REMEDIAÇÃO EM ESPAÇOS MUSEOGRÁFICOS1
A composição midiática da exposição Minas Rupestre do Memorial Minas Gerais Vale
Luana Caroline Damião2
RESUMO
O presente artigo pretende explorar a exposição Minas Rupestre, do Memorial Minas Gerais Vale através dos conceitos de Ecologia de Mídias, Remediação e Hipertexto, aplicando-os ao entendimento dos espaços museográficos como mídias. Partindo de um cruzamento bibliográfico e consequente análise e aplicação desses conceitos a sala expositiva, buscamos entender esse espaço como perpassado por processos de remediação em sua constituição comunicativa, com a mescla de acervos, suportes e meios, que visam a transformação da experiência do visitante.
PALAVRAS-CHAVE: Remediação. Hipertexto. Ecologia de mídia. Ambiente. Museu.
REMEDIATION IN MUSEOGRAFIC SPACESThe media composition of Minas Rupestre exhibition of Minas Gerais Vale Memorial
ABSTRACT
This article aims to explore Minas Rupestre exhibition of Minas Gerais Vale Memorial starting from the concepts of Media Ecology, Remediation and Hypertext, applying them to the understanding of museum spaces as media. Starting from a bibliographic cross and subsequent analysis and application of these concepts in the exhibition room, we seek to understand this space as permeated by remediation processes in its communicative constitution, with the mix of collections, supports and media, aiming to transform the visitor's experience.
KEYWORDS: Remediation. Hypertext. Media ecology. Environment. Museum.
INTRODUÇÃO
Partindo da perspectiva apresentada por Carlos A. Scolari (2012; 2015) sobre o
conceito de Ecologia de Mídia e seu entendimento de ambientes midiáticos, onde as
relações de múltiplas facetas dos meios ocorre, podemos compreender os espaços físicos
como integrantes desse movimento. Nesse contexto, é possível fazer o enquadramento de
1 Trabalho apresentado no GT [Interações, tecnologias e processos comunicativos].2 Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Temporalidades pela Universidade Federal de Ouro Preto; [email protected]
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museus como lugares de comunicação e informação, localizados dentro desta ecologia,
onde seus meios passam por processos de reconfiguração.
Desde o início dos anos dois mil, os museus brasileiros procuram englobar formas
de comunicação diversas, na busca pela utilização de meios transportados da cotidianidade
dos visitantes para as salas de exibições, almejando a identificação e atualização dos
espaços. Além disso, apontam para a identificação do público, para que este ainda se sinta
incentivado a visitar uma instituição museológica, ou seja, os museus procuram uma
reconfiguração comunicacional, que traga experiências diversas aos espectadores, de forma
que eles não consigam encontrar esses aspectos em outros locais, influenciando sua escolha
pela visita (Meneses, 2007).
Dentro desse cenário, aparece o conceito de Remediação, trabalhado por Jay David
Bolter e Richard Grusin (1999), ao entenderem que os meios não seriam estáticos diante do
espaço-tempo, mas se moldam de acordo com a necessidade dos indivíduos, respondendo a
preceitos de origem social, cultural, política e econômica. Assim, os meios se transformam
inserindo aspectos de outros a sua concepção ‘original’, remediando as mídias e
sobrevivendo ao serem utilizadas de formas mais diversas do que antes da existência desse
processo.
Essa lógica encontra também Derrick de Kerckhove (2003), ao trabalhar com a
hipertextualidade em três momentos distintos, onde na fase eletrônica (a que vivemos na
contemporaneidade) esse encontro sensorial e multifacetado seria realizado.
Nesse contexto, compreendemos que a ecologia de mídia e a mente hipertextual do
público trazem demandas quanto a formatação das exibições em instituições museológicas,
que veem sendo transformadas desde o início do século XXI no Brasil, com a ampliação do
acesso às tecnologias digitais e sua inserção cada vez mais incisiva na rotina dos
indivíduos. Assim, partindo desse cenário, temos como objetivo apontar as possibilidades
de expansão da experiência nos museus trazidas pela remediação dos espaços expositivos.
