrigando as empresas a pagar este um tero a maisnas frias. Esta insignificncia econmica da lei, aps alguma reflexo, no surpreendente: aotomar suas decises de contratar ou no trabalhadores, as empresas esto considerando o custo totalde contratao. Da mesma forma, trabalhadores tambm consideram em suas escolhas no apenas osalrio mensal, mas sim todos os ganhos do trabalho, incluindo a remunerao das frias, o dcimoterceiro salrio e demais benefcios.Para a empresa, no faz diferena alguma pagar, digamos, 12 salrios de R$ 1.300 reais ou 13salrios de R$ 1.200 reais, ou ainda 6 salrios de R$ 2.600, pois o custo anual o mesmo para elaem qualquer destes arranjos. A empresa vai escolher contratar o trabalhador se esperar um benefcioproveniente do trabalho dele superior a esse custo total, e ponto final. Se uma lei obriga a pagar umnmero maior de salrios, aps algum tempo o salrio mensal ajusta-se para baixo.Da mesma maneira, para o trabalhador, o que importa o bolo total, e no somente o salrio mensal.Isto ajuda a explicar porque, por exemplo, um funcionrio pblico que ganha por ms menos que seupar do mercado privado no necessariamente deixa o setor estatal pela iniciativa privada. Os outrosbenefcios que o trabalhador estatal tem compensam o salrio mensal menor, como, por exemplo,menor risco de desemprego e aposentadoria mais elevada. por uma lgica similar que, para ummesmo nvel de qualificao, pessoas que desenvolvem tarefas mais arriscadas ou maisdesagradveis, como ser mergulhador de plataforma de petrleo, ou trabalhar no turno da madrugada,recebem salrios mais elevados.Usando nosso arcabouo bsico, podemos analisar os efeitos de um imposto sobre o salrio. Nestecaso, a empresa leva a taxao em conta na hora de escolher contratar ou no um outro trabalhador,j que para ela o que importa o custo total de contratao e no apenas o salrio. Por outro lado, oimposto pago pela empresa no altera a remunerao do funcionrio e, portanto, no afeta osincentivos do trabalhador a ofertar sua mo-de-obra.Assim, do lado das firmas o imposto gera uma menor procura por trabalho, mas do lado dostrabalhadores ele no gera menor oferta. Esta combinao leva inicialmente a um aumento dodesemprego e, posteriormente, a diminuio dos salrios. O primeiro impacto no desempregoporque existem impedimentos a ajustes automticos dos salrios (por exemplo, necessrio aguardara prxima renegociao salarial, dado que os contratos fixam o valor nominal dos pagamentos por

  • um certo prazo). Estando as empresas impedidas, por algum tempo, de ajustar os salrios para baixo,a taxao impactar mais pesadamente a quantidade de empregados contratados, e o lucro, ambosagora menores. No longo prazo, aps os ajustes nova situao, o impacto negativo sobre os salriospassa a ser a consequncia mais importante do novo imposto sobre o trabalho.As empresas consideram em suas escolhas no apenas os custos presentes, mas tambm os futuros.Por exemplo, leis que aumentam os custos de demitir funcionrios influenciam no apenas asescolhas das empresas sobre demisses, mas tambm suas decises sobre contrataes.At aqui, viemos tratando o salrio como algo homogneo, comum a um grupo que denominamosgenericamente de trabalhadores. Mas as diferenas salariais entre as pessoas so grandes, htrabalhadores e trabalhadores. No Brasil ento, estas disparidades salariais so enormes, entre asmaiores do mundo. O gerente de informtica de uma grande empresa ganha mais de 10 vezes que ofaxineiro. De modo geral, na base da questo da desigualdade de renda est o fato de queprofissionais qualificados ganham salrios bem maiores que profissionais pouco qualificados. Masalm disso, h tambm diferenas expressivas de salrios entre profissionais com qualificaosimilar, mas que residem em