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EAD Rotas Musicais do Brasil Módulo 1 As músicas do Nordeste e Norte do Brasil Sobre o curso Bem-vindo ao curso EAD “Rotas Musicais do Brasil”! Esse curso tem como objetivo levar você a uma viagem musical pelo Brasil, conhecendo sua riqueza e diversidade cultural. Sabemos que hoje muitas de nossas crianças e jovens não possuem acesso pleno às diversas manifestações musicais presentes no Brasil, muitas vezes ficando restrito ou “refém” apenas ao que é disponibilizado pela mídia de massas ou ao que chamamos de “gosto musical”- o que pode ser deveras questionado e discutido, já que muitas vezes ele nos faz ficar restrito apenas ao que já conhecemos. A intenção desse curso é tirá-lo

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EAD Rotas Musicais do Brasil Módulo 1 As músicas do Nordeste e Norte do Brasil Sobre o curso

Bem-vindo ao curso EAD “Rotas Musicais do Brasil”!

Esse curso tem como objetivo levar você a uma viagem musical pelo Brasil, conhecendo sua

riqueza e diversidade cultural. Sabemos que hoje muitas de nossas crianças e jovens não

possuem acesso pleno às diversas manifestações musicais presentes no Brasil, muitas vezes

ficando restrito ou “refém” apenas ao que é disponibilizado pela mídia de massas ou ao que

chamamos de “gosto musical”- o que pode ser deveras questionado e discutido, já que muitas

vezes ele nos faz ficar restrito apenas ao que já conhecemos. A intenção desse curso é tirá-lo

um pouco da zona de conforto, buscando expandir e aprofundar seus conhecimentos sobre a

música brasileira e o desafio de levar esse incrível universo para dentro de sala de aula.

O ambiente escolar talvez seja um dos poucos locais onde seja possível que a criança entre em

contato com essa diversidade de estilos, ritmos, instrumentos, artistas e manifestações que

retratam nossa cultura. Este portanto é o objetivo principal desse curso.

A partir das “rotas musicais” traçadas pelo professor Fabio Bergamini, que passam por todas

regiões de nosso país (além de ‘mapear’ alguns diálogos com outras culturas como África,

Europa, América latina, EUA, entre outras), você entrará em contato com a riqueza e com a

complexidade contida em nossa cultura, podendo criar diversos caminhos para aplicar esses

conteúdos em suas aulas.

Partimos de cinco eixos básicos para a aplicação dessas rotas com os alunos:

1. Apreciação e percepção musical (escuta ativa)

2. A música no corpo (canto, percussão corporal, jogos, brincadeiras de roda e danças)

3. Instrumentos musicais (conhecer, ouvir, construir, explorar, brincar de tocar)

4. Cultura musical (gêneros, estilos, ritmos, instrumentos e artistas do Brasil)

5. Criação musical (buscar vários jeitos de tocar e cantar, construir instrumentos e brincadeiras,

criar composições, arranjos ou letras em cima dos gêneros, produzir apresentações, e tudo o

mais que surgir ao longo do caminho).

Nos três módulos que se seguem iniciaremos nossas rotas pelo Nordeste e Norte do Brasil, indo

para o Sudeste no Módulo 2 e, por fim, as regiões Centro-Oeste e Sul. Permeando essas rotas

estão alguns textos que servem para questionarmos e para nos apropriarmos dos conteúdos

propostos no curso. Vamos iniciar com um texto que discute o porquê de se trabalhar música

nas escolas e como aplicar esses conteúdos junto às crianças.

1. As Rotas Musicais e a importância da diversidade musical no contexto

escolar

Introdução

Consideramos a música como uma das atividades mais “complexas” do ser humano, não no

sentido de complicada ou difícil, mas sim, no sentido de conter em si uma riqueza sem fim de

elementos e significados, que permitem múltiplos caminhos e olhares sobre seu universo e que

transcendem apenas o aprendizado de sua linguagem específica, assim como, pode gerar

benefícios em várias áreas do desenvolvimento humano, dentre eles: cognitivos, emocionais,

sociais e culturais. Podemos citar como referência o conceito de “complexidade” de Edgar

Morin: “O pensamento complexo é animado por uma tensão permanente entre a aspiração a

um saber não fragmentado, não compartimentado, não redutor, e um reconhecimento do

inacabado e da incompletude de qualquer conhecimento” (Edgar Morin).

Baseado nessa ideia, podemos pensar que, a partir de uma simples escuta musical podemos

desenvolver inúmeros saberes, tanto da linguagem específica da música, como também

estabelecendo uma série de inter-relações com outras áreas do conhecimento, como por

exemplo:

1. De onde vem essa música? (fazendo relações entre a música e geografia)

2. De quando é? (obtendo uma visão histórica da música)

3. Quem fez? (analisando os aspectos sociais dos compositores, interpretes, arranjadores)

4. O que diz a letra da canção (se houver)? (estabelecendo inter-relações com a área da

linguagem)

5. Existe uma dança característica? (vamos dançar?)

6. Quais as inter-relações com as artes visuais, teatro ou o cinema?

Isso tudo sem fugir da linguagem musical propriamente dita, que sempre será o foco principal

de nossas ações, na qual podemos nos aprofundar num caminho interminável, em que você

coloca o limite até onde quer chegar, trabalhando em questões como:

7. Qual é o gênero e estilo?

8. Quais são os instrumentos presentes?

9. Como é o arranjo, a harmonia, a forma?

10. Como é o ritmo?

11. Como é o ritmo da melodia?

12. Como é relação dos intervalos contidos na melodia (fazendo inter-relações com a harmonia,

o arranjo e a letra da canção)?

13. Vamos cantar?

14. O que faz cada instrumento?

15. Vamos tocar?

16. Vamos criar novas formas de tocar e de cantar (arranjo, composição, improvisação,

interpretação)?

E assim seguem-se muitos outros caminhos que poderão ser desenvolvidos ao longo dos

projetos musicais em sua escola. Discutiremos agora um pouco sobre “os porquês” do trabalho

com a música na educação básica.

1.1 Para que música?

Essa segunda parte do texto 1 serve para colocarmos algumas reflexões sobre o universo musical

e suas relações com nossa vida cotidiana, para que o professor possa criar um significado mais

profundo sobre o trabalho com a música em sala de aula. Em tempos em que nossa sociedade

passa por um período altamente utilitarista, individualista e imediatista, além de pouco acesso

à diversidade cultural e à arte, fizemos a seguinte pergunta: para que serve a música, num

sentido mais amplo do que apenas o de entretenimento ou fundo musical?

Observando a pirâmide de Maslow, que contém as necessidades básicas do ser humano,

podemos perceber que a arte, ou mais especificamente, a música, não está inserida

explicitamente nesta categorização. Contudo, podemos questionar: por que então a música

está presente em todas as culturas e épocas que temos conhecimento?

Do ponto de vista emocional, sensível e afetivo

Para iniciar nossa reflexão, podemos citar um trecho do livro Psicologia da Arte, no qual Vygotsky

estabelece uma relação direta entre o surgimento e a existência da música com a dor e a

angústia gerada pelo trabalho:

"(...) a única peculiaridade desses cantos consiste em que o angustiante e o difícil

que a arte deve resolver estão contidos no próprio trabalho(...). Por isso é

extremamente interessante a afirmação geral de Bücher: 'Ora, os povos da

Antigüidade consideravam os cantos um acompanhamento necessário de qualquer

trabalho pesado' (24, p. 229). Em primeiro lugar, isto nos mostra que o canto

organizava, era um trabalho coletivo, e, em segundo, dava vazão à tensão

angustiante. Quintiliano expressou essa mesma idéia da seguinte maneira: 'E parece

que ela (a música) nos foi dada pela própria natureza para melhor suportarmos o

trabalho. Por exemplo, o remador também estimula o canto, este é útil não só

naquelas atividades em que os esforços de muitos se combinam como também o

cansaço de um encontra alívio no canto'(Vygotsky).

Portanto, podemos atribuir uma primeira função à música que é a de “dar vazão ao

sentimento”. Esse caráter sensível, afetivo, emocional da música é por si só motivo que justifica

sua existência. A sublimação da tensão angustiante e o “alívio” que o canto e a expressão através

dos sons pode nos trazer, conferem um caráter de sobrevivência, de cura, e de necessidade vital

à música. Citando Vitor Hugo: "A música expressa o que não pode ser dito em palavras, mas não

pode permanecer em silêncio”.

Do ponto de vista Social e Cultural

Dentre as mais diversas atribuições e características humanas, uma delas é que o ser humano

simplesmente faz música. Sem ela, por definição, o homem ficaria incompleto, perderia seu

sentido do todo. Portanto, a música é parte do homem.

Para apropriar-se de sua cultura, o homem tem que conhecer sua música, ou melhor, fazer

música (no sentido mais amplo do termo). A música como cultura sempre se dá num contexto

social específico, trazendo para quem a pratica o sentido de “pertencer”, trazendo noções de

identidade, de construção da personalidade e do caráter do indivíduo.

Podemos então afirmar que, como parte do homem, a música também é a representação ou o

reflexo deste, dentro de um determinado tempo e espaço. Conhecer a música de determinada

cultura, é conhecer o homem inserido em seu contexto social, em uma de suas manifestações

mais legítimas. Mesmo que cada indivíduo construa seu conjunto de significados em relação aos

determinados tipos de música, ela sempre pertence a um grupo e uma época, já que não temos

como isolar o homem da cultura na qual ele está inserido. Citando novamente Vygotsky e seu

livro “Psicologia da Arte”:

“A arte é o social em nós, e, se o seu efeito se processa em um

indivíduo isolado, isso não significa, de maneira nenhuma, que suas

raízes e essência sejam individuais. É muito ingênuo interpretar o

social apenas como coletivo, como existência de uma multiplicidade

de pessoas. O social existe até onde há apenas um homem e as suas

emoções pessoais." (VYGOTSKY, p. 314, 315 e 316)

Portanto, a música pode ser uma chave para o conhecimento de si mesmo e do outro. Quando

ouvimos a música de uma determinada cultura, ali estão contidos elementos que refletem o

homem daquele espaço e daquele tempo em toda sua complexidade. Como cita o sociólogo

francês Jacques Attali:

“...A música pode tornar-se um espelho do tempo em que foi

produzida e da relação entre homem e sociedade. Como espelho da

sociedade, a música é mais que um objeto de estudo em si mesma, é

um meio de perceber o mundo, um instrumento de conhecimento.

