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POPULAO EM SITUAO DE RUA: segurana pblica, fraternidade ou justia social? People who stay on the street: public safety, fraternity or social justice Maurcio de Campos Queiroz Resumo Trazendoatonaaanlisedosfatoresdeterminantesdaestruturasocialgeradorade pauperismo,esteartigoanalisaadinmicadeumapopulaoquehistoricamente injustiada, rotulada e perseguida. Para a populao em situao de rua so demandadas as incipientesformasdeenfrentamentodestaexcluso,nolimitedointeressedoEstado mnimo, o que impulsiona desta a possibilidade de conquista de alargamento de sua restrita cidadania, atravs do protagonismo poltico popular. Palavras-chave: Populao em situao de rua. Poltica Social. Campanha da Fraternidade 2009. Abstract Bringingouttheanalysisofthedeterminantsof socialstructuregeneratingpauperism,this articleanalyzesthedynamicsofapopulationthatishistoricallywronged,labeledand persecuted.Forthepeoplewhostayonthestreetdefendantsaretheincipientformsof coping with this exclusion, within the State's interest minimum, the driver of the possibility of winning the enlargement of its restricted citizenship through the political spotlight popular. Keywords: People who stay on the street. Social Politic. Fraternity Campaign 2009. Graduandodo7perododocursodeServioSocialdaPUCPR.E-mail: [email protected]. POPULAO EM SITUAO DE RUAQUEIROZ, Maurcio de Campos Faternidade e Cincia, Curitiba, v. 1, n. 1, p. 78-89, nov. 200979 Naperspectivadefavoreceraconstruodeumaculturadedefesadosdireitos humanos, trazendo tona uma reflexo tica sobre denncias de violaes que agridem o cotidiano de sujeitos com o reforo negao da cidadania, e com o propsito de construo de alianas e articulaes com a participao popular que projete um novo rumo e patamar de sociabilidade, trazem ao debate alguns pontos que fazem parte da pauta dos eventos e discussesdaCampanhadaFraternidade2009,quetemcomolema:apazfrutoda justia.Arelevnciadatemticapropostanesteartigoimpulsionaabordarsobreuma questomarcadapelaperversidadedasdesigualdadesscio-econmicaseda invisibilidade marcada por discriminaes ou estigmas. Populao em situao de rua um tema complexo, cercado de contradies e mitos, oqualrecentementevemadquirindovisibilidadeporpartedasociedadeegestopblica. Umdoselementosquecontribuiuparadesnudamentodaquestoaexpansodacrise estruturaldocapitalfinanceiro,oqualimpeformasderessarcimentodocicloprodutivo pautado na intensificao do trabalho somado ao aumento no desemprego e na instabilidade ou informalidade do trabalho, o que supem a emergncia de sujeitos espoliados, isto , margem do mundo do trabalho (ANTUNES, 2000). Outro pressuposto que coloca em pauta a questoaPesquisaNacionalSobrePessoasemSituaodeRua1encomendadapelo Ministrio de Desenvolvimento Social, na qual se identificou a existncia de 31922 pessoas em situao de rua no Brasil, sendo que 2776 destas moram em Curitiba. Essaprimeiraquantificaodosdadosanvelnacionaltrouxeindicativosque redefinem a viso tradicional deste segmento: 59% da populao em situao de rua exerce algumtrabalho(principalmenteinformal),sendoqueapenas16%afirmaramquepediam dinheiroparasobreviver.Estesdadoscontribuemparaexplicaroutracaracterstica pertencente a este segmento social, que a sua heterogenicidade, uma vez que ao falar de populao em situao de rua2 estamos nos referindo a uma grupo diversificado de sujeitos 1 Pesquisa solicitada pelo Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome instituda pela Meta Instituto de Pesquisa de Opinio em 71 cidades do Brasil, sendo auferida em abril do ano de 2008. A pesquisa revelou ascaractersticasscio-econmicas,educacionais,condiesdesade,trabalhoeacessoaserviosda pessoa em situao de rua. 2 A populao em situao de rua caracterizada por sua condio de pobreza extrema, pela interrupo ou fragilidadedosvnculosfamiliaresepelafaltademoradiaconvencionalregular.Sopessoascompelidasa