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Artigo de revisão ETIOPATOGENIA DO ANEURISMA DE AORTA ABDOMINAL. Orlando Caetano Júnior * Ricardo Soffiatti Mesquita Oli'veira * Paulo Eduardo' Giannini Braga ** Wolfgang Gunther Wilhelm Zorn *** Bonno van Bellen **** Múltiplas são as teorias que tentam explicar a etiopa - togenia do aneurisma aterosclerótico de aorta abdominal . Seu surgimento ocorreu, na maioria das vezes, de forma independente. Este fenômeno favoreceu a interpretação isolada dos diferentes conceitos. Ultimamente , no entan- to , a tendência cada vez maior é considerar que a causa do estabelecimento da dilatação aneurismática da aorta abdo- minal se deve a um conjunto de fatores , baseada na apre - ciação de todas as teorias até agora elaboradas. A teoria biomecânica se apoia no fato que a aorta in - fra-renal mostra afilamento gradual de sua luz, é mais rigi- da em relação à torácica e é mais sujeita à influência das ondas de reflexão provenientes dos seus ramos. Além dis- so, tem menor número de lamelas elásticas na camada mé- dia e irrigação inadequada pela vasa-vasorum. É provável que a própria doença aterosclerótica possa comprometer a nutrição da parede do vaso por dificultar sua embebição a partir da luz. Apesar do seu comportamento ser regido pela Lei de Laplace , a estabilidade do aneurisma pode ser exp li- cada pelo recrutamento de fibras colágenas, pelo enrijeci - mento progressivo da parede e pela mudança da forma geométrica. Os trombos murais e o músculo liso desempe - nham papel irrelevante no fenômeno de crescimento e ro - tura do aneurisma. A teoria dos metais - traço se baseia principalmente nas evidências clinicas e experimentais da . relação entre os distúrbios do metabolismo do cobre e os' aneurismas. A teoria genética se baseia no fato de haver predisposição familiar para o aneurisma da aorta abdomi - nal. O aneurisma familiar tem incidência quase 12 vezes maior nos parentes de primeiro grau e taxa de rotura qua- tro vezes maior, sendo essas caracteristicas mais marcan- tes quando ocorrem no sexo feminino. A teoria proteolitica sugere a possibilidade de o aneurisma de aorta abdominal ser conseqüência do balanço entre proteólise e antiproteó- , lise, apesar dos achados de diminuição dos níveis de colá- geno e elas tina na parede aórtica não terem sido evidencia - dos como sendo primários. Os principais fatores de risco , a hipertensão arterial e o tabagismo, provavelmente interfe - rem do ponto de vista mecânico e metabólico . Finalizando, o aneurisma de aorta abdominal provavelmente se deve à associação do desequilíbrio do balanço proteólise versus antiproteólise, da predisposição genética e da predisposi- ção estrutural e hemodinâmica do setor aorto-ilíaco. A hi - pertensão e o tabagismo atuam como fatores multiplicado - res . Unitermos: Aorta, aneurisma, etiologia. Trabalho rea li za do no Hospital São Joaquim da Rea l e Benemérita Sociedade Portuguesa de Beneficência - São Paul o. * Estagiário do Serviço *. A ss iste nte do Serviço .** Responsáve l pe lo Serviço •••• Responsáve l pe lo Serviço Doutor em Medicina pela FMUSP. Liv re·docente em Mol és tia s Vascular es Periféricas pela UN IC AMP. CIR. VASCo ANG . 7(4): 27,34, 1991 INTRODUÇÃO O aneurisma de aorta abdominal (AAA) é uma das principais causas de mortalidade dos pacientes com pato- logia do sistema vascular. Além do mais, é uma entidade relativamente freqüente com a qual se depara o cirurgião vascular. Tem prevalência de 1,8% a 6,6% em estudos de autópsia 49 . Tem -se observado um aume nto na sua Inci- dência nos últimos 30 anos, o que pode ser expliéado pelo aumento real da patologia em função do aumento da lon- gevidade, pelo aumento da capacidade diagnóstica e pelo próprio reconhecimento do problema graças à melhor for- mação profissional 49. Embora importante em decorrência da incidência e dos problemas que a ele se associam, sua etiopatogenia é extremamente controvertida. Até há duas décadas o con- ceito fundamental era de que o fator desencadeante mais importante fosse a arteriosclerose, sendo outras causas as arterites, as infecçõe s, as estenoses da própria artéria, os traumas e as causas congênitas. Os conceitos em relação à etiopatogenia, no entanto, têm mudado em virtude de di- ferenças bioquímicas, patológicas, epidem iológicas, gené- ticas e clínicas que têm "ido encontradas na população de doentes portadores de doença obstrutiva aorto-ilíaca. Vale ressaltar que nunca se conseguiu induz ir o desenvolvi- mento de AAA por dieta aterogênica, experimentalmen- te 12.49.59. Entre os modelos animais existentes para este ti- po de estudo há um relato de AAA induzido no cão e um AAA espontâneo relatado em 730 macacos 59 . Há mode- los experimentais associados com a deficiência de cobre em porcos e aves domésticas e com o latirismo induzido, em aloenxertos e em ratos B1otch y59. O objetivo deste trabalho é rever os conceitos existen- tes sobre a etiopatogenia dos assim chamados AAA ines- pecíficos, ou seja , aque les não associados a causas como lues, síndromes de Menkes e de Marfan, além de outras, de tipo infeccioso e inflamatório. Dos relatos de literatura, pode-se dividir os conceitos em quatro correntes básicas, a saber: biomecânica, metais- traço, genética e proteolítica. Adicionalmente são revisa- dos os principais fatores de risco associados, a hipertensão arterial e o tabagismo. TEORIA BIOMECÂNICA A observação de que as paredes aneurismáticas con- têm menos colágeno e elastina do que as paredes arteriais normais deu origem à teoria biomecânica para tentar ex- plicar a formação e a rotura dos AAAs, visto serem essas fibras as responsáveis pelas propriedades mecânicas das artérias normais 54 . Tais propriedades foram elegantemen- te demonstradas experimentalmente por meio de banhos de colagenase e elastase em artérias de cão e do homem 25.26.27. Observou-se que a diminuição de elastina na arté- ria torna o vaso aneurismático e enrijecido. A elastina foi , portanto, identificada como a responsável pela compla- cência arterial, mantendo suas dimensões em limites nor- mais. A diminuição das fibras de colágeno ocasionou rotu- ra em todos os vasos estudados sendo, portanto, conside- rado o responsável pela resistência tênsil da artéria. Em decorrência dessas observações, alguns aspectos são freqüentemente considerados na literatura. Em pnmelro 27

