O Bloco Ilê Aiyê acaba de divulgar a apostila para o tema do carnaval de 2014, intitulado “Do
Ilê Axé Jitolú para o mundo. Ah se não fosse o Ilê Aiyê!”.
Caro(a) Compositor(a):
Estamos lhe fornecendo o material de pesquisa do nosso tema para o Carnaval de 2014: Do Ilê
Axé Jitolu para o mundo. A h! Se não fosse o Ilê Aiyê.
A intenção do Ilê Aiyê é contar e cantar a história do carnaval baiano antes da criação do bloco,
os desdobramentos que ocorreram com a criação do bloco e os frutos advindos desse importante
fato histórico. Vamos abordar o contexto histórico em que o bloco foi criado, os motivos que
levaram a união daqueles jovens do bairro da Liberdade a fundar o sucesso que hoje é o Ilê Aiyê.
Um grupo de jovens que, imersos no mundo da cultura negra tradicional na Bahia – os
candomblés e sambas – moradores de um bairro popular e majoritariamente negro
apropriadamente chamado Liberdade, seduzidos pela “onda soul” que atravessou o país
empolgando a juventude negra no final dos anos 70, inspirados pelas lutas globais de
emancipação racial; resolvem formar um bloco só com negros, o “Ilê Aiyê”, mundo negro numa
tradução livre. Este ato inaugural é o ponto de partida para o início das interpretações sobre as
mudanças na identidade negra e nas relações raciais. Como costumo dizer, “antes os negros só
serviam para carregar alegorias”. O Ilê Aiyê surge dentro do Ilê Axé Jitolu, com as bênçãos da
Yalorixá Hilda Jitolu, com a intenção de mudar o paradigma do carnaval de Salvador. Ao longo
dos seus 40 anos, abordou vários assuntos ligados à temática negra, nos seus temas de carnaval.
Temáticas que nunca estiveram contidas nos currículos escolares do Brasil. Assim, de 1976 a
1988 todos os temas do Ilê contaram parte da história do continente negro, como por exemplos:
Watusi, em 1976; Zimbábue, em 1981; Angola, na comemoração dos seus 10 anos, em 1984 e
Senegal, em 1988.
A partir do final da década de oitenta, o bloco começa a voltar-se para a questão educacional.
Sobre influência da Yalorixá Hilda Jitolu, é criado, dentro do seu Ilê Axé Jitolu, a Escola Mãe
Hilda. As práticas educacionais existente na Escola Mãe Hilda, desde 1988 se torna o foco
principal da Lei 10.639/03, promulgada pelo Presidente Lula e que obriga a inclusão das
histórias de lutas e resistências povo negro no currículo escolar.
Em 1992 o bloco criou a Banda Erê, a principal ação educativa voltada para as crianças e jovens
do Ilê Aiyê, no Curuzu-Liberdade. Este processo educativo começou com aulas de percussão
para meninos como forma de envolvê-los em uma atividade lúdica e, ao mesmo tempo,
propiciar-lhes o acesso ao mundo da cultura negra produzido pelo Ilê Aiyê.
Em 1997 foi criada a Escola Profissionalizante do Ilê Aiyê que faz parte da estratégia da
Entidade de consolidar o seu projeto de autossustentação.
A Criação do Ilê Aiyê, em meados da década de setenta, desencadeou a criação de outros blocos
afro, o que mudou a configuração do carnaval de Salvador a partir da década de oitenta.
O seu trabalho é de fundamental importância para o Ilê Aiyê que desde a sua fundação tem como
objetivo narrar histórias do povo negro, para que através da consciência e educação conheçamos
a verdadeira história.
Desejamos a todos e todas boas músicas e mais um bom Festival de Música Negra do Ilê Aiyê
que ocorrerá nos meses de outubro, novembro e dezembro.
Axé,
Antonio Carlos dos Santos Vovô
ILÊ AXÉ JITOLU – MÃE HILDA JITOLU – ILÊ AIYÊ DO CURUZU
Breves Antecedentes para Relembrar
Mãe Hilda Jitolú – Guardiã da Fé e da Tradição Africana. Eterna guardiã e líder espiritual do Ilê
Aiyê.
“… Yá Hilda Jitolu, Obaluaê
Meu candomblé, meu tripé
Minha Mãe Hilda adupé…”
Comando Doce, de Juracy Tavares e Ulisses Castro
Em 1923 nasce uma liderança sócio-cultural-religiosa predestinada, a um especial lugar no
mundo. Ela fez história, preservou culturas, educou gerações: Hilda Dias dos Santos Jitolu, Mãe
Hilda, senhora de saberes, senhora de Ilês.
Em 1950, ela casou-se com Waldemar Benvindo dos Santos, dessa união nasceram cinco filhos:
Antonio Carlos Vovô, Hildete Valdevina – Dete Lima, Vivaldo Benvindo; Hildemaria Georgina,
Hildelice Benta – todos dos Santos, por nascimento e por escolha da região do candomblé.
Em 1942 Mãe Hilda se torna yaô iniciada pelo seu Pai de Santo, o Babalorixá Cassiano Manoel
Lima, que lhe confere a sua digina de origem do Gêge Mahi. Em 1952 nasce um novo Egbé na
Bahia: o ILÊ AXÉ JITOLU.
“Daí segui minha estrada” – Hilda Jitolú
A família, o Egbé, cresceu entre seus filhos e filhas biológicos e espirituais, que seguem a
religião da então Iyá, e pouco a pouco vão se tornando filhos e filhas de Santos Ogans e Ekedes,
dando continuidade à história e memórias, de ações religiosas, culturais e educacionais que aí se
desenvolvem.
Essa história tem suas raízes desde longos tempos, partindo do tradicional Terreiro Cacunda de
Yayá, de onde após a partida do seu Babalorixá Sr. Cassiano Manoel Lima, ela se torna filha
religiosa da Yalorixá Constância, Mãe Tança.
A então Yalorixá Hilda Jitolu, sempre foi uma filha e irmã querida, trocando obrigações, visitas,
bênçãos, amizade, experiência e fundamentos religiosos entre mitos e rituais com sua família de
origem.