pases diferentes: a faxineira na Inglaterra ganha substancialmente maisque a faxineira no Brasil. Por qu?Focando na escolha das empresas, um fator chave para entender os salrios a produtividade dotrabalhador. As empresas querem profissionais que rendam bastante, que gerem lucros maiores. Aconcorrncia entre empresas por trabalhadores mais qualificados far com que os salrios dessesprofissionais sejam altos. Por exemplo, um engenheiro que garante alta produtividade para a fbrica,um gerente de marketing que inventa uma boa maneira de vender cigarros, um mdico especialista emremover tumores sero certamente muito bem remunerados. Em mdia, quanto mais qualificado forum profissional de certa rea de atuao, maior ser seu salrio.Infelizmente, muitos brasileiros, em diversas profisses, possuem baixo nvel educacional e poucaqualificao. Isto implica em salrios baixos, por dois motivos. Em primeiro lugar, sendo menosqualificados, estes trabalhadores no sero capazes de executar trabalhos que trazem alto retornopara a empresa. Em segundo, como no Brasil a quantidade de profissionais pouco qualificados muito grande, seu salrio adicionalmente deprimido pelo fato de este grupo numeroso competirpelas mesmas vagas.Vejamos ento a questo da diferena salarial entre profissionais similares de pases diferentes. Afaxineira na Inglaterra ganha muito mais do que a brasileira no por limpar melhor a casa ou por sermais produtiva, mas sim porque h menos pessoas na Inglaterra que escolhem esse tipo de trabalho.Menos gente oferta o servio de faxineira e, portanto, seu rendimento, maior. Alm disto, como ossalrios nos outros setores da economia so mais altos l do que aqui, a faxineira s aceita exerceresta profisso por um ganho mais alto. Em termos do nosso arcabouo bsico, o custo deoportunidade da faxineira dado pelo salrio em outras atividades que ela poderia escolher exercer mais alto na Inglaterra do que no Brasil. Aqui h muitas pessoas dispostas a trabalhar comofaxineiras porque h muitas pessoas sem qualificao suficiente para almejar outros tipos detrabalho. A grande oferta de faxineiras reduz o rendimento obtido por cada uma e no por outro

  • motivo que mesmo famlias com poder aquisitivo no muito alto contratam faxineiras para limparsuas casas. O custo seu salrio baixo.Analisemos agora os possveis impactos de uma interveno do governo no rendimento de faxineiras.Como uma lei garantindo um preo mnimo por um dia de faxina afetaria este mercado? A lei nomuda os incentivos para as escolhas dos patres, nem para as das faxineiras, ela s altera a barganhaentre eles: no tendo como pagar menos que este salrio mnimo legal, algumas famlias limparo suaprpria casa e algumas faxineiras vo amargar o desemprego. Portanto, a lei vai beneficiar asfaxineiras que continuarem trabalhando e estavam ganhando menos que o preo mnimo agoraimposto aos patres. No entanto, a lei tem um efeito colateral: ela prejudicial para o grupo das ex-faxineiras agora desempregadas, dado que ao novo preo menos famlias contrataro faxineiras.Leis que estabelecem um salrio mnimo tm, portanto, dois efeitos: elas aumentam o salrio daspessoas que continuam com seus empregos, mas tendem a gerar desemprego. No Brasil, o debatesobre o salrio mnimo muito contagiado pelo impacto deste sobre as aposentadorias e sobre ascontas do governo. Isto uma particularidade brasileira, que se deve ao fato de os benefciosprevidencirios de muitos aposentados estarem, por lei, vinculados ao mnimo. Em princpio,contudo, aposentadoria e salrio mnimo so tpicos bem diferentes.Recentemente no Brasil, foi aprovada uma proposta de lei que aumentou o perodo da licenamaternidade das mulheres que do luz, de quatro para seis meses. A inteno de possibilitar que asrecm