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Artigo de revisão

ETIOPATOGENIA DO ANEURISMA DE AORTA ABDOMINAL.

Orlando Caetano Júnior * Ricardo Soffiatti Mesquita Oli'veira * Paulo Eduardo' Giannini Braga ** Wolfgang Gunther Wilhelm Zorn *** Bonno van Bellen ****

Múltiplas são as teorias que tentam explicar a etiopa­togenia do aneurisma aterosclerótico de aorta abdominal. Seu surgimento ocorreu, na maioria das vezes, de forma independente. Este fenômeno favoreceu a interpretação isolada dos diferentes conceitos. Ultimamente, no entan­to, a tendência cada vez maior é considerar que a causa do estabelecimento da dilatação aneurismática da aorta abdo­minal se deve a um conjunto de fatores , baseada na apre ­c iação de todas as teorias até agora elaboradas.

A teoria biomecânica se apoia no fato que a aorta in ­fra-renal mostra afilamento gradual de sua luz, é mais rigi­da em relação à torácica e é mais sujeita à influência das ondas de reflexão provenientes dos seus ramos. Além dis­so, tem menor número de lamelas elásticas na camada mé­dia e irrigação inadequada pela vasa-vasorum. É provável que a própria doença aterosclerótica possa comprometer a nutrição da parede do vaso por dificultar sua embebição a partir da luz . Apesar do seu comportamento ser regido pela Lei de Laplace, a estabilidade do aneurisma pode ser expli­cada pelo recrutamento de fibras colágenas, pelo enrijeci­mento progressivo da parede e pela mudança da forma geométrica. Os trombos murais e o músculo liso desempe ­nham papel irrelevante no fenômeno de crescimento e ro ­tura do aneurisma. A teoria dos metais-traço se baseia principalmente nas evidências clinicas e experimentais da . relação entre os distúrbios do metabolismo do cobre e os' aneurismas. A teoria genética se baseia no fato de haver predisposição familiar para o aneurisma da aorta abdomi­nal. O aneurisma familiar tem incidência quase 12 vezes maior nos parentes de primeiro grau e taxa de rotura qua­tro vezes maior, sendo essas caracteristicas mais marcan­tes quando ocorrem no sexo feminino. A teoria proteolitica sugere a possibilidade de o aneurisma de aorta abdominal ser conseqüência do balanço entre proteólise e antiproteó-, lise, apesar dos achados de diminuição dos níveis de colá­geno e elas tina na parede aórtica não terem sido evidencia ­dos como sendo primários. Os principais fatores de risco, a hipertensão arterial e o tabagismo, provavelmente interfe­rem do ponto de vista mecânico e metabólico. Finalizando, o aneurisma de aorta abdominal provavelmente se deve à associação do desequilíbrio do balanço proteólise versus antiproteólise, da predisposição genética e da predisposi­ção estrutural e hemodinâmica do setor aorto-ilíaco. A hi­pertensão e o tabagismo atuam como fatores multiplicado­res .

Unitermos: Aorta, aneurisma, etiologia.

Trabalho realizado no Hospital São Joaquim da Rea l e Benemérita Sociedade Portuguesa de Beneficência - São Paulo.

* Estagiário do Serviço *. Ass istente do Serviço .** Responsável pe lo Serviço

•••• Responsável pe lo Serviço

Doutor em Medicina pela FMUSP. Li vre·docente em Moléstias Vasculares Periféricas pela UN IC AMP.

