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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA & URBANISMO CURSO DE ARQUITETURA & URBANISMO
_____________________________
CONDOMÍNIOS FECHADOS E A REDEFINIÇÃO DAS RELAÇÕES
SOCIOESPACIAIS NO ESPAÇO URBANO
Um estudo de caso na cidade de Natal/RN.
Volume 01
_____________________________
Gabriela Fernandes Neves Luciano de Azevedo
NATAL, DEZEMBRO DE 2014.
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA & URBANISMO CURSO DE ARQUITETURA & URBANISMO
_____________________________
CONDOMÍNIOS FECHADOS E A REDEFINIÇÃO DAS RELAÇÕES
SOCIOESPACIAIS NO ESPAÇO URBANO
Um estudo de caso na cidade de Natal/RN.
Volume 01
_____________________________
Gabriela Fernandes Neves Luciano de Azevedo
Monografia apresentada ao Curso de Arquitetura &
Urbanismo da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte como requisito parcial para obtenção do grau de
Bacharelado. Orientadora: Ruth Maria da Costa Ataíde.
NATAL, DEZEMBRO DE 2014.
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA & URBANISMO CURSO DE ARQUITETURA & URBANISMO
FOLHA DE APROVAÇÃO
A monografia de graduação: “Condomínios Fechados e a Redefinição e a
redefinição das relações socioespaciais no Espaço Urbano: Um estudo de caso
na cidade de Natal/RN”, apresentada por Gabriela Fernandes Neves Luciano de
Azevedo, foi aprovada e aceita como requisito parcial para a obtenção do título
de graduação no curso de Arquitetura & Urbanismo, do Departamento de
Arquitetura & Urbanismo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, pela
seguinte banca examinadora:
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________________________
RUTH MARIA DA COSTA ATAIDE - UFRN Orientador
_____________________________________________________
MARIA DULCE PICANCO BENTES SOBRINHA - UFRN Examinador Interno
_____________________________________________________
TAMMS MARIA DA CONCEIÇÃO MORAIS - UFRN Examinador Externo
NATAL, 28/11/2014.
Catalogação da Publicação na Fonte. Universidade Federal do Rio Grande do
Norte / Biblioteca Setorial de Arquitetura.
Azevedo, Gabriela Fernandes Neves Luciano de.
Condomínios fechados e a redefinição das relações socioespaciais no
espaço urbano: um estudo de caso na cidade de Natal-RN/ Gabriela Fernandes Neves Luciano de Azevedo. – Natal, RN, 2014.
150f. : il.
Orientador: Ruth Maria da Costa Ataide.
Monografia (Graduação) – Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. Centro de Tecnologia. Departamento de Arquitetura.
1. Habitação – Arquitetura – Monografia. 2. Condomínios Fechados –
Natal-RN – Monografia. 3. Condomínios horizontais – Monografia.
4. Segregação Socioespacial – Monografia. 5. Morfologia – Desempenho
urbano – Monografia. I. Ataide, Ruth Maria da Costa. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.
RN/UF/BSE15 CDU 728.1
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AGRADECIMENTOS
Agradeço em primeiro lugar ao meu pai, Luís Fernando, por ser meu maior incentivador
e por acreditar e participar de todos os meus maiores desafios.
A minha família que durante toda a minha graduação me apoiou e foi essencial nesta
conquista. Meu sincero obrigada ao meu querido irmão Igor Azevedo, a minha mãe,
Jacqueline Pessanha, minha vó Julieta Fernandes e minha irmã Júlia Schiavon.
A minha orientadora Ruth Ataíde, por ter sido minha referência durante todo o curso
enquanto urbanista e educadora. É imensurável sua contribuição, tendo em conta que
com ela descobri os caminhos da pesquisa acadêmica e do amor ao urbanismo.
Ao meu namorado Rílliam Costa, por ter sido meu companheiro durante o
desenvolvimento desta monografia e ter me ensinado tanto em tão pouco tempo.
A professora Dulce Bentes que orientou meus primeiros esforços para entender o tema
“Condomínhos Fechados, Segregação Urbana e Sociabilidade”, participou com valiosas
colocações na Pré-Banca e sempre me incentivou e acreditou em mim.
A doutoranda Tamms Morais pelo cuidado e empenho com que se debruçou sobre este
TFG enquanto avaliadora externa, contribuindo para a qualidade final desta monografia.
Ao professor Petrus Nóbrega, pelas conversas sobre os futuros acadêmicos e
profissionais a seguir, papel importante que me ajudou a entender um pouco mais sobre
os caminhos da vida e me deu forças para seguir.
A UFRN pela educação pública de qualidade, que contribuiu imensamente com meus
conhecimentos e crescimento enquanto estudante.
Ao CNPq pela bolsa do Ciência sem Fronteiras, quando morei e estudei Arquitectura por
um ano acadêmico em Madrid-ES na Universidad Politécnica de Madrid. Este foi o
período mais rico da minha vida em aprendizado, tanto acadêmico quanto pessoal.
A amiga Fernanda Bernava, por ter compartilhado este ano de intercâmbio comigo, e
por todos os momentos que compartilhamos na Europa.
A amiga Jeniffer Chung, por ser tão importante em todas as etapas da minha vida.
A Lanah Han, Debora Cornetta e Stefanny Lyra pela amizade sincera e companheirismo.
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RESUMO
Produto de um processo de urbanização complexo e cheio de contradições, o espaço urbano sofre constantes transformações. Fruto de tensões sociais e jogo de interesses entre classes, a ocupação desigual é uma das características intrínsecas a cidade, que reflete espacialmente uma segmentação social na urbe. A segregação existe desde os primórdios porém vem se modificando ao longo dos anos, e atualmente apresenta novas configurações, com a crescente implementação de novas tipologias chamadas “enclaves fortificados”. Dentre estes empreendimentos destaca-se os condomínios fechados, tema desta monografia atrelados à segregação intrínseca à sua reprodução e consequente influência na urbanidade da área. Desenvolvido sob a perspectiva teórico-conceitual, este trabalho aborda temas como: condomínios fechados e suas origens, segregação socioespacial, e sociabilidade. Todo o referencial Teórico-metodológico é voltado para atender ao objetivo de caracterizar o padrão de sociabilidade existente na área, relacionando-o com a forma, analisa-se portanto o desempenho urbano na região, atrelado às características Morfológicas do universo de estudo repleto de condomínios fechados. Palavras-chave: Segregação Socioespacial, Condomínio Fechado, Urbanidade, Vitalidade Urbana, Configurações Socioespaciais, Morfologia.
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LISTA DE FIGURAS Figura 01: Localização da área de estudo ..................................................................... 14 Figura 02: Tabela de Condomínios da Área de Estudo ................................................... 15 Figura 03: Localização dos condomínios fechados em relação aos principais eixos .... 19 Figura 04: Ciclos de realimentação do desurbanismo .................................................. 57 Figura 05: Fatores influenciadores da sociabilidade Urbanas e suas correlações ........ 58 Figura 06: Morfologia e desempenho urbano .............................................................. 60 Figura 07: Mapa de localização dos condomínios ........................................................ 76 Figura 08: Rendimento nominal médio por área geográfica ........................................ 78 Figura 09: Mapa de vilas e favelas ................................................................................ 79 Figura 10: Sistema Viário de Natal, 1984 ...................................................................... 80 Figura 11: Informações referentes as favelas da região ............................................... 80 Figura 12: Mapa Aéreo Favela da Palha ....................................................................... 81 Figura 13: Favela da Palha ............................................................................................ 82 Figura 14: Campo de Futebol na Favela da Palha ........................................................... 82 Figura 15: Comunidade da Baixa do Cão, Cidade Nova ................................................ 82 Figura 16: Vista Aérea da Comunidade da Baixa do Cão, Cidade Nova ........................ 83 Figura 17: Fotografia da Comunidade Baixa do Cão ..................................................... 83 Figura 18: Agua servida na Baixa do Cão ...................................................................... 83 Figura 19: Mapa de lagoas urbanizadas e não urbanizadas ......................................... 84 Figura 20: Mapa da ZPA – 01 e Condomínios ............................................................... 85 Figura 21: Mapa de Macrozoneamento/Operação Urbana ......................................... 86 Figura 22: Mapa de centralidades de Natal .................................................................. 87 Figura 23: Folder de comercialização do Green Village ............................................... 88 Figura 24: Folder de Comercialização do West Park Boulevard ................................... 89 Figura 25: Folder de comercialização do West Side Boulevard .................................... 90 Figura 26: Cruzamento da Avenida dos Potiguares com a Avenida Mor Gouveia ....... 92 Figura 27: Calçada obstruindo a Rua dos Potiguares ................................................... 92 Figura 28: Perímetro Rua Potiguares sem pavimentação ............................................ 92 Figura 29: Material de propagando do Condomínio Smile .......................................... 93 Figura 30: Obstrução s Potiguares ................................................................................ 94 Figura 31: Rua dos Potiguares ...................................................................................... 94 Figura 32: Rua dos Potiguares após o Condomínio West Park Boulevard .................... 94 Figura 33: Entroncamento da Rua dos Potiguares com a Rua Manoel de Castro ........ 94 Figura 34: Mapa de hierarquia viária de Natal ............................................................. 96 Figura 35: Vista da Rua Jaguarari .................................................................................. 97 Figura 36: Vista da Avenida da Integração ................................................................... 97 Figura 37: Vista da Avenida Prudente de Moraes ........................................................ 97 Figura 38: Vista da Avenida Capitão Mor Gouveia ....................................................... 97 Figura 39: Vista da Av. Interventor Mário Câmara ....................................................... 98 Figura 40: Vista da Avenida Coronel Estevão ............................................................... 98 Figura 41: Mapa de Eixos e Acessos dos Condomínios ................................................. 99 Figura 42: Mapa Viário do Plano Diretor de 1984 ...................................................... 102 Figura 43: Detalhe do Mapa Viário do Plano Diretor de 1984 .................................... 104 Figura 44: Mapa do Sistema Viário do Plano Diretor de 1994 .................................... 106 Figura 45: Detalhe do Mapa Viário do Plano Diretor de 1994 .................................... 108
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Figura 46: Obstrução da Avenida da Integração – Lixo e entulhos ............................. 109 Figura 47: Obstrução da Avenida da Integração – Bloco de Concreto ....................... 109 Figura 48: Barricada na Avenida da Integração .......................................................... 109 Figura 49: Avenida da Integração obstruída ............................................................... 109 Figura 50: Obstrução da Avenida da Integração ......................................................... 110 Figura 51: Detalhe da proximidade com a ZPA-01 ..................................................... 110 Figura 52: Mapa de Pavimentação ............................................................................. 110 Figura 53: Mapa axial – RMN sem as vias internas aos condomínios – Integração HH RN ..................................................................................................................................... 113 Figura 54: Mapa axial – RMN com as vias internas aos condomínios – Integração HH RN ..................................................................................................................................... 114 Figura 55: Mapa axial – RMN com simulação de loteamento na área de estudo – Integração HH RN ....................................................................................................... 116 Figura 56: Mapa axial – RMN com simulação de loteamento na área de estudo – Integração HH R3 ........................................................................................................ 116 Figura 57: Mapa axial – Área sem as vias internas aos condomínios – Integração HH RN ..................................................................................................................................... 117 Figura 58: Mapa axial – Área sem as vias internas aos condomínios – Integração HH R3 ..................................................................................................................................... 117 Figura 59: Avenida Manoel de Castro ......................................................................... 118 Figura 60: Avenida Nelson Geraldo Freire .................................................................. 118 Figura 61: Mapa de parcelamento ............................................................................. 119 Figura 62: Mapa de dimensões das quadras comparado à legislação ........................ 122 Figura 63: Green Village ............................................................................................. 130 Figura 64: Green Woods ............................................................................................. 130 Figura 65: West Park Boulevard ................................................................................. 131 Figura 66: West Side Boulevard .................................................................................. 132 Figura 67: Rua comercial Manuel de Castro ............................................................... 133 Figura 68: Mercearia em frente ao WPB .................................................................. 133 Figura 69: Muro cego do SESI ..................................................................................... 133 Figura 70: Grande Gleba do CAIC ............................................................................... 133 Figura 71: CEASA-RN ................................................................................................... 133 Figura 72: Ginásio do DED .......................................................................................... 133 Figura 73: Entrada Principal Petrobrás ....................................................................... 134 Figura 74: Muro permeável ....................................................................................... 134 Figura 75: Entrada/Saída Secundária Petrobrás ......................................................... 134 Figura 76: Abertura da Raimundo Chaves .................................................................. 134 Figura 77: Edifício Vertical Golden Green ................................................................... 136 Figura 78: Edifício Maria Galante em construção ....................................................... 136 Figura 79: Condomínio Smile ...................................................................................... 136 Figura 80: Espaço Residual no West Side ................................................................... 137 Figura 81: Perceba a área sem uso no WSB ............................................................... 137 Figura 82: Campinho no terreno baldio em frente ao West Park Boulevard ............. 137 Figura 83: Campo de futebol improvisado nas dunas próximas à Avenida da Integração ..................................................................................................................................... 137 Figura 84: Cadeiras na Raimundo Chaves, os moradores da região usam muito o canteiro ....................................................................................................................... 137
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Figura 85: Improvisação de Mobiliário Urbano, na Rua Nelson Freire por trás do GW ..................................................................................................................................... 137 Figura 86: Rua dos Potiguares, pessoas nas mesas na rua no final de semana .......... 138 Figura 87: Crianças brincando na Rua Nelson Geraldo Freire por trás do Green Woods ..................................................................................................................................... 138 Figura 88: Fechamento de Área verde ....................................................................... 138 Figura 89: Parte de trás da área verde fechada .......................................................... 138 Figura 90: Folder do Edifício Golden Tower, com área verde pública incluída ........... 139 Figura 91: Ministério Público ...................................................................................... 139 Figura 92: Anexo do prédio do MPE ........................................................................... 139 Figura 93: Edifício do TRT, Av. Mor Gouveia .............................................................. 140 Figura 94: Justiça Federal de primeiro Grau ............................................................... 140 Figura 95: Edifício salas jurídicas ................................................................................ 140 Figura 96: Escritório advocatício nas proximidades do cond. West Park Boulevard .. 140 Figura 97: Edifício comercial ....................................................................................... 140 Figura 98: Rua Nelson Geraldo Freire, calçada do West Side Boulevard .................... 141 Figura 99: Rua Nelson Geraldo Freire, calçada do Green Village (parte posterior do condo) ......................................................................................................................... 141
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SUMÁRIO
VOLUME I
INTRODUÇÃO .............................................................................................. ........... 12
CAPÍTULO II - PARA COMPREENSÃO DO PROCESSO SEGREGATÓRIO ........................ 22
CAPÍTULO III - REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO .......................................... 23
3.1. CONDOMÍNIOS FECHADOS E SUAS ORIGENS .......................................................... 23
3.1.1. Política Habitacional no Brasil ............................................................................. 24
3.1.2. Condomínios horizontais no Brasil e no mundo ................................................. 30
3.2. A SEGREGAÇÃO ....................................................................................................... 33
3.2.1. A segregação e a formação da cidade dual .......................................................... 33
3.2.2. Segregação Socioespacial .................................................................................... 36
3.3. SOCIABILIDADE E SUA RELAÇÃO COM A FORMA URBANA ...................................... 46
3.3.1. Urbanidade e Desurbanidade ............................................................................. 46
3.3.2. Morfologia e Desempenho Urbano .................................................................... 58
3.4. ANÁLISE DA LEGISLAÇÃO URBANÍSTICA .................................................................. 69
3.4.1. Condomínios Horizontais Fechados e conflito entre fato e direito
....................................................................................................................................... 69
CAPÍTULO IV - Análise Morfológica ......................................................................... 75
4.1. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA ................................................................................... 75
4.1.1. Caracterização Sócio ambiental da Área de Estudo ............................................ 76
4.1.1.1. Caracterização Social da Área de Estudo ......................................................... 77
4.1.1.2. Caracterização Ambiental da Área de Estudo .................................................. 84
4.1.2. Legislação Urbanística Incidente ......................................................................... 86
4.2. ELEMENTOS ESTRUTURADORES DO TECIDO URBANO .......................................... 87
4.2.1. Vias e espaços públicos ....................................................................................... 87
4.2.2. Recortes Fundiários e Parcelas ......................................................................... 118
4.2.3. Tipologia ........................................................................................................... 128
CONCLUSÃO ......................................................................................................... 142
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................. 146
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VOLUME II
Prancha 1/14 – Mapa de Localização dos Condomínios .............................................. 75
Prancha 2/14 – Mapa de Loteamentos, Conjuntos Habitacionais e Condomínios
Fechados ....................................................................................................................... 77
Prancha 3/14 – Mapa Figura-Fundo de Vias ................................................................ 91
Prancha 4/14 – Mapa Figura-Fundo do Espaço Privado ............................................... 91
Prancha 5/14 – Mapa de Obstruções no Entorno Imediato e de Pavimentação ......... 91
Prancha 6/14 – Mapa Hierarquia Viária ....................................................................... 97
Prancha 7/14 – Mapa de Traços com Ruas Públicas/Privativas ................................. 111
Prancha 8/14 – Mapa de Favelas, Loteamentos, Conjuntos Habitacionais e
Condomínios Fechados ............................................................................................... 120
Prancha 9/14 – Mapa de Parcelamento do Solo com Detalhe de Glebas dos
Condomínios ............................................................................................................... 123
Prancha 10/14 – Mapa de Gabarito ........................................................................... 126
Prancha 11/14 – Mapa de Lotes Edificados ............................................................... 126
Prancha 12/14 – Mapa de Usos e Ocupação do Solo ................................................. 132
Prancha 13/14 – Mapa de Passeios Públicos ............................................................. 140
Prancha 14/14 – Mapa de Permeabilidade Visual das Fachadas ............................... 141
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I. INTRODUÇÃO
Esta monografia introduz, justifica e sistematizar o tema condomínios fechados
e segregação urbana, estudo voltado para a compreensão da relação entre o espaço
urbano e a sociedade a partir de abordagem teórico-conceitual. Para tanto desenvolve-
se um estudo morfológico atrelado a reflexões sobre urbanidade, e seu antônimo,
desurbanidade.
Se insere a motivação do presente TFG, que visa compreender a fragmentação
recorrente entre as áreas do entorno destes “enclaves fortificados”1 e os condomínios
fechados. Especificamente no caso dos condomínios Residenciais de Classe média Alta
Green Woods, Green Village, West Park Boulevard e West Side Boulevard, a ruptura
socioespacial com o entorno, bairros populares de Cidade da Esperança, Cidade Nova e
parte de Candelária em Natal.
Justifica-se este estudo devido ao acelerado processo de reprodução dos
condomínios fechados nas cidades médias e grandes brasileiras (ANDRADE, 2010; IVO,
2012; MOURA, 2008, SOUZA E SILVA, 2004). Estudos acerca dessa tipologia são
recorrentes, porém a abordagem se detém quase que exclusivamente ao entendimento
dos empreendimentos internamente. Faz-se relevante portanto um estudo para
investigar os impactos destes condomínios entorno imediato, espacial e socialmente
falando, para que discussões fundamentadas acerca do assunto sejam travadas, a fim
de conhecer melhor e refletir sobre as transformações sociais e espaciais relacionadas
a estes empreendimentos.
Nesse contexto, o estudo foi desenvolvido sob a perspectiva teórico-conceitual
e orientado pelo esforço de compreensão das relações entre: segregação socioespacial,
condomínio fechado, urbanidade, vitalidade, sociabilidade, e configurações
socioespaciais.
Analisa-se portanto neste TFG os impactos sociais, econômicos, morfológicos e
estéticos provocados no entorno deste empreendimento a fim de verificar se existe ou
não influência da sua implantação e comercialização para a transformação da paisagem
do entorno destes redutos fortificados.
1 CALDEIRA, 2000.
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O interesse nesse exercício acadêmico surgiu da observação empírica da ruptura
recorrente entre tipologias de bairros populares e condomínios fechados vivida durante
dois momentos de inserção na pesquisa acadêmica enquanto discente das disciplinas
Pesquisa Aplicada a Arquitetura e Urbanismo 01 e 02, em 2011.2 e 2012.1,
respectivamente. Nesta oportunidade participei e contribuí com o Projeto de Pesquisa
(O imobiliário turístico e os instrumentos de regulação: controle urbanístico ou
afirmação de uma ilusão? e Metropolização Turística: dinâmica e reestruturação dos
territórios em Salvador, Recife, Fortaleza e Natal – estudos comparativos para o
Nordeste (Núcleo RMNatal) voltado para a expansão dos equipamentos Imobiliários-
Turísticos em Natal e Parnamirim, analisando empreendimentos de grande porte
implantados na Zona de Expansão e na Área Litorânea de ambas as cidades, realidade
em que a tipologia de condomínios residenciais é recorrente, nesta oportunidade
adotou-se o enfoque legal, no sentido de verificar o cumprimento ou não da legislação
vigente, para cada empreendimento.
A verificação desses processos junto aos Condomínios Residenciais Green
Woods, Green Village, West Park Boulevard e West Side Boulevard, é feita analisando
suas imponentes barreiras físicas e se dá a partir do enfoque urbanístico socioespacial,
a fim de entender as relações estabelecidas e influências mútuas entre condomínios,
edificações em ruas no seu entorno e seus moradores, refletindo sobre a urbanidade da
área.
Como estudo de caso elegeu-se uma região na cidade do Natal/RN, Brasil, entre
os bairros de Cidade da Esperança, Cidade Nova, Candelária, Nossa Senhora de Nazaré
e Lagoa Nova, região onde se localizam quatro condomínios fechados encravados numa
realidade de bairros populares. A justificativa da escolha da área de estudo é a
localização de diversos condomínios em uma área residencial consolidada, onde existe
uma população anterior à implantação dos empreendimentos, com perfil
socioeconômico diferente dos condôminos. Ainda destaca-se a fragilidade
socioambiental do entorno imediato destes condomínios, questão fundamental para
decisão de estudar a área, pois assim existem reflexões interessantes a serem discutidos
tanto socialmente quanto ambientalmente falando.
15
Os condomínios que serão universo de estudo desta monografia são o Green
Village (1995), Green Woods (1996/7), West Park Boulevard (1999), e West Side
Boulevard (2009), todos estão localizados na Região Administrativa Sul da cidade de
Natal/RN, mais especificamente no bairro de Candelária, apenas o condomínio West
Park Boulevard se entende também ao bairro Cidade da Esperança, na Região
Administrativa Oeste da cidade de Natal.
Figura 02: Tabela de Condomínios da Área de Estudo
Fonte: Informações de AVELINO, 2007.
O objeto de estudo delimitado para esta pesquisa são os padrões de
sociabilidade relacionados aos padrões morfológicos da área de estudo. A análise foi
orientada pelas seguintes perguntas: Quais as relações socioespaciais estabelecidas
entre os Condomínios Fechados Green Village, Green Woods, West Park Boulevard e
West Side Boulevard, e os bairros de Cidade da Esperança, Cidade Nova, Nossa Senhora
de Nazaré, Candelária e Lagoa Nova? Quais as implicações da mudança na evolução de
ocupação da área estudada e seus reflexos na urbanidade?
Como hipótese de pesquisa acredita-se que a tipologia dos condomínios e suas
estratégias projetuais se constituem como barreiras físicas e imateriais para o
estabelecimento de relações socioespaciais com seu entorno imediato, os bairros de
Cidade da Esperança, Cidade Nova, Nossa Senhora de Nazaré Candelária e Lagoa Nova,
desta maneira existe uma ruptura do empreendimento com o entorno e das dinâmicas
de sociabilidade entre as diferentes tipologias.
O objetivo geral destes estudos é caracterizar o padrão de sociabilidade assim
como as relações morfológicas que se estabelecem entre os condomínios fechados e
frações urbanas do seu entorno, visando identificar processos de ruptura e segregação
nesta relação.
EMPREENDIMENTO ANO LOTES ÁREA ÁREA TOTAL EMPREENDEDORA
Green Village 1995 95 800,00 145.416,00 FBF Emp. LTDA
Green Woods 1996/7 146 450,00 91.689,00 FBF Emp. LTDA
West Park Boulevard 1999 232 450,00 197.237,42 Ecocil
West Side Boulevard 2009 46 500,00 40.633,00 Ecocil
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Para tanto se fará necessário atingir objetivos específicos que darão suporte ao
objetivo geral da pesquisa, são eles: (1) identificar vivências do cotidiano estabelecidas
na área; (2) refletir sobre os efeitos no fluxo da população de ambas as áreas em virtude
das diferentes tipologias; (3) identificar elementos arquitetônicos e urbanísticos que
contribuam para a fragmentação entre o bairro popular e o condomínio fechado;
(4) identificar de que maneira as mudanças de ocupação influenciaram a ocupação e o
padrão de sociabilidade na área; e (5) compreender os efeitos e influencias das
estratégias projetuais dos condomínios fechados e suas características físicas para a
urbanidade da área;
Tendo em vista os objetivos da pesquisa é essencial explorar o vínculo entre
espaço construído e vida social na cidade contemporânea, se faz necessário portanto
refletir sobre a proliferação destes empreendimentos cerrados, assim como o “novo
estilo de vida” relacionados a eles, assim como os impactos provenientes deste
processo, para melhor compreensão das relações sociais e de produção estabelecidas
dos mesmos com o entorno direto, assim como para a cidade como um todo. Nesse
sentido, IVO comenta que:
Esses “mundos cerrados” se articulam e se relacionam, mesmo que indiretamente. Independentemente da forma segmentada de apropriação física, esses “muros e mundos cerrados” se articulam em vários âmbitos: nas vivências do cotidiano, nos mecanismos de distinção simbólica, nas formas de subsunção implícitas às relações de trabalho, nas relações sociais de convívio, no usufruto das áreas públicas da cidade, na circulação e no fluxo das mercadorias dos quais a moradia e os bens de consumo são parte. Assim, ao invés da imagem de harmonia, que pode estar implícita nos novos padrões de sociabilidade cotidiana analisados, o conflito é uma condição intrínseca entre os “muros”. (IVO, 2012)
A segregação urbana, restrição da interação entre os socialmente diferentes
(FREEMAN,1978), objeto de análise é um processo complexo e fruto das interações
entre seres humanos e fatores ambientais, sociais, culturais, econômicos e históricos. O
ato de segregar uma determinada população priva certo grupo de pessoas de vivenciar
uma gama de lugares que compõe a paisagem urbana, configurando sítios sociais
particulares setorizando socioespacialmente camadas da população de acordo com suas
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características socioeconômicas, com a formação de micro territorialidades, que
somadas compõem a urbe como um todo. (SANTOS, 2013.)
Este processo, a fragmentação socioespacial observada nas cidades de forma
geral está intrinsecamente relacionada ao processo de urbanização e metropolização,
suas desigualdades e conflitos.
A urbanização das cidades brasileiras, processo que engendrado de forma mais
intensa na segunda metade do século XX, aconteceu de forma a atender a demanda
populacional urbana crescente na época; porém a infraestrutura necessária para
satisfazer as necessidades básicas dessa população pouco foi provida. Como resultado,
aliado ao rápido crescimento das aglomerações urbanas cresciam também os problemas
das cidades.
No decorrer do processo muitas cidades foram criadas, enquanto outras já
existentes se expandiam para atender as demandas emergentes da
urbanização/industrialização, tendo em vista o complexo jogo de interesses que
influencia a dinâmica espacial de uma cidade em pleno desenvolvimento, é sabido que
a distribuição de recursos e benefícios nas diversas áreas da cidade é desigual e injusta,
sendo resultante da atuação privilegiada de agentes produtores do espaço urbano.
Produto deste processo resultou cidades marcadas pela disparidade de oferta de
infraestrutura urbana, como saneamento básico, água, espaços públicos, transportes e
serviços, consolidando a segregação, que sempre esteve presente nas cidades, e,
segundo CALDEIRA (2000), pode ser classificada em três momentos diferentes: (1) o
primeiro inicia-se no século XIX quando a segregação se dava pela variação das
tipologias arquitetônicas, uma vez que as cidades ainda eram reduzidas fisicamente; (2)
a partir dos anos 1940 passa a predominar a segunda fase, com a configuração da
dicotomia centro-periferia, esta forma ainda pode ser percebida até hoje; (3) desde os
anos 1980 sobrepõe-se uma terceira fase, marcada pela inserção de “enclaves
fortificados” nas periferias, quando grupos sociais diferentes se aproximam na mesma
medida em que se isolam através de barreiras físicas e tecnológicas.
Este terceiro momento é marcado pela construção de espaços urbanos
privatizados, os chamados “enclaves fortificados”, que justificados pelo medo do crime
e pela busca de status, vêm sendo reproduzidos em larga escala nas cidades brasileiras,
18
tipologia que introduz uma segregação socioespacial complexa que será abordada neste
estudo.
O conceito de Condomínios horizontais fechados para esta monografia é o de
empreendimentos imobiliários caracterizados pelo espaço privatizado, que se
materializa nas comunidades artificiais com aspirações de serem totalitárias, em que
reúne-se um conjunto de residências cercados por muros, grades ou cercas vivas,
geralmente localizados em área de baixa densidade populacional e preferencialmente
nas áreas periféricas mais distantes próximas a importantes eixos viários. São
empreendimentos que seguem a lógica do capital e seguem o marketing que recria um
“novo estilo de vida” travando uma relação superficial com a cidade.
Em Natal, esses condomínios surgiram em 1995 com o lançamento do
empreendimento de luxo Green Village, iniciativa da FBF Empreendimentos LTDA,
empreendimento com objetivo de atingir classes mais abastadas em franjas de bairros
consolidados de alto padrão construtivo e social, como Candelária.
Segundo TAVARES, 2009, desde sua apresentação como alternativa de moradia
em Natal, os condomínios fechados são um fenômeno consolidado na cidade, estes
empreendimentos estão divididos em duas áreas da cidade, parte se localiza próximo
ao Subcentro Lagoa Nova, região em que foram construídos os primeiros condomínios
da cidade, com empreendimentos como o Green Village, Green Woods, Green Fields,
West Park, Barra Green, e West Park Boulevard, e ainda na divisa com o município de
Parnamirim próximo aos eixos Av. Prudente de Morais, BR-101, e Rota do Sol (RN-063)
com os empreendimentos Ponta Negra Boulevard, Canto dos Pássaros, Parco
Dellaveritá, Porto Boulevard, Flora Boulevard e Vila dos Lagos.
19
Figura 03: Localização dos condomínios fechados em relação aos principais eixos
Fonte: TAVARES, 2009.
Essas regiões caracterizavam-se por serem duplamente desvalorizadas. Devido a
sua fragilidade ambiental e ainda pela proximidade com áreas habitadas por pessoas de
poder aquisitivo mais baixo, sendo então utilizadas pelo capital imobiliário,
transformadas em produtos para classes mais elitizadas, como reflete SOUZA E SILVA
em sua colocação a seguir:
A pouca disponibilidade de grandes glebas disponíveis na área urbana [de Natal] e consequente encarecimento do solo levam cada vez mais empreendimentos habitacionais de luxo, na forma de condomínios fechados – verticais e/ou horizontais – a buscarem áreas mais baratas, inicialmente nas periferias urbanas, passando posteriormente a ocupar também os interstícios de bairros populares. Há, portanto, uma dinâmica combinada, mobilidade tanto de fora para dentro, quanto de dentro para fora, na criação e expansão das moradias para pobres e ricos. O resultado se traduz em bolsões valorizados dentro de áreas de pobreza, seja internamente, na área consolida da cidade, seja nas periferias urbanas, dado que a reprodução da classe menos favorecida sobrepuja o crescimento da mais abastada. (SOUZA E SILVA, 2004. p. 97)
20
Em face a tão complexo processo sociosegregatório e fenômeno de reprodução
de condomínios fechados, adotou-se para este trabalho uma metodologia de análise
proposta por Moura (2008), em que desenvolve parâmetros de análise dos condomínios
horizontais/loteamentos fechados baseada na Dimensão Subjetiva e Objetiva desses
empreendimentos e de seu entorno. Aliada a uma análise Morfológica com estudo da
evolução de ocupação com pesquisa documentária e produção e análise de mapas e
figuras.
Considerando a perspectiva de trabalho mencionada, esta monografia está
estruturada em 6 (seis) capítulos, sendo eles: (1) Introdução, (2) Referencial teórico-
metodológico, (3) Para compreensão do processo segregatório, (4) Estudo Morfológico,
(5) Reflexões finais e diretrizes.