habitar logradouros pblicos (ruas, praas, cemitrios etc.), reas degradadas (galpes e prdios abandonados, POPULAO EM SITUAO DE RUAQUEIROZ, Maurcio de Campos Faternidade e Cincia, Curitiba, v. 1, n. 1, p. 78-89, nov. 200980 quetemaruacomoespaodemoradia,abrangendo:trecheiros,andarilhos,mendigos, migrantesquenoencontramespaoreservadoparapernoitar,sem-tetos,pessoassob efeitosdesubstnciaspsicoativas,itinerantes,idososquesobanidosdeseuslarespela famlia, sujeitoem processo de comprometimento de sade mental, e outros. Medidasestabelecidaspelopoderpblicoepelasociedadeparareverteressa preocupantesituaosoresumidasemaeshigienicistasedecarteremergencial.A populao em situao de rua se constitui com um problema em si, e por isso, o remdio usadoparacuraroproblemanoultrapassaoassistencialismo,amoralizaooua coero.AprecariedadedosserviosdisponibilizadospeloEstadonosespaospblicos como:abrigos,centrosespecializados,banheirospblicos,alberguesreafirmaatesede Teixeira (1989) da cidadania invertida, em que o indivduo somente entra em contato com os aparelhos pblicos quando se percebe como um no-cidado. O multifacetado repertrio de necessidades demandadas pela pessoa em situao de rua delegado prioritariamente a instituies que assistem o sujeito aps rigorosa seleo efetuadapormeiodetriagensquereproduzemasrelaespersonalizadas,clientelistas, focalizadas que se distanciam do ideal de universalidade inscrita na Constituio de 1988. A culpabilizao da pobreza e ampliao da excluso manifestada tambm por quem deveria ser o elo para a autonomia do segmento revela a fragilidade da proteo social do Estado brasileiro, gerando assim condies concretas para a criminalizao, uso de violncia para o suprimento de suas necessidades. Barbriequeseapresenta,basicamente,emtrsdimenses.Aprimeiraa naturalizaodapobreza:enquantosemultiplicam,aosmilhares,planos,projetose programas de reduo da pobreza absoluta(de fato, daindigncia), no h uma s voz a indicar as suas causalidades sociaisprofundas nem, muito menos, que afirme serpossvel,vivele necessriolutar emprol dasupressoda pobreza.suprfluo acrescentar que, naturalizao da pobreza, segue-se a criminalizao do pobre... ao Estado de Bem-Estar Social, est sucedendo o Estado Penal. (NETTO, 2008). runas etc.) e, ocasionalmente, utilizar abrigos e albergues para pernoitar. (Nota Tcnica SAGI/MDS, 2008). A opodenominarosegmentodepopulaoemsituaoderuasefazpresenteporqueofatoqueum indivduo esteja vivendo nas ruas no quer dizer, necessariamente, que ser permanente: indica uma situao transitria e de rua (SARTORI, 2008, 123). Isso diferencia da usual nomeao como morador de rua, pois esta naturaliza a condio do sujeito, escondendo o processo histrico o qual motivou a pessoa a utilizar a rua como residncia, contribuindo, assim, para culpabilizar e estigmatizar ainda mais estesujeito. POPULAO EM SITUAO DE RUAQUEIROZ, Maurcio de Campos Faternidade e Cincia, Curitiba, v. 1, n. 1, p. 78-89, nov. 200981 SEGURANA PBLICA VdeoflagramoradorderuasendoagredidoporguardasnaGrandeSoPaulo3. Delegado de Paranagu fala sobre caso de tortura sofrida por moradores de rua e realizada por guardas municipais4. Em Curitiba guarda municipal persegue moradores de rua5. Estes soosenunciadosdematriasjornalsticasquecotidianamentesoapresentadosparaa sociedade,reafirmandoqueaoinvsdapopulaodaspessoasemsituaoderuaser consideradacomogrupoqueestemrisco,representadacomoqueoferecendorisco segurana da populao (ALENCIO, 2008, p.45). Pensar que erro de abuso de poder de autoridades policiais deva ser corrigida com puniodoautordodelitonoobastante.precisoqueosprofissionaisde segurana tenhamumaformaopermanentecalcadanosprincpiosdosdireitoshumanos,emque consigam exercer a profisso pautados em valores ticos e de cidadania.OProgramaNacionaldeSeguranaPblicacomCidadania(PRONASCI), implementado pelo Governo federal pode ser um poderoso instrumento para o enfrentamento