CIR. VASCo ANG. 7(4): 27,34, 1991

INTRODUÇÃO

O aneurisma de aorta abdominal (AAA) é uma das principais causas de mortalidade dos pacientes com pato­logia do sistema vascular. Além do mais, é uma entidade relativamente freqüente com a qual se depara o cirurgião vascular. Tem prevalência de 1,8% a 6,6% em estudos de autópsia49 . Tem-se observado um aume nto na sua Inci­dência nos últimos 30 anos, o que pode ser expliéado pelo aumento real da patologia em função do aumento da lon­gevidade, pelo aumento da capacidade diagnóstica e pelo próprio reconhecimento do problema graças à melhor for­mação profissional 49.

Embora importante em decorrência da incidência e dos problemas que a ele se associam, sua etiopatogenia é extremamente controvertida. Até há duas décadas o con­ceito fundamental era de que o fator desencadeante mais importante fosse a arteriosclerose, sendo outras causas as arterites, as infecções, as estenoses da própria artéria, os traumas e as causas congênitas. Os conceitos em relação à etiopatogenia, no entanto, têm mudado em virtude de di­ferenças bioquímicas, patológicas, epidemiológicas, gené­ticas e clínicas que têm "ido encontradas na população de doentes portadores de doença obstrutiva aorto-ilíaca. Vale ressaltar que nunca se conseguiu induzir o desenvolvi­mento de AAA por dieta aterogênica, experimentalmen­te 12.49.59. Entre os modelos animais existentes para este ti­po de estudo há um relato de AAA induzido no cão e um AAA espontâneo relatado em 730 macacos59. Há mode­los experimentais associados com a deficiência de cobre em porcos e aves domésticas e com o latirismo induzido, em aloenxertos e em ratos B1otchy59.

O objetivo deste trabalho é rever os conceitos existen­tes sobre a etiopatogenia dos assim chamados AAA ines­pecíficos, ou seja , aqueles não associados a causas como lues, síndromes de Menkes e de Marfan, além de outras, de tipo infeccioso e inflamatório.

Dos relatos de literatura, pode-se dividir os conceitos em quatro correntes básicas, a saber: biomecânica, metais­traço, genética e proteolítica. Adicionalmente são revisa­dos os principais fatores de risco associados, a hipertensão arterial e o tabagismo.

TEORIA BIOMECÂNICA

A observação de que as paredes aneurismáticas con­têm menos colágeno e elastina do que as paredes arteriais normais deu origem à teoria biomecânica para tentar ex­plicar a formação e a rotura dos AAAs, visto serem essas fibras as responsáveis pelas propriedades mecânicas das artérias normais54. Tais propriedades foram elegantemen­te demonstradas experimentalmente por meio de banhos de colagenase e elastase em artérias de cão e do homem 25.26.27. Observou-se que a diminuição de elastina na arté­ria torna o vaso aneurismático e enrijecido. A elastina foi , portanto, identificada como a responsável pela compla­cência arterial, mantendo suas dimensões em limites nor­mais. A diminuição das fibras de colágeno ocasionou rotu­ra em todos os vasos estudados sendo, portanto, conside­rado o responsável pela resistência tênsil da artéria. Em decorrência dessas observações, alguns aspectos são freqüentemente considerados na literatura. Em pnmelro

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Orlando Caetano Júnior e cals.

lugar, como explicar a estabilidade do AAA? Sabe-se que a parede do vaso exerce força circunferencial que se opõe às forças de distensão da pressão. Tais relações são expres­sas pela Lei de Laplace:

T = P.r, onde

T = tensão circunferencial da parede, P = pressão transmural, e r == raio do vaso. Em virtude das possíveis diferenças na espessura da pare­de, esta fórmula pode ser reescrita:

T = P.rlth, onde

th = espessura da parede25 .

Conseqüentemente, a tensão requerida para manutenção do equilíbrío aumenta com o crescimento do raio do vaso e com a diminuição da espessura da parede, dois eventos associados com a dilatação aneurismática. A estabilidade

do aneurisma pode, então, ser explicada por três mecanis­mos, à medida que a dilatação vai ocorrendo. Em primeiro lugar vão sendo recrutadas fibras colágenas ditas "de re­serva", ou seja, aquelas que normalmente não funcionam. Vale lembrar que apenas 7% do colágeno existente é nor­malmente utilizad026 . Em segundo lugar, há enrijecimen­to progressivo da parede 26.54. Em terceiro lugar, a forma geométrica muda porque a dilatação é gradual e com o 'aparecimento de uma forma mais esférica ocorre o apare­cimento de um segundo raio que provê força retrátil adi­cional, diminuindo a tensão sobre a parede. Essa redistri­buição faz com que haja necessidade de somente 50% da tensão usual em cada direção para contrabalançar a força de distensão.

Quanto ao papel dos trombos murais, sabe-se que contribuem muito pouco com as propriedades estáticas da parede do aneurisma. Os trombos agem mecanicamente 'como sangue coagulado, o qual não é compressíve!. Des­sa forma, transmite sem alterações as forças de distensão exercidas pela pressão arterial sobre a parede. Em outras palavras, a presença dos trombos não atua como um fator de diminuição do diâmetro da aorta. Ademais. têm pouca força retrátil, contribuindo muito ponco para a capacida­de tênsil da parede.