Para tanto procuramos demonstrar os pontos de convergência entre os conceitos de ecologia
de mídia, remediação e hipertextualidade, para em um segundo momento aplicá-los a
análise da exposição Minas Rupestre do Memorial Minas Gerais Vale, apontando para a
interface entre a ampliação das mídias nesse espaço e o processo de reconfiguração das
experiências envolvidas ao se frequentar um museu.
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SOBRE A RELAÇÃO DOS MEIOS
Diversos elementos e cenários afetam constantemente os meios de comunicação e
transformam tanto sua estrutura quanto conteúdo, além da forma como a composição destes
aspectos é trabalhada e disposta para o público. Essas questões são perpassadas nas
discussões sobre ecologia de mídia, remediação e hipertexto, de forma a considerar,
principalmente, como as relações técnicas e de modificações dos meios aparece pautada em
necessidades e respostas sociais, culturais, econômicas e políticas de maneira inseparável.
Assim, torna-se impossível pensar em ambientes técnicos afastados da ação humana, uma
vez que estão conectados desde o cerne de concepção de ambos.
A perspectiva de espaço-tempo se transforma com as criações tecnológicas, o
ambiente todo é alterado a partir delas. Scolari (2012) aponta para o entendimento das
mídias e dos indivíduos em relação constante e cíclica, de auto sustentação e permanência,
onde nada desaparece e meios convivem em um mesmo ambiente.
Entretanto, não podemos interpretar essa ampliação dos suportes como algo passivo
e sem grandes repercussões. Scolari (2012) aborda Neil Postman, que trabalha com este
conceito a partir de uma perspectiva de Marshall McLuhan para ilustrar melhor estas
convivências e implantações de novas mídias. Para Postman (1998 apud SCOLARI, 2012),
a partir da criação da prensa na Europa, não seria possível dividir a história entre uma era
antes da prensa e de um novo período do continente com a simples adição desse meio. O
que existiria a partir dessa invenção seria uma Europa diferente, já que “Um novo meio não
adiciona alguma coisa; ele muda tudo”. (POSTMAN, 1998 apud SCOLARI, 2012, p. 205,
tradução nossa).3
Nesse contexto, as teorias da comunicação se encontrariam inseridas em campo
discursivo caracterizado pela heterogeneidade, constituídas de redes de comunicação que se
associam e formam falas/performances singulares. Assim, podemos perceber a ecologia de
mídias como (...) uma teorização expandida que abarca, (...) quase todos os aspectos dos processos de comunicação, desde as relações entre os meios e a economia, até as transformações perceptivas e cognitivas que sofrem os sujeitos a partir de sua
3 “A new medium does not add something; it changes everything.” (POSTMAN, 1998 apud SCOLARI, 2012, p. 205)
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exposição as tecnologias de comunicação. (SCOLARI, 2015, p. 17, tradução nossa).4
As origens da metáfora da ecologia de mídia vem da biologia, que na década 1950
voltou seus olhares para relações maiores que as moleculares, na busca por compreender o
todo que envolvia o ambiente celular. No mesmo sentido, na década de 1960 e 1970, a
perspectiva comunicacional linear, onde um emissor transmite informações à um receptor
passivo, já não se fazia mais suficiente. Aparece em voga uma procura por entender o
entorno dos dois polos e se questionar quanto a linearidade dessa relação, assim, aspectos
sobre a composição entre as mídias, indivíduos e sociedade, com suas nuances político-
culturais desponta numa perspectiva de mutualidade. Neste ponto, a metáfora aparece com
sentido autoexplicativo para este ambiente de interações midiático-humanas.