Após introduzido o trabalho, no Capítulo 2, faz-se uma breve explanação sobre
Condomínios fechados e suas origens, relacionando o surgimento deste tipo de
empreendimento com o contexto econômico, político e social entre os anos de 1980 e
1990, em que tomou força o fenômeno no Brasil e no mundo, este capítulo está
portanto subdividido em partes para que sejam melhores compreendidas as questões
relacionadas à política habitacional no Brasil no período mencionado, assim como a
gênese da produção imobiliária de condomínios fechados no mundo e sua influência na
proliferação deles na América Latina, mais especificamente no Brasil.
No Capítulo 3, denominado “Para compreensão do processo segregatório é
sintetizada a metodologia da monografia, onde será desenvolvida uma síntese de como
foi realizada a pesquisa.
O Capítulo 4, em seguida trata-se do Estudo Morfológico da área de estudo,
oportunidade em que é feito um estudo da forma e relacionado com os padrões
socioespaciais engendrados a partir dele, através de esquemas, figuras e mapas. Nesta
oportunidade serão utilizados conceitos trazidos por PANEREI, 2006 para melhor leitura
da forma urbana. Os sub itens deste tópico são: Caracterização da Área, Histórico da
Ocupação do Solo Urbano na área, Estudo do Tecido Urbano.
Em seguida desenvolve uma “Análise crítica sobre mudança na evolução da
ocupação da área e suas implicações (Urbanidade e vitalidade) ”, retomando os
conceitos de Urbanidade de acordo com AGUIAR, Douglas; et al 2012 e Vitalidade da
21
autora JACOBS, 2000 e contrapondo-os com a realidade percebida no universo de
estudo após o estudo Morfológico, refletindo sobre as reais influências da tipologia
condomínios fechados sobre aspectos relativos à sociabilidade presente na área de
estudo.
Por fim, apresentam-se as Reflexões finais, oportunidade em que retoma-se os
objetivos do trabalho, trazendo reflexões e descobertas que foram feitas ao longo do
mesmo, assim como diretrizes que podem vir a ser úteis para tornar empreendimentos
do cunho dos condomínios fechados em menos prejudicais para suas áreas adjacentes.
De uma forma geral, neste tópico apresentar-se-á sinteticamente descobertas, dúvidas,
dificuldades e questões em aberto, talvez propostas para novas pesquisas.
22
II. PARA COMPREENSÃO DO PROCESSO SEGREGATÓRIO
Uma vez introduzidos os principais conceitos relativos ao tema deste trabalho
final de graduação, é importante abordar os procedimentos metodológicos a serem
seguidos neste estudo, abordando as variáveis e caminhos de análise da pesquisa.
Este trabalho será desenvolvido a partir da pesquisa bibliográfica, fazendo
revisão dos temas mais relevantes para o entendimento para o processo socioespacial
segregatório e sua relação com os condomínios fechados e sociabilidade. Em seguida
será feita uma pesquisa documental a fim de compreender os condicionantes da
mudança de ocupação na área de estudo.
Neste trabalho será feita uma análise Morfológica segundo os conceitos de
Panerai (2006), com estudo da evolução de ocupação com pesquisa documentária e
produção e análise de mapas e figuras referentes a área e os conceitos importantes para
o entendimento do fenômeno segregatório. A análise será dividida em estudo do
sistema viário, do parcelamento e edificações relacionados à sociabilidade.
Os critérios morfológicos a serem pesquisados com mais afinco são relacionados
à tipologia, densidade, configurações locais e globais, espaços urbanos, e diversidade do
uso do solo, sempre rebatidos aos conceitos de urbanidade, vitalidade e sociabilidade e
comparados a realidade do entorno.
A partir da dimensão objetiva pode-se elencar algumas variáveis para construir
parâmetros de análise para este exercício acadêmico, a localização do empreendimento
em relação a cidade e ao bairro, a escala deste, características relativas ao mercado e
agentes imobiliários, questões de áreas verdes e impactos ambientais, análise
cronológica quanto a ampliação ou não da infraestrutura e equipamentos urbanos assim
como a qualidade construtiva e padrões de moradia.
23
III. REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO
3.1. Condomínios Fechados e suas origens
Segundo Ueda (2006) os condomínios fechados e sua acelerada reprodução são
resultado de profundas transformações mundiais relacionadas ao plano neoliberal e
projetos capitalistas, com consequências para a organização socioeconômica vigente.
Tal processo teve ainda consequências nas políticas públicas, promovendo a
privatização dos serviços públicos e aumentando com isso a desigualdade de acesso a
eles. As consequências da difusão dos ideais liberais segundo Maria Camila Loffredo
D'Ottaviano, 2006 estão ainda relacionadas a liberalização do mercado imobiliário.
Enquanto agente atuante na reprodução do espaço urbano, o mercado imobiliário
atende aos interesses do lucro e aumenta a disparidade na organização e no acesso ao
espaço público e infraestrutura urbana. Todo este processo é retroalimentado pela
crescente dualidade social, a medida em que novas relações de trabalho e de produção
aumentam as desigualdades socioeconômicas no mundo atual.
A produção do mercado sofre diversas influências, em escalas globais e locais. A
globalização introduzia o processo de liberalização e internacionalização da economia,
dando força a iniciativa privada e a investidores do mercado imobiliário enquanto
empreendedores. Existe a escala regional e local, que influencia a produção imobiliária
a medida que políticas públicas, habitacionais e econômicas são estabelecidas na região.
Todos esses fatores e ainda a atuação do mercado imobiliário possibilitaram a
consolidação dos condomínios fechados no país. (SOUZA E SILVA, 2004)
A produção imobiliária precisa de financiamento, e, por causa disso está
intrinsecamente relacionada estabilização da economia de uma forma geral. Outro fator
com importante influência na produção imobiliária são as políticas públicas
habitacionais, que por sua vez elaboram programas habitacionais e criam linhas de
financiamento.
Portanto, como resultado dos transtornos ocasionados pela rápida urbanização
nas últimas décadas, das mudanças nas políticas nacionais de financiamento de
moradias, do avanço da política neoliberal e da estabilidade econômica alcançada desde
o Plano Real, formou-se o cenário para o aparecimento dos condomínios fechados no
Brasil. Esse contexto gerou insatisfação com a realidade dos serviços urbanos oferecidos
24
e em adição permitiu que o mercado imobiliário passasse a investir em
empreendimentos com público alvo antes tidos como não solváveis. (SILVA, 2001)
3.1.1. Política Habitacional no Brasil
A política habitacional em vigência desde meados da década de 80 até 1986 era
regida pelo Banco Nacional de Habitação (BNH), e do sistema Financeiro Habitacional
(SFH), foram criados para reajustar os financiamentos após a instituição de uma nova
moeda, oferecendo à população duas linhas de crédito: (1) “poupança compulsória”
para a população de baixa renda, com os recursos do Fundo de Garantias do Tempo de
Serviço – FGTS e (2) caderneta de poupança e poupança voluntária, para população com
renda média e alta.
Em relação à importância do BNH na produção habitacional brasileira, Nabil
Bonduki (2010) diz:
O Banco Nacional de Habitação, criado após o golpe em 1964, foi uma resposta do governo militar à forte crise de moradia presente num país que se urbanizava aceleradamente, buscando, (...) criar uma política permanente de financiamento capaz de estruturar em moldes capitalistas o setor da construção civil habitacional, objetivo que acabou por prevalecer. (BONDUKI, 2010)
Nesse contexto, Marcio Valença (1992) Lembra que o sistema de créditos era
baseado na capacidade de poupar da população, da atração de poupadores por parte
do sistema e da capacidade dos mutuários de pagarem seus débitos. Todas estas formas
de capitalização são baseadas na capacidade de poupar da população, da atração de
poupadores por parte do sistema e da capacidade dos mutuários de pagarem seus
débitos.
O país passava por um período de recessão econômica, porém os programas
foram criados para economia em crescimento, desta forma, seu desempenho foi aquém
do esperado. Os maiores problemas do sistema foi o fato de atingir apenas públicos com
maior poder aquisitivo, além da grande inadimplência, que contribuía para a baixa
liquidez do sistema e fechava o ciclo da incapacidade de bom desempenho na área
social. Esta realidade gerou uma forte reação nacional por parte dos mutuários
contrárias aos reajustes das prestações, que estavam acima dos reajustes salarias.
25
Consequência disso foi que o SFH financiou de forma subsidiada
majoritariamente, priorizando financiamentos para prédios novos dirigidos aos
trabalhadores formais com renda média e alta. Devido a estes critérios, o SFH prejudicou
a acessibilidade dos trabalhadores informais e com renda abaixo de 3,5 salários mínimos
aos financiamentos habitacionais. Esta parcela da população se beneficiou com apenas
6,4% dos recursos utilizados pelo SFH entre 1965 e 1985, segundo estudo Souza e Silva
(2004). Nota-se que pouco auxilio por parte do governo é dado para população mais
carente em relação aos problemas habitacionais, em um contexto de intensa
urbanização e consequente agudização da já existente crise do setor habitacional.
Como resposta a repercussão e fortalecimento destes movimentos sociais,
segundo SOUZA E SILVA, 2004: resultou em um considerável melhoramento da
infraestrutura urbana e na chegada de novos equipamentos e serviços às áreas mais
carentes, quanto através de governos locais e estaduais foram tomadas medidas para
melhorar a qualidade de vida nas periferias, devido às reivindicações da população.
Neste período houveram transformações no aspecto formal das habitações, ao
mesmo tempo em que a SFH beneficiou a construção civil. A medida em que a habitação
pôde contar com uma fonte de financiamento estável para a produção de unidades
prontas, passou-se a reproduzir tipologias habitacionais majoritariamente de
empreendimentos verticalizados. Estas, por sua vez eram em sua maioria voltado para
a classe média e alta, enquanto que a população mais carente construía casas por conta
própria na periferia ou adensava as favelas. Isso acontecida pois a população mais pobre
não preenchia os requisitos do SFH para obtenção dos empréstimos.
Do ponto de vista arquitetônico e urbanístico, Bonduki (2010) destaca que nesta
época foram construídos um grande número de conjuntos bastante de grande dimensão
na periferia das cidades. Esta realidade gerou verdadeiros bairros dormitórios,
desarticulação entre os projetos habitacionais e a política urbana. Além disso, a
reprodução acelerada de conjuntos habitacionais gerou a uniformização e padronização
de projetos, que não tinham preocupação com a qualidade da moradia, com a inserção
urbana nem com o respeito ao meio físico.
Uma análise crítica deste autor reflete sobre a construção informal de casa pela
população mais pobre, devido ao descaso do poder público para com o setor e sua
26
necessidade habitacional, uma vez que voltou todos os recurso para a produção da casa
própria construída pelo sistema formal da construção civil:
Um dos grandes equívocos foi (...) [não] ter estruturado qualquer ação significativa para apoiar, do ponto de vista técnico, financeiro, urbano e administrativo, a produção de moradia ou urbanização por processos alternativos, que incorporasse o esforço próprio e capacidade organizativa das comunidades. Em consequência, ocorreu um intenso processo de urbanização informal e selvagem, onde a grande maioria da população, sem qualquer apoio governamental, não teve alternativa senão auto empreender, em etapas, a casa própria em assentamentos urbanos precários, como loteamentos clandestinos e irregulares, vilas, favelas, alagados etc., em geral distantes das áreas urbanizadas e mal servidos de infraestrutura e equipamentos sociais. (BONDUKI, 2010)
Diante de um contexto de caos do sistema BNH-SFH, em Novembro de 1986,
anunciou-se o pacote de medidas econômicas do Plano Cruzado II e também o
fechamento do BNH. Nesta oportunidade o mesmo foi incorporado à Caixa Econômica
Federal, hoje CAIXA, justificando como medida de corte de gastos.
Destaca-se que outros interesses ainda estavam dentre as razões desta medida,
conforme apontado por Valença (2012), como o desejo por parte do poder executivo de
influenciar na política habitacional, que devido a se pautar em normas e leis
estabelecidas no período militar não havia espaço para inferências da presidência da
república no sistema BNH-SFH. Isso somado aos mutuários que organizados socialmente
deixaram de pagar as prestações entrando com processos judiciais alegando aumento
abusivo das prestações dos financiamentos, e ao interesse dos agentes financeiros
privados, principalmente os ligados aos conglomerados que com o fim do BNH teriam
maior flexibilidade para “desviar” os investimentos da área habitacional para outras
áreas de investimento como maior retorno econômico (mais lucrativas e líquidas), como
crédito ao consumidor, depósitos voluntários no banco central, dívida pública, entre
outros.
Com a transferência das competências do BNH para a então CEF, intensificou-se
a estagnação, com redução drástica dos financiamentos estatais. Isso aconteceu pois
mantiveram-se os problemas antigos, que foram ainda somados transtornos relativos a
falta de experiência do órgão. Lentidão dos processos e falta de coordenação das ações
27
relativas aos programas habitacionais foram consequências da decisão de extinguir o
BNH.
Ocorreu um esvaziamento e pode-se dizer que deixou propriamente de existir uma política nacional de habitação. Entre a extinção do BNH (1986) e a criação do Ministério das Cidades (2003), o setor do governo federal responsável pela gestão da política habitacional esteve subordinado a sete ministérios ou estruturas administrativas diferentes, caracterizando descontinuidade e ausência de estratégia para enfrentar o problema. (BONDUKI, 2010)
Como resposta a este cenário surgem tipos e modo de produção habitacional
alternativos, como os financiamentos diretos aos empreendedores, cooperativas
habitacionais autofinanciadas e os condomínios fechados. O mercado imobiliário
buscava mercado estável e com capacidade de investimento frente ao cenário de
recessão. Para tanto, passou a buscar empreendimentos que atingissem um público
mais elitizado.
Os produtos para atingir este público eram os condomínios luxuosos residências
e não residenciais além de enclaves fortificados verticais ou horizontais. Para
empreender este tipo de produto imobiliário, os empreendedores passaram a buscar
áreas fora dos grandes centros. Nestas áreas além da disponibilidade e preço de terras
mais baixo, geralmente encontrava-se ainda legislações mais permissivas. Segundo
Caldeira (2000), apesar de cidades periféricas apresentarem benefícios e facilidades
para a implementação deste tipo de empreendimento, enclaves fortificados em áreas
antes pouco povoadas, via de regra não promove melhorias no entorno.
No governo de Collor (1990-1992) houve o confisco das cadernetas de poupança.
Vivia-se um período de estagnação na poupança e no FGTS, realidade que repercutia em
graves consequências para a política habitacional do Brasil que ficou severamente
comprometida. Neste contexto, a participação do Estado no mercado de terras era
reduzida, sendo regulada portanto tão somente as leis de mercado. Esta realidade
deixou a população de menor renda ainda mais distante da possibilidade de obter a casa
própria. “A atuação desse governo na área da habitação foi caracterizada por processos
em que os mecanismos de alocação de recursos que passaram a obedecer
preferencialmente a critérios clientelistas, característica do referido plano. “(RIBEIRO,
2007)
28
Com o esvaziamento de uma estratégia nacional para a questão habitacional,
estados e municípios passaram a desenvolver programas habitacionais alternativos.
Para tanto prefeituras passaram a utilizar-se de recursos orçamentários, com projetos
de um víeis mais social, segundo Bonduki, 2010. Nesta época, ocorre uma progressiva
transferência de atribuições para os estados e Municípios. Esta mudança teve como
marco a Constituição de 1988, que tornou a habitação uma atribuição concorrente dos
três níveis de governo. Ainda na fase pós-BNH acentuou-se a tendência de
descentralização dos programas habitacionais.
O governo de Itamar Franco redesenha as políticas habitacionais em vigência,
passando a direcioná-las para a classe baixa, que sob o controle do Ministério do Bem-
Estar Social, aumentando significativamente o controle social e a transparência da
gestão dos programas em questão (SILVEIRA, 2005). Destaca-se o lançamento do
Programa Habitar Brasil voltado para os municípios de mais de 50 mil habitantes, e o
Morar Município, destinado aos municípios de menor porte, ambos dependentes de
verbas orçamentárias ou de recursos advindos do Imposto Provisório sobre
Movimentação Financeira (IPMF). (RIBEIRO, 2007) Em sua reflexão, Azevedo (1996), diz
que apesar de importantes do ponto de vista político por avançar em relação à gestão
da política habitacional do ponto de vista operacional, de redução do déficit
habitacional, houve pouca efetividade.
O governo de Fernando Henrique Cardoso introduz uma nova política nacional,
com uma ampla reorganização institucional e a criação da Secretaria de Política Urbana
(SEPURB), que seria então responsável pelas políticas da habitação popular articuladas
com outras políticas públicas, como fundiárias, saneamento e obras de infraestrutura
urbana em geral, neste contexto. Dentre os programas criados no governo FHC, incluiu-
se, programas de financiamento voltados ao beneficiário final, carta de crédito,
individual e associativa e o Pró-Moradia e o Habitar-Brasil, programas focado na
urbanização de áreas precárias, juntos segundo SEPURB, 1988, investiram apenas 2
bilhões de dólares, entre 1995 – 1998 o que ilustra a pouca escala dos programas em
questão, essenciais na execução das políticas de habitação, sobretudo no que se refere
à urbanização de áreas precárias.
Os programas de financiamento voltados ao beneficiário final passaram a
absorver a maior parte dos recursos do FGTS através de financiamento de material de
29
construção e a aquisição de imóveis usados, além da Carta de Crédito Associativa, este
se tornou uma espécie de válvula de escape para o setor privado captar recursos do
FGTS para a produção de moradias prontas. O financiamento para aquisição de imóvel
usado se destacou devido a reter sozinho 42% do total de recursos destinados à
habitação, tal fato é segundo Bonduki (2010) devido à preocupação de evitar déficits nos
fundos destinados à habitação tendo em vista que esta modalidade dá maior garantia e
é de mais fácil acompanhamento, porém é um programa com escasso impacto, não
gerando empregos e atividade econômica.
Em reflexão sobre o conjunto de medidas habitacionais estabelecidas Souza
(2005) destaca o SFI:
A marca mais importante do financiamento habitacional no período tratado, entretanto não foi o conjunto de pequenas medidas que flexibilizaram o SFH mas a aprovação de uma proposta de autoria da ABECIP – Associação Brasileira de Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança, que contou com o entusiasmado apoio do Ministro do Planejamento A. Kandir, Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), que estendeu a alienação fiduciária aos imóveis urbanos. Ao contrário dos demais projetos de lei que têm uma diretriz mais social, e tramitam longamente no Congresso Nacional, o SFI teve uma tramitação relativamente rápida. Até mesmo seus proponentes reconhecem que dificilmente ele beneficiará as faixas de renda situadas abaixo de 12 S.M. pois trata de mecanismos do mercado privado. (SOUZA, 2005)
A importância do SFI está na diminuição dos riscos do empreendimento, com
maiores garantias ao órgãos financiadores e ainda menor regulação do estado, em um
contexto de Plano de Estabilização Fiscal (Plano Real) que a partir de 1993 permitiu o
controle da inflação e a retomada do crescimento econômico, com a economia em
ascensão permite-se a volta do crescimento da produção imobiliária privada através da
incorporação e financiamento direto em médio prazo, segundo Estudo de LACERDA,
apontado por Souza e Silva (2004), período é caracterizado pelo incremento da
produção imobiliária voltado para setores médios e altos, com previsão inclusive de
entender essa possibilidade para empreendimentos voltados a baixa classe média.
30
3.1.2. Condomínios horizontais no Brasil e no mundo
A partir do contexto analisado, os condomínios horizontais surgiram como uma
alternativa de solução habitacional para uma classe de maior renda. Esta tipologia pode
ser considerada como resultado das transformações por que passou a economia nas
décadas de 80 e 90 do século XX, especialmente com a reestruturação produtiva, o
neoliberalismo e a globalização. Este foi o cenário propício para a criação e reprodução
em larga escala dos condomínios fechados. Estes, por sua vez encontraram nas grandes
e médias cidades brasileiras dois aspectos importantes: um Estado que começa a perder
o seu poder de planejador e de agente de políticas públicas. Ao longo dos anos,
consolida-se a reprodução dos enclaves fortificados, assim como a ampliação da
influência mercado imobiliário a partir da ausência do estado. Em sintonia com este
contexto, Arantes (2010) argumenta:
Uma das consequências das transformações ocorridas nas grandes metrópoles mundiais é a proliferação do que Tereza Caldeira chamou de “enclaves fortificados”, “espaços privatizados, fechados e monitorados para residência, consumo, lazer e trabalho”. Ainda que cada cidade tenha seu específico contexto econômico, social, político, cultural e institucional, é possível dizer que nos últimos trinta anos tem havido uma proliferação desses empreendimentos em escala mundial (ARANTES, 2010)
Nesse contexto, destaca-se o fato de Andrade (2001) apud Souza e Silva (2004)
apontar para registros de loteamentos com ocupação semelhantes aos atuais
condomínios fechados no Brasil, com habitações não permanentes e voltadas para o
lazer, partindo da década de 1970, quando os condomínios fechados começam a fazer
parte no cenário das grandes cidades brasileiras, inicialmente incipientes e voltados
para classes de alta renda, sendo influenciada pelo modelo de modificações na
estrutura física e social dos subúrbios nos Estados Unidos, com a criação das gatted
comunnities, como resposta aos problemas gerados após a democratização das terras
nestas áreas distantes dos centros:
Os subúrbios se tornaram urbanizados e passaram a concentrar problemas semelhantes aos das grandes cidades. Alguns deles
31
passaram a atrair os pobres e grupos de minorias raciais, não apenas negros, mas imigrantes de todos os tipos, latinos, chineses, entre outros. Para BLAKELY; SNYDER (1997), esse foi o estopim para o surgimento dos enclaves fortificados residenciais, que recriaram o padrão suburbano alterando as formas de acesso, restringindo os outsiders, através de cercas, muros e grades, de modo a manter o seu espaço seguro contra os pobres, garantindo a riqueza e a proteção do valor das
propriedades. (ARANTES, 2011. p. 35)
A partir da consolidação deste tipo de empreendimento nos EUA, os enclaves
fortificados de residências se alastraram para as principais cidades mundiais.
Estruturados a partir do interesse do capital, os condomínios nascem a partir da intensa
ação do mercado imobiliário. Trata-se de um fenômeno cada vez mais atuante e
poderoso na conformação das grandes cidades, especialmente na América Latina, e
especificamente no Brasil. Segundo Arantes, apud Blad (2003) este tipo de
empreendimento está sendo implantado em diversas partes do mundo:
Um rápido crescimento da incorporação desses empreendimentos vem se dando na África do Sul, no Oriente Médio, em partes da Ásia e na América do Sul, embora em outras regiões, como a Europa, Canadá, Austrália e Nova Zelândia, a sua difusão venha se dando em ritmos mais lentos.
Falando especificamente da reprodução acelerada deste tipo de
empreendimento na América Latina, Andrade (2001) e Tavares (2009) apontam sua
aparição para a década de 1980, sendo consolidada na década seguinte, elencando
cidades como Santiago (Chile), Buenos Aires (Argentina) e São Paulo (Brasil). A estudiosa
D’ottaviano (2008) apud Tavares at all (2010, p. 5), destaca que “apesar da importação
do modelo de moradia pautado nos princípios das lifestyle communities, o discurso do
medo e insegurança nas principais capitais latino americanas, sem dúvida, tiveram e
têm, ainda hoje, um papel importante na expansão da tipologia”.
Neste sentido, a partir dos anos 80, se intensificou e consolidou no mercado
imobiliário nacional os condomínios. Fomentados pelo contexto econômico de
crescimento da economia e ascensão da produção imobiliária, setores médios e altos
optaram cada vez mais, entre outras alternativas, pela utilização de condomínios
fechados, em geral afastados dos grandes centros, muitas vezes em cidades vizinhas
com legislações mais permissivas, porém com acesso rápido aos mesmos, tendo em
32
vista que são bem conectados a grandes eixos. Ribeiro e Azevedo, citado por Azevedo
(2001), mencionam ainda, outra solução adotada por estas classes, que é a recuperação
de bairros populares bem localizados, que são reestruturados a medida que se criam
externalidades exclusivas e diferenciadoras em relação ao entorno, assim como uma
nova significação simbólica.
As novas tipologias habitacionais começaram a surgir, principalmente, nas
grandes cidades e principais capitais, propostas pelo mercado imobiliário para as
camadas mais abastadas da população: os flats, os condomínios fechados verticais de
edifícios de apartamentos e condomínios fechados horizontais de casas, além dos
loteamentos fechados, implantados nas cercanias dos perímetros urbanos e em
municípios vizinhos, áreas das chamadas regiões metropolitanas.
Entretanto, a produção dessa tipologia no Brasil encontra referência alguns anos
antes, com início da reprodução de tipologias semelhantes aos condomínios fechados
no Brasil destaca-se o ano de 1973, no qual a Construtora Albuquerque Takaoka lança,
na Grande São Paulo, o conceito Alphaville. Segundo site da empresa, o grupo tinha
inicialmente o objetivo de criar distritos para a instalação de empresas não-poluentes
porém, com o sucesso, teria surgido a demanda por uma área residencial e com isso o
conceito dos núcleos urbanos e empreendimentos horizontais Alphaville:
“desenvolvimento urbano planejado de setores residencial, comercial, lazer e, em
alguns casos, educacional, regidos pelo sistema de autogestão. ”
Inicia-se a fase de reprodução de condomínios formados a partir de loteamentos
fechados, como Alphaville e outros conjuntos residenciais, pioneiros, que lançaram as
bases para que outros conjuntos com as mesmas características fossem implantados
dentro da malha urbana de São Paulo e de outras cidades brasileiras, de acordo com o
estudo de Môncaco dos Santos (2003).
Os condomínios horizontais fechados propriamente ditos vão aparecer na cidade
de São Paulo apenas uma década depois dos loteamentos periféricos, por volta de
meados da década de 1980. Pode-se definir condomínio horizontal fechado como um
agrupamento de unidades habitacionais unifamiliares, com acessos independentes,
construído por um empreendedor, de acordo com projeto que abarca o conjunto
edificado e as residências.
33
Segundo Santos (2003), os condomínios fechados, verticais e horizontais, assim
como os loteamentos fechados, já fazem parte das opções de moradias para a
população de parte significativa das grandes e médias cidades brasileiras, se
reproduzindo de forma acelerada com grandes consequências para as cidades, tendo
em vista que apesar da sua reprodução acentuada a maioria das cidades brasileiras, não
possui ainda legislação específica que viabilize a implantação desses empreendimentos
em seus perímetros urbanos. Mesmo assim, tais conjuntos estão sendo construídos
cada vez mais, muitas vezes embasados em soluções legais controversas.
3.2. A Segregação
3.2.1. A segregação e a formação da cidade dual
O processo de urbanização é complexo e cheio de contradições, marcado desde
seu início pelas tensões sociais e pelo jogo de interesses entre as diversas classes sociais.
Nesse sentido, a ocupação desigual da cidade reflete espacialmente uma segmentação
social, o que permanentemente esteve presente nas cidades. Andrade (2010. P. 2)
menciona que a segregação se materializou de maneiras diferentes durante a história
da humanidade, de acordo com a realidade social de cada época. Lefrebvre (2004)
menciona que “social e politicamente, as estratégias de classe (inconscientes ou
conscientes) visam à segregação” (LEFEBVRE, 1969, p.90). Em relação a esta
característica social, o autor alerta sobre seus perigos:
A separação e a segregação rompem a relação. Constituem, por si sós, uma ordem totalitária, que tem por objetivo estratégico quebrar a totalidade concreta, espedaçar o urbano. A segregação complica e destrói a complexidade (LEFEBVRE, 2004, p. 124).
Contemporaneamente, novas formas de habitat urbano se propõem a configurar
áreas de homogeneidade socioeconômica, os “enclaves fortificados”, ou “condomínios
fechados”. Estes possibilitam o antigo sonho da “convivência entre iguais”, através de
mecanismos de segurança e distinção simbólica espacial.
34
Na cidade contemporânea, ela [a segregação socioespacial] vem (re)assumindo características cada vez mais rígidas. A conjunção dos problemas urbanos atuais – desigualdades sociais abissais, informalidade e irregularidade fundiária, precariedade e déficit habitacional, dificuldades de acessibilidade e mobilidade urbana, prevalência do automóvel particular como meio de transporte, crescimento desordenado e espraiamento das cidades, grandes distâncias e vazios urbanos, degradação e abandono de regiões centrais - levam a uma fragmentação da urbe, construindo uma atmosfera de insegurança e violência que se reflete em disposições espaciais que promovem isolamento, controle e privatização dos hábitos cotidianos. (ANDRADE, 2010. p. 3)
Inseridos em um contexto de crescimento desordenado da cidade, em que a
cidade dual e sua concentração de renda e demais problemas sociais se refletem na
violência e decadência de espaços públicos, os condomínios expresso do tipo “enclave
fortificado” são justificados pelo medo da criminalidade urbana, que é utilizada pelos
agentes (re)produtores do espaço para tornar estes empreendimentos cada vez mais
objetos de consumo, gerando lucros e se tornando um fenômeno urbano condensador
de transformações sociais e espaciais que se fazem presentes em diversas cidades
brasileiras (ANDRADE, 2010), inclusive em Natal (ASSIS, 2011), como menciona Tavares
(2008) a seguir:
Os condomínios fechados horizontais já fazem parte da realidade da cidade de Natal, se constituindo em um novo tipo de prática socioespacial que tende a proporcionar significativas transformações no tecido urbano da cidade. Estas transformações estão relacionadas não só ao plano da configuração espacial, mas também no que diz respeito ao desenvolvimento das interações e relações entre os diversos grupos sociais. (TAVARES, 2008. p. 16)
Nesse contexto, de rápido crescimento urbano e emergência de novas formas de
produção do espaço, faz-se necessário refletir sobre as práticas socioespaciais que
surgem a partir da disseminação desse tipo de moradia, e quais seriam as consequências
para as cidades reais, uma vez que este tipo de simulacro nega a cidade habitada e traz
atividades antes realizadas em espaços públicos para esses espaços privatizados,
desafiando assim a noção de bens públicos e de domínio público.
35
A segregação – tanto social quanto espacial - é uma característica importante das cidades. As regras que organizam o espaço urbano são basicamente padrões de diferenciação social e de separação. Essas regras variam cultural e historicamente, revelam os princípios que estruturam a vida pública e indicam como os grupos sociais se inter-relacionam no espaço da cidade. (CALDEIRA, 2000. p. 211)
Para melhor entendimento das práticas sociais engendradas é necessário
conhecer as estratégias utilizados pelos incorporadores imobiliários, na medida em que
impõem uma espacialização que ignora o entorno e rompe com a continuidade da
paisagem (MOURA, 2008. P.132) e ainda as formas imateriais que se estabelecem nesse
contexto, que corroboram para a ruptura estabelecida entre a cidade e os condomínios
fechados, seria mesmo possível negar de forma decisiva a cidade como a imagem
vendida pela publicidade desenvolvida para este tipo de empreendimento:
A versão residencial (...) deles [enclaves fortificados] estão mudando consideravelmente a maneira como as pessoas das classes média e alta vivem, consomem, trabalham e gastam seu tempo de lazer. Eles estão mudando o panorama da cidade, seu padrão de segregação espacial e o caráter do espaço público e das interações públicas entre as classes. (CALDEIRA, 2000, p. 258)
A leitura espacial e as práticas sociais estabelecidas entre o entorno e o
condomínio fechado são fortemente impactadas pela sua configuração, trazendo
influências relevantes para a própria cidade. A sociabilidade de uma maneira geral
também é prejudicada, uma vez que se desvincula as relações sociais interiores das
exteriores nesse tipo de empreendimento, que se constituem como bolhas. Estas bolhas
artificiais rompem o intercâmbio entre os diferentes grupos sociais e provocando assim
a fragmentação social do tecido urbano. Sobre as consequências da implantação dos
condomínios fechados, Lefebvre (2004) alerta:
Esta segregação implica em uma série de consequências, desde as de cunho sócio-cultural-econômico, isto é, relacionada com a sociabilidade e questões de estratos sociais, até a naturalização dos espaços fechados como parte da paisagem natural e, ainda, aspectos infraestruturais (a forma como se constitui a cidade: periferia versus bairro nobre). Nesse sentido, os condomínios
36
horizontais fechados interferem na vida dos residentes, bem como na constituição da cidade. (ASSIS, 2011. p1.)
