José Pereira da Silva
Ensaios de Fraseologia
CiFEFiL/DIALOGARTS
Rio de Janeiro
1998
1
FICHA CATALOGRÁFICA
ISBN 85-86837-11-3
2
Epígrafes
Pela tendência à cristalização, as frases feitas resistem através dos
tempos, mas as palavras que as compõem perdem a potencialidade,
neutralizam-se diante da imposição rítmica do texto.
(FERNANDO SABINO).
Penetra surdamente no reino das palavras. Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
(CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE).
E, assim, o diamante bruto vai surgindo da ganga na crista do cô-
moro, graças a esses incansáveis perquiridores que o lapidam,
aproveitando-lhe as mínimas facetas, para deslumbrar-nos com seu
brilho e variadas cintilações.
(TOMÉ CABRAL).
Entre os autores, dos mais desvairados gêneros, figuram com certa
freqüência os cronistas, por se mostrarem, em maior ou menor
grau, bons espelhos da língua viva.
(AURÉLIO BUARQUE DE HOLANDA FERREIRA).
A tarefa social dos filólogos refere-se, de fato, aos textos de uso
repetido: os filólogos são encarregados de vigiar a tradição litúrgi-
ca e também literária da comunidade.
(HEINRICH LAUSBERG).
A língua é uma religião que se fortalece pela explicação de seus mistérios.
(DIÓGENES DA CUNHA LIMA FILHO).
É fácil acusar a existência de um lugar-comum, mas nem todos sa-
bem dizer em que consiste a verdade que o inspirou.
(FERNANDO SABINO).
3
4
Dedicatórias
À memória dos Mestres da Fraseologia:
a) Antenor Nascentes:
b) João Ribeiro;
c) Luís da Câmara Cascudo;
d) Leonardo Motta; e) Amadeu Amaral.
À Dedicação Filológica e Amizade de que me orgulho e
que me incentiva:
a) Celso Cunha (de saudosa memória).
b) Mário Camarinha (de saudosa memória).
c) Leodegário A. de Azevedo Filho
d) Evanildo Bechara
e) Sílvio Elia
5
6
Agradecimentos
Aos Colegas:
Sebastião Gonçalves, Cláudio Sobrinho, Alfredo
Maceira, Magali, Guaciara, Cristiane, Juvenal e
Leonora pelo incentivo, amizade e colaboração;
Aos Mestres, Orientadores e Amigos: Camarinha (de saudosa memória), Cafezeiro e
Bélkior, pela segurança emanada e pela abnegada
disponibilidade.
7
PREFÁCIO
Estes trabalhos foram realizados e, alguns deles, publicados em dife-
rentes épocas, com diferentes finalidades.
O artigo intitulado A classificação das frases feitas de João Ribei-
ro foi escrito especialmente para a participação no III Encontro Interdisci-
plinar de Letras da Faculdade de Letras da UFRJ em 1986 e publicado em
1992, nos Anais do referido encontro, p. 191 a 200.
Trata-se de uma tentativa de classificação do "discurso repetido",
tomando como corpus as expressões estudadas por João Ribeiro, em seu li-
vro, Frases feitas: estudo conjectural de locuções, ditados e provérbios. 2ª ed. Rio de Janeiro: F. Alves, 1960. 432 p.
A fraseologia nas crônicas de Carlos Drummond de Andrade foi es-
tudada em três trabalhos: o primeiro, que se constitui em subsídios para
um dicionário básico, foi orientado pelos professores Belchior Cornélio da
Silva e Mário Camarinha da Silva, como monografia final de duas discipli-
nas no curso de mestrado em Filologia Românica. Nosso fichamento atin-
giu o número de 1889 verbetes, limitados por motivos práticos a uns 700,
que nos pareceram mais interessantes.
O segundo pretende trazer contribuições para a história e etimolo-
gia das expressões em questão e também foi escrita como trabalho do curso
de mestrado. Pretendemos esclarecer a origem de algumas dessas constru-ções proverbiais e indicar pistas que possam levar a tal esclarecimento das
restantes. Contribuiremos, assim, para compreensão do seu verdadeiro sen-
tido.
O terceiro, Estrutura das frases feitas, é um trabalho de lingüística
apresentado ao Prof. Edwaldo Cafezeiro, ao final de um curso sobre estrutu-
ras frasais, em 1984. Quanto à estrutura morfossintática dessas expressões,
e considerando também o seu valor endossêmico (em nosso corpus), 69%
delas se constitui de estruturas com valor de verbo, 13% com valor de ad-
vérbio, 10% com valor de substantivo, 7% com valor de adjetivo e 2% com
valor de interjeição.
Quanto à estrutura morfológica, 45 das frases 93 frases feitas estuda-
das começam com verbos, 14 começam com advérbios, 14 com preposi-ções, 9 com pronomes, 6 com artigos, 3 com conjunções, 1 com substantivo
e 1 com adjetivo.
O estudo comparativo da fraseologia românica apresenta algumas
questões teóricas sobre o assunto, além de uma relação de 108 expressões
aproximadamente equivalentes semanticamente em português, galego, es-
panhol, francês, italiano, romeno e latim.
8
Com este trabalho comparativo, acreditamos que, analisada do ângu-
lo da fraseologia, a unidade lingüística românica será compreendida de um
modo bastante globalizante. Talvez maior do que se o for considerada de
qualquer outro ponto de vista.
Por fim, relacionamos todas as expressões estudadas, numa espécie
de índice rememorativo, dando uma idéia geral do corpus utilizado no con-
junto desses trabalhos.
Agradecemos as sugestões e críticas que porventura os leitores des-
tas páginas se dignarem a nos apresentar.
Rio de Janeiro, outubro de 1998.
José Pereira da Silva
9
SUMÁRIO
0 – PREFÁCIO 4
1 – A CLASSIFICAÇÃO DAS FRASES FEITAS DE JOÃO RIBEIRO 8 1.1 – INTRODUÇÃO 9
1.2 – O “DISCURSO REPETIDO” E SUA CLASSIFICAÇÃO 9
1.3 – CONCLUSÃO 14
1.4 – BIBLIOGRAFIA 15
2 – A FRASEOLOGIA NAS CRÔNICAS DE CARLOS DRUMMOND
DE ANDRADE (Subsídios para um dicionário básico). 16
2.1 – ESTUDO INTRODUTÓRIO 18
2.2 – BIBLIOGRAFIA 22
2.3 – DICIONÁRIO 24
2.4 – APÊNDICES 93
2.4.1 – Antigamente I 94
2.4.2 – Antigamente II 95
2.4.3 – O Homem, Animal Exclamativo 97
2.4.4 – O Homem, Animal que Pergunta 99
2.4.5 – O Homem e suas Negativas 101
2.4.6 – Dizer e suas Conseqüências 103
3 – A FRASEOLOGIA ROMÂNICA (estudo comparativo). 105
3.1 – INTRODUÇÃO 106
3.2 – A CONVERGÊNCIA NA FRASEOLOGIA ROMÂNICA 108
3.3 – A DIVERGÊNCIA NA FRASEOLOGIA ROMÂNICA 113 3.4 – FRASES FEITAS SINÔNIMAS EM LÍNGUAS ROMÂNICAS 118
3.5 – CONCLUSÃO 126
3.6 – BIBLIOGRAFIA 128
4 – A ORIGEM DAS FRASES FEITAS USADAS POR DRUMMOND
(contribuições para sua história e etimologia). 130
4.1 – INTRODUÇÃO 131
4.2 – UMA INTERPRETAÇÃO HISTÓRICA E ETIMOLÓGICA DAS
FRASES FEITAS 133
4.3 – CONCLUSÃO 180 4.4 – BIBLIOGRAFIA 181
5 – A ESTRUTURA DAS FRASES FEITAS 184
5.1 – INTRODUÇÃO 186
10
5.2 – ANÁLISE SINTÁTICA E MORFOLÓGICA DAS FRASES FEI-
TAS 187
5.3 – CLASSIFICAÇÃO DAS FRASES FEITAS 196
5.3.1 – Frases Feitas Classificadas como Verbos 197
5.3.1.1 – Frases feitas Classificadas Endossêmica e Exossemica-
mente como Verbos. 197
5.3.1.2 – Frases feitas Classificadas Endossemicamente como
Verbos e Exossemicamente como Substantivos. 199
5.3.1.3 – Frases feitas Classificadas Endossemicamente como Verbos e Exossemicamente como Advérbios. 200
5.3.2 – Frases Feitas Classificadas como Advérbios 201
5.3.2.1 – Frases feitas Classificadas Endossêmica e Exossemica-
mente como Advérbios. 201
5.3.2.2 – Frases feitas Classificadas Endossemicamente como
Advérbio e Exossemicamente como Substantivo. 201
5.3.3 – Frases Feitas Classificadas como Adjetivos 201
5.3.4 – Frases Feitas Classificadas como Substantivos 202
5.3.4.1 – Frases feitas Classificadas Endossêmica e Exossemica-
mente como Substantivos. 202
5.3.4.2 – Frases feitas Classificadas Endossemicamente como
Substantivo e Exossemicamente como Adjetivos. 202 5.3.5 – Frases Feitas Classificadas como Interjeições 203
5.4 – CONCLUSÕES 203
5.5 – BIBLIOGRAFIA 204
6 – ÍNDICE DAS EXPRESSÕES ESTUDADAS 206
11
A CLASSIFICAÇÃO DAS FRASES FEITAS DE JOÃO RIBEIRO1
O “discurso repetido” como texto literá-
rio e como “frases feitas”: em nível de
texto e em nível de sintagma. Como
texto: provérbio, ditado, apotegma, má-
xima, etc. Com unidade sintagmática
nominal, verbal ou adverbial. O livro de
João Ribeiro é o corpus mínimo consi-
derado.
1 Texto resultante do trabalho apresentado III Encontro Interdisciplinar de Letras, em abril de
1986 e publicado nos Anais do III Encontro Interdisciplinar de Letras. Rio de Janeiro: Uni-
versidade Federal do Rio de Janeiro / Faculdade de Letras, 1992, p. 191-200.
12
1 – INTRODUÇÃO
Classificar o “discurso repetido”, até hoje, tem sido uma tarefa sempre adi-
ada pelos especialistas, pelo menos se o considerarmos de uma forma globa-
lizante. Por isto, resolvemos partir de um corpus mínimo, que é a impor-
tante obra de João Ribeiro, Frases feitas.
Em busca de desafios, verificamos que a classificação das expressões pare-
miológicas jamais foi tentada de uma forma séria e que as “frases feitas” de
João Ribeiro não receberam sequer uma tentativa de sistematização. Estava ali um “prato feito”.
Dividiremos tais expressões em dois grupos, segundo o nível lingüístico que
apresentam: a) a nível de texto; b) a nível de sintagma.
2 – O “DISCURSO REPETIDO” E SUA CLASSIFICAÇÃO
Consideremos “discurso repetido” qualquer tipo de expressão fixa cujos
elementos não sejam substituídos ou recambiáveis segundo as regras atuais
da língua, importando, principalmente, o seu conceito de “expressões pré-
fabricadas”.2
Todas estas expressões, que constituem a fraseologia de uma língua e a sua paremiologia, ficam alheias à técnica do discurso propriamente dita.
Quanto a sua abrangência, o “discurso repetido” abarca tudo que tradicio-
nalmente está fixado como “expressão”, “giro”, “modismo”, “frase” ou “lo-
cução”. No entanto, não há precisão no uso dos termos que denominam os
diferentes tipos dessas expressões, usando-se, muitas vezes, um pelo outro.
São termos para os quais há um problema de identificação, sinonímia ou di-
ferença, para os quais procuraremos estabelecer alguns traços distintivos.
Antes disso, procuraremos classificar as unidades do “discurso repetido”
quanto ao nível lingüístico de sua expressão nos dois níveis seguintes, cla-
ramente distintos:
a) o nível lingüístico do texto, em que se incluem os provérbios, os ditados, os refrães, os adágios, as máximas, as sentenças, os aforismos, etc.
b) o nível lingüístico do sintagma, que corresponde às “perífrases
léxicas” de Coseriu, incluindo as frases feitas, assim como todos os tipos de
expressões fixas inferiores à oração: expressões proverbiais, apotegma.
As expressões fixas em nível de texto são todas as que correspondem a uma
unidade com sentido completo, em qualquer nível de complexidade. Podem
corresponder a uma oração e até a uma unidade mais complexa.
2 Cf. COSERIU, E. (1977) p. 113 & SEVILLA; J. M. /S.D./ f. 1
13
Segundo a terminologia de Coseriu, são as “locuções”, “frasemas” ou “tex-
temas” que constituem “certas unidades do ‘discurso repetido’, comutáveis
apenas no plano das orações e dos textos, com outras orações e com outros
inteiros”.3
As expressões fixas em nível de sintagma são todas as que estão abaixo do
nível da oração, unidades combináveis com sintagmas e com simples pala-
vras, cuja interpretação se faz ao nível do léxico.4
Do ponto de vista do significante, são unidades que funcionam como unida-
des léxicas, pouco importando o número e a complexidade dos elementos constituintes discerníveis.
Dada a flutuação por que passa essa terminologia, não é nada fácil definir os
diversos tipos dessas “expressões fixas” para se poder apresentar uma tenta-
tiva de classificação definitiva.
Por isso, no pequeno espaço de que dispomos, tentaremos definir cada uma
delas: provérbio, ditado, refrão, máxima, adágio, aforismo, apotegma e fra-
ses feitas com valor de sintagma nominal, verbal e adverbial ou como inter-
jeição.
a) O provérbio se liga a diferentes formas de expressão tradicional,
com as quais nem sempre é fácil traçar linhas divisórias exatas. Mas Ama-
deu Amaral nos ensina que eles (...) encerram um fundo condensado de experiência refletidas, são amos-
tras de um “saber de experiências feito”, experiências da alma humana, das relações sociais, dos fenômenos da natureza, etc. Não há que discutir a le-gitimidade teórica ou lógica desse saber, um conjunto de verdades gerais adequadas à mentalidade média dos povos e expresso com a segurança da convicção. Outras feições características dos provérbios aludidos são a concisão e a elegância. Não há palavras inúteis. Freqüentemente dispensam-se mesmo palavras que poderiam ser úteis, como se se quisesse dar ao conjunto mais
o atrativo de uma tal ou qual obscuridade. A frase é cadenciada: o provér-bio, quando não é puro verso, é parente próximo deste, pelo ritmo e, mui-tas vezes, também pela rima. O todo, firme, enérgico, definitivo, brilha de uma certa originalidade de invenção e de expressão e grava-se facilmente na memória.5
Além desses traços, é importante ressaltar os “traços arcaicos” ou arcaizan-
tes dos provérbios, que constituem uma de suas características distintivas
intrínsecas.
Exemplos:
3 COSERIU, E. (1977) p. 115. 4 Cf. COSERIU, E. (1977) p. 116-7. 5 AMARAL, A. (1948) p. 219.
14
No açougue, quem mal fala, mal ouve.
O alcaide e o sol por onde quer entram.
Melhor ama quem mais sente.
Com teu amo não jogues as pêras.
É maior o arruído que as nozes.
Mais vale um asno vivo que um doutor morto.
Ave por ave, o carneiro se voasse.
Cada casa favas lavam.
Cré com cré, lé com lé. Quem canta más fadas espanta.
b) O ditado é muito parecido com o provérbio. Por isto, muito pa-
remiologistas os tomam um pelo outro.
A diferença básica entre o ditado e o provérbio é que os elementos consti-
tuintes do provérbio são tomados sempre em sentido metafórico, enquanto o
ditado prima pelo sentido denotativo e diz respeito a setores precisos de ati-
vidades e grupos específicos.
Aliás, para que um ditado se transforme em provérbio, o que acontece com
muita freqüência, basta ele seja usado em sentido figurado, aplicando-se a
outra coisa diferente da que se refere diretamente o ditado.
Há três diferenças determináveis entre eles: o provérbio é uma construção metafórica ou conotativa, diz respeito a verdades gerais e faz um julgamen-
to de valor, enquanto que o ditado é uma construção direta ou denotativa,
diz respeito a setores precisos da atividade e a grupos específicos e fica na
simples observação e constatação dos fatos, sem julgá-los.
Exemplos:
Quem tem abelha, ovelhas e moinho, entrará com El-Rei em desafio.
Quem o alheio veste, na praça o despe.
Mais vale amigo na praça que dinheiro na arca.
Amigos, amigos, negócios à parte.
Quem comeu a carne que roa os ossos.
Céu pedrento, chuva ou vento. Comadres e vizinhas, a revezes hão farinha.
Pelejam as comadres, descobrem-se as verdades.
Lá vão as leis para onde querem os reis.
c) O refrão se apresenta como popular, familiar, festivo, gracioso e
não necessariamente metafórico, enquanto que o provérbio se apresenta
como culto, remoto no tempo e no espaço (logo, não familiar), contencioso,
grave, sério e necessariamente metafórico. Como só nesses particulares se
15
difere o refrão do provérbio, na maioria das vezes, eles são confundidos uns
com os outros.
Em nossos corpus não encontramos exemplos de refrão que se ajustasse ri-
gorosamente a essas características.
d) A máxima se distingue do provérbio por obedecer à gramática,
não permitindo a omissão do artigo necessário nem transgredindo o modelo
gramatical, como o faz este. E tanto é assim que, formalmente, basta que se
acrescentem determinantes adequados ao enunciado de um provérbio que ele se transforma numa máxima.6
A máxima não admite a construção em forma de frase nominal, tem uma
freqüência muito elevada do infinitivo e não costuma ter nem rima nem rit-
mo.
Exemplos:
É melhor coisa ter um amigo na corte que um vintém na bolsa.
Todos vêem o argueiro no olho do vizinho e ninguém vê a trave no seu.
Se queres que teu filho cresça, lava-lhe os pés, raspa-lhe a cabeça.
O hábito não faz o monge.
e) Adágio é o termo mais genérico e de sentido mais amplo, equi-
valendo às noções de provérbio, ditado e refrão. Sendo assim, os exemplos apresentados para ditados e provérbios são válidos também para o adágio.
f) Aforismo é uma sentença breve e doutrinal, que em poucas pala-
vras explica e compreende a essência das coisas. Tanto o aforismo como o
apotegma são peças literárias ou poéticas.7
g) O apotegma ou apólogo proverbial é uma fórmula coletiva e tra-
dicional, pertinente a um personagem ilustre, que se aplicam às mais varia-
das situações da vida.
Exemplos:
Não aumentar a aflição do aflito. Entrou bispo.
Nunca mais bodas ao céu!
Aqui há caveira de burro.
Não passe além das chinelas.
Quem cura é a fé e não o pau da barca.
Mateus, primeiro os teus.
Aí morreu o Neves!
6 Cf. MELEUC,S. (1969) p.84. 7 Cf. SEVILLA, J.M. /s.d./ f. 17.
16
A ocasião é calva.
h) As frases feitas não constituem textos, mas estão ao nível do lé-
xico e do sintagma. Tais expressões fixas, além de terem sentido incomple-
to, funcionando como um sintagma e não como uma frase, na maior parte
das vezes possuem formas variáveis.
Frase feita é uma locução fossilizada em sua forma e em seu sentido, que
perde um pouco de sua autonomia ou independência para se tornar parte in-
tegrante da cadeia da fala. Em seu sentido amplo, que é o que usou João Ribeiro no título de seu livro,
abrange todos os tipos de expressões fixas ou de “discurso repetido”.
Como as frases feitas, stricto sensu, se constituem de locuções em nível sin-
tagmático, resolvemos classificá-las de acordo com o tipo de sintagma a que
correspondem: sintagmas nominais, sintagmas verbais e sintagmas adverbi-
ais. Além dessas, há expressões equivalentes a interjeições, que estão numa
situação intermediária de palavra-frase, carregadas de emoção.
Eis um mostruário exemplificativo dessas frases feitas neste nível sintag-
mático:
Frases feitas com valor de sintagma nominais:
Alhos e bugalhos. Alma de cântaro.
Alqueires de razão.
Besta de carga.
Caldo requentado.
Camisa de onze varas.
Conta de mentiroso.
Fulano dos Anzóis Carapuça.
Pobre como Jó.
A morte da bezerra.
Frases feitas com valor de sintagmas verbais: Não se dar por achado.
Dar acordo de si.
Fazer de gato sapato.
Botar as manguinhas de fora.
Não meter a mão em cumbuca.
Custar os olhos da cara.
Não saber patavina.
Meter os pés pelas mãos.
Tirar sardinhas com a mão do gato.
17
Dar às de Vila Diogo.
Frases feitas com valor de sintagmas adverbiais:
Entre a bigorna e o martelo.
Por que cargas d’água?
Nem chus nem bus.
Enquanto o Diabo esfrega um olho.
Com todos os ff e rr.
Onde Judas perdeu as botas. Entre a quarta e a meia partida.
Por um triz.
Frases feitas com valor de interjeição:
Santa Bárbara!
Vá bugiar!
Que maganão!
A grifa parideira!
Ora cebo!
3 – CONCLUSÃO:
A execução dessa tarefa nos mostrou a intensidade das limitações existentes
neste campo de pesquisa, praticamente toda ainda por ser feita.
Acreditávamos chegar a uma classificação segura de todas as expressões es-
tudadas por João Ribeiro, apesar da advertência de Amadeu Amaral de sua
quase-impossibilidade.
A terminologia demasiado flutuante, ora demasiado restrita, ora extrema-
mente ampla, confunde mais que esclarece, e torna difícil uma fundamenta-
ção convincente de uma classificação objetiva.
Nossa classificação não pôde seguir um critério unificado para todos os ca-
sos. Primeiramente, dividimos todo o nosso corpus em dois tipos de ex-pressões: as que se encontravam em nível de texto e as que se encontravam
em nível de sintagmas. Em segundo lugar, levando em consideração aspec-
tos múltiplos de natureza interna e externa, procuramos estabelecer as dife-
renças fundamentais entre os seus diversos tipos. Por último, para classifi-
car as “frases feitas”, strito sensu, o critério gramatical e o valor exossêmi-
co das expressões é suficientemente seguro.
Apesar de não termos conseguido um nível de grau “ótimo” para o estabele-
cimento de alguns dos itens aqui desenvolvidos, vangloriamo-nos por ter-
18
mos avançado alguns passos em relação ao que até hoje existe pesquisado
sobre o assunto.
Como a perfeição é sonho que precisa ser sonhado, esperamos a contribui-
ção dos leitores para o aperfeiçoamento desta pesquisa.
4 – BIBLIOGRAFIA:
AMARAL, Amadeu. Tradições populares. Com um estudo de Paulo Duar-
te. São Paulo, Progresso: 1948. 418 p.
CÂMARA JÚNIOR, Joaquim Mattoso. Dicionário de filologia e gramáti-
ca: referente à língua portuguesa. 5ª ed. Rio de Janeiro: J. Ozon
[s.d.]. 409 p.
COSERIU, Eugenio. Principios de semántica estructural. Versión españo-
la de Marcos Martínez Hernández. Madrid: Gredos, 1977. 247 p.
MELEUC, Serge. Structure de la maxime. Languages. Paris, (13):69-99,
1969. Número dedicado à “analyse du discours”.
RIBEIRO, João. Frases feitas: estudo conjectural de locuções, ditados e
provérbios. 2ª ed. Com introdução de Joaquim Ribeiro. Rio de Janei-ro: F. Alves, 1960. 432 p.
SEVILLA, Julio Hernández. Estructura y contexto de las expresiones fijas.
Fotocópia de apontamentos feitos pela Profa. Maria de Lourdes Mar-
tini, na Universidade de Granada. (33 folhas manuscritas).
19
A FRASEOLOGIA
NAS CRÔNICAS DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
(Subsídios para um dicionário básico) 8
A fraseologia na Literatura e na Le-xicologia. Importância e escassez de
estudos especializados da Fraseolo-
gia no Brasil. A prosa drummondia-na e a fraseologia brasileira.
8 Trabalho final apresentado aos Professores Mário Camarinha da Silva, no curso de Teoria e
Técnica da Pesquisa, e Belchior Cornélio da Silva, no curso de Etimologia e Lexicologia, na
Faculdade de Letras da UFRJ, no primeiro semestre de 1984.
20
ABREVIAÇÕES
BL – Boca de Luar
CB – Cadeira de Balanço DL – Os Dias Lindos
DN – Da Notícia & Não Notícia Faz-se a Crônica
OC – Obra Completa
PP – Poesia e Prosa Obs. O livro Poesia e Prosa, nas abonações, é citado centenas de
vezes. Por isso, só aparece ali a indicação da página entre parênte-
ses, sem outra informação.
21
ESTUDO INTRODUTÓRIO
Fraseologia é o “conjunto ou compilação de frases ou locuções de uma lín-
gua ou de um escritor”, afirma Aurélio Buarque de Holanda Ferreira.9Joa-
quim Mattoso Câmara Jr. ensina que a Fraseologia se restringe ao estudo
das frases feitas, frases “fossilizadas em sua forma e seu sentido e usadas no
discurso à maneira de uma locução.”10 Enfim, a Fraseologia como ramo da
Lexicologia tem como matéria e objeto de estudo apenas a frase feita, que é
uma “locução fixa consagrada pelo uso”, segundo Aurélio.11 Não nos interessa a Fraseologia em seu sentido mais amplo, o estudo da
construção da frase, sua estrutura mórfica ou a sua geração. Também não
faremos um estudo histórico-comparativo, à João Ribeiro.12 O primeiro des-
tes aspectos será desenvolvido durante o curso de Estruturas Frasais, que fa-
remos com o Prof. Edwaldo Machado Cafezeiro no próximo semestre, mas
o estudo histórico-comparativo só será possível no próximo ano, quando es-
tudaremos comparativamente as línguas românicas, segundo os planos do
Prof. Bélkior.
Como a palavra fraseologia nos chegou através do francês phraseologie, se-
gundo A. G. Cunha13 e J. P. Machado,14 sendo documentada pela primei-
ra vez em 1813, por Antônio Morais Silva,15 concluímos que a Fraseologia
tenha se desenvolvido na França durante o século XVIII, embora seja muito mais antiga.
Em Portugal, já no século XVII, mais precisamente em 1651, Antônio Deli-
cado publicava o livro Adágios Portugueses Reduzidos a Lugares-comuns.
No Brasil, segundo nos parece, o mais antigo trabalho sobre o assunto é o
livro de Perestrelo da Câmara: Provérbios, Adágios, Rifãos, Anexins, Sen-
tença Morais e Idiotismo da Língua Portuguesa, publicado no Rio de Janei-
ro em 1848, conforme indicação bibliográfica de R. Magalhães Jr.16
São poucos os trabalhos científicos sobre a Fraseologia Brasileira, embora
haja alguns considerados pela crítica especializada como muito bons.
Este trabalho consiste em relacionar as frases feitas encontradas nas crôni-
cas de Carlos Drummond de Andrade publicadas em livros,17 em forma de
9 FERREIRA, A. B. H. (s. d.), s.v. 10 CÂMARA JR., J. M. (s.d.) s.v. 11 FERREIRA, A. B. H. (s. d.), s.v. 12 RIBEIRO, J. (1933) e (1963) . 13 CUNHA, A. G. (1982) s. v. 14 MACHADO, J. P. (1977) s. v. 15 SILVA, A. M. (1813) s.v. 16 MAGALHÃES JÚNIOR, R. /s.d./ p. 6 afirma ser de 1879 o mais antigo trabalho de fraseo-
logia conhecido entre nós, contraditoriamente, pois indica Perestrelo da Câmara na bibliogra-
fia, à p. 364. 17 Verifique na bibliografia quais foram as edições consultadas.
22
dicionário, com o significado ou explicação, abonação do cronista e indica-
ção da fonte. Quando julgamos conveniente ou necessário, dentro das limi-
tações do trabalho, acrescentamos algumas observações. Com isso preten-
demos facilitar o trabalho de quem for estudar melhor o tratamento literário
que Drummond dá às frases feitas, alertar os escritores para o aproveitamen-
to de nossa fraseologia em seus trabalhos e contribuir para a elaboração de
um dicionário básico da língua portuguesa.
Quanto à organização dos verbetes, verificamos que tanto Antenor Nascen-
tes18 quando Aurélio Buarque de Holanda Ferreira19 seguiram os critérios da Real Academia Espanhola.20 Seguimos a mesma trilha, pois deve ser a mais
segura.
Este critério consiste em dar entrada pelo substantivo ou pela palavra subs-
tantivada, desde que a frase o contenha. A seguir, pela ordem: o verbo, o
adjetivo, o pronome e o advérbio. Havendo mais de um vocábulo da mes-
ma classe, opta-se pelo primeiro. Entretanto, as palavras pessoa, coisa e
alguém e os verbos de ligação e auxiliares, a menos que constituam parte
essencial da locução, não são usadas.21
Em relação à organização do texto na lauda, como não existe um modelo
indiscutível, decidimos pela seguinte forma, que descrevemos detalhada-
mente, apesar da advertência do Prof. Bélkior de que seria desnecessária.
A entrada é feita em maiúsculas tiladas, começando na margem e em linha isolada.
O verbete só tem a primeira letra maiúscula. É sublinhado, seguido de pon-
to e começa também na margem. Depois do ponto final, ponto de exclama-
ção ou de interrogação há um espaço em branco de dois toques, não só no
verbete, mas em todo o trabalho.
O significado, ou explicação, ou sinônimo, ou definição da frase fica entre o
verbete e sua abonação, separado por igual espaço em branco de um lado e
de outro. termina sempre em ponto, mas, havendo mais de um significado,
separam-se por ponto e vírgula. Continuando na linha seguinte o texto não
volta à margem, mas continua a partir do quarto toque. O mesmo acontece
com as abonação. A abonação está sempre entre aspas duplas. As aspas já existentes no texto
são transcritas com aspas simples ou apóstrofos. Para indicar um corte no
texto do autor, utilizamos quatro pontos (...), conforme orientação do Prof.
18 NASCENTES, A. (1945) . 19 FERREIRA, A. B. H. (s. d.) . 20 Conforme Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, que usou a 19. ed. do Diccionario de la
Lengua Española da Real Academia Española, publicado em Madrid no ano de 1970. 21 Conf. FERREIRA, A. B. H. (s. d.), p. VII, item 5.
23
Camarinha e do Aurélio Buarque de Holanda, para que se evite confusão
com as reticências do texto.
A indicação bibliográfica, entre parênteses, logo depois de cada abonação,
é constituída da abreviação convencionada do livro, seguida do número da
página, separados por vírgula. A indicação bibliográfica também se separa
das abonações por um espaço de dois toques, como os demais elementos do
verbete. Em alguns casos, outros exemplos citados, apenas indicada a fonte
bibliográfica acrescida à da última abonação.
As observações são precedidas da abreviatura (obs.) entrada para o sétimo toque e precedidas de um espaço de dois toques em branco.
Apenas em três casos usamos mais de uma abonação: quando o autor usou
formas variantes da frase em questão, quando a frase tem significados dife-
rentes da frase em questão, quando a frase tem significados diferentes em
cada exemplo ou quando o exemplo nos pareceu insuficiente para esclarecer
o significado do verbete. Neste último caso, nem sempre dispúnhamos de
exemplos para uma abonação mais farta.
Muito dos significados foram deduzidos pelo contexto, já que não foram
encontrados na bibliografia de que dispomos.22
Além de nossa limitação pessoal, o espaço e o tempo específicos de um tra-
balho de final de curso têm algumas exigências limitadoras.
Nosso fichamento atingiu o número de 1889 verbetes, limitados por moti-vos práticos a uns 700, que nos pareceram mais interessantes.
Esse fichamento resultou da leitura dos dez livros de crônicas de Carlos
Drummond de Andrade, em que colaboraram os Professores Juvenal Leitão
Alves e Leonora Lamoglia de Souza: Confissões de Minas;23 Passeios na
Ilha;24 Fala, Amendoeira;25 A Bolsa & a Vida;26 Cadeira de Balanço;27
Caminhos de João Brandão;28 O Poder Ultrajovem;29 De Notícias & Não
Notícias Faz-se a Crônica: Histórias, Diálogos, Divagações;30 Os Dias
Lindos31 e Boca de Luar.32
O cronista Carlos Drummond de Andrade tem um especial carinho pelas
frases feitas de nossa língua. Basta notar a freqüência com que elas apare-
cem em sua obra e a importância implícita que lhes atribui, escrevendo be-
22 Verifique a Bibliografia, p. 13-15. 23 ANDRADE, C.D. (1964) p. 505-607 e (1979) p. 899-961. 24 Idem, p. 609-725 e 963-1971. 25 Idem, p. 727-820 e 1073-1147. 26 Idem, p. 821-906 e 1149-1224. 27 ANDRADE, C.D. (1979) p. 1225-1293 e (1978-A) . 28 ANDRADE, C.D. (1979) p. 1295-1353. 29 Idem, p. 1355-1394. 30 ANDRADE, C.D. (1979) p. 1395-1470 e (1978-C) . 31 ANDRADE, C.D. (1978-B) 32 ANDRADE, C.D. /1984/.
24
los estudos fraseológicos em forma de arte literária, como os que apresen-
tamos no final deste trabalho, como apêndices.
Detivemo-nos neste trabalho para mostrar aos que ainda não observaram a
obra do grande cronista sob esta ótica, que ele é um dos melhores “espelhos
da língua viva”,33 falada no Brasil; e que ele se esforça no aproveitamento
deste “diamante bruto”34 “em estado de dicionário”,35 ao qual dedica nada
menos que 13 crônicas.36
Ficaremos felizes se este trabalhinho vier a servir de auxílio a alguém para
uma pesquisa mais profunda sobre a obra de Drummond e de nossa fraseo-logia.
Aos estudiosos pedimos a colaboração, apresentando-nos sugestões para o
aperfeiçoamento deste trabalho.
33 FERREIRA, A. B. H. (s. d.) p. VII, ITEM 1. 34 CABRAL, T. (1982) p. 7. 35 ANDRADE, C.D. (1979) p. 160. 36 Além de outras, citemos: Excelências (DN, 46-48); O Outro (DN, 52-54); O Verbo Matar
(D, 54-56); A Eterna Imprecisão da Linguagem (PP, 1317-1318); Antigamente (PP, 1318-
1321); O Homem, Animal Exclamativo (DL, 63-64); O Homem, Animal que Pergunta (DL,
64-66); O Homem no Condicional (Dl, 66-67); O Homem e suas Negativas (DL, 69-70); Pra-
zer em Conhecê-lo (DL, 75-77); Cao de Seqüestro (DL, 79-82); A Moça Disse: Alto Lá! (BL,
175-177) .
25
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26
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[Rio de Janeiro]: Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro [1977].
191 p.
27
ACERTO
Acerto de contas. Ajuste de contas; solução de uma pendência. “Foi até lá
e houve um complicado acerto de contas, à base de álcool, ironia e ódio.”
(DL, 41).
ACHADO
Não se dar por achado. Não se sentir denunciado, acusado ou achacado (cf.
RIBEIRO, J. (1960) p. 201-203) . “Ele não se deu por achado: ‘Ora, minha
tia, então não vê que é de meu padrinho Sr. São José?’” (1179).
ADIANTADO
O adiantado da hora. O atraso quanto à realização de alguma coisa. “...o
Adiantado da Hora encerrou os debates, com aplausos...” (DL, 80).
Obs. Neste texto, as locuções são personalizadas.
ÁGUA
Claro como água. Óbvio; evidente; muito claro. “Antes disso, porém, já
havia produzido muito, e é claro como água que suas obras mais perfeitas
são anteriores...” (955).
Com água no barco. Em situação extremamente perigosa e desesperadora.
“...pode contar comigo em qualquer situação, qualquer emergência, até mesmo com água no barco.” (BL, 136).
Sem dizer água vai. Sem avisar; traiçoeiramente; inesperadamente. “Sem
dizer água vai.” (DL, 68) “Mas sucede que o outro pode ter feito isso ou
aquilo, sem dizer água-vai, e brota-nos a exclamação estupefata: ‘Quem di-
ria, hem?’ (DL, 70).
Obs. Veja que são duas formas: “água vai” e “água-vai”.
AINDA
Ainda por cima. Além disso; além do mais. “E ainda por cima, usando o
meu binóculo, que tirou da gaveta da cômoda sem pedir licença.” (1259).
ALÇA Alça de mira. Perspectiva ou expectativa de ataque iminente. “...que se es-
tabelecesse frente única diante da alça de mira.” (1269).
Na alça de mira. Observação para ser punido; em observação rigorosa.
“Me disse o Capitão Lobo que tem o Sebastião na alça de mira.” (1268)
“Perdão. O senhor disse que ele estava na alça de mira...” (1268).
ALÉM
Além do mais. Além disso; ainda por cima; também. “E além do mais, já
estou na idade de descansar.” (1242) Vide também: (1261 e BL, 111).
28
ALFINETE
Cheio de alfinete e navalhas. Violento e ameaçador; irritadíssimo. “Des-
sem-lhe carinho, e o homem cheio de alfinetes e navalhas se aveludava.”
(1131).
ALGUM
Ter sempre algum na bolsa. Não andar sem dinheiro. “...mas os fregueses
dão boas gorjetas, de maneira que tenho sempre algum na bolsa.” (1192).
ALMA
De alma embandeirada. Festivamente; muito alegre. “Levou-o rápido para
José, que o recebeu de alma embandeirada.” (1119).
Pôr a alma pela boca. Cansar-se exageradamente. “Com o aperto do laço,
o infeliz punha a alma pela boca.” (1118).
ALTO
Alto lá. Pare por aí! Não prossiga! “A moça disse: Alto lá!” (BL, 175) “–
Alto lá! Dobre a língua antes de pronunciar o nome de Madame Elzevir.”
(BL, 176).
ALTURA
À altura do pescoço. Em situação crítica; quase insuportável. “Quando me
deitei, à meia noite, os preços estavam à altura do pescoço.” (OC, 829).
A essa altura. Nesse exato momento; nesse ponto; nessa altura da situação
ou da narrativa. “A essa altura, porém, tornava-se mais fácil provar de di-
ferentes maneiras o intermezzo belo-horizontino do que invalidá-lo.”
(1078) “A essa altura, espantou-se com a mobilidade de suas reações.” (BL,
10).
AMIGO
Amigo é pras ocasiões. Nas horas difíceis é que se conhece o amigo. “...o senhor não entende isso, não compreende que amigo é pras ocasiões?” (BL,
169).
AMOR
Seja tudo pelo amor de. Expressão usada para indicar que o que se fará será
exclusivamente em atenção a ou por causa de algo ou alguém que se nomeia
a seguir. “– Não gosto de conversar na hora da refeição – mas seja tudo pe-
lo amor da Feira de Providência...” (DN, 115).
29
ÂNCORA
Levantar âncora. Sair do lugar em que está; arredar-se. “...que nunca le-
vantariam âncora, como na frase de Gide, para a descoberta do mundo.”
(950).
ANGU
Debaixo desse angu tem carne. Há intenções ocultas; há trapaça; há alguma
coisa escondida ou sob disfarce. “Minha sogra acha que debaixo desse an-
gu tem carne, e que o senhor pretende exprimir em símbolos uma realidade sutil.” (DL, 13) “Debaixo de todo angu tem carne, ou só no da classe A?”
(DL, 66).
APELIDO
Ser apelido. Não ser a inteira expressão da verdade, estando a pessoa ou
coisa referida muito além do que foi dito. “Pobreza é apelido.” (1337).
AR
Ar de cegonha tímida. Expressão de timidez, de insegurança. “Sobre o
homem, há a notar ainda sua magreza e altura, seu ar de cegonha tímida, seu
silêncio quase completo...” (926).
Com ar de procissão de enterro. Tristonho; com expressão de profundo abatimento emocional. “Se a gente encontra na rua um homem e uma mu-
lher caminhando juntos com ar de procissão de enterro ou de indiferença to-
tal...” (OC, 873).
Ar de quem comeu e não gostou. Aborrecido; desiludido. “...e o mestre me
sai com esse ar de quem comeu e não gostou?” (DN, 90).
ARCO
Abrir o arco. Fugir; retirar-se em demandada. “...depois de fintar e engam-
belar os coiós, e antes que se pusesse tudo em pratos limpos, ele abria o ar-
co.” (1320).
ASA
Arrastar a asa. Insinuar-se junto a alguém com intenções amorosas; procu-
rar namorar. “...faziam-lhes pé-de-alferes, arrastando a asa, mas ficavam
longos meses debaixo do laio.” (1318).
ASSIM
Assim assim. Modo de explicar como se fez a descrição de certa pessoa ou
coisa. “Disse mais que morava em Senador Camará, num sobradão assim
30
assim, e lá se foi com o presente.” (1235) “...para restituir-lhe uma bolsa,
não para isso assim assim.” (1152).
Obs. Está locução é usada mais freqüentemente para indicar uma circuns-
tância indefinida de modo. Ex.: – Como vai, amigo? – Assim assim; meia
pedra, mei tijolo.
Assim como assado. De qualquer modo; desta ou daquela maneira. “O al-
tão, calvo e corcunda, era antes uma fotografia xeroquisada (sic), em que os
traços tanto podem ser assim como assado.” (DL, 8).
Assim e assado. De vários modos. “Depois de mil peripécias, assim e as-sado, todo mundo acabava mesmo batendo com o rabo na cerca...” (1321).
ATAR
Não atar nem desatar. Não decidir; ficar sem solução. “Não ata nem desa-
ta.” (DL, 68).
AULA
Matar a aula. Faltar à aula; fazer gazeta. “O estudante que falta à aula con-
fessa que matou a aula, o que implica matança do professor, da matéria e...”
(1415).
AVISAR Eu bem que avisei. Expressão com que se reprova um ato contra o qual a
vítima fora prevenida. “Eu bem que avisei! Não apoiado!” (DL, 64).
AVISO
De bom aviso. Melhor; de bom senso. “...as mulheres acharam de bom avi-
so defender pelo menos suas pernas do ataque de agentes maléficos...” (DN,
102).
AVÓ
Como dizia minha vó. Expressão que precede a citação de um provérbio ou
expressão antiga. “...me tratando de Violeta e não de Violante, e pondo os pingos nos is, como dizia minha vó...” (DL, 23).
AZEITONA
Botar azeitona na empada de (alguém) . Ser um estraga-prazeres. “Não es-
tou aqui para botar azeitona na empada de ninguém.” (DL, 68).
BALACOBACO
Do balacobaco. Excelente. “Devia mexer com as fibras da elogiada o hino
na expressão, que também a fait son temps:
31
– É do balacobaco!” (1411).
BALAIO
Ficar debaixo do balaio. Sofrer muito com a separação, como a galinha
choca, que é forçada a ficar longe de seus ovos até esquecê-los ou sair do
choco. “...faziam-lhes pé-de-alferes, arrastando a asa, mas ficavam longos
meses debaixo do balaio.” (1318).
BANANEIRA Plantar bananeira. Ficar de cabeça para baixo, com o peso do corpo apoia-
do nas mãos, e as pernas para cima. “Nem todas as pessoas gostam de plan-
tar bananeira para contemplar normalmente uma obra de arte.” (1407).
Ser bananeira que já deu cacho. Estar em fase de improdutividade, por ve-
lhice; ser velho ou ultrapassado. “O Sr. Olavo Bilac... é bananeira que já
deu cacho.” (1006).
BANCA
Botar banca. Fazer-se de rogado; exibir-se. “Tenho medo que ele fique ri-
co, daí a pouco começa a botar banca.” (1399) “Pode parecer que estou bo-
tando banca, mas não é à toa que me chamo Teopompo.” (DN, 174).
BANDIDO
Trabalhar de bandido. Enganar; tramar contra alguém. “...e pediam a hora
a quem passava, sentindo que o tempo trabalhava de bandido, em sua lenti-
dão.” (1194).
BARBA
Botar as barbas de molho. Ficar de pé atrás; prevenir-se. “Se falta o boi
propriamente dito, peixe-boi deve botar as barbas de molho.” (DN, 116).
Pôr as barbas de molho. O mesmo que botar as barbas de molho. “O me-
lhor era pôr as barbas de molho diante de um treteiro de topete...” (1320).
BARCA
Tomar a barca de Caronte. Morrer. Segundo a Mitologia, Caronte é o bar-
queiro que transporta os mortos para o outro lado do rio Estige. “Já imagi-
naram se todos nós houvéssemos tomado a barca de Caronte antes desta
noite amena...?” (DN, 66).
BARRA
32
Agüentar a barra. Suportar uma situação difícil. “As empresas se queixam
de que o Governo cortou o subsídio que ajudava os empresários agüentar a
barra.” (BL, 187).
Forçar a barra. Insistir demasiadamente. “...fiquei calado, esperando a di-
ca... Não quis forçar a barra, desculpe.” (DN, 138) Veja também (DL, 28).
Sondar a barra. Observar atentamente o ambiente. “Peço? Perguntou a si
mesmo. Ou é melhor sondar a barra?” (DN, 149) “– Então não custa sondar
a barra.” (DN, 170).
BEM
Por bem ou por mal. De qualquer maneira. “E agora, José? Por bem ou
por mal, vai me dizer que horas são?” (DL, 66).
BICHO
Matar o bicho. Tomar um gole de aguardente; ingerir bebida alcoólica.
“...muita gente embira, que não tinha nem para matar o bicho; por exemplo,
o mão-de-defunto.” (1320).
Matar o bicho do ouvido. Aborrecer com uma conversa desagradável e pro-
longada. “O sujeito vulgarmente conhecido como chato, ao repetir a mesma
cantilena, ‘mata o bicho do ouvido’.” (1416).
Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. Situação inevitável; situação de quem está num beco sem saída. “O problema é que se correr o bicho pe-
ga, se ficar o bicho come.” (DL, 66).
Tornar-se um bicho do mato. Passar a viver solitariamente, afastado do
convívio social. “...Varela se tornou um bicho do mato e aparecia, como
um fantasma, nas fazendas da província do Rio...” (906).
BICO
Não abrir o bico. Calar-se; fechar-se em copas. “E quando Augusto fez
nova sujeira com outro da turma, você não abriu o bico para censurá-lo...”
(DL, 31).
BOCA
Botar a boca no mundo. Denunciar; gritar; botar a boca no trombone. “Se
mandam tomar o que é meu e me obrigam a receber uns cobres pra não bo-
tar a boca no mundo...” (BL, 169).
O que vem na boca. Forma de declarar insubmissão quanto ao que diz. “Eu
digo o que me vem na boca.” (1388).
Pegar com a boca na botija. Flagrar no delito. “Antigamente, certos tipos
faziam negócios e ficavam a ver navios; outros eram pegados com a boca na
botija...” (1319).
33
BOCA-DE-SIRI
Fazer boca-de-siri. Guardar segredos sobre determinado assunto. “Fez bo-
ca-de-siri e guardou a hora ‘da meia-noite que apavora’.” (1299).
BODE
Bode expiatório. Pessoa escolhida para pagar pela culpa dos outros. “Por
favor, não vá dizer que eu tenho complexo de bode expiatório...” (1436).
Dar bode. Azarar; dar errado. “A mulher tinha o mesmo pensamento ne-gro. Ia dar bode.” (1135).
BOFE
De maus bofes. Genioso; temperamental; de mau caráter. “Lugar por onde
esse homenzinho pardo e de maus bofes andou é lugar encantado.” (955).
BOI
Almoçar um boi e jantar outro. Ter muito bom apetite. “Acordar cedo, vai
à praia, almoça um boi, janta outro, pula feito macaco...” (1124).
BOLA
Dar bola. Demonstrar interesse por alguém ou por alguma coisa; insinuar-se. “– Por quê? Ele não dá bola pra gente! (DN, 62) “Mas os dois não lhe
deram bola.” (1293).
BOLACHA
Dar bolacha. Dar tapa no rosto. “Não, isso não, espere lá, não precisa me
dar bolacha, eu saio imediatamente...” (1499).
BOLOLÔ
Um bololô dos diabos. Uma grande confusão. “Negócio mexendo com
gente importante daquela época, os descendentes estão aí, coisas de política
internacional, grupos econômicos, um bololô dos diabos.” (1461).
BOMBA
Levar bomba. Ser reprovado na escola; não passar numa prova. “Mamãe,
eu levei bomba, mamãe, eu quero mamar!” (DL, 93).
Ser uma bomba. Não valer nada; ser muito ruim. “– É uma bomba.”
(1317).
BONDADE
34
Ter a bondade de. Forma que precede um infinitivo para indicar uma or-
dem ou um pedido. “– A senhorita quer ter a bondade de sair para fora da
areia?” (DN, 24) “Tenha a bondade de contar o dinheiro – pedi-lhe, cons-
trangido.” (1155).
BOTAR
Botar pra jambrar. Tomar a frente de um empreendimento com pulso fir-
me, fazendo que as coisas se decidam rápido. “O material sobe de preço,
enquanto o Ministro da Fazenda bota pra jambrar.” (1176).
BOTÃO
Dizer com os seus botões. Dizer consigo mesmo. “O gosto de dizer costu-
ma chegar ao excesso de dizê-lo com os seus botões, como se os botões dia-
logassem conosco.” (DL, 70).
BRAÇO
Cair nos braços de Morfeu. Dormir. Morfeu é o deus do sono. “...e se um
esquecia de arear os dentes antes de cair nos braços de Morfeu, era capaz de
entrar no couro.” (1320).
Cruzar os braços. Nada fazer; omitir-se. “Enquanto isso, cruza os braços,
em lugar de estendê-los. Deixa que o desfile prossiga...” (DL, 143). Não dar o braço a torcer. Não admitir um erro ou fraqueza; não mudar de
opinião ante a evidência do erro, ou fingir que não mudou. “Mas para não
dar o braço a torcer, nem me declarar vencido pela competição das cervejas,
concluí: Leovigil, traga a de sempre.” (DN, 138).
BRASA
Mandar brasa. Prosseguir; agir com disposição firme. “Querem que eu
acabe com a Frente Ampla e mande brasa na administração.” (1347) “...e saí
por aí, sem lenço e sem documento, mandando brasa.” (1352).
BRINCADEIRA Não estar para brincadeira. Estar muito ocupado; estar mal-humorado.
“Hoje não estou para brincadeiras, e retrucou-lhe nada menos que...” (BL,
199) Vide também (BL, 201).
BUBUBU
Diz-que em bububu no bobobó, mas ninguém balançou. Falta fundamenta-
ção a respeito de algo que se declara. “Diz-que tem bububu no bobobó, mas
ninguém balançou, ninguém mandou jenipapo maduro cair no galho.” (DL,
94).
35
BULHUFAS
Não entender bulhufas. Não entender nada; não entender patavina. “– Cê
não entendeu lhufas. Gravador faz parte do equipamento escolar moderno.”
(DL, 95).
BURRO
Burro velhote não acerta o trote. Cavalo velho não apanha andar; é de pe-
quenino que se torce o pepino. “...a sabedoria de Itabira do Mato Dentro, em um provérbio inventado neste momento, ensina que burro velhote não
acerta o trote.” (OC, 885).
Dar com os burros n’água. Sair-se mal numa empresa qualquer; fracassar;
falir “...se metiam em camisas de onze varas, e até em calças pardas; não
admira que dessem com os burros n’água.” (1319).
Pra burro. Muito. “...sofro pra burro, sofro sério, sofro sofrendo e não es-
petacularmente, é lógico.” (935).
CABEÇA
Botar na cabeça. Convencer-se. “Olhe, quando você botou na cabeça que
eu, para me afastar do Ernesto, devia contar a ele...” (DL, 29).
Com a cabeça mal atarraxada. Com um parafuso a menos; confuso; pouco lúcido. “– Depois do carnaval eu dou. Agora você está com a cabeça mal
atarraxada.” (1365).
Guardar na cabeça. Memorizar. “– E por que você guardou na cabeça que
ele é de Áries?” (1406).
Matar na cabeça. Resolver completa e definitivamente um problema.
“Não admira que, nas discussões, o argumento mais poderoso se torne arma
de fogo de grande eficácia letal: mata na cabeça.” (1415).
Passar pela cabeça. Imaginar; planejar. “Não lhe passaria pela cabeça re-
ceber qualquer coisa pelo correio sem a ler inteirinha.” (1172).
Perder a cabeça. Enlouquecer; perder o controle emocional. “Sai, azar!
Vá-se embora, antes que eu perca a cabeça e...” (1322). Ter cabeça fria. Ser ou estar calmo. “O Brasil lutando com a Bulgária, o
senhor quer que o nosso pessoal tenha cabeça fria para informar papéis?”
(1321).
CABRITO
Bom cabrito não berra. O comparsa ideal não denuncia os demais, qual-
quer que seja a situação. “Não foi aproveitado agora? Mais tarde será.
Bom cabrito não berra.” (BL, 135).
36
CAÇAMBA
Pisar a caçamba de altas cavalarias. Estar em situação privilegiada. “Juca
não entrava no miúdo, falava em honras, feitos e bens, sem particularizá-
los, mas sentia-se que pisara a caçamba de altas cavalarias.” (1178).
CACHIMBO
Fumar o cachimbo da paz. Desfazer uma inimizade. “Não precisamos fu-
mar o cachimbo da paz, porque nunca houve nem poderia haver guerra en-
tre nós.” (DL, 39).
CACHORRO
Amarrar cachorro com lingüiça. Estar em situação de grande fartura. “Uns
raros amarravam cachorro com lingüiça.” (1319).
CADA
Cada um na sua. Liberdade de ação e opinião. “Assim, Touro, Virgem,
Áries e Sagitário ficam inteiramente harmonizados, cada um na sua, um por
todos, todos por um.” (1406) “– Eu na minha, a senhora na sua, cada um na
dele, entende?” (1364).
CAIR Cair duro. Ter um grande susto; morrer. “O filho quase cai duro.” (1304).
Cair em cima de. Agredir ou tentar agredir. “Caíram em cima do garoto,
que soverteu na multidão.” (1378).
Cair em si. Convencer-se. “...o topônimo já foi restabelecido – caíram em
si e aplaudiram o restabelecimento...” (OC, 622).
Cair fora. sair; ir embora; sair rápido. “ – Cai fora, coisinha.” (1203).
CAJU
Despedir-se para o Caju. Morrer; despedir-se para São João Batista. “Os
‘sebos’ foram rareando, freqüentadores assíduos se despediram para o Caju
e o São João Batista...” (OC, 736). Obs. Caju e São João Batista são nomes de cemitérios da cidade do Rio de
Janeiro.
CALA-A-BOCA
Cala-a-boca já morreu, quem matou fui eu. Réplica à expressão cala a bo-
ca! proferida por outra pessoa. “– Cala-a-boca já morreu, quem matou fui
eu – era a resposta única a essa terrível ofensa. Seguida de tiro.” (BL, 176).
Obs. Há uma variante muito freqüente: Cala-a-boca já morreu, quem te
manda sou eu.
37
CALÇAS
Meter-se em calças pardas. Ficar em apuros; colocar-se em situação difícil.
“...se metiam em camisa de onze varas, e até em calças pardas; não admira
que dessem com os burros n’água.” (1319).
CALO
Pisar nos calos. Prejudicar; causar algum mal. “Por que estará de impli-
cância comigo, que nunca lhe pisei nos calos?” (DL, 78).
CAMISA
Dar a camisa do corpo. Esgotar todos os recursos disponíveis: sujeitar-se a
qualquer coisa. “Dei 200 contos, daria 500, doutor, daria 5 mil, daria a ca-
misa do corpo para usar bem a minha vista...” (1341).
Meter-se em camisa de onze varas. Correr e afrontar um grande perigo e
risco. “...se metiam em camisa de onze varas, e até em calças pardas; não
admira que dessem com os burros n’água.” (1319).
Obs. Confira o que diz a respeito J. Ribeiro, em Frases Feitas, p. 76-77.
CANELA
Espichar a canela. Morrer “...isso evitava de levar a lata, ficar na pindaíba ou espichar a canela antes que Deus fosse servido.” (1320).
CANIVETE
Doer como canivete na carne. Doer muito. “Em uns, o objetivismo sensua-
lista, voltado para o cheiro e o colorido das coisas; noutros, a auto-sátira
cruel, doendo como canivete na carne...” (927).
CANO
Entrar pelo cano. Ser ludibriado; fazer um mau negócio; decepcionar-se.
“Premiados, entram pelo cano, se me permite a expressão.” (DL, 6).
CANOA
Embarcar em canoa furada. Ser imprudente ou desprevenido; admitir ou
aceitar proposta de resultados duvidosos. “O que não impedia que, nesse
entrementes, esse ou aquele embarcasse em canoa furada.” (1318).