desituaesdeviolncia,poisalmdepromoveracapacitaodeprofissionaisda segurana,articulaprogramassociaiscomosdeseguranaatuandoassimnapreveno contra o crime. Com relao populao em situao de rua importante esclarecer que se constitui emumdireitoconstitucionalodequalquerpessoatransitarnasviaspblicasenela permanecer. Entretanto, a sobrevivncia na rua exige que se criem estratgias. Busca pelo alimentodirioaliadoaoprocessorompimentosdetodososvnculos,corporificaoda degradao da rua no sujeito, lcool e drogas so possveis ingredientes que culminam em 3Publicadodia31/03/2009peloPortaldeNotciasG1.MATTA.G.U.Vdeoflagramoradorderuasendo agredidoporguardasnaGrandeSP.Disponvelem:http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL1066850-5605,00 VIDEO+FLAGRA+MORADOR+DE+RUA+SENDO+AGREDIDO+POR+GUARDAS+NA+GRANDE+SP.html . Acesso em 2/05/2009 4EditadopelaRedeCentralBrasileiradeNotcias(CBN)nodia12/01/2007.TOSI, Marcos.Delegadode Paranagufalasobrecasodetorturasofridapormoradoresderuaerealizadaporguardasmunicipais. Disponvelem:http://www.cbncuritiba.com.br/index.php?pag=noticia&id_noticia=7810&id_menu=105& conjunto=&id_usuario=&noticias=&id_loja=&PHPSESSID=87e34ea92be52f852eee3c5259db436f.Acessoem 2/05/2009 5Notcia veiculada pelaCentro de Mdia Independente (CPI) Brasil no dia 20/09/2006. Igor. J . F. Em Curitiba GuardaMunicipalperseguemoradoresderua.Disponvelem:http://www.midiaindependente.org/pt/ blue/2006/09/361234.shtml. Acesso em 2/05/2009 POPULAO EM SITUAO DE RUAQUEIROZ, Maurcio de Campos Faternidade e Cincia, Curitiba, v. 1, n. 1, p. 78-89, nov. 200982 incidentes6 como furtos,brigas...resultandoemeintervenespoliciais.No convm aqui questionar a atuao policial, esta precisa serrealizada uma vez que direitos esto sendo violados. Porm, a coero e disciplinamento que realizado com o sujeito contribuem para individualizartodoumprocessodedegradaohumanaquefrutodedeterminantes estruturais. A moralizao do subjetivo acaba sendo fator que reproduz a realidade objetiva de empobrecimento e degradao de um nmero significativo de pessoas.A criminalizao da pobreza analisada por BUHL e KOROL (2008) in Rodrigues, por meio da explicao do papel do Estado em ofuscar as contradies resultantes de um modo de produo de desigualdades, injustias e explorao: Nestecontexto,caracterizadopelairrupodaexcluso,oEstadoredefiniusua interveno. Porque o Estado continuar intervindo, embora desta vez j no tenda integraosocial.Suaintervenoserexclusiva.Intervmparareasseguraressa exclusividade,paramanteraexcluso,ouatmesmoparaevitarairrupo.A intervenoestatalsetornadiruptiva,isto,fragmentadora.Adirupoaforma assumida pelo controle social quando se trata de manter a excluso, quando o invivel se torna insustentvel e, portanto, j no cabe incluso alguma. Essas tecnologias de controleestorelacionadascom:a)asagnciaspolticasque,baseando-seno clientelismo,organizamacooptao;b)asagnciassociaisque,baseando-sena cooptao,organizamosubstencialismo;c)asagnciasrepressivasquearticulam diferentes prticas (gatilho fcil, antitumulto, esquadres da morte), que so formas de gerirocrimeeocrescimentodoprotestosocial;ed)asagnciasjurdicasque organizam a criminalizao da pobreza e depois a criminalizao do protesto. [...] Da doutrina de segurana nacional passamos tolerncia zero, da mesma forma que a mo invisvel se torna mo dura. FRATERNIDADE AIgrejafoihistoricamenteoprincipalatornatentativadeinclusoeconstruode protagonismodapopulaoemsituaoderua.Osprimeirosindciosdeintervenoda Igreja so registrados na dcada de 50, atravs de prticas caritativas em que as instituies assistencialistasdaIgrejatinhamcomomissoaevangelizaoeconstruodeuma 6 Para Marx (1974, p. 136) No a conscincia dos homens que determina o seu ser, mas, ao contrrio, o ser social que determina sua conscincia. POPULAO EM SITUAO DE RUAQUEIROZ, Maurcio de Campos Faternidade e Cincia, Curitiba, v. 1, n. 1, p. 78-89, nov. 200983 conformaodeumaidentidadeapolticavinculadaaotrabalhodevidoaoprocessode