É nesse contexto de sabedoria, acolhimento, lições de vida e religiosidade, que se fortalecem as
interações entre Mãe Hilda e seus antepassados e ancestrais.
“… Mãe Preta, 30 anos de fé
Dos quais destinados
Ao culto do candomblé…”
Mãe Preta, de Jailson e Apolônio
Filha de Obaluayê e Oxum, ela vem do gege e do nagô. Ela é do Daomé e da Nigéria, com suas
nações que aqui no Brasil e na Bahia interagem, entre nagôs, bantus, zulus, fulas, cabindas,
mandingas, wolofs, serres, minas, ashantis, entre tantas outras nações, regiões, culturas e
civilizações africanas, do Continente e da diáspora.
A força do Ilê Axé Jitolu ao Ilê Aiyê
Esta é a origem do Ilê Axé Jitolu
Uma fonte de Educação, Cultura, Religião e Cidadania;
Uma mina de Axé que vai se preparando na luta cotidiana;
Um nascente;
Uma casa geradora, criadora;
Uma casa de cultura negra;
Um semeador de vidas, da palavra sagrada, de expressões de fé, entre mitos e rituais, que por sua
vez, alimentam, fortalecem, recriam processos educacionais, manifestações culturais, e
momentos de louvor a quem deve ser louvado, sob a benção e proteção, dos Orixás, Inquinces,
Voduns e Caboclos.
Do Ilê Axé Jitolu nasce o Ilê Aiyê e transcende para o mundo
“… Foi em 1974, se lembra pretinha
Nós dois éramos apenas namorados
Apaixonados, cheio de prazer
Quando vi o Ilê passar por mim
Cantando assim, que bloco é esse…”
Tentação Negra, de Caj Carlão e Suka
É dessa força e dessa energia vital do ILÊ, AXÉ JITOLU que nasce na Bahia, e transcende para
mundo, o Ilê Aiyê em 1974, por iniciativa e liderança de Antonio Carlos dos Santos Vovô, e
Apolônio de Jesus – Popó, com o reconhecido grupo de jovens negros do Curuzu.
O Axé Jitolu e o Ilê Aiyê sob o comando, inspiração e poderes espirituais de Mãe Hilda,
crescem, se ampliam, revigoram esperanças, e ultrapassam horizontes, tornam-se um porto de
abrigo, um verdadeiro ancoradouro para milhares de pessoas na Bahia, no país e em alguns
espaços no mundo, por onde o Ilê vai passando em diferentes continentes; Africano, Asiático,
europeu, americano do norte, sul, central, Caribe e Antilhas;
Tudo começou do Ilê Axé Jitolu para o Mundo. O Carnaval, desde 1975, parte do Terreiro de
Mãe Hilda, o Ilê Axé Jitolu.
“Era um dia de domingo, eu mais Apolônio sentamos no largo, voltando de Itapuã, ficamos
conversando, aí surgiu a idéia de fazer um bloco e foi a primeira vez que surgiu esse termo afro,
bloco-afro. Toda a influência com a questão do black, da música black, do movimento negro
americano, da forma de se vestir e tudo isso. E nós descemos, eu desci, conversei com Mãe, ela
achou a idéia legal.
Era final de outubro, começamos a espalhar a idéia. Aí surgiu o nome. Aí já se voltou tudo para a
África, um nome africano. Fizemos uma enquete. O pessoal sempre votando Ilê Aiyê… Aí
começou a se pensar em ensaio, instrumento. Os ensaios lá em cima na lavanderia, começaram a
surgir as primeiras musicas. Lio fazia a música na época. Lio cantava também. Apolônio fez
musica também. Buziga apareceu. Paulinho Camafeu quando soube do bloco, aí veio aqui, e fez
essa música, uma das três músicas (a gente fazia musica na hora) que é esse clássico hoje, Que
bloco é esse?”. (Falas do Presidente do Ilê Aiyê – Antonio Carlos dos Santos Vovô)
Esse é o bloco quente que você parou pra ver
Ele é o mundo negro, ele é o Ilê Aiyê
Bloco quente, de Apolônio
O diretor Vivaldo dos Santos narrou aos jornalistas sobre a presença ostensiva da polícia em
1975. Eles fizeram uma espécie de “segurança particular”. A fama do pessoal da linha 8, era de
não agredir, mas também não levar desaforo para casa nesse carnaval. A primeira vez que se
cantou “Que bloco é esse?” Para que toda cidade soubesse, que era o Ilê Aiyê, hoje sua passagem
pelo circuito principal da maior festa da cidade é ansiada, valorizada, elogiada. Salvador.
24.02.2001.
HISTÓRICO DA FUNDAÇÃO
“… Eu sou Ilê, sou Ilê Aiyê
Um instrumento da raça
Eu sou negro cultura, sou Ilê Aiyê…”
Instrumento da Raça, de Aroldo Medeiros
Mas como era o Carnaval de Salvador antes da criação do Ilê Aiyê?
O Trio Elétrico foi criado em 1949 por Osmar Macedo e Dodô, desfilando em 1950. Esse fato
histórico abriu caminho para o desenvolvimento do chamado “carnaval participação moderno”
em Salvador. Nessa mesma época, surgem outras organizações no carnaval, a exemplo do Afoxé
Filhos de Gandhi, fundado em 1949, que se tornou uma marca da resistência negra no carnaval.
Nesse período havia blocos de inspiração orientalista como o famoso “Mercadores de Bagdá” e
“Cavaleiros de Bagdá” entre outros. Haviam ainda os chamados blocos de embalo de inserção
territorial em determinados bairros como o “Barroquinha Zero Hora”, “Barrabas” da Liberdade,
os “Miseráveis” da Cidade Baixa, etc. Além disso, despontavam as escolas-de-samba, como os
“Ritmistas do Samba” da rua da Preguiça, A “Juventude do Garcia”, originária da antiga
batucada “Filhos do Garcia”. Em 1963, surgem os “Amigos do Politeama” e os “Filhos do
Tororó”, descendentes do cordão carnavalesco “Filhos do Tororó”. Todas estas organizações
seguiam convivendo com os tradicionais afoxés e mais uma infinidade de entidades
carnavalescas.