(Jacques Attali).

Portanto, a música e a educação musical são fundamentos para uma educação mais integra e

mais humana. O mínimo que o trabalho com a música nas escolas poderia fazer é colocar a

criança entre em contato com o maior número de gêneros musicais possíveis, propiciando assim

um alargamento de sua cultura e consequentemente do chamado “gosto” musical. Quando

damos a oportunidade para que a criança entre em contato com essa riqueza de ritmos, gêneros

e estilos, estamos expandindo a sua cultura, alargando as fronteiras de seu território estético e

do seu sentido de “pertencer”.

Podemos arriscar dizer que o nosso “gosto” é formado pela combinação da gama cultural em

que estamos inseridos, com o sentido interno que damos as nossas escolhas estéticas.

Podemos citar um trecho do livro “Pedagogia da Música - experiências de apreciação musical”,

no qual as organizadoras Esther Beyer e Patrícia Kebach ilustram muito bem nossa discussão:

“Ouvir música é uma atividade cotidiana do ser humano(...); os sons

invadem o ambiente e nosso cérebro seleciona aquilo que queremos

ouvir(...). Temos opção para ouvir aquilo que nos dá prazer,

tranquiliza, dá energia, que gostamos em determinados momentos e

em outros não, enfim, realizamos nossas escolhas sonoras de acordo

com nossos gostos pessoais; essas escolhas estão atravessadas pela

cultura à qual pertencemos. Quanto mais fechados para a diversidade,

menos amplas serão nossas escolhas, quanto mais abertos à diferença,

maiores serão as opções para escolhermos a trilha de nosso dia a dia.

Desse modo, as ações humanas estão imersas em uma realidade

social, cujas lacunas afetivas e instrumentos materiais e espirituais

derivam do contexto de valores culturais, que demandam do sujeito

ações e motivações. Essas ações inserem-se em um quadro de

possibilidades de objetos e sua época (BEYER e KEBACH, 2011).

Do ponto de vista Cognitivo

Continuando nossas reflexões a respeito do trabalho com música, podemos afirmar que, do

ponto de vista da Cognição, a música é uma das atividades mais complexas do ser humano e a

que mais estimula diferentes áreas do cérebro. Podemos citar como referência o livro “A música

no seu cérebro”, no qual, o autor Daniel Levitin, descreve o processo cognitivo e neuronal que

ocorre quando ouvimos música:

“A atividade musical mobiliza quase todas as regiões do cérebro de que

temos conhecimento, além de quase todos os subsistemas neurais”. Os

diferentes aspectos da música são tratados por diversas regiões neurais.

(LEVITIN, 2011: p.100)¹.

Levitin, Daniel J. (2011). A música no seu cérebro: a ciência de uma obsessão humana. 3ªEd. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira.

Portanto, a importância em se criar um ambiente musical, tendo como a base a diversidade,

recai também sobre o desenvolvimento do aparato perceptual da criança em relação à música;

em outras palavras, quanto mais ouvimos ou executamos diferentes tipos de música, mais nosso

cérebro tem que criar conexões e sinapses para decodificar aqueles sons e atribuir-lhe

significado.

O inverso também ocorre, quanto mais restritos ao mesmo tipo de música, mais acomodado

fica o cérebro, e menos desenvolvimento este terá. Por isso, temos em mãos uma grande

oportunidade para que a criança entre em contato com a diversidade musical e, o ambiente

escolar, talvez seja um dos poucos locais onde isso seja possível, pois percebemos hoje que

muitos pais não propiciam esse ambiente em casa. Sem entrar em juízo de valores, vivemos nos

últimos anos uma enorme capitalização e massificação da cultura e da arte, o que pode levar a

criança a ter acesso apenas ao que está na mídia e ao que está na “moda”. Não vemos problemas

quanto a isso, mas sim quanto à restrição que ocorre quando a criança não tem acesso ao que

lhe seria vital quanto ao desenvolvimento musical.

Observamos nos tempos atuais que, se por um lado o acesso à informação permite que as

crianças ampliem a quantidade dos saberes, isso não nos garante a qualidade dessas

informações e muito menos propiciam vivências ou experiências que sejam significativas para

seu desenvolvimento como ser humano.

Podemos ainda citar, dentro do contexto da cognição, que a prática musical e o contato com os

instrumentos musicais trabalhem diversas regiões do cérebro ao mesmo tempo, despertando,

por exemplo, as partes responsáveis pela motricidade, desenvolvendo a coordenação motora,

a lateralidade, a coordenação fina de movimentos, e ainda, os vários tipos de memória (visual,

sensorial, afetiva, auditiva, sinestésica, entre outras), os aspectos específicos da linguagem

musical e suas correlações com outras áreas como a da linguagem, da matemática, da dança,

entre outras.

Considerações finais

Voltando à pirâmide de Maslow apresentada no início do texto, acreditamos que a música

satisfaz um grande número de necessidades ao mesmo tempo, sendo essas, as necessidades

sociais, de autoestima e autorrealização - se é que ela não satisfaz também, necessidades

fisiológicas relativas às necessidades de sentimentos de prazer físico. Para ilustrar, podemos

citar um trecho de um artigo encontrado na Revista Superinteressante, que diz:

“A primeira hipótese sobre a função da música foi levantada

por Charles Darwin. O biólogo que popularizou o conceito de evolução

das espécies dizia que a música é determinante para a escolha de

parceiros sexuais, uma vez que as fêmeas seriam atraídas pelos

melhores cantores. "O homem que canta bem, é afinado, expõe

melhor seus sentimentos. Parece mais sensível, mais inteligente. E isso

agrada as mulheres", e o inverso também é verdadeiro, afirma o

jornalista e músico brasileiro Paulo Estêvão Andrade”.

Em relação às necessidades sociais, ao cantar ou ao tocar um instrumento em grupo, a

necessidade de comunicação, e de pertencer a algo maior, não somente é exercitada como

fortalecida. Podemos incluir aqui o caráter sagrado da música encontrado também em inúmeras

culturas, em seus cânticos sagrados, seu poder de cura e seu papel mediador perante

determinados santos e deuses existentes nas mais diversas culturas e épocas da história da

humanidade.

A música e o corpo estão intrinsecamente ligados. A prática musical, assim como a dança, inclui

o desenvolvimento de inúmeras habilidades motoras e cognitivas. Através da superação de cada

“obstáculo”, (que pode ser motor ou cognitivo, ou de qualquer outra natureza), o caminho do

desenvolvimento da linguagem musical contribui imensamente para a necessidade de “gostar

de si mesmo”, ou seja, de possuir autoestima - condição básica para o desenvolvimento do ser

humano integral.

Quanto às necessidades de autorrealização, entendemos que um indivíduo autorrealizado, é um

ser que almeja e atinge objetivos que considera importantes para seu estado de “felicidade”.

O exercício musical é uma forma excelente para desafiarmos os nossos potenciais internos.

Aprender música é como aprender a viver. Necessita de motivação, paciência, leveza,

planejamento, disciplina, aceitação, objetividade e perseverança, sendo essas algumas das

qualidades que pretendemos desenvolver nesse curso de Educação Musical.

Para encerrarmos momentaneamente as reflexões e discussões sobre o sentido da música e da educação musical no ambiente escolar, podemos citar um trecho do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil que resume bem o que abordamos ao longo desse texto:

“a integração entre os aspectos sensíveis, afetivos, estéticos e

cognitivos, assim como a promoção de interação e comunicação social,

conferem caráter significativo à linguagem musical(...). A música está

presente em todas as culturas, nas mais diversas situações: festas,

comemorações, rituais, manifestações. Existe música para adormecer,

música para dançar, para chorar, para dar coragem, para pensar e em

muitas outras finalidades do nosso cotidiano. Ela faz parte da educação

desde há muito tempo, sendo que, já na Grécia antiga era considerada

como fundamental para formação de futuros cidadãos, ao lado da

matemática e da filosofia. A linguagem musical é excelente meio para o

desenvolvimento do respeito mútuo, do equilíbrio emocional, do

desenvolvimento da auto estima, além de trazer consigo a

concentração, disciplina, coordenação motora, e também um poderoso

meio de integração social.

Contudo, o que nos move em direção à prática musical é sempre o prazer. Tocar, ouvir, cantar

deveria ser sempre muito gostoso, se não o é, algo errado ocorreu ao longo do caminho. O

prazer estético e a vivência do “belo” contribuem para a formação de um olhar positivo perante

a vida. A música (e a arte de maneira geral) pode nos ajudar a construir um belo “óculos” para

enxergamos o mundo com mais sentido, significado e beleza.

Desejamos então a você, muita música em seu caminho!