Quanto à formação aneurismática propriamente dita. uma série de fatores hemodinâmicos e estruturais pode ser importante na região infra-renal da aorta. que tem algu­mas particularidades em relação a outras regiões arteriais. Sabe-se que a onda de pressão arterial é transformada en­quanto caminha da raiz da aorta até a região femora!. São três os fenômenos que contribuem para essa transforma­ção. A aorta vai se tornando mais afilada à medida que se torna mais caudal, havendo diminuição da área de secção desde a válvula aórtica até a bifurcação. Ademais, à medi­da que progride distalmente, a aorta se torna mais rígida, especialmente depois de entrar no abdome. sendo que a aorta abdominal contém mais colàgeno e menos elastina que a aorta torácica25 . Finalmente. as ondas de pressão da aorta são refletidas pelos vasos periféricos e pelos ramos enquanto progridem distalmente. Essa reflexão. adiciona­da às ondas que estão progredindo. ampliam ' a pressão

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Aneurismas da aorta abdom inal

existente na região aorto-ilio-femoral. Tai\ ol1da~ de Icllc xão são minimizadas quando a soma da úrea de ~ecc~l() d~h artérias iliacas comuns é de 1.1 a 1.2 \e/es a d~l alll'l~l ~1\1

dominai "". o que corresponde no homem a lIllla ~llllaC~-II)

que ocorre na infância precoce. dlmlnuil1llo prog.re~~i\ ~l mente com o decorrer da idade. Pode até ocorrer lIllla di minuição proporcionalmente maior em decorl-êllci~l do el1 -volvimento arteriosclerótico dos óstios das artéri~h iliaGh e mesmo por ocorrerem obstruções mais dlstais(' -. A \OmCl ­tória dos três fatores mencionados aumenta Cl prewl0 si~ ­tólica e diminui discretamente a pressào diastólica. ha\el1 do um maior gradiente de pressão em relação à aorta torú cica, fenômeno que desencadeia um aumento da tensão pulsátil sobre a aorta abdominal. Adicionalmente. parece haver pequena margem de segu­rança nessa região, já que o número de lamelas elásticas em relação à espessura é menor quando comparado à aor­ta de outros mamíferos. Assim, para 0.7 mm de espessura. a aorta humana tem cerca de 30 lamelas enquanto que pa ra a mesma medida muitos mamíferos têm 40 lamelas. re ­sultando em uma tensão média tangencial de 2000 dyn/cm de lamela 13. Provocando-se lesões por esmaga­mento em aorta torácica de porco. que tem aproximada­mente 75 lamelas. demonstrou-se que quando resta va m menos de 40 lamelas intactas ocorria formação de aneu­risma pelo fato da tensão ter passado de 1316 dyn/cm para 4087 dyn/cm de lamela 71.

As especulações sobre o possível papel da placa ate­rosclerótica atrofiando a média na sua formação e lesa ndo lamelas até então intactas têm mantido um lugar nas dis­cussões acerca do assunto -l3. 71.

Além de todos esses fatores. a camada média da aorta humana não é abundantemente suprida por mecanismos nutrientes. Os vasos com menos de 0.5 cm de espessura de parede obtêm sua nutrição por difusão e embebição a par­tir da íntima. Os com mais de 0,5 cm necessitam de vasa­vasorum 25 , de modo que pode ha ver comprometimen to aorta abdominal é muito pouco irrigada por vasa­vasorum15 de modo que. pode haver comprometimento da nutrição da parede quando há dificuldade na difusão pela presença de placas de ateroma. É interessante obser­var, no entanto, que a interrupção experimental da vasa­vasorum não leva à formação de aneurismas. mas sim à necrose da média 3-u1 .

O papel da musculatura lisa da parede é muito pouco importante, uma vez que sua rigidez não é maior que a da elastina e também porque as fibras musculares ocupam so­mente uma pequena porção do volume total da parede das grandes artérias, por isso mesmo chamadas de "artérias elásticas". Não se pode deixar de mencionar, entretanto. que alguns autores consideram que a resistência tênsil da artéria é dada pelo conjunto fascicular músculo-elástico e não apenas pelas lamelas, deixando o tema bastante con­troverso l3 . Além disso, sua atividade sintética pode ser im ­portante, visto que as células musculares lisas são essen­ciais para o processo reparativo das artérias. As oscilações oscilatórias fisiológicas estimulam as células musculares li ­sas a sintetizarem colágeno e elastina25 No entanto. o AAA é extremamente rígido. exibindo poucas oscilações deformativas54 . ConseqUentemellle. há diminuição da atividade sintética das células musculares lisas e. por isso. diminuição da capacidade de regeneração.

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Orlando Caetano Júnior e cols.

TEORIA DOS METAIS-TRAÇO

Há tempos se sabe que os distúrbios do metabolismo do cobre podem levar a lesões arteriais21.47, mas o papel dos oligoelementos na etiopatogenia do AAA foi aventa­do com base em duas publicações que descrevem uma va­riedade de ratos com uma mutação nos alelos do cromos- ' somo X (lows Mottled), que cursa com aneurisma da aor­ta espontâneo l ,15. A base do distúrbio se situa na deficiên­cia do cobre, que por sua vez é um importante cofator da lisil oxidase, enzima responsável pelo primeiro passo nas

. ligações de colágeno e da elastina53, através da formação de aldeídos derivados de resíduos da lisina. Esses ratos cos­tumam apresentar também a pele friável e hiperextensí­vel. A síndrome de Menkes, um distúrbio genético cuja base é a má-absorção gastro-intestinal de cobre, também evolui com dano arterial, além de doença cerebral progres­siva, alterações ósseas, pêlos tortos, hipotermia, hipotonia muscular e fácies catacterístic023. Outro relato mostra que a indução experimental de enfisema pulmonar através de dieta deficíente em cobre gera AAA48.