“Sorrindo da vida mais linda
Vocês tem que ver
Os crioulos felizes do bloco Ilê Aiyê…”
Vida mais linda, de Buziga e Willians
A reentrada da elite baiana na cena do carnaval de rua enquadrou-se na esfera de lutas por
redefinições de identidade de classe/raça, protagonizadas pelo surgimento dos chamados blocos
de “barão” – ou de classe média branca – como “Os Internacionais”, “Os Lords” e “Os Corujas”.
O primeiro destes blocos de “barão” teria sido “Os Fantasmas” fundado em 1957 por moradores
do bairro do Barbalho. De dissidências deste surgiram “Os Internacionais”, em 1961 e “Os
Corujas”, em 1962, que se consolidaram como os principais blocos da elite até o surgimento dos
blocos de trio nos anos 80.
Além de toda esta variedade, a partir do final dos anos 60 passaram a existir também os blocos
de índio, que seriam fundamentais para a reafricanização, agregando grande massa de jovens
negros de origem popular. Estes blocos de índio tinham uma filiação direta com as escolas de
samba. Integrantes da “Juventude do Garcia”, por exemplo, passaram a constituir a partir de
1966 o “Cacique do Garcia”, primeiro bloco de índio de Salvador, assim com os “Filhos do
Tororó” vieram a constituir os “Apaches do Tororó”.
Nos anos 1970, os clubes carnavalescos não permitiam a entrada de jovens negros, não de
maneira declaradamente racista, mas utilizando a barreira determinada pelos preços altos que os
jovens negros pobres não podiam pagar. Quando começam as mudanças na estrutura econômica
e social com a construção do Centro Industrial de Camaçari, isso resultou numa melhoria das
condições de vida da população. Então, jovens com melhores condições procuravam estes clubes
e a entrada lhes era negada. Um bom exemplo foi o de Fernando Andrade, que teve negada a sua
entrada no Bloco “Os Lords”. O desenvolvimento dos grupos chamados blocos-afro tem sua
origem no Bairro da Liberdade e adjacências. Um grupo de jovens formou o chamado Zorra
Produções, que organizava passeios, campeonatos de futebol e festas. O grupo começou no Ilê
Axé Jitolu influenciado pelo Movimento Afro Americano e pelos processos de independência
dos países africanos.
Esses jovens negros elegem a arena do carnaval como espaço de declinação de um discurso
determinado que fez eco evidente às reivindicações por justiça presentes no manifesto do
“Embaixada Africana” de 1897. O Bloco Carnavalesco Ilê Aiyê surge na esteira da formação dos
Estados Nacionais Africanos, da luta pelos direitos civis dos negros norte-americanos, da “onda”
do “Black Rio” e é o responsável por um novo “renascimento” negro-baiano. Investidos de um
discurso eminentemente político contra a discriminação racial, eles saem às ruas no carnaval de
1975, com o propósito de mostrar a cultura negra de origem africana, através da língua iorubá,
indumentárias, penteados, adornos e ritmos africanos fazendo política e cultura no carnaval,
política de ensinar o que era ser negro.
“Kain osé emim, vou descer de Ilê
E para quem não se ligar mogba olorum babá…”
Kain osé emim, de Heron
Em 1º de novembro de 1974, o Ilê é fundado e tem como (espaço físico) o Terreiro de
Candomblé Ilê Axé Jitolu, casa de Mãe Hilda e Vovô, dois dos fundadores, junto com Apolônio,
Jailson, Dete, Lili, Macalé, Ana Meira, Auxiliadora, Sergio Roberto, Aliomar, Vivaldo e Eliete.
O objetivo desses jovens negros, moradores do Curuzu/Liberdade e adjacências, estudantes,
trabalhadores, era se divertirem no carnaval, com uma proposta de bloco que valorizasse as suas
culturas e exaltasse a mãe África. Inicialmente o nome do bloco era ”PODER NEGRO”, mas
como o país vivia na ocasião (1974) um regime de Ditadura Militar, a Polícia Federal, após
algumas horas de interrogatório e pressão psicológica, obrigaram os jovens a trocar o nome, a
fim de que o Bloco fosse inscrito registrado e liberado para sair no carnaval.
O Ilê Aiyê fez a sua primeira aparição em fevereiro de 1975, no tradicional circuito do Carnaval
da Bahia (Campo Grande x Praça da Sé) sob olhares assustados, vaias, tímidos aplausos e um
aparato policial. Os quase cento e cinqüenta jovens negros cantavam uma língua “embolada”,
dançavam uma dança até então proibida (ijexá) usavam tecidos estampados amarrados ao corpo
e cabelos naturais com penteados assustadores!
“… Que bloco é esse? Eu quero saber
É o mundo negro,
que viemos mostrar para vocês.
Somos crioulo doido, somos bem legal…!
Temos cabelo duro… Somos Black Pau!…
Que bloco é esse, de Paulinho Camafeu
Mas, na Quarta-feira de Cinzas, o principal jornal da cidade, o jornal A Tarde, exibiu a seguinte
manchete: “… Uma mancha negra no Carnaval da Bahia… uma nota dissonante no carnaval...”.
A partir desta data, nunca mais Salvador pôde esconder a sua população majoritariamente negra
no Carnaval. O vermelho, o amarelo, o preto e o branco passaram a fazer parte do figurino da
blackitude baiana. O Ilê impôs uma nova estética, abraçada por homens, mulheres e crianças.
Imprimiu um novo jeito de ser negro, mudou o ritmo, o tom e a cor dessa cidade de São
Salvador.
“… Nós conseguimos reunir uma média de cem pessoas fundadores do Ilê Aiyê. Muita gente
ficou com medo de sair por causa da Ditadura. Mas a musicalidade, desde o início alavancou o
Ilê, chamava-se samba de quadra”. (Antonio Carlos Vovô)
“… Todo mundo se envolveu na idéia. Lili vinha fazer inscrição, Auxiliadora, a namorada de
Apolônio, Dete aqui do Curuzu, todo mundo se envolveu, começou a vir gente de fora da
Liberdade. Depois eu mais Apolônio partimos para convidar os Diretores. Lio mesmo, não
andava com a gente, ele veio por causa do bloco, quem andava com a gente era Ademário, o
irmão dele. Nós chamamos Jailson, convidamos Macalé, Ana Meire, Eliete, Vivaldo, Roberto.