1.2 Sobre os gêneros, estilos e ritmos do Brasil

Como dissemos na introdução, nesse curso, faremos uma ‘viagem pelo Brasil’ conhecendo um pouco dos gêneros, estilos, ritmos, instrumentos, artistas, compositores, intérpretes, entre muitas outras características presentes em nossa cultura. O foco aqui é que você consiga levar um pouco da diversidade musical do Brasil e do mundo para suas aulas. Antes de entrarmos nas ‘rotas musicais´ propriamente ditas, faremos uma breve abordagem sobre as diferenças conceituais entre ritmo, gênero e estilo musical, direcionando o estudo para o campo da música popular brasileira, em suas múltiplas manifestações. Esses conceitos muitas vezes se confundem e se inter-relacionam, tornando-se muitas vezes um assunto complexo e polêmico, havendo margem a diferentes interpretações. Entretanto, o objetivo principal desse texto é ir além de simplesmente dar as definições e explanações exatas sobre esses conceitos musicais, mas sim aproveitar para falarmos um pouco de música, mais especificamente da música brasileira. Como sabemos, o Brasil é um incrível manancial de manifestações musicais nas quais estão presentes muitos instrumentos, ritmos, danças, estilos e gêneros que fazem parte de nossa cultura e de nossa história e refletem num sentido profundo o que somos e de onde viemos. Como dissemos acima, quando ouvimos uma música, encontramos uma complexa teia de elementos sobre os quais podemos colocar o foco da nossa atenção, e que também nos permitem direcionar o trabalho com as crianças em sala de aula, dentre eles: quais são os instrumentos que estão presentes, como é o arranjo, como é a melodia (vamos cantar?), o que

diz a letra (se houver), como é o ritmo, como é a dança, de onde vem essa música, que grupo representa ou pertence, qual o estilo, como é a interpretação, como são os acordes, de quando é essa música, dentre muitos outros aspectos que podemos refletir a respeito de determinada música. Tudo isso irá determinar qual gênero musical estamos a nos referir. Portanto, o Ritmo é apenas um dos inúmeros elementos que compõe essa complexa teia que é a música, o que não o torna menos importante, entretanto, não é o único elemento determinante para compreendermos um gênero ou estilo musical como muitas vezes ocorre em certos textos ou abordagens. Para começarmos a entender a música brasileira em toda sua complexidade, devemos dar alguns passos atrás e darmos uma olhada em suas origens e suas mais diversas influências, diálogos, atritos, miscigenações, transformações e fusões. Como um bom ponto de partida, podemos iniciar falando um pouco de nossa herança Africana, presente em praticamente todas as manifestações musicais do Brasil, num primeiro nível no que diz respeito à percussão, à riqueza rítmica e às danças – mas não ficando restrito a isso, como o senso comum nos mostra, trazendo inúmeros instrumentos melódicos, o modo de cantar e as belíssimas melodias dos inúmeros povos que cá vieram parar. Algumas dessas manifestações musicais “afro-brasileiras”- como o jongo, o ijexá, os maracatus, congadas, o samba de roda, o tambor de crioula, entre muitos outros - antecedem os chamados “gêneros populares urbanos” como o samba, as marchinhas, o baião, o samba-canção, a bossa nova e muitos outros, que estiveram desde seu início, ligados a radio e à indústria fonográfica. Podemos desde já fazer uma distinção entre os gêneros mais “autênticos” da música brasileira, mais ligados ao folclore e às manifestações mais genuínas e primordiais em nossa cultura, das outras manifestações mais urbanas que já nascem num contexto da cidade, da miscigenação, da industrialização e dos atritos sociais presentes na sociedade brasileira a partir do início do século XX, as quais sofrem certa influência ou, em outras palavras, são “manipuladas” pela indústria fonográfica e pela mídia. Podemos encontrar essas primeiras muito presentes ainda hoje em praticamente todas as regiões do Brasil, nas festas tradicionais, blocos de rua, e que mantém acesa a chama de nossas tradições musicais mais antigas nascidas em solo brasileiro. Um primeiro problema a ser levantado quando falamos em “gêneros” do folclore ou de tradições musicais afro-brasileiras ou mesmo da música indígena no Brasil, é cair no senso comum e na falsa generalização provinda de um conceito euro-centrista e pouco aprofundado. Apesar de já ser extremamente discutido atualmente, vale ressaltar a diversidade de etnias africanas que vieram a desembarcar em nosso país, as quais foram jogadas em solo brasileiro e tratados muito erroneamente como se fossem um único povo, uma única cultura. O mesmo se deu com a cultura indígena. Vale enaltecer, ainda que tardiamente, a riqueza e diversidade presente na cultura indígena, a qual tão pouco conhecemos. Eram 5 milhões e hoje não passam de 800 mil. De 1200 povos para 230 (mesmo assim são faladas mais de 150 línguas no Brasil hoje). Ainda para ilustrar, podemos citar o livro “Os Sons dos Negros no Brasil”, no qual o historiador José Ramos Tinhorão retrata perfeitamente a ignorância e preconceito da parte dos portugueses ao se referir às diversas tradições presentes no Brasil apenas pelo conceito de batuque:

“já na terceira década dos anos seiscentos, os escravos africanos conseguiam, em certas ocasiões, exercitar seus ritmos e danças (e, quase certamente, embora de forma dissimulada, também seus rituais religiosos), através de manifestações à base de ruidosa percussão, que os portugueses definiam genericamente sob o nome de batuque” (Tinhorão, 2008, p.36).

A partir dessa discussão, um primeiro cuidado ao se ter em usar o termo “gênero” musical, é não cair em uma superficial generalização e pasteurização de certa manifestação musical. Por outro lado, podemos sim nos aprofundar na riqueza e complexidade contida em tal gênero, já que esse termo pode englobar e conter em si uma infinidade de nuances e características que podem ser exploradas por nós. Vamos tomar como exemplo o Samba. O Samba é um gênero musical que possui uma história tão rica e fascinante que, se jogarmos toda sua complexidade em uma mesma gaveta, estaremos perdendo muito de suas inúmeras correntes e facetas (no módulo 3, o tema será retomado no texto “o samba ou ‘os sambas’). Entretanto, para começarmos a separar e aprofundar nosso conhecimento sobre esse grande ‘guarda-chuva’ que é o samba, podemos dividir ou definir cada ‘faceta’ dessas através do conceito de “estilo”, o qual necessariamente nos leva a buscar maiores especificidades e talvez um maior aprofundamento em seus detalhes e nuances. Podemos citar como exemplo de estilos dentro do gênero samba: o samba de roda, o samba choro, o samba enredo das Escolas de Samba, o samba canção, o samba de gafieira, a bossa nova, o samba jazz, o samba rock, o partido alto, samba-reggae, entre muitos outros. Cada um desses retrata diferentes períodos, regiões, grupos sociais e uma série de elementos que transcendem apenas a análise musical. Portanto, para que possamos caracterizar uma manifestação musical como gênero, evitando a ‘generalização’ no sentido negativo de ‘superficialidade’, e ainda, determinar os variados estilos dentro desse gênero, não podemos nos basear apenas no ritmo, ou apenas nos fatores que dizem respeito à linguagem musical, mas temos que considerar os fatores históricos, geográficos, sociais, étnicos, econômicos e culturais para que possamos ter uma visão mais profunda e ampla sobre cada gênero e estilo musical. Portanto, quando falamos “Samba” estamos falando de um termo que generaliza uma infinidade de diferentes nuances, particularidades, épocas, grupos, jeitos de tocar, instrumentações, regiões, jeitos de compor, de se expressar, de dançar, e de se comunicar. Emprestando alguns aspectos dentro do campo da linguística, a autora Helena Hathsue Nagamine Brandão discute as essas relações entre gênero e estilo dizendo:

“Onde há estilo há gênero. O vínculo entre estilo e gênero é indissolúvel, orgânico. E isso se percebe claramente quando se analisa a questão sob a ótica da funcionalidade do gênero em que cada esfera da atividade e da comunicação humana tem seu estilo peculiar. Cada esfera conhece seus gêneros, apropriados à sua especificidade, aos quais correspondem determinados estilos (BRANDÂO, 1997).

Enquanto o gênero se mostra relativamente “estável” e amplo, o estilo se mostra peculiar, característico, idiossincrático. Apelando ao The New Groove- dictionary of music, encontramos a seguinte definição de estilo:

“Estilo é um termo que denota a maneira do discurso; modo de expressão; mais particularmente a maneira em que cada trabalho de arte é executado. Nas discussões em música o termo ganhou especiais dificuldades; ele pode ser usado para denotar as características de um compositor individualmente, de um período, de uma área geográfica ou centro, ou de uma sociedade ou função social” 1.

Como surgem os novos gêneros e estilos?

Podemos também analisar o surgimento dos novos gêneros ou estilos pela ótica das rupturas ocorridas ao longo da trajetória da música. Como cita Fabbri: “um novo gênero se forma a partir de transgressões nas regras de um ou mais gêneros anteriores (FABBRI, 1981, p.61). Para ficar mais claro podemos citar como exemplo algumas dessas transgressões e rupturas ocorridas na história da música nos mais diversos âmbitos. Dentro da chamada “música erudita europeia”, por exemplo, o romantismo transgride as progressões harmônicas do período clássico, expandindo suas fronteiras; por sua vez o dodecafonismo rompe com o estilo romântico, construindo uma outra maneira da manifestação musical. O mesmo se passa no jazz, quando Charlie Parker e Dizzie Gillespie rasgam os limites do swing com o novo “Be Bop”, por conseguinte, Miles Davis grava o Birth of the Cool contrariando a corrente virtuosística do próprio Be Bop. Já na música popular brasileira, podemos citar, por exemplo, a mudança do padrão rítmico do samba feita pelos “bambas” do Estácio no final da década de 30 diferenciando-se do “samba-maxixe”, ou, a gravação do disco Chega de Saudade em 1956, na qual João Gilberto registra as inovações no modo de cantar e de tocar violão trazidas pela bossa-nova, rompendo com o samba-canção em voga nos anos 50. Ou na música sertaneja, com a introdução do country feita pelas duplas dos anos 80 e 90 (como Chitãozinho e Xororó, João Paulo e Daniel, Leandro e Leonardo) rompendo com as raízes da moda de viola. E hoje em dia, o chamado ‘sertanejo universitário’ com seus novos ritmos, letras e roupagens que rompem com o sertanejo romântico da geração anterior. Portanto, são as rupturas, as contradições e os diálogos internos que geram novos gêneros e novos estilos. Citando novamente Bakhtin:

Embora cada gênero tenha suas características específicas, um gênero não é, necessariamente, uma “fôrma” que se impõe ao falante/escritor (no nosso caso “o compositor”). Enquanto conjunto de traços marcados pela regularidade, pela repetibilidade, o gênero é

1 “Stile: a term denoting manner of discourse; mode of expression; more particulary the manner in a work of art is executed. In the discussion of music the term raises special difficulties; it may be used to denote music characteristic of an individual composer, of a period, of a geographical area or centre, or a society or social function. (The New Groove Dictionary, p. 638, vol.24, second edition)

relativamente "estável", mas essa estabilidade é constantemente ameaçada por forças que atuam sobre as restrições genéricas, forças de caráter social, cultural e individual (estilísticas) que determinam ou mudanças num gênero, ou seu apagamento, ou sua revivescência. Essa tensão entre estabilidade x variabilidade se faz marcar de maneira específica nos diferentes gêneros, criando assim novos estilos. (BAKHTIN, 1992).