recente de industrializao urbana no Brasil.Foiapartirdadcadade70,naconstruodeumcontatopermanentecomas classes menos bastadas, em um trabalho de base que parte da Igreja percebe que apenas comfilantropianoiriaconseguirsuperaroprocessodeempobrecimentoedegradao humana o qual torna-se global e insustentvel. Foi a partir destes novos ideais que a Igreja questionouassuasprticasmeramenteassistencialistaseorganizou,atravsda participao poltica da reivindicao, possibilidades de transformar os problemas individuais em questes coletivas, passveis de conquista a partir do protagonismo popular.Todaessaconstruohistrica,partindodainiciativadaIgrejaemsuperaro assistencialismoepromoveroengajamentopolticodapopulaoemsituaoderua relatadonolivroAIgrejadosexcludos:vidaemortedopovoquemoranarua,deJ os Roberval Freira Silva. A partir desta leitura pode-se compreender o modo como se inscreveu a construo de espaos organizativos de articulao e defesa da populao em situao de ruacomoumdireitoeinteressepblico,sendoelas:PastoraldoPovodeRuaeo Movimento Nacional da Populao de Rua. Apesardeexistireminiciativasparasuperaroassistencialismo,estaprticatem aumentadocondicionadapelaideologiadasolidariedade,oudeumavisoromnticade fraternidade.AfraternidadequefoilemadaRevoluoFrancesa,paraconquistade cidadaniaedoEstadodeDireito,tambmproduzreafirmaodadependnciadosujeito, sendo fonte de clientelismo e motivador da desrresponsabilizao do Estado na formulao de polticas, programas e projetos. O Estado Brasileiro, a partir da dcada de 1970 viveu uma crise na qual existiram respostasdosmaisdiversossetores,iniciandonaindstriacomaimplementaodo reestruturaoprodutivaeenxugamentodegastos.Nodecorrerdosanos90,essalgica perpassou por todas as instncias do corpo social, incluindo o Estado onde iro se erguer as bandeirasdaquebradosdireitosdosservidorespblicos,daprivatizaoedo estabelecimentodeparceriascomasociedadecivil(baseadasnasolidariedadeentreo Estado, as ONGs, entidades populares, igrejas, empresas) como forma de resolver a crise do Estado. Estas tesesconformaro a proposta de Reforma do Estado levada a efeito pelo POPULAO EM SITUAO DE RUAQUEIROZ, Maurcio de Campos Faternidade e Cincia, Curitiba, v. 1, n. 1, p. 78-89, nov. 200984 governo brasileiro: o enfrentamento da desigualdade social ser deixado caridade pblica ou a uma ao estatal evasiva e eventual. (OLIVEIRA in YAZBEK, 1995, p. 11). A transferncia da responsabilidade estatal s iniciativas de solidariedade individual, empresarialoudochamadoterceirosetorfazrecorreracitaodeYazbek(1995),que questiona o deslocamento das polticas sociais do campo das polticas pblicas portanto dosdireitosdoserhumanoparaocampodamoral(dodeverdeprestarsocorroaos pobres e inadaptados que no reuniram condies de vender-se no mercado), que acontece no por acaso na atual conjuntura de reestruturao produtiva e de alteraes nos padres de regulao das relaes sociais pelo Estado. Aaparnciadeefetuarumaconcessodebenefcios_enodeviabilizaode direitos_aliadasestratgiasdiscriminatrias,seletivasemeritocrticasno atendimentosnecessidadesdossubalternostemresultadopredominantementeem reiterao da subalternidade. A relao entre instituies que implementam as polticas deassistnciaeopblico-alvotemconduzidopulverizaodasdemandas, obscurecendosuaforaesuadimensocoletivas.Essasdemandasdespolitizadas abrem caminho ao clientelismo no trato da questo social (Iamamoto, 2007:309) Alm disso, a implementao e gesto de polticas sociais pelo chamado terceiro setor implica,tambm,emproblemasquevodesdeoscritrios(nemsempreclaros)paraa seleo das organizaes que recebero recursos pblicos at a ausncia de transparncia naprestaodecontassociedade,doempregodetaisrecursosoriundosdofundo pblico. JUSTIA SOCIAL ACartaConstitucionalde1988,conquistadapelosbrasileirosapartirdeintenso processo de participao popular, tem a dignidade humana e a como valor fundamental, a partir