(Antonio Carlos Vovô)
Os carros alegóricos do Ilê Aiyê
Visando dar um destaque especial ao Tema e a Rainha do Bloco, o Ilê Aiye criou carros
alegóricos que ficaram para sempre na memória dos foliões. Quem não se lembra dos carros das
Rainhas do Ilê nas décadas de setenta e oitenta? Eram verdadeiras obras de arte feitas por
Raimundo Carvalho conhecido como “Mundinho” e o saudoso Nilton, imbatíveis nas suas
criações: “O Navio Negreiro”, “A Cabaça” e o “Opaxorô”.
OS TEMAS DO ILÊ
“… Saudando Sonho dos Palmares
O Ilê Aiyê se revelou…”.
Sonho de Palmares, de Ary e Evilásio
O primeiro ano de desfile do Ilê Aiyê, fevereiro de 1975, uma das maiores preocupações dos
seus idealizadores, fundadores do Bloco, era a divulgação do nome, seu significado, sua
mensagem, seus objetivos, sua afirmação, chamando atenção da população para aderirem àquele
novo chamamento: __ “O grito da raça”! E o desejo de atrair adeptos e chamar a atenção era tão
grande que os próprios dirigentes se tornavam, naquele momento, grandes compositores a
exemplo de Aliomar, Jailson e Apolônio.
Atrair adeptos para essa grande causa tinha como apelo principal a MÚSICA.
“Aquela moça…
que tá na praça…
tá esperando, o bloco da raça…
quem é ele… vou lhe dizer…”
Aquela Moça, de Nego Tica
As músicas tema do Ilê Aiyê obrigatoriamente tinham um refrão em Yorubá, uma marca
registrada do bloco, indicativo de uma forte relação dos seus compositores com as religiões de
matriz africana. Afinal, a maior herança do Ilê Aiyê era ser filho do Ilê Axé Jitolu de onde o
Bloco as assimilou: valores, princípios, o toque, as cores, a indumentária, os adereços, o estilo e
o respeito ao sagrado.
Anos depois da fundação do Ilê, criou-se uma nova categoria além do samba tema, que foi o
samba poesia, onde o compositor podia se expressar livremente, desenvolvendo conteúdos
musicais de protesto, de elevação da estima de homens e mulheres, da cidadania, etc.
1975 ILÊ AIYÊ 1976 WATUTSI 1977 ALTO VOLTA
1978 CONGO – ZAIRE 1979 RWANDA 1980 CAMERUN
1981 ZIMBABWE 1982 MALI – DOGONS 1983 GHANA – ASHANTI
1984 ANGOLA 1985 DAOMÉ 1986 CONGO
1987 NIGÉRIA 1988 SENEGAL 1989 PALMARES
1990 COSTA DO MARFIM 1991 REVOLTA DOS BÚZIOS
1992 AZÂNIA
1993 AMÉRICA NEGRA O SONHO AFRICANO
1994 UMA NAÇÃO AFRICANA CHAMADA BAHIA
1995 ORGANIZAÇÃO DE RESISTÊNCIA NEGRA
1996 A CIVILIZAÇÃO BANTU
1997 PÉROLAS NEGRAS DO SABER
1998 GUINÉ CONAKRY
1999 A FORÇA DAS RAÍZES AFRICANAS
2000 TERRA DE QUILOMBO
2001 ÁFRICA VENTRE FÉRTIL DO MUNDO
2002 MALÊS – A REVOLUÇÃO
2003 A ROTA DOS TAMBORES NO MARANHÃO
2004 MÃE HILDA JITOLU GUARDIÃ DA FÉ E DA TRADIÇÃO AFRICANA
2005 MOÇAMBIQUE VUTLARE (o saber)
2006 O NEGRO E O PODER “Se o PODER é bom, eu também que o PODER”
2007 ABIDJAN – ABUJA – HARARE – DAKAR – Ah! Salvador se você fosse assim…
2008 CANDACES - As Rainhas do Império Méroe
2009 ESMERALDAS A Pérola Negra do Equador
2010 PERNAMBUCO UMA NAÇÃO AFRICANA
2011 MINAS GERAIS – Símbolo de Resistência Negra
2012 NEGROS DO SUL. Lá também tem!
2013 GUINÉ EQUATORIAL – Da herança pré-colonial a geração atual
Umas das ações mais fortes e concorridas do Ilê nos seus primeiros anos, além dos ensaios no
Barro Preto, eram os festivais de músicas, os quais estavam diretamente ligados aos temas
daquele ano.
“…Cada pedaço de chão
Cada pedra fincada
Um pedaço de mim
Ilê Aiyê, o povo bantu ajudou construir o Brasil…”
Heranças Bantu, de Paulo Vaz e Cissa
Os festivais representavam tudo para o bloco, pois nele além da música que conduziria os foliões
às ruas no Carnaval, reunia os compositores que tinham a oportunidade de expressar os seus
sentimentos africanistas. Os intérpretes fizeram escola na área, um jeito muito especial de cantar
nunca antes visto; todos queriam que a sua música fosse cantada, por isso os Festivais do Ilê
eram muito concorridos e festejados com fogos de artifício, panfletos com as letras das músicas e
torcidas organizadas. Tudo isso produzido pelos próprios compositores e cantores das músicas
concorrentes.
A importância dos Compositores na história do Ilê Aiyê
“… Se me perguntar de que origem eu sou
Sou de origem africana
Eu sou com muito orgulho, eu sou…”
Minha origem, Vicente de Paulo
Foram os compositores os maiores escritores, poetas e historiadores que fizeram “educação de
massa” contando a nossa verdadeira história e elevando a nossa estima, resgatando os nossos
valores, exaltando as religiões de matriz africana, elegendo os nossos heróis e heroínas e
lideranças do passado e da contemporaneidade. Para eles a nossa gratidão, agradecimento
profundo e reconhecimento pelo grande trabalho realizado em prol da afirmação da identidade
do nosso povo.