mames fiquem mais tempo com os filhos louvvel, mas como no caso do salrio mnimodas faxineiras, esta proposta tambm tem efeitos colaterais. Aumentar o perodo de licenamaternidade significa, para as empresas, um aumento do custo de contratar mulheres em idade onde aprobabilidade de gravidez mais alta. Como so as empresas que escolhem quem contratar, elastero menos incentivos para empregar mulheres nessa idade.Se leis como a de um tero a mais nas frias no geram efeito nenhum no longo prazo e a imposiode um salrio mnimo elevado beneficia alguns mas prejudica outros, o que se pode fazer paraaumentar de fato a remunerao das pessoas menos qualificadas, que passam necessidades por contade um rendimento insuficiente?Como vimos no captulo 3, as empresas procuram estimular a demanda por seus produtos para poderassim cobrar preos mais altos. Da mesma maneira, para aumentar o salrio dos trabalhadores, nadamelhor que estimular o interesse das empresas em contrat-los Para isso, a melhor soluo torn-los mais produtivos.E uma poltica pblica eficaz para torn-los mais produtivos investir em sua qualificao,aprimorando seu nvel educacional. Isso traz benefcios em duas frentes: em primeiro lugar, oprofissional mais qualificado executar trabalhos mais rentveis para a empresa (e que, portantopagam mais). Em segundo lugar, ao diminuir o nmero de pessoas com menor qualificao, diminui-se o contingente de pessoas dispostas a trabalhar em empregos como o de faxineira ou lixeiro, eaumenta-se consequentemente a remunerao daquelas que seguem nestas profisses.Outras polticas pblicas tm impactos nos salrios no por modificar a escolha das firmas, mas porafetar as decises dos trabalhadores. Por exemplo, quando o programa bolsa-escola foi

  • implementado no distrito federal em meados da dcada de 90, algumas mes de famlia contempladaspela ajuda financeira deixaram de trabalhar para outras famlias. Optaram por largar as profisses depassadeira, faxineira, empregada, etc.O programa bolsa-escola foi suspenso no governo seguinte. A ento secretria da educao haviadito em entrevista a um programa de televiso de Braslia que pelo menos cinco amigas minhasperderam suas passadeiras quando seus filhos comearam a receber a bolsa-escola. Ganhou o peixe,no precisa mais pescar.[3]Trabalhar como passadeira uma escolha. Sem o auxlio proveniente do bolsa-escola, a estasmulheres restam poucas opes alm de trabalhar pelo pagamento que for possvel obter para ajudarno oramento familiar. Mas, com o bolsa-escola abre-se outra possibilidade: elas podem escolherficar em casa e cuidar dos filhos. Ao dar essa opo s mes de famlias pobres, esses programasassistenciais reduzem o contingente de passadeiras dispostas a trabalhar pelo salrio vigente.Sobram donas de casa querendo passadeiras e, assim, a remunerao da passadeira sobe.Consequentemente, menos donas de casa vo querer passadeiras. Contudo, algumas passadeirasdecidem seguir no ramo at porque o salrio agora est mais alto (ou porque no tem filhos) e aps oajuste nova situao, quando no esto sobrando nem passadeiras, nem donas de casa, o salrio dapassadeira para de subir.Vejamos detalhadamente o que faz o preo da passadeira subir. A dona de casa que ficou sempassadeira ao preo antigo (por conta do bolsa-escola), mas que est disposta a pagar um pouco maispara ter suas roupas passadas, consegue manter a antiga passadeira ou contratar uma nova, pagandoum pouco mais. Simultaneamente, a passadeira que quer continuar trabalhando comea a notar amudana na demanda por seu trabalho: com a falta de passadeiras no mercado, as passadeirascomeam a ser mais requisitadas. O processo no instantneo, mas passadeiras e donas de casapercebem logo a nova situao e no tardam a se adaptar. O resultado