CARA
Com a cara e a coragem. Com determinação. “...sem auxílio de homem
algum, só com a cara e a coragem, atingiram...” (1440).
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Dar as caras. Aparecer; ir ou vir a algum lugar. “– Vai ter e não vai. Pes-
soal que saiu não pode dar as caras outra vez, pega mal.” (BL, 216).
Dar de cara com. Encontrar-se frente a frente com; deparar com. “Entre-
tanto, basta você sair por aí, na Gávea, e dá de cara com pencas de diadel-
fos.” (DL, 71).
De cara aberta. Bem humorado. “Junto ao guichê, o desconhecido de cara
aberta cutucou-o...” (DN, 173).
Estar na cara. Ser evidente. “É nota de propaganda comercial, o senhor
não vê que está na cara?” (1181) Vide também: (1108; DN, 32; BL, 122). Fazer cara feia. Não gostar; demonstrar desgosto ou insatisfação. “No
começo a gente faria cara feia, depois se acostumava...” (DN, 136).
Jogar na cara. Incriminar, cara-a-cara; relembrar. “...descobriu até aquelas
fotografias meio marotas que nós tiramos em Itacuruçá, e está me jogando
na cara como se eu fosse a última das traidoras.” (DL, 29).
Não ir com a cara de. Antipatizar-se com; ter aversão por. “Não li nem
gostei. Não vou com a cara dele.” (DL, 68).
Quebrar a cara (de alguém) . Espancar; dar sopapo. “Não sei onde estou
que não lhe quebro a cara.” (DL, 68).
Ter cara de. Parecer. “Mas tão manso e engraçado que não tinha cara de
mandão.” (DL, 51).
CARECA
É dos carecas que elas gostam mais. Frase maliciosa com que os carecas
revidam a qualquer insinuação a sua escassez de pêlos. “É dos carecas que
elas gostam mais?” (DL, 94).
CARNAVAL
Desde o carnaval do ano passado. Há bastante tempo; desde o outro carna-
val. “...mas eu te conheço desde o carnaval do ano passado e sei que sua
loucura é postiça...” (DL, 22).
CARNE Nem carne nem peixe. Imparcial; sem preferências; sem opinião expressa.
“Nem carne nem peixe.” (DL, 68).
Sentir na carne. Ter experiência direta com algo doloroso ou indesejável.
“Agora, como você está sentindo na própria carne o que os seus colegas já
sentiram...” (DL, 31).
CARRAPATO
Ser carrapato nas costas. Coisas incômoda e difícil de ser corrigida ou
eliminada. “Jorge dizia que casamento sete dias por semana é carrapato nas
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costas, não tem jeito de tirar.” (BL, 57) “...o casamento a semana inteira é
carrapato grudado nas costas.” (BL, 59).
CARRO
Empurrar o carro (de alguém) . Paparicar; bajular. “– Você se lembra co-
mo ele era vidrado em cantoras líricas? – Andou até empurrando o carro de
uma...” (1388).
CARTA Botar as cartas na mesa. Dizer francamente toda a verdade. “Vamos jogar
o jogo da verdade, vamos botar as cartas na mesa e...” (DL, 23).
Dar as cartas. Ter o comando de uma ação; dirigir soberanamente. “Bom
era ter costas quentes, dar as cartas com a faca e o queijo na mão...” (1320).
CASA
Casa da mãe Joana. Coisa desgovernada, em que todos mandam. “Isso
aqui não é casa da mãe Joana!” (DL, 64).
Obs. Segundo J. Ribeiro, em Frases Feitas, p. 143, esta expressão é usada
para evitar a verdadeira e nua, que é a mais conhecida: Cu da mãe Joana.
Casa de orates. Casa de loucos. “Nessa teia de enganos, não faltou quem
achasse a seqüestrada, tanto nos Pinhais de Azambuja como na Casa de Orates, e ainda no Asilo Inviolável do Cidadão.” (DL, 81).
Obs. As locuções são personificadas, neste texto, e tornadas substantivos
próprios.
CASO
Em todo caso. Apesar de tudo; enfim. “E em todo caso, de mim não deses-
pere nunca.” (931) “Em todo caso, me arranje uma lata de talco.’ (1210)
Vide também: (951; 1095).
Em último caso. Não havendo outra solução. “E depois, em último caso,
não coma nada, mas venha!” (BL, 164).
CAVACO
Dar o cavaco. Dar mostra de aborrecimento ou zanga, por ser objeto de
troça, de pirraça ou de ridículo. “Ganhar vidro de cheiro marca barbante,
isso não: a mocinha dava o cavaco.” (1320).
CAVALO
Cair de cavalo magro. Mostra-se inábil em coisa de fácil execução. “As
pessoas, quando corriam, antigamente, era para tirar o pai da forca, e não
caíam de cavalo magro.” (1318).
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Obs. Segundo Tomé Cabral, esta expressão é hoje quase desconhecida.
CABRAL, T. (1982) s. v.
Cavalo dado não se olha a idade. Não se examina o objeto que se ganha
com o fim de encontrar defeitos; a cavalo dado não se olham os dentes; a
cavalo dado não se abre a boca. “Cavalo dado não se olha a idade, presente
não se recusa nem se joga fora.” (1298).
Tirar o cavalo da chuva. Reduzir as pretensões; desistir de um propósito.
“E se levavam tábua, o remédio era tirar o cavalo da chuva e ir pregar em
outra freguesia.” (1318).
CECA
Andar por Ceca e Meca. Ir para um lado e para outro à procura de alguma
coisa; andar por várias terras. “Acolhiam com satisfação a visita do cometa,
que, andando por Ceca e Meca, trazia novidade de baixo...” (1319).
CÉSAR
A César o que é de César. A cada um o que é seu, por direito. “...aprecio
os grandes sendo um dos pequenos, porém a César o que é de César, e meu
humilde repertório dá para o gasto.” (1340).
Obs. Este provérbio corresponde ao versículo 21 do capítulo 22 do Evange-
lho segundo São Mateus: “Dê a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.”
CÉU
Caído do céu. Conseguido sem esforço. “Os homens não têm estrutura pa-
ra fruir prêmios caídos do céu ou do acaso.” (DL, 6).
CHÁ
Chá de casca de vaca. Surra de chicote ou de relho. “– Bem que este me-
recia um chá de casca de vaca!” (1334).
Tomar chá em criança. Ter uma educação fina. “Havia os que tomaram
chá em criança, e, ao visitarem família de maior consideração, sabiam cus-pir dentro da escarradeira.” (1319).
CHACRINHA
Fazer chacrinha. Fazer palhaçada; bagunçar. “Na repartição... tanto se faz
chacrinha com o Plano como sobre a corrente da sorte.” (DL, 14) “Somos
capazes de identificar o macaco-prego fazendo chacrinha no alto das árvo-
res...” (1440).
CHÃO
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Até cair no chão. Muito. “Vou sambar até cair no chão, e se ninguém se
animar, quebro o meu tamborim!” (DL, 93).
CHAVE
A sete chaves. Muito bem fechado. “Falta só dizer que o Dr. Kissinger me
transmitiu apelo do Presidente Nixon para eu guardar a sete chaves os pa-
péis e queimá-los em emergência grave, pois não?” (1397).
Sob sete chaves e sete selos. Muitíssimo bem fechado; mais bem fechado
do que a sete chaves. “É um poeta raro, que se encerra sob sete chaves e se-te selos.” (OC, 703).
CHINA
Nem aqui nem na China. Em parte alguma; em nenhuma lugar do mundo.
“Nem aqui nem na China.” (DL, 68).
Obs. O cronista usa variantes, não só desta, mas de várias expressões. Veja
os exemplos seguintes: “Isso nunca foi chá, nem aqui nem na Índia.” (1304)
“Isto não é bacalhau à Gomes da Sá aqui nem em Macau.” (1329).
CHUS
Sem chus nem bus. Sem nada; nem chus nem mus. “Sem chus nem bus.”
(DL, 68). Obs. Como esta expressão se usa mais freqüentemente precedida do verbo
dizer, não dizer chus nem bus, pode ser sinônima de não tugir nem mugir ou
ficar calado.
CINTO
Apertar o cinto. Reduzir as despesas; economizar. “ – O jeito é apertar o
cinto.” (BL, 101) “- Certo. Mas apertar o cinto, na recomendação oficial,
quer dizer: renunciar ao supérfluo, pechinchar, gastar o menos possível.”
(BL, 103) Vide também: (BL, 102; BL, 102).
COBAIA Quem não tem cobaia caça com preá. Quem não tem cão caça com gato;
quem não tem os meios necessários improvisa com os de que dispõe. “–
Quem não tem cobaia caça com preá – concordaram, abusando da proposi-
ção.” (1373).
Obs. Drummond usa e abusa das alterações de frase feitas, dando-lhes,
muitas vezes conotações muito especiais. Foi este ocaso que vimos no ver-
bete Nem aqui nem na China.
COBRA
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Dizer cobras e lagartos. Esbravejar, dizendo palavrões. “Pode ser que vo-
cê tenha razão quando diz cobras e lagartos de Augusto.” (DL, 31) “Por que
se dizem cobras e lagartos, e não se dizem rouxinóis e açucenas?” (DL, 70).
COISA
A coisa está preta. A situação está muito difícil. “– Eu é que sei? Só posso
dizer que a coisa está preta.” (BL, 101) Vide também (BL, 103).
A coisa está ruça. A coisa está preta; a maré não está para peixe. “As coi-
sas estão, quem sabe, mais para ruça, tirando a pardo... É o que lhe digo: a coisa está ruça.” (BL, 103).
A coisa está ficando preta. A situação está de mal a pior. “– Então a coisa
está ficando preta.” (DN, 81).
Não dar outra coisa. Exatamente; isto mesmo. “Não deu outra coisa.”
(DL, 68).
Não fazer outra coisa. Exatamente; não dar outra coisa. “– Quem dizer que
ele dá nó até em pingo d’água? – Não faz outra coisa.” (BL, 75).
Não ser mais lá essas coisas. Ter menos valor atualmente do que já teve
anteriormente. “Nem dólar, que aliás hoje não é mais lá essas coisas.” (DN,
83).
Perceber alguma coisa no ar. Prever um acontecimento iminente. “– Per-
cebe-se alguma coisa no ar. – Não. – Não dá para perceber, mas há.” (DN, 81).
Sabe de uma coisa? Pergunta que se costuma fazer para prender a atenção
do interlocutor antes de se afirmar alguma pretensa novidade. “– Sabe de
uma coisa? Você envenena tudo.” (DL, 76).
Saber das coisas. Ser entendido em determinado assuntos; ser sábio. “Eles
sabem das coisas.” (BL, 173).
Ser outra coisa. Ser muito melhor; ser superior. “É pena ter vindo este ano,
com a Semana Santa feita em Antônio Dias. A do Pilar é outra coisa...”
(986).
Ter coisa. Haver trapaça; haver armadilha. “Quer dizer, certeza mesmo
não, mas estou quase jurando que ali tem coisa.” (1135). Uma coisa louca. Um amor; um encanto; lindíssimo. “Dizem que no Reci-
fe foi uma coisa louca, o núcleo espalhando lágrimas fosforescentes, um
troço feito fogo-de-artifício que vou te contar.” (1259).
COLHER
Colher de chá. Oportunidade. “– Tou contratada. Vamos não negue uma
colher de chá.” (BL, 43).
Meter a colher. Intrometer-se em assunto alheio; meter a colher de pau. “–
Então, permite que eu também meta a colher no assunto, embora não seja
do meu feitio – aparteou Euclides.” (DL, 45).
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COLUNA
Dar coluna do meio. Dar empate; não haver vencedor nem vencido. “Ati-
rei na cara do Lopes a teoria do Katicic. – Deu coluna do meio? – Um a
zero.” (1430).
Obs. Esta frase é um neologismo que nasceu com a loteria esportiva, no
início dos anos 70.
COMEÇO Para começo de conversa. Antes de mais nada; pra começar. “...para co-
meço de conversa, Virgínia e Sinhá não eram Virgínia e Sinhá...” (1461).
CONSELHEIRO
Ser Conselheiro Acácio. Ser um idiota com ares de ponderado e grave; ser
um repetidor de lugares-comuns. “A noite é conselheira acácia.” (1379).
Obs. A deteriorização dos provérbios, segundo Drummond, em Poesia e
Prosa, p. 1379, cria os antiprovérbios, quase todos muito espirituosos. O
exemplo acima é um antiprovérbio, como diversos no corpo deste trabalho,
pois o personagem que deu origem à frase não poderia ser feminizado.
CONTA Afinal de contas. Enfim; pensando bem; em último caso. “Parece, afinal de
contas, que os moços têm alguma coisa a ensinar aos mais velhos.” (DN,
17) “Presto compromisso, mas discretamente, porque afinal de contas sou
um funcionário público...” (1045) Vide também (967).
Ajustar contas com. Haver-se com; tirar satisfação com. “...para caçar feli-
nos por aí, ou se estes mergulhassem com a intenção de ajustar contas com
ele.” (1416).
Dar conta do recado. Executar bem uma tarefa; dar conta de. “Providência
de muito alcance do nosso homem-em-Ipanema (pois julgou inútil voar até
Brasília para dar conta do recado) foi...” (1349) Vide também (BL, 31).
Dar-se conta de. Entender; perceber. “Muitas pessoas ainda não se deram conta do que aconteceu, senão superficialmente.” (BL, 114) “Assim, vai do
individual ao universal, sem que nos demos conta de sua longa viagem.”
(OC, 705).
Fazer a conta no lápis. Calcular com rigor. “Como você vem de comadre
e quatro filhos, faça a conta no lápis.” (DL, 124).
Fazer de conta. Fingir; supor; imaginar. “...faz de conta que você, assim de
botas e short, caminhou pra trás no tempo...” (1419) “Faça de conta que eu
sou o padre.” (1206).
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Ficar por conta. Enfurecer-se; irritar-se muito. “Mas fico por conta vendo
você tão ignorantezinha em poesia, que para mim é o máximo.” (1365).
Ser a conta de. Ser o bastante; bastar. “– Viu? Foi a conta de fundir o Es-
tado do Rio com o Rio, e os carros da Barra do Piraí vêm atochar nossas
calçadas.” (BL, 39).
Ter em conta. Considerar; levar em conta. “Tendo em conta que só à últi-
ma hora, quando o calor se torna insuportável, os casais se lembram de...”
(BL, 140).
CONTAR
Que vou te contar. Fora do comum; admirável. “...o núcleo espalhando lá-
grimas fosforescentes, um troço feito fogo-de-artifício que vou te contar.”
(1259) Vide Vou-te-contar.
CONTRA
Ser do contra. Discordar por princípio; ser espírito-de-porco. “– Puxa, mas
o senhor é mesmo do contra, hem?” (1259).
CONVERSA
Conversa vai, sorvete vem. Conversa vai, conversa vem; ao fim de muita
conversa e de muito sorvete. “Conversa vai, sorvete vem, o herói tranqüilo, de mais de quarenta anos...” (1195).
Obs. O antiprovérbio acima acrescenta ao sentido normal do provérbio ori-
ginal, conversa vai, conversa vem, a circunstância de que se fazia propa-
ganda de sorvete durante a entrevista com o ator.
Ir na conversa. Deixar-se enganar. “Não vá na conversa daquele senhor
que o trouxe no carro.” (DN, 13) “Você foi na conversa dele, me iludindo,
pois...” (DL, 27) Vide também (1202).
Levar na conversa. Enganar com mentiras ou meias verdades. “Ninguém
consegue. Leva a gente na conversa, no aveludado.” (DN, 92).
Passar uma conversa em. Enganar com falsas promessas; engambelar; le-
var na conversa. “Antes que isto aconteça, ele passa uma conversa manhosa na gatona...” (BL, 74).
Puxar conversa. Tirar um assunto; provocar alguém ao diálogo. “E então
parar e puxar conversa com gente chamada baixa e ignorante!” (933) “Puxe
conversa com ela.” (BL, 173).
CONVERSAR
Conversando é que a gente se entende. É através do diálogo franco que as
pessoas podem chegar a um acordo. “Talvez nos entendamos de alguma
forma, sei lá; pois conversando é que a gente se entende.” (DL, 32).
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Estar conversado. Ter-se chegado a uma conclusão; estar decidido. “ – Já
avisei. Estamos conversado – voou.” (DL, 6)
COPAS
Fechar-se em copas. Fazer-se em copas; ficar calado. “– Eu sei, eu perce-
bo. Faz bem em fechar-se em copas.” (DN, 12) “Quem é capaz de sabê-lo e
transmiti-lo, se o Outro se fechou em copas e desmentirá tudo quanto se dis-
ser que ele disse?” (1414) Vide também (1075).
COR
Conhecer de cor e salteado. Saber de cor e salteado; saber ou conhecer
muito bem. “Conheço de cor e salteado, sou capaz de distingui-lo entre mil
pointers iguaizinhos uns aos outros.” (BL, 46).
CORAÇÃO
Duro de coração. Insensível; não sentimental. “Talvez você seja apenas
mais duro de coração.” (1185).
CORNO
Elevar aos cornos da Lua. Pôr nos cornos da Lua; pôr ou colocar nas nu-
vens; elogiar; exaltar. “Portanto, não pense que desmereço os colegas para me elevar aos cornos da Lua.” (1367).
CORPO
De corpo e alma. Sem reservas. “Onde que você está com a cuca, Violeta?
Se entregar de corpo e alma a um indivíduo...” (DL, 27).
Tirar o corpo fora. não assumir; negar. “Interpelei Augusto, ele tirou o
corpo fora, alegando que namorada ou...” (DL, 27).
COSTAS
Cair nas costas de. Ser atribuído a; ficar na responsabilidade de. “Não fora
autor da gaiatice e um medo maior o invadiu: tudo iria cair nas suas cos-tas...” (1164).
Ter costas quentes. Ter as costas largas; ter santo forte; estar sob a proteção
de alguém. “Bom era ter costas quentes, dar as cartas com a faca e o queijo
na mão...” (1320).
Voltar as costas (a alguém) . Desprezar. “O irmão voltou-lhe as costas,
com desprezo: – Palhaço!” (1227).
COURO
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Entrar no couro. Levar um a surra; apanhar. “...e se um esquecia de arear
os dentes antes de cair nos braços de Morfeu, era capaz de entrar no couro.”
(1320).
CRESCER
Cresça e apareça. Votos de sucesso que se fazem aos iniciantes; ironica-
mente, é usada para recriminar alguém que age como se fosse muito mais
importante do que realmente o é. “Cresça como puder, mas apareça.” (DN,
135) “Comida, José, você terá que esperar que as roças plantadas pelo Mi-nistro Delfim cresçam e apareçam.” (BL, 86) “...e filho da gente, por mais
que cresça e apareça, é sempre uma plantinha mimosa, sabe como é?” (DL,
50).
CRIANÇA
Há criança e criança. Há vários tipos de criança. “Depende. Há criança e
criança.” (DN, 134).
Obs. Esse tipo de frase feita, com o verbo haver ou sinônimo, seguido de
dois substantivos ligados pela conjunção e, traz a idéia geral de que há duas
espécies de coisas: uma é autêntica e a outra é falsa e desvalorizada.
CRUZ Cruz credo! Expressão de asco ou de esconjuro. “– Mas sem levar o ca-
chorro dos mortos. – Cruz credo.” (DL, 87).
CUCA
Fundir a cuca. Confundir; esquentar a cabeça. “Assim o senhor me funde
a cuca.” (DN, 99) Vide também (DN, 155).
CUCUIA
Ir pras cucuias. Ir para os quintos do inferno; desaparecer. “Boa bisca!
Foi pras cucuias!” (DL, 64).
CUTILIQUÊ
De cutiliquê. De pouca monta; sem importância. “...quando na verdade usa
apenas jóias de cutiliquê, adquiridas na Rua da Alfândega.” (BL, 22).
Obs. É interesse a explicação que J. Ribeiro dá para a origem desta e de
outras expressões, que ele reúne sob o signo da soletração. Entre outras, es-
tuda: cutiliquê; gregotins; ramerrão, ff e rr (ou efes e erres); legalhé; p-a-pa,
santa Justa; e pé por pé. Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 52-57.
DANÇA
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Estranhar a dança. Não entender uma explicação. “– Agradeci, sim se-
nhor, mas estranhei a dança.” (1380).
DAR
Dar a entender. Insinuar. “Dá a entender que sim, ao pé do ouvido, sem se
comprometer publicamente.” (BL, 135).
Dar-se bem. Ser amigo. “...e o caso é que todas se dão muito bem, e são
madrinhas dos filhos umas das outras.” (1006) Vide também (BL, 123).
Dar-se mal. Ser mal sucedido; ter um insucesso. “Este cronista se deu mal ao excursionar pelo jet set para contar o que foi o jantar dos...” (BL, 21) Vi-
de também (DL, 103).
Dar uma de. Imitar; agir como se fosse o imitado. “Sem essa, vê lá se va-
mos dar uma de turista.” (1440).
Deu o que tinha de dar. Produziu tudo que pôde, ou o máximo que pôde.
“O Sr. Olavo Bilac... também deu o que tinha de dar; é bananeira que já
deu cacho.” (1006).
Não dar para entender. Estar confuso. “Não dá para entender.” (DL, 69).
Para dar e vender. De sobra; com muita fartura. “Há Joões Brandões para
dar e vender, do lado de lá e do lado de lá e do lado de cá do Atlântico.”
(DL, 16).
Para o que der e vier. Disposto e em condições de enfrentar a situação; sem reservas. “...compreendeu que devia obedecer, abrindo uma segunda
porta, esta invisível, para o que desse e viesse.” (DL, 8) Vide também (DL,
118).
Pouco se me dá. Pouco me importa; indiferentemente. “Quando a ele me
imortalizar, mesmo discretamente, isto é, por 150 ou 500 anos, pouco se me
dá.” (1439).
DECLARAR
Nada ter a declarar. Não estar disposto a dar informações, nem interessa-
do. “Nada tenho a declarar. Não há verba.” (DL, 68).
DEDO
Ficar cheio de dedos. Com medo; com muita cerimônia ou burocracia. “E
o banco, associado à companhia, fica cheio de dedos para falar com ela.”
(DL, 127).
DESAFORO
Não levar desaforo pra casa. Revidar imediatamente a ofensa ou agressão.
“Não levo desaforo para casa.” (DL, 68).
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DEUS
Deus me livre. Forma de esconjuro que corresponde a cruz credo. “ – Co-
mo? Quer dizer que ele morreu? – Deus me livre.” (BL, 47).
Deus sabe. Só Deus sabe; ninguém sabe. “...mas a idéia de subir ao cocu-
ruto do Pico (ou Bico) do Papagaio se implantara nelas, Deus sabe por quê.”
(1439).
Quando Deus é servido. Na hora certa. “Chega-se quando Deus é servido,
quando possível – e nem sempre é possível.” (982) “...pagaria quando Deus
fosse servido – e Deus foi servido um ano depois.” (OC, 921). Que Deus tenha. Expressão de reverência usada ao se nomear um falecido
de saudosa memória. “...por sinal que meu pai, que Deus tenha, era tratado
de Paquerinha pelos íntimos.” (1325) Vide também (BL, 98).
Se Deus ajudar. Provavelmente; se Deus quiser. “Se tudo der certo, né, e
se Deus me ajudar.” (DL, 67).
Se Deus quiser. Certamente; se Deus ajudar. “Acaba daqui a pouco, se
Deus quiser.” (DL, 14) Vide também (DL, 66).
Vá com Deus! Vai com Deus! Forma de despedida piedosa de quem fica
para quem fica para quem sai, à qual se responde, normalmente: fica com
Deus também! “- Vá com Deus!” (1318).
DEUS-ME-LIVRE Morar no deus-me-livre. Morar em lugar de difícil acesso. “Afinal o caso
não se passa comigo, que não tenho quintal nem moro no deus-me-livre.”
(DL, 137).
DIA
Dia de São Nunca de tarde. Nunca; jamais; dia 30 de fevereiro. “Mas até
aí morreu o Neves, e não foi no Dia de São Nunca de tarde: foi vítima de
pertinaz enfermidade...” (1321).
Estragar o dia (alguém) . Causar grande aborrecimento ou preocupação.
“– Agora não adianta, você estragou o meu dia.” (DL, 77).
Lá um belo dia. Num certo dia. “...pois há afetos que lá um belo dia, aliás um péssimo dia, explodem em tragédia, pelo menos em vergonha pública.”
(1457).
Lá um dia. Lá um belo dia. “...lá um dia assinou um gordo cheque e decla-
rou fundada a academia gonçalvina.” (1107).
Mais dia menos dia. Não tardará muito; está perto o dia em que. “...e a in-
fluência que, mais dia menos dia, o fato há de produzir em benefício da cul-
tura...” (1004).
49
Não há nada como um dia depois do outro. A melhor coisa que existe é se-
gurança sobre o futuro. “...‘não há nada como um verão depois do outro,
para refrescar este agora...” (BL, 141).
Obs. O cronista não usou o provérbio do verbete, mas criou um antiprovér-
bio correspondente a ele.
Um dia a casa cai. Não há bem que sempre dure nem mal que nunca se cu-
re. “Fraqueza de mulher, doutor. Um dia a casa cai.” (BL, 58).
Um dia é da caça e outro é do caçador. Frase com que se tenta consolar
alguém que não se deu bem no seu negócio. “Um dia é do caçador e outro também.” (1379).
Obs. Note-se que Drummond, ao criar um antiprovérbio, faz uma crítica
sócio-política ao regime capitalista.
DIABO
O diabo que o carregue. Qualquer coisa que não se deseja nomear; coisa
desagradável e que se odeia. “Dia do Poeta é um só, o resto do ano é todo
dos milicos, das multi, do imposto de renda e do diabo que o carregue!”
(BL, 166).
Pobre diabo. Pessoa sem prestígio social; João Ninguém; infeliz; miserá-
vel. “Picasso assina falsos Picassos por blague ou para ajudar pobres dia-
bos.” (1342) “Perceberam que somos uns pobres-diabos.” (BL, 197). Vá para o diabo. Vá para o inferno. “...pois para o diabo vá a razão quando
o futebol invade o coração.” (BL, 79).
Vá para o diabo que o carregue! Vá para o inferno; suma-se. “Te arrene-
go! Vá para o diabo que o carregue.” (DL, 63) “Mas se a gente não fizer is-
so, baseado no meu sistema universal do avessismo dinâmico, iremos todos
pro diabo que carregue, e então...” (BL, 67).
DITO
Dar o dito por não dito. Não levar em consideração o que foi falado ou
combinado anteriormente. “Dá o dito por não dito. Darei então o não dito
por dito.” (1424). Ficar o dito por não dito. Ignorar-se o combinado ou acertado verbalmen-
te; passar uma esponja em tudo. “E na variação, fica o dito por não dito.”
(DL, 69).
DIZER
Até dizer chega. Até atingir o limite máximo; ao máximo. “Agora, a 15
minutos de lancha de Salvaterra, dê uma olhada em Soure, isto sim, nomi-
nho portuga até dizer chega...” (BL, 171) “Dirá 2 milhões, dirá até dizer:
chega.” (DL, 70).
50
Digo e repito. Insisto; mantenho o que disse. “A menos que o convicto (ou
teimoso) diga: ‘Digo e repito’.” (DL, 69).
Dize-tu direi-eu. Bate-boca; discussão. “...lance uma contradita, passando
os dois a renhir em dize-tu direi-eu.” (DL, 70).
Dizer bem com. Ficar bem para; combinar com; estar de acordo ou em con-
formidade com. “O azul diz bem com a tua pele, minha querida: observa-
ção tranqüilizadora para a mulher que está pensando em encomendar um
vestido azul.” (DL, 70).
Dizer coisa com coisa. Ser coerente no que diz.”...deve assumir não só em lirismo como também na vida social, dizendo coisa com coisa e adotando o
lema pão-pão queijo-queijo.” (DL, 29).
Eu não disse? Expressão com que se assinala o acontecimento de algo pre-
visto. “Eu não disse? Repete.” (1379).
Não dizer coisa com coisa. Fazer declarações desencontradas, criando con-
fusões; se incoerente quanto ao que diz. “...o Inconsciente Coletivo, que,
visivelmente alcoolizado, não disse coisa com coisa...”
Não me diga. Expressão de encantamento ou surpresa, freqüentemente usa-
do em sentido irônico. “– Tou vendo. Mas olha aí. Mesmo com gravador,
o material ainda está faltando. – Não me diga.” (DL, 96).
Não ser lá que digamos. Não merecer destaque; não merecer elogios.
“Muito do que se diz em louvor disso ou daquilo, em confronto com a reali-dade, pode suscitar o bocejo em forma de frase: Não é lá para que diga-
mos.” (DL, 70).
Não ter nada a dizer. Não há novidade que deva ou possa ser dita. “Em
verdade, em verdade vos digo que hoje não tenho nada a dizer.” (DL, 70).
Não vá dizer que. Já se pode adivinhar que vai dizer que. “Não vá me dizer
que ela é sua cunhada.” (DL, 68).
Nem me diga. Nem precisa dizer, pois estou farto de saber. “Nem me di-
gam que o rol está errado, pois as pessoas anunciam...” (DL, 92).
O que é mesmo que eu estava dizendo? Expressão que se usa ao retomar
um assunto interrompido, para que interlocutor abandone a digressão e volte
ao tema em questão. “...apelando para fórmulas: ‘como eu ia dizendo...’ ‘O que é mesmo que eu estava dizendo?...’” (DL, 69).
Por assim dizer. Pouco mais ou menos; quase; digamos. “Os traços subsis-
tiram, mas a espécie nasceu, por assim dizer, errada, e tende a acabar.”
(1113) “A câmara esboça aqui uma compatibilização, por assim dizer, do
elemento vegetal com o humano.” (970) Vide também (1131).
Por isso que eu digo. Estou certo em dizer; insisto em dizer. “Por isso que
eu digo: devemos amar os animais, e não maltratá-los de jeito nenhum.”
(DN, 102).
51
Por que não dizer? Diga-se; é melhor que se diga; por que negar? “Pouco
importa que alguns crítico menos inclinados à justiça, e mesmo – por que
não dizê-lo?...” (1004).
Quem diria? É uma surpresa; ninguém imaginava. “Augusto, quem diria?’
(DL, 25) “...a Virgínia, hem? quem diria, aquela santinha nunca me enga-
nou, pois há afetos...” (1457).
Quem disse que? Expressão de realce, numa pergunta que pretende sugerir
uma resposta negativa. “...para pegar docemente no queixo da moça, quem
disse que o queixo cedeu?”
DOCE
Acabou-se o que era doce. Acabou a sopa; expressão com que se indica o
fim de uma situação cômoda e agradável. “...três feriados! E daí, mais na-
da, acabou-se o quer era doce.” (1103).
DOIDO
Ser doido por. Gostar muito de; ter grande atração por. “– Pois eu sou doi-
do por chá.” (1303).
DÓLAR
Dólar furado. Coisa sem valor ou de valor insignificante. “Se as malhas do processo chegarem até a nós, não dou um dólar furado pelo segundo manda-
to do Mr. Nixon.” (1397) Vide também (DN, 22).
DOR
Dar dor de cabeça. Aborrecer. “Há também uns casos de corrupção que
começam a me dar dor de cabeça.” (1347) “Ele só nos tem dado dor de ca-
beça...” (DL, 27).
DOSE
Dose para leão. Exagero; que passa dos limites. “...essa eu acho dose para
todos os leões do Simba Safári de São Paulo.” (DL, 27).
DOUTOR
Doutor de mula ruça. Charlatão. “...ia-se ver, debaixo de tanta farofa era
um doutor de mula ruça, um pé rapado, que espiga!” (1320).
DURO
Dar duro. Trabalhar muito, em serviço prolongado ou fatigante. “Na sua
idade eu já dava duro e ajudava em casa.” (1202) Vide também (1447;
1259).
52
EIRA
Sem eira nem beira. Muito pobre. “Sem eira nem beira.” (DL, 68).
EIXO
Entrar nos eixos. Ajustar-se; voltar ao bom funcionamento. “Em todo ca-
so, não lhe parece que respondida a grande pergunta... tudo entrará nos ei-
xos?” (1272) Vide também (DL, 117).
EMBIRA
Na embira. Sem dinheiro; em dificuldades financeiras. “...acabava na rua
da amargura, lá encontrando, encafifada, muita gente na embira, que não ti-
nha nem para matar o bicho; por exemplo, o mão-de-defunto.” (1320).
ENCARAMUJADO
Encaramujado em si mesmo. Fechado em si mesmo. “O indivíduo encara-
mujado em si mesmo lutava com o escritor socializante...” (931).
ENGANAR
Se não me engano. Acredito que; penso. “– Perdi a conta. Quatro ou cin-
co, se não me engano.” (BL, 74).
ENXERGAR
Você não se enxerga? Repreensão a alguém que ousa algo que está além de
sua posição. “Você não se enxerga?” (DL, 66).
ESCANTEIO
Botar pra escanteio. Desprezar; não dar a devida atenção. “Quando a gen-
te é modesta demais, botam pra escanteio.” (BL, 41).
ESCARRADEIRA
Saber cuspir dentro da escarradeira. Disfemismo que exprime a idéia de uma educação apurada; saber portar-se com elegância refinada. “Havia os
que tomaram chá em criança, e, ao visitarem família da maior consideração,
sabiam cuspir dentro da escarradeira.” (1319).
ESPERAR
Espere e verá. Você não perde por esperar; mais cedo ou mais tarde rece-
berá o que merece. “Da próxima espere e verá.” (DL, 22).
53
Quando menos se espera. Exatamente quando não parecia ser o momento
adequado; inesperadamente. “Quando menos se espera... Você pega um
táxi, manda tocar para...” (BL, 69).
Ser de se esperar. Ser previsível. “Era de se esperar.” (DL, 72).
ESPINHA
Curvar a espinha. Humilhar-se; reconhecer a superioridade de alguém.
“Perdemos o sono e o sentimento da nossa orgulhosa integração na cidade,
pois toda a cidade curva a espinha sob essa visita errante...” (1145).
ESPONJA
Passar uma esponja. Esquecer o que se passou; não se falar mais em. “Ele
prometeu passar uma esponja no acontecido, propôs que se estabelecesse
frente única diante da alça de mira.” (1269).
ESQUINA
Ali na esquina. Em toda parte. “Hoje estão ali na esquina para consumo
geral.” (1409).
ESSA
Essa é boa. Expressão pejorativa que indica insatisfação. “...essa é muito boa, então a gente tem que provar que nasceu, eu que estou viva...” (1447)
Vide também (1449).
Ora essa. Ora sebo; ora bolas. “Volto, ora essa, juro que volto, meu amor.”
(1222) “...disca de novo, mas quer falar é com o Nosso Bar, ora essa.”
(1170).
Por essas e outras. É por isso; por coisas semelhantes. “– Por essas e ou-
tras é que só moro em casa, e casa térrea, sem escada, pra não dar grilo.”
(1402).
Sem essa. Discordo; jamais. “Sem essa, vê lá se vamos dar uma de turista.”
(1440) “Eu descer porque estou suado? Sem essa.” (DN, 33) Vide também
(1339; DN, 62).
ESTRIBEIRA
Perder as estribeiras. Desnortear-se; descomedir-se; praticar despropósi-
tos. “Daí se perder as estribeiras por uma tutaméia, um alcaide que caixeiro
nos impingia...” (1320).
EVA
Como Eva é servida. Nua. “...é porque uma onda mais velhaca pode deixar
a gente como Eva é servida...” (DN, 25).
54
EXPRESSÃO
Se me permite a expressão. Com licença da má palavra. “Premiados, en-
tram pelo cano, se me permite a expressão.” (DL, 6).
FACA
Com a faca e o queijo na mão. Com amplo poderes; com todos os recursos
necessários para a realização de uma tarefa. “Bom era ter costas quentes,
dar as cartas com a faca e o queijo na mão...” (1320) “Eu não era governa-dor, não estava com a faca e o queijo na mão?” (CB, 106).
FALTAR
Não faltava mais nada. Expressão de descontentamento ao se constatar um
fato lamentável. “Não faltava mais nada!” (DL, 64).
FAMÍLIA
Acontece nas melhores famílias. É muito natural; não é motivo para se
amofinar. “Um dia, seus queridos bisnetos farão o mesmo. Acontece nas
melhores famílias.” (1384).
FAVOR Nem contra nem a favor, muito antes pelo contrário. Desejo de não opinar;
abstenção. “Nem contra nem a favor do divórcio, muito antes pelo contrá-
rio.” (DL, 68) “Mônica, você fica encarregado de tomar nota dos votos
iguais aos de Peter: nem contra nem a favor, antes pelo contrário.” (1364).
FAZER
Não fazer por menos. Não ceder; não diminuir o preço. “É da lei não escri-
ta, homem ficar emburrado e não fazer por menos.” (BL, 54) “...e as convi-
dadas não faziam por menos em toaletes que atestavam o talento de costu-
reiras...” (BL, 20).
Não se fazer de rogado. Sem cerimônias; aceitar imediatamente um convi-te. “Curió não se fez de rogado, e o vizinho adotou o figurino.” (1190).
Não se fazer num dia. Ser muito demorado. “A famosa Reforma de Lutero
não se fez num dia, ele levou tempo para...” (BL, 203).
Que se há de fazer? Expressão de resignação. “ – Que se há de fazer? São
os ossos do barão.” (1429).
Ter mais que fazer. Estar ocupado; não estar disponível. “Tenho mais que
fazer.” (1191) “E se o atacante tiver categoria, não ataca, pois tem mais que
fazer.” (1184).
55
FÉ
Dar fé de si. Perceber; notar; ver. “Quando dei fé de mim, estava dentro do
Opala 73 e recebia o cumprimento respeitoso do chofer...” (DN, 12).
FEDER
Não feder nem cheirar. Ser ou ficar indiferente; não interessar. “Não fede
nem cheira.” (DL, 68).
FEIO Fazer feio. Errar num cerimonial; fazer fiasco; dar uma mancada. “Passou
a noite, infeliz, pensando nos paulistas, ele mineiro fazendo feio ao lado dos
paulistas, sempre os paulistas.” (1252).
FEITIO
Não ser do feitio (de alguém) . Não ser hábito; não estar afeiçoado a. “Não
é do meu feitio e, mesmo, Deus me livre de fazer uma coisa dessas.” (1219).
FEITO
Bem feito! Expressão de satisfação por um mal ocorrido a outrem. “Não
disse: bem feito, porque não sou de gozar a tristeza dos outros.” (DL, 83).
FESTA
Em festa de jacaré, inhambu não entra. Galinha não faz negócio com rapo-
sa; os pequenos ou fracos devem ficar longe dos negócios dos grandes, for-
tes ou poderosos. “ – Em festa de jacaré... – Não entendi. – Inhambu não
entra, o senhor não sabia?” (1400).
FICAR
Fiquemos por aqui. Basta. “Fiquemos por aqui, você e eu habitando em
pensamento as ilhas que afloram em Minas...” (BL, 51).
Não ficar bem. Ficar mal; ter repercussão negativa. “Essas coisas não lhe
ficam bem, meu filho.” (1180). Não ficar mal. Ficar bem; ter boa acolhida; agradar. “Cadeira de balanço é
móvel de tradição brasileira, que não fica mal em apartamento moderno.”
(1225) Vide também (1010).
FIGA
Fazer figa. Esconjurar; fazer cruzes a. “Não ligue. Faça figa. – Eu faço,
mas adianta?” (DN, 91).
FILHO
56
Os filhos da Candinha. Boateiros; fuxiqueiros; candongueiros. “O Diacho
eram os filhos da Candinha: quem somava a candongas acabava na rua da
amargura...” (1320).
FIM
Ser o fim da picada. Ser inacreditável, horrível, impossível. “Que vergo-
nha, meu Deus do céu! É o fim da picada!” (DL, 64).
FLOR Não ser flor que se cheire. Ser desaconselhável; ser indesejável ou cheio de
defeitos. “É uma flor... que se cheire?” (1317).
FOGO
Com fogo não se brinca. Evitem-se as coisas perigosas; não ponha a mão
em boca de lobo. “ – Eu? Absolutamente. Apenas prevenindo que com
fogo não se brinca.” (DL, 127).
Obs. Brincar com fogo é deliciar-se em aventuras perigosas.
FORA
Dar o fora. ir-se embora; raspar-se; sair. “Dê o fora depressa antes que eu
chame meu marido!” (1229) Vide também (1240).
FREGUESIA
Ir pregar em outra freguesia. Ir pentear macacos; ir procurar o que fazer.
“E se levavam tábua, o remédio era tirar o cavalo da chuva e ir pregar em
outra freguesia.” (1318).
FRENTE
Nada de novo na frente ocidental. Sem novidades; tudo como dantes no
quartel de Abrantes. “Nada de novo na frente ocidental.” (DL, 68).
FRIA Entrar numa fria. Fazer um mau negócio; ser enganado; meter-se em en-
crencas. “Sabia de experiência própria que passageiro nenhum quer entrar
numa fria.” (DN, 32).
FRITO
Estar frito. Estar em apuros. “Se eu sou mesmo, estou frito.” (1267).
FUMAÇA
57
E lá vai fumaça. E tarará; e tantos; um bom número. “Aos sessent’anos –
sessenta e lá vai fumaça – nada, corre, entra em pelada, monta, joga vôlei...”
(BL, 74).
Tirar uma fumaça. Fumar um pouco; tirar um trago. “Sei o que é um fu-
mante inveterado, impedido de tirar uma fumaça.” (BL, 32).
Virar fumaça. Desaparecer; evaporar-se. “Sumo! Viro fumaça!” (DL, 46).
FUTURO
O futuro a Deus pertence. Ninguém deve comprometer o futuro; só o pre-sente é certo. “– Já sei. O futuro a Deus pertence.” (1267).
GABAR
Não é por me gabar. Embora eu não queira me exibir. “Mas fala a seu
modo, desde que eu saiba interrogá-lo, e eu, não é por me gabar, tenho meus
macetes.” (DN, 133) Vide também (DN, 170).
Não é pra me gabar. Sem exibicionismo. “Meu filho, não é pra me gabar,
mas é uma lindeza...” (1446) Vide também (BL, 43; DL, 125).
GALHO
Quebrar o galho. Dar um jeitinho. “Eles vão me quebrar esse galho.”
(1226) “...quem sabe se esse banqueiro não quebraria o galho da firma?” (CB, 75) Vide também (DN, 140; 1190).
GALO
Ouvir cantar o galo, mas não saber onde. Interpretar mal uma informação;
não ouvir direito ou não entender bem. “Alguns ouviam cantar o galo, mas
não sabiam onde.” (1319).
GAMBÁ
Comer gambá errado. Equivocar-se; tomar uma coisa por outra; comer ga-
to lebre. “Que sarro! Comeu gambá errado!” (DL, 64).
GATA
Não poder com uma gata pelo rabo. Ser ou estar muito fraco; estar sem re-
cursos. “ Não pode com uma gata pelo rabo.” (DL, 68).
GATO
O gato comeu. Desculpa de quem deu fim a alguma coisa e não quer se
confessar; maneira de dizer que sabe quem deu fim a algo, mas não deseja
delatar. “Não há mais nada? Havia; mas o gato comeu (e ninguém viu o
gato) .” (OC, 591).
58
Fazer de gato-sapato. Fazer gato e sapato de alguém; menosprezar; maltra-
tar; aproveitar de. “Qualquer um acabava enjerizado se lhe chegava a urtiga
ao nariz, ou se faziam de gato-sapato.” (1320).
GENTE
Desde que me entendo por gente. Há muito tempo; desde que tomei consci-
ência deste mundo. “Nunca a vi desde que me entendo por gente, e do tem-
po de garoto não guardo a menor lembrança dela.” (1188).
GERAÇÃO
Gerações e gerações. Muitas gerações. “Nos parques municipais, gerações
e gerações de namorados gravam no lenho indiferente...” (969).
Obs. Neste caso, a repetição é um recurso para indicar quantidade. Em
nossa língua, a repetição tem inúmeras funções, podendo indicar também
intensidade, modo e várias modificações de sentido da palavra repetida.
GIBI
Não estar no gibi. Ser inédito; ser inesperado; ser incrível ou maravilhoso.
“Não está no gibi.” (DL, 68).
GRAÇA Com a graça de Deus. Graças a Deus. “Detesto isso, minha formação é
cristã, com a graça de Deus.” (BL, 211).
GREGOS
Gregos e goianos. Todos; amigos e inimigos. “O chofer de V. Exa. pas-
sou a ser assediado por gregos e goianos...” (1096).
Obs. O espirituoso antiprovérbio drummondiano é uma sátira bem sutil aos
bajuladores em geral.
GRILO
Dar grilo. Criar confusão; azarar. “Por essas e outras é que só moro em ca-sa, e casa térrea, sem escada, pra não dar grilo.” (1402) “Mas se o senhor fi-
zer isso não bota o meu nome no meio, porque vai dar grilo.” (DN, 98).
Ouvir grilo. Sem dormir; com insônia. “Eu tinha tomado pervitim para va-
rar a noite guiando, e agora ia passar toda essa madrugada de olho aberto,
ouvindo grilo.” (1178).
GUERRA
Guerra é guerra. Na guerra, o feio é perder; na guerra, os fins justificam os
meios. “Guerra é guerra, greve é outra coisa, e a minha é outríssima.” (BL,
59
149) “...daqui a pouco você inventa carregar banheirinho plástico, torradei-
ra, essas coisas. Guerra é guerra.” (1440).
HAVER
Haver por bem. Decidir; achar melhor. “...e cujo proprietário houvera por
bem confiar à guarda deste amador das artes acima de qualquer suspeita?”
(DN, 21) Vide também (1407).
Não haver nada a tirar nem pôr. Estar ou ser perfeito. “Na realidade, tra-
vamos conhecimento com Edival quando o seu destino está consumado e perfeito, e não há nada a tirar nem pôr na sua vida.” (OC, 586).
HORA
Cheio de nove horas. Metido a besta; vaidoso; cerimonioso. “Às vezes,
sem tirte nem guarte, aparecia um doutor pomada, todo cheio de nove ho-
ras...” (1320).
De hora em hora Deus melhora. As coisas estão melhorando. “De hora em
hora Deus vai simbora.” (1379).
Obs. Neste antiprovérbio, Drummond parece indicar o que está causando
tantos males em nosso tempo.
Horas e horas. Durante muitas horas; horas a fio. “– Se prolonga por horas
e horas e não se esgota...” (OC, 873). Na hora de acertar os ponteiros. Na hora do acerto; no momento de pôr tu-
do em pratos limpos. “...se na hora de acertar os ponteiros você me vem
com essa história de que amor não deve ser objeto de contrato...” (DL, 36).
Quando soar a hora. Na hora agá; na hora da verdade. “Quando soar a ho-
ra de oficializar a composição do Governo, aí você chama os que tiver de
chamar.” (BL, 135).
Soar a hora da verdade. Estar na hora agá. “Soou a hora da verdade? E
que mais?” (DL, 65).
Vinte e quatro horas por dia. Todo o tempo. “...dor de não ocupar o seu
pensamento 24 horas por dia, e...” (DL, 90).
IDA
Nas idas e venidas. Nas andanças; nas idas e vindas. “Nas idas e venidas
em busca da moça carregava comigo o objeto embrulhado.” (1154).
IMPORTAR
Que bem me importa. Não tem importância. “...o moço não disse mas fa-
lou consigo mesmo, que bem me importa se ela não quer mais me beijar, eu
beijo outras...” (BL, 54).
60
INÊS
Se Inês é morta. Se o momento oportuno não foi aproveitado; se não adian-
ta mais nada; se o prejuízo é irreversível. “...aliás extinta, do Rio de Janei-
ro, para implicar com a indústria imobiliária nem seria mais tempo de fazê-
lo, se Inês é morta.” (DN, 23).
Obs. Esta frase é alusiva à revolta ou insatisfação popular causada pela
morte de Inês de Castro, assassinada pelo crime de ter amado seu Rei.
INFERNO Vá para o inferno. Suma-se; vá para o diabo que o carregue. “ – Quero que
o senhor vá para o inferno, sim?” (1334) “E seu marido? Vá tudo para o in-
ferno.” (1363) Vide ainda (1250).
IR
Ou vai ou racha. Não haverá mais paliativos; é o último recurso. “Pra
frente, Brasil! Ou vai ou racha!” (DL, 63).
Vá lá. Pode ser; admita-se. “Vá lá, pode derrubar ainda umas três ou qua-
tro, de pinga.” (DN, 114) Vide também (BL, 196).
Vamos e venhamos. Convite à reflexão, ao raciocínio. “...que o rótulo per-
tence a Gonçalo Fernandes Trancoso, e daí, vamos e venhamos, por que es-
sa mania de...” (DL, 19).
ISSO
É isso aí. Tudo bem; certo. “É isso aí. Te telefono amanhã, tá?” (1430) “É
isso aí: ninguém aprende mais nada na escola...” (DL, 71) Vide também
(DL, 94).
Lá isso é. Isso é verdade. “A gente tá em 1980, pô. – Lá isso é.” (BL, 42).
Não seja por isso. Não há por quê; tudo certo; tudo bem. “ – Não seja por
isso, meu poeta.” (BL, 164).
Não ser bem isso. Rigorosamente, não; apenas em parte. “Não é bem isso,
Inácio. Você não entendeu o meu ponto de vista.” (DL, 76).
ISTO
Lá isto é. Isto é verdade. “Lá isto é, ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou...” (DL, 67).
Lá isto é verdade. Sem dúvida; é verdade; isto é verdade. “Se cogitarmos...
já se sabe: nada feito. – Lá isto é verdade.” (1454).
JÁ
Já não se... como antigamente. As coisas modernas estão falsificadas; falta
autenticidade nas coisas de hoje. “Já não se comem broas de fubá como an-
61
tigamente!” (DL, 64) “Já não se pode mais andar como antigamente.” (BL,
151).
JABUTICABA
Não vale a pena chupar a jabuticaba dos outros. O alheio procura o seu
dono; o que é do homem o bicho não come. “Não vale a pena chupar a ja-
buticaba dos outros.” (1316).
JEITINHO Dar um jeitinho. Improvisar uma solução de última hora. “Espere um
momento, que dou um jeitinho.” (BL, 195).
JEITO
Dar-se um jeito. Dar um jeitinho. “O estatuto não permite, mas dá-se um
jeito.” (1110) Vide também (1156; 1450).
Do jeito que vão as coisas. Assim; desta maneira. “ – É mesmo. Do jeito
que vão as coisas temos de voltar ao suspensório.” (BL, 101).
JOGADA
Entrar na jogada. Aceitar uma situação; participar de um negócio; enten-
der. “Olhe, poeta, um conselho: não entre nessa jogada das cartas de Virgí-nia.” (1461) “Desculpe ter custado um pouco a entrar na jogada.” (1450)
“Melhor você não dar uma de contestadora, e entrar na jogada.” (DN, 133)
Vide ainda (1431).
JOSÉ
E agora, José? Já decidiu? Qual é a tua, bicho? “E agora, José? Por bem
ou por mal, vai dizer que horas são?” (DL, 66) “...botou as mãos na cabeça:
– E agora, José?” (1314) Vide também (1167).
JUDAS
Onde Judas perdeu as botas. Onde o vento faz a curva; cafundós do Judas; calcanhar do Judas; lugar pouco habitado e de difícil acesso. “...contavam
tudo tintim por tintim e iam comer o pão que o diabo amassou, lá onde Ju-
das perdeu as botas.” (1319).
JUIZ
Não haver mais juízes em Berlim. Só há justiça para alguns privilegiados; a
justiça já não é garantida para todos. “Não há mais juízes em Berlim.” (DL,
68).
62
LASCAR
Ser de lascar. Ser profundamente desagradável, ou irritante, ou decepcio-
nante; ser dos diabos. “É de lascar. Essa não!” (1379) Vide também (DL,
63).
LATA
Levar a lata. Receber resposta negativa a um pedido de casamento. “...pois
isso evitava levar lata, ficar na pindaíba ou espichar a canela antes que Deus
fosse servido.” (1320).
LATIM
Perder o seu latim. Explicar para quem não irá entender; sacrificar-se inu-
tilmente. “Mas quem escreveu, coitado! Esse perdeu o seu latim, como se
diz.” (1172).
LEITE
Defender o leite das crianças. Trabalhar; ganhar dinheiro; procurar garantir
lucro. “Então continuo nesta de defender o leite das crianças...” (BL, 63)
Vide ainda (BL, 61; BL, 61).
Esconder o leite. Ocultar alguma coisa; fingir que não sabe. “– Esconden-
do o leite, hem? Sabidão!” (DN, 14).
LELÉ
Lelé da cuca. Gira; doido; maluco. “Podia continuar toda vida neste papo,
mas desconfio que o leitor já está me achando lelé da cuca.” (1384).
LENÇO
Sem lenço e sem documento. Totalmente desprevenido; sem o mínimo con-
forto. “...e sai por aí, sem lenço e sem documento, mandando brasa.”
(1352) “Sem destino. Sem lenço nem documento.” (DL, 68).
LETRA Tirar de letra. Resolver com muita facilidade um problema. “Os caras que
têm ensino tiram de letra nas provas.” (1400) “Se me contratarem eu tiro de
letra.” (BL, 42) Vide também (BL, 74).
LEVAR
O que é que eu levo nisso? Qual seria a minha recompensa? “O que é que
eu levo nisso, me diga?” (DL, 66).
LIGAR
63
Nem te ligo. Demonstração de total desinteresse pelos acontecimentos.
“Alguém braceja entre as ondas, desesperadamente. O salva-vidas, de cos-
tas para o mar, nem te ligo.” (DN, 23) “O moço (pois ostentava barba e ca-
beleira amazônica, sinais indiscutíveis de mocidade, nem-te-ligo.” (DN,
31).
LÍNGUA
Dobrar a língua. Ter mais respeito ou reverência. “Antigamente, os pirra-
lhos dobravam a língua diante dos pais e se um esquecia...” (1320) “Dobre a língua antes de pronunciar o nome de Madame Elzevir.” (BL, 216).
LINHA
Tirar uma linha. Chegar a alguma conclusão; reparar em uma pessoa. “Fa-
lecido não manda. – Pelos discursos a gente tira uma linha.” (BL, 216).
LIRÓ
Todo liró ao copo d’água. Todo emperiquitado; todo enfeitado. “O verda-
deiro smart calçava botina de botões para comparecer todo liró ao copo
d’água, se bem que...” (1320).
LOCA Por locas e bibocas. Por toda parte. “Que a alma do padrinho Padre Cícero
te acompanhe por locais e bibocas do mundaréu...” (DL, 89).
LONA
Na última lona. Sem nenhum dinheiro; em petição de miséria. “É, esse es-
tá mesmo na última lona, e dói ver a lenta agonia de um ser tão gracioso,
que viveu para cantar.” (1234).
LUGAR
Ter seu lugar ao sol. Ter sua posição garantida. “Só? Não. Têm seu lugar
ao sol a metalinguagem, o servomecanismo, as algias...” (1409). LUZ
À luz da razão. Logicamente; racionalmente. “Além do mais, os conceitos
estabelecidos lucrariam em ser revistos à luz da razão.” (1407).
À luz do dia. Às claras; sem subterfúgios. “O fato de não produzir não é o
mais grave, e tolera-se no asfalto e na praia, à luz do dia...” (BL, 86).
MACACO
Macacos me mordam. Espécie de juramento. “Macacos me mordam se es-
tou pregando peta.” (1320).
64
MAL
Não há mal que sempre dure. Todos os sofrimentos terão um fim. “Não há
mal que sempre dure.” (DL, 68).
MANDAR
Mandar e não pedir. Ser autoritário. “Puxa, mas você é mesmo o Impera-
dor Augusto em pessoa. Manda e não pede.” (DL, 36).
MANTA
Passar manta. Lesar em negócios. “Encontravam alguém que lhes passava
manta e azulava, dando às de Vila-Diogo.” (1318).
MÃO
Abrir mão de. Desistir; não dar importância; abandonar. “Pode-se abrir
mão da analogia ou da sugestão...” (1312) “Abro mão de direitos autorais,
não da co-autoria.” (1461) Vide também (1052).
Agüentar a mão. Ter paciência; ser tolerante. “...enfim, que agüentasse a
mão, mesmo que isso fosse uma tremenda mão-de-obra...” (DL, 139).
Botar a mão na consciência. Pensar bem antes de agir. “...não desejava
meter a mão em cumbuca, e exortou-me a botar a mão na consciência...” (DL, 139).