Frente a essas evidências e ao achado de diminuição dos níveis de cobre hepático em uma série de pacientes ,com AAA em autópsia51í, foi sugerido que as alterações do metabolismo do co1)re, notadamente sua diminuição, po­deriam ser importantes na etiopatogenia do AAA. Refor­ça essa teoria o aChado de diminuição de cobre também na pele dos portadores de AAA 61.

A questão, no entanto, foi abalada por três publi­cações. Encontrou-se aumento de cobre na pele e no fíga­J059, níveis normais de cobre no fígado e em fragmentos de aorta aneurismática e diminuição de zinco, além de di­versas diferenças entre os aneurismas do rato Blotchy e os IAAAs52 e cobre normal e aumento de ferr0 29.

TEORIA GENÉTICA

O possível papel da herança na etiopatogenia do AAA foi inicialmente aventado pela descrição, em 1977, de três irmãos portadores de AAA 14. Novas sugestões fQ­ram dadas por estudos sobre a arteriomegalia generaliza­da, uma entidade clínica ainda não bem conhecida, de ca­ráter progressivo e que predispõe ~à formação de aneuris­mas que caracteristicamente são múltipos e ocorrem na aorta abdominal em mais de,90% dos casos35 ,60.

Em dois trabalhos conseguiu-se reunir 50 famílias com dois ou mais membros, parentes em primeiro grau , portadores de AAA64,65. Outro estudo, feito através de questionário, relata em 92 pacientes a ocorrência de aneurismas "familiares" rotos46 . Desses estudos conclui-se pela existência de predisposição familiar na patologia, com três possíveis padrões de herança: ligado ao cromossomo X, multifatorial e autossômico dominante. Em um peque­no relato de cinco familias com parentes em primeiro grau com AAA, é mostrada e discutida a herança como partici­pante de outras teorias etiopatogênicas66 .

Um estudo prospectivo, publicado em 1986, confirma a presença de predisposição genética; mostrando aumento do risco relativo para idade e sexo de 11,6 vezes em pes­soas com um parente de primeiro grau afetado por AAA38. Outro estudo mostra que a idé\de e o sexo são im­portantes para o desenvolvimento de AAA, mas não são

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Aneurismas da aorta abdominal

fatores exclusivos, encontrando 69% de acometimento em pessoas cuja mãe era portadora de AAAI'!. Estudos que realizaram rastreamento ou ultra-sonografia abdo­minal encontraram incidência de 29% de aneurismas "fa­miliares", com índice de rotura quatro vezes maior nessas famílias em relação ao grupo controle (0,8% contra 3% em homens e 0,2% contra 2% em mulheres)20.

Outro estudo encontrou 3,4% de AAA rôto em aneu­rismas "familiares", contra 0,17% encontrados em estu­dos de autópsia46. Um estudo prospectivo de aneurismas "familiares" observa incidência de 15,1 % (1,8 % no grupo controle), com 35% em mulheres (14% no grupo contro­le) e índice de rotura de 40,7% . O maior risco foi encon­trado na associação desses aneurismas com o sexo femini­no, que responde por uma taxa de rotura de 63%2-1,

Outros estudos tentaram também estabelecer corre­lações genéticas. Em um deles sugeriu-se maior incidência do grupo sangüíneo A nos portadores de AAA42 e há uma citação de maior incidência no tipo Rh negativ049. Esses dados, entretanto, não foram confirmados, não tendo sido l "lcontrado, em estudos ulteriores, diferenças de incidên­cia com relação ao grupo sangüíneo ABO. Observou-se, in clusive, menor incidência do grupo Rh negativo e aumen­to dos grupos Kell e MN, de modo que nada ficou definiti­vamente afirmado a respeit044. Também a freqüênc ia do tipo Hp 2-1 de haptoglobina foi encontrada aumentada em portadores de AAA45.

Sob o ponto de vista da teoria genética, existe uma su­gestão de que o AAA possa ser uma forma de doença do tecido conectivo. Uma nova ligação de aminoácido, um deoxianálogo da piridinolina59, descrito em níveis eleva­dos na pele de portadores de AAA, pode estar relacionada com tal tipo de doença63. Apesar disso, não houve evidên­cia de mutação na estrutura primária do colágeno, poden­do haver subgrupos de AAA de acordo com o defeito en­contrado. Os achados apoiam a existência de uma teoria proteolítica, já que o colágeno purificado da pele dos por­tadores de AAA tende à auto-digestão "in vitro"63. Um es­tudo histoquímico sugere que o AAA surge por defeito da maturação do colágeno e da elastina, com vários tipos de anormalidade molecular, à semelhança da osteogênese im­perfeita, à síndrome de Ehler-Danlos e outras58,

TEORIA PROTEOLÍTICA

Uma série de trabalhos chamou a atenção para a pre­sença de enzimas proteolíticas em portadores de AAA, A primeira preferência foi feita em 1970, quando se eviden­ciou a presença indireta de proteólise pelos achados de di­minuição da taxa relativa de colágeno e elastina, sem alte­ração de suas taxas totais. Esses achados foram interpreta­dos como decorrentes de diluição pelo processo degenera­tivo 54.