final menos passadeirasganhando mais e mais ex-passadeiras cuidando dos filhos. importante notar que o bolsa-escola melhora tambm a vida de mulheres pobres que no tm filhos,ao aumentar o salrio das passadeiras que continuam na profisso. Esse efeito similar ao impactoda busca do aposentado pelo preo mais baixo no preo do livro pago pelo executivo, discutido nocaptulo anterior.O efeito do bolsa-escola bastante diferente do efeito do salrio mnimo: no caso do bolsa-escola,algumas pessoas passam a escolher cuidar de suas famlias ou de seus afazeres ao invs de trabalharpara outras famlias; no caso do salrio mnimo, pessoas que gostariam de estar trabalhando erecebendo o salrio vigente no conseguem mais arrumar trabalho. O primeiro amplia o leque deescolhas do trabalhador, o segundo o reduz.Portanto, o bolsa-escola reduz os incentivos dos que ganham pouco a trabalhar. Assim, os salriossobem e o nmero de pessoas trabalhando cai. Essa uma boa poltica pblica? A importantediscusso sobre quais polticas pblicas devem ser implementadas ser retomada em captulo futuro.Por que algumas profisses pagam tanto? dolos do futebol e da msica so extremamente bemremunerados porque muitas pessoas esto dispostas a pagar para assistir suas performances. Basta

  • um clique no controle da televiso e l est o Neymar fazendo suas acrobacias nos gramados daEuropa. A tecnologia moderna permite que milhes de pessoas possam ver o Neymar nas suas TVs, eisto explica porque os clubes esto dispostos a pagar to caro por ele.A vontade, o sonho de se tornar um Neymar, ou uma Ivete Sangalo, explica porque muitas pessoasesto suando as camisas nas equipes juvenis de futebol e cantando nos bares por cachs mdicos.Elas no esto ali s pelo dinheiro que recebem agora, mas tambm pelo sonho, por poucosrealizados, de ganhar muito no futuro.Alm de escolherem sua profisso, as pessoas escolhem a cidade e at mesmo o pas onde iromorar e trabalhar. Como dissemos, existem grandes diferenas salariais entre pessoas de pasesdiferentes. O que explica estas diferenas? Estas diferenas existem, e persistem, porque himportantes barreiras migrao de trabalhadores, como restries legais, dificuldades com oidioma e a cultura, alm da prpria distncia entre os pases, que encarece a migrao. J dentro deum mesmo pas, as barreiras migrao so muito menores, e devido a isto so tambm menores asdiferenas salariais entre pessoas de qualificao similar e exercendo o mesmo trabalho em cidadesdiferentes.Mas, em alguns casos, h restries legais migrao dentro de um mesmo pas. Por exemplo, pormotivos ligados preservao do meio ambiente, um brasileiro qualquer no pode se mudar paraFernando de Noronha e abrir um negcio por l. Esta barreira ao livre fluxo de trabalhadores explicaporque os servios em Fernando de Noronha ou seja, a remunerao dos trabalhadores locais somais caros do que em outras praias do Brasil. O trabalhador local no ameaado pelo risco deoutros oferecerem o mesmo servio a preo menor.Concluindo, a lei que aumenta o salrio, mencionada no ttulo deste captulo, no o incuo incisoconstitucional que estabelece o pagamento de um tero a mais nas frias. Os fatores que determinamos salrios so as escolhas dos trabalhadores de ofertar ou no trabalho (relacionadas a seus custosde oportunidade), as consideraes de custo/beneficio de contratar das empresas, e as condies doambiente que determinam o poder relativo de barganha entre ambos. Leis que afetam os salrios soleis que alteram alguma dessas variveis.Dentre esses fatores, o mais relevante e que, portanto, deveria receber maior ateno no desenho depolticas pblicas, o valor produzido pelo trabalhador, sua produtividade. No prximo captuloveremos porque a renda do trabalhador subiu nos ltimos dez mil anos.