Botar a mão no fogo (por alguém) . Defender os atos de determinada pes-
soa, responsabilizando-se por sua lisura; ter confiança cega em alguém. “Se
porventura cair (não boto a mão no fogo por ele), a causa que os senhores
peritos deverão pesquisar...” (1157).
Botar as mãos na cabeça. Achar-se se situação embaraçosa. “...botou as
mãos na cabeça: – E agora, José?” (1314).
Com uma mão atrás e outra adiante. Em estado de penúria; muito pobre.
“...para que os velhinhos não ficassem de mãos abanando, ou com uma mão
atrás e outra adiante...” (DL, 139).
Dar as mãos à palmatória. Confessar-se vencido; convencer-se de erro. “Dei as mãos à palmatória. De fato, era eu quem iria cintilar na assem-
bléia...” (DL, 139).
Ficar de mãos abanando. Ficar sem nada; ficar com as mãos vazias.
“...para que os velhinhos convidadores não ficassem de mãos abanando, ou
com uma mão atrás e outra adiante...” (DL, 139).
Ficar na mão. Não conseguir o que esperava como certo; decepcionar com
o resultado de um negócio; ficar sem nada. “...não ficassem de mãos aba-
nando, ou com uma mão atrás e outra adiante, ou ainda, para falar mais cla-
ramente, na mão.” (DL, 139).
65
Meter a mão em cumbuca. Ser cauteloso; ser prudente; não arriscar; não se
entregar a aventuras perigosas. “Alegou que para esse tipo de coisas tinha
mão-de-pilão; além disso, não desejava meter a mão em cumbuca.” (1319).
Pôr a mão em cumbuca. Meter a mão em cumbuca. “...os presunçosos
queriam ensinar padre-nosso ao vigário, e com isso punham a mão em cum-
buca.” (1319)
Sujar as mãos em alguém. Esbofetear; dar uns tapas; sentar a mão. “Não
vou sujar minhas mãos em você.” (DL, 68).
MÃO-BEIJADA
De mão-beijada. Sem receber pagamento. “...que tivesse paciência e desse
uma mãozinha, mesmo de mão-beijada, pois...” (DL, 139).
MÃO-DE-OBRA
Ser uma mão-de-obra. Ser muito trabalhoso. “...enfim, que agüentasse a
mão, mesmo que isso fosse uma tremenda mão-de-obra...” (DL, 139)
MÃO-DE-PILÃO
Ter mão-de-pilão. Ter mão pesada; ser rigoroso. “Alegou que para esse ti-
po de coisas tinha mão-de-pilão...” (DL, 139).
MÃO-NA-RODA
Ser uma mão-na-roda. Ser rápido; ser veloz. “...que ela constituiria ele-
mento essencial; que seu concurso seria verdadeira mão-na-roda...” (DL,
139).
MÃOZINHA
Dar uma mãozinha. Auxiliar; prestar um pequeno serviço; dar uma mão.
“...que tivesse paciência e desse uma mãozinha, mesmo de mão-beijada,
pois...” (DL, 139).
MAPA Sumir do mapa. Desaparecer; viajar para lugar ignorado. “Sumiu do mapa.
Esses óculos!” (1341).
MARÉ
Espiar maré. Estar desocupado, sem o que fazer. “ – É verdade que tem
muito carioca,... espiando maré.” (DN, 172).
MARINHEIRO
66
Marinheiro de primeira viagem. Pessoa inexperiente. “Mas logo se verifi-
cava que as pessoas assim descobertas eram, na realidade, a Cláusula Rebus
Sic Stantibus, o Marinheiro de Primeira Viagem e o Cidadão Quase Acima
de Qualquer Suspeita.” (DL, 81).
MATO
Estar no mato sem cachorro. Ficar inteiramente desorientado, em face dos
negócios fracassados ou dos planos frustados; fracassar; sofrer grandes pre-
juízos. “Então ele está no mato sem cachorro – comentou um terceiro.” (1268) “É, não tem saída, não. Estamos no mato sem cachorro.” (1307) Vi-
de também (1443).
MEIO
No meio está a virtude. Nem oito nem oitenta; evitem-se os extremos. “Eu
acho que no meio está a virtude, como gostava de falar o vovô.” (BL, 41).
MEMÓRIA
Se não me falha a memória. Salvo maior engano; parece-me que. “Parar é
regra de ouro (se não me falha a memória) .” (DL, 67).
MINHOCA Tirar minhocas da cabeça. Esquecer certas idéias malucas ou certos planos
perigosos; criar juízo. “ – Vai tirar essas minhocas da cabeça dele?” (1399).
MISSA
Não saber da missa a metade. Desconhecer um assunto; estar mal informa-
do. “Embora sem saber da missa a metade, os presunçosos queriam ensinar
padre-nosso ao vigário...” (1319) “Não sabe da missa a metade.” (DL, 68).
MOLE
Não ser mole. Ser difícil, ruim, desagradável ou complicado. “Eu vou de
travesseiro, dormir no chão de pedra não é mole, hem?” (1440) Vide tam-bém (1436; 1302).
MONTANHA
Já que a montanha não vai até Maomé, Maomé vai à montanha. Se não for
possível a realização de um milagre, façamos o que estiver ao nosso alcan-
ce, dentro de nossa limitação. “Já que a montanha não vai até Maomé (e
quem sou eu para me comparar a Maomé), vou até a montanha.” (DL, 38).
Obs. Cf. MAGALHÃES JÚNIOR, R. (s.d.) p. 198.
67
MULHER
Mulher feia não bebe mas paga. É uma dessas frases com que os camelôs
se anunciam e anunciam suas mercadorias. “...é de toda colidade, mulher
feia não bebe mas paga.” (1352).
Obs. A forma norma da frase é: Mulher (ou moça) bonita não paga mas
também não leva. A paródia pretende castigar as mulheres feias, como se
toda mulher tivesse que ser bonita, ou se feiúra fosse crime.
MUNDO Virar o mundo abaixo. Ocorrer uma catástrofe, um mal irremediável, ou
uma ventania, ou chuva forte, etc. “Tinham-se rompido umas telhas, e o
mundo parecia vir abaixo, derretido em chuva.” (1244).
MÚSICA
Dançar conforme a música. Adaptar-se à situação; mudar de comporta-
mento ou até de objetivos. “Não mudo de alvo? Não danço conforme a
música ou até sem ela e contra ela?” (DN, 99).
NADA
Antes de mais nada. Principalmente; em primeiro lugar. “A nova institui-
ção se recomenda, antes de mais nada, pelo culto à memória de Gonçalves, hoje tão esquecido...” (1107) Vide também (DN, 119; DN, 115; 1157).
De nada. Mínimo ou insignificante. “ – Um objeto de nada.” (BL, 159).
De nada. Não há de quê; forma de responder a um agradecimento. “Mas
agradecer de coração, isso eu poso. – De nada, ora essa.” (BL, 98).
Não ser de nada. Não ter influência; ser uma nulidade; não ter mais força.
“Não é de nada.” (DL, 68) “...pois o Guto não é de nada em matéria de reli-
gião, ele é de outra coisa muito diferente, você sabe qual é.” (DL, 27).
NÃO
Por que não? Sim; é uma boa; é isso mesmo; exatamente. “Apelar para o
Presidente Figueiredo, por que não?” (BL, 16).
NARIZ
Diante do nariz. Debaixo do nariz; diante de si; óbvio. “O homem guarda
esta desconfiança a respeito de fatos ocorridos diante do seu nariz...”
(1078).
Meter o nariz no que não é da conta (de alguém) . Intrometer-se em assun-
tos alheios. “ – Sem querer meter o nariz no que não é da minha conta, gos-
taria que também...” (1450).
68
NASCER
Nascer de novo. Escapar de um grande perigo; recuperar-se de um aciden-
te. “No que eu nasci de novo e nunca mais vi o tipo.” (DN, 7).
NAVIO
A ver navios. Não conseguir o que desejava; dar-se mal. “Antigamente,
certos tipos faziam negócios e ficavam a ver navios...” (1319).
NEGÓCIO Negócio de mãe. Coisa que não dá lucro; trabalho sem importância. “A ve-
lha trate de arranjá-los é negócio de mãe.” (DN, 70).
Que negócio é esse? O que é isso? “Mas que negócio é esse de irmãozi-
nho fotografados na praia...?” (DL, 27) Vide também (1419).
Se o negócio é esse. Se é assim; sendo desta maneira. “Se o negócio é esse,
então tira o absinto e bota caninha.” (DN, 51).
NINGUÉM
Pra ninguém botar defeito. De primeiríssima qualidade; perfeito. “Eu acho
muito positivo esse nosso casamento, foi uma experiência pra ninguém bo-
tar defeito.” (BL, 123).
NÍQUEL
Não compreender níquel. Não compreender patavinas; não compreender
bulhufas; não compreender nada. “Ia retirar-se, sem que o Silva compreen-
desse níquel, mas voltou-se, e rapidamente desfolhou esta confidência...”
(1111).
NÓ
Dar nó até em pingo d’água. Ludibriar a todos; ser muito velhaco. “ –
Quer dizer que ele dá nó até em pingo d’água?” (BL, 75).
NOITE À noite todos os gatos são pardos. À noite, as pequenas diferenças não se
distinguem; é fácil ser enganado à noite. “Quem foi que verificou que à
noite todos os gatos são pardos?” (DL, 65).
Cair a noite. Anoitecer. “Caíra a noite, e, descendo a Rua do Ouvidor, tí-
nhamos em redor de nós...” (990).
NÓS
69
Aqui entre nós. Confidencialmente; discretamente. “– E depois, doutor,
aqui entre nós: a senhora que vai conosco é esposa do...” (1178) “Aqui entre
nós: ela dá pelota?” (DL, 65).
NOSSO SENHOR
Até Nosso Senhor me fechar os olhos. Enquanto eu estiver vivo; até à mor-
te. “Deixa pra lá, sem carteira vivi até hoje, sem ela vou viver até Nosso
Senhor me fechar os olhos.” (1447).
NOTA
Uma nota firme. Muito dinheiro. “ – Mas você descolou uma nota firme
naquela concorrência da ponte de São Luís Rei.” (1429) Vide também
(1438).
NUVEM
Cair das nuvens. Sofrer uma grande decepção. “Caí das nuvens lendo vos-
so relato do jantar chez Sempervírens.” (BL, 23) Vide também (1320).
Passar em branca nuvem. Não ser lembrado; ficar despercebido. “Certos
papais não apreciavam festa de aniversário, a data passava em brancas nu-
vens.” (1312) Vide também (BL, 163).
Pôr nas nuvens. Elogiar; gabar; elevar aos cornos da Lua. “O Inácio tam-bém põe você nas nuvens.” (DL, 75).
Ter lá suas nuvens. Duvidar; não estar seguro de. “Deus te ouça, meu fi-
lho. Mas tenho cá as minhas nuvens.” (DN, 90).
OBRA
Por obra e graça de. Graças à ação ou à participação de. “Não podia dei-
xar de reconhecer, entretanto, que se estabelecera o diálogo entre duas gera-
ções, por obra e graça do ensino.” (1248).
OLHO
Aos olhos de (alguém) . Diante de; perante; na opinião de. “Santos doía-se de ser um objeto aos olhos de D. Laurinha.” (1165) “...e o que se chama vi-
tória aparece aos olhos de todos com uma evidência corporal que dispensa a
imolação física.” (1091).
Aos olhos de hoje. Na opinião geral de hoje. “Esse Rei Congo e essa Rai-
nha Ginga, decorativos, burlescos aos olhos de hoje, mas revestidos de pro-
funda dignidade...” (977).
Bons olhos o vejam. Saudação a pessoa estimada que regressa. “Olalá!
Bons olhos o vejam!” (DL, 64).
70
Botar no olho da rua. Despedir; expulsar; pôr no olho da rua. “E se o se-
nhor me fizer mais uma, já sabe: boto-o no olho da rua.” (DL, 67).
Entrar pelos olhos da cara. Saltar aos olhos; ser evidente. “A lei entra pe-
los olhos da cara do transeunte.” (DL, 113).
Ficar de olho. Não descuidar; estar ou ficar atento. “...onde quer que este-
jas nascendo, fica de olho no futuro, presta atenção nas coisas...” (DN, 5).
Olhar com outros olhos. Observar com espírito desarmado; ver sem malí-
cias. “...eu diria que os moços convidam os pais e, por extensão, os homens
e mulheres de gerações anteriores, a olhar com outros olhos a vida.” (DN, 18).
Olho vivo! Cuidado! Atenção! “Olho vivo! Cavalo não desce escada!”
(DL, 64).
Não pregar olho. Não dormir; ter insônia. “Hoje, não. Nem preguei olho.”
(DL, 68).
Que meus olhos já viram. Conhecido; existente. “...onde hoje funciona o
mais lindo museu que meus olhos já viram.” (992).
ONÇA
Virar onça. Ficar furioso ou violento. “Embora sentido pena, e querendo
ajudar, virava onça.” (1308).
ONDA
Fazer onda. Criar problema. “ – Meu bem, é melhor a gente não fazer on-
da.” (1266).
Ir na onda. Enganar-se; deixar-se enganar; aderir sem pesar bem as conse-
qüências. “Mulher não vai na onda, só tem pena de aleijado e de velhinho.”
(1202) “Que fazer senão ir na onda?” (1379).
ORELHA
Abanar as orelhas. Discordar; não entender. “A todas essas interrogações,
eu continuo abanando as orelhas e...” (OC, 585) “Se ele abanou orelhas di-
ante da primeira advertência da nossa folha...” (996). Coçar a orelha. Demonstrar má vontade; interpor dificuldade. “...um ge-
rente simpático, desses que não coçam a orelha quando a gente propõe uma
reforma de títulos. “ (BL, 73).
OSSO
São os ossos do barão. São os ossos do ofício; são problemas atinentes a
uma atividade ou profissão. “ – Que se há de fazer? São os ossos do ba-
rão.” (1429).
71
OUTRA
Partir para outra. Dar por terminada uma tarefa ou uma etapa de uma ati-
vidade. “Por que, em vez disso, não parte para outra?” (BL, 47).
OUTRO
Como diria o outro. Como se supõe ou diz supor que alguém diria, se esti-
vesse na mesma ou idêntica situação. “Não creia ainda em quem lhe diz al-
guma coisa, precedida de: ‘Como diria o outro.’ O outro não diria aquilo.”
(DL, 70). Como diz o outro. Maneira de não assumir totalmente o que diz: “Tudo in-
dica que o Outro é cúmplice de quem diz: Como diz o outro.”
Como nenhum outro. Melhor que todos os outros. “No seio de uma gente...
como nenhuma outra, com as dores do mundo, no desejo de interpretá-las e
leni-las?” (981).
Que é que os outros vão dizer? Frase denunciadora de inibição quanto à re-
alização de uma tarefa; preocupação com a opinião pública. “Que é que os
outros vão dizer? Mas os outros nunca dizem nada, apenas se receia que
eles digam...” (1413).
PÁ
Uma pá de. Uma grande quantidade. “Posso contar ao senhor uma pá de infâncias que eu tive, uma pá de vidas que eu vou levando.” (1436).
PADRE-NOSSO
Desfiar padre-nossos. Rezar. “Ao pé do fogo quase extinto, siá Mariana
desfia padre-nossos pelos defuntos...” (1062).
Ensinar padre-nosso ao vigário. Tentar explicar um assunto a quem já é
perito nele. “Embora sem saber da missa a metade, os presunçosos queriam
ensinar padre-nosso ao vigário, e com isso punham a mão em cumbuca.”
(1319).
PAGAR Pagar e não bufar. Pagar sem reclamação; sujeitar-se a uma situação.” Es-
tou sim! Pague e não bufe!” (DL, 63).
PÁGINA
Fazer página virada. Esquecer; não dar importância mais. “Bastou que
uma espevitada rebolasse na sua frente para você fazer de mim página vi-
rada.” (DL, 26).
72
Revelar uma página de. Tornar pública uma parte de um segredo.
“...revelarei uma página – meia página, se tanto – da vida particular de Gre-
ta Garbo.” (1075).
PAI
Tirar o pai da forca. Fazer alguma coisa de extremíssima urgência. “As
pessoas, quando corriam, antigamente, era para tirar o pai da forca, e não
caíam de cavalo magro.” (1318).
PALAVRA
Dar a palavra (a alguém) . Permitir que fale. “Ou damos a palavra à Razão
das Coisas, ou a assembléia será dominada pelo Caos Telúrico.” (DL, 79).
Dizer duas palavras. Dizer umas palavrinhas; usar brevemente do direito
de falar. “Fuja do cara que lhe pede licença para dizer só uma palavrinha
ou, no máximo, duas palavras.” (DL, 70).
Em duas palavras. Laconicamente; com brevidade na exposição. “O se-
nhor recomendava ao menino: o essencial em duas palavras.” (1282).
Em poucas palavras. Em duas palavras. “Elementar, caríssimo. Explico
em poucas palavras.” (DL, 12).
Palavra de honra. Dou minha palavra; empenho minha palavra. “Ele me
faz falta, palavra de honra.” (DL, 55). Pedir a palavra. Pedir um tempo para falar, durante uma outra falação; pe-
dir uma parte. “...um convidado pediu a palavra, e tal foi a surpresa que
ninguém se mexeu para recusá-la.” (DN, 66).
PALETÓ
Abotoar o paletó. Morrer; ir visitar o Caju. “Perdeu 20 quilos com as
obras. Quase abotoa o paletó.” (1316).
PALHA
Não mover uma palha. Não fazer esforço nenhum; não fazer nada. “Você
é íntimo do Daniel Filho e não quer mover uma palha em favor de uma po-bre artista em potencial!” (BL, 43).
PALMATÓRIA
Ser palmatória do mundo. Pretender corrigir todos os erros da humanidade;
ter a função de castigar os erros alheios. “Não sou a palmatória do mundo.”
(DL, 69).
PANO
73
Pano de fundo. Conjunto de acontecimentos sobre os quais se desenvolve
uma ação. “...uma chusma vaga de bandeirantes, emboabas e liberais revo-
lucionários agitando-se sobre o pano de fundo...” (951).
PÃO
Comer o pão que o diabo amassou. Comer o que o diabo ajuntou; sofrer
com dificuldades, trabalhos forçados, perseguições ou apertos financeiros.
“...contavam tudo tintim por tintim e iam comer o pão que o diabo amassou,
lá onde Judas perdeu as botas.” (1319). Tirar o pão da boca de alguém. Apoderar-se do ganha-pão de outrem. “ –
Eu ia tirar o pão da boca de uma professora, se foi outra professora que em
ensinou a ler?” (1400).
PÃO-PÃO
Pão-pão queijo-queijo. Sim-sim, não-não; tudo certo e definido; nada de
subterfúgio. “...na vida social, dizendo coisa com coisa e adotando o lema
pão-pão queijo-queijo.” (DL, 29).
PAPA
Não ter papas na língua. Ser muito franco ou desabusado; dizer sempre e
claramente o que pensa. “Não ter papas na língua.” (DL, 68).
PAPAI
O papai aqui. Eu (referindo-se a homem), “ – E não venham dizer que o
papai aqui é zureta, só porque...” (DL, 86).
Obs. Se for mulher, o sinônimo é a mamãe aqui. Tanto num caso como no
outro, a expressão pretende se auto-valorizar, colocando em destaque, mui-
tas vezes, a função sexual.
PAPEL
Fazer papel pança. Fazer feio; fazer papel ridículo. “Quem queria lá fazer
papel pança?” (1320).
PAPO
Bater papo. Conversar ou falar despreocupadamente. “Eu tinha tristeza
quando as colegas de minhas garotas iam estudar ou bater papo.” (1337)
Vide também (OC, 872).
Bater um papo. Conversar um pouco, despreocupadamente. “– Diga ao
Vai-por-Mim que apareça aqui no São Sebastião para batermos um papo.”
(1339) Vide também (1450).
74
Levar um papo. Bater um papo. “...lá na Escola Técnica, ela simpatizou
comigo, a gente levou um papo, fiquei sabendo...” (1400) Vide também
(1437).
Com o papo cheio de vento. Passando fome; desanimado. “Éramos bons
poetas na circunstância tal, mas, já agora estamos com o papo cheio de ven-
to...” (1013).
Papo fino. Assunto encerrado; basta de conversa. “Portaria nenhuma diz
que o passageiro suado tem que viajar de pé. Papo findo, tá bom?” (DN,
33) Vide também (DN, 99).
PARADA
Ser uma parada. Ser um empreendimento difícil; ser uma situação embara-
çosa. “...o colega de escritório lhe garantiu que Palito Bol é uma parada.”
(DN, 155).
PARAFUSO
Não estar com os parafusos ajustados. Estar com a cabeça desatarrachada;
estar com um parafuso a menos; estar louco. “ – Vamos embora, frei Panta,
que esse aí não está com os parafusos ajustados.” (DL, 7).
PARTE Deixar de partes. Deixar da aparentar inocência; abrir o jogo. “ – Deixe
de partes, vamos!” (1198).
Mandar praquela parte. Mandar para o inferno; mandar à puta que o pariu.
“Quer dizer que a senhora está mandando meu presente praquela parte.”
(DL, 100).
PARTIDA
As sete partidas do mundo. Todo mundo. “Salvaterra, salvação de muita
gente das sete partidas do mundo. (São sete?) .” (BL, 173).
Obs. O número de sete se refere às sete massas continentais: África, Amé-
rica do Norte, América do Sul, Antártida, Ásia, Europa e Oceânia.
PARTIDO
Tirar partido de. Aproveitar de uma oportunidade ou posição vantajosa. “
– Sem essa! Eu a querer salvar o Vai-por-Mim, e o colega pensando em ti-
rar partido da loucura dele!” (1339) Vide também (1143).
PASSAGEM
Diga-se de passagem. É bom que se diga. “O que me parece muito cortês
de sua parte, diga-se de passagem.” (DL, 15).
75
PASSAR
Passar para trás. Enganar. “Para me ver passada para trás sem a menor
explicação...” (DL, 25).
PASSARINHO
Ver passarinho voar. Não ter o que fazer. “O moço de coração simples es-
tava à beira da estrada vendo passarinho voar.” (1254).
PASSO
A dois passos. Perto. “...chegamos a dois passos da Igreja; o que nos falta é
o sentimento de Deus.” (1013) Vide também (1073; 985).
PATAVINA
Não entender patavina. Não entender nada. “Não entendi patavina.” (DL,
68) Vide também (1320).
PATATI-PATATÁ
Ficar em patati-patatá. Ficar em conversa mole; não atingir nenhum obje-
tivo prático. “Pensei que ele fosse dizer alguma novidade, e ficou nesse pa-
tati-patatá!” (1301).
PAU
Cair de pau em. Espancar. “A gente está acostumada com ele, sabe lidar
com o bichinho, e cai de pau no lombo dele antes que ele ferre a gente...”
(DL, 48) “A Selminha contou ao pessoal, o pessoal caiu de pau em cima do
Bob, e exigiu dele a restituição de...” (BL, 145).
Dar por paus e por pedras. Ter vida muito acidentada; andar sofrendo pelo
mundo afora. “Não pensem vocês aí de Minas, que sou um qualquer levia-
no e estou dando por paus e por pedras sem saber bem o que estou fazen-
do.” (936).
Levar pau. Ser reprovado nos exames. “Porque vestibular enche, sobretudo quando a gente leva pau e começa a pensar, chateado, no vestibular ano que
vem.” (BL, 184).
Com quantos paus se faz uma canoa. O que alguém precisa de saber.
“Com quantos paus se faz uma canoa?” (DL, 64) “Algumas jogavam verde
para colher maduro, e sabiam com quantos paus se faz uma canoa.” (1318).
PAZ
Se queres a paz, prepara a guerra. Segurança é a melhor garantia de paz.
“Se queres a paz, prepara a guerra.” (DL, 66).
76
PÉ
Ao pé do ouvido. Confidencialmente. “Dá a entender que sim, ao pé do
ouvido...” (BL, 135) “Eu não sou jurista, dou meus palpites ao pé do ouvi-
do.” (1270) Vide também (1234).
Não arredar pé. Não se afastar. “Aí o meu eu tijucano, ele é de morte, não
arreda pé da Rua General Roca, meu domicílio global...” (1436).
Botar o pé na estrada. Pôr-se a caminho. “ – Mas antes de botar o pé na
estrada, passe na casa de...” (DL, 89). Dar no pé. Fugir. “ – Acho bom dar no pé – sussurrou um membro da co-
missão a outro.” (1268) Vide também (1378; 1453; DN, 7).
De pé atrás. Cauteloso; prevenido. “O certo é que inspiravam confiança,
ao contrário do que imagina o leitor, habituado a receber de pé atrás a visita
de um desconhecido...” (1286).
Ficar nesse pé. Ficar desse modo; ficar assim. “Ficou tudo nesse pé, até
dois dias depois, quando recebi o documento que...” (1098).
Não dar pé. Ser difícil. “No papel, em imagem, não dá pé.” (1439) “Não
dá pé. Lembra defunto.” (DN, 74) Vide também (DN, 63; 1422).
Pegar pelo pé. Pegar de surpresa; enganar; ludibriar. “...como fazem os
políticos da situação (de qualquer situação) quando o repórter os pega pelo
pé com uma provocada...” (BL, 180). Pé rapado. Indivíduo de baixa classe ou sem recursos. “...era um doutor de
mula ruça, um pé rapado, que espiga!” (1320).
Sem pé nem cabeça. Coisa ilógica ou sem nexo. “Sem pé nem cabeça.”
(DL, 68).
PEÇA
Pregar peças. Armar uma peça; lograr; enganar. “Diverte-se em pregar
peças ao dono e ao próximo...” (DN, 104).
PECADO
Dos meus pecados. Referência à pessoa por quem se preocupa. “Nunca mais pensei com raiva na tal crioula dos meus pecados.” (1388).
Por mal de pecados. Por azar. “...se pudesse deli-lo dos refolhos d’alma,
onde, por mal de pecados, se tatuou inapagavelmente.” (1062).
PEDRA
Atirar a primeira pedra. Acusar em primeiro lugar. “Quem tiver a mesma
idade que eu tinha, e alimentar idênticas ambições, me atire a primeira pe-
dra.” (1459).
77
Não ficar pedra sobre pedra. Destruir; arrasar completamente. “Não ficará
pedra sobre pedra.” (DL, 68).
PEGAR
Pegar mal. Ser mal aceita uma atitude ou ação; ser mal recebida uma ação
ou atitude. “Pessoal que saiu não pode dar as caras outra vez, pega mal.”
(BL, 216) Vide também (DL, 60).
PEITO Meter os peitos. Atirar-se com coragem a uma empresa. “ – Eu sei, e por
isso meti os peitos.” (DN, 25).
PEIXE
Não ter nada com o peixe. Não ter nenhuma ligação com o caso. “E eu não
tenho nada com o peixe, eu cumpro determinações do alto...” (DN, 80).
Vender o peixe. Cuidar de assunto do interesse pessoal; contar o que ouviu,
sem nada alterar. “Não digo isto para vender o meu peixe.” (DN, 175).
PELE
Salvar a pele. Evitar ser atingido por um perigo. “...(me perdoe, mamãe, se
desprezei os seus ensinamentos, mas era preciso salvar a pele de seu filhi-nho) .” (DL, 119).
PELOTA
Dar pelota. Dar bola; demonstrar interesse; insinuar-se. “Não dá pelota
para a hipótese da terra virar poeira, se um cometa como este que não...”
(1260).
PENA
A duras penas. Com muito trabalho, cansaço ou sacrifício. “Reconhecer
que muitos livros comprados a duras penas...” (1159) Vide também (1171).
Vale a pena. Compensar um sacrifício. “...mandaram a gente para uma ca-sa de saúde em Botafogo, negócio alinhado, valeu a pena.” (1156) Vide
também (949; 999; 1011; 1183).
PENSAR
Não ser o que está pensando. Estar havendo um mal-entendido. “Não sou
o que o senhor está pensando, cavalheiro.” (DL, 68).
Obs. Esta é uma frase de situação. Referindo-se ao contexto ou à situação
em que se dá um diálogo, esta frase pretende evitar que o interlocutor tenha
o falante como uma outra categoria de pessoa, mais ou menos favorável.
78
PERDER
Não perder por esperar. Frase que pode dar uma esperança ou significar
uma ameaça, conforme a situação do destinatário. “Você não perde por es-
perar.
“ (DL, 68).
PÉROLA
Ser excelente. “Ela diz que sou uma pérola – mas barroca, isto é, imperfei-ta.” (1309).
PERU
Sentir-se peru de natal. Verificar que seu destino certo é cruel. “É como a
gente sentir-se peru de Natal. Engordado para... Não!” (1267/8).
PESTANA
Tirar uma pestana. Dormir; tirar um cochilo. “Numa terra em que há uma
noite cada sete dias, em que ninguém consegue tirar uma pestana...” (OC,
874).
PETA Pregar peta. Mentir. “Macacos me mordam se estou pregando peta.”
(1320).
PEZINHO
Dar no pezinho. Dar no pé rapidamente; fugir depressa. “...mas se a chama
de cobaia, vê nesse nome conotações ingratas, e dá no pezinho.” (1373).
PINDAÍBA
Estar na pindaíba. Estar na embira; estar em dificuldades financeiras.
“...(ouço ainda a voz dos mais velhos: Estou numa pindaíba danada!) ...”
(BL, 51). Ficar na pindaíba. Ter apertos financeiros; ficar sem dinheiro. “...pois isso
evitava de levar a lata, ficar na pindaíba ou espichar a canela antes que Deus
fosse servido.” (1320).
PINGA
Dar de pinga. Dar de quebra ou como agrado. “Daí se perder as estribei-
ras por uma tutaméia, um alcaide que o caixeiro nos impingia, dando de
pinga um cascão de goiabada.” (1320) “Vá lá, pode derrubar ainda umas
três ou quatro, de pinga.” (DN, 114).
79
PINGO
Pôr os pingos nos is. Deixar tudo esclarecido. “Não vou a encontro ne-
nhum enquanto você não me responder esta carta, me tratando de Violeta e
não de Violante, e pondo os pingos nos is, como dizia minha vó...” (DL,
23).
PINHAL
Nos pinhais da Azambuja. Lugar, casa ou repartição onde se perpetram muitas ladroeiras. “Nessa teia de enganos, não faltou quem achasse a se-
qüestrada, tanto nos Pinhais de Azambuja como na Casa de Orates, e ainda
no Asilo Inviolável do Cidadão.” (DL, 81).
PIRA
Dar pira. Sair; afastar-se. “ – Rápido, pessoal, vamos dar o pira que isto
aqui...” (DN, 113).
PÓ
Pó de perlimpimpim. Pó dotado de propriedades ou virtudes mágicas; me-
zinha miraculosa. “...melhor ainda, ter uma caixinha de pós de perlimpim-
pim, pois isso evitava de levar a lata, ficar na pindaíba ou...” (1320). Virar pó. Decompor-se; desaparecer. “E o que era poder no tempo virou
pó. O que era riqueza nos abismos virou pó.” (1274).
POMAR
Avançar em pomar alheio. Roubar ou usar indevidamente qualquer coisa
ou propriedade alheia. “Que estava lá sabe que só executei umas coisinhas
de minha lavra, pois não sou de avançar em pomar alheio...” (1340).
PONTA
Andar na ponta dos pés. Andar com muito cuidado, para não fazer barulho.
“Andando na ponta dos pés, ou descalços, levamos tropeções no escuro, mas sendo por amor de Pedro, não tinha importância.” (1258).
Com a ponta do pé. Grosseiramente; sem esmero de técnicas. “Porque a
primeira Itabira, a Itabira do ouro, essa não tinha outra forma senão a que
lhe traçaram, com a ponta do pé, os desbravadores...” (948).
De ponta a ponta. Do princípio ao fim; de cabo a rabo. “Esclareço a Teo-
dorico que não leio de ponta a ponta, mas sempre abro ao acaso, leio uma
página ou umas linhas...” (1172) Vide também (991).
Na ponta da língua. Bem decorado; bem sabido; sem vacilar. “Mas ele tem
resposta na ponta da língua...” (1334) Vide também (BL, 184).
80
PONTA-CABEÇA
De ponta cabeça. De cabeça para baixo. “...foi lançado na água, de ponta-
cabeça, e até hoje não deu notícia.” (OC, 831) Vide também (1239).
PONTEIRO
Acertar os ponteiros. Colocar os pontos nos is; chegar a um acordo ou a um
entendimento. “...se na hora de acertar os ponteiros você me vem com essa
história de que amor não deve ser objeto de contrato...” (DL, 36).
PONTINHA
De pontinha (da orelha) . Muito bom; de boa qualidade. “...levar o polegar
e o indicador da mão direita (salvo se for canhoto) ao lóbulo da orelha e ex-
clamar: – É da pontinha!” (1410).
PONTO
Em ponto de bala. Em excelentes condições; bem treinado; pronto para en-
trar em atividade ou para ser utilizado. “...o Orador Nato, que se preparava
para incendiar o auditório com meia dúzia de Tropos de Retórica em ponto
de bala.” (DL, 80).
Entregar os pontos. Render-se; dar-se por vencido. “Isto é, podia. Eu é que entreguei os pontos.” (1245).
Não dar ponto sem nó. Não meter prego sem estopa; ser interesseiro. “Não
dá ponto sem nó.” (DL, 68).
Ponto de vista. Opinião. “Do ponto de vista nacional, apraz-me colocar a
poesia...” (1050) Vide também (BL, 110).
Ponto facultativo. Dia em que é facultativo o trabalho nas repartições pú-
blicas. “Estabelecido legalmente o feriado, sob a forma veludosa de ponto
facultativo nas repartições...” (DL, 102).
Pôr ponto final em. Encerrar; dar por encerrado. “ – Acho melhor pôr pon-
to final nesta discussão – disse Lucrécia.” (DL, 46).
PONTO-E-VÍRGULA
Não entender ponto-e-vírgula. Não entender vírgula, patavinas, bulhufas,
nada. “A fila chegou ao guichê, o papo acabou, e eu não entendi ponto-e-
vírgula do que os dois disseram.” (DL, 73).
Obs. Esta forma da frase é uma modificação estilística da frase não enten-
der vírgula, correspondente a um antiprovérbio.
PORTA
81
Bater à porta errada. Pedir alguma coisa a alguém que não tem condições
de atender, por não ter competência para tal. “ – E o namorado? – pergun-
tei, desistindo de esclarecer que ela batera à porta errada.” (BL, 42).
POSTO
Entregar os postas. Desistir. “ Mais sem força, mais entregando os postos.
O meu ordenado...” (1381).
POTE Chover a potes. Chover torrencialmente. “Chovia, não direi que a potes,
mas a bules de chá, e a moça disse que ia dar uma circulada por aí.” (DN,
42) “Em janeiro choveu a potes na cidade, mas...” (1336).
POUCO
Dizer poucas e boas. Dizer malcriações ou desaforos. “Pois me dá depres-
sa o chapéu para eu ir lá dizer poucas e boas!” (1219).
PRATO
Cuspir no prato em que comera. Não prezar os favores recebidos, tornan-
do-se ingrato. “Não sou daqueles que cospem no prato em que comeram.”
(DL, 68) Vide também (1320). Por em pratos limpos. Esclarecer. “...depois de fintar e engambelar os
coiós, e antes que se pusesse tudo em pratos limpos, ele abria o arco.”
(1320).
PRAZER
O prazer é todo meu. Resposta cortês a alguém que diz ter prazer em co-
nhecer pessoalmente uma pessoa, ou em qualquer situação que se faz seme-
lhante afirmação. “O senhor vai querer saber mais alguma coisa? Foi um
prazer. – O prazer é todo meu.” (BL, 213) “Oh, o prazer é todo meu.” (DL,
75).
PRECISÃO
Não guasqueies sem precisão nem grites sem ocasião. Seja comedido, não
se apressando nem criando confusão desnecessária; provérbio gaúcho que
desaconselha precipitações ou pressa. “ – Não guasqueies sem precisão
nem grites sem ocasião, homem!” (1333).
Obs. Guasquear é fustigar com guasca ou outro açoite.
PREÇO
82
A preço de banana. Muito barato; a preço de galinha morta. “Prefigurei o
leilão, as ilusórias cadeiras, o motor ilusionante, arrematados a preço de ba-
nana...” (DL, 83) “Um corretor ofereceu-me um apartamento supersensaci-
onal na Praça Saens Peña e outro, piramidal, na Estrada do Tumba, tudo a
preço de banana-prata...” (DN, 14) Vide também (BL, 181).
O preço da liberdade é a eterna vigilância. Se deseja a paz, prepare-se para
a guerra. “Não mate a árvore, pai, para que eu viva! O preço da liberdade é
a eterna vigilância!” (DL, 63).
PREGO
Não meter prego em estopa. Ser prevenido; não fazer nada antes de verifi-
car se o resultado será certo. “Não mete prego sem estopa.” (DL, 68).
Obs. Segundo CABRAL, T. (1982) s.v., não meter prego em estopa é me-
nos usada, mas é mais lógica e mais ajustada ao seu sentido.
PRIMAVERA
Completar primaveras. Fazer aniversário. “Não faziam anos: completavam
primaveras, em geral dezoito.” (1318).
PROVA
Até prova em contrário. Provisoriamente. “ – Cale-se. Até prova em con-trário, o senhor pode ser um criminoso.” (DL, 110) Vide também (DL, 116).
QUALQUER
Não ser para qualquer um. Ser difícil. “A técnica de chorar, que não é pa-
ra qualquer um?” (DL, 125).
QUANDO
De quando em quando. Uma vez ou outra. “De quando em quando, a mesa
interrompia os trabalhos, para jogar peteca ou dar um mergulho.” (1081).
QUÊ Sem quê nem praquê. Sem motivo plausível; sem razão justa; por motivo
fútil. “Sem quê nem praquê.” (DL, 68).
QUERER
Quem quer que seja. Qualquer pessoa; nenhuma pessoa. “Não dá bola a
cartões-postais. Ou a quem quer que seja.” (DL, 91).
Quero ver, mas quero ver. Quero ver urgente e perfeitamente. “...e quero
ver, mas quero ver quem derruba minha casinha!” (1088).
83
QUESTÃO
Questão de ordem. Em assembléias deliberativas, aquela que versa sobre o
encaminhamento dos trabalhos. “...o Equilíbrio Orçamentário e a Instrução
Moral e Cívica levantavam questões de ordem e eram aparteados...” (DL,
79).
QUINHENTOS
Ser outros quinhentos. Coisa muito melhor ou muito diferente. “Mas o gc
do Primeiro Ministro Chamberlain, da Grã-Bretanha, são outros quinhen-tos...” (DN, 105) “Talvez não pudesse, mas isso eram outros quinhentos.”
(1266).
QUINTOS
Nos quintos dos infernos. Bem longe; em lugar bem ruim. “ – Vá ser boni-
ta assim nos quintos dos infernos, puxa!” (1079) ‘...’vá fazer calor assim
nos quintos dos infernos’ e outras que tais...” (BL, 141).
RABICHO
Estar de rabicho. Estar apaixonado. “E a moçoila, que começava a nutrir
xodó por ele, que estava de rabicho, caía das nuvens.” (1320).
RABO
Bater com o rabo na cerca. Morrer. “...todo mundo acabava mesmo baten-
do com o rabo na cerca, ou simplesmente a bota, sem saber como descalçá-
la.” (1321).
Olhar com o rabo do olho. Olhar disfarçadamente; olhar de esguelha.
“Embaraçado, limitei-me a olhá-la com o rabo do olho, pois íamos no mes-
mo frescão...” (BL, 34).
Com o rabo entre as pernas. Acovardado; retraído; amedrontado; humilha-
do. “Saí de lá com o rabo entre as pernas e nunca mais entro em concurso
nenhum neste Rio de Janeiro.” (1401).
Pregar rabo em nambu. Fazer algo inútil; perder tempo com uma emprei-tada. “Não responda a ataques de quem não tem categoria literária: seria
pregar rabo em nambu.” (1184).
RAIMUNDO
Se eu me chamasse Raimundo. Se as coisas fossem diferentes; se a situação
fosse outra. “...se eu me chamasse Raimundo, seria talvez a solução.” (DL,
60).
RAPA
84
Rapa do tacho. O filho mais novo; o caçula. “A filha mais nova, nascida
depois de longo intervalo, encantava-o: um dia, brincando com ela, esque-
ceu-se e chamou-a de netinha; era a ‘rapa do tacho’.” (1212).
RARO
De raro em raro. Muito raramente; lá uma vez ou outra. “Brotam-lhe de
raro em raro pensamentos lúbricos...” (910) Vide também (1198; 1199).
RECADO Dar seu recado. Dar conta do recado; cumprir a contento sua obrigação;
dizer o que devia ser dito ou fazer o que devia ser feito. “’O máximo’, ‘o
maior’ deram seus recados.” (1411).
REMÉDIO
Não ter outro remédio. Ser a única solução possível. “João não teve outro
remédio senão declinar sua extinta importância...” (BL, 197).
RESTO
Aprender para o resto da vida. Aprender bem ou definitivamente. “...eu
ainda não tinha muita experiência de jacaré, facilitei, pronto: gurugutu, mas
aprendi pro resto da vida...” (DL, 49) Vide também (DL, 23).
RETIRADA
Bater em retirada. Ir embora; desistir; fugir. “Espantado com a reação, o
pseudofumante bate em retirada, a menos que...” (DL, 119).
RITMO
Em ritmo de tartaruga. Muito lento; sem a menor pressa. “Ultimamente, as
coisas vêm mudando, umas em ritmo de tartaruga, outras em ritmo de cáp-
sula espacial.” (1422).
RUA Na rua da amargura. Em difícil situação; em prolongada situação aflitiva.
“O Diacho eram os filhos da Candinha: quem somava a candongas acabava
na rua da amargura...” (1320).
Botar na rua. Expulsar; pôr no olho da rua. “Pra me botar na rua no dia
seguinte e me procurar outra vez...” (DL, 23).
SABER
Eu é que sei? Não sei. “ – Eu é que sei? Só posso dizer que a coisa está
preta.” (BL, 101).
85
Não sei onde estou que não. Ameaça de agressão, seguida da descrição da
forma de agressão pretendida. “Não sei onde estou que não lhe quebro a ca-
ra.” (DL, 68).
Não sei o quê. Forma de descartar a descrição ou nomeação de alguma coi-
sa, principalmente ao final de uma série. “Mulher carioca exige coisas de-
mais, desde geladeira a TV a cores, é um tal de cabeleireiro, de festas, de
não sei o quê...” (DL, 60) Vide também (DN, 33).
Não saber o que dizer. Não estar seguro quanto à conveniência de se dizer
ou ao que dizer. “Não sei o que diga.” (DL, 68). Obs. Há inúmeras formas variantes, em que se acrescenta uma palavra ou
expressão à forma básica não sei o que, como os exemplos que se seguem:
“Fica aí com essas milongas de Caetano, Gil e não sei que mais...” (1365)
“Inculpam-no de vacilação, timidez, frustração e não sei que outros peca-
dos...” (998) “Se o banco falir, o carro enguiçar, a canoa virar, a vaca for
pro brejo, nem sei o que será de nós, Madalena.” (DL, 67).
O que sabe das coisas. Referência à pessoa entendida do assunto em ques-
tão. “ – Tonerre de Dieu é assim – explicou o que sabia das coisas.” (DN,
50) “ – Ué, o senhor é o entrevistado, o que sabe das coisas.” (DN, 98) Vide
também (1382/3; 1461).
Quem sabe? Não sei; duvido; pode ser. “Quem sabe se mesmo à noite eu
poderia tranqüilizá-la?” (1152) Vide também (951; 955; 1461). Sabe como é? Entende? Sacumé? “...e filho da gente, por mais que cresça
e apareça, é sempre uma plantinha mimosa, sabe como é?” (DL, 50 “Padre
mesmo, desses de batina, sacumé?” (1401) Vide também (1436; BL, 54).
Sabe com quem está falando? Forma de ameaça feita por pessoa que se jul-
ga uma autoridade. “Mas quem é você? Sabe com quem está falando?”
(DL, 64).
Saber de experiência feito. A verdadeira sabedoria, que tem por fundamen-
to a prática e não a teoria. “Durante o não, andou por Manguinhos e Butan-
tã, trabalhou em laboratórios, adquiriu saber de experiências feito.” (1372)
Vide também (1232).
Sei lá. Não sei; duvido. “Essa gente é meio maluca, sei lá se elas levam mesmo o garoto para casa?” (1129) “Sabe lá que espécie de viúva é essa?”
(DN, 172) Vide também (1209; 1437; DN, 15; DN, 33).
SABUGO
Até o sabugo da alma. Profundamente; muito bem. “...pula feito macaco,
está exausto até o sabugo da alma; entretanto, quando o sol se recolhe, ele
não faz o mesmo.” (1124).
SAGRADO
86
Por tudo quanto é sagrado. Por amor de Deus. “...arregalando os olhos,
suplicou-me, por tudo quanto fosse sagrado para mim, que não contasse a
ninguém.” (1076).
SAIR
Daqui não saio, daqui ninguém me tira. Ser intransigente numa posição;
expressão do desejo de continuar numa posição vantajosa. “...que o condu-
ziu a uma pedreira, e lá faz greve de fome. De lá não sai, de lá ninguém o
tira.” (DL, 59).
SALAMALEQUE
Cheio de salamaleques. Cheio de mesuras exageradas ao cumprimentar as
pessoas; cortesia exagerada. “Luva-de-Pelica, um todo cheio de salamale-
ques, perdera 15 e teve de voltar para Miracema.” (1316).
SARDINHA
Tirar sardinha com mão de gato. Servir-se de terceiros para proveito pró-
prio. “...exortou-me a botar a mão na consciência: não estaria eu querendo
tirar sardinha com mão de gato?” (DL, 139).
SEDE Não vá com tanta sede ao pote. Calma; não deixe para a última hora o que
pode ser evitado. “Não vá com tanta sede ao pote.” (DL, 68).
SEGURO
O seguro morreu de velho. Segurança não se excede; é melhor prevenir do
que curar. “Apenas a Marcha da História, em companhia da Pausa Para
Meditação e do Seguro Morreu de Velho, se recolhera...” (DL, 82).
SER
Era só o que faltava. Só faltava essa. “Esqueci a pílula! Era só o que fal-
tava!” (DL, 64). Quem sou eu. Não tenho competência. “ – Quem sou eu para decretar feri-
ado, Zefa.” (DL, 101).
Se eu fosse você. Em sua posição. “O problema é que se correr o bicho pe-
ga, se ficar o bicho come. Bom, se eu fosse você...” (DL, 66).
Ser e acontecer. Fazer vantagem; conseguir sucesso. “Há por aí uma plan-
ta chamada amor-por-um-dia, que não carece muito esforço para ser e acon-
tecer, como doidivanas.” (DL, 85).
87
Ser e não ser. Mais ou menos; não estar muito bem definido. “ – É uma
invenção nacionalista? – É e não é.” (DN, 51) “V. Exa. vai ser e não ser,
qual novo Hamleto.” (1097).
Ser ou não ser. Situação duvidosa, de indecisão. “Afinal de contas, a cal-
çada é ou não é do povo?” (BL, 38).
SERAPIÃO
Comigo não, Serapião. Não me meta nesse negócio. “Caubi passava a mão
na testa, alisava-a, determinado: ‘Comigo não, Serapião’.” (DL, 60).
SÉRIE
Fora de série. Extraordinário; incomparável. “...essas manhãs fora de sé-
rie, que maio-junho dão de graça ao carioca, para compensá-lo dos vinagres
da vida-cão.” (DN, 153) Vide também (1411; DN, 153).
SÉRIO
Levar a sério. Dar crédito; acreditar em. “Como posso levar a sério um
homem doidamente apaixonado por mim que...” (DL, 28) Vide também
(DL, 25).
SERVIÇO Não brincar em serviço. Levar a sério o que faz; considerar o objeto em
questão em si mesmo. “Desça a serra e não brinque em serviço.” (1347).
SEXO
Apurar o sexo dos anjos. Discutir sobre coisas óbvias; pesquisar a respeito
de algo sobre que já se sabe tudo; tratar de problema inexistentes. “E o sexo
dos anjos, já se apurou se tem?” (DL, 66).
SILVA
Da silva. É muito freqüente o emprego a expressão constituída de um adje-
tivo na forma diminutiva seguido de da silva, significando: inteiramente; totalmente; de todo. “Não é que o canário tinha ressuscitado, perdão, relu-
zia vivinho da silva, com uma fome danada?” (1234) “Já sei, quer me botar
maluquinha da silva por você, com essa jogada...” (DL, 23) Vide também
(1437).
SIM
Sim e não. Situação ambígua ou intermediária; nem contra nem a favor,
muito antes pelo contrário. “ – Sim e não. – Sim e não, como?” (BL, 42).
88
Pelo sim pelo não. Por não haver decisão ainda; em qualquer caso. “Pelo
sim pelo não, estou tirando meu passaporte.” (1397).
SINAL
Avançar o sinal. Desrespeitar o regulamento; atrever-se. “Só não trouxe
Lucinéia consigo porque ele não é de avançar o sinal.” (DL, 60).
Dar sinal de vida. Aparecer. “Você prometeu conversar comigo sobre nos-
sos problemas e até agora não deu sinal de vida.” (DL, 38).
SOCO
Ser um soco na cara. Ser decepcionante; ser extremamente desagradável.
“Foi um soco na cara aquela foto. Roubei, não nego, essa prova terrível...”
(DL, 27).
SOMBRA
De boa sombra. Simpaticamente; amavelmente. “A Paulo Bittencourt, que,
no Correio da Manhã, recebeu de boa sombra estes escritos.” (1073) Vide
também (1014).
SOPA
Não deixar a sopa esfriar. Iniciar imediatamente; começar logo. “Vamos, governe já, governe logo, não deixe a sopa esfriar.” (BL, 136).
SUSPIRO
Exalar o último suspiro. Morrer; entregar a alma ao Criador. “Foi aliás o
que me recomendou meu pai, ao exalar o último suspiro...” (1325).
TÁBUA
Levar tábua. Ser rejeitado; receber resposta negativa a um pedido de casa-
mento. “E se levavam tábua, o remédio era tirar o cavalo da chuva e ir
pregar em outra freguesia.” (1318).
TAL
E tal e coisa. E outras coisas; etc.; e coisa e tal; e mais alguma coisa, que
não se precisa enumerar. “...racionalizar todos os atos de nossa vida (e a do
próximo) sob o critério exclusivo da eficiência, produtividade, rentabilidade
e tal e coisa.” (BL, 199) Vide também (DL, 10).
Que tal. Semelhante; idêntico. “Na impossibilidade de elucidar definitiva-
mente dúvidas que tais, mas também...” (1010).
Que tal? Qual a sua opinião a respeito deste assunto? “Que tal a Liza Mi-
nelli, em Cabaret?” (1410).
89
Tal qual. Muito parecido; do mesmo modo; exatamente o mesmo, em sua
essência. “A música permanecerá a mesma, tal qual Palestrina e Mozart a
deixaram...” (CB, 53).
TAMANHO
Tamanho família. Muito grande; exagerado. “ – O Neco é um sem-
vergonha tamanho família.” (DL, 15).
TEMPO Cada coisa em seu tempo. Frase com que as pessoas são lembradas sobre
as vantagens e conveniências de que haja ordem na execução das tarefas.
“Cada coisa em seu tempo, e todo assunto, para ser bem considerado, deve
ser decomposto em partes, ordenadamente.” (BL, 30).
Cada coisa no seu tempo e lugar. Frase com que se exortam as pessoas a
usarem o lugar adequado e o momento mais conveniente para executar suas
tarefas. “ – Cada coisa no seu tempo e lugar. Reforma não é revolução.”
(BL, 203).
Levar tempo. Demorar. “A página passou a interessar tão acentuadamente
o Sr. Borges que ele levou tempo para dizer...” (1407) Vide também (BL,
204).
Matar o tempo. Provocar perda de tempo; passar o tempo. “...citam Juve-nal e Cícero e acabam discutindo para matar o tempo.” (OC, 624) “...à falta
de atentados sangüinolentos a cometer, ele mata calmamente o tempo.”
(1415).
No tempo da vó da vó da nossa vó. Em tempo remotíssimo. “Isso nas ilhas
do Pacífico, no tempo da vó da vó da nossa vó, mas aqui na Zona Sul, dian-
te de...” (BL, 184).
Os tempos mudaram. Os tempos são outros; em novos tempos, são necessá-
rios novos métodos, novas técnicas. “É verdade que os tempos mudaram,
do século III para cá.” (DL, 105).
Obs. Camões, no século XVI, já escolhera este tema para um lindo soneto,
que transcrevemos da edição de Joaquim Ferreira:
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança, Tomando sempre novas qualidades. Continuamente vemos novidades, Diferentes em tudo da esperança; Do mal ficam as mágoas na lembrança, E do bem, se algum houve, as saudades.
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O tempo cobre o chão de verde manto, Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto. E, afora este mudar-se cada dia, Outra mudança faz de mor espanto: Que não se muda já como soía.”
(FERREIRA, J. Sonetos de Camões, 3ª ed. Porto, Domingos Barreira [s.d.] p. 97).
Rolaram os tempos. Depois de muito tempo. “Rolaram os tempos, e a mui-
ta insônia cívica devem ter assistido os pesados móveis...” (1092).
Sem tempo a perder. Sem se esforçar inutilmente; visando a aproveitar o
tempo. “Sem tempo a perder, procurou o essencial; dosagem, e como pre-
parar a isca.” (BL, 15).
Tudo a eu tempo. Cada coisa no seu tempo; há tempo para tudo. “ – Cal-
ma, tudo a seu tempo.” (DN, 23).
TER
Não ter de quê. Não há de quê; de nada; forma cortês de responder a al-
guém que agradece alguma coisa. “ – Falarei também a meu marido. Obri-
gada pela colaboração. – Não tem de quê.” (BL, 30) Vide também (BL, 70).
Ter mais que fazer. Ter que fazer; ter mais o que fazer; ter o quer fazer; ser
uma pessoa ocupada. “– Ah, mas agora sou eu que não penso em casamen-
to. Tenho mais que fazer.” (1191) Vide também (DL, 4).
Tenho para mim que. Suponho que; acho que; é minha opinião que. “Te-
nho para mim que a luzinha vermelha de Exu brilhava no farolete do car-
ro...” (1071) Vide também (BL, 91).
TINTIM
Tintim por tintim. Detalhadamente; minuciosamente. “...contavam tudo
tintim por tintim e iam comer o pão que o diabo amassou, lá onde Judas perdeu as botas.” (1319).
TINTURA
Ter uma tintura rala de. Conhecer superficialmente; saber um pouco de.
“Se você tivesse uma tintura rala de latim e grego, em vez de passar pelas
humanidades como motorista de ônibus pelo sinal vermelho...” (DL, 74).
TIRO
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Ser tiro e queda. Ser eficiente; não falhar; ser como água no fogo. “Eu não
experimentei, mas um amigo meu afiançou que é tiro e queda.” (BL, 15).
TIRTE
Sem tirte nem guarte. Sem cerimônia; sem prévio aviso. “Às vezes, sem
tirte nem guarte, aparecia um doutor pomada, todo cheio de nove horas...”
(1320) Vide também (DL, 68).
TITIO Não se esqueça aqui do titio. Lembre-se de mim. “Vá lá, pode derrubar
ainda umas três ou quatro, de pinga. Mas não se esqueça aqui do titio,
hem.” (DN, 114).
Obs. Com a palavra papai e a palavra mamãe lembrariam o aspecto ma-
chista e feminista, respectivamente, titio ou titia lembra a idade madura e a
relação afetiva. Em todos estes casos, os substantivos correspondem à pri-
meira pessoa, ao falante.
TOCAR
Não me toques. Expressão de asco ou de melindres. “Não me toques.”
(DL, 67).
Tocar pra frente. Esquecer o passado; prosseguir. ‘assim, em plena flores-ta de exclamações, vai-se tocando pra frente.” (1379).
TODAS
Estar em todas. Estar em evidência; ser o centro de atrações. “...riram de
mim, e agora, pelo que vejo, estou em todas.” (DN, 134).
TONA
Voltar à tona. Reaparecer. “Insinuava o mesquinho desejo de voltar à tona,
impelido pela lei geral.” (1247) “Pois não é que o ex-marido voltava à toda,
com seus sinais particulares, seu modo de falar, seu jeito de ser e viver?”
(DL, 57).
TOQUE
A toque de caixa. Festivamente; apressadamente. “As eleições vêm aí a to-
que de caixa, e, depois delas, novas eleições.”(1097).