Em 1980, em estudo de uma série de pacientes com AAA que rompeu após terem sido submetidos a laparoto­mia por algum outro motivo, sugere-se que haveria um aumento na atividade colagenolítica sistêmica desenca­deada pelo trauma da cirurgia e que esta seria a responsá­vel pelo desencadeamento do processo de rotura 55. No mesmo ano foi detectada pela primeira vez a atividade da colagenase em portadores de AAA, sendo correlacionada diretamente com o tamanho do aneurisma e inversamente

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Orlando Caetano Júnior e cals.

à quantidade proporcional existente de colágeno 6. É inte· ressante observar que não ficou demonstrado que essa en· zima seja a colagenase. Por definição, a colagenase dos mamíferos libera produtos de clivagem com um quarto e três quartos de comprimento da molécula tri·helicoidal, o que não foi encontrado no estud033.

Em 1982 encontrou·se um aumento da atividade ce elastase7. Face a esses achados, é introduzido o conceito da existência de um inibidor enzimático que em sua fun· ção normal impediria a formação aneurismática. Nó mes· mo ano demonstrou-se aumento da atividade da elastase sem diferenças significativas na alfa·l·antiprotease (alfa-l·antitripsina) e na alfa-2-macroglobulina (as princi· pais anti-proteases dos mamíferos) e pela primeira vez cor· relacionando estas alterações com o tabagismo, que pode· ria induzir a elastólise anormaJlo. Da mesma maneira, em 1983 demonstra· se a presença de um inibidor da colagena­se na pele, similar ou idêntico ao encontI'àdo em diversos outros tecidos, sendo sugerida a sua possível modulação na atividade proteolítica68.

Em 1985 foi descrita uma protease de origem não leu­cocitária, aumentada em pacientes com AAA e que até hoje não foi identificada5. A partir daí, novos trabalhos mostram alterações de enzimas e/ou antiproteases correla­cionadas com AAA e surge o problema da origém dessas enzimas pela demonstração da atividade de elastase pano creática, proporcional ao tamanho do aneurisma 30. Outro trabalho mostra diminuição da elastina e aumento da ati· vidade de elastase, concluindo ser a enzima de origem leu· cocitária, mas atribuindo o aumento da atividade a enzi· ma de outra origem, sem atividade sérica. Adicionalmen­te, encontrou·se uma enzima no extrato de uréia 2M, não sérica, sem atividade imunológica cruzada com a elastase leucocitária e com 67% de inibição por EDT A, o que suo gere ser a enzima uma metaloprotease8. Existe a possibili· dade desta enzima ser aquela encontrada e não identifica­da em estudo anteriormente mencionad05. Em outro tra· balho, foi encontrado aumento da atividade de elastase e tripsinogênio, mostrando que sua origem é pancreática e está ligada ao tabagism031 . Adicionalmente é demonstra· da maior atividade enzimática na parede arterial, princi· palmente no terço médio e externo da camada média e na adventícia.

'Em relação aos AAAs rôtos, um dos relatos conclui que a colagenase só é ativada pela lesão aórtica direta, não tendo alterações induzidas por traumas locais e distan­tes l7, ao contrário do sugerido pelo relato a respeit055.

Outro estudo demonstrou atividade sérica da elastase com diminuição dos níveis de alfa-l-antitripsina somente em AAAs rôtos e em tabagistas l6 . Além desse relato, opa· pel da elastase em AAAs rôtosfoi também estudado em outros dois trabalhos. Um deles mostra que, precedendo a rotura do aneurisma, há aumento da síntese e secreção da colagenase, reafirmando também o papel da elastase na di­latação arterial 41. Outro mostra aumento da atividade de elastase no trauma aórtico local e à distância, sendo que o aumento da colagenase aórtica só ocorreu no dano aórtico direto l8.

Outra enzima possivelmente relacionada com a etio­patogenia do AAA é a lisil oxidase, importante nas li­gações do colágeno e elastina. Trabalhos experimentais sugerem que o propanolol pode ter um papel importante

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Aneurismas da aorta abdominal

na diminuição da taxa de crescimento de AAA, indepen· dentemente de seu efeito hemodinãmico, pelo estímulo da atividade da lisil·oxidase, que aumentaria a resistência tên· sil do aneurisma3.4.39.