Diante dos conceitos trazidos neste tópico este exercício acadêmico será
desenvolvido a fim de analisar como se dá a articulação entre as tipologias de bairro
popular (nesta oportunidade Cidade da Esperança, Cidade Nova, N. S. de Nazaré) e
condomínios fechados (no caso os Condomínio de Classe Alta Residencial West Park
Boulevard, West Side Boulevard, Green Woods e Green Village), do ponto de vista
espacial e social, procurando entender a sociabilidade na região, refletindo sobre os
efeitos das estratégias projetuais desses condomínios nas relações sociais e espaciais
estabelecidas na área.
3.2.2. Segregação Socioespacial
Segregação é, segundo Lefebvre (1969) o rompimento do intercâmbio entre os
grupos sociais, ou a fragmentação social do tecido urbano. Nesse sentido, converte-se
em um conceito fundamental para o entendimento das relações engendradas em áreas
que aproximam e, ao mesmo tempo, afastam grupos socioeconomicamente diferentes,
como os condôminos dos empreendimentos estudados e os moradores do seu entorno
imediato.
Relacionar-se menos com os desiguais, é segregá-lo do seu convívio, um conceito
ainda mais profundo é gerado uma vez que esta distância social se materializa,
adquirindo uma expressão espacial, através da estruturação do espaço urbano, sendo
assim acontece a segregação socioespacial, segundo Negri (2008). Nesse sentido
Andrade (2010) refere-se a este conceito, identificando que ambos – segregação e
distância social – têm pelo menos duas dimensões: a espacial e a social e é neste
momento em que os Estudos Urbanos passam a relacionar-se com o tema.
O interesse pelos padrões de sociabilidade presentes na área de estudo, onde a
tipologia condomínios fechados é bastante recorrente, contrastando com ocupações
residenciais tradicionais e consolidadas, parte da inquietude com relação à restrição da
interação entre os socialmente diferentes, que segundo Freeman, (1978) produz para
segregação.
37
Para melhor compreensão desse processo faz-se necessário um estudo
cronológico dos modelos de segregação. Destaca-se portanto Oscar Yujnovsky e a
sistematização que ele traz acerca da construção da segregação socioespacial na
américa-latina, através de três períodos distintos e subsequentes. Para isso, ele
identifica a presença de diferentes padrões de segregação produzidos no processo de
urbanização avançados, destacando que no continente sul americano, este teria
ocorrido de forma semelhante, porém com defasagens temporais.
A primeira fase é compreendida pelo século XVI e meados do século XIX (1850)
e corresponde a quase todo o período colonial. Este período, que é caracterizado pela
centralidade das moradias da classe de maior renda, nesta fase o planejamento das
cidades seguia as regras estabelecida pela Lei das Índias, considerada o primeiro código
de urbanismo da cidade moderna, utilizada nas cidades coloniais espanholas por Felipe
II de Espanha, em 1537.
O modelo de segregação é semelhante ao de Kohl, definido por Elizabeth
Cardoso (2010), como:
O modelo de Kohl foi formulado em 1841 e tomou como base uma generalização da distribuição dos grupos sociais nas cidades da Europa continental. Neste modelo, a elite se segregava localizando-se junto ao centro, enquanto que na periferia viviam os pobres. A localização das elites junto ao centro se justificava pela pouca mobilidade da população devido às deficiências dos meios de transporte e à necessidade das elites de se localizaram próximas aos prédios que abrigavam as mais importantes instituições: palácios de governo, Igrejas, instituições financeiras e comércio. (CARDOSO, 2010, p. 76)
A segunda fase está compreendida pelos anos de 1850 a 1930, e é
caracterizada pela mudança do padrão de habitação da sociedade, quando a classe de
maior renda passa a morar mais distante do centro. Eles passam a viver longe dos
centros pois a periferia atinge um ao satisfatório nível de desenvolvimento e existem
possibilidades eficientes de locomoção, os centros passam a ser ocupados por pessoas
de menores ou nenhuma renda, com a formação de cortiços próximos aos locais de
trabalho da classe operária.
Esta realidade é bem representada segundo (o) modelo de segregação de E.
W. Burguess, descrito por Elizabeth Cardoso (2010) como:
38
Na década de 1920, E. W. Burguess, tomando como base as grandes cidades norte-americanas, desenvolveu outro modelo, oposto ao anterior, onde os pobres localizavam suas residências junto ao centro degradado pelo excesso de funções comerciais, industriais e de serviços que abrigava, enquanto as elites demandavam os subúrbios. Ou seja, os prazíveis arredores das cidades. Estes fatos sugerem uma sequência destes modelos ou padrões na organização espacial da cidade, fato que tem surtido várias discussões. (CARDOSO, 2010, p3)
A terceira fase da sistematização de Yujnovsky é conhecida como centro-
periferia e acontece aproximadamente a partir dos anos 1930. Diante disto acentua-se
a preferências da classe de maior renda por determinadas áreas dotadas de
amenidades, a medida em que, paralelamente, se direciona à periferia das cidades um
grande fluxo migratório, composto principalmente de trabalhadores rurais, que acabam
residindo em loteamentos populares, favelas ou conjuntos habitacionais financiados
pelo Estado.
Esta realidade é bem representada segundo modelo de segregação de Hyot,
descrito por Corrêa (1989) apud Cardoso (2010), como:
Por fim, tem-se o modelo de Hoyt, formulado em 1939, que, ao contrário dos anteriores, não demonstrou um padrão de segregação espacial em círculos concêntricos a partir da área central e sim se concretizou em forma de setores de círculo a partir do centro. Este modelo permite verificar que os setores residenciais de alto status localizam-se nas áreas de maiores amenidades, que são cercadas pelas camadas de médio status da população em outros setores, enquanto que no sentido oposto se encontrariam os setores ocupados por populações de baixo status social. (CORRÊA, 1989 apud CARDOSO, 2010. p.76)
Esse padrão centro-periferia de segregação marcou a constituição das
metrópoles brasileiras a partir das décadas de 1960 a 1980, segundo Santos (2013) e
ainda predomina em todas as áreas urbanas, especialmente as metrópoles.
A fase atual do processo de segregação, segundo Negri (2008), Santos (2013) e
Cardoso (2010), teve início a partir da década de 1980, e segundo uma nova forma de
segregar sócio espacialmente. Denominado modelo fractal, é caracterizado pelaauto
39
segregação das camadas de alta renda e marcado pela proximidade física e
distanciamento social entre os grupos. Esta fase ganha força a partir da década de 1990,
reproduzindo-se com ainda mais intensidade na década de 2000. Um dos principais
elementos desse novo padrão de segregação são os condomínios fechados, tema
desenvolvido no presente trabalho desta monografia. Segundo santos a escala gráfica
da segregação sofre mudanças com esse novo paradigma:
O modelo fractal de segregação relaciona-se com o processo de redução da escala geográfica da segregação, proposto por estudiosos da evolução do padrão de segregação nas cidades latino-americanas (SABATINI; SIERRALTA, 2006; VIGNOLI, 2001). Segundo esses autores, há uma mudança no padrão de segregação da escala metropolitana para a microescala (intraurbana), embora a segregação em grande escala (metropolitana) não deixe de existir. (SANTOS, 2013 , 58)
Este processo é diferenciado em relação aos demais modelos de segregação,
tendo em vista que as classes sociais diferentes apresentam uma aproximação física,
ainda que, mantendo um grande distanciamento psicológico e social, como afirma
Caldeira (2000):
Sobrepostas ao padrão centro-periferia, as transformações recentes estão gerando espaços nos quais os diferentes grupos sociais estão muitas vezes próximos, mas estão separados por muros e tecnologias de segurança, e tendem a não circular ou interagir em áreas comuns. O principal instrumento desse novo padrão de segregação espacial é o que chamo de ‘enclaves fortificados’, Trata-se de espaços privatizados, fechados e monitorados para residência, consumo, lazer e trabalho. A sua principal justificação é o medo do crime violento. Esses novos espaços atraem aqueles que estão abandonando a esfera pública tradicional das ruas para os pobres, os ‘ marginalizados’ e os sem-teto. (CALDEIRA, 2000, 45)
Nesse sentido, é preciso refletir sobre as consequências da redução da escala da
segregação, que pode acirrar conflitos socioterritoriais, uma vez que, apesar de
justapor-se às áreas mais pobres, substitui as distâncias físicas do modelo centro-
periferia pelos aparatos de segurança que garantem o distanciamento sociocultural,
através da decisão de manter-se isolado, ou seja, auto segregando-se das camadas mais
pobres e do ambiente do entorno.
40
Na implantação de um condomínio fechado separa-se condôminos de não
condôminos, através de muros, grades, muros verdes, e segrega-se, a medida em que
barreiras físicas e simbólicas são impostas com vistas a negar as possíveis relações ou
interações entre os que compõe o grupo de moradores do condomínio e os que estão
fora de seu perímetro. Nesse padrão identifica-se premissas básicas da segregação,
como podemos ver na definição de Lefebvre citado por Tavares, 2009: “a separação e a
segregação rompem a relação. Constituem, por si sós, uma ordem totalitária que tem
por objetivo estratégico quebrar a totalidade concreta, espedaçar o urbano. A
segregação complica e destrói a complexidade ”. (LEFEBVRE, 2004. P. 124.)
Sendo assim, a complexidade da sociedade atual em questões habitacionais leva-
nos a tentar entender a separação entre as classes sociais nas cidades, que configura-se
não apenas espacialmente, como também, socialmente segundo Negri (2008).
Intrinsicamente atrelado à urbanização e suas dualidades e contradições, a segregação
está relacionada ao jogo de interesses que desenha o espaço urbano, como as políticas
públicas urbanas, a influência das classes de maior renda, e a atuação do mercado
imobiliário. Nas palavras de Negri (2008): “Considera-se, ainda, como um fenômeno
essencialmente espacial, e não como um mero reflexo das diferenças sociais, mas um
espaço que é produzido e organizado de acordo com os interesses das diferentes
classes. (NEGRI, 2008. P. 148)
A realização dos interesses da classe dominante no tocante a garantir-lhes
vantagens na estruturação do espaço é a própria segregação. Nesse sentido os estudos
de Flávio Villaça, 1997 destacam três esferas de controle na produção e consumo do
espaço urbano por parte do Estado. Ainda em relação as esferas, Negri (2008) elenca:
(1) Esfera Econômica: através do controle do mercado imobiliário, que atende os desejos de localização espacial da classe dominante. (2) Esfera Política: ocorre pelo controle do estado, que se manifesta de três maneiras: Controle sobre a localização da infraestrutura urbana, Controle da localização dos aparelhos do Estado, Controle da legislação de uso e ocupação do solo urbano (3) Esfera ideológica: através do desenvolvimento de ideias dominantes que visam auxiliar, em determinados momentos, a dominação da sociedade e aceitação por parte de seus ideais. (NEGRI, 2008, p. 150)
41
A segregação, ainda segundo o mesmo autor, se intensificou diante da política
econômica recessiva dos anos 1980 e 1990 no Brasil, e a sua consequente falta de
investimento em políticas habitacionais e de infraestrutura urbana, ao longo do
processo de urbanização, que diante da realidade política e econômica da época
baseou-se na autoconstrução, em favelas e loteamentos sem infraestruturas
adequadas, alicerçadas na prevalência da especulação imobiliária sobre o direito à
cidade.
A falta de proatividade do Estado está em sintonia com o projeto neoliberal do
modo de produção capitalista, que se fundamenta na liberalização do mercado
imobiliário, com sua forte participação na reprodução do espaço urbano com vistas ao
lucro. Essa realidade perversa tem aumentado as disparidades na organização e no
acesso ao espaço público e na infraestrutura urbana como foi discutido no capítulo 2.
Em sintonia com o que foi dito, está o conceito de segregação de Tavares, “O processo
de segregação socioespacial é produto da ação dos agentes modeladores que produzem
o espaço social de acordo com seus interesses de classe” (TAVARES, 2009, 46),
controlando o mercado de terras, a incorporação mobiliária e a construção, de forma a
direcionar seletivamente a localização dos demais grupos sociais no espaço urbano
(Correia, 1989, 46).
A pesar de existirem diversas formas de segregação no Brasil, a maioria das
pesquisas demonstra que o principal tipo de segregação encontrada é socioeconômica,
por meio da qual as classes sociais distribuem-se de forma desigual no espaço urbano
das grandes e médias cidades. Desta forma, surge uma estrutura urbana dualizada entre
ricos e pobres, uma organização espacial corporativa e fragmentada, onde as elites
podem controlar a produção e o consumo da cidade, através de instrumentos da ação
do Estado e do mercado imobiliário, excluindo e abandonando a população de menor
renda à própria sorte (NEGRI, 2008, p. 150)
O fenômeno da segregação urbana faz-se ainda mais perverso por sua
característica de retroalimentação. Nas palavras de Negri (2008), o segregado tem
chances desiguais de ascender socialmente. Segundo Roitman (2003), isto acontece pois
além de aumentar as diferenças e divisões sociais, a segregação ainda reduz as
oportunidades de trabalho e aumenta a vulnerabilidade social dos que sofrem com ela.
Sendo assim é preciso compreender que a segregação não apenas diferencia e separa
42
grupos sociais, mas, também age diretamente nas possibilidades de exercício da
cidadania, influenciando na maneira díspare nas forma de acesso desses grupos aos
recursos e serviços coletivos (empregos, serviços sociais, infraestrutura etc) e, neste
sentido, a segregação espacial contribui para a produção da exclusão social. Como
podemos perceber no trecho de Negri (2008) sobre as consequências da segregação
espacial:
Ser segregado espacialmente, significa ter oportunidades desiguais em nível social, econômico, educacional, renda, cultural o que lhe confere condições mínimas de melhorar socialmente ou economicamente. Implica, na maioria dos casos, em apenas reproduzir a força de trabalho disponível para o capital. Maioria dos investimentos em bairros de mais alta renda Investimentos públicos não chegam ou chegam de maneira precária, o que reflete nos índices de instrução, saúde, entre outros (pobreza miséria e violência). (NEGRI, 2008, p. 136)
Além dos prejuízos mencionados anteriormente este autor, menciona os riscos
do prejuízo cultural, relativo ao modo como o segregado enxerga o mundo e qual a sua
consciência objetiva de seu estado de segregado social e espacial, considerando a sua
atitude em relação à sua condição de excluído.
Em relação a segregação sócio econômica, Negri (2008) afirma em reflexão sobre
a influência da condição econômica para a localização da habitação, assim como um
instrumento de controle de classes, que:
O que se pode afirmar é que essas relações nos dias atuais se dão muito mais em função de fatores econômicos. As maneiras como as classes se distribuem no espaço urbano dependem do acúmulo de capital individual que cada um consegue ter (...). A segregação não é simplesmente e somente um fator de divisão de classes no espaço urbano, mas também um instrumento de controle desse espaço. (NEGRI, 2008, p. 135)
Ainda em relação a este tipo de segregação, como consequência desta
distribuição díspare surge uma estrutura urbana desigual, em que o espaço se consolida
como condicionador das condições sociais a medida em que configura-se uma
distribuição espacial desigual dos segmentos sociais. Esta realidade tem por
consequência o aumento das diferenças sociais, pois a segregação acaba por garantir
43
feição espacial às desigualdades sociais. A estruturação da cidade segue então as
seguintes características, mencionadas por Silvio Negri (2008):
Uma cidade dualizada entre ricos e pobres, uma organização espacial corporativa e fragmentada, onde as elites podem controlar a produção e o consumo da cidade, através de instrumentos como o Estado e o mercado imobiliário, excluindo e abandonando a população de baixa renda à própria sorte (NEGRI, 2008, p. 250)
De uma forma geral a formação de espaços homogêneos são prejudiciais à
interação entre diferentes e a desejável complexidade das cidades. Em relação a isso
LEFEBVRE, 2004, entende a segregação como resultado de um processo social que
conforma a formação de espaços homogêneos que, por sua vez, não só diferenciam,
mas também segregam, a medida em que separam, ou seja, inibem a comunicação entre
os diferentes grupos sociais.
Para Manuel Castells, a segregação residencial é “a tendência à organização
do espaço em zonas de forte homogeneidade social interna e com intensa disparidade
social entre elas, sendo esta disparidade compreendida não só em termos de diferença,
como também de hierarquia”(Castells, 2001, p. 210). Segundo Sílvio Negri (2008), a
divisão por diferença no Status Hierárquico reflete e reproduz as relações de poder na
cidade. Essa categoria é representada, por exemplo, por um enclave (condomínio
fechado) ou pela distribuição dos serviços públicos pelo Estado.
Remetendo o conceito de segregação para o objeto de estudo desta monografia,
os condomínios fechados, Andrade(S/D) refere-se ao fato de que “condomínios
fechados, guetos e certas áreas periféricas destinadas aos estratos sociais mais pobres
são espaços altamente segregados na medida em que concentram pessoas
semelhantes”(Andrade, S/D. p. 35), lembrando que comunidades homogêneas são
segregadas e segregantes, a medida em que segregação “é um processo dialético, em
que a segregação de uns provoca, ao mesmo tempo e pelo mesmo processo, a
segregação dos outros (VILLAÇA, 1998, p. 148 apud TAVARES, 2009)
A diferença entre essas realidades é, segundo Andrade (S/D) que no condomínio
fechado os grupos sociais mais abastados têm o poder de optar pelo convívio entre
iguais, ou seja, a segregação ou a vontade de manter o outro distante é imposta e
materializada em barreiras físicas, como muros altos, cercas, muros verdes, além dos
44
elementos simbólicos como os pórticos de entrada (dimensão e localização). De
maneira intencional, essas estratégias projetuais, lançam mão de artifícios para
diferenciar-se e dar sensação de status. Para tanto, usa de influências junto ao Estado.
Este, por sua vez, em detrimento dos interesses coletivos, cede, permitindo esse tipo de
produção de moradia muitas vezes em desacordo com a legislação vigente. Isto faz com
que os condomínios sejam construídos e vendidos em muitas cidades brasileiras,
grandes e médias. Sobre o fato Negri (2008) assinala:
O Estado adquire um papel crucial, porque acentua a segregação através de legalizações para instalação de condomínios fechados, cercamento de bairros, suburbanização da classe alta, facilitação de transporte, entre outros mecanismos que facilitam a segregação. (NEGRI, 2008, p. 149)
Soma-se a esta realidade o controle do acesso por parte da segurança privada e
tecnologia empregada, que garantem, entre outros aspectos, o distanciamento dos que
vivem no entorno imediato do condomínio fechado, impedindo-os, também, de
adentrar em suas dependências. Devido as particularidades dessa nova forma de morar
que engendra uma relação diferente entre o espaço e as pessoas a sua volta, introduz-
se uma nova realidade social, mencionada por Silva, Costa, 2011:
Assim, ao nos remetermos a esta nova realidade social, podemos, segundo Caldeira, afirmar que “os enclaves fortificados - prédios de apartamentos, condomínios fechados, conjunto de escritórios ou shopping centers - constituem o cerne de uma nova forma de organizar a segregação, a discriminação social e a reestruturação econômica” (2000, p. 255). (SILVA, COSTA, 2011, 24.)
Nesse sentido, Tavares (2009) menciona que os condomínios são enclaves
excludentes, uma vez que é evidente a capacidade dos grupos que o compõe ou
idealizam isolar-se ou manter distância dos demais grupos sociais, os são considerados
“indesejáveis” pelos condôminos. MARCUSE (2004, p. 25), menciona essa forma de
segregação como segregação de status ou “enclave excludente”, tendo em vista que:
“Um enclave excludente (exclusionary enclave) é uma área de concentração espacial na qual os membros de um determinado
45
grupo populacional, definido por sua posição de superioridade em termo de poder, riqueza ou status em relação a seus vizinhos, aglomeram-se de modo a proteger essa posição.” (MARCUSE apud TAVARES, 2009, 36)
Em relação aos enclaves fortificados, ANDRADE menciona sua capacidade de
modificar a paisagem urbana, conferindo ao espaço urbano novas funções,
configurando verdadeiros enclaves sociais, com ativa contribuição para a fragmentação
das relações humanas, com intensificação do individualismo, e do desrespeito e
desatenção aos interesses coletivos que acabam deturpados a medida em que existe
forte indefinição dos interesses públicos e privados na sua implementação e
consolidação.
Segundo Andrade (S/D) os condomínios são prejudiciais a sociabilidade tanto
externa, em relação ao entorno, quanto interna, como podemos perceber:
Morar em um condomínio é uma forma de marcar claramente as distâncias espaciais, sociais e também simbólicas em relação aos outros, ou seja, aos que estão do lado de fora. No entanto, o mundo de iguais não é necessariamente um mundo coeso e solidário, ou um mundo de fortes laços de sociabilidade. A vida em condomínios é vista também como a possibilidade de uma vida mais individualizada e com maior privacidade até mesmo em relação ao próprio grupo de moradores; (...) Nos condomínios a distância dos mais próximos é possibilitada pelas moradias unifamilares em lotes de grandes extensões. (ANDRADE, S/D. p. 6)
Diante de uma realidade de prejuízo para as relações sociais na urbe, a expansão
acentuada dos condomínios horizontais na malha urbana das cidades deve ser foco de
debate na sociedade, pois antes de aceitar tacitamente sua expansão e reprodução é
necessário saber suas consequências para a cidade e suas relações desejáveis de
complexidade e urbanidade. Nesse sentido Andrade (2001), Sogame (2001), Moura
(2003) e Le guirriec e Marques (2007), definem os condomínios fechados como espaços
de exclusão sendo opostos ao uso democrático da cidade uma vez que, criam barreiras
físicas que se contrapõem a sociabilidade entre os grupos sociais, além de cerrar espaços
que deveriam ser públicos.
Entende-se, portanto, condomínios horizontais como empreendimentos que
engendram uma relação de segregação bastante complexa com o entorno, à medida
46
que se inserem em regiões periféricas, negando suas adjacências, privatizando serviços
coletivos, necessários não apenas aos condôminos, mas também aos moradores do
entorno. Essas características se afirmam cada vez mais perversas, constituindo-se em
barreiras, que separa grupos sociais de uma forma tão explícita, transformando a
qualidade do espaço público e a relação de urbanidade e vitalidade da área, como será
visto no desenvolver deste trabalho.
3.3. Sociabilidade e sua relação com a forma urbana
3.3.1. Urbanidade e Desurbanidade
Urbanidade é um tema relativamente recente e bastante complexo, que segue sendo
debatido e delineado pelos estudiosos de diversos campos de conhecimento, em particular da
Arquitetura e Urbanismo. As primeiras discussões foram desenvolvidas ao longo da segunda
metade do século XX, num contexto em que passou-se a reconhecer o fracasso urbanístico do
movimento moderno. Em reflexão sobre os motivos que teriam levado as cidades projetadas na
época ao fracasso, chegou-se à conclusão que faltava-lhes uma característica fundamental,
urbanidade, a partir de então passou-se a pesquisar o tema.
Desde então, alguns autores contribuíram para a formulação dos elementos da
urbanidade, dentre eles destacam-se Jane Jacobs, Kevin Lynch, Bill Hillier e Julienne Hanson e
Frederico de Holanda. Dentre estes autores, abordara-se nesta revisão conceitual os trabalhos
de Jacobs (1961), desenvolvido ainda na década de 1960, que tornou-se um emblema nesta
linha, além de estudos atuais desenvolvidos pelo grupo Urbanidades de Douglas Aguiar (2012),
que serão base para as reflexões feitas acerca das qualidades do urbano na análise morfológica
a ser feita no desenrolar desta monografia.
Levando em consideração a discussão desenvolvida nesta monografia, não há conceito
que expresse melhor os condicionantes das relações e interações sociais mediadas pela cidade
do que o de urbanidade, entendido como um conjunto de qualidades boas ou más que
constituem a cidade, segundo Vinicius M. Netto et all (2012)2. Capaz de traduzir o espírito
urbano, o conceito em questão seria, segundo o autor, um dos aspectos mais abrangentes da
vida urbana.
O espaço urbano é produzido pela sociedade a partir de relações sociais de produção
marcadas pela atuação dos atores sociais e ao mesmo tempo influenciando-as, tendo em vista
2Netto, 2012.
47
que não é inerte. Para melhor compreender de que forma esta relação se estabelece é
importante perceber que a “Sociedade é um sistema de encontros e esquivanças.” (HOLANDA,
2007, p. 1) no qual a forma estabelece que: “Barreiras e permeabilidades ao movimento somam-
se a outras, referentes à opacidades e transparências à visão.” (HOLANDA, 2007, p. 2).
Dessa forma, o espaço urbano é atuante na sua construção e reconstrução, à medida
que afeta a experiência cotidiana das pessoas. Esta realidade se dá, devido a estrutura material
que nos antecede que, por sua vez, media nossa experiência de mundo, que é material, como
podemos perceber no texto de Netto:
Espacialmente, nossas posições e movimentos não são inteiramente livres, irrestritos, mas modelados por uma estrutura material que nos antecede e nos cerca. Nossa experiência é construída por sentidos que capturam informação sensorial do ambiente (veja Merleau-Ponty, 1962), um ambiente largamente moldado por sob forma de cidades. Cidades passam a ser formas de mediação da nossa experiência física, material do mundo. (NETTO, 2012, p. 38)
As características e as relações estabelecidas do espaço urbano influenciam na
urbanidade a medida em que são atuantes na geração de encontros, sobretudo entre
habitantes e estranhos através de qualidades essencialmente materiais que repercutem
diretamente no comportamento e no bem estar das pessoas no espaço público.
Nessa perspectiva, a importância desse conceito ganha destaque na análise dos
espaços urbanos, à medida em que se debruça sobre os arranjos materiais da vida
coletiva, permitindo espacializar as relações espaço/corpo. Que por sua vez está
atrelada a algumas características do espaço que teriam influência nessas interações.
Para Netto (2012), “Urbanidade é uma propriedade robusta, chave; uma propriedade
que parece endereçar o coração da vida urbana e suas condições. (NETTO, 2012, p. 13)
Segundo Aguiar (2012), a urbanidade enquanto qualidade do espaço urbano se
dá, ainda, a medida em se sobrepõe características que estimulem pessoas a buscar
estes lugares, tal feito pode dar-se pela atratividade do próprio lugar, ou pela sua
configuração espacial, sendo aquela área conectada com outros polos, tornando-se
portanto passagem para eles. (AGUIAR, 2012, p. 77)
O conceito de configuração espacial, segundo Edja Trigueiro (2005) é o de “todo
resultante de partes que se relacionam entre si e cuja relação não pode ser alterada sem
que se altere o todo, uma vez que é esse sistema de relações que determina a natureza
48
do todo.” (TRIGUEIRO, 2005, p. 5), sendo determinante para a relação entre forma e
espaço, e portanto essencial para compreensão de fenômenos socioespaciais.
Hillier (1996) demonstra que a configuração espacial condiciona a funcionalidade urbana, a distribuição de usos do solo residencial e comercial, segurança pública, variação de densidades e qualifica as cidades como “economias do movimento”. Argumenta que o movimento natural desencadeia efeitos multiplicadores, com a presença de atividades de atração de população e geradoras de oportunidades. (TRIGUEIRO, 2005, p. 5)
Faz-se necessário portanto, relacionar as configurações espaciais aos sistemas
de interação entre pessoas, suas formas de encontros, como trocam informações, ou
seja, as maneiras de organização de grupos em sociedade. Desta forma sobrepondo
informações relativas aos espaços e a sociedade: enquanto o primeiro é tido como
sistema de barreiras e permeabilidades ao movimento das pessoas, o segundo é visto
como um sistema de encontros interpessoais. Nesse sentido, características físicas do
espaço público influenciam na menor ou maior promoção de encontros, esta dimensão
é a copresença, esta é tão importante para o conceito de urbanidade, que para Netto,
ela pode ser conceituada como: “Copresença dos diferentes modos de ser”3. Referindo-
se a esta dimensão do espaço urbano, Netto menciona atividades que contribuem para
a integração do mundo social:
Enquanto cenário da integração do mundo social, a cidade deve em sua materialidade reconhecer a centralidade da coexistência e da comunicação e sua condição ética, a medida em que seus espaços fomentam a civilidade no convívio, através de características espaciais que estimulem a copresença dos diferentes modos de ser, a comunicação livre de coerção (Habermas), a orientação para o outro (Heidgger), assim como o bem-vir às diferenças (Derida).4
Os atributos influenciadores da urbanidade mencionados por Netto são: espaço
público bem definido, forte contiguidade entre edifícios, frágeis fronteiras entre espaço
interno e externo, continuidade e alta densidade do tecido urbano, entre outros. No
entanto, Netto também afirma que a relação entre arquitetura e urbanidade é de
3 (NETTO, 2012. P. 19) 4(NETTO, 2012. P. 20)
49
estabelecimento, pela primeira em relação a segunda, de possibilidades e de restrições
que têm sua repercussão segundo as circunstancias, não sendo portanto uma relação
de determinação.5
Os mesmos aspectos são mencionados por Holanda, em suas palavras:
densidade de edificações, constituição do espaço de maneira a favorecer a boa conexão
entre espaço público e privado, e a boa condição de integração espacial, como podemos
perceber no fragmento de texto abaixo, escrito por Aguiar.
Holanda (2003:16) conceitua urbanidade como uma condição “simultânea ao espaço físico e aos comportamentos humanos” e que se caracterizam pela minimização dos espaços abertos em prol de ocupados”, ou seja, na densidade de edificações; na existência do maior número de portas para lugares públicos, jamais paredes cegas, ou seja, na constituição do espaço; na minimização dos espaços segregados, guetizados, becos sem saída[...] ou seja, na busca da condição de integração espacial decorrente do posicionamento do espaço no todo maior, ou a condição de rede. (AGUIAR, 2012, p. 70)
Suporte e resultado de práticas interpessoais reproduzidas no meio urbano, a
urbanidade tem natureza cumulativa, e é composta de forma temporal, ciclo em que atos de
urbanidade são amalgamados, impressos no espaço, configurações da cidade que seguem
“pulsando urbanidade”, em um processo em que o presente da cidade projeta urbanidades ao
futuro (NETTO, 2012, p. 56), como pode ser observado no parágrafo desenvolvido por Neto (2012)
a seguir:
O meio urbano participaria da urbanidade de duas formas: como suporte das práticas interpessoais e como resultado das práticas virtuosas na sua própria produção. Na primeira situação o meio urbano teria potencial para despertar, facilitar, ou, ao contrário, dificultar, inibir práticas interpessoais virtuosas. Na segunda, o meio urbano seria o testemunho de práticas virtuosas (em menor ou maior grau) do passado, como que congeladas e expostas no presente (“mesmo distantes no tempo, indivíduos estarão dialogando através dos objetos que inserem na manufatura urbana)”. Considerando a natureza cumulativa da produção do meio urbano, uma espécie de trabalho colaborativo através do tempo, virtualmente todo lugar urbano seria resultado da acumulação de diferentes urbanidades do passado, todas amalgamadas e ainda operando no presente como suporte a práticas interpessoais: “A interação entre agentes urbanos leva à produção de uma estrutura (a cidade) que, uma vez produzida, é incorporada como limitadora de futuras interações por muito tempo”. A inteireza desse
5(NETTO, 2012. P. 27)
50
circuito se completa com a adição, no presente de novas urbanidades. (NETTO, 2012, p. 24)
Estas projeções materiais de urbanidades mencionadas são materializadas na
diversidade de espaços urbanos e em um impulso à associação e à comunicação,
característica que nos mantém enquanto sociedade a despeito de toda tensão de
diferenciação. O conceito de urbanidade se faz ainda mais importante uma vez que
demonstra sua capacidade de influenciar-se por urbanidades amalgamadas no passado
e projetar urbanidades no futuro, logo configura-se a responsabilidade nos atos de
urbanização e nas escolhas que fazemos enquanto sociedade.
Enquanto a vida urbana envolve a ambiguidade fundamental de amparar
diferentes experiências individuais e relacioná-las em modos de experiências em
comum. (NETTO, 2012. p. 38), sob forma de convívio, ela relaciona-se à integração
social, como menciona Neto:
Minha aproximação do problema da “urbanidade” ao da “integração social” evoca a ideia de urbanidade como resultado e como condição da integração social, simultaneamente como sua construção, expressão e experiência. Refere-se ao papel das dinâmicas da urbe ao estabelecer condições de relação (mesmo espontâneas) entre pessoas e entre campos sociais – o efeito da urbe sobre o teer das nossas associações. (NETTO, 2012. p. 45)
Relacionada a continuidade do mundo social e a sua integração, e portanto, ao
seu oposto, as tendências de distanciação e segregação social, a urbanidade dialoga com
esses aspectos de maneira que Netto afirma: “Ela é dependente dessas características.