do reconhecimento da igualdade como valor reativo. Esta igualdade relativa se expressa quando a lei permite diferenciar os cidados como basenasdesigualdadessociais,propondocompensaressadesigualdadeerepor,assim, umaigualdadereal.Otratamentodesigual,noqualoEstadopromoveumadiscriminao POPULAO EM SITUAO DE RUAQUEIROZ, Maurcio de Campos Faternidade e Cincia, Curitiba, v. 1, n. 1, p. 78-89, nov. 200985 legal para uma real igualdade o plano de onde emergem os direitos sociais, os quais so pautados pelo princpio da equidade (SIMES, 2009). por meio disso que legitimado o tratamento privilegiado de segmentos sociais historicamente vulnerabilizados, como: idosos, pessoas com deficincia, mulheres, negros, criana e adolescestes e outros.UmagrandeconquistaparaestesegmentosocialfoiaPolticaparaInclusoda Populao em Situao de Rua, implementada em maio de 2008; Lei n 11.258/05, de 30 de dezembro de 2005 que altera a LeiOrgnica da Assistncia Socialobrigando os municpios a promoverem programas, aes e projetos para a incluso da populao de ruaSomarcosnormatizadorespautadospeloprincpiodejustiasocialquesuperam definitivamenteaperspectivadacaridadeepropemumanovaperspectivapautadana afirmao do direito. Aprevenoparafortalecerosvnculosfamiliaresevitandosituaesderiscoso disponibilizados pela rede de servios scio-educativos, dentre eles o Centro de Referncia de Assistncia Social. Os programas, a nvel nacional, de combate pobreza e transferncia derendacomooBenefciodePrestaoContinuadaeoBolsaFamlia,soformasde reproduzir os mnimos sociais. As polticas sociais que expressam pelos direitos sociais podem ser entendidas como ... um fenmeno contraditrio porque ao mesmo tempo em que responde positivamente aosinteressesdosrepresentantesdotrabalho,proporcionando-lhesganhos evindicadosnalutacontraocapital,tambmatendepositivamenteinteressesdos representantesdocapita,preservandoopotencialprodutivodemo-de-obraeem alguns casos (...) desmobilizando a classe trabalhadora. Sendo assim, a poltica social no pode ser analisada de forma linear, como uma funo apenas das necessidades do desenvolvimento capitalistas ou como o resultado apenas das lutas polticas da classe trabalhadoraorganizada,poisissosignificarnegligenciaraunidadecontraditria dentro do qual ela se processa. Convm, portanto, encarar a poltica social como uma unidadecontraditriaqueexpressaumacoalizoinstvelentrepositivoenegativo. (PEREIRA, 1999, p. 48). Ograndedesafioparaagestopblica,oqualestsentomotivodepressodos movimentosquelutampelaquestodapessoaemsituaoderuaano operacionalizao da perspectiva de incluso para alm da assistncia social. O abrigo e os eventuaisbenefciosacabamporconformarumadesmobilizaonosujeitoquereproduz aindamaisasuadependncia.Asinstituiesscio-assistenciaisacabammuitasvezes cristalizandoapermannciadosujeitonarua.Muitassosvezesemqueodireito POPULAO EM SITUAO DE RUAQUEIROZ, Maurcio de Campos Faternidade e Cincia, Curitiba, v. 1, n. 1, p. 78-89, nov. 200986 moradia,aotrabalho,autonomiaedignidadesosubstitudos,apenas,pelodireito assistnciasocial.Oassistencialafacecamufladadaextensodedireitossociais,e portanto, da universalizao das atenes nas polticas sociais brasileiras. (SPOSATI, 2008, p. 3). Reconhecida por alguns gestores como a via mais barata para curar as situaes de vulnerabilidadeeexcluso,aoperacionalizaodapolticadaassistnciasocialfica deslocadadeumainterfacecomasdemaispolticassociais,sendotambmrarosos equipamentos scio-assistenciais que realizam permanentemente uma ao scio-ecucativa de plublicizao dos direitos e motivao para a participao e protagonismo poltico.Faz-se necessrio compreender a poltica da assistncia social no como a alternativa nica de incluso para o segmento social. Entretanto, esta poltica pode servir como ponte para outras polticas de carter permanente, como a poltica de moradia, trabalho e renda. A cidadedeSoPaulo7sedestacaaooperacionalizarserviosqueenalteamaautonomia