Expressões como “Barro Preto”, “Coral Negro”, dentre outras, foram criadas por César
Maravilha. O Ilê Aiyê homenageia todos os compositores na pessoa do grande César Maravilha,
com o nome do troféu do Festival de Música, o Pássaro Preto, o cantador, como prova da
referência e importância que ele e todos os compositores tiveram na história do bloco.
“…Para aqueles que nos criticam por despeito
Façam como nós
Procurem alguma coisa inventar…”
Ilê Ilimitado, de Edy Fran
A seguir uma relação com os nomes de alguns desses poetas do passado e do presente: Aliomar
(Lio), Jailson, Apolônio, Jorjão Bafafé, Paulinho do Reco, Cesar Maravilha, Nilton Fernandes,
Mundão, Geraldo Lima, Buziga, Ademário, Môa do Catendê, Beto Jamaica, Miltão, Haroldo
Medeiros, Valfredo Reluzente, Milton Boquinha, Julinho Leite, Valter Farias, Suka, Cuiúba,
Edifran, Edson Xuxu, Valmir Brito, Cissa, Nelson Rufino, Paulinho Laranjeiras, Guiguio,
Marcos Boa Morte, Vicente de Paulo, Alberto Pita, Aloísio Menezes, Tote Gira, Marito Lima,
Nem Tatuagem, Itamar Tropicália, Adailton Poesia, Genivaldo Evangelista, Cláudio do Reggae,
Guza, Eloi Estrela, Gilson Nascimento, Zenilton Ferraz, Jose Carlos Cabelo, Guellwar, Odé
Rufino, De Neve, Reizinho, Gibi e Paulo Vaz.
OS ENSAIOS / A QUADRA
“… Meu filho onde você estava
Já passou da zero hora
Você vem chegando agora…”
Pai e Filho, Valfredo Reluzente
Vale um destaque muito especial, aos ensaios do Ilê Aiyê. Era o espaço de aglomeração da
população negra, espaço de encontro de confraternização. Era o espaço da alegria pelo
reencontro, do falar livre, dos falares e trocas de saberes, da exibição de modas, estéticas,
cabelos, roupas, danças, gingados, criatividades, coreografias. Era o espaço da liberdade de
criação. E era nesse clima que aconteciam os festivais onde compositores e cantores passavam a
ter visibilidade, fama e respeito no mitiê da negrada.
Os diretores fundadores, amigos próximos, adeptos da causa eram os compositores. Surgem
vários cantores, que na verdade ficaram conhecidos como “puxadores de bloco”.
Eram personagens, verdadeiros atores que tinham a capacidade de cantar, conduzir o bloco com
animação, conduzir a massa, a bateria, saudar a todos e incansavelmente sozinho, fizeram uma
revolução no Carnaval da Bahia. A música de Gerônimo, apesar de ser de uma época posterior,
retrata bem essa situação. “Eu sou Negão”, “Meu coração… é a liberdade… Sou do Curuzu…”.
“… O negrume da noite reluziu o dia
O perfil azeviche que a negritude criou…”
Negrume da noite, Paulinho do Reco
Nos três a cinco primeiros anos do surgimento do Ilê Aiyê houve uma revolução, as músicas
produzidas pelo Ilê eram cantadas com o corpo, alma e o coração – elas traduziam a nossa
história – nosso canto era o grito de uma raça e o nosso corpo traduzia tudo isso através da dança
e coreografias que surgiam a cada ano nas “quadras” dos blocos afro.
Miro, César Maravilha, Heron, Lazzo Matumbi, Bailado, Barabadá, Beto Jamaica, Guiguio,
Adelson, Graça Onashilê, Altair (in memórian) e Reizinho são alguns dos maiores e melhores
intérpretes, cantores e puxadores de bloco de estilo próprio de todos os tempos.
No início, os ensaios aconteciam no Curuzu, no espaço que ficou conhecido como senzala do
Barro Preto, no meio da Ladeira do Curuzu. Em meados da década de oitenta, os ensaios
passaram a acontecer no Forte Santo Antonio Além do Carmo, foi lá, em pleno ensaio do Ilê, que
foi gravado o Canto Negro I, o primeiro LP de música afro, em 1985. No final da década de 90, o
Ilê Aiyê volta para o Curuzu, realizando seus ensaios que eram considerados verdadeiras festas
de largo. Em 27 de novembro de 2003, é inaugurado o Centro Cultural Senzala do Barro Preto,
local onde acontecem os ensaios do bloco atualmente.
RAINHA DO ILÊ / FESTA DA BELEZA NEGRA
“… Minha crioula, vou cantar para você
Que estais tão linda, no meu bloco Ilê Aiyê
Com suas tranças e muita originalidade…”
Deusa do Ébano, Geraldo Lima
Quando do surgimento do Ilê Aiyê na década de setenta, negro não era sinônimo de beleza,
principalmente as mulheres negras que ocupavam o último degrau de uma sociedade racista e
machista. Em se tratando de mulher negra, a situação ainda era (e continua sendo) mais grave.
Contudo, desde o seu primeiro ano, o Ilê Aiyê, já pensava em colocar uma rainha no bloco
representando a raça, visto que até então só se via e falava em Rainhas brancas, inclusive nos
blocos Cruz Vermelha e Fantoches da Euterpe. Assim, em 1976, o Ilê tem a sua primeira Rainha
que foi Mirinha, filha de Santo de Mãe Hilda, que muito bem representou a beleza das mulheres
negras naquela ocasião.
No quinto ano de fundação do Bloco, Sergio Roberto, idealizou a Noite da Beleza Negra que
seria uma noite especial somente para a escolha da Rainha. Este evento ocorreu em 1980, uma
festa marcante que dentre várias candidatas foi escolhida Sandra, uma referência na dança afro,
samba duro, samba de caboclo, uma performance que revolucionou a dança afro, sem ferir o
sagrado. Todos se lembram até hoje desta Rainha que ficou como referencia para as Rainhas que
vieram depois.