Reconhecer as forças de segregação que põe em risco a sua reprodução e que afetam a
urbanidade como experiência da diversidade e da complexidade social. ” (WEIGERT,
2010; BORDIEU, 1989; FREEMAN, 1978 apud NETTO, 2012. p. 45).
Essa relação de dependência mencionada pelo autor ocorre, pois, a cidade deve
garantir as condições para as interações entre campos sociais, e, portanto, ser palco
delas. Ora, se em seu âmbito há uma redução substancial nesta integração, sobretudo,
se não compensadas por dinâmicas de interação entre campos sociais. Isto pode
implicar em restrição de interações de uma forma geral, o que é a própria definição de
segregação, segundo Linton Freeman (1978).
51
Sociedades enfrentam constantemente riscos para sua própria integração trazidos por tendências de diferenciação, em parte relacionadas a processos de formação de identidades socialmente reconhecidas e potencialmente exageradas em contextos de maior desigualdade. Sociedades poderiam “quebrar” em nichos de comunicação só relacionados funcionalmente em casos extremos, em lugares desconectados, impermeáveis, segregados (vivemos em nossas cidades e sociedades essas duas condições). Certamente a redução de interações externas na formação mútua de identidades e grupos sociais frequentemente termina produzindo suas próprias espacialidades em nossas cidades. Dado que sua eliminação tampouco é possível, essas tendências de restrição de encontro devem ser contrabalanceadas, de modo que sistemas sociais não quebrem em nichos completamente desconectados ou conectados apenas funcionalmente. (NETTO, 2012. p. 44)
Vivemos uma fase em que as tendências de diferenciação potencializadas pela
desigualdade podem materializar-se no espaço urbano enquanto tipologias que
reproduzem novos estilos de vida baseados na separação e restrição de encontros dos
desiguais, reiterando e consolidando fisicamente uma disparidade social que repercute
na urbe e nas suas relações sociais.
Nesse processo, é possível identificar uma oposição a noção de urbanidade,
introduzindo portanto, conforme identifica Lucas Figueiredo (2012), o Desurbanismo,
presente nas cidades brasileiras nas últimas décadas.
Segundo o autor este segue uma lógica de “produção de tipologias
arquitetônicas, espaços e sistemas de transporte que dão suporte a um determinado
modo de vida, que prioriza o automóvel particular, a separação de pessoas e ideias e, o
enclausuramento e a negação do espaço público.”. (NETTO, 2012. p. 209)
Para Figueiredo, o desurbanismo destrói as relações entre o público e o privado,
ao negar os espaços públicos, contribui com o crescente uso de automóvel, causa o
enclausuramento de pessoas, além de outras consequências que contribuem para
separar pessoas e ideias. Sobre esse processo, segundo Netto (2012), “Se cidades são
estruturas de aglomeração que facilitam encontros e copresença e, potencialmente
interação e cooperação entre pessoas, o desurbanismo pode ser definido, então, como
uma estratégia de destruição das cidades.” (NETTO, 2012. p. 30)
52
Em seu manual de destruição das cidades Figueiredo6 elenca uma série de
estratégias de intervenção e gestão urbanística que tem resultado no desurbanismo,
como: (1) incentivar o uso do automóvel particular; (2) transporte público de baixa
qualidade; (3) Construir muros altos, torres e condomínios fechados; (4) reduzir a
diversidade de usos e a adaptabilidade das edificações; e (5) segregar pessoas e ideias.
O uso do automóvel particular é prejudicial à urbanidade a medida em que é
oposto a ruas vibrantes e a presença de muitos pedestres, pois a copresença gerada pelo
pedestre gera encontros e possíveis interações, como, por exemplo, a entrada numa
padaria ou o olhar sobre uma vitrine durante o percurso. Enquanto que o usuário do
automóvel restringe sua copresença apenas aos ocupantes do veículo, além de restringir
de maneira drástica a relação entre movimento e interação, mesmo quando há fachadas
ativas, pois parar para fazer compras ou dialogar com alguém demanda muito mais
trabalho, diminuindo sua frequência.
Além de serem opostos em suas formas de relacionar com o meio urbano, o
pedestre e o condutor do automóvel geram diferentes demandas com relação à
mobilidade, a medida em que “Via de regra, qualquer adaptação do ambiente
construído em favor do automóvel ou da circulação de veículos cria restrições para os
pedestres.” (NETTO, 2012, p. 219) Segundo Figueiredo, essa estratégia vem sendo
utilizada com maestria no Brasil, como resultado de investimentos para aumentar as
vendas de automóveis no país, o ambiente para os pedestres é cada vez mais hostil e o
transporte público cada vez de pior qualidade. Esta realidade penaliza e restringe modos
de vida que dependem da utilização dos espaços urbanos, segundo o estudioso.
A construção de muros altos, torres e condomínios fechados é negativa para a
urbanidade uma vez que estas formas e tipologias que se apresentam como novas
formas de morar, são impulsionadas pelo medo do crime e da hostilidade do espaço
urbano. Em resposta a essas características, os usuários reformam sus muros ou aderem
à novas tipologias. Essa resposta geralmente ocorre com características físicas
prejudiciais à mesma, com pouca ou nenhuma fachada ativa, grande área de fachada
impermeável (fachadas cegas), diminuição (muitas vezes reduzida à apenas uma, a
portaria) de interfaces diretas entre o público e o privado, grandes recuos e afastamento
6 FIGUEIREDO, 2012.
53
topológico da rua, falta de visibilidade para a rua (note que para considerar conexão
visual para urbanidade contabiliza-se apenas até o 4º andar).
As torres são prejudiciais à urbanidade pois trazem características desurbanas já
citadas anteriormente, como por exemplo fachada cega nos primeiros andares devido à
construção de vagas de estacionamento nos subsolos e térreo e diminuição de
interfaces diretas entre público privado, com a preocupação da segurança privada e
controle de entrada e saída.
Essa realidade está aliada ao fato de que estas torres geralmente são compostas
por áreas de lazer interna, com adensamento que seria favorável à urbanidade passando
a não contribuir com o mesmo, uma vez que seus moradores passam a não ser
potenciais usuários do espaço urbano, pois não necessitam utilizar o espaço público se
restringindo à utilização dos equipamentos privados aos moradores das torres.
Condomínios fechados horizontais produzem impactos ainda maiores, uma vez
que ocupam grandes áreas, criam longas extensões de fachadas cegas, criam falhas na
malha urbana e se constituem como barreiras, aumentando distâncias não só para
pedestres assim como para veículos. É necessário frisar que muitas vezes são
implementados em áreas periféricas, se faz necessário refletir sobre o futuro, e se estes
não serão amalgamadas pelo crescimento da cidade.
Em conjunto, muros altos, torres e condomínios fechados continuem
para a configuração de um espaço urbano cada vez mais inóspito, e potencialmente
perigoso, em que os espaços abertos legitimamente públicos estão sendo
gradativamente abandonados a medida em que as pessoas se enclausuram, como em
um ciclo, ruas vazias e cercadas por fachadas cegas parecem ser outra restrição para os
modos ou estilos de vida que dependem de fachadas ativas e permeáveis para viver o
urbano.
A mistura de usos depende da viabilidade econômica de cada atividade em
relação ao valor do solo e é facilitada pela adaptabilidade das edificações ou pela
diversidade de tipologias arquitetônicas.7 Segundo Figueiredo (2012), “isso significa que
o processo de remodelamento através da substituição de edificações leva a um
7 JACOBS, 2000 apud FIGUEDIREDO, 2012
54
inevitável congelamento e homogeneização de áreas urbanas, quando a maioria das
edificações alcança seu maior valor viável no mercado.”8
Relacionada a esta viabilidade econômica, a possibilidade de adensamento
provoca uma homogeneização nas áreas urbanas, uma vez que multiplica o valor do solo
e permite verticalizar em determinadas áreas de coeficientes construtivos altos.
Outra realidade que fere a diversidade do solo é a implantação de condomínios
fechados, por diversos motivos, entre eles o fato de ocupar grandes áreas apenas
residenciais. Somado à isto, devido a sua natureza jurídica, um condomínio nunca
deixará de ser condomínio, pois compõe-se de frações ideais. Além dessa
impossibilidade, tampouco é permitido adaptar suas edificações, uma vez que têm
regulamento interno bem definido que impossibilita outros usos, permitindo apenas
usos pré-estabelecidos no projeto do mesmo.
Sendo um requisito da urbanidade o uso misto, a diminuição da diversidade dos
usos torna a área menos atrativa e a esvazia em determinadas horas, de acordo com os
usos que são feitos nela. O esvaziamento do espaço público por sua vez também tem
por consequência a diminuição da diversidade dos usos, completando um ciclo.
Nessa realidade apenas grandes empreendimentos são capazes de reunir
diversidades de usos e estacionamentos para atender a este público, que recriam
artificialmente os antigos centros urbanos. Em relação a isto Figueiredo (2012) diz: “O
porte de grandes empreendimentos como shoppings centers contribui para outro ciclo
vicioso: a atração do público que antes priorizava áreas e centros tradicionais. Com um
público reduzido, há uma diminuição da variedade de usos nessas áreas, contribuindo
para a decadência delas e incentivando a migração de novos usuários para tais
empreendimentos.” (FIGUEIREDO, 2012. P. 73)
É necessário, porém lembrar que “embora encontros e a copresença existam em
espaços segregados como shoppings, áreas de lazer de torres ou condomínios fechados
entre outros, esses espaços não teriam urbanidade por não serem legitimamente
públicos e, por conseguinte, de uma maneira ou de outra excluir partes da população.”
(FIGUEIREDO 2012, p. 227)
8 FIGUEIREDO, 2012. p. 227.
55
Em relação a segregação de pessoas e ideias, talvez esta seja uma das estratégias
mais cruéis do desurbanismo. Ora, o espaço urbano legítimo, deveria garantir a
copresença de diferentes classes e estilos de vida, tendo em vista a dimensão
democrática da urbanidade. Segundo Jacobs (2000) e Holanda (2010), essa mistura de
classes e de estilos de vida demandariam uma variedade de tipologias arquitetônicas
dentro de uma área urbana, realidade oposta ao processo pelo qual passa as cidades
brasileiras, que homogeneíza cada vez mais áreas, seja encerrando-as em condomínios
fechados horizontais, verticais, favelas (congeladas por áreas de interesse social),
programas de subsídio ao financiamento de imóveis que acabam beneficiando apenas
uma faixa de renda específica da população, ou mesmo a distribuição de casas para
famílias de baixa renda em conjuntos habitacionais.
De forma geral, a ausência de políticas habitacionais consistentes, realidade em
que há uma completa desvinculação entre as iniciativas de habitação e qualquer forma
de planejamento, configurando portanto modelos de construção desordenadas de
moradias. Isso significa que “A expansão de unidades habitacionais não leva em conta a
necessidade de infraestrutura, equipamentos públicos, de praças ou parques, dentre
outras. ” Como o poder público não toma as rédeas de uma política de planejamento
urbano que atenda às demandas da população e do crescimento urbano, vê-se uma
privatização de serviços urbanos que deveriam ser públicos, e consequente exclusão
daqueles que não podem pagar por eles.
Como vimos em cada uma das estratégias do desurbanismo, há uma perigosa
retroalimentação que faz com que este seja uma estratégia eficiente de destruição das
cidades tradicionais, à medida que esta realimentação materializa estruturas físicas que
restringem ou impossibilitam modos de vida urbana alternativos. Isto acontece ao
mesmo tempo em que suas estratégias resultam em ‘vantagens cumulativas’ para
modos que conseguem perpetuar seus interesses, numa espiral que produz
continuamente novas tendências desurbanas. (NETTO, 2012, p. 30). Isto acontece pois
a urbanidade se mostra tanto como resultado, quanto como meio de integração social,
e sua ausência, por sua vez, leva à desurbanidade.
O insuficiente planejamento identificado na realidade das cidades brasileiras
também é uma decisão de planejamento, há uma decisão consciente por parte de
governos e sociedade de não investir em políticas públicas, que gera a falta de
56
investimento em segurança pública, e por sua vez, a criminalidade. Somado a estes
mecanismos globais está a legislação permissiva, que traz novas possibilidades aos
empreendedores. Repercute neste ciclo o abandono do espaço público através da falta
de investimento e da regulação ineficiente na urbe, que como produto de todo o ciclo
gera cidades mais díspares e segregadas socioespacialmente. A síntese desse ciclo de
realimentação descrito por Figueiredo se expressa na figura 3.
A segregação socioespacial realimentada pelo ciclo do desurbanismo é produto
e matéria prima dele, tendo em vista que estes estão coerentes com a estrutura social,
processos como este estão coerentes com a estrutura social em que ocorrem. Se
analisarmos a realidade brasileira, a remodelação da cidade está coerente, tendo em
vista que no Brasil temos uma das piores distribuições de renda do mundo. Em relação
às políticas públicas e redistribuição de renda Filgueira reflete:
Se a redemocratização e os governos federais de Itamar Franco, FHC, Lula e Dilma promoveram a inclusão social, as políticas públicas para as cidades (ou a ausência delas) nesses mesmos governos, em especial os incentivos à especulação imobiliária e ao automóvel particular, consolidaram a cidade brasileira como um instrumento de segregação social.9
Uma vez analisado o modelo é possível perceber que fortes mudanças estão
sendo feitas nas cidades brasileiras com consequências bastante sérias. Diante desta
realidade, de acentuado grau de desurbanismo, faz-se necessária uma mudança
estrutural no sistema como um todo para reconstituir o modelo anterior de cidade
tradicional e suas urbanidades. Ou seja, cada vez torna-se mais difícil voltar a caminhar
no sentido oposto, que seria não o desurbanismo, mas sim o urbanismo.
9FIGUEIREDO, 2012. P. 231.
58
3.3.2. Morfologia e Desempenho Urbano
Tendo em vista a influência mútua entre forma e sociabilidade10 urbana, é sabido
que características morfológicas influenciam e são influenciadas por padrões de
vitalidade11 e urbanidade12. Segundo Renato Saboya, 2012, diversos autores trazem esta
relação, como Jacobs, (2000) e Holanda, (2002). Segundo Renato Saboya há interação
entre padrões de vitalidade e outros padrões urbanos:
Entende-se que esses padrões de vitalidade estão associados (influenciam e são influenciados) a outros padrões urbanos, tais como a configuração do sistema viário, a tipologia edilícia, as densidades populacionais e construtivas, o perfil socioeconômico e cultural, a infraestrutura de circulação e mobilidade, assim como muitos outros. Tais padrões interagem dentro do que poderia ser chamado de "temporalidades” da produção da cidade, em um processo permanente de convergência e divergência, de forma que estados específicos em um padrão podem desencadear ou influenciar, ainda que de forma complexa e sujeita a descontinuidades e assíncronas, certos estados específicos em outros padrões.13
Estas caraterísticas estariam relacionadas à quantidade de usuários em potencial
para o espaço público, aos facilitadores de atração dos mesmos a saírem de suas
atividades para a rua e aos atrativos/motivações que trariam estes usuários a vivenciar
o espaço urbano e relacionar-se com os demais.
A sistematização desses elementos pode ser observada na figura 04.
Figura 05: Fatores influenciadores da sociabilidade Urbanas e suas correlações
Fonte: Confecção própria
10 Socialidade é a copresença nos espaços públicos, movimento de pedestres e interação em grupos. 11 Vitalidade urbana é frequentemente tomada como sinônimo de urbanidade, já que envolvem noções que se sobrepõem. Conceito desenvolvido por Jacobs, na década de 1960, introduz de modo tentativo e assistemático, os principais ingredientes da urbanidade, tanto em sua escala local arquitetônica quanto na escala mais global da articulação com o entorno. Netto et al (2012, p. 65) 12 Civilidade do convívio urbano. (NETTO, 2012.) 13 SABOYA, 2012. Pág. 05.
Usuários em Potencial
Densidade útil
Facilitadores de Atração
Configuração Espacial(Global e Local)
Cognição/
Permeabilidade
Atrativos/
Motivação
Diversidade de Usos
Espaços Públicos
Estilo de Vida Urbano
59
O aumento do número de usuários em potencial, fomentados pela densidade
útil, ocorre através da construção de novos edifícios e traz maior número de residentes
e/ou trabalhadores de forma geral. Diante disto existe maior possibilidade de que as
ruas sejam utilizadas para chegar em casa ou sair do trabalho.
Esses usuários em potencial poderão ser novos usuários do espaço urbano,
transformando-se em pedestres e exercendo atividades desde que morfologicamente
configurem-se facilitadores de atração. Os facilitadores de atração agem gerando
possibilidade de cognição sobre oportunidades de interação, diminuindo distâncias a
serem percorridas, ou fazendo com que espaços urbanos estejam no caminho de outros
destinos, características relacionadas à configuração espacial (global e local), assim
como tipologia edilícia favorável à maximização da superfície de contato entre
público/privado.
Além dos aspectos citados acima faz-se, necessário garantir a atratividade do
espaço público, através da diversidade de usos, com a variedade e adensamento dos
atrativos, que devem conter obrigatoriamente uso residencial, mas também comércio,
serviços entre outros. A diversidade de horários de funcionamento também é
importante para manter a vitalidade e segurança dos espaços urbanos continuamente.
O último aspecto importante para manter a atratividade dos espaços públicos é a
infraestrutura do próprio espaço adequada, através de vias, praças, e calçadas com
tratamento e equipamentos adequados para dar apoio às atividades urbanas, e garantir
conforto aos usuários.
A seguir é possível observar um esquema com as principais características
morfológicas ligadas ao desempenho das cidades, os quais serão melhor detalhados na
sequência do capítulo.
60
Figura 06: Morfologia e desempenho urbano
Fonte: Confecção própria a partir de conceitos de Saboya (2012), Jacobs, (2000), Holanda (2004). Densidade útil
A densidade de pessoas e atividades é favorável à vitalidade urbana, uma vez que
contribui para o aumento de fluxo, e ainda de usuários em potencial para os espaços urbanos.
Devido a isto um incremento de área construída e da população residente nesses espaços, são
geralmente fatores impulsionadores da sociabilidade na área, como explica Saboya (2012):
Maiores quantidades de pessoas, usos e área construída estão direta e naturalmente relacionadas a uma maior quantidade de pessoas utilizando e interagindo nas ruas, desde que os outros fatores mantenham-se similares. Em outras palavras, todo o resto sendo igual, áreas com maior quantidade de moradores e/ou de economias e/ou de área construída tendem a possuir maior vitalidade em seus espaços físicos.14
14 Saboya, 2012, p. 11.
VITALIDADE URBANA
Densidade Útil
Aspectos de ConfiguraçãoLocal e Global
propícios
TipologiaEdilícia
Favorável
Diversidadede Usos do
Solo
Infraestruturado Espaço
Urbanoadequado
FAC
ILIT
AD
OR
ES D
E A
TRA
ÇÃ
O
61
Pessoas nas ruas e no espaço urbano em geral são o cerne da sociabilidade, a
copresença. Jane Jacobs (2000) destaca a importância dos contatos nas ruas pois,
aparentemente despretensiosos, despropositados e aleatórios, estes constituem a
pequena mudança a partir da qual pode florescer a vida pública exuberante da cidade.
Isto acontece devido ao fato de que a soma desses contatos públicos casuais no âmbito
local resultam na compreensão da identidade pública das pessoas, formando uma rede
de respeito e confiança mútuos, que por sua vez está relacionada ao comprometimento
pessoal dos usuários.
Sendo assim, Jacobs (2000) acredita que a densidade contribui para determinar
o número de pessoas circulando em determinada área. Porém, em se tratando de
sociabilidade, é importante relembrar que as interações devem ocorrer no espaço
público democrático, assim como envolver pessoas com diferentes classes
socioeconômicas, estabelecendo, portanto, o convívio entre os diferentes na
complexidade da cidade.
Diante disto, é importante estabelecer que a densidade em questão deve ser útil
para trazer usuários em potencial, que sejam de diferentes classes e estabeleçam
relações no espaço público. Ou seja, a heterogeneidade dos usuários das novas
edificações é favorável a sociabilidade, assim como a não massificação de tipos únicos
que favorece a heterogeneidade de usuários na área. A ocupação diluída ao longo dos
anos também tem influência na heterogeneidade dos que utilizam os espaços. Todos
estes critérios trariam um caráter mais diversificado aos usos e usuários, e se fazem
essenciais à medida em que permitem a interação e o convívio entre os diferentes.
A adensabilidade também contribui para que a massa edificada em determinada
área seja maior proporcionalmente, diminuindo as distâncias, fator positivo para a
sociabilidade, como será visto a diante. Neste sentido, ressalta-se que, ainda por
motivos de diminuição de distâncias e manutenção de distâncias percorríveis a pé a
rarefação é prejudicial à vitalidade urbana, portanto glebas pequenas e construções
compactas são preferíveis para questões de sociabilidade, reduzindo ainda espaços
imprecisos ou residuais.
62
Densidade não útil
Entre as tipologias que não contribuem para a densidade útil, no sentido de
usuários em potencial, estão aquelas que são caracterizadas pela homogeneidade,
pseudoautonomia e isolamento. Por remeter à exclusão e segregação, são também
conhecidos como enclaves fortificados.
Estes empreendimentos se voltam para si e negam seu entorno imediato, com
prejuízos para a sociabilidade do entorno e a vida urbana de uma forma geral. Devido à
sua própria concepção atrelada a um “novo estilo de vida”, as decisões projetuais
materializam uma percepção esdrúxula de urbanidade, autossuficiência em relação a
serviços urbanos, privatização da copresença, isolamento e motorização além de gerar
comumente espaços imprecisos ou residuais.
Alguns dos impactos negativos mencionados por Saboya (S/D) são: a)
desestímulos ao deslocamento de pedestres e à apropriação dos espaços públicos
adjacentes às edificações; b) maiores taxas de motorização, com especial destaque para
veículo individuais; c) diminuição das densidades urbanas acompanhada do aumento
das distâncias internas e dos custos de deslocamento e infraestrutura; d) a diluição da
vida microeconômica local; e e) aumento da violência urbana. Diante de todas as
consequências nocivas ao convívio na cidade, Ana Carolina Galhardo (2012) relaciona
estas tipologias as anticidade, como podemos perceber no trecho a seguir:
Podemos dizer que se estimula não a construção da cidade como local de convívio, com urbanidade, mas sim da anticidade. Como definido por Sánchez (2009, p. 11): “Entende-se que a cidade é o lugar do encontro, da diversidade de atividades e classes sociais. Anticidade vem a ser um modelo que se contrapõe a essa diversidade, que busca a homogeneidade, o isolamento”. 15
Portanto, o aumento da densidade ocasionado por tipologias análogas aos
enclaves fortificados - como shoppings, condomínios fechados, condomínios verticais
espraiados e com lazer interno - não são contabilizadas para a densidade útil relacionada
à urbanidade, tendo em vista que trazem muitos dos elementos que corroem a mesma.
15 Galhardo, 2012. p. 6.
63
Diversidade de usos do solo
Outra característica relacionada à vitalidade urbana é a diversidade e densidade
de atrativos. Diversos usos promoveriam, segundo Jacobs (2000), fluxos de pedestres e
automóveis que, por si só, já são favoráveis à sociabilidade da área.
O uso residencial é necessário, garante usuários durante toda a semana e em
horários dos mais diversos, além de relacionar-se de uma maneira diferenciada com o
entorno. Destacamos ainda a importância de outros usos, como serviços e comércios,
que podem consolidar-se como locais que o indivíduo pode buscar naturalmente e usar
de motivação e indução para sair de casa, segundo J. Gehl (2011).
Estes usos contribuem com a sociabilidade à medida que fazem com que uma
variedade de pessoas se desloquem àquela área ao longo de diferentes horários, por
diferentes motivos, usuários estes que podem vir a utilizar-se da infraestrutura urbana
de diversas outras formas, que não apenas deslocar-se.
Segundo Hillier et al (1993) e Penn et al (1998), usos comerciais atuam como multiplicadores dos fluxos “naturais” induzidos pela configuração do sistema viário. Esta determina, em grande parte, a quantidade inicial de movimento em cada rua da cidade, proporcionando ruas em que o movimento é maior e, portanto, oferecendo condições mais adequadas para os usos comerciais, que dependem desse fluxo de pessoas. Esses usos, por sua vez, tornam-se eles mesmos motivos e destinos para os deslocamentos, ampliando os fluxos já existentes.16
A diversidade de usos - variedade de usos principais combinados - pode ser
seguida pela diversidade combinada, que se dá através do surgimento de
empreendimentos que nascem a partir da presença de usos combinados. Caso ambos
existam em determinadas área, a diversidade será exuberante, segundo Jacobs.
Além das características mencionadas, faz-se necessária a oferta de espaços
públicos para fazer com que usuários, atraídos por diversos outros usos, além de apenas
transitar relacionem-se de forma mais profunda com a urbe, utilizando espaços
democraticamente públicos e convivam com demais usuários de diferentes classes
econômicas e sociais.
16 Saboya, 2012. p.12.
64
Espaços imprecisos, residuais ou sem uso específico são prejudiciais à diversidade,
uma vez que introduzem áreas sem uso algum, que além de não configurar-se com
atrativos, são obstáculos para a configuração de alta densidade de atrativos diversos.
Para que haja diversidade e continuidade dela, em sintonia com as mudanças da
sociedade e de suas demandas, a adaptabilidade se faz essencial. Jacobs (2000)
relaciona adaptabilidade à necessidade de uma combinação de edifícios com idades e
estados de conservação variados, isto se deve à variedade de preços e oportunidade de
implantação dos mais diversos usos e negócios, além da possibilidade de diversas classes
sociais terem acesso à residência nesta região.
Tipologia edilícia
Características tipológicas têm influências na sociabilidade de uma área à medida
em podem incentivar a vitalidade microeconômica local, a apropriação de espaços
públicos e até mesmo uma maior interação social, através da compactabilidade e a
maximização da superfície de contato e a permeabilidade público/privado. Jane Jacobs
(1961), já relacionava tipologias compactas à vitalidade urbana, segundo a autora, a
partir da construção de tipologias compactas e contínuas, permeáveis e mais próximas
da rua, incentiva-se a vitalidade microeconômica local, a apropriação dos espaços
públicos, a disposição de trocar o automóvel por meios de locomoção não motorizados
e até mesmo uma maior interação social.
As relações formais entre a tipologia e a vitalidade são as dimensões da forma
edificada e a interface edificado x aberto, no tocante a sua permeabilidade física e visual.
As dimensões da forma edificada são importantes à medida em que podem intensificar
as possibilidades de interação com a rua cognição do que acontece ali, além diminuir as
distâncias a serem percorridas pelos pedestres segundo GEHL (2011). Isto se dá a partir
de divisão da área em pequenas glebas, que devem ser utilizadas de maneira a
maximizar a superfície de contato entre edificação/espaço urbano.
Uma vez adotada esta tipologia, edifícios com glebas pequenas e a maior parte
da fachada frontal ativa faz com que ao caminhar o pedestre seja exposto a uma
densidade de atrativos que podem tornar o espaço urbano mais interessante e menos
monótono ao pedestre. Esta configuração maximiza o potencial que a interface entre os
65
lotes privados e a rua possui em termos de estímulo ao movimento de pessoas, ao
mesmo tempo em que diminui as distâncias a serem percorridas e aumenta a densidade
de atrativos.
Em relação à interface do edificado x aberto, a permeabilidade física e visual é
benéfica a vitalidade urbana a medida em que portas e janelas dão oportunidade de
apropriação do espaço público por parte da edificação. Estudiosos como Holanda
(2002), Bentley (1985) e Saboya (2012) apontam um maior número de portas e janelas
ao enriquecimento da vida pública, a medida em que aumenta a proximidade entre o
interior da casa e a rua.
Sendo assim, a relação edificação/lote é importante a medida em que aloca a
edificação no espaço do lote o mais próximo possível da rua, diminuindo as
proximidades, e a relação edificação/rua, a medida em que abre portas e possibilidades
de interação ainda maiores com o espaço urbano. Sendo assim, edificações não isoladas
no lote, compactas, com alta permeabilidade de acessos diretos à rua, pequenos
afastamentos laterais e frontais são favoráveis ao desempenho urbano na região.
As distâncias e fricções para entrar e sair das edificações são de grande influência
para o uso ou não do espaço público, a medida em que proximidade e facilidade
estimulam o uso de ruas, praças e parques, e grandes distâncias, e dificuldades (fricção)
são desestimulantes. Esta característica será retomada no tópico referente à
configuração local, em seguida.
A permeabilidade visual é uma das características mencionadas pelo estudo de
Jacobs (2000), como favorável à vitalidade urbana e está relacionada ao conceito de
“olhos voltados para a rua”17, “e de donos naturais da rua”. Estes elementos referem-se
aos aspectos de percepção espacial e relacionam-se à cognição da rua, com efeitos para
segurança, possibilidades de interação a distância ou não, e ainda à cognição sobre
oportunidades de interação, especialmente através de conexões visuais, mas também
auditivas.
Saboya (2012) afirma que Newman (1996), em seu conceito de espaços
defensáveis, argumenta nesse mesmo sentido. Segundo ele, é necessário que os
17 O conceito de “olhos da rua” (JACOBS, 2000) descreve a combinação de fachadas visualmente
permeáveis, próximas à rua e com moradores que se preocupam com o que acontece na sua vizinhança, e funciona no sentido de promover uma maior sensação de segurança para quem caminha ou desenvolve outro tipo de atividade nas ruas.
66
residentes sintam-se responsáveis pelos espaços públicos adjacentes às suas
habitações, o que só é possível se houver proximidade e conexão visual. Saboya (2012)
destaca que a visibilidade está, portanto, relacionada à segurança à medida em que têm
efeito sobre a capacidade de sentir-se responsável pela rua, quando a permeabilidade e
diversas experiências e estímulos mútuos ocorrem fazendo com que residentes passem
ser “donos naturais da rua”. Este comprometimento pessoal dos usuários já foi
comentado neste estudo e é essencial para a segurança nas ruas, contudo só acontece
se existe movimento fazendo com que haja interesse por parte das pessoas em olhar
para a rua, pois não há interesse em vigiar uma rua sem vida.
Ainda de acordo com o autor cognição sobre possibilidade de interação no
espaço público exerce influência no estímulo ao seu uso. Uma vez mantida a visibilidade
e audibilidade do espaço público, o usuário em potencial recebe frequentemente
estímulos visuais e auditivos emitidos pelo espaço público. Esta realidade faz com que o
espaço público e as oportunidades de interação se mantenham em seu consciente,
lembrando-o frequentemente de possibilidades de interação. Esta realidade afeta
profundamente os julgamentos e inferências que usuários potenciais fazem ao decidir a
frequência de utilização do espaço público.
Configuração global
O conceito de configuração espacial é o de “todo resultante de partes que se
relacionam entre si e cuja relação não pode ser alterada sem que se altere o todo, uma
vez que é esse sistema de relações que determina a natureza do todo”. (TRIGUEIRO,
1995. pág. 12), sendo determinante para a relação entre forma e espaço, e portanto
essencial para compreensão de fenômenos socioespaciais.