Dentro desses parâmetros, Scolari (2012) entende a ecologia de mídias possível a
partir de duas perspectivas. A primeira dessas interpretações seria o entendimento das
mídias como ambientes onde as tecnologias “(...) criam ambientes que afetam as pessoas
que os usam”. (SCOLARI, 2012, p. 207, tradução nossa)5, assim, os meios teriam a
capacidade de envolver as pessoas e influenciar as formas como elas se portam e percebem
o seu redor. O segundo aspecto aborda as mídias como espécies, onde elas seriam membros
paralelos a outros de atuação social, no desenvolvimento das tecnologias, entendido aqui
como uma intermídia, onde vários tipos de mídias se relacionam no mesmo ecossistema,
modificando-se mutuamente. O entendimento e mescla dessas duas perspectivas só é
possível para Scolari (2012) se considerarmos a ecologia de mídia como “(...) um ambiente
que inclui diferentes mídias e tecnologias.” (SCOLARI, 2012, p. 209, tradução nossa).6
Nesse ponto, encontramos o conceito de remediação e seus desdobramentos
trabalhados por Bolter e Grusin (1999). Para Scolari (2012) os autores falharam em sua
conceituação ao não se aprofundarem nas hibridizações dos meios que viriam justamente da
ecologia de mídias. A análise de Bolter e Grusin (1999) cerca o conceito de remediação e
sua dupla lógica, a de imediação e hipermediação, assim entendem os meios como
4 (...) una teorización expandida que abarca, (...) casi todos los aspectos de los procesos de comunicación, desde las relaciones entre los medios y la economía hasta las transformaciones perceptivas y cognitivas que sufren los sujetos a partir de su exposición a las tecnologías de la comunicación. (SCOLARI, 2015, p. 17)5 “(...) create environments that affect the people who use them” (SCOLARI, 2012, p. 207)6 “(...) an environment that includes different media and technologies” (SCOLARI, 2012, p. 209)
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híbridos, mas focando majoritariamente na questão estrutural das tecnologias, onde
entendemos se enquadrar a observação de Scolari (2012).
Na atualidade, nossa cultura busca por meios de comunicação que se espelhem cada
vez mais em nossos cotidianos e, ao mesmo tempo, percebemos uma tentativa de eliminar
os rastros dessa mediação, ou seja, a intenção é a multiplicação e transparência das mídias.
Esses objetivos são os abordados na lógica da remediação por Bolter e Grusin (1999)
através de duas perspectivas base.
A primeira delas seria a imediação, para entender essa lógica os autores apontam
para a realidade virtual, onde o objetivo seria a total imersão do público, sem detecção dos
meios, que ‘desapareceriam’ justamente por envolverem o indivíduo de forma total. Um
exemplo disso seriam narrativas virtuais, onde a interface se obscurece diante das ações do
indivíduo. Podemos perceber isso nos jogos em primeira pessoa, seguindo o estilo de
Doom, por exemplo, além de inserção no cinema com os filmes de terror found footage7
como Bruxa de Blair (Eduardo Sánchez; Daniel Myrick, 1999) e Amizade Desfeita (Levan
Gabriadze, 2014), que seriam produzidos como se os olhos do público fossem a câmera do
filme, o incluindo na narrativa.
A imediação, entretanto, não faria com que as pessoas se esquecessem
completamente dos meios, mas percebessem a realidade retratada de forma diferente da
tradicional, já que estaria pautada no objetivo de desaparecimento do meio, mesmo estando
imersos nele. Assim, o "Espaço gráfico deve ser continuo e cheio de objetos e deve
preencher o campo de visão do observador, sem rupturas." (BOLTER; GRUSIN, 1999, p.