Voltando então à música popular brasileira, podemos aplicar a afirmação de Bakhtin refletindo sobre como “as forças de caráter social, cultural e individual”, geraram os novos estilos na trajetória de nossa música. Alguns “marcos” na história da MPB podem dar pistas deste comportamento (social, cultural e individual). Como por exemplo: as composições da “revolucionária” Chiquinha Gonzaga no início do século XX; a gravação do samba Pelo Telefone em 1917 por Donga; a produção da extensa obra de Noel Rosa da Vila Isabel que morreu aos 26 anos de idade; o sucesso de Carmen Miranda nos Estados Unidos; o boom da rádio Nacional nos anos 30 e 40; a gravação do disco Chega de Saudade em 1956; a chegada do rock no Brasil, os Festivais da Canção na década de 60 e 70; a Tropicália; o Clube da Esquina; o Rock dos 80´; o pop dos 90´e todas as tendências mercadológicas que emplacaram nos últimos anos gerando imenso lucro às gravadoras como o sertanejo, o pagode, o axé, o “forró e o sertanejo universitário” e hoje em dia o funk carioca. Permeando toda esta trajetória da música popular, podemos pelo menos citar dois fatores determinantes para o entendimento desta história: a intermediação da indústria fonográfica na consolidação dos inúmeros gêneros e estilos; e a “canção” como linha mestra que perpassa quase todos os gêneros populares da música brasileira. No livro “O século da Canção”, o autor Luiz Tatit cita logo na introdução:

“Nossa canção incorporou ao longo desse período (o séc. XX) uma grande variedade de fisionomias que, embora não trouxesse qualquer obstáculo para o pronto reconhecimento da maioria das ouvintes, tornou-se trabalhosa sua definição artística e, acima de tudo, sua apreciação crítica. Comportou-se como um organismo mutante que ludibriava os observadores por jamais se apresentar com o mesmo aspecto. Onde o comentarista procurava coerência melódica, encontrava fragmentos entoativos independentes. Onde procurava soluções poéticas, deparava-se com a fala crua. Quando examinava o ritmo de fundo, a informação estava na melodia de frente. Quando focalizava o arranjo, este era apenas um recurso a serviço do canto. Quando se esperava maior complexidade harmônica, reentravam em cena os três acordes básicos e nem por isso a canção perdia seu encanto. Se o julgamento recaía sobre o conteúdo da letra, vingavam as músicas para dançar. Enfim, sem contar com um mínimo de consenso sobre o que a define como expressão artística, a canção brasileira converteu-se em um território livre, muito frequentado por artistas híbridos que não se consideravam nem músicos, nem poetas, nem cantores, mas um pouco de tudo isso e mais alguma coisa (TATIT, 2004).

Para finalizar esse texto, podemos relacionar também a criação dos novos gêneros e estilos à problemática da categorização dos estilos musicais nas “prateleiras” das lojas de discos. A cada ano surgem inúmeros estilos musicais que necessitam serem “enquadrados” em uma categoria de venda. Muito interessante se torna os novos termos utilizados pela indústria, como por exemplo o “sertanejo universitário”. O termo “universitário” tenta dar legitimidade e status a um “estilo” que antes poderia ser caracterizado como piegas ou “brega”. Contudo, necessitaríamos uma análise mais profunda sobre as manipulações e categorizações feitas pela indústria fonográfica para que conseguíssemos um maior entendimento sobre o surgimento desses novos gêneros. A intenção deste texto foi refletir, discutir e dar uma visão geral sobre as questões envolvidas neste tema “gêneros e estilos”, buscando abordar o assunto sob uma perspectiva da música popular como manifestação do homem em seus vários contextos sócio históricos, assim como, rever o vínculo inevitável da música popular brasileira com a indústria fonográfica. Entraremos a seguir em nossas ‘rotas musicais’ propriamente ditas, mas esse primeiro texto servirá como base para dar continuidade às discussões e ao aprofundamento histórico sobre os gêneros e estilos da música brasileira. Bibliografia relacionada BAKHTIN, M. “Gêneros do discurso”. In: Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, l992. TATIT, Luiz. O Século da Canção. Cotia: Ateliê Editorial, 2004. FABBRI, F. A theory of musical genres - two applications. In: First International Conference on Popular Music Studies, Popular Music Perspectives (ed. D. Horn and P. Tagg; 1982, Göteborg and Exeter: International Association for the Study of Popular Music). Amsterdam, 1981. BRAIT, B. (Org.)(2005) “Estilo” In: Bakhtin: Conceitos-chave. São Paulo: Contexto. . DOLZ, J. & SCHNEUWLY, B. "Gêneros e progressão em expressão oral e escrita". In: Gêneros orais e escritos na escola (Trad. e org. Roxane H. R. Rojo e Glaís S. Cordeiro). Campinas: Mercado de Letras. 2004. BRANDÃO, HHN. Estilo, Gêneros do discurso e implicações didática. In: Lingua Portuguesa: Pesquisa e ensino. São Paulo: Educ/Fapesp, 2007.

2. Rota 1: As músicas do Nordeste e Norte do Brasil Introdução Vamos iniciar nossa primeira ‘rota musical’ fazendo uma viagem pelo Nordeste e Norte brasileiro. Aqui começa “oficialmente” a história do Brasil desde a chegada dos portugueses na Bahia, a posterior vinda dos africanos e de tantos outros povos que vieram aportar aqui. Entretanto seria um erro abafar a história anterior a essa ‘história oficial’ ignorando tão diversa

e rica cultura indígena (como muito se faz). É entre os atritos e negociações dessas tantas culturas presentes em solo brasileiro que nasce a nossa música em suas incontáveis manifestações. Seria impossível aqui falar a fundo sobre todas as manifestações musicais presentes no riquíssimo território cultural nortista brasileiro. Se falarmos apenas do Maranhão, por exemplo, podemos listar logo de cara mais de 15 tradições musicais e danças típicas, como o bumba meu boi (e seus cinco sotaques básicos), o tambor de crioula, o tambor de mina, o bloco tradicional, tribo de índio, cacuriá, baralho, dança do lelê (ou péla porco), caroço, coco, festas do Divino Espírito Santo (e as caixeiras do Divino), além do famoso reggae do Maranhão. Se isso ocorre em apenas um estado, imagine em todos os 9 estados. Imagine em Pernambuco, o frevo, o maracatu, o caboclinho, o cavalo marinho e a ciranda. A Bahia e seus inúmeros ritmos e blocos afro-brasileiros, e ainda todos os outros estados com suas tradições, danças, instrumentos e manifestações culturais. Dito isso, daremos nesse curso uma pincelada geral em algumas das principais manifestações musicais do Norte e Nordeste, mas cabe a você continuar essa tão prazerosa pesquisa, e cada vez mais se aprofundar em nossa maravilhosa cultura. Vamos começar com o universo do “Forró”, que talvez seja um dos mais amplos e principais representantes da música nordestina em todo o Brasil, contendo em si uma série de idiossincrasias e simbologias tão ricas para nossas discussões e reflexões. O forró é em si um estilo musical com suas próprias características, entretanto, assim como discutido no texto anterior, consideraremos aqui (na nossa interpretação), o forró como um gênero, ou seja, como um enorme ‘guarda chuva’ que abarca inúmeras danças, ritmos, grupos e estilos musicais, dentre eles: o xote, o baião, o xaxado, o coco, o arrasta pé, a quadrilha, o “forró universitário”, o “forró pé de serra”, entre muitos outros. Para falar de forró, nada melhor que tomarmos como ponto de partida talvez o mais significativo nome da música nordestina: Luiz Gonzaga. Iniciaremos com um texto sobre um dos principais estilos musicais nordestinos, que foi praticamente criado e divulgado na voz de Luiz Gonzaga: o Baião. O baião já é considerado como música urbana, nascido no Rio de Janeiro, ligado desde seu início à Rádio Nacional, mas é um estilo que talvez sintetize musicalmente os diversos elementos, símbolos, caminhos e atritos contidos na história do povo nordestino. Depois desse texto sobre o baião, daremos uma rápida passada nos diversos outros gêneros e estilos nordestinos e por fim, e não menos importante, um resumo da música na região Norte do Brasil. 2.1 O Baião “...percebi que cantar as alegrias e as tristezas do homem da terra é também uma forma de ajudá-lo a conhecer seus problemas” (Luiz Gonzaga) A partir desta frase de Luiz Gonzaga, podemos afirmar que conhecer mais a fundo a música brasileira é sem dúvida uma porta de entrada para conhecermos a nossa própria cultura e consequentemente conhecermos a nós mesmos. Sendo assim, podemos dizer que Luiz Gonzaga

tenta sintetizar em sua música toda uma vivência dentro da cultura nordestina com sua riqueza de símbolos, tradições, histórias, ritmos, danças, cheiros, trejeitos, sons, dores e alegrias. No livro “Luiz Gonzaga: a música como expressão do Nordeste”, encontramos a seguinte frase:

“constatamos que Luiz Gonzaga e sua obra refletem a sociedade e a cultura do Nordeste brasileiro, pois, tanto a obra de arte quanto a sociedade são originadas na relação comum entre o indivíduo e seu meio natural.” (SANTOS,2004)