A configuração espacial é importante, pois está relacionado as escolhas feitas
pelos usuários no sentido de em que caminho seguir, com influência para o movimento
de passagem. O movimento de passagem é a maior parte do movimento de pedestre
urbano, e é definido de acordo com a posição e a distância de um espaço em relação a
todos os outros espaços da malha urbana. É a partir destes critérios que os pedestres
escolhem que caminho seguir. A importância deste movimento de passagem é explicada
por Penn (1998), a seguir:
67
A maioria do movimento em áreas urbanas é movimento de passagem. A maioria das pessoas que você vê andando em uma rua tende a estar vindo e indo para outras ruas. Entretanto, sua presença é um dos maiores recursos das cidades. A presença de pessoas faz os espaços serem percebidos como vivos e seguros, e são o principal pré-requisito para a vida econômica da cidade. 18
Características morfológicas da configuração global como alto grau de integração
são positivas para o aumento do fluxo e, consequente, sociabilidade na área, estudos
sintáticos mencionados por Saboya (S/D) mencionam esta correlação:
Especificamente no que diz respeito à relação dessas variáveis com a vitalidade urbana, estudos sintáticos (HILLIER et al, 1993; PENN et al, 1998; HILLIER; IIDA, 2005) têm recorrentemente encontrado altas correlações entre movimento de pedestres e medidas configuracionais, como integração e escolha, com diversos tamanhos de raios de análise. Isso significa que a posição e a distância de um espaço em relação a todos os outros espaços da malha urbana são um dos principais determinantes da quantidade de pedestres que passam por ele.19
Características como centralidade, continuidade da malha viária (ausência de
barreiras) e boa conexão com áreas de muitos atrativos (polos) são favoráveis à
integração e ao aumento do movimento de passagem na região, fazendo com que
determinada área seja bastante frequentada mesmo que não seja destino final de
usuários, acaba angariando benefícios com pedestres que trazem vitalidade à área.
Configuração local
Menores distância, múltiplas possibilidades de caminhos e elevado número de
interseções são características favoráveis a sociabilidade no espaço público segundo
Jacobs (2000), pois aumentam a proximidade e, por sua vez, a oportunidade de
interação. Devido a estas características a estudiosa defende a necessidade de quadras
curtas, ou seja, a intensificação métrica da grelha. Segundo C. N. Santos (1988), estas
características estimulam o movimento, são favoráveis à implantação de comércio e
ainda mais seguras.
18 PENN et al, 1998. P. 82. 19 SABOYA, S/D. P. 4.
68
Jacobs (2000) defende, como um dos elementos geradores de diversidade urbana, as quadras curtas. Segundo ela, isso gera alternativas de percursos e possibilita que os fluxos se distribuam por ruas que, de outra maneira, permaneceriam desertas. Quadras curtas adequam-se à escala do pedestre, por permitir acesso a todas as direções dentro de limites razoáveis de distância. Quadras longas em uma direção dificultam ou até mesmo inviabilizam os deslocamentos na direção ortogonal.20
Além da malha viária, Saboya (2012) enfatiza a permeabilidade física dos edifícios
e sua relação com a rua é importante a medida que pode estimular ou desestimular o
usuário a usar o espaço público. Segundo Chistopher Alexander et al (1977), estes
desestimulam significativamente o desenvolvimento de atividades nos espaços abertos.
Isto acontece pois isso possibilita que um espaço esteja metricamente mais próximo dos
espaços públicos e, ainda, de um maior número de habitações e comércio.
Por sua vez, a proximidade e facilidade em chegar ao espaço público tornariam
seu uso uma decisão mais natural, enquanto que, grandes distâncias e dificuldades para
chegar tornariam esta decisão mais custosa e menos espontânea. A permeabilidade
física entre edifícios e a rua é comporta por distâncias e fricção, a primeira é referente
às relações estabelecidas ente edifício/espaço público, edifício/lote enquanto que a
fricção é mais relacionada à esfera edifício/edifício, sua acessibilidade e barreiras de
segurança.
Infraestrutura do espaço urbano
A última característica morfológica relacionada ao desempenho urbano é a
disponibilidade de infraestrutura para dar apoio à interação e permanência nos espaços
públicos.
Esses aspectos infraestruturais exercem papel importante na medida em que
possibilitam e incentivam a permanência nesses espaços por períodos de tempo mais
extensos, através da oferta de melhores condições de conforto. Além do número de
usuários de determinado espaço público, o número de eventos individuais e a sua
duração são importantes indicadores para esta sociabilidade urbana, segundo Gehl,
2011 e V. Mehta, 2009.
20 SABOYA, 2012. P. 12.
69
Esta característica é tão importante para a vitalidade urbana, que segundo
Saboya ( 2012), a perda da qualidade do espaço público coletivo pode ser entendida
como uma regressão de urbanidade. Portando, cabe ao espaço público estar adequado
de maneira dar apoio à urbanidade, propiciando qualidade e a integração à vida urbana.
Um espaço público adequado ao apoio às atividades de vitalidade deve ter nítida
separação espaço público/privado, ser democrático e permitir livre acesso ao público,
estar localizado em áreas bem integradas e visíveis, ser proporcional ao número e
dimensão de espaços públicos/densidade populacional, além de conferir condições
confortáveis de permanência aos seus usuários (calçadas adequadas, mobiliário urbano,
sombras/arborização e boa iluminação), e ofertar atividades ao público em geral, como
equipamentos e eventos.
3.4. Análise da Legislação Urbanística 3.4.1. Condomínios Horizontais Fechados e conflito entre fato e direito
Com padrão urbanístico estabelecido e reincidente, empreendimentos do tipo
condomínios fechados horizontais, são objeto de impasse jurídico, com graves
implicações urbanísticas. A medida em que (in)definições jurídicas acabam contribuindo
para o proliferamento de condomínios irregulares, que se constituem como formas
injustas e ilegais de segregação, diminuindo a desejável e democrática “complexidade
da cidade”.
O condomínio irregular é um exemplo do conflito que se estabelece entre o fato e o direito. Primeiro a sociedade se vê privada de bens e serviços essenciais que deveriam ser prestados pelo poder público e não o são, em contrapartida, cria mecanismos para absorver esta omissão objetivando o seu bem-estar. Ocorre que da forma como ela procura suprir a ausência do Poder Público em muitas hipóteses é incompatível ao esquema legal. Cria-se então um impasse: como analisar então essa nova manifestação social? (SOARES, 1999, p.6. apud SOUZA E SILVA, 2004, p. 37.)
Para melhor compreender o fenômeno dos condomínios fechados e sua situação
jurídica é preciso fazer uma revisão da legislação vigente aplicada ao tema, atencipa-se
que não existe previsão legal para empreendimentos da tipologia estudada, porém
diante do interesse de incorporadores e agentes imobiliários e da consolidação desta
70
tipologia nas cidades brasileiras, são feitas diversas interpretações no esforço que
possam ser regulamentadas.
Os condomínios fechados de casas, ou condomínios residenciais horizontais, na forma como estão sendo implantados, reiteram valores que priorizam interesses privados. Na opinião de muitos juristas (por exemplo: ARAGÃO, 1997; SOARES, 1999; SILVA, 2000;) não são práticas legais. A polêmica advém consequentemente de muitos destes se constituírem, de fato, em loteamentos fechados, ou resultarem do fechamento da via pública de acesso a determinadas residências, ou ainda por basearem-se em interpretação inapropriada das bases legais disponíveis. (SOUZA E SILVA, 2004, p. 29.)
O condomínio fechado é juridicamente controverso, desde a definição de sua
natureza, tendo em vista que as formas de parcelamento previstas na legislação
brasileira são os loteamentos e os condomínios, analisa-se ambas as possibilidades à luz
das leis referentes as mesmas.
Inicialmente abordando os loteamentos, segue a Lei 3.175/84, que caracteriza
esta forma de parcelamento:
Art. 134º. O parcelamento do solo urbano poderá ser feito mediante loteamento ou desmembramento, observadas as disposições desta Lei e as das legislações estaduais e municipais pertinentes. § 1º - Considera-se loteamento a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes. § 4o Considera-se lote o terreno servido de infraestrutura básica cujas dimensões atendam aos índices urbanísticos definidos pelo plano diretor ou lei municipal para a zona em que se situe. § 5o A infraestrutura básica dos parcelamentos é constituída pelos equipamentos urbanos de escoamento das águas pluviais, iluminação pública, esgotamento sanitário, abastecimento de água potável, energia elétrica pública e domiciliar e vias de circulação. § 6o A infraestrutura básica dos parcelamentos situados nas zonas habitacionais declaradas por lei como de interesse social (ZHIS) consistirá, no mínimo, de: I - vias de circulação; II - escoamento das águas pluviais; III - rede para o abastecimento de água potável; e IV - soluções para o esgotamento sanitário e para a energia elétrica domiciliar.
71
Configurado como instrumento jurídico capaz de subdividir uma gleba em lotes
individuais, no loteamento existem áreas destinadas ao uso comum, porém neste tipo
de empreendimento estas não são de propriedade de seus moradores, mas sim de
propriedade pública. Portanto não se deve limitar o acesso à qualquer área no
loteamento que são seja privada. Segundo Moura, 2008: “Diante disto, a figura jurídica
do loteamento fechado não existe, pois as áreas de uso comum não podem se tornar
objetos particulares. O fechamento das vias internas, segundo a Lei 9.785/99, não
poderia ser admitido.”
Art. 4º. Os loteamentos deverão atender, pelo menos, aos seguintes requisitos: I - as áreas destinadas a sistemas de circulação, a implantação de equipamento urbano e comunitário, bem como a espaços livres de uso público, serão proporcionais à densidade de ocupação prevista pelo plano diretor ou aprovada por lei municipal para a zona em que se situem. IV - as vias de loteamento deverão articular-se com as vias adjacentes oficiais, existentes ou projetadas, e harmonizar-se com a topografia local.
Portanto, fica notória a impossibilidade jurídica de loteamento fechado, o que
seria uma incongruência, tendo em vista que isto seria uma afronta aos bens públicos,
que não podem ter seu acesso restrito, o que violaria o direito de ir e vir, além de
contribuir com o acirramento do processo de fragmentação do território urbano.
Para solucionar o problema dos loteamentos fechados Souza e Silva (2004)
aponta uma possibilidade, que seria o uso da ferramenta concessão de direito real de
uso, permissão de uso e concessão de uso (concessão de uso prevista no Decreto-Lei
271/67):
Através destes instrumentos, o poder municipal estaria capacitado para realizar, por ato administrativo, a transferência do uso destes bens aos proprietários dos terrenos do loteamento fechado. Ressalta-se que nesses casos, a relevância de se elegerem contrapartidas a serem impostas à iniciativa privada que busquem um equilíbrio e a promoção da justiça social. (SOUZA E SILVA, 2004, p. 36.)
É notório, contudo, que isto se trata de uma manipulação de artifícios jurídicos,
pois se analisarmos estes empreendimentos não estariam de acordo com a legislação
vigente. Apesar disso, utilização destes instrumentos tornariam-os legais, porém é
72
preciso ter muito cuidado com este tipo de artifícios. Deve-se priorizar o bem comum
aos interesses privados ou de grupos minoritários ao tomar decisões com impacto sobre
a realidade da cidade e sua sociabilidade.
Existe ainda a previsão dos condomínios fechados (verticais) pela Lei 4.591/64,
este é definido por lei como um espaço de uso restrito e privativo de seus condôminos,
sendo outra forma de parcelamento do solo possível.
Este parcelamento é diferenciado do anterior, pois não acontece o parcelamento
formal da gleba única, mas sim a configuração de unidades isoladas entre si, que são
alienadas de forma autônoma. Como pode ser entendido no trecho de Oliveira, a seguir:
O condomínio não se constitui como um tipo de parcelamento urbanístico do solo, do ponto de vista jurídico. Condomínios são conjuntos construídos dentro de um mesmo terreno, o qual é propriedade de todos. Pequenos ou grandes conjuntos construídos são praças, infraestrutura, e equipamentos implantados, é propriedade e responsabilidade do conjunto de moradores, os condôminos. A gleba, assim utilizada não é de sua individualidade, diferentemente do loteamento, onde uma parte do terreno transforma-se em lotes privados e outra parte se integra ao espaço público da cidade. (OLIVEIRA 2000, p.2. apud MOURA, 2008, p. 32.)
Para este instituto jurídico não é permitida a criação de ruas, apenas a área de
circulação e áreas comuns, para as quais são estabelecidos serviços e equipamentos de
uso exclusivo dos condôminos, considerados propriedade privada dos comunheiros.
(MOURA, 2008)
Art. 1º As edificações ou conjuntos de edificações, de um ou mais pavimentos, construídos sob a forma de unidades isoladas entre si, destinadas a fins residenciais ou não-residenciais, poderão ser alienados, no todo ou em parte, objetivamente considerados, e constituirá, cada unidade, propriedade autônoma sujeita às limitações desta Lei. § 1º Cada unidade será assinalada por designação especial, numérica ou alfabética, para efeitos de identificação e discriminação. § 2º A cada unidade caberá, como parte inseparável, uma fração ideal do terreno e coisas comuns, expressa sob forma decimal ou ordinária
Cabe ressaltar que o instituto do condomínio é previsto apenas para situações
em que se comercializa algo já edificado (ou construção ainda que futura), como
apartamentos, salas comerciais, e casas. Neste caso é possível enquadrar “condomínio
73
horizontal fechado”, aqueles em que as casas já estão prontas ou pelo menos têm o seu
projeto arquivado em cartório competente devidamente aprovado.
Art. 68. Os proprietários ou titulares de direito aquisitivo, sobre as terras rurais ou os terrenos onde pretendam constituir ou mandar construir habitações isoladas para aliená-las antes de concluídas, mediante pagamento do preço a prazo, deverão, previamente, satisfazer às exigências constantes no art. 32, ficando sujeitos ao regime instituído nesta Lei para os incorporadores, no que lhes for aplicável.
Art. 32. O incorporador somente poderá negociar sobre unidades autônomas após ter arquivado, no cartório competente de Registro de Imóveis, os seguintes documentos: a) título de propriedade de terreno, ou de promessa, irrevogável e irretratável, de compra e venda ou de cessão de direitos ou de permuta do qual conste cláusula de imissão na posse do imóvel, não haja estipulações impeditivas de sua alienação em frações ideais e inclua consentimento para demolição e construção, devidamente registrado; b) certidões negativas de impostos federais, estaduais e municipais, de protesto de títulos de ações cíveis e criminais e de ônus reais relativamente ao imóvel, aos alienantes do terreno e ao incorporador; c) histórico dos títulos de propriedade do imóvel, abrangendo os últimos 20 anos, acompanhado de certidão dos respectivos registros; d) projeto de construção devidamente aprovado pelas autoridades competentes; e) cálculo das áreas das edificações, discriminando, além da global, a das partes comuns, e indicando, para cada tipo de unidade a respectiva metragem de área construída; f) certidão negativa de débito para com a Previdência Social, quando o titular de direitos sobre o terreno for responsável pela arrecadação das respectivas contribuições; g) memorial descritivo das especificações da obra projetada, segundo modelo a que se refere o inciso IV, do art. 53, desta Lei; h) avaliação do custo global da obra, atualizada à data do arquivamento, calculada de acordo com a norma do inciso III, do art. 53 com base nos custos unitários referidos no art. 54, discriminando-se, também, o custo de construção de cada unidade, devidamente autenticada pelo profissional responsável pela obra; i) discriminação das frações ideais de terreno com as unidades autônomas que a elas corresponderão;
Examinando o texto da Lei acima transcrito é possível verificar que os
condomínios objeto de estudo deste trabalho não se enquadrariam no instituto jurídico
a que se refere o texto da lei, pois trata-se de terrenos vendidos para que o comprador
74
construa de acordo com projeto próprio (que deve seguir diretrizes estabelecidas pelo
condomínio), ou seja, a construção não está estabelecida anteriormente à compra.
Segundo Marini, “Há necessidade de se vincular a venda da propriedade à construção
ainda que futura. Não se pode afirmar a existência de condomínio especial desprovido
de construção” (MARINI, 2000, p. 6. apud SOUZA E SILVA, 2000 p. 33.).
A fim de solucionar legalmente os condomínios horizontais os juristas fazem
adaptações questionáveis no texto legal, como por exemplo, o uso do artigo 8º da Lei
4.591/64 analisado junto ao 3º artigo do Decreto-lei 271/69:
Quando, em terreno onde não houver edificação, o proprietário, o promitente comprador, o cessionário deste ou o promitente cessionário sobre ele desejar erigir mais de uma edificação, observar-se-á também o seguinte: a) em relação às unidades autônomas que se constituírem em casas térreas ou assobradadas, será discriminada a parte do terreno ocupada pela edificação e também aquele eventualmente reservada como de utilização exclusiva dessas casas, como jardim e quintal, bem assim a fração ideal do todo do terreno e de partes comuns, que corresponderá às unidades. c) serão discriminadas as parte do terreno que poderão ser utilizadas em comum pelos titulares de direito sobre os vários tipos de unidades autônomas d) serão discriminadas as áreas que se constituírem em passagem comum para as vias públicas ou para as unidades entre si (BRASIL, 1999). Art. 3º - aplica-se aos loteamentos a Lei nº 4591, de 16 de dezembro de 1964, equiparando-se o loteador ao incorporador, os compradores do lote aos condôminos e as obras de infraestrutura à construção da edificação. (BRASIL, 1967).
Sendo assim de acordo com o disposto neste Decreto-lei é possível enquadrar os
condomínios fechados horizontais de lotes no instituto jurídico dos condomínios, posto
que as obras de infraestrutura são consideradas construção de edificação, ou seja, as
obras básicas do empreendimento cumprem por si só a exigência da construção prévia
da casa. Como explica Moura:
Portanto, deve-se deixar que os condomínios horizontais, podem ser de dois tipos: de casas e de lotes. Ambos têm um padrão urbanístico de uso residencial resultante da divisão de uma gleba em unidades residenciais, áreas de circulação, áreas verdes e de lazer privativas aos
75
moradores do empreendimento. As áreas comuns internas são consideradas privativas e de responsabilidade dos condôminos, que têm de pagar uma taxa condominial para a manutenção dessas áreas. Cada unidade residencial é considerada uma fração ideal do terreno, ou seja, todos os proprietários também são donos de parte das áreas comuns (proporcional ao tamanho da área do terreno), o que justifica a denominação de ‘condomínio’ para o empreendimento. (MOURA, 2008, p.46.)
Diante da inexistência de legislação que preveja empreendimentos nos moldes
dos condomínios fechados, uma vez que no Brasil as formas jurídicas reconhecidas de
parcelamento do solo são o loteamento, desmembramento além do instituto do
condomínio, a jurisprudência tem suprido o branco normativo, amparados por
legislação não específica e nada exaustiva segundo Tepedino (apud SOARES, 1999,
prefácio apud SOUZA E SILVA, 2004).
IV. ANÁLISE MORFOLÓGICA
4.1. Caracterização da Área
O universo de estudo é a que envolve os condomínios Green Woods, Green
Village, West Park Boulevard e West Side Boulevard, que se encontram entre as Zonas
administrativas Sul e Oeste da Cidade de Natal/RN, entre os bairros de Cidade da
Esperança e Candelária, como podemos ver na figura 09.
Para desenvolver uma análise de sociabilidade determinou-se como área de estudo,
região compreendida entre os bairros de Nossa Senhora de Nazaré, Lagoa Nova, Cidade da
Esperança, Candelária, e Cidade Nova. Essa área foi delimitada, envolvendo um perímetro
urbano suficiente para compreensão das características sociais e ambientais contíguas aos
condomínios, assim como o processo de ocupação de seu entorno, estendendo-se até os
grandes eixos urbanos mais próximos, importantes para a compreensão do fenômeno dos
enclaves fortificados em questão.
Ainda para dar suporte à discussão desenvolvida, determinou-se uma área de entorno
imediato (ver Mapa 01/14 em anexo), que compreende apenas espaços edificados com testada
voltada para os condomínios e proximidades importantes em discussões de cunho mais local. A
área de entorno imediato está localizada dentro da área de estudo, porém só compreende
regiões entre os bairros de Cidade da Esperança e Nossa Senhora de Nazaré.
76
Figura 07: Mapa de localização dos condomínios
Fonte: Desenvolvido pela autora a partir de CAERN (2006), 2014.
O Mapa de Localização dos condomínios ilustra o universo de estudo (condomínios), a
área de estudo e a área de entorno, para que seja possível compreender melhor sua localização
e relação entre elas.
4.1.1. Caracterização Sócio ambiental da Área de Estudo
Grandes glebas disponíveis nas áreas mais centrais, com ampla oferta de
infraestrutura e serviços são escassas e caras em demasia. Os empreendedores
imobiliários, focando em áreas bem conectadas e de grande porte, muitas vezes
condomínios fechados, se utilizam de grandes áreas que estão desocupadas devido a
fragilidades ambientais. Com vistas na ampliação dos lucros, os empreendedores
vendem um “novo estilo de vida” e tiram proveito relacionando empreendimentos tipo
enclave fortificado com a vivência da natureza e a sustentabilidade.
77
No caso dos empreendimentos em questão, a área encontrada pela FBF
Empreendimentos para lançar o empreendimento Green Village e dar a largada na
reprodução da tipologia “condomínio fechado” em Natal foi em uma região de franjas
dos bairros elitizados de Natal. Candelária, proximidades de Cidade da Esperança.
Segundo Souza e Silva (2004), uma região duplamente frágil, por questões ambientais e
sociais. A questão social está ligada à natureza da região e sua sensibilidade e
importância para a cidade. A questão social ligada ao perfil socioeconômico dos
moradores dos bairros das proximidades, de classe social mais baixa em relação ao
público em potencial do empreendimento.
4.1.1.1. Caracterização Social da Área de Estudo
Localizada em uma área de muitas disparidades sociais, a área de estudo se
insere em meio à transição da zona oeste e sul da cidade. À Oeste encontramos bairros
populares, com condomínios residenciais populares e um grande número de imigrantes
vindos do interior do estado.21 Ao sul a ocupação foi iniciada pela, chegada de imigrantes
à caminho da Base de Parnamirim Fields em Lagoa Nova. E conjuntos habitacionais (ver
Mapa 02/14 em anexo) voltados para a classe média em Candelária. Com o passar do
tempo os bairros da Região Oeste mantiveram suas características populares, enquanto
a leste houve intensa valorização, que elitizou ainda mais os bairros de Lagoa Nova e
Candelária.
Podemos notar essa desigualdade socioespacial analisando o mapa abaixo
(figura 10) que traz dados de rendimento nominal médio por área geográfica. Enquanto
Lagoa Nova e Candelária tem média de rendimento dos moradores entre 11 e 15 SM,
Cidade da Esperança e Cidade Nova de 2 a 4 SM. Trata-se de uma renda de 3 a 5 vezes
maior do que os moradores do bairro contíguo aos bairros elitizados.
21 SEMURB. Cidade da Esperança: Conheça melhor seu bairro – 2007. Natal: SEMURB, 2007.
SEMURB. Anuário Natal 2005. Natal (RN): Departamento de Informação, Pesquisa e
Estatística, 2005.
78
Figura 08: Rendimento nominal médio por área geográfica
Fonte: Desenvolvido pela autora a partir de CAERN (2006) e dados do IBGE, 2014.
Entre as Zonas Administrativas Oeste e Sul, a área de estudos está compreendida
em uma área socialmente frágil, com favelas consolidadas e grande número de vilas. Na
região, existem duas favelas consolidadas, compreendidas ao sul da área, a favela da
Baixa do Cão – Cidade Nova, e a favela da Palha. Nestas regiões, segundo o Plano
Municipal de Redução de Riscos, há altos riscos de deslizamento de solo “Dunas” além
de outros riscos com índices mais baixos, como ocupação irregular de “faixa de domínio”
e carreamento de lixo.
79
Figura 09: Mapa de vilas e favelas
Fonte: Desenvolvido pela autora a partir de CAERN (2006), 2014.
Neste sentido vale destacar que as áreas de interesse social se implantaram
historicamente na região. Este mapa de Áreas Especiais, do Plano Diretor de 1994 ilustra
que mancha de vila e ocupações em forma de favela já existiam pelo menos um ano
antes da construção do condomínio Green Village.
80
Figura 10: Sistema Viário de Natal, 1984.
Fonte: PLANO DIRETOR DE NATAL, 2008.
Outros estudos mais recentes apontam a existência de duas áreas de favela na
área de estudo, são elas a Favela da Palha, e a Favela da Baixa do Cão.
Figura 11: Tabela de Informações referentes as favelas da região
Fonte: Acervo próprio com base no PMRR e SEMURB 2005.
Favela Ano/
Fonte
Do
mic
ílio
s
Ocu
pad
os
Po
pu
laçã
o
Re
sid
en
te
Mé
dia
de
Mo
rad
ore
s
Processos Presentes e
índices
Processos
Predominantes
Palha PMRR
2008 124 496 4
Carreamento de Lixo (2)
e Ocupação Irregular de
“Faixa de Domínio” (2)
Assentamento
ocupando
irregularmente via
pública
SEMURB
2005 114 456 4 - -
Baixa
do Cão
PMRR
2008 270 1080 4
Deslizamento de Solo
“Dunas” (5) e
Carreamento de Lixo (2)
Invasão de dunas,
sujeito a remoção
parcial.
81
Fazendo uma reflexão sobre as questões sociais e sua espacialização no meio
urbano, nota-se que o condomínio instala exatamente na fronteira da mancha de vilas.
Bairro popular à oeste, bairro elitizado à leste. Condomínio ao centro, voltado para leste,
claro suas barreiras físicas o mantém isolado, não é necessário relacionar-se com o
entono. Este desejo de segregar é o desejo daqueles que decidem morar em um
empreendimento desta natureza. Reconhecido pelo convívio entre iguais, as decisões
projetuais materializam o desejo de manter o diferente fora. O que é interessante neste
contexto é a quase a sobreposição dos diferentes, e a manutenção da desigualdade.
Aprendeu-se com o fenômeno da segregação socioespacial que se uma área é
desvalorizada por não ter infraestrutura urbana, pode-se privatizá-la e buscar os lucros
ao vendê-la como um produto elitizado. O mais perverso é que a infraestrutura
construída não é mais para todos, mas apenas para quem pode pagar por ela.
Favela da Palha
Com uma área de assentamento correspondendo a 9,590 m2, a Favela da Palha
ocupa irregularmente a via pública “Rua Francisco Varela”, e está localizada ao sudeste
dos condomínios, em Cidade Nova, Zona Administrativa Oeste. (Figura 13)
Figura 12: Mapa Aéreo Favela da Palha
Fonte: AcervoPMRR, 2008
82
Figura 13: Favela da Palha
Fonte: Acervo PMRR, 2008.
Figura 14: Campo de Futebol na Favela da Palha
Apontada como um assentamento precário desde o anuário de 2005,
desenvolvido pela SEMURB, a favela da palha nesta época era composta, segundo o
estudo, por 114 domicílios particulares ocupados, e 456 moradores.
O Plano Municipal de Redução de Riscos, de 2008 faz menção aos riscos da
região, que segundo o levantamento teria 124 domicílios particulares, com 496. A área
apresenta riscos médios, sendo eles: Carreamento de Lixo (2) e Ocupação Irregular de
“Faixa de Domínio” (2). Ambos atingindo índice 2 em uma escala de 2 a 5.
Favela da Baixa do Cão – Cidade Nova
A Favela da Baixa do Cão – Cidade Nova, com uma área de assentamento de
208,786 m2, invade as dunas no bairro de Cidade Nova, ocupando parte da Zona de
Proteção Ambiental 01 – Zona de Preservação ambiental do campo dunar dos bairros
de Pitimbu, Candelária e Cidade Nova. Também localizada à sul/sudeste dos
condomínios, esta favela se estende desde a parte mais ao sul do condomínio West Park
Boulevard e West Side Boulevard até o outro lado da duna, transpondo o alto da duna
até chegar a outra área residencial do bairro de Cidade Nova.
Figura 15: Comunidade da Baixa do Cão, Cidade Nova.
Fonte: Jaeci, 2001.
83
Apontada como área de risco pelo Plano Municipal de Redução de Riscos, de
2008, os riscos mencionados para a região são: alto risco de deslizamento de Solo
“Dunas” (índice 5 de 5) e carreamento de lixo (índice 2 de 5). Ainda segundo o
levantamento, a favela teria 270 domicílios particulares, com 1080 moradores.
Figura 16: Vista Aérea da Comunidade da Baixa do Cão, Cidade Nova.
Fonte: Acervo PMRR, 2008.
Figura 17: Fotografia da Baixa do Cão
Fonte: Acervo PMRR, 2008
Figura 18: Agua servida na Baixa do Cão
Fonte: Acervo PMRR, 2008
84
4.1.1.2. Caracterização Ambiental da Área de Estudo
Devido a sua formação geomorfológica, a área de estudo é uma zona bastante
frágil em termos ambientais. Como podemos perceber na figura existem duas
formações geológicas: a formação Potengi e Dunas Fixas. A parte mais frágil
ambientalmente falando são as dunas fixas, que demandam uma série de cuidados para
sua manutenção e equilíbrio.
Figura 19: Mapa de lagoas urbanizadas e não urbanizadas
Fonte: Desenvolvido pela autora a partir de CAERN (2006), 2014.
Devido a estas características foi instituída na região a primeira Zona de Proteção
Ambiental da Cidade (ZPA). A ZPA-01 compreende a maior parte da região formada de
dunas fixas na área de estudo. Além da ZPA – 01, existe uma duna fixa, chamada Duna
85
08, que está sem amparo legal e numa realidade de contínua ocupação por parte da
população.
Souza e Silva (2004) menciona em seus estudos os problemas de drenagem
vividos na área de estudos antes da construção das lagoas de capitação da região. Os
problemas eram tão sérios que os empreendedores do Condomínio Green Village,
(1995) primeiro condomínio fechado da região, tiveram que construir uma lagoa
urbanizada de grandes dimensões na área.
A ZPA – 01, ou Zona de Proteção Ambiental dos bairros de Pitimbu, Candelária e
Cidade Nova, foi regulamentada pela Lei Municipal número 4.664, em 31 de julho de
1995. A região ocupa uma área de aproximadamente 8 km2 e está compreendida entre
as Zonas Sul e Oeste da Cidade. A ZPA 01 é a principal área de recarga do aquífero
subterrâneo de Natal, sendo responsável pela manutenção do reservatório de água
potável da cidade, além da proteção da flora e fauna das dunas.
Esta ZPA é contígua a um dos condomínios universo de estudo desta monografia,
Condomínio Green Woods, e muito próxima de todos os outros, como podemos ver no
mapa a seguir:
Figura 20: Mapa da ZPA – 01 e Condomínios
Fonte: SEMURB, 2007
86
A importância desta Zona de proteção ambiental para este trabalho é sua
configuração enquanto barreira física, e área de ocupação. Duas discussões que trazem
à tona os conceitos de urbanidade e morfologia urbana e reforçam os graus de
segregação e disparidades social da área de estudo.
4.1.2. Legislação Urbanística Incidente
A área de estudo é constituída por fragmentos de bairros diferentes do
Município de Natal. No que diz respeito à legislação incidente, na área, não existe muita
disparidade, a área compõe-se basicamente de área não adensável, portanto com o
coeficiente de aproveitamento básico 1,2. Em Lagoa Nova é possível adensar mais, o
coeficiente máximo é 3,0 segundo o Plano Diretor de Natal (2007).
Em relação às áreas especiais, destaca-se a Zona de Proteção ambiental 01 que
faz disposições com vistas a preservar a área de dunas fixas uma vez que ela é
importante fonte para o aquífero da cidade do Natal. Existe ainda a previsão de possível
Operação Urbana, em Candelária.
Figura 21: Mapa de Macrozoneamento/Operação Urbana
Fonte: Desenvolvido pela autora a partir de CAERN (2006), 2014.
87
Em relação à legislação incidente, questões como adensabilidade podem ser influentes
para a urbanidade de qualquer região, tendo em vista que coeficientes de ocupação maiores
permitem maior densidade de construção. Esta realidade pode fazer com que haja verticalização
na área, aumentando assim o número de pessoas proporcional à área de solo ocupada pelo
edifício. Isso contribui para o número de usuários em potencial para o espaço público.
4.2. Elementos estruturadores do Tecido Urbano
4.2.1. Sistema viário
Os Condomínios fechados da área de estudo e sua relação com o sistema viário
Condomínios fechados são tipologias fortemente relacionados ao sistema viário, mesmo
que, por vezes, implantados distante dos centros urbanos - o que não é o caso dos condomínios
universo de estudo aqui estudados, que se localizam próximos a grandes eixos viários. Isto se
deve ao importante papel exercido pelo sistema viário em um enclave fortificado, que reproduz
um “novo estilo de vida”, em que a motorização é acentuada, e as distâncias relativizadas.
Figura 22: Mapa de centralidades de Natal
Fonte: SEMURB 2007
88
Analisando a localização dos condomínios em questão em termos de sistema viário,
percebemos que se encontra perto do polo “Lagoa Nova”, que segundo o mapa de centralidades
do Plano Setorial seria uma centralidade projetada também se configuraria como um Subcentro
– Porção Sul. Os condomínios ainda se encontram nas proximidades do grande eixo Prudente
de Morais.