“… Oh minha beleza Negra
Oh minha Deusa do Ébano
Cultura negra Ilê Aiyê,
escrita no seu corpo nú…”
Deusa do Ébano II, de Miltão
Hoje, a festa da Beleza Negra faz parte do calendário oficial das festas pré-carnavalescas, com
repercussão nacional, atrações musicais locais e de outros estados e nos últimos quatro anos, com
transmissão direta da TVE. São trinta e cinco anos de Festa da Beleza Negra, um evento que tem
como objetivo maior mostrar a beleza da mulher negra através da dança, indumentária, adereços,
penteados, conhecimento da sua ancestralidade e da sua negritude.
Passados 35 anos, temos em vários saldos positivo fruto deste Concurso de Beleza Negra. Hoje
as nossas ex-Deusas do Ébano, dentro do entendimento do Ilê, ainda são majestades
reconhecidas e prestigiadas. Algumas delas estão fora do país – Alemanha, França, Itália. Outras
em outros estados. Algumas se tornaram empresárias e empreendedoras bem sucedidas,
professoras, outras já com mestrado, a caminho do doutorado.
Mas, o mais importante deste concurso é que ele incentivou essas jovens para o estudo e a
pesquisa e motivou as mulheres a conquistarem o seu espaço no mercado de trabalho, na
academia, na sociedade. Foi a maior política de ação afirmativa para as mulheres negras desta
cidade. Esta festa geralmente acontece 15 dias antes do Carnaval.
OS MESTRES DE BATERIA
“… Imagina Ilê, tentaram lavar minha consciência
Dizendo que nada tem a ver
Com esse meu ser revolucionário…”
Jeito de ser, Gibi
Bafo, Carneiro, Neguinho do Samba, Mestre Valter, Mestre Prego, Jacó, Mestre Senac, além dos
mais novos Marivaldo Paim e Mario Pam Rafael Andrade (in memorian) e Carlos Kehindê,
fizeram história e criaram fama com o apito na boca e a baqueta na mão, a frente dos
“batuqueiros dos blocos afro, especialmente do Ilê Aiyê onde tudo começou. Além de ficarem
famosos, se tornaram um marco, uma referência na revolução rítmica que ocorreu no Carnaval
da Bahia – reafricanizaram o Carnaval.
Qual seria a origem desses grandes Mestres? De onde eles vieram? Com certeza eles vieram dos
Terreiros de Candomblé, alabês, tocadores dos 3 tambores sagrados, escolas de samba,
batucadas, afoxés. Oriundos dos Ritmistas do Samba, Vai Levando, Bafo de Onça, Apaches,
Filhos da Liberdade, Cacique do Garcia, Comanches, etc. Esses velhos Mestres de Bateria são os
verdadeiros inventores de uma batida nova, tirada do sagrado e recriada, sem ferir os princípios
religiosos. Tudo que veio depois dos anos setenta, foi em consequência, do que estes gênios de
percussão reinventaram. Eles deixaram uma base pronta para a criação e novas batidas, inclusive
a do samba-reggae, atribuída sua invenção ao Mestre Neguinho do Samba, que como vimos
acima, também teve uma passagem pelo Ilê Aiyê.
“… É tão hipnotizante, negão
O swing dessa banda
A minha beleza negra
Aqui é você quem manda…”
Charme da Liberdade, de Adailton Poesia e Valter Farias
Dois percussionistas da “velha guarda” da Band’Aiyê merecem destaque: Valdir Lascada, com
passagem em várias entidades, dentre elas Apache do Tororó, Comanche, Secos e Molhados,
Cacique do Garcia, Ritmistas, Calouros da barra, Filhos da Liberdade, Vai Levando, Lords,
Corujas, Internacionais, Orquestra Vivaldo Conceição e Reginaldo de Xangô. E o grande Deri do
Ilê que ainda toca com a mesma maestria de outrora.
A riqueza e variedades rítmicas que ecoavam no Carnaval de Salvador, fazia com que, mesmo a
distância, pudéssemos identificar as batidas do Muzenza, do Ilê Aiyê, do Olodum, do Araketu,
da Puxada Axé e do Badauê, inconfundíveis aos ouvidos de qualquer um.
Ao longo desses 40 anos, muitas coisas mudaram “batuqueiros”, “ritmistas” ou
“percussionistas”, seja qual for o nome, como os Mestres ou Maestro de Baterias (que um dia
também foram “batuqueiros”), fizeram uma revolução rítmica nesta cidade. A seguir uma relação
com os nomes dos grandes ritmistas do início da Band’Aiyê: Deri do Ilê, Tico, Gambá, Anselmo,
Jorge Ceguinho, Regi Nigrinha, Ari, Luizinho, Murumba, Val Caçolão, Baiaco, Dinho Maluco,
Bob Cabeça, Eron, João Bocão, Papito, Duricão, Caveirinha, Cabeça Branca, Virgílio, Edinho
Porquinho, Tamanca, Deri Neguinho, Valdir Capenga, Valdir Duzentos, Estivador, Calembê
Mario Tetetê e muitos outros.
Outros personagens que fizeram parte da história do Ilê Aiyê
Jota Cunha, artista plástico que ao longo de 25 anos, foi o criador artístico-visual da identidade
do Ilê Aiyê, Waldeloir Rego, historiador, Radovan, belga que ajudou na escolha do nome do
bloco e Edno, criador da Inebrás Som e responsável pelos primeiros carros de som do Ilê, criador
das orelhas dos trios, tendência que começou com o Ilê Aiyê e hoje é comum em todos os trios
elétricos.
ILÊ AIYÊ – MUITO MAIS QUE UM BLOCO AFRO
“… Te adoro Ilê, tenho orgulho Ilê
É o mais pleno e invulgar respeito
A sua trajetória tornou-se um monumento
“Irreverente dessa nossa história…”.