Contudo, o baião consolida-se como gênero popular urbano em meados da década de 40, quando Luiz Gonzaga, o chamado “rei do Baião”, já estava no Rio de Janeiro e conseguiu se adentrar nos meandros da Rádio Nacional, que era o eixo central da música brasileira naquela época. Nascido em Exu, Pernambuco, Gonzagão viaja por todo o Brasil, antes de se consolidar na capital federal da época, o Rio de Janeiro, onde, depois de muita dificuldade, e muitas histórias a serem contadas, tornou-se muito popular, principalmente depois da gravação em 1946 da música Baião, que virou um marco do estilo:

Eu vou contar pra vocês Como se dança o baião E quem quiser aprender É favor prestar atenção

Apropriando-se de uma série de elementos do chamado ‘folclore’ nordestino (como o xaxado e sua ligação com Lampião, os aboios nordestinos, ou ainda, toda a tradição da sanfona vinda de Portugal e tão presente no Nordeste e no interior do Brasil), Gonzaga digere, recria e traduz tudo isso em suas músicas, sendo precursor e porta voz da cultura nordestina no Sudeste e posteriormente no Brasil e no mundo. Em entrevista para a Revista Veja de março de 1972, Luiz Gonzaga descreve:

“O baião foi ideia minha e do Humberto Teixeira. Quando eu toquei o baião para ele, saiu a ideia de um gênero novo. Mas o baião já existia como coisa do folclore. Eu tirei do bojo da viola do cantador, quando ele faz o tempero para entrar na cantoria e dá aquela batida, aquela cadência no bojo da viola. A palavra também já existia. Uns dizem que vem do baiano e outros que vem de baía grande. O que não existia era uma música que caracterizasse o baião como ritmo, como letra...(Revista Veja, 15 de março de 1972).

Nas reminiscências do nacionalismo-populista de Vargas, Luiz Gonzaga tornou-se símbolo da cultura nordestina, tendo seu ápice de 1946 a 1955. O samba ‘tradicional’ andava em baixa nesta época (sobretudo pelo advento do samba-canção mais ‘abolerado’) e Gonzaga chega à Rádio Nacional criando um novo paradigma que representava grande parte da população brasileira que até então era marginalizada e excluída do grande mercado fonográfico brasileiro. Ainda no livro de José Farias dos Santos “as músicas do Rei do Baião formaram veículos significativos que proporcionaram aos Estados do Sul e Sudeste, especificamente São Paulo e Rio de Janeiro, a

tomarem conhecimento da cultura, da sociedade e da realidade dramática do Nordeste brasileiro”. Contribuindo para o contexto da valorização da cultura nordestina como continuidade da construção de uma identidade nacional para o Brasil, houve ainda, na literatura, um movimento precedente à música de Gonzaga: os chamados Romances Regionalistas que retratavam a realidade sertaneja, suas paisagens e histórias, como por exemplo, o romance “Vidas Secas”, de Graciliano Ramos, publicado em 1938, dentre outros. Falando mais especificamente sobre a instrumentação típica do baião, podemos perceber uma forte influência da música portuguesa, na qual podemos comumente encontrar até hoje o uso da sanfona, dos tambores tradicionais e do triângulo, chamado pelos portugueses de “ferrinhos”. No livro Pequena história da Música Popular, o autor José Ramos Tinhorão cita:

“o compositor Luiz Gonzaga afirmaria vinte anos depois, em início de 1972, ter sido também o introdutor do triângulo nesse conjunto típico de sanfona e zabumba, formando assim a composição instrumental mais indicada para produzir o ritmo do novo gênero. Porém, a fotografia de uma banda de música do interior do Estado do Alagoas, publicada pela Revista Ilustração Brasileira, em 1929, já mostrava, ao lado dos tocadores de pífaros, caixa, zabumba e rabeca, um menino segurando um triângulo de ferro”.

Talvez não tenha sido Gonzaga que introduziu o triângulo na música nordestina, (visto que o triângulo já era usado anteriormente em outros gêneros, inclusive na própria música folclórica do Nordeste) mas coube a ele estilizar e sintetizar em sua própria sanfona, e em seu trio de forró, as diversas vozes contidas na cultura rítmica, melódica, harmônica e simbólica do Nordeste. Na continuidade desta história podemos citar inúmeros compositores e músicos que levaram a frente, expandindo e inovando a música nordestina pelo mundo. Dentre eles: João do Vale, Jackson do Pandeiro, Dominguinhos, Sivuca, Osvaldinho do Acordeon, Hermeto Pascoal, Fagner, Elba Ramalho, Chico César, Lenine, entre tantos outros. Um outro momento histórico importante para a música nordestina foi pós-bossa nova, em que músicos como Edu Lobo e Geraldo Vandré voltaram seus olhos para a o Nordeste buscando assim uma ‘verdadeira’ fonte para o que seria a mais ‘genuína’ música brasileira. Esse momento foi retratado inclusive pelos festivais da canção da década de 60 (época em que surge a sigla MPB como gênero), quando músicas como Ponteio, Arrastão, Disparada e Domingo no Parque tiveram grande destaque e traziam de certa forma elementos da cultura nordestina para o eixo central da música brasileira. Hoje em dia encontramos inúmeros grupos que tocam o baião em diversos contextos e instrumentações, desde o forró ‘eletrônico’, feito com teclados e programações, até o chamado forró ‘pé de serra’, que de certa forma tenta manter algumas características da estética criada por Gonzaga. Podemos ainda citar como por exemplo grupos como “Fala Mansa”, do chamado ‘forró universitário’, que inclui a guitarra, baixo, bateria e teclado. Para finalizar, vale ressaltar a importância de músicos como Sivuca e Hermeto Pascoal, que fundem a linguagem do nordeste com outros gêneros musicais como o jazz, levando a música brasileira para os mais altos patamares da música instrumental mundial.

Como sugestão de atividade, podemos partir da apreciação musical de alguma canção de Luiz Gonzaga e trabalhar com os alunos:

• quais são os instrumentos típicos do baião

• qual a temática das letras das canções

• cantar e tocar algumas músicas selecionadas

• como é a dança do baião e do xote (dançar com eles)

• como tocar cada instrumento da percussão

• construir ou adaptar objetos do cotidiano para imitar o som da zabumba e do triângulo

• pesquisar quais são as roupas, comidas e costumes dos nordestinos

• pode ainda: assistir aos filmes “De pai para filho”

https://youtu.be/tWFCfUiF7oA

• ou “O mistério de Santa Luzia” que retratam a cultura e a história do baião.

https://www.youtube.com/watch?v=-0DQ7rTGZIk&t=3231s

Enfim, podemos expandir e aprofundar a pesquisa e os conhecimentos musicais com foco na aquisição da linguagem musical através da cultura musical em seus vários aspectos, criando projetos educacionais que podem ser muito interessantes e divertidos para os educandos. Sugestão de Apreciação: Luiz Gonzaga, Humberto Martins, Dominguinhos, Sivuca, Hermeto Pascoal, Jackson do Pandeiro.

Links relacionados ao Forró

• Dominguinhos Canta e Conta Gonzaga

https://www.youtube.com/watch?v=gKVavm_QiZ4

• Ritmos e Danças do Nordeste: https://youtu.be/K_-F5Gzx3rE

• Baião e coco https://www.youtube.com/watch?v=CnzP_z03Ehc

https://www.youtube.com/watch?v=G1_Bz6yg9Wo

https://www.youtube.com/watch?v=Q871ol8aUKU

• Documentário sobre Luiz Gonzaga: https://youtu.be/4kO0AiLPB7I

SANTOS, José Farias. Luiz Gonzaga: a música como expressão do Nordeste. São Paulo: IBRASA, 2004. TINHORÃO, José Ramos. Pequena história da Música Popular: da modinha à lambada. São Paulo: Art. editora, 1991. MOURA, Fernando. Jackson do Pandeiro: o rei do ritmo. São Paulo: Ed. 34, 2001. RAMALHO, Elba Braga. Luiz Gonzaga: a síntese poética e musical do sertão. São Paulo: Terceira Margem, 2000. ALBUQUERQUE, Jr. Durval Muniz de. A Invenção do Nordeste e Outras Artes. São Paulo: Cortez,1999. HOBSBAWN, Eric. “Introdução: A Invenção das Tradições.” In: Hobsbawm, Eric e Terence Ranger (org.). A Invenção das Tradições. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997. Parpinelli, Santino. Temas Nordestinos, Rio de Janeiro. Manuscrito, 1985. HERMIDA, Borges. O Interessante Estudo do Folclore: História do Brasil. 8. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1986. LIMA, Luiz Costa. Teoria da Cultura de Massa. 3. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. PHAELANTE, Renato. Forró: Identidade Nordestina, Fundação Joaquim Nabuco (Instituto de Pesquisas Sociais/Departamento de Antropologia). Recife – PE Brasil, Set/Out de 1995. 2.2 A diversidade musical do Nordeste

Nessa parte, faremos uma geral passando por alguns dos principais gêneros da música

nordestina. Porém, como dissemos anteriormente, cabe a você continuar sua pesquisa

ampliando e aprofundando seu conhecimento sobre a diversidade musical nordestina.

Xote e o xaxado

Esses dois gêneros precedem o baião de Luiz Gonzaga e foram amplamente cantados,

transformados incorporados em seu próprio repertório. Podemos citar ‘A vida do viajante’ ou

‘Xote das meninas’ como exemplos de xote e ‘Mulher Rendeira’, Paraíba e Xaxado como

exemplos do segundo.

O Xote é um ritmo mais lento e procede das danças europeias, sobretudo do schottish, e das

danças portuguesas como a chula e o malhão. Segundo o percussionista e pesquisador Ari

Colares: “o xote é um ritmo mais cadenciado, isto é, mais lento. Seu nome deriva de uma dança

de salão europeia chamada schottish, dançado em par enlaçado” (COLARES, 2011).