TRAMONTANA
Perder-se a tramontana. Desorientar-se; desgovernar-se; descontrolar-se;
atarantar-se. “Era natural que com eles se perdesse a tramontana.” (1319).
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Obs. João Ribeiro afirma que “o norte para antigüidade era uma noção de
pequena importância... Como ficava para além dos montes, chamou-se em
certo tempo tramontana, na língua dos pilotos genoveses e venezianos...
Daí a frase ‘perder a tramontana’, perder o norte, o rumo certo.” Vide RI-
BEIRO, J. (1963) p. 62/3.
TRAPINHO
Separar os trapinhos. Largar-se, o casal; desquitar-se; divorciar-se. “De-
pois separamos nossos trapinhos e a vida continua.” (BL, 123). Obs. Juntar os trapinhos é a forma normal, que significa casar-se, ajuntar-
se, viver maritalmente com alguém.
TRIPA
Fazer das tripas coração. Fazer todo o possível; fazer um grande esforço;
dispor-se a enfrentar perigos e adversidades, desprezando situações humi-
lhantes ou repugnantes. “Faça das tripas (há quem prefira das entranhas)
coração, e, garanto, lá um dia será feliz.” (1383).
TUDO
Ou tudo ou nada. Situação ou posição extremista; situação de extremo ris-
co. “...só para deixar passar o Chevrolet 54, mas Cyro foi irredutível: ou tudo ou nada.” (1178).
Tudo como dantes, no quartel de Abrantes. Nada foi alterado. “A reforma
não deve reformular a forma. Deve confirmá-la. – Tudo como dantes, no
quartel-de-abrantes?” (BL, 204).
Tudo virá a seu tempo. Tudo a seu tempo; cada coisa em seu tempo; não há
motivos que justifiquem o atropelamento do tempo. “Mas para que tanta
pressa? Tudo virá a seu tempo, e se não for agora, como foi em 1898...”
(946).
TUGIR
Não tugir nem mugir. Não reclamar; calar. “Não tugiu nem mugiu.” (DL, 68) “Não devia também se esquecer de lavar os pés, sem tugir nem mugir.”
(1320).
TUTAMÉIA
Por uma tutaméia. Por uma tuta-e-meia; por uma ninharia; por quase nada.
“Daí se perder as estribeiras por uma tutaméia, um alcaide que o caixeiro
nos impingia, dando de pinga um cascão de goiabada.” (1320).
Obs. Compare o que diz João Ribeiro: RIBEIRO, J. (1960) p. 170 e FER-
REIRA, A.B.H. [s.d.] s.v.
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UM
Se um não quer dois não brigam. Numa briga, ninguém tem toda a razão.
“Pois é, se um não quer, dois não brigam.” (DL, 66).
Um por todos, todos por um. União perfeita; completa integração de forças.
“Assim, Touro, Virgem, Áries e Sagitário ficam inteiramente harmonizados,
cada um na sua, por todos por um.” (1406).
Dar uma de. Fingir-se; querer ser. “Marquinhos roubou a margarida, quis
dar uma de poeta.” (DN, 63) “Melhor você não dar uma de contestadora, e entrar na jogada.” (DN, 133) Vide também (DN, 69).
Umas e outras. Algumas doses de bebida alcoólica. “Todas as noites, de-
pois de ingerir uma e outras, sente necessidade de dizer-me pelo telefone
palavras amáveis...” (1170).
USAR
Usar e abusar. Fazer uso excessivo; usar indevidamente. “Porém seu mau-
humor nunca foi maior que o meu, que usei e abusei de seus serviços com
impaciência...” (1244).
VACA
Aí é que a vaca foi pro brejo. Neste ponto é que vai tudo a perder. “No fim, está aí o neologismo, e aí o neologismo é que – desculpe a expressão,
que não costumo usar, mas me deu vontade – aí é que a vaca vai pro brejo.”
(DN, 99) “Se o banco falir, o carro enguiçar, a canoa virar, a vaca for pro
brejo, nem sei o que será de nós, Madalena.” (DL, 67) “E se a vaca for pro
brejo? (DL, 66).
VACA-FRIA
Voltar à vaca-fria. Retornar ao assunto principal duma conversa. “Mas
voltando à vaca-fria: nenhuma esperança para as próximas vagas?” (1109).
VALER Ser para valer. Não ser de brincadeiras; não temer as conseqüências. “O
anúncio é pra valer ou não é?” (1243).
VER
A meu ver. Em minha opinião. “A meu ver, a insubmissão dos filhos aos
pais é fenômeno que envolve...” (DN, 17) Vide também (1053; 1057).
Não ter nada a ver. Não interessar; não ser da conta de. “Bem, este assun-
to é particular, os senhores e senhoras aqui presentes não têm nada a ver
com isso.” (BL, 61).
94
Não ter nada que ver. Não ter nada a ver; é outro assunto. “...é uma ima-
gem poética e daí isso não tem nada que ver com mineiro...” (BL, 53).
Quem te viu e quem te vê! Como estás diferente! Expressão usada ao se re-
ver uma pessoa depois de muito tempo, já com idéias ou aspecto físico mui-
to diferente. “Quem te viu e quem te vê! Átila, você é bárbaro!” (DL, 64).
VERDE
Jogar verde para colher maduro. Insinuar ou afirmar algo, conduzindo a
conversa para determinado assunto, a fim de apurar o que tenciona saber; obter informações indiretamente. “Algumas jogavam verde para colher
maduro, e sabiam com quantos paus se faz uma canoa.” (1318).
VÉSPERA
Ninguém morre na véspera. Nada acontece fora de seu tempo próprio; tudo
tem seu tempo. “ – Não é bem com a morte dele, afinal ninguém morre na
véspera, a hora é a hora.” (BL, 216).
VEZ
Até outra vez. Despedida de quem pretende retornar; resposta a esta expe-
dida. “Bom, tudo legal. Até outra vez.” (DL, 56)
Cada vez mais. Progressivamente mais. “– Eu disse isso? Você esta cada vez mais por fora.” (DL, 131) Vide também (DL, 73).
De uma vez por todas. Definitivamente. “Exijo que fique e resolva de uma
vez por todas esta situação.” (DL, 46)
De vez em quando. Freqüentemente. “De vez em quando eu tiro e contem-
plo esse casal embolado na areia da praia.” (DL, 27)
Era uma vez. Terminava; tinha fim. “...13 de maio, e era uma vez o cati-
veiro; 14 de julho, viva a queda da Bastilha!...” (1103)
Lá de vez em quando. Uma vez ou outra; periodicamete. “Os que... nos
impacientavam lá de vez em quando...” (1105) Vide também (1155).
VIDA Cuidar da vida que a morte é certa. Não é necessário cuidar da morte.
“Todos têm que cuidar da vida que a morte é certa.” (DL, 50)
E a vida continua. Nem por isso a vida se extingue. “Depois separamos
nossos trapinhos e a vida continua.” (BL, 123)
Ser da vida. Ser normal, natural ou comum. “Amigos me informam que o
serviço costuma levar seis meses, e não por moleza dos oficiais. É da vida.”
(1175)
VILA-DIOGO
95
Dar às de Vila-Diogo. Fugir rapidamente. “Encontravam alguém que lhes
passava manta e azulava, dando às de Vila-Diogo.” (1318)
VIOLÃO
Comigo não, violão! Afaste-se, satanás! Comigo não, Serapião! “Do alto
destas pirâmides, quarenta séculos vos contemplam! Comigo não, violão”.
VIR
Isso não vem ao caso. Isso não interessa, neste caso. “...fica com pena da gente gastar o dinheiro com os livros de sua livraria. Mas isso não vem ao
caso.” (1430)
Não vem que não tem. Não se meta comigo. “Não tenho que lhe dar satis-
fação! Não vem que não tem!” (DL, 64)
VÍRGULA
Não entender vírgula. Não entender nada. “Em segundo lugar, não entendi
nem uma vírgula de sua carta...” (DL. 22)
Não falar vírgula. Não falar nada. “Estas é que são as melhores figuras do
elenco; não falam vírgula...” (1466)
VISITA Não pagar nem visita. Ser péssimo pagador. “Ele não paga nem visita.”
(DL, 68)
VISTA
Perder de vista. Ficar muito distante; deixar de ser visto. “...que Saint-
Hilaire observou, com as montanhas a se perderem de vista...”
VIVER
Vivendo e aprendendo. Quanto mais se vive mais se aprende. “Vivendo e
aprendendo – concluiu Andréia, voltando à paz e à ventura de morar sozi-
nha.” (BL, 17) “Ilmo. colunista. Vivendo e aprendendo. Caí das nuvens lendo vosso relato...” (BL, 23)
VOLTA
Dar a volta por cima. Contornar um problema, superando-o. “Não costu-
mo bancar o infeliz em amor. Sei perder e dar a volta por cima.” (DL, 30)
Dar uma volta. Dar um passeio. “Vamos dar uma volta geral?” (DL, 72)
VOU-TE-CONTAR
Que vou-te-contar. Expressão enfática que se usa no meio de uma narrati-
va. “É uma taxa de desemprego que vou-te-contar.” (BL, 103) “...que vou
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te contar.” (1259) (Vide CONTAR)
XODÓ
Nutrir xodó (por alguém). Estar apaixonado; estar enamorado; ser amante
de. “E a moçoila, que começava a nutrir xodó por ele, que estava mesmo de
rabicho, caía das nuvens.” (1320)
X.P.T.O.
X.P.T.O. London. Excelente; de ótima qualidade; XPTO. “...a casimira ti-nha que ser superior e mesmo X.P.T.O. London...” (1319) “Em tempos
mais remotos, batizava-se deste modo o objeto da melhor qualidade: – É
X.P.T.O. London.” (1410)37
ZERO
Estar a zero. Estar arruinado; estar a nenhum. “– Então estamos a zero. –
Zerinho quilômetro.” (DL, 86)
ZORRA
Ser uma zorra global. Ser uma grande confusão; ser uma confusão genera-
lizada; ser uma zorra total. “...senão de repente ele solta uma faixa de Billy
Cohbam, e aí é uma zorra global, entende?” (DL, 95).
Ser uma zorra total. Ser uma zorra global. “Vocês sabem? Era uma zorra total.” (DL, 86).
37 XPTO Cartacho é o seu antônimo, segundo ensina João Ribeiro: RIBEIRO, J. (1960) p. 142.
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APÊNDICES:
1 – Antigamente I (PP, 1318-1319).
2 – Antigamente II (PP, 1320-1321).
3 – O Homem, Animal Exclamativo (DL, 63-64).
4 – O Homem, Animal que Pergunta (DL, 64-66).
5 – O Homem e suas negativas (DL, 67-69).
6 – Dizer e suas Conseqüências (DL, 69-70).
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ANTIGAMENTE
Carlos Drummond de Andrade
I
ANTIGAMENTE, as moças chamavam-se mademoiselles e eram todas
mimosas e muito prendadas. Não faziam anos: completavam primaveras,
em geral dezoito. Os janotas, mesmo não sendo rapagões, faziam-lhes pé-
de-alferes, arrastando a asa, mas ficavam longos meses debaixo do balaio.
E se levavam tábua, o remédio era tirar o cavalo da chuva e ir pregar em ou-tra freguesia. As pessoas, quando corriam, antigamente, era para tirar o pai
da forca, e não caiam de cavalo magro. Algumas jogavam verde para co-
lher maduro, e sabiam com quantos paus se faz uma canoa. O que não im-
pedia que, nesse entrementes, esse ou aquele embarcasse em canoa furada.
Encontravam alguém que lhes passava manta e azulava, dando às de Vila
Diogo. Os mais idosos, depois da janta, faziam o quilo, saindo para tomar a
fresca; e também tomavam cautela de não apanhar sereno. Os mais jovens,
esses iam ao animatógrafo, e mais tarde ao cinematógrafo, chupando balas
de altéia. Ou sonhavam em andar de aeroplano; os quais, de pouco siso, se
metiam em camisa de onze varas, e até em calças pardas, não admira que
dessem com os burros n’água.
Havia os que tomavam chá em criança, e, ao visitarem família de maior consideração, sabiam cuspir dentro da escarradeira. Se mandavam seus res-
peitos a alguém, o portador garantia-lhes: “Farei presente.” Outros, ao cru-
zarem com um sacerdote, tiravam o chapéu, exclamando: “Louvado seja
Nosso Senhor Jesus Cristo”; ao que o Reverendíssimo correspondia: “Para
sempre seja louvado.” E os eruditos, se alguém espirrava – sinal de defluxo
– eram impelidos a exortar: “Dominus tecum”. Embora sem saber da missa
a metade, os presunçosos queriam ensinar padre-nosso ao vigário, e com is-
so punham a mão em cumbuca. Era natural que com eles se perdesse a tra-
montana. A pessoa cheia de melindres ficava sentida com a desfeita que lhe
faziam, quando, por exemplo, insinuavam que sem filho era artioso. Ver-
dade seja que às vezes os meninos eram mesmo encapetados; chegavam a pitar escondido, atrás da igreja. As meninas, não: verdadeiros cromos,
umas tetéias.
Antigamente, certos tipos faziam negócios e ficavam a ver navios: outros
eram pegados com a boca na botija, contavam tudo tintim por tintim e iam
comer o pão que o diabo amassou, lá onde Judas perdeu as botas. Uns raros
amarravam cachorro com lingüiça. E alguns ouviam cantar o galo, mas não
sabiam onde. As famílias faziam sortimento na venda, tinham conta no car-
niceiro e arrematavam qualquer quitanda que passasse à porta, desde que o
moleque do tabuleiro, quase sempre um “cabrito”, não tivesse catinga.
99
Acolhiam com satisfação a visita do cometa que, andando por Ceca e Meca,
trazia novidades de baixo, ou seja, da Corte do Rio de Janeiro. Ele vinha
dar dois dedos de prosa e deixar de presente ao dono da casa um canivete
roscofe. As donzelas punham carmim e chegavam à sacada para vê-lo ape-
ar do macho faceiro. Infelizmente, alguns eram mais do que velhacos: eram
gradessíssimos tratantes.
Acontecia o indivíduo apanhar constipação; ficando perrengue, mandava o
próprio chamar o doutor e, depois, ir à botica para aviar a receita, de cápsu-
las ou pílulas fedorentas. Doença nefasta era phtysica, feia era o gálico. Antigamente, os sobrados tinham assombrações, os meninos lombrigas, as-
thma os gatos; os homens portavam ceroulas, botinas e capa-de-goma, a ca-
simira tinha de ser superior e mesmo X.P.T.O. London, não havia fotógra-
fos, mas retratistas, e os cristãos não morriam: descansavam.
Mas tudo isso era antigamente, isto é, outrora.
II
Antigamente, os pirralhos dobravam a língua diante dos pais, e se um se es-
quecia de arcar os dentes antes de cair nos braços de Morfeu, era capaz de
entrar no couro. Não devia também se esquecer de lavar os pés, sem tugir nem mugir. Nada de bater na cacunda do padrinho, nem de debicar os mais
velhos, pois levava tunda. Ainda cedinho, aguava as plantas, ia ao corte e
logo voltava aos penates. Não ficava mangando na rua nem escapulia do
mestre, mesmo que não entendesse patavina da instrução moral e cívica. O
verdadeiro smart calçava botina de botões para comparecer todo liró ao co-
po d’água, se bem que no convescote apenas lambiscasse, para evitar flatos.
Os bilontras é que eram um precipício, jogando com pau de dois bicos, pelo
que carecia muita cautela e caldo de galinha. O melhor era pôr as barbas de
molho diante de um treteiro de topete; depois de findar e engambelar os
coiós, e antes que se pusesse tudo em pratos limpos, ele abria o arco. O di-
acho eram os filhos da Candinha: a quem somava a candongas acabava na rua da amargura, lá encontrando, encafifada, muita gente na embira, que
não tinha nem para matar o bicho; por exemplo, o mão-de-defunto.
Bom era ter costas quentes, dar as cartas com a faca e o queijo na mão; me-
lhor ainda, ter uma caixinha de pós de perlimpimpim, por isso evitava de
levar a lata, ficar na pindaíba ou espichar a canela antes que Deus fosse ser-
vido. Qualquer um acabava enjerizado se lhe chegavam a urtiga ao nariz,
ou se o faziam de gato-sapato. Mas que regalo, receber de graça, no dia-de-
reis, um capado. Ganhar vidro de cheiro marca barbante, isso não: a moci-
nha dava o cavaco. As vezes, sem tirte nem guarte, aparecia um doutor
100
pomada, todo cheio de nove horas; ia-se ver, debaixo da tanta farofa era um
doutor de mula ruça, um pé rapado, que espiga! E a moçoila, que começava
a nutrir xodó por ele, que estava mesmo de rabicho, caía das nuvens. Quem
queria lá fazer papel de pança? Daí se perder as estribeiras por uma tuta-
méia, um alcaide que o caixeiro nos impingia, dando de pinga um cascão de
goiabada.
Em compensação, viver não era sangria desatada, e até Chico vir de baixo
vosmecê podia provar uma abrideira que era o suco, ficando na chuva mes-
mo com tempo bom. Não sendo pexote, e soltando arame, que vida supim-pa a do degas! Macacos me mordam se estou pregando peta. E os tipos que
havia: o pau-para-toda-obra, o vira-casaca (este cuspia no prato em que co-
mera), o testa-de-ferro, o sabe-com-quem-está-falando, o sangue-de-barata,
o Dr. Fiado que morreu ontem, o zé povinho, o biltre, o peralvilho, o salta-
pocinhas, o alferes, a polaca, o passador de nota falsa, o mequetrefe, o sa-
fardana, o maria-vai-com-as-outras... Depois de mil peripécias, assim ou
assado, todo mundo acabava mesmo batendo com o rabo na cerca, ou sim-
plesmente a bota, sem saber como descalça-la.
Mas até aí morreu Neves, e não foi no Dia de São Nunca de tarde: foi víti-
ma de pertinaz enfermidade que zombou de todos os recursos da ciência, e
acreditam que a família nem sequer botou fumo no chapéu?
101
O HOMEM, ANIMAL EXCLAMATIVO
Carlos Drummond de Andrade
AVE! SALVE! Viva! Sursum corda!
Alvíssaras, meu capitão!
Essa, não! Antes a morte! E eu que pensei que você fosse meu amigo!
Nunca! Jamais! Credo! Te arrenego! Vá para o diabo que o carregue!
Raio que te parta! Deus é grande! Ô diabo, esqueci! Salvo seja! Mas que beleza! Que tetéia! Que pancadão! Que pão! Que
uva! Que coisa mais boba! Que gracinha!
Ah, você está querendo briga! Você não se emenda! Casaca! casaca! ca-
saca!
Está na hora! Protesto! Agora é tarde! Tarde piaste! Que dor! Ai! Ui!
Irra! Bofé! Minha santa Maria eterna! Este garoto é de morte! Nunca
morrer assim! Num dia assim, de sol assim!
Corta! Desliga! Mas que calor! Que friu, meu tiu, na beira do riu! É de-
mais! Socorro! Este país está à beira do abismo! É a vovozinha!
Fora! Fiau! Argh! Catrapus! Alto lá! Repita se é capaz! Rua! Volta,
meu amorzinho, volta!
Feiosa! Tem gente! Socorro! Assim é demais! Grandessíssimo canalha! O senhor está me ofendendo! Estou sim! Pague e não bufe! Atenção, mui-
ta atenção! Vae victis! Pega ladrão!
Não mate a árvore, pai, para que eu viva! O preço da liberdade é a eterna
vigilância! Pra frente, Brasil! Ou vai, ou racha!
Tome que o filho é seu! O passarinho do relógio está maluco! Não quero
saber de nada! Cuidado! Puxa vida! Boa piada!
Do alto destas pirâmides, quarenta séculos vos contemplam! Comigo não,
violão! Mea culpa! É de lascar! Da pontinha! Sossega, leão!
Putzgrila! Eia! Tá! Olá! Tá doido! Exijo mais respeito!
Chi! Ora bolas! Papagaio! Não pode! Pipocas! Olha o rapa! Não diga!
Shazam! Michou os carburetos! Hélas! Lotado! Não chateia! Te mato! Te adoro! Não admito! Até a próxima!
Bom fim de semana, boas festas, bom tudo!
Não faltava mais nada! Eu bem que avisei! Não apoiado! Podia ser pior!
Assim não vai! Desenvolvimento e segurança!
Cala a boca, Etelvina! Você é que é culpado! Eu nunca disse isso! Pois
agora, tome! Filhinha, nunca vi essa mulher na minha vida! Sou uma bes-
ta! Comigo ninguém pode!
Uma esmolinha, pelo amor de Deus! Presente! Os que forem brasileiros
me sigam! Ame-o ou deixe-o! Eu estava brincando!
102
Noutra não caio! Olho vivo! Cavalo não desce escada! Sou pequenino
mas não sou burro! Que é isso, rapaz! Genial! Mamãe, papai deixou! Es-
queci a pílula! Era só o que faltava!
Cretino é você! Olalá! Bons olhos o vejam! Nem me fale! O filme é uma
droga! Que sarro! Comeu gambá errado!
Bravo! Assim é que é! Vou-me embora pra Pasárgada! Não quero saber
mais de você! É baixo! Guerra é guerra!
Joga a chave! É mentira! Juro por alma de minha mãe! Vamos acabar com
isso! Amanhã é outro dia! Que vergonha, meu Deus do céu! É o fim da picada! Sou filho do carbono e do amoníaco!
Caramba! Per la Madonna! Quem te viu e quem te vê! Átila, você é bár-
baro! Peço a palavra! Paz e amor! A guerra acabou, eu devolvo o órfão a
Saigon!
Ama com fé e orgulho a favela em que nasceste! Isto não está no script!
Babau! Oxalá! Braço é braço! Boa bisca! Foi pras cucuias!
É o cúmulo! Isso aqui não é a casa da mãe da Joana! Dobre a língua! Vos-
sa excelência é quem sabe! Já ganhou! Independência ou morte! Essa é
boa! Coitado! Você é que é feliz! Acabou! Foi ele! Não tenho que lhe
dar satisfação! Não vem que não tem!
Que tempos, meu caro senhor, que tempos! Já não se comem broas de fubá
como antigamente!
103
O HOMEM, ANIMAL QUE PERGUNTA
Carlos Drummond de Andrade
QUE HORAS SÃO? Mas quem é você? Sabe com quem está falando?
E daí? Por quem os sinos dobram? Que é a verdade? Há sinceridade nis-
so?
Com quantos paus se faz uma canoa? Mas você se emenda? Está pensando
o quê? Aceita mais uma xícara? Por que não me disse antes? Sabe da última? Quem ganhou? Qual o seu
desodorante predileto? E a CIA, hem?
Esses camarões são frescos? O senhor é parente do falecido? Soou a hora
da verdade? E que mais?
Fez sua declaração dentro do prazo? Dói muito? Afinal, quando é que vo-
cês se casam? A que hora é o batizado? Passou na Alfândega sem bololô?
Qual nasceu primeiro, o ovo ou a galinha? De que cor era o cavalo russo de
Napoleão? Até quando abusarás da nossa paciência?
O senhor é que é o Epaminondas? És cristão? Que é ser cristão? Quando é
que sai o pagamento?
Você é mais Brossard ou mais Portela? Será que via chover? Ia esquecen-
do o meu aniversário, né? Aqui que nós; ela dá pelota? Seu signo é Leão, e você não aproveita hoje? Tem certeza que ele mora no
Beco das Garrafas? Em que posso servi-lo? Por que ela vai sempre ao den-
tista a essa hora, mesmo nos feriados?
Me dá uma cópia da sua dieta, para eu experimentar? Como você faz,
quando é assaltado? Quem tem medo do Imposto de Renda? Quem matou
e quem mentiu nos crimes da Barra? Who’s who?
Desde quando eu tenho que lhe prestar contas da minha vida? Quando foi
que o senhor percebeu que era andrógino? Se vier o divórcio, como é que
você vai fazer pra casar de novo?
Você é surdo de nascença ou de rock? A reclassificação ainda vai demorar
50 anos, ou apenas mais 10? Que há de novo? To be or not to be? Por que você não pareceu mais lá em casa? Esta briga
é pública ou particular? Você jura que não está me traindo, jura? Chi lo
sa?
Que é que eu vou fazer com tanto dinheiro? Qual o maior: César ou Ale-
xandre, Gonçalves Dias ou Castro Alves? A senhorita está sentindo alguma
coisa? E a moral da história, pode me dizer qual é, se não for imoral?
É seu este cachorrinho que acabou de fazer pipi na minha calça nova? Sabe
que vai se arrepender de não ter comprado este apartamento a preço de ba-
nana-prata? Você sonha em preto e branco, ou tevê a cores?
104
O senhor se julga realizado, semi-realizado ou não-realizado? Kissinger
vem ao Brasil antes ou depois de Frank Sinatra? O cavalheiro está namo-
rando pra casar ou pra que é? Na sua opinião, o terceiro partido resolve, ou
é melhor nenhum? À quoi bon?
Por que as coisas só melhoram amanhã ou depois de amanhã, e hoje é sem-
pre hoje? Por que ninguém ri quando está com dor de barriga, por melhor
que seja a piada? Quem foi que verificou que à noite todos os gatos são
pardos? Você me ama, diz, você me ama de verdade ou é de mentirinha?
Por que ninguém mais se lembra de ir à Lua: preguiça? Afinal, quem é que descobriu o Brasil: Cabral ou as multinacionais? Debaixo de todo angu tem
carne, ou só na classe A? Quem, se eu gritasse, me escutaria, entre as cortes
angélicas? E o sexo dos anjos, já se apurou se tem?
Você não se enxerga? Você sabe se o Xavier já pediu demissão? Você está
louco? O que é que levo nisso, me diga? E quando ele souberem? E se a
vaca for pro brejo? Quem desconstantinoplorizará o arcebispo de Constan-
tinopla, se?... Verdade que o Prefeito desistiu de alugar sede para a Prefei-
tura porque não agüenta pagar predial e taxas?
E agora, José? Por bem ou por mal, vai me dizer que horas são?
105
O HOMEM E SUAS NEGATIVAS
Carlos Drummond de Andrade
NÃO PODE. Não me diga. Não dá. Essa, não.
Não me toques. Não me deixes. Não te esqueças de mim. Não tem de quê.
Não vá com tanta sede ao pote. Não admito. Não estou aqui pra botar azei-
tona em empada de ninguém.
Hoje, não. Nem preguei olho. Não sei de que se trata. Não li e não gostei. Não vou com a cara dele.
Nada tenho a declarar. Não há verba. Não ficará pedra sobre pedra. Não
entendi patavinas. Não sei onde estou que não lhe quebro a cara.
Nem aqui nem na China. Não fede nem cheira. Não dá ponto sem nó. Não
pode com a uma gata pelo rabo. Não sabe da missa a metade.
Não tem papas na língua. Não mete prego sem estopa. Não é de nada. Não
sou o que o senhor está pensando, cavalheiro.
Não me amole. Nem te ligo. Não quero saber e tenho raiva de quem sabe.
Não dá para a saída. Nem me fale. Não atire.
Não tugiu nem mugiu. Não ata nem desata. Não quero saber de namoro na
Barra da Tijuca. Não e não, já disse. Homem, nem sei o que diga. Nada,
não. Não vá me dizer que ela é sua cunhada. Nunca mais. Não sou daqueles que cospem no prato em que comeram.
Não adianta você chorar. Não repita. Não penso noutra coisa. Não insista,
por favor, seu Januário. Não há mal que sempre dure. Não há pressa. Você
não perde por esperar. Não há mais juízes em Berlim.
Não matarás. Não cobiçarás a mulher do próximo. Não buzine. Não tenho
que lhe pedir desculpas. Não comi nada até esta hora. Não estou gostando
dessa história. Não queria aborrecê-lo, mas...
Não sei de que se trata. Não goste de ser incomodado. Nem contra nem a
favor do divórcio, muito antes pelo contrário. Não vou sujar minhas mãos
em você. Não bebe mais não, meu anjo. Não abuse do crediário, meu filho.
Tenho lá alguma coisa com isso. Não levo desaforo pra casa. Não bato em mulher. Nada de novo na frente ocidental. Nesse andar você não emplaca.
Ele não nem visita.
Sem chus nem bus. Sem tirte nem guarte. Sem eira nem beira. Nem um
pio. Nem carne nem peixe. Nem por pensamento, doutor. Nadinha, queri-
do. Sem pé nem cabeça. Sem dizer água vai. Sem quê nem praquê. Não
me provoque que eu digo tudo.
Sem destino. Sem lenço nem documento. Não deu outra coisa. Não é
normal. Não está no gibi. Não é mole não. Nada pior do que um elefante
não hora do jantar. Garçom, isso nunca foi sopa à la Sainte Meunière.
106
Não estou te reconhecendo hoje. Não dói na hora. Não estou lembrado. Já
disse que não pago e não pago. Não há país no mundo igual a esse. Nem se
compara. Nem tanto. Nunca me senti tão perto de Deus como naquela tar-
de no Corcovado.
Não há exemplo de tamanha bandalheira. Nesta casa eu não mando nada.
Não posso contar por enquanto. Nunca se sabe o que elas estão tratando.
Não me chamo Antônio, não sou casado e não moro em Niterói.
Não dá pra entender. Nem assim. Ali não boto mais os pés. Você não sabe
quanto me custa. Santa não sou. Até que nem. Hoje não estou para brin-cadeiras. Não pedi nem pedirei demissão; não peço nada a ninguém.
Não pense que isso fica assim, não. Ringo não perdoa. Hoje não tem carta
para a senhora. Proibido estacionar. Mas não espalha. Não sou palmatória
do mundo. Proibido pisar no gramado. Proibido proibir.
Eu não tinha esse rosto de hoje, assim calmo, assim triste, assim magro.
Não te fies do tempo nem da eternidade. Hippocrate dit oui, mais Galien
dit non. Os não alinhados, a não-valia, a não-violência – esta última, valen-
do como sim à vida, ou nem isso.
107
DIZER E SUAS CONSEQÜÊNCIAS
Carlos Drummond de Andrade
MUITAS COISAS SE DIZEM, que não deviam ser ditas; muitas outras se
calam, que não mereciam calar-se. As palavras são as mesmas, em um e
outro caso; só a conveniência delas, na circunstância delas, na circunstância,
é que varia. E na variação, fica o dito por não dito. A menos que o convic-
to (ou o teimoso) diga: “Digo e repito.” Também cabe referir aquelas coisas manifestadas com a ressalva: “Diga-se
de passagem.” Em geral, são as que não passam, as mais relevantes no dis-
curso, e a matéria que parecia principal descolore em função do que parecia
acessório.
Dizer, bendizer, maldizer, confundem-se na massa de sons. Tudo escapan-
do da mesma boca, mas vozes diferentes atropelam-se nesse anunciar de ju-
ízos, interesses, paixões e estados de espírito que se desmentem uns aos ou-
tros. Contradizer-se é ainda uma solução para o conflito que nossos impul-
sos sucessivos travam por meio e à custa de palavras.
É tão incoerente essa trama verbal a desenvolver-se no tempo, que se procu-
ra dar-lhe nexo, apelando para fórmulas: “Como eu ia dizendo...” “O que é
mesmo que eu estava dizendo?” O dizer de um precisa ser acionado pelo di-zer do outro, e do acoplamento (linguagem espacial em curso) dos dizeres
surge novo dizer, que é o anterior e é outro. De modo que ninguém diz pro-
priamente o que diz, mas só o que lhe ocorre (se ocorre) dizer, ou lhe é so-
prado na ocasião. E pode acontecer que o companheiro, em vez de soprar
uma dica, lance uma contradita, passando os dois a renhir em dize-tu direi-
eu.
O gosto de dizer costuma chegar ao excesso de dizê-lo com os seus botões,
como se os botões dialogassem conosco. Mas há quem diga que botão não
só escuta, como também fala a quem tem ouvido capaz de ouvir e de enten-
der botões.
Por que se dizem cobras e lagartos, e não se dizem rouxinóis e açucenas? Dizer maravilhas de alguém ou de alguma coisa não é o mesmo que dizer
chocolates ou estrelas ou sonatas. O repertório da língua presta-se mais ao
dizer contra que ao dizer a favor. O Zico disse horrores de você. O Zico
não disse arco-íris de você. Disse as últimas, e você não reagiu?
O azul diz bem com a tua pele, minha querida: observação tranqüilizadora
para a mulher que está pensando em encomendar um vestido azul. Mais um
vestido, amor? Bem, eu não queria dizer isto. Muito do que se diz em lou-
vor disso ou daquilo, em confronto com a realidade, pode suscitar o bocejo
em forma de frase: Não é lá para que digamos.
108
Fuja do cara que lhe pede licença para dizer só uma palavrinha ou, no má-
ximo, duas palavras. Dirá 2 milhões, dirá até dizer: chega. Não creia ainda
que quem lhe diz alguma coisa, precedida de: “Como diria o outro.” O outro
não diria aquilo. Mas sucede que o outro pode ter feito isso ou aquilo, sem
dizer água-vai, e brota-nos a exclamação estupefata: “Quem diria, hem? O
Astolfo!”
Do diz-que-diz cumpre fugir às léguas, embora seja tão capitoso o “ouvi di-
zer que”, pois nos permite ser indiscretos e nos exime de responsabilidade.
Como seria imprudente, em outras eras, “dizer a alguma dama com al-guém”, pois seria o mesmo que culpá-la de mancebia com esse alguém, que
podia ser, digamos, o comandante da praça: “Dir-se-ia que...” não teria a
mesma origem montanhesa?
Entre o dizível e o indizível balança a criação do poeta, flutua o êxtase dos
namorados. Dizer o que jamais soube ser dito, aspiração de manipulador de
vocábulos, que talvez nem saiba dizer o sabido. Haverá algo a dizer, abso-
lutamente inefável, que nem os anjos conseguissem exprimir nem os ho-
mens entender?
Em verdade, em verdade vos digo que hoje noa tenho nada a dizer. Dizen-
do esse nada, encerro aqui. Dictum, factum.
109
A FRASEOLOGIA ROMÂNICA
(estudo comparativo) 38
A necessidade de um estudo
comparativo da fraseologia
das línguas românicas. A
convergência e a divergência
na comparação das frases
feitas de sete línguas româ-
nicas, semântica, fonética e
morfossintaticamente. A uti-
lidade do estudo comparati-
vo das frases feitas das lín-
guas românicas.
38 Trabalho final apresentado ao Professor Belchior Cornélio da Silva, ao final do curso de Es-
tudo Comparativo das Línguas Românicas, na Faculdade de Letras da UFRJ, primeiro semestre
de 1985
110
INTRODUÇÃO
Estudaremos algumas das frases feitas da língua portuguesa documentadas
literariamente por Carlos Drummond de Andrade em suas crônicas.39 Tal
estudo consistirá, basicamente, na comparação de nossas frases feitas com
as frases feitas correspondentes semanticamente em outras línguas români-
cas.
Não tivemos a ousadia de atingir um grande número de expressões nem de
compará-las com as existentes em todas as línguas românicas. Aliás, nem
mesmo as línguas que elegemos para fazermos nossa comparação, puderam ser exaustivamente examinadas, visto a escassez de bibliografia disponível.
Partindo do português, examinamos a fraseologia galega, a espanhola, a ita-
liana, a francesa, a romena e a latina.
Para os fins deste trabalho, consideraremos como frase feita toda locução
cristalizada e todo tipo de expressão fixa, tais como provérbios, adágios,
anexins, etc., utilizados na linguagem oral e documentados literariamente.
Como língua românica também, ousamos incluir o latim literário, fugindo
ao tradicional conceito universalmente aceito pelos romanistas. Justificar-
nos-emos disto pelo fato de serem, as frases feitas, expressões cristalizadas
numa língua, que refletem o espírito de seus falantes e não de seus artífices.
Assim sendo, acreditamos que as frases feitas encontradas no latim literário
sejam as mesmas do latim oral e vulgar, como são as que se encontram nas literaturas de línguas neolatinas. Portanto, do latim vulgar também.
Além disso, a comparação se torna mais abrangente, se levarmos em conta
uma fase das línguas românicas bastante mais antiga. Com isto, além de
observarmos os diferentes usos de uma locução ou provérbio nas diversas
línguas românicas comparadas, notaremos também a antigüidade de algu-
mas delas, que já se usavam em latim. Na realidade, o latim é um estágio
anterior das nossas línguas.
As nossas limitações pessoais, mais as limitações impostas pelo tema, cuja
bibliografia não é das melhores, mais as limitações relativas à natureza do
trabalho, que tem um cronograma apertado, tudo isto junto é responsável
por não ampliarmos um pouco mais as nossas pesquisas agora. Além de ficarmos apenas no português, galego, espanhol, italiano, francês,
romeno e latim, como dissemos, não utilizaremos frases feitas de todas estas
línguas nas diversas comparações realizadas. Aliás, isto acontece raríssimas
vezes.
Além de não existirem formas correspondentes, como frases feitas, em to-
das as línguas comparadas, nem todas as existentes tivemos acesso. Nou-
tros casos, as expressões que traziam semelhança semântica eram tão dife-
39 Confira, na Bibliografia, os livros de crônicas consultados para este trabalho.
111
rentes da nossa ou têm aplicações tão diversas, que nos desanimaram a in-
cluí-las no trabalho.
Algumas frases feitas são tão semelhantes que mais parecem traduções lite-
rais. Isto não é de estranhar, pois têm origem comum todas as línguas em
que elas se encontram.
O número de frases feitas estudadas pouco passa de uma centena em portu-
guês, ficando bastante aquém em todas as demais línguas. Confessamos
que nossa bibliografia sobre o assunto é muito deficiente.
O único dicionário bilíngüe romeno-português, editado em 1977, é uma ra-ridade. Mesmo assim, ainda agradecemos a Deus por termos este, pois o fa-
to é muito mais lamentável quando tratamos das outras línguas românicas
que não se tornaram línguas nacionais, como é o caso do galego.
É urgente que se levantem questões sobre estas entre-palavras-e-frases, tão
ricas de expressividade, e que se amplie a bibliografia comparativa da fra-
seologia entre as diversas línguas românicas, ou mesmos, simples dicioná-
rios bilíngües de locuções, que seriam as bases destes estudos.
Quanto ao galego, por exemplo, nada encontramos a respeito. Nossa fonte
de consulta foi o Prof. Alfredo Maceira Rodríguez, galego, poliglota, e es-
tudioso apaixonado das fatos referentes às línguas românicas.
Filólogo, professor de Português, Espanhol, Inglês e Esperanto, é autor de
uma gramática espanhola para falantes de português40, e pretende publicar, em breve, um opúsculo de divulgação do galego. Sua tese de doutorado,
cujo curso ainda não começou, já está definida: será sobre o galego41.
Eis os passos que seguimos para realização deste trabalho.
Inicialmente, levantamos a fraseologia nas crônicas de Carlos Drummond
de Andrade, que foi o nosso corpus básico para diversos outros trabalhos.
Das 700 frases feitas constantes no trabalho A Fraseologia nas Crônicas de
Carlos Drummond de Andrade: subsídios para um dicionário básico,42 após
verificação da fraseologia nas línguas românicas selecionadas, escolhemos
108 frases feitas entre as 175 que tiveram pelo menos em três línguas uma
forma proverbial ou locucional correspondente.
Antes de começar este estudo comparativo, estudamos o seu significado e fizemos sua abonação com exemplos extraídos das crônicas drummondia-
nas,43 conjeturamos sobre a sua origem e a sua história,44 apoiado na me-
40 Foi publicada em 1996, com o título Estudiemos Español: gramática, ejercicioos, lecturas,
para estudiantes brasileños. 41 Intitulada Interferência do léxico galego no português falado pelos imigrantes galegos no
Rio de Janeiro, foi defendida em abril de 1995. 42 SILVA, J.P. (1984-B) . 43 SILVA, J.P. (1984-B) . 44 SILVA, J.P. (1984-B) .
112
lhor bibliografia existente sobre o assunto, e procuramos demonstrar a sua
estrutura morfossintática,45 ou seja, a sua constituição interna.
Estabelecido assim o nosso corpus para este trabalho, analisaremos compa-
rativamente algumas dessas expressões, levando em conta a sua estrutura
semântica, a sua estrutura morfossintática e a sua estrutura morfossintática e
a sua estrutura métrico-rímica.
Quanto aos dois últimos aspectos, faremos considerações nos dois primeiros
capítulos seguintes, levando em conta a convergência e a divergência nessas
formas. Quanto ao aspecto semântico, sem discussões mais personalizadas, apresentamos as frases feitas em ordem alfabética da palavra-chave da for-
ma portuguesa, de acordo com os critérios adotados por Antenor Nascen-
tes46 e por Aurélio Buarque de Holanda Ferreira,47 e adotados também por
nós em nossos trabalhos anteriores. V. capítulo 4.
No capítulo 2, trataremos da convergência na fraseologia das línguas româ-
nicas, observando que quase sempre esta convergência é parcial, pois as co-
res locais sempre ficam evidentes na fraseologia do falantes de cada língua,
e apresentando hipóteses para explicar alguns casos. Observamos, inclusi-
ve, que a convergência pode se dar em relação a duas línguas, em relação a
um fato, ou em relação a uma estruturação qualquer. Também, que pode
haver convergência só em relação a duas ou três línguas e não em relação às
demais. O mesmo que dissemos em relação à convergência é válido para os fatos
divergentes, que trataremos no capítulo 3.
O nosso objetivo principal, com elaboração deste trabalho, é mostrar aos es-
tudiosos da Filologia e da Lingüística Românicas que existe uma área de es-
tudos comparativos da mais alta importância para o desenvolvimento das
ciências da linguagem, das ciências humanas, de diversas áreas do conhe-
cimento, que está quase totalmente intocado.
Lembramos, inclusive, que o estudo comparativo das diversas fraseologias
(portuguesa, galega, espanhola, italiana, francesa, romena, latina, etc.) será
muito importante para a compreensão de fatos relativos a cada uma destas
línguas e de todas, no conjunto da romanidade lingüística.
2 – A CONVERGÊNCIA NA FRASEOLOGIA ROMÂNICA
45 SILVA, J.P. (1984-B) . 46 NASCENTES, A. (1945) . 47 FERREIRA, A. B. H. (s. d.) .
113
Embora saibamos que as frases feitas sinônimas em línguas diferentes e
com a mesma estrutura morfossintática são muito raras, podemos afirmar
que elas não são tão raras assim, quando se trata das línguas românicas.
Basta que admitamos que os sinônimos sejam imperfeitos ou que formem
séries sinonímicas. Além do mias, podemos encontrar pontos de conver-
gência até em construções locucionais bastante diferenciadas. A final de
contas, estamos lidando com línguas que têm um ponto de partida comum,
ao latim vulgar.
Muitas vezes, o que é uma locução ou uma frase feita em uma língua, em outra é uma palavra composta simplesmente. Isto acontece com muita fre-
qüência quando a frase feita se constitui de apenas dois ou três elementos
vocabulares.
Como escolhemos a fraseologia como elemento de comparação, neste traba-
lho, não consideraremos tais casos, mesmo quando as formas corresponden-
tes contiverem os mesmos elementos mórficos constituintes. Mesmo sa-
bendo também que isto é muito mais um problema convencional de ortogra-
fia do que um problema de natureza semântica ou morfossintática.
É claro que existem muitas frases-feitas que não têm forma locucional em
outras línguas ou em algumas outras línguas. Existem até semas que não
possuem correspondentes em tais outras línguas.
Aliás, dentro de uma mesma língua, é possível encontrar formas locucionais paralelas a palavras compostas. Vejamos os seguintes casos, em português:
“cabeça fria” e “cabeça-chata”; “água mineral” e “água-comum” ou “aguar-
rás”; “em cima” e “embaixo”; etc.
Não achamos fácil explicar por que umas dessas palavras constituem “pala-
vras compostas” e outras palavras, da mesma natureza e classe morfo-
semântica, constituem “locuções”.
Entre línguas diferentes também ocorre o mesmo fato. Eis alguns exem-
plos: o português “talvez” corresponde à locução galega e espanhola “tal
vez”; a nossa locução “por isto” corresponde ao vocábulo italiano “perciò”;
o português “mestre-cuca” corresponde à locução francesa “maître coq”.
Dados os graus de afinidades geopolíticas e culturais, o português é mais parecido com o galego, com a qual se confundiu durante a sua fase proto-
histórica, e com o espanhol. A seguir, com o italiano e com o francês, com
que teve relações histórico-culturais que não se podem desprezar.
O latim, por estar no tempo, e o romeno, por se ter isolado no espaço, estão
igualmente muito distantes da estrutura atual da língua portuguesa, conside-
rando-se que são todas de uma mesma família, numa relação de irmãs e de
filha-mãe.
Analisemos, comparativamente, algumas frases feitas, considerando os seus
diferentes níveis e natureza de convergência.
114
A nossa frase-feita “uma andorinha só não faz verão”, por exemplo, con-
verge com a correspondente espanhola em relação à partícula de restrição.
É claro que, mesmo nesta convergência, a forma espanhola diverge sutil-
mente da nossa por ser claramente adjetivante, enquanto a nossa partícula
mantenha a ambigüidade, podendo ser analisada também como adverbial,
modificando o determinante de andorinha. Portanto, em português, pode-
mos analisar a frase como “uma andorinha sozinha...”ou “uma andorinha
somente...”.
A expressão espanhola “uma golondrina sola no hace verano” e a portugue-sa “uma andorinha só não faz verão” ainda têm em comum a referência ao
verão, enquanto que nas demais a estação do ano em que as andorinhas de-
vem aparecer é a primavera. Ei-las, todas juntas:
Português: Uma andorinha só não faz verão.
Espanhol: Una golondrina sola no hace verano.
Italiano: Una rondine no fa primavera.
Francês: Une hirondelle ne fait pas le printemps.
Latim: Una hirundo no facit ver.
Como as frases-feitas refletem o meio ambiente em que surgiram e prospe-
raram, os costumes e a história do povo que as cultivaram, etc., podemos
concluir, provisoriamente, que as andorinhas costumavam estacionar-se no
território da Península Ibérica durante a primavera. Mais ainda. Podemos concluir que estas aves migratórias mantém o seu hábito de revoar sobre as
cabeças dos romanos, desde a época em que sua língua era o latim, durante
a estação da primavera.
Aí está, portanto, uma frase em que é importante a inclusão da língua latina
junto às línguas românicas neste trabalho comparativo. Com isto documen-
tamos um fato relativamente interessante em relação ao hábito migratório
das andorinha no território europeu desde priscas eras.
Podemos ainda observar, em relação à estrutura destes provérbios români-
cos, que todos têm a forma de um negação que diz respeito ao que uma an-
dorinha não pode fazer sozinha.
Em todas se entrevê, portanto, a crença popular de que as andorinhas é que trazem o verão ou, para os outros, a primavera.
Um outro exemplo é a locução portuguesa “por acaso”, que tem correspon-
dente em espanhol, “por acaso”, em italiano, “per caso”, em francês, “par
hasard”, em romeno, “po brodite”, em latim, “per accidens”, e em galego,
“por suposto”.
Em todos os casos, as locuções se constituem de preposição mais nome.
Nos três primeiros casos, os nomes têm os mesmos traços semânticos, en-
quanto nos demais casos eles têm constituição morfo-semântica apenas se-
melhante.
115
O português “levantar âncora” corresponde ao espanhol “levar anclas, ao
italiano “salpere ancora” e ao latim “ancoras vellere”ou “ancoras moliri”.
Todos os casos documentados acima se constituem dos mesmos elementos
mórficos. A diferença está apenas na colocação inversa, no latim, em rela-
ção às demais línguas, e no plural da palavra âncora em espanhol e latim.
Acreditamos que isto está relacionado ao tipo mais comum de barcos ou
embarcações em cada uma dessas regiões. As embarcações em cada uma
dessas regiões. As embarcações menores podiam fixar-se com uma âncora
apenas, ao passo que as maiores precisavam de mais de uma. Por outro la-do, registramos o fato de que existe a variante “levantar âncoras” também
em português, com a ressalva de que tal expressão só se usa quando o sujei-
to da ação está no plural, podendo-se supor que cada um esteja em embar-
cação diferente.
A frase-feita “sem dizer água vai” tem correspondente literal em espanhol,
que é “sin decir agua va”. Em francês também a frase tem forma muito pa-
recida com a nossa. Principalmente se considerarmos a história da frase,48
em que a situação já é suficiente para esclarecer que também os franceses
queriam dizer “água vai”.
Se considerarmos que gritar é uma forma especial de dizer, a frase francesa
“sans crier gare” considera a situação, em que, realmente, não se dizia, mas
se gritava para os transeuntes: água vai! Como aviso de que iria lançar al-guma coisa à rua. Como na realidade não se jogava apenas água, parece
mais lógica a expressão francesa do que as outras duas. Sendo “gare” uma
palavra de situação real de seu uso, sem trazer expressa a informação que
trazem as formas ibéricas, sem dizer o que é que se pretende jogar à rua.
“Quem não arrisca não petisca.” Provérbio português de sentido prático
evidente, cuja intenção é persuadir o seu decodificador a ousar, a tentar ul-
trapassar os eus próprios limites. Pode ser interpretado também de maneira
passiva, como justificação de alguém, que fracassou numa aventura arrisca-
da, mas com objetivos práticos.
Nos cinco casos documentados, em português, espanhol, italiano, francês e
latim, a estrutura morfossintática é idêntica. É uma frase com sujeito oraci-onal e oração principal negativa, que tem significado afirmativo, visto se
negar a respeito de uma outra negação. Além disso, em todas elas, existe
uma preocupação com a rima grande. A tal ponto de ser quase totalmente
desprovida de valor semântico a última palavra de cada uma dessas frases.
A última palavra da primeira oração rima com a última palavra da frase.
Confira:
Português: Quem não arrisca não petisca.
Espanhol: Quien no arriesca no pesca.
48 Cf. SILVA, J.P. (1984-B) p.14.
116
Italiano: Chi no risica, non rosica.
Francês: Qui ne risque rien, n’a rien.
Latim: Nihil lucri cepit que nulla pericla subivit.
A frase-feita que significa tomar um gole de bebida alcoólica em jejum, tem
origem numa história de que duvidamos um pouco.
Conta-se que uma senhora sentiu um a forte dor e morreu dentro de pouco
tempo, sem se poder saber a causa de sua morte. Como era gente de bem,
uma equipe médica abriu-lhe o cadáver para examinar as suas entranhas,
encontrando um pequeno verme atravessado em seu coração, violentamente encravado.
Extraindo-o, aplicaram sobre ele os mais diferentes remédios sem lhe causar
o menor mal.
Esgotados todos os recursos, colocaram-no sobre um pedaço de pão embe-
bido em vinho e ele morreu imediatamente.
Sabendo disso, passou-se a tomar uma dose de bebida alcoólica pela manhã,
com o pretexto de “matar o verme”.
Como correr dos anos, mata-se o bicho a qualquer hora.
Pois bem. Esta frase tem esta mesma origem nas três línguas em que a en-
contrei: português, espanhol e francês.
Curiosamente, a palavra que traduz a palavra copo, em italiano, é “bicchie-
re”. Por isto, tomar um copinho ou tomar uma dose de bebida, traduz-se como “tracannare un bicchierino”, que forma uma expressão aparentemente
semelhante.
Nessas quatro línguas, as expressões referidas são: “matar o bicho” (portu-
guês), “matar el gusanillo” (espanhol), “tuer le ver” (francês) e “tracannare
un bicchierino” (italiano, com devida ressalva).
Outra expressão também interessante é “bode expiatório”.
Em português, espanhol, italiano e romeno, a locução tem a mesma estrutu-
ra morfo-semântica: “bode expiatório”, “chivo expiatorio”, “capro espiato-
rio” e “tap ispasitor”, respectivamente.
Em espanhol e em francês existe aproximada, também convergente nestas
duas línguas: “chivo emisario” e “bouc emissaire”.
Embora esteja ligada à mesma origem, provavelmente, a expressão romena
“cal de ba taie”, que quer dizer cavalo de pancada, lembra muito mais de
perto a cena das tragédias gregas em que se espancava um bode no palco.
As demais frases acima, inclusive as variantes, lembram o costume dos ju-
deus de abandonarem um bode no deserto para expiar os pecados do povo.
Por fim, consideremos a frase, ”quem canta, seus males espanta”, que é uma daquelas inúmeras frases feitas românicas que refletem o veio poético do
povo.
117
Como na frase “quem não arrisca não petisca”, também nesta a rima e o
ritmo são importantes. A pausa entre o sujeito oracional e o seu predicado
marca o fim de um verso que rima com o seu par, formando um dueto.
A forma espanhola constitui um par sem nenhuma divergência com o por-
tuguês. No entanto, a forma francesa tem o objeto da segunda oração no
singular, em oposição à nossa e em convergência com a italiana. Esta, por
sua vez diverge com todas as demais eliminando a idéia de posse no objeto
da segunda oração.
Fora esses detalhes, em tudo mais são convergentes entre si, como se pode ver:
Português: Quem canta, seus males espanta.
Espanhol: Quien canta, sus males espanta.
Italiano: Chi canta, il soffrir incanta.
Francês: Qui chante, son mal enchante.
Seria cansativo enumerar todos os casos convergentes na fraseologia mos-
trada neste trabalho. Esta pode ser até mesmo gratificante, se for feita ao
sabor do leitor, que poderá ir descobrindo detalhes interessantíssimos nesta
comparação. Por isto mesmo é que deixaremos inúmeros casos, apenas ar-
rumados, em ordem alfabética, para que possam ser cotejados por quem
quiser fazer disso um lazer.
Muitas vezes a convergência está entre duas línguas estrangeiras, e não, en-tre uma estrangeira e a nossa. Nuns casos a convergência é mais abrangen-
te, noutros envolve apenas alguns aspectos. Enfim, é difícil encontrarmos
frases sinônimas em diferentes línguas românicas em que não haja algum
tipo de convergência, mesmo que sutil. Quando isto acontece, o caso é de
um frase feita que reflete uma situação exclusiva de uma população ou de
um período histórico de um povo, totalmente desligado da história e da evo-
lução dos demais.
Por outro lado, também existem divergências na maioria das frases-feitas de
línguas diferentes. É que, embora sejam todas estas línguas descendentes
diretas do latim vulgar, cada um se desenvolveu num meio ambiente parti-
cular, com características que não se confundem com as dos demais. É isto que veremos no capítulo seguinte.
3 – A DIVERGÊNCIA NA FRASEOLOGIA ROMÂNICA
Como a fraseologia constitui o que de mais característico existe no léxico de
qualquer língua, é natural que aí apareçam as divergências e as convergên-
cias que caracterizam cada uma dessas línguas em relação a todas as outras
118
do grupo a que pertencem. Através da fraseologia afloram os fatos sociais,
o aspecto geopolítico, a cultura e a história dos falantes de cada região e de
cada povo.
Os fatos convergentes são a prova da unidade na diversidade, enquanto os
fatos divergentes são a prova da diversidade na unidade.
A “unidade na diversidade e a diversidade na unidade” a que se refere Sera-
fim da Silva Neto49 talvez seja mais válida em relação às línguas românicas
em conjunto do que a cada uma delas em particular. Basta verificar que a
extensão territorial ocupada por falantes de línguas românicas é bastante maior do que a metade de toda porção ocupada de nosso planeta, sendo es-
pantosas as diferenças de costumes entre todos esses homens, que vivem em
ambientes das mais extremadas diferenças, a ponto de se tornar difícil qual-
quer tipo de comparação entre alguns deles com outros.
É exíguo o número de frases feitas totalmente convergentes entre línguas di-
ferentes. Alias, tal exigüidade se estende aos povos diferentes que falam
uma mesma língua, embora em menor extensão. Tanto assim é que poderí-
amos partir das mesmas frases feitas estudadas sob o ponto de vista da con-
vergência, no capítulo anterior, e chegaríamos a resultados interessantes,
como é fácil entrever das poucas observações que ali fizemos a tal respeito.
Vamos considerar a divergência, portanto, em expressões que estão muito
próximas das portuguesas. Comecemos pela locução “num átimo”, que corresponde à espanhola “en un
santiamén” e à romena “cît sa zici miau”.
As duas primeiras locuções, embora sejam as mais semelhantes, têm dife-
renças essenciais em seus núcleos constituintes.