  • 5. De caadores-coletores a guias de turismo lunar O imaginrio popular permeado pelo medo de que as mquinas tomem o lugar do homem ou, menosdramaticamente, ocupem parcela significativa dos nossos postos de trabalho. Woody Allen captoucomo poucos essa aflio do homem moderno ao dizer: meu pai trabalhou na mesma empresadurante doze anos. Eles o demitiram e o substituram por uma maquininha deste tamanho, que faz tudoo que o meu pai fazia, s que muito melhor. O deprimente que minha me tambm comprou umaigual.O medo das mquinas quase to velho quanto a industrializao. Nos idos de 1811-1817, ainda noincio da revoluo industrial, alguns trabalhadores da industria txtil inglesa chegaram at a destruirmquinas em protesto contra as mudanas trazidas pelas novas tecnologias. Os Luddites, comoeram chamados, se opunham a utilizao de mquinas, vociferando que elas gerariam quedassalariais (dado que poderiam ser operadas por trabalhadores menos qualificados) e perdas deemprego (pois as mquinas fariam parte do trabalho dos homens).Na mesma toada, em meados do sculo XIX, Karl Marx afirmava que o processo de acumulao decapital produziria constantemente um exrcito de desempregados. Essa massa desempregadacontribuiria para reduzir os salrios dos trabalhadores. Alm disso, as variaes nos salriosdependeriam basicamente da expanso e contrao no contingente desse exrcito.Mas o que dizem os dados? Podemos descobrir a relao entre acumulao de capital, desemprego esalrios mdios observando os seus valores em um pas ao longo do tempo ou em vrios pases numdado momento. Se no sculo XIX esses dados no estavam a disposio, hoje eles esto, e osresultados deste tipo de anlise saltam aos olhos.De acordo com os dados, no h relao importante entre o estoque de capital e a taxa dedesemprego. Alm disso, quanto maior o estoque de capital per capita em uma economia, maior osalrio mdio. Em pases desenvolvidos, h mais capital, mais mquinas e os salrios so muito maisaltos e o desemprego no maior que em pases com pouco capital.A evoluo nos processos de produo e as consequentes mudanas nos salrios e na natureza dosempregos no so fenmenos recentes. De fato, essa histria comea bem antes da revoluoindustrial. Mais precisamente, h milhares de anos atrs.Antes de domesticar as primeiras plantas selvagens (ou seja, adapt-las ao cultivo agrcola), hcerca de 11.000 anos atrs, os homens viviam em pequenos bandos nmades de caadores-coletores.Por volta daquela data, segundo nos relata o bilogo Jared Diamond em seu livro Guns, Germs, andSteel, foram domesticadas as primeiras espcies de plantas na regio da Eursia, dando origem agricultura e ao sedentarismo. A domesticao das plantas, dentre vrias consequncias, diminuiu autilidade dos caadores para os bandos, apesar de no elimin-la completamente. No era maispreciso tanta gente correndo pela mata ou se aventurando pelos rios atrs de alimento. Aoproporcionar comida de modo mais farto e fcil, a domesticao das plantas um avano

  • tecnolgico importantssimo gerou provavelmente a primeira onda de re-alocao de empregomundial. Caiu a demanda pelos servios dos caadores-coletores e cresceu a necessidade deagricultores.No comeo, provvel que os mais empedernidos caadores tenham torcido o nariz para a mudana.Alguns devem inclusive ter amargado o desemprego e a perda de status social por algum tempo, equem sabe at tentado organizar movimentos contra o avano da agricultura. Mas, com o decorrer dotempo, eles deixaram sua atividade antiga, passaram a se dedicar a outras tarefas (dentre elas aprpria agricultura) e se beneficiaram do avano econmico-social trazido pela maior abundncia dealimentos. Prova disto que a proporo de caadores-coletores no mundo hoje nfima, e nosrecnditos quinhes onde esta atividade no foi completamente eliminada, predomina a