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COESÃO E COERÊNCIA TEORIA
1.Coesão
Termo que designa os mecanismos linguísticos de sequencialização que instituem
continuidade semântica entre diferentes elementos da superfície textual. Esses
mecanismos envolvem processos léxico-gramaticais diversos, dos quais destacamos as
cadeias de referência, as reiterações e substituições lexicais (coesão lexical), os
conectores interfrásicos (coesão interfrásica), a ordenação correlativa dos tempos
verbais (coesão temporo-aspectual). A unidade semântica do texto é assim garantida
por uma organização formal que permite articular e interligar sequencialmente
diferentes componentes.
1.1. Cadeia de referência
Quando num texto há um ou mais fragmentos textuais sem referência autónoma, cuja
interpretação depende do valor referencial de uma expressão presente no discurso
anterior (anáfora) ou subsequente (catáfora) estamos perante uma cadeia de referência.
No enunciado "O Pedro lidera a turma. Os colegas apoiam-no incondicionalmente e
estão do lado dele em todas as situações", a expressão nominal [O Pedro] e os pronomes
pessoais [o] e [ele] formam uma cadeia de referência, dado que o referente das formas
pronominais é estabelecido pela expressão nominal, presente no contexto verbal. As três
estruturas sublinhadas reenviam para o mesmo referente, ou seja, para a mesma entidade
do mundo.
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1.1.1. Anáfora
Fala-se de anáfora quando a interpretação de uma expressão (habitualmente designada
por termo anafórico) depende da interpretação de uma outra expressão presente no
contexto verbal (o termo antecedente). Mais concretamente, a expressão
referencialmente não autónoma (o termo anafórico) retoma, total ou parcialmente, o
valor referencial do antecedente. Há casos de anáfora em que o termo anafórico e o
antecedente são co-referentes (isto é, designam a mesma entidade, como os exemplos 1
e 2 ilustram), mas há também casos de anáfora sem co-referência (ex.3).
Ex 1) O João está doente. Vi- o na semana passada.
Aqui, o pronome pessoal o é o termo anafórico, referencialmente dependente, que
retoma o valor referencial do grupo nominal o João.
Ex 2) A Ana comprou um cão. O animal já conhece todos os cantos da casa.
Aqui, o termo anafórico é o grupo nominal o animal, que retoma o valor referencial do
antecedente o cão. É a relação de hiponímia/hiperonímia entre cão e animal que
suporta a co-referência.
Ex 3) A sala de aulas está degradada. As carteiras estão todas riscadas.
Aqui, a interpretação referencial do grupo nominal as carteiras depende da sua relação
anafórica com o grupo nominal a sala de aulas. Entre os lexemas em causa, há uma
relação parte-todo (ver meronímia e holonímia) que sustenta a relação anafórica.
Ex 4) O João faz 18 anos no dia 2 de Julho de 2001. No dia seguinte parte para uma
grande viagem pela Europa.
Aqui, exemplifica-se um caso de anáfora temporal. O valor referencial da locução
adverbial no dia seguinte constrói-se a partir da interpretação do termo antecedente, a
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expressão temporal no dia 2 de Julho de 2001. Assim, o dia seguinte designa o dia 3 de
Julho de 2001.
1.1.2. Catáfora
Numa cadeia de referência, a expressão que estabelece o referente pode ocorrer no
discurso subsequente àquele em que surgem as expressões referencialmente
dependentes habitualmente designadas por termos anafóricos (anáfora). Quando a
cadeia de referência exibe esta ordenação linear, o termo catáfora substitui o termo
anáfora. No fragmento textual "A irmã olhou-o e disse: - João, estás com um ar
cansado", o pronome pessoal o é uma expressão referencialmente não autónoma, cujo
valor depende da interpretação de uma expressão presente no contexto discursivo
subsequente, o nome próprio João. Catáfora designa este tipo particular de anáfora, em
que o termo anafórico precede o antecedente.
1.1.3. Elipse
Na frase "O Rui caiu e fracturou uma perna", verifica-se a elipse do sujeito da segunda
oração, mas esse sujeito continua a ser interpretado anaforicamente, por retoma do valor
referencial do antecedente ‘O Rui’.