A forma portuguesa provém da linguagem erudita, através da palavra áto-
mo, que é a menor parte da matéria e tomou o significado de menor parte do
tempo.50
A expressão espanhola provém diretamente do latim dos cristãos, através do
sinal-da-cruz,51 que termina com as palavras “sancti, amem”. A oração, que já é pequena: “In nomine Patris, et Fili et Spiritus Sancti. Amen.”, ao
ser reduzida às suas duas últimas palavras demonstra uma grande pressa, ou
a exigüidade de tempo disponível.
Quanto à frase romena, que mais parece com a nossa frase “enquanto o Di-
abo esfrega um olho”, traduz-se literalmente como enquanto o gato diz mi-
au E o seu sentido é facilmente compreensível.
49 SILVA NETO, S. (1979) p. 161, 50 MACHADO, J. P. (s.v.) s.v. 51 FERREIRA, A. B. H. (s. d.) . Vocábulo “santia men”
119
A frase feita “casa da Mãe Joana”, que já foi por nós explicada noutro lu-
gar,52 tem forma correspondente em francês e em romeno.
A expressão francesa, “la cour du roi Pétaud”, tem estrutura idêntica à nos-
sa. Analisadas em sua estrutura profunda, para utilizarmos uma expressão
do gerativismo, as duas frases são semanticamente igualmente estruturadas.
Mas a sua estrutura superficial, digamos, é uma para cada uma das línguas.
Certamente, aquele “roi Pétaud” dos franceses tenha admitido livremente
quaisquer pessoas em sua corte, como fizera a rainha Joana, conhecida co-
mo Mãe Joana, em seu palácio.53
A expressão romena correspondente é “sat fa ra cîini”, que se traduz literal-
mente como casa sem cachorros. Isto significa que nessa casa também en-
tram todos os que quiserem, pois não já o que impeça a alguém de fazê-lo.
A expressão latina correspondente à portuguesa “fechado a sete chaves” ou
à espanhola “bajo siete llaves” diverge no numeral, principalmente, cem e
não sete.
No entanto, a expressão latina “servatus centum clavibus” significa exata-
mente o mesmo que a nossa, pois, tanto o numeral sete quanto o numeral
cem são palavras que indicam quantidade indefinida. Nada mais indicam do
que uma grande quantidade ou um número exagerado de chaves. Também neste caso, a divergência é apenas superficial.
De outro lado, os franceses têm a expressão “tirer son épingle du jeu”, que
se traduz literalmente como tirar seu alfinete do jogo, que corresponde à
nossa “tirar o corpo fora” e à espanhola “echar el cuerpo fuera”.
Tanto as frases ibéricas quanto a francesa, sem dúvida se referem a algum
jogo, ao menos na sua origem. A frase portuguesa lembra o jogo de futebol,
como tivemos oportunidade de mostrar em outro trabalho. A frase espanho-
la pode ser uma adaptação da nossa (ou vice-versa), aplicada à tourada, que
é seu esporte favorito.
No caso dos franceses, não é o corpo que está em jogo. É um alfinete. E o
jogo, certamente, é um jogo de azar. Se o alfinete a que se refere a frase é o que se usa para prender coisas, a ori-
gem da frase se torna obscura. No entanto, é bem mais provável que alfine-
te seja uma jóia que os homens usam presas à gravata, em forma de alfinete,
ou a jóia em forma de broche que as mulheres costumam usar na roupa.
Com este último sentido, é muito fácil o entendimento da frase feita acima.
São muito mais divergentes entre si as frases feitas correspondentes à nossa
“dia de São Nunca, de tarde”.
A maioria tem em comum a característica de indicara data através de um fa-
to estranho ao calendário. E entre essas está a nossa.
52 Cf. SILVA, J.P. (1984-B) p.29. 53 Cf. CASCUDO, L.C. (1970) p.102.
120
Os espanhóis costumam dizer: “cuando febrero tenga treinta días”,. Os
franceses dizem: “la semaine des quatre jeudis” ou “trois jours après ja-
mais”. Diziam os romanos: “ad kalendas graecas”.
Ora, como não existem fevereiro de trinta dias, nem semana de quatro quin-
tas-feiras, também não é possível chegar ao terceiro dia após jamais. Quan-
to às calendas, elas não existiram no calendário dos gregos, mas no latino.
Deste modo, quem fizer quais compromissos para essas datas, não tem a
menor intenção de executá-los.
Além dessas formas, os franceses costumam marcar para “à Pâques ou à la Trinité”, deixando imprecisa a data.
Os romenos usam expressões que correspondem também à nossa “quando a
galinha nascer dente”. Dizem eles “cînd s-o face agurida miere”, ou seja,
quando a uva verde fica doce. Dizem também “de joi pîna mai apoi”, que
se traduz literalmente como de quinta-feira até mais depois ou de quinta-
feira em diante. Em ambos os casos, a interpretação fácil dispensa esclare-
cimentos.
Nossa frase feita “ensinar padre-nosso ao vigário” tem correspondentes em galego, espanhol e latim.
Em galego se diz “ensinar a seu pai a fazer fillos”; em espanhol se diz “en-
señar al cura a decir misa” e em latim se diz “piscem natare doces”.
Embora todos se refiram ao fato de alguém pretender ensinar alguma coisa a
alguém que já sabe com perfeição esta coisa, cada um considera ações dife-
rentes para serem ensinadas e pessoas diferentes para receberem os ensina-
mentos.
Os espanhóis são os que mais se aproximam dos portugueses, embora ensi-
nem a rezar missa e não o padre-nosso apenas. Os galegos descem um pou-
co o nível, embora permaneçam na mesma idéia básica. Mas os latinos es-
quecem o ser humano para considerarem o peixe como sendo quem já sabe nadar muito bem.
De qualquer modo, perde-se o tempo de ensinar a quem já sabe.
Para a expressão “pão, pão; queijo, queijo”, os italianos e os espanhóis mu-
daram o queijo pelo vinho, construindo frases feitas parecidas com a nossa.
Os primeiros dizem “pane al pane, vino al vino”, enquanto os espanhóis di-
zem “al pan pan, y al vino vino”.
Os franceses e os romenos têm bastante mais divergentes em relação à nos-
sa. Dizem os franceses: “appeler un chat un chat”. Os romenos dizem: “ori
alba, ori neagra”, que se traduz literalmente: ou branco, ou negro.
Há frases feitas curiosas, ou cômicas, como as francesas correspondentes à nossa “comer o pão que o Diabo amassou”. Dizem eles: “tirer le Diable par
la queue” (puxar o Diabo pelo rabo) ou ainda “manger de la vache enragée”
(comer carne de vaca zangada).
121
Como não poderíamos mostrar todos os casos, vamos concluindo esta
amostragem com a conhecida expressão com que se iniciam os contos in-
fantis: “era uma vez”.
Com uma estrutura mais ou menos semelhante, só descobrimos a forma ita-
liana “c’era una volta”.
Os espanhóis dizem: “erase que se era”. Os galegos dizem: “foi no tempo
de María Castaña”. Os romenos dizem: “a fost odata ”, que se traduz litera-
riamente como em antiga vez.
Era de se supor que forma como esta, de um certo modo literária, tivesse
constituição mais semelhante entre as diversas línguas românicas. No en-
tanto, é o que se vê, são totalmente diferentes.
Para que o leitor possa analisar outros casos ou fazer a sua análise pessoal
dessas mesmas expressões já apresentadas, apresentemo-las em ordem alfa-
bética.
122
4 – FRASES FEITAS SINÔNIMAS EM LÍNGUAS ROMÂNICAS
P.54 POR ACASO
G.55 Por suposto
E.56 Por acaso.
I.57 Per caso.
F.58 Par hasard; Des fois.
R.59 Pe brodite.
L.60 Per accidens, Forte quandam.
P. NÃO SE DAR POR ACHADO
G. Non se inteirar.
E. No darse por enterado.
I. Fare l’indiano.
P. ESTAR DE ACORDO.
F. Tomber d’accord; Vouloir bien.
R. A gasi cu cale.
L. Consentire cum aliquo.
P. SEM DIZER ÁGUA VAI
E. Sin decir agua va.
F. Sans crier gare.
P. LEVANTAR ÂNCORA
E. Levar anclas; Irse com la música
a otra parte.
I. Salpere ancora.
54 P. será a abreviação de Português, neste
capítulo. 55 G. será a abreviação de Galego, neste ca-
pítulo. 56 E. será a abreviação de Espanhol, neste
capítulo. 57 I. será a abreviação de Italiano, neste ca-
pítulo. 58 F. será a abreviação de Francês, neste ca-
pítulo. 59 R. será a abreviação de Romeno, neste ca-
pítulo. 60 L. será a abreviação de Latim, neste capí-
tulo.
L. Ancoras vellere; Ancoras moliri.
P. UMA ANDORINHA SÓ NÃO
FAZ VERÃO.
E. Ni una flor hace ramo, ni una
golondrina sola hace verano.
I. Una rondine no fa primavera. F. Une hirondelle ne fait pas le
printemps.
L. Una hirundo non facit ver; Una
hirundo non efficit ver.
P. QUEM NÃO ARRISCA NÃO
PETISCA.
E. Quien no arriesca no pesca.
I. Chi no risica, non rosica.
F. Qui ne risque rien, n’a rien.
L. Nihil lucri cepit qui nulla pericla
subivit
P. ASSIM ASSIM
E. Así, así.
I. Cosí, cosí.
F. Cousi-cousi
R. Si bino si rau.
P. NUM ÁTIMO
E. En un santiamén.
R Cît sazici miau; cît ai da.
P. MATAR O BICHO.
E Matar el gusanillo.
F. Tuer le ver.
P. BODE EXPIATÓRIO
E. Chivo expiatorio; chivo emisa-
rio.
I. Capro espiatorio.
F. Bouc emissaire.
123
R. T ap ispasitor; cal de ba taie.
P. (FALAR) COM SEUS BO-
TÕES.
E. Hablar para sus adentros.
I. Parlare fra sé e sé.
F. À part soi.
R. A-si sopti în barba.
P. NÃO DAR O BRAÇO A TOR-
CER.
E. No dar el brazo a torcer.
I. No dar filo da torcere.
P. NÃO ENTENDER PATAVINA
(BULHUFAS, VÍRGULA, ETC.). E. No entender ni torta.
F. Ný voir qui du feu; N’entendre
goutte à; N’y comprendre que dalle.
P. PERDER A CABEÇA.
E. Irsele a uno la cabeza.
R. A iesi din minti; A-si pierde
mintile.
L. Animo ceficer; Exire de consi-
lio.
P. DAR CABO DE.
E. Dar buena cuenta de.
F. Venir à bout de.
R. A mînca fript (pe cineva).
P. CAIR EM SI.
E. Volver en sí.
I. Tornare in sé.
P. (DAR ou VENDER) A CAMISA
DO CORPO.
E. (Vender) uno hasta la camisa.
F. (Y laisser) as dernière chemise.
P. QUEM CANTA, SEUS MALES
ESPANTA.
E. Quien canta, sus males espanta.
I. Chi canta, il soffir incanta.
F. Qui chante, son mal enchante.
P. FAZER CARA FEIA.
E. Poner cara de pocos amigos. R. Ase face cîrlig.
L. Oculis infestis conspire; Excipe-
re malo vultu.
P. NEM CARNE NEM PEIXE.
E. Ni carne ni pescado; Ni chicha
ni limonada (ou limoná).
I. Nè carne, nè pesce.
F. N’être ni chair ni poisson.
P. BOTAR AS CARTAS NA ME-
SA. F. Jouer cartes sur table; Jouer ses
cartes sur la table.
R. A da în carti. L. Astuto nihil esse acturus.
P. DAR AS CARTAS.
I. Avere il mestolo in mano.
F. Tenir le dé; Tenir la queue de la
poêle.
R. A da cu cart ile.
P. CASA DA MÃE JOANA.
F. La cour du roi Pétaud.
R. Sat fara cîini.
P. EM TODO CASO.
E. En todo caso. I. In tutti i modi.
F. En tout cas; À tout hasard.
R. În tot cazul.
124
L. Quidquid est; Utcumque erit;
Utcumque casura res est.
P. CAVALO DADO NÃO SE
OLHA A IDADE.
E. A caballo de presente no se le
mira el diente.
I. A caval donato non si guarda in
bocca. F. À cheval donné on ne regarde
pas la bouche.
L. Equi donati dentes non insipi-
cuntur.
P. FAZER CENA.
E. Hacer escenas.
I. Far scenate.
F. Faire une scène à quelqu’un;
Faire du chichi; Faire des chichis.
P. A CÉSAR O QUE É DE CÉ-SAR.
E. Lo de Cesar dalo a Cesar.
I. A Cesare quello che é di Cesare.
F. À César ce qui appartient à Cé-
sar.
L. Quæ sunto Cæsaris, Cæsari.
P. CAÍDO DO CÉU.
F. Tombé du ciel.
L. Missus caelo.
P. A SETE CHAVES.
E. Bajo siete llaves.
L. Servatus centus clavibus.
P. AFINAL DE CONTAS
G. Ao fin e ao cabo.
I. Alla fine dei conti.
F. Au bout du compte; Après tout;
Tout compte fait; À tout prendre.
P. FAZER DE CONTA
I. Far conto.
F. Faire semblant.
P. TER EM CONTA DE
G. Ter en conta.
E. Llevar en cuenta.
I. Tenere in conto di. F. Tenir compte; Faire la part de
quelque chose.
R. A face caz.
P. DE COR
E. De coro; De memoria.
I. A memória.
F. Par couer.
R. Pe de rost; Din gînd; Pe dinafara; Pe din afara.
P. TIRAR O CORPO FORA.
E. Echar el cuerpo fuera.
F. Tiere son épingle du jeu; Se tirer
d’affaire; Tirer au flanc; Tirer au
cul.
P. TER COSTAS QUENTES.
E. Tener las espaldas cubiertas. F. Avoir bon dos.
P. VOLTAR AS COSTAS A AL-
GUÉM.
E. Dar la espalda alguien.
L. Tergum vertere.
P. ENTRAR NO COURO.
F. Prendre une piquette.
R. A mînca bataie; A lua la de-
panat.
P. DAR-SE MAL
125
E. Llevarse mal.
R. A ajunge rau.
P. POUCO SE ME DÁ
E. Me importa muy poco.
F. Je m’en fiche.
P. DIA DE SÃO NUNCA DE
TARDE.
E. Cuando febrero tenga treinta dí-
as.
F. Trois jours après jamais; La se-
maine des quatre jeudis; À Pâques
ou à la Trinité.
R. Cînd s-o face agurida miere; De
joi pîna mai apoi.
L. As kalendas græcas.
P. HOJE EM DIA.
E. Hoy en día; Hoy poer hoy; Hoy
día.
I. Al giorno d’oggi.
F. Des nos jours.
P. O DIABO QUE O CARRE-
GUE. F. Que le Diable l’emporte.
R. Bata-te sa te bata!
P. POBRE DIABO.
E. Pobre diablo.
F. Un pauvre diable.
L. Homo nihili.
P. VÁ PARA O DIABO.
F. Va te faire fiche. R. La dracu cu; Du-te la naiba!
L. Abi ad Acherontem; Abi in ma-
lam pestem.
P. POR ASSIM DIZER.
F. Pour ainsi dire; Autant vaut dire.
R. Ca sa zic asa.
P. PASSAR UMA ESPONJA
F. Passer l’éponge.
R. A da cu buretele.
L. Spongia delere.
P. PERDER AS ESTRIBEIRAS.
E. Perder los estribos.
R. A scoate din pepeni.
P. COM A FACA E O QUEIJO
NA MÃO
E. Estar con la sartén por el mango;
Ser el que corta el bacalao.
I. Avere il coltello per il manico.
F. voir beau jeu.
P. POR FAVOR.
E. Por favor.
F. S’il vous plaît.
R. Prin hatir.
P. ESTAR FRITO
I. Esser fritto; Star fresco.
F. Être frit; Être fichu; Être fait.
P. O FUTURO A DEUS PER-
TENCE. E. El futuro es de Dios.
I. L’avenire è nelle mani di Dio.
P. FAZER ALGUÉM DE GATO-
SAPATO.
E. Tomar el pelo a alguien.
I. Fare qualcuno de mosca cieca.
P. GRAÇAS A DEUS!
E. ¡Gracias a Dios!
F. Dieu merci!
126
R. Slava Domnului!
L. Deo Gratias!
P. DE HORA EM HORA DEUS
MELHORA.
I. Di ora in ora, Iddio migliora.
F. En peau d’heures, Dieu labeure. L. Utile quid nobis novit Deus om-
nibus horis
P. IDAS E VENIDAS.
E. Idas y venidas.
F. Allées et venues.
P. IR PARA O INFERNO.
I. Andare al diavolo.
L. Sub terras ire.
P. ONDE JUDAS PERDEU AS BOTAS.
E. Donde el diablo perdió el pon-
cho; Por las lomas de Zamora.
F. Au diable vauvert; Au diable
vert.
P. PERDER O SEU LATIM.
G. Gastar o seu latín.
F. Y perdre son latin.
L. Non habeo quo me vertam.
P. LEVAR A MAL
E. Llevar a mal.
I. Aversela a male.
F. Prendre en mauvaise part.
P. MAIS OU MENOS.
E. Mas o menos.
I. Più o meno.
F. À peu-près; À peu de chose près;
Pas mal.
L. Plus minus.
P. BOTAR A MÃO NO FOGO.
E. Poner las manos en el fuego.
I. Metter la mano sul fuoco.
F. En metre la main au feu.
P. DAR AS MÃOS À PALMA-
TÓRIA
F. Faire amende honorable; Batre as coulpe.
L. Manus dare.
P. FICAR DE MÃOS ABANAN-
DO
E. Quedar com las manos vacías.
I. Tornarsene a mani voute.
F. Revenir bredouille; Rentrer bre-
douille.
P. À MEDIDA QUE.
E. A medida que. F. À mesure que; Au fur et à mesu-
re.
R. Cu cît.
L. Ut quieque.
P. DANÇAR CONFORME A
MÚSICA
G. En terra de lobos ai que ouvear
como todos.
F. Hurler avec les loups.
P. DE NADA.
E. Por nada.
F. Il n’y a pas de quoi.
P. POR QUE NÃO?
E. ¿Por qué no?
F. Porquoi pas?
R. D-apoi cum nu?
127
P. METER O NARIZ EM.
E. Meter las narinas en; Meter la
nariz.
I. Mettere il naso.
F. Fourrer le nez dans; Fourrer son
nez partout.
R. A-si baga nasul în toate; A se
anesteca unde nu-i fierbe oala.
L.Immiscere se alicuius negotiis.
P. FICAR A VER NAVIOS.
E. Quadarse a la luna de Valencia;
Quedase con un palmo de narices.
I. Restare con un pugno de mosche;
Restare con un palmo di naso.
F. Être de la revue.
P. À NOITE TODOS OS GATOS
SÃO PARDOS. E. De noche todos los gatos son
pardos.
I. Al buio tutte le gatte son bigie;
Di notte tutti i gatti son bigi.
F. La nuit, tous les chats son gris.
L. Nocte latent mendæ; Lucerna
sublata nihil discriminis inter mulie-
res.
P. CAIR DAS NUVENS
E. Caer de las nubes. I. Cader dalle nuvole.
F. Tomber des nues.
L. Attonitis animis haerere.
P. PÔR ALGUÉM NAS NUVENS.
E. Poner alguien en las nubes.
L. Ad cælum ferre aliquem.
P. NÃO PREGAR OLHO.
G. Non cerrar ollo.
E. No pegar ojo.
F. Ne pas fermer l’oeil.
L. Somnum non vidit.
P. SER DURO DE OUVIDO.
I. Duro d’orecchio; Duro d’orecchi.
F. Être dur d’oreille; Avoir l’oreille
dure; Être dur de la feuille.
L. Aures habetiores.
P. ENSINAR PADRE-NOSSO AO
VIGÁRIO.
G. Ensinar a seu pai a fazer fillos.
E. Enseñar al cura a decir misa.
L. Piscem natare doces.
P. PALAVRA DE HONRA.
E. Palabra de honor.
F. Parole d’honneur.
R. Pe crucea mea.
L. Medius fidius.
P. PEDIR A PALAVRA.
E. Pedir la palabra.
I. Chiedere la parola.
L. Ius dicendi petere.
P. NÃO MOVER UMA PALHA.
E. No mover una paja.
F. Ne pas en ficher une secousse.
P. PANO DE FUNDO.
E. Telón de fondo. I. Scena di fondo.
P. PÃO-PÃO, QUEIJO-QUEIJO.
E. Al pan pan, y al vino vino.
I. Pane al pane, vino al vino.
F. Appeler un chat un chat.
R. Ori alba, ori neagra.
128
P. COMER O PÃO QUE O DIA-
BO AMASSOU.
I. Vivere fra gli stenti.
F. Tirer le Diable par la queue;
Manger de la vache enragée.
P. NÃO TER PAPAS NA LÍN-
GUA.
E. No tener pelos en la lengua. F. Ne pas avoir la langue dans as
poche.
P. TIRAR PARTIDO DE.
E. Sacar partido de.
I. Prender partito di.
R. A lua partea cuiva; A t ine cu.
P. SE QUERES A PAZ, PREPA-
RA A GUERRA. F. Si tu veux la paix, prépare la
guerre.
L. Si vis pacem, para bellum.
P. PÉ ANTE PÉ.
G. Andar pe ante pe.
E. De puntillas; A la chita callando;
Paso a paso.
I. In punta di piedi.
F. À pas de loup; À pas de velours.
P. SEM PÉ NEM CABEÇA.
E. No tener ni pies ni cabeza.
I. Senza capo né coda.
F. Sans queue ni tête.
L. Nec caput nec pedes habere.
P. VALER A PENA.
E. Merecer la pena.
I. Valere la pena.
F. Ca vaut le coup.
R. A merita osteneala.
P. TIRAR UMA PESTANA.
I. Fare un sonnellino.
F. Piquer un roupillon.
P. PÔR OS PINGOS NOS IS.
E. Poner los puntos sobre las íes.
F. Mettre les points sur les i.
P. QUEM PLANTA COLHE.
E. Quien siembra, coger espera.
I. Chi semina, racconglie.
F. Il faut semer pour récolter.
P. ANDAR NA PONTA DOS PÉS
E. Andar de puntillas.
I. Sulla punta dei piedi.
L. Ire gradu suspenso; Summis di-
gitis ambulare.
P. DE PONTA A PONTA. G. De riba a baixo.
E. De punta a punta; De cabo a ra-
bo.
I. De cima al fondo.
R. Din cap in cap; Din fir pîna in
ata . P. SABER NA PONTA DA LÍN-
GUA.
E. En la punta de la lengua.
I. Sapere a fil di campanello.
F. Savoir sur le bout de la langue.
R. A sti pe degete.
P. DE QUANDO EM QUANDO.
E. De cuando en cuando.
I. Di tanto in tanto.
R. Din cînd în cînd; Cînd si cînd;
Pe alocuri.
129
P. OLHAR COM O RABO DO
OLHO.
G. Ollar de reollo.
E. Mirar com el rabillo de ojo.
R. A se uita acru la cinova.
L. Limis oculis adspicere; Limis
oculis intueri.
P. COM O RABO ENTRE AS PERNAS.
E. Com el rabo entre las peirnas.
R. Cu coada între picicare.
L. Remulcere caudam.
P. BATER EM RETIRADA.
I. Battere in ritirata.
F. Batre en retraite.
R. A da îndarat (înapoi).
P. NÃO SEI O QUÊ.
E. No sé qué.
I. No so che.
R. Nu stiu ce.
P. TIRAR SARDINHA COM MÃO DE GATO.
I. Cavar la castagna del fucco con
la zampa altrui; Togliere le castagen
dal fuoco com lo zampino del gatto.
F. Faire commo le singe; Tirer les
marrons du feu avec la patte du
chat.
P. O SEGURO MORREU DE VE-
LHO.
G. Quen dunha escapa cen aos vi-
ve. E. Dona Prudencia murió de vieja.
F. La prudence est la mère de la su-
reté.
P. TAL QUAL.
G. Tal cal.
E. Tal cual.
I. Tale e quale.
R. Iac-asa.
L. Talis qualis.
P. MATAR O TEMPO.
E. Matar el tiempo.
I. Ammazzare il tempo.
F. Tuer le temps.
R. A-si împlini timpul.
P. (CONTAR) TINTIM POR TIN-
TIM.
E. Con pelos y señales; Punto por
punto; C’por bé. Punto per punto.
F. Conter par le menu; Raconter
par le menu.
P. PERDER A TRAMONTANA.
E. Perder la tramontana; Perder el
rumbo.
I. Perdere la tramontana.
F. Perdre la tramontane; Battre la
campagne.
R. A iesi din balamale.
L. Mantem amittere.
P. DE VEZ EM QUANDO.
G. De vez en cando.
E. De vez en cuando.
F. De temps en temps; De temps à
autre; Par moments.
P. ERA UMA VEZ.
G. Foi no tempo de María Castaña. E. Erase que se era.
I. C’era una volta.
R. A fost odata.
130
P. DAR ÀS DE VILA-DIOGO.
E. Tomar las de Villadiego; Coger
las de Villadiego.
F. Prendre le chemin de Saint Jac-
ques.
R. A-si lua cîmpii.
5 – CONCLUSÃO:
As frases feitas, nas línguas românicas, são elementos de vital importância
para o conhecimento da história externa de cada uma delas, isoladamente, e
de todas elas, no conjunto da romanidade lingüística.
Sua análise pode entremostrar as mais diversas naturezas de fatos com os
quais esteve relacionada uma língua durante a sua história. Desde os fatos
históricos, propriamente ditos, aos que seus falantes, e mesmo com os que
dizem respeito ao meio ambiente em que ela se desenvolve ou se desenvol-
veu, em determinado período.
Analisada do ângulo da fraseologia, a unidade lingüística românica será
compreendida de um modo bastante globalizante. Talvez maior do que se o
for de qualquer outro ponto de vista.
Além disso, através de provérbios, rifões, anexins, adágios, etc., a diversi-dade subjacente nesta unidade maior poderá ser vista com grande naturali-
dade, tornando, certamente, mais simples, interessante e curioso estudo
comparativo das línguas que constituem esta família lingüística.
Analisando a convergência e a divergência da fraseologia românica, preten-
demos ter mostrado a viabilidade de um importante estudo de tal natureza.
Não o concretizamos aqui e agora porque nos faltam meios para conseguir
uma amostragem suficientemente confiável e porque não dispomos de tem-
po.
Mesmo assim, estamos convictos de termos contribuído para o desenvolvi-
mento da Lingüística e da Filologia Românica, alertando os estudiosos para
este interessante ramo dos estudos lingüísticos e filológicos. Com as limitações a que nos submetemos, já descritas na introdução, dei-
xamos ainda uma amostragem de 108 frases feitas para que os interessados
possam experimentar a nossa sugestão, antes de se embrenharem numa pes-
quisa mais demorada.
Voltamos a lembrar que a nossa bibliografia de línguas estrangeiras é insu-
ficiente. Daí o número e a qualidade de expressões nestas línguas, que pode
ser melhorado muito, com alguma pesquisa. Inclusive com maior proximi-
dade e semântica a morfossintática.
131
Enfim, agradecemos a paciência e a gentileza do leitor, por ter chegado até
aqui.
Esperamos que tenha valido a pena.
132
6 – BIBLIOGRAFIA:
ALMOYNA, Julio Martínez. Dicionário de espanhol-português. Porto:
Porto Editora. [1983]. 1058 p.
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______. Poesia e prosa. Organizada pelo autor. Com nora editorial, de
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Ehrhardt e Maria Luísa Schemann. 2ª ed. Lisboa: Fundação Calouste
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133
MACHADO, José Pedro. Dicionário etimológico da língua portuguesa;
com a mais antiga documentação escrita e conhecida de muitos dos
vocábulos estudados. 3ª ed. Lisboa: Livros Horizonte [s.d.]. 5 v.
MAGALHÃES JÚNIOR, R.[aimundo]. Dicionário de provérbios, locu-
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ções. [Rio de Janeiro]: EDIOURO [s.d.]. 366 p.
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RÓNAI, Paulo. Guia prático da tradução francesa. 2ª ed. revista e ampli-ada. [Rio de Janeiro]: Educom [1975]. XVI + 120 p.
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sentado ao Prof. Edwaldo Cafezeiro, no curso de Estruturas Frasais,
em 1984. Tem 45 laudas.
______. A fraseologia nas crônicas de Carlos Drummond de Andrade:
subsídios para um dicionário básico. Trabalho final apresentado aos
Professores Mário Camarinha da Silva, no curso de Técnica da Pes-
quisa, e Belchior Cornélio da Silva, no curso de Etimologia e Lexico-
logia, em 1984. Tem 125 p.
______. A origem das frases feitas usadas por Drummond: contribuições
para sua história e etimologia. Trabalho final apresentado ao Profes-sor Belchior Cornélio da Silva, no curso Do Latim ao Português, em
1984. Tem 111 p.
SPINELLI, Vincenzo & CASANTA, Mário. Dizionário completo italiano-
portoghese (brasiliano) e portoghese (brasiliano)–italiano. Con
l’etimologia delle voci italiane e portoghesi (brasiliane), la lor esatta
traduzione, frasi e modi di dire. Milano: Editor Ulrico Hoelpi, 1957 e
1962. 2v.
TORRINHA, Francisco. Dicionário latino-português. 3ª ed. [Porto]: Ma-
ranus, 194561. 957 p.
______. Dicionário português-latino. 2ª ed. Porto: Domingos Barrera Edi-
tor & Livraria Simões Lopes [s.d.]. 1129 p. VICTORIA, Luiz A. P. Dicionário de frases, citações e aforismos latinos.
3ª ed. Rio de Janeiro: Científica, 1966. 212 p.
61 Uma nota na última página informa que o volume acabou de imprimir-se em 1959.
134
A ORIGEM DAS FRASES FEITAS
USADAS POR DRUMMOND
(contribuições para sua história e etimologia) 62
Estudo conjetural sobre a
origem histórico-lingüística
de frases feitas utilizadas por
Carlos Drummond de An-
drade em suas Crônicas.
Análise comparativa de al-
gumas variantes vernáculas.
62 Trabalho final apresentado ao Professor Belchior Cornélio da Silva, no curso Do Latim ao
Português, na Faculdade de Letras da UFRJ, no segundo semestre de 1984.
135
1 – INTRODUÇÃO:
Embora a Paremiologia não tenha definido ainda com perfeição os diversos
tipos de manifestações lingüísticas que constituem o objeto de suas investi-
gações, sentimos a necessidade de estabelecer o que entendemos por frase
feita, para que possamos estabelecer os limites de nossa pesquisa.
Esclarecemos, em primeiro lugar, que as frases feitas, no sentido que pre-
tendemos estudar não levam em conta o fato de serem ou não usadas na lin-
guagem corrente atual e geral, embora o sejam quase sempre. É que nosso
trabalho pretende ser filológico e não folclórico. Dando uma definição mais precisa de frases feitas do que o fizemos no tra-
balho A Fraseologia nas Crônicas de Carlos Drummond de Andrade: Sub-
sídios para um Dicionário Básico63, como começamos por observar que
elas constituem abreviações ou paráfrases do provérbios, adágios, rifões,
etc., ou meras alusões a tais expressões proverbiais. As frases feitas se ca-
racterizam por sua subordinação e adaptação à construção da frase corrente,
na qual se integram. Diferentemente dos provérbios, não constituem neces-
sariamente, unidades completas e independentes, como ensina Amadeu
Amaral.64
Os provérbios, além de constituírem unidades completas e independentes,
são construídos em forma concisa e pitoresca, revelando uma sabedoria fei-
ta de experiência.65 Voltando às frases feitas, lembramos que todas as frases “fossilizadas em
sua forma e seu sentido e usadas no discurso à maneira de uma locução”66
são objeto de estudo da Fraseologia, mesmo se usadas apenas na linguagem
literária e erudita.
Como as pesquisas em Ciências Humanas não podem ter um nível de com-
provação de suas hipóteses semelhantes ao que têm as Ciências Físicas e
Biológicas, os etimologias, e os filólogos em geral, satisfazem-se em anali-
sar a sua “mostra”, compará-la com variantes documentadas, analisar conje-
turas já formuladas por outros especialistas e estabelecer novas hipóteses.
Raramente se estabelecem verdades consideradas definitivas durante muito
tempo. É lamentável, mas não é outra coisa o que fizeram Antenor Nascentes, José
Pedro Machado, Antônio Geraldo Cunha, João Ribeiro, Luís da Câmara
Cascudo e todos os outros que se embrenharam por este caminho. Neste ca-
so, só se pode falar em prováveis exceções em relação a alguns verbetes.
Jamais para toda a obra de um autor.
63 Trabalho final apresentado na Faculdade de Letras da UFRJ. 64 Cf. AMARAL, A. (1948) p. 220. 65 Cf. AMARAL, A. (1948) p. 219-220 66 CÂMARA JR., J. M. (s.d.) s.v.
136
As frases feitas estudadas aqui foram extraídas das crônicas de Carlos
Drummond de Andrade. Pretendemos esclarecer a origem de algumas des-
sas construções proverbiais e indicar pistas que possam levar a tal esclare-
cimento das restantes. Contribuiremos, assim, para compreensão do seu
verdadeiro sentido. Evitaremos repetir as abonações drummondianas e os
seus significados, visto que isto já foi feito no trabalho que citamos acima.67
Quanto aos estudos sobre este mesmo tema, registramos sua escassez e sua
infância. Embora tenham surgido trabalhos de real valor, como os de J.
Ribeiro68 e os de L. da Câmara Cascudo69, por exemplo, poucos foram os trabalhos desta natureza que tenham merecido a referência da crítica especi-
alizada. Além disso, não conseguimos registrar trabalhos merecedor de crí-
tica sobre o nosso tema anterior ao badaladíssimo Origens de Anexins, etc.,
de A. de Castro Lopes70, que ainda não comemorou seu centenário.
Indicamos na Bibliografia71, além das obras por nós consultadas, os traba-
lhos de Antônio de Castro Lopes, Lindolfo Gomes, Monsenhor Vicente
Lustosa e Tomás Antônio Pires, que são peças importantes no desenvolvi-
mento desta pesquisa, mas não puderam ser manuseadas.
Seguimos, grosso modo, a orientação metodológica de João Ribeiro, em su-
as Frases Feitas72, e Luís da Câmara Cascudo, em suas Locuções Tradicio-
nais no Brasil,73 redigindo todo o trabalho em forma de artiguetes.
Quanto à disposição dos artiguetes ou verbetes, seguimos a ordem alfabéti-ca das palavras chaves, orientando-nos por Antenor Nascentes74 e por Auré-
lio Buarque de Holanda Ferreira.75
Quanto às normas de redação e datilografia, seguimos o que ensina o nosso
Mestre, Mário Camarinha da Silva.76
Registramos todas as variantes encontradas, seja quanto à forma, seja quan-
to ao sentido, mesmo quando nada pudéssemos concluir a respeito. As va-
riantes em língua estrangeira só foram anotadas quando parecia muito pro-
vável uma filiação ou qualquer forma de parentesco próximo.
67 SILVA, J. P. (1984) p. 18-118. 68 RIBEIRO, J. (1933), (1960) e (1963) . 69 CASCUDO, L. C. (1968), (1970) e (1984) . 70 LOPES, A. C. (1886) / (1909) . 71 Talvez não seja o lugar mais adequado, por fazer crescer a Bibliografia com simples indica-
ções de obras não consultadas. 72 RIBEIRO, J. (1960) . 73 CASCUDO, L. C. (1970) . 74 NASCENTES, A. (1945) . 75 FERREIRA, A. B. H. (s. d.) p. VIII, § 5. 76 SILVA, M. C. (s. n. t.)
137
2 – UMA INTERPRETAÇÃO HISTÓRICA E ETIMOLÓGICA DAS
FRASES FEITAS.
2.1. – Não se Dar por Achado
João Ribeiro afirma que “ACHAR é voz arábica que não tinha o sentido,
corrente hoje, de descobrir ou encontrar,”77 de onde imagina derivar as pa-
lavras achaque, enxaqueca, etc., que equivalem a doenças, mal-estar, defei-
to ou moléstia.
Enfim, “achar está por achacar e restou penas na locução proposta, tornan-do-se voz obsoleta nos demais casos. Dar-se por achado é dar-se por acha-
cado e ofendido.”78
A forma e o sentido da frase já era o mesmo no Cancioneiro Geral, já sendo
freqüente nos quinhentistas.
A explicação de João Ribeiro não satisfaz, pois é muito pequena a probabi-
lidade de ter havido o processo fonético que resultaria achar a partir do ára-
be /as-saka/ ou achaque.
Inclusive, João Ribeiro não persistiu na defesa de sua conjetura nem tentou
rebater as críticas de Carolina Michaëlis de Vasconcelos, como recorda Luís da Câmara Cascudo.79
O correspondente etimológico de achar, em castelhano, é ajar e não hal-
lar, opina ainda João Ribeiro, visto que “ajar /é/ maltratar de palabra a al-
guno para humillarle”80, segundo os léxicos castelhanos.
Seria achar um derivado de achanar=achaar=achar?
Esta hipótese, sugerida por Carolina Michaëlis de Vasconcelos81, não é de
todo improvável. Afinal de contas, esta palavra é um arcaísmo que se revi-
talizou no Brasil, principalmente no Nordeste e que significa “reduzir ou
aniquilar moralmente; abater, humilhar, achatar;” e ainda “dominar, subju-
gar: Apesar de sua força o adversário terminou achanando-o”.82
Sendo assim, não se dar por achado pode ser não se dar por achanado, o que parece até mais lógico.
O que é certo é que o verbo achar, em seu significado atual em português,
nada tem a ver com a frase em questão.
2.2. Sem Dizer Água Vai
77 RIBEIRO, J. (1960) p. 201. 78 RIBEIRO, J. (1960) p. 201. 79 CASCUDO, L. C. (1970) p. 275. 80 RIBEIRO, J. (1960) p. 202, notas. 81 Apud J. Ribeiro. Frases Feitas, 1960, p. 203. 82 FERREIRA, A. B. H. (s. d.), verbete “Achanar”.
138
Esta locução é antiga e sua explicação é conhecida. Ela provém dos tempos
em que ainda havia esgotos nas cidades.
Os moradores lançavam normalmente a água usada pelas janelas, usando
sempre o indispensável grito de alerta aos transeuntes: Água vai!...
É compreensível a intolerância às pessoas que costumavam lançar seus de-
jetos à rua sem o costumeiro grito.
Com o sistema de esgotos, o velho costume desapareceu, mas a expressão
sobreviveu com um significado bastante próximo do original.83
2.3. Pôr a Alma pela Boca
As idéias de alma e sopro ou corrente de ar expelida dos pulmões, desde os
tempos bíblicos, estão em estreita relação.
Foi com um sopro que Deus infundiu a vida ao primeiro homem, conforme
a versão de Gênesis 2:7.
Pôr a alma pela boca, a partir desta interpretação, passa a sugerir a idéia de
perder a vida ou parte da vida, o que normalmente acontece com o cansaço
ou sofrimento excessivo.
Raimundo Magalhães Júnior registra a variante deitar a alma pela boca, já
documentado na Feira de Anexins, de D. Francisco Manuel de Melo.84
2.4. Debaixo desse Angu tem Carne Angu é uma alimentação barata, cujo elemento básico é o fubá de milho ou
farinha de mandioca. Foi largamente utilizado na alimentação dos escravos
negros no Brasil.
Como as cozinheiras também eram escravas, freqüentemente se encontra-
vam pedaços de carne que deveriam ser reservados aos feitores escondidos
debaixo do angu de determinados escravos protegidos pela cozinheira ou
por outra pessoa, geralmente o transportador dos alimentos ou seu distribui-
dor.
Por isso, se fosse observado que determinado escravo estava muito cuidado-
so com sua porção de angu ou se houvesse preferência por uma outra, des-
confiava-se sempre dessa diferença de tratamento. E todos pensavam que debaixo daquele angu devia haver carne.
Até bem pouco tempo ainda se costumava fazer dessas trapaças com os
“companheiros” de trabalho, reservando-se uma marmita ou caldeirão espe-
cial para o dono do serviço. Este se afastava um pouco de seu grupo para
saborear sua refeição de maneira escondida dos outros. Debaixo do angu, a
cozinheira botava a carne ou torresmo, que não existia nas marmitas dos ou-
tros.
83 Cf. MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 308 e CASCUDO, L. C. (1970) p. 116-117. 84 Cf. MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 101.
139
Leonardo Mota registra uma variante: “Debaixo desse angu tem torresmo”,
que tem o mesmo valor semântico e origem semelhante. A pequena dife-
rença está no grau ou intensidade da discriminação entre os tratamentos dis-
pensados, lembrando-se a decadência dos todo-poderosos senhores de es-
cravos e de outras elites.
A extensão do significado fez esquecer o antigo costume e aplicar a expres-
são a qualquer tipo de disfarce para transportar qualquer tipo de coisa de
maior valor que o aparente.
2.5. Arrastar a Asa.
Arrastar a asa é a forma de um galo cortejar a galinha.
É da observação deste fato que surgiu a frase feita que indica o seu corres-
pondente entre os humanos, ou seja, o cortejo do homem a uma mulher.
Como o galo é o símbolo do macho dominador, subentende-se que arrastar
asa inclui a demonstração de habilidades de macho ou mesmo de machista.
Muitas outras expressões proverbiais em trono do galo ressaltam esta sua
característica, comparando-o ao homem machista e dominador. Vejamos:
Cada galo canta no seu poleiro, e o bom no seu e no alheio; Folgai, gali-
nhas, que é morto o galo; Galo que fora de horas canta, faca na garganta;
Na casa de Gonçalo, canta a galinha e o galo; Onde canta galo não canta
galinha; Onde há galo não canta galinha; Triste é a casa onde a galinha canta e o galo cala;85 Onde o galo canta, aí janta;86 Galo, antes de cantar,
bate as asas três vezes; Galo cantando, à boca da noite, é sinal de que es-
tão furtando moça; Como canta o galo velho, assim cantará o novo; Todo
galo é valentão para galinha e capão; A pinta que o galo tem o pinto nasce
com ela; Cantiga que o pinto canta o galo já cantou; Galo no seu poleiro
briga com o mundo inteiro; Franga que canta chama galo: Galo velho; Ga-
lo de um terreiro só; O galo daqui sou eu; Cantar de galo; Quando o galo
canta fora de hora é moça roubada que vai dando o fora; Baixar a crista;
Cada galo em seu terreiro; Depressa que só trepada de galo.
2.6. Ficar Debaixo do Balaio A expressão lembra o processo caseiro, ainda usado no interior de Minas
Gerais, de fazerem que as galinhas percam o choco. O processo consiste
em prender a galinha choca sob um balaio e sobre uma poça d’água, de mo-
do que ela não possa deitar-se, na posição normal de chocar. (Galinha não
85 Este adágio é uma versão literal do italiano: “Trist’é quella casa dove la gallina canta e il
gallo tace”. Os quatro os antecedem sãos suas variantes. 86 Depara-se aqui um caso curioso, observa Amadeu Amaral, em seu livro Tradições Popula-
res, (1948), p. 262: “por influência, naturalmente, do verbo ‘cantar’, que em outros dizeres
consagrados aparece como predicado do sujeito ‘galo”, alterou-se desse modo o velho provér-
bio português, que é: ‘Abade, d’onde canta, daí janta’.”
140
se deita sobre água.) Desta maneira aparentemente cruel, a galinha se es-
quece plenamente do seu instinto de chocadeira, voltando naturalmente aos
eu período de postura.
Aplicada aos namorados, ficar debaixo do balaio é uma situação idêntica,
em que eles têm de esquecer o parceiro ou a parceira desejada e procurar
outra, recomeçando, forçadamente, todo o ciclo que já iniciaram.
2.7. Plantar Bananeira
O que é característico e marca o ridículo de tal ato é aspecto visual, a partir do qual se criaram várias metáforas. Tais metáforas, sugeridas pelas natu-
rais substituições dos nomes das partes pudendas do corpo humano por no-
mes relacionados com animais, plantas ou objetos, são conseqüências dos
tabus lingüísticos que cercam, principalmente, órgãos sexuais.
Quem planta bananeira, ficando de pernas para cima e de cabeça em dire-
ção ao solo (senão posta ao solo) cria a imagem de uma bananeira, com um
cacho, com banana, com umbigo, com as folhas representadas pelas pernas,
tudo isto muito exposto e aumentado o aspecto ridículo com o fato de ser a
posição oposta à que normalmente o ser humano posa.
A idéia de ridículo deste ato, portanto, está relacionado com um aspecto
psíquico da linguagem, que se estabelece por comparação ou associação de
imagens.
2.8 Matar o bicho
Este é um processo usado pelos beberrões há mais de quatro séculos para
tomar de vez em quando o seu gole de bebida forte.
Inicialmente, e até bem pouco tempo, o pretexto medicinal rezava que um
gole de bebida alcoólica de alto teor, ingerida pela manhã em jejum, surpre-
ende o bicho que deve existir dentro do beberrão, combatendo-o.
A história de Madame La Vernade, filha de um general francês, que morreu
em 1519 e que tinha um verme atravessado no coração, resistindo a todos os
tóxicos, parece ter dado início a esta crença, que mais parece uma desculpa.
Conta-se que Madame La Vernade, falecendo subitamente, foi autopsiada, tendo-se encontrado tal verme atravessado em seu coração. Não morrendo
com aplicação de todos os tóxicos disponíveis, os médicos embeberam um
pedaço de pão em vinho forte, colocando sobre o pão umedecido o resisten-
te verme. Foi o suficiente para que ele morresse imediatamente.
A partir de então, os médicos passaram a aconselhar que se quebrasse o je-
jum com pão e vinho.
Os beberrões, no entanto, não se contentaram com o pão e o vinho. Come-
çaram a tomar bebida mais forte e, depois, aboliram o pão. Atualmente,
141
mata-se o bicho a qualquer hora, e o vinho foi substituído pela cachaça, de
preferência.
A fraseologia brasileira relacionada com a cachaça é das mais ricas que te-
mos. Com o significado idêntico ao de matar o bicho temos as seguintes,
além de outra: Morder a batata; Dobrar o cotovelo; Quebrar a munheca;
Acender a lamparina; Alertar as idéias; Molhar a palavra; Molhar o bico;
Mudar a camisa; Tomar um oito; Mudar o colarinho; Salgar o galo.87
2.9. Matar o Bicho do Ouvido É tradicional a crença de que a cera do ouvido é retirada por um bicho, que
é o responsável pela audição, pois do contrário o ouvido seria entupido de
cerúmen. Como o excesso de ruído causa a surdez, acredita-se que o bicho
do ouvido morre ou adoece toda vez que houver mais ruído do que o supor-
tável, seja quanto à intensidade, seja quanto à continuidade.
Falar demais ou muito alto com alguém é uma forma de matar o bicho do
ouvido de quem for obrigado a ouvir tal falador exagerado.
2.10. Fazer Boca-de-siri
Como diversas frases feitas por nós estudadas, esta também é resultado da
observação da natureza. O siri, ao prender alguma coisa com a “boca”, que
é uma de suas garras, não a solta nem mesmo depois de morto. Ora, como fechar a boca implica ficar calado, fazer boca-de-siri passou a substituir
uma explicação muito mais extensa que pudesse indicar o ato de calar-se ou
fazer segredo rigoroso.
Há diversas outras formas de sugerir idéia de segredo através da palavra
“boca”, que se pode fechar de vários modos: Em boca fechada não entra
mosquito; Boca calada é remédio; Boca cheia não conversa; Boca que fala
não mastiga; Minha boca é um túmulo; Minha boca é um botão; A boca
pequena; De boca em boca.
O provérbio: Em bica fechada não entra mosquito, que é uma forma amea-
çadora de prevenir os delatores contra prováveis conseqüências de sua in-
discrição, tem versões em latim, espanhol, francês, italiano e inglês. Destas formas, destacam-se pela semelhança com a nossa, a francesa: En bouche
serée n’entrent des mouches e a espanhola: En boca cerrada non entra
mosca.88
2.11. Dar Bode
É evidente o significado de dar, que corresponde a resultar ou ter por resul-
tado. Mas o que vem a ser bode?
87 MOTA, L. (1982) verbete “Matar o bicho”. 88 MOTA, L. (1982) s. v.
142
Lembramos que bode sempre esteve ligado às forças diabólicas, como lem-
bra Câmara Cascudo, em seu Coisas que o Povo Diz: “Qualquer velha bru-
xa de outrora, sabedora de orações e remédios fortes, informava do poder do
Bode, sinônimo diabólico, temido e respeitado na ambivalência natural.”89
Aliás, segundo a tradição judaica, o bode era o animal escolhido para carre-
gar todos os pecados de seu povo e, por isso, ser abandonado num deserto.
Representando todo o mal, o bode expiatório era ao mesmo tempo vítima e
réu.
Dar bode é resultar numa situação infernal, indesejável, confusa. Embora o bode esteja quase sempre relacionado com a atividade sexual
masculina, em diversos provérbios e expressões populares, não há probali-
dade de haver conotações desta natureza na frase feita em questão.
Relacionada com a idéia de vítima, conheço o seguinte anexim com a pala-
vra bode: Quem menos pode é quem paga o bode.
Vide também: Bode preto; Bode amarrado; Bode expiatório.
2.12. De Maus Bofes
Segundo a crença popular, os bofes, entranhas ou vísceras, são responsáveis
pelo bom ou mau humor das pessoas. Até se costuma dizer que quem sofre
do fígado está sempre de mau humor. Daí expressões com antipatia visce-
ral ou inimigo fidagal ou de bofe inchado, que é o mesmo que excessiva-mente irado.
2.13. Dar Bola
Surgiu certamente com o jogo de futebol. Neste esporte, os atletas devem
dar a bola aos companheiros de equipe em situações estratégicas mais van-
tajosas para que se atinja o objetivo, que é o gol, o mais rápido possível.
É claro que não se dá bola para quem estiver em situações menos favorá-
veis, como por exemplo, marcado por adversário muito forte.
Também existe a expressão dar pelota, que tem a mesma origem e signifi-
cado.
2.14 Dar com os Burros n’Água
Antônio José da Silva, o Judeu, tem o seguinte passo, na voz do Escudeiro:
“- Ah burro do meu coração! Bem te entendo o que queres dizer nesse zur-
ro; mas não te posso ser bom; tem paciência, que bem sei, que deixar-te,
dei com os burros na água!” 90
89 CASCUDO, L. C. (1968) p. 80. 90 Antônio José da Silva. Vida do Grande D. Quixote de la Mancha e do Gordo Sancho Pan-
ça, 2,1, Lisboa, 1733. Apud CASCUDO, L. C. (1970) p. 112-113
143
A outra abonação antiga que possuímos é de Gregório de Matos: “– Que de
tudo o que tem vítima faz, / E dá com os burros n’Água desta vez.”91
Acreditamos que a frase provém de um conto popular vulgarizado oralmen-
te no interior do Brasil. Lembro-me de tê-lo ouvido há uns 25 ou 30 anos
em Minas Gerais.
Conta-se que dois tropeiros foram incumbidos de realizar a façanha de
transportar com suas respectivas tropas uma carga qualquer até um determi-
nado lugar, onde estaria a pessoa que pagaria com um prêmio o que primei-
ro chegasse com a sua carga. Acontece que o caminho era desconhecido, e ambos tiveram o direito de es-
colher a mercadora que desejavam para que a viagem se tornasse mais fácil.
O primeiro escolheu uma carga de algodão, porque era mais leve. O segun-
do escolheu uma carga de sal, por que era mais volumosa.
Seguindo caminhos diferentes, no entanto, ambos tiveram que passar a vau
por um rio, que surgiu inesperado.
O primeiro, ao tentar passar, umedeceu sua carga e os quase morreram afo-
gados, saindo a custo do rio, onde a carga ficou perdida, com um peso insu-
portável.
Ao tentar passar, o segundo tropeiro teve toda a sua carga de sal derretida,
chegando na outra margem apenas com a sua tropa descarregada.
Deste modo, ao dar com os burros n’água, os dois tropeiros tiveram fracas-sadas as suas empresas, não logrando o desejado prêmio.
Existem outras variantes, em que apenas um dos tropeiros dá com os burros
n’água, enquanto o outro consegue passar com a carga e receber o prêmio,
conforme relato do Prof. Edwaldo Cafezeiro, da Profa. Guaciara e outros
colegas a quem consultei sobre tal conto popular.
2.15. Bom Cabrito Não Berra
Segundo Tomé Cabral,92 cabrito é o mesmo que garoto atrevido. Sendo a
forma de diminutivo masculino de cabra, é natural que tenha herdado a ba-
se semântica da forma primitiva, que corresponde a capanga, criminoso,
pistoleiro ou membro subalterno de grupo de cangaceiros. É nesse sentido que se usa a palavra cabra nas expressões seguintes: Cabra
do Cariri mata pra ‘istruir’; Cabra e cobra...; Não há doce ruim nem cabra
bom; Cabra valente não deixa semente; Para o primeiro cabra bom falta
um; O cabra bom nasceu morto.
Embora seja também usado como gíria de marginais, esta frase feita não
deve ter-se originado entre os marginais do Rio de Janeiro, nem tão recen-
temente. Se muito recente, deve ter sido da época em que o cangaço consti-
91 Apud. CASCUDO, L. C. (1970) p. 113. 92 CABRAL, T. (1982) s. v.
144
tuiu uma frente política no Nordeste, onde houve muito cabra de respeito e
até hoje se fala de cabra macho, como sendo um título com que todos os
homens simples pretendem ser distinguidos.
Raimundo Magalhães Jr. explica que “a ética dos criminosos lhes impõe a
solução dos seus problemas, mas sem delações à polícia, ficando tudo entre
eles mesmos. Berrar é sinônimo de delatar e bom cabrito é o criminoso que
adere rigorosamente àquela norma de conduta.”93
Ora a expressão em questão deve ter considerado que o bom cabrito é aque-
le garoto atrevido que se submete a uma norma de vida, embora não seja a norma da lei oficial. E esta norma consiste em não berrar ou não delatar os
companheiros.
2.16. Amarrar Cachorro com Lingüiça
É provável que esta frase venha do texto do Decameron, de Boccacio, que
descreve uma terra maravilhosa de gargantões, onde as montanhas todas de
queijo parmezão grattugiato e macheroni e pavioli faziam água na boca.
Nesta terra, Bengodi, é que se via o costume extraordinário que ainda hoje
a frase relembra, pois lá se amarravam os cães com lingüiça.94
A terra de cucanha ou reino de cucanha, de que existem referências na li-
teratura popular de todos os países do ocidente, é a origem mais remota des-
sa frase feita. Vejamos o que diz João Ribeiro a respeito:
Desta circunstância de serem na terra da Cucanha amarrados os cães com lingüiça e de haver um deles, por menos tolo, devorado os grilhões, é que
no anedotário picaresco e popular se formou a história de um edito do rei dos cães ordenando que farejassem todos os adventícios em certos lugar, a fim de verificar se tinham comido a lingüiça, a lei que não tendo sido re-vogada ainda hoje dos cães se cumpre. A anedota poderia passar por um mito verbal sugerido pelas palavras terra ou reino de Cucanha (Cu-canis)...95
Relacionado com este fato, que resulta da observação da natureza, existem
outros provérbios e dizeres tais como: Costume de cachorro é cheirar toco e
lamber o traseiro; Cachorro não cheira flor mas cheira o cu do outro.
2.17. Meter-se em Calças Pardas
Embora o significado atual desta expressão seja idêntico ao de meter-se em
camisa de onze varas, sua origem é seguramente diferente.
Certamente a forma de uma dessas expressões influenciou na outra, fazendo
o seu sentido também tornar-se idêntico.
93 MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 231. 94 RIBEIRO, J. (1960) p. 84. 95 RIBEIRO, J. (1960) p. 85, notas.
145
João Ribeiro acha que esta expressão se aplica principalmente “à ousadia
donjuanesca dos sedutores de mulheres”.96 Neste caso, calças conservou o
sentido arcaico de meias; e pardo é uma palavra que indica ou sugere a
idéia de que os nobres faziam questão de serem os primeiros a romper as
barreiras da virgindade de suas vassalas.
Se houvesse algum documento que comprovasse que as calças de tal cor
fossem insígnias da virgindade, facilmente se resolveria o caso. Mas isto
não passa de probalidade remota.
O registro mais antigo da expressão, lembrado por João Ribeiro, é do século XVIII, o que mostra probabilidade de haver influência quanto à forma e
quanto ao sentido de...