Para comprovar a importância da conexão com grandes eixos no estilo de vida e
na comercialização destes empreendimentos, seguem mapas de folders dos
condomínios. Nestas imagens é possível perceber o destaque para os grandes eixos e a
omissão ou diminuição da importância das vias locais.
O folder do Green Village destaca as Avenidas Mor Gouveia, Jaguarari, Avenida
Senador Salgado Filho, Avenida da Integração. Roberto Freire e BR-101, além de alguns
empreendimentos de grande porte, como o Natal Shopping, por exemplo. Como
podemos perceber todos são grandes eixos, e na representação nota-se que o
empreendimento está voltado para os eixos, reforçando a ideia de facilidade de
deslocamento.
Figura 23: Folder de comercialização do Green Village
Fonte: FBF Empreendimentos, 1995.
89
O folder do empreendimento West Park Boulevard (figura 23), destaca a conexão
da Av. Libânia Galvão Pereira com a Jaguarari. Apesar de estar parte em Candelária e
parte em Cidade da Esperança, na representação aparece apenas o bairro de Candelária
e Lagoa Nova. Apesar de ser uma área residencial bastante ocupada e consolidada, o
entorno do empreendimento é representado como se não houvesse nada construído,
além da manipulação da escala. O enfoque é voltado para grandes empreendimentos e
vias.
Figura 24: Folder de Comercialização do West Park Boulevard
Fonte: SOUZA E SILVA (2004) e Avelino (2007).
Para a comercialização do Condomínio West Side Boulevard a deturpação do
sistema viário é ainda mais intensa. Além de constar no mapa vias que não existem,
ainda aparecem vias que estão interditadas com barricadas e intransitáveis. Todo esse
mascaramento da verdade para passar uma imagem de boa conexão com grandes eixos
(figura 25).
90
Figura 25: Folder de comercialização do West Side Boulevard
Fonte: SOUZA E SILVA (2004) e Avelino (2007).
Uma vez comprovada a forte relação entre os condomínios e os grandes eixos
viários, é importante lembrar que a motorização é desfavorável à sociabilidade urbana.
Segundo o conceito de desurbanismo, a motorização é um dos preceitos para destruição
das cidades, elemento com capacidade de retroalimentar o ciclo de aspectos
desfavoráveis ao deslocamento em transportes públicos e a pé, e fortalecer cada vez
mais os estilos de vida que se deslocam apenas em automóvel.
O sistema viário não é importante apenas para aqueles que se locomovem de
carro, os pedestres também fazem uso das vias e este uso é fomentador da
sociabilidade. Segundo Phillippe Panerai (2006), “o espaço público compreende a
totalidade das vias, ruas e vielas, bulevares e avenidas, largos e praças, passeios e
esplanadas, cais e pontes, mas também rios e canais, margens e praias. Esse conjunto
organiza-se em rede a fim de permitir a distribuição e a circulação.” (PANERAI, 2006. P.
81). Com a função de conectar, as vias exercem um papel importante na sociabilidade
uma vez que é a ponte pela qual o usuário em potencial chega aos demais espaços
91
públicos, além disso, uma vez em uma via pública o usuário já vivencia o espaço urbano,
pode ser interagir e sentir a copresença dos demais usuários de determinada via.
As vias e seu aspecto democrático na área de estudo
É nas ruas que a sociabilidade acontece, e, como já foi visto, a urbanidade
depende de espaços democráticos, onde diferentes estilos de vida e classes
socioeconômicas possam coexistir e relacionar-se. Devido a importância do livre acesso
às vias, o primeiro critério a ser analisado será a privatização de ruas, fenômeno em que
espaços que deveriam ser públicos e com acesso à todos são enclausurados em grandes
empreendimentos, cerceando a mobilidade dos demais que não têm acesso à estas
áreas privadas.
Em uma região com grandes glebas fragmentando o sistema viário, nota-se um
grande número de vias internas às parcelas (ver Mapa 03/14 em anexo). Ora, áreas tão
grandes precisam de conexões entre as vias públicas que as servem e seus diversos
fragmentos. Este papel seria feito por vias locais, caso houvesse parcelamento
convencional em loteamento. Porém como a área apresenta diversos condomínios
fechados e grandes empreendimentos, as vias privatizadas acabam se reproduzindo em
larga escala (ver Mapa 04/14 em anexo).
Além das ruas que já foram concebidas em áreas privadas, chama-se atenção
para vias que deveriam ser públicas, porém foram interrompidas por empreendimentos
(ver Mapa 05/14 em anexo), e ainda ruas interrompidas propositadamente por moradores
da região através do uso de barricadas, para acabar com o fluxo em determinadas
regiões.
A Rua dos Potiguares foi interrompida por uma ocupação residencial contígua ao
terreno da Petrobrás, e pelos empreendimentos Condomínio West Park Boulevard, e
também pelo Condomínio Smile. Via de importante papel para a cidade, a Rua dos
Potiguares sofreu um processo contínuo de esmaecimento. Quando da implantação do
condomínio West Park Boulevard, em 1999, a implementação da rua planejada pelo
Plano Diretor de 1984 e de 94 não foi respeitada, o projeto simplesmente desconsiderou
a via que deveria existir construiu um sistema viário interno desconexo ao sistema viário
do entorno.
92
Via larga, com vazão para vários carros, e grande extensão, a Rua dos Potiguares
foi interrompida em seu cruzamento com a Avenida Mor Gouveia. A figura 26 mostra a
altura do cruzamento.
Figura 26: Cruzamento da Avenida dos Potiguares com a Avenida Mor Gouveia
Fonte: Acervo próprio, 2014.
O empreendimento Condomínio Smile, construído em 2012, extermina
simbolicamente a Rua dos Potiguares, à medida que pavimenta apenas a entrada
necessária para os carros acessarem a portaria do condomínio residencial. Após a
entrada do condomínio além não haver mais pavimentação, o empreendimento
construiu uma calçada no meio da rua interrompendo a passagem de veículos. Destaca-
se portanto a incoerência com o folder do empreendimento, que destacava a Rua dos
Potiguares como se fosse acessível (Figura 29)
Figura 27: Calçada obstruindo a Rua dos Potiguares
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 28: Perímetro Rua Potiguares sem pavimentação
Fonte: Acervo próprio, 2014.
93
Em 2011, quando começaram as pesquisas para esta monografia, a área do
empreendimento estava cercada com tapumes. Estes tapumes se estendiam isolando
também a área da rua dos Potiguares. Porém após o término da construção do
empreendimento, o condomínio já não se configura como obstáculo ao acesso à rua dos
Potiguares. Apesar dos aspectos mencionados em termos simbólicos, fisicamente, o
empreendimento respeitou a área da rua, não invadindo ou privatizando seu perímetro.
Figura 29: Material de propagando do Condomínio Smile
Fonte: Empreendedora Patrimônio, 2012.
O próximo trecho em que a Rua dos Potiguares encontra-se obstruída está em
uma área contígua ao terreno da Petrobrás, na Av. Libânia Galvão pereira. As casas
foram construídas no espaço destinado à Rua dos Potiguares, restando pouca largura
para a rua, que permite a passagem de pedestres, porém não veículos. Além da largura
impedir a passagem de carros, outros osbstáculos foram construídos no sentido de
impedir a passagem de carros na área. Apesar de não ter dados precisos relativos ao
início desta ocupação, acredita-se que ela é anterior à construção do condomínio West
Park Boulevard.
94
Figura 30: Obstrução s Potiguares
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 31: Rua dos Potiguares
Fonte: Acervo próprio, 2014.
A próxima barreira encontrada pela Rua dos Potiguares é o Condomínio West
Park Boulevard. De maior dimensão que qualquer outro obstáculo, devido a sua
natureza, o impacto do empreendimento em relação ao fechamento da via é muito
maior. Isso se deve à grande área cerrada, sem outras alternativas para o fluxo que não
percorrer todo o perímetro do condomínio para chegar ao outro lado do
empreendimento, onde a Rua dos Potiguares continua.
Temos, portanto, o cerramento de uma via e a conformação de uma grande
barreira para o deslocamento de pedestres e automóveis, diferente dos outros dois
gargalos mencionados. Na foto a seguir (figura 33) vê-se a continuação da Rua dos
Potiguares e o encontro entre a rua e o condomínio, onde a mesma deveria continuar,
porém foi interrompida.
Figura 32: Rua dos Potiguares após o Condomínio West Park Boulevard
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 33: Entroncamento da Rua dos Potiguares com a Rua Manoel de Castro
Fonte: Acervo próprio, 2014.
95
O cerne da questão levantada neste tópico de sistemas viários e sua relação com
os condomínios fechados é a falta de conexão com a malha viária do entorno, e
constituição de barreira ao deslocamento, com grandes áreas fechadas à passagem dos
demais moradores da cidade, que não condôminos.
Toda esta discussão tem relevância para a sociabilidade, pois está ligada à
configuração local, que versa que menores distâncias e maiores proximidades são
favoráveis ao uso do espaço público. Neste contexto, o fechamento da rua aumentou as
distâncias, além de diminuir a intensidade métrica da grelha, ofertando menores
possibilidades de caminho para os transeuntes, com consequências também negativas
para o movimento nas vias principais e principalmente locais segundo o argumento de
“quadras curtas” de Jane Jacobs (2000).
Hierarquia Viária
Fazendo referência a ruas, de acordo com sua importância em relação às escalas
locais ou globais, verificamos que vias são utilizadas para longos ou curtos
deslocamentos de acordo com suas características hierárquicas. Nesse sentido, Panerai
(2006) destaca que a rede viária é contínua e hierarquizada, à medida em que vias
hierarquicamente superiores organizam uma porção de território urbano maior do que
vias locais.
Fazendo referência à hierarquia viária, o Plano Diretor de Natal (2007), adota
também um Sistema Viário Hierarquizado, classificando as vias em arteriais, coletoras e
locais.
Art. 43. – Para efeito dos programas e projetos que dizem respeito ao Sistema de Circulação e Transporte, bem como para a definição dos critérios de localização dos usos expressos no art. 34 desta Lei, são consideradas as seguintes categorias e hierarquização do Sistema Viário: I – Via Arterial – Forma a principal estrutura viária da cidade, compreendendo grandes volumes de tráfego e desenvolvimento de velocidades mais altas. a) Via Arterial – I (Penetração) – constitui os principais acessos a outros municípios/rodovias; b) Via Arterial – II (Articulação) – permite articulação e deslocamentos entre regiões extremas; II – Via Coletora – a via de importância intermediária na articulação da malha urbana, estabelecendo ligação entre as demais vias e alimentadora das arteriais:
96
a) Via Coletora – I (Distribuição) – distribui os fluxos dos veículos entre as vias arteriais e locais; b) Via Coletora – II (Apoio) – apoia a circulação da via arterial; III – Via Local – Caracteriza-se por baixo volume de veículos e desenvolvimento de baixas velocidades: a) Via Local – I – usada como itinerário de transporte coletivo; b) Via Local – II – usada para acesso direto a áreas residenciais, comerciais ou industriais. (SEMURB, 2007)
Introduzindo o tema de sistema viário hierarquizado, segue o mapa de vias de
Natal (Figura 34), com a classificação hierárquica viária.
Figura 34: Mapa de hierarquia viária de Natal
Fonte: SEMURB, 2008.
97
Nesse mapa é possível perceber certa proximidade por parte dos
empreendimentos com vias importantes hierarquicamente, desde vias coletoras à
arteriais. Estas vias serão elencadas a seguir, no estudo do mapa da área de estudo.
Analisando o mapa em nível municipal, é possível perceber a rarefação de vias
importantes hierarquicamente no entorno imediato dos empreendimentos. Ora, isto
acontece pois eles mesmo se configuram como barreira à continuidade de algumas
delas (a Rua dos Potiguares, por exemplo), que naturalmente continuariam até a
barreira natural da ZPA-01, porém foi interrompida.
Uma vez compreendido o sistema hierárquico das vias da cidade, analisaremos
o mapa de hierarquia viária da área de estudo (ver Mapa 06/14 em anexo). Faz-se
necessário analisar a relação do sistema viário com os condomínios fechados, universo
de estudo deste trabalho acadêmico.
O sistema viário na área de estudo é composto por vias arteriais, coletoras e
locais. As vias arteriais, são as principais do ponto de vista hierárquico, e são
responsáveis por grandes volumes de tráfego. As vias arteriais na área são: Avenida
Jaguarari, Avenida da Integração, Avenida Prudente de Morais, Avenida Capitão Mor
Gouveia e Avenida Interventor Mário Câmara e Avenida Coronel Estevam.
Figura 35:Vista da Rua Jaguarari
Fonte: Google Maps, 2012.
Figura 36:Vista da Avenida da Integração
Fonte: Google Maps, 2012.
Figura 37: Vista da Avenida Prudente de Moraes
Fonte: Google Maps, 2012.
Figura 38:Vista da Avenida Capitão Mor Gouveia
Fonte: Google Maps, 2012.
98
Figura 39: Vista da Av. Interventor Mário Câmara
Fonte: Google Maps, 2012.
Figura 40:Vista da Avenida Coronel Estevão
Fonte: Google Maps, 2012.
As vias coletoras, tem o papel de conectar-se bem com as demais vias locais e
alimentar as arteriais, distribuindo (coletora I) e apoiando fluxos (coletora II). O papel de
conectar bem as vias locais às vias arteriais é essencial para a boa fluidez do fluxo, para
tanto faz-se necessário que estas vias se estruturem de forma a atrair o fluxo de usuários
que saem de seus comércios ou residências, em vias locais, para utilizar-se de vias
coletoras, que o levarão aos grandes eixos artérias, responsáveis por articular maiores
distâncias. Para assumir este papel é importante certa regularidade e boa conexão de
vias coletoras, se em uma grande área não houverem vias coletoras a via local vai acabar
realizando um papel que não é o seu, prejudicando o sistema hierarquizado de vias. Este
prejuízo causaria problemas de tráfego, pois as vias locais não foram projetadas para
grandes fluxos.
Destacamos na área algumas vias coletoras, sendo elas as vias coletoras I:
Avenida Lima e Silva, Avenida Jerônimo Câmara e Avenida Rio Grande do Norte. Como
Coletora II, a Rua Raimundo Chaves (Avenida Libânia Galvão Pereira), Rua dos
Potiguares, Rua dos Tororós e Rua dos Caicós.
No sistema viário é possível perceber que as vias coletoras sofrem a influência
dos grandes empreendimentos. Esta influência se dá à medida que todas elas, com
exceção da Rua Adolfo Gordo (ou Rua dos Caicós), são cortadas ou acabadas em grandes
empreendimentos. É o caso da Av. dos Potiguares, já mencionada anteriormente, que
foi fragmentada em duas partes, a antes do condomínio West Park Boulevard e a depois.
A avenida Raimundo Chaves também acaba ao encontrar-se com a mesma gleba, na
porção do terreno da Petrobrás. Após este terreno outras vias coletoras desconectadas
entre si foram projetadas para distribuir e apoiar o fluxo das vias arteriais, porém
acredita-se que sua eficiência sofra com tanta fragmentação. A Rua dos Tororós também
99
acaba ao encontrar-se com um grande empreendimento, a CEASA em conjunto com o
CAIC.
Figura 41: Mapa de Eixos e Acessos dos Condomínios
Fonte: Desenvolvido pela autora a partir de CAERN (2006), 2014.
As avenidas Coletoras I, responsáveis pela distribuição do fluxo, ao norte da área
de estudo vinham se repetindo com certa intensidade, porém ao sul da Avenida Mor
Gouveia, com as grandes glebas em sentido mais vertical, há uma descontinuidade da
reprodução das mesmas, nesta porção do território, apesar de existirem algumas vias
arteriais na direção vertical, não existem vias coletoras horizontais para distribuir os
fluxos entre locais e arteriais.
Isto sem mencionar as ruas locais suprimidas pela construção de grandes
condomínios horizontais e verticais, caso fossem feitos loteamentos tradicionais haveria
100
uma série de vias locais necessárias no licenciamento deste tipo de parcelamento, que
passam automaticamente para o patrimônio púbico. A legislação ainda menciona a
obrigatoriedade de sua articulação com o sistema viário existente e características que
devem ser respeitadas de acordo com a classificação hierárquica das mesmas.
O que podemos apreender disso é que o interesse privado se sobrepôs ao
interesse público, com influência para vias locais e até mesmo de escala mais global,
como vias arteriais e coletoras.
Uma vez analisada as características deste sistema viário e hierárquico
fragmentado por grandes glebas, é necessário refletir sobre suas consequências para a
urbanidade na região. Sua consequência está relacionada a fatores de rarefação da
intensidade métrica da malha viária, diminuição de alternativas de caminhos e de
interseções. Todos estes fatores são negativos para a urbanidade. Se na escala do
automóvel distancias tão grandes já são prejudiciais, imagine para os pedestres, grandes
protagonistas da copresença e por consequência da sociabilidade no espaço urbano.
Maiores distâncias desestimulam o usuário em potencial a caminhar, e quadras longas
ocasionadas por esta rarefação direcionam o fluxo para uma só via, fazendo com que as
demais vias locais fiquem desertas, com consequências para a segurança e a
microeconomia.
Após estudo da área acredita-se que aproveitando-se da grande barreira natural
da Zona de Proteção Ambiental 01, os grandes empreendimentos se utilizaram da falta
de influência dos proprietários das edificações na porção ao sul dos condomínios, região
mais pobre e em grande parte de ocupação. Esses moradores são os maiores
prejudicados, tendo em vista que precisam traspassar os condomínios para chegas às
suas residências. Se apropriando desta realidade, os empreendedores se aproveitaram
dela para recortar o sistema viária ao seu bel prazer. Além de voltar estes grandes
empreendimentos para as vias principais, cortam os grandes eixos e ainda viram suas
costas para a comunidade pobre da região, negando o entorno e projetando-se para as
áreas mais cêntricas da cidade, onde certamente não poderiam ter realizado tal feito,
pois interesses se chocariam e haveria maiores discussões acerca de fechamento de ruas
e construção de grandes barreiras.
101
Estudo da evolução do sistema viário ao longo dos últimos 30 anos
Para compreender o processo de formação da malha viária e o encadeamento
de fechamento de ruas faremos o estudo de mapas viários de legislação municipal de
1984 e de 1994.
O Plano Diretor de 1984 continha anexos que sistematizam e planejamento do
sistema viário do município hierarquicamente, dividindo-o em sistema viário principal e
secundário e inclui subclassificações das vias em seis tipos diferentes, desde vias de
contorno, penetração, distribuição até vias coletoras, locais e de pedestres, conforme
pode ser visto no artigo que regula tal classificação e o seguinte que estipula requisitos
para cada tipo.
Art. 17 – O Sistema viário Urbano será planejado de forma atender à seguinte classificação hierarquizada das vias, de conformidade com as funções que devam desempenhar, procurando-se garantir sua adequada conexão com os planos rodoviários federal e estadual. I – Sistema Viário Principal: a) Vias de Contorno – VC b) Vias de Penetração - VP c) Vias de Distribuição – VD II – Sistema Viário Secundário: a) Vias Coletoras – VCO b) Vias Locais – VLO c) Vias de Pedestres Art. 18 – As vias urbanas, de acordo com a classificação contida no artigo anterior, deverão ter as seguintes características funcionais: I – As vias de contorno deverão tangencias as áreas urbana e de expansão urbana, estabelecendo conexões rodoviárias externas do Município de forma a otimizar seu acesso. II – As vias de penetração deverão possibilitar a ligação contínua das vias de contorno aos grandes polos de geração de tráfego das áreas urbana e de expansão urbana. III – As vias de distribuição interligarão as vias de penetração distribuindo seu tráfego para as vias coletoras. IV – As vias locais são as que atendem ao acesso aos lotes, estabelecendo sua ligação com as vias coletoras. VI – As vias de pedestres deverão permitir o livre trânsito de pessoas no interior de unidades funcionais. (SEMURB, 1984.)
Uma vez conhecedores dos tipos de via planejados pelo legislador, seguimos com
o mapa de Sistema Viário confeccionado para regular interferências nas vias públicas e
ordenar a ocupação do território.
102
Figura 42: Mapa Viário do Plano Diretor de 1984
Fonte: SEMURB, Plano Diretor de 1984.
Rua dos Potiguares
103
Nesta imagem nota-se uma grande diferença em relação ao mapa de hierarquias
viárias atual do município de Natal. Isto se dá devido ao fato de que às vias que cortam
toda a cidade, as que se destacam no mapa são vias de contorno, em pontilhado e de
penetração, com o traço mais grosso. Nota-se uma integração mais homogênea, em que
a cidade é cortada por eixos verticais e horizontais. É certo que nesta época projetaram-
se vias sem a preocupação a preservação de áreas de proteção ambiental, como a ZPA-
01 por exemplo, que seria cortada eixos nesta projeção. Mesmo com essa ressalva é
importante analisar a configuração viária do sistema proposto no documento em
questão.
A via de penetração Rua dos Potiguares já estava presente neste mapa. No
projeto ela tinha o papel de ligar o aeroporto como o centro da cidade, ligando portando
polo de geração de tráfego dentro da zona urbana e na zona de expansão. A via dos
Potiguares cortaria a Zona de Proteção Ambiental 01 e também o condomínio West Park
Boulevard, o projeto dela como podemos perceber é muito anterior à implantação do
condomínio. Outra via importante neste contexto é a vida de distribuição planejada para
fazer a ligação entre a BR – 226 e a BR – 101. A via viria do oeste da cidade e cruzaria a
área de estudo do nosso estudo, até encontrar com a BR 101. Esta via está muito
próxima a ZPA – 01 porém adaptações poderiam ter sido feitas para que a via fosse
construída sem maiores prejuízos ambientais. Hoje existe a Avenida da Integração, que
desempenha a função de distribuição, porém só se estende até o condomínio Green
Tower, encontrando barreiras para continuar a partir dali, como será abordado a seguir.
Além das vias mencionadas do Sistema Principal, as ruas do Sistema Viário
Secundário também foram prejudicadas ao longo da história na área de estudo, como
podemos perceber no mapa a seguir (figura 43), vias locais foram suprimidas dentro das
grandes propriedades privadas da área. Neste sentido destaca-se a Rua Raimundo
Chaves, que no mapa é contínua, cortando o terreno da Petrobrás e fazendo a conexão
entre a parte leste e oeste da área de estudo. Na configuração atual a via tem
importância hierárquica, tendo em vista que é coletora II, porém ao se encontrar com o
terreno da Petrobrás é interrompida, não cumprindo portanto, a sua função planejada
de conectar como foi projetada para fazer.
104
Figura 43: Detalhe do Mapa Viário do Plano Diretor de 1984
Fonte: Plano Diretor de 1984.
O outro instrumento de Ordenamento Urbano analisado foi o Plano Diretor de
1994. Este documento contêm aproximadamente a mesma classificação viária do Plano
Diretor Atual, com diferenças nas vias que, atualmente são chamadas arteriais, e na
época eram classificadas como estruturais, porém uma questão apenas de
nomenclatura, uma vez que as funções foram mantidas, como podemos perceber no
trecho abaixo:
Art. 43. – Para efeito dos programas e projetos que dizem respeito ao Sistema de Circulação e Transporte, bem como para a definição dos critérios de localização dos usos expressos no art. 34 desta Lei, são consideradas as seguintes categorias e hierarquização do Sistema Viário: I – Via Estrutural – Forma a principal estrutura viária da cidade, compreendendo grandes volumes de tráfego e desenvolvimento de velocidades mais altas. a) Via Estrutural – I (Penetração) – constitui os principais acessos a outros municípios/rodovias;
Rua dos Potiguares Raimundo Chaves
105
b) Via Estrutural – II (Articulação) – permite articulação e deslocamentos entre regiões extremas; II – Via Coletora – a via de importância intermediária na articulação da malha urbana, estabelecendo ligação entre as demais vias e alimentadora das estruturais: a) Via Coletora – I (Distribuição) – distribui os fluxos dos veículos entre as vias estruturais e locais; b) Via Coletora – II (Apoio) – apoia a circulação da via estrutural; III – Via Local – Caracteriza-se por baixo volume de veículos e desenvolvimento de baixas velocidades: c) Via Local – I – usada como itinerário de transporte coletivo; d) Via Local – II – usada para acesso direto a áreas residenciais, comerciais ou industriais. (Plano Diretor de 1994)
Porém o Mapa do sistema Viário de 1994 (figura 44) traz algumas diferenças em
relação ao anterior, segue o documento para que algumas características do mesmo
sejam analisadas posteriormente.
No Plano Diretor de 1994 segue sendo clara a interferência dos grandes
empreendimentos na continuidade do sistema viário. Neste sentido, abordando o
condomínio Green Village e sua contribuição para a fragmentação da malha viária,
analisaremos as vias coletoras II (responsáveis por apoiar o fluxo das vias estruturais), a
Rua Jaguarari e a Rua Doutor Lauro Pinto/Rua dos Tororós. Como podemos perceber no
mapa, a gleba que hoje dá lugar aos condomínios Green Village e Green Woods era
maior e se constituía como barreira para duas vias coletoras. A Rua Jaguarari no
desmembramento da gleba teve sua extensão prolongada e hoje corta todo o perímetro
até o final da gleba em questão. (figura 44)
O mapa deste plano reforça a nossa compreensão sobre a interferência dos grandes
empreendimentos na continuidade do sistema viário. Neste sentido, abordando o condomínio
Green Village e sua contribuição para a fragmentação da malha viária, analisaremos as vias
coletoras II (responsáveis por apoiar o fluxo das vias estruturais), a Rua Jaguarari e a Rua Doutor
Lauro Pinto/Rua dos Tororós. Como podemos perceber no mapa, a gleba que hoje dá lugar aos
condomínios Green Village e Green Woods era maior e se constituía como barreira para duas
vias coletoras. A Rua Jaguarari no desmembramento da gleba teve sua extensão prolongada e
hoje corta todo o perímetro até o final da gleba em questão.
Figura 44: Mapa do Sistema Viário do Plano Diretor de 1994 (Pág. 101) Fonte: SEMURB, 2004.
VIA ESTRUTURAL I
VIA ESTRUTURAL II
VIA COLETORA I
VIA LOCAL
VIA COLETORA II
d i r e t o rn a t a l
p l a n o
OUT/94
1:65000
DATA
ESCALA
LEGENDA
PREFEITURA MUNICIPAL DE NATAL
IPLANAT - INSTITUTO DE PLANEJAMENTO URBANO DE NATAL
SISTEMA VIARIO
n a t a l
ANEXO 03 MAPA 03
RUA PERCIVAL CALDAS
1720
AV. BERNARDO VIEIRA
RUA LIBANIA GALVAO PEREIRA
PRU
R. ABAETE
LIMITE DE MUNICIPIONATAL-PARNAMIRIM
35
AV.
AYRT
ON
SEN
NA
DAS
AV. ENGENHEIROROBERTO
FREIRE
AV. P
RAIA
DEG
ENIPA
BU
OC
EA
NO
AV.
AYRT
ON
SEN
NA
R. ABAETE
R.AL
TERO
SA
34
32
AV. CO
NTO
RNO
CER
CA
DO
IBD
F
CAMPUS UNIV.DO
AV. DOS IPES
AV. DOS GERMANIOS
BR-1
01
36
AT
LA
NT
I CO
XAVI
ER
SALG
ADO
FILH
O
MILITAR
AREA
26
AV.
25
Av.
DEN
TE
DE
AV. BERNARDO VIEIRA
SILV
EIRA
DA
MILITAR
AREA
RUA
ROM
UALD
OG
ALVA
O
MO
RAIS
DE ALENCAR
R. ALEXANDRINO
RUA
JAG
UARA
RI
21
RUA PROJETADA
29
DUNAS
RIOPIT
IMBU
BR-1
01
AV. ANTOINEDE SAINT EXUPERY
33
30ABREU E
RUA
LIMA
31
DUNAS
VIA
FERR
EA
AV. CAP. MOR GOLVEIA
23
AV. PERIMETRAL SUL
LAUREANO
RUAAV
.
GOUVEIA
R. CAP.
Av.
MOR
R. DA FLORESTA
POTIG
UARE
S
RUA
DOS
28
AV. AMINTAS BARROS
22
24
DO
S
CEL
.ES
TEVA
OC
AIC
OS
PASTO
R
RUA MANUELMIRANDA
TV. Sta. ISABEL
DUNAS
DUNAS
27
NAP
OLE
AO
RUA
R.
BOM
RIOALINHAMENTO
DE EIXODA
RUABEBERIBE
MILITAR
AREA
15
R JUVINO B.AV
. DEO
DO
ROD
AFO
NSE
CA
R. ALBERTO M.
AVHE
RMES
DA
FON
SEC
A
R MIPIBU
14R MOSSORO
13
TINO
CO
19
R.RE
GUL
O
R.O
LINTO
MEI
RA
12
AV. R
IOBR
ANC
O
09
1110
08
FORTE REIS MAGOS
RIODOCE
R. BAYPENDER
AV. T
OC
ANTIN
EA
LIMITE
DOC
ONJ. PO
TENGI
POTENGI
NAVAL
BASE
16
RIO
POTE
NG
I
TRAV
.
RIO
JAGUARIB
E
07
RIO
18
JUND
IAI
RUA TOMAZ LANDIM
RUA IRMA VITORIA
06
AV. GO
VERNADOR
ANTONIO
DEM
ELOE
SOUZA
RUADr. JO
AOMEDEIROS FILH
O
05
RIODOCE
02
03
AV. D
AS
FRO
NTE
IRA
S
RUA
VOTU
PORA
NGA
AVCIDADE
PRAIA
R.PO
NTE
NOVA
RUA TOMAZ LANDIM
04
EST. DE PAJUCARA
EST.
DE
GEN
IPA
BU
01
RIODOCE
RN-
160
RIO DOCE
R DA ARARUNA
R DA CHEGANCA
RDO
PAST
ORI
L
AV. BUMBA MEU BOI
AV GUARARAPES
AV PIRASSUNUNGA
AVD
RJU
LIAN
OM
ORE
IRA AV.
TINOCO
C. LIMA
MO
EMA
AV. ITAPETINGA
AVDR
JOAO
MEDEIROS
RSENHO
RDO
BONFIM
AV FLORIANOPOLIS
AV MARANGUAPE
R SANTO INACIO DE LOYOLA
RUAJOSE LUIS DA
SILVA
RUARIZOMAR CORREIA
DOS SANTOS
RUABOA
SORTE
AV ALMIRANTE A DE ALENCAR
RUA CEARA MIRIM
R APODI
R ACU
AVFL
ORI
ANO
PEIX
OTO
AVG.V
ARGAS
AVEN
IDA
DE
MO
RAIS
PRUD
ENTE
RUAPRESID
ENTE
BAND
EIRA
R.PRESIDENTE
SARMENTO
RUA DOSCANINDES
AVCEL
ESTEV
AO
RUA MARIO
NEGOCIO
CAM
ARA
AV.
INTE
RVEN
TOR
MAR
IO
AV.MIGUEL CASTRO
AV. LIMAE SILVA
AV. GERONIMOCAMARA
AVRI
OG
RAND
EDO
SUL
AVCEN
TRAL
RUARAIN
HAD
OM
AR
RUAIN
DO
MAR
RUA MAR E CEU
R PASTOR
J.
GALVAO
RUAANTO
NIO
CAROLINO
R PROF.
COUTINHO
AV. ANTONIOBASILIO
AV. NASCIMENTOCASTRO
AV. AMINTAS BARROS
AV. MIGUEL CASTRO
AV. LIMAE SILVA
AV. DOS CAIAPOS
AV. DOS XAVANTES
AV. DOS XAVANTES
R.JO
SEF.
SOBR
INHO
R.AL
FRED
OP.