pobreza.Difundindo-se a prtica da agricultura, mais gente passou a despender boa parte de seu tempo naslavouras, mas como a prtica agrcola mais eficiente na tarefa de prover alimentos que a caa-coleta, menos pessoas eram necessrias para gerar a mesma quantidade de alimentos e assim, algunsmembros do grupo puderam se dedicar a outras atividades. No toa que os primeiros sinais dodesenvolvimento da linguagem escrita tenham sido encontrados justamente nas regies que maisprecocemente dominaram a agricultura. O antigo caador-coletor, no aproveitado na agricultura,mas beneficiado por ela, tornou-se inventor da escrita moderna. Nada mal.Mas o avano no parou a. Como nos ensina Adam Smith, um dos pais da cincia econmicamoderna, a labuta cotidiana, no mesmo lugar, sobre o mesmo objeto, facilita a descoberta de novastcnicas de fazer a mesma tarefa mais eficientemente. Deste processo de constante inovao surgeento a enxada, a irrigao, o plantio alternado, o trator, os fertilizantes, etc, e a produtividadeagrcola no cessa de crescer.Estas descobertas de melhores prticas agrcolas, que vieram gradativamente, levaram, com o tempo,a aumentos adicionais da quantidade de alimento produzida por cada trabalhador. A economia foiassim enriquecendo (mais produo por trabalhador), e um novo fluxo de re-alocao de trabalhocomea ento a ocorrer: agora cada vez menos gente era necessria nas lavouras para produziralimento para todos, e consequentemente a quantidade de gente empregada no campo comea adeclinar.Para se ter uma idia da magnitude deste movimento no perodo mais recente, nos pases hojedesenvolvidos, a populao empregada no campo no comeo do sculo XX era de mais ou menos50% da fora de trabalho. No final do mesmo sculo, este nmero beirava os 5%. Mas os 45%restantes no ficaram desempregados. Hoje, a taxa de desemprego nos Estados Unidos e na Inglaterraoscila nas vizinhanas dos 5%. Na Europa continental, este nmero maior, por volta de 10%, masainda assim bem menor que a perda de emprego no setor agrcola ao longo dos ltimos cem anos.J nos pases mais pobres do mundo, onde h fome e extrema misria, muita gente se encontra aindaempregada na agricultura, em muitos dos casos mais de 50% da fora de trabalho ainda rural.Nestes lugares, por diversas razes, no chegaram as inovaes tecnolgicas e o maquinriomoderno, e muita gente segue empregada na agricultura. A maioria, contudo, amarga a pobrezaextrema.

  • O impressionante que nestes cem anos de reduo da mo-de-obra no campo (e reduo tambm daproporo do produto agrcola dentro do PIB total), a produo agrcola total cresceu a taxasvertiginosas. O filsofo e economista Malthus, que postulou no sculo XVIII que o crescimento daproduo de alimentos seria incapaz de acompanhar o passo do crescimento populacional, errou. Aproduo de alimentos, ao contrrio do por ele esperado, cresceu mais rpido que a populaomundial, e hoje os episdios de fome em pases muito pobres no se devem pouca produo decomida, mas pobreza.Como foi dito acima, as mquinas e a tecnologia expulsaram grandes contingentes de agricultores docampo, mas isso no foi ruim para as pessoas. Pelo contrrio. O desemprego no campo foicompensado, ao longo do tempo, pelo surgimento do emprego em outras reas: muitos se empregaramna indstria; mais pessoas passaram a se dedicar aos servios em geral; outros se empregaram noscargos pblicos; aumentaram os contingentes dos exrcitos; cresceu o nmero de cientistas,professores, pintores, msicos, navegadores, apenas para citar algumas das ocupaes que,dinamicamente, e de maneira imprevisvel, foram, ou crescendo, ou surgindo, para tomar o lugar dasantigas.Este processo evolutivo fluido, ininterrupto e incerto. Se h muito tempo atrs muitos de nsramos caadores, depois nos tornando agricultores, e mais tarde trabalhadores