1.1.4. Co-referência não anafórica
Duas ou mais expressões linguísticas podem identificar o mesmo referente, sem que
nenhuma delas seja referencialmente dependente da outra. Fala-se, então, de co-
referência não anafórica. No texto "O Rui foi trabalhar para África. Finalmente, o
marido da Ana conseguiu concretizar o seu sonho", as expressões ‘O Rui’ e ‘o marido
da Ana’ podem ser co-referentes, ou seja, podem identificar a mesma entidade, sem que
nenhuma delas funcione como termo anafórico. Naturalmente, só informação de
carácter extralinguístico permite afirmar se há ou não co-referência entre as duas
expressões nominais.
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1.2. Coesão Lexical
Mecanismo de coesão textual que envolve a repetição da mesma unidade lexical ao
longo do texto ou a sua substituição por outras unidades lexicais que com ela mantêm
relações semânticas de natureza hierárquica (hiponímia, hiperonímia) ou não
hierárquica (sinonímia, antonímia).
Veja-se o seguinte fragmento textual: "Quando chegou a casa, o Rui viu um carro
estacionado em frente da sua garagem. Ficou intrigado: o veículo não lhe era familiar."
A substituição da palavra carro (hipónimo) pela palavra veículo (hiperónimo) assegura
coesão lexical e garante simultanemanente identidade referencial (o carro e o veículo
designam o mesmo objecto).
1.3. Coesão Interfrásica
Designa os mecanismos de sequencialização que marcam diversos tipos de
interdependência semântica entre as frases que ocorrem num texto. Basicamente, a
conexão interfrásica é assegurada pelos conectores, que podem ser conjunções (ex.1) ou
advérbios conectivos(ex.2).
(1) Parto para férias, quando acabar o relatório.
(2) Estou disposta a abdicar do feriado.Agora, não me peçam que trabalhe 12 horas por
dia.
1.4. Coesão Temporo-Aspectual
Designa os processos que asseguram compatibilidade semântica ao nível da localização
temporal e da ordenação temporal relativa das situações textualmente representadas.
A utilização correlativa dos tempos verbais é um dos mecanismos que garante a coesão
temporal: se se pretende representar uma situação passada que se sobrepõe
temporalmente a uma outra, também ela pertencente à esfera do passado, é necessário
recorrer a uma forma de Imperfeito do Indicativo e a uma forma de Pretérito Perfeito
Simples: (1) Quando o João nasceu, a Ana tinha cinco anos. Seria inaceitável o
fragmento (1a) Quando o João nasceu, a Ana teve cinco anos.
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Os advérbios de localização temporal devem igualmente ser compatíveis com os tempos
verbais seleccionados: veja-se o contraste entre a boa formação semântica de (2)
Amanhã, vou ao cinema e a inaceitabilidade de (2a) Amanhã, fui ao cinema.
Para que a coesão temporal seja assegurada, é ainda necessário compatibilizar os
valores aspectuais das expressões predicativas com o valor semântico dos conectores de
valor temporal utilizados. Confronte-se a boa formação semântica de (3) Enquanto o
João arrumava a cozinha, a irmã atendeu cinco telefonemas com a inaceitabilidade de
(3a) Enquanto o João atingiu a meta, a irmã desmaiou.
Saliente-se, por fim, que a ordenação textual linear dos eventos representados deve
corresponder à ordem pela qual ocorreram no mundo, ou seja, a descrição de eventos
anteriores deve preceder a descrição de eventos posteriores: (4) Entrou na livraria e
comprou o último Saramago. Quando esta condição não é respeitada, derroga-se a
coesão temporal e a própria coerência do texto: (4a) Comprou o último Saramago e
entrou na livraria.
Preencha os espaços de forma a que o texto evidencie coesão temporo-aspectual:
Logo que chegou à estação, comprou o bilhete, enquanto esperava até o comboio
chegar.
2.Coerência Lógico-Conceptual
Um texto é coerente se as situações nele recriadas forem conforme àquilo que sabemos
acerca do mundo e se forem respeitados alguns princípios básicos de natureza lógico-
conceptual.
A coerência não releva, portanto, do plano estritamente idiomático. Se se disser "As
ruas estão molhadas porque não choveu", produz-se um texto incoerente, porque se
estabelece um nexo de causalidade que entra em ruptura com a nossa apreensão
cognitiva do mundo.