CO
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R.LU
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LOPE
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AV. DA INTEGRACAO
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R. DECIOFONSECA
R.D
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AVPR
ESC
AFE
FILH
O
RUAM
IRASSOL
RUAPEIXE
BOI
RUA ENG.JOAO
HELIOALVES
ROCHA
RUA SANTAADELIA
RUA JARDIM DO EDEN
ESTR
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I
AV. P
RAIA
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RUA MAJOR
CORINGA
R. VEREADOR
MANO
EL
LIMITE DE BAIRRO
LIMITE DE MUNICIPIO
LINHA FERREA
AV
PRUD
DE
MO
R
ENTE
AIS
DUNAS
PARQUE
PAJUÇARA02
NEÓPOLIS
CANDELÁRIA
CIDADE DA ESPERANÇA
CIDADE NOVA
GUARAPES
CAPIM MACIO
PARQUE DAS DUNAS
PONTA NEGRA
34
36
35
31
32
33
29
28
30
PITIMBU
FELIPE CAMARÃO
N. S. NAZARÉ
BARRO VERMELHO
MÃE LUIZA
PETROPOLIS
N. S. APRESENTACÃO
AREIA PRETA
CIDADE ALTA
PRAIA DO MEIO
DIX-SEPT ROSADO
LAGOA NOVA
BOM PASTOR
LAGOA SECA
NORDESTE
NOVA DESCOBERTA
SANTOS REIS
15
21
25
27
26
23
22
24
18
20
19
16
17
ALECRIM
TIROL
QUINTAS
12
14
13
10
09
11
05
07
06
08
03
04
RIBEIRA
ROCAS
IGAPÓ
SALINAS
REDINHA
POTENGI
LAGOA AZUL01
107
Contudo, outra solução foi dada à Rua dos Tororós/Rua Doutor Lauro Pinto. Com
a mesma classificação hierárquica na época, portanto com a mesma importância
funcional, o eixo já havia sido fragmentado pelo terreno do CAIC ao norte, marco que
dividia –o em Rua dos Tororós ao norte e Rua Doutor Lauro Pinto ao sul. Apesar de voltar
com diferente nome, o eixo, mantinha sua classificação, porém não foi estendido ao
longo da gleba em questão. No Plano Diretor de 2007, o atual, a Rua Doutor Lauro Pinto
deixou de ser superior hierarquicamente e classifica-se como local, já a Rua Jaguarari
ganhou importância e hoje tem o status de Via Arterial II, permitindo articulações e
deslocamentos entre regiões extremas.
Neste contexto, a Rua dos Potiguares segue com o importante papel de ligar a
parte das áreas periféricas das regiões sul e oeste, já sendo classificada como via
coletora II, responsável por apoiar o fluxo das vias estruturais. Chama atenção, porém,
a incoerência entre a projeção da rua coletora e a vias locais desenhadas no mapa. O
conjunto de vias locais parece não estar em sintonia com a Rua dos Potiguares, que
cruzaria todas elas, cortando diversas quadras ao meio, em diagonal. Destaca-se que no
desenho a rua foi representada como construída até a rua Libânia Galvão Pereira, depois
passa a ser projeção, uma via a ser construída.
A conexão antes feita por uma via de distribuição de oeste, até a BR – 101, passa
a ser feita por uma via coletora I, representada pela via Perimetral Sul e Rua da Floresta.
O eixo hierarquicamente superior acaba ao sul do terreno da Petrobrás e encontra com
a Avenida da integração, que segue até a BR -101 sem obstáculos.
108
Figura 45: Detalhe do Mapa Viário do Plano Diretor de 1994
Fonte: Natal, 1994.
Na configuração atual, porém essa possibilidade não existe, tendo em vista que
a Avenida da Integração foi interrompida de forma intencional com a colocação de
grandes volumes de concreto e barricadas para impedir o fluxo entre a parte ao sul do
Condomínio Green Woods e o restante do perímetro da rua, na altura do início da
Avenida Jaguarari.
109
A seguir as fotos da interdição da rua por iniciativa de particulares (Figuras 46 e
47). Na interseção da Av. Integração com a Jaguarari, foram colocados entulhos e lixo,
de modo a impedir a passagem de automóveis.
Figura 46: Obstrução da Avenida da Integração – Lixo e entulhos
Fonte: Acervo Próprio, 2014
Figura 47: Obstrução da Avenida da Integração – Bloco de Concreto
Fonte: Acervo Próprio, 2014.
O mesmo foi feito ao final oficial da Avenida a Integração, aos fundos do Green
Woods, a via, sem pavimentação foi obstruída por lixo e destroços. Neste caso, porém
houve a desobstrução e hoje apesar dos entulhos é possível passar a pé ou de
automóvel.
Figura 48: Barricada na Avenida da Integração
Fonte: Acervo Próprio, 2014.
Figura 49: Avenida da Integração obstruída
Fonte: Acervo Próprio, 2014.
Uma outra via conectada ao trecho foi obstruída da mesma forma e continua
sem uso. A vegetação tomou conta do que seria via pública e já não se usa mais nem
para pedestres, pelo que se pode perceber.
110
Figura 50: Obstrução da Avenida da Integração
Fonte: Acervo Próprio, 2014.
Figura 51: Detalhe da proximidade com a ZPA-01
Fonte: Acervo Próprio, 2014.
Cogita-se que moradores da Favela da Baixa do Cão, que se conecta com a rua,
obstruíram as passagens para manter as autoridades policiais e de fiscalização longe do
local. Entre a barreira física da ZPA – 01 e os condomínios a favela acaba segregada e
isso facilita o avanço da ocupação por sobre as dunas da zona de proteção, que são
importantes para a manutenção do aquífero da cidade. Além disso, a área corre sérios
riscos de deslizamento de terra além de problemas com lixo e higiene.
Figura 52: Mapa de Pavimentação
Fonte: Desenvolvido pela autora a partir de CAERN (2006), 2014.
111
Ainda no contexto destas ruas interrompidas, outro aspecto chama atenção nos
mesmos perímetros. Relacionado à infraestrutura do Sistema Viário, a pavimentação
das vias é importante a medida em que traz conforto e fluidez aos transeuntes e
moradores. De maneira geral, a pavimentação segue a lógica da hierarquia viária, à
medida em que vias coletoras e arteriais são asfaltas, e as vias locais têm pavimentação
em paralelepípedo. As exceções são apenas as relacionadas à interrupção indevida de
ruas, e na região mais pobre da área de estudo, segregada aos fundos dos condomínios
e sem infraestrutura de pavimentação (figura 51).
Tendo em vista todo este contexto de desigualdade de oferta de infraestrutura,
cabe refletir sobre os aspectos segregatórios que se materializam na falta de
infraestrutura, criação de barreiras e no aumento de distâncias. Nesta realidade de
justaposição dos diferentes, a segregação socioespacial se configura a medida em que a
infraestrutura e comodidade da vida urbana chega para o morador do condomínio e não
chega para o morador da favela fundos do terreno. Favelas já são locais de
homogeneidade social de forma geral, com sociabilidade prejudicada, uma vez que
poucas relações são estabelecidas entre diferentes níveis socioculturais.
A falta de integração com o entorno devido às barreiras criadas pelos
condomínios e a barreira natural da ZPA – 01 prejudica ainda mais a possibilidade da
vivência da complexidade da cidade no seu sentido mais democrático. O fechamento
das poucas vias que chegam ao local intensifica ainda mais o processo de isolamento e
segregação socioespacial, realidade em que pessoas de classes socioeconômicas
diferentes vivem uma ao lado da outra, porem separadas por barreiras físicas, como os
muros do condomínio, ou de acessibilidade, como é o caso da Favela da Baixa do Cão.
Configuração espacial global e local do sistema viário
A configuração espacial global do sistema viário tem influência sobre o número
de pedestres que passarão por ela, segundo estudos relativos ao movimento de
passagem. Tendo em vista que esse movimento seria o de maiores proporções em áreas
urbanas, nos cabe avaliar as medidas de integração da área, para compreender melhor
os efeitos da fragmentação do sistema (ver Mapa 07/14 em anexo) no movimento das ruas
da área de estudo.
112
Para analisar morfologicamente a configuração espacial do sistema viário da área
de estudo e os impactos da implantação do conjunto de condomínios, universo de
estudo desta pesquisa na área, seguiremos com um estudo de integração. Este estudo
abrange as relações das vias do entorno com todas as outras vias da Região
Metropolitana de Natal, refletindo sobre a configuração global do sistema viário e suas
influências sobre a sociabilidade na área do entorno imediato dos condomínios.
Utilizou-se como fonte no estudo, o mapa de linhas axiais, desenvolvidos a partir
do mapa viário da RMN, procurando representar todas as vias em “linhas mais longas e
em menor quantidade possível”. Segundo V. A. S. de Medeiros (2006), este tipo de mapa
é a base para a leitura das medidas sintáticas, e indicam a integração dos eixos em escala
cromática.
Como mencionado no tópico Morfologia e Desempenho Urbano a integração é
uma medida bastante importante para a medição de fenômenos socioespaciais. Neste
trabalho utilizaremos o conceito de integração global e integração espacial, descrito por
Natalie Kim Crovadore e Jussara Maria Silva (2013):
A integração local (HH – R3) é a avaliação entre as linhas axiais até no máximo três passos topológicos de profundidade, esta relação aponta características de acessibilidade na escala local. A integração global (HH - RN) á a principal variável de sintaxe espacial, sua função é relacionar todas as lixas axiais do sistema entre si, indicando quantos passos topológicos são necessários para que uma linha alcance todas as demais, ponderando pela quantidade de linhas do sistema. A medida de integração tem por objetivo demonstrar a relação entre a estrutura configuracional de uma malha urbana e o movimento urbano, revelando os estímulos e desestímulos da malha ao movimento. (CROVADORE, SILVA, 2013. p. 1)
Na análise do mapa axial, evidenciamos a quantificação dos valores, trazendo a
quantificação dos valores de integração HH (RN e R3) do sistema que se quer estudar.
Em seguida as características locais serão enfocadas, oportunidade em que o mapa axial
com raio de 3.000 metros será determinado a partir do centro dos condomínios, esta
decisão foi tomada, para diminuir os efeitos de borda desta discussão.
113
No sistema viário modelado as vias dos condomínios não se fazem presentes,
visto que são privativas aos moradores dos condomínios e não fazem parte das opções
dos transeuntes comuns nem dos motoristas.
O mapa axial a seguir (figura 53) representa o sistema viário da RMN e sua
integração HH raio N (configuração global). Neste contexto é possível verificar que assim
como esperado, o condomínio se encontra próximo a vias de grande integração,
seguindo a lógica dos grandes eixos e do uso de automóveis, são eles a Av. Mor Gouveia,
Av. Prudente de Moraes, Av. da Integração, Av. Jaguarari e Rua Francisco Mignori, todas
em vermelho no mapa, e acessos importantes para os moradores dos condomínios
quando se locomoverem para as demais áreas da cidade.
Sendo assim comprova-se que as vias da proximidade no condomínio são bem
conectadas. Porém e as vias internas ao condomínio? Seriam bem conectas e bastante
utilizadas? E se ao invés de condomínios fechados ali fossem implementados
loteamentos tradicionais, haveria muita influência nas características globais da região?
Figura 53: Mapa axial – RMN sem as vias internas aos condomínios – Integração HH RN
Fonte: Adaptado pela autora, do Mapa Axial fornecido pelo MuSA, 2013
114
Um estudo morfológico de sintaxe espacial realizado pela autora desta
monografia sobre a área levantando estas questões foi desenvolvido. O objetivo era
medir as influências da fragmentação espacial no fluxo de pessoas e veículos. Para tanto
criou-se 4 sistemas, nesse modelo: (1) Sistema viário sem vias privativas ao condomínio;
(2) Sistema viário incorporando as vias dos condomínios como públicas; (3) Abstração
do Sistema viário incorporando as vias como públicas e conectando vias ao sistema
viário existente, quando possível e (4) Loteamentos hipotéticos conectados ao sistema
viário existente em substituição aos condomínios horizontais.
Os resultados apontaram dois pontos interessantes, o primeiro deles é o alto
potencial de integração da área. Caso esta abstração acontecesse, as vias dos
condomínios teriam media a alta integração por estarem conectadas com vias bem
conectadas, mostrando que trata-se de uma área com potencial para grande movimento
de passagem, portanto bastante vitalidade urbana. Veja o mapa abaixo, com um sistema
que trata as vias dos condomínios como públicas, e calcula sua integração relativa a
todas as outras ruas com raio N.
Figura 54: Mapa axial – RMN com as vias internas aos condomínios – Integração HH RN
Fonte: Adaptado pela autora, do Mapa Axial fornecido pelo MuSA, 2013
115
Para esta simulação (HH/RN) os principais eixos mencionados anteriormente
mantêm-se com sua capacidade de movimento ressaltada pela cor vermelha na escala
de cores, e as vias internas aos condomínios que agora aparecem no mapa apresentam
coloração amarelada ou esverdeada, esta característica é notada devido a ligação das
vias internas ao condomínio com vias bem integradas, ou mesmo à sua proximidade de
grandes eixos.
O segundo ponto a ser destacado é que, levando em consideração a integração
HH RN (configuração global), caso o parcelamento da região seguisse a lógica de
parcelamentos tradicionais, a diferença numérica não seria tão relevante. Ou seja,
levando em conta a integração HH RN, a configuração global não sofreria grandes
alterações caso o parcelamento da área fosse feito em loteamento ao invés de em
condomínio urbanístico. Para esta reflexão foi feito um exercício de abstração,
substituindo hipoteticamente o sistema viário fragmentado da atualidade por um
preenchido por malha de loteamento nas áreas em que hoje se localizam condomínios.
Para o sistema mencionado acima, a integração RN, apresentaria vias internas
aos condomínios seriam de integração média para alta. As integrações seriam laranja
para aqueles situados na região do Green Woods e Green Village, devido a sua maior
proximidade com eixos como a Jaguarari e integração. Enquanto que a região onde hoje
estão localizados o West Park Boulevard e o West Side teria coloração amarelada, menor
um pouco que a região anterior.
Para o mesmo sistema, o mapa axial referente a integração HH R3 nota-se uma
pequena diferença em relação ao sistema 02 e 03, pois as vias passam a apresentar-se
com a coloração mais amarelada, ao invés e azulada, configurando, portanto, um
maior potencial de integração, isto levando em consideração o raio 3 para integração,
ou seja, apenas os 3 primeiros passos topológicos possíveis a partir de cada via com
relação a todas as outras vias.
116
Figura 55: Mapa axial – RMN com simulação de
loteamento na área de estudo – Integração HH RN
Figura 56: Mapa axial – RMN com simulação de
loteamento na área de estudo – Integração HH R3
Fonte: Adaptado pela autora, do Mapa Axial fornecido pelo MuSA, 2013
De uma forma geral, a integração se manteria na mesma ordem de grandeza,
pois foi mantida a escala de cores para a região, tendo, portanto, uma influência menor
do que a esperada para este estudo.
Uma vez apresentados os mapas da integração global serão introduzidos a seguir
os mapas para características de integração local, analisando especificamente os
impactos e influências relativas à área em si, o entorno imediato dos condomínios, foco
real do trabalho.
Primeiramente o mapa axial da região como é hoje, sem as vias internas aos
condomínios. Neste mapa podemos notar a importância local dos eixos Av. Jaguarari e
Av. Mor Gouveia, únicos em vermelho nas proximidades dos condomínios.
117
Figura 57: Mapa axial – Área sem as vias internas aos
condomínios – Integração HH RN
Figura 58: Mapa axial – Área sem as vias internas aos condomínios – Integração HH R3
Fonte: Adaptado pela autora, do Mapa Axial fornecido pelo MuSA, 2013
Neste mapa do sistema 1 integração HH R3 nota-se uma semelhança bastante
grande em relação a integração HH RN. As vias que delimitam os terrenos dos
condomínios levam as cores verde e amarela, que são referentes a média integração,
porém próximos a eixos bastante integrados como a Av. Jaguarari e Av. Mor Gouveia.
Neste sentido os condomínios Green Village e Green Woods apresentam saída direta
para a via mais integrada da região, a Av. Jaguarari, enquanto que o West Park Boulevard
está a 3 passos topológicos da Av. Mor Gouveia, sendo sua entrada Principal na Av.
Raimundo Chaves, de coloração amarela. E o West Side Boulevard está ligado a rua
Nelson Geraldo Freire, em verde, a 3 passos topológicos da Av. Mor Gouveia, e a 2 da
Rua Jaguarari.
Quanto mais integrada é uma via, maior é o movimento de passagem por ela,
elemento incentivador da sociabilidade. Segundo os estudos sintáticos desenvolvidos
neste tópico a rua com maior fluxo deveria ser a Rua Jaguarari. Se contarmos o fluxo
automobilístico isto retrata a verdade. Porém, nosso estudo vai mais além. Ressaltamos
que a motorização demasiada é negativa à sociabilidade pois minimiza a relação daquele
que se desloca em relação à via que utiliza, e privatiza a copresença. Usuários de carro
dificilmente irão parar em uma praça, por exemplo para vivenciar o espaço público.
Menos ainda se morar em um enclave fortificado, que conta com sua área de lazer
privativa.
Faz-se necessário lembrar que urbanidade está relacionada a uma série de
fatores e não apenas um. Eixos demasiadamente rápidos, nos quais é proibido
118
estacionar e sem espaços públicos podem se tornar corredores automobilísticos sem
vida urbana que não fluxo de carro e privatização de copresença.
Usando conhecimento empírico da área adquirido ao longo deste estudo, as vias
com maior número de pessoas transitando a pé na área do entorno imediato dos
condomínios são as Ruas Nelson Geraldo Freire, Rua Manoel de Castro e Interventor
Mário Câmara, todas apontadas na escala cromática como integração HH – RN e HH –
R3 média. Nelas há grande fluxo de carro e também de pessoas a pé.
Figura 59: Avenida Manoel de Castro
Fonte: Acervo próprio, 2014
Figura 60: Avenida Nelson Geraldo Freire
Fonte: Acervo próprio, 2014
O estudo do sistema viário puramente pode apontar fluxos, porém para analisar
sociabilidade faz-se necessário refletir sobre outros aspectos. Os aspectos por exemplo
que fazem com que as vias: Rua Nelson Geraldo Freire e Rua Manoel de Castro terem
usos diferentes por seus transeuntes. É certo que as duas têm aproximadamente o
mesmo fluxo, porém enquanto uma transborda vitalidade e interações na rua, a outra
se restringe à passagem com vistas unicamente a deslocar-se. Estes demais aspectos
serão tratados nos tópicos seguintes.
4.2.2. Recortes Fundiários e Parcelas
O tecido urbano é constituído pela superposição de rede de vias, parcelamentos
fundiários e edificações. Segundo Panerai (2006), a análise do mesmo deve ser feita pela
identificação de cada um desses conjuntos, deve-se entender a lógica de cada um deles,
assim como as relações estabelecidas entre os mesmos. Nesse sentido, o sistema viário
organiza as parcelas, que por sua vez estabelecem relação com o edifício. Nesta
119
oportunidade analisa-se a relação rua/parcelas, que segundo o autor é o fundamento
para a existência do tecido urbano.
A rua estrutura o domínio construído, que por sua vez constitui-se como uma
soma de propriedades fundiárias sequenciais que podem ser edificados ou não. As
parcelas representam partes de um todo, esta divisão tem seus limites materializados
por muros e cercas no espaço urbano, que todo segmentado segundo lotes e quadras.
Panerai (2006) menciona estes níveis do espaço urbano e os classifica-os.
Segundo o autor, lote é “o edifício, ou melhor, o lote edificado, quer dizer, o edifício
ancorado no chão incluindo espaços abertos, como pátios, jardins, quintais, etc. e
caracterizado por uma relação específica com os espaços urbanos – ruas, pracinhas ou
canais. (PANERAI, 2006. P. 123). Já a quadra seria, segundo ele:
“O agrupamento de lotes, que revela a organização elementar do tecido e, conforme o período de formação, sua localização na cidade, caracterizado pelo papel estruturante dos espaços públicos, a posição dos monumentos, a lógica do adensamento e do crescimento interno, as possibilidades de associação com outras formas de tecido. (PANERAI, 2006. P. 123)
Diante destes conceitos desenvolveremos uma análise do parcelamento da área
de estudo, iniciando pelas quadras, que podem ser observadas no mapa a seguir:
Figura 61: Mapa de parcelamento
Fonte: Desenvolvido pela autora a partir de CAERN (2006), 2014.
120
É possível observar no mapa a heterogeneidade entre as quadras que compõe a
área de estudo. Existem quadras ortogonais de pequena dimensão organizadas em
família que contrastam com quadras de grande dimensão distribuídas ao longo do
tecido urbano.
Como Souza e Silva faz referência em seu trabalho, tipos de ocupação geram
famílias de quadras semelhantes e geralmente homogêneas entre si, por isso construiu-
se um mapa para análise das quadras relacionado ao tipo de ocupação. O mapa de
Loteamentos, Conjuntos Habitacionais, Favelas e Condomínios Fechados (Ver mapa
08/11) introduz a discussão sobre essas formas de parcelar e suas influências no padrão
de quadras e parcelas resultantes. Panerai (2006) também introduz reflexão sobre o
tema: “A observação do tecido (vias e parcelamento) em grandes extensões, isto é,
incluindo territórios mais vastos que o conjunto formado apenas por algumas ruas, na
maior parte das vezes revela fortes oposições. (PANERAI, 2006 P. 89) Neste caso, a esta
altura da discussão buscamos relações de disparidade entre as quadras, e mais a diante
faremos o mesmo exercício com os lotes.
Os condomínios fechados se destacam por compor as maiores quadras da região,
além da sua dimensão exacerbada, ainda se inserem em uma mesma quadra (West Park
Boulevard e West Side; Green Village e Green Woods), o que torna ainda maiores as
áreas ininterruptas em que se estendem. Souza e Silva (2004) menciona o fenômeno das
grandes áreas ocupadas por condomínios:
Enquanto os condomínios populares têm de 10 a 20 unidades, em média, e se inserem no meio de quadras já existentes, os empreendimentos dirigidos aos ricos disponibilizam no mercado um número médio de unidades em torno de 100 a 350 moradias e se espalham em grandes áreas, com o agravante de muitas vezes serem construídos colados uns aos outros gerando grandes áreas impermeáveis. (SOUZA E SILVA, 2004. P. 130.)
Os loteamentos da região, assim como conjuntos habitacionais geraram quadras
homogêneas, organizadas em família e de acordo com um ritmo próprio, são quadras
de menores dimensões, variando entre 60 a 270 metros lineares.
O padrão morfológico existente no entorno resultou de loteamentos formais públicos e privados, e reparcelamentos,
121
em grande parte, frutos de posses realizadas por pessoas de baixa renda. O resultado averiguado no mapa mais recente mostra que as quadras têm, normalmente, lotes distribuídos para todas as faces, com dimensões que variam de aproximadamente 50 a 230 metros lineares. Os lotes assumem dimensões bem contrastantes, dependendo do trecho onde se localizam. (SOUZA E SILVA, 2004. P. 206)
A Favela da Baixa do cão introduz no tecido urbano outra configuração de malha
que apresenta características ímpares na região. São dois grupos diferentes, nos
diferentes lados da duna. O conjunto de casas mais próximos aos fundos do condomínio
West Park Boulevard apresenta quadras com pequena dimensão, disformes e que foram
surgindo de acordo com o relevo e o avanço da ocupação na duna. O outro conjunto de
casas segue o sistema viário margeando as ruas e a formação dunar, este grupo
apresenta quadras mais longas e com pouca profundidade.
Em relação à dimensão das quadras, o capítulo de Parcelamento do Plano Diretor
de 1984 introduz alguns requisitos no sentido de manter as quadras em um tamanho
adequado à escala do pedestre, como podemos observar nos artigos abaixo:
Art. 144 - O comprimento das quadras, nos novos loteamentos, não poderá ser superior a 250,00 (duzentos e cinquenta metros). § 1º - As quadras com mais de 150,00(cento e cinquenta metros) de comprimento serão divididas ao meio por passagem ou via de circulação de pedestres ou vielas sanitárias com largura não menos de 14%(quatorze por cento) do comprimento de passagem, observando no mínimo de 7,00 m (sete metros). § 2º - Nenhum lote poderá fazer frente para as vielas ou passagens de que trata o parágrafo anterior, tendo obrigatoriamente uma de suas frentes voltadas para urna via de circulação com largura mínima de 12,00 m (doze metros). Art. 145 - Nenhum lote poderá distar mais de 600,00 (seiscentos metros) de eixo de uma via coletora, medida essa distância em linha normal do vértice mais pr6ximo do lote em relação àquele eixo. (SEMURB, 1984)
Diante disto foi feito um levantamento para analisar as quadras da área e se
estão de acordo com a legislação vigente, garantindo assim os padrões de espaço
urbano determinado por lei.
122
Figura 62: Mapa de dimensões das quadras comparado à legislação
Fonte: Desenvolvido pela autora a partir de CAERN (2006), 2014.
Como é possível perceber no mapa, existem algumas quadras maiores do que as
permitidas pela lei de parcelamento. As em coloração rosa apresentam comprimento
maior do que 150 metros, sem rua de servidão, e as em vermelho mais de 300 metros,
proibido pela legislação independente de abrir via de servidão, tamanha inadequação
de sua dimensão.
Destacamos portanto as quadras em vermelho, com maiores dimensões e mais
prejudiciais à continuidade da malha urbana. De todas as quadras destacadas nenhuma
faz parte de loteamentos, apenas uma do conjunto habitacional Cidade da esperança,
anterior à esta lei. A maioria das grandes quadras foram destinadas a grandes
empreendimentos públicos, ou privados, como os condomínios fechados. De fato as
maiores glebas são as compostas pelos condomínios. Elas têm o comprimento de 2 a 3
vezes maior do que o permitido por lei, e são entre 10 a 12 vezes maiores do que as
quadras do entorno. Diante de tamanha disparidade da legislação e da realidade do
entorno, Souza e Silva (2004) reflete:
Outro ponto que estimula o debate da legalidade dos condomínios fechados horizontais trata da dimensão dos mesmos. Na observação da implantação destes
123
empreendimentos, é visível a desproporção entre a área a eles reservada e as quadras o entorno. No caso do Green Village e do Green Woods, o fechamento da área verde [...] e a existência da lagoa de captação contígua ao Green Village perfazem juntos uma dimensão total de aproximadamente 500 por 600 metros quadrados, ou 30 hectares, onde a malha urbana torna-se impermeável. Cada face desta área corresponde a quatro quadras existentes no entorno. Fica clara novamente a não consideração às normas de Parcelamento do Solo Municipal, onde a dimensão máxima de uma quadra não deve ultrapassar 250.00 metros lineares (SOUZA E SILVA, 2004. P. 191)
Neste sentido destaca-se que o Parcelamento do Solo Urbano e também a Lei
9.785/99 são um instrumento de execução da política de desenvolvimento e expansão
urbanos, devendo regular a ocupação do solo, e garantir a tutela do interesse público
coletivo em detrimento de interesses privados e do capital. Ele está regulado por
diretrizes do art. 2º do Estatuto da Cidade e regulado pela Lei n. 6.766, de 19 de
dezembro de 1979, compreendendo normas urbanísticas, sanitárias, civis e penais que
devem ser cumpridas de modo a garantir as funções sociais da cidade e a garantia ao
direito das cidades sustentáveis.
Refletindo sobre a forma e o desempenho urbano, a intensificação métrica da
grelha, evocada por Jacobs (2000), não é favorecida diante da configuração dos
condomínios fechados. Grandes quadras, impermeáveis ao pedestre física e
visualmente. Isso tem como repercussão aumento das distâncias, diminuição de
alternativas de percursos e falta de distribuição de fluxos, com prejuízos para o número
de pedestres e a microeconomia local.
Uma vez analisadas as quadras, seguimos para a sua subdivisão, os lotes.
Segundo o Guia do Parcelamento do Solo (2010): “Entenda-se por lote o terreno servido
de infraestrutura básica, cujas dimensões atendam aos índices urbanísticos definidos
pelo plano diretor ou lei municipal para a zona em que se situe.” (MPSC, 2010. Pág. 19.).
Analisa-se portanto a configuração das parcelas na área de estudo, a fim de
entender sua relação com o traçado urbano e a ocupação do solo. No mapa de
Parcelamento do Solo com detalhe de glebas dos condomínios (ver Mapa 09/14 em anexo)
destaca-se o parcelamento do solo. Distinguem-se as cores das quadras em que se
localizam os condomínio fechados, para análise mais apurada.
124
Em relação às parcelas do fragmento urbano analisado, é notória sua
organização a partir do sistema viário, grande maioria das parcelas estão
perpendiculares à rua e há grande homogeneidade de parcelas nas localidades em que
foram construídos conjuntos habitacionais ou parcelados segundo loteamentos. Em
relação à influência exercida pela malha viária no parcelamento, Panerai (2006) afirma
que a edificação construída está submissa ao espaço público:
A parcela não é um terreno a ser ocupado de qualquer maneira, mas uma unidade de solo urbano organizada a partir da rua. As edificações podem estar no alinhamento do lote ou recuadas, podem ser geminadas ou isoladas, altas ou baixas, mas têm sempre a rua como referência. Tal submissão do construído ao espaço público tem duas consequências: (1) Ela permite que haja uma solidariedade entre os edifícios, mesmo quando estes pertençam a épocas ou tipos diferentes; (2) Ela cria características diferenciadas no interior da parcela, que ocorrem em todos os lotes edificados. (PANERAI, 2006. P.87 e 88)
A maioria das casas é isolada no lote, isso se repete na área dos conjuntos
habitacionais e também em alguns loteamentos. Porém como os lotes não são
demasiadamente grandes mantém-se uma proximidade com a rua aceitável. Existem
contudo áreas em que as casas são geminadas, e a relação edificação/rua é ainda mais
forte. Segundo os conceitos de Holanda (2002) e Jacobs (2000) isto é favorável a
urbanidade, diminuindo distâncias e fricção e aumentando permeabilidade e
visibilidade.
No mapa de quadras havia-se identificado que as maiores quadras eram de
grandes empreendimentos ou condomínios fechados, nunca de loteamentos ou
conjuntos habitacionais. Neste novo mapa é possível perceber que 100% destas grandes
quadras não são reparceladas. Muitas das parcelas mencionadas são maiores do que as
quadras do entorno, com dimensão exacerbada. Sendo destoante da realidade do
entorno, e inclusive maior do que a dimensão máxima de quadras prevista por legislação
(250,00 m).
Grandes quadras constituídas por parcelas do mesmo tamanho ou metade de
toda a área da própria quadra. Esta realidade está atrelada não apenas aos condomínios
fechados, como também à condomínios verticais e instituições públicas. Para
125
intensificar as consequências de lotes tão grandes, eles estão todos bastante próximos.
A fragmentação da malha urbana é tamanha que é difícil e confuso deslocar-se entre os
eixos Avenida Interventor Mário Câmara e Rua Jaguarari, se não nos grandes eixos. Esta
região é a dos condomínios, onde intensifica-se ainda mais o fenômeno.
Em relação ao limite dos fundos dos lotes, em sua maioria se configura de forma
retilínea ao longo da quadra e divide-a sem dois. Existem algumas exceções na área da
Favela da Baixa do Cão, devido sua ocupação irregular, e os condomínios fechados e
grandes empreendimentos da área. Interessa-nos muito o assunto, à medida que
Panerai (2006) destaca a importância da linha de fundos:
O limite dos fundos do lote também é uma linha muito
particular, por que separa as parcelas servidas por uma rua
daquelas servidas pela rua seguinte. Reta e continua nos
loteamentos, ela é irregular nos tecidos antigos, seja por que no
decorrer dos séculos os traçados perderam seu rigor original,
seja por que o jogo de modificações e ajustes da propriedade
fundiária tirou a sua continuidade. (PANERAI, 2006. p. 90)
As grandes parcelas apresentam a característica peculiar de ser conformada por
duas ruas ou mais, sua relação com a rua poderia ser ampliada, diversas entradas e
saídas por ruas diferentes uma relação mais intensa com o espaço público. Dos grandes
empreendimentos apenas um maximiza o contato com a rua, através de entrada e saída
por duas ruas diferentes, cercas permeáveis visualmente para delimitar o terreno, e
recuo frontal bastante grande com área acessível a todos.
Porém, esta realidade não se repete com os condomínios fechados, que apesar
de ter duas ou mais arestas do terreno voltadas para a rua, não maximizam sua conexão
física nem visual com o espaço público. Esta realidade se dá a medida em que colocam
apenas uma entrada para a via mais conectada, esta é construída em pórtico e conta
com segurança privada. Outra forma de isolar-se do entorno é o cercamento de toda a
propriedade com grandes muros.
Apesar da negação o entorno, os condomínios fechados continuam se
organizando pelo traçado viário público, a medida em que sempre direcionam sua
126
entrada para a rua principal que tem acesso. Ora, a determinação dos acessos do
condomínio e seu sistema viário interno é importante para a definição de todo o projeto.