Ilê para somar, Valmir Brito, Armando Áras e Lavis Meneses
Antônio Carlos dos Santos Vovô, inúmeras vezes afirma entre amigos, em palestras e entrevistas
que o seu maior desejo ao fundar o Ilê Aiyê, era ser apenas um carnavalesco, nada mais. Mas,
com o decorrer do tempo, o Ilê Aiyê se tornou um Centro de referência da comunidade do
Curuzu/Liberdade e adjacências para solução de vários problemas, como por exemplo,
providenciar emprego aos jovens, vagas nas escolas públicas para as crianças, até as mais graves
questões sociais. Por conta disso o Ilê Aiyê tem hoje:
Escola Mãe Hilda
A Escola Mãe Hilda nasce por iniciativa de Mãe Hilda dentro dos espaços do Ilê Axé Jitolu.
Em 1988, algumas crianças com dificuldade de aprendizado vieram à filha de Mãe Hilda
pedindo aulas de reforço escolar. O resultado alcançado fez com que outras mais viessem. Mãe
Hilda, que sempre sonhou fazer de seu terreiro também um espaço de educação formal,
conseguiu, junto ao então secretário de educação, Dr. Edvaldo Boaventura, o mobiliário
necessário para atender às crianças, começando, assim, o funcionamento da escola no barracão
das festas sagradas.
A Escola Mãe Hilda, ao mesmo tempo homenageia a sua fundadora e incorpora à Educação
fundamental a cultura religiosidade negra, e a convivência no interior de um Terreiro de
Candomblé, sob o comando de sua própria diretora Ialorixá, Mãe Hilda Jitolu, incorporando
valores e práticas de Candomblé no cotidiano da Escola.
Hoje a Escola Mãe Hilda oferece educação para os níveis Educação Infantil e Ensino
Fundamental – Ciclo I, ministrados em dois turnos, matutino e vespertino, para crianças na faixa
etária de 07 a 12 anos de idade. Tem como objetivo principal formar cidadãos conscientes e
capazes, oferecendo conteúdos e habilidades necessários à inserção no ambiente social de forma
digna e adota como eixo temático a equidade racial e de gênero.
Nos seus 25 anos de existência, a Escola Mãe Hilda atendeu aproximadamente 2.000 crianças da
comunidade do Curuzu e bairros vizinhos como IAPI, Pero Vaz, Caixa D’Água, São Caetano,
Fazenda Grande do Retiro, Largo do Tanque, dentre outros.
Escola de Percussão Banda Erê
“… Ei não, não, não me deixe aqui
Me leva com você
Menino da Banda Erê…”
Encanta Erê, Guiguio
A Banda Erê é a principal ação educativa voltada para as crianças e jovens do Ilê Aiyê, no
Curuzu-Liberdade, cidade de Salvador. Este processo educativo começou em 1992 com aulas de
percussão para meninos como forma de envolvê-los em uma atividade lúdica e, ao mesmo
tempo, propiciar-lhes o acesso ao mundo da cultura negra produzido pelo Ilê Aiyê.
A partir de 1995, com a criação do Projeto de Extensão Pedagógica do Ilê Aiyê, a Banda Erê
passa a ministrar para seus alunos e alunas, conteúdos de cidadania, história, literatura, saúde
corporal, percussão, dança, canto e coral. A Banda Erê torna-se uma escola de arte e educação
voltada para o resgate e expansão dos valores culturais de origem africana.
Além de dar iniciação ao mundo da arte negra às crianças e jovens, a Banda Erê é a principal
fonte de renovação do quadro artístico da Band’Aiyê, a banda profissional do Ilê Aiyê.
A Banda Erê tem em seu currículo apresentações em cidades brasileiras como Porto Alegre, São
Paulo e Rio de Janeiro, além de já ter realizado uma turnê internacional na Alemanha e na
França.
Projeto de Extensão Pedagógica – PEP
Foi criado em 1995 com o objetivo de sistematizar e ampliar as ações educacionais que o Ilê
Aiyê já realiza desde a sua fundação. Nas escolas da rede pública são desenvolvidos cursos para
professores, supervisores e orientadores educacionais, sobre história e a cultura afro-brasileira
com aprofundamento no estudo de questões étnicas e pluralidade cultural. A capacitação é
realizada por educadores do projeto citado.
“Elevar a autoestima é a sua missão
Consciência negra é a sua sina
Fabricando interlocutores de cidadania
Mostrando pro mundo desigual, a covardia…”
Diferentes, mas iguais, de Mario Pam e Sandro Teles
Escola Profissionalizante do Ilê Aiyê
Ao observar a crescente dificuldade dos jovens em capacitar-se para o mercado de trabalho, o Ilê
Aiyê resolveu ampliar suas atividades na área pedagógica criando uma Escola que permitisse a
estes jovens acesso a uma formação profissionalizante, de forma gratuita, e dessa forma
aumentando suas possibilidades de realização pessoal e profissional. Permitindo-lhes, inclusive,
o exercício profissional como autônomo. Exercício este que os transforma, no decorrer do tempo,
em fonte geradora de empregos.
E assim, em 1997 foi criada a Escola Profissionalizante do Ilê Aiyê. Ela faz parte da estratégia da
Entidade de consolidar o seu Projeto de auto-sustentação. Além das aulas práticas dos cursos
profissionalizantes e teóricas de matemática e português são ministradas aulas de cidadania onde
a questão da história do negro e do racismo é visualizada. A escola oferece os cursos de Estética
Afro e Eletricidade Predial, tendo como pré-requisitos básicos jovens na faixa etária entre 18 e
29 anos e que estejam cursando o ensino médio ou tê-lo concluído. As aulas são ministradas de
segunda a sexta, na sede do Bloco o Centro Cultural Senzala do Barro Preto, na Rua do Curuzu.
Outros cursos oferecidos são os de confecção de calçados, bolsas e acessórios, informática, corte
e costura e ajudante de cozinha.
Os valores que orientam as lições de vida do Ilê Aiyê
“… A esperança do povo
Que vivesse num mundo melhor
Liberdade, igualdade e respeito
Eu quero direitos, sem preconceito…”
Esperança de um povo, de Reizinho
Os valores que orientam a formação das pessoas no bloco são culturais-religiosos, a fé na vida e
nas pessoas, a confiança em si e nas outras pessoas, a fé, sobretudo, na força e proteção dos
ancestrais, o respeito pelo ser humano, pelas pessoas mais velhas, pelos que precisam de
incentivo à coragem, à disposição para as lutas, a partilha, a troca, a solidariedade, a vida em
comunidade.
