Para ser bom professor é preciso, sim, ter vocação Flavio Farah*
Introdução
A revista Nova Escola publicou, na edição de março de 2011, uma reportagem intitulada “Os 15 mi-
tos da Educação”. À página 38, consta que o primeiro mito da Educação é: “Para ser um bom pro-
fessor é preciso ter dom e vocação”. O texto afirma que “A docência não é uma capacidade inata, e
sim uma carreira que, como outras, pressupõe esforço pessoal e formação que possibilitem o domí-
nio de aspectos teóricos e práticos ligados à aprendizagem”. E mais adiante: “Só com estudos cons-
tantes, planejamento e dedicação, é possível ser um bom professor (...)”. A meu ver, o texto está
equivocado. Para ser professor, como para seguir qualquer profissão, é preciso, sim, ter vocação.
Vocação
Vocação profissional tem sido definida como um conjunto de características que apontam para de-
terminadas carreiras. Dentre essas características, duas se destacam pela frequência com que apare-
cem nas definições: aptidão e interesse.1, 2, 3, 4
Vamos analisar esses dois construtos psicológicos.
Aptidão
Aptidão é um termo da Psicologia que representa a capacidade natural ou pré-disposição de um in-
divíduo para adquirir certos conhecimentos ou habilidades, representando o potencial de uma pes-
soa em termos do que esta é capaz de fazer se receber educação ou treinamento apropriados.
A aptidão é inata e existe sem que a pessoa se tenha submetido a qualquer exercício, treino ou
aprendizagem. A aptidão, quando exercitada por meio do treinamento, transforma-se, conforme o
caso, em conhecimentos ou habilidades efetivas. Os testes de aptidão permitem prognosticar as pos-
sibilidades de sucesso de um indivíduo em determinada atividade.
O Dicionário de Psicologia publicado pela Oxford University Press define aptidão [em inglês,
aptitude] como “capacidade natural ou capacidade de aprender; potencial (grifo adicionado) (...) pa-
ra desempenhar alguma função, física, mental ou uma combinação de ambas, [desde que seja] mi-
nistrado o necessário treinamento ou educação.” 5 Aptidão é a capacidade (em inglês, ability) natu-
ral de fazer algo ou de aprender a fazer algo. Existem diversos tipos de aptidão: verbais, numéricas,
espaciais, perceptivas, musicais, visuais, auditivas etc. Podemos dizer que aptidões são capacidades
mentais naturais. O citado dicionário, portanto, equipara aptidão a potencial.
As diferenças de aptidões entre as pessoas explicam por que alguns poucos indivíduos se tornam
cientistas ou escritores de destaque, outros fazem sucesso como cantores, e outros ainda, desportis-
tas famosos. No presente caso, dentre as aptidões necessárias a um professor universitário, pode-se
citar, por exemplo, a fluência verbal. Fluência verbal é a facilidade inata de formar palavras e de
usar a palavra escrita ou falada. Se um indivíduo possui alta dose de fluência verbal, ele poderá fa-
cilmente aprender a fazer uma boa exposição.
Interesse
Outro componente integrante da vocação profissional é o interesse. Ter vocação para a docência
significa ter interesse no magistério ou, em bom português, gostar de ser professor. Ninguém pode-
rá ser um bom professor se não tiver interesse na docência. O professor que gosta do que faz possui
a motivação intrínseca que é essencial para que o indivíduo se disponha a empreender o enorme es-
forço pessoal necessário para exercer bem seu ofício a despeito de todas as dificuldades. Em con-
traste com o professor que gosta do que faz, há docentes que exercem o magistério porque não con-
seguiram exercer a profissão que de fato almejavam e também aqueles que têm a docência como
ocupação secundária, apenas para completar a renda proveniente de sua atividade principal. Dificil-
mente estes serão bons professores.
Como exemplo do efeito produzido pela falta de interesse pela docência, menciono o fato de que,
durante o curso de Mestrado, mais de uma vez eu ouvi queixas e comentários de colegas de curso
sobre professores que eram obrigados a lecionar pela respectiva Instituição; eram péssimos docentes
porque não tinham paciência para o ensino (talvez nunca a tenham tido) e não faziam segredo de
que, se pudessem, dedicariam todo o seu tempo à pesquisa.
Conclusão
Não há dúvida de que a docência exige conhecimentos científicos. Qualquer indivíduo, porém, que
pretenda exercer o magistério, deve antes avaliar se possui os dois pré-requisitos indispensáveis pa-
ra se tornar um bom professor: 1) interesse efetivo na docência; 2) um conjunto de aptidões especí-
ficas necessárias a esse ofício. Para verificar se possui esses pré-requisitos, existem testes psicológi-
cos específicos que o candidato pode realizar. Se possuir ambos os requisitos, o pretendente poderá
adquirir as competências necessárias ao magistério matriculando-se em um bom curso de formação
profissional.
Notas
1 CAMINHANDO PELA PSICOLOGIA. “Psicologia Vocacional.” Disp. em:
http://caminhandopsicologia.no.comunidades.net/index.php?pagina=1029253413
2 PSYCHOLOGY SCHOOL GUIDE. “Vocational Psychologist Career Guide.” Disp. em:
http://www.psychologyschoolguide.net/psychology-careers/vocational-psychologist/
3 PARSONS, Frank. Choosing a Vocation. Boston: Houghton Mifflin Company, 1909. p. 5.
4 COLLEGE, CAREER, LIFE. “Factors to consider when choosing a career.” Disp. em:
http://collegecareerlife.net/factors-to-consider-when-choosing-a-career/
5 COLMAN, Andrew M. A Dictionary of Psychology. 3
th ed. New York, NY: Oxford University Press, 2009. p. 52.
*Flavio Farah é Mestre em Administração de Empresas, Professor Universitário e autor do livro “Ética na gestão
de pessoas”. Contato: [email protected] .