22, tradução nossa).8
Nessa perspectiva conseguimos encontrar exemplos além dos de imersão
computacional ou cinematográfica. Alguns jogos em real life trazem esse aspecto, como o
Escape Room SP, que foi influenciado por jogos virtuais e disponibiliza salas em uma
edificação onde um grupo de jogadores é trancafiada com o objetivo de escapar a partir da
7 Segundo Ana Maria Acker (2015), os filmes foud footage são “(...) (filmes de gravações encontradas ou perdidas, dependendo da tradução). Essas obras são realizadas em parte ou totalmente a partir de falsos registros amadores de situações estranhas ou extraordinárias (...). Tais filmes, muitas vezes, simulam ser documentários e geralmente têm a premissa de que as pessoas que captaram as imagens estão mortas ou desaparecidas”. (ACKER, 2015, p. 1). Disponível em: <https://lumina.ufjf.emnuvens.com.br/lumina/article/view/405/380>. Acesso em 25 ago. 2016. 8 “Graphic space should be continuous and full of objects and should fill the viewer's field of vision without rupture.” (BOLTER; GRUSIN, 1999, p. 22)
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resolução de enigmas. O espaço físico é real e os objetivos são traçados pela empresa,
entretanto a intenção seria a completa imersão dos jogadores nos sessenta minutos de jogo9.
Além deste exemplo, podemos também apontar para algumas salas de museus, onde
a partir de cenografia, recursos audiovisuais e artefatos, buscam a criação de ambientes
para retratar determinadas temáticas de forma imersiva, abordando as informações que se
almeja passar ao público numa perspectiva sensorial. Observamos esse aspecto na sala que
buscamos abordar nesse trabalho, Minas Rupestre, do Memorial Minas Gerais Vale, além
de outros locais como a exposição de curta-duração Stanley Kubrick do Museu da Imagem
e do Som de São Paulo, e a Galeria Cosmococa de Hélio Oiticica no Instituto Inhotim em
Minas Gerais.
Enquanto isso, a lógica da hipermediação, para os autores, se faz mais evidente na
World Wide Web, pela multiplicidade de janelas e meios que uma mesma página pode
conter, mas também pode ser observada em outros locais, como em meios físicos, que
seriam o caso das exposições em museus novamente, por exemplo. Ao contrário da
imediação, aqui a intenção não é tornar o meio transparente, mas perpassado por múltiplos
meios simultaneamente em determinado espaço, que não necessariamente possuem uma
conexão ou linearidade, mas transformam as experiências com aspectos mais interativos.
Na hipermediação, a performance que o meio terá ao seu final importa mais que sua
transparência, assim os produtores dessas mídias deixam claro para os usuários os
processos que fazem essa interatividade possível e almejam que os indivíduos se sintam
confortáveis com isso, ou seja, faz dos espectadores conscientes dos meios e das mídias.
(BOLTER; GRUSIN, 1999, p. 39).
Essas duas lógicas completam o quadro da remediação, que seria a representação de
uma mídia em outra (s). Por exemplo, um computador possibilitar que se faça downloads
de fotos e filmes que não necessariamente dependem deste aparelho para sobreviver. Ao
possibilitar o acesso a esses arquivos ele não estaria excluindo ou modificando as mídias
anteriores, mas incluindo-as na dele.
A mesma coisa pode ser observada na concepção expositiva em museus, com o
trabalho de mescla de mídias em um mesmo ambiente para se abordar uma temática,
transformando a exposição como um meio diferente do que era antes dessas intervenções.
9 ESCAPE ROOM SP. Release da Escape Room SP. Disponível em: <http://escaperoomsp.com/>. Acesso em 23 ago. 2016.
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Essas construções atingiriam os objetivos da cultura contemporânea, explicitados nas
lógicas de imediação e hipermedição, que seriam justamente de multiplicar e obscurecer as
mídias nas nossas relações sociais.
Caminhando nesse mesmo sentido, Kerkhove (2003) trabalha com o conceito de
hipertexto, que é abordado tanto por Scolari (2012, 2015) na ecologia de mídia através da
ideia de interface, quanto por Bolter e Grusin (1999) com mescla de técnicas e meios
trazidas na remediação.