(Pesquise na internet a dança do schottish e veja a semelhança com o xote).

Luiz Gonzaga- Xote ecológico https://www.youtube.com/watch?v=XZdr9LpGJcw

Quando falamos em Xaxado, seu nome nos remete diretamente ao bando de Lampião. O termo

‘xaxado’ vem do verbo ‘sachar’, em que agricultores nordestinos faziam o ritmo do xaxado em

suas inchadas quando ‘sachavam’ o feijão e roçavam a vegetação rasteira do nordeste. A dança

do xaxado é muito característica pelas batidas do pé chão fazendo um ritmo percussivo,

arrastando as ´sandálias’ ao embalo do xaxado. Diz a lenda que o bando de lampião quando

invadia alguns vilarejos, batiam suas armas no chão no ritmo do xaxado, o que amedrontava

toda a população. Segundo o percussionista nordestino Eder Rocha, o xaxado é ritmo mais

sincopado e mais rápido que o baião, caracterizado por maiores variações rítmicas e pelo

virtuosismo dos zabumbeiros.

Xote das meninas https://www.youtube.com/watch?v=mtqmDejqTho

Xaxado https://www.youtube.com/watch?v=KoA7Z32ahpM

Gonzaga e Dominguinhos https://www.youtube.com/watch?v=Z91xqCp-kUM

Coco, embolada, repente e aboio

Falaremos aqui de mais quatro importantes gêneros musicais que antecedem a música urbana nordestina e nos remetem ao Brasil profundo, de tantas dores e lutas, refletidas tão lindamente em sua música mais rústica e genuína. A origem do Coco é ligada aos cantos e batidas praticados na colheita e na quebra do coco no Nordeste, tendo como uma de suas principais referências o Quilombo dos Palmares em Alagoas. Entretanto, esse é um gênero encontrado em praticamente todo o Nordeste. Apenas dentro do coco podemos citar mais de 10 diferentes estilos, diferenciados por suas regiões, instrumentações, formas de dançar e cantar. Entre eles podemos citar: o coco de embolada, o coco de roda, o coco de umbigada, coco de repente, coco de engenho, coco de praia, coco de ganzá, o coco de Zambê do RN, entre outros. Dentre suas principais características estão as batidas de palmas na mão, sua dança com as batidas dos pés no chão, e seu canto em pergunta e resposta que retrata de forma encantadora a vida cotidiana nordestina. Sua instrumentação varia de acordo com a região, mas podemos citar o pandeiro e o ganzá como principais instrumentos, podendo haver atabaques (coco de Zambê), batidas dos tamancos no chão (Alagoas e Pernambuco), e até viola, sanfona, triângulo, caixa ou zabumba dependendo de seu contexto. Podemos dizer que o coco também tem certo parentesco com o que veio a ser o samba no RJ, em estilos que precederam a música urbana e que tem suas inter-relações com o coco, como o samba-chula, chula arraiada, maxixe, samba de roda, samba rural, partido alto, samba duro, samba-coco e embolada. Podemos citar como um de seus principais representantes o compositor e interprete Jackson do Pandeiro.

Outras duas fortes tradições nordestinas ligadas ao coco são a Embolada (coco de embolada no pandeiro) e o Repente (mais ligado ao aboio e à viola). A Embolada pode muitas vezes ser considerada um estilo de coco, mas possui suas próprias características, quase sempre havendo improvisação (mas não necessariamente), cantado normalmente em duplas, com muita malícia e senso de humor, aproveitando de situações cotidianas para criarem seus versos. Sua base rítmica é normalmente feita pelo pandeiro com um andamento bem acelerado. Grosso modo é o chamado ‘repente no pandeiro’. Podemos fazer uma comparação da embolada com o RAP, em que dois improvisadores se duelam criando seus versos na hora do desafio. É muito importante ouvir e pesquisar para que você entenda as diferenças e peculiaridades de cada estilo a partir de sua percepção e não apenas do texto escrito. O Repente surge como gênero (muito provavelmente em Teixeira, na Paraíba), a partir da tradição da viola, dos cantos ligados aos aboios, da improvisação e dos versos ligados à literatura de cordel nordestina. O repente tem como instrumento de base a viola, e possui normalmente em seus versos um grande senso de humor e muita criatividade, havendo em outros casos, histórias, rimas e falas que retratam a vida cotidiana do nordestino, sendo usado até para fazer propaganda de lojas ou de políticos locais. Há muitos estilos dentro do repente, como o martelo agalopado ou o galope à beira mar. Vale a pena continuar essa pesquisa e conhecer os diversos tipos de Repente ao redor do Brasil. Para finalizar, podemos citar o Aboio como uma das principais fontes do canto nordestino e também uma das principais influências árabes na música do Brasil. Seu canto dolente, sempre ligado à boiada, a seca e às dificuldades da vida no sertão, lembra o lamento árabe (que também encontrado na música portuguesa e flamenca) com seu canto monocórdico e repetitivo, como um mantra que se repete sem uma forma definida de início, meio e fim. O berrante é um instrumento bastante presente na tradição do Aboio. Vamos ouvir?

• Coco de Roda https://www.youtube.com/watch?v=G1_Bz6yg9Wo

• Coco Alagoano https://www.youtube.com/watch?v=Q871ol8aUKU

• Cantando Coco https://www.youtube.com/watch?v=QvoSOdigkyw

• Improvisação na embolada https://www.youtube.com/watch?v=pPlHMPcJziw

• Repente (martelo agalopado) https://www.youtube.com/watch?v=TEUGOG6HrFM

• Aboio e música árabe https://www.youtube.com/watch?v=lz2WnIr1R5U

2.3 Bahia

Bahia: você já foi a Bahia nega, não? Então vá!

Continuando nossas rotas, pegaremos agora carona nas caravelas de Cabral para aportar nas

terras onde se deu início a história de nosso país: A Bahia.

Existem certos lugares no Brasil onde a tradição africana está muito presente. Certamente a

Bahia é um dos principais deles! Nas comidas, nas roupas, na religião, nos costumes e, sobretudo

na música, a Bahia é um celeiro de tradições afro-brasileiras. Seus blocos afro (como Ilê Ayê,

Filhos de Gandhy, Olodum, Timbalada e tantos outros) e seus inúmeros gêneros musicais e

artistas tão significativos para nossa música brasileira (Caymmi, Gil, Caetano, Gal, Bethânia,

Moraes Moreira, Pepeu Gomes, Armandinho, Margareth Menezes, entre tantos outros)

refletem a riqueza e diversidade desse povo que é uma das matrizes musicais mais importantes

do Brasil. Vejamos um pouco do Samba de roda e do Ijexá que talvez sejam dois dos mais

representativos ritmos baianos e que influenciaram diversos gêneros musicais brasileiros como

o samba e a axé music.

O samba de roda do recôncavo baiano

Um dos mais significativos gêneros musicais da Bahia é sem dúvida o Samba de Roda.

Considerado patrimônio imaterial nacional pelo IPHAN, o samba de roda do recôncavo baiano é

uma das matrizes do que se tornou mais tarde o samba urbano carioca. Ligado, sobretudo à

cultura bantu de Angola, o samba de roda tem ligação direta ao culto dos orixás e também com

a capoeira. Seus principais instrumentos são os mesmos utilizados no ritual de candomblé: 3

atabaques (rum, rumpi e lé), o gan (agogô), xequerê e o ganzá (as vezes pandeiro e até surdo).

O samba de roda do recôncavo também era chamado de samba chula, com seus versos

improvisados e sua dança em meio aos instrumentos e à roda de palmas. Existiam ainda muitas

denominações e estilos dentro do samba de roda, como: samba corrido, a chula raiada, o samba

rural, samba de pernada, samba de viola, samba amarrado, samba duro, samba de kabula, entre

muitos outros. O samba de roda da Bahia influenciou diretamente o samba carioca, sobretudo

o chamado samba de “Partido alto” cantado hoje em dia por artistas como Zeca Pagodinho, Beth

Carvalho, Fundo de Quintal, Dudu Nobre, entre outros. Grupos como É o Tchan e outros do

“pagode baiano”, também tem suas raízes no samba de roda.

Documentário https://www.youtube.com/watch?v=p9h2rydFT_0

Outros vídeos

https://www.youtube.com/watch?v=CSlnL67F4Xk

Doc Samba chula https://www.youtube.com/watch?v=H2Z_5wo7X_s

Ijexá

O ijexá é um gênero que veio diretamente da África Ocidental (cultura Yorubá) e se estabeleceu

no Brasil, sobretudo em Salvador, na Bahia. Inicialmente o Ijexá era tocado dentro dos rituais

do candomblé, mas aos poucos foi tomando as ruas de Salvador nos chamados “Blocos de

Afoxé”. Um dos bloco de afoxé mais representativos atualmente é o “Filhos de Gandhy,” que sai

todo ano pelas ruas durante o carnaval da Bahia. Muitos compositores e interpretes da MPB

incorporaram Ijexás em seu repertório, dentre eles: Dorival Caymmi, Clara Nunes, Vinícius de

Moraes, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Djavan, João Bosco, Margareth Menezes, Daniela

Mercury, Marisa Monte, Maria Bethânia, entre muitos outros. O Ijexá é uma das matrizes do

que se transformou na “Axé Music” da Bahia.

Instrumentos: Assim como no samba de roda, os instrumentos originais do Ijexá são os mesmos usados no candomblé. Existem três principais atabaques: o Rum (grave), o rumpi (médio) e o lé (agudo). Há também um agogô chamado Gan (ou Gã) e uma cabaça com miçangas chamada Agbé os Xequerê.

Curiosidades (letra, ritmo, dança, vestimentas) Os blocos de Afoxé, também chamados de candomblé de rua, como os Filhos de Gandhy, por exemplo, tocam praticamente só Ijexás. Eles saem todos vestidos de branco e cantam em homenagem aos seus orixás. Geralmente um “cantador” entoa a melodia e em seguida todos repetem. As danças afro brasileiras são ainda reminiscências de nossa herança africana no Brasil. Assista abaixo alguns vídeos de músicas e danças no ritmo do IJEXÁ.