para pessoas em situao de rua como moradias provisrias e definitivas e oportunidade de trabalho dentro da perspectiva da economia solidria. Um dos pressupostos para a conjugao de esforos a interlocuo institucional com asorganizaesorganizativasemovimentossociaisparaaarticulaodeatoressocias visandoasuperaoafragmentaodasaeseaconstruodelutascoletivas.A formaodeumtrabalhoqueintervenhaemredecomoobjetivodedebatereformular resposta para proteo do segmento um caminho para uma ao intersetorial. Aredeumaarticulaodeatoresemtorno(...)deumaquestoaomesmotempo poltica,social,profundamentecomplexaeprocessualmentedialtica.(...)Na intervenoemredes,oprofissionalnosevnemimpotentenemonipotente,mas comoumsujeitoinseridonasrelaessociaisparafortalecer,apartirdasquestes histricasdosujeitoedassuasrelaesparticulares,asrelaesdestesmesmos 7 Em conseqncia de uma histrica articulao em espaos de organizao e de movimentos representativos da populao emsituaoderuadeSoPauloqueefetivou-seaconquistadasleis12.316/97 queestabelececomogarantiado municpio alm dos albergues e casa de passagens a possibilidade de existir a garantida de incluso ao trabalho, a partir de padarias comunitrias partindo da perspectiva da economia solidria. Alm disso, esta lei garante que a moradia seja de fato um direito, uma vez que a pessoa que tem como casa a rua escolhe se deseja morar em uma casa, garantida pela prefeitura de So Paulo a qual visa o processo dereinsero social. As moradias provisrias e definitivas possibilitam a possibilidade de conquista de uma maior liberdade, uma vez que oportuniza maiores chances na contratao de empregos e garante maior liberdadequenosabrigos,umavezquenoexistemasregrasdehorriosdepermanncia,visitaserotinaspr estabelecidas. POPULAO EM SITUAO DE RUAQUEIROZ, Maurcio de Campos Faternidade e Cincia, Curitiba, v. 1, n. 1, p. 78-89, nov. 200987 sujeitos para ampliao de seu poder, saber, e de seus capitais (FALEIROS, 1997, p. 25). Protagonismo, participao, mobilizao e engajamento poltico parece algo impossvel para as pessoas em situao de rua. Aos olhos de quem est acostumado a culpabilizar o sujeito pela sua condio, a pessoa que mora na rua sempre ser o bbado, mendigo e drogadoquedependersempredeumoutro,oqualreiteradia-a-diaasubmisso,dependncia e o estigma.Apesar destas representaes ainda serem predominantes, no Brasil existem espaos deorganizaoeconstruodeprotagonismodapopulaoemsituaoderua.Nestes espaososegmentosocialconstrioentendimentodesicomosujeitodedireitos,oqual possui voz para discutir, modificar e at ampliar a polticas pblicas dos quais usufruem.apartirdestesmecanismosdeparticipaoqueconfirmemoprotagonismodesta populaoemespaoscoletivosdedisputadeprojetosdesociedade,quesepode construirumarupturacomomodelodesumanizador,individualizanteefalidovigentee construir um novo projeto pautado na tica, emancipao dos sujeitos coletivos e autonomia. Paraisso,necessrioumdialogofrancoefraternoemqueotaxadodiferente tambmtenhavozerepresentao.Uminstrumentoparaissoaessnciadoque representaoecumnico,isto,pensaremummundoonderealmentecomporteatodos, sem diferenas e indiferena. No haver completa justia enquanto no se puder viver a liberdade como mstica, ou seja, na dimenso de que a pessoa tanto mais livre quanto mais descentrada de si mesmanoOutroenosoutros.Domesmomodo,nessemundoenessaculturade propores globais, em que o pobre uma inumervel coletividade, o amor no pode sermaispensadoevividosomenteemtermosderelaointerpessoal.Torna-se tambmexignciapolticadeentregadavidaaoresgatedafraternidadeeda solidariedade entre homens e mulheres, de compromisso libertador. (BETTO, 2006, p. 301-302). POPULAO EM SITUAO DE RUAQUEIROZ, Maurcio de Campos Faternidade e Cincia, Curitiba, v. 1, n. 1, p. 78-89, nov. 200988 REFERNCIAS ALENCIO,N.F.L.daS.etal.PessoasemsituaoderuanoBrasil:estigmatizao, desfiliao e desterritorializao. 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