Para Kerkhove (2003) a linguagem humana se divide em três estágios. O primeiro
seria o da oralidade, onde a linguagem se faz extremamente corporal, baseada em memórias
e cânones físicos, como monumentos, que contribuem para a passagem de significados
abusando dos aspectos sensoriais do corpo diante do coletivo. O sentido da escrita
apresenta formas de guardar as linguagens e compreende-las por seu contexto através desse
instrumento de registro, além de tirar a responsabilidade de guarda dos sentidos da memória
e transferi-la para um objeto. Enquanto isso, o sentido da eletricidade trabalha com a ideia
de digital, onde os contextos podem ser diversos e elaborados a partir de suportes sensoriais
que ampliam e modificam a experiência que era observada nos dois tópicos anteriores, com
o entrecruzamento dos três.
Na perspectiva eletrônica, o hipertexto surge no sentido de amplificação das
possibilidades de meios e significados gerados por eles, uma vez que
A mente do hipertexto é dominada por ícones, logotipos, links. Sua principal interface é a tela. O hipertexto não implica simplesmente ‘um texto que está ligado a outros textos’, ele realmente circunda todo o mundo da comunicação eletrônica em um processo de armazenamento permanente de informação. Ao mesmo tempo, o hipertexto introduz as mentes dos usuários às telas, interconectando-os e os acelerando em redes. (KERCKHOVE, 2003, p. 7).
O autor exemplifica aqui uma análise mais voltada para as redes da World Wide
Web, mas ao abordar as interfaces como o elo de ligação entre o espectador e os meios,
vemos o hipertexto conectado com a ecologia de mídia, além do conceito de remediação,
trazido pela mescla de sentidos geradas pelas mídias e a interatividade proposta pela
imediação na busca por transparência.
Esses aspectos trabalhados por Scolari, (2012, 2015), Bolter e Grusin (1999) e
Kerckhove (2002) exemplificam o trabalho dos museus no século XXI, com a entrada das
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tecnologias digitais para a gama de acervo e suporte das instituições. O objetivo seria o de
cobrir o olhar do espectador com a obra, assim as exposições se tornam imersivas, através
da multiplicidade dos meios, além de trabalhar com símbolos e despertar percepções
sensoriais diversas no público em um mesmo ambiente. Partindo desses pressupostos,
voltamos nossos olhares para a exposição Minas Rupestre, do Memorial Minas Gerais
Vale.
IMERSÃO ESPACIAL: O MUSEU COMO MEIO
O Memorial Minas Gerais Vale está localizado na Praça da Liberdade na cidade de
Belo Horizonte em Minas Gerais e foi inaugurado no ano de 2010. O prédio em que foi
instalada a instituição data de 1897, tendo funcionado como sede da Secretaria do Estado
da Fazenda de Minas Gerais. Como a edificação não foi construída com o objetivo de
abrigar um museu, algumas alterações tiveram que ser feitas para adaptação dos espaços,
então além de buscar apontar características originais do local e sua importância histórica
para a cidade, adaptações cenográficas ocorreram para ambientar determinadas salas, com o
objetivo de fazer com que o público experimentasse os locais de forma sensitiva.10
O Memorial é dividido em três pavimentos e cada um deles aborda determinados
aspectos da história de constituição do Estado de Minas Gerais, no sentido de homenagem e
buscando identificação dos visitantes. Especificamente no segundo pavimento, o objetivo é
tratar de heranças históricas que constituem a região, em diversas épocas.
A sala Minas Rupestre tem a intenção de apontar para doze mil anos atrás,
remontando “(...) um ambiente de uma caverna com registros rupestres. A proposta é levar
o visitante a uma viagem pelos sítios arqueológicos do Estado”.11 Minas Gerais possui uma
grande gama de reservas arqueológicas e até mesmo o esqueleto de Luzia, considerado o
mais antigo da América, foi encontrada no estado, ou seja, enaltecer esses aspectos se torna
algo de interesse ao Memorial por, mais uma vez, reafirmar a posição do estado diante do
país e continente.