2.18. Meter-se em Camisa de Onze Varas
Duas explicações me parecem interessantes e prováveis. O que ensinou Jo-
ão Ribeiro97 e o que ensinou Luís da Câmara Cascudo.98 No entanto, preva-
lece a dúvida.
João Ribeiro pretende analisar a origem de camisa e varas a partir de dois
parônimos árabes: /al-kándara/ e /alkandur/. Alcândara ou alcândora era o
poleiro, o pau ou a vara em que descansava o falcão ou descansa o papagaio
moderno, ou poleiro para ave de rapina.99
A forma /al-kandur/ não se registrou em português, tendo dado “alcandora” em espanhol, que significa camisa longa e talar, a camisa de dormir.
Com as duas idéias reunidas em alcândor ou alcândora, fundiu-se a noção
de roupa longa ou camisa longa e o de vara longa. Talvez isto seja uma
boa explicação da subsistência das palavras camisa e varas na mesma frase
feita.
Quanto ao numeral onze, deve ser um número indefinido com o que aparece
em locuções como: língua de onze palmos, onze mil virgens, etc. Afinal de
contas, nunca houve uma camisa de onze varas, ou seja, de mais de doze
metros.
A relação entre a camisa de onze varas e a túnica dos enforcados foi lem-
brada por Gonçalves Viana e retomada freqüentemente, inclusive com a hi-pótese de que tais varas podem ser uma alusão ao antigo feixe de varas dos
juizes.100
A explicação de Câmara Cascudo tem como base ou argumento mais forte
os Estatutos da Confraria de Santa Maria do Castelo de Thomar, de 1388.
96 RIBEIRO, J. (1960) p. 404. 97 RIBEIRO, J. (1960) p. 76-77. 98 CASCUDO, L. C. (1970) p. 23. 99 Cf. CUNHA, A. G. (1982) s. v. e MACHADO, J. P. (s. d.) s. v. 100 Vide também CABRAL, T. (1982) s. v.
146
Diz, a certa altura, este estatuto: “Se algum Confrade ferir outro Confrade
com espada ou com coytello, entre em camisa em XXX tagantes. Aquele
que a seu Confrade der punhada, ou lhe messar a barba, entre em camisa a
sinco tagantes.”
Sabendo-se que tagante é o choque do açoite, meter-se em camisas de onze
varas é o mesmo que entrar em camisa a onze tagantes.
Como lembra Cascudo, “a pena seria rápida e pouco dolorosa”, mas se tor-
nava humilhante por ser apregoada e pública. Daí ser tão temida.
As chicotadas por cima da camisa, além disso, lembravam que o sentencia-do ou condenado era um fraco, que não resistiria os açoites sobre a pele,
comparado a uma mulher torpe.101
2.19. Entrar pelo Cano
Magalhães Jr. acredita que o “o cano”, nesta expressão, é o cano do esgo-
to,102 o que parece ser a verdade. Além disso, ele nos lembra que entrar
bem é uma variante de entrar pelo cano, com o sentido de entrar profunda-
mente pelo cano, ou seja, acrescentando-lhe a idéia de intensidade, com a
elipse de cano.103
Acrescentamos mais uma variante muito comum, que é entrar mal. Entrar
mal é entrar pelo cano de uma maneira desastrosa. Mal, nesta expressão, é
advérbio de modo redundante, visto que entrar pelo cano jamais poderia ser entrar de maneira agradável.
A hipótese de origem inglesa da expressão, com adaptação em português,
não me parece ter fundamentos sólidos. Entrar pelo cano, em inglês, é To
go down the drain, que se traduz melhor como Ir por água abaixo ou Dar
em nada, segundo o Professor Oswaldo Serpa.104
Aliás, o mesmo lexicógrafo registrou Entrar pelo cano igual a come a crop-
per, fail, be an unsuccessful flop, get in hot water.105
2.20 Embarcar em Canoa Furada
Embarcar, que deveria ser o ato de entrar ou colocar alguma mercadoria
num barco ou numa barca, pode indicar tal ato em relação a qualquer meio de transporte aquático, terrestre ou aéreo.
Um outro fato muito interessante no uso e na evolução da linguagem é o de
que uma característica ou um determinante muito forte pode obscurecer o
determinado, tomando o seu lugar.
101 Cf. CASCUDO, L. C. (1970) p. 23. 102 Cf. MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 122. 103 Idem ibidem. 104 SERPA, Oswaldo (1976) s. v. 105 Idem s.v.
147
Foi, por exemplo, o que aconteceu com burro (asinus burrus) e com maçã
(mala matiana), além de muitos outros.
Não há nada de tão marcante em embarcar numa canoa que possa tornar a
expressão uma frase feita. Mas embarcar em canoa furada constitui prenún-
cio quase certo de uma tragédia. Portanto, é o furo, ou a característica de
estar furada essa canoa, que chama a atenção.
Daí as naturais derivações: Entrar numa fria e Entrar numa furada ou en-
trar numa fria.
É fácil perceber que o parentesco entre Entrar numa fria e Entrar ou Em-barcar em canoa furada. Se a canoa está furada, estará molhada e, obvia-
mente, fria.
Outro fato que nos leva a esta origem das expressões elípticas acima é a
concordância feminina de furada e fria.
A troca de embarcar por entrar dispensa explicações, vista a origem meta-
fórica de embarcar.
Veja que ninguém diz embarcar numa bicicleta, ou num cavalo, ou num pá-
ra-quedas, ou numa asa delta.
Embarcar é o mesmo que entrar, em se tratando de meios de transporte.
2.21. Dar as Caras
Assim como a flexão facilita a interpretação nas variantes acima, suponho ter descoberto a origem desta frase feita a partir do plural, que parece estra-
nho ao significado normal ou à associação que fazemos com a idéia de rosto
da pessoa que dá as caras.
Como as pessoas não têm mais de uma cara, a expressão deveria ser dar a
cara, se estivesse relacionada com rosto ou cara da pessoa que aparece,
dando as caras.
Só por associação vem-nos a idéia de caras, correspondentes às cartas de
baralho de maior valor em vários jogos. Dar as caras, que não é expressão
dos jogos de cartas, associa-se a dar as cartas quanto à forma morfossintá-
tica e fonética, e a mostrar o jogo quanto ao significado.
Como as caras das pessoas não podem aparecer sem que as próprias pessoas apareçam, dar as caras passou a significar “aparecer, fazer uma visita”.
O cruzamento semântico proveio da semelhança dos elementos componen-
tes das expressões dar as cartas e dar as caras.
2.22. Botar as Cartas na Mesa
A expressão tem origem no jogo de baralho.
Dar as cartas ou botar as cartas na mesa são expressões que indicam o ato
de comando que inicia o jogo.
148
Quem dá as cartas ou bota as cartas na mesa é responsável pela sorte dos
demais jogadores.
No jogo-de-cartas com a pretensão de adivinhar o futuro (cartomancia), a
superioridade de quem bota ou põe as cartas na mesa não acaba com este
ato, continuando durante o desenrolar da ação que aí começa. É mesmo
provável que esteja especificamente neste tipo de jogo-de-cartas a origem
da expressão.
2.23 Casa da Mãe Joana João Ribeiro pensa que a expressão, em sua forma crua e nua, é Cu da mãe
Joana.106
E acrescenta: Esta pobre da Mãe Joana é o simples vocábulo árabe damchan que signifi-ca garrafão, e como verbo, meter uma coisa em outra: e é dedução perfei-ta porque os garrafões servem para que neles se lance alguma coisa e sem-
pre são por sua vez metidos em palhas ou gigos abertos e protetores. De damchan o espanhol fez damajuana, e o francês dame-jeanne também a tem com o mesmo sentido de vaso grande de cristal ou garrafão. Daí a expressão casa de Mãe Joana, formada por etimologia popular.107
Sem ao menos fazer alusão às conjeturas de João Ribeiro, Luís da Câmara
Cascudo vê a origem da frase em questão sob um outro ângulo, mais aceitá-
vel e menos conjetural: Joana, rainha de Nápoles e condessa de Provença (1326-1382), em sua tu-multuosa existência, refugiou-se no Avignon em 1346. No ano seguinte, regulamentando os bordéis da cidade, aprovou um estatuto que dizia em um de seus artigos: “– et que siegs une porto... dou todas las gens entra-ron.” Ou seja,... e que tenha uma porta por onde todas as pessoas possam entrar.
O prostíbulo se tornou o Paço da Mãe Joana, nome que se divulgou em Portugal.
Aliás. Teófilo Braga informa: “– Paço da Mãe Joana com que se designa a
casa que está aberta para toda a gente. Nos açores é muito usual para dizer
que uma porta está escancarada. – É como o Paço da Mãe Joana!”108 No Brasil, paço não é vocábulo popular. Tornou-se casa e, às vezes, com
nome mais repugnante e feio.109
2.24 Casa de Orates
106 RIBEIRO, J. (1960) p. 143. 107 RIBEIRO, J. (1960) p. 144. 108 Teófilo Braga. O Povo Português. Apud CASCUDO, L. C. (1970) p. 96. 109 Cf. CASCUDO, L. C. (1970) p. 96.
149
Orate é o mesmo que louco, tendo chegado ao português através do espa-
nhol orate, que vem do catalão orat, de uma forma do latim tardio ora ou
oura.110
Segundo J. P. Machado,111 foi o romance do latim aura, “ar, vento”, que
deu a forma portuguesa orate, e não os vocábulos indicados por Magalhães
Jr.
Ligando-se diretamente ao vocábulo oura, que significa “tontura de cabeça,
vertigem”,112 casa de orates é um ambiente de tumulto, desordem, balbúr-
dia, pelo menos no Brasil. Em Portugal, por irreverência, andaram chamando os conventos, diz Maga-
lhães Jr., de casa de orate frates, num jogo de palavras facilitado pela fle-
xão do verbo orare, na expressão latina orate, frates! (orai, irmãos!) .113
2.25. Dar o Cavaco
Há três expressões com a palavra cavaco que parecem tomar tal palavra
com sentido bem diferente um do outro: Dar o cavaco (lamentar, culpando
alguém); Dar o cavaco por (gostar muito) e Catar cavaco (desequilibrar-se
para frente e tentar equilibrar-se novamente, correndo com as mãos prepa-
radas para proteger o corpo da queda iminente) .
A primeira expressão (dar o cavaco), mostra ser cavaco algo indesejável
por que o recebe. Supõe-se ter havido um cruzamento de sovaco com cava-co.
Sovaco ou sobaco são palavras de origem desconhecida, tendo chegado ao
português, provavelmente, através do espanhol. Como é mais comum a
forma sobaco, justapondo-se sob (debaixo) e aco ou aca (fedorento), de
origens latina e tupi, respectivamente, a preferência popular por esta forma
deve estar relacionada com essa falsa etimologia, pois a forma sovaco, já
antiga na língua, elimina tal correlação.
Aliás, aca, cheiro desagradável, é a terminação de alguma palavra, porque
isoladamente tem, em tupi, significado inteiramente diverso, sem nenhuma
relação olfativa. Inhaca já de há muito registrado, transformou-se em iaca,
no Maranhão e aca no Ceará.114 Cavaco ou cavaca, que são variantes de uma mesma palavra, constituem-se
de cava (buraco) e aco ou aca (fedorento; cheiro desagradável).
Certamente por coincidência, mas possivelmente de propósito, o exemplo
que colhemos em Carlos Drummond de Andrade sugere tais correlações:
110 Cf. MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 68. 111 MACHADO, J. P. (s. d.) s. v. 112 FERREIRA, A. B. H. (s. d.) s.v. 113 Cf. MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 68. 114 Neiva, p. 246. Apud MACHADO, J. P. (s. d.) s. v.
150
“Ganhar vidro de cheiro marca barbante, isso não: a mocinha dava o cava-
co.”115
A segunda expressão (dar o cavaco por ou dar o cavaquinho por) parece
ter tomado a palavra cavaco (cavaca) ou cavaquinho com o sentido de ins-
trumento musical, cuja variedade mais conhecida e popular é o cavaquinho,
já que tem sentido positivo, ou seja, de coisa desejável. Dar o cavaco (ou o
cavaquinho) por alguma coisa é demonstrar que gosta muito desta coisa.
Logo, o cavaco ou cavaquinho só pode ser algo de valor ou de estimação.
A palavra cavaco, neste sentido, é formada por metáfora a partir de cavaco, no sentido que veremos a seguir.
A terceira expressão (catar cavaco, ou sair de cata cavaco) leva em consi-
deração a posição arqueada do corpo de quem sai de cata cavaco ou catan-
do cavaco, comparando esta posição com a de quem estivesse catando ca-
vacos, ou seja, pequenas estilhas ou lascas de madeira, pelo chão.
2.26. Tirar o Cavalo da Chuva
Ainda é costume, no interior, onde o cavalo é o meio de transporte mais
comum, amarrar-se o cavalo na frente da casa. Amarrá-lo sob a varanda ou
em algum lugar protegido do sol é indício de que o visitante pretende demo-
rar, o que se considera uma indiscrição pouco desculpável. Tirar o cavalo da chuva seria amarrá-lo na varanda ou alguma outra prote-
ção, para que o visitante pudesse demorar-se calmamente.
Quando este esboça um gesto de partir, o dono da casa diz logo: – Pode ti-
rar o cavalo da chuva, ou seja, pode desistir dessa pressa de partir.
A ampliação de sentido para desistir de alguma coisa, ou simplesmente de-
sistir, é uma conseqüência do uso muito freqüente da expressão.
Amadeu Amaral afirma que não existe em português nem noutra língua um
correspondente exato deste adágio.116
2.27 Andar por Ceca e Meca
Andar de ceca-e-meca em ceca-e-meca; andar de Ceca em Meca; andar Ceca e Meca e olivais de Santarém; correr Ceca e Meca; correr Ceca e
Meca e olivais de Santarém; correr de Ceca em Meca; etc. são todas vari-
antes igualmente usadas.
Ceca é o nome da mesquita de Córdova, a mais importante do maometismo
no ocidente, nome que significa Casa da Moeda, em árabe, língua de que se
origina.
Meca é o mais importante centro da religião do oriente.
115 ANDRADE, C. D. (1979) p. 1320. 116 AMARAL, A. (1948) p. 249.
151
Ir de um a outro desses centros de peregrinação religiosa era correr Ceca e
Meca.
Ora, com o tempo, a expressão perdeu seu significado específico, desapare-
cendo-se o sentido das palavras básicas: Ceca e Meca. Deste modo é que
passou a significar: andar por toda parte; andar de um lado para outro; cor-
rer mundo; andar de déu em déu; etc.
Tanto em Portugal quanto na Espanha, onde a frase se tornou popular antes
de viajar para o Brasil, existem lugares com os nomes de Ceca (Seca ou As-
seca) e Meca. Sendo assim, a origem precisa da frase continua obscura, de um certo modo, pois não sabe se a expressão surgiu em Portugal ou na Es-
panha, ou se se refere a cidades daquele país ou aos centros de cultura reli-
giosa dos mouros.
A probalidade de ser uma criação dos mouros e de se referir à casa de roma-
ria islâmica de Córdova e à cidade sagrada do Islamismo, na Arábia, é, sem
dúvida, a maior.117
Quanto à origem do vocábulo Ceca, explica Said Ali, pouco importa. Basta que sirva de rima antecipada a Meca, com o que se fica entendendo que a pessoa viaja muito, percorrendo grandes regiões e em todos os senti-dos. (...). Faz-se aqui uso de um meio de expressão em que se repete parte de um vocábulo, da sílaba acentuada em diante. Esta repetição parcial produz efeito análogo ao da repetição total. Deixa no espírito do ouvinte a im-
pressão de reforço, de um conceito levado ao grau extremo, ou de cousas contrárias ou pontos extremos, quando os termos rimantes pela natureza da frase devem denotar cousas muito diferentes.118
2.28 Chá de Casca de Vaca
Chá é uma infusão que se toma para combater alguns males, como remédio.
Casca de vaca é o couro com que se fabricam, entre outras coisas, as talas e
os chicotes, objetos de suplício de largo emprego.
O couro, ou a casca de vaca passaram se confundir com a surra ou com o objeto suplício com que a vítima é surrada, respectivamente. Chá de casca
de vaca corresponde a surra ou couro, no sentido da expressão tomar couro
ou levar couro ou dar couro.
Como o que motiva uma surra é sempre considerado um mal, aconselha-se
um chá para a cura deste mal. E o chá mais recomendado é feito de couro
de boi, ou seja, casca de vaca.
As expressões seguintes são provas de que o chá de casca de vaca é muito
recomendado como método de educação familiar: Menino e sino só com
117 Cf. CASCUDO, L. C. (1970) p. 278-283. 118 SAID ALI, M. (1971) p. 11.
152
pancada; Pé de galinha não mata pinto; De pequenino se torce o pepino;
Surra grande, meizinha é; Criaste e não castigaste? Não criaste.
A frase feita Tomar chá em criança só pode ser facilmente interpretada se
chá for o chá de casca de vaca. É a prova da crença de que só tem boa
educação quem toma chá quando ainda é criança.
2.29 Fazer Chacrinha
Locução corrente no meio radiofônico, com o sentido de formar grupos para
comentar desfavoravelmente os colegas de trabalho. Embora pareça ser o diminutivo de chacra ou chácara, de proveniência quí-
chua (chajra), com o sentido de pequena propriedade rural, é mais fácil re-
lacioná-la com o indo-europeu correspondente aos sânscrito chakra, chak-
kram em malaiala.
O sentido da palavra em sânscrito, chakra = roda, está bem claro na expres-
são brasileira fazer chacrinha, ou seja, fazer uma rodinha de amigos para
fofocar ou bater um papo.
Com o sucesso dos programas televisionados do Chacrinha, Abelardo Bar-
bosa Chacrinha, pretende-se relacionar a expressão com as características
dos programas deste artista, com o sentido de promover uma reunião ao
mesmo tempo festiva e aparentemente desorganizada, bagunçada. É um uso
modernizado da expressão, que é anterior ao aparecimento do Chacrinha. Embora a palavra chacra ou chácara, de origem quíchua, seja a única forma
viva em português, ao menos no Brasil, não é visível a relação entre o seu
diminutivo (chacrinha) e a frase feita fazer chacrinha.
2.30. A Sete Chaves.
Sete é um número indefinido, um número que indica grande quantidade e
que sempre seduziu a imaginação popular. A expressão fechado a chave ou
simplesmente a chave já significa bem fechado. Com o determinante quan-
titativo, intensifica-se indefinidamente o ato de bem fechar.
Como fato real, existiram arcas fechadas a quatro chaves, como a que se
encontra no Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte. Cada uma das chaves ficava com um alto funcionário, com o que se garantia a to-
tal reserva na responsabilidade do segredo guardado.119
2.31 Nem Aqui nem na China
O fato de ser a China um país distante, onde vivem nossos antípodas, deve
ter contribuído para fixar a expressão e talvez até para criá-la.
119 CASCUDO, L. C. (1970) p. 294.
153
Vejamos estas duas variantes usadas por Drummond: “Isto nunca foi chá,
nem aqui nem na Índia.”120 Neste caso, Índia faz associação com chá, que é
também chamado de chá-da-índia. “Isto não é bacalhau à Gomes de Sá nem
aqui nem em Macau.”121 Aqui, a rima é um dos motivos da escolha do pon-
to de referência. No entanto, a grande distância e a posição oposta cultural
e geograficamente são fatores muito importantes, visto que é comum pensar
que tudo que está em posição oposta deve estar de algum modo invertido.
A China, a Índia e a província portuguesa de Macau se encontram no hemis-
fério norte-oriental e nós no hemisfério sul-ocidental; quando lá é dia aqui é noite; quando lá é inverno aqui é verão; enquanto aqui é tudo novo e recém-
descoberto, lá é tudo velho e milenar. Assim, o que não existe ou não acon-
tece aqui, pode muito bem existir e estar acontecendo por lá.
O que não existe ou não acontece nem aqui nem na China é, realmente, uma
coisa muito rara.
Certamente esta frase deve ter surgido logo após as grandes descobertas dos
portugueses no Oriente.
2.32. Nem Chus nem Bus
A expressão já é encontrada nos mais antigos documentos da língua, assim
como a sua variante nem chus nem mus, que tem maior semelhança fonética
com a expressão sinônima não tugir nem mugir. Além da rima, que caracteriza todas essas expressões, a forma sempre nega-
tiva formando dois blocos sônicos metricamente equivalentes fá-las muito
semelhantes.
João Ribeiro afirma que buge, bus e mus e muge só podem ser derivadas de
basium e bucca.
Como se usam separadamente os elementos chus e bus: “Não dizer chus” e
“Não dizer (ou não fazer) bus”, compreendo-se que o sentido de chus é o
de mais no latim plus, palavra de que derivou. Não dizer chus é não dizer
mais, ficar calado.
Bus, no dialeto cigano, é igual a mais. Em castelhano, entretanto, significa
beijo. Como o muxoxo (do quimbundo muxoxu) é uma forma de beijo para indicar
negação, desprezo ou desdém, é possível que haja alguma relação entre bus
e mus com a palavra basium, conforme lembrou João Ribeiro.122
Tugir (falar baixinho) é palavra de origem obscura, enquanto mugir (berrar,
gritar) provém do latim mugire. Logo, a expressão nem tugir nem mugir ou
120 ANDRADE, C. D. (1979) p. 1304. 121 ANDRADE, C. D. (1979) p. 1329. 122 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 64-65.
154
não tugir nem mugir se torna bastante transparente, visto que com ela se
exige silêncio absoluto.
2.33 Dizer Cobras e Lagartos.
Eugênio Pacheco e Carolina Michaëlis de Vasconcelos acreditavam que co-
bras, nesta frase feita, é uma forma antiga de coplas; donde dizer cobras
significa satirizar ou zombar através de versos de escárnio.123
A necessidade de fazer a frase redonda fez juntar-se a cobras, já com o
sentido obliterado, a palavra lagartos, criando-se uma expressão simétrica, de quatro mais quatro sílabas.
João Ribeiro acredita, no entanto, que a estrutura desta frase já estava de-
terminada na literatura bíblica, não sendo criada arbitrariamente, como su-
pôs Eugênio Pacheco. Cobras e lagartos corresponde ao texto que é do
salmo XC: “sobre o áspido e basilisco andarás”, onde áspido e basilisco
corresponde, mais ou menos a cobra e lagartos.124
Luís da Câmara Cascudo acredita que a origem da frase esteja na imagina-
ção popular, habituada à velha e feroz animosidade dos dois animais, assis-
tida ao vivo ou narrada nos contos populares. Reuni-los na imagem de
agressividade verbal seria conservar os elementos antagônicos como ex-
pressão viva de debate e guerra, de inferioridade cruel.125
De qualquer maneira, o problema da estrutura métrica existe, assim como a rima aparece noutras expressões entre as que estudamos. No mínimo, ela
facilitou a conservação da frase.
2.34– A Coisa Está Preta
A cor preta simboliza algumas das piores coisas, entre as quais se encontra
o luto.
Segundo Luís da Câmara Cascudo, no entanto, “o luto negro só tomou mai-
or popularidade em Portugal no séc. XVI. Antes o burel (branco) competia
com o dó (negro) como cores dedicadas ao luto. Nas antigas missas de sé-
timo dia quem não possuía preto ia de branco.”126
Acreditamos ter nascido daí a expressão a coisa está preta, pintadinha de branco. Supõe-se uma situação ainda pior do que aquela em que a coisa es-
tá preta, pois carrega o agravante da pobreza, que impossibilitou a compra
de um luto, ou seja, da roupa de cor preta.
Costuma-se dizer também que a coisa está ruça, equivalendo a a coisa está
preta. Ora, também o ruço supõe o preto e o branco. No mínimo, é um pre-
123 Apud RIBEIRO, J. (1960) p. 331-333. 124 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 179. 125 Cf. CASCUDO, L. C. (1970) p. 154-155. 126 CASCUDO, L. C. (1984) verbete “cores”.
155
to desbotado. Tratando de roupa, a cor desbotada supõe um longo uso, e,
neste caso de luto, o prolongamento de uma situação muito desagradável.
A coisa, o estado-de-coisas ou a situação está ficando preta quando as pes-
soas enlutadas começam a se aglomerar. É uma imagem visual do indese-
jável, do que é ruim.
O preto talvez tenha predominado com o sentido de luto a partir do séc.
XVI, conforme vimos, por analogia à situação miserável da escravidão im-
posta aos africanos negros a partir daquela época na Europa e transportados,
posteriormente, para o Brasil.
2.35. Não Dizer Coisa com Coisa
A coerência quanto ao que se faz ou diz só pode ser aferida por compara-
ção. Se o que alguém disse ou fez há algum tempo e o que diz ou faz atu-
almente não se ajusta, tal pessoa não está dizendo coisa com coisa.
Ao contrário dos modismos que indicam a disparidade ou a extravagância e
contradição de objetos que acaso ou a propósito se defrontam, suas formas
primitivas são de identificação de coisas que se enumeram seguidamente e
aos pares, como coisa com coisa, que dever ser a mais primitiva.
As frases: que tem o cu com as calça? Que tem o cós com as calças? ou
que tem uma coisa com a outra? são todas variantes cujo núcleo é coisa
com coisa. Aliás, a própria palavra cós tem alguma analogia fonética com coisa127
2.36 Dar uma Colher de Chá
O chá é dado aos doentes, como remédio, mas não apenas uma colher.
Uma colher de chá seria insuficiente para curar qualquer tipo de doença.
Mas não deixa de ser uma pequena oportunidade, a partir da qual se poderá
avaliar a conveniência ou não-conveniência em prosseguir com ajuda.
Quem aproveita uma colher de chá poderá receber mais ajuda. Mas há
quem não dá colher de chá a ninguém. E, não dar uma colher de chá, qua-
se sempre é considerado um ato execrando, a menos que a primeira não te-
nha sido aproveitada.
2.37. Meter a Colher
Meter a colher; meter a colher de pau; meter a colher enferrujada; meter o
bedelho; meter o nariz; meter a catana, são variantes da mesma expressão.
Naquelas em que entra a palavra colher não há dúvidas de que a origem está
na cozinha. Certamente, isto aconteceu quando alguém, assumindo a res-
ponsabilidade da execução de um prato, não quis ceder às opiniões ou inter-
127 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 331-333.
156
ferência de outra pessoa. Os determinantes de pau ou enferrujada têm a
pretensão de desprestigiar as opiniões emitidas, os palpites dados.
Bedelho é uma carta de pequeno valor nos jogos de baralho. E meter o be-
delho é intrometer-se inopinadamente em conversa ou assunto que não lhe
diz respeito. Neste caso, o que se leva em consideração é o valor ou o peso
da opinião, comparada a um bedelho, que é um trunfo menor.
Meter o nariz não significa uma interferência necessariamente ativa, poden-
do consistir em olhar de perto e atentamente, quase por mera curiosidade,
interferindo passivamente nos negócios ou assuntos alheios. Meter o nariz onde não é chamado é a forma desenvolvida de meter o nariz
Sendo a catana uma espada afiada e longa, usada no Japão no século XVI,
quando o vocábulo surgiu em Portugal, houve uma símile entre a espada
afiada e a língua ferina. Por isso é que meter a catana tem a mais o sentido
de ferir, falando contra alguém ou comentando fatos reprovativos.128
2.38 Dar Coluna do Meio
Coluna do meio, na loteria esportiva, é aquela em que se marcam os empa-
tes, ou seja, quando não houve decisão a favor de um clube nem de outro.
Generalizada, a expressão passou a indicar qualquer situação em que se es-
pera uma decisão favorável para um ou outro lado e acontece um impasse
ou indecisão. Dar coluna do meio é não haver vencedor, enquanto ser coluna do meio é
ser homossexual.
Como os resultados da loteria esportiva, durante muitos anos, foram anunci-
ados na televisão por uma zebrinha, dar zebra passou a significar um resul-
tado oposto ao esperado.
2.39. Fechar-se em Copas
Magalhães Jr. garante que a expressão teve origem no voltarete, que foi um
jogo de cartas muito popular no século passado.129
O fato de copas estar no plural é um ponto importante a favor da hipótese
de se referir a algum tipo de jogo de cartas. Só não sabemos se seria seguro afirmar é o tipo de jogo de cartas que lhe deu origem.
Existe também a variante fazer-se em copas, com o mesmo significado de
guardar um segredo. A origem é a mesma, ou seja, um jogo de cartas em
que os naipes de copa são muito importantes para o resultado final do jogo.
2.40. Elevar aos Cornos da Lua
128 Cf. CASCUDO, L. C. (1970) p. 152. 129 MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 139.
157
Cornos ou cúspides são as extremidades, em forma de pontas, na região
iluminada de um planeta ou satélite. Por sua semelhança visual com a for-
ma dos cornos ou chifres, que são as partes mais elevadas dos animais que
os possuem, com raras exceções.
Elevar aos cornos da Lua ou pôr nos cornos da Lua são expressões sinô-
nimas de pôr ou colocar nas nuvens, sendo menos difundidas e menos po-
pulares que estas.
Como a Lua é um lugar-comum na poesia romântica, suponho que a expres-
são tenha uma origem literária, embora desconheça a sua fonte precisa. Além do mais, tanto as nuvens quanto a Lua estão em grandes alturas em
relação aos homens. Como as alturas foram sempre os sonhos dos homens,
colocar nas alturas é uma forma de elogiar, seja em alturas indefinidas, se-
ja nas nuvens, seja ainda nos cornos da Lua, a romântica Lua dos namora-
dos, dos poetas e dos boêmios.
2.41. Tirar o Corpo Fora
No futebol, de onde deve ter vindo esta expressão, é muito freqüente a ação
de tirar o corpo fora para evitar a responsabilidade por um lance arriscado.
A diferença é que, neste caso, é o corpo mesmo que se tira fora da direção
que vem a bola.
Na situação do jogo é justificável o pleonasmo tirar fora, visto que é a emoção que domina os torcedores e os atletas durante o jogo, principalmen-
te nos momentos de perigo.
A ênfase ficaria na palavra corpo, se o grito fosse tira o corpo! Gritando-se
tira o corpo fora! a ênfase se transfere para a palavra fora, sendo que o
verbo mal seria ouvido no grito do torcedor.
Generalizando-se o seu sentido, a expressão passou a significar a fuga a
qualquer responsabilidade arriscada ou que já teve resultado não satisfató-
rio.
2.42. Ir pras Cucuias
Cucuias é o nome de algum lugar, se não real, ao menos imaginário. Pro-vavelmente, uma região maranhense entre os rios Panamá e Marapi, onde
vive um subgrupo dos índios pianocotós denominado de cucuianas.130
S e esta é a origem da expressão, corresponde estrutural e semanticamente
com ir pra caixa-prego ou ir pra cabrobó, que são nomes de lugares reais,
localizados na Bahia e em Pernambuco, respectivamente.
José Pedro Machado, no entanto, aponta origem malaiala para o termo cu-
cuia, que provém do verbo kukkuka, que significa bradar ou dar rebate. O
130 FERREIRA, A. B. H. (s. d.) s.v.
158
grito de rebate, dando sinal de inimigo, ou, entre os navegantes, dando sinal
de terra, denomina-se cucuiada, que é uma palavra derivada de cucuia.131
Embora não seja fácil a explicação, nesta linha de pensamento, visto que
grito não poderia ser um lugar para onde se possa ir, imaginamos um lugar
onde haja muitos gritos, um lugar onde o medo e a dor predominam. Aí de-
vem ser as cucuias. Um lugar imaginário. Neste caso a expressão corres-
ponde a ir para os infernos ou ir para as profundezas dos infernos, etc.
2.43. De Cutiliquê A expressão original, razões de cutiliquê, simplificada em seu determinante,
perdeu o sentido primitivo de razões breves ou pequenas.132
Cutiliquê origina-se da soletração da abreviatura q, que se lia ku-til=quê,133
“...pois esta q tem tão perversa natureza além do mau nome, que se não
ajunta às lêteras vogais, se não mediante esta, que lhe é semelhável.”134
Na locução proposta, q era a abreviatura de que e podia significar o mesmo
que razões de cutiliquê ou simplesmente de cutiliquê.
Ainda no século XVI, como se pode ver em Duarte Nunes de Lião, o nome da letra q passa a ter o nome que hoje lhe damos, razão por que a locução se
tornou opaca.135
2.44. Dar uma de
Dar uma de e tirar uma de são expressões sinônimas, mas não têm a mes-
ma origem. Ambas significam fingir, imitando ou tentando passar-se por.
Por exemplo: Dar uma de doido é fingir que está doido, tentar iludir a ou-
trem de que é ou está doido.
Essas locuções se tornarão mais claras quando descobrimos quais foram as
palavras que se elidiram.
Na frase feita Dar uma de, a palavra que falta é impressão, donde se vê que a expressão original era Dar uma impressão de.
Tirar uma de proveito da gíria da juventude, onde a palavra onda tomou
significados muito abrangentes. Tirar uma onda, ou estar na crista da on-
da, vieram diretamente dos esportes aquáticos, não sendo difícil formara a
locução tirar uma onda de para substituir a sua sinônima dar uma impres-
são de.
131 MACHADO, J. P. (s. d.) s. v. 132 Vide § 2.20 – Embarcar em canoa furada, neste trabalho 133 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 51. 134 BARROS, J. (1957) P. 64. 135 Apud RIBEIRO, J. (1960) p. 51.
159
Embora a expressão mais nova já fosse curta, resolveram encurtá-la ainda
mais com a elipse do substantivo dispensável, o que é um processo natural
que está na deriva da língua.
Aliás, estar na crista da onda, para o surfista, é o mesmo que atirar uma bo-
la a gol, no futebol. A posição em que o surfista é mais admirado por seus
torcedores é exatamente na crista da onda. Ora, como as praias cariocas
são pontos de lançamentos das modas mais avançadas da costura brasileira,
a relação com a moda foi natural. Estar na crista da onda significa também
estar atualizado com a moda mais avançada.
2.45. Para Dar e Vender
Observe-se que o que se tem para dar não é para ser vendido, nem deve ser
dado o que é para ser vendido. O que se tem para dar e vender, no entanto,
é o que se tem em grande quantidade.
Embora não tenha nenhum mistério, esta expressão é interessante pela sua
estrutura. São dois vocábulos que se opõem quanto ao sentido e se ligam
por uma aditiva, indicando fatos que se somam.
Há inúmeras frases feitas com esta estrutura. Por exemplo: para o que der e
vier; não feder nem cheirar; dizer cobras e lagartos; nas idas e venidas;
sem eira nem beira; por locas e bibocas; com uma mão atrás e outra adian-
te; sem pé nem cabeça; sem tirte nem guarte; sem tugir nem mugir; quem te viu e quem te vê; etc.
Em muitas dessas expressões, pode-se retirar um dos termos sem dificultar
o entendimento do sentido. Foi um simples acréscimo para arredondar a lo-
cução, como vimos ao estudar a expressão dizer cobras e lagartos, em 2.23.
2.46 Ficar Cheio de Dedos
Há dois aspectos interessantes a observar nesta frase feita: o uso da expres-
são cheio de e o significado de dedos.
Não é pequeno o número de frases feitas que começam com cheio de, onde
este adjetivo significa excesso ou abundância.
Vejamos: cheio de chove-não-molha; cheio de frescura; cheio de história; cheio de ipisilones; cheio de merda; cheio de nove horas; cheio de si; cheio
de vento; etc.
Dedos, além de instrumentos de trabalho, são os principais instrumentos de
defesa do ser humano. O medo ou o susto são capazes de nos fazer armar
psicologicamente de muito mais dedos do que os que possuímos, como um
caranguejo acuado.
Ficar cheio de dedos é uma descrição desse nosso estado de espírito que as-
sim se arma quando nos sentimos ameaçados.
160
Não é por acaso que as pessoas, quando se sentem nervosas, movimentam
os dedos descontroladamente, como se estes estivessem maiores que o nor-
mal ou como se houvesse alguns dedos em excessos.
2.47. Dia de São Nunca de Tarde
A locução normal é Dia de São Nunca. O acréscimo do circunstancial de
tarde é uma tentativa de adiar ainda mais a idéia deste dia nunca chegará.
A marcação do calendário popular está sempre relacionado com o calendá-
rio litúrgico ou com a realização de alguma coisa extraordinária. É deste costume que surgiram expressões como Desde o outro carnaval ou
Até o outro carnaval; No dia que o macaco deu bom dia; No dia que a ga-
linha nascer dente e, também, Dia de São Nunca, que deveria estar no ca-
lendário litúrgico.
Como existe um Dia de Todos os Santos, dia 1º de novembro, costuma-se
dizer que este é o dia de se pagarem as dívidas que ficaram para o Dia de
São Nunca. Mas, como não existe este santo, a dívida continua sendo adia-
da.
2.48. Vá para o Diabo que o Carregue
Nesta construção houve um cruzamento de duas frases feitas preexistentes:
Vá para o diabo e O diabo que o carregue. Por sua vez, vá para o diabo deve ser uma variante de vá para o inferno, visto que diabo nunca foi lugar
para onde se possa mandar alguém. Do mesmo modo o diabo que o carre-
gue, no mínimo, é uma inversão da frase normal, que deveria ser que o dia-
bo o carregue, como é normal a construção de optativas.
Vá para o diabo que o carregue deve corresponder à idéia de que o amaldi-
çoado seja levado para o inferno pelo diabo. Ou seja vá para o inferno e
que o diabo o carregue para lá.
As variantes desta natureza são inúmeras. Vejamos: mandar para o diabo;
mandar para o diabo que o carregue; que o leve o diabo; diabos o levem; ir
para a casa do diabo; etc.
2.49 Acabou-se o que Era Doce
Como toda criança gosta de doce, essa expressão deve corresponder a uma
forma disfêmica de negar às crianças aquilo que elas pedirem. Esta deve ter
sido a origem da expressão. É menos agressivo alegar que o objeto solicita-
do não existe do que negá-lo pura e simplesmente com um não.
Variante sintética muito comum é o já era. Um pouco menos, aparece o era
uma vez, nascido dos contos populares e das histórias infantis.
Acabou-se o que era doce corresponde a acabou-se o que você queria. O
doce como sinônimo de coisa saborosa e desejada parece constantemente
161
nas músicas populares, nas conversas românticas de namorados, não estan-
do muito afastado nem mesmo da fraseologia. Vejamos alguns casos: dar
os doces; dar um doce se acertar; quando serão os doces? ser um doce;
etc.
A sabedoria popular nordestina registrou a excelência indiscutível do doce
neste provérbio: não há doce ruim nem cabra bom.136
2.50 Dose para Leão
Dose para leão, dose para elefante ou dose para cavalo são algumas das variantes que circulam com o mesmo significado e atendem às preferências
individuais dos falantes.
Supõe-se que o leão, por ser valente; o elefante, por ser grande, e o cavalo,
por ser forte, necessitam de doses exageradas de remédio para que este pos-
sa produzir o efeito desejado.
Com a ampliação do sentido, dose para leão e suas variantes é o exagero
na ampliação de qualquer coisa desagradável, ou mesmo aquelas que só se
tornam desagradáveis com o exagero.
2.51 Doutor da Mula Ruça
As explicações de João Ribeiro e Magalhães Jr., embora diferentes, comple-
tam-se. João Ribeiro lembra que “em geral, os doutores e pregadores da casa real,
como convinha à decência deles, tinham mula e mula ruça.”137 Ou seja,
doutor mula ruça era um doutor da casa real portuguesa.
Magalhães Jr., no entanto, lembra que “era esse o apelido de certo curandei-
ro que existiu em Portugal durante o reinado de D. João III e que foi reco-
nhecido oficialmente.”138
É óbvio que o apelido do médico e político brasileiro Francisco de Sales
Torres Homem desde que publicou o Libelo do Povo não seria mais um
elogio, mas um epíteto ironicamente pejorativo. Doutor da mula ruça já era
sinônimo de charlatão.
O sentido pejorativo deve ter nascido com o reconhecimento de um curan-deiro como doutor de mula ruça, que era insígnia de altos funcionários da
casa real.
2.52. Dar Duro
Dar duro, ou dar um duro, ou dar o duro, são expressões que indicam o ato
de prestar ou conceder um serviço duro, árduo, penoso, cansativo.
136 MOTA, M. (1969) verbete “cabra”. 137 RIBEIRO, J. (1960) p. 275. 138 MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 112.
162
Este é o seu verdadeiro sentido e origem, com o verbo dar no sentido de
conceder, prestar ou executar e com a elipse do substantivo trabalho, servi-
ço ou outro equivalente.
Usando o mesmo critério da elipse, mas fazendo subentender outra palavra,
a expressão passa a ter sentido chulo.
2.53. Sem Eira nem Beira
Sem leira nem beira é uma variante pouco conhecida, mas há uma outra
mais extensa que é bastante popular: Sem eira nem beira nem ramo de fi-gueira.
Tanto eira quanto leira constituem propriedades insignificantes. Possuir
uma eira ou uma leira seria quase o mesmo que nada possuir. No entanto,
quem nem isso tem, ainda é mais pobre, mais desprovido de recursos. Talvez seja o epíteto senlheira (só, singular, solitária, solteira) : ‘Eu sen-lheira deitei’ (Canc. Vatic., 772) [pois] no castelhano ainda se usa señera, com o mesmo sentido. Não é improvável que de senlheira (sem-l’eira, sen eira) se formasse a expressão com a forma sem eira aplicável à pessoa que
não pode casar por não ter nada de seu.139
A intenção de rimar está mais evidente ainda na variante sem eira nem beira
nem ramo de figueira, podendo-se considerar que o sentido de toda a frase
já está em sua primeira parte (sem eira), tornando-se dispensável todo o res-tante.140
O que seriam essa beira e esse ramo de figueira?
Se a beira for mesmo a beira dos rios, como supõe João Ribeiro, 141 o ramo
de figueira deverá ser um símbolo de valor insignificante, por analogia com
o ramo de oliveira, que é o símbolo do valor dos atletas olímpicos desde a
antiga Grécia.
Neste e em muitos outros casos, os termos rimantes não fazem sentido
quando examinados fora do conjunto, como afirma o Prof. Said Ali:142
Quando de um indivíduo muito pobre dizemos que ele não tem eira, nem
beira, nem ramo de figueira, só o primeiro substantivo exprime cousa signi-
ficativa referente a posse. Os dous outros conceitos, considerados de per si, são difíceis de entender. Que tem beira com os bens de alguém? E desde
quando se avaliam as possibilidades do indivíduo pela possessão ou não
possessão de um ramo de figueira? Todo o valor das duas expressões está
simplesmente na rima, cujo papel reforçativo nos sugere a idéia de pobreza
extrema.
139 RIBEIRO, J. (1960) p. 415. 140 Cf. 2.45 – Para Dar e Vender, neste trabalho. 141 RIBEIRO, J. (1960) p. 415. 142 SAID ALI, M. (1971) p. 11.
163
2.54 Na Embira
Na embira é o mesmo que na pindaíba, e ambas têm origens parecidas. Es-
tar na pinda-î (pindaíba) equivale a estar nas ibira-aî (embiras), que são fra-
ses de origem brasílica.
É bom lembrar que pindá (anzol) é a base de pinda-i (ib), que é vara de an-
zol. Pinda-aî é o dente, a volta recurva do anzol, cipó ou graveto. Do
mesmo modo, ibira-aî é pau não liso, com voltas, cipó, cipoal.
Como a ambas convém o sentido de cipoal, salsa de espinhos, lugar emba-raçado onde fica tolhido ou sem movimento, conclui João Ribeiro que estar
na pindaíba ou estar na embira é estar amarrado, sem saída, em dificulda-
des e apuros.
O sentido atual e moderno da expressão é conseqüência da troca de tais di-
ficuldades pela falta de dinheiro, que é de nossa civilização.143
Tomé Cabral registra a expressão estar na embira como sinônimo de ser
açoitado, para a qual cita a seguinte abonação de Manoel de Oliveira Paiva:
“Os criminosos já devem estar na embira.”144
2.55 Botar pra Escanteio
Proveniente da gíria do futebol, esta frase feita se refere ao não aproveita-
mento ou não valorização de uma oportunidade que se desperdiça. É o mesmo que botar pra córner.
2.56. Passar uma Esponja
Proveniente da sala de aula, onde o quadro é apagado com a esponja ou
apagador, a símile se estabelece entre o ato de apagar o que está escrito no
quadro e o que está fixo na memória. Passar um esponja é esquecer tudo,
como se nada tivesse acontecido sobre o assunto em questão, começando
tudo de novo.
2.57 Perder as Estribeiras
Perder os estribos, que já não é uma expressão usual, é perturbar-se como o cavaleiro que os perde e não tem onde firmar montaria.
Câmara Cascudo lembra que ...nas antigas corridas de Argolinhas e nas Manilhas, nos séculos XV-XVIII, [perder as estribeiras] desclassificava o cavaleiro do páreo. Nas
velhas corridas-de-cavalos sertanejas, quem perdesse as estribeiras, per-desse os estribos, bambeando, atrapalhando, temendo queda, pagava multa de bebida aos companhia, em pleno alarido zombeteiro.145
143 RIBEIRO, J. (1933) p. 50-51. 144 CABRAL, T. (1982) s.v. 145 CASCUDO, L. C. (1970) . p. 144.
164
Do sentido primitivo, relacionado com os estribos ou as estribeiras, passou a
significar perder o controle, a direção; desnortear-se em palavras e atos; ex-
ceder-se na resposta incortês e violenta ou até desatinar-se momentanea-
mente.
2.58 Com a Faca e o Queijo na Mão
A faca e o queijo, nesta expressão, significam o poder absoluto. A faca é o
poder emanado da tecnologia e o queijo é o poder emanado do capital ou do poder econômico.
Na mão, à sua disposição, sob seu controle, deveria estar no plural, se quei-
jo e faca fossem seres que costumeiramente assim se denominam. Ninguém
segura a faca e o queijo numa só mão, a menos que não deseje parti-lo.
Uma variante comum é ter a faca e o queijo na mão, que corresponde ao
mesmo significado de estar por cima da carne seca ou ser o dono da situa-
ção.
2.59– Não Feder nem Cheirar
A união de termos que se opõem quanto ao sentido, excluindo-os a ambos
simultaneamente, resulta numa idéia de neutralidade absoluta.
Ao contrário da expressão anterior, que apenas une elementos que comple-tam a idéia de poder, esta só os aproxima para negá-los em conjunto.
Compare esta frase feita com as que citamos em 2.45 – para dar e vender,
neste trabalho.
2.60 – O Fim da Picada
Picada é uma faixa limpa de terra, entre o roçado e o mato não roçado, para
evitar que o fogo ateado no roçado não passem além dele. Neste caso, o fim
da picada é um lugar perigoso para quem estiver botando fogo no roçado,
pois o fogo poderá colocá-lo em risco de vida.
Picada é também uma trilha feita por quem ingressa numa mata, geralmen-
te a facão, para facilitar a passagem e para marcar o caminho de regressa. Desaparecida uma pessoa que assim entrou na mata, é relativamente fácil
procurá-lo, seguindo a picada. No entanto, se chegarem ao fim da picada
sem encontrá-lo, está-se correndo dum grande risco, pois quem atacou o in-
divíduo, está-se correndo um grande risco, pois quem atacou o indivíduo
procurado fê-lo naquele local. Do contrário, a picada deveria continuar. E
quem está no mesmo lugar onde acontecer tal ataque está correndo risco
semelhante.
O fim da picada é o pior que pode existir numa aventura.
165
2.61– Não Ser Flor que se Cheire
Há flores, como o cravo-de-defunto, cuja beleza se opõe fortemente ao ser
mau odor. Metaforicamente, as pessoas que têm aspecto agradável nem
sempre merecem uma aproximação maior que as outras. Como há flor de
mau odor, há pessoas de mau caráter, que devem ser evitadas, embora te-
nham uma aparência de lindas flores, de almas cativantes.
Não ser flor que se cheire é ser pessoa que deve ser evitada.
2.62 – Vá Pregar em Outra Freguesia Freguesia, sob o aspecto eclesiástico, é uma povoação, e corresponde, gros-
so modo, a paróquia.
Na frase é melhor da paróquia, paróquia é o lugar, a região. Neste sentido é
que corresponde a freguesia.
Como, originalmente, freguesia está relacionada com o pregador, que é seu
líder espiritual, e como não admite um líder espiritual, ir pregar em outra
freguesia é sair daquele lugar, pois o pároco só pode ficar onde pode pregar.
As variantes cantar em outra freguesia e bater em outra freguesia corres-
pondem a uma confusão do sentido de pregar
Assim como cantar está relacionado com pregar pelo uso da palavra como
matéria de trabalho, também bater está relacionado com pregar pelo uso do
prego e das pancadas que sobre ele devem ser dadas.
2.63 E Lá Vai Fumaça
A locução é de difícil explicação, assim como a sua sinônima e tarará, que
dão idéia de quantidade indeterminada e não pequena.
Talvez fumaça esteja relacionada com a poeira que se levanta como fuma-
ça quando se transporta grande quantidade de gado pelas estradas de terra,
formando uma verdadeira nuvem.
Tarará é palavra onomatopeica que indica o som da trombeta, que é muito
forte. Talvez tenha havido aí também uma metáfora da idéia de intensidade
e quantidade.
De qualquer modo, não nos parece clara a origem destas expressões. É pre-ciso um pequeno esforço extra de raciocínio.
2.64 Quebrar o Galho
Na gíria, galho é uma dificuldade ou complicação. Quebrar ou destruir o
galho é remover definitivamente uma dificuldade.
Considerando que a expressão é mais usada nos setores burocráticos da ad-
ministração pública, é possível que se tenha estabelecido uma símile com o
galho de uma estrada ou de um rio.
166
Quebrar um galho de estrada seria passar por um atalho, evitando uma ca-
minhada mias longa pela estrada principal.
No caso do rio, galho é um pequeno afluente. Quebrar este galho seria fazê-
lo desembocar mais rapidamente no rio principal, abrindo-lhe um caminho
artificial.
Deste modo quebrar o galho é facilitar o andamento de um serviço ou ne-
gócio através de meios não autorizados, como, por exemplo, as influências
pessoais ou o dinheiro.
2.65 Ouvir Cantar o Galo, Mas Não Sabe Onde
Entre os camponeses, é o galo que informa com o seu canto o nascimento
do novo dia, logo em suas primeiras horas.
Quando o galo canta fora deste esquema que lhe é natural é que algo de es-
tranho está acontecendo à sua volta. Pode ser a Lua que saiu muito clara e o
acordou, um ladrão de galinha ou qualquer outra coisa. Neste caso, ele não
é acompanhado pelos demais galos da vizinhança.
Ouvir o galo cantar é sempre uma informação para quem entende a sua lin-
guagem, mas é necessário saber onde ele cantou para que se possa tomara
alguma providência.
Se o galo cantou fora de seu lugar habitual, certamente está sendo roubado.
Pois todos os galos cantam quando acordam, à noite. Ora, o ladrão de galinha costuma transferir suas presas para um lugar mais
distante e seguro, usando um pedaço de madeira. Encostando o pedaço de
madeira nos pés das galinhas, no poleiro, estas passam para ele e são, deste
modo, transportadas, sem perceber que já não estão em seu poleiro.
Distantes dos ouvidos do dono ou de algum cachorro vigilante, o ladrão po-
de prendê-las como melhor lhe aprouver.
Drummond usou a frase com uma inversão, que é a forma registrada por
Leonardo Mota, 146 mas Mauro Mota147 registra a rigorosa ordem direta: ou-
viu o galo cantar e não sabe onde, como acontece no espanhol: ois gallo
cantar, y no sabeis en que muladar.
2.66 Comer Gambá Errado
Parece que é uma variante de comer gato por lebre.
Como a carne de gato, embora apetitosa, não goze da preferência dos brasi-
leiros, vender ou passar gato por lebre é enganar alguém e comer gato por
lebre é ser enganado.
Não sabemos de onde vem a preferência pela lebre e a repugnância pelo ga-
to, que de fato existem, quanto à repugnância pelo gato, que de fato exis-
146 MOTA, L. (1982) s. v. 147 MOTA, M. (1969) verbete “galo”.
167
tem. Quanto à repugnância pelo gambá, o seu mau-cheiro explica suficien-
temente.
Como o seu mau-cheiro pode ser totalmente eliminado, é fácil enganar al-
guém que gostaria de comer carne de lebre, passando-lhe gambá por lebre.
A palavra errado funciona como predicativo do sujeito, como sinônimo de
enganado, com nas expressões tomar um caminho errado, tomar um bonde
errado, etc.
Sendo assim, comer gambá errado é comê-lo enganado com quem come
gato por lebre, é ser levado a fazer algo por engano.
2.67 Não Poder com uma Gata pelo Rabo
O feminino, neste caso, tem o objetivo de humilhar o impotente ou fraco a
que se dirige a referência. Supõe-se que a gata é mais fraca, menos veloz e
menos feroz em sua própria defesa do que o gato.
Na realidade, não é fácil segurar uma gata pelo rabo, e não deveria ser tão
humilhante a expressão como realmente é.
2.68 Fazer de Gato-Sapato
João Ribeiro ensina que fazer de gato sapato indica o erro de leitura ou de
escrita no tempo em que as abreviaturas eram muito freqüentes e podiam
induzir a engano. Antigamente sapato era escrito com ç e a palavra gato podia ser lida como çapato na abreviatura çato. É até possível. Mas o mes-
tre continua:
É digno de nota que o sentido da frase indica menos um erro de leitura que
uma depreciação e motejo, o que indica já uma metáfora.148
A. Faria149 argumenta que a frase provém de um jogo infantil. E Câmara
Cascudo acrescenta que tal jogo era uma modalidade da cabra cega ou cobra
cega, em que “Uma criança, sempre de olhos vendados, é batida pelos
companheiros que empunham sapatos, chinelas, varinhas, até que consiga
agarrar a um deles, seu substituto.”150
Gato-sapato seria esta criança “entregue ao arbítrio alheio, humilhada, abú-
lica, ínfima e sofredora.”151 Embora ambas as explicações pareçam corretas, creio que a origem mesma
da expressão é a que propôs João Ribeiro. O jogo infantil aproveitou a ex-
pressão já existente e aplicou-a com sentido semelhante ao ser humano, fa-
zendo-a sobreviver.
148 RIBEIRO, J. (1960) p. 127. 149 Apud. RIBEIRO, J. (1960) p. 127. 150 CASCUDO, L. C. (1970) . p. 106. 151 Idem ibidem.
168
2.69 Não Estar no Gibi
O gibi corresponde, na literatura em quadrinhos, ao folheto da literatura de
cordel.
Segundos seus respectivos apreciadores, todo fato importante está registra-
do no gibi ou no cordel. O que não está no gibi é uma extravagância que
não merece fé ou ainda não é um fato que deva ser amplamente divulgado.
No Nordeste, onde a literatura de cordel é mais divulgada, existe a frase
correspondente: não está no folheto.152
2.70 Dar Grilo
Grilo, nesta locução, corresponde a confusão, complicação, trapalhada.
Analisando o que acontece a quem ouve o cri-cri de um grilo dentro de casa
ou no campo, é fácil perceber que o grilo realmente confunde a audição, não
sendo fácil localizá-lo com precisão, de tão penetrante que é o seu ruído.
O significado de grilo igual a confusão é conseguido por metonímia, como
deve ser o caso de dar bode e outras.
2.71 Cheio de Nove Horas
Nove horas era a hora clássica do século XIX, regulando o final das visitas
e ditando o momento das despedidas.
A figura do cheio de nove horas surgiu nessa época, como a criatura infalí-vel em citar regras de conduta para os outros e em restringir as alegrias dos
outros, complicando as coisas mais simples.153
A variante registrada por Tomé Cabral parece deixar mais claro este aspecto
do cheio de nove horas, que é a intenção de pôr tudo à prova. Em lugar de
nove horas, emprega-se noves-fora.
A abonação que ele registra é de José Lins do Rego: “Nunca vi mulher mais
cheia de noves-fora.”154
2.72 Inês É Morta
Inês é morta ou morreu Inês são frases que facilmente se explicam, dada a
notoriedade do fato histórico que lhe deu origem: a morte de Inês de Castro, cantada por Camões, por Antônio Ferreira, por João de Barros e muitíssi-
mos outros.
Por ter sido tão amplamente divulgada essa notícia, depois de algum tempo
passou a ser corriqueira trivialidade a notícia de que morreu Inês ou de que
Inês é morta.
152 Informações do Prof. Pedro Lira, em conferência realizada no Congresso Brasileiro de Lín-
gua e Literatura, na UERJ. 153 CASCUDO, L. C. (1970) . p. 41-43. 154 José Lins do Rêgo. Pedra Bonita. P. 268. Apud. CABRAL, T. (1982) s.v.