industriais, hojesomos majoritariamente provedores de servios. Nos pases desenvolvidos, mais de 60% da forade trabalho hoje se encontra no setor tercirio: as pessoas esto criando seguros para evitarmosriscos, fazendo cinema, cozinhando pratos que misturam elementos franceses e tailandeses, provendoservios para os turistas, etc.E Amanh? Guias de turismo lunar? Agricultores do solo submarino? Produtores de energiaalternativa? Simplesmente no h como saber. Por exemplo, em 1943, o presidente da IBM disse: euacho que h um mercado mundial para talvez cinco computadores. Como se pode ver, a economiaevolui, mudanas tecnolgicas fazem desaparecer profisses e surgir outras.O que sabemos que as mquinas e o avano tecnolgico, que ganharam grande impulso a partir doincio do sculo XIX, tiraram a humanidade do nvel de subsistncia e nos proporcionam hoje umnvel mdio de vida muito superior ao de nossos antepassados, assim como, provavelmente,proporcionaro bem-estar econmico e social maior ainda para as geraes futuras. J onde houvepouca penetrao tecnolgica e de mquinas, os salrios permaneceram baixos e a renda totaltambm.O nmero de mquinas e novas tcnicas a servio do homem na produo de bens e servios cresceu,substancialmente, desde a Revoluo Industrial. Fosse o nmero de empregos na economia fixo, oaumento da participao das mquinas e o avano cientfico teriam causado uma exploso dodesemprego. Mas o nmero de empregos no est fixo porque no h uma certa quantidade definidade bens que temos que produzir. Se as mquinas fazem parte do nosso trabalho, ns produzimos mais.Alis, muito mais. Como nos mostra o historiador Angus Madison, nos 8 sculos entre o ano 1000 e oano 1820, a renda mundial per capita cresceu 50%. Aps a revoluo industrial, entre 1820 e 1998, arenda mundial per capita cresceu espantosos 800%.

  • O equvoco de quem pensa que as mquinas roubam, de maneira duradoura, emprego do trabalhador,est diretamente associado idia de que a quantidade e a natureza dos postos de trabalho estofixos, quando em verdade no esto. E no esto porque ainda no se encontraram limites para aspossibilidades de se produzir mais, ou de se produzir coisas diferentes.A evoluo da natureza dos empregos , por vezes, surpreendente. No filme Flores Partidas, apersonagem vivida por Sharon Stone responde ao ex-namorado Don Johnston (Bill Murray), quandoperguntada sobre sua profisso atual, que ela agora arrumadora profissional de armrios. A outraex-namorada de Don, Carmem (Jessica Lange) trabalha intermediando o dilogo de animais com seusdonos, uma espcie de psicloga e mdium de animais de estimao. Esses so exemplos extremosde uma tendncia mundial de criao de novos servios, que tm absorvido os trabalhadores queestavam h 100 anos majoritariamente na indstria, e h 1000 anos principalmente na agricultura.A tendncia de crescimento da participao da mulher no mercado de trabalho tambm ilustra acriao de novos empregos na economia. At algumas dcadas atrs, um percentual muito baixo dasmulheres se dispunha a adentrar na fora de trabalho. Mas, mudanas culturais e de atitude, a quedada taxa de natalidade e inovaes tecnolgicas como a mquina de secar e o forno microondaslevaram a uma maior participao da mulher no mercado de trabalho em quase todo o mundo. Asmulheres, que antes estavam realizando tarefas domsticas, passaram a buscar insero no mercadode trabalho, competindo com os homens. Entretanto, isso no gerou uma elevao da taxa dedesemprego porque o nmero total de empregos cresceu.Como j mencionado, o avano tecnolgico e mais investimento em mquinas, no longo prazo, estoassociados a salrios mais altos. Pases desprovidos de mquinas e atrasados tecnologicamente so,em geral, mais pobres. Mas por qu precisamente o par tecnologia/mquinas est associado asalrios mais elevados?Salrios, como d