10 MEMORIAL Minas Gerais Vale. Sobre o memorial. Disponível em: <http://www.memorialvale.com.br/sobre-memorial/apresentacao-sobre-memorial/>. Acesso em 25 ago. 2016. 11 MEMORIAL Minas Gerais Vale. Sala Minas Rupestre. Disponível em: <http://www.memorialvale.com.br/ambientes/minas-rupestre/>. Acesso em 25 ago. 2016.
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Para tratar desse período muito distante da atualidade e coberto de mistificações, a
instituição optou por - através de cenografia, recursos sonoros, audiovisuais, acervos e
obras interativas que se ativam com a movimentação do público - tentar transpor o visitante
para um ambiente de caverna.
Os circuitos das exposições do Memorial são, em sua maioria, livres, não
delimitando a trajetória que o público deve fazer de forma rígida, entretanto, na sala Minas
Rupestre, mesmo com a autonomia de ir e voltar no local, a entrada e saída do espaço é
bem demarcada, justamente por trabalhar com transposição ambiente. Aqui a intenção seria
a de apagar os vestígios de influência visual do exterior da sala (Imagem 1), através da
baixa incidência de luz e da proteção do espaço por cortinas, assim o olhar do visitante
seria completamente preenchido pela sala em si, sem influências externas, encontrando a
imediação de Bolter e Grusin (1999).
Imagem 1 – Visão Geral da Exposição Minas Rupestre
Fonte: Revista Ecológico, 2014
Além disso, a mescla de muitas mídias também é característica desse espaço, como
apontamos acima, transformando o ato final de performance da sala como algo interativo,
caracterizando-se como a hipermediação de Bolter e Grusin (1999). Além de encontrar a
ecologia de mídias, na exposição especificamente falando, e na própria relação do museu
como meio com outros espaços e mídias.
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Através da cenografia e ambientação audiovisual, principalmente, a remediação
pode ser observada em todo o circuito de Minas Rupestre. Ao entendermos a sala como
mídia, os vários outros meios que são sobrepostos nesse espaço trabalham para criar o
ambiente da exposição e atingir seu objetivo de comunicação. Assim, na exibição, a
estrutura foi retrabalhada a partir da implantação de novos/diferentes suportes dos vistos em
salas tradicionais de museus (acervos e iluminação, basicamente), para uma gama muito
mais ampla de meios, que trabalhados em conjunto levam a uma remediação da exposição
enquanto mídia.
Ao mesmo tempo, a hipertextualidade de Kerckove (2003) aparece até mesmo na
divisão de sua análise de eras, entre oralidade, escrita e eletricidade, uma vez que esses três
aspectos são levados em consideração na sala, por sua temática. Mas, além dessa
coincidência, a tecnologia e sua gama de objetos aponta para um trabalho sobre o contexto
a partir de suportes sensoriais, que visam a ampliação da experiência, justamente o que
encontramos na exposição.
Minas Rupestre trabalha com a cenografia das paredes de uma caverna, com escritas
e pinturas imitando a arte rupestre; a temperatura ambiente é baixa, como se o público
realmente tivesse adentrado uma sala cavada na terra; existe a mescla com acervos, como a
réplica do esqueleto de Luzia, além de representação da pré-história com o aspecto de
museus escolares de história natural (com a recriação de espaços em vitrines) e textos
informativos (Imagem 2); a ambientação sonora também se faz presente, com leve som
ambiente; além disso, a baixa iluminação em união com os recursos audiovisuais, buscam
transparecer o estilo visual daquele período, ao mesmo tempo que as pinturas rupestres
projetadas e identificadas nas paredes se alteram com o movimento dos corpos dos
visitantes, assim, dependendo do posicionamento que o público assume dentro do espaço, é
possível alterar a localização e a forma das artes, colocando o espectador como primeira
pessoa na visita, que tem capacidade de controlar parte do local. (Imagem 3).
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Imagem 2 - Detalhe de vitrine.