169
Embora genuinamente portuguesa, Tomé Cabral afirma que a frase Inês é
morta é muito mais usada entre nós do que entre os criadores. Seu signifi-
cado atual corresponde a agora é tarde.155
Por desconhecer o fato da morte súbita de João Pereira de Araújo Neves
(1814-1885), governador do Rio Grande do Norte, com noticiário derrama-
do e contínuo na imprensa do Rio de Janeiro e debates na Câmara dos De-
putados, 156 João Ribeiro relaciona a frase morreu o Neves ou aí morreu o
Neves com aquela que se refere a Inês de Castro, que acabamos de ver.157
2.73 Onde Judas Perdeu as Botas
Diz-se de um lugar longínquo, remoto e de difícil acesso. Corresponde a
para lá de caixa-pregos; no fim do mundo; no calcanhar de Judas ou nos
calcanhares de Judas; onde o diabo perdeu as botas; onde o diabo perdeu
a espora; no cu do Judas; nos cafundós do Judas ou nos cafundós de Judas.
Pode-se explicar esta frase a partir da Bíblia. Em Mateus 27:5, lemos que
“Judas, não podendo expiar sua culpa, mas tocado de arrependimento, reti-
rou-se e foi pendurar-se num laço”158
Ora, sendo Judas um personagem malquisto, não se pode imaginar que te-
nha escolhido, em seu mais profundo desespero, um lugar bonito e agradá-
vel para se enforcar. Onde Judas perdeu as botas, com a decomposição de
seu cadáver dependurado no laço, só pode ser um lugar em tudo desagradá-vel, feio e de difícil acesso.159
2.74 Não Há Mais Juizes em Berlim
Raimundo Magalhães Jr. explica a origem desta frase resumindo o conto
em verso de François-Guillaume-Jean-Stansislas-Andrieux, O Moleiro de
Sans-Souci: Aí se narra que, quando o rei da Prússia resolveu mandar construir o famo-so castelo de Sans-Souci, o seu intendente tudo fez para afastar da vizi-nhança um modesto moleiro, cujo moinho daria uma nota prosaica a tão belo sítio. O moleiro, porém, não aceitou nenhuma proposta para sair do local e permitir a demolição de seu moinho. Ameaçado com a expulsão violenta, ainda assim não se deu por vencido e gritou, decidido a ir lutar
com o rei na justiça: ‘Il y a des juges à Berlin’ (Há juizes em Berlim) .160
155 CABRAL, T. (1982) s. v. 156 CASCUDO, L. C. (1970) . p. 136. 157 RIBEIRO, J. (1960) p. 307-309. 158 Existem centenas de traduções da Bíblia, mas em todas elas a idéia original prevalece, em-
bora varie a forma. 159 Os Atos dos Apóstolos registra que “tendo ele se pendurado, rebentou pelo meio, e todas as
suas entranhas se derramaram”. Ou seja, ele permaneceu pendurado até seu corpo se desfazer
pela putrefação. (Atos, 1:18) 160 MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 18-19.
170
Quando a justiça dá um mau passo, dobrando-se ao poder, usa-se a expres-
são: não há mais juizes em Berlim, acusando a falta de juizes imparciais.
Tanto esta forma negativa quanto a forma original, positiva, são vivas na
linguagem popular.161
2.75 Levar a Lata
Explicando a origem da frase amarrar a lata (que nunca ouvimos), João
Ribeiro lembra-se a possibilidade de derivação desta frase a partir de outra,
de lata ao rabo, que provém da brincadeira maldosa que consiste em amar-rar latas ao rabo dos cachorros vadios, que foi comum entre os estudantes de
Coimbra.162
Como o sentido de amarrar a lata é o de recusa ou falta ao cumprimento de
uma promessa, equivalente a dar tábua em pedidos de casamento, é prová-
vel que tal significado tenha vindo da fusão do latim medieval glatire, que
deu latir (bater), hoje obsoleto, e lata (folha de ferro batido), com outra
forma latina lattere (por latere), que significava esconder-se.
Em amarrar a lata ambas as formas originais se confundem e se influem
porque é certo que lata aqui envolve o sentido de falta, recusa ou negativa.
Enquanto amarrar a lata e deitar a lata têm sentido ativo, levar a lata tem
o sentido passivo correspondente a levar uma surra, levar bomba, etc.
Levar a lata, portanto, é receber uma recusa.
2.76 Perder o seu Latim
Até o século XVIII o latim era a língua da comunicação letrada, o idioma
das exposições, dos debates e das composições científicas. E perder o seu
latim seria a derrota na tentativa de uma conquista verbal.
O acréscimo do complemento tempo só se deu no século passado, já que era
dispensável, pois é inadmissível o exercício dialético sem a sua duração. A
frase perder seu latim é arredondada com quatro mais quatro sílabas (con-
tando-se até a última tônica), o que é normal na fraseologia:163 perder seu
tempo e seu latim.
A elipse é tão natural que não prejudica o sentido da frase completa, neste caso.
Citando Mantaigne, Câmara Cascudo documenta a frase também em língua
francesa: “Qu’avant qu’il soit venu à la certitude de ce point où doibt join-
dre la perfection de son experience, le sens humain y per son latin.”164
161 Cf. MOTA, L. (1982) s. v. 162 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 247. 163 Vide Cobras e Lagartos, neste trabalho. 164 Montaigen, II, XXXVIII, Apud CASCUDO, L. C. (1970) p. 262.
171
Magalhães Jr. acha ter descoberto a origem desta frase na versão de um
conto popular francês, que ele resume: Augusto, vitorioso numa guerra, regressara a Roma. Em seu palácio, apa-receu um homem com um papagaio ensinado. O louro dizia: ‘Salve, César invicto!” Encantado, o imperador o comprou por alto preço. Logo apare-ceu outro homem, com uma pega, que igualmente falava: “Salve, Augus-
to, vencedor glorioso.” Também a pega foi adquirida por uma bela soma. Um sapateiro quis ensinar coisa parecida a um corvo. Mas encontrava di-ficuldades e, a toda hora, se queixava: “Não adianta! Estou perdendo o meu tempo e o meu latim!” Tanto perseverou, no entanto, que por fim o corvo aprendeu as palavras lisonjeiras. E foi, então, levado ao palácio. Mas Augusto se limitou a dizer: “Chega de tanta adulação! Não compro mais ave alguma!” Recordando, subitamente, as palavras desanimadas do sapateiro durante o seu aprendizado, o corvo gritou: “Não adianta! Estou
perdendo o meu tempo e o meu latim!” Augusto começou a rir e comprou o corvo amestrado por preço muito superior ao das outras aves.165
Se a origem foi esta, ao contrário de que pensa Câmara Cascudo, a frase
completa foi anterior à frase elíptica.
No entanto, é bom deixar claro que a expressão proverbial no texto traduzi-
do não corresponde, literalmente, à expressão portuguesa, enquanto a ex-pressão elíptica já estava registrada por Montagne, naquela mesma língua.
A frase do conto era: “Hélas! J’ai perdu mon temps et ma peine!”
Perdre son latin é frase tradicional francesa e significa perder seu tempo.166
2.77 Sem Lenço nem Documento
O lenço e os documentos são elementos indispensável para quem se despe-
de de sua família ou de sua comunidade para melhorar de vida.
O lenço se liga aos valores afetivos e os documentos aos valores morais,
que não os mínimos que se podem exigir de alguém.
Quem sair de casa sem o lenço para acenar de longe ou enxugar as possí-
veis lágrimas de saudade e sem os documentos para se identificar por onde passar em suas aventuras, naturalmente será discriminado e tido por suspei-
to, já que lhe faltam os valores básicos: o amor e a gratidão à família e uma
história que comprove os seus costumes e habilidades.
Um só desses elementos (sem lenço ou sem documento) já é suficiente mo-
tivo de discriminação, mas a rima e a métrica facilitaram a união dos dois
elementos simbólicos.
2.78 Tirar de Letra
165 MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 265-266. 166 CORRÊA, R. A. & STEINBERG, S. H. (1980) verbete “latin”.
172
O verbo tirar parece estar empregado aqui no sentido de realizar alguma
coisa. Tirar de letra pode estar relacionado com a música, quando, a partir
da letra conhecida ou do texto marcado se torna mais fácil, por exemplo, ti-
rar um samba.167
Tirar um samba de letra seria tirá-lo com facilidade.
No sentido de conseguir, obter ou receber, o verbo tirar pode estar relacio-
nado à compra a crédito, que se faz através de letra (promissória) . Afinal,
a compra a crédito não deixa de ser uma maneira mais fácil de obter as coi-
sas. Tirar de letra, neste caso, é resolver o problema da compra através de letra.
2.79 Por Locas e Bibocas
Locas, possivelmente do tupi roca, são buracos ou abrigos entre pedras,
dentro ou fora d’água.
Biboca, segundo José Pedro Machado, é um substantivo proveniente do tupi
“ybi-boc”, alterado para “bi-boc”, que significa terra, chão, fendido ou ras-
gado. Emprega-se também no sentido de casinha de palha, casebre barre-
ado, neste caso, porém, o vacábulo biboca ou yby-b-oca, se traduzirá como
casa de terra ou de barro.
Andar por locas e bibocas significa andar por lugares muito pobres, muito
primitivos, totalmente afastados da tecnologia e do desenvolvimento mo-dernos.
2.80 Na Última Lona
Lona é o nome do tecido que, por sua vez, provém do nome da cidade fran-
cesa onde ele era fabricado: Olonne.
Como tal tecido é utilizado na fabricação de tendas de circos itinerantes,
passou a significar a própria tenda, por um processo metonímico normal.
Ora, estar na lona, ou seja, estar morando numa tenda de lona, já é uma si-
tuação de grande desconforto.
É de se supor que as pessoas que habitam a última lona de um circo não são
os grandes artistas circenses, mas os mais humildes funcionários, encarre-gados da limpeza e da segurança do grupo.
Sem dificuldades se pode imaginar o que é estar na última lona: estar em
extrema pobreza.
Como os jogos são muito comuns neste ambiente, a ligação entre a idéia de
extremo desconforto e pobreza com o valor zero foi automática. Por isso,
estar na lona e estar a zero significam a mesma coisa. E lona, nos jogos
de porrinha, dominó e muitos outros, é o mesmo que zero.
167 FERREIRA, A. B. H. (s. d.), verbete “tirar”.
173
2.81 Passar Manta
A manta é uma proteção de tecido grosso ou encorpado que se coloca entre
o arreio e o pelo da cavalgadura. Além de evitar pisaduras, é uma peça de
adorno para a montaria.
Como o burro ou o cavalo são os que levam manta para servir de montaria,
dar manta ou passar manta em alguém, além de ser um logro numa transa-
ção, é um modo de demonstrar que quem leva manta é burro, pois do con-
trário veria que aquele negócio seria uma manta para ele.
Aliás, a pessoa que dá manta, por gentileza, jamais diz que deu manta na-quele fulano, a menos que ele nem pessoas de sua intimidade estejam por
perto. Isto seria uma agressão.
A preposição em favorece esta nossa hipótese, visto que passar manta em
alguém ou dar manta em alguém não poderia ser uma boa regência, se esta
fosse a manta do Demo, a que se refere Câmara Cascudo168 ou um simples
invólucro ou embrulho, como observa João Ribeiro.169
2.82 Botar a Mão no Fogo
Embora João Ribeiro170 e Magalhães Jr.171 nos forneçam importantes infor-
mações sobre esta frase feita, transcreveremos apenas um fragmento do
Câmara Cascudo, pois ele nos parece suficiente para esclarecer a sua histó-
ria. Ele nos faz recordar que: ...uma das justificações nos ordálios da Idade Média era a prova do ferro
caldo. Quem alegava inocência submetia-se a pegar numa barra de ferro aquecida ao rubro e caminhar com ela na mão por alguns metros. Envol-via-se a mão em estopa, selada com cera, e três dias depois abria-se atadu-ra. Se a mão estivesse ilesa, sem sinal de queimadura, era evidente e pro-vada a inocência. Se estivesse queimada, provada estava a culpabilidade e era imediata a punição pela forca.172
Botar a mão no fogo por alguém, portanto, é jurar pela sua inocência.
Existem inúmeras variantes, como: pôr a mão no fogo; meter a mão no fo-
go; colocar a mão no fogo; assim como as suas negativas.
Ao contrário dos numerosos adágios traduzidos pelos paremiógrafos portu-
gueses, este, que é tradução “J’en mettrais la main au feu”, não só introdu-
zido no uso vulgar, mas vive na torrente oral e está inteiramente nacionali-
zado.173
168 Cf. CASCUDO, L. C. (1970) p. 317. 169 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 212. 170 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 233. 171 Cf. MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 206. 172 CASCUDO, L. C. (1968), p.137. 173 Cf. AMARAL, A. (1948) p. 238, 251 e 267.
174
2.83 Dar as Mãos à Palmatória
Não faz muitos anos ainda havia palmatórias em algumas escolas do interi-
or.
Era tão natural que os alunos que errassem fossem punidos pelos que acer-
tassem as perguntas do professor que as mãos estendiam automaticamente,
humildes e reconhecidas.
Dar a mão à palmatória é reconhecer o próprio erro, mesmo hoje, quando
já não existe tal objeto de suplício.
Dar o braço a torcer e Dar a mão a bolos têm o mesmo sentido, sendo a origem também relacionada com o castigo. Não conhecemos referência a
este castigo de torção do braço na história da escola tradicional. Pode estar
relacionado com os castigos aplicados nas escolas de artes marciais ou des-
portos.
Quanto aos bolos, que ainda se dão nos jogos infantis, lembram o aspecto
da mão de quem é castigado com a palmatória. Fica inchada e com as mar-
cas dos furos da palmatória em alto-relevo, como se fosse um bolo confei-
tado.
Hoje, nos referidos jogos infantis, dá-se bolo ou se ganha bolo com a pró-
pria mão. Dar bolo é castigar e ganhar bolo é ser castigado.
2.84 Meter a Mão em Cumbuca Esta frase feita é a redução de um provérbio muito conhecido: macaco velho
não mete a mão em cumbuca.
Embora Couto de Magalhães assevere ser este um anexim tupi, do qual diz
ter encontrado a seguinte versão rimada: macáca tuiué inti omundéo i pó
cuiambuca opé,174 sua origem é mais remota, como veremos adiante.
Literalmente, esta versão tupi corresponde à portuguesa: macaco velho não
mete a mão em cumbuca.
Como a palavra cumbuca é um brasileirismo, a variante portuguesa é meter
a mão no cabaço, como nos informa Afrânio Peixoto.175
A história que deu origem a este provérbio é muito divulgada, mas não pa-
rece estar embasada em fatos verídicos e sim em fatos literários. Tanto João Ribeiro quanto Câmara Cascudo estão de acordo neste particular. E ambos
citam lendas bastante remotas que justificam suas opiniões.
Eis a história, segundo a versão de João Ribeiro:176 Para caçar o macaco, introduz-se uma espiga de milho em um cumbuca, ele mete a mão, segura a espiga, e por não ter o instinto de largá-la, apesar de sua decantada astúcia, fica preso pela mão, que estando cheia não pode
174 Apud CASCUDO, L. C. (1968), p.21. 175 Afrânio Peixoto. Miçangas. Rio de Janeiro, 1981. Apud. CASCUDO, L. C. (1968), p.21 176 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 232-233.
175
sair por onde entrara vazia. Como o cabaço está preso por uma corda a um objeto fixo, torna-se impossível a fuga. O macaco velho, porém, tendo visto assim logrados muitos de seus com-
panheiros, não se deixa cair na armadilha.
Além do mais, não seria o macaco o símbolo da esperteza entre os nossos
índios, mas o jacaré ou a raposa. O macaco é símbolo de astúcia entre os
africanos. No entanto, Oscar Ribas afirma que o provérbio não existe em Angola.177
Segundo Câmara Cascudo,178 o anexim divulgado em nheengatu por Couto
Magalhães é uma composição de fundo cultural que se tornou popular, já ci-
tada em Roma há quase vinte séculos e vulgarizada na China, na Índia e no
mundo árabe.
João Ribeiro estuda esta frase em A Língua Nacional, p. 107-111 e 232-233
e nas Frases Feitas, p. 404. Luís da Câmara Cascudo a estuda em Coisas
que o Povo Diz, p. 21-24 e em Locuções Tradicionais no Brasil, p. 262-
263. Raimundo Magalhães Júnior fá-lo em seu Dicionário de Provérbios,
p. 206.
2.85 Estar no Mato Sem Cachorro Originária das histórias de caçadas, estar ou ficar no mato sem cachorro é
estar metido em grande enrascada.
No mato indica o lugar em que se encontra a pessoa abandonada ou perdida,
em seu lugar perigoso, entre as feras.
Além de amigos e companheiro fiel, o cachorro é um bom caçador. Quando
até este faltou, o desespero é flagrante. É o fim da picada.
Deixar (alguém) no mato sem cachorro é abandonar ou colocar alguém
numa situação da qual dificilmente se desembaraçará, seja porque a situação
é difícil em si, seja porque lhe faltam os meios.
Como a várzea, no Nordeste, é o lugar de maior densidade da vegetação, a
variante mais difundida ali é Ficar na várzea sem cachorro.
2.86 Cair nos Braços de Morfeu
Morfeu, filho de Hypnos, era o criador dos sonhos e, como seu pai, um dos
deuses do sono.
Cair nos braços de Morfeu ou recolher-se aos braços de Morfeu são formas
que se correspondem. Estar nos braços de Morfeu é estar dormindo.
Tais expressões foram muito usadas pelos poetas românticos, quando o so-
no era pintado com asas de borboleta.
177 Apud Cf. CASCUDO, L. C. (1970) p. 24. 178 Cf. CASCUDO, L. C. (1970), p.191-192.
176
2.87 Não Entender Patavina
Há uma explicação de natureza histórica e uma de natureza lingüística, ou
melhor, histórico-lingüística.
A explicação tradicional, de natureza histórica, é que Tito Lívio, nascido em
Patavium, Pádova, Pádua, usara latinidade incorreta, peculiar a sua terra,
constituindo o Patavinismo, erros reprovados pelos gramáticos.
Ora, contra-argumenta Luís da Câmara Cascudo, não seriam os reparos
gramaticais a um historiador as fontes criadoras de uma frase ainda hoje tão
viva em Portugal e no Brasil. Se assim fosse, certamente ficaria reduzida às áreas letradas.
Provavelmente esta imagem verbal tenha sido formada em Portugal, entre
os patavinos (de Pádua, antiga Patavium), e divulgada pelos mercadores e
pelos franciscanos, entre os quais se encontrava Santo Antônio de Pádua.
João Ribeiro acredita, no entanto, que se trata “apenas de mera ampliação
popular do tema de reforço negativo existente em outras línguas romanas,
pas (passus) como no francês.”179
E ainda acrescenta quase uma dezena de formas negativas em estruturas lo-
cucionais, muitas das quais nada têm a ver com este caso.
Logo a seguir, entretanto, esclarece: “Deste tema negativo pá foi possível
formar derivações populares como saber pataca ou não saber patavina e
não ter nada.”180 Entre as variantes mais comuns atualmente, citemos: não entender níquel,
não entender pataca, não entender vírgula, não entender bulhufas.
Considerando a natureza do objeto que representam as palavra pataca e ní-
quel, moedas de pequeno valor, seu parentesco se torna evidente e seu signi-
ficado, explicável.
Do valor de moeda insignificante de pataca nasceu a expressão meia pataca,
que significa quantia insignificante, nonada, ninharia.
Embora a pataca fosse cunhada em prata, foi o seu substituto, o níquel, que
representou o valor de insignificância na fraseologia. Hoje, que as moedas
já não são de prata, é assim que se costuma chamar qualquer moeda cunha-
da em metal, esquecendo-se a sua verdadeira etimologia provençal, em que plata é lâmina de metal.
Rafael Bluteau e Antônio Tomás Pires explicam a expressão como uma de-
rivação do nome de A breve, em hebraico, que é pathach. Assim, não sa-
ber pataca equivale a não saber o A, sequer.181
179 RIBEIRO, J. (1960) p. 242. 180 Idem, ibidem. 181 Cf. MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 216 e RIBEIRO, J. (1960) p. 242.
177
De qualquer modo, sendo verdadeira esta etimologia de pataca, na frase
não saber vírgula ou não entender vírgula, a palavra vírgula também re-
presenta um sinal da escrita e o seu parentesco se estabelece com facilidade.
Foi considerando a locução sob este ângulo que Drummond apresenta uma
outra variante com o ponto-e-vírgula: não entender ponto-e-vírgula – “A fi-
la chegou ao guichê, e papo acabou, e eu não entendi ponto-e-vírgula do
que os dois disseram.”182
Bulhufas deve provir de bolhas, que vem do latim bulla, ou seja, qualquer
corpo esférico. Como a bolha é um glóbulo de ar, coisa inaproveitável, é fácil derivar daí o sentido da expressão não entender bulhufas, assim como
a sua variante sintética, não entender lhufas.
Todas essas variantes equivalem a não entender nada.
Quanto à estrutura, todas têm uma negação seguida de um verbo, que é se-
guido de um reforço da negação anterior.
De um certo modo, isto confirma as teorias de João Ribeiro sobre tais estru-
turas negativas.183
O verbo pode ser outro, como dizer, fazer, ouvir, etc.; as formas de reforço
variam, conforme vimos, mas a estrutura da frase permanece: negação +
verbo + reforço de negação.
2.88 Custar os Olhos da Cara Esta frase só pode ser interpretada como uma alusão ao suplício bárbaro de
arrancar os olhos aos prisioneiros de guerra perigosos à estabilidade do rei-
no, tonando-os inofensivos.
Aliás, desde os tempos homéricos o valor incomparável da visão é decanta-
do como a mais preciosa das jóias, a imagem mais viva na simbologia amo-
rosa; tão valorizado que surge na Lei de Talião como a imagem de terror na
locução: olho por olho, dente por dente, a maior ameaça que se poderia fa-
zer aos malfeitores.184
Custar os olhos da cara é custar muito caro; é custar a jóia mais cara que se
possui.
João Ribeiro pretende ver no adjetivo caro, cara, no sentido de de alto pre-ço, a partir da frase fita custar os olhos da cara, por meio da elipse de os
olhos. Caro, como advérbio, seria uma evolução posterior, partindo do ad-
jetivo na forma masculina ou neutra.185
2.89 Não ter Papas na Língua
182 ANDRADE, C. D. (1979) p. 1320. 183 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 241-244. 184 Cf. CASCUDO, L. C. (1970) p. 110-111. 185 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 153.
178
João Ribeiro supõe que a nossa frase é uma adaptação da frase castelhana
“No tiene pepitas en la lengua”, com a evolução de pepitas para papitas,
que é o diminutivo de papas.186
Pepitas, em castelhano, corresponde a pevides, que são películas que reves-
tem a língua de algumas aves, ou, no singular, uma espécie de disartria na
qual o paciente tem dificuldade ou até impossibilidade de pronunciar o /r/.
De qualquer modo, pode ter havido até uma confluência sêmica, facilitando
o entendimento da frase.
Não ter dificuldade de articulação e não ter daquelas películas, próprias das galinhas, pegadas à língua é poder falar o que quiser, pois o papagaio pode
articular bem o /r/, mas não fala o que quiser, porque é uma ave e não uma
pessoa.
Pode falar o que quiser somente quem não tem papas na língua, mesmo que
papas sejam batatas inglesas (como dizem os gaúchos) ou qualquer tipo de
mingau (como se ouve no Nordeste) . Quem não tem papas na língua está
com a boca desimpedida para falar.187
Aliás, achamos que a expressão deve ter sido não ter papas na boca (se pa-
pas forem as batatas ou os mingaus) . Língua deve ter surgido como uma
analogia com idioma; uma espécie de assimilação semântica.
2.90 Não Dar Pé Origina-se da arte ou técnica da natação. Dar pé significa poder ficar de pé
ao fundo da piscina, lagoa, rio, etc. e ficar com a cabeça fora d’água. Ou
seja, dar para ficar de pé ao fundo, naturalmente, sem se afogar.
Não dar pé é o contrário, não ser possível tal ato.
Com a ampliação do sentido, não dar pé significa ser impossível. Aqui, a
palavra pé já não significa nada, fora do contexto.
2.91 Fazer Pé de Alferes
É possível que fazer pé de alferes esteja relacionado com a locução francesa
pied d’affaires, por simples associação fonética, como são muitas das etimo-
logias populares.188 Mas, como o alferes é um militar em meio de carreira na hierarquia do
Exército Colonial Brasileiro, sua posição firme e inabalável é justificada por
ter igual número de patentes ultrapassadas e por ultrapassar. Se não fosse
firme não teria chegado até ali, mas se deixar de ser firme não atingirá o fim
da carreira.
186 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 139. 187 Cf. MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 218. 188 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 238 e 405-406.
179
Na linguagem dos namorados, fazer pé de alferes é fazer pé firme como se
fosse um alferes, não se abalando com a vizinhança da mulher amada nem
com um rival que talvez a corteje também. É namorar com serenidade, sem
medo e sem disparatadas emoções.
2.92 É da Pontinha!
O gesto e a frase são muito populares em Portugal, de onde provêm.
Segundo Luís da Câmara Cascudo:
Aplicava-se especialmente aos vinhos e isto se verificava porque havia e há em Portugal a frase vinho de orelha quando alguém quer referir-se a um
bom vinho. E não querendo citar o de orelha, alusivo ao vinho, bastará fa-
zer o gesto de tocar na orelha. É daqui... e todo bom bebedor entende per-
feitamente. Pertencente à gíria dos provadores passou ao patrimônio co-
mum da linguagem popular nas regiões da vindima.189
A frase portuguesa, da qual nos veio a que ora estudamos, provém do fran-
cês, onde “vin d’une oreille” é o bom vinho, cujo sabor se aprova com a in-
clinação da cabeça apenas para um lado.
O “vin des deux oreilles” é o mau vinho, cujo sabor desagradável faz que se
movimente várias vezes a cabeça, e, conseqüentemente, de uma orelha a ou-
tra, conforme a Larousse.190
2.93 Pôr em Pratos Limpos
Pratos é a forma correspondente ao plural neutro prata ou plata, cujo sin-
gular era platum, em latim.
Assim, não há diferença entre as locuções en plata (do castelhano) e em
pratos (do português).
A frase original, segundo João Ribeiro, deve ter sido em prata limpa ou em
prata límpida, equivalendo a em seus verdadeiros termos. Neste caso,
concluímos que “o sentido da metáfora consiste em equiparar qualquer coi-
sa embaraçada ou abstrusa, ao seu valor, preço e metal.”191
2.94 São Outros Quinhentos! Frei Domingos Vieira, em seu Tesouro da Língua Portuguesa, edição de
1874, esclarece que “Isto são outros quinhentos! quer dizer que alguém
pronunciou novo disparate afora os que havia soltado.”192
189 Cf. CASCUDO, L. C. (1968) p. 154. 190 Apud CASCUDO, L. C. (1968) p. 153. 191 RIBEIRO, J. (1960) p. 249. 192 Apud CASCUDO, L. C. (1968) p. 39.
180
Magalhães Jr. tenta relacioná-la a frase inglesa that is another story e com
a francesa c’est un autre paire de manches, ao que nos parece, sem resulta-
do satisfatório.193
Um registro de Câmara Cascudo parece esclarecer melhor a história desses
outros quinhentos: A partir do séc. XIII os fidalgos de linhagem na Península Ibérica podiam requerer satisfação de qualquer injúria, sendo condenado o agressor em 500 soldos. Quem não pertencesse a essa hierarquia alcançava apenas 300. Compreende-se que outra qualquer vilta, vitupério sem razão, poste-rior à multa cobrada, não seria incluída na primeira. Matéria para novo julgamento. Outra culpa. Outro dever. Seriam, evidentemente, outros
quinhentos soldos.194
A frase é antiga em português e encontrada com freqüência desde Camões.
Em castelhano, desde Cervantes até os nossos dias tem uso freqüente tam-bém.
2.95 Tirar Sardinha com Mão de Gato
Popularizada a frase tirar castanhas com mão de gato através da fábula de
La Fontaine O Macaco e o Gato, traduzida do francês “faire comme le sin-
ge, tirer les marrons du feu avec la patte du chat”,195 não seria difícil o su-
cesso de sua variante portuguesa difundida literariamente a partir de A Arte
de Furtar.
A frase é descritiva e, o que interessa mesmo é como se tira algo, isto e,
com mão de gato, veloz e disfarçadamente como sugere a fábula.
2.96 Da Silva Quando se pretende exprimir o rigor da exatidão e precisão com que se qua-
lifica qualquer coisa, é comum dar forma de diminutivo ao adjetivo e de-
terminá-lo com a expressão da silva.
Acreditamos que a associação do antropônimo Silva à idéia de intensidade e
é da mesma natureza da associação do adjetivo católico à idéia de autêntico
e verdadeiro. Como a maioria esmagadora dos brasileiros até alguns anos
atrás era católica, o que não fosse católico não era verdadeiro. Assim, dizia-
se que uma roupa não estava muito católica quando não apresentava bom
aspecto.
Ora, como da Silva é o nome de família mais difundido entre nós, ser da
silva é ser reconhecido, autêntico, verdadeiro. Assim a sardinha vivinha da silva era vivinha de verdade. Além de intensificar o adjetivo, por ser uma
193 Cf. MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 307. 194 Cf. CASCUDO, L. C. (1970) p. 30. 195 Cf. MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 338.
181
espécie de pleonasmo ou redundância, o da silva dá uma idéia de familiari-
dade, como se já fosse coisa conhecida.
João Ribeiro relaciona a expressão com o pregão dos vendedores de peixe,
que vendiam as sardinhas com o grito habitual: Vivinha da costa! Ainda vi-
va!
Como Costa é nome de pessoa, originaram-se variantes: vivinha da Costa e
vivinha da Silva.
Costa e Silva são apelidos que se opõem quanto ao sentido, o que facilitaria
a criação da variante.196 Mas ainda existe uma noutra conjetura, de autoria de Sílvio de Almeida:
Silva, em latim, era selva, floresta, e Juvenal usou da palavra em sentido figurado quanto escreveu: silva comæ, uma floresta de cabelos. Seme-
lhantemente: chamamos silva a malha de pêlos da cara dos cavalos, em referência aos quais branco da silva tem uma significação tão clara como, por exemplo, calçado das mãos. Compreende-se, pois, o encarecimento da locução branco da silva, aplica-da primeiro aos animais. Depois ela se generalizou, e a idéia de branco sugeriu a de fresco; como a de fresco, a de viçoso ou cheio de vida, e as-sim por diante.197
2.97 Levar Tábua A locução é corrompida de tábula, pedra do jogo de gamão. Seria possi-velmente tomada da expressão proverbial ser tábula que não se joga que se encontra nos antigos escritores e que significa não ter valor algum e es-
tar fora do jogo.198
No jogo que se constitui o namoro, quem recebe um não fica com a inútil
tábula. Na mesma acepção, costuma-se dizer que a moça que já é noiva é
carta fora do baralho, o que vem a ser outra espécie de tábula que não jo-ga.
Levar, carregar ou tomar tábua são frases de sentido passivo, correspon-
dendo a receber um não em pedido de casamento. Dar ou passar tábua,
dar a tábua ou passar a tábua são frases de sentido ativo, correspondente a
negar-se a um pedido de casamento. Aliás, tanto estas expressões, como as
que substituem tábua por lata ou por peru, todas são empregadas nas recu-
sas a algum pedido, seja para dançar (levar peru) ou de casamento, como as
demais.
2.98 Sem Tirte nem Guarte
196 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 150-151. 197 Sílvio de Almeida. Palestras Filológicas. Diário Popular de 11-09-1907. Apud RIBEIRO,
J. (1960) p. 134 198 RIBEIRO, J. (1960) p. 190.
182
Tirte ou tir-te é forma apocopada do imperativo tira-te, que significa retira-
te ou arreda-te. Guarte ou guar-te é forma apocopada de guarda-te, que
significa defende-te, protege-te.
A redução da frase, tornando-a mais opaca, elimina também o verbo dicendi
que deveria estar presente na frase original: sem (dizer: re) tir (a-) te nem
guar (da-) te.
Com o significado idêntico ao de sem dizer água vai, fica mais fácil, deste
modo, o seu entendimento.
2.99 Perder a Tramontana
Em seu livro de Curiosidade Verbais, João Ribeiro nos oferece a seguinte
explicação desta frase feita: O Norte para a antigüidade era uma noção de pequena importância, mais do céu estrelado que da terra, por isso que a civilização antiga, quase toda debruçada sobre o Mediterrâneo, se estendia no sentido dos paralelos,
sendo o Norte, mais ainda que o Sul, a região desconhecida, inabitável e impérvia dos bárbaros. Essa região da morte e dos gelos tinha em seu fir-mamento um ponto luminoso, a estrela polar, espécie de farol para os na-vegantes mediterrâneos. Como ficava para além dos montes, chamou-se em certo tempo a tramontana, na língua dos pilotos genoveses e venezia-nos, os primeiros que regularizaram as grandes navegações do Levante e Poente, no mundo medieval. A estrela polar ficava para além dos Alpes (transmontes).
Daí a frase perder a tramontana, perder o norte, o rumo certo.199
De origem italiana, esta frase foi amplamente difundida e se encontra nas li-
teraturas de quase tosas as línguas européias. Exemplos em outras línguas podem ser vistos no Dicionário de Provérbios,
de Raimundo Magalhães Jr.200
2.100 Dar às de Vila-Diogo
É uma da expressões mais estudadas em português e, certamente, em espa-
nhol e no galego. Nem por isso foi esclarecida sua verdadeira e incontestá-
vel origem.
Usada literariamente desde D. Francisco Manuel de Melo, nos Relógios
Falantes, de 1645, em português, e desde Fernando de Rojas, em La Celes-
tina, em 1499, em castelhano, ainda hoje é um mistério para os investigado-
res, folcloristas, filólogos ou historiadores. Nem mesmo se sabe ao certo se
a frase se refere ao lugar situada na província de Burgos, na Espanha, ou a uma pessoa de nome Villadiego, que conseguiu fugir do cárcere ou de al-
gum outro perigo.
199 RIBEIRO, J. (1960) p. 62-63. 200 Cf. MAGALHÃES JR., R. (s. d.) p. 265.
183
Gabriel Maria Vergara Martin, no Refranero Geográfico Español, afirma
que a frase Tomar las de Villadiego é uma alusão alforges, pelos quais Vil-
ladiego é muito conhecida.201
Mas acrescenta: “outros crêem que se refere esta locução a um Villadiego
que escapou do cárcere...”202 No entanto, a maioria entende que a frase
equivale a “tomar o caminho de Santiago de Galícia”, ou a direção ou rumo
do lugar Villadiego.
José Ramón Y Fernández Oxea, debatendo todas as sugestões da pesquisa
de D. José Maria Iribarren, tomar las de Villadiego, só não apresentou re-cusa formal à que evoca Fernando III (1199-1252) protegendo os judeus
perseguidos como feras, dando-lhes Villadiego como refúgio inviolável.
Deveriam os israelita dessa localidade usar trajes distintivos, marcando a
distinção. Assaltados ou ameaçados noutras paragens, os judeus fugiam pa-
ra Villadiego, tomando as insígnias salvadoras.203
Quanto à alusão às calças, este fragmento de Iribarren é bastante esclarece-
dor: E, como por decreto real, os judeus usassem traje distinto dos demais ci-dadãos, quando se viam em perigo, abandonavam suas próprias roupas e fugiam para tomar as de Villadiego e aceitar os privilégios e regalias de quantos habitavam essa villa.204
No Brasil, entre outros, estudaram a origem desta frase feita e sua interpre-
tação: Antônio de Castro Lopes, Luís da Câmara Cascudo, Oskar Nobiling,
João Ribeiro, Raimundo Magalhães Júnior e Sílvio de Almeida.205
A explicação de Castro Lopes não tem sentido, visto que o fato que ele su-
põe dar origem à locução teria ocorrido em 1808, quando a frase já era cor-
rente há mais de 300 anos.
A partir dos estudos de Sílvio de Almeida no Diário Popular, em 1905, Os-
kar Nobiling conclui que Vila Diogo poderia ser Vila Diabo, já que Diogo é
um dos nomes do Demônio, ou Casa do Diabo, como na frase: vá para a
casa do Diabo ou vá para as profundezas dos Infernos. Supomos que neste caso houve engano, visto que Vila Diogo é lugar de sal-
vação, para onde se vai e não de perdição, para onde se mandam os desafe-
tos.206
João Ribeiro, relacionando calças com calçado, observou que deixar ou es-
ticar as botas é morrer e que o contrário de morrer, ou seja, escapar ou sal-
201 Apud CASCUDO, L. C. (1970) p. 91. 202 Apud CASCUDO, L. C. (1970) p. 91. 203 Apud CASCUDO, L. C. (1970) p. 93-94. 204 Apud CASCUDO, L. C. (1970) p. 94. 205 O roteiro deste sub-capítulo é o texto de CASCUDO, L. C. (1970) p. 90-95. 206 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 92.
184
var-se, ou mesmo fugir, seria tomar as botas ou tomar as calças, ou ainda,
levar as calças.207
Interpretando a Lex Salica, ele ainda argumenta que tirar as calças corres-
pondia a uma das cláusulas de uma cessão dos bens (e a morte e uma cessão
forçada) e queria dizer o cedente teria de sair, abandonando tudo.208
Com razão, contra-argumenta Câmara Cascudo que a frase sugere vestir as
calças e não tirá-las. Ou seja Levar as de Vila-Diogo, Tomar as de Vila-
Diogo, Dar às de Vila-Diogo, Colher as de Vila-Diogo.209
Isto, entretanto, pode ser entendido como tirar as próprias calças para tomar as de Villa-Diogo.
3 – CONCLUSÃO
Pudemos observar, com o estudo destas 100 frases feitas usadas por Carlos
Drummond de Andrade em suas crônicas, que o uso atual de uma frase feita
envolve a sua história durante toda a sua existência no passado.
Atrás de uma frase feita, embora deva haver exceções, há uma torrente de
expressões paralelas ou variantes, há uma história ou um fato literário mar-
cante e há a participação ativa do povo que a divulgou através da língua oral.
As variantes de uma frase feita podem levar o pesquisador, através da com-
paração, a descobrir a sua origem e o seu sentido etimológico. Principal-
mente se considerarmos também as variantes já abandonadas, e que devem
ter estado mais próximas da sua origem.
Podemos considerar também que as variantes podem ter formas muito se-
melhantes e sentidos bem diferentes, assim como podem ter sentidos seme-
lhantes e formas muito diferentes.
Como a frase feita sempre se refere a um fato real ou literário, aí está o nó
da questão: descobrir o fato real ou fictício a que se liga a frase feita estuda-
da. Nem sempre é possível. Nunca será fácil. E são raríssimas as vezes que não se possa contestar uma hipótese levantada.
Uma locução só é uma frase feita se for uma estrutura petrificada na língua.
Ora, só pode ser petrificada uma locução consagrada pelo uso, ativo ou pas-
sivo, do povo ou por uma pequena parcela do povo que tenha força de tradi-
ção. A frase feita, se não for um lugar-comum, deve tê-lo sido em alguma
época e em algum lugar do país.
207 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 58. 208 Cf. RIBEIRO, J. (1960) p. 58. 209 Cf. CASCUDO, L. C. (1970) p. 93.
185
Notamos a predominância, por exemplo, de frases feitas que se relacionam
com a vida do campo e com diversões ou jogos. Mais de 30% das frases
feitas estudadas se relacionam com a vida campestre e uns 10% se relacio-
nam com os jogos.
Outra predominância diz respeito ao comportamento humano. A maioria
absoluta delas se relaciona com um comportamento humano específico ou
com a sua conseqüência.
Quanto aos fatos semânticos e estruturais, ressaltam-se as elipses (que cos-
tumam dificultar a interpretação etimológica); o ritmo e a rima interna; a ampliação ou restrição do sentido original; as freqüentes metáforas e as me-
tonímias.
Há frases feitas que dificilmente poderão ser definitivamente esclarecidas,
pois fazem alusão a fatos ou seres que não foram registrados pela história
nem pela tradição. Foram certamente fatos marcantes de curta duração, não
levados em consideração pelos que fazem a história dos homens.
Não sendo possível conseguir provas concretas da verdadeira origem das
frases feitas aqui estudadas, contentamo-nos com os breves esclarecimentos
apresentados e com levantamento de algumas hipóteses que poderão ser me-
lhor examinadas e desenvolvidas mais tarde.
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curso de Etimologia e Lexicografia (Mestrado em Letras) na UFRJ em
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188
A ESTRUTURA DAS FRASES FEITAS210
Estudo elementar da estrutu-
ra sintática e morfológica de
93 frases feitas, na forma em
que aparecem nas crônicas
de Carlos Drummond de
Andrade. Classificação mor-
fossintática dessas frases fei-
tas em suas formas endo e
exossêmicas.
210 Este texto resulta do trabalho final do Curso de Estruturas Frasais, apresentado ao Prof. Dr.
Edwaldo Machado Cafezeiro, na Faculdade de Letras da UFRJ, no segundo semestre de 1984.
189
ABREVIATURAS USADAS NESTE CAPÍTULO
a Advérbio
A Adjetivo
Adn Adjunto adnominal
Adv Adjunto adverbial
Ap Aposto c Conjunção
Cc Complemento circunstancial
Cn Complemento nominal
I. Índice de indeterminação do
sujeito
N Núcleo ou Numeral
Oadj Oração subordinada adjetiva
Oadv Oração subordinada ad-
verbial
Oc Oração coordenada
Od Objeto direto
Oi Objeto indireto Op Oração principal
Os Oração subordinada substan-
tiva
P Período simples ou Pronome
Pa Partícula apassivadora
PC Período composto por coor-
denação
Pn Predicado nominal
Po Predicativo do objeto
Ps Predicativo do sujeito
PS Período composto por su-
bordinação
Pv Predicado verbal
Pvn Predicado verbo-nominal S Sujeito ou Substantivo
Sp Sujeito paciente
V Verbo ou verbo principal de
uma locução verbal
v Verbo auxiliar
/ Artigo
+ Conectivo coordenante
_ Conectivo subordinante
() Inclusão da descrição do
termo a que se pospõe
^ Indeterminação do termo a
que se pospõe * Inexistência do termo a que
se pospõe
~ Negação do termo a que se
pospõe
– Preposição ou conectivo vo-
cabular
´ Subentendimento do termo a
que se pospõe
190
1 –INTRODUÇÃO
Este trabalho consiste em analisar sintática e morfologicamente a estrutura
das frases feitas, ou seja, das locuções petrificadas na língua ou tornadas lu-
gares-comuns, as abreviações ou paráfrases de provérbios, adágios, anexins,
etc., ou meras alusões a estas expressões proverbiais, subordinadas sempre à
construção da frase corrente.
Nestas expressões, consideradas na forma em que aparecem nas crônicas de
Carlos Drummond de Andrade, observaremos e analisaremos elementar-mente a sua estrutura morfossintática, de acordo com os padrões e nomen-
clatura tradicionais.
Como o nosso objetivo é observar e apresentar a estrutura básica da frase
feita, tanto internamente com em suas relações com o contexto em que se
encontra inserida, só faremos esparsos comentários quando os casos consi-
derados nos parecerem ambíguos, admitindo maus de uma análise. Com is-
so, pretendemos ainda dar-lhes uma classificação, de acordo com a sua fun-
ção morfossintática, considerando ao mesmo tempo o seu valor interno (ou
endossêmico) e seu valor externo (ou exossêmico).
Nosso corpus será limitado a 93 frases feitas, todas colhidas nas crônicas de
Carlos Drummond de Andrade, nos seguintes livros: Os Caminhos de João
Brandão,211 De Notícias & Não Notícias Faz-se a Crônica,212 Os Dias Lin-dos213 e Boca de Luar214.
Não Conhecemos nenhuma referência a trabalho que trate especificamente
do tema que pretendemos desenvolver, embora sejam numerosos os que es-
tudam a estrutura morfológica e sintática das línguas ou de alguns tipos de
frases e também não é pequena a bibliografia sobre as formas petrificadas
da linguagem, entre as quais se encontram as frases feitas.
O que torna peculiar o nosso critério de análise da estrutura frasal neste tra-
balho é, basicamente, o uso de abreviações. Com isto pretendemos fazer
economia de espaço e facilitar uma visão de conjunto das análises de cada
frase feita, com o que se facilita também uma abordagem comparativa.
No geral, esta forma abreviada de análise consiste em substituir a nomencla-tura gramatical por abreviações por nós convencionadas. Na análise morfo-
lógica, constituída apenas da indicação da classe de palavra de cada vocábu-
lo formal, alinhamos simplesmente as abreviações convencionadas, na or-
dem em que aparecem no texto eleito como corpus. Na análise sintática, no
entanto, tivemos de estabelecer uma hierarquia das funções, o que foi feito
211 In ANDRADE, C. D. Poesia e Prosa, p. 1295-1353. 212 In ANDRADE, C. D. Poesia e Prosa, p. 1395-1470. 213 ANDRADE, C. D. Os Dias Lindos, 1978. 214 ANDRADE, C. D. Boca de Luar, 1984.
191
através de parênteses, com que inscrevemos a descrição detalhada do termo
a que se segue a abertura dos referidos parênteses.
Exemplo: “Isto é dose para leão.”
Análise sintática | DOSE PARA LEÃO | Análise morfológica
Ps (NAdn (-N)) | | S-S
Na análise sintática temos:
Predicativo do sujeito: Dose para leão;
Núcleo do predicativo do sujeito: Dose;
Adjunto adnominal do predicativo do sujeito: Para leão; Preposição do adjunto adnominal: Para;
Núcleo do adjunto adnominal: Leão.
Na análise morfológica temos:
Substantivo: Dose; Preposição: Para; Substantivo: Leão.
A relação estabelecida entre a frase feita em questão e o contexto em que se
insere está indicada pela primeira abreviação colocada na análise sintática,
que, no caso acima, é Ps, ou seja, Predicativo do sujeito, que é uma função
substantiva.
Em todos os casos, a análise sintática fica à esquerda e análise morfológica
fica à direita, ambas na linha seguinte à em que transcrevemos em maiúscu-
las a frase em estudo.
Como todas as abonações são de Drummond, sua indicação bibliográfica, que remete sempre à bibliografia, constitui-se do nome do livro, seguido da
indicação da página.
Na esperança de poder produzir algo melhor, aguardo ansioso, os comentá-
rios valiosos do exímio leitor.
2 – ANÁLISE SINTÁTICA E MORFOLÓGICA DAS FRASES FEITAS
Na ordem em que aparecem no texto, são analisadas as frases destacadas nos fragmentos citados, primeiro, sintaticamente, e depois, morfologica-
mente.
E se levavam tábua, o remédio era tirar o cavalo da chuva e ir pregar em
outra freguesia. (Poesia e Prosa, 1318).
LEVAVAM TÁBUA
Oadv (S^Pv (VOd)) VS
TIRAR O CAVALO DA CHUVA
Os (S^pV (VOd (AdnN) Adv (-AdnN))) V/S-/S
IR PREGAR EM OUTRA FREGUESIA
192
Os (S^Pv (vVAdv (-AdnN))) vV-PS
As pessoas, quando corriam, antigamente, era para tirar o pai da forca, e
não caíam de cavalo magro. (Poesia e Prosa, 1318).
TIRAR O PAI DA FORCA
Pv (VOd (AdnN) Oi (-AdnN)) V/S-/S
NÃO CAÍAM DE CAVALO MAGRO
Pv (V~Cc (-NAdn)) aV-SA
Algumas jogavam verdes para colher maduro, e sabiam com quantos paus
se faz uma canoa. (Poesia e Prosa, 1318). JOGAVAM VERDE PARA COLHER MADURO
Pv (Vod (N^Adn) Oadv (-S^Pv (VOd (N^Adn))) VA-VA
Ou
PvN (VodPo) Oadv (-S´Pv (VOd^Po)).
Obs.: Além das duas análises sintáticas diferentes apresentadas, ainda há um
problema a ser considerado nessa frase:
Os dois verbos, embora pareçam ter o mesmo sujeito (algumas), aparece na
forma impessoal no segundo, quando deveria concordar com o seu sujeito.
Considerando isto, fizemos uma terceira análise, desta vez considerando
que este verbo está na voz passiva sintética, com elipse da partícula apassi-
vadora. Neste caso, o sujeito do segundo verbo seria maduro, ou seja:
Pvn (VOd^Po) Oadv (_Pa´PvSp (N^Adn)).
COM QUANTOS PAUS SE FAZ IMA CANOA
Os (Pv (Adv (-AdnN) PaV) Sp (AdnN)) -PSPV/S
Ou
Os (Pv (Adv (-AdnN) IVOd (AdnN))). -PSPV/S
Obs.: Esta segunda análise leva em conta o fato de que a partícula apassiva-
dora e o sujeito paciente não são percebidos naturalmente como tais, crian-
do-se um a espécie de análise artificial, onde os termos não correspondem à
realidade percebida.
É óbvio, para mim, que não há intenção de se dizer, com esta frase, que uma
canoa é feita. Que alguém faz uma canoa, num sentido ativo, é o que pare-ce ser o sentido da construção se faz uma canoa.
O que não impedia que, nesse entrementes, esse ou aquele embarcasse em
canoa furada. (Poesia e Prosa, 1319).
EMBARCASSE NUMA CANOA FURADA
Pv (VCc (-Nadn)) V-SA
Encontravam alguém que lhes passava manta e azulava, dando às de Vila-
Diogo. (Poesia e Prosa, 1318).
LHES PASSAVA A MANTA
Pv (OiVOd) PVS
193
DANDO ÀS DE VILA-DIOGO
Oadv (S´Pv (VCc (-AdnN^Adn (-N)))) V-/-S
Ou sonhavam em andar de aeroplano; os quais, de pouco siso, se metiam em
camisa de onze varas, e até em calças pardas; não admira que dessem com
os burros n’água. (Poesia e Prosa, 1319).
SE METIAM EM CAMISAS DE ONZE VARAS
Pv (OdVCc (-NAdn (-AdnN))) PV-S-NS
(SE METIAM) EM CALÇAS PARDAS
Pv (Od´V´Cc (-NAdn))) P’V’-SA DESSEM COM OS BURROS N’ÁGUA
Pv (VCc (-AdnN) Cc (-N)) V-/S-S
Havia os que tomaram chá em criança, e, ao visitarem família de maior
consideração, sabiam cuspir dentro da escarradeira. (Poesia e Prosa, 1319).
TOMARAM CHÁ EM CRIANÇA
Pv (VOdAdv (-N)) VS-S
Embora sem saber da missa a metade, os presunçosos queriam ensinar pa-
dre-nosso ao vigário, e com isso punham a mão em cumbuca. (Poesia e
Prosa, 1319).
SEM SABER DA MISSA A METADE
Oadv (_~SPv (VCn (-AdnN) Od (Adn))) -V-/S/S
ENSINAR PADRE-NOSSO AO VIGÁRIO Os (SPv (VOdOd (-AdnN))) VS-/S
PUNHAM A MÃO EM CUMBUCA
Pv (VOd (AdnN) Adv (-N)) V/S-S
Era natural que com eles se perdesse a tramontana. (Poesia e Prosa, 1319).
SE PERDESSE A TRAMONTANA
Pv (IVOd (AdnN)) ou Os (...PaVSp (AdnN)) 215 PV/S
Antigamente, certos tipos faziam negócios e ficavam a ver navios; outros
eram pegados com a boca na botija, contavam tudo tintim por tintim e iam
comer o pão que o diabo amassou, lá onde Judas perdeu as botas. (Poesia e
Prosa, 1319).
A VER NAVIOS Oadv (S´Pv (_VOd) -VS
COM A BOCA NA BOTIJA
Adv (-AdnNÂdnAdv (-AdnN)) -S/-S
TINTIM POR TINTIM
Adv (N-N) S-S
IAM COMER O PÃO QUE O DIABO AMASSOU
Oc (S’Pv (V (vV) Od (AdnNAdn (Oadj (OdS (AdnN) V))))) vV/SP/SV
ONDE JUDAS PERDEU AS BOTAS
215 Vide observação sobre a análise de “com quantos paus se faz uma canoa”.
194
Oadj (AdvSPv (Vod (AdnN))) PSV/S
Obs.: O antecedente da oração adjetiva acima é o advérbio de lugar lá, o
que parece estranho, visto que o adjetivo é uma classe de palavra que funci-
ona sempre com determinante de um substantivo. Tal estranheza desapare-
ce ao analisarmos o significado deste advérbio, que nos dá, em qualquer
contexto que o encontrarmos, “naquele lugar”. Este, como outros advér-
bios, é pronome adverbial, subentendendo sempre um demonstrativo e o
substantivo “lugar”, que é o termo determinado.
Uns raros amarravam cachorro com lingüiça. (Poesia e Prosa, 1319). AMARRAVAM CACHORRO COM LINGÜIÇA
Pv (VOdAdv (-N)) VS-S
E alguns ouviam cantar o galo, mas não sabiam onde. (Poesia e Prosa,
1319).
OUVIAM CANTAR O GALO, MAS NÃO SABIAM ONDE
Pv (VOd (Os (PvS (AdnN)))) +S’V~OdOs) VV/ScaVP
O pronome relativo e conectivo subordinante da última oração da frase feita
analisada constitui o que se costuma chamar de vestígio. Ele representa to-
da a oração de que é o vestígio. Eliminando-se esta zeugma, além de ficar
redundante, a frase resultante perderia toda a sua graça. Ficaria: Ouviam
cantar o galo, mas não sabiam onde o galo cantava.
Acolhiam com satisfação a visita do cometa, que, andando por Ceca e Me-ca, trazia novidades de baixo, ou seja, da Corte do Rio de Janeiro. (Poesia e
Prosa, 1319).
ANDANDO POR CECA E MECA
Oadv (S’Pv (VAdv (-N+N))) V-ScS
Antigamente os pirralhos dobravam a língua diante dos pais, e se um se es-
quecia de arear os dentes antes de cair aos braços de Morfeu, era capaz de
entrar no couro. (Poesia e Prosa, 1320).
DOBRAVAM A LÍNGUA
Pv (VOd (AdnN)) V/S
CAIR NOS BRAÇOS DE MORFEU
Pv (VCc (-AdnNAdn (-N))) V-/S-S ENTRAR NO COURO
Os (S’Pv (VCc (-AdnN))) V-/S
Não deviam também, se esquecer de lavar os pés, sem tugir nem mugir.
(Poesia e Prosa, 1320).
SEM TUGIR NEM MUGIR
Oadv (_~S^Pv) +~Oadv (S^Pv) -VcV
Não ficava mangando na rua nem escapulia do mestre, mesmo que não en-
tendesse patavina da instrução moral e cívica. (Poesia e Prosa, 1320).
NÃO ENTEDESSE PATAVINA
195
Oadv (S^Pv (V~Od) aVS
Os bilontras é que eram um precipício, jogando com pau de dois bicos, pelo
que carecia muita cautela e caldo de galinha. (Poesia e Prosa, 1320).
JOGANDO COM PAU DE DOIS BICOS
Oadv (S’Pv (VCc (-NAdn (-AdnN)))) V-S-NS
MUITA CAUTELA E CALDO DE GALINHA
Od (AdnN+Nadn (-N)) PScS-S
O melhor era pôr as barbas de molho diante de um treteiro de topete; depois
de fintar e engambelar os coiós, e antes de que se pusesse tudo em pratos limpos, ele abria o arco. (Poesia e Prosa, 1320).
PÔR AS BARBAS DE MOLHO
Os (S^Pvn (VOd (AdnN) Po (-N))) V/S-S
PUSESSE TUDO EM PRATOS LIMPOS
Oadv (IPv (VOdAdv (-NAdn))) VP-SA
Ou
Oadv (Pv (PaVAdv (-NAdn)) Sp) 216 VP-SA
ABRIA O ARCO
Pv (Vod (AdnN)) V/S
O diacho eram os filhos da Candinha: quem somava a candongas acabava
na rua da amargura, lá encontrando, encafifada, muita gente na embira,
que não tinha nem para matar o bicho; por exemplo, o mão-de-defunto. (Poesia e Prosa, 1320).