Outro aspecto a ser mencionado é o papel do TIMP (tissue inhibitor of metalloprotease), fisiologicamente res· ponsável pela inibição da colagenase, gelatinase e proteo· glicanase ll . Há dados que sugerem que 10% dos AAAs têm deficiência do fenótipo alelo da alfa·l-antitripsina, o que permitiria excessiva elastólise49. A diminuição da ati· vidade da alfa· l·antitripsina seria causada por defeito da elastina ou super·produção de elastase ou inibição inade· quada da elastólise. Considerando essa última hipótese, conseguiu-se demonstrar que a diminuição da atividade do TIMP aumenta a proteólise49. Outra evidência de seu papel localiza o gene TIMP no cromossomo X e o correia· ciona com outras síndromes conhecidas cujos genes res· ponsáveis estão próximos ao do TIMP, como a síndrome de Menkes 23,36, colocando o AAA como um distúrbio do tecido conectivo de causa genética. Em apoio a essa suges­tão demonstrou·se a presença de um inibidor de metalo· proteases na pele de alguns pacientes com AAA57. O dis· túrbio do tecido conectivo seria semelhante à síndrome de Ehlers-Danlos tipo IV, na qual há diminuição do colágeno tipo III, com tendência à formação de aneurismas52. Ou· tra hipótese aventada .é que haveria falha primária do co­lágeno pela diminuição do TIMP e, sendo que a resistên· cia tênsil se localiza principalmente na adventícia, onde se encontra a maior proporção de colágeno, haveria falha se­cundária da elastina com conseqüente formação .aneuris­mática62.

FATORES DE RISCO

Como citado por Hammond, os fatores mais comu­mente associados ao AAA são o tabagismo e a hiperten­são arterial sistêmica49.

A associação do AAA com a hipertensão arterial leva a uma taxa acumulativa de rotura de 72%, significativa· mente maior que em pacientes não hipertensos49, sendo o AAA oito vezes mais freqüente em tabagistas que em não tabagistas2. Analisando o papel das variáveis associadas à rotura de AAAs pequenos, definiu·se como principal fator de risco a presença de doença pulmonar obstrutiva crôni· ca, independentemente do tabagismo, sendo outros fato· res a pressão arterial diastólica e o diâmetro ântero· posterior inicial do aneurisma22. A hipertensão arterial agiria na expansão.e rotura pela Lei de Laplace (T = P.r) , sendo que outras medidas hemodinâmicas, como o débito cardíaco e a força de contração ventricular (dp/dt) podem ter também um papel importante39. Além das proprieda· des hemodinâmicas, a hipertensão arterial conduz a um aumento do metabolismo proteico, com aumento da ativi· dade da elastase, colagenase e catepsina D, entre outras69.

Com relação ao tabagismo, este pode agir de diversas maneiras. Primeiro, diminuindo a atividade da lisil oxida· se. Segundo,-diminuindo as ligações da elastina. Terceiro, aumentando as relações entre a elastase e a elastina. E, fi­nalmente, inativando inibidores da elastase, por exemplo a alfa-l-antitripsina37, sendo então encarado no contexto de doença sistêmica, levando a aumento da proteólise e po· dendo ter a mesma atuação no enfisema pulmonar37 e em

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hérnias inguinais9, que têm sua incidência aumentada em portadores de AAA. Diversos relatos correlacionam o au· mento de enzimas induzido pelo tabagismoIU ~~3U3U~.4U

DISC USSÃO

Do exposto notam·se determinados problemas ainda sem solução e a falta de concordância da literatura em al ­guns dos aspectos estudados.

A teoria biomecânica perdeu seu lugar como explica­ção única para o desenvolvimento do AAA. tendo. apesar

. disso, aspectos que traduzem a sua importância . Dentre esses são importantes os que explicam a presença de aneu· rismas íntegros na prática clínica, ou seja, os conceitos de

. reserva de colágeno. do enrijecimento arterial e da dilata­ção gradual com mudança da forma aneurismática. Salienta-se também que os trombos murais nâo têm efeti­vidade na proteção à rotura, ao contrário do que se imagi­nava. São também importantes os fatores que tornam a aorta infra·renal sujeita a maior tensão pulsát iL ou seja. o afilamento gradativo da artéria , sua relati va rigidez e a existência das ondas de reflexão. Desempenham papel imo

'portante o número diminuído de lamelas elást icas e a pro­porção de vasa-vasorum. Entende·se a aterosclerose não como fator principal, mas sim como amplificador daquelas particularidades, aumentando o efeito das ondas de refle· xão e comprometendo lamelas elásticas. No que diz res· peito ao músculo liso, há controvérsia quanto ao seu papel na estabilidade do AAA. Deve-se frisar seu possível papel como indutor da formação do AAA pela diminuição de sua atividade de síntese.

A teoria dos metais-traço, dtscrita a partir de mode· los experimentais de aneurismas e distúrbios genéticos. se apresenta centralizada no cobre, cuja deficiência permiti · ria o enfraquecimento da parede da aorta. Se os primeiros relatos apoiam essa teoria, outros demonstraram eÀistir ní­veis normais ou mesmo aumentados desse metal. Adicio­nalmente, foram encontradas alterações de outros metais. isoladamente e sem aparente correlação etiopatogên ica com o AAA. A conclusão é que até agora há uma apa ren te coincidência de alterações encontradas. sem correlaçãD inequívoca com o AAA.