Links relacionados ao Ijexá (músicas e vídeos interessantes)

*Curiosidade: há também um

instrumento chamado Afoxé.

• Clara Nunes: Ijexá https://www.youtube.com/watch?v=J3TW7zpwS3A

• Afoxé Filhos de Gandhy https://www.youtube.com/watch?v=9Y-xBSDotpc

https://www.youtube.com/watch?v=5bj_O8S6jhA

• Dorival Caymmi: Promessa de Pescador: https://youtu.be/qMGvIWUiSQ8

• Rita Ribeiro: É D´Oxum: https://www.youtube.com/watch?v=KJyvhFa_U20

• Canto de Oxum: https://www.youtube.com/watch?v=yJIVLsxa8Sw

Vale continuar suas pesquisas sobre a música baiana, estudando seus blocos, ritmos, artistas e

seus diálogos com as diversas culturas que formam esse caldeirão cultural baiano. Podemos

sugerir alguns temas para que você expanda e aprofunde suas pesquisas, como por exemplo: o

Olodum e suas relações com o merengue e o samba reggae (diálogos com ritmos da América

latina), a Timbalada e seu projeto social (ver o instrumento Timbal), o Ile Ayê e suas raízes

africanas (mantendo a tradição da cultura negra na Bahia), Dodô e Osmar e a invenção do trio

elétrico (ver guitarra baiana), Margareth Menezes e a criação da Axé Music, o fenômeno Daniela

Mercury (1989), O grupo ‘É o Tchan’ e a industrialização do samba duro, Ivete e o “pop baiano”,

e tantos outros temas, bandas, estilos, e artistas que hoje povoam o cenário da música da Bahia.

Vamos agora continuar nossas ‘rotas musicais', dando uma pincelada na também riquíssima

música pernambucana, formada pelo encontro das culturas portuguesa, holandesa, africana e

indígena.

______________________________________________________________________

2.4 Pernambuco

Saindo da Bahia e cruzando os estados de Sergipe e Alagoas, nossas rotas musicais aportam

agora em outro importante estado: o Pernambuco. Podemos listar sem pestanejar mais de 10

tradições musicais, blocos e ritmos encontrados nas ruas de Olinda e Recife (como o maracatu,

o frevo, caboclinho, o coco e a Dona Selma do Coco, a ciranda, os blocos Bacalhau do Batata e o

famoso Galo da Madrugada, entre tantos outros). Entretanto, precisamos nos precaver para não

virarmos uma enciclopédia com listas de nomes de gêneros, e sim tentarmos apreciar, conhecer,

ouvir, sentir, cantar, tocar e assim assimilar e se apropriar do conhecimento aqui oferecido.

Vamos começar com talvez os dois mais representativos gêneros musicais de Pernambuco: o

maracatu e o frevo.

O Maracatu

Assim como o ijexá, o maracatu é uma das tradições afro-brasileiras que marcam os primórdios

de nossa música, do qual encontramos relatos desde o século XIX e que continuam ainda hoje

muito presentes em nossa cultura. Tipicamente pernambucano, o maracatu é tocado por alfaias,

gonguês e gans (agogôs), taróis (caixa), agbés (xequerês), variando um pouco sua

instrumentação e seus toques de acordo com cada “nação”. A alfaia e o tarol são instrumentos

que tem sua origem europeia, enquanto o gonguê e o xequerê provem da África ocidental. A

dança e o ritual do maracatu possui uma grande riqueza de significados, simbolizando a

coroação dos reis africanos (rei Congo) em terras brasileiras em contrapartida ao rei branco

português (esse ritual é encontrado também nas congadas em todo o Brasil). Ela possui seus

personagens típicos entre o Porta-Estandarte, as Damas de Paço (que levam a boneca de

madeira chamada Calunga), o Rei, a rainha, as figuras da nobreza, as yabás (baianas), entre

outros. Existem dois tipos básicos de maracatu: 1. Baque virado (maracatu nação) mais típico da

região metropolitana de Recife e, 2. Baque solto (maracatu rural) mais encontrado na zona da

mata de Pernambuco. O maracatu foi estilizado e amplamente divulgado na década de 90 por

Chico Science e Nação Zumbi e mantém suas raízes e sua chama acesa até hoje nas ruas de

Recife e Olinda como sendo uma das mais antigas e tradicionais manifestações musicais do

Brasil.

Vale a pena pesquisar mais a fundo este gênero tão rico e tão presente em nossa cultura,

conhecendo suas peculiaridades, suas “nações”, e seus diferentes estilos.

Links relacionados ao Maracatu

• Maracatu Estrela Brilhante https://www.youtube.com/watch?v=iF4j747M8Hg

• Maracatu Nação Porto Rico https://www.youtube.com/watch?v=FXMNm8sxLfc

• Maracatu: Dança: https://www.youtube.com/watch?v=iF4j747M8Hg

Frevo

O Frevo é um gênero típico do Pernambuco, mais especificamente do Recife e Olinda, e tem

como principal característica os andamentos rápidos e suas melodias bem trabalhadas, e que

são muito exigentes para os músicos que as tocam (TELES, 2000, p.35). Apenas para ilustrar, na

contracapa do livro Do frevo ao Manguebeat, o autor José Teles cita:

Em um depoimento sobre Capiba e Nelson Ferreira, o maestro Guerra

Peixe declarou sobre a complexidade do frevo: ´antes de mais nada o

compositor de frevo tem que ser músico, tem que entender de

orquestração`. Já para o mestre Capiba, o frevo é um dos gêneros da

música popular mais criativos do mundo e, em determinada ocasião,

se baseou nele para compor uma peça para o Quinteto da Filarmônica

de Berlim. Os instrumentistas não conseguiram tocar e responderam:

´infelizmente o senhor escreveu algo muito difícil e rápido demais

para nós` (TELES, 2000, contracapa do livro).

O nome “Frevo” vem provavelmente do verbo ferver, ou da corruptela do termo “fervo” que designa o ritmo quente, alegre e agitado. Existem diversos estilos de frevo, como o Frevo-Canção (com cantor), o Frevo de Rua (instrumental) e o Frevo de Bloco (com violões, cavaquinhos, e coro). O que mais chama atenção é sua dança que provém dos passos da capoeira e utiliza o famoso guarda chuva colorido. Os dançarinos de frevo são verdadeiros acrobatas, pois eles pulam, abaixam, levantam, giram e fazem muitas peripécias com suas sombrinhas coloridas. Tente aprender alguns passos de frevo e veja se você está em forma para acompanhar essa exigente dança. Conheça os passos de frevo como: o Saci-Pererê, o ferrolho, a tesoura, entre muitos outros. Um dos mais importantes Blocos de frevo é o Galo da Madrugada, que mantém viva essa tradição que foi considerada pela UNESCO como Patrimônio Imaterial da Humanidade. Links relacionados Hino do Galo da Madrugada https://www.youtube.com/watch?v=kX7QuO4OrX4 Dança (Frevo) https://www.youtube.com/watch?v=yUzxN5yR8MI Spok Frevo https://www.youtube.com/watch?v=muo6fW2fnwQ Ainda em Pernambuco Caboclinho

Referência à cultura indígena (pajelança). Ligados também ao Candomblé. Culto à Jurema ou Catimbó. Instrumentos típicos: Preaca (arco e flecha), maracás (caracachás), inúbia (flauta), e as vezes atabaques, surdos ou tambores menores e até caixa. Ritmos: Guerra, Baião, Perré, Macumba (atabaque) https://www.youtube.com/watch?v=LvAc_GEzLyc https://www.youtube.com/watch?v=ToTYGXB2eiE https://www.youtube.com/watch?v=J5bUlOm2PRM Ciranda Dança em roda e belas melodias. Lia de Itamaracá https://www.youtube.com/watch?v=URDn8x4uRr0 Cavalo Marinho (zona da mata) É o “pai do frevo” e do maracatu rural, dança típica, rápida e muito alegre. https://www.youtube.com/watch?v=EVOZAf4vucY https://www.youtube.com/watch?v=HkXqvDEJOPc Movimento Armorial Antes de irmos para nossa próxima parada, vale ressaltar ainda em Pernambuco a importância do Movimento Armorial, encabeçado por Ariano Suassuna na década de 70 e que teve tantos frutos não só na música como nas artes e na poesia. Suassuna pretendia criar um movimento artístico-cultural baseado nas tradições populares nordestinas. Conheça o Quinteto Armorial, filho desse grande turbilhão cultural que foi o Movimento Armorial: https://www.youtube.com/watch?v=jZxKKPG2A7c https://www.youtube.com/watch?v=wDC2TJRpF_0 ____________________________________________________________ 2.5 Maranhão Continuando nossas rotas, estamos agora rumando para o Norte do Brasil. Embalados pelo “Cavalo Piancó” do Piauí, chegamos ao Maranhão, outro epicentro cultural do Nordeste. Como dissemos anteriormente, seria impossível aqui falarmos sobre todas as tradições do Maranhão, portanto escolhemos duas das principais: o bumba meu boi e tambor de crioula. Bumba meu boi O bumba meu boi é uma das principais manifestações do Maranhão. É uma encenação ecumênica que retrata perfeitamente as diversas tradições culturais e religiosas do Brasil, como o catolicismo europeu, o candomblé africano e a pajelança indígena. Conta a lenda que “Mãe Catirina” ficou grávida e ficou com desejo de comer a língua do melhor boi da fazenda. “Pai Francisco” foi lá e matou o boi, trazendo a língua que Mãe Catirina tanto queria. Visto isso, o dono da fazenda ficou irado e foi atrás de Pai Francisco. Desesperado, ele pediu ajuda aos santos católicos, aos orixás e aos pajés, os quais, unindo suas forças, fizeram o milagre de ressuscitar o boi.