OS FILHOS DA CANDINHA
S (AdnNAdn (-AdnN) /S-/S
NA RUA DA AMARGURA
Cc (-AdnNAdn (-AdnN)) -/S-S
NA EMBIRA
Adv (-Adn) -/S
MATAR O BICHO
Oadv (S’Pv (VOd (AdnN))) V/S
Bom era ter costas quentes, dar as cartas com a faca e o queijo na mão;
melhor ainda ter uma caixinha de pós de perlimpimpim, pois isso evitava de levar lata, ficar na pindaíba ou espichar a canela antes que fosse servido.
(Poesia e Prosa, 1320).
TER COSTAS QUENTES
Os (S^Pv (VOd (NAdn))) VSA
DAR AS CARTAS
Os (S^Pv (VOd (AdnN))) V/S
COM A FACA E O QUEIJO NA MÃO
Adv (-AdnN+AdnNAdv (-AdnN)) -/Sc/S-/S
216 Idem.
196
LEVAR LATA
Os (S^Pv (VOd)) VS
FICAR NA PINDAÍBA
Os (S^Pv (VCc (-AdnN))) V-/S
ESPICHAR A CANELA
Os (S^Pv (VOd (AdnN))) V/S
Qualquer um acabava enjerizado se lhe chegavam a urtiga ao nariz, ou se o
faziam de gato-sapato. (Poesia e Prosa, 1320).
O FAZIAM DE GATO-SAPATO Oadv (S^Pvn (OdVPo (-N))) PV-S
Ganhar vidro de cheiro marca barbante, isso não: a mocinha dava o cavaco.
(Poesia e Prosa, 1320).
DAVA O CAVACO
Pv (VOd (AdnN) V/S
Às vezes, sem tirte nem guarte, aparecia um doutor pomada, todo cheio de
nove horas; ia-se ver, debaixo de tanta farofa era um doutor de mula ruça,
um pé rapado, que espiga! (Poesia e Prosa, 1320).
SEM TIRTE NEM GUARTE
Adv (-~N+~N) -ScS
UM DOUTOR POMADA
S (AdnNAdn) /SS TODO CHEIO DE NOVE HORAS
Ps (AdvNCn (-AdnN)) aA-NS
DEBAIXO DE TANTA FAROFA
Adv (– (N-) AdnN) a-PS
UM DOUTOR DE MULA RUÇA
Ps (AdnNAdnN (-Nadn) /S-SA
UM PÉ RAPADO
Ps (AdnNAdn) /SA
E a moçoila, que começava a nutrir xodó por ele, que estava mesmo de ra-
bicho, caía das nuvens. (Poesia e Prosa, 1320).
NUTRIR XODÓ Pv (Vod) VS
DE RABICHO
Ps (-N) -S
CAÍA DAS NUVENS
Pv (VAdv (-AdnN)) V-/S
Daí se perder as estribeiras por uma tutaméia, um alcaide que o caixeiro
nos impingia, dando de pinga um cascão de goiabada. (Poesia e Prosa,
1320).
SE PERDER AS ESTRIBEIRAS
197
IPv (VOd (AdnN)) PV/S
DE PINGA
Po (-N) -S
Os tipos que havia: o pau-para-toda-obra, o vira-casaca (este cuspia no pra-
to em que comera), o testa-de-ferro, o sabe-com-quem-está-falando, o san-
gue-de-barata, o Dr. Fiado que morreu ontem, o zé-povinho, o biltre, o pe-
ralvilho, o salta-pocinhas, o alferes, a polaca, o passador de nota falsa, o
mequetrefe, o safardana, e maria-vai-com-as-outras... (Poesia e Prosa,
1320). CUSPIA NO PRATO EM QUE COMERA
Pc (VCc (-AdnN) Oadv (-AdvS’Pv)) V-/S-PV
Obs.: Este período é importante exemplo de como as frases feitas se asse-
melham às palavras compostas. É possível que as frases feitas sejam uma
espécie de transição entre a frase corrente e a palavra composta. Um fato
semelhante à transição existente entre uma gíria, de uso restrito a certas
classes sociais ou grupos regionais, e o vocabulário comum.
Por que “o maria-vai-com-as-outras” é tão diferente da frase “Maria vai
com as outras colegas à praia”?
Onde está a diferença estrutural entre “os filhos da Candinha” e “o testa-de-
ferro” ou “o sangue-de-barata”? Não é apenas um problema de ortografia?
Imaginamos que a frase feita é uma unidade semântica estruturada com tan-ta coerência quanto a palavra composta por justaposição, e como tal pode
ser considerada. Tanto assim é que os lexicógrafos não conseguem unificar
sua ortografia, ora escrevendo-os com hífens, ora sem hífens.
Se existe uma distinção clara, por que não divulgá-la, estabelecendo um cri-
tério ortográfico? É simplesmente porque não existe.
Depois de mil peripécias, assim ou assado, todo mundo acabava mesmo ba-
tendo com o rabo na cerca, ou simplesmente a bota, sem saber com descal-
ça-la. (Poesia e Prosa, 1320).
ASSIM OU ASSADO
Adv (N+N) aca
BATENDO COM O RABO NA CERCA Oadv (S^ Pv (V Od (-Adn N) Cc (-Adn N))) V-/S-/S
Ele não se deu por achado: Ora, minha tia, então não vê que é de meu pa-
drinho Sr. São José? (Poesia e Prosa, 1179).
NÃO SE DEU POR ACHADO
Pvn (OdV~Ps (-N)) aPV-A
Com o aperto do laço, o infeliz punha a alma pela boca. (Poesia e Prosa,
1118).
PUNHA A ALMA PELA BOCA
Pv (VOd (AdnN) Cc (-AdnN) V/S-/S
198
– Bem que este merecia um chá de casca de vaca! (Poesia e Prosa, 1334).
UM CHÁ DE CASCA DE VACA
Od (AdnNAdn (-NAdn (-N))) /S-S-S
Minha sogra acha que debaixo desse angu tem carne, e que o senhor pre-
tende exprimir em símbolos uma realidade sutil.
(Os Dias Lindos, 13).
DEBAIXO DESSE ANGU TEM CARNE
Os (S’Pv (Adv (– (N-) AdnN) VOd)) a-PSVS
Não vem que não tem! (Os Dias Lindos, 64). NÃO VEM QUE NÃO TEM
PS (Op (S’Pv (V~)) Oadv (_S’Pv (V~Od^))) aVcaV
Isso aqui não é a casa da mãe Joana! (Os Dias Lindos, 64).
A CASA DA MÃE JOANA
Ps (AdnNAdn (-AdnNAdn)) S-/SS
Bons olhos o vejam! (Os Dias Lindos, 64).
BONS OLHOS O VEJAM
P (S (AdnN) Pv (OdV)) ASPV
Parar é regra de ouro (se não me falha a memória).
SE NÃO ME FALHA A MEMÓRIA
Oadv (_Pv (OiV~) Sp (AdnN)) caPV/S
O problema é que se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. (Os Dias Lindos, 68).
SE CORRER O BICHO PEGA, SE FICAR O BICHO COME
Oadv(_S^Pv)Op(S(AdnN)Pv)Oadv(_S^Pv)Op(S(AdnN)Pv) Cv/SVcV/SV
Não tem papas na língua. (Os Dias Lindos, 68).
NÃO TEM PAPAS NA LÍNGUA
P (S^Pv (VOdOi (-AdnN))) aVS-/S
Não pode com uma gata pelo rabo. (Os Dias Lindos, 68).
NÃO PODE COM UMA GATA PELO RABO
P (S^Pv (V~Oi (-AdnN) Adv (-AdnN))) aV-/S-/S
Não estou aqui para botar azeitona na empada de ninguém. (Os Dias Lin-
dos, 68). BOTAR AZEITONA NA EMPADA DE NINGUÉM
Oadv (S’Pv (VOdAdv (-AdnNAdn (-N~)))) VS-/S-P
Não fede nem cheira. (Os Dias Lindos, 68).
NÃO FEDE NEM CHEIRA
PC (S^Pv (V~) +S^Pv (V~)) aVcV
Porque se dizem cobras e lagartos, e não se dizem rouxinóis e açucenas?
(Os Dias Lindos, 70).
SE DIZEM COBRAS E LAGARTOS
Oc (Pv (PaV) Sp (N+N)) PVScS
199
Também cabe referir aquelas coisas manifestadas com a ressalva: ‘Diga de
passagem’.
DIGA-SE DE PASSAGEM
Ap (S^PvIAdv (-N)) VP-S
A menos que o convicto (ou teimoso) diga: ‘Digo e repito’. (Os Dias Lin-
dos, 69).
DIGO E REPITO
Os (S’Pv) +Os (S’Pv) VcV
E na variação, fica o dito por não dito. (Os Dias Lindos, 69). FICA O DITO POR NÃO DITO
P (Pvn (...VPs (-N~Adn)) S (AdnN~Adn)) V/A-aA
Tentei convencer (sem muita convicção) à recalcitrante que o fim era nobre,
uma vez que se trata de prevenir o enfarte, ou infarto, dos sócios do clube,
por uma terapêutica artístico-literária em que ela constituiria elemento es-
sencial; que seu concurso seria verdadeira mão-na-roda; que tivesse paciên-
cia e desse uma mãozinha, mesmo de mão-beijada, pois o clube não falara
em pagamento; enfim, que agüentasse a mão, mesmo que isso fosse uma
tremenda mão-de-obra, para que os velhinhos convidadores não ficassem de
mão abanando, ou com uma mão atrás e outra adiante, ou ainda, para falar
mais claramente, na mão. (Os Dias Lindos, 139).
DESSE UMA MÃOZINHA Os (S’Pv (VOd (AdnN))) V/S
DE MÃO-BEIJADA
Adv (-NAdn) -SA
AGÜENTASSE A MÃO
Os (S’Pv (VOd (AdnN))) V/S
NÃO FICASSE DE MÃO ABANANDO
Pn (V~Ps (-NAdn (Oadj))) aV-SV~
COM UMA MÃO ATRÁS E OUTRA ADIANTE
Ps (-AdnNAdv+AdnN’Adv) -SacPa
NA MÃO
Ps (-AdnN) -/S A tudo ela respondeu com obstinada indiferença, que nem à mão de Deus
Padre cederia. (Os Dias Lindos, 139).
NEM À MÃO DE DEUS PADRE
Od (_~-AdnNAdn (-N)) c-/S-SS
Alegou que para esse tipo de coisas tinha mão-de-pilão; além disso, não de-
sejava meter a mão em cumbuca, e exortou-me a botar a mão na consciên-
cia: não estaria eu querendo tirar sardinha com mão de gato? (Os Dias
Lindos, 139).
METER A MÃO EM CUMBUCA
200
Os (S’Pv (VOd (AdnN) Oi (-N))) V/S-S
Ou
Os (S’Pv (VOd (AdnN) Cc (-N))) V/S-S
Obs.: Nem sempre é muito fácil distinguir o objeto indireto do complemen-
to circunstancial. Talvez fosse por isso que a comissão organizadora da
Nomenclatura Gramatical Brasileira tenha englobado ambos sob a rubrica
de objeto indireto, em alguns casos, ou ambos sob o nome de adjunto ad-
verbial, quando a confusão estabelecida estivesse entre estes dois últimos:
complemento circunstancial e adjunto adverbial. BOTAR A MÃO NA CONSCIÊNCIA
Os (S’Pv (VOd (AdnN) Oi (-AdnN))) V/S-/S
Ou
Os (S’Pv (VOd (AdnN) Cc (-AdnN))) V/S-/S
Obs.: Vide observação acima.
TIRAR SARDINHA COM MÃO DE GATO
Os (S’Pv (VOdAdv (-NAdn (-N)))) VS-S-S
Dei as mãos à palmatória. (Os Dias Lindos, 139).
DEI AS MÃOS À PALMATÓRIA
P (S’Pv (VOd (AdnN) Oi (-AdnN))) V/S-/S
Mas para não dar o braço a torcer, nem me declarar vencido pela competi-
ção das cervejas, concluí: Leovigil, traga a de sempre. (De Notícias & Não Notícias Faz-se Crônica, 138).
NÃO DAR O BRAÇO A TORCER
Oadv (S’Pv (V~Od (AdnN) Adv (Oadv (_Sp´Pv)))) aV/S-V
Eu sei, eu percebo. Faz bem em fechar-se em copas. (De Notícias & Não
Notícias Faz-se a Crônica, 12).
FECHAR-SE EM COPAS
Oadv (S’Pv (VOdCc (-N))) VP-S
– Tou contratada. Vamos, não me negue uma colher de chá. (Boca de Luar,
43).
UMA COLHER DE CHÁ
Od (AdnNAdn (-N)) /S-S
3 – CLASSIFICAÇÃO DAS FRASES FEITAS
Fizemos a classificação morfossintática das 93 frases feitas estudadas le-
vando em consideração o que ensina o Professor Aloizio Manna no seguinte
fragmento de seu livro: Padrões Estruturais da Língua Portuguesa:
201
Cada fragmento de um conjugado semântico qualquer, a par de seu valor in-
trínseco – mais ou menos vago, considerado em si mesmo – irradia simulta-
neamente, no processo associativo, um valor semântico externo, fundamen-
tal na estruturação da língua. Ao mesmo tempo, o seu valor externo reflui
sobre si mesmo, para delimitar, ou melhor, precisar o seu próprio valor in-
terno.
Como se pode perceber, este duplo aspecto – endossêmico e exossêmico –
se apresenta intimamente vinculado, e só se dissocia para efeito metodoló-
gico.217 De acordo com a sua estrutura e função morfossintática, as frases feitas fo-
ram classificadas endossêmica e exossemicamente em cinco classes de pa-
lavras, a saber: verbos, substantivos, adjetivos, advérbios e interjeições.
Seu valor endossêmico é avaliado pela classe da palavra pela qual poderia
ser substituída. Mas o seu valor exossêmico é determinado pela função sin-
tática que desempenha no contexto frasal de que é extraída.
Reagrupadas, aqui, de acordo com este critério, cada frase feita estudada é
destacada do texto e repetida, juntamente com a sua análise sintática e mor-
fológica, para que se possa fazer mais facilmente um confronto.
Centralizada, em maiúsculas, vem a frase feita; abaixo e à esquerda, vem a
análise sintática; e à direita, nesta mesma linha, vem a análise morfológica,
sempre abreviadas.
3.1 – Frases Feitas Classificadas como Verbos
Considerando apenas a estrutura e o valor semântico interno, 64 das 93 fra-
ses feitas estudadas se constituem de verbos. Ou seja, 69% do total.
Desse número, 34 frases feitas, ou 37% do total, são classificada como ver-
bos endossêmica e exossemicamente; 18, ou seja, 20% do total, são classifi-
cadas como verbos endossemicamente e como substantivos exossemica-
mente; e 12 frases feitas, que constituem 12% do total, classificam-se exos-
semicamente como advérbios.
3.1.1. – Frases Feitas Classificadas Endossêmica e Exossemica-mente como verbos.
TIRAR O PAI DA FORCA
Pv (VOd (AdnN) Oi (-AdnN)) V/S-/S
NÃO CAÍAM DE CAVALO MAGRO
Pv (V~Cc (-NAdn)) aV-SA
IAM COMER O PÃO QUE O DIABO AMASSOU
Oc (S’Pv (vVOd (AdnNAdn (Oadj (OdS (AdnN) V))))) vV/SP/SV
TOMARAM CHÁ EM CRIANÇA
217 MANNA, A. Padrões Estruturais da língua Portuguesa, p. 34.
202
Pv (VOdAdv (-N)) VS-S
SE METIAM EM CAMISAS DE ONZE VARAS
Pv (OdVCc (-NAdn (-AdnN))) PV-S-NS
(SE METIAM) EM CALÇAS PARDAS
Pv (ÓdV’Cc (-NAdn))) P’V’-SA
DESSEM COM OS BURROS N’ÁGUA
Pv (VCc (-AdnN) Cc (-N)) V-/S-S
LHES PASSAVA A MANTA
Pv (OiVod) PVS EMBARCASSE NUMA CANOA FURADA
Pv (VCc (-NAdn)) V-SA
AMARRAVAM CACHORRO COM LINGÜIÇA
Pv (VOdAdv (-N)) VS-S
OUVIAM CANTAR O GALO, MAS NÃO SABIAM ONDE
Pv (VOd (Os (PvS (AdnN)))) +S’V~OdOs) VV/ScaVP
DOBRAVAM A LÍNGUA
Pv (VOd (AdnN)) V/S
CAIR NOS BRAÇOS DE MORFEU
Pv (VCc (-AdnNAdn (-N))) V-/S-S
JOGAVAM VERDE PARA COLHER MADURO
Pv (VOd (N’adn) Oadv (_S’Pv (VOd (Nadn))) VA-VA DAVA O CAVACO
Pv (VOd (AdnN) V/S
NUTRIR XODÓ
Pv (VOd) VS
CAÍA DAS NUVENS
Pv (VAdv (-AdnN)) V-/S
SE PERDER AS ESTRIBEIRAS
IPv (VOd (AdnN)) PV/S
CUSPIA NO PRATO EM QUE COMERA
Pc (VCc (-AdnN) Oadv (-AdvS’V)) V-/S-PV
PUNHAM A MÃO EM CUMBUCA Pv (VOd (AdnN) Adv (-N)) V/S-S
SE PERDER A TRAMONTANA
Pv (IVOd (AdnN)) PV/S
PUSESSE TUDO EM PRATOS LIMPOS
Pv (VOdAdv (-NAdn)) VP-SA
ABRIA O ARCO
Pv (Vod (AdnN)) V/S
NÃO FICASSEM DE MÃOS ABANANDO
Pn (V~Ps (-NAdn (Oadj))) aV-SV
203
DEI AS MÃOS À PALMATÓRIA
P (S’Pv (VOd (AdnN) Oi (-AdnN))) V/S-/S
FICA O DITO POR NÃO DITO
P (...VS (AdnN´Adn) Ps (-N´Adn’)) V/A-aA
SE CORRER O BICHO PEGA, SE FICAR O BICHO COME
Oadv(_S^Pv)Op(S(AdnN)Pv)Oadv(_S^Pv)Op(S(AdbN)Pv) Cv/SVcV/SV
NÃO SE DEU POR ACHADO
Pvn (OdV~Ps (-N)) aPV-A
PUNHA A ALMA PELA BOCA Pv (VOd (AdnN) Cc (-AdnN) V/S-/S
SE DIZEM COBRAS E LAGARTOS
Oc (Pv (PaV) Sp (N+N)) PVScS
NÃO FEDE NEM CHEIRA
PC (Oc (S^Pv (V~) +Oc (S^Pv (V~))) aVcV
NÃO PODE COM UMA GATA PELO RABO
P (S^Pv (VOi (-AdnN) Adv (-AdnN))) aV-/S-/S
NÃO TEM PAPAS NA LÍNGUA
P (S^Pv (VOdOi (-AdnN))) aVS-/S
NÃO DAR O BRAÇO A TORCER
Oadv (S’Pv (V~Od (AdnN) Adv (Oadv (_Sp’Pv)))) aV/S-V
3.1.2 Frases Feitas Classificadas Endossemicamente como Verbos
e Exossemicamente como Substantivos.
TER COSTAS QUENTES
Os (S^Pv (VOd (NAdn))) VSA
DAR AS CARTAS
Os (S^Pv (VOd (AdnN))) V/S
LEVAR LATA
Os (S^Pv (VOd)) VS
FICAR NA PINDAÍBA
Os (S^Pv (VCc (-AdnN))) V-/S
FICAR NA PINDAÍBA Os (SPv (VCc (-AdnN))) V-/S
TIRAR O CAVALO DA CHUVA
Os (SpV (VOd (AdnN) Adv (-Adn))) V/S-/S
IR PREGAR EM OUTRA FREGUESIA
Os (SPv (vVAdv (-AdnN))) vV-PS
ENTRAR NO COURO
Os (S’Pv (VCc (-AdnN))) V-/S
ENSINAR PADRE-NOSSO AO VIGÁRIO
Os (SPv (VOdOd (-AdnN))) VS-/S
204
PÔR AS BARBAS DE MOLHO
Os (SPvn (Vod (AdnN) Po (-N))) V/S-S
DESSE UMA MÃOZINHA
Os (S’Pv (VOd (AdnN))) V/S
AGÜENTASSE A MÃO
Os (S’Pv (VOd (AdnN))) V/S
METER A MÃO EM CUMBUCA Os (S’Pv (VOd (AdnN) Oi (-N))) V/S-S
BOTAR A MÃO NA CONSCIÊNCIA
Os (S’Pv (VOd (AdnN) Oi (-AdnN))) V/S-/S
TIRAR SARDINHA COM MÃO DE GATO
Os (S’Pv (VOdAdv (-NAdn (-N)))) VS-S-S
DIGO E REPITO
Os (S’Pv) +Os (S’Pv) VcV
DIGA-SE DE PASSAGEM
Ap (SPvIAdv (-N)) VP-S
DEBAIXO DESSE ANGU TEM CARNE Os (S’Pv (Adv (– (N-) AdnN))) a-PSVS
3.1.3. Frases Feitas Classificadas Endossemicamente como Verbos e Exos-
semicamente como Advérbios
DANDO ÀS DE VILA-DIOGO
Oadv (SPv (VCc (-AdnN’Adn (-N)))) V-/-S
MATAR O BICHO
Oadv (S’Pv (VOd (NAdnN))) V/S
LEVAVAM TÁBUA
Oadv (SPv (VOd)) VS
JOGANDO COM PAU DE DOIS BICOS
Oadv (S’Pv (VCc (-NAdn (-AdnN)))) V-S-NS
NÃO ENTEDESSE PATAVINA
Oadv (SPv (Vod) aVS
ANDANDO POR CECA E MECA
Oadv (S’Pv (VAdv (-N+N))) V-ScS
O FAZIAM DE GATO-SAPATO
Oadv (SPvn (OdVPo (-N))) PV-S
BATENDO COMO RABO NA CERCA
Oadv (SPv (VOD (-AdnN) Cc (-AdnN))) V-/S-/S
SE NÃO ME FALHA A MEMÓRIA
Oadv (_Pv (OiV) Sp (AdnN)) caPV/S
BOTAR AZEITONA NA EMPADA DE NINGUÉM
205
Oadv (S’Pv (VOdAdv (-AdnNAdn (-N)))) VS-/S-P
FECHAR-SE EM COPAS
Oadv (S’Pv (VOdCc (-N))) VP-S
SEM TUGIR NEM MUGIR
Oadv (_SPv) +Oadv (SPv) -VcV
3.2– Frases Feitas Classificadas como Advérbios
As frases feitas que têm valor de advérbio, considerando-se apenas a sua es-
trutura interna, são 12. O que corresponde a 13% do total de 93 estudadas
neste trabalho. Dessas 12, 11 se classificam endossêmica e exossemica-
mente com advérbio (12% do total) e apenas 1 se classifica endossemica-
mente com advérbio e exossemicamente como substantivo (1% do total de
93) . Ei-las:
3.2.1. – Frases Feitas Classificadas Endossêmica e Exos-
semicamente com Advérbios
SEM TUGIR NEM MUGIR
Oadv (_SPv) +Oadv (SPv) -VcV
COM A BOCA NA BOTIJA
Adv (-AdnNÂdnAdv (-AdnN)) -S/-S
NA RUA DA AMARGURA
Cc (-AdnNAdn (-AdnN)) -/S-S
NA EMBIRA
Adv (-AdnN) -/S
COM A FACA E O QUEIJO NA MÃO
Adv (-AdnN+AdnNAdv (-AdnN)) -/Sc/S-/S
DEBAIXO DE TANTA FAROFA Adv (– (N-) AdnN) a-PS
SEM SABER DA MISSA A METADE
Oadv (_SPv (VCn (-AdnN) Od (Adn))) -V-/S/S
ASSIM OU ASSADO
Adv (N+N) aca
DE MÃO-BEIJADA
Adv (-NAdn) -SA
3.2.2. Frase Feita Classificada Endossemicamente com Advérbio e Exos-
semicamente como Substantivo
NEM À MÃO DE DEUS PADRE
Od (_~-AdnNAdn (-N)) c-/S-SS
3.3. Frases Feitas Classificadas como Adjetivos
206
As 6 frases feitas classificadas como adjetivos são-no endossêmica e exos-
semicamente, constituindo 7% do total das frases feitas estudadas neste tra-
balho.
ONDE JUDAS PERDEU AS BOTAS
Oadj (AdvSPv (VOd (AdnN))) PSV/S
TODO CHEIO DE NOVE HORAS
Ps (AdvNCn (-AdnN)) aA-NS
DE RABICHO
Ps (-N) -S DE PINGA
Po (-N) -S
COM UMA MÃO ATRÁS E OUTRA ADIANTE
Ps (-AdnNAdv+AdnN’Adv) -PSacPa
NA MÃO
Ps (-AdnN) -/S
3.4. Frases Feitas Classificadas como Substantivos
Das 9 frases feitas que se classificam como substantivos, constituindo 10%
do total das frases feitas analisadas, 7 são endossêmicas e exossemicamente
substantivos (8% do total) e 2 são endossemicamente substantivos e exos-
semicamente adjetivos, ou 2% do total.
3.4.1. Frases Feitas Classificadas Endossêmica e Exossemicamente como
Substantivos.
MUITA CAUTELA E CALDO DE GALINHA
Od (AdnN+NAdn (-N)) PScS-S
COM QUANTOS PAUS SE FAZ IMA CANOA
Os (Adv (-AdnN) IVOd (AdnN)) -PSPV/S
OS FILHOS DA CANDINHA
S (AdnNAdn (-AdnN) /S-/S
UM DOUTOR POMADA
S (AdnNAdn) /SS A CASA DA MÃE JOANA
Ps (AdnNAdn (-AdnNAdn)) S-/SS
UM CHÁ DE CASCA DE VACA
Od (AdnNAdn (-NAdn (-N))) /S-S-S
UMA COLHER DE CHÁ
Od (AdnNAdn (-N)) /S-S
3.4.2 – Frases Feitas Classificadas Endossemicamente como Substantivos e
Exossemicamente como Adjetivos.
207
UM DOUTOR DE MULA RUÇA
Ps (AdnNAdnN (-NAdn) /S-SA
UM PÉ RAPADO
Ps (AdnNAdn) /SA
3.5. Frases Feitas Classificadas como Interjeições
Só 2 frases feitas entre as 93 analisadas (2% do total) foram classificadas
como interjeições.
BONS OLHOS O VEJAM P (S (AdnN) Pv (OdV)) ASPV
NÃO VEM QUE NÃO TEM
PS (Op (S^PV (V~)) Oadv (_S^Pv (V~))) aVcaV
4 – CONCLUSÕES:
Sem grandes exercícios mentais, através da análise dos dados numéricos
mostrados no desenvolvimento do trabalho, podemos concluir que a maior
parte das frases feitas gira em torno do verbo.
Quanto à estrutura morfossintática dessas expressões, e considerando tam-
bém o seu valor endossêmico, 69% delas se constitui de estruturas com va-
lor de verbo, 13% com valor de advérbio, 10% com valor de substantivo, 7% com valor de adjetivo e 2% com valor de interjeição.218
Quanto à estrutura morfológica, 45 das frases 93 frases feitas estudadas co-
meçam com verbos, 14 começam com advérbios, 14 com preposições, 9
com pronomes, 6 com artigos, 3 com conjunções, 1 com substantivo e 1
com adjetivo.
Observando ainda a freqüência dessas construções, notamos que apenas 39
delas se repetem em sua estrutura morfológica rigorosa e que 54 não se re-
petem, Das 39 que se repetem, 29 são estruturas frasais mais freqüentes em
todo o corpus trabalhado.
As estruturas mais freqüentes são V/S, como “dobrar a língua” ou “agüentar
a mão”, com 9 casos; V/S-/S, como “tirar o pai da forca” ou “dar as mãos à palmatória”, com 5 casos; VS, como “levar tábua”, V-/S, “cair das nuvens”
e V/S-S, como “pôr a mão em cumbuca”, com 3 casos cada. As outras es-
truturas, que tiveram 2 casos cada, foram: VS-S, V-/S-S, VP/S, PV/S, a-PS,
–/S-/S, –/S e –S.
Ainda quanto ao aspecto da valorização do verbo, em 61 casos constatados
de sujeito no interior das frases feitas, 52 não são expressos, ficando ora su-
bentendidos, ora indeterminados. Há até um caso de oração sem sujeito, na
218 O arredondamento das percentagens, nos cálculos, criou um acréscimo de 1% na soma dos
valores (69%+13%+10%+7%+2%=101%) .
208
frase: “Debaixo desse angu tem carne”, em que o verbo ter equivale ao ha-
ver impessoal.
Quanto ao número de palavras em cada estrutura, considerando o desmem-
bramento das combinações e contrações de preposições com outras pala-
vras, tivemos: 5 estruturas de 2 palavras, 20 estruturas de 3 palavras, 18 es-
truturas de 4 palavras, 20 estruturas de 5 palavras, 17 estruturas de 6 pala-
vras, 8 estruturas de 7 palavras, 3 estruturas de 8 palavras, 1 estrutura de 9 e
1 de 10 palavras.
Das 93 frases feitas analisadas, 75 são redigidas com um número de pala-vras que varia entre 3 e 6 palavras.
Embora a nossa “mostra” seja insuficiente para formularmos hipóteses se-
guras sobre o assunto, pretendemos ter concluído que há uma decidida pre-
ferência pelas formas constituídas com um verbo em sua base e que a exten-
são da frase oscila, normalmente, entre 3 e 7 palavras. Assim como são
poucas as frases feitas com apenas 2 palavras, menor ainda é o número das
que ultrapassam o número de 7.
5– BIBLIOGRAFIA;
AMARAL, Amadeu. Paremiologia. In – Tradições populares. São Paulo:
Instituto Progresso Editorial [1948]. p. 213-273. ANDRADE, Carlos Drummond de. Boca de luar. [Rio de Janeiro]: Record
[1984]. 217 p.
______. De notícias & não notícias faz-se crônica: histórias, diálogos, di-
vagações. 3ª ed. [Com dados biográficos do autor]. Rio de Janeiro:
J. Olympio, 1978. X+182 p.
______. Os dias lindos. 2ª ed. [Com dados biográficos do autor]. Rio de
Janeiro: J. Olympio, 1978. X+145 p.
______. Poesia e prosa. Organizada pelo autor. Com nota editorial, de
Afrânio Coutinho; As várias faces de uma poesia, de Emanuel de Mo-
raes; Fortuna crítica; Cronologia da vida e da obra; Bibliografia. Rio
de Janeiro: Aguilar, 1979. 1534 p. [Corresponde à 5ª ed. da Obra Completa].
MANNA, Aloizio. Padrões estruturais da língua portuguesa. (Prefácio de
Gladstone Chaves de Melo) . Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro; [Nite-
rói]: Universidade Federal Fluminense, 1984. 205 p.
SILVA, José Pereira da. A fraseologia nas crônicas de Carlos Drummond
de Andrade: subsídios para um dicionário básico. 118 + VIII folhas
datilografadas.
______. A origem das frases feitas e provérbios brasileiros: contribuições
para sua história e etimologia. 105 folhas datilografadas.
209
EXPRESSÕES ESTUDADAS NESTES ENSAIOS
1. À altura do pescoço.
2. A césar o que é de césar.
3. A coisa está ficando preta.
4. A coisa está preta.
5. A coisa está ruça.
6. A dois passos.
7. A duras penas
8. A essa altura.
9. A grifa parideira!
10. À luz da razão.
11. À luz do dia.
12. À medida que.
13. A memória.
14. A meu ver.
15. A morte da bezerra.
16. À noite todos os gatos são pardos.
17. A ocasião é calva.
18. A preço de banana.
19. A sete chaves.
20. A toque de caixa.
21. A ver navios.
22. Abanar as orelhas.
23. Abotoar o paletó.
24. Abrir mão de.
25. Abrir o arco.
26. Acabou-se o que era doce.
27. Acertar os ponteiros.
28. Acerto de contas.
29. Acontece nas melhores famílias.
30. Adiantado da hora.
31. Afinal de contas.
32. Agüentar a barra.
210
33. Agüentar a mão.
34. Aí é que a vaca foi pro brejo.
35. Aí morreu o neves!
36. Ainda por cima.
37. Ajustar contas com.
38. Alça de mira.
39. alcaide e o sol por onde quer entram.
40. Além do mais.
41. Alhos e bugalhos.
42. Ali na esquina.
43. Alma de cântaro.
44. Almoçar um boi e jantar outro.
45. Alqueires de razão.
46. Alto lá.
47. Amarrar cachorro com lingüiça.
48. Amigo é pras ocasiões.
49. Amigos, amigos, negócios à parte.
50. Andar na ponta dos pés.
51. Andar por ceca e meca.
52. Antes de mais nada.
53. Ao fim e ao cabo.
54. Ao pé do ouvido.
55. Aos olhos de (alguém) .
56. Aos olhos de hoje.
57. Apertar o cinto.
58. Aprender para o resto da vida.
59. Apurar o sexo dos anjos.
60. Aqui entre nós.
61. Aqui há caveira de burro.
62. Ar de cegonha tímida.
63. Ar de quem comeu e não gostou.
64. Arrastar a asa.
65. As sete partidas do mundo.
66. Assim assim.
211
67. Assim como assado.
68. Até cair no chão.
69. Até dizer chega.
70. Até nosso senhor me fechar os olhos.
71. Até o sabugo da alma.
72. Até outra vez.
73. Até prova em contrário.
74. Atirar a primeira pedra.
75. Avançar em pomar alheio.
76. Avançar o sinal.
77. Ave por ave, o carneiro se voasse.
78. Bater à porta errada.
79. Bater com o rabo na cerca.
80. Bater em retirada.
81. Bater papo.
82. Bater um papo.
83. Bem feito!
84. Besta de carga.
85. Bode expiatório.
86. Bom cabrito não berra.
87. Bons olhos o vejam.
88. Botar a boca no mundo.
89. Botar a mão na consciência.
90. Botar a mão no fogo (por alguém).
91. Botar as barbas de molho.
92. Botar as cartas na mesa.
93. Botar as manguinhas de fora.
94. Botar as mãos na cabeça.
95. Botar azeitona na empada de (alguém) .
96. Botar banca.
97. Botar na cabeça.
98. Botar na rua.
99. Botar no olho da rua.
100. Botar o pé na estrada.
212
101. Botar pra escanteio.
102. Botar pra jambrar.
103. Burro velhote não acerta o trote.
104. Cada casa favas lavam.
105. Cada coisa em seu tempo.
106. Cada coisa no seu tempo e lugar.
107. Cada um na sua.
108. Cada vez mais.
109. Caído do céu.
110. Cair a noite.
111. Cair das nuvens
112. Cair das nuvens.
113. Cair de cavalo magro.
114. Cair de pau em.
115. Cair duro.
116. Cair em cima de.
117. Cair em si.
118. Cair fora.
119. Cair nas costas de.
120. Cair nos braços de morfeu.
121. Cala-a-boca já morreu, quem matou fui eu.
122. Cala-a-boca já morreu, quem te manda sou eu.
123. Caldo requentado.
124. Camisa de onze varas.
125. Casa da mãe joana.
126. Casa de orates.
127. Cavalo dado não se olha a idade.
128. Céu pedrento, chuva ou vento.
129. Chá de casca de vaca.
130. Cheio de alfinete e navalhas.
131. Cheio de nove horas.
132. Cheio de salamaleques.
133. Chover a potes.
134. Claro como água
213
135. Coçar a orelha.
136. Colher de chá.
137. Com a cabeça mal atarraxada.
138. Com a cara e a coragem.
139. Com a faca e o queijo na mão.
140. Com a graça de deus.
141. Com a ponta do pé.
142. Com água no barco
143. Com ar de procissão de enterro.
144. Com fogo não se brinca.
145. Com o papo cheio de vento.
146. Com o rabo entre as pernas.
147. Com quantos paus se faz uma canoa
148. Com teu amo não jogues as pêras.
149. Com todos os ff e rr.
150. Com uma mão atrás e outra adiante.
151. Comadres e vizinhas, a revezes hão farinha.
152. Comer gambá errado.
153. Comer o pão que o diabo amassou.
154. Comigo não, serapião.
155. Comigo não, violão!
156. Como diria o outro.
157. Como diz o outro.
158. Como dizia minha vó.
159. Como eva é servida.
160. Como nenhum outro.
161. Completar primaveras.
162. Conhecer de cor e salteado.
163. Conta de mentiroso.
164. Contar tintim por tintim.
165. Conversa vai, sorvete vem.
166. Conversando é que a gente se entende.
167. Cré com cré, lé com lé.
168. Cresça e apareça.
214
169. Cruz credo!
170. Cruzar os braços.
171. Cu da mãe joana.
172. Cuidar da vida que a morte é certa.
173. Curvar a espinha.
174. Cuspir no prato em que comera.
175. Custar os olhos da cara.
176. Da pontinha (da orelha) .
177. Da silva.
178. Dançar conforme a música.
179. Daqui não saio, daqui ninguém me tira.
180. Dar (ou vender) a camisa do corpo.
181. Dar a camisa do corpo.
182. Dar a entender.
183. Dar a palavra (a alguém) .
184. Dar a volta por cima.
185. Dar acordo de si.
186. Dar as caras.
187. Dar as cartas.
188. Dar às de vila-diogo.
189. Dar as mãos à palmatória.
190. Dar bode.
191. Dar bola.
192. Dar bolacha.
193. Dar cabo de.
194. Dar coluna do meio.
195. Dar com os burros n’água.
196. Dar conta do recado.
197. Dar de cara com.
198. Dar de pinga.
199. Dar dor de cabeça.
200. Dar duro.
201. Dar fé de si.
202. Dar grilo.
215
203. Dar nó até em pingo d’água.
204. Dar no pé.
205. Dar no pezinho.
206. Dar o cavaco.
207. Dar o dito por não dito.
208. Dar o fora.
209. Dar pelota.
210. Dar pira.
211. Dar por paus e por pedras.
212. Dar seu recado.
213. Dar sinal de vida.
214. Dar um jeitinho.
215. Dar uma de.
216. Dar uma mãozinha.
217. Dar uma volta.
218. Dar-se bem.
219. Dar-se conta de.
220. Dar-se mal.
221. Dar-se um jeito.
222. De alma embandeirada.
223. De boa sombra.
224. De bom aviso.
225. De cara aberta.
226. De cor
227. De corpo e alma.
228. De cutiliquê.
229. De hora em hora deus melhora.
230. De mão-beijada.
231. De maus bofes.
232. De nada.
233. De pé atrás.
234. De ponta a ponta.
235. De ponta cabeça.
236. De quando em quando.
216
237. De raro em raro.
238. De uma vez por todas.
239. De vez em quando.
240. Debaixo desse angu tem carne.
241. Defender o leite das crianças.
242. Deixar de partes.
243. Desde o carnaval do ano passado.
244. Desde que me entendo por gente.
245. Desfiar padre-nossos.
246. Despedir-se para o caju.
247. Deu o que tinha de dar
248. Deus me livre.
249. Dia de são nunca de tarde.
250. Dia de são nunca de tarde.
251. Diabo que o carregue.
252. Diante do nariz.
253. Diga-se de passagem.
254. Digo e repito.
255. Dizer bem com.
256. Dizer cobras e lagartos.
257. Dizer coisa com coisa.
258. Dizer com os seus botões.
259. Dizer duas palavras.
260. Dizer poucas e boas.
261. Dize-tu direi-eu.
262. Diz-que em bububu no bobobó, mas ninguém balançou.
263. Do balacobaco.
264. Do jeito que vão as coisas.
265. Dobrar a língua.
266. Doer como canivete na carne.
267. Dólar furado.
268. Dona prudencia murió de vieja.
269. Dos meus pecados.
270. Dose para leão.
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271. Doutor de mula ruça.
272. Duro de coração
273. E a vida continua.
274. E agora, josé?
275. É dos carecas que elas gostam mais.
276. É isso aí.
277. E lá vai fumaça.
278. É maior o arruído que as nozes.
279. É melhor coisa ter um amigo na corte que um vintém na bolsa.
280. E tal e coisa.
281. Elevar aos cornos da lua.
282. Em duas palavras.
283. Em festa de jacaré, inhambu não entra.
284. Em ponto de bala.
285. Em poucas palavras.
286. Em ritmo de tartaruga.
287. Em todo caso.
288. Em último caso.
289. Embarcar em canoa furada.
290. Empurrar o carro (de alguém) .
291. Encaramujado em si mesmo.
292. Enquanto o diabo esfrega um olho.
293. Ensinar padre-nosso ao vigário.
294. Entrar na jogada.
295. Entrar no couro.
296. Entrar nos eixos.
297. Entrar numa fria.
298. Entrar pelo cano.
299. Entrar pelos olhos da cara.
300. Entre a bigorna e o martelo.
301. Entre a quarta e a meia partida.
302. Entregar os pontos
303. Entrou bispo.
304. Era só o que faltava.
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305. Era uma vez.
306. Esconder o leite.
307. Espere e verá.
308. Espiar maré.
309. Espichar a canela.
310. Essa é boa.
311. Estar a zero.
312. Estar de acordo.
313. Estar de rabicho.
314. Estar em todas.
315. Estar frito.
316. Estar na cara.
317. Estar na pindaíba.
318. Estar no mato sem cachorro.
319. Estragar o dia (alguém) .
320. Estranhar a dança.
321. Eu bem que avisei.
322. Eu é que sei?
323. Eu não disse?
324. Exalar o último suspiro.
325. Falar com seus botões.
326. Fazer a conta no lápis.
327. Fazer alguém de gato-sapato.
328. Fazer boca-de-siri.
329. Fazer cara feia.
330. Fazer cena.
331. Fazer chacrinha.
332. Fazer das tripas coração.
333. Fazer de conta.
334. Fazer de gato sapato.
335. Fazer feio.
336. Fazer figa.
337. Fazer onda.
338. Fazer página virada.
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339. Fazer papel pança.
340. Fechar-se em copas.
341. Fica com deus também!
342. Ficar a ver navios.
343. Ficar cheio de dedos.
344. Ficar de mãos abanando.
345. Ficar de olho.
346. Ficar debaixo do balaio.
347. Ficar em patati-patatá.
348. Ficar na mão.
349. Ficar na pindaíba.
350. Ficar nesse pé.
351. Ficar o dito por não dito.
352. Ficar por conta.
353. Fiquemos por aqui.
354. Foi no tempo de maría castaña.
355. Fora de série.
356. Forçar a barra
357. Fulano dos anzóis carapuça.
358. Fumar o cachimbo da paz.
359. Fundir a cuca.
360. Futuro a deus pertence.
361. Gato comeu.
362. Gerações e gerações.
363. Graças a deus!
364. Gregos e goianos.
365. Guardar na cabeça.
366. Guerra é guerra.
367. Há criança e criança.
368. hábito não faz o monge.
369. Haver por bem.
370. Hoje em dia.
371. Horas e horas.
372. Idas e venidas.
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373. Ir na conversa.
374. Ir na onda.
375. Ir para o inferno.
376. Ir pras cucuias.
377. Ir pregar em outra freguesia.
378. Isso não vem ao caso.
379. Já não se... Como antigamente.
380. Já que a montanha não vai até maomé, maomé vai à montanha.
381. Jogar na cara.
382. Jogar verde para colher maduro.
383. Juntar os trapinhos.
384. Lá de vez em quando.
385. La dracu cu; du-te la naiba!
386. Lá isso é.
387. Lá isto é verdade.
388. Lá isto é.
389. Lá um belo dia.
390. Lá um dia.
391. Lá vão as leis para onde querem os reis.
392. Lelé da cuca.
393. Levantar âncora.
394. Levar a lata.
395. Levar a mal
396. Levar a sério.
397. Levar bomba.
398. Levar na conversa.
399. Levar pau.
400. Levar tábua.
401. Levar tempo.
402. Levar um papo.
403. Macacos me mordam.
404. Mais dia menos dia.
405. Mais ou menos.
406. Mais vale amigo na praça que dinheiro na arca.
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407. Mais vale um asno vivo que um doutor morto.
408. Mandar brasa.
409. Mandar e não pedir.
410. Mandar praquela parte.
411. Marinheiro de primeira viagem.
412. Mas o menos.
413. Matar a aula.
414. Matar na cabeça.
415. Matar o bicho do ouvido
416. Matar o bicho.
417. Matar o tempo.
418. Mateus, primeiro os teus.
419. Melhor ama quem mais sente.
420. Meter a colher.
421. Meter a mão em cumbuca
422. Meter o nariz em.
423. Meter o nariz no que não é da conta (de alguém) .
424. Meter os peitos.
425. Meter os pés pelas mãos.
426. Meter-se em calças pardas
427. Meter-se em camisa de onze varas
428. Morar no deus-me-livre.
429. Mulher (ou moça) bonita não paga mas também não leva.
430. Mulher feia não bebe mas paga
431. Na alça de mira.
432. Na embira.
433. Na hora de acertar os ponteiros.
434. Na ponta da língua.
435. Na rua da amargura.
436. Na última lona.
437. Nada de novo na frente ocidental.
438. Nada ter a declarar.
439. Não abrir o bico
440. Não arredar pé.
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441. Não atar nem desatar.
442. Não aumentar a aflição do aflito.
443. Não brincar em serviço.
444. Não compreender níquel.
445. Não dar o braço a torcer.
446. Não dar outra coisa.
447. Não dar para entender.
448. Não dar pé.
449. Não dar ponto sem nó
450. Não deixar a sopa esfriar.
451. Não dizer coisa com coisa.
452. Não é por me gabar.
453. Não é pra me gabar.
454. Não entender bulhufas
455. Não entender patavina (bulhufas, vírgula, etc.).
456. Não entender ponto-e-vírgula.
457. Não entender vírgula.
458. Não estar com os parafusos ajustados.
459. Não estar no gibi.
460. Não estar para brincadeira.
461. Não falar vírgula.
462. Não faltava mais nada.
463. Não fazer outra coisa.
464. Não fazer por menos.
465. Não feder nem cheirar.
466. Não ficar bem
467. Não ficar mal
468. Não ficar pedra sobre pedra.
469. Não guasqueies sem precisão nem grites sem ocasião.
470. Não há mal que sempre dure.
471. Não há nada como um dia depois do outro.
472. Não haver mais juízes em berlim.
473. Não haver nada a tirar nem pôr.
474. Não ir com a cara de.
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475. Não levar desaforo pra casa.
476. Não me diga.
477. Não me toques.
478. Não meter a mão em cumbuca.
479. Não meter prego em estopa.
480. Não mover uma palha.
481. Não pagar nem visita.
482. Não passe além das chinelas.
483. Não perder por esperar.
484. Não poder com uma gata pelo rabo
485. Não pregar olho.
486. Não saber da missa a metade.
487. Não saber o que dizer.
488. Não saber patavina.
489. Não se dar por achado.
490. Não se esqueça aqui do titio.
491. Não se fazer de rogado.
492. Não se fazer num dia.
493. Não sei o quê.
494. Não sei onde estou que não.
495. Não seja por isso.
496. Não ser bem isso.
497. Não ser de nada.
498. Não ser do feitio (de alguém) .
499. Não ser flor que se cheire.
500. Não ser lá que digamos.
501. Não ser mais lá essas coisas.
502. Não ser mole.
503. Não ser o que está pensando.
504. Não ser para qualquer um.
505. Não ter de quê.
506. Não ter nada a dizer.
507. Não ter nada a ver.
508. Não ter nada com o peixe.
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509. Não ter nada que ver.
510. Não ter outro remédio.
511. Não ter papas na língua.
512. Não tugir nem mugir.
513. Não vá com tanta sede ao pote.
514. Não vale a pena chupar a jabuticaba dos outros.
515. Não vem que não tem.
516. Nas idas e venidas.
517. Nascer de novo.
518. Negócio de mãe.
519. Nem aqui nem na china.
520. Nem carne nem peixe.
521. Nem carne nem peixe.
522. Nem chus nem bus.
523. Nem contra nem a favor, muito antes pelo contrário.
524. Nem me diga.
525. Nem te ligo.
526. Ninguém morre na véspera.
527. No açougue, quem mal fala, mal ouve.
528. No meio está a virtude.
529. Nos pinhais da azambuja.
530. Nos quintos dos infernos.
531. Num átimo
532. Nunca mais bodas ao céu!
533. Nutrir xodó (por alguém).
534. Olhar com o rabo do olho.
535. Olhar com outros olhos.
536. Olho vivo!
537. Onde judas perdeu as botas.
538. Ora cebo!
539. Ora essa.
540. Os filhos da candinha.
541. Os tempos mudaram.
542. Ou tudo ou nada.
225
543. Ou vai ou racha.
544. Ouvir cantar o galo, mas não saber onde.
545. Ouvir grilo.
546. Pagar e não bufar.
547. Palavra de honra.
548. Pano de fundo.
549. Pão-pão queijo-queijo.
550. Papai aqui.
551. Papo fino.
552. Para começo de conversa.
553. Para dar e vender.
554. Para o que der e vier.
555. Partir para outra.
556. Passar em branca nuvem.
557. Passar manta.
558. Passar para trás.
559. Passar pela cabeça
560. Passar uma conversa em.
561. Passar uma esponja.
562. Pé ante pé.
563. Pé rapado.
564. Pedir a palavra.
565. Pegar com a boca na botija.
566. Pegar mal.
567. Pegar pelo pé.
568. Pelejam as comadres, descobrem-se as verdades.
569. Pelo sim pelo não.
570. Perceber alguma coisa no ar.
571. Perder a cabeça.
572. Perder a tramontana.
573. Perder as estribeiras.
574. Perder de vista.
575. Perder o seu latim.
576. Perder-se a tramontana.
226
577. Pisar a caçamba de altas cavalarias.
578. Pisar nos calos.
579. Plantar bananeira.
580. Pó de perlimpimpim.
581. Pobre como jó.
582. Pobre diabo.
583. Ponto de vista.
584. Ponto facultativo.
585. Pôr a alma pela boca.
586. Pôr a mão em cumbuca.
587. Por acaso.
588. Pôr alguém nas nuvens.
589. Pôr as barbas de molho.
590. Por assim dizer.
591. Por bem ou por mal
592. Pôr em pratos limpos..
593. Por essas e outras.
594. Por favor.
595. Por isso que eu digo.
596. Por locas e bibocas.
597. Por mal de pecados.
598. Por nada.
599. Pôr nas nuvens.
600. Por obra e graça de.
601. Pôr os pingos nos is.
602. Pôr ponto final em.
603. Por que cargas d’água?
604. Por que não dizer?
605. Por que não?
606. Por tudo quanto é sagrado.
607. Por um triz.
608. Por uma tutaméia.
609. Pouco se me dá.
610. Pra burro.
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611. Pra ninguém botar defeito.
612. Prazer é todo meu.
613. Pregar peças.
614. Pregar peta.
615. Pregar rabo em nambu.
616. Puxar conversa.
617. Quando deus é servido.
618. Quando menos se espera.
619. Que bem me importa.
620. Que deus tenha.
621. Que é mesmo que eu estava dizendo?
622. Que é que eu levo nisso?
623. Que é que os outros vão dizer?
624. Que maganão!
625. Que meus olhos já viram.
626. Que negócio é esse?
627. Que sabe das coisas.
628. Que se há de fazer?
629. Que tal?
630. Que vem na boca.
631. Que vou te contar.
632. Quebrar a cara (de alguém) .
633. Quebrar o galho.
634. Quem canta más fadas espanta.
635. Quem canta, seus males espanta.
636. Quem comeu a carne que roa os ossos.
637. Quem cura é a fé e não o pau da barca.
638. Quem diria?
639. Quem disse que?
640. Quem não arrisca não petisca.
641. Quem não tem cobaia caça com preá.
642. Quem o alheio veste, na praça o despe.
643. Quem planta colhe.
644. Quem quer que seja.
228
645. Quem sabe?
646. Quem sou eu.
647. Quem te viu e quem te vê!
648. Quem tem abelha, ovelhas e moinho, entrará com el-rei em desafio.
649. Quero ver, mas quero ver.
650. Questão de ordem.
651. Rapa do tacho.
652. Revelar uma página de
653. Rolaram os tempos.
654. Sabe com quem está falando?
655. Sabe como é?
656. Sabe de uma coisa?
657. Saber cuspir dentro da escarradeira.
658. Saber das coisas.
659. Saber de experiência feito.
660. Saber na ponta da língua.
661. Sacar partido de.
662. Salvar a pele.
663. Santa bárbara!
664. São os ossos do barão.
665. Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come
666. Se deus quiser.
667. Se eu fosse você.
668. Se eu me chamasse raimundo.
669. Se inês é morta.
670. Se me permite a expressão.
671. Se não me engano.
672. Se não me falha a memória.
673. Se o negócio é esse.
674. Se queres a paz, prepara a guerra.
675. Se queres que teu filho cresça, lava-lhe os pés, raspa-lhe a cabeça.
676. Se um não quer dois não brigam.
677. Seguro morreu de velho.
678. Sei lá.
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679. Seja tudo pelo amor de.
680. Sem chus nem bus
681. Sem dizer água vai.
682. Sem eira nem beira.
683. Sem essa.
684. Sem lenço e sem documento.
685. Sem pé nem cabeça.
686. Sem quê nem praquê.
687. Sem tempo a perder.
688. Sem tirte nem guarte.
689. Sentir na carne.
690. Sentir-se peru de natal.
691. Separar os trapinhos.
692. Ser apelido.
693. Ser bananeira que já deu cacho.
694. Ser carrapato nas costas.
695. Ser conselheiro acácio.
696. Ser da vida.
697. Ser de lascar.
698. Ser de se esperar.
699. Ser do contra.
700. Ser doido por.
701. Ser duro de ouvido.
702. Ser e acontecer.
703. Ser e não ser.
704. Ser excelente.
705. Ser o fim da picada.
706. Ser ou não ser.
707. Ser outra coisa.
708. Ser outros quinhentos.
709. Ser palmatória do mundo.
710. Ser para valer.
711. Ser tiro e queda.
712. Ser um soco na cara.
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713. Ser uma bomba
714. Ser uma mão-de-obra.
715. Ser uma mão-na-roda.
716. Ser uma parada.
717. Ser uma zorra global.
718. Ser uma zorra total.
719. Sim e não.
720. Soar a hora da verdade.
721. Sob sete chaves e sete selos.
722. Sondar a barra
723. Sujar as mãos em alguém.
724. Sumir do mapa.
725. Tal qual.
726. Tamanho família.
727. Tenho para mim que.
728. Ter a bondade de.
729. Ter cabeça fria
730. Ter cara de.
731. Ter coisa.
732. Ter costas quentes.
733. Ter em conta de
734. Ter em conta.
735. Ter lá suas nuvens.
736. Ter mais que fazer.
737. Ter mão-de-pilão.
738. Ter sempre algum na bolsa.
739. Ter seu lugar ao sol.
740. Ter uma tintura rala de.
741. Tintim por tintim.
742. Tirar de letra.
743. Tirar minhocas da cabeça.
744. Tirar o cavalo da chuva
745. Tirar o corpo fora.
746. Tirar o pai da forca.
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747. Tirar o pão da boca de alguém.
748. Tirar partido de.
749. Tirar sardinha(s) com (a) mão de gato.
750. Tirar uma fumaça
751. Tirar uma linha.
752. Tirar uma pestana.
753. Tocar pra frente.
754. Todo liró ao copo d’água.
755. Todos vêem o argueiro no olho do vizinho e ninguém vê a trave no seu.
756. Tomar a barca de caronte.
757. Tomar chá em criança.
758. Tornar-se um bicho do mato
759. Trabalhar de bandido.
760. Tudo a eu tempo.
761. Tudo como dantes, no quartel de abrantes.
762. Tudo virá a seu tempo.
763. Um bololô dos diabos.
764. Um dia a casa cai.
765. Um dia é da caça e outro é do caçador.
766. Um por todos, todos por um.
767. Uma andorinha só não faz verão.
768. Uma coisa louca.
769. Uma nota firme.
770. Uma pá de.
771. Umas e outras.
772. Usar e abusar.
773. Vá bugiar!
774. Vá com deus!
775. Vá lá.
776. Vá para o diabo que o carregue!
777. Vá para o diabo.
778. Vá para o inferno.
779. Vale a pena.
780. Vamos e venhamos.
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781. Vender o peixe.
782. Ver passarinho voar.
783. Vinte e quatro horas por dia.
784. Virar fumaça.
785. Virar o mundo abaixo.
786. Virar onça.
787. Virar pó.
788. Vivendo e aprendendo.
789. Você não se enxerga?
790. Voltar à tona.
791. Voltar à vaca-fria.
792. Voltar as costas a alguém.
793. X.P.T.O. London.
ISBN 85-86837-11-3