A teoria genética surgiu em virtude da ocorrência dos chamados aneurismas "familiares'~ os quais. afe tando pelo menos um parente de primeiro grau de um portador de AAA, podem ser definidos como um subgrupo espec ial. com uma incidência muito mais elevada de AAA que o es­perado para a população normal e com taxa de rotura também mais elevada. Os estudos a esse respeito defini­ram uma clara predisposição genética da doença, faltando ainda a definição do principal padrão de herança. ligado ao X, multifatorial ou autossômico dominante. já que ne­nhum desses, isoladamente, pode explicar todas as va­riações encontradas na prática clínica. Não foi encontrada qualquer correlação consistente com respeito aos grupos sangüíneos e os antígenos HLA .

A teoria proteolítica ganhou importância a partir de observações de aumento de atividade de colagenase e de elastase em portadores de AAA, tanto íntegros quanto ro­tos. Achados de alterações de níveis de enzimas do sistema proteolítico foram correlacionados com o aumento da ati· vidade das colagenases e elastases, surgindo o conceito da

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presença de fatores agressores e 1atores de defesa (protease x antiproteasel. cujo equilíbrio em favor dos fatores agres­sores seria o indutor do AAA. então doença sistêmica. Quanto ao fator traumático predisposto à rotura do AAA, parece que apenas o dano aórtico direto poderia levar a al­terações importantes dos níveis de colagenase. Também as alterações da elastase poderiam ser correlacionadas com a expansão do aneurisma . São necessários, no entanto, estu­dos adicionais para concluir se realmente há aumento da incidência de rotura nessas situações. O papel da lisil oxi­dase também precisa ser melhor esclarecido com estudos adicionais, já que por sua referência indireta não é possí· vel definir a sua atuação, observação válida também para

l O TlMP. Há necessidade de definição, em primeiro lugar, da ordem das enzimas implicadas. Basta lembrar de que a elastase pode provir de leucóticos, macrófagos, células si noviais, baço, pâncreas. plaquetas, fibroblastos e múscu· lo liso I5.31. Em segundo lugar, é necessário definir sua na­tureza bioquímica 5. 15.30.62. E, o mais importante. se a par· ticipação é primária ou secundária em relação à instalação do a"leurisma. O único relato que tenta responder a essa questão descreve aumento da atividade de colagenase coincidindo com o início da formação de aneurismas expe­rimentalmente induzidos. Mas, como as características he­modinâmicas são as que foram responsáveis pela dilata­ção. os achados das alterações enzimáticas são considera­dos secundários à mesma 70.

Quanto aos fatores de risco, os estudos demonstram que sua participação é inequívoca, atuando como coadju­vantes das alterações já descritas, principalmente na hipó­tese protease x antiprotease, pelo aumento da proteólise. A hipertensão age também pelas suas conseqüências he­modinâmicas.

Concluindo. o AAA é uma entidade mórbida de ori­gem multifatorial de causas desconhecidas. Há sugestões de que seu desenvolvimento se deve a pelo menos três even­tos que atuam com interdependência: o desequilíbrio en­tre proteólise e ant iproteólise, a predisposição genética e a predisposição estru tural e hemodinâmica do setor aorto­ilíaco. Acres~em-se a estes os fatores de risco, a hiperten­são arterial e o tabagismo, que multiplicam direta ou indi­retamente os efeitos dos eventos.

SUMMARY

ETlOPATHOGENESIS OF ABDOMINAL AORTlC ANEURYSMS

The etiology of the atherosclerotic abdominal aortic aneurysm is still controversial. Different theories develo ­ped in independent ways. Probably therefore the different concepts developed independently, and were not conside­red together to explain the different aspects of the etiology of this peculiar vascular pathology. Recently a tendency appeared to try to put together the different theories since it became clear that etiology of the aneurysm could not be explained by a single idea . The biomecanical is based upon the fact that the infra -renal abdominal aorta has a tapered fashion, is more rigid than the thoracic aorta and is more prone to suffer the influence of the reflection waves cau­sed by the branches. It has also fewer elastic lamelae in its wall and fewer vessels arising from its vasa vasorum. It

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seems possible that the atherosclerotic disease contribu­tes to impair the nutrition of the vessel wall. Although the growing rate of an aneurysm is determined by Laplace's law, the ultima te stability of the aneurysm can be explai­ned by recruitment ofcollagen fibers, by the progressive ri­gidity of the wall and by the modification of the geometry of the wall. Mural trombi a'1d smooth muscle fibers do add very little to the wall strength . Th~ theory of the ínfluence of metaIs in the development of the aneurysm is based upon the clinicaI and experimental evidences of a partici­pation of the copper metabolism upon the development of aneurysms of the aorta. The genetic theory is based upon the fact that there is probably a familiar tendency for the appearance by an aoftic aneurysms. The proteolytic theory explains the aneurysm by an imbalance between proteoly­sis and anti-proteolysis although the findings of diminish­ment of elastin and collagen in th~ aortic wall were not considered to be primary. The most important risc factors such as hipertension and cigarette smoking do probably act as mechanical and metobolic factors. It is very likely that the abdominal aortic aneurysm should be explained by an association of a proteolytic and anti-proteolytic imba­lance, a genetic predisposition, a structural pedisposition and hemodynamic factors related to the aorto-iliac geo­metry. Hypertension and cigarette smoking do act as wor­sening factors.

Uniterms: Aorta, aneurism, ethiology

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