“Se não fosse Ilê Aiyê
A onda onde mergulhamos e trocamos beijos
O que seria de mim o que seria de você…”
Romance do Ilê, de Tote Gira
AH! SE NÃO FOSSE O ILÊ AIYÊ
“A força de nossa cultura vai chegar a qualquer parte do mundo”. Acredita o nosso Presidente
Vovô, para ele tempos de dificuldades renova resistência.
E nessa perspectiva que estamos celebrando nossos 40 anos de resistência no Ilê Aiyê. Entre
vida, resistência, trabalho, muita luta de superação dos obstáculos, sobretudo aqueles que dão
origem a filosofia do bloco: a preservação da cultura negra, o respeito e o crescimento das
religiões de origens africana e afro-brasileiras, a autoestima, a consciência negra, e
principalmente os alicerces que constituem a luta do combate ao racismo e as desigualdades
raciais hoje continuadas através das Ações Afirmativas, inclusive a lei 10.639/2003.
É essa ancora de forças, que sustenta o Ilê Aiyê, na crença a cada dia renovada nos Orixás,
Inquinces, Voduns e Caboclos.
“… Se escurecer
Pode dizer que é o Ilê
É tão bonito demais
Amanhecer com você…”
Argeu Portela
O Ilê Aiyê é referência para o povo negro na Bahia e no Brasil
“A semente foi semeada
No Barro Preto Curuzu
Germinou nasceu Ilê Aiyê…”
Nação Ilê, de Lucinha Ouro Preto.
Esta fase retrata as contribuições do Ilê para a Bahia e o Brasil a se enxergarem como nações
negra e mestiça:
Reafricanização do Carnaval da Bahia, música dança, ritmo, toque, moda, estética,
colorido, adereços e figurino;
Os Trios Elétricos aderiram aos atabaques;
Abriu espaço para o surgimento de mais de cinqüenta blocos afros e afoxés nos anos 80;
Valorização e respeito através de seminários, debates, campanhas, temas do bloco,
músicas e homenagens:
As religiões de matriz africana
Baianas do acarajé, feirantes
As yalorixás e babalorixás
Através das letras das músicas:
Elevou a estima das mulheres e homens negros
Descortinou os nossos heróis e heroínas negros
Recontou a nossa verdadeira história
Louvou e ovacionou os verdadeiros heróis e heroínas da nossa história de
resistência negra
Cantou a epopéia de Zumbi dos Palmares e ajudou o governo reconhecer o 20 de
novembro como data nacional de referência da luta negra no Brasil
Foi o primeiro Movimento Negro Organizado na Bahia após o golpe da ditadura militar,
na década de 60 e deu lastro para o surgimento de muitas outras instituições de caráter
sócio-racial. Além, de ser palco e plateia principais para o MNU difundir as suas
diretrizes, objetivos e proposições;
Encabeçou o movimento para que a Bahia fosse o 1º Estado Brasileiro a incluir nos
Currículos das escolas de 1º e 2º graus o ensino de História Africana e Afro Brasileira
(1986);
Responsável e pioneiro na formação de percussionistas, compositores e maestros de
blocos afro;
Responsável por uma escola de puxadores e cantores de bloco-afro, inimitáveis nas suas
formas de cantar e interpretar: Cesar Maravilha, Heron, Bailado, Barabadá, Lazzo
Matumbi, Guiguio;
Primeiro bloco afro que oportunizou uma mulher na em sua ala de canto (Graça
Onashilê);
Primeiro bloco afro a realizar capacitação para professores da rede pública estadual e
municipal na área da temática africana e afro-brasileira;
“Cadernos de Educação do Ilê”, fruto dos Temas de Carnaval, foram os primeiros
materiais didáticos que chegaram às escolas para subsidiar os professores para o ensino
da História e Cultura Africana e Afro-brasileira;
Nossas identidades continuariam escondidas, manipuladas, escamoteadas, negadas,
agredidas;
Nossas vestimentas não teriam a nossa alegria de vestir vermelho, amarelo, preto;
Nossas cores não seriam reconhecidas, respeitadas, vizibilizadas;
Nossas línguas ancestrais, de nossos antepassados continuaram dialetizadas, consideradas
crioulos;
Nossas belezas continuariam a ser negadas, desrespeitadas, desmerecidas, zombadas,
descaracterizadas;
Nossa feminilidade continuaria a ser estuprada, explorada, escravizada;
Nossa história continuaria negada, distorcida, escondida, colonizadas. Mitos e
preconceitos esconderam por muito tempo, o verdadeiro rosto da África;
Nossa cultura continuaria ser folclorizada, relegada a momentos de folguedos, pintada
para motivos de divertimentos e zombaria;
Nossa inteligência continuaria a ser considerada menor, desvalorizada, reduzida,
hierarquizada;
Nosso ritmo ainda seria ocidentalizado, negando o nosso gosto pelo ijexá que vem da
África;
Os poderes públicos continuariam a relegar a um plano inferior as manifestações culturais
e religiosas não ocidentais, não europeias;
As gravações de nossas músicas continuariam subjugadas às imposições dos que detém o
poder da mídia, das gravadoras, das empresas que tratam da difusão da música, da cultura
e da religião no país;
Nossa religião continuaria a ser desconsiderada, desrespeitada, interpretada como
feitiçaria, magia, macumba;
São Inúmeras as contribuições que o Ilê proporcionou com o seu surgimento, teimosia insistência
e persistência numa cidade tão negra, contudo tão racista. As demais contribuições,
desdobramentos e avanços a partir do surgimento do Ilê e outras entidades, fica a critério de cada
um de nós que poderá traçar uma “linha do tempo”: antes do Ilê e depois do Ilê.
“… Eu não tenho a força só porque sou o primeiro
É simplesmente por ser ilê
O quilombo dos negros de luz…”
Negros de luz, Xuxu e Cuiúba