Fonte: Fotografia da autora.
Imagem 3 - Detalhe do acervo audiovisual com influência de movimentação do público.
Fonte: Super Uber, 2013.
Todos esses aspectos de constituição trabalham conjuntamente para realizar a
composição deste espaço enquanto exposição. A partir da tendência trazida desde o início
do século XXI nas instituições museológicas, que versam sobre a transformação destes
locais segundo uma perspectiva de experiências dos visitantes, a existência de mescla de
acervos, mídias e suportes, imersão nos ambientes, além da possibilidade de interatividade
se tornam aspectos essenciais de fruição. E, essa interpretação das performances tidas IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Gerais
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nesses espaços, trazem outras formas com as quais os museus podem tratar as informações,
para atingir seu objetivo como meio comunicador e de formação crítica.
CONSIDERAÇÕES FINAIS.
Percebemos com esses apontamentos que o cruzamento dos conceitos de ecologia
de mídia, remediação e hipertexto se fazem presentes nos ambientes digitais e virtuais, mas
também são condizentes com discussões referentes a ambientes e espaços físicos, como na
exposição Minas Rupestre. A sala se apresenta como meio que atua com a incorporação e
reutilização de diversos elementos midiáticos, assim como apontado por Bolter e Grusin
(1999), dando um novo formato para as tradicionais exposições e colocando-as no âmbito
da ecologia de mídia, como um meio no sentido de ambiente, que influência a forma como
as pessoas se relacionam com aquele espaço e as informações ali veiculadas. Além disso, a
hipertextualidade se faz presente ao pensarmos na experiência vivenciada nesse
entrecruzamento e multiplicidade de meios, como forma de ampliação sensorial.
Nesse sentido, faz-se importante associar esses conceitos trazidos da comunicação e
aplicá-los aos estudos dos espaços e museus, com possibilidades geradas pelo diálogo com
a museologia. Isso porque, além das áreas dialogarem justamente na concepção das
exposições - o ato comunicativo das instituições - ao associarmos esses conceitos à área dos
museus, ampliamos o debate sobre a forma como as informações podem ser vinculadas
nesses espaços, almejando formas mais eficientes e experimentais de diálogo com o
público.
REFERÊNCIAS
BOLTER, J. David; GRUSIN, Richard. Remediation: Understanding new media. MIT Press, 1999.
ECOLÓGICO, Revista. As Muitas Minas no Museu VIII: Minas Rupestre. Disponível em: <http://www.revistaecologico.com.br/materia.php?id=83&secao=1375&mat=1528>Acesso em: 06 nov. 2016.
KERCKHOVE, Derrick. Texto, contexto e hipertexto: três condições da linguagem, três condições da mente. Famecos, n. 22, dezembro, 2003.
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MENESES, Ulpiano T. B. Os Museus na Era Virtual. IN: IN: BITTENCOURT, José Neves; BENCHETRIT, Sarah Fassa; GRANATO, Marcus. Museus, Ciência e Tecnologia. Livro do Seminário Internacional. Museu Histórico Nacional: Rio de Janeiro, 2007. p. 49-70.
SCOLARI, Carlos A. Ecología de los medios: de la metáfora a la teoria (y más allá). IN: SCOLARI, Carlos A. (Org.) Ecología de los Medios: entornos, evoluciones e interpretaciones. Barcelona: Gedisa, 2015.
SCOLARI, Carlos A. Media ecology: exploring the metaphor to expand the theory. Communication Theory, vol. 22, n.2, mai./2012. P. 204-225. Disponível em: <https://drive.google.com/file/d/0B19fnVg9-hoDRWYxd0hGTUUzYkE/view>. Acesso em: 22 ago. 2016.
SUPER UBER. Memorial de Minas Gerais – Vale. Projeto Multimídia e Interativo. Disponível em: <http://www.superuber.com.br/memorial-de-minas-gerais-vale/>. Acesso em: 06 nov. 2016.
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