Isso acontece pois cada parcela deve ser o mais bem conectada possível com o único
acesso do condomínio. As parcelas internas ao condomínio se organizam a partir do
sistema viário interno, que teve sua definição por sua vez baseado no sistema viário
público. Portanto os condomínios fechados e suas parcelas se relacionam de uma forma
particular com o espaço público.
Em relação à permeabilidade com o espaço público os condomínios horizontais
são extremamente atuantes no sentido de distancias e dificultar o acesso ao espaço
público de maneira geral. Em relação à permeabilidade física, esta tipologia é
responsável pelo aumento das distâncias.
Isto acontece pois antes de chegar a qualquer área adjacente ao terreno do
condomínio é preciso atingir a sua saída primeiramente, para depois, fora do
condomínio caminhar em direção ao local em que se deseja chegar. Ou seja, aumenta-
se um passo topológico para chegar a qualquer lugar, pelo menos. Outro ponto negativo
dos condomínios nesse tema é fricção, ou dificuldade para chegar aos espaços públicos.
Isso acontece pois além de sair de sua própria casa, os condôminos ainda precisam fazer
a travessia pelo pórtico de entrada com segurança particular e toda uma burocracia que
dificulta e faz mais demorado e formal o percurso entre sua casa e o espaço público.
Em relação ao tamanho das parcelas, Jacobs (2000) faz referência aos tipos
compactos e contínuos como benéficos à vitalidade urbana. Estes diminuem a
monotonia e trazem mais densidade e diversidade de atrativos ao espaço urbano.
Diminuindo a reprodução de grandes perímetros do mesmo empreendimento, torna-se
mais variada a paisagem urbana, além de reduzir espaços imprecisos ou residuais.
Neste sentido os condomínios são duplamente prejudiciais à sociabilidade do
espaço urbano. Primeiro, pois apropriam de grandes lotes, inclusive com duas fachadas
voltadas para a rua ou mais, sem conexão com a rua, com exceção do pórtico de entrada.
Em segundo lugar, pois em comparação com o entorno, a área dos lotes é maior do que
os da região, e como seus planos diretores internos geralmente condicionam os projetos
ao gabarito de 2 andares, a densidade do complexo é pequena em relação ao tamanho
do lote, como podemos perceber no mapa (ver Mapa 10/14 e 11/14 em anexo).
127
Estendendo-se a discussão para o conceito de barreira, Panerai (2006) classifica
os obstáculos em naturais e “construídos”, os segundos cerceam a expansão da
aglomeração urbana de forma intencional, ou não intencional. No caso dos condomínios
da área, eles se configuravam como obstáculos não naturais e intencionais.
Os terrenos dos condomínios fechados à época devem ser vistos como barreiras,
enquanto limites de propriedade, os mesmos impediram o crescimento da cidade
naquela área por muito anos, até que foram construídos. Esta realidade se deu pois
tratava-se de áreas muito grandes, contíguas, em uma região com infraestrutura e
consolidada em termos de ocupação. Realidade na qual se a glebas não fossem únicas,
ou seja, caso já estivessem parceladas, certamente a região seria ocupada
anteriormente à construção dos condomínios, sendo portanto mais natural o
crescimento urbano na área.
Classifica-se esta barreira como intencional, pois de maneira premeditada o
proprietário dos terrenos não os edificou, devido ao seu interesse em valorizar aquele
imóvel. Realidade que o fez esperar até o momento certo de lançar os
empreendimentos, a ponto de só dar função social ao terreno a partir de 1995, quando
construiu-se na área o primeiro condomínio. O último foi construído em 2007.
Portanto, a medida em que os condomínios foram construídos, as barreiras
foram transpostas, e quando transpostas, barreiras se constituem como marcos,
caracterizando morfologicamente sua antiga realidade de barreira, enquanto
morfologicamente diferente do seu entorno. Nesse sentido Panerai (2006) menciona:
Após ter atuado por muito tempo como impedimento à expansão, o limite, quando ultrapassado, permanece sendo o local de uma mudança no modo de crescimento, que se materializaria na diferença entre o tecido urbano anterior e aquele posterior. (PANERAI, 2006. P. 66)
No caso específico dos condomínios a transposição pode ser caracterizada pela
extensão da aglomeração sem destruição da barreira, à medida que o condomínio é
edificado, porém organiza-se a sua maneira. Segundo Panerai, neste caso (2006):
A extensão da aglomeração efetua-se sem destruição, e a barreira (muros, fossos, canais ou via férrea) subsiste e introduz uma ruptura no tecido urbano. A parte mais recente organiza-
128
se de maneira autônoma a partir de traçados preexistentes ou sob a forma de um novo loteamento que se liga ao centro apenas através de umas poucas vias. Isso pode causar, às vezes, uma degradação do tecido nas vizinhanças da barreira: malha viária insuficiente, quarteirões de difícil acesso, becos sem saída, lotes muito grandes, como se fosse criada uma zona de depressão no reverso do obstáculo, naqueles locais que não estão diretamente conectados com seus pontos de franqueamento. (PANERAI, 2006. P. 70)
Após análise do traçado e parcelamento da área é perceptível a ruptura no tecido
urbano na região dos condomínios. Agora o objetivo é analisar a transposição desta
barreira, que muda parcelamento, adensabilidade e a tipologia em relação ao entorno
à medida em adentra os muros das propriedades e segue sua ocupação segundo uma
lógica própria. O condomínio fechado cria seu traçado de maneira livre apenas
atrelando-o ao existente na entrada do condomínio. Diante disso faz-se possível
identificar com bastante precisão a partir de grandes diferenças morfológicas dentro e
fora do condomínio a transposição de barreira. Apresentando todas as características
identificadas por Panerai (2006), são elas:
Primeiramente, identificação de uma ocupação com diferentes densidades, a
medida em que onde não havia barreiras identifica-se um tecido antigo e saturado, pois
suas possibilidades de crescimento foram exploradas ao longo da história. Na região
onde se encontrava a barreira, por sua vez, há pouco adensamento. Em segundo lugar,
descontinuidade do traçado geométrico de vias e lotes com geralmente apenas grandes
artérias prolongadas. O terceiro aspecto é relativo aos tipos, que são diferentes entre si
por diversas questões. Todas essas modificações afetam a estrutura física das cidades,
e deve refletir-se sobre o assunto.
4.2.3. Edificações
Elemento constituinte do tecido urbano junto à rede de vias e parcelamentos
fundiários, as edificações, segundo Aymnino (1971) apud Panerai (2006) devem ser
entendidas de maneira mais ampla, enquanto tipologia edilícia. Esta tipologia abarcaria
“não só os edifícios, mas os muros, as ruas, os jardins, a massa edificada da cidade, a fim
129
de classificá-los em relação à forma urbana de um dado período histórico.” (AYMNINO
1971 APUD PANERAI 2006 P. 123
Segundo Panerai , (2006) a tipologia edilícia é o conjunto dos tipos que, em uma
cidade ou bairro, permite caracterizar o tecido construído, a forma urbana, a cidade
como um conjunto, como totalidade. O interessante ao utilizar um instrumento capaz
de conduzir os fenômenos urbanos a partir do estudo da: “relação dialética e não causal
entre a tipologia dos edifícios e forma urbana ” ( PANERAI, 2006. P. 124)
Nada mais pertinente que estudar esta relação, busca-se compreender as
relações de influência mútua sofridas entre forma e desempenho urbano neste esforço
acadêmico. Portanto em sintonia sua natureza, tendo em vista que a tipologia edilícia,
ou o “O estudo das relações entre os tipos construídos e a forma urbana é o “meio para
compreender” a estrutura da cidade ao mesmo tempo como continuidade histórica de
um processo e como fenômeno parcial de tal continuidade. (PANERAI, 2006. P. 124.)
O estudo do construído será baseado na análise de mapas e constante
comparação entre a tipologia condomínios fechados, seu entorno e as características da
forma urbana relacionadas ao seu desempenho, analisando cada aspecto morfológico e
fazendo uma ponte com a sociabilidade da região.
Para iniciar o estudo do espaço construído, introduziremos cada um dos
condomínios:
O condomínio Green Village tem entrada principal a leste na Rua Jaguarari, ao
seu leste, encontra-se a Rua Nelson Geraldo Freire, ao norte a Rua Eleuzes Magno Lopes
Cardoso e ao sul a área verde privatizada pelo condomínio Green Woods. Os
incorporadores responsáveis pelo empreendimento foram a FBF Empreendimentos
LTDA, o condomínio inaugurou o ramo de condomínios fechados da cidade, sendo
lançado no ano de 1995.
A área total do empreendimento é de 145.416,00 m2, com 95 unidades
habitacionais, dividida em quadras disformes compostas por lotes de 800,00 m2, o
condomínio é o mais valorizado da cidade. Destaca-se o padrão elevado do condomínio,
com pórtico monumental de aproximadamente 8 metros de altura, segurança particular
feita por sistema interno de televisão, existe ainda cerca elétrica em todo o percurso e
central de segurança. O condomínio conta com um muro de 3 metros que circunda toda
a área.
130
Figura 63: Green Village
Fonte: Acervo próprio, 2014.
O condomínio Green Woods tem entrada principal a leste na Rua Jaguarari, ao
seu leste, encontra-se o condomínio Green Woods, ao norte a área verde privatizada
pelo condomínio Green Tower e ao sul pela avenida da integração. Os incorporadores
responsáveis pelo empreendimento foram a FBF Empreendimentos LTDA, o
condomínio foi lançado no ano de 1995.
A área total do empreendimento é de 91.689,00m2, com 146 unidades
habitacionais, dividida em quadras com desenho moderno e compostas por lotes de
450,00 m2. Destaca-se o padrão elevado do condomínio, com pórtico monumental,
segurança particular feita por sistema interno de televisão e cerca elétrica em todo o
percurso e central de segurança. O condomínio conta com um muro de 3 metros que
circunda toda a área.
Figura 64: Green Woods
Fonte: Acervo próprio, 2014.
131
O condomínio West Park Boulevard tem entrada principal a norte na Rua
Libânia Pereira Galvão, ao sul a Rua Manoel de Castro, e ao leste a Rua Nelson Geraldo
Freire e ao oeste a Petrobrás. Os incorporadores responsáveis pelo empreendimento
foram a Ecocil (execução), Abreu Imóveis (venda) e Talento (solução de segurança), o
condomínio foi o terceiro grande empreendimento da categoria de condomínios
fechados da cidade, e foi lançado no ano de 1999.
A área total do empreendimento é de 197.237,52 m2, com 232 unidades
habitacionais, dividida em 13 quadras compostas por lotes de 450,00 m2, cada um
deles na ocasião de lançamento do condomínio custou 39.000,00 (trinta e nove mil
reais). Destaca-se para esta abordagem a segurança feita por sistema interno de
televisão, o controle de acesso feito pelo pórtico monumental de entrada com quatro
cancelas além da cerca elétrica e a central de segurança, complementado pelo muro
de 3 metros que circunda toda a área.
Figura 65: West Park Boulevard
Fonte: Acervo próprio, 2014.
O condomínio West Side Boulevard tem entrada principal a leste na Rua
Nelson Gonçalves Freire, a oeste o Condomínio West Park Boulevard, a Norte a Rua
Raimundo Chaves, e a Sul a Rua Manoel de Castro. Os incorporadores responsáveis
pelo empreendimento foram a Ecocil (execução), Abreu Imóveis (venda) e Talento
(solução de segurança), o condomínio foi o terceiro grande empreendimento da
categoria de condomínios fechados da cidade, e foi lançado no ano de 1999.
132
A área total do empreendimento é de 40.633,00 m2, com 46 unidades
habitacionais, dividida em 13 quadras compostas por lotes de 500,00 m2, cada um
deles na ocasião de lançamento do condomínio custou 39.000,00 (trinta e nove mil
reais). Destaca-se para esta abordagem a segurança feita por sistema interno de
televisão, o controle de acesso feito pelo pórtico monumental de entrada com quatro
cancelas além da cerca elétrica e a central de segurança, complementado pelo muro
de 3 metros que circunda toda a área.
Figura 66: West Side Boulevard
Fonte: Acervo próprio, 2014.
O mapa de usos (ver Mapa 12/14 em anexo) ilustra a monofuncionalidade dos
condomínios fechados em contraponto com a diversidade do seu entorno. Um dos
aspectos mencionados por Jacobs benéficos para a vitalidade urbana é a diversidade de
usos, ela seria boa para a microeconomia e criaria atrativos diversos para os usuários do
espaço público, além de manter usos ativos em diferentes horários do dia, gerando
fluxos ininterruptamente.
Analisando a área de estudos é notório que apesar de predominantemente
residencial, outros usos são mesclados ao longo da malha urbana, as esquinas passam a
dar lugar à comércios e serviços e as vias mais movimentadas também.
As áreas comerciais que mais se destacam são o eixo da Prudente de Morais,
Avenida Mor Gouveia, Rua Rio Grande do Norte, Rua Adolfo Gordo, Rua Nelson
Gonçalves, Rua Doutor Lauro Pinto e Jaguarari (na parte mais ao norte da área de
estudo). Mesmo diante desta preferência dos comércios pelos eixos principais ainda há
certa diversidade nas ruas locais.
133
Figura 67: Rua comercial Manuel de Castro.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 68: Mercearia em frente ao WPB.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Como área residencial mais heterogênea em termos de usos destaca-se parte do
conjunto habitacional Candelária, que apresenta um pequeno número de comércios e
serviços, com a maioria dos usos comerciais no eixo da Prudente de Morais.
Os condomínios do universo de estudo são por natureza monofuncionais, são
residenciais e desenvolvem instrumentos para manter-se assim ao longo dos tempos. A
função residencial é importante para a urbanidade a medida em que traz olhos para a
rua, fluxos frequentes e os chamados “donos naturais da rua”, porém ela sozinha não é
suficiente para gerar vitalidade nas ruas.
Outro uso que se destaca na região é o uso institucional, com grandes
empreendimentos que tomam áreas enormes próximo a grandes eixos. Destaca-se o
SESI, CAIC, CEASA-RN e DAD.
Figura 69: Muro cego do SESI
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 70: Grande Gleba do CAIC.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 71: CEASA-RN
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 72: Ginásio do DED.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
134
Na Avenida do Exército outra instituição está inserida, a Petrobrás, com um lote
bastante grande foi uma das primeiras edificações das glebas que depois dariam origem
aos condomínios fechados da região.
Figura 73: Entrada Principal Petrobrás
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 74: Muro permeável
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 75: Entrada/Saída Secundária Petrobrás
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 76: Abertura da Raimundo Chaves.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Em relação à não massificação de tipos únicos, realidade que seria reproduzida
por conjuntos habitacionais, por exemplo, também é reproduzida pelos condomínios
fechados. Isso se deve à tipologia reproduzida dentro destes condomínios, com casas
muito similares umas às outras. Também devemos relacionar o conceito ao seu motivo.
Os tipos únicos não são desejáveis devido à homogeneidade socioeconômica e
cronológica. Para termos de cronologia, o condomínio tampouco é favorável, pois de
maneira geral as casas são construídas rapidamente após a entrega dos lotes. Dos
condomínios que compõe o universo de estudo apenas o West Side Boulevard não
apresenta cerca de 100% dos lotes edificados, talvez por ser o condomínio mais novo,
construído em 2009.
135
A adaptabilidade é outro aspecto relativo à massa edificada que devemos levar
em consideração nesta análise. Sendo assim é notório que as partes da região em que
foram construídos conjuntos habitacionais e loteamentos residenciais inicialmente
eram residências, que ao longo do tempo se transformaram em comércio/serviço. Elas
podem voltar a ser residência um dia, de acordo com a necessidade de cada época. Esta
opção não existe nos condomínios, eles não são adaptáveis. Além de serem constituídos
por frações ideais, ou seja, partes inseparáveis de uma propriedade. Sendo assim temos
um empreendimento de grandes dimensões, isolado, monofuncional e não adaptável.
Realidade bastante preocupante, tendo em vista que a tipologia se reproduz
rapidamente e pouco se reflete sobre o tema.
Passando para aspectos de tipologia edilícia, analisaremos as características do
condomínio fechado, a fim de compreender sua real influência para a sociabilidade.
Em relação à densidade, pode-se considerar em duas esferas, enquanto um
bloco, e suas unidades habitacionais isoladamente. Enquanto bloco, a densidade do
condomínio fechado é menor que a do entorno, em comparação às demais áreas do
mapa apresenta menos área construída por metro quadrado. Além disto, levando para
a escala do lote, nota-se edificações isoladas no lote, devido à grande dimensão dos
lotes, e talvez à legislação interna dos condomínios que deve exigir afastamentos
mínimos.
A rarefação e o isolamento no lote, com aumento das distâncias e fricção
desestimulam o usuário do espaço público a sair de casa. Para acabar com essa questão
glebas menores fariam com que edifícios se desempenhassem de melhor forma para
contribuir com a sociabilidade no espaço público.
Ainda em relação à densidade útil, lembramos que o condomínio fechado
caracteriza-se como enclave fortificado devido ao seu isolamento, com a privatização da
copresença e homogeneidade, através da busca pela vida “entre iguais”. Sendo assim
sua construção não seria benéfica para o número de usuários em potencial, tendo em
vista que seus moradores têm acesso aos serviços que deveriam ser públicos,
privatizados, como área de lazer, por exemplo. Além da pseudo autonomia, estes
moradores também em sua maioria têm uma visão esdruxula da urbanidade,
manifestando repúdio ao espaço público, talvez pela política do medo, ou pela própria
realidade de violência crescente.
136
Densidade nem sempre é útil para questões de sociabilidade. Existem vários
edifícios residenciais e comerciais verticais construindo ou recém construídos na área,
grande parte deles a que parece não irá contribuir com usuários em potencial para o
espaço público.
Figura 77: Edifício Vertical Golden Green
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 78: Edifício Maria Galante em construção
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 79: Condomínio Smile
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Outra característica prejudicial presente nos condomínios fechados de forma
geral são os espaços residuais e imprecisos. A construção de grandes pórticos com o
recuo da área privada para dar lugar à passagem de carros gera áreas residuais, sem
função específica, trechos sem acessibilidade e ocupantes de grandes perímetros. Na
frente do condomínio West Side Boulevard por exemplo existe um recuo que tem a
função de estacionamento, porém está sempre vazio e não oferece variedade alguma
ao usuário do espaço público, sendo prejudiciais inclusive para a segurança do local,
quando não houver boa distinção entre espaço público e privado.
137
Figura 80: Espaço Residual no West Side
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 81: Perceba a área sem uso no WSB.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Em relação à oferta de espaços públicos, na área do entorno imediato existem sérios
problemas, tendo em vista que são poucos os espaços públicos para contemplação e lazer.
Diante da falta de oferta os moradores criam suas soluções com campos de futebol
improvisados, mobiliário urbano criados com materiais antigos e reciclados, além de mesas nas
calçadas durante o fim de semana. Como dizer que não há demanda de espaço público se os
usuários criam as mais diversas soluções para poder ter acesso ao lazer?
Figura 82: Campinho no terreno baldio em frente ao West Park Boulevard.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 83: Campo de futebol improvisado nas dunas próximas à Avenida da Integração.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 84: Cadeiras na Raimundo Chaves, os moradores da região usam muito o canteiro.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 85: Improvisação de Mobiliário Urbano, na Rua Nelson Freire por trás do GW.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
138
Figura 86: Rua dos Potiguares, pessoas nas mesas na rua no final de semana.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 87: Crianças brincando na Rua Nelson Geraldo Freire por trás do Green Woods.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Enquanto não existem espaços urbanos democráticos de livre acesso, muitos são
os espaços internos aos condomínios, privados e públicos. Isto acontece pois além de
ter grandes áreas de lazer internas, os condomínios horizontais ainda engendram
iniciativas para privatizar espaços públicos.
A área verde entre o Green Tower e o Green Village está fechada por muros e foi
privatizada pelo Green Woods. A área verde ao lado do Green Tower não é utilizada por
ninguém porém foi cercada com arame farpado para impedir a passagem para o local,
acredita-se que os moradores do condomínio Green Tower tenham cercado a área, pois
foi construído um estacionamento de carros no local, que deve ser utilizado pelos
moradores do condomínio vertical na área.
Figura 88: Fechamento de Área verde
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 89: Parte de trás da área verde fechada
Fonte: Acervo próprio, 2014.
O Condomínio residencial horizontal Barra Green Também cercou a área verde presente
na sua área, com o mesmo estilo do Green Village e Green Woods, construiu um muro com certa
permeabilidade visual para privatizar a área apenas para seus moradores.
139
O condomínio Vertical Golden Green também privatizou área pública entre seus lotes
inclusive vendendo o empreendimento com folder incluindo a área na perspectiva do
condomínio.
Figura 90: Folder do Edifício Golden Tower, com área verde pública incluída
Fonte: Site do Empreendimento, 2014.
As áreas institucionais que tem por obrigação de lei ser cedidas para uso
institucional, no caso da gleba do Green Village e Green Woods, por exemplo, foi cedido
para implantação do Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN),
empreendimento cerrado, ao invés de criar áreas públicas como praças e parques,
isuficientes na região.
Figura 91: Ministério Público
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 92: Anexo do prédio do MPE.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
A implantação do MPRN na área deu início a implantação de um grande núcleo
jurídico na área, que só gerou mais valorização para os terrenos ainda vazios no entorno.
140
O MPRN comprou mais dois terrenos na área e hoje há diversos condomínios verticais
de prédios comerciais do setor jurídico e também escritórios empreendidos em
edificações nas proximidades desse núcleo jurídico.
Figura 93: Edifício do TRT, Av. Mor Gouveia.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 94: Justiça Federal de primeiro Grau.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 95: Edifício
salas jurídicas
Fonte: A. próprio, 14.
Figura 96: Escritório advocatício nas
proximidades do cond. West Park Boulevard
Fonte: Acervo próprio, 2014
Figura 97: Edifício
comercial
Fonte: A. próprio, 2014
De acordo com Jacobs (2000), Netto (2012) e Saboya (2012) o espaço público é
importante para dar apoio às atividades de vitalidade. Ele deveria apresentar
características como livre acesso (não privatização), boa integração, proporção
adequada número e dimensão de espaços públicos/densidade populacional e separação
bem definida entre espaço público/privado. Infelizmente nenhuma dessas
características se reproduz nos poucos espaços públicos da área.
Outra característica prejudicial à urbanidade identificada na área relacionada aos
espaços públicos (ver Mapa 13/14 em anexo) é a irregularidade e inadequação das
calçadas, que muitas vezes são descontínuas, inacessíveis para usuários com deficiência
física ou mesmo para usuários sem dificuldades motoras, devido à grandes degraus ou
obstáculos no passeio público. Grande parte das calçadas dos condomínios são
141
inadequadas à circulação de transeuntes, contribuindo para o quadro prejudicial à
sociabilidade na área.
Analisando permeabilidade física e visual dos edifícios (ver Mapa 014/14 em
anexo), nos deparamos com a tipologia dos condomínios fechados, que tem por
característica grandes áreas de muros altos, cercando-se de fachadas cegas e
relacionando-se com a rua unicamente através de pórticos pelos quais os moradores
entram e saem. Mesmo a área permeável visualmente, o pórtico transborda aspectos
simbólicos que criam barreiras para aqueles que não fazem parte daquela realidade.
Além disso há segurança privada, para manter artificialmente a segurança que através
da vitalidade urbana do condomínio certamente não existiria.
São perímetros de 500, 600 metros impermeáveis visualmente, muitas vezes
duplamente, tendo em vista que condomínios estão justapostos, criando cenários que
não traduzem a complexidade e a vida urbana. Não há permeabilidade, as distâncias são
longas e a monotonia demasiada. Todos aqueles que passam por ali estão de passagem,
não há nenhuma atividade ou relação para estabelecer ali.
Figura 98: Rua Nelson Geraldo Freire, calçada do
West Side Boulevard.
Fonte: Acervo próprio, 2014.
Figura 99: Rua Nelson Geraldo Freire, calçada do
Green Village (parte posterior do condo).
Fonte: Acervo próprio, 2014.
142
V. CONCLUSÃO
Os processos de constante recriação do espaço urbano das médias e grandes
cidades brasileiras, espelho de um desenvolvimento econômico desigual e incessante
adequação do meio ambiente aos interesses humanos, especialmente dos detentores
do capital, é fomentado por um contexto de globalização e consequente acentuação das
desigualdades sociais e da violência, e tem como resultado a modificação do espaço
urbano tradicional de forma antidemocrática e perversamente desigual, com
transformações que refletem espacialmente a fragmentação socioeconômica vivida nos
dias de hoje.
Este cenário é observado no universo de estudo de uma forma clara, pois a
segregação socioespacial baseada no fenômeno "enclaves fortificados" está fortemente
presente na região, através de diversos condomínios fechados como o Green Village,
Green Woods, West Park Boulevard e West Side, empreendimentos que materializam
em técnicas projetuais o desejo de manter-se isolados dos "não-iguais".
Mesmo sendo uma tipologia específica e com menor estabelecimento de
relações entre o condomínio e o entorno provou-se neste estudo a existência de
relações entre o Condomínio West Park Boulevard, West Side Boulevard, Green Woods
e Green Village e o fragmento urbano que lhe cerca, seja devido a vivências do cotidiano
e mecanismos de distinção presentes entre os moradores de ambas as tipologias,
relações de trabalho, comércio e/ou serviço comuns entre os moradores da região , ou
mesmo a influência do empreendimento no deslocamento, fluxos e acessos das
redondezas, inclusive da sua própria locomoção. Destaca-se ainda forte influência na
infraestrutura da região, trazendo melhorias para os principais acessos, calçamento e
iluminação e ainda indiretamente valorização e outras questões fundiárias.
Em relação aos fluxos e deslocamentos da região, identificou-se que há intrínseca
relação com a forma de ocupação e a configuração de barreiras, sendo elas naturais e
não naturais, respectivamente a Zona de Proteção Ambiental-01 e os condomínios
fechados universo de estudo deste trabalho. A manutenção de grandes quadras e
implantação de empreendimentos com grandes dimensões gerou prejuízo para a
continuidade da malha viária, configurando um tecido urbano fracionado.
143
Diversas características formais contribuem para a segregação conformada entre
os moradores do entorno e dos condomínios, sobretudo aspectos ligados aos
multiplicadores de usuários do espaço urbano em potencial, elementos facilitadores de
atração destes possíveis usuários e atrativos capazes de induzi-los a utilizar as ruas e
praças da cidade. Sistematizados em cinco grupos de características morfológicas
capazes de melhorar o desempenho urbano em determinada região, aumentando a
sociabilidade a partir de configurações da forma. Esses grupos são: densidade útil,
diversidade de usos do solo, tipologia edilícia favorável, configuração local e global
propícios e infraestrutura do espaço urbano adequado.
Refletindo sobre a forma e sua capacidade de atuar na sociabilidade que se
inscreve nela, é comprovado que mudanças de ocupação são determinantes na
urbanidade vivida ali. Tipologias reproduzem heterogeneidade/homogeneidade,
diversas densidades e usos, além de formas diferentes de se relacionar com o espaço
público, que contribuem ou não para facilidade, proximidade e cognição de interações
no meio urbano.
Retomando a tipologia condomínios fechados, é possível fazer uma análise de
suas estratégias projetuais que contribuem para a segregação socioespacial nestes
empreendimentos engendrada. A sociabilidade precisa de pessoas de diferentes classes
sociais, dispostas a relacionar-se entre si e com diversidade e densidade de atrativos
acessíveis e fáceis. Essas características se fazem necessárias pois é preciso tomar a
decisão de sair de casa para o espaço público de maneira natural e não formal ou
burocrática.
Pois bem, características dos condomínios fechados distinguem os seus
moradores de usuários do espaço público. São elas: a percepção esdrúxula de
urbanidade que se reflete em decisões projetuais prejudiciais à sociabilidade, sua
autossuficiência em relação aos serviços urbanos, a privatização da copresença e o
isolamento e motorização. Sendo assim moradores de enclaves fortificados, como os
condomínios não são contabilizados para densidade útil, pois sequer se configuram
enquanto usuários em potencial.
Além de não contribuir com pessoas dispostas a viver o espaço público e
distanciar-se da complexidade da cidade de forma geral, a tipologia ainda se configura
como limitador da sociabilidade em seu entorno, uma vez que impõe obstáculos para a
144
continuidade da malha viária, aumenta distâncias e dificulta caminhos, imprime grandes
espaços monótonos e sem atrativos ao pedestre.
Condomínios fechados então atuam de forma a segregar duplamente, primeiro
pela decisão de auto segregar-se, isolando-se em barreiras físicas e simbólicas, e ainda
dificultando a sociabilidade dos demais com as consequências sociais de suas barreiras.
Contudo faz-se uma ressalva, o padrão de sociabilidade de uma área está
relacionado às características dos moradores de uma região e a forma urbana na qual
se vive. No caso de áreas próximas a condomínios fechados, características desta
tipologia dificultam o convívio e as relações sociais, pois sua forma imprime ao espaço
características desfavoráveis à sociabilidade. Contudo não podemos ser deterministas
de afirmar que não existe sociabilidade em áreas no entorno de condomínios fechado.
A análise deve se estender e compreender as características da área passível de
convívio e verificar in loco se relações são estabelecidas no espaço urbano que
imprimam vitalidade, urbanidade, sociabilidade ao contexto urbano. Caso isto aconteça,
apesar do desestímulo da forma do condomínio fechado, prevalece a potencialidade
que as pessoas têm de conviver e sair às ruas. Além do mais é preciso lembrar que o
condomínio fechado se cerra em si, porém a área do entorno é aberta, e sua
configuração em si pode gerar os atrativos suficientes para que haja certa vida e
complexidade no espaço público.
Sendo assim, o estudo comprovou que a forma da tipologia condomínio fechado
é em sua totalidade prejudicial à sociabilidade em seu entorno, porém reafirma que é
preciso conhecer a área de estudo de maneira integral, avaliando as características
sociais e morfológicas de todo o entorno.
Por fim, estabelece-se uma reflexão sobre a segregação e a não vivência da
cidade. É certo que a dimensão do conflito é um elemento intrínseco à
constituição das cidades, tendo em vista que as diferenças socioculturais de uma
comunidade multicultural demanda um citadino ativo e capaz de lidar com as diferenças
no seu cotidiano para buscar soluções eficazes no enfrentamento dessas tensões sociais,
características do espaço urbano complexo e plural, porém a segregação urbana e os
novos modos de vida implementam estruturas que visam negar a complexidade urbana
e promover a fragmentação baseada na diferenciação entre classes, implementando a
homogeneidade como melhor solução, processo excludente e prejudicial a cidade.
145
Decorrente de processo segregatório pode acontecer a desvitalizarão dos
lugares públicos, além da diminuição das interações sociais, com empobrecimento da
vivência da cidade e desvalorização dos ambientes públicos e ruas de maneira geral.
Estes por sua vez, sofrem um processo de abandono e crescente desertificação, ao passo
em que ambientes privatizados como “enclaves fortificados” se popularizam, como
solução para a violência e a falência da cidade, contudo são espaços excludentes e
segregatórios, sem a intenção nem capacidade para abarcar a todos os grupos sociais.
Saboya (2012) alerta sobre a Desurbanidade e as estratégias para destruição das
cidades, e fala da capacidade brasileira em reproduzir esta política desurbana com
maestria. O fenômeno condomínio fechado se alastra cada dia mais em cidades médias
e grandes brasileiras, e as consequências são fortes e permanentes. Diante desta
realidade é necessário refletir, pois estudos acadêmicos já são capazes de comprovar a
nocividade deste tipo de empreendimento para a cidade democrática e sustentável.
Neste sentido, a contribuição desta monografia é no sentido de confirmar a
relação da tipologia condomínios fechados, pontuando cada característica e em que
cerceia a sociabilidade para que seja revista sua permissão legal. Faz-se necessária a
intervenção do legislador no sentido de regulamentar requisitos para que condomínios
sejam (ou não sejam) licenciados e construídos. Se a decisão for no sentido de permitir
sua reprodução, que sejam estabelecidos critérios que minorem os prejuízos dos
condomínios a socialidade de seu entorno, e da cidade como um todo. Principalmente
pensando no futuro e no desenvolvimento de cidades em que as pessoas se relacionem
e vivam o espaço público, e não encerradas nas suas fortalezas.
146
IV. REFERÊNCIAS
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