A riqueza rítmica do boi do Maranhão é algo indescritível. Suas danças, seu colorido e sua riqueza simbólica traduzem o que temos de melhor na cultura brasileira. Existem cinco sotaques (ou estilos) dentro do gênero bumba meu boi, os quais se diferenciam pelo ritmo, pela instrumentação e, sobretudo pelas diferentes regiões do estado. 1. Boi de Matraca e pandeirão (sotaque da Ilha, mais lento, influência indígena, polirritmia 3 contra 2) 2. Boi de Pindaré ou Floresta (sotaque da Baixada, rio Pindaré, personagem Cazumbá, máscara e sininhos de vaca) 3. Boi de orquestra (com sopros, região do rio Munim, mistura de gêneros). Boi da axixá. 4. Boi de Zabumba (mais africano, é muito antigo, localidade: Guimarães, dança com calcanhares) 5. Boi de costa de mão (região litoral oeste do Maranhão, Cururupu, (parece xote), calças de veludo, chapéu de cogumelo, pandeirão pendurado no pescoço) Assista o documentário: https://www.youtube.com/watch?v=5G8gYfk-bBg https://www.youtube.com/watch?v=t_cziTYeoLY Tambor de crioula O tambor de crioula é também uma das mais características manifestações musicais do Maranhão. Vindo diretamente de escravos africanos, seu ritmo é rápido, complexo e contagiante. Normalmente o ritual do Tambor de Crioula são pagamento de promessas a São Benedito e ocorrem durante o ano todo nas ruas de São Luis. A instrumentação básica é feita por três tambores básicos feitos de tronco de árvore escavado e pele de cabra ou de boi; são eles: o tambor grande, o meião e o crivador. Seu canto em perguntas e respostas acompanhado de palmas, a dança das coreiras, com seus passos e umbigadas (punga), e sua complexidade rítmica fazem do tambor de crioula uma das mais autênticas, sofisticadas e belas manifestações musicais do Brasil. https://www.youtube.com/watch?v=RcGSkX5MjEk https://www.youtube.com/watch?v=OBhTBFJDmyo Ainda no Maranhão 1.Tambor de Mina https://www.youtube.com/watch?v=E6oAH-OYvPE https://www.youtube.com/watch?v=9KZ_ieXZxFE (caráter religioso, candomblé/umbanda do Maranhão) 2. Festa do Divino Espírito Santo (caixeras do Divino) https://www.youtube.com/watch?v=o0g6srTle-U https://www.youtube.com/watch?v=0316tq4DZQ4 3. Baralho (bloco) https://www.youtube.com/watch?v=WxHZL4JIutM

4. Cacuriá https://www.youtube.com/watch?v=dos51bOSDlU (sensual, parte profana da Festa do Divino) 5. Bloco tradicional (carnaval) https://www.youtube.com/watch?v=CO9mq8FGLWg https://www.youtube.com/watch?v=F781AQS2Inc (Flavia Bittencourt) 6. Coco https://www.youtube.com/watch?v=wixN4ElCEA8 7. Lelê ou Pela Porco (“samba boi”) https://www.youtube.com/watch?v=cVlZHfyDXts 8. Caroço (Piauí e MA) https://www.youtube.com/watch?v=JxXrF9w10mc 2.6 A música da região Norte Deixando a região Nordeste e entrando um pouco nos mistérios da cultura Amazonense, não podemos de falar sobre a importância da cultura indígena nessa região. Teríamos que dedicar um curso extra apenas para falarmos da diversidade cultural indígena no Brasil. Só para termos uma ideia, quando os portugueses chegaram havia em torno de 5 milhões de indígenas no Brasil; hoje não passam de 800 mil. De 1200 povos fomos para 230. Ainda assim são faladas mais de 150 línguas indígenas no Brasil hoje. Quem disse que o Brasil fala uma língua, está muito enganado. Essa história é muito mal contada e os povos indígenas são até hoje marginalizados e excluídos de nossa sociedade. Veja algumas de nossas línguas originais do Brasil: Tronco Tupi: tupi-guarani, arikém, aweti, juruna, mawé, mondé, puroborá, mundukuru, ramarama, tupari Tronco Macro Jê: bororo, krenak, guató, jê, karajá, maxakali, rikbaksá, ofayé e yatê Alguns instrumentos musicais de índios brasileiros. Os tambores não são muito usados pelas culturas indígenas brasileiras, havendo muitos instrumentos de sopro e de percussão leve, com destaque para o maracá, encontrado em praticamente todas as culturas já que era também um instrumento de cura utilizado pelos pajés.

KWORO KANGO (letra e vídeo) canto dos índios KAYAPÓ https://www.youtube.com/watch?v=TQNMkjnjq-w Doc. https://www.youtube.com/watch?v=n10Wrks2HXI https://www.youtube.com/watch?v=ScaUURAJkC0 Canto https://www.youtube.com/watch?v=zFjxKEOQsc4 Dança do bate pau MT https://www.youtube.com/watch?v=W7A7ELRGWVU https://www.youtube.com/watch?v=7ojK6Bb8Dlw 2.7 A cultura Amazonense e o Boi de Parintins A cultura do Amazonas de modo geral tem por base a cultura indígena, porém sofre muita influência da cultura Nordestina e afro-brasileira. Podemos iniciar falando do boi de Parintins que é um dos maiores espetáculos da cultura brasileira, em que dois principais ‘bois folclóricos’ disputam a melhor apresentação – o Garantido e o Caprichoso. Essa disputa acirrada encanta nossos olhos, pois seguem critérios rígidos a serem analisados, dentre eles: A música (toada): que é tocada por volta de duas horas e meia, acompanhada por um grupo de mais de 400 ritmistas e as letras das canções resgatam o passado de mitos e lendas da floresta amazônica. O ritual dos Bumbás, que assim como no Maranhão, mostra a lenda de Pai Francisco e Mãe Catirina que conseguem, com a ajuda do Pajé, fazer reviver o boi do patrão. O Apresentador marca o centro do espetáculo, conduzindo o tema com sua voz. Precisa ter afinação, dicção, timbre e técnica de canto. O Levantador de toadas que precede à batucada. Todas as músicas que fazem a trilha sonora das apresentações são interpretadas pelo levantador de toadas. Trata-se de uma figura importante, já que a técnica, a força e a beleza de sua interpretação não só valem pontos como ajudam a trazer à tona a emoção dos brincantes. O Amo do Boi, com seu jeito caboclo, exalta a originalidade e a tradição do folclore, fazendo soar o berrante e tirando o verso em grande estilo; outros personagens da festa são: a Sinhazinha da Fazenda que é a filha do dono da fazenda, e precisa ter graça, desenvoltura, simplicidade, alegria, saudando o boi e do público. A Porta Estandarte, que representa o símbolo do Boi em movimento. Ela deverá ter garra, desenvoltura, elegância, alegria, sincronia de movimentos entre o bailado e o estandarte.

A Cunhã Poranga, que representa a moça bonita, uma sacerdotisa, guerreira e guardiã. Expressa a força através da beleza. Deve possuir desenvoltura e incorporar a personagem. A Rainha do Folclore, que representa a expressão do poder, pela manifestação popular. Deve possuir graça, movimentos com desenvoltura, incorporação, indumentária. E por fim o Boi Bumbá Evolução que é o símbolo da manifestação popular. Motivo e razão de ser do festival. Deve ter geometria idêntica, leveza, alegria, evolução, encenação, coreografia e movimentos de um boi real. Como vimos é uma manifestação complexa, cheia de simbolismos, influências e retrata tão lindamente os diversos aspectos de nossa cultura.

• Boi de Parintins: garantido e caprichoso • https://www.youtube.com/watch?v=nd17N_VD7L8 • https://www.youtube.com/watch?v=YQpwWTDVm0I

2.8 Pará Iremos agora para o Pará e falaremos um pouco sobre suas principais manifestações, dentre elas: o carimbó, a guitarrada, a lambada e a música atual paraense (brega/melody). Carimbó Como nas diversas culturas amazonenses, o Carimbó tem como base a cultura indígena visto que é originalmente uma dança de roda e suas letras refletem diretamente essa influência, muito ligada à natureza, à pesca e ao plantio. Entretanto, já é uma manifestação miscigenada com as tradições africanas, dada a sensualidade e complexidade rítmica, e também com a cultura europeia, que trouxe os instrumentos de cordas e sopro presentes no Carimbó, sendo chamado também de “pau e corda” ou siriá. O carimbó originalmente é tocado em um tambor chamado curimbó, entretanto passou pelo processo de “industrialização” sendo criado também o carimbó urbano, com o uso de guitarra, bateria e teclados eletrônicos. O Carimbó influenciou diretamente na criação de outros gêneros ligados a cultura paraense, como a lambada, a guitarrada e o calipso. É interessante notar os diálogos com outras músicas da América latina, sobretudo do Caribe, como a cumbia, o calipso, o merengue e o reggae da Jamaica. ‘Dona Maria que dança é essa, que a gente dança só, Dona Maria que dança é essa, é Carimbó é Carimbó’. Doc Carimbó https://www.youtube.com/watch?v=yNSHKqbgW84 https://www.youtube.com/watch?v=3tRbQd2i-ow Guitarrada https://www.youtube.com/watch?v=dAv4gwoPmxo Lambada https://www.youtube.com/watch?v=csaUvkYOkLY O “Brega” e o Melody (tecno brega e tecno melody)

https://www.youtube.com/watch?v=2K5uyhPWS7E 2.9 Outras manifestações da região Norte Gambá de Mauê (pai do carimbo) https://www.youtube.com/watch?v=6vdDbYgLD44 https://www.youtube.com/watch?v=Eed-mF-DQSU Marabaixo (Amapá – Macapá) Comunidade Curiaú Ligação com o forte de Mazagão no Marrocos- história muito interessante https://www.youtube.com/watch?v=4nQJxpQs0x4