Há três princípios gerais que devem ser respeitados na estruturação de um texto
coerente: a não contradição, a não tautologia e a relevância. Estes princípios
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funcionam como constrições de natureza cognitiva, lógico-conceptual, que suportam a
coerência de um texto.
1. O princípio da NÃO CONTRADIÇÃO exclui de um texto que se pretende coerente
a representação de situações logicamente incompatíveis: não será coerente um
fragmento do tipo “O número 3 é ímpar e é par”.
2. O princípio da NÃO TAUTOLOGIA implica que um texto coerente não seja
informativamente nulo. No fragmento “As viúvas só recebem 50% das pensões do
respectivo marido. Só têm direito a 50% do dinheiro que o marido recebia em vida”, a
derrogação do princípio da não tautologia dá origem a uma taxa de redundância
inaceitável num texto coerente. um texto coerente deve conter alguma informação. A
repetição das mesmas ideias por palavras diferentes torna o texto excessivo e rebuscado:
Um jantar abundante ...um banquete, uma copiosa refeição...
Tautologia é o vício da linguagem que consiste em repetir a mesma ideía por palavras
diferentes
3. O PRINCÍPIO DA RELEVÂNCIA exclui a representação de situações/eventos que
não estejam relacionados entre si. O que distingue um texto coerente de um conjunto
heteróclito de enunciados é justamente o facto de, no primeiro, se recriarem situações
que se interligam (espacial ou temporalmente, ou em função de conexões de diversa
ordem: causa/consequência, meio/fim, contraste, etc).
A festa estava óptima. Os donos da casa receberam-me com toda a amabilidade e
simpatia. Esperei muito antes que chegassem os meus amigos, pois chegaram,
finalmente, atrasados, mas alegres, como sempre. Por fim divertimo-nos muito, apesar
de tudo. (Será necessário seleccionar a informação relevante e suprimir aquela que pode
estar implícita.}
De salientar ainda que a coerência textual envolve continuidade temática e
progressão semântica. A continuidade implica a recorrência de informação ao longo
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do desenvolvimento linear do texto (ver coesão); a progressão implica a renovação da
informação ao longo das sequências textuais.
Verifique da coerência das seguintes frases:
O concerto foi espectacular, porque o público não o ouviu.
A Susana é solteira e casada.
O número 16 é superior e inferior a 15.
3.COERÊNCIA PRAGMÁTICA-FUNCIONAL
Qualidade do discurso atinente à consideração da articulação estabelecida entre os actos
ilocutórios, tomados como sobredeterminados por uma configuração discursiva global,
a que cada um dá realização local.
A exigência de adequação de um acto em sequência ao contexto conduz ao apuramento
de um esquema de relação de tipo funcional e hierárquico entre os actos ilocutórios. É
na orientação accional - intermédia e global - do discurso que o acto ilocutório, para
além de força ilocutória que o identifica, obtém na cadeia discursiva uma função
ilocutória: ele prepara a aceitação do segundo acto, mas um terceiro acto aparecerá
implementado pelos dois anteriores. Dizemos, então, que é a função ilocutória do
primeiro e segundo acto que os configura como actos subordinados relativamente ao
terceiro acto: o acto director. Este desenho de articulação entre actos ilocutórios
expandir-se-á até à consumação de uma intenção comunicativa global que preside ao
texto.
A caracterização do discurso em termos ilocutórios elaborada em torno da sua
coerência pragmático-funcional contribui para a assumpção de uma visão alargada do
sentido: um sentido accional que se realiza e se funde com outras dimensões
significativas vinculada à enunciação.
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Uma perspectiva pragmática e funcional contribui para um melhor
aproveitamento da produtividade da linguagem e para criação de um contexto
conveniente.
O texto é construído e articulado com coerência, de acordo com a intenção
comunicativa do locutor.
Cada acto ilocutório determina uma adaptação das palavras, das frases, da
interligação entre as frases, em função da finalidade pretendida.
Assim, as intenções dos falantes e os efeitos dos enunciados nos interlocutores
devem ser considerados no momento da produção do discurso, que será
adequado (coerente) a essas intenções e efeitos.
EXERCÍCIOS
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